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82909959 Areia e Espuma Gibran Khalil Gibran

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  • GIBRAN KHALIL GIBRAN

    AREIA E ESPUMA COM UM ESTUDO DE MANSOUR CHALLITA

    SOBRE A VIDA, OBRA E MENSAGEM DE GIBRAN

    Assoc iao Cultural Internacional Gibran

  • Becharre, a cidade natal de Gibran no Lbano

  • T O D A grande vida uma conquista. E em toda grande vida, h lutas e sofrimentos pro-curados e aceitos cofh vista a um triunfo determinado, enquanto as vidas comuns co-nhecem apenas as lutas e os sofrimentos impostos pelas circunstncias.

    Gibran escreveu, em 1908, a Amine Gho-raieb: "H em nossas vidas algo mais nobre do que a celebridade: so as aes elevadas que constituem o fundamento da celebridade. Sinto nas profundidades do meu ser um poder que deseja encobrir sua nudez com uma bela roupagem de aes elevadas."

    Em As Tempestades, escrever: "Se tivesse de escolher entre a alegria e a tristeza, no trocaria as tristezas do meu corao pelas ale-grias do mundo inteiro."

    De maneira mais categrica, declarava em 1910: "Gosto que haja dificuldades em minha vida. Pois quero e espero super-las. Sem obstculos, no haveria nem esforo, nem luta. E a vida seria inspida."

    Gibran desejou, pois, a luta e aceitou suas exigncias. E essa luta nersistiu em toda sua vida.

    Qual o propsito dessa luta? O engrandeci-mento e a elevao do homem. E a sua libertao.

    Na primeira fase de sua vida e de sua obra, o homem que Gibran queria elevar e liber-tar era o homem de um determinado pas e

  • de uma determinada classe social. Era o ho-mem do povo do Lbano e de outros pases orientais, oprimido pelo clero e pelos senhores feudais, e em quem Gibran desejava insuflar bastante orgulho e audcia para torn-lo capaz de se erguer contra seus opressores. Visava a libertar o homem do homem. E essa libertao deveria ser feita pela revoluo.

    Na segunda fase, o objetivo mesmo da luta se eleva. O homem que Gibran procura ento engrandecer e libertar tanto o ocidental quanto o oriental, tanto o opressor quanto o oprimido; e quer libert-los, no mais uns dos outros e, sim, das limitaes mais perni-ciosas impostas a todos eles pelas enfermida-des e cegueiras inerentes sua condio hu-mana. E essa libertao deveria ser feita pela sabedoria.

    No decorrer de uma e de outra fase, a luta de Gibran desenvolveu-se paralelamente na sua vida e na sua obra. Esfora-se por im-plantar em sua vida os ideais que prega em sua obra, e glorifica em sua obra as virtudes que procura realizar na sua vida.

    Todos seus heris so a sua prpria perso-nificao: desde Khalil o Ateu, at Joo o Louco, at O Profeta, at o prprio Jesus. Atravs das peripcias da sua vida, todos lutam e sofrem, como le prprio, para fazer triunfar um ideal.

    Poucos escritores tm-se identificado a tal ponto com seus heris. Poucos pensadores tm realizado igual unidade entre sua vida e sua obra.

    E o mais notvel que Gibran no somen-te desejou essa luta. Estava convencido de ter sido enviado a este mundo para desempenhar uma misso. E essa convico deu sua obra um calor messinico que muito contribuiu para dot-la da seduo que a caracteriza.

  • "AMO AS TEMPESTADES

    ^ y i B R A N nasceu na pequena cidade li-banesa de Becharre, a 6 de dezembro de 1883.

    Seu pai era fiscal de rebanhos. Desde tenra idade, Gibran o acompanhava nas suas pere-grinaes atravs de prados e colinas e ia povoando a imaginao com cenas da nature-za que, mais tarde, transformaria em alegorias e parbolas, como Jesus havia transformado em parbolas, no Evangelho, as cenas bucli-cas da Galilia.

    Desde cedo, Gibran manifestou o tempera-mento que o caracterizaria na vida. Uma vez, num acesso precoce de anticlericalismo, cari-caturou o padre-professor sob os traos de um asno adormecido, a cabea coberta por um solidu.

    Tinha oito anos quando, um dia, um ven-daval passa por sua cidade. Gibran observa, fascinado, a natureza em fria e, estando sua me ocupada, abre a porta e sai a correr com os ventos. Quando a me, apavorada, o alcana e repreende, ele responde com todo o ardor das suas paixes nascentes: "Mas , mame, eu gosto das tempestades. Gosto delas! Gosto ! "

    Gostar delas toda a sua vida, mais ainda no sentido social do que cosmolgico. Sua obra-prima rabe intitular-se-, justamente, Al-Auassef (As Tempestades).

    Gibran aos 15 anos

  • Sua sensibilidade artstica e sua devoo por Jesus manifestam-se tambm cedo.

    Passava horas a desenhar. Mas, assim que seus desenhos estavam prontos, destrua-os, pois "les no se assemelham nunca aos que vejo quando meus olhos esto fechados", explicava.

    Uma certa Sexta-Feira Santa, desapareceu misteriosamente. Procuraram-no em toda par-te e acabaram encontrando-o no meio da flo-resta, a roupa rasgada, carregando uma bra-ada de flores silvestres. Explicou me em lgrimas que havia recolhido essas flores nas vertentes escarpadas em lembrana dos sofri-mentos de Cristo.

    E j amava a natureza. Amava-a maneira romntica. Amava os rjachos e as cascatas, a flauta do pastor ao crepsculo, as folhas que tombam no outono.

    Em casa, a vida no era idlica. O pai, um bomio de olhos azuis, de companhia alegre, j u mas de ambies limitadas, ganhava pouco e bebia muito. A me, Camila, morena, ativa, | gil, sonhava com outra vida para seus filhos.

    Entre a mulher e o marido, as discusses eram frequentes.

    "No receias os carrapatos para esta crian-a?" recriminava Certa vez a mulher contra o marido que queria levar Gibran com ele a ** selvas distantes. "Quero antes mostrar-lhe que as mordeduras dos carrapatos so menos ve-nenosas do que as mordeduras da lngua da sua me," retrucou o marido. A m e d e Gibran

    Em 1894, Gibran, sua me, suas duas irms, Sultane e Mariana, e seu irmo Butros emi-gram para os Estados Unidos e estabelecem-se em Boston. O pai permanece em Becharre:

  • Quatro anos mais tarde, Gibran volta ao Lbano, a fim de completar os estudos do rabe, e se matricula no Colgio da Sabedo-ria em Beirute. A o superior que procura acal-mar sua ambio impaciente, explicando-lhe que uma escada deve ser galgada degrau por degrau, Gibran retruca: "Mas as guias no precisam de escadas!"

    N o colgio, deixava o cabelo crescer at os ombros; e quando a administrao se ops a essa moda, ameaou abandonar o colgio. Deixaram-lhe sua cabeleira!

    Percorria as montanhas, como outrora, em companhia do pai. Gostava de ler a Bblia e de contemplar a vida dos campos e das flo-restas.

    Mas descobre, tambm, o drama doloroso do povo espoliado pelo clero e pelos latifun-dirios, sombra de instituies e abusos se-melhantes aos da Europa, antes da Revoluo Francesa.

    Acumularia, ento, na alma, uma raiva surda contra os opressores; e seus primeiros escritos sero uma tentativa para provocar a revolta das massas contra eles, como haviam feito os Enciclopedistas franceses. E o cora-o interveio para exasperar a revolta. Gibran conheceu e amou com a exaltao de toda primeira paixo uma bela e simples cam-ponesa, Hala Daher, e props-lhe casamento. Mas o tio da jovem era bispo, e no permitiu sobrinha desposar um anticlerical, aumen-tando assim a ira de Gibran contra o clero.

    Gibran no conheceu outro amor igual e nunca se casou. O mesmo aconteceu com Hala Daher. Quando, trinta anos mais tarde, devolveram ao Lbano o corpo inanimado de Gibran, uma mulher vestida de preto rompeu

  • a multido, aproximou-se do caixo e deposi-tou um beijo nos lbios gelados, retirando-se em seguida. Era Hala Daher. Morreria anos depois em Becharre, velha, solitria c cega.

    Em 1901, Gibran voltou a Boston e teve a infelicidade de perder, no espao de um ano e meio, o irmo, a me e a irm Sultane, vi-timados pela tuberculose.

    Em 1905, publica sua primeira obra, um pequeno livro rabe de 13 pginas, que tinha por ttulo e por assunto: a msica. So consi-deraes poticas sobre a msica, "linguagem da alma e do corao", evocando seu papel e influncia em todas as pocas e em todos os povos: na dor e na alegria, na adorao e na dvida, na pobreza e na opulncia, tanto sobre os pastores como sobre os reis.

    "Como o amor, o apelo da msica univer-sal. E seus ritmos expressam rodas as estaes da alma.

    O homem no sabe o que diz o pssaro ou o crrego ou as ondas ou a chuva. Mas seu corao percebe misteriosamente o sentido de todas essas vozes, que ora o alegram e ora o entristecem."

    No ano seguinte, publica seu segundo livro, tambm em rabe: As Ninfas do Vale, com-posto de trs novelas que do vazo, sob o vu da fico, a seus dios revolucionrios.

    Joo, o Louco, a mais representativa entre elas, a histria de um jovem pastor que, absorto na leitura do Evangelho, distrai-se das suas vacas; e elas penetram no vinhedo do convento So Ezequias e danificam algumas cepas. Os monges apoderam-se das vacas e exigem do pobre Joo exorbitante indeni-zao.

  • Joo esfora-se, em vo, por sublevar o povo. Demonstra como os monges traem Jesus, levando uma vida contrria ao seu en-sinamento. Mas o povo permanece submisso e aptico. Mesmo o pai e a me do rapaz ficam amedrontados com seu ateismo e tomam o partido dos monges contra ele.

    Joo dirige ento a Jesus esta comovente splica:

    " Jesus, que ests sentado no meio da luz celestial, olha para esta terra que ontem visi-taste. Olha: os espinheiros sufocam os rama-lhetes de flores cujas sementes regaste com o suor de tua fronte; os lobos devoram o cor-deiro que carregaste no teu colo... Os que ocupam os tronos em teu nome e pregam, dos plpitos, tua doutrina so surdos aos ge-midos das vivas e aos apelos dos rfos e dos indigentes... Ergueram igrejas para glo-rificar seus prprios nomes e cobriram as pa-redes de seda e de ouro, enquanto deixavam nus os corpos martirizados de teus eleitos, os pobres. . . Volta, Jesus imortal, e expulsa de teus templos os vendedores de religio..'. Vem libertar e erguer de novo os humildes dominados e explorados... "

    Em 1908, Gibran publica um outro livro do mesmo gnero, sob um ttulo ainda mais eloquente: As Almas Rebeldes. A obra con-tm quatro novelas: Uardi Al-Hani, Os Tmu-los Gritam, Alcova de Noiva e Khalil o Ateu.

    Contra que se rebelam essas almas? Con-tra as unies matrimoniais venais; contra a crueldade das leis que justificam o assass-nio do homem pelo homem; contra a sujei-o da mulher; contra a opresso dos pode-rosos.

  • LIBERTAR O HOMEM DO HOMEM

    A P R I M E I R A fase da luta de Gibran est toda contida nessas sete histrias. A o analis-las, percebem-se ao mesmo tempo a qualidade dos seus sentimentos e a fraqueza e fora de suas idias.

    Seus sentimentos so, a toda a evidncia, o reflexo de um corao sensvel aos sofri-mentos humanos e que, como Jesus, que ele toma incessantemente como modelo, se colo-ca com ardor ao lado dos deserdados e dos humildes.

    Mas evidente tambm que, a seus senti-mentos, como a suas idias, faltam a matu-ridade e uma compreenso mais profunda.

