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PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA GABINETE DE SEGURANÇA INSTITUCIONAL SECRETARIA DE ACOMPANHAMENTO E ESTUDOS INSTITUCIONAIS ENCONTRO DE ESTUDOS MUDANÇAS CLIMÁTICAS 12 de junho de 2007 Brasília 2008

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PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICAGABINETE DE SEGURANÇA INSTITUCIONAL

SECRETARIA DE ACOMPANHAMENTO E ESTUDOS INSTITUCIONAIS

ENCONTRO DE ESTUDOS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

12 de junho de 2007

Brasília2008

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ENCONTRO DE ESTUDOSMUDANÇAS CLIMÁTICAS

12 de junho de 2007

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Presidente da RepúblicaLuiz Inácio Lula da Silva

Vice-Presidente da RepúblicaJosé Alencar Gomes da Silva

Gabinete de Segurança InstitucionalGen. Jorge Armando Felix

Secretaria de Acompanhamento e Estudos InstitucionaisJosé Alberto Cunha Couto

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PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICAGABINETE DE SEGURANÇA INSTITUCIONAL

SECRETARIA DE ACOMPANHAMENTO E ESTUDOS INSTITUCIONAIS

ENCONTRO DE ESTUDOS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

12 de junho de 2007

Brasília2008

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Permitida a reprodução, sem fins lucrativos, parcial ou total, por qualquer meio, secitada a fonte.Observação: Versão Atualizada e Normalizada em 27/11/2008

Tiragem: 200 exemplares

Impresso no Brasil

Edição: Secretaria de Acompanhamento e Estudos InstitucionaisEndereço para correspondência:Praça dos Três PoderesPalácio do Planalto, 4º andar, sala 130Brasília-DF - 70150-900Telefone: (61) 3411-1374Fax: (61) 3411 1297E-mail: [email protected]

Criação, editoração eletrônica e impressão:Gráfica da Agência Brasileira de Inteligência

A presente publicação expressa a opinião dos autores e não reflete,necessariamente, a posição do Gabinete de Segurança Institucional.

Organizadora:Carla Márcia Parisi Checchia

Revisora:

Giovana Dias da Costa

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

E56 Encontro de Estudos: Mudanças Climáticas (Brasília : 2007).Encontro de Estudos: Mudanças Climáticas. Brasília: Presidência daRepública, Gabinete de Segurança Institucional, 2008.

112p.

ISBN 978-85-85142-27-8

1. Clima – alteração 2. Aquecimento Global. 3. Gerenciamentoambiental. 4. Gerenciamento ambiental – legislação. I. Título. II. Brasil.III. Presidência da República. Gabinete de Segurança Institucional.

CDD - 363.73874

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SUMÁRIO

ABERTURA

Palavras do Ministro Jorge Armando Felix – GSI/PR ...................... 9

PALESTRAS

Professor Dr. Paulo Artaxo ............................................................. 15Universidade de São Paulo

Senador Renato Casagrande ........................................................ 53Senado Federal

Jornalista André Trigueiro .............................................................. 83Globonews

DEBATE

Perguntas ao Senador Renato Casagrande .................................. 69

Perguntas ao Professor Dr. Paulo Artaxo ...................................... 75

Perguntas ao Jornalista André Trigueiro ...................................... 101

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Abertura

General Jorge Armando FelixMinistro-Chefe do Gabinete de Segurança Institucional

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Abertura

Paula Lima – Mestre de Cerimônias: Boa tarde a todos e atodas. Gostaria de iniciar esta reunião de estudos agradecendo apresença de todos os representantes de organismos internacionais,órgãos de governo, universidades, organizações não-governamentais,aqui presentes. Meu nome é Paula Lima, eu sou da Secretaria deAcompanhamento e Estudos Institucionais, da Coordenadoria deEstudos, e vou chamar para compor a mesa o nosso ministro, GeneralJorge Armando Felix, Ministro-Chefe do Gabinete de SegurançaInstitucional da Presidência da República, o Professor Paulo Artaxo,nosso primeiro palestrante, e a minha colega Carla Checchia, que seráa mediadora da reunião de hoje.

Ministro Jorge Armando Felix: Em primeiro lugar, eu queriacumprimentar os demais integrantes da mesa: Professor Paulo Artaxo eCarla. Cumprimentar, também, a todos que estão destinando um poucodo seu tempo a esse nosso encontro, que é o primeiro desse ano.

As mudanças climáticas são um problema global que exigiráunião e parcerias diversas para ser enfrentado. É com esse espíritoque o GSI resolveu realizar esse encontro de estudos. Nossapreocupação com o tema se alia à preocupação de muitas outraspessoas, governos e instituições, no Brasil e fora dele, com o quepoderemos nos deparar em um futuro próximo, caso se concretizemas previsões e estudos realizados sobre o assunto, maisespecificamente, caso se configurem as previsões do IV Relatório doPainel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas – IPCC. Assim,expressões como derretimento de geleiras, elevação do nível dosoceanos, secas generalizadas, nova era do gelo e até os chamadosrefugiados do clima, que, de acordo com a Cruz VermelhaInternacional, somam hoje 25 milhões de pessoas deslocadas porrazões ambientais, já fazem parte do nosso vocabulário cotidiano.Como é do conhecimento da maioria dos senhores, o Gabinete de

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Segurança Institucional, o GSI, tem entre as suas competências atuarcomo Secretaria-Executiva do Conselho de Defesa Nacional,acompanhar temas com potencial de crises para o Estado, para asociedade e para o governo, articular órgãos e instituições paraprevenir a ocorrência de crises, e coordenar, se for o caso, seugerenciamento, quando houver grave e iminente ameaça àestabilidade institucional. Além disso, o GSI tem-se dedicado àidentificação do que chamamos de infra-estrutura crítica que, segundodefinição de diversos organismos internacionais como a OEA, porexemplo, consiste, entre outras, naquelas instalações, sistemas eredes, bem como serviços e equipamentos físicos e de tecnologia dainformação, cuja interrupção ou destruição teria impacto negativosobre a população, a saúde pública, a segurança, a atividadeeconômica, o meio ambiente, a governabilidade democrática ou ofuncionamento eficaz do governo de um país. Podemos mencionar,nesse contexto, toda a infra-estrutura cada vez mais interligada, emalguns casos vulnerável, dos serviços de telecomunicações, bancose setor financeiro em geral, energia, transportes, água, serviçosessenciais, entre outros. Cumpre destacar que a preocupação comessa temática cresceu muito, no mundo inteiro, em virtude dosatentados do 11 de setembro nos Estados Unidos.

Para atender essas missões, temos que estar atentos a qualquerameaça que venha a prejudicar ou a interromper o perfeitofuncionamento desses setores estratégicos para a economia brasileira.Desse modo, se considerarmos a avaliação de especialistas eestudiosos em mudanças climáticas, é importante levar em conta oaquecimento global e seus efeitos no que diz respeito a questões deinfra-estruturas, seja no planejamento de novas instalações, seja paraproteger o funcionamento daquelas existentes.

Com o anúncio dos resultados do IV Relatório do PainelIntergovernamental de Mudanças Climáticas, muito se tem faladosobre a abrangência dos impactos das mudanças do clima nasdiferentes regiões e setores de atividades do país e sobre asvulnerabilidades brasileiras. A adaptação a essas mudanças, segundoopinião de especialistas, tende a ocorrer na recuperação e narestauração de rodovias, na construção de usinas hidrelétricas e na

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navegabilidade das hidrovias. Outro exemplo a ser considerado é,principalmente no sul e no sudeste, o aumento do volume de chuvasque tende a reduzir a qualidade das estradas, diminuir a freqüênciade chuvas que deverá ocorrer juntamente com o aumento da forçadas precipitações, tendendo a elevar o assoreamento dos rios,prejudicando a navegação e, como os períodos de estiagem devemser mais prolongados, poderá haver reflexos na capacidade degeração das usinas. Entendemos, portanto, que os efeitos dasmudanças climáticas podem-se configurar como situações de criseou de ameaça à segurança da infra-estrutura crítica, o que exigirá denós ações preventivas em articulação com os demais Ministériosresponsáveis, para que possamos reduzir os efeitos negativos quepossam ser causados à população brasileira.

Esse esforço de articulação e de parceria entre governo, setorprivado e sociedade civil é fundamental no enfrentamento dos desafiosresultantes do aquecimento global, como já mencionamos no início.Mais do que isso, penso que é importante, ou mais importante ainda,a contribuição individual de cada um de nós na reorganização donosso modo de vida, na reformulação consciente dos nossos hábitosde consumo e no maior cuidado com a natureza, se quisermoscombater a mudança climática. Dessa forma, com o intuito de estudare aprofundar o conhecimento dessas mudanças e seus impactos parao Brasil, o GSI identificou e convidou para esse Encontro palestrantesque irão falar esta tarde, que se encontram entre os mais qualificadospara tal no país em suas áreas de atuação. Com certeza, com asexposições que serão realizadas e os debates que se seguirão,teremos uma tarde muito proveitosa para todos. Um bom trabalho,muito obrigado.

Paula Lima – Mestre de Cerimônias: Obrigada, Ministro.A continuação dos trabalhos será feita pela Carla Checchia, quecoordenará nossa reunião de hoje.

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Palestra

Professor Doutor Paulo ArtaxoUniversidade de São Paulo

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PalestraProf. Dr. Paulo Artaxo

Carla Checchia - Mediadora: Obrigada Ministro, obrigadaPaula. Boa tarde a todos. O Ministro mencionou em seu discurso quea problemática do aquecimento global exigirá união e parceirasdiversas para ser enfrentado. É com esse espírito, hoje, que trouxemosnossos ilustres palestrantes com os quais pretendemos aprender sobreo tema abordado nesse Encontro e conhecer visões de três diferentessetores: a academia, com o professor Paulo Artaxo; o PoderLegislativo, com o senador Renato Casagrande; e a mídia, com ojornalista André Trigueiro.

Nessa pasta que foi distribuída aos senhores, além daprogramação, há uma ficha de avaliação desse evento. Nósgostaríamos de pedir a gentileza de que todos respondessem essaavaliação. Ela é um importante feedback para a organização deencontros futuros que nós pretendemos fazer aqui na Presidência.Há também um formulário de perguntas que será utilizado por ocasiãodo debate. As perguntas serão encaminhadas exclusivamente porescrito, através desse formulário. Há também uma lista com aspublicações dos encontros de estudos já realizados pela SAEI, queestão disponíveis no endereço eletrônico www.planalto.gov.br/gsi/saei.Lá fora, nós disponibilizamos alguns exemplares sobre o Estudo daAmazônia e, além desse, há vários outros que podem ser baixadosna internet.

Antes de dar início ao encontro de hoje, gostaríamos de convidá-los, desde já, a participar do VII Encontro Nacional de EstudosEstratégicos. Este ano a coordenação do encontro será do GSI eacontecerá aqui em Brasília, entre os dias 6 e 8 de novembro próximos.Serão abordadas quatro grandes áreas: segurança e defesa, relaçõesinternacionais, ciência e tecnologia e temas sociais. Também já estádisponível na página do GSI, na internet, a divulgação desse evento,onde vocês poderão acessar maiores informações. Na pasta de vocês,há uma prévia sobre a programação e alguma explicação sobre essasquatro áreas que serão abordadas no evento.

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Para o nosso encontro de hoje, adotamos a seguintemetodologia: a primeira exposição é do professor Paulo Artaxo.Ele terá 45 minutos para nos apresentar os principais pontos doIV Relatório do IPCC e, em seguida, o senador RenatoCasagrande também terá 45 minutos para nos falar da formulaçãode políticas públicas sobre a questão das mudanças climáticas.Faremos uma pausa para o café, de 15 minutos, após aapresentação do senador, e em seguida teremos a apresentaçãodo jornalista André Trigueiro, também com 45 minutos para nosfalar sobre os impactos do aquecimento global sobre o mundosustentável. E finalmente abriremos o debate a todos aquipresentes.

Passo, agora, à leitura do currículo do professor Paulo Artaxo,que em seguida fará sua apresentação.

O Professor Paulo Artaxo é doutor em física atmosféricapela Universidade de São Paulo. Atualmente é professor titulardo Departamento de Física Aplicada e coordenador do Laboratóriode Física Atmosférica do Instituto de Física da USP. Trabalhacom fís ica apl icada, problemas ambientais, atuandoprincipalmente nas questões de mudanças climáticas globais,meio ambiente na Amazônia, física de aerossóis atmosféricos,poluição do ar urbana e outros temas. É membro titular daAcademia Brasileira de Ciências, tendo publicado mais deduzentos trabalhos científicos e apresentado mais de quinhentospapers em conferências científicas internacionais. Tem mais de2.700 citações de seus trabalhos. É coordenador do Instituto doMilênio de Experimento – LBA, que é um projeto internacionalconduzido por cientistas brasileiros, americanos e europeus; emembro do IPCC (Painel Intergovernamental de MudançasClimáticas) e de sete outros painéis científicos internacionais. Étambém um dos principais autores de um dos capítulos do novorelatório do IPCC. Em 2004, recebeu um voto de aplauso doSenado Brasileiro pelo trabalho científico em meio ambiente naAmazônia. Em 2006, foi eleito fellow da American Association forthe Advancement of Science. É coordenador da área degeociência da FAPESP, a Fundação de Apoio à Pesquisa doEstado de São Paulo. Professor Paulo Artaxo, por favor.

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Professor Paulo Artaxo: Boa tarde a todos. Boa tarde, SenhorMinistro. É uma satisfação para mim vir à Presidência da Repúblicadiscutir esse tema que vocês já devem ter ouvido falar muito nosjornais e na televisão, às vezes de uma maneira um pouco distorcida,às vezes de uma maneira um pouco até sensacionalista. Mas a idéiaé discutir com vocês os pontos principais do relatório do IPCC, e,além disso, discutir alguns trabalhos feitos no Brasil por pesquisadoresbrasileiros de simulações climáticas feitas aqui para o Brasil, e otrabalho da EMBRAPA sobre os impactos das mudanças climáticasna agricultura, para permitir um debate amplo sobre as questõesestratégicas desse tema para o país. Começando direto no assunto,um dos aspectos que acho relevante e que muitas pessoas meperguntam é o 4º relatório do IPCC, porque somente agora esse temarealmente dominou o interesse governamental, científico, da mídia,não só no Brasil, mas no globo como um todo (Fig. 1).

Fig. 1 – Principais pontos do IV IPCC.

Pontos principais da nova abordagem doQuarto relatório do IPCC:

• Enorme quantidade de novas observações em todas as áreas;

• Capitulo sobre paleoclima: Entender o passado como chave para prever o futuro

• Efeitos das partículas ed aerossóis em nuvens incluído na forçante radiativa

• Capítulo sobre biogeoquímica e ciclagem de carbono em todos os compartimentos

•Criteriosa avaliação das incertezas e utilização de 95% de confiabilidade

•Modelos climáticos muito mais completos

• Projeções do futuro feitas com uma grande variedade de modelos aprimorados

• Projeções climáticas regionais pela primeira vez

de

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A primeira questão é que as mudanças globais vêm sendodiscutidas há uns vinte anos, mas a comunidade científica, até dois,três anos atrás, não tinha uma massa crítica suficiente de dadosobservacionais para realmente poder identificar de uma maneiraunívoca que o homem estava causando as alterações climáticasque estavam sendo observadas. Então, uma rede enorme de dados,que precisa ser bastante melhorada do lado brasileiro, diga-se depassagem, é responsável por uma solidez de observaçõesambientais em todas as áreas. Há, inclusive, por exemplo, um doscapítulos sobre o paleoclima, para nós entendermos o clima dopassado como sendo uma chave para entendermos o clima do futuro.Isso é novidade nesse relatório do IPCC. Também é novidade norelatório do IPCC ter estudos mais específicos de efeitos dosaerossóis nas nuvens, o que foi principalmente motivado pelosestudos aqui na Amazônia, que fizemos como parte do experimentoLBA. Tem uma questão toda em um capítulo sobre geoquímica eciclagem de carbono em todos os seus compartimentos. Então, nãose trata só da questão do clima, mas, na verdade, trata-se da questãodo funcionamento do nosso planeta como um todo. Foi feita umacriteriosa avaliação das incertezas e foi utilizado um padrão deconfiabilidade de 95% para qualquer tipo de afirmação científicaneste relatório. Isso trouxe uma confiabilidade que os relatóriosanteriores não têm. Os modelos climáticos de hoje são de uma ordemde grandeza mais complexa de que os modelos climáticos dosrelatórios anteriores e as projeções do clima futuro. Apresentareialgumas dessas projeções para vocês, que foram feitas com umaenorme variedade de modelos muito aprimorados. São cerca de 24modelos climáticos utilizados nesse estudo e isso permitiu umasolidez bastante forte nos resultados. As projeções climáticas foramregionalizadas e, pela primeira vez, então, discutiu-se não só aquestão do clima global, mas também o que vai acontecer na Américado Sul, na Europa, nos Estados Unidos, e assim por diante. Umadas questões importantes para o entendimento da questão climáticaglobal é a compreensão do enorme número de processos físicos equímicos que afetam a composição da atmosfera (Fig. 2).

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Fig 2. – Processos físico-químicos que afetam a composição da atmosfera.

Desde as emissões industriais até as emissões naturais devulcões, a emissão da vegetação e dos oceanos, vão para a atmosfera.Isso é transportado, processado do ponto de vista físico-químico, einterage com a radiação solar de maneira bastante forte, criandobasicamente a composição da atmosfera como a conhecemos hoje.É muito importante salientar que a atmosfera é compartilhada portodos os países e por todos os seres humanos do nosso planeta,sendo um dos poucos recursos onde isso ocorre de uma maneiraefetiva e, portanto, nós temos que cuidar dos processos que ocorremna atmosfera com uma atenção toda especial. Neste relatório, nóstambém temos um entendimento muito maior do modo como estamosalterando a ciclagem do carbono, do qual o principal gás do efeitoestufa, o dióxido de carbono - CO

2, é um dos maiores representantes.

Então, a queima de combustíveis fósseis, hoje, emite cerca de 6,4 a7,2 milhões de toneladas de carbono por ano, que são lentamenteadicionadas na atmosfera. O que nós estamos observando hoje é aemissão cumulativa ao longo dos últimos 150 anos. É sempre

Processos fProcessos fíísicosico--ququíímicos que afetam a micos que afetam a composicomposiçção da atmosfera ão da atmosfera

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importante salientar que, do lado brasileiro, a questão da queimadade florestas tropicais foi quantificada com uma emissão da ordem de1,6 gigatonelada de carbono e, portanto, é sim uma emissão bastantesignificativa para a atmosfera, comparada com a queima total decombustíveis fósseis. Nós quantificamos os fluxos dos ecossistemasterrestres para a atmosfera num processo de deposição extremamentecuidadoso de estudos de balanço do carbono. Se fizermos aretrospectiva histórica desde 1850, de como se dá o fluxo paraatmosfera e do fluxo da atmosfera para quem absorve esse gás deefeito estufa, nós observamos que na mudança de uso do solo, ondeo Brasil tem uma contribuição importante nos últimos quinze anos,houve uma evolução ao longo desses 150 anos, mas a quantidadetotal de carbono por esse processo é razoavelmente constante,enquanto que as emissões de combustíveis fósseis tiveram umaumento extraordinário, principalmente nos últimos cinqüenta anos ehoje é de longe a maior fonte de gás de efeito estufa para a atmosfera.Do ponto de vista das absorções desses gases, o oceano tem umaparcela importante, mas já está chegando ao ponto de saturação dasua capacidade de absorver esse gás. Há também a absorção decarbono pelos ecossistemas terrestres, onde as florestas tropicais,inclusive a Amazônia, jogam um papel extremamente importante dafixação desse carbono na biosfera. A diferença do que é emitido peloque não é absorvido é acumulado na atmosfera, levando ao aumentoda concentração desses gases no efeito estufa.

Neste gráfico (Fig. 3), nós temos – desde 1700 até 2005 – aemissão, a concentração de dióxido de carbono, onde antes daRevolução Industrial essa concentração era da ordem de 280 partespor milhão; hoje ela é da ordem de 375 partes por milhão,correspondente ao aumento médio de 33% na concentração dessegás. E a projeção para o final deste século é de termos concentraçõesde metano (CO

4), que é o segundo gás mais importante de efeito

estufa, variando de 500 a 1.000 partes por milhão. As concentraçõesde metano mais que dobraram nos últimos 150 anos, de tal maneiraque as atividades humanas começaram a controlar a composição daatmosfera, o que era um privilégio somente dos processos naturaisaté há 150 anos.

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Fig. 3 – Concentração da emissão de dióxido de carbono e metano.

Este gráfico aqui (Fig. 4) mostra a concentração de dióxido decarbono nos últimos dez mil anos, em que temos as variabilidadesnaturais da concentração desse gás. Nos últimos 150 anos temosum aumento muito significativo das concentrações. Isso acontecepara o dióxido de carbono, para o metano e para o terceiro gás emimportância de efeito estufa, que é o óxido nitroso (N

2O). Este gás é

emitido principalmente pela queima de combustível fóssil e pelodesmatamento em regiões tropicais. O metano é emitidoprincipalmente pelo gado, em primeiro lugar; por cultivo de arrozirrigado, em segundo, o que mostra que está associado com asatividades de agropecuária; e em terceiro lugar com exploração eenvasamento de gás natural. O óxido nitroso é um gás emitidobasicamente quando se adiciona uréia e fertilizantes ao solo. Ele éprocessado pelas bactérias do solo e emite quantidades significativasde N

2O. Portanto, o N

2O também está associado às atividades da

agricultura.

DiDióóxido de carbono xido de carbono e metanoe metano

aumentaram aumentaram significativamente significativamente desde a revoludesde a revoluçção ão

industrialindustrial

CO2var iabilidade espacial e temporal CH

4 variabilidade espacial e temporal

CO2: aumento de 33% CH4: aumento de 100%

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Fig. 4 – Concentração de dióxido de carbono nos últimos dez mil anos.

