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MARCO ZERO Jornal-laboratório do Curso de Jornalismo da Facinter • Ano I • Número 1 • Curitiba, dezembro de 2009 Como Maria Bueno virou um mito O túmulo de Maria Bueno é o mais visitado do Cemitério Municipal. Conheça esta história que permanece no imaginário do curitibano. Página 6 E o circo pegou fogo Liamir Hauer, autora dos livros O circo pegou fogo e Rescaldo, conta em entrevista sobre os seus personagens e o que mudou na cidade nos últimos tempos. Página 3 Onde Curitiba começou Apesar de estar na região onde se iniciou oficialmente a cidade de Curitiba, o marco zero é praticamente desconhecido dos habitantes da capital. Página 7 LENDAS URBANAS PERFIL SEBOS Um mundo a ser descoberto Páginas 4 e 5 Claudia Bilobran

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Curitiba, dezembro de 2009 MARCO ZERO

MARCO ZEROJornal-laboratório do Curso de Jornalismo da Facinter • Ano I • Número 1 • Curitiba, dezembro de 2009

Como Maria Buenovirou um mito

O túmulo de Maria Bueno é o mais visitado do Cemitério Municipal. Conheça esta história que permanece no imaginário do curitibano.

Página 6

E o circo pegou fogoLiamir Hauer, autora dos livros O circo pegou fogo e Rescaldo, conta em entrevista sobre os seus personagens e o que mudou na cidade nos últimos tempos.

Página 3

Onde Curitiba começou Apesar de estar na região onde se iniciou oficialmente a cidade de Curitiba, o marco zero é praticamente desconhecido dos habitantes da capital.

Página 7

LENDAS URBANAS

PERFIL

SEBOS

Um mundo a ser descoberto

Páginas 4 e 5

Claudia Bilobran

Page 2: Jornal Marco Zero 1

MARCO ZERO Curitiba, dezembro de 20092

EDITORIAL BOCA NO TROMBONE

Em meio aos filmes arrasa-quarteirões de origem nacional, alguns têm insistido em temáticas fortes, sendo ambientados em morros e favelas e apresentando a violência e o tráfico de drogas entre algumas situações barras-pesadas que suas personagens têm de suportar para sobreviver. Cidade de Deus (2002) e Tropa de elite (2007) são alguns exemplos. Cada uma à sua maneira, essas obras contam histórias pesadas, baseadas em aspectos da realidade brasileira que estão sempre presentes nos noticiários – combates entre traficantes e policiais, crime organizado e situações que se deterioram a cada década. Um documentário que não é tão conhecido e não deve ser esquecido é Notícias de uma guerra particular, dirigido por João Moreira Salles e Kátia Lund.

Filmado no Morro Dona Marta, no Rio de Janeiro, entre 1998 e 1999, Notícias de uma guerra particular aborda este mesmo assunto: como é a vida nos morros, quais os problemas que seus habitantes enfrentam, e quão complicada é essa situação. Porém, existem diferenças significativas nesse documentário que merecem ser destacadas. Em vez de uma construção em que se vêem os fatos pela ótica de apenas uma personagem, nessa obra são mostradas várias perspectivas: a do morador, a do policial e a do traficante, o que transmite uma visão muito mais realista dos acontecimentos.

Ao mesmo tempo em que busca uma forma de sobreviver, o traficante diz que “não quer machucar ninguém”. A impressão que se tem é que no seu modo de ver a atividade é como outra qualquer, com seus riscos e ganhos – mas muito maiores do que uma profissão regularizada. Ele faz o “serviço” – e é cobrado por isso –, mas se tiver que tirar a vida de um policial, é o que vai fazer. Entradas e fugas da prisão são comuns, e pessoas são iniciadas no tráfico desde crianças. Em entrevista com Leandro, de 14 anos, ele responde que só fez até a 3ª série, mas sabe o nome de várias armas usadas no “serviço”. Em outra cena, um jovem diz

que já assaltou e já assassinou. Quando a equipe do documentário pergunta se ele já matou um policial, ele responde: “Ainda não tive essa oportunidade”. Nota-se o que a vida no meio dessa guerra reserva para os mais jovens: nenhum estudo, nem futuro, apenas violência gerando violência para sobreviver.

“Estou participando de uma guerra (...) mas volto para casa todo dia”, afirma o capitão Pimentel. Quando está equipado, é como se fosse invencível. Na guerra entre policial e traficante, não existe necessariamente um vencedor. Apenas quem fica vivo – para no dia seguinte encarar o combate de novo. É uma luta injusta, pois os oponentes estão com arsenal bélico mais potente que os policiais. De acordo com o capitão Pimentel, a família já nem pergunta mais como foi o dia.

