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Direito Administrativo – LFG – Intensivo I Prof.: Fernanda Marinela Indicação Bibliográfica: - CABM - JSCF - Fernanda Marinela Leituras Obrigatórias: - CR/88 - Lei 9.784/99 - Lei 8.666/93 (com as alterações das Leis 11.763 e 11.783, de 2008) - Lei 10.520/02 - Lei 9.986/00 - Lei 11.107/05 (+/-) - Lei 8.987/95 - DL 25/1937 Dicas extras: - Leitura de lei seca e de Informativos - Cadastro no push para receber por e-mail a movimentação das ações mais relevantes para a matéria. ÍNDICE INTRODUÇÃO:..........................................................................................................................................5 Direito:..................................................................................................................................................... 5 Direito Administrativo:............................................................................................................................ 5 Fontes do Direito Administrativo:........................................................................................................... 6 Sistemas Administrativos – Mecanismos de Controle: .......................................................................... 7 Estado x Governo x Administração:........................................................................................................7 Atividade Administrativa:......................................................................................................................10 REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO:............................................................................................ 11 Aspectos preliminares e Conceito:.........................................................................................................11 Princípios como normas integrantes do sistema jurídico:......................................................................11 Princípios que compõem o Regime Jurídico Administrativo:............................................................... 12 Pedras de toque do Direito Administrativo:...........................................................................................12 Princípios previstos no art. 37, caput, CR:.............................................................................................13 1) Legalidade: ................................................................................................................................... 13 2) Impessoalidade: ............................................................................................................................ 14 3) Moralidade: ...................................................................................................................................15 4) Publicidade: .................................................................................................................................. 16 5) Eficiência: .....................................................................................................................................18 Outros Princípios:.................................................................................................................................. 19 1) Isonomia: ...................................................................................................................................... 19 2) Contraditório e Ampla Defesa: .....................................................................................................20 3) Razoabilidade e Proporcionalidade:.............................................................................................. 22 4) Continuidade:.................................................................................................................................23 5) Autotutela:..................................................................................................................................... 24 6) Especialidade:................................................................................................................................25 7) Presunção de Legitimidade:...........................................................................................................25 1

Direito administrativo profa. fernanda marinela mari

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Direito Administrativo – LFG – Intensivo I

Prof.: Fernanda Marinela

Indicação Bibliográfica:- CABM- JSCF- Fernanda Marinela Leituras Obrigatórias:- CR/88- Lei 9.784/99- Lei 8.666/93 (com as alterações das Leis 11.763 e 11.783, de 2008)- Lei 10.520/02- Lei 9.986/00- Lei 11.107/05 (+/-)- Lei 8.987/95- DL 25/1937 Dicas extras:- Leitura de lei seca e de Informativos- Cadastro no push para receber por e-mail a movimentação das ações mais relevantes para a matéria.

ÍNDICE

INTRODUÇÃO:..........................................................................................................................................5Direito:.....................................................................................................................................................5Direito Administrativo:............................................................................................................................5Fontes do Direito Administrativo:...........................................................................................................6Sistemas Administrativos – Mecanismos de Controle: ..........................................................................7Estado x Governo x Administração:........................................................................................................7Atividade Administrativa:......................................................................................................................10

REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO:............................................................................................11Aspectos preliminares e Conceito:.........................................................................................................11Princípios como normas integrantes do sistema jurídico:......................................................................11Princípios que compõem o Regime Jurídico Administrativo:...............................................................12Pedras de toque do Direito Administrativo:...........................................................................................12Princípios previstos no art. 37, caput, CR:.............................................................................................13

1) Legalidade: ...................................................................................................................................132) Impessoalidade: ............................................................................................................................143) Moralidade: ...................................................................................................................................154) Publicidade: ..................................................................................................................................165) Eficiência: .....................................................................................................................................18

Outros Princípios:..................................................................................................................................191) Isonomia: ......................................................................................................................................192) Contraditório e Ampla Defesa: .....................................................................................................203) Razoabilidade e Proporcionalidade:..............................................................................................224) Continuidade:.................................................................................................................................235) Autotutela:.....................................................................................................................................246) Especialidade:................................................................................................................................257) Presunção de Legitimidade:...........................................................................................................25

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REFORMA ADMINISTRATIVA:...........................................................................................................27Introdução:.............................................................................................................................................27Mutação do modelo de Estado e de Administração Pública:.................................................................27Os 4 núcleos de atividades do Estado e as novas figuras da Administração:........................................31Síntese dos novos rumos da Administração Pública Brasileira:............................................................34

ORGANIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA:..........................................................................35Introdução:.............................................................................................................................................35Administração Direta e Administração Indireta:...................................................................................35Formas de prestação da atividade administrativa:.................................................................................36Descentralização:...................................................................................................................................40Relação Estado x Agente:......................................................................................................................44Órgãos Públicos:....................................................................................................................................45

→ Características dos órgãos públicos:.............................................................................................45→ Classificações de órgãos públicos:................................................................................................46

Pessoas Jurídicas que compõem a Administração Pública Indireta:.....................................................47Fundações:.............................................................................................................................................49Autarquias:.............................................................................................................................................51Conselhos de Classe:..............................................................................................................................53Autarquias de Regime Especial:............................................................................................................54Agências Reguladoras:...........................................................................................................................55Agências Executivas:.............................................................................................................................61Consórcios Públicos:..............................................................................................................................65Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista:..........................................................................66

ENTES DE COOPERAÇÃO / PARAESTATAIS:...................................................................................71Serviço Social Autônomo – “Sistema S”:..............................................................................................71Entidades de Apoio:...............................................................................................................................73Organização Social (OS):......................................................................................................................74Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP):...........................................................77

PODERES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA:.....................................................................................80Introdução:.............................................................................................................................................80Características:.......................................................................................................................................81Poder Vinculado e Poder Discricionário:..............................................................................................81Poder Regulamentar:..............................................................................................................................81Poder Hierárquico:.................................................................................................................................85Poder Disciplinar:..................................................................................................................................85Poder de Polícia:....................................................................................................................................87Quadro Sinóptico:..................................................................................................................................89

ATO ADMINISTRATIVO:.......................................................................................................................92Conceitos Gerais:...................................................................................................................................92Conceito de Ato Administrativo:...........................................................................................................94Elementos ou Requisitos do Ato Administrativo:.................................................................................94Quadro Comparativo:.............................................................................................................................95

- Sujeito Competente ou Competência:.............................................................................................96- Forma:..............................................................................................................................................98- Motivo:............................................................................................................................................99- Objeto:...........................................................................................................................................100- Finalidade:.....................................................................................................................................101

Outras considerações sobre os elementos do ato administrativo:........................................................102Atributos do ato administrativo:..........................................................................................................103Classificação dos atos administrativos:...............................................................................................103Modalidades de ato administrativo:.....................................................................................................104Formação e Efeitos dos atos administrativos:......................................................................................104Extinção dos atos administrativos:.......................................................................................................105Anulação do ato administrativo:..........................................................................................................106Revogação de ato administrativo:........................................................................................................106

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Convalidação x Sanatória x Estabilização:..........................................................................................107PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA NO DIREITO ADMINISTRATIVO:..............................................108

Segurança jurídica como fundamento dos institutos:..........................................................................108Prescrição:............................................................................................................................................108decadência:...........................................................................................................................................110

CONTROLE JUDICIAL DOS COMPORTAMENTOS PÚBLICOS:...................................................112Aspectos preliminares:.........................................................................................................................112Limites do controle judicial do comportamento público:....................................................................112Controle judicial dos atos vinculados e dos atos discricionários:........................................................113Os efeitos do silêncio administrativo e o controle da omissão administrativa ilícita:.........................115Controle do ato político:......................................................................................................................116

LICITAÇÃO:...........................................................................................................................................118Conceito e Finalidades:........................................................................................................................118Obrigação de licitar – Sujeitos:............................................................................................................118Competência para legislar em matéria de licitações:...........................................................................119Princípios em matéria de licitações:....................................................................................................120Hipóteses de contratação direta:..........................................................................................................120

→ Dispensa:.....................................................................................................................................120→ Inexigibilidade:...........................................................................................................................121

Alguns conceitos importantes:.............................................................................................................122Modalidades de Licitação:...................................................................................................................122

A) Em razão do Valor:.....................................................................................................................123- Concorrência:.................................................................................................................................123- Tomada de Preços:.........................................................................................................................123- Convite:.........................................................................................................................................124B) Em razão do Objeto:...................................................................................................................125 - Leilão:...........................................................................................................................................125- Concurso:.......................................................................................................................................125- Pregão:...........................................................................................................................................126→ Observações Finais:....................................................................................................................127

Procedimento:......................................................................................................................................128Procedimento do Pregão:.....................................................................................................................132

CONTRATOS ADMINISTRATIVOS:...................................................................................................135Introdução:...........................................................................................................................................135Conceito:..............................................................................................................................................135Características:.....................................................................................................................................135Formalidades do contrato administrativo:...........................................................................................136Cláusulas necessárias dos contratos administrativos:..........................................................................137Garantia:...............................................................................................................................................137Duração do contrato:............................................................................................................................137Cláusulas Exorbitantes:........................................................................................................................138Exceptio non adimpleti contractus:......................................................................................................141Extinção do contrato:...........................................................................................................................142

SERVIÇOS PÚBLICOS:.........................................................................................................................143Conceito:..............................................................................................................................................143Princípios aplicáveis:...........................................................................................................................143Estrutura:..............................................................................................................................................144Classificação:.......................................................................................................................................145Delegação de serviço público:.............................................................................................................146Concessão de serviço público:.............................................................................................................147

A) Concessão comum de serviço público:.......................................................................................147B) Concessão especial ou Parceria Público-Privada:.......................................................................150

Permissão de serviço público:..............................................................................................................151Autorização de serviço público:...........................................................................................................153

AGENTES PÚBLICOS:..........................................................................................................................154

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Introdução:...........................................................................................................................................154Conceitos importantes:.........................................................................................................................154Classificação dos agentes públicos:.....................................................................................................154Acessibilidade:.....................................................................................................................................157Questões jurisprudenciais sobre o concurso público:..........................................................................159Estabilidade dos Servidores:................................................................................................................161Sistema Remuneratório:.......................................................................................................................163Teto Remuneratório:............................................................................................................................164Acumulação de cargos:........................................................................................................................165Aposentadoria:.....................................................................................................................................166

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO:......................................................................................171Considerações gerais:...........................................................................................................................171Princípios Justificadores:.....................................................................................................................171Evolução da responsabilidade civil do Estado:....................................................................................171Aspectos constitucionais:.....................................................................................................................173Características do dano indenizável:....................................................................................................175Ação de Responsabilidade Civil:.........................................................................................................176Prazo Prescricional:.............................................................................................................................177Observações importantes:....................................................................................................................177

INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE:.........................................................................178Aspectos preliminares:.........................................................................................................................178Evolução histórica da Propriedade:.....................................................................................................178Função Social da Propriedade:.............................................................................................................180Considerações Gerais:..........................................................................................................................181Mecanismos de Intervenção:................................................................................................................182Formas de Intervenção:........................................................................................................................183Desapropriação Indireta:......................................................................................................................183Limitação Administrativa:...................................................................................................................184Servidão Administrativa:.....................................................................................................................186Requisição Administrativa:..................................................................................................................188Ocupação Temporária:.........................................................................................................................189Tombamento:.......................................................................................................................................190Desapropriação:...................................................................................................................................193

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(01/08/08)

INTRODUÇÃO:INTRODUÇÃO:

• Direito:

→ Conceito: conjunto de regras e princípios impostos coativamente pelo Estado que vão disciplinar a coexistência pacífica dos seres em sociedade.

→ Subdivisões:- Direito Interno: relações internas ao território- Direito Internacional: relações externas ao território- Direito Público: é aquele que se preocupa com a satisfação do interesse público. Na busca desse interesse público ele regulamenta, define a atuação do Estado.- Direito Privado: é aquele que se preocupa com os interesses dos particulares.

→ Direito Público x Ordem Pública:Não são sinônimos! Uma regra de ordem de pública é aquela regra inafastável,

imodificável pela vontade das partes. Toda regra de direito público também é uma regra de ordem pública, mas o inverso não é verdadeiro: nem toda regra de ordem pública é regra de direito público (ex.: regras sobre capacidade civil, impedimentos matrimoniais, etc., são regras de direito privado e são inafastáveis pela vontade das partes). Ou seja, também se encontram regras de ordem pública no direito privado. O conceito de ordem pública, portanto, é mais abrangente do que o conceito de direito público.

• Direito Administrativo:

As divergências doutrinárias existentes tem como origem a discussão quanto ao objeto do Direito Administrativo. Inicialmente a Corrente Legalista ou Exegética afirmava que o Direito Administrativo se preocupava somente com o estudo da lei seca. Esta corrente foi criticada porque só o estudo da lei é pouco para ser o objeto do Direito Administrativo como um todo, seria preciso também o estudo de princípios para definir o objeto do DA. Por isso foram criados alguns Critérios ou Teorias para definir o Direito Administrativo:

a) Critério do serviço público: o Direito Administrativo estudava todo o serviço prestado pelo Estado, ou seja, se o Estado prestou o serviço a matéria era de DA, caso contrário não era. Não é um critério válido no Brasil porque, na verdade, não é todo serviço prestado pelo Estado que será objeto do DA e nem podemos falar somente em serviços quando se fala em DA.

b) Critério do Poder Executivo: o DA não tem como objeto de estudo tão somente o Poder Executivo. Também não é um critério válido no Brasil.

c) Critério das Relações Jurídicas: o DA estuda toda a relação jurídica do Estado. Também não é admitida porque o DA não estuda todas, mas somente algumas relações jurídicas (caso contrário não seria necessária a existência dos demais ramos do direito).

d) Critério Teleológico: trazido pelo doutrinador Osvaldo Aranha Bandeira de Mello (pai de CABM); é um conceito aceito no Brasil, mas foi dito como insuficiente; segundo este critério, o DA é um conjunto de regras e princípios. É mesmo um conceito muito simplório. Os critérios que o sucederam foram sempre aceitos, mas sempre na tentativa de melhorar este critério teleológico.

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e) Critério Residual ou Negativo: segundo este critério, o DA é definido por exclusão – o DA não se preocupa com a função jurisdicional e nem com a função legislativa do Estado, ele fica com a atividade residual. Também não é um critério suficiente.

f) Critério de distinção da atividade jurídica e da atividade social do Estado: o DA se preocupa com a atividade jurídica e não com a atividade social do Estado, por isso é preciso fazer uma distinção entre elas. Há atividades sociais do Estado sim, mas o DA se preocupa com a atividade jurídica do Estado, inclusive com o aspecto jurídico das atividades sociais (ex.: controle sobre as contas das bolsas escola, família, etc.)

g) Critério da Administração Pública: trazido pelo doutrinador HLM; é o aceito no Brasil como mais completo, pois é uma soma dos conceitos / critérios anteriores. Assim, de acordo com este critério, pode-se afirmar que Direito Administrativo é um conjunto harmônico de princípios e regras que rege os órgãos públicos, os agentes públicos e a atividade administrativa como um todo, realizando de forma direta, concreta e imediata, os fins desejados pelo Estado.→ OBS.: (explicação de porque se trata da soma dos critérios anteriores)

Este conjunto harmônico de princípios e regras nada mais é do que o Regime Jurídico Administrativo.

Quem estabelece os fins desejados pelo Estado é o Direito Constitucional, o DA apenas executa, realiza os fins e objetivos do Estado. Por esta razão, estas duas disciplinas andam sempre juntas.

→ Realização direta, concreta e imediata: - A função do Estado será direta ou indireta se depender ou não de provocação. A função

administrativa é direta porque não depende de provocação. A função que depende de provocação é a jurisdicional (a Jurisdição é inerte).

- A realização de forma concreta exclui a função abstrata do Estado; significa que a função administrativa tem destinatários determinados e produz efeitos concretos (ao contrário da função legislativa, que é abstrata).

- A função imediata do Estado é a atividade jurídica, que se diferencia da função mediata, que é aquela correspondente à atividade social (o DA não se preocupa com o social).

Os critérios que mais caem nos concursos são: critério teleológico, critério do Poder Executivo e, é claro, o critério da Administração Pública.

• Fontes do Direito Administrativo:

Fonte é aquilo que leva ao surgimento de alguma coisa.São as seguintes as fontes do DA:

1) Lei em sentido amplo (qualquer espécie normativa) → atenção: o nosso ordenamento jurídico, segundo a denominação do STF, tem uma estrutura escalonada, assim, as normas inferiores devem ser compatíveis com as superiores, e todas elas devem ser compatíveis com a CR/88. A esta idéia de compatibilidade o STF deu o nome de “relação de compatibilidade vertical”. Ou seja, o ato administrativo tem que ser compatível com a lei e tem que ser compatível com a CR/88.

2) Doutrina → é o resultado do trabalho dos estudiosos; no DA a doutrina é muito divergente e, ainda, tem como tendência ser mais universal, portanto, muitas vezes ela não esclarece todas as questões.

3) Jurisprudência → tem um caráter mais nacionalista, mais local, por isso pode ser mais útil. Jurisprudência são julgamentos reiterados num mesmo sentido (é diferente de uma simples decisão isolada). Quando se trata de uma jurisprudência consolidada, sedimentada no Tribunal, ela pode se tornar Súmula deste Tribunal. Súmula no Brasil tem valor de orientação, mas

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algumas podem ter efeito vinculante, a partir da EC 45, sendo que, para que a súmula ganhe este efeito vinculante, é preciso que ela seja submetida a um procedimento próprio previsto na Lei 11.417. A Súm. vinculante obriga os administradores e demais órgãos do PJ, ou seja, ninguém poderá julgar em sentido contrário.

