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RIO 9 771983 190002 ISSN - 1983-1900 Diabetes: avanço silencioso Número de casos aumenta rapidamente e põe em alerta autoridades e agentes de saúde pública De pijama no museu Em atividade inédita no País, estudantes passam a noite no museu, na companhia de múmias, índios e animais extintos Entrevista: Malvina Tuttman UniRio completa 30 anos, busca a consolidação de sua Pós-graduação e a ampliação do número de doutores VENDA PRO IBIDA DISTRIBU IÇÃO GRATU ITA ANO II N ° 7 JU NHO DE 2009

Diabetes: avanço silencioso

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RIO

9771983190002

ISSN

- 1

983-1900

Diabetes: avanço silenciosoNúmero de casos aumenta rapidamente e põeem alerta autoridades e agentes de saúde pública

De pijama no museuEm atividade inédita no País, estudantes passam a noiteno museu, na companhia de múmias, índios e animais extintos

Entrevista: Malvina TuttmanUniRio completa 30 anos, busca a consolidação de suaPós-graduação e a ampliação do número de doutores

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2009

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SUMÁRIO

EXPEDIENTEEXPEDIENTEEXPEDIENTEEXPEDIENTEEXPEDIENTE

Governo do Estado do Rio de JaneiroGoverno do Estado do Rio de JaneiroGoverno do Estado do Rio de JaneiroGoverno do Estado do Rio de JaneiroGoverno do Estado do Rio de JaneiroGovernador | Sérgio Cabral

Secretaria de Estado de Ciência eSecretaria de Estado de Ciência eSecretaria de Estado de Ciência eSecretaria de Estado de Ciência eSecretaria de Estado de Ciência eTTTTTecnologiaecnologiaecnologiaecnologiaecnologiaSecretário | Alexandre Cardoso

Fundação Carlos Chagas Filho deFundação Carlos Chagas Filho deFundação Carlos Chagas Filho deFundação Carlos Chagas Filho deFundação Carlos Chagas Filho deAmparo à Pesquisa do Estado do RioAmparo à Pesquisa do Estado do RioAmparo à Pesquisa do Estado do RioAmparo à Pesquisa do Estado do RioAmparo à Pesquisa do Estado do Riode Janeiro � Fde Janeiro � Fde Janeiro � Fde Janeiro � Fde Janeiro � FAPERJAPERJAPERJAPERJAPERJDiretor Presidente | Ruy Garcia MarquesDiretor Científico | Jerson Lima SilvaDiretor de Tecnologia | Rex Nazaré AlvesDiretor de Administração e Finanças | CláudioFernando Mahler

3 | POPULARIZAÇÃO DACIÊNCIALaboratório da PUC-Rio desenvolveexperimento que reproduz a sensação depilotar o Demoiselle 19, lendária aeronavede Santos Dumont

6 | MEIO AMBIENTEGrupo de Tecnologia Química Ambientaldo campus de Resende da Uerjdesenvolve método que utiliza fonte de luzultravioleta para despoluir água usadaem processos industriais

9 | MUDANÇAS CLIMÁTICASCiência brasileira ganha força naAntártica com apoio de uma ampla redede fomento à pesquisa

14 | CULTURAEm iniciativa inédita no País, o MuseuNacional/UFRJ leva grupo de crianças apassar a noite no Palácio da Quinta daBoa Vista, sede da instituição

17 | AGROPECUÁRIAProjeto desenvolvido na Unisuampesquisa formas de aumentar a produçãodos ranários fluminenses. Atividade podese tornar uma importante fonte derecursos para o setor agropecuário

20 | PERFILJosé Murilo de Carvalho: historiadormineiro, um dos dois únicos brasileiroscom assento nas academias de Letras eCiências, ganha o mais importanteprêmio para a ciência e tecnologia noPaís

23 | INOVAÇÃO TECNOLÓGICAPesquisadores da Uenf criam unidade paratransformar casca de camarão emquitosana. Produto tem aplicaçõesdiversas, da remediação de derrames depetróleo à produção de nutrientes

26 | MEDICINA VETERINÁRIACom a inauguração do Laboratório deAvaliação de Desempenho de Equinos, naEscola de Equitação do Exército, setor dásalto de qualidade

29 | SAÚDEExplosão do número de casos de diabetespreocupa autoridades e mobilizapesquisadores de diversas áreas damedicina. Cerca de metade dos pacientesnem imagina que é portador da doença

34 | INFORMAÇÃO CIENTÍFICAPortal de Periódicos da Capes (MEC)contribui para o crescimento da ciênciabrasileira e ajuda a inserir o País pelasnovas fronteiras da economia

37 | INFRAESTRUTURANovo navio polar da Marinha, adaptadopara as necessidades da pesquisa brasileirano Atlântico Sul e na Antártica, conta comcinco laboratórios e tem capacidade paraacomodar até 36 pesquisadores

40 | OCEANOGRAFIAPresença cada vez mais rara no litoralfluminense, botos funcionam comotermômetro para revelar como anda apoluição das águas. Os cetáceos podemdesaparecer, alertam pesquisadores da Uerj

44 | MEDICINALaboratório de Cirurgia Experimental daFaculdade de Medicina da UFRJ ganhanovos equipamentos, amplia número deprocedimentos e contribui paraprodução do conhecimento e para aformação de profissionais

48 | ENTREVISTAMalvina Tuttman: em seu segundomandato, a reitora da UniRio defende onovo Enem, o sistema de cotas e apontaos principais desafios para a ensinosuperior nos próximos anos

52 | ARTIGOA neurocientista Suzana Herculano-Houzel, pesquisadora do Instituto deCiências Biomédicas da UFRJ e articulistada Folha de São Paulo, explica porquesomos �apenas um grande primata�

55 | TECNOLOGIAEmpresa cria equipamento de vigilânciamóvel para dar mais segurança aeventos com grande circulação depessoas. Sistema permite mobilizar ecoordenar unidades da PM, Defesa Civil,Bombeiros e agentes da CET-Rio

58 | FAPERJIANASCapes e FAPERJ detalham acordo decooperação técnica e acadêmica queprevê investimentos de R$ 94 milhões

60 | EDITORAÇÃOAcervo de títulos publicados com oapoio da FAPERJ chega à marca de 500títulos

Rio Pesquisa. Ano II. Número 7

Coordenação editorial | Paul Jürgens

Redação | Danielle Kiffer, Débora Motta, PaulJürgens, Vilma Homero, Vinicius Zepeda eRosilene Ricardo (estagiária)

Colaboraram para esta edição | Roni Filgueiras,Flávia Machado, Gustavo Smiderle e BeatrizCoelho Silva

Diagramação | Adrianne Mirabeau e Mirian Dias

Capas | Adrianne Mirabeau e Mirian Dias

Mala direta e distribuição | Élcio Novis e VivianeLacerda

Revisão | Ana Bittencourt

Foto da capa| Divulgação/Associação deDiabetes Juvenil (ADJ)

Gráfica | Grafitto Gráfica e Editora Ltda.

Tiragem |15 mil exemplares

Periodicidade |Trimestral

Distribuição gratuita |Proibida a venda

Avenida Erasmo Braga 118/6° andar,Centro, Rio de Janeiro, RJ - CEP 20020-000Tel.: 2333-2000 | Fax: 2332-6611

[email protected]

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Ano II - nº 7 - Rio Pesquisa | 2EDITORIAL

Em 30 meses de governo, a co-munidade científica tem recebi-do do Palácio Guanabara sinaisinequívocos de apoio às insti-tuições de ensino e pesquisasediadas em território flumi-nense: recursos disponibilizadosem tempo hábil, estímulo àsparcerias com o governo fede-ral, investimentos na inclusão di-gital da população e eminfraestrutura para pesquisa,além de solenidades e reuniões

de trabalho cada vez mais frequentes na sede do gover-no, com a participação de cientistas e gestores do setorde C&T.

Depois de um início de gestão dedicada à correção derumos e à identificação das prioridades para os investi-mentos futuros em ciência e tecnologia no estado, o fo-mento à pesquisa no estado do Rio de Janeiro vem al-cançando novos patamares neste final de década. Emmaio, a produção científica do Brasil, medida pelo nú-mero de artigos indexados na base internacional de da-dos Thomson Reuters-ISI, registrou um novo avanço,inserindo o País na 13º posição, à frente de Rússia eHolanda. Como bem assinalou o ministro Sérgio Rezende,a novidade �é resultado de um esforço continuado detoda a sociedade� � e o Rio de Janeiro certamente ofere-ceu importante contribuição nesse sentido.

Esta nova fase da pesquisa fluminense pode ser avaliadatambém pelo rico e variado cardápio de temas aborda-dos nas páginas da Rio Pesquisa. A reportagem de capadesta edição trata de uma doença que já é consideradaepidemia pelo meio médico: o diabetes. Estima-se quemetade dos pacientes não sabe que é portadora da do-ença, já que nem sempre apresenta sintomas perceptíveis.O diabetes já atinge cerca de 10 milhões de pessoas noBrasil, ou 5,9% da população. No mundo, seriam 250milhões. Rio Pesquisa ouviu a opinião de diversos pesqui-sadores que trabalham em projetos distintos.

A reitora da Universidade Federal do Estado do Rio deJaneiro (UniRio), Malvina Tânia Tuttman � uma das pou-cas mulheres a ocupar esse cargo no País �, é a entrevis-tada desta edição. Reconduzida ao cargo em setembrode 2008 para um novo mandato, ela defende a adoçãodo Enem em substituição aos vestibulares, o sistema decotas no ensino público e avalia que, embora as mulheres

A contribuição da ciência fluminensejá tenham conquistado algum espaço na sociedade, elasainda têm um longo caminho pela frente. A articulistaconvidada, desta vez, é a neurocientista Suzana Hercula-no-Houzel, que aborda algumas das mais recentes des-cobertas sobre o cérebro humano.

O Portal de Periódicos da Capes, ferramenta virtual pormeio da qual professores, pesquisadores, alunos e funcio-nários de 268 instituições de ensino superior e de pesqui-sa em todo o País têm acesso imediato à produção cien-tífica mundial, também é assunto da edição. A área deinovação tecnológica foi mais uma vez contemplada naspáginas da Rio Pesquisa, que ouviu os responsáveis porum projeto da empresa TrcC2, destinado a oferecer maissegurança à população, durante a realização de eventosque reúnem uma grande circulação de pessoas.

A pesquisa na área �marinha� ganhou amplo destaqueneste número, com pelo menos quatro reportagens quetratam direta ou indiretamente do tema. Em uma delas,visitamos o novo navio oceanográfico brasileiro, que che-gou ao Rio no mês de abril. A embarcação terá papelimportante na pesquisa brasileira na Antártica, na qual tra-balha a bióloga Yocie Yoneshigue Valentin. Coordena-dora do Instituto Nacional de Ciência & Tecnologia An-tártico de Pesquisas Ambientais (INCT-APA � CNPq/FAPERJ), ela relata, em outra reportagem, os resultadosobtidos por uma série de estudos multidisciplinares queenvolvem cerca de 200 pessoas, entre profissionais e alu-nos de 16 instituições de ensino e pesquisa sediadas nosestados do Sudeste, Sul e Nordeste do País.

Já na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj),um projeto da Faculdade de Oceanografia monitora a pre-sença � cada vez mais rara � de botos nas baías fluminenses,e que revela o avanço da poluição ambiental em suas águas.Por último, na região de Campos, pesquisadores da Uni-versidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf) trabalhamna criação de uma unidade para transformar casca de ca-marão em quitosana. O produto tem aplicações diversas,que vão desde a remediação de derrames de petróleo até aformulação de suplementos alimentares.

Entre os demais temas abordados nesta edição, está acirurgia experimental com o uso de animais; um projetode criação de rã-touro; um simulador de voo de aerona-ves para o público leigo; a Medicina Veterinária; e umaatividade cultural inédita no País que leva crianças a pas-sarem uma noite em um museu � De pijama no museu.

Boa leitura!

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3 | Rio Pesquisa - nº 7 - Ano II

Um passeio virtual pelo céu a bordodo primeiro ultraleve da história

Experimentoreproduz de forma

acessível paratodos a sensação

de pilotar alendária aeronaveDemoiselle 19, de

Santos Dumont

O ano era de 1909, quandoSantos Dumont (1873-1932) colocou no ar o pri-

meiro ultraleve da história, oDemoiselle 19. A invenção, desen-volvida apenas três anos após o cé-lebre voo do 14-Bis, seria mais tar-de reconhecida como o primeiroultraleve da aviação mundial e a pri-meira aeronave a ser produzida emsérie, trazendo diversas inovações econceitos relacionados ao voo queainda hoje são copiados. Passadoscem anos do voo do Demoiselle,uma equipe de pesquisadores e es-tudantes da Pontifícia UniversidadeCatólica do Rio de Janeiro (PUC-

Rio) vem desenvolvendo um expe-rimento que reproduz, por meio douso de computadores, o que seria asensação de pilotar a antiga aerona-ve construída pelo �pai da aviação�.O projeto, intitulado Simulador de Mo-

vimentos para Ensino e Aprendizado dos

Fenômenos Relativos ao Voo de Aerona-

ves, tem coordenação do engenheiromecânico e professor da PUC-RioMauro Speranza Neto e conta aindacom a colaboração de pesquisado-res e estudantes do Grupo de Siste-mas Veiculares e Robóticos (GSVR)� equipe de pesquisa ligada à Enge-nharia de Controle e Automação(ECA) da universidade. Com o ob-jetivo de popularizar o gosto e o en-sino das ciências, o projeto aborda

Vinicius Zepeda

3 | Rio Pesquisa - nº 7 - Ano II POPULARIZAÇÃO DA CIÊNCIAFo

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Ano II - nº 7 - Rio Pesquisa | 4

ças, durante a Semana de C&T, aequipe do GSVR/PUC-Rio consi-derou o período de exposição e opróprio projeto ainda insuficientes,pois o simulador era apenas virtual.�Ao final do evento, decidimosaperfeiçoá-lo de forma que fossemais realista, mas continuasse a terum manuseio fácil e prático, e quepudesse ser transportado para apre-sentações em escolas, universidadese eventos científicos em geral�, dizo pesquisador.

Dessa forma, a equipe do GSVR/PUC-Rio desenvolveu a plataformade Stewart em escala, sobre a qualacoplou um aeromodelo, adaptan-do o comando de direção da aero-nave via radiocontrole, além de cri-ar material didático como cartazes eapresentações em powerpoint, para ser-vir de apoio às demonstrações doexperimento. �O material serve parailustrar aos interessados no assunto,principalmente o público leigo,como e por que os aviões voam.Nele, são apresentadas noções bási-cas sobre sustentação e arrasto, pro-pulsão e hélices, carga, decolagem,pouso, curvas e mecanismos de con-trole. Também são apresentadas ca-racterísticas específicas do Demoiselle,tais como os comandos acoplados,a possibilidade de produção da ae-ronave em série e aspectos relativosà simplicidade de fabricação, sem-pre baseada no projeto original doavião�, explica Speranza.

O novo simulador de voo já foiapresentado ao público em geral na

fenômenos relativos ao voo das ae-ronaves destinados ao público lei-go, incluindo adultos, jovens e estu-dantes. Sentado em frente a uma telade computador e com a ajuda deum aparelho de radiocontrole semfio, pode-se controlar, simultanea-mente, um simulador de voo de umDemoiselle na tela do computador eem uma réplica em escala reduzida.�Na tela, temos a sensação de estardentro da cabine do piloto, dirigin-do a máquina voadora�, explicaSperanza Neto. �A réplica doultraleve, colocada em cima do su-porte conhecido como plataformade Stewart, surpreende quem estáno comando, já que, por meio decomandos eletropneumáticos, exe-cuta as principais manobras do vooda aeronave.�

A plataforma de Stewart consisteem uma espécie de robô controla-do eletronicamente. A estrutura, ar-ticulada por meio de seis braços me-cânicos conectados ao aeromodelodo Demoiselle, reproduz as princi-pais manobras realizadas peloultraleve. Segundo o engenheiro, omecanismo é totalmente funcional epode ser utilizado por qualquer pes-

soa. �A partir de instruções básicasmuito simples e sem riscos � umavez que o avião não sai do chão �,os usuários têm a sensação de pilo-tar a aeronave�, esclarece.

O projeto do simulador remonta a2006, quando os integrantes doGSVR/PUC-Rio tomaram conhe-cimento de que o tema da SemanaNacional de Ciência e Tecnologiadaquele ano seria uma homenagemaos 100 anos do vôo do 14-Bis, e,consequentemente, ao seu criador,Santos Dumont. �Queríamos en-contrar uma forma criativa de par-ticipar do evento e elaboramos umvideogame a partir de um simula-dor de voo de aeromodelos comer-cial no qual adaptamos a interfacecomputacional para reproduzir olayout e as manobras executadaspelo Demoiselle�, recorda SperanzaNeto. O experimento foi, então, ins-talado no Museu do Universo, queintegra as diversas atrações do Pla-netário do Rio de Janeiro. Apesardo grande sucesso entre o públicoem geral, e, em particular, as crian-

Réplica do Demoiselle 19,usado por Santos Dumont:simulador proporcionasensação de pilotar a antigaaeronave construída pelo �paida aviação�

Fotos: divulgação PUC-Rio

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5 | Rio Pesquisa - nº 7 - Ano II

Semana Nacional de Ciência eTecnologia de 2008 no Planetáriodo Rio de Janeiro, e também noestande da PUC-Rio na Feira daProvidência, e aos alunos do cursode Engenharia da PUC duranteeventos internos e já tradicionais dauniversidade, como a Mostra PUC

e o PUC por um Dia. Além disso,Speranza Neto e sua equipe nego-ciam com escolas do estado do Riode Janeiro, como os Colégios SãoJosé, Teresiano, Pedro II e São Ben-to, seja a visita de estudantes do en-sino médio para conhecer o expe-rimento, seja a ida dos pesquisado-res aos colégios.

Incluído no material didático desen-volvido em conjunto com o simula-dor, os pesquisadores, inspirados nopatrono da aviação, pretendemdisponibilizar todo o processo deconstrução do sistema para quem seinteressar. �Quem sabe se em futu-ras edições da Semana Nacional deC&T não teremos o nosso experi-mento sendo apresentado em outrosestados e regiões do País?�, lança,com entusiasmo, o coordenador doprojeto. Speranza Neto destaca ain-da a possibilidade do simulador ser-vir para o treinamento de pratican-tes de aeromodelismo. �No futuro,queremos testar a possibilidade deacoplar uma cadeira idêntica à dopiloto de aeronaves em cima de umaplataforma de Stewart. Desta for-ma, o piloto faria uma manobra e acadeira reproduziria os movimentos,tornando ainda mais real o efeito dasmanobras feitas pelo avião.�

Grupo de pesquisadorestem como lema�Aprender se divertindo�

Os experimentos desenvolvidos pe-los pesquisadores e alunos do Gru-po de Sistemas Veiculares e Robó-ticos têm servido para a formaçãode recursos humanos em diversosníveis � de iniciação científica a tesesde doutorado, passando por proje-tos de fim de curso, dissertações demestrado e projetos patrocinados.Speranza Neto lembra que o traba-lho desenvolvido pelo GSRV/PUC-Rio não se limita ao simulador, sen-do utilizado também em diferentesveículos, como carros, motos, e ou-tros aparatos, todos em escala, e ain-da em robôs radiocontrolados. �Nocaso das aeronaves, estamos desen-volvendo trabalhos desde 1999,quando participamos da primeiraedição da Competição SAE Brasilde Aerodesign, que reúne anualmen-te, em São José dos Campos [SP],mais de 50 equipes de estudantes deengenharia de todo o País�, diz.

Outro evento de que os pesquisa-dores do GSVR/PUC-Rio partici-pam regularmente é o chamado�Combate de Robôs� � torneios nosquais veículos robóticos duelam en-tre si para ver qual deles é mais resis-tente. Nessa competição, já são vári-os os prêmios nacionais e internaci-onais obtidos pelos robôs da Equi-pe Riobotz, desenvolvidos por umgrupo de alunos de graduação co-ordenado pelo engenheiro mecâni-co Marco Antonio Meggiolaro, co-

lega e parceiro de trabalho deSperanza Neto na PUC-Rio, e quetambém conta com uma bolsa daFAPERJ para desenvolvimento deseus estudos.

Na opinião de Speranza Neto, o as-pecto lúdico dos torneios, com aparticipação de robôs, veículos eaviões miniaturizados, leva um pou-co de leveza para o curso de Enge-nharia � famoso por suas diversasdisciplinas envolvendo cálculos ma-temáticos pesados � sem, no entan-to, perder a seriedade. �Nosso tra-balho populariza o ensino, além dealiviar a pressão de que ensinar as-pectos técnicos como matemática deterceiro grau tem que ser maçante edifícil. Não por acaso, um dos le-mas de nosso grupo é Aprender se

divertindo�, revela.

Sobre a ideia de se adquirir conheci-mento de uma maneira divertida,Marco Antonio Meggiolaro concor-da e aproveita para citar um exem-plo. �Graças a esta suposta brinca-deira de construir robozinhos, pude-mos desenvolver tecnologia de veí-culos robóticos para a inspeção detubulações e da tampa do reator nu-clear da usina de Angra dos Reis�,conta. Diversão criativa, diriam al-guns, mas só para quem também écapaz de resolver uma equação da-quelas bem complexas.

À esquerda, o laboratório na PUC-Rio, onde trabalham Mauro Speranza Neto (centro) e Marco Antonio Meggiolaro (à direita)

Pesquisadores: Mauro Speranza Netoe Marco Antonio MeggiolaroInstituição: Pontifícia UniversidadeCatólica (PUC-Rio)

Foto: Weiler Filho

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Há luz eágua limpano fim do cano

Processo de fotocatálise,desenvolvido por pesquisadoresno campus de Resende da Uerj,degrada poluentes de efluentesindustriais

Foto: André Luiz Bonacin Silva

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7 | Rio Pesquisa - nº 7 - Ano II

Despoluir o Rio Paraíba doSul e incentivar o desenvol-vimento autossustentável

da região do Vale do Paraíba. Umsonho cada dia mais próximo darealidade, se depender dos pesqui-sadores do Grupo de TecnologiaQuímica Ambiental do campus re-gional de Resende da Universidadedo Estado do Rio de Janeiro (Uerj),que há dez anos desenvolvem a pes-quisa Degradação de poluentes por

fotocatálise. O método permite adespoluição da água usada nos pro-cessos industriais, transformando-aem H

2O (água) limpa e CO

2 (dió-

xido de carbono).

Correndo no sentido oeste-leste, emuma altitude média de 370 metros,o Rio Paraíba do Sul e seus afluen-tes têm origem nas serras daMantiqueira e do Mar. É o principalmanancial de águas correntes do es-tado do Rio de Janeiro, fornecendocerca de 80% do suprimento da áreametropolitana do Grande Rio, ondetambém é responsável por cerca de20% da produção de energia. O rioe as correntes de água que o alimen-tam nascem no estado de MinasGerais e chegam ao Rio de Janeirocom a qualidade das águas já com-prometida pelos lançamentos de es-gotos domésticos, efluentes indus-triais e grande carga de sólidos emsuspensão.

Da mesma forma, no trecho flu-minense da bacia, as contribuiçõesde despejos industriais e de esgotossanitários, que chegam in natura aoscorpos hídricos receptores, avo-lumam a carga poluente, piorandoa qualidade da água. Dentre as subs-tâncias poluidoras, podem-se citar oscompostos orgânicos, presentes nasemissões gasosas e nos efluentes lí-quidos de uma variedade de pro-cessos industriais. São, em geral, tó-

Roni Filgueiras xicos. Lançados em rios e córregosou na atmosfera, esses compostosorgânicos causam impactos em cur-to prazo, prejudicando a flora e afauna, e também trazendo riscos parao abastecimento urbano para con-sumo humano.

�A fotocatálise emprega comocatalisador (agente responsável pelaaceleração de uma reação, neste casoa de degradação de poluentes orgâ-nicos) o dióxido de titânio�, explicao pesquisador Alexandre Tôrres. �Afonte de energia que promove essareação é a luz. O efluente � ou seja, aágua contaminada � passa pelo rea-tor (um tubo especial), onde há umafonte de luz ultravioleta e também ocatalisador.� O resultado no fim dotúnel, ou do tubo, é água limpa.

Mas o que acontece, afinal, nestemétodo, conhecido como polimen-to físico-químico? �A energia da luzultravioleta é absorvida pelocatalisador, que devolve ao sistemao líquido em forma de energiaeletroquímica, usada na degradaçãodas moléculas de poluentes�, escla-rece o professor. �Imagine uma mo-lécula bem grande; ela é quebradaaté ser transformada em água eCO

2�, detalha. Mas o dióxido de

carbono (gás responsável pelo efei-to estufa), liberado durante esse pro-cesso, não afetaria a atmosfera? Ale-xandre Tôrres garante que o impac-to é muito menor que o da molécu-la poluente destruída.

�É uma questão de avaliar essa rela-ção de custo-benefício. O carbono,de alguma forma, é reabsorvido pelanatureza, o que não acontece comvárias outras substâncias, que sãobem mais tóxicas e poluentes�, acres-centa a pesquisadora Elaine FerreiraTôrres que, como Denise Godoy,Jacques F. Dias e Sérgio M. Corrêa,alunos de engenharia de produçãono campus de Resende, tambémparticipa do projeto.

MEIO AMBIENTE

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O método vem sendo estudado notratamento de substâncias frequente-mente presentes em efluentes indus-triais, como formol e corantes ali-mentícios. �O formol, por exemplo,é componente de vários produtos delimpeza e tanto aparece no materialdescartado da indústria como é ha-bitualmente despejado nos ralos do-mésticos�, explica Elaine.

Outra vantagem da fotocatálise emrelação a outros métodos de purifi-cação é que consegue degradar mo-léculas poluentes, mesmo em baixasconcentrações. �Tomemos comoexemplo uma indústria farmacêuti-ca que libera como subproduto umcomposto cancerígeno. Este com-posto está em baixas concentraçõese os outros métodos de degradaçãosão ineficientes para eliminá-lo. Afotocatálise consegue destruí-lo, mes-mo em baixa concentração�, garan-te Alexandre Tôrres.

