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1 TEMA ESPECIAL 05 – MERCOSUL MERCOSUL: SOBRE LIVRE-COMÉRCIO, SALVAGUARDAS E RESTRIÇÕES VOLUNTÁRIAS DE EXPORTAÇÃO 1. Introdução O Mercosul vem passando por um momento crucial em sua história. Os dois principais sócios do bloco estão discutindo a criação de um mecanismo de limitação dos fluxos comerciais para setores nos quais ocorrem assimetrias que desequilibram o intercâmbio bilateral. O embrião da nova proposta de mecanismo foi o documento do Ministro da Economia argentino, Roberto Lavagna, entregue ao governo brasileiro, em setembro de 2004, sugerindo a criação de salvaguardas 1 automáticas para os setores em que haja assimetrias no comércio. Esta proposta, somada às constantes ameaças de restrições comerciais por parte da Argentina, induziu o governo a estimular o setor privado brasileiro a negociar restrições para as exportações brasileiras de alguns setores de significativa importância no comércio bilateral. O pano de fundo nas negociações para a criação de mecanismos de restrição do comércio bilateral no Mercosul é o mal-estar dos industriais argentinos com 1 O conceito jurídico de medidas de salvaguarda é extraído do GATT-1994 (Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio) e do Acordo sobre Salvaguardas da OMC (Organização Mundial do Comércio). Salvaguarda, em sentido específico, é a medida de defesa comercial por meio da qual um país importador pode, em caso de urgência e por tempo limitado, suspender as concessões tarifárias para determinado produto ou restringir (quantitativamente) sua entrada, caso verifique não apenas um aumento brusco e repentino nas importações de tal produto, mas também que isto causa ou ameaça causar prejuízo grave para a indústria nacional.

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TEMA ESPECIAL 05 – MERCOSUL

MERCOSUL: SOBRE LIVRE-COMÉRCIO, SALVAGUARDAS E

RESTRIÇÕES VOLUNTÁRIAS DE EXPORTAÇÃO

1. Introdução

O Mercosul vem passando por um momento crucial em sua história. Os

dois principais sócios do bloco estão discutindo a criação de um mecanismo de

limitação dos fluxos comerciais para setores nos quais ocorrem assimetrias que

desequilibram o intercâmbio bilateral. O embrião da nova proposta de mecanismo foi o

documento do Ministro da Economia argentino, Roberto Lavagna, entregue ao governo

brasileiro, em setembro de 2004, sugerindo a criação de salvaguardas1 automáticas

para os setores em que haja assimetrias no comércio. Esta proposta, somada às

constantes ameaças de restrições comerciais por parte da Argentina, induziu o governo

a estimular o setor privado brasileiro a negociar restrições para as exportações

brasileiras de alguns setores de significativa importância no comércio bilateral.

O pano de fundo nas negociações para a criação de mecanismos de

restrição do comércio bilateral no Mercosul é o mal-estar dos industriais argentinos com

1 O conceito jurídico de medidas de salvaguarda é extraído do GATT-1994 (Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio) e do Acordo sobre Salvaguardas da OMC (Organização Mundial do Comércio). Salvaguarda, em sentido específico, é a medida de defesa comercial por meio da qual um país importador pode, em caso de urgência e por tempo limitado, suspender as concessões tarifárias para determinado produto ou restringir (quantitativamente) sua entrada, caso verifique não apenas um aumento brusco e repentino nas importações de tal produto, mas também que isto causa ou ameaça causar prejuízo grave para a indústria nacional.

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o aumento das importações provenientes do Brasil. O crescimento das importações,

segundo os empresários locais, estaria prejudicando a retomada da indústria argentina.

Desde então, os empresários argentinos dos setores com maiores desequilíbrios no

comércio bilateral vêm pressionando o governo para que tome medidas contra a

suposta invasão dos produtos brasileiros no mercado local, como a implementação de

salvaguardas que, atualmente, vêm sendo chamadas de Cláusula de Adaptação

Competitiva. Estas medidas, contudo, manterão o objetivo original de uma salvaguarda,

limitando os desembarques de produtos brasileiros no país vizinho, por meio de cotas

ou sobretaxas, nos casos em que o aumento de importações prejudique os fabricantes

locais.

Por enquanto, sem a definição de um mecanismo de restrição de

exportações institucionalizado no bloco, criou-se a Comissão Bilateral de

Monitoramento de Comércio, em agosto de 2003, como resposta às pressões do setor

privado argentino. A Comissão tem como objetivo abrir um canal de negociação entre

os empresários com a participação dos governos para negociar restrições quantitativas

ao comércio bilateral nos setores produtivos considerados assimétricos. Desde então

vários acordos privados foram negociados, criando cotas para as exportações de

diferentes setores como: têxteis, televisores, linha branca, calçados e vinhos.

Contudo, o estabelecimento de salvaguardas no âmbito do Mercosul,

como divulgado pela imprensa e mesmo comentado nas reuniões da Comissão de

Monitoramento, não tem fundamento jurídico. Inicialmente, é necessário considerar que

uma medida dessa ordem precisa ser compatível com as disciplinas previstas pela

Organização Mundial do Comércio (OMC), que vinculam todos os membros do

Mercosul. Ainda que haja discussão sobre a possibilidade jurídica, à luz das regras da

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OMC, de um membro de uma união aduaneira (mesmo que incompleta) impor essa

restrição às importações de outro, as regras do acordo regional precisariam prever essa

possibilidade para que se cogite de sua viabilidade jurídica. Como se verá abaixo, as

regras do Mercosul, no momento, não contam com previsão que autorize a imposição

dessas medidas.

Diante deste cenário, o objetivo principal deste estudo é examinar a partir

de uma perspectiva histórica, econômica, política e jurídica do processo de discussão e

negociação para a criação de um sistema de salvaguardas no Mercosul, assim como

pesquisar os acordos de restrições voluntárias às exportações, opção que surgiu como

resposta do Brasil às pressões argentinas para a institucionalização das salvaguardas.

Neste trabalho, focalizam-se os condicionamentos e as formas pelas quais Brasil e

Argentina atuaram nas discussões para a institucionalização de salvaguardas no bloco,

assim como a diferença de posicionamento dos dois países na Comissão de

Monitoramento de Comércio Bilateral, fórum responsável por negociar as restrições

quantitativas para o comércio de setores onde ocorrem assimetrias. Com esta análise,

pretende-se abordar mais profundamente dois temas que foram pouco pesquisados no

processo de integração regional: as salvaguardas e os acordos de restrição voluntárias

às exportações, instrumentos de política comercial que servem para excepcionar a

regra do livre-comércio intrazona no Mercosul.

O artigo está assim estruturado: na primeira seção são contextualizados

alguns aspectos recentes das relações bilaterais entre Brasil e Argentina,

principalmente no que se refere à proposta argentina da criação de salvaguardas para

os setores assimétricos; a segunda seção analisa os argumentos jurídicos relativos à

aplicação de salvaguardas no Mercosul e na OMC; a terceira seção, por sua vez,

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discute os principais desdobramentos comerciais e os acordos entre os setores

privados de Brasil e Argentina originados desde a criação da Comissão Bilateral de

Monitoramento de Comércio; e, por fim, na quarta seção são apresentadas as

conclusões.

2. Histórico das Medidas de Restrição ao Comércio entre Brasil e Argentina

O debate sobre a aplicação das salvaguardas já tem uma longa história no

Mercosul. Inicialmente, este instrumento existiu no contexto do Regime de Adequação

do Mercosul, previsto no Tratado de Assunção, e permitia que se efetuassem ajustes

tarifários antes da implementação definitiva da Tarifa Externa Comum, em 1994.

Prorrogou-se até janeiro de 1999 a possibilidade de se aplicarem as salvaguardas, a

partir do que foram proibidas no contexto do comércio intrabloco. Apesar de não serem

mais permitidas, sempre que existe algum tipo de desequilíbrio nas relações comerciais

no Mercosul, as salvaguardas acabam voltando ao centro das discussões.

