8
NTRAPON por " Campos, "Ido SilveIra eira Cobra Leom " ue Nogu Marcos Henn q es Costa e Esdras Borg

por Campos, LeomIdoSilveIra Nogueira Cobra Marcos Hennq ue ...rae.fgv.br/sites/rae.fgv.br/files/artigos/10.1590_S0034... · pentecostalismo, surgiu no início deste século e rapidamente

Embed Size (px)

Citation preview

NTRAPON

por " Campos,"Ido SilveIra eira CobraLeom " ue NoguMarcos Hennq

esCosta

e Esdras Borg

-'HOSTIAS EDIR

A

CONTEM MAISDEUS

-MARKETING e RELIGIAO

o::~::::~;:~~l~~:::~=crescer a sua comunidade de fiéis. Suasestratégias, que muito antes já incluíamo uso abundante da retórica, gestos,imagens e símbolos, institucionaliza-ram-se apenas em 1622, com a criação,por Gregório XV, da Congregação paraa Propaganda da Fé.

O movimento do qual a Igreja Uni-versal do Reino de Deus faz parte, opentecostalismo, surgiu no início desteséculo e rapidamente teve intenso cres-cimento, usufruindo inclusive de novas-descobertas como o rádio e a televisão.Mas, muito antes da explosão pentecos-tal, existiram pregadores do "desperta-mento religioso" - tais como Wesley,Moody e Billy Sunday - que já se uti-lizavam de métodos agressivos, e nemsempre ortodoxos, para atraírem a aten-ção e seduzirem segmentos da popula-ção anglo-saxônica arredios às práticasreligiosas. Um deles, por exemplo,Wesley (século XVIII), ia até as pes-soas nos campos, feiras e minas de car-vão, e comunicava-se com elas usandolinguagem popular, tendo como púlpi-to simples caixotes de madeira. Outrofoi D. L. Moody (1837-1899), queabandonou o comércio atacadista de sa-patos para se dedicar à pregação reli-giosa. Seus métodos incluíam afixaçãode cartazes em toda a cidade, contrata-

s de cesaís econs ••de planejamento e p

ganda,""s~ét_as evangelístiilly SU~,1r (+1935), outro im-

e nome,' a músicas~1)Uare~,dí.:9figem . deseus ClJlttos espetãculossemelharifês aos showsditório,uma estratégia que, deca depois.torn4lise-iam marcas registradas da."lgreJl!',;Eletrônica"q~Oral Rob~,J.ry Falwell, Jimmy Swagoutros.

"~i' ;"Mesm6<com essas tentativas ionei-ras'8e sintonizar o~uto religioso

s anseios "liio povo, não se podialar na existê, ia de um ',~rke-

ting dO sagrado' , nalmen6p"ne-jado, antes do .io da segude deste'

em parceria come outros, do livro Marke-

for congregations - choosing to,e people more effectivety'. No en-to, desde os anos 70, assistia-se à

irrupção de um fenômeno religioso-co-mercial - os "televangelistas", tam-bém pentecostais - que tomou contade certas áreas da mídia norte-ameri-cana, com repercussões até mesmopolíticas (eleições de Carter, Reagane Bush). Os "televangelistas" fizeramda teatralização da fé espetáculos demassa, primeiro no rádio e depois natflevisão.

Assim, o cenário religioso foi dei-xando de se situar num ambiente "re-lativamente estável-dinâmico", parase tornar "turbulento" (Eric Trist e F.E. Emery) e "pluralista" (Peter Berger).A partir de então, num contexto decompetição, a sobrevivência tornou-sequestão básica para as organizaçõesreligiosas, exigindo delas a incorpora-ção da lógica do mercado e, conseqüen-temente, o desenvolvimento de práticasderivadas do marketing das organiza-ções seculares. Peter Berger captoubem essa nova "ecologia organizacio-nal" ao registrar que" a situação plura-lista é, sobretudo, uma situação demercado. Nela, as instituições religio-sas se convertem em agências comer-ciais e as tradições religiosas, em mer-cadorias para o consumidor. Em todo

.'1'bIJç()esque s~W;lr-tmpClis os t~os de

Os religiosos ainda não tinham a visãode que era possível desenvolver técni-cas mais eficientes de intervenção nocomportamento de pessoas, em proces-sos de troca de bens simbólicos.

