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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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CIDADANIA E

INTERCULTURALISMO

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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IMES Instituto Mantenedor de Ensino Superior Metropolitano S/C Ltda.

William Oliveira Presidente

MATERIAL DIDÁTICO

Produção Acadêmica Produção Técnica Adroaldo Belens | Autor Márcio Magno Ribeiro de Melo | Revisão de Texto

Equipe Ana Carolina Paschoal, Andrei Bittencourt, Augusto Sansão, Aurélio Corujeira, Fernando Fonseca,

João Jacomel, João Paulo Neto, José Cupertino, Júlia Centurião, Lorena Porto Seróes, Luís Alberto Bacelar, Paulo Vinicius Figueiredo e Roberto Ribeiro.

Imagens Corbis/Image100/Imagemsource

© 2009 by IMES Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra poderá ser reproduzida

ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer meio, eletrônico ou mecânico, tampouco poderá ser utilizado qualquer tipo de sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem a prévia autorização, por escrito, do

Instituto Mantenedor de Ensino Superior da Bahia S/C Ltda.

2009 Direitos exclusivos cedidos ao Instituto Mantenedor de Ensino Superior da Bahia S/C Ltda.

www.ftc.br

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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SUMÁRIO

1 BLOCO 1 - CICADANIA ................................................................................................................................ 5

1.1 Tema 01 - A Cidadania e os direitos humanos ................................................................................. 5

1.1.1 A Cidadania: conceito e histórico ......................................................................................... 5

1.1.2 Direitos Humanos e Justiça Social ..................................................................................... 10

1.1.3 A Inclusão e Exclusão Social no Contexto Urbano ............................................................ 18

1.1.4 Movimentos Sociais e o Exercício da Cidadania ............................................................... 22

1.2 Tema 02 - A Cidadania no Mundo Contemporâneo ........................................................................ 29

1.2.1 A Globalização, o Estado e o Terceiro Setor ..................................................................... 29

1.2.2 Mundo Contemporâneo 1: a cidadania e as emoções. ...................................................... 42

1.2.3 Mundo Contemporâneo 2: A Cidadania e a Indústria Cultural .......................................... 45

2 BLOCO 2 – A INTERCULTURALIDADE .................................................................................................... 51

2.1 Tema 03 - A Formação Cultural do Brasil ....................................................................................... 51

2.1.1 O Conceito Sócio-Antropológico de Cultura e Identidade .................................................. 51

2.1.2 Cultura Brasileira: a multiplicidade de influência ................................................................ 58

2.1.3 Interculturalidade: Raça e Etnicidade um conceito híbrido no Brasil e as raízes das

“ciências racialista”. ............................................................................................................ 61

2.1.4 Pluralidade religiosa: um diálogo permanente com o “outro” e a educação intercultural. .. 68

2.2 Tema 04 – A virtualidade e a Urbanidade ....................................................................................... 75

2.2.1 A Sociedade da Informação: a sociedade virtual ............................................................... 75

2.2.2 As Mídias Digitais: Das Comunidades Virtuais Aos Games. ............................................ 81

2.2.3 Construindo Comunidades Virtuais De Aprendizagem ...................................................... 89

2.2.4 Tribos Urbanas 1: Os Estilos Em Jogo. ............................................................................. 90

REFERÊNCIAS ...................................................................................................................................................... 94

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1 BLOCO 1 - CICADANIA

1.1 TEMA 01 - A CIDADANIA E OS DIREITOS HUMANOS

1.1.1 CONTEÚDO 1 - A CIDADANIA: CONCEITO E HISTÓRICO

Pela primeira vez na história da humanidade podemos exigir condições mais dignas de so-

brevivência. Os organismos nacionais e internacionais pressionam os países por políticas públicas

de inclusão social.

Ainda hoje, a discussão sobre cidadania tem muita importância, como no passado (a.C e

d.C), muitas mudanças ocorreram, tratando-se da vida dos despossuídos de renda e riqueza no

Brasil e em todo o mundo.

Cidadania é um termo associado à vida em sociedade. Sua origem está ligada ao desenvol-

vimento das polis gregas, entre os séculos VIII e VII a.C. Todavia, para estudarmos cidadania pre-

cisamos contextualizar as mudanças nas estruturas socioeconômicas nas quais incidiram, igual-

mente, na evolução do conceito e da prática da cidadania conforme as necessidades de cada época.

O tempo não é somente um relógio que marca as horas, mas também é como a nossa mente,

percebe as coisas na sociedade em que vivemos.

Façamos uma viagem de volta a Idade Média. Se num verão do litoral europeu, na Idade

Média, homens e mulheres aparecessem na praia de sunga e biquínis, com óculos, como nos dias

atuais, tudo isso não seria estranho às pessoas da época? Pense o inverso. Se uma pessoa da Idade

Média estivesse aqui no nosso tempo, talvez fosse mais fácil vê-la como um ator ou uma atriz que

representava um esquete teatral.

Então, o que as pessoas pensam sobre cidadania também muda conforme o tempo. Nos dias

de hoje, vemos a cidadania como uma condição de igualdade civil e política, para tanto, destaca-

remos alguns processos históricos e algumas alterações que ajudam no entendimento da evolução

do conceito. Para o especialista em cidadania, J. Barbalet (1989), o século XVIII legou ao mundo

novas visões sobre a economia, a sociedade e a política. A partir daí, alargaram-se a visão sobre a

esfera pública e ampliaram-se, conseqüentemente, os direitos dos cidadãos nos seus aspectos civis,

políticos e sociais.

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A conquista desses direitos provocou, ao mesmo tempo, uma contrapartida conservadora

das elites que procuraram conter as lutas travadas por direitos legítimos. Vamos pensar o exemplo

da luta do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) pela reforma agrária. Pensar

nos gays e nas mulheres que buscam seu espaço na sociedade. Em outras palavras, do mesmo mo-

do que as classes populares lutam pela garantia dos seus direitos, as elites dominantes reagem pa-

ra que as mudanças deixem de acontecer. Por isso, eles são chamados de conservadores.

No entanto, entra aí mais um ingrediente no nosso estudo: os antagonismos de interesses e

de classes sociais, que mostram que o conceito de cidadania se relaciona a uma dialética entre o

social e o político.

Mas dialética, entre o social e o político, que é isso afinal?

Dialética, para os filósofos gregos significava diálogos, ou melhor, tensão de

pontos de vista entre duas pessoas que debatiam um mesmo tema. Mas para

o filósofo Karl Marx, as classes sociais estavam em constante luta e a con-

quista do poder pelos operários acabaria com a exploração do homem pelo

homem. Por quê? Porque as riquezas seriam distribuídas para todos da so-

ciedade e não apenas para poucos.

No entanto, a noção desses conceitos é primordial para a compreensão

do debate atual sobre a cidadania. Essa importância é reforçada pelas con-

seqüências provocadas pela Segunda Guerra Mundial, que motivou também a discussão a cerca

do tema cidadania, sem esbarrar na questão dos direitos humanos.

O significado clássico de cidadania associava-se à participação política. O próprio adjetivo

‘político’, por sua vez, já nos remete a idéia de Polis (Cidade-Estado Antiga). Polis é uma organiza-

ção político-administrativa, com a qual uma elite exercia o poder sobre os menos favorecidos (os

não cidadãos) na Grécia Antiga.

A urbanização muito contribuiu para a evolução dessas Polis. Foi nesse tipo de organização

urbana que se assentaram as bases do conceito tradicional de cidadania, que ainda hoje tem uma

considerável influência na nossa sociedade.

Foi assim também na sociedade grega e romana, as transformações nos campos da técnica,

da economia e da arte bélica, alteraram potencialmente as relações entre o poder e a sociedade. Na

realidade grega, por exemplo, era o regime aristocrático que imperava. Com esse modo de fazer

política, a cidadania confundia-se com o conceito de naturalidade, ou seja, o lugar onde cada indi-

víduo nascia.

Considerava-se cidadão aquele nascido em terras gregas, o qual poderia usufruir de todos os

direitos políticos. Ao passo que, os estrangeiros eram proibidos de se ocuparem da política, dedi-

cando-se somente às atividades mercantis.

Com o passar do tempo, operou-se uma redistribuição do poder político. Aceitou-se o in-

gresso de estrangeiros na categoria de cidadão, abolindo-se a escravidão por dívidas.

Nesse contexto, a aristocracia cedeu espaço a favor das Assembléias e dos Conselhos, com

participação popular. Alguma mudança ocorreu, ainda que os fatores de ordem social e política

continuassem associando o termo cidadania ao exercício da participação política.

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Se assim era concebido, pouco as classes populares podiam influenciar as formas de poder

na sociedade. Mesmo com esse pleno direito assegurado e a existência de um regime democrático,

a cidadania aparecia de forma tímida, principalmente no que se refere às decisões políticas.

Segundo a Filósofa Hana Arendt, muitos cidadãos, cercados por

restrições econômicas e valores ligados à família, permaneciam comple-

tamente alienados e tolhidos na expressão de atos políticos. A cidadania

significava, portanto, um status que oferecia ao cidadão várias possibili-

dades, indo além das destinadas ao indivíduo comum.

Na Roma Antiga a situação não era diferente. Sociedade escravista, baseada nas “gens” (famí-

lias), era dominada pelos patrícios, os quais detinham a cidadania e os direitos políticos.

Um poder assentado na tradição mítico-religiosa de origem romana reservava aos patrícios o mo-

nopólio da comunicação com os deuses. Ao contrário da plebe, constituída de romanos não nobres

e de estrangeiros, não tinha qualquer tipo de direito. Este quadro alterou-se aos poucos, possibili-

tando o acesso à cidadania a todos os romanos de nascimento, mesmo que fossem escravos libertos.

Contudo, uma manobra da Aristocracia para preservar o controle político restringiu, nova-

mente, o acesso à cidadania. Apenas as mais altas magistraturas, entre elas o Senado e o Patriciado,

poderiam usufruir dos privilégios dessa posição.

À plebe, reservava-se apenas o direito à representação. Mesmo assim, esse direito só foi con-

seguido após conflitos políticos que se estenderam até o século III a.C. com a criação de instituições

propriamente plebéias, como o Tribunato e a Assembléia da Plebe.

O conceito de cidadania na realidade greco-romana revestia-se de uma discrepância entre

Democracia real e ideal. Defendia-se, portanto, uma igualdade de direitos políticos que, de fato,

não era praticada.

Com o passar dos tempos, entretanto, o conceito de cidadania passou a se referir a outras es-

feras que não apenas à política. Assim, para entender seu significado, somos obrigados a atentar

para os direitos civis e sociais, situando a cidadania também na esfera jurídica e moral.

AS ESTRUTURAS POLÍTICAS NA IDADE MÉDIA E A CIDADANIA

No século V cai o Império Romano e a Europa vive uma nova fase: A Idade Média. Notamos

uma perda no significado de cidadania, tal como herdado da Antiguidade.

Na Idade Média, muitas transformações e adaptações a uma nova realidade organizacional

da sociedade ocorreram baseadas em ideais de fidelidade. Por isso, a participação política tornou-

se um assunto secundário.

As constantes invasões fizeram da Europa um território no qual contrastavam instituições e

costumes provenientes dos mundos bárbaro e romano, dando surgimento a um tipo peculiar de

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organização social: nobreza, clero e camponeses, cujos reflexos foram sentidos até os finais da Ida-

de Moderna.

Além disso, devemos considerar o quadro de dependência, herdado das organizações bárba-

ras. Os camponeses subordinavam-se à nobreza, responsável pela redenção de todos.

Todavia, o julgamento dos direitos estava condicionado à distinção social e ao status. Somen-

te os estamentos superiores podiam ser julgados por semelhante. Observe você, como ainda falta-

va uma visão igualitária, assim como ainda acontece hoje. Mas o mesmo não ocorria entre os “i-

guais” das camadas menos favorecidas da sociedade.

No entanto, Clero e Nobreza detinham, respectivamente, saber e poder e, conseqüentemente,

os direitos advindos do termo cidadania. Enquanto isso, os servos permaneciam alheios aos privi-

légios dos “cidadãos”, não podiam acessar o poder público sem a mediação de outro estamento

detentor de maior poder.

No contexto do renascimento urbano e da formação dos Estados Nacionais, este quadro co-

meça a se reverter. Esta fase, conhecida como Baixa Idade Média foi a responsável pelo ressurgi-

mento da ideia de um Estado centralizado e, por conseqüência, da noção clássica de cidadania,

ligada à concessão de direitos políticos.

O processo de formação dos Estados Nacionais conheceu paralelamente às mudanças nos

quadros sociopolíticos, a consolidação da burguesia capitalista como classe atuante, no campo po-

lítico econômico.

O dinamismo do nascente capitalismo provocou uma nova relação entre política, economia e

sociedade. Tudo isso, favoreceu ao fortalecimento de uma burguesia mercantil, que aspirava os

mesmos direitos, destinados aos estamentos privilegiados.

Com o desenvolvimento dos princípios teóricos, se instauraram tanto o Absolutismo Monár-

quico, quanto a Moderna noção de Cidadania.

No contexto medieval, a noção de direitos políticos e cidadania tornou-se frágil demais se

comparada às necessidades materiais e espirituais impostas pela ruralização da economia, e pela

cristianização da sociedade. A crescente urbanização, por outro lado, registrou profundas altera-

ções sociais, fato que promoveu a reformulação do antigo conceito de cidadania e com isso, foi

retomado o ideal de igualdade entre os cidadãos no período iluminista.

Mesmo com a centralização promovida pelo absolutismo monárquico, por um longo tempo,

manteve-se o caráter hereditário do poder e as características estamentais da Idade Média. Esse foi

um período de transição de muitas transformações.

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Revoluções sociais, transformações

políticas e econômicas, criações artísticas,

desenvolvimento das ciências, dissemina-

ção do conhecimento, busca da liberdade

de pensamento e da igualdade entre os

indivíduos, além do nascimento do ideal

de liberdade. Tudo isso representou o Pe-

ríodo Iluminista.

Dessa forma, uma elite pensante

passou a formular ideias contestatórias

contra os valores e as injustiças praticadas

pelo clero e pela nobreza que de certo

modo fortaleceu a burguesia.

Tudo isso, coincidia com a luta da

burguesia para ampliar o seu poder que, apesar de sua proeminência econômica e do apoio rece-

bido do Mercantilismo, politicamente, ainda era uma camada sem muita expressão na sociedade.

A partir dessas mudanças, a exigência por uma sociedade mais justa era inevitável. Essas i-

deias ganharam corpo por dois fatores: o desenvolvimento do Capitalismo e as reformas religiosas

do século XV. Disso, surgiram novas visões sobre a espiritualidade, a qual valorizava o trabalho.

E qual era a base dessa contestação? A necessidade de maior autonomia de pensamento aos

homens comuns, surgindo como conseqüência as ideias iluministas-liberais, provenientes dos a-

vanços nas ciências experimentais e de uma nova racionalidade, por meio da qual, se procurava

entender o mundo.

Ao mesmo tempo, o ideal de sociedade, daí surgido, fez com que na Europa dos séculos XVII

e XVIII ocorressem as Revoluções Burguesas que ditavam uma democracia fundamentada na ra-

zão contra o direito divino. A intenção era regular as relações de poder que permitissem aos cida-

dãos, liberdade de atuação civil, econômica e política.

Os direitos políticos para o exercício do poder cabiam à burguesia e, ao povo, apenas obede-

cer, sem que os seus interesses fossem reconhecidos pela nova ordem social. As ideias produzidas

pelos iluministas traduziam o pensamento político da época, influenciando tanto os movimentos

de independência na América, quanto as Revoluções Inglesa e Francesa.

A desigualdade social trazia inúmeros prejuízos para a cidadania, restringindo a sua prática.

Simultaneamente à ampliação da esfera da cidadania, as diferenças de classe operavam no sentido

de limitar os atributos políticos dos cidadãos.

Vimos, até aqui, como o conceito de cidadania percorreu mais de dois mil e quinhentos anos

de história, vinculando-se, cada vez mais, às mudanças nas estruturas sociais. Em tão pouco tempo

os avanços nos campos da técnica e da política provocaram na sociedade impactos tão radicais e

influenciaram os direitos e deveres dos cidadãos, sobretudo nos séculos XIX e XX, além desses pro-

gressos transferirem para a esfera da cidadania, muitos, desajustes oriundos do sistema de classes.

O conceito atual de cidadania relacionado às questões sociais ainda herda o processo de for-

mação das democracias modernas. Isso pôde ser observado na Independência dos Estados Unidos

e no processo revolucionário francês, que acabaram por delinear um novo tipo de Estado.

Os ideais de liberdade e de igualdade, embora tivessem uma origem propriamente burgue-

sa, contribuíram para a inclusão de um maior número de indivíduos no contexto político das soci-

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edades. Contudo, a população economicamente menos favorecida, pouco teve os seus direitos so-

ciais garantidos.

Observadas em diversos países ao longo dos séculos XIX e XX, como legado das lutas sociais,

os movimentos reivindicatórios trouxeram à cidadania um conceito que abrange multiplicidades

de interesses: luta pela terra, moradia, casamentos de gays e lésbicas etc.

O cidadão deve atuar em benefício da sociedade, pela garantia dos direitos básicos à vida,

como moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, trabalho, entre outros.

Como conseqüência, cidadania passa a significar o relacionamento entre uma sociedade polí-

tica e seus membros.

Mas, foi apenas com as guerras mundiais e com o temor à extrema vio-

lência dos conflitos promovidos pelos regimes totalitários, que a sociedade

civil e os órgãos internacionais, como a ONU (Organização das Nações Uni-

das), entenderam ser os direitos humanos uma questão de primeira ordem

para o tema da cidadania contemporânea.

Muitas denúncias são feitas contra a violação dos direitos humanos. As garantias constitu-

cionais e os acordos firmados entre as Nações Unidas não foram suficientes para promover as con-

dições necessárias ao exercício de uma cidadania plena, com liberdade, igualdade e garantia de

direitos humanos.

Esta nova consciência sobre as diferenças no interior do status de cidadão acentua os debates

sobre a exclusão social, os direitos humanos e mesmo sobre a atuação política da sociedade civil.

Por outro lado, no atual estágio do Capitalismo, falar em cidadania significa considerar, igualmen-

te, as próprias mudanças ocorridas na sociedade, nos valores e na educação, proporcionados pelas

inovações da realidade científica e tecnológica.

Um quadro evolutivo do conceito de cidadania apontou a existência de profundas desigual-

dades sociais, apesar de o termo evoluir com o passar dos anos. Por outro lado, podemos dizer que

todos esses anos de evolução acabaram por afirmar que a cidadania, de fato, se realizará por meio

de acirrada luta quotidiana por direitos e pela garantia daqueles que já existem.

Torcer por dias melhores vai muito além da compaixão, mas de responsabilidade pelo outro,

pois o sorriso feliz e o direito à vida, devem se estender a todos aqueles que desejarem viver inten-

samente feliz, assim como, o desabrochar das flores na primavera.

1.1.2 CONTEÚDO 2 - DIREITOS HUMANOS E JUSTIÇA SOCIAL

Continuaremos estudando a cidadania, e acredito que a cada aula você somará conhecimen-

tos sobre o tema. Queremos, além de conhecer, também provocar uma transformação no modo de

pensar e agir no mundo, para que a justiça social reine na sociedade.

O fato de o ser humano viver em sociedade, conviver com outros seres humanos, cabe-lhe

pensar e responder à seguinte pergunta: “Como devo agir perante os outros?”. Neste trabalho,

então, estudaremos os direitos humanos e a justiça social, que têm muito a ver com a cidadania. A

Declaração Universal dos Direitos Humanos completou 60 anos e a AI (Anistia Internacional), en-

tidade que acompanha e denuncia atos que violam os direitos fundamentais da pessoa, como, tor-

tura, cárcere privado, violência, direitos políticos. O órgão denuncia que todos esses elementos

ainda não são presentes em muitos países.

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A BBC Brasil publicou uma matéria na internet, em maio de 2008, com a chamada: “Anistia

condena '60 anos de fracasso' em direitos humanos”. Segundo a matéria, a AI pediu aos líderes

mundiais que se desculpassem por seis décadas do que a entidade considera fracasso na defesa

dos direitos humanos.

Com a explosão da bomba atômica em Hiroshima e Nagasaki, lançada pelos Estados Unidos

durante a Segunda Guerra Mundial, que o mundo inteiro refletiu sobre os direitos humanos em

diferentes esferas do conhecimento, ao constatar a barbaridade da guerra que matou quase toda

uma população.

Um movimento de pesquisadores, médicos, psicólogos, políticos, diplomatas, humanistas,

historiadores, juristas, teólogos, ativista ambiental, entre outros, se mobilizaram pela criação da

ONU e pela defesa dos direitos humanos.

Em uma nota à imprensa, em maio de 2008, Irene Khan, secretária-geral da organização, dis-

se que: "Injustiça, desigualdade e impunidade, são as marcas do nosso mundo hoje. Os governos

devem agir agora, para acabar com a distância entre promessa e desempenho".

Não se deve apenas falar em Direitos Humanos, mas garantir sua proteção. Devemos fazer

uma reflexão sobre o que somos, o que desejamos e esperamos, pois somos uma nação com incrí-

veis recursos, mas tantas diferenças sociais.

Primeiramente, a consolidação dos Direitos Humanos deve se dá na órbita interna de um Es-

tado, começando pela conscientização de cada membro da sociedade, especificamente no seio fa-

miliar, para então atingir níveis mundiais de conscientização, por mera conseqüência. A base se

encontra, pura e simplesmente, na educação.

Educar para se alcançar um novo ideal humano, um indivíduo que lute para banir, do seio

social, todo o tipo de violência contra os diversos segmentos da sociedade com a quais interagi-

mos. Alguém que veja nos lavradores, presidiários, homossexuais, negros, crianças, enfim, em seu

semelhante, uma extensão de si próprio.

A justiça e a retidão moral são essenciais ao bem comum. É por isto que o bem comum exige o

desenvolvimento das virtudes na massa dos cidadãos, virtudes que nascem com o sentimento moral

inerente a cada indivíduo e que o desenvolve em conseqüência da própria vida em sociedade.

O povo, que detém o poder sobre o Estado, tem direito à cidadania, ou seja, a possibilidade

do exercício dos direitos civis, de acordo com a lei, sendo um dos fundamentos da Nação, confor-

me expressa a Carta Magna em seu artigo 1°, inciso II.

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A cidadania possui três elementos principais que a caracterizam e é composta pelos direitos:

1. Civis – aqueles direitos necessários à liberdade individual;

2. Os direitos políticos – direito de participar no exercício do poder político como um

membro de um organismo investido de autoridade política ou como um eleitor dos membros

de tal organismo;

3. Os direitos sociais – que se referem a tudo que vai desde o direito a um mínimo de

bem-estar econômico e segurança, ao direito de participar, por completo, na herança social e le-

var a vida de um ser civilizado de acordo com os padrões que prevalecem na sociedade.

A Carta Magna de 1988, diferentemente das Constituições anteriores, começa com o homem,

tendo sido escrita para o homem. É um documento que se espelha nos princípios da Carta Univer-

sal de Direitos Humanos e procura amparar tanto quanto possível, os direitos e garantias do ho-

mem e do cidadão.

Apesar de deter uma Constituição considerada como um dos documentos mais democráticos

do mundo, percebe-se que o Brasil, depois de 500 anos de Descobrimento, carece de cidadania,

num fantástico descompasso em relação à Carta Magna, pois a situação atual dos direitos humanos

em nosso país encontra-se ainda em fase de consolidação. O elenco de exclusões é vasto e o presen-

te estudo não fará justiça a todos, detendo-se nos principais focos de desigualdade social no país.

A herança que recebemos de séculos de escravidão, gerou uma mentalidade de indiferença

em relação à desigualdade, à violência e à impunidade, num sentimento quase que "natural" de

coexistência entre riqueza e pobreza.

A sociedade brasileira acostumou-se ao convívio com a violência e esqueceu-se do próprio

passado de servidão. O trabalho escravo é ainda uma realidade em nosso país, alcançando índices

alarmantes, pois, em diversos estados brasileiros, aproximadamente 95 mil brasileiros vivem ainda

sob o regime de escravidão em pelo menos 300 fazendas no interior, de acordo com dados da OIT

(Organização Internacional do Trabalho).

DEMOCRACIA E ACESSO À RIQUEZA

A ampliação do caráter democrático de uma sociedade depende de uma cultura de respeito e

promoção de condutas guiadas pelos valores pautados nos direitos humanos.

É notória em nossa sociedade, a rejeição sumária à noção da existência de direitos extensivos

a qualquer ser humano, como, por exemplo, o direito a “proteção aos bandidos”, que por sua “fa-

lha moral”, não deveriam ser sujeitos de direitos.

As democracias modernas nascem de forma solidária e mesmo como decorrência da afirma-

ção de direitos (civis, políticos e sociais) capazes de impor, por um lado, controle e limites à ação

do Estado e, por outro, obrigá-lo a promover políticas públicas de efetivação de direitos sociais.

Observe que os direitos humanos se tornaram universais por uma necessidade de combater

as atrocidades nos países e ao mesmo tempo, exigir que os seus governantes se comprometam com

políticas públicas que nos garantam a conquista dos direitos sociais.

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O grau de democracia de uma sociedade se mede pelo

direito de liberdade e de acesso igualitário a bens sociais e

não simplesmente pela presença de mecanismos de represen-

tação política. Não somente deputados, vereadores, senado-

res ou prefeitos, governadores e presidente são responsáveis

pela melhoria de nossa vida, mas também a nossa ação orga-

nizada nos movimentos sociais.

Mas o que isso quer dizer? A democracia não se res-

tringe ao direito de votar, mas ao direito de desfrutar dos

bens necessários à sobrevivência, com qualidade de vida.

Então reflita, você acha justo que as mulheres lutem por mais espaço na sociedade? Que o

MST lute pela distribuição igualitária da terra? Que gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros re-

queiram do Estado políticas publicas que lhes garantam direitos para optarem sexualmente naqui-

lo que mais os convém? Ou que os presos de uma penitenciária exijam instalações de melhor qua-

lidade de sobrevivência? São muitas questões para se pensar...

A Constituição Brasileira, de 1988, lista muitos direitos que temos (civis, sociais e políticos) e

que resumem a obrigação do Estado em nos garantir uma vida digna e participativa. Cidadania é o

direito à vida com tudo que deve vir junto: liberdade, justiça, saúde, trabalho, educação, entre ou-

tras coisas.

No entanto, cabe fazer uma diferenciação entre o que vem a ser indivíduo e cidadão. O indi-

víduo corresponde a um ser humano com as suas características físicas e psíquicas, enquanto cida-

dão é o indivíduo no gozo dos direitos que lhe confere o Estado.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, assinada em 1948 e reafirmada em 1993 por

171 países, é referência básica para os princípios da cidadania. Na verdade, a declaração relaciona

os direitos que os Estados devem pôr em prática e sem os quais nenhum indivíduo chega à condi-

ção de cidadão. Para alcançar esse objetivo da Declaração, os Estados têm que criar mecanismos

legais, leis e regulamentações.

Todavia, nem sempre as leis saem do papel. A Constituição Brasileira determina no seu arti-

go 7, alínea IV, que todos os trabalhadores devem receber um salário mínimo “capaz de atender

suas necessidades vitais básicas e as de sua família, com moradia, alimentação, lazer, higiene.”

Então, dedique-se a observar os invisíveis da cidade, mendigos, trabalhadores informais, os

negros, enfim, aqueles que vivem nos bolsões de miséria ou faça algumas leituras nos jornais, você

consegue ver a Constituição ser cumprida pelas autoridades políticas?

Mas, volto ao mesmo assunto, não basta somente votar, mas tam-

bém atuar como agente político organizado nos movimentos soci-

ais. No entanto, nenhuma reivindicação da sociedade deve ser

entendida como errada, mas como um direito constitucional de

exercer a cidadania.

Quantas experiências de luta influenciaram em mudanças

importantes na sociedade: as ações de Martir Luther King (1929-

1968) nos Estados Unidos; Nelson Mandela, na África do Sul; am-

bos contra a discriminação racial que impossibilitava aos negros, a

cidadania.

Considera-se assim, que a democracia de verdade contribui

de fato para a formação da cidadania. Ainda que no Brasil o grau

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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de cidadania varie de lugar para lugar. E isso por quê? Porque no mundo contemporâneo, o Esta-

do anda de mãos dadas com o poder econômico, e desse modo, privilegia a supremacia de um

grupo (ou classe social) sobre o outro. Pense sobre como a violência no campo, por exemplo, cresce

a cada dia, por conta de interesses de setores do agronegócio e a concentração da terra.

A violência no campo permanece no Brasil porque os interesses econômicos e a propriedade

privada da terra muitas vezes são considerados mais importantes do que a vida e os direitos fun-

damentais da pessoa humana. Ruralistas, latifundiários e empresários do agronegócio, além de

contarem muitas vezes com o apoio do poder judiciário, continuam tomando a iniciativa de “fazer

justiça pelas próprias mãos” para defender suas propriedades e seus interesses, a favor de barrar a

ação dos movimentos sociais do campo.

Somente no ano de 2006 identificou-se que em torno de 20% dos conflitos ocorrem envol-

vendo comunidades tradicionais, principalmente indígenas, quilombolas e ribeirinhas.

Esse é o retrato do mundo e do Brasil ainda hoje, muita injustiça social, fome, desemprego,

criminalidade, por isso nós não queremos apenas comida queremos também diversão e arte.

DECLARAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela ONU, em 1948, foi o primeiro

anúncio do aparecimento de novas concepções, embora ainda sem romper com o tradicional for-

malismo, distanciado da realidade.

A Declaração Universal proclamou a existência de direitos fundamentais e reafirmou a preo-

cupação com a liberdade, lembrando que a igualdade, totalmente esquecida na prática dos direi-

tos, deve ser também preservada.

Embora a Declaração proclamasse que "todos os seres humanos nascem livres e iguais em

dignidade e direitos", isso continuou a ser ignorado no plano concreto das relações sociais.

E os direitos fundamentais permaneceram, em grande parte, como valores abstratos, que to-

dos louvam, mas que poucos praticam. Por esse motivo, a própria ONU aprovou, em 1966, dois

novos documentos, conhecidos como Pactos dos Direitos Humanos: o Pacto dos Direitos Civis e Polí-

ticos e o Pacto dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.

Esses Pactos tornaram bem mais minuciosos quanto à enumeração dos direitos fundamen-

tais. É mais importante, estabeleceram as tarefas que os Estados devem desempenhar para a supe-

ração das injustiças e a proteção da dignidade humana.

Seguindo a orientação dos Pactos de Direitos Humanos e reproduzindo grande parte de seus

dispositivos que teve início um novo modo de se produzir as constituições de cada país.

Segundo o Relatório da Anistia, 60 anos depois de a Declaração Universal dos Direitos

Humanos ter sido adotada pelas Nações Unidas, pessoas ainda são torturadas ou mal tratadas

em pelo menos 81 países, onde são submetidas a julgamentos injustos em pelo menos 54 países

e não têm direito de se manifestar livremente em pelo menos 77.

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O ano de 2007 foi caracterizado pela impotência de governos ocidentais e a ambivalência ou

relutância dos poderes emergentes em combater algumas das piores crises de direitos humanos no

mundo, desde guerras a desigualdades, que deixam milhões para trás. Para a organização, a maior

ameaça ao futuro dos direitos humanos é a ausência de uma visão compartilhada e de uma lide-

rança coletiva.

Que isso quer dizer? Que os diferentes países devem envolver nas suas relações diplomáticas e

econômicas, exigências que os países devem cumprir para manter as suas relações.

Para a secretária-geral da Anistia Internacional, o ano de 2008 representa uma oportunida-

de para que novos líderes e países emergentes no cenário internacional estabeleçam uma nova

direção e rejeitem as políticas e práticas míopes que têm tornado o mundo um lugar mais peri-

goso e mais dividido.

