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A LITERATURA NO ENSINO MÉDIO

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A LITERATURA NO ENSINO MÉDIO

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A LITERATURA NO ENSINO MÉDIO

SOCORRO DE FÁTIMA PACÍFICO BARBOSA

ENSINAR LITERATURA É ENSINAR O QUÊ?

Caro aluno,

Este é o momento de você colocar em prática os conteúdos aprendidos durante o

seu curso. Agora você irá ao mesmo tempo observar, refletir e praticar a docência no ensino

da literatura.

Contudo, o desafio de ensinar literatura vai além dos conteúdos aprendidos na

Universidade. Ele se pauta principalmente sobre a sua história de leitura. Neste volume,

privilegiamos as questões teóricas que envolvem o conceito da literatura e aquelas que dizem

respeito à história do ensino desta disciplina no Brasil, bem como a sua presença no seu mais

recente suporte: a rede mundial de computadores.

Assim, a disciplina está dividida em quatro unidades, apresentadas em quatro

capítulos. No primeiro, abordaremos a história do conceito de literatura e do seu ensino no

Brasil desde o período colonial. O segundo discute o conceito de literatura no âmbito dos

Documentos oficiais – os parâmetros curriculares e os documentos do Enem. O terceiro tratará

das conseqüências da escolarização literária. Seguindo a reflexão de Magda Soares, propomos

uma escolarização adequada da literatura no Ensino Médio. Por fim, será discutida a relação

da literatura e sua divulgação na internet, bem como as possibilidades de utilizá-las no seu

ensino.

Bom estudo!

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UNIDADE I

UMA BREVE HISTÓRIA DO CONCEITO DE

LITERATURA E DO SEU ENSINO NO BRASIL

Sobre o ensino e o conceito de literatura no período colonial

O ensino da literatura no Brasil tem uma história. O interesse por esta história foi

motivado pelo questionamento de alguns alunos e professores que sempre perguntavam por

que estudar literatura. Por isso, vamos fazer um pequeno percurso histórico sobre a história

desta disciplina, que teve início no ensino secundário do Colégio Pedro II. Antes porém de se

transformar em ensino de História da Literatura, a literatura era “ensinada” através de duas

disciplinas das quais foi originada: a Retórica e a Poética. Compreendo que esta história

precisa ser conhecida, para que você possa entender e melhor avaliar o nível das mudanças

que estão em curso há alguns anos com os Parâmetros Curriculares Nacionais e as Orientações

e, mais recentemente, com a Matriz de Referência do Enem 2009.

Foram os jesuítas que, em fins do século XVI, norteados pelo Método Pedagógico dos

Jesuítas, ou o Ratio Studiorium, introduziram o ensino da literatura no Brasil. Naquela época, o

conceito de literatura ainda não estava estabelecido e os escritos clássicos – a poesia, as cartas

e os discursos dos gregos e latinos – eram utilizados para o ensino da Retórica e da Poética.

Assim, a leitura dos clássicos servia tanto para conhecer as regras da boa conduta, adquirir

erudição, como a da sua escrita, por isso se ensinava retórica e poética: “pois compreendem a

formação perfeita para a eloqüência que abraça as duas mais altas faculdades, a oratória e a

poética (e entre as duas se deve dar sempre preferência à primeira); e atende não só ao que é

útil senão também à beleza da expressão”.

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Seguindo os modelos criados por Platão e Aristóteles ou Horacio, este ensino produziu

um grande número de tratados, diálogos, compêndios que além da terminologia, dos

conceitos e das regras para composição, oferecia ferramentas para a leitura e análise das

obras clássicas, ou o que costumavam chamar de Belas Letras (Abreu, 2003).

Luis Antonio Verney

Observe que nesta concepção ensinar retórica e poética se constituía como ensinar

modelos e principalmente ensinar a imitar, a norma por excelência da composição até a

revolução romântica, conforme vemos na seguinte afirmação de Verney [1746] (1991, p. 177):

Porque na leitura dos melhores autores aprende-se melhor. Assim que, não achando isto feito, pode o mestre nos mesmos autores mostrar os lugares que são necessários, e encomendar muito aos rapazes que os leiam e decorem, pois só assim se faz algum progresso na poesia. A poesia não é coisa necessária na República: é faculdade arbitraria e de divertimento. E assim, não havendo necessidade de fazer versos, ou fazê-los bem, por não se expor às risadas dos inteligentes. Se eu visse que o estudante não tinha inclinação à composição, explicaria brevemente as leis poéticas, que é uma erudição separada da composição e que todos podem aprender, ao menos para entenderem as obras, e o deixaria empregar no que lhe parecesse.

Como se observa, nesta longa citação, a composição de poesias baseadas em modelos

estava prevista no ensino da poética. Também é possível verificar que as regras e a leitura dos

modelos era também prescritiva no sentido de oferecer instrumentos de leitura e

compreensão. Este modelo de ensinar “literatura” prevaleceu até meados do século XIX,

quando o ensino da Retórica e da Poética foi substituído pelo ensino da História da Literatura.

Contudo, até que o ensino da disciplina se consolidasse e fosse introduzido no Colégio Pedro II,

o próprio sentido do termo literatura foi se construindo e adquirindo aos poucos o perfil do

que atualmente consideramos como Literatura.

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Senão vejamos. Até o século XVIII, o termo literatura significava erudição,

conhecimento; ciência, filosofia, história. Abaixo temos uma longa citação do escritor francês

Voltaire, onde se percebe que já no século XIX, em 1819, ainda não havia uma definição

precisa para o termo:

Literatura: essa palavra é um desses termos vagos tão freqüentes em todas as línguas[...] a literatura designa em toda a Europa um conhecimento das obras de gosto, uma tintura de história, de poesia, de eloqüência, de crítica [..] Não se distinguem de forma alguma obras de um poeta, de um orador, de um historiador, por esse termo vago de literatura, ainda que seus autores possam apresentar um conhecimento muito variado e possuir tudo aquilo que se entende pelas palavras e letras [...]Chama-se de bela literatura aquela que se prende aos objetos que têm beleza, à poesia, à eloqüência, à história bem escrita. a simples crítica, as diversas interpretações dos autores, os sentimentos dos antigos filósofos, a crônica, não são absolutamente bela literatura pois suas pesquisas não têm beleza. (Voltaire). Apud Abreu (2003, p. 17)

Nesse contexto, a leitura estava restrita àqueles que dominavam as regras da poética e

da retórica, portanto um ciclo reduzidíssimo de homens de gosto, cuja erudição estava ligada

ao conhecimento dos clássicos e à língua latina o que garantia certa universalidade a estes

saberes, ou belas-letras, uma produção sem pátria. Este modelo de literatura vigorou até o

momento em que os critérios da história pátria e da língua passaram a referendar um modelo

de escrito que levava em consideração, sobretudo, a nacionalidade do escritor e o conteúdo

do seu escrito. Assim, como afirma Márcia Abreu, “literatura e nação foram projetados para o

passado e deram origem à preparação das histórias literárias. Transformar o estudo diacrônico

dessas obras em disciplina escolar foi a etapa final do processo de consagração de alguns

literatos e de seus escritos”. No caso da literatura portuguesa, foi em fins do século XVIII que

começaram a surgir estratégias que viessem a “destacar um grupo de escritos do conjunto das

obras para valorizá-lo com o nome de literatura” (ABREU, 2003).

Foi ao alemão Frederich Bouterweck a quem coube incluir e definir pela primeira vez a

literatura portuguesa, ao publicar uma história da poesia e da eloqüência de vários países, em

doze volumes, sendo que o referente a Portugal foi o quarto deles, publicado em 1805. Trata-

se da História das Artes e das Ciências desde a época de sua renascença até o final do século

XVIII. Observe-se que, mesmo quando utiliza o termo literatura, o faz em relação à nação

especificamente – literatura italiana, literatura francesa – uma vez que os volumes dele estão

incluídos na História das belas artes – poesia e eloqüência – como parte de uma categoria

maior, a das “artes e ciências”.

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O leitor deve estar se perguntando onde entram o romance e o conto se atualmente

estes são os gêneros literários por excelência e as belas letras como vimos compreendia

gêneros bastante diversos? Este é o caso, por exemplo, dos livros didáticos que elencam de

forma bem natural os autores e obras dos períodos literários anteriores ao Romantismo, como

se houvesse um senso comum sobre quais autores e que obras poderiam ser consideradas

como obras literárias1.

Friedrich Bouterweck(1805), por exemplo, inclui apenas o poeta brasileiro Cláudio

Manuel da Costa entre aqueles que fizeram a glória de Portugal com sua poesia. Os critérios

pelos quais o historiador elege o poeta mineiro revelam a distância que separa a concepção de

fazer poético da época, daquela que orienta as produções atuais. Como a maioria dos retores e

historiadores da época, Bouterweck (2003, p. 131) condenava as extravagâncias barrocas,

denominadas à época, entre outras, como maneiristas:

A poesia um tanto quanto corrompida, que estava na moda, o estilo do maneirismo português, era aquela que prevalecia durante os anos que ele passou na Universidade de Coimbra, como ele mesmo conta. Foi, portanto, uma sorte especial para o jovem Da Costa o fato de ele começar a estudar e a imitar, durante sua estadia em Coimbra, Metastásio

2 e os poetas italianos

mais antigos. Essa sua atitude também constituiu a primeira prova de que, em sua profissão, ele se direcionava a uma formação mais pura. Ele inclusive foi bem-sucedido na tentativa de fazer sonetos petrarquianos em língua italiana (Grifos meus).

Observe que o critério de valorização do poeta foi justamente o estudo e a imitação de

Mestastásio, pois nesta época, ainda não existia a originalidade como critério de valoração de

uma obra. Veja que fazer sonetos à maneira de Petrarca3 também se constituía como exercício

e escrita válidos.

1 No capítulo referente à análise do livro didático, comentaremos mais a fundo a idéia de cânone e a origem desta

tradição de fazer de apenas alguns autores ou obras o repertório digno de ser conhecido ou abordado pela posteridade. 2 Pietro Trapassi, mais conhecido como Metastasio, (13 de janeiro de 1698, em Roma, Itália - m. 12 de abril de

1782, Viena, Áustria) pseudônimo adotado foi um poeta e dramaturgo. Em 1723 alcançou o primeiro sucesso com Didone abbandonata , melodrama escrito para a sua amante, a cantora lírica Marianna Bulgarelli, no qual explora o conflito entre o amor e o dever. Em 1730 foi nomeado poeta imperial da corte vienense, dedicando-se à produção de melodramas e à escrita de libretos que foram musicados por Mozart. De entre as suas obras, destacam-se: Siroe , Catone in Utica , Ezio , Semiramide riconosciuta , Alessandro nell'Indie , La clemenza di Tito e Attilio Regolo . Enquanto poeta, são dignas de nota o seu Epistolario e cinco "canzonette", de entre as quais se destacam La Libertá e La Partenza , que constituem exemplos da poesia italiana segundo a tradição arcádica. Disponível em http://www.infopedia.pt/$pietro-metastasio Acesso em 18/09/2009. 3 Francesco Petrarca (Arezzo, 20 de Julho de 1304 - Arquà Petrarca, 19 de Julho de 1374) foi um importante

intelectual, poeta e humanista italiano, famoso, principalmente, devido ao seu Romanceiro. É considerado o inventor do soneto, tipo de poema composto de 14 versos. Foi baseado no trabalho de Petrarca (e também de Dante e Boccaccio) que Pietro Bembo, no século XVI, criou o modelo para o italiano moderno, mais tarde adotado pela Accademia della Crusca. É tido como o "pai do Humanismo". Mas esse grande latinista deve sua fama principalmente a seus poemas, redigidos em língua italiana. Disponivel em http://pt.wikipedia.org/wiki/Francesco_Petrarca Acesso em 18/09/2009.

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Porém, coube ao francês Simond de Sismondi que, em seu De la Literature du Midi de

l´Europe (1813), dedica alguns capítulos à literatura de língua portuguesa (Abreu, 2003),

modificando esse paradigma de obedecer as regras e aos modelos consagrados. Segundo

Abreu (2003, p. 55), “apesar de supor a existência de “regras fundamentais” que organizam

cada literatura, opunha-se à obediência a elas como origem da criação, acreditando que as

fontes para produção deveriam ser procuradas “no coração” dos escritores pois “não existem

modelos exceto para aqueles que querem se reduzir ao triste ofício de imitador”. Além de

promover essa mudança, Sismondi também pode ser considerado o formulador do “esqueleto

da moderna história literária”, que consistia em:

Seleção e hierarquização de obras e autores, apresentação cronológica dos textos e biografia dos escritores, articulação entre história, língua e fazer literário. É verdade que ainda havia terreno para os futuros historiadores da literatura operarem cortes e introduzirem novidades, como a identificação de escolas e o encadeamento de estéticas [...]

É possível identificar até hoje esse modelo de história da literatura e a sua repercussão

no seu ensino, através, principalmente do conteúdo e da disposição da literatura no livro

didático. Outro problema evidenciado neste suporte é o de oferecer a todo e qualquer texto

literário os mesmos suportes de leitura, sem considerar as regras e os protocolos de leitura

exigidos para a leitura feita neste período.

A história da literatura como modelo do ensino da literatura

No Brasil, é possível rastrear as origens da disciplina no século XIX através dos

programas de ensino do Colégio Pedro II, fundado em 1837, sob o patrocínio do imperador,

destinado à formação de bacharéis num período de sete anos. Como não havia no país curso

superior de Letras — situação que persistiu até 1934 —, o colégio exercia este papel. Esta

análise e levantamento foram feitos primeiramente por Souza (1999).

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Imperial Colégio Pedro II

Pelos programas é possível perceber que em 1850, sob o ensino da Retórica, a

literatura nacional constava de apenas dois pontos, dos quarenta elencados para o sexto e o

sétimo anos.

1850

Rhetorica4

1. Poesia, sua origem e progresso

2. Idem

3. Poesia pastoril, suas regras

4. Idem

5. Poesia lyrica em geral

6. Do enthusiasmo poético; poetas lyricos conhecidos

7. Poesia didactica em geral

4 Mantenho a ortografia da época.

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8. Satyra e epistola

9. Poetas que se distinguiram no genero didactico

10. Poesia descriptiva, suas regras

11. Idem

12. Poesia epica

13. Idem

14. Idem

15. Iliada de Homero

16. Idem

17. Odysséa

18. Eneida de Virgilio

19. Idem

20. Pharsalia, de Lucano

21. Jerusalem Libertada, de Tasso

22. Idem

23. Idem

24. Orlando Furioso, Ariosto

25. Lusíadas de Camões

26. Idem

27. Idem

28. Telemaco, de Fenelon

29. Henriade, de Voltaire

30. Paraiso perdido, de Milton

31. Caramurú, Durão

32. Idem

33. Idem

34. Poesia dramatica; tragedias

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35. Idem

36. Differença entre as tragedias antiga e moderna

37. Tragicos antigos e modernos

38. Poesia dramatica. Comedia

39. Idem

40. Comicos antigos e modernos

Fonte: Sousa (1999, p. 160)

Os Lusíadas

Observe que o que hoje consideramos próprios à matéria literária era ensinado por

gêneros, o que justifica a inclusão das epopéias Os Lusíadas e o Caramuru, menos por serem

escritas em língua portuguesa, do que por se enquadrarem no gênero épico. É possível

também verificar que o ensino da “literatura” era baseado principalmente nas obras clássicas

de origens diversas.

