13
REVISTA PORTUGUESA DE PNEUMOLOGIA Vol XI N.º 5 Setembro/Outubro 2005 443 Atrofia muscular espinhal – Apoio ventilatório não invasivo em pediatria Spinal muscular atrophy – Noninvasive ventilatory support in pediatrics Recebido para publicação/received for publication: 04.12.03 Aceite para publicação/accepted for publication: 05.07.21 Mónica Vasconcelos 1 Isabel Fineza 2 Miguel Félix 3 Maria Helena Estêvão 4 Resumo Resumo Resumo Resumo Resumo A deterioração da função respiratória em crianças com doença neuromuscular degenerativa é a principal responsável pela elevada mortalidade associada a estas doenças. A ventilação não invasiva (VNI) veio diminuir a morbilidade e a mortalidade por insuficiência respiratória nestas crianças. No entanto, o uso de suporte ventilatório nalguns casos de atrofia espinhal anterior (AEA) é ainda controverso. Apresenta-se um estudo retrospectivo de 22 doentes com AEA seguidos no Hospital Pediátrico de Coimbra: 7 do tipo I, 11 do tipo II e 4 do tipo III. Em 17 casos foi iniciado apoio ventilatório por máscara e, Artigo Original Original Article Abstract Abstract Abstract Abstract Abstract The deterioration of the respiratory function in chil- dren suffering from degenerative neuromuscular disease is the main cause of the high mortality rate associated with these diseases. Noninvasive venti- lation (NIV) has reduced the morbidity and mor- tality due to respiratory insufficiency in these chil- dren. However, the use of support ventilation in some cases of spinal muscular atrophy (SMA) is still controversial. A retrospective study of 22 patients suffering from SMA who were followed up in the Paediatric Hospi- tal of Coimbra is presented: 7 of type I, 11 of type 1 Interna do Internato Complementar de Pediatria/Complementary Paediatrics Internship Student 2 Assistente Hospitalar Graduada de Neuropediatria/Graduate Hospital Assistant in Neuropaediatrics 3 Assistente Hospitalar de Pediatria/Hospital Assistant in Paediatrics 4 Assistente Hospitalar Graduada de Pediatria/Graduate Hospital Assistant in Paediatrics Instituição/Institution: Laboratório do Sono e Ventilação/Sleep and Respiration Laboratory. Responsável/Responsible: Maria Helena Estêvão. Correspondência/Correspondence to: Mónica Vasconcelos, Hospital Pediátrico de Coimbra/Paediatric Hospital of Coimbra. Av. Bissaya Barreto - 3000-075 Coimbra

Atrofia muscular espinhal – Apoio ventilatório não ... · A atrofia espinhal anterior (AEA) é uma doença neuromuscular degenerativa, transmitida de forma autossómica recessiva

  • Upload
    buinhan

  • View
    225

  • Download
    1

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Atrofia muscular espinhal – Apoio ventilatório não ... · A atrofia espinhal anterior (AEA) é uma doença neuromuscular degenerativa, transmitida de forma autossómica recessiva

R E V I S T A P O R T U G U E S A D E P N E U M O L O G I A

Vol XI N.º 5 Setembro/Outubro 2005

443

Atrofia Muscular Espinhal – Apoio Ventilatório Não Invasivo em PediatriaMónica Vasconcelos, Isabel Fineza, Miguel Félix, Maria Helena Estêvão

Atrofia muscular espinhal – Apoio ventilatório nãoinvasivo em pediatria

Spinal muscular atrophy – Noninvasive ventilatorysupport in pediatrics

Recebido para publicação/received for publication: 04.12.03Aceite para publicação/accepted for publication: 05.07.21

Mónica Vasconcelos1

Isabel Fineza2

Miguel Félix3

Maria Helena Estêvão4

ResumoResumoResumoResumoResumoA deterioração da função respiratória em crianças comdoença neuromuscular degenerativa é a principalresponsável pela elevada mortalidade associada a estasdoenças. A ventilação não invasiva (VNI) veio diminuira morbilidade e a mortalidade por insuficiênciarespiratória nestas crianças. No entanto, o uso desuporte ventilatório nalguns casos de atrofia espinhalanterior (AEA) é ainda controverso.Apresenta-se um estudo retrospectivo de 22 doentescom AEA seguidos no Hospital Pediátrico deCoimbra: 7 do tipo I, 11 do tipo II e 4 do tipo III. Em17 casos foi iniciado apoio ventilatório por máscara e,

Artigo OriginalOriginal Article

AbstractAbstractAbstractAbstractAbstractThe deterioration of the respiratory function in chil-dren suffering from degenerative neuromusculardisease is the main cause of the high mortality rateassociated with these diseases. Noninvasive venti-lation (NIV) has reduced the morbidity and mor-tality due to respiratory insufficiency in these chil-dren. However, the use of support ventilation insome cases of spinal muscular atrophy (SMA) isstill controversial.A retrospective study of 22 patients suffering fromSMA who were followed up in the Paediatric Hospi-tal of Coimbra is presented: 7 of type I, 11 of type

1 Interna do Internato Complementar de Pediatria/Complementary Paediatrics Internship Student2 Assistente Hospitalar Graduada de Neuropediatria/Graduate Hospital Assistant in Neuropaediatrics3 Assistente Hospitalar de Pediatria/Hospital Assistant in Paediatrics4 Assistente Hospitalar Graduada de Pediatria/Graduate Hospital Assistant in Paediatrics

Instituição/Institution: Laboratório do Sono e Ventilação/Sleep and Respiration Laboratory. Responsável/Responsible: Maria Helena Estêvão.Correspondência/Correspondence to: Mónica Vasconcelos, Hospital Pediátrico de Coimbra/Paediatric Hospital of Coimbra.Av. Bissaya Barreto - 3000-075 Coimbra