No entanto, os líderes dos países mais poderosos do mundo devem dar exemplos para que es-

se quadro alarmante de violação dos direitos humanos venha a ser melhorado. Entre os países pode-

rosos que cometem essa violação estão a China, os Estados Unidos, a Rússia e a União Européia.

Segundo a Anistia, a China deve cumprir as promessas feitas por conta dos Jogos Olímpicos e

permitir a liberdade de expressão e de imprensa e acabar com o sistema de "reeducação através do

trabalho", que permite a prisão por até quatro anos sem indiciamento, julgamento ou revisão judicial.

No caso dos Estados Unidos, o apelo se refere ao fechamento da prisão de Guantánamo e outros

centros de detenção e à rejeição da tortura. Já a Rússia deveria mostrar mais tolerância à dissidên-

cia política e nenhuma tolerância à impunidade de abusos de direitos humanos na Chechênia.

E a União Européia, segundo a Anistia, deveria investigar a cumplicidade de seus integran-

tes em "entregar" suspeitos de terrorismo e exigir deles os mesmos padrões de direitos humanos

que exige de países fora do bloco.

No Brasil, a violação dos direitos humanos é muito freqüente, é o caso da índia Kuretê Lo-

pes, de 69 anos e pertencente à tribo dos Guarani-Kaiowá, que morreu em janeiro de 2007, atingida

por disparos de um segurança particular contratado por fazendeiros durante uma desocupação

forçada de indígenas no Mato Grosso do Sul.

Desde 2001, tanto a Europa quanto os Estados Unidos, vêm enfraquecendo "princípios fun-

damentais", e o resultado é a "perda de seu prestígio como líderes dos direitos humanos", afirma a

secretária-geral.

Como você pode observar, a imagem de detentores de instituições que condenam os países

em desenvolvimento de muitas vezes desrespeitosos aos direitos humanos, a denuncia da Anistia

que esse é um problema que atinge todas as nações independente do seu desenvolvimento econô-

mico e social, assim como nos foi vendida essa imagem há muitos anos em filmes e propagandas.

A presente Declaração Universal dos Direitos Humanos visa que cada indivíduo e cada órgão da

sociedade que através do ensino e da educação promova o respeito a esses direitos e liberdades, e,

pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, assegure o seu

reconhecimento e a sua observância universais e efetivos, tanto entre os povos dos próprios Esta-

dos-Membros, quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição.

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A violência policial continua sendo um dos pro-

blemas de direitos humanos mais difíceis de resolver no

Brasil. Diante de taxas altíssimas de crimes violentos,

especialmente nos centros urbanos, alguns policiais se

envolvem em práticas abusivas, ao invés de seguirem

políticas legítimas de policiamento.

As condições das prisões são aterradoras. Nas á-

reas rurais, a violência e os conflitos de terra são contí-

nuos, e defensores de direitos humanos sofrem ameaças

e ataques. Apesar de esforços do governo brasileiro

para reparar os abusos contra os direitos humanos, os

responsáveis por esses crimes são raramente punidos.

Segundo estimativas oficiais, a polícia matou 694 pesso-

as nos primeiros seis meses de 2007 no Rio de Janeiro,

em situações descritas como “resistência seguida de

morte” – um terço a mais que no mesmo período de

2006. Os dados incluem 44 pessoas mortas durante uma operação policial de dois meses, que teve

como objetivo desmantelar gangues de traficantes de drogas no Complexo do Alemão, uma das

regiões mais pobres do Rio de Janeiro.

A violência atingiu seu pico no dia 27 de junho de 2007, quando 19 pessoas foram mortas em

alegados confrontos com a polícia. Segundo residentes e organizações não-governamentais locais,

muitas das mortes foram execuções sumárias. Em outubro, pelo menos 12 pessoas foram mortas

durante uma incursão policial na Favela da Coreia, incluindo um garoto de quatro anos de idade.

As condições desumanas, a violência e a superlotação que historicamente caracterizaram as

prisões brasileiras, permanecem entre os problemas mais sérios de direitos humanos no país. De

acordo com o Departamento Penitenciário Nacional, as prisões e cadeias brasileiras tinham sob sua

custódia, 419.551 detentos em junho de 2007, ultrapassando a capacidade do sistema em aproxi-

madamente 200 mil pessoas.

Esses são quadros alarmantes no Brasil, que não devemos deixar sob a responsabilidade do

Estado a sua fiscalização, devemos buscar alternativas de mudanças para que os direitos humanos

possam ser cumpridos pelos governantes no Brasil e em todo mundo.

A justiça no Brasil é somente acessível aos ricos e à classe média alta, enquanto aos pobres, os

seus direitos são violados sem que haja sequer uma denúncia mais ostensiva da imprensa.

DIREITOS HUMANOS NO BRASIL

As causas da injustiça social do Brasil são inúmeras. A nossa herança escravocrata gerou

uma mentalidade de indiferença em relação à desigualdade, à violência e à exclusão e o Brasil a-

costumou-se às injustiças, como se fosse natural a convivência entre tanta desigualdade de alguns

com a riqueza e prazeres de outros.

O Brasil habituou-se a conviver com a violência, com o lado feio da vida: o da exclusão soci-

al. O início se deu com os negros, logo após a libertação, vindo a ser os primeiros excluídos de nos-

sa história recente.

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Os anos 90 têm sido marcados por profundas transformações na economia brasileira, com a o-

corrência de um período de baixas taxas inflacionárias

após décadas de economia turbulenta e instável, sobre-

tudo para os segmentos de menor nível de renda.

Isso refletiu num maior poder aquisitivo dos

brasileiros que por muito tempo não comprava tanto,

com um salário tão baixo e indigno. Ainda que esse

desrespeite os padrões dos princípios universais de

direitos humanos que pregam a dignidade como um

dos valores absolutos do homem.

Após a crise das bolsas de valores na Rússia e

Ásia, o país mergulhou novamente no medo da recessão e da volta da inflação. Não está sendo fácil,

mas uma vez mais o povo está confiante no governo que elegeu e aspira por um amanhã melhor.

Relatórios internacionais sobre a pobreza no Brasil identificaram a existência de 72 milhões

de pobres e miseráveis no país, cuja população chega a 166 milhões, este dado é assustador. Outras

fontes se referem a 42 milhões de pobres (30% da população) e 16 milhões de indigentes (12% da

população). O critério para se medir a pobreza leva em conta o custo das necessidades básicas de

cada indivíduo.

A incidência de pobreza é mais alta no Norte e Nordeste, em relação direta com os padrões

regionais de desenvolvimento econômico. É muito evidente em áreas rurais, entretanto, ocorre

uma grande "urbanização" da pobreza no Brasil de hoje, porque o pobre se concentra nas regiões

mais desenvolvidas.

A precariedade do trabalho, o desemprego e o arrocho salarial colocam, a cada dia, mais pes-

soas nas ruas. Além disso, muitas pessoas passam apressadas por aquelas que dormem ao relento,

ignorando o problema, pois a miséria só incomoda quando ela nos afeta diretamente.

Entre 1977 e 1998, a proporção de indigentes na população brasileira caiu pouco mais de dois

pontos percentuais, de 16,3% para 13,9% e o percentual dos considerados pobres oscilou de 39,6%

para 32,7%.

Um em cada três brasileiros, ou 50 milhões de pessoas, em 1998, estava em situação de po-

breza. E essa pobreza se reflete pela dificuldade destas pessoas de terem acesso real aos bens e ser-

viços mínimos adequados a uma sobrevivência digna. Nisso inclui basicamente as necessidades

físicas elementares, como, alimentação, saúde, educação, entre outros.

O artigo 23 da Declaração Universal dos Direitos Humanos enuncia que:

"Todo homem tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e fa-

voráveis de trabalho e a proteção contra o desemprego."

Os desajustes causados pela exclusão de parte crescente da população mundial dos benefí-

cios da economia global e a progressiva concentração de renda, constituem-se no grande problema

das sociedades atuais, sejam pobres ou ricas.

O desemprego destrói a vida familiar e a esperança para construir um futuro melhor. Suas

conseqüências são o aumento da violência, insegurança, crianças subnutridas, corrupção em geral,

menos crianças nas escolas etc.

Um salário mínimo vergonhoso, que não supre as necessidades básicas e que a cada dia tem

seu valor reduzido, é a esperança diária de cada cidadão brasileiro que não teve melhores condi-

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ções para uma vida mais digna. No entanto, o desemprego leva à perda dos valores, da esperança

e a vida humana é reduzida à mera "sobrevivência".

A fome atinge cerca de trinta e dois milhões de brasileiros (nove mil famílias) e a renda men-

sal lhes garante, na melhor das hipóteses, apenas a aquisição de uma cesta básica de alimentos.

Segundo alguns estudiosos, a fome que atinge 32 milhões de brasileiros não se explica pela falta de

alimentos. O problema alimentar reside no descompasso entre o poder aquisitivo de um amplo

segmento da população e o custo de aquisição de uma quantidade de alimentos compatível com a

necessidade de alimentação do trabalhador e de sua família.

É fundamental um novo Brasil, cujos cidadãos libertem-se de muitos preconceitos sociais

preponderantes em nossa sociedade, tais como: o preconceito racial, a marginalização de indiví-

duos menos abastados ou em condições de pobreza absoluta, o preconceito contra a orientação

sexual, entre outros.

Uma nova consciência nacional é necessária e a transformação que deve imperar não passa

simplesmente pelo universo jurídico ou legal. Antes de qualquer coisa, é preciso mudar a mentali-

dade social, a maneira de pensar do cidadão.

A educação é um dos meios mais eficazes de realização da equidade social, e como direito e

bem fundamental, é um dos atributos da própria cidadania, fazendo parte de sua própria essência.

Para uma maior integração do indivíduo enquanto cidadão e sua conscientização como pessoa

detentora de direitos e garantias individuais, cabe à educação, inserir o homem num processo de

ação histórica e empoderá-lo como um ser capaz de transformar a realidade à sua volta.

São 500 anos de exclusões, mas isso não impede que tenhamos outros 500 anos, porém, de

justiça social. Para uma mudança realmente concreta na realidade brasileira, o primeiro passo é a

transformação cultural, principalmente no que tange à auto-estima nacional.

É o caso, por exemplo, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que determina que o

adolescente só pode trabalhar a partir dos 16 anos, com carteira assinada, desde que não seja um

trabalho que coloque em risco sua integridade física e o seu desenvolvimento.

A partir dos 14 anos, só é permitido o trabalho na condição de aprendiz. Infelizmente, a-

pesar da lei, existem 2,7 milhões de crianças e adolescentes que não estudam porque são subme-

tidos ao trabalho em condições indignas, privados dos direitos elementares de cidadania.

O melhor remédio para combater este mal é investir em educação, permitindo aos excluídos

obterem maiores chances e oportunidades de vida digna.

1.1.3 CONTEÚDO 3 - A INCLUSÃO E EXCLUSÃO SOCIAL NO CONTEXTO URBANO

Para falar sobre inclusão social é preciso entender o seu conceito. Para isso, recorri primei-

ramente ao dicionário, e constatei que o nome “incluir” significa inserir, introduzir, compreender;

e “social” diz respeito a uma sociedade.

O conceito de inclusão é inseparável do de cidadania, e se refere aos direitos que as pessoas

têm de participar da sociedade e usufruir certos benefícios considerados essenciais. Mais a frente,

você terá elementos para distinguir, conforme a literatura, os três tipos de direito – os direitos ci-

vis, políticos e sociais cujos estão previstos na Constituição Brasileira.

Por outro lado, só existirá inclusão social se as pessoas tiverem acesso à informação e ao co-

nhecimento; ao uso de tecnologia; ao investimento em infraestrutura e ao social, além da vontade e

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determinação das autoridades políticas para realizar os projetos de desenvolvimento em suas di-

versas modalidades.

Não falta uma lista de temas que desprotege a maioria da população brasileira dos seus di-

reitos essenciais:

- Pobreza e exclusão social

- Pessoas disputando o lixo com os animais

- Mendicância

- Menino e meninas em situação de rua

- Famílias moradoras das ruas das cidades

- Desnutrição e fome

- Analfabetos funcionais

- Desemprego

- Favelas

- Violência urbana e policial

Agora me responda:

- O Brasil tem jeito?

- Até onde iremos?

- Por que a desigualdade apenas cresce?

Tais perguntas, com certeza, mexem com a nossa subjetividade e nos instigam a buscar alter-

nativas de mudança. Sabendo que pessoas sequer têm acesso às suas necessidades básicas, não

podemos dizer que vivemos bem.

A URBANIDADE: INCLUSÃO E EXCLUSÃO

A mudança começa quando o nosso olhar se direcionar para outra face da cidade: os excluí-

dos. Segundo Ribeiro, o espaço urbano tem uma face cuja representação é dos excluídos, sem po-

der desfrutar das suas necessidades materiais básicas.

Conforme alguns estudiosos, os excluídos podem transgredir a lei para garantir a sua sobre-

vivência financeira e ajudar a fortalecer a sua identidade, fenômeno considerado pelos pesquisa-

dores de abrangência mundial.

Mas o que vem a ser: inclusão e exclusão social no contexto urbano?

A cidade dos que têm e a cidade daqueles que nada têm.

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Há exclusão quando negada às pessoas os recursos essenciais para a sua sobrevivência. Entre

as regiões que há um tratamento diferenciado de investimento público formam-se explicitamente

um contingente de excluídos.

Os espaços públicos são criados para garantir socialização da vida urbana.

Ao passo que crescem as zonas privatizadas com uma boa oferta de serviços públicos e de

equipamentos coletivos. Em contrapartida, há um número de pessoas que vivem ilhadas em áreas

degradadas e periféricas, sem meios para se informar e ter acesso a estes equipamentos.

O crescimento urbano e populacional nas cidades dos países em desenvolvimento vem a-

companhado pela degradação da qualidade de vida. Aspecto que a torna um palco de “desordem”

e de tensão pela sobrevivência no mundo contemporâneo.

Foi assim desde o século XIX. Construída sob uma visão burguesa, o espaço urbano exibia o

espetáculo da multidão nas ruas, famílias concentradas num mesmo espaço, próximas às fábricas,

e o movimento intenso de pessoas e mercadorias.

Nela existe uma parcela da população que desfruta de um nível alto de consumo e outra parte

que tem condições de satisfazer as suas necessidades básicas. E uma maioria pobre que fica à mar-

gem, totalmente destituída de proteção social e das políticas públicas: educação de qualidade, o tra-

balho com dignidade e renda, pilares essenciais de desenvolvimento de um povo e de uma região.

A renda e os indicadores sociais não são suficientes para mostrar qualidade material de vida

da coletividade. A percepção de pobreza refere-se também à ausência do bem estar, à dignidade da

pessoa, ao exercício da cidadania, à violência nas relações humanas como sujeito social.

A população excluída do desenvolvimento, da estrutura social do Estado, é mais vulnerável

aos problemas de saúde-doença. Quando adoece, fica mais tempo doente e morre mais de causas

básicas que podiam ser evitadas.

A CIDADE E A JUVENTUDE

A ocupação do solo urbano e da localização espacial dos mais pobres pode variar de lugar para

lugar. A cidade é o lugar das contradições, mas também da exclusão, principalmente dos jovens.

A cidade de Salvador, por exemplo, agrega uma população perto de três milhões de habitan-

tes e a desigualdade se apresenta em diversas facetas, assim como nas grandes capitais brasileiras.

A sociedade de consumo marca a vida urbana no mundo contemporâneo e influencia o au-

mento da exclusão social entre os jovens. A partir da segunda metade do século XX, o estrato jovem

da população passa a ocupar uma posição destacada no campo da cultura massiva e, posteriormen-

te, no campo midiático, tanto na esfera da produção, quanto na do consumo real e simbólico.

Esse consumo acontece por meio de complexas redes sócio-econômicas e culturais, e os jo-

vens compartilham diferentes imaginários nas suas experiências urbanas. A juventude de baixa

renda vive as tensões da urbanidade com poucas oportunidades de bem estar social, diferentemen-

te dos jovens de maior poder aquisitivo, que têm maior proteção social.

Numa cidade desigual, a maioria da juventude tem restritas as oportunidades de emprego e

renda, escolarização, lazer, acesso à cultura, entre outros aspectos.

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Precisamos fazer a nossa parte, sabe por quê? Porque a crise social atinge você, eu e ou-

tros, enfim, todos nós estamos sujeitos as ameaças desse mundo urbano em crise.

Quantos fatos são noticiados diariamente na nossa cidade, os quais provocam emoções de

medo e pavor:

1. Crimes até mesmo no seio da família...

2. A sensação de que não se pode mais caminhar pela cidade;

3. Assaltos;

4. Mortes por Acidente de trânsito;

5. Uma sensação de completo desamor e hostilidade;

Essas infrações são comuns em todas as classes sociais. Faça uma pesquisa nos jornais para

você perceber.

Como se ainda não faltasse, os preconceitos são fortes contra os jovens e, em muitos casos,

anulam a sua identidade para serem aceitos.

Os jovens também enfrentam muitas dificuldades no campo das relações de gênero e famili-

ar, sobretudo aqueles mais pobres. Entre os problemas estão a violência doméstica, a falta de edu-

cação sexual, as dificuldades de acesso a cultura e uma escolarização incapaz de lhe preparar para

o exercício da cidadania e o mundo do trabalho.

Isso tem impacto na relação de gêneros no contexto das famílias. Os homens jovens desem-

penham papéis nos quais excluem as jovens que são vítimas de violência doméstica.

EXCLUSÃO SOCIAL - UM DOS REFLEXOS DA SOCIEDADE DE CONSUMO

A globalização constitui-se uma nova ameaça, ao exacerbar a desigualdade econômica e a

exclusão social entre as nações e no interior delas mesmas. A mesma dinâmica uniformizadora

promete integrar os países, mas globaliza a miséria. Além disso, o frenesi da modernização e do

consumo exacerba os custos sociais e ambientais locais e globais.

A leitura de um artigo de Lucia de Mello e Souza Lehmann (2003), cujo título é: Faces Invisí-

veis da Exclusão: um olhar sobre os jovens impressiona numa passagem do seu texto em que ela escre-

ve: “a dimensão estética ganha espaço no cotidiano”.

Ela narra sobre as cenas cotidianas da cidade do Rio de Janeiro, onde os jovens pobres bus-

cam objetos de consumo para pertencer ao mundo urbano.

Leia parte da narrativa:

“Uma menina... Batom, brinco, faixa no cabelo enrolado. Apetrechos femininos, na bolsa a tiracolo,

misturam-se com restos de balas e alguns trocados. Pés descalços ou saltos altos apontam o caminho da rua.

São mulheres, ainda meninas”.

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“A vaidade no asfalto pode ser arma certeira na guerra pela sobrevivência. O vai e vem dos pequenos

quadris, em corpos quase sempre mal tratados. Assim desfilam as "flores do asfalto" pela cidade. Perambu-

lam pelas ruas, um destino meio vago. Filhas, que às vezes são também mães, brancas ou negras, altas ou

baixas, roliças ou magrelas, roubam a atenção de quem passa”.

Ela continua analisando, e mostra que o ritmo frenético das grandes cidades evoca uma nova

forma de comunicação, de mais fácil leitura, onde o sentido da visão se faz presente no olhar. E é

nesse contexto que as meninas se enquadram.

Elas e eles fazem da visibilidade uma possibilidade de transmitir e captar. Assim, aquele que

é visto ou se mostra, se implica com sua aparência, porque é através desta que será visto e percebi-

do pelo outro.

A miscigenação racial, as segregações, os fragmentos da abundância e da pobreza estão es-

tampados nas imagens de nossos jovens, negro ou índio, branco, mulato, mestiço, caboclo, rico ou

pobre, menino ou menina.

Suas configurações físicas, suas indumentárias, revelam suas inserções sociais e um somató-

rio de associações que elas suscitam. Inclusões e exclusões se ancoram na aparência e produz na

sociedade de consumo a pobreza e o preconceito.

O sucesso social e a felicidade pessoal são identificados pelo nível de consumo que o indiví-

duo tem. O somos o que temos é elevado à condição de ideal social: a qualquer preço o hedonismo

materialista triunfa. Se não temos, nada somos.

O potencial de consumo determina o grau de inclusão ou de exclusão social, de sucesso ou

de insucesso, de felicidade ou de infelicidade. A sociedade do espetáculo que manipula a aparên-

cia do trampolim social para o ter:

O excluído sonha em ser celebridade, e quem já é não vive sem ser, para não perder o status.

É a realização convicta do somos o que consumimos.

O discurso do marketing é o grande agenciador da montagem perversa do discurso capitalis-

ta na sociedade de consumo.

O marketing se dedica a mostrar às pessoas que o consumo da marca sugerida na propagan-

da é o meio pelo qual se ganha status social.

Ou seja, a regra é você consumir o objeto que lhe identifica com a marca, que dá a sensação

de estar fazendo parte do mundo de consumo. Enfim, pagamos para divulgar a marca do produto

que indica quem somos.

1.1.4 CONTEÚDO 4 - MOVIMENTOS SOCIAIS E O EXERCÍCIO DA CIDADANIA

Neste texto, trataremos sobre Movimentos Sociais e a Cidadania, com o objetivo de compre-

ender de que modo estes agentes coletivos contribuem para a transformação da sociedade e a con-

quista de direitos sociais.

Mas você já se perguntou o que significa movimento social? Eles são importantes para a

promoção da justiça social?

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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Observe que chamo de Agentes Coletivos, por quê?

Porque são as diferentes organizações sociais que juntas se organizam em torno de uma cau-

sa: seja esta pela reforma agrária, por questões de gênero e sexualidade, étnico-racial, ao lazer, à

saúde, educação, entre outros interesses.

Segue alguns exemplos de organização social: sindicatos, entidades estudantis, associações

de moradores, literárias, esportivas, que podem ou não ter uma ação pela transformação da socie-

dade ou pela manutenção da ordem.

A reivindicação dos movimentos sociais indica o grau de criticidade da sociedade e a sua

consciência cidadã.

As duas últimas décadas do século XX são paradoxais para os movimentos sociais no Brasil,

sobretudo nos anos de 1980, quando esses entram na cena política brasileira de modo marcante.

Nessa década, novos movimentos sociais representaram o aparecimento de um novo tipo de ex-

pressão da sociedade organizada nas primeiras décadas do século, especialmente após 1945.

Esses movimentos colocaram na agenda política brasileira a luta pela democracia, pela re-

forma agrária e do regime político, por entenderem ser uma condição para a realização de seus

interesses, principalmente pelo contexto ditatorial em que vivia o país.

Tendo como alvo a luta contra a ditadura militar e a democratização do país, os movimentos

sociais exigiam do Estado não apenas participação política no processo decisório das políticas públi-

cas, mas o responsabilizavam pela situação de precariedade em que vivia a maioria da população.

Utilizavam os mais variados instrumentos de luta como passeatas, greves, caravanas, entre

outras, para pressionarem o Estado por direitos sociais. As políticas públicas como saúde e educa-

ção, por exemplo, eram concebidas como dever do Estado e direito do Cidadão.

Estava presente, pelo menos, em uma boa parte destes movimentos, a “transformação da so-

ciedade” capitalista.

Na década de 1990, o cenário se modifica: o neoliberalismo adentrou a seara dos movimentos

sociais e modificou não apenas suas formas de luta, mas principalmente sua disposição para a luta.

Essa década é marcada pela institucionalização dos movimentos sociais.

E o que representa isso?

Por ter uma boa parte dos movimentos sociais aderido à ideologia neoliberal e se tornarem

parceiros do Estado, afinou-se com a ideologia de revalorização da "sociedade civil", sobretudo no

aspecto da sua autonomia.

Entretanto, a despeito de ter sido importante durante a ditadura militar como idéia-força na

organização dos movimentos de resistência, no contexto neoliberal, serviu de base ideológica para

o desmantelamento do sistema de proteção social. Ou seja, minimizou as responsabilidades do

Estado como uma instituição de promoção do bem-estar social.

As expectativas de transformações sociais se modificaram para aderir à dinâmica institucio-

nal através das parcerias, que significou adesão ao ideário neoliberal e abrir mão da concepção das

políticas públicas, como direito do caráter universal e gratuito dos serviços públicos.

Na era neoliberal, os movimentos sociais se enfraquecem e as ONGs (Organizações Não-

Governamentais) assumem a centralidade da cena política. As Organizações não-governamentais

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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têm sido importantíssimas na nova lógica neoliberal, pelo fato destas assumirem o papel de agen-

tes privilegiadas de mediação entre o Estado e a população mais empobrecida.

Tornaram-se defensora da participação da sociedade civil no Estado trazendo para si a fun-

ção de executoras de políticas públicas, inclusive apoiando as várias formas de privatização dos

serviços públicos. Por isso, e outras coisas, as manifestações populares foram redefinidas, se apro-

ximando da forma de campanhas, cujos principais protagonistas são as ONGs.

Voltam-se, sobretudo para questões de caráter ético-moral e de solidariedade individual, em

que se convoca a "sociedade civil" para buscar alternativas para a pobreza, a violência e a corrup-

ção. É ilustrativo dessa época o Movimento: Ética na Política, a Ação da Cidadania contra a Miséria

e pela Vida, o Movimento Viva Rio.

O início do século XXI tem sido paradigmático. Novas lutas sociais eclo-

diram em quase todos os países latinos americanos, que instabilizaram e/ou

derrubaram governos. Foram os zapatistas no México, os índios no Equador,

as comunidades no Uruguai e na Venezuela, as FARCs na Colômbia, os pique-

teiros na Argentina e os Trabalhadores Sem Terra no Brasil.

Levantaram-se os índios colombianos, em marchas gigantescas, resistindo à tomada de suas

terras e de suas sementes milenares. Também saíram às ruas os hondurenhos em defesa da água,

os bolivianos em defesa do gás, os guatemaltecos, os equatorianos, os chilenos, os paraguaios, os

nicaragüenses, os salvadorenhos.

As novas lutas contemporâneas forçaram, inclusive, os EUA a mudarem seus planos de implan-

tarem a ALCA sem protestos e a partirem para a alternativa de negociação em separado, pressionan-

do os países a assinarem os chamados acordos bi-lateral ou o Tratado de Livre Comércio – TLC.

Os movimentos sociais se vêem na condição de lutarem pelo resgate da cidadania, conside-

rando que o pouco que foi conquistado ao longo de anos de luta, encontra-se ameaçado e parte

significativa da população fica excluída de participar da comunidade política.

O processo de globalização do capital fragiliza o Estado em sua capacidade de implementar

políticas específicas e de tornar todos os indivíduos de uma determinada comunidade nacional em

cidadãos, sujeitos de direitos iguais.

Essa relação entre inclusão e exclusão levou uma parte dos movimentos sociais a adotarem a

defesa da cidadania como a principal referência de luta na década de 1990, sem, no entanto, apre-

sentar os limites estruturais da cidadania no contexto do capitalismo.

Todavia, estar “incluído” no mercado de trabalho não sig-

nifica plenos direitos de cidadania garantidos. A exclusão pode

ser observada nas extensas jornadas de trabalho, com baixos

salários, o trabalho infantil, privatização dos serviços públicos

ou o acesso aos serviços públicos com caráter de caridade públi-

ca ou privada.

Portanto, para um melhor entendimento desses aspectos

tratados até aqui, vale a pena ver a entrevista do Professor Marcelo Rocha. Ele contextualiza como os

movimentos sociais podem ser um instrumento de libertação social e individual e um termômetro da

participação política, mas também apresenta a educação como principal elemento de formação da

consciência libertadora e cidadã.

Agora você terá a oportunidade de entender por que as ONGs formaram uma rede de tama-

nha importância na sociedade contemporânea e como essas protagonizaram como organização

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social potencializadora das transformações sociais em alguns momentos e por outro para atender

os interesses de agentes financeiros internacionais.

Agentes financeiros podem ser empresas, governos, fundações, universidades, que se dis-

põem a financiar projetos sociais de ONGs e entidades sem fins lucrativos.

Todavia, há estudiosos que assumem uma posição mais radical e critica, ao argumentar, que

as ONGs exercem um papel muito mais de manutenção da ordem capitalista do que de transfor-

mação social.

Antes de adentramos sobre essa polêmica, entenda o que vem ser uma ONG. O termo ONG

foi utilizado pela ONU, na década de 1940, para designar diferentes entidades executoras de proje-

tos humanitários ou de interesse público.

Ou seja, elas são organizações que não representa um determinado grupo social específico

ou uma categoria de trabalhadores, mas têm a função de desenvolver projetos sociais visando com

que as comunidades se tornem auto-sustentáveis.

No Brasil, a expressão se referia principalmente, às organizações de cooperação Internacio-

nal, formada por Igrejas (católica e protestante), organizações de solidariedade ou governos de

vários países.

A sua concepção se difunde no Brasil em meados dos anos 1990, com a Conferência Mundial

sobre o Meio Ambiente, conhecida como ECO 92.

Mas somente no final da década de 1980 é que as ONGs se expandiram por aqui, muitas de-

las, como um apêndice do Estado, que demandava as suas necessidades, e essas intervinham na

sociedade.

Cabe relembrar, que essas organizações ganham visibilidade no momento em que os movi-

mentos sociais perdem força como movimento autônomo e de luta pela libertação social.

O que antes era pauta do movimento social, como a transformação social e aí incluía a luta

pela “cidadania”, significando melhores condições de vida como transporte, saúde, educação, ago-

ra as ONGs desenvolvem projetos de caráter social sem às vezes pretensão de desenvolver um

movimento de pressão pelas mudanças efetivas na ordem vigente. Por quê?

Porque a fonte financiadora é na maioria, os recursos públicos que são destinados para o ter-

ceiro setor ou para as ONGs. Então, essas entidades ficam reféns daqueles que financiam os proje-

tos. Na era das ONGs, a luta pela cidadania desvinculou-se da proposta de transformação social, e

o discurso tornou-se perfeitamente compatível com as desigualdades sociais. É desta forma que

Marshall critica o processo.

Numa sociedade dividida em classes sociais, e sua necessidade incessante de reprodução do

capital para o lucro de poucos, quanto maior a participação política dos movimentos sociais, maior

será a pressão pela conquista de equidade social.

Para muitos, as ONGs devem ser uma entidade intermediária, entre a sociedade, o Estado e

o mercado: “a forma por meio da qual a sociedade se estrutura politicamente para influenciar a

ação do Estado”.

Muitos ainda argumentam que as ONGs são o caminho para a construção de uma terceira

via, empenhadas na realização dos serviços sociais pela sociedade civil, que realizam esses serviços

com mais “qualidade” e mais liberdade que o Estado.

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Em toda a América Latina, pós-regime militares, as ONGs eram utilizadas para contrapor ao

Estado, um agente para limitar os governos autoritários, fortalecer os movimentos sociais e reduzir

os efeitos do mercado e melhorar a qualidade da “governança”.

Todavia, os críticos indicam que as ONGs foram forçadas a adotar um enfoque cada vez

mais econômico e “apolítico” para trabalhar com os pobres, pelo fato de suas estratégias limitar a

participação comunitárias a projetos locais, pontuais, de pequena escala e com isso não terem difi-

culdades para atuarem nos países que tiveram regimes autoritários.

O fato de estes projetos terem prazos determinados para funcionarem, os grupos comunitá-

rios terminavam sendo abandonados, para que por conta própria a sua autonomia como uma for-

ma de empoderamento, em vista de que isso exigia mudanças na cultura de organização sócio-

política das comunidades. Etimologicamente, empoderar-se significa tornar-se autosustentável,

responsabilizar-se pela dinâmica da sociedade.

A idéia que impera é de que os agentes comunitários são considerados “empreendedores”,

levados a atuarem como pequenos empresários. Por isso, muitos estudiosos mais radicais enten-

dem que não há impacto substancial nas comunidades onde atuam, a não ser como um fator de

despolitização.

