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The Journal of Transport Literature ©2014 | BPTS | Brazilian Transport Planning Society
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Palavras-Chave: parâmetro de conduta, econometria, cartel, antitruste, transporte aéreo .
Key words: Conduct parameter, econometrics, cartel, antitrust, air transportation.
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Abstract
The present work aims at studying the competitive conduct of Brazilian airlines on the main routes within the country by
using a theoretical model of competition and parametric estimation. The methodology consists of an empirical model of supply
and demand which permits the estimation of a parameter indicative of firms´ conduct in the market, and therefore to test if it is
a cooperative situation (cartel rationality) or a non-cooperative situation (competitive market). Moreover, this research aims at
incorporating a refinement by using a resampling method called Bootstrap. With bootstraping, it is possible to compute more
accurate measures of the standard deviation of estimates and therefore to have more reliable tests of hypotheses on firms'
conduct. Results indicated the non rejection of the non-cooperative conduct among firms, meaning the absence of evidence of
coordination. Additionally, an episode of exchange rate devaluation in 2002 did not have any effect of soothing competition in
the market; on the contrary, it intensificated the competitive conduct of firms.
Lovadine, D. (2009) Análise econométrica estrutural da conduta competitiva: estudo de caso do transporte aéreo pós-
liberalização. Journal of Transport Literature, vol. 3, n. 1, pp. 7-39.
Débora Lovadine*
Resumo
O objetivo da presente pesquisa é estudar a conduta competitiva das companhias aéreas brasileiras nas principais ligações do
país, utilizando modelagem teórica e estimação paramétrica. A metodologia consiste no desenvolvimento de um modelo
empírico de oferta e demanda que permita a estimação de um parâmetro indicativo da conduta das firmas; se cooperativa (com
racionalidade de cartel), ou não-cooperativa (competitiva). Busca-se também incorporar um maior refinamento ao modelo
através do método de reamostragem chamado Bootstrapping. Por meio dele, é possível computar medidas mais precisas para
estatísticas de desvio-padrão utilizadas na realização de testes de hipótese para a conduta. Os resultados indicaram a não
rejeição de conduta competitiva entre as firmas, ou seja, não há indícios de cooperação (com racionalidade de cartel) entre as
empresas do setor nas rotas estudadas. Adicionalmente, a desvalorização cambial de 2002 não se configurou como um fator de
redução da competição; pelo contrário, intensificou a conduta competitiva das firmas.
This paper is downloadable at www.transport-literature.org/open-access.
■ JTL|RELIT is a fully electronic, peer-reviewed, open access, international journal focused on emerging transport markets and
published by BPTS - Brazilian Transport Planning Society. Website www.transport-literature.org. ISSN 2238-1031.
* Email: [email protected].
Research Directory
Journal of Transport Literature
Submitted 15 Sep 2008; received in revised form 14 Nov 2008; accepted 25 Nov 2008
Vol. 3, n. 1, pp. 7-39, Jan. 2009
Análise econométrica estrutural da conduta competitiva:
estudo de caso do transporte aéreo pós-liberalização
[Structural econometric analysis of competitive conduct: a case study of air transportation in Brazil]
Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), Brazil
B T P SB T P SB T P SB T P S
Brazilian Transportation Planning Society
www.transport-literature.org
JTL|RELITJTL|RELITJTL|RELITJTL|RELIT
ISSN 2238-1031
1. Introdução
Desde a década de 1990 o setor de transporte aéreo vem passando por um processo gradual de
desregulamentação e encontra-se atualmente liberalizado. Um mecanismo amplamente
utilizado para promover o bem-estar econômico em mercados oligopolísticos recentemente
liberalizados é a política antitruste.
No setor aéreo, uma das atribuições principais da política antitruste diz respeito ao chamado
―controle de condutas‖, que tem se intensificado nos últimos anos em virtude, principalmente,
das alianças firmadas entre as firmas. Diante desse novo cenário, a preocupação é garantir um
grau de competição ―saudável‖, evitando que a maior aproximação entre as firmas facilite a
implementação de uma conduta cooperativa (com racionalidade de cartel) e resulte em abusos
do poder de mercado. Um de seus exemplos mais relevantes foi o caso de condenação das
companhias aéreas da Ponte Aérea RJ-SP, pelo Conselho Administrativo de Defesa
Econômica - CADE, em 1999.
Nesse trabalho será desenvolvida uma modelagem empírica de ―parâmetro de conduta‖,
utilizando-se como base os chamados ―modelos de parâmetro de conduta‖ propostos por
Bresnahan (1982) dentro da abordagem da Nova Organização Industrial Empírica (NOIE),
com dados coletados junto ao Departamento de Aviação Civil para as principais ligações do
país. Assim, através de modelos estruturais aliados a um extenso aparato econométrico, é
possível averiguar os atuais comportamentos das firmas e também verificar se eventos
relevantes para o setor (ex. desvalorização cambial) modificaram o grau de competição no
mercado.
Espera-se que essa proposta metodológica se torne um ferramental adicional para os
tomadores de decisão em análise a casos de infrações à ordem econômica e que, de forma
geral, o trabalho contribua para o esclarecimento de questões acerca do funcionamento de
mercados desregulamentados para condução adequada de políticas antitruste.
Propõe-se ainda, a utilização de um procedimento de reamostragem simples, porém pouco
explorado pela literatura, chamado bootstrap. Através dele, objetiva-se oferecer um
refinamento adicional ao modelo, trazendo um fator diferencial para o presente trabalho.
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2. O Mercado de Transporte Aéreo no Brasil
O setor de transporte aéreo cumpre importante papel estimulando as relações econômicas e o
intercâmbio de pessoas e mercadorias no âmbito nacional e internacional. Considerado de
caráter ―estratégico‖ pelos governos e analistas setoriais, congrega as seguintes
características:
Na economia: estimula o comércio interno e internacional, além de acordos de longa
distância que necessitam de presença física das partes envolvidas e incentiva o turismo
possibilitando a entrada de divisas e a geração de renda para pontos turísticos.
No âmbito social: conecta cidades e regiões cujo acesso via outros modais é difícil,
promovendo a inserção social, econômica e cultural.
No âmbito tecnológico: sua interação com a indústria aeronáutica é um dos
responsáveis pelo estímulo à inovação com respeito ao desenvolvimento de novos
produtos (aeronaves e equipamentos) e métodos de gerência (logística, tomada de
decisão, simulações).
2.1 Lado da Demanda
Na busca por identificar os ―consumidores‖ do serviço de transporte aéreo, Berry, Carnal e
Spiller (1996) constataram a existência de dois tipos distintos de passageiros: um com
atributos típicos de ―viajante a turismo‖ - alta sensibilidade a preço, baixa propensão a pagar
por altas freqüências de vôos e baixa desutilidade por vôos com conexão - e outro, com
atributos que configuram o padrão de ―viajante a negócio‖ - baixa sensibilidade a preço, alta
propensão a pagar por altas freqüências de vôos e alta desutilidade por vôos com conexão.
Essa segmentação também pode ser visualizada no mercado doméstico, onde há
predominância dos ―viajantes a negócio‖. Segundo estudo realizado pela Sindicato Nacional
das Empresas Aeroviárias (SNEA), cerca de 71% das viagens realizadas no país no período de
1980 a 1996 foram viagens de negócios. Tal fato se reflete na baixa elasticidade preço da
demanda agregada, de –0,439 para o período de 1978 a 1997 e de –0,438 de 1994 a 1997,
encontradas em estudos realizados pela Secretaria de Acompanhamento Econômico – SEAE
(Tavares, 1999).
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Outra característica da demanda diz respeito a sua alta relação com o PIB. No mercado de
transporte aéreo, a demanda por viagens aéreas acompanha as oscilações no produto, ou seja,
existe relação positiva entre a renda gerada pela economia e viagens aéreas. Mudanças
proporcionais na renda provocam mudanças mais do que proporcionais na demanda por
viagens aéreas, indicando elasticidade-renda da demanda elástica (maior do que um). Segundo
estudos realizados pela SEAE, a elasticidade renda da demanda foi de 1,067 tanto nos
períodos de 1978 a 1997 quanto para o período de 1994 a 1997 (Tavares, 1999).
