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Direito Tributrio Temas Atuais
Sacha Calmon Navarro Coelho
(Publicada na Revista Dialtica de Direito Tributrio nr. 135)
1
Planejamento Tributrio e
Aquisio/
Incorporao de Empresas
Questes
Atinentes ao IRPJ e CSLL
Sacha Calmon Navarro Coelho
Professor Titular de Direito Tributrio da UFRJ,
Doutor em Direito Pblico pela UFMG, Presidente Honorrio da ABRADT, Vice-
Presidente da ABDF, Membro da IFA, Advogado.
Eduardo Maneira
Professor Adjunto de Direito-Tributrio da UFRJ,
Mestre e Doutor em Direito Tributrio pela UFMG, Secretrio-Geral da ABRADT e Advogado
1. CONSULTA.
Consulta-nos a Imaginarius S/A a respeito da legalidade das
medidas que pretende realizar
para a reestruturao societria do
grupo, a qual, segundo
informaes, iniciou-se h cerca
de 1 ano, e que compreender diversas etapas.
2. A ESTRUTURAO
SOCIETRIA ATUAL.
A atual estrutura societria do grupo Imaginarius, a qual se
mantm inalterada deste o incio
de suas atividades no Brasil e cuja
reorganizao ora submete-se
anlise, composta pela empresa
Alfa, uma sociedade de capital estrangeiro sediada na Holanda,
controladora da sociedade holding
brasileira Beta, detendo 100% de
seu capital, e da sociedade
operacional brasileira Gama, de
cujo capital detm participao
equivalente a 93%. Por sua vez, a
Beta detm 7% do capital da
sociedade operacional Gama.
Para melhor visualizao da
estrutura, vejamos o grfico
abaixo:
3. A REESTRUTURAO
SOCIETRIA.
A primeira etapa da
reestruturao trata da operao
em que a Beta adquirir da controladora estrangeira Alfa a
totalidade (93%) da participao
que mantm no capital social da
Gama, a preo de mercado, de
acordo com a projeo dos
resultados estimados desta,
atravs de Laudo de Avaliao a ser emitido previamente
aquisio. Aps este passo, a
Gama tornar-se- subsidiria
integral da Beta.
Esta operao, por
conseqncia, implicar na formao de um gio
fundamentado em expectativa de
rentabilidade futura (art.385,
inciso II, do Regulamento do
Imposto de Renda RIR/ 99,
aprovado pelo decreto n
3.000/99), que ser registrado na
Beta
Gama
Alfa
100% 100%
7%
93%
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contabilidade da empresa
incorporada Beta e poder ser
amortizado em um perodo de 5 a
10 anos, conforme previso legal.
O planejamento ora
proposto considera que a
aquisio das aes ser contratada para pagamento em
longo prazo, atravs de diversas
remessas ao exterior, em perodo
que pode variar de 5 a 10 anos.
Em etapa subseqente, a
Gama, ento subsidiria integral da Beta, ser por esta
incorporada, reduzindo a estrutura
societria no Brasil e permitindo,
em conseqncia, na hiptese de
haver resultados tributveis, a
dedutibilidade do gio amortizado
para fins do Imposto de Renda da Pessoa Jurdica IRPJ e da
Contribuio Social sobre o Lucro
Lquido CSLL.
Assim expondo, a
Consulente, formula os seguintes
quesitos: 1 Pode a Empresa controladora
com sede no exterior (Alfa) alienar
a sua participao societria na
empresa controlada para uma
terceira Empresa, sediada no
Brasil, tambm sob seu controle?
2- A adoo do valor de mercado,
na operao de compra e venda
de investimentos, entre Empresas
controladora e controlada uma
opo ou uma imposio da
legislao brasileira, inclusive frente s disposies concernentes
distribuio disfarada de lucros?
3- Quais critrios (inclusive
cambiais) devero ser
considerados na determinao do valor do investimento na empresa
brasileira, pela Empresa alienante,
para efeitos de apurao do ganho
de capital, sujeito tributao?
4- Qual dever ser o tratamento
contbil e fiscal a ser observado
pela Empresa adquirente, entre o
valor da aquisio e o valor
patrimonial do investimento
adquirido?
5- A quem caber a
responsabilidade (sujeio passiva) pela apurao do
provvel ganho de capital e do
recolhimento dos tributos
incidentes?
6- Qual o tratamento tributrio a ser dado ao ganho de capital
auferido pela Empresa estrangeira,
na alienao do investimento para
a Empresa brasileira (momento da
apurao e da reteno na fonte,
alquotas a serem consideras)?
7- Em que extenso o ganho de
capital sob anlise deve ter o
tratamento equiparado ao
tratamento dado s pessoas fsicas
ou dado s pessoas jurdicas,
sediadas no Brasil (arts. 140, 421, 682 e seguintes do RIR/99)?
8- Em se tratando de alienao
para recebimento do preo, em
um prazo de 05 anos ou mais, o
ganho de capital pode ser reconhecido e os tributos apurados
e recolhidos (inclusive IR Fonte)
medida e na proporo das
parcelas recebidas em cada
perodo de apurao, mesmo
sendo o alienante uma pessoa
jurdica estrangeira (art. 421, do RIR/99)?
9 Com a incorporao da
empresa adquirida (Gama) pela
empresa adquirente (Beta), o
valor do gio pago quando da aquisio poder ser amortizado
como despesa dedutvel, conforme
previsto nos arts. 7 e 8, da Lei
n 9.532/97?
10 Algumas das operaes
poderiam ser caracterizadas como
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procedimentos de evaso e/ou
eliso fiscal, e, em sendo, podero
sofrer algum tipo de restrio,
pela legislao brasileira, em
especial, pela LC n 104/2001?
11 A realizao da operao, entre empresas do mesmo Grupo
poderia, s por esta razo, de
alguma forma, ser caracterizada
como simulao?
12 A operao em questo, poderia, de alguma forma, ser
tratada como operao ilcita, sob
os argumentos de que ao final
haver benefcio fiscal decorrente
de amortizao do gio?
Em prosseguimento anlise das hipteses acima
relatadas, passamos a nos
manifestar.
4. ESCLARECIMENTOS INICIAIS.
O presente parecer se
baseia nas informaes relatadas
pela Consulente, atravs de seus
consultores retrocitados, os quais fundamentam as mencionadas
operaes na existncia de
relevante propsito negocial e
econmico para a reestruturao
societria do grupo.
Segundo o relato da
Consulente, existem relevantes interesses empresariais para a
reestruturao societria do
grupo, dentre eles, a mudana do
perfil dos investimentos no Brasil,
com a reduo do nmero de
empresas no pas, bem como obter, atravs de tal
reestruturao, alternativas
viabilizadoras para uma situao
operacional que justifique a
remessa lcita de recursos ao
exterior (matriz).
Cabe ainda ressaltar que se
analisa aqui a legalidade das
medidas pretendidas, sem
qualquer avaliao acerca de sua
viabilidade financeira.
5. ELISO E EVASO FISCAL.
Oportuno que se discorra
sucintamente sobre a questo
jurdico/doutrinria que ir
permear todo o parecer, qual seja: a reestruturao societria
pretendida pela Consulente se
enquadraria no campo da eliso ou
da evaso fiscal? Pois bem. A
estrutura a seguir apresentada
decorre da sistematizao do tema
evaso, a partir da mescla dos critrios adotados por SAMPAIO 1DRIA e de ALBERTO XAVIER2:
EVASO FISCAL (LATO SENSU)
1. Evaso omissiva (intencional ou
no), subdividida em:
1.1. Evaso imprpria (absteno
intencional de incidncia; no
entrar no fato gerador);
1.2. Evaso em sentido prprio (por sua vez subdividida em):
1.2.1. No pagamento por
desconhecimento ou
mau conhecimento do
dever fiscal (no
intencional).
1.2.2. No pagamento apesar do
conhecimento do dever
fiscal, sonegao
(intencional).
2. Evaso comissiva (sempre intencional):
1 DRIA, Antonio Roberto Sampaio. Eliso e Evaso Fiscal. So Paulo: Lael, 1971, pp.14-22. 2 XAVIER, Alberto Pinheiro. O negcio Indireto em Direito Fiscal: Lisboa: Companhia e Editora Forense, 1971, pp.9-12
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2.1. Ilcita (fraude, simulao,
conluio);
2.2 Lcita (economia fiscal ou
eliso).
Segundo esses autores, a evaso por omisso imprpria
quando, por exemplo, no se
pratica o fato gerador para no se
ter que pagar o tributo (deixar de
alienar bens para fugir do imposto
sobre lucro imobilirio ou deixar de obter rendas suplementares
que aumentariam o patamar do IR
progressivo). Enquadram-se
ainda no conceito de evaso
omissiva imprpria os casos de
transferncia econmica do
encargo fiscal (deslocamento do peso fiscal do contribuinte de iure
para o contribuinte de facto)
mediante determinaes
contratuais ou legais atravs dos
fenmenos da repercusso,
absoro ou difuso. A evaso omissiva prpria
ocorre quando:
a)intencionalmente o contribuinte
omite dados, informaes e
procedimentos que causam a
ocluso do dever tributrio (sonegao); ou b) no
intencionalmente, o contribuinte
obtm os mesmos resultados por
ignorar a lei ou o dever fiscal. As
duas espcies se diferenciam pela
presena do dolo especfico na
primeira e pela sua inexistncia na segunda.
A evaso comissiva ilcita
d-se nas hipteses de fraude,
simulao ou conluio, que so
aes unilaterais ou bilaterais,
voltadas ao escopo de alterar a realidade com o fito de no pagar
o tributo ou retardar o seu
pagamento (falsificao de
documentos, notas fiscais, valores,
negcios, etc).