No meio desse fogo cruzado, está o morador do morro. Sem opção, acaba encontrando no tráfico alguém que o ajuda. Quando precisa de um remédio para o filho ou alguma outra coisa, a moradora recorre ao traficante, não a entidades assistencialistas. De certa forma, quem acaba ajudando a “comunidade” do morro é o bandido, pois o povo do tráfico faz “tudo que o governo não faz”, como respondem os presos aos berros. Se falharem com o pessoal que faz algo por eles, não quer dizer que estejam seguros pela proteção oficial, pois a polícia também representa uma ameaça. Uma moradora afirma: “quando o policial sobe no morro, vai preparado para agredir”.

Enfim, Notícias de uma guerra particular é um documentário tão forte que pode chocar alguns espectadores, tamanho o caos da situação. Como citado anteriormente, o filme foi rodado em 1998-99. Considerando-se a história contada por traficantes, policiais e moradores, cabe a quem assiste imaginar o desenvolvimento desse círculo vicioso. A obra oferece uma visão assustadora, mas extremamente realista do que poderia ser chamado um mundo à parte – mas está no Brasil.

Notícias de umaguerra particularCom este primeiro número, estamos

lançando o Marco Zero, jornal-labora-tório do curso de Comunicação Social com habilitação em Jornalismo da Faculdade Internacional de Curitiba (Facinter).

Se “educação de qualidade é a maior atração do centro da cidade”, como reza o slogan do Grupo Uninter, ressaltando a localização privilegiada de várias unida-des do Grupo, o Marco Zero pretende fazer com que a informação de qualidade sobre o centro de Curitiba também seja uma atração para seus leitores.

Como jornal-laboratório, o Marco Zero será um espaço para a práti-ca dos estudantes e, portanto, sujeito a lacunas e falhas eventuais, normais nesse tipo de veículo, mas também às experimentações portadoras de novida-des, sempre bem-vindas na formação de futuros jornalistas.

As pautas envolvem a região central de Curitiba e buscam revelar informa-ções, curiosidades, personagens e fatos menos conhecidos dessa área da capital paranaense.

O Marco Zero mantém um canal aberto com seu público-alvo – gente que trabalha, mora ou transita pela área central de Curitiba – e acolherá críticas, comentários ou sugestões dos leitores. O contato pode ser feito pelo e-mail: [email protected] ou pelos telefones 2102-7953 e 2102-7954. Boa leitura!

Aos leitores

“Eu tiraria o trânsito do centro e deixaria somente nas proximidades”. Simone Lima

“Eu colocaria mais policiais no centro, melhoraria a segurança, principalmente no Largo da Ordem”.Guilherme Pereira

“Eu gosto do Centro, não mudaria nada”.Rafael Gonçalves Cordeiro

“Eu fecharia algumas ruas, deixaria abertas somente para transporte público”. Flávio Manfré

“Não mudaria nada, tá bom como tá!”Camila Oliveira

“Eu limparia os orelhões, tiraria esses papéis horríveis que ficam colados neles e tiraria a Guarda Municipal”.Fernanda Lima

“Eu colocaria teto na XV”.Jonas Milan

“Faria rodízio de veículos pelo final da placa, pararia um dia os de final par e no outro os ímpares”.Daylon Henrique

“Se fosse possível, eu mudaria as pessoas, aumentaria o policiamento, pegaria todos os usuários de drogas e os traficantes e internaria para tratamento”. Juliane Corominas

“Não mudaria nada”!Erivaldo Felipe

O que você mudaria nocentro de Curitiba?

RESENHA

Walter Voigt Bach

O jornal-laboratório Marco Zero é uma publicação do Curso de Jornalismo da Facinter

Coordenadordo Curso de Comunicação Social: Gustavo Lopes

Professores responsáveis: Roberto Nicolato e Tomás Barreiros

Redação: Regiane Silva, Letícia Le-mos, Walter Voigt Bach, Cláudia Bi-lobran, Larissa Glass, Mariana Lima, Vanusa Pereira da Silva

Concepção gráfica: Professor Roberto Nicolato

Facinter: Rua do Rosário, 147 CEP 80020-110 Curitiba-PR

Expediente

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Curitiba, dezembro de 2009 MARCO ZERO

Nascida em Curitiba, em 9 de março de 1923, a escritora Liamir dos Santos Hauer

mudou-se para Paranaguá aos cinco anos de idade, juntamente com seus pais, os professores Pompilia Lopes dos Santos e Dario Nogueira dos Santos, que foram nomeados para le-cionar na Escola Normal Dr. Caeta-no Munhoz da Rocha, no litoral.

