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Reflexões Filosofia 10.º ano Isabel Bernardo Catarina Vale 1724 - 1804 De que modo devemos agir para agir moralmente? A ética deontológica de Kant Uma ética do dever na Fundamentação da Metafísica dos Costumes

A Ética Kantiana

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Page 1: A Ética Kantiana

Reflexões Filosofia 10.º ano

Isabel Bernardo

Catarina Vale

1724 - 1804

De que modo devemos

agir para agir

moralmente?

A ética deontológica

de Kant

Uma ética do

dever na

Fundamentação

da Metafísica dos

Costumes

Page 2: A Ética Kantiana

Noção de vontade boa, segundo Kant

O que torna o ato moral num ato moralmente bom?

Para responder a esta questão, Kant, ao contrário de outras

teorias éticas, não procura definir o que é o Bem, mas procura

identificar algo que se possa identificar como

absolutamente bom, algo que incarne completamente uma

ideia de Bem.

“Neste mundo, e até fora dele, nada é possível pensar que

não possa ser considerado como bom sem limitações a

não ser uma só coisa: uma boa vontade”Immanuel Kant (1785). Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Lisboa: Ed. 70, 2000, p. 21.

Exercício de conceptualização

Page 3: A Ética Kantiana

Noção de vontade boa , segundo Kant

A vontade boa é aquela que age exclusivamente por dever,

por respeito à lei moral, independentemente das

consequências que advenham da sua ação ou das inclinações

que podem levar à ação.

“A boa vontade não é boa por aquilo que promove ou

realiza, pela aptidão para alcançar qualquer finalidade

proposta, mas tão-somente pelo querer, isto é, em si

mesma e por si mesma”.

Immanuel Kant (1785). Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Lisboa: Ed. 70, 2000, p. 21.

Exercício de conceptualização

Page 4: A Ética Kantiana

Para clarificar melhor esta ideia (e assim explicitar melhor

o conceito de vontade boa), Kant introduz uma distinção:

agir por dever ou agir em conformidade ao dever.

Esta distinção é fundamental para saber se uma ação

tem, ou não, uma intenção ética e se se pode considerar

moralmente boa.

Page 5: A Ética Kantiana

Vamos analisar um exemplo, apresentado por Kant

embora um pouco adaptado, com os quais o autor

pretende exemplificar o que entende com a diferença

entre “agir por dever” e “agir em conformidade ao

dever”.

Exercício de conceptualização – aplicação de

conceitos

Page 6: A Ética Kantiana

Um merceeiro tem um cliente novo na sua loja, um turista

que não sabe falar ou ler em português. O turista quer um

quilo das belas maçãs que acabaram de chegar e que ainda

não têm o preço marcado. O merceeiro pode aumentar o

preço das maçãs, mas vende-as ao turista ao mesmo preço

a que estavam no dia anterior.

Como sabemos se a ação do merceeiro foi moralmente

boa?

Para sabermos se a ação do merceeiro foi uma ação moral,

Kant diz que temos que saber a resposta à seguinte

questão: “Qual foi o motivo da ação do merceeiro?”

Page 7: A Ética Kantiana

De acordo com Kant, qual dos motivos, apresentados

no diapositivo seguinte, nos permitiria considerar a

ação como sendo moralmente boa, isto é, feita por

dever? Justifica a tua resposta.

Exercício de conceptualização – aplicação de

conceitos

Page 8: A Ética Kantiana

a) Teve receio que o comprador fosse, afinal, um inspetor das

atividades económicas disfarçado de turista;

b) Não quer ficar mal visto e perder a confiança dos clientes

habituais que estavam na loja;

c) Não se deve enganar os outros;

d) É muito religioso e tem receio do castigo divino;

e) É naturalmente bondoso e não faz parte das suas inclinações

naturais, do seu modo de ser, enganar seja quem for.

O merceeiro agiu assim, porque:

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Somente a razão “porque não se deve enganar os outros”

torna a ação moralmente boa.