A evaso comissiva lcita,
finalmente, tambm chamada de
economia fiscal ou eliso fiscal,
ocorreria quando o agente,
visando a certo resultado
econmico, buscasse, por
instrumentos sempre lcitos,
frmula negocivel alternativa e
menos onerosa do ponto de vista fiscal, aproveitando-se da
legislao no proibitiva ou no
equiparadora de formas ou
frmulas de Direito privado
(reduo legal das formas ao
resultado econmico). A disciplina da eliso fiscal
comporta mais uma diferenciao.
Temos eliso induzida quando a
prpria lei deseja o
comportamento do contribuinte,
por razes extrafiscais. Exemplo
a iseno por 10 anos do IR para os lucros das indstrias que se
instalem no Norte-Nordeste do
Brasil. Temos eliso por lacuna
quando a lei, sendo lacunosa,
deixa buracos nas malhas da
imposio, devidamente aproveitados pelos contribuintes.
A verdadeira eliso fiscal esta,
por apresentar questionamentos
jurdicos e ticos na sua avaliao.
Baseia-se na premissa de que, se
o legislador no a quis, como na eliso fiscal induzida, pelo menos
no a vedou expressamente,
quando podia t-lo feito (princpio
da legalidade). Esse princpio, no
particular, abriga duas conotaes
relevantes. A primeira a de que
o contribuinte, observada a lei, no est obrigado a adotar a
soluo fiscal e jurdica mais
onerosa para o seu negcio. Pelo
contrrio, est eticamente liberado
para buscar a menos onerosa, at
porque, sendo o regime econmico considerado de livre iniciativa e de
assuno de responsabilidades,
prevalece a tese da minimizao
dos custos e da maximizao dos
resultados. A segunda conotao
do princpio da legalidade no
particular reside no aforisma de
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que ningum est obrigado a fazer
ou deixar de fazer alguma coisa
seno em virtude de lei, de resto
preceito constitucional e, pois,
dominante.
Disto isso, oportuno
ofertar exemplos prticos de condutas elisivas lcitas por parte
dos contribuintes:
a) o contribuinte ao comprar bens
para o seu ativo fixo pode optar
por faz-lo via leasing, que
permite abater a despesa do lucro tributvel pelo IR, ou via compra-
e-venda que gera despesa no
dedutvel, acrescendo seu
patrimnio lquido (Nem pensar
em simulao...) O STF j se
pronunciou, caracterizando a
espcie como eliso;
b) o contribuinte pode formar uma
sociedade com bens imveis
(colao de bens ao capital de
sociedade) ficando sua quota
imune ao ITBI, ao invs de faz-lo com bois, v.g., sujeitados ao
ICMS;
c) para gozar de uma iseno do
IR por dez anos, o contribuinte
ergue sua fbrica em Ilhus/BA, ao invs de faz-lo em Vitria/ES,
que no est na rea da SUDENE;
d) no Municpio limtrofe, a
Cmara Municipal no votou lei
instituindo o ISS. O contribuinte
instala ali o seu escritrio de representao comercial, embora
tenha domiclio no outro
Municpio;
ANTNIO ROBERTO SAMPAIO
DRIA3 assim distingue a evaso ilcita da eliso, que sempre
lcita:
Os elementos comuns a ambas a
ao, a inteno, a finalidade e o
3 DRIA, Antnio Roberto Sampaio. Op. cit.,p.20.
resultado, conforme assinalado. Em
conseqncia, de nenhum deles pode
logicamente depender a distino das
figuras em pauta.
O primeiro aspecto substancial que as
estrema a natureza dos meios
eficientes para sua consecuo: na
fraude, atuam meios ilcitos (falsidade) e, na eliso, a licitude dos
meios condio sine qua non de sua
realizao efetiva.
O segundo aspecto de maior
relevncia o momento da utilizao
dos meios; na fraude, opera-se a
distoro da realidade econmica no
instante em que ou depois que ela j se manifestou sob a forma jurdica
descrita na lei como pressuposto de
incidncia. Ao passo que, pela eliso,
o agente atua sobre a mesma realidade antes que ela se exteriorize,
revestindo-a da forma alternativa no
descrita na lei como pressuposto de
incidncia.
Com ligeira ampliao dos momentos
em que a fraude se verifica, para
incluir tambm a simultaneidade de sua ocorrncia com a do fato gerador,
pode-se afirmar que hoje
doutrinariamente pacfica a adoo
desse critrio formal distintivo entre
fraude e eliso.
MARCEL WURLOD4, em tese de
doutoramento apresentada
Faculdade de Direito de Lausanne,
intitulada Forme Juridique at ralit conomique dans
lapplication des lois fiscales, traa
idntico paralelismo, colocando a
ao humana, anterior ou
posterior ao fato gerador, como o
elemento fulcral da distino entre evaso ilcita e eliso, esta sempre
lcita (economia de imposto).
4 WURLOD, Marcel. Forme Juridique at ralit conomique dans lapplication des lois fiscales. Lausanne: Librairie F. Rouge et Cie S/A, 1947
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Sacha Calmon Navarro Coelho
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RUBENS GOMES DE SOUZA5,
entre ns, igualmente erigiu, como
nico critrio seguro para
distinguir evaso e eliso, a poca
em que realizada a ao
excludente do contribuinte, se
antes ou depois da ocorrncia do fato gerador do tributo:
O nico critrio seguro (para
distinguir a fraude da eliso)
verificar se os atos praticados pelo contribuinte, para evitar, retardar ou
reduzir o pagamento de um tributo
foram praticados antes ou depois da
ocorrncia do respectivo fato gerador: na primeira hiptese, trata-se de
evaso; na segunda, trata-se de
fraude fiscal.
NARCISO AMORS6, na Espanha, outro que repercute a
mesma idia, sem falar em fato
gerador, mas falando em relao
jurdica, o que, sem dvida
significa um avano na fixao do
critrio distintivo. Em vernculo,
eis a frase:
A eliso para ns no entrar na relao
fiscal. A evaso dela sair. Exige, portanto, estar dentro, haver estado ou
podido estar em algum momento.
GILBERTO DE ULHA CANTO7, um dos autores do anteprojeto de
reforma tributria (Emenda 18
Constituio de 1946) e do Cdigo
Tributrio Nacional, cuidando de
sentena sobre contratos de
leasing que tivemos a
oportunidade de prolatar quando respondamos pela 14 Vara
Federal de Belo Horizonte, honra-
se com o seguinte comentrio:
5 SOUSA, Rubens Gomes de. Compndio de Legislao Tributria, Rio de Janeiro:
Financiaras, 1960, 3 ed., p.113. 6 AMORS, Narciso. La Elusion y la Evasion Tributria, in Revista de Derecho Financiero y
de la Hacienda Pblica, Madrid, 1965, vol.15, .573. 7 Apud COLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributrio Brasileiro. Rio de Janeiro, Forense, 1999, 4 ed., pp.219-22.
A sentena respeitvel e
merecedora de elogio. Seu autor, o
ilustre juiz e professor, versa sobre
um tema que no sei porque encontra freqentemente inibio dos
magistrados que os impede de
assumir uma posio clara com pleno
apoio na melhor doutrina num pas como o nosso, em que prevalece o
princpio da legalidade estrita em
matria tributria, imbudo num
sistema de direito positivo fechado,
que, em matria de direitos subjetivos, no permite qualquer
margem de discrio autoridade no
trato com o indivduo.
Sei que h um bem relevante a
preservar atravs da aplicao da
regra de isonomia, e em seu nome o
que a justia indica que pessoas em situaes econmicas iguais paguem
impostos iguais; da, com propriedade
e acerto, muitos afirmaram que na
aplicao das leis tributrias deve-se
ter em vista o contedo econmico das situaes, fatos ou negcios, pois
sempre a ele que a vontade da lei
ou do legislador visa.
Esqueceram os que assim pensam
que h outro princpio tambm
importante e de incidncia muito mais
ampla, que o da certeza das relaes jurdicas, mxime daquelas
que se estabelecem com
prescindncia da manifestao de
vontade das partes, porque resultam da prpria lei.
(...)
Nenhum contribuinte tem obrigao de pagar imposto que a lei no prev,
ou maior do que por ela previsto;
isso, porque em o fazendo, alm de
sofrer leso patrimonial sem justa causa, estaria coadjuvando na
infrao ordem constitucional. Uma
primeira verificao a fazer consiste,
pois, em apurar se a conduta do contribuinte que o leva a no pagar
imposto, pagar menor imposto ou
pagar imposto mais tarde, importa em
violao de direito da Fazenda
Pblica, ou seja, contrape-se a um
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comando legal que o torne obrigado
ao tributo evitado, reduzido ou cuja
satisfao retardada.
(...)
Na busca desordenada de fundamento
para definir a conduta do contribuinte
como evaso, comum ver-se a Fazenda Pblica pretender que certos
atos tenham sido por ele praticados
com simulao, porque o seu objetivo
nico ou principal foi evitar ou reduzir nus tributrio. Trata-se de um erro
palmar, pois, no direito positivo
brasileiro, os casos de simulao
acham-se definido no art. 102 do
Cdigo Civil num numerus clausus, sem que dentre eles figure o nimo de
evitar imposto. O que, de resto, nem
seria admissvel num sistema jurdico
no causalista, que somente se refere causa nos dois nicos casos
mencionados no art. 90, em que ela
expressa como razo determinante ou
como condio do ato. A rigor, a vontade de no pagar imposto nem
seria causa, podendo caracterizar
quando muito um motivo.