Liamir estudou em Paranaguá do Jardim de Infância até os 15 anos, quando se casou com o seu professor e diretor do Ginásio, Ernani Santiago de Oliveira, com quem teve dois fi-lhos, Ernani Filho e Leilah.

Após o casamento, Liamir vol-tou para a capital e, na década de 50, ao lado de seu marido, então prefeito de Curitiba, dedicou-se a diferentes atividades sociais e políticas, como convinha a uma primeira-dama.

Passado esse período, Liamir foi classificada em concurso para o car-go de escriturária do quadro de ser-viços públicos do Paraná e começou a trabalhar na Biblioteca Pública e, posteriormente, na Escola de Músi-ca e Belas Artes do Paraná. Em 1977, desenvolveu o gosto pela literatura e dedicou-se inteiramente a ela, tendo hoje cinco livros publicados (O circo, O circo pegou fogo, Do trapézio para o mun-do, Pra lá de Marrakech e Rescaldo).

Hoje, a biografia dessa notável mulher está sendo escrita pelo poeta e vice-presidente do Centro de Letras do Paraná, Paulo Walback, sob o titulo Mulher Araucária, Frente-Verso e Rever-so. Por que mulher araucária? Mulher Araucária por sua fibra e grandeza, afinal, trata-se de é uma árvore impo-ente, que não se curva ao tempo.

A seguir, a escritora fala sobre sua obra e a cidade de Curitiba.

A senhora escreveu um livro auto-biográfico, O Circo, em 1977. Qual o assunto abordado nele?

Nesse livro, falo de minha vida, do tempo que vivi em Paranaguá, de como foi bom. Ele é dedicado a meu irmão, Dario, companheiro de uma feliz infância, cuja perda havia sido recente. Escrever esse livro me aju-

dou a sair de uma depressão.O que levou à escolha de O Circo para título de seu primeiro livro?

Eu não poderia deixar de falar no meu livro sobre o circo que montamos no quintal da chácara onde moráva-mos, em Paranaguá, com a colabora-ção da criançada. Foi ele que inspirou o titulo do meu livro.

Como foi montar esse circo em seu quintal?

A principio, tivemos que limpar o quintal, carpir, rastelar. Escolhe-mos essa área pelos bons galhos de goiabeira que tinha no local, essas árvores muito resistentes cujos ga-lhos, mesmo os mais finos, podem ser dobrados até o chão sem lascar ou quebrar. Esses galhos foram usa-dos de trapézio e de corda bamba. Usamos até os lençóis de minha mãe para construí-lo.

Quais as lembranças que esse cir-co lhe traz?

Principalmente de meu irmão, que foi quem me ajudou a construí-lo. Não só ele, outras pessoas também ajudaram, mas me lembra dele em es-pecial. Me lembro de nossas traves-suras, da dificuldade para construí-lo, de como foi difícil carregar para casa os sacos de serragem que buscáva-mos cheios na casa de um amigo.

O circo tinha bilheteria?Sim, graças a nossa imaginação.

Improvisamos com a tampa de uma privada aposentada amarrada entre as árvores. Quando o circo estava aber-to, deixávamos a tampa levantada, e quando estava abaixado era porque estava fechado. Vendíamos entradas, que deviam custar 50 réis. Em cima da tampa tinha uma frase que dizia: Grande Circo Mirim!

O seu livro O Circo pegou fogo fala dos escândalos de Curitiba. O que a se-nhora acha que mudou na cidade de Curitiba de ontem para a de hoje?

Mudou barbaridade! Esses dias, fiquei por um tempo sentada na Rua XV e fiquei boba com as coisas que vi. Meninas com a barriga de fora naquele frio, mulheres grávidas com aqueles pircengs no umbigo... O que aconteceu em Curitiba não é evolu-ção, é um retrocesso.

Quais os escândalos de que a se-nhora fala em seu livro?

Conto várias histórias, escân-dalos que aconteceram em Curitiba, só que uso nomes fictícios para não mexer com a imagem dessas pessoas. Mas quem conhece a história sabe de quem eu estou falando.

Todas as mudanças na cidade fo-ram para pior ou há características boas que foram mantidas?

Para mim, as mudanças foram para pior. Na verdade, as característi-cas boas da cidade foram mantidas, o que mudou foi a índole das pessoas.

Depois de seu primeiro livro, a se-nhora deixou de lado seu trabalho como escriturária e se dedicou so-mente à literatura?

Na realidade, não deixei. Eu já es-tava aposentada, mas nem minhas ami-gas acreditaram que eu ia me dedicar a escrever... Não que elas achassem que eu não tinha capacidade – elas sabiam que eu escreveria até uma enciclopé-dia se fosse preciso –, mas, por eu ser elétrica, elas não acreditavam que eu ia conseguir parar para escrever. Mas eu me sentei durante cinco anos e me de-diquei somente a meu livro.

