Retiro Diocesanas

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espiritualidad

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26 de Abril de 20141 Dia: Introduo 1. A vida espiritual como um processo: as etapas da vida espiritual; o homem interior como ser caminho. A vida espiritual como movimento do corao: sstole e distole; interior e exterior; inspirar e expirar; entrar e sair; xtase e nstase; palavra e silncio, converso e testemunho. So os ritmos da natureza: vivemos neles (noite e dia, calor e frio, hmido e seco, vida e morte...); no podemos escolher viver doutra maneira. A orao realiza-se naturalmente, como o movimento da vida... a tentao mais forte das nossas vidas permanecer fora, no barulho, na palavra. preciso parar, entrar dentro, fazer silncio, entrar no deserto, na solido... Os SS Padres ensinavam a orar com o corao e com a respirao: a cada bater, a cada inspirar, podemos tomar conscincia da presena de Deus nas nossas vidas. O processo: acolher a Boa Nova da libertao (escutar, abrir o corao, reconhecer a Palavra como a Palavra que d sentido minha vida); converter-se (Metanoia, mudar a mente e o corao, deixar que o dom da Salvao se apodere de ns e nos transforme); testemunhar (anunciar a salvao recebida, com o exemplo da prpria vida e com a palavra). Este movimento: acolhimento, converso e testemunho, repete-se constantemente porque a obra do Esprito em ns. A vida espiritual est caracterizada por duas foras: um movimento da vida toda que procura uma transformao fundamental, que pretende conduzir-nos a uma opo fundamental (primeiro a opo de vida crist como vocao e depois a consagrao especfica); e um movimento constante, no quotidiano, que pretende fazer-nos viver a salvao a cada momento da nossa vida, e o Esprito que caminha conosco.

2. A vida espiritual como tarefa pedaggica e mistaggica: como aprendizagem e como iniciao. H sempre uma converso primeira, a que fizemos quando conhecemos por vez primeira o caminho de Jesus; mas esta converso continua, cada vez mais profunda na medida em que vamos compreendendo mais e aprofundando mais na nossa F; quanto mais compreendemos, maior a exigncia da nossa converso... Por isso o Esprito para ns um mestre, um pedagogo, aquele que nos introduz nos seus mistrios.

3. Este caminho e esta tarefa perseguem um mesmo objectivo: conduzir-nos at a opo fundamental das nossas vidas. Sem vida interior no possvel penetrar em ns, e por tanto tambm no possvel a opo fundamental. A opo fundamental[footnoteRef:1] caracteriza-se por trs aspectos: livre e consciente (no influenciada), compromete totalmente a nossa existncia (tudo o que nos constitui como pessoas fica implicado), identifica uma etapa decisiva da nossa vida (marca um antes e um depois da nossa vida; a vida toda fica referida a essa opo tomada). A vida crist uma opo fundamental das nossas vidas, exige de ns plena liberdade, integra todas as dimenses da nossa vida e transforma radicalmente o nosso viver e agir. [1: Optar significa decidir-se, comprometer-se, por algo que nos oferecido. A opo fundamental deciso livre e generosa para acolher um dom, o dom de Deus. A opo no depende puramente da nossa escolha, no uma obra nossa, depende da generosidade da resposta ao dom acolhido. A vida crist, a vocao, so dons de Deus que nos so oferecidos; optar pela vida crist e pela vocao significa chegar a perceber que estas so o sentido mais profundo da nossa vida, que nos oferecido gratuitamente e que ns podemos acolher pobremente; de ns apenas depende o acolhimento e a generosidade para responder; o dom acolhido no fruto do nosso esforo, no obra nossa, por isso, como dom de Deus, ele prprio se realizar, porque no depende de ns, depende de Deus; Deus quem faz a sua obra em ns. ]

4. Alguns aspectos pedaggicos do retiro: O silncio: esvaziado totalmente para que Deus possa encher de si o teu copo; silncio tomar conscincia da prpria pobreza: ficar nu, espiritual, pobre, diante de Deus; permanecer aberto para receber o dom; orar no consiste em pensar, em reflectir, mas em esvaziar o copo... O mais importante duma casa o seu vazio (Tao). Fazer-se pobre, esvaziar-se, ser uma conscincia pobre e aberta, eis o segredo da orao, para que a orao se faa em ns e seja verdadeira orao do Espirito. O que impede a orao a dificuldade para ficar pobres, humildes, diante de Deus; somos orgulhosos e auto-suficientes, e assim no abrimos a nossa vida ao amor. Com as janelas fechadas da nossa casa, o sol no entra. As preocupaes impedem-nos ficar pobres, nus; orar implica abandonar todo esforo pessoal, renunciar a pensar, a reflectir... Eis o verdadeiro silncio. A solido: entra totalmente, permanece sozinho, sai diferente. Este tambm movimento da nossa natureza; comunidade e pessoa vivem em tenso; permanecer sempre na comunidade, nos outros, sem solido, impede o encontro mais profundo consigo mesmo. A experincia espiritual uma das experincias mais marcantes da nossa vida: mas s acontece quando somos capazes de viver sozinhos: como o nosso nascimento ou a nossa morte, acontecem quando estamos sozinhos; para morrer e nascer espiritualmente tambm devemos ficar sozinhos.

A permanncia: permanece no teu inferno e no desesperes. Permanecer significa enfrentar o absurdo e o sem sentido; estar, permanecer, mesmo sem sentir, nem ver, nem saber nada. So Joo da Cruz dizia: entrei-me onde no soube, fiquei-me no sabendo, toda a cincia transcendendo; um dos segredos da vida espiritual apreende-se na contemplao da natureza: meditar como uma montanha (permanecer sentado como uma montanha, enraizar, descender dentro de si mesmo e ficar assim, para ser como a pedra sobre a qual Jesus possa edificar a sua Igreja), meditar como uma rvore (permanecer orientado para a luz, para o sol, flexvel aos ventos e humilde), meditar como o mar (na respirao constante das suas ondas, em movimento exterior, mas na calma interior); meditar como um pssaro (em constante murmrio do nome de Jesus)[footnoteRef:2]. [2: Cfr J.Y.Leloup, La montaa en el ocano, 31ss]

A humildade: diante de Deus, nada temos, nada somos, nada podemos, nada merecemos... Na nossa histria em Deus, Ele o importante. Ficamos sem perceber Deus quando achamos que somos autosuficientes. Tambm So Joo da Cruz dir: quanto mais ter quis, tanto menos achei; quanto mais procurei, tanto menos achei; quando j mais nada quis, achei-o tudo sem querer; quando menos eu quis, tudo achei sem querer.... Humildade significa ser terra: dispor-se a receber tudo de fora, a chuva, o sol, a semente, a enxada, os ps, o vento...

27 de Abril de 20142 Dia: A primeira liberdade: decidir-se a caminhar. A primeira liberdade: pr-se caminho: a quem iremos? S Tu tens palavras de vida Eterna. Descobrir a necessidade de orientar a vida, de tomar decises e comear um caminho de realizao. Desde as perguntas mais profundas do nosso interior: que devo fazer com a minha vida? Para que vivo? Para onde vou? Qual o sentido da minha existncia?... Pr-se a caminho significa decidir-se por um projecto de realizao: que ou quem pode conduzir-me a esta realizao? A tarefa fundamental da vida comea pelo discernimento dos caminhos; quais so os caminhos que eu j conheo? Qual a experincia que tenho deles?[footnoteRef:3] Quais so os caminhos da minha vida que me podem conduzir plenitude? Porqu?... Vejamos o esquema dos dois caminhos na luz do Deut 30,11ss [3: O mesmo Jesus orienta-nos neste discernimento; samaritana ele diz: aquele que bebe desta gua ter sede novamente, mas quem beber da gua que eu lhe darei nunca mais ter sede (Jo 4,13-14)]

