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24 Revista Brasileira de Nutrição Funcional - ano 15, nº 63, 2015 Dra. Felícia Bighetti Sarrassini, Dr. João Luiz Curvo de Almeida e Dra. Camila Mercali Extrato de arroz vermelho fermentado pelo Monascus purpureus ( red yeast rice): uma opção de tratamento para redução do LDL colesterol em pacientes intolerantes às estatinas Red rice extract fermented by Monascus purpureus (red yeast rice): an optional treatment for LDL cholesterol reduction in patients intolerant to statins Resumo O objetivo deste estudo foi analisar a redução dos índices de LDL colesterol associada ao uso do red yeast rice (RYR), em indivíduos hipercolesterolêmicos intolerantes às estatinas. Foi realizada revisão sistemática de literatura e recorrendo-se às bases de dados da NCBI, PubMed, Medscape, a sites científicos, além de jornais, revistas, livros e artigos científicos. Procedeu-se à seleção dos artigos mais relevantes desde 1990 a 2014 nas línguas inglesa e portuguesa. Foram incluídos artigos de revisão e de crítica, estudos prospectivos e laboratoriais e ensaios clínicos. Foram encontrados 49 artigos, a maioria de caráter internacional, e tanto os estudos da década de 1990 como os mais recentes observaram que pacientes hipercolesterolêmicos intolerantes às estatinas que fizeram uso do RYR obtiveram redução do colesterol total e do LDL colesterol. Em diversos achados também verificou-se aumento significativo do HDL colesterol com o uso desse fitoterápico. Concluiu-se que a associação do extrato de RYR com hábitos saudáveis, que incluem alimentação balanceada com reduzida ingestão de gordura saturada e atividade física regular, contribui para a redução do LDL colesterol e pode ser um caminho para tratar pacientes que, por intolerância às estatinas ou por alguma filosofia de vida, buscam tratamentos naturais para reduzir o colesterol. Palavras-chave: Doenças cardiovasculares, Dislipidemias, Hipercolesterolemia, Inibidores de Hidroximetilglutaril-CoA redutases, Fitoterapia. Abstract This study aimed at analyzing the reduction of LDL cholesterol levels associated with the use of red yeast rice (RYR) in hypercholesterolemic subjects intolerant to statins. This research was carried out through systematic review of literature using NCBI, PubMed, Medscape databases, scientific websites besides journals, magazines, books and scientific articles. The most relevant articles ranging from 1990 to 2014 written in English and Portuguese were selected. Review articles, critical articles, prospective studies, laboratory studies and clinical trials were included. A number of 49 articles - most of them foreign - were found. Not only the studies from the 1990’s but also the most recent ones observed that hypercholesterolemic patients intolerant to statins who used RYR had their total and LDL cholesterol levels reduced. Several other findings also pointed out significant increase of HDL cholesterol levels when using this phytotherapic supplement. In conclusion, the association of RYR extract with healthy habits, which include a balanced diet with reduced saturated fat ingestion and regular physical exercises, contributes to the reduction of LDL cholesterol levels and can also be a valid option to treat patients who either due to intolerance to statins or to any philosophy of life seek natural treatments to reduce cholesterol levels. Keywords: Cardiovascular diseases, Dyslipidemias, Hypercholesterolemia, Hydroxymethylglutaryl-CoA reductase inhibitors, Phytotherapy.

Extrato de arroz vermelho fermentado pelo Monascus ...€¦ · rice, RYR)2,4-8. Em 1970, foi identificada a monacolina K, um metabólito do fungo Monascus sp., que apresenta forma

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Dra. Felícia Bighetti Sarrassini, Dr. João Luiz Curvo de Almeida e Dra. Camila Mercali

Extrato de arroz vermelho fermentado pelo Monascus purpureus (red yeast rice): uma opção de tratamento para redução do LDL colesterol em

pacientes intolerantes às estatinas

Red rice extract fermented by Monascus purpureus (red yeast rice): an optional treatment for LDL cholesterol reduction in patients intolerant to statins

