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DIÁLOGOS SOBRE EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE: DESAFIOS PARA O CURRÍCULO E PRÁTICA PEDAGÓGICA As pesquisas que compõem o presente painel enfocam os desafios epistemológicos e práticos para educar na perspectiva da diversidade por meio da implementação de políticas públicas para a educação do campo e relações étnico-raciais. Analisa os limites e as possibilidades de educar no sentido de visibilizar a pluralidade multiétnica e as diferenças presentes no ambiente escolar e as tensões provocadas pelas mudanças trazidas ao currículo e ao fazer pedagógico. As pesquisas foram realizadas em escolas públicas do estado de Mato Grosso do Sul e tiveram como participantes docentes do Ensino Fundamental. Optou-se pela abordagem qualitativa, análise documental, revisão bibliográfica, questionários e entrevistas. As políticas públicas para a educação do campo e a Lei 10.636/2003 surgiram das reivindicações dos movimentos sociais dos povos do campo e dos movimentos sociais negros no Brasil. Os dados mostraram que a implementação dessas normatizações ainda é incipiente no contexto escolar, além da ausência de ações efetivas para a formação continuada para os professores, que atuam nas escolas pesquisadas. Os dados mostraram que mesmo existindo políticas públicas para a educação do campo, as mesmas ainda são pouco conhecidas pelo corpo docente que atuam na escola pesquisada. Como resultante das reflexões sobre a Lei 10.636/2003 podemos afirmar que tem contribuído para a visibilização da cultura dos povos africanos e afro-brasileiros e, ambivalentemente, observamos que há uma tensão inerente às práticas pedagógicas como também muitos desafios epistemológicos para a consolidação da educação das relações étnico-raciais. Os resultados apontaram as dificuldades que as escolas e docentes possuem para atender esse preceito normativo e a identificação do preconceito e da discriminação racial no cotidiano escolar. Palavras-chave: Educação do Campo. Formação Docente. Relações Étnico-Raciais. XVIII ENDIPE Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira 10655 ISSN 2177-336X

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DIÁLOGOS SOBRE EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE: DESAFIOS PARA O

CURRÍCULO E PRÁTICA PEDAGÓGICA

As pesquisas que compõem o presente painel enfocam os desafios epistemológicos e

práticos para educar na perspectiva da diversidade por meio da implementação de

políticas públicas para a educação do campo e relações étnico-raciais. Analisa os limites

e as possibilidades de educar no sentido de visibilizar a pluralidade multiétnica e as

diferenças presentes no ambiente escolar e as tensões provocadas pelas mudanças

trazidas ao currículo e ao fazer pedagógico. As pesquisas foram realizadas em escolas

públicas do estado de Mato Grosso do Sul e tiveram como participantes docentes do

Ensino Fundamental. Optou-se pela abordagem qualitativa, análise documental, revisão

bibliográfica, questionários e entrevistas. As políticas públicas para a educação do

campo e a Lei 10.636/2003 surgiram das reivindicações dos movimentos sociais dos

povos do campo e dos movimentos sociais negros no Brasil. Os dados mostraram que a

implementação dessas normatizações ainda é incipiente no contexto escolar, além da

ausência de ações efetivas para a formação continuada para os professores, que atuam

nas escolas pesquisadas. Os dados mostraram que mesmo existindo políticas públicas

para a educação do campo, as mesmas ainda são pouco conhecidas pelo corpo docente

que atuam na escola pesquisada. Como resultante das reflexões sobre a Lei 10.636/2003

podemos afirmar que tem contribuído para a visibilização da cultura dos povos

africanos e afro-brasileiros e, ambivalentemente, observamos que há uma tensão

inerente às práticas pedagógicas como também muitos desafios epistemológicos para a

consolidação da educação das relações étnico-raciais. Os resultados apontaram as

dificuldades que as escolas e docentes possuem para atender esse preceito normativo e a

identificação do preconceito e da discriminação racial no cotidiano escolar.

Palavras-chave: Educação do Campo. Formação Docente. Relações Étnico-Raciais.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10655ISSN 2177-336X

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A DOCÊNCIA E A LEI 10.639/03: A DESCOLONIZAÇÃO CURRICULAR A

PARTIR DA PRÁTICA

Wilker Solidade da Silva

Universidade Federal da Grande Dourados

Maria Edinalva do Nascimento

Universidade Católica Dom Bosco

Resumo: O artigo expõe os resultados de pesquisa desenvolvida com algumas escolas

públicas estaduais do estado de Mato Grosso do Sul, versando sobre os desafios

epistemológicos e práticos para o combate às formas de preconceito racial presente no

ambiente escolar. Evidenciando os reflexos da intervenção legal para com as demandas

sociais, a pesquisa originária tem por objetivo principal identificar e debater as formas

de interpretação da implementação da Lei 10.639/2003 no currículo escolar sul-mato-

grossense e se utiliza como método para análise, o uso de questionários estruturados

sobre a temática aplicados à profissionais da educação, bem como a realização de

entrevista com alguns destes. Para interpretação das informações angariados a partir

disso, dialogamos com a definição de racismo e identidade étnica de D’Adesky (2009),

identidade e espaço escolar de Marques (2004) e Gomes (2008) e pensando no papel do

currículo, a interpretação de “Colonialidade” no viés decolonial de Quijano (2005) e

Walsh (2009). Os resultados apontaram as dificuldades que as escolas e docentes

possuem para atender esse preceito normativo e a identificação do preconceito e da

discriminação racial no cotidiano escolar. Demonstram ainda que não há uniformidade

no processo de implementação da referida Lei nos sistemas de ensino e nas escolas

públicas participantes, retratando um contexto ainda marcado por tensões, avanços e

limites que requer “paradigmas outros” para se pensar a diferença étnico-racial, e que

permita ao aluno uma compreensão de si como parte de uma sociedade plural, na qual a

diferença não deva apartar, e sim integrar indivíduos e saberes em prol ao

enriquecimento intelectual.

Palavras-chave: Currículo. Lei 10.639/03. Educação decolonial.

Introdução

Os últimos quinze anos marcam a concretização de arcabouços jurídicos que

podem ser considerados derivadas de uma política educacional voltada para a afirmação

da diversidade cultural e da materialização de uma Educação das Relações Étnico-

Raciais nas escolas brasileiras. A implementação da Lei 10.639/2003 que alterou os

artigos 26-A e 79-B da Lei 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

- LDB), a Resolução CNE/CP 01/2004 que define Diretrizes Curriculares Nacionais

para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura

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Afro-Brasileira e Africana, e o Parecer CNE/CP 03/2004, justificam todo o processo de

de lutas para a implementação das políticas de ações afirmativas na educação brasileira

nos seus diferentes níveis, etapas e modalidades educacionais. Estas conquistas são a

concretização de antigos anseios do Movimento Negro, bem como dos intelectuais,

educadores e diferentes organismos da sociedade civil que historicamente reivindicam

educação democrática, antirracista e a formulação de políticas públicas de promoção da

igualdade racial.

Partindo dessa premissa, e como parte das pesquisas desenvolvidas pelo Grupo

de Estudos e Pesquisas sobre Educação, Relações étnico-raciais e Formação de

professores (GEPRAFE/UFGD), a investigação a que este trabalho se insere tem por

objetivo principal identificar e debater as formas de interpretação da implementação da

Lei 10.639/2003 no currículo escolar sul-mato-grossense, em diálogo com as

percepções dos docentes envolvidos para com as formas de preconceito racial existente

no ambiente escolar. Para expor os passos da pesquisa e os resultados dela obtidos, o

texto está estruturado em dois momentos. Na primeira parte discorremos sobre a relação

entre a efetivação de uma legislação educacional envolvendo a temática étnico-racial e a

identidade social a ela relacionada e, em seguida, ponderamos sobre a realidade

observada nas escolas estaduais públicas do estado de Mato Grosso do Sul a partir de

análises pontuais no que se refere a legislação educacional.

Currículo e legislação escolar

A escola pela sua própria estrutura social reflete a organização da sociedade

pertencente, sendo ela permeada pela complexidade das relações entre os diferentes

sujeitos e grupos sociais. Este ambiente é um espaço onde os conflitos e as contradições

ocorrem frequentemente, resultado das diferentes inter-relações dos sujeitos que ali

transitam e se fazendo sentir as práticas das desigualdades sociais, econômicas, culturais

e raciais.

Almejando criar um espaço “comum” a todos, intervenções legislativas são

criadas e aplicadas de forma verticalizada sobre o seu cotidiano. Para Gomes (2008,

p.71) mais do que documentos oficiais, essas intervenções representadas pelas leis, os

planos, as diretrizes e as resoluções expressam não só resultados dos debates nacionais

em torno da questão educacional, mas os principais rumos, concepções ideológicas,

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tensões, divergências e acordos políticos que visam orientar a elaboração e

implementação das políticas públicas no país. Desse modo, e por compreendermos a

própria Lei 10.639/03 como uma resultante de ações político-sociais, propomos uma

reflexão sobre a interpretação da essência dessa lei no âmbito curricular.