Uma olhada de amor e misericrdia sobre a minha vida: como estou? Como me sinto? Qual a minha situao pessoal, social, espiritual? Aceitar humildemente a minha realidade debilitada, pobre, pecadora, mas tambm abenoada por Deus, marcada com uma promessa de felicidade e um desejo de vida e de plenitude. No julgar nem condenar nada de mim. Sentir o abrao de Deus. Tudo o que sou e vivo amado por Deus, amor incondicional. Escutar a voz profunda do meu interior, a voz do amor: (texto: Nouwen, Tu es o meu amado): Tu e eu no temos porqu destruir-nos a ns mesmos. Somos amados. Fomos amados intimamente muito antes de que os nossos pais, professores, esposos, filhos e amigos nos amaram ou nos feriram. Esta a autntica verdade das nossas vidas. a verdade que eu quero que procures para ti. a verdade dita pela voz que proclama: Tu es meu amado. Escutando a voz com a maior ateno interior oio no mais ntimo de mim mesmo palavras que dizem: desde o comeo chamei-te pelo teu nome. Es meu e eu sou teu. Es o meu amado, em ti me comprazo (Mc 1, 11). Formei-te nas entranhas da terra, entreteci-te no ventre da tua me. Levei-te nas palmas das minhas mos, amparai-te na sombra do meu abrao. Olhei-te com infinita ternura e cuidei-te mais intimamente que uma me faz com o seu filho. Contei todos os cabelos da tua cabea e guiei todos os teus passos. Onde quiser que fores, eu estou contigo, vigio sempre o teu descanso. Dar-te-ei um alimento que saciar totalmente tua fome, e uma bebida que apagar a tua sede. Nunca vou te ocultar meu rosto. Conheces-me como propriedade tua, conheo-te como propriedade minha. Pertences-me. Sou teu pai, tua me, teu irmo, tua irm, teu amante e teu esposo. At, teu filho. Serei tudo aquilo que tu sejas. Nada nos separar. Somos um... Sempre que ouvires dentro de ti com grande ateno a voz que te chama amado, descobrirs o desejo de escuta-la intensamente e para sempre. como achar um poo num deserto, quando descobres a humidade da terra seguirs cavando mais profundamente Podemos passar o nosso retiro s com estas palavras: experimentando esse Deus-Amor que nos fala assim, a cada um, porque somos seus filhos muito amados: descobrir esta verdade profunda conduzir-nos- ao compromisso mais profundo e radical da nossa vida. Mas no suficiente com saber esta verdade, preciso experimenta-la. A vida interior no se explica com teorias, questo de experincia. Sem experincia no h nada... Vejamos os smbolos do caminho espiritual que nos revela a Palavra de Deus: (textos bblicos...) O mar: smbolo espiritual da F (Mt 14,26-32; Mc 4,35-41); na barca em que todos vamos, Jesus convida-nos a no duvidar; de qu? Do Evangelho, boa nova do Amor aos homens, presente na pessoa, na vida e palavra de Jesus. As chaves do Reino que Pedro recebe de Jesus, so este corao que no duvida, o corao crente. O mar smbolo da provao, lugar de risco e perigo, de morte. o mar da nossa vida, tudo aquilo que devemos enfrentar, e que no tem sentido sem F. No mar Pedro caminha sobre as guas, afunda-se quando o seu corao duvida. Tambm ns afundamos quando o nosso corao desconfia, quando esquecemos o verdadeiro caminho, a verdadeira verdade e vida. Caminhar na f significa caminhar com a conscincia viva da promessa de Deus: tudo est nas suas mos, a nossa vida, o nosso desejo, a nossa histria; a F conduzir-nos- at a realizao do projecto que Deus tem para ns. O mar a vocao de confiana que Deus preparou para ns. Pobres, vulnerveis, em condies precrias, mas conscientes e livres, caminho da felicidade, pelo mar da confiana. O deserto (Lc 4,1-13; Ex 13,17-22) : smbolo de dependncia, da nossa vida sedenta, da nossa existncia necessitada dessa gua que d vida, da nossa procura permanente de sentido. O deserto um paradigma da nossa compreenso humana: e ser sempre um caminho necessrio, um caminho que todo seguidor de Deus dever empreender alguma vez na sua vida; no era o caminho mais curto para Israel, mas Deus escolheu-o porque conhece a fragilidade humana e a sua necessidade de se purificar; no deserto que podemos enfrentar as tentaes mais profundas da vida: a tentao do po (da exterioridade que aliena), a tentao da auto-suficincia (da afirmao de si, do encerramento em si mesmo, negando qualquer dependncia dos outros), a tentao do poder (do no amor, do domnio dos outros, do ser mais). A montanha: no evangelho aparecem trs montanhas: as bem-aventuranas (Mt 5), a transfigurao (Mt 17) e o Glgota (Mt 27). So smbolos da nossa caminhada espiritual. Descobrir a vocao crist significa descobrir na prpria vida a ligao que h entre estas trs montanhas: esta ligao o amor. O amor ao prximo (bem-aventuranas) a realizao das nossas vidas, a verdadeira glria (transfigurao) e ao mesmo tempo a nossa paixo (Glgota) que nos faz capazes de amar at dar a vida (Jo 15,13) O combate (Gn 32,25-30; Lc 22,35-38; Mt 10,34-36). O evangelho para ns uma palavra exigente, que nos anima para o combate; a vida interior este combate; So Paulo diz que ainda no chegamos ao sangue na nossa luta pela f. Combater significar para ns esse esforo continuo pela liberdade, sem nos deixarmos seduzir pelo poder, pelo po, pela auto-suficincia. S se pode conhecer a verdadeira identidade quando se tem afrontado este combate: como acontece a Jacob; e s se alcana a plenitude da vida quando estamos dispostos a dar tudo pelo evangelho: como Jesus fez, por amor, a nica maneira de vencer o mal deste mundo. As expresses de Jesus: vim trazer fogo na terra, espada, diviso... so expresses deste combate necessrio da nossa vida. A noite: (Mc 13,33-37) smbolo da vigilncia, da necessidade de permanecer atentos, profundamente atentos, intima e interiormente. A noite simboliza esta ateno ao interior que deve ser constante, essa conscincia que permanece desperta, contemplativa, orante. A noite ser sempre o lugar da orao, do silncio, da solido... porque a luta da nossa conscincia no est condenada ao vazio mas plenitude do amor de Deus, comunho profunda que d sentido nossa vida. O caminho de Israel se faz de noite, enquanto Deus, como coluna de fogo, vai diante guiando para essa terra prometida (Ex 13,20ss). Jesus indica a noite como o tempo de regresso do Senhor; a noite uma imagem espiritual da nossa vida contemplativa; nela que podemos experimentar o Deus que se d como amor.

Podemos permanecer na nossa orao ligados a uma destas imagens bblicas. Descobrir como tambm a nossa vida pode explicar-se desde estas imagens espirituais. na orao que podemos delinear o nosso projecto de vida espiritual: o nosso caminho como mar, como montanha, como deserto, como noite, como combate... H um ponto que liga estas imagens entre si: todas elas implicam um desafio, uma generosidade e uma confiana, uma entrega totalmente livre. A generosidade para empreender o caminho da vida espiritual no se pode medir, no em ltimo termo, uma questo de certezas; quem esperar a ter as ideias claras, a ter certeza intelectual, ficar sempre a sem se decidir verdadeiramente... Deus amor, e o Amor quando se experimenta compromete, e no h razes para explica-lo. O importante descobrir cada um o que cada um precisa e... Pr-se caminho.

28 de abril de 2014Dia 3: No caminho fazemos duas paragens: na casa da liberdade-conscincia e na casa da f-confianaA paragem primeira: a casa da Liberdade-Conscincia. Para caminhar preciso a conscincia; a conscincia smbolo de liberdade.

preciso tomar conscincia... a conscincia libertar-se enquanto se caminha; chegar na casa da liberdade significa encontrar alguns amigos, exigentes mas necessrios, para nos fortalecer e animar a continuar: S posso entrar Humildemente: No caminhamos bem sem reconhecer a necessidade de ser libertados; a conscincia das nossas necessidades, dos nossos limites, das nossas falhas, a que tira as vendas dos nossos olhos. Quando iniciamos uma caminhada na liberdade a primeira coisa que vemos a nossa auto-suficincia. Mas a humildade a que nos faz ver, a que nos faz tomar conscincia da necessidade que temos de nos deixarmos guiar, de renunciar nossa auto-suficincia orgulhosa. Para Jesus to importante a humildade que no se pode chegar a ele sem ela: vinde a mim que sou manso e humilde de corao. Humildade o primeiro dos nossos mestres e as suas lies so estas: A terra frtil: humildade renunciar a me valer por mim mesmo, apreender a receber tudo como a terra frtil. Ela ensina-nos a lio mais importante da nossa vida: caminhar na dependncia, colocar-nos numa perspectiva contrria a este mundo de eficcia, de poder e domnio. Apreender esta lio significa descobrir que a grandeza de ser homem no est naquilo que podemos fazer ns mesmos, mas naquilo que Deus faz em ns. situar-se na dinmica do amor: receber e dar, e no acumular e conseguir. passar de pensar para mim a pensar para os outros, de viver para mim a viver para os outros. Humildade a lio da vida: a semente que se atira e morre para dar muito fruto (Jo 12,24). A verdadeira fecundidade no vem dos nossos projectos, dos nossos clculos para obter mais, mas da humildade que se deixa fecundar pela verdadeira vida: desde o poder no criamos nada, apenas construmos as obras das nossas mos; s Deus cria, manifestando seu poder de vida na nossa debilidade, na nossa morte. Ser humilde significa deixar que a fonte da Vida jorre livremente na nossa terra, fazendo-a fecunda. Renunciar superioridade: ajoelhar-se diante dos mais pequenos; Jo 13,1-17. A verdade mais profunda de Jesus esta. Jesus aquele que sendo grande faz-se pequeno, escravo de todos: aquele que tinha a condio divina, mas no a considerou e esvaziou-se a si mesmo, assumindo a condio de servo (Fil 2,6-9). Na vida de Jesus h dois momentos fundamentais de revelao de Deus, os mais importantes, nos quais vemos claramente o rosto do Deus da nova aliana: no lava-ps e na cruz. Deus revela-se como caminho, verdade e vida nestes dois factos: ajoelhando-se diante dos homens para lhes lavar os ps (uma aco que s as mes faziam aos filhos mais pequeninos e os escravos aos seus amos), para nos dizer que o caminho de Deus no o poder mas o amor e a debilidade; assumindo totalmente a nossa condio at a morte, para nos dizer que s o amor pode triunfar sobre a morte, porque mais forte, porque poder de ressurreio. S posso entrar sozinho: conscincia de absoluta precariedade, indigncia: pois nada nem ningum pode caminhar por mim. A liberdade verdadeira leva-me ao encontro mais puro comigo mesmo, a liberdade sou eu perante o meu futuro, o meu projecto, a minha deciso. Ser livre esta solido. Nada nem ningum pode me substituir, pode decidir por mim: a liberdade aquela dimenso que me faz verdadeiramente homem. a conscincia de mim mesmo e de meu sofrimento. Por si s, a liberdade no nos faz felizes; mas aquele que livre pode escolher o amor; e o amor a fonte da felicidade. Descobrir que cada um de ns somos um projecto de Deus: nico e intransfervel, e que s cada um pode responder a este projecto, ao projecto da sua vida, porque ela sua e ningum a pode viver por outro. A solido o preo da liberdade, a absoluta responsabilidade que cada um temos pela nossa vida, por aquilo que fazemos e vivemos. Para Paulo, esta solido a condio da liberdade: Gal 5. Renunciar solido deixar-se prender de novo pelo jugo da escravido (v.1). Sabendo que sou dbil: conscincia da nossa impotncia, da nossa pobreza e vulnerabilidade: pois descobrimos que no temos nada que oferecer a Deus, que nos desviamos tantas vezes, que estamos perdidos, encerrados na auto-suficincia, na impotncia de no poder sair, nem levantar, nem chegar onde o nosso desejo quer. A debilidade o terceiro mestre da casa da liberdade: a conscincia de ser vulnerveis e pobres. A grande mstica Teresa de Lisieux achou o caminho da santidade na que ela chamava asctica da debilidade: como a criana demasiado pequena que quer subir os degraus da escada e no pode, mas tenta constantemente, at que o Pai desce e levanta ela e leva-a consigo para cima. Esta conscincia da debilidade o esprito dos pequenos, o esprito daqueles que entraro no Reino dos cus (Mc 10,15).

