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ENSINO DE PROJETO : Integração de conteúdos
Universidade de São PauloFaculdade de Arquitetura e Urbanismo
São Paulo2005
Kátia Azevedo Teixeira
ENSINO DE PROJETO : Integração de conteúdos
Kátia Azevedo Teixeira
Tese apresentada à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo para a obtenção do título de Doutor em Arquitetura e Urbanismo.
Área de Concentração: Estruturas Ambientais UrbanasOrientador: Prof. Dr. Adilson Costa Macedo
São Paulo2005
AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE. E-MAIL: [email protected]
Teixeira, Kátia Azevedo T266e Ensino de projeto: integração de contéudos / Kátia Azevedo Teixeira. --São Paulo, 2005. 233 p. : il. Tese (Doutorado - Área de Concentração: Estruturas Ambientais Urbanas) - FAUUSP. Orientador: Adilson Costa Macedo
1.Arquitetura – Estudo e ensino 2.Projeto de arquitetura 3.Integração I.Título
CDU 72:37
Aos professores, meus pares, à sua maneira
inquietos, intrigados com as
questões da educação do
arquiteto.
Aos estudantes
Agradecimentos
Prof. Adilson Costa Macedo, pela orientação e pela amizade.
Eneida de Almeida,
Jorge Abussamra, Luís Augusto Contier,
Márcia Maria Benevento, pelo estímulo e comentários.
Fábio Teixeira, pela cuidadosa revisão do texto.
Cristina Gouvêa, pela colaboração na
formalização do documento.
Fábio Teixeira Mira Teixeira,
Mira Andrade, Pedro Miguel,
pelo grande apoio.
Sumário
Introdução 9 Capítulo 1: Reflexões sobre o currículo 18
Capítulo 2: Aspectos recorrentes do ensino de projeto de arquitetura 36 Capítulo 3 :
Alternativas de integração nos cursos de arquitetura e urbanismo em países de línguas neo–latinas. 68
3.1 A lógica geral da pesquisa 68 3.2 Aspectos da pesquisa nos cursos em países estrangeiros 69 3.2.1 Aspectos gerais dos cursos pesquisados de outros países 71 3.3 Aspectos da pesquisa: Brasil 79 3.4 Alternativas de integração implantadas 82 3.4.1 Instâncias oficiais de supervisão 83 3.4.2. Ateliê integrado 95 3.4.3 Módulos internos na disciplina 101 3.4.4 Ênfase temática 113 3.4.5 Estratégias Mistas 118 3.4.5.1 Ênfase + módulos 118 3.4.5.1 Ateliê + disciplina de apoio 124 3.4.6 Conteúdos agregados ao programa das disciplinas de projeto 127 3.5 Considerações 133
Capítulo 4: Conclusão 138 Apêndices Matriz dos Indicadores 162 Indicadores dos cursos 166 Lista de cursos de arquitetura e urbanismo . ABEA 2004 200 Lista de cursos de arquitetura e urbanismo . ABEA 2005 204 Anexos Diretrizes Curriculares Gerais – Portaria 1770 – MEC 209 Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Arquitetura e Urbanismo – Parecer CNE/CES 112/2005 – MEC 212
Bibliografia 217
Lista de Planilhas
Síntese dos indicadores . cursos estrangeiros 130 Síntese da proposta de integração . cursos brasileiros 131 Matriz dos indicadores . cursos estrangeiros 162 Indicadores dos cursos: Universidad de Buenos Aires . Argentina 166 Universidad Abierta Interamericana . Argentina 167 Universidad Mayor de San Andrés . Bolívia 168 Universidad de Chile . Chile 169 Pontificia Universidad Católica de Chile . Chile 170 Universidad Nacional de Colombia . Colombia 171 Universidad Católica de Colombia . Colombia 172 Instituto Sup. Politécnico "José Antonio Echeverría" . Cuba 173 Universidad de Costa Rica . Costa Rica 174 Universidad Latina de Costa Rica . Costa Rica 175 Universidad de El Salvador . El Salvador 176 Universidad S. Francisco de Quito . Equador 177 Pontificia Universidad Católica Del Ecuador . Equador 178 Universidad de Barcelona . Espanha 179 Universidad Politécnica de Madrid . Espanha 180 Ecole d'Architecture de Lyon . França 181 Ecole d'Architecture de Paris La Villette . França 182 Universidad Francisco Marroquín . Guatemala 183 Università Degli Studi di Firenze . Itália 184 Università Roma Tre . Itália 185 Universidad Autonoma Metropolitana . México 186 Universidad de las Americas – Puebla . México 187 Universidad America . Nicarágua 188 Universidad Del Valle . Nicarágua 189 ISTHMUS- Escuela de Arquitectura y Diseño . Panamá 190 Universidad Nacional de Assunción . Paraguai 191 Universidad Católica Del Peru . Peru 192 Universidad Peruana de Ciencias Aplicadas . Peru 193 Universidade do Porto . Portugal 194 Universidade Técnica de Lisboa . Portugal 195 Universidad de la República Uruguay . Uruguai 196 Universidad ORT de Uruguay . Uruguai 197 Universidad Simón Bolívar . Venezuela 198 Universidad de Los Andes . Venezuela 199 Lista de cursos de arquitetura e urbanismo . ABEA 2004 200 Lista de cursos de arquitetura e urbanismo . ABEA 2005 204
Resumo
A reflexão sobre o ensino de arquitetura e urbanismo pode ser feita, naturalmente, sob diferentes aspectos. A premissa deste trabalho reconhece a existência de um hiato entre as diversas fontes de conhecimento que integram a formação do arquiteto, assim como a ausência de uma estrutura consistente que as conecte. Tem-se como hipótese de trabalho que as características atuais da área de ensino, em particular do ensino de projeto de arquitetura, no Brasil, mantêm-se precariamente organizadas, permanecendo na expectativa da síntese a ser realizada preponderantemente pelo aluno. Defende-se que o ensino deve investir na construção de alguma estrutura pedagógica que admita, também para si, a responsabilidade de conceber, implantar e garantir a operacionalização efetiva de uma malha de vínculos entre os conteúdos que cada curso julgar fundamentais, centralizada nas disciplinas de projeto, o lugar pedagógico onde essas relações devem ser prioritariamente desenvolvidas, considerando que este pode ser um processo de aperfeiçoamento, que não implica a exclusão de outros. A argumentação se apóia em três vertentes principais: incorpora, por um lado, conceitos da área da educação, em particular aqueles referentes à idéia de currículo; analisa algumas causas que colaboram, ainda, para a permanência da tensão entre a necessidade de síntese que a atividade do arquiteto requer e a fragmentação do conhecimento, intensificada no contexto atual; finalmente, verifica a existência de experiências de integração, implantadas e constituintes da estrutura dos cursos, através da pesquisa em 91 cursos de arquitetura e urbanismo, nacionais e estrangeiros, ocupando-se da análise das estratégias, meios e procedimentos de que se valem.
Palavras-chave: estrutura de curso, integração, ensino, projeto de arquitetura.
Abstract
A reflection on the teaching of architecture and urban planning can be made, naturally, under different aspects. The premise of this work recognizes the existence of a hiatus among the several knowledge sources that integrate the architect's formation, as well as the absence of a consistent structure connecting them. It is held as a working hypothesis that the current features of the teaching area, in particular that of architectural design teaching, in Brazil, is still precariously organized, remaining in the expectation of a synthesis to be accomplished mainly by the student. It is postulated that teaching should invest in the construction of some pedagogic structure which admits, also to itself, the responsibility of conceiving, implanting and guaranteeing the effective operation of a net of links among the contents that each course considers fundamental, centered in the project disciplines, the pedagogic place where those relationships should be priorly developed, considering that this may be a process of improvement which does not imply the exclusion of others. The argument is based on three main lines: it incorporates, on one side, concepts from the educational area, particularly those referring to the idea of a curriculum; it analyzes some causes that also collaborate to the permanence of the tension between the need of synthesis required by the architect's activity, and the fragmentation of knowledge, intensified in the present context; finally, it verifies the existence of integration experiences, implanted and constituent of the courses' structure, through a research of 91 architecture and urbanization courses, national and foreign, proceeding to an analysis of the strategies, means and procedures they embrace. Keywords: course structure, integration, teaching, architectural project.
9
Introdução
Entre as várias questões freqüentemente levantadas por
aqueles envolvidos com os cursos de arquitetura e
urbanismo – docentes e discentes – a que envolve a
ausência de integração, por parte do estudante, nos
conhecimentos das diversas áreas presentes na
formação é, provavelmente, uma das mais constantes,
presente já de longa data, como atestam diferentes
estudos e a documentação da ABEA – Associação
Brasileira de Ensino de Arquitetura, permanecendo,
ainda, com grandes dificuldades de ser enfrentada.
A situação registrada é, em parte, conseqüência do
ensino marcado por uma visão fundada nos conteúdos
isolados de cada área - orientação geral no ensino de
nível universitário - e, nesse sentido, o grande número de
disciplinas presentes nos cursos de arquitetura e
urbanismo não deixa de ser um reflexo, mesmo
considerando a abrangência e a diversidade de
conhecimentos que integram a formação do arquiteto.
Os ajustes curriculares que os próprios cursos fazem, além
daquelas reformulações obrigatórias atendendo às
Diretrizes em nível nacional, não alteraram, de maneira
significativa, a estrutura de ensino, particularmente para
estudantes que permanecem com grande dificuldade
para relacionar os diversos conteúdos.