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Em 1860 é introduzida nos estudos do sétimo ano a disciplina Literatura Nacional que

constava de trinta pontos. Nesta época, por literatura nacional se compreendia as produções

portuguesas e brasileiras. Como se pode observar, o conceito de literatura incluía a oratória, a

história, a biografia, os gêneros didáticos, além dos gêneros hoje considerados como literários.

Sobre os romancistas elencados no item nove não se tratavam do gênero que atualmente

conhecemos e cujo estudo se constitui atualmente o grosso dos estudos de literatura. Mais

adiante trataremos deste gênero e do seu ingresso nos estudos da literatura. Os romancistas

aqui citados são os autores do romance

1860

Literatura Nacional

1. Origem da Lingua Portuguesa.

2. Noção e divisão da sua litteratura.

3. Desenvolvimento e progresso durante as duas primeiras épocas.

4. Poetas lyricos

5. Idem de Didaticos

6. Idem Epicos

7. ldem Dramaticos Do Seculo aureo.

8. Moralistas e Historiadores

9. Viajantes e Romancistas

10. Poetas Epicos Portuguezes

11. Idem Lyricos Brasileiros

12. Historiadores, Biographos, e Oradores Portuguezes Da decadencia.

13. Chronistas Brasileiros

14. Poetas Lyricos Portuguezes

15. Idem Brasileiros

16. Dramaticos Portuguezes

17. Idem Epicos Brasileiros

18. Idem idem Portuguezes Do Renascimento.

19. Historiadores, Biographos e Monographos Portuguezes

20. ldem Brasileiros

21. Oradores Portuguezes

22. ldem Brasileiros

23. Influencia da Escola Petrarchista sobre a Iitteratura Portugueza.

24. Idem da Gongoristica.

25. Causas da decadencia da litteratura Portugueza.

26. ldem do seu renascimento no 18 seculo.

27. Influencia da Arcadia e da Academia Real das Sciencias.

28. Escola Franceza e reacção archaista.

29. Natureza e reforma de Garret.

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30. ldem do Sr. Magalhães.

Livro — Postilia do Professor. Fonte: Souza (1999, p. 166)

Em 1862, surge no panorama do ensino da literatura o primeiro compêndio de

literatura nacional, o Curso de Literatura Nacional, do cônego Fernandes Pinheiro. No

programa deste ano do curso de literatura, podemos observar já o princípio que norteou e

ainda norteia em alguns estabelecimentos de ensino da literatura. A ênfase recai sobre os

períodos literários.

Literatura Nacional

1. Definição e divisão da Litteratura.

2. Origem e desenvolvimento da portugueza.

3. Escola trovadorista.

4. “ petrarchista

5. gongonistica (sic).

6. “ archaica (sic).

7. franceza.

8. “ romantica.

9. Caracteristicos das composições portuguezas e brasileiras.

10. Tendencias da nova litteratura.

Livro. — Conego Dr. J. C. Fernandes Pinheiro. — Curso elementar de Litteratura Nacional.

Fonte: Souza (1999, p. 168).

O romance e a revolução da leitura no Brasil

Após consulta à obra do Cônego Fernandes Pinheiro, observe quais os principais

gêneros considerados literários à época e qual o conceito de literatura. Veja que à página 115,

ele trata do romance. Porém, ao contrário da concepção que temos atualmente deste gênero

em prosa, principalmente daqueles que estavam sendo escritos na época em que o cônego

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publicou o seu livro, os romances aludidos dizem respeito a outro tipo de concepção poética,

que à exceção das histórias de amor, não possuíam muitas semelhanças com o romance, o

folhetim, publicados desde fins do século XVIII.

Foi exatamente o fato de não demandar regras e protocolos para a leitura que levou

muitos teóricos e homens de letras a condenar esse gênero novo que surgia – baseado

inteiramente na originalidade de seu autor e na imaginação daquele que o lia o romance. Tem

início com Samuel Richardson Pamela; ou a virtude recompensada (2 vol., 1740); Henry

Fielding Tom Jones; Daniel Defoe: Robson Crusoe, (1719). O seu nascimento na Inglaterra do

século XVIII modificou parcialmente o estado das coisas no que diz respeito aos leitores e

autores da época. Publicado em jornais e periódicos, os romances eram lidos por leitores

ignorantes, desconhecedores das regras da retórica e da poética. Segundo Watt (1990), o

romance constituiu a principal atração e foi o gênero que mais contribuiu para ampliar o

público leitor de ficção, inclusive os das classes inferiores.

A leitora (1770-1772)

Jean-Honoré Fragonard

A leitura do romance passou a ser um entretenimento basicamente feminino, ligado

ao ócio forçado, o que levou mercantilistas e religiosos a vê-la como uma distração perigosa,

pois podia afastar os seus leitores e leitoras de suas ocupações, já que o romance não previa a

instrução como parte da máxima horaciana de instruir e deleitar.

Publicados inicialmente em jornais, ao mesmo tempo em que promovia uma leitura

rápida, o romance dava ao seu escritor o estatuto de autor menor, uma vez que ganhava por

linhas. Segundo Watt (Idem), o Gentleman’s magazine instituiu um outro tipo de escritor: os

colaboradores de aluguel e amadores. Neste sentido, os livreiros passaram a ocupar

(determinar) uma posição estratégica entre o escritor e o impressor e entre este e o público.

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Alguns escritores lamentavam “essa fatal revolução que converteu (a arte de ) escrever numa

profissão mecânica; e os livreiros, ao invés dos grandes, tornaram-se os patrões e pagadores

dos homens de gênio” (Goldsmith, apud Watt, p.49).

Mulher a ler numa paisagem, 1869

Jean Baptiste Camille Corot (1796 - 1875)

Porém, ao retirar a literatura da tutela dos mecenas e colocá-la sobre o controle das

leis de mercado os editores contribuíram indiretamente para o desenvolvimento do romance,

principalmente em relação à tradição clássica (Watt, 1990, 52). Neste sentido, as descrições e

explicações próprias ao romance ajudaram os escritores a ganhar mais dinheiro com o volume

dos seus escritos e aos leitores menos instruídos favoreceram a compreensão do que liam.

Dessa forma, o romance, longe de exigir uma leitura racional, analítica e pragmática provocava

e mobilizava os sentimentos íntimos e as emoções mais primárias. É o que se observa nesta

passagem do Elogio a Samuel Richardson, feito pelo filósofo Diderot, sobre a leitura que faz do

romance Clarissa. Como observa Roger Chartier (2007, p. 268), a “primeira ocorrência remete

à imposição obrigatória do sentimento”:

Homens, venham aprender com ele [Richardson] a vos reconciliar com os males da vida. Venham. Choraremos juntos sobre personagens infelizes e suas ficções, e nos diremos, se a sorte nos sobrecarrega: “Ao menos as pessoas honestas chorarão por nós também”. Se Richardson se propôs a interessar a alguém, o fez para os infelizes. Em sua obra, como neste mundo, os homens são divididos em duas classes: os que gozam e os que sofrem. É sempre a estes últimos que me associo; e, sem que se perceba, o sentimento da comiseração estabelece-se e fortifica-se.

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No Brasil, o surgimento do romance também

nobres – a poesia, em suas várias versões fixas e prosa

gênero para o qual não havia regras nem para elaborá

Quem atualmente toma como natural e obrigatória a lei

Machado de Assis, José de Alencar ou Aluisio Azevedo, não tem id

romancistas – normalmente jovens que, assim como os romancistas ingleses escreviam sem as

bênçãos oficiais em jornais e periódicos

ensino da literatura. Segundo Augusti (2006, p. 7), em cuja tese discute e analisa a inserção do

romance no ensino da literatura:

Da emergência dos primeiros exemplares nacionais no século XIX até a sua consagraçpercorrido. Distante da aceitação inconteste pela crítica, o romance foi alvo, naquele século, dos mais diversos e acirrados debates, que conduziram à sua aceitação enquanto gênero literário elevado, diler nas escolas, tomando parte na literatura nacional.

Para uma visão plural da leitura do romance na época do seu nascimento e durante o

século XIX, sugiro que você assista aos filmes:

Para um maior aprofundamento da história deste gênero no Brasil, sugiro a consulta ao site da UNICAMP, Caminhos do romance no Brasil, coordenado pela Profª Drª Márcia Abreu: http://www.caminhosdoromance.iel.unicamp.br/

Agora é com você

No Brasil, o surgimento do romance também foi marcado pelo preconceito. As formas

a poesia, em suas várias versões fixas e prosa – não previam o surgimento de um

gênero para o qual não havia regras nem para elaborá-lo, nem para lê-lo.

Quem atualmente toma como natural e obrigatória a leitura dos romances de

Machado de Assis, José de Alencar ou Aluisio Azevedo, não tem ideia das lutas travadas pelos

normalmente jovens que, assim como os romancistas ingleses escreviam sem as

bênçãos oficiais em jornais e periódicos – para torná-lo quase que o gênero por excelência do

ensino da literatura. Segundo Augusti (2006, p. 7), em cuja tese discute e analisa a inserção do

romance no ensino da literatura:

Da emergência dos primeiros exemplares nacionais no século XIX até a sua consagração pelo sistema formal de ensino um longo caminho foi percorrido. Distante da aceitação inconteste pela crítica, o romance foi alvo, naquele século, dos mais diversos e acirrados debates, que conduziram à sua aceitação enquanto gênero literário elevado, digno de ser lido e dado a ler nas escolas, tomando parte na literatura nacional.

Para uma visão plural da leitura do romance na época do seu nascimento e durante o

século XIX, sugiro que você assista aos filmes:

Para um maior aprofundamento da história deste gênero no Brasil, sugiro a consulta ao site da UNICAMP, Caminhos do romance no Brasil, coordenado pela Profª Drª Márcia Abreu: http://www.caminhosdoromance.iel.unicamp.br/

foi marcado pelo preconceito. As formas

não previam o surgimento de um

tura dos romances de

ia das lutas travadas pelos

normalmente jovens que, assim como os romancistas ingleses escreviam sem as

lo quase que o gênero por excelência do

ensino da literatura. Segundo Augusti (2006, p. 7), em cuja tese discute e analisa a inserção do

Da emergência dos primeiros exemplares nacionais no século XIX até a sua ão pelo sistema formal de ensino um longo caminho foi

percorrido. Distante da aceitação inconteste pela crítica, o romance foi alvo, naquele século, dos mais diversos e acirrados debates, que conduziram à

gno de ser lido e dado a

Para uma visão plural da leitura do romance na época do seu nascimento e durante o

Para um maior aprofundamento da história deste gênero no Brasil, sugiro a consulta ao site da UNICAMP, Caminhos do romance no Brasil, coordenado pela Profª Drª Márcia Abreu:

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Madame Bovary, filme de Jean Renoir (1934)

• Os contos proibidos do Marquês de Sade (Quills); Gênero: Drama; Origem/Ano: EUA/2000;Direção: Philip Kaufman;

• Madame Bovary. Gênero Drama; Origem/ Ano França/1999; Direção: Claude Chabrol.

Para conhecer a grande romancista inglesa Jane Austen, sugiro os filmes Orgulho e

preconceito, de 2005, dirigido por Joe Wright; Razão e Sensibilidade, 1995, dirigido por Ang

Lee; Ema, 1996, dirigido por Douglas McGrath, todos baseados em romances homônimos da

escritora. Sobre uma leitura contemporânea dos romances da autora, sugiro o filme Clube da

leitura de Jane Austen, 2007; direção: Robin Swicord .

Capa do DVD Madame Bovary, de

Claude Chabrol (1991)

Agora que você já sabe sobre as origens do ensino da literatura no Brasil e de onde

vem a tradição, até recentemente consagrada, de abordá-la de uma perspectiva da história da

literatura, vamos passar para a análise dos documentos oficiais e as possibilidades de

abordagem dos gêneros literários que circulam nas escolas do Ensino Médio.

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UNIDADE II

A LITERATURA NO CONTEXTO DOS DOCUMENTOS

OFICIAIS

Os Parâmetros curriculares nacionais e suas reedições

Considerando que você já cursou a disciplina Lingüística aplicada, não vamos tratar da

história e da produção dos documentos oficiais para o Ensino Médio, tais como PCNS (1997),

PCNs + (2002) e as ORIENTAÇÕES CURRICULARES PARA O ENSINO MÉDIO Linguagens, Códigos

e suas Tecnologias, publicado em 2006, pois já foram muito bem analisados pelo prof. Pedro

Francelino, na disciplina Lingüística aplicada à língua portuguesa, no volume V do livro

Linguagens usos e reflexões (2009)

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O trabalho de reflexão que vamos empreender neste capítulo tem como objetivo

principal demonstrar como a criação de vários documentos ao longo destes dez anos revelam

a dificuldade de situar a literatura no contexto da linguagem e de fazer dela uma disciplina

escolar. Os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio surgem em 1999, com o

objetivo de “delimitar a área de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias”, à luz da LDB n°

9.394/96. A principal perspectiva desta Lei consiste em formar uma “escola média com

identidade”, isto implica na formação de alunos preparados para viver o mundo atual.

Considerando a diversidade como o eixo principal da proposta, o seu texto foi escrito de forma

coletiva, o que lhe garante, entre outras coisas, o caráter de Lei que escrita por todos não tem

um autor.

Para os professores de literatura, no entanto, este documento se constituiu como

mais um “documento do Mec”, de difícil compreensão e interpretação, longe, portanto, de

atingir o objetivo a que se propunha: indicar, orientar, informar e até mesmo servir de modelo.

Porém, diferentemente dos PCNs do Ensino Fundamental, que sugerem e até mesmo criam

situações de aprendizagem, os do Ensino Médio concentram-se na filosofia, descrevendo

principalmente a visão geral da área Linguagens, Códigos e suas Tecnologias.