Na nossa orao podemos tentar: Perguntar-nos se chegamos a perceber em que consiste a humildade; situar-nos como o publicano, como a terra frtil, acolhendo tudo aquilo que Deus queira fazer em ns... Encontrar-nos com a nossa solido mais ntima e dolorosa: enfrentar a nossa liberdade, descobrir tudo aquilo que nos impede a liberdade, tentar perceber o que ela nos exige... Meditarmos na asctica da debilidade: situar-nos em lugar da criana muito pequena que quer chegar at o pai e no pode, sentir esta impotncia e descobrir a necessidade da splica, at as lgrimas...

A paragem segunda: a casa da F-Confiana. No se pode caminhar sem Confiana. A confiana vislumbrar o horizonte. A liberdade no cega, confia.

Libertar o nosso desejo. Para con-fiar precisa entregar a um outro a nossa fiana. Libertar o desejo significa chegar a uma opo fundamental da vida. Optar significa entregar a nossa liberdade a uma causa; para ns esta a causa de Jesus. Mas para se realizar esta entrega o nosso desejo precisa de ser libertado. Qu significa libertar o desejo? Significa descobrir que no mais ntimo de mim habita um desejo profundo que quer conduzir a minha vida para a felicidade. S penetrando na nossa intimidade, no mais profundo de ns mesmos podemos dar com o nosso desejo. Por isso o primeiro passo a dar a liberdade: humildade, solido e debilidade. Muitas vezes penetramos em ns mesmos e conseguimos intuir o nosso desejo. O problema que no confiamos nele, no acreditamos nele. O nosso desejo tem a forma dos nossos sonhos, aqueles que achamos impossveis. Geralmente temos medo de falar esses sonhos, porque pensamos que os outros vo rir de ns, como de facto acontece. Mas o reconhecimento do nosso desejo fundamental para que sejamos verdadeiramente ns mesmos. S eu posso falar o meu desejo: eu sou o meu desejo. S eu posso dar-lhe nome, permitir que ele seja. Acontece que quase ningum se atreve a nomear o seu desejo; e ento a nossa vida fica encerrada nos caprichos e nas iluses imediatas, mas ao preo de renunciar a ser si mesmo. O engano da vida consiste em confundir o desejo profundo com os caprichos e as iluses imediatas. Geralmente renunciamos a ns mesmos, ao nosso desejo, para ser aceites pelos outros... este o medo da solido, mas a subjectividade leva consigo muita solido. Jesus sentiu muita solido, mas no quis renunciar ao seu desejo, mesmo sofrendo a rejeio dos outros. S quem d nome ao seu desejo e comea a ser ele mesmo pode encontrar sentido na vida. S esse chega a libertar o seu desejo.

Libertar o desejo significa converter-se. A converso o grande objectivo da nossa vida interior. Na sua verdade mais profunda, converso confiana. Converso meta-noia: mudar de caminho e tambm pensar de outra maneira. Acolher a converso significa ento recolocar a nossa vida num caminho novo e pensar de maneira nova. Para Jesus esta a condio para entrar no Reino de Deus (Mt 4,17). Trata-se pois de recolocar o desejo, de liberta-lo: viver desde o desejo profundo e no desde os desejos imediatos; seguir Jesus no porque comemos po at ficar saciados[footnoteRef:4] mas porque vemos e reconhecemos nele a fonte da Vida, aquela fonte que nos d de beber uma gua que tira a sede. A vida interior significa colocar-se em perspectiva de converso, de libertao do desejo, de re-orientao do corao e da conscincia. Esta converso tambm a que muda o mundo, pois o mundo muda quando se v de maneira diferente. Converter-se pensar, sentir e viver de maneira diferente; de maneira nica, porque cada um nico. Mas o que provoca a converso a luz nova da nossa vida quando se abre F, confiana. Jesus a fonte da vida, a luz do mundo (quem segue ele no andar nas trevas), a gua viva (quem bebe dele no sentir mais sede), o po vivo que desceu do cu (quem come dele no sentir mais fome e no morrer). A converso acontece quando nos encontramos com este Jesus. Fruto deste encontro ser a opo fundamental da nossa vida, a deciso que unificar a nossa vida sem permitir a desagregao provocada pelo pecado e pelo esquecimento de Deus, a nica deciso que nos dar fora para enfrentar o vazio e a angstia da vida. [4: o que Jesus reprocha multido que o segue depois da multiplicao dos pes (cfr.Jo)]

Mc 10,35-40. Nos evangelhos encontramos um relato no qual Jesus aplica a sua pedagogia para libertar o desejo dos seus discpulos. Os discpulos de Jesus s compreenderam verdadeiramente quem era ele depois da sua ressurreio. Na sua vida terrena Jesus tentou muitas vezes catequizar os seus discpulos sobre o sentido profundo do seu messianismo; os anncios da paixo so um exemplo claro; os evangelhos tambm exprimem constantemente a desconfiana dos discpulos: assim Pedro revolta-se contra Jesus depois dele ter anunciado a sua sorte em Jerusalm; os discpulos discutiam de caminho quem era o maior; os discpulos de Emas iam de regresso, ressentidos e decepcionados pelo que tinha acontecido com Jesus em Jerusalm, pois eles esperavam que fosse o libertador de Israel... E Joo e Tiago aproximam-se de Jesus para lhe fazer um pedido: estar sua direita e sua esquerda no seu Reino. Vamos meditar esta cena no evangelho de Mc. Surpreende ouvir nos apstolos um pedido semelhante, mas surpreende ainda mais ver como Jesus no fica escandalizado, mas acolhe esse pedido, para tentar levar Tiago e Joo ao seu desejo profundo. claro que Tiago e Joo querem poder, querem ser superiores; ainda no entenderam a mensagem de Jesus. Jesus no nega o seu desejo, recoloca-o. Em cada um dos nossos desejos h uma imagem; Tiago e Joo imaginam-se no seu trono junto de Jesus. Vale a pena pensar nas imagens dos nossos desejos; elas vo nos dizer muita coisa de ns. Jesus pergunta: que quereis que vos faa?; deste modo Jesus possibilita aos filhos de Zebedeu pensar e ordenar os seus desejos; como se Jesus perguntasse: que realmente o que desejas e nunca satisfazes?. No meio da confuso dos nossos desejos temos que fazer esta pergunta: o que procuro realmente?, o que quero verdadeiramente?. A converso acontece quando somos capazes de confessar a Jesus o desejo que nos habita; esta confisso a que muitas vezes no conseguimos fazer; porque duro ver-se diante dos olhos dos outros identificado com tantos desejos inconfessveis. Geralmente damos aos outros uma imagem mais mitigada de nosso desejo. A converso comea com humildade. O desejo liberta-se da sua imagem quando comunicado. Uma vez que Tiago e Joo falam o seu desejo, Jesus pode liberta-lo: no sabeis o que pedis; o vosso desejo muito mais grande, profundo, e podeis descobri-lo; detrs de cada um dos nossos desejos esconde-se o verdadeiro desejo profundo, o desejo de amar e ser amados, at dar a vida. Este o desejo que Jesus coloca em Tiago e Joo: podeis beber o meu clice? Podeis amar como eu? Quando o desejo se liberta aparece ento a opo fundamental: a resposta de Tiago e Joo (podemos!), a confiana: beber o seu clice, significa seguir Jesus, entregar-lhe a liberdade...

Na orao podemos tentar aprofundar no mundo dos nossos desejos: Tentemos confessar a Jesus as imagens dos nossos desejos; situemo-nos na pele de Tiago e Joo, mas com os nossos desejos; deixemos que Jesus leve o nosso desejo para ele... Podemos tambm penetrar no mais ntimo de ns mesmos e dar nome aos nossos desejos profundos, aqueles que nunca ficam satisfeitos; encontrar-nos com os nossos sonhos, apresentar-nos com eles a Jesus...