Este gráfico (Fig. 5) mostra a concentração de CO2, em

vermelho, ao longo dos últimos 650 mil anos; em azul, a concentraçãode metano e, em preto, uma medida da temperatura neste mesmoperíodo. Nós observamos que sempre que temos aumento daconcentração de CO

2 e de metano, há um correspondente aumento

da temperatura do nosso planeta nessa escala temporal, o que mostraclaramente que a concentração de gás de efeito estufa, pelo menosnessa escala temporal, está diretamente vinculada à temperatura donosso planeta. E por que isso ocorre? Isso ocorre basicamente porquea humanidade está alterando o que chamamos balanço de radiaçãoterrestre. Toda a vida do planeta é sustentada pela radiação solar;são 342 watts por metro quadrado que, em média, atinge a superfícieterrestre a cada dia. Parte é refletida de volta pelo espaço e pelasnuvens, parte é refletida pela superfície do planeta e parte é absorvida.Desta parte que é absorvida, utilizamos os processos para manter avida no planeta e a radiação escapa na forma de calor ou de raiosinfravermelhos. Outra parte desse calor é interceptada pelas nuvens,

Concentrações atmosféricasde dióxido de carbono, metano e óxido nitroso nosúltimos 10.000 anos.

As forçantes radiativas estãocalculadas na escala da direita.

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pelas partículas de aerossóis e pelos gases de efeito estufa e voltapra cá. O que a humanidade está fazendo é aumentar a fração dessaradiação que volta para a baixa atmosfera, armazenando mais energiacom o correspondente aumento de temperatura associado com esseprocesso. Então, estamos alterando a concentração dos gases deefeito estufa, alterando a fração de calor que é armazenada na baixaatmosfera.

Fig. 5 – Concentração de CO2, CH

4 e N

2O nos últimos 650 mil anos.

Neste último relatório do IPCC foi feito um estudo muitocuidadoso dos impactos climáticos, região por região do planeta (Fig.6). Aqui está o resultado da América do Sul. Por exemplo, a linhapreta mostra os valores observados de aumento de temperatura dosúltimos cem anos; a linha azul é quanto deveria ser a variação natemperatura se somente as forças antinaturais climáticas estivessemem operação, e em vermelho são as forças naturais e as forçasantropogênicas. O que nós observamos é que só se explica o valormedido de temperatura para todas as regiões do planeta se levarmos

ConcentraConcentraçção de COão de CO22, metano e , metano e óóxido nitroso nos xido nitroso nos úúltimos 650.000 anos.ltimos 650.000 anos.A linha preta A linha preta éé a temperatura na mesma escala temporal.a temperatura na mesma escala temporal.

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em conta a componente natural mais a componente antropogênica.Esse gráfico foi decisivo no IPCC para mostrarmos que, realmente,sem a interferência do homem, jamais conseguiríamos explicar osvalores observados de aumento de temperatura para todos oscontinentes do nosso planeta, mostrando claramente que o homem éo responsável por esse aumento de temperatura. Mas o aquecimentoglobal não é só aumento de temperatura. Na verdade, desde 1970, éestatisticamente significante o aumento da temperatura superficialda atmosfera e na troposfera do nosso planeta, bem como o aumentoda temperatura dos oceanos. Nós estamos observando um aumentosignificativo do nível global do mar e da quantidade de vapor de águana atmosfera. Por causa da maior temperatura, ocorre a maiorevapotranspiração. Estamos observando o aumento de vapor d’águaque intensifica o ciclo hidrológico, o aumento na intensidade da chuvae o aumento na quantidade de chuva extra região tropical, o aumentona intensidade de furacões de categoria 4 e 5, o aumento naintensidade de secas e o aumento na incidência de ondas de calor.

Fig. 6 – Variação da temperatura no planeta (último século).

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Todos esses indicadores estão sendo estatisticamente significantesdo ponto de vista observacional, além de estarmos também verificandoum decréscimo na extensão de neve, particularmente da Região Ártica,um decréscimo na quantidade de gelo no Mar Ártico, um decréscimona maior parte das geleiras de todos os continentes e um decréscimona incidência de temperaturas frias. Então, este quadro, que hoje já ébem claro do ponto de vista científico, demonstra que essasobservações são realmente muito maiores do que somente o aumentoda temperatura. Por isso, nós nos referimos a essas alterações comomudanças globais.

O próximo gráfico mostra o aumento da temperatura média donosso planeta nos últimos 150 anos, mostrando que, de 1850 atémais ou menos 1950, o sistema climático variou muito a temperatura- porque essa temperatura tem uma variabilidade natural muito grande.Isso é normal no sistema climático -, mas, a partir de 1970, nóssistematicamente observamos um aumento dessa temperatura queultrapassou a variabilidade natural do sistema climático (Fig. 7).

(a) Mudanças observadas na temperatura global da superfície desde 1850;

(b) Nível médio do nível do mar desde 1850

(c) Cobertura de neve no hemisfério Norte

Fig. 7 – Aumento da temperatura média no planeta nos últimos 150 anos.

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Estamos observando o aumento médio do nível do mar em função damaior presença de neve nas águas oceânicas, que é particularmenteimportante para o Brasil pela sua extensão das áreas costeiras.

No caso do aumento da temperatura, se olharmos este gráfico(Fig. 8), agora com valores ano a ano, vamos observar o seguinte: setirarmos uma média nos últimos cem anos, a razão de aumento é daordem de 0,07°C por década. Se essa mesma média for feita nosúltimos cinqüenta anos, a razão do aumento praticamente dobra. Issoquer dizer que estamos observando um aumento de temperatura cadavez mais rápido. Se olharmos com mais cuidado ainda e observarmosque, dos últimos quatorze anos, tivemos os doze anos mais quentesde toda a série temporal dos 650 mil anos, isso quer dizer algumacoisa ainda mais importante. Então estas evidências agora mostram,inclusive para os céticos, que esse aumento de temperatura érealmente muito claro.

Fig. 8 – Aumento da temperatura global - os doze anos mais quentes.

A temperatura está aumentando cada vez mais rápido

100 0.074±±±±0.018

50 0.128±±±±0.026

Os 12 anos mais quentes:1998,2005,2003,2002,2004,2006, 2001,1997,1995,1999,1990,2000

Período Razão

Anos °°°°/década

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Isso não acontece só em nível global. Se nós olharmos, porexemplo, aqui para o nosso país, veremos o aumento de temperaturasmínimas em Campinas, constatadas pelo IAC, onde, no final do séculopassado, o valor médio da temperatura mínima era 14,2 °C; maisrecentemente, em 2006, está na ordem de 16,7 °C. Isso não é sóalteração global, mas também alteração no nosso próprio país, noBrasil. No caso do vapor d’água, ele está aumentando de concentraçãona atmosfera e isso tem duas implicações importantes. O vapor d’água,ele próprio também um gás que faz efeito estufa, absorve radiaçãona faixa de infravermelho e, além disso, para se formarem nuvens echuvas, é preciso ter mais vapor d’água na atmosfera, o que intensificao ciclo hidrológico com as repercussões que nós vamos ver daqui apouco, além de ser um fator estatisticamente importante.

A precipitação, baseada em dados de milhares de observaçõesmeteorológicas no globo como um todo, está mudandosignificativamente em grandes áreas (Fig. 9).

Smoothed annual anomalies for precipitation (%) over land from 1900 to 2005; other regions are dominated by variability.

A PrecipitaA Precipitaçção jão jáá estestáá mudando significativamente em grandes mudando significativamente em grandes ááreas.reas.

Aumento

Decréscimo

Fig.9 – Precipitação de chuvas no planeta.

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Em algumas áreas está havendo aumento da taxa deprecipitação, como, por exemplo, na parte sul do Brasil, norte daArgentina e Uruguai; esse aumento é bastante significativo. Tambémestá havendo aumento de precipitação em áreas da América do Nortee da Ásia, enquanto que em outras regiões está havendo decréscimode chuva, em particular na região sul da Europa, na região do Sahelda África e na parte central da Ásia. Então, em algumas regiõesobserva-se um aumento da incidência de chuvas; em outras, umdecréscimo, indicando que o ciclo hidrológico do nosso planeta estásendo alterado.

Também se observa um aumento na proporção de chuvaspesadas em áreas continentais (Fig. 10). Um percentil de chuvas muitoforte está aumentando sua freqüência em praticamente todas asregiões do globo, com algumas exceções que são esses sinais de‘menos’, indicando que eventos de chuvas fortes, causandoinundações, tornam-se cada vez mais freqüentes.

Fig. 10 – Aumento da proporção de chuvas pesadas.

Regiões de mudanças na ocorrência de chuvas pesadas (95th) e muito pesadas (99th)

Aumento da proporção de chuvas pesadas em áreas continentais

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Torna-se cada vez mais freqüente, também em nível global, aincidência de secas, medida por um índice de severidade de secasdesenvolvido pelos meteorologistas. Esse índice de seca indica que,por exemplo, a região central do Brasil e a região da Bacia do SãoFrancisco estão sofrendo uma redução na taxa de precipitação,enquanto que toda a parte sul do Brasil e o norte da Argentina estãosofrendo um aumento na redução da incidência de seca. Mas se vocêsobservarem, no globo como um todo, predomina a intensificação desecas e, em particular, nas regiões tropicais e subtropicais essefenômeno está mais evidenciado (Fig. 11).

Fig. 11 – Aumento das secas.

Ondas de calor também estão tendo a sua incidênciaaumentada. Essa é a anomalia para a temperatura nos meses dejunho, julho e agosto, durante o verão europeu, onde podemosobservar que, a partir de 1950, há uma tendência de aumento daanomalia de temperatura. Por exemplo, em 2003, houve cerca de

Índice de secas (Palmer DroughtSeverity Index(PDSI)) para 1900 a 2002.

As secas estão aumentando em vAs secas estão aumentando em váárias regiõesrias regiões

Decréscimo na chuva em áreas tropicais e

subtropicais

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trinta mil mortos na Europa causada por esta onda de calor que foimuito forte, a mais forte de que já houve registro (Fig. 12).

Fig.12 – Aumento das ondas de calor.

Mas tirando esse caso episódico, observamos um aumento natendência de eventos climáticos extremos. Isso ocorre porque estáhavendo um deslocamento da circulação atmosférica, causado poraquecimento diferencial da região do Ártico em relação às regiõesmais temperadas e que faz com que os centros de alta pressãopredominem nas regiões que influenciam as massas de ar queadentram na Europa, causando basicamente ondas de calor, reduçãode precipitação e alterando profundamente o clima da Europa.Provavelmente, esse tipo de fenômeno ocorre também em outrasregiões do globo e está sendo estudado pelos meteorologistas.Também é estatisticamente significante o aumento da incidência defuracões (Fig. 13). Esta linha amarela é o aumento de incidência defuracões de categoria 4 e 5, e esse aumento de furacões está

Ondas de calor extremas: em 2003, 30.000 mortosna Europa

Aumento de ondas de calor: Exemplo da EuropaAumento de ondas de calor: Exemplo da Europa

Tendência somadaà variabilidade

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associado com o aumento do nível da temperatura superficial do mar,particularmente no Atlântico Tropical. Ao injetar mais energia nosistema climático, essa energia é dissipada na forma de furacões eeventos climáticos extremos. Isto já está sendo observado e já éestatisticamente significante, em particular a partir do início dadécada de 90.

Fig. 13 – Aumento da incidência de furacões.

Na Groenlândia e na Antártica, vemos que está havendo perdade água, ou seja, está havendo mais perda de água líquida pela bordada Antártica do que pela acumulação da taxa de precipitação na partecentral. Isto tudo está fazendo com que haja uma contribuição para oaumento do nível médio dos oceanos. Para vocês terem uma idéiada magnitude da quantidade de água armazenada na Groenlândia,se em trezentos ou em quinhentos anos, toda água armazenadaderretesse, nós teríamos um aumento médio do nível do mar da ordemde sete metros. É importante salientar que isso não vai ocorrer em

A percentagem de furacões categoria 4 e 5 está aumentando desde 1944

O aumento da incidência de furacões estO aumento da incidência de furacões estáá ligada ao ligada ao aumento da temperatura superficial do maraumento da temperatura superficial do mar

SST(1944-2005)

Aumento após 1994

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cem, duzentos anos. Isso ocorre numa escala temporal muito maisampla (Fig. 14).

Fig. 14 – Perda de água nas geleiras da Groenlândia e da Antártica.

E quais são as previsões para o futuro que esse relatório doIPCC coloca? Basicamente, para fazer previsões sobre o aumentoda temperatura no futuro, precisamos de um cenário possível deaumento de concentrações de CO

2 e isso tem uma incerteza muito

grande, pois vai depender da reação dos governos e da sociedade aessas questões das mudanças climáticas. Para isso, o IPCC fez quatrocenários diferentes (Fig. 15). Um dos cenários, que é esse amarelo,de estabilização em níveis do século passado, ou seja, nesse momentovamos imaginar que ninguém emita mais uma única molécula de CO

2

para a atmosfera, que não se gere eletricidade, que não semovimentem veículos, e assim por diante. Um cenário impossível,mas foi considerado para ver a resposta do sistema climático, alémdesses três outros cenários: um cenário onde a concentração de CO

2

GroenlândiaGroenlândia e Ante Antáártica estão perdendo rtica estão perdendo ááguagua

Groenlândia ganha massa no interior, mas perde mais nas bordas.

Se em 300-500 anos toda a água armazenada na Groenlândia derretesse: Aumento médio no nível do mar de 7 metros.

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se estabilize em 550 partes por milhão; um cenário mais próximo desetecentas partes por milhão; e um cenário da ordem de oitocentaspartes por milhão. Hoje a concentração de CO

2 é 375 partes por milhão

e aqui está o aquecimento previsto para cada um desses cenários.

Fig. 15 – Previsão de aquecimento global: cenários do IPCC.

No cenário mais otimista, o aquecimento é da ordem de 1,5 a2ºC. No cenário mais pessimista, ele é da ordem de 3 a 3,5°C. Mesmono cenário em que se congelem as emissões de CO

2 hoje, o sistema

continua aquecendo por causa do efeito residual desses gases deefeito estufa na atmosfera, o que vai durar algumas centenas de anos.Então, mesmo as políticas mais rígidas de controle não têm comoevitar um aumento na temperatura ao longo do próximo século. E seolharmos para seis cenários diferentes do IPCC, nós vamos ver quea faixa de aumento de temperatura amplia significativamente em 1,5ºCe, em alguns cenários, chegando a 6ºC. A nossa tarefa é tentar fazercom que esses cenários de maior aumento de concentração de gás

Previsão de aquecimento ao longo Previsão de aquecimento ao longo dos prdos próóximos 100 anosximos 100 anos

Cenários possíveis de aumento nas

concentrações de CO2Aumento na temperatura média

global: de 2 a 4 graus centígrados

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de efeito estufa não se realizem e que estejamos do lado doscenários mais benéficos para estabilizarmos a concentração deCO

2 em 500, 550 partes por milhão, o que dará um aumento de

temperatura da ordem de 1,5 a 2ºC. Porém, esse aquecimentoglobal será fortemente regionalizado, isto é, a temperatura nãovai aumentar o mesmo valor em todas as regiões do nossoplaneta.

Este gráfico aqui mostra o aumento de temperatura paratrês cenários diferentes para daqui a 30 anos e para o final doséculo (Fig. 16). O que observamos é que, por exemplo, nocenário do final do século, as regiões polares podem aquecer daordem de 7 a 7,5 ºC, de acordo com esses modelos, e a regiãodo Brasil central pode aquecer da ordem de 5ºC ao longo desteséculo, o que é um aumento bastante significativo.

Fig. 16 – Estimativas de aumento de temperatura até o final do século XXI.

Estimativas de aumentos regionais de temperatura para Estimativas de aumentos regionais de temperatura para 2029 e 2099 de acordo com 3 cen2029 e 2099 de acordo com 3 cenáários de emissõesrios de emissões

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Aqui está um zoom no cenário B2 (Fig. 17), o cenário maisconservativo, onde o aumento para a maior parte do território brasileiroé da ordem de 2 a 2,5ºC, e um cenário, digamos assim, maispessimista, com um aumento da ordem de 4,5 a 5ºC da temperaturamédia do nosso país. Neste caso, esses aumentos de temperaturaterão forte impacto sobre a precipitação, sobre a chuva.

Fig. 17 - Estimativas de aumento de temperatura do Brasil.

Aqui estão as mudanças regionais no padrão de precipitaçãopara o final do século, relativo ao ano 2000, quando em junho, julho,agosto, durante a estação seca, no interior da região amazônica, éprevista uma redução forte da taxa de precipitação (Fig. 18). O InstitutoNacional de Pesquisas Espaciais - INPE, em particular José Marengoe Carlos Nobre, refizeram essas simulações, que apresentaremosdaqui a pouco, com grau de detalhamento maior do que odetalhamento feito pelo relatório do IPCC; mas vocês observam queextensas áreas do globo sofrerão redução significativa de precipitação,

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enquanto que em outras áreas, em particular em altas latitudes,teremos aumento dessa taxa de precipitação e isso vai afetarfortemente a agricultura e as atividades associadas.

Fig. 18 – Mudanças regionais no padrão de precipitação para o final do século XXI.

Na questão do aumento do nível do mar, esse gráfico (Fig. 19)mostra o aumento observado no nível do mar ao longo dos últimostrezentos anos e uma previsão do aumento de acordo com os modelosclimáticos do IPCC para os próximos cem anos, indicando um aumentoda ordem de trinta a quarenta centímetros, média global. Como esseaumento será pontual para cada região do nosso país, os modelosainda não conseguem fazer essa previsão com uma incertezapequena, inclusive isto foi muito explorado pela mídia, que tevealgumas matérias extremamente sensacionalistas sobre a questãodas mudanças globais, por exemplo.

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Fig. 19 – Aumento do nível do mar (1900 – 2100).

Fig. 20 – Exemplo de hipóteses alarmistas exploradas pela mídia.

Aumento do nível do mar nos últimos e nos próximos 100 anos

NãoNão vaivai ocorrerocorrerpelopelo menosmenos emem200200--300 300 anosanos……

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Isso é uma matéria do Jornal do Brasil (Fig. 20), mostrandobasicamente o que aconteceria numa hipótese completamenteimpossível e sem base científica de um aumento do nível do mar daordem de dez metros. Basicamente, uma parte do Rio de Janeiroseria inundada. É sempre importante frisar que este cenário éimpossível de ocorrer nos próximos duzentos ou trezentos anos. Éuma especulação que não tem base científica.

Este gráfico do IPCC (Fig. 21) compara as contribuições dasalterações climáticas para o dióxido de carbono, para o metano epara o óxido nitroso, que são os gases que aquecem a atmosfera,comparados com uma componente que resfria a atmosfera, que sãoas partículas de aerossóis, como, por exemplo, as partículas deaerossóis emitidas em queimadas ou no cano de descarga dos carros.Essas partículas resfriam o clima através da absorção de radiaçãodiretamente e através de processos de inibição de formação denuvens, alterando a microfísica das nuvens. Então, o sistema climáticoé extremamente complexo, com componentes de aquecimento sendo

ForForççantes radiativas dos componentes do sistema climantes radiativas dos componentes do sistema climáático globaltico global

Fig. 21 – Forçantes radioativas dos componentes do sistema climático global.

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parcialmente balanceadas por componentes que resfriam o clima donosso planeta. Aqui está a componente de aquecimento dos gasesde efeito estufa; aqui está a componente de resfriamento das nuvense dos aerossóis e aqui está a componente antropogênica total. Éimportante salientar que aquilo que fizermos na componente docontrole das partículas de aerossóis é absolutamente crítico para oque vai acontecer na forçante radioativa final.

No caso dos cenários de estabilização de temperaturas emfunção do aumento da concentração de CO

2 (Fig. 22), o que

observamos é que, conforme vai aumentando a concentração de CO2,

a temperatura de equilíbrio do sistema climático também vaiaumentando, não linearmente, diga-se de passagem, e está sendotrabalhada uma tentativa de estabilizar o aumento máximo detemperatura em 2ºC para preservar o funcionamento dos principaisecossistemas do globo, inclusive a própria floresta amazônica e issoimplica uma estabilização da concentração de CO

2 da ordem 450 a

500 partes por milhão, o que não é uma tarefa muito fácil de serrealizada num curto prazo.

Cenários de estabilização de temperatura em função do CO2

Evitar mudanças climáticas “perigosas”: Aquecimento máximo abaixo de 2 graus

Fig. 22 – Cenários de estabilização de temperaturas em função do CO2 .

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O IPCC é dividido em três relatórios. O que eu apresentei para

vocês é o relatório do Grupo 1, do qual José Marengo, Pedro Dias e

eu participamos ativamente. Há outros componentes, como o relatóriodo Grupo 3, que trata dos impactos desses aumentos no

funcionamento do sistema terrestre como um todo, incluindo a

disponibilidade de água, o funcionamento dos ecossistemas, produçãode alimentos, danos nas áreas costeiras e danos na saúde humana.

Conforme vai aumentando a temperatura média do planeta, em geral

vai aumentando o dano, por exemplo, de enchentes, aumentandoproporcionalmente a exposição da população para essas questões.

E um dos aspectos importantes é que o aumento da incidência de

eventos climáticos extremos é previsto para todos os modelos, issoinclui secas, inundações, furacões, etc e tal. Isso certamente também

tem implicações em relação à segurança do funcionamento do sistema

terrestre como o conhecemos hoje, de uma maneira muito importante.

Anomalias de Precipitação (mm/day)-DJF- [(2071-2100)- (1961-90)]

Anomalias de Temperaturas (C ) DJF - [(2071-2100)- (1961-90)]

Seco

SecoSeco

Seco

A2B2B2 A2

A2B2B2 A2

Quente Quente

JoséMarengo, INPE/CPTEC

Fig. 23 – Anomalias de precipitação de chuvas e de temperaturas no Brasil.