Lovadine e Oliveira (2005) explicam que, com o processo de desregulamentação, houve uma
evolução nos padrões competitivos entre as companhias aéreas, que apresentaram maior
diferenciação dos atributos oferecidos aos passageiros. Estudando o mercado específico de
Ponte Aérea, os autores tratam o produto como heterogêneo, corroborando a idéia de
Borenstein (1989) e Berry (1990), de que passou-se a entender a competição no setor como
sendo a rivalidade entre firmas que são distintas entre si, que possuem atributos diversos que
são efetivamente percebidos pelo consumidor. Estes atributos distintos adviriam de vantagens
competitivas referentes à presença na rota (por exemplo, diferentes escalas de operação, com
diferentes números de freqüências diárias de vôo, diferentes padrões de serviços de
atendimento ao consumidor, etc) e vantagens competitivas referentes à presença no
aeroporto (por exemplo, tamanhos diferentes de rede doméstica e internacional, participação
em alianças globais de companhias aéreas, número de cidades atendidas, etc).
Com relação ao grau de substitubilidade inter-modal aéreo e terrestre (representado pelo
ônibus), o trabalho de Turolla, Oliveira e Vassalo (2005) mostra que os passageiros de ônibus
classificados como ―premium‖, isto é, aqueles têm alta sensibilidade à qualidade do ônibus e
estão dispostos a pagar por altas tarifas são os efetivos consumidores marginais nesse
mercado; logo, eles constituem um conjunto pequeno de passageiros que consideram a
mudança de transporte significativa quando as diferenças de preço se reduzem. Assim, o
transporte aéreo se configura numa alternativa viável para a classe de passageiros de ônibus
que atribuem grande valor à qualidade do serviço e que irão optar pelo transporte aéreo
durante períodos de guerra de preços ou de descontos.
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2.2 Lado da Oferta
A oferta de transporte aéreo doméstico é realizada por firmas que se distinguem por operar
vôos em trechos nacionais ou regionais. De fato, essa distinção não se estende mais à
classificação das firmas uma vez que em 2000, o Departamento de Aviação Civil (DAC)
instituiu que se devia utilizar apenas o termo ―empresas aéreas brasileiras‖. Essa decisão
advém do fato de ser extremamente difícil realizar uma delimitação exata, ou definir um fator
que permita a distinção sobre o que é uma firma regional e o que é uma firma nacional.
Uma diferenciação que é pertinente ao setor diz respeito a empresas de transporte aéreo
regular e não regular. Segundo estatísticas da ANAC (ANAC, 2006), foram listadas trinta e
quatro empresas cadastradas no ramo de transporte aéreo regular no país e treze no ramo de
transporte aéreo não-regular. Do total de empresas regulares, cinco aguardam pela concessão
de autorização para iniciar atividade e outras cinco estão com atividades paralisadas. Das
empresas aéreas não regulares, as que se dedicam ao transporte de passageiros ou de
passageiros e cargas são cinco.
Apesar de um número expressivamente grande de empresas, o mercado de empresas
regulares, alvo desse trabalho, é concentrado em poucas firmas. A Figura 1 mostra a evolução
da participação do mercado das principais companhias aéreas brasileiras. Pode-se observar
que desde o início do período até 1997 havia a dominância do mercado por três firmas: Varig,
Vasp e Transbrasil. A partir do respectivo ano, a TAM desponta como uma das grandes e logo
em seguida a Gol também, enquanto que há o declínio da Vasp e Transbrasil. Em 2003, as
três maiores empresas (TAM, VRG e Gol) detinham mais de 80% do mercado.
Existe ainda uma segmentação entre as firmas surgida no pós-desregulamentação e que
convém tecer algumas considerações. Full Service Carrier - FSC (Empresa de serviço
completo) e Low Cost Carrier - LCC (Empresa de baixo custo) são as classificações que
surgiram dada a observância de que existiam estratégias reconhecidamente distintas entre as
firmas, assim como nichos de mercados que as diferenciavam. No Brasil, a Gol foi
considerada uma LCC, enquanto que as outras eram as legacy ou FSC. Oferecendo serviço
básico de transporte aéreo, sem frills, com preços baixos, vendas diretas aos consumidores e,
sobretudo, com baixos custos e escolha cuidadosa de rotas, a Gol se tornou uma das empresas
mais bem sucedidas e com penetração crescente no mercado.
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As características mais marcantes das LCC são: padronização da frota; simplificação ou
eliminação de serviço de bordo; opção por utilização de aeroportos secundários e menos
congestionados; utilização da venda pela internet de passagens; rede de trabalho com estrutura
simples de ponto a ponto com ausência ou fraca propensão a realizar vôos de longas
distâncias; programa de freqüência de vôo simples ou inexistente; alto nível de utilização da
frota e empregados altamente motivados. Além disso, as LCCs estão tipicamente associadas a
estratégia de preços muito agressiva, tipicamente usando uma estrutura de tarifa simplificada
e baixas tarifas.
3. O Processo de Liberalização Econômica do Setor Aéreo no Brasil
A liberalização do transporte aéreo brasileiro iniciou-se nos anos noventa e envolveu um
conjunto de medidas chamado de ―Política de Flexibilização do Transporte Aéreo‖. Consistiu
num processo gradual de flexibilização constituído por três etapas liberalizadoras (Oliveira,
2005c). A primeira etapa de liberalização aconteceu em 1992. A partir dela, os monopólios
regionais, exceto no caso das linhas aéreas especiais2, foram definitivamente abolidos. Com a
extinção da política de ―quatro companhias nacionais e cinco regionais‖ observaram-se uma
série de pequenas novas companhias aéreas entrantes no mercado (ex. Pantanal, Tavaj, Meta,
Rico, etc.). Nessa etapa, também ficou determinado o alargamento das bandas tarifárias ao
redor dos preços de referência, gerando maior liberdade, ainda que restrita, para variações de
preços. Assim, os limites inferior e superior, que eram de –25% a +10% passaram a ser de –
50% a +32%, respectivamente.
Segundo Oliveira (2005c), nesse novo cenário, a competição em preços era vista como
―saudável‖ para a indústria e passou a ser incentivada. Nesse sentido, as bandas tarifárias
eram consideradas instrumentos temporários para intensificar a rivalidade de preços. No
entanto, os preços ainda eram, de certa forma, indexados, já que as tarifas de referência eram
controladas e sujeitas às políticas de reajustes periódicos.
No final dos anos noventa (início de 1998) aconteceu a segunda etapa de liberalização. Nesse
momento, foram removidos os dois dispositivos de controle da competição que ainda
2 São denominadas linhas aéreas especiais as ligações que envolvem vôos entre pares de aeroportos centrais das cidades de
São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Brasília.
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perduravam no setor: as bandas tarifárias e a exclusividade do direito das regionais operarem
as linhas aéreas especiais. Nesse novo ambiente liberalizado, houve elevação de 22,4% na
oferta (ass.km oferecidos) para as linhas domésticas, de 1997 para 1998. Em contrapartida,
no mesmo período, a lucratividade da indústria (linhas domésticas) reduziu 8,21 pontos
percentuais (de 10,63% para 2,42%) (fonte: Anuário Estatístico do DAC, 2001). De fato,
durante o ano de 1998 foram observados fenômenos de ―guerras de preços‖ e ―corridas por
freqüência‖, que nada mais representavam que os ajustes de curto prazo das novas medidas
implementadas, mas que provocaram uma movimentação competitiva como não se via pelo
menos desde a década de sessenta (Oliveira, 2005c).
O andamento do processo de liberalização foi significativo e negativamente afetado com a
mudança no regime cambial em 1999. A elevada desvalorização ocorrida em janeiro daquele
ano provocou grande impacto no desempenho da atividade do transporte aéreo, tendo em vista
que o componente câmbio é extremamente representativo na composição de custos das
empresas, dada a sua dependência de insumos cotados em dólares tais como: leasing, seguro e
manutenção.
A maxidesvalorização da moeda afetou ainda as receitas, tendo em vista a diminuição
constatada na demanda de passageiros. Assim, houve em um primeiro momento, uma
tendência generalizada à suspensão das tarifas promocionais vigentes e, em seguida, a
necessidade de um realinhamento de preços face ao choque nos custos (Anuário Estatístico do
DAC, 2001). No entanto, diante de aumentos de preços em diversos setores da economia, o
Ministério da Fazenda não permitiu que os preços dessa indústria fossem realinhados. Tal fato
representou uma limitação às estratégias das firmas, dado que o controle dos reajustes de
preços foi novamente posto em prática, na forma da necessidade de autorização prévia do
DAC e do Ministério da Fazenda (Oliveira, 2005c).