Na casa da Confiana nos encontramos dois mestres: a coragem e a esperana. Uma vez libertado o nosso desejo, a caminhada torna-se uma constante renovao da confiana. Conscientes da nossa debilidade e da grandeza do nosso desejo, viver na confiana viver com coragem e com esperana. na casa da confiana que nos encontramos os mestres que vo nos preparar a continuar a caminhada. Vamos para o amor. A confiana tem dois grandes inimigos: o medo e o ressentimento. Nos evangelhos Jesus tenta constantemente encorajar os seus seguidores convidando-os a no se deixarem paralisar pelo medo: no temais!, uma das palavras mais recordadas por Jesus. O temor prprio daqueles que ainda no alcanaram o amor (1Jo). A coragem e a esperana so mestres muito necessrios para a vida interior. Vamos escutar algumas das suas lies: A coragem. A coragem o convite constante de Jesus a confiar, a superar os medos. Os medos so os responsveis da nossa falta de crescimento, de amadurecimento. Geralmente no aceitamos o nosso medo. Este um dos seus poderes: fazer-nos crer que no existe. Mas o medo est muito mais presente do que ns pensamos. Podemos medir a presena do medo entre ns medindo as ameaas, a desconfiana que h na nossa comunidade. Porque o medo impede chegar ao objectivo do Evangelho. O medo no nos permite viver em confiana, e sem confiana no h intimidade. E no h comunidade sem intimidade. Quando Jesus arrestado no monte das oliveiras os seus discpulos, levados pelo medo, abandonaram-lhe e fugiram (Mt 25,56). Depois da crucifixo os discpulos encerram-se por medo aos judeus (Jo 20,19). O medo cria distncia, a suficiente para nos sentirmos salvo, ou provoca refgios para ficarmos muito perto dos outros e sentir-nos salvo. O medo cria sempre ou uma distncia excessiva ou uma proximidade sufocante. Pensemos se na nossa comunidade h pessoas as que evitamos, se fugimos das pessoas, se tentamos passar inadvertidos, se apenas somos capazes de comentrios superficiais; pensemos se nos nossos encontros com os outros falamos a mais, se ficamos a rir superficialmente qualquer comentrio... Tambm possvel que na nossa comunidade haja assim grupinhos fechados, ou pessoas que s conversam dos seus temas... tudo isso indica que h medo entre ns, e se h medo nunca poderemos confessar-nos mutuamente aquilo que somos e sentimos, as nossas feridas e pecados; ento a reconciliao torna-se impossvel... H pessoas entre ns que so mais fracas, pessoas que tal vez achemos diferentes a ns, pessoas que pensamos que devemos evitar, porque no so como ns... Quando se evita os outros (outras irms, formadoras, superiora), por qualquer razo, o medo est por meio[footnoteRef:5]. [5: A comunidade como as mos que protegem um pssaro ferido, se abrimos ele vai cair e morrer no chao; se fechamos ele morrer sufocado. Para este tema, cfr. Nouwen, Signos de vida, pp.28ss]

Tambm podemos dar conta do medo se a nossa vida for pouco fecunda; rodeados de ameaas as pessoas ficamos encerradas, estreis; quando nos lavamos as mos como Pilatos, quando atribumos aos outros as responsabilidades, quando nos anulamos a ns mesmos a capacidade de dar aos outros qualquer pequena coisa... Ento o medo que se apoderou de ns. Pensemos no nosso fatalismo: porqu nos impedimos a ns mesmos a capacidade de crescer, as possibilidades de mudar, porqu ficamos a calados, indiferentes, cheios de fatalismo?... medo. Pouco a pouco temos ficado convictos da nossa esterilidade, achando que somos incapazes para dar vida. Pode nos ajudar meditar no texto da samaritana (Jo 4): essa mulher cheia de medos, rejeitada por ser proscrita, por ser diferente, procurando gua na hora do meio-dia, evitando se encontrar com as outras mulheres; Jesus enfrenta-a com a sua desconfiana, com os seus medos, curando a sua esterilidade; essa mesma mulher voltar aldeia, sem medo nenhum, cheia de confiana e testemunha daquele que a fonte da vida.Por ltimo a tirania do medo chega a fazer de ns pessoas sem criatividade, pessoas que se submetem instituio, sem capacidade nenhuma para criar algo novo. A ltima consequncia do medo a incapacidade de criar, de construir, de mudar... a submisso aos rituais, aos regulamentos, s formas exteriores... incapacidade para sair deles e para criar algo novo. Na casa da confiana podemos encontrar a coragem suficiente para superar os medos, para transformar a nossa vida, para tirar de ns todos os condicionamentos que impedem o nosso crescimento, e viver assim uma verdadeira liberdade. A esperana. A esperana combate o segundo dos inimigos da confiana: o ressentimento. Ressentidos no caminhamos para diante, mas para atrs (como os discpulos de Emaus que voltam para suas casas, as que tinham deixado quando seguiram Jesus por primeira vez). No h confiana sem esperana. O ressentimento espreita a cada momento, porque geralmente a nossa autossuficincia no nos permite nenhum fracasso[footnoteRef:6]. Sempre que as coisas no vo como ns queremos e quando os resultados no correspondem com as nossas expectativas, ficamos ressentidos. a experincia dos discpulos de Emas (Lc 24,13ss). Voltam para casa frustrados, decepcionados: ns espervamos... O sentimento dos discpulos semelhante ao nosso sentimento quando perdemos alguma esperana, quando as coisas no correm como ns espervamos. O ressentimento mina o nosso desejo profundo e mata os nossos sonhos. Quando algum de quem espervamos algo, no responde; quando as nossas aspiraes no so correspondidas; quando costumamos dizer que ficamos desmotivados; quando s falamos daqueles que no gostamos; quando s lembramos as feridas; quando actuamos com receio e com medo; quando s queixamos; quando julgamos constantemente... ento, ficamos incapacitados para a confiana, paralisados pelos ressentimentos sentindo-nos fracassados. O ressentimento obriga-nos a procurar culpados, mergulha-nos no desespero, faz-nos perder o sentido... Os nossos fracassos pem em crise a nossa auto-suficincia, ajudam-nos a re-colocar a vida. Mas preciso apreender a lio da esperana: no podemos evitar as decepes, os fracassos, porque eles pertencem condio humana, mas podemos esperar algo deles, podemos tomar conscincia da nossa dependncia e fragilidade, podemos apresentar-nos diante de Deus com a nossa pobreza e a nossa imperfeio, sem ficar abatidos, desesperados, sem voltar atrs, pois tudo para o bem dos que amam a Deus, diz So Paulo. A esperana ensina-nos que em cada acontecimento de fracasso, de perda, h outra possibilidade: h uma esperana escondida para quem confia; como descobriram os discpulos de Emas. Podemos aceitar a nossa responsabilidade, acolher a possibilidade do perdo e da reconciliao, abrir um horizonte novo, descobrir que condenar, culpabilizar os outros, s paralisa o crescimento. A esperana ensina-nos que confiar possibilita o novo, que cada situao da nossa vida uma possibilidade para crescer e amadurecer, que h sempre um sentido escondido em todas as experincias da vida. [6: A auto-suficincia tambm um medo, o medo a fracassar.]

A coragem e a esperana preparam-nos para continuar a caminhada na liberdade mais profunda do nosso desejo. Na casa da confiana podemos encontrar a liberdade necessria para seguirmos at a perfeio do amor, o corao da salvao evanglica. Experimentar esta salvao experimentar o amor e viver o compromisso do amor. Mas a F, a confiana, a que nos abre a esta salvao. Podemos fazer a nossa orao de uma forma mais penitencial para nos prepararmos tambm ao sacramento da reconciliao: Posso perguntar-me como esto a me influenciar os medos, os condicionamentos... se a experincia do meu amor est cheia de medos e condicionamentos, dificilmente poderei acolher o amor incondicional de Deus. Como libertar-me dos medos? Posso tambm pensar nos meus ressentimentos... procurar identifica-los; re-situar a minha vida espiritual a partir deles. Se achar que a minha confiana est em condies ptimas (sem medos nem ressentimentos), ento: o qu estou disposto a dar de mim mesmo?

29 de abril de 2014Dia 4: A obedincia como liturgia da vida

1.- A obedincia toca uma dimenso importante da pessoa: o poder-a liberdade. O poder no no sentido negativo, como domnio sobre os outros. Todos somos sujeitos de poderes, fazemos coisas porque podemos, porque temos poderes. O problema cmo, desde onde e em benefcio de quem uso os meus poderes. O que vai definir a orientao dos meus poderes, da minha energia, a liberdade. A liberdade o que nos faz pessoas, o que faz que nos diferenciemos dos animais. Os animais no tm outra opo do que viver no esquema estmulo-resposta. Eles nascem programados e vo responder sempre segundo os seus instintos. Na sua resposta eles nunca erram.A pessoa nunca nasce programada. Se nascemos com um desejo profundo de felicidade e estamos chamados a dar a vida, a entregar ela a algo. Algo podem ser muitas coisas: um ideal, uma famlia, uma profisso, um partido...Como no estamos programados por instintos temos que dar um contedo nossa vida, esse contedo o damos graas liberdade. O nico que me define como pessoa a liberdade, o nico que me define aquilo pelo qual eu aposto a minha vida. Sou pessoa na medida em que vou consagrando a minha vida no que realmente quero. E nessa medida vou satisfazendo o meu desejo de felicidade, nessa medida vou acertando.Mas como no estamos programados podemos errar. Posso viver no esquema estimulo-resposta no utilizando a minha liberdade mas respondendo segundo o que me vai acontecendo, esperando ter sorte na vida.Respondo segundo a comunidade em que calhar, segundo os meus amigos, segundo... sempre dependendo das circunstncias alheias a mim. Desde o esquema estimulo-resposta vou seguir gastando a minha vida mas no estou a apostar nem a arriscar por nada. Segundo Jesus no dou a vida, ma tiram ou vai-se consumindo. Desde o estimulo-resposta no vou satisfazer o meu desejo de felicidade. Sempre vou estar queixando-me, reclamando y exigindo realidade e as pessoas que me rodeiam. Vou sentir a realidade como obstculo, no como oportunidade j que nunca vai me oferecer as condies ideais. No ficando neste esquema, vivo na liberdade. Mas no toda a liberdade verdadeira. Jo 8,31-36: Podemos dar por suposto que somos livres mas segundo Jesus somos escravos. Gal 5,13-15: Pela desculpa da liberdade podemos servir aos instintos egostas, quer dizer a ns mesmos. A liberdade um meio, no um fim. Um meio importantssimo j que ela a nica possibilidade para ser pessoas, mas nunca um fim. Tem que ter um para qu, um contedo que eu prprio devo dar.A liberdade ou se traduz pelo amor e o servio aos outros ou no liberdade.1Cor. 9,19-23.A minha liberdade ou autnoma ou uma liberdade que escuta. Isso mesmo obedecer. A verdadeira obedincia vai fazer que a minha liberdade fique engajada na escuta e s assim o meu poder poder estar ao servio do Outro e dos seus interesses. Sou obediente quando todo o meu ser dispe-se escuta. Assim, a obedincia toca a nossa postura na vida: ou de soberba (eu sou o centro) ou de humildade (o meu centro outro Deus). Uma liberdade autnoma que no escuta, no obedece, traduz-se em soberba, o mais oposto ao amor. Sou soberbo quando me constituo em centro porque fiquei fechado ao amor. Fechar-se ao amor a raiz de todos os nossos desajustes (Gal: vivemos mordendo-nos e devorando-nos uns aos outros).Se eu no escutar estou a pr-me no lugar de Deus. E se j sou Deus como vou entregar-me a ele? (Jo 7,15-18; 8,26-29). Ou falo pela minha conta (soberba) ou falo por conta de outro e ento nunca posso deixar de estar escuta. Segundo Jesus quem fala por si mesmo procura a sua glria, seu prprio prestgio. Qu glria eu procuro?, a minha ou a daquele que me enviou?. Se no vivo na escuta no fundo estou a viver o problema da suplantao: suplanto a Deus e procuro a minha glria. Por tanto, os meus poderes estaro ao meu servio.