4) Costume → no Brasil, costume nem crime e nem exime obrigação; nada mais é do que a prática habitual acreditando ser ela obrigatória.

5) Princípios Gerais do Direito → são os princípios que compõe o alicerce do nosso Direito; na sua maioria são regras implícitas (eles não precisam estar escritos) – exs.: ninguém pode beneficiar-se da própria torpeza; aquele que causar dano a outrem tem que indenizar; vedação ao enriquecimento sem causa.

• Sistemas Administrativos – Mecanismos de Controle:

Quem pode controlar os atos praticados pelo administrador?→ Sistemas:

1) Contencioso Administrativo ou Sistema Francês: segundo este sistema, quando o ato é praticado pela Administração, ele deve ser revisto pela própria Administração (em regra), admitindo-se, excepcionalmente, o controle pelo Poder Judiciário, em 5 hipóteses (rol exemplificativo): - em caso de atividade pública de caráter privado: ex.: contrato de locação celebrado pelo Estado com o particular (atenção: mesmo sendo um contrato de regime privado, isso não dispensará o dever de licitar); - quando tratar-se de ação ligada ao estado das pessoas;- quando tratar-se de ação ligada à capacidade das pessoas;- quando tratar-se de propriedade privada;- quando tratar-se de repressão penal.Obviamente, não é este o sistema adotado no Brasil.

2) Sistema de Jurisdição Única: predomina o Poder Judiciário, que é quem decide em última instância. Mas há também o julgamento pela Administração (exs.: processo disciplinar, processo administrativo de trânsito, etc.) que, no entanto, não impede o controle pelo Judiciário, que será sempre possível. É o adotado no Brasil. Atenção: a EC 7, de 1977 introduziu no Brasil o Sistema do contencioso administrativo, mas ele não saiu do papel, ou seja, o Brasil sempre teve na prática o Sistema de Jurisdição Única.Questão: é possível a admissão de um sistema misto de controle? Não. Não há que se falar em sistema misto, até porque a mistura de Administração e Judiciário já e natural em qualquer dos dois sistemas, o que há é uma preponderância de um ou de outro em cada um dos sistemas.

• Estado x Governo x Administração:

Questão: a responsabilidade civil da Administração no Brasil está sujeita, em regra, à Teoria da Responsabilidade Objetiva?

Resposta: NÃO! Parece correta a questão, mas não está. A responsabilidade não é da Administração, é do Estado!!!

Atenção para a diferenciação:

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Estado : é uma pessoa jurídica de direito público; sob o ponto de vista constitucional, é pessoa jurídica territorial soberana, é uma nação politicamente organizada, dotada de personalidade própria, sendo pessoa jurídica de direito público que contém seus elementos e três poderes. É ele que tem personalidade jurídica e tem aptidão para ser sujeito de direitos e obrigações.

Obs.: nem sempre foi assim. Existia no Brasil a “Teoria da dupla personalidade” → quando o Estado exercia atividade de natureza publica, tinha natureza de direito público, quando exercia atividade de natureza privada, tinha natureza de direito privado. Mas esta Teoria está superada e não é mais admitida no Brasil. Como ente personalizado, o Estado tanto pode atuar no campo do direito público, como no do direito privado, mantendo sempre sua personalidade de direito público.

Vale lembrar o conceito de Estado de Direito como Estado, juridicamente organizado e obediente às suas próprias leis.

O Estado é composto de três elementos originários e indissociáveis: o povo (que representa o componente humano), o território (que é a sua base física), e o governo soberano (que é o elemento condutor do Estado, que detém e exerce o poder absoluto de autodeterminação e auto-organização, emanado do povo).

Não se admite Estado independente sem soberania, isto é, sem esse poder absoluto, indivisível e incontrastável de organizar-se e de conduzir-se, segundo a vontade livre de seu povo e de fazer cumprir as suas decisões, inclusive pela força, se necessário.

Governo : é a direção, o comando do Estado (atividade política de índole discricionária). Para que o Estado seja independente, o governo precisa ser soberano. Soberania é independência na ordem internacional e supremacia na ordem interna (“lá fora eu faço o que quiser e aqui dentro quem manda sou eu”).

Na verdade, o Governo pode ser definido em diversas vertentes: em sentido formal, Governo é o conjunto de Poderes e órgãos constitucionais; já no seu aspecto material, é o complexo de funções estatais básicas; e, num enfoque operacional, é a condução política dos negócios públicos, estando constante a expressão política de comando, de iniciativa, de fixação de objetivos do Estado e de manutenção da ordem jurídica vigente, atuando, por meio de atos de soberania e atos de autonomia, como direção suprema dos interesses públicos.

Em resumo, é uma atividade política e discricionária, representando uma conduta independente do administrador, como um comando com responsabilidade constitucional e política, mas sem responsabilidade profissional pela execução.

→ O nosso Estado, segundo a tripartição clássica de Montesquieu, é dividido em 3 Poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário. (Atenção: Poderes do Estado é ≠ de poderes da Administração, que são os poderes hierárquico, regulamentar, disciplinar, e de polícia).

Para cada Poder do Estado foram definidas algumas funções.Função é uma atividade em nome e no interesse de outrem. Função pública é uma

atividade em nome e no interesse do povo. Nossos administradores exercem função pública, ou seja, o direito e o interesse é nosso, do povo, eles são meros representantes.

Cada Poder tem funções principais (típicas – para as quais aquele Poder foi criado) e funções secundárias (atípicas). Funções típicas de cada Poder:

- Legislativo → legislar + fiscalizar (segundo alguns autores que estão incluindo esta função de fiscalizar dentre as funções típicas do PL)- Executivo → administrar; executar o ordenamento vigente- Judiciário → julgar; aplicar coativamente a lei na solução dos conflitos

Características de cada função principal:

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- Função legiferante: inova o ordenamento jurídico (somente esta função tem este poder). Esta é uma função em regra abstrata, mas há, excepcionalmente, leis de efeitos concretos, que têm cara, procedimento e forma de lei, mas que em seu conteúdo não é nada mais do que um ato administrativo. A função legislativa tem caráter geral, aplicável erga omnes. Pode ser exercida diretamente, independentemente de provocação, o que, contudo, não impede a provocação.

- Função jurisdicional: não inova o ordenamento jurídico. É concreta (o controle concentrado de constitucionalidade não é a regra geral, mas a exceção). É indireta, depende de provocação. Tem como característica essencial a intangibilidade jurídica, ou seja, impossibilidade de mudança, imutabilidade, produção da cosa julgada (só o PJ tem esta característica).

- Função executiva: não inova o ordenamento jurídico (a edição de MP é função atípica!). A atuação é concreta. É direta. É revisível pelo PJ (no que tange à legalidade). Obs.: a expressão “coisa julgada administrativa” é na verdade equivocada, quer dizer que não cabe mais recurso na via administrativa, mas não perante o PJ (não é uma verdadeira coisa julgada).

Administração : Administração e Governo são termos parecidos e, muitas vezes, confundidos, embora expressem conceitos diversos, nos vários aspectos em que se apresentam. O Governo e a Administração, como criações abstratas da Constituição e das leis, atuam por intermédio de suas entidades (pessoas jurídicas), de seus órgãos (centros de decisão) e de seus agentes (pessoas físicas investidas em cargos e funções).

Administração é todo o aparelhamento do Estado pré-ordenado à realização de serviços, visando à satisfação das necessidades coletivas. Não pratica atos de governo; pratica atos de execução, com maior ou menor autonomia funcional. Conforme a competência dos órgãos e de seus agentes, é o instrumental de que dispõe o Estado para colocar em prática as opções políticas do Governo.

A doutrina também coloca uma segunda utilização para essa expressão, estabelecendo que a Administração Pública, de igual forma, pode ser conceituada como uma atividade neutra, normalmente vinculada à lei ou à norma técnica, exercendo uma conduta hierarquizada, sem responsabilidade constitucional e política, mas com responsabilidade técnica e legal pela execução. Destarte, a Administração tem poder de decisão somente na área de suas atribuições e competência executiva, só podendo opinar sobre assuntos jurídicos, técnicos, financeiros ou de conveniência administrativa, sem qualquer faculdade de opção política.

A Administração, na verdade, tem duas acepções ou critérios:

a) Critério formal / orgânico / subjetivo: administração pública nada mais é do que a máquina administrativa (órgãos, agentes, bens que compõem a estrutura); é o instrumento que detém o Estado para por em prática as decisões políticas do Governo; é o conjunto de órgãos instituídos para a consecução dos objetivos do Governo. Para muitos autores, inclusive, é sinônimo de Estado, quando pensado em seu aspecto físico estrutural. Assim, neste sentido, a expressão Administração Pública deve ser grafada com as iniciais maiúsculas.

b) Critério material / objetivo: administração pública significa atividade administrativa; atividade exercida nos limites da lei e da norma técnica; é o conjunto de funções necessárias para os serviços públicos. Neste sentido, a expressão administração pública deve ser grafada com todas as letras minúsculas.

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HLM entende haver ainda um critério operacional, que define a Administração como o desempenho perene e sistemático, legal e técnico dos serviços próprios do Estado ou por ele assumidos em benefício da coletividade.

• Atividade Administrativa:

É a gestão de bens e interesses qualificados da comunidade, de âmbito federal, estadual e municipal, segundo os preceitos do Direito e da Moral, visando ao bem comum. Representa toda atividade desenvolvida pela Administração, protegendo os interesses da coletividade e decorre do fato de o Brasil ser uma república, em que toda atividade desenvolvida deve privilegiar a coisa pública.

A natureza da Administração Pública, enquanto atividade administrativa, é de múnus público para quem a exerce, caracterizando-se como um dever de defesa, conservação e aprimoramento dos bens serviços e interesses da coletividade, não se admitindo a liberdade para a perseguição de outros interesses.

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REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO:REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO:

• Aspectos preliminares e Conceito:

O Estado, ao realizar a função administrativa, submete-se a um regime jurídico próprio que lhe impõe restrições e assegura prerrogativas.

O regime jurídico administrativo é o conjunto de normas que exorbita o direito privado e que estabelece sujeições e benefícios em face da Administração e daqueles que com ela mantêm vínculos jurídicos.

É, pois, o conjunto de princípios e regras que guardam entre si uma correlação lógica, que têm entre si um ponto de coincidência.

É um conjunto sistematizado de princípios e normas que dão a esta disciplina autônoma identidade e a diferencia das demais ramificações do Direito, reconhecendo a existência de princípios que lhe são peculiares e que guardam entre si uma relação lógica de coerência e unidade, compondo um sistema ou regime.

O regime jurídico administrativo, assim, tem grande valor metodológico, porque explica cada um dos institutos de Direito Administrativo e permite a compreensão da respectiva disciplina.

A Administração Pública quando age não está sujeita à normas de direito privado, mas sim a normas de direito público.

Ao contrário das normas de direito privado, que regulam relações jurídicas em termos de igualdade, as normas de direito público outorgam ao ente incumbido de cuidar do interesse público (o Estado) posição de autoridade nas relações jurídicas que trave, sendo os poderes daí decorrentes limitados e condicionados pelo próprio ordenamento.

Se as normas que asseguram prerrogativas e cominam sujeições restringiam-se, em uma visão clássica, somente às regras legais aprovadas pelo Parlamento, hoje é manifesta a importância atribuída, no regime jurídico administrativo, aos princípios, bem como aos regulamentos e aos atos regulatórios da Administração Pública.

Além da proliferação de decretos veiculadores de regulamentos e de atos regulatórios em geral, adquire cada vez maior importância o estudo das normas principiológicas, afinal, os princípios assumem importância central no regime que vincula às relações administrativas exigências de razoabilidade, segurança jurídica e boa-fé.

Pode-se afirmar, assim, que a efetividade do regime jurídico público depende, hoje em dia, da real compreensão de todas as normas que o integram, e, principalmente, do papel dos princípios na normatização das relações jurídico-administrativas, como fundamento e finalidade última a ser implantada pela Administração.

• Princípios como normas integrantes do sistema jurídico:

Aos princípios tem sido atribuída a função de servir como base para a atual evolução da ciência jurídica, uma vez que a celeridade das transformações sociais impede a sincronicidade com a produção das regras necessárias à regulação das complexas e mutáveis realidades. A flexibilidade epistemológica que lhes é característica e a possibilidade de legitimarem regulamentação, julgamentos e condutas renovadas atendem à multiplicidade inerente à sociedade contemporânea.

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Tal transformação vincula-se à redução da densidade normativa das leis administrativas, presente no momento em que os Parlamentares reconhecem a sua incapacidade regulativa exaustiva da atuação pública sem incorrer no equívoco de renunciar à reserva legal que lhes deve ser resguardada.

Referido processo assume peculiar importância em se considerando a tendência atual de homogeneização do conhecimento e do seu produto, da qual resulta a atitude comum de importar normas concebidas para outras estruturas sociais e estatais, com o objetivo de aplicá-las a países com realidades diversas. Neste contexto, os princípios despontam como instrumento capaz de reduzir o desajustamento decorrente das diferenças sócio-culturais, históricas, geográficas e jurídicas, e diminuem os efeitos potencialmente danosos da tantas vezes precipitada globalização normativa. Firmam-se como axiomas jurídicos que se vinculam à cultura de uma dada sociedade e que expressam a ideologia política e jurídica prevalecente, consagrando valores ideais que servem como pontos básicos e vitais do próprio Direito. Tornam também desnecessária a substituição radical de um sistema anterior em função de novas necessidades históricas, garantindo um mínimo de segurança jurídica. a maleabilidade deles resultante e a plasticidade a eles inerente não compromete a estabilidade normativa do ordenamento, mas, ao contrário, a assegura.

Assim sendo, cumpre analisar os princípios que constituem o pilar do Direito Administrativo enquanto sistema jurídico, bem como a positividade capaz de assegurar a realização das diversas funções hodiernamente lhes atribuídas.

• Princípios que compõem o Regime Jurídico Administrativo:

A doutrina diverge sobre quantos são e quais são os princípios que compõem o Regime Jurídico Administrativo. Mas uma coisa é certa, só compõe a lista aquele princípio que tenha relação com os demais.

• Pedras de toque do Direito Administrativo:

São aqueles princípios que estão na base do Direito Administrativo (segundo CABM). Todos os demais princípios do Direito Administrativo são decorrência desses:

1) Supremacia do interesse público : superioridade, sobreposição do interesse público (coletivo) em face do interesse individual. É pressuposto para a existência da vida em sociedade, para o convívio social. É um princípio implícito na CR/88 (não está expresso em nenhum artigo), mas é fácil identifica-lo dentro da estrutura da Administração, pois está presente em praticamente todos os institutos (ex.: direito de propriedade x desapropriação ou requisição; exercício do poder de polícia; auto-executoriedade dos atos administrativos; cláusulas exorbitantes dos contratos administrativos). Diante da existência de tantos abusos, há quem afirme que deveria haver a desconstituição deste princípio, ou seja, que ele deveria desaparecer de nosso ordenamento jurídico (Marsal Justen Filho); mas, segundo a doutrina majoritária, esta não seria a saída adequada, mas sim a utilização adequada do princípio para que não existissem mais tantos abusos.

2) Indisponibilidade do interesse público : a Administração Pública, o administrador não pode abrir mão do interesse público, justamente porque ele não é o detentor do interesse, do direito, não podendo, pois, dele dispor. Ele exerce função pública, exerce a atividade em nome e no interesse do povo. Quando a AP não faz concurso público e contrata diretamente, ou quando

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não licita, viola primeiramente o principio da indisponibilidade do interesse público, que é um princípio constitucional.

(07/08/08)

Vale lembrar qual é o conceito de Interesse Público, o que não é uma tarefa fácil diante das diversas divergências doutrinárias: numa conceituação básica, interesse público é a soma dos interesses individuais dos membros de uma sociedade, desde que este número represente a sua maioria.

A doutrina italiana (em especial o autor Renato Alessi) distingue interesse público primário e interesse público secundário: o interesse público primário é efetivamente o interesse do povo, da coletividade, enquanto o interesse público secundário é a vontade do Estado, enquanto pessoa jurídica. O que se espera é que o interesse público primário coincida com o secundário, sendo com ele compatível, mas isso nem sempre ocorre na prática. Ex.: arrecadação de impostos pelo Estado, de forma abusiva (é o interesse do povo que o Estado arrecade dinheiro, mas nesse caso não é exatamente a vontade do povo que exista abuso na arrecadação, e o reconhecimento dos abusos e sua vedação é justamente a prevalência do interesse público primário em detrimento do interesse público secundário). Assim, não havendo coincidência entre os dois interesses, nosso ordenamento privilegia o interesse público primário., o que se protege efetivamente é o interesse do povo.(☺ texto colocado no material de apoio)

• Princípios previstos no art. 37, caput, CR:

A AP de qualquer dos Poderes, Direta ou Indireta, estão sujeitas aos Princípios da: Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Publicidade, e Eficiência (LIMPE).Este art. foi alterado pela EC 19/98 (Reforma Administrativa), que introduziu ao rol o Princípio da Eficiência. Mas esses não são os únicos Princípios aplicáveis à Administração. Existem inúmeros outros princípios a que se sujeita a AP.

Os previstos expressamente no caput do art. 37 são:

1) Legalidade:

Pode ser encontrado em diversos dispositivos constitucionais (☺art. 5º; art. 37; art. 150, CR – o constituinte preocupou-se muito com este Princípio ao ponto de chegar a ser redundante). Este princípio está na base de um Estado de Direito. Estado de Direito é o Estado politicamente organizado, e que obedece às suas próprias leis.

→ Legalidade foi conceituada por Seabra Fagundes com a seguinte expressão: “Administrar é aplicar a lei de ofício”, ou seja, independentemente de qualquer cobrança ou exigência, quando o administrador aplica a lei ele está administrando (é um conceito muito cobrado pela FCC).