ResumoO objetivo deste estudo foi analisar a redução dos índices de LDL colesterol associada ao uso do red yeast rice (RYR), em

indivíduos hipercolesterolêmicos intolerantes às estatinas. Foi realizada revisão sistemática de literatura e recorrendo-se às bases de dados da NCBI, PubMed, Medscape, a sites científicos, além de jornais, revistas, livros e artigos científicos. Procedeu-se à seleção dos artigos mais relevantes desde 1990 a 2014 nas línguas inglesa e portuguesa. Foram incluídos artigos de revisão e de crítica, estudos prospectivos e laboratoriais e ensaios clínicos. Foram encontrados 49 artigos, a maioria de caráter internacional, e tanto os estudos da década de 1990 como os mais recentes observaram que pacientes hipercolesterolêmicos intolerantes às estatinas que fizeram uso do RYR obtiveram redução do colesterol total e do LDL colesterol. Em diversos achados também verificou-se aumento significativo do HDL colesterol com o uso desse fitoterápico. Concluiu-se que a associação do extrato de RYR com hábitos saudáveis, que incluem alimentação balanceada com reduzida ingestão de gordura saturada e atividade física regular, contribui para a redução do LDL colesterol e pode ser um caminho para tratar pacientes que, por intolerância às estatinas ou por alguma filosofia de vida, buscam tratamentos naturais para reduzir o colesterol.

Palavras-chave: Doenças cardiovasculares, Dislipidemias, Hipercolesterolemia, Inibidores de Hidroximetilglutaril-CoA redutases, Fitoterapia.

AbstractThis study aimed at analyzing the reduction of LDL cholesterol levels associated with the use of red yeast rice (RYR) in

hypercholesterolemic subjects intolerant to statins. This research was carried out through systematic review of literature using NCBI, PubMed, Medscape databases, scientific websites besides journals, magazines, books and scientific articles. The most relevant articles ranging from 1990 to 2014 written in English and Portuguese were selected. Review articles, critical articles, prospective studies, laboratory studies and clinical trials were included. A number of 49 articles - most of them foreign - were found. Not only the studies from the 1990’s but also the most recent ones observed that hypercholesterolemic patients intolerant to statins who used RYR had their total and LDL cholesterol levels reduced. Several other findings also pointed out significant increase of HDL cholesterol levels when using this phytotherapic supplement. In conclusion, the association of RYR extract with healthy habits, which include a balanced diet with reduced saturated fat ingestion and regular physical exercises, contributes to the reduction of LDL cholesterol levels and can also be a valid option to treat patients who either due to intolerance to statins or to any philosophy of life seek natural treatments to reduce cholesterol levels.

Keywords: Cardiovascular diseases, Dyslipidemias, Hypercholesterolemia, Hydroxymethylglutaryl-CoA reductase inhibitors, Phytotherapy.

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Introdução

Entre as terapias alternativas, a fitoterapia é a ciência que estuda a utilização clínica dos produtos à base de plantas medicinais1.

Apesar da evidência ainda pouco concreta no que diz respeito à eficácia de muitos fitoterápicos e da regulação (por vezes confusa), o mercado de produtos naturais é um setor em franco crescimento e um desafio à prática médica2,3.

O extrato de arroz fermentado por Monascus purpureus é um dos fi tomedicamentos hipocolesterolemiantes considerados mais eficazes para redução do LDL colesterol (LDLc). Obtido a partir da fermentação do arroz pelo fungo Monascus purpureus, que pertence à família Aspergillaceae, o extrato do arroz é fermentado pela levedura vermelha (red yeast rice, RYR)2,4-8.

Em 1970, foi identificada a monacolina K, um metabólito do fungo Monascus sp., que apresenta forma idêntica à lovastatina, que tem ação de inibir a síntese do colesterol no fígado9.

Nos últimos 20 anos, foram documentados vários estudos que comprovaram a indicação do RYR como fitoterápico eficaz para a redução do LDLc7,10,11. O RYR tem sido apontado como alternativa para tratar pacientes dislipidêmicos que apresentam efeitos adversos com o tratamento das estatinas, entre eles dores musculares e miopatia, pois possui a capacidade de inibir a síntese de colesterol via hidroximetilglutaril-CoA redutase (HMG-CoA) e, por isso, tem propriedade semelhante à estatina12-19.

Embora alguns pacientes se mostrem intolerantes às estatinas, as mesmas ainda são considerados os medicamentos de primeira linha entre os agentes hipocolesterolêmicos para redução do LDLc e de eventos cardiovasculares, apresentando notável segurança20. São drogas mais eficientes que o RYR, contudo apresentam maiores efeitos colaterais, dentre eles os mais citados são as dores musculares e a rabdomiólise21. O RYR é indicado como opção para a redução dos níveis de colesterol total (CT) e LDLc,

para os pacientes que optam por um tratamento natural para a dislipidemia e também para os que apresentam mialgias ou rabdomiólise com o uso das estatinas2,3,22-24.