A Lei 10.639/03, bem como outras com teor similar, aponta para a ampliação da

responsabilidade do Estado diante da complexidade e das múltiplas dimensões e tensões

em torno da questão racial, étnica e social. Sua aplicabilidade resultou do desenvolver

de planos de ação do Ministério da Educação, as secretarias de educação e as escolas na

efetivação de políticas e práticas que garantam o trato com as temáticas relacionadas à

saúde, trabalho, meio ambiente, terra, juventude, gênero, raça e etnia. A aplicabilidade

de sua tomada é justamente a atualização do currículo escolar para com a diversidade

cultural da nação brasileira, partindo da valorização da cultura africana e afro-brasileira,

bem como do reconhecimento de uma identidade multicultural de sua constituição

social.

Identificar quais grupos sociais são priorizados nos currículos e quais são

estereotipados é de suma importância para que se possa trabalhar a diversidade de forma

positiva e, consequentemente, superar concepções românticas acerca da diversidade,

que ainda residem nas atividades curriculares e metodológicas.

É passível de se esperar que o Estado desenvolva práticas e ações direcionadas

para a concretização e concatenação dos preceitos estipulados na Lei, em consonância

com as mudanças na estrutura curricular escolar. No caso específico das secretarias

estaduais e municipais de educação, através de revisão bibliográfica das produções da

área, mensuramos que várias delas pelo país têm explorado ações de formação voltadas

para a temática étnico-racial, tais como: cursos; seminários; organização de

coordenações ou equipes pedagógicas específicas para cuidar do processo de

implementação da Lei; elaboração junto aos Conselhos Estaduais e Municipais de

Educação de diretrizes curriculares estaduais e municipais para implementação da Lei

10.639/03, mas sempre através de ações isoladas (GOMES, 2008 p.13) em meio as

práticas cotidianas.

Para conhecermos como a legislação está sendo aplicada no estado de Mato

Grosso do Sul e quais os percalços que ainda embatem sobre sua execução, seguimos ao

próximo tópico com as fases da pesquisa envolvendo as escolas públicas estaduais.

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Momentos da pesquisa

Com o intuito de obter um panorama sobre como os docentes recepcionam a Lei

10.639/03 e a aplicam em sua prática, a estrutura da pesquisa se dividiu em duas etapas.

Inicialmente formulamos um questionário semiestruturado que possibilitasse colher

informações sobre o envolvimento da escola e seus atores nas temáticas étnico-raciais.

O texto aqui impresso é uma reflexão de parte das questões que compunham os

formulários respondidos pelas escolas, e que permitiram manter uma interlocução com

as diretrizes orientadas pela legislação de referência para as questões raciais e étnicas no

ambiente escolar.

Em posse dos dados, organizamos mapas discursivos que expressam o grau de

relação do trabalho com as questões étnico-raciais nas instituições participantes, o qual

assinala a implementação ou não da Lei 10.639/2003 no seu cenário. Utilizando a rede

mundial de computadores para envio dos questionários e preenchimento dos mesmo,

contamos com a participação de 47 diretoras/es, 80 coordenadoras/es pedagógicas/os e

437 professoras/es, totalizando 564 sujeitos distribuídas por 179 escolas públicas

estaduais sul-mato-grossense.

Como prévia, o trabalho revelou detalhes importantes para a reflexão sobre as

práticas, espaços, avanços e limites na implementação da obrigatoriedade do ensino de

História e Cultura Afro-Brasileira e Africana nas instituições pesquisadas. Elencaremos

algumas reflexões oriundas deste contato com as escolas, mas antes é necessário

pautarmos que, para cada um dos apontamentos citados, existem características que só

poderiam ser melhor esmiuçadas se trabalhadas individualmente, pretensão para

trabalhos futuros, e que no texto aqui expresso trabalharemos apenas uma parcela do

contexto que envolve a temática nestes espaços.

Apontamentos norteadores

Com os dados, identificamos um valor significativo de profissionais da educação

do estado de Mato Grosso do Sul que conhecem a Lei 10.639/03, as Diretrizes

curriculares e o Parecer 003/2004, bem como a temática relacionada as questões étnico-

raciais no ambiente escolar. Ao todo soma-se 59% dos participantes. Cabe salientar que

os profissionais que serviram de amostragem para a pesquisa são profissionais da

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educação básica do ensino público estadual, e que possuem nível superior, licenciados e

habilitados para o trabalho docente. Com ciência disso, levantamos um questionamento

a mais: será que existe uma falta de interesse pessoal para com a temática, ou são

apenas reflexos do sistema de educação os 33% que afirmaram desconhecer a

legislação?

Entendemos que esse desconhecimento das questões étnico-raciais nas escolas

não se restringe apenas a epistemologia do racismo, discriminação ou formas de

preconceito. Este desconhecimento é diretamente proporcional ao modo como os

educadores lidam com questões mais gerais de ordem política e pedagógica,

simbolizando o próprio descompromisso com o público, o que é resultante muitas vezes

do ainda persistente desestímulo à carreira e à condição do docente.

Nessa mesma ordem, 64,1% dos participantes afirmam já ter presenciado

alguma situação que envolvesse preconceito ou discriminação racial no ambiente

escolar. Identificamos a partir deste dado e diálogo com as outras questões levantadas

uma possibilidade de interpretação. Tal possibilidade diz respeito à definição de

“preconceito e discriminação racial” exposto no questionário, pois levantamos a

hipótese de que é possível que os sujeitos não tenham refletido sobre o real significado

de discriminação racial, ou se o tenha, não consiga estabelecer um limiar entre a

discriminação e suas diversas formas de representação, como moral, social, religiosa, de

gênero e racial. Podemos refletir aqui sobre o que se considera no espaço de convívio

social, profissional ou familiar, atitudes preconceituosas. Isso dito porquê, quando

refizemos a pergunta dentro do mesmo questionário, obtivemos que 66% afirmaram não

haver situações de discriminação racial na escola, seja para com alunos, professores ou

demais funcionários. Como isso é possível, se 64,1% destes mesmos sujeitos

responderam já ter presenciado atitudes preconceituosas no ambiente escolar?

Esse fato demostra que os conhecimentos dos próprios docentes sobre as

relações étnico-raciais ou até mesmo sobre a definição de racismo ou preconceito racial

são superficiais ou inexistentes, cheios de estereótipos e por vezes confusos. Não

porquê os olhos estão cerrados propositalmente para isso, mas porque a formação que o

docente obtém não é desvinculada de seu convívio social extra sala, tampouco permite

retirar os conceitos que este internalizou durante toda sua vida, cabendo a formação

docente a parcela de responsabilidade que se refere a conscientização e, acima de tudo,

o esclarecimento definido dos conceitos que envolve a heterogeneidade social humana.

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Se o professor partilhar do conhecimento sobre essas definições e sobre a

ideologia que elas acarretam, perceberá a complexidade do tema, contribuindo para o

desencadeamento do processo de afirmação de identidades e da cidadania da parcela de

51% da população brasileira, e não mais contribuirá para um engessamento de ideias

preconceituosas.

Essa identidade citada está, para Jacques D’Adesky (2001), ligada ao sentimento

de pertencimento do indivíduo para com o espaço e que, por sua vez, é um fator de uma

identidade coletiva deste próprio indivíduo. A identidade coletiva é perceber o “mesmo”

nos “outros”. Neste sentido, “o grupo torna-se uma coletividade cuja estruturação e

unificação permitem um acesso a um nível mais seguro de existência. De agregado, o

grupo passa a um estado mais consciente de si próprio” (D’ADESKY, 2001 p.41),

proporcionando o pertencimento do indivíduo a ele e por consequência, a sua não

exclusão. A escola é o ambiente propício para isso.

Isso porque ela é interpretada como um “espaço sociocultural”

(DAYREL,1996), marcada pelo tempo, espaço e cultura em que se insere, refletindo

padrões de comportamento, conflitos e contradições que permeiam a sociedade. E

exatamente por isso também é potencialmente um espaço para sua reinvenção e

reinterpretação.

Ainda dos questionários obteve-se que 92% dos professores afirmam considerar

a questão étnico-racial necessária para o currículo escolar, incluindo o marco de 20 de

novembro como dia da Consciência Negra. Entretanto, apenas 68% informaram

trabalhar tal temática em suas disciplinas. O livro didático é apontado como um dos

principais responsáveis por esse número por desempenhar um papel importante para a

efetivação do preconizado pela lei, ao apresentar a temática em seu conteúdo base.

Contudo, esse mecanismo é suficiente para se ter uma educação voltada para as relações

étnico-raciais de qualidade? Não podemos aferir isto por esta pesquisa, mas lembramos

que ele também pode se traduzir como um mecanismo limitador para o trabalho docente

por trazer o conteúdo em moldes a ser seguido, e ligando este fato a característica

mencionada sobre o desinteresse profissional, expõe-se um outro problema: o manuseio

do livro didático.

