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Revista Horus #0Revista Interativa. Guido Pratti / João Espíndola Orientação: Wagner Bandeira FAV - UFG Outubro de 2014Revista elaborada durante a disciplina de Design Editorial em 2014. Magazine created for 2014 Editorial Design subject at college.
QUADRINHOS por Waldomiro Nogueira
HORUS
Quadrinhos Arte?Waldomiro Vergueiro tenta responder eterna questo
H O R U S
ENsaio Visual
Leandro abreu e suas iLustraes do bem
GamEs
natLia bridi apresenta assassins Creed
Grafitti Vs.
Pixao
N00out|2014
EDITORA
GESTALT
E DITORIAL
HO
RU
SGames, softwares, websites, sistemas computacionais variados,
no h, na atualidade, elemento de maior projeo que a mdia interativa, responsvel por grandes mobilizaes, a partir da comunicao mediada por redes e sites sociais e uma mudana profunda na organizao social, econmica e cultural.
Lidar com sistemas computacionais algo j natural, mesmo para aqueles que no usam diretamente computadores em suas casas. O uso de cartes de programas sociais, de caixas de bancos, de produo e impresso de documentos, enim, no h quem ou como escapar desta realidade, mesmo recebendo jornais, vendo televiso. Estamos impactados social e culturalmente por este contexto.
Compreender e melhorar os sistemas de mdias interativas torna-se, ento, premente, na exata medida em que a contemporaneidade urge por espaos, ecoa nos sentidos e sente pulsar cada vez mais em unssono, no corpo social global. Em nveis menores, quebrar resistncias ainda existentes, via melhoria do padro de usabilidade destes sistemas passa a ser obsesso, engrandecida pela velocidade em acelerao dos mercados, dos bits, bytes, dos cabos de ibra tica e satlites que conformam um novo backbone mundial, cuja importncia passa a deinir potncias. O sangue do mundo no tem mais como principais veios a via martima ou area; agora os luxos que oxigenam mercados e culturas so informacionais, embalados por uma presentiicao ascendente, em uma atualizao constante, apressada, em tempo real. O tempo do mundo o agora, seu espao ao mesmo tempo foi reduzido e ampliado, com uma fsica no to clara, mas densa o suiciente para abarcar o mundo com as sutilezas do virtual e do atual. Entre estes, uma torrente de dados abre caminho para os luxos convencionais.
As mdias interativas respondem por este luxo, aliceradas pelas interfaces computacionais, que tornam impulsos em impactos, fazem agir e interagir sociedades, promovem deslumbramentos e encantamentos, tornam mais tangveis ideias abstratas que agora so imagens, e interativas.
Agradecemos aos autores, que gentilmente atenderam o convite e ajudam a pensar as mdias interativas, com competncia e presteza j habituais, o que demonstra no s a importncia temtica, mas a existncia de competncias no campo, em terras brasileiras. Nosso desejo de que o signo verbal, vivo e pujante, que descansa nas prximas pginas, consiga suscitar novas questes, e se torne tambm interativo, ainda que no plano das ideias.
4
S UMRIO
HORUS
fotoGrafia 8 | O suicdio da fotgrafa Francesca Woodman, segundo o ilsofo Arthur Danto
moda 12 | O Futuro da Moda: destaques deste ano da Central Saint Martins14 | O ltimo giorno de Yasmine Sterea na fashion week de Milo
dEsiGN
16 | Designer do Hotel Pantone vem ao Brasil e fala sobre uso de cores18 | Entrevista com Rpida Alexandre WollnerDesign: 70 | O Design e a Cultura Visual Urbana80 | Do tipo tela
6
S UMRIO
H O R U S
Imagem do desenhista
Moebius, conhecido por
ilustrar quadrinhos.
HORUS
ExPEdiENtE
Editora e diretora responsvel: Daysi
Bregantini
Redao: Amanda Massuela, Gabriela Soutello
e Patrcia Homsi
Editora do site: Patrcia Homsi
Edio de arte e digramao: Guido Pratti e
Joo Espndola
Assistente de arte: Guido Pratti e Joo
Espndola
Espao Revista HORUS: Eduardo Pratti
Diretor inanceiro: Marcos EspndolaGerente dpto. assinatura: Guido Eduardo
Gerente inanceiro: Joo MarcosPublicidade em Goinia (62) 4385-3385
Executivo de contas: Tiago Barros ([email protected]
revistahorus.com.br)
Representante em Braslia (61) 3321-
9100 G&J Comunicao Paulo Abelho
Grica: VermelhinhoProibida a distribuio (exclusiva no Brasil):
Dinap S/A Distribuidora Nacional de
Publicaes
HORUS REVISTA DE CULTURA VISUAL uma publicao mensal da Editora Gestalt
Rua C-15, 8 3 andar Setor Sul Goinia
GO CEP 24533-070 Tel.: (62) 2485-3385
Fax: (62) 2485-3386
Matrias e sugestes de pauta: [email protected]
revistahorus.com.br
E-mail: [email protected]
GamEs
66 | Assassin's Creed: Unity ter histria "mais sria e madura"68 | The Last of Us Remastered
QuadriNhos
20 | Quadrinhos Arte? Waldomiro Vergueiro tenta responder eterna questo32 | Superior Spider-Man34 | Entrevista: O artista e a cartola
ENsaio Visual
38 | Leandro Arajo
artEs Visuais 54 | Tecnologia e arte digital: um estudo sobre imagens virtuais e dispositivos mveis60 | O Luto da Arte
urbaNa
64 | Graitti Vandalismo, Pichao Arte
84 | Notas
7
F OTOGRAFIA
HORUS
A artista extremamente
talentosa Francesca
Woodman terminou
abruptamente sua breve vida
e carreira em 19 de janeiro de
1981, saltando para a morte
de uma janela do seu estdio
em Nova York. Francesca
tinha 22 anos, quando
cometeu suicdio. A obra de
seus oito anos produtivos foi
exposta, entre outros lugares,
no Museu de Arte da Cidade
de Helsnquia, na Finlndia; na
Marian Goodman Gallery, em
Nova York, em 2004; e na Galeria
Mendes Woode (Mendes Wood
DM), em So Paulo, em 2012.
Francesca Woodman ficou
famosa pelos seus trabalhos
em preto e branco, onde
utilizou da sua prpria imagem
ou modelos femininos. Muitas
das suas fotografias mostram
jovens mulheres nuas,
O suicdio da fotgrafa
Francesca Woodman, segundo o filsofo Arthur Danto
O filsofo e crtico de arte Arthur Danto, na revista The Nation, na coluna Darkness Visible, em 15 de novembro de 2004, comentou sobre a fotgrafa
Francesca Woodman e os mistrios da sua morte em sua prpria arte.
desfocadas (devido ao movimento e longos tempos de exposio),
fundindo com os seus arredores, ou com os seus rostos velados.
Arthur Danto afirma que teria sido mgico e enigmtico
qualquer que fosse o destino da jovem fotgrafa Francesca
Woodman, mas o seu suicdio causou aos espectadores uma
curiosidade em saber se ele foi prenunciado em suas fotografias.
Mas, segundo Danto, a relao entre a vida de um artista e o
seu trabalho sempre provisria, mesmo quando a vida parece,
Autorretrato de Francesca Woodman.
8
FOTOGRAFIA
obviamente, ter sido o objeto
do trabalho, como o caso do
famoso escritor Marcel Proust.
A melhor razo para a leitura da
biografia de Proust, por exemplo,
aprender como diferente so a
sua vida e o seu grande romance
literrio, apesar da interna
relao entre os dois. A diferena
entre esse autor e o narrador da
sua obra Em Busca do Tempo
Perdido uma intrincada
questo de interpretao.
Estando ou no o suicdio
de Francesca projetado em
sua arte, o seu trabalho parece
revelar sua vida interior, no s
porque Francesca tipicamente
o seu prprio modelo para as
suas fotografias, mas por causa
do jeito que em Francesca
cria imagens de si mesma: as
fotografias so de uma mulher
jovem, freqentemente nua,
muitas vezes usando tipos de
roupas vintage (retrgrada) ou ntimas roupas que os amigos de
Francesca diziam que ela usava a todo tempo. A jovem fotgrafa
geralmente aparece sozinha em quartos, em grande parte vazios,
com paredes manchadas e peas de mveis de segunda mo, que
ela usava como estdio ou espao de trabalho ou ambos. Ento,
as pessoas tm debruado muito sobre as fotografias dela, com
olhos forenses, procura de pistas sobre o seu suicdio.
Enfim, at hoje estudiosos continuam a buscar evidncias,
realmente embasadas, de um prenncio do seu suicdio em suas
obras fotogrficas, as quais Francesca utilizou de elementos como
o simbolismo, o Barroco, o Surrealismo e o Futurismo. Hoje,
muitos consideram uma arte mais conceitual.
Francesca conseguiu revelar sua alma o romantismo, a
alegria, o medo, a ambio, o feminismo e a angstia de uma
menina por meio da exposio do corpo. Agora reconhecida
pelo mundo das artes, deixou obras lindas. Alguns textos de
seu dirio mostram como era intensa, ambiciosa, ansiosa por
reconhecimento. Em uma de suas frases afirma que vaidosa e
masoquista e se indaga como pode ser as duas coisas.
Suas fotografias so, como toda arte dessa natureza, to
poderosas que impossvel passar por elas sem ser atrado, sem
sentir certa perturbao e angstia, sem pensar nos limites do
Retrato de Francesca.
Francesca Woodman na foto acima e na imagem ao fundo da pgina.
FOTOGRAFIA 9
HORUS
corpo. Francesca explora o
corpo humano, seus limites e
temas como a solido, a morte
e o feminino.
Para os interessados, em
2010 foi lanado o documentrio
The Woodmans, realizado
por C. Scott Willis (ainda no
legendado em portugus). O
filme fala sobre a famlia e vida
da fotgrafa Francesca, traz
depoimentos de familiares
prximos, como seu irmo, fala
sobre a relao e importncia
da arte na vida de Francesca e
seu trgico fim. Sem dvida, a
arte era o sentido da sua vida
e foi aps um bloqueio criativo
que afetou todo o seu processo
lhe impedindo de produzir,
que ela entrou numa crise e
desequilibrou-se a ponto de
se matar, segundo o The
Woodmans.
Na atualidade, um jovem que
tem se destacado na fotografia
como arte mais conceitual
ou, em alguns casos, surreal,
o fotgrafo Kyle Thompson,
que tem tambm Francesca
Woodman como fonte de
inspirao. Vale pena conhecer
igualmente o seu trabalho.