Page 2: Atrofia muscular espinhal – Apoio ventilatório não ... · A atrofia espinhal anterior (AEA) é uma doença neuromuscular degenerativa, transmitida de forma autossómica recessiva

R E V I S T A P O R T U G U E S A D E P N E U M O L O G I A

Vol XI N.º 5 Setembro/Outubro 2005

444

Atrofia Muscular Espinhal – Apoio Ventilatório Não Invasivo em PediatriaMónica Vasconcelos, Isabel Fineza, Miguel Félix, Maria Helena Estêvão

II, and 4 of type III. In 17 of these cases, non-inva-sive ventilation by mask was begun, and in 3 ofthem NIV was applied for prophylactic purposes.The 7 children with SMA type I began NIV whenthey were 13 months of age on average (3 months– 3 years); 5 of them died, between 1 and 15 monthsafter the beginning of the ventilation. Of the 11children with SMA type II, 8 were submitted toNIV and one died 22 months later. Three of thechildren in this group began NIV in a prophylac-tic way, and in all of them a decrease in the tho-racic deformity was observed. Of the 4 patients oftype III, 2 of them were submitted to non-inva-sive ventilation. In all of the symptomatic cases, adecrease in the frequency and severity of respira-tory infections was observed, after ventilation wasstarted. The respiratory support with NIV mayimprove the quality of life of children sufferingfrom SMA as well as prolong their life expectan-cies. In SMA type I, whose clinical manifestationsare precocious and whose prognostic is very seri-ous, the application of this support has been de-bated.

Rev Port Pneumol 2005; XI (5): 443-455

Keywords: Spinal muscular atrophy, respiratoryfailure, noninvasive ventilation, neuromuscular

em 3 destes, a VNI foi aplicada com intuitosprofilácticos.As 7 crianças com AEA tipo I iniciaram VNI comuma idade média de 13 meses (3 meses – 3 anos) e 5faleceram, entre 1 a 15 meses após o início daventilação. Das 11 crianças com AEA tipo II, em 8foi instituída VNI, e uma faleceu 22 meses depois.Três crianças deste grupo iniciaram a VNI de formaprofiláctica e em todas se verificou uma diminuiçãoda deformidade torácica. Dos 4 doentes do tipo III,em 2 foi iniciado o suporte ventilatório. Natotalidade dos casos sintomáticos verificou-se umadiminuição da frequência e gravidade de infecçõesrespiratórias após o início do apoio ventilatório.O apoio respiratório com VNI pode melhorar aqualidade de vida de crianças com AEA e prolongar asua sobrevida. Na AEA tipo I, cujas manifestaçõesclínicas são muito precoces e o prognóstico muitograve, a aplicação deste apoio tem sido discutida.

Rev Port Pneumol 2005; XI (5): 443-455

Palavras-chave: Atrofia espinhal anterior, insufi-ciência respiratória, ventilação não invasiva, doençaneuromuscular.

IntrIntrIntrIntrIntroduçãooduçãooduçãooduçãooduçãoA atrofia espinhal anterior (AEA) é umadoença neuromuscular degenerativa,transmitida de forma autossómica recessiva.É caracterizada por um défice progressivoda força muscular, de predomínio a nível dasregiões proximais dos membros.A AEA é, geralmente, classificada em trêsgrupos de acordo com a gravidade e a idade

IntrIntrIntrIntrIntroductionoductionoductionoductionoductionSpinal muscular atrophy (SMA) is a dege-nerative neuromuscular disease which isautosomal recessive transmitted. It is cha-racterised by a progressive wasting of mus-cular force, predominantly in the areas clo-sest to the limbs.SMA is generally classified into three groupsaccording to the severity of the disease and

A atrofia espinhalanterior (...) écaracterizada por umdéfice progressivo daforça muscular, depredomínio a níveldas regiõesproximais dosmembros

Page 3: Atrofia muscular espinhal – Apoio ventilatório não ... · A atrofia espinhal anterior (AEA) é uma doença neuromuscular degenerativa, transmitida de forma autossómica recessiva

R E V I S T A P O R T U G U E S A D E P N E U M O L O G I A

Vol XI N.º 5 Setembro/Outubro 2005

445

Atrofia Muscular Espinhal – Apoio Ventilatório Não Invasivo em PediatriaMónica Vasconcelos, Isabel Fineza, Miguel Félix, Maria Helena Estêvão

de manifestação da doença. A forma maisgrave – AEA tipo I ou doença de Werdnig--Hoffmann – tem um início muito precoce,antes dos seis meses de idade, podendomuitas vezes manifestar-se ainda no períodopré-natal por redução dos movimentosfetais. As crianças são muito hipotónicas,não chegam a adquirir a capacidade de sesentarem sem apoio e apresentam, muitoprecocemente, problemas respiratóriosgraves e dificuldades alimentares. A AEAtipo II é uma forma de gravidade inter-média, cuja idade de instalação se situaentre os seis meses e os dois anos; a criançaadquire a capacidade de se sentar, mas éincapaz de se levantar sozinha e/ou andarsem apoio. Na forma menos grave, a AEAtipo III, ou doença de Kugelberg-Welander,a progressão é mais lenta; os primeirossintomas surgem após os dois ou três anos,idade em que a criança já adquiriu amarcha. Os problemas são tanto mais fre-quentes e graves quanto mais precoce-mente se manifesta a doença.A causa mais frequente de morte em criançascom AEA e outras doenças neuromuscularesé a insuficiência respiratória, que se podeapresentar de uma forma aguda, como porexemplo em resultado de uma pneumonia//atelectasia, ou que se pode desenvolvermais lentamente por descompensaçãoventilatória progressiva. As medidas tera-pêuticas habitualmente usadas nesta doençasão de suporte. A fisioterapia regular, osuporte postural adequado, os métodos deauxílio de limpeza brônquica e a manu-tenção de um bom estado de hidratação enutrição são essenciais para a melhoria doestado geral destas crianças. A ventilaçãonão invasiva (VNI) veio alterar a aborda-gem respiratória dos doentes neuromus-

