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jornaljornal

LINCEJornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton PaivaNº 56 | Outubro de 2013

UMA LIÇÃO DE VIDAUMA LIÇÃO DE VIDAENTRE RISOS E TRISTEZAS| PÁGINAS 12 À 14

UMA LIÇÃO DE VIDAGUINÉ BISSAU

PRAÇA 7

AQUI, MACHUCADO E FORTE,

BATE O CORAÇÃO DA CIDADE

| PÁGINA 08 E 9

MIGRANTES

RODOVIÁRIA É A PORTA

DA ESPERANÇA DE QUEM CHEGA

| PÁGINAS 10 E 11

ENTREVISTA

MARCELO BARRETO: NÃO ADIANTA

SER UMA WIKIPÉDIA AMBULANTE

| PÁGINAS 20 E 21

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2 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013

João Paulo Freitas

(4º período)

Lutam por liberdade, mas escondem sua

história. Gritam por Justiça, desde que ela

não os prejudique. Este é o novo método esco-

lhido por alguns de nossos bravos defensores

da “liberdade”. Tudo isso devido ao projeto de

lei que pretende alterar o artigo 20 do Código

Civil de 2012, incluindo um parágrafo que, no

caso de pessoas públicas, permite a publica-

ção de imagens e textos com finalidade bio-

gráfica sem a autorização do biografado ou de

seus familiares.

Pessoas de quem, antes, eu sentia orgu-

lho de chamar compatriotas, hoje nem

mesmo sei quem são. Sim, me refiro princi-

palmente aos grandes nomes da MPB: Cae-

tano Veloso e Chico Buarque. Dois seres mai-

úsculos que defenderam o país entregando-se

de corpo e alma à luta contra o regime imposto

por governos totalitários. Porém, simples-

mente não querem permitir que suas biogra-

fias sejam publicadas. Se não me engano, não

foi aquele mesmo senhor que vivia debaixo

dos caracóis dos seus cabelos, quem disse um

dia que era “proibido proibir”? E não foi ele

quem gritou “Eu digo não ao não”?

Com certeza eles não estão medindo a

dimensão do mal que estão fazendo às suas

próprias histórias. Sim, suas vidas. O pre-

sente, principalmente. Não estão enxergando

que dessa forma vão de encontro a tudo o que

um dia abominaram. Ou seja, a maldita cen-

sura. Suas letras cheias de grandes metáfo-

ras, que batiam fortemente no rosto dos gene-

rais, irão cair por terra por simplesmente

omitirem algo que não os prejudicaria — enri-

queceria. Ou será que nossos “mocinhos” se

esconderam debaixo de uma máscara por

anos e, depois de tudo, descobriremos que

não são tão bonzinhos assim? Prefiro não

acreditar que seja isso.

Para não ser injusto com os fatos, outros

membros da MPB se apresentam a favor da lei.

São alguns deles: Frejat, Ivan Lins, Leo Jaime e

Fernanda Abreu. Fernanda Abreu? Que diabos

teria de tão relevante na história de um “Rio 40

graus”? Só Deus sabe. Está me cheirando

modinha nova no ar. Duelo de egos.

Não permitir publicar biografias é muti-

lar a história de um país. Até porque, para

serem expostas, será preciso contar com pes-

soas extremamente importantes e relevantes

na mudança de algo. Seja no esporte, cultura,

política, ou até mesmo em qualquer outra

instância da vida do país. Se não gostou do

que foi escrito sobre você, então xingue, grite,

processe, mas não impeça. Prove que é men-

tira. Mas, se for verdade, arque com as conse-

quências, pois suas vidas foram feitas de cara

limpa. Às vezes, pintadas.

Quando digo “Passado às Avessas”, seria

aquilo que o povo brasileiro conheceu doloro-

samente como censura, sendo hoje feita pelos

líderes que lutaram contra ela. Bela ironia,

não acham?! Me diga, Chico, vai querer beber

desta bebida amarga que tanto pediu a Deus

para afastar o cálice de ti? Me diga então, Cae-

tano, por que não? Por que não?

Cor res pon dên Cia

NP4 - Rua Ca tumbi, 546

Bairro Cai çara - Belo Horizonte - MG

CEP 31230-600

Contato: (31) 3516.2734

[email protected]

Este é um jOr nal-la bO ra tó riO da

dis ci plina la bo ra tó rio de jorna lismo ii.

O jor nal não se res pon sa bi liza pela

emis são de con cei tos emi ti dos em ar ti-

gos as si na dos e per mite a re pro du ção

to tal ou par cial das ma té rias, desde

que ci ta das a fonte e o au tor.

SugEStõES dE pautaS?participE dO jOrnal lincE.

uma publicação feita pelos alunos do curso de jornalismo do centro universitário newton.

E-Mail: [email protected]

presidente do Grupo spliCeAntônio Roberto Beldi

reitorJoão Paulo Beldi

ViCe-reitoraJuliana Salvador Ferreira de Mello

Coordenadora dos Cursos de CoMuniCaÇÃoJuliana Lopes Dias

Coordenador da Central de produÇÃo JornalistiCa - CpJPro fes sor Eus tá quio Trin dade Netto (DRT/MG 02146)

Conselho editorialProfessor Menoti Andreotti

pro Jeto Grá fiCo e direÇÃo de arteHelô Costa (Registro Profissional 127/MG)

MonitoresJoão Paulo Freitas, João Vitor Cirilo e Caíque Rocha

reportaGensAlu nos do Curso de Jornalismo do Centro Universitário New ton

diaGraMaÇÃo Laura SenraMárcio JúnioEstagiários do Curso de Jornalismo

ExpedienteOpiniãOjornal

LINCEJornal laboratório

do Curso de Jornalismo

do Centro universitário

newtonÀS AVESSAS

ar

qu

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es

so

al

PASSAdo

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Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013 3

raPhael GouVÊa

2º período

Mineiro de fala mansa e gestos mais

calmos ainda, foi em 2007 que, aos 18

anos, Marco Antônio Pereira deixou Cor-

disburgo e veio para Belo Horizonte, onde

trabalha hoje como diretor de videoclipes

e publicidade. Chegando a Belo Hori-

zonte, foi logo a um dos cinemas mais tra-

dicionais da cidade e assistiu um projeto

que se exibia aos sábados, e que se cha-

mava “Imagem Pensamento”.

— Lembro como se fosse hoje: a sala

escura, as pessoas, o clima frio por causa do

ar condicionado e o vídeo... Aquilo tudo

confundia muito minha cabeça. Mas, dos

pensamentos confusos que eu tinha, eu só

conseguia destacar um: “Eu preciso fazer

um filme! Eu nasci p ra fazer isso!”.

“nÓis tuDo”

Marco Antônio não perdeu tempo.

Logo após o seu primeiro fim de semana

em Belo Horizonte, já iniciava as aulas no

curso de Jornalismo na Newton. Afinal,

era a profissão que ele sonhava seguir

desde criança, ainda cursando o ensino

médio. No decorrer do curso, Marco Antô-

nio teve uma visão ainda mais complexa

do Jornalismo, que lhe serviria muito mais

do que ele imaginava a princípio.

Em busca de realizar o sonho de ir

para o cinema, correu cada vez mais atrás

de seus objetivos. Encontrou em Léo San-

tos um mestre que o ensinou muito sobre

o assunto e o ajudou com o empréstimo de

equipamentos que ele precisaria para

desenvolver seu projeto. Com essa ajuda,

Marco procurou um curso específico den-

tro da área e se formou na Escola Livre de

Cinema, no final de 2008. Depois de for-

mado, dirigiu seu primeiro filme, que na

verdade era uma espécie de documentá-

rio, chamado “A arte é de nóis tudo”. Esse

documentário chegou a ser exibido em

Brasília e na Alemanha.

“nÓs e o horiZonte”

Mesmo durante o curso de Jorna-

lismo, que levou de maneira muito pecu-

liar, Marco Antônio sempre teve a cabeça

voltada para o cinema. Não era, certa-

mente, um aluno exemplar, mas era “dife-

renciado”, como bem definia uma de suas

professoras, Juniele Rabêlo. José Maria

Souza Neto, o Zé Neto, outro aluno de

jornalismo que também incursionava pelo

cinema, era um apoio constante.

Após concluir o curso de Jornalismo,

Marco Antônio dirigiu um longa-metragem

chamado “Sobre Nós e o Horizonte”, um

filme em que fala sobre a importância das

pequenas coisas. Sem financiamento, con-

tando apenas com a ajuda dos amigos e com

muita criatividade para reverter a falta de

grana, ele conseguiu transformar “Sobre

Nós e o Horizonte” em uma experiência

única. Por isso, a exibição do filme se trans-

formou em um momento mágico.

— Um fato marcante nessa minha

relação com cinema foi exibir o “Sobre

Nós e o Horizonte” na sala Humberto

Mauro, no Palácio das Artes. Foi uma ses-

são muito marcante. A sala estava lotada,

as pessoas se emocionando...

“Eu fiquei refletindo que foi um mila-

gre ter conseguido terminar o filme e lançar

o longa, no mesmo cinema em, que há cinco

anos, eu estava deslumbrado em ver a

telona pela primeira vez”, conta Marco

Antônio, sempre destacando que essa foi, de

fato, “uma experiência fascinante”.

— Acho que ninguém ali na sala

conseguiria entender o que se passava

no meu interior.

Atualmente, aos 26 anos, Marco está

terminando as gravações de uma websérie,

que conta com a participação de vários ato-

res consagrados no cenário belo-horizon-

tino. Entre eles, Guilherme Colina, Fer-

nando Veríssimo e Márcia Moreira.

E o jornalismo? Atualmente, ele traba-

lha como jornalista na comunicação interna

em uma multinacional brasileira, e diz que

até pretende continuar na área, mas que

ninguém se engane: o jornalismo será ape-

nas uma ferramenta a mais para desenvol-

ver seus novos trabalhos no cinema.

pERFiL

UMA CÂMERA NA MÃo E...