Por outro lado, o fato de as diversas áreas que participam
da formação do arquiteto apresentarem características e
especificidades próprias, particulares do seu objeto de
estudo, torna mais difícil, compreensivamente, a
disposição dos docentes para alterações que visem à
10
integração. Há entraves de muitas ordens para serem
considerados, desde a ausência de experiências
duradouras nesse sentido, no Brasil, às estruturas
administrativas em que cada curso está inserido,
responsáveis tantas vezes pelos nossos recuos. Todavia,
quaisquer que sejam as razões e circunstâncias, elas não
eliminam, por si mesmas, a existência de concepções,
hábitos, práticas e procedimentos arraigados no ensino
superior, pouco permeáveis à idéia de integração dos
conteúdos fundamentais, teóricos e práticos, das diversas
áreas.
A tensão entre a capacidade de síntese que a atividade
do arquiteto requer e o entendimento da estrutura
curricular em vigor, que fragmenta excessivamente os
conteúdos não só na organização dos mesmos, mas
também na ênfase ou hierarquia que atribui a uns em
detrimentos de outros (mesmo considerando o elenco
das disciplinas profissionalizantes e obrigatórias) colabora
para que a própria formação do arquiteto, no sentido
mais amplo, torne-se mais frágil, comprometendo, nos
desdobramentos de sua atuação profissional, muitas
vezes de maneira relevante, a percepção social das
nossas competências e atribuições.
Parte da nossa dificuldade em interromper, de forma
efetiva, algumas questões recorrentes do ensino, tem
como causa aspectos de nosso próprio paradigma de
formação. Entre os traços e características priorizados,
que constituem a imagem da profissão e do arquiteto,
estão os valores atribuídos à criatividade – com o
resquício, ainda, da idéia de artista - e ao desenho, como
elemento poderoso de síntese; a ambas deve ser
acrescentada a exclusividade da prática profissional
11
requerida para a docência, transformada, ela mesma,
em prática educativa.
Aliadas, essas condições vêm mantendo um nó intricado,
uma alimentando e justificando a outra: o ato de
criação é em si uma síntese, ligado à idéia de autonomia
do autor e da dependência exclusiva entre este e a obra
criada1, aqui expressa através da linguagem do desenho.
Esse entendimento, transportado para o ensino superior
institucionalizado, autoriza, em boa medida, a
compreensão de que cabe ao estudante, na
elaboração dos projetos, proceder a síntese dos
conhecimentos teóricos e técnicos que vai adquirindo,
ministrados separadamente, nas diversas disciplinas das
várias áreas que integram a sua formação. A esse
panorama acrescenta-se a suficiência da prática
profissional para ensinar, circunstância que deriva para a
permissão da ausência de fundamentação teórica mais
consistente para esse ensino (de projeto), além da menor
presença de reflexão sobre questões específicas de
ensino/aprendizagem, esta última uma característica do
nível superior, menos receptivo às contribuições da área
de Educação.
Mesmo o atual esgarçamento da concepção do
arquiteto-artista e a entrada maciça e preponderante,
tanto de novas gerações de profissionais na atividade
docente, como de outros estratos sociais de estudantes
1 San Sebastian, em palestra proferida no Colóquio Internacional Criatividade, Arquitetura e Interdisciplina, realizado em Buenos Aires, 1989, focaliza a grande armadilha do ensino da nossa profissão: “En una conversación mantenida com el arquiteto Oscar Niemeyer, sobre Creatividad y Enseñanza, él manifestaba: ‘..sabemos que la arquitectura es como la pintura, uno nace com esa habilidad, no se aprende, es algo que se trae...’ Esta idea de un gran arquitecto, prolífico realizador y modelo de la arquitectura moderna, es una concepción típica y sumamente enraizada en los sujetos comprometidos com el quehacer arquitetónico, acuerden o no com esta idea, y se encuentra explícita o implícitamente en el centro de la problemática de la formación de los arquitectos”(ABEA, 1989, p.57).
12
no nível superior, não implicaram, em essência, na
reformulação da concepção e da estrutura das
disciplinas de projeto e das práticas didáticas que as
refletem. E, no entanto, o atual é um contexto
absolutamente distinto daquele que originou tais traços
dos arquitetos.
A extensão do acesso ao ensino superior a um número
muito maior de jovens, rompendo com isso o círculo
sócio-cultural de onde tradicionalmente arregimentou os
seus estudantes, vinculada à criação acelerada de novos
cursos, com forte presença do setor privado, e à grande
demanda por arquitetos–professores, circunstâncias que
passaram a caracterizar, em ritmo crescente, as décadas
de 70, 80 e 90, são dados de imensa repercussão para
uma graduação tradicionalmente elitizada e constituem,
sob qualquer perspectiva, parte das razões que ajudam à
compreensão das transformações de que o ensino
necessita. Em plano paralelo, a expansão dos cursos
coincidiu, como aponta Santos Júnior (2001, p.7) [...] com um deslocamento da importância da
Arquitetura e Urbanismo no tecido sociocultural brasileiro.
Ainda às voltas com a definição tardia de seu estatuto
profissional e social no país, os arquitetos e urbanistas
passaram a se ressentir da diminuição do prestígio político
e da perda de inserção e influência institucional.
Também se tornaram diluídos os laços entre os notáveis
da área e o ensino. O corpo docente das escolas já não
conta, em número expressivo, com aqueles arquitetos -
reunião de talentos e personalidades incontestáveis,
donos de nossa mais justa admiração - que conduziram à
realização das principais referências simbólicas do país.
Mas também o entendimento de “melhor arquitetura” foi
deixando de ser univalente (PORTOGHESI,1982; CONNOR,
1996), naquela consideração rigorosa e irredutível da
13
possibilidade de apenas um grupo restrito de conteúdos
e belezas. A expansão tardia dos horizontes de mais de
uma geração de profissionais para outras referências
arquitetônicas vai-se dando paulatinamente, ainda,
enquanto nos quadros de formação saltávamos dos 31
cursos em 1974 para os 183 em 2005, espalhadas por todo
o país2.
Embora a produção acadêmica sobre o ensino de
arquitetura e urbanismo seja excessivamente reduzida -
justamente pela pouca tradição da área – com
freqüência as reflexões que apresentam fazem referência
a vários dos aspectos aqui mencionados, atestando a
sua generarização e persistência nos vários cursos. Essa
discussão vai sendo atualizada tanto pela reelaboração
das reflexões quanto pela incorporação de novos
aspectos que caracterizam o momento histórico
presente.
A construção do objeto de estudo, neste trabalho, foi
amadurecendo no transcorrer de algumas
circunstâncias: o envolvimento, através da disciplina de
Projeto de arquitetura, a cada tempo, com os alunos de
todos os níveis do curso: do primeiro ao quinto ano. Esse
tipo de circunstância implicou, fatalmente, na ampliação
da percepção das questões que envolvem o ensino e do
imbricamento entre elas. Interessava focalizar em quais
delas uma possível melhora estaria mais atrelada a
questões internas da disciplina (de projeto) e menos,
dentro do possível, a elementos ou razões externos a ela,
como forma de tentar sair de uma dimensão crítica que
imobilizasse. E qual, dentre elas, seria a mais fundamental,
2 Dados da ABEA, atualizados em abril de 2005. Disponível em www.abea-arq.org.br/
14
mais estratégica, para o quadro que se percebia. A
experiência na chefia de departamento do curso de
arquitetura e urbanismo, da Universidade São Judas
Tadeu, durante quatro anos, trouxe o outro lado, o lado
de lá: a imensa dificuldade que a idéia de conjunto
significa e a convicção da sua necessidade e
possibilidade urgentes.
O foco da pesquisa envolve o ensino de projeto
arquitetônico – o qual, naturalmente, não se desvincula
da questão urbana. Entretanto a distinção entre ambos
foi necessária, porque pressupõem diferença de
abrangência, de graus de estruturação de conteúdos, de
métodos e práticas didáticas distintos. Assim recortado
como se pretende – ensino de projeto arquitetônico - o
enfoque permite que se atenha e se explore uma de suas
questões principais, em nosso ponto de vista: o reduzido
elenco de elementos que sustenta, de modo geral, a
organização dos conteúdos dessas disciplinas,
relativamente ao seu comprometimento com conteúdos
fundamentais das demais disciplinas dos cursos. Tal
condição, a nosso juízo, favorece, a uma parcela
ponderável de estudantes, a dispersão dos
conhecimentos aprendidos nas demais áreas e o seu
desvinculamento freqüente das soluções de projeto.
A hipótese que orienta esse trabalho é a de que as
disciplinas responsáveis pelo desenvolvimento da
atividade de Projeto (particularmente Projeto de
Arquitetura), em parte expressiva dos cursos, mantêm-se
precariamente organizadas, recusando-se, por diferentes
razões, a assumirem o papel natural que lhes é inerente
de aglutinadoras dos conhecimentos que intervêm na
elaboração de um projeto, permanecendo mais na
15
posição, inegavelmente confortável, de expectativa da
síntese dos conhecimentos a ser realizada pelo aluno, do
que buscando uma ação preparada, programada,
relativa ao desenvolvimento interno da própria disciplina.
Defende-se principalmente que, para maiores cotas de
autonomia – seja dos docentes, dos alunos ou de ambos
– a necessidade de atuação integrada aumenta,
particularmente nas disciplinas obrigatórias.