the age of onset. The most severe type –SMA type I or Werdnig-Hoffmann diseasepresents very early, before the patient is sixmonths old. It may often manifest itselfduring the pre-natal period, by a reductionin foetal movement. The children are hypo-tonic, never being able to sit unaided andpresent severe respiratory problems andfeeding difficulties very early on. SMA typeII is of intermediate severity and its onsetoccurs at between six months and two years.While a child suffering from this form ofthe disease may be able to sit, it cannot getup unaided and/or walk unsupported. Theless severe type, SMA type III or Kugelberg-Welander disease has a slower progression;the first symptoms appear after the age oftwo or three and by that time the child isable to walk. The problems associated withthe disease are much more frequent and se-vere the earlier the onset of the disease.The most frequent cause of death in chil-dren with SMA and other neuromusculardiseases is respiratory insufficiency. This maypresent in an acute form, for example theresult of pneumonia/lung atelectasy, or maydevelop more slowly due to progressiveventilatory descompensation. Therapeuticmeasures which are normally used to treatthis disease are support measures. Regularphysiotherapy, adequate postural support,auxiliary bronchial clearance methods andmaintaining a good state of hydration andnutrition are essential for improving thegeneral state of these children. Non-inva-sive ventilation (NIV) alters the respiratoryaspect of the neuromuscular patients,working towards an improved quality oflife and also a greater survival rate. Try-ing, however, to prolong life in situationswhich are very grave and which have a

A forma mais grave éa AEA tipo I oudoença deWerdnig-Hoffmann

A AEA tipo II é umaforma de gravidadeintermédia

A forma menos graveé a AEA tipo III, oudoença deKugelberg-Welander

A ventilação nãoinvasiva (VNI) veioalterar a abordagemrespiratória dosdoentes neuromus-culares

Page 4: Atrofia muscular espinhal – Apoio ventilatório não ... · A atrofia espinhal anterior (AEA) é uma doença neuromuscular degenerativa, transmitida de forma autossómica recessiva

R E V I S T A P O R T U G U E S A D E P N E U M O L O G I A

Vol XI N.º 5 Setembro/Outubro 2005

446

Atrofia Muscular Espinhal – Apoio Ventilatório Não Invasivo em PediatriaMónica Vasconcelos, Isabel Fineza, Miguel Félix, Maria Helena Estêvão

culares, contribuindo para uma melhoriada sua qualidade de vida e, também, parauma maior sobrevida. No entanto, tenderáa prolongar a vida em situações muitograves e de mau prognóstico, como a AEAtipo I, o que levanta questões de ordemética, económica e social.

ObjectivoCaracterização das crianças com AEAsubmetidas a VNI no Hospital Pediátrico deCoimbra (HPC).

Material e métodosMaterial e métodosMaterial e métodosMaterial e métodosMaterial e métodosFoi efectuada uma análise retrospectiva detodos os processos de crianças com odiagnóstico de AEA seguidas em Consultade Pneumologia no HPC nos últimos 11anos. As variáveis analisadas foram idade,sexo, tipo de AEA; nas crianças com VNIforam estudadas as características da ven-tilação, critérios que determinaram o seuinício, número de infecções respiratórias,necessidade de hospitalização e ventilaçãomecânica.

ResultadosResultadosResultadosResultadosResultadosNos últimos 11 anos foram seguidos emConsulta de Pneumologia do HPC um totalde 22 doentes com o diagnóstico de AEA.Actualmente, as suas idades estão compreen-didas entre os 6 meses e os 26 anos (medianade 5,5 anos), e 16 (73%) são do sexo mas-culino. Sete pertencem ao tipo I, 11 aotipo II e 4 ao tipo III. Em 17 dos casos foiiniciada a VNI (Quadro I). No Quadro IIestão resumidas as principais característicasda ventilação.A idade de início de ventilação das setecrianças com AEA tipo I variou entre os trêsmeses e os três anos (Fig. 1). Os critérios

poor prognosis, such as SMA type I, leadsto questions of an ethical, economic andsocial nature.

AimCharacterisation of the children with SMAwho underwent NIV at the Paediatric Hos-pital of Coimbra (PHC).

Material and methodsA retrospective study of all the clinical filesof SMA diagnosed children who were fol-lowed up in Pulmonolgy appointments at thePaediatric Hospital of Coimbra over the last11 years was made. The variables which wereanalysed were age, sex and type of SMA. Inthe children who had undergone NIV, thecharacteristics of ventilation, the criteriawhich determined its initiation, the numberof respiratory infections, the need for hos-pital admittance and mechanical ventilationwere studied.