UMA IdEIA NA CABEÇA,Nasce um cineasta em ponto de bala! O sonho de seguir carreira no cinema destaca os projetos e as dificuldades de um jornalista mineiro das veredas do grande sertão

fotos arquivo pessoal

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4 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013

Rock

o ÚLTIMo dINoSSAURo

Em atividade desde os anos 60, black Sabbath,

uma das bandas mais emblemáticas do rock,

mostra que o grupo ainda continua no topo

raPhael GouVÊa e raquel Durães

2º período / 4º período

Formada em 1968, no Reino Unido, a

banda Black Sabbath, criticada e idola-

trada por muitos, carrega consigo traços

de mudanças na história do rock. Inicial-

mente, a banda tocava um som influen-

ciado pelo ritmo do blues e pelas músicas

de Jimi Hendrix, Cream e The Beatles.

Mais tarde, após a mudança de nome, de

Polka Tulk e Earth para o atual, o grupo

mudou o estilo musical radicalmente.

Com letras repletas de misticismo e com

um som mais pesado, que é justamente o

que o novo nome propõe, se tornou um

dos pioneiros do heavy metal.

Ao longo do percurso do grupo, mui-

tos críticos dizem que o Black Sabbath,

comparado às superbandas anteriores

da época, como Rolling Stones, Led

Zeppelin, Pink Floyd e Yes, que inaugu-

ram o rock progressivo em 68, não era

uma banda assim tão boa. Algumas das

antigas edições da revista Rolling Stone,

por exemplo, considerada uma das boas

referências em música e cinema, era

uma das que faziam críticas à banda.

Entretanto, se era tão criticada assim,

qual a razão de todo esse mistério e

lenda ao redor do Black Sabbath?

Pais Do heaVY Metal

Originalmente composta por Tony

Iommi na guitarra, Bill Ward na bateria,

Geezer Butler no baixo e John Michael

Osbourne no vocal (mais tarde conhecido

apenas como o famoso Ozzy Osbourne), o

grupo fazia parte da ascensão das bandas

inglesas de metal no início da década de

1970. Tendo como raízes o blues, o rock

clássico e o rock psicodélico, o heavy metal

se tornou símbolo de um som maciço,

solos de guitarra arrepiantes e baterias

frenéticas. As pioneiras desse estilo, como

foi o caso dos britânicos do Black Sabbath,

Deep Purple e Led Zeppelin, por exemplo,

atraíram milhões de camisas pretas.

“O Black Sabbath foi a primeira

grande banda de metal que surgiu; para

muitos, a fagulha do heavy metal foi acesa

com os Beatles, na música ‘Helter Skel-

ter’, do álbum ‘The Beatles’, mais conhe-

cido como Àlbum Branco, de 1968”,

afirma o crítico musical e repórter de cul-

tura do Correio Braziliense, Tomaz Alva-

renga. Algo interessante de se observar é

que Ozzy sempre foi um grande fã dos

Beatles. Antes deles, não havia banda que

reunia uma sonoridade tão pesada, aliada

a tons e letras sombrias. “Graças ao Sab-

bath, o metal cresceu, se desenvolveu e

procriou, se dividindo em diversos gêne-

ros como trash metal, white metal, power

metal, etc.”, completa o crítico.

MuDanÇa no roCK

O primeiro disco lançado pelo Black

Sabbath, no ano de 1970, que leva o nome

da banda, chegou à oitava posição nas para-

das britânicas. Entretanto, o grupo foi

bombardeado pela crítica. “As mídias e os

críticos, de uma maneira geral, são veícu-

los tendenciosos de informação. São, na

prática, formadores de opinião e apoiado-

res dos que estão em volta ou na ‘crista da

onda’ num dado momento”, afirma Jean

Ricardo de Oliveira, 35, músico e vocalista

da banda de rock Pedra Lascada.

Os ritmos e as letras que falavam de

paz, amor, sexo e drogas já estavam conso-

lidados como sendo bandeiras do rock n’

roll. O Black Sabbath surgiu com uma

nova concepção de rock, influenciando

várias bandas como Metallica, Megadeth,

até as mais atuais como System of a Down

e Limp Bizkit. Em tempos conturbados e

de guerras, o rock flertava com ideais de

paz e amor em vários ritmos. “O Black

Sabbath não foi a primeira banda a enxer-

gar essa situação e dirigir sua sonoridade

de encontro a esses problemas, mas, com

certeza, foi a mais notável”, acredita o

músico.

divulGaÇÃo

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Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013 5

1970: Black Sabbath e Paranoid – O segundo, é um dos álbuns mais vendidos e dono

dos maiores sucessos como “Iron Man”, “War Pigs” e “Paranoid”. O primeiro traz

“N.I.B.” e a faixa título como destaque.

1971: Master of Reality – Deste álbum saíram clássicos como “Sweet Leaf”,

“Children of the Grave” e “Into The Void”.

1972: Black Sabbath, Vol. 4 – Uma mistura do hard rock com o progressivo.

1973: Sabbath Bloody Sabbath – Primeiro álbum a ser elogiado pela crítica da época,

sendo aclamado pela revista Rolling Stone americana como “um grande sucesso”.

1975: Sabotage – Mais um trabalho mesclado com o rock progressivo e até mesmo

sons gregorianos, mas, é claro, sem perder o som pesado da banda.

1976: Technical Ecstasy – Suas músicas abordam temas como tráfico de drogas e

prostituição, bem diferente das gravações anteriores do grupo.

1978: Never say Die! – Último álbum com o vocalista Ozzy Osbourne.

1980: Heaven and Hell – Primeiro a contar com o novo vocalista Ronnie James Dio.

1981: Mob Rules – Além de ser muito elogiado, o álbum marca a substituição do

baterista Bill Ward por Vinny Appice.

1983: Born Again – Felizmente, temos o retorno de Bill Ward e uma nova

troca de vocalista. Entra em cena Ian Gillan, ex-vocalista do Deep Purple.

1986: Seventh Star – Após algum tempo de inatividade da banda, “Seventh Star”

é lançado com mais uma mudança nos vocais: assume Gleen Hughes.

1987: The Eternal Idol – Hudhes abandona a banda por problemas com drogas e é

substituído pelo vocalista Ray Gillen junto a Tony Martin.

1989: Headless Cross – Considerado um dos melhores discos da época, este

foi o primeiro álbum com o baterista Cozy Powell e o segundo com Tony Martin.

1990: Tyr – Tony Martin, Cozy Powell e Tony Iommi continuam a todo vapor.

1992: Dehumanizer – Álbum que traz músicas como “Computer God”

e “Master of Insanity”, e o retorno do lendário Dio no vocal.

1994: Cross Purposes – Mais uma vez a troca de vocalistas.Tony

Martin retorna ao grupo. Álbum muito elogiado pelos fãs.

1995: Forbbiden – Este foi um dos trabalhos mais criticados pelos fãs e um dos

menos conhecidos do público em geral.

2013: 13 – Primeiro álbum com a formação original da banda, com exceção de Bill

Ward. O retorno de Ozzy ao Black Sabbath traz a tradição sombria do grupo.

Discografia – Time Line Black SabbathAlém dos 19 álbuns de estúdio, a banda ainda reúne cinco álbuns ao vivo, sete coletâneas, 39 singles e 11 álbuns de vídeo.

Segundo o crítico musical Tomaz

Alvarenga, alguns críticos não gostaram

da mudança da banda em meados dos

anos 1970 devido à troca de vocalistas.

“Acho injusta a cobrança, pois mesmo os

maiores nomes da música, como Paul

McCartney e Bob Dylan, também lança-

ram álbuns bastante contestados”, res-

salta o jornalista. “Acho que ocorre um

saudosismo exagerado, gente que espera

que a banda sempre faça o mesmo som,

soe da mesma forma. A resposta veio com

o mais recente álbum, que é ótimo”, diz.

O músico Jean também concorda e

defende a banda. “A grande maioria dos

críticos tem dificuldade em aceitar o

novo de bom grado”.

Tomaz Alvarenga analisa os demais

vocalistas que já passaram pelo Sabbath e

diz que cada um deixou sua marca. “O

Ozzy sempre foi um grande vocalista e sua

voz é uma marca do Black Sabbath. O

Ronnie Dio, quando entrou no lugar do

Ozzy, também deixou sua marca e a banda

variou um pouco o seu som, mas sem per-

der a admiração de boa parte do seu

público”. Entretanto, o crítico se preo-

cupa com a nova turnê. “Assisti alguns

vídeos da turnê atual e a forma que Ozzy

está cantando atualmente me preocupa.

Ele não parece estar muito bem. Tomara

que eu esteja enganado”, diz.

FansMoZiZ oZZY Brasil

Há 17 anos, um dos maiores fãs clu-

bes do Brasil vem reunindo seguidores do

Sabbath de vários países, que vão dos 13

aos 60 anos. O Fansmoziz Ozzy Brasil foi

criado em setembro de 1996 pelo empre-

sário Almir Figueiredo, 53, de São Paulo.

“O objetivo inicial era reunir o máximo de

fãs do Black Sabbath do Brasil, mas logo

começaram a aparecer pessoas de todos

os lugares”, conta. A partir disso, o site

recebeu apoio de várias mídias, que come-

çaram a divulgar o trabalho. “No dia 30 de

janeiro de 97, fui surpreendido ao receber

uma carta do Ozzy agradecendo por ter

criado o fã clube. Até hoje mantenho con-

tato com a equipe dele na Califórnia”,

revela Almir.

“Sou fã de rock há mais de 30 anos,

mas o que me levou à loucura foi um tal de

Black Sabbath. Pirei quando escutei

‘Paranoid’ e ‘War Pigs’. É impossível não

gostar do trabalho destes quatro monstros

do rock”, afirma Almir. “Ozzy canta com a

alma, além de ser muito carismático no

palco”. Sobre a mudança de vocalistas ao

longo dos anos, o fã não discute. “Amo o

trabalho do Dio, o cara tem uma voz incrí-

vel, e Gillan é divino. Mas o Sabbath só

está vivo por causa de Ozzy”, opina. “Para

mim, Ozzy só é Ozzy hoje por causa do

Black Sabbath e vice-versa: um sem o

outro não seria nada”.

Mal falados, mas adorados

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6 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013

GEnTE

A GENTE NÃo QUER

SÓ CoMIdA...a gente quer comida, diversão e arte, mas na região noroeste fica difícil, pois quase não há investimentos e quem mais sofre com isso são os jovens

raYZa KaMKe e roDolPho ViCtor

4º período / 2º período

Entre as diversas regiões que compõem o município de

Belo Horizonte, a Noroeste, que engloba os bairros do Caiçara,

Pedro II, Aparecida, Adelaide, Ermelinda, Nova Esperança e

Santo André, entre outros, é a mais populosa e representa

11,2% dos jovens na faixa etária de 15 a 29 anos, entre os 632

mil que fazem parte da população da cidade, hoje de aproxi-

madamente 2.375.444 habitantes. Apesar da densidade

populacional, trata-se de uma região de grandes desigualda-

des, em que os jovens das comunidades carentes se veem

ainda mais prejudicados pelos poucos recursos que possuem

para se incluírem nas pequenas opções.

