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Ciência Veterinária nos Trópicos, Recife-PE, v. 18, n. 1 p. 27-32 - janeiro/abril, 2015

Determinação das variáveis fisiológicas e bioquímicas de equinos Mangalarga Marchador durante prova oficial de marchaMayra Carla Pedrosa da SILVA1, Carolina BERKMAN2, Peres Ramos BADIAL3, Emílio Carlos Leão Bittencourt SARMENTO1, Nielma Gabrielle Fidelis OLIVEIRA4, Ulisses Barbosa RAPHAEL4, Jéssica Monteiro Queiróz de MEDEIROS4, Luisa Gouvêa TEIXEIRA*5.

RESUMO

Objetivou-se avaliar os efeitos da prova de marcha nas variáveis fisiológicas e bioquímicas de equinos e compará-los entre os dois tipos de marcha (picada e batida). Aferiu-se a frequência cardíaca (FC), temperatura retal (TR), lactatemia e glicemia de 18 cavalos atletas, Mangalarga Marchadores, machos, divididos nas categorias de Cavalo Júnior e Cavalo Jovem. Em cada uma destas, cinco animais realizaram marcha picada e quatro realizaram marcha batida. Os dados foram coletados 60 minutos antes da prova (T0), um (T1), cinco (T2) e dez minutos (T3) após o término desta. Os dados foram analisados pelo ANOVA, com nível de probabilidade de 5%, e para as diferenças entre as médias utilizou-se o Teste de Tukey (p≤0,05). Observou-se aumento significativo apenas da FC no T1 e da TR nos T1 a T3, exceto em Júnior Marcha Picada. Não houve diferença significativa entre as marchas. Conclui-se que os equinos estavam aptos para exercer tais provas e que a execução da marcha picada ou da batida exigiu o mesmo condicio-namento físico.

P A L A V R A S - C H A V E glicemia, lactatemia, marcha picada, marcha batida.

Physiological and biochemical findings in Mangalarga Marchador horses during official competition of marcha

ABSTRACT

We evaluated the gait competition effects on some physiological and biochemical para-meters in Mangalarga-Marchador horses, and compared these findings between two gait types (marcha picada and marcha batida). Heart rate (HR), rectal temperature (RT), lactatemia, and glycemia were measured in 18 athlete male horses subdivided in two categories (Júnior and Jovem). Each category was comprised of five and four animals performing marcha picada and marcha batida, respectively. The variables were measured 60 minutes before (T0), and one (T1), five (T2) and ten (T3) minutes after the competition. Data were analyzed using ANOVA fol-lowed by Tukey’s test considering significance level at P=0.05. The HR and RT increased sig-nificantly on T1, and from T1 to T3, respectively, when compared to T0 in all groups except one (Júnior category, marcha picada). There was no significant changes between groups. We conclude that all horses were well trained and conditioned to perform the competition. Also, the same conditioning level is necessary to perform marcha picada or marcha batida.

K E Y W O R D S glycemia, lactatemia, marcha picada, marcha batida.

1 Médico(a) Veterinário(a) autônomo(a).

2 Docente do Departamento de Diagnóstico por Imagem da UFMT, Sinop, MT.

3 Postdoctoral Research Associate Mississipi State University, College of Veterinary Medicine Department of Pathobiology and Population Medicine Starkville, MS, US.

4 Graduando(a) do Curso de Medicina Veterinária do Centro Universitário Cesmac, Marechal Deodoro, AL.

5 Docente do Curso de Medicina Veterinária do Centro Universitário Cesmac, Marechal Deodoro, AL e Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Cirurgia Veterinária da FCAV/UNESP, Jaboticabal, SP.

*Autora para correspondência: [email protected]

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Determinação das variáveis fisiológicas e bioquímicas de equinos Mangalarga Marchador durante prova oficial de marcha

INTRODUÇÃO

No Brasil, a população de equinos é estimada em aproxi-madamente 5,5 milhões de cabeças, sendo a quarta maior do mundo (IBGE, 2015). Os equinos são utilizados em diversas áreas esportistas e este setor do agronegócio movimenta anual-mente, em média, R$ 705 milhões e emprega cerca de 20 mil pessoas. Nas últimas décadas, o setor esportivo desenvolveu- se rapidamente, contribuindo para o aumento do estudo da fisio-patologia do exercício equino (LIMA et al., 2006). No entanto, devido à grande variedade de esportes e das raças de cavalos, torna-se importante a avaliação dos animais praticando as suas atividades físicas em condições de campo para que se estabele-çam programas de nutrição e condicionamento físico (WAN-DERLEY et al., 2010).