Se 92% afirmam ser a temática importante para o currículo e apenas 68% a

utilizam em suas aulas, é possível que os limites estabelecidos pelo zelo conteudista da

atividade docente, ou até mesmo a falta de diálogo entre a disciplina, o conteúdo e o

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espaço social de sua função, tenham engessado qualquer possibilidade de discussão.

Essa falta de diálogo reflete como um aspecto legitimador de uma monocultura que

valoriza as mesmas caricaturas condicionantes da educação europeizada, convergindo

assim na percepção negativa das possibilidades intelectuais dos não brancos, herança do

currículo perpetuado pelo colonialismo.

Vale lembrar que o colonialismo na América Latina foi uma relação política e

econômica na qual a soberania de uma nação subjugava outra (QUIJANO 2007)

forjando em seu bojo a colonialidade que atuava sobre várias dimensões do colonizado.

Essa colonialidade seguiu na estrutura social mesmo após o término do colonialismo e,

como resquício, se instaurou nos currículos escolares. Autores como Quijano (2005),

Mignolo (2005) e Walsh (2007) apresentam essa colonialidade intrínseca a partir de

quatro eixos: colonialidade do poder, do saber, do ser e da mãe-natureza. Estes eixos

possuem sentidos sociais, culturais, epistêmicos, existenciais e políticos, e para Walsh

(2007), atuam de maneira a afirmar a hegemonia epistêmica europeia, ao passo que

silencia, nega e rejeita outras formas de racionalidade e história.

Essa colonialidade do currículo conserva a ideia de inexistência do racismo no

seu ambiente de trabalho, resultando no que pode ser entendido como violências

simbólicas transcritas em suas práticas, e que tem como efeito a permanência de

posicionamentos que propiciam a discriminação e subalternização de povos diversos.

A descolonização do currículo só é possível a partir de um olhar crítico para a

história e a formação social da nação brasileira. O trabalho desenvolvido pelas

secretarias de Educação no que tange ao evidenciamento das relações étnico-raciais,

somados à gestão da escola viabilizam os processos de formação de indivíduos aptos

para essa ação. No estímulo e na construção de condições de processos de formação

continuada, que se refletem na prática docente, o debate sobre o modelo engessado do

currículo se torna ferramenta para a construção de práticas pedagógicas condizentes

com a Lei 10.639/2003 e suas Diretrizes.

Essa participação estatal para o cumprimento da Lei se faz positiva quando

supomos que problemática do racismo e do preconceito em sala, e do não envolvimento

docente por meio de sua disciplina seja resultante de uma formação defasada dos

professores, ou até mesmo da formação indiferente a tal perspectiva por ter se efetivado

antes dos anos 2003, ano de promulgação da Lei que altera o currículo.

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Contudo, a investigação indicou que 83% dos profissionais em educação não

participaram de formação continuada relacionada a temática étnico-racial. Deficiência

do poder público, da escola em não manter os professores conectados com essas

formações ou desinteresse dos mesmos quando este foi oferecido? Não conseguimos

definir isso neste ensaio.

O que podemos aferir é que um número muito pequeno de profissionais realiza

tais cursos, e isso não somente nas escolas do estado de Mato Grosso do Sul, pois

conforme autores da área existem ainda hoje uma cultura de atitudes celulares, no qual o

professor ou escola que se interessa pela discussão étnico-racial é que buscam

capacitação, individual ou coletiva, corroborando com outros fatores que contribuem

para o atraso e enfraquecimento do trabalho com a diversidade na escola.

Ana Lúcia Valente (2005), enfatiza que para enfrentar estes desafios se faz

necessário a superação da dicotomia entre uma suposta questão social desvencilhada da

questão racial no país, pois em sua opinião a questão social brasileira só pode ser

compreendida a luz do contexto racial, pois se trata de articular valores universais com

as especificidades étnico-culturais (VALENTE, 2005, p.48). Como uma crítica as

formações continuadas neste contexto, a autora defende que a formação docente para o

enfrentamento da questão racial na educação não se resolve com capacitações de “final

de semana”, pois esta precisa repensar as políticas sobre a “capilaridade” nas relações

pedagógicas e uma mudança de olhar sobre o racismo nos espaços escolares. É

necessário então pensar essa formação no contexto da problemática da formação em

geral, superar o dualismo entre prática e teoria e politizar o debate, já que tal questão

envolve relações de poder e conflitos históricos nas relações sociais brasileiras.

Traduzimos a partir desse discurso que tais análises para a escola, a prática

pedagógica e sua relação com a temática racial, se transformam numa perspectiva de

dúvida e incapacidade teórica/prática de enfrentar os conflitos iminentes nas discussões

étnico-raciais e educação, sendo importante a partir daí salientar a necessidade de uma

proposta pedagógica e didática que entoe um debate permanente entre os docentes,

gestores e sociedade, num viés educativo conflitual, bem como numa formulação de

políticas educacionais de formação inicial e continuada que possam dar vazão a

interpretação da história com uma abordagem de construção de saberes, e não de

reprodução.

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Dos entrevistados, 78% dos respondentes afirmaram que a escola trata

adequadamente as questões étnico-raciais, dispondo de biblioteca e matérias didático-

pedagógicos para trabalharem o preconizado pela legislação. Informação essa

confrontada com os 22% que definiram não ser real esse apoio da escola e não existir

cobertura física e didático-pedagógica para esta discussão. Como é possível que o

professor consiga ter a execução desse papel se a escola não oferece uma base sólida

para tanto? 78% é um valor importante, principalmente se pensarmos nos 68% que

afirmaram trabalhar a temática em suas disciplinas. Contudo, onde estão os 10% de

diferença entre os que desempenham sua função para com a relações étnico-raciais e os

que têm a possibilidade e não a executa?

Este questionar expõe outra deficiência que a legislação em si não consegue

sanar: a da sua efetivação frente à vontade individual. É real no Brasil a ineficácia de

leis que existem no papel, mas não se executam no país. Na educação não é diferente,

isso por dependerem da aplicabilidade viabilizada pelo gestor responsável pela

instituição, este que pode obedecer a interesses pessoais, políticos ou da própria

instituição, que por vezes pode não contemplar temas tópicos, como as relações raciais

ou de gênero.

A escola sozinha não faz a diferença, até mesmo porque esta é subordinada a

uma extensa relação organizacional, mas é passível dizer que aliadas a elaboração de

políticas públicas eficazes, faz-se necessário que as escolas, os seus profissionais

promovam um amplo movimento, tendo como horizonte a discussão e

redimensionamento dos currículos, dos materiais pedagógicos com relação às etnias, a

comunidade negra, incluindo ainda nas manifestações escolares, nas discussões as

diversidades culturais e, principalmente, as questões referentes aos mesmos deveres e

direitos garantidos pela Constituição Federal de 1988.

Como síntese, elucidamos agora alguns apontamentos conclusivos sobre as

questões que elencamos: ainda é muito superficial o conhecimento teórico e prático das

dinâmicas estabelecidas pela construção de uma legislação, representada pela Lei

10.639/03 nas escolas públicas estaduais sul-mato-grossenses. Os professores conhecem

a Lei (59%), seja por contato direto ou indireto, mas isso não significa que os mesmo a

compreendem.

No que se refere as relações do profissional entrevistado com o preconizado pela

legislação no exercício de sua função, seu interesse pelas abordagens que ela sugere e

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10664ISSN 2177-336X

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sua opinião sobre a temática defendida em pauta, aferimos que muitos educadores estão

trabalhando a questão étnico-racial em sala de aula, mas nos colocamos a pensar sobre

como isto está sendo feito. Alarmante foi a quantidade de professores que disseram não

desejarem realizar formação continuada no viés das relações étnico-raciais, pois isso

expõe uma posição conservadora para com as atitudes de preconceitos. Conservadora no

sentido de que, desejar permanecer no mesmo paradigma pode contribuir para que a

quebra deste seja impossibilitada, ou até mesmo, realizada de forma deturpada. Isso no

entendimento de que o espaço escolar é um lugar em que vários atores se posicionam, e

esse posicionamento reflete na formação social de indivíduos. Estes indivíduos, que de

forma receptiva se embebedam das opiniões por eles recebidas, transmitem e

consolidam tais opiniões.

Podemos observar, de maneira geral, que a maioria dos entrevistados não dão

conta da complexidade posta pela diferença étnico-racial e esporadicamente contempla

a diversidade étnico-racial no seu trabalho docente. Os resultados apontam para os

desafios epistemológicos e práticos posto a formação docente, pois essas legislações

requerem paradigmas outros para se pensar a diferença étnica, ou continuará reforçando

os processos coloniais e relações de poder e saber vigentes na prática docente.