Foram importantes às reflexões desenvolvidas, como
fontes de dados, o conjunto das publicações da
Associação Brasileira de Ensino de Arquitetura – ABEA. Os
cadernos, como são chamados, reúnem trabalhos
desenvolvidos sobre o ensino, originados das diferentes
partes do país, relatando experiências, dificuldades e
êxitos dos docentes, além de estudos que a própria ABEA
produz, a partir dos registros, levantamentos, informações
e depoimentos que acumula, e de debates e encontros
que organiza. Com facilidade, remetem o leitor
interessado aos problemas mais freqüentes da área, ao
mesmo tempo em que o remetem ao seu cotidiano e,
por isso, ao socializá-los, permitem as generalizações. A
produção acadêmica, teses e dissertações sobre
aspectos distintos do ensino de arquitetura e urbanismo,
embora ainda muito reduzida é, justamente por isso,
extremamente relevante. Contem dados, investigações e
análises às quais recorri, em diferentes oportunidades. Em
ambas as fontes foram encontrados testemunhos
importantes de questões recorrentes do ensino e uma
amostra significativa de quem somos, do pensamento do
arquiteto-professor.
A procura de fundamentação na área de educação e
de sociologia da educação fixou-se, em particular, na
16
relação entre a idéia do conhecimento como uma
seleção da cultura e o sistema escolar como um dos
agentes principais de sua transmissão; a partir desse
vínculo, a concepção de currículo como conteúdo,
organização e forma de transmissão intencionados.
Exposto no primeiro capítulo, esse suporte permanece, ao
longo dos demais, como fio condutor, referência
contínua para as reflexões que se pretendeu desenvolver
e a eles credito parcela importante da ampliação de
perspectivas em relação às questões examinadas.
O segundo capítulo seleciona alguns aspectos
recorrentes do ensino de arquitetura e urbanismo,
entendidos como resultados de características
constituintes da concepção moderna da profissão. O
exame que se desenvolve, voltado para a relação entre
esses traços e seus desdobramentos e permanência na
estrutura do ensino, constitui parte da argumentação que
sustenta este trabalho.
Procurou-se, como parte importante da argumentação,
identificar a existência de alternativas de integração
entre os conhecimentos das diversas áreas que
participam da formação do arquiteto, pertencentes, de
maneira inequívoca, à estrutura dos cursos. Neste sentido,
a pesquisa desenvolvida privilegiou o exame de
programas de cursos de arquitetura e urbanismo
(nacionais e externos) que permitiram a compreensão de
sua operacionalização: estratégia pedagógica utilizada,
os meios e os recursos disponibilizados para, assim,
incorporá-los como argumento importante para a defesa
desse trabalho. O terceiro aborda as experiências
encontradas, que podem constituir-se, a meu juízo, em
um panorama consistente de referências para o leitor
17
interessado no assunto. Foram, por isso, mais
minuciosamente expostas, uma a uma, agrupadas
segundo uma análise que considerou o “tipo”, de acordo
com a estratégia pedagógica predominante, o grau de
estruturação e alcance da mesma.
O último capítulo, à guisa de conclusão alia, à
sistematização final das reflexões desenvolvidas,
elementos que procuram reforçar a idéia da integração
de conteúdos centralizada nas disciplinas obrigatórias de
projeto. Este trabalho pretende contribuir para o processo
de aprimoramento do ensino na graduação, atribuindo,
à estrutura pedagógica dos cursos, possibilidade de
maior responsabilidade em relação ao aprendizado.
18
Capítulo 1
Reflexões sobre o currículo e seu rebatimento
no ensino de projeto de arquitetura
É verdade que os problemas presentes na prática do
ensino não se ajustam, em várias ocasiões, tanto quanto
preferíamos, às concepções e aos modelos
preestabelecidos que temos. Como arquitetos e
docentes muitos de nós não dispomos, tanto quanto
pensamos, de fundamentação teórica e de ferramentas
intelectuais imprescindíveis para, no exercício dessa outra
profissão, a de professor, detectar as origens de um
problema, identificar os seus contornos, os limites de nossa
atuação, e os procedimentos possíveis, ou a serem
criados, requeridos para a ação. E que são condição
indispensável para se ultrapassar os limites do campo de
visão aderente ao nosso próprio paradigma de
formação, o do arquiteto.
Vários de nossos critérios tendem a ser contraproducentes
na medida em que, permanecendo atados a
concepções pré-existentes e já articuladas – de
educação, de currículo, de aluno, de métodos, de
épocas, de marcos, de razões de várias ordens – eles nos
servem, amiúde, de referência fundamental para julgar o
presente e, por outro lado, nos impedem de refletir sobre
os pressupostos dessa mesma prática e de contrapô-los,
criticamente, à realidade do nosso tempo.
A incorporação de conceitos da área da educação
neste trabalho foi, por isso mesmo, obrigatória. Embora o
papel adequado da teoria, aqui, seja mesmo o de
19
instrumentalizar a capacidade de ver, mais que ser ela
mesma minuciosamente exposta, alguns elementos do
repertório teórico mobilizado para construir o objeto de
estudo foram pinçados e, então, colocados em
evidência, pelo valor formativo que desempenharam,
agregando condições específicas que permitiram a
expansão da análise e das perspectivas que se tinha
inicialmente sobre o ensino de projeto de arquitetura.
A educação no mundo, ao longo do tempo e da história,
manteve-se preocupada em formar um determinado tipo
de homem, em garantir seu crescimento e
desenvolvimento no rumo definido pelo sistema de
valores, crenças e exigências que vigorou nas
sociedades, nas diferentes épocas, desde a Antigüidade.
É, justamente por isso, permanentemente, um campo
amplo e fértil para a investigação: na totalidade de seu
significado, ela é sempre um bem público, no sentido de
ser um saber do homem e de condensar o processo “pelo
qual a humanidade elabora a si mesma”, na bonita e precisa
definição de Manacorda (1995, p.6.) Em decorrência
disso, é reprodutora da organização e do conhecimento
dominantes de uma dada sociedade e, justamente por
isso, se constitui também, de modo contínuo, em um
imenso e vital campo de disputa. Neste entendimento, a
educação representa sempre uma seleção intencionada
da cultura, uma seleção do conhecimento disponível em
cada época.
Deste modo, é absolutamente direta e estreita a
vinculação entre o sistema de ensino e a cultura de um
determinado tempo, comunidade e lugar, uma vez que
reside aí, se não de maneira exclusiva, mas de forma
determinante, uma das garantias de permanência e
20
reprodução dessa cultura. Por isso, as instituições
educacionais estão entre os principais agentes de
transmissão e reprodução da cultura dominante, isto é,
da cultura socialmente legitimada e, à medida que
cultura e poder se vinculam, ela é transformada em
expressão de uma classe social: (...) a cultura e o conhecimento são produzidos como
relações sociais, são, na verdade, relações sociais. Mais:
essas relações sociais são hierárquicas, assimétricas, são
relações de poder. O currículo, como o conhecimento e
a cultura, não pode ser pensado fora das relações de
poder. ( SILVA, 1997. p. 11).
Essa transmissão da cultura dominante através do sistema
formal de ensino tem como um dos principais veículos o
currículo – conteúdo, organização e forma de transmissão. Daí
deriva a compreensão de currículo escolar como uma
seleção particular da cultura geral de uma sociedade,
como o projeto de cultura que se quer formar, imbuído
de história, vinculado a formas determinadas de
organização da sociedade e da educação. O
entendimento de currículo, em que pesem as diferentes
concepções encontradas na área especializada, deve
ter necessariamente uma abrangência que ultrapasse a
visão mais freqüente, que o remete a uma listagem de
disciplinas, acompanhada das cargas horárias, créditos,
seqüências, etc., e que é, via de regra, mais facilmente
percebida como o currículo do curso pela comunidade
da escola. Sem deixar de ser uma forma de
manifestação curricular - é o currículo proposto,
formalizado - essa percepção não significa, entretanto, a
sua totalidade. O currículo é, antes disso, um conjunto
representativo dos compromissos e idéias de um grupo
de pessoas, ou de um segmento dominante da
sociedade e, por isso, irá refletir, implícita ou
21
explicitamente, tanto em seu conteúdo quanto em sua
organização e comunicação pedagógica, um corpo de
valores, de prioridades, de crenças, de compromissos e
de interesses. É esta compreensão que permite e
alavanca os questionamentos em torno das escolhas que
integram um currículo e da permanência de práticas
aderentes a estas escolhas: por que razão este conteúdo
e não outro, esta organização e não outra, esta forma de
transmissão e não outra?
As transformações por que passa a cultura até se tornar
presente nas instituições de ensino, através do currículo
de cada uma, são o resultado das diversas forças
intervenientes em todas as etapas desse percurso. A
seleção da cultura geral, formulada inicialmente nas
grandes instâncias de decisão - portanto fora do meio
em que se realiza na prática, isto é, a sala de aula - será
reproduzida sucessivamente, nas diversas disputas entre
grupos, especialidades, marcos de formação e enfoques,
nos desdobramentos que envolvem o processo de
elaboração, de implantação e da prática do currículo,
no interior de cada instituição. Passará por uma série de
procedimentos intermediários, que vão desde as
decisões sobre a grade curricular à atribuição de carga
horária às diversas disciplinas e à elaboração dos
programas de cada uma, procedimentos esses que, por
sua vez, também orientam, minimizam, enfatizam e filtram
aquilo que será ensinado. As decisões sobre o currículo
serão balizadas ainda, e de forma vigorosa, pelos
recursos disponíveis, pela administração, pela estrutura e
pelas condições físicas da escola, pelo ambiente, por
todas as circunstâncias do meio escolar concreto, de seu
contexto interno.
