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TEORIA D
O
CONHECIMENTO
AULA 02
DOGMATISMO E
CETICISMO
Por dogmatismo (do grego
dógma - doutrina estabelecida)
entendemos a posição
epistemológica para a qual o
problema do conhecimento não
chega a ser levantado.
A possibilidade e a realidade
do contato entre sujeito e
objeto são pura e
simplesmente pressupostas.
É auto-evidente que o
sujeito apreende seu
objeto, que a consciência
cognoscente apreende
aquilo que está diante dela.
Esse ponto de vista é
sustentado por uma
confiança na razão humana
que ainda não foi acometida
por nenhuma dúvida.
O fato de que, para o
dogmatismo, o conhecimento
não chega a ser um
problema, repousa sobre uma
visão errônea da essência do
conhecimento.
O contato entre sujeito e
objeto não pode parecer
questionável se não se vê
que o conhecimento
apresenta-se numa relação.
É o que ocorre com o
dogmático. Ele não vê que o
conhecimento é,
essencialmente, uma relação
entre sujeito e objeto.
Ao contrário, acredita que
os objetos de conhecimento
nos são dados como tais, e
não pela função mediadora
do conhecimento (e apenas
por ela).
Ele desconsidera esta
última. E isso vale não
apenas para o campo da
percepção, mas também
para o do pensamento.
Segundo a concepção do
dogmatismo, os objetos da
percepção nos seriam dados
diretamente, corporeamente, e
assim também os objetos do
pensamento.
Num caso desconsidera-se a
percepção por meio da qual
determinados objetos nos são
dados; no outro, desconsidera-
se a função pensante.
O mesmo ocorre quanto ao
conhecimento dos valores.
Também os valores estão,
para o dogmático, pura e
simplesmente aí.
O fato de pressuporem uma
consciência valorativa
permanece, para ele, tão oculto
quanto o fato de todos os objetos
de conhecimento exigirem uma
consciência cognoscente.
Aqui como lá, ele
desconsidera o sujeito e
sua função.
Pode-se falar de um dogmatismo
teórico, ético e religioso. A
primeira forma de dogmatismo
diz respeito ao conhecimento
teórico; as duas últimas, ao
conhecimento dos valores.
O dogmatismo ético lida
com o conhecimento moral;
o religioso, com o
conhecimento religioso.
Sendo a atitude do homem
ingênuo, o dogmatismo é,
tanto psicológica quanto
historicamente, o primeiro e
mais antigo dos pontos de
vista.
No período inicial da filosofia
grega, ele predominou de
modo quase generalizado.
As reflexões epistemológicas
estão, de modo geral, afastadas
do pensamento dos pré-
socráticos (os filósofos jônios
da natureza, os eleatas,
Heráclito, os pitagóricos).
Esses pensadores são
inspirados ainda por uma
confiança ingênua na
eficiência da razão humana.
Completamente voltados para
os entes, para a natureza, não
percebem o conhecimento
como problema. Isso só irá
acontecer com os sofistas.
Eles levantam pela primeira vez
o problema do conhecimento e
tornam o dogmatismo, tomado
em sentido estrito, para sempre
impossível no campo da filosofia.
Dos sofistas em diante,
encontraremos em todos os
filósofos, de uma forma ou de
outra, reflexões críticas sobre
o conhecimento.
É verdade que Kant acreditava
que a designação "dogmatismo"
deveria ser aplicada aos
sistemas metafísicos do século
XVII (Descartes, Leibniz, Wolff).
Dogmatismo, para ele, é fazer
metafísica sem ter antes
examinado a capacidade da
razão humana. Neste sentido,
os sistemas pré-kantianos da
filosofia moderna são, de fato,
dogmatismos.
Isso não quer dizer que falte a
esses sistemas toda e qualquer
reflexão epistemológica e que
ainda não tenham percebido o
problema do conhecimento em
geral.
Isso acontece em todos eles,
como mostram as discussões
epistemológicas em
Descartes e Leibniz.
Não se deve falar aqui num
dogmatismo geral e axiomático,
mas num dogmatismo especial.
Não se trata de um dogmatismo
lógico, mas de um dogmatismo
metafísico.
Enquanto o dogmático encara a
possibilidade de contato entre
sujeito e objeto como auto-
evidente, o cético a contesta.
CETICISMO
Para o ceticismo, o sujeito não
seria capaz de apreender o
objeto. O conhecimento como
apreensão efetiva do objeto
seria, segundo ele, impossível.
Por isso, não podemos
fazer juízo algum; ao
contrário, devemos nos
abster de toda e qualquer
formulação de juízos.
Enquanto o dogmatismo de um
certo modo desconsidera o
sujeito, o ceticismo não enxerga
o objeto. Seu olhar está colado
de modo tão unilateral ao
sujeito, à função cognoscente,
que desconhece por completo a
referência ao objeto.
Sua atenção está sempre
completamente direcionada
aos fatores subjetivos do
conhecimento humano.