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O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais - INPE, em particular o

José Marengo e o Carlos Nobre, fez simulações detalhando esses

modelos globais para a realidade brasileira. Isso foi publicado numrelatório do Ministério do Meio Ambiente e, em especial, uma das

projeções principais é de que a Amazônia e toda a região do

nordeste sofrerão um forte aquecimento da ordem de 4 a 5ºC euma forte redução na taxa de precipitação. Isso pode fazer com

que o ecossistema amazônico, pelo menos na sua parte leste, tenha

dificuldade de sustentar uma floresta tropical chuvosa como a queconhecemos hoje, e parte dessa floresta seja convertida para

savanas ou para cerrado. Essa é uma das projeções dos modelos

climáticos, particularmente para a Amazônia e para a regiãonordeste (Fig. 23).

Uma outra questão importante, do ponto de vista meteorológico,

é a incidência de dias de seca consecutiva. Nesse caso, foi feita umaanálise nos últimos trinta anos desse século versus trinta anos do

século passado, e o que se observou é que, com dois cenários

diferentes, o aumento na freqüência de dias consecutivos de secavai aumentar significativamente na região do nordeste e na região da

Bacia do São Francisco; e o contrário vai ocorrer na região sul do

país. Então, vai aumentar a taxa de precipitação em reduzir incidênciasde secas na região do país.

Do lado brasileiro, uma das questões mais importantes é a

emissão de queimadas. Este gráfico aqui mostra o desmatamentoda Amazônia (Fig. 24), com dados oficiais do INPI mostrando

que desde o início da década de 90 há um sistemático aumento,

seguido por um decréscimo nos últimos 3 anos, bastantesignificativo da região desmatada, aqui medida em área de Km2/

ano. Esta redução também se dá em função da identificação do

número de focos de queimada, que também sofreu uma reduçãosignificativa, e acreditamos que é extremamente importante

continuar nesta tendência de queda da incidência de queimadas

na Amazônia.

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Fig. 24 – Desflorestamento e focos de queimadas na Amazônia.

Desflorestamento e focos de queimadas na AmazôniaDesflorestamento e focos de queimadas na Amazônia

De sflore station in Amazon ia 1977-2006 in km² pe r year

0

5000

10000

15000

20000

25000

30000

35000

77/88*

88/89

89/90

90/91

91/92

92/94

94/95

95/96

96/97

97/98

98/99

99/00

00/01

01/02

02/03

03/04

04/05

05/06

Desflorestation (km² per year)

* média annual da década Dados do INPE, 2005

Number of fire spots in Brazil 1999 - 2006NOAA-1 2 s at ellit e images

0

50000

100000

150000

200000

250000

1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Number of fire spots in

Brazil

Emissão brasileira de CO2 em 1994 por setor

23%

3%

0%

74%

0%

Energia Processos IndustriaisAgropecuária Desmatamento e queimadasTratamento de resíduos

v

Maiores emissores globais de CO2 em 1994

5272

2960

16601200

1030 861

0

1000

2000

3000

4000

5000

6000

EstadosUnidos

China Russia Japão Brasil Índia

Emissões de CO2 (m

illhões de t)

O Brasil é o quinto maior emissor mundial de

CO2 em 1994, valor que é maior em 2007.Sem as emissões de queimadas seria o 16º.

A maior parte (74%) das emissões brasileiras

está relacionada ao desmatamento e queimadas.

InventInventáário de emissões de COrio de emissões de CO22 do Brasildo Brasil

Fig. 25 – Inventário de emissões de CO2 do Brasil.

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Isto é importante porque o inventário nacional de emissão degás de efeito estufa indica, segundo dado oficial do Ministério daCiência e Tecnologia, que 74% das nossas emissões de CO

2 são

causadas pelas queimadas na Amazônia e uma fração bastante menorpela produção de energia pelo sistema industrial (Fig.25). Isso noscoloca numa posição da ordem de 6º maior emissor de gás de efeitoestufa, basicamente por causa das emissões de CO

2 causadas pelas

queimadas na Amazônia.Evidentemente, efeito estufa não é só CO

2. Aqui está uma

compilação das edições de metano no Brasil (Fig. 26), ondeverificamos que as atividades agropecuárias associadas com aprodução de gado dominam completamente a emissão de metano,associado com outros processos, inclusive o tratamento deresíduos em grandes cidades, aterros sanitários e assim pordiante.

Emissões de metano no BrasilEmissões de metano no BrasilParticipaParticipaçção da pecuão da pecuáária e agricultura ria e agricultura éé grandegrande

Fonte: Comunicação nacional (MCT)

Fig. 26 – Emissões de metano no Brasil.

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A Amazônia tem uma dinâmica de ocupação de solo muito

particular e com processos de alterações muito rápidos. Foi identificado,

em 2005, que cerca de 20% do desmatamento no Mato Grosso já está

sendo feito pela conversão direta de floresta para região de pastagem

e isso não acontecia há alguns anos atrás, o que mostra que a dinâmica

da Amazônia é muito forte, de tal maneira que reverter esse quadro

pode não ser tão difícil quanto imaginamos. Independente da questão

climática, no caso da Amazônia, foram feitas simulações da evolução

do desmatamento da Amazônia, realizadas pelo pessoal que trabalha

no Experimento LBA. Nessas simulações, se continuarmos desmatando

na taxa de hoje, basicamente cerca de 50% da floresta ao longo deste

século será desmatada, causando uma emissão adicional de 33

pentagramas, 33 a 15 gramas de carbono para atmosfera,

realimentando o efeito estufa de maneira muito significativa. O cenário

mais otimista revela uma emissão de 17 pentagramas de carbono,

num cenário de governança sobre a região amazônica possível de ser

implantado e que acredito ser um dos principais temas que devemos

enfocar.

E para terminar, vou apresentar alguns dos resultados

recentes do impacto na agricultura, que são extremamente

interessantes e que foram realizados pela Embrapa. Primeiro,

o impacto na produção de soja, a qualificação da especialização

dos riscos climáticos para a cultura de soja, espacializados pelo

Brasil, na temperatura normal de hoje. Tal espacialização é

alterada de uma maneira leve, quando se aumenta a temperatura

para 1ºC, mas se aumentar a temperatura para cerca de 3ºC, a

área de soja plantada no Brasil central se reduz de uma maneira

muito significativa. Num caso extremo, se a temperatura

aumentar para 5 ou 6ºC, reduz-se ainda mais mostrando a

sensibilidade do setor da agricultura para as questões climáticas

(Fig. 27).

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Fig. 27 – Impactos das mudanças climáticas sobre a cultura de soja.

No caso do café, a Embrapa fez simulações muito detalhadaspara a ocorrência em vários estados. Por exemplo, em Minas Gerais,com a temperatura atual; com aumento da ordem de 1ºC; com oaumento da ordem de 3ºC; e com o aumento de 6ºC. Então, tem-seuma redução significativa na área propícia ao plantio do café causadapelas mudanças globais. Isso acontece tanto no estado de Minas Geraisquanto no estado de São Paulo (Fig. 28). Essas simulações foramfeitas pelo Professor Eduardo Assad e pelo Hilton da Embrapa e peloCentro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas àAgricultura da Universidade Estadual de Campinas – Cepagri/Unicamp.

A questão da cana-de-açúcar também é importante pelas razõesestratégicas que essa cultura tem na parte energética. Aqui estáplotado o zoneamento agroclimático da cana-de-açúcar para o estadode São Paulo (Fig. 29). Em azul, as áreas aptas; em vermelho, asáreas não-adequadas para o cultivo da cana-de-açúcar. Conformese observa o aumento de temperatura de 3ºC ou de 5ºC, há umaredução da adaptabilidade dessas variedades de cana ao clima futuronessas regiões. Também está previsto e há estudos detalhados no

Temperatura atual: espacializaTemperatura atual: espacializaçção dos riscos da sojaão dos riscos da soja

Eduardo Ass ad, Hilton S. Pinto, EMBRAPA e CEPAGRI/UNICAMP

Temperatura +1 grau: espacializaTemperatura +1 grau: espacializaçção dos riscosão dos riscos

Eduardo Assad, Hi lton S. Pinto, EMBRAPA e CEPAGRI/UNICAM P

Temperatura +3 graus: espacia liz aTemperatura +3 graus: espacia lizaçção dos riscos ão dos r iscos -- SOJASOJA

Eduardo As sad, Hi lton S. Pinto , EMBRAPA e CEPAG RI/UNICAMP

Temperatura +5.8 graus: espacializaTemperatura +5.8 graus: espacializaçção dos riscosão dos riscos

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Brasil da redução da biodiversidade com as mudanças climáticas.Onde? Basicamente num cenário para duas espécies endêmicas daregião do cerrado, particularmente na região central do cerrado. Istotambém pode ocorrer para várias outras espécies, particularmentepara as espécies arbóreas que são muito sensíveis àevapotranspiração do solo.

Eduardo As sad , Hi l ton S. Pin to, EM BRA PA e C EPAG RI/UNIC AM P

Cultura do cafCultura do caféé em Minas Gera is em vem Minas Gerais em váários cenrios cenáários de mudanrios de mudançças climas climááticasticas

Eduardo As sad , Hil ton S. Pi n to, EM BR APA e CEPAG RI/UN ICAM P

Cultura do cafCultura do caféé em São Paulo em vem São Paulo em váários cenrios cenáários de mudanrios de mudançças c limas climááticasticas

Eduardo Assad, Hi lton S. Pinto, EMBRAPA e CEPAGRI/UNICAMP

Zoneamento agroclimZoneamento agroclimáático da Canatico da Cana--dede--aaçúçúcar em São Paulocar em São Paulo

Fig. 29 – Impactos das mudanças climáticas sobre a cultura da cana-de-açúcar.

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É importante sempre lembrar que a contribuição histórica doBrasil para emissão de gases de efeito estufa, se nós integrarmos osúltimos 150 anos, é muito pequena, da ordem de 1%. A emissão degases de efeito estufa é dominada completamente pelos EstadosUnidos, Inglaterra, China, França e pelos países desenvolvidos. Paraterminar, nós temos desafios importantes nesta questão, não só pelosimpactos, mas também pelas possíveis implicações no nossodesenvolvimento econômico. Num recente debate que houve em SãoPaulo, eu colhi esse slide (Fig. 30) para servir de subsídio para nossadiscussão de que o Brasil teria uma oportunidade histórica dealavancar negociações num período pós-Kyoto, pós 2012, propondouma diminuição de suas emissões dos gases de efeito estufa. Umaredução de 20% das emissões de gás de efeito estufa no Brasilcorresponderia a uma redução da ordem de 35% das taxas atuais dedesmatamento. Limitar voluntariamente as nossas emissões não setrata, primeiro, um empecilho para nossa economia, muito pelocontrário, significa não incinerar a rica biodiversidade que a floresta

O Brasil tem a oportunidade histórica de alavancar as

negociações do período pós-2012, propondo uma diminuição voluntária

de suas emissões de GEE. Uma redução de 20% dos GEE que o Brasil

emite anualmente corresponde a uma redução de, apenas, 35% das taxas

atuais de desmatamento. Portanto, l imitar voluntariamente nossas emissões

não é um empecilho para nosso desenvolv imento econômico. Pelo contrário,

significa não incinerar nossa rica biodiversidade, dando às gerações futuras a

possibi lidade de usá-la de forma sustentável.

Este esforço tem custos que devem ser financiados pelos países desenvolvidos, em função da contribuição histórica em termos de emissões de GEE.

Mas é indispensável que o Brasil, que dos países em desenvolvimento é o que tem o menor custo para reduzir as emissões de GEE, estabeleça metas claras de redução e se submeta à fiscalização e à certificação, por organismos independentes, do efetivo cumprimento das metas de redução de desmatamento (emissões de GEE) estabelecidas. Estas obrigações devem ser igualmente seguidas pelos países desenvolvidos.

Desafio: Impactos, Adaptação e Mitigação

Fig. 30 – Oportunidades do Brasil Pós-Kyoto.

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amazônica contém, dando às gerações futuras a possibilidade deusar essa floresta de uma maneira mais sustentável. Os custos desseesforço começam a ser discutidos e eles eventualmente podem serfinanciados pelos países desenvolvidos, mas é fundamental que oBrasil estabeleça metas claras de redução de emissão de gases deefeito estufa, reduzindo o desmatamento da Amazônia. Essasobrigações devem ser igualmente seguidas, evidentemente, pelospaíses desenvolvidos.

Para encerrar, acho importante colocar que a maior parte doscientistas que trabalha com esta questão não compartilha da coberturamuito sensacionalista que foi feita na imprensa. Na verdade, a maiorparte dessa comunidade acredita que essa seja uma oportunidadeúnica que a humanidade começou a ter para utilizar os seus recursosnaturais de uma maneira sustentável, alterando a trajetória dodesenvolvimento que estávamos tendo até o momento. A produção eo consumo de energia e de matérias-primas, sem dúvida nenhuma,terão que ser radicalmente alterados globalmente nos próximos anos.A implantação em larga escala de programas de energia renovável,tais como biocombustíveis, energia solar, energia eólica e outrasformas de energia, será fundamental nas próximas décadas. Asemissões de gases de efeito estufa são influenciadas pelo crescimentoeconômico, mas não são rigidamente ligadas a ele. Realmente podeter crescimento econômico com redução de emissão de gases deefeito estufa e há grande margem de manobras, de acordo comestudos feitos pela COPPE no Rio de Janeiro. Enfrentar a questãodas mudanças climáticas não significa frear o desenvolvimento dospaíses; às vezes é justamente o contrário. O Brasil tem importantesvantagens estratégicas: o programa do álcool, a energia hidrelétrica,recursos abundantes de energia eólica e solar. Temos que utilizá-lasnas mesas de negociações em nosso benefício, de uma maneirainteligente. Não enfrentar o problema das mudanças climáticas globaisagora é condenar os países a se desenvolverem, se estiveremdesenvolvidos, e não se desenvolverem, se ainda estiverem emdesenvolvimento, não só no final do século, mas ao longo das próximasdécadas.

Como fazer isso? Existe um número enorme de medidaspossíveis de serem implementadas, tais como o aumento na eficiênciaenergética na indústria. Resultados da FIESP indicam que se

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consegue aumentar entre 25% a 30% a eficiência energética deutilização na indústria de uma maneira relativamente fácil. Pode havermelhora na técnica de construção; construir eletrodomésticos maiseficientes; implantar programas de controle de emissões veicularespara reduzir a emissão no setor de transporte. Na agricultura, com omelhoramento genético de variedades resistentes a altas temperaturase à seca, e na questão de florestas, que é o tópico mais sensível emais importante para nós, com uma forte redução das emissõesassociadas ao desmatamento e com o aumento do reflorestamento.A implantação de programas de reflorestamento em larga escala, emáreas degradadas da Amazônia, pode ter um sucesso muito grande.O Brasil não dispõe ainda de uma rede de monitoramento ambientalem larga escala, para acompanhar a evolução do processo dasmudanças climáticas e a estruturação dessa rede de observações,além da rede já existente na metrologia, que pode auxiliar bastanteno diagnóstico e na estratégia de mitigação. Recentemente têmaparecido algumas soluções de geo-engenharia, como por exemplofertilização dos oceanos, bloqueio de parte da radiação solar comnaves espaciais no caminho entre a Terra e o Sol, mas não existemsoluções mirabolantes. Na verdade, as soluções serão dadas peloque está sendo pensado agora, mas implantadas de maneirainteligente e o Brasil tem um largo caminho para andar nesta direção.

Agradeço a atenção de vocês. Obrigado.

Carla Checchia – Mediadora: Muito obrigada, Professor PauloArtaxo.

Resumo: O Professor Paulo Artaxo trouxe alguns pontos do IVRelatório do IPCC, aspectos extremamente instigantes e importantescomo a avaliação de incertezas e a utilização de 95% de confiabilidade,além de modelos climáticos mais completos, o que melhora oentendimento de como estamos alterando a ciclagem de carbono,principalmente por meio da queima de combustíveis fósseis e dodesmatamento.

Os principais gases do efeito estufa são o dióxido de carbono,o metano e o óxido nitroso, os quais têm apresentado aumentossignificativos de concentração na atmosfera nos últimos 150 anos.

Há uma correspondência direta entre o aumento da concentraçãode dióxido de carbono e de metano e o aquecimento da atmosfera,principalmente devido à ação humana, além da forçante natural.

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O aquecimento global tem-se apresentado na superfície da terra,nos oceanos e na atmosfera, ocasionando aumento da intensidade eda precipitação de chuvas, furacões, aumento do nível do mar e dovapor d’água.

As previsões do IPCC para os próximos cem anos dependerãodo nível de concentração de dióxido de carbono na atmosfera.

O aumento da temperatura será diferenciado em cada regiãodo planeta, com variações entre 1,5 e 6° C.

No Brasil, o Professor Artaxo destacou que o desflorestamentoe os focos de queimada na Amazônia, responsáveis por 74% denossas emissões de gases de efeito estufa, sofreram reduçãosignificativa nos últimos anos.

As mudanças globais impactam na biodiversidade e na agricultura,notadamente em cultivos como a soja, o café e a cana-de-açúcar.

O Brasil tem uma oportunidade histórica de alavancar asnegociações do período pós-Kyoto, por meio de uma diminuiçãovoluntária de suas emissões de dióxido de carbono.

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Palestra

Senador Renato CasagrandeSenado Federal

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Carla Checchia – Mediadora: Gostaria de convidar agora oSenador Renato Casagrande, enquanto faço a leitura do seu currículo.

O Senador Renato Casagrande é líder do Partido SocialistaBrasileiro e terceiro vice-líder do bloco de apoio ao governo no SenadoFederal; é vice-presidente da Subcomissão Permanente de Serviçode Informática e da Comissão Parlamentar de Inquérito do ApagãoAéreo; é presidente da Subcomissão Permanente de AquecimentoGlobal e membro titular da Comissão de Meio Ambiente, Defesa doConsumidor e Fiscalização e Controle, da Comissão de Educação,da Comissão de Ciência e Tecnologia e Inovação, Comunicação eInformática e da Comissão de Assuntos Econômicos; é também relatorda Comissão Mista Especial sobre Mudanças Climáticas. Senador,por gentileza, a palavra é sua.

Senador Renato Casagrande: Muito obrigado. Boa tarde,senhoras e senhores. Boa tarde, Ministro. Muito obrigado pelaoportunidade de estar aqui neste debate. Obrigado, Professor Artaxo,que acabou de fazer uma bela apresentação para nós. Acho que oProfessor cumpriu seu papel com muita competência ao fazer aapresentação técnica desse tema de interesse de todos. O brasileirotem sido apontado nas pesquisas mundiais como o povo e a populaçãomelhor informados ou mais interessados no debate sobre o tema,então eu acho que a imprensa tem dado uma contribuição, às vezesexagerando e às vezes não exagerando, tornando o problema menor,mas a população está atenta até porque esse é um tema que atingea todos já. Não é uma previsão que vai acontecer no futuro. O futuropoderá ser muito pior ou muito melhor dependendo da nossa atuaçãoaqui e agora, da atuação de cada ser humano. A princípio, há algunsconceitos que estão sendo hoje questionados. O primeiro conceito éo modelo de desenvolvimento implantado pelos países que já sedesenvolveram e o modelo adotado pelos países que estão no

PalestraSenador Renato Casagrande

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caminho do desenvolvimento, nos quais o uso dos recursos naturais,de uma forma predatória, é a base única do crescimento, e esse usode recursos naturais vem da cultura desde a nossa colonização, douso da madeira, do mineral, do uso daquilo que a natureza nosconcedeu. Da Revolução Industrial para cá, isso tem causadomudanças na composição da nossa atmosfera, tem causado poluiçãodos nossos recursos hídricos, tem causado a mineralização de solos,tem causado aumento de área no deserto. Então, a responsabilidadereside na ação efetiva do homem, o que foi comprovado, agora,cientificamente, pelos relatórios do IPCC. E o que de fato nos levou aisso foi essa busca incessante e insaciável do ser humano emacumular riqueza, usando a riqueza que a natureza tem oferecidopara nós. O debate do modelo de desenvolvimento é o debate centralque nos coloca diante deste tema neste momento.

A outra questão é da governança global. Se o nosso país tomarhoje as medidas necessárias para equilibrar zero de emissão de gásde efeito estufa, nós não vamos causar nenhum impacto no problemamundial. Já foi dito aqui que a nossa contribuição é muito pequenaperto da contribuição dos Estados Unidos, da Europa, da China queé uma locomotiva quando se trata também de emissões. Portanto, senós tornarmos zero o balanço total do efeito estufa, não vamos alteraresse quadro. Por isso, cada vez mais o governo não pode preocupar-se apenas com a sua área territorial; cada vez mais o governante,qualquer que seja ele, o cidadão, onde ele estiver, tem que ter umapreocupação com aquilo que acontece no mundo. Os instrumentosde política de gestão global precisam ser fortalecidos, a Organizaçãodas Nações Unidas, os programas de meio ambiente, todos osprogramas, todas as entidades de atuação regional no mundo ou deatuação global precisam ser fortalecidas, porque são globais.

Nós trabalhamos com alguns princípios, trabalhamos primeirodentro de uma premissa histórica. Não sei se o Professor Artaxo tratoudesse assunto, mas, a partir da década de 80, começou umapreocupação maior com relação ao tema. Na Convenção-Quadro dasNações Unidas de 1992, o tema de mudanças climáticas foi de fatoapresentado, debatido e aprovado. Com essa Convenção-Quadroiniciou-se uma ação dos países que culminou, em 1997, com oProtocolo de Kyoto. A partir daí, tornou-se um debate mais popularperante a sociedade mundial, provocando um interesse em muitaspessoas da academia e fora da academia.