O número de entidades consideradas sem fins-lucrativos e de utilidade pública, somente no

Brasil, já chega a quase 276 mil instituições e nas ações de muitas delas, prevalecem as de ativida-

des de caráter assistencial.

As ONGs desenvolveram nas décadas de 1960 e 1970, o papel de mediadores dos movimentos

sociais e de apoio às causas populares, no sentido da luta pela democratização da sociedade brasileira.

O papel político dos mediadores variava de acordo com as necessidades dos movimentos e

as conjunturas políticas específicas. Estes agentes foram fundamentais para a qualificação dos con-

flitos sociais neste período.

Nos anos 80, percebe-se a proliferação de instituições que desenvolviam trabalhos voltados

para novas temáticas: meio ambiente, crianças e adolescentes, discriminação de minorias étnicas e

sexuais, entre outras.

Durante o Regime Militar e ainda no período de transição da Nova República, a relação das

ONGs com o governo era muito tensa e as parcerias eram praticamente inexistentes.

Havia o reconhecimento da impossibilidade de diálogo ou parceria com os governos autori-

tários, pela violação dos direitos humanos e pela falta de espaços de participação.

É na década de 1990 que um novo perfil de ação das ONGs é motivado:

1. Pelas novas relações com o Estado;

2. Pela crise nas fontes tradicionais de financiamento, oriundos da cooperação internacional;

3. Pelos novos parâmetros de relação com os movimentos sociais.

Tudo isso vai se apresentar como espaço de trabalho para muitas pessoas, algumas migran-

do dos movimentos sociais.

Este movimento foi relevante para o seu fortalecimento estimulador, como contra partida, de

certa desmobilização dos movimentos sociais.

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As relações das ONGs com os movimentos sociais também sofrem mutações e a participação

de instituições não governamentais como representantes da sociedade civil é bastante criticada

pelos movimentos sociais, pelo fato dessas não representarem nenhuma parcela da sociedade, em-

bora haja o reconhecimento da importância dos trabalhos desenvolvidos.

Em algumas áreas, como a dos direitos de crianças e adolescentes, a defesa do meio ambiente

e do direito da mulher, a atuação das ONGs tornaram-se mais significativas e detentoras de maior

visibilidade do que os movimentos sociais.

Costuma-se classificar as chamadas ONGs em progressistas e as conservadoras. As progres-

sistas seriam aquelas oriundas da década de 1970/1980, vinculadas direta ou indiretamente aos

movimentos sociais. Enquanto as conservadoras, criadas já no auge da implementação das políti-

cas neoliberais, teriam um forte cunho assistencialista. Ou seja, a maioria delas.

Essa classificação na verdade não revela a realidade dessas organizações, Mesmo as conside-

radas “progressistas”, assim como o termo “sociedade civil”, tomam uma significação durante os

regimes autoritários na América Latina.

Todos aqueles que se opunham aos regimes autoritários, fossem a favor da “redemocratiza-

ção” da sociedade, da liberdade de expressão, eram imediatamente considerados do campo pro-

gressista.

CIDADANIA E MOVIMENTOS SOCIAIS

A cidadania tem sido o horizonte pelo o qual os movimentos sociais reivindicam as suas ne-

cessidades essenciais, sobretudo aquelas que atendam aos interesses das camadas populares.

Outros aspectos importantes são: a comunicação e a educação. Ambos se constituem em elemento

essencial para as relações sociais e culturais. Nesse contexto, o conceito de cidadania e o papel do

cidadão na busca de oportunidades e de acesso à informação são essenciais.

As transformações têm sido feitas por meio de redes, pelo menos, nas últimas duas décadas,

tem sido o paradigma de organização "alternativa". O conceito de rede, fazendo referência a rede de

pesca, cuja malha é resistente e composta, pode-se perceber que as organizações sociais se interligam

por fios aparentemente frágeis, como um sistema descentralizado e com grande resistência e ampli-

tude. Por exemplo, o Fórum Social Mundial reúne inúmeras organizações mundiais em contraposi-

ção ao Fórum Econômico Mundial. Os interesses do Fórum social são construir agendas políticas

para as camadas empobrecidas e discriminadas e defender as questões étnicas, religiosas e ambien-

tais, enquanto o Fórum econômico define estratégias para exercer maior domínio econômico.

As redes são sempre lembradas como estruturas orgânicas. Baseiam-se em figuras da natu-

reza. Como, por exemplo, a teia de aranha e a minhoca exemplificam esse tipo de estruturação. É

impressionante a resistência da teia de aranha, apesar de ser toda construída a partir de um fio tão

vulnerável. A minhoca, por outro lado, é capaz de reconstituir-se mesmo depois de retalhada.

O mesmo acontece com as redes dos movimentos sociais. Cada um deles é composto por inúmeras

organizações que têm suas lideranças, metas, objetivos e formas ação específicas.

Quanto maior for o entrelaçamento entre as várias organizações que compõem essa rede,

maiores serão as chances de coesão em torno de objetivos definidos pelo conjunto. E mesmo que a

rede sofra derrotas ou perca algumas organizações que a compõem, não será facilmente destruída.

No entanto, com a desvalorização da política e o esvaziamento aparente de poder do governo, vis-

lumbra-se o cenário propício ao surgimento de formas substitutivas da política tradicional, que se

traduzem pelo surgimento de novos movimentos sociais, organizações não-governamentais, orga-

nizações comunitárias.

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São desses movimentos que se originam novas formas de organização da sociedade, que a-

qui chamaremos de micro-políticas. Isso quer dizer que a política formal feita com os partidos polí-

ticos, nem sempre tem respondido às novas exigências, nem aos novos problemas postos pelo pro-

cesso de globalização.

Pelo contrário, tem causado desilusão, apatia, sensação de

fim da política e o aumento da "massa muda". Segundo o filósofo e

sociólogo Jean Baudrillard, a decepção com os políticos, seus par-

tidos e suas práticas esclerosadas, "não consolida a idéia do fim da

política, pois o campo de ação agora é a vida cotidiana".

Nesse sentido, temos hoje os movimentos sociais, associa-

ções. São as micro-políticas, que expressam e contribuem com os

anseios da vida local e global neste final de século.

Esse movimento se constitui também como antropolíticas,

por quê? Trabalham nas arenas da vida pessoal, abrindo espaço

para o diálogo público; não são dirigidas por regras, ao contrário, alteram as regras do jogo; São

descentralizadoras do poder político;

Os Novos Movimentos Sociais, ONGS, grupos comunitários e outras entidades introduzem

uma nova concepção política relativa à prática tradicional. Através desses grupos, possibilita-se

uma articulação de novas ideias, concepções diversas das tradicionais, uma maior participação

social, baseadas na concepção de rede.

Com o surgimento, inserção e expansão das micro-políticas, caracterizadas por sua capaci-

dade de auto-organização, engajamento social e participação comunitária, vislumbra-se a necessi-

dade de uma reformulação ou redefinição nas áreas de responsabilidade governamental.

Contudo, tal processo não importa em um desaparecimento da política tradicional, ou uma

supremacia das micro-políticas sobre o Estado, mas sim, um trabalho que deve ser equilibrado,

realizado em conjunto pelos vários segmentos representantes tanto da política tradicional como

das micro-políticas.

Um dos objetivos das micro-políticas é a busca de um equilíbrio entre o Estado e a sociedade

civil, compreendidos como governo e partidos políticos e agrupamentos sociais dialogando as po-

líticas públicas no âmbito do Estado.

A partir das novas concepções sobre o espaço de poder e a participação social frente ao Esta-

do, cada vez mais os cidadãos querem manifestar seus desejos e opiniões sobre a direção ou os

objetivos governamentais, fazendo-o através das micro-políticas.

Os antigos sistemas representacionais da sociedade, os partidos políticos, constituem-se cada

vez mais em instituições desacreditadas, burocratizadas e que não refletem os anseios populacio-

nais. Assim, suscita a criação de novas formas de se fazer política, desvinculando-se do modelo

tradicional, conclamando a sociedade a participar do processo político, possibilitando locais para

expressão das opiniões através dos grupos constituintes das micro-políticas.

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1.2 TEMA 02 - A CIDADANIA NO MUNDO CONTEMPORÂNEO

1.2.1 CONTEÚDO 5 - A GLOBALIZAÇÃO, O ESTADO E O TERCEIRO SETOR

No Brasil dos anos 90 do século XX, o tema da “globalização” vem intensificando o debate sobre a

economia mundial e as relações internacionais do país.

Segundo Paulo Nogueira Batista Jr. (1998), este debate virou uma mania nacional depois que

a abertura da economia e o programa de estabilização monetária iniciado em 1994, expuseram a-

bruptamente grande parte da economia nacional à competição internacional.

Para outros estudiosos, esta mania à brasileira, explicitou algum atraso, diante das discus-

sões já iniciadas nos países desenvolvidos, especialmente nos EUA, onde os meios de comunicação

de massa e diferentes setores da intelectualidade lançaram-se avidamente na discussão do assunto.

Do ponto de vista histórico, “globalização” é a palavra da moda, para um processo que re-

monta à expansão da civilização européia a partir do final do século XV.

Como lembra o historiador Marc Ferro, esse antigo processo de internacionalização e de cria-

ção de um mercado de alcance mundial foi lançado pela colonização, tendo como resultado a am-

pliação das desigualdades entre os países colonizadores e os demais.

Muitos questionam se a chamada “globalização” não seria uma nova faceta da colonização.

Há uma falsa novidade da “globalização”

Vale a pena recordar de alguns aspectos do quadro internacional que prevaleceu nas décadas

anteriores à Primeira Guerra Mundial. Naquele período, ocorreu uma revolução tecnológica em

transportes e comunicações, que favoreceu forte expansão dos fluxos internacionais.

É verdade que os métodos modernos de comunicação e transporte ampliaram dramatica-

mente o volume e a complexidade das transações econômicas, mas não se deve perder de vista que

a economia internacional dispõe, há mais de 100 anos, de meios de informação e transporte capa-

zes de sustentar um sistema de cunho internacional.

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Um contraste notável na economia “global” são as ações restritivas e severas contra imigran-

tes, originários da África, da América Latina e da Ásia. Esses são perseguidos pela polícia e, às

vezes, recebidos a tiros, nas fronteiras do mundo desenvolvido. Além de não ser um fenômeno

inteiramente novo, o processo recente de integração das economias nacionais não tem o alcance

que sugere o uso indiscriminado do termo “globalização”. O grau de internacionalização alcança-

do nos últimos 20 ou 30 anos é, na realidade, bem menor do que geralmente se imagina.

Os mercados de trabalho permanecem altamente segmentados por políticas restritivas de i-

migração e barreiras lingüísticas, culturais e outros obstáculos à movimentação internacional de

trabalhadores.

Nas décadas de 1950 e 1960, ainda houve um montante limitado de migração internacional

de trabalhadores dos países em desenvolvimento para os países desenvolvidos, atribuível em

grande medida à escassez de mão de obra na Europa de pós-guerra e, em alguns casos, a ligações

pós-coloniais reforçadas por uma língua comum.

Dos anos 1970 em diante, entretanto, a migração internacional foi severamente limitada por

leis restritivas à imigração, e, desde então, o movimento internacional de trabalhadores tem afeta-

do apenas uma pequena parcela da força mundial de trabalho.

Apesar de tudo que tem sido dito sobre o efeito avassalador das tendências “globais”, o de-

sempenho do mercado de trabalho reflete, no essencial, processos que ocorrem em âmbito nacional

ou no máximo regional, especialmente nas economias maiores.

A questão do desemprego, assim como tantas outras, continua a depender fundamentalmen-

te da evolução da economia doméstica e da eficácia das políticas econômicas e sociais.

O último relatório anual da Organização Internacional do Trabalho (OIT), critica os “exage-

ros sensacionalistas” a respeito do impacto das variáveis internacionais sobre os mercados de tra-

balho. Ainda é relativamente pequeno o número de trabalhadores empregados em atividades li-

gadas ao mercado internacional.

Nos países desenvolvidos, uma média de quase 70% dos trabalhadores estão no setor de ser-

viços. Nos países em desenvolvimento, de baixa-renda, o grosso do emprego ainda é gerado pela

agricultura tradicional ou de subsistência e pelo setor urbano informal.

Não é verdade, ressalta a OIT, que a “globalização” seja uma força supranacional irresistível

que tenha usurpado, em grande medida, a autonomia dos governos. As políticas nacionais ainda

são a influência dominante nos resultados em termos econômicos e de mercado de trabalho.

O ESTADO E A GLOBALIZAÇÃO

A ideologia da “globalização” é especialmente enganosa quando associada à ideia de que es-

tá em curso na economia mundial, um declínio do Estado e das suas possibilidades de interven-

ção nos domínios econômico e social.

Essa concepção representa um retorno ao que pregavam os liberais do século XIX. O Estado

deveria atuar na definição e proteção dos direitos de propriedade e do sistema de leis e contratos, na

garantia da segurança interna e externa do país e na defesa da estabilidade do padrão monetário.

Além disso, os governos deveriam, no máximo, proporcionar educação básica, uma rede mí-

nima de proteção social e alguns investimentos de infra-estrutura.

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A rigor, não haveria porque designar essa corrente de “neoliberal”. A etiqueta confere status

de novidade a um fenômeno ideológico que representa uma volta ao passado e não incorpora nada

de novo ao velho liberalismo.

Como há um preconceito generalizado a favor do novo e do “progresso”, o prefixo “neo” co-

loca os seus adversários em posição desvantajosa. É uma concessão indevida, que enfraquece au-

tomaticamente a crítica.

Há uma enorme distância entre a retórica “neoliberal” e a realidade prática dos países nos

quais essa ideologia teve origem. A discussão, inclusive nos meios acadêmicos, se dá em nível pu-

ramente ideológico. Essa distância não tem recebido a devida atenção.

Nos países desenvolvidos, o prestígio intelectual e acadêmico dos teóricos e ideólogos do

“neoliberalismo” contrasta, de forma notável, com a sua limitada influência prática, especialmente

nos anos mais recentes.

Intelectuais do mundo inteiro se opõem a ideia de que o liberalismo seja uma doutrina eco-

nômica que tenha efetiva força nos governos e no Estado.

Indiferentes a essa realidade internacional, os porta-vozes brasileiros do “neoliberalismo” e

da “globalização”, pregam a aplicação de modelos que são pouco aplicados nos países onde têm

origem essas ideologias. Enquanto isso, os seus adversários ideológicos se deixam intimidar pelo

discurso dominante.

Em conseqüência da alienação reinante, prevalece no Brasil a convicção de que a tendência

mundial é de redução do papel do Estado no campo econômico e social.

É verdade que em certas regiões do mundo, em grande parte da África e da América Latina,

por exemplo, o Estado entrou em fase de declínio ou até de desmantelamento. Mas não é o que vem

acontecendo nos países desenvolvidos ou nos países em desenvolvimento, mais bem-sucedidos.

Esse desconhecimento de aspectos centrais da evolução da economia internacional acaba

tendo efeitos práticos. Nos últimos anos, particularmente desde o governo Collor, a política eco-

nômica nacional vem se caracterizando, em larga medida, como uma adaptação passiva não às

tendências mundiais, tal como realmente ocorrem, mas a uma versão mitificada, construída para

consumo na periferia subdesenvolvida.

E, no entanto, não é necessário grande esforço para perceber as falácias

do discurso hegemônico. Basta consultar, por exemplo, as estatísticas publi-

cadas por organizações internacionais, como, a OCDE e o FMI.

Quem se der ao trabalho de fazê-lo, verá que nos anos 80 e na primeira

metade dos anos 90, em plena época de suposto triunfo do chamado “neoli-

beralismo”, a participação do Estado na economia não diminuiu nos países

mais adiantados. Ao contrário, aumentou em quase todos eles.

É certo que houve desregulamentação de mercados, remoção de barreiras ao comércio interna-

cional, acordos multilaterais e regionais de liberalização comercial, eliminação de controles sobre os

movimentos internacionais de capital e programas importantes de privatização de empresas públicas.

Mas a participação do Estado na economia, que já vinha crescendo de forma expressiva e

contínua desde a Primeira Guerra Mundial, continuou a aumentar no período mais recente, a des-

peito da preponderância ideológica do pensamento “neoliberal”.

Em suma, o “neoliberalismo” reina, mas não governa. Assim afirma Batista Junior (1998).

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Como já foi mencionado, o aumento da participação do Estado nas economias desenvolvidas

nas últimas décadas representou a continuação de uma tendência que remonta ao início do século XX.

No campo econômico, sobretudo depois da Segunda Guerra Mundial, predominaram políti-

cas macroeconômicas. No campo social, construiu-se uma ampla rede de proteção social, o chama-

do Estado do bem-estar social.

O mito do declínio do Estado é a ideia da ascensão de corporações “globais”, supostamente

livres de lealdades nacionais e apontadas como os principais agentes de uma avassaladora trans-

formação da economia mundial.

Não há dúvida de que nas últimas décadas aumentou a proporção de firmas que operam em

âmbito internacional.

As corporações industriais e financeiras dos países desenvolvidos e mesmo de alguns países

em desenvolvimento, ampliaram as suas atividades no exterior e mantêm uma parte dos seus ati-

vos fora do seu país de origem.

Uma percentagem maior do valor adicionado é produzida por subsidiárias estrangeiras e

cada empresa individual enfrenta maior número de competidores externos, tanto na sua base do-

méstica, quanto em outros países

Daí não segue, entretanto, que se possa falar em supremacia de empresas “transnacionais”

ou “multinacionais”, sem identificação nacional específica.

Mesmo as grandes empresas, que tendem a ser mais internacionalizadas do que as pequenas

e médias, permanecem marcadas por sua origem nacional.

Corporações verdadeiramente transnacionais são raras, especialmente nas economias de

maior porte, que contam com amplos mercados internos.

E não se pode dizer que exista tendência perceptível de predomínio de empresas genuina-

mente globais, que não revelam preferência por um país particular.

GLOBALIZAÇÃO X ESTADO

As percepções sobre a evolução do contexto internacional sempre condicionam, em certa

medida, o debate sobre as opções de um país. Uma avaliação objetiva, não mitificada, do quadro

mundial, constitui uma das pré-condições para a definição apropriada das políticas nacionais.

Apesar de marcadas por vulgaridades e simplificações, as discussões sobre a “globalização”

ou “mundialização” da economia adquiriram, nos últimos anos, uma importância estratégica. Da

forma como vem sendo conduzido, esse debate tem tido efeitos predominantemente negativos.

Por um lado, ajuda a mascarar a responsabilidade pelas opções e decisões dos governos, obs-

truindo a crítica das políticas públicas. Por outro, inibe a reflexão sobre as alternativas de que dis-

põem os países na definição de suas políticas econômicas, sociais e de

inserção internacional, contribuindo para imobilizar as iniciativas

nacionais.

Para países como o Brasil, que ainda carregam traços acentua-

dos do seu passado colonial, um debate como esse é sempre proble-

mático. A ideologia da “globalização”, principalmente nas suas ver-

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tentes mais extremadas, constitui um reforço considerável e falsamente moderno para a arraigada

subserviência de muitos setores das camadas dirigentes do país, sempre prontos a atuar como

prepostos dos interesses internacionais dominantes e a colaborar para uma integração subordinada

à economia internacional.

Nesse contexto, a “globalização” funciona como álibi para algumas posições tradicionais das

elites locais. Um dos principais efeitos desse debate tem sido o de propagar a impressão de que a

margem de manobra dos Estados nacionais, especialmente na periferia do sistema econômico in-

ternacional, sofreu dramático estreitamento nas décadas recentes.

Segundo as versões mais extravagantes da ideologia da “globalização”, os Estados nacionais

estariam indefesos diante de processos “globais” incontroláveis ou irreversíveis e teriam ingressa-

do em uma época de inevitável declínio.

As avaliações recentes sobre as tendências da economia internacional estão carregadas de

exageros e mitos. Carecem freqüentemente de perspectiva histórica. Apóiam-se, em geral, em pre-

conceitos e impressões superficiais e não em um exame cuidadoso dos dados macroeconômicos

internacionais.

O próprio vocabulário – “globalização”, “mundialização”, “neoliberalismo”, empresas

“transnacionais” ou “multinacionais”– está contaminado de distorções e conotações ideológicas.

A “Globalização” é uma nova palavra para um processo que remonta, em última análise, à

expansão da civilização européia desde o final do século XV.

A internacionalização econômica dos últimos 20 ou 30 anos tem precedentes históricos, no-

tadamente nas décadas anteriores à Primeira Guerra.

O processo de internacionalização observado nas décadas recentes não tem o alcance e muito

menos o caráter universal sugerido pelo uso indiscriminado do termo “globalização”. Está muito

longe de provocar o desaparecimento das fronteiras ou ameaçar a sobrevivência do Estado nacional.

É verdade que o progresso técnico e as inovações em áreas como informática, telecomunica-

ções e finanças, combinados com a liberalização de mercados e a remoção de restrições a operações

internacionais, vêm contribuindo para a maior integração das economias nacionais.

Além disso, os mercados de trabalho permanecem altamente segmentados por políticas res-

tritivas de imigração e outros obstáculos à movimentação internacional de trabalhadores.

A própria expressão “globalização” é enganosa e deve ser evitada. É preferível utilizar ter-

mos como “economia internacional” ou “internacionalização econômica”, mas compatíveis com

um quadro mundial caracterizado pelo intercâmbio entre economias nacionais distintas.

CONCEITO DE GLOBALIZAÇÃO

Nessa parte, dediquei a uma conceituação de globalização a partir da teoria de Paulo Batista

Jr (1998), no artigo intitulado Os Oito Mitos da Globalização, e como devemos desmitificar o ter-

mo. Há um mito de que não existirão empresas nacionais e tudo será global. Pelo menos, isso que

orienta as políticas de governo e de Estado.

O predomínio ideológico do chamado neoliberalismo – que apesar do prefixo constitui uma

tentativa de restaurar o ideário econômico do século XIX –, não chegou a modificar de maneira

significativa e duradoura a dimensão do Estado na maioria das economias desenvolvidas.

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Não chegou sequer a interromper a tendência de aumento do peso do governo, medido por indi-

cadores agregados, como a relação entre a despesa e a receita públicas e o PIB (Produto Interno

Bruto), que é soma das riquezas nacionais dividido pelo número de habitantes.

O exame dos dados macroeconômicos das economias desenvolvidas indica que há uma e-

norme distância entre o discurso “neoliberal” e a realidade dos países onde essa ideologia teve

origem.

Nas últimas décadas as empresas dos países desenvolvidos e mesmo de alguns países em

desenvolvimento, ampliaram as suas atividades no exterior e passaram a desenvolver uma parte

das suas atividades fora de seu país de origem. Mas isso não significa que as firmas perderam as

suas referências e vínculos nacionais.

A maioria delas mantém o grosso dos seus ativos, vendas e empregos, na sua base nacional.

As atividades geradoras de maior valor adicionado e funções estratégicas, como pesquisa e desen-

volvimento, tendem a se realizar no país de origem das empresas.

Em geral, as corporações não devem ser caracterizadas como “transnacionais” ou “multina-

cionais”, mas sim, como firmas nacionais com operações internacionais.

O grau de internacionalização das finanças é mais limitado do que sugere o uso indiscrimi-

nado de expressões como “globalização financeira” ou “mundialização do capital financeiro”. A

despeito da acentuada expansão das operações financeiras internacionais, as aplicações domésticas

ainda são largamente predominantes.

Longe de estarem reduzidos à condição de atores secundários, os Bancos Centrais continuam

e continuarão a preservar a sua autonomia e a exercer forte influência sobre os mercados de câm-

bio, agindo isoladamente ou em intervenções coordenadas com outros bancos centrais.

O TERCEIRO SETOR E A GLOBALIZAÇÃO

Os Estados nacionais, sobretudo nos países mais bem-sucedidos, não estão indefesos diante

de processos econômicos “globais” incontroláveis ou irresistíveis. Ao contrário do que sugere o

fatalismo associado à ideologia da “globalização”, o desempenho das economias e o raio de mano-

bra dos governos continuam a depender crucialmente de escolhas nacionais.

O fascínio com a “globalização” é revelador do estado de prostração mental e desarmamento

intelectual em que se encontram países como o Brasil. Para superá-lo, poderíamos começar por

uma reavaliação do quadro mundial e do papel dos Estados nacionais, desenvolvendo, sem inibi-

ções, a nossa própria concepção dos rumos que devem tomar as relações internacionais da econo-

mia brasileira.

Na primeira metade do século XX, o capitalismo tinha interesse em fortalecer o Estado – no

qual as grandes empresas "mamavam" recursos financeiros, isenções fiscais e privilégios legais

(como ainda acontece no Brasil). Agora, as empresas transnacionais, que controlam a economia do

planeta, insistem em privatizar as empresas estatais. Ou seja, querem enfraquecer o Estado e forta-

lecer o mercado – menos leis, mais competitividade desenfreada.

A globalização tende a destruir um valor importante: a nossa identidade como nação. Um

brasileiro não é igual a um estadunidense ou a um indiano.

Cada povo tem suas raízes, sua cultura, seu modo de encarar a vida. Não é verdade que um

mineiro adoraria encontrar, ao viajar pelo mundo, um tutu com feijão? O nordestino não morre de

saudade de uma carne de sol com feijão-de-corda e manteiga de garrafa?

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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Ou seja, elas são organizações que não representam um determinado grupo social específico

ou uma categoria de trabalhadores, mas tem a função de desenvolver projetos sociais, visando com

que as comunidades se tornem auto-sustentáveis.

O que antes era pauta do movimento social, como a “transformação social” e a luta pela “ci-

dadania”, significando melhores condições de vida como transporte, saúde, educação, agora as

ONGs, desenvolvem projetos de caráter social sem às vezes, pretensão de desenvolver um movi-

mento de pressão pelas mudanças efetivas na ordem vigente.

Porque a fonte financiadora é, na maioria, os recursos públicos que são destinados para o ter-

ceiro setor ou para as ONGs. Então, essas entidades ficam reféns daqueles que financiam os projetos.

Na era das ONGs, a luta pela “cidadania” desvinculou-se da proposta de transformação so-

cial, e o discurso tornou-se perfeitamente compatível com as desigualdades sociais.

Para muitos, as ONGs devem ser uma entidade intermediária entre a sociedade, o Estado e o

mercado: “a forma por meio da qual a sociedade se estrutura politicamente para influenciar a ação

do Estado”.

A ideia que impera, é de que os agentes comunitários são considerados “empreendedores”,

levados a atuarem como pequenos empresários. Por isso, muitos estudiosos mais radicais, enten-

dem que não há impacto substancial nas comunidades onde atuam, a não ser como um fator de

despolitização.

O número de entidades consideradas sem fins-lucrativos e de utilidade pública, somente no

Brasil, já chega a quase 276 mil instituições. E nas ações de muitas delas, prevalecem as de ativida-

des de caráter assistencial. As ONGs desenvolveram, na década de 1960 e 1970, o papel de mediado-

res dos movimentos sociais e de apoio às causas populares, no sentido da luta pela democratização

da sociedade brasileira.

O papel político dos mediadores variava de acordo com as necessidades dos movimentos e

as conjunturas políticas específicas. Estes agentes foram fundamentais para a qualificação dos con-

flitos sociais neste período.

É na década de 1990 que um novo perfil de estratégia de ação das ONGs é motivado:

1. Pelas novas relações com o Estado;

2. Pela crise nas fontes tradicionais de financiamento, oriundos da cooperação internacional;

3. Novos parâmetros de relação com os movimentos sociais;

4. Vão se apresentar como espaço de trabalho para muitas pessoas, algumas migrando dos

movimentos sociais.

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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ÉTICA E MORAL NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA

CONCEITO DE ÉTICA E MORAL

A ética e a moral na sociedade contemporânea é uma temática

que ultrapassa o campo teórico para invadir o universo cotidiano. Isso

porque muitas das questões que lidamos nas relações do dia a dia são

difíceis de tomarmos uma decisão, ou, quando tomamos partido em

uma questão, usamos os nossos valores para assim definirmos os ru-

mos de nossas ações.

Então lhe pergunto, a ética tem importância para você? Ética é a

mesma coisa que Moral? No entanto, se alguém rouba uma lata de sar-

dinha no supermercado, ele está cometendo um ato moral ou antiético?

A discussão sobre ética e moral ocupa espaço nos meios de comunicação social, nas organiza-

ções empresariais, nos debates políticos e universitários, além de congressos nacionais e Internacio-

nais, debates e seminários sobre questões ligadas à ecologia, à fome, à saúde e à educação.

O dois termos são etimologicamente quase parecidos, mas têm origem diferente: “Ética” vem

do grego “ethos”, e significa hábito. E Moral, vem do latim mores que significa hábito, costumes.

Adquirimos a moral também no meio ambiente em que vivemos pelo simples fato de que a locali-

dade onde se mora influencia o comportamento humano.

Para distinguir, os dois conceitos variam de sociedade para sociedade: o que em geral pode

ser prejudicial para uma, para outra é antiético. Tome como exemplo, uma rua de grande movi-

mento na sua cidade, onde uma tira a roupa. É provável que a comunidade o julgue conforme os

seus valores e ainda manifeste o quanto esse ato fere os seus princípios como, por exemplo, o ato

pode perverter adolescentes, levando-os para um “mau caminho sob parâmetros morais?

Diferindo-se da moral, a ética, em geral, é concebida como a ciência que trata apenas do co-

nhecimento natural sobre o Bem e o Mal ou teoriza sobre as condutas, estudando as concepções

que dão suporte à moral numa sociedade, tendo em vista a sua história e as estruturas sociais. E a

moral normatiza e direciona a prática das pessoas.

Os filósofos afirmam a ética como a ciência normativa, que emite juízos de valor em função

do discernimento entre o bem e o mal. E Moral, é um código de conduta variável com os costumes

ao longo dos tempos de uma sociedade.

A moral existe para se viver melhor. Mesmo que as regras morais sejam concebidas como

condição de repressão humana e geradoras de infelicidade, os grupos humanos precisam dela para

viver bem.

Nos conflitos bélicos, na insatisfação de milhões de seres humanos com a má distribuição de

renda, na desigualdade entre os chamados países desenvolvidos e subdesenvolvidos, entre a opu-

lência e desperdícios de poucos, em contraste com a fome e a miséria de muitos, as milhões de pes-

soas que buscam uma vida melhor nos grandes centros capitalistas modernos se frustram com as

políticas anti-imigração desses países.

É comum que no mundo contemporâneo fechemos os olhos para as questões que estão em

crise de valores. Mas você se considera uma pessoa ética?

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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Digamos que se você faz uma critica ao cotidiano daquilo que todos consideram normal e

pauta a sua vida na responsabilidade e solidariedade com o outro de natureza humana, animal,

vegetal ou material, você está tendo uma atitude ética.

Para Deleuze e Guattari (1976, apud WEINMANN, 2002), as idéias de Ética e Moral são movi-

mentos produtores de realidade psicossocial ou sentidos de produção da vida psicossocial que

agenciam, em seu percurso, maiores ou menores espaços.

Para obter mais informações, acesse o link:

www.scielo.br

O espaço psicossocial é a relação entre o indivíduo e suas conexões sociais, econômicas, lin-

güísticas e culturais. Esses movimentos psicossociais podem produzir desde a manutenção de um

estado de valores até a recriação da subjetividade.

Por práticas psicossociais entende-se exatamente aquilo que os homens fazem em seu cotidi-

ano. Essa prática é a própria produção humana em sua existência, em todas as instâncias psicológi-

cas, culturais, Políticas, etc. que produz a subjetividade e, portanto, a realidade psicossocial.

O conteúdo das regras morais, conforme a época ou lugar, todas as comunidades têm a ne-

cessidade formal de regras morais. É formalmente correto que a coragem é melhor que a covardia,

que a amizade é um valor desejável entre os membros de um grupo.

Tomemos um exemplo corriqueiro, ainda que não referente à moral propriamente dita: se al-

guns riem de uma pessoa oriunda do interior do Estado com medo de atravessar a avenida na

grande cidade, certamente será ele que rirá de uma pessoa nascida numa grande cidade, assustada

com sapos e cobras na fazenda.