Existe, no entanto, um empecilho a ser enfrentado ao se pensar no currículo, a

questão da diversidade cultural: fazer com que não se torne uma ameaça à preservação

da própria identidade seja da cultura europeia/colonizadora ou dos povos colonizados,

neste caso, indígenas e africanos. Logo, a hibridização de saberes das diversas culturas

deve levar em consideração os aspectos culturais, sociais e econômicas de cada

sociedade.

Dessa forma, se um professor não deseja realizar um curso de formação na

temática da Lei 10.639/03, só pode significar que ele não identifica a presença da

diferença étnico-racial, tampouco a necessidade de repensar sobre as características

dessa diferença na formação social. E como consequência de sua ação, pode contribuir

para a construção de outros indivíduos que irão carregar essa mesma posição, tornando

assim mais difícil a luta pela igualdade e equidade étnico-racial e a educação

democrática e antirracista.

Por fim, é papel da gestão escolar o trato com a exigência legislativa, pois se

entendemos a escola enquanto facilitadora/agilizadora da ação docente, ela pode

também se traduzir como uma barreira para o bom desempenho dessa ação, pois quando

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ela não disponibiliza ferramentas necessárias para o desenvolver de sua função básica,

ela está impondo limites para a potencialidade, não do professor, mas também do aluno,

que não irá render em toda sua potencialidade devido à ausência de elo entre o mundo

do conhecimento científico de qualidade e o seu.

Especificamente no caso da gestão, é importante ressaltar que a implementação

da Lei 10.639/2003 nas escolas públicas relaciona-se à democratização da gestão

escolar, ou seja, da instituição de canais democráticos que garantam a efetiva

participação, de aprendizado do jogo democrático e do repensar das estruturas de poder

autoritário, que permeiam as relações sociais e as práticas educativas (DOURADO,

2003).

Considerações

A democratização da gestão escolar, se efetivada de forma integral, permite que

a escola se faça uma extensão da sociedade que permita se moldar às necessidades da

própria sociedade, não ao modelo desejado a ela. Gestores, professores, pais e alunos

necessitam caminhar neste rumo, e o ensino sul-mato-grossense ainda precisa de alguns

ajustes para se fixar neste trilho.

Expomos neste ensaio uma pequena parcela da pesquisa que o Grupo

GEPRAFE/UFGD desenvolve com as escolas estaduais do estado de Mato Grosso do

Sul. Este recorte já nos revelou o grande desafio que ainda espreita o ensino no que se

refere a obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. De

forma geral, é possível dizer que mesmo as mudanças almejadas para as práticas

docentes, o currículo e o cenário escolar ainda não se aproxima do esperado pela

promulgação da Lei, muita coisa mudou desde então. Há um movimento crescente no

espaço acadêmico e, consequentemente, da educação básica que propicia mudanças

vindouras, e respaldados nessa perspectiva é que continuamos nossa investigação a fim

de indicar pontos a serem trabalhados com mais detalhamento para que potencialize o

preconizado pelas Leis 10.639/03 e 11.645/08.

Os resultados apontaram as dificuldades que as escolas e docentes possuem para

atender esse preceito normativo e a identificação do preconceito e da discriminação

racial no cotidiano escolar. Demonstram ainda que não há uniformidade no processo de

implementação da referida Lei nos sistemas de ensino e nas escolas públicas

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participantes, retratando um contexto ainda marcado por tensões, avanços e limites que

requer “paradigmas outros” para se pensar a diferença étnico-racial, e que permita ao

aluno uma compreensão de si como parte de uma sociedade plural, na qual a diferença

não deva apartar, e sim integrar indivíduos e saberes em prol ao enriquecimento

intelectual

Referências

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EDUCAÇÃO DO CAMPO: POLÍTICAS PÚBLICAS E FORMAÇÃO DOCENTE

Gisele Morilha Alves

Universidade Católica Dom Bosco

Hildete Pereira da Silva Bolson

Universidade Católica Dom Bosco

das Políticas Públicas para a Educação do Campo e de autores/as e

pesquisadores/as que produzem sobre a Educação do Campo.

Posteriormente, pesquisamos sobre a formação docente tanto nas políticas

públicas quanto nos autores/as e pesquisadores/as que defendem uma formação crítica e

emancipatória.

Num terceiro momento, aplicamos os questionários, no qual optamos por

perguntas abertas relacionadas às políticas públicas para a educação do campo e sobre a

formação docente, pessoalmente, em data, horário e local pré-agendados, por telefone,

com as três professoras que aceitaram participar da pesquisa. As três professoras

receberam neste artigo nomes fictícios, atuam nos anos iniciais do Ensino Fundamental,

em uma escola municipal de Campo Grande, situada na zona rural do estado de Mato

Grosso do Sul. Os encontros aconteceram em dezembro de 2015 e em janeiro de 2016.

Políticas públicas para a educação do campo

Segundo aponta Molina (2012, p. 585):

Na história da EDUCAÇÃO DO CAMPO, o debate e a compreensão

sobre o tema das políticas públicas torna-se relevante porque, desde o

seu surgimento, a Educação do Campo se configura como demanda

relativa à garantia do direito à educação para os trabalhadores rurais:

inicialmente com a luta dos Sem Terra para garantir o direito à

educação nas áreas de Reforma Agrária, com as exigências para a

criação do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária

(PRONERA), e, na sequência, com a ampliação das lutas pela garantia

do direito à educação para todos os povos do campo, organizadas e

desencadeadas coletivamente a partir da I Conferência Nacional de

Educação Básica do Campo, em 1998. (Destaque da autora).

As políticas públicas para a educação do campo surgem em oposição à classe

latifundiária, em oposição à educação rural que buscava subalternizar e explorar os

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povos do campo. Assim, os povos do campo, organizaram duas conferências nacionais

por uma educação do campo, ambas em Luziânia/GO.

A I Conferência Nacional Por uma Educação Básica do Campo, ocorrida de 27 a

31 de julho de 1998, definiu algumas proposições, dentre elas que a educação do campo

precisa: resgatar os valores que se contrapõem ao individualismo, ao consumismo e

demais contravalores que degradam a sociedade; prestar atenção às raízes da mulher e

do homem do campo, que se expressam em culturas distintas, percebendo os processos

de interação e de transformação; resgatar o direito dos povos do campo à educação

básica, pública, ampla e de qualidade; partir das linguagens que esses povos dominam e

combinar a leitura do mundo com a leitura da palavra; e, a partir de práticas e de estudos

científicos, aprofundar uma pedagogia que respeite a cultura e a identidade dos povos

do campo. Durante a I Conferência (1998), foi proposto ainda “[...] garantir o acesso à

cultura tecnológica contemporânea desde que apropriada” (ARROYO, 2009, p. 166).

A II Conferência Nacional Por uma Educação do Campo, que aconteceu em

2004, propôs cinco frentes de discussão: ampliar as reflexões que estavam centradas na

educação básica e dar ênfase à educação superior e pós-graduação para os povos do

campo; inserir a educação do campo na agenda política e normativa, por meio das

manifestações sociais, cartas e declarações elaboradas no final das reuniões e encontros;

consolidar arranjos governamentais construídos por meio das parcerias com as

universidades e movimentos sociais; ampliar a produção acadêmico-científica de

natureza coletiva, que teve início nos anos de 1990 com produções do Movimento dos

Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST); e ampliar os embates judiciais contraditórios,

desde que fortaleçam a efetivação dos direitos sociais, pois há os que são favoráveis às

políticas afirmativas e aqueles que, em nome da igualdade formal, as condenam

(SOUZA, 2012).

Nesse contexto de reivindicações dos povos do campo é que surgem as políticas

públicas, dentre elas, citarei algumas que são importantes para o movimento dos povos

do campo e que constaram no questionário:

– A criação do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária

(PRONERA) em 1998, é uma política pública de educação envolvendo

trabalhadores(as) das áreas da reforma agrária. Tem como objetivo fortalecer a

educação nas áreas da reforma agrária propondo projetos educacionais e utilizando

metodologias voltadas para a especificidade do campo, tendo em vista contribuir para a

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promoção do desenvolvimento sustentável. Apresentam como princípios político-

pedagógicos a relação indissociável da educação e do desenvolvimento territorial como

condição essencial para a qualificação pautada em quatro princípios básicos: inclusão,

participação, interação e multiplicação (BRASIL, 2004).

Na região rural em que a escola pesquisada se situa não há acampados e

assentados do Movimento dos Sem Terra (MST). É uma região onde há muitos sítios,

chácaras e pequenas propriedades rurais.

– O PROJOVEM CAMPO – SABERES DA TERRA - criado em 2005 tem

como objetivo desenvolver políticas públicas de educação do campo e de juventude que

oportunizem a jovens agricultores(as) familiares, com idade entre 18 a 29 anos,

excluídos do sistema formal de ensino, a elevação de escolaridade em Ensino

Fundamental com qualificação profissional inicial respeitando as características,

necessidades e pluralidade de gênero, étnico-racial, cultural, geracional, política,

econômica e produtiva dos povos do campo (BRASIL, 2016a).