2.- claro que desde o nosso querer ser cristos, a obedincia, a escuta, a Deus (Act 5,29) mas a questo a qu Deus escutamos. Com frequncia confundimos o ideolgico com o existencial: o assunto no o que eu digo mas o que eu experimento de Deus. H dois modelos de Deus (Heb 10,5-10): o Deus do AT., o Deus que est l cima, o Deus-amo, e o Deus de Jesus, o Deus que sempre est em baixo, o Deus Pai.Dependendo de qual seja o Deus que eu experimentar as praticas que se geram e os modos de estar na vida, os modos de se relacionar com os outros e com os preferidos do Pai so muito diferentes.

- Se experimento o Deus de l cima, estou perante a um Deus amo, dominador. E prprio do amo e dos amos ter servidores. Se o nosso Deus est acima, como domnio, legitimamos dominar aos outros. Deus impe a sua vontade atravs da lei e a pessoa, que um ser inferior, no tem outra alternativa seno acatar passivamente. Desde esta imagem de Deus criamos umas relaes e uma Igreja jerarquizada, piramidal e patriarcal. Entendemos a obedincia como submetimento, como cumprimento das ordens daqueles que esto na escala por cima de ns, e ns mandamos e impomos aos que esto por em baixo de ns. Desde esta experincia de Deus necessitamos no a liberdade que aposta e arrisca mas uma lei para poder cumprir e sentir-nos perfeitos e justificados perante Deus. Se experimento a Deus de l cima ento um Deus amo e ns somos assalariados. Ao assalariado no lhe importam as ovelhas, sai a correr quando o lobo chega e as abandona. Utilizamos interessadamente ao outro para estar a bem com Deus, nos justificamos a custa da dor dos outros. Isto mortal para os pobres e para aquele que diz estar a servir. Mortal para os que este mundo coloca os ltimos porque fcil manipular o seu possvel agradecimento interessadamente. Assim, no experimentar libertao mas dependncia servil e escravizante. Mortal para quem diz estar a servir porque desde motivaes sempre inconfessadas seguir necessitando a quem sofre pare se sentir til e justificado perante Deus. Isto pode ser horrivelmente blasfemo: matar de facto a dignidade inerente a toda criatura do Pai.Se experimento o Deus de l cima, um Deus amo e dominador que me pede que me sacrifique pelos outros. E quando este sacrifcio no est cheio de misericrdia, aparece o sacrifcio amargo, ressentido, exigente e intransigente com os outros. Nas minhas relaes sempre estou a passar factura aos outros pelos sacrifcios que fao por eles, e no fundo do meu corao o que h um reproche contnuo a Deus que me pediu o sacrifcio da minha pessoa. Como diz s. Paulo em Rom 8,15, desde este Deus recebo um espirito de escravo que me faz viver no temor. Desde o temor a minha vida no cresce nem frutifica (nem para mim nem para os outros).

- Se experimento o Deus que est c em baixo, ento estou perante o Deus Pai de Jesus: um Deus tenro, todo carinhoso que acaricia e no agarra a vida nem a histria, que pede permisso para se fazer carne como fez com Maria de Nazaret e continua a fazer com cada um de ns hoje. o Deus cheio de misericrdia, o Pai com entranhas de me que se inclina especialmente ante os filhos mais dbeis, os que so injustamente tratados, os que mais sofrem. um Deus que desfruta com a nossa humanidade. Ante ele no preciso ser perfeito pois sentimo-nos queridos na nossa vulnerabilidade. Desde esta experincia de Deus no preciso justificar-me nem subir acima de ningum. Sou como sou e o nico que me justifica a bondade desde Pai.Desde aqui, as relaes nunca podem ser piramidais, mas circulares: Deus pai e por tanto todos ns somos filhos, criaturas suas. Mt 23,8-12Tambm no preciso a lei pois no preciso me justificar ante Ele. S preciso experimentar o seu amor, pois como diz S. Paulo em Gal 2,15-21: se com a lei consegussemos a reabilitao em vo teria morrido o Messias. Desde este Deus Pai a obedincia esta escuta realidade e especialmente a escuta aos seus filhos mais vulnerveis e a liberdade libertao pessoal para poder colocar-nos ao seu servio, dos seus interesses. Como diz Jon Sobrino: o que impacta de Jesus a sua liberdade, para que nada seja obstculo para fazer o bem. Se experimento ao Deus Pai de Jesus que est em baixo, sou como Jesus servo, mas um servio desde a total gratuidade. Jesus no serve aos pequenos e excludos para ter seguidores. Jesus cura pela dignidade ferida dos filhos do Pai, e quando cura mantm a sua dignidade, despedindo-os com uma palavra de paz. Jesus no se justifica ante Deus porque alivia e serve aos que mais sofrem. O processo ao contrrio, desprende-se gratuitamente da sua vida, porque no tem segundas intenes. S lhe interessa e lhe importa o outro porque a sua nica justificao encontra-se na bondade de Deus, e seu nico interesse que se faa a sua vontade. Jo 4,34: meu alimento fazer a vontade do Pai. o alimento, quer dizer, algo sem o qual no possvel viver.Se experimento o Deus de Jesus que est em baixo, o Deus que Pai e Me, sou como Jesus servo. Jesus no tem a Deus por amo, nem ele amo de ningum. Por isso ele no veio a ser servido mas a servir (Mc 10,45)Mas ser servo como Jesus: desde a liberdade, porque quero: ningum me tira a vida, eu a dou livremente (Jo 10,17-18). A Jesus importam-lhe os filhos do Pai ameaados na sua dignidade de criaturas: o Bom Pastor desprende-se da sua vida pelas ovelhas. Este desprendimento servio. Jesus serve desde uma liberdade libertada pelo amor. Em Mt 26,36ss, Getsmani, Jesus chega ao mximo da sua descentralizao. Jesus o des-vivido por amor, no o sacrificado. Jesus nunca defendeu seus direitos, ao contrrio, perdeu-os por defender os direitos dos outros. Jo 18,8 : se me procurais a mim, deixai ir a estes. E especialmente na eucaristia (Lc 22,4) perde seu direito vida por amor a ns.Mas o servio de Jesus no qualquer servio. Ante o seu empenho por servir desde em baixo, o que supe despojar-se do manto (Jo 13) e no reter para si o ser semelhante a Deus (Fil 2), cingir-se a toalha e ser um de tantos, ante este servio Jesus recebe a proposta de servir desde o domnio e a imposio. o que aparece em Mt 16,21-28: quando Pedro no aceita o anuncio da paixo. Jesus rejeita as suas palavras como uma tentao: desde o poder no pode realizar a sua misso, no pode servir.Mt 20, 25-28. No podemos dar a vida, des-viver-nos pelos outros, seno desde o ltimo lugar. Desde l cima s manipulamos aos outros para a nossa imagem e os nossos interesses. Desde l cima no se pode servir, no se pode ser o servo des-vivido para que os outros vivam e para que tenham vida, e vida plena.Fil 2. S descendendo Jesus pde fazer essa entrega total ao Pai. E o servo que se fez um de tantos at a morte e morte de cruz, recobra a vida, porque no servio desvivido, descentralizado de si mesmo, quando o centro Deus e os seus filhos, est o viver (Jo 12,23-25)

3.- Todos temos uma mistura do Deus amo e do Deus Pai. E o nosso seguir Jesus um caminho de converso para o deus Pai de Jesus, o Deus que est em baixo.Nosso problema na hora de viver a obedincia, que no outra coisa que todo o meu ser posto escuta, que ns estamos sempre a subir (ou pelo menos com desejos), e Deus est sempre a descer. Enquanto ascendemos e ele desce h momentos em que nos encontramos e podemos escutar a sua voz com clareza. Em muitos outros momentos da nossa vida a distncia impede-nos escutar. Nossa obedincia a Deus, mas para que seja ao Deus de Jesus temos que o escutar na realidade e nela temos que o responder. Desde a encarnao o melhor lugar para buscar a Deus onde Ele quer estar: na rua, no mundo, na humanidade, no rosto de cada pessoa,..., quer dizer, em baixo.A maneira de escutar Deus no concentrando-nos e baixando o nosso olhar para o nosso umbigo, mas levantando a cabea, abrindo bem os olhos, dirigindo-os l onde se move a vida, com as suas dores e alegrias, com as suas preocupaes e lutas dirias. A onde muitas vezes Deus negado, esquecido e assassinado, mas tambm louvado, gozado e desfrutado. Desde a encarnao a onde Deus quer estar e estar actuando.