    Para ele, a humanidade divide-se esquema-ticamente em duas classes: os pobres e os ricos os dominados e os dominadores. Os primeiros so todos bons: preciso apoi-los; os segundos so todos perversos: preciso combat-los.

    Sua luta contra o casamento imposto mulher se transforma em luta. contra a pr-pria instituio do casamento.

    Sua luta contra os abusos da lei se trans-forma em luta contra todas as leis.

    Prega uma vida humana to liberta dos liames como a vida dos pssaros.

    "Tudo neste mundo, das rvores aos pssa-ros, vive de acordo com a vocao de sua na-

  • tureza, e desta vocao recebe a glria da liberdade e da alegria. Somente os homens so privados desta graa porque submeteram suas almas divinas a leis humanas limitadas e encarceraram suas aspiraes e enterraram seus coraes. E quando algum se rebela contra essas supersties, chamam-no malva-do e decaido e impuro...

    Mas permanecer o homem assim escravi-zado pelas suas leis viciadas at o fim dos tempos ou libertar-se- para viver do esprito e para o esprito?" (Uardi Al-Hani).

    Entretanto, apesar de suas fraquezas, esses dois livros tiveram uma repercusso extraor-dinria por todo o Oriente rabe. s massas oprimidas, levavam a vingana e a esperana. Anunciavam novamente o dia em que os mansos se apropriariam da Terra.

    A o mesmo tempo, os livros impunham-se pela sua beleza literria. Renovavam a litera-tura rabe, ento ressecada e decadente, com o sopro da vida e da Natureza, como os ro-mnticos haviam feito na Europa no sculo X I X . Traziam s elites, cansadas das sonori-dades e acrobacias ocas, uma vibrao e um colorido que encantavam.

    Em 1908, Gibran sai dos Estados Unidos para Paris, onde iria passar dois anos a aper-feioar seus dotes artsticos graas ao amparo amigo de uma norte-americana de grande co-rao, Mary Haskel, que lhe envia todos os meses setenta e cinco dlares, tal uma bolsa de estudos.

    Em Paris, Gibran estuda na Acadmie Julien com uma aplicao de devoto, frequen-ta os museus, as bibliotecas, as exposies, os teatros. Mede a insignificncia do que produ-ziu, em comparao com as grandes obras da humanidade. Mas no se desencoraja. Sente

    Mary Haskel

  • cm si um poder capaz de faz-lo alcanar as alturas. Encontra Rodin, que lhe prediz um grande futuro.

    Os setenta e cinco dlares mensais no lhe permitem uma vida folgada. Assim mesmo, sacrifica seu conforto pessoal aos seus gostos aristocrticos. Vive num pequeno apartamen-to asctico, economiza nas refeies, para poder comprar roupas mais elegantes, viajar em primeira classe e distribuir gorjetas com liberalidade.

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    May Ziade

    APAIXONADO, IDEALISTA,

    SOLITRIO

    O s T R A O S de seu carter e de sua vida se f ixam definitivamente: apaixonado, idealis-ta, ambicioso, solitrio, feliz e triunfante em seu trabalho, mas perseguindo uma felicidade sentimental que sempre lhe fugir apesar da importncia primordial que d ao amor em sua escala de valores.

    N o f im de sua estada em Paris, tem a satis-fao de ver uma das suas telas escolhida para a Exposio das Belas Artes de 1910.

    De volta aos Estados Unidos, transfere-se

  • de Boston para Nova York, onde suas ambi-es esperam encontrar um campo mais vasto. Instala-se em Greenwich Village, num peque-no apartamento que lhe serve, ao mesmo tem-po, de estdio e de domiclio. Sobre as pa-redes, pendem grandes telas, nas auais se destaca Jesus Crucificado. Num canto, um leito estreito de solteiro. O conjunto forma mais uma cela de anacoreta do que uma casa de artista. Seus amigos o apelidam " o er-mitrio".

    nesse apartamento que Gibran viver e trabalhar at o fim de sua vida, um homem solitrio a quem a felicidade pessoal escapar sempre e que se consola entregando-se inteira-mente ao culto da arte e da sabedoria.

    Em casa, gostava de vestir um roupo oriental, beber caf turco, que ele prprio preparava, e encher o ar com a fumaa de seus cigarros ininterruptos.

    Em 1912, publica As Asas Quebradas, um romance que relata seu amor infeliz Dor Hala Daher, chamada no romance Selma Karame.

    O livro liga-se primeira fase de sua vida e luta. violentamente anticlerical e pe em relevo, mais uma vez, o contraste entre as pa-lavras e o comportamento do clero.

    Uma vez mais, tambm, deplora a cruelda-de com que a sociedade nega os direitos da paixo e mantm a mulher sob o jugo.

    Mais, porm, do que pelas teses, o livro faz poca pelo seu romantismo: o culto da mu-lher amada, o culto da Natureza e o emprego sistemtico da imagem e da parbola.

    "Selma Karame foi a primeira mulher a despertar meu corao, por seus encantos, e a guiar-me ao paraso dos sentimentos puros.. . Foi ela quem me ensinou, por sua beleza, a adorar a beleza."

  • AS PROMESSAS DA AURORA

    C M 1914, Gibran publica uma coleo de poemas em prosa, contos, meditaes filosfi-cas e parbolas, sob o ttulo de Uma Lgrima e um Sorriso. O ttulo simboliza a vida de Gibran (e toda vida humana) que caminha entre alegrias e tristezas.

    Os temas predominantes so: a beleza do amor purificado, a superioridade da vida do campo sobre a vida das cidades, a procura do sentido profundo das coisas, a ternura para com os fracos e os decados, a condenao dos exploradores e dos ricos.

    O modo de expresso quase exclusiva-mente a imagem. O livro contm parbolas poderosas, que j anunciam o grande Gibran. A Morte do Rico um exemplo tpico:

    "No silncio da noite, a Morte desceu do alm e entrou na casa do rico e lhe tocou a fronte. E o rico despertou em sobressalto. E quando viu a sombra da Morte, gritou, ao mesmo tempo revoltado e aterrorizado:

    "Afasta-te de mim, sombra maldita; afasta-te de mim, ladra! Seno, chamarei meus escra-vos para que te despedacem."

    A Morte aproximou-se mais e retrucou:

    "Sou a Morte. Reflete e escolhe tuas pa-lavras. "

    O rico replicou: "Que queres de mim to cedo? Que esperas dos poderosos como eu?

  • Vai visitar os pequenos. Sai daqui, com tuas unhas cortantes e tua cabeleira enrolada como serpentes. Vai. No tenho nenhuma vontade de ver tuas asas grotescas e teu corpo dis-forme. "

    Mas, depois de um silncio turbado, retra-tou-se:

    "No, no, Morte benevolente, no me julgues por minhas divagaes. O medo faz dizer o que a razo condena. Toma uma por-o do meu ouro, ou algumas almas de meus escravos, e poupa-me. Tenho contas com a vida, que ainda no liquidei. Tenho crditos a receber. Tenho, pelas ondas, navios que ain-da no alcanaram o porto. Tenho, sob a ter-ra, sementes que ainda no germinaram. Leva o que quiseres dessas riquezas, mas poupa-me. Tenho concubinas belas como a aurora: esco-lhe entre elas a que desejares. Escuta, Morte, tenho um filho nico. a concretiza-o de todas as minhas esperanas. Ieva-o, e deixa-me. Leva tudo o que quiseres. Leva tudo. Mas poupa-me."

    Ento a Morte ps a mo sobre a boca do escravo da vida e tomou sua verdade e a en-tregou ao vento. . ."

    (No resto da histria, a Morte visita um pobre, que restitui sua alma sem discutir).

    Em 1919, Gibran publica, sob forma de livro abundantemente ilustrado com desenhos seus, um longo poema buclico, As Procis-ses, que consiste num dilogo entre dois ho-mens: um, criticando a vida das cidades, seus vcios, sofrimentos e crueldades; o outro, exal-tando a vida dos campos, singela, pacfica, pura e feliz.

    Na realidade, a primeira voz v somente as aparncias da vida e impressionada pelas suas contradies e imperfeies; a segunda

  • penetra at o fundo das coisas e l descobre sua beleza e harmonia. O poema a manifes-tao do estado de alma de Gibran, ainda revoltado pelas injustias e contradies da vida, mas j descobrindo que, alm dessas aparncias, onde pra o observador superfi-cial, existe uma verdade mais profunda, capaz de explicar e conciliar as contradies.

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    GRANDEZA E MEDIOCRIDADE

    E m 1920, apareceu o ltimo livro rabe de Gibran, As Tempestades, no qual o revolucio-nrio atinge um paroxismo que ser seu me-lhor remdio. Sua revolta e sua clera no se limitam mais s injustias e imperfeies que resultam das instituies sociais: estendem-se humanidade toda, a todos os homens, s suas leis, s suas trad es, s suas opinies.

    Alm disso, essa revolta universal apresen-ta-se tinta de um desprezo sarcstico, que no condiz com a alma naturalmente compassiva de Gibran, e se explica pela influncia que Nietzsche exercia ento sobre le.

  • Clera e desprezo exprimem-se em parbo-las e artigos poderosos, dignos, pela imagina-o, do prprio Nietzsche ou de um Victor Hugo, tais como: O Cavador de Tmulos, A Escravido, Ns e Vs, Filhos de Deuses e Netos de Macacos, Os Dentes Cariados, O Furaco, Satans.

    Dirigindo-se a todos os homens, diz-lhes:

    "Vs andastes um s passo para frente des-de que saistes das fendas da terra? Ou levan-tastes vossos olhares para cima desde que os demnios abriram vossos olhos?

    H 70.000 anos passei por vs, e vi-vos mexendo como vermes nos cantos das grutas. E h 7 minutos, olhei atravs do vidro de minha janela, e vi-vos andando nas ruas sujas, com os grilhes da escravido em vossos ps... Vs sois hoje o que reis ontem, e assim sereis amanh."

    H no livro, tambm, o poeta e o pensador, que exprimem, num estilo cada vez mais belo, as inquietudes de seu corao e os frutos de suas meditaes.

    Seu estilo acusa um aperfeioamento cons-tante na arte de criar e de utilizar a imagem sob todas as suas formas: desde a metfora de uma linha at a parbola de uma pgina.

    "Muitos falam como os mares, mais vivem como os pntanos. E muitos erguem a ca-bea acima das montanhas, mas suas almas jazem na noite das cavernas."

    Para glorificar a ambio que eleva s al-turas, mesmo que deva acabar por destruir seu heri, Gibran escolhe as violetas e as rosas, e cria a saborosa parbola seguinte:

    "Havia num bosque isolado uma bonita violeta que vivia satisfeita com suas compa-

  • nheiras. Certa manh, ergueu a cabea, e viu uma rosa que se balanava acima dela, radian-te e orgulhosa.

    Gemeu a violeta, dizendo: "Pouca sorte te-nho eu entre as flores! Humilde meu des-tino! Vivo colada terra, e no posso erguer a face para o sol, como fazem as rosas..."

    A Natureza ouviu, e disse: "Que te aconte-ceu, filhinha? As vs ambies apoderaram-se de ti?"

    "Suplico-te, Me Poderosa, disse a viole-ta, transforma-me numa rosa, por um dia s que seja."

    "No sabes o que ests pedindo, respondeu a Natureza. Ignoras o que se esconde de in-fortnios atrs das aparentes grandezas."

    "Transforma-me em rosa, insistiu a violeta, e aceitarei todas as consequncias de minhas aspiraes e desejos."

    A Natureza estendeu sua mo mgica, e a violeta tornou-se uma rosa suntuosa. Na tar-de daquele mesmo dia, o cu escureceu, e o vento e a chuva devastaram o bosque. As r-vores e as roseiras foram abatidas. S as hu-mildes violetas escaparam ao massacre. E uma delas, olhando sua volta, gritou s compa-nheiras: "Olhem e vejam o que a tempestade fez das grandes plantas que se elevam com orgulho e impertinncia!"