As pistas para uma abordagem maissistemática do marketing das organiza-ções religiosas foram aprofundadas em1975, por Philip Kotler, com o seu esti-mulante livro Marketing for non-profitorganizations e, 17 anos depois, com a

© 1996,RAE Light /EAESP/FGV,São Paulo, BrasiL 5

CONTRAPONTO

caso, grande parte da atividade reli-giosa, nesta situação, é dominada pelalógica da economia de mercado "2.

o marketing fazendo carreirana religião

o emprego calculista do marketingpelos religiosos ganhou força nos anos80. Em 1984, George Barna fundou,na Califórnia, a Barna Resea .Group, empresa especializadamarketing e também em prestar servi-ços para igrejas. A sua perspectiva foiresumida no livro O marketing naigreja', no início dos anos 90. Em SãoPaulo, há o exemplo de uma megaigre-ja, Igreja Renascer em Cristo, cujofundador, Estevam Hernandes Alho,foi gerente de marketing de grandesempresas no ramo de computação.

É claro que esse uso das estratégiasde marketing encontrou barreiras., ta&"to entre os especialis-tas seculares como en-tre os próprios religio-sos. Barna reproduzargumentos típicosdos que afirmam: "omarketing não pareceser uma prática bíbli-ca, é uma atividade

licos, segmentação, alvo, posição, es-tratégia, produtividade e outros mais. Acirculação desses vocábulos indica queo marketing está se tornando uma fer-ramenta para as organizações religio-sas atingirem objetivos que vão dacooptação do laicato para seus proje-tos de crescimento institucional até aacumulação de poder e dinheiro - "osangue da Igreja, sem o qual ela nãopode sobreviver", segundo Edir

cujas .padronizadaJ.~:':i

aguarêlam tormes'também seriadas

tratamento.mundana'", De formasemelhante, Kotler, Schawchuch et al?observaram que a maior parte das crí-ticas formuladas pelos religiosos são nosentido de que "o marketing joga foraum dinheiro que é de Deus" e que, porisso mesmo, não passa de "uma ativi-dade intrometida ", "manipulatária" e"dessacralizadora da religião".

A despeito do preconceito antinegó-cio, o discurso recente dos religiososfoi recheado de termos como imagem,troca, satisfação, produto, bens simbó-

6

em membresia" e patrimônio. Lembre-mos que em 1996, no seu 19· ano defuncionamento, essa igreja possui maisde 4,5 milhões de seguidores, ultrapas-sou o número de 2.000 templos no Bra-sil, está presente em mais de 40 paísese é proprietária da quinta maior rede detelevisão brasileira, a Rede Record deTelevisão, na qual foram investidos atéhoje cerca de US$ 100 milhões. Publica

um jornal semanal, com circulação na-cional, cuja tiragem é de aproximada-mente 800.000 exemplares, um jornaldiário em Minas Gerais, de caráter secu-lar, um na África do Sul e um outro nosEstados Unidos. Além disso, por meiode seus pastores e bispos, é proprietáriade dezenas de estações de rádio em pa-íses onde ela se faz presente de formaagressiva - Brasil, Portugal e algunspaíses da África - e em outros, onde

é menor, situados na Euro-Latina e América do Nor-

álise desse sucesso religioso-implica aceitar que há vá-

rias que indicam caminhos paraa sua explicação, assim como há inú-~$ paradigmas que subsidiam cadauma das interpretações. A perspectivade marketing, embora muito importan-te,#penas uma dessas portas e podenolfjferecer várias contribuições paraunQnelhor entendimento do fenômeno.