Ele observa que todo
conhecimento é condicionado por
peculiaridades do sujeito e de
seus órgãos de conhecimento,
bem como por circunstâncias
externas (meio ambiente,
cultura).
Com isso, desaparece de
sua vista o objeto, que é, no
entanto, necessário para que
aconteça o conhecimento,
que significa exatamente
uma relação entre um sujeito
e um objeto.
Como o dogmatismo, o
ceticismo também pode estar
associado tanto à possibilidade
do conhecimento em geral
quanto de um conhecimento
determinado.
No primeiro caso, estamos
diante de um ceticismo lógico,
também chamado ceticismo
absoluto ou radical. Se referir-
se apenas ao conhecimento
metafísico, falaremos de
ceticismo metafísico.
Com respeito ao campo dos
valores, distinguimos o ceticismo
ético do ceticismo religioso. Para
o primeiro, o conhecimento ético
é impossível; para o segundo, o
religioso.
Finalmente, cabe distinguir
ainda o ceticismo metódico do
sistemático. Aquele está
relacionado a um método; este,
a uma posição de princípio.
Esses tipos de ceticismo não
passam de diferentes formas
dessa posição de princípio.
Mas o ceticismo metódico
consiste em pôr em dúvida tudo
que aparece como certo e
verdadeiro à consciência natural,
eliminando toda a inverdade e
atingindo um conhecimento
absolutamente seguro.
É, sobretudo na Antiguidade
que o ceticismo pode ser
encontrado. Seu fundador é
Pirro de Élis (360-270 a.C.).
Segundo ele, não ocorre
contato entre sujeito e objeto.
A apreensão do objeto é
vedada à consciência
cognoscente. Não há
conhecimento. De dois juízos
contraditórios, um é
exatamente tão verdadeiro
quanto o outro.
Isso representa uma negação
das leis lógicas do pensamento,
em especial do princípio de
contradição. Como não há juízo
ou conhecimento verdadeiro,
Pirro recomenda a suspensão
do juízo, a epokhé.
Não tão radical quanto
este ceticismo antigo ou
pirrônico é o ceticismo
médio ou acadêmico de
Arcesilau (241 a.C.) e
Carnéades (129 a.C.).
Um conhecimento no sentido
estrito, segundo eles, é
impossível. Sendo assim, não
devo mais dizer que esta ou
aquela proposição é verdadeira,
mas sim que parece ser
verdadeira, que é verossímil.
Portanto, não há certeza no
sentido estrito, mas apenas
verossimilhança. Este ceticismo
médio distingue-se do antigo
exatamente por estabelecer a
possibilidade de se chegar a
uma opinião verossímil.
O ceticismo mais recente, cujos
principais representantes são
Enesidemo (séc. I a.C.) e Sexto
Empírico (séc. II d.C.),
envereda novamente pelo
caminho do ceticismo pirrônico.
O ceticismo também pode ser
encontrado na filosofia
moderna. O que encontramos
aqui, porém, é um ceticismo
mais específico e não aquele
outro, radical e absoluto.
No filósofo francês Montaigne
(1592), deparamos com um
ceticismo, sobretudo ético; em
Hume, com um ceticismo
metafísico.
Em Bayle tampouco
encontraremos um ceticismo no
sentido de Pirro, mas, no máximo,
no sentido do ceticismo médio.
Em Descartes, que proclama os
direitos da dúvida metódica,
temos um ceticismo metódico e
não de princípio.
É palpável que o ceticismo
radical ou absoluto é
autodestruidor. Ele afirma que
o conhecimento é impossível.
Com isso, porém, ele
expressa um conhecimento.
Consequentemente, trata o
conhecimento como sendo, de
fato, possível, mas, ao mesmo
tempo, afirma que ele é
impossível. O ceticismo padece,
assim, de autocontradição.
O cético poderia certamente
encontrar uma saída. Poderia
indicar o juízo "o
conhecimento é impossível"
como duvidoso e dizer: não
há nenhum conhecimento, e
mesmo isto é duvidoso.
Também aqui, porém, há um
conhecimento sendo expresso,
a saber, o conhecimento de
que é duvidoso que haja
conhecimento.
Por um lado, portanto, a
possibilidade do conhecimento
será afirmada pelo cético e, por
outro, será posta em dúvida.
No fundo, encontramo-nos
diante da mesma
autocontradição de antes.
Conforme os céticos antigos
já reconheciam, o
representante do ceticismo só
pode contornar a
autocontradição revelada há
pouco se suspender o juízo.
A rigor, porém, nem isso basta.
O cético não pode, na verdade,
realizar nenhum ato de
pensamento, pois tão logo o
faça estará pressupondo a
possibilidade do conhecimento
e enredando-se, assim, na
mesma autocontradição.
A aspiração ao conhecimento da
verdade é, do ponto de vista do
ceticismo estrito, desprovida de
sentido e de valor. Nossa
consciência ética dos valores,
porém, protesta contra essa
concepção.