4.- Dois verbos para conjugar: h dois verbos que so condies de possibilidade para poder viver escuta de Deus Pai que est em baixo: suspeitar e surpreender-se.Viver a conjugar estes dois verbos ajuda-nos a no cair em duas armadilhas que aparecem com respeito a ns mesmos e com respeito a Deus. Suspeitar: a atitude que desmascara a armadilha que temos com respeito a ns mesmos. A armadilha da autojustificao e dos mecanismos defensivos. Normalmente temos connosco uma atitude de defesa e autojustificao que nos leva a camuflar o nosso pecado e a justificar tudo. Viver suspeitando um convite a no dar nada por suposto, a abrir-nos a nossa verdade. Esta atitude importante por como funcionamos as pessoas e por como funcionamos no seguimento de Jesus. Vou utilizar duas coisas dos exerccios de Sto. Incio: Como funcionamos de fronte realidade: no primeiro modo de orar, Sto Incio nos convida a rezar sobre como vivemos os dez mandamentos. Explica-o desde trs nveis, e a seguir o seguinte esquema: 10 mandamentos- 7 pecados m./7 virtudes o.- 3 potncias da alma- 5 sentidos corporais. Quando nascemos no conhecemos nada da realidade. atravs dos cinco sentidos que a percebemos aos poucos. Percebemos dados que no so neutrais para ns; os passamos pelo laboratrio das trs potncias da alma. Temos uma espcie de arquivo, a memria, sempre condicionada pelo inconsciente; e uma inteligncia com capacidade de comparar e relacionar os diferentes dados e fazer elaboraes que desembocam numa deciso (a vontade). Estes resultados repetidos na experincia originam esquemas reactivos fixos (7 pecados e 7 virtudes), so as nossas atitudes. Este conjunto de esquemas fixos vai originando uma viso global da realidade (os dez mandamentos), o nosso sistema de valores. O que acontece que de adultos funcionamos quase ao contrrio. Quer dizer, o nosso sistema de valores refora e confirma os nossos esquemas reactivos fixos que por sua vez condicionam a nossa memria (s lembramos o que nos convm: o problema do inconsciente), a nossa inteligncia (as comparaes e relaes se fazem num sentido determinado e no noutro), e como consequncia a nossa vontade (nos sentiremos incapazes para certas decises). Por ltimo, os nossos sentidos perdem sensibilidade e ateno respeito a todos aqueles campos que o nosso interior no valoriza. (Mt 13,10-17). Deste modo at os nossos sentidos podem estar condicionados e ser condicionantes para perceber a realidade. Como funcionamos no seguimento de Jesus: nos Exerccios de Sto Incio contemplam-se quatro semanas, mas apenas nas duas primeiras h regras de discernimento; isto porque apenas existem duas situaes: na primeira semana, situao de no converso, escolho entre o bem e o mal, sou tentado grosseira e abertamente; na segunda semana, situao de converso, escolho entre o bom e o melhor, e sou tentado sob espcie de bem (~fariseismo). Se a minha viso da realidade pode estar condicionando at a percepo da realidade e alm disso estou em situao de segunda semana, tentado sob espcie de bem, ou introduzo a suspeita prpria ou vou passar a vida enganando-me. um presente poder abrir-nos a nossa verdade. Sta. Teresa diz que a humildade andar na verdade. A humildade aceder prpria verdade sem defesas prvias, com a suspeita de que no sou o que vejo de mim nem o que persigo em mim. Surpreender-se: a atitude que desmascara a armadilha que temos frente a Deus: a projeco. Queremos que Deus coincida connosco, que a sua vontade e o seu actuar na realidade sejam de acordo com os nossos gostos e desejos. Mas Deus sempre maior do que os nossos projectos e expectativas. Deus trabalha constantemente no corao da histria e no de cada pessoa ainda nas situaes mais escuras. Deus teimoso no seu modo de estar no mundo criando sempre o seu reino, brotes de nova humanidade: vou fazer uma coisa nova, no o notais? (Is. 43,19). O problema que o possamos perceber, que o possamos ver, que nos deixemos surpreender. Dolores Aleixandre (uma teloga espanhola) diz que surpreender-se andar pela vida como por um campo que esconde um tesouro, ou como por um caminho no qual nu desconhecido em qualquer momento pode juntar-se connosco e dar-se a conhecer ao partir o po. Trata-se de ir pela vida como permanente aprendiz, acolhendo, sem pre-julgar, com a receptividade e a capacidade de admirar-se acordadas, percebendo os limites e as carncias mas tambm as possibilidades. estar disposto a deixar-se descolocar, a abrir-se ao novo, no ao programado por mim, mas ao que no se esperava e precisamente por isso surpreendeu. Fascina-nos a inrcia , o conhecido, o que podemos controlar. Assusta-nos a novidade e por isso classificamos as pessoas e as realidades. Como diz Mercedes Navarro: se a realidade muda pior para a realidade, pois nossos sagrados esquemas no devem ser alterados. aquilo de: de Nazaret pode sair algo bom?. De facto pode e sai. O que pode acontecer que pelos nossos pre-juzos tal vez no demos conta. Temos que apreender a viver surpreendendo-nos se queremos escutar ao Deus que nos d como sinal para reconhecer ao Salvador do mundo: um beb, envolvido num manto e deitado numa manjedoura.

5.- O Deus que est em baixo que vos oferte a cada um o que formula Miqueias no captulo 6, versculo 8: J te foi dito, Oh homem, o que o Senhor quer de ti: que ames com ternura, que pratiques a justia e que caminhes humildemente com o teu Deus. As trs coisas so fundamentais mas desde o que hoje nos toca compartilhar, a obedincia, e porque para mim muito sugerente, desejo-vos especialmente o ltimo: que caminhes humildemente com o teu Deus.Caminhar: s se pode com os ps bem colados terra; no ar no se caminha. Se voa. E ao caminhar os ps se sujam de barro, de p. A terra que vos toca caminhar o povo... Peo para que no vosso caminhar vos impliqueis tanto com este povo, que leveis sempre os ps bem sujos.Humildemente: peo que a vossa liberdade cada vez mais possa e queira colocar como centro da vossa vida o Deus Pai que est em baixo.

30 de abril de 2014Dia 5: Livres para amar, livres para servir. Castidade. Pobreza, castidade e obedincia so as caractersticas distintivas do homem redimido, interiormente resgatado da escravido do egosmo.Livres para amar, livres para servir: assim so os homens e as mulheres que renunciam a si mesmos pelo Reino dos Cus. Seguindo Cristo, crucificado e ressuscitado, os consagrados vivem esta liberdade como solidariedade, assumindo os pesos espirituais e materiais dos seus irmos.E assim: Os votos so assumidos pelos consagrados como elemento desta entrega total nas mos de Deus a exemplo de Cristo para o servio do Reino e da humanidade, ou so vistos como uma carga insuportvel que os limita e os torna infelizes?

Convite a recriar Lucas 2, 22-40: Todo o filho primognito varo ser consagrado ao Senhor: Como Jesus, ser levadas ao templo para ser consagradas ao Senhor. Cumprir a vida num ecce venio, numa entrega total nas mos do Pai, ao servio do projeto de salvao de Deus para os homens e para o mundo: paixo pela humanidade, paixo pelo mundo. Para oferecerem em sacrifcio um par de rolas ou duas pombinhas. Segundo a Lei de Moiss, todos os primognitos, tanto dos homens como dos animais, pertenciam a Jahwh e deviam ser oferecidos a Jahwh (cf. Ex 13,1-2. 11-16). Um costume cananeu que Israel transformou no que dizia respeito aos primognitos dos homens Estes no deviam ser oferecidos em sacrifcio, mas resgatados por um animal, imolado ao Senhor (vers. 23-24). A castidade tem a ver com este resgatar: algo muito valioso que ns entregamos. Mas no somos resgatados porque somos castos, somos castos porque somos resgatados: a resposta da consagrao, pessoal, ao dom gratuito da misericrdia. Importa viver esta dimenso que no situa a castidade na renncia, mas na resposta. Ela no mutila nada daquilo que ns somos, ela capacita-nos para uma misso em liberdade, potencia o mais precioso de ns e faz brilhar os nossos rostos. Apenas a castidade (as necessidades coartadas no seu fim, dizia Freud) possibilita a ternura duradoira. Simeo e Ana representam o Israel fiel que esperava ansiosamente a sua libertao e a restaurao do reinado de Deus. Resposta de fidelidade ao amor. O amor casto porque fiel, mesmo quando sexual. A castidade amar na fidelidade, na aliana (por isso no menos casto o amor do matrimonio fiel). Os consagrados no renunciam sua sexualidade, apenas dimenso genital. Apenas em fidelidade orante isso possvel. Fidelidade orante fidelidade amante. Simeo toma Jesus nos braos e apresenta-O ao mundo, definindo-O como a salvao que Deus quer oferecer a todos os povos, luz para se revelar s naes e glria de Israel. Tomar Jesus nos braos e apresenta-lo ao mundo: a vivncia do amor gratuito da castidade mantm a verdadeira ternura e apresenta-a ao mundo. Amor de castidade que tambm se abre universalidade da salvao, j no mais apenas dedicado a uma s realidade (independentemente da sua raa, da sua cultura, das suas fronteiras, dos seus esquemas religiosos). Este menino foi estabelecido para que muitos caiam ou se levantem em Israel e para ser sinal de contradio; e uma espada trespassar a tua alma. A consagrao num amor assim livre provocar a mesma diviso que a proposta de Jesus trouxe em Israel e ao resultado dessa diviso o drama da cruz. No h amor casto separado da justia, da pobreza, da verdadeira obedincia da cruz. Ana tambm uma figura do Israel pobre e sofredor (viva), que se manteve fiel a Jahwh; ela falava do menino a todos os que esperavam a redeno (lustrosis: resgate) de Jerusalm. Amor de castidade intimamente ligado com os anawim (Israel pobre e sofredor). Consequencia de fecundidade inesperada: o resgate resgata (o amor que entrego vem libertar a humanidade, assim como Israel foi libertado do Egipto). Jesus o Messias libertador que vai conduzir o seu Povo do domnio da escravido para o domnio da liberdade. A apresentao no Templo de um primognito celebrava precisamente a libertao do Egipto e a passagem da escravido para a liberdade (cf. Ex 13, 11-16). Esta libertao a que cada consagrao renova. Eis que Ele vem ao Templo, numa figura frgil, de um Menino, sinal de contradio, mas tambm, e sobretudo, sinal de redeno, de libertao para todos os que ainda ousam crer e esperar num mundo segundo a ordem de Deus, em que a sabedoria e a graa que habitavam a pessoa de Jesus possam ser os fundamentos de uma civilizao do amor. A fragilidade e as contradioes no podem provocar desanimo ou vontade de recuar. um menino fragil quem carrega em si a redenao do mundo. E o menino crescia em sabedoria e graa. Deus vem ao encontro da humanidade em Jesus, e tambm em ns, consagrados. Carregamos a sabedoria e a graa de Deus, sua vontade de amor, seu projecto de salvao, para todos os povos da terra.