M.rescimento patrimonial da IURD e, ~ .

~tros empreendedores autônomosates, a existência, no País, de um ren-doso mercado que funciona à margemda "economia religiosa" das chamadasi~eps históricas (católica e protestan-te Y e 40 próprio pentecostalismo clássi-~~sembléia de Deus e CongregaçãoÇrltã no Brasil). Trata-se de um mer-'cado de difícil mensuração, visto que

..dhá sonegação de informações por partedas igrejas e seitas e, ainda, que os da-dos estatísticos contraditórios geral-mente se transformam em armas depropaganda, sendo superestimadospelo ufanismo de certos líderes.

Um outro entrave para o conhecimen-to do potencial financeiro desse merca-do é o segredo que cerca a contabilida-de religiosa no Brasil. A JURO, favore-cida pela legislação fiscal, faz de seu

RAE Light • V.S • n.2

HÓSTIAS EDIR CONTÊM MAIS DEUS

faturamento um segredo guardado a sete formação teológica em seminários,chaves. Há alguns meses pensou-se que como os de outras denominações reli-esses valores viriam a público com a do- giosas. O seu treinamento acontececumentação apreendida emblitzconjun- no próprio local de trabalho, onde co-ta da Polícia Federal, Banco Central e meçam atuando em cargos denomina-Procuradoria da República. Entretanto, dos de obreiros, evangelistas, pastor-30 dias depois, umjuiz concedeu liminar auxiliar e, depois, pastor-efetivo, pas-ao mandato de segurança impetrado pela tor-regional ou bispo. Tod avia, oigreja, permitindo-lhe ter de volta todos entusiasmo de cada um deles no púl-os seus documentos e das empresas co- pito e no vídeo é notável, aparentandoligadas (rede de televisão, gráfica, fábri- estar gostando do que fazem e traba-ca de móveis, banco comercial e aglêl'MIJI.".l'I.dI~':de viagens).

Às vezes, alguns lampejos dessa rea-lidade oculta surgem nos poucos con-flitos de cúpula que provocam dissi-dências. Em 1991, o pastor CarlosMagno Miranda abandonou a igreja e- no que pesem dúvidas quanto à sualisura e honestidade pessoal - entre-gou para a imprensa cópias de balan-cetes contendo listas de contribuiçõesde vários templos e uma relação dopagamento de comissões a pastores.Arevista Isto É7, que publicou parte des-sas informações, revela que, somandoa arrecadação de apenas oito templosda JURO na Grande São Paulo, no tri-mestre agosto-outubro de 1990,contabilizou-se um total de US$2.168.600. E, mais ainda, que, no finalde 1995, cada um de seus 2.000 tem-plos no Brasil estava arrecadando US$40.000 por mês, o que representariaum total de US$ 960 milhões por ano.

A JURO conta com um entusiasma-do "corpo de vendas", apenas parcial-mente pago. Os "obreiros", homens emulheres, trabalham gratuitamente, eos pastores, num total de 7.000, rece-bem salários na faixa de R$ 750,00 aR$ 1.500,00, mais comissões de 2%sobre o aumento das contribuições deum mês para outro, além de algunsoutros benefícios, como casa e assis-tência médica. Os pastores não têm

RAE Líght • v.3 • n.2

O crescimento explosivo da JUROindica o acerto das estratégias de ofe-recimento de serviços religiosos apro-priados para determinados segmentosde pessoas, em função das carênciasque sofrem. Edir Macedo descobriu,na sociedade, a existência de um enor-me número de pessoas afetadas porproblemas de saúde, quase sempre deorigem psicossomática, ou por outros,advindos do alcoolismo, do consumo

do desemprego, e mesmo---...,da impossibilidadede ascensão social oudo risco de descensosocial. Muitas dessaspessoas entregam-seà depressão, geradapela baixa-estima epelo pessimismo, e aigreja se oferece aelas como um novocentro rearticulador

dlfrojeto de vida. Ao gravarem "tes-t.unhos de fé", transmitidos poste-riormente pela Rede Record de Tele-

'~"jl~ão,os fiéis dizem que" estavam nofunlio do poço ", "próximos ao suicí-dio ", quando então teriam ligado orádio ou a televisão e decidido ir a umtemplo da Igreja Universal, onde "to-dos os seus problemas foram resolvi-d~~', enfatizam.