Em 2001, ocorreu a terceira etapa de liberalização do setor. Através de um acordo entre o
DAC e o Ministério da Fazenda, os mecanismos de regulação econômica que ainda existiam
no setor foram removidos, inclusive a interferência macroeconômica. Assim, além da
liberalização dos preços, houve a flexibilização dos processos de entrada de novas firmas e de
pedidos de novas linhas aéreas, freqüências de vôo e aviões, em um processo que culminou
com a entrada da Gol, em janeiro de 2001.
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Em 2003, diante de um novo governo federal e de novas políticas setoriais, as autoridades
reguladoras voltaram a interferir no mercado, buscando controlar o que foi chamado de
―excesso de capacidade‖ e o acirramento da ―competição ruinosa‖ no mercado. Pedidos de
importação de novas aeronaves, novas linhas e mesmo de entrada de novas companhias
aéreas, somente seriam aceitos mediante apresentação de estudos de viabilidade econômica
prévia, configurando-se uma situação semelhante ao do período regulatório típico. No
entanto, havia uma grande diferença neste caso, uma vez que não houve interferência na
precificação das companhias aéreas, ou seja, não houve re-regulação tarifária (Oliveira
2005c).
Em 27 de setembro de 2005, foi criada, através da lei nº 11.182, a Agência Nacional de
Aviação Civil (ANAC). A entidade é integrante da Administração Pública Federal indireta,
submetida a regime autárquico especial, vinculada ao Ministério da Defesa. De acordo com a
lei, é competência da União, por intermédio da ANAC e nos termos das políticas
estabelecidas pelos Poderes Executivo e Legislativo, regular e fiscalizar as atividades de
aviação civil e de infra-estrutura aeronáutica e aeroportuária.
Não é, porém, atribuição da ANAC, julgar casos de infração à ordem econômica. Pela lei de
criação da ANAC, em seu Art. 6º, tem-se que ― Com o objetivo de harmonizar suas ações
institucionais na área da defesa e promoção da concorrência, a ANAC celebrará convênios
com os órgãos e entidades do Governo Federal, competentes sobre a matéria‖.
Adicionalmente, no Parágrafo único do Art. 6º, prevê que ―Quando, no exercício de suas
atribuições, a ANAC tomar conhecimento de fato que configure ou possa configurar infração
contra a ordem econômica, ou que comprometa a defesa e a promoção da concorrência,
deverá comunicá-lo aos órgãos e entidades referidos no caput deste artigo, para que adotem
as providências cabíveis‖.
Assim, temos que o arcabouço legal hoje existente leva à agência reguladora a exercer um
papel de acompanhamento econômico das condutas do setor e, no caso de conhecimento de
ato ou fato que apresente evidências de exercício de poder de mercado, deverá comunicá-lo
aos órgãos e entidades específicos (SEAE, SDE e CADE) para que adotem as medidas
necessárias à defesa da concorrência.
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4. Modelagem da Conduta
4.1 Modelo Teórico
Modelos de conduta, em última instância, têm como objetivo identificar o exercício do poder
de mercado. Isso porque, algumas condutas, assim como alguns atos de concentração podem
conduzir a praticas abusivas ou de excesso de poder de mercado e, conseqüentemente gerar
ineficiência.
Até o início dos anos 1980, a identificação de poder de mercado era feita através da estimação
da performance das firmas, exercício desenvolvido pela abordagem da Estrutura-Conduta-
Desempenho, conhecida como ECD. Ao assumir a existência de uma relação causal estável
entre as estrutura da indústria, a conduta da firma e a performance do mercado, acreditava-se
que a partir de um conjunto de variáveis estruturais observáveis seria possível explicar as
diferenças interindústria na performance de mercado e, particularmente, o poder de mercado.
E ainda que medidas de poder de mercado podiam ser calculadas de dados disponíveis
(medidas de lucratividade). Dados contábeis poderiam ser usados para construir aproximação
do índice de Lerner ou lucros econômicos.
Várias críticas surgiram em relação a essa abordagem, tais como: i) é assumido que a
estrutura da indústria determina causalmente seu desempenho, quando o desempenho pode
influenciar a estrutura da indústria; ii) medidas de concentração pouco refletem o nível de
poder de mercado de uma indústria, já que não levam em conta as elasticidades da demanda,
incentivos aos produtores e entrada potencial de competidores; e principalmente; iii)
informações corretas sobre custos marginais podem não existir. Diante dessa última razão,
tem-se que, tanto pela endogeneidade das variáveis estruturais ou pela pouca confiabilidade
de dados contábeis, as formas tradicionais de calcular poder de mercado baseados no
paradigma ECD, implicariam resultados inadequados para medir o desempenho das
indústrias.
Com o surgimento da corrente da Nova Organização Industrial Empírica (NOIE), foi
desenvolvida uma nova forma de identificação do poder de mercado. A abordagem NOIE
consiste em associar modelos teóricos de competição (com componentes da teoria dos jogos)
à utilização de métodos econométricos na investigação empírica. Trata-se, dessa forma, de
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uma abordagem estrutural, porque envolve o uso de teoria para especificar a estrutura da
demanda e oferta, e identificar a conduta da firma.
As vantagens dessa nova abordagem em relação à ECD são apontadas por Church e Ware
(2000): i) dados contábeis de custos não são usados; assim, medidas significativas de custo
marginal são assumidas como não-observáveis. Isso significa que margens preço-custo e a
observação direta do índice de Lerner não são possíveis ou não são significativas; ii) o foco
em estimar poder de mercado é uma única indústria. Logo, hipóteses falsas considerando
simetria na indústria não são necessárias; iii) o comportamento da firma ou da indústria é
estimado baseado em modelos teóricos de oligopólio, o que permite testar o grau do poder de
mercado; iv) o grau do poder de mercado pode ser identificado e estimado e sua inferência é
baseada na conduta das firmas.
Dentro dessa nova abordagem, Bresnahan (1982, p.87) desenvolveu os chamados ―modelos
de parâmetro de conduta‖, cuja idéia é resumida nos seguintes termos: ― A parameter indexing
the oligopoly solution concept is econometrically identified. It is identified by standard
econometric methods, even when no cost or profit data are available, and when the demand
and cost curves must be estimated as well. That is, the comparative statistics of equilibrium,
as price and quantity are moved by exogenous variables, reveal the degree of market power.‖
Assim, grande avanço dessa modelagem com relação ao proposto pela linha da ECD é o fato
de que não são necessários mais os dados de custo marginal e de poder de mercado, mas
apenas deslocadores de custo.
Essa metodologia tem ainda a vantagem de não depender de informações a respeito da
comunicação prévia entre as empresas. No entanto, tais informações são importantes para
compor o total de documentos necessários para uma análise completa de um caso antitruste.
Desse modo, optou-se por essa última abordagem para a realização desse trabalho e
especificamente, pela aplicação dos ― modelos de parâmetro de conduta‖ descritos por
Bresnahan (1989), dentro da NOIE.
A clássica descrição dessa metodologia se resume na estimação de equações de demanda e
oferta, representando o comportamento das firmas por parâmetros desconhecidos a serem
estimados, os chamados ―parâmetros de conduta‖. A partir de então, inferências sobre poder
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de mercado tornam-se factíveis quantitativamente na forma de simples testes de hipóteses
como, a de concorrência competitiva (ausência de interação estratégica) e da maximização
conjunta de lucros (coordenação ou colusão), bem como hipóteses intermediárias, típicas de
modelos oligopolísticos.
Diferentes estratégias de equilíbrio das firmas são derivadas de condições de maximização do
lucro, que por sua vez, são sensíveis ao jogo que as firmas costumam jogar, a informação da
estrutura e o tipo de produto assumido. Por exemplo, competição perfeita, Bertrand, Cournot
ou equilíbrio de Stackelberg direcionam o modelo para diferentes condições de maximização
de lucro e, logo, diferentes equações estruturais das quais se derivam os parâmetros
estimados.
Assim, antes de proceder à especificação do modelo, serão apresentadas as duas hipóteses que
definirão o tipo de equilíbrio competitivo:
Tipo de produto3: no setor, existe uma discussão proeminente sobre o ―produto‖
transporte aéreo ser homogêneo ou heterogêneo. Segundo Oliveira e Turolla (2005), o
período pós-regulatório apresentou mudanças nas características do setor que o
transformaram de produto homogêneo para heterogêneo. Com o aumento da
competição, houve estímulo em oferecer produtos com maior diferenciação de
atributos (programas de milhagem, com diferentes estruturas de premiação; graus
diferentes de dominância das freqüências ao longo de um dia e também nos horários
de pico), que são efetivamente perceptíveis ao consumidor. Corroborando a idéia dos
autores, nesse trabalho será adotada a hipótese de produto heterogêneo.