HORUS
Acima e ao lado, retratos de
Kyle Thompson.
10
FOTOGRAFIAFOTOGRAFIA
Autoretrato de Francesca Woodman.
11
MODA
HORUS
A Central Saint Martins, em Londres, um lugar onde todo mundo que ama moda gostaria de estudar. Tem renome e reputao de criar gnios.
Uma aluna que se formou neste ano disse assim: compartilhar ideias com este grupo de pessoas criativas s me faz querer fazer algo acontecer. quase uma iluminao. Alm de todo esse privilgio, quem estuda l recebe muita ateno, e seus trabalhos de concluso de curso so assistidos e analisados pela nata
O FUTURO DA MODA: Destaques deste ano da
Central Saint Martins
RICHARD MALONE
Ele irlandes e tem 24 anos. Sua coleo foi inspirada na cidadezinha natal, costumes e esteretipos da Irlanda, mas com um approach bem jovial e uma pegada meio esportiva. Segundo ele, o foco principal foram seus conterrneos mais jovens, que s querem saber de baguna e bebedeira e no tem planos pro futuro.
do universo da moda. Uma presso enorme, e uma honra maior ainda.
Em junho foi a formatura de mais uma turma promissora, e desde ento tenho ficado de olho nos designers que me chamaram mais a ateno. Tenho trs que viraram meus queridinhos, e achei legal compartilhar aqui, porque no Brasil muitas vezes no recebemos tantas notcias sobre essa parte to enriquecedora do fashion business.
Estas so as minhas trs apostas pro futuro da moda, recm sadas da CSM:
MODA
HORUS
Modelo vestindo as peas da coleo de Richard Malone.
12
Destaques deste ano da
Central Saint Martins
MODA
HyON PARk
Meu preferido! Coreano de
25 anos, fez uma coleo sexy
sportswear, segundo ele. A
inspirao principal foi a energia
refrescante da juventude, e
lgico, da prtica de esporte. D
pra perceber que esse o estilo
dele, com as cores flor, as
calas de cinturas baixssimas,
peas oversized e os materiais
de alta tecnologia. A influncia
da cultura do esporte que virou
Sport Couture.
GRACE WALES-BONNER
Foi a vencedora do prmio
LOreal de Designer do Ano,
que entregue no fim das
apresentaes pela marca.
Grace inglesa descendente de
jamaicanos e tem 23 anos. Suas
trs inspiraes principais:
Coco Chanel, a Nigria nos
anos 70 e o blaxploitation. E
tudo isso banhado a jias
Foi uma mistura inusitada, especialmente porque os modelos escolhidos eram homens, e as
peas, a princpio, femininas. Segundo ela, essa barreira no precisa existir, quem gostar, que use.
Adorei isso!
Agora ficar de olho!
MODA
Peas da coleo de Grace Wales-Bonner.
Peas da coleo de Hyon Park.
13
MODA
HORUS
ltimo dia de MFW (25.02). Gosto tanto de Milo e essa semana de moda foi to incrvel que bateu at uma certa nostalgia. O dia no ia ser to corrido como os outros. A maioria dos fashionistas j estava de malas prontas para Paris, mas todos fizeram questo de ficar para prestigiar Mr. Armani em sua Giorgio Armani. Antes do desfile, fui tomar caf da manh com Paula Cademartori em seu office lindo, to cool quanto as bolsas. Foi uma espcie de re-see casual. Ela me mostrou toda sua nova coleo detalhadamente, enquanto matvamos as saudades. Gosto tanto de seu trabalho que comprei dois modelos para mim. Sem dvida, suas bolsas fariam o maior sucesso no brasil fica a dica. O tempo passou to rpido durante o caf que tive que sair apressada para o desfile de Giorgio, s 11h. Como de costume, o estilista fez uma alfaiataria impecvel, numa nova androginia. Confesso que o desfile da Emporio Armani (do dia anterior) mais minha cara, mas ambos foram belos, cada um com seu estilo.
Do desfile, Giovanni Frasson e eu fomos direto pro re-see dos dolos Dolce & Gabbana ver de perto toda aquela preciosidade monstica. Giuseppe Torissi e Francisca Macedo, PR da marca no brasil, nos receberam calorosamente com chocolatinhos deliciosos para o tour no showroom. Como voc j deve ter percebido, eu sou daquelas que gosta de experimentar tudo, e na Dolce no foi diferente. Provei todos aqueles acessrios maravilhosos da passarela: tiaras, brincos, colares, bolsas e at os sapatos do desfile,
O ltimo giorno de
Yasmine Sterea na fashion week de Milo
Yasmine Sterea.
14
MODA
que ficam gigantes no meu p tamanho 35. Gostaria at de ter aqueles vestidos espetaculares, mas me contive porque o showroom estava lotado de compradores e no seria de bom tom - apenas coloquei-os na frente do corpo para ter uma sensao basiquinha de como ficariam (thanks, Fran, do corao, pelos cliques show!).
Voltamos para o hotel porque tnhamos uma reunio de alguns novos superprojetos que a Vogue esta organizando, fechamos as malas e corremos para fazer a nica comprinha da temporada. Tnhamos apenas uma hora ento escolhemos a Excelsior, porque ficamos sonhando com algumas peas que havamos visto l no dia anterior. Giovanni se equipou para Paris com duas jaquetas maravilhosas e eu comprei uma sandalhinha de ponyskin branca bordada da Marni e um moletom branco supercool masculino da MSGM. Sim, eu adoro comprar roupas no setor masculino, elas ficam mais charmosas e ningum tem dica de styling, mas s entre nos, ok? De l voltamos para o hotel Bulgari, mangiamos nosso utimo spaghetti a pomodoro, pegamos as malas e corremos (atrasados, claro) para o aeroporto. Giovanni foi pra Paris encontrar as nossas diretoras incrveis, Daniela Falco e Donata Meireles. Eu voltei pro Brasil para tocar um supereditorial da nossa edio de aniversrio de maio. At a prxima e fique ligado nos dirios de fashion weeks da Vogue, no quais Dani seguir contando tudo sobre a semana parisiense.
(YASMINE STEREA, de Milo)
Desfile da coleo Dolce & Gabbana.
Modelo desfilando com pea da
coleo Emprio Armani.
15
HORUS
D ESIGN | ENTREVISTA RPIDA
Michel Penneman, designer do Hotel Pantone, veio ao Brasil para uma palestra e conversou com Vogue sobre o uso de cores em ambientes.
Designer do Hotel PANTONE vem ao Brasil e fala sobre
uso de CORES
Um dos quartos do Hotel Pantone.
16
CORES
Michel Penneman designer de interiores, mas no
v imaginando tapearias e vasos da dinastia Ming:
o belga conhecido pelo seu estilo contemporneo,
fresh e minimalista. Tanto que um de seus mais conhecidos
trabalhos, o Pantone Hotel, em Bruxelas, uma espcie de Meca
dos designers e criativos em geral.
Os 59 quartos, distribudos em sete andares, so brancos
com carpete cinza, bem clean, mas os detalhes do dcor como
quadros, almofadas e colchas
trazem combinaes de oito
tons diferentes e permitem
que os hspedes sintam
influncia das cores em seu
estado de esprito. "Na minha
experincia, vermelho e laranja
significam poder e energia",
conta Penneman, "mas para
usar com parcimnia, mais em
uma cozinha ou uma sala de
estar do que em um quarto de
dormir (colocar atrs da cama,
no na frente de seus olhos,
melhor). Em um banheiro
ou dormitrio, azul ou verde
menos saturados podem
dar calma e serenidade".
Curiosamente, segundo o
designer, a combinao mais
solicitada pelos hspedes do
hotel a energizante laranja,
vermelho e cinza.
DESIGN
Penneman, que veio a
So Paulo ministrar uma
palestra na Belas Artes, com
o tema Interiores comerciais
- hospitalidade, no dia 13.08,
ainda acrescenta que o
ambiente minimalista no
necessariamente frio
ou sem expresso: "um
espao minimalista pode
ser quente se voc usar um
colorwall quente, com uma
iluminao aconchegante, e
carpete confortvel", diz, "e, com certeza, uma bela pintura da cor
ou obra de arte pode dar um ambiente mais convidativo". Por fim,
o designer d a letra para um ambiente profissional confortvel,
elegante e moderno: "Em primeiro lugar, pinte todas as paredes com
um branco quente (na Europa, eu uso vrias vezes a referncia RAL
9010). Depois, se possvel, um piso natural claro de carvalho com um
verniz incolor, ou um tapete cinza, e um teto acstico branco puro.
Depois, voc pode escolher cadeiras vermelhas para dar dinamismo
e uma mesa de carvalho natural (com estrutura de alumnio). Voc
pode com certeza fazer combinaes, como uma parede com
cor (a mesma cor que as cadeiras, por exemplo) ou algumas
imagens coloridas. Cuidado com a temperatura da iluminao:
no deve ser muito quente, para dar energia".
Cozinha do Hotel Pantone.
17
HORUS
D ESIGN | ENTREVISTA RPIDA
HORUS - Alexandre Wollner, Fale-nos sobre o
seu percurso acadmico at Ulm.
WOLLNER - No tive nenhum percurso
acadmico antes de Ulm. Desenvolvi meu
talento de artista somente com observaes
e prticas. Participei do curso do Instituto
de Arte Contempornea idealizado por Pietro
Maria Bardi no Museu de Arte de So Paulo
(MASP). Nesta oportunidade, tive cincia da
existncia do design. Esta percepo ficou
evidente quando fui solicitado para auxiliar,
como aluno, na montagem de uma exposio
de Max Bill, arquiteto, pintor, escultor, designer
suo, em 1951, no MASP. Em 1953, quando tive
um encontro e uma entrevista com Max Bill, no
MASP, em So Paulo, fui convidado a frequentar
a escola de Ulm (HfG). Fiz parte da primeira
turma de alunos entre 1954 /1958, como aluno
do curso de design em Comunicao Visual,
tendo como mestres Josef Albers (Bauhaus),
Johannes Itten (Bauhaus), Max Bill (Bauhaus),
Otl Aicher, Max Bense, Toms Maldonado,
entre outros (vide Alexandre Wollner 50 anos
de Design Visual, CosacNaify, 2003).
HORUS
WOLLNER - Como foi o contexto do seu
regresso ao Brasil?
WOLLNER - Retorno a So Paulo, minha cidade
natal, onde inauguro, juntamente com Geraldo
de Barros, Ruben Martins e Walter Macedo, em
fins de 1958, o primeiro escritrio brasileiro de
design.