Os sofredores e os necessitados for-,~""

'mam o público-alvo da IURD. Sãopessoas arrebanhadas de um mercadoreligioso mais amplo, onde estavamdiluídas e dispersas. Por meio da seg-mentação, elas são agrupadas por ne-cessidades homogêneas e estáveis,possibilitando a oferta de produtos pa-dronizados e produzidos em massa.Desta maneira, pessoas dirigidas pornecessidades de sucesso, riqueza eprestígio são atendidas pela "teologiada prosperidade", aquelas com necessi-

sua experiência como pastor na Bahia,no final dos anos 80, quando participa-va do expurgo de pastores considerados"improdutivos". Estes, segundoJustino, eram eliminados do "corpoministerial" sob acusações falsas de fa-lhas morais, geralmente adultérios, jáque somente alguns deles teriam come-tido a suprema falha, usar o dinheiro daigreja para fins particulares",

7

CONTRAPONTO

dade de cura psíquica ou física são en-caminhadas para a "cura divina", e assubjugadas por "poderes espirituaismaléficos" são dirigidas para a práti-ca do "exorcismo".

são inseridos na programação diurnaou noturna dos veículos de comunica-ção pertencentes à igreja. São históri-as de vida padronizadas na estruturasofrimento-desilusão/descoberta-so-lução, gravadas e trabalhadas em es-túdios, quase sempre acompanhadasde voz sobreposta do locutor, de mú-sica em maior ou menor volume, dequadros em flash-back, imagens so-brepostas, enfim, produzidas com

Para atender a essas pessoas, os tem-plos ficam abertos das 6h às 22h e ne-les há sempre um pastor ou um obreiroà disposição. A estratégia de manter ostemplos abertos o maior número de ho-ras ("templos de conveniência"?), detornar disponíveis serviços •..••'...,,'-'..•••,como o "disque fé" e de contatosas emissoras de rádio da igreja - algu-mas, como a Rádio São Paulo, perma-necem no ar 24 horas por dia - facili-ta o atendimento do desesperado pelasolidão, doença ou uma outra desgraçaqualquer. A mensagem que a I\lRD "igrejalhes entrega é repetida constantemen~~~cllãQ admite que gr

objetivoscooptação doaté a acumulação d~poder e dinheiro ....i:k~osangue da Igreja, semo qual ela não p

sobreviver".

te em suas programa-ções por meio doslogan: "Pare de so-frer, na Igreja Univer-sal do Reino de Deusum milagre esperapor você".

Os "testemunhos defé" são elementos fun-damentais no con-vencimento dos queestão em dúvida quan-to à idoneidade ou àfuncionalidade damensagem pregadapela igreja. Esses depoimentos sãoadaptados tecnicamente às exigênciasda mídia moderna. Neles aparecempessoas, semelhantes ao ouvinte ou te-lespectador, que contam como resol-veram os seus problemas num temploda IURD, depois de terem procuradosoluções na Igreja Católica, num ter-reiro afro-brasileiro, kardecista ou atémesmo numa outra igreja protestanteou pentecostal. Tais "testemunhos"

8

Na Igreja Universal, os dias da se-mana são divididos em "correntes defé", cuja função é selecionar, classifi-car e nivelar as pessoas, oferecendo-lhes rituais de acordo com as suas ca-rências. Nessas "correntes", a maioriadas necessidades classificadas porMaslow são contempladas, e cada umadelas é atendida em determinado dia

da semana. A sua pregação insiste quenão há aquela dicotomia que outrasreligiões fazem, entre carências espi-rituais e materiais. As bênçãos e sofri-mentos, materiais e espirituais, inter-ligam-se, e a IURD promete revolvê-los plenamente.