O bloco, atualmente, está distante da realidade do período 1994-98. Estes

foram os anos dourados da integração comercial no bloco, havia estabilidade cambial e

monetária, os ciclos econômicos dos países eram comuns, os fluxos de capitais

permitiam financiar desequilíbrios e o comércio intersetorial era mais equânime. Este

período foi marcado pela evolução do processo integrativo e pelo adensamento das

relações entre os membros do Mercosul. Por conseguinte, a adoção de medidas

restritivas ao comércio, como as salvaguardas, não tinha espaço em um cenário de

otimismo onde o interesse político de seus sócios era o de aprofundar a integração.

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Os conflitos comerciais entre Brasil e Argentina e as discussões sobre a

adoção de salvaguardas ressurgiram a partir de janeiro de 1999, quando a moeda

brasileira foi desvalorizada, provocando o receio de uma invasão de produtos

brasileiros na Argentina. Refém da lei de conversibilidade, a Argentina passou a

conviver com o temor de assumir a maior parte dos custos decorrentes da mudança

cambial brasileira, que seria, no curto prazo, o aumento substancial das importações

provenientes do Brasil, acompanhado da queda das exportações argentinas para o

parceiro do bloco.

Nestas condições, o tema das salvaguardas encontrou um terreno fértil

para voltar à tona no Mercosul. Em julho de 1999, o governo argentino, pressionado

pelo desemprego e pela recessão, regulamentou um sistema de salvaguardas aplicável

também aos membros do Mercosul, materializado na Resolução nº 911. Além disso,

foram aplicadas salvaguardas específicas contra as importações de fios e fios

combinados de algodão. O governo brasileiro agiu depressa e buscou apoio do Uruguai

e Paraguai para forçar a Argentina a recuar, e declarou que o Brasil não participaria das

reuniões do Mercosul até que a Resolução nº 911 fosse suspensa.

Em relação aos produtos têxteis, a Argentina introduziu, de acordo com as

previsões do artigo 6o do Acordo sobre Têxteis e Vestuário (ATV) da OMC, uma

salvaguarda de transição por um período de três anos sobre as importações de fios de

algodão e fios combinados originárias do Brasil, Paquistão e China. As autoridades

argentinas consideraram que as exportações brasileiras estavam causando dano à

indústria têxtil do país. No entanto, o Órgão de Supervisão dos Têxteis (OST)

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determinou que tal medida não se justificava, o que obrigava a Argentina a desistir da

aplicação da salvaguarda2.

O Brasil se opôs decididamente a essa disposição restritiva da Argentina

e, apesar do início das conversações de alto nível, não foi solucionado o impasse em

relação à Resolução nº 911. Assim, o Brasil apresentou uma reclamação ante a

Comissão de Comércio do Mercosul e, posteriormente, iniciou os procedimentos para

levar a controvérsia ao Tribunal Arbitral do Mercosul. O Tribunal se pronunciou,

sustentando que, diferentemente do alegado pela Argentina, as regras vigentes no

Mercosul não permitiam a adoção de salvaguardas intrabloco.

Após a decisão do Tribunal Arbitral a Resolução nº 911 foi extinta pela

Resolução do Ministério da Economia (ME) nº 265/00, e a Resolução ME nº 337/00

extinguiu a medida referente aos produtos têxteis, já que as importações registradas,

segundo a recomendação do OST, não ocorreram em volumes que pudessem causar

prejuízo grave à indústria doméstica.

Simultaneamente a este processo, o Brasil vinha rechaçando as propostas

argentinas de implementar restrições ao comércio bilateral por meio da aplicação de

salvaguardas, preferindo negociar acordos de restrições voluntárias às exportações. Os

acordos privados para limitação de exportações começaram a ser discutidos a partir de

fevereiro de 1999, para os setores calçadista e de papel e celulose.

Ao longo de 2000 e 2001, para contornar o impacto da desvalorização do

real no comércio entre os países do bloco, a Argentina passou a pressionar o governo

2 A Argentina, contudo, não suspendeu a aplicação das medidas, o que lhe gerou um contencioso na OMC movido pelo Brasil. No âmbito do contencioso, os países fizeram um acordo que colocou fim à disputa. Cf. Argentina – têxteis, WT/DS190 (os documentos da OMC aqui indicados podem ser vistos em <www.wto.org>).

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brasileiro para admitir juridicamente as salvaguardas ao comércio intrazona. As

reuniões bilaterais buscavam determinar se o mecanismo de salvaguardas adotado

seria setorial, como defendia o Brasil, ou global, desejo argentino.

Mesmo se mostrando disposto a negociar, o governo brasileiro resistia a

adotar um mecanismo irrestrito e preferiu criar limites setoriais para aplicação de

salvaguardas. Em outubro de 2001, os governos do Brasil e da Argentina chegaram a

anunciar, em São Paulo, a criação de um sistema de salvaguardas para o comércio

bilateral. As salvaguardas seriam uma saída emergencial para enfrentar a crise nas

economias dos dois países-membros do Mercosul, teriam caráter temporário e seriam

regidas pelas normas da OMC. A partir do anúncio, a previsão para a adoção de

salvaguardas deveria ser definida num prazo de duas semanas por equipes de Brasília

e Buenos Aires. Logo em seguida, contudo, as negociações foram suspensas face à

crise desencadeada pelas contínuas declarações do então Ministro Domingo Cavallo,

que afirmou: “está esgotado este modelo de associação comercial com países que

fazem o que querem com suas moedas (...) claro que me refiro ao Brasil”3.

Em decorrência das constantes declarações do Ministro Cavallo, o

Ministro das Relações Exteriores do Brasil, Celso Lafer, ordenou ao embaixador

brasileiro na Argentina, José Botafogo Gonçalves, suspender as discussões sobre a

adoção de medidas de salvaguardas no Mercosul. As negociações, planejadas para

terminar em duas semanas, foram encerradas em conclusões sobre a adoção de

salvaguardas e criaram um impasse entre Brasil e Argentina. Este foi o momento em

3 As declarações do Ministro da Economia Domingo Cavallo estão disponíveis em: <http://www.estadao.com.br/agestado/noticias/2001/out/27/23.htm>.

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que mais se aproximou da definição de um mecanismo para a aplicação de

salvaguardas no Mercosul.

No final de 2001, a Argentina passava pelos piores momentos da crise

política: 2001 será lembrado como um ano trágico, de convulsão social e anarquia

econômica. No intervalo de dez dias, a presidência da Argentina mudou de mão cinco

vezes. Este cenário de instabilidade política e econômica forçou a paralisia decisória do

bloco, o que se iniciou com o afastamento dos quadros técnicos argentinos de muitas

das diferentes instâncias negociadoras e logo as propostas de criação de salvaguardas

foram esquecidas.

As iniciativas de criação de um sistema de salvaguardas voltam à pauta

do Mercosul depois da eleição de Nestor Kirchner, em 2003. Sob o argumento de que

há assimetrias na evolução das economias do Brasil e da Argentina, especialmente na

produção industrial, o governo argentino, em setembro de 2004, apresentou aos

governo brasileiro sua proposta de criação de mecanismo que permitiria a aplicação de

salvaguardas. Nesta proposta, nos casos de desequilíbrio no comércio entre os países

do bloco haveria aumento de tarifas de importação ou definição de restrições

quantitativas.

A primeira proposta de salvaguardas foi enviada ao governo brasileiro, em

setembro de 2004, pelo Ministro da Economia argentino, Roberto Lavagna, que a

entregou a Antonio Palocci, Ministro da Fazenda brasileiro. O documento previa a

elevação de barreiras quantitativas e tarifárias caso houvesse aumento das importações

de produtos provenientes do país vizinho, com prejuízos aos setores produtivos,

quando houvesse desníveis nas taxas de câmbio, ou quando ocorresse desequilíbrio

acentuado na evolução da atividade econômica.