O processo possibilita o polimentoda água, tornando-a limpa, eliminan-do componentes orgânicos, comofenol e benzeno. �Os outros méto-dos de controle ambiental, como otratamento microbiológico de lodosativados, não eliminam facilmenteessas moléculas porque normalmentenão são biodegradáveis. A foto-catálise é usada em associação comprocessos tradicionais e, em breve,se conseguirá usar a água em circuitofechado�, prevê Alexandre, que dizque essa tecnologia ainda não está dis-ponível no País, apenas no exterior.

�A catálise funcionacomo um refino e, naadaptação para a indús-tria, será preciso acrescen-tar uma etapa a mais noprocesso de tratamentode efluentes, antes dodescarte. O material re-sultante poderá serreutilizado em algumasetapas do próprio pro-cesso industrial ou para

usos domésticos menos nobres,como para limpeza de áreas exter-nas�, exemplifica Elaine. A Uerj estádesenvolvendo esta tecnologia noBrasil com um grupo de pesquisa-dores que começaram as suas pes-quisas no Instituto Alberto LuizCoimbra de Pós-graduação e Pes-quisa de Engenharia, da Universida-de Federal do Rio de Janeiro(Coppe/UFRJ).

Em longo prazo, outra ideia é subs-tituir a luz da lâmpada pela luz solar,o que tornará o método mais bara-to e competitivo no mercado. A pre-visão é chegar a um catalisador comenergia natural até 2013. �Está se ten-tando fazer isso no mundo inteiro,ou seja, criar catalisadores que façama degradação a partir da luz visível.Será barato em relação aos méto-dos tradicionais. Hoje, o processo écompetitivo em alguns casos. Já es-tudamos muitos fenômenos envol-vidos e vamos passar para esta fasedo reator solar nos próximos cincoanos�, destaca Alexandre.

Outra aplicação da fotocatálise comdióxido de titânio é o seu empregona síntese de substâncias. �A vanta-gem, neste caso, é evitar o uso de umreagente tóxico, que mais tarde serádescartado, como acontece no pro-cesso tradicional. Há também umagrande economia na energia gasta

num processo industrial à alta tem-peratura, já que, na catálise, a energiautilizada é na geração da luzultravioleta. O processo pode serempregado na química fina, o quepermite o desenvolvimento de inter-mediários para fármacos e corantesde alto valor agregado. Esse será umdos futuros desdobramentos de nossapesquisa�, finaliza Elaine.

Estudos recentes dão conta de queos efluentes domésticos e os resídu-os sólidos oriundos das cidades demédio e grande porte localizadas àsmargens do rio constituem a fontede poluição mais prejudicial da ba-cia do rio Paraíba do Sul. A implan-tação de estações de tratamento deesgotos e a construção de aterrossanitários e usinas de beneficiamentode lixo domiciliar estão entre as prin-cipais ações para combater esse pro-cesso. A fotocatálise pode se trans-formar em uma importante ferra-menta para ajudar a reverter essa si-tuação no futuro.

Pesquisadores: Alexandre RodriguesTôrres, Elaine Ferreira Tôrres, DeniseGodoy Rodrigues, Jacques F. Dias eSérgio M. CorrêaInstituição: Universidade do Estadodo Rio de Janeiro � Uerj

Fotos: divulgação Uerj

O reator: fonte de luz ultravioletae catalisador agem para

obter água limpa

FOTO DOSPESQUISADORES

Denise, Jacques e Elaine: contribuição para o controle ambiental

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Corrida aodeserto de gelo

Ciência fluminense ganha força na Antárticacom apoio de uma ampla rede de pesquisa

Vinicius Zepeda

O século XXI já testemunhaos primeiros movimentosdo que deverá ser uma

nova �corrida do ouro�, desta vezem direção às regiões polares. Apon-tada como zona de interesse estraté-gico para o futuro do planeta, a �úl-tima fronteira� para a conquista do

homem se esconde debaixo do gelonas calotas polares. No hemisférioSul, a Antártica atrai o interesse dediversos países, reunidos no Trata-do Antártico, que investem em pes-quisas científicas e na avaliação de suasriquezas naturais, que não seriampoucas � de fonte de água doce adepósito de micro-organismos quehá 20 milhões de anos não têm ne-

nhum contato com o exterior. OBrasil, com posição geograficamen-te privilegiada em relação ao �sextocontinente�, como essa porção deterra também é chamada, vem inten-sificando sua presença na região.

Pesquisadores brasileiros realizamexpedições regulares ao continen-te, onde o País mantém em funci-onamento, desde 1984, a Estação

Pesquisadores realizam expedições regulares ao continente gelado: País mantém base na região desde 1984

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MUDANÇAS CLIMÁTICAS

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Ano II - nº 7 - Rio Pesquisa | 10

leiros e das ações de conservação eproteção do meio ambiente.

A baía possui séries temporais queestão entre as mais longas da Antár-tica, relativas a dados meteoroló-gicos, aves e organismos que vivemassociados aos fundos marinhos.Análises desses dados pretéritos po-dem auxiliar na compreensão doefeito das mudanças climáticas glo-bais naquele ambiente.

Projeto envolve cerca de200 pessoas de 16instituições de pesquisa

Ao longo dos próximos três anos, aBaía do Almirantado será um dosprincipais focos de atenção do Ins-tituto Nacional de Ciência &Tecnologia Antártico de PesquisasAmbientais (INCT-APA) � um dos20 centros de excelência fluminensescontemplados no mais ambiciosoprograma de apoio à ciência do País,lançado em agosto de 2008 peloConselho Nacional de Desenvolvi-mento Científico e Tecnológico(CNPq). O programa, alavancadopor meio de inúmeras parcerias queincluem fundações de amparo à pes-quisa (FAPs) de diversos estados, in-cluindo a FAPERJ, disponibilizoupara a pesquisa o maior volume de

recursos já reunidos na história daciência nacional.

Coordenado pela bióloga e pesquisa-dora da Universidade Federal do Riode Janeiro (UFRJ) Yocie YoneshigueValentin, o INCT-APA atuará no de-senvolvimento de uma série de estu-dos multidisciplinares que envolvemcerca de 200 pessoas, entre profissi-onais e alunos de 16 instituições deensino e pesquisa sediadas em esta-dos do Sudeste, Sul e Nordeste doPaís. A iniciativa conta ainda com aparceria do Ministério do Meio Am-biente. Os estudos serão divididosem quatro módulos temáticos: At-mosfera Antártica e os ImpactosAmbientais na América do Sul; Im-pacto das Mudanças Globais noMeio Ambiente Antártico; Impactodas Atividades Antrópicas no MeioAmbiente Antártico; e GestãoAmbiental.

�Se por um lado a Antártica ainda éo mais preservado dos seis continen-tes que compõem a Terra, por ou-tro, é também o mais frágil deles�,explica Yocie. �O continente temforte influência no clima da Américado Sul, podendo afetar regiões mui-to além da Antártica, até mesmo aAmazônia�, diz a pesquisadora. Elaressalta que há 50 milhões de anos a

Antártica Comandante Ferraz(EACF). Implantada pelo governobrasileiro para dar suporte aos diver-sos estudos realizados por instituiçõesde pesquisa, suas instalações estão si-tuadas na Baía do Almirantado, IlhaRei George do Arquipélago Shetlandsdo Sul, ao nordeste da Península An-tártica. A cada ano, mais de uma cen-tena de navios passam pela área, umadas mais visitadas da região.

A ilha abriga uma base aérea chilena,que funciona como porta de entra-da para expedições científicas de vá-rias nações em direção a outras par-tes do continente. No local, existemoito estações de pesquisa de bandei-ras diversas, além da brasileira.

A Baía do Almirantado é considera-da �Área Antártica EspecialmenteGerenciada� no contexto do trata-do, por seus valores históricos, bio-lógicos e ambientais. Cinco paísesatuam com maior frequência nesselocal: Estados Unidos, Polônia, Bra-sil, Peru e Equador � pela ordem deestabelecimento de suas respectivasatividades científicas. A gestãoambiental obedece a um sistema derodízio entre estes países, e atualmen-te está sob a responsabilidade do Bra-sil, o que aumenta a importância daspesquisas desenvolvidas pelos brasi-

Fotos: André Monnerat

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Antártica ainda estava ligada à Amé-rica do Sul � que hoje é a região maispróxima do continente gelado.

Baleias entram comfrequência na Baía doAlmirantado

Na Baía do Almirantado, que ofere-ce aos pesquisadores uma importan-te fonte de informações para os es-tudos da biodiversidade marinha docontinente, é frequente a entrada debaleias, incluindo a espécie jubarte,e, no fim do século XIX e até o iní-cio do XX, havia uma importanteestação de caça a esses animais nolocal. �Também é comum encon-trarmos pinguins das espécies papua,adeliae e antartico, e outras aves mari-nhas, como skuas, biguás e pombasantárticas. Mamíferos, como elefan-te-marinho, foca de Weddell e foca-leopardo também são frequente-mente avistados�, relata Yocie. �AAntártica não deve ser vista somen-te como um deserto gelado, mascomo um local que detém uma altadiversidade de espécies, especialmen-te no ambiente marinho e, por issomesmo, deve ser preservada comosantuário ecológico, como patrimô-nio da humanidade�, defende Lúciade Siqueira Campos, bióloga da

UFRJ, uma das coordenadoras doCenso de Vida Marinha Antártica eassessora científica internacional doINCT-APA.

Segundo Lúcia, a Baía do Almiran-tado pode sofrer forte influência dasmudanças ambientais globais, e, poressa razão, ela e sua equipe trabalhamagregando informações passadasàquelas coletadas recentemente.�Estamos monitorando o local embusca de respostas para essas varia-ções e como afetam os seres vivospara avaliar o que possa vir a ocor-rer no futuro. Alterações que ocor-rem no ambiente marinho antárticocertamente poderão influenciar oresto do planeta�, diz. Entre janeirode 2008 e março deste ano, umaequipe coordenada por Lúcia Cam-pos trabalhou na coleta de espéciesmarinhas encontradas na Baía doAlmirantado, em profundidades deaté 1.100 metros. Essa é a primeiravez na história da ciência brasileiraque organismos marinhos sãocoletados em águas tão profundas.O trabalho só foi possível graças àinstalação de um cabo geológicoadequado para a coleta de amostrasem altas profundidades. Além disso,o trabalho sobre a diversidade ma-rinha buscou �inovação tecnoló-gica�, com o desenvolvimento e

adaptação do robô mergulhadorLuma, idealizado por pesquisadoresdo Instituto de Pós-graduação emEngenharia da universidade (Coppe/UFRJ). O equipamento consiste noprimeiro ROV (sigla em inglês paraveículo remotamente operado) comtecnologia nacional. Equipado comduas câmeras, uma de alta e outrade baixa resolução, o dispositivo estásendo acrescido de outros sensorese novos flutuadores para chegar aprofundidades além de 300 metros.

Antártica e América doSul têm espéciescomuns

No trabalho de laboratório realiza-do pelo INCT-APA, espécies mari-nhas coletadas na Antártica já estãosendo comparadas com a fauna ma-rinha encontrada na margem conti-nental brasileira profunda. Uma es-pécie comum encontrada nessas duasregiões é a Oneirophanta (�entidadedos sonhos�, em grego), um pepi-no-do-mar de aspecto bastante exó-tico. Segundo Rafael de Moura, es-pecialista no tema e aluno de Lúcia,já é possível identificar pelo menostrês espécies que habitam tanto a mar-gem continental brasileira como aAntártica. Moura pretende agora

Cientistas monitoram o local em busca de respostas para as mudança ambientais globais e como estas afetam os seres vivos, como o leão-marinho

Fotos: Rafael Moura

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Ano II - nº 7 - Rio Pesquisa | 12

comparar o DNA das espécies en-contradas no Oceano Atlântico comas do Oceano Austral para conhecero grau de isolamento genético entreas espécies dos dois continentes.

O INCT coordenado por Yocie, emsuas próprias palavras, �visa ser uminstituto de referência em pesquisaambiental na Antártica e na preser-vação daquele continente como bemda humanidade�. Para a pesquisado-ra, a missão do instituto é �valorizaro desenvolvimento de investigaçõescientíficas transdisciplinares na RegiãoAntártica, promovendo a pesquisa,a formação de recursos humanos etransferindo os conhecimentos ad-quiridos para a sociedade�.

A bióloga destaca que as principaismetas são quatro: conhecer emonitorar a atmosfera antártica eseus impactos ambientais na Amé-rica do Sul; conhecer e monitorar oimpacto das mudanças globais, na-turais e aquelas provocadas pelohomem no meio ambiente antárti-co terrestre e marinho; desenvolverum modelo integrado de gestãoambiental para monitoramento eavaliação das mudanças ambientaislocais e globais; e valorizar a ciênciaantártica para a sociedade brasilei-ra, promovendo a educação e a di-fusão de informações.

Para levar adiante esses objetivos, oinstituto pretende acompanhar deperto as regiões de deslocamentosdas frentes frias da Antártica até aAmérica do Sul, especialmente oBrasil; o efeito estufa percebido naAntártica nos dias de hoje; as altera-ções na química da atmosfera e suainfluência no clima � envolvendo ainteração Sol-Terra, a temperatura namesosfera e o buraco na camada deozônio. Essas informações, esclare-ce Yocie, poderão oferecer subsídi-os a modelos numéricos de previ-são de tempo e clima. Mas a lista detarefas para a pesquisadora e sua

equipe não terminam aí: o institutoinvestigará também o efeito daretração das geleiras e suas implica-ções para os ciclos biogeoquímicos,a aferição das mudanças da cober-tura vegetal e as alterações da diver-sidade das comunidades vegetais.Uma avaliação da flutuação e distri-buição das populações de aves tam-bém está prevista, bem como a de-finição de quais espécies animais evegetais são endêmicas, e a identifi-cação da presença de espécies exóti-cas na região.

Estudo monitora osambientes atmosférico,terrestre e marinho

Em relação aos vegetais encontra-dos na região, o grupo de pesquisa-dores reunidos sob a supervisão deYocie deverá investigar sinais de es-pécies que não existiam antes e quecomeçam a surgir, seja pela ação dohomem ou pela transferência de or-ganismos de outras regiões para aAntártica, como espécies invasoras.Segundo o especialista em Botânicae professor da Universidade Fede-ral do Pampa (Unipampa), Antônio

Batista Pereira, ainda não há nenhumestudo específico de sua equipe so-bre plantas introduzidas na regiãopela ação do homem. �O que temospor enquanto é o registro de Poa annua

L., espécie de grama anual, cespitosa,pertencente à família Poaceae, nativada Europa e comum no Sul do Bra-sil, como invasora de cultivos de in-verno. Muito resistente ao frio, vemcrescendo em áreas de degelo nosarredores da estação antártica polo-nesa, que se localiza na Ilha ReiGeorge�, explica o coordenador domódulo temático Impacto das Mudan-

ças Globais de Mudanças Antárticas no

Meio Ambiente Antártico.

Por meio de estudos dos efeitos deimpactos ambientais (naturais e pro-vocados pelo homem), o INCT-APA pretende contribuir para a me-lhor compreensão dos processosecossistêmicos que necessitam dedados coletados ao longo do tem-po, monitorando os ambientes at-mosférico, terrestre e marinho. Aspesquisas do instituto, contudo, nãose limitam a estudar a Baía do Al-mirantado, mas pretende, por exem-plo, investigar como essa área, quevem sendo mais afetada por efeitos

A Estação Antártica Comandante Ferraz (EACF): suporte aos diversos estudos realizados por...

Foto

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ael M

oura

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como o do aquecimento, compara-se a outras da Antártica.

�Compreender processos ambientaisque ocorrem naquela região pode nosauxiliar a averiguar potenciais efeitosem outros locais, memo o litoral doestado do Rio de Janeiro, que sofreinfluência de massas d�água oriundasdas regiões Antártica e Sub-antártica,a última aflorando no Rio de Janeiroa cada primavera e verão�, diz Yocie.�Qualquer alteração mais drástica noambiente antártico vem repercutir naprodutividade do nosso oceano. En-tão, precisamos estar atentos a essasinterrelações no meio para termosmaior capacidade de predição donosso futuro�, enfatiza.

Ela destaca que todo o trabalho ser-virá para nortear ações sobre diver-sidade biológica e desenvolver umsistema de gestão ambiental para aregião antártica, em especial para aBaía do Almirantado. �Isso abrangea realização de diagnóstico, planeja-mento, implementação, acompanha-mento e avaliação permanente do

ambiente antártico. Essas informa-ções técnicas serão disponibilizadaspara o governo, auxiliando-o na to-mada de decisões�.

No mês de outubro, terá início ocronograma de viagens de pesquisa-dores ligados ao instituto, em dire-ção à Antártica. O grupo, que pode-rá ser um dos primeiros a utilizar anova embarcação adquirida pelo Paíspara o apoio às pesquisas científicas,o Navio Polar Almirante Maximiano(veja reportagem à pág. 37), deve per-manecer entre 30 e 40 dias na Re-gião Antártica � o tempo de perma-nência dependerá das condições cli-máticas encontradas no período.Cada uma das equipes será divididaem grupos que participarão de trêsfases distintas da pesquisa de campo:a primeira irá de outubro a novem-bro; a segunda, de novembro a janei-ro; e a terceira, de janeiro a fevereiro.A presença brasileira, assim, ganhaforça no continente gelado, mas den-tro das regras acordadas no Tratadoda Antártica, que garante o direito àexploração científica da região.

Concluído em 1959, o tratado en-trou em vigor em 1961, após a suaratificação pelos 12 Estados signa-tários (África do Sul, Argentina, Aus-trália, Bélgica, Chile, Estados Unidos,França, Japão, Noruega, NovaZelândia, Grã-Bretanha e URSS)para um período de 30 anos. O tra-tado destinava-se a suspender as rei-vindicações territoriais dos países ea reservar o continente antártico àpesquisa científica. Em 4 de outu-bro de 1991, o acordo foi pror-rogado por um período adicional de50 anos, sendo complementado porum protocolo sobre a proteção doambiente � que ficou conhecidocomo o Protocolo de Madrid � eproíbe qualquer atividade explo-ratória até 2041. O Brasil aderiu aoTratado da Antártica em 1975 e, noinício da década de 1980, inauguroua Estação Antártica ComandanteFerraz � homenagem ao hidrógrafoe oceanógrafo Luís Antônio de Car-valho Ferraz, comandante da Mari-nha que teve papel central na deci-são do País de desenvolver seu pro-grama antártico.

Pesquisadores: Yocie YoneshigueValentin e Lúcia de Siqueira CamposInstituição: Universidade Federal doRio de Janeiro (UFRJ)

Pesquisadores da UFRJ: missão de valorizar apesquisa transdisciplinar e transferir os

conhecimentos adquiridos para a sociedade

O que é o Tratadoda Antártica

Foto: André Monnerat

...instituições de pesquisa do País na região

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Imagine-se como uma criança de9 ou 10 anos que, salvo casa deamigos ou parentes, na maior

parte das vezes, nunca dormiu lon-ge de casa ou da companhia dos pais.Agora, recorde um pouco como erao seu mundo. Brincar de super-he-róis, reis e rainhas, povos antigos,mágicos, escutar, contar e inventarhistórias, dar asas à imaginação edeixar a fantasia rolar... Nesse uni-verso de sonhos e aventuras, um gru-po de 20 crianças, estudantes doColégio de Aplicação da Universi-dade do Estado do Rio de Janeiro(CAp/Uerj), teve uma experiênciaque dificilmente será apagada de suasmemórias: passaram uma noite � oupelo menos uma boa parte dela �aprendendo e brincando, por meiode uma série de atividades que en-volvem histórias sobre reis, rainhas,múmias egípcias, índios, fósseis dedinossauros e outros animais já ex-tintos. Se todos esses personagensnão chegam a ganhar vida, ressusci-tar, na escuridão da noite � como

acontece no filme �Uma noite noMuseu�, para desespero do ator BenStiller, no papel de vigia noturno �,as crianças não tiveram dificuldadepara embarcar neste faz-de-conta,com uma mãozinha de atores carac-terizados de escravos, reis, rainhas epersonagens históricos, além de pes-quisadores e monitores do MuseuNacional. Fundada em 1818, a insti-tuição abriga o mais importante acer-vo de história natural da América doSul e serviu de residência da famíliaimperial brasileira.

Desenvolvido com o apoio daFAPERJ e batizado de De pijamano museu�, o projeto teve início às17 horas do sábado, dia 30 de maio,e terminou por volta de 10 horasdo dia seguinte, após um café damanhã de confraternização com ospais das crianças. Foi a primeira edi-ção do evento, que deverá reunir, nosúltimos fins de semana de junho ejulho, mais dois grupos de 20 crian-ças. Vitória Teixeira Ferreira, 10 anos,estava entre as participantes da edi-ção de estreia e não cabia em si de

Uma noite na companhia deíndios, múmias, dinossauros...

Em iniciativainédita no País,

crianças dormemnas dependências

do MuseuNacional/UFRJ e

�transformamsonhos emrealidade�

Vinicius Zepeda

Fotos: Vinicius Zepeda

CULTURA

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tanta ansiedade. �Já visitei o museuantes, mas esta será a primeira vezque dormirei lá. Espero encontrarobjetos que nunca vi antes e que euache uma coisa que me surpreendamuito�, disse a menina. Vitória foilevada ao local por sua mãe, a ge-rente financeira Ana Rosa Ferreira.Na expectativa de ver a filha dor-mir pela primeira vez fora de casa,ela esqueceu por uns momentos afrieza dos números e o mundo dosnegócios para embarcar na fantasiainfantil: �Acho que vai ser uma ex-

periência incrível. Eu mesma gostariade dormir no museu. Será que elesnão vão fazer uma versão do proje-to para adultos?�, perguntava-se.

�No olhar de sinhá, tinha mistériode amor, meu sinhô / No olhar desinhá, tinha mistério de amor, meusinhô / Minha origem é quilombola/ Ensaboa mulata, ensaboa / Ensa-boa, estou ensaboando�, entoavamatores caracterizados de escravos naporta de entrada do Museu Nacio-nal, por volta das 17h30, quando osúltimos raios de sol já começavam ase despedir da paisagem. Os escra-vos negros dançavam jongo e can-tarolavam melodias típicas da cultu-ra africana, enquanto as crianças, ain-da na companhia de seus pais, assis-tiam à cena encantadas. Após a apre-sentação, as portas do museu foramabertas e os escravos convidaram acriançada a entrar. Foi ali que os paisse despediram dos filhos e deixaramsuas crianças sob a responsabilidadede monitores, pesquisadores do lo-cal e professores do CAp/Uerj queos acompanhariam na aventura. Noalto da escadaria do museu, os ne-gros indicavam quem mais estavapor vir: Dom João VI, Dona CarlotaJoaquina e Dona Maria (�a rainhalouca�) � um espetáculo à parte du-rante o evento. Com seu jeito exa-gerado e humor histriônico, elainteragia com as crianças, e tambémcom os próprios repórteres de emis-soras de TV e jornais que ali se en-contravam.

Múmia egípcia rouba acena da criançada

Pouco tempo depois, as criançasforam convidadas para o �lanchereal� e, depois de comer, ganhavamlanterninhas para, no escuro, explo-rar a exposição �Dinossauros do Ser-tão�, que exibia, entre outros, oAngaturama limai � maior dinossaurocarnívoro já reconstituído no País. Asala da mostra foi o local escolhido

pela coordenação do evento para ascrianças passarem a noite � emcolchonetes espalhados pelo ambi-ente � após o encerramento das ati-vidades noturnas de sábado. �Foiimpressionante o grau de participa-ção, entusiasmo e interesse das cri-anças�, comemorava a paleontólogaDeise Henriques, uma dasorganizadoras do evento. �Por vol-ta das 22 horas, foi servido o �jantarimperial�. Em seguida, cada um dogrupo fez sua higiene pessoal antesda exibição do longa �Uma noite noMuseu 1�, a que todas as crianças as-sistiram. Elas estavam tãoempolgadas que foram dormir porvolta de 3 horas da manhã�, acres-centou.

Outra atração que roubou a cena foia múmia egípcia. Os atores, caracte-rizados, integravam-se perfeitamen-te aos �cenários�. As crianças, inicial-mente, viam os atores parados ouse mexendo pouco, escutavam umaexplicação dos monitores e, depois,interagiam com os personagens his-tóricos. �Mas o personagem damúmia roubou a cena e a atençãodas crianças. Toda vez que ela semexia, as crianças se distraiam e es-queciam de prestar atenção no queestava sendo dito pelos monitores�,lembrou rindo a paleontólogaLuciana Barbosa, que também par-ticipou da organização do evento. Odiretor do Museu Nacional, SérgioAlex de Azevedo, junto com umaequipe, acompanhou e filmou tudo,em formato DVD. �Em uma pró-xima edição, já sabendo do fascínioque a múmia exerce sobre os estu-dantes, vamos provavelmente mo-dificar o roteiro para que a múmiaapareça apenas após a explicação domonitor�, disse o paleontólogo. AColeção Egípcia do museu, que con-ta com três múmias, é uma das maisantigas e importantes do gênero naAmérica do Sul. Sérgio Alex esperaque o DVD possa servir para divul-

Atores caracterizados de índios:estudantes (à dir.) fazem imersão na história

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gar o projeto em outras escolas etambém entre a iniciativa privada,para que, no futuro, o evento passea fazer parte do calendário oficial deatividades do museu.