    Disse uma outra: "Vivemos coladas terra, mas escapamos fria dos furaces."

    Uma terceira disse: "Somos pequenas e hu-mildes; mas as tempestades nada podem con-tra ns."

    A Rainha das violetas viu tambm a rosa que tinha sido violeta, estendida por terra

  • como morta. E disse: "Vejam e meditem, mi-nhas filhas, sobre o destino da violeta que as ambies embriagaram. Que sua infelicidade lhes sirva de exemplo."

    Ouvindo estas palavras, a rosa agonizante agitou-se, e disse, com voz entrecortada:

    "Escutai, antes, vs, ignorantes, medocres, covardes. Ontem, eu era como vs, humilde e satisfeita. Mas a satisfao que me protegia, tambm me limitava. Podia continuar a viver como vs, colada terra, at que o inverno me envolvesse na sua neve e me levasse ao silncio eterno, sem que conhecesse dos segre-dos e glrias desta vida mais do que as in-meras geraes de violetas, desde que existem violetas.

    Mas escutei no silncio da noite, e ouvi o mundo superior dizer a este mundo: O alvo da vida alcanar o que h alm da vida. Pedi, ento, Natureza que'nada seno a materializao de nossos sonhos invisveis que me transformasse em rosa. E a Natu-reza atendeu ao meu desejo.

    Vivi uma hora como rosa. Vivi uma hora como rainha. Vi o mundo com os olhos das rosas. Ouvi a melodia do ter com os ouvidos das rosas. Acariciei a luz com as ptalas das rosas. Pode alguma de vs gabar-se desta honra?

    Morro agor,a, levando na alma o que ne-nhuma violeta jamais experimentara. Morro, sabendo o que h por trs dos horizontes es-treitos onde nasci. este o alvo da vida-"

  • LIBERTAR O HOMEM DE SI MESMO

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    A caligrafia de Gibran em rabe

    ^ ^ I B R A N acreditava que sua estada em Paris abriria uma etapa decisiva em sua vida. Na verdade, essa estada havia simplesmente acelerado sua evoluo, alargando suas ambi-es e enriquecendo sua cultura. Mas no havia transformado sua vida.

    O fato determinante em sua vida, aquele que a divide em duas pocas bem diferentes, a data em que deixa de escrever em rabe e se entrega ao ingls. O fenmeno comeou imperceptivelmente, Mary Haskel incentivan-do Gibran a escrever em ingls. De 1918 a 1920, Gibran publica obras nas duas lnguas. Mas a partir de 1920, dedica-se definitivamen-te ao ingls.

    Era mais do que uma lngua que abandona-va, mais do que uma lngua que adotava: na verdade, passava de um mundo para outro.

    Sua orientao fundamental permanece a mesma: est convencido de que tem uma men-sagem a transmitir humanidade atravs de seus escritos e pinturas. Mas a substncia da mensagem muda.

    Gibran, at ento, no tinha vivido na Amrica seno com o corpo. Seu esprito, suas atividades, suas ambies, suas preocupa-es, seus escritos se achavam orientados para o Lbano e o Mundo rabe, que le queria emancipar pela revoluo.

    Mas pouco a pouco, uma dupla transforma-

  • o se opera nele.

    Em primeiro lugar, a sabedoria e a matu-ridade suplantam em sua alma o ardor revo-lucionrio. Para alm dos conflitos que opem os homens aos homens, v os conflitos mais profundos que opem o homem a si mesmo. E para alm da dominao exercida sobre o povo pelo clero e os tiranos feudais, v a domina-o exercida sobre cada um de ns pelas im-perfeies e limitaes prprias nossa natu-reza humana. E o homem, todos os homens, que le aspira doravante libertar pela sa-bedoria.

    A o mesmo tempo, suas ambies em cons-tante crescimento o desviam do pblico leitor rabe, de dimenses limitadas, para o pblico leitor ilimitado de lngua inglesa. E, no ten-do ligaes com os problemas sociais e pol-ticos dos Estados Unidos, encontra-se mais naturalmente levado a concentrar-se nos as-suntos de interesse humano geral.

    Assim, com a lngua, tudo muda: os temas, o tom, o objetivo. E, a maturidade ajudando, ser inquietando-se com os problemas eternos do homem que Gibran tingir seu apogeu.

    Sua vida e seu temperamento seguem um ritmo que no mudar mais.

    Enquanto seu gnio amadurece, o corao permanece o mesmo: sempre jovem, sempre apaixonado, sempre inquieto. Continua a es-crever pginas muito belas sobre o amor, ao qual d o primeiro lugar na vida. E continua a procur-lo atravs de aventuras ocasionais.

    Mas nenhum grande amor vir tir-lo de sua solido.

    E o tdio o domina na companhia dos ho-mens. Refugia-se cada vez mais em seus livros e sua pintura. E cada vez que realiza um so-

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    A caligrafia de Gibran em ingls

  • nho, um sonho maior se lhe impe.

    Seu primeiro livro em ingls, O Louco, aparece em 1918. Compe-se de 34 parbolas curtas, que so a expresso de uma vida in-terior ainda tumultuada e cheia de paixes no controladas.

    um grito de revolta contra a hipocrisia, a ignorncia, a insensibilidade. Eis aqui uma de suas parbolas caractersticas, intitulada O Olho:

    "Um dia, o Olho disse: Vejo, l alm dos vales, uma montanha velada pela bruma. No bela?

    O Ouvido ps-se a escutar, e disse: Mas on-de que h alguma montanha? No a ouo.

    Ento, a Mo falou e disse: Tento em vo toc-la. No encontro montanha alguma.

    Disse o Nariz: No h nenhuma montanha. No lhe sinto o odor.

    Ento o Olho voltou seu olhar para outra parte. E todos puseram-se a comentar a estra-nha alucinao do Olho, dizendo uns aos ou-tros: H qualquer coisa errada com o Olho."

    Em 1920, Gibran publica seu segundo livro ingls, O Precursor. No Evangelho, "pre-cursor" o apelido de So Joo Batista, que precedeu e anunciou Cristo. Talvez Gibran tenha querido insinuar que este livro precedia e anunciava O Profeta.

    "Tu s o precursor de ti mesmo. E as edifi-caes que construste na tua vida sero sim-ples fundaes para teu Eu gigante. E, por sua vez, esse Eu gigante ser uma base para um outro Eu, ainda maior.

    Desde o comeo do tempo ns somos os pre-cursores de ns mesmos. E o que acumulamos

  • em nossas vidas nada seno sementes para campos ainda incultos. Ns somos os campos e os lavradores. Ns somos as frutas e os co-Ihedores das frutas."

    O livro contem parbolas e provrbios que pintam e combatem os defeitos humanos que Gibran mais detestava (a tirania, a cobia, a cegueira) e poemas em prosa que cantam a insatisfao da alma neste mundo materialis-ta e suas aspiraes para um mundo superior. A viso j mais ampla; e a sabedoria, mais serena. A ironia mais controlada e menos amarga. O captulo final, intitulado A ltima Viglia, como uma ponte entre este livro e O Profeta.

    Eis alguns trechos desta viglia, sumamente humana: noite, o Precursor sobe ao terrao tia sua casa e dirige-se nos seguintes termos ao povo adormecido:

    "Meus amigos, meus vizinhos e todos vs que cada dia passais por minha porta, gostaria de dirigir-me a vs em vosso sono, pois vossas horas despertas so muito desatentas e vossos ouvidos tornam-se surdos quando os barulhos os invadem. Desde h muito tempo, amo-vos, e com super-abundncia.

    Amo a cada um de vs como se fosse todos vs, e a todos como se fossem um... Amo o gigante e o pigmeu, o leproso e o ungido, aquele que apalpa seu caminho nas trevas como aquele que dana seus dias sobre a mon-tanha.

    Mas, ai, foi a super-aoundncia do meu amor que vos afastou de mim. Pois sois ca-pazes de beber o amor numa taa, mas no num rio tumultuoso.

    E porque amei-vos todos, dissestes: Ele ama como um cego que no distingue a beleza da

  • fealdade.

    E dissestes muito mais. E no meu corao, decidi amar-vos ainda mais, mas esconder meu amor sob um veu de dio.

    Do alto do meu teto, chamei-vos hipcritas, fariseus, velhacos e trapaceiros.

    O quarto de dormir de Gibran

  • Mas, enquanto meus lbios vos denun-ciavam, meu corao sangrava dentro de mim e vos chamava com nomes ternos.

    E imaginai que milagre se operou ento!

    Meu disfarce abriu vossos olhos, e meu dio simulado despertou vossos coraes "

    7

    "O PROFETA ": UMA DEFESA CON-

    TRA A DESUMANIZAO DO

    HOMEM

    E m 1923, aparece o terceiro livro ingls de Gibran, O Profeta, sua obra-prima sob todos os pontos de vista: a que continua a ter o maior xito e a que concretiza, no mais alto grau, aquele senso messinico que foi sempre o centro de sua vida.

    Gibran tinha escrito o primeiro esboo de seu livro na idade de 15 anos, em rabe; e o reescreveu cinco vezes em ingls antes de en-treg-lo a seu editor.

    Durante esta gestao de 25 anos, a mensa-gem se formava no fundo de seu corao, como uma prola se forma no fundo do mar.

  • E quando a prola enfim expelida, le suspira de alvio: "Enfim pronunciei-a, a pa-lavra que trago comigo desde que nasci e que vim ao mundo para pronunciar", declara, ju-biloso, a um migo.

    E essa palavra no era para le uma men-sagem simplesmente terica, simplesmente in-telectual: era a expresso de sua prpria vida.

    As idias que prega (sobre o conforto, o amor, a amizade, o trabalho. . . ) , le as pra-ticava. E sua morada e seu modo de vida con-tinuaro a ser marcados pela mesma simplici-dade, mesmo depois que o sucesso o tornar milionrio.

    Que contm esse livro famoso? Um corpo de reflexes aplicveis s diferentes ativida-des da vida, e que Gibran acumulara atravs de suas experincias e meditaes.

    Gibran imagina um profeta que viveu doze anos numa terra estrangeira, e que, no mo-mento de embarcar para sua ilha natal, cer-cado pelo povo que lhe pede deixar-lhe a essncia de sua experincia e sabedoria.

    " E de que quereis que vos fale?" pergunta o Profeta.

    E cada um sugere um assunto. E o Profeta o comenta.

    Os assuntos escolhidos se relacionam com os aspectos mais fundamentais da vida: o amor, o casamento, os filhos, o crime e o castigo, a liberdade, a mor te . . .

    Brbara Young As idias expressas no constituem um sis-

    tema filosfico, mas antes um ideal de vida. E este ideal tanto prtico como espiritual. Convence e exalta, ao mesmo tempo. Porque, baseado nas atividades mais comuns da exis-

  • tncia, d a essas atividades um sentido que as transfigura. Casamento, conversao, tra-balho, prazer, amor, vender e comprar, beber e comer, todas as nossas atividades so acei-tas e aprovadas; mas, ao mesmo tempo, em-belezadas e elevadas. Gibran no nos prope o herosmo, mas a grandeza. No nos convida a renunciar vida, mas a sermos dignos dela. No procura fazer de ns super-homens, ms homens completos.

    O sucesso que O Profeta conquistou em todos os pases indica a que ponto le res-ponde s aspiraes mais profundas da alma, especialmente neste sculo em que a alma se sente cada vez mais invadida e ameaada pelo materialismo. Nos Estados Unidos Conde se vendem dele cerca de 300.000 exemplares por ano), sua popularidade muito significativa porque mostra que, mesmo nos pases mais cumulados com os benefcios da cincia, o corao humano sente a nostalgia dos valores espirituais e a necessidade de defender-se con-tra a sua prpria desumanizao.