→ Este princípio tem 2 enfoques ou aplicações diferentes:- Legalidade para o Direito Público: o administrador só pode fazer o que a lei autoriza

ou determina, não tem liberdade ou flexibilidade para criar regras novas; segue o chamado

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“critério de subordinação à lei”. Ele não é um mero executor da lei, ele tem discricionariedade sim, mas dentro dos limites da lei (a liberdade do administrador é a dada lei).

- Legalidade para o Direito Privado: a legalidade significa que o particular pode tudo, salvo o que estiver vedado, proibido em lei. É o chamado de “critério de não contradição à lei”.

Assim, para o Direito Administrativo, objeto lícito de um ato jurídico não é o que não está vedado ou proibido, mas pelo contrário, é aquele que está previsto na lei, e isso decorre do Princípio da Legalidade.

Ex.: Na aplicação de uma pena (ex.: multa de trânsito, penalidade disciplinar), o administrador deve dar observância à lei; a criação de um cargo público deve estar autorizada em lei, e em qualquer outra circunstância, a atuação do Estado deve estar em consonância com a lei. A atividade administrativa tem toda a sua atividade na previsão legal, na lei.

→ Atualmente, este Princípio tem uma aplicação mais ampla do que a pensada antigamente. É entendido em sentido amplo. Legalidade em sentido amplo significa que a legalidade não é só o controle na aplicação da lei, mas também das normas constitucionais. O controle dos atos que violam princípios constitucionais também é um controle de legalidade (além de ser um controle de constitucionalidade), este controle também advém do Princípio da Legalidade. Controle de legalidade = lei + Constituição.

→ Princípio da Legalidade x Princípio da Reserva de Lei: não são sinônimos. Para o Direito Administrativo, o Princípio da Reserva de Lei significa separar uma determinada matéria e dar a ela uma determinada espécie normativa (ex.: matéria “x” depende de LO, matéria “y” depende de LC), é a mera seleção, escolha de uma espécie normativa (é só uma fatia da Legalidade). Legalidade, por sua vez, é fazer o que a lei determina, como um todo.

2) Impessoalidade:

Significa que o administrador não pode agir buscando interesses individuais, pessoais, próprios (ou de amigos, de familiares, etc.). Este Princípio exige do administrador a ausência de subjetividade em sua atuação. Os dois institutos que representam a impessoalidade por excelência são: a licitação e o concurso público. Obs.: o concurso previsto na Lei 8.666/93 é ≠ do concurso público (este último tem como objetivo o provimento de cargo público, e não é modalidade de licitação).

→ Princípio da Impessoalidade x Princípio da Finalidade: há duas correntes diversas quanto a esta relação: 1ª) segundo a doutrina tradicional (ex.: HLM), o Princípio da Finalidade é um velho Princípio (antes também chamado de Princípio da Imparcialidade) que com a nova Constituição foi substituído pelo Princípio da Impessoalidade, assim, para esta corrente eles são sinônimos, tendo ocorrido simplesmente uma troca de terminologia; 2ª) segundo a doutrina moderna (ex.: CABM – sendo esta a corrente adotada por nosso ordenamento) esses princípios são princípios autônomos, que não se confundem: o Princípio da Finalidade significa buscar o espírito da lei, a vontade maior da lei. Assim, para a doutrina moderna, o Princípio da Finalidade não está ligado ao Princípio da Impessoalidade, mas sim ao Princípio da Legalidade (já que não se pode separar a finalidade da lei da própria lei, pois quando se cumpre a lei se cumpre o seu espírito, e vice-versa). Para respaldar essa posição da doutrina moderna, podemos citar o art. 2º, da Lei 9.784/99 (Lei de Processo Administrativo), que fala expressamente sobre o Princípio da Finalidade, o que significa que ele não foi substituído, não desapareceu de nosso ordenamento. Nas provas fechadas, os concursos de forma geral cobram o entendimento da doutrina moderna, mas nas provas abertas é conveniente citar ambas.

→ ☺ Conceito de CABM: O Princípio da Impessoalidade traduz a idéia de que a AP tem que tratar a todos sem discriminações, o administrador não pode prestigiar determinados interesses em detrimento de outros, não pode criar nem favoritismos e nem perseguições. É um

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conceito ligado também ao Princípio da Isonomia, mas é o conceito trazido por ele para o Princípio da Impessoalidade, que é muito cobrado em concursos. De acordo com este seu entendimento, o Princípio da Impessoalidade está ligado ao Princípio da igualdade ou isonomia constitucional, enquanto o Princípio da moralidade está ligado à lealdade e a boa-fé.

→ Discussão quanto ao Nepotismo: a proibição do nepotismo (parentesco na AP) representa a aplicação de qual princípio? Já tivemos varias respostas diferentes em concursos, citando ora o Princípio da Impessoalidade, ora o da Moralidade ou outro. Mas a matéria já está consolidada em nossa jurisprudência. O nepotismo foi proibido em Resoluções do CNJ e do CNMP e nesses conselhos a preocupação foi no sentido de que não se proíbe parentes na AP se este entrar por concurso público ou por licitação; a proibição, portanto, não é para a regra geral, mas para as hipóteses em que há facilidade: não se permite o parentesco até o 3º grau, cônjuge ou companheiro nos cargos em comissão (de livre nomeação e exoneração), na contratação temporária (que não exige concurso, mas processo administrativo simplificado), na contratação direta (dispensa ou inexigibilidade de licitação). “Troca de parentes”: foi chamado de nepotismo cruzado e também foi proibido no Judiciário e no MP. Mas e se o Judiciário operar a troca de parentes com o Executivo ou Legislativo: ai, neste caso não há ainda como haver o controle, evitando o problema. Cabe lembrar que vários tribunais resistiram a essa vedação ao nepotismo e não quiseram exonerar seus parentes. Diante disso, a discussão chegou ao STF, para que se decidisse sobre a constitucionalidade ou não da regra trazida pelos conselhos – ☺ADC 12, que ainda não foi julgada no mérito, mas, em julgamento liminar decidiu-se pela constitucionalidade da proibição, que tem como fundamento o exercício de 4 princípios constitucionais: Impessoalidade, Moralidade, Eficiência (porque nem todos estão preparados para assumir as responsabilidades do cargo) e Isonomia (porque todos vão querer dar lugar a um parente).

Obs.:☺ Súmula Vinculante nº 13! Estende a proibição do nepotismo também ao Poder

Legislativo e ao Poder Judiciário:“A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por

afinidade, até o 3º grau, inclusive (...)”O parente não pode entrar pela “janela” (nomeação sem concurso público); se for por

concurso não há problema. O parente não pode ser parente do nomeante, mas também não o pode ser de qualquer outro servidor que ocupe cargo de direção, chefia ou assessoramento.

3) Moralidade:

Seu conceito ainda é indeterminado, vago; há muita divergência na doutrina quanto à sua conceituação. O Judiciário mesmo tem dificuldade em reconhecer o Princípio da Moralidade, e quando o faz geralmente o relaciona, atrela com outros princípios, justamente em razão da indeterminação de seu conceito. Este princípio está ligado à idéia de honestidade, de lealdade e de boa-fé. Representa a aplicação de princípios éticos aceitáveis socialmente.

O princípio da moralidade torna jurídica a exigência de atuação ética dos agentes da AP.Moralidade administrativa é sinônimo de moralidade comum? Não! Moralidade comum

diz respeito à correção de atitudes, do que é certo ou errado. A moralidade administrativa é mais rigorosa do que a moralidade comum, pois exige do administrador mais do que a atuação correta, exige também a “boa administração”, o que significa que o administrador tem o dever de escolher sempre a melhor alternativa. Ademais, a denominada moral administrativa difere da comum justamente por ser jurídica e pela possibilidade de invalidação de atos administrativos que sejam praticados com inobservância deste princípio.

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Segundo CABM, de acordo com este princípio, a AP e seus agentes têm de atuar na conformidade de princípios éticos. Violá-los implicaria violação ao próprio Direito, configurando ilicitude que assujeita a conduta viciada a invalidação, porquanto tal princípio assumiu foros de pauta jurídica, na conformidade com o art. 37, CR. Compreendem-se em seu âmbito, como é evidente, os chamados princípios da lealdade e boa-fé. Segundo os cânones da lealdade e da boa-fé, a AP haverá de proceder em relação aos administrados com sinceridade e lhaneza, sendo-lhe interdito qualquer comportamento astucioso, eivado de malícia, produzido de maneira a confundir, dificultar ou minimizar o exercício de direitos por parte dos cidadãos.

→ Imoralidade x Improbidade: não são sinônimos. Imoralidade pode configurar improbidade, mas somente se a conduta for praticada na forma dolosa (se o administrador praticou a conduta com culpa ele não responde por improbidade), ou seja, depende do elemento subjetivo. Improbidade também não é sempre imoralidade, necessariamente.

Resumindo: imoralidade pode ser improbidade; a improbidade tem como base a imoralidade, mas não só; nem toda improbidade tem como base a imoralidade (pode ter como base a violação de outros princípios também, como a não publicação, por ex.).

Nos termos do art. 85, V, CR, atentar contra a probidade na administração é hipótese prevista como crime de responsabilidade do Presidente da República, fato que enseja sua destituição do cargo. De resto, os atos de improbidade administrativa dos servidores públicos imporão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade de bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível (☺art. 37, §4º, CR).

Por fim, de se dizer ainda que o princípio da moralidade administrativa acha-se também eficientemente protegido no art. 5º, LXXIII, CR, que prevê o cabimento de ação popular para anulação de ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente, etc.

4) Publicidade:

O administrador exerce uma função pública, em nome e no interesse do povo (o poder emana do povo), conforme vimos. Assim, ele deve dar ciência, conhecimento ao povo (titular do direito) sobre o que está acontecendo com seus interesses. Publicidade, assim, é, em primeiro lugar, dar conhecimento ao titular do direito. Mas não é só isso. Ex.: a AP celebra com o particular um contrato de merenda escolar que não foi publicado; a publicação do contrato seria condição de validade ou de eficácia desse contrato? A lei é expressa quanto a isso: ☺art. 61, §U, Lei 8.666/93, que diz que o Princípio da Publicidade é condição de eficácia dos atos administrativos, e significa, portanto, início de produção de efeitos. É condição de eficácia porque, no caso supra citado, se a empresa tinha o prazo de 30 dias para entregar a merenda escolar, a partir de quando começa a correr o prazo? O termo inicial está justamente no momento em que se publica o contrato e passa a correr deste momento. A publicidade também significa, portanto, início da contagem de prazos. Outro ex.: multa por excesso de velocidade computada em radar, o prazo de defesa começa a partir da notificação. Ocorre muito na AP o inicio do prazo a partir da expedição da notificação, mas isso está errado, tem que ser do recebimento (se a pessoa não sabia ainda da notificação não tem como se defender). Com a tomada de conhecimento é que se tem a possibilidade de controlar, assim, publicidade também significa viabilidade de controle (instrumento ou mecanismo de controle). Há um art. na CR que diz que as contas municipais devem estar à disposição dos cidadãos para controle por 60 dias no ano (é um absurdo – não viabiliza o acesso na prática). Assim, na prática esse princípio acaba não saindo do papel, no que diz respeito à viabilização do controle.

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→ Atenção: licitação na modalidade convite não tem publicação do instrumento convocatório, que é a carta convite (não há publicação de edital), mas isso não quer dizer que não há publicidade! Publicidade é ≠ de publicação: publicidade é muito mais amplo. A publicação em DO é somente um dos exemplos de publicidade. Ciência pessoal, encaminhamento de convites para os convidados, realização de licitação de portas abertas, etc., são todas formas de publicidade.

→ Exceções ao Princípio: em regra, a obrigação do administrador é publicar, mas há exceções trazidas pela CR, na qual se veda a publicação: ☺

- art. 5º, X, CR: são invioláveis a intimidade, a vida privada e a honra das pessoas – assim, só deve haver publicidade até onde esta não ofenda esses direitos;

- art. 5º, XXXIII, CR: todos têm direito à informação, desde que não coloque em risco a segurança da sociedade e do Estado (ex.: suspeita de intenção de ataque terrorista ao Brasil, o Estado pode negar a publicidade a cerca do local onde deverá ocorrer o ataque); esta é a única hipótese pacífica na doutrina (quanto as outras a doutrina diverge um pouco).

- art. 5º, LX, CR: os atos processuais correm em sigilo na forma da lei; alguns doutrinadores afirmam que este dispositivo está ligado somente ao processo judicial (segredo de justiça), mas a doutrina majoritária afirma que os atos do processo administrativo também podem correr em sigilo (o sigilo não é válido somente para os processos judiciais, vale também, para, por ex., processos éticos disciplinares, até mesmo para proteger a carreira do profissional, evitando-se que ele seja condenando pela sociedade antes mesmo do seu julgamento final do processo).

→ Informações (de seu interesse) sobre empresa que se pretende adquirir em algum órgão público: o remédio cabível no caso de não darem as informações não é HD, mas sim MS! Informação de interesse pessoal é diferente de informações pessoais (ai sim o remédio adequado é HD).Atenção para isso! HD é para corrigir ou obter informações pessoais.

→ ☺art. 37, §1º, CR: vedação à vinculação da atuação do Governo (obras, bolsa escola, etc.) ao nome do administrador, como forma de promoção pessoal deste. Esta é uma regra muito desrespeitada no Brasil. O administrador ao fazer a obra ou serviço não fez mais do que a sua obrigação e não se pode promover aquilo que não passa de sua obrigação (ex.: placas de agradecimento pela obra). É ato de improbidade administrativa. Há, inclusive, um projeto de lei em tramitação para alterar a Lei 8.429/92 para que passe a incluir expressamente esta vedação. Antigamente, os nomes das obras, nome de ruas, praças, etc., eram sempre o nome de pessoas importantes depois de mortas. Depois passou-se a fazer isso inclusive com o nome de pessoas vivas. Atualmente já há até mesmo o absurdo de pessoas que nem fizeram novas obras, mas simplesmente fizeram alguma alteração em obras antigas e colocaram seus nomes. É um absurdo e constitui ato de improbidade administrativa. O STJ diz que o simples fato de fazer constar o nome não significa necessariamente promoção social, gerando improbidade, porque poderia ter mero caráter educativo ou informativo, por isso deve-se observar com atenção a intenção do administrador. Ou seja, para violar o art. 37, §1º, é preciso que se configure a promoção pessoal. Uma mesma conduta nesse sentido pode violar também o Princípio da Impessoalidade, da Eficiência, da Legalidade (já que a vedação está expressa na CR), da supremacia e da indisponibilidade do interesse público, dentre outros (e não só o Princípio da Moralidade).

→ Cumprimento da exigência: a publicidade somente por rádio e TV, quando a lei diz que tem que publicar no DO ou de outra forma específica, não opera o cumprimento da exigência legal.

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5) Eficiência:

Foi introduzido pela EC 19/98 (quando ganhou roupagem de princípio constitucional expresso), mas é claro que antes de 1998 a AP já tinha a obrigação de eficiência. Além disso, antes da EC 19 o princípio já estava expresso em nosso ordenamento (embora não o estivesse no art. 37, CR), na Lei 8.987/95, art. 5º.

→ Eficiência significa ausência de desperdícios, economia de direito público, de bens públicos. Mas não é só isso, também se pensa em eficiência quando se fala em produtividade, agilidade, presteza.

→ Quando, em 1998 o nosso legislador constituinte resolveu alterar a redação do caput do art. 37, CR para incluir este princípio, para viabilizar este princípio ele teve que alterar outros dispositivos, em especial os que tratavam da estabilidade do servidor, porque naquele tempo se pensava que a estabilidade era o maior problema para se atingir a eficiência. Assim, o legislador estabeleceu exigências para se adquirir estabilidade: ☺art. 41, CR:

- nomeação para cargo efetivo, após prévia aprovação em concurso público;- 3 anos de exercício (atenção: a CR não fala em estágio probatório, cujo prazo está

previsto na Lei 8.112/90 – a MP 431 fixou o prazo em 36 meses, mas ainda não foi convertida em lei –, a CR fala sim em anos de exercício);

- avaliação de desempenho (que é a exigência de eficiência, é desdobramento ou conseqüência do Princípio da eficiência).

A partir de então o servidor será estável. A perda da estabilidade, por sua vez, só poderá ocorrer por meio de: processo judicial com transito e julgado; processo administrativo com contraditório e ampla defesa; e por meio de avaliação periódica. Esta avaliação já existia antes da EC 19, mas antes de 98 ela não tinha o poder de retirar a estabilidade, só existia para fazer constar. Critérios para esta avaliação: a MP 431 também trata sobre isso no caso da avaliação de desempenho, mas quanto à avaliação periódica, ainda não ouve regulamentação, o que significa que esta avaliação não ocorre na prática.

→ Eficiência e despesas com o pessoal: era muito comum na AP que se gastasse com folha de pagamento tudo o que o ente arrecadava ou até mais do que isso, o q não é eficiente. Assim, em 1998 também foram estabelecidas regras sobre a racionalização da máquina administrativa (☺art. 169, CR): os entes políticos só poderão gastar com folha de pagamento até o limite previsto em LC (☺LC 101, art. 19: o limite será na União, 50%; nos Estados e nos Municípios, até 60%). O ente político que estivesse acima desse limite deveria realizar o corte das despesas na seguinte ordem:

1º) cargos em comissão e funções de confiança (≠ entre eles: cargo em comissão é o cargo baseado na confiança, de livre nomeação e exoneração, serve para direção, chefia e assessoramento e pode ser ocupado por qualquer pessoa; já a função de confiança também é atribuída de acordo com a confiança, também serve para direção, chefia e assessoramento, mas só pode ser atribuída para quem tem cargo efetivo, significa um “plus” nas responsabilidades e na remuneração, já que o servidor terá direito à gratificação por função de confiança), no percentual mínimo de 20% (pode ser mais);

2º) servidores não estáveis, até quantos forem necessários; 3º) servidores estáveis. Atenção: só se passa à categoria seguinte depois de cumprida a

exigência da anterior.Obs.: os servidores excluídos da AP para enxugar a máquina administrativa são

exonerados e não demitidos (demissão é pena por cometimento de falta grave, e esses servidores não praticaram infração alguma). Para evitar que o instituto seja mal utilizado (como instrumento de vingança), a CR estabeleceu que o cargo será extinto e só poderá ser criado novamente com funções idênticas ou assemelhadas 4 anos depois (ou seja, só pode mandar

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embora o servidor que ocupa cargo dispensável). Os servidores estáveis exonerados por esse instrumento gozam de direito à indenização.

