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A FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA: AS LICENCIATURAS Bernardete A. Gatti

Gatti , Importante

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  • A formAo iniciAl de

    professores pArA A educAo

    bsicA: As licenciAturAs

    Bernardete A. Gatti

  • REVISTA USP So PAUlo n. 100 P. 33-46 DEZEMBRo/JAnEIRo/FEVEREIRo 2013-201434

    Dossi Educao

    RESUMO

    Este artigo aborda, com fundamento em pesquisas, a questo da formao inicial de professores para a educao bsica em cursos de graduao. So apresen-tados dados quantitativos sobre as ca-ractersticas desses cursos no Brasil. Evi-dencia-se a pouca procura de algumas formaes e a migrao dessa formao para propostas EAD, sobretudo no setor privado, que responsvel pela maioria das matrculas nesses cursos. Discutem--se anlises qualitativas dos currculos das licenciaturas, as quais mostram a fragmentao entre a formao em rea de conhecimento e a formao em edu-cao e prticas de ensino, estas ofere-cidas de modo insuficiente para formar professores. Abordam-se algumas inicia-tivas governamentais intervenientes no mbito dos estgios curriculares. O pa-norama preocupante dada a insuficin-cia da formao oferecida para subsidiar a atuao de um profissional docente na educao bsica.

    Palavras-chave: formao de professo-res; licenciatura; pedagogia; currculo; EAD.

    ABSTRACT

    Grounded on researches, this paper addres-ses the issue of the initial training provided to undergraduate students for teaching in ele-mentary, middle and high school education. We present quantitative data concerning the characteristics of those courses in Brazil. The results demonstrate low interest in some knowledge areas and the migration of tho-se areas to programs of distance learning, mainly in the private sector, which is res-ponsible for most of university enrollments in those courses. This paper also discusses qualitative analyses of curriculums offered in those programs, which show a gap be-tween the training in the knowledge field and the training in education and teaching practices, which is insufficient for training teachers. It addresses some governmental initiatives regarding academic internships. The scenario is worrisome due to the

    Keywords: teacher training; teaching programs; pedagogy; curriculum; distance learning.

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    no Brasil, pas de escolariza-o tardia, a necessidade de incluir nas redes de ensino as crianas e jovens de segmen-tos sociais que at poucas dcadas atrs no eram aten-didas pela educao bsica colocou grandes desafios, um deles a formao de professo-res. Com a grande expanso das redes de ensino em curto espao de tempo e a amplia-o consequente da necessi-

    dade de docentes, a formao destes no logrou, pelos estudos e avaliaes disponveis, prover o en-sino com profissionais com qualificao adequada. Pesam nessa condio no s a urgncia formativa, mas tambm nossa tradio bacharelesca, que leva a no considerar com o devido valor os aspectos didtico-pedaggicos necessrios ao desempe-nho do trabalho docente com crianas e jovens.

    o crescimento populacional, confrontado com o desenvolvimento e a paz sociais, coloca desafios contundentes s sociedades humanas, e a educa-o, por meio dos professores, certamente tem papel decisivo a desempenhar nesse cenrio o da possibilidade de ajudar na construo de uma civilizao humana de bem-estar para todos. Isso coloca um peso considervel na responsabilidade das instituies formadoras de professores uni-versidades, faculdades ou institutos. no mbito dos movimentos das transformaes societrias atuais, a informao e a comunicao ocupam papel cen-tral na vida diria, no trabalho em geral e na vida

    cientfica. na era da comunicao, nada mais es-sencial do que as capacidades de decodificar e in-terpretar informao, o que permite criao. Essas capacidades, para seu desenvolvimento, dependem da iniciao e do domnio da palavra e da escrita, do domnio cultural de reas diversas de saberes, do desenvolvimento de lgicas e capacidade de relacionar, comparar, distinguir, agregar saberes, o que nos reporta imediatamente educao, em especial aquela que inicia as novas geraes nos conhecimentos que foram sistematizados no de-correr da histria humano-social. A chave para o desenvolvimento pleno das capacidades humanas est nos processos educativos. Quem faz educao, e como, torna-se questo central nesses processos.

    A formao dos professores tem sido um gran-de desafio para as polticas educacionais. Inme-ros pases vm desenvolvendo polticas e aes agressivas na rea educacional cuidando, sobretu-do, dos formadores, ou seja, dos professores, que so os personagens centrais e mais importantes na disseminao do conhecimento e de elementos substanciais da cultura. Da Tailndia Frana, do Chile aos Estados Unidos, Inglaterra, Colmbia, Sucia, Finlndia, nigria, Argentina, Equador, entre tantos outros, medidas vm sendo tomadas nas duas ltimas dcadas no sentido de formar de modo mais consistente professores em todos os n-

    BERNARDETE A. GATTI diretora do Departamento de Pesquisas Educacionais da Fundao Carlos Chagas.