No calendário semanal iurdiano'", asegunda-feira é um dia muito importan-te e está dedicado ao tema da prosperi-dade financeira. Nesse dia, toda a retó-

mídia da igreja, no púlpíto e noscentra-se na idéia de que a pes-

aceitar o "desafio" e fazer<l1l,"UI."a com Deus" mediada pelo

, isto é, contribuição finan-se quiser progredir na vida mate-

rial. Assim, se o indivíduo quiser umnovo emprego ou melhor salário, deve"Mer um voto", ou "um sacrifício", eoferecer antecipadamente a Deus, numgesto de fé, o salário desejado. Trata-se 9luma monetarização do sacrifícioe das votos, procedimento comum no

licismo popular. Com esse ato, oemonstra "ter colocado em ação

,~ fé", já que, como afirma Edir"'acedo, "nada pode impedir os resul-tadi>sde uma fé quando colocada emação". Ao fazer a sua parte, o fiel au-tqmaticamente estabelece uma "alian-ça 'com Deus". Então, os pastores tran-qüüizam as pessoas, dizendo que estãose relacionando com um Deus "muito'sériç" e não com um "farsante", des-cu~ridor de promessas.

Na segunda-feira, realiza-se tambéma "corrente dos empresários", quando seinsiste junto aos fiéis que deixem de serempregados para serem proprietários,microempresários. É comum - umaprática semelhante a dos métodos darede de marketing Am Way - os queconseguem sucesso financeiro irem àfrente da platéia para contar o resultadoda sua prática de utilizar os ensinamen-

RAE Light • v.3 • n.2

HÓSTIAS EDIR CONTÊM MAIS DEUS

tos oferecidos, e cada "vitorioso" rece- que a JURO vai forjando os seus fiéis,ber uma salva de palmas do auditório. usando para isso um conjunto de signos

Na terça-feira, o produto ofertado é o percebidos no imaginário social. Con-milagre. Nos templos maiores, forma- tudo, as trocas entre "vendedor" ese um corredor onde 70 pastores rezam "comprador" ocorrem num contextoem voz alta, "exorcizando os demô- de tensão e de muita pressão psicoló-nios" das enfermidades que atrapalham gica sobre o fiel.a saúde das pessoas. Na quarta-feira, A Igreja Universal privilegia as fan-buscam-se experiências místicas mais tasias, os sonhos, a criatividade e asprofundas com a divindade. Já na quin- práticas mágico-simbólicas abandona-ta-feira, tudo gira em torno da felicida- das pelo protestantismo secular e dei-de familiar, tema corriqueiro par.,h~guns, porém relevante para certas tai~ • 'xas da população urbana que sofremdesajustes familiares. A sexta-feira édedicada à concorrência dos cultosafro-brasileiros e kardecistas, todostratados como "espiritismo" e, indistin-tamente, como "manifestações de de-mônios". Pratica-se, nesse dia, o exor-cismo - terapia indicada para afastaro único responsável por todos os sofri-mentos que um indivíduo experimentana vida: o diabo. O mal-estar, a deser-ganização social e a ansiedade e a an-gústia da vida atribulada numa socie-dade urbano-industrial são então perso-nificados e excluídos, por meio de umritual de impressionante poder drama-túrgico - a expulsão dos demônios.No sábado e no domingo, há uma repe-tição, em vários horários, de temáticasdos dias anteriores.