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Apesar de ter recebido a proposta em setembro, só em dezembro de

2004, durante a reunião do Conselho do Mercado Comum, principal órgão de condução

política do processo de integração, voltou-se a se discutir a sugestão argentina de

implementação de salvaguardas. A reunião de cúpula do Mercosul, entre 15 e 17 de

dezembro, marcou o aniversário de dez anos do documento que transformou o grupo

de países do Cone Sul em uma união aduaneira. Nesta ocasião, a Argentina insistiu na

proposta de criação de um mecanismo de restrição do comércio por meio da aplicação

de salvaguardas. A Argentina, contudo, ficou isolada; Paraguai e Uruguai, além do

Brasil, posicionaram-se contra o mecanismo. Tanto o Uruguai, quanto o Paraguai se

manifestaram contra a proposição por entenderem que o mecanismo de salvaguardas

comerciais fere os princípios almejados de livre-comércio na zona.

Em janeiro de 2005, representantes do Brasil e da Argentina reuniram-se

para avaliar o processo de integração e, particularmente, a situação do comércio

bilateral, momento em que se deu continuidade às conversações sobre a adoção de

salvaguardas intrabloco. O Brasil, naquele momento, sugeriu a criação de uma

Comissão para a Expansão do Comércio e a Promoção da Integração Produtiva, em

resposta às iniciativas argentinas. A estratégia parecia ser a de evitar as salvaguardas

por meio da expansão das correntes de comércio bilateral de forma equilibrada, que

pudesse levar à integração dos setores produtivos.

Muito embora tenha rejeitado a iniciativa argentina, o Brasil, em janeiro de

2005, sugeriu que os agentes privados brasileiros auto-limitassem as exportações de

produtos sensíveis para a Argentina, tais como têxteis, calçados e eletroeletrônicos de

linha branca.

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Até maio, o empresariado brasileiro parecia irredutível em acatar

iniciativas que comprometessem o fluxo comercial e restringissem o comércio no

Mercosul. Mas a posição brasileira em relação às salvaguardas muda depois da

primeira reunião entre os Ministros da Fazenda brasileiro e argentino para discutir o

tema. Nesta ocasião, Antonio Palocci declara, em entrevista ao jornal argentino La

Nación:

Conversamos la semana pasada durante la cúpula América del

Sur-Países Arabes, pero él no me presentó formalmente una

propuesta. El ministro Lavagna me recordó los detalles de la

propuesta que hicieron inicialmente [en septiembre], recordamos

las ponderaciones que hizo Brasil, y me dijo que a partir de ese

diálogo va a hacer una segunda. Le dije que la esperamos con

respeto. Creemos que los sectores productivos de Brasil y la

Argentina pueden realizar acuerdos. Nosotros sugerimos al

gobierno argentino que no utilicemos mecanismos de

salvaguardias, porque ese instrumento va en sentido contrario de

la profundización del Mercosur4.

Depois do encontro dos dois ministros, o governo argentino enviou nova

proposta de restrição comercial que foi entregue pelo seu Ministro Roberto Lavagna, ao

Ministro Antonio Palocci, ainda em maio de 2005, quando o presidente da Argentina,

Néstor Kirchner, esteve em Brasília para a Cúpula América do Sul-Países Árabes.

O documento, com a segunda proposta de criação de salvaguardas no

Mercosul, é mais sucinto que o anterior, ainda que contenha explicação e sugestões

sobre prazos e percentuais. A proposta, contudo, mantém o princípio do "gatilho",

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mecanismo que acionaria de maneira automática e unilateral as restrições ao comércio

bilateral, dispensando, assim, consultas prévias aos país prejudicado pelas medidas. O

plano argentino de criação de salvaguardas enfrentou fortes resistências no governo e

no setor privado brasileiros5. Na essência, todavia, a proposta é praticamente a mesma

apresentada em 2004. Trata-se da adoção de cotas ou de sobretaxas para impedir o

acesso irrestrito de produtos brasileiros em casos comprovados de “invasão” do

mercado argentino.

Em julho de 2005, durante as reuniões do Comitê de Monitoramento de

Comércio entre Brasil e Argentina, no Rio de Janeiro, iniciaram-se as negociações para

a formalização de alguma medida de restrição nas relações comerciais entre os países.

Nesta reunião, a discussão foi retomada com pelo menos dois avanços que agradaram

aos negociadores brasileiros. A Argentina concordou em não acionar as salvaguardas

automaticamente, por meio de um gatilho, e também aceitou que os setores

beneficiados por uma salvaguarda se comprometam com um programa de

reestruturação para se tornarem mais competitivos.

Além da divergência de caráter político a respeito da conveniência de se

admitir a restrição ao comércio intrabloco, as equipes técnicas que negociam as

mudanças têm pelo menos um ponto de discordância. Os argentinos querem que o

mecanismo seja aplicado também por fatores macroeconômicos, como alterações nas

cotações de moedas dos dois paises ou em caso de recessão.

4 Entrevista do Ministro da Fazenda brasileiro Antônio Palocci ao jornal La Nación. Para ter acesso à entrevista basta acessar: <http://www.lanacion.com.ar/EdicionImpresa/economia/nota.asp?nota_id=705142>. 5 Ver posicionamentos dos Ministros do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan, e do Ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, no endereço: <http://www.idcid.org.br/default.asp?sec=3&id=4303>.

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Os negociadores brasileiros, por sua vez, insistem que o acordo de

institucionalização das salvaguardas deva conter três pontos principais. Primeiro, que

não haja gatilhos, como pretendem os argentinos. O Brasil, em essência, insiste para

que a decisão a respeito da aplicação da medida seja compartilhada entre os membros

do Mercosul, de modo que um país não tenha a liberdade de adotar cotas e sobretaxas

a partir de um sinal pré-definido de aumento de importações. Segundo, seria preciso a

confirmação do prejuízo grave sofrido pelo setor concorrente nacional e do nexo causal

com a elevação das importações. Terceiro, seria indispensável definir um prazo de

vigência da salvaguardas.

3. Aspectos Jurídicos Relativos à Aplicação de Salvaguardas no Mercosul

Muito embora o Mercosul seja o foco da análise deste artigo, é importante

ter presente que todos os membros do bloco fazem parte do sistema multilateral de

comércio articulado pela OMC e, assim, todos têm obrigações jurídicas no plano

multilateral. Nesta seção, analisam-se as salvaguardas, tanto à luz das regras da OMC,

quanto das disciplinas vigentes no Mercosul. O propósito desta reflexão é justamente

analisar a viabilidade jurídica de se adotar essa limitação comercial no âmbito do

Mercosul, o que exige reflexão também a respeito das regras do sistema multilateral.

Vale desde logo ter em mente que os obstáculos jurídicos eventualmente

existentes no âmbito regional tendem a ser mais facilmente solucionados que os de

ordem multilateral. Além do interesse anunciado de seus membros com o processo de

integração regional, o Mercosul conta com apenas quatro sócios. Na OMC, além dos

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148 membros existentes, a revisão das regras é decidida por consenso e a atual rodada

de negociação em curso, a Rodada Doha, não confere mandato negociador para a

revisão das regras sobre salvaguardas, de maneira que as perspectivas para a

alteração das disciplinas vigentes são muito mais remotas no âmbito multilateral. Ainda

assim, é importante considerar que as regras adotadas pelos membros do Mercosul em

relação ao comércio regional devem ser compatíveis com as disciplinas do sistema

multilateral. A rigor, não basta, portanto, a adoção de instrumentos jurídicos que

permitam a restrição do comércio intrabloco, se as regras do sistema multilateral não

admitirem tais restrições6.

De fato, por ser uma medida de caráter excepcional, que restringe o

comércio sem que esteja ocorrendo prática desleal por parte do país que sofre seus

efeitos, a aplicação das salvaguardas é dificultada ao máximo pelas normas da OMC.

Para que se adote uma medida dessa natureza, três fatores devem ser comprovados7.