“Uma ação praticada por dever tem o seu valor moral (...)

no princípio do querer segundo o qual a ação,

abstraindo-se de todos os objetos da faculdade de

desejar, foi praticada. (...) O valor moral de uma ação não

reside, portanto, no efeito que dela se espera”.

Immanuel Kant (1785). Fundamentação da Metafísica dos Costumes.

Lisboa: Ed. 70, 2000, pp. 30-31.

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Tipos de ações segundo Kant

1. Ações contrárias ao dever - ações que violam o dever. Ex: Matar,

roubar, mentir.

2. Ações em conformidade com o dever- ações que cumprem o dever,

não porque é correto fazê-lo, mas porque daí resulta um benefício ou

a satisfação de um interesse. Ex: Não roubar por receio de ser castigado.

3. Ações feitas por dever – ações que cumprem o dever porque é correto

fazê-lo. O cumprimento do dever é o único motivo em que a ação se

baseia. A intenção de cumprir o dever não está associada a outras

intenções, é a única intenção. Ex: Não roubar porque esse ato é errado.

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Noção de dever

O que Kant entende por dever?

“Dever é a necessidade de uma

ação por respeito à lei”.

Immanuel Kant (1785). Fundamentação da Metafísica

dos Costumes. Lisboa: Ed. 70, 2000, p. 31.

Exercício de conceptualização

Duplo Retrato de Almada

Negreiros (1934-36)

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A lei moral – é uma lei presente na consciência de todos os seres racionais,

que, ao contrário das normas estabelecidas (“Não deves roubar”; “Não deves

mentir”; Não deves matar”), não diz o que é correto, mas sim como cumprir de

forma correta o que é correto. Essa lei diz-nos de forma muito geral o seguinte:

“Deves em qualquer circunstância cumprir o dever pelo dever, sem segundas

intenções”. A lei moral diz-nos como cumprir os deveres (ou normas morais);

qual a forma correta de os cumprir. A lei moral exige um respeito absoluto pelo

dever e apresenta-se sob a forma de um imperativo (“Deves”). O cumprimento

do dever é um imperativo incondicional, categórico, não depende de condições

ou de interesses.

Page 13: A Ética Kantiana

Noção de imperativo categórico

“Mas que lei pode ser essa, cuja representação, mesmo

sem tomar em consideração o efeito que dela se espera,

tem de determinar a vontade para que esta se possa

chamar boa absolutamente e sem restrição?” (p. 33)

Ou seja, qual é a lei moral a que, independentemente da ação

que seja, das circunstâncias em que se realize, ou das

consequências que possa vir a ter, deve obedecer a ação

voluntária?

A essa lei, Kant chama de imperativo categórico.

Exercício de conceptualização

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Imperativo categórico - O imperativo categórico é uma regra

geral que traduz o que a lei moral exige, ou seja, exprime uma

obrigação absoluta e incondicional. Exige que a vontade seja

exclusivamente motivada pela razão, que seja independente em

relação a desejos, interesses e inclinações particulares. Ordena

que uma ação seja realizada pelo seu valor intrínseco, que seja

realizada por ser boa em si e não por causa dos seus efeitos. Por

exemplo “Deves ser honesto porque esse é o teu dever”.

Imperativo hipotético - é uma regra concreta de ação cujo

cumprimento depende de um interesse que queiramos satisfazer.

Diz-nos que devemos ser honestos, não porque esse é o nosso

dever, mas sim se for do nosso interessa. “Se queres ser

compensado, deves ser honesto” é um exemplo de imperativo

hipotético. O cumprimento da regra está associado a uma condição.

O cumprimento do dever subordina-se a uma condição e, por isso,

cumprindo o dever, estamos, contudo, a fazê-lo por interesse.