HORUS - E como surge a oportunidade de ser
membro fundador da ESDI?
WOLLNER - Em fins de 1958, aps a concluso
do curso na HfG, retorno com a finalidade de
participar da implementao de uma escola de
design no Brasil, recomendado por Max Bill,
Otl Aicher e Toms Maldonado, e que seria
desenvolvido pelo Museu de Arte Moderna
do Rio de Janeiro, dirigido pela Sra Niomar de
Moniz Sodr, e pelo Ministrio da Educao
e Cultura do Brasil. Em 1963, inaugurada
(ESDI) Escola Superior de Desenho Industrial
do Rio de Janeiro, primeira escola de design no
Brasil. O programa de ensino baseava-se o
modelo da HfG de Ulm.
Um dos principais nomes na formao do design moderno no Brasil, Alexandre Wollner participou de uma srie de entidades importantes
no fortalecimento do design brasileiro.
ENTREVISTARPIDA com
Alexandre Wollner
18
DESIGN | ENTREVISTA RPIDA
HORUS - Quais os diferenciais da ESDI ao nvel
do tipo de ensino?
WOLLNER - A programao do ensino na
ESDI foi conceituada tendo como foco a
profissionalizao adequada ao design,
propondo-se a no ter caractersticas somente
formais nos moldes das escolas que seguem
uma formao segundo conceitos de artes
e ofcios, como ainda, a maioria das escolas
existentes de design, nacionais e internacionais.
WOLLNER - Na sua opinio quais so os
principais problemas na formao dos
designers?
WOLLNER - Desenvolver o potencial criativo
e dar conhecimento das possibilidades
tecnolgicas ao futuro profissional, saber
quais so os parmetros de um projeto,
como devemos definir a funo dentro das
necessidades do consumo, da indstria e do
comrcio, como objetivar formas criativas de
acordo com a evoluo cultural, tecnolgica e
cientfica.
HORUS - Acha importante o associativismo em
design?
WOLLNER - Acho, isto existe e necessrio em
todas as reas profissionais.
HORUS - Na sua opinio, acha que falta esprito
de classe entre os designers?
WOLLNER - Falta a conscincia de envolvimento
com um certo idealismo a respeito desta
profisso que constantemente inovada,
e ainda no est includa no consciente e
inconsciente coletivo cultural.
HORUS - Que conselhos daria aos jovens
designers?
WOLLNER - Para um design de qualidade, o
profissional deve acompanhar a evoluo de
sua prpria profisso, sempre se interessando
em divulgar conceitos verdadeiros decorrentes
da experincia na prtica de seu trabalho,
preocupando-se em desenvolver projetos
consistentes que tenham significado de
interesse coletivo.
19
Alexandre Wollner
Alexandre Wollner
QUADRINHOS por Waldomiro Nogueira
HORUS
As histrias em quadrinhos padeceram durante dcadas a indiferena das camadas
intelectuais da sociedade, apesar de representarem a continuidade de uma longa tradio de manifestaes iconogrficas...
QUADRINHOS por Waldomiro Nogueira
20 HORUS
QUADRINHOS
... cuja gnese pode ser encontrada nas pinturas das cavernas do homem pr-histrico e que se desenvolveram durante sculos em diversas formas de manifestaes artsticas...
... como as colunas de Trajano, a Tapearia de Bayeux, o Livro dos Mortos etc...
... de linguagem direcionada para as massas. No entanto, os ltimos anos parecem ter trazido novos e promissores ventos para as histrias em quadrinhos no que diz respeito sua insero no mundo das manifestaes artsticas socialmente reconhecidas. Este artigo busca discutir essa trajetria e traar algumas diretrizes que garantam a permanncia dessa forma de manifestao do pensamento humano no campo das Artes.
21QUADRINHOS
Embora constituindo uma linguagem prpria hbrida da linguagem escrita e da imagem desenhada -, os quadrinhos tiveram sua aceitao pelas elites pensantes dificultada por diversos fatores, mas principalmente por sua caracterstica...
HORUS
A LUTA PELA LEGITIMAO
Recentemente, uma conceituada
pesquisadora brasileira da rea de
histrias em quadrinhos, pleiteou a um
importante museu de Arte da cidade de So
Paulo a instalao de uma grande exposio
sobre o tema . Embora no se recusando a
abrigar a exposio, os responsveis pelo
equipamento cultural condicionaram sua
concordncia justificativa, por parte da
professora, de que as histrias em quadrinhos
poderiam ser entendidas como Arte.
Logicamente, considerando a evoluo da
linguagem grfica sequencial e seu atual estgio
de aceitao no mundo artstico contemporneo,
a professora se recusou a elaborar tal justificativa
ao museu paulistano, entendendo que a esta
altura tal esclarecimento deveria ser dispensvel
para uma instituio com to larga trajetria na
preservao e divulgao de bens culturais; alm
disso, pesou tambm na deciso o fato desta
mesma instituio museolgica ter abrigado, na
segunda metade do sculo passado, uma das
primeiras exposies de quadrinhos do mundo,
demonstrando na ocasio uma postura de
vanguarda em relao postura ento dominante
no meio intelectual brasileiro e mundial.
Rorschach, personagem da srie Watchmen, de Allan Moore, ilustrada por Dave Gibbons e publicada originalmente pela DC Comics entre 1986 e 1987.
HORUS22
QUADRINHOS
eles no se constituram, absolutamente,
em precursores desse tipo de valorizao da
linguagem grfica sequencial. Na realidade, o
mrito nessa rea cabe a diversos intelectuais
europeus, mais geis em reconhecer o forte
impacto social dos produtos quadrinsticos
e sobre ele realizando estudos e exposies.
De fato, com relao a esse fato, alm de
salienta-lo e solidarizar- se com a professora
pela resposta infeliz por ela obtida, pode-se
cogitar que os atuais responsveis por essa
importante instituio artstica e cultural da
cidade de So Paulo, alm de desconhecerem
a prpria histria do rgo que dirigem, fazem
ainda parte de uma minoria de intelectuais
que persiste vendo a arte como uma essncia
metafsica reconhecida pelos seus mritos
tcnicos, mas, principalmente, pelo seu
status filosfico (MARTINS, 2006, p. 67),
da mesma forma em que ignoram ou fingem
ignorar os avanos ocorridos na rea artstica,
especialmente no que se refere s histrias
em quadrinhos, a partir da dcada de 1960,
quando uma grande variedade de movimentos
arte pop, arte conceitual, performance,
instalaes, arte ambiental etc. intensificaram
abertamente a resistncia s polaridades do
sistema das belas artes buscando manter e at
mesmo aprofundar a relao entre arte e vida
(MARTINS, 2006, p. 68).
Esses movimentos estiveram mesmo no
centro da insero das histrias em quadrinhos
no mundo das artes, pois, na realidade, elas
adentraram o ambiente museolgico por
meio da arte pop, especialmente na obra de
artistas como Andy Warhol (1928- 1987) e Roy
Liechtenstein (1923-1997), que apreenderam
elementos da linguagem grfica sequencial e
os re-significaram em seus trabalhos artsticos,
produzindo intenso impacto visual.
No entanto, ainda que esses autores tenham
representado, no ambiente norte-americano, o
comeo de um movimento de reconhecimento
dos quadrinhos como manifestao artstica,
Roy Lichtenstein (1923-1997) Foot and Hand, 1964
Nesse sentido, tambm no se pode
desmerecer a ao visionria de alguns
admiradores do gnero no Brasil, que, j em
1951, ainda que sem obter o mesmo impacto
no contexto intelectual brasileiro, realizaram a
primeira exposio de histrias em quadrinhos
em ambiente formalmente constitudo como
artefato wcultural (MOYA, 2001).
Por outro lado, preciso reconhecer
que a classificao de extratos ou pginas
de histrias em quadrinhos como objetos
museolgicos muito pouco em termos de
descrio ou categorizao das possibilidades
artsticas dos quadrinhos. Bebendo nas guas
das mais variadas artes, como a ilustrao,
o teatro, a literatura, a caricatura e o cinema
QUADRINHOS 23
HORUS
(BARBIERI, 1998), as histrias em quadrinhos
constituem um gnerocomplexo, em que
elementos narrativos de vrias manifestaes
artsticas ou linguagens so explorados.
Esta caracterstica hbrida da linguagem
quadrinstica, bem como o fascnio que ela
tradicionalmente exerceu sobre grandes massas
de leitores, principalmente os mais jovens,
est talvez no centro de sua rejeio pelas
elites intelectuais. Embora compreendidas pelo
universo da arte na era da reproduo mecnica,
conforme visto por Benjamin (2006 [1969]),
elas eram difceis de classificar e contextualizar.
No entanto, talvez em maior medida que a
indstria cinematogrfica, objeto de ateno do
autor alemo, os quadrinhos levavam o aspecto
de distrao a seu extremo, dificultando sua
compreenso por parte dos crticos de Arte.
Da, a incompreenso, o estranhamento. Isto
tambm dificultou a insero das histrias em
quadrinhos no ambiente acadmico, em que
eles foram virtualmente ignorados durante boa
parte do sculo, independentemente de seu
impacto social.
A ateno dispensada aos quadrinhos
pelos intelectuais ocorreu em paralelo com a
emergncia de movimentos de produo de
quadrinhos que buscavam sua independncia
das obras disponibilizadas pela indstria
massificada genericamente denominada
como quadrinhos mainstream -, colocandose
como auto-suficientes e superiores ao que era
ento disponibilizado pelas grandes editoras
de quadrinhos.
Nesse sentido, eles se aliavam, embora
muitas vezes no explicitamente, crtica
indstria cultural feita pelos idelogos da
Escola de Frankfurt, que viam os produtos
dessa indstria como essencialmente os
mesmos. Como defenderam Max Horkheimer
e Theodor W. Adorno (2006 [1944], p. 43-44)
em seu famoso texto sobre a indstria cultural.
Surgido na costa do Pacfico nos Estados
Unidos, o movimento dos quadrinhos
underground, tambm conhecidos como
comix, bebeu mais especificamente na
fonte dos movimentos hippies e da revolta
estudantil, representando uma tomada de
deciso pelo fortalecimento e autonomia
da produo quadri nstica e sua utilizao
como meio privilegiado para manifestao
artstica e social. Fazendo jus ao seu tempo,
seus autores, em geral oriundos e atuantes
no ambiente universitrio, recusavam-se a
fazer parte da mquina editorial massificada
e massificante, bem como a seguir as normas
estabelecidas pelas grandes editoras do pas.