A região tem um número muito grande de escolas e um

parque (Parque do Caiçara), mas quase nada em função do

lazer e do esporte. Uma das poucas opções para os jovens

ainda é o Shopping Del Rey, onde nada é de graça. Na área

cultural, quase nenhum investimento. A região Noroeste é um

espelho do que, a exceção da região Centro Sul, acontece em

todas as demais. A psicóloga Sylvia Flores explica que o lazer

bem executado, planejado e saudável é imprescindível para o

equilíbrio emocional. De acordo com ela, se não houver

momentos de lazer ou prazer, o ser humano acaba entrando

em um processo de stress profundo, que pode gerar doenças

psicossomáticas, ou simplesmente psíquicas, como agressivi-

dade exagerada ou impulsividade. “É necessário ter prazer

para podermos ter um equilíbrio entre a vida cotidiana, do

trabalho, dos estudos, e um bem-estar psicológico”, afirma.

Já o sociólogo Carlos Magalhães comenta que, mais do

que uma forma de lazer, as atividades que envolvam arte e

cultura são itens indispensáveis para a construção da identi-

dade dos jovens, ainda mais em uma sociedade desigual,

injusta e preconceituosa. Carlos salienta que os jovens neces-

sitam de acessos mais fáceis a todos os tipos de expressão

cultural e artística, até mesmo para a criação de suas persona-

lidades. “O acesso a esses meios deveria ser facilitado de modo

que os jovens pobres pudessem encontrar seu lugar no mundo

de hoje, além das fronteiras simbólicas e materiais que estão

colocadas”, explica.

rafael martins

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Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013 7Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013 7

ProPostas oFiCiais

BH foi a primeira cidade brasileira a

criar um Conselho Municipal da Juven-

tude. Decretado por lei em 1998 (lei

7551/98), determina a finalidade de estu-

dar, elaborar, discutir, aprovar e propor

políticas públicas que permitam e garan-

tam a integração e a participação do jovem

na sociedade. Já a Coordenadoria Munici-

pal da Juventude, por sua vez, visa promo-

ver a interlocução, o acompanhamento e

a proposição de ações e políticas voltadas

aos jovens. Após período de inatividade,

desde 2005, ambos voltaram a trabalhar

neste ano, edesenvolvem várias ações

específicas voltadas ao público jovem.

O gerente da Coordenadoria, Gelson

Antônio Leite, informou ao Lince as pro-

postas e projetos que a Prefeitura oferece

aos jovens da capital. Entre as novidades,

se destaca o “Centro de Referência da

Juventude”, um equipamento destinado

aos jovens, com inauguração prevista para

maio de 2014. O Centro, que pretende

atender de 500 a 800 jovens por dia, ainda

constrói a proposta de projetos, mas pro-

porcionará aos belo-horizontinos cursos

profissionalizantes e ofertas de emprego,

teatro de arena, estúdio de gravação musi-

cal, e até uma biblioteca digital e interativa.

Para as regiões carentes são idealiza-

dos os chamados “Fóruns Juvenis”, onde

serão escolhidos locais de maior vulnerabi-

lidade juvenil. A ação será realizada aos

sábados, e levará aos jovens carentes as

informações sobre o que a Prefeitura pro-

põe. Um novo projeto também será inaugu-

rado neste semestre, no Barreiro. O espaço

revitalizado e reformado da antiga FEBEM

se torna hoje o “Point Barreiro”, onde será

realizada a “Estação Juventude”, local de

atendimento e execução de oficinas, aten-

dimentos aos jovens, e cadastramento aos

programas da prefeitura. “Pretendemos

expandir o “Estação Juventude” para todas

as regionais”, completou Gelson.

GrÊMio Mineiro

O clube de futebol Grêmio Mineiro, no

Santo André, é presidido pelo ex-policial

civil Wallace Araújo, e o aposentado Renato

de Almeida. O clube, fundando em 1947,

sobrevive graças ao esforço da comuni-

dade. Da doação de bolas e equipamentos a

uma máquina de lavar roupas e sofás para

a sede, todo o projeto é movido pelo empe-

nho dos presidentes e pela força da socie-

dade. Apenas para a manutenção de água e

luz é cobrada uma taxa de R$ 60/hora para

o aluguel do campo da agremiação.

Entre as atividades realizadas pelo

clube, a escolinha de futebol é a principal,

mas Wallace destaca que, na maioria das

vezes, falta interesse das crianças. Reeleito

para a presidência, desde 2010, ele e o

amigo Renato afirmam que, muitas vezes,

fazem papel de assistente social para os

jovens mais agressivos ou necessitados. O

motivo principal da escolinha é controlar os

problemas que atingem os jovens da comu-

nidade — a violência e o envolvimento com

drogas.“O problema de falta de lazer é rela-

tivo, falta interesse”, afirma Wallace.

O presidente, às vezes, abre mão do

aluguel da quadra, promove lanches

comunitários e, ainda assim, não atrai a

atenção dos jovens do bairro. Em relação

aos pais, Wallace observa que é pouco o

estímulo vindo deles, já que em reuniões

propostas pelos presidentes, apenas

alguns se apresentam e têm consciência

da vida ativa de seus filhos. “É preocu-

pante, mas fazemos tudo o que podemos

fazer”, lamenta.

atleta CiDaDão

O projeto renomeado “Atleta Cidadão”

funciona desde 2005 e é administrado por

José Santana, diretor de esportes e forma-

ção de atletas do clube Vila Nova, e atende

jovens entre 11 e 16 anos. Os treinos são de

segunda a quinta (terça e quinta para os

mais novos e segunda e quarta para os

maiores). Mesmo sendo novo, o clube já

participou de torneios como a “Taça BH” e

a “Copa Criança Esperança”.

Os treinos, realizados em um campo

colado ao Cemitério da Paz, são ainda

esperança aos jovens que o frequentam, já

que levaram Rafael Vítor, de 20 anos, para

a base do Atlético-MG — hoje, ele é um

dos destaques do Tupi-MG. Para partici-

par, basta contribuir com R$ 10 para a

compra de bolas e redes. É imprescindível

que o jovem seja frequente e tenha bom

aproveitamento escolar. Os dados são pas-

sados diretamente das escolas ao treina-

dor Santana — “a melhor herança para

uma criança é a educação”, emociona-se.

o ConsuMo e o laZer

As alternativas no Shopping Del Rey

giram em torno de R$ 79 a R$ 90. Para os

carentes, as opções, às vezes, são quase ina-

cessíveis. Felipe dos Santos Fernandes, 18,

estudante e morador do Caiçara, admite

que a melhor escolha é a quadra de futebol,

na Praça da Rosinha, na rua Rosinha

Sigaud. Felipe, que vai diariamente jogar

bola com os amigos, diz que é grande o movi-

mento de jovens, principalmente à noite.

Lanchar com a turma na praça de alimenta-

ção do Del Rey também é uma opção — mas

os lanches podem variar de R$ 15 a R$ 25!

Fernando Medeiros, psicólogo, con-

firma a falta de opções de lazer para o filho

de 12 anos. Por isso, a opção é sair da rotina.

“Levo meu filho e os amigos na Serra do

Cipó, para andar de bicicleta e também jogar

bola na pracinha”. Já para os menores João

André Alves Santos, Gabriel Rabelo Couto e

Emerson Lima, do 5º ano da escola Dimen-

são, é unanime a escolha pelas reuniões em

casa dos amigos, onde costumam estudar,

jogar futebol ou vídeo game.

Joseanne Santos e Priscila Gonçalves,

ambas com 16, moradoras do Santo André,

optam por um cinema, ou até mesmo se

reunir com amigos. Para elas, as garotas da

região sofrem mais que os meninos. “São

poucas as opções; às vezes, decidimos ir a

um shopping diferente, mas o Del Rey cos-

tuma ser o de maior frequência”, diz Jose-

anne, que costuma fazer um “cinema em

casa” quando está sem dinheiro. O preço do

cinema nessa região varia de R$ 9 a R$ 24,

dependendo dos dias, horários, e salas 3D.

Marcos Vinicius Silva, 13, e Cleber

Eduardo Meirelles, 14, moram no Nova

Esperança e fazem do futebol seu passa-

tempo principal. Além do esporte, costu-

mam ir algumas vezes ao inevitável Del Rey

quando o parque de diversões Play City

passa uma temporada por lá. Outra opção é

o Boliche. Mas, aí, só quando recebem

mesada dos pais. O Boliche se diferencia

pelos dias da semana e horário, mas fica em

torno de R$ 48,60 a R$79,20/hora. O bom é

que dá pra fazer uma vaquinha: a pista pode

ser dividida em até seis jogadores.

Page 8: Jornal lince outubro 2013

8 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013

raFael Martins

4 período

Ponto de encontro. Reunião de cidadãos. Um lugar

público, cercado de edifícios; conjunto das instituições

comerciais e financeiras de uma cidade. Na verdade, seu

coração. Pode-se definir também como espaço urbano

livre de edificações, que proporciona convivência ou

recreação aos cidadãos. Em Belo Horizonte, só uma

praça reúne todas as características acima e ainda adi-

ciona outras. Claro, estamos falando da Praça Sete,

onde, torto, maltratado, mas, mais vivo do que nunca,

palpita o coração da capital mineira.

Ponto de interseção de duas grandes avenidas da

cidade — Amazonas e Afonso Pena —, com o nome

original de Praça 14 de outubro (data referente a uma

comissão que fazia estudos para instalação da nova

capital), só em 1922, teve seu nome alterado para

Praça Sete de Setembro, nas comemorações do cente-

nário da Independência do Brasil. Um dos seus símbo-

los é o “Pirulito”, presente dos moradores da cidade

vizinha Betim, em torno do qual gira outra face impor-

tante: a diversidade. Marco zero para encontros de

manifestações políticas e comemorações de títulos

dos clubes da cidade, a praça é de todo mundo e não é

de ninguém. Ou, como já dizia um antigo compositor

baiano, é do povo, como o céu é do avião.