Page 15: A Ética Kantiana

Ao longo do texto da Fundamentação da Metafísica dos

Costumes, Kant apresenta várias formulações do imperativo

categórico, mas afirma que todas elas são equivalentes, de

tal modo que as diferentes formulações surgem apenas como

clarificações de uma mesma ideia fundamental.

A fórmula mais conhecida do imperativo categórico diz-nos:

“Age apenas segundo uma máxima tal que possas ao

mesmo tempo querer que ela se torne lei universal”.Immanuel Kant (1785). Fundamentação da Metafísica dos Costumes.

Lisboa: Ed. 70, 2000, p. 59.

Page 16: A Ética Kantiana

Como se pode observar o imperativo categórico é uma

lei formal que não nos diz o que fazer em concreto, mas

dá-nos uma orientação para avaliarmos se a ação que

pretendemos fazer é, ou não, moralmente aceitável.

Exercício de conceptualização – aplicação de conceitos

Page 17: A Ética Kantiana

Assim, ao deliberarmos se devemos fazer uma ação

temos que:

1.º Identificar qual a regra que estaríamos a seguir se

fizéssemos a ação.

2.º Perguntar se estaríamos dispostos a que a regra fosse

seguida por todos em todas as situações iguais.

3.º Realizar, ou não, a ação de acordo com a conclusão

obtida.

Page 18: A Ética Kantiana

Para mostrar a aplicabilidade da sua posição, Kant apresenta

quatro exemplos de ações e analisa-os de modo a

determinar a sua moralidade. Vamos analisar dois, um pouco

adaptados aos nossos dias.

Analisa, com o teu par de carteira ou colega do lado, o

exemplo que se segue e determina, argumentando, se o

poderemos considerar, à luz da ética kantiana, um ato

moralmente bom.

O trabalho será seguido de discussão em grande grupo.

Tarefa 1

Page 19: A Ética Kantiana

Imagina que queres comprar um tablet, mas não tens dinheiro

suficiente. Sabes que um amigo teu tem um dinheiro guardado

porque trabalhou nas férias de Verão. Ponderas pedir o

dinheiro ao teu amigo, embora saibas que com a tua mesada

não lhe podes pagar tão cedo. Decides, no entanto, pedir o

dinheiro emprestado e prometes ao teu amigo que lhe pagarás

no final do mês, sabendo que não o vais poder fazer.

Exemplo 1 – Exemplo das falsas promessas

Page 20: A Ética Kantiana

Podes, pela tua vontade, desejar que a máxima que presidiu a

esta ação seja universalizável?

Para podermos chegar a uma conclusão, em primeiro lugar

temos de identificar qual seria a máxima da ação. Qual é a

máxima da ação?

“É possível efetuar uma falsa promessa se isso nos permite

obter um fim desejado”.

Page 21: A Ética Kantiana

Ao universalizarmos a máxima estamos a afirmar que todos

podem mentir, efetuar falsas promessas, se isso permitir

atingir um objetivo.

Ora, considera Kant, nenhum ser racional poderia eleger

esta máxima como princípio universal de ação, pois isso iria

destruir todo o edifício de confiança sobre o qual assentam as

relações sociais.

Por outro lado, a máxima da ação entra logicamente em

contradição, pois colocaria em causa as bases que

possibilitam as falsas promessas, já que uma mentira só tem

efeito se partirmos do princípio de que as pessoas, em geral,

dizem a verdade.

Page 22: A Ética Kantiana

Analisa, com o teu par de carteira ou colega do lado, o

exemplo que se segue e determina, argumentando, se o

poderemos considerar, à luz da ética kantiana, um ato

moralmente bom.

O trabalho será seguido de discussão em grande grupo.

Tarefa 2

Page 23: A Ética Kantiana

Imagina que subitamente recebeste um dinheiro inesperado

que te permite viver bem e ter tudo o que queres. Passas por

um jovem que está na rua a pedir com um cartaz que diz “Por

favor ajude-me! Preciso de pagar as propinas do meu último

ano de curso”. Ponderas partilhar algum do teu dinheiro com

ele. Porém pensas: nada lhe tirei e nada lhe invejo, porque

hei de contribuir para o seu bem-estar? Decides, então,

continuar o teu caminho e não dar nenhum dinheiro ao jovem.