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    veis e de propiciar a esses profissionais carreiras atrativas. Podemos dizer que essa preocupao se tornou mundial. no entanto, quanto formao inicial de professores no ensino superior no Brasil, no tivemos at aqui iniciativa nacional forte o suficiente para adequar o currculo s demandas do ensino, iniciativa que levasse a rever a estrutura dessa formao nas licenciaturas e a sua dinmica, em que pesem algumas resolues do Conselho nacional de Educao a partir do ano 2000. os dados de pesquisa que exporemos abaixo justifi-cariam uma poltica bem diferente para as licen-ciaturas no mbito de seu objetivo, que formar profissionais para o trabalho docente na educao bsica, ou seja, formar professores, o que muito diferente de formar especialistas disciplinares.

    PANORAMA DA FORMAO INICIAL DE PROFESSORES AS LICENCIATURAS

    Quando se tece o panorama sobre a formao dos professores para a educao bsica, atravs de dados de pesquisa disponveis, verificamos que o cenrio geral no muito animador (Gat-ti, Barretto & Andr, 2011; Diniz-Pereira, 2011; libneo, 2010; Gatti & Barretto, 2009; Freitas, 2007). H um acmulo de impasses e problemas historicamente construdos e acumulados na for-mao de professores em nvel superior no Brasil que precisa ser enfrentado. no foco das licenciatu-ras, esse enfrentamento no poder ser feito apenas em nvel de decretos e normas, o que tambm importante, mas processo que deve ser feito tam-bm no cotidiano da vida universitria. Para isso, necessrio poder superar conceitos arraigados e hbitos perpetuados secularmente e ter condies de inovar. Aqui, a criatividade das instituies, dos gestores e professores do ensino superior est sendo desafiada. o desafio no pequeno quando se tem tanto uma cultura acadmica acomodada e num jogo de pequenos poderes, como interesses de mercado de grandes corporaes.

    De um lado, alguns dados da demografia educacional podem sustentar reflexes que per-mitem a tomada de decises para esse cenrio e, de outro, anlises da qualidade dos currculos oferecidos nos cursos de licenciatura podem ser tomadas como ponto de partida para uma reno-vao formativa no que se refere aos profissio-

    nais professores. novos caminhos para a forma-o inicial de docentes ficam na dependncia de atuaes em poltica educacional de modo mais coerente e integrado, e, na condio de executivos e legisladores, de basear-se em pesquisas para a tomada de decises, dentro de uma viso mais ampla de contexto educacional e social. Ficam ainda associados s possibilidades criativas das instituies e pessoas que proveem essa formao.

    Demografia das l icenciaturas

    Conforme os dados apresentados nos resumos tcnicos do Censo da Educao Superior de 2009, 2010 e 2011 disponibilizados pelo MEC/Inep (Bra-sil, 2013a, b e c ltimos dados mais detalhados disponveis), observa-se que a grande maioria dos cursos e das matrculas em licenciaturas est nas instituies privadas de ensino superior, e que o crescimento das matrculas nos cursos que formam professores vem sendo proporcionalmente muito menor do que o crescimento constatado nos de-mais cursos de graduao. no relatrio tcnico de 2011, l-se, na pgina 57, que, em relao a 2010, as matrculas presenciais em 2011, no que se refere s licenciaturas, mostram decrscimo de 0,2% e aumento de 0,8% para licenciatura a distncia, en-quanto os demais cursos de graduao cresceram em torno de 12% (Brasil, 2013c).

    na sequncia temporal 2001-2011 h uma visvel migrao dos cursos de licenciatura para o regime a distncia, o que no ocorre na mesma proporo com outros cursos de graduao. Por exemplo, entre os cursos de bacharelado, 73% eram de oferta presencial em 2011, enquanto ape-nas 17% das licenciaturas assim se caracterizavam. As licenciaturas a distncia oferecidas por institui-es privadas detm 78% das matrculas em cursos de formao de professores. Esse dado notvel, uma vez que, em 2001, havia apenas matrculas em licenciaturas a distncia em instituies p-blicas, e, em 2002, a proporo era de 84% de matriculados em EAD nessas instituies, e 16% nas instituies privadas. A inverso nesses dados, em oito anos, est certamente associada a polticas que favorecem a expanso da EAD nesse segmento de instituies. A reordenao do campo da edu-cao a distncia por parte do poder pblico, a partir de 2005, criou condies para o crescimen-

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    funes diversas e esto procurando alterar sua condio de emprego. Sua provenincia so as escolas pblicas, em maioria. Quanto s conclu-ses nesses cursos, observa-se uma evaso mdia em torno de 80%. Grande parte dos estudos em EAD solitria e demanda proficincia em leitura e interpretao de textos, que contatos virtuais ou tutorias fragilizadas no favorecem. Entram tam-bm as dificuldades com as linguagens de reas especficas, como sociologia, filosofia e cincias. Tambm, nessa modalidade, exigem-se hbitos de estudo que, para os estudantes tardios, j foram esmaecidos, demandando um esforo razovel para sua recuperao. Essas condies so aspec-tos apontados para as desistncias.