A VIdA PINTA o SETE

coração de belo Horizonte, praça mais famosa da capital, palco onde a vida é sempre mais ativa que a morte

NESSA PRAÇA

CaFÉ CoM PolítiCaem 1963, a praça foi desfigurada, com a retirada do tradicio-nal pirulito, que ficou até 1980 na savassi. hoje, no entorno dele, há importantes imóveis que contam a história de Belo horizonte — o Cine teatro Brasil, o antigo edifício do BeMGe (hoje, posto de serviço integrado urbano - psiu) e até o famoso Café nice, um dos redutos da praça, parada obrigatória de políticos em tempos de eleição. o café recebeu visitantes famosos, dos ex--presidentes Juscelino Kubitscheck, tancredo neves e itamar franco à cantora emilinha Borba, estrela maior da rádio nacional, que lá passaram para tomar o famoso cafezinho e fazer média com o povo. até uma de suas garçonetes, ana pas-choal, se elegeu vereadora da capital mineira, em 1964. José Murta, aposentado com seus 87 anos bem vividos, frequenta o local há mais de três décadas.— o lugar é ótimo, o estabelecimento mudou pra melhor e o

café continua gostoso.o curioso é que muitos aposentados se reúnem na porta do

Café nice para conversar e comercializar objetos pessoais e engraxar os sapatos. aliás, os engraxates são outra presença marcante na praça, junto com os idosos, que, em um de seus quarteirões fechados, se reúnem para jogar damas. no meio da correria do centro, alguns ainda encontram paciência para jogar e, às vezes, nem percebem que o Café nice agora fecha mais cedo, por causa da violência.

em 1963, a praça foi desfigurada, com a retirada do tradicio-

CaFÉ CoM PolítiCaem 1963, a praça foi desfigurada, com a retirada do tradicio-

em 1963, a praça foi desfigurada, com a retirada do tradicio-

fotos rafael martins

Page 9: Jornal lince outubro 2013

rafael martinsrafael martins

triBos e CoMÉriCoO comércio na região é variado. Há uma diversidade enorme, que vai

de lojas de calçados a pastelarias, restaurantes, fast food, farmácias,

sebos, livrarias, passando por ambulantes que se misturam aos hippies e,

mais recentemente, aos índios que hoje tomaram conta da praça para

vender seu artesanato. O índio Taruãde, 23, da tribo Pataxó, saiu de Porto

Seguro (Bahia) para vender as especialidades de sua terra aos mineiros e

conseguir a fonte de renda para a aldeia Coroa Vermelha, onde vive.

— Na baixa temporada de Porto Seguro, nós viajamos para outras cidades e

os mineiros compram nossas pulseiras, farinheiras, colares.

Vários estabelecimentos bancários funcionam no entorno da praça,

onde fica também uma das galerias mais antigas e movimentadas da

cidade, a Galeria Praça Sete, reduto das lojas que vendem discos e aces-

sórios de rock e recebe grande afluência de jovens. Complementando a

confusão, lojas de produtos evangélicos, motéis, o famoso Fórmula 1,

loterias, estátuas vivas, bancas de revista, skatistas e desempregados se

encarregam de botar mais lenha na fogueira, ou seja, de incrementar o

movimento.

hiPPie sÓ no noMeA agitação da principal praça mineira

só parece não incomodar os hippies e seus

fregueses que param para comprar colares e

trançar os cabelos. Quem olha de fora pode

até achar estranho, sem valor, mas para o

hippie e artesão Edson Freitas Assis, eles

estão “no ápice da transição do artesanato

em Belo Horizonte”.

— Não estamos conseguindo expor

nossas artes, já que não podemos expor na

Feira Hippie, que de hippie só tem o nome...

Outro que parece não se incomodar

com a agitação é o professor de matemática

Willian Barbosa, que montou um quadro e

ensina cálculos para quem tiver tempo de

parar e aprender — é tudo de graça! Nem

aos domingos, quando há calmaria no

trânsito de pessoas e carros, por ser um dia

mais tranquilo, a praça fica parada. O movi-

mento Black Soul se reúne para dançar e

mostrar seus passos, sua música e sua

moda, cheia de cores e de vida.

No meio de tanta coisa boa, há pessoas

que tentam desmoralizar a aparentemente

caótica harmonia da praça. Há vendedores

e consumidores de drogas, outros que ven-

dem armas e, por ser um local de muita

movimentação, há furtos. A segurança é

feita por vários militares e guardas munici-

pais, mas nem as câmeras conseguem inibir

a criminalidade. E assim segue batendo o

coração da cidade. Se as câmeras não ini-

bem o crime, também não inibem a vida.

Mais teimoso do que nunca, o coração da

cidade não tem tempo de temer a morte.

o sol e a soMBraQue atire a primeira pedra o belo-horizontino que nunca ouviu os gritos de “Foto

na hora, foto”; “Compro e vendo ouro e prata”; “Dentista!”; “Celular, compro, troco,

acessórios” ao passar pelo quarteirão fechado das ruas Espírito Santo, Rio de Janeiro

e Carijós. Margarete Aparecida, 50, trabalha no local há dois anos, desde que o marido

a abandonou. Forçada a buscar emprego, mas com dificuldades, devido à idade, arru-

mou o de “ambulante”. Sua função é conseguir vendedores e compradores de ouro.

Segundo ela, se ficar o dia inteiro na praça, dá pra tirar uma boa renda.

— O salário é fixo e não por comissão ao levar fregueses.

Margarete vai logo avisando que não fica o dia todo gritando. Primeiro, por não

aguentar; e também “para não avacalhar uma loja de calçados da vizinhança”. E diz

que nem o sol forte a incomoda.

— Eu adoro sol: mas, se uma hora o sol incomodar, vou pra onde tem sombra —

conclui bem humorada.

Page 10: Jornal lince outubro 2013

10 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013

MiGRAÇÕES

é andar por esse país...MINhA VIdA

Mas, nem sempre, o

cartão postal que espera

os migrantes

tem os braços

abertos na vida real: é

mais comum ter a cara e os punhos

cerrados

raFael Martins

4º período

“Se dizem que é impossível,

eu digo: é necessário! Se dizem

que estou louco, fazendo tudo

ao contrário, eu digo que é pre-

ciso, eu preciso, é necessário

seguir viagem, tirar os pés da

terra firme”. Como diria a can-

ção “Seguir Viagem”, da banda

Engenheiros do Hawaii, é pre-

ciso seguir viagem, conhecer

novos ares, mas será que isso se

aplica à saga dos migrantes?

Desde o início dos tempos, essa

atividade, movida por objetivos

distintos — econômicos, religio-

sos ou até mesmo por amor — a

vontade de mudar leva multi-

dões a viajar, sem, muitas vezes,

saber aonde chegar.

No Brasil, as primeiras migra-

ções datam do início da República.

Com o fim do Ciclo da Cana de

Açúcar, no nordeste, levas nume-

rosas desceram em busca de pro-

messas de uma vida melhor no

Sudeste e no Sul do país, regiões

que se industrializaram primeiro.

Com as indústrias, veio também a

expectativa dos novos empregos,

de uma vida melhor, sem o fan-

tasma da seca, que sempre afligiu

os estados nordestinos. São Paulo

sempre foi visto como o Eldorado

dos migrantes, mas Minas Gerais,

assim que começou também a se

industrializar, passou a fazer parte

da rota das grandes migrações.

Page 11: Jornal lince outubro 2013

Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013 11

No Terminal Rodoviário, tristes e

famintos, com vontade de ir embora, preci-

sando ir ao banheiro, se encontravam dois

jovens, Jean Carlos Cândido, 22, e Rafael

Pereira Cândido, 21. Os irmãos saíram de

Varginha, no sul de Minas, à procura de

emprego na capital. Vieram com a cara e a

coragem, sem conhecer ninguém. O caso

deles é apenas mais um de muitos que

deram errado.

Sem sucesso, dinheiro, hospedagem

(pernoitaram em uma pensão com ajuda de

um desconhecido), foram obrigados a voltar

e pedir socorro para regressar à terra natal.

No abrigo da prefeitura, outros dois

migrantes esperavam para entrar e pernoi-

tar. Um deles, vindo de Virgem da Lapa, no

distante Vale do Jequitinhonha. Lucyon

Eduardo, 21, veio em busca de emprego, de

carona em um caminhão que transportava

frutas para a CEASA. Assim que chegou a

Belo Horizonte, ficou sabendo de um ser-

viço em uma serralheria e já conseguiu se

empregar. Deu sorte! Lucyon tem muitas

expectativas nessa nova fase de sua vida.

— Tenho o objetivo de constituir famí-

lia, mandar o dinheiro lá pro interior, con-

quistar minha casa...

Por sair de Virgem da Lapa, sem gran-

des expectativas, ele já se sente feliz por ter

sido bem recebido em Belo Horizonte.

Juliarlei Aparecido, 24, natural de Pom-

péu, interior de Minas, é experiente como

migrante. Já esteve em Belo Horizonte por

um ano e dois meses, voltou para casa e

depois foi para São Paulo. Na primeira pas-

sagem por BH, conseguiu emprego e casa,

mas segundo ele, um “desacerto” o forçou a

retornar ao lugar de onde veio.

— Em São Paulo, não tive sorte. Rouba-

ram meus documentos e não consegui

emprego; fui forçado a voltar para BH. Além

de emprego, procurei também ajuda para

tirar novos documentos.

Ambos têm pouca escolaridade, não

têm conhecidos em Belo Horizonte e, além

disso, suas malas quase vazias — com algu-

mas roupas. Mesmo assim, não pensam em

voltar para o interior. Ingenuamente, salien-

tam que chegar a um lugar diferente é sem-

pre complicado. “Poucos ajudam; as portas

estão, na maioria das vezes, fechadas”.

O sonho não acabouPorta de entrada

Novo perfil

A falta de empregos na zona rural

provocou o fenômeno do êxodo rural, a

migração em massa do campo para a

cidade. Ao chegar a Belo Horizonte, no

entanto, o panorama que se descortina é

outro: entre saudades de casa, a procura

por um novo mundo mostra um caminho

de sofrimento, da perda da identidade

cultural, quando a grande cidade mostra

para os que chegam sua face mais cruel.

Uma situação que pode ser conferida dia-

riamente na principal porta de entrada da

capital, o Terminal Rodoviário.