→ Eficiência no serviço: os serviços devem ser eficientes quanto aos meios e quanto aos resultados. Ex.: AP constrói um hospital com pouquíssimo dinheiro, mas o hospital fica péssimo. A eficiência exige que se deva gastar o menor valor possível para se obter o melhor resultado possível.

→ Apesar de tudo isso, a doutrina diz que o conceito de eficiência é fluido, vulnerável demais e por isso sua aplicação é muito difícil; a eficiência não passaria de uma utopia, de um mero desabafo do legislador constituinte de 1998. Na prática, quase nada mudou após a sua inclusão no rol dos princípios.

(08/08/08)

• Outros Princípios:

1) Isonomia:

Significa tratar os iguais de forma igual, os desiguais de forma desigual, na medida das suas desigualdades.

Quem são os desiguais? E os iguais? Preencher o conteúdo desse princípio é muito difícil. É necessário verificar o fator de discriminação. Se esse fator de exclusão não estiver compatível com a norma, ele violará o princípio da isonomia.

Ex: Prefeitura de Salvador decidiu fazer concurso para salva-vidas. Os deficientes físicos de cadeira de rodas não podem prestar o concurso. Neste caso, a exclusão desse deficiente está compatível com o objetivo da norma. O mesmo não ocorreria se estivermos diante de uma atividade administrativa. Se admitíssemos essa exclusão, ocorreria a violação ao princípio da isonomia.

→ Limite de idade em concurso público é possível? ☺Súm. 683, STF. Essa súmula permite o limite de idade, tendo como base o art. 7º, V, da CR e a natureza das atribuições do cargo a ser exercido.

Ex: Concurso de delegado de São Paulo. O sujeito não pode ter menos de um metro e meio de altura. Essa exigência viola o princípio da isonomia? Essa exclusão está compatível como objetivo da norma? Se ele tiver que pular um muro muito alto, ele não conseguirá. Mas, e se ele tiver que passar por um buraco muito pequeno? Essa regra é completamente inconstitucional.

Ex: Concurso para o cargo de gari. O sujeito precisa de tantos dentes na arcada superior e tantos dentes na arcada inferior. Isso é um absurdo.

→ Conclusão: essas exigências só podem aparecer no edital se estiverem previstas na lei da carreira e se forem compatíveis com as atribuições do cargo.

Ex.: Penúltimo concurso de Delegado da Polícia Federal – Exame psicotécnico. É difícil conseguir a objetividade desse exame. Outro problema foi por causa da prova física, no exercício de barras (diferença entre homens e mulheres). E aí, viola a isonomia? Não. É caso de dar tratamento desigual àqueles que são desiguais.

→ Aposentadoria: 60 anos de idade e 35 de contribuição para homens e 55 anos de idade e 30 de contribuição para as mulheres. Isso viola o princípio da isonomia? Claro que não.

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Primeiro, por causa da dupla jornada da mulher e, segundo, a mulher tem capacidade laborativa diferente da do homem.

2) Contraditório e Ampla Defesa:

Contraditório significa dar à parte ciência, conhecimento do processo; comunicar à parte da existência do processo. Esse princípio estabelece a bilateralidade da relação processual.

A idéia do ordenamento jurídico brasileiro é a de que ninguém pode ser processado ou condenado sem tomar ciência do processo. A doutrina diz que é uma situação de cunho político.

A Ampla Defesa sempre caminha ao lado do Contraditório. Quando se fala em ampla defesa, significa dar a oportunidade para que a parte se defenda. Aqui é preciso fazer algumas considerações: Será que basta abrir o prazo, dar a oportunidade? Se a parte irá usar ou não, o problema é da parte. É necessário dar a oportunidade. Mas cuidado: Não basta abrir o prazo, é necessário fazê-lo de forma efetiva. Iremos verificar algumas situações que estão ligadas ao exercício da ampla defesa, a saber: (a prof. Odete Medauar chama de “desdobramentos”)

- Exigência de defesa prévia: É a defesa anterior à condenação. Para que essa defesa prévia ocorra, as possíveis sanções aplicáveis ao processo devem estar predeterminadas. Ex: um sujeito é surpreendido por uma pena da qual ele nem sabia. Isso não é possível. Ao final daquele processo, a pena pode ser de suspensão ou de advertência. Então, já irá se defender, pensando nessa situação. O processo deve ser também predeterminado. É necessário estabelecer o procedimento. Ex: No processo penal é habitual que o advogado do sujeito, na defesa prévia, não fale muito. Ele já sabe que lá na frente terá a chance de oferecer alegações finais. No processo administrativo, também é necessário saber o que se terá lá na frente. A defesa prévia depende das penas e dos procedimentos predeterminados.

- Além da defesa prévia, o processo administrativo exige produção de provas. Ex: testemunha na sala de audiência. É necessário digitar o que a testemunha disser. A prova deve ser produzida, mas ela também deve ser levada em consideração, deve convencer o julgador.

- Ademais, tem-se o direito de informação. O processo de licitação é muito extenso, normalmente. Será que há direito de cópia do processo? O STJ diz que há o direito, desde que o interessado pague. É necessário viabilizar essa garantia. A garantia de informações traz a garantia de cópia.

- Garantia de recurso: ☺ art. 5º, LV, da Constituição da República. O direito de recurso é inerente ao princípio da ampla defesa. O direito de recurso não pode ser vedado. Se o edital não admitir recurso, estar-se-á violando a ampla defesa.

Depósito da multa: No processo tributário, exigia-se o depósito prévio da multa para poder recorrer. E se o contribuinte ou a empresa não tivesse esse dinheiro? O recurso estaria prejudicado. Então, hoje é considerada inconstitucional a cobrança do depósito prévio da multa. Cuidado: Essa discussão foi feita especificamente num processo administrativo tributário. Porém, a prof. não vê impedimento para discussões em outras áreas. (☺RE 388.359 e Resp. 943.116).

→ Questão: Será que no processo administrativo, para o exercício da ampla defesa, exige-se a defesa técnica? Quando se fala nisso, fala-se na presença do advogado. Em regra, a presença do advogado é facultativa, em qualquer processo administrativo. A polêmica ocorre em torno do processo administrativo disciplinar.

Com base na Lei 8112/90, o PAD tinha a presença do advogado como facultativa. Com o passar dos anos, percebeu-se que a presença do advogado colaborava para a regularidade do processo. Dentro dessa evolução e, felizmente, o STJ editou a Súm. 343. Nessa linha de

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raciocínio, o STJ diz ser obrigatória a presença do advogado em todas as fases do processo administrativo disciplinar. O STJ queria com isso a legalidade. O que aconteceu depois disso? O Governo Federal começou a fazer contas. Se a presença é obrigatória, como ficam os processos em que o servidor foi demitido e não contou com a presença do advogado. Os processos seriam nulos, logo, a demissão também seria ilegal. A conseqüência jurídica, portanto, é a reintegração. A Administração tem 05 anos para rever esses processos. A reintegração é o direito do servidor estável, retornar ao cargo de origem com todas as suas vantagens do período em que ele esteve afastado. Imagine se todos os servidores realizassem esse pedido?

Após 3 decisões do STF, ele resolveu editar uma Súmula Vinculante de nº 05: “a defesa ou a falta de defesa técnica em processo administrativo disciplinar não ofende à CR”. Qual é a preocupação com relação a essa súmula? Se o STF edita uma súmula vinculante, significa dizer que ninguém pode decidir em contrário. O STF acabou com a evolução do STJ. Isso foi um grande retrocesso para o processo administrativo. Qual é a idéia de súmula vinculante? Uniformizar, solucionar grandes conflitos. É necessário ter um precedente firme, consolidado no STF. Foram apenas 3 precedentes. Isso não é suficiente. Essa súmula tem natureza financeira, econômica.

Cássio Scarpinella entende que Súmula Vinculante 05 não precisa enterrar a súmula do STJ. Bastava marcar a linha de tempo.

→ O Contraditório e a Ampla Defesa estão previstos no art. 5º, LV, CR. Na via judicial, esses princípios estão cristalizados, completamente sedimentados. É muito difícil imaginar que no processo o réu não terá prazo para se defender. Cuidado: na via administrativa, isso ainda é muito comum. Entram no direito administrativo só a partir de 1988.

☺Súmula vinculante de nº 03: “Nos processos perante o tribunal de contas da união asseguram-se o contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado, excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão”.

Antes dessa Súm. o administrador praticava os seus atos. Dentre esses atos, imagine que uma pessoa, que não tem nada a ver com a administração, requereu uma licença para construir. O administrador presta contas perante o TC. Se este descobrisse que a licença era ilegal, ele chamava o administrador. Se fosse o caso, ele anularia a licença sem chamar a parte interessada. Isso era um absurdo! Perdia-se o direito, sem ser chamado para essa relação. O TC, controlando o ato do Administrador, o chamava para prestar informações. Se concluísse que o ato era inconveniente, esse ato seria revogado ou anulado. Prestada a conta, o TC não chamava o interessado para se manifestar. Essa súmula quis evitar isso. Com ela será necessário chamar o terceiro para participar do processo. Esse raciocínio é lógico.

Na sua parte final, a súmula ressalva a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão. Nessa parte, a súmula não admite o contraditório e a ampla defesa. Mas isso não seria injusto? A concessão da aposentadoria é ato complexo (aquele que depende de 2 manifestações de vontade). O servidor requer a aposentadoria perante o Administrador e essa será concedida após 2 manifestações favoráveis em órgãos diferentes (Administrador + TC). Neste caso, o TC não precisa dar contraditório e ampla defesa. Na verdade, o ato só estará pronto com as duas manifestações. Essa decisão não é de controle, de fiscalização, mas para formação do ato. Ex: José pede licença. A relação é entre José e a Administração. A licença já foi dada pela Administração. Um ano depois, quando as contas foram prestadas, haverá o controle pelo TC em outro momento. O aposentado terá contraditório e ampla defesa dentro da Administração, e não do TC (essa discussão será revista na aula de atos).

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3) Razoabilidade e Proporcionalidade:

A razoabilidade significa lógica, coerência, congruência.É importante tomar cuidado porque a doutrina brasileira entende que o princípio da

proporcionalidade está embutido no princípio da razoabilidade. O princípio da proporcionalidade significa equilíbrio. Se o nosso Administrador age de forma equilibrada, ele estará agindo de forma coerente,

lógica. Por isso é necessária uma medida necessária e proporcional. O equilíbrio entre o ato e a medida significa proporcionalidade. Ex: prática de infração leve com pena de demissão seria desproporcional. Também se exige o equilíbrio entre os benefícios e os prejuízos causados pela conduta. Na verdade, o beneficio deve ser maior que o prejuízo.

Sobremodo quando a AP restringe situação jurídica dos administrados além do que caberia, por imprimir às medidas tomadas uma intensidade ou extensão supérfluas, prescindendas, ressalta a ilegalidade de sua conduta. É que ninguém deve estar obrigado a suportar constrições em sua liberdade ou propriedade que não sejam indispensáveis à satisfação do interesse público.

As medidas desproporcionais ao resultado legitimamente alvejável são, desde logo, condutas ilógicas, incongruente, inadequadas ao escopo legal. Ora, inadequação à finalidade da lei é inadequação à própria lei. Assim, atos desproporcionais são ilegais e, por isso, fulmináveis pelo PJ, que, sendo provocado, deverá invalidá-los quando impossível anular unicamente a demasia, o excesso detectado.

O Princípio da proporcionalidade enuncia a idéia de que as competências administrativas só podem ser validamente exercidas na extensão e intensidade proporcionais ao que seja realmente demandado para cumprimento da finalidade de interesse público a que estão atreladas.

Em rigor, o princípio da proporcionalidade não é senão faceta do princípio da razoabilidade. Sua matriz constitucional é a mesma. E ambos assistem nos próprios dispositivos que consagram a submissão da AP ao cânone da legalidade.

Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade estão implícitos na norma constitucional e expressos na norma infraconstitucional. Decorrem do art. 5º, LIV, CR, mas a lei que traz esses dois princípios é a Lei 9.784/99, em seu art. 2º.

☺ art. 5º, LXXVIII, CR: esse dispositivo foi introduzido pela EC 45/04. Ele estabelece que os processos administrativos e judiciais devem durar um prazo razoável. Será que essa disposição representa o princípio da razoabilidade expresso no texto constitucional? É claro que não. Alguns autores afirmaram isso, mas depois mudaram de opinião. Esse artigo traz o princípio da celeridade, e esta já é uma posição tranqüila nos dias atuais.

→ O que significa uma decisão vinculada? É aquela em que o Administrador não tem liberdade. Ele não tem juízo de valor, não tem conveniência e oportunidade para decidir. Diante da vinculação, preenchidos os requisitos legais, o Administrador deve conceder. Uma decisão vinculada pode ser revista pelo PJ? Claro que pode. Ele irá controlar no que tange à sua legalidade.

→ O que significa uma decisão discricionária? Discricionariedade significa juízo de valor, conveniência e oportunidade. Significa liberdade de escolha. É o que se chama de mérito administrativo. O mérito é a liberdade do Administrador. Ele tem o seu endereço no motivo e no objeto do ato discricionário (MéritO – Motivo e Objeto).

A discricionariedade pode ser revista pelo Poder Judiciário? Ela também pode ser controlada quanto à legalidade. Isso serve para qualquer decisão administrativa. Se a liberdade deve ser pratica nos limites da lei, e ela desrespeita esse limite, o PJ poderá rever. Mas, e quanto ao mérito do ato administrativo? Ex.: as leis determinam que é competência do Administrador cuidar dos bens municipais e a forma como ele irá realizar esse cuidado é discricionária. Admitir

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a substituição da discricionariedade do Juiz pela discricionariedade do Administrador violaria a Separação dos Poderes.

Imaginemos um Município precise de escola e de hospital, porém ele só tem dinheiro para um deles. O Administrador resolve construir o hospital. Essa decisão é razoável, proporcional. Por isso o PJ não poderá rever essa decisão. Mas, se o Município precisa de escola e de hospital, mas tem dinheiro para construir uma coisa apenas e decide construir uma praça, essa decisão viola o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade. Nesse caso, o PJ pode rever essa decisão. Essa revisão é controle de legalidade, e não de mérito. Ele está revendo princípios constitucionais. Mas é claro que esse controle acaba atingindo, por vias tortas, a liberdade do Administrador, o mérito da decisão. O Administrador terá a liberdade razoável. Assim, não se pode rever qualquer mérito. Só é possível atingir a decisão que não é razoável. Pensando nisso, o PJ pode fazer o controle de legalidade, utilizando-se dos princípios constitucionais. Atenção: não é controle de mérito, mas atinge o mérito de forma indireta (☺ADPF nº 45 – controle de políticas públicas).

(10/09/08)

4) Continuidade:

A prestação de serviço público é um dever do Estado. CABM diz que, se a prestação de serviço público é uma obrigação, não pode ser prestado de qualquer forma. Deve acontecer sem violar o Princípio da Continuidade.

Serviços públicos, portanto, não podem ser interrompidos. Devem ser prestados sem interrupção.

Desdobramentos:- Hipótese de corte do serviço: por inadimplemento o usuário ou por desrespeito pelo

usuário das regras de segurança. ☺ art. 6º, Lei 8.987/95. Essa lei cuida dos serviços públicos, no que tange à concessão e permissão de serviços públicos. A lei diz que não há violação ao princípio da continuidade em duas circunstâncias (é permitido o corte em 2 casos): em razão de normas de segurança técnica; e em razão de inadimplemento do usuário, desde que com prévia comunicação. Só é possível cortar o serviço se existir a prévia comunicação ou aviso. E no caso de serviço essencial? A posição atual é de que sim, mesmo o serviço essencial pode ser cortado. Se a empresa for obrigada a prestar o serviço a quem não paga, não conseguirá manter sua capacidade financeira e irá à falência, o que acarretará a interrupção do serviço, que ficará prejudicado. Assim, em nome do próprio Princípio da Continuidade e também em nome da supremacia do interesse público, é melhor que o serviço seja interrompido. A jurisprudência também inclui o fundamento da supremacia do interesse público, alegando que não se pode proteger um inadimplente em detrimento de toda a coletividade. Por fim, alega-se o Princípio da Isonomia. Se há o consumidor adimplente e o inadimplente, é preciso tratar os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual. Atenção: há divergência doutrinária. Há, inclusive, decisões do STJ dizendo que o corte não é permitido, sob os fundamentos previstos nos arts. 22 e 42 do CDC; mas não é a posição majoritária. Ocorrem, ainda, decisões isoladas a respeito de cortes em hospitais públicos, logradouros públicos, em que esse corte não seria possível. Ou até mesmo o caso do corte no próprio Estado (quando o Estado é o usuário inadimplente), também há casos isolados nesse sentido.