Depois de sua dedicação à literatura, às pessoas e à vida, qual é a sua maior recompensa?

Minha vida é uma recompensa! Tudo o que fiz, o reconhecimento das pessoas pelas coisas de valor, minha liberdade... Meu terceiro casamento, com Arnaldo Hauer, foi uma recompensa, assim como minha enteada, Ossy Hauer, que mora comigo e é minha fiel companheira. Ela foi a grande herança que Arnaldo me deixou.

PERFIL

“Esses dias, fiquei por um tempo sentada na Rua XV e fiquei boba com as coisas que vi. Meninas com a barriga de fora naquele frio, mulheres grávidas com aqueles pircengs no umbigo...”

“Nessa época já havia punguistas aproveitadores da confusão para furtar nesses locais. Geralmente agiam em dupla: um pivete apalpava a nádega das mulheres e, enquanto elas largavam a alça da bolsa para se defenderem, o outro a esvaziava num zás. Depois dessa, não descuidei mais da minha bolsa, poderiam apalpar meu bumbum à vontade...”

Trecho do livro Do trapézio para o mundo

Regiane Silva

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“O que aconteceu com Curitibanão é evolução, é retrocesso”

Claudia Bilobran

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MARCO ZERO Curitiba, dezembro de 2009

DO ANTIGO AO CONTEMPORÂNEO

Num sebo, pode-se encon-trar edições fora de circulação, livros raros, discos em vinil e até lançamentos usados a pre-ços baixos, entre outras coisas interessantes.

Devido à diversidade de pro-dutos, os sebos atraem diferen-tes grupos de pessoas, como o colecionador como José Albano Fernandes Luiz, de Paranaguá, que sempre que possível vem a Curitiba e roda os sebos da ci-dade atrás de vinis e LPs para completar sua coleção de rock das décadas de 60 e 70.

José Albano começou a co-lecionar discos aos 14 anos de idade e devido à mudança com o casamento acabou perdendo boa parte de sua coleção, que foi encontrar quase 30 anos mais tarde.

Apaixonado por vinil, ele e sua esposa mantêm um toca-discos na cozinha, onde es-cutam juntos os embalos da Jovem Guarda e dos Beatles, banda da qual ele possui qua-se todos os discos.

Hoje, é possível encontrar di-versos sebos na cidade. Alguns são mais populares, e seu foco são livros atuais e revistas. Há também os mais tradicionais, que mantêm oferecem peças mais raras, como é o caso do Sebo Ar-cádia, no centro da cidade. O esta-belecimento conta com uma vasta opção, sendo possível encontrar desde os livros mais procurados a algumas peças raras.

Para o proprietário João Nei de Almeida Barbosa, que trabalha há 12 anos no ramo, ter livros raros é um atrativo maior e acaba fazendo parte de um acervo. Se for pensar na parte financeira, não rendem muito dinheiro, pois a procura por essas peças é bem menor.

Andar pelos os corredores de uma loja de sebo é contemplar o passado junto com o presente. Dos clássicos ao contemporâneo, do brega ao cult, do trash ao intelectual. Pelos corredo-res, muitas vezes estreitos, dessas lojas, instaladas principalmente no centro de Curitiba, pode-se observar nas prate-leiras altas uma infinidade de títulos de livros para todas as áreas e gostos, au-tores e temas diferenciados.

“A leitura é um hábito viciante para quem gosta”, diz Cristiane Mar-ques, 26 anos, frequentadora de sebos há seis anos. É uma sensação indes-critível poder abrir um livro e sentir o

Geralmente, são colecionado-res que as procuram. A internet tem facilitado bastante o acesso. Os materiais vendidos no sebo são adquiridos de outros sebos que estão fechando ou de clientes que querem trocar ou vender seus produtos usados.

Em seu acervo, a Arcádia conta com alguns livros autografados, como alguns de Juscelino Ku-bitschek, Clarice Lispector e as primeiras edições de Raquel de Queiroz, além dos importados, como uma obra de 1899, de Rai-ner Maria Rilke (Canção de amor e morte do Alferes Cristovão Ri-lke) em alemão. Este livro foi es-crito em uma noite e foi o livro que tornou conhecido o autor.

João Nei e sua esposa Adriana Chaiarelli, que também trabalha com ele, possuem uma coleção particular – ele na área de artes plásticas, e ela, de música.

cheiro de um objeto velho e imaginar quais as pessoas que o leram, quais as mãos que o tocaram, e porque está es-crita aquela dedicatória a tal pessoa e o telefone anotado.