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Nós já temos um consenso da comunidade científica comrelação ao impacto do aquecimento global na mudança do padrão deocorrência de furacões, que também já foi dito aqui pelo Professor,além do de outros fenômenos como ciclones, tufões, tempestades,enchentes, secas. Isto está cientificamente comprovado com dadose cabe a nós, agora, tomarmos as medidas.

Os principais efeitos também já foram ditos (Fig. 1). Podemosacrescentar ali saúde e agricultura. Agricultura, alguma coisa já foidita aqui. Na área da saúde não sei se já foi dito, mas as doençastropicais tendem de fato a aumentar as epidemias. São os efeitosdas mudanças climáticas que nós já estamos vivenciando: já temosrefugiados ambientais, já estamos com problemas de áreas comdeserto, já estamos com problemas de redução das geleiras, nósestamos com todos os problemas já colocados aí. Não são problemasdo futuro; são problemas do presente.

A minha tarefa, a minha função, aqui, é tratar um pouco daquiloque nós estamos fazendo no Congresso e aquilo que nós achamosque deve ser feito em termos de ação pública para o tema; esse é o

Conseqüências mais preocupantes das mudanças climáticas:

• O aquecimento global;

• A maior freqüência e intensidade de eventos climáticos extremos;

• Alterações nos regimes de chuvas;

• Perturbações nas correntes marinhas;

• Retração de geleiras;

• A elevação do nível dos oceanos.

Fig. 1 – Conseqüências das mudanças climáticas.

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tema da minha contribuição. No início dessa legislatura, muitasiniciativas foram tomadas sobre o tema das mudanças climáticas:criações de subcomissões na Câmara, no Senado, debates,audiências públicas. Resolvemos criar uma Comissão Mista (Câmarae Senado) sobre Mudanças Climáticas e desativamos outrassubcomissões, para nos concentrarmos na Comissão Mista. EssaComissão tem feito diversas atividades, proposto diversas audiênciaspúblicas, realizado visitas. Fizemos uma visita ao INPE, lá em SãoPaulo; conhecemos o que o INPE tem feito, conhecemos asdificuldades do Instituto de Pesquisa. Fizemos uma visita a Belém;fomos visitar o Museu Paraense Emilio Goeldi; tivemos uma audiênciapública na Assembléia Legislativa do Pará, para que nós pudéssemosdebater o tema. Fomos ao Pará porque é o estado brasileiro commaior problema de desmatamento hoje. Já ouvimos a Embrapa comrelação às mudanças na agricultura; já ouvimos o Ministério da Ciênciae Tecnologia e o Ministério do Meio Ambiente; já debatemos o assuntona Comissão, em diversas atividades, e vamos continuar esse debateaté o final do ano.

A Comissão vai funcionar até dezembro de 2007 quandoteremos um relatório final com a contribuição do Congresso Nacionalsobre esse importante tema. De vez em quando, surge um tema.Daqui a pouquinho o tema literalmente esfria. No nosso caso, aqui,se esfriar, perderemos a noção da importância do debate. Esse tema,na minha avaliação, veio para ficar e o Congresso tem umaparticipação no sentido de cobrar, de fiscalizar, de propor, de interagircom os institutos de pesquisa, com a sociedade organizada, paraque possamos efetivamente fazer com que o país tome medidas clarasnessa área, em termos de mudanças climáticas. Agora mesmo estounuma audiência pública. Eu saio daqui e vou para essa audiênciasobre o Código Florestal, que é um problema que nós temos na regiãonorte do nosso país.

Nos próximos dias, domingo, segunda e terça-feira, nós vamosvisitar o Amazonas, que está com uma iniciativa pioneira com ogoverno, com uma proposta estadual nessa área de mudanças

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climáticas. Vamos visitar o INPA, conhecer as atividades do INPA efazer essa audiência pública na Assembléia do Estado do Amazonas,para que nós possamos também ter noção clara daquilo que estáacontecendo, das propostas que a sociedade de lá tem para oCongresso Nacional. Também não podíamos deixar, já no decorrerdesse ano, de apresentar propostas. No Congresso Nacional, nóstemos diversas propostas que estão tramitando; são mais de cem.

Nas nossas discussões sobre projetos de lei que estãotramitando na Casa, das audiências públicas e visitas que temos feito,nós temos perseguido alguns eixos dessa discussão. Primeiro, ocontínuo envolvimento da sociedade num projeto de educaçãoambiental para ocorrer a conscientização da sociedade sobre aquestão do consumo consciente. Falar de consumo consciente comquem não consome é muito difícil. Uma parcela da população brasileiranão consome, mas uma parcela consome muito, consome de formairracional. A pesquisa mostra que o consumo de energia e o consumode água, quanto mais rico e mais poder tem a pessoa, maior é odesperdício. Falar sobre consumo consciente também é importante,porque parte daquilo que temos que ter de resultado tem que vir dainiciativa das pessoas. As pessoas têm de tomar a iniciativa de fazera sua parte com a atuação transversal do governo. A questão demudanças climáticas não é um problema do Ministério da Ciência eTecnologia e do Ministério do Meio Ambiente; não é uma questão depolítica de governo. Esses princípios têm norteado o nosso trabalho.

Dentro desse trabalho que nós estamos fazendo, como eu disse,há mais de cem projetos de iniciativa de parlamentares. Estamostentando selecionar alguns projetos que achamos importantes, paraque possamos adiantar a sua tramitação. São 129 proposições emdiversas áreas: matriz energética, floresta, biocombustível, divisa desolo, tributação, incentivos, mercado de carbono, compras públicas.Esses projetos têm diversos objetivos. Tratam da matéria no geralcom alguns objetivos específicos, mas nós selecionamos alguns queachamos que são importantes para nós agilizarmos as suas votaçõesnos plenários da Câmara e do Senado (Fig. 2).

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Fig. 2 – Propostas no Congresso Nacional relativas às questões ambientais.

Há o Projeto de Lei nº 261 que dispõe sobre as políticas de

mudanças climáticas. O nosso objetivo quando colocamos um projeto

desses para ser debatido no Congresso – certamente o projeto será

muito alterado e certamente o governo terá interesse nesse debate –

é porque nós achamos que o governo brasileiro necessita tomar

iniciativas. O governo brasileiro defende uma tese que nós

concordamos e defendemos também. Eu estive participando de uma

reunião do G8 + 5, dos Fóruns de Legisladores em Washington/EUA

em fevereiro, e outro agora em Berlim, preparatório do G8 que

aconteceu na semana passada. Nós concordamos com o princípio

das responsabilidades comuns a todos nós. Todos os países, todos

os governos têm responsabilidade, mas as responsabilidades são

diferenciadas. Nós não podemos achar que a responsabilidade do

Brasil é a mesma que têm os Estados Unidos. Então, são

Situação atual das proposições legislativas no Congresso Nacional

� Há, atualmente, 129 proposições, classificadas em categorias como aquecimento global, matriz energética, florestas, biocombustíveis, resíduos sólidos, tributação, incentivos, mercado de carbono e compras públicas.

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responsabilidades comuns, mas diferenciadas. Mas por serem

diferenciadas não podem colocar o Brasil numa posição de defesa; o

Brasil tem de ter audácia nesse debate por todas as características

que nós temos, por tudo que temos de positivo. Nós temos de negativo

o desmatamento ilegal, porque isso representa 74% das emissões

no Brasil, mas nós temos muitas coisas de positivo. Nós temos de

positivo a floresta, o percentual de cobertura florestal no nosso país.

Nós temos ainda um problema na região do cerrado. O desmatamento

do cerrado é muito intenso. Nós temos de positivo o programa de

biocombustível; o etanol é positivo.

Há uma preocupação que tem uma meia razão com relação ao

nosso programa de etanol, que é a ocupação da área de produção

de alimentos e da área com floresta. No debate que fizemos agora,

em Berlim, isto é colocado por todos os países da Europa, mas no

documento final ficou colocada a necessidade do programa de

biocombustível e do rendimento energético que é a cana-de-açúcar;

nada se compara à cana-de-açúcar em termos de retorno energético.

Nós sabemos que temos condições de usar o programa como um

atrativo para a política que o Brasil desenvolve, até para recebermos

mais investimentos, desde que o Brasil tenha controle das suas áreas,

desde que o Brasil faça o zoneamento, desde que tenha efetivamente

o controle das áreas de desmatamento ilegal, das áreas de produção

da agricultura e que tenha hoje condições tecnológicas de estabelecer

este controle.

O Brasil tem de positivo a sua matriz elétrica; 86% da nossa

matriz elétrica são de hidroeletricidade; 46% da nossa matriz

energética são de fonte alternativa de energia; 82% dos carros do

Brasil são flex; temos 23% de álcool adicionado ao combustível. Não

tem país nenhum no mundo que tenha os pontos positivos que nós

temos, mas eu ainda acho que o Brasil se esconde nesse debate, o

Brasil ainda acompanha uma posição atrasada nessa visão de quem

está de fora olhando; a posição de países como a China e a Índia que

têm situações totalmente diferenciadas da nossa - 85% da matriz

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energética da China são de carvão mineral. Não podemos achar queteremos as mesmas posições de outros países em desenvolvimentonos fóruns internacionais. Não podemos estar alinhados da mesmaforma que alguns outros países. O Brasil tem muito que ganhar nessedebate internacional, tomando medidas adequadas e eu concordoplenamente com o professor Artaxo com relação à meta de reduçãode desmatamento ilegal no nosso país. Acho que aí está a nossagrande contribuição e já tem hoje um consenso nesses fórunsmundiais de que se a floresta é um patrimônio da humanidade,preservar a floresta e evitar o desmatamento também é umaresponsabilidade da humanidade. Não pode ser só a visão que elaprotege a humanidade com relação às mudanças climáticas, comrelação às necessidades que temos hoje de manter umabiodiversidade, com relação a todos os efeitos positivos da presençada maior floresta tropical do mundo e achar que o Brasil vai dar contadisso sozinho. O Brasil tem hoje crédito para cobrar esta colaboraçãoe é a forma de colaboração que temos que discutir. Se é através domecanismo de desenvolvimento limpo, do crédito de carbono, se éatravés de um fundo. O Banco Mundial disse nesse encontro nossoque colocaria projetos de desenvolvimento sustentável nessas áreas,algo que chegaria até 1 bilhão de dólares nesses programas. Mashoje, por exemplo, evitar o desmatamento não está incluído napossibilidade de crédito de carbono. O crédito de carbono tem queser usado em parte. Para a floresta, pode ser um dos mecanismos definanciamento da nossa capacidade de preservar a floresta em pé,mas o crédito de carbono não pode ser a única medida a tomarmos ede exigirmos dos países desenvolvido as suas ações, até porque umpaís desenvolvido compra o crédito de uma empresa que evitou olançamento de gás de efeito estufa aqui e isso conta na meta que eletem que cumprir nesse acordo internacional. É como se fosse a comprade indulgência, como se eu comprasse o direito para ir para o céumesmo pecando. Acho que um percentual disso pode ser exigido,mas nós temos que exigir efetivamente as ações dos países que jáestão desenvolvidos.

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Este outro projeto estabelece a necessidade de um inventáriode emissões (Fig. 3). Até agora, tivemos somente um inventário deemissões. Nós temos de ter inventários periódicos de emissões aquino Brasil; esse projeto tem esse objetivo.

Fig. 3 – Projeto de Lei nº 1.147 – dispõe sobre balanço de emissões de GEE.

Esse outro projeto que também está tramitando no CongressoNacional dispõe sobre a inspeção técnica veicular (Fig. 4). Esse projetoé importante. Algumas cidades já implantaram a inspeção técnicaveicular, mas não tem ainda uma legislação federal e não tem aobrigatoriedade da implantação desse projeto. Na hora que se discuteesse projeto, onde ele agarra? Os Municípios querem fazer paraarrecadar, os Estados querem fazer para arrecadar, a União quer fazerpara arrecadar nos grandes centros, mas a inspeção técnica veicular éum problema porque se o nosso maior problema é uso de combustívelfóssil, racionalizar e tornar mais eficiente esse uso é importante.

Principais Iniciativas legislativas na defesa do meio ambiente (9/11)

� Projeto de Lei nº 1.147, de 2007.

Determina a obrigatoriedade, para o licenciamento de obra ou atividade utilizadora de recursos ambientais efetiva ou potencialmente poluidoras e empreendimentos capazes de causar degradação ambiental, da realização do balanço de emissões (assimilação e liberação) de gases do efeito-estufa.

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� Projeto de Lei n º 5.979, de 2001.Acrescenta o art. 66-A e altera a redação do caput do art. 104 na Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, e estabelece normas referentes à Inspeção Técnica Veicular – ITV.

Principais Iniciativas legislativas na defesa do meio ambiente (5/11)

Principais Iniciativas legislativas na defesa do meio ambiente(10/11)

� Projeto de Lei do Senado nº 23, de 2004.Altera, com vistas a fomentar a utilização da energia solar, a Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001 (Estatuto da Cidade), para instituir diretriz a ser observada pelos municípios, e a Lei nº 4.380, de 21 de agosto de 1964, para condicionar a obtenção de financiamento no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação (SFH).

Fig. 4 – Projeto de Lei nº 5.979 – dispõe sobre Inspeção Técnica Veicular.

Fig. 5 – Projeto de Lei do Senado nº 23 – dispõe sobre a utilização da energia solar.

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Incentivo à energia solar. A energia solar é um grandepotencial que nós temos. Hoje ela é utilizada de forma econômicapara aquecimento de água, mas ainda não para geração deeletricidade porque o custo dela é muito alto. Temos muito quepesquisar; nossos institutos de pesquisas têm que ser incentivadosa pesquisar, para que possamos cada vez mais ter essadisponibilidade sendo usada por nós (Fig. 5).

Energia eólica. A região nordeste do Brasil tem um potencial. AAlemanha usa muito a energia eólica. Algumas pessoas ainda sãodescrentes dessa energia, mas, dentro de uma matriz, ela é umcomponente que pode ser ampliado aqui no Brasil, porque o nossouso é muito pequeno (Fig. 6).

Vamos passar para o resultado da Comissão para poder concluira nossa apresentação. Nós vamos apreciar prioritariamente algumasproposições, para não esperarmos o final do ano, por isso nósapresentamos um relatório parcial. As nossas sugestões do PoderLegislativo Federal são essas:

Principais Iniciativas legislativas na defesa do meio ambiente (11/11)

Projeto de Lei nº 220, de 2007.

Permite a dedução de despesas com aquisição de bens e serviços necessários para a utilização de energia solar ou eólica da base de cálculo do imposto de renda das pessoas físicas e jurídicas e da contribuição social sobre o lucro.

Fig. 6 - Projeto de Lei nº 220 – dispõe sobre a utilização de energia solar oueólica.

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• apreciar e participar ativamente do Fórum Brasileiro deMudanças Climáticas, inclusive com a indicação derepresentantes. O governo tem um fórum. O presidente doFórum é o Presidente Lula. Esse Fórum está praticamentedesativado; houve uma reunião no início do primeiro governodo presidente Lula. Nós temos que reativá-lo. Há arepresentação dos presidentes do Senado e da Câmara.Então, eu acho que o Congresso tem que provocar, para queeste Fórum seja reativado;• nós temos que estruturar e dar condições ao Poder Executivo

Federal de funcionamento de uma rede de pesquisa demudanças climáticas, porque nós fizemos um levantamentode 2000 até 2007 e houve uma estagnação de repasse derecursos para os principais institutos de pesquisa: para o INPE,INPA, Museu Paraense Emílio Goeldi, INMET, EMBRAPA.Alguns desses institutos tiveram uma redução e alguns umaestagnação. Então, se um dos métodos para fazer com quenós possamos minorar o problema é investir em novastecnologias, em eficiência energética, e em tudo o mais; seminvestimento em pesquisa não há nenhuma condição de oBrasil ser protagonista nesse tema. Nós já temos avançadomuito com relação ao consumo de energia: mudanças delâmpada; mudanças de potência de veículo; eficiência dessesveículos; consumo em nossos eletrodomésticos; mas nóstemos muito que avançar ainda em termos de eficiênciaenergética e de novos métodos de produção. Por isso, éfundamental que nós possamos ter investimentos. O MinistroSérgio Resende disse que já está trabalhando numa redebrasileira de pesquisa das mudanças climáticas, mas paraisso acontecer tem que ter investimento, tem que ter dinheiro;• aprimorar continuamente a metodologia e a elaboração do

inventário nacional de emissões – nós só tivemos um. Temosque ter isso de forma periódica para que possamos, de fato,situar o Brasil no cenário internacional;• aos Poderes Legislativo e Executivo, com relação aos recursos

orçamentários que nós temos que alocar, como eu já disse,temos que adotar políticas estratégicas de conservar as fontes

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renováveis da matriz energética brasileira. Se nós temos umamatriz energética em que grande percentual dela é de fontealternativa, fonte renovável de energia; nós temos queaumentar. Temos agora um grande debate sobre ashidrelétricas do norte do Brasil; temos um grande debate sobreenergia nuclear, que de fato não causa nenhuma emissão,não tem resíduo; temos o grande debate sobre energia acarvão mineral, porque o caminho mais fácil que o Governotem de abastecer de energia é fazer leilão de energia a carvãomineral e é um desastre para nós, porque é injeção de CO

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na veia, então, é um problema que temos que enfrentar coma nossa matriz energética;• sobre a questão do desmatamento, devemos adotar uma

estratégia para eliminar o desmatamento, até mesmo ajudainternacional, para que possamos financiar inclusive oagricultor. Se o agricultor tem 100% da sua propriedade comfloresta e ele tem que sobreviver, a floresta tem de ser umativo, tem que ser algo que lhe dê retorno. Existem atividadesque dão retorno com floresta, como o ecoturismo. Temosalgumas experiências. Pode-se caminhar para isso. Mas atéfinanciar as pessoas que têm floresta é um problema que ogoverno tem que adotar com recursos próprios e com a ajudainternacional. É preciso implementar uma política vigorosa demitigação das mudanças climáticas, a fim de cobrar a mesmapostura dos demais países. O Brasil tem que fazer seu deverde casa para cobrar efetivamente dos demais países e comisso conseguir até financiar as nossas iniciativas aqui no Brasil.Incentivar, onde não existe, fórum para estudar o tema“mudanças climáticas”, no sentido de avaliar causa, impacto,propor alternativas para mitigação, adaptação em âmbito local.Isso não é só uma tarefa do Governo Federal; é também dosestados e municípios; é tarefa de todo mundo. Temos quefazer esses incentivos por meio do debate, de projeto de lei,da discussão com prefeitos e com governadores.

Então era essa a minha contribuição. Eu agradeço e me colocoà disposição de vocês.

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Carla Checchia - Mediadora: Muito obrigada, Senador. OSenador tem alguns compromissos, então nós abriremos o debateagora ao Senador Casagrande. Quem quiser encaminhar algumapergunta por meio do nosso formulário, por favor, eu aguardarei.

Senador Renato Casagrande: O compromisso que eu tenhotambém é nessa área que é a nossa audiência pública sobre CódigoFlorestal.

Resumo: O Senador Casagrande iniciou sua apresentaçãorelatando que, na década de 1980, intensificou-se o estudo e asdiscussões sobre o aquecimento global, sobre o que surgiramimportantes tratados internacionais, como a Convenção-Quadro dasNações Unidas e o Protocolo de Kyoto.

A comunidade científica tem consenso de que a questão é gravee requer medidas urgentes.

A atuação legislativa em defesa do meio ambiente traz a criaçãoda Comissão Mista Especial sobre Mudanças Climáticas, com diversasatividades como audiências públicas, visitas e seminários, procurandomanter vivo o debate sobre o tema, a respeito do qual o PoderLegislativo tem o importante papel de interagir com a sociedade e deconhecer as propostas existentes.

No Congresso Nacional, há diversas propostas voltadas aotema, como a conscientização da sociedade, educação ambiental,consumo consciente e a atuação conjunta com os Ministérios do MeioAmbiente e da Educação. São 129 proposições em diversas áreas,como a formulação de uma Política Nacional de Mudanças Climáticas,o incentivo ao uso do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, daInspeção Técnica Veicular, o Fundo de Desenvolvimento da AmazôniaOcidental, o incentivo ao uso da energia solar, etc.

O Senador Casagrande finalizou sua apresentação propondo adinamização do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, bem comode outros fóruns de debate, o investimento em pesquisa para aprodução de energia e eficiência energética com a criação de umaRede Brasileira de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas, a adoçãode políticas e estratégias para conservar a participação de fontesrenováveis na matriz energética brasileira, e a criação de políticaspara eliminar o desmatamento e mitigar as mudanças climáticas.

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Carla Checchia - Mediadora: Nós estamos aqui com trêsperguntas. Uma é do Maurício e ele questiona o seguinte, Senador:“considerando a necessidade de um controle externo para atestar ocrédito de carbono, Vossa Excelência considera esse controle externoatentatório contra a soberania brasileira sobre a Amazônia?”

A próxima pergunta é de Fernando Brito: “do ponto de vista doconsumo consciente, que avaliação pode ser feita do Parlamento,Executivo e Judiciário brasileiros tendo em vista, por exemplo, osconstantes reajustes de ganho desses setores?”

A próxima pergunta é de Celso Pinto de Melo: “como se explicao fato de que países como a Alemanha e o Reino Unido tenham umprograma estruturado de energia solar, como os sinais de trânsito emBerlim que funcionam com painéis solares, e, apesar disso, o Brasil,maior país tropical do mundo ainda vê esse tipo de energia comoexótica e alternativa. Essa não seria uma solução, por exemplo, parapovoações isoladas da Amazônia?”