O Plantão Social de Atendimento ao

Migrante foi implantado em 2003 (inicial-

mente feito pelo Estado, mas, a partir de

2008, a Prefeitura assumiu a administra-

ção do Terminal Rodoviário). Seu objetivo

é atender o indivíduo residente há menos

de dois meses em Belo Horizonte e garan-

tir que ele usufrua de benefícios que, em

tese, são garantidos por lei. O serviço fun-

ciona de segunda a sexta-feira, das 8h às

18h, na área de embarque do terminal,

mas se alguém por ventura chegar depois

do horário de fechamento, os seguranças

da rodoviária estão orientados a pedir aos

migrantes para pernoitar em algum lugar

e retornar na manhã seguinte ao atendi-

mento. O problema é que nem sempre há

lugar para o pernoite.

PassaGens e aBriGo

É oferecido auxilio aos migrantes em

situação de vulnerabilidade social ou

àqueles que precisam de orientações

quando desembarcam na capi ta l .

Segundo a assistente social Desirê Mou-

rão, que coordena o plantão, a procura

maior é por passagens e abrigo. De janeiro

a agosto deste ano, o serviço prestou 4167

atendimentos, uma média de 650 por dia.

Neste mesmo período, 936 pessoas

aproveitaram a concessão de passagens e

voltaram pra casa ou migraram para outra

região. Outros aproveitaram os serviços de

encaminhamento para abrigos da cidade,

kits de fotografia, kits de lanches para via-

gem, isenções das taxas de banhos/sanitá-

rios no terminal, auxílios para retirar a

segunda via de documentos, além de outros

serviços de políticas sociais da Prefeitura.

Desirê conta que o interior de

Minas lidera o ranking na procura por

socorro no terminal.

— O interior é o primeiro lugar. Em

segundo estão outros estados do Sudeste e

depois o Nordeste.

“Houve uma mudança no perfil dos

atendidos e estamos priozirando o atendi-

mento aos dependentes químicos”, afima.

— Mas, ainda assim, continuamos a

trabalhar com pessoas vindas de regiões

com pouca oferta de emprego; a maioria

volta para o lugar de onde veio

Diante de uma equipe de seis assis-

tentes sociais e um estagiário, os viajantes

passam por um atendimento bem deta-

lhado e, após o raio-X , se traça um perfil

para definir o que deve ser feito. Alguns

critérios são usados para tal definição.

Entre eles, a concessão de passagens que

só é feita caso a pessoa prove ter algum

parente que o acolha na cidade de destino

(o que não ocorre em cidades do interior).

Para ter sucesso nas informações, há uma

ligação com secretarias de segurança,

saúde e assistência social de cada cidade.

Não há uma orientação nacional vol-

tada para o migrante. Em Belo Horizonte,

uma consultoria foi contratada para fazer

o diagnóstico do atendimento prestado no

terminal rodoviário. Desirê fez um estudo

que comprova a falta de uma orientação

padrão: cada estado age de uma maneira.

— No Nordeste, cada capital trabalha

de uma forma. Poucas têm o serviço; em

Goiânia e Salvador, por exemplo, não tem.

Uma casa para homens

Diego Frederico, assistente social do abrigo Acolhimento Institucional para população de rua e migrantes,

explica como funciona a casa.

— Depois de passar pela triagem da rodoviária, as pessoas com o perfil de acolhimento (em busca de serviço

e documentos) chegam ao albergue, onde é feito um novo cadastro. Dentro do albergue, têm o direito a alimenta-

ção — café, almoço, janta — e guarda-volumes. O prazo máximo de habitação é de dois meses e o migrante tem

que passar o dia todo fora à procura de emprego. São 80 vagas destinadas. Todas destinadas somente aos homens.

Page 12: Jornal lince outubro 2013

12 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013

Depoimento

fotos arquivo pessoal

Page 13: Jornal lince outubro 2013

Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013 13

Yohannã Ioshua tem 22 anos e cursa publicidade na

Newton. Apaixonado por culturas e viagens, chegou a um

dos países mais miseráveis da África, a Guiné Bissau. Nesse

depoimento ao Lince, Yohannã conta como foi o trabalho

desenvolvido lá. Uma belíssima lição de vida, que ele justi-

fica com desconcertante simplicidade:

oS NÚMERoS FALAM PoR SI(NÃo PoR GUINÉ BISSAU)

Em um mundo que quase só acena para os jovens com a máxima de que consumir é que é viver, ações como voluntariado mostram uma outra face da juventude

Fui porque acredito que fazer bem ao próximo é uma atitude primordial pra quem sonha com um mundo melhor.

“ “

Page 14: Jornal lince outubro 2013

Yohannã ioshua

Quando fui participar de um trabalho

voluntário em Guiné Bissau, África, passei as

30 horas de viagem tentando dimensionar o

tamanho da pobreza que estava por vir. Ao

chegar, vi que nenhum número ou dado era

suficiente para isso. Saber que a economia do

país regride 1,5% ao ano passou a não signifi-

car nada. Saber que de cada mil nascidos,

quase cem morrem, também se tornou inútil.

As pesquisas sobre a expectativa de vida, que

não passa dos 50, e a média de escolaridade de

2,3 anos viraram meras estatísticas.

Em apenas 30 horas, regredi décadas no

tempo. Sim, foi espantoso ver o que é Guiné

Bissau. Ruas de terra, casas de palha, açou-

gues a céu aberto, um trânsito maluco. Pra se

ter uma ideia da realidade, caso alguém roube

algo seu, você faz a denúncia e tem que pagar o

táxi para o policial ir atrás do meliante.

Vi mulheres que suam de sol a sol,

enquanto os maridos estão se divertindo deita-

dos tomando warga, um chá regional. Vi

homens de mãos dadas com outros homens,

sem nem imaginar que isso seria motivo de

preconceito a quilômetros dali.

Aos poucos fui sentindo a necessidade do

povo. E são muitas. Ou melhor, todas. O país

não tem luz, água, fonte de renda. Não tem

esperanças. Um dia, conversando com um

médico, o único obstetra local, ele disse que o

problema de Guiné Bissau é a pequena parte

rica. Na maioria dos casos, os que têm dinheiro

“conseguem” subsídios federais para seus

filhos nascerem em Portugal. E esse din heiro

sai do 1% que é investido em saúde.

Se confrontar com tantos desafios só

aumentava o desejo de querer fazer mais.

Antes da viagem, eu e minha namorada

conseguimos várias bolas e bonecas pra doar.

No entanto, quanto mais íamos dando os

brinquedos, mais impotentes nos sentíamos

em meio a tanta necessidade.

Mesmo sendo inofensivo contra a pobreza,

era gratificante sair das tabancas, como são

chamados os vilarejos, e ver dezenas de crianças

felizes, com sorriso de orelha a orelha, correndo

atrás do caminhão. Aos poucos, os gritos de

“branco, branco!” da meninada iam ficando

pra traz, e a vontade de voltar e tentar fazer até

o impossível era cada vez mais latente. Mas

isso não se contabiliza nas estatísticas.

Page 15: Jornal lince outubro 2013

A FORÇA DO AMOR AO PRÓXIMO

“Receber um sorriso de uma criança ou

idoso, um abraço carinhoso não tem preço”.

É assim que Adriana Machado define o pra-

zer de ser voluntário. Ela que é professora e

participa do grupo “Um toque de alegria”,

diz ainda que nem sempre pode definir com

palavras o que é ser voluntário.

— Isso é um dom para poucas pes-

soas, já nasce dentro de nós.

O grupo “Um toque de alegria” teve

seu inicio em 2004, com Rogério Pereira

Rodrigues, que atua em hospitais, cre-

ches, asilos vestindo a fantasia de palhaço.

Sempre tentando levar alegria para as

pessoas, e com o passar do tempo

ganhando novos voluntários.

“Nós temos o costume de reclamar da

nossa vida por qualquer coisa. Sendo que

há pessoas com todos os motivos do

mundo para reclamar. Mas nos recebem

com sorrisos, e, isso, sim, é que é uma

lição de vida”, revela Adriana, afirmando

qual é a maior experiência que teve como

voluntária.

Apesar de todas as dificuldades que o

grupo enfrenta (sendo uma delas as doa-

ções que nem sempre representam aquilo

que buscam), eles continuam sonhando.

salVanDo ViDas

Atendimentos médicos de emergên-

cia, resgates e primeiros socorros são

alguns dos serviços que o grupo “Anjos do

asfalto” presta de forma voluntária. Eles

trabalham em parceria com Polícia Rodovi-

ária Federal, Corpo de Bombeiros, SAMU e

Batalhão de Operações Aéreas. O grupo foi

criado em 2004, inicialmente tendo a par-

ticipação de um pequeno grupo de pessoas

que se desdobrou com muita determina-

ção a socorrer vitimas de acidentes na

rodovia, BR-381, saída para Vitória.

“Levar alívio em um momento tão difí-

cil”, Marcus Campollina, 49, um dos lideres

da equipe, falando sobre a maior motivação

do grupo. Apesar de terem o apoio dos órgãos

citados, e também de um deputado e da

Revista Entre Vias, algumas despesas são

bancadas por eles. “Combustível, materiais

de consumos... Tudo isso acaba saindo do

bolso da gente”, revela Marcus.

O trabalho geralmente ocorre aos fins

de semana e feriados. Isso porque são nessas

datas, que há mais movimento na rodovia.

São os dias no qual as pessoas saem para

viajar. Ao ser questionado sobre qual é a pior

situação que esse trabalho apresenta, Mar-

cus não hesita em responder que o trabalho

em si não é fácil de ser desenvolvido, “mas,

quando envolve crianças, é muito mais difí-

cil”. Por conviverem com a morte no dia a

dia, ele revela o momento mais marcante,

que eles viveram.

— Chegar ao local do acidente, e

deparar com cinco vitimas fatais. É sem-

pre muito difícil.

Levando alegria

FeliPe Freitas

(4° período)

Voluntário é a pessoa que realiza deter-

minada ação de livre e espontânea vontade;

faz seu serviço sem ganhar nada. Trabalhos

são feitos individualmente, por ONGs ou

por pessoas que se reúnem e levam de graça

atendimentos médicos, ajuda psicológica,

cestas básicas, entre outros. Eventos como a

Copa das Confederações e a JMJ (Jornada

Mundial da Juventude) contavam com

voluntários que auxiliaram aqueles que

aproveitavam o encontro do futebol mun-

dial e a dos fieis da igreja.