Os sebos vendem histórias nos livros “ensebados” pelas velas do passado e fazem a história do com-portamento atual. Em Curitiba, exis-tem mais de 30 sebos espalhados pela cidade, onde podem ser encontrados não apenas livros usados e raridades, mas também livros atuais, novinhos em folha.

Eles estão localizados em regiões centrais, bairros antigos, centros his-tóricos e até feiras ao ar livre, como por exemplo aos domingos no Lar-

Em buscade raridades

SEBOS

Mariana Lima

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Mariana Lima

Os discos de vinil, como a trilha do Festival de Woodstock, ainda são muito procurados nos sebos de Curitiba

Em Curitiba, existem mais de 30 sebos, onde se pode encontrar de tudo: de livros e CDs antigos até uma variedade de produtos inimagináveis

Larissa Glass

Albano: “Venho a Curitiba completar minha coleção de rock dos anos 70”

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Curitiba, dezembro de 2009 MARCO ZERO

DO ANTIGO AO CONTEMPORÂNEO

Os sebos surgiram no século XVI, na Europa, quando os mer-cadores começaram a vender a pesquisadores papiros e docu-mentos importantes da época.

Segundo o historiador Leo-nardo Dantas Silva, esses masca-tes eram chamados de alfarrabis-tas (alfarrábio significa livro velho e raro), nome que os acompanha até hoje em países como a Fran-ça e a Bélgica, onde essa ativida-de é considerada essencial para historiadores e pesquisadores.

go da Ordem. Embora o que esteja à venda sejam, principalmente, objetos usados, muitos proprietários de sebos têm-se utilizado de ferramentas mo-dernas para divulgar seus produtos, seja por meio de lojas virtuais ou da “cibercultura”, com a troca de infor-mações entre comunidades do Orkut. Nestas pode-se encontrar a história do dono de uma loja e comprar pela a internet produtos ou descobrir que um livro lido em Curitiba está sendo folheado em Maceió por outra pessoa de uma de cultura e clima diferentes.

O mais antigoO sebo mais antigo de Curitiba,

a “Feira dos Livros Usados”, existe há 65 anos e atualmente fica no centro,

na Rua Emiliano Perneta, 325. Há 55 anos, é administrado por Irajá Souza Reis. Ele conta que desde os dez anos de idade acompanha a rotina do negócio de seu pai, o fundador, Claudio Luis Reis.

Irajá lembra que entre os fre-quentadores do sebo que fazem parte da história da cidade, estão Dalton Trevisan, Jaime Lernner, Rocha Pombo e o próprio Emilia-no Perneta.

O sebo Feira de Livros Usa-dos foi fundado em 1942 com o nome de “Agência Atômica”, numa referência à bomba atômi-ca, e ficava na Praça Osório. De-pois foi para a Rua Desembarga-dor Westhephalen, com o nome de “Ao desaperto”, por causa do pós-guerra. “Alguns comerciantes vendiam livros para desapertar”, conta Reis. Depois, foi para a Rua Voluntários da Pátria e em segi-da se estabilizou na Rua Emilia-no Perneta. Reis diz que no sebo os livros mais procurados são os clássicos da literatura brasileira, como Machado de Assis e José de Alencar.

Hoje, não é difícil encontrar em Curitiba colecionadores de música, amantes da velha vitrola, que saem em busca daquele vinil raro de certo cantor ou banda. Procuram desde Beatles e Pink Floyd a Guilherme Arantes, Pe-peu Gomes, Secos & Molhados e Roberto Carlos. Os colecionado-res de CDs, DVDs, gibis, revistas e VHS também encontram nesses locais o seu espaço.

Estudantes e apreciadores de arte procuram filmes, gravu-ras, quadros, camisetas de bandas, vitrolas e peças antigas para cole-ção, como miniaturas de desenhos animados antigos e manequins. Nessa mistura, é possível deparar-se com uma máquina de costura de ferro ao lado de mestre Yoda, de Guera nas Estrelas, junto com Bart Simpson e a camiseta da ban-da Kiss. Os sebos trazem de volta o passado, num complemento ao presente fragmentado. Para todos estilos e gostos.

A origem dos sebosO nome sebo vem do tempo

em que não havia energia elé-trica, e as pessoas liam à luz de velas, sujando e engordurando os livros. O contato com as velas deixava o livro todo engordura-do, ensebado, o que originou a expressão sebo para o comércio de livros usados.

Os primeiros sebos no Brasil foram montados por intelectuais no Rio de Janeiro, no final do sé-culo XIX, e logo se espalharam pelo território nacional.