Ainda segundo ULHA
CANTO, a Lei n 4.506, de
30/11/64, contm impropriedades
a respeito do conceito de fraude:
Para terminar estas breves observaes, penso que oportuno
ponderar mais uma vez, a pssima
redao adotada nos arts. 71, 72 e 73
da Lei n 4506, de 30.11.1964, que por fora, do disposto no art. 21 do
Dec.-lei n 401, de 30.12.1968,
acabou sendo tambm vlida para
efeitos de imposto sobre a renda e
proventos de qualquer natureza, na qualificao de sonegao, fraude ou
conluio. A maneira de caracterizar
essas figuras ilcitas foi infeliz, porque
misturou conceitos que deveriam ter ficado separados e, principalmente,
porque deu uma definio de fraude
que suscita dificuldade de
entendimento, sendo no meu parecer, um daqueles casos para os quais a
interpretao reservada como meio
de compreenso do verdadeiro
sentido da norma; eis o que diz o art.
72:
Art. 72. Fraude toda ao ou
omisso dolosa tendente a impedir ou retardar, total ou parcialmente, a
ocorrncia do fato gerador da
obrigao tributria principal, ou a
excluir ou modificar as suas caractersticas essenciais, de modo a
reduzir o montante do imposto
devido, ou definir o seu pagamento.
Uma coisa que j foi claramente dita
por vrios autores (notadamente por
Rubens Gomes de Sousa, Pareceres e
Imposto de Renda. Ed. Resenha
Tributria, 1976, ps. 175 e segs.) que a distino entre evaso e eliso
no pode ser feita levando-se em
conta elemento subjetivo ao autor,
porque em uma e noutra o intuito o mesmo: no pagar tributo, pag-lo a
menor ou em data mais afastada, de
sorte que a diferena dever ser
buscada noutro elemento. Da, a formulao do conceito, j enunciado,
que extrema a evaso e a eliso a
partir da anterioridade da conduta em
relao ao fato gerador. Uma exposio muito interessante desse
entendimento foi feita pelo suo
MARCEL WURLOD, no seu Forme
Juridique et Ralite conomique Dans
Lapplication des Lois Fiscales (ed. F.Rouge, Lausanne, 1947).
Ora, se esse o fator distintivo
correto, e no a intencionalidade do agente, foroso entender o art. 72
da Lei n 4.502/64 como contendo
implcita a condio de a conduta ser
de per si contrria lei, pois o mero fato do impedimento de que o fato
gerador surja, se entendido de modo
ilimitado, levaria a conceituar-se
como fraude e deliberao de um
profissional de no trabalhar durante os ltimos dias do ano, para evitar
que o seu nus tributrio com o
imposto sobre a renda passasse de
um limite prefixado, como o de sua possibilidade de caixa; ou o fato de
algum vender um imvel antes do
dia 31 de dezembro de certo ano,
para no ter que pagar vultuoso imposto predial e territorial; e assim
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por diante, numa infinidade de
hipteses em que mais do que
evidente que seria rematado absurdo
tentar evitar a aplicao do
dispositivo.
A essa altura, cumpre fazer
um reparo crtico aos autores
citados. No que suas lies
estejam erradas. Apenas que so insuficientes. que, para separar
as formas evasivas das formas
elisivas no basta a indagao (e a
resposta) sobre o momento em
que se realizaram, se antes ou
depois do fato gerador. O
momento pode ser tambm, v.g., antes do pagamento do imposto.
Sobre o tema, ALBERTO XAVIER8,
nos idos de 1971, fez notar a
insuficincia doutrinria:
Outro equvoco de certa doutrina que sobre o tema tem se ocupado o de
restringir o campo de atuao do
negcio menos oneroso ao do
pressuposto (Tatbestand) do tributo. Assim o sugere, desde logo, a
classificao de origem anglo-
saxnica, mas logo retomada pela
doutrina continental, entre a tax avoidance e a tax evasion.
Na tax avoidance ou eliso do
imposto, o particular consegue evitar, impedir a realizao do pressuposto
de fato de um tributo, no praticando
o ato jurdico que a lei arvorou em
elemento de previso ou praticando
outro que a mesma lei no atribui conseqncias fiscais. Na tax evasion
ou evaso do imposto, o particular
praticou um ato correspondente ao
pressuposto de fato de um tributo, e posteriormente, procura evitar o
cumprimento da obrigao que lhe
corresponde. Por outras palavras: na
tax avoidance o particular pretende no entrar na relao tributria; na
tax evasion procura dela sair.
A verdade, porm, que esta
dicotomia no consegue surpreender todas as modalidades possveis do
8 XAVIER, Alberto Pinheiro. Op.cit., p.10.
negcio fiscalmente menos oneroso.
certo que esta figura assenta num
jogo de tipos legais cuja aplicao
est em certa medida, ao menos,
dependente da vontade do particular. Quer dizer: o carter tipolgico do
direito fiscal que est na base da
problemtica do negcio fiscalmente
menos oneroso. Ora, no s os pressupostos de fato so objeto de
uma tipologia por parte da lei fiscal,
so-no tambm os fatos impeditivos,
em que as isenes se traduzem, so-no ainda os fatos de que depende a
aplicao da taxa, no caso de
pluralidade de taxas so-no
finalmente os fatos aos quais a lei
atribui a dedutibilidade matria colectvel. Por outras palavras: objeto
de um processo de tipificao legal
no s os elementos da previso da
norma, mas tambm os de sua estatuio, ou seja, todos os
relevantes para a produo dos
efeitos jurdico-tributrios. Dessa
sorte, facilmente se compreende como o negcio fiscalmente menos
oneroso, se atua, via de regra, nos
elementos de previso (pressupostos
de fato), pode atuar quanto s isenes, quanto s dedues
(contrao de dvidas ou realizao de
doaes para efeitos de deduo
matria colectvel) e quanto aos
pressupostos da aplicao da taxa.
Daqui resulta uma importante
conseqncia: ou a distino entre
eliso do imposto e evaso fiscal corresponde diferena entre no
sujeio a tributo e violao
fraudulenta da lei de imposto aplicvel
e ento ficam de fora os negcios fiscalmente menos onerosos que no
respeitam previso, mas
estatuio da norma; ou tal dicotomia
exclui a violao fraudulenta da lei e
nesse caso no se consegue descortinar qualquer diferena de
regime entre a eliso e a evaso,
apenas em funo do elemento da
norma a que se refere o negcio.
Como vimos de observar, a
eliso pode se dar tambm nos
elementos da conseqncia (base
de clculo) por meio de dedues,
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por exemplo, que reduzam ou
extingam o montante do tributo a
pagar, de maneira absolutamente
lcita.
Para que haja fraude
material ou de forma jurdica
(simulao ou abuso de forma jurdica) devem estar presentes
requisitos rigorosos. A saber:
(a) na fraude, os meios so
sempre ilcitos. Na eliso, os meios so necessariamente
lcitos;
(b) a utilizao desses meios, na
fraude, d-se em momento posterior ocorrncia do fato
jurgeno ou do pagamento,
falseando-se os dados de
clculo. Na eliso o emprego
dos meios, quase sempre, ocorre antes;
(c) em relao pertinncia dos
meios, quando estes
expressam formas jurdicas alternativas (negcio jurdico
indireto), tem-se que, na
fraude, h simulao de
negcio e, na eliso, compatibilidade entre forma e
contedo. Na fraude, a
intentio facti uma, e a
intentio iuris outra. Na eliso, a inteno real volta-se
a duas ou mais formas
jurdicas opcionais, as quais
levam sempre ao resultado
desejado a priori. Podemos exemplificar com a
possibilidade, no Direito
Brasileiro, de uma pessoa
jurdica dotar-se de um bem de produo (ativo fixo) seja
adquirindo-o vista ou a
prazo (compra e venda) seja
alugando-o, por contrato de arrendamento mercantil
(leasing). Cabe ao
contribuinte, licitamente,
decidir que frmula jurdica,
dente as permitidas, lhe a mais favorvel, quer do ponto
de vista negocial, quer do
ponto de vista fiscal;
(d) finalmente, se h razes empresariais reais, como
reestruturao da empresa,
para obter ganho de qualquer
natureza, funcional,
operacional, mercadolgica ou
financeiro business purpose dificilmente se poderia
inquinar a operao de
fraudulenta, apenas porque
exerce o contribuinte o direito de escolher, entre meios
lcitos, aquele menos oneroso,
do ponto de vista tributrio.
Em suma, quando ocorre fraude material, temos
falsificaes. Na fraude por abuso
de formas de direito privado
imprescindvel a simulao do
negcio jurdico, cujo conceito est
no Cdigo Civil, art. 102 (numerus clausus):
Art.102. Haver simulao
nos atos jurdicos em geral:
I quando apresentarem
conferir ou transmitir direitos a
pessoas diversas das a quem
realmente conferem, ou transmitem.
II quando contiverem
declarao, confisso, condio ou
clusula no verdadeira. III quando os instrumentos
particulares forem antedatados,
ou ps-datados.
A simulao de negcio
jurdico, assunto serssimo pelas
conseqncias que acarreta, exige
rigor tcnico e cautela para que
possa ser irrogada s pessoas,
mormente em matria tributria.
Diz CAIO MRIO DA SILVA
PEREIRA9 que:
Consiste a simulao em celebrar-se
um ato que tem aparncia normal, mas que, na verdade, no visa ao
9 PEREIRA, Caio Mrio da Silva.
Instituies de Direito Civil, vol.I., Rio de Janeiro, Forense, 11 ed., 1989, p. 367.
Direito Tributrio Temas Atuais
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10
efeito que juridicamente devia
produzir, mas enganosa.
(...).
Pode a simulao ser absoluta ou relativa. Ser absoluta, quando o ato
encerra confisso, declarao,
condio ou clusula no verdadeira,
realizando-se para no ter eficcia nenhuma.(...)