Transportando o exemplo para o campo da moral, a coragem do guerreiro da tribo é certa-

mente diferente da coragem do homem urbano desafiado, por exemplo, pelos riscos da corrupção.

Ninguém nasce moral, mas torna-se moral. Há uma longa caminhada a ser percorrida para a

aprendizagem de descentralização do eu subjetivo, a fim de superar o egocentrismo infantil e tor-

nar-se capaz de "con-viver". Por isso, segundo Elizete Passos (2003), ela tem um caráter social e

outro dialético.

O seu caráter social se explicita no papel que ela desempenha na sociedade, no sentido de pos-

sibilitar o equilíbrio entre aquilo que anseio individualmente e os interesses da sociedade. Por isso, se

diz que não existe moral individual, mas sempre social, porque envolve as relações entre os sujeitos.

O seu caráter é dialético porque os valores morais expressam uma cultura, variam historica-

mente, pois cada sociedade edifica as suas normas a partir das suas crenças, modelo social, forma-

ção econômica e social.

Em outras palavras, a moral deve ser entendida como produto da sociedade que estamos in-

seridos: se vivemos numa sociedade desigual é evidente que prevalecerá a moral de um determi-

nado grupo dominante, que impõe para a maioria, seus valores como mecanismo de dominação

social e cultural.

As pessoas são aquilo que pensa. E aquilo que pensa é a referencia de como elas agem na so-

ciedade, na relação concreta com as pessoas no cotidiano. No entanto, a nossa liberdade pode ser

condicionada ao sistema de valores de uma sociedade.

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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Passo a considerar a questão da ética a partir de uma visão pessoal, através do seguinte qua-

dro comparativo:

Ética Normativa Ética Teleológica Ética Situacional

Ética Moral Ética Imoral Ética Amoral

Baseia-se em princípios e

regras morais fixas

Baseia-se na ética dos

fins: “Os fins justificam

os meios”.

Baseia-se nas circunstâncias.

Tudo é relativo e temporal.

Ética Profissional e Ética

Religiosa: As regras de-

vem ser obedecidas.

Ética Econômica: O que

importa é o capital.

Ética Política: Tudo é possí-

vel, pois em política tudo

vale.

O ato moral é exclusivo do ser humano, e outros animais vivem conforme o seu instinto e

não se baseiam em valores construídos historicamente. Por outro lado, o ser humano é o único

dotado de consciência, de liberdade e de poder de decisão.

A liberdade depende da transgressão dos valores, assunto que veremos na entrevista do pro-

fessor Rodrigo Araújo e nas próximas aulas.

CIDADANIA E ÉTICA - LIBERDADE

A liberdade é a concepção natural de uma pessoa ou a-

nimal ser livre, mas ser livre significa, antes de tudo, algumas

limitações que a própria Lei Natural impõe ao ser humano.

A liberdade parte em princípio do respeito aos direitos

alheios, onde, dialeticamente, não se constata que na vida prá-

tica exista o respeito ao homem em si. O que existe na consci-

ência humana é o respeito a si mesmo, a busca de tudo, para si

próprio, e o resto que procure respeitar os direitos dos outros,

sem nenhuma contrapartida.

Ao longo da história se tem deturpado o real significado

da palavra liberdade; é só verificar o dia a dia das novelas; os

anúncios de jornais, os outdoors, os filmes de sexos, que são

verdadeiros atentados contra o pudor e os bons costumes. Isto

tem trazido uma revolução aos princípios éticos e morais de

uma sociedade que prima pelas boas maneiras de vida.

A liberdade que se procura não é esta, mas aquela que

está dentro de uma formação trazida pelos pais, avós, ancestrais, que sempre procuram transmitir

de geração a geração os caminhos da verdade e da vida.

O caráter consciente e livre da ação: a responsabilidade moral está na exigência de um com-

promisso livremente assumido. Responsável, é a pessoa que reconhece seus atos como resultantes

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da vontade e responde pelas conseqüências deles. Quando adultos, como as mulheres e os escra-

vos, permanecem tutelados, o resultado é o empobrecimento moral das relações humanas.

Há um grau de articulação entre interesses coletivos e pessoais. Enquanto nas tribos primiti-

vas o coletivo predomina sobre o pessoal, nas sociedades contemporâneas, o individualismo exa-

cerbado tende a desconsiderar os interesses da coletividade. É importante que o desenvolvimento

de cada um não seja feito à revelia do desenvolvimento dos demais.

A liberdade precisa ser analisada historicamente e não como um dado a priori fruto da abs-

tração. Ela surge como condição concreta de um ser humano real, concreto e operante, capaz de

transformar a sua realidade a parir das suas necessidades.

A liberdade não implica ausência de condicionamentos; ao contrario, ela ocorre dentro des-

ses condicionamentos, o que força o sujeito a tomar decisões conscientes. Respeitar a pluralidade

de valores é a condição exigida para a conquista da liberdade e para o exercício da cidadania.

A pluralidade é o respeito à autonomia do ser humano, a sua capacidade de escolher; é o

caminho mais coerente com nossa faculdade criadora, pois respeita o exercício da liberdade.

A liberdade é o cerne da nova ética, que deve ser entendida como supressão de todo e qual-

quer tipo de coação e toda repressão imposta pela lei ou pela necessidade. Segundo Elizete Passos,

o ser humano está livre quando passa a conceber a vida de maneira mais simples e mais alegre.

Livrando-se das amarras da repressão e da exploração de uma sociedade comprometida a-

penas com a produtividade, com o lucro desmedido e com o sucesso a qualquer custo.

ÉTICA – POLÍTICA

Há uma relação entre política e moral. Embora sejam campos de ação diferentes e autôno-

mos, a política e a moral estão estreitamente relacionadas, ainda que essas não tenham o mesmo

fim. A moral responde a uma exigência interior, segundo a retidão dos atos pessoais quanto à

norma dos deveres, enquanto a outra é acima de tudo, ação social.

Aristóteles distingue o cidadão do homem de bem. O ideal é o homem associar as duas vir-

tudes, “mas pode ser bom cidadão sem possuir as virtudes de um homem de bem”. A política diz

respeito às ações relativas ao poder e à administração dos assuntos públicos.

Quando há desequilíbrio de poder na sociedade e a maior parte das pessoas não atinge a ci-

dadania plena, isso repercute na moral individual de inúmeras maneiras: as exigências de compe-

tição para manter ou alcançar privilégios e a luta pela sobrevivência na sociedade desigual, elevam

a níveis intoleráveis o egoísmo e o individualismo, geradores de violência dos mais diversos tipos.

É assim que se poder falar em falte a ética tanto diante da má administração de verbas publi-

cas, provocando, por exemplo, o colapso da rede de hospitais, como também em moral seqüestrar

ou assaltar a mão armada.

Os problemas decorrentes da decadência Ética que presenciamos não podem ser resolvidos,

a partir de ações isoladas de educação moral dos indivíduos. É preciso que exista a vontade políti-

ca de alterar as condições geradoras da doença social, para que se possa dar possibilidade de supe-

ração da pobreza moral.

Dito de outra forma, não basta "reformar o indivíduo para reformar a sociedade". Um projeto

moral desligado do projeto político está destinado ao fracasso. Os dois processos devem caminhar

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juntos, pois formar o homem plenamente moral só é possível na sociedade que também se esforça

para ser justa.

A sua manutenção ou superação dependem da nossa livre escolha, em consonância com a

mudança da estrutura social, política e econômica da sociedade.

A mudança dessa ordem moral, baseada na exploração e no egoísmo, depende da criação de

novas condições socioeconômicas e culturais. Para isso, precisamos de uma ação política.

Uma nova ordem moral implicará, segundo Sanchez Vásquez (2008), numa mudança de ati-

tude diante do trabalho, num desenvolvimento de um espírito coletivista, na eliminação do espíri-

to de posse, do individualismo, do racismo e do preconceito.

Trará também uma mudança radical na atitude para com a realização e a estabilização das

relações familiares.

Apesar da hegemonia que os valores capitalistas mantêm no mundo atua, cresce a consciên-

cia de que não basta viver, que a vida não pode resumir-se a ganhar dinheiro sem sequer ter tempo

para gastá-lo, que além das necessidades físicas, os indivíduos possuem as espirituais (amizade,

prazer, cultura, descanso).

À nova ética não interessa as condições de raça, classe ou sexo, pois seu compromisso é com a

liberdade de condições para todos os indivíduos e com a superação de toda forma de exploração e de

dominação, inclusive aquela que tem sido exercida pela razão, sobre os instintos e dos sentimentos.

ÉTICA NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA

Por que se discute tanto a ética e a moral no mundo contemporâneo? Por que vivemos num

mundo em crise, o que representa estar em CRISE?

No seu significado original, do grego antigo, o conceito de crise - Krinein - significa dis-

tinguir, separar, decidir. O termo crise tem a mesma equivalência da palavra vento. Indica, as-

sim, um estágio de alternância, no qual uma vez trasncorrido, diferencia-se do que costumava

ser. Enfim, não existe possibilidade de retorno aos antigos padrões.

CRISE DE VALORES

Hoje se fala muito em valores morais. Mas afinal o que são estes valores? Quais os seus crité-

rios? Quem os define ou quem os deveria definir? Estes padrões de comportamento devem existir?

Acho que depende de pessoa para pessoa.

Vivemos, portanto, em momento de crise de valores.

Mas cabe perguntar: que é valor?

Toda sociedade, seja essa simples ou desenvolvida, possui os seus valores morais, que vão

sendo ensinados a seus membros através da família, da escola, da igreja, dos meios de comunica-

ção de massa.

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Isso porque os valores morais desempenham um papel de elemento regulador do compor-

tamento das pessoas, pautando-se nos valores são em parte herdados da cultura. Aliás, a primeira

compreensão que temos do mundo.

Os valores não são coisas, pois resultam da experiência vivida pelo homem quando se rela-

ciona com o mundo e os outros homens. Tais experiências variam conforme o povo e a época, num

contexto de diversidade de costumes: para algumas tribos, é indispensável matar os velhos e as

crianças que nascem com algum defeito, o que para nós pode parecer incrível crueldade.

Na Idade Média era proibido dissecar cadáveres, e, no entanto, as instituições de justiça ti-

nham o direito de torturar seres vivos. Nosso costume de comer bife escandaliza o hindu, para

quem, a vaca, é animal sagrado.

Isso significa que os valores são em parte herdados da cultura. Aliás, a primeira compreen-

são que temos do mundo é fundada no solo dos valores da comunidade a que pertencemos.

Cabe-nos, pois, refletir sobre comportamentos em nosso tempo e nesta sociedade. Que é mais

importante para você neste momento de crise?

• Reproduzir as mudanças que acontecem a todo o momento e que mui-

tas vezes são desenvolvidas num sentido contrário aos valores maiores

da solidariedade, justiça e liberdade, entre outros... Ou problematizar

essas mudanças, procurando evidenciar as suas contradições?

• Procurar viver em sociedade de acordo com as conveniências sociais,

servindo os interesses do imediato, do aqui e agora... Ou Viver de uma

forma autêntica, genuína, "sendo aquilo que é", sem receios nem falsos

preconceitos?

• Procurar o sensacionalismo fácil e a rápida ascensão profissional... Ou

procurar com humildade e esforço reflexivo, empenhar-se no seu próprio aperfeiçoamento pessoal

e profissional?

• Alguém que se deixa encerrar por preconceitos e falsos estereótipos... Ou alguém que procura ter

uma atitude crítica e de abertura perante os acontecimentos?

A sociedade contemporânea vive uma crise da inversão de valores e agora paga o preço de

optar apenas pelo TER e sem considerar o SER. Nessa direção, as pessoas da sociedade buscam

orientar-se para um verdadeiro culto ao prazer e ao poder, ao hedonismo materialista que fomen-

tou seu isolamento, sua depressão e a falta de perspectiva de futuro.

O acumulo econômico ganhou o mais alto alcance de valorização, fazendo o ser humano vol-

tar-se totalmente para a procura dos meios que possibilitem o crescimento de seu poder econômi-

co. Como conseqüência, a essência humana é alterada, e orientação moral fundamenta a explora-

ção do homem pelo homem, egoísmo, a hipocrisia, o lucro e o individualismo. Valemos pelo que

TEMOS e não pelo que SOMOS.

Valoriza-se mais no ser humano seu potencial produtivo, sua possibilidade de tornar-se

ÚTIL aos interesses do capital. Uma sociedade regida pela desigualdade e pelo processo de explo-

ração, despreza as virtudes públicas da justiça social, igualdade e liberdade e valoriza os ditos ví-

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cios individuais, tais como: sexo, vestimenta, descanso, prendendo-se ao moralismo privado, dei-

xando de lado a moral pública.

1.2.2 CONTEÚDO 7 - MUNDO CONTEMPORÂNEO 1: A CIDADANIA E AS EMOÇÕES.

A CIDADE FORTIFICADA: PERDA DA ESPONTANEIDADE DAS EMOÇÕES

Hoje, você já se olhou no espelho? Observou o que em você? Existe alguma coisa diferente

em você? Enquanto nos olhamos no espelho, muito sequer tem um lar. Sabia disso ou pensou so-

bre isso algum dia na sua vida?

A cidade é aquilo que produzimos com as nossas emoções. A cidade está em pânico e em lu-

ta para garantir a cidadania, tudo isso como reflexo da desigualdade em todos os níveis.

Os espaços públicos das chamadas cidades globais passam por profunda re-significação, e

por isso, regulamentações e instrumentos de vigilância são instituídos, com a pretensão de disci-

plinar a freqüentação de pessoas aos espaços através da exclusão desses das áreas da cidade.

Termos como insegurança, violência, medo, risco e perigo fazem parte de um domínio se-

mântico que tem sido empregado de forma crescente para descrever a vida urbana.

O Brasil passa a ser então o país da violência urbana e dos enclaves fortificados onde os

membros das “elites alienadas” se encastelam em ilhas da fantasia onde podem se inocular dos

perigos e impurezas do caos urbano tido como incontrolável.

A cidade é uma instância significativa na “desordem” do mundo contemporâneo.

É nela que, por assim dizer, a vida acontece. Aparatos de vigilância e condomínios fechados

proliferam nas mais diversas partes do globo e têm, como justificativas, anseios, medos e sonhos

de bem-viver, que se alimentam no espaço urbano.

Há uma “cultura do medo” sendo alimentada na sociedade, porque traz vantagens para um

contexto de desigualdade. Com isso, se tem a vantagem de apontar para processos simbólicos e for-

mas de apreensão da realidade que não são simplesmente conseqüências diretas de “fatos” concretos.

Análises da “cultura do medo” nos Estados Unidos apontam para uma incongruência entre

riscos estatisticamente calculáveis e imaginários compartilhados pelo senso comum, mesmo tendo

em vista as ansiedades geradas pela arbitrariedade e imprevisibilidade de atos de graves conse-

qüências como ataques terroristas.

A proliferação de medidas de controle do espaço, aliada à circulação cada vez maior

de narrativas de violência pela mídia, certamente faz parte dessa cultura do medo.

A propaganda, como produtora de significados, também atua como produtora de inseguran-

ças a serem sanadas por medidas de segurança. O sentimento de insegurança e as medidas profilá-

ticas, são muitas vezes comprados simultaneamente, em uma criação constante de necessidades

próprias do espírito do consumismo moderno.

De fato, o mercado aparece preenchendo o espaço vazio deixado pelas instituições públicas e

civis, criando também novas formas de associação baseadas na confiança fabricada por peritos

devidamente treinados.

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Este olhar é particularmente dirigido à expressão emocional dos intervenientes, na apresen-

tação deles mesmos e na relação com os outros, a qual serve de critério da sua ‘autenticidade’,

quando não mesmo da sua ‘sanidade’

É Zigmut Baumann (2003), quem aponta para o fato de que os guetos voluntários pretendem

servir à causa da liberdade. Se a liberdade só é possível dentro de certos limites de segurança, o

sentimento de segurança está em oposição direta a outro sentimento, o de insegurança.

Essa insegurança, por sua vez, está ligada à noção de risco que se refere a uma concepção de

que o mundo fora dos muros é perigoso e violento. A “cultura do medo” se alimenta de narrativas

e fluxos de informações em que, muito transcendem as experiências locais imediatas.

A CIDADANIA E POLÍTICA DAS EMOÇÕES

A impessoalidade é uma das primeiras máscaras da contra emoção. Somos emocionais a to-

do instante de nossas vidas. As emoções têm conexão direta com o controle social seja este a ver-

gonha, nojo, e muitas vezes geram preconceito contra o “outro”.

Emoção em oposição à razão é um mito ainda fortemente arraigado à nossa cultura. A

própria etimologia carrega essa pecha: em latim, deriva de motion, movimento, perturba-

ção causada por febre. Em francês, que gerou a grafia émotion, o sentido aponta para “per-

turbação moral”, chegando ao português com o mesmo sentido: turbação, abalo afetivo.

O indivíduo e a sociedade são intrínsecos, ou seja, não há uma separação radical entre o que

é “interno” e “externo” ao sujeito, portanto, qualquer produção do sujeito é composta por elemen-

tos sociais e elementos subjetivos.

As emoções parecem agora cada vez mais vigiadas em praça pública, sujeitas ao escrutínio,

ao debate e à reflexão, ou moral. Ao contrário da razão, que se define como “faculdade de racioci-

nar, de apreender, de compreender, de ponderar, de julgar; a inteligência”, o senso comum esvazia

as possibilidades cognitivas presentes nas emoções.

Todo este comportamento emocional incita o sujeito a refletir e a falar sobre as suas emoções.

Há discordância no mundo contemporâneo quanto a oposição entre razão e emoção.

Para muitos autores, ser racional significa também ser emocional, já que a razão precisa se

amparar na emoção para julgar e escolher entre inúmeras variáveis que, sozinha, não teria capaci-

dade para decidir.

Para Platão as emoções pervertem a razão, e por isso não são confiáveis. E para Darwin são

resquícios evolutivos de nossa animalidade, presentes com mais intensidade na infância.

Na verdade, as emoções fazem hoje parte de um conjunto cada vez mais alargado de refe-

rências identitárias das sociedades contemporâneas ditas ocidentais. Desde o nível profissional ao

nível familiar, saber gerir, controlar. Ao nível pessoal, a capacidade de ‘envolvimento’ no mundo,

por um lado, e a ‘expressão autêntica’ da individualidade, por outro, preenchem um imaginário de

projeto de vida onde o contacto com as emoções, a sua compreensão, a atenção que lhes é dedica-

da, a sua expressão ‘saudável’, desempenham papel igualmente fundamental.

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O processo civilizador de racionalização ou de modernização da sociedade tem como cerne,

o controle da razão, e instituições sob a consciência individual para “domesticar” os desejos do

sujeito. A padronização da conduta individual é cada vez mais necessária para a sociedade, por-

que está esta cada vez mais dependente da ação de cada indivíduo que a compõe.

Essas padronizações são muito comuns numa sociedade de consumo em massa, pois o con-

trole das emoções indica aos consumidores, o mais essencial para se relacionar no contexto social.

Pense a ideia de ser gordo ou magro. Alto ou baixo. Jovem e Idoso. Bonito ou feio. Todas es-

sas emoções são construídas para nos controlar e nos forçarmos na busca de padrões estéticos que

se adéqüem a sociedade de consumo.

A política das emoções vai além da escolha, pois precisamos reconhecer que somos sujeitos

únicos e temos responsabilidade em construir o campo emocional sem necessariamente termos que

nos submeter àquilo que outros acham mais importante para nós.

O MUNDO CONTEMPORÂNEO E AS EMOÇÕES

Como sentimos que estamos vivos? Você sabia que em quase tudo que fazemos na vida pos-

sui uma carga de emoção? Agora estudaremos o papel das emoções na reconstrução da condição

humana, sugerindo a auto-organização do sujeito como ponto de partida para novas formas de

gestão social, mediadas pela partilha e cooperação.

De qualquer forma, os discursos autorizados pelos lugares oficiais de transmissão da cultura

– família, escola, religião, produzem o conhecimento proibido. Como se fosse uma armadilha ne-

cessária do pensamento, certo espaço do segredo e do perigo foi sendo resguardado para acondi-

cionar domínios da condição humana, sobre os quais olhamos ora com desconfiança, ora com me-

do. Penso que isso se deu, sobretudo, com as interpretações científicas a respeito da dinâmica de

produção do pensamento e da condição humana.

Para Erving Goffman (1975), a interação entre os indivíduos de uma coletividade especifica

as trocas simbólicas que ocorrem em dois níveis: um consciente (a expressão) e outro inconsciente

(a impressão). Ambos os níveis estão presentes na interação entre as pessoas. A diferença é que o

primeiro, que é consciente, é controlado pelo indivíduo durante a interação, constituindo as más-

caras sociais que aprendemos a demonstrar diante das situações sociais específicas, então, para

cada situação (ou quadros), há uma representação ou máscara adequada. Já as impressões, por

serem inconscientes, seriam muito mais difíceis de controlar ou manipular durante as interações.

Os dois modos de representação dos indivíduos (expressão e impressão) nas interações soci-

ais, estão vivamente carregados de todas as conseqüências advindas dos estudos das emoções.

A atuação é afetada pelas emoções e todos os interlocutores das interações simbólicas podem

se beneficiar do conhecimento. A empatia para com o outro pode se traduzir num nível de atenção

ou de desatenção, diante das impressões passadas pelo outro, o que pode contribuir para a supera-

ção das dificuldades inerentes as relações humanas: preconceitos, julgamentos, antipatia e rejeição.

Para BAUMAN (2003), a dinâmica da sociedade contemporânea provoca um verdadeiro re-

dimensionamento das relações familiares, levando-a a fragilidade na formação e manutenção de

seus vínculos, e exige dos indivíduos investimento pessoal cada vez mais difícil de manter frente

ao pragmatismo da vida moderna.

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O afeto é parte integrante do sentimento das famílias contemporâneas. Difícil, tem sido defi-

nir o que é esse sentimento e apreender seu significado. Segundo Leonardo Boff, construímos o

mundo a partir de laços afetivos.

As emoções poderiam parecer plausíveis quando aplicada a uma

emoção particular como, por exemplo, a raiva ou o desprezo, mas não

para a maioria das outras emoções. As fontes, as formas de aparecimento

e as conseqüências da raiva e do medo ou vergonha, por exemplo, são

diferentes o suficiente para que as proíba de aparecerem juntas.

Nós definimos vergonha como uma extensa família de emoções

com muitos cognatos e variantes, alguns dos quais não são negativos. Nós também localizamos o

modo no qual a vergonha regula e amplia outras emoções, como na vergonha-ira de braços dados

com a fúria-humilhação.

A culpabilidade é uma emoção altamente individualista, reafirmando a centralidade da pes-

soa isolada. Também envolve sentimentos de que o ego é forte e intacto. A vergonha é uma emo-

ção social e reafirma a interdependência emocional das pessoas. É por contraste, apresenta-se co-

mo um sentimento de fraqueza e de dissolução do ego.

Internet e a ausência do corpo nas relações afetivas

O tema amor contemporâneo se manifesta pela web

como um sinal de proteção do EU. Esse comportamento

mostra que a relação com os sentimentos é imediata e a

manifestação com a ausência do corpo, via Internet, é um

meio pelo qual as pessoas reinventam as suas características

físicas e emocionais para o seu interlocutor.

As mudanças na sociedade e na concepção de sujeito

influenciaram nas manifestações amorosas, principalmente

para apresentar os sentimentos como construções sociais.

1.2.3 CONTEÚDO 8 - MUNDO CONTEMPORÂNEO 2: A CIDADANIA E A INDÚSTRIA CULTURAL

Para discutir a indústria cultural podemos nos eximir de discutir alguns aspectos da cultura.

A cultura é entendida como o cultivo do espírito e ocorre como algo que vem de dentro para

fora do indivíduo, através dela recebe escolarização, tornando-o culto; (2) como a manifestação

artística e filosófica de uma elite; (3) como um conceito nacionalista: o pensamento coletivo dos

habitantes de um país ou da maioria deles.

De todo modo, a transmissão da cultura sempre esteve associado a figura do Estado, bem

como a outros temas, tais quais “amparo”, proteção”, “incentivo”.

No Brasil, o vocábulo cultura ressurge em diversas passagens do Texto Constitucional de

1988, na acepção de “bem” a ser protegido, segundo o qual é de competência comum da União,

Estados, Distrito Federal e Municípios, proporcionar “meios de acesso” à cultura, que, além da

educação, ensino e desporto, constitui o objeto primordial destes entes de direito público interno.

No artigo 215, que inaugura a seção intitulada “Da cultura”, por sua vez, estabelece que:

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O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes de cultu-

ra nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais.

Uma pessoa quando diz que teve contato com “várias culturas”, ele está se referindo ao “to-

do” dessas culturas, o que inclui:

- Hábitos alimentares;

- Etiqueta social (cumprimentos, olhares, gestos);

- O modo de usar a linguagem — o emprego ou não de gírias em situações formais etc.;

- O modo de trajar;

- A música, popular ou não, a literatura, oral ou escrita, as artes plásticas, o teatro e todas as

demais manifestações artísticas;

- A maneira de estabelecer relações familiares, amorosas, profissionais, etc.;

- O modo de ver a si mesmo e aos outros povos, entre muitas outras características.

Para o antropólogo brasileiro Roberto DaMatta (1998), a cultura, no sentido antropológico, é

um conjunto de regras que nos diz como o mundo pode e deve ser classificado.

Segundo Renato Ortiz (1998), com prenúncio da Modernidade, a metrópole, industrialização

e divisão do trabalho, passaram a se tornar temas dominantes, ao passo que folclore e cultura po-

pular eram considerados “coisa do passado”.

Na América Latina, o interesse pela cultura popular é semelhante ao que ocorre nos países

periféricos europeus. A ausência da modernidade, ou seja, sua realização ‘incompleta’, implica o

corolário oposto, a riqueza das tradições populares, o que é visto como um entrave à moderniza-

ção pelas elites dominantes.

Em outras palavras, no início do século XX, a cultura popular passa a receber grande atenção

dos intelectuais na América Latina; mas, ao mesmo tempo, a elite econômica continua a desprezá-

la, pois a considerava um obstáculo ao desenvolvimento.

Nas décadas de 1930 e 1940, surge nos Estados Unidos uma nova questão no campo das teo-

rias culturais: o conceito de cultura de massa, que não se confunde com o de cultura popular. Esta

produção se deveu ao fato de os Estados Unidos conhecerem, antes dos outros, a ‘revolução’ tecno-

lógica-comunicacional e os seus impactos na esfera da cultura.

A cultura de massa consiste na produção de filmes, programas de TV, livros e outros bens

culturais para o grande público. Os alemães Theodor Adorno (1903-1969) e Walter Benjamin (1892-

1940) e o francês Edgar Morin (1921), afirmam a cultura de massa como uma indústria — daí a

denominação indústria cultural, adotada por eles.

A indústria cultural é responsável pela destruição das culturas locais, pela padronização do

pensamento e, principalmente, pela criação de um clima “conformista e dócil na multidão passiva”.

As manifestações folclóricas ainda estavam bem presentes por aqui quando se iniciou a mo-

dernização. A indústria cultural, que se seguiu a esse processo, oriunda em grande parte do pró-

prio Estados Unidos, tornou-se um modo paralelo de se produzir cultura, ao passo que com o

tempo, o folclore foi perdendo espaço para a cultura de massa.

Dentre outras abordagens de estudo, a cultura, como toda prática social que tenha significa-

do para o grupo que a realiza, é um conceito muito utilizado.

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Assim, um baile funk, as telenovelas, desenhos animados, ou mesmo um programa de audi-

tório são manifestações culturais e nos interessam descobrir quais significados os sujeitos atribuem

a tais práticas.

A chamada “Indústria Cultural”, termo muito usado hoje pelas sociedades modernas, foi

uma terminologia que surgiu na obra publicada em 1947, na “A Dialética do Esclarecimento” de

Adorno & Horkheimer.

Pode-se mesmo dizer que em alguns aspectos sociais, políticos e econômicos, ou se está na

mídia ou, estando fora dela, será excluído da sociedade que amplia cada vez mais o binômio inclu-

são/exclusão.

Observando um contexto no qual a arte passa a se subordinar a “necessidades” de consumo,

Adorno apresenta o conceito de Indústria Cultural em parceria com Horkheimer, e descreve o I-

luminismo como um esforço consciente de valorização da razão e abandono de preconceitos tradi-

cionais, com vistas ao progresso da humanidade.

Na Indústria Cultural, portanto, padronizam-se, não apenas os bens culturais, mas também

seus consumidores, prevendo-se e destinando-se a todos, um tipo de arte a ser consumida.

Com a finalidade de tornar este consumo fácil e imediato, o processo de padronização em-

pobrece o material estético, tornando-o previsível e impondo este padrão aos consumidores. Estes

bombardeados pela completa ausência de fantasia e imaginação experimentam e se tornam desvir-

tuados ao longo de seu desenvolvimento.

Instaura-se então, o desejo pelo consumo da arte que Adorno chama de “leve”, que propor-

ciona o divertimento, em detrimento da arte “séria”, que leva à reflexão crítica; elimina-se qual-

quer indício de instinto revolucionário e institui-se a tolerância da vida desumana proporcionada

pelo sistema capitalista.

Contudo, a reflexão dos autores mostra de que maneira a ciência e a técnica, que a priori li-

bertariam a humanidade da visão mágica, findaram por criar outro mito, mais potente e sofistica-

do. A partir de então, os homens passam a ser vítimas do próprio progresso e racionalidade técni-

ca, uma vez que estas instâncias vão se desassociando de seu potencial libertário e tornando-se

verdades absolutas, portanto, mito. Em contrapartida, nos deparamos com uma nova geração, a

geração da tecnologia da informação.

Hoje em dia, os micro-computadores devem ser entronizados em local mais importante do

que os antigos televisores. Em cada casa, pelo menos um micro, se possível com acesso à Internet.

É a exigência da chamada inclusão digital.

Mas um aspecto que ganha força nesses meios de comunicação, é o conteúdo em torno da

violência. Na televisão esse fenômeno é muito difundido, sobretudo nas telenovelas, filmes, tele-

jornalismo. A mídia dissemina a violência simbólica que se assenta no deslumbramento.

O desenvolvimento das organizações que produzem cultura é concomitante ao processo de

‘desencantamento do mundo’ e perda do sentido. A mídia vem preencher o vazio do mundo de-

sencantado com seu êxtase.

Para o filósofo Jean Baudrillard (2000), a fascinação ‘é a intensidade extrema do neutro (...) os

leitores não vêem mais diferença entre os conteúdos que se refratam no vácuo – só o meio funcio-

nando como efeito ambiente e se apresentando como espetáculo e fascinação’.

O meio é a mensagem, afirma MacLuhan (1999), que complementa a ideia dizendo que as

massas não escolhem, não produzem diferenças, mas indiferenciação – elas mantêm a fascina-

ção do meio, que preferem à exigência crítica da mensagem. O termo meio que se refere MacLu-

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han nos faz entender que é por onde se chega a informação ou a mensagem que a industria cul-

tural pretende formatar.

Transformados em consumidores passivos, os ouvintes divorciam-se da consciência, estabe-

lecendo-se o bloqueio da transcendência antes inspirada pela música séria. No lugar desta, estabe-

lecem-se os repetitivos clichês e estereótipos que deseducam a sensibilidade das massas, levando-

as à ingênua regressão e à aceitação de mistificações da realidade.

Ao invés de se buscar a arte, finda-se por buscar o lazer e o descanso dos corpos e das men-

tes, regados generosamente pelo conformismo diante das agruras sociais .

A espacialização das relações sociais que objetivam práticas de consumo cultural (material

ou não) está fortemente relacionada ao conceito de lugar.