Extremamente rgidas e reguladas, essas
normas eram consequ .ncia indesejada da
ainda recente perseguio aos quadrinhos,
ocorrida h apenas uma dcada e tinham
sua expresso concreta no chamado
Comics Code, pelo qual cada publicao em
quadrinhos era analisada e recebia um selo
de aprovao, atestando sua insipincia em
relao aos valores socialmente aprovados
(NYBERG, 1998).
Os artistas do movimento underground
propunham uma criao quadrinstica
totalmente desvinculada de editoras ou
normas editoriais, com obras voltadas para
a expresso de sentimentos, para o desafio
s tradies e para a liberao de costumes,
sem preocupaes imediatas com o consumo
24
QUADRINHOS
ou motivaes mercantilistas. frente dessa verdadeira bandeira libertria estiveram nomes posteriormente consagrados no universo dos quadrinhos, verdadeiros cones em sua proposio como forma de manifestao artstica capaz de suplantar as limitaes da produo industrializada: Robert Crumb, Gilbert Shelton, Rick Griin, S. Clay Wilson, Spain Rodriguez, entre outros (SKINN, 2004).
Embora limitado espacial e temporalmente, pois o movimento dos quadrinhos underground teve seu apogeu basicamente entre inal da dcada de 1960 e meados de 1970, a inluncia
tanto de obras como de autores ampliou-se bem alm das fronteiras do estado da Califrnia e atingiu os pases europeus e latino-americanos, podendo-se airmar que ajudaram na formulao de um estilo de produo de quadrinhos. Na Europa, eles foram fontes de inspirao para revistas de vanguarda. Nas Amricas, por sua vez, assumiram forte vis poltico-partidrio, sendo o estilo preferencial utilizado por artistas latino-americanos para o enfrentamento de governos totalitrios que se espalharam pelo continente nas dcadas de 1960 e 1970. No Brasil, a inluncia do quadrinho
Saque de Roma de 1527
retratado por Milo
Manara para a srie
Brgia, de Alejandro
Jodorowsky.
25
HORUS
underground pode ser encontrada na obra do
mineiro Henfil e nas colaboraes dos vrios
parti cipantes do semanrio O Pasquim, do Rio
de Janeiro, em que as audaciosas alfinetadas
nos representantes ou nos (mal)feitos da
ditadura militar eram retratados por traos
econmicos e esteticamente desafiadores,
numa composio que se afastava de cnones
mais tradicionais e adentrava pelo universo
da caricatura e da stira. Esse espectro de
atuao das histrias em quadrinhos mas no
exclusivamente delas, uma vez que a revista O
Pasquim tambm abria espao para a charge, o
cartum, a crnica , tambm realizava a crtica
de costumes, principalmente classe mdia
acomodada, to necessria sociedade da poca.
Com o reconhecimento do potencial artstico
dos quadrinhos por parte dos intelectuais
europeus e com a ecloso do movimento de
quadrinhos underground estavam assentadas
as bases para uma outra etapa na legitimao
cultural das histrias em quadrinhos no mundo
inteiro. Pode-se dizer que estava se agilizando o
ritmo em que elas deixavam de ser vistas como
uma linguagem exclusivamente direcionada
para o pblico de menor idade e passavam a
ser encaradas como manifestaes voltadas
a pblicos diversos, com diferentes nveis de
qualidade e representao do mundo.
De um primeiro momento, com as pginas
dominicais e tiras dirias, quando foram vistos
como forma de assimilao das camadas
populares, quase que majoritariamente composta
por imigrantes europeus ou asiticos, civilizao
norteamericana, os quadrinhos passaram depois,
com as revistas de quadrinhos ou comic-books,
a ser direcionados prioritariamente ao pblico
infanto-juvenil, sofrendo as agruras e perseguies
Imagem da srie "Sin City", autoria
de Frank Miller. Publicada de
1991 a 2000
HORUS26
QUADRINHOS
de pais e educadores, num movimento de rejeio
que se espalhou por praticamente os quatro
cantos do mundo.
A verdadeira ressaca cultural que seguiu o
perodo mais acirrado de perseguio ao meio
anos imediatamente posteriores Segunda
Guerra Mundial, poca da chamada caa s
bruxas e apogeu da Guerra Fria entre Estados
Unidos e Unio Sovitica, com a proposio do
j mencionado Comics Code , pode ser vista
como um momento, ainda que forado, de
preparao para a transposio dos limites da
linguagem, quele tempo ainda aparentemente
intransponveis. Desta forma, mesmice de
uma produo padronizada, massificada e
padronizadora seguiu-se um momento de
ajuste, em que proposies diferenciadas de
produo e composio esttica eram expressas
em diversas partes do mundo.
Mesmo no mbito da produo industrializada
de quadrinhos era possvel vislumbrar indicadores
dessa busca por novos parmetros criativos. Em
meio a centenas de ttulos e histrias que apenas
repetiam um modelo de quadrinhos andinos,
agindo de forma quase subterrnea no ambiente
dessa produo industrializada - ou mesmo
sob o olhar complacente de seus editores ,
alguns autores dos quadrinhos comerciais
norteamericanos aqueles publicados nas
revistas de super-heris, principalmente pelas
duas grandes editoras da rea, a Marvel e a DC
Comics , incluam em suas histrias elementos
Yellow Kid, de Richard Felton
Outcault, personagem publicado
originalmente na revista Truth
entre 1894 e 1895.
QUADRINHOS 27
HORUS
narrativos ou grficos que as faziam avanar alm
de produes contemporneas, transformando-
se em marcos para outros autores do gnero. O
trabalho de Jim Steranko frente do personagem
Nick Fury, por exemplo, apresentava diferenas
gritantes em relao aos da mdia dos criadores
da poca, com designs em que abundavam as
fotocolagens e fotomontagens inspiradas em
movimentos artsticos como a arte psicodlica
e a Op Art.
Outro autor que se destacou na produo
industrializada de quadrinhos foi Steve
Ditko, mundialmente conhecido como um
dos criadores do personagem Homem-
Aranha, cujos primeiros 38 nmeros foram
por ele desenhados. Verdadeiro mestre da
composio, linguagem corporal e ritmo
da narrativa (WOLK, 2007, p. 156), ele se
revelou especialmente inspirado no trabalho
que realizou para a revista Strange Tales,
protagonizada pelo mestre das artes msticas
conhecido como Doutor Estranho fotografia,
mereceu a 7a colocao...).
Quase que paralelamente, as histrias
em quadrinhos passaram a ser tambm
mencionadas como Arte Sequencial, uma
denominao pouco satisfatria, uma vez que,
a rigor, poderia se referir no apenas s histrias
em quadrinhos, mas tambm a outras artes com
as mesmas caractersticas, como o cinema e a
animao (razo pela qual, este autor prefere
utilizar a expresso arte grfica sequencial para
fazer referncia s histrias em quadrinhos...).
Isto, no entanto, talvez no tenha tanta
importncia, mas sim a proposio das histrias
em quadrinhos como arte, objetivo que a
expresso parece atender satisfatoriamente.
De qualquer forma, j no incio da dcada de
1980 intensificou-se o uso desse termo por
pesquisadores e artistas. Mais uma vez, foram
liderados por Will Eisner, que o utilizou em
um curso sobre quadrinhos que ministrou na
School of Visual Arts da cidade de Nova Iorque e
posteriormente como ttulo de seu primeiro livro
terico na rea (EISNER, 2001 [1985]). Tal como
ele, outros artistas trataram de divulgar essa
denominao em eventos e publicaes da rea.
Tratou-se de mais um passo na busca da
legitimao cultural da linguagem. Nesse
sentido, Thierry Groensteen, analisando a
realidade dos quadrinhos a partir da situao
europia, tambm identifica dois momentos
na histria recente, bem semelhantes ao que
se passou no ambiente norte-americano: em
primeiro lugar, a reconquista do leitor adulto,
ocorrida a partir de 1972, com o lanamento
da publicao LEcho de Savanes, considerada
por ele como a primeira revista somente para
adultos; em segundo lugar, o crescimento
da publicao de lbuns na Frana, ocorrida
quase que em paralelo com o desaparecimento
das revistas tradicionais de quadrinhos do
pas, Tintin, Pif, Pilote, Charlie, Metal Hurlant.
acontecendo exatamente agora. Analisando
a produo atual e o nvel de qualidade de
imagens e roteiros encontrados em muitas
produes quadrinsticas, no se pode deixar
de concordar com esse autor. Estamos, sim,
vivendo uma grande poca para os quadrinhos.
Por outro lado, no se pode deixar de
reconhecer que a produo industrializada
continua massiva e massificante: tolhida
em limites mais amplos do que os de vinte
ou trinta anos atrs, certo, mas, ainda
HORUS28
QUADRINHOS
assim, com evidentes limitaes. A oferta de
quadrinhos como um todo, considerada a
produo industrial, continua disponibilizando,
em propores bastante exageradas cerca de
80 ou 90 por cento, dependendo do ponto de
vista -, daquilo que poderia ser denominado
como lixo, ou seja, quadrinhos padronizados
e presos a um modelo industrializado de
produo, voltados para a reproduo das
mesmas histrias a serem consumidas pelas
mesmas massas de leitores invisveis e no-
identificados. Apenas uma pequena parcela
da produo continua a ser composta por
obras que realmente colaboram para o avano
da linguagem dos quadrinhos e sua evoluo
artstica, enquanto todo o restante da produo
busca perpetuar o interesse da sociedade em
geral por esse meio de comunicao de massa.
Mas nisso as histrias em quadrinhos no se
diferenciam de todas as outras artes, pois fato
semelhante pode ser encontrado no cinema, no
teatro, na literatura, etc. Ambas as tipologias de
produo o lixo, por um lado, e a arte, por
outro , cumprem muito bem o seu papel.
A boa notcia que as obras que fazem avanar
a linguagem quadrinstica j no se situam mais
somente no mbito do quadrinho alternativo.
Cada vez mais, possvel encontrar no
contexto de quadrinhos mainstream obras que,
embora tratando de temticas aparentemente
padronizadas, re-elabo instituies culturais
ainda permaneam estupidamente fechadas
para acesso e valorizao das produes
quadrinsticas, outras j se abrem e algumas at
mesmo se escancaram para elas. Bibliotecas,
que antes sequer cogitavam em armazenar
quadrinhos, j as oferecem abertamente. Livrarias
criam sees especiais para comercializao de
graphic novels, lbuns e mini- sries. Escolas
so tomadas por professores e alunos vidos
pela utilizao de histrias em quadrinhos em
sala de aula. So novos tempos.