O modelo que os professores julgavam encontrar nesse texto, no caso da literatura, se

traduz em algumas observações genéricas que supõem um leitor já apto e familiarizado com

os pressupostos da Análise do Discurso e das concepções teóricas de Mikhail Bakhtin. Em

muitos casos, os PCNEM vêm ratificar os lugares-comuns do ensino da literatura, os fatos

amplamente observados pelo professor em seu cotidiano: como por exemplo, o de se

surpreender com os alunos que acham Carlos Drummond de Andrade um chato; afirmar que

nos estudos literários, “ a história da literatura costuma ser o foco da compreensão do texto”;

ou propor: “o conceito de texto de literário é discutível” (Op. Cit., p. 34). Em resumo, podemos

afirmar que os PCNEM levantam muitas questões, mas não oferecem respostas. Talvez pelo

fato de o foco de interesse do governo anterior ser o Ensino Fundamental, o certo é que os

Parâmetros, elaborados para o Ensino Médio, pouco têm a oferecer ao professor que, tanto

anos longe de cursos de capacitação, ou até mesmo freqüentando algum curso de licenciatura

(sabe-se que, contraditoriamente, a maioria não discute a questão do ensino), julga-se incapaz

ou temeroso de mudar a sua prática. A apresentação do documento, assinada por Ruy Leite

Berger Filho, Secretário de Educação Média e Tecnológica, deixa claro a responsabilidade do

professor na transformação e aplicação dos ensinamentos dos PCNEM:

Estes Parâmetros cumprem o duplo papel de difundir os princípios da reforma curricular e orientar o professor, na busca de novas abordagens e

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metodologias. Ao distribuí-los, temos a certeza de contar com a capacidade de nossos mestres e com o seu empenho no aperfeiçoamento da prática educativa.

A Secretaria do Ensino Médio revendo as suas posições cria as PCN+ Orientações

complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM+, 2002),

cujo foco de atenção desloca- se do professor para a escola em sua totalidade. Nesse novo

livro – assim denominado por aqueles que o organizam, o volume dedicado especialmente às

Linguagens, Códigos e suas Tecnologias tem como objetivo:

• trazer elementos de utilidade para o professor de cada disciplina, na definição de conceitos estruturantes, conteúdos e na adoção de opções metodológicas;

• explicitar algumas formas de articulação das disciplinas para organizar, conduzir e avaliar o aprendizado;

• apontar direções e alternativas para a formação continuada dos professores do ensino médio, no sentido de garantir-lhes permanente instrumentação e aperfeiçoamento para o trabalho que deles se espera (2002, p. l3).

Como pode ser verificado no sumário abaixo, não havia uma parte destinada especificamente

à literatura:

Língua Portuguesa 55

Introdução

Conceitos e competências gerais a serem desenvolvidos

A seleção de conteúdos

Temas estruturadores

Critérios para a seleção de conteúdos

Avaliação

Sobre a formação do professor

Bibliografia

Orientações curriculares para o Ensino médio: linguagens, códigos e suas

tecnologias

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Por uma série de motivos que não trataremos aqui, mas que podem ser evidenciados a

partir da leitura integral do documento5, as orientações complementares, ou os PCNEM+ de

2002, também tiveram que sofrer reparos e, por isso, mais uma orientação foi publicada:

Orientações curriculares para o Ensino Médio: linguagens, códigos e suas tecnologias6

atualmente em vigor. Como podemos observar no índice abaixo, o ensino da literatura ganha

um capítulo à parte da Língua portuguesa:

CONHECIMENTOS DE LITERATURA

Introdução

1 Por que a literatura no ensino médio?

2 A formação do leitor: do Ensino Fundamental ao Ensino Médio

3 A leitura literária

3.1 A importância do leitor

3.2 Que leitores somos

3.3 Formação do leitor crítico na escola

4 Possibilidades de mediação

4.1 O professor e a seleção dos textos

4.2 O professor e o tempo

4.3 O leitor e o espaço

Referências bibliográficas

Embora tenha passado pelo crivo da leitura crítica de dois experts no ensino da

literatura, Lígia Chiappini Moraes Leite e Haquira Osakabe, este capítulo apresenta alguns

problemas de incompatibilidade teórica e histórica. Esses são mais visíveis no que concerne a

aspectos relativos à história do ensino da literatura no Brasil, sua função no Ensino Médio e as

formas de abordá-la. Principalmente com relação à abordagem teórica, os comentários são

tecidos meio que ao acaso, a partir de várias perspectivas teóricas, sem levar em consideração

as competências e habilidades exigidas para área de Linguagens, códigos e suas tecnologias:

Boa parte da resposta [para a pergunta por que literatura no Ensino Médio] pode ser encontrada talvez no próprio conceito de Literatura tal como o utilizamos até aqui, isto é, em seu sentido mais restrito. Embora se possa

5 PCN+ Ensino Médio - Orientações Educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília:

MEC, 2002. 6 Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/book_volume_01_internet.pdf (Acesso: 22/10/2009.)

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considerar, lato sensu, tudo o que é escrito como Literatura (ouve-se falar em literatura médica, literatura científica, etc.), para discutir o currículo do ensino médio tomaremos a Literatura em seu stricto sensu: como arte que se constrói com palavras (2009, p. 52).

Algumas vezes, o critério para o ensino da literatura é baseado no senso-comum,

como o de que a literatura humaniza, o que não fornece ao professor de literatura que lê o

documento nenhuma resposta à pergunta inicialmente elaborada.

Considerando do ponto de vista das outras disciplinas, parece ser a leitura literária

aquela que, unicamente, dá ao homem sua condição humana. Esta distinção estabelece uma

oposição entre os leitores e não leitores, deixando a estes últimos o caráter de seres

embrutecidos porque não leram Homero, não conhecem Machado de Assis, ou não

reconhecem um poema com valor estético. Criada por autores e críticos ingleses, alheios aos

problemas reais da sociedade (Eagleton, 2003: p, 47), esta premissa tende a representar os

não leitores de literatura, ou a maioria esmagadora da sociedade, como seres “moralmente

indiferentes, humanamente banais e imaginativamente falidos”. Veja abaixo, como esta

concepção se apresenta nas Orientações, reforçando o conceito segundo o qual, os

trabalhadores e os pobres só serão alçados à condição humana pela via da leitura literária:

como meio, sobretudo, de humanização do homem coisificado: esses são alguns dos papéis reservados às artes, de cuja apropriação todos têm direito. Diríamos mesmo que têm mais direito aqueles que têm sido, por um mecanismo ideologicamente perverso, sistematicamente mais expropriados de tantos direitos, entre eles até o de pensar por si mesmos(OCEM, 2009, p. 53)

Além disso, esta concepção de validade estética é confusa e, pode-se afirmar que,

sacraliza o texto de literatura ao ponto de retirar esta produção discursiva do contexto de sua

produção. Neste sentido, as manifestações literárias deixam de ser abordadas a partir da

diversidade cultural, das relações de grupos e de das relações sociais, para serem validadas a

partir de preconceitos ou conceitos formulados pelos formalistas russos, tais como o de

estranhamento e intencionalidade artística. Se na página 55 do documento, as autoras criticam

e contestam os limites das correntes teóricas (“Houve diversas tentativas de estabelecimento

das marcas da literariedade de um texto, principalmente pelos formalistas e depois pelos

estruturalistas, mas essas não lograram muito sucesso, dada a diversidade de discursos

envolvidos no texto literário”), na página 57, contraditoriamente, elas se baseiam nos

conceitos destas correntes para justificar a validade do texto literário:

Qualquer texto escrito, seja ele popular ou erudito, seja expressão de grupos majoritários ou de minorias, contenha denúncias ou reafirme o status quo, deve passar pelo mesmo crivo que se utiliza para os escritos

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canônicos: Há ou não intencionalidade artística? A realização correspondeu à intenção? Quais os recursos utilizados para tal? Qual seu significado histórico-social? Proporciona ele o estranhamento, o prazer estético?

Ao final do documento, o professor não consegue ter nem uma idéia clara sobre o

motivo de ensinar-se literatura no Ensino Médio, nem orientações para possibilitar um ensino

eficiente da disciplina. Assim, considerando a pouca clareza do documento, passemos a

analisar as orientações implementadas pelo Enem, aliando-as às questões das provas aplicadas

até o momento.

O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem)

Estas últimas, embora tenham sido publicadas desde 19997, tendem, com a atual

repercussão que o exame ganhou, a modificar o ensino não apenas da literatura no Ensino

Médio, mas de todas as disciplinas. Tanto que o Ministério da Educação sugeriu ao Instituto

Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, ou o INEP, a reformulação deste

documento, que resultou na Matriz de Referência para o Enem de 2009. Assim, o nosso

interesse recairá sobre a inserção da literatura na área Linguagens, Códigos e suas Tecnologias,

neste novo documento, nomeado como Fundamentação Teórico-Metodológica do EXAME

NACIONAL DO ENSINO MÉDIO (ENEM).

Comecemos pelas competências da Matriz de Referência de Linguagens, Códigos e

suas Tecnologias8 mais diretamente ligadas à linguagem escrita, e em língua portuguesa. Ao

todo vamos trabalhar seis competências e vinte e três habilidades (H). Antes, porém, temos

que compreender qual o significado da palavra competência9 e o sentido que este termo

adquire quando pensamos na literatura e no seu ensino.

No Dicionário de Houaiss, competência é descrita entre outras, como:

7 Disponível em http://www.inep.gov.br/download/enem/1999/docbas/docbas1999.doc.

8 Disponível em http://www.enem.inep.gov.br/Enem2009_matriz.pdf

9 Para uma visão mais aprofundada do termo e de sua mais variadas possibilidades, confira o documento do INEP, O

Exame Nacional do Ensino Médio: Fundamentação Teórico-Metolodológica.

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a) capacidade que um indivíduo possui de expressar um juízo de valor sobre algo a respeito de que é

versado;

b) soma de conhecimentos ou de habilidades;

c) indivíduo de grande autoridade num ramo do saber ou do fazer; notabilidade;

d) capacidade objetiva de um indivíduo para resolver problemas, realizar atos definidos e

circunscritos.

A partir deste sentido mais corriqueiro, vamos pensar o que significam para o ensino

da literatura as competências e as habilidades abaixo relacionadas e o seu relacionamento

com o ensino da literatura:

Competência de área 1 - Aplicar as tecnologias da comunicação e da

informação na escola, no trabalho e em outros contextos relevantes para

sua vida.

H1 - Identificar as diferentes linguagens e seus recursos expressivos como

elementos de caracterização dos sistemas de comunicação.

H2 - Recorrer aos conhecimentos sobre as linguagens dos sistemas de

comunicação e informação para resolver problemas sociais.

H3 - Relacionar informações geradas nos sistemas de comunicação e

informação, considerando a função social desses sistemas.

H4 - Reconhecer posições críticas aos usos sociais que são feitos das

linguagens e dos sistemas de comunicação e informação.

Competência de área 2 - Conhecer e usar língua(s) estrangeira(s)

moderna(s) como instrumento de acesso a informações e a outras culturas

e grupos sociais*.

H5 – Associar vocábulos e expressões de um texto em LEM ao seu tema.

H6 - Utilizar os conhecimentos da LEM e de seus mecanismos como meio de

ampliar as possibilidades de acesso a informações, tecnologias e culturas.

H7 – Relacionar um texto em LEM, as estruturas linguísticas, sua função e

seu uso social.

H8 - Reconhecer a importância da produção cultural em LEM como

representação da diversidade cultural e lingüística.

Competência de área 3 - Compreender e usar a linguagem corporal como

relevante para a própria vida, integradora social e formadora da

identidade

H9 - Reconhecer as manifestações corporais de movimento como originárias

de necessidades cotidianas de um grupo social.

H10 - Reconhecer a necessidade de transformação de hábitos corporais em

função das necessidades cinestésicas.

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H11 - Reconhecer a linguagem corporal como meio de interação social,

considerando os limites de desempenho e as alternativas de adaptação para

diferentes indivíduos.

Competência de área 4 - Compreender a arte como saber cultural e

estético gerador de significação e integrador da organização do mundo e

da própria identidade.

H12 - Reconhecer diferentes funções da arte, do trabalho da produção dos

artistas em seus meios culturais.

H13 - Analisar as diversas produções artísticas como meio de explicar

diferentes culturas, padrões de beleza e preconceitos.

H14 - Reconhecer o valor da diversidade artística e das inter-relações de

elementos que se apresentam nas manifestações de vários grupos sociais e

étnicos.

Competência de área 5 - Analisar, interpretar e aplicar recursos

expressivos das linguagens, relacionando textos com seus contextos,

mediante a natureza, função, organização, estrutura das manifestações, de

acordo com as condições de produção e recepção.

H15 - Estabelecer relações entre o texto literário e o momento de sua

produção, situando aspectos do contexto histórico, social e político.

H16 - Relacionar informações sobre concepções artísticas e procedimentos

de construção do texto literário.

H17 - Reconhecer a presença de valores sociais e humanos atualizáveis e

permanentes no patrimônio literário nacional.

Competência de área 6 - Compreender e usar os sistemas simbólicos das

diferentes linguagens como meios de organização cognitiva da realidade

pela constituição de significados, expressão, comunicação e informação.

H18 - Identificar os elementos que concorrem para a progressão temática e

para a organização e estruturação de textos de diferentes gêneros e tipos.

H19 - Analisar a função da linguagem predominante nos textos em situações

específicas de interlocução.

H20 - Reconhecer a importância do patrimônio linguístico para a

preservação da memória e da identidade nacional.

Competência de área 7 - Confrontar opiniões e pontos de vista sobre as

diferentes linguagens e suas manifestações específicas.

H21 - Reconhecer em textos de diferentes gêneros, recursos verbais e não-

verbais utilizados com a finalidade de criar e mudar comportamentos e

hábitos.

H22 - Relacionar, em diferentes textos, opiniões, temas, assuntos e recursos

linguísticos.

H23 - Inferir em um texto quais são os objetivos de seu produtor e quem é

seu público alvo, pela análise dos procedimentos argumentativos utilizados.

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H24 - Reconhecer no texto estratégias argumentativas empregadas para o

convencimento do público, tais como a intimidação, sedução, comoção,

chantagem, entre outras.

Competência de área 8 - Compreender e usar a língua portuguesa como

língua materna, geradora de significação e integradora da organização do

mundo e da própria identidade.

H25 - Identificar, em textos de diferentes gêneros, as marcas linguísticas que

singularizam as variedades linguísticas sociais, regionais e de registro.

H26 - Relacionar as variedades lingüísticas a situações específicas de uso

social.

H27 - Reconhecer os usos da norma padrão da língua portuguesa nas

diferentes situações de comunicação.