A raça Mangalarga Marchador é a mais populosa do Bra-sil, havendo aproximadamente 350.000 equinos registrados (WANDERLEY et al., 2010). Poucas pesquisas são realizadas com esta raça, cujo andamento característico é a marcha. Du-rante as provas equestres desta modalidade, o animal realiza exercício de longa duração, em um percurso em círculo, sem repouso e em velocidade constante, considerado exaustivo e de grande gasto energético (GAMA et al., 2012).

O estudo de variáveis fisiológicas como frequência cardía-ca (FC) e temperatura retal (TR), e das variáveis bioquímicas como o lactato e glicose sanguíneos, auxiliam na determina-ção do grau de condicionamento e dos gastos energéticos de equinos atletas durante o esforço físico (ROGERS et al., 2007; EVANS et al. 2007; FERRAZ et al., 2010). Estas variáveis, quan-do relacionadas, tornam-se uma importante ferramenta para avaliar o tipo de via metabólica utilizada durante o exercício (DAVIE et al., 2000; VERMEULEN et al., 2006).

A utilização de testes para a avaliação do desempenho atlético, realizados a campo (pista), adicionado a avaliação das respostas fisiológicas obtidas pela ação do exercício e do trei-namento, pode ser considerada uma valiosa ferramenta para maximização dos resultados obtidos nas competições. Desta forma, o programa de treinamento deixa de ser realizado so-mente de maneira empírica tornando-se um processo técni-co, com embasamento clínico e fisiológico (SANTOS, 2006; ERCK et al., 2007). No entanto, pouco se tem estudado sobre a influência do tipo de prova equestre nas variáveis fisiológicas e bioquímicas, em cavalos de marcha.

A partir do presente estudo, objetivou-se avaliar em cavalos Mangalarga Marchadores os efeitos da prova de marcha em re-lação às variáveis fisiológicas (FC e TR) e bioquímicas (lactato e glicose plasmáticos) de cada categoria, além de compará-los entre os dois tipos de marcha (picada e batida).

MATERIAL E MÉTODOS

ANIMAIS

Durante prova oficial de marcha realizada no Parque de Exposições José da Silva Nogueira, situado na cidade de Ma-ceió - AL, foram avaliados 18 equinos Mangalarga Marchado-

res, machos, em plena atividade atlética, distribuídos em duas categorias, sendo Cavalo Júnior (30 a 36 meses de idade) e Cavalo Jovem (36 a 54 meses de idade). Em cada uma destas categorias, cinco animais realizaram marcha picada e quatro animais marcha batida.

PROCEDIMENTOS

As aferições dos parâmetros físicos, ambientais e coletas de sangue foram realizadas 60 minutos antes do início de cada prova de marcha (T0), um (T1), cinco (T2) e dez minutos (T3) após o término destas. Realizou-se a aferição da FC (batimen-tos por minuto - bpm) por meio de estetoscópio, da TR (ºC) utilizando-se termômetro digital e do tempo de cada prova (min.) com o cronômetro digital. Foram mensuradas, com auxílio de termo-higrômetro digital, a temperatura do ar e a umidade do ambiente no qual foi realizada a prova equestre.

A partir de um banco de amostras pertencente à Associa-ção Alagoana dos Criadores do Cavalo Mangalarga Marcha-dor (AACCMM), filiada à Associação Brasileira dos Criadores do Cavalo Mangalarga Marchador (ABCCMM), as amostras plasmáticas sanguíneas congeladas foram gentilmente cedidas para este estudo. Previamente, estas foram coletadas por meio de venopunção jugular à vácuo, em frascos estéreis conten-do fluoreto de sódio, e centrifugadas a 1000 x g durante cin-co minutos para obtenção apenas do plasma sanguíneo. Este foi acondicionado em microtubos de 1,5 mL e congelado em freezer a -20 ºC. Posteriormente, as amostras foram analisadas a partir do analisador bioquímico semi-automático (Bioplus 200F®) utilizando- se kits comerciais para mensuração do lac-tato (Liquiform, Labtest®, Ref. 116-1/40) e glicose (PAP Liqui-form, Labtest®, Ref. 84-1/500) plasmáticos.