A simulao se diz relativa, tambm
chamada dissimulao, quando o ato tem por objetivo encobrir outro de
natureza diversa (e.g., uma compra e
venda para dissimular doao), ou
quando aparenta conferir ou
transmitir direitos a pessoas diversas das a quem realmente se conferem ou
transmitem.
Como se observa, na simulao de negcio jurdico, a
intentio facti divorcia-se da
intentio iuris. A inteno das
partes uma. A forma jurdica
adotada outra. Ou ento o ato
ficto. Segundo CLVIS
BEVILAQUA10, a simulao uma declarao enganosa da
vontade, visando produzir efeito
diverso do ostensivamente
indicado. A simulao consiste,
pois, na discordncia entre a
vontade e declarao: as partes regulam, clandestinamente, as
relaes jurdicas de acordo com a
vontade desejada, mas no
declarada. No negcio jurdico
indireto, emprega-se determinado
instituto jurdico com o objetivo de alcanar finalidades diversas das
que lhe so tpicas. As partes
recorrem a negcio jurdico, a cuja
forma e disciplina sujeitam-se,
voluntria e conscientemente,
visando a alcanar um fim diverso
do fim tpico do negcio adotado.
10 BEVILQUA, Clvis. Teoria Geral do
Direito Civil, 2 ed. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1976, p. 225
Negcio indireto no negcio
simulado11.
Postos esses fundamentos,
veremos que no caso ora em
anlise os meios a serem
utilizados sero lcitos, com estrita
observncia aos preceitos legais, e com absoluta coincidncia entre a
inteno real e a inteno
manifestada, baseada, segundo
relatamos a Consulente, no
relevante propsito empresarial de
reorganizao societria, patrimonial e de economia de
custo.
6. INAPLICABILIDADE DO
PARGRAFO NICO DO ART.
116 DO CTN.
Pelas mesmas razes,
inteiramente inaplicvel ao caso
em tela o pargrafo nico do art.
116 do CTN, introduzido pela Lei
Complementar n 104, de 10 de janeiro de 2001, a saber:
Art. 116. Salvo disposio de lei
em contrrio, considera-se ocorrido
o fato gerador e existentes os seus efeitos:
I - tratando-se de situao de
fato, desde o momento em
que o se verifiquem as circunstncias materiais
necessrias a que produza os
efeitos que normalmente lhe
so prprios;
II - tratando-se de situao jurdica, desde o momento
em que esteja
definitivamente constituda,
nos termos do direito aplicvel.
11 ASCARELLI, Tullio. Problemas das
sociedades annimas e direito comparado. 2 ed., So Paulo, Saraiva, 1969, p. 110.
Direito Tributrio Temas Atuais
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11
Pargrafo nico. A
autoridade administrativa
poder desconsiderar atos
ou negcios jurdicos
praticados com a finalidade de dissimular a
ocorrncia do fato gerador
do tributo ou a natureza
dos elementos constitutivos da obrigao
tributria, observados os
procedimentos a serem
estabelecidos em lei ordinria. (grifamos)
A fraude, a simulao e a
dissimulao, no campo do
Direito Tributrio, so formas
ilcitas de evaso ou de
sonegao fiscal. A simulao caracteriza-se pelo intencional
desacordo entre a vontade
interna e a declarada, no sentido
de criar, aparentemente, um ato
jurdico que, de fato, no existe,
ou ento oculta, sob determinada
aparncia, o ato realmente querido. Como diz CLVIS, em
forma lapidar, a declarao
enganosa da vontade, visando a
produzir efeito diverso do
ostensivamente indicado.12 Ela,
em regra, pressupe uma declarao bilateral de vontade,
conluio entre as partes e visa a
iludir e lesar terceiros ou a violar
disposio de lei.
Embora a lei civil no
estabelea distino entre simulao absoluta ou relativa, a
doutrina as diferencia. A
simulao absoluta exprime
ato jurdico inexistente, ilusrio,
fictcio, ou que no corresponde
realidade, total ou parcialmente,
mas a uma declarao de vontade falsa. o caso de um
contribuinte que abate despesas
inexistentes, relativas a dvidas
12 MONTEIRO, Washington de Barros.
Curso de Direito Civil. Parte Geral, 28 ed. So Paulo. Saraiva, 1989, p. 207
fictcias. Ela se diz relativa, se
atrs do negcio simulado existe
outro dissimulado. Explica
BARROS MONTEIRO13:
relativa, quando
efetivamente h inteno de realizar algum ato jurdico, mas este: a)
de natureza diversa daquele que, de
fato, se pretende ultimar (colorem
habens, substantiam vero alteram). o caso da doao concubina,
mascarada sob aparncia de venda.
Para alcanar seu objetivo, as partes
realizam negcio jurdico diverso do
que soam as palavras; b) no efetuado entre as prprias partes,
aparecendo ento o testa-de-ferro, o
presta-nome, ou a figura de palha.
Por exemplo, algum, desejando vender bens a um dos descendentes
e no podendo satisfazer a exigncia
do art. 1.132, do Cdigo Civil, simula
alienao a terceiro, para que este, em seguida ou mais tarde, sem
outros embaraos, concretize o ato
que o primeiro tinha originariamente
em mira; c) no contm elementos
verdadeiros, ou melhor, seus dados so inexatos. Por exemplo, numa
escritura de compra e venda, os
contratantes mencionam preo
inferior ao real, a fim de reduzir o quantum do imposto de transmisso
da propriedade. Diz-se, nesse caso,
que a simulao parcial, hiptese
em que subsiste o ato, ressalvada Fazenda, bvio, a percepo dos
respectivos direitos fiscais.
(...)
Cumpre no confundir simulao com dissimulao. Distinguiu-as
FERRARA, nos seguintes termos: na
simulao, faz-se aparecer o que no
existe, na dissimulao oculta-se o
que ; a simulao provoca uma crena falsa num estado no-real, a
dissimulao oculta ao conhecimento
dos outros uma situao existente...
Mas, em ambas, o agente quer o engano; na simulao quer enganar
13 MONTEIRO, Washington de Barros. Op. cit.pp.209-13.
Direito Tributrio Temas Atuais
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12
sobre a existncia de uma situao
no-verdadeira, na dissimulao,
sobre a inexistncia de situao real.
Se a simulao um fantasma, a
dissimulao uma mscara.
Segundo a doutrina, a
simulao distinta da
dissimulao. Enquanto a
simulao expressa o que no
existe na realidade (total ou
parcialmente), a dissimulao oculta o que na realidade se
constituiu. Por isso, alguns
vislumbram na simulao relativa
dois aspectos distintos, do ato
que se aparentou fazer e o do ato
que na realidade foi feito, o fingido e o real, o invlucro e o
contedo. Desfeito o ato
aparente, roto o invlucro,
cumpre examinar a validade do
que restou, do contedo. Se no
houver inteno de prejudicar a
terceiros, ou de violar disposio de lei, o ato dissimulado vlido
(plus valet quod agitur quam
quod simulate concipitur), na
hiptese contrria, ilcito o
contedo, ser anulvel14.
Para a doutrina tradicional, ocorrem dois negcios: um real,
encoberto, dissimulado,
destinado a valer entre as partes;
e um outro, ostensivo, aparente,
simulado, destinado a operar
perante terceiros.
Para outros, no se pode
negligenciar a complexidade da
simulao, que no pode ser
reduzida a uma divergncia entre
a vontade e a declarao. Forte
em KHLER (para quem a
simulao uma incorporao do prprio querer) e em BETTI (que
conceitua a simulao relativa
como um vcio da causa, ou
14 MONTEIRO, Washington de Barros.
Op. cit., p. 210
abuso da funo instrumental do
negcio), UBALDINO MIRANDA15
constri unitariamente o
fenmeno simulatrio, a saber:
Com efeito, a simulao um
procedimento complexo a que as partes recorrem para a criao de
uma aparncia enganadora. Nesse
procedimento, mediante uma s
inteno, as partes emitem duas declaraes: uma destinada a
permanecer secreta e a outra com o
fim de ser projetada para o
conhecimento de terceiros, isto , do
pblico em geral. A declarao, destinada a permanecer secreta,
consubstanciada numa
contradeclarao ou ressalva,
constata a realidade subsistente entre os simuladores.
O procedimento simulatrio
deliberado pelas partes mediante um
acordo ou pacto (pactum simulationis) pelo qual celebram um
negcio jurdico aparente: umas
vezes, por lhes interessar apenas
essa aparncia, frente a terceiros, os
quais, na inteno dessas partes que simulam, devem tomar a aparncia
como realidade, nenhuma relao
jurdica efetiva estabelecida entre
elas (simulao absoluta). Outras vezes, as partes tm em vista a
formao de uma determinada
relao jurdica, mas pactuam a
celebrao de uma forma negocial aparente, a fim de ser projetada ao
conhecimento de terceiros para, sob
essa forma aparente, subsistir, entre
elas, aquela relao jurdica que visam (simulao relativa).
Assim, na primeira hiptese, quando
uma das partes simula com o seu
comparsa uma venda fictcia
(imaginaria venditio), para fugir ao assdio dos seus parentes
sucessveis; e, na segunda hiptese,
quando algum simula uma venda a
15 MIRANDA, Ubaldino. Teoria Geral do
Negcio Jurdico. So Paulo: Atlas, 1991, p. 115.
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13
outrem, quando na realidade lhe
doa.