Comecemos pelas competências, que incluem a literatura no complexo universo da

linguagem e de suas possibilidades de criação, de circulação e de comunicação. Concebida

desta forma, a literatura passa a ter um status de produção cultural que, como qualquer outra,

deve ser compreendida como uma construção histórica – não entenda como história literária –

produzida por diversos grupos sociais – daí a possibilidade de vários tipos de literatura – que

revela modos de ver e dizer e uma época. Estas premissas podem ser reconhecidas na

competência de número 5.

Observe que a competência exigida não restringe os recursos expressivos apenas aos

textos literários, nem à linguagem verbal, mas a todas as linguagens e qualquer tipo de texto:.

Analisar, interpretar e aplicar recursos expressivos das linguagens,

relacionando textos com seus contextos, mediante a natureza, função,

organização, estrutura das manifestações, de acordo com as condições de

produção e recepção.

Contudo, para o aluno do Ensino Médio seja formado para desenvolver algumas das

habilidades, como as de “Estabelecer relações entre o texto literário e o momento de sua

produção, situando aspectos do contexto histórico, social e político”; ou a de “relacionar

informações sobre concepções artísticas e procedimentos de construção do texto literário”, é

necessário mais do que saber a respeito das escolas literárias.

Isso inclui conceber a literatura como um modo de expressão que deve ser pensada a

partir dos três elementos fundamentais que a compõem: o texto, o suporte e o leitor (Chartier,

1999). Assim, o estudo da literatura deve levar em consideração a análise dos textos e o fato

de que os mesmos textos podem ser diversamente apreendidos por leitores de diversos

extratos sociais, manejados e compreendidos. Também compreende pensar as várias práticas

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que estabelecem os modos diferenciados de leitura aos textos: para quê, onde, de que

maneira? Dizendo com Chartier, “não há texto fora do suporte que o dá a ler (ou a ouvir), não

há compreensão de um texto que não dependa das formas através das quais ele atinge o seu

leitor”.

As competências não se limitam a habilitar o estudante a apenas identificar no cânone

ou naquilo que chamamos literatura os efeitos desta linguagem, que faz uso de recursos

expressivos, para chamar a atenção sobre si. Elas prevêem que qualquer texto escrito em

língua portuguesa ou formulado em qualquer outra linguagem – pictórica, corporal, fílmica,

etc. – faz uso dos “sistemas simbólicos”, como forma de “organização cognitiva da realidade”,

como se verifica na competência 6. Este pressuposto habilita o aluno para identificar os

elementos que concorrem para a progressão de um texto seja de que gênero for, e não apenas

o literário.

Atualmente, é visível como a propaganda, por exemplo, abusa da expressividade da

linguagem para fixar o seu produto na memória do consumidor, conforme vemos nesta

logomarca do Banco Itaú. A utilização das cores laranja, azul, amarelo e branco, ou o gesto que

o ator faz do símbolo @ nas propagandas de televisão são de certa forma uma maneira de

vender um produto através de mecanismos simbólicos e artísticos da linguagem. Um bom

leitor de literatura deve compreender esses mecanismos lingüísticos e saber também inferir

“estratégias argumentativas empregadas para o convencimento do público, tais como a

intimidação, sedução, comoção, chantagem, entre outras”.

Quem assiste à televisão deve ter percebido o quanto este veículo faz das propagandas

pequenas narrativas, onde, geralmente, atores e atrizes bonitos induzem ao consumo de

objetos que completam as suas vidas e proporcionam felicidade. Veja abaixo que a Claro não

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pede para o consumidor comprar seus celulares, mas sugere que ele “compartilhe”, neste

caso, a alegria, a inocência, a brincadeira e uma história.

O aluno do Ensino Médio deve perceber que a linguagem não é apenas um veículo de

comunicação, mas o mais poderoso instrumento de dominação, de poder e de convencimento.

É através da linguagem que nos constituímos como sujeitos, expressamos nossos afetos,

manifestamos nossas dificuldades e angústias.

No caso dos brasileiros, significa “compreender e usar a língua portuguesa como língua

materna, geradora de significação e integradora da organização do mundo e da própria

identidade”. Assim, o ensino da literatura no Ensino Médio deve também levar em

consideração a diversidade lingüística das várias regiões do país, bem como incluir em sua

literatura, as manifestações populares, tais como a literatura de cordel, as cantorias, as lendas

e histórias tradicionais; da mesma forma, o funk, o rap, a música popular, o forró e todas as

manifestações artísticas que nos dão identidade.

Vejamos agora como a prova do Enem testa algumas dessas competências e

habilidades, através das questões 4 e 5 do exemplo de prova elaborada pelo INEP10:

O poema de Manoel de Barros será utilizado para resolver as questões 4 e 5.

O apanhador de desperdíciosO apanhador de desperdíciosO apanhador de desperdíciosO apanhador de desperdícios

Uso a palavra para compor meus silêncios.

Não gosto das palavras

10

Disponível em http://www.enem.inep.gov.br/index.php?option=com_frontpage&Itemid=1 Acesso em 21/10/2009.

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fatigadas de informar.

Dou mais respeito

às que vivem de barriga no chão

tipo água pedra sapo.

Entendo bem o sotaque das águas

Dou respeito às coisas desimportantes

e aos seres desimportantes.

Prezo insetos mais que aviões.

Prezo a velocidade

das tartarugas mais que a dos mísseis.

Tenho em mim um atraso de nascença.

Eu fui aparelhado

para gostar de passarinhos.

Tenho abundância de ser feliz por isso.

Meu quintal é maior do que o mundo.

Sou um apanhador de desperdícios:

Amo os restos

como as boas moscas.

Queria que a minha voz tivesse um formato

de canto.

Porque eu não sou da informática:

eu sou da invencionática.

Só uso a palavra para compor meus silêncios.

BARROS, Manoel de. O apanhador de desperdícios. In. PINTO, Manuel da Costa.

Antologia comentada da poesia brasileira do século 21. São Paulo: Publifolha, 2006. p. 73-74.

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Questão 4

É próprio da poesia de Manoel de Barros valorizar seres e coisas considerados, em geral, de

menor importância no mundo moderno. No poema de Manoel de Barros, essa valorização é

expressa por meio da linguagem

(A) (A) (A) (A) denotativa, para evidenciar a oposição entre elementos da natureza e da modernidade.

(B) (B) (B) (B) rebuscada de neologismos que depreciam elementos próprios do mundo moderno.

(C) (C) (C) (C) hiperbólica, para elevar o mundo dos seres insignificantes.

(D) (D) (D) (D) simples, porém expressiva no uso de metáforas para definir o fazer poético do eu-lírico poeta.

(E) (E) (E) (E) referencial, para criticar o instrumentalismo técnico e o pragmatismo da era da informação digital.

Questão 5

Considerando o papel da arte poética e a leitura do poema de Manoel de Barros, afirma-se que

(A) (A) (A) (A) informática e invencionática são ações que, para o poeta, correlacionam-se: ambas têm o mesmo valor na sua poesia.

(B) (B) (B) (B) arte é criação e, como tal, consegue dar voz às diversas maneiras que o homem encontra para dar sentido à própria vida.

((((C) C) C) C) a capacidade do ser humano de criar está condicionada aos processos de modernização tecnológicos.

(D) (D) (D) (D) a invenção poética, para dar sentido ao desperdício, precisou se render às inovações da informática.

(E) (E) (E) (E) as palavras no cotidiano estão desgastadas, por isso à poesia resta o silêncio da não comunicabilidade.

Nas duas questões está em jogo a competência para analisar, interpretar e identificar

os “recursos expressivos” da linguagem poética. Na questão de número 4, ao responder a letra

D, o aluno deve ser capaz de estabelecer relações entre o texto literário e o momento de sua

produção. Observe que a questão tenta avaliar se o aluno conhece as funções da linguagem, e

os modos de expressá-las e alia estes conhecimentos à capacidade de interpretar e analisar. Já

a questão de número 5, cuja resposta é a letra B, requer que o aluno seja capaz de reconhecer

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nesse poema a “arte é criação e, como tal, consegue dar voz às diversas maneiras que o

homem encontra para dar sentido à própria vida”.

UNIDADE III

A ESCOLARIZAÇÃO DA LITERATURA NO ENSINO

MÉDIO

Os programas governamentais de distribuição de livros

A biblioteca como espaço de escolarização da leitura

Neste capítulo, avaliaremos os livros didáticos de literatura. A análise tem como

objetivo oferecer a você instrumentos para um melhor aproveitamento deste suporte

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importante no ensino de literatura. A despeito dos problemas que apresenta, o livro didático

não deve ser abolido das aulas de literatura, pois em muitos casos, trata-se do único material

de leitura de alguns alunos deste país. Nele, os alunos têm contato com outras produções

culturais como pinturas, sites, sugestão de filmes e muito mais. Ademais, muito dos problemas

que encontraremos nos LDs são conseqüência da falta de um consenso sobre o ensino da

literatura, conforme vimos no capítulo anterior.

O Ministério da Educação implantou o Programa Nacional do Livro Didático do Ensino

Médio (PNLEM11) em 2004, a partir da Resolução nº 38 do FNDE. O Programa Nacional do Livro

Didático para o Ensino Médio (PNLEM) prevê a universalização de livros didáticos para os

alunos do ensino médio público de todo o país. Atualmente, o Programa Nacional do Livro

Didático para o Ensino Médio (PNLEM) está disponível para todas as escolas públicas

brasileiras. Todavia, as escolas podem optar por não receber livros do programa – todos os

livros ou apenas de algumas disciplinas.

Por isso, você poderá, quando se formar, ser convocado para escolher um livro de

literatura para seus alunos do ensino médio, pois atualmente todos os alunos de escolas

públicas recebem livros didáticos. Para pedir os livros, as escolas fazem a seleção diretamente

em um sistema informatizado do Programa Nacional do Livro Didático. Nesse mesmo sistema,

as escolas que não desejam receber livros de uma ou todas as disciplinas fazem a opção.

No site do Ministério da Educação você encontrará um Guia de Avaliação dos Livros

Didáticos de Língua Portuguesa do Ensino Médio12, contendo os critérios específicos de cada

área, aliados a outros que são norteadores da seleção para todas as disciplinas. A seleção dos

livros é feita a partir de convite do MEC às universidades públicas de notório saber na análise

de livros didáticos. Estas organizam equipes de pareceristas com comprovada experiência

acadêmica, didática e pedagógica. Cada obra é avaliada por pelo menos dois pareceristas; caso

não haja consenso, ela é submetida a um terceiro. Dependendo dos temas tratados e das

especialidades envolvidas, o mesmo livro é submetido a outros pareceristas especialistas em

outras áreas do conhecimento. Nessa avaliação, além dos critérios específicos para cada área,

são definidos como critérios comuns de exclusão:

• correção de conceitos, informações e procedimentos propostos como objetos de ensino e aprendizagem;

11

Disponível em http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12371&Itemid=584 12

No momento em que escrevo este capítulo, o Guia de Avaliação dos Livros Didáticos de Língua Portuguesa do Ensino Médio não está disponível no site do Ministério da Educação, o que nos impede de discutir os critérios de seleção e as resenhas dos livros com os quais você provavelmente se deparará no momento em que se tornar professor.

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• coerência e adequação da abordagem teórico-metodológica assumida pela coleção, no que diz respeito à proposta didático-pedagógica explicitada;

• adequação da estrutura editorial e do projeto gráfico aos objetivos didático-pedagógicos da coleção;

• observância das características e finalidades específicas do manual do professor;

• respeito a preceitos legais e jurídicos, bem como a princípios éticos necessários à construção da cidadania.

No escopo desses critérios comuns de exclusão é, também, fator determinante para

eliminação de uma determinada obra ou coleção aquela que, nos termos do Edital:

• veicular preconceitos de condição social, regional, étnico-racial, de gênero,

de orientação sexual ou de linguagem, assim como qualquer outra forma

de discriminação ou de violação de direitos;

• fazer doutrinação religiosa ou política, desrespeitando o caráter laico e

autônomo do ensino público;

• utilizar o material escolar como veículo de publicidade ou de difusão de

marcas, produtos ou serviços comerciais.

• Além disso, é importante considerar que existem os critérios de avaliação

específicos das áreas do conhecimento. Estes critérios representam o

patamar de qualidade exigido das obras inscritas no PNLD.

Outro programa fundamental é o PNBE (Programa Nacional Biblioteca da Escola),

responsável pela distribuição de livros de literatura, de pesquisa e de referência às bibliotecas

escolares, cuja lista encontra-se no site do Ministério da Educação. Segundo o ministério, este

programa tem como objetivo acesso à cultura e à informação e o incentivo à formação do

hábito da leitura nos alunos, nos professores e na população. O sucesso do programa depende

da utilização e divulgação que os professores e os outros profissionais da escola desses livros,

que muitas vezes ficam trancados nas salas da diretoria. Por isso, é fundamental a prática do

ensino da literatura, como prática de leitura, cujo sentido deve e pode ser atribuído a partir e

pelos alunos. Em 2009, no ensino médio, 17.419 unidades de ensino receberam novos acervos,

num total de 7,2 milhões de estudantes contemplados, segundo dados oficiais. Os acervos são

compostos por títulos de poemas, contos, crônicas, teatro, texto de tradição popular,

romance, memória, diário, biografia, ensaio, histórias em quadrinhos e obras clássicas.

A despeito dos esforços dos documentos oficiais e do empenho de alguns autores, o

ensino da literatura é sempre atrelado à história da literatura e suas características, o que

impede a autonomia leitora dos alunos. Assim, o conhecimento deste acervo13, que inclui

obras de várias nacionalidades, gêneros diversos e épocas diferentes é fundamental para

13

Disponível em: http://www.fnde.gov.br/index.php/programas-biblioteca-da-escola

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possibilitar um ensino da literatura que habilite os alunos para as competências e habilidades

que já discutimos anteriormente.

A escolarização da literatura no livro didático:

O que faremos agora é avaliar qual a concepção de ensino de literatura proposta pelo

Livro didático que analisaremos e como se apresenta a escolarização da disciplina.

O que é a escolarização da literatura? Aqui vou utilizar uma definição elaborada por

Magda Soares (2003: p. 17) para a literatura infanto-juvenil que, guardadas as devidas

proporções também pode ser aplicada à literatura no Ensino Médio. Segundo a professora

chama-se de escolarização a “apropriação pela escola da literatura”, através de um processo

de pedagogização e didatização.

Assim, a literatura que foi produzida para os habitantes da colônia nos séculos XVII,

XVIII e XIX, bem como a literatura produzida para os leitores de jornal do oitocentos e a

literatura do século XX, se transforma em produto escolar, como conteúdo que será avaliado a

partir das perspectivas da escola. Só como exemplo, temos que se os sermões do Padre

Antonio Vieira serviam na época da sua criação como crítica aos corruptos da colônia e àqueles

que deixavam de seguir os preceitos cristãos, na escola, esses textos, ou melhor, os pequenos

trechos deles, se transformam em conteúdo escolar. Ou seja, sua presença será determinada a

partir de um espaço, um tempo, uma metodologia, um programa e um manual, o que

constituem elementos próprios do processo de escolarização. Para Soares a escolarização é

um processo inevitável (Idem, p.21).