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Não é novidade para os apre-ciadores de uma boa leitura que os grandes livros estão nos sebos, lojas que só vendem livros antigos, obras raras, discos de vinil e coisas desse gênero.

As livrarias modernas, que contam com ciber-cafés, computadores de última geração e livros novinhos em folha, além de oferecer um preço não muito camarada, muitas vezes não possuem um acervo tão rico e cul-turalmente interessante quanto um sebo.

Todo sebo tem seu charme, seja pela música de fundo, pela decora-ção ou por aquele cheiro de papel antigo, amarelado e cheio de histó-rias para contar.

Há aproximadamente uma déca-da, era difícil adquirir uma obra lite-rária rara, ou um livro técnico muito importante para o universitário. Po-rém, nos dias atuais, com a ajuda da internet e com a inclusão digital, tudo ficou mais fácil, pois os sebos tam-bém aderiram à era digital.

Veja algumas dicas de sites de se-bos virtuais:

http://www.estantevirtual.com.brhttp://www.traca.com.brhttp://www.sebol.com.brhttp://www.sebosonline.comhttp://www.reler.com.brhttp://www.tabernalivraria.com.brhttp://www.espacodolivro.com.brhttp://www.sebopapirus.com.brhttp://www.livrariacultura.com.br

Uma viagempelo tempoClaudia Bilobran

DICAS DE SITES

Os discos de vinil, como a trilha do Festival de Woodstock, ainda são muito procurados nos sebos de Curitiba

Em Curitiba, existem mais de 30 sebos, onde se pode encontrar de tudo: de livros e CDs antigos até uma variedade de produtos inimagináveis

Claudia Bilobran

Mariana Lima

“Dos diversos instrumentos utilizados pelo homem, o mais espetacular é, sem dúvida, o livro. Os demais são extensões de seu próprio corpo. O microscópio, o telescópio são extensões de sua visão; o telefone é a extensão de sua voz; em seguida, temos o arado e a espada, extensões de seu braço. O livro, porém, é outra coisa: o livro é uma extensão da memória e da imaginação.”

Jorge Luis Borges

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MARCO ZERO Curitiba, dezembro de 2009

Maria da Conceição Bueno, conhecida popularmente como Maria Bueno, nasceu no dia 8 de dezembro de 1854, dia de Nossa Senhora da Conceição, daí o nome Maria da Conceição. Sua história é envolta em mistérios desde o seu nascimento. Conta-se que, quando grávida, sua mãe, Júlia, teve a vi-são de uma santa que dizia que seu bebê seria uma menina com uma missão muito importante.

Mas, diferentemente da tradi-cional vida de santa, Maria Bueno veio jovem para Curitiba e, contra-riando os costumes da época, fre-quentava bailes e festas, circulando pela cidade. Teve vários envolvi-mentos sentimentais, despertando paixão num soldado do Exército, Ignácio José Diniz, com quem vi-veu sem se casar legalmente

A morteSão muitas as histórias em

torno da morte de Maria Bueno. Ela foi assassinada na noite de 29 de janeiro de 1893, com 28 anos, quando passava por um matagal na rua Campos Gerais, a atual Vicente Machado, entre as ruas Visconde de Nácar e Visconde do Rio Bran-co, zona do meretrício na época.

Teve a cabeça e as mãos qua-se separadas do corpo a navalha-das, por Ignácio José Diniz. Mo-tivo? Ciúmes. Segundo relatos dos seus fiéis, Maria Bueno foi morta ao resistir à tentativa de Diniz de estuprá-la, quando voltava de seu trabalho como lavadeira. Já seus difamadores afirmam que Diniz, seu amante (já que ela não era casa-da, nem ele era seu marido), a teria proibido de ir ao bordel naquela noite. Ela desobedeceu. Como cas-tigo, foi assassinada.

José Diniz foi preso, julgado e… absolvido.

Por ser prostituta, segun-do alguns, os padres da Matriz recusaram-se a enterrá-la. Missa? Muito menos. A princípio, seu tú-

mulo era comum, sem capela, no mesmo cemitério Municipal São Francisco de Paula. Contava ape-nas com cimento e uma pequena placa. Outro motivo da recusa dos padres seria por Bueno ser prati-cante de outra religião.

CanonizaçãoEmbora muitas pessoas digam

que Maria Bueno tem operado mi-lagres, segundo Jadir Pessette Buza-nello, integrante da irmandade Ma-ria da Conceição Bueno, o processo de canonização tem um custo muito alto e teria de ser iniciado por uma organização com provas escritas e científicas dos milagres. “Milagres acontecem todos os dias e a irman-dade já pensou em iniciar este pro-cesso, mas as despesas dependeriam de doações e são poucas. Nem sede temos ainda “, diz Jadir.