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- Direito de greve dos servidores públicos: situação atual: o servidor público tem direito de greve, é uma garantia constitucional (art. 37, VII, CR). Esse art. da CR diz que o direito será exercido na forma da lei; trata-se de lei ordinária (se o constituinte quisesse LC, teria dito expressamente). Essa espécie normativa foi alterada em 98, pela EC 19 (até então era necessário LC). A lei que regulamenta o direito de greve dos servidores ainda não existe. Trata-se, portanto, de uma norma de eficácia limitada (NEL). Apesar de ter “cara” de NEC, já que os servidores sempre estão em greve, ou seja, exercendo o direito, trata-se de NEL. Assim, é norma discutível via MI. Vários MI foram ajuizados desde 1988. O STF reconhecia a omissão do CN e comunicava o CN que estava faltando a lei, mas não podia obrigá-lo a legislar. Felizmente, no ano passado, o STF resolveu mudar de posição. Naquela ocasião havia 3 MI tramitando no STF sobre essa questão (MI 670, 708 e 712). O STF decidiu no MI 708, e aproveitada nos demais. O STF decidiu não mais comunicar ao CN a falta de lei, e sim aplicar ao servidor público a Lei 7.783/89, que disciplina a greve para o âmbito privado. Conseqüência: se antes, quando não existia a regulamentação, feita a greve esta greve era dita como legal (não infringia nenhuma norma) e só acarretava o desconto dos dias (não caracterizava abandono de cargo porque o servidor não tinha o ânimo de abandonar). Agora, o servidor teve seu direito de greve regulamentado. Assim, se respeitados os limites da Lei 7.783 a greve vai ser ilegal, mas caso contrário, a greve será ilegal. Assim, a verdadeira extensão dessa decisão foi maior do que a imaginada. Houve problemas na AGU, que ainda estão em andamento.

- Exceptio non adimpleti contractus: é aplicável aos contratos administrativos? Esta é a cláusula segundo a qual uma parte não pode exigir que a outra parte cumpra sua obrigação, se ela ainda não cumpriu a sua. No caso do inadimplemento da AP, a empresa deverá continuar prestando o serviço pelo prazo de 90 dias, podendo somente após esse prazo cortar o serviço. Assim, diz-se que a cláusula é aplicável sim aos contratos administrativos, mas somente a partir dos 90 dias. Mas o tema é um pouco controverso. Temos, pois, duas correntes: 1ª) segundo a qual a cláusula é aplicável sim, mas de forma diferenciada (art. 78, XV, Lei 8.666/93) – segundo esta corrente, por ser a cláusula aplicável tanto aos contratos entre privados como também aos contratos administrativos, não seria uma cláusula exorbitante, porque está no contrato comum, não exorbitando o ordinário – é a corrente majoritária; 2ª) entende que a cláusula não é aplicável aos contratos administrativos e, assim, a sua ausência representaria uma cláusula exorbitante; mas esta é uma corrente minoritária (HLM).

5) Autotutela:

Há duas aplicações desse princípio:a) como permissão para que a AP revise seus próprios atos: a AP pode fazer revisão

dos seus atos quando ilegais (por meio da anulação), ou quando inconvenientes (por meio da revogação). ☺ Súm. 346 e Súm. 473, STF (ambas continuam válidas, apesar de que uma complementa a outra).

b) segundo MSZDP, este princípio tem ainda um outra aplicação, como o dever de cuidado, está ligado à idéia de zelo com o próprio patrimônio, bens e interesses.

Como vimos, no Brasil vigora o princípio da inafastabilidade da jurisdição, ou sistema de jurisdição única (ou sistema inglês), segundo o qual a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. Assim, é ao Poder Judiciário e só a ele que cabe resolver definitivamente sobre quaisquer litígios de direito (por isso se diz que a expressão “coisa julgaa administrativa” é imprópria).

Ele detém a universalidade da jurisdição, quer no que respeita à legalidade ou à consonância das condutas públicas com atos normativos infralegais, quer no que atina à

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constitucionalidade delas. Nesse mister, ele tanto anulará atos inválidos, como imporá à AP os comportamentos a que esteja de direito obrigada, como proferirá e imporá as condenações pecuniárias cabíveis.

Ao lado dessa possibilidade absoluta de apreciação pelo Poder Judiciário, quando provocado, de atos que possam implicar lesão ou ameaça a direito, existe também o poder-dever administrativo de autotutela. O poder-dever de autotutela possibilita à AP controlar seus próprios atos, apreciando-os quanto ao mérito e quanto à legalidade.

O princípio da autotutela instrumentaliza a AP para a revisão de seus próprios atos, assegurando um meio adicional de controle da atuação da AP e reduzindo o congestionamento do Poder Judiciário. É um princípio implícito , que decorre da natureza da atividade administrativa e de princípios expressos que a informam, especialmente o princípio da legalidade.

O princípio da autotutela autoriza a atuação da AP de forma mais ampla do que a possibilidade de atuação pelo Poder Judiciário, em razão de ser possível a ela agir sem provocação e de somente ela própria possuir competência para revogar seus atos válidos.

Este princípio autoriza o controle, pela AP, dos atos por ela praticados, sob dois aspectos: a) de legalidade, em que a AP pode, de ofício ou provocada, anular seus atos

ilegais;b) de mérito, em que examina a conveniência e oportunidade de manter ou

desfazer um ato legítimo, nesse último caso, mediante a denominada revogação.

☺Súm. 473, STF: “A Administração pode anular seus atos quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial”.

6) Especialidade:

As pessoas jurídicas que compõem a AP Direta são os entes políticos (União, Estados, Municípios e DF).

Para maior prestação dos serviços por parte da AP, ou seja, para a maior eficiência da AP, a AP Direta decide criar a AP Indireta. As pessoas jurídicas que compõem a AP Indireta são as autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista.

Para que a AP Direta crie a AP Indireta é preciso uma lei (que ora cria e ora autoriza a criação). Quando a AP Direta cria a AP Indireta, o faz através de lei, esta lei estabelece uma finalidade específica, e as pessoas jurídicas se vinculam a esta lei e às finalidades específicas para as quais foram criadas.

Modificação da finalidade: só é possível se a própria lei a promover. O que a lei cria o administrador não pode modificar.

Atenção: o MP de MG aplicou este Princípio da Especialidade aos órgãos públicos. Agora a maioria da doutrina também diz que eles estão vinculados sim, e, por isso, presos à finalidade específica.

7) Presunção de Legitimidade:

A doutrina entende que ela abrange a presunção de legalidade e de veracidade. Isso significa que os atos são presumidamente legítimos porque obedecem às regras morais; são

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presumidamente legais porque obedecem à lei; e são presumidamente verídicos porque correspondem à verdade.

Trata-se de uma presunção relativa, iuris tantum. Admite, portanto, contestação.A quem é atribuído o ônus da prova? Se o ato pode ser contestado, afastado, o ônus da

prova, normalmente, é atribuído ao administrado (porque é quem geralmente contesta).Conseqüência jurídica dessa presunção de legitimidade: o ato administrativo será

aplicável desde logo; até a sua contestação ele deverá ser cumprido; tem aplicação imediata. É diferente de autoexecutoriedade, que é a aplicação independentemente da presença e permissão do Poder Judiciário.

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REFORMA ADMINISTRATIVA:REFORMA ADMINISTRATIVA:

(Caderno da Raquel Carvalho)

• Introdução:

Analisando a estrutura da AP no Estado brasileiro no Séc. XXI, verifica-se que o exercício das competências públicas não se dá, atualmente, somente por meio dos órgãos da AP Direta e das entidades da AP Indireta (autarquias, empresas públicas, SEM e fundações públicas). Inúmeros outros formatos jurídicos vêm sendo adotados para o exercício das atividades de que a sociedade necessita. Os novos modelos de estruturas administrativas inserem-se em um panorama global de transformação por que vem passando o Estado.

A fim de compreender, com rigor técnico necessário, cada um dos novos instrumentos de atuação pública (agências executivas, organizações sociais, agências reguladoras, organizações da sociedade civil de interesse público, contratos de gestão), é mister que se os insira em um panorama global de mutação do Estado.

• Mutação do modelo de Estado e de Administração Pública:

Tratou-se de uma evolução lenta e gradativa, sem que tenha havido uma verdadeira ruptura epistemológica. Não há, em regra, a substituição imediata do paradigma então dominante por outro emergente, em sentido radicalmente oposto.

Cada época da história dos Estados produz um tipo próprio de Administração caracterizado por seus fins peculiares e pelos meios de que se serve. Mas isso não quer dizer que uma espécie de Administração seja substituída, abrupta e repentinamente por outra.

No que diz respeito à Administração Pública, o Estado de Direito liberal, por ex., não surgiu de modo a derrubar todos os princípios do Estado Absoluto, mas os desenvolveu e adaptou.

Novos paradigmas vão sendo incorporados, influenciados por aspectos históricos que são peculiares a cada um deles e que repercutem, de modo diverso, nas respectivas estruturas administrativas, inclusive de modo proporcional às conseqüências dos novos fatos da realidade social.

Etapas:

1) Estado liberal:- limitação do poder em favor das liberdades individuais, princípio da abstenção estatal (Estado mínimo).- prevalência do privado sobre o público.- vícios: aumento de concentração de riquezas e alarmante exclusão social e miséria.

2) Estado do Bem-Estar Social (Apogeu: Lei Fundamental de Bonn – 1949):- decrescente capacidade do Estado se auto-regular.- demanda por uma maior intervenção administrativa.- alargamento significativo do espaço público.

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→ Política do New Deal (EUA – depressão – 1929):- intervenção do Estado com a finalidade de viabilizar a obtenção do pleno emprego.- Estado assume faltas da iniciativa privada.- Estado não mais um mal necessário.→ Estado Providência:- desenvolvimento de atividades – serviços públicos.- público prevalece sobre o privado.

3) Estado Neoliberal:→Reengenharia da Administração:- privatização;- desregulamentação;- reforma fiscal;- redução dos gastos sociais;- parceria com o setor privado.

Como vimos, a reforma da estrutura do Estado não é linear. A mutação é feita de forma lenta e gradual.

No Estado Liberal, o Estado era entendido como um mal necessário. Toda intervenção do Estado era vista com grande desconfiança. O espaço de atuação deveria ser o menor possível, na medida em que o Estado era visto como uma fonte de descumprimento de direitos e liberdade individuais. Para a proteção do indivíduo, entendia-se que a intervenção estatal deveria ser mínima.

O Estado Liberal foi mais voltado para a limitação do poder em favor das liberdades individuais, em sentido omissivo, que para a ação administrativa, em sentido comissivo. A doutrina do Liberalismo tinha com intenção conter, pelo direito, o Estado. Destacam-se, aqui, os princípios da abstenção estatal, a idéia básica da não-ingerência, a noção do Estado Mínimo e a máxima “laissez faire, laissez passer”. Entendia-se consistir em atribuição do Estado conceder à iniciativa privada toda a liberdade negocial, ficando a cargo do Poder público apenas algumas atividades, como segurança, tributação, relações exteriores, construção e preservação de estradas, pontes, canais, portos, etc. Pretendia-se, pois, um Estado pequeno, cuja presença deveria ser dispensada, tanto quanto possível. Havia prevalência do privado sobre o público, e o Direito Público surgia como o conjunto mínimo de leis gerais editadas par asseguras as liberdades e demais direitos individuais.

Isso ampliou a esfera e atuação do mercado e viabilizou a concentração de riquezas nas mãos de poucos, a exclusão social e a miséria. Embora a expectativa fosse que a atividade econômica, de modo espontâneo, levasse ao desenvolvimento de toda a sociedade, certo é que, a despeito do crescimento incomum da economia no Séc. XIX, verificou-se um aumento da concentração de riquezas, que culminou em níveis alarmantes de exclusão social e miséria. Os mecanismos auto-reguladores do mercado não conseguiram impedir as crises econômicas cíclicas, dentre as quais a mais grave viria a ocorrer em 1929.

Assim, surgiu a concepção de que o Estado Liberal não consegue atender ao mínimo para a sociedade existir de forma equânime.

Dessa forma, a sociedade passou a clamar por uma maior intervenção estatal, o que provocou o aumento do espaço público.

Administração Pública deveria prestar serviços e executar atividades. Isso ampliou o espaço público. O Estado deveria então suprir as faltas que o próprio mercado não era capaz de satisfazer.

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A política do New Deal surgiu quando do Estado de Bem-Estar Social, com a imperiosa demanda de prestações positivas da estrutura da Administração. O Estado passou a assumir o exercício de atividades e a prestação de serviços públicos. Foi nesse momento que o Estado deixou de ser um mal necessário.

Neste contexto, o Direito do Estado Social buscava orientar as condutas humanas para a promoção do desenvolvimento econômico e social, sendo vislumbrado como uma técnica de regulação social. Sem abandonar a defesa da liberdade, o Estado assumiu a justiça social como sua preocupação primeira e, para tanto, aparece gradualmente como a instituição responsável por promover a igualdade na sociedade, não sob o ponto de vista formal vigente na época do liberalismo, mas sim a isonomia material e concreta.

O Estado do Bem-Estar Social é também chamado de Estado Providência. Ele teve a política do New Deal como um dos elementos propulsores, culminando com a Lei Fundamental de Bonn, de 1949. Naquele contexto, o Estado já não podia furtar-se a corresponder à pressão da sociedade que se conscientizava de suas necessidade, suscitando graves problemas que exigiam a interferência da autoridade pública, tais como a necessidade de uma política de pleno emprego e de institucionalização de ajuda para aqueles que ainda não se encontravam no mercado de trabalho. Ocorre que os custos das atividades desenvolvidas pelo Estado eram muito altos.

Com a crise do petróleo de 1973, que levou à diminuição a produtividade e, conseqüentemente, à queda da arrecadação fiscal, o que minou a capacidade do Estado de desempenhar as múltiplas tarefas que assumira, colocou-se em xeque a capacidade de o Estado prestar todos esses serviços e atividades.

O welfare state, vitimado por uma grave crise fiscal decorrente da crise econômica mundial, mostrou-se inapto a responder, satisfatoriamente, às solicitações e requerimentos da sociedade. várias contradições ocorreram dentro do projeto do Estado Social, que, cada vez mais, tornou-se menos capaz de atingir seus objetivos substanciais, sendo manifesta a debilidade da sua Administração em assumir responsabilidades, as quais não lograva cumprir. Uma lista cada vez maior de necessidades sociais sem o correspondente incentivo ao investimento eficaz, o crescimento do setor público e a corrupção inerente ao sistema administrativo corroboraram para o colapso do sistema.

Houve, então, um retrocesso, ressurgindo o Estado Neoliberal, para buscar o equilíbrio orçamentário, diminuindo-se as funções do Estado Providência. Houve uma “reengenharia da Administração”.

No Brasil, porém, não foi assim que aconteceu. Existiram aqui algumas especificidades que devem ser observadas.

A estruturação do Estado brasileiro começou em 1808 quando a coroa portuguesa veio para o Brasil. Nessa época havia clientelismo, corrupção etc. As pessoas pagavam para exercer funções públicas; esse pagamento funcionava como uma espécie de investimento, que seria posteriormente compensado com os ganhos ilícitos.

A estrutura inicial da Administração Pública recebe algum tipo de mutação a partir da 2ª República, isto é, com o Governo de Getúlio Vargas.

Em 1930, no Governo de Getúlio Vargas, houve uma mudança do sistema agrário para o urbano e surge a proposta do Estado Providência. A CR/1934 traz a idéia de que o Estado tem determinadas tarefas que deve realizar.

Organiza-se a estrutura do Estado com base em órgãos. Surge, portanto, a organização da Administração Pública Direta (CR/1934).

A CR/1937 trouxe a imposição do Estado interventor, forte, uma verdadeira “ditadura”. A burocracia administrativa foi consagrada definitivamente na CR/1937, mas é mínima.

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Foi a partir da década de 1940, sob a égide da CR/1937, que foram são criadas as entidades da Administração Pública Indireta – inicia-se um movimento de descentralização administrativa.

A CR/1946, por sua vez, teve um caráter liberal. Além da Administração Pública Direta e Indireta, surgiram as parcerias público-privadas.

A ditadura interrompeu o avanço da reestruturação administrativa. O aparato burocrático, que exigia cada vez mais a criação de órgãos estatais, não satisfazia as necessidades sociais, não cumpria as responsabilidades.

Obs.: Sobre este tema - ☺ artigo de Edilson de Oliveira Martins Filho – RDA, v. 30, n.º 6, p. 94.

O Decreto-lei n.º 200/1967 é a base para preservar a necessidade de se manter a autonomia das entidades criadas pela Administração Pública Indireta. A legislação era boa, mas os resultados do aparado burocrático eram questionados e insuficientes.

A CR/1988 retrocedeu e passou a buscar a idéia do Estado do Bem-Estar Social. No resto do mundo, ao contrário, buscava-se, neste momento, um Estado Neoliberal. A CR/1988 impôs deveres a serem cumpridos pela Administração Pública.

Em 1990, com o Governo Collor, houve uma quebra do modelo de competências administrativas, impostas teoricamente pela CR/1988.

Importou-se a idéia de Estado Neoliberal, que impôs uma retração do Estado, já que o aparato burocrático brasileiro era excessivo e ineficiente. Assim, passou-se a buscar a diminuição de órgãos públicos.

No Estado Neoliberal, adota-se a Administração Pública gerencial e acaba-se com a burocracia weberiana.

Burocracia weberiana é a estrutura de órgão e entidades administrativas que integram o Estado e, em um escalonamento sucessivo de competências, tem as suas responsabilidades fixadas e exercidas de uma forma extremamente tecnocrática. É aquilo que é feito do ponto de vista formal sem nenhuma preocupação do resultado e não satisfaz o interesse público primário.