ESCOLARIZAÇÃO: o termo é em geral tomado em sentido

pejorativo, depreciativo, quando utilizado em relação a

conhecimentos, saberes, produções culturais

Magda Soares, contudo, ressalta que essa escolarização pode ser adequada ou

inadequada. A escolarização “adequada é aquela que conduz mais eficazmente à práticas de

leitura que ocorrem no contexto social e às atitudes e valores que correspondem ao ideal de

leitor que se quer formar”. A escolarização “inadequada, errônea, prejudicial da literatura é

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aquela que antes afasta que [se] aproxima de práticas sociais de leitura, aquela que

desenvolve resistência ou aversão à leitura”.

Magda Soares considera que o LD é a instância em que a escolarização da literatura é

mais intensa e é também aquela que apresenta a forma de escolarização mais inadequada do

texto literário. Nesta, a literatura é sempre apresentada em fragmentos, que devem ser lidos,

compreendidos e interpretados (Idem, p. 25).

A literatura tal como foi concebida todos esses anos pelos LDs do Ensino Médio – uma

relação de “clássicos”, cuja única motivação para a leitura era a indicação dos vestibulares –

tem se arvorado à categoria de único objeto legível e estimulador do hábito de leitura. Assim,

quando a escola se propõe a tomar para si a responsabilidade de formar leitores, sempre

coube à literatura e quase sempre, unicamente, à literatura brasileira cumprir essa função.

Assim, considerando o ensino da literatura do ponto de vista da história da literatura, o

seu conceito, apresentado no início do livro – geralmente construído a partir de fundamentos

formalistas –, é anacronicamente extensivo para quinhentos anos de produção escrita do

Brasil. Independemente da época, todos os objetos literários são apresentados, lidos e

compreendidos da mesma forma. Esse é o motivo por que o termo “literatura” se apresenta

de forma tão pouco definida no LD: ora é abordado na perspectiva de gênero, ora como estilo

de época, ora como manifestação artística e até como texto dramático, sem que seja discutida

a sua condição de objeto literário a partir dos seus usos e apropriações.

Resta ainda saber que o “objeto literário” é uma determinação histórica e retórica,

“estatuto irreversível de signo, figura ou convenção, que se define no interior de um gênero

particular” (PÉCORA, 2001, p.12). Aliás, até mesmo o termo literatura, empregado para toda a

produção anterior aos românticos, se constitui um anacronismo, haja vista que a produção

anterior a este período era regrada pela retórica, e a palavra literatura não designava um

objeto esteticamente constituído.

Alheias ao tempo que designam, as Escolas literárias não só estabelecem semelhanças

que não existem como impedem uma melhor compreensão da época, quando traçam marcos

históricos inexistentes. É o caso do Barroco, que segundo João A Hansen “é uma categoria

equívoca, utilizada de modo positivo pela primeira vez por Wölfflin, em 1888, em seu livro

Renascimento e Barroco, para descrever as artes plásticas italianas dos anos de 1520/1550 —

artes que, depois de 1920, passariam a ser conhecidas como ‘maneirismo’” (1997, p.11).

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Não bastasse a ênfase dos estudos recair sobre a história, esta se dá de forma

equivocada. O exemplo, generalizável a todos os livros didáticos, pode ser o da produção dos

jesuítas que não produziram nem teatro, nem literatura, mas textos didático-religiosos,

pautados por modelos fixos de dizer, construídos a partir de lugares-comuns da tradição

religiosa. Dizendo de outro modo, é preciso pensar esses objetos a partir do que “era

disponível na tradição de composição de textos” da época.

Essa compreensão evita anacronismos como aplicar indiscriminadamente convenções

próprias de uma época a outras quando ainda não existia: é o caso, por exemplo, do termo

poema. Segundo Pécora, o termo é desconhecido “da preceptiva de tradição clássica” como

“poema”, termo que hoje engloba objetos de tradições letradas diferentes, impossibilitadas de

serem comparadas e aproximadas, pois dispõem de “formas poéticas precisas” – madrigal,

soneto, epístola etc – , com teoria, história e efeitos particulares (2001, p. 12).

Dom Casmurro, de Machado de Assis. Presença obrigatória

nos livros didáticos de literatura do Ensino médio.

No caso do Ensino Médio, as obras literárias apresentadas no LD são sempre os

clássicos que se relacionam com o conteúdo do período da história da literatura, considerando

os quatro principais aspectos levantados por Soares, sobre a leitura do texto literário na escola

– a seleção dos textos (gêneros, autores e obras); a seleção de fragmentos; a transferência do

suporte literário para o suporte didático e, por último, “as intenções e os objetivos da leitura e

do estudo do texto”(Idem, p. 26).

Neste trabalho de arrolar todos os autores que aqui produziram ao longo de

quinhentos anos de história, criou-se uma exigência de tomar a abordagem dos textos no

sentido diacrônico. Talvez por termos uma história tão curta, a tradição dos estudos da

literatura brasileira obriga os alunos do Ensino Médio a tomarem conhecimento da existência

de alguns autores e apenas alguns títulos de uma seleção de obras que ele só chega a

conhecer através de pequenos trechos, descontextualizados de suas condições de produção.

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Não é preciso ser um grande observador para identificar em praticamente todos os

livros didáticos de literatura do Ensino Médio, mesmo naqueles mais modernos, que seguem

as determinações do ENEM, a prevalência do gênero poético e da prosa. Raros são aqueles

que incluem o texto dramático, a epístola

entre tantos outros. Da mesma forma como foi observado por Magda Soares nos LDs d

Ensino Fundamental, existe um cânone de trechos de romances, sempre os mesmos, de

seleção de “poemas”, como se tivessem sido construído de forma natural. Por exemplo, não

há livro didático do Ensino Médio que não traga um trecho ou uma Lira de Marília de

de Tomás Antonio Gonzaga.

Se em qualquer ato de linguagem, o objetivo principal é a produção de sentido, ler um

texto literário, como qualquer outro, deve, portanto, incluir o leitor na produção desse

sentido. Isso significa retirar os estudos li

que são apresentados pela História da Literatura e sua classificação em escolas literárias. É o

que observamos no exemplo de exercício a

Dei o nome de Primeiros Cantos às poesias que agora publico, porque espero que não serão

as últimas.

Muitas delas não têm uniformidade nas estrofes, porque menosprezo regras de mera

convenção; adotei todos os ritmos da metrificação portuguesa, e usei dele

quadrar melhor com o que eu pretendia exprimir.

Não têm unidade de pensamento entre si, porque foram compostas em épocas diversas

debaixo de céu diverso - e sob a influência de impressões momentâneas. Foram compostas nas

14

O título deste e de outros livros didáticos citados neste capítulo não serão mencionados para não corrermos o risco de “individualizar o que é genérico, mas também penalizar uma depelo que é freqüente no livro didático em geral (Idem, p.26).

“O texto a seguir é um trecho do “Prólogo” de Gonçalves Dias a seu livro Primeiros cantos. Nele, podemos perceber características essenciais da estética romântica. Leia

Agora é com você

Não é preciso ser um grande observador para identificar em praticamente todos os

livros didáticos de literatura do Ensino Médio, mesmo naqueles mais modernos, que seguem

terminações do ENEM, a prevalência do gênero poético e da prosa. Raros são aqueles

que incluem o texto dramático, a epístola – salvo a de Caminha – os epigramas, os diálogos,

entre tantos outros. Da mesma forma como foi observado por Magda Soares nos LDs d

Ensino Fundamental, existe um cânone de trechos de romances, sempre os mesmos, de

seleção de “poemas”, como se tivessem sido construído de forma natural. Por exemplo, não

há livro didático do Ensino Médio que não traga um trecho ou uma Lira de Marília de

Se em qualquer ato de linguagem, o objetivo principal é a produção de sentido, ler um

texto literário, como qualquer outro, deve, portanto, incluir o leitor na produção desse

sentido. Isso significa retirar os estudos literários dos sentidos previamente dados, como os

que são apresentados pela História da Literatura e sua classificação em escolas literárias. É o

que observamos no exemplo de exercício a seguir14:

Dei o nome de Primeiros Cantos às poesias que agora publico, porque espero que não serão

Muitas delas não têm uniformidade nas estrofes, porque menosprezo regras de mera

convenção; adotei todos os ritmos da metrificação portuguesa, e usei deles como me pareceram

quadrar melhor com o que eu pretendia exprimir.

Não têm unidade de pensamento entre si, porque foram compostas em épocas diversas

e sob a influência de impressões momentâneas. Foram compostas nas

O título deste e de outros livros didáticos citados neste capítulo não serão mencionados para não corrermos o

risco de “individualizar o que é genérico, mas também penalizar uma determinada obra e um determinado autor”, ático em geral (Idem, p.26).

“O texto a seguir é um trecho do “Prólogo” de Gonçalves Dias a seu livro Primeiros cantos. Nele, podemos perceber características essenciais da estética romântica. Leia-o atentamente para responder às questões de 1 a 5.

Não é preciso ser um grande observador para identificar em praticamente todos os

livros didáticos de literatura do Ensino Médio, mesmo naqueles mais modernos, que seguem

terminações do ENEM, a prevalência do gênero poético e da prosa. Raros são aqueles

os epigramas, os diálogos,

entre tantos outros. Da mesma forma como foi observado por Magda Soares nos LDs do

Ensino Fundamental, existe um cânone de trechos de romances, sempre os mesmos, de

seleção de “poemas”, como se tivessem sido construído de forma natural. Por exemplo, não

há livro didático do Ensino Médio que não traga um trecho ou uma Lira de Marília de Dirceu,

Se em qualquer ato de linguagem, o objetivo principal é a produção de sentido, ler um

texto literário, como qualquer outro, deve, portanto, incluir o leitor na produção desse

terários dos sentidos previamente dados, como os

que são apresentados pela História da Literatura e sua classificação em escolas literárias. É o

Dei o nome de Primeiros Cantos às poesias que agora publico, porque espero que não serão

Muitas delas não têm uniformidade nas estrofes, porque menosprezo regras de mera

s como me pareceram

Não têm unidade de pensamento entre si, porque foram compostas em épocas diversas -

e sob a influência de impressões momentâneas. Foram compostas nas

O título deste e de outros livros didáticos citados neste capítulo não serão mencionados para não corrermos o terminada obra e um determinado autor”,

“O texto a seguir é um trecho do “Prólogo” de Gonçalves Dias a seu livro Primeiros cantos. Nele, podemos perceber características essenciais da

o atentamente para responder às questões de 1 a 5.

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margens viçosas do Mondego e nos píncaros enegrecidos do Gerez - no Doiro e no Teia - sobre as

vagas do Atlântico, e nas florestas virgens da América. Escrevi-as para mim, e não para os outros;

contentar-me-ei, se agradarem; e se não... é sempre certo que tive o prazer de as ter composto.

Com a vida isolada que vivo, gosto de afastar os olhos de sobre a nossa arena política para

ler em minha alma, reduzindo à linguagem harmoniosa e cadente o pensamento que me vem de

improviso, e as idéias que em mim desperta a vista de uma paisagem ou do oceano - o aspecto enfim

da natureza. Casar assim o pensamento com o sentimento - o coração com o entendimento - a idéia

com a paixão - cobrir tudo isto com a imaginação, fundir tudo isto com a vida e com a natureza,

purificar tudo com o sentimento da religião e da divindade, eis a Poesia - a Poesia grande e santa - a

Poesia como eu a compreendo sem a poder definir, como eu a sinto sem a poder traduzir.

GONÇALVES DIAS. Poesia completa e prosa.

1. No segundo parágrafo do texto, Gonçalves Dias fala a respeito da forma utilizada em

seus poemas.

a) O que diz ele a respeito de seus versos?

b) Como sua postura reflete os ideais do Romantismo?

2. Segundo o autor, os poemas “não têm unidade de pensamento entre si”.

a) Explique essa afirmação, de acordo com o texto.

b) O que tal afirmação sugere a respeito do processo de criação poética no

Romantismo?

3. Ao dizer, sobre as poesias, “Escrevi-as para mim, e não para os outros, GD incorre num

paradoxo.

a) Qual seria esse paradoxo?

b) Que traço romântico se evidencia por essa contradição?

4.Uma das características românticas mais notáveis é a idealização, o descompromisso

com a retratação fiel do real. Em alguns momentos do texto, GD refere-se,

implicitamente, a essa característica.

a. Transcreva duas dessas passagens.

b. Explique de que maneira essas passagens indicam a tendência à idealização.

Em sua maioria, esses exercícios de compreensão não levam o aluno, nem o professor

a compreender o caráter histórico de determinadas manifestações literárias, pois elas sempre

são lidas no sentido apriorístico e determinista que localiza no texto os sinais previstos

antecipadamente para a escola literária. Observe-se que este exercício não menciona em

momento algum a data da publicação do texto. Embora elenque em um parágrafo os livros

publicados por Gonçalves Dias, os autores não se furtam a publicar o conhecidíssimo “Canção

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do Exílio”, e um pequeno trecho do “I Juca- Pirama”, poemas que não são lidos nem

analisados, mas apenas referidos. Assim, o exercício se limita a utilizar um paratexto, ou seja, o

prefácio do livro, para reforçar o que o aluno já deve saber de antemão: as características do

Romantismo. Em nenhum momento, os poemas do livro, entre os quais o citado Canção do

Exílio, são citados ou abordados.

Por que não privilegiar a formação do leitor e atrair o aluno do Ensino Médio para uma

leitura dos textos literários que incluam comportamentos leitores mais compatíveis com

aqueles que este leitor exerce fora dos muros da escola? Na grande maioria das propostas de

leitura de trechos da literatura, o que vemos é um modo de ler que não conduz “à análise do

que é essencial neles, isto é, à percepção de sua literariedade, dos recursos de expressão, do

uso estético da linguagem” (SOARES, 2003, p. 43).

Observa-se em outro livro didático do Ensino Médio, a noção de que a linha do tempo

ou a sucessão das escolas literárias carregam sempre o novo, ou como afirma Pécora (2005, p.

11), “como naturalizações de uma mitologia determinista da história”. Segundo essa mitologia,

o “novo” é necessariamente a melhor forma, e a mais apropriada do ponto de vista estético,

culminando os objetos literários em uma evolução da literatura “acabada” que seria a

modernista e contemporânea? Não há o que podemos chamar de “evolução qualitativa” – na

falta de melhor termo – na literatura, mas como um embate entre maneiras e possibilidades

de dizer de uma época. No entanto, difunde-se fartamente essa concepção pelos livros

didáticos, que pode ser ilustrada com o exemplo a seguir, retirado de um livro didático do

Ensino Médio.