Senador Renato Casagrande: Maurício fala com relação aocrédito de carbono que poderia ser adquirido ou gerado através dodesmatamento evitável. Se tivesse que ter um controle externo sobreo desmatamento, sobre a vigilância, se de fato o desmatamento foievitado e se gerou, de fato, o crédito. Eu acho que quem tem de fazera gestão sobre a Amazônia é o Brasil e não pode abrir mão em hipótesealguma disso. Mas na hora que se estabelece mecanismos de créditosobre o trabalho de se evitar o desmatamento na Amazônia e queesses créditos são adquiridos por empresas externas e que vocêtenha, através da ONU, entidades que façam esse controle, eu nãovejo problema. Para se aferir, para atestar, para acompanhar juntocom o governo brasileiro as políticas adotadas, não feitas pelo governo,mas pelas comunidades, pelas pessoas, eu não vejo isso como

DebatePerguntas ao Senador Renato Casagrande

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problema, não vejo isso como intromissão, se houver umacompanhamento por um organismo internacional, de que o Brasilfaça parte, e que essa discussão seja aprovada e aceita por esseorganismo. Não vejo problema, acho que esse seria um caminho quepoderemos adotar para buscarmos recursos externos para mantermosnossa floresta de pé.

O Fernando fala sobre o consumo consciente, que avaliaçãopode ser feita pelo Parlamento, Executivo e Judiciário brasileiros, tendoem vista os constantes reajustes de ganhos destes setores. Pelo queeu estou entendendo aqui, como é que você vai consumir de formaconsciente, se quem gera energia quer gerar mais energia para podervender, é isso, Fernando?

É verdade que o gasto da Administração Pública, o gasto doCongresso é um gasto que pode ser racionalizado. Para manter essecálculo de custo, quanto custa um deputado, quando custa umvereador, um senador, é um cálculo que a gente tem que fazer, refletire analisar, porque a imprensa não faz um cálculo de quanto custa umjuiz, de quanto custa um desembargador, um ministro de Tribunal deJustiça, porque sustentar as instituições tem um custo. É importanteque se compreenda que sustentar a Presidência da República, quandoo Presidente vai para algum lugar com dez, vinte seguranças, aspessoas acham um absurdo. Mas o Presidente da República é umainstituição, ele não é uma pessoa física que está ali. Portanto, éimportante que nós compreendamos isso: sustentar uma instituiçãopública tem um custo. Isso não significa que nós não temos queracionalizar os gastos da Administração Pública, especialmente emtodos os níveis do Poder Legislativo, porque é uma necessidade reale concreta. A forma de se fazer é limitar orçamento percentualmente;é o jeito que a gente tem de fazer essa racionalização. Ao mesmotempo, esse debate sobre o gasto da Administração Pública écrescente em todos os Poderes. O gasto é crescente anualmente eisso não pode impedir que nós façamos o debate sobre consumoconsciente, que nós apresentemos uma proposta nessa área sobre otrabalho de educação com as pessoas em relação ao consumoconsciente. O trabalho tem que ser feito nas escolas, pelos ministérios.Os desvios de gastos públicos devem ser corrigidos e aperfeiçoadose não podem impedir que, neste momento, um assunto importantecomo esse não seja debatido, porque nós ainda gastamos de forma

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equivocada na Administração Pública. Mas eu quero concordar queesse gasto da Administração Pública é um gasto que tem que ser defato racionalizado.

O Celso pergunta como se explica o fato de que países como aAlemanha e o Reino Unido tenham um programa estruturado deenergia solar e o Brasil não tem; ainda funciona como uma fonte deenergia um pouco esdrúxula. A Alemanha tem cerca de 12% de suaenergia de fontes renováveis. Na parte elétrica, nós temos 86% e aAlemanha tem 12%. Mesmo que nós não possamos comparar aAlemanha com o Brasil nas fontes alternativas de energia, dá paracomparar com a energia solar. A Alemanha tem mais energia solarque o Brasil, tem mais energia solar para comunidades isoladas. Hápaíses que tem mais energia solar para áreas isoladas. No Brasil,nós começamos a usar agora a energia solar em algumascomunidades isoladas, como uma fonte energética alternativa. Muitagente já está usando energia solar para aquecimento, mas uma coisaé real e concreta: tudo na vida se torna realidade quando é viáveleconomicamente. Se ela não for viável economicamente, é difícil deas pessoas absorverem, assumirem e implementarem; então tem queter viabilidade econômica. O aquecimento de água tem viabilidadeeconômica; vemos que tem um crescimento, tem incentivos dogoverno de isenção de IPI para esse tipo de equipamento; tem algunsprojetos de incentivo ao uso de energia solar em um programanacional. Acho que falta incentivo. Para geração de eletricidade nósnão temos condições de competir com a hidroeletricidade; nós aindatemos um potencial hídrico a ser explorado e a energia solar não éainda a alternativa, pois não temos tecnologia à disposição que dêviabilidade econômica à energia solar.

Carla Checchia – Mediadora: O Eduardo Werneck pergunta:“há projetos propondo debater a lógica de transporte urbano baseadono automóvel? Existem condições concretas para iniciarmos açõesno sentido de quebrarmos o dogma da indústria automobilística quenos prende ao transporte individual, comemorando recordes de vendasde carros?”

Ainda do Eduardo Werneck: “existem projetos para que asinstituições de financiamento considerem as reservas legais depropriedades rurais como ativos, benfeitorias?”

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Senador Renato Casagrande: O transporte coletivo, mais doque um projeto, é uma ação de governo, é um grande debate que sefaz. Eu participei agora do Fórum de Transporte Urbano feito em Vitóriae tenho uma grande preocupação. O primeiro item é que tem quemelhorar a qualidade; segundo, tem que inibir o uso de automóvel,senão as pessoas não deixam de usá-lo. É mais uma ação de governo;acho que não tem um projeto que esteja tramitando no Congresso.Acho que é mais uma ação de governo com relação à melhoria daqualidade do transporte coletivo. O governo começa a discutir o tremde alta velocidade e acho importante que essa cultura possa espalhar-se pelo Brasil com investimentos da iniciativa privada, comacompanhamento e, naturalmente, com fiscalização do governo. Masenquanto não melhorarmos a qualidade do transporte coletivo e nãoinibirmos o número de automóveis, nós teremos dificuldade. Nosgrandes centros está cada vez mais impossível usar automóvel. Osgrandes centros de países desenvolvidos já inibem muito o uso deautomóvel. Não vale a pena a pessoa sair em alguns grandes centrosdo mundo, porque há uma única faixa para automóvel e há faixasespecíficas para táxi, para trem, para ônibus. Eu acho que esse é ocaminho que temos que ter, mas é uma ação de governo. Em relaçãoao outro ponto que o Eduardo questiona: não considero. Não sei setem alguém de banco aqui. Agora que o BNDES começa a debateralgum tipo de critério de preservação de suas florestas na hora deviabilizar um financiamento, mas considerar as florestas como ativo,não tem banco que considere, e eu não sei se tem viabilidade. Achoque não tem essa prática para bancos e não sei, por falta deconhecimento mesmo, se isso tem viabilidade nas operaçõesbancárias.

Carla Checchia – Mediadora: João Patusco pergunta “quaisações estão sendo tomadas junto a outros países para coibirimportações de produtos em cuja produção seja utilizada madeiranão certificada, como aço, móveis e produtos de madeira?”.

Senador Renato Casagrande: As ações de fiscalização sãomuito precárias. O Brasil, na verdade, exporta pouca madeira emtora. Pouca madeira ilegal em tora sai do Brasil. Ela sai de uma formamais beneficiada; a maior parte é beneficiada. Há um debate dos

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países desenvolvidos em relação à certificação. Neste mesmoencontro de Berlim, houve um encontro de desmatamento ilegal etinha representantes das mais diversas empresas madeireiras domundo. Estão debatendo essa questão da certificação para se comprarmadeira do Brasil ou de qualquer outro país da África ou da Ásia. Épreciso certificação para essa madeira entrar no país que estáimportando. O Brasil precisa avançar no controle. Acho que acertificação é um método e um caminho para que possamos aumentaro controle do desmatamento ilegal, inibindo esse desmatamento.

Carla Checchia – Mediadora: Acho que para o Senador nãohá mais nenhuma questão. Como o Senador Casagrande tem umcompromisso, eu gostaria de agradecer sua participação com tãovaliosa apresentação. Como forma de agradecimento, eu gostaria defazer a entrega do nosso certificado pela participação como palestrantedo nosso seminário. E aqui também estão duas publicações doGoverno Federal sobre mudanças do clima. Gostaria de agradecer eapresentar as nossas palmas ao Senador.

Senador Renato Casagrande: Eu peço desculpas. Peçodesculpas ao Professor Artaxo por ter que me ausentar. Peçodesculpas a vocês também, mas eu tenho que participar dessa outraaudiência pública. Obrigado.

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Carla Checchia – Mediadora: Retomando os nossos trabalhos,vamos iniciar agora as perguntas que foram encaminhadas aoProfessor Paulo Artaxo.

Professor Paulo Artaxo: Bom, nós temos aqui um conjunto dedez ou doze questões. Algumas são realmente importantes e podemtrazer mais luz ao debate, pois não podemos discutir todos os aspectosnuma apresentação curta.

Essa primeira pergunta é uma pergunta importante e coloca oseguinte: “alguns cientistas apresentam estudos demonstrando queas questões climáticas não seriam somente causadas por fatoresantrópicos, mas também por outros, como, por exemplo, aquelesprovenientes de atividades solares. Qual seriam, se existem, asrelações entre essas causas.”

Bem, eu não apresentei aqui, mas evidentemente o relatório doIPCC faz toda uma avaliação dos impactos naturais que sãorelevantes, às vezes são inclusive dominantes em alguns aspectos eos mais importantes são: primeiro, a variabilidade da intensidade dosol. O sol está longe de ser uma estrela com brilho constante. Eletem ciclos, não somente o ciclo de onze anos das manchas solares,mas também ciclos associados à órbita do sol em relação à Terra eele é uma estrela que está evoluindo, crescendo. A constante radioativado Sol, do aumento do brilho do Sol nos últimos 150 anos é de 0,14watts, por exemplo. Então, é uma forçante radioativa significativa e élevada em conta em todos esses modelos.

O segundo componente natural importante são as erupçõesvulcânicas. Quando um vulcão joga CO

2 na alta atmosfera, ele joga

material particular e isso resfria a superfície; isso tem que ser levadoem conta nos modelos climáticos. Foi feito um levantamento, nos

DebatePerguntas ao Prof. Dr. Paulo Artaxo

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últimos 150 anos, de todas as erupções vulcânicas e foi feito o cálculoclimático destas emissões. Em alguns aspectos tem uma contribuiçãosignificativa, mas ela é muito menor do que a contribuição dos efeitosantrópicos. A contribuição do CO

2 é de 1,6 watts por metro quadrado.

As contribuições naturais, então, têm que ser levadas em conta eelas são, sim, levadas em conta.

Uma segunda pergunta do Roberto Lorena é sobre a emissãode CO

2 no Brasil. “Exceto pelo ato do desmatamento, as liberações

de queimadas e a pecuária não podem ser consideradas ciclos anuaisde seqüestro e emissão de CO

2. Ele questiona, por exemplo, sobre

quando o cerrado queima.”O fogo faz parte de um dos mecanismos naturais do cerrado,

que é um tipo de vegetação muito mais resistente ao fogo do queoutros. No caso do cerrado, você fixa carbono, ele queima e, depoisde três, quatro ou cinco anos, recupera essa biomassa. Em caso deincêndios no cerrado, não há emissão líquida alguma em larga escalapara o efeito estufa. No caso da pecuária é diferente, principalmenteporque o boi come o capim e o capim vai voltar de uma maneira oude outra para atmosfera. Acontece que, no caso da pecuária, aemissão é principalmente devido ao metano. E o metano tem umfator de aquecimento global que é cerca de 120 vezes maior que oCO

2, porque ele absorve mais o infravermelho e tem uma meia vida

muito mais curta. Portanto, o metano emitido pelo boi tem um efeitomuito maior do que o CO

2 do capim que ele comeu. Neste caso, a

pecuária tem sim um impacto líquido importante no agravamento doefeito estufa porque as emissões são de metano e não de CO

2.

Há também uma pergunta associada com essa componenteque diz o seguinte: “estudos recentes sinalizam que o grande vilão doaquecimento global seria o vapor d’água e não o CO

2; em

conseqüência, as mudanças climáticas e o aquecimento global teriamseus efeitos minimizados diante destas circunstâncias?”

O vapor d’água é, sim, um gás de efeito estufa muito importante.Na verdade, é o gás de efeito estufa mais importante na atmosferaterrestre. Ele absorve o infravermelho e, evidentemente, o efeito doaumento da concentração do vapor d’água é incluído em todos osmodelos de efeitos climáticos. Se não fosse assim, nuncaconseguiríamos prever nebulosidade e o balanço de radiação correto.

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A questão é que o vapor d’água e seus efeitos são considerados. OIPCC dividiu em dois efeitos. O primeiro são os efeitos radioativosantropogênicos; e o segundo são as respostas do ecossistema àsradiações causadas pelo homem. Essa é uma discussão científicamuito complicada. O aumento do vapor d’água na atmosfera éconsiderado um feedback e não uma ação direta de emissão dohomem; então, ele não é diretamente considerado emissãoantropogênica e sim uma resposta, mas a forçante radioativa queesse vapor d´água exerce é, sim, considerado em todos os modelosclimáticos.

Aqui tem uma pergunta do Donald: “se 74% das emissõesbrasileiras são do desmatamento na Amazônia, qual é a contribuiçãodo desmatamento no cerrado com cerca de 30 mil Km2 por ano, queé o dobro da área desmatada na Amazônia. Pode ser reduzido? Podeter um efeito importante no clima?”

Na verdade, o cerrado é o grande esquecido nessa história damudança climática no Brasil. O cerrado tem um valor extremamenteimportante pela biodiversidade e pela regulação climática na partecentral do Brasil, da mesma maneira que a Amazônia tem importânciana região norte. Então, o cerrado é realmente esquecido nessacontabilidade, digamos assim, de emissão de efeito estufa. Uma dasrazões é que o cerrado é um ecossistema mais adaptado ao fogo.Como numa das respostas anteriores, o fogo faz parte do funcionamentodaquele ecossistema, como faz parte das savanas na África, quandonão se tem destruição das savanas por troca, como por exemplo, porsoja, arroz ou algodão. O cerrado tem sim uma contribuição. Do pontode vista de biomassa por hectare, enquanto a floresta amazônica tem,digamos – varia da região leste para a oeste –, de 250 a 350 toneladasde carbono por hectare, o cerrado tem cerca de sete vezes menosbiomassa, ou seja, a densidade de biomassa é menor. Como ele éadaptado ao fogo, se não tiver queimadas recorrentes que inviabilizema sua recuperação, num ano há a queima, mas depois ele recupera amaior parte daquele carbono emitido. Porém, no processo desubstituição do cerrado ou de destruição do cerrado por cultivo de soja,temos evidentemente uma emissão líquida para a atmosfera que precisaser contabilizada, embora essa emissão seja bem menor do que pordesmatamento na Amazônia, pela menor quantidade de biomassa quehá no cerrado, se comparada com a floresta tropical densa.

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Carla Checchia – Mediadora: Belisário Franco pergunta se “éfato que a contribuição do país é insignificante no contexto global dospaíses emissores. Qual ou quais ações que o Brasil deveriadesenvolver nessas temáticas, bem como os estados?”

Professor Paulo Artaxo: Na verdade, não é bem fato que acontribuição do país é insignificante no contexto global dos paísesemissores, porque temos duas maneiras de fazer essa conta. Uma,é a maneira que eu apresentei como a COPPE fez com as emissõeshistóricas de todos os países. Nas emissões históricas, a contribuiçãodo Brasil é realmente pequena, da ordem de 1%, mas se levarmosem conta as emissões de queimadas, o Brasil é o sexto maior emissorde gás de efeito estufa. Em algumas publicações vocês encontrarãoo quinto lugar; outra é o sexto; outra é o quarto. Isso não importamuito porque são diferentes maneiras de fazer a conta. O que importaé que, sim, as emissões de queimada são bastante significativas,são o cerne das nossas emissões e, ao mesmo tempo, são o nosso“calcanhar de Aquiles”. Portanto, reduzir essas emissões éabsolutamente estratégico e eu quero enfatizar de uma maneira bemforte, não porque isso é importante do ponto de vista de mudançaclimática global por causa do IPCC, mas porque interessa a nósbrasileiros preservar aquele ecossistema que é absolutamente críticopara o nosso país, independente de qualquer negociaçãointernacional. Precisamos utilizar aquele ecossistema de uma maneirainteligente, aproveitando-o de uma maneira positiva e a pior coisaque podemos fazer com aquela riqueza de biodiversidade é queimá-la, transformá-la e jogá-la para nossa atmosfera. Precisamos ser maisinteligentes na utilização dos nossos próprios recursos naturais,independente de qualquer pressão internacional ou acordointernacional que por ventura venha a ser assinado.

Carla Checchia – Mediadora: Pergunta do Gustavo Lopes:“Quais as fontes de dados para definição da concentração dos gasesde efeito estufa nos últimos seiscentos mil anos? Até que ponto asmudanças globais que vêm ocorrendo podem ser atribuídas a efeitosnaturais? E considerando a existência de dados históricosconsistentes, principalmente na Europa, como podem ser realizadasextrapolações dos dados para o restante do globo?”

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Professor Paulo Artaxo: Então são três questões. A primeiradelas é como que instrumentalmente obtivemos a concentração deCO

2 nos últimos 650 mil anos. Aqui na platéia está um glaciologista, o

Jefferson Simões, que trabalha exatamente nessa área. O que se fazbasicamente é o seguinte: fura-se um buraco na Antártica, na neveda Antártica; atualmente, o buraco mais profundo foi furado numabase russa de Vostok. Quando a neve se deposita, ela aprisionaminúsculas quantidades do gás da atmosfera com a qual ela sedepositou. Esse gás fica preso nesse gelo. Então furamos um buracode 3 ou 3,5 km, no caso da Antártica, retiramos parcelas pequenasdesse gelo, derretemos esse gelo num cromatógrafo de gás emedimos a quantidade de CO

2 que tinha naquele gelo. Pode parecer

muito simples, mas o processo é mais complicado do que isso, masem essência é isso que se faz. A temperatura se mede pela razãoisotópica de oxigênio e de deutério nesse gelo. Com isso sabemos acomposição, a quantidade e a temperatura que esse gás depositou.Esses estudos também foram feitos nos Andes para saber o impactodos últimos três, quatro mil anos da concentração de gás de efeitoestufa. São estudos extremamente importantes. Instrumentalizar opaís para fazer esses estudos aqui no Brasil é absolutamenteimportante e estratégico para nós. É extremamente importante queesses estudos possam ser feitos no Brasil, e não só em laboratóriosfora daqui. A terceira questão levantada foi a dos dados históricosrecentes que são obtidos na Europa e como é que esses dados sãoextrapolados para o restante do mundo. Na verdade, esses dadosnão são extrapolados; eles valem regionalmente. Agora, essa questãoé importante para mostrar a nossa fragilidade nos dados históricosde clima do nosso país. Se vocês olharem para a América do Sul,aquela série histórica de temperatura, antes de 1950, é tracejadaporque não há medidas, em particular na Amazônia, por exemplo,que é 60% da área da América do Sul. Não temos nenhum dado commais do que trinta, quarenta ou cinqüenta anos. Isso prejudica muito.O estabelecimento de uma rede nacional de observação de mudançasclimáticas é muito importante. E isso não tem que se limitar só aoclima; pode-se limitar ao funcionamento dos ecossistemas.Precisamos conhecer, acompanhar e monitorar melhor as mudançaspelas quais os nossos ecossistemas irão passar: Mata Atlântica,Cerrado, Amazônia... e isso hoje, no Brasil, ainda é feito de uma

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maneira muito, muito limitada. Isso vai ganhar muita importância nosEstados Unidos. Graças a essas redes observacionais de sessenta,setenta anos, mantidas pela NASA, é que eles podem fazer umdiagnóstico muito mais preciso do que vai acontecer com osecossistemas deles, o que ainda não temos capacidade de fazer.Então, temos que correr atrás do atraso, implantar essas redes ecolocá-las em funcionamento, coletar esses dados e distribuí-los parao público, para que possamos saber o que está acontecendo do pontode vista de monitoramento ambiental de todo o país; não só do clima.

Carla Checchia – Mediadora: A Sabrina Brenha pergunta:“sabendo que a pavimentação de rodovias representa um dos maioressetores de desmatamento, não deveriam ser revistos os critériostécnicos para implantação de obras de transporte terrestre naAmazônia, avaliando-se a alternativa ferroviária para regiões críticascomo é o caso da BR-163 Cuiabá – Santarém?”

Professor Paulo Artaxo: Sem dúvida nenhuma. Concordoabsolutamente 100% com a afirmação. Agora é sempre importanteobservar que evidentemente o vetor de destruição maior da Amazônia,ao logo dos últimos trinta, quarenta anos, foi realmente a construçãode estradas; isso está muito bem documentado. O que é importanteentender é que não podemos condenar uma região do Brasil aoisolamento, digamos assim, com uma falta de interação com o restantedo país. Temos que integrá-la de alguma maneira. As alternativasseriam integrar através de uma rede fluvial, através de ferrovias,através de impacto ambiental mínimo. Isso é possível, é um poucomais difícil do que simplesmente abrirmos a floresta com um trator econstruir estradas. Isso é possível e, na verdade, desejável, sequisermos desenvolver um modelo sustentável para a Amazônia amédio e a longo prazos. Sem dúvida alguma, eu acredito que osplanos de asfaltamento da BR-163, os planos de construção de novasestradas e de grandes obras na Amazônia, terão que ser revistos eisso é uma questão que a sociedade, como um todo, terá que decidir,inclusive os habitantes da Amazônia. São mais de 20 milhões debrasileiros que vivem na Amazônia e eles têm o direito de ter umavida adequada, “contato com a civilização”, digamos assim, tantoquanto nós temos. Então, como fazer esse equilíbrio é uma questão

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delicada, é uma discussão com que a sociedade brasileira inteira temque estar envolvida.