ANÁLISE ESTATÍSTICA

Os dados obtidos foram submetidos a testes paramé-tricos, por meio da análise de variância em blocos (ANOVA) e as médias submetidas ao Teste de Tukey. As médias relacio-nadas aos equinos em repouso (T0) com os demais momentos (T1, T2 e T3), foram comparadas em uma mesma categoria e tipo de marcha. O efeito do tipo de marcha (picada versus ba-tida) foi comparado em cada categoria e no mesmo momento de avaliação. A análise estatística foi realizada utilizando-se o programa SAS (Statistical Analysis System®), considerando-se nível de probabilidade de 5% (p≤0,05).

RESULTADOS

A temperatura ambiente média foi de 26,69 ± 1,56 °C e a umidade do ar de 80,0 ± 0,08 % no dia da execução das provas de marcha, as quais foram realizadas no tempo médio de 18,88 ± 0,25 minutos para as categorias Cavalo Jovem ou Júnior, tanto marcha batida quanto picada.

Os valores da FC apresentaram aumento significativo (p≤0,05) apenas no T1 quando comparadas ao T0, nas cate-gorias Cavalo Jovem Marcha Batida (tabela 1), Cavalo Jovem

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Mayra Carla Pedrosa da Silva et al.

Marcha Picada (tabela 2) e Cavalo Júnior Marcha Batida (ta-bela 3). A categoria de Cavalo Júnior Marcha Picada (tabela 4) não apresentou alteração significativa (p>0,05) da FC. Adicio-nalmente, observou-se o declínio dos valores da FC (p>0,05) nos momentos T2 e T3, se comparado ao T0, em todas as ca-tegoria e tipos de marcha, apresentando-se próximo ao T0 aos dez minutos após o término da prova (T3).

Em relação aos resultados da TR, observou-se diferen-ça significativa (p≤0,05) nos momentos T1, T2 e T3, quando

comparados ao T0, para as categorias Cavalo Jovem Marcha Batida (tabela 1) e Cavalo Jovem Marcha Picada (tabela 2) e Cavalo Júnior Marcha Batida (tabela 3). A categoria Cavalo Jú-nior Marcha Picada (tabela 4) apresentou aumento significati-vo (p≤0,05) somente em T1, para esta variável. No entanto, ao avaliarmos os valores da TR nas diferentes categorias, pode-se observar que houve a diminuição de T3 para T1, sendo em T1 o maior valor após a prova de marcha, para esta variável.

Os valores do lactato plasmático do presente estudo não

Momento da Coleta Frequência cardíaca (bpm) Temperatura retal (ºC) Lactato (mmol/L) Glicose (mmol/L)

T0 44,00±4,90a 37,90±0,19a 1,61 ± 0,42a 5,52±0,47a

T1 67,50±3,30b 39,63±0,29*b 2,89±0,42a 6,72±0,58a

T2 57,75±5,72ab 39,53±0,19b 3,02±0,67a 6,64±0,41a

T3 49,25±4,11ab 39,00±0,08b 3,02±0,70a 6,99±0,29a

Médias seguidas por letras diferentes, nas colunas, diferem entre si pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade (P<0,05). *(P<0,01). T0 = 60 minutos antes da prova de marcha; T1 = um minuto, T2 = cinco minutos e T3 = 10 minutos após o término da prova de marcha.

Momento da Coleta Frequência cardíaca (bpm) Temperatura retal (ºC) Lactato (mmol/L) Glicose (mmol/L)

T0 39,20±2,33a 37,88±0,17a 1,11±0,09a 5,19±0,43a

T1 73,80±4,15*b 39,66±0,23*b 3,06±0,70a 6,44±0,80a

T2 58,60±4,47ab 39,02±0,33b 2,84±0,60a 6,27±0,82a

T3 52,20±2,76ac 38,98±0,21b 2,04±0,42a 5,52±0,56a

Médias seguidas por letras diferentes, nas colunas, diferem entre si pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade (P<0,05). *(P<0,01). T0 = 60 minutos antes da prova de marcha; T1 = um minuto, T2 = cinco minutos e T3 = 10 minutos após o término da prova de marcha.

Tabela 2 - Médias ± desvios-padrão obtidos para a frequência cardíaca, glicose, lactato e temperatura retal de equinos da raça Mangalarga Mar-chador e categoria Cavalo Jovem Marcha Picada.