ResultsA total of 22 SMA diagnosed patients havebeen followed up in Pulmonolgy appoint-ments at the PHC over the last 11 years. Theages of the patients currently varies fromn6 months to 26 years (with an average of 5.5years) and 16 (73%) are male. Seven are oftype I, 11 are of type II and 4 are of typeIII. NIV was begun in 17 of these cases (Ta-ble I). The main characteristics of ventila-tion are summarised in Table II.The age at which ventilation was begun inthe seven type I SMA children varied fromthree months to three years (Fig. 1). Thecriteria which determined initiating ventila-tion were acute respiratory insufficiency dueto pneumonia in 4 children and chronic res-piratory insufficiency in 3. Five children died

Page 5: Atrofia muscular espinhal – Apoio ventilatório não ... · A atrofia espinhal anterior (AEA) é uma doença neuromuscular degenerativa, transmitida de forma autossómica recessiva

R E V I S T A P O R T U G U E S A D E P N E U M O L O G I A

Vol XI N.º 5 Setembro/Outubro 2005

447

Atrofia Muscular Espinhal – Apoio Ventilatório Não Invasivo em PediatriaMónica Vasconcelos, Isabel Fineza, Miguel Félix, Maria Helena Estêvão

que determinaram o seu início foraminsuficiência respiratória aguda por pneumo-nia em 4 crianças e insuficiência respiratóriacrónica em 3. Cinco crianças faleceram, en-tre 1 a 15 meses, após o início da VNI, 4na sequência do episódio de descom-pensação respiratória que motivou ventilaçãomecânica. As duas crianças actualmenteventiladas têm 22 meses e 6,5 anos e estãosob ventilação há 16 meses e 3,5 anos,respectivamente.

within 1 – 15 months of beginning NIV;4 following respiratory descompensationepisodes which led to mechanical venti-lation. The two children currently onventilation are aged 22 months and 6.5years and have been on ventilation for 16months and 3.5 years respectively.The 11 SMA type II patients are aged be-tween 15 months and 12 years. In 8 an NIVprogrammed was initiated between the agesof 11 months and 9 years. The reasons for

Quadro I – Distribuição dos casos de AEA por tipo e apoioventilatório

Table I – SMA cases by type and ventilatory support

Table II – Ventilation characteristicsQuadro II – Características da ventilação

IR- insuficiência respiratória; IPAP- inspiratory positive airway pressure; EPAP- expiratory positive airwaypressure; M- meses; A- anos

RI-respiratory insufficency; IPAP- inspiratory positive airway pressure; EPAP- expiratory positive airwaypressure; M- months; Y- years

Page 6: Atrofia muscular espinhal – Apoio ventilatório não ... · A atrofia espinhal anterior (AEA) é uma doença neuromuscular degenerativa, transmitida de forma autossómica recessiva

R E V I S T A P O R T U G U E S A D E P N E U M O L O G I A

Vol XI N.º 5 Setembro/Outubro 2005

448

Atrofia Muscular Espinhal – Apoio Ventilatório Não Invasivo em PediatriaMónica Vasconcelos, Isabel Fineza, Miguel Félix, Maria Helena Estêvão

���� ������

�������

��������� �� ���������

��0

1

2

3

4

5

6

7

1º 2º 3º 4º 5º 6º 7º 8º 9º 10º >10

�AEA tipo I

�AEA tipo II

��AEA tipo III

anos de idade years of age

������ ������

��������

�������� ��� ���������

���0

1

2

3

4

5

6

7

1º 2º 3º 4º 5º 6º 7º 8º 9º 10º >10

�AEA tipo I

��AEA tipo II

��AEA tipo III

Os 11 doentes com AEA tipo II têm idadescompreendidas entre os 15 meses e os 12anos. Em 8 foi iniciado o programa deVNI entre os 11 meses e os 9 anos, porinsuficiência respiratória aguda em 2 casos,insuficiência respiratória crónica em 3 epara efeitos profilácticos nos restantes 3.Uma criança faleceu cerca de 22 meses apósiniciar VNI, no decurso de uma infecçãorespiratória aguda. As 3 crianças queiniciaram ventilação de forma profilácticanão tinham qualquer sintomatologiarespiratória. Após o início da ventilação,aos 11, 19 e 26 meses de idade, verificou-seem todas uma diminuição importante dadeformidade torácica. Actualmente, têm 15meses, 5 e 3 anos, respectivamente; apenasuma teve uma infecção respiratória que

this were acute respiratory insufficiencyin 2 cases, chronic respiratory insuffi-ciency in 3 cases and prophylactic NIVin the remaining 3. One child died around22 months after beginning NIV due to anacute respiratory infection. The 3 childrenwho began prophylactic ventilation hadno respiratory symptoms. After begin-ning ventilation at 11, 19 and 26 monthsof age, a decrease in thoracic deformitywas observed in all. These children arecurrently aged 15 months, 5 and 3 yearsold respectively. Only one of the threehas had a respiratory infection which ledto admittance to hospital. In the remai-ning 4 children the duration of the venti-lation varied between 9 months and 4.5years and after starting NIV there was a

SMA type I SMA type II SMA type IIIAEA tipo I AEA tipo II AEA tipo III

Fig. 1 – Idade de início da VNI para os diferentes tipos de AEA Fig. 1 – Age at beginning NIV for the different SMA types

Table III – Comparison of the number of respiratory infections, neededhospital admittances and mechanical ventilations before and after be-ginning NIV

Quadro III – Comparação do número de infecções respiratórias,necessidade de hospitalização e de ventilação mecânica antes e após oinício da VNI

Page 7: Atrofia muscular espinhal – Apoio ventilatório não ... · A atrofia espinhal anterior (AEA) é uma doença neuromuscular degenerativa, transmitida de forma autossómica recessiva