Seja como for, nas
simulaes relativas, se existem
dois negcios distintos (o
ostensivo-simulado e o real-oculto) ou se o negcio
dissimulado constitui um todo
com o acordo simulatrio, o
pargrafo nico, acrescentado ao
art. 116 do Cdigo Tributrio
Nacional, autoriza desconsiderar atos e negcios jurdicos
ostensivos (simulados), que
dissimulam outros atos e
negcios jurdicos, realmente
ocorridos e integrativos do fato
gerador. Como j realamos, o
mesmo artigo distingue entre fatos geradores situaes
jurdicas e fatos geradores
situaes de fato, mas, em
qualquer uma dessas
modalidades, graas ao carter
relacional e transformacional do Direito, existem direta ou
indiretamente atos e negcios
jurdicos pressupostos. As
impropriamente chamadas
situaes de fato, descritas em
numerosas hipteses normativas tributrias configuram execues
de determinados atos e negcios
jurdicos.
O pargrafo nico do art.
116 permite autoridade
administrativa desconsiderar atos
e negcios jurdicos dissimulatrios, portanto
fraudulentos, que visam a ocultar
a ocorrncia do fato gerador, ou
seja, as verdadeiras relaes
negociais constitudas, ou seu
objeto, ou certas determinaes de seu contedo, relevantes e
por ele pressupostas. Veremos,
portanto, que o art. 116 no
consagra clusula genrica
antielisiva, nem tampouco altera
os critrios de interpretao para
autorizar o abandono da forma,
conceitos e institutos de direito
privado em favor de uma
chamada interpretao
econmica.
O pargrafo nico do art.
116 refere-se evaso ilcita, pois a simulao absoluta ou
relativa (dissimulao), quando
oculta a ocorrncia do fato
gerador ou a natureza dos
elementos constitutivos da
obrigao (preo, por ex.), viola a lei, configurando verdadeira
sonegao. E mais, sempre foram
desconsiderados pela autoridade
administrativa.
So numerosas e rotineiras
as hipteses de simulao e
dissimulao. (Entre muitos outros exemplos, a simulao de
gasto inexistente para reduo do
lucro ou da renda recibo de
aluguis fictcios; de emprstimos
inexistentes; recibos relativos a
pagamento de servios jamais prestados por jovens profissionais
liberais em favor de um
contribuinte, carente de despesas
a deduzir; igualmente o aparente
contrato de compra e venda que
dissimula verdadeira doao; os juros excessivos cobrados por
scio e emprstimo sociedade e
o valor de aluguis acima do
mercado podem esconder e a
lei j o pressupe verdadeira
distribuio disfarada de lucro;
contratos de compra e venda de imveis a registrar preo inferior
ao real, etc.) O Cdigo Tributrio
Nacional, no art.116, no est
coibindo a eliso ou o
planejamento tributrio, por si
lcito, mas sim a simulao, sempre ilcita. Na eliso os meios
so lcitos e o ato ou negcio
jurdico real, desencadeia
efeitos prprios, no mascara a
ocorrncia do fato gerador e h
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14
compatibilidade entre forma e
contedo. Na eliso, o fato, ato
ou negcio jurdico pressuposto
na norma simplesmente no
acontece.
O art.116 no cogita de
simulao relativa inocente. H, portanto, que diferenciar. A
doutrina tradicional do Direito
Civil distingue entre simulao
fraudulenta e simulao inocente.
Admitindo na simulao relativa
dois diferentes atos, o que se aparentou fazer e aquele que na
realidade foi feito, o fingido e o
real, ela tira da conseqncias
diversas. O aparente ser nulo,
invalidado. J o real, dissimulado,
poder ser vlido. Desfeito o ato
aparente, roto o invlucro, cumpre examinar a validade do
que restou, do contedo. Se no
houver inteno de prejudicar a
terceiros, ou de violar disposio
de lei, o ato dissimulado vlido
(plus valet quod agitur quam quod simulate concipitur); na
hiptese contrria, ilcito o
contedo, ser anulvel16.
Ora, o art.116 refere-se
dissimulao fraudulenta, aquela
ilcita, que oculta a ocorrncia do fato gerador ou a natureza dos
elementos constitutivos da
obrigao. Portanto, visa a coibir
a simulao que viola disposio
de lei tributria e, que, portanto,
no pode ter validade jurdica.
No visa, assim, o art. 116 a coibir a eliso, nem tampouco a
introduzir a interpretao
econmica entre ns.
16 MONTEIRO, Washington de Barros. Op.cit.,p.210
7. LEGISLAO COMER-
CIAL E NORMAS
REGULAMENTARES.
Afastada a possibilidade da
reestruturao sob exame ser
enquadrada como planejamento
ilcito e uma vez verificada a inaplicabilidade do art. 116,
nico, ao caso, cabe-nos, agora,
examinar a questo sob o
aspecto comercial e tributrio,
pela abordagem de dois
institutos: a aquisio de investimentos e a incorporao
de pessoa jurdica.
Primeiramente, observamos que
a aquisio de aes da Gama
pela Beta dever obedecer todas
as normas de regulamentao da
Comisso de Valores Mobilirios CVM para realizao de tal
operao, bem como as
respectivas remessas de valores
a ttulo de pagamento pelos
ttulos mobilirios adquiridos
devero seguir os procedimentos estabelecidos pelo Banco Central
do Brasil, a fim de assegurar o
cumprimento das disposies
legais pertinentes e evitar
qualquer argumentao para
desconsiderao do negcio jurdico.
A legislao comercial (Lei
n 6.404/76 Lei das S.A.) assim
prev a aquisio de aes para
converso da pessoa jurdica em
subsidiria integral:
Art. 251. A companhia pode ser constituda, mediante escritura
pblica, tendo como nico acionista
sociedade brasileira.
1. A sociedade que subscrever em bens o capital de subsidiria integral
dever aprovar o laudo de avaliao
de que trata o artigo 8,
respondendo nos termos do 6 do
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15
artigo 8 e do artigo 10 e seu
pargrafo nico.
2. A companhia pode ser
convertida em subsidiria
integral mediante aquisio, por sociedade brasileira, de todas as
suas aes, ou nos termos do
artigo 252. (grifamos)
J a incorporao de pessoa jurdica dever dar-se
conformidade com o artigo 227
da Lei n 6.404/76, extinguindo-
se a incorporada e sucedendo-lhe
a incorporadora em todos os
direitos e obrigaes. Vejamos:
Art.227. A incorporao a operao pela qual uma ou mais
sociedades so absorvidas por
outra, que lhes sucede em todos
os direitos e obrigaes.
1. A assemblia-geral da
companhia incorporadora, se aprovar o protocolo da operao,
dever autorizar o aumento de
capital a ser subscrito e realizado
pela incorporada mediante verso
do seu patrimnio lquido, e
nomear os peritos que o avaliaro.
2. A sociedade que houver de
ser incorporada, se aprovar o
protocolo da operao, autorizar
seus administradores a
praticarem os atos necessrios
incorporao, inclusive a subscrio do aumento de capital
da incorporadora.
3. Aprovados pela assemblia-
geral da incorporadora o laudo de
avaliao e a incorporao,
extingue-se a incorporada, competindo primeira promover
o arquivamento e a publicao
dos atos da incorporao.
8. CRITRIOS DE AVALIAO
DE PREO DE MERCADO DAS
AES PARA FINS DE
ALIENAO.
O artigo 465 do RIR/99, ao
tratar da distribuio disfarada
de lucros, conceito que, alis, caiu em desuso desde a extino
da tributao sobre a distribuio
de lucros e dividendos, refere-se,
em seu pargrafo 4,
determinao do valor de
mercado de bem negociado com pessoa jurdica ligada atravs de
laudo de avaliao de perito ou
empresa especializada, no
trazendo nenhuma outra
referncia quanto forma de
emisso do laudo de avaliao.
Desta forma, devemos recorrer s disposies da
legislao comercial, mais
especificamente ao artigo 8 da
Lei das Sociedades por Aes
Lei n 6.404/76, in verbis:
Art. 8 A avaliao dos bens era feita por 3 (trs) peritos ou por
empresa especializada, nomeados
em assemblia-geral dos
subscritores, convocada pela imprensa e presidida por um dos
fundadores, instalando-se em
primeira convocao com a presena
de subscritores que representem metade, pelo menos, do capital
social, e em segunda convocao
com qualquer nmero.
1 Os peritos ou a empresa
avaliadora devero apresentar laudo fundamentado, com a indicao dos
critrios de avaliao e dos
elementos de comparao adotados
e instrudo com os documentos relativos aos bens avaliados, e
estaro presentes assemblia que
conhecer do laudo, a fim de
prestarem as informaes que lhes forem solicitadas.(...)
Direito Tributrio Temas Atuais
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16
Os critrios de elaborao
de laudos de avaliao e de
eleio de peritos tecnicamente
qualificados esto dispostos no
Parecer CST n 926, de maio de
198717, do qual transcrevemos o
seguinte trecho:
Alm da capacidade dita jurdica, o
perito dever possuir tcnica ou
competncia, isto , aptido,
idoneidade, conhecimentos suficientes para exercer com
competncia a funo pericial que
lhe cometida. Por outras palavras,
o perito dever ser entendido, um
tcnico na arte ou cincia de que depender a percia. Quanto mais
caracterizadamente tcnica for a
matria objeto do exame, mais
acentuadamente tcnico urge seja o perito. Tanto que em determinados
casos a lei menciona expressamente
a especializao tcnica do perito a
ser nomeado. Assim, entre outros vrios, a lei de falncias manda se
escolha perito contador para os
exames de escriturao do falido;
nas aes de demarcao,
funcionar um agrimensor (Cd. Cit., art.423); no processo de interdio
sero nomeados peritos mdicos
(Cod.Cit., art.607); em se tratando
de percia de engenharia, deve ser designado perito engenheiro, isto ,
profissional habilitado secundo a lei
que regulamenta essa profisso.