    Em todas as pginas, passagens inspiradoras iluminam o caminho da vida:

    " Vossos filhos no so vossos filhos. So os filhos e as filhas da nsia da vida por si mesma.

    Vm atravs de vs, mas no de vs.

    E embora vivam convosco, no vos per-tencem. "

    "Dizeis muitas vezes: Eu daria, mas somen-te queles que o merecem.

    As rvores de vossos pomares no falam assim, nem os rebanhos de vossos pastos.

  • Do para continuar a viver, pois reter perecer."

    "E agora vs perguntais em vosso corao: como distinguiremos no prazer o que bom d que mau?

    Ide, pois, aos vossos campos e pomares e l aprendereis que o prazer da abelha su-gar o mel da flor, mas que o prazer da flor entregar o mel abelha.

    Pois, para a abelha, uma flor uma fon-te de vida. E, para a flor, a abelha uma mensageira de amor.

    E para ambas, a abelha e a flor, dar e re-ceber o prazer uma necessidade e um xtase."

    O Profeta termina com um comovente dis-curso de adeus, em que Al-Mustafa desenvol-ve suas idias sobre a vida em geral, o des-tino humano, as relaes entre as almas de elite e o povo. Exprime tambm, em termos belssimos, a nostalgia da separao e a espe-rana de um outro encontro.

    E conclui:

    "Se estas forem palavras vagas, no as procureis esclarecer.

    Pois, hoje, vs -no vedes, nem ouvis, e melhor assim.

    Mas um dia, o vu que cobre vossos olhos ser retirado pelas mos que o teceram.

    E a argila que obstri vossos ouvidos ser rompida pelos dedos que a amassaram.

    Ento vereis,

    Ento ouvireis,

    E no deplorareis ter conhecido a cegueira

  • e a surdez.

    Pois, naquele dia, compreendereis a finali-dade oculta de todas as coisas.

    E bendireis as trevas como bendizeis a luz."

    8

    AREIA E ESPUMA

    E m 1927, Gibran publica um quarto pe-queno livro, que havia nascido como por aca-so e se revelaria o seu segundo best-seller, aps O Profeta: Areia e Espuma.

    Constitudo de 322 pensamentos e reflexes, o livro teve sua origem numa iniciativa de Brbara Young, uma poetisa norte-americana que frequentava e assessorava Gibran. Pro-ps-lhe ela que reunisse num volume os pen-samentos que no haviam sido includos em outros livros.

    A primeira reao de Gibran foi desfavo-rvel. "Haveria a somente areia e espuma", argumentou. Mas falando assim, viu nesta prpria expresso um ttulo feliz. E comeou a interessar-se pela obra.

  • Conta Barbara Young: "Remetia-me com acanhamento ora um pedao de um progra-ma de teatro, ora um mao de cigarros vazio ou um envelope rasgado, sobre os quais havia rabiscado algumas linhas, dizendo-me: "Eis a para tua tola coleo de areia e espuma". Mas, na realidade, o interesse de Gibran au-mentava. Escrevia textos especiais para o no-vo livro, e este foi completado em poucos meses.

    um livro de profunda ternura humana. Marca a cura definitiva de Gibran do virus Nietzscheiano e sua volta bondade evan-glica.

    O escritor que proclamava em As Tempes-tades que todos os homens so cadaveres p-tridos, que urgente enterrar, afirma agora:

    "Quando alcanares o corao da vida, no te achareis superior ao criminoso nem infe-rior ao profeta."

    "A piedade no mais do que meia justia."

    "Deves ter ouvido falar da Montanha Sa-grada.

    a montanha mais alta do mundo.

    Se lhe atingires o cume, ters apenas um desejo: descer e estar com os que moram no rale mais profundo.

    por isso que chamada a Montanha Sagrada."

  • UM LIVRO PARA AS ALMAS

    MAIS SENSVEIS

    Jesus, como Gibran o imaginou

    E m O Profeta, Gibran exps um ideal de vida abstrata. Em Jesus, o Filho do Homem, publicado em 1928, d-nos o mesmo ideal personificado em Jesus.

    Desde a infncia, Gibran tinha estado fas-cinado pela personalidade e o ensinamento de Jesus. E Jesus havia sido o verdadeiro heri de todos os seus contos ideolgicos. Para le, nestes contos, Jesus era um revolucionrio e um rebelde, o amigo dos deserdados, o apoio dos fracos, o aliado dos oprimidos, que lutou e morreu por les, e continua a inspirar-lhes, no a aceitao resignada da sua sorte, mas a vontade de revoltar-se e de vencer.

    medida que amadurecia, porm, e apro-fundava seu conhecimento da vida, Gibran descobria em Jesus mais do que um revolu-cionrio e um rebelde. E sua concepo de Jesus evolua paralelamente sua prpria evo-luo. T em sido, alis, sempre assim com nos-sos deuses. Criamo-los tanto quanto les nos criam. E sua imagem muda na medida em que mudamos.

    N o tempo em que comeou a escrever seu livro, Gibran tinha alcanado a plenitude de sua maturidade. Longe estavam os dias em que dividia com simplismo a humanidade em

  • pobres e ricos, em povo e aristocracia, sendo os primeiros sempre bons e os segundos sem-pre maus. Longe, tambm, os dias em que via na libertao do homem do jugo do homem a primeira necessidade. E longe os dias de excessivo entusiasmo por Nietzsche e seus arrebatamentos.

    Seu notfo ideal, muito mais equilibrado e em que o homem procura essencialmente su-perar-se a si mesmo e vencer-se a si mesmo, este ideal, ele o exps em O Profeta. Mas sentia, sem dvida, ao mesmo tempo, a ne-cessidade de dar corpo a este ideal e tambm de proclamar a sua nova concepo de Jesus.

    O resultado foi Jesus, o Filho do Homem, que uma evocao comovente da personali-dade de Jesus e um convite para seguir-lhe os passos, sendo considerado Jesus no como um Deus, mas como o homem mais sublime que j visitou este planeta, a personificao de todas as virtudes, de todas as qualidades que deveramos esforar-nos por atingir.

    No o trabalho de um exegeta ou de um historiador preocupado com a verdade cient-fica. o trabalho de um poeta e de um idea-lista preocupado com a verdade humana.

    A figura que pinta de Jesus tanto a do Evangelho como a da sua prpria alma.

    Jesus, o Filho do Homem , no fundo, o prprio Gibran tal como le queria ter sido e tal como imagina que todo homem deveria

    Do Evangelho, Gibran toma emprestado o essencial da personalidade de Jesus, mas le a retoca tanto para adapt-la melhor s suas prprias concepes e inclinaes, como para aproxim-la de nossa humanidade, manten-do-a, contudo, bastante superior a ns para inspirar nossa f e nossa adorao.

  • procurar tornar-se.

    E, como sempre, a arte de Gibran reala magistralmente suas idias.

    Gibran encontra, para desenvolver seu as-sunto, uma frmula original, que lhe permite utilizar mais eficazmente a fora das emoes e a magia das imagens.

    Em vez de contar a vida de Jesus manei-ra de um historiador, faz que falem dele, fic-ticiamente, setenta e sete de seus contempo-rneos, que o descrevem, cada um, como o conhecera e concebera.

    A narrao direta d ao relato um realis-mo e uma vida que seria difcil criar de outra forma, e a diversidade das vozes permite in-tercalar, entre captulos de intensa emotivida-de, outros mais serenos e mais prticos.

    E o resultado um Jesus to real e to palpitante de vida quanto os heris criados pelos maiores romancistas. Vemos seu corpo, seu andar, seus gestos, suas idas e vindas. Assistimos a seus milagres, s suas pregaes, sua crucificao. Vivemos com le atravs do livro, como acompanhamos um amigo no curso da existncia. E quando terminamos a leitura, este ser nico e fascinante continua a habitar no fundo de nosso corao.

    Assim, O Profeta e Jesus, o Filho do Homem se completam. Um expe um ideal de vida; o outro apresenta a personificao mais sublime desse ideal.

    O Profeta acessvel ao maior nmero; Jesus, o Filho do Homem o apangio das almas mais elevadas e sensveis.

  • ENCONTRO DE JESUS E DE

    MARIA MADALENA

    T O D A S as pginas deste livro merecem ser lidas e relidas. Citemos simplesmente alguns trechos da narrao em que Maria Madalena relata seu encontro com Jesus:

    "Foi no ms de agosto que O vi novamente, atravs de minha janela. Estava sentado sombra do cipreste, em meu jardim, e estava imvel como se tivesse sido talhado na pedra, como as esttuas de Antioquia e das outras cidades do pas do Norte.

    E minha escrava, a egpcia, veio at mim e disse: "Aquele homem est novamente aqui. Est sentado ali, em vosso jardim."

    E olhei para Ele, e minha alma estremeceu dentro de mim. Pois Ele era belo.

    Seu corpo era perfeitamente coordenado, e cada parte parecia amar cada outra parte.

    Ento, vesti-me com vestidos de Damasco, deixei minha casa e dirigi-me para Ele.

    Seria a minha solido, ou seria Sua fra-grncia que me impelia para Ele? Era uma fome em meus olhos que desejava a beleza ou era Sua Beleza -que buscava a luz d.os meus olhos? Ainda hoje no o sei.

    Caminhei para Ele com meus vestidos per-fumados e minhas sandlias douradas que o capito romano me deu, sim, estas mesmas sandlias. Quando O alcancei, disse-lhe: "Bom dia para vs."

    E Ele disse: "Bom dia para ti, Miriam."

    Maria Madalena, como Gibran a imaginou

  • E olhou para mim, e Seus olhos-de-noite me viram como nenhum outro homem jamais me tinha visto. Subitamente, senti-me como se es-tivesse despida, e fiquei envergonhada.

    Entretanto, Ele apenas dissera: "Bom dia para ti, Miriam."

    E eu disse: "No quereis servir-vos de po e vinho comigo?"

    E Ele disse: "Sim, Miriam, mas no agora."

    No agora, no agora, disse Ele. E a voz do mar estava nestas duas palavras, e a voz dos ventos e das rvores. E quando Ele mas disse, a vida falou morte.

    Pois imagina, meu amigo, eu estava morta. Era uma mulher que se tinha divorciado de sua alma. Estava vivendo parte deste Eu que agora ests vendo. Pertencia a todos os ho-mens, e a nenhum. Chamavam-me prostituta e uma mulher possuda por sete demnios. Eu era amaldioada, e era invejada.

    Mas quando Seus olhos-de-aurora olharam dentro dos meus olhos, todas as estrelas da minha noite desvaneceram-se, e tornei-me Miriam, somente Miriam, uma mulher perdi-da para a terra que tinha conhecido, e en-contrando-se em novos lugares.

    E eu Lhe disse: "Entrai em minha casa e partilhai comigo o po e o vinho."

    E Ele disse: "Por que me convidas para ser teu hspede?"

    E eu Lhe disse: "Rogo-vos que entreis em minha casa." E era tudo o que era terra em mim e tudo o que era cu em mim chamando por Ele.

    Ento, Ele me olhou, e o meio-dia dos Seus

  • olhos estava sobre mim, e Ele disse: "Tens muitos amantes e, entretanto, s eu te amo. Os outros homens amam a si mesmos quando te procuram. Eu te amo por ti mesma. Os outros homens vem em ti uma beleza que desaparecer mais cedo do que seus prprios anos. Mas eu vejo em ti uma beleza que no esmaecer e, no outono dos teus dias, esta beleza no ter receio de olhar-se no espelho, e no ser ofendida. Somente eu amo o que no se v em ti."

    Depois, Ele disse numa voz suave: "Vai em-bora, agora. Se este cipreste teu, e no qui-seres que me sente sua sombra, prosseguirei meu caminho."