Volto a ressaltar que a escola do campo pesquisada não oferece salas de

Educação Infantil e de Educação de Jovens e Adultos (EJA). A escola oferece práticas

agrícolas e zootécnicas do 6º ano de Ensino Fundamental ao 3º ano do Ensino Técnico

Agrícola.

– As Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo

(2002) que “estabelece diretrizes complementares, normas e princípios para o

desenvolvimento de políticas públicas de atendimento da Educação Básica do Campo”,

foi complementada pela Resolução no. 2, de 28 de abril de 2008.

As professoras quando questionadas se já leram, estudaram ou discutiram as

Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo (2002)

responderam:

Não. (Professora Francielle).

Sim. Em reuniões de elaboração do Projeto Político Pedagógico da

escola. (Professora Sofia).

Estudei as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas

Escolas do Campo na pós-graduação em Educação do Campo

(UFMS/EaD). Elas enfatizam a importância de se manter a identidade

dos povos do campo, por meio de uma educação escolar de qualidade

direcionados ao mundo do trabalho e desenvolvimento social.

(Professora Janete).

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As respostas das professoras acima citadas nos mostram o quanto é importante

que o corpo docente da escola do campo conheça as Diretrizes Operacionais para a

Educação Básica nas Escolas do Campo (2002) para entender e respeitar a identidade

dos povos do campo, sua cultura, suas especificidades e seus saberes.

Questionei as docentes se há diferença em trabalhar em uma escola urbana e

trabalhar em uma escola do campo e obtive as respostas.

Sim. A maioria dos pais não são alfabetizados e não ajudam seus

filhos nas tarefas escolares. (Professora Francielle).

Sim. O contexto é outro, as relações que fazemos entre a vivência que

eles carregam com o que colocamos em sala de aula é totalmente

diferente de uma escola urbana. (Professora Sofia).

Sim. A diferença é que a escola do campo tem suas especificidades e

devem ser valorizadas oportunizando aos alunos aprenderem por meio

de seus conhecimentos prévios. (Professora Janete).

As professoras percebem que há diferenças entre uma escola do campo e uma

escola urbana. Uma elas enfatiza o analfabetismo dos pais e falta de participação dos

mesmos nas atividades escolares, as outras duas percebem as especificidades dos povos

do campo e o quanto é importante trabalhar contextualizando essas questões. São alunos

e alunas que já possuem conhecimentos agropecuários aprendidos com seus pais em

suas casas.

Contudo, a escola não oferece um calendário que respeite essas especificidades,

conforme as três professoras informaram no questionário, fato que acaba gerando faltas

aos alunos e alunas em alguns períodos do ano letivo, porque as crianças estão ajudando

aos pais no plantio/colheita ou porque estão viajando com seus pais para acompanhá-los

nas exposições agropecuárias.

Questionadas sobre se há materiais e livros didáticos específicos para a

Educação do Campo, as professoras responderam:

Não são materiais específicos para o campo. O material é o mesmo

das escolas urbanas do município, os professores adaptam para que se

aproxime um pouco da realidade dos alunos. A Secretaria de

Educação está com um olhar diferente para esta modalidade da

educação e para um futuro próximo pode ser que tenha material

específico. ( Professora Janete)

Não existem livros didáticos diferenciados, o que existe é a

metodologia que se aplica que a torna diferente. Os projetos que são

desenvolvidos fora de salas de aula tornam alguns momentos de

aprendizagem bem diferentes de uma escola urbana. Como andar a

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cavalo, cuidar da horta, entender a rotina do aviário, da suinocultura,

da piscicultura, enfim. São nesses momentos com professores

específicos do campo que esses alunos provam de uma metodologia

contextualizada em sua vivência. (Professora Sofia).

Não. Existem aulas técnicas agropecuárias. (Professora Francielle).

As professoras relatam que na escola do campo não há materiais e livros

didáticos específicos para a realidade do campo, mas que a partir do 6º ano do Ensino

Fundamental até o 3º ano do Ensino Técnico Agrícola há aulas práticas de agricultura,

bovinocultura, suinocultura, avicultura e piscicultura. Podemos inferir que do 1º ano do

ao 5º ano do Ensino Fundamental se assemelha às escolas urbanas por não haver aulas

práticas.

– A criação da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade

(SECAD), em 2004, também é considerada uma conquista, pois há programas voltados

à Educação do Campo. Na Secretaria Municipal de Educação de Campo Grande, há a

Coordenadoria da Diversidade e dentro dela o Núcleo de Educação do Campo.

– A criação do Programa de Apoio à Formação Superior em Licenciatura em

Educação do Campo (PROCAMPO), em 2010, apoia a implementação de cursos

regulares de licenciatura em educação do campo nas instituições públicas de ensino

superior de todo o país, voltados especificamente para a formação de educadores para a

docência nos anos finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio nas escolas rurais

(BRASIL, 2016b).

As três professoras pesquisadas são graduadas em Pedagogia. As professoras

Janete e Sofia fizeram pós-graduação lato sensu pelo Programa de Pós-graduação em

Educação da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, na modalidade EaD. As

práticas educativas das professoras Janete e Sofia se diferenciam das práticas de seus

colegas porque procuram contextualizar suas aulas à realidade campesina.

– A Escola Ativa (2010) tem como objetivos: apoiar os sistemas estaduais e

municipais de ensino na melhoria da educação nas escolas do campo com classes

multisseriadas, fornecendo diversos recursos pedagógicos e de gestão; fortalecer o

desenvolvimento de propostas pedagógicas e metodologias adequadas a classes

multisseriadas; realizar formação continuada para os educadores envolvidos no

programa em propostas pedagógicas e princípios políticos pedagógicos voltados às

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especificidades do campo e fornecer e publicar materiais pedagógicos que sejam

apropriados para o desenvolvimento da proposta pedagógica (BRASIL, 2016c).

A escola pesquisada não oferece classes multisseriadas, as turmas são regulares

do 1º ano do Ensino Fundamental ao 3º ano do Ensino Técnico Agrícola, mas no Estado

de Mato Grosso do Sul há escolas do campo que oferecem classes multisseriadas.

Os dados mostraram que as professoras Janete e Sofia conhecem as Diretrizes

Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo (2002), mas não conhecem

as demais políticas e programas aqui citados. O desconhecimento implica na não

implantação/implementação das mesmas.

Neste sentido, defendemos ser necessário o conhecimento, o estudo, as

reflexões, a implantação/implementação, pelos/as educadores/as que trabalham nas

escolas do campo, das Políticas Públicas e Programas para a Educação do Campo, pois,

se elas existem é porque foram reivindicadas pelos povos do campo e se foram

reivindicadas é porque são necessárias.

Formação docente para a educação do campo: uma discussão importante

Nossa pesquisa nos mostrou que há políticas públicas e programas que

incentivam a formação do/a docente para atuar em escolas do campo.

O/a docente, ao sair do curso de formação e ingressar em uma escola, insere-se

em um espaço que já tem uma história, que já possui rotinas, que segue regulamentos e

que lhe apresenta certas condições de trabalho.

Entendemos, com Contreras (2012), que a autonomia do/a professor/a está

ligada ao processo político, ao processo de emancipação e de autonomia social, porque

ele/a precisa buscar a transformação do ensino para torná-lo mais justo e educativo, e

somente conseguirá isso em conjunto com os movimentos sociais, buscando justiça e

igualdade, partindo do compromisso de respeitar as diferenças presentes na escola.

Perguntamos às professoras em quais momentos a comunidade de pais, as

famílias das crianças são chamadas a participar de atividades na escola e as mesmas

responderam:

Somente nas apresentações culturais e reuniões de pais. (Professora

Sofia).

A comunidade e família das crianças participam das reuniões

bimestrais e, eventualmente, em algum evento nas datas

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comemorativas ou culminância de projetos realizados na escola.

(Professora Janete).

Estão presentes nas datas comemorativas: Dias dos Pais, Dia das

Mães, Festa Julina e Formaturas. (Professora Francielle).

Os dados mostraram que não há presença dos pais e da comunidade escolar na

elaboração do Projeto Político-Pedagógico da escola. Essa é uma questão pontuada nas

Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo (2002) como

importante. A participação da comunidade local, a participação dos pais nas atividades

escolares, na elaboração do Projeto Político-Pedagógico é uma forma de conhecer as

especificidades da população campesina, conhecer seus interesses, seus saberes, sua

cultura entre outros, é fazer da escola um espaço democrático e participativo.

Pavan (2005, p. 172) pontua em sua tese que “ser educador(a) não é nem

vocação nem destino”. A compreensão dessa dimensão da formação docente

problematiza a questão do comprometimento com a profissão escolhida e com suas

implicações.

Nesse sentido defendemos que o/a educador/a que atua nas escolas do campo

precisa ter esse comprometimento com os povos do campo, de ouvir e dialogar com

seus saberes. É preciso comprometimento com as questões campesinas. Buscar

conhecer suas reivindicações, seus direitos para apoiá-los nessa luta.