Exemplo 2 – Auxílio aos mais necessitados

Page 24: A Ética Kantiana

Podes, pela tua vontade, desejar que a máxima que presidiu a

esta ação seja universalizável?

Para podermos chegar a uma conclusão, em primeiro lugar

temos de identificar qual seria a máxima da ação. Qual é a

máxima da ação?

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A dignidade do homem como fundamento do imperativo categórico.

“Mas porque deve o imperativo categórico ser aceite como

uma lei prática que ordena absolutamente a vontade apenas

por dever e sem qualquer outra inclinação natural?” (p. 64)

- Ou seja, por que devemos obedecer ao imperativo categórico?

Por que a razão que comanda a vontade impõe um fim a que se

devem submeter todos os seres racionais.

Exercício de argumentação

Page 26: A Ética Kantiana

Que fim pode ser este?

O Homem e todos os seres racionais em geral.

O Homem é o único ser que não pode ser entendido como um

meio para atingir um fim. Esta ideia levou Kant a apresentar

uma nova formulação do imperativo categórico:

“Age de tal maneira que uses a humanidade, tanto na tua

pessoa, como na pessoa de qualquer outro, sempre e

simultaneamente como fim e nunca simplesmente como

meio” (p. 69).

Page 27: A Ética Kantiana

Como é que esta nova formulação do imperativo

categórico reforça as conclusões já obtidas na

primeira formulação?

Tarefa

Page 28: A Ética Kantiana

Se aplicarmos este princípio aos exemplos anteriores,

poderemos concluir que houve instrumentalização do

Homem, ou seja, que o agente usou outros seres racionais

como meios para atingir os seus fins?

No primeiro exemplo, é fácil de observar que o amigo, a

quem foi feita uma falsa promessa, foi utilizado para atingir

um fim: comprar um tablet, mesmo sabendo-se que não se

poderia devolver o dinheiro no prazo prometido.

Page 29: A Ética Kantiana

No segundo exemplo, Kant admite

que a humanidade pode subsistir se

nenhum de nós contribuísse para a

felicidade dos demais, desde que não

retirássemos nada intencionalmente.

No entanto, argumenta Kant, se cada

um de nós não contribuir ativamente

para os fins dos nossos semelhantes,

não estamos a contribuir para a

“humanidade como um fim em si

mesma”.Os miseráveis diante do mar

de Pablo Picasso (1903)

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“Pois se um sujeito é um fim em si mesmo, os seus

fins têm de ser quanto possível os meus, para aquela

ideia poder exercer em mim toda a sua eficácia”.Immanuel Kant (1785). Fundamentação da Metafísica dos Costumes.

Lisboa: Ed. 70, 2000, p. 71.

Ou seja, para que a ideia de que o “Homem é um fim em si

mesmo” se imponha de forma inequívoca à vontade, é

necessário que considere que os seus fins (objetivos ou

projetos) sejam igualmente importantes para mim e

considerados como algo de bom.

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O que é uma Boa Vontade? (Conclusão)

1- É uma vontade que age de forma moralmente correta.

2- É uma vontade que cumpre o dever respeitando absolutamente a lei

moral, ou seja, cuja única intenção é cumprir o dever.

3- É uma vontade que age segundo regras ou máximas que podem ser

seguidas por todos porque não violam os interesses de ninguém.

4- É uma vontade que respeita todo e qualquer ser humano

considerando-o uma pessoa e não uma coisa ou um meio ao serviço

deste ou daquele interesse.

5- É uma vontade autónoma porque decide cumprir o dever por sua

iniciativa e não por receio de autoridades externas ou opinião dos outros.

Page 32: A Ética Kantiana

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Bibliografia