    E gritei para Ele, e disse-lhe: "Mestre, entra em minha casa. Tenho incenso para queimar para Ti, e uma bacia de prata para Teus ps. Tu s um estranho e, entretanto, no s um estranho. Peo-Te, vem minha casa."

    Ento, Ele levantou-se e olhou-me, como as estaes devem olhar para os campos, e sor-riu. E disse novamente: "Todos os homens te amam por si mesmos. Eu te amo por- ti mesma.

    E, ento, afastou-se, caminhando.

    Mas nenhum outro homem jamais cami-nhou da maneira como Ele caminhava. Era uma brisa nascida no meu jardim, que se movia para o Leste? Ou era uma tempestade que abalaria todas as coisas at seus alicerces?

    Eu no sabia, mas naquele dia, o poente de Seus olhos matou o drago que havia em mim, e tornei-me uma mulher, tornei-me Miriam, Miriam de Mijdel."

    em Jesus, o Filho do Homem, que Gi-bran atinge a perfeio suprema do seu esti-

  • lo. difcil encontrar, no importa em qual literatura, um livro que encante e enfeitice pela pura beleza da forma tanto quanto Jesus, o Filho do Homem.

    Nele, Gibran atinge uma maneira verda-deiramente escultural de conceber e exprimir-se. Fala de Jesus no mesmo estilo do Evan-gelho. Toma emprestado suas imagens e suas parbolas natureza, s estaes, aos cam-pos, s flores, aos pssaros; e envolve-as numa harmonia musical cheia de magia.

    "Uma semente escondida no corao de uma ma um pomar invisvel. Mas, se a semente cair sobre um rochedo, no dar em nada."

    "Quando lavrais, e vosso ajudante lana a semente terra detrs de vs, acaso parais e voltai-vos para enxotar um pardal que se ali-menta de algumas de vossas sementes? Se o fizsseis, no sereis dignos das riquezas de vossa colheita."

    O Estdio de Gibran em Nova Iorque

  • COM AMOR E SABEDORIA

    E NESSES trs livros que se exprime, da maneira mais luminosa, a mensagem de Gi-bran. Duas palavras resumem essa mensagem: amor e sabedoria o amor, pelo qual o homem consegue identificar-se com os outros homens e com a natureza; a sabedoria, pela qual consegue penetrar os segredos da vida, descobrir, ao mesmo tempo, a grandeza e as limitaes do destino humano e, assim, con-quistar a serenidade e a paz.

    Gibran quer acrescentar ao progresso e s riquezas materiais da civilizao ocidental a riqueza espiritual das milenares civilizaes orientais. E ele no v contradio entre esses dois legados do homem, desde que ele aprenda a os conciliar.

    Muitos pregadores pregam a salvao do homem atravs do seu afastamento de todos os prazeres, da sua renncia aos seus apeti-tes e desejos, em benefcio das suas aspira-es. Gibran segue outro caminho: procura conciliar nossos apetites e nossas aspiraes, convidando-nos a gozar de todos os bens da vida ao nvel, porm, do que h de mais elevado, e no mais baixo, em ns.

    Gibran acredita na continuidade da vida humana que comea antes do nascimento e se prolonga por alm do tmulo. A morte torna-se assim uma mera etapa da prpria vida e perde o poder de nos aterrorizar. Diz

  • ele em Areia e Espuma: "Quando tiverdes desvendado todos os mistrios da vida, an-siareis pela morte, pois ela no seno outro mistrio da vida."

    Gibran acredita na solidariedade de todos os homens, na necessidade de sua fraterniza-o. Prega a ternura para com todos eles. A o seu ver, o homem superior no o homem que domina seus semelhantes, mas aquele que sabe compreend-los e am-los apesar das suas imperfeies, graas a sua prpria elevao.

    Acredita no poder do amor, de tornarmo-nos felizes e puros, mesmo atravs dos sofri-mentos.

    "Quando o amor vos chamar, segui-o, em-bora seus caminhos sejam agrestes e escarpa-dos; e quando ele vos envolver com suas asas, cedei-lhe, embora a espada oculta na sua plu-magem possa ferir-vos; e quando ele vos falar, acreditai nele, embora sua voz possa despeda-ar vossos sonhos como o vento devasta o jardim." (O Profeta)

    Gibran nos ensina a ser fortes com os for-tes, mas compassivos com os fracos, e a amar os que caem, e a ajud-los antes que conde-n-los.

    Leia em que termos ele comenta a morte de Jesus Cristo na cruz e como nos convida a sermos ao mesmo tempo invencveis e cheios de bondade:

    "Ele no pronunciou uma palavra quando cravaram os pregos em Suas mos e ps, nem fez ruido algum.

    E Seus membros no estremeceram sob o martelo."

    "E quando nosso Amado morreu, eu tam-bm morri. Mas nas profundezas de meu es-

  • quecimento, ouvi-O falar e dizer: "Pai, per-doai-lhes porque no sabem o que fazem."

    E Sua voz procurou meu esprito afogado e fui trazido de volta praia.

    Que outro juiz de homens ter assim absol-vido seus juizes? E jamais o amor desafiou o dio com fora mais segura de si mesma?

    Soube-se antes de algum assassinado ter compaixo de seus assassinos? Ou de um me-teoro deter-se por causa de uma topeira?

    As estaes cansar-se-o e os anos envelhe-cero antes que se esgotem estas palavras: Pai, perdoai-lhes porque no sabem o que fazem." (Jesus, o Filho do Homem)

    Gibran acredita que o homem, ao afastar-se da Natureza, est transformando suas cida-des em crceres. Para salvar-se deveria voltar Natureza, aprender dela e harmonizar-se com ela.

    "A flor diz: Olho sempre para cima a fim de ver a luz e no a minha sombra!" Este um aspecto da sabedoria que o homem ainda no aprendeu."

  • O DECLNIO

    O PROFETA e Jesus, o Filho do Homem so os monumentos mais elevados que o gnio de Gibrail edificou. Antes deles, era ainda a asceno: depois deles, j o declnio.

    Em I93l. Gibran publica um livro intitu-lada Os Deuses da Terra, que se compe de um s poema, de forma alegrica e tom pico, no qual Gibran expripie suas idias sobre o homem e a vida.

    0 poema um dilogo entre trs deuses terrestres. O primeiro est cansado de reinar. O segundo tem ainda a ambio de reinar. O terceiro, jovem e apaixonado, descobriu o amor sobre a terra e o acha mais atraente do que qualquer reinado.

    Os dois pensamentos diretrizes do livro so:

    1 O amor mais forte que os prprios deuses, e a ddiva mais preciosa da vida.

    2 O homem destinado a tornar-se igual aos deuses. Pois o que humano perde seu valor se permanecer humano. O homem o po dos deuses. E da mesma forma com que o gro de trigo se transforma em melodia de amor quando o pssaro o come. assim o ho-mem se transformar em divindade quando for absorvido pelos deuses.

    Com O Errante, que Gibran deixou em ma-nuscrito e foi publicado um ano depois de sua morte, em ll>32. acentua-se o afastamento de

  • Gibran dos cumes de O Profeta e Jesus, o Filho do Homem.

    O Errante recorda O Louco: feito de um conjunto de cinquenta parbolas e fbulas, nas quais uma amargura sombria, uma ironia impiedosa contrastam quase dolorosamente com a iluminao de O Profeta e a fora se-rena de Jesus, o Filho do Homem.

    Antes mesmo de terminar O Errante, Gi-bran tinha comeado a trabalhar em O Jar-dim do Profeta. Nele trabalhou at s vs-peras de sua morte.

    Brbara Young deu uma forma definitiva aos manuscritos deixados por Gibran e publi-cou o livro dois anos aps a morte do autor, cm 1933.

    O Profeta termina com a partida de Al-Mustaf da cidade de Orfalese. O Jardim do Profeta abre-se com a chegada de Al-Mustaf sua ilha natal.

    Como em O Profeta, seus discpulos formu-lam-lhe perguntas e le as responde; mas per-guntas e respostas flutuam numa atmosfera demasiadamente vaga e inconsistente.

    Entretanto, de pgina em pgina, encon-tram-se idias originais expressas com beleza:

    "Frequentemente vos tenho ouvido falar da noite como de um tempo de repouso; na ver-dade, a noite o tempo da pesquisa e da des-coberta. "

    Mas o que h de mais belo no livro o umor natureza, um amor no mais romn-tico, mas humano:

    "Tu e a pedra no sois seno um s. A ni-ca diferena est no ritmo das pulsaes do corao. Teu corao bate um pouco mais

    A irm de Gibran, Mariana

  • rapidamente."

    Como O Profeta, O Jardim do Profeta ter-mina com um adeus e uma promessa de retorno.

    E tem-se a impresso de que O Jardim do Profeta no seno uma plida repetio de O Profeta. Dir-se-ia que a substncia que che-gara condensao em O Profeta voltou a ser bruma. O homem que alcanara a sua meta recomeou a procurar.

    que, enquanto trabalhava no Jardim do Profeta, a doena fazia progressos mortais em seu corpo.

    Gibran tinha sido sempre um homem debi-litado. A doena, dizia ele, era seu estado normal; a sade, perodos de trgua.

    Pagou frequentemente o preo de seus li-vros em sofrimentos fsicos extenuantes.

    s vezes, gemia: "H alguma coisa mais dolorosa do que a unio de um esprito que quer com um corpo que no pode? . . . Sou como uma abelha doente num jardim de flores."

    A molstia agrava-se no incio de 1931. Gibran enfraquece de dia em dia. Sofre do estmago e dos intestinos. Sente palpitaes no corao. Tinha apenas 4S anos.

    A 3 de abril, Sexta-Feira Santa, passa o dia sozinho, segundo um velho hbito. Sentia vi-vamente a agonia de Cristo. Depois da hora da Crucificao, telefonava a Brbara Young: "Mais uma vez tudo est consumado."

    Naquele dia, d os ltimos retoques aos de-senhos de O Errante. Depois, continua a tra-balhar no sbado e mesmo no domingo de Pscoa, escondendo seu mal, alegando aos

    Gibran, por Joseph Hoyeck

  • amigos que estava atacado pela "doena do trabalho".

    Logo depois, entretanto, o mal aumenta, e le transferido ao Hospital So Vicente. Morre a dez de abril, na primeira sexta-feira depois da Sexta-Feira Santa, no curso de uma crise pulmonar que o deixara inconsciente. Tinha dito um dia: "Asp i ro eternidade, por-que l encontrarei meus poemas no escritos e meus quadros no pintados."

    13

    A VOLTA AO LBANO

    N O T C I A de sua morte teve grande repercusso, e seu corpo ficou exposto at o domingo em cmara ardente. Milhares de admiradores foram dizer-lhe adeus.

    Na manh de segunda-feira, o corpo foi transferido de trem para Boston, onde ficou exposto durante dois dias na sede de uma associao libanesa. Outros milhares de admi-radores lhe prestaram as ltimas homenagens, fazendo-se notar os orientais por suas mani-festaes emocionais.

    Num certo momento, os presentes foram

    Busto de Gibran, por Halim El-Hajj

  • surpreendidos com a chegada de uma mulher vestida toda de branco, que abriu caminho at junto do corpo, depositou um beijo nos lbios frios e retirou-se. Ningum lhe pode ver a face, nem a reconheceu.

    As exquias foram celebradas na Igreja de Nossa Senhora dos Cedros, em Boston, por Monsenhor Stephan Douaihy. Centenas de pessoas tiveram que acompanhar a cerimnia da rua. por falta de lugar.

    Em seguida, Gibran foi enterrado proviso-riamente no Cemitrio So Benedito. O cor-tejo fnebre percorreu as ruas a p, interrom-pendo o trnsito durante vinte minutos na grande cidade de Boston, e dando lugar a ce-nas pblicas raras em qualquer cidade ociden-tal: dezenas de pessoas caam de joelhos pelas caladas, e ouviam-se por toda parte choros e lamentaes.