Na manhã de domingo, após o caféda manhã de confraternização e en-cerramento das atividades, JoãoPedro, 10 anos, exibia um misto detristeza e excitação. �Eu esperava viraqui e aprender mais sobre osdinossauros. Mas aprendi muitomais com a história do Egito, asmúmias, que foi a parte que eu maisgostei�, contava o menino. �Agoraeu tenho certeza que vou querer sercientista no futuro e que não tenhosó os dinossauros para estudar, masum bando de coisas muito legais�,acrescentou o futuro pesquisador.Já a responsável pela CoordenaçãoCultural do CAp/Uerj, a professora

Rita Josélia da Capela, destacou aimportância de o evento servir paraensinar não só os alunos, mas tam-bém os próprios pais e professo-res. �A atividade permitiu um olhardiferenciado, mais íntimo, o que emuma visita guiada e com tempocorrido, muitas vezes não é possí-vel. Já para os pais e professores,serviu para entenderem melhor opapel cultural, a importância e ogrande número de possibilidadeseducativas existentes dentro do mu-seu�, explicou Rita.

O programa de De pijama no museu

também contou com outras atra-ções, como a identificação demeteoritos; teatrinho com Cleó-patra, e o faraó, para contar a his-tória do Egito; uma índia contan-do uma lenda indígena antes da re-alização de um ritual por um pajé,além de outras atividades, comoidentificar fósseis de peixes pormeio de um kit-pesquisador com-posto de livrinho, quebra-cabeças elanterninha, dados de brinde às cri-anças. �No caso do teatro egípcio,as crianças aprenderam sobre umdos povos mais antigos e misterio-sos do mundo, tudo com muitohumor e alegria proporcionada pe-los atores. Já a identificação demeteoritos também os emocionoue os fez se sentir como verdadeiros

cientistas-mirins� recordaram aspaleontólogas Luciana e Deyse.

Apesar de a experiência de passaruma noite em um museu de histórianatural já ser bastante comum eocorrer regularmente e com bastan-te sucesso em outros países, comoInglaterra e Estados Unidos, foi aprimeira vez que a atividade foi rea-lizada no Brasil. Até então, a experi-ência mais similar realizada no Paísera levar crianças para passar umanoite observando as estrelas, comojá ocorre em alguns planetários doBrasil. �As crianças que participaramdo evento certamente serão maissensíveis às questões científicas nofuturo. Elas aprenderão sobre o pa-pel do museu de uma forma nova,descobrirão que, apesar do fascínioque os dinossauros exercem sobreelas, há muito mais que isto aqui: hámúmias, índios, civilizações antigase/ou milenares. Muitos desses per-sonagens podem até despertar o in-teresse infantil para que se tornemos cientistas do amanhã�, concluiu opaleontólogo Alexandre Kellner, queidealizou e formulou o projeto.

Para o diretor presidente da FAPERJ,Ruy Marques, atividades de carátercultural que envolvam a participaçãode crianças estão entre as formasmais adequadas para se difundir epopularizar a ciência e a tecnologia.�É por meio das crianças que o �es-pírito do cientista� pode ser mais fa-cilmente propagado, e, apesar daparticipação exclusiva delas no pro-jeto, os pais também acabam envol-vidos. Iniciativas assim devem sercontinuamente estimuladas�, apoia.A expectativa dos organizadores éde que a atividade possa se tornarrotineira no Museu Nacional e quesirva de modelo para ações seme-lhantes em outros museus. Acima, crianças

identificam fósseis depeixe; ao lado, divertem-se com atorescaracterizados de nobresna hora do �Lanche Real�

Pesquisadores: Alexandre Kellner,Deise Henriques e Luciana BarbosaInstituição: Museu Nacional/UFRJ

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Criação de rãsnegócio antigo,saudável e promissor

Aagropecuária fluminense,marcada ao longo das últi-mas décadas pela perda de

competitividade de suas principaisproduções, pode estar a caminho dereverter esse quadro com a ajuda deuma atividade que já provou seuenorme potencial: a aquicultura.Quem garante é o biólogo JoséTeixeira de Seixas Filho, professor epesquisador do Centro Universitá-rio Augusto Motta (Unisuam). Elecoordena o projeto Melhorias da técni-

ca de criação de rã-touro, que vem estu-dando formas de baratear os custosde um ranário, para que a carne de rãchegue à mesa de um número maiorde brasileiros. Executado no Labo-ratório de Pesquisas em Biologia doCurso de Ciências Biológicas e doMestrado em Desenvolvimento Lo-cal da Unisuam, o projeto é desen-volvido em convênio com a Funda-ção Instituto de Pesca do Estado doRio de Janeiro (Fiperj) e das associa-ções de ranicultores do estado.

O valor nutritivo da carne de rã jáfoi comprovado por pesquisas rea-lizadas em diferentes países. Maspoucos sabem que seu consumopode minimizar certos tipos de pro-blemas de metabolismo em crian-ças � característica confirmada peloestudo coordenado por Seixas Filhoe sua equipe. Nem mesmo a pele pre-cisa ser descartada. Os pesquisadoresjá descobriram que, transformada empó, ela ajuda a diminuir o tempo decicatrização de queimaduras.

A decisão da Unisuam de levaradiante um projeto de estudos vol-tado para a criação de pequenos ani-mais � principalmente os envolvidosem aquicultura e maricultura � sur-giu na esteira da constatação de queo Rio de Janeiro possui a terceiramaior costa em extensão do Brasil eum complexo hídrico interior de re-conhecida qualidade. �O estado foi

Rosilene Ricardo

AGROPECUÁRIA

Foto: Angélica Gomes

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Estudo coordenadopor biólogo e

pesquisador doconvênio Fiperj/

Unisuam revela asvárias aplicações

da carne e da peledo anfíbio

de mortalidade apresentada pelosanimais nas fases de girino e adulta, eas suas deficiências nutricionais. �Ain-da hoje, não são conhecidas as neces-sidades nutricionais diárias da rã-tou-ro, assim como da maioria dos orga-nismos aquáticos criados em cativei-ro�, completa Seixas.

O pesquisador revela que, mesmocom a expressiva redução do núme-ro de ranários, a produção não dimi-nuiu, embora o consumo da carne de

artesanais. Isso está diretamente liga-do à situação em que se encontra aatividade nos dias atuais. A nutriçãoe a patologia de organismos aquáti-cos vêm promovendo grande au-mento nos custos operacionais naaquicultura, em particular nos ranários,pela morte dos animais tanto na fasede girinagem como na de recria.�

Carne de rã minimizaproblemas dedesnutrição

Por seu tamanho avantajado, suagrande adaptação à criação em cati-veiro e pela carne altamente nutriti-va, a espécie Rana catesbeiana foi aescolhida para ocupar o centro des-se projeto de pesquisa na Unisuam.�A carne de rã pode ajudar a dimi-nuir mais de 500 erros inatos de me-tabolismo em seres humanos, comocertas alergias a carboidratos�, ex-plica Seixas. Seu consumo tambémfortifica o sistema imunológico,minimizando problemas de desnu-trição. �Quando os estudos estive-rem bem fundamentados, nossopróximo passo será elaborar umapapinha, destinada a crianças alérgi-cas e desnutridas. O assunto é temade projeto de mestrandos da Uni-suam, envolvendo alunos dos pro-gramas de Iniciação Científica doCurso de Ciências Biológicas e daSaúde�, conta o biólogo.

Conhecendo todas essas caracterís-ticas nutritivas da carne de rã, o pes-quisador viu a oportunidade de aju-dar as crianças das comunidades doentorno da universidade, que sofremprejuízos no seu desenvolvimento.�Estamos trabalhando com umamenina de 5 anos que tem alergia acarboidratos. Uma nutricionista ori-enta a mãe e nós fornecemos a car-ne. Já estamos observando melho-ras�, comemora. Na universidade, opesquisador mantém um ranário, comtanques onde as rãs ficam separadaspor fases de desenvolvimento � de

pioneiro na criação de rãs em cati-veiro, atividade que teve início na dé-cada de 1930, quando um técnicocanadense trouxe cerca de 100 ca-sais de rã-touro americana [Rana

catesbeiana] para o País�, conta Seixas.

De acordo com o pesquisador, apartir da década de 1970 as pesqui-sas para o aprimoramento daranicultura ganharam importância, oque culminou com o surgimento decriatórios espalhados por todo o ter-ritório nacional. No início da déca-da de 1990, contudo, a maior partedos ranicultores passou a enfrentardificuldades para manter os negóci-os. �Foram várias as razões para esserevés�, diz o biólogo. Ele cita a gran-

rã entre os brasileiros ainda esteja dis-tante da popularidade que alcança emoutros países. �Os ranicultores são res-ponsáveis pela maioria das adaptaçõeszootécnicas que levam ao sucesso daatividade e à garantia de produção, nãoesperando pelas pesquisas que pode-riam encurtar esse longo caminho deaprendizado, que deixa um rastro deperda econômica irreparável, além delevar descrédito à ranicultura�, lamentao coordenador do projeto, desenvol-vido com o apoio da FAPERJ.

Segundo Seixas, os ranicultoresfluminenses possuem característicasbastante heterogêneas. �Não é pos-sível classificá-los como produtoresexclusivamente profissionais ou

Seixas Filho: desafio de diminuir as altas taxas de mortalidade dos animais nos ranários

Foto: Angélica Gomes

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tos, já podemos dizer que a cicatri-zação acontece bem mais rápido queno tratamento convencional. Alémdisso, encontramos um empregopara a pele de rã, que, de outra for-ma, termina sendo descartada deforma inadequada no meio ambien-te�, acrescenta o professor Januário.

Pele de rã-touroapresenta atividadeantimicrobiana

Estudos realizados no Brasil e noexterior já comprovaram a eficáciade tratamento de herpes e de infec-ções, a partir da utilização de subs-tâncias secretadas pelo anfíbio, e com-postos químicos encontrados nessesanimais podem se tornar a base denovos antibióticos e antivirais.

A esses estudos se somam uma ou-tra pesquisa resultante do trabalho deSeixas, desenvolvida por suamestranda em Desenvolvimento Lo-cal e coordenadora do curso de Es-tética e Cosmetologia da universida-de, Simone Blanco. Ela examina apossibilidade de usar a pele do anfí-bio � já bastante explorada pela in-dústria na confecção de bolsas, sa-patos e cintos � para criar uma novaalternativa de tratamento facial. �Vi-mos que também pode auxiliar notratamento da acne, problema degrande incidência entre nós, sobre-tudo entre a população jovem. Mo-tivo para que a pesquisa de métodospara sua cura e controle seja um pro-cesso em constante renovação e buscade melhores resultados pela indústriacosmética�, diz Simone.

Segundo Simone, dados da literatu-ra reportam que algumas bactérias,como os estafilococos, são respon-sáveis por grande quantidade de in-fecções cutâneas. Substâncias compropriedades antimicrobianas mos-

tram-se úteis para o tratamento deacnes, seborreias e furúnculos. �Ob-servamos que a pele de rã-touroapresenta nove peptídeos, denomi-nados ranatuerinas, com atividadeantimicrobiana. Agora, estamos ava-liando, em ratos da espécie Wistar, oefeito de composições farmacêuticaspreparadas a partir do extrato brutoaquoso dessa pele sobre a bactériacausadora dos abscessos da acne. Es-peramos elaborar uma substância queapresente baixo custo e possa ser uti-lizada no tratamento�, conclui.

Se o Brasil permanece como um dosprincipais atores globais no mercadode produção de carne de rã � atrásapenas de Indonésia e de regiões vizi-nhas �, Seixas aposta que os investi-mentos em pesquisa podem assegu-rar resultados ainda melhores para oPaís no futuro. �Nessas regiões daÁsia, as rãs são criadas de forma ex-tensiva, mais comumente nos cam-pos de arroz, onde não se têm o con-trole dos fatores de produção, que,dentre outros aspectos, garantem aqualidade do produto final�, diz. Elenão tem dúvidas de que a produçãomédia por mês dos ranários flu-minenses, de 120 kg/peso vivo, ain-da pode crescer para se tornar umaimportante fonte de recursos para osetor agropecuário do estado.

girinos até a idade adulta. São 60matrizes e um total de 400 rãs que,abatidas, produzem carne suficientepara o desenvolvimento de todos osprojetos.

Com sua equipe e os técnicos daFiperj, Seixas estuda formas de esti-mular a produção, diminuindo as al-tas taxas de mortalidade dos animaisnos ranários fluminenses e a ofertairregular da carne de rã. Sua propos-ta é reduzir o custo operacional noscriadouros com medidas simples,por exemplo, a filtragem da água dostanques de modo a reutilizá-la � jáem estudo na unidade de pesquisaem ranicultura, instalada na EstaçãoExperimental de Aquicultura Almi-rante Paulo Moreira da Fiperj, emGuaratiba, bairro da Zona Oeste doRio. �Nosso objetivo é baixar oscustos de produção, e só isso levariaa uma economia de 30% do custooperacional, com uma boa reduçãono preço final. A carne é muito pro-curada, mas ainda é muito cara�, dizSeixas. E acrescenta: �Futuramente,pretendemos reunir todas as informa-ções da pesquisa em cartilhas paraorientar os donos dos ranários. Seráuma forma de contribuir para orien-tar os produtores familiares a aumen-tar a oferta da carne de rã�.

Desses estudos, surgiram duas novaslinhas de pesquisa. Desde 2008 queSeixas também analisa a aplicação dapele de rã em queimaduras. A ideianasceu a partir de seu uso na medici-na popular, e agora tem sua eficáciaavaliada em laboratório. �Os testescomeçaram em outubro do ano pas-sado, com o pesquisador JanuárioMourão, coordenador do Laborató-rio de Morfologia da Unisuam, e jáapresentam dados bem significati-vos�, diz Seixas. Para facilitar o uso,os pesquisadores decidiram transfor-mar essa pele em pó. A pesquisa ain-da está em fase de observação emratos, que têm DNA semelhante aodo ser humano. �Com os experimen-

Pesquisador: José SeixasInstituição: Fundação Instituto dePesca do Estado do Rio de Janeiro(Fiperj) / Centro UniversitárioAugusto Motta (Unisuam)

Rãs em criadouro: fonte de recursos para osetor agropecuário do estado

Foto: Rosilene Ricardo

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Um pensadordo BrasilHistoriador mineiro é agraciadocom o Prêmio Almirante ÁlvaroAlberto para Ciência e Tecnologia

Já dizia Drummond que �ser mineiro é ter simplicidade e pureza, humildade e modéstia�. Os versos do poeta traduzem emparte a natureza daqueles que nascem cercados por montanhase, como um bom mineiro, desta prosa não escapa José Murilo

de Carvalho. Nascido no interior das Minas Gerais, ele traz consi-go, além de muita humildade e modéstia, o reconhecimento por terse tornado um dos historiadores mais respeitados e consagradosno País. Mas a trajetória desse intelectual, que em 2004 se tornou osexto ocupante da cadeira número cinco da Academia Brasileira deLetras (ABL), que pertenceu a Oswaldo Cruz, vai muito além desua atuação como historiador.

Formado em Sociologia e Política pela Universidade Federal deMinas Gerais (UFMG), com mestrado e doutorado em CiênciaPolítica pela Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, �ZéMurilo�, como é carinhosamente chamado pelos amigos, colecionahomenagens e condecorações em áreas diversas. A mais recentedelas aconteceu no mês de abril, quando foi laureado, na categoriaCiências Humanas e Sociais, Letras e Artes, com o Prêmio Almi-rante Álvaro Alberto para Ciência e Tecnologia � uma parceria en-tre o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), o Conselho Naci-onal de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a Fun-dação Conrado Wessel. Uma premiação que o deixa em excepcio-nal companhia, ao lado de Celso Furtado, Antônio Cândido,Florestan Fernandes e Caio Prado Júnior.

Professor da UFMG por nove anos e do Instituto Universitário dePesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj) por quase duas décadas, ohistoriador lecionou também nas universidades de Stanford, UCIrvine e Notre Dame, todas nos Estados Unidos, e ainda nas deLeiden (Holanda), Londres e Oxford (Inglaterra) e na Escola deAltos Estudos em Ciências Sociais (França). Ao longo de sua longacarreira acadêmica, foi pesquisador da Casa de Rui Barbosa, doCentro de Pesquisa e Documentação de História Contemporâneado Brasil e pesquisador visitante do Instituto de Estudos Avança-dos da Universidade de Princeton, nos Estados Unidos.

Autor de diversos títulos, assina obras como A construção da ordem,Teatro de sombras, Os bestializados: o Rio de Janeiro e a república que não foi

Flávia Machado

PERFIL

Fotos: Paul Jürgens

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e A cidadania no Brasil: o longo caminho

(2001), e D. Pedro II: ser ou não ser

(2007). Suas pesquisas se concen-tram na história do Brasil Impérioe na Primeira República, abordan-do temas como cidadania, republi-canismo, militares e história intelec-tual e da ciência.

Uma outra distinção o posiciona aolado do jurista e professor CelsoLafer. Os dois são os únicos brasi-leiros a fazer parte da Academia Bra-sileira de Ciências (ABC) e tambémda ABL. Hoje, é professor titular deHistória do Brasil no Departamen-to de História do Instituto de Filo-sofia e Ciências Sociais da Universi-dade Federal do Rio de Janeiro(IFCS/UFRJ). Como se vê, estemineiro coleciona, além de prêmiose reconhecimento público, uma tra-jetória singular e a vontade de ir mui-to além das montanhas de Minas.

Nascido no ano de 1939, na Fazen-da de Santa Cruz, que fazia parte domunicípio de Andrelândia e hoje in-tegra o de Piedade do Rio Grande,José Murilo teve uma infância demuito trabalho. A propriedade, quepertencia à sua família, concentravasuas atividades na criação de gadoleiteiro. Ele conta que a vida naquelaépoca era muito dura e que sua alfa-betização foi feita em casa, pelo pró-prio pai. �Não havia estradas de ro-dagem e andávamos a cavalo ou emcarros-de-boi. Eu ajudava meus tiostirando leite e ainda tinha que lavaros pés deles à noite�, recorda-se. Fi-lho de Sebastião Carvalho de Souzae Maria Angélica Ribeiro, seu pai for-mou-se em Odontologia � feito raropara a época � e tratava dos dentesde parentes e dos que precisavam,sem cobrar. Possuía uma pequena bi-blioteca em casa, era amante da lín-gua portuguesa e �de um idealismomuito grande�, como ele mesmo serefere ao pai, que o incentivou a es-tudar e despertou seu interesse parao mundo dos livros.

Aos 10 anos, foi morar longe dospais, em um colégio interno, em San-tos Dumont. Mesmo com a dificul-dade de ficar longe da família aindatão novo, a experiência de estudar emum colégio de franciscanos holande-ses foi enriquecedora, assegura. Paraele, tirando desconfortos, como o detomar banhos frios em uma cidadecomo Santos Dumont, havia o ladopositivo daquela experiência: estudarcom pessoas esclarecidas e ter achance de absorver uma tradição decultura europeia. �Certamente meuinteresse pela cultura, pela língua, pelaliteratura, minha educação artística,

vem de meu pai e desses franciscanos.�Ele também se orgulha de ter lido Os

sertões, de Euclides da Cunha, aos 15anos de idade, nesse mesmo períodoquando estudou no colégio interno.

Quando terminou o curso que equi-valia ao ensino médio, pensou emseguir Agronomia ou Veterinária, dis-ciplinas que tinham ligação com al-guém que passara a infância em umafazenda. A matemática e a biologiao desencorajaram e, em 1962, ele en-trava para a Faculdade de CiênciasEconômicas, em Belo Horizonte.Tentou primeiro o curso de Econo-mia, mas foi derrubado por umaequação de segundo grau. Acabouentrando para o curso de Sociolo-gia e Política, da mesma faculdade,do qual diz se recordar como sendode muito boa qualidade, sobretudopela presença do historiador Fran-cisco Iglésias, a quem muito admi-rava. Ele descreve a faculdade como�muito bem organizada�, com um

sistema de bolsas de graduação queexigia disciplina e muito estudo. Seuprimeiro trabalho publicado, sobreBarbacena, fazia parte das obriga-ções de bolsista. �O sistema de bol-sas para alunos da graduação era re-almente extraordinário e deu resul-tados fantásticos�, lembra. �Os bol-sistas recebiam atenção especial e,além de ajudar outros colegas, tínha-mos que produzir uma monografiaao final de cada ano.�

Ao mesmo tempo, a faculdade tam-bém era um grande centro de agita-ção política, com dimensão nacio-nal. Por influência desse clima, aca-bou aderindo à militância política aolado de outros colegas, alguns dosquais alcançaram expressão nacional,como Vinícius Caldeira Brant, queocupou a presidência da União Na-cional dos Estudantes (UNE), eBetinho. �O ambiente combinavaenvolvimento político e atividadeacadêmica. Ninguém podia ser líderestudantil se não fosse bom aluno�,diz. Por sorte, reconhece, deixou omovimento estudantil antes do Gol-pe de 64, evitando, de formainvoluntária, o confronto com osmilitares que vitimou vários colegas.A decisão, porém, não foi política,mas apenas motivada pelo fato deque a militância estava interferindoem seu desempenho nos estudos.

O término do curso na faculdade,em 1965, coincidiu com a decisãoda Fundação Ford de investir nasCiências Sociais na América Latina,�sem dúvida numa reação à Revo-lução Cubana e à ameaça comunis-ta��, enfatiza. José Murilo foi seleci-onado para a primeira turma debolsistas e acabou emendando a gra-duação brasileira com a pós-gradu-ação nos Estados Unidos, comple-tando mestrado e doutorado emCiência Política na Universidade deStanford, experiência que definecomo enriquecedora. �Tive contatocom a Ciência Política norte-ameri-

José Murilo é umdos dois brasileirosque integram asacademias deletras e de ciências

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cana, muito voltada para a pesquisaempírica. Até então, minha forma-ção era muito calcada na tradiçãoeuropeia, sobretudo francesa�. Paraele, morar em terra estrangeira e con-viver com culturas diferentes fazemcom que se enxergue o próprio Paíscom outros olhos, �livrando-nos deprovincianismos�.

De volta ao Brasil, em dezembro de1968, José Murilo começa a dar au-las no Departamento de CiênciaPolítica da Faculdade de Filosofia,Ciências e Letras da UFMG, e alipermanece por uma década. O Bra-sil que encontra na volta ao País estámais tenso, com a instauração doAto Institucional nº 5 (AI-5). Ele con-ta que a convivência com os alunosera, às vezes, difícil, por causa daradicalização política. Professoreseram vistos pelos militantes mais ra-dicais como coniventes com o fa-moso status quo, sobretudo os que,como ele, tinham estudado nos Es-tados Unidos. �Encontrei, comoprofessor, militância políticadissociada do engajamento acadêmi-co, coisa que não acontecia no meutempo de aluno�, recorda-se.

O convite para trocar Minas peloRio partiu do cientista políticoWanderley Guilherme dos Santos,que conheceu em Stanford. Na ex-capital da República, dedicou-se aoensino e à pesquisa no Iuperj, vin-

culando-se também à FundaçãoCasa de Rui Barbosa e ao Centrode Pesquisa e Documentação deHistória Contemporânea(CPDOC), da Fundação GetúlioVargas (FGV). Muitos de seus tra-balhos foram publicados nessa épo-ca, como A construção da ordem: a eli-

te política imperial, de 1980, Teatro de

sombras: a política imperial, de 1988,A formação das almas: o imaginário da

república no Brasil, de 1990.

Uma experiência marcante, que elefaz questão de ressaltar, foi o con-vite para passar um ano sabático noInstituto de Estudos Avançados dePrinceton, em Nova Jersey, na CostaLeste dos Estados Unidos, em1980. A política do Instituto era co-locar pesquisadores de várias áreasem contato e deixá-los em liberda-de para fazerem o que quisessem,na esperança de que da convivênciasurgissem novas ideias. Nesse perí-odo, conviveu com matemáticos,físicos, historiadores e cientistas so-ciais de vários países. �Eram todospessoas muito cultas. O convíviocom eles foi uma experiência abso-lutamente fantástica, abriu minhacabeça para vários temas, às vezesa partir de uma simples conversadurante o almoço�, conta entusias-mado. Reflexos da experiência es-tão presentes em livros como Os

bestializados e formação das almas. Este

utiliza, pela primeira vez, a pintura ea escultura, como evidência históri-ca e não apenas como ilustração,como era, até então, o costume.

José Murilo observa que a partir dePrinceton e da experiência de escre-ver para a imprensa, desenvolvida noRio de Janeiro, voltou à antiga preo-cupação dos tempos da graduação� incentivada por Francisco Iglesias�, com a forma da escrita. Bons his-toriadores, sobretudo europeus, sãoem geral também bons escritores.Acha que o livro mais representativodo esforço é D. Pedro II: ser ou não ser,publicado em 2007. Mas, modesto,julga-se ainda longe de um resultadosatisfatório.

Entre inúmeros prêmios e medalhasque recebeu pelos trabalhos publica-dos, ele conta que ficou particular-mente lisonjeado com o Prêmio Al-mirante Álvaro Alberto. �Fiquei re-almente surpreso com a premiação.É uma honra estar na companhia degente tão importante!�, comemora.

Apesar de estar a um passo da apo-sentadoria compulsória, já que é ser-vidor público, o historiador demons-tra preocupação quando o assunto éo futuro da universidade e da pesquisano Brasil e no mundo. Diante dasgrandes transformações no campo datecnologia e na própria sociedade,acha que os historiadores vão ter derenovar suas fontes, métodos, abor-dagens, temas e a prática docente.

E depois de toda uma vida dedicadaà pesquisa, influenciando gerações,questionando a sociedade e pensan-do o Brasil, a aposentadoria, revela,não estava em seus planos. JoséMurilo de Carvalho não pensa emparar de pesquisar e publicar, refe-rindo que os problemas enfrenta-dos pelo País e pela própria huma-nidade constituem um imenso de-safio para historiadores e cientistassociais. E desse desafio, ele não querestar distante.

O acadêmico, durante entrevista na ABL: simplicidade contrasta com estatura intelectual

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Resíduo da pescavira produto nobre

Em Campos dos Goytacazes, noNorte Fluminense, pesquisadores daUenf criam unidade para transformarcasca de camarão em quitosana

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Atividade pesqueira nas águas do Farol deSão Thomé: redução no descarte de restosoriundos do processamento

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nanceiros que receberam com aaprovação do projeto.