Tabela 1 - Médias ± desvios-padrão obtidos para a frequência cardíaca, glicose, lactato e temperatura retal de equinos da raça Mangalarga Mar-chador e categoria Cavalo Jovem Marcha Batida.

Tabela 3 - Médias ± desvios-padrão obtidos para a frequência cardíaca, glicose, lactato e temperatura retal de equinos da raça Mangalarga Mar-chador e categoria Cavalo Júnior Marcha Batida.

Momento da Coleta Frequência cardíaca (bpm) Temperatura retal (ºC) Lactato (mmol/L) Glicose (mmol/L)

T0 43,00±6,61a 37,93±0,09a 1,78±0,30a 5,33±0,14a

T1 70,50±5,62b 39,65±0,33*b 4,11±1,67a 6,38±0,17a

T2 56,75±6,21ab 39,38±0,35b 4,16±2,17a 6,14±0,28a

T3 50,75±5,44ab 39,38±0,21b 3,64±1,65a 6,34±0,25a

Médias seguidas por letras diferentes, nas colunas, diferem entre si pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade (P<0,05). *(P<0,01). T0 = 60 minutos antes da prova de marcha; T1 = um minuto, T2 = cinco minutos e T3 = 10 minutos após o término da prova de marcha.

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apresentaram diferença estatística (p>0,05), apesar do maior valor destes em T1, T2 e T3 se comparados ao T0, nas catego-rias de Cavalo Jovem Marcha Batida (tabela 1), Cavalo Jovem Marcha Picada (tabela 2), Cavalo Júnior Marcha Batida (tabe-la 3) e Cavalo Júnior Marcha Picada (tabela 4). Também foi possível verificar que os níveis desta variável apresentaram-se menores em T3 do que em T1, tendendo ao retorno aos valores basais aos 10 minutos após o exercício.

Os valores de glicose plasmática nas categorias Cavalo Jo-vem Marcha Batida (tabela 1), Cavalo Jovem Marcha Picada (tabela 2), Cavalo Júnior Marcha Batida (tabela 3) e Cavalos Júnior Marcha Picada (tabela 4) não apresentaram diferença estatística (p>0,05) nos diferentes momentos após o exercício, se comparados ao T0. No entanto, o aumento foi observado nos valores da glicose em T1, T2, e T3, nas duas categorias e tipos de marchas, apesar de não significativo (p>0,05). Neste estudo, a média de aumento dos valores da glicose nas diferen-tes categorias e tipos de marcha durante o T1 foi de 20 % em relação ao T0, exceto para Cavalo Júnior Marcha Picada, que foi de 14%.

Comparando os dois tipos de marcha (Picada versus Ba-tida) não foi observada diferença estatística (p>0,05) entre as categorias Cavalo Júnior e Cavalo Jovem nos momentos T0, T1, T2 e T3 para as variáveis analisadas (FC, TR, lactato e gli-cose). Logo, neste estudo, os resultados desta comparação não foram apresentados em forma de tabela, visto que não houve diferença significativa.

DISCUSSÃO

O aumento dos valores da FC é fisiologicamente mediado por estímulos ao sistema nervoso simpático, a partir da libe-ração das catecolaminas durante o exercício e captação destas pelos receptores β-adrenérgicos, produzindo assim alteração desta variável (MARTÍNEZ et al., 2009). Os resultados relati-vos à FC no presente estudo, corroboram aqueles obtidos por Wanderley et al. (2006) e Gomes et al. (2015), os quais relatam aumento significativo desta em equinos, imediatamente após o término de prova de marcha e vaquejada, respectivamente, com diminuição da FC para valores próximo ao basal, aos

quinze minutos de repouso. Pode-se inferir que recuperação do ritmo cardíaco dentro dos primeiros dez minutos após o término de uma prova equestre ocorre em cavalos bem condi-cionados ao exercício (FLAMÍNIO e RUSH, 1998). Além disto, sugere-se que o rápido retorno da FC demonstra também que não houve superaquecimento corpóreo como consequência deste (GOMES et al., 2015).

A ausência de alteração significativa da FC observada no grupo Cavalo Júnior Marcha Picada indica que a intensidade do exercício não foi suficiente para alterá-la e que estes ani-mais podem estar mais condicionados em relação aqueles dos demais grupos.