“Ser voluntária é amar ao meu pró-

ximo. É fazer o mínimo pelo outro. Agrade-

cer pelo dom da vida”. Assim definiu Renata

Kelen, fisioterapeuta, que trabalhou na JMJ

como voluntária. Ela completou dizendo

que foi voluntária, por ser católica, ser fre-

quentadora assídua da igreja e, também, por

fazer trabalhos sociais.

— O padre de minha paróquia teve de

assinar uma carta comprovando minha

participação efetiva na Igreja Católica.

Independente da religião, apoio outros

projetos sociais. Já participei de visitas,

festas infantis em abrigos e de grupos que

arrecadam roupas e entregam jantar aos

moradores de rua.

ConheCiMento e DiVersão

O voluntariado não é só fazer trabalhos

em eventos como a Copa e a JMJ. Mas sim

levar algo de útil a comunidade, como o que

acontece nas ONGs Valorizar e Instituto

Pedra Viva.

A ONG Valorizar foi criada por Luiz

Tibé, em 2007. A instituição oferece, aos

moradores do bairro da Concórdia, cursos

gratuitos nas áreas cultural, artística e pro-

fissional. Cursos de cabelereiro, depilação,

design gráfico, manicure e pedicure, entre

outros. Além disso, os alunos dos cursos

podem colocar em prática o aprendizado,

supervisionados pelo instrutor em ações

sociais da ONG. Essas ações geralmente

acontecem em asilos e creches. A organiza-

ção oferece ajuda jurídica para a população

mediante agendamento.

O Instituto Pedra Viva trabalha com

garotas carentes, de nove a dezenove anos,

moradoras da região noroeste de Belo Hori-

zonte. Bairros como a Pedreira Prado Lopes,

Lagoinha, Bonfim, Concórdia, dentre

outros, estão no raio de ação da ONG. A

Organização funciona de segunda a sexta,

disponibiliza um espaço de convívio saudá-

vel. São oferecidas oficinas de artesanato

semi profissionalizante, de música, de

dança, de esportes, além de aulas de inglês,

reforço escolar e ajuda psicológica.

Voluntários fazem a

diferença na vida

de muita gente,

seja levando

alimentos, roupas

ou apenas um

sorriso a uma

criançaa

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ess

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Page 16: Jornal lince outubro 2013

16 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013

Olhar jornalismo

TIARA

Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013

TRANSPARENTENunca imaginei ter um irmão. Já fiz

dezoito anos e apesar de meus pais

serem jovens, nunca me passou pela

cabeça ter outra pessoa morando em

nossa casa. Brinquedos espalhados no

chão, televisão ligada em desenhos ani-

mados, nada disso. Eis que escuto um

grito no banheiro, corro até lá e minha

mãe me mostra sem nem mesmo acredi-

tar, um exame de gravidez. E o resul-

tado: positivo.

Acompanhar a gestação foi a coisa

mais gostosa; comprar tudo o que via

pela frente, satisfazer todas as vontades

da minha mãe (a grávida em questão), e

lotar o médico de perguntas bobas foram

algumas delas. Como toda família acre-

dita no esotérico, fizemos o cálculo da

lua para descobrir o sexo do bebê, sendo

que o tal cálculo não dá errado com nin-

guém. Iríamos ter um menino em casa.

Tudo ficou azul; paredes, roupas, brin-

quedos, berço e até o nome já estava

definido: Rafael. Rafael ia ser cruzei-

rense, jogar videogame, assistir Ben 10 e

ter todos os carrinhos e bonecos da loja

(já tinha alguns inclusive). Chega o dia

do ultrassom, em que o resultado já era

mais do que uma certeza para todo

mundo, e o doutor nos manda a bomba:

— Parabéns, você vai ter uma menina.

Todo mundo ficou feliz por ser uma

menina , que , com cer teza , ser ia

mimada ao extremo. Centenas de rou-

pas foram às lojas para serem trocadas.

Começaram a chover sapatos femininos

de presente sendo que, uma semana

depois do resultado, duas gavetas já

estavam cheias de sapatos e um guarda-

-roupa cheinho de ves t idos . Não

escondo que fiquei um pouco decepcio-

nado. Como já havia traçado tantos pla-

nos, não gostei de ser contrariado —

acho que esse é o efeito de ser mimado

demais por dezoito anos consecutivos...

No dia 8 de agosto de 2013, às 21h33,

nasceu Isabella. Eu assisti o parto. Fui a

primeira pessoa a pegá-la no colo, colo-

quei uma tiara rosa na cabeça dela para

que ela não fosse trocada e por medo de

não reconhecê-la da próxima vez que

fosse vê-la. Nessa hora, pensei: “E se

fosse menino, como eu iria fazer para

marcá-lo? Não colocaria nele uma tiara

nem que fosse azul”. Só depois pude per-

ceber o quanto foi desnecessária aquela

atitude. Afinal, só depois de ver aquele

rostinho redondo e branquelo, foi que eu

percebi que, no meio de cem crianças, eu

reconheceria minha irmã de longe,

mesmo que a tiara fosse transparente.

Até porque, não se perde de vista tão

facilmente a coisa mais importante que

te aconteceu na vida.

roGer leon

(2º período)

fotos arquivo pessoal

Page 17: Jornal lince outubro 2013

Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013 17

Esporte

ATLETISMo: AS CAUSAS do INSUCESSoApós outro desempenho ruim em uma competição internacional, o Mundial de Atletismo, fica a pergunta: de quem é a culpa pelos fracassos recentes dos esportistas brasileiros?

fotos: arquivo pessoal/luís fernando de almeida paula

Page 18: Jornal lince outubro 2013

18 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013

Por João Vitor Cirilo e Caíque roCha

4º período / 2º período

O roteiro é sempre o mesmo. Nos

últimos anos, brasileiros que chegam a

competições esportivas internacionais

não conseguem grandes resultados vis-

tos em tempos passados. No último mês,

no Mundial de Atletismo em Moscou, o

Brasil não voltou com uma medalha

sequer. Quando as coisas pareciam dar

certo, no fechamento do torneio, até o

bastão no revezamento 4x100 metros

feminino caiu, jogando fora a única

chance de medalha restante para o Bra-

sil. Mas essa queda é apenas reflexo de

uma questão muito maior.

Qual seria o principal causador dos

fracassos recentes no esporte brasileiro?

O Estado não investe onde deveria? Falta

amor aos atletas, que pegam o dinheiro e

vão somente “a passeio”? Governo, confe-

derações e competidores apresentam, na

maioria das vezes, posições divergentes

sobre as causas do fraco desempenho.

De queM É a CulPa?

A questão acima gera divergências.

Após a última edição dos Jogos Olímpicos

e também neste Mundial de Atletismo,

muitos competidores culparam confede-

rações e o governo pelo fraco desempe-

nho. Daniel Ottoni, repórter do jornal “O

Tempo”, de Belo Horizonte, tem a mesma

visão. “Os atletas não possuem a melhor

estrutura para trabalhar. O esporte não é

valorizado como deveria e os resultados

no Mundial são uma consequência de

todo um descaso para com o esporte, que

vem de anos”, opina. “Atletas e treinadores

lutam muito todos os dias contra condi-

ções péssimas de treinamento. O governo

brasileiro é o maior culpado pela falta de

investimento”, completa Daniel.

Entretanto, para o maratonista Luís

Fernando de Almeida Paula, irmão de

Paulo Roberto de Almeida Paula, sétimo

colocado na maratona do Mundial, essa

postura crítica é errada. “Esse desempe-

nho ruim não é culpa nem do governo

nem da confederação. Em minha opi-

nião, é culpa do profissional, do atleta,

que tem que visar aquilo que ele quer”,

argumenta. “Falo para o meu irmão:

‘Paulo Roberto, você vai ficar em função

deste treino’. Brasileiro compete todo

fim de semana e quer chegar a uma

competição internacional achando que

vai ganhar ou subir no pódio. Não vai! É

outra pegada”, declara Luís Fernando,

de 34 anos, há 20 como corredor.

Para Solonei Silva, sexto colocado (o

melhor brasileiro) na maratona do Mun-

dial, não existe culpado. “A vida do atleta

não é fácil. Não se pode avaliar o desem-

penho do atleta em uma simples ou com-

plicada competição. Teria que acompa-

nhar o dia a dia durante o ciclo inteiro”.

Solonei também criticou a postura da

imprensa. “Eu nunca fiquei sabendo de

nenhuma mídia ou jornalista que fez isso

(acompanhar os treinos diariamente)”.

Dinheiro teM

Luís Fernando ressaltou que, nos últi-

mos tempos, nunca se teve tanto investi-

mento do Estado no esporte como agora.

“Muitos ficam com desculpa, falando bes-

teira na mídia. Nós podemos falar tudo, mas

o governo está investindo muito dinheiro

em cima do esporte. Tem dinheiro

sobrando. Você pede uma coisa, e o

governo banca. E por que o atleta chega

na hora e não dá resultado?”, questiona.

Solonei está de acordo. “Os clubes,

federações e confederação nunca tiveram

tanto apoio do governo e da iniciativa pri-

vada como estão tendo agora, como o

Bolsa Atleta, Bolsa Pódio, entre outros”.

Porém, para ele, estamos no caminho

correto. “Cabe aos atletas fazer o melhor

possível e isso está acontecendo”.

Luís Fernando criticou a postura de

alguns competidores, que, segundo ele, “só

pegam o dinheiro e colocam no bolso”. “E aí

você pensa: como esse atleta não conseguiu

um treinamento internacional? Porque ele

tem medo de mexer no bolso dele, não quer

investir, e aí fica difícil mostrar resultado.

Todo o dinheiro que entra para o meu irmão,

da Bolsa Atleta, da Confederação Brasileira

de Atletismo, é investido na carreira dele. A

diferença é essa”, conclui o maratonista.

renoVaÇão

Daniel Ottoni diverge da opinião de

Luís. “Atualmente eles (o governo)

investem pouco; antes, não investiam

nada. O governo não abre os olhos para o

Page 19: Jornal lince outubro 2013

Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013 19

atletismo, a não ser quando campeona-

tos importantes acontecem. Em cima da

hora, o resultado não vem. É preciso ter

investimento na base, pensar no futuro,

acreditar no esporte e demonstrar isso

por meio de ações. Não adianta investir

faltando dois ou três anos para Mundiais

e Olimpíadas”, observa Daniel Ottoni.