A quitosana, cujo uso no Brasil de-pende em grande parte de importa-ção, é um produto obtido a partirdo exoesqueleto (esqueleto externo)de diversas espécies de crustáceos,como camarões, lagostas, carangue-jos e siris. Na carapaça desses crus-táceos está presente uma substânciachamada �quitina�, um polímero deaçúcares geralmente dotado de umamatriz de carbonato de cálcio. Esteprojeto consiste na montagem deuma unidade experimental de pro-dução de quitosana a partir de cascade camarão. O projeto envolve acooperação dos pesquisadores daUenf com a empresa MJC Nasci-mento, que atua no beneficiamentodesse tipo de pescado.

Resíduos podem serdescartados sem risco

O processo utilizado para a obten-ção da quitosana segue diversas eta-pas. Primeiro, é preciso secar a cascado camarão. Depois, o material émoído e despigmentado. A seguir,ocorre a etapa da hidrólise, quandose dá a desmineralização, mediantetratamento com ácido para a retira-da do carbonato de cálcio. Por fim,o material é desproteinizado. O quese obtém ao término do processo é

a quitina, que é, então, hidrolisadapara dar origem à quitosana. E o quesobra como resíduo de todo esseprocesso? �Os resíduos finais consis-tem em uma solução ácida e uma so-lução básica que, ao serem mistura-das, vão gerar uma solução de sal decozinha que pode ser descartada semnenhum problema, pois o pH estaráneutralizado�, explica Edmilson.

O projeto prevê a produção deaproximadamente 300 quilogramasde quitosana por mês. A produçãopoderá ter diferentes destinos. A pos-sibilidade que parece mais próximaé o mercado ligado à produção depetróleo offshore. Empresas do setorjá utilizam o material na remediaçãode derrames de petróleo, já que aquitosana tem grande capacidade deabsorver a gordura e a graxa. OFarol de São Thomé, única praia domunicípio de Campos, fica noepicentro daquela que ainda é a mai-or bacia produtora de petróleo doPaís, responsável por cerca de 80%da produção nacional. Para esse tipode aplicação, são menores as exigên-cias em termos de pureza do mate-rial, ao contrário do que ocorre quan-do o produto entra na fabricação desuplementos alimentares.

Uma segunda opção é justamente omercado de produtos voltados paraconsumo humano. Como a quito-

Dentro de pouquíssimo tem-po, os resíduos da indústriade beneficiamento de ca-

marão no litoral de Campos, noNorte Fluminense, deixarão de serlançados no ambiente e passarão agerar um produto nobre: a quitosana,que tem aplicações as mais diversas,desde a obtenção de produtos utili-zados na remediação de derramesde petróleo até a formulação de su-plementos alimentares pela crescen-te indústria de nutracêuticos � ter-mo cunhado a partir da fusão doradical grego nutri, de nutriente, ecêutico, de farmacêutico. Em outraspalavras, alimentos que nutrem e tra-zem saúde. O projeto, contempla-do no edital Desenvolvimento de Mode-

los de Inovação Tecnológica e Social, de

2008, da FAPERJ, está sendo im-plantado na praia do Farol de SãoThomé, uma extensão de areia decerca de 40 quilômetros que ocupatoda a região litorânea do municí-pio de Campos. A coordenação éde Gabriel Henrique da Silva, pes-quisador do Laboratório de Ciên-cias Químicas da Universidade Es-tadual do Norte Fluminense DarcyRibeiro (Uenf).

Gabriel, autor de cinco patentes de-positadas no Instituto Nacional dePropriedade Industrial (INPI), coor-dena o projeto ao lado do profes-sor Edmilson José Maria, do mes-mo laboratório da Uenf. Além daárea de interesse, ambos comparti-lham a convicção de que os recur-sos públicos aplicados no desenvol-vimento das pesquisas científicas de-vem resultar em ganhos visíveis paraa sociedade, não apenas no longoprazo, mas também na forma deaplicações práticas do conhecimen-to já disponível. E é a isto que osdois pesquisadores estão dedicandoparte de seus esforços nestes últimosmeses, contando com os recursos fi-

Gustavo Smiderle

Gabriel Henrique da Silva: pesquisador tem cinco patentes depositadas no INPI

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sana tem a propriedade de absor-ver gorduras, a substância tem sidoutilizada na formulação de medica-mentos ou suplementos alimentaresvoltados para o emagrecimento.�Cada farmácia de manipulação uti-liza em média 5 quilograma dequitosana por mês. Só no eixo Cam-pos-Rio de Janeiro, existem cerca de300 farmácias desse tipo�, dizEdmilson, lembrando que aquitosana também tem proprieda-des antibacterianas e pode ser utili-zada nos processos de tratamento deágua. Outra aplicação envolve o usona produção de álcool de amido, emum processo de imobilização dasenzimas que atuam no processo eque, assim, podem ser reutilizadas.

Objetivo é dar aplicaçãoa conhecimento

O projeto não envolve o desenvol-vimento de uma nova tecnologiapara a produção da quitosana, poisnão é esse o objetivo do edital emque foi aprovado, voltado para odesenvolvimento de modelos de ino-vação tecnológica e social. O desa-fio é dar aplicação a um conhecimen-to já disponível, em um contexto tra-dicionalmente marcado pelo baixoíndice de inovação, como é o casoda atividade pesqueira do Farol deSão Thomé. Trata-se de uma tarefaum pouco diferente daquela mais ca-racterística da vida de pesquisador,que, geralmente, consiste em subme-ter projetos, captar recursos, desen-volver pesquisas e publicar artigoscom os resultados. O objetivo aquié tentar estabelecer uma ponte entreo conhecimento acadêmico e o mun-do da produção, superando todasas diferenças de linguagens, de co-nhecimento e de expectativas quemarcam os dois mundos. Esse in-tercâmbio entre empresas e univer-

sidades, que já ocorre em maior in-tensidade em algumas partes do País,ainda é um desafio em Campos eno Norte Fluminense.

�Na verdade, assim como o peque-no empresário do Brasil e da regiãoNorte Fluminense em geral não foihabituado a estabelecer parceriascom o meio acadêmico, também amaioria de nós, das universidades einstitutos de pesquisa, não foi treina-da para buscar a aplicação dos co-nhecimentos que ajudamos a gerar.Portanto, o desafio é de mão dupla,e o êxito sempre vai depender deum empenho muito grande de par-te a parte�, avalia Gabriel, que já es-teve, por assim dizer, �do outro ladodo balcão�, quanto atuava naPetrobras e dialogava com colegaslotados em universidades.

Uma das tarefas bem específicas queesperam por Gabriel e Edmilson é

o monitoramento do processo deprodução na unidade experimental,de modo que o produto final, aquitosana, tenha grau de pureza su-ficiente para ter acesso ao mercadode nutracêuticos. Desde a secagemda casca até a hidrólise da quitina,tudo tem de ser controlado para seobter a qualidade desejada. Pelomenos um técnico em química pre-cisará ser contratado para gerenciaro processo.

O projeto despertou a curiosidadee o interesse da Prefeitura de Cam-pos, que vislumbrou uma alternati-va de geração de renda para as�marisqueiras� da praia do Farol �mulheres que atuam no ramo dobeneficiamento do pescado. Comoa atividade está sujeita a períodos dedefeso, a introdução de um modelode inovação tecnológica como estepode ser uma saída para a emanci-pação socioeconômica dessas mu-lheres. Mas esta é outra tratativa, quepor enquanto está no terreno das in-tenções.

Pesquisador: Gabriel Henrique daSilvaInstituição: Universidade Estadual doNorte Fluminense Darcy Ribeiro(Uenf)

Desafio é criarponte entre oconhecimentoacadêmico e aatividade pesqueirana região

Projeto prevê produção de 300 kg dequitosana/mês a partir do reaproveitamento

da casca de camarão

Foto: Silana Rust

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Um salto de qualidade naMedicina Veterinária

Laboratório deAvaliação do

Desempenho deEquinos (Lade), emDeodoro, subúrbioda Central, tem à

disposição 450cavalos-atletaspara avaliação

e estudos

Ohipismo brasileiro já foiprotagonista de importan-tes conquistas no cenário

desportivo internacional. Para citarapenas algumas delas, nos JogosOlímpicos de Atenas, em 2004, le-vamos o ouro no individual de sal-tos, com Rodrigo Pessoa, e nos Jo-gos Pan-Americanos, disputados noRio, em 2007, o título por equipes.Já nos Jogos de Sydney, em 2008,problemas veterinários e quedas dei-xaram os brasileiros fora do pódiopela primeira vez em 12 anos. Masse o desempenho, na média, ainda éirregular, para as campanhas futuraso País poderá contar com um im-portante aliado na busca por novostriunfos. Trata-se do Laboratório deAvaliação do Desempenho deEquinos (Lade), inaugurado em mar-ço, na Escola de Equitação do Exér-cito, em Deodoro, subúrbio da Cen-tral do município do Rio de Janeiro.

A iniciativa representa um passo im-portante para o País na área cientí-fica e acadêmica no que tange ao de-senvolvimento da Medicina Veteri-

nária. A execução do projeto é fru-to de uma ampla parceria, reunindodiversas instituições, entre elas, a Uni-versidade Federal Rural do Rio deJaneiro (UFRRJ), Universidade Fe-deral Fluminense (UFF), Universida-de Estadual do Norte Fluminense(Uenf) e Universidade Federal deMinas Gerais (UFMG), além da Es-cola de Equitação do Exército. Oprojeto conta, ainda, com a colabo-ração do Instituto de Pesquisa daCapacitação Física do Exército e, ospesquisadores, com o apoio finan-ceiro da FAPERJ, CNPq e Capes.

Sob a coordenação do pesquisadorFernando Queiroz de Almeida, daUFFRJ, o laboratório irá agregartoda a infraestrutura do Centro Na-cional de Hipismo, legado dos Jo-gos Pan-Americanos de 2007, aosestudos de pesquisadores que traba-lham na área da produção, medici-na, melhoramento genético, sanida-de e treinamento esportivo deequinos. �Este é o grande diferen-cial do Lade, pois, além de podercontar com o amplo espaço do Cen-tro de Hipismo, temos aqui cerca de450 cavalos-atletas disponíveis paraavaliação e estudos�, destacaFernando. �Somos o único labora-tório da América Latina que reúneessas condições de trabalho e pes-quisa�, diz o veterinário.

Danielle Kiffer

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A excelência das instalações pode sermedida pelos equipamentos de pontadisponíveis, como a esteira de altavelocidade. �Como nas academiasde ginástica, oferece a possibilidadede submetermos os animais a umaprova de esforço, com as variaçõesde velocidade e inclinações�, dizFernando. O centro também contacom aparelho de hemogasometria,que analisa os eletrólitos sanguíneose as pressões sanguíneas de oxigênioe gás carbônico; contador automá-tico de células sanguíneas; e um fre-quêncímetro com GPS, que determi-na a frequência cardíaca, velocidade edistância percorrida pelo animal.

�Avaliamos os cavalos de forma dis-tinta, de acordo com as diferentesmodalidades e formas de treinamen-to. Com o frequencímetro com GPS,podemos determinar em uma cor-rida de 6 quilômetros, por exemplo,a velocidade por intervalos associa-da à frequência cardíaca dos cavalosde Concurso Completo de Equita-ção, em esforços submáximo e má-ximo�, explica Fernando. �Os equi-pamentos permitirão a realização demuitas pesquisas necessárias para sair-mos do empirismo e avançarmos nadireção de um treinamento esporti-vo voltado para o alto desempe-nho�, avalia o pesquisador.

O Lade também possui um exer-citador de equinos, com capacidadede movimentar até oito cavalos porvez, economizando tempo, mão-de-obra e padronizando as atividadesfísicas. Nele, os animais não necessi-tam ser contidos, pois o sistema depainéis telados forma compartimen-tos, dentro dos quais os animais ca-minham separadamente. Os cavalospodem ser trabalhados nos dois sen-tidos, evitando a sobrecarga das ar-ticulações de um dos lados.

A importância do laboratório podeser medida já nos primeiros mesesde funcionamento, período quandodiversos estudos e técnicas desenvol-vidos pelos profissionais que atuamno Lade entraram em fase de exe-cução. A avaliação do treinamento eaptidão física de equinos de Concur-so Completo de Equitação contoucom a colaboração da professoraAna Paula Delgado da Costa, daUenf. A modalidade esportiva deConcurso Completo de Equitaçãoé um �triatlon�, disputado em trêsdias, ao longo dos quais os cavaloscompetem em provas de adestra-mento, corrida com obstáculos esalto. �Os equinos da EsEqEx se-rão avaliados em competições reaise na esteira de alta velocidade�, adi-anta Fernando.

Em uma outra linha de pesquisa como uso da biópsia muscular, realizadaem parceria com a professora AnaMaria Reis Ferreira, do Departamen-to de Patologia Animal da UFF, aequipe de profissionais e técnicos fa-rão a análise da morfologia emorfometria dos tipos de fibrasmusculares de equinos adultos e emcompetição, para analisar sua capa-cidade atlética e possíveis desordensneuromusculares. �Por meio de umaavaliação do conjunto de fibras mus-culares, separamos os cavalos de altae de baixa velocidade. Como esta-mos instalados na Escola de Equita-ção do Exército, também identifi-camos cavalos que tenham caracte-rísticas favoráveis ao uso militar, querequer maior resistência�, dizFernando. O laboratório tambéminvestiga novas técnicas de diagnós-tico da babesiose, doença transmiti-da por carrapatos aos equinos. �Ababesia não é um problema graveno Brasil, mas impede nossos cava-

los de irem competir na Europa enos Estados Unidos. Outro ponto ne-gativo é que a doença interfere na ca-pacidade física do cavalo. O estudoprocura medir o impacto dababesiose na área esportiva e tambémna área de defesa sanitária animal.�

Avaliar os cavalos ainda jovens e de-finir suas aptidões é outro campo aser explorado com a ajuda do Lade.�Há o cavalo de concurso completode equitação, salto e adestramento.Dependendo de suas característicasfísicas, pode-se determinar em quaisdessas modalidades ele terá maischances de aprendizado e, emconsequência, de se destacar. Se essecritério já fazia parte da EsEqEx,com o laboratório, nós vamos agre-gar informações importantes, origi-nadas dos vários testes que realiza-mos�, explica Fernando. �Em outrafrente de trabalho, iniciamos uma ava-liação da cinemática, do tipo e daqualidade do salto em cavalos mon-tados e não montados, em potrosjovens que estão aprendendo a fazero salto e em animais adultos, já bem

Cavalo é submetido à prova de esforço em esteira:procedimento filmado por câmera de alta velocidade

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classificados�, acrescenta. �Esses estudos contam com a parti-cipação dos oficiais instrutores da escola, como o capitão Schlupe o major Ruy Couto, comandante da EsEqEx.�

Como os cavalos chegam às dependências da escola ainda jo-vens, com cerca de 4 anos de idade, e ali permanecem até osseus 20 anos, a equipe responsável pelo plantel tem a chancede acompanhar e testar o desempenho dos animais ao longodo período. �Nesse período, são testadas as possibilidades decada um dos animais, com ajuda da cinematografia, que incluia cinemática do salto, os movimentos do salto e os andamen-tos na esteira. Todo o procedimento é filmado por uma câmerade alta velocidade�, relata o pesquisador.

Alguns dos projetos desenvolvidos por alunos e pesquisadoresdas instituições de ensino associadas ao laboratório já alcança-ram destaque, não só no País como também no exterior. Ainclusão de óleo de soja na dieta dos cavalos, que vem sendoutilizada em testes de avaliação no laboratório, é um deles. �Quan-do inserimos óleo de soja na ração dos animais, aumentamosseu conteúdo energético, o que faz com que o cavalo consumamenor quantidade da dieta�, explica o pesquisador. �Essa dietaespecial é ideal para cavalos de alto desempenho, para que con-sumam menor quantidade de ração e, em consequência, corrammenos risco de ter distúrbios gastrointestinais, possibilitando ummelhor desempenho na pista.�

Como os trabalhos de pesquisa no Lade têm chamado a aten-ção de instituições de ensino e pesquisa de outros países, olaboratório tem recebido a visita de renomados pesquisadoresexternos. Uma delas foi a do professor Francisco CastejónMontijano, catedrático de Fisiologia do Departamento de Bio-logia Celular, Fisiologia e Imunologia da Universidade de Cór-doba, na Espanha. �Acredito que este intercâmbio entre a Uni-versidade de Córdoba e o Lade pode ser muito interessante ebeneficiar a todos. O laboratório é assessorado por pessoasmuito experientes e pode trazer um desenvolvimento impor-tante para o desporto e treinamento dos equinos�, dizMontijano. �O número de cavalos disponíveis para estudo éum grande benefício para a universidade, que ganha muitocom isso. A interação está sendo magnífica, a esteira escolhidaé muito boa e o exercitador de equinos idem�, empolga-se.Ele revela que pretende formar uma parceria com o Ladepara analisar aspectos de equinos da raça Andaluz e de raçasbrasileiras, a fim de examinar em quais aspectos elas se dife-renciam e de que forma podem ser aprimoradas.

Pesquisador: Fernando Queiroz de AlmeidaInstituição:Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ)

Fernando Queiroz de Almeida (à esq.) recebe a visita do pesquisadorFrancisco Castejón Montijano: proposta de intercâmbio em debateentre o Lade e a Universidade de Córdoba, na Espanha

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29 | Rio Pesquisa - nº 7 - Ano II

Diabetes:epidemia silenciosa

Em 2030, o númerode pessoas com

diabetes devechegar a 500

milhões em todo omundo, mas metade

dos pacientes nemimagina que tem a

doença

Débora Motta

Um novo caso de diabetessurge a cada cinco segundosno mundo, de acordo com

estatística divulgada pela SociedadeBrasileira de Diabetes (SBD). Osdados indicam que a doença já é umaepidemia. Cerca de 250 milhões depessoas em todos os países têm dia-betes e a projeção feita pela Organi-zação Mundial da Saúde (OMS),para o ano de 2030, é que esse nú-mero dobre. No Brasil, segundo aSBD, pelo menos 10 milhões de pes-soas têm a doença � o equivalente a5,9% da população brasileira.

Crescendo em ritmo acelerado, adoença, que eleva a quantidade deglicose no sangue, é responsável porcerca de 5% das mortes anuais domundo. Um dos fatores que favo-recem o aumento do número de ca-sos é o consumo de fast-food, símbo-lo do estilo de vida contemporâneono ocidente, que avança sobre asdemais regiões do planeta. �A inci-dência do diabetes aumenta em adul-tos e até em adolescentes, tendocomo principais causas a obesidadee a vida sedentária�, diz o professordo Departamento de Clínica Médi-ca da Faculdade de Medicina daUniversidade Federal do Rio de

No diabetes do tipo 1, o corpo não produz insulina e os pacientes são obrigados a repor o hormônio com aplicações diárias de injeção

Foto: Vinicius Marinho/Fiocruz Multimagens

SAÚDE

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Janeiro (UFRJ) Gil Salles, destacan-do que a obesidade gera doenças quematam mais que a fome no País.

No entanto, longe de ser um fenô-meno moderno, o Diabetes mellitus éum antigo problema relatado aolongo da história da medicina. Aprimeira descrição documentada dossintomas do diabetes encontrada atéhoje está no papiro egípcio de Ebers,datado de 1.552 a.C. O documentodescreve pacientes que emagrecem,sentem sede contínua e urinam emabundância. O tratamento incluía di-eta, folhas de hortelã e evocações aosdeuses Osíris e Íris.

Na Grécia Antiga, o médico Apo-lônio de Memphis, em 250 a.C., foipioneiro no uso do termo diabetes,que significa �passar através de�,devido à passagem de líquido pelocorpo dos pacientes. Já o termomellitus, que em latim quer dizer�mel�, foi adicionado mais tarde naliteratura médica ocidental em alu-são à urina adocicada dos pacientes,que atraía formigas e abelhas.

O que é diabetes?

O diabetes é uma doença metabólicacaracterizada pela redução da secre-ção pelo pâncreas do hormônio in-sulina � responsável pelo aumento dapermeabilidade da membrana celu-lar à glicose � ou da diminuição da

sensibilidade do organismo à ação dainsulina. Em ambos os casos, a glicoseé impedida de ser absorvida pelascélulas e ocorre um acúmulo deglicose no sangue (hiperglicemia).

Esse excesso de glicose é eliminadopela urina. Para sair na urina, porém,necessita levar água consigo, fazen-do a pessoa urinar bastante. Ao eli-minar muita água pela urina, a pes-soa se desidrata, tem sede e passa abeber mais água do que o normal.Outros sintomas são fraqueza, fadi-ga, perda de peso, maior susce-tibilidade a infecções e visão turva.

Mas nem sempre o diabetes apre-senta sintomas tão perceptíveis.�Metade dos pacientes que têm dia-betes não sabe sequer que tem adoença. E como eles não sentemnada e acreditam que estão bem,não buscam o tratamento�, diz oprofessor Gil Salles. �É uma epi-demia silenciosa�, alerta.

A glicose é a principal fonte de ener-gia do organismo, mas, quando emexcesso, pode trazer várias compli-cações à saúde. Uma vez diagnos-ticada a doença, o tratamento deveser durante toda a vida do paciente.Quando não tratado adequadamen-te, o diabetes pode causar infarto,derrame cerebral, insuficiência renal,problemas visuais � mesmo a ce-

gueira � e lesões de difícil cicatriza-ção. Os tipos mais comuns são o dia-betes tipo 1 e o tipo 2.

Diabetes tipo 1

Também conhecido como diabetesinsulino-dependente, o diabetes tipo1 ocorre quando o pâncreas produzpouca ou nenhuma insulina. É umadoença autoimune, caracterizada peladestruição das células beta produto-ras de insulina. Isso acontece quandoo organismo as identifica, por enga-no, como elementos estranhos.

O controle da doença envolve a re-posição desse hormônio para regu-larizar o metabolismo do açúcar.�Como o corpo não produz insuli-na, deve ser reposta por aplicaçõesdiárias de injeção�, diz a endo-crinologista Marília de Brito Gomes,do Hospital Universitário PedroErnesto, da Universidade do Esta-do do Rio de Janeiro (Hupe/Uerj).

Além do uso contínuo de insulina,os pacientes com diabetes tipo 1 re-cebem orientação para automo-nitorar as taxas de açúcar no sanguediariamente. �É recomendável reali-zar testes de glicemia capilar, pormeio da coleta de sangue nas pontasdos dedos, uma ou mais vezes aodia�, diz Marília, lembrando que essetipo de diabetes ocorre com maisfrequência em crianças e adultos jo-vens, apesar de poder atingir pessoasde qualquer faixa etária.

Gil Salles (à esq.), Paulo Bahia e Célia Resende: equipamento do hospital universitário daUFRJ mede espessura das carótidas para avaliar relação entre diabetes e aterosclerose

Marília de Brito Gomes: endocrinologistaanalisou dados de 2.223 pacientes

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Foto: Vinicius Zepeda

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Coordenadora da pesquisa Fatores de

risco para doença vascular em pacientes com

diabetes mellitus tipo 1 � que recebeuapoio da FAPERJ �, a professoraestá investigando as complicaçõesvasculares geradas pela doença empacientes do Hupe com diabetestipo 1. �O diabetes é uma doençaisquêmica que acomete os vasos doindivíduo. Há uma disfunção doendotélio, a camada celular que re-veste a parte interna dos vasos san-guíneos, prejudicando o seu adequa-do funcionamento�, explica.

De acordo com Marília, que tambémé presidente da Sociedade Brasileirade Diabetes, a doença gera uma pre-disposição para a formação precoceda aterosclerose, ou seja, para oacúmulo progressivo de placas degordura que vão entupindo os vasossanguíneos, contribuindo para causarmales, como o infarto e o acidentevascular cerebral. �É como se hou-vesse um envelhecimento precoce. Osvasos do paciente com diabetes sãocomo de uma pessoa com 20 anos amais do que ele realmente tem, mes-mo que o tratamento esteja sendo rea-lizado�, ressalta.

Diabetes tipo 2

No Diabetes mellitus tipo 2, as célulasbeta do pâncreas aumentam a pro-dução de insulina e, ao longo dosanos, acabam por levá-las à exaustão.Geralmente, há uma combinação dadeficiência parcial da produção deinsulina com uma resposta reduzidado corpo ao hormônio, o que é cha-mado de resistência insulínica. O or-ganismo torna-se incapaz demetabolizar a glicose da corrente san-guínea para satisfazer as suas neces-sidades de nutrição. Enquanto as cé-lulas �ficam com fome�, o açúcarvai se acumulando no sangue.

O tipo 2 é o tipo de diabetes maiscomum. �De cada 10 pacientes comdiabetes, uma média de nove têmdiabetes tipo 2�, afirma Salles, acres-

centando que existe uma grande re-lação entre diabetes tipo 2 e a obesi-dade e o sedentarismo. �Surge maisna idade adulta, principalmente empessoas acima do peso.�

O excesso de peso (sobrepeso ouobesidade) está presente em grandeparte dos pacientes com diabetes tipo2, o que aumenta a probabilidade deacometimento por doenças cardio-vasculares. Um estudo multicêntriconacional que aponta essa relação, co-ordenado por Marília, foi realizadono Hupe e em outros 13 centros dis-tribuídos por todo o País.

A pesquisa avaliou dados clínicos elaboratoriais de 2.223 pacientes comdiabetes tipo 2. �Constatamos que75% da amostra estudada de paci-entes não estavam na faixa de pesoideal, sendo que 33,3% eram obe-sos. A maioria não realizava o con-trole adequado e a investigação dascomplicações crônicas da doença�,diz Marília, assinalando que o estu-do resultou na publicação de umartigo na renomada The Review of

Diabetic Studies, em 2006.