Sendo assim, o laudo de avaliao do valor de mercado
das aes da Gama a serem
adquiridas pela Beta dever ser
emitido por profissional
tecnicamente capacitado para tal
percia, apontando, se correta a
expectativa das Empresas, a mais valia do investimento adquirido, a
qual dever ser registrada na
Beta como reserva de gio para
posterior incorporao ao capital
17 Imposto de Renda e Incorporao de
Aes de Sociedade Holding, in Revista
Dialtica de Direito Tributrio n77. So Paulo, Editora Dialtica, 2002.p.181.
social, conforme disposio do
artigo 385, inciso II do RIR/99.
A ttulo de esclarecimento,
alertamos que o laudo de
avaliao a que ora se faz
referncia no se confunde com a
reavaliao do ativo permanente de que trata o artigo 434 do
RIR/99.
9. DA AQUISIO DE AES.
9.1 ASPECTOS CONTBEIS
Vejamos os lanamentos contbeis da aquisio de aes
na empresa brasileira Beta,
tomando-se por base os
seguintes nmeros, a ttulo de
mera exemplificao:
Lanamentos contbeis na
Beta relativos aquisio de
aes a prazo:
Beta
Gama
Alfa
100% 100%
7%
93%
Valor contbil da Empresa Gama = 1.000
Valor de mercado da Empresa Gama = 5.000
Valor do investimento na Beta = 70
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17
Dbito Investimento =
930
Dbito gio na aquisio
de investimentos = 3.720
Crdito Passivo com
empresa ligada18 = 4.650
Clculo do valor do gio:
A Gama no ser objeto de
qualquer lanamento nesta
etapa, visto que a alterao a ela
pertinente uma troca de
controle acionrio, fato que no
importa em ajustes contbeis.
O gio, que definido pela diferena entre o valor pago e o
valor patrimonial das aes, e
que ocorre quando adotado o
mtodo de equivalncia
patrimonial, pode ocorrer por
origens e circunstncias diversas, podendo o seu tratamento
contbil, quanto sua futura
amortizao, variar em funo de
seu fundamento econmico e
natureza.
9.2. ASPECTOS TRIBUTRIOS
Dentre as hipteses
previstas pelo artigo 385 do
RIR/99, o caso em tela diz
18 Este deve ser segregado por longo e
curto prazo conforme o vencimento das parcelas.
respeito ao gio pago por
rentabilidade futura, isto ,
aquele que ocorre quando se
paga pelas aes um valor a
maior que o patrimonial, em
funo de expectativa de
rentabilidade futura da coligada ou controlada adquirida.
Este deve ser amortizado
dentro do perodo pelo qual se
pagou tal lucro futuro, ou seja,
contra os resultados dos
exerccios considerados na projeo dos lucros estimados
que justifiquem o gio. Neste
sentido, vide a transcrio do
2 do artigo 14 da Instruo n
247/96 da CVM Comisso de
Valores Mobilirios, autarquia
responsvel pela regulamentao e fiscalizao das companhias
abertas:
Art.14 O gio ou desgio
computado na ocasio da aquisio
ou subscrio do investimento dever ser contabilizado com
indicao do fundamento econmico
que o determinou.
2. O gio ou desgio decorrente de expectativa de resultado futuro,
dever ser amortizado no prazo e na
extenso das projees que o
determinaram ou pela baixa por alienao ou perecimento do
investimento.
Alm disso, de acordo com
o 3 do artigo 385 do RIR/99,
no caso do fundamento
econmico do gio em aquisio de investimentos estar baseado
na sua rentabilidade futura, h a
necessidade de elaborao de um
demonstrativo que identifique o
valor imputado ao investimento
adquirido, ou seja, um laudo de avaliao, elaborado com
observncia ao disposto no item
8 acima, o qual dever ser
4.650 (93% de 5000)
(930)
3.720
Mercado Contbil
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18
arquivado como comprovante da
escriturao.
Conforme a previso legal
do artigo 391 do RIR/99, as
contrapartidas da amortizao do
gio ou desgio, oriundo de
aquisio de investimentos em coligada e controladas, no sero
computadas na determinao do
lucro real. Este, portanto, seria o
tratamento tributrio a ser
observado pela Beta caso no
houvesse a posterior etapa do planejamento, qual seja, a
incorporao da controlada
Gama.
Inobstante a previso
acima, o inciso III do artigo 386
do mesmo diploma legal, assim
dispe:
Art.386. A pessoa jurdica que
absorver patrimnio de outra, em
virtude de incorporao, fuso ou
ciso, na qual detenha participao societria adquirida
com gio ou desgio, apurado
segundo o disposto no artigo
anterior:
(...)
III poder amortizar o valor do
gio cujo fundamento seja o de
que trata o inciso II do 2 do
artigo anterior, nos balanos correspondentes apurao de lucro
real, levantados posteriormente
incorporao, fuso ou ciso, razo
de um sessenta avos, no mximo, para cada ms do perodo de
apurao; (grifamos)
O inciso II do 2, por sua
vez, traz a seguinte redao:
Art. 385. O contribuinte que avaliar investimento em sociedade coligada
ou controlada pelo valor de
patrimnio lquido dever, por
ocasio da aquisio da participao, desdobrar o custo de aquisio em:
(...)
2. O lanamento do gio ou
desgio dever indicar, dentre os
seguintes, seu fundamento
econmico:
(...)
II valor de rentabilidade da
coligada ou controlada, com base em
previso dos resultados nos
exerccios futuros;
Desta forma, em
consonncia com as disposies
legais acima transcritas, para a
amortizao do gio e para que
ele seja considerado dedutvel para fins de apurao do Lucro
Real (base de clculo do IRPJ) e
do Resultado Ajustado (base de
clculo da CSLL), deve estar
suportado por um laudo de
avaliao que indique as razes
econmicas do valor imputado ao investimento adquirido.
Assim, percebe-se que a
amortizao do gio dever, a
priori, ser realizada no prazo e
extenso projetados no laudo de
avaliao.
Porm, se os lucros
previstos pelos quais pagou-se o
gio no seguirem os lucros
projetados em uma base
uniforme de ano para ano, a
amortizao dever acompanhar esse desenvolvimento
proporcional. Ademais, se os
lucros esperados forem
superiores aos anteriores
previstos, h a possibilidade de
acelerao da amortizao do
gio, desde que respeitados os prazos mximos e mnimos
previstos na legislao.
No caso em tela, esse
efeito ser vislumbrado na etapa
Direito Tributrio Temas Atuais
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19
posterior da reestruturao
societria, quando da
incorporao da Gama, ento
subsidiria integral, por sua
ento controladora Beta.
Deve-se, entretanto,
observar que a projeo para o pagamento das aes adquiridas
dar-se-, de forma financiada,
em prazo igual ou superior a 5
anos. Por tal razo, cumpre
frisarmos que um prazo inferior
de financiamento tornaria a operao mais segura, evitando
que o perodo das remessas ao
exterior a ttulo de pagamento
das aes coincida, ou mesmo
seja superior, ao do perodo de
amortizao do gio na
incorporadora.
No nos parece adequado
que o contribuinte possa
amortizar um gio pelo qual
sequer teve o nus de
pagamento pela aquisio do
investimento.
Os efeitos tributrios na
alienante estrangeira das aes,
a empresa Alfa, do ganho de
capital na operao, representado
pela diferena entre valor
patrimonial de venda e o valor contbil das aes, sero
observados, s.m.j., no momento
da disponibilizao dos recursos,
ou seja, somente quando da
remessa ao exterior. Isto porque
a reteno e o recolhimento do
imposto de renda na fonte devem ser realizados quando da
ocorrncia do fato gerador, que
corresponde ao pagamento,
crdito, entrega, emprego ou
remessa de rendimentos, o que
ocorrer primeiro.19
19 SRRF/8 RF, Consulta n 319 de 21/11/2002.
Sobre o tema, vejamos
abaixo a Soluo de Consulta n
45/9820, proferida pela Receita
Federal:
SOLUO DE CONSULTA
GANHOS DE CAPITAL NA
ALIENAO DE PARTICIPAO SOCIETRIA
A incidncia do imposto de renda
sobre ganhos de capital auferidos
por residente ou domiciliado no
exterior, na alienao de
participao societria, somente ocorre se o valor total pago,
creditado, entregue, empregado
ou remetido for superior ao
montante registrado como
investimento ou reinvestimento
junto ao Banco Central do Brasil.
Em que pese o termo creditado, o nos remeteria ao crdito
contbil da operao, de acordo
com o pargrafo 3 do artigo 685
do RIR/99, o ganho de capital
auferido por residente ou
domiciliado no exterior ser apurado e tributado de acordo
com as regras aplicveis aos
residentes no Pas. (grifamos)
Desta forma, aplicam-se,
subsidiariamente, os artigos 140
e 421 do RIR/99, que assim dispem, respectivamente: Nas
alienaes a prazo, o ganho de
capital dever ser apurado como
venda vista e tributado na
proporo das parcelas
recebidas em cada ms,
considerando-se a respectiva atualizao monetria, se
houver; e Nas vendas de bens
do ativo permanente para
recebimento do preo, no todo ou
em parte, aps o trmino do ano-
calendrio seguinte ao da
20 SRRF/8 RF, Consulta n 45 de 23/03/1998.
Direito Tributrio Temas Atuais
Sacha Calmon Navarro Coelho
(Publicada na Revista Dialtica de Direito Tributrio nr. 135)
20
contratao, o contribuinte
poder, para efeito de determinar
o lucro real, reconhecer o lucro
na proporo da parcela do
preo recebida em cada perodo
de apurao. (grifamos)
A responsabilidade pela reteno e o recolhimento do
imposto, alquota de 15%
(quinze por cento), sobre o
ganho de capital da Alfa,
traduzido pela diferena a maior
entre o valor pago ou remetido pela Beta e o valor do
investimento21 registrado no
BACEN, da adquirente dos bens
alienados por pessoa jurdica
residente ou domiciliada no
exterior22. O valor do
investimento em moeda estrangeira, registrado no
BACEN, no constituir base de
clculo para determinao do
montante de Imposto de Renda a
ser retido na fonte quando de seu
retorno ao pas de origem23.