R E V I S T A P O R T U G U E S A D E P N E U M O L O G I A

Vol XI N.º 5 Setembro/Outubro 2005

449

Atrofia Muscular Espinhal – Apoio Ventilatório Não Invasivo em PediatriaMónica Vasconcelos, Isabel Fineza, Miguel Félix, Maria Helena Estêvão

motivou internamento hospitalar. Nasrestantes 4 crianças a duração da ventilaçãovaria entre os 9 meses e 4,5 anos e, apósiniciarem a VNI, houve uma diminuiçãosignificativa do número de infecçõesrespiratórias, um menor número deinternamentos hospitalares e uma menornecessidade de recorrer à ventilação mecâ-nica (Quadro III). Estas crianças referiram,ainda, uma melhoria das queixas associadasà sua hipoventilação crónica, nomeada-mente perturbações do sono, acordaresmúltiplos, sudorese nocturna e cefaleiasmatinais. Dos 3 doentes que não foramventilados, 2 foram transferidos para outraunidade hospitalar por terem ultrapassadoa idade pediátrica.Dos 4 doentes com AEA tipo III, 2 estãocom ventilação nocturna no domicílio.Iniciaram VNI no decurso de uma pneumo-nia, um aos 2 anos e 9 meses e o outro aos20 anos, e estão ventilados há 4 e 3 anos,respectivamente. Após iniciarem ventila-ção, tiveram uma diminuição importantedo número de infecções respiratórias e nãovoltaram a ser hospitalizados (Quadro III).O mais velho frequenta um curso superiorcom bom aproveitamento. Os outros doisdoentes, que não estão ventilados, sãojovens adultos (20 e 26 anos) sem qualquerclínica respiratória, tendo sido ambos trans-feridos para um hospital de adultos da área.

DiscussãoDiscussãoDiscussãoDiscussãoDiscussãoA deterioração da função respiratória emcrianças com doença neuromusculardegenerativa é a principal responsável pelaalta mortalidade associada a estas doenças.A diminuição da capacidade pulmonar totale da capacidade vital (CV) estão claramenterelacionados com o grau de atingimento

significant drop in the number of respira-tory infections, less admittance to hospi-tal and less need for mechanical ventila-tion (Table III). In addition, these childrenexperienced an improvement in the com-plaints associated with chronic hypoventi-lation, such as sleep disturbances, nightsweats and morning headaches. Of the 3patients which did not undergo ventila-tion, 2 were transferred to another hospi-tal centre as they were no longer of paedi-atric age.Of the 4 SMA type II patients, 2 are on homenight ventilation. They began NIV follow-ing pneumonia, one at the age of 2 yearsand 9 months and the other at the age of20. They have been on ventilation for 4 and3 years respectively. After beginning ventila-tion they had a significant drop in the numberof respiratory infections and they did notneed to be admitted to hospital again (Ta-ble III). The older patient is enrolled infurther education and is doing well. Theother two patients, who were not on ven-tilation, are young adults of 20 an 26 yearswith no clinical respiratory picture andhave both been transferred into a localhospital for adults.

DiscussionThe deterioration of respiratory function inchildren with degenerative neuromusculardisease is the main cause of the high mor-tality rate associated with these diseases. Thediminishing of the total lung capacity andthe vital capacity (VC) are clearly related tothe degree of muscular growth in that theVC diminishes as the disease evolves.1

Several factors contribute to increasing thenumber of respiratory problems these chil-dren suffer from1-3: a) muscular weakness,

A deterioração dafunção respiratóriaem crianças comdoençaneuromusculardegenerativa é aprincipal responsávelpela alta mortalidadeassociada a estasdoenças

A CV diminui àmedida que a doençaevolui

Page 8: Atrofia muscular espinhal – Apoio ventilatório não ... · A atrofia espinhal anterior (AEA) é uma doença neuromuscular degenerativa, transmitida de forma autossómica recessiva

R E V I S T A P O R T U G U E S A D E P N E U M O L O G I A

Vol XI N.º 5 Setembro/Outubro 2005

450

Atrofia Muscular Espinhal – Apoio Ventilatório Não Invasivo em PediatriaMónica Vasconcelos, Isabel Fineza, Miguel Félix, Maria Helena Estêvão

muscular, de forma que a CV diminui àmedida que a doença evolui1. São váriosos factores que contribuem para umaumento dos problemas respiratóriosnestas crianças1-3: a) fraqueza muscular,nomeadamente dos intercostais que sãoafectados precocemente, levando a umaconformação do tórax «em sino» e a respi-ração paradoxal; b) deformidade torácica,secundária a cifoescoliose grave, comdiminuição da compliance pulmonar; c) tosseineficaz, também por fraqueza muscular,com uma clearance inadequada das vias aéreas;d) ausência de respirações profundas espon-tâneas que normalmente reinsuflam zonasatelectásicas; e) distúrbios do sono, secun-dários a hipoventilação alveolar e predispo-sição a obstrução das vias aéreas superiores.A VNI por pressão positiva tem sido usadacom sucesso no suporte respiratório depacientes com complicações agudas ecrónicas de doenças neuromusculares. É umaopção segura, bem tolerada, facilita odesenvolvimento da criança e não interferecom a vocalização e aprendizagem, proble-mas inerentes à traqueostomia. Ajuda asuprimir os sintomas de hipoventilação al-veolar crónica (acordares múltiplos, sudoresenocturna, cefaleias matinais, sonolênciadiurna), facilita a extubação, pode prevenira entubação em caso de insuficiênciarespiratória, melhora a qualidade de vida eaumenta a sobrevida. Pequenas compli-cações podem ocorrer, como a secura dasmucosas, úlcera do dorso do nariz ou dafronte, conjuntivite, depressão do maciçocentral da face, todas associadas ao usoprolongado da máscara nasal4.Para o sucesso da VNI é fundamental umsuporte familiar adequado que garantatodos os cuidados no domicílio. O presta-