22
Finalmente, o currículo chega à sala de aula onde será
moldado, mais uma vez - agora tanto pelo
conhecimento específico como pelo juízo de valor do
professor, pela sua concepção de ensino. Com
freqüência, será transmitido através de relações e
métodos pedagógicos normalmente já existentes,
testados, oriundos de tradições e convicções as mais
profundas às vezes e, em outras ocasiões, hábitos e
procedimentos mantidos por comodidade.
O ensino é, por isso, fundamentalmente resultante da
interseção entre conteúdo, meios e agentes; o conteúdo -
aquilo que se intenta, que se transmite e,
conseqüentemente, o projeto de formação; os meios,
através dos quais a ação, isto é, a atividade, se
desenvolve; e os agentes, todos aqueles elementos
externos e internos que condicionam a atividade e o
conteúdo, tais como forças sociais, instituição escolar,
materiais, ambiente e clima pedagógico.
Esse o tripé que condiciona a educação, ao qual se
refere Sacristán (1998) e, nesta acepção, o ensino é um
processo de desenvolvimento indiscutivelmente
intencionado. Mais imediatamente ligada à experiência
de cada um, a atividade é a que primeiro se manifesta,
mais exposta por isso às trocas de opiniões e às iniciativas
de melhora. O mesmo não se dá com o conteúdo, pomo
de discórdia por excelência, mais difícil de ser aclarado,
objeto fácil de infinitas posições e disputas,
permanecendo, por isso mesmo, tantas vezes,
convenientemente mais suposto que discutido. E, no
entanto, é o conteúdo a força motriz; meios e agentes
mobilizados só o são em relação ao conteúdo que
comunicam.
23
Além das dificuldades e disputas inerentes à questão dos
conteúdos mantém-se, também no ensino, o legado da
modernidade: a divisão do real - aqui, do objeto didático
- separando a tradição da inovação, o contexto interno
do externo, atividades, agentes e conteúdos do processo
de ensino, o que ensinar, do como ensinar.
É na tentativa de ultrapassar essa constante divisão da
realidade que o pensamento curricular mais
contemporâneo se volta para as condições concretas da
prática em que ele é desenvolvido. Aglutina, nesse
sentido, no que é chamado de currículo real, as três
perspectivas: aquela do currículo oficial - referente ao que
é dito que deve ser ensinado; o currículo manifesto, que diz
respeito àquilo que se pretende ensinar, e a forma disso
ser feito, na visão dos professores; e ainda a terceira, o
currículo oculto1, a perspectiva de quem aprende, que irá
englobar o conteúdo de toda a experiência do
estudante, a prática real que determina a sua
experiência de aprendizado. Em outros termos: o que é
colocado para os docentes ensinarem, o que eles
pensam ou dizem que ensinam e o que os estudantes,
afinal, aprendem: eis o currículo real, o currículo que de
fato opera.
É no currículo oculto que estão as expectativas
valorizadas, as grandes dificuldades, os hábitos
difundidos, os modelos de referência, as soluções que
dão certo, a percepção da maior importância atribuída
a algumas disciplinas, comportamentos e significados
muitas vezes subliminares mas que, presentes no
1 Expressão cunhada por JACKSON, Ph., conforme mencionado por SACRISTÁN, Op. cit, p. 132 e por APPLE, M.W. Ideologia e Currículo. São Paulo: Editora Brasiliense, 1982.
24
cotidiano e tal como água mole em pedra dura ...,
tendem a alcançar um efeito determinado.
Essa diferença entre as pretensões declaradas - o currículo
manifesto - e as condições em que se dá o ensino - o
currículo oculto - ajudam a entender, em boa parte, por
que as reformas curriculares implicam em pouca
alteração concreta para o aluno, têm menor incidência,
às vezes nenhuma, em sua experiência real
(SACRISTÁN,1998).. Mudanças de disciplinas, de cargas
horárias, até mesmo de conteúdos, transformam menos o
currículo real para o estudante, porque não alteram de
fato as condições nas quais decorre a experiência,
porque não se fixam nas situações reais em que
trabalham os professores, porque mantêm procedimentos
desenvolvidos para alunos ideais, porque as
necessidades de realização do currículo encontram, nas
instituições e nas práticas escolares, uma condição de
mudança extraordinariamente mais lenta.
Além da expansão do entendimento de currículo para o
de currículo real – desvendando aquele que de fato
opera em uma instituição – a revisão vigorosa da noção
do mérito pessoal do estudante, formulada por Bourdieu
(1998), na área de sociologia da educação, é uma
contribuição importante no sentido de esclarecer a
expectativa de aluno ideal que norteia os pressupostos
do sistema de ensino, fornecendo pistas importantes,
particularmente para o entendimento da concepção
geral das disciplinas de projeto, como será desenvolvido
no segundo capítulo .
No conceito de “habitus” desenvolvido por ele, cada
indivíduo vivencia experiências que irão formar um
25
conjunto de percepções e disposições duráveis que
estruturam internamente sua subjetividade. Esse conjunto
mais ou menos estável de disposições incorporadas é
diferenciado, de acordo com a posição social de origem
do indivíduo, refletindo as características da realidade
social na qual ele foi anteriormente socializado. Sem ser
inflexível, o habitus constitui um “princípio gerador
duravelmente armado de improvisações regradas” (BOURDIEU,
1983, p. 65), uma matriz que sempre pode ser acionada,
orientando e ajustando as ações do indivíduo ao longo
do tempo, nas mais diversas situações sociais, mesmo
quando essas situações diferem daquelas em que o
habitus foi forjado.
Em outros termos, a socialização primária, isto é, as
experiências primitivas, da origem, possui mais força
estruturante, sobre a maioria dos indivíduos, que as
experiências posteriores. As questões da cultura e da
linguagem têm mais possibilidade de atingir o seu melhor
potencial, quando foram cultivadas de forma
despreocupada e constante na relação pedagógica
familiar, incorporando-se naturalmente ao indivíduo e
nele permanecendo de modo duradouro, integrantes do
habitus.
Assim, duas maneiras básicas e distintas de indivíduos se
relacionarem com o mundo da cultura - que a escola
reproduz - são forjados, desde o nascimento, a partir do
modo como a cultura foi adquirida, isto é, lastreados na
origem de cada um: se de forma precoce, natal,
marcada pela familiaridade, ou se mais tardiamente,
estrangeira, dependente da apresentação escolar
(BOURDIEU, 1983). O primeiro, oriundo da intimidade e do
cotidiano do indivíduo com expressões da “cultura
26
legítima”, resultaria em uma relação desenvolta,
descontraída, fácil, segura, natural com essas questões. O
outro, no mais das vezes, produziria uma relação de
estranhamento, mais tensa e desajeitada, acanhada,
solicitando esforço árduo para construir pontes,
alavancar a compreensão.
Nos diversos níveis do ensino e da aprendizagem, a
eficiência de uma comunicação pedagógica necessita,
para o seu pleno aproveitamento, que os alunos tenham
domínio sobre o código necessário à decifração dessa
comunicação. De maneira geral, esse domínio seria
função da maior ou menor proximidade entre aquilo que
é apresentado pela escola como cultura legítima e a
cultura familiar de origem do aluno. O dito popular “filho
de peixe, peixinho é” não tem sido, como se sabe, uma
afirmação descabida, e essa não é uma percepção
estranha aos docentes, mesmo quando não temos total
clareza do que a fundamenta ou explica.
Nessa lógica, a educação escolar que vigora –
socialmente legitimada e que é oriunda da cultura e do
saber dominantes, como visto anteriormente - seria uma
espécie de continuação da educação familiar para os
indivíduos que pertencem aos meios culturalmente
favorecidos; para os demais, a cultura acadêmica
significaria algo distante, estranho, por vezes ameaçador.
Originado na cultura “legítima”, o sistema de ensino,
consciente ou inconscientemente, implícita ou
explicitamente, espera e cobra dos estudantes um
conjunto de comportamentos, habilidades e atitudes
(pesquisa, curiosidade, articulação entre conhecimentos,
vontade de aprender, etc.) que, via de regra, aqueles
27
socializados na cultura dominante é que estão aptos a
apresentar, justamente pela maior proximidade que
encontram entre a sua cultura familiar de origem e a
cultura escolar. Essa naturalidade ou desenvoltura não
seria encarada, pela escola, como algo socialmente
herdado. No desdobramento inerente a essa situação, as
diferenças de resultados escolares obtidos são, mais
imediata e facilmente, creditadas às diferenças de
capacidade e de dons entre alunos, interpretadas como
a expressão de uma facilidade, de uma inteligência, de
uma aptidão ou talento naturais para as atividades
intelectuais que alguns apresentam.
Assim, de forma bastante extensiva, é menos valorizado o
aluno que tenta compensar a sua falta de bagagem
cultural, através do esforço minucioso e tenaz, mas que
raramente apresenta um trabalho excepcional, em favor
do aluno brilhante, talentoso e desenvolto que - sem
exigir muito esforço didático do professor e sem também
despender muito esforço - compreende, articula
conhecimentos, avança e responde bem às exigências
da escola. No nível superior, como sabemos, essa é uma
idéia generalizada: “O sistema de ensino, sobretudo nos seus
ramos mais elevados, consagraria e cobraria dos alunos essa
segunda postura.” (NOGUEIRA, 2004, p.91).