São eles: (i) surto de importações; (ii) existência ou ameaça de prejuízo grave à

indústria nacional e (iii) nexo causal entre o aumento das importações e o prejuízo (ou a

ameaça dele). Além dos pressupostos de aplicação serem rigorosos, limitando o

emprego da medida, a exigência das compensações e a não-seletividade8 fazem com

6 No exame de processos de integração e de medidas de salvaguarda, é importante ter presente que o Acordo sobre Salvaguardas autoriza a união aduaneira a aplicar uma salvaguarda como uma entidade única (Acordo sobre Salvaguardas, nota de rodapé 01). Esse, contudo, não é o foco deste trabalho. 7 Veja para esta e outras questões relativas a salvaguardas BROGINI, Gilvan. Medidas de Salvaguarda e Uniões Aduaneiras. São Paulo: Aduaneiras, 2000, p. 24 e ss. Sobre o assunto, veja-se também PAUWELYN, Joost. The Puzzle of WTO Safeguards and Regional Trade Agreements. Journal of International Economic Law, n. 7, v. 01, 2004, p. 109-142. 8 O país que sofrer com as medidas impostas por outro tem o direito de ser compensado pelo prejuízo econômico decorrente das restrições às suas exportações (Vide artigo 8 do Acordo sobre Salvaguardas). Além disso, a salvaguarda definida por um país deve se aplicar a todas as suas importações do produto protegido, não importando sua origem. Não são possíveis, assim, salvaguardas destinadas a proteger o mercado interno contra as importações provenientes apenas de um determinado país (a única exceção prevista refere-se às salvaguardas excepcionais temporárias contra os produtos de origem chinesa).

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que o interesse dos países na aplicação de salvaguardas diminua sensivelmente. Aliás,

restringir o interesse na adoção de salvaguardas vai justamente ao encontro do

propósito central da OMC: a promoção do comércio internacional.

Diante do panorama regulatório das salvaguardas, concentra-se na

questão que interessa a este estudo: a possibilidade jurídica de uma salvaguarda ser

aplicada dentro de uma união aduaneira, particularmente por um membro da união

aduaneira contra outro.

De início, é importante notar que as regras da Organização admitem,

respeitados alguns parâmetros, que se formem acordos regionais de comércio. De

acordo com a lógica que motivou o artigo XXIV do GATT-1994, áreas de livre comércio

e uniões aduaneiras podem prestar um serviço para a liberalização do comércio

internacional em escala global, mesmo que, para isso, desrespeitem o princípio básico

de não-discriminação previsto pela OMC.

Segundo o GATT-1994, uma união aduaneira deve ser entendida como a

criação de um único território aduaneiro, a partir de dois ou mais pré-existentes, de

maneira que as tarifas e outras regulações restritivas de comércio sejam eliminadas em

relação a “substantially all the trade” (expressão, aliás, sujeita a grandes polêmicas na

OMC). Além disso, para a conformação da união aduaneira é necessário que

“substantially the same” tarifas e outras regulações de comércio sejam aplicadas pelos

membros da união aduaneira em relação aos países que não fazem parte dela9. A

adoção de uma tarifa externa comum por um bloco comercial, por exemplo, enquadra-

se nas previsões da OMC a respeito de uniões aduaneiras.

9 GATT-1994, artigo XXIV, 8(a), (i) e (ii).

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Nas regras da Organização, há disciplinas vigentes para acordos que

visam à formação de uma união aduaneira e para as uniões aduaneiras formadas.

Durante o chamado período de transição (ou seja, antes da formação da união

aduaneira), os países dispõem de certa flexibilidade quanto à escolha dos instrumentos

que farão uso para atingirem a união aduaneira (mesmo que imperfeita). Segundo

Brogini, nesse contexto, “a utilização de salvaguardas no comércio interior antes do

estabelecimento da UA [união aduaneira] não é incompatível com as normas do artigo

XXIV”10.

Depois de estabelecida a união aduaneira, mesmo que imperfeita, há

divergência na literatura a respeito da possibilidade de se empregar uma salvaguarda

intrabloco.

Os argumentos que defendem a inviabilidade jurídica das salvaguardas

intra-união aduaneira têm como base o seguinte fundamento. A norma aplicável da

OMC define que na união aduaneira as tarifas e demais regulações comerciais

restritivas sejam eliminadas em relação a substancialmente todo o comércio interno,

“com exceção, na medida em que seja necessário, das restrições previstas nos artigos

XI, XII, XIII, XIV, XV e XX do GATT-1994”11. As salvaguardas, por sua vez, estão

previstas no artigo XIX do GATT-1994, dispositivo não contemplado no rol acima. Isso

significa que, formada a união aduaneira (mesmo incompleta), deve haver a livre-

circulação de bens intrabloco (em relação a “substantially all the trade”), sendo

possíveis as exceções listadas acima, entre as quais não se incluem as salvaguardas.

10 BROGINI, Gilvan. Op. cit., p. 83. 11 Os dispositivos listados referem-se, por exemplo, a restrições ao comércio necessárias para proteger o meio ambiente, a saúde e a vida humana, para proteger balanço de pagamentos entre outras.

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16

Se fosse possível a aplicação de salvaguardas intrabloco, o artigo XIX estaria

expressamente previsto no rol das disciplinas que podem persistir mesmo após a

formação da união aduaneira, o que não ocorre. A lista das exceções à livre-circulação

de mercadorias intrabloco, nesse sentido, seria exaustiva. Segundo este entendimento,

a rigor, portanto, não seria possível a aplicação de salvaguardas intrazona após a

formação da união aduaneira12. A Austrália, por exemplo, defende que as salvaguardas

intrabloco não são possíveis com base nesse entendimento13.

Por outro lado, os argumentos que sustentam a possibilidade de se

empregar uma salvaguarda intrazona têm o seguinte fundamento. Segundo a definição

da OMC de união aduaneira, esta implica a liberalização do comércio em relação a

“substantially all the trade”, e não a rigorosamente todo o comércio. Assim, haveria uma

margem de manobra para se adotar uma prática restritiva ao comércio intrazona e,

dessa forma, uma salvaguarda entre os membros de uma união aduaneira seria

viável14. A possibilidade de aplicação de salvaguardas intrazona é defendida, por

exemplo, pela União Européia15. Interessante, ainda, é registrar o posicionamento de

Israel e do Canadá, para quem as salvaguardas intrabloco só poderiam ser permitidas

se ficasse comprovado que o prejuízo à indústria doméstica se deve à redução das

barreiras previstas no acordo regional16.

12 Neste sentido, vide por exemplo, BROGINI, Gilvan. Medidas de Salvaguarda e Uniões Aduaneiras. São Paulo: Aduaneiras, 2000. 13 Cf. Australia, WT/REG/M/15, para. 40. 14 Neste sentido, vide, por exemplo, PAUWELYN, Joost. The Puzzle of WTO Safeguards and Regional Trade Agreements. Journal of International Economic Law, n. 07, v. 01, 2004, p. 109-142. 15 EC, WT/REG/M/14, para. 13. 16 Israel, WT/REG31/M/1, para. 30; Canada, WT/REG38/M/1, para. 44.

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17

A respeito da aplicação de salvaguardas dentro de uniões aduaneiras, há

ainda o entendimento segundo o qual as medidas apenas seriam possíveis se forem

aplicadas indistintamente a todos os membros da OMC (incluindo-se, assim, os

parceiros do acordo regional) – essa é a posição, por exemplo, do Japão e de Hong

Kong17. Uma medida que incidisse apenas sobre os parceiros do bloco ou que

excluísse esses países estaria violando tanto a cláusula da nação mais favorecida,

quanto o princípio da não-seletividade comentado acima. Esse entendimento, contudo,

não parece o mais acertado: respeitados parâmetros, o artigo XXIV admite que a

cláusula da nação mais favorecida e outras regras possam ser legitimamente

excepcionadas. Portanto, seria possível que membros de um bloco comercial (que

devem eliminar substancialmente todas as barreiras ao comércio intrazona) não sejam

obrigados a estender a restrição comercial a seus parceiros do acordo regional.