specifically in the intercostals muscleswhich are affected early on leading to the‘bell shaped’ distortion of the thorax andparadoxical respiration; b) thoracic de-formity, secondary to serious scoliosiswith loss of lung compliance; c) drycough, accompanied by muscular weak-ness, with inadequate clearance of the airways; d) lack of the spontaneous deep res-piration which normally reinflatesatelectasy; e) sleep disturbance, secondaryto alveolar hypoventilation and predis-position to obstruction of the upper airways.NIV by positive pressure has been used suc-cessfully as respiratory support in patientswith acute and chronic complications ofneuromuscular diseases. It is a safe optionthat is well tolerated and that promotes thechild’s development and that doesn’t inter-fere with speech and learning, problems in-herent in a traqueostomy. It helps to sup-press the symptoms of chronic alveolarhypoventilation (frequent wakings, nightsweats, morning headaches, day time sleepi-ness), it eases the process of extubation, itcan prevent intubation in the case of respi-ratory insufficiency, improving the quality oflife and increasing survival. Minor compli-cations may occur, such as dry mucous, dor-sal and front nasal ulcers, conjunctivitis, de-pression of the central mass of the face –all associated with the prolonged use of thenasal mask.4.In order for NIV to be successful, familysupport sufficient to guarantee total homecare is fundamental. The child’s care providershould be familiar with the use of the manualinsufflator in case of sudden desaturation,with secretion aspiration, with readjusting thenasal mask and in the repositioning of the

A VNI por pressãopositiva tem sidousada com sucessono suporterespiratório depacientes comcomplicaçõesagudas e crónicas dedoençasneuromusculares

Para o sucesso daVNI é fundamentalum suporte familiaradequado

Page 9: Atrofia muscular espinhal – Apoio ventilatório não ... · A atrofia espinhal anterior (AEA) é uma doença neuromuscular degenerativa, transmitida de forma autossómica recessiva

R E V I S T A P O R T U G U E S A D E P N E U M O L O G I A

Vol XI N.º 5 Setembro/Outubro 2005

451

Atrofia Muscular Espinhal – Apoio Ventilatório Não Invasivo em PediatriaMónica Vasconcelos, Isabel Fineza, Miguel Félix, Maria Helena Estêvão

dor de cuidados da criança deve estar fami-liarizado com a utilização do insufladormanual em caso de dessaturações súbitas,na aspiração de secreções, no reajuste damáscara nasal e no reposicionamento dacriança, de forma a facilitar a ventilação ea eliminação das secreções das vias aéreas5.No HPC, o programa de VNI foi iniciadoem 17 crianças com o diagnóstico de AEA.Nas crianças com AEA tipo II e III,verificou-se um menor número de infecçõesrespiratórias, de internamentos hospitalarese do recurso à ventilação mecânica invasivaapós iniciarem a ventilação. A possibilidadede ser efectuada no domicílio vai, também,favorecer o crescimento e desenvolvi-mento destas crianças, permitindo umamelhor reinserção social e familiar. Po-demos, assim, estimar que, neste grupo decrianças, a VNI contribuiu para melhorara sua qualidade de vida e a da sua família.Em 3 crianças com AEA tipo II a decisãode iniciar ventilação foi tomada de formaelectiva. A multiplicação alveolar é muitoimportante nos primeiros anos de vida e osmovimentos torácicos têm um papel signifi-cativo neste crescimento. Assim sendo, aventilação artificial iniciada precocemente emcrianças com paralisia dos músculos respi-ratórios, vai permitir o desenvolvimento dacaixa torácica e o crescimento pulmonar6

e vai aumentar a capacidade vital, atravésda expansão passiva dos pulmões e do re-pouso dos músculos respiratórios, quandoo suporte ventilatório é instituído à noite7.Em todas as crianças que iniciaram venti-lação de forma profiláctica se verificou umadiminuição importante da deformidadetorácica, embora não haja dados objectivosque permitam quantificar esta observação.Bach et al5 também verificou um desapare-

child so as to facilitate the ventilation andthe elimination of the secretions from theair ways.5.At the PHC, NIV was started in 17 childrendiagnosed with SMA. Children with SMAtype II and III had fewer respiratory infec-tions, admissions to hospital and recourseto invasive mechanical ventilation after be-ginning ventilation. The possibility of car-rying out ventilation at home was anotherfactor contributing to the growth and de-velopment of these children, allowing bet-ter social and familiar integration. In thisway we can estimate that in this group ofchildren NIV contributes to improving thequality of life of the patient and its family.In the 3 children with SMA type II thedecision to start ventilation was takenelectively. Alveolar multiplication is veryimportant in the first years of life and tho-racic movements play an important partin this growth. This being the case, artifi-cial ventilation started early in childrenwith paralysis of the respiratory musclesencourages the development of the tho-racic cage and pulmonary growth6 and in-creases vital capacity through passive ex-pansion of the lungs and through reposeof the respiratory muscles when ventila-tory support is used at night7. In all thechildren who begin prophylactic ventila-tion an important diminishing in thoracicdeformity is seen, although there are noobjective data which allows for this ob-servation to be quantified. Bach et al5 havealso seen a disappearance in pectus escavatumafter beginning nasal ventilation in chil-dren with this pathology.In SMA type I, the severity of the muscularweakness and the bulbar dysfunction makesthe decision to start NIV a controversial one.