Dessa maneira, o pastor no palco-al-tar sempre lida com platéias segmenta-das, cujas necessidades padronizadasaguardam formas também seriadas detratamento. O discurso, os cânticos, asorações e as palavras repetidas pelosfiéis, tudo leva o indivíduo a se sentirparte integrante de um espetáculo doqual ele é um participante e não um as-sistente, como ocorre em outras igrejasde tradição protestante ou católica.Portanto, mais do que a propaganda namídia, é no envolvimento emocional

RAE Light • v.3 • n.2

••roI',.,..,,:, reiiqiaso«

,~apropriados para, determinados

, oas, em função$ carênc;s, que

sofrem.'

giosos~9sos, numa época .,

~~ukrização cres-~e~te. "'ida, de fimdts ufpias clássicas, "

de t,rr",~,r",'""",s,',fdrmação daitfãÜem algo invi-

, decrescaaeneeividualismo, de

mudanças

"que se recusa a morrer.Os produtos com a griffe "Univer-

sal" são diferenciados dos concorren-tes por meio de uma legitimidade niti-damente carismática, pois a propagan-da garante que a JURO é "uma igrejaque funciona", e porque funciona é umaigreja legítima. Esse argumento lembrauma frase de Claude Levi-Strauss, emAntropologia estrutural, quando se re-fere ao feiticeiro Quesalid: este não se

tornou um grande feiticeiro porque cu-rava os seus doentes, mas os curava por-que se tornou um grande feiticeiro. Apropaganda iurdiana é tautológica: aJURO é a "Igreja de Deus" porque fazmilagres, e faz milagres porque somen-te uma "Igreja de Deus" pode apresen-tar tão bons resultados.

Ao participar dos serviços religiososda Igreja Universal, o fiel recebe, deacordo com a "campanha de fé" que

sendo realizada no momento, umobjeto-símbolo dapresença da força di-vina. Ao final dacampanha, as pessoaslevam para casa uma"rosa abençoada";um punhado de "salorado", para fechar ocorpo contra os de-mônios; uma porçãode "óleo de Israel",para ungir um doenteem casa; cópia de umanota de cem reais,para "abençoar" as

is notas na carteira, e uma fitaazul, amarrada no pulso, para darmuita sorte nos negócios. Os objetosdistribuídos na igreja têm por finali-dade tornar tangível uma graça intan-gfvel. Diferentemente dos demaisgrupos religiosos concorrentes, aIURD não promete uma felicidadevindoura ou uma graça invisível. Asbênçãos divinas são tangibilizadas naforma de cura, de solução dos proble-mas e de objetos comprados no gran-de mercado que é a sociedade de con-sumo. Para ela, a presença divina pre-cisa ser visualizada nos objetos mate-riais. Desta forma, para o fiel é maisfácil levar para casa uma "varinha deJacó" (um palito de madeira que deveser apontado para o carro sonhado ou

9

CONTRAPONTO

emprego desejado) e usá-la como sefosse uma varinha mágica, do que co-locar em prática as decisões políti-cas sugeridas na Comunidade Ec1e-sial de Base ou imaginar O "galardãono céu" prometido pelo pastor do pro-testantismo histórico para o períodopós-morte.

A mídia tem explorado a questão da"mercantilizaçào" do sagrado e se re-ferenciado ao alto preço dos produtosiurdianos. Porém, a pessoa spela pregação dessa igrejaassim: "Se Deus vai me dar a saúdede que tanto preciso, o emprego e acasa com os quais sempre sonhei, e seirei conseguir comprar um carro'zero', o que é dar apenas 10% Q~

20% do que estou ganhando?" .,,;Ob-servemos que a lógica desse fief'não,coincide com o cartesianismo de mui-tos de seus críticos, pois o que ele temé muito pouco e sem valor, perto domuito que Deus lhe promete por p:t~dos pastores. A Igreja Universal ven-,de esperanças e promessas para ~C:i,

soas que, por se sentirem no "fim dalinha", têm pouco a perder. Daí de-corre a facilidade de uma inserção nabase do tudo ou nada. Desta maneira,o que poderia ser uma limitação parao seu crescimento, torna-se exata-mente o segredo de seu dinamismo.