Assim, aplicando-se as lições acima à situação do Mercosul, uma união

aduaneira incompleta, conclui-se o seguinte:

• Há divergências a respeito da possibilidade jurídica à luz das regras da

OMC de se adotar uma salvaguarda intrabloco. As normas aplicáveis não

são claras, o tema ainda não foi discutido no sistema de solução de

controvérsias da Organização e as discussões sobre a reforma do artigo

XXIV no âmbito da Rodada Doha evidenciam que países têm

posicionamentos distintos sobre o assunto.

17 Japan, WT/REG/M/14, para. 7; HKC, WT/REG/M/15, para. 22.

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18

Se já não bastasse a indefinição sobre a possibilidade de se adotar uma

salvaguarda intrabloco, a pretensão argentina ainda agrava a dificuldade de aplicar a

medida. De acordo com o comentado na seção anterior, o interesse argentino era

aplicar uma salvaguarda apenas contra um país, se necessário. Além disso, havia

interesse em fazer o mecanismo acionável de maneira automática (a partir de um

“gatilho”). Ademais, os argentinos não parecem ter cogitado de compensar o Brasil

pelos prejuízos que as salvaguardas lhe imporiam. Os problemas jurídicos que

decorrem das pretensões argentinas são os seguintes:

• A rigor, a aplicação da salvaguarda dá ensejo à compensação por parte

do país prejudicado (o que, se não é um problema jurídico, tende a gerar

problemas políticos na prática, pois que vai de encontro aos interesses

argentinos).

• De acordo com o artigo XIX do GATT-1994 e com o entendimento do

sistema de solução de controvérsias da OMC, o país que deseja aplicar

uma salvaguarda precisa demonstrar não apenas o aumento das

importações, mas também que esse incremento das importações está

associado a uma “evolução imprevista das circunstâncias”. Se na

Argentina dos dias de hoje o aumento das importações do Brasil é algo

facilmente demonstrável, parece difícil comprovar que esse surto de

importações decorre de uma evolução imprevista das circunstâncias:

pode ser considerado previsível o aumento significativo das importações

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19

num determinado setor a partir da criação de um bloco regional que

justamente elimina as tarifas nesse dado setor18.

• O surto das importações, elemento necessário para a aplicação da

salvaguardas, precisa ser um resultado do compromisso do país junto à

OMC. No caso do Mercosul, em razão da eliminação das barreiras ao

comércio interno, poderia haver alguma dificuldade em demonstrar que o

aumento das importações foi decorrente dos compromissos que o país

assumiu na OMC19.

• Caso se admita o emprego de salvaguardas contra parceiros do bloco,

ela só seria possível se fosse aplicada a todos os membros da OMC

(incluindo-se aí os parceiros do acordo regional). Um membro da união

aduaneira não é obrigado a aplicar a salvaguarda contra os parceiros do

acordo, pode excluir as importações provenientes do bloco na

caracterização do dano à sua indústria e, conseqüentemente, pode

excluí-los da incidência da medida. O que um membro de união

aduaneira não pode fazer, contudo, é aplicar uma medida contra um

único destinatário: justamente o parceiro do bloco. Esse comportamento

18 O artigo XIX do GATT prevê, entre outras questões, que a salvaguarda pode ser aplicada “[i]f, as a result of unforeseen developments and of the effect of the obligations incurred by a contracting party under this Agreement”, haja o surto de importações. Pauwelyn, por exemplo, entende que, no contexto de uma união aduaneira, a aplicação de uma salvaguarda seria algo juridicamente questionável justamente em função desse aspecto: se a liberalização do comércio de um determinado produto foi prevista no acordo que estabelece a preferência regional, como se poderia alegar que circunstâncias imprevisíveis ou imprevistas provocaram um surto repentino de importações? PAUWELYN, Joost. Op. cit., p. 109-142. 19 O argumento decorre do artigo XIX do GATT-1994, particularmente do trecho transcrito na nota acima.

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20

violaria o princípio da não-seletividade e não seria respaldado pelo artigo

XXIV do GATT-199420.

• O mecanismo de “gatilho”, ademais, não encontra suporte nas regras da

OMC. Sabe-se, afinal, que as disciplinas exigem negociação prévia a

respeito da imposição da medida que venha a prejudicar as exportações

de um membro, inclusive com vistas a permitir a negociação das

compensações a que esse país tem direito, conforme se comentou. Um

mecanismo automático de imposição de salvaguardas, assim, viola as

previsões do Acordo sobre Salvaguardas.

Não surpreende, diante disso, que os argentinos não tenham interesse em

denominar de “salvaguarda” o instrumento de proteção que gostariam de criar para se

protegerem do Brasil. Além de a adoção de salvaguardas intrabloco ser politicamente

sensível, juridicamente é difícil sustentar a aplicação da medida no âmbito de uma

união aduaneira (mesmo que imperfeita). Além disso, nos moldes em que

aparentemente interessaria aos argentinos, ou seja, salvaguarda automática (sem

consultas prévias), sem compensações ao país prejudicado, e seletivas (ou seja, contra

o Brasil), a medida seria absolutamente incompatível com as regras da OMC. Uma

medida nesses termos seria a fusão de tudo o que as regras da OMC visam a evitar.

Apenas para fins de reflexão mais ampla, é curioso observar que as

discussões a respeito de medidas de salvaguarda em uniões aduaneiras, em regra,

dizem respeito à facilitação do comércio intrabloco e, assim, concentram-se em explicar

20 Registre-se, em contrário, a posição do Canadá e de Israel indicada acima.

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21

de que maneira os parceiros do acordo regional podem ser excluídos das salvaguardas

que um dos membros do bloco queira aplicar contra terceiros. Os contenciosos levados

ao sistema de solução de controvérsias da OMC demonstram justamente isso:

parceiros de um bloco aplicando medidas de salvaguarda contra terceiros países e

excluindo de sua abrangência as importações provenientes de outros membros do

acordo regional21. O que se verifica no Mercosul é exatamente o interesse contrário. A

medida de salvaguarda serviria para a proteção de um membro do bloco justamente

contra o bloco – o que contraria a essência de um acordo de liberalização comercial e

demonstra o momento delicado em que o Mercosul se encontra.

Feitas as considerações gerais a respeito da possibilidade jurídica, à luz

das regras da OMC, de um membro de uma união aduaneira empregar uma

salvaguarda contra as importações de outro membro do bloco, analisa-se agora o

panorama jurídico existente no Mercosul a respeito desse assunto. Vale retomar a

reflexão feita no início da seção: a revisão das regras do Mercosul é processo mais

simples que a reforma das disciplinas da OMC. Ainda assim, a revisão das regras do

Mercosul, se necessária para contemplar os interesses de seus membros, não pode

colocá-los em situação de descumprimento das regras da OMC, que vinculam todos os

quatro sócios do bloco.

O Tratado de Assunção, acordo constitutivo do Mercosul, define em seu

artigo 1o que o mercado comum implica, entre outras questões, a livre-circulação de

bens e a eliminação de direitos alfandegários e não-tarifários intrabloco. O Anexo IV do

Tratado de Assunção prevê a chamada “cláusula de salvaguarda”, admitindo que

21 Vide Argentina – calçados, WT/DS121; Estados Unidos – glúten, WT/DS166; Estados Unidos – line pipe, WT/DS202.

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22

temporariamente se empregassem essas medidas ao comércio intrabloco, respeitados

os quesitos previstos nesse Anexo22. O artigo 5o do instrumento, contudo, prevê

expressamente que em nenhum caso a aplicação de cláusulas de salvaguarda poderia

estender-se além de 31 de dezembro de 1994. Neste mesmo sentido, o Artigo 10 do

Anexo I do Tratado de Assunção prevê que “[e]m 31 de dezembro de 1994 e no âmbito

do Mercado Comum, estarão eliminadas todas as restrições não tarifárias”.