A possibilidade deser efectuada nodomicílio vai,também, favorecer ocrescimento edesenvolvimentodestas crianças

Em todas as criançasque iniciaramventilação de formaprofilácticaverificou-se umadiminuiçãoimportante dadeformidade torácica

Page 10: Atrofia muscular espinhal – Apoio ventilatório não ... · A atrofia espinhal anterior (AEA) é uma doença neuromuscular degenerativa, transmitida de forma autossómica recessiva

R E V I S T A P O R T U G U E S A D E P N E U M O L O G I A

Vol XI N.º 5 Setembro/Outubro 2005

452

Atrofia Muscular Espinhal – Apoio Ventilatório Não Invasivo em PediatriaMónica Vasconcelos, Isabel Fineza, Miguel Félix, Maria Helena Estêvão

cimento do pectus escavatum após instituiçãoda ventilação nasal em crianças com estapatologia.Na AEA tipo I, a gravidade da fraquezamuscular e da disfunção bulbar tornam adecisão de iniciar VNI um motivo decontrovérsia. No grupo estudado, as duascrianças ventiladas têm, actualmente, 22meses e 6,5 anos. Existem opiniões muitodivergentes acerca da tentativa de prolon-gar a vida destas crianças através de suporteventilatório. De facto, é muito difícil defi-nir o grau de incapacidade intelectual oumotor a partir do qual se considera inacei-tável a qualidade de vida de uma criançadoente. Além dos conflitos éticos inerentesa esta questão, também se levantam pro-blemas de ordem económica e social, umavez que a ventilação vai exigir a prestaçãode cuidados importantes por parte dafamília8.A classificação dos diferentes tipos de AEAbaseia-se em critérios clínicos, nãoexistindo nenhum determinante genéticoque determine o prognóstico mais oumenos grave da doença. Não há, portanto,limites precisos entre os diferentes tiposde AEA e existem formas intermediárias.Na AEA tipo I existem, pelo menos, doissubtipos de prognóstico6: a) a forma maisgrave, que se inicia no período pré-natalou nos primeiros três meses de vida, deprogressão muito rápida; b) a forma menosgrave, com idade de instalação entre os trêse os seis meses, em que o suporte ventila-tório e as medidas ortopédicas permitemuma sobrevida mais prolongada. Conse-quentemente, como a progressão da doençaé diferente para cada doente, as medidasde intervenção terapêutica têm de serindividualizadas de acordo com as

In the study group, the two children onventilation are currently aged 22 monthsand 6.5 years old. There are very diver-gent opinions about trying to prolong thelife of these children through ventilatorysupport. In fact it is very difficult to de-fine the degree of intellectual and motorincapacity, the factor that leads to judg-ing if the quality of life of an ill child isacceptable or not. In addition to the ethi-cal considerations inherent in this matter,there are also factors of an economic andsocial nature, in that ventilation demandsthat the whole family must be involvedin the care giving8.The classification of different SMA types isbased on clinical criteria. There is no geneticdeterminant which leads towards a better orworse prognosis of the disease. In effect,there are no precise limits between the dif-ferent types of SMA and intermediate formsalso exist. There are at least two subtypes ofprognosis in SMA type I6: a) a more severeform, which begins in the pre-natal periodor in the first three months of life and has avery rapid progression; b) a less severe form,which presents at between three and sixmonths, and in which ventilatory supportand orthopaedic measures allow for a greatersurvival. In consequence, seeing as the pro-gression of the disease is different for eachpatient, therapeutic intervention measureshave to be individualised in accordance withthe needs of each patient. In a recent study9

which compared the practice of differenthealth professionals in the treatment ofrespiratory insufficiency in children with SMAtype I, there was a great heterogeneity ofrecommended therapeutic options andones which have been offered to these chil-dren. Some authors5 believe that a

É muito difícil definiro grau deincapacidadeintelectual ou motora partir do qual seconsidera inaceitávela qualidade de vidade uma criançadoente

A classificação dosdiferentes tipos deAEA baseia-se emcritérios clínicos

A progressão dadoença é diferentepara cada doente

Page 11: Atrofia muscular espinhal – Apoio ventilatório não ... · A atrofia espinhal anterior (AEA) é uma doença neuromuscular degenerativa, transmitida de forma autossómica recessiva

R E V I S T A P O R T U G U E S A D E P N E U M O L O G I A

Vol XI N.º 5 Setembro/Outubro 2005

453

Atrofia Muscular Espinhal – Apoio Ventilatório Não Invasivo em PediatriaMónica Vasconcelos, Isabel Fineza, Miguel Félix, Maria Helena Estêvão

necessidades de cada um. Num estudorecente9, que comparou a prática de dife-rentes profissionais de saúde no trata-mento da insuficiência respiratória emcrianças com AEA tipo I, verificou-se umagrande heterogeneidade nas opções tera-pêuticas recomendadas e nas que são,efectivamente, oferecidas a estas crianças.Alguns autores5 acreditam que a traqueos-tomia pode ser evitada através do uso deVNI, com prolongamento da sobrevida emelhoria da qualidade de vida dos doentes.Num trabalho10 em que foi avaliado o usoda ventilação por pressão positiva nãoinvasiva e da gastrostomia em quatrocrianças com AEA tipo I, os resultadosforam decepcionantes; no entanto, os seusautores continuam a defender a mesmaorientação por uma melhor qualidade devida, apesar do mau prognóstico destadoença.O conceito de qualidade de vida é muitodifícil de definir em pediatria e, muitas vezes,não há concordância entre médicos, pais ecrianças8. A maioria dos estudos7 que avaliama qualidade de vida de crianças com venti-lação assistida referem-se a crianças porta-doras de traqueostomia, sendo escassa ainformação relacionada com a VNI. Emgeral, os médicos têm tendência a subestimaro grau de satisfação dos seus doentes com avida. Deve haver uma interacção dinâmicaentre o médico e a família que incluaconsiderações sobre a opção de cuidadospaliativos, discussão sobre os vários modosde ventilação assistida e exploração dosvalores e expectativas da família. Cada criançacom AEA tipo I é única na sua doença,nos ideais, recursos e expectativas da suafamília11. A VNI pode melhorar a qualidadede vida destas crianças e diminuir a