Este lugar constitui então um elemento de sentido para quem nele habita e contribui para

a capacidade interpretativa dos seus observadores, o que encaminha a constituição das caracte-

rísticas fundamentais associadas aos lugares para autor: pretenderem-se identitários, relacionais

e históricos.

A ideia de Identitário se explicita como expressão de “nascer em um lugar”. É o lugar onde

as pessoas interagem com os símbolos da cultura e vivem os costumes que aprenderam na sua

história de vida.

Patrimônio Cultural Imaterial

O Patrimônio Cultural Imaterial se caracteriza pelas práticas, representações, expressões, co-

nhecimentos e técnicas e também os instrumentos, objetos, artefatos e lugares que lhes são associ-

ados e as comunidades, os grupos, e, em alguns casos, os indivíduos que se reconhecem como par-

te integrante de seu patrimônio cultural.

O Patrimônio Imaterial é transmitido de geração em geração e constantemente recriado pelas

comunidades e grupos, em função de seu ambiente, de sua interação com a natureza e de sua his-

tória, gerando um sentimento de identidade e continuidade, contribuindo assim, para promover o

respeito à diversidade cultural e à criatividade humana.

As culturas populares, segundo Néstor Garcia Canclini (2004), se constituem por um proces-

so de apropriação desigual dos bens econômicos e culturais de uma nação ou etnia, por parte dos

seus setores subalternos,e pela compreensão, reprodução e transformação real e simbólica das

condições gerais e específicas do trabalho e da vida.

O termo cunhado como popular, quer representar o conjunto de produção de objetos materi-

ais ou imateriais em uma determinada cultura, onde as classes subalternas criam para garantir a

sua identidade na sociedade ou para mostrar a sua forma de ser.

Ao discutir a festa como conceito e objeto, “tudo indica que o capitalismo cooptou as festas

populares e foi cooptado por elas, mas também que o povo vem reinventando suas festas nas no-

vas condições de vida, resultantes de novos contextos econômicos e sociais.

Exemplificando o arrocha, manifestação genuinamente da Região do Recôncavo baiano, so-

fria muito preconceito por parte das elites de classe média. Quando esta se tornou um produto da

indústria cultural, esta manifestação passou a ganhar destaque na mídia, assim como o Axé Music,

o Funk, no Rio de Janeiro, entre outros exemplos.

Do mesmo modo no carnaval, quando os blocos de trio apresentam os seus cantores e ban-

das para arrecadar milhões de reais com vendas de abadas. E não muito diferente, os camarotes.

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Mas o que está por trás disso tudo? Uma elitização dos grupos que podem comprar os pro-

dutos da indústria cultural. Os blocos de abadás ofereceram o status aos mais ricos, ainda que as

pessoas das classes populares não deixassem de ira à festa, à sua maneira, como forma de imprimir

o seu caráter subversivo, satírico.

Observe um exemplo muito interessante, é o Pelourinho, Centro Histórico de Salvador, que

sofreu intervenções urbanas para atender uma demanda da indústria cultual. Em contrapartida, os

moradores foram expulsos de suas moradias.

Na verdade, houve uma adequação do patrimônio às demandas de mercado, inserindo no

contexto urbano um processo que forma lugares de exclusão sócio-econômica e afirmação de po-

der social em espaços públicos.

FESTAS POPULARES

A análise das festas para entender o universo cul-

tural do lugar, das pessoas, das experiências de alterida-

de, foi aparecendo naturalmente nas narrativas orais.

Aquilo que se concebe como ‘tradição’, costume não são

imutáveis, ao contrário, são constantemente revisitadas e

transformadas em resposta às novas experiências.

Nas festividades, é possível perceber a dinamici-

dade de ações, interações, sociabilidades e construção de

identidade dos diferentes grupos sociais. É muito co-

mum na Bahia, as cidades que não possuem carnaval,

realizarem as micaretas.

Termo deriva do francês Micarême, uma festa que

acontecia na França, desde o século XV, em meio ao perí-

odo de quarenta dias de penitência da Igreja Católica. De

origem francesa, a palavra significa literalmente "meio da

quaresma". No Brasil, a introdução da Micarême como festa urbana, ocorreu primeiramente nas

grandes capitais brasileiras, como Rio de Janeiro, Belo Horizonte.

No Brasil, o que é denominado "carnaval fora de época", deriva-se de uma festa francesa,

Mi-carême, e desde os anos noventa vêm se espalhando por várias capitais e cidades brasileiras,

também em países como Canadá e Portugal, e na Bahia em Jacobina e Feira de Santana.

IDENTIDADE

Os fenômenos sociais e culturais, segundo Michel de Certeau (2002), resultam das práticas

vivenciadas no cotidiano. As práticas culturais estão sempre em consonância com o contexto histó-

rico dos territórios onde são realizadas.

Assim como o de cultura, o conceito de identidade transformou-se ao longo do tempo e teve

(ou tem) diferentes acepções. Até o advento da globalização, fenômeno que estudamos, o conceito

de identidade era bem limitado.

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Um homem que vivesse, por exemplo, durante a Revolução Industrial na Inglaterra, teria sua

identidade social e individual decisivamente marcada por três fatores: trabalho, classe social e lugar.

No fim do século XX, a globalização econômica, as novas tecnologias da informação e da

comunicação e a emergência da sociedade do conhecimento, mudaram radicalmente esse quadro.

A noção de identidade tornou-se múltipla, móvel, escorregadia e passou, então, a atrair o interesse

dos intelectuais.

Para Bauman (2003), vivemos em um mundo líquido, no qual as relações sociais dissolvem-

se e “escorrem”, frouxas e sem peso. Assim como a indústria do consumo nos leva a trocar cons-

tantemente de carro, computador, celular e TV, em busca de uma satisfação que nunca vem, a “li-

quidez” do mundo atual nos leva a querer trocar o tempo todo de identidade e relacionamentos,

inclusive amorosos.

Nessas mudanças de identidade, o mercado se ajusta inteiramente organizado à procura do

consumidor que, por sua vez, mantém-se permanentemente insatisfeito. Esse comportamento evita

que quaisquer hábitos adquiridos sejam diluídos em nome do excitado o apetite dos consumidores

de sensações cada vez mais intensas e sempre novas experiências.

Para Bauman (1998), essa é a identidade que se ajusta ao mundo da cultura de massa, a arte

de esquecer é um bem mais importante do que a arte de memorizar. Associado a isso, esquecer é

mais do que aprender, é a condição de contínua adaptação na cultura de massa. Sempre novas

coisas e pessoas entram e saem de cena sem muita ou qualquer finalidade. A memória é como uma

fita de vídeo, sempre pronta a ser apagada, a fim de receber novas imagens. (BAUMAN, 1998)

Segundo Stuart Hall (1996) (1999), a identidade coletiva pode ser pensada segundo duas

perspectivas: a da semelhança e a da diferença. Na perspectiva da semelhança, os indivíduos se

agrupam em comunidades imaginadas, segundo aquilo que têm em comum.

A perspectiva da semelhança, porque nela o indivíduo se percebe, em essência, como perten-

cente a determinado grupo — é a que predominou até o fim do século XX.

Nas décadas de ouro do Estado-Nação, estimulava-se fortemente a construção à semelhança

da identidade nacional, de maneira que os indivíduos se percebessem, antes de qualquer coisa,

como alemães, brasileiros, japoneses etc.

Além de aumentar as chances de cada país na competitividade internacional, essa estratégia

estimulava os jovens a “morrer pela pátria” nas inúmeras guerras do século XX.

Com a emergência de poderosos organismos supranacionais, como a União Européia, o FMI

e o Banco Mundial, e com a decadência do Estado de Bem-Estar Social, o Estado-Nação vai per-

dendo sua força, junto com a ideia de identidade nacional.

Em outras palavras: ter a identidade coletiva de negro pode ser libertador, se você consegue

obter direitos com isso, como o de processar alguém por racismo; mas também pode ser uma “cami-

sa-de-força”, se a sociedade exigir que você siga o “estereótipo do negro” e o rejeite caso não o faça.

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2 BLOCO 2 – A INTERCULTURALIDADE

2.1 TEMA 03 - A FORMAÇÃO CULTURAL DO BRASIL

2.1.1 CONTEÚDO 9 - O CONCEITO SÓCIO-ANTROPOLÓGICO DE CULTURA E IDENTIDADE

A INTERCULTURALIDADE

Você já ouviu alguma vez alguém dizer assim: nasci no Rio de Janeiro e me criei na Bahia,

portanto sou mais baiano que carioca? Mas por que as pessoas dizem isso? É pelo fato de ser mais

importante a sua naturalidade ou a cultura pela qual essa pessoa foi educada?

Os intercâmbios culturais entre sociedades coincidem com o início da história da humanida-

de, desde a Grécia Clássica e o Império Romano, com as inúmeras trocas e interações ocorridas no

Mediterrâneo, passando pela expansão da Europa em direção à América e a África. Como se vê,

sempre ocorreu o contato entre diferentes culturas (CANCLINI, 2006).

Nos anos setenta e oitenta do séc. 20, um forte movimento emigratório para o continente eu-

ropeu provocou uma transformação demográfica em algumas cidades européias, e teve como con-

seqüência o surgimento de situações limites de tolerância.

Os emigrantes que vieram das ex-colônias européias (na África, América Latina e Ásia) for-

çaram o convívio dos europeus com o “outro”. Naquela década os emigrantes freqüentam as “ruas

e praças, mercados e igrejas, escolas e cinemas”, e cotidianamente disputam vagas de emprego,

submetiam-se à tutela do Estado como responsável por sua saúde, pela educação de seus filhos e

por sua seguridade social. E por outro lado, esses emigrantes trazem consigo valores que colocam

em cheque as suas tradições morais como instituição familiar e monogamia.

Mas quem é o outro de que se trata aqui?

O outro é aquele estranho os seus costumes de comer, falar, cultuar um deus, esta-

belecer laços afetivos, entre outros aspectos.

É neste contexto que surge o conceito de interculturalidade, usado para indicar um conjunto

de propostas de convivência democrática entre diferentes culturas, buscando a integração entre

elas sem anular sua diversidade.

Aparecem dois conceitos importantes:

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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Convivência

democrática

Os emigrantes podem desfrutar da rede de proteção social – segurança,

saúde, educação, entre outros benefícios – assim como os nativos euro-

peus.

Diversidade

cultural

O respeito e tolerância as diversidades de tradições e identidades sem

preconceito ou xenofobia.

Xenofobia, que é isso?

É um substantivo feminino que significa desconfiança, temor ou antipatia por pessoas es-

tranhas ao meio daquele que as ajuíza, ou pelo que é incomum ou vem de fora do país.

Explicados os conceitos, surge um novo: multiculturalidade que indica a coexistência de di-

versos grupos culturais na mesma sociedade sem apontar para uma política de convivência.

A questão da interculturalidade ultrapassou os limites dos países hegemônicos a partir do

final do séc. 20 com a globalização dos mercados que são operados por instituições transnacionais

e com a diminuição do poder dos estados-nações.

Também a criação de um mercado mundial, onde são efetuadas trocas de bens materiais,

mensagens e imigrantes, proporcionou um aumento de fluxos e interações e diminuiu as fronteiras

entre as nações do planeta.

Apesar de já termos estudados sobre a globalização vale a pena acrescentar mais uma infor-

mação:

A globalização, quando definida em termos políticos e econômicos, aponta para uma sub-

missão da civilização mundial às práticas do mercado com a prevalência do modelo centro-

periferia, ou seja, continua a mesma lógica de apenas os países mais ricos levarem vantagem sobre

os países em desenvolvimento.

O desenvolvimento das tecnologias de comunicações e as facilidades de deslocamento per-

mitiram um aumento dos contatos entre pessoas, ideias, bens e significados provocaram também

um maior contato entre as diversas culturas.

A Interculturalidade não se sustenta sem as trocas simbólicas en-

tre as deferentes culturas, ou melhor, sem a diversidade cultural. Sem

um nível de tolerância e respeito à diferença da cultura alheia.

Segundo os estudiosos do assunto, o fenômeno da globalização

tem o efeito de evidenciar a diversidade cultural do mundo e apontar

para a necessidade de diálogo entre estas diferentes civilizações.

Mas não sejamos ingênuos. Os países centrais não são tão toleran-

tes assim como eles costumam propagandear. Basta atentar-se um pou-

co para a nova lei anti-imigração da União Européia. Por pressão política dos patriotas, os governan-

tes da União vêm restringindo a presença de imigrantes ilegais na região, inclusive ameaçando a

aplicar penas como prisão e deserção forçada.

Para o mestre Milton Santos, a globalização é uma fábula que defende um mercado avassa-

lador global, supostamente capaz de homogeneizar o planeta, quando na verdade acentua as desi-

gualdades locais.

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

53

Ele disse fábula que significa narração popular ou artística de fatos puramente imaginados.

Como conseqüência, enquanto o consumo impera neste mercado global é incentivado, o mundo

se torna mais distante de uma verdadeira cidadania universal (SANTOS, 2006).

E já que até agora não paramos de discutir conceitos vou rechear o nosso estudo com mais

dois: desigualdade e diferença.

Para Canclini (2006), apesar de esses termos estarem, na maioria das vezes, intrinsecamente

relacionados, a desigualdade se manifesta como disparidade sócio-econômica enquanto a diferen-

ça transparece nas práticas culturais.

Vivendo e aprendendo!

Trazendo para a realidade brasileira, tendo como e-

xemplo a migração nordestina para os grandes centros ur-

banos do centro-sul do país, ficou explicito que o forte fluxo

migratório possibilitou a constituição de um grupo social

que tinha em comum sua origem e uma identidade cultural

própria, diferente da cultura urbana do centro-sul.

Apesar da utilização desta mão de obra abundante,

com baixa qualificação técnica e barata, ter sido um dos mo-

tores do desenvolvimento acelerado desta região, o grupo

de migrantes nordestinos foi tratado de forma desigual e preconceituosa pelas forças hegemônicas

destas cidades.

Podemos identificar neste caso brasileiro a utilização da diferença cultural para esconder a

questão de fundo que é a desigualdade social. Por isso que defendo que a inter-relação entre

cidadania e interculturalidade.

Outro exemplo ainda mais evidente e que permeia toda a realidade do Brasil é a questão da

inserção dos afro-descendentes na sociedade brasileira após a abolição da escravatura.

Este grupo étnico de forte identidade cultural, porém historicamente privado de cidadania e

direitos humanos, desde sua chegada ao país, foi um dos maiores contribuintes ao desenvolvimen-

to do mesmo. No entanto este mesmo grupo continua excluído e marginalizado após mais de cem

anos de abolição, com resultados sociais desastrosos como analfabetismo, desemprego e violência,

apesar de sua origem tanto histórica quanto geográfica e sua identificação étnico-cultural ser di-

versa dos grupos dominantes nacionais.

Estas duas interfaces culturais conflituosas têm seus respectivos contrapontos. A convi-

vência destes grupos culturais com a cultura hegemônica também permitiu sua penetração na so-

ciedade, gerando a mestiçagem, o sincretismo religioso e, indo mais além: a construção de uma

identidade nacional comum.

A construção da identidade brasileira se deu principalmente através da valorização da cultu-

ra nacional e particularmente através da música popular: o grande sucesso da música nordestina

que se inicia desde a década de 40 com Luiz Gonzaga na Rádio Nacional, passou por ciclos de su-

cesso e permanece até hoje como fenômeno de mercado como o forró universitário e os grupos de

forró espetacularizados.

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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A contribuição da cultura negra foi significativa na construção da identidade nacional. É

fundamental destacar a eleição do samba como símbolo da cultura brasileira, passando a represen-

tar a mesma tanto no Brasil como no exterior.

Segundo Hermano Vianna, este fato é resultado das mediações entre os diversos grupos cul-

turais ocorridas desde o fim do séc. XIX (VIANNA, 1995).

CULTURA E IDENTIDADE

São muito interessantes esses dois conceitos para a compreensão da sociedade com a qual li-

damos cotidianamente. Não há sociedade sem cultura, tampouco cultura sem sociedade. Assim

afirma o antropólogo, Levi Strauss. Do mesmo modo que não há cultura sem identidade

Entende-se cultura por um conjunto de crenças, costumes, atividades de um grupo social.

Segundo o inglês Antonny Giddens (2005), cultura de uma sociedade compreende tanto aspectos

intangíveis – as crenças, as ideias e os valores que forma o conteúdo da cultura, como também as-

pectos tangíveis – os objetos, os símbolos ou a tecnologia que representam esse conteúdo.

Vamos exemplificar?

Pois pense um monumento de uma cidade. Pensou? Pois ali constam elementos intangíveis e

tangíveis, ou seja, material e imaterial. Por quê? Para cada imagem projetada no monumento quer

se expressar uma ideologia, um valor, uma crença.

Desse modo podemos concluir que Cultura é a soma das ideias, práticas e dos objetos mate-

riais compartilhados que as pessoas usam para se adaptar aos seus ambientes.

Roque Laraia (2005) traz o conceito de determinismo biológico e geográfico. O primeiro é

derrubado pelo próprio desenvolvimento das sociedades. Embora haja diferenças anatômicas e

fisiológicas, estas não são responsáveis pela forma de comportamento do ser humano.

A conclusão antropológica é que “o comportamento dos indivíduos depende de um aprendi-

zado” chamado processo de endoculturação. O determinismo geográfico, segundo o qual “as dife-

renças do ambiente físico condicionam a diversidade cultural”, também encontra barreiras práticas.

Como exemplo, considera-se as diferenças entre os lapões e os esquimós (os primeiros habi-

tantes da calota polar ao norte da Europa e os segundos, ao norte da América). Embora em ambi-

entes semelhantes, possuem características distintas entre si. Diferenças também são observadas

entre índios na América do Norte e no Brasil.

E é certo que não há cultura sem a identidade. A identidade é observada a partir de diferen-

tes prismas. Não há como vivenciar uma identidade cultural específica se esta não for incorporada

à identidade pessoal de cada agente social.

Vivemos um tempo de um sujeito com identidades fragmentas e múltiplas que põe em ques-

tão uma série de certezas firmadas.

Quando discuto esse tema, gosto muito de fazer uma analogia com a digital de dos dedos de

uma pessoa que não é igual à de outra pessoa?

Identidade é aquilo nos dá sentido individual ou coletivo, é a fonte de significado e experi-

ência de um povo. Conjunto das características próprias e exclusivas de um indivíduo ou uma co-

letividade.

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Identidade social refere-se à característica que são atribuídas a um indivíduo pelos outros.

Como exemplo de identidades sociais, podemos citar o estudante, a mãe, o advogado, o católico,

asiático, sem-teto, disléxico, casado.

Falar em identidade cultural é exigida à compreensão de um tempo de mudanças onde o

moderno vive no mesmo patamar do tradicional.

Não há uma anulação das tradições antigas para serem substituídas por outra, mas é possí-

vel que diferentes realidades convivam em diferentes tempos e no mesmo espaço e estas possam

ser vivenciadas concomitantemente pelas pessoas.

Tenha como exemplo o São João. O Forró do São João da Roça agora está nos shows espeta-

cularizados da indústria cultural. Mas isso não impede que as pessoas vivenciem o forró tradicio-

nal. É comum pessoas dizerem: gosto mais do forró pé de serra. Não é verdade? Então, vale apenas

evidenciar mais um conceito para problematizar a questão da identidade cultural.

É o conceito de “supermercado cultural global”: como pensar em culturas nacionais quando

uma boa parcela da população mundial, diariamente, escolhe aspectos da sua vida nas prateleiras

de um supermercado cultural global?

As opções de escolha disponíveis a todos são inúmeras: tratando-se de comida, por exemplo,

pode-se comer ovos e bacon no café da manhã, lasanha no almoço e sushi no jantar; como entrete-

nimento, pode-se ouvir jazz, samba, reggae e salsa; no campo da religião, pudesse escolher entre se

tornar cristão, budista ou ateu.

Observe nas fotografias exibidas que o Brasil é constituído de várias identidades e que isso

pesa sobre a vida das pessoas.

A imagem de como as pessoas se apresenta, mostra como elas são na sociedade a que perten-

ce, pois o exterior exerce um importante papel na formação de nossa identidade, que está presente

no nosso imaginário e é transmitida por meio da cultura.

A identidade é o que nos diferencia dos outros, o que nos caracteriza como pessoa ou como

grupo social. Ela é definida pelo conjunto de papéis que desempenhamos e é determinada pelas

condições sociais decorrentes da produção da vida material.

Quando nos referimos à identidade cultural, nos referimos ao sentimento de pertencimento a

uma cultura nacional, ou seja, aquela cultura em que nascemos e que absorvemos ao longo de nos-

sas vidas.

A globalização, portanto, cria um modo de vida em que os processos de formação da identi-

dade estão relacionados ao consumo de mercadorias. Esse processo destrói as culturas locais e sua

identidade cultural, ou do resultado desse contato surge uma nova cultura que contém elementos

tanto da cultura local quanto da cultura dominante.

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A CRISE DE IDENTIDADE NA PÓS-MODERNIDADE

A identidade entra em crise quando muitos valores não mais respondem as nossas tradições.

Quando é preciso rever os nossos conceitos. Quando nos voltamos para compreender o nosso

tempo que não é mais aquilo que idealizamos na nossa educação.

Estamos na pós-modernidade, em face de demandas que a modernidade não tinha. O ho-

mem do ideal humanista começa a ruir quando suas fronteiras já não conseguem mais sustentar

sua integridade.

A crise individual das identidades singulares soma-se a crise coletiva das identidades nacio-

nais, pois o processo de globalização denota a fluidez das fronteiras nacionais, igualmente difusas.

A chamada crise de identidade pode ser compreendida como um processo de fragmentação

do indivíduo moderno. As referências que davam ao indivíduo certa sensação de pertinência em

um universo centrado onde as pessoas poderiam dizer que tudo estava seguro, de alguma forma,

entra em crise, e passam a se constituir em algo descentrado e fragmentado.

Podemos ver que as ideologias, o casamento, a segurança de que fazer um curso superior lhe

garante emprego de imediato. Tudo isso fragmenta a identidade no mundo pós-moderno.

Isto se caracteriza em algumas mudanças explicitadas a seguir:

Somos incapazes de promover grandes mudanças na sociedade porque agora somos indiví-

duos isolados de qualquer construção histórica.

Isso reflete nos movimentos sociais e nas lutas políticas por uma sociedade mais igualitária.

Os partidos políticos perderam a sua força, entre outros exemplos. O mundo sonhado como coleti-

vo, agora se tornou individualista.

Outro aspecto diria que vivemos na crise de não mais ser o corpo o elemento central para as

relações interpessoais.

A internet vai sendo o ponto de encontro em que as pessoas podem simular aquilo que às

vezes não são, ou melhor, simular uma identidade que não possui de fato.

Outro aspecto é que se considera que as novas instituições disciplinam as populações mo-

dernas. Todas as dimensões humanas estão sob o rígido controle das instituições.

As câmeras nas ruas e nos shoppings. As telenovelas ditam os estilos de vida e o que deve-

mos consumir. A Receita Federal controla o nosso movimento financeiro e os nossos passos são

controlados pelos meios tecnológicos que usamos.

A necessidade de se obter melhor desempenho com menos esforço (consumo de menos re-

cursos) exige uma Mudança de abordagem, uma descontinuidade obtida através da inovação. Po-

deríamos pensar em carros mais potentes consumindo menos combustível, ou consumindo outros

tipos de combustíveis, ou simplesmente um novo tipo de locomoção.

A inovação tem sido uma das prioridades em muitas organizações no mundo todo. Existe uma

ideia de que “inove ou evapore”, mostrando que é a única fronteira que pode diferenciar qualquer

tipo de organização, e que garanta a sua sustentação. Algumas empresas correm para poder inovar

em algum produtos/serviço, processo ou mesmo criando um novo tipo de negócio, porque sabem

que se não fizerem outras empresas farão. Existe a crença de que a inovação pode trazer lucros signi-

ficativos para a empresa e um diferencial competitivo, até que ela seja copiada por alguém. Por isso a

inovação tem que ser uma constante, para que se possa manter sempre com um novo produto ou

uma carta na manga contra a concorrência. Além dessa visão empresarial e econômica, podemos ver

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a inovação como uma maneira de resolvermos os atuais desafios que enfrentamos no mundo, pro-

blemas de meio ambiente, problemas de transporte, alimentação, saúde, energia.

CULTURA E IDENTIDADE NACIONAL

Um dos mecanismos de identificação do sujeito é o sentimento de nacionalidade como per-

tencente a uma nação.

O sentimento de identidade e lealdade é gerado pela ideia de que a nação é uma comunida-

de simbólica e, portanto, compartilhada por um número suficientemente grande de indivíduos

capazes de dar ao homem uma significação de pertencimento.

O processo de globalização aparece como um dos fatores responsáveis pelo processo de des-

locamento dessa ideia de identidade nacional, uma vez que, diante de tal realidade, o nacional

parece diluir-se.

Todavia, segundo Hall, o nacional não são apenas as fronteiras: “uma cultura nacional é um

discurso” (HALL, 2003, p.50).

Somos brasileiros apenas por termos nascidos no Brasil?

O conceito de identidade é complexo e não

se refere apenas ao sujeito da ação, à esfera pú-

blica e a retorna para a subjetivação mediada

pelos valores, sentidos e símbolos de uma cultu-

ra específica.

A noção de identidade além de ser históri-

ca também é fruto das fantasias e do imaginário

social sobre a ideia de cultura nacional. E essa

ideia tange a esfera política e ideológica de co-

mo tal cultura é representada seja pelo povo seja

pelos aparelhos ideológicos e institucionais.

As mais gerais são aquelas associadas à ideia de uma mesma raça, religião, língua e costumes,

além da questão das fronteiras, dos limites territoriais que favoreciam o sentimento de nação.

Qualquer análise com coesão histórica e política mostra que tais fatores são equivocados;

primeiro porque nem todo povo possui uma etnia una nem mesmo uma religião, os credos, a lín-

gua e os costumes.

É fácil verificar a diversidade racial e lingüística de muitos países; mas como ocorre a subje-

tivação desses elementos para proporcionarem o sentimento de nacionalidade? Mesmo conside-

rando que nação é uma ideia real construída historicamente, como se afugentar das tradições e dos

ícones nacionais?

A questão da identidade e da cultura brasileira estrutura-se a partir de elementos já forma-

dos e “inerentes” à estrutura social, como a ideia mítica de um país “abençoado por Deus”, um

paraíso sem terremotos nem desgraças, ela está num movimento constante de adaptação e reestru-

turação de elementos novos que a atualizam.

Portanto, pressupor uma cultura nacional é construir um leque multifacetado de discursos

que dão sentidos, coerência e organização aos que se consideram possuidores de uma identidade

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nacional, pois através desses sentidos estabelecidos entre alguns elementos “nacionais”, o sujeito

poderá se reconhecer (identificar) com a nação.

2.1.2 CONTEÚDO 10 - CULTURA BRASILEIRA: A MULTIPLICIDADE DE INFLUÊNCIA

A FORMAÇÃO DO BRASIL

Que no faz realmente brasileiro é o fato de ter nascido no Brasil ou a nossa cultura? Pois vi-

mos nas aulas virtuais que a identidade é um conceito essencial que nos ajuda na compreensão do

modo de ser da sociedade brasileira.

Há uma tendência de pensar um Brasil Civilizado a partir de uma visão redentora, ou me-

lhor, a visão de que o Brasil precisava passar pelo processo de civilização a partir de parâmetros

eurocêntricos para se tornar uma nação civilizada.

O único caminho para se construir a identidade nacional seria

o país se adequar à ideologia do embranquecimento ou tendo como

alternativa uma civilização nova, mestiça e original.

Com publicação de “Casa Grande e Senzala” por Gilberto Fre-

yre, em 1933, se transformaria em clássico maior da nossa literatura

social. Gilberto Freyre dá ênfase aos elementos culturais na análise

do comportamento de diferentes grupos étnicos e raciais.

Na formação da nação brasileira, depois da sua independência,

a análise culturalista de Gilberto Freyre foi fundamental para a construção de uma interpretação

de etnias e culturas.

Freyre sugere a substituição do conceito de "raça" pelo de "cultura", na imagem que os brasi-

leiros fazem de si mesmos.

Com o abandono de "raça", fica muito mais fácil "construir-se a nação dos mestiços”.

Em certos momentos, a nossa cultura é profundamente desvalorizada por nossas elites, to-

mando-se em seu lugar a cultura européia, ou mais recentemente a norte-americana, como modelo.

Como reação, em outros momentos nota-se que certas manifestações da cultura brasileira

passam a ser extremamente valorizadas, exaltando-se nossos símbolos nacionais (Oliven, 1982).

Artigo de Ruben George Oliven (1982) que retrata a formação cultural do Brasil, ele afirma

que os Intelectuais como, Sílvio Romero, Euclides da Cunha, Nina Rodrigues, Oliveira Viana e

Arthur Ramos se empenharam em explicar a sociedade brasileira através da interação da raça e do

meio geográfico. Eles se apresentam como profundamente pessimistas e preconceituosos em rela-

ção ao brasileiro que é caracterizado, entre outras coisas, como apático e indolente.

Outro aspecto, tido como processo inverso ao mencionado, busca-se a representação do Bra-

sil pela valorização daquilo que seria mais autenticamente brasileiro. Uma tendência já manifesta

no século XIX nos escritos dos representantes da escola indianista da nossa literatura e atinge seu

apogeu nos romances de José de Alencar, nos quais se valorizam nossas raízes nacionais: o índio, a

vida rural etc. (Pereira de Queiroz, 1980).

O movimento modernista de 1922 representa dois processos distintos. Por um lado significa

a reatualização do Brasil em relação aos movimentos culturais e artísticos que ocorrem no exterior;

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por outro lado implica também em buscar novas raízes nacionais valorizando o que haveria de

mais autêntico no Brasil.

O que é mais autêntico no Brasil?

Uma das grandezas do movimento consiste justamente em ter colocado tanto a questão da atua-

lização artístico-cultural de uma sociedade subdesenvolvida, como a problemática da nacionalidade.

Todavia, o Manifesto Regionalista de Gilberto Freyre, em 1926 ─ que cinquenta anos mais

tarde ele chamaria de "regionalista, tradicionalista e a seu modo, modernista" ─ tem um sentido

inverso ao de 1922. Trata-se de um movimento que não exalta a inovação que atualizaria a cultura

brasileira em relação ao exterior, mas que deseja, ao contrário, preservar não só a tradição em ge-

ral, numa região economicamente atrasada.

A preocupação de Freyre era a necessidade de reorganizar o Brasil como nação, combatendo

as conseqüências maléficas de modelos estrangeiros que são impostos aos brasileiros sem levarem

consideração suas peculiaridades e sua diversidade física e social.

Para Freyre,

[...] uma região pode ser politicamente menos do que uma nação. Mas vitalmente, e cul-

turalmente é mais do que uma nação; é mais fundamental que a nação, como condição de

vida e como meio de expressão ou de criação humana. Um filósofo, no legítimo sentido,

tem que ser super ou supranacional; mas dificilmente ele pode ser supra-regional no sen-

tido de ignorar as condições regionais da vida, da experiência, da cultura, da arte e do

pensamento que lhe cabe julgar ou analisar (FREYRE, 1947, p. 140-1).

O analisar o Nordeste, ele afama que esta região estaria perdendo a consciência de seus valo-

res históricos e de suas possibilidades devido à padronização decorrente da conquista industrial

do mundo e aos efeitos de influências semelhantes no Brasil.

Há uma forte crítica à influência do capital estrangeiro sobre o país e sobre a cultura

brasileira. Por isso critica as mudanças no contexto das cidades, em especial, a mudança nos nomes

das ruas, que terminaram homenageando pessoas insignificantes, assim como defende a culinária

nordestina com o receio de que esta poderia ser descaracterizada.

Para Oliven (1982), pelo menos duas leituras podem ser feitas do Manifesto Regionalista. A

primeira veria nele um documento elaborado por um intelectual que representa uma aristocracia

rural e que vê a ordem social passar por transformações que colocam em cheque o padrão

tradicional de denominação.