Por meio da Decisão nº 05/94 do Conselho do Mercado Comum (CMC),

definiram-se as condições do Regime de Adequação Final para a União Aduaneira.

Segundo a decisão, os membros do bloco deveriam indicar os produtos sujeitos a uma

barreira tarifária no comércio intrabloco. A essa lista de produtos se aplicaria um prazo

final de desgravação, linear e automática, com vistas à eliminação definitiva das

restrições tarifárias aos fluxos comerciais intrazona. Ainda de acordo com a decisão, os

produtos sujeitos ao Regime de Salvaguardas previsto no Tratado de Assunção

deveriam também dispor de um prazo final de desgravação, linear e automática.

Segundo a norma, esse prazo seria de quatro anos, contados a partir de 1o de janeiro

de 1995 para todos os sócios23. Em suma: as restrições que ainda existissem ao

comércio intrabloco seriam gradualmente eliminadas e as salvaguardas que ainda

houvesse ao comércio regional seriam extintas em 1o de janeiro de 1999. A Decisão

22 Prevê o artigo 1o do Anexo IV que: “Cada Estado Parte poderá aplicar, até o dia 31 de dezembro de 1994, cláusulas de salvaguarda à importação dos produtos que se beneficiem pelo Programa de Liberação Comercial estabelecido no âmbito do Tratado”. 23 Poder-se-ia argumentar que a Decisão está em conflito com o Tratado de Assunção, já que ela admite salvaguardas intrabloco até janeiro de 1999, ao passo em que o Tratado as admitia até janeiro de 1995. Prevalece, neste caso, a Decisão, com base no Protocolo de Ouro Preto, que define: “Revogam-se todas as disposições do Tratado de Assunção de 26 de março de 1991 que estiverem em conflito com os termos do presente Protocolo e com o conteúdo das Decisões aprovadas pelo Conselho do Mercado Comum durante o período de transição" (artigo 53). Esse, aliás, foi o entendimento expresso no caso Argentina – têxteis analisado pelo sistema de solução de controvérsias do Mercosul.

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23

CMC nº 05/94 foi incorporada por todos os membros do Mercosul, sendo, portanto,

juridicamente vinculante24.

Para compreender o emprego das salvaguardas intrabloco, é necessária

uma breve menção ao contencioso envolvendo Brasil e Argentina, julgado em 2000

pelo sistema de solução de controvérsias do Mercosul. Neste caso conhecido como

“salvaguardas contra produtos têxteis”, o Brasil questionou uma resolução do Ministério

da Economia argentino, que impôs cotas às importações de produtos têxteis

provenientes do Brasil. Na decisão, que considerou as normas argentinas incompatíveis

com as regras do bloco, consta:

Os Artigos 1 e 5 do Anexo IV do Tratado de Assunção formulam

uma proibição geral sobre a aplicação de salvaguardas ao

comércio intrazona, que somente poderá ser excetuada por meio

de uma norma específica dentro do sistema Mercosul que legitime

a imposição de salvaguardas aos produtos têxteis.

Conseqüentemente, não existe "vácuo legal" sobre esta matéria

[como alegava a Argentina];

A interpretação das disposições sobre união aduaneira do

Mercosul deverá ser realizada, salvo por norma expressa em

contrário, em conformidade com o objeto e fim de toda a

integração econômica [que, naturalmente, não é a criação de

barreiras para o comércio intrabloco, efeito da salvaguarda

argentina];

24 Fonte: <www.mercosur.org.uy>.

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24

Como regra geral, é possível a aplicação de medidas de

salvaguarda ao comércio intrazona no Mercosul, desde que exista

uma norma explícita que assim o autorize. O Tribunal não

encontra normas do Mercosul que permitam explicitamente a

aplicação de salvaguardas à importação intrazona de produtos

têxteis [acrescente-se que não há tampouco normas para outros

setores].

Ainda, conforme se depreende da decisão do tribunal, a possibilidade de

se aplicar uma salvaguarda intrabloco fica limitada aos produtos de zonas de

processamento de exportações e áreas aduaneiras especiais (como o Pólo Industrial de

Manaus e a Zona Franca da Terra do Fogo, em Ushuaia, na Argentina, por exemplo),

em razão de esta possibilidade estar expressamente prevista na Decisão CMC nº

08/9425. A título de ilustração, registre-se que o bloco adotou normas para a aplicação

de salvaguarda às importações provenientes de países não-membros do Mercosul – o

que não interessa no contexto deste estudo26.

Diante de tudo isso, conclui-se que nem as normas, tampouco o sistema

de solução de controvérsias do Mercosul autorizam a aplicação de salvaguardas

intrabloco (ainda que o julgamento tenha-se limitado a produtos têxteis)27. Os árbitros

que decidiram o contencioso dos têxteis, contudo, indicaram a possibilidade de

25 MERCOSUR/CMC/DEC Nº 8/94 - Zonas Francas, Zonas de Procesamiento de Exportaciones y Areas Aduaneras Especiales. Artículo 3o.- Podrán aplicarse salvaguardias bajo el régimen jurídico del GATT cuando las importaciones provenientes de zonas francas comerciales, de zonas francas industriales, de zonas de procesamiento de exportaciones y de áreas aduaneras especiales, impliquen un aumento imprevisto de importaciones que cause daño o amenaza de daño para el país importador. 26 MERCOSUR/CMC/DEC Nº 17/96 – Regulamento relativo à aplicação de medidas de salvaguarda às importações provenientes de países não membros do Mercado Comum do Sul (Mercosul) 27 A exceção, como observado, advém da possibilidade de se aplicar salvaguarda contra produtos de zonas francas dos países do bloco.

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25

futuramente adotar-se norma que autorize a aplicação de salvaguarda no bloco. A esse

respeito, vale reiterar que há ainda divergências a respeito da possibilidade jurídica, de

acordo com as normas da OMC, de se admitirem as salvaguardas intrazona. Esse

assunto, em particular, veio à tona no caso dos têxteis, conforme consta do julgado:

A Argentina questionou a afirmação do Brasil sobre o fato de que

as medidas de salvaguarda não podem coexistir em uma união

aduaneira. A Argentina sustenta que o assunto é controvertido no

âmbito do GATT/OMC, onde o Artigo XXIV:8 do GATT 1994 define

as uniões aduaneiras afirmando que são compatíveis com as

regras multilaterais. O Artigo XXIV:8(a) define uma união

aduaneira como "a substituição de dois ou mais territórios

aduaneiros por um só território aduaneiro, de maneira que os

direitos de aduana e as demais regulamentações comerciais

restritivas sejam eliminadas com respeito à essência dos

intercâmbios comerciais entre os territórios constitutivos da união".

A Argentina enfatiza que a interpretação da expressão "a essência

dos intercâmbios" é controvertida e, portanto, pode ser

interpretada de forma quantitativa ou qualitativa. Por isso o

argumento para a aplicação de salvaguardas intrazona se refere

ao fato de que a obrigação de eliminar direitos aduaneiros e

regulamentações restritivas do comércio entre os Membros de

uma união aduaneira é aplicável à "essência do intercâmbio" entre

os Membros e não a "todo o intercâmbio" entre Membros de uma

união aduaneira.

Ainda que possa haver dúvidas sobre a possibilidade jurídica (à luz da

OMC) de acordos regionais de comércio virem a autorizar seus membros a

empregarem, contra si, salvaguardas ao comércio, o Mercosul, até o momento, optou

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26

por não as admitir. Não existindo norma que autorize essas medidas no contexto do

Mercosul, não há dúvidas de que as salvaguardas são, no momento, juridicamente

inviáveis.

4. Acordos Privados de Restrição Quantitativa de Exportações

Os acordos privados de restrição quantitativa de exportações ocorrem

quando um país importador induz um outro a reduzir suas exportações, sob a ameaça

de restrições comerciais mais elevadas, quando tais exportações ameaçam alguma

indústria do país importador. Este tipo de barreira é criado geralmente a pedido do país

importador e recebe apoio do exportador para evitar maiores restrições comerciais,

como, por exemplo, uma salvaguarda. Um acordo bem sucedido de restrição

quantitativa de exportações produz todos os efeitos das cotas de importação, exceto

pelo fato de que são administradas pelo país exportador.