    Tambm os estudantes a distncia no so fa-vorecidos com um convvio em cultura acadmica, como o dilogo direto com colegas de sua rea e de outras, com professores no dia a dia, com a partici-pao em movimentos estudantis, debates, e com vivncias diversas que a vida universitria oferece de modo mais intenso. ou seja, ficam os futuros professores carentes de uma socializao cultural no desprezvel. Evidentemente essas caracters-ticas esto associadas forma como as propostas de EAD para a formao de professores se apre-sentam, em sua maioria, no pas. A necessidade de suportes fortes aos estudantes em cursos a dis-tncia requer cuidados especiais, e o custo de um projeto bem formatado, qualificado e consistente alto. A inquietao que vem se revelando entre os educadores diante desse quadro que a insero, nos moldes propostos, de uma modalidade de for-mao docente que oferecida ainda de maneira mais precria que a dos cursos presenciais, em vez de contribuir para a soluo da crise dos processos de formao de professores, poder torn-los mais frgeis e desestabilizar uma larga experincia acu-mulada de formao atravs dessa modalidade, j experimentada no pas em iniciativas pblicas di-versas, por exemplo, nos estados de Mato Grosso, Minas Gerais e So Paulo (Gatti & Barretto, 2009, cap. VI). Essa modalidade, rica em possibilidades, a despeito das crticas que lhe so devidas, requer alternativas que contribuam para fortalec-la e consolid-la. Para tanto, os caminhos atuais tm que ser alterados.

    Essas preocupaes tm fundamento no exame dos dados dos Censos citados. Setenta por cento

    to acelerado do ensino superior nessa modalidade. A equiparao da graduao EAD presencial, a nova legislao para esses cursos e a instituio da Universidade Aberta do Brasil abrem novas perspectivas de expanso da oferta desses cursos (Brasil, 2005; 2006). Mas o monitoramento das condies de oferta, que esto bem definidas nos instrumentos normativos federais (Brasil, 2007), no tem sido realizado com a eficcia necessria (Gatti & Barretto, 2009).

    Por outro lado, h muitos indcios de que a multiplicao de consrcios e polos para a oferta de cursos de licenciatura a distncia ocorre sem que um projeto poltico-pedaggico de formao docente mais adensado no mbito de sua articu-lao nacional e local tenha sido desenvolvido e compartilhado e sem que as estruturas operacio-nais bsicas estejam funcionando adequadamente. A crtica sobre a qualidade dos projetos pedag-gicos desses cursos tambm cabe, como veremos, aos cursos presenciais, mas a questo das estrutu-ras operacionais bsicas, a dos materiais especfi-cos que a EAD requer e a dos ambientes virtuais de aprendizagem que so necessrios reportam a essa modalidade de curso. Barreto (2008), anali-sando o portal da Universidade Aberta do Brasil, evidencia que a arquitetura do programa simples-mente remete ao cumprimento das metas estabe-lecidas no Plano nacional de Educao quanto ao nmero de vagas oferecidas na educao superior, mas a fundamentao pedaggica da proposta no explicitada, limitando-se referncia vaga da metodologia de EAD. Fica-se restrito dimen-so operacional das formulaes. Dourado (2008) lembra que preciso que a centralidade do projeto poltico-pedaggico seja estabelecida e ateno maior seja dada s condies efetivas de ensino--aprendizagem nesses cursos, de forma a romper com a prioridade conferida ao aparato tecnolgico e ao seu uso, subsumidos como responsveis dire-tos pela qualidade do ensino ofertada ou pela sua falta, o que um falso conceito.

    nota-se pelos dados dos Censos, acima refe-ridos, que os alunos de EAD so, em mdia, dez anos mais velhos do que os dos cursos presenciais, o que sinaliza que a formao a distncia nas licen-ciaturas procurada tardiamente pelos segmentos sociais que demandam por esses cursos, os quais, em geral, j se acham no mercado de trabalho em

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    dos cursos de pedagogia so a distncia: a pro-poro para as licenciaturas em matemtica de 61%; em letras, 55%. Verifica-se que entre os con-cluintes, em 2009, j se constatava que 58% dos formados em pedagogia e 45% dos formados em normal superior fizeram seus cursos a distncia. Esses professores trabalharo com crianas em tenra idade e com a alfabetizao, o que exige uma formao delicada, um aprendizado de relaes pessoais, pedaggicas, didticas, de formas de linguagem especficas. A modalidade a distncia no favorece de forma cabal esse tipo de formao, que implica aspectos psicossociais relacionais. o prprio currculo desses cursos emula o dos cursos presenciais, que no oferecem formao suficiente quanto a metodologias de alfabetizao e ao traba-lho na educao infantil, como adiante se ver por dados de pesquisa.