Tipo de Jogo: adotou-se como jogo o padrão estabelecido por Bertrand, de jogo
estático em preços. O uso dos preços como variável estratégica é procedimento padrão
em caso de mercados com produto heterogêneo.
3 A importância da adoção de hipótese sobre o tipo de produto advém do fato de que o resultado de equilíbrio
competitivo para um mercado depende dessa decisão. Ao assumir que um produto é homogêneo, estamos
também assumindo que o resultado não-cooperativo (competitivo) desse mercado seria o preço se igualando ao
custo marginal. Ao assumir que o produto é heterogêneo (diferenciado) tem-se que o equilíbrio do resultado não-
cooperativo (equilíbrio de Bertrand-Nash) seria um preço acima do custo marginal. Slade (2004) já apontou que
é comum observar, em mercados oligopolísticos, margens positivas sobre o custo marginal advindas da estrutura
do mercado e da diferenciação de produto.
Vol. 3, N. 1 (2009) Revista de Literatura dos Transportes - RELIT Página 17
O mercado será modelado como estrutura de duopólio, em que se tem uma firma base versus
uma média ponderada das demais. Essa forma de modelagem está fundamentada na hipótese
do ―oponente médio‖ desenvolvida por Slade (2004), em que o preço da rival é uma média
ponderada do preço das oponentes.
A função de demanda de cada firma foi baseada no trabalho de Slade (1986) e será
representada por:
rtrtrtrtrtrtrt ppppqq )(),,( 210, (1)
Onde rtq é a quantidade demandada da firma, na rota r, no mês t; rtp e
rtp são,
respectivamente, o próprio preço e o do oponente médio; é um vetor de deslocadores da
demanda e os s' são parâmetros.
De (1), segue-se a condição de primeira ordem para maximização de lucros em relação à
variável estratégica preço (p)4:
0),( dp
dq
dq
dctq
dp
dqpqctqpMax rtrtrtrt
p (2)
Onde: o termo rtrtqp representa a receita da firma e rtct é a função custo total e é um vetor
de deslocadores de custos da firma ( dqdct / ) sendo o custo marginal da firma, na rota r, no
mês t, rtcmg .
O termo dpdq / pode ser então desenvolvido de modo a incorporar crenças, ou seja,
conjeturas sobre a forma em que as firmas oponentes variam seus preços, caso uma firma
varie seu preço. Isso pode ser representado por dpdp / , que surge conforme o
desenvolvimento abaixo :
21
dp
dp
dp
dq
p
q
dp
dq (3)
4 A maximização de lucros em relação ao preço, p, advém da adoção da hipótese, anteriormente justificada, de
que se trata de um jogo estático em preços.
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Esse termo, dpdp / , denominado , é então o chamado parâmetro de conduta, através do
qual é possível testar hipóteses a respeito das variações conjeturais das firmas no mercado.
Com a inserção de (3) em (2), e juntamente com alguma manipulação algébrica, chega-se ao
formato final da condição de primeira ordem, que nesse caso, também é considerada a relação
de oferta da firma:
qcmgp 21
1
(4)
Onde cmg é o custo marginal.
Ao adotar a hipótese de variações conjeturais, pode ser considerado um índice de
competição média da conduta do oligopólio, capaz de representar benchmarks relevantes
como comportamento do equilíbrio de Nash em preços (Bertrand-Nash) e desvios deste
equilíbrio não-cooperativo. Desse modo, têm-se duas situações de referência:
(i) Se 0 , estamos diante da hipótese clássica de variações conjeturais nulas em preços de
Bertrand ( 0/ dpdp ), ou seja, não há reação no preço das rivais diante de uma mudança no
preço de uma das firmas. Caso estivéssemos em um mercado com produto homogêneo, essa
situação resultaria em preço igual ao custo marginal. Mas, pelo fato de os consumidores
perceberem as firmas como distintas (produto heterogêneo), o comportamento de ―tomador de
preço‖ não leva ao resultado de competição perfeita, mas sim a preços superiores ao custo
marginal e no patamar do equilíbrio de Bertrand-Nash (benchmark de equilíbrio não-
cooperativo).
Nesse caso, temos uma relação de oferta tal como:
qcmgp1
1
(5)
Se criarmos uma nova variável, 1
qqtp , obtemos o seguinte modelo:
tpqcmgp 1 (6)
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Desse modo, torna-se factível a realização de um teste de hipótese sob o comportamento das
firmas em que a hipótese nula é: 11 (é tomador de preço/competitiva) e a hipótese
alternativa: 11 (não é tomador de preço).
ii) Se 1 , configura-se hipótese de que as firmas rivais imitam qualquer variação de preço
realizada por uma das firmas, alterando também seus preços. Nesse caso, as firmas adotam
um comportamento conhecido na literatura como ―equiparador de preço‖ e enquadrado como
prática colusiva (Corts, 1995). Nessa análise, considera-se que, quanto maior o parâmetro
conduta das companhias, maior a probabilidade de que elas estejam empreendendo alguma
prática colusiva, e portanto, o referencial 1 (benchmark de equilíbrio cooperativo)
representa uma importante ferramenta de análise antitruste. Nesse caso, a equação de oferta
fica:
qcmgp21
1
(7)
Se criarmos uma nova variável 21
q
qep obtemos o seguinte modelo:
epqcmgp 1 (8)
Desse modo, torna-se factível a realização de um teste de hipótese sob o comportamento das
firmas em que a hipótese nula é: 11 (equiparação de preços/possível cartel) e a hipótese
alternativa: 11 (não há equiparação de preços).
Pode-se ainda, estimar a relação de oferta padrão tal como em (4) e considerando que o termo
121 )/(1 , testa-se a hipótese de precificação ao custo marginal, em que a hipótese
nula é 01 (precificação ao custo marginal) e a hipótese alternativa: 01 (precificação
não é ao custo marginal).
Vol. 3, N. 1 (2009) Revista de Literatura dos Transportes - RELIT Página 20
4.2 Modelo Empírico
O modelo empírico será estimado com os dados provenientes da base do Núcleo de Economia
dos Transportes (NECTAR) do Instituto Tecnológico de Aeronáutica, detalhados na Seção 6
desse trabalho. Foram estimadas as equações de demanda e oferta, para cada firma. Assim, o
equivalente empírico das equações do modelo teórico (1), (6) e (8) está apresentado abaixo.
A equação de demanda para cada firma (1) é estimada na seguinte forma:
rt
r
rrtrtrtrt rotaDPIBppq
20
1
33210 _ (9)
Onde: rtq é o número de passagens aéreas vendidas. O índice rt se refere ao número de
passagens vendidas pela companhia aérea no par de cidades r no mês t. Inclui todos os
bilhetes comercializados para o par de cidades, independentemente das características e
restrições associadas ao próprio bilhete e à viagem em si; desta forma, engloba bilhetes
representativos de vôos tanto non stop, quanto com escala e/ou conexão, etc. rtp é o preço
médio da passagem aérea (R$) da companhia, na ligação r, no mês t. Esse preço foi obtido
pela multiplicação do yield (preço por passageiro-km) pelo km, obtendo, assim, o preço
médio por passageiro. rtp é o preço do oponente médio ou preço do rival. Esse preço foi
calculado a partir da média ponderada dos preços das firmas rivais, onde o fator de
ponderação é o número de passagens aéreas vendidas. tPIB é um indicador mensal do produto
gerado pela economia no mês t. E, por fim, D_rota é uma variável de efeitos fixos de rota r
(total de 20 variáveis).
Adotou-se a estrutura linear para a equação de demanda. Nesse caso, é esperado que a
inflexibilidade pela utilização dessa estrutura seja refletida nos parâmetros estimados e,
conseqüentemente, nas elasticidades e padrões de substitutibilidade entre as firmas (ver
Crooke et al. 1999). Além disso, a linearidade da curva de demanda implica que elasticidades
menores estejam relacionadas a preços menores e elaticidades maiores estjam relacionadas a
preços maiores (ver Pindyck e Rubinfeld, 2002).