Ele afirma que, na visão da Igreja, Maria Bueno era “mulher de

LENDAS URBANAS

vida fácil”, o que ele considera uma forma preconceituosa de qualificá-la, já que ninguém sabe verdadeira-mente a profissão de Maria Bueno e, mesmo que fosse uma prostituta, esse fato não deveria ser conside-rado, já que Maria Madalena, santa abençoada por Jesus e reconhecida pela Igreja, foi prostituta.

O culto a Maria BuenoA repercussão da morte cha-

mou muito a atenção na época pelo fato de ter sido o primeiro cri-me passional de Curitiba. Até en-tão, não havia registro de um crime como esse. Chocada, a população, por curiosidade ou comoção, co-meçou a frequentar o túmulo de Maria Bueno. Logo, começaram a surgir as primeiras placas de agra-decimentos colocadas por fiéis que diziam ter sido agraciados por Ma-ria Bueno.

Em 1962, foi inaugurada na

primeira Rua do Cemitério São Francisco de Paula a capela de Ma-ria Bueno, onde estão até hoje seus restos mortais. Há na capela uma imagem em tamanho real, local para se acenderem velas à alma de Maria Bueno e para oração.

Santa ou não, no feriado de Finados, segundo a administração do cemitério, o túmulo de Maria Bueno recebe em média 3 mil visi-tantes por dia. O muro em frente à capela está quase tomado por pla-cas de agradecimentos, com datas que vão de 1983 até os dias atuais. Fiéis de todo o Brasil e do exterior frequentam o túmulo, aberto todos os dias.

Os fiéisO túmulo de Maria Bueno é

frequentado por devotos de todas as idades e classes sociais, mas há boatos de que os devotos mais fer-vorosos são infratores e foras da lei que diante do túmulo costumam relatar seus crimes e pedir prote-ção. Reza a lenda que, por ter sido assassinada por um policial, Maria Bueno tenha se tornado adversa a policiais e homens da lei, tornando-se defensora e protetora dos bandi-dos e infratores.

Tal ideia é contrariada pelo fato de sua capela e a irmandade Maria da Conceição Bueno serem gerenciadas por Dona Lenira, poli-cial investigadora aposentada.

Devoção ou desespero?Diante da muitas crises do

mundo de hoje, o povo anda em busca de consolo espiritual e cria suas próprias devoções.

Assim, no mesmo cemitério, na mesma rua onde se encontra o túmulo de Maria Bueno, já se ini-ciou um novo culto. A nova “san-ta” é a menina Eunice Taborda Ribas, nascida em 15 de janeiro de 1923 e falecida aos seis anos, em 20 de julho de 1929. Já po-dem ser encontradas no túmulo da menina as primeiras placas de agradecimento. O motivo da de-voção ainda é um mistério.

Maria Bueno: verdade ou crença popular?Vanusa Pereira da Silva

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Túmulo de Maria Bueno no Cemitério Municipal de Curitiba

A repercussão da morte de Maria Bueno chamou muito a atenção na época pelo fato de ter sidoo primeiro crime passional de Curitiba

Claudia Bilobran

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Curitiba, dezembro de 2009 MARCO ZERO

Apesar de estar na região onde se iniciou oficialmente a cidade de Curitiba, o marco zero ainda é prati-camente desconhecido dos habitan-tes da capital paranaense. Além da falta de conhecimento, um dos pre-textos para isso é a correria do dia a dia, pois a maioria das pessoas não pára para observar as informações que constam nos locais públicos.

A estudante de radiologia Alana Silva, 22, disse que não sabia onde fica o marco zero da cidade e que na escola os professores nunca haviam falado no assunto. Mas gostou de sa-ber que um local tão importante está tão próximo dela. Apesar de sempre passar pela Praça Tiradentes, a cabe-leireira Maria Carolina, 52, também desconhece o monumento. Para ela, o governo deveria divulgar mais o patrimônio histórico da cidade.

O marco zero de Curitiba fica na Praça Tiradentes, que teve outros dois nomes: Largo da Matriz e Largo Dom Pedro II, este último em homenagem ao imperador, que visitou a cidade em

1880. Logo no ano seguinte, passou a ser nomeada Praça Tiradentes em consequência do regime republicano. Na região, há um monolito histórico com a Cruz de Cristo, que simboliza o poder legalmente constituído pelo rei de Portugal no dia 29 de março de 1693, dia do aniversário da cidade.

ReformaA praça passou por uma refor-

ma no ano passado cuja maior inter-venção foi no piso, que já estava de-teriorado devido às raízes expostas das árvores, causando problemas de acessibilidade. O novo piso de con-creto foi elevado cerca de cinco cen-tímetros, fazendo com que as raízes das árvores não o atinjam. A ilumi-nação foi reforçada, melhorando a segurança da população.