O romance romântico teve aproximadamente quarenta anos de vida: da

década de 40 à década de 80 do século XIX. Nessa trajetória, modificou-se,

amadureceu, aprimorou suas técnicas e preparou as bases para o

surgimento de grandes mestres no gênero, como Machado de Assis

Assim, José de Alencar é rebaixado à condição de romancista menor, por ter escrito

em uma época em que o romance estaria se “aperfeiçoando”. Observe-se que os autores

sugerem uma evolução para o romance, emitem um juízo de valor, aliás, impossível de ser

averiguado nos fragmentos de umas poucas obras elencadas pelo LD que organizaram.

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Iracema, pintura de José Maria de Medeiros, 1884.

A proposta, então, é questionar “esses saberes discutíveis” e valorativos. O exemplo

acima reproduz o discurso autorizado sobre a obra de Machado, sem dar qualquer chance de o

aluno vir a questioná-la. Por isso, é fundamental que o ensino da literatura se empenhe em

demonstrar as relações que se estabelecem entre as várias gerações, que não são apenas de

ruptura e negação, mas são também de permanência, de diálogo. Aliás, analisar essa

“experiência” garante a possibilidade de compartilhar as maneiras de dizer, que foram

herdadas do passado, o que é “apenas o começo do reconhecimento da parte que cabe a cada

um no processo histórico”.

É preciso que o aluno reconheça que por trás desta observação existe “uma história de

lutas classificatórias, que devem ser revistas no âmbito escolar” (PCNEM, 1999, p.16),

principalmente porque ela implica em critério de valorização e imposição de determinado

gosto: se Machado é o “grande mestre”, que atinge a perfeição, ao aluno nada mais resta do

que ser obrigado a ler e a gostar desse autor.

Esse tipo de observação no ensino da literatura ajuda a fomentar preconceitos, formas

dadas e apriorísticas de ler as obras, desprezando-se os recursos expressivos próprios a cada

época e a cada autor. A proposta é relacionar, confrontar as obras, analisando as soluções

estilísticas adotadas pelos autores, não como amadurecimento de determinado gênero, mas

como significados históricos e culturais que os propõem. Assim, voltando a José de Alencar,

como compreender o papel decisivo que teve como consolidador do romance brasileiro, cuja

obra foi exemplo e modelo para o genial Machado de Assis, se o seu romance ainda não estava

“pronto”, ainda estava por se fazer, ainda não havia atingido a maturidade? Temos que, nessa

perspectiva, até mesmo do ponto de vista histórico seria impossível que José de Alencar viesse

um dia a atingir o aprimoramento da técnica conquistada por Machado.

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José de Alencar Machado de Assis

Apesar da importância e da necessária presença do Livro Didático na sala de aula,

principalmente para aqueles alunos que não contam com outros objetos escritos, nem

computadores, faz-se necessário que o ensino da literatura mobilize práticas efetivas de

leitura. Isso inclui a leitura e o trabalho com os textos literários que circulam em sites e blogs,

que são produzidos de forma virtual e lidos por navegadores. É fundamental também que os

títulos sejam atualizados e incluam autores contemporâneos, bem como gêneros diversos,

além dos títulos que freqüentam a lista dos mais lidos das revistas semanais, nas quais

raramente encontramos a revitalização da leitura de um clássico, por exemplo. É sobre estas

práticas que nos debruçaremos no capítulo seguinte.

REFERÊNCIAS

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literatura: o discurso fundador. Campinas: Mercado de Letras, 2003.

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oitocentista. Campinas: IEL/UNICAMP, 2006. (Tese de doutorado). Disponível em

http://libdigi.unicamp.br/document/?code=vtls000379054 Acesso em 20/09/2009.

CHARTIER, Roger. A ordem dos livros. Brasília: Ed. Unb, 1999.

CHARTIER, Roger. O comércio do romance. In Inscrever e apagar. Cultura escrita e literatura. São Paulo:

Ed. Unesp, 2007.

Dicionário eletrônico Houaiss de língua portuguesa. 2002.

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Fontes, 2003.

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PÉCORA, Alcir. Máquina de Gênero. São Paulo: Edusp, 2001.

Ratio Studiorium. Disponível em

http://www.histedbr.fae.unicamp.br/navegando/fontes_escritas/1_Jesuitico/ratio%20studiorum.htm

SOARES, Magda. A escolarização da literatura infantil e juvenil. In A escolarização da leitura literária.

Belo Horizonte: Autêntica, 2003.

SOUZA, Roberto Acízelo de. O Império da Eloqüência. RJ: Ed. UERJ, 1999.

VERNEY, Luís António. Verdadeiro método de estudar. Cartas sobre retórica e poética. Lisboa: Editorial

Presença, 1991.

WATT, Ian. A ascenção do romance. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.

UNIDADE IV

LITERATURA E INTERNET

GILSA ELAINE DE LIMA RIBEIRO

Diferentemente do que muitos temiam nos momentos iniciais de sua

difusão, a Internet não criou um mundo paralelo sem conexão com o

mundo “real”, nem gerou uma realidade “virtual” que substituísse

aquela característica do mundo físico. Criou, sim, um espaço

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alternativo que, embora tendo um relativo grau de independência

em relação ao espaço “físico”, com ele interage permanentemente.

(COSTA, 2006, p. 35)

Desde muito tempo temos nos deparado com questões que mais do que ajudar a

escola e o professor impedem pensar melhor a respeito da Literatura nos Ensinos

Fundamental e Médio: a internet é uma aliada ou uma inimiga do processo de ensino da

literatura na escola?

Escutamos sempre em reuniões escolares as reclamações acerca da utilização

excessiva do computador pelos jovens estudantes, colocando este suporte como um mal para

a vida dos filhos, causador de insônias e comportamentos anti-sociais, como um lugar de

perigos, de conversas, de dispersão, de afastamento do estudo etc. É quase como uma

verdade institucionalizada, por mais que já haja estudos significativos e experiências

pedagógicas bastante interessantes desmistificando essa verdade. O que não se observa é que

dispersões, lugares perigosos, comportamentos anti-sociais, insônias, falta de estudo sempre

fizeram parte da vida dos jovens em idade escolar. A televisão já participou desse discurso, daí

surgiram os canais educativos para crianças e as contações de histórias continuaram em outro

suporte.

A grande questão é: como utilizar essas novas tecnologias a favor do letramento

literário nas escolas de Ensino Fundamental e Médio? De que maneira a internet pode

contribuir para que o aluno possa encontrar na literatura um lugar de encontro consigo e com

o mundo em que vive? E mais, como aliar um conteúdo programático com o ensino de

literatura através da Internet?

Primeiramente, deve-se ter em mente o que queremos ensinar e para quê ensinamos.

Ao longo desse curso, você já deve ter se deparado com a necessidade de refletir sobre o

ensino da literatura, suas práticas, sua dinâmica, seus discursos, seus conceitos – mutáveis por

excelência – e as leis que regem esse ensino. Então, vale a pena olhar esse suporte – a Internet

– como uma ferramenta necessária para o ensino de literatura na escola.

Para estudarmos e pensarmos sobre a Internet e ensino de Literatura, faz-se

necessário fazermos um percurso histórico-cultural, conhecendo sua origem, suas

ferramentas, como também a trajetória histórica dessa nova relação com a leitura e com a

escrita inaugurada com o advento do ciberespaço.

Internet: um breve percurso histórico-cultural

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A Internet surge, inicialmente dentro das Universidades, desenvolvido, para o meio

puramente acadêmico. Porém, sua expansão foi para além dele e causou impactos tanto

positivos quanto negativos na sociedade, principalmente no campo educacional, sobre o qual

falaremos mais adiante.

Essa expansão trouxe profundas transformações sócio-culturais que já despertaram e

vem despertando cada vez mais as pesquisas de estudiosos em várias áreas do conhecimento:

Psicologia, Educação, Informática, Filosofia, História, Letras etc. Essas transformações passam

também pela necessidade de se compreender esse meio de comunicação e interação social

que interferiu, também, nas formas de pensar e compreender o mundo.

Inicialmente vamos procurar definir alguns termos que circulam nesse campo do

saber, tais como, ciberespaço, leitor virtual e cibercultura. Esses termos surgem como uma

necessidade de instaurar uma distinção entre o espaço físico-temporal – a que estamos

acostumados – e uma nova realidade que trás uma relação diferente do indivíduo com o

mundo que lhe é apresentado: o mundo virtual.

Em seu livro O perfil cognitivo do leitor imersivo, Santaella (2004) define o ciberespaço

como

[...] todo e qualquer espaço informacional multidimensional que,

dependente da interação do usuário, permite a este o acesso, a

manipulação, a transformação e o intercâmbio de seus fluxos codificados de

informação. Assim sendo, o ciberespaço é o espaço que se abre quando o

usuário conecta-se com a rede. [...] Conclusão, ciberespaço é um espaço

feito de circuitos informacionais navegáveis.” (2004, p. 45).

Desse modo, quando você está diante do computador e se interliga a uma rede que

lhe dá acesso, por exemplo, às aulas da EAD, você está dentro desse ciberespaço.

Santaella ainda fala em “leitor imersivo”. Nesse caso, ela está se referindo a você, por

exemplo, um estudante que lê na tela do computador, de um celular, em lugares variados, que

se inscreve nesse espaço e navega nas redes da internet, isto é, o chamado leitor virtual.

Agora, quando se fala em cibercultura, está-se falando numa forma

sociocultural que advém de uma relação de trocas entre a sociedade, a

cultura e as novas tecnologias de base microeletrónicas surgidas na década

de 70, graças à convergência das telecomunicações com a informática. A

cibercultura é um termo utilizado na definição dos agenciamentos sociais

das comunidades no espaço eletrônico virtual. Estas comunidades estão

ampliando e popularizando a utilização da Internet e outras tecnologias de

comunicação, possibilitando assim maior aproximação entre as pessoas de

todo o mundo. (Wikipédia)

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Assim, esses termos refletem uma realidade que já faz parte das nossas relações

sociais, pessoais e comerciais.

Uma vez que nos comunicamos por meios de emails (correios eletrônicos), MSN,

Orkuts e outros sites de relacionamento, compramos objetos nas lojas virtuais, pesquisamos

em bibliotecas virtuais e em sites de busca, lemos poesia, prosa e drama, entre tantas outras

atividades mediadas pela Internet, deixar o ensino de literatura fora desse contexto seria uma

forma de manutenção da leitura literária longe da realidade de nosso aluno e,

consequentemente, do contexto escolar.

Internet e leitura: um novo leitor

Figura 1: livro eletrônico ou e-book

Aqui, então, merece destaque a questão da leitura.

Após anos da supremacia da leitura impressa, a leitura virtual traz à tona uma nova

discussão sobre as formas de ler, entre elas a importância do suporte15 no qual elas ocorrem.

Os textos, antes circulados e lidos em livros, revistas, jornais, em espaços como bibliotecas,

sala de aula, interiores da vida privada ou pública, agora navegam pela Internet.

No entanto, a leitura no espaço virtual possui uma dinâmica que ultrapassa a

habilidade letrada, pois o fato de dominar o código alfabeto, uma vez que o usuário de

Internet tem que dominar as técnicas de navegação para se tornar um leitor virtual, exige um

letramento digital. Como já afirma Santaella (2004), “O ato de ler passou a não se restringir

15

Entende-se aqui como suporte um meio físico ou virtual, por onde circulam os textos. Por exemplo: revistas, livro, jornais, blogs, orkuts etc.

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apenas à decifração de letras, mas vejo também incorporando, cada vez mais, as relações

entre palavra e imagem, desenho e tamanho de tipos gráficos, texto e diagramação.” (p. 17)

Assim,

No caso da navegação, à sincronia de habilidades perceptivas e

motoras adicionam-se operações mentais, complexas, que envolvem

compreensão, identificação, seleção, decisão e avaliação. [...], mas é

impossível navegar sem estar com a atenção e o pensamento colados

nos operadores e nas mudanças dinâmicas que resultam da ação dos

operadores. (SANTAELLA, 2004, p. 72).

Dessa forma, segundo a mesma autora, há diversidades de leitores: o leitor da

imagem, do jornal, de revistas, de gráficos, mapas, sistemas de notações, da cidade. Há o

leitor-espectador da imagem em movimento, no cinema, televisão e vídeo. “Agora o leitor que

salta para a superfície do texto eletrônico.” (p. 18).

No que se refere aos estudos sobre a leitura e suas práticas, autores como Chartier

(1998) procura analisar as transformações ocorridas nessa passagem entre o leitor do suporte

impresso e o leitor navegador e suas implicações para a história do livro. Nessa perspectiva, há

a preocupação com o fato de que o livro no formato eletrônico poderá ou não substituir o livro

impresso, além de que a alteração do suporte implica diretamente nas práticas de leitura,

como afirma Chartier (1998). A esse respeito, Santella (2004) ainda afirma que a discussão

sobre a permanência ou não do livro só faz sentido se for encaminhada na perspectiva do

suporte do livro, em que a leitura individual, solitária, de um manuseio íntimo entre leitor e

livro assume, com o advento da Internet, a noção de atividade leitora, isto é, uma atividade

corpórea, em que se misturam todos os sentidos: o leitor vê, escuta, lê, escreve, estabelece

conexões entre links, sites, imagens, se dispersa e se centra, utiliza o oral e o escrito, tudo isso

ao mesmo tempo.

A sociedade, desde aproximadamente 6.000 anos atrás lida com a escrita de formas

diferentes, apesar de a oralidade ser a forma de linguagem mais básica do ser humano. Como

pertencemos a uma cultura da escrita, é quase impossível pensá-la desvinculando-a da

imprensa, desde o seu surgimento no século XVIII; e mais, pensar a leitura literária fora do

suporte livro é a grande questão desse capítulo.

Internet e escola: a formação do leitorInternet e escola: a formação do leitorInternet e escola: a formação do leitorInternet e escola: a formação do leitor

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Pesquisas já apontam para a necessidade de inserir esse suporte como ferramenta de

ensino-aprendizagem dentro do espaço escolar. Citando Pierre Lévy (1996), Freitas (2005, p.

17) diz que

“considerar o computador apenas como um instrumento a mais para

produzir textos, sons ou imagens sobre um suporte fixo equivale a negar sua

fecundidade propriamente cultural, ou seja, o aparecimento de novos

gêneros ligados à interatividade.”

Nesse sentido, considerar a Internet como uma atividade que mais se aproxima do

entretenimento do que do aprendizado, da dispersão do que da pesquisa, da alienação do que

inserção cultural é negar a esse suporte o seu caráter autônomo e democrático no que se

refere, entre outros aspectos, à formação do leitor.