Jesus escolheu um caminho de total fidelidade aos mandamentos e aos projetos do Pai. Ao oferecer-Se a Deus em oblao, ao ser consagrado ao Pai, Jesus manifesta a sua disponibilidade para cumprir fiel e incondicionalmente o plano salvador do Pai at s ltimas consequncias, at ao dom total da prpria vida em favor dos homens.O ecce venio de Jesus o modelo da doao e da entrega de todos os consagrados, chamados a seguir Jesus mais de perto, numa oblao total a Deus e ao Reino. A vocao de consagrados concretiza-se na entrega de toda a existncia nas mos do Pai, na fidelidade absoluta sua vontade e aos seus planos.

1 de Maio de 2014Dia 6: Practicar a justia; pobreza, o voto da solidariedade e da partilha

O sentido da vida crist e da vida consagrada nunca se encontra em si mesma, mas em razo dos excludos, os que ficam nas periferias, nas fronteiras e nos desertos dos sistemas socioeconmicos e tambm religiosos. A imagem do nosso mundo cada vez mais aquela do banquete de uns poucos que s deixa algumas migalhas para a maioria. Muitas pessoas apenas tem o desejo de ser e existir, no tem a vida por suposto, mas cada dia uma luta por viver. O voto de pobreza manifesta a paixo de Deus pelos excludos. No se trata de um voluntarismo ou de uma ideologia, mas de uma seduo irresistvel para com os povos e culturas que mostram o rosto do Deus encarnado. Assim o voto de pobreza brota da experincia pessoal de ser puro dom de Deus, indigente, necessitado, vulnervel, sustentado por um amor transbordante que convida a viver em partilha, em totalidade, com os pobres (poder, ter, valer, querer, possibilidades e precariedades). o convite a reproduzir com a vida o dinamismo da eucaristia: tomai e comei, tomai e bebei (Mt 26,22)

1. Voto de solidariedade e partilha.Partilha significa dividir, distribuir em partes, possuir em comum. Quem partilha uma pessoa que faz parte de outra em alguma coisa. Compartilhar partilhar-com: no mesma coisa partilhar algo para outro do que partilhar algo com outro. Partilhar tambm significa participar: formar parte do universo vital daqueles com quem desejamos partilhar a vida. Compartilhar participao num universo comum que supe a reciprocidade. Quem compartilha companheiro/a (de cum-panis, comer o mesmo po, isto partilhar a mesma vida, o mesmo sonho). Significa: eu dou do meu (o que tenho e sou) e tu das do teu (o que tens e s). Poder dar e poder receber o dinamismo que permite humanidade a sobrevivncia. Compartilhar implica a nossa totalidade como pessoas e ressoa eucaristia.A pobreza afecta nossa relao com as coisas: implica simplicidade, no acumular, liberdade perante as coisas. Mas a esta dimenso pessoal verdadeira vai unida uma dimenso scio-poltica: uma solidariedade afectiva e efectiva com a humanidade mais empobrecida. Apenas a dimenso pessoal pode significar coar o mosquito e engolir o camelo.O voto de pobreza voto de expropriao. No nos pertencemos. Nosso corao est onde est a nossa riqueza... O voto exige defesa publica dos pobres e denuncia dos mecanismos que geram excluso, des-privatizao das congregaes que no podem mais ser instituies fechadas no seu autossustento, converso pessoal sempre necessria. O voto de pobreza converte os pobres em nossa perspectiva ali onde estivermos. O voto de pobreza situar-se desde a perspectiva do pobre. No importa o lugar, importa esta perspectiva (Jesus visitou Zaqueu, foi amigo de Nicodemos, frequentou as casas de pessoas importantes, mas nunca abandonou a perspectiva dos pobres, dos excludos).A solidariedade no tem origem voluntarista, mas espiritual: s Deus Deus, e em Jesus Cristo ele se faz ltimo, expropriando-se, des-privatizando-se, fazendo-se eucaristia, po para os pobres. Sair aos caminhos para partilhar o po da vida, o teto, a palavra, a cultura, a festa o amor, a luta, com os que no encontram lugar em outras mesas.

2. Pobreza e reciprocidadeA solidariedade implica a reciprocidade. A esmola humilha ao pobre. A pobreza um voto de vulnerabilidade assumida, implica exposio iniciativa carinhosa das pessoas, solidariedade popular, chama-nos a deixar-nos cuidar, acolher a ternura e o dom que se encontra no meio da dureza da vida dos pobres. A reciprocidade implica tecer relaes inclusivas, relaes tambm desde a amizade e a partilha das possibilidades e as precariedades, no apenas dos outros, mas tambm as prprias. um desafio a relacionar-nos e reconhecer-nos desde a nudez do ser, chamar-nos pelo nome, sem etiquetas, sem imagens artificialmente construdas. viver perdendo o medo a mostrar a prpria vulnerabilidade e a reconciliar-nos com ela. A reciprocidade recorda-nos que no somos salvadores, mas pessoas sedentas, dbeis, que procuram e fazem caminho com o povo.Aprender a receber tambm uma lio evanglica... Temos ainda uma imagem algo prepotente da vida religiosa, intervencionista demais...O voto de pobreza exige descer em terrenos concretos que ainda custa muito assumir: viver des-programando-nos e com um profundo respeito ao real sem nos escandalizarmos por isso. Quer dizer: viver em espaos e tempos informais, no programados, na familiaridade e vizinhana de cada dia, com seus imprevistos, descobrindo a os sinais da presena do Reino; situar-nos na realidade desde aquilo que ela , desde os pontos de sada e no desde os pontos de chegada sempre hipotticos, isto assumindo a realidade desde dentro e desde em baixo, em sua complexidade, para a transformar (sem prepotncia e sentindo a carga, carregando e tomando conta das cargas... como o samaritano).

3. Um voto poltico Exposio no compromisso com os pobres nas plataformas e mediaes que combatem a pobreza: voto de pobreza na intemprie. Recuperar assim o sentido poltico do voto da pobreza. Reaprender a ser humildes, procurar estar com outros desde o que somos: exposio da nossa identidade em contraste com a dos outros, com o diferente. Tecer cultura cidad: movimentos sociais que combatem a excluso (direitos humanos, comits de solidariedade...) Onde se jogam os interesses dos pobres e a possibilidade de uma nova humanidade. Territrios onde a vida religiosa ainda forasteira e a sua presena causa inquietao ou perplexidade. Assumir a perspectiva de gnero...

4. Urgncia da vivencia do voto de pobreza Contextos. Amar os pobres e amar os seus contextos (cenrios vitais, geografias, culturas). Necessidade da vizinhana e da relao de familiaridade. Trabalho. O voto de pobreza se concretiza tambm no trabalho. O pobre vive a lei do trabalho para ganhar o po e sobreviver. Na vida religiosa por vezes relativizamos demasiado isso de ganhar o po com o trabalho. Resistncia ao consumo. A mentalidade depredadora tambm entrou na vida religiosa: consumo, logo existo. Eis uma forma de contraculturalidade necessria na relao com as coisas. Precisamos crescer em liberdade, precisamos rever as nossas praticas e comportamentos. Como ajudar a descobrir o valor de carecer como solidariedade sem impor a ningum? Com que conscincia ou inconscincia vivemos a nossa relao com o dinheiro e seu uso? Lc 12,31-34 Contradies. As temos, mas no podemos pactuar com elas. Levamos em vasos de barro (2 Cor4,7) este tesouro, no se trata de cumprimentos, mas sim de viver em atitude de permanente desapropriar-se e comunho com os pobres, suas historias e culturas. Um caminho sempre inacabado.