    Gibran tinha exprimido mais de uma vez o desejo de ser enterrado na sua cidade natal de Becharre " beira daquele vale majestoso de Kadisha. . . Que alegria se pudesse ouvir no meu sono eterno o timbre dos cmbalos e a flauta do pastor!"

    Logo depois de sua morte, sua irm Maria-na quis satisfazer-lhe o desejo. Comprou o velho convento de So Sarkis, onde Gibran havia sonhado viver como anacoreta em seus ltimos anos, e preparou-o para servir de l-tima morada ao irmo.

    Em julho, seu corpo foi transferido do Ce-mitrio So Benedito ao navio "Providence", para a viagem ao Lbano. A remoo teve lugar num dia de nevoeiro e chuva, tao ao gosto de Gibran. Uma multido de amigos e admiradores acompanhou-o ao porto. Um deles recitou as palavras de O Profeta:

  • "Filhos de minha velha me, que correis na crista das vagas impetuosas,

    Quantas vezes navegastes nos meus so-nhos! E agora chegais ao meu despertar, que meu sonho mais profundo."

    Monsenhor Douaihy pronunciou algumas palavras comovidas; e o esquife, envolvido nas duas bandeiras dos Estados Unidos e do Lbano foi depositado no navio, ao som da msica do "Tannhauser" (O Cro dos Pere-grinos) e de "Peer Gynt" ( A Morte de Aase) .

    O homem deixava o continente americano; mas sua mensagem ficava.

    E no corao de todos os que o conheciam, ressoavam as ltimas palavras de O Profeta.

    "Adeus, povo de Orfalese! Breves foram meus dias entre vs, e mais breves ainda as palavras que pronunciei.

    Mas se um dia, minha voz se desvanecer em vossos ouvidos, e se meu amor se evaporar de vossa memria, ento voltarei a vs.

    E, com um corao mais fecundo e lbios mais obedientes- voz do esprito, falar-vos-ei de novo."

    No Lbano, o povo e as autoridades religio-sas e civis lhe reservaram um acolhimento sem precedentes. Um profeta vivo corre o risco de ser excomungado ou lapidado. Mas um profeta morto sempre glorificado.

    Milhares de pessoas acompanharam o cor-tejo at Becharre; e no caminho, em todas as aldeias, era uma chuva de flores e de perfume.

    Dezenas de oradores exaltaram seu gnio.

    Depois, pode dormir seu sono eterno beira do vale que tanto amou, no Convento de So

  • Sarkis, em meio de uma floresta de silncio e de paz onde canta o rouxinol.

    E, diante de seu tmulo, retomamos o nosso tema inicial.

    Ele tinha sofrido e lutado. Mas teria triunfado?

    14

    VIVEREI PARA ALM DO TMULO"

    ^ ^ A L V O que Gibran se fixara em sua obra (libertar e elevar o homem), profetas melhor armados do que le jamais o atingiram em sua plenitude, sem dvida porque ina-tingvel.

    Mas Gibran triunfou em dois sentidos:

    Em primeiro lugar, conheceu, em sua vida e em sua obra, uma asceno constante que o aproximou de um ideal ao mesmo tempo definido e vivido por ele e que, sem alcanar as alturas sonhadas, constitui uma vitria cer-ta nesta aventura da existncia humana.

    Em segundo lugar, esse ideal bastante universal e humano para poder exercer uma atrao sobre qualquer homem e poder ser

  • cm parte realizado por qualquer homem. E Gibran soube iluminar o caminho desse ideal ao ponto de o tornar estimulante e vivifican-te para a maioria dos homens.

    Conta Brbara Young, em sua biografia de Gibran This Man From Lebanon, que certa senhora, tendo comeado a folhear O Profeta numa livraria, ficou to entusiasmada que gritou: "Eis o livro que sempre procurei! Exceto que no , na verdade, um livro: um alimento; po e vinho para as pessoas abatidas como eu."

    A mesma renovao sentida por centenas de milhares de pessoas ao contacto com o con-junto da obra gibraniana.

    E haver assim chegado a elevar o homem, nem que seja s momentneamente, acima de suas fraquesas e limitaes, e a inspirar-lhe uma nova paixo por viver e realizar-se, , em verdade, a mais bela vitria. Que bem mais precioso se poderia, com efeito, fazer a um homem, pergunta o Profeta, que o de trans-formar todas as suas aspiraes em lbios vidos e toda a vida em uma fonte?

    E esse movimento para as alturas, Gibran continuar a inspirar-nos do mundo etreo para onde se foi. Pois le quem fala pela boca de Al-Mustaf, em O Jardim do Profeta, para dizer-nos:

    "Viverei para alm do tmulo

    12 continuarei a cantar para vs, 0 Museu de Gjbran

    Mesmo depois que as ondas do vasto mar

    Me tenfiam reconduzido s profundezas.

    E acompanhar-vos-ei a vossos campos,

  • Esprito invisvel;

    E assentar-me-ei ao canto do vosso fogo,

    Embora no me vejais.

    A morte no muda seno as mscaras que recobrem nossas faces.

    O lenhador ser sempre_ um lenhador,

    E o lavrador ser sempre um lavrador;

    E os que lanam suas canes ao vento

    Continuaro a faz-lo em outras esferas."

    O Tmulo de Gibran

  • Caminho para sempre nestas praias Entre a areia e a espuma. A mar alta apagar minhas pegadas. E o vento dissipar a espuma. Mas o mar e a praia permanecero Para sempre.

    Uma vez, enchi minha mo de neblina. Depois, abri-a; e eis que a neblina era

    um verme. Fechei e abri novamente minha mo, e

    l estava um pssaro. E novamente fechei e abri minha mo,

    e em seu cncavo, erguia-se um homem de face triste, virada para cima.

    Fechei minha mo mais uma vez. e quando a abri, no havia nada seno ne-blina.

    Mas ouvi uma cano de inexcedvel doura.

  • At ontem, considerava-me um sim-ples fragmento, a tremer sem ritmo na es-fera da vida.

    Agora sei que sou a esfera, e que a vida toda se move dentro de mim em rt-micos fragmentos.

    Dizem-me no seu despertar: "Tu e o mundo em que vives no sois mais do que um gro de areia na praia infinita de um mar infinito."

    E, em meu sonho, digo-lhes: "Sou o mar infinito, e todos os mundos no so mais do que gros de areia em minha praia."

    Somente uma vez fiquei mudo: quando algum me perguntou: "Quem s tu?"

  • O primeiro pensamento de Deus foi um anjo.

    A primeira palavra de Deus foi um ho-mem.

    .ZZKCSSS

    ramos criaturas palpitantes, errantes, cheias de anseios, milhares e milhares de anos antes que o mar e o vento na flo-resta nos dessem palavras.

    Como agora poderemos exprimir o an-tigo dos dias em ns com apenas os ccns de nossos ontens?

    ^ v g r ^ j g r ^ ^ j g n N i i g r ^

    A Esfinge falou uma vez s, e disse: "Um gro de areia um deserto, e um deserto um gro de areia; e agora fique-mos todos novamente em silncio."

    Ouvi a Esfinge, mas no entendi.

  • Vi, uma vez, o rosto de uma mulher, e contemplei todos os seus filhos ainda no nascidos.

    E uma mulher olhou para a minha face, e conheceu todos os meus antepassados, mortos antes que ela nascesse.

    Eu gostaria de atingir a minha pleni-tude. Mas como o faria a no ser que me tornasse um planeta habitado por se-res inteligentes?

    No esta a meta de todo homem?

    Uma prola um templo construdo pela dor em torno de um gro de areia.

    Que anseios construram nossos cor-pos, e em volta de que gros?

  • Quando Deus me lanou, um seixo, neste lago maravilhoso, perturbei sua su-perfcie com incontveis crculos.

    Mas quando alcancei as profundezas, fiquei inteiramente quieto.

    Dem-me o silncio, e afrontarei a noite.

    Tive um segundo nascimento quando minha alma e meu corpo se apaixonaram um pelo outro e se casaram.

    Conheci, cert? vez, um homem cujos ouvidos eram extraordinariamente sens-veis; mas ele era mudo. Tinha perdido a lngua numa batalha.

    Sei agora que batalhas aquele homem travara antes que chegasse o grande si-lncio. Agrada-me que ele esteja morto.

    O mundo no bastante largo para ns dois.

  • Jazi muito tempo no p do Egito, silen-cioso e alheio s estaes.

    Depois, o sol me deu nascimento, e ergui-me e caminhei pelas margens do Nilo,

    Cantando com os dias e sonhando com as noites.

    E agora, o sol anda sobre mim com mil ps para que eu possa jazer novamen-te no p do Egito.

    Mas olhem que prodgio e que enig-ma!

    O prprio sol que me juntou no me pode dispersar.

    Mantenho-me ainda ereto, e com p firme caminho pelas margens do Nilo.

    A lembrana uma forma de encon-tro.

    O esquecimento uma forma de liber-tao.

  • Medimos o tempo pelo movimento de incontveis sis; e eles medem o tempo com pequenas mquinas em seus peque-nos bolsos.

    Agora, diga-me: como poderemos ja-mais nos encontrar no mesmo lugar e na mesma hora?

    O espao no espao entre a Terra e o Sol para quem olha para baixo, das janelas da Via Lctea.

    A humanidade um rio de luz corren-do da ex-eternidade para a eternidade.

    Ser que os espritos que moram no ter no invejam ao homem a sua dor?

  • Em meu caminho para a Cidade San-ta, encontrei outro peregrino e perguntei-lhe: " mesmo este o caminho para a Ci-dade Santa?"

    E ele disse: "Siga-me, e alcanar a Cidade Santa em um dia e uma noite."

    E segui-o. E caminhamos muitos dias e muitas noites, mas no alcanamos a Cidade Santa.

    E, para surpresa minha, ficou zanga-do comigo, porque eie me havia desen-caminhado.

    Faze de mim, Senhor, a presa do leo, antes que fazer do coelho a minha presa.

    No podemos atingir a aurora sem pas-sar pela noite.

  • Minha casa me diz: "No me deixes, pois aqui mora teu passado."

    E a estrada me diz: "Vem e segue-me, porque sou o teu futuro."

    E eu digo a ambas: "No tenho pas-sado, nem futuro. Se ficar aqui, haver uma ida em minha permanncia; e se partir, haver uma permanncia em mi-nha ida. S o amor e a morte mudam todas as coisas."

    Como posso perder minha f na jus-tia da vida, quando os sonhos dos que dormem num colcho de penas no so mais belos do que os sonhos dos que dormem no cho?

    Coisa estranha, o desejo de certos pra-zeres uma parte de minha dor.

  • Sete vezes desprezei minha alma: Quando a vi disfarar-se com a humil-

    dade para alcanar a grandeza; Quando a vi coxear na presena dos

    coxos. Quando lhe deram a escolher entre o

    fcil e o difcil, e escolheu o fcil; Quando cometeu um mal e consolou-

    se com a idia de que outros cometem o mal tambm;

    Quando aceitou a humilhao por co-vardia e atribuiu sua pacincia forta-leza;

    Quando desprezou a fealdade de uma face que no era, na realidade, seno uma de suas prprias mscaras;

    Quando considerou uma virtude elogiar e glorificar.

  • Sou ignorante ?nte a verdade absolu-ta. Mas sou humilde ante a minha igno-rncia, e nisto consistem minha honra e minha recompensa.

    Existe um espao entre a imaginao do homem e suas realizaes que somen-te sua nsia pode atravessar.

    O paraso est a, atrs daquela por-ta, no quarto contguo. Mas perdi a chave. '

    Talvez a tenha apenas posto fora do lugar.

    Tu s cego e sou surdo-mudo. Bas-ta-nos tocar as mos para nos entender-mos.

  • O medida do homem no est naqui-lo que ele alcana, mas naquilo que al-meja alcanar.