Diferente do tipo 1, a administra-ção de insulina nem sempre é neces-sária. O paciente pode responder aotratamento apenas com dieta e exer-cícios físicos. �Primeiro, são reco-mendadas medidas não farma-cológicas, como reeducação alimen-tar e atividade física. É importanteperder peso�, ressalta Gil Salles, lem-brando que, dependendo do resul-tado, é necessário tomar medicamen-tos orais e, por fim, a combinaçãodesses com a insulina.

Aliado à hipertensão, o diabetes é umgrande fator de risco para o desen-volvimento da aterosclerose. Sallesestuda os mecanismos de evoluçãoda aterosclerose em pacientes comdiabetes e hipertensão do HospitalUniversitário Clementino Fraga Fi-lho (HUCFF), no projeto Avaliação

da espessura íntima-média das carótidas por

ultrassonografia como marcador de risco

cardiovascular e de doença aterosclerótica

sub-clínica em pacientes com hipertensão ar-

terial resistente e em pacientes com Diabe-

tes mellitus tipo 2.

O objetivo é investigar sinais de da-nos precoces nos vasos sanguíneosdesses grupos de pacientes e os ris-cos de eles desenvolverem doençascardiovasculares � haja vista que asprincipais causas de morte nos paci-

Eduardo Tibiriçá, pesquisador da Fiocruz: estudosobre a disfunção vascular no diabetes do tipo 2

entes diabéticos são o infarto agudodo miocárdio e o acidente vascularcerebral. �A espessura das artériascarótidas é um potencial marcadorda aterosclerose precoce em pacien-tes com diabetes�, diz o pesquisa-dor, que participa do Programa deHipertensão Arterial e de Diabetestipo 2 do HUCFF.

Para Salles, a hipertensão arterial eo diabetes são �doenças quase ir-mãs�, que devem ser tratadas emconjunto. �É muito difícil ver umdiabético que não seja tambémhipertenso. As chances de um paci-ente com diabetes tipo 2 desenvol-ver hipertensão são de pelo menos75%. Em hipertensos, as chances deter diabetes sobem para 20% a30%�, diz. �As duas doenças dão

Foto: divulgação

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complicações vasculares semelhantes. Se um paciente tem asduas, deve dobrar o controle�, assinala.

O pesquisador chama a atenção para aquelas pessoas que seencontram na chamada fase pré-diabetes tipo 2, ou seja, quejá estão em processo de desenvolvimento da doença, masque ainda não apresentam os sintomas. �O início da doençaocorre, em geral, de quatro a sete anos antes do diagnóstico�,diz Salles, destacando a importância da realização de examesde rotina, especialmente para as pessoas acima do peso.

A disfunção vascular inerente ao diabetes tipo 2 também étema de estudo do doutor em Farmacologia EduardoTibiriçá, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). No projetoEfeitos do tratamento crônico com ácido alfa-lipóico na rigidez arterial e

na função endotelial da microcirculação em pacientes com diabetes mellitus

tipo 2, ele vai testar os efeitos do tratamento da doença comácido alfalipóico, ainda não observados em humanos.

�Alguns estudos demonstram que o ácido alfa-lipóico seriaeficaz para reduzir a resistência insulínica�, diz o pesquisador,que trabalha nesse projeto em parceria com Marília. �A metaé investigar os efeitos do tratamento oral crônico com esseácido na reatividade microvascular e na rigidez arterial empacientes com diabetes tipo 2�, completa ele

A Secretaria Estadual de Saúde vem organizando um grupode trabalho para dar efetividade à Lei 3.885/2002, que definediretrizes para uma política de prevenção e atenção integral àsaúde da pessoa com diabetes. Sob a coordenação da secre-taria, o grupo deverá contar com representantes daDIVDANT (Divisão de Vigilância de Doenças e AgravosNão-transmissíveis), das secretarias municipais do Rio eTeresópolis, das universidades estaduais, do Conselho Esta-dual de Saúde, da Sociedade Médica de Diabetes e da As-sociação dos Diabéticos do Estado do Rio de Janeiro.

Na primeira fase, o trabalho será dividido em grupos técni-cos, contemplando as áreas de política de atenção e vigilância,atenção básica e farmacêutica, e ainda, de atenção especia-lizada. O deputado Nilton Salomão, coautor da lei ao ladodo então deputado e hoje governador do estado SérgioCabral, vê na iniciativa a oportunidade de o estado do Rio deJaneiro sair na frente nesse campo da saúde. �A lei que apro-vamos inclui a destinação de recursos para as atividades cien-tíficas e de pesquisa�, informa.

É possível ter uma boa qualidade de vida,mesmo com diabetes. Praticar exercícios físicos regularmente é uma grande

arma para o tratamento da doença, que reduz anecessidade de medicamentos orais e a dose deinsulina a ser aplicada. �Os exercícios exercemum efeito direto na musculatura e nos tecidosem geral, aumentando a captação da glicose. Issoestimula a sensibilidade do corpo à insulina eevita a hiperglicemia�, explica o professor An-tonio Cláudio Lucas da Nóbrega, do Labora-tório de Ciências do Exercício da UniversidadeFederal Fluminense (UFF), atual Pró Reitor dePós-graduação e Pesquisa da UFF.

As atividades físicas também atuam na preven-ção da doença, especialmente para evitar o dia-betes tipo 2. �Os exercícios diminuem a gordu-ra corporal e a resistência insulínica, que estãoassociadas ao desenvolvimento do diabetes tipo2�, diz Nóbrega. Ele avalia os impactos das ati-vidades físicas em pacientes na fase pré-diabetes� aqueles aparentemente saudáveis, mas comgrande risco de desenvolver o diabetes tipo 2 �, no projeto Mecanismos fisiológicos da adaptação na

função autonômica e endotelial ao exercício físico em indi-

víduos sob risco de diabetes tipo 2.

O estudo � que rendeu um artigo na revista bri-tânica Diabetic Medicine, em 2008, e outro na revis-ta americana Diabetes Care, em 2009 � propõe aobservação dos efeitos que a prática regular deexercícios físicos provoca no organismo, especial-mente as adaptações fisiológicas que ocorremno sistema nervoso autonômo e no sistema cir-culatório de pacientes com perfil pré-diabetes �mesmo os com histórico familiar da doença.�Entender os mecanismos que provocam essasalterações é fundamental para detectar precoce-mente a doença�, enfatiza o pesquisador.

�O sistema nervoso autônomo controla as fun-ções viscerais do organismo, como a pressãoarterial e os batimentos cardíacos. As eventuaisalterações fazem parte do início e da evolução

Pesquisadores: Gil Salles, Marília de Brito Gomes, EduardoTibiriçá e Antônio NóbregaInstituições: Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), FundaçãoOswaldo Cruz (Fiocruz) e Universidade Federal Fluminense (UFF)

Antônio Nóbrega (à esquerda) e equipe monitorampacientes durante prática de exercícios físicos

Fotos: Lewi Moraes

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33 | Rio Pesquisa - nº 7 - Ano IIdas doenças cardiovasculares e cardiometa-bólicas�, explica Nóbrega. �Já a lesão doendotélio, camada interna que recobre os va-sos sanguíneos, é o primeiro passo para o de-senvolvimento da aterosclerose�, completa oprofessor, que monitorou mais de 200 pesso-as antes, durante e após 12 semanas de treina-mento físico.

Depois da realização de exames laboratoriais,os resultados das sessões regulares de exercíciosaeróbicos e de força � com 50 minutos de du-ração, três vezes por semana � indicam que ofator genético não é determinante de distúrbiosdo sistema nervoso autônomo ou do endotélio.�Existia na literatura médica a sugestão de queser parente de diabetes causava primariamentelesão endotelial e alterações do sistema nervosoautônomo. Mas percebemos que existia umaconfusão. Os autores incluíam indivíduos comparentescos de diabetes, mas também sedentá-rios e com sobrepeso�, diz o médico especia-lista em Medicina do Esporte e em Cardiologia.

A pesquisa é importante porque reforça a tesede que as alterações do endotélio e do sistemanervoso autônomo não são geneticamente pro-gramadas, mas sim consequência de um estilode vida pouco saudável e das consequentes al-terações metabólicas. �Ser parente de diabéti-cos, apenas, não provoca lesões do endotélio.Prevenir o desenvolvimento do diabetes tipo 2evita as alterações metabólicas causadas peloexcesso de peso, como hiperinsulinemia e au-mento do colesterol e, portanto, protege a fun-ção autonômica e endotelial.�

Ele ressalta a necessidade de se prevenir a do-ença. �Basta ser fisicamente ativo, incorporan-do exercícios no cotidiano, e manter o peso ade-quado com uma dieta equilibrada. Em outraspalavras, a saúde vascular e do sistema nervosoautônomo depende de nossos hábitos e atitu-des e não da nossa herança genética.�, concluiNóbrega. (D. M.)

Exercícios físicos diabetesx

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Informação que gerariqueza e conhecimentoPortal de Periódicos da Capes contribui para ocrescimento da produção científica brasileira e ajudaa inserção do País pelas novas fronteiras da economia

Na era da sociedade do co-nhecimento e da inovação,em que a riqueza gerada

pelos bens tangíveis � como terras,obras de infraestrutura, máquinas, au-tomóveis, produtos industrializadosetc. � perde terreno rapidamente naeconomia planetária, a informaçãoaparece cada vez mais como ele-mento essencial para assegurar o de-

senvolvimento social e econômico,principalmente entre as nações maisavançadas. Uma �informação� quegera conhecimento, peça-chave nodepósito de patentes e processos, quecontribuem para reduzir custos, pou-par tempo e maximizar benefícios dosetor produtivo. Em reuniões efóruns internacionais, esses bens in-tangíveis ocupam cada vez mais es-paço nos debates, como moeda denegociação entre países e empresas.

No Brasil, uma iniciativa da Coor-denação de Aperfeiçoamento de Pes-soal de Nível Superior (Capes) �agência de fomento à pesquisa, su-bordinada ao Ministério da Educa-ção (MEC), responsável pela avalia-ção e certificação dos cursos demestrado e doutorado das institui-ções brasileiras � vem contribuindopara disseminar informações de ca-ráter científico e, assim, alavancar asáreas de pesquisa e de inovação

Débora Motta

Acesso on-line à produção científica transformou o cotidiano de pesquisadores, mesmo nas regiões menos desenvolvidas do País

Foto: Reprodução

INFORMAÇÃO CIENTÍFICA

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tecnológica. Trata-se do Portal dePeriódicos da Capes, ferramenta vir-tual de acesso à informação, pormeio do qual professores, pesquisa-dores, alunos e funcionários de 268instituições de ensino superior e depesquisa em todo o País têm acessoimediato à produção científica mun-dial. Em março deste ano, a FAPERJganhou acesso ao portal.

A iniciativa desperta o interesse depaíses vizinhos, que veem no portalum exemplo de programa de gover-no bem estruturado. Atribui-se à suaentrada em cena a melhora do Brasilno ranking mundial do número de ar-tigos científicos publicados: de 15º em2007, para 13º no ano passado � ul-trapassando Holanda e Rússia. Osdados são da estatística realizada pelaempresa Thomson Reuters, quecontabiliza anualmente os trabalhoscientíficos publicados por 200 países.Em anos recentes, o aumento daprodução brasileira em C&T saltoude 19.346 artigos, publicados em2006, para 30.415, em 2008.

Apontado como a única iniciativagovernamental do gênero no mun-do, o portal é uma das maiores fon-tes de acesso eletrônico à produçãocientífica mundial, com uma médiade 175 mil acessos diários. Criadoem novembro de 2000, com ape-nas 1,8 mil títulos, multiplicou seuacervo ao longo dos anos e já conta

com 13 mil periódicos e 126 basesde dados referenciais em todas asáreas do conhecimento, além de seisbases dedicadas exclusivamente apatentes. �As melhores publicaçõescientíficas nacionais e internacionaisestão disponíveis no portal, como asrevistas Nature, Science e a baseScopus�, diz a coordenadora doportal, Elenara de Almeida.

Impactos para opesquisador brasileiro

O portal surgiu para atender à ne-cessidade do cientista brasileiro deter acesso ao conteúdo atualizado dasbibliotecas virtuais, que despontavamno cenário mundial após o adventoda Internet. Aderindo às novastecnologias de informação e comu-nicação, muitas revistas científicaspassavam a ter edições on-line. A di-fusão desse acervo pelo Portal dePeriódicos da Capes veio preencheressa lacuna e representou, na prática,uma revolução no cotidiano dospesquisadores do País.

�Antes da criação do portal, a Ca-pes comprava as revistas em papel eas distribuía para as bibliotecas dasprincipais instituições de pesquisa euniversidades. Os periódicos cientí-ficos mais importantes, produzidosna Europa e nos Estados Unidos,chegavam ao Brasil de navio, já queo frete aéreo era muito caro�, conta

Elenara, lembrando que esse trans-porte demorava cerca de seis meses.�A longa espera pela chegada dosartigos gerava uma defasagem noconhecimento científico em relaçãoaos países desenvolvidos�, diz.

Os pesquisadores das regiões distan-tes dos grandes centros do País eramos mais prejudicados. Nem sempreos periódicos chegavam, por causade extravios e dificuldades de distri-buição. Considerando as dimensõescontinentais do Brasil, o conhecimen-to acabava restrito a algumas biblio-tecas, gerando condições desiguaispara a produção científica da pós-graduação. O portal oferece umacesso mais democrático à literaturaespecializada, eliminando as barreirasregionais.

�Hoje, um pesquisador da Univer-sidade Federal do Acre e um pes-quisador em meio a um trabalho decampo na Amazônia têm acesso àmesma bibliografia que antes eradestinada apenas aos pesquisadoresdas universidades do Sudeste�, des-taca ela. Além disso, ferramentasinterativas de bate-papo virtual sãooferecidas por várias editoras queparticipam do portal. �Pesquisado-res podem trocar informações emtempo real entre si e com o próprioautor do artigo�, diz.

Outra vantagem do portal é a eco-nomia para os cofres públicos, comresultados de maior impacto. Deacordo com o presidente da Capes,Jorge Guimarães, o acesso à infor-mação impressa implicava alto cus-to para o Ministério da Educação(MEC) atender às bibliotecas dasinstituições federais de ensino supe-rior. �O portal tem um custo consi-derável do ponto de vista do volu-me de recursos. Todavia, custariamuito mais ao MEC manter umabiblioteca modesta e limitada emcada uma das suas instituições�, pon-dera Guimarães. No ano de 2007,os gastos com o portal foram deGráfico indica percentual de títulos do Portal de acordo com área do conhecimento

Fonte: Capes, 2009

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cerca de US$ 35 milhões. Em 2009,segundo a Capes, o volume de re-cursos gasto com a iniciativa deveráalcançar US$ 42,5 milhões.

Esse volume de recursos é bem infe-rior em relação ao custo despendidopor grandes universidades america-nas com o pagamento de direitos

autorais para acesso à produção ci-entífica on-line. Na Universidade daCalifórnia (Ucla), o custo da assina-tura eletrônica de cerca de 11 mil pe-riódicos e bases de dados, apenaspara esta instituição, atinge US$ 11milhões anuais. Na Universidade deHarvard, esse valor chega a US$ 27milhões. O custo médio para as ins-tituições brasileiras, levando em contaapenas aquelas de acesso gratuito, éde US$ 237 mil por instituição.

Segundo Elenara, o custo para cadadownload de artigo científico baixadono portal é de R$ 0,39. �Esse é umvalor barato se levarmos em conta aelevada capilaridade do portal, con-siderada a maior do mundo. Isso dizrespeito à sua ampla cobertura parainstituições de todo o País e ao gran-de número de coleções que oferece,resultando em uma maior velocida-de e competitividade na geração deideias e de produtos�, completa.

O acesso ao portal é destinado a 268instituições no País � entre universi-dades públicas, particulares e órgãosgovernamentais. Dessas, cerca de 160utilizam o serviço gratuitamente. �Noinício do projeto, só as universida-des federais com pós-graduação re-comendadas pela Capes tinham aces-so ao portal. Esse leque foi amplidopara as universidades estaduais emunicipais, além de institutos de pes-quisa e instituições privadas comconceito elevado no Capes�, expli-

ca Elenara, acrescentando que, donúmero total, 75 instituições foramincluídas no projeto em março de2009, entre elas, 11 fundações deamparo à pesquisa.

A conexão individual a essa gigan-tesca biblioteca pode ser realizada apartir de qualquer terminal ligado àInternet localizado nas instituiçõesparticipantes � ou fora delas, a par-tir de senha fornecida a critério decada instituição. Mais de um milhãode alunos, professores, pesquisado-res e servidores podem ler, transfe-rir, copiar e imprimir, na íntegra,publicações dos mais conceituadoscentros de pesquisa do mundo e degrandes editoras internacionais,como Elsevier, Springer e Blackwell.

A expectativa é de crescimento doportal. �Até 2010, a meta é ampliaras assinaturas para englobar todos osperiódicos qualificados do mundoque têm versão eletrônica, que sãocerca de 15 mil�, adianta Elenara. Nomês de maio passado, o portal pas-sou a disponibilizar o acesso à Enci-clopédia Britânica e ao JCR, o Journal

Citation Reports, que aborda o fatorde impacto das revistas indexadas nabase ISI (Institute for Scientific

Information). Outra novidade é umprojeto de atualização da ferramen-ta que vem sendo desenvolvido emparceria com a Rede Nacional deEnsino e Pesquisa (RNP). A novaversão do portal, que deve serlançada ainda em 2009, vai facilitar aconsulta por informação científica eoferecer ao usuário uma navegaçãomais moderna e personalizada.�Após a reformulação, o pesquisa-dor poderá consultar as informaçõespor assunto ou palavra, em uma úni-ca metabusca�, explica.

Curva ascendente: responsáveis pelo Portalacreditam que número de periódicos podechegar a 15 mil em 2010

Elenara de Almeida, coordenadora do Portal: custopara cada download de artigo é de R$ 0,39

Foto: divulgação Capes (MEC)

Fonte: Capes, 2009

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Pesquisa brasileira navegaem busca de novos desafios

Novo navio polar da Marinha, adaptado em estaleiroalemão para as necessidades do Programa AntárticoBrasileiro (Proantar), conta com cinco laboratórios etem capacidade para acomodar até 36 pesquisadores

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tografia náutica e do conhecimentodo solo marinho. O novo navio,embora ainda não seja um quebra-gelo, tem casco reforçado e capaci-dade para operar em campos degelo com até 40 centímetros de es-pessura. �Com esse navio, a pesqui-sa deixa de ter apenas uma embar-cação de apoio logístico para dis-por de um laboratório flutuante,com equipamentos de última gera-ção�, diz o comandante, o Capitãode Mar e Guerra Sérgio RicardoSegovia Barbosa. �Ele oferecerámais conforto aos pesquisadores eseus laboratórios permitirão a reali-zação de pesquisas tanto no oceanocomo na Antártica, seja na área deBiologia, Físico-química, Oceano-grafia, Hidrografia, Geologia, Me-teorologia etc.�, acrescenta.

Navio pode embarcaraté 36 pesquisadores

Durante os trabalhos de adaptaçãono estaleiro Bredo, em Bremerhaven,norte da Alemanha, foram cons-truídos hangar e convés de voo parareceber helicópteros, e instalados cin-co laboratórios � dois secos, doismolhados e um misto. As acomoda-ções foram ampliadas de 50 para 106pessoas, incluindo 36 pesquisadores.A embarcação possui ainda um es-paço �Internet Café�, com seis com-putadores e academia de ginástica,além de amplo salão de reuniões.

No segundo semestre, o navio de-verá receber equipamentos científi-cos e de navegação, tais como guin-cho geológico e oceanográfico paraáguas profundas, ecobatímetros,sonares, termômetros, perfiladoresde correntes, arcos de popa e late-ral etc. A reforma durou cincomeses, e o custo total com a com-pra e adaptação foi de R$ 69 mi-lhões � provenientes da Financi-adora de Estudos e Projetos (Finep),agência de fomento do Ministérioda Ciência e Tecnologia. Com a in-corporação dos novos equipamen-tos, esse valor deve subir para cer-ca de R$ 100 milhões.

Para o professor do Departamentode Biologia Marinha da Universida-de Federal Fluminense (UFF) Rena-to Crespo, que atua há mais de 20anos na área de Ecologia Marinha,as pesquisas brasileiras ainda são pre-dominantemente voltadas às regiõescosteiras. Ele atribui o fato à poucadisponibilidade de meios apropria-dos para a obtenção de dados � bi-ológicos, físicos, químicos e geoló-gicos � em áreas oceânicas, em par-ticular, de navios oceanográficos,como o que agora entra em serviço.�Pela importância econômica, polí-tica e social dessas pesquisas, quepropiciam o conhecimento em di-ferentes escalas, desde aquelas locaisa outras de grandes dimensões e queinfluenciam o sistema climático do

O fim do Ano Polar Inter-nacional, em março de2009, deixou para a co-

munidade científica brasileira umaherança de grandes investimentospor parte do governo federal, querepresentam um salto de qualidadenas pesquisas e coletas de dados rea-lizadas na Antártica, consideradazona de interesse estratégico para ofuturo do planeta (veja reportagem à

pág. 8). Um dos mais importantesfoi a aquisição de uma nova embar-cação de apoio ao Programa An-tártico Brasileiro (Proantar) e à pes-quisa no Atlântico Sul. Depois depassar por alterações estruturais emestaleiro alemão, o navio, batizadode �Navio Polar AlmiranteMaximiano�, chegou ao País, peloporto do Rio, no mês de abril. Des-de meados da década de 1990, oscientistas brasileiros utilizavam o�Navio de Apoio OceanográficoAry Rongel� para chegar, por mar,à Estação Comandante Ferraz, naAntártica.

A incorporação da embarcação àMarinha brasileira abre novas pers-pectivas para o setor de pesquisa naAntártica e no Atlântico Sul, com aampliação da capacidade de coletade dados destinados ao aprimora-mento das previsões meteorológicase oceanográficas, bem como de car-

Paul Jürgens

A partir da esq.: um dos cinco laboratórios disponíveis a bordo, a sala de ginástica, o comandante Segovia no passadiço e o navio na Baía de Guanabara

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planeta, devem ser consideradas es-tratégicas para o Brasil, que possuigrande extensão continental em con-tato com o mar e que representacerca de 40% das regiões costeirasdo Atlântico Sul�, diz Crespo.

De acordo com o pesquisador, a in-corporação do navio polar permiti-rá incrementar os estudos oceano-gráficos, que, de forma integrada emultidisciplinar, investigam os pro-cessos que ocorrem nos sistemasmarinhos. �Essa aquisição é de gran-de importância, pois permitirá aoBrasil ampliar significativamente a suaparticipação na pesquisa oceanográ-fica na Antártica, além de abrir no-vas perspectivas para a compreen-são de fenômenos que ocorrem emnosso litoral e que ainda necessitamser investigados, e outros que regemo funcionamento do planeta.�

Com 93,4 metros de comprimento,calado que chegará a 7,2 metros apósa instalação dos novos equipamen-tos e velocidade máxima de 12,5 nós(cerca de 23 quilômetros por hora),o navio, que vinha sendo utilizadocomo pesqueiro, tem grande capa-cidade de tração. Construído peloestaleiro Todd Pacific ShipyardsCorp., em Seattle, na Costa Oestedos Estados Unidos, em 1974, pas-sou mais tarde por uma amplareformulação no estaleiro Aukra, naNoruega, no ano de 1988, quandotrocou as funções de navio de apoio

a plataformas de petróleo pela deatividade pesqueira.

Embarcação ajudará nalogística de apoio

O biólogo Carlos Eduardo deRezende, chefe do Laboratório deCiências Ambientais do Centro deBiociências e Biotecnologia da Uni-versidade Estadual do NorteFluminense (Uenf), acha que o na-vio vem preencher uma lacuna nodesenvolvimento do Proantar bra-sileiro. �É um presente justo para os25 anos de pesquisa brasileira naAntártica. O Brasil possui inúmerasinstituições participando desse pro-jeto, porém a logística de apoio ne-cessita de contínuos aprimoramen-tos e manutenção�, diz. Ele ressaltaque a embarcação traz a possibilida-de de termos mais pesquisadores ealunos, de graduação e pós-gradua-ção, atuando em projetos de interes-se científico para o País e para o pla-neta, uma vez que a Antártica �pos-sui um papel regulador nos proces-sos climáticos globais�. E acrescenta:�Os estados litorâneos também de-veriam investir na compra de em-barcações bem equipadas, de formaque possamos incrementar a forma-ção de recursos humanos na área deCiências do Mar�.

Professor da Faculdade de Ocea-nografia e diretor do Centro de Es-tudos Ambientais e Desenvolvimen-

to Sustentável (Ceads) da Universi-dade do Estado do Rio de Janeiro(Uerj), Marcos Bastos lembra que aescolha do nome para batizar o na-vio presta uma justa homenagem �aum dos homens que mais se dedi-cou à inserção do Brasil na regiãoAntártica e que, ao garantir a com-pra do navio Barão de Teffé, em1982, viabilizou a primeira expedi-ção Antártica brasileira e o estabe-lecimento da Estação ComandanteFerraz. O almirante MaximianoEduardo da Silva Fonseca (1919-1998), hidrógrafo, ocupou a pastade ministro da Marinha de 1979 a1984.

Bastos ressalta que o País, ao aderirao Tratado da Antártica (veja box à

pág. 13) e criar o Proantar, em 1982,iniciou os estudos científicosdirecionados às Ciências da Terra,Vida e Atmosfera, no que toca à pes-quisa oceanográfica. �A aquisiçãodesse meio flutuante irá oferecer achance de aumentar, de forma sig-nificativa, os estudos que investigamos fenômenos que influenciam ossistemas costeiros e oceânicos brasi-leiros�, diz.

Com a incorporação à Marinha donovo navio polar, o País dá mais umpasso para se posicionar como umdos interlocutores no debate sobreas mudanças climáticas, que prome-te ocupar parte importante da agen-da internacional neste século XXI.