Vol. 3, N. 1 (2009) Revista de Literatura dos Transportes - RELIT Página 21
A relação de oferta padrão representada pela equação (4)5:
rt
r
rrrtrtrt rotaDtcâmbioqqcmep
20
1
33210 __ (10)
Onde rtp é o preço médio da passagem aérea (R$) da companhia, na ligação r, no mês t. Esse
preço foi obtido pela multiplicação do yield (preço por passageiro-km) pelo km, obtendo,
assim, o preço médio por passageiro. rtq é o número de passagens aéreas vendidas. O índice
rt se refere ao número de passagens vendidas pela companhia aérea no par de cidades r no
mês t. Inclui todos os bilhetes comercializados para o par de cidades, independentemente das
características e restrições associadas ao próprio bilhete e à viagem em si; desta forma,
engloba bilhetes representativos de vôos tanto non stop, quanto com escala e/ou conexão, etc.
rtq _tcâmbio é uma variável resultante da multiplicação de tp
rtq pela taxa de câmbio6. Utilizou-
se a taxa de câmbio média mensal comercial para compra (fonte: Boletim do Banco Central
do Brasil). cme é o custo médio operacional (R$) da companhia, na ligação r, no mês t. E,
novamente, D_rota é uma variável de efeitos fixos de rota r (total de 20 variáveis).
Nesse modelo, assumiu-se a hipótese de que os custos marginais na rota são iguais ao custos
médios, ou seja, diante da impossibilidade de se conhecer os custos marginais, foram
utilizados como proxies os custos médios. Essa hipótese pode não ser razoável se for
considerado que existem ganhos de escala e de densidade para as firmas do setor. No entanto,
independentemente da razoabilidade ou não da hipótese assumida, espera-se que não haja
prejuízo ao modelo visto que, certamente, deslocamentos nos custos médios estão atrelados a
deslocamentos nos custos marginais e essa relação é suficiente para a identificação da relação
de oferta e, conseqüentemente, do parâmetro de conduta.
A relação de oferta para a situação de tomador de preço representada pela equação (6):
rt
r
rr
tp
rt
tp
rtrtrt rotaDtcâmbioqqcmep
20
1
33210 __ (11)
5 Considerou-se, nessa notação, que 121 )/(1 .
6 Espera-se que o coeficiente dessa variável represente a alteração da conduta das firmas devido às variações da
taxa de câmbio, principalmente, devido à desvalorização cambial de 2002.
Vol. 3, N. 1 (2009) Revista de Literatura dos Transportes - RELIT Página 22
Onde tp
rtq é o rtq com as modificações propostas em (6). A relação de oferta para a situação
de equiparador de preço representada pela equação (8):
rt
r
rr
ep
rt
ep
rtrtrt vrotaDtcambioqqcmep
20
1
33210 __ (12)
Onde ep
rtq é o rtq com as modificações propostas em (8).
Em suma, a seqüência de procedimentos a serem adotados para cada firma são: i) estimação
de demanda, ii) estimação das relações de oferta (padrão, tomador de preço e equiparador de
preço), iii) correção dos devios-padrões através de bootstrapping e iv) realização dos testes de
hipótese para conduta (precificação ao custo marginal, tomador de preço, equiparador de
preço).
4.3 Os Dados
Os dados para este estudo são provenientes da base de dados do Núcleo de Economia dos
Transportes (NECTAR) referentes a preços das passagens aéreas, quantidades de bilhetes
vendidos, atributos das firmas e custo médio das firmas. A principal fonte de dados relativos a
preços, quantidades e atributos das firmas é o conjunto de Relatórios Mensais do Yield,
desenvolvido pela Divisão de Assuntos Econômicos (SA3). Estes relatórios foram criados a
partir de setembro de 2001, com as determinações da Portaria 1213, de 16 de agosto de 2001
(revogada pela Portaria 447/DGAC), que aperfeiçoava o Regime de Liberdade Tarifária do
segmento de aviação regular doméstica.
Os Relatórios Mensais do Yield são elaborados a partir de remessa mensal de informações
pelas empresas de transporte aéreo regular, cuja remessa deve acontecer até o quinto dia útil
do mês subseqüente, e se refere a uma relação desagregada das bases tarifárias, respectivas
tarifas e quantidades de passagens comercializadas em cada uma delas, pela companhia aérea.
Importante salientar que os Relatórios Mensais do Yield são construídos tendo-se como
referência a comercialização de passagens pela companhia aérea, e não o tráfego de
passageiros.
Vol. 3, N. 1 (2009) Revista de Literatura dos Transportes - RELIT Página 23
A segunda fonte de informações para a Base de Dados do NECTAR é constituída pelo
Relatório Operacional Mensal que, por sua vez, serve de base para o Anuário Estatístico do
DAC, Volume II — Dados Econômicos, onde são apresentadas informações anuais
detalhadas sobre custos, desagregadas por companhia aérea. Nesse documento encontram-se
dados detalhados sobre custos operacionais diretos e indiretos, desagregados por aeronave
(tanto no mercado doméstico como internacional), são apresentados. Desta forma, os dados
constantes do Relatório Operacional Mensal foram utilizados na geração de um custo
operacional médio ao nível da rota, que simplesmente é a média dos custos das aeronaves que
operam uma dada rota, ponderada pelo número de assentos oferecidos por aquela aeronave
naquele mercado.
Para fins de construção da Base de Dados final, foram escolhidas, dentre as linhas
monitoradas, incluídas na Portaria DAC 447/DGAC, as que envolvessem as seguintes
cidades: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Curitiba, Florianópolis e Porto Alegre.
Para simplificação, foram adotados os seguintes códigos para essas cidades: CBSP, CBRJ,
CBBH, SBBR, SBCT, SBFL, SBPA. Foram também utilizados índice mensal de PIB7 e taxa
de câmbio comercial para compra provenientes do Banco Central.
Tem-se assim um conjunto de:
4 firmas: Vasp, Tam, Gol e Grupo Varig (VRG+NES+RSL).
20 rotas, que envolvem 7 cidades: CBSP, CBRJ, CBBH, SBBR, SBCT, SBFL, SBPA.
Sendo que CBSP = SBSP + SBGR; CBBH = SBBH + SBCF; CBRJ = SBRJ +
SBGL8.
21 períodos (meses) referentes ao período de julho de 2002 a março de 2004.
7Os valores mensais de PIB podem ser encontrados na seção de séries históricas, tabela número 4380. Disponível em:
www.bcb.gov.br
8 As rotas são: CBBH=>CBSP – Belo Horizonte => São Paulo, CBBH=>SBBR – Belo Horizonte => Brasília,
CBRJ=>CBSP – Rio de Janeiro => São Paulo, CBRJ=>SBBR – Rio de Janeiro => Brasília, CBRJ=>SBCT – Rio de Janeiro
=> Curitiba, CBRJ=>SBPA – Rio de Janeiro => Porto Alegre, CBSP=>CBBH – São Paulo => Belo Horizonte,
CBSP=>CBRJ – São Paulo => Rio de Janeiro, CBSP=>SBBR – São Paulo => Brasília, CBSP=>SBCT – São Paulo =>
Curitiba, CBSP=>SBFL – São Paulo => Florianópolis, CBSP=>SBPA – São Paulo => Porto Alegre, SBBR=>CBBH –
Brasília => Belo Horizonte, SBBR=>CBRJ – Brasília => Rio de Janeiro, SBBR=>CBSP – Brasília => São Paulo,
SBCT=>CBRJ – Curitiba => Rio de Janeiro, SBCT=>CBSP – Curitiba => São Paulo, SBFL=>CBSP – Florianópolis => São
Paulo, SBPA=>CBRJ – Porto Alegre => Rio de Janeiro, SBPA=>CBSP – Porto Alegre => São Paulo.
Vol. 3, N. 1 (2009) Revista de Literatura dos Transportes - RELIT Página 24
Esses dados são representativos do tráfego de onze milhões de passageiros, ou seja,
aproximadamente, 38% do tráfego aéreo doméstico em 2001 (Anuário Estatístico do DAC,
Dados Estatísticos). No total, são 1680 (4 x 20 x 21) observações referentes às ligações mais
densas do país. A base inclui somente transporte de passageiros (exclui carga), operações
domésticas e companhias brasileiras (exclui companhias regionais da franja de mercado e
companhias internacionais). Os valores monetários para preços e custos foram atualizados
pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a valor presente de janeiro de
20069.
Um dos eventos relevantes para o período e que se buscou inserir ao modelo foi a
desvalorização cambial de 2002. Com isso, a intenção é verificar se esse fato alterou de
alguma forma a conduta competitiva das firmas no mercado.