    Alguns de ns somos como tinta e outros como papel.

    No fcsse pelo negrume de alguns de ns, quantos de ns seramos mudos;

    E no fosse pela brancura de outros, quantos de ns seramos cegos.

    Dai-me um ouvido, e vos darei uma voz.

    Nossa mente uma esponja; nosso corao um arroio.

    No estranho que a maioria de ns prefiramos embeber a correr?

  • rnzs^mai

    Quando ansiais por bnos que no podeis nomear, e vos afligis sem saber por que, ento, sem dvida, estais cres-cendo com todas as coisas que crescem, e elevando-vos rumo ao vosso Eu maior.

    Quando algum est embriagado por uma viso, qualquer plida expresso que dela der parece-lhe o prprio vinho.

    Bebeis vinho para ficardes embriaga-dos; eu bebo para me curar da embria-guez daquele outro vinho.

    Quando a minha taa est vazia, re-signo-me; mas quando est meio cheia, revolto-me.

  • A verdade da outra pessoa no est no que ela te revela, mas naquilo que no pode revelar-te.

    Portanto, se quiseres compreend-la, no escutes o que ela diz, mas, antes, o que no diz.

    A metade do que digo no tem signi-ficado; mas digo-o para que a outra me-tade te possa alcanar.

    Um senso de humor um senso de proporo.

    Minha solido nasceu quando os ho-mens elogiaram meus defeitos faladores e censuraram minhas virtudes silenciosas.

  • Quando a vida no encontra um can-tor para cantar o seu corao, produz um filsofo para falar a sua mente.

    A verdade deve ser sempre conhecida, mas poucas vezes enunciada.

    O real em ns silencioso; o adqui-rido que fala.

    A voz da vida em mim no pode al-canar o ouvido da vida em ti; mas fa-lemos para que no nos sintamos soli-trios.

  • Quando duas mulheres falam, no di-zem nada; quando uma mulher fala, re-vela toda a vida.

    A voz dos sapos talvez seja mais forte do que a dos bois; mas os sapos no podem puxar o arado no campo nem gi-rar a roda do lagar, e no se pode con-feccionar sapatos com suas peles.

    Somente o mudo inveja o falador.

    Se o Inverno dissesse: "A Primavera est no meu corao", quem acreditaria no Inverno?

    Toda semente um anseio.

  • Se abrisses realmente os olhos e visses, contemplarias tua imagem em todas as imagens.

    E se abrisses os ouvidos e escutas-ses, ouvirias tua voz em todas as vozes.

    So necessrios dois para descobrir a verdade: um para enunci-la, o outro para entend-la.

    Embora ondas de palavras nos envol-vam continuamente, nossas profundezas esto sempre em silncio.

    *

    Muitas doutrinas so como a vidraa da janela. Vemos atravs dela, mas ela nos separa da verdade.

  • Brinquemos agora de esconder. Se te escondesses no meu corao, no se-ria difcil encontrar-te. Mas se te escon-desses atrs de tua prpria casca, ento seria intil procurar por ti.

    Uma mulher pode velar a face com um sorriso.

    Quanto nobre o corao triste que canta com os coraes alegres!

    Quem capaz de compreender uma mulher, ou de dissecar o gnio, ou de desvendar o mistrio do silncio, qual um homem que despertasse de um belo sonho para sentar-se mesa do des-jejum.

  • Caminho com todos aqueles que ca-minham. No permaneceria imvel, assis-tindo procisso passar.

    Deves mcis do que ouro a quem te serve. D-lhe de teu corao ou serve-o.

    No, no temos vivido em vo. No construram torres com nossos ossos?

    No caiamos na discriminao nem no regionalismo. A mente do poeta e a cauda do escorpio erguem-se gloriosa-mente da mesma terra.

    Todo drago d nascimento a um So Jorge, que o mata.

  • As rvores so poemas que a terra escreve sobre o firmamento. Derrubamo-las e transformamo-las em papel para re-gistrar nosso vazio.

    Se cuidais de escrever (e s os san-tos sabem por que o fareis), precisareis possuir o conhecimento, a arte e a magia: o conhecimento da msica das palavras, a arte de se libertar da arte, e a magia de amar vossos leitores.

    Mergulham suas penas em nossos co-raes e pensam que so inspirados.

    Se uma rvore escrevesse sua auto-biografia, no seria diferente da histria de qualquer raa.-

  • Ge tivesse de escolher entre o poder de escrever um poema e o xtase de um poema no escrito, escolheria o xtase. uma forma superior de poesia.

    Mas tu e todos os meus vizinhos con-cordais em que sempre escolho mal.

    A poesia no uma opinio expres-sa. uma cano que se ergue de uma ferida em sangue ou de uma boca sor-ridente.

    As palavras so eternas. Deveis pro-nunci-las ou escreve-las, lembrando-vos da sua eternidade.

    Um poeta um rei destronado, sen-tado entre as cinzas do seu palcio e ten-tando confeccionar uma imagem com as cinzas.

  • A poesia muita alegria e dor e espan-to, e um pouco de dicionrio.

    Em vo, um poeta procurar a me das canes do seu corao.

    Uma vez, disse eu a um poeta: "S conheceremos teu valor aps a tua morte."

    E ele respondeu, dizendo: "De fato, a morte sempre a reveladora. E se chegar-des realmente a conhecer meu valor, ser porque tenho mais no corao do que na lngua, e mais no desejo do que na mo."

    Se cantares a beleza, embora sozi-nho em pleno deserto, ters uma au-dincia.

  • A poesia uma sabedoria que deslum-bra o corao.

    A sabedoria uma poesia que canta na mente.

    Se pudssemos deslumbrar o corao do homem e, ao mesmo tempo, cantar em sua mente,

    Ento, em verdade, ele viveria sombra de Deus.

    A inspirao sempre cantar; a inspira-o nunca explicar.

    Freqentemente cantamos acalentos para nossos filhos a fim de que ns pr-prios possamos dormir.

    Todas as nossas palavras no passam de migalhas de po que caem do festim do esprito.

  • O pensamento a pedra de tropeo da poesia.

    Um grande cantor aquele que canta nossos silncios.

    Como podes cantar se tua boca est cheia de alimento?

    Como tua mo se erguer numa bno se est cheia de ouro?

    Dizem que o rouxinol traspassa o peito com um espinho quando canta sua can-o de amor.

    Assim fazemos todos. Como podera-mos cantar de outra forma?

  • O gnio uma cano de pintarroxo no incio de uma lenta primavera.

    At o esprito mais alado no pode escapar da necessidade fsica.

    Um louco no menos msico do que tu e eu; somente, o instrumento que ele toca est um pouco desafinado.

    A cano que permanece silenciosa no corao de uma me canta nos lbios de seu filho.

    Todo anseio ser realizado.

  • Nunca concordei inteiramente com meu outro Eu. A verdade parece estar a meio caminho entre ns dois.

    Teu outro Eu est sempre com pena de ti. Mas teu outro Eu se nutre de tristeza para crescer. Assim, tudo est bem.

    No h luta entre o corpo e a alma, a no ser nas mentes daqueles cujas almas esto adormecidas e cujos corpos esto desajustados.

    Quando alcanares o corao da vida, encontrars a beleza em todas as coisas, at mesmo nos olhos que esto cegos para a beleza.

  • Vivemos somente para descobrir a be-leza. Tudo o mais uma forma de es-pera.

    Semeia uma semente, e a terra te dar uma flor. Eleva teu sonho ao firmamento, e ele te trar tua bem-amada.

    O demnio morreu no mesmo dia em que nasceste.

    Agora, no tens de passar pelo infer-no para encontrar um anjo.

    Muitas mulheres ocupam o corao de um homem; poucas chegam a apro-priar-se dele.

    Se desejas possuir algo, no o re-clames.

  • Quando a mo de um homem toca a mo de uma mulher, ambas tocam o cora-o da eternidade.

    O amor um vu entre amante e amante.

    Todo homem ama duas mulheres: uma a criao de sua imaginao; a outra ainda no nasceu.

    Os homens que no perdoam s mu-lheres suas pequenas falhas jamais des-frutaro suas grandes virtudes.

    O amor que no se renova a cada dia, torna-se um hbito e o hbito, uma es-cravido.

  • Os amantes abraam mais aquilo que est entre eles do que um ao outro.

    O amor e a dvida nunca estiveram em bons termos.

    O amor uma palavra de luz, escrita por uma mo de luz, sobre uma pgina de luz.

    A amizade sempre uma doce res-ponsabilidade, nunca uma oportunidade.

    Se no compreendes teu amigo em to-das as circunstncias, nunca o compre-enders.

    1 EsffilS

  • Tua veste mais radiosa tecida pela outra pessoa;

    Tua comida mais saborosa a que comes mesa da outra pessoa;

    Teu leito mais confortvel est na casa da outra pessoa.

    Agora, dize-me, como podes separar-te da outra pessoa?

    Tua mente e meu corao jamais es-taro de acordo, at que tua mente deixe de viver nos nmeros e meu corao, na neblina.

    Nunca nos entenderemos um ao ou-tro at que reduzamos a linguagem a sete palavras.

  • Como podero abrir meu corao a no ser quebrando-o?

    Somente uma grande tristeza ou uma grande alegria pode revelar tua verdade.

    Se quiseres revelar-te, dana nu ao sol, ou carrega tua cruz.

    Se a natureza seguisse nossos con-selhos sobre o contentamento, nenhum rio correria at o mar, e nenhum inverno se tornaria primavera. E se prestasse ateno ao que dizemos da frugalidade, quantos de ns estaramos respirando este ar?

    * 1 ,

    Quando viras as costas ao sol, s vs a tua sombra.

  • s livre ante o sol do dia e os astros da noite;

    E s livre quando no h nem sol nem lua nem estrelas.

    s livre at quando fechas os olhos a tudo quanto h.

    Mas s um escravo daquele a quem amas, porque o amas,

    E s um escravo daquele que te ama, porque ele te ama.

    Somos todos mendigos porta do templo, e cada um de ns recebe sua quo-ta da generosidade do Rei, quando ele chega e quando se vai.

    Mas temos todos inveja uns dos ou-tros, o que mais uma maneira de depre-ciar o Rei.

  • No podes consumir alm de teu ape-tite. A outra metade do po pertence outra pessoa, e deves deixar um pouco de po para o hspede inesperado.

    No fosse pelos hspedes, todas as casas seriam tmulos.

    Disse um lobo corts a um carneiro ingnuo: "No querers honrar a nossa casa com uma visita?"

    E o carneiro respondeu: "Sentir-nos--amos muito honrado com essa visita, se tua casa no estivesse no teu estmago."

    Detive meu hspede no limiar da casa, e disse-lhe: "No, no limpes os ps ao entrar, rnas sim ao sair."

    1

  • A generosidade no est em dar-me aquilo de que preciso mais do que tu, mas em dar-me aquilo de que precisas mais do que eu.

    Sois realmente caridosos quando dais c, ao dar, virais a face para no ver o acanha-mento do que recebe.

    A diferena entre o mais rico e o mais pobre apenas um dia de fome e uma hora de sede.

    Muitas vezes contramos dvidas para com nossos amanhs para pagar as dvi-das de nossos ontens.

  • Eu tambm sou visitado por anjos e de-monios, mas livro-me deles.

    Quando um anjo, rezo uma velha pree, e ele fica entediado;

    Quando um demnio, cometo um velho pecado, e ele vai-se embora.

    Afinal de contas, esta no uma m priso; mas no gosto da parede entre mi-nha cela e a do prisioneiro vizinho.

    Contudo, garanto-vos que no desejo recriminar o guarda nem o Construtor da priso.

    Quem te d uma serpente quando pedes um peixe, talvez no tenha seno serpen-tes para dar. , ento, uma generosidade de sua parte.