    Temos problemas com a alfabetizao de crian-as no pas, como mostram as avaliaes nacionais e regionais, e como se evidencia pela preocupao do governo federal lanando a poltica de alfabe-tizao na idade certa. No temos coerncia entre a poltica de formao inicial de professores e as necessidades da educao escolar e sua qualidade, especialmente em seus nveis iniciais.

    As demais licenciaturas, que formam os cha-mados professores especialistas, mostram percen-tuais mais baixos de concluintes do que nos cursos de pedagogia. A oferta de cursos de licenciatura nessas reas especficas bem menor. Pode-se pensar que algumas so disciplinas consideradas difceis ou que tm baixa atribuio de aulas, o que afeta a remunerao, e esses fatores deter-minam a baixa demanda para algumas licenciatu-ras. ou, ainda, considerando que a maior parte da oferta de cursos feita pelas instituies privadas, estas no oferecem aquelas licenciaturas que no propiciam cobertura dos custos ou lucratividade. Encontram-se nesse caso licenciaturas como fsica, qumica, biologia, geografia, sociologia, filosofia.

    Fica evidente, pelos relatrios tcnicos dos Censos da Educao Superior do Inep, anterior-mente referidos, que h mudana de modalidade de oferta no s na distribuio dos cursos, mas, tambm, na matrcula dos estudantes: diminuem as matrculas em cursos presenciais e aumentam nos cursos a distncia. A preocupao dos educa-dores e pesquisadores com a EAD no quanto

    modalidade em si, que, como j dissemos, rica em possibilidades, mas quanto forma como ela vem sendo desenvolvida no pas, e quanto sua pertinncia para tipos diferenciados de formao. Cursos a distncia demandam: equipes docen-tes com boa formao na rea e tambm quanto a aspectos especficos do ensino nessa modali-dade; tecnologias sofisticadas e geis; materiais bem produzidos e testados; polos bem instalados; monitores ou tutores bem formados, tanto nos co-nhecimentos de reas como no uso de tecnologias educacionais, apoiados e acompanhados sistemati-camente; sistemas de controle bem delineados com pessoal adequado; avaliao da aprendizagem em formas consistentes, entre outros cuidados. So aspectos nem sempre encontrados na oferta dos cursos EAD no pas. Aspecto frgil, e nevrlgico, que vem sendo apontado em estudos o exerccio da tutoria tal como vem se realizando, tanto do ponto de vista da seleo dos tutores e sua compe-tncia, como do ponto de vista de sua precariedade contratual (Jorge & Antonine, 2011).

    Ainda, comparando os dados relativos ao n-mero de concluintes das licenciaturas, presenciais e a distncia, verifica-se que nos cursos de pedago-gia o nmero de concluintes, em cinco anos, caiu pela metade e, nas demais licenciaturas, em torno de 17%. So perdas que, de um lado, pem em questo o acompanhamento dos cursos formadores de professores pelos rgos responsveis e, de outro, levantam o problema das estruturas insti-tucionais e dos currculos que esses estudantes encontram, ao lado do fator atratividade da car-reira do profissional docente (Gatti et al., 2010).

    Currculos da formao inicial de professores em nvel superior

    no contamos no Brasil, nas instituies de ensino superior, com uma faculdade, centro ou instituto que centralize a formao desses profis-sionais, de modo integrado, com perfil prprio, como observado em outras profisses (engenharia, medicina, direito, etc.) e, tambm, como ocorre em outros pases, onde h unidades ou centros de formao de professores englobando todas as es-pecialidades, com estudos, pesquisas e extenso relativos educao, atividade didtica e s refle-xes e teorias a ela associadas, nos diversos ramos

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    p. 7), ao analisar experincias formativas de do-centes, assinala que as formaes clssicas vol-tadas preparao individual para o trabalho tm se revelado ineficazes, ou seja, a concepo tradicional de formao inicial de profissionais apenas como propedutica, em forma terica dis-sociada de experincias e conhecimentos adqui-ridos pela experincia de trabalho, no responde s necessidades de reconverso profissional que a contemporaneidade coloca. A formao inicial de um profissional, alm da formao acadmica, requer uma permanente mobilizao dos saberes adquiridos em situaes de trabalho, que se cons-tituiro em subsdios para situaes de formao, e dessas para novas situaes de trabalho. Tal como comumente pensada, a formao inicial no inclui referncias s experincias do exerccio profissional e dos sujeitos, quando sua funo seria exatamente a de orientar a aquisio da experin-cia desejvel. Como coloca Silva Jnior (2010, p. 6), os contextos de trabalho se credenciam como ambientes de formao, pelo reconhecimento de seu valor formativo.