Temos aqui uma questão importante do ponto de vista político.É o seguinte: “Tendo em vista que as mudanças climáticas,independente dos fatores causadores, ações humanas ou naturaispela civilização industrial, ou tendências climáticas de longuíssimoprazo, podem efetivamente ocorrer de modo inexorável, não seria ocaso de, em lugar de investir os novos recursos no esforço demitigação, dedicar-se desde já a iniciativas de adaptação às novascondições que serão inexoravelmente criadas com as tendências jádeterminadas, ou seja, menos investimentos na minimização dasmudanças e mais na readaptação, reconversão e transformação dasatividades produtivas hoje em uso?”

É uma questão que ninguém tem uma resposta no bolso docolete, mas acho que é uma questão muito relevante de equilíbrio.Onde a sociedade brasileira vai realmente investir seus recursos: namitigação ou na readaptação? Mas, na verdade, a meu ver, comoestá colocada a questão, elas não são excludentes. Vai ter, sim, quetrabalhar na mitigação das emissões e ao mesmo tempo terá quetrabalhar em alguns aspectos na adaptação dos danos que já estãosendo causados pelos ecossistemas. Como se dará esse equilíbrio,ninguém realmente sabe, mas isso é uma questão que estará nessefórum de discussão. Até onde nós vamos gastar os nossos recursospara reduzir as emissões ou para tratar de adaptar às novas condiçõesclimáticas, tanto na agricultura quanto no setor energético e assimpor diante. Em minha opinião, na verdade vai-se dar uma combinaçãoentre os dois com muito cuidado. Na parte de mitigação, porque éfundamental reduzirmos as emissões o máximo possível, no menorespaço de tempo possível, para que possamos diminuir o custo deadaptação mais pra frente. Agora, como se dará esse equilíbrio,realmente ninguém tem resposta; é uma questão em aberto eobviamente extremamente relevante para o país.

Carla Checchia – Mediadora: Tenho uma última pergunta aqui.Caso alguém tenha interesse em encaminhar mais alguma, eu voudeixar para que isso ocorra após a apresentação do jornalista AndréTrigueiro. Após a apresentação, teremos um debate e, caso alguémtenha mais algum questionamento a fazer ao Professor Paulo Artaxo,faremos ao final.

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A pergunta é de Marcos Augusto de Almeida: “na palestra, VossaSenhoria sugeriu a adoção, no país, de uma redução voluntária dosGE a partir de 2012. Tal procedimento seria abrir mão do princípiodas responsabilidades diferenciadas do Protocolo de Kyoto, pelo qualos países desenvolvidos têm de reduzir os GEE de forma mais intensaque os países em desenvolvimento. Como Vossa Senhoria acha queo Brasil vai exigir, nos fóruns internacionais, uma efetiva redução deGEE dos países desenvolvidos, se adotar, internamente, uma reduçãoapenas voluntária?”

Professor Paulo Artaxo: Eu volto à questão de que falei hácinco minutos atrás. A redução do desmatamento da Amazôniainteressa a todos nós, brasileiros. Não interessa somente aos governosinternacionais. Agora, evidentemente isso é uma ferramenta denegociação que, na verdade, já está na mesa de discussão. Qual é obalanço que nós vamos fazer em relação à redução na Amazônia e,segundo, quem paga a conta, quem paga por isso? Os países emdesenvolvimento vão pagar pelo custo da redução das emissões porum efeito que, na verdade, eles não acabaram causando. Quer dizer,é uma questão que está na mesa de discussão o tempo inteiro, comovocês têm acompanhado, mas no caso brasileiro, a minha opinião éde que interessa para nós reduzirmos o máximo possível. Eu achoque se continuarmos fazendo aquele gráfico do desmatamento cairpor mais dois ou três anos, teremos a nosso favor uma ferramentafortíssima na mesa de negociação internacional e que pode fortalecerbastante a posição brasileira. Não se trata de uma redução voluntáriaou voluntarista, mas na verdade é como um instrumento de negociaçãoque evidentemente tem que ser levado pelo Itamaraty, pelo Ministérioda Ciência e Tecnologia, pelo Ministério do Meio Ambiente, etc. Achoimportante que nós façamos nossa lição de casa - que não está feitaainda - de reduzir essas emissões ao máximo possível, ou pelo menosestabilizar essas emissões e, a partir daí, nós iremos para umasegunda etapa muito mais fortalecidos na mesa de negociação,exigindo parcerias na emissão dos países desenvolvidos.

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Palestra

Jornalista André TrigueiroGlobonews

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Carla Checchia – Mediadora: Eu passarei a ler o currículo dojornalista André Trigueiro para fazer sua apresentação.

André Trigueiro é jornalista com pós-graduação em gestãoambiental pela UFRJ, professor e criador do curso de jornalismoambiental na PUC-RJ. Autor do livro Mundo sustentável: abrindoespaço na mídia para um planeta em transformação, pela EditoraGlobo. Coordenador editorial e um dos autores do livro no Meioambiente no século XXI pela Editora Sextante e desde 96 vem atuandocomo repórter e apresentador do Jornal das Dez, da GloboNews,canal de TV a cabo, onde também produziu, roteirizou e apresentouprogramas especiais ligados à temática socioambiental. Pela sérieÁgua: desafio do século XXI, recebeu o prêmio Imprensa Embratelde Televisão e os prêmios Ethos responsabilidade social na categoriatelevisão. Pela série Kyoto, o protocolo da vida recebeu o título de“hors- concours” no II Prêmio CBDS de desenvolvimento sustentável;e pela séria A Nova energia do mundo recebeu o Prêmio Nacional deConservação e Uso Racional de Energia 2005, oferecido pelaEletrobrás e pela Petrobrás. Cobriu, pela GloboNews, as Olimpíadasde Sidney 2000 e as Copas do Mundo na Coréia do Sul e no Japão,em 2002, e na Alemanha em 2006, e as eleições para a presidêncianos Estados Unidos, em 2004. É comentarista da Rádio CBN, emque apresenta aos sábados e domingos o quadro Mundo Sustentável;presidiu o júri das 6ª e 7ª edições do Festival Internacional de Cinemae Vídeo Ambiental de Goiás. André, a palavra é sua.

Jornalista André Trigueiro: Boa tarde. Não vim aqui nacondição de especialista ou técnico, venho na condição de jornalistaque procura acompanhar com atenção um assunto da maior relevânciaestratégica para o Brasil e que tem um fórum apropriado para que

PalestraJornalista André Trigueiro

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haja esse encontro de diversos setores da sociedade, encontrandoas melhores respostas ao que devemos fazer e rápido para oenfrentamento desse tema aqui e lá fora. Estou falando do FórumBrasileiro para Mudanças Climáticas, que tem no Presidente daRepública o seu coordenador e nove ministros como membros. EsseFórum foi criado no Governo Fernando Henrique Cardoso e teve àsua frente o ex-Deputado, ex-Secretário de Meio Ambiente FábioFeldman. Naquela época era um fórum que tinha muita visibilidade,era muito atuante, promoveu alguns encontros bem interessantes,colocou esse assunto na mídia, mobilizou a comunidade acadêmica,políticos, empresários. O atual governo, durante mais de um anoignorou a existência do Fórum. Fábio Feldman ficou obsoleto. Achou-se por bem encaixar no Fórum o Professor Luiz Pingueli Rosa que foi“saído” da Eletrobrás, porque não tinha votos no Congresso. OProfessor Luiz Pingueli Rosa faz o que é possível, mas o que faz nãotem sido suficiente, pela falta de estrutura, para mobilizar a sociedadeem torno desse tema, atraindo os atores que têm o que falar, o quepropor para que o Brasil tenha um discurso adequado em relação aesse tema e me parece que não encontramos ainda esse discurso.Perdemos um protagonismo na política externa.

O atual Presidente da República tem falado com muitapropriedade e ênfase do protagonismo do Brasil em relação ao etanole ao biodiesel. São predicados importantes para pontuarmosinternacionalmente e dizer que estamos fazendo nossa parte tambémnesse particular. Entretanto, não é suficiente, principalmente quandoo Presidente vem dizendo que os biocombustíveis são a solução parao aquecimento global. Não são a solução para o aquecimento global.Estou errado, Professor? Longe de ser a solução. Hipoteticamente,se todos os automóveis do mundo pudessem andar - e não é possível- tendo etanol ou oleaginosas misturadas com álcool comocombustível, estaríamos longe da solução. Ajuda? Ajuda, mas não éo suficiente. É pouco? É pouco. Ah, mas o Brasil está há trinta anosinvestindo em recursos humanos e tecnológicos para sermos o paísdo etanol. Perfeito! Temos uma nova frente tecnológica na direção aobiodiesel. Ótimo! Não é suficiente. O biocombustível não resolve oproblema do aquecimento global.

Vamos reciclar o discurso e vamos em frente. E uma questãoque eu também acho problemática e que precisamos discutir - mas

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isso é a posição do Itamaraty - é a posição que o Brasil vem mantendode não aceitar, em nenhuma hipótese, metas formais na redução deemissão de CO

2. Desculpem-me se esse assunto já foi tratado aqui.

Eu vou manifestar a minha opinião, é claro. E Kyoto afirma que aresponsabilidade é comum, porém diferenciada - que não podemosser penalizados com metas draconianas de redução de emissão deCO

2. Em outras palavras, não é justo que o Brasil seja punido no seu

projeto de desenvolvimento, assumindo metas formais, compulsóriasna redução de emissão de CO

2, mas também não é justo que nos

recusemos a discutir a possibilidade de – juntamente com Índia, China,Indonésia, México – termos metas de redução de CO

2, sim.

Eu fico imaginando, metaforicamente, a seguinte situação: todosno mesmo barco e o barco está afundando, entrando água. Aí osprimeiros tripulantes que, de forma acidental ou não, permitiram queaquela água entrasse e são os responsáveis, estão nos melhorescômodos do barco. A água está entrando em todos os lugares e nósdizemos assim: eles que tirem a água. O barco está afundando eestamos todos dentro, mas eles que tirem a água, apenas eles terãometas formais de retirada da água do barco, porque eles causaram asituação majoritariamente. Eu não consigo entender e, comoprofissional de comunicação, acho que há um risco desse discursotornar-se impopular. Não “cola” essa discussão - que pode sercategorizada como nacionalista, em defesa dos interesses do Brasil,em defesa do nosso projeto de desenvolvimento - de não podermose de não querermos ter metas formais de redução. Não sei se “cola”,dada a emergência da crise, a necessidade de respostas rápidas.Direito de poluir? Não “cola”. Eu temo pelo político que ache queessa é uma proposta inteligente no curto e médio prazo; nem estoucolocando lá para frente, não.

A ciclotimia da crise se dá de tal maneira que acredito quepoderíamos ter melhores perspectivas no jogo diplomático, abrindopara uma discussão. Eu nem diria como fez a China há poucos diasatrás. A China fez isso e fez de forma hábil; eu não vou nem dizer ameta – talvez eles nem tenham meta – mas eles assumiram o papelhistórico deles. Nós vamos fazer algo, nós precisamos fazer algo,algo que não implique uma penalidade, uma punição para o nossoprojeto de desenvolvimento, mas a China abriu um discurso que oBrasil ainda não colocou e isso nos expõe. É uma opinião, estou

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compartilhando. Isso nos expõe negativamente; é hora de agir. Vamosdizer que os países do Anexo 1 do IPCC têm a maior fatia de culpa,de responsabilidade; vamos dizer que as metas, se acontecerem,deverão ser negociadas de forma diferente; mas não podemos nosomitir e ficar negando um papel que todas as nações do mundo devemter que é o de reduzir emissões.

Parece-me também um tanto monolítico o discurso quandofalamos do Brasil como se fosse só a Amazônia. Ah, mas a Amazôniaresponde pela maior parte das emissões de gases de efeito estufa noBrasil! A Amazônia é um discurso importante, mas não é o único.Temos que nos olhar no espelho, como país emergente, o qual já éapontado como um dos países que terá nos próximos 25, 30 anos umpapel de destaque no cenário internacional, inclusive econômico.Existem outras frentes em que poderíamos estar pensando em comoreduzir emissões de CO

2 e, a meu ver, isso não implicaria grandes

malabarismos, não tem a complexidade da questão amazônica.Eu vou dar aqui alguns exemplos. Vou começar pelo meu

favorito. O Brasil é o campeão mundial de uso do chuveiro elétricopara tornar quente a água do banho. O chuveiro elétrico, como sesabe, drena uma energia preciosa, estimada pelos pesquisadoresem clima solar da PUC-MG e do Instituto Vitae civilis de São Paulo,em, aproximadamente, 8% de toda a energia produzida no Brasil –isso é um Rio Grande do Sul. Não há outro país no mundo com tantochuveiro elétrico e ninguém fala nisso. Está tudo muito bem. Aliás, noano passado, no segundo pacote de estímulo à construção civil,reduziu-se a alíquota de cimento, tijolo, areia e de chuveiro elétrico.Fantástico! Nós temos um país solar, nós vivemos num país em quea incidência de sol é de, aproximadamente, 280 dias por ano; nóstemos um país que já tem e, no caso de Belo Horizonte, isso éflagrante, uma condição de ofertar produtos com uma boa resoluçãotecnológica, os quais são os coletores solares que transformam águafria em água quente usando a radiação solar. Nós temos hoje, emBelo Horizonte, mais de 2.000 edifícios que têm essa ferramenta,esse aparelho. É caro, não é accessível. Não coloquem na balançachuveiro elétrico e coletor solar, porque o coletor é muito mais caro -entre mil oitocentos e dois mil reais um coletor para uma família dequatro pessoas aproximadamente. Entretanto, nós temos “knowhow”,nós temos um parque industrial bem razoável, nós exportamos

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coletores para mais de vinte países e nenhum desses vinte paísestem mais incidência de sol do que o Brasil. Coletor é programa paraincremento da renda em comunidades pobres, porque onde não há o“gato”, o chuveiro elétrico responde por 30%, em média, do que sepaga de conta de luz apenas para aquecer a água do banho. Euvisitei uma comunidade em Jacarepaguá que tinha coletor solar. ALight instalou o coletor solar dentro de um programa que é um Fundode Inovação Tecnológica ou Eficiência Energética que todas asdistribuidoras de energia têm que ter; é um percentual da receitadestinado ao Fundo e esse percentual pode ser utilizado apenas emprogramas de eficiência energética ou inovação tecnológica. A Lightquis usar em coletor. Quem era inadimplente, tornou-se adimplenteem muitos casos e, no caso de uma senhora chamada Dona Giovana,de uma comunidade de Jacarepaguá, uma senhora que vive arealidade de uma comunidade de baixa renda, que tem uma filhaadolescente que gosta de tomar banho quente - e o banho não érápido -, ela passou a ter, com o coletor solar em lugar do chuveiroelétrico, sessenta reais a mais por mês, no bolso, o que para ela éalgo que faz a diferença e ela não tem mais chuveiro elétrico. Bom,por que não um programa que facilite o crédito, pagamento em dez,quinze anos; financiamento com juros “de mãe” para que vocêpromova a substituição de um equipamento que é o barato que saicaro? Se formos procurar, o chuveiro elétrico custa dezenove, vintereais. Instalado em casa, esse chuveiro “puxa” muita energia e, nahora do pico, a distribuidora de energia tem calafrio. É uma hora difícilporque a distribuidora tem que estimar todo o consumo da rede apartir do horário de pico, e aí temos um custo Brasil que tem umchuveiro elétrico correspondendo ali de forma infinitesimal, masrespondendo a esse custo. Estamos falando de reduzir a emissão deCO

2? Vamos falar de chuveiro elétrico, vamos falar de coletor solar; é

uma solução que está ao nosso alcance. O Brasil tem seiscentos milcoletores solares instalados e isso é pouco.

Nós temos um programa de controle da poluição do ar porveículos automotores, conhecido como Proconve. O Proconve foicopiado de uma lei da Califórnia; isso já tem seus vinte anos. O queé o Proconve? As montadoras de veículos têm metas tecnológicaspara reduzir a emissão de poluentes. Até 2020, 2025 têm que reduziros poluentes resultantes da queima do combustível. Não se menciona

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CO2 no Proconve. Temos motor flex, temos álcool, temos biodiesel,

temos as montadoras batendo recorde de venda. Temos asmontadoras e, nesse governo, no primeiro mandato, o ex-Ministro daFazenda, Antônio Pallocci, bateu de frente com um pedido cínico dasmontadoras de veículos de reduzir IPI. Estamos passando por ummomento difícil, não estamos exportando muito, risco de desempregoe o Ministro à época bateu pé e falou: não temos garantia que aredução de IPI implique algo que seja benéfico para o todo.Prevaleceu, naquela época, o interesse das montadoras e se reduziuo IPI. Pois bem, o Proconve não tem CO

2. O Brasil não tem metas

tecnológicas impostas para as montadoras de veículos que asobriguem a reduzir, no médio e no longo prazo, as emissões de CO

2

resultantes da queima de combustível dos nossos motores. Vamosfalar de reduzir a emissão de CO

2 no Brasil? Vamos falar de Proconve.

E vamos colocar CO2.

A Petrobrás é a maior patrocinadora de projetos culturais, deprojetos esportivos e ambientais do Brasil; mas temos que falar daPetrobrás. Por quê? Quando os senhores e as senhoras quiserempassar o pente fino no planejamento estratégico da maior empresado Brasil, vejam o que ela está perseguindo para alcançar em 2020 echegar à energia renovável, vejam os investimentos da Petrobrás emenergia renovável. Lá existirá o compromisso da Petrobrás de investiraté 1% do que tem de receita em energias renováveis: biodiesel,solar, eólica, biomassa e estamos conversados. Até 1%. Eu estoufalando isso, em tom queixoso, há muito tempo. É pouco. Quando sechega para alguém da Petrobrás e diz: “até 1%?” Já aconteceu comigo,a resposta foi: “e ninguém investe mais do que nós”. Muito bem, masé pouco, porque a própria Petrobrás já não se assume, desde 2001,no seu estatuto, como Companhia de Petróleo; é Companhia deEnergia, como todas as grandes do mundo já o fizeram. Por quê?Assim como a Idade da Pedra não acabou por falta de pedra, a Idadedo Petróleo não vai acabar por falta de petróleo. Se os relatórios doIPCC estiverem corretos, com bom nível de confiabilidade, e meparece que há; se o relatório do ex-economista chefe do BancoMundial, Dr. Nicholas Stern, o “Stern Review” - um relatório deseiscentas páginas pormenorizando cenários econômicosapocalípticos -; se nada for feito em relação à redução drástica, nocurto prazo, das emissões de CO

2; se os pesquisadores do nível do

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Professor Artaxo e outros recrutados pelo MMA para produziremcenários que já estão aí - no caso da Amazônia, o cenário mais positivoé uma elevação de até 3°C na temperatura da Amazônia -; se essesdiagnósticos estiverem corretos, não é por falta de petróleo que ovalor vai subir. Subirá porque não analisamos, no preço docombustível, o custo ambiental dele. No preço do querosene, que metrouxe do Rio para Brasília, no preço da minha passagem, não foipago o custo ambiental desse avião que emitiu até mais CO

2 porque

veio correndo por causa do atraso. Então, a Petrobrás tem que investirmais do que até 1%. Tem que. Aí é uma área em que atuamos, que éa da comunicação. É o risco da maquiagem verde.

Outro dia eu vi um anúncio bonito da Vale do Rio Doce ocupandomeia página do jornal, falando que as locomotivas da Valetransportando minério seriam movidas a biodiesel. O que não saiu nomesmo espaço no jornal foi que, lá para março, a Vale do Rio Doceadquiriu uma mineradora da Austrália, para se tornar a quartamineradora de carvão do mundo para suprir a sanha, a fome de carvãomineral da China e, três semanas atrás, a Vale anunciou a construçãode três termelétricas a carvão mineral no Maranhão - carvão mineralimportado, porque o do Brasil não é de boa qualidade - apenas pararesponder a uma demanda crescente de minério da China. E a Valenão podia perder o negócio. E o bom negócio a gente sabe... Qual éa tradução do bom negócio? É o que me dá o maior retorno, o maiorlucro, no menor intervalo de tempo possível e, em boa parte dos casos,eu ousaria dizer aqui, na maioria dos casos, isso não é sustentável.

A Petrobrás precisa elevar a estatística, seu compromisso noplanejamento estratégico de investir mais. É aquilo que os democratasfizeram, nos Estados Unidos, desde a campanha – foi a campanhado Gore e foi a campanha do John Kerry. Qual é o discurso que osdemocratas emplacaram e não avançaram perante o Bush?Precisamos substituir combustível fóssil não por uma questãoecológica, mas por uma questão de segurança nacional. Os EstadosUnidos são reféns da Venezuela e dos países, instáveis politicamente,do Oriente Médio.

Precisamos descobrir como podemos dar um salto tecnológicocomo a Alemanha, que vive há oito anos com o Partido Verde noPoder: Gerhard Schröder, Jürgen Tritin, do PV, conseguiram formatarum projeto que consolidou a terceira maior economia do mundo e o

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terceiro da Europa numa condição de protagonista tecnológico daenergia eólica, de uma legislação federal muito arrojada. Eu estivena Alemanha, no ano passado, cobrindo a Copa do Mundo e aí eu jáestou mudando de assunto, estou saindo da Petrobrás e da Vale eindo para um país que é criativo na forma de descobrir soluções parareduzir emissão. Quando o Brasil foi desclassificado no futebol, nósjá estávamos morrendo de saudade de voltar para o Brasil e ligamospara a redação da GloboNews. “Podemos voltar?” Responderam:“Não, Portugal segue em frente e Felipão é o técnico. Vamosacompanhar”. Bom, adiamos o retorno e ficamos até a final da Copa.Portugal estava na cidade de Marienfeld, no sul da Alemanha, repletade plantações, um lugar bonito, plantação de canola, aqueles camposbonitos e coloridos. De repente, um quintal, quatro placas enormes,fotovoltaicas um pouco maior do que uma mesa de ping-pong, umacasa relativamente humilde, chegamos próximos para fazer essachecagem - jornalista é uma raça - fomos lá descobrir qual era ahistória que estava ali para fazer uma reportagem, se fosseinteressante, e foi interessante e fizemos. Lá, morava um pedreiro eeu fiquei com vontade de ser pedreiro na Alemanha, se jornalismonão der certo, porque era uma boa qualidade de vida e aquele pedreirode Marienfeld instalou, no quintal de casa, quatro placas fotovoltaicas,porque se sentiu estimulado pela legislação alemã, que remunera oque ele está captando, e era mais do que o dobro que ele necessitava.Estava ligado à rede e do que estava indo para a rede, que era oexcedente, a remuneração era superior à media do que se paga pelasdistribuidoras de energia da Alemanha. Então, existe um incentivopara o cidadão comum. Em tendo interesse de fazer esse investimento,ele o faz e é premiado por isso com uma tarifa acima da média. Quandofomos entrevistá-lo, ele disse assim: “eu me interessei em fazer issopelo dinheiro e pela preocupação ambiental. Daqui a doze anos euvou começar a ter lucro, a minha previdência privada está ali”.