A abordagem multidisciplinar para tratar as dislipidemias com médico, nutricionista e professor de educação física é a conduta mais indicada. O alcance das metas de tratamento depende da adesão a programa alimentar saudável, evidenciando a dieta mediterrânea e correções no estilo de vida como redução do peso corporal e adoção de prática de atividade física regular25-31.

Naqueles indivíduos que não atingem as metas de lípides apenas com modificações comportamentais, o uso continuado de drogas hipolipemiantes se faz indispensável à prevenção e ao tratamento das doenças cardiovasculares (DCV). As dislipidemias, a hipertensão arterial sistêmica (HAS) e o diabetes mellitus (DM) são considerados as principais entidades mórbidas que apresentam os maiores índices de morbidade e mortalidade cardiovascular20,32-38.

Assim, este estudo teve por objetivo analisar, por meio de revisão sistemática de literatura, a redução dos índices de LDLc associada ao uso do extrato de arroz fermentado por Monascus purpureus em indivíduos hipercolesterolêmicos intolerantes às estatinas. Foi realizada revisão sistemática de literatura, recorrendo-se a bases de dados da NCBA, PubMed, MEDLINE, Medscape, Interscience, sites científicos, além de jornais, revistas, livros e artigos científicos. Procedeu-se à seleção dos artigos mais relevantes nos âmbitos nacional e internacional. Foram incluídos artigos de revisão e de crítica, estudos prospectivos e laboratoriais e ensaios clínicos.

Resultados e discussão

O quadro 1 traz diferentes estudos relacionados ao uso do RYR em pacientes hipercolesterolêmicos e seus efeitos sobre os índices de colesterol sérico.

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Shen et al.39

Heber et al.40

Rippe et al.41

Keithley et al.38

Venero et al.7

Bogsrud et al.42

Verhoeven et al.13

Sartore et al.31

Estudos com 324 pacientes hipercolesterolêmicos tratados com 1.200 mg/dia de Monascus purpureus durante oito semanas.

Estudo prospectivo, duplo cego, randomizado, placebo controlado por 12 semanas, com 83 pacientes, hipercolesterolêmicos. Mediram-se 8, 9, 11 e 12 semanas. Dieta hipogordurosa associada ao extrato de RYR.Estudo multicêntrico, por oito semanas, com 187 indivíduos hipercolesterolêmicos.

Estudo multicêntrico, randomizado, com 502 pacientes hiperlipidêmicos tratados com 1.200 mg/dia de Monascus purpureus por oito semanas.

Revisão de literatura com 25 pacientes hipercolesterolêmicos tratados com RYR durante quatro semanas.Estudo randomizado duplo-cego, com 42 pacientes hipercolesterolêmicos entre uso do RYR (n=22) e placebo (n=20) por 16 semanas.Estudo randomizado duplo-cego, com 52 pacientes hipercolesterolêmicos, um grupo fazendo uso do RYR e outro grupo com placebo.Estudo realizado com dieta do mediterrâneo sozinha e em associação com RYR em pacientes dislipidêmicos intolerantes às estatinas, com e sem DM II por 24 semanas.Foram estudados 171 pacientes:Grupo I (GI) - 46 pacientes com DM II e dieta mediterrânea;Grupo II (GII) - 44 pacientes com dieta do mediterrâneo associada ao uso do RYR;Grupo III (GIII) - 38 pacientes dislipidêmicos com dieta do mediterrâneo;Grupo IV (GIV) - 43 pacientes dislipidêmicos associado ao uso de RYR.