No âmbito do Mercosul, os acordos voluntários de restrição de

exportações surgiram como uma alternativa, diante das dificuldades políticas e jurídicas

(essas, tanto no plano multilateral quanto no regional) para a definição de salvaguardas,

e visam a dar uma resposta às constantes queixas do setor privado e do governo

argentino sobre o desequilíbrio no intercâmbio nos setores assimétricos. Por ora,

concentra-se na viabilidade jurídica dessa opção, primeiramente à luz das regras do

sistema multilateral e, em seguida, do regional. Como nota Jackson, “[o]ne of the most

troublesome and increasingly common types of safeguard action seen in recent

decades has been the export restraint imposed by an exporting country on behalf or at

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27

the request of an importing country”28. Segundo o autor, “in most cases, the

arrangements have dubious legal status”29.

Desde 1947, quando do início do sistema multilateral de comércio, foram

proibidas, como regra geral, as restrições quantitativas ao comércio entre os membros

do GATT. Preocupação maior na época do GATT-1947 em relação às restrições

quantitativas eram as cotas, ainda hoje existentes30. A partir da década de 1970, sob a

aparência e denominação de Acordos Voluntários de Exportação, passou-se a temer

também uma situação similar à das cotas, com efeitos econômicos equivalentes. Ao

invés de o país importador determinar a quantidade a ser importada, o país exportador

“voluntariamente” restringiria suas exportações para outro país.

Muito se discutiu na literatura a respeito da viabilidade jurídica desses

acordos, que foram considerados como que “na área cinzenta” entre a legalidade e a

ilegalidade. O Acordo sobre Salvaguardas da OMC, em 1994, veio a proibir

expressamente esta prática, por meio do seu artigo 11, que trata de “proibição e

eliminação de certas medidas”31.

Furthermore, a Member shall not seek, take or maintain any

voluntary export restraints, orderly marketing arrangements or any

other similar measures on the export or the import side32. These

28 JACKSON, John. The World Trading System: law and policy of International Economic Relations. 2 ed. Cambridge: MIT Press, 1997, p. 203. 29 Idem, p. 204. 30 Na prática, o artigo XI é geralmente descrito como a proibição ao uso de cotas, mas o dispositivo vai muito além disso, vedando restrições quantitativas em sentido amplo. 31 Acordo sobre Salvaguardas, artigo 11,1, b. 32 O próprio Acordo, neste ponto, contém duas notas de rodapé: 3. An import quota applied as a safeguard measure in conformity with the relevant provisions of GATT 1994 and this Agreement may, by mutual agreement, be administered by the exporting Member. 4. Examples of similar measures include export moderation, export-price or import-price monitoring systems, export or import surveillance,

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28

include actions taken by a single Member as well as actions under

agreements, arrangements and understandings entered into by

two or more Members. Any such measure in effect on the date of

entry into force of the WTO Agreement shall be brought into

conformity with this Agreement or phased out in accordance with

paragraph 2.

É importante ter presente que o Acordo proíbe que os países membros da

OMC adotem acordos que limitem as exportações. Nada nas disciplinas da

Organização, contudo, proíbe que representantes da iniciativa privada desses países

busquem entendimentos desse tipo. Evidentemente que, na prática, é difícil saber onde

termina a ação privada, onde inicia a do Estado, esse, sim, com compromissos perante

a OMC. O que importa deixar claro neste momento é que, a rigor, as disciplinas da

Organização não incidem sobre acordos de caráter privado. Não faria sentido, aliás,

que um membro do regime pudesse ser condenado pelo sistema de solução de

controvérsias porque as empresas instaladas em seu território não quiseram vender

para um dado país. De acordo com a análise de Jackson, “the sweeping language

would seem to embrace virtually any export control maintained by government authority,

but not those caused by private-firm action”, afinal, como o autor mesmo reconhece

“[t]he GATT does not apply to private companies”33.

Em relação às regras do Mercosul, cabem dois comentários. Não há nada

que especificamente proíba acordos voluntários de exportação. Há, contudo, a

obrigação geral de não definir obstáculos tarifários ou não-tarifários à livre-circulação de

compulsory import cartels and discretionary export or import licensing schemes, any of which afford protection. 33 Idem, p. 205.

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29

mercadorias intrabloco. Isso, de fato, parece o bastante para que, também no âmbito do

Mercosul, considere-se vedado um acordo entre dois países do bloco para limitar os

fluxos comerciais. Não obstante, a ressalva feita em relação às normas da OMC é

igualmente válida no contexto do Mercosul. Os Estados assumem o compromisso com

o respeito às normas, mas não podem determinar o comportamento dos atores

privados. Acordo entre setores privados dos dois países, nesse sentido, não encontraria

obstáculos jurídicos seja na OMC, seja no Mercosul.

Desta forma, para regular as negociações entre os setores privados de

Brasil e Argentina foi institucionalizada, em agosto de 2003, a Comissão Bilateral de

Monitoramento de Comércio. A Comissão visa a abrir um canal de diálogo entre os

empresários dos dois países para que possam eventualmente negociar restrições

quantitativas ao comércio bilateral dos setores produtivos que apresentem assimetrias.

Desde 2003, durante as reuniões desta Comissão, foram negociados acordos de

restrição de exportações para, entre outros, eletrodomésticos da linha branca, produtos

têxteis, calçados e vinho. Seguem abaixo os principais aspectos dos acordos privados

de restrição voluntária às exportações, negociados entre o empresariado brasileiro e

argentino, desde a criação da Comissão.

4.1 Setor Têxtil

Cada um dos acordos do setor têxtil, negociados no âmbito da Comissão

de Monitoramento, teve suas particularidades. No caso do denim (tecido para a

confecção de jeans), foi fixada uma cota 15,8 milhões de metros lineares para as

importações provenientes do Brasil, sendo que em 2003 as importações foram de

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30

quase 20 milhões. No caso dos fios acrílicos, foi estabelecida uma restrição em termos

do preço mínimo (US$ 3,76 / kg), que começou a vigorar a partir de abril de 2004. No

que tange aos tecidos de algodão com fios coloridos, foi acordada uma cota de 980

toneladas/ano, quando em 2003 as importações oriundas do Brasil alcançaram 1380

toneladas. Por último, no caso dos tapetes foram estabelecidos preços mínimos em

função dos diferentes tipos de produtos.

4.2 Linha Branca

Em relação aos eletrodomésticos de linha branca também houve acordo

entre os setores privados para restringir as exportações brasileiras para a Argentina. As

vendas de fogões brasileiros foram limitadas a 95 mil unidades, cota válida até o final

de 2005, quando o acordo será renegociado. Para refrigeradores, em 2005, foi

negociada uma cota de 316.250 unidades, o que representa 50% do mercado

argentino. Este volume foi distribuído em 26.354 unidades por mês, com uma

flexibilidade de variação quantitativa de até 10% destes montantes mensais. O acordo

determina que as importações de terceiras origens não podem exceder 18.975

unidades anuais. Para as máquinas de lavar roupas foi negociada cota de 180 mil

unidades anuais com licença não-automática de importações, sendo dividida da

seguinte forma: 58% do total no primeiro semestre do ano e 42% no último.

4.3 Setor Calçadista

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Os fabricantes argentinos e brasileiros de calçados fecharam um acordo que

limita as exportações brasileiras para o país vizinho aos 15,4 milhões de pares

embarcados em 2004. O acerto tem como condição que a produção brasileira não seja

substituída por produtos de terceiros fornecedores, especialmente da China, e também

prevê que a Argentina poderá usar licenças não-automáticas na importação de

calçados.

A limitação dos embarques brasileiros para a Argentina foi aceita ante o

compromisso das autoridades argentinas de monitorar as importações de terceiros

mercados. Caso elas cresçam, o Brasil também ganharia direito a uma cota maior.