Sua reação é de cunho tradicionalista e saudosista e assemelha-se à reação aristocrática frente

às mudanças decorrentes da urbanização e da industrialização e que estavam vazadas numa crítica à

perda dos valores comunitários e da pureza cultural que supostamente teriam existido no passado.

E a segunda, de fato, o Manifesto suscita uma série de questões que são recorrentes em nossa

história: estado unitário versus federação, nação versus região, unidade versus diversidade, nacio-

nal versus estrangeiro, popular versus erudito, tradição versus modernidade.

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Há que considerar que a influência européia foi muito

forte na formação da cultura brasileira, principalmente a de

origem portuguesa. Durante 322 anos, o País foi colônia de Por-

tugal e houve uma transplantação da cultura da metrópole para

as terras sul-americanas.

Em maior número, os colonos portugueses chegaram à

colônia a partir do século XVIII, sendo já neste século o Brasil,

um país Católico e de língua dominante portuguesa.

Os indígenas, segundo alguns historiadores, depois de

séculos de dominação moura e relação com outras civilizações

facilitaram o contacto entre os colonos portugueses e os indíge-

nas brasileiros, todavia isso não impediu que os nativos fossem

dizimados pela ação colonizadora.

As primeiras décadas de colonização houve uma rica fu-

são entre a cultura dos europeus e a dos indígenas, dando mar-

gem à formação de elementos como a Língua geral, que influ-

enciou o português falado no Brasil, e diversos aspectos da cul-

tura indígena foram herdados pela sociedade brasileira.

Esta contribuição não impediu que houvesse a dizimação

dos povos indígena, e um processo denominado de aculturação

através da ação da catequese e a intensa miscigenação, o que

contribuiu para que muitos desses aspectos culturais fossem

perdidos.

A influência indígena faz-se mais forte em certas regiões do país em que esses grupos conse-

guiram manter mais distantes da ação colonizadora e em zonas povoadas recentemente, princi-

palmente na Região Norte do Brasil.

A cultura africana chegou através dos povos escravizados trazidos para o Brasil num longo

período que durou de 1550 a 1850.

A diversidade cultural de África contribuiu para uma maior multiplicidade do povo brasilei-

ro. Os próprios escravos eram de etnias diferentes, falavam idiomas diferentes e tinham tradições

distintas.

Assim como a indígena, a cultura africana fora subjugada pelos colonizadores. Os escravos

eram batizados com nomes portugueses antes de chegarem ao Brasil. Na colônia aprendiam o por-

tuguês, e obrigados a converterem-se ao catolicismo.

Alguns grupos, como os escravos das etnias hauçá e nagô, de religião islâmica, já traziam

uma herança cultural e sabiam escrever em árabe e outros, como os bantos, eram monoteístas.

Através do sincretismo religioso, os escravos adoravam os seus orixás através de santos Ca-

tólicos, dando origem às religiões afro-brasileiras como o Candomblé.

Os estudos literários e folclóricos de Sílvio Romero e os etnológicos de Nina Rodrigues

revelam uma ambiguidade intrínseca, que resulta da tensão entre o engajamento ou a

simpatia pela causa da abolição e a adoção de teorias sobre a inferioridade das raças ne-

gra e das culturas não europeias (ZAMONER, ET ell, 2004).

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A representação que se faz do negro como bom de samba e de futebol acaba por complemen-

tar a ideia de que eles são geneticamente inferiores a outras etnias em sua capacidade intelectual.

O movimento modernista na década de 1920 retomou e valorizou o indígena, eram idealistas

Gilberto Freyre, Oliveira Vianna, Aluísio Azevedo, Graça Aranha, Mário de Andrade, Jorge Amado.

2.1.3 CONTEÚDO 11 - INTERCULTURALIDADE: RAÇA E ETNICIDADE UM CONCEITO HÍBRIDO NO BRASIL E AS RAÍZES DAS “CIÊNCIAS RACIALISTA”.

O RACISMO CIENTÍFICO

Neste texto estudaremos um tema muito polêmico NO MUNDO e no BRASIL que mexe com

vida de milhões de pessoas cotidianamente: RAÇA E ETNIA.

Mas antes de conceituarmos esses termos vamos conhecer outros que fazem parte do com-

portamento social e cultural que segrega e discrimina.

A partir de então, a discussão sobre as etnias que formam a sociedade e a cultura brasileira

ganham novos contornos.

Identificar-se como afro-descendente, por exemplo, é mais uma escolha pessoal de cada um

do que propriamente uma definição por meio das características físicas ou biológicas, assim como

ser judeu ou cigano. Não são os traços físicos que definem a sua etnia, mas a sua opção a cultural.

Mas alguns termos muito usado dia-dia por nós, explicam aspectos desse universo que se-

grega as pessoas no Brasil: racismo, preconceito, estereótipos, discriminação e genocídio.

Racismo

Preconceito

Estereótipos

Discriminação

Genocídio

Por racismo entende-se uma idealização preconcebida de que as pessoas ou grupos de pes-

soas se acham superior ao outro que é diferente na aparência e na origem cultural.

Racismo é antes de tudo, a expressão de desprezo por uma pessoa, apenas por esta pertencer

ao um grupo. Como por exemplo, ao dizer: “eu não gosto desse índio porque todos os índios são

preguiçosos!”

O termo racista é um termo relativamente recente e vem de “raça” que bem mais antigo, mas

que não havia referencia no latim base lingüística do português.

No entanto, raça passou a se denominar grupo de pessoas com as mesmas características físi-

cas, mesmas origens geográficas e mesmos hábitos culturais.

Entenda melhor a noção de raça assentava-se na característica genética passadas de pais para

filhos: cor da pele, formato da cabeça, o tipo de cabelo.

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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Mas hoje é provado que não é bem assim, pois o fator “cultura” que significa conjunto de

padrões de comportamentos, crenças, conhecimentos e costumes, que é mais importante na dife-

renciação entre os grupos humanos.

As características biológicas entre indivíduos de origem diferentes, como cor da pele, a tessi-

tura do cabelo, nada explica, por exemplo, que um povo é desenvolvido que outro.

É a história, e não a natureza, que explica o desenvolvimento desigual de um povo.

Conheça outros termos que lhe ajudará na compreensão do tema da nossa aula.

O preconceito. É um prejulgamento, ou seja, o juízo ou julgamento que se faz antecipada-

mente, precipitado apenas pela aparência, sem que se conheça a essência de alguém, de um grupo

ou mesmo de um objeto.

Racismo é então preconceito.

O indivíduo racista parte de uma idealização de si mesmo para desvalorizar a pessoa ou

grupo que ele considera inferior.

Essa idealização resulta de uma impressão mental fixa, numa opinião preconcebida, deriva-

da não de uma avaliação espontânea e sim de julgamento repetidos rotineiramente.

Estereótipo é uma fotografia que nossa imaginação produz. É uma ideia preconceituosa,

uma superposição, que se cria, de um grupo de pessoas, a partir do comportamento de um ou

mais indivíduos daquele grupo.

Por exemplo, quando você ver nos livros de História, gravuras de negros apanhando e cho-

rando, você pode criar o estereótipo de que o negro é covarde e medroso.

Outro exemplo, se você sempre, nas novelas de televisão, os

negros servindo às mesas, limpando o chão, você pode criar o es-

tereótipo de que todo negro é subserviente. Mas isso é uma im-

pressão falsa. Do mesmo modo quando se retrata o índio como

selvagem ou o português de sujo, “burro”, apesar de serem avali-

ados de trabalhadores, econômicos, religiosos, bondosos e sim-

ples.

Daí surge outros conceitos que são a discriminação, que é a

forma de tratamento desigual do outro ou de seu grupo; e a segre-

gação que é a separação física de grupos, baseada no racismo; mo-

lestamento é que a agressão física por motivos raciais, e podendo

chegar ao extremo do genocídio.

Mas não podemos perder de vista que o racismo

é uma estratégia de dominação. Por quê?

Toda vez que se quer dominar um povo, o racis-

mo é usado como estratégia, pois todos os elementos

estudados até aqui: estereótipo, discriminação, segre-

gação, molestamento e genocídio, mostram que são

formas de controle social das minorias étnicas.

Agora, minoria, se os negros são maioria? Pois é,

não tem nada a ver com quantidade de pessoas ou coi-

sas, mas espaço de poder que os grupos possuem na

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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sociedade que estão inseridos. Os negros são maioria, mas os seus direitos políticos, sociais e civis

ainda são muito restritos, apesar das leis do Brasil não indicar que os detentores de outras etnias

sejam os privilegiados.

Então a definição de raça que era usada para seres humanos era a mesma usada para animais

irracionais, por isso acreditava-se que havia raças melhores outras piores.

Acreditava-se que a raça era o determinante do progresso das nações. Pelo menos assim en-

tendia o francês Conde de Gobineau, concebia que a pureza da raça é fundamental para impedir

ela se enfraqueça. E que foi a liderança dos brancos, principalmente arianos, que se construíram as

grandes nações.

No século XVIII, os sábios justificavam a inferioridade de raças pelo viés religioso, ou seja,

como uma determinação de Deus. E depois como uma questão de clima e ambiente onde nascia.

Em 1859, a teoria do inglês Charles Darwin publicada no livro “A Origem das espécies” foi

mal compreendidas e foi utilizada para reforçar o racismo. Com isso se difundiram que havia gru-

pos humanos superiores, por que evoluídos mais que outros, e o parâmetro era a SELEÇÃO DAS

ESPÉCIES.

Essa evolução classificava os grupos negros e amarelos como inferior ou primitivo por que

não havia o espírito dos brancos que colocava o trabalho e desenvolvimento como parte da civili-

zação branca em outras palavras.

Então, o darwinismo interpretado pelos intelectuais racista do século XIX, definia que a evo-

lução dos seres primitivos havia se produzido conforme uma seleção natural.

Foi Gobineau que estruturou a em seu livro “Ensaio sobre a Desigualdade das raças huma-

nas”, as bases da ideologia que ficou conhecida como “racismo científico”; e que pregava a superi-

oridade da chamada “raça nórdica”: loura, originária do norte da Europa Ocidental.

Mesmo no século XX, essa concepção tinha muita força, e no Brasil foi uma ideia muito di-

fundida, por volta da década dos 20, pelo sociólogo Oliveira Vianna. A superioridade da raça aria-

na foi um argumento que foi muito assimilado no Brasil e no mundo, trazendo consequências drásti-

cas para as etnias que não eram ariana, como negros e amarelos. Por outro lado, serviu a ideologia do

racismo científico para justificar o colonialismo europeu.

Negros e índios eram tidos como “selvagens” e “canibais”, pois para tais concepções precon-

ceituosas e racistas os cientistas se baseavam na teoria da “hierarquia das raças”. O tema é muito

complexo, mas nada que você não possa compreender. Tudo depende de paciência e dedicação.

Para tanto, gostaria de indicar um livro muito legal, escrito em forma de romance pelo escri-

tor e compositor carioca Ney Lopes (2007): “O Racismo explicado aos Meus filhos”.

OS MÉTODOS DE DOMINAÇÃO PELA “COR”

Quando a discriminação racial combina com a discriminação contra o pobre, têm-se as mais

claras situações de exclusão em diversos setores, por variados processos.

Todo processo social resulta em mudanças e esta mudança depende do nível de conflito que

são gerados na sociedade. Para isso, ao mesmo tempo em que as elites buscam aperfeiçoar os seus

métodos de dominação, utilizando-se de preconceito, discriminação, segregação, por outro lado, o

movimento social de resistência aponta novas alternativas para que os direitos individuais, políti-

cos e civis possam ser garantidos.

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Para compreender estes processos, vamos fazer uma revisitação a história das lutas dos ne-

gros nos Estados Unidos e áfrica do Sul. Pois vivemos em um momento de reivindicações organi-

zadas e de busca de alternativas que levem a diminuir as desigualdades sociais, inclusive as gera-

das pelo racismo.

Além dessa condição legal, foi de suma importância para a construção do mito da democra-

cia racial o diálogo entre abolicionistas brasileiros e norte-americanos, no século XIX, em que se

identificava a sociedade brasileira como paradisíaca frente ao inferno racial que era a sociedade

norte-americana.

O termo “negro” tem vários significados que varia conforme o lugar, a época e o contexto

que ela aparece, e pode significar, na sociedade brasileira, ofensa ou carinho.

Na época colonial, negro era sinônimo de escravo. Quando não se queria ofender um africa-

no ou descendente, principalmente se fosse livre, usava-se a expressão “pessoa de cor”.

No Brasil, as pessoas que lutam pela ampliação dos direitos afro-descendentes usam a ex-

pressão negro para se referirem descendentes de africanos para em qualquer grau de mestiçagem.

Os negros constituem um grande grupo de populações humanas distribuídas na África e O-

ceania, e, em virtude do trafico africano de escravos, também por boa parte das Américas. Muitos

autores consideram também como negros alguns indivíduos de populações da Índia, localizado no

sul do país.

Hoje quando se fala “negro”, o que vem a cabeça de qualquer pessoa: é o africano ou des-

cendente, de pele mais ou menos escura, cabelos muito ou pouco encarapinhados, nariz largo, lá-

bios grossos, testa e maças do rosto salientes.

Pouco as pessoas ou quase ninguém se lembra de um aborígene da Austrália ou indianos. A Á-

frica não é um “continente negro” e sim um todo de muitas etnias e muitas culturas vindas da Ásia.

E se falamos de escravidão somos obrigados a discutir o seu conceito assim como o de servidão

e o de cativo. Mas uma pergunta: por que os negros africanos foram escravizados pelos europeus?

A escravidão vitimou o continente africano, tornando-se o elemento que consolidou a ideia

de inferioridade dos negros.

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Escravidão é uma forma de trabalho forçado, na qual os direitos individuais da pessoa e a fa-

culdade de explorar economicamente seu trabalho são propriedade de uma pessoa. O escravo é,

então, alguém cujo corpo pertence ao outro que faz dele o que bem entender.

Cabe lembrar que o racismo norte-americano foi ao extremo da segregação étnica. Com a cri-

ação da Klu Klux Klan a violência contra os negros foi intensa.

A Klu Klux Klan era uma organização terrorista racista que afirmava pela força, a superi-

oridade dos brancos de origem anglo-saxão e de religião protestante, sobre negros, judeus e ca-

tólicos.

A organização estendeu a sua influencia até Cuba, tendo tentado também chegar ao Brasil.

Então, a imprensa norte-americana atribuía aos negros uma série de crimes, levando a passa-

rem a viver um clima de terror e histeria coletiva, fortalecendo o Ku Klux Klan.

Somado a isso, as teorias do “racismo científico”, então em plena divulgação, contribuía para

a imposição e a aceitação da ideia de selvageria e inferioridade do povo negro.

Foram vários protestos organizados pelas organizações de militância negras que se uniram

num longo boicote ao sistema de ônibus em toda a cidade onde ocorrera o incidente.

A esse boicote, seguiu-se a organização de outras manifestações, sempre bem sucedidas, o

deu também lugar ao surgimento de novas entidades de defesa.

É nesse momento que surge uma liderança muito influente nas lutas raciais nos EUA, o pas-

tor Martin Luther king Jr.

Lutando pelos direitos civis do povo negro, mas posicionando também contra a Guerra do

Vietnã e ligando a continuação desse conflito ao crescimento da pobreza entre negros, índios e

brancos miseráveis da região, o doutor King, como ficou conhecido, assassinado em abril de 1968.

Essas lutas resultaram na aprovação em 1964, de um novo Ato dos Direitos Civis que viera

abolir oficialmente a segregação, ficando proibida a discriminação em acomodações públicas e em

programas mantidos pelo governo;

As escolas públicas sendo obrigada a receber brancos e negros indiscriminadamente;

Ficando garantida a igualdade de condições entre os candidatos a empregos, constituindo-se

uma Comissão de Oportunidades de Emprego para investigar os casos de violação da lei.

É certo que nem todos os grupos do movimento negro norte-americano ficaram satisfeitos

com esses direitos conquistados, dando a origem a outras organizações que defendiam uma ação

mais radical.

Na áfrica do Sul não foi diferente. As lutas contra o racismo foram sob forte resistência do

povo negro que não aceitava o Apartheid.

Apartheid quer dizer separação, em 1910, teve amparo legal na Constituição sul-africana,

como esse instrumento legal, os negros foram privados de votar e possuir terras.

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O Apartheid dividia a população sul-africana em três categoria: os brancos, negros e os

bantos. Estes, então, eram chamados de “cafres”. Mais tarde, a minoria de imigrantes indianos e

paquistaneses veio constituir uma quarta categoria, a dos asiáticos.

Tudo isso como objetivo de cada vez mais os já limitados direitos dos africanos negros em sua

própria terra, e estabelecer o controle da minoria branca sobre 80% do território da África do Sul.

A forte resistência negra promoveu diversas mudanças no país. O movimento teve como

principal liderança Nelson Mandela, em 1994, se tornou presidente da república, e, com a aprova-

ção da nova constituição e a eleição democrática.

Então, somente as lutas impulsionam as mudanças sociais. E nenhum movimento social é

igual ao outro, cada país reinventa as suas estratégias por que as condições históricas específicas.

DEMOCRACIA RACIAL E O IDEAL DE EMBRANQUECIMENTO NO BRASIL (I)

Podemos conceber o Brasil como um país racista?

A crença no mito da democracia racial é estruturante do sentimento de nacionalidade brasi-

leiro, a ponto de operar uma rara concordância valorativa entre as diferentes camadas sociais que

formam a sociedade nacional.

Na formação da nação brasileira, depois da sua independência, a análise culturalista de Gil-

berto Freyre foi fundamental para a construção de uma interpretação de etnias e culturas.

O Brasil, a falta de homogeneidade étnica e racial, faz dele um país multicultural por voca-

ção, apesar das discriminações "sutis" ocorrerem, e um país mais aberto às diversas identidades

étnicas existentes no mundo.

O mito da democracia racial não nasceu, em 1933, com a publicação de Casa Grande e Senza-

la, por Gilberto Freire, mas ganhou, através dessa obra, sistematização e status científico – para os

critérios de cientificidade da época.

Tal mito tem o seu nascimento quando se estabelece uma ordem, pelo menos do ponto de vista

do direito, livre e minimamente igualitária. É, na verdade, um país que rejeita teoricamente o racis-

mo, embora na prática apresente sinais de discriminação dos negros e dos mestiços provenientes da

mistura entre os vários negros e "brancos" que aqui aportaram e os indígenas que aqui já estavam.

A partir do final do Século XIX, em decorrência dos processos abolicionistas e de Proclama-

ção da República, passa a ocorrer entre as elites dominantes em nosso país a necessidade de for-

mulação de uma identidade nacional. Em vários segmentos da sociedade, tanto nos chamados

“novos movimentos sociais” quanto nos setores governamentais, busca-se uma definição mais pre-

cisa na identificação dos afro-descendentes brasileiros, com o objetivo de implementar políticas

públicas de inclusão social, com o processo de colonização do século XVI, as atividades econômi-

cas passaram a exigiam cada vez mais trabalhadores. E foi a África que forneceu a mão de obra

necessária para o trabalho escravo, inicialmente, na lavoura de cana de açúcar.

Mantendo forte ligação com Angola, Moçambique, Congo e países do Golfo da guiné, o trafi-

co de africanos trouxe para o Brasil, entre as a primeira metade do século XVI e meados do século

XIX, aproximadamente cinco milhões de indivíduos provenientes de mercados africanos.

O abolicionismo europeu refletiu no Brasil ao mesmo

que tempo em que se difundia as ideias do racismo científico.

O próprio Conde de Goubienau, que serviu como diplomata e

era intimo de D. Pedro II, foi o portador dessa difusão.

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Com a abolição da escravatura, acreditava-se que o mestiçamento da população brasileira fosse

levá-la ao “embranquecimento” , ideia muito difundida na propaganda oficial, que teve como prin-

cipal favorecimento a imigração européia, e a restrição à entrada de africanos no país ate mesmo de

asiático.

A Abolição da Escravatura não devolveu a esses indivíduos a cidadania que lhes foi usur-

pada, junto com a sua própria condição humana, quando arrancaram de suas terras e os submete-

ram a um dos mais terríveis regimes escravistas conhecidos pelo ser humano.

As condições de vida dos afro-brasileiros, após a Lei Áurea, representaram uma segunda

cassação de sua cidadania. Abolida a escravidão e proclamada a Republica, as elites dirigentes

incumbiram-se de criar “um novo povo” mestiço, mas próximo do branco europeu.

Os afro-descendentes passaram a ocupar os centros urbanos, sobretudo as favelas, formando

os bolsões de miséria nas cidades, aumentando os estereótipos de incivilizados e um empecilho

para a civilização brasileira.

O mito da democracia racial brasileira foi disseminado como uma forma de dificultar a dis-

cussão da identidade negra, considerada pelas elites como destituída de sentido, pelo fato de o

país ser essencialmente mestiço. Essa ideia, por exemplo, na literatura de Jorge amado, vem até

hoje ocultando a verdadeira face do racismo e o combate a ele e a sua conseqüente eliminação. As-

sim, conforme a democracia racial brasileira, um bom negro era empregado doméstico, o motorista

da família, a babá, o sambista, a mulata assanhada, o jogador de futebol, etc. A democracia racial

brasileira é um recurso muito usado para negar a existência do racismo entre nós. Essas pessoas

reconhecendo a baixa condição social e econômica do negro, ela não se deve ao racismo e sim a

fatores puramente econômicos.

Por desconhecimento, essas pessoas negam o fato de essas pessoas de origem africana constru-

ir uma barreira e intransponível à mobilidade social, econômica e política do povo negro no Brasil.

Algumas ascensões sociais são exceções: ministros de Estado e do Supremo Tribunal Federal.

Este poder, por exemplo, somente depois 173 anos de funcionamento, um negro conseguiu chegar

esse posto.

As elites brasileiras por muito tempo ignoraram a questão racial e a discriminação como es-

tratégia de manutenção no poder. O racismo foi escondido estrategicamente em uma imagem de

pobreza. Pelas contradições sociais do país perpassa as questões raciais que deve ser enfrentada

como elemento estratégico.

Segundo o pesquisador de questão racial, Abadias Nascimento, o brasileiro tem recurso na-

tural, mas passa fome, que é naturalmente rico mas vive endividado, que negro e mestiço mas

quer ser europeu.

Tanto que foi apregoada a ideia de que o Brasil não é um país racista acabou por se enraizar

na consciência nacional. Nessa perspectiva, para conviver com o próprio racismo, o qual embora

não se mostre claramente, pode ser visto no dia a dia, na rua, no trabalho, na escola, no lar, até

mesmo entre suas próprias vitimas. O mito da democracia racial ainda impera no Brasil, mas com

menor força. As políticas públicas voltadas para o setor e as ações afirmativas tem sido essencial na

mudança de mentalidade da sociedade.

DEMOCRACIA RACIAL E OS DESAFIOS PARA A IMPLEMENTAÇÃO DE AÇÕES

AFIRMATIVAS NO BRASIL (II)

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Pois é, buscando negar essa articulação com do afro-descendente sempre a miséria ou a con-

dição de inferioridade, que a partir da década de 1970 que houve uma ascensão dos movimentos

negros voltados para a afirmação da identidade negra como parte da nacionalidade.

Foi com essa ação que se denunciou a construção da imagem do negro estilizada e pitoresca

assim como se difundiu na literatura. Buscando uma estética própria, através da dança, musica,

das artes visuais, da expressão corporal, das roupas, dos penteados, etc., ainda que essa estética

proviesse da cultura de massas manipuladas pelas grandes corporações internacionais, como por

exemplo, a chamada cultura hip-hop.

Há também uma condição que é a ação afirmativa ou assistência compensatória, como re-

compensa aos não brancos estarem submetidos por tanto tempo a exploração e dominação colonial

e escravista.

A assistência desdobra-se em duas modalidades de ação afirmativa: a defesa e a promoção.

O mito da democracia racial está sendo desnudado, mas é preciso reparar de alguma forma

os malefícios e prejuízos causados pela escravidão.

Isso por quê?

Em 2001, depois de estudos realizados pela ONU e o governo brasileiro ficou constatado que

negros que representa 43,3% da população brasileira, representam 64% dos pobres e 69% dos indi-

gentes; A pesquisa também mostrou que a desigualdade social estava associada a formas sutis de

discriminação racial e era razão maior que impedia o desenvolvimento da população negra no país.

Nesse quadro, o analfabetismo penaliza muito mais os negros que os brancos.

Do total de Brasileiros matriculados no Ensino Superior, apenas 2% são negros.

A política de quotas para acesso de afro-descendentes à educação, ao emprego, a saúde, a mo-

radia é certamente uma importante arma de combate ao racismo. Não bastam as cotas, é preciso

preparar a escola e as outras instituições, como o universo do trabalho, o da saúde pública, etc. para

a valorização dos povos afro-descendentes, de sua história, de suas conquistas, de seus anseios.

É preciso melhora a sociedade brasileira, tornando-a digna desse segmento tão importante,

lhe dando acesso às oportunidades de emprego e moradia, melhorando a educação, ao lazer.

O sistema de cotas para os pobres, ainda que seja a maioria negra, resolveria o problema dos

pobres, mas não dos negros. É preciso também considerar a sua condição étnica.

No entanto, não adianta tornar todo mundo escolarizado, se as políticas de desenvolvimen-

tos não dão conta dessa necessidade, se a estrutura da terra continuar concentrada nas mãos de

poucos ou se os negros que estudam enfrentarão problemas de sempre no mercado de trabalho.

2.1.4 CONTEÚDO 12 - PLURALIDADE RELIGIOSA: UM DIÁLOGO PERMANENTE COM O “OUTRO” E A EDUCAÇÃO INTERCULTURAL.

CULTURA E PLURALIDADE RELIGIOSA

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A Pluralidade Religiosa contribui para a formação de uma consciência de respeito ao outro que

cultua a sua fé, conforme a religião que melhor se identifica ou mesmo que nenhuma religião possui.

A palavra religião vem do latim “religare” que dizer ligação com o ser superior. Neste sen-

tido, não a cultura sem religião, independente de que o culto seja praticado a partir de um dog-

ma ou uma instituição religiosa católica, petencostal, candomblecista, mulçumana ou budista.

Os tempos em que vivemos são marcados por profunda e essencialmente pela convivência

entre diferenças. Não há mais uma visão homogênea e dominante sobre o mundo, o ser humano,

Deus, a religião.

Pelo contrário, há visões diferentes que se cruzam e se interligam, procurando e desejando

conviver.

E quando este convívio não acontece, temos um triste panorama de violência ou de guerras

religiosas que hoje assolam o Oriente Médio ou a intolerância, que acontece no mundo inteiro sob

todas as suas formas, desde a mais elementar à mais sofisticada.

Aquele Brasil do início do século XX, hoje dificilmente se reconhece o mesmo país, a não ser

pela língua e pelo território. Observando apenas algumas das mais visíveis mudanças, notamos

rapidamente que a população cresceu sobremaneira, o país urbanizou-se e industrializou-se, as

desigualdades regionais e sociais se acentuaram. Igualmente salta aos olhos a emergência de uma

pluralidade religiosa.

A rigor, o Brasil sempre foi uma sociedade plural em termos religiosos, e tanto na Colônia

como no Império encontramos criativas formas de relacionamento entre as diversas manifestações

religiosas e o catolicismo, a religião oficial, sendo esta mesma bastante heterogênea.

O conceito de cultura escolhido para discutir o tema foi como a totalidade das atividades

humanas incluindo as atividades sócio-políticas, economia e ideologia, seja na esfera material, inte-

lectual, espiritual ou simbólica.

Através de sua cultura, os grupos sociais se adaptam ao seu meio ambiente, se associam uns

aos outros, criam laços intra e interculturais e se organizam em instituições sociais, expressam seu

pensamento e sentimento e interpretam seu estar-no-mundo e seus sonhos de um futuro melhor.

O diálogo entre culturas, então, é essencialmente democrático e potencialmente transforma-

dor, absorvendo, ainda, outras características que vão do embelezamento do mundo à realização

existencial de homens e mulheres como seres humanos autônomos. O contexto religioso também

está em evolução, e a identidade religiosa voltou à esfera pública de várias formas.

Enquanto o século XX foi dominado pelo confronto entre ideologias, a “identidade” está sur-

gindo como um dos aspectos que causam divisão no século XXI. Todos os cristãos são desafiados a

considerar sua identidade no contexto de uma nova pluralidade religiosa.

A rápida urbanização, a industrialização e a racionalização da agricultura de exportação

provocaram profundas modificações nas formas tradicionais de relacionamento social, produzindo

um ambiente propício para a emergência de uma pluralidade religiosa.

A questão religiosa apresenta, pois, outra face proeminente: a da pluralidade.

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O pluralismo está presente na história do Cristianismo desde os seus primórdios. Já desde os

primeiros séculos, o cristianismo nascido no seio do judaísmo deverá encontrar maneiras de co-

municar-se no seio do mundo pagão e politeísta da Grécia e da Roma antigas.

Face esta que, por sua vez, implicará igualmente na existência de uma interface: a das dife-

rentes tentativas do diálogo inter-religioso, da prática plurireligiosa e da religião do “outro” como

condição de possibilidade de viver mais profunda e radicalmente a própria fé.

Assim como há algo que só o outro gênero, o outro sexo, a outra cultura, a outra raça, a outra

etnia, podem ensinar em termos de mística, há também, sem dúvida, algo que apenas a religião do

outro, na sua diferença, pode ensinar, ou enfatizar.

Às vezes trata-se simplesmente de um ponto ou uma dimensão que vamos descobrir na nos-

sa experiência religiosa e do qual não nos havíamos dado conta.

No diálogo e no desejo de interlocução e encontro entre as religiões, experimenta-se o dilace-

ramento entre o amor e a verdade. No fundo mais profundo do desejo inaudito de ir ao encontro

do outro está igualmente o desejo de com ele aprender coisas que só o Espírito de Deus no outro

pode ensinar. Mas para que diálogo haja, haverá que fazê-lo sem perder a identidade da própria

experiência.

Neste sentido, a pertença religiosa no início deste novo milênio nos obriga a repensar categori-

as tão fundamentais da vida quanto tempo e espaço, conteúdo e forma, razão e imaginação. Esta não

pode fazer-se senão em contínua e fecunda interface com a ciência da religião e a espiritualidade.

QUE PLURALIDADE RELIGIOSA É ESSA?

Com uma história escrita sob os "olhares e ditames de

Roma", o Brasil religioso católico por natureza - vem de-

monstrando em seus últimos Censos populacionais, que não

é mais assim tão católico como antes.

O surgimento e o grande crescimento de inúmeras i-

grejas evangélicas é uma realidade visível em todas as esfe-

ras da sociedade brasileira.

De acordo com o Censo 2000, o número de pessoas que

se denominam evangélicas cresceu de 6,66% na década de

80, para 15,41%.

Ou seja, um aumento de mais de 100% em 20 anos.

Outro aspecto que merece destaque no campo religioso brasileiro é o de que a pluralidade re-

ligiosa no Brasil é um fato. Como se observa, a existência dos “sem religião” já aponta para uma

mudança na forma de crer, pois a instituição religiosa não é mais um centro que define a crença

Daí a emergência de nos adaptarmos ao novo mundo brasileiro, respeitando e convivendo

com o diferente, como uma forma de educação e tolerância religiosa.

Obviamente, a liberdade religiosa que assistimos nos últimos tempos e a estruturação da so-

ciedade moderna, favorecem tanto o crescimento dessa pluralidade religiosa, quanto o abandono

da religião formal.

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A sociedade moderna e urbana tem obrigado as pessoas provenientes de sociedades tradi-

cionais ou rurais, não são obrigados a permanecer na religião tradicional. A religiosidade hoje, os

vínculos tornam-se quase que exclusivamente experimentais. A própria ideia de liberdade religio-

sa revela-se compatível com diversos graus de concretização, a depender das circunstâncias fáticas

de cada caso concreto. A sociedade brasileira atravessou nas últimas décadas um processo de mo-

dernização, dessacralização e reavivamento religioso.