Indivíduos saudáveis: CT ↓ 23%TG ↓ 36,5% Indivíduos hipercolesterolêmicos: CT ↓ 19,5% LDL ↓ 31%TG ↓ 34% HDL ↑ 16,7%Grupo tratadoRedução do colesterol total em oito semanas, de 254±36 mg/dL a 208±31 mg/dL (↓17%).LDL ↓ 23% e TG↓ 16%CT ↓ 16,4%, LDL ↓ 21%, TG ↓ 24,5%, HDH ↑ 14,6%CT ↓ 22,7%,LDL ↓ 30,9%, TG ↓ 34,1%HDL ↑ 19,9%CT ↓ 15 %, LDL ↓21%

CT ↓ 15,5%,LDL ↓ 23% em pacientes que fizeram uso do RYR em comparação ao grupo placeboCT ↓ 15%, LDL ↓ 22% em pacientes que fizeram uso do RYR em comparação ao grupo placeboRedução do LDLcG1: ↓ 7,34 ± 3,14%G2: ↓ 21,02 ± 1,63%G3: ↓ 12,47 ± 1,75%G4: ↓ 22 ± 2,19%

Autores Metodologia Resultados

Um dos estudos identificados foi realizado com 502 pacientes hipercolesterolêmicos em tratamento com RYR (1.200 mg/dia) por oito semanas, e como resultado observou-se significativa redução do LDLc, de aproximadamente 31%38. Em outro estudo com 52 pacientes hipercolesterolêmicos, divididos em dois grupos, um grupo em uso do

RYR e outro recebendo placebo, notou-se também que no grupo de pacientes em uso de RYR houve importante redução do LDLc em 22%11.

Além dos achados acima, em outra recente pesquisa com 171 pacientes intolerantes às estatinas que consumiram a dieta mediterrânea como única fonte de tratamento e também

Quadro 1. Resultados de estudos relacionados ao uso do red yeast rice (RYR).

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associada ao uso de RYR, foram criados quatro grupos com indivíduos dislipidêmicos com ou sem o diagnóstico de DM tipo 2. Destaque para o grupo 2, composto por 44 pacientes com DM tipo 2 fazendo uso da dieta do mediterrâneo associada ao RYR, em que se verificou significativa redução do LDLc de aproximadamente 21 mg/dL31. No entanto, outros estudos demonstraram que o uso de RYR associado à qualidade de vida ou mudança de comportamentos contribui para melhor resposta na redução dos índices séricos do LDLc em pacientes intolerantes às estatinas39,40.

Diante dos resultados de diversos estudos, o uso do RYR parece estar entre uma das satisfatórias opções de tratamentos para pacientes hipercolesterolêmicos e intolerantes às estatinas39-41. Verificou-se, ainda, que a maior parte das pesquisas mostrou importante redução dos níveis séricos do CT e do LDLc, e em alguns achados houve significativo aumento do HDL colesterol (HDLc).

Os primeiros estudos e os achados mais recentes parecem ressaltar que o uso adequado do RYR associado à qualidade de vida, como alimentação saudável e atividade física, apresentou eficaz redução nos valores séricos de lipídeos (CT e LDLc) e, consequentemente, diminuição para o risco de DCV e outros agravantes7,11,31,38,39,41-43.

No estudo de Fujimoto et al.6 concluiu-se que o uso do RYR demonstrou moderada redução do LDLc e tem sido uma alternativa aceita e bem tolerada em pacientes que se mostraram intolerantes a outros medicamentos inibidores de lipídeos séricos6.

Em estudo multicêntrico, utilizando-se o Monascus purpureus em pacientes dislipidêmicos durante oito semanas, observou-se significativa diminuição do CT em 22,7% e do LDLc em 30,9%. Os pacientes do grupo controle apresentaram redução de 7,0% e 8,3%, respectivamente. Importante resultado também foi encontrado com relação ao significativo aumento do HDLc em 19,9%, em comparação ao grupo controle, que apresentou aumento dessa lipoproteína de 8,4%. Portanto, o uso do RYR associado à dieta adequada trouxe efeito favorável de redução de lipídios nos pacientes hiperlipidêmicos44.

Em uma revisão de literatura, verificou-se que o

uso do extrato do RYR reduziu significativamente os níveis séricos do CT, LDL, triglicerídeos (TG) e, em alguns estudos, também observou-se o aumento do HDLc. Quando comparados em sua eficácia, o RYR e as estatinas apresentaram resultados semelhantes. Esse fitoterápico parece também ser superior ao grupo placebo na prevenção de enfarto do miocárdio, em eventos cardíacos e mortes súbitas45.