Falando sobre renovação, Luís Fer-

nando tem a mesma visão. “Em 2016,

chance real mesmo só na maratona, porque

vai correr no calor e pode ter chance de

pódio. Nas outras, só por Deus, porque não

há jovens. No feminino, faz dez anos que são

as mesmas meninas que ganham no Brasil.

Não se vê uma renovação. O trabalho pra

2016 deveria ter começado há uma década.

Agora, fica difícil”, avalia Luís Fernando.

D a n i e l O t t o n i re f o r ç a q u e a

mudança só poderá acontecer se for

feito um trabalho em longo prazo. “A

partir do momento em que investimen-

tos que mereçam elogios apareçam, os

resultados aparecerão em cinco ou sete

anos. O processo é lento”.

VaMos Às esColas

Com um território muito extenso e

grande população, é evidente que o Bra-

sil tem escondido por aí um grande

potencial. Pensemos nas inúmeras

escolas públicas. Alguém já parou para

refletir sobre o número de crianças e

jovens que poderiam se transformar em

atletas de ponta? Porém, na atual men-

talidade educacional no Brasil, esse

ainda não é o papel das escolas.

A reportagem do Jornal Lince procurou

a Secretaria Estadual de Educação de

Minas Gerais para ter um posicionamento

sobre o tema, e foi atendida por Celina Gon-

tijo, analista de educação em Educação

Física, e interlocutora dos Jogos Escolares

de Minas Gerais (JEMG). “Não podemos

ensinar o atletismo como competição den-

tro das escolas, e sim como esporte. Através

do JEMG é que descobrimos talentos em

jovens atletas. A formação deles é feita nos

clubes”, disse Celina. Segundo ela, o motivo

deve-se ao fato de que nem todos os alunos

têm vocação para determinado esporte.

“As categorias de base do atletismo no

Brasil são excelentes. Vários jovens atle-

tas, inclusive de Minas Gerais, venceram

campeonatos mundiais. Estamos sempre

organizando competições”, completa

Celina Gontijo, ao lembrar que o MEC

criou o projeto “Atleta na Escola”, que tem

como intuito estimular a prática do atle-

tismo e promover competições envol-

vendo escolas de todo o país.

Falta ValoriZaÇão

Elbert Fagundes é professor de Edu-

cação Física em uma escola estadual

localizada na capital mineira. Segundo

ele, um dos problemas encontrados nos

colégios é o total descaso e desvalorização

do profissional. “Encontramos dificul-

dade de transmitir conteúdos aos alunos

devido à falta de material, uma realidade

constante, péssimas condições de traba-

lho e alunos completamente desinteres-

sados com novos projetos e aulas”, afirma.

Para o professor, a falta de motiva-

ção para o trabalho nas escolas mineiras

se deve a um “governo que é punitivo,

desinteressado e que não pensa em edu-

cação”. Elbert criticou a postura do

governador de Minas Gerais, Antônio

Anastasia, que retirou todos os profissio-

nais de Educação Física das escolas

públicas de anos iniciais. “Crianças que

antes deveriam aprender o básico sobre

coordenação, equilíbrio e força, agora

são obrigadas a ficar dentro de sala de

aula, sem um professor especialista para

ensiná-las tais competências”.

“O Brasil poderia explorar muito mais

seu potencial. Imagine quanto atletas estão

perdidos por aí e que poderiam ser desco-

bertos se projetos e peneiras acontecessem

com mais frequência, se parcerias aconte-

cessem com escolas, se o investimento que

eles falam que existe acontecesse de ver-

dade. Teríamos vários atletas, por ano, com

condições de medalhas, e não um ou outro

que chegam apenas para participar e tentar

surpreender”, opina Daniel Ottoni.

“Estudos recentes mostram o cres-

cimento exagerado de doenças associa-

das ao excesso de peso e, com certeza, a

Educação Física escolar pode ajudar

nesse combate, estimulando o jovem a

ser ativo desde a sua infância para que

na vida adulta ele consiga definir aquilo

que mais gosta e desenvolver melhor tal

habilidade”, defende Elbert Fagundes.

Page 20: Jornal lince outubro 2013

20 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Setembro de 2013

MAdE IN MINASTALENTO

João Paulo Freitas

4º período

Lince - Conte-nos um pouco sobre sua

trajetória no jornalismo.

Barreto - Meu primeiro emprego foi na

assessoria de imprensa da Prefeitura Muni-

cipal de João Monlevade, logo depois que

completei os créditos no curso de comuni-

cação da PUC-Minas, no início de 1990.

Pouco depois, tive minha primeira experi-

ência em jornal, na sucursal do Hoje em Dia

em Governador Valadares. No ano seguinte,

fiz prova de estágio para O Globo e me mudei

de vez para o Rio. Trabalhei por sete anos na

editoria de esportes do jornal, pela qual

cobri dois Mundiais de Basquete e as Olim-

píadas de Atlanta em 96. Em 98, participei

da equipe que fundou o LANCE!. Trabalhei

no jornal, no site LANCENET!, coman-

dando a transformação em portal e a incor-

poração da Agência Sportpress, e coordenei

o lançamento da revista LANCE!A+.

Durante esse período, fiz um fellowship de

jornalismo na Universidade de Michigan e

na volta cursei o MBA Executivo do

Coppead-RJ. Depois, minha carreira trans-

correu dentro das Organizações Globo. Fui

editor-chefe do Portal do Esporte, trabalhei

na editoria de esportes da TV Globo como

produtor e repórter e, em 2003, fui para o

SporTV. Aqui, implantei o Núcleo de Produ-

ção (do qual fui chefe) e fui apresentador e

comentarista de vários programas: Redação

SporTV, Tá na Área, Troca de Passes,

SporTV Repórter, Arena Olímpica,

Momento Olímpico. Nos últimos dois anos,

fui correspondente do canal em Londres.

Voltei ao Brasil no meio deste ano e hoje

apresento o SporTV News, jornal do qual fui

editor-chefe antes dessa experiência no

exterior. Pelo SporTV, cobri duas Copas do

Mundo, duas Olimpíadas, uma Paralimpí-

ada e três Copas das Confederações, entre

outras competições internacionais.

lince - atualmente, quais as maiores

dificuldades que os jovens jornalistas

irão enfrentar para ingressar na área de

comunicador esportivo?

Barreto - Pelo que ouço quando con-

verso com estudantes de comunicação, um

dos principais problemas será a concorrên-

cia. Estou impressionado com o número de

jovens que ingressam nas faculdades de

comunicação pensando especificamente

em trabalhar com o jornalismo esportivo. E

não tenho certeza se nosso mercado conti-

nuará em crescimento nos próximos anos.

Existe todo um movimento de mudança de

hábitos de consumo que tem afetado áreas

importantes do mercado, principalmente

os jornais. É claro que eventos ao vivo

ainda têm um valor diferente, o que

pode preservar TVs e rádios enquanto

não tiverem de disputar os direitos com

a internet. É possível que os jovens que

hoje estudam para serem jornalistas

esportivos cheguem ao mercado num

momento de grande mudança. Mas eles

são também, como consumidores de

mídia, agentes dessa mudança, e têm

tudo para se adaptar rapidamente.

Lince - Como foi sua experiência como

correspondente internacional Sportv, em Lon-

dres, e quais os pontos positivos que trouxe

para a comunicação no Brasil?

Barreto - Para mim, foram dois anos

inesquecíveis, de grande crescimento pro-

fissional e pessoal. Mudar de país é uma

decisão bastante complicada, que mexe

com a logística de toda a família. Tenho dois

filhos, que tiveram de se adaptar a um

ambiente educacional totalmente dife-

rente, e minha mulher, que também é jorna-

lista, precisou adaptar sua carreira à nova

EnTREViSTA

Nascido na pequena cidade de Bicas, interior de Minas Gerais, Marcelo Guilhermino Barreto, 45 anos — mais conhecido

como Marcelo Barreto —, conheceu uma de suas maiores paixões, o jornalismo. Com uma vasta experiência e um currículo

invejável, Barreto figura entre os maiores jornalistas esportivos do país. Passou os dois últimos anos como correspondente

internacional em Londres, pelo canal por assinatura SPORTV. Atualmente ocupa a bancada do programa Sportv News, no

qual foi editor chefe. Confira abaixo o bate papo que tivemos com esse grande profissional da comunicação.

fotos sportv.Globo.Com

Page 21: Jornal lince outubro 2013

Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Setembro de 2013 21

realidade. Voltamos todos felizes e com

grandes experiências na bagagem — e agora

estamos passando pelo processo de readap-

tação. No meu caso, foi uma importante

reciclagem profissional. Saí do estúdio e

voltei para a rua. Cobri competições impor-

tantes, entrevistei grandes atletas, viajei por

toda a Europa e tive de me virar em outros

idiomas. Observei muita coisa na forma de

se cobrir esporte lá fora e acho que trouxe

alguns bons exemplos para usar no Brasil.

Lince - Como você avalia o futuro do fute-

bol brasileiro, tendo em vista o crescimento

econômico das equipes e, também, os eventos

internacionais prestes a serem realizados em

nosso país, em termos de visibilidade?

Barreto - Tenho dúvidas sobre quanto

tempo vai durar o crescimento econômico

das equipes. O que aconteceu nos últimos

anos foi um reflexo do crescimento da eco-

nomia brasileira como um todo, e esse

processo já está sofrendo uma desacelera-

ção. Os grandes times do futebol europeu

não foram tão abalados pela crise econô-

mica no continente — que também já

começa a mudar de curso — e voltaram a

fazer grandes contratações. Basta ver o

desastre que foi para o futebol brasileiro a

última janela de transferências. O uso das

arenas da Copa pelos clubes pode ter um

impacto positivo na arrecadação, mas é

preciso muito mais para competir com o

dinheiro que vem de fora. Alguns avanços

estão sendo feitos na administração de

dívidas, mas ainda é preciso melhorar o

calendário, resolver o problema das divi-

sões de base, investir em estrutura.

Lince - Durante os protestos feitos no

Brasil, você ainda residia na capital inglesa.

Como os europeus reagiram a todos esses

acontecimentos? Você acha que isso afetará na

vinda de turistas estrangeiros, principal-

mente para a Copa do Mundo 2014?