As mudanças que esse processo desencadeou são visíveis: aumento do número de pessoas

que se declaram sem religião, crescimento dos adeptos das igrejas pentecostais e diminuição no

número de católicos.

Sendo assim, uma das características mais marcantes da atual sociedade brasileira é a sua

crescente pluralidade religiosa. O fato de pertencer a uma religião deixou de estar ligado á tradi-

ção familiar e passou a ser uma opção livre, como a opção política, própria do homem jurídico que

habita uma sociedade democrática.

EDUCAÇÃO INTERCULTURAL

A educação intercultural vislumbra-se contribuir para uma sociedade democrática e multi-

cultural, fundada no diálogo, na assunção da diversidade, e na possibilidade de todos os seres

humanos assumirem-se politicamente frente o mundo e tomar a história em suas mãos. Para Mar-

tin Buber (1979), a verdadeira educação é aquela dialógica e que torna presente a essência de nossa

existência: a relação.

A educação dialógica é um momento mais que cognitivo, racional, pois engloba dimensões

outras, como a afetividade, a sensibilidade, a espiritualidade, a intuitividade. E para tratar sobre

espiritualidade, buscamos relacioná-la a educação.

Neste contexto invasivo, anti-dialógico e opressor, há uma naturalização do saber das clas-

ses dominantes que expressa a própria naturalização da divisão desigual da sociedade. Além

disso, a cultura do silêncio impede o desenvolvimento das capacidades criativas dos sujeitos em

formação, impõe o processo de padronização cultural levando à negação das diversidades exis-

tenciais e culturais.

Na interculturalidade na educação, o diálogo é o fundamento desta, pois seu princípio básico

é a abertura ao outro, o encontro entre sujeitos e culturas, a afirmação do direito de todos, inde-

pendentemente de etnia, religião, sexo, idade.

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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À medida que a inteculturalidade proporciona a afirmação e a vivência destes princípios dia-

lógicos, combate o autoritarismo, o etnocentrismo e a invasão cultural típicos da pedagogia bancária.

A sociedade a ser construída por meio da educação intercultural é eminentemente democrá-

tica e multicultural e a utopia professada é que, nestas, o ensino religioso nos estabelecimentos

públicos de educação oferece chances preciosas de criar em crianças e adolescentes interesse em

Deus e sua Palavra, a Bíblia, desenvolvendo neles abertura para um contato pessoal com Jesus

Cristo. Contudo, é preciso salientar que a oportunidade de ensino religioso nas escolas pública está

à disposição não só de evangélicos, mas também de todos os que praticam uma religião: espíritas,

budistas, candomblecista, etc.

O Ministério da Educação (MEC), em suas metas humanistas e pluralistas, não dá valor es-

pecial a Jesus. Todos os deuses e religiões são iguais e têm a mesma importância.

Até mesmo um pai ou mãe-de-santo que quiser, terá direito legal de dar aulas no ensino reli-

gioso. É assim que, em nome da liberdade democrática, o governo quer preencher a lacuna religio-

sa das escolas: dando espaço para todas as religiões.

Não sabemos exatamente de que modo as outras religiões tentarão aproveitar o espaço que o

governo está dando, porém estamos certos de que nossa responsabilidade é grande. A oportuni-

dade está aí para todos, porém se a negligenciarmos, outros têm a liberdade de pegá-la.

Ao contrário dos esforços do MEC de mostrar que tudo é igual na esfera religiosa, nas aulas

de religião precisamos deixar claro que a Bíblia não é apenas mais outro livro religioso com valor

espiritual comparável aos livros sagrados dos muçulmanos, hindus, etc. A situação é delicada, pois

o MEC manda “repudiar toda discriminação baseada em diferenças de… crença religiosa…”

A pluralidade religiosa nos exige uma postura que indica toda a religião como sendo o pri-

vilégio para encontrar a sua felicidade.

O MEC quer estender suas ideias de “pluralidade democrática” à esfera da educação religio-

sa nos estabelecimentos públicos de ensino, na esperança de formar nos futuros cidadãos a aceita-

ção, tolerância e harmonia entre as diferentes religiões.

Assim, os cristãos que sentem chamado para essa área precisam se preparar com paixão, sa-

bedoria e visão missionária.

Jesus diz: “Escutem! Eu estou mandando vocês como ovelhas para o meio de lobos. Sejam

espertos como as cobras e sem maldade como as pombas” (MATEUS, 10:16 BLH).

A educação intercultural se apresenta como uma forma de práxis transformadora que rejeita

qualquer forma de ver o mundo e as pessoas que nele vivem de forma homogênea, unívoca, unila-

teral. Daí que a ênfase das discussões sobre a diversidade cultural e o processo de construção de

identidades num contexto de pluralidade cultural é a relação que sujeitos, grupo, classes e culturas

estabelecem entre si.

A prática educativa intercultural valoriza a diversidade cultural no debate político democrá-

tico no combate contra qualquer forma historicamente reconhecida de manipulação ideológica,

massificação, esmagamento consensual e anti-dialógica. Pois os educadores dialógicos estão com-

prometidos a escutar sensivelmente os grupos culturalmente oprimidos, sua voz de esperança e de

vida melhor, e com eles buscar alternativas e soluções para os nossos problemas.

A prática do diálogo viabiliza a vivência democrática na qual cada pessoa tem o direito de se

expressar, de ser ouvido e de intervir de forma crítica e consciente na realidade, pois só no diálogo

é possível a práxis crítica.

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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PLURALISMO RELIGIOSO: O DIÁLOGO E ALTERIDADE COMO CHAVES PARA A

CONSTRUÇÃO DE UMA CULTURA DE PAZ

Ações de diálogo e reflexão para a superação da intolerância religiosa estão entre os princi-

pais pilares das organizações ecumênicas no Brasil. “É inviolável a liberdade de consciência e de

crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a pro-

teção aos locais de cultos e suas liturgias” diz o artigo 5, inciso VI da Constituição Federal. A liber-

dade religiosa é também um dos direitos fundamentais da humanidade, como afirma a declaração

universal dos direitos humanos

O artigo XVII da Declaração Universal tem como prerrogativa:

“Todo ser humano tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião;

este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar

essa religião ou crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância, em público

ou em particular”.

As manifestações de intolerância ainda ocorrem com muita freqüência,

quase sempre associadas à discriminação racial, étnica ou de classe social. Muitos

ainda são os embates travados, por exemplo, por religiões de matriz africana co-

mo o candomblé: culto dos orixás, de origem totêmica e familiar.

A religião, que tem por base a “anima” (alma) da Natureza, sendo, portan-

to chamada de anímica, foi desenvolvida no Brasil com o conhecimento dos sa-

cerdotes africanos que foram escravizados e trazidos da África para o Brasil, jun-

tamente com seus hábitos, sua cultura, e seu idioma.

O desconhecimento e o preconceito levam a muitas ações de intolerância

como a invasão e depredação de locais de culto. Muitas comunidades de terreiros

têm sido apoiadas em ações de promoção da igualdade racial que buscam supe-

rar a ignorância e o preconceito por parte de segmentos das igrejas cristãs.

A realidade das diferenças religiosas não deve ser vista como traços negativos, mas como si-

nais ricos e substanciosos. A existência das diferenças é que propicia o crescimento e o aprendiza-

do. As identidades religiosas permanecem frágeis quando desprovidas da possibilidade de um

enriquecimento com a alteridade.

O outro é capaz de propiciar dimensões inusitadas e belas que escapam cada visão em parti-

cular. A cada dia cresce a percepção de que o único caminho possível para a paz é o do diálogo, a

compreensão mútua e a hospitalidade inter-religiosa.

Qual é a base que serve de ponto de partida para o cristão entrar

em diálogo com o fiel do Candomblé?

A pluralidade de religiões não pode ser vista apenas como um

fenômeno sociocultural que não pode ser ignorado e que deve ser res-

peitado como sinal de bondade.

A pluralidade de religiões pode ser inclusive compreendida

como conseqüência da liberdade humana e da diversidade do ser

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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humano na busca de uma resposta às suas questões existenciais ante às suas limitações.

Antes e independente de qualquer escala de valores dos conteúdos de fé do Candomblé‚ este

precisa ser percebido como Candomblé‚ isto é, uma religião em sua autonomia.

O Candomblé reivindica o seu espaço como religião.

A reivindicação do outro ou não é percebida (não levada a sério) ou é simplesmente negada

(tida como não-verdadeira). É o encontro através da negação do outro: o concorrente é sentido

como ameaça que precisa ser eliminada.

A consciência de respeito da própria relatividade concorre para outra atitude no encontro

com o fiel de outra crença: a atitude de quem está à procura; e esta é justamente a atitude daquele

que deixa espaço para que o Espírito possa agir.

MÍDIA E RELIGIÃO

A comunicação é a força que dinamiza a vida das pessoas e das sociedades; a comunicação

excita, ensina, vende, distrai, entusiasma, dá status, constrói reputações, orienta, desorienta, faz rir,

faz chorar, inspira, narcotiza, reduz a solidão.

Na contemporaneidade, a comunicação religiosa assumiu novos contornos com a utilização

dos meios de comunicação massiva.

Hoje as igrejas encontram-se irremediavelmente submersas numa parafernália de símbolos e

apelos midiáticos, e mergulhadas na aberta permissão para a existência de uma, por vezes, “incô-

moda” pluralidade religiosa.

Assim, a comunicação nos mass media passa a ser adota-

da nas diversas denominações religiosas com muita facilidade, e

normalmente é vista como um instrumento eficaz no competiti-

vo mercado religioso.

Por este motivo, os meios de comunicação tanto impressos

quanto eletrônicos, têm sido veículos de grande importância na

difusão e sustentação de várias religiões no Brasil e no mundo.

As estatísticas comprovam que as televisões e as rádios

brasileiras estão abarrotadas de programas religiosos, em sua

maioria, programas cristãos.

Isso sem mencionar as emissoras de propriedade de denominações religiosas. Atualmente,

no Brasil, diversos programas religiosos são veiculados diariamente em canais abertos e em TVs

por assinatura.

Dessa forma, não se trata simplesmente da presença constante de uma propaganda ideológi-

ca no sentido estrito do termo, mas de uma nova forma de anunciar a fé cristã, através da aberta

possibilidade de utilização dos meios de comunicação de massa.

Deve-se atentar para o fato de que o discurso religioso na mídia tem uma estratégia de co-

municação baseada na prosperidade. Trata-se de uma autêntica propaganda religiosa dirigida às

massas, com apelos nem sempre éticos quanto à veracidade dos milagres anunciados.

Hoje esta visão sofreu diversas modificações. Artistas, intelectuais, empresários, políticos, a-

tletas, e muitas outras pessoas, têm se tornados evangélicos declaradamente. Não mais se pode

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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negar que a pluralidade religiosa protestante tem assumido contornos inusitados e conseguido se

estabelecer de forma contundente dentro do universo religioso.

No geral, a comunicação midiática tem estabelecido com o sagrado um diálogo interessante.

A possibilidade de escolher, através da mídia, adquirir produtos ou formas religiosas que melhor

se ajustem às necessidades individuais de cada fiel.

Isso justifica porque é possível encontrar católicos romanos em centros espíritas, praticantes

do candomblé tendo devoções a santos católicos, ou evangélicos que freqüentam diversas igrejas

simultaneamente:

O lugar mais propício para a exposição das características de cada religião são os meios de

comunicação de massa. Na mídia, os produtos religiosos e a própria religião, são cuidadosamente

apresentados em uma atraente embalagem.

O fato é que as mensagens religiosas adaptaram-se aos tempos da comunicação massiva e

geraram o maior vetor de ajustamento sócio-religioso de todos os tempos.

2.2 TEMA 04 – A VIRTUALIDADE E A URBANIDADE

2.2.1 CONTEÚDO 13 - A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO: A SOCIEDADE VIRTUAL

DESAFIOS DA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO

Entre as décadas de 1950 e 1980, a cultura ocidental sofreu transformações generalizadas, per-

cebidas nas artes, ciências, na filosofia, economia, política e nas relações sociais em geral, de tal sorte

que o modo como entendemos e lidamos com o mundo e como nos relacionamos uns com os outros

é bastante ou totalmente diferente daquilo que prevalecia antes da Segunda Guerra Mundial.

Há também uma variedade de termos contemporâneos, tais como: sociedade da informação,

era do conhecimento, sociedade em rede, sociedade pós-industrial. A sociedade da informação traz

novas responsabilidades para todos os atores sociais nela inseridos. A expressão “sociedade da

informação” transformou-se rapidamente em jargão nos meios de comunicação, alcançando, de

forma conceitualmente imprecisa, o universo vocabular do cidadão.

A sociedade da informação possui importantes ferramentas: A comunicação e a informação

em tempo real, nas quais as relações empresariais e

pessoais são facilitadas pelo livre e irrestrito acesso a

internet.

A vida diária encontra-se em um mundo digi-

talizado, e isso fez com que muitos dos costumes e

valores da sociedade fossem substituídos.

Hoje, podemos dizer que somos dependentes

das máquinas, principalmente dos computadores, da

rede internet e da telefonia móvel.

A expressão “sociedade da informação” passou a ser utilizada, nos últimos anos desse sécu-

lo, como substituta para o conceito complexo de “sociedade pós-industrial” e como forma de

transmitir o conteúdo específico do “novo paradigma técnico-econômico”.

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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A expressão “sociedade da informação” é mais utilizada numa dimensão global (ou mundi-

al), pois identifica os setores sociais, independentemente de sua implicação local, que participam a

favor dos “atores de processos produtivos, de comunicação, políticos e culturais que têm como

instrumento fundamental as TIC [tecnologias de informação e comunicação] e se produzem – ou

tendem a produzir-se – em âmbito mundial” (AGUDO GUEVARA, 2000 apud WERTHEIN, 2000).

Um olhar sobre a experiência concreta das sociedades da informação permite revelar como a

re-estruturação do capitalismo e a difusão das novas tecnologias da informação lideradas e/ou

mediatizadas pelo Estado estão interagindo com as forças sociais locais e gerando um processo de

transformação social.

As desigualdades de renda e desenvolvimento industrial entre os povos e grupos da socie-

dade reproduzem-se no novo paradigma.

A informatização de processos sociais ainda tem que incorporar as minorias sociais que vi-

vem na maior parte dos países em desenvolvimento. Entre essas, a população latino-americana,

compreendida por médios e pequenos produtores e comerciantes, docentes e estudantes da área

rural e setores populares urbanos, adultos, jovens e crianças, além dos marginalizados em situação

de desemprego e os “sem-teto”, estão longe de integrar-se ao novo paradigma.

Dessa maneira, formas organizativas da sociedade civil como ONGs, movimentos sociais,

sindicatos e associações de bairro podem contribuir para que os cidadãos exerçam sua cidadania

mediante provisão de informações relacionadas aos seus direitos políticos, civis e sociais conquis-

tados historicamente.

Antes de qualquer coisa, o Estado precisa encarar a informação como um recurso de gestão e

desenvolvimento para o país. Nessa ótica, assim como se concebem políticas direcionadas para os

setores de habitação, saúde, educação, segurança pública, geração de emprego e renda, cabe aos

governos dos três entes federativos desenvolverem políticas de informação.

De maneira mais precisa, enquanto o Estado pretende acabar com o analfabetismo digital,

condição necessária para a inserção do cidadão na sociedade virtual em rede, muitos brasileiros

ainda permanecem à parte da produção e da compreensão da palavra escrita, a qual soa mais co-

mo um privilégio de poucos, do que como um direito de todo cidadão.

O analfabetismo é o maior desafio a ser enfrentado pelo Estado para a consolidação de uma

sociedade da informação no Brasil, uma vez que, os estoques de informação disponíveis na Internet

encontram-se, em sua maioria, sob a forma de texto escrito, inacessíveis para cerca de 20 milhões

de brasileiros que não sabem ler e escrever.

Para muitos trabalhadores assalariados, o computador e a Internet ainda são categorizados

como bens de luxo, pois o preço médio desse equipamento corresponde a cerca de um terço da

renda média anual per capita do Brasil.

No que se refere à Internet, cabe lembrar que ela apresenta muitas questões a serem conside-

radas quanto à democratização da informação. A popularização dessa rede mundial, por exemplo,

trouxe consigo uma quantidade expressiva de informação, muitas vezes de qualidade duvidosa,

servindo mais para desinformar do que informar o cidadão.

A INTERNET

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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O surgimento da Internet foi, sem dúvida alguma, a matéria mais veiculada em todos os mei-

os de comunicação, universitário e científico, na última década.

No atual cenário de desenvolvimento do processo de globalização da economia, consolida-se

uma nova forma de relação entre a sociedade, o Estado, as ONGs, a academia e especialmente os

agentes econômicos.

Num golpe de demolição à soberania dos países, por meio de um processo de internacionali-

zação dos capitais e virtualização das relações econômicas, “a própria Sociedade se (re) organiza

em Rede” (CASTELLS, 2000, p. 2).

Esse novo paradigma tem segundo Castells (2000) as seguintes características fundamentais:

• A informação é sua matéria-prima: as tecnologias se desenvolvem para permitir ao homem atu-

ar sobre a informação propriamente dita, ao contrário do passado quando o objetivo dominante

era utilizar informação para agir sobre as tecnologias, criando implementos novos ou adaptando-

os a novos usos.

• Os efeitos das novas tecnologias têm alta penetrabilidade: isso porque a informação é parte

integrante de toda atividade humana, individual ou coletiva, e, portanto, todas essas atividades

tendem a ser afetadas diretamente pela nova tecnologia.

• Predomínio da lógica de redes: esta lógica, característica de todo tipo de relação complexa, pode

ser, graças às novas tecnologias, materialmente implementada em qualquer tipo de processo.

• Flexibilidade: a tecnologia favorece processos reversíveis, permite modificação por reorganiza-

ção de componentes e tem alta capacidade de reconfiguração.

• Crescente convergência de tecnologias: principalmente a microeletrônica, telecomunicações,

optoeletrônica, computadores, mas também e crescentemente, a biologia. O ponto central aqui é

que trajetórias de desenvolvimento tecnológico em diversas áreas do saber tornam-se interligadas

e transformam-se nas categorias segundo as quais pensamos todos os processos.

Exageros especulativos à parte, é preciso reconhecer que muitas das promessas do novo paradig-

ma tecnológico foram e estão sendo realizadas, particularmente no campo das aplicações das no-

vas tecnologias à educação.

Educação a distância, bibliotecas digitais, videoconferência, correio eletrônico, grupos de “bate-

papo”, e também voto eletrônico, banco on-line, video-on-demand, comércio eletrônico, trabalho a

distância, são hoje parte integrante da vida diária na maioria dos grandes centros urbanos no mundo.

A tecnologia virtual é acusada de disseminar na sociedade a utilização de um simulacro de

relacionamento como substituto de interações face a face e contra a alegada usurpação pelo capital

do direito de definir a espécie de automação que desqualifica trabalhadores, amplia o controle ge-

rencial sobre o trabalho, intensifica as atividades e corrói a solidariedade.

Os dados a seguir ilustram o contraste em relação ao acesso à informação pelas populações

de países industrializados e em desenvolvimento.

O surgimento e a ampliação da Internet foram a representação mais que empírica do fenô-

meno designado por “globalização”, já que tal meio de comunicação passou a desempenhar um

papel fundamental na sociedade mundial, pois vem mostrando que pode impedir qualquer tipo de

barreira à essa extraordinária amplitude e profundidade das interações transnacionais.

A sociedade globalizada, na qual se avança o novo paradigma, a emergência de novas forças

de exclusão se dá tanto no nível local quanto global e requer esforços em ambos os níveis no senti-

do de superá-las.

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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A INTERNET E O HIPERTEXTO

As Primeiras Máquinas de Calcular

A importância da linguagem digital ou a sacralização desta faz-se notar quando se tem dian-

te de si a rede mundial de computadores, a Internet, alterando e interagindo no comportamento da

sociedade e atuando diretamente na nossa cultura.

Atualmente, vê-se surgir uma nova concepção de leitura e leitor. A leitura que antes era feita

no livro de forma linear, hoje se apresenta na forma de Hipertexto.

Através do hipertexto informatizado tem-se contato com o que existe de mais novo e atual, a

velocidade das informações se processa em um ritmo que exige do profissional uma constante e

rápida de atualização.

Para evidenciar o significado dessas informações, tentar-se-á mostrar um pouco da dinâmica

da linguagem do hipertexto informatizado.

O termo computador é definido como aquele que faz cômputos, que calcula. Entretanto, as

operações a serem realizadas por um computador vão além de simples contas aritméticas que

marcaram o seu início e que motivaram sua construção. Foi a partir da II Guerra Mundial que o

desenvolvimento dos computadores eletrônicos ganhou mais força, pois o interesse pelas máqui-

nas aumentou em vários Estados, visto o grande potencial estratégico que elas possibilitavam.

Além disso, buscava-se uma forma de compartilhamento de informações de forma rápida e

segura e máquinas capazes de executar cálculos balísticos com rapidez e precisão para serem utili-

zadas na indústria bélica.

O hipertexto abre caminho para um novo entendimento da leitura, e evidencia a linguagem

que marca a era da informação. Esta modalidade do texto escrito propôs transbordamentos e re-

formações do espaço de significações, numa produção frenética que acelera os tempos do real para

o virtual.

Para Pierre Lévy (1999), as linguagens humanas virtualizam o tempo real, as coisas materiais,

os acontecimentos atuais e as situações em curso. Lévy atribui a linguagem à responsabilidade de

criar tempos, desintegrar ou reintegrar tempo e as situações que surgem na criação deste. O hipertex-

to é mais uma forma de re-elaboração do tempo, pois ele muda o comportamento do leitor. Há uma

hibridez de pensamentos e recepções do hipertexto que inaugura uma forma nova de ser e estar no

tempo. Não mais existe o texto inicial, mas há multiplicidades dos textos, das reais idades e as infini-

tudes das leituras e dos textos. A deslumbrante e libertadora abstração que verticaliza o pensamento

e impele o homem a continuar criando e redesenhando mundos em tempos diferentes.

EDUCAÇÃO E SOCIEDADE INFORMACIONAL

Ao longo da história da humanidade, os avanços tecnológicos sempre foram responsáveis

por transformações nos mais diversos campos de atividade. Hoje, o desenvolvimento informacio-

nal e técnico está modificando a sociedade sob diversos ângulos, e a educação não poderia ficar

alienada neste processo.

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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As novas tecnologias da informação e da comunicação vêm desafiando a humanidade pelas

transformações econômicas, sociais e políticas globalizadas, em um processo irreversível e cada

vez mais acelerado.

Para melhor visualizarmos os impactos das tecnologias na cultura contemporânea devemos di-

rigir nosso olhar para a educação como um processo complexo, inacabado e em permanente evolução.

Para Lévy, este novo meio tem a vocação de colocar em sinergia e interfacear todos

os dispositivos de criação de informação, de gravação, de comunicação e de simulação. A

perspectiva da digitalização geral das informações provavelmente tornará o ciberespaço o

principal canal de comunicação e suporte de memória da humanidade a partir do início do

próximo século (LÉVY, 1999).

Para Castells (2000), a partir do rompimento dos padrões espaciais em redes intera-

tivas, o “espaço de fluxos” passou a substituir o “espaço de lugares”.

Este espaço imaterial de fluxos realiza um processo de desmaterialização das relações sociais

e educacionais conectadas em rede. O que antes era concreto e palpável adquire uma dimensão

imaterial na forma de impulsos eletrônicos.

O virtual é uma nova modalidade de ser, cuja compreensão é facilitada se considerarmos o

processo que leva a ele: a virtualização. “O real seria da ordem do ‘tenho’, enquanto o virtual seria

a ordem do ‘terás’, ou da ilusão, o que permite geralmente o uso de uma ironia fácil para evocar as

diversas formas de virtualização” (LÉVY, 1996, p. 15).

O “lugar virtual” está apoiado em quatro eixos primordiais, que são: o tempo-real, a desterri-

torialidade, imaterialidade e interatividade.

Tais aspectos possibilitam relações sociais simultâneas e acesso imediato a qualquer parte do

mundo, inaugurando uma nova percepção do tempo, do espaço e das relações sociais. Neste novo

século, a sociedade se caracteriza pela vasta quantidade de informação em fluxo e por seu conse-

qüente acesso, bem como a acelerada alteração e atualização da informação. A educação contem-

porânea mostra que os atuais paradigmas não atendem mais o momento atual, visto a velocidade e

quantidade de informações.

Como o conhecimento tornou-se dinâmico, precisamos fazer novas conexões de fatos e in-

formações, pois tudo está sistematizado. Essa nova visão mostra a necessidade de um perfil dife-

renciado de cidadão para conviver na sociedade da informação e da tecnologia.

Torna-se importante, então, distinguirmos informação e conhecimento. A informação é a ma-

téria-prima ainda não processada. Na segunda parte do século XX houve uma crescente especiali-

zação nas escolas, fazendo com que os conhecimentos fossem menos amplos que no passado, mas

com uma maior profundidade.

Hoje, é necessária uma menor preocupação com a acumulação do conhecimento, com sua

construção a partir de informações que devem ser pesquisadas dentro de contextos significativos e

reflexões críticas.

Atualmente, a velocidade com que circulam e são produzidas as informações, os conheci-

mentos passam a ser constantemente revistos, modificados ou sistematizados. Assim a internet,

conectada a outras possibilidades digitais permite o acesso a bancos de informação que se prolife-

ram geometricamente no ciberespaço.

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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Nesse contexto, os professores devem assumir posturas novas e diferenciadas, ensinando e

levando o educando a aprendizagem de forma colaborativa, na investigação e na pesquisa às in-

formações existentes na rede.

A abordagem pedagógica da aprendizagem colaborativa e a distância vem ganhando força

cada vez maior, constituindo-se na modalidade educacional apropriada, para atividades coletivas

em redes de produção de conhecimento nos meios digitais de comunicação, como a Internet.

O conhecimento é visto como uma construção social, o processo educativo via ciberespaço é

favorecido pela participação social em um ambiente que propicia a colaboração, a avaliação e o

acesso a infinitos saberes universais.

INTERNET E AFETIVIDADE

As discussões sobre o papel da afetividade na subjetividade humana vêm sendo travadas

desde a Antiguidade, mas como elemento dissociável da cognição. A afetividade é um estado psi-

cológico do ser humano que pode ou não ser modificado a partir das situações. Segundo Piaget, tal

estado psicológico é de grande influência no comportamento e no aprendizado das pessoas junta-

mente com o desenvolvimento cognitivo.

Faz-se presente em sentimentos, desejos, interesses, tendências, valores e emoções, ou seja,

em todos os campos da vida. Diretamente ligada à emoção, a afetividade consegue determinar o

modo com que as pessoas visualizam o mundo e também a forma com que se manifesta dentro

dele. Todos os fatos e acontecimentos que houve na vida de uma pessoa traz recordações e experi-

ências por toda a sua história. Dessa forma, a presença ou ausência do afeto determina a forma

com que um indivíduo se desenvolverá.

Quando uma pessoa não consegue excluir a afetividade de sua vida, tornam-se incontinentes

emocionais. A afetividade é uma sensação de extrema importância para a saúde mental de todos

os seres humanos, por influenciar o desenvolvimento geral, o comportamento e o desenvolvimen-

to cognitivo.

É a partir desse hipertexto que se desenvolve a virtualidade do momento, que de tão envol-

vente, poderíamos dizer que quase se torna real. A produção das imagens no espaço virtual des-

territorializa o limite de verdades, anteriormente significativa do pensamento epistemológico da

modernidade.

Nessa dimensão que as conversas nas salas de chat se tornam

textos, constantemente costurados e recosturados.

As conversas se passam sobre os mais variados assuntos que

vão sendo direcionados conforme a interação dos escritores como

também dos leitores que são escritores e vise versa. Há a presença

de uma mobilidade textual e, digamos assim, desta nas costuras

das conversas. Os participantes podem intervir diretamente em

todos os níveis de exploração da construção da conversa, e como

qualquer outro participante, em particular ou com o grupo.

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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Nos grupos presenciais se ocorrem momentos nos quais não gostaríamos de estar

participando da conversa, podemos nos retirar, pois o arsenal físico nos ajuda a dizer o não.

E durante esse percurso, várias imagens que constituem as ideias dão vida a emoções que

são construídas, vividas com intensidade como se fossem presenciais. Há momentos em que a fala

expressa felicidade ou raiva, momentos de carinho e afeição, momentos de exclusão e descaso.

Outro dado importante, e que se percebeu, na maioria dos jovens, é que em conversas nas sa-

las de chat, muitos já se conhecem, e o contato com a própria turma presencial já determina as re-

gras do grupo ao qual se pertence. Isso facilita para o jovem a questão da intervenção direta em

seus conceitos pessoais. Acontece também do jovem não querer que o amigo o descubra, e se torna

uma brincadeira ou uma conquista sensual, no caso de namoros.

Os participantes da rede inscrevem nos hipertextos suas identidades a partir do momento em

que tecem a seleção, a articulação e a reapropriação de novos pensamentos nas áreas dos sentidos.

A construção da identidade é fundamental para a da subjetividade. O indivíduo necessita de

bases, as quais possam recorrer quando preciso, para expor-se a internalização das regras de con-

vívio social, e a partir daí constituir a subjetividade.

Abordamos as duas dimensões na formação do ser humano por entender que as duas têm

bases de formação advindas do mesmo contexto – as experiências tecidas durante sua vida, porém

são conceitos diferenciados.

Quando falamos de identidade, nos referimos àquilo que é próprio/particular e que somente

o indivíduo poderá vivenciar consigo mesmo a partir da base em que foi se formando. Os papéis

que os jovens representam estão presentes pelas relações sociais, conscientes ou inconscientes, que

vivenciam em variadas situações.

Assim, criam-se máscaras, nas quais pensamos ser nós mesmos.

Essa vivência é constantemente experimentada nas salas de chat a partir do momento em que

esses jovens criam estereótipos para si próprios e para os outros.

2.2.2 CONTEÚDO 14 - AS MÍDIAS DIGITAIS: DAS COMUNIDADES VIRTUAIS AOS GAMES.

AS MÍDIAS DIGITAIS

Neste texto refletiremos sobre o mundo virtu-

al, especialmente sobre as mídias digitais, as comu-

nidades virtuais e os games. Essa tem sido uma

realidade na vida de muitas pessoas que têm o di-

reito de exercer plenamente a cidadania. Mas, te-

mos a obrigação de destacar que alguns que estão

na rua, em regiões, que sequer experimentaram a

luz elétrica, nada ou quase nada sabem sobre esse

universo próprio da sociedade da informação. Em

outras palavras, o tempo histórico nem sempre é

igual para todas as sociedades.

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CIDADANIA E INTERCULTURALISMO

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A rede mundial de computadores fornece uma infinidade de espaços e possibilidades de in-

teração, produção de sabe-

res e socialização de infor-

mações. Por isso a Inclusão

Digital DEVE SER para

todos os cidadãos, sem

distinção, para que possam

manter as suas interações

com o mundo contemporâ-

neo. Ainda que saibamos que nem todos participam das mudanças deste mundo em que a interação

face a face deixa de ser prioridade máxima.

Segundo Lucia Santaella (2004), o ser humano tem duas necessidades básicas, cuja sua sobre-

vivência depende: necessidade física e necessidade psíquica. Para a autora, a necessidade física é a

mais fácil de explicar por que está no campo tangível, palpável e muito presente na sobrevivência

entre os animais – reprodução, comer, beber, consumo de energia. Enquanto a psíquica depende da

fala, considerada por ela, mais complexa. Nesta está cifrado o enigma da condição humana em cujo

seio se aloja um milagre até hoje tão inexplicável quanto à vida.

Diríamos que a partir desta segunda necessidade é que se manifesta a “virtualidade”.