A medida, que burocratiza as importações, permite que o governo controle o

fluxo de produtos brasileiros que ingressa no país e ponha travas toda vez que

considerar que há um aumento grande de embarques.

4.5 Setor Vinícola

Os produtores brasileiros vinham se queixando de que os vinhos

argentinos de baixa qualidade estavam chegando ao Brasil por um preço muito baixo,

prejudicando a indústria nacional. Inicialmente, o Brasil propôs um preço mínimo de

US$ 15 por caixa, enquanto os argentinos falavam em US$ 6. Os dois lados acabaram

concordando que o vinho argentino deve entrar no país com um preço mínimo de US$

8 dólares por caixa com 12 garrafas de 750 ml. cada. Este foi o primeiro acordo de um

setor em que a assimetria no comércio foi reclamada pelo Brasil.

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5. Considerações Finais

O processo de construção de uma união aduaneira implica vantagens e

desvantagens aos que optam por participar do empreendimento integrativo. Setores

economicamente menos competitivos inevitavelmente sentirão de forma mais

acentuada os impactos da abertura comercial. Quando se decide pela conformação de

um acordo regional nesses moldes, avaliam-se os custos decorrentes do processo, que

são inevitáveis, e, ainda assim, por uma opção política, julga-se conveniente prosseguir

caso os benefícios se sobreponham às desvantagens. Decididos pelo engajamento em

arranjos cooperativos dessa natureza, os Estados estabelecem as regras do jogo e

aderem a elas, mesmo diante dos prejuízos pontuais que necessariamente advêm do

processo.

Por várias razões, as regras do jogo definidas no âmbito do Mercosul

parecem excessivamente sujeitas às vicissitudes políticas de seus sócios maiores.

Entre os motivos para isso está justamente o fato de que os rumos e o ritmo do

processo integrativo são, a bem da verdade, definidos por apenas dois parceiros. O

Mercosul, com efeito, ressente-se de maior grau de institucionalidade, de maior

estabilidade jurídica, de segurança e previsibilidade. Excessivamente preso às

circunstâncias políticas dos dois sócios, o Mercosul depende, a todo momento, da

convergência de interesses entre seus membros para avançar. E, o que é mais sensível

para o sucesso da empreitada, o interesse de um dos membros é capaz de determinar

não apenas interrupções, mas também retrocessos no avançar rumo à consolidação de

um mercado comum.

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A discussão sobre a possibilidade de se empregar salvaguardas ao

comércio intra-Mercosul se opera nesse contexto. Como se viu, a rigor, as salvaguardas

ao comércio intrabloco deveriam ser eliminadas até janeiro de 1995. Não obstante, em

1994, decidiu-se por estender-lhes a vigência até 1o janeiro de 1999. Mesmo após ter

expirado o prazo dilatado, medidas dessa natureza foram adotadas no comércio intra-

zona. A salvaguarda argentina contra produtos têxteis importados de países do

Mercosul motivou um contencioso no sistema de solução de controvérsias do bloco,

que esclareceu (se é que havia dúvidas) não haver fundamento jurídico para a

aplicação das medidas a partir de 1999.

Diante da impossibilidade, à luz das regras acordadas pelos próprios

membros do Mercosul, de se restringir o comércio intrazona, a Argentina faz pressão

para que justamente se alterem essas regras. E, naturalmente, as regras seriam

alteradas não para acelerar o processo rumo aos objetivos definidos, mas para se

flexibilizá-lo, atendendo às necessidades políticas e econômicas de um dos países

capazes de, como observado, orientar a ação do bloco.

De fato, o momento por que passa a Argentina tem sua sensibilidade

econômica e política. Apesar de já ter passado pela fase mais aguda da crise

econômica que afetou o país principalmente entre 2001 e 2002, a Argentina dos dias de

hoje busca promover políticas que estimulem a recuperação do setor produtivo do país

arrasado pelas medidas econômicas dos anos 90. Para isso, é fundamental, na visão

argentina, ter um controle maior sobre o comércio com o Brasil e, se possível,

institucionalizar algum tipo de mecanismo de limitação das relações comerciais entre os

principais parceiros do bloco do Cone Sul.

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Se desde 1999, quando da desvalorização do real, a Argentina já cogitava

implementar medidas para restringir os fluxos comerciais intrazona, nos dias de hoje,

em que a recuperação da economia argentina é prioridade absoluta para o governo do

país, o discurso pró-salvaguardas ganha novo vigor e, mais, adquire tom por vezes

ameaçador. O governo argentino, especialmente sensível às demandas dos setores

empresariais, faz repercutir nas suas relações com o Brasil a pressão que sofre

internamente.

A indústria argentina, de fato, tem encontrado no governo local importante

interlocutor na busca de restabelecer as condições econômicas para o crescimento do

país. A capacidade do setor privado argentino em se articular e pressionar o governo é

grande, não só pela necessidade de recuperação do setor, mas também pela

sensibilidade do governo aos problemas domésticos. A julgar pela avaliação da

imprensa local, o governo argentino tem colhido bons frutos com esta postura, à medida

que consiga influenciar o processo de integração regional para que seja flexibilizado,

acomodando os interesses convergentes do setor privado e do Estado.

O Mercosul, sempre sujeito às circunstâncias políticas e econômicas de

seus parceiros principais, precisou se adaptar ao novo momento e, assim, acomodar,

da forma menos prejudicial à evolução do bloco, as novas necessidades de seus

parceiros. A busca de uma solução conciliatória tomou corpo na Comissão Bilateral de

Monitoramento de Comércio, por meio da qual os governos abrem ao setor privado dos

países a possibilidade de chegarem ajustes que atenuem as assimetrias existentes em

diversos setores da economia de Brasil e Argentina.

Como se viu ao longo deste artigo, acordos entre os governos para

restringir exportações são incompatíveis com as regras da OMC. Também se observou

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que, no momento, não há fundamento legal para a adoção de salvaguardas no

comércio regional. Ainda que muitos sustentem ser viável, à luz das regras da OMC, a

adoção de um mecanismo de salvaguardas intra-Mercosul, vale lembrar que a

possibilidade jurídica não se traduz necessariamente em conveniência política. Assumir

compromisso dessa ordem significa confirmar o retrocesso do Mercosul. Se, diante das

circunstâncias atuais, entende-se adequada a adoção de algum instrumento que

permita proteção temporária às indústrias argentinas, perenizar mecanismo para esse

fim implicaria institucionalizar o recuo do Mercosul.

Neste contexto, a opção pela criação da Comissão de Monitoramento de

Comércio parece solução politicamente conveniente, economicamente adequada e

juridicamente viável para atender às circunstâncias temporárias por que passa a

Argentina. Como mecanismo que permite ajustes ad hoc, evita institucionalizar a

involução do bloco. Ao possibilitar acordo entre particulares, afasta problemas jurídicos,

seja no âmbito do Mercosul, seja da OMC. E, ao conciliar diferentes interesses

econômicos, permite o avançar – mesmo que lento – do bloco, ao diluir conflitos

comerciais em potencial.

Há, de fato, uma defasagem entre o processo de integração hoje possível

e aquele eventualmente desejado por seus parceiros (ao menos no plano do discurso).

Os crescentes desentendimentos entre os dois principais sócios do Mercosul ameaçam

de forma consistente o cumprimento das etapas programadas para ampliar a integração

comercial no bloco. Não há dúvida de que o Brasil perde muito, pois, como a economia

mais importante da região, precisa consolidar as trocas comerciais com seus vizinhos

da forma mais estável e duradoura possível.

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O histórico das experiências de integração na América do Sul sugere

haver o risco de se inviabilizar a iniciativa da integração regional, à medida que se lhe

imprima um ritmo incompatível com a realidade dos países que dela façam parte.

Parece, enfim, sensato saber dotar o processo de integração regional da flexibilidade

necessária para que ele não se torne impraticável.