Já a Administração Pública gerencial preocupa-se com o resultado (eficaz), não se importando com o meio utilizado. A preocupação agora é de atingir metas. O Estado tem que diminuir. O Estado deve “planejar e controlar” e não mais executar.

Para isso, o Estado privatiza empresas, desregula determinados setores, flexibiliza o regime jurídico-administrativo (e alguns desses institutos não têm amparo constitucional – a CR/1988 adotou claramente a idéia de Estado do Bem-Estar Social).

Cabe às empresas executar. Isso diminui a supremacia do Estado.“O Estado deve parar de remar e passar apenas a navegar”. Não deve executar as

atividades. Deve apenas estabelecer o rota (meta) e controlar se ela foi cumprida (resultado). O Estado estabelece o rumo e controla o resultado.

Nesse Estado Pós-Neoliberal, há a adoção de algumas figuras:- contratos de gestão, termos de parceria, contratos de programas (são todos nomes para

vínculos que a Administração a pretende manter, a título de contrato administrativo, porque executam competências públicas);

- agências executivas;- agências reguladoras; - organizações sociais (OS); - OSCIP;- parcerias público-privadas (PPP’s).

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São instrumentos utilizados na reestruturação do Estado, que, no Brasil, implicou a adoção de um modelo parecido com aquele surgido no estrangeiro com a concepção neoliberal.

Na concepção desse novo modelo, a competência pública foi dividida em alguns núcleos, que deram origem a esses instrumentos, como veremos a seguir.

• Os 4 núcleos de atividades do Estado e as novas figuras da Administração:

A Reforma Administrativa partiu de uma análise crítica das técnicas de organização administrativas baseadas no modelo burocrático weberiano, colocado em cheque o paradigma clássico dos procedimentos rígidos e a prevalência do próprio princípio da legalidade. Na década de 90, que se pretendia era que o Estado diminuísse sua participação no cenário, adotando um projeto econômico globalizado, com as tendências de redução do aparato administrativo advindas de países como Nova Zelândia, EUA e Grã-Bretanha. Nestes países, o mercado aparece como o produtor fundamental de bens e serviços, permanecendo o Estado com a função de regulador.

As medidas que ainda orientam as mudanças administrativas obedecem ao imperativo orçamentário, a saber, a necessidade de redução de custos, e partem da premissa da flexibilidade como meio de viabilizar a atuação eficiente do Estado. Acredita-se que o ajuste fiscal da União, dos Estados e Municípios, a curto prazo, possibilitará uma Administração Pública mais moderna, voltada para o atendimento dos cidadãos, a médio prazo. O objetivo que se preserva como inspirador da reforma é transitar de uma AP burocrática, considerada “lenta, cara, auto-referida, pouco ou nada orientada para o atendimento das demandas dos cidadãos”, para a gerencial, inspirada na descentralização política e administrativa, no controle a posteriori dos processos administrativos, afastado o controle rígido, numa Administração voltada para o atendimento do cidadão, em vez de auto-referida, e na redução dos níveis hierárquicos, em vez de piramidais.

Para tanto, concebeu-se, no âmbito federal, o Plano Diretor da Reforma do Estado, divulgado em novembro de 1995, no bojo do qual estruturam-se 4 núcleos estatais:

1) Núcleo estratégico: exerce atividades fundamentais, básicas do Estado, sem as quais ele não existe. É composto:

- pela cúpula do Poder Executivo;- pelo Poder Judiciário;- pelo Poder Legislativo;- pelo Ministério Público.

Aqui, incide o regime jurídico-administrativo da Administração Pública Direta.A única inovação é o chamado “contrato de gestão”, que é firmado entre a cúpula do

Poder Executivo (Ministério da Educação, Ministério da Previdência, Ministério da Saúde etc.) e aquelas entidades que vão executar as atividades. Assim, além dos instrumentos tradicionais, como a aprovação de leis (Congresso), a definição das políticas públicas (Presidência e cúpula dos ministérios) e emissão de sentenças e acórdãos (Poder Judiciário), será empregado pela AP o novo instrumento do contrato de gestão. Através dele, o núcleo estratégico definirá os objetivos das entidades executoras do Estado e os respectivos indicadores de desempenho e garantirá a estas entidades os meios humanos, materiais e financeiros para a sua consecução.

Assim, são estabelecidas metas e concedidas vantagens para a entidade da Administração Pública Indireta que vai executar a atividade.

Registre-se que as entidades executoras serão, respectivamente, as Agencias Executivas, no setor das atividades exclusivas do estado, e as Organizações Sociais, no setor dos serviços não-exlcusivos do Estado, admitido o emprego de vínculos contratuais como concessões e

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permissões de serviço público, inclusive sob o novo formato das parcerias público-privadas (PPPs). Não se tem excluída a possibilidade de acordos do núcleo estratégico com entidades da AP Indireta, como o que se pretende com as fundações públicas que atuem no setor de saúde.

2) Núcleo de serviços exclusivos do Estado: constituído por atividades que só o Estado pode realizar, porque a CR/1988 prevê aquilo como competência exclusiva do Estado. Ex.: previdência social, atividade arrecadatória, poder de polícia.

Equivale, pois, ao setor no qual são prestados serviços em que se exerce o poder de regulamentar, tributar, fiscalizar, e fomentar, como ocorre com a cobrança e fiscalização dos impostos, polícia, previdência social básica, controle do meio ambiente, regulamentação e regulação de mercados, fiscalização do cumprimento de determinações legais, serviço de emissão de passaporte, etc.

Procura-se neste setor promover a implementação de um modelo de Administração caracterizado por decisões e ações orientadas para resultados. Isto pressupõe uma instituição com seus corpos diretivo e funcional comprometidos com a missão institucional.

Considera-se que a propriedade só pode ser estatal. As atividades exclusivas de Estado deverão ser, em princípio, organizadas através do sistema de agência, que deverá ter um dirigente, nomeado pelo Ministro, com quem será negociado o contrato de gestão. Uma vez estabelecidos os objetivos e os indicadores de desempenho não apenas quantitativos, mas também qualitativos, o dirigente terá ampla liberdade para gerir o orçamento global recebido (maior autonomia); poderá administrar seus funcionários com independência, no que diz respeito à admissão, demissão e pagamento; poderá realizar compras obedecendo aos princípios gerais de licitação, com sujeição ao controle de resultados.

Aqui, incide o regime jurídico-administrativo.Sem afastar o regime jurídico-administrativo, foram concebidas, pois, duas inovações:

- agências executivas (não deram certo); e- agências reguladoras (deram certo).

Elas integram o núcleo de serviços exclusivos do Estado. São personalidades jurídicas públicas.

A Agencia Executiva consiste em uma qualificação a ser concedida, por decreto presidencial específico, a autarquias e fundações públicas, responsáveis PR atividades e serviços exclusivos do Estado. A exigência prévia de um plano estratégico de reestruturação e desenvolvimento institucional e da celebração do contrato de gestão, aliada à qualificação especial, objetiva sujeitar tais entidades a um regime jurídico especial, melhorando sua eficiência, com a garantia da autonomia necessária para tanto.

3) Núcleo de serviços não exclusivos: é o que se chama de terceiro setor, no qual se realizariam programas de publicização. Tratam-se de atividades que podem ser realizadas pelo mercado junto com o Estado. Ex.: educação, saúde, pesquisa e desenvolvimento tecnológico, cultura, proteção ao meio ambiente.

O Estado atua simultaneamente com outras organizações públicas não-estatais e privadas. Entende-se que, embora as instituições deste setor não detenham o poder de Estado, este se faz presente porque os serviços envolvem direitos humanos fundamentais, ou porque possuem economias externas relevantes, na medida em que produzem ganhos que não podem ser apropriados por estes serviços através do mercado, exatamente como ocorre com as universidades, as escolas técnicas, os hospitais, os museus e os centros de pesquisa voltados para o desenvolvimento da ciência e da tecnologia.

Neste setor tem-se atribuições sociais (ex.: saúde), bem como atribuições educativas (ex.: ensino, pesquisa, estímulo aos esportes, à cultura, às artes, etc.).

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A sociedade e o Estado exercem conjuntamente as atividades privadas de interesse coletivo – é o que se chama de programa de publicização. A estratégia da reforma do Estado apoiou-se, teoricamente, na publicização dos serviços não-exclusivos do estado. Trata-se da absorção destes serviços por um setor público não-estatal (levando-se em conta os ensinamentos de Habermas, público é ≠ de estatal – o espaço público é mais amplo do que o estatal).

Uma vez fomentados pelo Estado, tem-se cabível que assuam a forma de OS ou OSCIP, firmando contrato de gestão com o Poder Executivo, mediante autorização do Parlamento para participar do orçamento público.

Assim, adotou-se, em princípio, esses dois modelos:- OS (organização social) – Lei 9.637; e- OSCIP (organização da sociedade civil de interesse público) – Lei 9.790.

No Brasil, não ocorreu essa publicização de fato. Houve, na verdade, uma privatização. Passou-se do público para o privado, mas o mais estranho de tudo é que se mantiveram a origem, a titularidade e o patrimônio públicos. Trata-se de entidades de mercado, que recebem um “auxílio” do Estado. O regime jurídico é privado.

4) Núcleo de produção e comercialização de bens: através da privatização, devolve-se para o mercado uma competência que é sua. Produzir e comercializar bens não é função do Estado. É função do mercado. Ex.: CSN, Vale. Tratam-se de sociedades de economia mista e empresas públicas que exerciam atividades (comercialização bens e serviços) que não eram exclusivos do Estado, mas pertencem, na verdade, ao setor privado unicamente.

Assim, esse núcleo corresponde à área e atuação das empresas estatais do segmento produtivo ou do mercado financeiro. Caracteriza-se pelas atividades econômicas voltadas para o lucro que ainda permanencem no aparelho do Estado, como as do setor de infra-estrutura.

No núcleo de atividades econômicas, a propriedade privada é a regra, dada a possibilidade de gestão efetiva destas atividades pela via exclusiva do mercado, salvo inexistência de capitais privados disponíveis – o que não seria o caso do Brasil – ou no caso de um monopólio natural – caso em que a estão privada seria mais adequada –, desde que acompanhada por um seguro sistema de regulação.

Neste núcleo, a produção de bens e serviços para o mercado deverá ser, em princípio, realizada pelo setor privado.

Essa situação é diferente da privatização de serviços públicos exclusivos (2º núcleo) e não exclusivos (3º núcleo) do Estado, pois nestes casos a titularidade continua sendo dele. Ex.: privatização do serviço de telefonia.

A fim de exercer controle sobre as pessoas do setor privado, que, após a privatização, passaram a prestar serviços públicos, foi criado um novo tipo de autarquias, denominadas Agencias Reguladoras. Dentre suas metas, destaca-se a função de regulamentar o serviço, traçar objetivos e regras estáveis para o aprimoramento institucional, fiscalizar a prestação sob o prisma da eficiência, regularidade e modicidade das tarifas, admitida a participação da sociedade em sua direção.

Resulta clara, assim, a intenção de que o novo paradigma empresarial de governo substitua o modelo de Administração burocrática. Procura-se reforçar o papel de regulador do Poder Público e enfatizar a participação do setor privado, afastando a incidência de normas rígidas de controle, em benefício do controle de resultados.

Ao prever a transferência para o setor público não-estatal dos serviços considerados não-exclusivos do Estado, possibilitando sua absorção por entidades qualificadas como OS ou OSCIP, pretende-se lograr maior autonomia e flexibilidade, bem como aumentar a responsabilidade dos respectivos dirigentes. Além de forjar parceria entre o Estado e a

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sociedade, objetiva-se um maior controle social na formulação e avaliação do desempenho das OS e OSCIP.

Como forma de viabilizar a transferência, para a iniciativa privada, da execução de competências até então exercidas pela Administração, foi editada a Lei Federal 11.079/04, que regulou as parcerias público-privadas (PPP). Como justificativa para o novo instituto, invocou-se a ausência de recursos públicos suficientes para a realização de obras fundamentais de infra-estrutura no país. A PPP tem a intenção de viabilizar a divisão dos custos necessários à implantação de infra-estrutura entre o Estado e o particular. Para tanto, concebeu-se uma nova e complexa forma de financiamento em que se prevê amortização futura, pelo Estado, dos custos arcados pelo parceiro particular. A amortização pelo Estado ocorre depois de já executado o empreendimento mediante investimentos privados, sendo prevista a incidência de garantias públicas perante a entidade financiadora do projeto e o próprio parceiro privado. No âmbito federal, o art. 16 da Lei 11.079/04 estabeleceu a criação do Fundo Garantidor das PPPs, cuja finalidade é prestar garantia de pagamento de obrigações pecuniárias pelos parceiros públicos federais.

A junção da Administração Pública Direta + Indireta + concessões/permissões com essas inovações supra citadas trazem “a nova cara” do Estado.

• Síntese dos novos rumos da Administração Pública Brasileira:

REFORMA ADMINISTRATIVA

Estrutura Tradicional Núcleo de atividades do EstadoInovações concebidas pela

reforma:

Administração DiretaNúcleo Estratégico (Poder

Executivo Federal: Presidência, Ministério e Auxiliares)

Celebrará contratos de gestão por meio de que definirá objetivos das

entidades executoras do Estado (Agências Executivas e OS)

Autarquias e Fundações

Atividades exclusivas (arrecadação de impostos, polícia, previdência social,

regulação de mercados, controle do meio-ambiente, atividades de

fiscalização)

(Se for o caso, extinção de órgãos e criação de autarquias).

Agências Executivas (qualificação) + contrato de gestão.

Agências reguladoras (criação por lei).

Autarquias e Fundações

Serviços não-exclusivos (áreas em que há atuação do Estado e

atuação privada, de modo concomitante – ex.:

universidades, centros de pesquisa, hospitais e museus)

(Se for o caso, extinção de órgãos/autarquias/fundações e

associações privadas).OS (Lei Federal 9.637)

OSCIP (Lei Federal 9.079/99)(3º Setor)

Empresas Paraestatais(SEM/EP exploradoras de atividades econ. e

prestadoras de serviço público)

Concessões e Permissões

Produção de bens e de serviços pra o mercado

Privatização (se exploram atividades econômicas)

Privatização + Concessão (se prestam serviços públicos)PPP´s (Lei Federal 11.079)

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ORGANIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA:ORGANIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA:

• Introdução:

A Organização do Estado é matéria constitucional no que concerne à divisão política do território nacional, à estruturação dos Poderes, à forma de Governo, ao modo de investidura dos governantes, aos direitos e garantias dos governados.

Definidas as disposições constitucionais que moldam a organização política do Estado soberano, passa-se à instituição da legislação infraconstitucional, que estabelece a Organização Administrativa das entidades estatais, de suas autarquias e empresas estatais, instituídas para a execução desconcentrada e descentralizada de serviços públicos e outras atividades de interesse coletivo, que são objetos do Direito Administrativo e das modernas técnicas de administração.

Assim, Organização da Administração é a estruturação das entidades e órgãos que irão desempenhar as funções, por meio de agentes públicos. Essa organização se dá normalmente por leis e, excepcionalmente, por decreto e normas inferiores.

Para definir a Organização Administrativa Federal tem-se o Dec. Lei 200/67 que, em seu art. 6º e ss, estabelece os princípios básicos norteadores dessa estrutura e das atividades desenvolvidas por essa ordem política, o que hodiernamente é copiado pelos demais entes da Federação. Os princípios apontados são:

- Princípio do planejamento: consiste na elaboração de planos e programas, visando promover o desenvolvimento econômico-social do país, assegurando aos cidadãos o direito à prosperidade;

- Princípio da cooperação: visa harmonizar as ações administrativas, mantendo-se nos limites do planejamento, objetivando evitar duplicidade de atuação, soluções divergentes e desperdício de recursos financeiros;

- Princípio da descentralização administrativa: consiste em atribuir à pessoa distinta daquela do Estado poderes suficientes para que, atuando por sua conta e risco, mas sob o ordenamento e controle estatal, desempenhe atividade pública ou de utilidade pública;

- Princípio da delegação de competência: subentende a transmissão de poderes decisórios atribuídos originalmente à autoridade superior para a autoridade subordinada, caracterizando-se pelo caráter transitório e facultativo, processando-se segundo o ordenamento jurídico e mediante ato próprio;

- Princípio do controle: consiste no acompanhamento sistemático da execução dos planos e programas governamentais pelos órgãos e chefias competentes, balizando-se pela observância do ordenamento legal de regência. Baseia-se no princípio administrativo da hierarquia.

Este mesmo Dec. Lei 200/67, com suas alterações posteriores e com fundamento na descentralização administrativa, propôs, em seu art. 4º, a atual estrutura administrativa da organização federal, dividindo-a em: Administração Direta e Indireta.

• Administração Direta e Administração Indireta:

Os conceitos de Administração Direta e Indireta são legais, porquanto definidos no ordenamento de regência.

No âmbito federal, o conceito legal de Administração Direta encontra-se disposto no art. 4º, I, do DL 200/67. Segundo o mencionado dispositivo, a AP Direta se constitui dos serviços

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integrados na estrutura administrativa da Presidência da República e na dos Ministérios. Assim sendo, é parte da Administração Direta federal a Presidência da República, o Ministério da Fazenda, o Ministério dos Transportes, a Casa Civil, o Ministério das Relações Exteriores, dentre outros, bem como os órgãos que a estes encontram-se vinculados, integrando a própria União Federal.

A doutrina estabelece, assim, como AP Direta ou centralizada os serviços integrados à estrutura da Presidência, seus Ministérios e demais órgãos inferiores, no plano federal; às Governadorias, suas Secretarias e demais órgãos, no plano estadual; e às Prefeituras, suas Secretarias e respectivos órgãos, no âmbito municipal.

O núcleo fundamental da AP Direta refere-se ao fato de a própria Constituição implicitamente considerá-la como o conjunto de órgãos públicos que compõe a estrutura dos entes da federação (União, Estados, DF e Município), sujeitando-os ao regime jurídico administrativo.