traqueostomy can be avoided through theuse of NIV, prolonging the survival andimproving the quality of life of the patients.The results of a study10 which studied theuse of non-invasive positive pressure ven-tilation and gastrostomy in 4 children withSMA type I were disappointing. Its au-thors, however, continue to defend thesame guidelines for a better quality of lifedespite the poor prognosis of this disease.The concept of quality of life is very dif-ficult to define in paediatrics and manytimes there is no agreement between doc-tors, parents and children8. The majorityof studies7 which evaluate the quality oflife of children on assisted ventilation cen-tre on children who have undergone tra-queostomies, and there is a scarcity of in-formation on NIV. In general, doctorshave tended to underestimate the degreeof satisfaction with their lives these pa-tients have. There has to be a dynamicinteraction between the doctor and thefamily which includes considerationsabout the option of palliative cures anddiscussion about the various models of as-sisted ventilation in addition to an explo-ration of the family’s values and expecta-tions. Each child with SMA type I isunique in its disease, and in its family’sideals, resources and expectations.11 NIVcan improve the quality of life of thesechildren and diminish the family’s feelingof powerlessness in the face of the disease.

ConclusionsConclusionsConclusionsConclusionsConclusionsPositive pressure NIV can improve thequality of life and prolong the survival ofchildren with SMA, with repercussions atthe level of their growth and develop-ment. The use of ventilatory support in

O conceito dequalidade de vida émuito difícil dedefinir em pediatria

Os médicos têmtendência asubestimar o grau desatisfação dos seusdoentes com a vida

A VNI pode melhorara qualidade de vidadestas crianças ediminuir a sensaçãode impotência dosfamiliares perante adoença

Page 12: Atrofia muscular espinhal – Apoio ventilatório não ... · A atrofia espinhal anterior (AEA) é uma doença neuromuscular degenerativa, transmitida de forma autossómica recessiva

R E V I S T A P O R T U G U E S A D E P N E U M O L O G I A

Vol XI N.º 5 Setembro/Outubro 2005

454

Atrofia Muscular Espinhal – Apoio Ventilatório Não Invasivo em PediatriaMónica Vasconcelos, Isabel Fineza, Miguel Félix, Maria Helena Estêvão

sensação de impotência dos familiaresperante a doença.

ConclusõesA VNI com pressão positiva podemelhorar a qualidade de vida e prolongara sobrevida das crianças com AEA, comrepercussão a nível do seu crescimento edesenvolvimento. No entanto, o uso desuporte ventilatório em crianças com umadoença rapidamente progressiva, como aAEA tipo I, é ainda controverso. Alémdas questões éticas que envolvem oprolongamento da vida de pacientes comuma doença degenerativa progressiva, aqualidade de vida possível de atingir, apósintervenção médica, tem de ser bemdelineada.

Bibliografia/Bibliografia/Bibliografia/Bibliografia/Bibliografia/BibliographyBibliographyBibliographyBibliographyBibliography1.Gozal D. Pulmonary manifestations of neuromuscu-lar disease with special reference to Duchenne musculardistrophy and spinal muscular atrophy. PediatrPulmonol 2000; 29: 141-50.2. Barois A, Estournet-Mathiaud B. Respiratory prob-lems in spinal muscular atrophies. Pediatr Pulmonol1997; Suppl 16: 140-1.3. Seddon PC, Khan Y. Respiratory problems in childrenwith neurological impairment. Arch Dis Child 2003;88: 75-8.4. Estevão MH. Ventilação não invasiva no domicílio empediatria. Acta Pediatr Port 2000; 2(31): 135-141.5.Bach JR, Niranjan V, Weaver B. Spinal muscular atro-phy type 1 – a noninvasive respiratory management ap-proach. Chest 2000; 117: 1100-56. Barois A, Estournet-Mathiaud B. Ventilatory supportat home in children with spinal muscular atrophies.Eur Respir Rev 1992; 2(10): 319-22.7. Gilgoff IS, Kahlstrom E, Eithne MacLaughlin, KeensTG. Long-term ventilatory support in spinal muscu-lar atrophy. J Pediatr 1989; 115:904-9.8. Cambra FJ, Estevão MH, Nuñez AR. Aspectos éticosde la ventilación no invasiva. En: Medina A, Pons M,Esquinas A (eds). Ventilación no invasiva en Pediatria.

children with a rapidly progression di-sease, such as SMA type I, is, however,still controversial. In addition to the ethi-cal questions involved in prolonging thelives of patients with a progressive dege-nerative disease, the quality of life it is pos-sible to attain after medical interventionhas to be clearly defined.

A VNI com pressãopositiva podemelhorar a qualidadede vida e prolongar asobrevida dascrianças com AEA

Page 13: Atrofia muscular espinhal – Apoio ventilatório não ... · A atrofia espinhal anterior (AEA) é uma doença neuromuscular degenerativa, transmitida de forma autossómica recessiva

R E V I S T A P O R T U G U E S A D E P N E U M O L O G I A

Vol XI N.º 5 Setembro/Outubro 2005

455

Atrofia Muscular Espinhal – Apoio Ventilatório Não Invasivo em PediatriaMónica Vasconcelos, Isabel Fineza, Miguel Félix, Maria Helena Estêvão

Madrid: Ergon 2004; 143-148.9. Hardart MKM, Burns JP, Truog RD. Respiratory sup-port in spinal muscular atrophy type I: a survey of phy-sician practices and attitudes. Pediatrics 2002; 110 (2).10. Birnkrant DJ, Pope JF, Martin JE, Repucci AH,

Eibem RM. Treatment of type I spinal muscularatrophy with noninvasive ventilation and gastros-tomy feeding. Pediatr Neurol 1998; 18: 407-1011. Hardart MKM, Truog RD. Spinal muscular atro-phy-type I. Arch Dis Child 2003; 88: 848-50.