2 de Maio de 2014Dia 7: Paixo por Deus, paixo pela humanidade.Apenas o amor-fonte de um Deus que ame apaixonadamente pode exercer em nos a sua atrao. Depois ns responderemos apaixonados por Ele e apaixonados pela humanidade. Ser sempre resposta a esse Amor.Duas personagens evanglicas ajudam a re-criar tambm em nos esta experincia do amor que poder ser respondido como verdadeira paixo. A samaritana e o samaritano: Jo 4.1-42 e Lc 10,25-37. Nas duas narraes encontramos um paralelismo de trs cenrios que se seguem: situao inicial de carncia, ao criadora do Senhor sobre as personagens e a sua transfigurao no fim dos relatos. Contemplar estas imagens evanglicas deixando que elas nos interpelem para assim renovar o sentido da vida consagrada desde esta inspirao das origens. Com o escriba que dialoga com Jesus perguntar-nos: encontra-se a vida eterna ai onde o samaritano a encontra? Deixaremos que Deus nos modele a sua imagem e semelhana como Jesus prope? A nossa liberdade ficar mesmo desafiada pelo mesmo imperativo que o escriba escutou de Jesus: vai e faze o mesmo!a. Dois pontos de partida semelhantes: caos, carncia e vazio (como no Gnesis). J o facto de serem samaritanos identifica esta carncia. Uma mulher em situao deficiente (no tem marido), no tem gua viva. Um homem ferido quase morto, sem vida. Um escriba que no tem vida eterna. At Jesus aparece em situao de vulnerabilidade: tem sede e no tem bilha, e se expe a ser rebatido por um escriba perito na lei. No evangelho de Joo especialmente esta condio deficitria, o no ter, descreve sempre o risco de ficar fora da vida: no tem vinho (2,3), no tenho ningum para me mergulhar na gua (5,7), tendes peixe?... no (21,5). Tambm surpreende no texto ver a Deus Pai apresentado por Jesus como algum em situao de carncia: esses so os adoradores que o meu Pai procura (Jo 4,24). Nenhuma de estas situaes de necessidade ficar sem resposta: nada vai poder impedir o encontro com Jesus, nem os medos ou receios nem as justificaes, nem a falta de ortodoxia nem os preconceitos tnicos ou de gnero. Mas interessa salientar que aquelas personagens que nas narraes aparecem acomodados e sem necessidades, ficaro fora da possibilidade de qualquer mudana ou transformao. O resultado das narraes mesmo uma surpresa. Uma mulher que est fora da ortodoxia e no o fariseu e mestre da lei Nicodemos, aceitar a Jesus. Um ignorante samaritano e no o escriba entendido acertar com a correta conduta que conduz vida eterna. Para alm disto um homem ferido por salteadores, meio morto, quem est no centro da pergunta pela identidade do prximo. Tambm de salientar que no seja nos templos nem na cidade o lugar de revelao de Deus: um poo no meio do campo e um caminho cheio de perigos so os lugares escolhidos por Deus para se manifestar.

b. Ao criadora divina. A samaritana deixa-se moldar por Jesus (como no Genesis). Ela recebe gua viva como Adam recebeu o sopro divino que lhe conferiu a vida (Gn 2,7). O escriba de Lc convidado a se fazer a imagem e semelhana do samaritano que agora a verdadeira imagem de Deus misericordioso. A rede que Jesus lana tira a mulher samaritana da vida banal, da superficialidade, e ao escriba da auto justificao e do intelectualismo. Jesus guia como um bom pastor as duas ovelhas para a autenticidade, para a terra do Dom: o que se recebe (gua viva) e o que se entrega (a vida oferecida para salvar a quem a perdeu). Assim no importa a negatividade em que se encontrem, Jesus pode abrir uma fenda em sua vida e atra-los (se conhecesses o dom de Deus... mas um samaritano viu-o e aproximou-se...).Jesus conduz a samaritana e o escriba ao seu terreno, onde ele quer: nem se retira perante as defesas da mulher nem evita a evaso do escriba no terico. Jesus no se cansa das armadilhas, das provas, das resistncias, ele uma e outra vez ensaia tcnicas novas de relao. Jesus dialoga, prope, no reprova, no acusa nem condena. Fala ao corao com a estratgia do espao vazio: se soubesses quem te fala... possibilita samaritana um espao de reconhecimento para que ela possa propor-se perguntas; tambm ao escriba no responde Jesus com uma lio, mas possibilitando um espao vazio que d a oportunidade de descobrir por si mesmo o que est a perguntar.

c. Transfigurao. Apresenta-se uma alternativa de eleio para a mulher e para o escriba: permanecer no velho, nas convices, procurando em templos esgotados, em leis e costumes a gua viva, ou escolher a vida eterna se deixando arrastar pela transfigurao que Jesus provoca. A samaritana representa aqueles que pretendem acalmar a sede nas tradies dos antepassados; o escriba representa a lei incapaz de conceder a vida nem de responder pergunta pelo prximo. Acolher o dom de Jesus implica deixar de ser o centro de si, abrir-se a relaes com os semelhantes. Jesus quer que descubramos o Elemental: o ser humano precisado, comum a todos e por cima de qualquer ideologia e religio. O prximo se reconhece por implicao. As instituies velhas so substitudas pelo caminho novo da sua carne: heb 10,20. A humanidade frgil agora espao de encontro: cansao e sede possibilitam a reciprocidade. A converso acontece no contacto com as pessoas reais e concretas. O saber ao qual Jesus convida a realidade concreta e tangvel. Jesus no procura que as pessoas conheam mais, mas que mudem de vida. A vida se alcana fazendo, no sabendo. Tambm os esquemas de gnero ficam transfigurados no encontro com Jesus: a samaritana se torna evangelizadora, o samaritano age gerando vida (toca nele, cura as feridas, levanta-o, carrega com ele, procura hospedagem...), funes tradicionalmente maternais ou femininas.

A samaritana transformada numa mulher conhecedora do manancial da gua viva, consciente de ser procurada pelo Pai que quer fazer dela uma adoradora. Assim torna-se em evangelizadora. Uma mulher que deixa a bilha no poo e corre a anunciar gratuitamente o dom recebido.O samaritano transformado pela identidade de misericrdia que faz com que ele se comporte como prximo, agora aquele que teve compaixo o seu nome novo. O escriba desafiado a mudar seu desejo de vida eterna (que manifestou como desejo de possuir) com um gesto de desapropriao a imagem e semelhana do samaritano. O prximo que na pergunta inicial apenas era uma referencia sem contedo passa a ser algum de carne e osso, concreto e pessoal. o corao do ser humano que se relaciona com os outros como um tu (toma conta dos outros e possibilita-lhes a vida).Jesus passa a ser o manancial de gua viva, que fala conosco (se relaciona pessoalmente) no corao (como o profeta Os 2,22) e alberga a vontade divina: faze isso e vivers... Deus se converte no gerador e doador de vida, d e procura, e pode ser chamado Pai, que no se deixa possuir pois esprito. Deseja comunicar-nos plenitude, alegria, mas encontra-lo implica olhar para baixo e no para cima (no fundo do corao e nas beiras dos caminhos). A provocao permanece para ns. O prximo no aquele que decidimos ser tal, mas cada um de ns devemos ser prximos de todos os seres humanos que andam em necessidade. Na perspectiva de Jesus o centro j no sou mais eu, o centro o outro e para ele devemos dirigir a ateno. A imagem e semelhana implica alteridade e gratuidade, assim como Deus . As perguntas para a nossa contemplao podem brotar das mesmas personagens: para onde sou conduzido como religioso/a desde a experincia de carncia da minha vida? Como vivo a ao criadora de Deus?Jesus no se deteve perante as resistncias e no vai se deter perante as nossas. No importam nossas negatividades. H em ns um ponto de fratura onde nossa sede mais profunda emerge: o desejo mais profundo que pode relativizar todos os demais. Importa fazer memria dos poos nos quais vivemos fortes encontros com o Senhor e assim conectar com nossa sede e os pontos de fratura. Viver mantendo a sede da origem, da primeira vocao, do chamamento primeiro, sem que nada nem ningum nos sufoquem, afoguem, ou entretenham. E permanecer como buscadores com os que buscam e caminhantes com os que caminham.

Contemplar a cena descrita por Jesus no bom samaritano. Manifesta o que ainda no somos. Descobrir a importncia do mas dissidente (mas um samaritano...): no meio de tantos sinais de morte, algum que no parece muito capacitado nem pertence a nenhum centro de poder destacvel, sem prestigio nem influencias... esse permite que seu corao bata ao ritmo do Outro. Afectar-se e responsabilizar-se, possibilitando que no cenrio penetre uma luz tnue mas firme e duradoira, a da misericrdia. A urgncia de ajudar ao prximo se impe e pospe o prprio. Predomina a preocupao pela vida de outrem. Possivelmente seja esta a adorao qual se refere Jesus com a samaritana. No medir, no calcular, deixar que o amor nos desaproprie, eis a lgica de Jesus. Os demais devolvero a tua identidade quando tenhas a sensao de que estas a perder a tua vida.

Pensar na vida religiosa, nos meio-mortos que tambm h no seu seio, entre ns. Recordar que chegamos a ela procurando a vida em abundancia. Descobrir que o que sentimos meio-morto em nos poderia estar destinado a revelar-nos dimenses desconhecidas da nossa existncia. H novidades que chegam a nossa vida e talvez no somos capazes de ver... ver assim como oportunidades o que aparentemente parece ser apenas morte.

Recriar estes cones da vida religiosa para que a nossa resposta seja realmente paixo por Deus e pela humanidade.

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