Um círculo vicioso montado: o que a escola exalta –
aquilo que orienta seus conteúdos e formas de
transmissão – é um modo de relação com a cultura e o
saber que, potencialmente, apenas os filhos das classes
dominantes, pela sua forma de socialização familiar,
podem ostentar.
28
Confrontada particularmente com os cursos de
arquitetura, essa não é uma idéia que possa ser
desprezada, minimizada ou arquivada. Historicamente e
de forma preponderante até o final da década de 70, os
integrantes dos cursos de arquitetura são recrutados nos
extratos sociais mais cultos, conforme é minuciosamente
examinado por DURAND (1989). Disso dão prova cabal as
exigências especiais dos vestibulares para ingresso,
através do peso atribuído às provas de linguagem
arquitetônica e de história da arte, disciplinas que não
integravam - e ainda não integram - o currículo oficial do
Ensino Médio.
Neste sentido, é impossível dissociar os pressupostos que
moldaram a prática do ensino de arquitetura e
urbanismo (e que se tornaram hegemônicos),
particularmente no que se referem às competências para
uma boa aula, do alunado que deu sustentação a esse
ensino, vinculado, desde a origem, à cultura socialmente
legitimada.
Por isso mesmo, outra questão de interesse para um
exame, ainda que breve, é aquela relacionada ao
âmbito da ação do docente. Em qualquer que seja a sua
área – Artes, Ciências Exatas, Humanas – pode ser
percebida a existência de algumas vertentes,
considerando os pressupostos e a lógica que orientam
suas práticas educativas.
Um grupo, segundo PIMENTEL (1996), é aquele em que a
certeza é priorizada em todos os seus procedimentos,
estabelecida já na própria forma de atuação. Alicerça
essa conduta a crença no conhecimento como um todo
construído, pronto, organizado e estruturado em
29
seqüência, que pode ser bem assimilado se dividido em
parcelas menores e transmitido gradativamente, passo a
passo, de determinada forma. Na prática desses
professores, com variações eventuais, o percurso das
aulas é seguro, dominado, dentro do paradigma
adotado. Bons conhecedores do seu conteúdo e da
área de especialização, são capazes de demonstrações
convincentes, de articulações interessantes com
questões de áreas correlatas e de incentivar a reflexão
do aluno, no sentido de acompanhar a seqüência
percorrida na formação do conceito que desenvolvem,
com lógica e precisão.
Estes professores mantêm profunda coerência entre a
prática didática e suas posições epistemológicas e, na
essência, não abrem mão da confiança nos paradigmas
que moldaram a sua formação. Se forem percebidas
fragilidades, ou mantêm a mesma perspectiva, ou o
receio da mudança se desdobra na defesa do que está
instituído. São esses docentes, no geral bem sucedidos e
prestigiados, entendidos como o centro da atividade de
ensino e a fonte do conhecimento, que melhor
representam a imagem tradicional, institucional e social
do professor.
Para um outro grupo de docentes, o conhecimento é a
contínua conquista de verdade parciais, resultado do
esforço cumulativo da humanidade. Daí decorre a sua
característica principal: a compreensão de que o
contexto social se movimenta e, por isso, permanecem
atentos à transição e à experimentação. E, se não
tomam o saber como produto final acabado, então não
se restringem à sucessão de procedimentos que os
pressupostos desse mesmo saber desencadeiam. Noutros
30
termos, a lógica que os orienta não contempla a
perspectiva de ter a verdade acabada, o que significa
que colocam a si próprios em questão, a sua formação e
os valores que a fundamentam - posições filosóficas,
epistemológicas, políticas, ideológicas. E, por isso mesmo,
alteram comportamentos estabelecidos que estendem à
sua prática.
Para esses professores, é absolutamente insuficiente o
conhecimento apenas transmitido e também
absolutamente necessário que ele seja construído.
Combatem o distanciamento confortável do ensino - em
relação ao indivíduo que se educa, ao contexto, à
realidade concreta - que os alija do objeto de reflexão.
Na pratica educativa, investigam, ensaiam,
experimentam formas de ensinar que ultrapassem as
dicotomias tradicionais como teoria / prática,
conhecimento / realidade, sujeito / objeto. Priorizam o
processo de procura, de identificação e criação de
relações, de “sínteses provisórias” que podem indicar outras
relações, outros objetivos, outras perspectivas.
No terceiro grupo estão aqueles professores que
convivem com as indeterminações e as incertezas desse
tempo e que, com freqüência, reúnem em si mesmos
posturas e enfoques diferentes relativos ao que é ciência,
conhecimento, ensino. Inovam em algumas situações e
se mantêm conservadores em outras. Podem fazer seguir
a uma aula absolutamente tradicional de transmissão de
um conhecimento - cujo centro é a figura do professor e
a sua perspectiva de verdade, e onde os alunos ouvem,
perguntam ou respondem - uma outra em que tudo o
que foi aprendido de forma abstrata, anteriormente, se
31
reúne na ação dos próprios alunos, quando então as
motivações são realmente ativadas.
Especialistas, conhecedores do conteúdo da área de
especialização, na maioria das vezes não tiveram
formação pedagógica e nem manifestam qualquer
interesse pela área; verdadeiramente duvidam de sua
utilidade, pois as questões que ela aborda não fazem
parte de seu paradigma de formação. Nem sempre há,
portanto, o hábito da reflexão conceitual em torno do
que seja ensinar e, principalmente, de qual forma melhor
se aprende. Dominam os fundamentos de sua área, mas
não têm clareza ou ignoram os fundamentos de sua
ação docente.
Representam, esse terceiro grupo, a maioria de todos nós,
envolvidos pelas ambigüidades da época e pelas
dificuldades que daí decorrem, vinculados ao ensino da
profissão, portanto, ao futuro próximo, mas mantendo
posição conservadora, resistente, ainda, em relação ao
reconhecimento da necessidade de aprofundamento
nas questões vinculadas à educação.
A persistência desse desligamento entre as
preocupações dos arquitetos-professores e as prováveis
contribuições da área da educação - e as salvaguardas
com que esse meio ainda se protege, ancoradas na
defesa da suficiência da prática profissional para a
condução à docência - negando, sem conhecer, as
bases e os conhecimentos intrínsecos de uma outra
profissão, a de professor, é que é de fato espantosa!
Masseto (1998, p.13) aponta essa condição, generalizada,
no nível universitário:
32
(...) a docência no ensino superior exige não apenas
domínio de conhecimentos a serem transmitidos por um
professor como também um profissionalismo semelhante
àquele exigido para o exercício de qualquer profissão. A
docência nas universidades e faculdades isoladas precisa
ser encarada de forma profissional, e não
amadoristicamente.
Mas também é um fato que se vem ampliando a
percepção dos arquitetos ligados ao ensino
relativamente à necessidade de alterações de diversas
ordens nos cursos de graduação de arquitetura e
urbanismo, tanto pelo eco, nas escolas, da questão
profissional do arquiteto - agregando à atuação
conceitos e procedimentos novos e ampliando as formas
tradicionais de trabalho na área - como pelo quadro
geral do ensino no país, que já não pode ser pensado
sem a consideração do extraordinário aumento da oferta
de cursos e os desdobramentos alienáveis dessa nova
situação. Entre estes desdobramentos estão incluídos a
demanda urgente por docentes, muita vezes com menor
experiência, e o extraordinário ingresso de alunos
oriundos de extratos sociais diferentes daquele que
tradicionalmente compuseram a base dos estudantes de
arquitetura - cuja cultura de origem era perfeitamente
adequada para o ensino que se estruturou.
É compreensível a maior cautela do docente em relação
às alterações no ensino, pela quantidade de questões
que podem ser abordadas. É compreensível a
permanência das dificuldades e do acanhamento em
romper com estruturas tão arraigadas e de propor novas
estratégias de ensino. Compreensível, mas não
justificável.
33
Daí a importância de orientação em questões específicas
da educação, recomendação aliás que foi citada por
quatro entre os cinco relatórios regionais, relativos aos
encontros promovidos pela CEAU e ABEA, em 1994, e que
por isso a incluiu no relatório sobre Ensino de Arquitetura e
Urbanismo - Condições e Diretrizes (BRASIL, 1994, p.28), na
avaliação final feita sobre as condições do ensino
oferecido pelos cursos do país: Propõe-se, ainda, o estímulo à adoção de orientação
didático-pedagógica para arquitetos/professores na
área de educação, através de encontros locais, regionais
e nacionais de metodologia do Ensino Superior. Ao
mesmo tempo deve-se reunir esforços para ampliar a
reflexão sobre a prática do ensino de Projeto de
Arquitetura e Urbanismo.
No pensamento contemporâneo de educação, uma
questão fundamental na prática docente é invertida: a
consideração de que o foco do ensino é o aluno deve
direcionar tanto o conteúdo quanto a forma de ele ser
conquistado. Nesta perspectiva, torna-se incompatível a
lógica do conhecimento (que deve ser transmitido), cujo
centro é o próprio conhecimento, e passa a ser priorizada
aquela cujo foco é o aluno. Deslocando dessa forma o
eixo da educação para o aprendizado, este se
transforma no objetivo central da formação do
estudante, constituindo-se em uma alteração
absolutamente significativa no entendimento da
educação. Para quem se ensina passa a ser uma questão
básica que se desdobra, necessariamente, em outra: a
preocupação com a forma como melhor se aprende, como
é ressaltado por Masetto (1998, p.12): [...] não se tem consciência na prática de que a
aprendizagem dos alunos é o objetivo central dos cursos
de graduação e que nosso trabalho de docentes deve
privilegiar não apenas o processo de ensino, mas o
34
processo de ensino-aprendizagem, em que a ênfase
esteja presente na aprendizagem dos alunos e não na
transmissão de conhecimentos por parte dos professores.