    o histrico legal e institucional dos cursos for-madores de professores por mais de um sculo nos permite avaliar a fora de uma tradio e de uma viso sobre um modelo formativo de professores que se petrificou no incio do sculo XX, com ins-pirao na concepo de cincias do sculo XIX, e que mostra dificuldades de inovar-se. o esquema de formao hbrido que se consolidou historica-mente no pas, desde as origens das licenciaturas no incio do sculo passado, postas como adendo dos bacharelados, mostra-se quase impermevel construo de concepes especficas para a formao de professores tendo a educao e seus aspectos fundamentais como eixo curricular b-sico. A questo importante, no entanto, que se oferece nesses cursos apenas um verniz superficial de formao pedaggica e de seus fundamentos que no pode ser considerado como realmente uma formao de profissionais para atuar em escolas na contemporaneidade. observada uma reduo da carga horria til dos cursos de licenciatura voltada a processos formativos profissionais, te-ricos e prticos, de fundamentos e metodologias , reduo que se faz via um conjunto de atividades vagamente descritas nos currculos, como: ativi-dades culturais, estudos independentes, ativida-

    do conhecimento. Pelas pesquisas abaixo citadas, no Brasil, os cursos de licenciatura mostram-se estanques entre si e, tambm, segregam a formao na rea especfica dos conhecimentos pedaggicos, dedicando parte exgua de seu currculo s prticas profissionais docentes, s questes da escola, da didtica e da aprendizagem escolar. Isso denota desconsiderao da Resoluo no 01/2002 do Con-selho nacional de Educao (Brasil, 2002).

    A formao para a prtica da alfabetizao e iniciao matemtica e s cincias naturais e humanas precria, como tambm precria a formao para o trabalho docente nos anos fi-nais do ensino fundamental e no ensino mdio. H quase ausncia nesses cursos de formao em conhecimentos sobre o desenvolvimento cognitivo e socioafetivo de crianas, adolescentes e jovens, suas culturas e motivaes. De modo geral, nas ementas dos currculos das licenciaturas encon-tram-se, nos fundamentos educacionais, proposi-es genricas que passam ao largo de oferecer uma formao mais slida. H muito descompasso entre os projetos pedaggicos desses cursos e a estrutura curricular realmente oferecida. nesta, observa-se claramente a ausncia de integrao formativa na direo de um perfil profissional de professor para atuar na educao bsica (Gatti & nunes, 2009; Gatti et al., 2010a; libneo, 2010; Gatti, 2012; Pimenta & lima, 2007). observe-se que os dados dos estudos nacionais, quanto aos currculos e ementas das disciplinas oferecidas, incorporam instituies pblicas e privadas, pro-porcionalmente.

    Conforme as pesquisas citadas, embora a maio-ria dos projetos pedaggicos dos cursos de licen-ciatura, seja de pedagogia ou de outras reas do conhecimento, coloque um perfil abstrato do pro-fissional a formar, seu campo de trabalho no tra-tado, no sendo, ento, tomado como referncia da estruturao do currculo e das disciplinas. Com isso se constata uma dissonncia entre o exposto nos projetos pedaggicos e o conjunto de discipli-nas oferecidas, e suas ementas. As ideias no se concretizam na formao realmente oferecida, bem como teorias e prticas no se mostram integradas.

    Seria desejvel que o campo de trabalho real de profissionais professores fosse referncia para sua formao, no como constrio, mas como foco de inspirao concreta. Silva Jnior (2010,

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    des complementares, etc. Pode-se perguntar se a formao panormica e fragmentada, reduzida, encontrada nos currculos dessas licenciaturas suficiente para o futuro professor vir a planejar, ministrar, avaliar ou orientar atividades de ensino na educao bsica, lidando adequadamente com os aspectos de desenvolvimento humano de crian-as, adolescentes e jovens, oriundos de contextos diferenciados, com interesses e motivaes hetero-gneos, comportamentos e hbitos diversos. Uma vez que esses alunos no so seres abstratos, mas pessoas que partilham sua constituio com ambi-ncias sociais cada vez mais complexas, o trabalho dos professores demanda uma compreenso mais real sobre eles e sobre a prpria instituio escola, em uma formao que lhes permita lidar com as condies concretas de aprendizagem nas ambin-cias das salas de aula. A constatao das pesquisas referidas de que h uma insuficincia formativa evidente nas licenciaturas para o desenvolvimento desse trabalho.