De fato, as repartições de competência levadas a efeito no interior das pessoas federativas sujeitam-se ao regime de direito público que vincula o todo. Se a União, os Estados, os Municípios e o DF estão obrigados a cumprir uma série de restrições e tiverem a si outorgados um conjunto de vantagens tais sujeições e prerrogativas incidem, à obviedade, sobre as partes internas aos entes federativos.

Observe-se que, entendida a AP Direta como um conjunto de órgãos interiores às pessoas federativas, que delas são partes, é certo que a noção legal de AP Direta corresponde ao conceito doutrinário de Administração Centralizada (☺ próximo tópico). Afinal, tem-se Administração Centralizada quando uma pessoa federativa exerce, por meio dos seus órgãos, as atividades que lhe foram imputadas pelo ordenamento. O ente da federação (U, E, DF, M) e, aqui, o titular e o executor da atividade administrativa, não havendo interposta pessoa entre ele e o beneficiário da sua ação. É exatamente isso que acontece na AP Direta Federal, estadual, distrital e municipal. Irrepreensível, portanto, a conclusão segundo a qual a noção de AP Direta corresponde à de Administração Centralizada, com submissão ao regime jurídico de direito público vinculante de todos os entes da federação.

A AP Indireta, por sua vez, é composta por entidades que possuem personalidade jurídica própria e são responsáveis pela execução de atividades administrativas que necessitam ser desenvolvidas de forma descentralizada. No âmbito federal, o conceito legal de AP Indireta está disposto no art. 4º, II, DL 200/67, segundo o qual ela é composta pelas autarquias, fundações públicas e empresas estatais, mais especificamente, as empresas públicas e as sociedades de economia mista. Cada uma dessas categorias de entidades será melhor estudada a diante.

• Formas de prestação da atividade administrativa:

As noções de centralização e descentralização políticas distinguem-se dos conceitos de centralização e descentralização administrativa. As primeiras, analisadas no âmbito do Direito Constitucional, referem-se à manutenção do poder de legislar em um único centro (centralização política) ou à transferência do poder legiferante, pela Constituição, a outras pessoas políticas (descentralização política). A centralização e descentralização administrativas não possuem relação alguma com o poder de legislar, referindo-se apenas à manutenção, ou não, da execução das atividades administrativas em uma mesma pessoa competente para realizá-las. O Brasil, como uma República Federativa, encontra na própria Constituição a fonte da descentralização política levada a efeito. Por sua vez, a centralização e a descentralização administrativas dependem, atualmente, de normatização específica federal, estadual, municipal ou distrital.

Quanto à centralização e descentralização política, pode-se dizer que no Estado Unitário não há descentralização política, uma vez que o poder de legislar está restrito a um único núcleo

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à pessoa central. No Estado Federado, ao contrário, a Constituição, ao repartir os poderes entre os entes que lhe integram, estabelece clara descentralização da competência legislativa. Neste contexto, a descentralização política é basilar para caracterizar o Estado como federado, com independência dos entes que lhe integram, excluindo-se o enquadramento como Estado Unitário. A autonomia dos entes descentralizados politicamente resta manifesta em nossa Constituição nos seus arts. 1º, 18, 25 e 30.

Com efeito, uma vez delineada, no âmbito do Direito Constitucional, a autonomia política de cada um dos entes da federação, é mister fixar as diferentes formas de exercício das competências administrativas por cada um dos entes federativos. Em outras palavras, reconhecida a existência autônoma da União, dos Estados, dos municípios e do DF, é necessário aferir como cada um deles exerce o conjunto de competências administrativas que lhe foram imputadas.

A atividade administrativa pode ser prestada de diversas maneiras: centralizada, descentralizada ou desconcentrada.

A primeira idéia que surge é a de prestação de serviço feita pelo núcleo, pelo centro da Administração. A prestação, portanto, seria feita de forma centralizada, pela própria AP Direta, que é composta pelas pessoas políticas União, Estados, Municípios e DF. Isso é a Centralização.

Na Administração Centralizada, o único centro de exe4rcício da competência administrativa é a pessoa federativa (União, Estado, Município ou DF). A pessoa federativa, que é ente descentralizado politicamente (em razão da distribuição de competências legislativas realizada pela Constituição), atua centralizadamente na realização da competência administrativa. Trata-se, pois, de ente federativo descentralizado politicamente, centralizado administrativamente (o exercício da competência administrativa se dá em um único centro, o da própria pessoa federativa).

Na Administração Centralizada, o ente federativo será, ao mesmo tempo, o titular e o executor da atividade administrativa, já que o desempenho da competência ocorre do Poder Público diretamente em favor do cidadão. CABM elucida que, na Administração Centralizada, o serviço vai da AP ao seu beneficiário último, sem passar por interposta pessoa.

Ocorre que o leque ou número de serviços público cresce dia a dia e, conseqüentemente, a busca pela eficiência aumentou. Para se conseguir prestar todos os serviços, buscando-se maior eficiência e especialização no exercício da função pública, e assim protegendo o interesse público, o Estado decide retirar o serviço do centro da Administração, transferindo-o para outras pessoas jurídicas, ou seja, ele transfere a competência para exercício de atividades que lhe são pertinentes a pessoas jurídicas auxiliares por ele criadas ou para particulares. E o faz através do instituto da Descentralização, que é a transferência para uma nova pessoa, ou seja, o Estado passa a atuar indiretamente, por intermédio de outras pessoas, seres juridicamente distintos.

Se é para nova pessoa, não há hierarquia. O que existe é controle, fiscalização, mas não hierarquia. As pessoas jurídicas auxiliares criadas pelo Estado compõem a AP Indireta (Autarquia, fundação pública, EP e SEM).

A quem pode ser descentralizado o serviço: a AP Indireta ou a particulares (concessionárias e permissionárias de serviços públicos) - ☺ próximo tópico.

Não obstante, muitas vezes, o serviço é deslocado dentro da própria pessoa jurídica. Sai de um órgão e vai para outro órgão dentro do próprio núcleo, dentro da própria pessoa jurídica, a isso dá-se o nome de Desconcentração. Ou seja, para que um ente federativo consiga exercer todas as atribuições administrativas que lhe são impostas pelo ordenamento, diretamente, em

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face dos cidadãos, é mister que ocorra uma distribuição interna de competências, a que a doutrina denomina de desconcentração.

Se há desconcentração, há uma relação de hierarquia (é o chefe dando a ordem e os demais obedecendo). Ex.: o Presidente da República determina que o serviço A vai sair do Ministério X para o Ministério Y: é desconcentração.

Não se pode confundir descentralização e desconcentração. Esta última é um fenômeno de distribuição interna de partes de competências decisórias, agrupadas e unidades individualizadas. Ela não prejudica a unidade monopolítica do Estado, pois todos os órgãos e agentes permanecem ligados por um sólido vínculo denominado hierarquia, podendo ser em razão da matéria, do grau de hierarquia ou do território, como, por ex., a distribuição das atividades entre os órgãos públicos.

A desconcentração é figura que se refere à organização interna de cada pessoa jurídica, ao passo que a descentralização envolve mais de uma pessoa ao mesmo tempo.

A desconcentração pode ocorrer de forma originária ou derivada. A desconcentração originária decorre imediatamente da lei, que desde logo reparte a competência entre o superior e os subalternos, e a desconcentração derivada só se efetiva mediante um ato específico praticado para o efeito pelo superior.

O fenômeno da desconcentração, por meio do qual há distribuição, entra as unidades internas e individualizadas de qualquer ente federativo, das diversas tarefas administrativas a serem realizadas, pode ocorrer segundo diferentes critérios: a) desconcentração em razão da matéria; b) desconcentração em razão da hierarquia; c) desconcentração territorial.

Assim sendo, um ente federativo que exerça centralizadamente as suas atribuições administrativas pode, internamente, distribuí-las conforme a diversidade entre as matérias de atuação (desconcentração em razão da matéria), de acordo com os limites territoriais (desconcentração territorial ou geográfica) e a gradação hierárquica de cada um dos seus órgãos (desconcentração em razão da hierarquia).

Observe-se que esta distribuição interna de competências administrativas não implica a sua transferência a outra pessoa jurídica, mas se dá dentro da mesma pessoa jurídica de direito público interno política (U, E, M, DF), entre órgãos que lhe integram. Estes órgãos são partes da pessoa federativa e são escalonados sucessivamente em uma pirâmide cujo ápice é o Chefe do Executivo.

Tem-se várias vantagens da desconcentração, pois se viabiliza a aproximação do Poder Público perante os cidadãos. Desoneram-se os níveis superiores da Administração, cujo funcionamento poderá tornar-se mais célere e eficaz. Outrossim, trata-se de uma técnica mais simples e, por vezes, de menor custo que a descentralização. Mantém-se os poderes dos superiores hieráqruicos de prevenirem e corrigirem as ações dos inferiores.

→ Reconhece-se que a Administração Centralizada é aquela exercida pelos entes federativos diretamente em face dos beneficiários da sua atuação. Em regra, o exercício centralizado de competências se dá mediante desconcentração. Não são criadas outras pessoa, mas apenas se repartem os poderes dentro do mesmo ente federativo, entre os órgãos que lhe formam, em um movimento que se denomina desconcentração. É comum, pois, que a Administração centralizada seja, simultaneamente, desconcentrada.

Atenção: inicialmente, a descentralização realiza-se por pessoas jurídicas diversas e não há vínculo hierárquico entre a Administração Central e a pessoa estatal descentralizada, existindo apenas um poder de controle, enquanto a desconcentração se refere a uma só pessoa, pois cogita-se sobre a distribuição de competências na intimidade dela, mantendo-se o liame unificador da hierarquia.

Para que não reste dúvidas, é preciso diferenciar hierarquia de controle: hierarquia é o vínculo de autoridade que une órgãos e agentes, por meio de escalões sucessivos, relação de

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autoridade superior a inferior, consiste no poder de comando, de fiscalização, de revisão, de punir, de delegar e avocar competências; já o controle representa o poder que a Administração central exerce sobre a pessoa descentralizada, sendo o oposto à hierarquia, visto que, nesse caso, não há qualquer relação de subordinação, há somente uma relação de fiscalização quanto ao cumprimento da lei, obediência às suas finalidades pré-estabelecidas e a busca do interesse público. O controle depende de previsão legal, logo, diferentemente da hierarquia, não se presume e se manifesta tão-só nos aspectos autorizados pela lei.

☺Quadro sinóptico:

Formas de prestação da atividade administrativa:Forma

Centralizada:- quando a atividade é exercida pelo próprio Estado (AP Direta).

Forma Descentralizada:

- quando o Estado transfere o exercício de atividades que lhe soa pertinentes, para pessoas jurídicas auxiliares por ele criadas ou para particulares, e passa a atuar indiretamente, pois o faz por intermédio de outras pessoas jurídicas, seres juridicamente distintos, tendo vários planos de descentralização.- descentralização política é diferente de descentralização administrativa: a primeira ocorre sempre que pessoas jurídicas de direito público concorram com competências políticas, com soberania ou autonomia para legislar, para ditar seus propósitos e para governar, o que é feito pela CR; já a descentralização administrativa ocorre quando as atribuições que os entes descentralizados exercem têm o valor jurídico que lhes empresta o ente central, suas atribuições decorrem desse ente, não decorrendo de força própria da CR. Nesta situação, o que existe é a criação de entes personalizados, com poder de auto-administração, capacidade de gerir os próprios negócios, mas com subordinação a leis e regras impostas pelo ente central. Nada impede que concorram, ao mesmo tempo, a descentralização política e a administrativa.- formas de descentralização administrativa: descentralização territorial ou geográfica, descentralização de serviços, funcional ou técnica e descentralização por colaboração.

Forma Desconcentrada:

- é um fenômeno de distribuição interna de partes de competências decisórias, agrupadas em unidades individualizadas, que não prejudica a unidade monolítica do Estado, pois todos os órgãos e agentes permanecem ligados por um sólido vínculo denominado hierarquia.

Resumindo:

→ Descentralização é a transferência da execução do serviço público para outra pessoa ou para particulares; ou seja, é a transferência de atribuições de uma pessoa jurídica a outra pessoa jurídica ou física. Pode ser por outorga ou por delegação. Não há hierarquia (subordinação);

→ Desconcentração é a transferência da execução do serviço público de um órgão para outro, sem sair da AP Direta; ou seja, é a distribuição de competências na estruturação de uma única pessoa jurídica; é o que dá origem a órgãos (e não a pessoas, porque sempre ocorre dentro de uma mesma/única pessoa). Há hierarquia (subordinação de um órgão a outro).

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• Descentralização:

O exercício descentralizado da competência administrativa ocorre quando um ente federativo transfere parte da função administrativa que lhe foi imputada a outra pessoa, pública ou privada. Aqui não se fala de distribuição interna de competências dentro de uma mesma pessoa federativa (desconcentração), nem mesmo da distribuição do poder de legislar feita pela Constituição de um Estado Federado (descentralização política).

Trata-se da repartição de competências administrativas, não legislativas. Ou seja: tem-se, aqui, a distribuição do poder-dever de cumprir a lei de ofício para satisfação do bem estar geral; não o poder de criar o direito. Ademais, esta distribuição de competência administrativa se dá em cada esfera da federação (federal, estadual, distrital e municipal) entre duas pessoas: a) o próprio ente federativo (U, E, DF, M) que originariamente detinha a competência para realizar aquela tarefa; b) a pessoa pública ou privada que recebe do ente federativo a titularidade e/ou execução da atividade administrativa.

Resulta claro que, para haver Administração Descentralizada, é preciso que haja o mínimo de duas pessoas: uma delas é o ente federativo que tem a titularidade da atividade administrativa, por ex., em razão de norma constitucional; a outra pessoa é aquela que receberá a titularidade e/ou execução da competência. Em outras palavras, existirão dois centros: o primeiro corresponde à pessoa federativa competente para exercer aquele múnus administrativo; o segundo equivale à pessoa pública ou privada que, em última instancia, realizará a atividade administrativa em favor do corpo social.

CABM explicita que na descentralização o Estado atua por meio de seres que lhe são juridicamente distintos, sejam criaturas suas, sejam particulares que recebem apenas a execução daquele mister: “Na descentralização o Estado atua indiretamente, pois o faz através de outras pessoas, seres juridicamente distintos dele, ainda quando sejam criaturas suas e por isto mesmo se constituem em parcelas personalizadas da totalidade do aparelho administrativo estatal”.

Conseqüentemente, entre a pessoa federativa competente (U, E,DF, M) e o cidadão beneficiário da atuação estatal haverá uma interposta pessoa, qual seja, a entidade descentralizada. É esta entidade descentralizada, a quem incumbe desempenhar a função administrativa, que prestará o serviço público, exercitará o poder de polícia ou executará a atividade de fomento público.

Assim, podemos diferenciar:

Centralização administrativa: Descentralização administrativa:- O ente federativo é titular e prestador da atividade;- Atuação direta por órgãos (há uma só pessoa – o ente federativo – que age diretamente em favor do beneficiário da atividade estatal, mediante suas repartições internas: os seus próprios órgãos);- Há uma só pessoa (o ente federativo). Sendo a Administração centralizada, é possível que ocorra a desconcentração material, hierárquica ou territorial (distribuição interna de competências no próprio ente federativo).

- O ente federativo transfere a titularidade e execução ou somente a execução da atividade administrativa para pessoa distinta do Estado;- Atuação indireta do ente federativo por interposta pessoa (seres distintos do ente federativo: autarquias, fundações públicas, empresas públicas, sociedades de economia mista, concessionários ou permissionários);- Há no mínimo duas pessoas: o ente federativo competente originariamente e a pessoa descentralizada administrativamente que recebe a titularidade e execução ou somente a execução da competência. Na hipótese de descentralização técnica (outorga) pode haver desconcentração material, hierárquica e territorial internamente à pessoa administrativa descentralizada (é possível haver desconcentração dentro da autarquia, FP, EP, SEM).

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São 3 os mecanismos de descentralização administrativa descritos na doutrina atual: a) descentralização territorial (ou geográfica); b) descentralização por serviços ou outorga; c) descentralização por colaboração ou delegação.

1) Descentralização Territorial : na verdade, a descentralização territorial não existe atualmente na estrutura do Estado Brasileiro, uma vez que o ADCT determinou a transformação dos territórios de Roraima e do Amapá em Estados (☺art. 14, ADCT), a extinção do território de Fernando de Noronha, cuja área foi incorporada ao Estado do Pernambuco (☺art. 15, ADCT), e tendo sido Tocantins criado originariamente como Estado, conforme desmembramento de área descrito no texto constitucional (☺art. 13, ADCT). Porém, antes da extinção dos territórios brasileiros, havia esta denominada descentralização geográfica ou territorial. Sua primeira característica era a de que o ente descentralizado não possuía competência legislativa. Afinal, a descentralização territorial é administrativa e não política. Sendo assim, transfere-se ao ente descentralizado capacidade de administrar e não de legislar. Por isso os territórios jamais integraram a federação brasileira, já que, para fazer parte do Estado Federado, é necessário que a pessoa tenha em seu favor reconhecida autonomia política diretamente pela Constituição; se a Constituição não lhe reserva competência legislativa própria, mas apenas competência administrativa genérica, não se trata de ente federativo, mas somente de entidade administrativa descentralizada.

Os territórios brasileiros não possuíam uma única capacidade administrativa específica. A competência do ente descentralizado geograficamente era, por natureza, genérica. Portanto, os antigos territórios brasileiros abrangiam uma série de atividades as quais se mostravam simultaneamente de necessidade da coletividade, na área geográfica que lhes delimitava.