Outro aspecto merece destaque: é aquele que associa a
questão pedagógica à construção do conhecimento. Se
o aluno é o ponto central da ação docente, o modo
como ele percebe e avalia a sua aprendizagem é
fundamental para aqueles que atuam como professores
e coordenadores. É nesse sentido que as dificuldades
mais comuns aos estudantes precisam ser consideradas e
verificadas. Algumas delas, generalizadas entre os alunos
e com freqüência constatadas por professores,
permanecem, mesmo com as alterações curriculares por
que tem passado o ensino. No entanto, parecem ser a
evidência do entrelaçamento de uma conceituação,
organização e conjunto de práticas didáticas que,
provavelmente adequadas em um dado momento – e a
um dado coletivo de alunos - não se ajustam
integralmente às condições dos tempos atuais.
O tempo atual não é o tempo da certeza. É aquele que
desmistificou crenças que alimentaram gerações, valores
e instituições que ordenaram nossas vidas. Há mais
opiniões sendo veiculadas, mais demonstrações de fé
sendo consideradas, mais formas de beleza sendo
admiradas, mais dúvidas fundamentais instaladas. Como
esta, de um professor – sempre envolvido com o sentido
do que faz, intrigado com as questões do ensino da
profissão, à sua maneira sempre inquieto: Agora, deixa eu fazer uma pergunta, que é o que mais
me preocupa: será que nós estamos realmente
pregando no deserto? Quer dizer, que para esse pessoal
que nós temos não é esse processo, não é o que eles
querem, e não percebemos como é que seria? O que
35
nós teríamos que fazer quanto a um processo didático,
metodológico ou temático diferenciado, não sei.2
2 MAITREJEAN, J. A. V. Depoimento. In: TEIXEIRA, K. A. A arquitetura moderna no Brasil e a educação do arquiteto. Dissertação (Mestrado em Educação: Supervisão e Currículo) PUC-SP, São Paulo, 1998. p. 93.
36
Capítulo 2
Aspectos recorrentes do ensino de projeto de
arquitetura
A conceituação geral dos cursos de arquitetura e
urbanismo1 parte do entendimento de que está na
natureza da ação do arquiteto a necessidade de
integrar conhecimentos de diversas áreas, o que implica
tanto a capacidade de análise das questões envolvidas
quanto a de sintetizar soluções, concretizadas através do
projeto. A graduação visa, por isso, proporcionar uma
formação dirigida à intervenção nas diversas áreas de
domínio, que incluem a concepção, a construção e a
transformação do espaço edificado e do território.
Essas áreas de formação, independentemente dos
diferentes acréscimos ou agrupamentos de disciplinas
utilizados pelas escolas e faculdades, envolvem de forma
constante:
▪ instrumentação e formação em desenho: a
representação das idéias e a materialização das formas,
adquirida pela prática do desenho, da observação e do
domínio dos meios atuais de representação;
▪tecnologia e sistemas estruturais, construtivos e de
instalações: os conhecimentos necessários para a
1 Este entendimento é bastante generalizado; de qualquer modo, pode ser confirmado no enunciado dos cursos pesquisados, constante nos trabalhos programados: Teixeira, K. Identificação e análise de propostas de Integração presentes nos cursos de Arquitetura e Urbanismo do Brasil. São Paulo: FAUUSP, 2004 (envolvendo pesquisa em 57 cursos do país); Identificação e análise da organização dos cursos de Arquitetura e Urbanismo de países de línguas neolatinas. São Paulo: FAUUSP, 2004 (pesquisa envolvendo 34 cursos estrangeiros).
37
criação de sistemas que viabilizem a concretização da
obra e garantam a qualidade dos ambientes,
estendendo-se da edificação à infra-estrutura urbana,
em seus aspectos técnicos e materiais;
▪ conforto ambiental: entendido como um dos
condicionantes constantes tanto da organização dos
espaços como da forma, a partir da compreensão das
condições climáticas, acústicas e de iluminação e do
domínio das técnicas vinculadas a elas.
▪ teoria, história e crítica da arquitetura e do urbanismo:
os conhecimentos que envolvem a interdependência
entre as formas edificadas e de apropriação do território,
registrados ao longo da história, e o meio social, o
econômico, o ambiente e as tecnologias;
▪ projeto de arquitetura, paisagismo e urbanismo:
atividade integradora dos conhecimentos e das
competências necessários à resolução de problemas em
todas as escalas do projeto (do edifício, da cidade e do
território) e que envolvem tanto o caráter estético e
humanista quanto os valores de ordem técnica e
tecnológica, que caracterizam a natureza integradora
da profissão.
▪ planejamento urbano e regional: reúne os
conhecimentos necessários à elaboração de estudos,
análises e proposições para o estabelecimento de
padrões orientadores e de intervenções no espaço
urbano e regional.
Os cursos mantêm, na quase totalidade daqueles
pesquisados, como eixo central da formação do
38
arquiteto, as atividades de ateliê, onde se desenvolve a
prática do projeto e para a qual devem convergir os
conhecimentos obtidos nas diferentes áreas de
conhecimento, envolvendo as relações entre o objeto e
os condicionantes do meio, o entendimento das
necessidades e características do programa, a solução
dos espaços externos e internos, a escolha das
tecnologias apropriadas, a atenção com as questões
relativas ao conforto, sempre na perspectiva de uma
progressão para a idéia mais abrangente.
A integração desses conhecimentos, requerida pela
profissão, é por isso justificadamente enfatizada na
formação e é expressa no que comumente chamamos
de capacidade de síntese do aluno. Todavia, embora seja
uma condição compreendida como imprescindível, ela
não é verificada, no decorrer dos trabalhos dos
estudantes, ao longo dos estudos, na medida
correspondente à ênfase que lhe é atribuída. A não ser
que nos contentemos com os resultados geralmente
obtidos, que apontam desempenhos pouco suficientes
de uma parcela mais significativa dos estudantes, e
melhores resultados de outra, numericamente menos
expressiva. Minoria que, como é usual no comentário dos
professores, caminha sozinha... E, justamente por ser
menos representativa, quantitativamente, não nos
autoriza a permanecer com os pressupostos e práticas de
ensino que temos, ignorando quando os fatos devem
ditar a procura de novas soluções.
Uma situação recorrente diz respeito à insistência com
que a elaboração do projeto de arquitetura, durante a
formação, continua separada de sua materialização,
tratada - se diria, à primeira vista, “pelos alunos” - muito
39
mais como uma questão plástica, meramente formal,
independente da caracterização física, material e
construtiva do objeto, sem a preocupação, ou com
grandes dificuldades, em relação à sua própria
existência, à sua viabilidade. Seja a solução baseada nos
recursos conhecidos do modernismo ou no entusiasmo
imediato que alguns projetos contemporâneos mais
extravagantes despertam, a proposta desenvolvida pelo
estudante tende a ser formulada em detrimento dos
demais aspectos, minimizados ou simplesmente
ignorados, principalmente aqueles que envolvem os
conhecimentos teóricos e técnico-científicos. Dentre os
vários registros sobre o assunto encontrados, há exemplos
contundentes como o do resultado de pesquisa realizada
por Vidigal (2004, p.72), centralizada nas escolas de
arquitetura e urbanismo de Curitiba: “[...] o maior problema
do ensino de arquitetura, no entanto, para 65% dos professores,
é o distanciamento entre as disciplinas das áreas teórica e
tecnológica e o ensino de projeto.”
Na mesma linha de preocupação, Kufner (2002, p.60, grifo
nosso) se refere à abrangência da questão: [...] a preocupação em capacitar melhor os alunos em
seu desenvolvimento intelectual como fonte para um
desenvolvimento mais consciente da prática projetual,
ou seja, ‘ saber o que está fazendo ao projetar’ parece
ser unânime entre todos (docentes e discentes) de norte
a sul deste país.
Freqüente, generalizada e persistente nos diversos cursos
(ZANETTINI,1980; CARVALHO,1994; LEITE, 1998; KUFNER, 2002;
VIDIGAL, 2004) essa questão sugere como causa, em nosso
ponto de vista, pelos menos, uma possibilidade da qual
não se furta: a existência de uma aprovação tácita dos
cursos, integrante do currículo oculto, que vai permitindo
ao estudante prosseguir em seus trabalhos de projeto,
40
independente da consideração do conjunto de
conteúdos obrigatórios já ministrados em disciplinas de
outras matérias. É uma boa pista, por isso, o depoimento,
registrado em ata, de uma representante discente2 de
curso de graduação (UNVERSIDADE DE SÃO PAULO, 2004,
grifo nosso), que: (...) manifesta ser esta desconexão entre teoria e prática
um problema das disciplinas de ateliê em geral. Observa
que os conteúdos teóricos das disciplinas dos
departamentos de História da Arquitetura e de
Tecnologia da Arquitetura jamais são utilizados - ou
exigidos - nas disciplinas de ateliê. De maneira geral, a
atitude dos alunos em ateliê, com relação à teoria,
restringe-se a aplicar o pouco que é diretamente
ministrado na disciplina [de Projeto] em si mesma e quase
nunca os conteúdos das demais disciplinas do curso”.