A Tabela 3 apresenta as estatísticas descritivas10
para as principais variáveis do modelo:
número de passagens aéreas vendidas (q), preço médio da passagem (p), preço médio da
passagem dos rivais ( p ) e custo médio (cme), todas consideradas no nível da rota. Nota-se
que existe grande variabilidade para todas as variáveis, o que se configura como um ponto
positivo para a identificação dos parâmetros da equação de demanda e de oferta. Os preços
próprios se mostraram próximos aos preços médios das rivais no entanto, os primeiros
apresentaram maior variabiliadade. Os custos médios apresentaram valores menores do que os
preços próprios, conforme o esperado, e correspondem a um montante aproximado de 66%
dos preços.
9 Testes com o IPA para deflacionar custos mostraram que ele pondera excessivamente os períodos de variações cambiais,
não refletindo as reais condições de mercado para insumos adquiridos internamente como: mão-de-obra, tarifas
aeroportuárias e serviços de bordo. Dessa forma, o IPCA mostrou-se o índice mais adequado para o deflacionamento de todos
os dados, inclusive os de custo.
10 As estatísticas descritivas para cada firma não serão apresentadas em virtude da sigilosidade dos dados.
Vol. 3, N. 1 (2009) Revista de Literatura dos Transportes - RELIT Página 25
Tabela 1 – Estatísticas Decritivas das Variáveis do Modelo
4.4 Estimador, Endogeneidade e Instrumentos
A estimação de um sistema de demanda e oferta pode ser realizada de duas formas: utilizando
somente um procedimento (equações simultâneas) ou em etapas, equação-por-equação
(estimação em dois estágios). Nesse trabalho, será utilizado o segundo, que em geral, tem a
vantagem de que a estimação de uma equação não influencia a estimação das outras equações
do sistema e ainda, será realizada através de painéis de ligações para cada firma.
O método de estimação utilizado foi o MMG (Método dos Momentos Generalizado). Este
estimador se mostra mais eficiente com relação aos métodos usuais de estimação de sistemas
de equação, por ser robusto à presença de heteroscedasticidade desconhecida (Wooldridge,
2002). Através do uso de variáveis binárias de rota, espera-se controlar os efeitos que não se
alteram no tempo, o que deve produzir resultados equivalentes ao estimador de efeitos fixos
para painéis de dados.
Nas equações de demanda (para cada firma), as variáveis consideradas endógenas no modelo
foram p e p . Nesse caso, os instrumentos utilizados foram: custo do combustível, da
manutenção, do aluguel, das tarifas aeroportuárias e distância média das etapas percorridas,
todos defasados de um período, e preços em outros mercados – no caso, em outras rotas. Estes
últimos foram construídos conforme os procedimentos utilizados por Hausman, Leonard e
Zona (1994). Os autores partem da idéia de que choques de demanda em mercados diferentes
são independentes, logo exógenos. Isso quer dizer que os preços de um mesmo produto
possuem componentes comuns de custos, ou seja, de oferta em mercados de diferentes
Variáveis Média Desvio-Padrão Mínimo Máximo
q 1,932.35 2,363.77 22.16 16,899.63
p (R$) 461.91 189.83 175.45 1,191.83
p- (R$) 414.00 145.93 176.72 959.23
cme (R$) 304.00 155,193.00 56.00 948.12
Vol. 3, N. 1 (2009) Revista de Literatura dos Transportes - RELIT Página 26
regiões, além de um componente não observado de demanda específico de cada região e, na
medida em que estes choques de demanda específicos a cada região são independentes entre
si e os preços são formados com base em custos comuns, o preço em outra localidade será um
bom instrumento não correlacionado com o erro e correlacionado com a variável endógena.
Essa hipótese pode ser testada a partir dos testes J de Hansen e LR de Anderson.
Nas relações de oferta, as variáveis consideradas endógenas no modelo foram rtq e
tcâmbioqrt _ . Os instrumentos utilizados nesse caso foram PIB (deslocador da demanda) e
características das firmas rivais, tais como: vôos com stops, vôos durante o fim-de-semana,
vôos durante a semana e vôos no pico; todas medidas como fatias de mercado (em termos de
assentos transportados) da respectiva empresa, em determinada rota, em determinado mês. A
utilização de características das rivais como instrumentos para a oferta foi sugerida por Berry,
Levinson e Pakes (1995), cuja lógica está no fato de que atributos são bons deslocadores de
demanda da firma (relevantes) e atributos das rivais não estão correlacionados diretamente
com o preço da firma (válidos/ortogonais).
Em ambos os casos, equações de demanda e relação de oferta, foram realizados testes de
validade e relevância dos instrumentos através dos testes J de Hansen e LR de Correlação
Canônica de Anderson, respectivamente.
4.5 Estimação em Dois Estágios, Correção de Desvios Padrões e Bootstrapping
Um problema quando se trabalha com modelos de estimação em dois estágios é que o modelo
do segundo estágio contém variáveis construídas com parâmetros estimados no primeiro
estágio. A prática usual é desconsiderar o fato de que essas variáveis são aleatórias e proceder
à estimação do modelo de segundo estágio como se todas as variáveis fossem determinísticas.
Esse procedimento continua produzindo estimativas não tendenciosas (coeficientes estão
corretamente estimados), porém, elas não são eficientes, pois a matriz de variância-
covariância das estimativas dos parâmetros de segundo estágio inclui ruído induzido pelas
estimativas do primeiro estágio. Em outras palavras, o problema se traduz em desvios-padrões
incorretos, o que implica resultados não confiáveis para testes de hipótese.
Vol. 3, N. 1 (2009) Revista de Literatura dos Transportes - RELIT Página 27
Pode-se realizar a correção do desvio-padrão de duas maneiras: baseado na fórmula
assintótica ou através de método simples de reamostragem chamado bootstrap. Em seus
estudos, Karaca-Mandic e Train (2002) constataram que a correção do desvio-padrão baseado
na fórmula assintótica e no bootstrap apresentaram resultados similares.
O Bootstrap é um método de reamostragem com reposição de elemento descrito
primeiramente por Bradley Efron (1979). A teoria de modelos baseados em amostragem para
inferências estatísticas parte da hipótese de que os dados surgem como uma amostra de
alguma distribuição de probabilidade conceitual f. Incertezas sobre as inferências podem ser
medidas se for estimado f. A idéia fundamental do método bootstrap é que se pode computar
medidas de incerteza (média, intervalo de confiança, desvio-padrão) a partir da distribuição de
f estimada da amostra (Burnham, 2004).
Existem duas situações distintas em que o bootstrap atua: a paramétrica e a não-paramétrica.
Quando existe um modelo matemático particular, com constantes ajustáveis ou parâmetros
que determinam f, o modelo é chamado de paramétrico e os métodos estatísticos baseados
nesse modelo são métodos paramétricos. Nesse caso, a estatística de interesse, , é
componente ou função de . Quando nenhum modelo matemático é usado, a análise
estatística é não-paramétrica, e usa apenas o fato de que as variáveis aleatórias são
independentes e identicamente distribuídas. No caso de tratar-se de um modelo paramétrico, a
análise não-paramétrica pode ser útil para indicar a robustez das extrações da análise
paramétrica (Hair et all, 1998).
Em geral, métodos de reamostragem são mais utilizados em aproximações não-paramétricas.
Nesse caso, o procedimento consiste na geração de múltiplas amostras (x*B) – onde B é o
número de reamostras bootstrap - a partir de uma amostra inicial (x), através de um processo
aleatório e com reposição. Freqüentemente, a amostra é composta de n unidades
independentes, e isso basta para fazer um simples exemplo aleatório de tamanho n, com
reposição, e obter uma amostra bootstrap.
Vol. 3, N. 1 (2009) Revista de Literatura dos Transportes - RELIT Página 28
O conjunto B das reamostras bootstrap é uma proxy para um conjunto B de amostras reais
independentes de f (na realidade tem-se somente uma amostra atual de dados). Propriedades
esperadas da replicação de amostras reais são inferidas das amostras bootstraps (uma a uma),
exatamente como inicialmente foi analisada a amostra real de dados. Do conjunto de
resultados de amostra tamanho B, pode-se medir as incertezas sobre inferência da amostra
para a população. O bootstrap pode trabalhar bem para amostras de grandes tamanhos (n),
mas pode não ser confiável para pequenas (n = 5, 10 ou até 20). A distribuição bootstrap pode
ser vista como aproximação altamente acurada da verdadeira distribuição da amostra do
estimador (Burnham, 2004).