Frisamos que a avaliao
das disposies legais da Holanda
extrapola o foco da presente
consulta, e, portanto, aqui no
analisamos o tratamento
tributrio que dever ser dispensado Alfa no exterior,
limitando-nos a verificar os
efeitos perante o ordenamento
jurdico brasileiro.
10. DA INCORPORAO DE
SOCIEDADE.
21 Convertido pela cotao da moeda estrangeira na data da alienao. 22 Vide artigos 26 e 93, II da Lei n
10.833/03. 23 Artigo 690, inciso II do RIR/99.
10.1 ASPECTOS CONTBEIS.
Na incorporao da
sociedade Gama pela sociedade
Beta, dever ser criada uma
conta de incorporao,
transitria, com objetivo de
formalizar e registrar, contabilmente, a extino da
sociedade incorporada.
Na sociedade
incorporadora Beta, devero ser
contabilizados os ativos e
passivos da ento extinta sociedade Gama, conforme as
respectivas naturezas das contas
de registro na incorporada.
O gio pago pela
incorporada Beta, por expectativa
de lucros futuros da extinta
controlada e ora incorporada sociedade Gama, dever ser
amortizada dentro do perodo
pelo qual pagou-se por tal
rentabilidade futura, observando-
se os comentrios feitos no item
9.2 acima acerca da possibilidade de acompanhamento proporcional
aos efetivos lucros ou prejuzos.
10.2. ASPECTOS SOCIET-
RIOS E TRIBUTRIOS.
A incorporao da subsidiria integral Gama por sua
controladora Beta acarretar a
extino daquela pessoa jurdica
e dever observar as disposies
do artigo 264 da Lei n 6.404/76,
abaixo transcrito:
Art. 264. Na incorporao, pela controladora, de companhia
controlada, a justificao,
apresentada assemblia-geral
da controlada, dever conter,
alm das informaes previstas
nos arts. 224 e 225, o clculo das
Direito Tributrio Temas Atuais
Sacha Calmon Navarro Coelho
(Publicada na Revista Dialtica de Direito Tributrio nr. 135)
21
relaes de substituio das
aes dos acionistas no
controladores da controlada com
base no valor do patrimnio
lquido das aes da controladora
e da controlada, avaliados os dois
patrimnios segundo os mesmos critrios e na mesma data, a
preos de mercado, ou com base
em outro critrio aceito pela
Comisso de Valores Mobilirios,
no caso de companhias abertas.
(Redao dada pela Lei n 10.303, de 2001).
1. A avaliao dos dois
patrimnios ser feita por 3
(trs) peritos ou empresa
especializada e, no caso de
companhias abertas, por empresa
especializada. (Redao dada pela Lei n 10.303, de 2001)
2. Para efeito da
comparao referida neste
artigo, as aes do capital da
controlada de propriedade da
controladora sero avaliadas,
no patrimnio desta, em
conformidade com o disposto
no caput. (Redao dada pela
Lei n 10.303, de 2001)
3. Se as relaes de
substituio das aes dos
acionistas no controladores,
previstas no protocolo da
incorporao, forem menos
vantajosas que as resultantes da
comparao prevista neste artigo, os acionistas dissidentes
da deliberao da assemblia-
geral da controlada que aprovar a
operao, observando o disposto
nos arts.137, II, e 230, podero
optar entre o valor de reembolso fixado nos termos do art.45 e o
valor do patrimnio lquido a
preos de mercado. (Redao
dada pela Lei n 10.303, de
2001)
4. Aplicam-se as normas
previstas neste artigo
incorporao de controladora por
sua controlada, fuso de
companhia controladora com a
controlada, incorporao de
aes de companhia controlada ou controladora, incorporao,
fuso e incorporao de aes de
sociedades sob controle comum.
(Redao dada pela Lei n
10.303, de 2001)
5. O disposto neste artigo no se aplica no caso de as aes do
capital da controlada terem sido
adquiridas no prego da bolsa de
valores ou mediante oferta
pblica nos termos dos artigos
257 a 263.
Relativamente legislao tributria, a operao de
incorporao implicar no
levantamento do balano na data
do evento, o encerramento do
perodo e a respectiva tributao
pelo IRPJ e pela CSL, se houver resultados tributveis.
11. CONCLUSO PELA LICITU-
DE DA OPERAO.
A operao em comento,
consoante as exposies acima, no apresenta quaisquer indcios
de fraude ou simulao, uma vez
que:
- Os meios utilizados para
reestruturao societria e
economia fiscal so,
inquestionavelmente, lcitos e utilizados de forma
coerente e legtima;
- A operao realizada
aquela efetivamente
desejada pelas empresas,
havendo plena coincidncia entre intentio facti e a
Direito Tributrio Temas Atuais
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22
intentio iuris, inexistindo,
portanto, simulao;
- Como informado pela
Consulente, existem
relevantes interesses
empresariais para a
reestruturao societria do grupo, dentre eles, a
mudana do perfil dos
investimentos no Brasil,
com a reduo do nmero
de empresas no pas, bem
como a alternativa de liquidez de remessa de
valores ao exterior. Tais
propsitos negociais
ensejam a operao de
forma absolutamente lcita.
Diante de todos os meios
lcitos disponveis, cabe ao contribuinte eleger a opo
menos onerosa e adequada ao
seu interesse e objeto
empresarial. Tanto assim, que
o Conselho de Contribuintes
entende que os contribuintes tm direito a administrar e planejar
sua relao jurdico-obrigacional
tributria, visando obter o
mximo de economia fiscal
dentre os limites legais. Vejamos:
IRPJ Ex(s): 1988 e 1999 IRPJ SIMULAO NA
INCORPORAO Para que se
possa materializar,
indispensvel que o ato
praticado no pudesse ser
realizado, fosse por vedao
legal ou por qualquer outra razo. Se no existia
impedimento para a realizao
da incorporao tal como
realizada e o ato praticado
no de natureza diversa
daquela que de fato apresenta, no h como
qualificar-se a operao de
simulada. Os objetivos visados
com a prtica do ato no
interferem na qualificao do
ato praticado. Portanto, se o
ato praticado era lcito, as
eventuais conseqncias
contrrias ao fisco devem ser
qualificadas como casos de
eliso fiscal e no de evaso
ilcita. (Ac. CSRF/01-01.874/94).
IRPJ INCORPORAO
ATPICA A incorporao de
empresa superavitria por
outra deficitria, embora
atpica, no vedada por lei, representando negcio jurdico
indireto.24
NORMAS GERAIS EVASO
FISCAL X ELISO FISCAL
Aproveita-se, legitimamente, do
instituto da eliso fiscal o
contribuinte que se vale de uma determinada jurdica que lhe seja
mais benfica, sem infringir
nenhum dispositivo legal. Por
outro lado, comete evaso fiscal
sujeitando-se ressarcimento dos
tributos sonegados e s penalidades cabveis, o
contribuinte que, por trs do
comportamento aparentemente
normal, oculta a inteno
deliberada de fraudar a lei.25
IRPJ ELISO FISCAL DESCONSIDERAO DA
PERSONALIDADE JURDICA
princpio assente na
doutrina e na jurisprudncia,
que os contribuintes podem
organizar seus negcios de
modo a minorar a carga
24 1 CC do Min. da Fazenda, Recurso n
131653, Acrdo n 101-94127, 1 Cmara, Publicado no DOU em
07/05/2003 25 1 CC do Min da Fazenda, Acrdo 106-05.619, 6 Cmara. Publicado no
DOU em 05/03/1997.
Direito Tributrio Temas Atuais
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(Publicada na Revista Dialtica de Direito Tributrio nr. 135)
23
tributria, desde que antes de
ocorrido o fato gerador e
respeitados os permissivos
legais. Evidentemente, o
princpio no amplo e
irrestrito, a ponto de tolerar
abuso desmesurado das firmas
jurdicas, divorciados de
racional organizao societria
e empresarial. No caso, duas
empresas interligadas,
explorando atividade quase
coincidente, com escriturao contbil, recursos materiais e
humanos, independentes, no
chegam a evidenciar indvido
o abuso das formas
jurdicas.26
SIMULAO Para que se
possa materializar a simulao
em incorporao,
indispensvel que o ato
praticado no pudesse ser
realizado, fosse por vedao legal ou por qualquer outra
razo. Se no existia
impedimento para a realizao
da incorporao tal como
realizada e o ato praticado no
de natureza diversa daquele
que de fato aparenta, isto ,
se de fato e de direito no
ocorreu ato diverso da
incorporao, no h como
qualificar-se a operao de
simulada. Os objetivos visados
com a prtica do ato no interferem na qualificao do
ato praticado; portanto, se o
ato praticado era lcito, as
eventuais conseqncias
26 1 CC do Min da Fazenda, Acrdo n
808010, publicado no DOU em 05/06/1991, p.10688.
contrrias ao fisco devem ser
qualificadas como casos de
eliso fiscal e no de evaso
ilcita.27
SIMULAO NO
COMPROVADA
Incomprovada a ocorrncia de
simulao na incorporao de
uma empresa superavitria
por uma deficitria, podem os
prejuzos desta serem
compensados com o lucro
daquela, no futuro, observado o prazo legal, posto no haver
vedao legal.28
SUBSTITUIO DE AES
Investimento feito em
empresa posteriormente
incorporada por terceiro. A
substituio de aes da
incorporada por aes da
incorporadora no implica na
baixa do investimento para
efeito de determinao de ganhos ou perdas de
capital.29
ESCOLHA ERRNEA DO
MTODO DE AVALIAO DE
INVESTIMENTO No existe
previso legal para que seja
equiparada reavaliao de bens a avaliao de investimentos pelo
27 1 CC do Min da Fazenda, Acrdo n
101-88316, publicado no DOU em
14/08/1995 e CSRF, Acrdo n 01-1.857/1995 e n 1.874/95 DO
13/09/1996. 28 1 CC do Min. Da Fazenda, Acrdo n
101-92.311, publicado no DOU em 27/10/1998. 29 1 CC do Min da Fazenda, Acrdo n
105-6.756 publicado no DOU em 17/10/1996.