Os valores veiculados no ensino tratam, justamente, da
“formação”, por isso afetam o comportamento dos
futuros profissionais, neles incutindo tanto procedimentos
de resistência como de modificação ou alteração dos
elementos ideológicos da ocupação (DURAND, 1989).
Nesse entendimento, essa situação que se origina, no
ensino, a partir da desconexão entre conteúdos das
áreas de formação e que desliza, durante o aprendizado,
para a permissão da desconsideração de alguns saberes
de disciplinas obrigatórias nos trabalhos que os
estudantes desenvolvem, com freqüência se estende à
prática profissional3, naquele entendimento de projeto
arquitetônico preocupado apenas com as características
2 Tanaka, G. In: FAU PENSA A GRADUAÇÂO 2001. Depoimento da representante discente. O documento relata os resultados do Ciclo de Debates que a FAUUSP promoveu sobre o ensino de graduação e é uma contribuição extraordinária para a pesquisa sobre diferentes aspectos desse ensino 3 CARVALHO, J. M. N. Prática de Arquitetura e Conhecimento Técnico. Tese (Doutorado em Arquitetura e Urbanismo) – FAU USP, São Paulo, 1994. O trabalho aponta a carência de conhecimento básico estrutural dos arquitetos e inclui depoimentos de profissionais a esse respeito.
41
finais da forma, materiais aparentes, textura,
descompromissado com conhecimentos pregressos da
área, e omisso nas questões do como fazer. Situação que
expõe e fragiliza parte dos arquitetos e, por extensão
natural, a compreensão social sobre os atributos da
profissão, permitindo tanto a substituição inconseqüente
de valores específicos da arquitetura por outros, mais
exclusivamente ligados às questões visuais, com o reforço
da identificação do arquiteto, ainda, como o profissional
das boas idéias.
Tal identificação, além de ignorar ou desprezar o
conjunto de trabalho e conhecimento que sustenta e
autoriza aquela “boa idéia”, nos equipara a outras
profissões, cujo exercício não depende nem da nossa
longa e cara formação superior nem da regulamentação
a que estamos sujeitos.
A desarticulação entre as diferentes fontes de
conhecimento que comparecem na educação do
arquiteto e que constituem disciplinas obrigatórias, ou
ainda a menor presença de determinados conteúdos,
em termos de valor a eles atribuído na prática do
currículo (e não necessariamente de quantidade de
carga horária), é uma constatação recorrente, presença
assídua no discurso dos docentes, apontada em
discussões internas de cursos, documentos, análises de
diferentes autores4. Em trabalho corajoso, tanto sintético
quanto abrangente sobre o ensino de projeto, Zanettini
4 Sobre essa questão, o conjunto dos Cadernos – ABEA são uma fonte importante, com o registro do pensamento de professores de diferentes áreas da formação e de diferentes instituições, além das dissertações e teses sobre ensino de arquitetura e urbanismo, várias delas integrantes da bibliografia.
42
(1980, p.93) advertia sobre tais insuficiências da formação,
já em 1974: (...) pelo menos, fazer o seu pré-dimensionamento ou,
menos ainda, de lançar um partido estrutural correto; de
conceber ou discutir uma rede de hidráulica; de calcular
o nível de aclaramento de um ambiente; de detalhar um
para-sol como resposta técnica-coerente à orientação
da face de um edifício; de orientar o desenvolvimento de
um sistema construtivo (...)
Na mesma linha seguiram as considerações de Graeff
(1995, p. 130, grifo nosso), em um dos trechos mais
conhecido de trabalho realizado em 1984, analisando a
dicotomia entre arte e técnica, na defesa das
características da atividade: (...) O divórcio esse, entre a concepção-projeto da obra
e sua realização-construção, gera graves conseqüências
para a arquitetura: o desenho se faz cada vez menos
projeto e mais desenho mesmo, e a arquitetura passa a
ser, cada vez mais, pensada e avaliada como arte
plástica... O saber fazer arquitetura vai dando lugar, na
formação do arquiteto, ao saber desenhar e discursar
sobre arquitetura. Assim, o divórcio entre arte e técnica
na arquitetura começa com o distanciamento entre
teoria e prática, o desenho / proposta teórica e a
construção / realização prática da obra, vale dizer, do
espaço.
No entanto, os conhecimentos técnico-científicos são
entendidos socialmente como uma necessidade
intrínseca à atividade do arquiteto e é o reconhecimento
dessa necessidade uma das fortes razões que justifica a
regulamentação5 da profissão e a existência, na
5 A elaboração de projetos de lei destinados a regulamentar o exercício das profissões segue as recomendações da CTASP: “ [...] a) imprescindibilidade de que a atividade profissional a ser regulamentada – se exercida por pessoa desprovida da formação e das qualificações adequada – possa oferecer riscos à saúde, ao bem – estar, à segurança ou aos interesses patrimoniais da população; b) real necessidade de conhecimentos técnico-científicos para o desenvolvimento da atividade profissional, os quais tornem indispensável a
43
formação, das disciplinas correspondentes,
coerentemente conceituadas como profissionalizantes e
obrigatórias nos cursos de todo o país.
A hipótese que orienta esse trabalho é a de que as
disciplinas responsáveis pelo desenvolvimento da
atividade de projeto se mantêm precariamente
organizadas, recusando-se, por diferentes razões, a
assumirem o papel natural que lhes é inerente de
aglutinadora, integradora dos conhecimentos que
intervêm na elaboração de um projeto – permanecendo
mais na posição, inegavelmente confortável, de
expectativa da síntese dos conhecimentos a ser realizada
pelo aluno, do que na busca de uma atuação integrada
no desenvolvimento interno da própria disciplina,
correspondendo à atividade de projeto. Defende-se que,
se a inter-relação de saberes não vem dada pelas fontes
que originam os conteúdos, é preciso buscá-las tanto na
organização dos cursos como nas práticas didáticas e
que, para maiores cotas de autonomia – seja dos
docentes, dos alunos ou de ambos, a necessidade de
atuação integrada aumenta, particularmente nas
disciplinas obrigatórias.
São conhecidas várias das circunstâncias que estão na
origem do ensino que temos; o exame de algumas delas
e dos valores a elas associados, que persistem como
pano de fundo ainda ativo, importam para o
entendimento de como opera o locus de resistência e,
conseqüentemente, para a possibilidade de uma
compreensão mais alargada da nossa dificuldade em
interromper, de forma efetiva, os aspectos recorrentes.
regulamentação; [...]”. In: Brasil. Perfis da Área & Padrões de Qualidade – Expansão, Reconhecimento e Verificação Periódica dos Cursos de Arquitetura e Urbanismo. Brasília, 1995, p.6.
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Porque perduram e porque têm importância no
desdobramento desse trabalho, essas questões – algumas
delas objeto da pesquisa de outros autores, que as
aprofundaram, são aqui rapidamente relembradas.
A argumentação a seguir relaciona as conseqüências da
permanência da separação entre arte e técnica no
ensino de arquitetura, a presença de requisitos
particularmente especiais cobrados aos estudantes para
o ingresso nos cursos, e a constância das mesmas
práticas escolares.
A tensão entre “arte” e “técnica” remonta suas raízes,
como se sabe, ao Renascimento italiano. Anteriormente,
das pirâmides às catedrais góticas, arquitetura e
construção foram sempre atividades indissociáveis. O
“mestre construtor” do Egito, o “architekton” da Grécia
clássica, o “ architetto” de Roma ou o “capomastro” da
Idade Média são incumbidos tanto da concepção dos
projetos como da condução das obras e do comando
dos artesãos das diversas artes que a construção
requeria. A característica principal e comum ao
aprendizado da profissão, nesses períodos, é a de que ele
se desenvolve na própria área do canteiro,
minuciosamente, através do conhecimento prático do
ofício, atento à lógica dos materiais que conduz as
decisões da construção e dentro da relação tutelada de
mestre-aprendiz: ver fazer e fazer, ver fazer e fazer.
Raramente o arquiteto existia, nesses tempos, como um
indivíduo independente.
A Renascença irá alterar, drasticamente, o
desenvolvimento da atividade. Até então, o gótico está
enraizado na prática, ensinado e aprendido nos canteiros
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e obras que funcionam como centros de formação
profissional, transmitindo, de geração para geração, os
conhecimentos que se vão aperfeiçoando.
A retomada dos padrões clássicos, formas e técnicas da
Antiguidade, como o ideal de harmonia desejado para a
arquitetura, não se originou, portanto, no interior do
conhecimento em vigor; pelo contrário, foi ambicionada
“[...] surgia de las cabeças de artistas {...}” (THOENES, 2003, p.
10) e daqueles que se empenhavam na leitura dos
autores antigos.
Como toda demarcação idealizada, contrapunha-se ao
existente, ao costume da profissão, àquilo que era a lição
do canteiro e, por isso mesmo criou, para a cultura que
seria agora legitimada, a necessidade tanto de que sua
teoria fosse estudada como a de que o artista fosse
capaz de autonomia: decidir e fazer: [...] l’artista medievale era responsabile solo dell’esecuzione perché i
contenuti e perfino i temi di immagine gli erano dati; ora l’artista deve
trovarli e definirli, cioè non opera più secondo direttive ideologiche
imposte da un’autorità superiore o da uma tradizione consacrata, ma
determina in modo autônomo l’orientamento ideológico e culturale
del próprio lavoro. L’arte non è più uma attività manuale o
mechanica, sia pure d’alto livello, ma intellettuale o liberalis. (ARGAN, 1988, vol2, p. 106)
Quanto à sua origem social, o arquiteto desse período
sairá principalmente das classes letradas. Pode ser um
homem da corte, mas, antes de tudo, é um artista.