Oswald de Andrade, poeticamente disse em seus escritos que o ser humano é um animal que

vive entre dois grandes brinquedos: o amor que tudo ganha e a morte que tudo perde. Para preen-

cher essa lacuna inventou as artes, o jogo e as tecnologias.

As tecnologias da comunicação facilitaram viver, para aqueles que têm acesso, esse universo

de projeção das nossas lacunas, deixadas pelos nossos desejos e aspirações.

A virtualidade é o conceito que explicita essa lacuna, pois essa ferramenta de reinvenção da

identidade, de simulação das intenções, de encontro de pessoas distantes, de disseminação das ide-

ologias, em fim, de inúmeros comportamentos que revelam a riqueza do nosso potencial criador.

A cultura da atualidade está intimamente ligada à ideia de interatividade, de interconexão,

de inter-relação entre homens, informações e imagens dos mais variados gêneros. Esta intercone-

xão diversa e crescente é devida, sobretudo, à enorme expansão das tecnologias digitais na última

década. Essa conexão se discute sob uma perspectiva pública do lugar que cada pessoa está man-

tendo a interação.

Para Habermas (1968), o espaço público refere-se à geografia da esfera pública, isto é, ao lu-

gar em que as pessoas se reúnem para dar voz e discutir assuntos de interesse público.

Richard Sennett (1998) demonstra como o espaço público se descaracterizou. Segundo ele, o

espaço público, que caracterizou o início do modernismo, foi substituído por um recolhimento ao

espaço privado.

O que vem a ser isto?

Sennett (1998) analisa como os espaços abertos e de encontro com pessoas face a face e com

pessoas estranhas ao seu meio teriam passado por um processo de maior controle, no espaço pri-

vado. O espaço físico se explicita tanto de não-lugares, a saber, espaços destituídos de história e

vida social, entre-lugares de trânsito e ocupações provisórias: aeroportos, hotéis, trens etc., quanto

de lugares de consumo, como cafés, shoppings, pontos turísticos, concertos, exibições, áreas de

esportes, em que as pessoas meramente se cruzam sem interagir.

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Há um tipo distinto de espaço: o espaço informacional e abstrato, batizado de ciberespaço. É

um espaço virtual de conexões planetárias ditas imateriais. Esse paralelo opositivo entre o físico,

esvaziado de interações sociais vivas, e o cibernético despertou muitos discursos críticos com

prognósticos sobre a perda da escala humana do tempo e do espaço, apontando a geração de mo-

delos de realidade sem origem e sem destino, sobre a ausência do corpo físico, apenas interconec-

tado e inerte enquanto a mente navega pelos espaços da virtualidade.

Para Castells (2000), pensar a sociedade em rede implica conceber o ciberespaço também

como parte integrante de um espaço de fluxos. Este se caracteriza, antes de tudo, pelas práticas

sociais que dominam e definem a sociedade em rede, ou seja, a organização material de práticas

sociais temporalmente compartilhadas que funcionam através de fluxos. Isso nos leva a constatar

que, na realidade, as comunidades virtuais eletrônicas nunca deixaram de viver nas áreas limítro-

fes entre a cultura física e a virtual.

Para Santaella (2004), não importa qual forma o corpo virtual possa adquirir, sempre haverá

um corpo biológico junto, ambos inseparavelmente atados. O virtual pode estar em outro lugar – e

o outro lugar ser um ponto de vista privilegiado– mas a consciência permanece firmemente arrai-

gada no físico.

Historicamente, o corpo, a tecnologia e a comunidade se constituem mutuamente. A comu-

nicação mediada por computador via internet deslocou os pontos de encontros físicos para os en-

contros virtuais.

As tecnologias como os computadores pessoais, a internet, os telefones celulares, palmtops,

TV digital, brinquedos eletrônicos e consoles de videogames podem ser caracterizadas como mí-

dias digitais, pois a interatividade é o fio condutor das novas mídias.

O hipertexto é o novo paradigma tecnológico, pois democratiza a relação do sujeito com a in-

formação, possibilitando que este “ultrapasse a condição de consumidor, expectador passivo, para

a condição de sujeito operativo, participativo e criativo.

Deste modo, estas novas mídias digitais têm causado modificações na maneira como os indi-

víduos se comunicam, se relacionam e, inclusive, aprendem.

Espaços de escrita colaborativa são comuns na internet. Um destes, que pode se utilizado co-

mo fonte de pesquisa e produção textual é a Wikipédia, uma enciclopédia digital, livre e gratuita em

forma de hipertexto.

A internet atua mediando à construção de novos saberes, bem como, resignifica e reconstrói

conhecimentos já assegurados, pois na perspectiva sóciointeracionista, o meio social e cultural são

as bases para que os indivíduos elaborem o conhecimento.

As novas mídias podem ser elementos pedagógicos e pertencentes à prática docente. É um

desafio indispensável na sociedade contemporânea, da informação e das representações de uma

cultura digital.

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O JOGO COMO INVENÇÃO HUMANA E REINVENÇÃO DA REALIDADE

Pelo grau de influência que os games têm na vida das pessoas

começarei esse texto discutindo o tema das mídias digitais pelos jogos.

As tecnologias da informação ajudaram para que nos tornásse-

mos mais distantes do outro do ponto de vista físico e nos aproximou

do outro, pelo viés da virtualidade expressa na imagem, na voz, na a-

nimação, na musicalidade, nas artes e nos jogos.

O jogo é uma atividade cultural, mas que também está no campo

social. O lúdico é mais antigo que a cultura, pois o animal não-humano

sempre brincou: cachorro, gato, golfinhos, macacos.

“O ser humano, além disso, é a única espécie capaz de ri, chorar e de transmutar a brincadeira

em jogo, em arte, em musica, em poesia que, em razão disto, é definida como brincadeira com regras”

Santaella (2004).

As formas do jogo são múltiplas ao longo da história humana, exibindo desde a crueldade e

violência do circo romano até os jogos como a gude ou o dominó.

Os jogos eletrônicos estão desempenhando na sociedade contemporânea forte influência so-

bre pessoas de diversas idades e sexo. A indústria deste setor tem uma movimentação financeira

que ultrapassa a casa de 20 bilhões no mundo e 500 milhões no Brasil, faturamento maior que o

cinema. Esta movimentação lhe dá o status de primeira atividade no ramo de entretenimento.

O jogo eletrônico, assim como o jogo tradicional, promove o desenvolvimento cognitivo, na

medida em que possibilita a aquisição de informações, transformando o conteúdo do pensamento

infanto-juvenil.

Desenvolvendo, desta forma, habilidades dos sujeitos, que poderão ser reelaboradas e re-

construídas. Não há um consenso entre os estudiosos sobre os games como elemento de entrete-

nimento. Há uma convicção de que os games estimulam a violência entre os jovens e as crianças,

quando estes são produzidos sob temáticas de guerras.

Assim como outros estudiosos que argumentam que os mesmos devem ser julgados confor-

me o seu conteúdo e vê nos games um gênero artístico e um campo estético de rica possibilidade.

Os games possuem vários gêneros, entre esses de atirar,

de esporte, educativos, de exploração de lutas, os jogos de estra-

tégia em tempo real. E nele, o jogador e o jogo são inseparáveis,

um exercendo controle sobre o outro. Nele o jogador interage e

aprende as regras específicas de cada jogo.

As mídias como games, internet, aparelhos celulares, en-

tre outros, despertam o interesse e acendem o desejo nos ado-

lescentes, já que tais mídias fornecem possibilidades de comu-

nicação e favorecem sociabilidades.

Do mesmo modo os filmes e programas televisivos, os jogos eletrônicos são, hoje, um dos

principais veículos de representação da violência. São inúmeros os títulos de jogos, cujo enredo

envolve situações de violência. Nessa perspectiva, os jogos eletrônicos, muito mais do que gerado-

res são catalisadores, de uma violência individual e social e assumem um papel positivo na regula-

ção da sociedade atual.

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Estes jogos se constituem em espaços de aprendizagem, na medida em que é possível exerci-

tar diferentes emoções inerentes aos seres humanos: o medo, a alegria e a cólera, sem, contudo,

provocar danos físicos, sociais e afetivos.

O jogo sempre esteve presente no cotidiano dos indivíduos, desde os tempos primitivos até

os dias atuais, proporcionando o prazer, despertando a criatividade e possibilitando interação en-

tre os sujeitos aprendentes.

Neste contexto, destaco a interação dos jovens com os games. Interação esta que aponta a exis-

tência de uma forma diferente de aprender na relação dessa nova geração com os jogos eletrônicos.

Os jovens simultaneamente que navegam em vários sites, falam ao celular, comunicam-se em

chats, ouvem música. Estes jovens parecem pensar e aprender de forma hipertextual e não-linear

por nascerem imersos nessas novas mídias.

O jogo é uma arena privilegiada onde são desenvolvidas as relações interpessoais, porém,

nem todo jogo, bem como nem todo ensino contribui para o desenvolvimento pessoal.

Jogos eletrônicos constituem-se em uma ferramenta de aprendizagens, possibilitando que o

ensino-aprendizagem não seja mais concebido como um processo isolado de transmissão de in-

formações,

No game o jogador não é espectador e sim participante ativo, escolhendo, alterando, criando

caminhos para o conhecimento, além de ressignificá-lo. O jogo está sendo ressignificado pelas mí-

dias digitais e, por conseguinte, surgiram ambientes de aprendizagem.

A VIOLÊNCIA NOS JOGOS ELETRÔNICOS

Apesar de os jogos serem caracterizados como

um meio de entretenimento há outra vertente dos

mesmos que não se pode esquecer: a violência.

Para discutir essa temática, escolhi um texto de

Lynn Alves (2003) para a análise e pelo fato dele ser

um dos maiores estudiosos no assunto.

Segundo ele, as representações da violência sem-

pre fizeram parte do cotidiano das sociedades organiza-

das, seja sob a forma de rituais (religiosos, familiares,

militares etc.), dos jogos ou da arte.

Essas representações despontam como mecanismos sociais de controle dos instintos de a-

gressividades que vão sendo sublimados com a entrada do homem nas instâncias da lei, trazidas

pelas necessidades de organização social.

Ao lado de filmes e programas televisivos, os jogos eletrônicos são, hoje, um dos principais

veículos de representação da violência.

A problemática da violência deve ser analisada como um fenômeno social e afetivo que en-

volve questões ligadas às perspectivas sócio-econômicas, culturais, políticas e familiares suscitadas

pela vida urbana contemporânea, assim como o papel e significação das representações violentas.

Estas são efeitos de uma sociedade que gera uma violência e uma agressividade que se mani-

festam de diversas formas: nas guerras, na violência urbana, nos comportamentos agressivos, no

consumo das representações simbólicas.

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Os jogos eletrônicos, muito mais do que geradores são catalisadores, de uma violência indi-

vidual e social e assumem um papel positivo na regulação da sociedade atual. No universo dos

jovens, os games (incluindo os violentos) ocupam um lugar de construção simbólica, na medida

que aos sujeitos imersos nesse mundo, tem o prazer de ver, sentir e agir, ao mesmo tempo em que

mobilizam o desejo de arriscar constantemente, de vencer desafios, alcançar objetivos, abrindo

simultaneamente várias janelas cognitivas.

Pesquisas realizadas nos Estados Unidos revelam que:

(1) facilita o comportamento agressivo e anti-social,

(2) dessensibiliza os espectadores para a violência

(3) aumenta as percepções dos espectadores de estarem vivendo em um mundo mau e perigoso.

Os estudos realizados na Inglaterra mostra que há um número crescente de evidências suge-

rindo a existência de uma relação entre jogos de computador e agressividade, considerando que

esta aparentemente aumentou em rapazes com muito tempo de exposição a tais jogos.

Há que se pontuar ainda um aspecto que não pode ser esquecido: a violência vende.

A violência vende por favorecer um efeito terapêutico, possibilitando aos sujeitos uma catar-

se, na medida em que canalizam os seus medos, desejos e frustrações no Outro, identificando-se

ora com o vencedor ou perdedor das batalhas.

Visto desta forma, a violência passa a ser considerada de forma construtiva, como motor

propulsor do desenvolvimento.

Nesse sentido, os jogos se constituem em espaços de elaboração de conflitos, medos e angús-

tias. Os adolescentes tornam-se consumidores em potencial das imagens de violência e são cons-

tantemente seduzidos pelas grandes empresas que investem em um marketing pesado, ao comprar

versões diferenciadas dos jogos considerados violentos.

O adolescente é um sujeito capaz, instruído e treinado por mil caminhos — pela escola, pelos

pais, pela mídia — para adotar os ideais da comunidade.

A violência deve ser analisada como um problema social e histórico. A ideia de que não se

pode estudar a violência fora da sociedade que a produziu.

E ela se nutre de fatos políticos, econômicos e culturais traduzidos nas relações cotidianas

que, por serem construídos por determinada sociedade, e sob determinadas circunstâncias, podem

ser por ela desconstruídos e superados.

As famílias de classe média ausentam-se cada vez mais dos seus lares, deixando os filhos sob

a responsabilidade da escola, de outras instituições que os mantêm

ocupados durante o turno oposto às aulas (cursos de inglês, com-

putador, balé, etc.), da empregada, da mídia (TV, jogos eletrônicos,

Internet, etc.), de outros familiares.

A interação com estes elementos tecnológicos pode promo-

ver, assim, um efeito catártico para a agressividade existente em

todos nós, ocupando as horas de prazer e lazer como um mero pas-

satempo, não sendo, portanto, encarados como uma compulsão.

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A Internet abre novas potencialidades de criação de vínculos sociais e de representação soci-

al da realidade, que são apropriadas pelos usuários e teorizadas pelos intelectuais a partir relações

e usos de mídias anteriores, já estabelecidas culturalmente

AS COMUNIDADES VIRTUAIS

Neste trataremos de entender sobre as comunidades virtuais.

No ciberespaço, trocam-se idéias e assumem personalidades reinventadas conforme a inten-

ção do interlocutor. Temos a oportunidade de construir novos tipos de comunidades virtuais, nas

quais pessoas do mundo todo participam conversam diariamente mantém relações íntimas, mas

que provavelmente jamais se encontrarão fisicamente.

É claro que não da mesma forma que estas interações a-

contecem nas relações face a face. Esse sentimento foi possível

perceber com utilização do telefone no século XX num estudo

realizado sobre a cidade do Salvador. Comportamentos como

galanteios, trotes etc., foram sendo instituídos pela invisibilida-

de do rosto dos interlocutores (BELENS, 2002). Com as novas

tecnologias digitais, as imagens deixaram de ser mental para

serem visíveis mesmo que sejam reinventadas conforme o dese-

jo dos interlocutores. O webcam é uma forma que os interlocutores mais se aproximam fisicamente

um do outro, quando esses ganham um nível de confiança para se exporem como os são na realida-

de.

Para Juciano de Souza Lacerda (2004), compreender os modos de reconhecimento e apropri-

ação das especificidades das novas tecnologias digitais e o seu papel na produção de vínculos soci-

ais entre os usuários constitui-se numa perspectiva que nos afasta do risco do reducionismo.

Quanto às comunidades virtuais que caracterizam o mundo contemporâneo:

A Internet pode dar possibilidade de o indivíduo experimentar, inclusive, um eu fantasioso,

mas presente em seu imaginário que jamais tentaria na vida real, como é o caso da mudança de sexo

Em muitos casos há um jogo que se estabelece entre os participantes da sala de bate papo. E

depender das estratégias de sedução nessa mudança de identidade sexual, os envolvidos na sedu-

ção buscam efetivar o caso amoroso.

Essa experiência, eu pude observar na minha pesquisa sobre a Telefonia na cidade do Salva-

dor no século XIX e início do século XX.

Muitas telefonistas eram paqueradas pelos usuários das linhas telefônicas e muitos mentiam

sobre a sua identidade a fim de ser bem sucedido na sua investida.

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Enquanto modos de se comunicar e se expressar, os usuários fazem diferentes tipos de apre-

ciações da comunicação digital (aqui correio eletrônico e chat), do telefone e da comunicação face a

face em ambientes comunicacionais diversos.

Muitas vezes assumir uma identidade que não é a sua seria muito difícil face a face. Por isso

na relação entre os usuários das salas há uma preocupação de logo apresentar uma imagem facial e

que em muitos casos definem a continuidade da comunicação entre os mesmos.

Nas interações, mesmo as efêmeras dos ambientes digitais, os contratos, normas e ritos vão

sendo construídos simultaneamente, e um novo participante pode se tornar inconveniente, e ser

desconectado.

É na internet que pessoalmente, que as pessoas buscam dizer aquilo que mais lhe interessa

pelo fato de visibilidade da face está escondido é na internet, no correio Eletrônico uma grande

possibilidade de manifestação dos desejos.

É comum pensarmos que a Internet pode “enganar” mais que o telefone, pelo fato de a co-

municação se dar na forma escrita e abrir muitas possibilidades de representação, de criação.

O Internauta também pode sair de um canal de chat e voltar com outra identidade sem que

os demais participantes saibam disso, embora corra o risco de continuar a não ser aceito.

Mas a voz no telefone, a exemplo do rádio, é um poderoso construtor de representações a-

brindo margem para muitas interpretações por parte do receptor.

Pelo telefone, as pessoas que o acessam para bater papo também informam outras identida-

des, preservam os seus dados reais e, somente, quando ganham confiança, arriscam-se a dar o seu

número do telefone.

Do mesmo modo o MSN as pessoas entram numa sala de bate papo e trocam os endereços a fim

de continuidade a aquela conversa que às vezes podem ser com intenção amorosa ou de amizade.

Uma das características das relações nos chats é a transitoriedade, a exemplo das salas de ae-

roporto, em que duas pessoas que nunca se viram começam a conversar, partilham algumas afini-

dades e interesses, mas pode ser que nunca mais se encontrem.

“Na atmosfera de um chat-room não existe o sentimento de permanência experimentado

quando se assume um papel, tornando-se parte da vida de outro, o que é típico da comunidade”

Nas relações em ambientes digitais são marcados pela transitoriedade – chats, por exemplo,

são os efeitos de identidade que produzem.

Contudo, mesmo os chats podem

deixar de ser transitórios, pois não é sim-

plesmente o meio que determina o caráter

de transitoriedade da relação, mas as in-

tenções dos participantes da interação.

Há modos de comunicação em am-

bientes digitais que fazem com que pesso-

as que usam a Internet possam se sentir

membros de uma comunidade: a perma-

nência e a possibilidade de construir nor-

mas sociais, rituais e sentido

Podemos definir que os grupos de discussão na Internet em que seus membros cruzam experi-

ências on line com o resto da vida, são umas entre outras possibilidades de constituir comunidades.

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Os chats também devem ser incluídos como possibilidade de gerar laços menos débeis.

Essas comunidades midiatizadas constituem vínculos pelo sentido de “pertencimento” mo-

tivado por objetivos, ações e temas de interesse comuns, que ficam num lugar entre os fortes laços

coesivos.

O fascínio pela comunidade on-line reside na suposição de que as pessoas estão ali para nos

responder. É um elemento do poder atrativo da comunidade on-line difícil de ser comparado com

experiências off-line.

E com um acréscimo: as reações dos interlocutores, nos chats, são muito mais rápidas que

nas listas de discussão por e-mail por exemplo. E ainda há várias outras possibilidades de criar

vínculos sólidos no chat.

O usuário geralmente seleciona uma sala buscando alguma afinidade (idade, lugar, gostos,

temas, etc.). Procura criar vínculos com outros participantes da sala selecionada logo no primeiro

contato: quem é você? O que faz? Qual a sua idade? Onde mora?

São algumas perguntas básicas.

E se o nível de interação aumentar os interlocutores desejará se encontrar na mesma sala no-

vamente. Essa prática pode render até um encontro presencial. Mesmo utilizando outra identida-

de, geralmente o internauta deixa passar uma faceta de si próprio, até sentir-se seguro e propor

encontrar-se.

A permeabilidade entre as identidades construídas em ambientes digitais e a vida real se dá

de várias formas, de acordo com as ofertas de sentido e os contratos estabelecidos entre os partici-

pantes da interação. As identidades criadas na Internet podem ter alguma relação com nosso eu,

não sendo contraditórias, mas complementares, psicoterapêuticas, expansivas.

Às vezes nos ajuda a conviver com várias carências afetivas ligadas a relacionamentos amo-

rosos e familiares difíceis.

2.2.3 CONTEÚDO 15 - CONSTRUINDO COMUNIDADES VIRTUAIS DE APRENDIZAGEM

Faremos agora um esforço para compreender pelo menos algumas abordagens do que seja

o virtual, na atualidade, para entramos num seara de discussão sobre comunidades virtuais de

aprendizagem.

O tema que aqui propomos discutir tem sua relevância baseada no desenvolvimento e nas

práticas das Comunidades Virtuais de Aprendizagem, viabilizadas pelas novas tecnologias da

informação e da comunicação que proporcionam a formação de educadores on-line para atuar

numa sociedade altamente tecnologizada e caracterizada por novos espaços de sociabilidades e

subjetividades.

Segundo André Parente (1999), pelo menos existem três abordagens de virtualidade.

Uma primeira propõe que o surgimento de uma tecnologia do virtual, que proporciona as

imagens de síntese digitais, fez a imagem, na cultura contemporânea, romper com os modelos de

representação, tornando-se auto-referente.

A segunda tendência, defendida por Jean Baudrillard e Paul Virilio, aponta o virtual tecno-

lógico como sintoma e não como causa das mudanças culturais, pois toda imagem contemporânea

– ou pós-moderna – é virtual, um “significante sem referente social”;

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A terceira tendência estabelece o virtual como “uma função da imaginação criadora, fruto de

agenciamentos os mais variados entre a arte, a tecnologia e a ciência, capazes de criar novas condi-

ções de modelagem do sujeito e do mundo” (Idem).

As comunidades virtuais vêm ganhando espaço no cenário pedagógico, constituindo-se em

lócus de aprendizagem e sociabilidade. Conceitualmente, as comunidades são agregações sociais

que surgem na Internet formada por interlocutores invisíveis com interesses que vão desde o co-

nhecimento científico ao conhecimento espontâneo, utilizando esses espaços para trocas intelectu-

ais, sociais, afetivas e culturais, permitindo aflorar os seus sentimentos, estabelecendo teias de rela-

cionamentos, mediadas pelo computador, conectados na rede.

Os jovens que interagem com estas tecnologias não têm a princípio nenhum interesse peda-

gógico, querem construir vínculos, fazer “amigos” que talvez nunca encontrem presencialmente.

Entram em diferentes salas de bate-papo, produzem diários on-line, criam fóruns e listas de

discussões instigando os pares a participarem e a compartilharem com eles pontos de vista que

envolvem desde questões políticas até as ligadas “a dor e a delícia” de adolescer.

A interatividade e a interconectividade, favorecidas pelas tecnologias digitais, pela cultura da

simulação, vêm também contribuindo para a instauração de outra lógica que caracteriza um pensa-

mento hipertextual, o que pode levar à emergência de novas habilidades cognitivas, tais como, a

rapidez no processamento de informações imagéticas; disseminação mais ágil de ideias e dados, com

a participação ativa no processo, interagindo com várias janelas cognitivas ao mesmo tempo.

As comunidades virtuais de aprendizagem têm seu funcionamento ligado, num primeiro

momento, às redes de conexões proporcionadas pelas tecnologias de informação e comunicação.

As comunidades virtuais são espaços formados por agrupamentos humanos no ciberespaço.

“Seu funcionamento está diretamente ligado, num primeiro momento, às redes de conexões

proporcionadas pelas tecnologias de informação e comunicação e, num segundo momento, à pos-

sibilidade de, neste espaço, pessoas com objetivos comuns, se encontrarem, estabelecerem relações,

e desenvolverem novas subjetividades”.

Neste espaço há possibilidade de as pessoas com objetivos comuns, se encontrarem e estabe-

lecerem relações. O ambiente utilizado para a criação da comunidade em 2004 foi o Moodle.

O Moodle contém vários módulos de atividades que podem ser usados para produção de

conhecimento e interação (como: Fóruns de Discussão, Chat, Diários, Pesquisa de Opinião), bem

como para armazenamento de dados (como: Materiais, Tarefas entre outros). A aprendizagem está

mais independente da sala de aula, mas a socialização necessita cada vez mais de espaços possibili-

tadores deste fenômeno.

Comunidades virtuais são espaços que oportunizam agrupamentos humanos que propor-

cionam o desenvolvimento de novas socialidades e subjetividades, portanto de cultura, assim co-

mo a aprendizagem, através de seus dispositivos de comunicação e informação, são espaços que,

ao proporcionar aprendizagem, fomentam o imaginário.

2.2.4 CONTEÚDO 15 - TRIBOS URBANAS 1: OS ESTILOS EM JOGO.

OS JOVENS E O TRIBALISMO

Neste texto refletiremos sobre a os estilos de vida nas cidades, em especial das tribos juvenis.

Maffesoli (2000) define tribos urbanas como agrupamentos semi-estruturados, constituídos pre-

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dominantemente de pessoas que se aproximam pela identificação comum a rituais e elementos da

cultura que expressam valores e estilos de vida, moda, música e lazer típicos de um espaço-tempo.

Ao mesmo tempo, seu caráter dinâmico e em constante transformação lhe confere um poten-

cial criativo, inovador, que não pode ser desprezado.

Os indivíduos se unem por interesses comuns para, em grupo, obterem mais força e uma

maior representação perante a sociedade.

Na contemporaneidade, essa união, portanto, se tornou mais evidente e necessária; o indivi-

dualismo continua a existir, é claro, mas de forma paradoxal.

A formação de tribos se tornou mais complexa na sociedade contemporânea, e foi favorecida

pelo intenso e acelerado desenvolvimento de tecnológico de comunicação com a multiplicidade de

interesses e assuntos e a constante influência da mídia na formação e reafirmação dos sujeitos.

O tribalismo contemporâneo e a cultura jovem são propulsores de fases socialmente distintas e

dispostas à criação e negação de valores. Ainda mais se tratando da sociedade atual em que a juven-

tude recebe uma rede de poderes ainda maior, por diversos meios: mídia, moda, estética, campos

que focam na juventude e adolescência as estratégias consumo e isso aumenta sua visibilidade social.

Segundo Giselle Godoi Vieira (2007):

Os jovens têm um instinto de liberdade, querem se orientar por novos valores, não

mais os familiares, precisam formar uma identidade própria, e para isso, compõem novas re-

des sociais por uma associação de valores, atitudes, comportamentos e estética, buscando es-

tilos de vida expressivos e visíveis, introduzindo novas maneiras de pensar e agir, formando

tribos que constroem cultura, determinam época, marcam história.

A crise de identidade comum na fase juvenil caracteriza um perfil nômade. Para representar

a cultura vigente, os jovens se unem conforme os valores mais interessantes do momento que vari-

am a forma de percepção decorrente de uma intensa vida cotidiana e urbana ligada à cidade, às

tradições e às mídias.

Os jovens tendem a curtir o momento, não se apega ao passado e nem tem planos para o fu-

turo, o que lhe importa é o momento. Este comportamento renova o conceito de tribalismo, onde

os sujeitos eram estáveis em suas identidades e os grupos também garantiam uma estabilidade aos

sujeitos pertencentes.

O interesse na atualidade é o elemento mais importante da pós-modernidade. Saliente-se que

com a globalização, inúmeros assuntos procuram ganhar visibilidade e, para que tudo fosse visto,

ainda que superficialmente, as aparições tornaram-se momentâneas. Com isso surgiu um novo

tipo de identidade, pautada mais na intensidade do que na longevidade das tradições ou impor-

tância das experiências passadas.

As novas identidades se formam por identificação, o que implica a convivência de uma série

de valores opostos uns aos outros. O tribalismo pode ser considerado uma resistência às ideias

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homogêneas sugeridas pelo mundo globalizado, por isso as identidades são partilhadas em comu-

nidades que representam formas de resistência coletiva.

Os símbolos são elementos essenciais na recriação dos signos de identificação das tribos.

Para isso, as tribos rejeitam as instituições fundamentais da sociedade como: igreja, poder

político, militar e criam os seus próprios símbolos. Os poderes não impõem identidades sob os

indivíduos porque eles já são fortemente identificados dentro de suas próprias tribos.

“As recentes evoluções das relações interculturais podem contribuir para despertar meca-

nismos de resistência e para exacerbar a virulência de sua força. Sejam as tribos conservadoras ou

revolucionárias elas possuem ideais de resistência, mesmo se de forma inconsciente pelos atores

sociais” (VIEIRA, 2007).

Os jovens urbanos se unem em tribos, partilham linguagem, sentimento, vestuário, pensa-

mento, costume, agregam características por interesses comuns inseridos na estrutura cotidiana.

Todavia, há uma instabilidade dos sentimentos e dos interesses particulares desses indiví-

duos, isso porque as tribos se constituem por laços sociais bastante sólidos que fazem parte da éti-

ca de cada tribo, resultante dos sentimentos vividos em comum.

Cada grupo sustenta a si mesmo e se interliga por redes sociais apoiadas na integração e na

recusa afetiva de valores, resignificando a cultura localizada.

A superioridade de cada grupo em relação aos demais resulta basicamente dos segredos par-

tilhados entre os seus membros. Alguns indivíduos ao viverem a mesma ideologia, os mesmos

costumes, hábitos, rituais de signos de reconhecimentos específicos, fortalecem o pequeno grupo

contra a sociedade.

Sem a necessidade de um contrato ou algo racional do tipo, sem verbalizações ou formalis-

mos, o costume é primordial para o indivíduo que pretenda entrar e permanecer no grupo.

São os costumes que indicam aos observadores externos a imagem que um determinado

grupo pretende mostrar pelos meios de comunicação ou não.

Na vida social contemporânea ninguém escapa do jogo das aparências, pois o estilo de vida

escolhido pelas pessoas é uma maneira de marcar território, em espaço, tempo e lugar, além de

garantir o pertencimento a um grupo.

A adequação ao se vestir da mesma maneira em um grupo é uma demonstração da pessoa

em fazer-se pertencer a ele, o respeito às normas do grupo, e isso faz com que a pessoa não seja

marginalizada por tal grupo.

A apropriação de apenas um dos costumes de um grupo preenche a necessidade do indivi-

duo de se sentir parte, essa relativa participação a algum grupo coloca-o também como pertencen-

te da rede social.

O tribalismo e a massificação caminham lado a lado, a moda e seus apelos pressionam os in-

divíduos a agregarem-se, todos têm de pertencer, ainda que de maneira diferente.

A estetização e a imagem, como elementos predominantes, nos quais as minorias se reconhe-

cem e a não realização pessoal levam o indivíduo a depressão, a fuga para o mundo das drogas e a

violência dos excluídos.

A sociedade atual se articula na movimentação e exacerbação das imagens. A globalização

envolveu as ligações sociais em uma velocidade tão rápida, que só mesmo a imagem para passar

tanta informação em tão pouco tempo.

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As imagens projetadas servem de agregação as diversas tribos que transitam nas megalópo-

les contemporâneas. É comum ver as imagens, as formas ou as figuras como coisas estáticas, mas,

na verdade, neste contexto, não deixam de estar em ação na evolução social.

Se a mídia cumprir seu papel como formadora de identidades, simultaneamente, será produ-

tora também do sujeito-objeto de consumo.

Alguns elementos contribuem para definir a imagem social de cada tribo ao compartilharem:

1. Códigos - gírias, jargões, músicas, pautas comportamentais;

2. Elementos estéticos - estilos de vestir, adornar e expressar-se por meio do corpo;

3. Práticas sociais - relativas ao comportamento político e às formas de lazer, de circulação e

apropriação do espaço urbano e da cultura.

As tribos, portanto, são comunidades organizadas em torno do compartilhamento de gostos

e formas de lazer. Os vínculos comunitários perduram enquanto se mantém o interesse pela ativi-

dade, como por exemplo, uma apresentação musical, uma festa ou manifestação política.

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