Um outro aspecto importante, emtermos de marketing, é a ampliação doproduto na mente do consumidor. Emoutras palavras, a Igreja Universal ofe-rece um produto semi-acabado, cujamontagem final ocorrerá na mente decada consumidor, quando então eleacrescentará ao produto padrão, recebi-do numa grande concentração de mas-sa, aquelas características e soluçõesexigidas pela sua dor particular. Essaestratégia permite à igreja se apropriardos bons resultados do otimismo des-

10

pertado no fiel e, paradoxalmente, atri-buir a este os possíveis insucessos. Istoé, o sucesso, quando existe, deve-se aocapital religioso acumulado pela igreja,e os insucessos, ao fiel, seja por algumafalha na observância dos rituais, sejapor não ter tido fé suficiente, pois "semfé é impossível agradar a Deus".

Em termos de moralidade e ética, areligiosidade despertada nos fiéis daIURD gera menor repressão quanto

do

compura );,,,,simpporv~tlJra

,J'- ,: -, .não podem ser deixados de lado: o po-lítico e o que se refere à imagem daIURD junto à opinião pública. A IgrejaUniversal articula um discurso apolíti-co" que, entretanto, não se sustenta,diante de uma prática que sinaliza serela portadora de um projeto políticopara o País. No período eleitoral, seustemplos têm se transformado em comi-tês eleitorais de pastores e membroscom candidaturas referendadas pelo

"colégio de bispos". Foi dessa formaque os membros dessa igreja elegeramum deputado federal em 1986, três em1990 e seis nas eleições de 1994. EmSão Paulo, elegeram-se deputados es-taduais uma irmã de Edir Macedo e umpastor, e, no Rio de Janeiro, um outroirmão de Macedo - cuja especialida-de na tribuna é atacar a Rede Globo deTelevisão - e um pastor, nomeado se-cretário de Trabalho e Ação Social.

s, a igreja não só parece es-candidato próprio a al-

~<l~i!'~u<,.andoo número de adeptosa fidelidade da membresia

- j á testada em outras eleições - e acapacidade de Macedo de fazer alian-ças com outros grupos pentecostais, épossível que essa igreja, no futuro,ve~",ii'"a surpreender muitos analistaspo icos. O argumento é simples, ga-ra1iJndo que todos os problemas da so-ciRade brasileira serão resolvidos

o, à frente de cada instância po-ltica, estiverem "homens de Deus".No momento, a IURD está preocu-

pada com a deterioração de sua irna-gern diante da opinião pública, quetem.recebido seguidos golpes, desdeo episódio da "agressão à santa", emoutubro de 1995, ato de um bispoque conseguiu reunir poderosas for-çasadversárias da IURD, a IgrejaCatólica e a Rede Globo de Televi-são. Pesquisa feita pelo Datafolha"indicou que em onze capitais a IURDatingiu 28 pontos, contra 56 da Igre-ja Católica, no "ranking do prestígiodas instituições", e 37 pontos, contra54, no "ranking do poder das insti-tuições". O prestígio da IURD, comoobservou o jornal, é maior entre osentrevistados jovens, com menos de

RAE Light • v.3 • n.2

RAE Light • v.3 • n.2

HÓSTIAS EDIR CONTÊM MAIS DEUS

A Igreja Universal é umaempresa?

Concluímos que a Igreja Universaldo Reino de Deus é um sistema de co-municação e de ritos, que subsiste pormeio do emprego da mídia, utilizando-se, para isso, de estratégias de marke-ting que a transformam em uma Igre-ja "antiga", à medida que se aproximadas práticas mágicas de uma popula-

24 anos, enquanto a Igreja Católicagoza de maior prestígio entre as pes-soas mais velhas. Seria um efeito dapropaganda da IURD sobre uma fai-xa etária orientada menos pela tradi-ção e mais pela mídia ? Uma outrapesquisa publicada no mesmo jor-nal+' informou que 70% das pessoasentrevistadas tinham uma imagemnegativa da Igreja Universal. Dessetotal, 46% acusavam essa igreja de"charlatanismo", de dar "golples'.""·~1~".sr;~~",~B:fjic(thkld1!1I'11l."explorar" pessoas, e, ainda, de seuspastores e bispos "só quererem di-nheiro" e serem "corruptos" e "de-sonestos".