Distinto dos pedreiros, carpinteiros e construtores, com
clientela elitizada, instruída, sensível às idéias humanistas,
o arquiteto renascentista obtém a distinção e ascensão
social que, parece, almejava. Essa mesma nova
condição permitirá, também, que muitas vezes ele seja
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substituído por pintores e escultores na concepção dos
espaços renascentistas: É quando se destacam figuras gigantescas como
Bramante, Michelangelo, entre dezenas de outros
escultores-pintores-arquitetos que armaram o cenário da
extraordinária aventura do Renascimento.(GRAEFF,
1995, p.129).
Os desdobramentos desse quadro ao longo do tempo
acabarão por introduzir uma dicotomia contundente
entre concepção e execução, entre arte e técnica, que
será reforçada duplamente: primeiro, com a significativa
alteração do local de formação dos arquitetos,
transferido da obra para o ateliê de pintores e escultores
e, depois, para as academias as quais, à medida que se
institucionalizam, solidificam tanto o afastamento do
aprendiz do canteiro como a crescente ausência dos
mestres ligados à prática da atividade. Paralelamente à
institucionalização das academias, há o
desmantelamento progressivo das corporações de ofício
que, durante o período medieval, haviam tido papel
fundamental na natureza da formação e do exercício
profissional dos arquitetos/construtores.
A Academie Royale dArchitecture, a primeira, oriunda do
ensino para a formação dos arquitects du roi, na França
de Luiz XIV - foi estabelecida por Colbert em 1671, sob
inspiração do renascimento italiano, significativamente
“depois de comissionar Perrault para traduzir Vitruvius.”
(TSCHUMI, 1995, p.24). Dela derivou a École des Beaux-Arts
de Paris, que servirá internacionalmente de modelo para
a educação institucional do arquiteto.
A espinha dorsal da formação no sistema Beaux Arts é o
ensino da forma correta, resultado da aplicação da
47
teoria da composição e da adoção das soluções
consagradas. No modelo pedagógico, o aprendizado do
projeto arquitetônico se dá através de exercícios que –
realizados nos limites do papel e com permissão para
ignorar as questões técnicas – tratam, de forma exclusiva,
de edifícios de caráter monumental, vinculados à
administração pública e às elites, desenvolvidos “ [...] sob
a orientação do patron do ateliê, em geral um arquiteto de
prestígio que havia recebido a mesma formação.”
(FICHER,1988, p.137).6 Estava definida a primeira
dissociação a que se refere Tschumi (1995): os arquitetos
não mais constroem.
Quando a Revolução Industrial se instala - e as demandas
e possibilidades científicas e técnicas se ampliam
vigorosamente, induzindo a inevitáveis mudanças
culturais – a Academia é incapaz de reagir,
permanecendo “na defesa de sua arte, contra as ameaças
da ciência” (GRAEFF, 1995, p.58) e tornando insuficientes as
possibilidades do ensino que se vincula apenas aos
valores das artes plásticas. Uma resposta às novas
necessidades será dada por Monge, em 1794, quando
organiza a École Polytechnique, com os cursos de
engenharia, incluindo o de engenharia civil, tendo o
conhecimento técnico como o pivô do ensino, como seu
fio condutor.
Cento e vinte e cinco anos depois, a experiência
vigorosa da Bauhaus (1919), embora de curtíssima
duração, propõe uma solução à dicotomia, inovando a
concepção e estruturação desse ensino, empenhada em
fundir arte e técnica. Mas o sistema das Beaux-Arts
6 FICHER, S. Ensino, Documentação e Pesquisa. Revista Projeto, São Paulo, n° 114, p. 135-140, set. 1988.
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sobreviveu tanto a ela como à Politécnica, influenciou
decididamente arquitetos europeus e, desde o século
XIX, a constituição e formação de escolas nas três
Américas.
No Brasil, portanto, é esse o espírito que orienta o ensino
na Academia Imperial no Rio de Janeiro, com a vinda da
Missão Francesa, e é o que permanece, quando, com a
República, a Academia transformou-se em Escola
Nacional de Belas Artes –ENBA, a primeira e a principal
referência para a educação escolarizada do arquiteto
no Brasil, até cerca de 1950, com estrutura
marcadamente convencional. Em outros estados,
prosseguem cursos antigos: derivados dos cursos de
engenharia, vinculados à Escola Politécnica da USP(1894)
e ao Mackenzie College(1917), em São Paulo; o de Belo
Horizonte (1930) e o de Salvador (1896).
A exceção, no ensino desse período, foi dada pela
brevíssima experiência de Lúcio Costa na direção da
ENBA (pela qual também havia sido diplomado), entre
1930 e 1931; aliada à divulgação, por extenso, das
“Razões da Nova Arquitetura”, impulsionou um
movimento de renovação nessa área que, em sua
essência, é progressista e reúne, na base, profissionais
respeitados, tanto no sentido de dominarem as técnicas
e artes desenvolvidas, quanto no de partilharem
preocupações sociais.
Uma sucessão de campanhas envolvendo profissionais,
docentes e estudantes irá moldando, ao longo do
tempo, o ensino que veio a caracterizar a área. A partir
da década de 30, as articulações são vinculadas ao
processo de emancipação – tanto buscando as
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expressões de arquitetura tipicamente nacionais, aliadas
às modernas tecnologias, como a instrução normativa
das profissões envolvidas com a construção, obtida em
1933, com a regulamentação nacional para engenheiros,
arquitetos e agrimensores.
Embora no panorama internacional as vanguardas do
século XX tivessem suas lideranças divididas entre alguns
arquitetos, Frank L. Wright, Mies Van der Rohe, Gropius e
Le Corbusier, ao Brasil elas chegam quase que com uma
única orientação: aquela do pensamento de Le
Corbusier, arquiteto e pintor que, por uma série de
circunstâncias, fora dos limites desse trabalho, tem rápida
aceitação, tornando-se hegemônica.
A presença de Le Corbusier no Brasil em 1929 e
novamente em 1936 reforça a afinidade entre suas
concepções e aquelas do grupo de jovens arquitetos
cariocas. O projeto do Ministério da Educação no Rio de
Janeiro em 1936, realizado durante o governo Vargas,
sob o patrocínio do ministro Gustavo Capanema, e
resultado da colaboração entre Le Corbusier e esse
grupo de arquitetos - onde se sobressaem Lúcio Costa e
Oscar Niemeyer - consegue fazer-se notar em nível
internacional, reforça no país a influência da tendência
corbusiana, e alavanca o futuro da arquitetura moderna,
ao mesmo tempo em que dá início à boa safra de
projetos.
Nos anos 50, existe otimismo e existe futuro, existe um
projeto nacional. A comunidade universitária se envolve
com a questão da industrialização e da modernização,
entusiasmada com o conhecimento científico: todos os
projetos poderiam ter êxito. A modernidade iniciada no
50
país na década de 30 é fortalecida a partir de 1955, com
a idéia de desenvolvimento aderente ao progresso
técnico.
À arquitetura brasileira, já prestigiada nacionalmente,
interessa a criação de novos quadros. Nas décadas de
40, 50 e 60, paralelamente ao crescimento do prestígio
da atividade, o movimento trata de plantar as suas raízes
voltando-se, sucessivamente, para a autonomia do
ensino de arquitetura, tanto em relação às estruturas das
belas artes como às das politécnicas, e para a
constituição de currículo próprio para a formação do
arquiteto. É o período que marca a luta pela autonomia
desse ensino e marca a história da Arquitetura Brasileira,
com a planificação e construção de Brasília.
É extraordinário o poder de agregação que os resultados
da nossa nova arquitetura representaram para o meio
profissional e estudantil. Alavancado pela forte
repercussão da construção de Brasília, externamente ao
país, o coletivo desses trabalhos foi o testemunho da
conquista, do acerto do rumo da produção brasileira,
consolidando, entre profissionais e estudantes, um padrão
consistente de identidade cultural e profissional.
O projeto didático subjacente ao conjunto do
pensamento em vigor se apóia em uma diretriz: o
docente é um profissional ligado à produção de
arquitetura ou da arte e é sob essa condição
imprescindível que se vincula ao ensino. O corpo
docente é formado por arquitetos carismáticos,
respeitados em sua área de atuação, quase mitos. A
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade
de São Paulo, a Faculdade de Arquitetura da
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Universidade Federal do Rio Grande do Sul e a Faculdade
de Arquitetura da Universidade de Brasília representam as
principais escolas e experiências desse período no país,
implantando as duas primeiras, em 1962, seus novos
currículos, conseqüências das amplas discussões
fermentadas desde os anos 50.
Na FAUUSP, por exemplo, é o conceito de projeto que
centraliza e estrutura o ensino, transformando o ateliê no
principal espaço de aula e discussão. Implementando as
idéias de currículo próprio e o de ampla formação, sob
influência da experiência da Bauhaus, são introduzidos os
laboratórios para experimentação, as disciplinas de
tecnologia, as de teoria e história e as de urbanismo.
Todo o curso é organizado em departamentos: Técnicas,
História e Projeto, neste último incluídos o planejamento
urbano, o edifício, o desenho industrial e a comunicação
visual. O conceito de projeto centraliza e estrutura o
ensino, transformando o ateliê no principal espaço de