4.6 Resultados
Os resultados das estimações das demandas são apresentados na Tabela 2. Pode-se observar
que todos os coeficientes são significativos e possuem sinais condizentes com expectativa da
teoria econômica: preço próprio negativamente relacionado com a quantidade demandada
(aumento de preço próprio reduz a demanda por esse serviço); preço do rival/substituto
positivamente relacionado com a quantidade demanda (aumento do preço do rival, aumenta a
demanda da firma) e; renda positivamente relacionada com a quantidade demandada
(aumento da renda, aumenta consumo desse serviço).
Entre as firmas, o maior valor estimado para o parâmetro de preço próprio foi o da Gol, isso
reflete o fato de que seus passageiros são mais sensíveis a preço do que os passageiros das
demais. O maior valor estimado para o parâmetro de preço das rivais foi o da Vasp,
indicando que diante de um aumento em seus preços, sua perda de demanda seria maior do
que se fosse com qualquer outra firma. Com relação ao PIB, o maior valor estimado está na
equação de demanda da TAM, sinalizando a maior sensibilidade de seus passageiros diante de
uma alteração na renda.
Um ponto que merece considerações é o fato do valor estimado para o parâmetro do PIB ser
negativo e significativo (1% de significância) para a Vasp. Esse resultado inesperado
possivelmente pode ter relação com a crise da empresa que já despontava nesse período, ou
seja, apesar de um aumento de renda da economia (PIB), a empresa, devido à crise, perdia
demanda para os concorrentes.
Vol. 3, N. 1 (2009) Revista de Literatura dos Transportes - RELIT Página 29
Tabela 2 –Resultados: Lado da Demanda
***-Significativa ao nível de 1% de confiança. ** - Significativa ao nível de 5% de confiança.
* Significativa ao nível de 10% de confiança. Dummies controladoras de rotas foram omitidas.
A Tabela 3 apresenta as elasticidades estimadas desagregadas por empresa. Todos os valores
correspondem às elasticidades no ponto médio.
Tabela 3 – Elasticidades-Preço Estimadas
Variáveis explicativas Gol Tam Varig Vasp
p -7,06*** -4,37*** -6,24*** -5,03**
(1,35) (0,84) (1,41) (1,94)
p- 5,90*** 4,96*** 3,44*** 7,18**
(0,94) (1,29) (0,82) (3,08)
PIB 33,60*** 39,52*** 20,81*** -13,64***
(3,28) (6,61) (6,71) (4,66)
constante -3276,69*** 8369,91*** -468,47 1139,58
(515,44) (1055,44) (985,02) (971,63)
Número de Observações 400 400 400 400
Centered R² 0,78 0,93 0,75 0,84
F (82, 1593) 56,63*** 117,01*** 66,92*** 50,19***
Estatística J de Hansen 8,41 9,49 12,62 5,73
Estatística LR de Anderson 121,68*** 123,93*** 89,38*** 12,58**
p
p
p
p
FirmasElasticidade
preço-própria
Elasticidade
preço-cruzada
Elasticidade
renda
Gol -2.03 2.55 3.48
Tam -5.64 3.82 10.63
Varig -8.05 2.64 5.59
Vasp -6.73 10.62 -5.99
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Destaca-se que o maior valor para a elasticidade própria foi encontrado para a Varig e o
menor para a Gol; o maior para elasticidade cruzada corresponde ao da Vasp e o maior para
elasticidade renda corresponde ao da TAM. De fato, era esperado que as elasticidades ao nível
da firma fossem maiores do que as encontrada ao nível do mercado (agregada), que gira em
torno de –0,4 (elasticidade-preço) e 1,1 (elasticidade-renda). Isso decorre do fato de que o
transporte aéreo representa um serviço essencial, principalmente em viagens de longa
distância ou de necessidade rápida (demanda agregada inelática) no entanto, o passageiro tem
opções em relação à escolha da empresa com a qual pretende obter o serviço (demanda da
firma elástica). Além disso, elasticidades menores para a Gol e maiores para a Varig, refletem
a estrutura linear da demanda, em que preços menores estão relacionados a elasticidades
menores e preços maiores estão relacionados a elasticidades maiores.
Na Tabela 4 estão reportadas as estimativas das relações de oferta (padrão, tomador de preço
e equiparador de preço) para cada firma.
Tabela 4 – Resultados: Relação de Ofeta (Gol)
***-Significativa ao nível de 1% de confiança. ** - Significativa ao nível de 5% de confiança.
* Significativa ao nível de 10% de confiança. Dummies controladoras de rotas foram omitidas.
Variável (1) Sem transformação(2) Com transformação
Tomador de Preço
(3) Com transformação
Equiparador de Preço
q 0,10*** 0,74** 0,12**
(0,02) (0,29) (0,04)
q_tcambio -0,04*** -0,31*** 0,052**
(0,01) (0,15) (0,03)
cme 0,30*** 0,30*** 0,30***
(0,08) (0,10) (0,11)
Número de Observações 420
Centered R² 0,70
F (82, 1593) 74,36***
Estatística J de Hansen 7,61
Estatística LR de Anderson 11,12*
Vol. 3, N. 1 (2009) Revista de Literatura dos Transportes - RELIT Página 31
Tabela 5 – Resultados: Relação de Ofeta (Tam)
***-Significativa ao nível de 1% de confiança. ** - Significativa ao nível de 5% de confiança.
* Significativa ao nível de 10% de confiança. Dummies controladoras de rotas foram omitidas.
Tabela 6 – Resultados: Relação de Ofeta (Varig)
***-Significativa ao nível de 1% de confiança. ** - Significativa ao nível de 5% de confiança.
* Significativa ao nível de 10% de confiança. Dummies controladoras de rotas foram omitidas.
Variável dependente
(1) Sem transformação –
Precificação ao custo
marginal
(2) Com transformação – (3) Com transformação -
q 0,13*** 0,57*** 0,07***
(0,04) (0,23) (0,03)
q_tcambio -0,04** -0,19*** -0,03***
(0,01) (0,07) (0,00)
cme 0,60*** 0,60*** 0,60***
(0,10) (0,11) (0,11)
Número de Observações 420
Centered R² 0,70
F (82, 1593) 64,86***
Estatística J de Hansen 1,88
Estatística LR de Anderson 26,56***
Variável dependente
(1) Sem transformação –
Precificação ao custo
marginal
(2) Com transformação – (3) Com transformação -
q 0,12*** 0,76** 0,34**
(0,05) (0,38) (0,16)
q_tcambio -0,04*** -0,26*** -0,12***
(0,01) (0,09) (0,04)
cme 0,49*** 0,49*** 0,49***
(0,08) (0,10) (0,09)
Número de Observações 420
Centered R² 0,88
F (82, 1593) 148,31***
Estatística J de Hansen 7,06
Estatística LR de Anderson 15,04**
Vol. 3, N. 1 (2009) Revista de Literatura dos Transportes - RELIT Página 32
Tabela 7 – Resultados: Relação de Ofeta (Vasp)
***-Significativa ao nível de 1% de confiança. ** - Significativa ao nível de 5% de confiança.
* Significativa ao nível de 10% de confiança. Dummies controladoras de rotas foram omitidas.
Para os modelos em que houve modificação da variável q - tomador de preço e equiparador
de preço – as estimativas dos desvios-padrões apresentadas já foram corrigidas através do
bootstrap. O sinal do custo médio é positivo, conforme esperado. O coeficiente de q
(parâmetro de conduta) também se mostrou positivo e condizente com a teoria econômica. A
variável deslocadora de q devido ao câmbio, apresentou sinal negativo em todos os modelos.
Essa variável representa a variação da conduta associada à variação na taxa de cambio. É
importante ressaltar que não se trata do efeito da taxa de câmbio sobre o preço ofertado, uma
vez que essa relação é originalmente positiva (aumento dos custos eleva os preços). Se se
considera que durante o período da base de dados houve um período de desvalorização
cambial e isso foi captado pela variável em questão, o resultado pode ser justificável se
pensarmos que durante um período de desvalorização cambial as firmas se tornam mais
agressivas competitivamente para manter suas margens de lucro. Ou seja, diante dessa
situação, não há necessariamente a necessidade de coordenação entre as firmas para que não
haja perda de lucratividade, pelo contrário, trata-se de uma situação mais ―individualista‖ em
que cada qual busca, por outras maneiras, se manter competitiva no mercado.