Fotos: Paul Jürgens

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Boto-cinza

O flagrante é inusitado, masnão pouco frequente. Bo-tos-cinza brincam, jogando

para cima sacos plásticos que veemflutuando sobre as águas. A imagemtalvez seja a que mais reflete a atualsituação da Baía de Guanabara. Comaltos índices de poluição ambiental,suas águas concentram variada gamade poluentes, de metais pesados asubstâncias tóxicas persistentes, comoascarel (PCB) e o pesticida DDT(dicloro-difenil-tricloroetano). A po-pulação de botos residentes na baíacontinua resistindo, mas pesquisado-res, como José Lailson Brito Jr. eAlexandre Azevedo, da Faculdade deOceanografia da Universidade doEstado do Rio de Janeiro (Uerj), seperguntam: �Será que o Rio de Ja-neiro vai ser o primeiro estado a extin-guir uma população do boto-cinza

da Baía de Guanabara, animal que jáfoi tão abundante na costa flumi-nense e que está simbolizado no bra-são da cidade do Rio de Janeiro? Secontinuarmos nesse ritmo, isso podeacontecer�.

Não é de hoje que os dois pesquisa-dores estudam botos e outros cetá-ceos do estado. Desde 1992, quan-do criaram na Uerj o projeto Mamí-

feros aquáticos, ou simplesmente Maqua,eles vêm acompanhando a popula-ção desses animais nas baías do lito-ral fluminense. �A Baía de Guanabaraé onde estão as maiores concentra-ções populacionais humanas e, conse-quentemente, onde estão também asmaiores concentrações de poluentes.Como habitam as águas do interiorda baía, alimentam-se de peixes e es-tão no topo da cadeia alimentar des-sa fauna, os botos-cinza são um ter-mômetro da situação. Suas taxas decontaminação são um aviso, para

nós, das taxas de poluição não só dabaía, como também das áreas adja-centes do litoral. A situação é críti-ca�, alerta Lailson.

Para chegar a esses resultados, os pes-quisadores comemoram o impulsoque seus estudos ganharam com a re-cente inauguração do novo Labora-tório de Mamíferos Aquáticos eBioindicadores Izabel Gurgel, insta-lado na universidade depois de umacordo de cooperação técnica coma Petrobras, e equipado com recur-sos recebidos por meio do progra-ma Pensa Rio, da FAPERJ. �O nossoé o único laboratório da região Su-deste em que se tem a possibilidadede receber uma carcaça e proceder aanálises que nos darão todo o perfildo animal estudado, revelando ida-de, hábitos alimentares, aspectos ge-néticos, histologia e presença de con-taminantes, como metais e organo-clorados�, entusiasma-se José Lailson.

termômetrodas águas

Vilma Homero

A contaminação desses cetáceosé um aviso sobre as taxas depoluição das baías e áreasadjacentes do litoral fluminense

OCEANOGRAFIA

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três baías do estado: Guanabara, Se-petiba e Ilha Grande, as duas últi-mas no litoral sul fluminense. Nooutro, promovem a capacitação ana-lítica de profissionais de alto padrãoem monitoração ambiental. Ambosos projetos contam com apoio fi-nanceiro da FAPERJ.

Tudo isso servirá para, cada vez commaior acurácia, acompanhar e estu-dar os cetáceos do litoral do estado.Estamos falando de várias espéciesde botos � ou golfinhos, como sãodenominados em algumas regiões �e baleias. �Eles passam a maior par-te do dia se alimentando ou procu-rando comida. É quando tambémincursionam por águas próximas nolitoral, fora da baía. Como esses ani-mais não dormem, apenas nadammais devagar, a outra parte do dia épassada em brincadeiras, socializaçãocom outros membros do grupo ecom a corte às fêmeas. Na ausênciade estações marcadas no País, a cor-te e a reprodução acontecem duran-te o ano todo�, explica o oceanó-grafo Alexandre.

O mais visível no comportamentodos botos são os saltos. Verdadei-ros acrobatas das águas, eles pulammuitas vezes a grandes alturas. �Po-dem simplesmente estar brincando,usando estratégias de alimentação, sedeslocando mais rápidamente ou sal-tando por outros motivos�, fala Ale-xandre. Igualmente surpreendente,esses cetáceos brincalhões aindaaproveitam as ondas formadas pe-las embarcações para �surfar�. �Tal-vez seja mais apropriado falar queeles �pegam jacaré� no impulso daságuas para nadar mais rápidamente

Estrutura que também está abertapara atender a outros grupos de pes-quisa. �Universidades ao longo dolitoral brasileiro costumam nos en-viar amostras para análise. Como so-mos referência em toxicologia demamíferos aquáticos, já recebemosaté mesmo material da Amazônia, apartir de um acordo com o Institu-to Nacional de Pesquisas da Ama-zônia (Inpa). Nosso principal parcei-ro é o Laboratório de Radioisótoposdo Instituto de Biofísica da Univer-sidade Federal do Rio de Janeiro(UFRJ)�, fala um igualmente anima-do Alexandre. Com o novo labora-tório, eles agilizam dois grandes pro-jetos que já estão em curso: em umdeles, traçam o caminho dospoluentes na cadeia alimentar dosmamíferos aquáticos que habitam as

Botos nadam nas águas do litoral fluminense: flagrante cada vez mais raro

Pesquisadores acompanham deslocamento dosanimais com fotos: nadadeira dorsal, nunca

idêntica, é como impressão digital

Fotos: Alexandre Azevedo/Maqua/Uerj

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e sem esforço�, acrescenta ooceanógrafo. Essas são característi-cas de comportamento que valempara todos os cetáceos.

Golfinhos e baleias,visitantes do litoral

Além dos residentes fixos de nossasbaías, outras espécies são visitanteshabituais, como os golfinhos de den-tes rugosos, golfinhos pintados doAtlântico, golfinhos nariz de garrafa� as três espécies mais comuns nolitoral do estado. E ainda baleiasjubarte, que costumam aparecer noperíodo que vai do inverno à pri-mavera; baleias franca do sul, quechegam na mesma época para re-produzir-se; e baleias de Bryde, que,embora pouco conhecidas, são bas-tante comuns em águas tropicais, ehabitualmente aportam por aqui en-tre a primavera e o verão. Há aindaas orcas, baleias que frequentamtodo o litoral, de norte a sul do esta-do, entrando ocasionalmente nasbaías costeiras, como a da Ilha Gran-de. Elas ganharam má fama pelo fatode incluir cetáceos menores em seushábitos alimentares.

Como único cetáceo residente dasbaías do estado, o boto-cinza temsido o grande alvo das pesquisas doprojeto Maqua. Nas águas daGuanabara, o grupo que, entre 1995e 1998, era de 70 animais; em 2003já havia sido reduzido a 57; e, hoje,conta com 49 indivíduos. �Isso sig-nifica que, de 1995 a 2005, o gruposofreu uma redução de cerca de30%. De 2002 para cá, essa reduçãotem se acentuado�, critica Lailson. Ogrupo, e cada um de seus membros,é acompanhado de perto pelos pes-quisadores. �Sabe-se que emboratenham padrão residente em baías,fazem breves incursões por áreasadjacentes. Conseguimos traçar suasrotas, tirar fotos e ter a localizaçãoexata de cada um deles por GPS.Assim, ficamos sabendo onde cadaum está. E também é assim que con-seguimos saber que quatro deles per-manecem no grupo desde o iníciode nossas pesquisas�, garante Lailson.

Para isso, recorrem a uma tecnologiasimples. Usando desde 1995 o pro-cesso de fotoidentificação, os pes-quisadores do Maqua conseguemreconhecer individualmente cada

animal. A técnica é mais fácil do queo nome sugere. Com uma potentecâmera digital, cada boto teve a suanadadeira dorsal devidamente foto-grafada. �Ao nascer, os cetáceos têmessa nadadeira completamente lisa.Ao longo do tempo, porém, embrincadeiras ou lutas com outrosanimais, elas vão sofrendo feri-mentos, que, mesmo cicatrizados,não se regeneram. Cada um delesconfere à nadadeira um aspecto úni-co, comparável a uma impressãodigital humana, que nos permiteidentificar cada boto individual-mente�, explica Lailson.

Os pesquisadores também costu-mam gravar os sons emitidos pelosbotos e outros mamíferos aquáticos,num trabalho de bioacústica. �Sabe-mos que os golfinhos se comunicamo tempo todo por meio do som.Assim, estamos estudando tambémas formas como eles se comuni-cam�, fala Alexandre. Cada grupoou população pode emitir sinais so-noros com características próprias eisso também pode ser usado comouma ferramenta para a identificação.

Os riscos nem semprevisíveis nas águas

Infelizmente, na Baía da Ilha Gran-de e, sobretudo, na de Sepetiba,onde estão as maiores populaçõesde bota-cinza, o mau exemplo daBaía de Guanabara vem sendo se-guido. A crescente implantação degrandes empreendimentos industri-ais e imobiliários e o crescimento dasatividades marítimas, além daconsequente poluição, vêm reduzin-do drasticamente o número do botoe das demais espécies locais. �O Pro-jeto Boto-Cinza, um de nossos par-ceiros na região da Baía de Sepetiba,estimou que existam de 700 a 1.000botos residentes, mas pelos relatosde pescadores e moradores, há al-guns anos, esse número era visivel-mente maior�, preocupa-se Lailson.

Exame de carcaça dos botos permite detectar presença de mercúrio no ambiente

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São muitas as perturbações no am-biente daquela área que se refletemnos parâmetros populacionais.

�Foi delimitada uma nova área defundeio de embarcações, exatamenteonde estão concentrados os maioresgrupos de golfinhos. Com o aumen-to do trânsito de navios, certamente,eles terão de mudar-se para outroponto da baía e, com isso, podemficar expostos a predadores. Mas háoutros reflexos não tão visíveis: épossível que o movimento marítimoprovoque estresse nos animais e queisso se reflita em suas taxas repro-dutivas.�, explica Alexandre. Além detodos esses fatores, ainda há o riscosempre presente da captura aciden-tal pelas redes de pesca.

Embora a taxas menores que emSepetiba, a Baía da Ilha Grande tam-bém vem sendo progressivamentedegradada, embora a uma velocida-de menor. �É preciso compreenderque nem só a atividade industrial temimportância. A paisagem também éfundamental para a pesca, o turismoe o bem-estar humano. E estamostornando tudo isso inviável, já que,de 1994 para cá, temos visto que cer-tas concentrações de poluentes têmaumentado�, critica Lailson.

A preocupação dos pesquisadorestem razão de ser. Ao analisar e com-parar amostras de carcaças decetáceos de todo o País, eles consta-taram diversos indicadores que de-monstram que o boto-cinza da Baíade Guanabara é o que mais sofrecom a contaminação das águas.�Aqui, as deformidades no esquele-to do boto são mais frequentes e adensidade óssea é menor. Não ape-nas menor, mas no boto fluminensecom maior densidade óssea, ainda ébem menor que a do animal commenor densidade óssea do Espírito

Santo�, compara Lailson, depois desubmeter as amostras de animais daBahia, Espírito Santo, São Paulo,Paraná e Ceará a exames anatômicose de densitometria óssea. E sabemosque o PCB, ou ascarel, substância pre-sente no óleo usado em transforma-dores, influi nos mecanismos de de-posição de cálcio. Logo, essas defor-midades indicam que pode haverrelação entre os achados e as gran-des concentrações de ascarel na Baíade Guanabara.

O fato é que as baías fluminenses, ade Guanabara, em particular, vêmacumulando grandes concentraçõesde poluentes altamente tóxicos,como compostos polibromados,perfluorados e dioxinas. �Em umaorca encontrada morta na Baía daIlha Grande, encontramos concen-trações de PCB e DDT quase trêsvezes maior que no próprio boto-cinza. Isso nos leva a concluir queestamos exportando esses poluentespara fora das baías, para áreas adja-centes do ambiente costeiro�, expli-ca José Lailson.

Para evitar o agravamento de uma si-tuação já crítica, os pesquisadores su-gerem várias medidas, que vão docontrole do descarte de efluentes in-

dustriais ao saneamento, com coleta etratamento de esgoto de comunida-des. E também propõem o estabele-cimento de áreas restritas de conser-vação nas zonas costeiras, onde nãosejam permitidas atividades maríti-mas, como a pesca, o despejo de águade lastro de navios e o fundeio de em-barcações. �É o mínimo necessáriopara minimizar esses impactos.�

A questão maior, para os pesquisa-dores, é a reprodução do péssimomodelo da Guanabara nas demaisbaías do País. �Os problemas ali, naverdade, refletem graves problemasde saúde pública, como saneamen-to, visível na falta de esgoto em vá-rias comunidades pobres. E essas sãoquestões que só se resolvem em lon-go e médio prazo. E devem viracompanhadas de outras iniciativas,como educação de boa qualidade,incluindo educação ambiental. �Aságuas de uma baía em região metro-politana jamais deixarão de ser po-luídas. Mas a situação pode ser mui-to melhorada. Estamos torcendopara isso.�

Pesquisadores: José Lailson Brito Jr. eAlexandre AzevedoInstituição: Universidade do Estadodo Rio de Janeiro (Uerj)

Botos captutados acidentalmenteem redes de pesca

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O ideal do pesquisador daárea de saúde é trabalharcom conforto e dispor de

meios para aprimorar procedimen-tos, criar equipamentos e medica-mentos capazes de trazer qualidadede vida para o maior número depessoas. Esse sonho está perto de seconcretizar para professores, pesqui-sadores e estudantes do Centro deCirurgia Experimental, do Depar-tamento de Cirurgia da Faculdadede Medicina da Universidade Fede-ral do Rio de Janeiro (UFRJ). Como apoio da FAPERJ, que destinourecursos para a realização de obrase a aquisição de equipamentos, foipossível reformar as instalaçõesonde, desde 1978, funciona o Cen-tro, situado no campus da Ilha doFundão. Os recursos possibilitarama compra de novos materiais per-manentes e permitiram que a ma-nutenção dos equipamentos se trans-formasse em rotina. O resultado doinvestimento chegou �ao leito dohospital�, como se diz no jargão mé-dico, ou seja, as evidências obtidasnas pesquisas com animais já permi-tem testes em humanos, aprovadospelo Comitê de Ética da instituiçãohospitalar.

�As verbas da FAPERJ correspon-dem a cerca de 70% dos investimen-tos em aquisição e manutenção deequipamentos nos últimos trêsanos�, calcula o responsável peloCentro, o cirurgião e coordenadordo Programa de Pós-graduação doDepartamento de Cirurgia, Alberto

Beatriz Coelho Silva

MEDICINA

Ciência nas condições ideaisCom conforto e segurança, Cirurgia Experimentalda UFRJ inova e se destaca na pesquisa médica

Schanaider. �Assim, podemos fun-cionar em condições muito próxi-mas das ideais, pois melhoramossubstancialmente a infraestrutura parao ensino, a pesquisa e para a criaçãoe manutenção dos animais.�Com os recursos recebidos até 2009,uma das salas de cirurgia foi total-mente reformada para criar um am-biente cirúrgico modelo. Uma

câmera foi acoplada a um micros-cópio de pedestal, usado em inter-venções cirúrgicas, e a imagem é pro-jetada em uma tela de 32 polegadaspara facilitar a execução do proce-dimento pelos auxiliares e o apren-dizado, pois permite que vários alu-nos assistam, com detalhes, às ope-rações. �Não há mais necessidade detodos se agruparem à mesa de ope-

Sala de cirurgia reformada: infraestrutura para ensino, pesquisa e criação de animais

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para o diagnóstico e/ou tratamen-to, pode-se propor a fase de testesem seres humanos, mediante auto-rização prévia e dentro das normaslegais vigentes. Desse modo, obser-va-se a aplicabilidade do equipamen-to, do procedimento ou do medi-camento desenvolvido. Trata-se deatividade multidisciplinar, pois en-volve muitas outras áreas das ciênci-as da saúde�, explica o médico.

Parceiros sãofundamentais

Um exemplo desse trabalho é a pes-quisa com marcadores biológicos ecom células-tronco. Marcadores bio-lógicos do estresse oxidativo (quecompreendem, entre outros, os ra-dicais livres) são substâncias que in-dicam a existência de dano celular,que pode estar relacionado à causade diversas doenças, tais como osprocessos de isquemia e reperfusão(transplantes, doenças vasculares), ouinflamatórios (pancreatite, colites).Nessa pesquisa, o parceiro é o La-boratório de Estresse do Departa-mento de Bioquímica da Faculdade

de Química da UFRJ, com a cola-boração da professora Elis CristinaAraújo Eleutherio.

Já as células-tronco se caracterizampor ter o potencial de se diferenciare substituir ou reparar aquelas dani-ficadas, como, por exemplo no tra-tamento de doenças inflamatórias in-testinais. Essas pesquisas são desen-volvidas em parceria com o Labo-ratório Multidisciplinar do HospitalUniversitário Clementino Fraga Fi-lho e o Instituto de Ciências Biomé-dicas (ICB) da UFRJ, com a partici-pação dos professores Celeste Elia,Heitor Siffert Pereira de Souza,Morgana Lima Castelo Branco eMaria Isabel Doria Rossi.

O Programa de Pós-graduação emEngenharia Biomédica da Coppe, daUFRJ, é outro parceiro do Centrode Cirurgia Experimental, especial-mente na criação de tecnologia parao diagnóstico de lesões precocesgastrintestinais ou do dano em osso.No primeiro caso, está o projeto noqual o engenheiro e professor JoãoCarlos Machado trabalha na concep-ção de um aparelho de ultrassono-

Testes com animais contribuem para o desenho de novas drogas que ajudam a salvar vidas

Fotos: Vinicius Zepeda

ração e a atividade, agora, compor-ta mais alunos. Beneficia quem reali-za a cirurgia e quem a assiste�, dizSchanaider, professor associado daUFRJ.

Laboratório ajuda adespertar vocações

Em 2009, com recursos do editalpara Difusão e Popularização da Ciência

e Tecnologia, lançado pela Fundaçãono ano anterior, está em construçãoum auditório multimídia onde serãoministradas palestras, inicialmentepara alunos de escolas públicas doensino médio. Dessa forma, serápossível mostrar à sociedade que apesquisa ética, científica e de quali-dade contribui para a produção doconhecimento e para a formação denovos profissionais. �Tais ações cer-tamente vão despertar vocações,pois, ao introduzir os jovens em umcenário de pesquisa científica, estespoderão se interessar e, no futuro,atuar como agentes formadores deopinião e como interlocutores entrea ciência e tecnologia e a sociedade.�

Schanaider explica que o trabalhodesenvolvido no Centro de Cirur-gia Experimental, geralmente, é osegundo passo na pesquisa científi-ca em Medicina. Um projeto co-meça com uma ideia ou uma per-gunta relacionada a uma doença oua intervenções que visam à melhoriano atendimento e tratamento dopaciente. A partir daí, faz-se um le-vantamento de dados que resulta emuma proposta original. Depois, par-te-se para um modelo a ser testadoem animais.

�Neste contexto, nós também ofe-recemos suporte para pesquisas bá-sicas de outras instituições, dentro efora da universidade, em um ambi-ente multiusuário. Quando o mode-lo testado em animais se mostra pro-missor, ao esclarecer dados dafisiopatologia da doença e contribuir

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Alberto Schanaider: médico garante queresultado do investimento já chegou �ao leito

do hospital�, como se diz no jargão médico

do é trabalhado em um software e irácontribuir para o conhecimento so-bre cicatrização em diversas situaçõescirúrgicas, que incluem a reconstru-ção do trânsito intestinal(anastomoses). �Além desse aparelhoaperfeiçoado, temos uma patente deum afastador autostático semicircu-lar para cirurgia em animais de pe-queno porte�, conta Schanaider, comsatisfação. Ele destaca que a comprade equipamentos para o laboratóriotambém contou com recursos de umsegundo edital da Fundação, Apoio às

Instituições de Pesquisa Sediadas no Rio de

Janeiro, em projeto conjunto com oprofessor Mario Vaisman.

Atenção aos animais

O professor Schanaider lembra que�o Centro de Cirurgia Experimen-tal, atualmente, trabalha com três es-pécies: ratos, coelhos e suínos. A es-colha depende do que se busca, de oanimal ter fisiologia e anatomia pa-recidas com as do ser humano e dafacilidade de manuseio. Ratos são maisfáceis de cuidar por serem animais demenor porte, mas eles não têmvesícula, por exemplo. Então, quan-do a pesquisa envolve esse órgão, te-mos que escolher outro animal.�

Ele ressalta, no entanto, que muitoantes da Lei 11.794, de 8 de outubrode 2008, que regula o uso de animaisem experimentos científicos, o Cen-tro de Cirurgia Experimental já se-guia normas éticas. �Vamos nos ade-quar a essa nova legislação federal,mas sempre tivemos como princí-pio impedir ou minimizar o sofri-mento dos animais, utilizar o menornúmero possível capaz de determi-nar resultados, mantê-los em condi-ções de saúde e ambientais adequa-das, sob a supervisão de veterinário, erealizar a pesquisa com o mesmo ri-gor empregado para o ser humano.�

Os biotérios (locais onde os animaissão colocados) também sofreram

reformas � para as quais a parceriacom a FAPERJ foi fundamental. Foiconstruído um biotério para manu-tenção de coelhos, e foram incor-porados, para criação de ratos, ga-binetes microambientes (estantes fe-chadas com ventilação, filtros deexaustão e controles digitais) emacroambiente (sala com tempera-tura, umidade e exposição à luz con-troladas). Nesse biotério, são criadosanimais SPF � sigla em inglês paradefinir que estão livres de espéciespatogênicas (micro-organismos quecausam doenças), e isogênicos (oriun-dos de cruzamentos interfamiliarespor aproximadamente cinco anos).

�Atualmente, existem 158 ratos paranossos experimentos e, no biotériopara suínos, temos seis animais�,explica o veterinário do Centro deCirurgia Experimental, Paulo CésarSilva, professor adjunto do Depar-tamento de Cirurgia da UFRJ. Alémdele, também está lotado no Centroo anestesiologista Luiz Vivas, queauxilia nos procedimentos e detémuma patente registrada de um apa-relho de anestesia para uso em ani-mais de pequeno e médio porte.

Em seus 31 anos de existência, oCentro de Cirurgia Experimentaltem produzido conhecimento apli-cável em situações clínicocirúrgicase suas pesquisas são citadas frequen-temente em congressos e em revis-tas internacionais de impacto. Hoje,a circulação de pesquisadores peloprédio, que fica em uma das pon-tas do Centro de Ciências da Saúde(CCS), é intensa: são pesquisadorese membros de equipes, entre pro-fessores, pós-graduandos e estu-dantes de Medicina e de outras áre-as envolvidas em projetos de inici-ação científica.

Ademais, em torno de 100 alunos dagraduação da Faculdade de Medici-na da UFRJ passam por lá, todos ossemestres, cursando disciplinas do

grafia de alta resolução, capaz dediagnosticar lesões precoces e de pe-quenas dimensões no sistemadigestório. O aparelho, ainda em de-senvolvimento, permite visualizarcamadas do intestino com um pa-drão microscópio, tornando, em umprimeiro momento, o diagnósticomenos invasivo no que tange ao graude penetração da lesão. �Creio que,em dois anos, o equipamento estaráconcluído para uso associado a umendoscópio�, avisa Schanaider. Nosegundo projeto com a Coppe, de-senvolve-se, em ratos, um estudo dopotencial diagnóstico do ultrassomna avaliação de pseudoartrose (fra-tura óssea que não se consolida detodo), e conta com a colaboração doprofessor Wagner C. A. Pereira e alu-nos de pós-graduação.

Ainda com apoio da FAPERJ, umprojeto, sob orientação do profes-sor Domingos Lacombe e com par-ticipação da doutoranda EdnaDelubio Ferraz, resultou no aperfei-çoamento de um dinamômetroacoplado a computador, para estu-do de anastomoses e resistência detecidos. Trata-se de aparelho quemede a tensão de um tecido subme-tido a tração controlada. O resulta-

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Departamento de Cirurgia. No finalde 2008, foi credenciado pela Capeso Programa de Pós-graduação emCiências Cirúrgicas. A primeira turmade mestrandos já tem à sua disposi-ção os laboratórios do Centro emtempo integral e, em junho de 2009,a nova turma de doutorandos devechegar. �Nossa intenção é produzirpesquisas de ponta, com conteúdo deimpacto, e que sobraessaiam no Bra-sil e entre a comunidade internacio-nal�, comenta Schanaider.

Da clínica ao laboratório

Para ele, uma particularidade de mui-tos médicos-cientistas brasileiros ��ainda que não exclusiva, mas pre-dominante� � determina o bom an-damento dos projetos nessa área.Como boa parte desses profissionaisdedica-se também ao atendimentoclínico, eles sabem quais são as áreasmais carentes de pesquisas e estraté-gicas para o Brasil e estão aptos parafazer propostas para um melhoratendimento de saúde, com origina-lidade e inovação.

�Além do trabalho acadêmico, tam-bém sou um cirurgião. Essa forma-ção nos dá competência para avali-ar, de modo crítico, autônomo e efi-ciente nossas pesquisas, o que se ex-pressa na busca do melhor tratamen-to para o paciente, determinantepara uma melhor qualidade de vida�,relata o médico. No entanto, ele res-salta: �Como temos de harmonizarpesquisa, ensino e assistência, ativida-des que exigem muito de nossa de-dicação, é preciso disciplina paraencontrar tempo para escrever, pes-quisar, atuar na bancada do laborató-rio e no centro cirúrgico�. Se for pos-sível conciliar tais práticas em condi-ções ideais, como no Centro de Ci-rurgia Experimental, melhor ainda!