Em contrapartida, outro estudo analisou 187 pacientes hipercolesterolêmicos (média de LDLc 154 mg/dL) com história de recusa às estatinas ou quadro de mialgias. Os participantes foram divididos em dois grupos: um grupo recebeu 1.800 mg do extrato de RYR duas vezes por dia, e o outro, placebo durante 12, 24 e 52 semanas. No entanto, não houve melhora significativa do LDLc em 12 (p=0,54), 24 (p=0,67) e 52 (p=0,76) semanas em comparação com o grupo placebo. Portanto, concluiu-se que o uso de RYR não resultou em diminuição adicional dos níveis de LDLc, pois os participantes estavam inseridos em um programa de melhora no estilo de vida, apresentando perda de peso significativa e mais propensos, dessa forma, a alcançar valores de LDLc <100 mg/dL46.

Em uma recente metanálise, foram analisados 13 ensaios clínicos randomizados, controlados por placebo com 804 participantes. A levedura de arroz vermelho apresentou efeitos significativos sobre a redução do CT (0,97 mmol/L, p<0,001), TG (0,23 mmol/L, p<0,001), e LDLc (0,87 mmol/L, p<0,001), mas não houve nenhum efeito significativo sobre o aumento de HDLc (0,08 mmol/L, p=0,11) em comparação com o grupo placebo. Em todos os ensaios não houve efeitos colaterais significativos com o uso do RYR. Essa metanálise sugere que o arroz vermelho fermentado é uma abordagem eficaz e relativamente segura para os quadros de dislipidemias47. No entanto, mais ensaios randomizados controlados a longo prazo e rigorosamente projetados deverão ser realizados antes de o extrato da levedura de arroz vermelho ser recomendado para pacientes com dislipidemia, especialmente como alternativa às estatinas11.

Em contrapartida, outra pesquisa investigou o efeito do extrato de RYR sobre o perfil lipídico,

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administrando-o durante 16 semanas em 100 voluntários com hipercolesterolemia moderada sem tratamento, em estudo randomizado, duplo-cego, controlado por placebo. Os resultados evidenciaram redução do LDLc de 22 mg/dL (14,3%) em comparação com o grupo placebo, bem como do CT, que foi observado durante quatro, 10 e 16 semanas. Concluiu-se que o uso do RYR foi eficaz, principalmente na redução do LDL, em indivíduos com hipercolesterolemia moderada, sem modificar os parâmetros de segurança48. No entanto, em outra pesquisa com delineamento duplo-cego, realizada com 42 pacientes hipercolesterolêmicos, randomizados em dois grupos para receber RYR ou placebo, observou-se que o grupo dos pacientes que receberam o extrato de RYR apresentou significativa redução do CT (15,5%) e do LDLc (23%) em comparação ao grupo placebo42.

Já em uma revisão de literatura, referiu-se discreta redução do CT e do LDLc em pacientes hipercolesterolêmicos que receberam RYR, concluindo-se que o arroz vermelho mostrou-se bem tolerado para essa população, sendo uma alternativa aceitável em pacientes intolerantes a outros medicamentos hipolipemiantes7.

Um estudo randomizado analisou 62 pacientes com dislipidemia e história descontinuada de terapia com estatinas devido a mialgias. Os indivíduos foram divididos em dois grupos aleatoriamente, sendo um grupo com 31 pacientes que usaram 1.800 mg/dia do extrato da levedura do arroz vermelho e outro também formado por 31

pacientes, que receberam placebo duas vezes ao dia durante 24 semanas. Todos os pacientes foram submetidos a um programa de mudança de estilo de vida. No grupo em uso do extrato de arroz, observou-se diminuição do LDLc em 43 mg/dL na semana 12 e de 35 mg/dL na semana 24. Já no grupo placebo, o LDLc diminuiu em 11 mg/dL na semana 12 e em 15 mg/dL na semana 24. No entanto, o número da amostra avaliada apresentou-se pequeno, e o estudo foi considerado de curta duração, porém o uso do extrato da levedura de arroz vermelho associado a mudança de estilo de vida parece ser terapêutico na redução do LDLc, apresentando alternativa satisfatória de tratamento para pacientes com dislipidemias que não toleram a terapia com estatinas49.

Conclusão

Apesar de atualmente existirem estudos sobre a eficácia do uso do RYR, as evidências ainda exigem achados mais consistentes para se comprovar a qualidade do extrato e sua concentração.

Serão necessárias novas investigações a fim de se padronizar a qualidade do extrato de RYR e sua dosagem para promover melhores respostas nos pacientes que são intolerantes às estatinas e que demonstram boa aceitação desse fitoterápico.

Novas pesquisas com maior número de pacientes e de longa duração também serão essenciais para comprovar a eficácia do extrato de RYR.

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