Exerccios de futurologia so sempre
arriscados. Assim, seria provavelmente
arriscado fazer qualquer tipo de prognstico
em relao ao futuro da arte grfica sequencial.
Existe um caminho a ser percorrido, talvez
ainda com algumas dificuldades.
Autores e leitores, no entanto, parecem
cada vez menos temerososem relao a ele e
o vem como uma grande promessa. E talvez
realmente o seja.
Quadrinho de Joan
Cornell, ilustrador
e carutnista.
Waldomiro Vergueiro doutor e livre-docente em Cincias da Comunicao e Professor Titular do Departamento de Biblioteconomia e Documentao da Escola de Comunicaes e Artes da Universidade de So Paulo (ECA-USP). Docente do Programa de Ps-Graduao em Cincias da Comunicao da ECA-USP, onde tambm coordena o Observatrio de Histrias em Quadrinhos. Publicou os seguintes livros: Como usar as histrias em quadrinhos na sala de aula, O Tico-Tico: Centenrio da primeira revista de histrias em quadrinhos no Brasil e Historieta Latinoamericana. v. 3: Brasil (na Argentina).
QUADRINHOS 29
HORUS
RERNCIAS
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Pgina da srie "Technopriests",
de Alejandro Jodorowsk.
HORUS30
QUADRINHOS | CRTICA por marcelo hessel
HORUS
Quem consome histrias de super-heris j est
acostumado a ver seus personagens preferidos tratados
como produtos.
Quando a Marvel Comics decide, no final de 2012,
encerrar a revista Amazing Spider-Man e iniciar Superior Spider-
Man - com o Dr. Octopus assumindo o lugar do Homem-Aranha
- j o faz pensando no retorno triunfante do verdadeiro heri s
vsperas de seu novo longa-metragem. Isso trar, na expectativa
da editora, novos espectadores-leitores-consumidores para
a revista Amazing Spider-Man, que, agora com o fim da fase
Superior, volta com numerao zerada neste ms, nos EUA.
O principal diferencial de Superior Spider-Man em relao
aos sazonais eventos caa-nqueis de Marvel e DC Comics
que justamente essa ideia de franquia est no centro da histria
desenvolvida pelo roteirista Dan Slott ao longo de 30 edies.
Quando Otto Octavius - aqui to inventor quanto industrialista -
toma para si o corpo de Peter Parker, num cenrio mercadolgico
de heris e viles que ele assume no s a identidade do Homem-
Aranha mas principalmente a marca Homem-Aranha.
Para o f pode ser atraente ver, no trao anguloso, cuidadoso
do desenhista Humberto Ramos, situaes clssicas como
a impregnao do simbionte se moldar visualmente ao Dr.
Octopus. O que torna essa fase interessante de fato, porm,
o tratamento moderno dado a outros viles - sejam de terceira
categoria, que, por um senso de oportunidade, encontram um
SUPERIORSpider-ManLonge de ser s um evento caa-nquel, fase da HQ do Homem-Aranha
sabe ser moderna.
QUADRINHOS | CRTICA por marcelo hessel
HORUS32
QUADRINHOS | CRTICA
nicho de mercado para atuar
(como Polichinelo e Croma,
que jogam para a gerao
YouTube), sejam de viles
de primeirssima categoria,
como o Rei do Crime, que
representam o "dinheiro velho"
e so derrotados por acreditar
num ultrapassado senso fsico
e territorial do capitalismo.
O que passa a valer nas
histrias do Homem-Aranha
Superior so elementos
relacionados ao marketing,
como a abertura de franquias
que pode fortalecer marcas
(na participao interessante
do "empresrio" Duende
Macabro), o gerenciamento
publicitrio de crises (na
chachina planejada por
Massacre) e a manipulao
da opinio pblica (na
forma miditica como Otto
lida com a populao). Para
lidar com essas situaes, o
Aranha se mostra superior
no naquilo que o torna um
heri, e sim naquilo que faz
dele um excelente produto:
certificado cientfico (a busca
pelo doutorado), alcance e
presena de mercado (os
bots-aranha e o exrcito-
aranha) e apoio institucional
(a chantagem com J. Jonah
Jameson, a Ilha-Aranha II e
as Indstrias Parker).
No deixa de ser irnico que,
no clmax dessa fase, a partir da
edio 27, quem assume papel
de protagonismo e desarma
a eficincia de Octopus seja
justamente um ex-magnata
industrial: Norman Osborn, o
Duende Verde, numa verso
"marketing de guerrilha" - com
direito a pixaes anrquicas
espalhadas por Nova York.
Se o desfecho com a edio
31 soa anticlimtico - com
aquelas resolues apressadas
tipo final de novela - ao menos
Slott conseguiu criar, ao longo
das edies anteriores, esses
antagonismos todos para dar
substncia fase Superior.
E nenhum antagonismo
maior, evidentemente, do
que Peter Parker versus Otto
Octavius. Sempre se discutiu,
dentro e fora das histrias, o
que torna o Homem-Aranha
um super-heri singular, e
aqui isso fica claro: o senso
de sacrifcio pessoal e de
improviso que sempre foram
centrais personalidade de
Parker so o avesso da imagem
de frieza, eficincia e estratgia
que o Aranha de Octopus criou
para si.
Chega a ser irritante como
a HQ martela durante meses
essa oposio, na figura do
"fantasminha" de Peter que
assombra Otto - em suas
sries blockbusters a Marvel s
vezes se rende excessivamente
a essa exposio bvia nos
roteiros - mas Superior Spider-
Man mostrou ser, apesar dos
didatismos, um evento digno
de acompanhar.
Amazing Fantasy
nmero 15, de
agosto de 1962.
33
E N TREVISTA por ademir luiz
HORUS
ADEMIR LUIZ - O lbum "BioCyberDrama Saga" o resultado final de vrios anos de trabalho. Como foi a concepo inicial do projeto? Como foi o processo de criao conjunta com Mozart Couto?
EDGAR FRANCO - Tudo comeou no ano 2000, quando eu ainda cursava o mestrado na Unicamp e criei um fanzine chamado Biocyberdrame (que foi publicado na ntegra nos anexos do lbum), eu tirei mais de uma centena de cpias desse fanzine e enviei a diversas pessoas, uma delas foi o mestre Mozart Couto, um artista que sempre admirei. Algum tempo depois Mozart me enviou um e-mail entusiasmado, dizendo que ficou instigado com o material e que poderamos criar algo juntos, uma HQ com
um roteiro mais tradicional, mas enfocando os mesmos temas do zine. Imagine a minha alegria ao receber um convite desses de um dos meus dolos da adolescncia! Eu j estava criando as bases de meu universo ficcional da Aurora Ps-humana e no perdi tempo, mergulhei na escrita da primeira parte de BioCyberDrama Saga,
composta pelos 3 primeiros captulos. Mozart desenhou, por prazer e nas horas vagas, esse primeiro tomo de 64 pginas que veio ento a ser publicado pela editora Opera Graphica (SP) em 2003, com uma recepo muito positiva de crtica e pblico, recebendo indicaes de melhor roteirista e melhor edio especial de 2003 no trofu HQMIX e Mozart ganhou o trofu ngelo Agostini de melhor desenhista de 2003 pelo lbum. Quando escrevi o primeiro tomo eu j tinha o argumento geral para toda a saga, por isso nomeei o personagem principal de Antnio Euclides (referncia direta a Antnio Conselheiro e Euclides da Cunha), mas a viabilizao dos outros tomos s seria possvel a partir da recepo do primeiro, por
Edgar Franco, quadrinista, msico e professor, doutor em artes pela Universidade de So Paulo, fala sobre sua nova HQ.
E N TREVISTA por ademir luiz
34
Edgar Franco.
O ARTISTA E A
ENTREVISTA
isso fiz com que o tomo 1 tivesse vida prpria. Com a boa recepo do lbum Mozart convidou-me a continuarmos a desenvolver a saga, lembrando que abraamos o projeto sem nenhuma remunerao, pelo simples prazer de criar. Conclumos os dois tomos finais em 2009 e desde ento procurvamos uma editora ideal para publicar o material com a qualidade que ele merecia, at que numa iniciativa indita no Brasil a Editora da Universidade Federal de Gois abraou o projeto e o lanou exatamente como o tnhamos concebido. Incluindo a saga completa o primeiro tomo e os dois tomos finais inditos a longa introduo que apresenta o universo ficcional e ainda anexos importantes, em um volume de 252 pginas.
AL - BioCyberDrama Saga uma histria em nove partes. Uma saga, como bem registraram na capa. Esse tipo de narrativa longa e cronolgica no comum em sua produo quadrinstica, marcada pelos chamados quadrinhos potico-filosficos, caracterizados por apresentarem uma ideia fechada em poucas pginas. Como construiu a narrativa do lbum? Sabemos que voc dialoga com vrios artistas conceituais em sua obra, mas, nesse caso especfico, buscou inspirao em algum autor de HQ para montar a distribuio dos quadros e contar a histria?
EF - Essa uma observao muito sagaz. BioCyberDrama Saga foi um desafio para um artista acostumado a trabalhar HQs curtas e com forte teor
Ilustrao da srie BioCyber Drama,
de Edgar Franco.
experimental no trao e no texto pois essa a caracterstica que marca minha obra. Um desafio muito prazeroso j que sou um amante de todas as formas narrativas das HQs e do cinema, mas procurei criar a saga sem nenhuma referncia direta a alguma outra obra, simplesmente me propus a escrever uma longa narrativa na tradio das grandes narrativas e dar consistncia aos personagens e ao universo em que eles esto inseridos. poca da criao do primeiro tomo, escrevi e desenvolvi sozinho a HQtrnica Ariadne e o Labirinto Ps-humano, outro trabalho de flego, com mais de 600 painis desenhados, animaes e som, que foi encartado em um CD-ROM no meu livro HQtrnicas: Do Suporte Papel
35
HORUS
Rede Internet. A histria de
Ariadne se passa no mesmo
universo e at cidade em que
vive Antnio (personagem
principal de BioCyberDrama
Saga), e apesar de ser uma
narrativa hipermdia, est
muito mais conectada
tradio das narrativas, sem
arroubos experimentais.
Inclusive Ariadne aparece
em BioCyberDrama Saga,
Antnio a cumprimenta no
elevador no primeiro tomo,
uma marca da estrutura
transmiditica de minhas
obras recentes. Essas duas
obras so, dentre as centenas
de HQs que j fiz, as duas com
narrativa mais tradicional.