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24
mtodo da equivalncia
patrimonial, ao invs do mtodo
do custo corrigido. Adotar tal
procedimento configura dar
tratamento diferenciado a
hipteses iguais (avaliao de
investimentos sejam relevantes ou no relevantes), o que se
afigura consentneo com a
legislao do imposto de renda e
com os princpios constitucionais
vigentes. Recurso voluntrio
provido.30
GIO PAGO EMPRESA
LIGADA No existe restrio,
na legislao do imposto de
renda, a que uma pessoa
jurdica, que adquira participao
societria em outra empresa, efetue o pagamento de gio, com
fundamentao econmica
baseada na rentabilidade futura
do investimento, ainda que a
aquisio se processe junto
empresa ligada ao adquirente. O gio regularmente pago poder
ser deduzido ou excludo na
determinao do lucro real da
investidora, desde que
observadas as condies
previstas na legislao do imposto de renda, quando da
aquisio do investimento.31
12. RESPOSTAS
1- Pode a Empresa controladora
com sede no exterior (Alfa) alienar a sua participao societria na
empresa controlada para uma
30 1CC do Min. da Fazenda, Acrdo n
101-90.675 publicado no DOU em 07/05/1997. 31 1 CC do Min. da Fazenda, Acrdo n
101-84.191, publicado no DOU em 05/08/1994.
terceira Empresa, sediada no Brasil,
tambm sob seu controle?
Sim. No h qualquer
impedimento legal para a
alienao de participao
societria entre pessoas jurdicas coligadas ou controladas. A
legislao comercial probe
apenas a participao recproca
entre empresas do mesmo grupo
societrio.
2 A adoo do valor de mercado, na operao de compra e venda de
investimentos, entre Empresas
controladora e controlada uma
opo ou uma imposio da legislao brasileira, inclusive frente
s disposies concernentes
distribuio disfarada de lucros?
Trata-se de opo do
contribuinte, que pode realizar sua operao pelo valor
registrado ou pelo valor de
mercado. Frise-se que as
disposies legais acerca da
distribuio disfarada de lucros
caram em desuso, conforme j
citado anteriormente, em virtude da extino da tributao na
distribuio de lucros e
dividendos a acionistas. Ressalte-
se, porm, a incidncia do IRRF
sobre distribuio de reservas
tributveis, i.e., reservas de lucros relativas aos anos-
calendrio em que havia a
previso legal de tributao.
3 Quais critrios (inclusive
cambiais) devero ser considerados na determinao do valor do
investimento na empresa brasileira,
pela Empresa alienante, para efeitos
de apurao do ganho de capital,
sujeito tributao?
Dever ser alterado o valor
do investimento registrado no
Banco Central do Brasil BACEN.
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25
4 Qual dever ser o tratamento
contbil e fiscal a ser observado pela
Empresa adquirente, entre o valor da
aquisio e o valor patrimonial do
investimento adquirido?
A diferena entre o valor
da aquisio e o valor primordial
das aes adquiridas pela Beta
dever ser contabilizada como
gio na aquisio de
investimento. O referido gio somente ser passvel de
amortizao aps a incorporao
da Gama pela Beta, em virtude
das disposies do artigo 386, III
do RIR/99, no perodo em que se
baseou-se a expectativa de lucros futuros, ou em prazo maior ou
menor, acompanhando os
efetivos lucros ou prejuzos.
5 A quem caber a
responsabilidade (sujeio passiva)
pela apurao do provvel ganho de capital e do recolhimento dos
tributos incidentes?
A responsabilidade pela
reteno e recolhimento dos
tributos incidentes sobre o ganho de capital apurado do
remetente dos valores, neste
caso, a adquirente Beta.
6 Qual o tratamento tributrio a
ser dado ao ganho de capital auferido pela Empresa estrangeira,
na alienao do investimento para a
Empresa brasileira (momento da
apurao e da reteno na fonte, alquotas a serem consideradas)?
O ganho de capital auferido
pela Alfa na alienao das aes
Beta ser tributado na fonte
alquota de 15% conforme o
artigo 685, I e 3 do RIR/99, em cada remessa ao exterior.
7 Em que extenso o ganho de
capital sob anlise deve ter o
tratamento equiparado ao
tratamento dado s pessoas fsicas
ou dado s pessoas jurdicas,
sediadas no Brasil (arts.140, 421,
682 e seguintes do RIR/99)?
De acordo com o pargrafo 3 do artigo 685 do RIR/99, o
ganho de capital auferido por
residente ou domiciliado no
exterior ser apurado e tributado
de acordo com as regras
aplicveis aos residentes no Pas (grifamos).
Desta forma, aplicam-se,
subsidiariamente, os artigos 140
e 421 do RIR/99, que assim
dispem, respectivamente: Nas
alienaes a prazo, o ganho de
capital dever ser apurado como venda vista e tributado na
proporo das parcelas recebidas
em cada ms, considerando-se a
respectiva atualizao monetria,
se houver; e Nas vendas de
bens do ativo permanente para recebimento do preo, no todo ou
em parte, aps o trmino do ano-
calendrio seguinte ao da
contratao, o contribuinte
poder, para efeito de determinar
o lucro real, reconhecer o lucro na proporo da parcela do preo
recebida em cada perodo de
apurao.
8- Em se tratando de alienao pra
recebimento do preo, em um prazo
de 05 anos ou mais, o ganho de capital pode ser reconhecido e os
tributos apurados e recolhidos
(inclusive IR Fonte) medida e na
proporo das parcelas recebidas em cada perodo de apurao, mesmo
sendo o alienante uma pessoa
jurdica estrangeira (art. 421, do
RIR/99)?
Sim. Conforme resposta
anterior, respeitando o princpio
da capacidade contributiva.
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26
9 Com a incorporao da empresa
adquirida (Gama) pela empresa
adquirente (Beta) o valor do gio
pago quando da aquisio poder ser
amortizado como despesa dedutvel, conforme previsto nos arts. 7 e 8,
da Lei n 9.532/97?
Sim. Ademais a sucesso
dos direitos e obrigaes no
mbito civil e comercial, no mbito tributrio, ser possvel a
amortizao do gio como
despesa dedutvel na apurao do
IRPJ e da CSL da pessoa jurdica
incorporadora Beta, conforme
disposio do artigo 386 do RIR/99, com base nos artigos 7
e 8 da Lei n 9.532/97.
10 Algumas das operaes
poderiam ser caracterizadas como
procedimentos de evaso e/ou eliso fiscal, e, em sendo podero sofrer
algum tipo de restrio, pela
legislao brasileira, em especial,
pela LC n 104/2001?
Como vimos ao longo desta exposio, a reestruturao
societria busca, entre outros
propsitos empresariais, a
reduo da carga tributria,
atravs da utilizao de meios
lcitos e da coincidncia entre a intentio facti e a intentio iuris. A
reduo da carga tributria no
consiste em nica motivao para
a total reorganizao das
empresas do grupo no Brasil.
Portanto, entendemos tratar-se de caso de eliso fiscal, de
natureza intrinsecamente lcita,
constituindo negcio no sujeito
descaracterizao.
Ainda assim, frisamos, a
norma contida no artigo 116
nico do Cdigo Tributrio Nacional CTN possui natureza
antidissimulao e no anti-
elisiva, posto que a eliso, como
vimos forma de economia fiscal
absolutamente lcita, no
ensejando sua descaracterizao.
No obstante, a aplicao
da referida norma, ainda que
pretendida, somente poderia dar-
se atravs do Poder Judicirio,
uma vez que a mesma pende ainda de regulamentao, e o
agente fiscal, enquanto aplicador
da lei, no detm poderes para
desconsiderar negcios jurdicos,
sob pena de aniquilar-se a
segurana jurdica e a liberdade negocial.
11 A realizao da operao,
entre empresas do mesmo Grupo
poderia, s por esta razo, de
alguma forma, ser caracterizada como simulao?
As operaes entre
empresas do mesmo grupo
societrio ensejam maior ateno
dos agentes fiscais por refletir
situao facilitadora de planejamentos ilcitos,
fraudulentos. Todavia, este
argumento no suficiente para
a caracterizao de operao
simulada, sob o escudo de todos
os fundamentos aqui elencados.
A simulao, como vimos,
consiste na realizao de ato
aparente para fingir situao
inexistente (simulao absoluta)
ou encobrir situao real diversa
(simulao relativa). Na hiptese de planejamento ora analisada, o
ato jurdico realizado refletir a
real inteno das partes, e, por
conseguinte, no h como se
falar em simulao.
12 A operao em questo, poderia, de alguma forma, ser
tratada como operao ilcita, sob os
argumentos de que ao final haver benefcio fiscal decorrente de
amortizao do gio?
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27
No. Os meios utilizados
para aproveitamento da
dedutibilidade do gio decorrente
da aquisio de investimento
decorrem de expressa previso
legal e atendem a todos os
fundamentos e pressupostos do fato gerador dos tributos. A
reorganizao societria em
questo contempla propsitos
empresariais relevantes e utiliza
medidas no s no coibidas,
como expressamente permitidas em lei, para o aproveitamento de
economia fiscal.
Este o parecer.