Antes de tudo, não podemos inserir essa discussão sem antes analisar as implicações

didático-pedagógicas e curriculares que a inserção desse suporte no espaço escolar provoca.

Temos que analisar, inicialmente, os novos conceitos de texto e de leitor/escritor, que se

modificam com esse suporte.

Ao contrário do texto impresso, “[...] conjunto de parágrafos sucessivos, reunidos em

artigos ou capítulos que são lidos, habitualmente, do princípio ao fim,” o hipertexto “é um

conjunto de dados textuais, que tem um suporte eletrônico e, que podem ser lidos de diversas

maneiras, por diversos caminhos.” (COSTA, 2005, p. 40). Tais características do texto

eletrônico já nos colocam em um grande desafio no que se refere à leitura literária mediado

pelo ciberespaço. O texto literário circula de maneiras variadas, não se prendendo mais a

categorias de tempo e espaço, tão importantes para os estudos literários na escola, em

especial no Ensino Médio.

Um mesmo poema ou um mesmo texto em prosa circula de formas diferentes dentro

da Internet. Quem o insere é um internauta que dá a esse texto estruturas variadas de

organização, assim como critérios de escolha que não perpassam pelos já estabelecidos pela

cultura impressa, um dos únicos meios de parâmetros tidos pela escola na escolha de seu

material de leitura: classificação, regras, valoração cultural, produção, mídia, linguagem, livro

didático etc. Ao contrário, o texto literário circula por meio de e-mails, chats, blogs, orkuts etc.,

em que tanto podem aparecer na íntegra como fragmentados sem que haja sequer uma

citação de que isso ocorreu, como também em vídeos, com imagens e até, desestruturando a

forma do poema. Vejamos os exemplos abaixo:

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Figura 2: Imagem da página inicial do Google vídeos

No exemplo acima, a poesia “Inconfesso desejo”, do poeta brasileiro Carlos

Drummond de Andrade, é apresentada em vídeos diferentes, inclusive resultados de trabalhos

feitos por alunos que publicam no Youtub. Dessa maneira, por meio de uma pesquisa simples,

o internauta pode ter acesso a várias formas de circulação de um mesmo poema. Esse poema,

por exemplo, ainda aparece em blogs.

Figura 3: Blog Chico na ditadura (http://chiconaditadura.blogspot.com/)

Nesse blog, os alunos comentam e discutem sobre os poemas, apresentando sua

compreensão. A escolha do poema pode perpassar pelo gosto, facilidade quando estava

procurando por textos do autor etc.

No blog abaixo, o poema de Vinícius de Morais, “Soneto de fidelidade”, aparece sem a

preocupação com a forma. Apesar do poema tratar-se de um soneto, a separação das estrofes

não é obedecida, dando ao leitor virtual que desconhece esta poesia em sua forma de

produção uma ideia diferente da estrutura do texto.

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Figura 4: Blog Moraesliteraturageo (http://moraesliteraturageo.blogspot.com/)

No entanto, esse não deve ser um argumento para a desconsideração desse gênero

eletrônico para a leitura da poesia, pois o desconhecimento ou despreocupação com a forma

de produção poética não impediu que a autora do blog realizasse sua leitura, conforme

podemos ver em seu comentário:

No poema acima, Vinicius se entrega à pessoa amada mostrando todo o seu

amor e mostrando também que esse sentimento não vai acabar mesmo que

apareça outra pessoa, por mais linda que ela seja. O Soneto da Fidelidade

fez tanto sucesso, que muitos vestibulandos usaram sua criatividade e

formaram o Sonhando com a Felicidade.

Neste comentário, a blogueira faz referência a um poema criado por vestibulandos,

“Sonhando com a Felicidade” inspirado pelo “Soneto de Fidelidade”, de Vinícius de Morais.

Isso demonstra, entre outros fatores, que ao buscar poesias do poeta, o internauta acaba por

se deparar com leituras não previstas o que pode vir a ser uma significativa ampliação do

universo literário do estudante.

Diante dessas possibilidades que a Internet pode proporcionar, caberá então ao

professor ampliar o conhecimento do aluno, promovendo pesquisa e trazendo a produção

impressa do autor para a sala de aula, discutindo, inclusive, sobre a importância da forma na

construção do poema e na sua inserção em uma tradição literária a que o autor pertence.

Esses fatos parecem entrar em choque com o que se entende por literatura na

perspectiva do ensino: obras, autores e épocas, características de estilo, e claro, livro didático.

Outro aspecto que merece atenção é a questão de que o limite entre leitor e escritor

torna-se imprecisa, pois “o leitor-navegador não é um mero consumidor passivo, mas um

produtor do texto que está lendo, um co-autor ativo, leitor capaz de ligar os diferentes

materiais disponíveis,” (COSTA, 2005, p. 41.).

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Chartier (1998), em seu livro A aventura do livro: do leitor ao navegador, já traz a

questão da função-autor que sofreu transformações significativas com a chegada da Internet.

Inicialmente ele parte de uma trajetória de afirmação da autoria que não se deu da mesma

maneira em diferentes épocas na História da Humanidade:

A cultura escrita é inseparável dos gestos violentos que a reprimem. Antes

mesmo que fosse reconhecido o direito do autor sobre sua obra, a primeira

afirmação de sua identidade esteve ligada à censura e à interdição dos

textos tidos como subversivos pelas autoridades religiosas ou políticas. (p.

23)

O autor relembra a relação entre autor e obra num contexto medieval em que a

“apropriação penal” dos discursos justificava a destruição dos livros e a punição de seus

autores, editores e livreiros (Chartier, 1998). O fato de queimar os chamados livros heréticos16

e manter vivos os livros religiosos, de fé traz como consequência a própria destruição de uma

história que ficou à margem da construção da História da humanidade, e principalmente, a da

literatura e da leitura.

No quadro do pintor Pedro Berruguete, podemos ver a representação da censura da

Igreja acima referida, que ao dominar a produção do escrito, retirava do autor o poder sobre

sua obra. Veja o quadro abaixo:

Figura 5: Pintura de Pedro Berruguete, São Domingos e os Albigenses, cerca de 1477-1503. Madrid, Museu do Prado.

17

16

Livros que divergem em ponto de fé ou de doutrina religiosa. 17

In: Chartier, Roger. A aventura do livro: do leitor ao navegador. São Paulo: UNESP, 1998, p.

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Essa interdição e censura, no entanto, não se dão nas mesmas proporções na Internet.

Primeiramente não se podem queimar os escritos. É o autor quem vai decidir o que pode ou

não permanecer em seu texto. Não há censores públicos. O censor é o próprio leitor que

navega e direciona suas escolhas sob o crivo pessoal, unicamente. Até mesmo os comentários

quando postados em blogs, por exemplo, é o autor do comentário quem decide se vai

permanecer naquela escritura ou não; se vai desmanchar e refazê-lo, ou não.

Tal liberdade confere uma alteração nos papéis que foram ao longo dos séculos bem

definidos. Na antiguidade, por exemplo, os elementos autor e leitor estavam separados pela

estrutura do rolo. Não havia espaço para o leitor se inscrever nesses textos, ele era apenas um

sujeito passivo de um texto do qual não participava. As figuras abaixo são exemplos desses

suportes do texto escrito.

Figura 6: Imagem do papiro.18

Figura 7: Pergaminho19

Porém, não havia entre os antigos a preocupação com a função do autor, tendo em

vista que “o escritor não era senão o escriba de uma Palavra que vinha de outro lugar. Seja

porque era inscrita numa tradição, e não tinha valor a não ser o de desenvolver, comentar,

glosar aquilo que já estava ali.” (Chartier, 1998, p. 31)

O sentido de escritor, como aquele que reúne para si uma obra, cuja identidade lhe é

mantida e associada, surge, ainda, no período da renascença, quando é atribuída às obras a

imagem do autor, que lhe confere identidade, carregando para si a punição e a consagração.

E o leitor?

18

Planta da família das ciperáceas, à qual também pertence, por exemplo, o capim-cidreira, em cujas folhas os antigos escreviam. 19

Feito da pele de animal, geralmente de carneiros, preparada para servir de suporte para a escrita. (http://clubedaleiturace.blogspot.com/2009_10_01_archive.html, acesso em 21/11/09)

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Conforme já discutimos, não existe uma única forma de ler nem um único leitor. O

texto não está limitado a uma forma de leitura determinada por instâncias como autor e

editor. No entanto, tais instâncias são revistas dentro do campo da Internet, uma vez que o

autor é ao mesmo tempo o editor de seus textos; e mais, o leitor é também editor e autor,

pois ele pode se inscrever na escritura dos gêneros eletrônicos como a Wikipédia e os blogs,

por exemplo.

Tais mudanças nos remetem, ainda, a uma questão que a Internet vem deixar mais

evidente: é o leitor quem dá sentido ao texto, não o contrário. No século XIX, com o advento

dos jornais, essa presença do leitor como elemento necessário para a consagração das obras e

autores começa a ser vista com mais clareza. A Internet, mais ainda, vem inserir o leitor nesse

lugar: o de sujeito desse processo de escritura da obra literária, uma vez que é ele quem vai

lhe dá sentido e lugar na sociedade.

É o caso dos blos de autores ainda não consagrados pela cultura impressa que, tendo

em vista a dificuldade de ver seus livros impressos em livros, usam a Internet como um espaço

para a divulgação de suas obras.

Figura 8: Blog Casa de Paragens (http://www.casadeparagens.blogspot.com/)

Esse leitor que, na Internet, navega por espaços distintos, encontra links, imagens,

sons, poesia, prosa, notícias; se dispersa, reúne-se. Tudo isso atribuindo a essa navegação um

sentido que lhe pertence, mais do que em outros suportes impressos. Esse espaço, então, é

muito mais um espaço de autonomia do que de subjugação, a depender do uso que fazemos

dele.

Na imagem abaixo, vemos o homem moderno que, em meio a tantas atividades, em

meio à pressa, não escapa da leitura. Esta faz parte do homem e o homem faz parte dela. Além

de que a Internet lembra essas inúmeras mãos que se interligam em atividades

aparentemente desconcentradas. É desse modo que devemos compreender a leitura literária

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neste suporte, principalmente

diversas ações humanas e não separadas dela.

Figura 9: Fotografia

Esse suporte vem sendo largamente estudado no campo da pedagogia, mas

precisamos olhá-lo com mais atenção para o campo da Literatura.

A literatura no mundo virtual

A Wikipédia, blogs

podem ser grandes colaboradores para o ensino da literatura na escola básica. Vamos

agora analisar alguns destes sites:

A Wikipédia é uma enciclopédia

variadas (música, obras literárias, notícias, entretenimento, cultura etc.) com agilidade e

20

In: http://osilenciodoslivros.blogspot.com

neste suporte, principalmente em contexto escolar: o seu lugar se encontra interligado às

diversas ações humanas e não separadas dela.

Figura 9: Fotografia Philippe Halsman [ Jean Cocteau ] 194820

Esse suporte vem sendo largamente estudado no campo da pedagogia, mas

lo com mais atenção para o campo da Literatura.

A literatura no mundo virtual

literários, Orkut, sites como o Domínio Público

podem ser grandes colaboradores para o ensino da literatura na escola básica. Vamos

agora analisar alguns destes sites:

Figura 10: Slogan da Wikipédia

é uma enciclopédia online, nela podemos encontrar informações das mais

variadas (música, obras literárias, notícias, entretenimento, cultura etc.) com agilidade e

http://osilenciodoslivros.blogspot.com.

em contexto escolar: o seu lugar se encontra interligado às

Esse suporte vem sendo largamente estudado no campo da pedagogia, mas

Domínio Público entre outros

podem ser grandes colaboradores para o ensino da literatura na escola básica. Vamos

, nela podemos encontrar informações das mais

variadas (música, obras literárias, notícias, entretenimento, cultura etc.) com agilidade e

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simplicidade. O próprio slogan do site já o define “A enciclopédia livre”, em que internautas

podem não só lê as informações nela contidas, mas escrevê

dados que a compõem. As pessoas que escrevem são colaboradores voluntários e de várias

nacionalidades, como se pode observar na imagem que compõe o

quebra-cabeças, cujas peças se referem a línguas diferentes em que faltam algumas delas. Esse

quebra-cabeça propositadamente incompleto é a marca do site: o conhecimento que se

constrói a cada momento, um conhecimento que não é estático, mas mutável. Observe a

imagem abaixo, em que o internauta pode editar as modificações e/ou correções, que deseja,

em qualquer artigo do site.

Apesar de ser uma enciclopédia livre, em que qualquer usuário pode inserir notas,

alterar informações etc., o s

conteúdo, a fim de conferir-lhe credibilidade, conforme podemos ver no texto abaixo:

ConfiabilidadeConfiabilidadeConfiabilidadeConfiabilidade

Ver artigo principa

Apesar de ser de conteúdo aberto, e, portanto

Wikipédia conquistou a aprovação

científica Nature, da Inglaterra, publicação que, por sua vez, goza de enorme prestígio em nível mundial. A

simplicidade. O próprio slogan do site já o define “A enciclopédia livre”, em que internautas

mações nela contidas, mas escrevê-las, atualizando ou corrigindo os

dados que a compõem. As pessoas que escrevem são colaboradores voluntários e de várias

nacionalidades, como se pode observar na imagem que compõe o slogan: um globo, como um

, cujas peças se referem a línguas diferentes em que faltam algumas delas. Esse

cabeça propositadamente incompleto é a marca do site: o conhecimento que se

constrói a cada momento, um conhecimento que não é estático, mas mutável. Observe a

aixo, em que o internauta pode editar as modificações e/ou correções, que deseja,

Figura 11: Página da Wikipédia

Apesar de ser uma enciclopédia livre, em que qualquer usuário pode inserir notas,

alterar informações etc., o site possui um controle bem rígido para que não haja erros de

lhe credibilidade, conforme podemos ver no texto abaixo:

ConfiabilidadeConfiabilidadeConfiabilidadeConfiabilidade

Ver artigo principal: Confiabilidade da Wikipédia

Apesar de ser de conteúdo aberto, e, portanto, sujeito a ser editado por qualquer internauta, a

Wikipédia conquistou a aprovação — no tocante à confiabilidade de suas informações — da renomada rev

, publicação que, por sua vez, goza de enorme prestígio em nível mundial. A

simplicidade. O próprio slogan do site já o define “A enciclopédia livre”, em que internautas

las, atualizando ou corrigindo os

dados que a compõem. As pessoas que escrevem são colaboradores voluntários e de várias

: um globo, como um

, cujas peças se referem a línguas diferentes em que faltam algumas delas. Esse

cabeça propositadamente incompleto é a marca do site: o conhecimento que se

constrói a cada momento, um conhecimento que não é estático, mas mutável. Observe a

aixo, em que o internauta pode editar as modificações e/ou correções, que deseja,

Apesar de ser uma enciclopédia livre, em que qualquer usuário pode inserir notas,

ite possui um controle bem rígido para que não haja erros de

lhe credibilidade, conforme podemos ver no texto abaixo:

, sujeito a ser editado por qualquer internauta, a

da renomada revista

, publicação que, por sua vez, goza de enorme prestígio em nível mundial. A

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revista britânica realizou uma pesquisa comparativa, de 50 artigos científicos, entre a Wikipédia (WWWW) e a

Enciclopédia Britannica (BBBB). Dos artigos, 42 foram analisados por especialistas, e o resultado foi

surpreendente, vez que a comparação obteve pontos semelhantes entre as duas:

• Inconsistências por verbete (média): W = 4W = 4W = 4W = 4; B = 3B = 3B = 3B = 3; (empate técnico);

• Erros graves: W = 4W = 4W = 4W = 4; B = 4B = 4B = 4B = 4;

• "[…] incorreções factuais, omissões e afirmações falsas." (sic): W = 162W = 162W = 162W = 162;

B = 123B = 123B = 123B = 123.