E foi muito prazeroso cri-
las, pretendo desenvolver
outras narrativas assim ainda,
inclusive tenho o rascunho de
uma nova saga.
AL - O estilo de Mozart Couto
clssico e limpo, primando
pelo virtuosismo do trao.
Com exceo de algumas
rpidas passagens, ele no
realizou muitos experimentos
em termos de narrativa grfica.
De certa forma contrasta com
a histria contada, que
bastante complexa e inusitada.
Essa foi uma opo esttica
Ilustrao da srie BioCyber Drame.
36
ENTREVISTA
consciente ou mais fruto da
escola narrativa do Mozart?
EF - Tive total confiana
no domnio da narrativa
quadrinstica de Mozart
Couto, para mim um dos
maiores desenhistas de
HQ do mundo ocidental.
Descrevia as sequncias, os
dilogos e dava sugestes
gerais, mas sempre lhe
dei margem para fechar a
estrutura das pginas e me
adequei viso narrativa de
Mozart. Como conhecedor de
sua obra, ao escrever a saga
j sabia que era ele quem a
desenharia, ento levei isso
em conta. Obviamente tenho
meus arroubos poticos
experimentais marca de
minha obra e Mozart topou
os desafios de desenh-los
nos momentos em que eu
os propunha e o fez com
maestria. Mas a obra se insere
na grande tradio narrativa
dos quadrinhos ocidentais
e isso foi intencional, uma
tenso interessante entre a
narrativa grfica e o roteiro.
AL - Voc um artista
cosmopolita. Atua e tem sua
obra divulgada em vrias partes
do mundo. Chama ateno
em BioCyberDrama Saga a
aproximao que realiza com a
cultura brasileira. O ltimo ato
da saga dialoga diretamente
com a histria da revolta de
Canudos. O que motivou essa
volta s origens?
EF - Dentre os episdios
marcantes de nossa histria,
a saga de Conselheiro e do
Arraial de Canudos sempre
mexeu muito comigo. O
livro de Euclides da Cunha
pungente e impressionante e
narra uma histria universal,
a histria de um mrtir com
ideias utpicas, paradoxais,
repletas de certa inocncia,
mas tambm de uma viso
densa do que o humano.
Conselheiro era um messias
naif, mas de grande fora
interior. No sou um narrador
de historicismos, sou um
ficcionista afeito a gneros
marginais como a fantasia,
a fico cientfica e o horror,
esse o meu territrio, mas
a histria de Canudos contm
um contedo universal que
muito me interessa, e de certa
forma eu implodo qualquer
romantismo que se criou em
relao figura de Conselheiro
no mestre Antnio Resistente.
Foi instigante recontextualizar
nossa dita histria e como
criador trabalhar com a
essncia do que aquele
episdio significa para mim,
minha interpretao dele, j
que acredito que a chamada
histria to ficcional quanto
qualquer outra narrativa,
sempre desconstruda e
reconstruda a partir dos
olhares dos narradores.
Abaixo, arte do feto Ps-humano, que
simboliza a harmonia interespcies e a
transcendncia, segundo Edgar Franco.
37
E NSAIO VISUAL | LEANDRO ARAJO
HORUS
Leandro Arajo Ilustrador goiano, formado em Design Grfico
pela Universidade Federal de Gois. Seus trabalhos refletem o
esprito urbano com uma grande pegada introspectiva. Com
E NSAIO VISUAL por leandro arajo
38 HORUS
ENSAIO VISUAL
traos bem definidos e muita habilidade no uso da cor, seus
desenhos expressam a inquietude de um jovem atento sua
cultura e ao meio social em que vive.
HORUSHORUS
ENSAIO VISUALENSAIO VISUAL 41
HORUS42
ENSAIO VISUAL 43
HORUS44
ENSAIO VISUAL 45
HORUS46 HORUS
ENSAIO VISUAL 47ENSAIO VISUAL
HORUSHORUS48
ENSAIO VISUALENSAIO VISUAL 49
HORUS50 HORUS
ENSAIO VISUAL 51ENSAIO VISUAL
HORUS52 HORUS
HORUS
A RTES VISUAIS por hivo Navarro, fabrco Gomes e marcelo lopes
Diante de todas as
informaes, ferramentas
e suportes que a
tecnologias nos proporcionam
hoje, a sociedade se apresenta
em meio a uma grande revoluo
informacional, desenvolvendo no
homem sensibilidades corporais
e relaes sociais totalmente
diferente das apresentadas nos
sculos passados. A era digital
em que vivemos faz com que
muitos artistas iniciem um
interessante dilogo com os
meios virtuais, necessitando,
desta maneira, das interfaces e
redes como item principal para
o desenvolvimento de seus
trabalhos dentro dessa grande
esfera virtual no totalizada em
que vivemos.
O universo da arte sofre
mudanas constantes, sempre
fazendo uso das tcnicas e
tecnologias disponveis. Com
o surgimento da era digital isto se torna mais evidente, pois as
linguagens esto sendo trabalhadas atravs de um hibridismo.
Com o surgimento da tecnologia chamada wireless, conceitos
como arte mvel (mobile art) vo aparecendo e a cada dia se
aprimorando. Uma das questes que se faz premente se a
arte e as tecnologias contemporneas, levando-se em conta o
alto grau de virtualizao que as mesmas podem atingir, co-
habitaro um mesmo espao reflexivo dentro dos processos
criativos dos artistas. Outra questo a responder que tipo de
resultado se apresenta para o pblico de arte, que espcies de
sensibilidades resultam nos trabalhos dos artistas que fazem
uso das novas tecnologias como suportes e ferramentas em
seus processos criativos.
A grande tendncia artstica contempornea a utilizao das
mdias mveis, tais como: celular, palm, o GPS, e os computadores
portteis. Assim, consideramos esses dispositivos mveis como
sendo uma nova forma de produo, atualizao e visualizao
das obras de arte, tendo como objetivo estimular os artistas e
usurios amantes de tecnologias a terem novas perspectivas na
construo de modelos hbridos e suas ampliaes.
ARTE E TECNOLOGIA: TRANSFORMAO CULTURAL
A revoluo tecnolgica apodera-se de todas as atividades da
sociedade. Tudo est voltado para as novas tecnologias, todas
IMAGENS VIRTUAIS e dispositivos mveis (mdias mveis)
Tecnologia e arte digital:
UM ESTUDO SOBRE
HORUS
A RTES VISUAIS por hivo Navarro, fabrco Gomes e marcelo lopes
54
A imagem ao fundo da pgina uma
arte-postal de autor desconhecido
ARTES VISUAIS
as reas do saber: humanas,
exatas, biolgicas, sendo
empregadas na indstria,
cincia, educao, entre outros,
assumindo uma relao direta
com a vida, fazendo com que os
artistas repensem a condio
humana.
No inicio do sculo era
perceptvel a entrada das novas
tecnologias dentro dos lares,
locais de trabalho, educao,
tendo por conseqncia um
ambiente de tecnologias
semnticas, cognitivas, que
no se comportavam como
ferramentas e sim como
forma do ambiente, isto ,
fazendo parte integral de
algo que fosse necessrio
para o processo, sendo assim
essencial (VILLARES, 2008).
Podemos observar tambm
que at a metade do sculo XIX
apresentavam-se dois tipos
de cultura nas sociedades
ocidentais: a cultura popular,
produzida pela grande massa
dominada e a cultura erudita,
das elites dominantes.
No entanto, se no
tivssemos as grandes
tecnologias ao nosso alcance
nunca chegaramos a essa
transformao cultural, onde
o impacto das conseqncias
desta mudana permite que
a informao possa ser referida como revoluo digital. Se
reunirmos cultura e cincia que foram cindidas pela sociedade
industrial, a cultura digital se apresentar como digitalizao
crescente da produo simblica da humanidade, imbricada
entre espao e ciberespao, dentro das redes informacionais.
CULTURA DIGITAL E ARTE
Concebendo as tcnicas e tecnologias como prteses, como
extenses do corpo (MCLUHAN, 2007) e que tm por funo
receber dados do mundo sensvel e agir sobre um contexto,
deduz-se que tcnicas e tecnologias obedecem ao princpio de
otimizao de desempenho do corpo perante o mundo. Podemos
considerar tcnica como um conjunto de procedimentos
necessrios para realizar determinada atividade, a organizao de
informaes com determinado objetivo dentro de um processo
de trabalho onde o homem controla as foras da natureza com
objetivos prprios. Tecnologia pode ser considerada como o
saber que integra processos aplicados dentro de um contexto
organizacional do trabalho, objetivando fins especficos. Por
exemplo, um lpis, um martelo, so ferramentas tcnicas,
j a mquina fotogrfica, que pode ser concebida como um
objeto tcnico que agrega um saber humano, a tica, pode ser
considerada uma mquina tecnolgica.
Para McLuhan (2007) o meio a mensagem, os meios no
condicionam seu pblico pelo que informam, mas pela maneira
como informam, a mudana de percepo ocorre devido ao
meio e no ao seu contedo, ou seja, a mensagem de qualquer
meio ou veculo a mudana de padro que este meio provoca
na sociedade, considerando-se que o meio que rege a forma
e a dimenso dos atos e associaes humanas. Instrumentos
tcnicos como extenses do corpo agregariam implicaes
psquicas e sociais e, conseqentemente, artsticas.
O homem e suas extenses so um sistema inter-relacionado. O
ser humano est intimamente imbricado com suas coisas, sua casa,
sua cidade, sua tecnologia (HALL, 2005). Por isso necessitamos
estudar os tipos de extenses criados, as novas tecnologias, porque
ARTES VISUAIS 55
HORUS
o relacionamento do homem com suas extenses uma continuao e uma forma especializada do relacionamento dos organismos com seu meio ambiente, e quando um processo se amplia a evoluo se acelera to rapidamente que possvel que a extenso assuma o controle. Para Lvy temos, portanto, o telefone para a audio, a televiso para a viso, os sistemas de telemanipulaes para o tato e a interao sensrio-motora, todos esses dispositivos virtualizando os sentidos e organizando a utilizao coletiva dos rgos virtualizados. Desta maneira, as pessoas que vem o mesmo programa de televiso compartilham as mesmas imagens, simultaneamente; uma passagem da cultura material para uma cultura imaterial.