Os valores da TR registrados neste estudo corroboram aqueles descritos por Lopes et al. (2009) e Gomes et al. (2015), os quais também observaram aumento significativo (p≤0,05) da TR após o exercício em cavalos da raça Quarto de Milha, submetidos à prova de vaquejada. McConaghy (1994) e Mc-Cutcheon e Geor (2008), relatam que após 10 minutos do fim de exercícios extenuantes, a TR dos equinos fica em torno de 39ºC a 40ºC e deve diminuir nos 10 a 20 minutos seguintes, corroborando os resultados apresentados no presente estudo. Isto indica que os animais estavam retornando a TR para o basal, não sendo observado aumento progressivo da TR após o término do exercício.

Os equinos possuem mecanismos termorregulatórios ela-borados que são capazes de manter a temperatura corpórea interna, apesar dos efeitos ambientais (McCONAGHY, 1994). Assim, a atividade física produz energia térmica suficiente para elevar a temperatura corporal em até 5°C, sendo que este calor é difundido pelo sangue em direção à pele e trato respiratório, para dissipação por meio da sudação e evaporação. No entanto, durante o exercício físico cansativos, a taxa de calor produzido excede a taxa de dissipação, podendo elevar a temperatura em até 1ºC por minuto (JONES, et al. 2006).

A ausência de alterações significativas nas concentrações de lactato também foram observadas por Rizzo et al. (2008) ao avaliar éguas Mangalarga Marchadoras submetidas a prova de marcha, concordando com os resultados desta pesquisa para essa variável. No entanto, Wanderley et al. (2010) e Gama et al. (2012), examinando cavalos desta mesma raça após prova experimental de marcha, demonstram o aumento significati-

Momento da Coleta Frequência cardíaca (bpm) Temperatura retal (ºC) Lactato (mmol/L) Glicose (mmol/L)

T0 44,80±4,96a 38,56±0,33a 3,02±1,50a 5,42±0,45a

T1 64,60±5,47a 39,92±0,11b 3,31±0,44a 6,18±0,38a

T2 56,80±5,12a 39,46±0,21ab 2,86±0,45a 5,94±0,45a

T3 51,00±3,90a 39,40±0,19ab 2,71±0,43a 6,00±0,64a

Médias seguidas por letras diferentes, nas colunas, diferem entre si pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade (P<0,05). T0 = 60 minutos antes da prova de marcha; T1 = um minuto, T2 = cinco minutos e T3 = 10 minutos após o término da prova de marcha.

Tabela 4 -Médias ± desvios-padrão obtidos para a frequência cardíaca, glicose, lactato e temperatura retal de equinos da raça Mangalarga Marchador e categoria Cavalo Júnior Marcha Picada.

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Mayra Carla Pedrosa da Silva et al.

vo do lactato plasmático imediatamente e aos cinco minutos, respectivamente, após o exercício. Este fato deveu-se, provavel-mente, ao maior tempo de prova aos quais os equinos foram submetidos, se comparados ao presente estudo.

A redução observada nos níveis plasmáticos de lactato du-rante o T3 desta pequisa, tendendo aos valores basais, apesar de não significativa, foi semelhante aquela descrita por Wan-derley et al. (2010), os quais também relataram a diminuição destes após 15 minutos do término da simulação da prova de marcha, à campo.

O lactato é uma variável sanguínea importante para ser analisada, pois serve de parâmetro para todos os tipos de trei-namento, podendo ser um fator limitante durante a atividade atlética (HYYPPA et al., 1997). O aumento do lactato plasmá-tico superior a 4,0 mmol/L é indicativo de exercício de curta duração e alta intensidade, sendo a produção de energia rea-lizada por via anaeróbia. Os exercícios de intensidade mode-rada (submáxima) e longa duração caracterizam aumentos plasmáticos entre 2,5 e 4,0 mmol/L, com predominância do metabolismo aeróbio (GAMA et al., 2012). As concentrações do lactato abaixo do limiar de anaerobiose justificam os resul-tados encontrados neste experimento possibilitando classificar o tipo de exercício realizado pelos equinos do presente estudo, como submáximo.