A resposta da Igreja Universal estásendo articulada por meio de umamudança da retórica televisiva, quedesde janeiro de 1996 tem insistidona busca de uma dimensão mística emseus cultos e no enorme espaço que sedá ao seu braço beneficente, a Asso-ciação Beneficente Cristã (ABC), queatua na distribuição de alimentos em'favelas e dá assistência a presídiãriçse a seus familiares. De acordo com ojornal Folha Universal, em 1995 aABC distribuiu 7.000 toneladas dealimentos. O slogan de sua campa-nha, "Brasil 2000 - um futuro semfome e sem droga", concorre comcampanhas de adversários no camporeligioso: a de Caio Fábio Jr., com a"Fábrica Esperança", no Rio de Janei-ro, e a do sociólogo Betinho, com a"Ação da Cidadania contra a Misériae pela Vida", campanhas estas acusa-das, nos jornais e programas daIURD, de ineficientes, desorientadas,personalistas e parte do esquema daRede Globo de Televisão.

Está, portanto, em andamento umforte esquema de marketing insti-tucional para recuperar a imagemda igreja.

aos s se~lucrativos. Todavia, mesmo assim aIURD alega estar sendo perseguida ediscriminada, lançando mão inclusi-ve de uma teologia que fala de "guer-ra santa" e de "batalhas espirituais",ideologias essas que deságuam numtipo de "marketing de guerra". A suaexpansão ocorre também dentro deum quadro de diversificação de servi-ços e de agências, que extrapola aárea tradicionalmente considerada

religiosa, e seus interesses ampliam-se num leque que abrange construto-ras, gráficas, bancos, hospitais, cre-ches, escolas, agências de turismo eredes de comunicação social.»

Notas

1. KOTLER, Philip et al, Murketing forcongregations . choosing to serve people moreeffectively. Nashville: Abingdon Press, 1992.

.,"'''''-'c ••.•Peter. The sacred canopy: elementstheory of religion, N. Y.:

)ouble,1ay.1969, p.138.

ARNA, George. O marketing na igreja. RioJaneiro: JUERP, 1993.

KOTLER. Philip et ai. Op. cit.

6:c~embresia, do espanhol, significa o conjuntode pessoas que freqüenta uma determinada

EDITORA TRÊS. Isto É, 27 dez.1995. p. 22·3.

JUSTINO, Mário. Nos bastidores do reino: avida secreta na Igreja Universal do Reino deDeus. São Paulo: Geração Editorial. 1995.

nota de esclarecimento na Folha de S.31 mar. 1996, Caderno I, p. 4.

de S. Paulo, 29 jan. 1996, Caderno 1, p. 8.

de S. Paulo, 14 jan. 1996, Caderno 1, p. 12.

Artigo escrito por Leonildo Silveira Campos apartir de questões formuladas por Marcos

Henrique Nogueira Cobrae Esdras Borges Costa.

Leonildo Silveira Camposé Mestre em Administração de Empresas,

Doutorando eProfessor do Instituto Ecumênico de Pós-

Graduação em Ciências da Religião, doInstituto Metodista de Ensino Superior e co-

editor do livro Na força do espitito- ospentecostsis na América Latina. São Paulo:

Pendão Real, 1996, 290 p.

Esdras Borges Costaé Coordenador da Central de Casos e Ex-

Professor da EAESP/FGV.

Marcos Henrique Nogueira Cobraé Chefe do Departamento de Mercadologia da

EAESP/FGV.

11