INTERATIVIDADE E ARTE
Os artistas que esto conectados a centros avanados de pesquisa percebem a necessidade de conhecer e dominar novos meios tecnolgicos de produo e reproduo das artes, levando-se em conta que o cenrio artstico est dominado pela arte da participao e da
interao. Discute-se o fim da arte representativa e o domnio de uma arte interativa. Popper (1983) escreve que arte tecnolgica faz referncia a uma relao entre o espectador e uma obra de arte aberta j existente, na qual o termo interao implica um jogo de duas vias entre um indivduo e um sistema de inteligncia artificial. Desta maneira, pensar em interatividade dentro da arte relacionar o fruidor artstico como co-autor da obra. Para Lvy (1999, p. 79), O termo interatividade em geral ressalta a participao ativa de beneficirio de uma transao de informao. De fato, seria trivial mostrar que um receptor de informao, a menos que esteja morto, nunca passivo. Plaza (1990, p.17) tambm destaca que A interatividade como relao recproca entre usurios e interfaces computacionais inteligentes, suscitada pelo artista, permite uma comunicao criadora fundada nos princpios da sinergia, colaborao construtiva, crtica e inovadoras.
Assim, a questo de arte e tecnologia se resume a uma passagem da cultura material para uma cultura imaterial. Prpria da arte tecnolgica, artistas trocam artefatos e ferramentas por dispositivos mltiplos eletrnicos, celular, smartphones, computadores, satlites, redes, entre outros que possibilitam cada vez mais comunicao e a multiplicao da arte. Embora seja algo novo entre os profissionais e artistas, h muito mais dispositivos, principalmente os de rede, j sendo utilizados em diversos espaos como suportes artsticos. Segundo Machado (2001, p. 24), Com as formas tradicionais de arte entrando em fase de esgotamento, a confluncia da arte com a tecnologia representa um campo de possibilidades e de energia criativa que poder resultar proximamente numa revoluo no conceito e na prtica da arte.
ARTE MVEL
Com o desenvolvimento das novas tecnologias surgiram os chamados dispositivos mveis integrados com a rede, permitindo a comunicao entre indivduos tanto comuns como profissionais da rea com uma grande facilidade. o que acontece com este processo de transformao das mdias, onde houve a passagem da comunicao oral para a escrita, resultando
HORUS56
ARTES VISUAIS
que, na comunicao, os
indivduos no precisam mais
estar presentes no mesmo
local ou momento, possibili
tando a comunicao mesmo
se estiverem a milhares de
quilmetros de distncia.
Dentro deste processo de
transformao das mdias
entende-se por Arte Mvel,
Mobile art, a produo artstica
que faz a veiculao em meios
mais amplos, tambm chamada
de mdias locativas. Por mdias
locativas compreendem-
se os dispositivos mveis
voltados para a aplicao
a partir de um local
envolvendo ao de interao
distncia, tecnologias e
servios fundamentados em
localizao, onde a informao
a parte principal do processo.
(LUCENA, 2010) As tecnologias
que se fundamentam em
localizao dividem-se em
dispositivos (celulares, palms,
netbooks, GPS, QR Codes),
em sensores (entre eles as
etiquetas RFID) e redes (celular,
Wi-Fi, Wi-Max, bluetooth, GPS).
Os servios classificam-se em
mapeamento, localizao,
redes sociais mveis,
informao jornalstica, games,
turismo, realidade aumentada,
publicidade, etc. Apesar da
expresso Mobile Art, ser associada a obras feitas com o celular,
a constante mudana dos dispositivos mveis faz com que o
termo se associe mobilidade, abrindo um grande campo para a
produo da arte nesses meios. Porm, no podemos considerar
como toda a arte feita por celular se caracterizando como uma obra
locativa, como por exemplo, a criao de vdeos, teasers, motion
graphics e game art para celulares, ou seja, sem o envolvimento
da interao distncia, a obra pode ser gravada a partir de uma
memria interna do dispositivo.
"Senslles Drawing Bot" de So Kanno
e Takahiro Yamaguchi.
ARTES VISUAIS 57
HORUS
CONSIDERAES FINAIS
O uso da tecnologia nos dias de hoje faz com que cada vez mais paremos e pensemos sobre as novas prticas dentro da cultura, no fenmeno tcnico em sua forma de totalidade. fato que as matrias-primas artsticas muitas vezes so substitudas por mecanismos digitais, onde as humanizaes das tecnologias se tornam cada vez mais comuns. Mas se levarmos em considerao que instrumentos tcnicos sempre foram usados por artistas em todos os tempos, pincis, esptulas, telas, nada mais natural que o uso das novas tecnologias pelos artistas contemporneos, computadores, softwares, celulares, etc.
O processo de desmaterializao da cultura, de virtualizao, presente na contemporaneidade atravs dos medias on-line, a arte eletrnica, o entretenimento, entre tantos outros. As novas tecnologias tornam-se onipresentes ao ponto de no podermos discernir claramente onde comeam e onde terminam,
por isso natural que comecemos a conviver com a humanizao das tecnologias, uma humanizao atravs das artes.
Percebemos que os computadores esto cada vez mais presentes nos lares, seja com o objetivo de simples lazer ou para fins profissionais, e no s se tratando de computadores, mas tambm dos dispositivos mveis em geral, nota-se que a tendncia caminha para as conexes; desktops, notebooks, netbooks, celulares, smartphones, I-PAD, todos ligados grande rede mundial. Esses dispositivos mveis, especificamente os celulares, esto rompendo os parmetros para os quais foram criados, recebendo em seu corpus outros aparatos tais como cmeras, acesso a internet via Wi-fi, 3G e 4G, caixa de e-mails, entre outros. Percebe-se que este tipo de dispositivo aproxima-se das caractersticas de um computador porttil, possibilitando que sua interface possua conceitos de usabilidade mais simples, permitindo queles que ainda tm pouco controle sobre as novas tecnologias certa facilidade no uso das ferramentas do dispositivo.
A rede, cada vez mais presente no cotidiano dos homens, possibilita a conexo com o mundo digital, permitindo a obteno rpida de informaes sobre tudo e a qualquer hora. No podemos interpretar os avanos tecnolgicos como um simples modo de facilitar o cotidiano, o principal foco fazer com que a tecnologia desperte sensaes, estmulos, lembranas, para que no fique somente designado como um simples aparato computacional e matemtico. Cabe ao artista visual contemporneo esta tarefa.
Torna-se evidente que as novas tecnologias podem e devem ser agregadas arte, multiplicando as possibilidades de expresses artsticas em novos suportes. O hibrido e o cbrido, a unio das tcnicas artsticas atravs das novas formas tecnolgicas presentes como suporte e como ferramentas na contemporaneidade, resultando em consequncias psquicas e sociais, atestam a humanizao das artes atravs das manifestaes artsticas em seus desdobramentos sensveis nas mos de artistas como Giselle Beiguelman.
HORUS58
ARTES VISUAIS
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS
BEIGUELMAN, Giselle. Admirvel mundo cbrido. Disponvel em . Acesso em 18 de maio, 2010.QRcod: Suite4 MobileTags. Disponvel em: < http://www.desvirtual.com/qartcode/pt/>. Acesso em 18 de maio, 2010.DOMINGUES, Diana (Org.). A Arte no Sculo XXI: a humanizao das tecnologias. So Paulo: Editora UNESP, 1997.HALL, Edward T. A dimenso oculta. Trad. Walda Barcellos. So Paulo: Martins Fontes, 2005.LEOTE, Rosangela. Mobile Art. Enciclopdia de Arte e Tecnologia do Ita cultural. Ita Cultural, So Paulo. Disponivel em: . Acesso em 01 de maio, 2010. Biografia de Giselle Beiguelman . Enciclopdia de Arte e Tecnologia do Ita cultural. Ita Cultural, So Paulo. Disponivel em: . Acesso em 01 de maio, 2010. Pierre. Cibercultura. 2ed. So Paulo: Ed. 34, 1999. Pierre. O que o virtual. Trad. Paulo Neves. So Paulo: Ed. 34, 2005. LUCENA, Tiago Franklin Rodrigues. # m-arte: ((( arte_comunicao_mvel ))). Braslia: 2009.MACHADO, Arlindo. Mquina e imaginrio: O desafio das poticas tecnolgicas. So Paulo: EDUSP, 2001.MCLUHAN, Marshall. Os meios de comunicao como extenses do homem. Trad. Dcio Pignatari. So Paulo: Cultrix, 2007.PLAZA, Julio. Arte e Interatividade. Disponvel em . Acesso em 27 de maio, 2010.POPPER, Frank. Art of Electronic Age. Nova Iorque: Harry N. Abrams, 1983.SANTAELLA, Lucia. Linguagens lquidas na era da mobilidade. So Paulo: Paulus, 2007. Cultura e artes do ps-humano: da cultura das mdias cibercultura. So Paulo: Paulus, 2003.
ARTES VISUAIS 59
A imagem do fundo dessa pgina
recebe o ttuolo de "Lomocatraque",
autoria de Leandro Munhoz.
HORUS
A RTES VISUAIS por mrcia tiburi
A discusso sobre a morte da arte teve um lugar essencial
nas Lies de Esttica, de Hegel, no sculo 19. No se
pode perder de vista que a morte da arte qual Hegel se
referia era a da arte bela e no da arte de modo geral. Se Hegel
tem razo, em havendo uma morte da arte que no deve ser
generalizada, trata-se de entender que tipo de arte, para alm da
arte bela, sobreviveu. Em um sculo de genocdios, ditaduras e
violncias de toda sorte, a arte a memria da sua prpria morte.
O LUTOda arteA tese da morte da arte ainda significa mais do que parece.
Deus do Materialismo, de Chen Wenling.
60
A pr-histria dessa
percepo est na Crtica da
Faculdade de Julgar, de Kant,
que antes afirmou a existncia
de dois sentimentos, o belo e
o sublime, como sustentculos
da experincia esttica. Belo
a sensao de prazer com os
objetos agradveis e sublime
um misto de prazer com
desprazer so formas de
acesso subjetivo beleza, tanto
da natureza quanto das artes.
Kant define a arte bela como
aquela que pode representar
de modo belo at mesmo as
coisas feias. A tarefa histrica
da arte sempre foi a de colocar
beleza no mundo e suplantar o
feio. Criamos essa expectativa e
isso hoje em dia no nos ajuda.
Mas o prprio Kant disse
que havia uma espcie de
feiura, que no pode ser
representada de acordo com a
HORUS
A RTES VISUAIS por mrcia tiburi
ARTES VISUAIS
A imagem ao fundo da pgina de autoria de Kent Williams
Obra de Huang Yong Ping.Obra de John U. Abrahamson.
61
natureza sem cancelar a complacncia esttica, ou seja, a nossa
capacidade de perceber a beleza em geral e a beleza da arte.