Pesquisador: Alberto SchanaiderInstituição: Universidade Federal doRio de Janeiro (UFRJ)

Em outubro de 2008, foi aprova-da a Lei nº 11.794, que trata douso científico de animais. Ela repre-senta, sem dúvida, um grandeavanço, haja vista que, até então,a comunidade científica não dispu-nha de uma regulamentação espe-cífica para essa atividade. Era re-almente surpreendente que umanação que está formando 10 mildoutores por ano, que chegou, re-centemente, à 13ª colocação noranking internacional de publica-ções científicas e que, notadamentea partir de anos recentes, vem pos-sibilitando elevação substancial derecursos financeiros destinados aofomento da pesquisa científica etecnológica, ainda não possuísseuma legislação federal que regu-lamentasse as atividades de pesqui-sa com animais de laboratório, im-prescindíveis para a ciência e parao desenvolvimento tecnológico e ainovação no País.

Em virtude da lacuna que existia nalegislação federal, os pesquisado-res ficavam expostos a algumas si-tuações absurdas, e mesmo cons-trangedoras, como as que ocorre-ram, p.ex. nos municípios do Riode Janeiro e Florianópolis, em queprojetos de Lei de parlamentaresdas Câmaras Municipais visaramimpedir a pesquisa científica comanimais de laboratório.

A nova Lei passa a permitir quetodo território nacional esteja sub-metido a uma mesma regulamen-tação, no que se refere à utilizaçãode animais para propósitos cientí-ficos ou didáticos. Na ausência deleis específicas, estávamos sob a in-terpretação jurídica de outras leisque, por aproximação ou similari-dade, determinavam o que se po-deria ter como certo ou errado.

Precisamos, agora, que ela seja re-gulamentada, dentro dos 180 dias

Lei dispõe sobre o uso científico deanimais no ensino e na pesquisa

Ruy Garcia Marques* previstos para tal, haja vista que, aose analisar uma lei, devemos ser cui-dadosos porque o que não se afir-ma é tão importante quanto aquiloque se determina, orientando posi-tiva ou negativamente a conduta doser humano em sociedade.

As agências de fomento à pesquisa,bem como os gestores de instituiçõesde ensino e pesquisa, precisam es-tar atentos ao importante papel quedesempenharão nos próximos anosno processo de mudança da reali-dade da experimentação animal noBrasil. Políticas claras e continuadasserão necessárias para que o aportede recursos financeiros seja previsto(modernização de biotérios, imple-mentação de comissões de éticapara pesquisa em animais etc.) epara que a formação de pessoal es-pecializado seja realizada por meiodo estímulo à organização de cur-sos e de eventos sobre boas práticascom animais. Somente comenvolvimento articulado e contínuoda comunidade científica estaremosrealmente pondo em prática as pre-missas previstas na nova lei.

Avançamos muito, sem dúvida. A uti-lização científica de animais está,agora, amparada por uma lei fe-deral. O professor e/ou pesquisa-dor digno, probo, consciente e éti-co, necessitava e clamava pela ado-ção de dispositivos regulamentareslúcidos e realistas que garantissema continuação de sua prática no en-sino e na pesquisa científica. Con-tudo, cada vez mais, projetos deensino ou pesquisa com a utiliza-ção de animais devem ser cuida-dosamente delineados, com avali-ação precisa de potenciais desdo-bramentos, e levando em conside-ração os fundamentos éticos paraa sua realização.

* Coordenador da Disciplina de TécnicaOperatória e Cirurgia Experimental daFaculdade de Cências Médicas da Uerj eDiretor-Presidente da FAPERJ

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Uma das poucas mulheres aocupar o cargo de reitoraem universidades do País,

Malvina Tânia Tuttman iniciou a car-reira profissional como professoraprimária de uma escola municipal emPadre Miguel, na Zona Oeste, nadécada de 1970. Eleita para dirigir aUniversidade Federal do Estado doRio de Janeiro (UniRio), em 2004,foi reconduzida para novo manda-to à frente da instituição em setem-bro de 2008. Ela chegou à universi-dade em 1980 e, no final da mesmadécada, assumiu a direção da escolade Educação da universidade. Maisadiante, ocupou, ainda, o cargo dePró-reitora de Extensão, antes deocupar a cadeira de reitora.

Com experiência na área de Edu-cação � com ênfase em Planejamen-to e Avaliação Educacional, atuan-do principalmente em temas relati-vos à flexibilização curricular, exten-são universitária, cotidiano na edu-cação, metodologias participativas eplanejamento �, Malvina foi umadas primeiras a se manifestar emfavor da adoção do novo ExameNacional do Ensino Médio (Enem),proposto pelo ministro Fernando

Haddad. Antes do anúncio do titu-lar da Educação, a UniRio já desti-nava 50% das vagas a estudantesoriundos do exame.

Em entrevista à Rio Pesquisa, ela de-fende, além do novo Enem, tam-bém o Reuni, outro projeto deBrasília, �que está possibilitando queas Instituições Federais de EnsinoSuperior (Ifes) recuperem as perdasacumuladas no decorrer de décadasem relação à falta de investimentosdo governo federal�.

Sobre o sistema de cotas, a reitoraentende que se trata de �política com-pensatória para diminuir a imensa in-justiça implantada e mantida no Brasildesde a sua formação�, e que excluidas universidades públicas a parcelamajoritária da população brasileira.�É urgente e indispensável que essapopulação, constituída na sua maio-ria de negros, mas também de bran-cos, tenha acesso à universidade, àqualificação e à produção de conhe-cimentos que realmente estejam vol-tados para a sociedade.�

Para a pedagoga, um dos objetivosde sua gestão na direção da UniRioé a gradativa consolidação da pós-

graduação, com a ampliação do nú-mero de doutores, que, somadosaos já experientes pesquisadores deseu quadro funcional, poderão con-tribuir de forma ainda mais signifi-cativa para a produção do conheci-mento, �voltados para a superaçãodos gravíssimos problemas sociais,culturais e econômicos da nossa po-pulação�. No início de junho, aUniRio completou 30 anos de suafundação. Ao longo dos anos, a ins-tituição construiu uma reputação deexcelência em diversas áreas, comomuseologia, teatro e música.

Confira a íntegra da entrevista:

O ministro Fernando Haddad surpre-endeu a comunidade acadêmica coma proposta de substituir os vestibula-res das universidades federais por umnovo Enem. A UniRio foi uma das pri-meiras universidades a aderir inte-gralmente à proposta. Há, no entan-to, certo receio de que estudantes dascapitais venham a ocupar vagas emuniversidades do interior, ou que hajadificuldade na manutenção do pes-soal que saia de cidades com custode vida mais baixo em direção àque-las de custo de vida mais alto. AUniRio dispõe de estrutura ou algumprograma voltado para receber alu-nos de fora do estado?

Malvina Tânia Tuttman: �É urgente e indispensável que os socialmentemenos favorecidos tenham acesso à universidade, à qualificação e à produção deconhecimentos que realmente estejam voltados para a sociedade�

ENTREVISTA

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A UniRio já vinha adotando, desde2001, o Enem como um de seusprocedimentos para o acesso à uni-versidade. A partir de estudosinvestigativos sobre os resultados aca-dêmicos de tal procedimento, nossainstituição ampliou, gradativamente,o percentual de vagas oferecido para50%. Portanto, na UniRio já existeuma experiência acumulada e exitosaem relação ao Enem. O desafio, a-gora, é participar de um sistema na-cional que avança no processo dademocratização em relação ao aces-so à universidade. Cidadãos de to-dos os cantos e recantos do nossoPaís poderão se inscrever e partici-par do processo seletivo, tendocomo parâmetro o mesmo instru-mento avaliativo. É preciso avançar,no entanto, nas políticas de assistên-cia estudantil, que possibiliteminfraestrutura adequada, como mo-radia, alimentação e também apoioacadêmico e psicológico, entre ou-tros. Há um comprometimento porparte do Ministério da Educação emapoiar, com verbas destinadas espe-cificamente para tais fins, as univer-sidades que irão participar da pro-posta do novo Enem como fase úni-ca de seu processo seletivo. A UniRiojá possui uma política de assistênciaestudantil definida, estando, no atualmomento, estruturando e consoli-dando algumas ações necessárias

para o recebimento adequado e dig-no de todos aqueles que desejaremfazer a sua formação acadêmica emnossa universidade.

Um outro grande projeto do governofederal para a área de Ensino Supe-rior tem sido o Programa de Apoioao Plano de Reestruturação e Expan-são das Universidades Federais � Reu-ni. Como a sra. avalia este progra-ma e que passos a UniRio tem dadona participação ao Reuni?

O Reuni está possibilitando que asInstituições Federais de Ensino Su-perior (Ifes) recuperem as perdas acu-muladas no decorrer de décadas emrelação à falta de investimentos dogoverno federal, além de estimularoutras formas de se pensar e fazer auniversidade. A UniRio, ao comple-tar 30 anos, encontra-se em plenocrescimento, com a criação de no-vos cursos e com a possibilidade deconsolidar os cursos já existentes, tan-to os de graduação como os de pós-graduação. Prédios estão sendo re-formados ou construídos, projetospara a criação de laboratórios deinformática nos diferentes campi es-tão sendo executados, assim comoo projeto do Restaurante-escola. Otransporte intercampi já é uma realida-de. Os concursos públicos para acontratação de professores e de téc-nicos-administrativos vêm reforçar aexcelência do nosso quadro de ser-vidores. A previsão é de aumento sig-nificativo do número de alunos naUniRio, com a projeção de um cresci-mento de matrícula de 64,8%, perfa-zendo um total de 12.931 ingressantesa partir do ano de 2010, somente noensino presencial da graduação.

Que impacto deverá ter a recenteampliação do corpo docente da insti-tuição na contribuição à pesquisa ci-entífica? Quais são as perspectivaspara a pesquisa e pós-graduação nauniversidade nos próximos quatroanos e como vislumbra a parceria coma FAPERJ neste esforço?

A preocupação da UniRio em pro-duzir conhecimentos comprometi-

dos com a sua vocação humanistavem, ao longo dos anos, orientandoas ações que visam atender tanto oensino da graduação e da pós-gra-duação quanto as pesquisas e suasinterações com a sociedade, refleti-das nos programas e projetos de ex-tensão. As pesquisas desenvolvidasnos distintos programas de pós-gra-duação mostram, por si mesmas,essa interação quando investigam ohorário integral na política educacio-nal pública, o preconceito racial nasdiferentes práticas educativas, os pro-cessos formais e não-formais de en-sino em música, a divulgação cientí-fica em saúde e suas redes sociais oua construção cotidiana de uma es-cola inclusiva e democrática, paracitar apenas alguns exemplos. A con-tinuidade e expansão desses propó-sitos estão atreladas, principalmente,ao crescimento da pesquisa nas áre-as das Artes, das Humanidades e daSaúde. A UniRio é uma jovem uni-versidade com cursos de graduaçãocentenários e de excelência. No en-tanto, ainda está se consolidando napós-graduação. Tivemos nos últi-mos anos um aumento no númerode mestrados (de quatro para nove)e de doutorados (de dois para qua-tro). Com o Programa Reuni, vamosampliar o número de doutores nasmais diversas áreas do conhecimento,permitindo antever que, em breve,teremos novos mestrados e douto-rados. A expectativa é que os novose os já experientes pesquisadores danossa universidade consigam contri-buir de forma ainda mais significati-va na produção de conhecimentos,voltados para a superação dos gra-víssimos problemas sociais, culturaise econômicos da nossa população.A FAPERJ tem sido, nestes últimosanos, uma parceira inquestionável dasuniversidades do Rio de Janeiro, con-tribuindo para o fortalecimento dosgrupos de pesquisa e para a produ-ção de conhecimentos. Consideran-do as características específicas da

Fotos: divulgação UniRio

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UniRio, temos expectativa quanto aolançamento de mais editais voltadospara as áreas de Artes e Humanida-des e, também, de programas e gru-pos emergentes.

O debate em torno das cotas paranegros, índios, egressos da escolapública e estudantes de famílias me-nos favorecidas nas universidadesparece dividir opiniões. Com a sra.avalia essa questão?

Este debate já faz parte da agendade discussão da sociedade e das uni-versidades e é muito bem-vindo.Trata-se da proposição de políticascompensatórias que tenham porobjetivo diminuir a imensa injustiçaimplantada e mantida no Brasil des-de a sua formação, e que exclui dasuniversidades públicas a parcela ma-joritária da população brasileira �aqueles desfavorecidos socialmen-te � constituída, em grande parte,de negros, mas também com umnúmero considerável de brancos. Éurgente e indispensável que essa po-pulação tenha acesso à universida-de, à qualificação e à produção deconhecimentos que realmente este-jam voltados para a sociedade. Nomomento quando a inclusão real-mente acontecer e quando a popu-lação tiver acesso igualitário aos co-nhecimentos produzidos, as políti-cas afirmativas não serão mais ne-cessárias. Para a UniRio, consideroque a mais adequada, mais justa ede mais rápida realização é a políti-ca de cotas para a escola pública.Política esta que já colocamos emprática nas licenciaturas e que deveser ampliada no debate que agorase inicia, depois da nossa adesão aoSistema Nacional Unificado deAcesso, por meio do Enem.

Menos de 20% dos municípios brasi-leiros dispõem de museus, que nasprincipais cidades do mundo são umgrande atrativo para o turismo e aformação cultural e científica de seuscidadãos. A UniRio possui uma fortetradição na área de Museologia.Também os cursos de Música e Tea-

tro da UniRio gozam de grande pres-tígio no meio acadêmico. Como osprofissionais formados pela UniRio eseus docentes/pesquisadores podemcontribuir para o desenvolvimento daárea cultural em nosso estado?

A Escola de Museologia da UniRiofoi a primeira instituição no gênerodo País. Gostaríamos de lembrar aimportância que um museu possui jáque é, por definição e vocação, �umainstituição de caráter permanente, ad-ministrado para interesse geral, coma finalidade de recolher, conservar,pesquisar e valorizar de diversas ma-neiras um conjunto de elementos devalor cultural e ambiental�. Para osmunicípios menores, seja em âmbi-to geográfico como demográfico,sua importância é vital para as suaspopulações. A preservação econsequente perpetuação da memó-ria social é de relevante função so-cial, e devem ser feitos todos os es-forços para consegui-la. Um paíssem memória torna-se mais suscep-tível, em todos os aspectos, pela fra-gilidade de sua identidade que lhe édiretamente consequente. Encontra-se em fase de finalização na nossa ins-tituição a instalação do Ceme � Cen-tro de Memória das Artes da Cultu-ra �, uma biblioteca digital para abri-gar coleções de documentos sono-ros e visuais, relacionados com pes-quisas nas Artes e Cultura, primordi-almente da UniRio, mas abertos paraconsulta ao público em geral. A nos-sa universidade também possui cur-sos de Teatro e Música, ambos deexcelência, seja em graduação, seja empós-graduação � mestrado e dou-torado �, considerados, nos dois es-

tágios, como referências nacionaisem suas áreas de atuação. São cur-sos fundamentais, uma vez que for-mam muitos artistas e pesquisado-res que, pelo importante exercício desuas funções, contribuem decisiva-mente para a circulação, fruição eprodução na área artístico-cultural,sempre com respeito às diversida-des observáveis na nossa sociedade.

Apesar de mais conhecida por seuscursos voltados para as �humanida-des�, a UniRio tem presença desta-cada em diversas outras áreas, comoa Medicina. O Hospital UniversitárioGafrée e Guinle, por exemplo, é re-ferência em várias áreas, mesmo notratamento da Aids. Como a UniRiopode estreitar seus laços com asagências de fomento à pesquisa?

O hospital universitário é um locus

privilegiado para a produção nos di-ferentes campos de conhecimento.É necessário perceber seu grandepotencial para a produção de pes-quisas nas áreas das Ciências Sociais,da Cultura e da Tecnologia da In-formação. Consideramos ser esta amissão de um hospital universitáriono século XXI: oferecer-se comouma arena para a geração de conhe-cimento plural, interdisciplinar, paraalém daquele estabelecido pela tra-dição assistencialista. Em relação aocrescimento da investigação, as agên-cias de fomento podem fortaleceras atividades de pesquisa já em de-senvolvimento, mantendo a sua atu-al política e possibilitando apoio àsações acadêmicas pertinentes a umhospital universitário.

A difusão do conhecimento geradopelas universidades é essencial parafortalecer o apoio que a sociedadedeve prestar às universidades. Comoa UniRio tem trabalhado as suas ati-vidades de extensão e qual tem sidoo retorno da sociedade?

A Extensão, por suas característicasatuais, é tratada na UniRio comouma das estratégias utilizadas no pro-cesso de flexibilização curricular, poispossibilita o olhar da universidade

UniRio completa 30anos de fundaçãoem 2009, expandecorpo docente einveste em pesquisa

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para as transformações que ocor-rem no cotidiano. As ações de Ex-tensão na UniRio são referidas àsÁreas Temáticas de Extensão, a sa-ber: Comunicação, Cultura, DireitosHumanos, Educação, Meio Ambi-ente, Saúde, Tecnologia e Trabalho.Em 2009, estão em andamento seteprogramas, 84 projetos, 41 cursos e14 eventos de Extensão. Poderíamosmencionar ainda outras ações de Ex-tensão nas diferentes unidades daUniRio. Na Escola de Teatro, porexemplo, estão em andamento oprojeto Teatro na Prisão; ProgramaInterdisciplinar de Formação, Açãoe Pesquisa Enfermaria do Riso; Pro-jeto O Hospital como Universo Cê-nico; e o Programa Núcleo de Es-tudos Afro-Ameríndios � Nepaa. Jáo hospital universitário promove oPrograma de apoio à Terceira Ida-de � Renascer. Na Escola de Ciên-cias Biológicas, as atividades inclu-em o Programa para a Conserva-ção do Ambiente Pão de Açúcar eo Projeto Aprender com a Nature-za: Educação e InterpretaçãoAmbiental, com estudantes de esco-las municipais públicas nos arredo-res do Parque Nacional da Tijuca. A

Prática Contemporânea do Ensinode Música e o Projeto CamerataQuantz, esses, têm lugar na Escolade Música. Na Escola de Bibli-oteconomia, as iniciativas incluemRodando as Leituras, com a EstanteCirculante, Implantação, Padroniza-ção, Processamento Técnico eDinamização da Biblioteca PauloFreire/Maré � Ceasm e Implanta-ção da Biblioteca Comunitária DonaZica: uma Experiência com o Livroe a Leitura. Também merecem men-ção o Projeto Assistência JurídicaGratuita, na Escola de Direito, e trêsações na Escola de Enfermagem eno Instituto Biomédico: Fábrica deCuidados: Modelos e Tecnologias deCuidar em Saúde; Orientação emSaúde e Levantamento das Para-sitoses com profissionais e criançasdo Abrigo Teresa de Jesus; Abor-dagem Humanitária dos Pacientescom Miíases Atendidos no HospitalGeral do Andaraí no Rio de Janeiro.

Apesar do grande e crescentepercentual de mulheres como do-centes universitárias, o número demulheres que ocupam, ou ocupa-ram, o cargo de reitoras em univer-sidades no País, permanece peque-no. Como se sente tendo sido

reeleita para um segundo mandatoà frente da UniRio?

Responder a esta pergunta me remetea um passado de cerca de 40 anos.Em 1969, vivi a incrível experiênciade iniciar a minha carreira profissio-nal como professora primária domunicípio do Rio de Janeiro, na ZonaOeste, em Padre Miguel. Foi lá, comos meus alunos, que comecei aaprender a ser professora. Quantashistórias de vida se misturaram àsminhas! Com eles, meus alunos,aprendi a riqueza e o privilégio deser docente. Hoje, refletindo sobreminha trajetória profissional, com-partilhada com tantos outros profis-sionais e estudantes, com quemaprendo cotidianamente, sinto-mehonrada em representar a comuni-dade da UniRio, ocupando o cargode reitora, a partir de um processodemocrático de escolha, com a par-ticipação de professores, técnicos-administrativos e alunos. Gosto depensar que uma professora, peda-goga, pode ocupar um cargo de ta-manha relevância e responsabilidade,apesar de a minha área de formação,incrivelmente, não ser considerada,em nosso País, uma área nobre doconhecimento. Vejo que a atuação damulher, em vários setores, e, especi-almente, nas universidades, vem seampliando, ainda que com restrições,mesmo salariais. Na UniRio, destacoa atuação direta de importantes pró-reitorias acadêmicas coordenadaspor mulheres, decanias e direções deescolas, que foram indicadas não pelogênero, mas pela competência de-monstrada no decorrer do exercícioprofissional. Parafraseando a nossaDoutora Honoris Causa FernandaMontenegro, que abordou o assuntona Folha de São Paulo, o que se esperadas mulheres no poder é a perfeitaconjugação da delicadeza com a fir-meza profissional. Porém, há muitoque caminhar, apesar do enfren-tamento e da abertura de espaços jáconquistados pelas mulheres.

Malvina: defesa de amplo acesso da população à universidade pública

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Darwin nos tirou do berçoesplêndido: se a diversida-de animal na face da terra

é fruto da evolução a partir de umancestral em comum, então nós, hu-manos, autoclassificados como �osque vêm primeiro�, significado dapalavra �primata�, somos feitos àimagem de... outros primatas. Namesma época, em meados do sécu-lo XIX, a ciência passou a aceitar quea mente é fruto do funcionamentodo cérebro. Desde então, muitosbiólogos, psicólogos e neuroci-entistas se empenharam em encon-trar características distintivas do cé-rebro humano que justificassem nos-sa �superioridade� � algo que nosdistinguisse dos demais animais.

Tamanho absoluto não funciona,pois elefantes e vários cetáceos pos-suem cérebros maiores que o nosso.Tamanho relativo também não: parao pequeno corpo de um camundon-go, seu cérebro é enorme e relativa-mente maior que o nosso. O con-forto chegou quando, na década de1950, Henry Jerison calculou o Co-eficiente de Encefalização e demons-trou que, comparados aos demaismamíferos, �nosso cérebro é de 5 a7 vezes maior que o esperado parao tamanho do nosso corpo�. Con-sidere que o tamanho do cérebrocresce junto com o tamanho do cor-po na evolução, e olhe para gorilas eorangotangos: donos de corpos até

Apenas um grande

primata

E se o encéfalo humanopossuir apenas o tamanho enúmero de neurôniosesperados para um primata?

Suzana Herculano-Houzel

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três vezes maiores que o humano, océrebro deles é apenas um terço donosso. Para o corpo relativamentediminuto que temos, nosso cérebrodeveria ser menor que o dos gorilas.Mas não é. Assunto encerrado: so-mos especiais.

Mas a ideia de que seríamos espe-ciais não se encaixava com o que euaprendera na Biologia: por que asregras da evolução se aplicariam atodos os outros animais, menos anós? Além do mais, olhando-me noespelho, minha cabeça não pareciadesproporcionalmente grande � si-nal de que meu cérebro também nãodeveria ser (de fato, compartilhamoscom a maioria dos outros primatasum tamanho encefálico relativo decerca de 2% do corpo).

Meu interesse pelo assunto passoude amador a profissional inci-dentalmente quando, na época quan-do trabalhava no Museu da Vida, naFundação Oswaldo Cruz, descobri,com um questionário, que 60% daspessoas de nível superior acredita-vam no mito de que usaríamos ape-nas 10% do cérebro. Uma das ex-plicações possíveis para o númeroseria o fato de que, segundo os li-vros didáticos, os neurônios seriamapenas 10% de todas as células docérebro humano.

Pouco depois, em 2003, cheguei àUFRJ como professora recém-con-tratada pela universidade para fazerdivulgação científica no departamen-to chefiado por Roberto Lent, au-tor de um livro-texto intitulado Cem

bilhões de neurônios. Parecia uma fontesegura, então fui lhe perguntar: quemtinha contado e encontrado 10 ve-zes mais células gliais do que neu-rônios no cérebro humano, e, aliás,quem tinha determinado que seriam100 bilhões de neurônios? Como aresposta foi um sincero �não sei�,pus-me a revirar a literatura e a ques-tionar colegas neurocientistas, algunstão proeminentes quanto Pasko

Rakic, Miguel Nicolelis e Karl Herrup,este, autor de uma revisão sobrenúmeros de neurônios no cérebro �em vão. Os �cem bilhões deneurônios e dez vezes mais glia�eram �fatos� tão difundidos que erapossível citá-los em artigos científi-cos sem mencionar fontes; até o Prin-

cípios de Neurociência, do prêmioNobel Eric Kandel e colaborado-res, traz esses �fatos� em uma de suaspáginas iniciais. Os poucos estudosquantitativos que encontrei tratavamapenas de regiões do encéfalo, comoo córtex cerebral ou o cerebelo, enão do todo. A razão parecia clara:faltava um método para determinarcom precisão a composição celulardo encéfalo inteiro, humano ou não.

Voltei a procurar por Roberto, ago-ra com uma proposta. Lembrandode uma técnica de isolamento denúcleos que havia conhecido na ini-ciação científica, 15 anos antes, euhavia pensado em uma maneira sim-ples e direta de contar células noencéfalo (e estava surpresa de nin-guém haver feito isso antes). Comela, poderíamos tirar a limpo de queé feito o encéfalo humano � e, dequebra, abordar uma questão queme interessava profundamente: aorigem da diversidade do sistemanervoso, que, só em mamíferos, va-ria 100 mil vezes em tamanho, domenor insetívoro ao maior cetáceo.

Mas eu não tinha um laboratórionem recursos; apenas um escritórioe uma ideia, um tanto quanto inusi-tada, se não insana, de tranformarcérebros em sopa para contar suascélulas. Roberto, receptivo e de men-

te aberta como sempre, topou sempestanejar iniciarmos uma colabora-ção � e ainda achou graça em pen-sar que, com o resultado, talvez pre-cisasse mudar o título de seu livro.Assim comecei a pesquisar a melhormaneira de desfazer a estrutura alta-mente heterogênea do encéfalo etransformá-lo em uma sopa de nú-cleos, os quais, uma vez libertadosda membrana da célula à qual per-tenciam, poderiam ser facilmentecolocados em uma suspensão ho-mogênea de volume definido, e con-tados por amostragem sob um sim-ples microscópio de fluorescência.Dois anos depois, publicamos nos-so primeiro artigo descrevendo ométodo, batizado de FracionadorIsotrópico � e eu conseguia apoiofinanceiro da FAPERJ, graças aoedital Primeiros Projetos, para montarmeu próprio laboratório.