Com Pavan e Lopes (2007, p. 31), compreendemos que promover uma formação

crítico-reflexiva é “[...] fazer com que todos os participantes desse processo passem a se

sentir responsáveis também pelas práticas sociais, políticas, econômicas, identificando e

denunciando incoerências e sugerindo mudanças quando necessárias”.

Na perspectiva da formação de professores para atuar nas escolas do campo,

Arroyo (2012, p. 359) pontua que “o primeiro significado a extrair dessa história é a

superação da formação de um protótipo único, genérico de docente-educador para a

formação básica”. O autor afirma que, sem a superação dessa formação, os cursos de

formação docente continuarão privilegiando a transferência para as escolas do campo de

professores da cidade, sem vínculos com a cultura e os saberes dos povos do campo.

Arroyo pontua que uma estratégia dos movimentos sociais do campo é defender

cursos como política afirmativa.

Na proposta do Plano Nacional de Formação de Profissionais da

Educação do Campo, o plano é justificado como ação afirmativa para

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correção da histórica desigualdade sofrida pelas populações do campo

em relaçãoao seu acesso à educação básica e à situação das escolas do

campo e de seus profissionais. (ARROYO, 2012, p. 362).

Os dados mostraram que os/as professores/as que não dialogam com os saberes

campesinos, que não procuraram fazer uma formação específica em educação do campo

(inicial ou continuada), que não procuraram realizar leituras (autoformação) sobre a

educação do campo ignoram esses saberes e especificidades em suas práticas educativas

em sala de aula.

Algumas considerações possíveis ...

A pesquisa realizada nos possibilita realizar algumas considerações a partir dos

dados produzidos. A primeira delas é a de que os povos do campo quando mobilizados

questionam as condições atuais da educação rural imposta e reivindicam a educação do

campo que respeite os seus direitos e que dialogue com seus saberes, com sua cultura,

com seu jeito de ser, ver e estar no mundo.

As políticas públicas reivindicadas pelos povos do campo existem, mas ainda

precisam ser implantadas e implementadas nas escolas do campo. Todas as pessoas que

trabalham nas escolas do campo precisam conhecê-las, estudá-las, discuti-las no âmbito

da escola para que os direitos já conquistados possam ser respeitados, como o direito a

um calendário específico, materiais didáticos que contemplem também os saberes do

campo, participação da comunidade na construção do Projeto Político-Pedagógico da

escola, entre outros.

Outra questão importante é assegurar que o corpo docente possa realizar

momentos de leituras, estudos e debates sobre as especificidades da educação do campo

in loco, ou seja, momento para a formação continuada do professor e da professora

dentro da própria escola com seus pares. Essa formação é importante para que possam

conhecer as políticas públicas para a educação do campo e para que possam ter acesso

às pesquisas e artigos sobre a temática.

Defendemos uma formação específica para os professores/as das escolas do

campo, uma formação que os ajudem a questionar e denunciar as injustiças históricas,

políticas, culturais, econômicas e sociais construídas ao longo do tempo.

Neste artigo, não temos a intenção de finalizar a discussão até porque os dados

nos trouxeram outras questões. Também não culpabilizamos a escola, os docentes, a

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coordenação pedagógica, e tão pouco, a gestão porque entendemos que precisamos

questionar as Instituições de Educação Superior e sua grade curricular. Nos cursos de

licenciatura são oferecidas disciplinas que discutem a educação do campo?

Referências

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HISTÓRIA E CULTURA AFRICANA E AFRO-BRASILEIRA: TENSÕES E

POSSIBILIDADES NAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

MARQUES, Eugenia P. de S1

Universidade Federal da Grande Dourados

CALDERONI, Valéria. A. M. O2

Universidade Católica Dom Bosco

Resumo: Este artigo apresenta algumas reflexões sobre como os professores tem lidado

com a inclusão da História e Cultura Afro-Brasileira em suas práticas pedagógicas.

Ancora-se para essa interpretação nas perspectivas teóricas pós-coloniais e nas

mudanças trazidas pelas leis n. º 10.639/2003, bem como nas pesquisas realizadas sobre

como as reivindicações dos movimentos sociais negros contribuíram para a

implementação de políticas educacionais voltadas para a superação do racismo, da

desigualdade racial, da potencialização da pedagogia da diferença e da subversão

epistêmica da formação docente. Tendo presente este cenário, e problematizando a

relação entre os efeitos de uma estrutura legislativa e o currículo, este artigo tem por

objetivo analisar as tensões e as possibilidades de educar para as relações étnico-raciais

no sentido de visibilizar a pluralidade multiétnica e as diferenças presentes no ambiente

escolar. As construções teóricas deste texto se embasam em Marques e Calderoni

(2014), Walsh (2009), Gomes (2012), Munanga (2012), entre outros. Como

procedimento técnico-metodológico, a pesquisa contou com a revisão bibliográfica dos

trabalhos da área e o uso de entrevistas temáticas, demonstrando as inquietações dos

professores dos anos finais da educação básica do município de Campo Grande/MS.

Como resultante das reflexões entre outras pesquisas e pontos de vista diversos oriundo

do diálogo entre atores do processo educacional, podemos afirmar que a legislação nº

10.636/2003 tem contribuído para a visibilização da cultura dos povos africanos e afro-

brasileiros e, ambivalentemente, observamos que há uma tensão inerente às práticas

pedagógicas como também muitos desafios epistemológicos para a consolidação da

educação das relações étnico-raciais.

Palavras-chave: Relações Étnico-raciais. Práticas Pedagógicas. Formação Docente.

Introdução

Serão os interesses da teoria “ocidental” necessariamente coniventes com o

papel hegemônico do Ocidente como bloco de poder? Não passará a

linguagem da teoria de mais um estratagema da elite ocidental culturalmente

privilegiada para produzir um discurso do Outro que reforça sua própria

equação conhecimento-poder? (BHABHA, 2003, p. 45).

Num tempo que coloca as identidades e as diferenças em jogo e evidências,

remetendo também à escola a obrigatoriedade do estudo da História e Cultura Africana

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

10678ISSN 2177-336X

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e Afro-brasileira por meio da Lei nº10639/2003, torna-se importante problematizar

como os professores, em seu fazer pedagógico aborda a legislação que alterou a Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDBEN 9394/1996), em seus artigos 26 - A

e 79- B, posteriormente modificada pela Lei nº 11.645/2008.3

O tema deste trabalho está diretamente relacionado as nossas investigações sobre

o ensino da cultura e história do povo africano, como também a nossa experiência com

professores na educação básica e a partir de uma aproximação ao pensamento pós-

colonial que potencializa o debate e a construção de uma relação democrática e plural

que permita o diálogo entre culturas diferentes como também potencializa os universos

culturais e plurais existentes na escola.

Na história da produção de saberes escolares da educação brasileira, na produção

historiográfica e nas políticas curriculares que orientam a formação dos alunos no que

diz respeito a constituição do povo brasileiro nos contextos históricos coloniais e pós-

coloniais, bem como as publicações didáticas e paradidáticas pode-se afirmar que há um

predomínio de saberes ocidentais, colocados como universais. Entretanto, os autores

pós-colonialistas afirmam que esses saberes discursados como universais são na

verdade de um lugar geopolítico bem definido, a Europa, tendo esse entendimento,

podemos afirmar que se trata de saberes eurocêntricos, que precisam ser revisionados

(BHABHA, 2003).

Na América, a ideia de raça e a construção de novas identidades, possivelmente

se tenha originado nas relações entre colonizadores e colonizados, as diferenças entre

povos tão diferente sejam elas sociais ou culturais causavam tanta estranheza entre esses

grupos, que acabaram de alguma forma classificando-os, segregando-os, colocando-os

as margens. As relações de poder, ser e saber foram encontrando formas e instrumentos

para instituir a ideia de raça e identidade racial. A formação de relações sociais

fundadas nessa ideia, produziram na América identidades sociais historicamente

novas: índios, negros e mestiços, e redefiniu outras” (QUIJANO, 2005).

Na perspectiva pós-colonial que assumimos nesta pesquisa temos o pensamento

de Homi Bhabha (2003) sobre o conceito de diversidade. Para Bhabha (2003),

diversidade refere-se à cultura como um objeto do conhecimento empírico,

reconhecendo conteúdos e costumes culturais pré-dados.

Em contraposição a esta perspectiva essencialista e simplista de cultura via a

compreensão de diversidade, a diferença cultural se constitui, para Bhabha (2003),

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26

como o processo de enunciação da cultura. Segundo o autor trata-se de "[...] um

processo de significação através do qual afirmações da cultura e sobre a cultura

diferenciam, discriminam e autorizam a produção de campos de força, referência,

aplicabilidade e capacidade" (2003, p. 63).