Kant refere-se feiura que desperta asco. O asco, segundo Kant,
uma sensao peculiar marcada pela imposio do objeto
feio que imediatamente se nos lana sobre os sentidos, sem que
desejemos aceitar sua presena. O filsofo espanhol Eugenio
Tras d um exemplo repugnante s de ler: quem pisa em um rato
morto e eviscerado na rua tem a sensao de que ele vai parar
dentro da boca. A experincia do asco se d como se um prato de
merda fosse oferecido para se comer.
O asco uma espcie de sentimento impossvel, por estar na
contramo do gosto. Podemos traduzi-lo por nojo. E nojo algo
que se traduz por luto. A experincia do asco ou do nojo, como
experincia do des-gosto, da mesma ordem da experincia do
luto, de algo que no desejamos e que mesmo assim se impe. A
lstima pela perda de um objeto amado, mas tambm do gosto
seja pela arte, seja pela vida que acompanhava aquele objeto
experincia disseminada em nossa cultura, da qual a arte atual
vem a ser a apresentao mais clara.
ARTES VISUAIS
HORUS
A ARTE, DO ASCO AO LUTO
O luto sempre uma reao perda de um objeto amado. , portanto, a experincia da morte enquanto ela pode ser conhecida: a morte dos outros, das coisas, das experincias. At mesmo, como em Luto e Melancolia, de Freud, a perda de uma abstrao, de um ideal qualquer. Nunca a da epicuriana morte que no encontraremos, pois j no estaremos quando ela aparecer. A arte contempornea experincia enlutada e, por isso, di tanto tratar dela. Encar-la experimentar o luto na forma de sua exposio possvel. Mas, se h entre arte e vida, entre fico e realidade, uma relao que sempre de mimese, por imitao ou por mimetismo, e se h tanta perda na vida, a arte no deveria ser nosso resgate para alm do que a vida nos d sem nenhuma elaborao?
A promessa romntica da arte que ela viria nos salvar da vida. Mas, aps a perda da ingenuidade romntica, por que ainda esperamos tanto da arte? Arte apenas um conceito que tem to pouco valor quanto pouco uso nos dias de hoje. No entanto, arte ainda , como conceito, algo que vai na frente da nossa sempre atrasada sensibilidade. Que a arte mova nossa sensibilidade a esperana sem fundamento de muitos, mas sensibilidade uma formulao imprecisa entre o perigoso culto da emoo e os sentimentos que s so elaborados mediante a interferncia da racionalidade capaz de criar conceitos. No h chance de que arte hoje seja mais do que uma construo para fazer pensar.
Temos na experincia contempornea da arte a autopresentificao do seu prprio luto. Como se a arte ainda estivesse no perodo enojado em que tem que se haver com a memria de um cadver que ela mesma e que, na verdade, mimetiza o estado das coisas de um mundo em crise de sentido. Assim que a obsolescncia do conceito de arte o coloca na posio de um conceito-memria. Um conceito que foi vlido, mas que perdeu sua circunstncia na atualidade. Arte no mais a bela arte, ainda que possamos com muito esforo descobrir nas obras que a beleza tambm um conceito e, como tal, uma viso das coisas.
HORUS62
Dino Valls - Limbus
ARTES VISUAISARTES VISUAIS 63
O PARADOXO DO GOSTO
O que a arte contempornea nos sugere a experincia do paradoxo do gosto. Como possvel apreciar esteticamente aquilo que repugna se neste momento a experincia esttica como mediao entre sensibilidade e racionalidade foi anulada? A questo que a arte contempornea, sendo trabalho do luto, acontecendo na contramo do gosto, provoca sempre a experincia do desgosto. A arte conceitual tem tanto espao em nosso tempo por chamar ao pensamento em tempos de cancelamento da sensibilidade. como se toda obra nos enviasse a mensagem: se no podemos gostar, podemos pensar. o paradoxo da inesttica: a sensao de perda da sensibilidade na arte; mais do que um problema da arte, problema da cultura na qual ela surge. Um artista como Damien Hirst, com seus bezerros e tubares no formol no julgvel segundo o padro do gosto pela arte bela, porque estamos em tempos de perda do gosto. O que ser que ele nos mostra que no sabemos pensar?
Com isso se consegue compreender o que acontece com a arte atual. Ela a experincia da morte da prpria arte bela nestes tempos de desgraa cultural. Tempos tensos: de um lado tragicoflicos desejamos a tragdia e de outro tragicofbicos evitamos a morte a qualquer custo , como disse Hans Gumbrecht. Podemos dizer, nestes tempos, que a arte se faz na ordem do trgico, este sentimento da morte em mim, da morte como experincia subjetiva, como imagem da melancolia que nada mais do que a morte do eu e do pensamento que sempre foi a prova de que existia algo chamado eu. No, no exageremos.
A arte contempornea no nem trgica nem melanclica. Enlutada, ela nos pede que ultrapassemos a memria da morte e reinventemos o presente. S o que impede isso o capital culto desgraa em que vivemos hoje. O gozo atual com a ideologia da morte como um fim, quando, na verdade, estpidos e conceitualmente avarentos, no sabemos entender o valor e o poder das transformaes histricas das quais a arte nos d apenas uma imagem para nos fazer acordar. Mas quando at mesmo a desgraa se tornou um capital, haver espao para a arte que denuncia o seu carter capitalista?
U RBANA
HORUS
Toda arte , na verdade, um
delrio ou um grito, ou os
dois. Geralmente, os dois.
Parecemos ser to pequenos
fazendo parte de algo to maior
quando olhamos para fora. E
parecemos ser to grandes,
quando confiantes olhamos
para dentro de ns. E quando
voc olha para o cu, voc que
humano, o que voc v? E
quem est l fora, no cu, o
que veria se pudesse olhar
para ns, humanos? Entre o
universo do macrocosmo e
do microcosmo: ns, Homo
sapiens e a sapincia que tantas
vezes parece nos faltar.
A arte uma deliciosa
ocupao dos nossos sentidos,
um jeito de entendermos o
que acontece por dentro do
outro e por dentro de ns.
Quem livre no se acostuma
com paredes, natureza no
tem portas. Alguns olham para
dentro, outros olham para fora.
Do Brasil que assiste, para o
Brasil que se movimenta. A
rua vira tela para o universo
Muitos julgam a pichao como vandalismo, o grafitti como arte.
GRAFITTI vandalismopichao ARTE
64
URBANA
que puder enxerg-la. Dentro
de casa ningum te v, a rua
fora as pessoas a verem. Todo
mundo precisa ir pra rua uma
hora, porque a rua a verdade.
Gritar com a rotina e ela te ouvir,
afinal, quem no lembrado
quase no existiu. Precisamos da
interao, cor refrao de luz,
no somos nada sem luz, dentro
ou fora de ns. Aqueles que no
tem fronteiras para se expressar
so mais felizes. Quem no se
expressa se sufoca.
Os artistas Fbio Nagate,
de Presidente Prudente, e
Anderson Ferreira Lemes,
mais conhecido como Alemo,
de Assis, representam o grafitti
no interior paulista e mundial.
Afirmando com delicadeza,
reforando o contraste das
runas do meio urbano e do
sonho colorido, lugares pouco
provveis abandonados
prpria sorte.
Nagate atravs do seu
personagem, Macaco, buscar
transmitir e ilustrar a evoluo
no homem em seu universo,
representando o primata com
o terceiro olho, aliando o fsico
e o espiritual (imagem abaixo).
Alemo, que desde pequeno
teve, no desenho, estmulo para
o estudo e superao de uma
dislexia, procura transmitir em
suas intervenes as melhores
lembranas de sua infncia,
bales e bicicletas com muita
cor. Os olhos de uma criana so
a melhor forma de ver o mundo
(vide imagem acima).
URBANA 65
HORUS
GAMES por Natlia bridi
Assassin's Creed Unity ter uma histria "mais sria e madura", de acordo com o diretor criativo Alex Amancio (via Game Informer).
O arco envolver lise de la Serre, personagem central no jogvel, e Arno Dorian, o protagonista da histria: "Histrias de amor so sempre algo difcil de se fazer nos games pois pode facilmente se tornar superficial. Ao fazer com que lise seja uma templria, sendo parte do ncleo da histria, tornamos [o romance] parte verdadeira da luta do protagonista. Isso previne que se torne um subtrama ou seja superficial", explicou Amancio.
O diretor criativo tambm entrou em detalhes sobre a personagem feminina do game: "Queramos criar uma personagem esperta, inteligente e complexa que no representasse qualquer esteretipo. Quando
Assassin's Creed: UNITY ter histria
"mais sria e madura"
Romance entre assassino e templria estar no centro no arco.
criamos qualquer personagem, seja Arno ou lise, tratamos todos igualmente, Gnero
algo complicado, mas no um fato decisivo de como o personagem ser.
Tudo o que importa que ela uma personagem forte".
Assassin's Creed Unity se passa no sculo XVIII, em Paris, na
poca da Revoluo Francesa. A qualquer momento durante
o single player, mais trs jogadores podem entrar
na partida e auxiliar o protagonista em suas misses. O jogo sai para
PlayStation 4, PC e Xbox One em 28 de outubro.
HORUS66
GAMES
Assassin's Creed Unity se passa
no sculo XVIII, em Paris, na poca
da Revoluo Francesa. A qualquer
momento durante o single player,
mais trs jogadores podem entrar na
partida e auxiliar o protagonista em
suas misses.
O jogo sair para PlayStation 4,
PC e Xbox One.
GAMES 67
HORUS
GAMES por bruno silva
fcil entender porque tantos estdios tm investido em verses remasterizadas de grandes sucessos. Requentar um trabalho aprovado por pblico e crtica sempre mais fcil (e mais barato), e os fs ardorosos garantem o retorno necessrio em um perodo de entressafra - principalmente agora, em que as bibliotecas dos novos consoles precisam engordar enquanto os jogos mais aguardados ainda esto em desenvolvimento. Dessa necessidade e das tendncias do mercado, nasceu The Last of Us Remastered, que nada mais uma jogada da Sony para lucrar um pouco mais com seu jogo de maior sucesso do ano passado.
Apesar do intuito comercial bvio, a verso remasterizada de Last of Us tem mritos de sobra. Se a Naughty Dog se disps a jogar o jogo corporativo da Sony, ela o fez de forma bem feita. A edio do game para o PlayStation 4 faz o que todas as verses remasterizadas deveriam fazer: uma atualizao competente, com contedos e melhorias de sobra para atrair at mesmo que