    Agreguem-se a isso as condies em que os estgios curriculares so realizados. lembramos que o nmero de horas de estgio obrigatrio visa proporcionar aos licenciandos um contato mais aprofundado com as escolas de educao bsica, de forma planejada, orientada e acompanhada de um professor-supervisor de estgio. Embora, em princpio, os estgios constituam espaos privile-giados para a aprendizagem das prticas docentes, no se obtiveram evidncias, nos estudos a que nos referimos, sobre como esses estgios vm sendo de fato realizados, pois os dados referentes a eles padecem de uma srie de imprecises, que prati-camente inviabilizam uma anlise do que acontece realmente nesses espaos de formao a partir ape-nas dos currculos documentados. Apesar disso, as observaes largamente difundidas sobre o fun-cionamento das licenciaturas e estudos especficos publicados nos autorizam a sugerir que a maior parte dos estgios envolve atividades de observa-o, os estudantes procuram por conta prpria as escolas, sem plano de trabalho e sem articulao entre instituio de ensino superior e escolas, e sua superviso acaba tendo um carter mais genrico, ou apenas burocrtico, muitas vezes, em funo do nmero de licenciandos a serem supervisionados por um s docente da instituio de ensino supe-rior. Esses estgios acabam no se constituindo em

    prticas efetivas e fonte de reflexo sobre aes pedaggicas para os estagirios. Sobre a orienta-o e a validao deles, no se encontra, na grande maioria dos casos, referncia clara. os efeitos des-se descaso com os estgios supervisionados pre-cisam ser considerados sob uma perspectiva tica e moral (Fazenda & Piconez, 2005; Silva, 2011; Calderano, 2012; Gatti & nunes, 2009).

    Iniciativas e inovaes nos estgios

    H esforos em outra direo, embora poucos. So raras as referncias encontradas sobre dife-renciais em iniciativas de trabalho com estgios se considerarmos o universo dos cursos de licencia-tura. Tratar de algumas delas pode servir de con-traponto penosa situao encontrada na maioria desses cursos. Em algumas universidades pblicas, presentemente, encontram-se propostas aqui e ali de transformao dos estgios curriculares para a docncia em atividade mais bem planejada e orientada, com perspectivas inovadoras, como se pode observar em alguns relatos de experincias apresentados em eventos cientficos da rea, como, por exemplo, nos anais do X Congresso Estadu-al Paulista de Formao de Professores (Unesp, 2009); do XI Congresso Estadual Paulista de For-mao de Professores e do I Congresso nacional de Formao de Professores (Unesp, 2011); do XVI Endipe Encontro nacional de Didtica e Prti-ca de Ensino (Endipe, 2012). Essas iniciativas so pontuais, encontradas em alguns cursos de uni-versidades pblicas ou comunitrias/filantrpicas, mas no representam forte tendncia no conjunto das licenciaturas ofertadas.

    Questo trazida frequentemente a da invia-bilidade institucional de se desenvolver o estgio supervisionado de modo mais programado e acom-panhado. H, no entanto, testemunhos da viabili-dade de formas planejadas e tambm inovadoras de se realizar esses estgios, por exemplo, entre outros, o trabalho relatado por Manrique (2012), que coordena iniciativa diferenciada de estgio supervisionado com licenciandos em matemtica e fsica, em que planejadamente se estruturam e desenvolvem intervenes pedaggicas em esco-las da rede de ensino pblica. As intervenes so realizadas pelos estagirios a partir de uma inser-o inicial nas salas de aula e discusses com os

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    seus profissionais como alternativa no preparo para sua insero profissional. E, ainda, que ele pode ser eixo da formao de docentes na medida em que se coloque a partir da anlise, da crtica e da proposio de novas maneiras de fazer educao (Pimenta & lima, 2007, p. 44).

    INICIATIVAS INTERVENIENTES

    Alguns programas foram recentemente imple-mentados como poltica que pretende incidir na qualidade da formao inicial de docentes, tais como, em nvel nacional, o Programa Institucional de Bolsa de Iniciao Docncia (Pibid), em nveis estaduais, o Programa Especial de Formao de Professores da Zona Rural (Profir) do estado do Acre, o Programa Bolsa Estgio Formao Do-cente do estado do Esprito Santo, e o programa Bolsa Formao Escola Pblica e Universidade, do estado de So Paulo. o surgimento dessas ini-ciativas, pelos documentos que as fundamentam, deve-se constatao da necessidade de melhor qualificar a formao inicial de professores para a educao bsica e, em ltima instncia, de ajudar na melhor qualidade da educao escolar de crian-as e jovens. So programas sinalizadores de que as licenciaturas no esto oferecendo formao adequada aos futuros docentes.

