1
Louis Lavelle O social é o inimigo Como todos sabem, o social é o inimigo. Origina-se a força do social sempre da inveja ao individual. A vida social sensaboriza, descora e esgota o pensamento, banaliza-o e materializa-o. Transforma o ser em algo de verbal e falso e obriga-o a discutir, a se defender e atacar. Distancia-o amiúde do centro de si mesmo. Como se abolisse o indivíduo, ela empresta toda sua força ao amor-próprio e sai em busca dum território comum a todos, que há de ser ou a opinião, isto é, o mundo, ou a intimidade de Deus. É inata ao grupo a abolição de toda comunicação possível entre homens, pois a comunicação se trava entre indivíduos e se dá para além do grupo, no universal. Existem apenas duas formas de comunicação: a amizade e o amor. Mas é inato ao grupo excluí-las. Sob a forma duma presença anônima, pesada e odiosa, o coletivo me esmaga. Perde tempo quem queira conciliá-lo com a existência da pessoa e com as relações interpessoais, pois o coletivo é a negação das duas, é força que exalta o corpo, mas oprime a alma. Apenas em sociedade encontram o seu arrimo o materialista e o ateu, apenas em solidão o espiritual e o religioso. Somente a comunhão dos solitários é a verdadeira. Eis o paraíso, em oposição à comunidade das massas, em que se atritam os corpos ou em conjunto emitem os mesmos gemidos. Evitai o comunismo e até a comunidade, que obrigam os homens a comunicar apenas o lado mais banal de si mesmos. Eia pois, que não se deve comunicar aos outros nem o que dissemos da solidão.

Louis Lavelle O social é o inimigo

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Louis Lavelle   O social é o inimigo

Louis Lavelle O social é o inimigo

Como todos sabem, o social é o inimigo. Origina-se a força do social sempre da inveja ao individual.

A vida social sensaboriza, descora e esgota o pensamento, banaliza-o e materializa-o. Transforma o ser em algo de verbal e falso e obriga-o a discutir, a se defender e atacar. Distancia-o amiúde do centro de si mesmo. Como se abolisse o indivíduo, ela empresta toda sua força ao amor-próprio e sai em busca dum território comum a todos, que há de ser ou a opinião, isto é, o mundo, ou a intimidade de Deus.

É inata ao grupo a abolição de toda comunicação possível entre homens, pois a comunicação se trava entre indivíduos e se dá para além do grupo, no universal. Existem apenas duas formas de comunicação: a amizade e o amor. Mas é inato ao grupo excluí-las. Sob a forma duma presença anônima, pesada e odiosa, o coletivo me esmaga. Perde tempo quem queira conciliá-lo com a existência da pessoa e com as relações interpessoais, pois o coletivo é a negação das duas, é força que exalta o corpo, mas oprime a alma.

Apenas em sociedade encontram o seu arrimo o materialista e o ateu, apenas em solidão o espiritual e o religioso.

Somente a comunhão dos solitários é a verdadeira. Eis o paraíso, em oposição à comunidade das massas, em que se atritam os corpos ou em conjunto emitem os mesmos gemidos.

Evitai o comunismo e até a comunidade, que obrigam os homens a comunicar apenas o lado mais banal de si mesmos. Eia pois, que não se deve comunicar aos outros nem o que dissemos da solidão.