Nessa vertente pós-colonialistas, a diversidade deve ser assumida dentro de

uma política de crítica, questionadora da subalternização e silenciamento a que os

povos colonizados foram impostos. Este pensamento leva-nos a questionar e

superar os mecanismos que forjam as desigualdades e produzem estereótipos e

representações. Seus pensadores potencializam e problematizam categorias como

identidade e diferença, as entendem como construções discursivas que se deslocam

e se conflitam, “reinscrevendo” novos signos em sua composição (HALL, 2009;

SILVA, 2000). Ou seja, nessa perspectiva, a “[...] diferença é sempre um processo

relacional” (MACEDO, 2006, p. 348) que dependendo das relações de poder, ser e

saber posicionam saberes e consequentemente povos no sistema social.

Para Mignolo (2003, p.10), “[...] a diferença colonial é, finalmente, o local ao

mesmo tempo físico e imaginário onde atua a colonialidade do poder, no confronto de

duas espécies históricas locais visíveis em diferentes espaços e tempos do planeta”.

Rever categorias como a diferença colonial, universalização do saber,

colonialidade do saber entre outras impostas nos processos coloniais são relevantes

pelos seguintes motivos: aprendemos com a colonização a não levarmos em

consideração o lugar de onde fala o sujeito para a sua compreensão do mundo e,

acabamos tendo como referência, os conhecimentos de um lugar geográfico específico:

a Europa. E, se fizermos a crítica à colonização e à subalternização dos conhecimentos

dos povos colonizados poderemos descolonizar o pensamento hegemônico ocidental.

Esta critica aponta como possibilidade para se pensar pedagogicamente um

movimento de reversão da historicidade social e cultural, poderiam também tornar-se

um lócus de enunciação de conhecimentos outros.

Assim, identificamos que a colonialidade impõe e legitima uma única lógica

cristalizada no currículo monocultural, no material didático ucêntrico/homogêneo e nas

relações interpessoais hostis, que sutilmente ignoram e inferiorizam as diferenças

presentes no espaço escolar. As ocorrências de tratamentos diferenciados, podem

conduzir direta ou indiretamente, à exclusão das crianças da escola, ou ainda, para

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aqueles que permanecem, a construção de um sentimento de inadequação ao sistema

escolar e inferiorização racial.

Neste trabalho investigativo, centramos nossa atenção “[...] na descrição e

análise da artificialidade da produção de saberes na educação (conhecimentos, verdades,

discursos) ”, como argumenta Paraíso (2004).

O processo revisionário de nossa colonização

Estamos vivendo um tempo histórico, posterior aos processos de descolonização

do “Terceiro Mundo”, pois a descolonização ocorreu enquanto regime político somente,

a era colonial, mas epistemicamente o colonialismo, ou melhor dizendo a colonialidade

ainda se faz presente em nossas relações cotidianas e precisam ser repensadas

pedagogicamente. Esta colonialidade se manifesta nas metanarrativas que legitimaram o

sistema de ideias do processo de colonização, levando às relações de preconceito a

partir do entendimento errôneo das diferenças raciais, que insistem em hierarquizar,

apresentando-nos como sendo um “processo civilizatório”. Esta vem para justificar

discursivamente a dominação, a perda de identidade, a diáspora, o preconceito racial, a

subalternização, enfim, toda a forma de manter a dominação política, social e

epistêmica.

Costa (1999, p.65), nos afirma que a “[...] cultura ocidental eurocêntrica que se

autodeclara instituidora de padrões em todas as dimensões da vida humana, governa os

desejos e os sonhos e ainda invoca para si as credenciais de magnanimidade”. O que fez

com que criasse uma hierarquia social nos países da América Latina com bem observa

Quijano (2003).

Segundo Figueiredo, Grosfoguel (2009, p.225):

Esse paradoxo se refere ao fato de que a luta pela independência dos

brancos crioulos (poderíamos dizer mestiços claros) nunca

descolonizou a hierarquia étnico-racial do poder político, econômico e

social construído durante o colonialismo europeu nas Américas.

Tendo este entendimento, podemos perceber que estamos inscritos numa

sociedade onde os padrões tidos como normais, universais foram traduzidos pelo viés

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ocidental e pensar sobre as relações “neocoloniais”, ou pós-coloniais é um ato político-

pedagógico para esse tempo histórico a ser construído.

No Brasil o processo de abolição foi um processo que Figueiredo e Grosfoguel

(2009) chama de “independência sem descolonização”, pois, os povos que foram

subalternizados, colocados as margens, ainda seguem nesta posição política, ou seja, a

colonialidade4 do poder segue excluindo, segregando em todas as instancias e

instituições sociais, políticas e culturais, tendo como parâmetro a lógica ocidental. Em

países como o nosso a riqueza de sua diversidade é resultado de um processo histórico,

social e cultural no qual contribuíram de forma significativa inúmeras experiências

humanas específicas.

Concordamos com Hall quando este argumenta que a descolonização foi um

processo longo, epistêmico e diferenciado, e que a colonialidade (WAHLS, 2009), ou

seja, as relações coloniais, internalizadas na própria sociedade colonizada, vai dar

surgimento a uma forma difusa de hegemonia colonial, que através de novos arranjos

(poder sempre se rearranja), dá seguimento aos processos de poder e dominação entre os

povos. As reflexões dos autores pós-colonialistas como Hall (1997), Wahls (2009) nos

provocam a pensar e analisar os efeitos de poder, ser e saber nas relações estabelecidas

desde os tempos coloniais à contemporaneidade, permitindo analisar como elas seguem

nas práticas pedagógicas das escolas.

Ao analisar essas práticas com a perspectiva apontada por Bhabha (2003), esse

processo revisionário permite revemos a diferença não mais a partir de um referencial

coloniazador, não mais considerando ou partindo de uma classificação hierarquizada,

construída pelo único modelo cultural, o ocidental.

Segundo Bhabha (2003, p.21- 22):

As diferenças sociais não são simplesmente dadas à experiência

através de uma tradição já autenticada; elas são os signos da

emergência da comunidade concebida como projeto - ao mesmo

tempo uma visão e uma construção - que leva alguém para “além” de

si para poder retornar, com um espírito de revisão e reconstrução, às

condições políticas do presente.

Um deslocamento importante para o processo revisionário (BHABHA, 2003) de

nossa colonização aconteça esta ancorada nas bases legais, fruto do protagonismo das

minorias existentes no pais.

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A Constituição Federal/1988 trouxe amparo legal que confere “às minorias” o

direito à diversidade cultural em nosso país. Compõe um dos objetivos fundamentais

dessa nova formulação contida na Constituição de 1988, com relação às minorias,

“promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade, e

quaisquer outras formas de discriminação” (BRASIL, 1988, p. 3).

A LDBEN- Lei nº 9.394/1996 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação ratifica a

importância das ações transdisciplinares no tocante à importância da cultura popular e à

valorização da pluralidade cultural. Normatizada, regulamentada pelo Parecer 03/2004

do Conselho Nacional de Educação - CNE, que institui as Diretrizes Nacionais para a

Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-

brasileira e Africana.

A regulamentação do currículo representou um avanço no âmbito da legislação

educacional e correspondeu aos anseios de diversos setores da sociedade e do

movimento negro brasileiro, pois tensionam a necessidade de reflexão acerca da

construção de uma pedagogia antirracista. Para Oliveira e Candau (2010, p. 32),

[...] entre os objetivos, estão a garantia do igual direito às histórias e

culturas que compõem a nação brasileira e a afirmação de que os

conteúdos propostos devem conduzir à reeducação das relações

étnico-raciais por meio da valorização da história e da cultura dos

afro-brasileiros e dos africanos.

As pressões legítimas e antirracistas dos movimentos negros em vários

municípios e estados brasileiros foram determinantes para que essa alteração curricular

da legislação nacional se efetivasse e romperam com o silêncio em torno do currículo

monocultural, dando “vez e voz” às diferenças étnico-raciais. Tais iniciativas

enfrentaram e enfrentam limitações para a efetivação nas práticas pedagógicas. Dentre

essas dificuldades, podemos destacar a ausência de formação específica dos professores

educarem para as relações étnico-raciais, sem promoverem a hierarquização de

conhecimentos, culturas, crenças e etnias. Apesar das situações de preconceito e

discriminação ainda presentes no ambiente escolar, muitas vezes estas são ignoradas e

comprometem, desse modo, a construção da identidade negra, conforme os estudos

realizados por CAVALHEIRO (2000), MUNANGA (2012), GOMES, (2012), DIAS

(2012).

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Tensões e possibilidades nas práticas pedagógicas

Nesta seção analisaremos com as falas dos professores de escolas públicas de

Campo Grande – MS, os conhecimentos e as dificuldades que impedem as discussões

sobre as diferenças étnicas-raciais e as implicações para as práticas pedagógicas,

articuladas às referências e teorias epistemológicas escolhidas para esse caminho

investigativo. Elegemos a análise das seguintes questões: a) - Em sua disciplina você

trabalha com conteúdo sobre a História e Cultura Africana e Afro-brasileira? Quais? b)

- De que forma você insere a temática na sua disciplina? c) - Você possui dificuldades

para atender os objetivos da lei? d) - Quais as dificuldades você percebe que os

professores em geral possuem?