    o Pibid, criado pelo Decreto no 7.219, de 24 de junho de 2010 (Brasil, 2010), expe claramente que sua finalidade fomentar a iniciao docn-cia e melhor qualific-la, visando melhoria do desempenho da educao bsica. Visando incen-tivar a formao docente em nvel superior para a educao bsica e contribuir para a valorizao do magistrio, tem por objetivos: inserir os licencian-dos no cotidiano das escolas das redes pblicas de ensino, propiciando oportunidades de criao e participao em experincias metodolgicas, tec-nolgicas e prticas docentes de carter inovador e interdisciplinar que busquem a superao de pro-blemas identificados no processo de ensino-apren-dizagem (inciso IV, art. 3o); incentivar as prprias escolas atravs da mobilizao de seus professores, que assumem a funo de coformadores dos licen-ciandos; contribuir para a melhor articulao entre teoria e prtica, elevando a qualidade das aes acadmicas nos cursos de licenciatura (inciso VI, art. 3o). o programa conta hoje com aproxi-

    professores da rede e o orientador de estgio, com a gerao de sequncias didticas em perspectiva interdisciplinar, balizadas por um diagnstico e por avaliao final quanto s aprendizagens, per-mitindo adequar as propostas didticas s condi-es do alunado. o amadurecimento dos licencian-dos quanto s realidades escolares e s atividades docentes muito satisfatrio, sendo um processo interessante de conscientizao. outra proposta--exemplo, a de Mercado e Mercado (2012), vale ser citada, mostrando que mudar as condies dos estgios supervisionados possvel quando h in-vestimento profissional no ensino superior nessa direo. Esses autores propem e realizam um projeto de estgio para estudantes de pedagogia baseando-se em uma orientao pedaggica que toma por base a construo de blogs para comu-nicar, explicitar, supervisionar e orientar aes de estagirios nas escolas, no imediato das aes, com fundamento na perspectiva da problematiza-o como eixo para reflexo das prticas. Como os autores explicam em seu texto, ao utilizarem o blog como ferramenta pedaggica e investigarem as suas possibilidades educacionais no coletivo de professores da universidade e dos estagirios , houve um intenso repensar no s das prticas pe-daggicas, mas tambm da construo-reconstru-o do prprio processo de ensino-aprendizagem.

    no vamos nos estender em outros relatos sobre essas iniciativas. Apenas sinalizamos que elas mostram, pelas anlises trazidas, a neces-sidade de repensar e redirecionar os estgios curriculares na formao de professores, e que h viabilidade para tanto. Isso demanda, sem dvida, um investimento profissional por parte dos docentes das instituies de ensino superior, mas demanda tambm um esforo das prprias instituies para criar condies para a concreti-zao desses projetos. Para as instituies priva-das, essa renovao significa tambm custos que devem se propor a assumir. na EAD a questo mais crucial e necessita cuidados especficos.

    no trivial a proposio, realizao e super-viso de estgios curriculares qualificados. lem-bramos, ento, com Pimenta e lima (2004, p. 43) que, ao [] estgio dos cursos de formao de professores, compete possibilitar que os futuros professores compreendam a complexidade das prticas institucionais e das aes praticadas por

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    madamente 50 mil bolsistas, entre licenciandos, professores coordenadores de rea, professores supervisores (coformadores) e coordenadores ins-titucionais. As instituies pblicas e comunitrias de ensino superior, a quem o programa se destina, devem fazer suas propostas configurando plano de aes, dentro dos objetivos do Pibid, ao MEC, nos prazos anualmente estipulados em edital, devendo os licenciandos bolsistas exercer atividades peda-ggicas em escolas pblicas de educao bsica. Configura-se como um programa de fomento. Es-tudos tm mostrado vrios efeitos positivos desse programa (Andr, 2012; Bergamaschi & Almeida, 2013; Fetzner & Souza, 2012).

    o estado do Acre desenvolveu programa pr-prio de formao de professores o Programa Es-pecial de Formao de Professores da Zona Rural (Profir) que visa atuar, de modo dinmico e atua-lizado, diretamente na formao inicial de profes-sores. Ele realizado por parceria do governo do Estado com a Universidade Federal do Acre e as prefeituras municipais, com currculo desenhado especialmente para atender s situaes contex-tuais e de ensino em vrias regies do estado, configurando-se dentro dos objetivos e polticas da rede de ensino estadual do Acre (Silva, 2013).

    os dois outros programas estaduais acima ci-tados visam ao aperfeioamento dos estgios nos cursos de licenciaturas, em funo de diagnsticos que evidenciam grandes problemas nesse compo-nente curricular na formao inicial de profes-sores. no estado do Esprito Santo, o Programa Bolsa Estgio Formao Docente destinado a estudantes de cursos de licenciatura em estabele-cimentos pblicos estaduais de ensino. Foi insti-tudo pelo Decreto no 2.563-R, de 11 de agosto de 2010 (Governo do Estado do Esprito Santo, 2010). o programa tem o objetivo de contribuir para a formao profissional dos futuros professo-res, estreitando as relaes entre teoria e prtica, de modo a associar o conhecimento do contedo com os conhecimentos didticos e metodolgicos necessrios educao bsica (art. 3o). o governo do estado de So Paulo, atravs de sua Secretaria Estadual de Educao (SEE), criou o programa Bolsa Formao Escola Pblica e Universidade, mais conhecido como Bolsa Alfabetizao, atravs do Decreto no 51.627, de 1o de maro de 2007 (Go-verno do Estado de So Paulo, 2007). um pro-