Variável dependente
(1) Sem transformação –
Precificação ao custo
marginal
(2) Com transformação – (3) Com transformação -
q -0,17 1,67 -1,20
(0,19) (2,71) (1,90)
q_tcambio 0,03 1,00 0,04
(0,04) (1,83) (0,08)
cme 0,24*** 0,24** 0,25***
(0,08) (0,09) (0,08)
Número de Observações 420
Centered R² 0,87
F (82, 1593) 129,81***
Estatística J de Hansen 1,18
Estatística LR de Anderson 8,26**
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O grau de ajustamento dos modelos, representado pelo 2R , enquadrou-se entre 70% e 88% e
os testes de significância conjunta das variáveis do modelo (teste F) foram estatisticamente
significantes ao nível de 1% .
Os instrumentos também se mostraram eficientes no procedimento de identificação das
relações de oferta; os testes de validade dos intrumentos – Estatística J de Hansen ( :0H o
instrumento é válido e :aH o instrumento não é válido) – não foram rejeitados e os testes de
redundância dos instrumentos – Estatística LR de Anderson ( :0H o instrumento é redundante
e :aH o instrumento não é redundante) foram rejeitados.
Novamente, os resultados nas relações de oferta para a Vasp se mostraram contrários à teoria
econômica no que diz respeito ao sinal de q , que se apresenta negativo. As estimativas para
os custos foram positivas e significantes e, apesar de os instrumentos se mostrarem
razoavelmente bons, não foi possível identificar a equação de oferta.
As Tabelas 13 e 14 apresentam os testes de conduta para o ―caso base‖ e para a situação de
efeito da taxa de câmbio, respectivamente. Os resultados dos testes mostram que a hipótese de
equiparação de preço é rejeitada em qualquer dos modelos, sob qualquer situação. Isso mostra
que não há constatação empírica que as firmas atuaram de forma coordenada no mercado
(racionalidade de cartel) para o período de julho de 2002 a março de 2004.
Tabela 13 – Teste de conduta – Caso Base
Firmas Precificação ao custo
marginal (H0: 2 = 0)
Tomador de preço
(H0: 2 = 1)
Equiparador de preço
(H0: 2 = 1)
Gol 0,10*** 0,74 0,12***
TAM 0,13*** 0,57* 0,07***
Varig 0,12*** 0,76 0,34***
Vasp -0,17 1,67 -1,19
***-Significativa ao nível de 1% de confiança. ** - Significativa ao nível de 5% de confiança.
* Significativa ao nível de 10% de confiança. Dummies controladoras de rotas foram omitidas.
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Tabela 14 – Teste de conduta – Efeito da taxa de câmbio11
Firmas Precificação ao custo marginal
(H0: 2 + 3 * tcambio = 0)
Tomador de preço
(H0: 2 + 3 * tcambio = 1)
Equiparador de preço
(H0: 2 + 3 * tcambio = 1)
Gol -0,02* -0,23*** -0,037***
TAM -0,004 -0,03*** -0,02***
Varig 0,006 - 0,06*** - 0,04***
Vasp -0,06 4,81 -1,06
***-Significativa ao nível de 1% de confiança. ** - Significativa ao nível de 5% de confiança.
* Significativa ao nível de 10% de confiança. Dummies controladoras de rotas foram omitidas.
Tabela 15 – Estatística descritiva de preços
Média Desvio-Padrão Mín Máx
p 455,18 181,75 175,45 1131,66
p (na desvalorização cambial) 470,90 199,87 176,72 1191,83
Para o caso base, não se pôde rejeitar a hipótese de tomador de preço para as firmas
(equilíbrio competitivo para produto diferenciado). Esse resultado também foi encontrado no
trabalho de Oliveira (2005), em estudo sobre a competição na ligação Rio de Janeiro - São
Paulo. Assim, pode-se dizer que, apesar de o setor apresentar várias características
classificadas como facilitadoras de possível conluio entre as firmas, tal situação não foi
verificada com base nos dados. Possivelmente, a diferenciação em termos de estrutura
tarifária e de estratégias adotadas pelas firmas, ainda mais acentuada no pós-
desregulamentação, tenha se configurado como um fator relevante para a obtenção desse
resultado de não-coordenação.
A análise da conduta diante de um choque de desvalorização cambial mostrou que as firmas
se tornaram mais competitivas (não rejeição de precificação ao custo marginal) quando se
incorpora essa situação ao modelo. Diante desse resultado e analisando-se a base de dados,
percebe-se que, de fato, durante o período de desvalorização cambial a variância dos preços se
tornaram maiores, ou seja, houve maior ―descolamento‖ de preços entre as firmas – refletido
na redução do valor do parâmetro de conduta e maior competição entre as firmas (Tabela 15).
11
Os valores utilizados correspondem à soma do coeficiente de q ao coeficente de q_tcambio multiplicado pela
taxa de cambio média, ou seja, o efeito da taxa de câmbio na conduta é representado por:
tcambiotcambioqq *_ .
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Realizando um teste de igualdade de variâncias, não se pôde rejeitar a hipótese de que há
diferença entre elas.
Tal resultado pode ser justificado se levarmos em conta que diante de uma situação adversa,
as firmas se tornam mais agressivas competitivamente, visando preservar sua própria margem
de lucro. Além disso, a dificuldade em repassar integralmente o aumento dos custos – devido
à desvalorização cambial - para o valor das passagens aéreas, também colabora para uma
situação de equilíbrio de mercado em que os preços se apresentam mais próximos ao custo
marginal.
Os resultados inconclusivos de conduta para a Vasp refletem estimativas da oferta cujos sinais
não foram condizentes com a lógica econômica. De fato, os dados relativos à Vasp não
tiveram o mesmo ajustamento dos dados correspondentes à demais firmas. Um possível
justificativa seria a crise pela qual a empresa já passava nesse período.
Conclusões
Esse trabalho buscou estudar a conduta competitiva das companhias aéreas brasileiras para as
principais ligações do país através dos chamados ―modelos de parâmetro de conduta‖,
desenvolvidos dentro da abordagem da Nova Nova Organização Industrial Empírica. A
análise foi realizada com dados que compreenderam o período de julho de 2002 a março de
2004, para as quatro principais firmas (Gol, TAM, Varig e Vasp) dentro de um conjunto de 21
ligações de pares de cidades. Foi incorporada à metodologia, a aplicação de um método
chamado Bootstrap, utilizado como forma de corrigir os desvios-padrões das estimativas
obtidas da relação de oferta de modo a permitir a realização de testes de hipótese mais
confiáveis para conduta.
Os resultados mostraram que durante o período da base, não foi possível rejeitar a hipótese de
que as firmas adotaram uma conduta não-cooperativa (Equilíbrio Bertrand Nash para produto
heterogêneo ou situação de Tomador de preço). De fato, em outros trabalhos realizados para o
setor (Oliveira, 2005 e Lovadine e Oliveira, 2005) foram obtidos resultados semelhantes. Isso
significa que apesar do setor de transporte aéreo congregar algumas características
aparentemente possíveis facilitadoras para uma conduta colusiva (oligopólio, barreiras à
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entrada, inelasticidade agregada da demanda, etc), os resultados empíricos não comprovam
essa idéia.
A análise da conduta para um dos eventos relevantes para o período – desvalorização cambial
de 2002 - mostrou que esse evento produziu uma conduta mais competitiva, de modo que não
foi possível rejeitar a hipótese de precificação ao custo marginal para essa situação. Tal
resultado pode ser justificado se levarmos em conta que diante de uma situação adversa, as
firmas se tornam mais agressivas competitivamente, visando preservar sua própria margem de
lucro. Do exposto, conclui-se que não há indícios para afirmar que houve abuso de poder de
mercado via conduta coordenada em preços por parte das firmas, uma vez que essa hipótese
foi rejeitada na análise empírica. É importante ressaltar que os resultados de estudos
empíricos devem ser complementares dentro da análise antitruste, não desconsiderando o fato
de existirem evidências outras que devem ser investigadas para um julgamento adequado.
Como sugestões para aperfeiçoamento do trabalho, a primeira delas seria a utilização de outra
forma funcional para a estimação da demanda. Conforme apontado no tópico 5.2, existem na
literatura atual, formas que conferem maior flexibilidade aos parâmetros estimados da
demanda (log-linear, logit e Almost Ideal Demand System) e que, conseqüentemente,
impactam nas estimativas das elasticidades obtidas. Outro ponto que mereceria maior atenção
seria com respeito ao encontro de instrumentos para identificar a relação de oferta. De fato
esse foi um ponto crítico do trabalho e que inviabilizou a exploração de um único painel de
ligações e firmas. Por fim, caberia ainda um estudo aprofundado da base de dados com
relação à Vasp. Pode ser que um estudo minucioso dos dados ajude a entender os resultados
inesperados nas estimações e nos testes de hipótese para essa firma.
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