Os participantes da pesquisa responderam as questões da seguinte forma:

Tenho trabalhado com todas as turmas em forma de debate, om a sala

em círculo. Os trabalhos relacionados à cultura e história social

africana. Não sinto dificuldade, pois em Artes, o conteúdo abrange

várias áreas do conhecimento, oferecendo aos alunos oportunidades de

criar, fazer e responder. Na escola não percebo dificuldades em meus

colegas, pois trabalhamos a interdisciplinariedade (Professora A –

Componente Curricular - Artes).

Trabalho durante o ano letivo, com temas sempre relacionados às

questões históricas-culturais; procurando sempre definições para:

estereótipo, discriminação, preconceito e racismo. Tema principal a

ultimamente a "cotas", desmistificando e demonstrando que é um

direito. Quanto a História da África, sempre procuro trabalhar com

pesquisas, tendo como base clássicos sobre a História da África, o que

culmina como uma apresentação anteriormente em novembro e

atualmente em outubro (Projeto Diversidade Étnico Racial e Cultural).

Com os alunos nenhuma dificuldade, apenas uma rejeição inicial

devido a um conhecimento prévio que vem de seu cotidiano, que logo,

ao argumentar com bases científicas aderem sistematicamente ao

projeto. Muita dificuldade com a Direção, Coordenação e Professores,

que ainda hoje se demonstram preconceituosos e com falta de vontade

em capacitar e fazer leituras em relação ao tema. Quanto ao material,

há hoje uma quantidade expressiva a disposição na internet, na

literatura escrita, é só ter boa vontade. Muitos possuem dificuldades

pela falta de capacitação, outros a falta de vontade em capacitar-se.

Alguns por ter uma guerra no seu "eu", com os preconceitos de sua

própria formação e aceitação até mesmo de sua própria identidade

negra em alguns casos. Outra situação, a falta de Capacitação da

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própria direção e coordenação da escola e o descaso da SED-MS (Professor B – Componente Curricular - História).

O professor C, nos diz:

Procuro cumprir a base curricular atual que prevê estes importantes

conteúdos. O próprio material didático da Rede Pública de Ensino

(municipal e estadual) contempla estes conteúdos, aos quais procuro

sempre agregar conteúdo extra, traçando paralelos com a realidade

social, cultural e econômica encontrada. Particularmente não tenho

dificuldades, mas percebo que muitos professores acabam por evitar o

tema, movidos, por incrível que pareça, não só pelo despreparo

pedagógico, mas principalmente por preconceitos religiosos, quando

estes, misturam suas crenças religiosas preconceituosas, tachando

representações religiosas de matriz africana de maneira

pejorativa. (Professor C – Componente Curricular – História)

Segundo o professor D, que ministra o Componente Curricular - Arte:

Fui professor universitário de arte e educação numa faculdade privada

no ES. Nessa experiência, procurava mostrar aos alunos exemplos de

arte africana, brasileira e indígena em suportes diversos (tecidos,

esculturas, trançados, cerâmica etc.) obtidos em publicações

especializadas, pois os materiais didáticos existentes costumam não

contemplar essas expressões artísticas, privilegiando a arte dita

ocidental. Nesse tempo, coordenava também uma oficina de

modelagem em argila numa clínica psiquiátrica, assim costumava

levar os trabalhos desses alunos/pacientes para as aulas na faculdade.

Acredito que a arte contemporânea; por estimular a coexistência de

estilos diversos, técnicas de toda sorte e suportes materiais ou não

materiais; permite também que, transversalmente, se possa trabalhar

História e Cultura africana e afro-brasileira. Eu não tenho muita

dificuldade, pois amparo meu trabalho com pesquisas próprias nos

referenciais multimídias e em trabalhos de campo. Poderia

exemplificar com atividades didáticas que pudessem ser

desenvolvidas numa aldeia indígena, território quilombola, terreiros

de candomblé ou umbanda, onde as pesquisas sobre tal etnia ou tal

grupo, feitas anteriormente por intermédio da literatura ou outros

meios, pudessem ser observadas no cotidiano desses espaços. Uma

outra forma é trabalhar com cinema (vídeo), aproveitando a temática

do filme para suscitar questões de história e cultura indígena, africana

e afrodescendente. Creio que seja a dificuldade de acesso material

didático específico e também nos estabelecimentos de recortes que

deem conta de passar alguns conteúdos sobre a História e Cultura

africana e afro-brasileira em transversalidade com outras áreas de

conhecimento (Professor D – Componente Curricular - Arte).

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Nos diz a professora E:

Sempre trabalho algum (pouco) conteúdo sobre o assunto, pois a

Língua Portuguesa permite (e até exige) que assuntos de relevância

social e históricas sejam abordados. Percebo dificuldades no

planejamento que envolve os demais professores no sentido de haver

parceria e planejamento de projetos, fica tudo muito restrito ao

individual. Nesses dois últimos anos, em função das greves, o

planejamento coletivo foi prejudicado. Sinto que a coletividade

prioriza eventos específicos como a Feira Cultural ou o Dia da

Consciência Negra. Acho que isso é pouco significativo. Fica como

"uma mera obrigação no calendário"; penso que deveria ser

sistemático e abranger outras questões (não só meio ambiente ou

água). Acho que a maior dificuldade é mesmo o planejamento, pelo

menos não percebo, na unidade onde atuo, nenhum outro motivo que

impeça a implementação de atividades referentes ao tema (Professora

E – Componente Curricular de Língua Portuguesa).

Indicações conclusivas

“[...] a diferença colonial é, finalmente, o local ao mesmo tempo

físico e imaginário onde atua a colonialidade do poder, no confronto

de duas espécies históricas locais visíveis em diferentes espaços e

tempos do planeta” (MIGNOLO, 2003 p.10).

Podemos afirmar que há deslocamentos epistêmicos significativos nas práticas

pedagógicas vigentes dos professores investigados após entrar em vigor a lei nº

10.639/2003, entretanto, a ausência de um projeto pedagógico nas escolas orquestrado

coletivamente e coordenado pela gestão escolar se configura como um dos empecilhos

para que as políticas pedagógicas referentes ao trato à diversidade e a diferença cultural

se efetive plenamente, no sentido de que educar para as relações étnico-raciais significa

garantir que o currículo e as práticas pedagógicas possibilitem que as crianças

indígenas, brancas e negras compreendam e respeitem as diferenças culturais, a

corporeidade, a estética e presença no mundo. O estudo sobre as diferenças culturais de

cada povo e cada etnia para dar sentido e tornar possível a discussão da diferença no

cotidiano escolar é o desafio a ser enfrentado.

As microrrelações de poder existentes no cotidiano das escolas trazem as

tensões próprias das relações pedagógicas, principalmente as que buscam construir um

conhecimento fronteiriço. Pensar a educação na perspectiva das fronteiras para

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aproximar as diferentes culturas presentes no cotidiano escolar é vislumbrar um diálogo

intercultural e antirracista (OLIVEIRA; CANDAU, 2010), no qual os saberes das

crianças negras e indígenas possam ser legitimados e, desse modo, possam romper com

a visão homogeneizadora, hegemônica e eurocêntrica do currículo colonizado.

A análise das falas dos professores investigados indica que estes vivenciam uma

tensão constante, pois encontram-se numa tentativa de ressignificação cultural em um

processo revisionário dos saberes até então legitimados na escola.

A descontinuidade de acompanhamento por parte das Secretarias de Educação

que inviabilizam a formação continuada para professores também é um indicador que

interfere negativamente na proposição de uma educação antirracista e democrática.

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1 Doutora em Educação pela Universidade Federal de São Carlos. Chefe do Núcleo de Estudos

AfroBrasileiros da Universidade Federal da Grande Dourados –NEAB/UFGD. Professora adjunta do

curso de Pedagogia da UFGD. Líder do Grupo de pesquisa Estudos e Pesquisas sobre Educação, Relações

étnicoraciais e Formação de professores – GEPRAFE. 2

2 Doutora em Educação pela Educação da Universidade Católica Dom Bosco - UCDB, graduada em

Educação Artística e pedagogia. Pesquisadora do Projeto Observatório de Educação Escolar

Indígena/MEC/CAPES, pesquisadora no Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Educação, Relações étnico-

raciais e Formação de professores - GEPRAFE, do (a) Universidade Federal da Grande Dourados,

também membro do grupo de pesquisa Interculturalidade e Educação (UCDB).

3 Posteriormente a Lei nº 11645/2008 altera o artigo 26 - A ao disciplinar que nos estabelecimentos de

ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados, torna-se obrigatório o estudo da história e

cultura afro-brasileira e indígena.

4 Introduzido por Anibal Quijano em Colonialidade Del poder, eurocentrismo y América Latina (2005),

onde o autor apresenta as implicações dessa colonialidade do poder a respeito da história da América

Latina.

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