(http://pt.wikipedia.org/wiki/Wikip%C3%A9dia)

Desse modo, tal site pode ser uma excelente ferramenta de pesquisa em que o

professor pode utilizar para discutir conceitos que possam, inclusive, divergir daqueles aceitos

por autores trabalhados em sala de aula. Assim, o professor estará preparando o aluno para a

construção de um pensamento autônomo, e não apenas a cultura do “copiar-colar”

indiscriminadamente, como vem sendo amplamente criticado, mas muito pouco discutidas as

estratégias positivas desse recurso. O professor ainda pode dar outro direcionamento ao

estudo de temas trabalhados em sala e aos trabalhos escritos pelos alunos.

A Wikipédia pode ser utilizada como uma ferramenta bastante interessante para o

desenvolvimento da pesquisa enquanto uma produção textual-discursiva. A questão da cópia

de um verbete de uma enciclopédia on-line ou de um texto impresso não é o problema, mas o

uso que se faz dessa técnica. De posse dos dados, a reflexão deve passar pelas estratégias de

ensino e não pela condenação do que foi produzido, uma vez que a escola proíbe, mas muitas

vezes não ensina a usar de maneira a desenvolver uma autonomia de produção e pensamento.

O professor ao estudar o gênero poético, pode sugerir aos seus alunos uma atividade

que envolva a Wikipédia. Pensando num autor como o poeta paraibano Ascendino Leite, os

alunos podem recorrer à Wikipédia pelo endereço http://pt.wikipedia.org, e pesquisar sobre

esse escritor, no que se refere à sua biografia, obra, atuação político-cultural, poesias etc. Caso

não sejam encontrados os dados que estiverem sendo sugeridos pelo professor, os alunos

podem desenvolver uma pesquisa através do site de busca, o Google, discutir os resultados e

construir um texto para ser inserido na enciclopédia. Dessa maneira, o professor estará

desenvolvendo leitura, pesquisa e produção textual.

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Figura 12: Slogan do Portal do Domínio Público

Outro site que merece destaque é o Domínio Público. Criado em novembro de 2004

pela Secretaria de Educação a Distância do Ministério da Educação, tem por missão se tornar

um espaço de “Livre acesso ao conhecimento” a alunos, professores, pesquisadores e à

população em geral.

Dessa forma, ela pode se tornar uma excelente ferramenta para o ensino de literatura,

uma vez que o aluno pode baixar textos de autores trabalhados em sala de aula, ou ainda,

serem estimulados a se tornarem colaboradores do site, digitalizando obras que se encontram

em domínio público21 e, com isso, o professor estará incentivando tanto a pesquisa, leitura e o

processo de escrita. O acesso é fácil, basta digitar o endereço www.dominiopublico.gov.br., e

preencher os espaços destinados às pesquisas. O site dispõe de recursos que ajudam o usuário

a “baixar” os arquivos de que necessita, sem que haja necessidade de conhecimentos técnicos

mais elaborados para tal.

Nesta biblioteca virtual, há obras que já se tornaram de domínio público e aquelas

cujos direitos autorais foram cedidos. É o caso do autor Machado de Assis. Como já se

passaram mais de setenta anos de seu falecimento, sua obra encontra-se no site do Domínio

Público. Com relação à obra desse autor, o professor pode trabalhar com os gêneros literários,

uma vez que Machado de Assis escreveu poesia, prosa e drama.

Na página de abertura do site, o aluno encontrará o link “Machado de Assis: obra

completa”. Ao clicar nele, o usuário é levado a uma página, cujo menu apresenta várias

possibilidades de atividades. Entre eles está um vídeo produzido pela TV Escola sobre o autor,

sua vida, obra, com comentários de estudiosos de sua obra. É um momento interessante para

21

Domínio publico: no Direito da Propriedade Intelectual, é o conjunto de bens culturais, de tecnologia ou de informação - livros, artigos, obras musicais, invenções e outros - cujos direitos econômicos não são de exclusividade de nenhum indivíduo ou entidade. Tais bens são de livre uso de todos, eis que integrando a herança cultural da humanidade. (wikipédia)

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se trabalhar o escritor, seu tempo, seus posicionamentos político-culturais e sua produção

artística.

Outro link nos leva à obra completa (o acervo da biblioteca virtual). Nele, podemos

propor uma atividade intitulada CATALOGANDO OS LIVROS, inspirada no autor Rildo

Cosson, em seu livro Letramento literário: teoria e prática, na qual ele sugere que os alunos

vão à biblioteca da escola com a proposta de descobrir os gêneros literários e suas

características. Fazendo as adaptações, deve-se pedir que os alunos procurem, no site de

busca, livros, cuja autoria seja Machado de Assis, e tragam uma lista contendo um maior

número possível de títulos para a sala de aula – o professor deve trazer sua lista também, a fim

de acrescentar o que faltar na lista dos alunos. De posse dessa lista, os alunos devem escolher

os títulos de que mais gostaram ou tiveram interesse, de modo que sejam contemplados todos

os gêneros.

Feita essa etapa, o professor deve indicar o endereço do Portal do Domínio Público,

pedir que os alunos procurem, através do link “Obras completas” o(s) título(s) que escolheram

e descobrirem a que categoria dos gêneros literários ele(s) pertence(m). Descoberto o gênero,

cada aluno deve “baixar” a(s) obra(s) que pertence(m) àquele(s) título(s) e visitar a Wikipédia

para buscarem informações sobre o(s) título(s). Fica o desafio para a leitura do livro

selecionado ou daqueles livros que foram mais próximos e/ou mais divergentes da

expectativa.

Como proposta de escrita, o site disponibiliza um espaço para postagens, em que o

usuário poderá publicar seu comentário, levando em consideração, portanto, à adequação às

propostas do site e a sua explícita vontade de publicá-lo, o que confere o caráter de seriedade

da construção do texto pelo aluno.

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Figura 13: página inicial do site Domínio Público.

Como pode ser notado, a Internet vem realizar o sonho dos Iluministas do século XVIII:

a democratização do saber. O conhecimento colocado à mão de toda uma sociedade sem que

haja fronteiras que limitem essa inclusão, mesmo em classes menos favorecidas, uma vez que

as lanhouse se tornaram um meio de inserção neste espaço digital.

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Figura 14: Carl Spitzweg, Le rat de bibliothèque, cerca de 1850. Schweinfurt, coleção Georg Schaefer.22

Além dos gêneros eletrônicos já citados, temos o Orkut que, apesar de ser de origem

norte-americana e seus comandos em inglês, este site é bastante popular no Brasil, contendo

o maior número de usuários do mundo, segundo SOUZA & HAMANN (2006). O fato de o Brasil

possuir condições econômicas inferiores a de países como os EUA, possuir o maior número de

usuários de Orkut merece investigação, segundo as autoras.

O Orkut é um site de relacionamentos na Internet, que permite ao usuário acessar,

com um simples clique, uma lista de amigos e conhecidos cadastrados, além de outras

ferramentas. Duas características principais, ainda segundo SOUZA & HAMANN (2006) são a

confiabilidade e a socialização, visto que para pertencer a essa comunidade, o usuário tem que

receber um convite por e-mail.

No entanto, há usuários que utilizam desse espaço para divulgar conhecimentos de

várias áreas do saber. Por isso, o Orkut pode se tornar uma ferramenta interessante para o

22

In: http://www.repro-tableaux.com/a/carl-spitzweg/le-rat-de-bibliotheque.html

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ensino de literatura na e fora da sala de aula. Na figura abaixo, temos uma comunidade

intitulada Biblioteca digital do Orkut, que já possui 13.135 membros. Na descrição, o autor da

página demonstra certa preocupação em fornecer um serviço de qualidade a seus usuários

(acervos, e-books, fóruns de trocas de livros etc.).

Figura 15: página inicial da comunidade Biblioteca Digital do Orkut

Neste comunidade, mais do que pertencer a um grupo de amigos, o usuário pode

conectar-se com o mundo dos livros, trocar leituras e informações sobre a vida acadêmica e

cultural. Dessa forma, o professor de literatura pode inserir essa ferramenta que, como já nos

referimos, é largamente utilizada pelos jovens.

Outra comunidade do Orkut que demonstra interesse pela leitura literária chama-se E-

book Ebooks de Romances AR!! Esse espaço se destina àqueles “que amam livros de romances

e nem sempre tem a oportunidade de adquiri-los via banca, livraria e afins..”, como a autora

do site descreve em sua página de abertura. Esse site já possui 3.167 membros.

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Figura 16: página inicial da comunidade “E-book Ebooks de Romances AR!!!

Seguindo o exemplo, os alunos podem criar comunidades de escritores escolhidos por

eles ou sugeridos pelo professor, a fim de trocar suas experiências sobre a leitura da obra de

um autor, inclusive buscar comunidades que tratem das obras que escolheram para delas

participar e fazer suas trocas.

Esse espaço pode ser criado, também, junto com o professor em sala de aula. Os

alunos se tornariam participantes da comunidade com o intuito de ler, pesquisar, comentar,

divulgar livros, relacionar com outras artes que explorem os mesmos temas tratados pelo

autor literário da comunidade.

Um autor interessante é Martins Pena, dramaturgo brasileiro do século XIX, uma vez

que se pode fazer um ponte interessante entre suas peças e os comportamentos atuais, além

de a comunidade promover trocas de vídeos de peças teatrais, adaptações de textos teatrais

para o cinema e para a literatura (o caso das peças do dramaturgo inglês Shakespeare),

refletindo, inclusive, sobre o teatro e seu lugar no contexto histórico-cultural em que estamos

inseridos. Em sala, pode-se promover a escrita de uma adaptação para o gênero narrativo de

uma das peças de Martins Pena.

Dessa forma, a circulação do texto literário e sua leitura encontram na Internet um

espaço de fomentação e de trocas. A escola, portanto, tem que se apropriar desses recursos

para tornar o ensino de literatura, como prática de leitura cotidiana dentro e fora da escola,

mais próximo do aluno. A leitura literária tem um lugar interessante neste suporte, o que nos

faz reclamar a Internet para dentro da sala de aula.

Não só os exemplos citados, mas outros sites como o blog, chats, fóruns, twitter etc.,

devem percorrer os espaços destinados ao ensino, sempre buscando novas maneiras de

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formar esse leitor de literatura, mesmo diante de um currículo já formado e de um lugar que

destina a Literatura à utilidade exclusiva para vestibulares.

No entanto, para que o letramento literário por meio da Internet possa ir se tornando

uma realidade viva, a capacitação de professores se faz cada vez mais necessária – o chamado

letramento digital.

Segundo pesquisa realizada pela autora Roseane de Albuquerque dos S. Abreu (2006)

apresentada em seu artigo “Cabeças digitais”: um motivo para revisões na prática docente, os

professores se sentem pressionados tanto por parte do mercado quanto por parte dos alunos

a utilizarem a Internet em sala de aula. Cada vez mais as exigências do mercado para que as

escolas utilizem a Internet como tecnologia educacional fazem com que a dinâmica da sala de

aula seja modificada, e mais ainda, “os trabalhos reclamam uma postura inovadora destes

profissionais (professores), colocando-os como agentes de mudanças educacionais. E os

professores, como estão percebendo tudo isso? Como estão se sentindo? Como estão

agindo?” (ABREU, 2006, p. 166 – grifo nosso).

A preocupação dessa pesquisadora faz com que no âmbito universitário possa ser

revista a formação do professor e sua preparação para esse novo mercado, essa nova relação

na sala de aula, uma vez que a maior pressão que os profissionais enfrentam é o seu próprio

despreparo para utilizar essas tecnologias midiáticas e digitais. Esse preparo minimiza,

inclusive, os conflitos entre os profissionais que utilizam os recursos tecnológicos e os que não,

distinguindo os que estão atualizados daqueles que não estão.

Outro aspecto é a necessidade de inclusão digital nas escolas e nas universidades que

preparam professores para essa inversão do saber. A Internet traz a informação, o que coloca

o professor noutro lugar que não o conhecedor, o sabedor. Tal inversão incomoda, segundo

ABREU (2006), os professores entrevistados em sua pesquisa, em que unânimes constataram

que os alunos não mais se interessam pelas aulas convencionais o que os leva a rever sua

prática docente.

Visando ao letramento digital, conforme discutimos acima, vamos trabalhar com

atividades que forneçam a você a possibilidade de utilizar a Internet como mais uma

ferramenta de ensino da Literatura em sala de aula, com os alunos do Ensino Fundamental e,

principalmente, do Ensino Médio.

Nas atividades, a Internet será nossa aliada tanto para avaliar os conteúdos

trabalhados por essa disciplina, como para que você possa se familiarizar com um recurso que

deverá fazer parte de sua prática docente, assim como já está fazendo parte de sua vida

acadêmica.

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Bom Estudo!

REFERÊNCIAS

ABREU, Rosane de Albuquerque dos S. “Cabeças digitais”: um motivo para revisões na prática docente.

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Roberto; FREITAS, Maria Teresa de Assunção (orgs.). Leitura e escrita de adolescentes na internet e na

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SOUZA, Solange Jobim e; HAMANN, Fernanda Passarelli. Os jovens e o Orkut: considerações sobre a

criação de jogos de linguagem e de identidade em rede. In: COSTA, Ana Maria Nicolaci-da-. Cabeças

digitais: o cotidiano na era da informação. Rio de Janeiro: PUC-Rio; São Paulo, Loyola, 2006, p. 107-130.

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