Desta forma, a avaliação da concentração de lactato plas-mático pode ser um parâmetro empregado para indicar o condicionamento atlético de cavalos, visto que animais que apresentam grande capacidade aeróbia geralmente possuem baixas elevações das concentrações de lactato em resposta ao exercício, justificando os presentes resultados (GAMA et al., 2012). Assim, cavalos bem treinados absorvem melhor o lacta-to, após o esforço físico, se comparados aos não treinados. Em um organismo sadio, a produção de lactato aumenta durante o exercício quando se necessita de mais energia por unidade de tempo, do que aquela produzida pelo metabolismo oxida-tivo. No entanto, o excesso de lactato causa a fadiga muscular (LINDNER, 2006; OÇANHA, 2011).

Os valores de glicose plasmática encontrados no presente delineamento, quando os equinos estavam em repouso (T0), estão dentro do intervalo considerado fisiológico para esta es-pécie, sendo de 4,16 a 6,18 mmol/L (COELHO et al., 2011). O aumento da glicose sanguínea após a execução de prova de marcha nesta pesquisa, corrobora aqueles citados por Silva et al. (2014), apesar do resultado destes ter sido significativo esta-tisticamente. Desta forma, infere-se que houve o aumento na glicemia apenas em decorrência da execução de atividade físi-ca, havendo a disponibilização de substrato energético para o trabalho muscular, no presente estudo.

O efeito do exercício sobre a concentração sanguínea da glicose é variável, dependendo do tipo e duração do exercício. Esta variável se eleva em decorrência do aumento da atividade de hormônios que regulam o metabolismo energético, como as catecolaminas e o glucagon que, ao serem liberados, provo-cam glicogenólise e gliconeogênese hepática. Neste processo metabólico há diminuição da liberação da insulina, que soma-dos ao efeito do cortisol, promovem um efeito hiperglicêmico (HYPPA et al., 1997).

Semelhante aos nossos resultados, Wanderley et al. (2010) encontraram valores de glicose sanguínea 20% maiores em ca-valos submetidos à simulação de prova de marcha à campo, quando comparado aqueles em repouso. Equinos melhor con-dicionados demonstram maiores valores de glicose durante a prova de marcha, em relação aqueles pouco condicionados (SILVA et al., 2014).

Wanderley et al. (2006), ao avaliarem cavalos Mangalarga Marchadores durante prova experimental de marcha picada e batida, relataram diferença significativa de FC, frequência res-piratória, volume globular sanguíneo e lactato plasmático, os quais foram maiores naqueles que realizaram marcha picada, diferindo do presente estudo. Estes autores sugerem que os animais deveriam estar mais adaptados ao exercício proposto e citam que a realização da marcha picada requer maior gasto de energia por produzir maior atrito e contato com a superfície do solo durante a locomoção, quando comparada à marcha ba-tida. No entanto, a partir dos resultados obtidos após compara-ção entre os dois tipos de marcha no presente estudo, pode-se inferir que o gasto energético e exigência de condicionamento físico para a realização da marcha picada e marcha batida foi o mesmo.

Deve-se considerar que os dados da presente pesquisa fo-ram coletados em uma prova oficial de marcha a campo e não durante simulação deste tipo de prova. Assim, os equinos deste estudo são atletas em plena atividade, fato que justifica o bom condicionamento ao tipo de prova realizada. Neste estudo não foram questionados os protocolos de treinamento ou nutri-cional dos cavalos. Acredita-se que haja relação direta do tipo de treinamento e alimentação com os resultados encontrados, visto que não houve prejuízos metabólicos para estes animais, após a prova. Assim, sugere-se a realização de estudos que rela-cionem o condicionamento físico de cavalos Mangalarga Mar-chadores durante prova de marcha, com protocolos de treina-mento e alimentar destes animais.

CONCLUSÃO

A realização da prova de marcha ocasionou alterações nos valores das variáveis fisiológicas dos equinos, retornando próximo aos valores basais aos dez minutos após o término do exercício. Este fato, aliado à ausência de aumento significativo dos valores das variáveis bioquímicas, faz-nos sugerir que os equinos do presente estudo estavam devidamente condiciona-dos para exercer as respectivas provas de marcha. Adicional-mente, infere-se que a execução da marcha picada ou da mar-cha batida exige o mesmo gasto energético e condicionamento físico dos cavalos Mangalarga Marchadores, quando estes são atletas.

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Determinação das variáveis fisiológicas e bioquímicas de equinos Mangalarga Marchador durante prova oficial de marcha

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