A dona de casa Ana Carvalho, 41, disse estar muito feliz com a reforma, pois antes tinha medo de passar pelo local em virtude dos altos índices de criminalidade e hoje traz os amigos de fora da cidade para ver o marco zero.

A Praça Tiradentes possui o desenho original do século XX, que

SERVIÇO PÚBLICO

TRILHAS DO TEMPO

Marco Zero de Curitibaé pouco conhecido

foi mantido. O trabalho de reforma teve o acompanhamento de um ar-queólogo, que orientou a renovação sem tirar a originalidade do local. O formato dos canteiros, visto de cima, lembra uma estrela com uma rosácea no centro da praça.

Segundo a funcionária pública Genilda Soares, 45, que faz a limpe-za da praça há cerca de seis anos, a reforma ajudou muito no seu traba-lho, pois está conseguindo conservar mais o jardim. Ela diz que as pessoas estão colaborando, e que antigamen-te haviam muitos drogados que per-maneciam o dia todo no local, difi-cultando seu trabalho.

O mesmo afirma seu colega de trabalho Carlos Paulo de Godoy, 51, que há cerca de seis meses faz a limpe-za da região, de segunda a sexta-feira, das 9 horas da manhã até as 17h30min, cuidando do jardim. “Tenho muita sa-tisfação em trabalhar aqui na praça. É um ambiente gostoso, com pes-soas que respeitam nosso trabalho”. Godoy faz apenas um reparo: “Acho que a única coisa que está faltando é um banheiro público”.

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Marco Zero, na Praça Tirantes foi o local onde nasceu oficialmente a cidade de Curitiba

Letícia Lemos

Poucas são as pessoas que param para observar asinformações contidas nos locais públicos de Curitiba

Agência do TrabalhadorRua Pedro Ivo, 744Fones: (41) 3883-2200 • 3883-2500Horário de atendimento: de segunda a sexta-feira, das 8h às 16h.Site: http://www.setp.pr.gov.brA Agência do Trabalhador conta com atendimento para informações e encami-nhamento do seguro desemprego, além de intermediação de mão de obra para serviços temporários ou efetivos.

Ministério do TrabalhoRua José Loureiro, 574 Fone: 3219-7700Site: http://www.mte.gov.br

Ministério da FazendaRua João Negrão 246 6º and.Fones para Curitiba e Região Metropolitana: 3350-5009 • 3222-5863 (ligação local) Fone para outras localidades: 0800-41-1528 (ligação gratuita).Atendimento de segunda a sexta-feira, das 7h às 19h.Site: http://www.fazenda.pr. gov.br

Delegacia da MulherRua Presidente Carlos Cavalcanti, 480Fone: 3223-5323

Delegacia de Polícia Civil Cepol - Centro de Comunicações Av. Pres. Getúlio Vargas, 430 - Rebouças Fone: 3324-3020

Secretaria de Estado daJustiça e da Cidadania Palácio das AraucáriasRua Jacy Loureiro de Campos S/N - 2º andar. Fone: 3221-7200

Delegacia de Homicídios(Denúncias)Avenida sete Setembro, 2007 Fone: 3363-0121

Guarda MunicipalR. Pres. Faria 451 Fone: 3222-8010

Serviço Municipal de HomeopatiaAv. Mal Floriano Peixoto, 250 - 6º andar Fone: 3321-2777

Instituto Médico Legal (IML) Av. Visc. de Guarapuava, 2652Fone: 3281-5600

Unidade Municipalde Saúde da MulherAv. Mal Floriano Peixoto, 250 Fone: 3232-5411

Hospital de Clínicas R. Gen. Carneiro, 181 - Alto da Glória Fone: 3360-1800

Liceu de OfíciosFone: 3321-2645Site: http://www.fas.curitiba.pr.gov.brHorário de atendimento: de segunda a sexta-feira, das 8h às 22h.

Rua da Cidadania- Matriz- Praça Ruy BarbosaFone: 3323-4474Fax: 3324-2552

Hamilton Júnior

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MARCO ZERO Curitiba, dezembro de 20098

ENSAIO

Cenas do cotidianoTexto e fotos de Claudia Bilobran

O jornal Marco Zero registrará as cenas do dia a dia do centro de Curitiba. Mostrará a rotina das pessoas que passam pelas ruas e avenidas e dos que moram em bancos ou sob marquises. Imagens curiosamente engraçadas, ou tristes, porém que revelam a realidade e os costumes dos caminhantes e moradores da região central da cidade.