No Rio de Janeiro, na Ilha do Fundão, decidiu-se investir numaplanta energética nova para o Brasil. Lá fora já existe, queimando olixo para produzir energia e o resíduo dessa cinza pode ser usadocomo adubo, se não houver metal pesado; ou pode ser usado comobase, sub-base de asfalto, se tiver algum ingrediente que não sejabom. Eles conseguem produzir energia e estrategicamente instalarama usina – que eles chamaram de Usina Verde – entre o Hospital

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Universitário (HU) e o alojamento dos estudantes, para onde sopra ovento. Eles se expõem a uma crítica que não virá sem pressão. Atéhoje ninguém reclamou. A tecnologia implica um sistema de lavagemde fumaça e de contenção de poluente que é fantástico. Funciona.Qual foi o problema deles? Eles não tinham, pelas regras do jogo doBrasil, pelas regras do Mercado Aberto de Energia (MAE),regulamentação para inserir na rede uma usina que queima lixo etransforma energia. Fantástico. Portanto, abrir caminho para a UsinaVerde é abrir caminho para o bagaço de cana. Lá no Rio de Janeiro,há o Instituto Nacional de Eficiência Energética (INEE), que reúneengenheiros aposentados de Furnas e da Eletrobrás. Eles estãofazendo, há muito tempo, uma conta interessante e isso antes doboom do álcool, antes de Bill Gates, antes de o megaespeculadorSoros virar empreendedor do etanol, antes disso. A conta do pessoaldo INEE era que, se os equipamentos, que já se estão tornandoobsoletos, porque o tempo de vida útil deles é de 25, 30 anos para aprodução de etanol, forem substituídos por equipamentos maiseficientes e usarmos a energia da queima do bagaço, não só apenaspara subsistência da usina, mas tendo a pretensão de fazer daquiloalgo importante para a matriz energética, chegaremos a dois dígitosda matriz energética, pelo menos 10% de toda a matriz energéticabrasileira naquela época, antes do Soros, do Bill Gates, da turma doGoogle, que chega aí com muita vontade de ser senhor de engenho.A estimativa era de que 10% da matéria poderiam ser obtidos combagaço de cana, energia renovável, alimentando a matriz energética,usando uma infra-estrutura que já está aí e o BNDES já fez a partedele, no papel de banco de desenvolvimento com interesse nacional,oferecendo créditos especiais para esse tipo de financiamento.Substituir o equipamento usado numa usina de álcool para queimarbagaço oferece o melhor crédito, isso já está aí consolidado. Qual éo problema que está colocado? É o da logística de distribuição. Asredes de transmissão que varam propriedades, quer dizer, você tema sua usina em Ribeirão Preto, tem muita energia de bagaço ali, sóque tem um problema: quem é que vai tirar daqui e inserir na rede?Nem todo mundo gosta de ter linha de transmissão passando pelasua propriedade. Alguém tem que entrar como árbitro, alguém temque entrar para dizer isso vai ser feito e vai ser assim. É preciso ternormas, marcos regulatórios claros, é preciso ter um governo central

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estabelecendo como prioridade, como algo estratégico para o Brasil,superar essa divergência de cerca: para cá é minha propriedade,para lá é a sua, não vai passar “linhão” aqui. A questão é saber comovai passar, porque precisa passar. O PAC prevê algo em torno dequinhentos bilhões de reais em investimentos para o Brasil crescer.10% do PAC, algo em torno de cinqüenta bilhões de reais, são para aAmazônia e a Amazônia, como o Professor Artaxo lembrou, tem 23milhões de habitantes, é uma região que tem um potencial, queinteressa ao Brasil explorar de maneira sustentável. Abrindo umparêntesis. Palmas para Nicolas Sarcozy que criou o super Ministériodo Desenvolvimento Sustentável, nomeando o ex-Primeiro-MinistroAlain Juppé. Eu adoraria ver o nosso Presidente e o atual Ministro doDesenvolvimento, toda vez que usarem a palavra desenvolvimento,assumirem de público o compromisso com a sustentabilidade.Fechado o parêntesis. Voltemos aos cinqüenta bilhões de reais naAmazônia. Essa conta e a logística, como é que você vai desenvolvera Amazônia? Então, vamos usar o cabedal de conhecimento quetemos hoje para projetar desenvolvimento numa região importantedo Brasil. Muito bem. O que deu errado no Plano? Nada até vir orelatório do IPCC, até vir o relatório dos brasileiros com notório sabernessas projeções; quer dizer, temos um índice de confiabilidade quedeve ser considerado; uma hipótese que não é remota; é até umahipótese bastante consistente e que aponta a transformação daquelebioma: mudança do ciclo da chuva, mudança na forma como a florestase resolve, a resolução da floresta, da mata. Então, onde vamosinvestir cinqüenta bilhões de reais na Amazônia? Estamos olhandopara ela no retrovisor. Sugestão: vamos refazer as contas, vamos verem que medida eventualmente esse investimento merece serrealizado, apesar dos diagnósticos novos, das projeções, dos planos,vamos investir. Mantemos o PAC nessa direção, mas fizemos ascontas. A minha pergunta é, e eu não tenho a resposta, alguémreconsiderou as prioridades do PAC, os investimentos previstos noPAC da Amazônia em função dos diagnósticos do IPCC, que sãomacros? Não há uma boa resolução para cá e o próprio governo, pormeio do MMA, encomendou estudo aos especialistas brasileiros, queapontaram que, na média, a elevação da temperatura da Terra deverádar-se, no melhor cenário, em 3ºC. É uma pergunta. A outra: o semi-árido deixará de ser semi-árido e tornar-se-á árido? O PAC também

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prevê a transposição das águas do Rio São Francisco. Pergunta:alguém refez as contas para ver se o projeto de desenvolvimento donordeste, a partir da transposição das águas, considera se eu estouolhando o nordeste no retrovisor como região semi-árida ou se estouprojetando? Eu estou fazendo um investimento maciço de recursos,visando um investimento numa região que está em transformação.Infelizmente, sob esse ponto de vista, para pior. Alguém refez ascontas? Alguém está preocupado com isso? Alguém está usando essedinheiro público todo e é um dinheiro que não está sobrando. Esserecurso está sendo canalizado de forma responsável? Todos os riscosestão sendo considerados? E os riscos não são pequenos.

Por último, mas não menos importante, o Jornal O Globo, deduas semanas atrás, no domingo – que é um dia nobre para venderjornal – colocou na chamada principal do Caderno de Economia umapesquisa realizada pela Análise Editorial que produz um anuário apartir de uma grande pesquisa feita com as maiores empresas doBrasil. Das quinhentas maiores empresas do Brasil, 472 foramconsultadas. As perguntas foram na direção dos investimentos oudas preocupações socioambientais dessas empresas. Um dado mechamou atenção: 72% das empresas de grande porte no Brasil nãotêm projetos para reduzir as emissões de CO

2. Qual é o papel do

governo? Bom, o governo da Amazônia lançou há poucos dias umprojeto – assumiu seu papel como governo. O governo não podetudo, mas pode muito. O governo do Amazonas criou facilidades eestímulos para que os empresários que estão naquele estado sesintam atraídos, haja recompensa fiscal para que se tomemprovidências reduzindo CO

2. Esse número sugere que talvez o

Governo Federal, o Ministério da Fazenda, possam também consideraralgum tipo de estímulo, recompensa, incentivo para que as empresaspossam também fazer a sua parte na redução das emissões.

De tudo o que eu estou discutindo aqui, nenhum dos exemplosque eu dei são mais importantes que conter desmatamento equeimada na Amazônia. O que me incomoda é que tornamosmonolítico o discurso da redução da emissão de CO

2 no Brasil sobre

a Amazônia e não é só a Amazônia. Estamos agravando as emissõesantrópicas fora da Amazônia, portanto é uma bolinha de neve queestá crescendo.

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Vejo daqui o Professor José Miguez e tenho por ele uma enormeempatia, porque vi a forma que trabalha - como jornalista, não voucometer nenhuma inconfidência -, com muita dificuldade, levando àfrente um trabalho que já está precisando ser atualizado, que é oinventário das emissões. Nós tínhamos que ter esse inventário assimcomo o IBGE não pode deixar de ter o censo. É um absurdo termosa radiografia do Brasil, quando se quer saber o que é o Brasil, olhandoo censo de 2000. Para um jornalista que precisa basear-se em dadosconcretos e confiáveis é um desastre, porque estamos em 2007,partindo para 2008, e eu quero saber o que é o Brasil hoje em relaçãoa saneamento, lixo, ocupação das cidades, crescimento, qual ocomportamento, etc. E eu tenho que olhar pra trás.

Da mesma forma, sobre o inventário, pela ciclotimia da crise epela importância, pelo prestígio desse tema no Brasil e no mundo,precisamos ter estrutura para produzir informação que justifique, porexemplo, o Brasil acompanhar os fenômenos meteorológicos, querdizer, o mundo está muito preocupado em monitorar as mudançasclimáticas. O Brasil ainda “come muito na mão” dos satélites doprimeiro mundo e ficamos com um déficit de informação. Um paísque já tem furacão, um país que precisa precaver-se de novasocorrências extremas como essa e um país que precisa estar bemcalçado na produção de informação para fazer os diagnósticoscorretos. Tudo isso envolve informação, consciência da opiniãopública, mídia tendo encontro com fontes e o Fórum. Vou terminarpor onde eu comecei: o Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas,institucionalmente, é o lugar onde o Presidente da República e noveministros, que estão relacionados na certidão de nascimento do Fórum.O Fórum está invisível, o Fórum está atrofiado. Não fossem os briose a motivação do Professor Pinguelli de fazer o que é possível, eleseria um cadáver insepulto. O Fórum Brasileiro de MudançasClimáticas existe e ele precisa existir de verdade, porque essadiscussão que vocês estão promovendo hoje aqui – para a qual eutenho a honra de ter sido convidado - precisa ocorrer sistematicamente,precisa incorporar os atores, precisa trocar as experiências.Precisamos fazer desdobrar essa informação que emerge dacomunidade científica, porque ela alcança a economia, alcança apolítica, alcança as relações internacionais, é estratégico porexcelência. Não podemos ir a reboque da crise, não podemos ficar

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dizendo que o biocombustível resolve o problema do aquecimentoglobal; precisamos ir além com consistência, com fundamento, comcuidado e com diálogo. O Brasil é uma nação democrática, o Brasil éum país emergente que está confirmando essa profecia que vai serum país que fará a diferença no Terceiro Milênio. Temos que estarmuito preparados para saber o que fazer e o que dizer quando oassunto é mudança climática, porque o nosso discurso e a nossaprática ainda estão muito aquém do que me parece o necessário.Muito obrigado.

Carla Checchia – Mediadora: Muito obrigada, André. A suapalestra foi provocativa, no mínimo. Quem quiser, pode encaminharperguntas.

Resumo: O jornalista André Trigueiro destacou que o FórumBrasileiro de Mudanças Climáticas deve ser dinamizado para que oBrasil tenha um discurso adequado ao tema.

A questão dos biocombustíveis não é suficiente para resolver aproblemática do aquecimento global. É preciso que o Brasil assumaa possibilidade de ter metas de redução dos gases de efeito estufa,junto a outros países em desenvolvimento. A responsabilidade é detodas as nações, uma vez que estamos enfrentando uma crise queafeta todo o planeta e a omissão do Brasil nesse quesito expõenegativamente o país. A Amazônia, isoladamente, também não é umaquestão que resolva a problemática ambiental.

Medidas mais simples podem produzir resultado significante naquestão do impacto do aquecimento global. O Brasil é o maior usuáriomundial de chuveiro elétrico. Não há incentivo para a utilização deenergia solar, que possibilitaria, inclusive, a melhoria da qualidade devida das comunidades carentes - com a redução do valor pago peloconsumo de água quente -, e da melhoria da qualidade do ar.

O Brasil não tem metas tecnológicas que obriguem asmontadoras a reduzir a emissão de dióxido de carbono pelosautomóveis.

No planejamento estratégico da Petrobrás, há o compromissode investir até 1% do total de seu faturamento em energia renovável.É preciso que a Petrobrás aumente esse percentual, pois não temosa cultura de internalizar no preço do combustível o custo ambientalque sua utilização proporciona.

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Um exemplo positivo do uso de energia renovável está presentena Alemanha, onde o cidadão comum que se interessar em instalar eutilizar a energia solar é remunerado pela energia excedente, que édisponibilizada para a rede.

O PAC prevê quinhentos bilhões de reais em investimento parao Brasil crescer, sendo 10% para a Amazônia. O relatório do IPCCaponta mudanças no bioma da Amazônia que podem inviabilizar osinvestimentos propostos. O mesmo se aplica em relação ao biomasemi-árido e o projeto de transposição das águas do Rio SãoFrancisco. É preciso refazer as contas, considerando os riscos queas mudanças climáticas trazem.

72% das empresas de grande porte no Brasil não têm propostaspara redução de dióxido de carbono. O governo brasileiro precisariapensar em algum tipo de estímulo para que essas empresasrealizassem projetos de redução desse gás.

O Brasil precisa ter estrutura para produzir informações sobrefenômenos meteorológicos e ambientais. O Fórum Brasileiro deMudanças Climáticas é o lugar em que essas questões e informaçõesdevem ser tratadas, com a incorporação dos diversos atores.

Se alguém tiver algum questionamento a fazer ao jornalistaAndré Trigueiro, por gentileza. O Professor Eduardo Viola solicitoutomar a palavra para fazer algumas considerações. Por favor,Professor.

Comentário da Platéia – Professor Eduardo Viola (UnB):Foram brilhantes as três palestras. Gostei muito, aprendi bastante.Eu queria fazer apenas dois comentários mais específicos que sãoos seguintes. Primeiro, em relação ao André Trigueiro, é que a ênfasena Amazônia, na minha visão, é correta. O ponto-chave é que o custode reduzir emissões, de reduzir o desmatamento na Amazônia ébaixíssimo, portanto, se você só faz isso e não faz mais nada, háinércia na outras áreas, nas áreas industrial, de transporte e residência,o que é muito errado. Mas o custo de reduzir emissões em outrasáreas é maior. Portanto, a vantagem comparativa do Brasil em reduziremissões na Amazônia é muito grande. Nenhum dos três dessesgrandes emissores do mundo, digamos assim, a União Européia emais dois países, não têm nem remotamente o poder do Brasil, quepode reduzir 4% das emissões globais. A redução de 2% das emissões

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globais, em quatro ou cinco anos, com um custo reduzidíssimo, estárelacionada à fiscalização, ao monitoramento e à repressão naAmazônia. É impressionantemente barato. Não há ninguém, não hánada equivalente no mundo. Esse é o primeiro ponto.

O segundo ponto que eu queria colocar diz respeito à questãode quando não falamos dos caminhos da redução de emissões paraestabilizar as mudanças climáticas e acho que esse é um comentárioque tem mais a ver com o Professor Artaxo. Há caminhos importantesque estão faltando nisso aí. Há duas questões muito importantesque não foram mencionadas porque são controversas: uma é a capturae o seqüestro de carbono fóssil. Isso é algo importantíssimo desde anossa tradicional tecnologia futurista, lançada pelos noruegueses;hoje, uma tecnologia já na ponta do projeto demonstrativo e dehabilidade comercial que tem uma eficácia extraordinária de seqüestrode carbono e é uma solução tecnológica de alta viabiabilidade. Daquia dez anos já está para ser implementada e facilitará muitíssimo porquecria todo o fator da descarbonização, a retirada de dióxido de carbonodo carbono e cria carbono limpo, que é decisivo para fazer ponto deengagement com a China e com a Índia. Outra questão muitoimportante é a da energia nuclear. Em outra época, a energia nuclearera denunciada porque era muito perigosa e não havia mudançaclimática; e agora há mudança climática e a energia nuclear se tornoumais segura do que no passado. Muitos países precisam de energianuclear. Outra questão que eu queria colocar é a seguinte: cuidadoao fazer uma ilusão. O cálculo do COPPE sobre emissões históricasé bastante controverso. Só nós, e uma parte de nós, no Brasil,acreditamos nisso. Uma coisa são as emissões de hoje, outra coisasão as históricas. Não há nenhum outro país com comunidadecientífica forte que acredite nessas emissões históricas e os cálculosfeitos aqui, por enquanto, são precaríssimos. Então cuidado para nãocriar uma ilusão. Historicamente temos muita baixa responsabilidade,1%. Isso ainda é muito incerto e isso é contraditório com o discursode assumir nossas responsabilidades, porque a realidade de hojecom as emissões é que nós temos 4% das emissões globais, 3% dapopulação do mundo e 2,5% do PIB mundial. Portanto, nós já estamosem débito, do ponto de vista da atualidade. Obviamente que todos sealimentam do discurso do Presidente Lula em torno deles. É umproblema deles e tudo o mais. Desculpe se me alonguei. Obrigado.

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Carla Checchia – Mediadora: Vamos iniciar a leitura dasperguntas. A primeira é do Juarez Júnior. “O Senador RenatoCasagrande falou sobre a redução do consumismo que assola ospovos capitalistas e, é claro, o Brasil. Como você acha que esseespírito de austeridade pode ser implantado na humanidade eespecialmente no povo brasileiro?”

Jornalista André Trigueiro: Ele falou da questão do consumoconsciente? Ainda é um tanto subversivo o discurso do consumoconsciente num país em que chamamos o Diretor de Embalagens daFIESP, por exemplo, para dar entrevista, para saber se está vendendomuita embalagem. Se estiver vendendo muita embalagem, a economiaestá aquecida, está tudo bem. O que é um recorte linear, pequeno,por exemplo, da questão das embalagens no universo dos resíduossólidos. Como é que pensamos consumo? - e eu escrevi isso, é umaquestão sobre a qual eu acho importante não nos omitirmos.

Quem paga meu salário na GloboNews ou na CBN é apublicidade. Entretanto, eu não tenho nenhum pudor de denunciarpublicidade que remete ao consumo compulsivo, perdulário, do não-necessário, para que tenhamos como projeto de vida trabalhar. E avocação fica para o segundo plano. Qual é a profissão que me dámais dinheiro para que eu possa, ao longo da minha existência,acumular bens, posses e me afirmar numa sociedade materialistacomo sendo alguém importante porque eu ando com boas roupas, oúltimo modelo de celular, carro? São valores que estão fortementeenraizados. Há três semanas atrás estávamos acompanhando apalestra do Al Gore em São Paulo. Foram duas horas e meia em queele falou sobre várias questões, mas não falou, ao meu ver,suficientemente sobre o consumismo. Aliás, eu não me lembro de tê-lo ouvido falar sobre consumismo. É curioso você estar fazendo essapergunta. Veio em boa hora porque a edição do próximo domingo do

DebatePerguntas ao Jornalista André Trigueiro

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Cidades e Soluções, que é o programa que faço na GloboNews, éexatamente sobre isso. Há uma entrevista exclusiva com o Al Gore.Há a Joana Calmon, que é a nossa correspondente em Paris, falandode como os europeus, em particular, estão cada vez mais seletivosem relação a produtos ou serviços com baixa emissão de CO

2. Há

uma rede de supermercados britânica chamada Tesco que estáetiquetando setenta mil produtos nas gôndolas e prateleiras com ainformação sobre o quanto cada produto emite de CO

2 para existir.

Há os vôos verdes, que é algo interessante e “está pegando” por lá:na decolagem, já se sabe que não se ficará sobrevoando aeroporto,esperando autorização para descer; você decola sabendo que vaipousar na hora certa e você tem um software inteligente que faz aprogramação desses vôos. Seria uma sugestão interessante para oBrasil incorporar essas tecnologias, por outras razões. E nós temosfinalmente uma cultura ainda muito incipiente, mas é bom registraraqui duas organizações no Brasil, protagonistas na disseminação dosvalores do consumo consciente. O Instituto de Defesa do Consumidor(IDEC), cujo site tem a biblioteca virtual, com o link para baixargratuitamente um livro que é destinado a professores que queiramtrabalhar com seus alunos, na rede pública ou privada, os conceitosdo consumo consciente. É o melhor material em português que eu jáli na vida sobre o tema. Recomendo. E o Instituto Acatu para oConsumo Consciente, com sede em São Paulo, que tem o Hélio Mattarà frente. Ele aparece na GloboNews, também agora no Cidades eSoluções, no domingo, falando como você está reduzindo CO

2 quando

faz uso racional da água, quando recicla o seu lixo, quando tira doaparelho eletro-eletrônico o dispositivo do standby, como é que você,na sua calibragem individual, como cidadão, pode fazer a diferença,realizando pequenos gestos que implicam redução de CO

2. Essa

discussão sobre consumo vai longe, mas eu acho que ainda estamosna pré-história, precisamos discutir isso em sala de aula.