Barreto - Na época dos protestos, eu

morava em Londres, mas estava em Madri

cobrindo a Copa das Confederações. A rea-

ção aos protestos, lá, foi de perplexidade. Os

espanhóis, que vivem num país em crise,

com mais de um quarto da população sem

emprego formal, viam no Brasil um país em

crescimento econômico, e não imaginavam

que os brasileiros tinham motivos para

reclamar. Mas como os próprios espanhóis

se acostumaram a ver os protestos na Plaza

del Sol, em Madri, a repetição das imagens

acabou gerando uma simpatia, uma sensa-

ção de identificação. A imprensa esportiva

espanhola, que errou a mão em alguns

comentários sobre a Copa das Confedera-

ções, foi bastante equilibrada quando tratou

da questão dos protestos.

Lince - O futebol sempre foi o carro chefe

dos esportes no Brasil. O que você acredita que

deve ser feito para que modalidades como

vôlei, basquete, entre outros especializados,

atinjam um nível de excelência tão forte

quanto o dos gramados?

Barreto - Não vejo chances de isso

acontecer num futuro próximo, nem acho

que deva ser esse o foco de outros espor-

tes. O futebol é dominante em muitos

países do mundo, não apenas no Brasil.

Exerce esse domínio há muitos anos e

deve mantê-lo por muitos outros. O que os

demais esportes precisam fazer é encon-

trar seu espaço. Construir uma base sólida

de torcedores, investir no desenvolvi-

mento de talentos, manter-se competitivo

em nível internacional. Foi a receita que o

vôlei aprendeu há algum tempo, e que o

basquete parece ter esquecido.

Lince - Quem foi seu maior mestre na área

profissional, e quais as lições mais valiosas

que ele te deixou?

Barreto - Seria injusto escolher um

entre os muitos jornalistas que me inspira-

ram e me ajudaram ao longo da minha

carreira. Mas ainda pior seria fazer uma

lista e deixar alguém importante de fora.

Então, para não deixar a pergunta sem

resposta, cito aqui a maravilhosa convivên-

cia que tive com Armando Nogueira no

Redação SporTV. Ele já não era mais um

alto executivo da TV Globo, estava che-

gando aos 80 anos exercendo sua maior

paixão, falar de futebol. Mas trazia com ele,

claro, a experiência de quem tinha come-

çado a cobrir Copas do Mundo em 1954.

Era uma figura muito doce, um homem

muito inteligente, um jornalista brilhante.

Faz muita falta a todos nós que convivemos

com ele naquela época.

Lince - Avalie e faça um comparativo entre

a imprensa europeia e a brasileira.

Barreto - É muito difícil falar em

imprensa europeia. A inglesa é muito dife-

rente da francesa, da italiana, da espa-

nhola. Para ficar apenas no jornalismo

esportivo, os ingleses gostam mais de texto,

nos jornais, e de debates, nos programas de

TV. Os franceses dão menos espaço ao fute-

bol, dividem mais a atenção com outros

esportes. Espanhóis e italianos têm um

jeitão mais parecido com o brasileiro, mais

apaixonado. Os jornais espanhóis se porta-

ram mal durante a Copa das Confedera-

ções, fazendo comentários tendenciosos

para defender sua seleção de acusações de

mau comportamento fora de campo. No

geral, o que dá para dizer é que em termos

de qualidade, de tecnologia, a imprensa

brasileira não deixa muito a dever a essas

que citei. São características diferentes,

mas estamos num nível semelhante.

Lince - Para finalizar, deixe um recado

para os estudantes de comunicação do Centro

Universitário Newton (Belo Horizonte), que

pretendem seguir seus passos na carreira.

Barreto - O que gosto de dizer a

quem escolhe o jornalismo esportivo é

que nossa área não está isolada do resto

do mundo. Para falar de esporte, acaba-

mos falando também de economia, de

saúde, de direito, de política. Enfim, ser

uma Wikipédia ambulante sobre esporte

pode ajudar, mas com cultura geral se

vai muito mais longe. Boa sorte a todos,

nos encontramos nas coberturas!

Barreto esperando ansiosamente o início

das olimpíadas em londres

Page 22: Jornal lince outubro 2013

22 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 201322 Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva -

Feminismo

Antes dominado pelos homens, ringues, tatames e octógonos abrem cada vez mais espaço para o sexo feminino

Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do Centro universitário newton paiva - Outubro de 2013

MULhER MACho, SIM SENhoR!

Page 23: Jornal lince outubro 2013

CaMila ChaGas e PÂMela Matos

4º período

se você acha que lugar de mulher é

na cozinha, é porque ainda não viu o

desempenho delas no tatame ou no octó-

gono. o lugar onde a testosterona predo-

minava agora pode ser preenchido por

uma explosão de ovários. para as meni-

nas que cresceram admirando a coragem

de Maggie fitzgerald (protagonista do

filme “Menina de ouro”), em sua busca

pelo seu lugar ao sol no mundo da luta,

chegar em 2013 e participar da principal

organização de MMa do mundo, o ulti-

mate fighting Championship (ufC),

pode ser considerado dever cumprido.

no segundo evento com luta femi-

nina, realizado em agosto, em las Vegas,

o combate de mulheres, entre ronda

rousey e Miesha tate, foi considerado o

melhor da noite pelo público e pela crítica.

a transmissão gerou us$ 18 milhões só

com a venda de pacotes “pay-per-view”.

infelizmente, por enquanto, o ufC con-

tará apenas com uma categoria, a de

galos (até 61kg), o que dificulta a entrada

de mais lutadoras na competição. Mas,

para quem há pouco tempo não imagi-

nava tops e calções cor de rosas relacio-

nados a socos e cinturões, já é um grande

começo.

GranDe

VitÓria

o i n t e -

r e s s e d a s

m u l h e r e s

pelas lutas

v e m c r e s -

c e n d o a o

l o n g o d o s

anos, e mais

ainda o desejo

d e t o r n a r o

esporte uma pro-

fissão. Mas só em

março deste ano

elas puderam ter a

esperança de “bater”

de igual aos colegas de

p r o f i s s ã o , q u a n d o

dana White, presi-

dente do ufC, decidiu

ceder e aceitar o universo

feminino nos octógonos. depois de

acompanhar uma luta feminina entre

rousey e tate, ele se impressionou com

a força, e beleza, delas. “aquela foi uma

luta como se fosse entre homens; duas

mulheres inacreditavelmente talento-

sas que estão muito bem cercadas, e

não faz mal a ninguém quando elas são

bonitas também”, disse White em vídeo

gravado pela “showtime”, rede de

canais de tV por assinatura.

e, claro, o Brasil tem uma represen-

tante. Jéssica ‘Bate-estaca’ andrade foi a

primeira mulher a representar o país no

octógono. a paranaense encarou liz Car-

mouche na primeira luta do card princi-

pal do evento. infelizmente, para nós, a

americana levou a melhor com um

nocaute técnico no segundo round do

ufC on fox, em seattle (eua), mas a

inserção de brasileiras na competição já

pode ser considerada uma grande vitória.

não ProFissional

Mas o sucesso das lutas entre as

mulheres não é todo voltado ao esporte

profissional. Muitas desenvolveram o

interesse pelas lutas como uma forma de

aliviar a tensão e o estresse do cotidiano,

melhorar o condicionamento físico e até

como um exercício para perder calorias

(variam de 800 até 1.200 por hora no

MMa). “fora que aprender uns golpes e

técnicas de defesa pessoal nunca fez

mal a ninguém”, afirma a estudante ana

souza, que aos 21 anos pratica o MMa

amador há alguns meses e garante que

sua saúde física e psicológica só lucrou

com os exercícios.

Mas não é só o MMa que conquista o

público feminino. Jiu jitsu, taekwondo e

muay thai também são bem populares

entre as mulheres. a recepcionista thais

Vieira pratica jiu jitsu há sete anos e

afirma que o esporte trouxe muitas

melhorias para sua vida. “eu luto desde

criança, e acho que é um esporte que me

motiva e me completa. Quero continuar

praticando para o meu bem-estar”, conta

a jovem, que apesar do treinamento

intenso – três vezes na semana por uma

hora mais ou menos –, não vê o esporte

como uma profissão e nunca se interes-

sou em participar de competições.

Já namucheta ricardo pratica o

taekwondo há oito anos e participa de

competições há quase cinco. Mas

enfrenta um problema muito comum à

maioria das esportistas: patrocínio, ou

melhor, a falta dele. “Competir, para mim,

é algo extremamente gratificante. um

sonho é poder viver apenas para treinar e

competir, porém, a falta de patrocínio não

permite. por muitas vezes já pensei em

desistir das competições, pois não é fácil

viajar por Minas Gerais e pelo Brasil sem

patrocinadores, o que acaba sendo um

motivo de desistência para muitos”,

reclama namucheta, que também não

acredita que a questão do sexo influencie

essa falta de investimento. “não vejo o

fato de ser mulher como um agravante na

questão dos patrocínios, infelizmente

esta é uma realidade que ambos os sexos

compartilham”. porém, essa realidade

existe! o patrocínio para mulheres é

muito mais difícil e, quando conseguem,

são bem abaixo do que é dado para os

homens.

Mais tÉCniCas

o que mais diferencia as lutas mas-

culinas às femininas é que a das mulhe-

res é caracterizada pelo domínio da téc-

nica. Já os homens usam e abusam da

força quando estão de frente aos seus

oponentes. “os homens veem a luta

como uma forma de demonstrar sua

masculinidade, seu poder como o lado

forte e protetor da equação. as mulheres

são mais perfeccionistas e calculam

seus movimentos, a partir de técnicas e

critérios que elas desenvolvem nos trei-

nos”, acrescenta o personal sandro

Moreira. “até porque socos e rostos san-

grando ainda assustam um pouco as

mulheres”, diverte-se.

segundo sandro, qualquer mulher

pode começar a praticar luta, mas o trei-

namento inicial requer alguns cuidados

específicos. “É recomendado fazer mus-

culação, junto com a prática da luta para

evitar lesões graves e melhorar no condi-

cionamento físico”, orienta sandro. e

conclui que o que atrai as mulheres é

manter a academia cheirosa, limpa e

organizada. “além de tratá-las igual os

homens. isso é primordial”, enfatiza.

Page 24: Jornal lince outubro 2013