  • A velhacaria s vezes obtm xito, mas acaba sempre se suicidando.

    s realmente um perdoador quando perdoas a assassinos que nunca derra-mam sangue, a ladres que nunca furtam, e a mentirosos que nunca dizem falsi-dades.

    Quem puder pr o dedo sobre aqui-lo que separa o bem do mal, tocar a pr-pria fmbria da vestimenta de Deus.

    Se teu corao um vulco, como po-ders esperar que se abram flores em tuas mos?

  • Estranha forma de auto-complacncia! H ocasies em que gostaria de ser mo-lestado e enganado, para que pudesse rir-me dos que pensam que no sei que estou sendo molestado e enganado.

    Que direi do perseguidor que finge ser o perseguido?

    Aquele que limpa as mos sujas om tua veste, deixa-o levar a veste. Talvez precise dela novamente; tu, com toda a certeza, no precisars.

    Pena que os cambistas no possam ser bons jardineiros!

  • Por favor, no encubras teus defeitos inerentes com tuas virtudes adquiridas. Aceito teus defeitos: so semelhantes aos meus.

    Quantas vezes atribu a mim mesmo crimes que nunca cometi, para que os ou-tros se sentissem bem em minha pre-sena!

    At mesmo as mscaras da vida so mscaras de profundo mistrio.

    Podeis julgar os outros pelo vosso co-nhecimento de vs mesmos.

    Dizei-me ento, quem entre ns cul-pado e quem inocente?

  • O verdadeiro justo o que se sente meio culpado de teus delitos.

    S um idiota e um gnio quebram as leis feitas pelo homem; e so os mais prximos do corao de Deus.

    s quando s perseguido que te tor-nas ligeiro.

    No tenho inimigos, Deus, mas se tiver de ter um inimigo,

    Faze com que a sua fora seja igual minha,

    Para que s a verdade seja a ven-cedora.

    Estars em completa amizade com teu inimigo quando ambos morrerem.

  • Um homem pode cometer suicdio em defesa prpria.

    H muito tempo, viveu um Homem que foi crucif icado por ter muito amado e ser muito digno de amor.

    E estranho relatar que o encontrei ontem trs vezes.

    Na primeira vez, estava pedindo a um policial que no levasse uma prostituta priso; na segunda vez, estava beben-do vinho com um fora-da-lei; e na ter-ceira vez, estava lutando aos murros com um vendedor, dentro de uma igreja.

    Se tudo o que dizem do bem e do mal for verdade, ento minha vida no passa de um longo crime.

    A piedade no mais do que meia justia.

  • O nico homem que foi injusto comi-go foi um homem com cujo irmo fui in-justo.

    Quando virdes um homem sendo leva-do priso, dizei em vosso corao: "Talvez esteja escapando de uma priso mais estreita".

    E quando virdes um homem embria-gado, dizei em vosso corao: "Talvez es-teja procurando escapar de algo ainda mais feio do que a embriaguez".

    Muitas vezes odiei em defesa prpria; mas se fosse mais forte, no teria usado tal arma.

    Como estpido aquele que procura emendar o dio dos seus olhos com um sorriso nos lbios.

  • S os que esto abaixo de mim podem invejar-me ou odiar-me.

    Nunca fui invejado ou odiado: no estou acima de ningum.

    S os que esto acima de mim podem elogiar-me ou depreciar-me.

    Nunca fui elogiado ou depreciado: no estou abaixo de ningum.

    Quando me dizes: "No te entendo", elogias-me mais do que mereo e te in-sultas a ti mesmo mais do que mereces.

    Como sou mesquinho quando a vida me d ouro e eu te dou prata, e, contudo, julgo-me generoso!

    Quando alcanares o corao da vida, no te achars superior ao criminoso, nem inferior ao profeta.

  • E estranho que tenhais piedade do que tem o passo lento e no do que tem a mente lenta,

    E do cego dos olhos, e no do cego do corao.

    mais sensato para o aleijado no quebrar suas muletas na cabea do seu inimigo.

    Como cego quem te d do seu bol-so para tirar do teu corao!

    A vida uma procisso. O que lento de ps acha-a muito rpida, e se retira.

    E o que rpido de ps acha-a muito lenta, e tambm se retira.

  • Se esta coisa chamada pecado exis-te, alguns de ns o cometemos andando para trs nas pegadas de nossos antepas-sados;

    E alguns de ns o cometemos pulando para a frente na nossa pretenso de mudar o curso de nossos filhos.

    O verdadeiro bom aquele que um com todos os considerados maus.

    Somos todos prisioneiros, mas as celas de uns tem janelas e as de outros no tem.

    estranho que todos defendamos nos-sos erros com mais vigor do que nossos acertos.

  • Se todos confessssemos nossos pe-cados uns aos outros, rir-nos-amos uns dos outros por nossa falta de originali-dade.

    E se todos revelssemos nossas vir-tudes, tambm nos riramos, pelo mesmo motivo.

    Um indivduo est acima das leis fei-tas pelo homem, at cometer um crime contra as convenes feitas pelo homem.

    Depois disso, no est acima de nin-gum, nem abaixo de ningum.

    O governo um acordo entre ti e mim. Eu e tu estamos freqentemente errados.

    O crime ou um dos nomes da necessi-dade ou um aspecto de uma doena.

  • Haver defeito maior do que estar cons-ciente dos defeitos da outra pessoa?

    Se a outra pessoa se ri de ti, talvez te-nhas pena dela; mas se te ris dela, nunca te perdoars a ti mesmo.

    Se a outra pessoa te injuria, talvez es-queas a injria; mas se a injurias, sem-pre te lembrars.

    Na verdade, a outra pessoa o teu Eu mais sensitivo, num outro corpo.

    Como s insensato quando queres que outros voem com tuas asas, conquanto no possas dar-lhes sequer uma pena.

  • Uma vez, um homem sentou-se mi-nha mesa e comeu meu po e bebeu meu vinho e foi-se embora rindo de mim.

    Depois, voltou procura de po e vi-nho, e eu o expulsei;

    E os anjos riram de mim.

    c M g r ^ e j g r ^ j g T K j g r v *

    O dio um cadver. Quem de vs deseja ser um tmulo?

    honra para o assassinado no ser o assassino.

    A tribuna da humanidade est em seu corao silencioso, nunca em sua mente faladora.

  • Consideram-me louco porque no vendo meus dias por ouro;

    E considero-os loucos porque pensam que meus dias tem um preo.

    Espalham diante de ns suas riquezas de ouro e prata, de marfim e bano, e espalhamos diante deles nossos cora-es e nossos espritos;

    E, entretanto, acham que so os hospe-deiros, e ns, os hspedes.

    Preferiria ser o ltimo dos homens com sonhos e o desejo de realiz-los, do que o primeiro, sem sonhos nem desejos

  • O mais digno de piedade entre os ho-mens o que transforma seus sonhos em ouro e prata.

    Estamos todos subindo para o cume do desejo de nossos coraes. Se ou-tro escalador roubar teu saco e tua bol-sa, e ficar gordo com um e pesado com a outra, devers ter pena dele; pois a su-bida ficar mais rdua para sua carne, e o fardo tornar mais longo seu caminho.

    E se, em tua esbelteza, vires sua car-ne arquejando, ajuda-lhe o passo; isto au-mentar tua velocidade.

    No podeis julgar qualquer homem alm do vosso conhecimento dele, e quan-to limitado vosso conhecimento!

  • Eu no gostaria de ouvir um conquista-dor pregando para o conquistado.

    O homem verdadeiramente livre o que carrega pacientemente as cadeias do escravo.

    H mil anos, meu vizinho me disse: "Odeio a vida, pois ela nada contm se-no dores . "

    E, ontem, passei por um cemitrio, e vi a vida danando sobre seu tmulo.

    A luta na ntureza a desordem ansian-do pela ordem.

  • A solido uma tempestade silenciosa que derruba todos os nossos ramos mortos.

    Contudo, ela consolida nossas razes vivas no corao vivo da terra viva.

    Uma vez, falei do mar a um pntano, e o pntano achou que eu era um visionrio.

    E, uma vez, falei de um pntano ao mar, e o mar achou que eu era um difamador.

    Como limitada a viso que exalta a operosidade da formiga acima do canto do grilo!

    A primeira virtude neste mundo talvez seja a ltima no outro mundo.

  • O profundo e o alto descem para as profundezas ou sobem para as alturas em linhas retas; somente o espaoso pode mover-se em crculos.

    No fosse por nossa concepo dos pesos e medidas, sentiramos o mesmo deslumbramento ante o vagalume e o sol.

    Um cientista sem imaginao um aougueiro com facas cegas e balanas desajustadas.

    Mas que quereres, j que no somos todos vegetarianos?

    Quando cantais, o faminto vos ouve com seu estmago.

  • A morte no est mais perto do ido-so do que do recm-nascido. Nem a vida.

    Se precisares mesmo ser singelo, s-lo com beleza; de outro modo, guarda si-lncio, porque h um homem na nossa vizinhana que est morrendo.

    Talvez um funeral entre os homens seja uma festa entre os anjos.

    Uma realidade esquecida pode mor-rer e deixar em seu testamento sete mil fatos a serem gastos em seu funeral e na construo de seu tmulo.

  • Na verdade, conversamos somente co-nosco mesmos, mas s vezes falamos to alto que os outros nos ouvem.

    O bvio aquilo que ningum enxer-ga, at que algum o expresse com sim-plicidade.

    Se a Via Lctea no estivesse dentro de mim, como poderia v-la ou conhe-c-la?

    A no ser que eu seja um mdico en-tre mdicos, no acreditariam que sou um astrnomo.

  • Talvez para o mar, a definio da con-cha seja a prola.

    E para o tempo, talvez a definio do carvo seja o diamante.

    A fama a sombra de uma paixo exposta luz.

    Uma raiz uma flor que despreza a fama.

    No h religio nem cincia para alm da beleza.

  • Todo grande homem que conheci ti-nha alguma coisa pequena em sua forma-o; e era essa coisa pequena que im-pedia a inatividade ou a loucura ou o sui-cdio.

    O verdadeiro grande homem o que no domina ningum e no dominado por ningum.

    No podemos considerar que o homem medocre simplesmente porque mata os criminosos e os profetas.

    A tolerncia o amor atingido pela doena da altivez.

  • Os vermes lutam; mas no estranho que at os elefantes acabam curvando-se?

    Um desacordo talvez seja o atalho mais curto entre duas mentes.

    Sou a chama e sou a sara seca; e uma parte de mim consome a outra parte.

    Estamos todos procurando o cume da montanha sagrada; mas nosso caminho no seria mais curto se considerssemos o passado um mapa e no um guia?

  • A sabedoria deixa de ser sabedoria quando se torna demasiadamente orgu-lhosa para chorar, demasiadamente gra-ve para rir, e demasiadamente egotista para procurar os outros.

    Se enchesse a mim mesmo com tudo o que sabes, que espao ficaria para tudo o que no sabes?

    Aprendi o silncio com o ioquaz, a to-lerncia com o intolerante, e a bondade com o maldoso; estranho, no sinto ne-nhuma gratido por esses mestres.

    Um fantico um orador completa mente surdo.

  • O silncio do invejoso ruidoso de-mais.

    Quando chegares ao fim do que de-verias saber, estars no princpio do que deverias sentir

    Um exagero uma verdade que per-deu a calma

    Se s podes ver o que a luz revela e ouvir o que o som anuncia,

    Ento, em v e r d a d e , no vs nem ouves.

    Um fato uma verdade assexuada.

  • No podes rir e ser duro ao mesmo tempo.

    Os que so mais caros ao meu cora-o so um rei sem um reino e um po-bre que no sabe mendigar.

    Um fracasso com modstia mais nobre do que um xito com arrogncia.

    Cava onde quiseres na terra, encontra-rs um tesouro; mas precisars cavar com a f do lavrador.

  • Uma raposa perseg