Existe um relatório da UNESCO chamado Perspectivas sobrea Criança e a Mídia que mostra os efeitos negativos dos apelospublicitários no país mais consumista do mundo, que são os EstadosUnidos, em especial sobre as crianças. Eu vou destacar dois:obesidade infantil. A publicidade escolhe os ícones, os super-heróis

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dos quadrinhos, o Homem-Aranha, por exemplo, para vender biscoitode chocolate. O garoto vai comer biscoito de chocolate sem ter muitavontade. Ele não gosta propriamente do biscoito de chocolate, mas éo biscoito de chocolate do Homem-Aranha, ele vai comer. Obesidadeinfantil porque os produtos muito calóricos, com pouca fibra, que nãoestão incorporados a uma dieta balanceada, são aqueles que apublicidade tem que jogar pesado para atrair. E o outro fator ruim:estresse familiar. A criança fica seduzida pela publicidade em dizer:eu quero a boneca daquela apresentadora de televisão, eu queroaquele tênis de marca, eu quero aquele celular. Os pais, na maiorparte dos casos, em países como o Brasil, não têm dinheiro parahonrar esse investimento fora do Natal, fora do dia de aniversário e,às vezes, nem no Natal, nem no aniversário. Ele foi inoculado com ovírus do consumo agora. “Eu quero aquilo”. Há uma discussão. Ospais dizem “Não”. A criança fala “Mas eu quero”. Resposta: “Não vaiter”. Estresse familiar. Já há índices bem interessantes de comomonitorar ruídos na comunicação familiar a partir de uma publicidade,que transforma você numa pessoa que nunca estará satisfeita, porquea magia do consumismo é essa. Não importa o quanto você tenha,nunca será o suficiente. A maior parte desses produtos não énecessária, é uma conveniência, é uma sofisticação sua: eu queromais um relógio que a pulseira seja da cor vermelha porque eu tenhouma camisa assim. Enfim, mergulhamos a humanidade numaencrenca, numa armadilha. Precisamos ter matéria-prima e energiasuficientes pra honrar a sanha de consumo de 20% da humanidadefortemente concentrados no hemisfério norte e não há matéria-primae energia suficientes para responder a essa sanha de consumo. 80%da humanidade que consome 20% da matéria-prima e da energiatêm o sonho da inclusão social. Não há inclusão social. A retórica évazia se você não rever o modelo de consumo do hemisfério norte edas ilhas de prosperidade como Rio de Janeiro, Brasília, São Paulo,etc. Então, o aquecimento global é uma resposta da demandacrescente de energia para produzir muito para poucos. A discussãodo consumo está colocada, a discussão do aquecimento globaltambém.

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Carla Checchia – Mediadora: Roberto pergunta: “a metáforado barco fazendo água desconsidera que os ricos de hoje têm acessoaos botes salva-vidas. O crescimento econômico é uma necessidadepolítica e social. A imprensa critica o governo se não há crescimentoeconômico e, ao mesmo tempo, critica se há aumento de emissões.Como compatibilizar as duas coisas: crescimento e preservaçãoambiental?”

Jornalista André Trigueiro: Ótima pergunta. É verdade, issoestá muito bem fundamentado, ou seja, os efeitos mais danosos doaquecimento global se farão sentir sobre os estratos mais pobres dahumanidade, que são a maioria da população do planeta. A suapergunta me fez lembrar uma entrevista do economista-chefe do ABNAMRO Bank, Hugo Penteado, quando ele critica a necessidade docrescimento econômico. E eu levei um susto quando li a entrevistado Hugo Penteado: o economista-chefe de um banco do porte doABN questionar a lógica que leva economistas a fazer um recortemíope da realidade quando dizem “vamos crescer como a China”.Então, você fecha o foco no PIB e na área dos estatísticos. Há umquestionamento enorme do PIB como indicador de desenvolvimento.E que crescimento é esse que leva, por exemplo, a humanidade,hoje, a operar com um déficit de 25% na capacidade de reposição dematéria-prima e energia que está demandando. Ou seja, se o Brasilfosse o planeta Terra, estaríamos operando no vermelho, em regimepré-falimentar. Esses dados são da World Wide Foundation (WWF).

Esse é o desafio, Roberto. Estamos aqui para isso, paradescobrir qual é a saída. A boa notícia - alguns não gostam de ouvirisso, mas eu considero isso desafiador - é que, em nenhum momentoda História, a humanidade foi instigada a realizar, num intervalo detempo tão curto, tantas escolhas determinantes da nossasobrevivência nesse planeta. Então eu diria a você o seguinte: não étão importante se eu não tenho hoje todas as respostas para achar afórmula perfeita que compatibilize sustentabilidade com crescimentoeconômico; eu não vou perder o sono. Agora, eu vou mudar, eu vouexperimentar, eu vou fazer diferente. Esse é o discurso chinês hoje. AChina, que ainda é modelo para economistas do Brasil - “precisamoscrescer como a China” - tem o crescimento do PIB com dois dígitoshá quase vinte anos, o que levou a uma forte inclusão social. Mais deduzentos milhões de chineses ascenderam de uma classe pobre para

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uma classe média emergente. Esse é um lado bom. Ninguém podeser a favor da pobreza para não agredir meio ambiente. Eu acho queessa discussão está mal colocada nesses parâmetros. Agora, há umefeito colateral extremamente danoso pela forma como a Chinacresceu e eu vou reproduzir alguns dados do Governo Chinês, que éum país curioso, tolera o capitalismo, mas é um regime comunistafechado e vertical. Jornalista lá não pode falar o que eu estou falandoaqui e a Justiça também fica a reboque do Estado, então, é um paíscurioso. Dados do equivalente ao Ministério do Meio Ambiente chinêstrazem: a cada dois dias ocorre um grave desastre ambiental naquelepaís; 1/3 das cidades chinesas sofre os efeitos de uma chuva ácidaimpregnada de dióxido de enxofre liberado pelas termelétricas acarvão. Não está sobrando água na China e não temos muitos dadosconfiáveis, mas o que chega de lá é assustador, porque a água dosrios está poluída. É difícil para o próprio chinês, no médio prazo,imaginar qual seja a solução e eles estão exaurindo os aqüíferossubterrâneos numa velocidade espantosa. Existe um estudo do WorldWater Institute, mostrando a depressão de cidades na China – ePequim é a primeira delas – porque você está retirando água semque haja a recarga no volume equivalente. Ou seja, estão drenandoágua do solo sob uma cidade que já está construída, portanto, nãoexiste uma pressão para baixo, a cidade afunda. Isso já ocorre, porexemplo, em algumas áreas do Recife. Aí eu devolvo a pergunta paravocê, até onde a China vai continuar crescendo desse jeito? Percebeque não temos opção? Falar de desenvolvimento sustentável não éum capricho, uma alternativa, uma opção; é uma questão matricial,não temos opção. Eu fico um pouco incomodado quando se coloca:“como é que faz isso sem isso?” Lembrem-se ou acessem essaspesquisas, porque a abolição da escravatura completou cem anos,acompanhamos isso e, quando houve o Centenário da Abolição, veioà tona a publicação de artigos dos jornais da época em queabolicionistas e escravagistas duelavam nos jornais. Os escravagistasdiziam de forma taxativa: “se houver abolição da escravatura, aeconomia do Brasil vai quebrar”. Os abolicionistas evocavam avergonha de sermos o último país do mundo a ter escravos e, comose sabe, a economia do Brasil não quebrou por causa da abolição daescravatura. Portanto, eu não acho que é uma falsa premissa dizerque sem consumismo a economia não anda; é uma falsa premissa

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dizer como é que compatibilizamos crescimento com meio ambiente.Não há crescimento sem meio ambiente. Precisamos reformular odesafio da nossa geração; vamos colocar todos nós na mesmageração ou na mesma experiência comum de existência no planetahoje. Nós somos contemporâneos. Nós temos que reprogramar; eudigo isso aos meus alunos de jornalismo ambiental da PUC. Faculdadede Comunicação que prepara jornalista assim como a de Engenhariaprepara engenheiro, a de Economia prepara economista, como sefosse tijolinho sob medida para colocar naquela parede que já existe;não cumpre a sua função social. Vivemos um tempo de tanta demandade inovação tecnológica, de novos padrões de consumo, de uma novacultura, que a descoberta da sustentabilidade deve ser consideradacomo valor cultural e humanitário, porque não é o planeta que estáem risco; somos nós. O aquecimento global não é um problemaambiental ou econômico; é um problema ético, porque sabemos qualé o problema, sabemos como resolver o problema. Por que nãoresolvemos? É um problema ético. Refazer as perguntas, reformularas fórmulas, os códigos; a forma como costumamos pensar asociedade, a economia. A política tem que ser reconfigurada. Ospolíticos são analfabetos ambientais. É triste. Eles pensam pequenono curto prazo. O horizonte do político são quatro anos. Os interessespartidários prevalecem. Eles não estão à altura do momento gravepor que passa a humanidade, o planeta.

Um exemplo de pensamento tacanho, míope, linear,reducionista, cartesiano, interesseiro: o Ministro de Minas e Energianão pode ser cota política porque esse cargo nunca foi tão estratégico.Eu não vou dar educação para qualquer um, não vou dar saúde paraqualquer um. Não dê o Meio Ambiente para qualquer um. Minas eEnergia hoje, num mundo como está hoje, energia sendo um assuntoestratégico como é hoje, não entra em cota política, não pode. Ah,mas é engenheiro! Mas não é suficiente. Ah, mas já foi de Furnas!Não é suficiente. Os predicados para ser Ministro de Minas e Energia,hoje, vão além do que a maioria dos currículos traz. Alguém tem queser especial; ele tem que resistir, inclusive, à pressão monumentaldas empreiteiras, tem que ser alguém que seja ético, por excelência.Suspeição zero e alguém que o Presidente da República tire do colete.Esse é meu, porque não é um Ministério qualquer.

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Carla Checchia – Mediadora: Pergunta de alguém que não seidentificou: “Fiquei bastante motivado e bastante sensibilizado com asua resposta. Mas a pergunta é a seguinte: Você criticou a idéia deuma maquiagem verde no marketing das empresas quando dizemque estão fazendo política de preservação e, na verdade, estão-selegitimando, pegando carona na onda verde. Queria lhe fazer umapergunta, com todo respeito e toda a admiração que eu tenho porvocê. Você não faz uma analogia desse tipo de procedimento dessasempresas ao seu programa, dentro de uma corporação que éflagrantemente, evidentemente, o motor desse consumismoexacerbado? Como é que você se sente sendo colega da Xuxa, porexemplo?”

Jornalista André Trigueiro: Eu nunca pensei nisso, mas voupassar a pensar. Vamos lá. Eu não sei onde você trabalha. Nóscoabitamos, dividimos o mesmo espaço com pessoas que temos maiorou menor afinidade. Isso acontece no ambiente de trabalho, na famíliada gente, nos laços consangüíneos. Temos afinidade ideológica ouespiritual ou intelectual, ou não temos. Estamos juntos. Portanto,coabitar ou estar inserido no mesmo lugar, é um exercício de respeitomútuo. Você acha que eu sou flor que se cheire? A Xuxa talvez sejauma pessoa muito mais dócil, delicada, interessante do que eu, doque boa parte dos jornalistas. Precisamos ter um certo cuidado nopré-julgamento das pessoas, quer dizer, a imagem pública delas namaior parte das vezes não combina com a imagem real.

Segundo ponto: eu tenho o maior orgulho de ser funcionário daRede Globo. Eu tenho carta branca para fazer o Cidades e Soluções,para escolher os temas espinhosos que escolhemos e osquestionamentos duros que fazemos. Você vai dizer: André, mas éTV por assinatura, não é uma TV aberta. Eu vou te dizer: estamoschegando em político, empresário e formador de opinião. Essasemana, estamos concorrendo ao Prêmio Ethos de Jornalismo poruma reportagem que falava de compras públicas governamentais.Nós mostramos que, no Brasil, as licitações das compras públicasrespondem por 10% do PIB; não é pouca coisa e estamos começandoa fazer algo que no primeiro mundo já se está tornando uma rotina,que são licitações sustentáveis. Eu quero fazer uma licitação paracomprar um equipamento como esse. Eu não vou considerar apenas

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o menor preço; vou levar em consideração o menor consumo dematéria-prima e energia, quero saber se houve emprego de mão-de-obra infantil. Eu quero saber outros dados sobre o meu fornecedor,não apenas o menor preço. A partir da exibição desse programa,houve dois efeitos que são motivo de orgulho para a equipe doprograma. Um senador, que eu não conheço pessoalmente, chamadoTião Viana, do Acre, mandou-me o projeto de lei que ele redigiu. Eleme mandou o ofício, tem o numero do projeto, sugerindo que, o quehoje são experiências isoladas em cidades como São Paulo e PortoAlegre, sejam uma norma para o Brasil. Na prefeitura do Rio, aSecretaria de Obras, que faz inúmeras licitações – em tempos deJogos Panamericanos, nem queira saber quantas –, ligou para aredação pedindo os contatos de duas fontes que foram as principaisdo programa: a Professora Rachel Biderman Furriela, da FundaçãoGetúlio Vargas de São Paulo, e Laura Valente, que está à frente deuma organização chamada ICLEI. Elas duas foram convidadas paraoferecer um seminário para todos os técnicos da Secretaria de Obrasensinando a redigir um edital de licitação que incorpore outros quesitospara pontuação, não apenas o menor preço. Estreou na semanapassada, o Cidades e Soluções, sendo exibido no canal Futura. Sãomais de 23 milhões de pessoas podendo acessar sem precisar pagarpor isso. Já que se tocou nesse assunto, eu queria exibir um clipmuito breve desse trabalho que eu desenvolvo por meio dasOrganizações Globo, que também toleram os artigos imperfeitos queeu escrevo no jornal Bissextos; que também toleram os comentáriosmal criados que eu faço na Rádio CBN; que também toleram umasséries que levamos ao ar no Jornal das Dez; que também estãoabrindo muito espaço para discussão sobre o aquecimento emprogramas de grande audiência, como o Fantástico. Existe tambémum movimento que alcança a mídia na direção dessa reciclagem devalores e da definição das pautas e prioridades do que seja a notícia,do que seja importante veicular. Em algum momento, eu espero,vamos chegar a um ponto que seja o da ética da publicidade e daquiloque os comerciais de cerveja já fazem, há cinco ou seis anos, que éde se encerrar o comercial de cerveja com uma frase que é “Bebacom moderação”. É pouco, concordo, mas é um avanço. Você usa osrudimentos da publicidade para atrair e despertar a sede e depoisvocê meio que “bota uma ducha de água fria” dizendo “Beba commoderação”. É pouco, mas estamos caminhando para isso.

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Estamos acompanhando o duelo desse debate de idéias entreo Ministro Temporão e o Zeca Pagodinho, sobre o papel, a funçãosocial do artista que tem uma empatia enorme junto às camadas maispopulares, num país onde o alcoolismo é um caso de saúde públicagravíssimo e que tem agora a “Zeca-feira”. É claro que o Ministro daSaúde tem algo a dizer. E eu louvo a iniciativa do Ministro Temporãode ter essa coragem, porque os políticos normalmente não têmcoragem de arranhar, às vezes, o seu prestígio, discutindo o supostodireito de um artista emprestar a sua credibilidade e a sua empatiapara induzir, no caso do Brasil, menores de idade a consumir bebidaalcoólica. Não é a intenção do Zeca Pagodinho, mas a publicidadealcança uma garotada que quer experimentar novas sensações, novosprazeres e vai beber, talvez, a reboque dessa publicidade.

Carla Checchia – Mediadora: Temos quatro perguntas aresponder primeiro antes do vídeo. O Leandro pergunta o seguinte:“Qual a sua opinião a respeito do candidato à Presidência dos EstadosUnidos, Al Gore, quanto ao clima, e se este está superestimando osefeitos das mudanças climáticas para o uso do marketing verde, novoviés de defesa política, uma vez que esta não é realmente a estratégiados Estados unidos?”

Jornalista André Trigueiro: Primeiro ele não é pré-candidato.Até aqui não tem sido. E segundo, ainda que o interesse dele sejaegoísta, pessoal, carreirista, etc., eu agradeço a Deus por existir AlGore fazendo documentário agraciado com o Oscar, o qual permitiuque ele fosse ao Programa da Oprah Winfrey, no Programa do DavidLetterman. Na entrega do Oscar, ele fez uma dobradinha com oLeonardo DiCaprio. O que isso significa? Esta informação estáchegando onde estava completamente elitizada e onde isso nãointeressava. Eu acho que ainda que se possa colocar sobre ele apecha de oportunista, de político interesseiro; é inegável que, pormeio do documentário Uma Verdade Inconveniente, muitasinformações indigestas chegaram, inclusive, a pessoas que têm alergiaà informação científica. Está lendo jornal, está vendo televisão, estáouvindo rádio, e vem uma notícia que fala de ciência; é complicado.Tem a pecha do complexo de que isso eu não vou entender mesmo.Então, precisamos reconhecer o mérito desse político norte-americano

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de ter feito o que fez para abrir caminho para uma discussão quepassou a existir a partir do documentário. Eu bato palmas para o AlGore. Ah, ele é interesseiro! Ah, ele está ganhando dinheiro, muitodinheiro. Ah, ele tem uma mansão que consome muita energia.Obrigado, Al Gore, por você estar fazendo o que está fazendo! Euacho curioso que não existam outros. E ele está longe de ser umGandhi do meio ambiente. Estamos precisando de uma liderança queajude a consolidar, a emprestar musculatura a esse debate em termosglobais.

Carla Checchia – Mediadora: Mais uma pergunta da FernandaDalton: “O senhor acredita que, com a divulgação dos relatórios doIPCC, está havendo uma mudança nas expectativas da comunidadeinternacional quanto ao posicionamento retrógrado ou pró- meioambiente de políticos e governos em nível internacional, ou seja, quea questão ambiental finalmente começa a fazer parte da conta deeleitores e opinião pública?”

Jornalista André Trigueiro: No hemisfério norte, muito. Istoestá acontecendo numa velocidade espantosa. Abaixo da linha doEquador, há um processo em andamento. Vamos tomar por base aúltima reunião do G8. A proposta da Alemanha, que é um tantoprevisível, é de redução de 50% até 2050. O Primeiro-Ministro japonêsShinzo Abe tem a mesma proposta. O Tony Blair já fala sobre isso hámuito tempo, inclusive abrindo fissuras não-usuais entre as relaçõesEstados Unidos e Grã-Bretanha. Houve um desgaste nessa relaçãoa partir da cobrança pública do Blair para que Bush fosse maiscomplacente em relação a Kyoto. A França, de que eu já falei, com oNicolas Sarcozy. O IPCC se reuniu em Paris no início do ano paradivulgar o relatório. A comunidade científica estava presente, todosos candidatos à presidência da França assumindo de público ocompromisso em tornar aquele país um modelo na redução dasemissões de CO

2. Esse é o cenário. Aqui no Brasil não estaria

evoluindo, amadurecendo a contento essa discussão. Eu acho quepodemos incrementar de uma forma mais consistente esse debate

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mobilizando os setores da sociedade, a comunidade acadêmica e osgovernantes. E aqui eu quero registrar meus cumprimentos aoGovernador do Amazonas, por mais que os inimigos políticos delepossam dizer que é marqueteiro verde, que é maquiagem verde oque ele está fazendo na Amazônia. Eu acho que ele marcou um golaçoe como político ele foi muito inteligente, porque a Amazônia não é sóo Amazonas; ele colocou o Amazonas nas manchetes, dizendo: “aqui,a gente está fazendo algo que é pioneiro, que não tem em outro lugardo Brasil; primeira legislação estadual criando esse tipo de estímulo,benefício”. Ele é um político antenado e até pela sobrevivência política.Porque o Schwarzenegger - Conan, o Bárbaro - resolveu bater defrente com o coleguinha republicano Bush e dizer: “aqui, no estadoda Califórnia, eu, republicano, como meu eleitorado tem um perfilhistórico progressista, eu não vou contra”. O que ele fez no final doano passado? Vocês se lembram? O estado da Califórnia processouseis montadoras de veículos, três americanas e três japonesas.Processou, entrou na Justiça e a Justiça acatou pelos prejuízoscausados ao estado da Califórnia pelas mudanças climáticas. Ou seja,ele contabilizou os prejuízos e disse que eles tinham culpa nisso. Sea justiça californiana der ganho de causa para o estado, olha oprecedente que estaremos abrindo, responsabilizando quem fabricacarro pelos efeitos danosos causados pela queima de combustívelfóssil por meio do automóvel. A Califórnia tem mais veículo do que oBrasil inteiro. E a Califórnia também tem a lei estadual de reduçãodas emissões de CO

2, que o Schwarzenegger não teve pudores em

fazer, sendo republicano. “O Bush está lá em Washington, mas eu,Schwarzenegger, estou aqui. E eu vou fazer”. E fez.

Eu faço uma propaganda aqui. Cidades e Soluções, domingo,nove e meia da noite, com reprise na segunda-feira, oito e meia damanhã e às três e meia da tarde. As reprises são no canal Futura, àssextas-feiras, às nove da noite, e domingo, às três da tarde. E quemquiser ver na internet, não tem problema algum. Acesse o sitewww.mundosustentavel.com.br. Há o link para você ver em casa, ahora em que você quiser, os programas que foram exibidos naGloboNews.

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Carla Checchia – Mediadora: Eu vou deixar essas duas últimasperguntas restantes nas mãos do André Trigueiro. As duas têmendereço eletrônico para que ele responda depois pelo correioeletrônico.

Eu gostaria de encerrar os trabalhos de hoje em nome doGabinete de Segurança Institucional e agradecer aos nossos trêsconferencistas: o Professor Paulo Artaxo, ainda aqui presente; oSenador Renato Casagrande, que já se retirou; e o jornalista AndréTrigueiro, que nos brindaram com conhecimento e talento nessa tarde.Eu gostaria de fazer a entrega do certificado aos dois. Ao SenadorRenato Casagrande já foi feito. É uma forma simbólica de mostrar onosso agradecimento. Obrigada a todos.