    grama de bolsas destinado a estudantes dos cursos de licenciatura que, sob superviso de professores universitrios, devem atuar nas classes e no horrio de aula da rede estadual de ensino ou em projetos de recuperao e apoio aprendizagem. Seus obje-tivos principais so: possibilitar que as escolas p-blicas da rede estadual de ensino constituam-se em campi de pesquisa e desenvolvimento profissional para futuros docentes; propiciar a integrao entre os saberes desenvolvidos nas instituies de ensino superior e o perfil profissional necessrio ao aten-dimento qualificado dos alunos da rede estadual de ensino; permitir que os educadores da rede pblica estadual, em colaborao com os alunos/pesquisa-dores das instituies de ensino superior, desen-volvam aes que contribuam para a melhoria da qualidade de ensino (art. 2o, incisos I a III). A atua-o desse programa na esfera da alfabetizao, comportando licenciandos em pedagogia e letras.

    Essas iniciativas com atuao focalizada na formao inicial de professores sinalizam os des-confortos por parte de rgos governamentais com a dinmica e os resultados das formaes ofereci-das nas licenciaturas. Reverter um quadro de for-mao inadequada de professores no processo para um dia ou alguns meses. no se faz milagre com a formao humana mesmo com toda a tecno-logia disponvel. no d para implantar um chip de sabedoria no homem. Esta tem que ser desenvolvi-da em longo processo de maturao, como longo nosso processo de crescimento fsico-fisiolgico.

    CONSIDERAES FINAIS

    o debate sobre toda essa situao na forma-o inicial de professores para a educao bsica tem mobilizado os profissionais da educao, bem como os gestores estaduais e municipais que res-pondem diretamente pelas escolas. o que se neces-sita , a partir da situao mapeada, do conjunto de ideias e ideais postulados, criar condies concre-tas para um novo tipo de formao inicial, no en-sino superior, para a docncia na educao bsica. H necessidade de melhor estruturar, qualificar e avaliar o trabalho desenvolvido nas licenciaturas, na formao inicial de docentes para a educao bsica. tarefa de ontem, mas ousar mudar de fato no uma questo simples nos contextos de nossas instituies e das normatizaes. os inte-

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    resses so diversos e, sem uma poltica nacional firme, com foco na qualidade formativa de no-vos professores, continuamos patinando quanto a possibilidades de uma renovao educacional necessria ao pas e seus cidados. Expandiu-se o atendimento educacional numericamente, mas no se est garantindo uma formao adequada para as novas geraes, mesmo com os grandes investimentos em reformas educacionais, curricu-lares e em tecnologias, etc. Educao se concretiza com pessoas nas relaes de, em tese, algum que sabe mais, e que sabe comunicar-se com al-gum que quer aprender. Reformas ou inovaes na educao escolar bsica no ganham flego, no se realizam, sem a participao qualificada de professores. Avaliaes sistmicas, por si, no mudam o desempenho dos estudantes. Elas podem informar. Mas o que favorece aprendizagens mais ricas o trabalho educacional qualificado dentro de cada escola, em cada sala de aula. Observa-se nos estudos citados neste artigo que as Diretrizes Curriculares nacionais (DCns) para as diferentes licenciaturas no tm sido suficientes para criar uma nova ordenao curricular para o conjunto dos cursos, seja nas instituies pblicas, seja nas privadas. Muitas das disposies dessas diretrizes no so observadas nos currculos, como mostram as pesquisas, por exemplo, no que respeita s horas

    a serem dedicadas s prticas de ensino. Mas h um outro lado: algumas dessas DCns ainda no deixam claras as orientaes formativas dirigidas a um perfil de professor, mostrando muito mais nfase nos conhecimentos disciplinares de rea de conhecimento especfica e no com vistas forma-o de educadores (Gatti, 2012; Gatti et al., 2010a).

    os professores desenvolvem sua condio de profissionais tanto pela sua formao bsica na graduao, como por suas experincias com a pr-tica docente, iniciada na graduao e concretizada no trabalho das redes de ensino. Mas preciso ressaltar que esse desenvolvimento profissional parece, nos tempos atuais, configurar-se com condies que vo alm das competncias ope-rativas e tcnicas associadas ao seu trabalho no ensino, tornando-se uma integrao de modos de agir e pensar, implicando um saber que inclui a mobilizao no s de conhecimentos e mtodos de trabalho, como tambm de intenes, valores individuais e grupais, da cultura da escola; inclui confrontar ideias, crenas, prticas, rotinas, obje-tivos e papis, no contexto do agir cotidiano, com as crianas e jovens, com os colegas, com os ges-tores, na busca de melhor formar os alunos, e a si mesmos. Aprendizagens iniciais, bsicas, para a concretizao dessa configurao deveriam ser propiciadas pelas licenciaturas, em sua graduao.

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