Outros quatro anos depois, agoracom apoio financeiro do CNPq eda FAPERJ, e junto com minha equi-pe no Laboratório de Neuroanato-mia Comparada e nossos colabora-dores na Universidade Vanderbilt,nos Estados Unidos, já sabemos des-crever a relação entre tamanho docérebro e seu número de neurôniosem mais de 25 espécies de roedo-res, insetívoros e primatas. E, agora,também em humanos � graças auma colaboração bem-sucedida comRoberto Lent e a equipe do Banco

�A ideia de queseríamos especiaisnão se encaixava como que eu aprenderana Biologia�

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de Cérebros da USP e do empenhode Frederico Azevedo, então mes-trando, e de nossa técnica, LudmilaCarvalho.

E assim podemos hoje dizer, pelaprimeira vez, que, com 86 bilhões deneurônios (não 100), e sendo elesmetade das células do cérebro (e nãoum décimo), o cérebro humano éconstruído exatamente da maneiraesperada para um cérebro �genérico�de primata em um corpo de 70 qui-lograma � não maior que o espera-do, nem com mais neurônios que oesperado. O tamanho do corpo é,provavelmente, irrelevante para nos-sas capacidades cognitivas. Pontosfora da curva, aliás, seriam não oshumanos, mas gorilas e orangotan-gos, donos ao que tudo indica de cé-rebros igualmente �normais� deprimata, mas corpos exageradamentegrandes � o que é facilmente expli-cável por seu valor adaptativo.

Ou seja: as regras da evolução doencéfalo de primatas também se apli-cam a nós, como deveriam. Se algo

nos torna especial, é a combinaçãode sermos primatas (e não, por exem-plo, roedores, o que nos permite con-centrar um grande número deneurônios em um volume pequeno)e, dentre os primatas, os felizes por-tadores do maior encéfalo � e, por-tanto, do maior número de neurônios.Bons argumentos para Darwin res-ponder aos seus detratores, 150 anosdepois da publicação de A origem das

espécies: �Sou primata, sim � e commuita honra�.

Felizmente, as plateias atuais, paraminha grata surpresa (que, confesso,inicialmente beirava a decepção), sor-riem e concordam com a cabeçaquando eu os chamo de �apenasprimatas grandes, como Darwin eeu�. O que 150 anos de evolução,história, educação científica e deba-tes não fazem: Darwin foi duramen-te atacado por dizer que somos pa-rentes dos macacos � mas hoje pos-so chamar meu público de primatae ainda receber sua aprovação bem-humorada.

Suzana Herculano-Houzel éneurocientista, pesquisadora do

Instituto de Ciências Biomédicas daUFRJ, autora de cinco livros de

divulgação científica sobre o cérebro,ganhadora do Prêmio Jabuti na

categoria Ciências Naturais (2008) ecolunista do jornal Folha de São

Paulo

Foto: divulgação

Ao longo da última década, agências de fomento einstituições que se dedicam à ciência têm dado es-pecial atenção a pesquisadores que se encontram

em fase intermediária da carreira acadêmica. A razão paraesse esforço é justificada pela difícil travessia dos cientistasaté o reconhecimento profissional � e que estaria na ori-gem de um dos gargalos a ser superados pela ciência bra-sileira. Esse reconhecimento tem sido essencial para ga-rantir o acesso dos cientistas aos recursos disponibilizadospelas instituições e agências governamentais que oferecemapoio financeiro à pesquisa. Sem isso, os obstáculos paralevantar financiamento põem em risco carreiras e talentosdos quais o País tanto necessita.

Um dos 276 contemplados no edital Primeiros Projetos daFAPERJ, em 2004, foi a neurocientista Suzana Herculano-Houzel (que assina o artigo acima), que se tornou rapidamen-te um dos expoentes do universo de pesquisadores brasi-

leiros, que conta com cerca de 200 mil integrantes, entremestres e doutores. Pouco tempo depois de receber apoioda Fundação para dar continuidade a seu projeto de pes-quisa na UFRJ, Suzana elogiou a iniciativa da instituição ementrevista à Rádio Nacional. �Permite que jovens cientistasdesenvolvam seus próprios projetos de pesquisa, encora-jando-os a seguirem a profissão de cientista.�

Nos últimos anos, a Fundação vem intensificando o apoioà nova geração de pesquisadores, a fim de garantir que no-vos talentos para a carreira científica não se percam ao lon-go do caminho. Além de destinar, atualmente, 240 bolsasao programa Jovem Cientista do Nosso Estado, a Fundação lan-çou, em 2008, uma nova iniciativa voltada para esse seg-mento, destinada a apoiar grupos emergentes de pesquisa.Em sua primeira edição, o programa aplicou R$ 20 mi-lhões, contemplando 101 projetos, vinculados a 19 institui-ções de ensino e pesquisa no estado.

Ciência a caminho da maturidade

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Garantir a segurança e um ambiente tranquilodurante a realização de eventos que reúnemuma intensa circulação de pessoas � tais como

shows ao ar livre, festas de réveillon e blocos carnava-lescos � tem sido um desafio para o poder públiconas grandes cidades. Nessas ocasiões, as autoridadessão obrigadas a mobilizar e coordenar diversos agen-tes, como a Polícia Militar, Defesa Civil, Corpo deBombeiros e responsáveis pela engenharia do trânsito(no Rio, a CET-Rio). Cada uma das equipes, no entan-to, possui seu efetivo disperso pelo trajeto e coorde-nado por seus próprios centros de operações, o quedificulta a troca de informações e a tomada de deci-sões. Em busca de uma solução que permita agilizar otrabalho desses agentes e garantir a segurança e o bem-estar do público, a empresa carioca Tecnologia em Sis-temas de Comando e Controle Ltda. (TecC2), emparceria com o Instituto Militar de Engenharia (IME),desenvolveu equipamento que pode facilitar a tarefadas autoridades mobilizadas nessas datas. Trata-se doCentro Integrado de Monitoramento e CoordenaçãoMóvel (CIMov).

O dispositivo consiste em uma central de comandoinstalada em um micro-ônibus, que recebe informa-ções em tempo real por meio de potentes câmeras eantenas. O sistema inclui dois pequenos reboques, cha-mados de Unidades de Vigilância Móveis (UVMs). �Noveículo, há uma central de monitoramento das ima-gens enviadas pelas câmeras. Uma central de coman-do e controle recebe as informações sobre ocorrên-cias e permite que os comandantes dos Bombeiros,PM, Defesa Civil etc. tomem decisões utilizando com-putadores portáteis equipados com um software que pos-sibilita a transmissão das informações de vigilância�,explica o engenheiro de computação Ulf Bergmann,coordenador do projeto, professor do IME e diretorda empresa carioca TecC2. O micro-ônibus, equipa-do com câmeras de vídeo, ainda possui uma potenteantena capaz de receber sinais via rádio.

�As unidades móveis também carregam câmeras, seme-lhantes àquelas que equipam o micro-ônibus, e podem

Umbig brothermóvel para

cuidar da suasegurança

Empresa cria sistemapara dar mais segurançaa eventos ao ar livre

Vinicius Zepeda

TECNOLOGIA

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ser acopladas a qualquer veículo, co-locado em local próximo para apoiaro trabalho da central�, explicaBergmann. �Tanto a central de co-mando como as UVMs não neces-sitam de fios, já que toda a sua co-municação se dá por meio de umarede do tipo MESH, via rádio. Alémdisso, a energia elétrica necessária aofuncionamento dos sistemas dis-ponibilizados nos três veículos se dápor meio de baterias capazes de ali-mentar a central por até cinco diasininterruptamente�, destaca o enge-nheiro. �Já no caso das câmeras devigilância, alcançam um perímetro de300 metros de distância, em alta re-solução, e ainda possuem um zoom

ótico de 35 vezes�, acrescenta.

Produto foi testado comsucesso durante desfiledo Galo da Madrugada

Bergmann acrescenta que a propos-ta de integração das diferentes for-ças de apoio à realização de eventosem uma só central de comandomóvel e com vigilância eletrônica éinédita em todo o mundo. �Já de-positamos um pedido de patente noINPI [Instituto Nacional da Propri-edade Intelectual] e estamos aguar-dando os trâmites legais desse pro-cesso�, conta. No início do ano, oCIMov foi testado com sucesso du-rante o desfile do Galo da Madru-gada, em Recife. Apontado como omaior bloco de rua do mundo, cos-tuma reunir cerca de 1,5 milhão defoliões. Na ocasião, foram utilizadoso CIMov e as duas UVM, dispo-nibilizados ao longo do percurso dobloco, interligados por 10 câmerasde vigilância eletrônica. �O poderpúblico e os órgãos de segurança dolocal ficaram tão satisfeitos com oresultado do teste que iniciaram ne-gociações para contratar nossos ser-viços pelo ano todo. Ele servirá paraoutras grandes festas ao ar livre,como os tradicionais festejos de São

João, na cidade de Caruaru, festasreligiosas e carnaval fora de época�,afirma um entusiasmado Bergmann.

Após os testes realizados no perío-do de carnaval, a empresa buscaagora dar mais visibilidade aoCIMov, com o intuito de alavancara sua comercialização. Em abril, oproduto foi apresentado e expostona Latin America Aero e Defence

(LAAD 2009), considerada a maiorfeira de materiais de defesa e segu-rança da América Latina. O eventoaconteceu no Riocentro, na ZonaOeste do Rio de Janeiro. No mêsseguinte, o sistema foi mostrado paraum público voltado para a área desegurança, durante a ExpoSec2009,na cidade de São Paulo. �Em ambosos eventos, o produto teve excelenteaceitação por parte do público espe-cializado�, assegura Bergmann.

Para o professor do IME e diretorda TecC2, o sistema oferece a pos-sibilidade de reagir com rapidez, to-mando decisões que evitem ou mi-nimizem conflitos em grandes even-tos. Outra vantagem destacada peloengenheiro é a precisão e maior ca-pacidade de visão proporcionada

pelas câmeras de vigilância e o curtoespaço de tempo necessário à insta-lação de todo o aparato tecnológico� inteiramente sem fios. �No casodas centrais de segurança instaladasusualmente nesses acontecimentos,demandam a montagem de umaestrutura física e instalação de fiaçãoelétrica que leva dias. Além disso,durante todo o processo de monta-gem desses equipamentos, ficamossujeitos à ação de vândalos, antesmesmo de o sistema de segurançaestar pronto�, lembra. �Já o nossoaparato, que inclui o CIMov e asduas UVMs, necessita de, no máxi-mo, seis horas para estar pronto, sema necessidade de instalação de fia-ção�, exalta o engenheiro.

No que se refere à precisão e aodetalhamento das imagens transmi-tidas pelas câmeras, Bergmann des-taca que a vigilância de um determi-nado evento pode ser realizada utili-zando ou não a �vigilância eletrôni-ca�. Ele frisa, contudo, que a utiliza-ção do CIMov permite umavisualização mais completa da situa-ção quando comparado ao que oolho e a atenção humana podem

Ulf Bergmann, do IME, e o diretor da FAPERJ, Rex Nazaré: parceria em prol da segurança pública

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proporcionar. �Já no caso da rapi-dez da tomada de decisões, o pro-cesso utilizado atualmente funcionade forma não integrada, com cadaórgão atuando com um conjuntoincompleto de informações. Porexemplo, no caso de uma briga en-volvendo arma de fogo e feridos,os policiais nas proximidades do lo-cal, ao avistarem a confusão, se diri-gem para conter a violência, captu-rar os envolvidos no incidente e afas-tar as pessoas do local. Em seguida,eles comunicam à sua central de co-mando o que aconteceu e que háferidos. Ao escutar o relato, a centralentão solicita o apoio do serviçomédico de urgência e entra em con-tato com o comando da guarda mu-nicipal para liberar o trajeto para quea ambulância possa se deslocar até olocal�, explica. �Ao analisar todo esseprocesso, verificamos uma demorana tomada de decisões para a reso-lução desses conflitos. Já com o usodo CIMov e das duas UVMs, ao in-tegrar fisicamente as forças e ossoftwares de segurança em um mes-

mo espaço físico, o processo é feitode forma bem mais rápida e, cons-equentemente, com mais eficiência.�

Versão portátil dosistema auxiliaráincursões em favelas

O projeto do CIMov inicial, desen-volvido com o apoio da FAPERJ,tem até o final de 2009 para estarconcluído. O engenheiro da compu-tação Ulf Bergmann acredita que an-tes disso ele estará pronto. �Achamosque o maior benefício para a socie-dade é incluir o produto no merca-do e, com isto, ter a oportunidade detestá-lo, aperfeiçoá-lo e provar a suaeficiência. Com a experiência que ti-vemos no Galo da Madrugada, veri-ficamos a necessidade de realizar ain-da um pequeno ajuste, expandindode dois para seis o número deUVMs�, afirma o diretor da TecC2.

O diretor de Tecnologia daFAPERJ, Rex Nazaré, comemora autilização do fomento concedidopara a melhoria da qualidade de vidada população: �É exatamente istoque estamos buscando; que o apoioda Fundação se reverta para obem-estar da sociedade. Emboranem sempre isso ocorra tão rapi-damente, este é mais um dos exem-plos altamente positivos e que, fe-lizmente, vêm se tornando cada vezmais frequentes.�

Além do CIMov, a TecC2 já traba-lha em outro projeto, que tambémconta com o apoio da FAPERJ. Nofinal de 2008, a empresa foi contem-plada no edital Prioridade Rio � Segu-

rança Pública, com um projeto queconsiste em adaptar a tecnologia de-senvolvida no CIMov a um sistemade vigilância eletrônica portátil a serutilizado em incursões policiais pe-las comunidades de baixa renda. Oprojeto ainda está em fase inicial.�Este sistema consistirá em uma pe-quena maleta portátil, equipada comtodos os softwares do CIMov. No casode uma operação policial nesses lo-cais, bastará ao comandante utilizaras informações contidas na pequenamaleta, que substituirá o CIMov so-bre rodas. As imagens dos sistemasde vigilância eletrônica serão geradasa partir das UVMs, que poderão sercolocadas no alto de morros próxi-mos da área onde ocorrerá a incur-são. Nesse novo sistema, além daminiaturização e portabilidade damaleta, teremos dois avanços tecno-lógicos importantes: o alcance dascâmeras será maior � cerca de 1 qui-lômetros � e a visão noturna se darápor meio de infravermelho�, con-clui Ulf Bergmann.

Pesquisador: Ulf BergmannEmpresa: Tecnologia em Sistemas deComando e Controle Ltda. (TecC2)Instituição: Instituto Militar deEngenharia (IME)

Central de Comando do CIMov: perímetrode 300 metros sob vigilância

Fotos: divulgação TecC2

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Baixada Fluminenseterá museu interativo

O município de Duque de Caxias,na Baixada Fluminense, deverá ga-nhar, até o início de 2010, o maiormuseu interativo do Brasil. O anún-cio foi feito no final de março, du-rante solenidade que marcou o iní-cio das obras. Composto por trêsexposições permanentes, um plane-tário com tecnologia 3D, auditóriodestinado a exibições de cinema outeatro, além de exposições tempo-rárias, o Museu Ciência e Vida teráquatro andares. O projeto é o resul-tado de uma parceria da Secretariade C&T, FAPERJ, Centro de Ciên-cias e Educação Superior a Distân-cia do Estado do RJ (Cecierj) eFiocruz.

FAPERJ torna-semembro institucional daAcademia de Ciências

Na solenidade de posse no início demaio, no Hotel Copacabana Palace,de seus 18 novos membros titularese quatro estrangeiros, a AcademiaBrasileira de Ciências (ABC) conce-deu o título de membro institucionalà FAPERJ, que foi recebido por seudiretor-presidente, Ruy Marques. Aassociação prevê a consultoria e rea-lização de atividades científicas de in-teresse comum. �Essa diplomaçãoconsagra uma parceria muito forteentre a ABC e a FAPERJ, que sem-pre esteve presente no cotidiano daacademia�, disse o presidente daABC, Jacob Palis. Na ocasião, o go-vernador Sérgio Cabral também foiagraciado, com o título de membrobenemérito da ABC. Desde 2007, ogoverno do estado tem dispensadoespecial atenção à área de C&T. En-tre as diversas ações em favor da ci-ência fluminense, garantiu o repassede 2% de sua arrecadação tributárialíquida à FAPERJ. Tal medida per-mitiu que as atividades relacionadas

Depois da orla de Copacabana e domorro Santa Marta, que ganharamuma rede de Internet gratuita embanda larga, chegou a vez da Cida-de de Deus, na Zona Oeste, receberidêntico serviço. No mês de maio,os 45 mil moradores da comunida-de passaram a receber sinal deInternet sem fio, por meio deradiotransmissores. O projeto, frutode uma parceria da Secretaria Esta-dual de Ciência e Tecnologia,FAPERJ e Pontifícia UniversidadeCatólica (PUC-Rio), segue os mol-des das iniciativas de popularizaçãodo uso da Internet realizadas emtodo o estado.

Para orientar os moradores, duran-te os primeiros meses de funciona-mento do projeto, instrutores deinformática ocuparão tendas mon-tadas na praça para oferecer cursosde capacitação em informática. Ogovernador Sérgio Cabral, presenteà solenidade de lançamento do pro-jeto, lembrou que os serviços na co-munidade continuarão após os qua-tro meses de instalação das tendasna praça. �Depois desse período, ire-

mos instalar um CVT [Centro de Vo-cação Tecnológica], em que iremoscapacitar jovens e adultos em profis-sões como ladrilheiro, pedreiro, ele-tricista e bombeiro hidráulico. O se-cretário de C&T Alexandre Cardo-so confirmou que o Rio de Janeiropassará a ser o primeiro estado doPaís a oferecer a modalidade Educa-

ção de Jovens e Adultos (EJA) no ensinoprofissionalizante. Ofereceremos aEJA dentro do CVT. Dessa forma,em um ano, jovens e adultos que in-terromperam os estudos poderãoretomá-los e ainda sairão especia-lizados em uma profissão.�

O Cidade de Deus Digital é uma redeinclusiva com três pontos principais:Internet gratuita para a inclusão digi-tal, utilização de serviços pela popu-lação (como consulta de processos,agendamento de perícias no INSS,pesquisas escolares, consultas noDetran, emissão de segunda via decontas, criação de contas de e-mailetc.) e acesso aos microempresáriosdo local para que possam ganharcompetitividade para desenvolvimen-to e oferta de seus produtos.

Cidade de Deus entra na era digital

Sérgio Cabral discursa no lançamento do projeto: inclusão digital avança no estado

Foto: Vinicius Zepeda

FAPERJIANAS

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biotério do Centro de Ciências daSaúde, financiado com recursos daFAPERJ. Em seu discurso, Cardosofrisou que a placa não era destinadaa ele, mas sim às ações da secretariada qual é o titular.

Encontro reúnepesquisadores de Uerj,Uenf e Uezo

A sede da FAPERJ foi palco, na se-gunda quinzena de março, de novoencontro de pesquisadores vincula-dos às universidades estaduais, emcontinuidade à série de reuniões inau-gurada em setembro de 2008. Des-ta vez, foram apresentadas 15 pes-quisas conduzidas na Uerj, Uenf eUezo. O evento permitiu uma mai-or interação entre os pesquisadoresdas três instituições que, além dos re-sultados de suas pesquisas, discuti-ram sobre a necessidade de as uni-versidades investirem na obtenção depatentes com escritórios para trans-missão de conhecimento, visando àobtenção de futuras patentes, aexemplo do que já ocorre naFiocruz e na UFRJ.

ao setor experimentassem um cres-cimento importante. �Isso significouuma mudança importante nadisponibilização de recursos para aFAPERJ. Nós saímos de uma mé-dia de R$ 89 milhões anuais, entre2000 e 2006, para R$ 250 milhõesem 2008�, destacou Cabral.

Alexandre Cardosorecebe homenagens naUerj e na UFRJ

O secretário de Ciência e Tecnologia,Alexandre Cardoso, foi homenage-ado, entre os meses de março e maio,pelas duas maiores instituições de en-sino superior do estado. Em 16 demarço, na Uerj, recebeu a comendada Ordem do Mérito José Bonifácio,concedida a personalidades nacionaise estrangeiras que tenham se desta-cado nas áreas da Educação, Ciên-cia e Cultura. Cardoso aproveitou aocasião para pedir uma união de es-forços das três universidades do es-tado � Uerj, Uenf e Uezo � em de-fesa da aplicação de mais recursos.Em 10 de maio, no anfiteatro doInstituto de Biofísica da UFRJ, foi avez de o secretário de C&T no esta-do receber placa em sua homena-gem durante a inauguração do novo

Solenidade no Palácio Guanabara: governador enaltece iniciativa do acordo das duasinstituições, ao lado de Ruy Marques (centro), da Faperj, e Jorge Guimarães, da Capes

Acordo Capes/FAPERJ:R$ 94 milhões eminvestimentos

Um acordo de R$ 94 milhões foi ce-lebrado em maio, no Salão Nobre doPalácio Guanabara, entre a Coorde-nação de Aperfeiçoamento do Pes-soal de Nível Superior (Capes) e aFAPERJ. As duas instituições fecha-ram um amplo programa de incenti-vo ao pós-doutorado e à fixação dejovens talentos no estado. Com isso,por meio de um edital, serão conce-didas 320 bolsas, no valor de R$ 3,3mil, com vigência de até 5 anos; alémdisso, cada um dos contemplados re-ceberá uma taxa de bancada no va-lor de R$ 1 mil mensais. O acordotambém prevê o lançamento de umedital visando ao apoio financeiropara aquisição de equipamentos soli-citados por coordenadores de Pro-gramas de Pós-graduação stricto sensu

de excelência do estado (com con-ceitos Capes 5, 6 e 7), em que tenhamsido contemplados bolsistas de pós-doutorado, em associação com ou-tros programas, ainda em consolida-ção (conceitos 3 e 4).

Alexandre Cardoso: atuação elogiada à frente da secretaria de C&T

Foto: Vinicius Zepeda

Foto: Carlos Magno

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O ano de 2009 será lembra-do no setor responsávelpelo Auxílio à Editoração

(APQ 3) da FAPERJ pela chegada àmarca de 500 títulos editados como apoio da instituição. Com essamodalidade de fomento à pesquisa,a Fundação visa possibilitar a difu-são e popularização da ciência e

Acervo chega à marca de 500 títulos

Desigualdades raciais esegregação urbana em antigascapitaisSalvador, Cidade d�Oxum e Rio deJaneiro, Cidade de Ogum

Neste livro chamam a atenção três ideiasembasadoras: o desenvolvimento das cida-des, antigas capitais que se tornaram me-

trópoles; a categorização racial como princípio hierarquizadordos indivíduos como questão específica, sem esgotar-se naexploração de classes, e, dentro disso, o reconhecimento doracismo sem racistas. Ainda, a visão de que a segregação ur-bana e racial no Brasil é significativa, mas não é autoevidente.

Autor: Antonia dos Santos Garcia

Editora: Garamond Universitária

Número de páginas: 544

Cientistas & jovens cientistasdo nosso estadoPublicação que divulga os resumos dosmuitos projetos que serão desenvolvidoscom o apoio da FAPERJ. Os dois progra-mas contemplam pesquisadores de todasas áreas do conhecimento, filiados à maioriadas instituições de ensino e pesquisa do es-

tado do Rio de Janeiro.

Organização: FAPERJ

Número de páginas: 447

Violência na História

O objetivo deste livro é abordar a violênciaem suas manifestações mais diferenciadas,buscando compreender a sua incidência eseus efeitos nas distintas formações sociais.Para tanto, foi organizado em cinco eixostemáticos: Violência e Política; MovimentosSociais; Violência e Direito; Violência e Reli-

giosidade; e Violência e Cultura.

Organizadores: Regina Maria da Cunha Bustamante e José Francisco

de Moura

Editora: Mauad X

Número de páginas: 295

EDITORAÇÃO

tecnologia fluminenses, oferecendoaos pesquisadores a oportunidade deque o resultado do seu trabalho pos-sa chegar à população, por meio daedição de livros, manuais, númerosespeciais (temáticos) de revistas e co-letâneas científicas em qualquer tipode suporte � papel, eletrônicos,vídeos, CDs e DVDs. O período de

inscrições no programa encontra-seaberto desde o início de março e en-cerra-se no dia 31 de julho. A contra-tação das propostas selecionadas estáprevista para novembro e dezembro.A lista completa de títulos contempla-dos está disponível no endereço ele-trônico da Fundação. Confira, abaixo,alguns lançamentos de 2009:

A Cadeira nº 39

Este livro narra, com precisão histórica, umséculo da cirurgia brasileira e da AcademiaNacional de Medicina. Livro de leitura agra-dável e narrativa que prende o leitor, consti-tui-se em uma peça de valor na história daMedicina e para a secular Academia.

Autor: Augusto Paulino Netto

Editora: Rubio

Número de páginas: 218

América Latina 2020Cenários, alternativas eestratégias

O presente livro é resultado do III Encon-tro de Estudos Prospectivos da Unesco,realizado no Rio de Janeiro, em setembrode 1999. O objetivo deste livro éproporcionar recomendações viáveis e con-

cretas aos desafios do futuro.

Nos debates, estiveram presentes os fundadores do novopensamento latino-americano, desde os da Cepal, como Cel-so Furtado, até outros pioneiros como Aldo Ferrer, além derenomados criadores da Teoria da Dependência, comoTheotonio dos Santos.

Coordenadores: Francisco López Segrera e Daniel Filmus

Editora: Viramundo

Número de páginas: 677

Arouca, meu irmãoUma trajetória a favor da saúdecoletiva

Esta publicação apresenta um mosaico deleituras plurais sobre o percurso de um in-divíduo que mobilizou e foi mobilizadopor diferentes pessoas em conjunturas pre-

cisas da vida social e política brasileira.

Coordenação: Guilherme Franco Netto e Regina Abreu

Editora: Contra Capa

Número de páginas: 265