No tocante à multiplicidade de interesses que buscavam atender, tinham independência para se auto-administrarem, malgrado a incidência de controle pelo poder central. Não se pode ignorar que a Constituição ainda mantém regra segundo a qual “os territórios federais integram a União e a sua criação, transformação em Estado ou reintegração do Estado de origem serão reguladas em LC” (☺art. 18, §2º, CR). Ademais, o art. 33 da Constituição determina que “a lei disporá sobre a organização administrativa e judiciária dos territórios”, que poderão ser divididos em municípios (☺§1º). Esses dispositivos evidenciam a possibilidade de, no futuro, serem criadas pessoas administrativas de direito público que se definirão como descentralização territorial da União. Embora esta seja uma descentralização típica dos Estado Unitários, como a França, nada impede que idêntico desmembramento venha a ocorrer no Brasil, no âmbito federal.

2) Descentralização por Serviços ou Outorga : ocorre quando a AP transfere a titularidade e a execução do serviço. Como é uma situação mais grave, depende de um regime mais rigoroso, portanto, só pode ser feita por lei. A titularidade do serviço não pode sair das mãos do Poder Público (não pode ser para particular). Assim, quem pode receber essa transferência, via outorga, é a AP Indireta. Hoje a doutrina majoritária diz que não é para qualquer AP Indireta, mas sim para as pessoas de direito público, mais especificamente para as autarquias e fundações públicas de direito público. Isso ocorre justamente porque quando se dá a titularidade do serviço, se dá muito poder a quem a recebe.

Inúmeras são as hipóteses de descentralização por serviços ou outorga no Direito Administrativo brasileiro. Nela, o ente federativo cria ou autoriza a criação de uma pessoa jurídica de direito público ou de direito privado, atribuindo a ela a titularidade e a execução de uma determinada atividade administrativa. Ou seja, a U, E, DF ou M outorga a titularidade e a execução de uma competência administrativa a uma pessoa pública ou privada que institui ou cuja criação autoriza.

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A outorga realizada pelas pessoas federativas é feita por lei que transfere à pessoa pública ou privada descentralizada a competência específica de exercer uma dada atividade administrativa. Assim ocorre quando, por ex., a União cria, por lei federal, uma autarquia como o IBAMA e a ela transfere a titularidade e a execução da polícia administrativa ambiental no território nacional. A pessoa descentralizada possui personalidade jurídica própria e capacidade específica para atuar em determinada seara administrativa (e somente nela – ex.: proteção do meio ambiente), sendo-lhe outorgada certa independência, a qual é limitada somente pelo controle denominado tutela. Aqui a atividade vai do ente federativo ao cidadão dela beneficiário por meio de uma pessoa (pública ou privada) originada a partir de uma lei federal, estadual, municiapl ou distrital, que a criou diretamente ou autorizou a sua instituição.

MSZDP define a descentralização por serviços funcional ou técnica como “a que se verifica quando o poder público (U, E, M) cria uma pessoa jurídica de direito público ou privado e a ela atribui a titularidade e a execução de determinado serviço público”. A autora ainda aduz que, embora tradicionalmente no Brasil os autores refiram-se sempre às autarquias como forma de serviço público descentralizado, há que inserir também as fundações governamentais, SEM e empresas públicas, que exerçam serviços públicos.

Não é impossível que em cada entidade descentralizada tecnicamente ocorra desconcentração. Assim sendo, se entre a União e o INSS o que ocorre e a descentralização por serviços (funcional, técnica ou outorga), dentro do INSS (uma mesma pessoa jurídica administrativa) pode acontecer, por ex., distribuição interna de competências, ou seja, dentro da autarquia previdenciária pode ocorrer desconcentração hierárquica, material e territorial. Conclui-se, por conseguinte, que a descentralização técnica ou outorga realizada por um ente federativo em favor de uma autarquia, FP, EP ou SEM não é incompatível com o fato de, em cada uma dessas entidades administrativas, promover-se, cumulativamente, o fenômeno da desconcentração. Com efeito, é possível que haja desconcentração internamente a uma entidade descentralizada funcionalmente ou por outorga.

3) Descentralização por Colaboração ou Delegação : ocorre quando a AP transfere somente a execução do serviço (a AP detém a titularidade do serviço). Essa transferência pode acontecer através de lei, de contrato ou de ato administrativo. Pode-se delegar por lei (delegação legal) para as empresas públicas e sociedades de economia mista. Pode-se delegar por contrato administrativo para os particulares (ex.: concessionário se permissionários de serviço público). Pode-se, por fim, delegar via atos administrativos também para os particulares (ex.: autorização de serviço público).

Há descentralização por colaboração quando o ente federativo transfere determinada competência administrativa, por contrato, a uma pessoa de direito privado que já existia anteriormente, no mercado. Aqui, a pessoa federativa não delega a titularidade, mas somente a execução de determinada competência administrativa. Daí porque é possível fazê-lo por contrato: a titularidade da atividade prevista em lei permanece com a pessoa política indicada no ordenamento.

O particular, que não tem origem no Estado, recebe a tarefa de executar a atividade administrativa por contrato, como é o caso, por ex., da concessão e da permissão de serviço público, e deve observar o regramento público que lhe é imposto. Sujeita-se, ainda, ao controle inerente a todo e qualquer contrato administrativo. Destacam-se o poder de o Estado fiscalizar, alterar e rescindir unilateralmente o vínculo, bem como a competência para realizar as medidas coercitivas previstas em lei como cláusulas exorbitantes, as quais se presumem presentes nos acordos, mesmo quando não expressas.

Também na hipótese de delegação, a atividade vai da pessoa federativa ao cidadão por meio de uma interposta pessoa, qual seja, o particular contratado (concessionário ou permissionário). A distinção entre a outorga e a delegação é justamente que, nesta última, a

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transferência é apenas da execução da atividade, por meio de contrato, a uma pessoa jurídica de direito privado pré-existente, enquanto na outorga a transferência é, por lei, da titularidade e da execução da competência administrativa.

Quando um Município, por ex., contrata uma empresa particular para realizar o transporte coletivo urbano, por meio de um contrato administrativo de concessão de serviço público, ele delega a execução de uma atividade administrativa que lhe foi imputada a uma pessoa jurídica de direito privado pré-existente. A titularidade do serviço de transporte público coletivo local permanece com o Município, apenas a execução da atividade é transferida contratualmente à empresa que se tornou concessionária. Entre o Município e o cidadão usuário do ônibus local há, a partir de então, uma interposta pessoa, qual seja, a empresa concessionária de transporte coletivo urbano. Cabe ao Município controlar a prestação do serviço pela empresa concessionária de forma ampla, o que decorre da própria natureza da atividade pública descentralizada, sendo despicienda até mesmo previsão contratual específica, pois os poderes de fiscalização presumem-se implícitos em razão das cláusulas exorbitantes.

→ Obs. finais:

- Pergunta: A AP pode outorgar a concessão de serviço público ao particular? A AP pode realizar, fazer, dar a concessão de serviço público ao particular? Sim. O

enunciado não disse que a concessão é uma outorga. Utilizou o termo “outorga” de forma geral, em sua acepção vulgar, e não na sua acepção técnica. Significa “dar”. A resposta é, portanto, afirmativa. Se dissesse que a concessão é uma forma de outorga, ai sim seria errada, porque é uma forma de delegação.

O problema é que o art. 175 também usa a palavra outorga na sua acepção vulgar e confunde o intérprete. Atenção para o sentido da palavra!

- Pergunta: É possível a descentralização de serviços públicos feita a pessoas físicas e jurídicas no Brasil? Sim. Quanto a pessoa jurídica não há dúvida, mas devemos nos lembrar que tanto a permissão como a autorização de serviço pode se dar com a pessoa física (ex.: taxi).

- Pergunta: A União transfere um serviço para o Estado realizando descentralização administrativa? Não. Se a União é ente político e o Estado é também ente político, distribuição de competências entre entes políticos recebe o nome de descentralização política e não administrativa. É a repartição de competências constitucionais, estudada em Direito Constitucional. A descentralização administrativa é a transferência de atividade administrativa uma pessoa para uma outra pessoa ou para um particular, e não entre entes políticos.

Descentralização administrativa: Desconcentração administrativa:Pessoas jurídicas diversas (ente federativo central e pessoa centralizada)

Uma só pessoa jurídica

Não há hierarquia; na descentralização por serviços (técnica, funcional ou outorga) o controle é de tutela e na descentralização por colaboração (ou delegação) a fiscalização é a inerente aos contratos administrativos.

O controle é o de hierarquia (com a desconcentração há vínculo de subordinação dos órgãos inferiores em face dos superiores).

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Descentralização por serviços(funcional, técnica ou outorga)

Descentralização por colaboração(ou delegação)

- É feita por lei;- Cria pessoa jurídica de direito público ou autoriza a criação de pessoa jurídica de direito privado;- Atribui a titularidade e execução da atividade administrativa;- sujeita-se à tutela (controle possível se a lei autoriza e nos estritos limites da permissão legislativa).

- É feita por contrato;- Atribui à pessoa jurídica de direito privado já existente a execução de uma atividade;- Atribui somente a execução da atividade administrativa (a titularidade permanece com o Poder Público);- Controle mais amplo: possibilidade de alteração unilateral das condições de execução, de rescisão unilateral e de fiscalização com poderes pressupostos, mesmo se não expressos no contrato (cláusulas exorbitantes).

• Relação Estado x Agente:

O Estado, enquanto pessoa jurídica, depende do agente, pessoa física, para exercer seus atos. O agente pratica seus atos como se fosse o próprio Estado.

Teorias que surgiram no Brasil para explicar a relação entre o Estado e seus agentes:

a) Teoria do Mandato: segundo esta teoria, o Estado celebra com o agente um contrato de mandato, para que o agente aja e faça sempre a vontade do Estado. Mas quem assinaria o contrato? O Estado não pode assinar sem o agente. O Estado não pode celebrar contrato de mandato com o agente porque ele não pode manifestar esta vontade sem a presença do próprio agente. Esta teoria, portnaot, não prosperou.

b) Teoria da Representação: segundo esta teoria, a relação Estado x agente acontece como na tutela e na curatela; o pressuposto para se constituir a curatela é a incapacidade. Assim, esta teoria pressupõe uma incapacidade. O Estado aparece como um sujeito incapaz, porque precisa de um representante. Ocorre que no Brasil o Estado não é incapaz. ☺art. 37, §6º - o Estado responde pelos atos de seus agentes, é portanto, sujeito capaz e não precisa de representante. Esta teoria, portanto, também não prosperou.

c) Teoria do Órgão ou Teoria da Imputação: é a teoria adotada no Brasil; segundo ela, a relação jurídica entre o Estado e o agente decorre de uma imputação legal (e não de contrato ou de representação). O poder decorre da lei. A lei cria um cargo, define as atribuições, o salário, etc. Mas esta teoria traz também uma segunda idéia, segundo a qual no Brasil a ação do agente se confunde com a vontade do Estado. Acontece, assim, uma confusão de vontades. A vontade do agente é a própria vontade do Estado. O agente não tem vontade própria. É como se não desse para separar o que quer o agente e o que quer o Estado. Um depende e se confunde com o outro.

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• Órgãos Públicos:

As pessoas jurídicas que compõem a AP Direta são a União, os Estados, o DF e os Municípios. Aqui estudaremos a subdivisão administrativa desses entes políticos em órgãos públicos.

O Estado, bem como as outras pessoas de Direito Público, para prestação de suas atividades, pelas diversas funções que exerce, tem que distribuir em seu interior os encargos de sua competência com diferentes unidade, exercendo cada qual uma parcela de suas atribuições. Essas unidades são chamadas órgãos públicos e, em razão de sua especialização, conseguem desenvolver serviços mais eficientes. Assim, pode-se afirmar que a Administração, assim como o corpo humano, é dividida em órgãos, cada um com uma especialidade, função.

A AP, portanto, foi dividida em vários centros de competência, em vários órgãos públicos, a fim de buscar a especialidade, a maior eficiência.

Os órgãos públicos, segundo HLM, são centros ou núcleos especializados de competência.

Segundo CABM, são unidades abstratas que sintetizam os vários círculos de atribuições, de poderes funcionais do Estado, repartidos no interior da personalidade estatal e expressados por meio dos agentes neles providos.

Além da conceituação doutrinária, órgão também está definido no art. 1º, §2º, I, da Lei 9.784/99, que dispõe: “órgão é a unidade de atuação integrante da estrutura da Administração Direta e da estrutura da Administração Indireta”.

Interpretando esta regra seria possível a existencia de órgãos tanto nos entes políticos como nas demais pessoas jurídicas da AP Indireta. De fato, a existência de órgão público na AP Direta é clara. Mas, e nas pessoas da AP Indireta, é possível? Vejamos o caso da autarquia INSS: há uma distribuição de competências dentro dela, tanto que em cada Estado tem uma sede. Assim, podemos concluir que é possível sim a presença de órgãos tanto na AP Direta como na Indireta.

→ Características dos órgãos públicos:

- Órgão público não tem personalidade jurídica e, portanto, não tem aptidão para ser sujeito de direitos e obrigações. Assim, por ato de órgão público, quem responde é a pessoa jurídica a qual pertence. Se não pode ser sujeito de direitos e obrigações, como regra o órgão público não pode celebrar contrato. Ele licita sim, administra o contrato (aparece como gestor do contrato), mas quem celebra o contrato é a pessoa jurídica. ☺ art. 37, §8º, CR (introduzido pela EC 19) – estabelece a possibilidade de se haver o chamado “contrato de gestão”, contrato que inicialmente foi concebido para definir um contrato entre a AP e a própria AP (ex.: União celebra contrato com uma autarquia – trata-se de uma Agência Executiva). Ocorre que, com o passar do tempo, o contrato de gestão foi desconfigurado, passando a qualificar qualquer contrato que não tinha nome. O art. 37, §8º também admitiu o contrato celebrado entre administradores e entre órgãos. Esse dispositivo, nestes pontos, é constitucional? Contratos entre administradores não tem nada a ver com contrato de gestão, não é contrato administrativo (é contrato entre particulares). Quanto aos contratos entre órgãos, a regra tornou-se aplicável; o dispositivo seria inconstitucional porque órgão público não tem personalidade e, por isso, não pode celebrar contrato de gestão. Está na CR, mas, segundo a maioria da doutrina é inconstitucional, apesar de não ter assim sido declarada. Cuidado com as provas!

- Órgão público pode ter CNPJ? Apesar de não ter personalidade jurídica, o órgão público, se tem recurso / dinheiro circulando, terá CNPJ, para viabilizar o controle. O CNPJ é

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especialmente utilizado pela Receita Federal, para acompanhar e fiscalizar o fluxo dos recursos (a aquisição de renda) de cada órgão. ☺ Instrução Normativa da Receita Federal 748/07, art. 11.

- Órgão público pode ir a juízo? Pode. Todavia, a nossa jurisprudência faz duas ressalvas, dizendo que ele pode ir a juízo não em qualquer circunstancia, mas só em busca de prerrogativas funcionais. Ademais, normalmente ele aparece em juízo como sujeito ativo (se não responde pelas suas obrigações ou pelos seus atos, não poderia, em tese, ir a juízo como sujeito passivo), mas esta não é uma regra absoluta. Ex.: Câmara e repasse dos duodécimos – as despesas da Câmara são bancadas pelo repasse dos duodécimos; quem faz o repasse dos duodécimos à Câmara é o chefe do Executivo. Imagine-se que o Prefeito briga com a Câmara e não repassa os duodécimos. Como se trata de prerrogativa funcional (porque sem o repasse ela não poderá exercer suas funções), ela poderá ir a juízo pleiteando o repasse.

→ Classificações de órgãos públicos:

1) Quanto à posição estatal:a) Órgãos independentes: têm controle, mas não sofrem qualquer relação de

subordinação (ex.: chefia do PL, do PE e do PJ).b) Órgãos autônomos: gozam de autonomia; não têm o mesmo poder dos órgãos

independentes porque a eles estão subordinados, mas têm muita liberdade, poder de decisão (ex.: Ministérios, Secretarias de Estado e Secretarias Municipais) – obs.: para o Direito Administrativo, o MP e o TC são órgãos autônomos e não independentes.

c) Órgãos superiores: ainda têm poder de decisão, mas estão subordinados aos órgãos independentes e autônomos (ex.: Gabinetes e Procuradorias).

d) Órgãos subalternos: não têm poder de decisão algum, são meros órgãos de execução (ex.: almoxarifado, zeladoria, seções administrativas, etc).

(11/09/08)

2) Quanto à estrutura:a) Órgão Simples: órgão que existe só, não tem outros agregados à sua estrutura; não tem

ramificações, repartições (ex.: gabinete, em regra);b) Órgão Composto: tem agregados à sua estrutura (delegacia de ensino e as escolas a ela

relacionadas; hospital e posto de saúde a ele ligado).Obs.: ato administrativo é que pode ser complexo; órgão complexo não existe, não entra nesta classificação (não confundir!).

3) Quanto à atuação funcional: (nº de agentes que compõem o órgão)a) Órgão singular ou unipessoal: é composto por um único agente (ex.: Presidência da

República; Governadoria; Prefeitura; juízo monocrático, etc.);b) Órgão colegiado: é composto por vários agentes (ex.: Casas Legislativas; Tribunais; etc.).

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• Pessoas Jurídicas que compõem a Administração Pública Indireta:

- Autarquias: Agências reguladoras

Fundações públicas de direito públicoConselhos de classeAgências executivas

- Fundações Públicas: Agências executivas (podem ser autarquias ou fundações públicas)

- Associações: surgem dos consórcios públicos (Lei 11.107/05)

- Empresas Públicas

- Sociedades de Economia Mista

Obs.: As demais são todas pessoas privadas que não compõem a Administração, não estão na estrutura da AP Indireta (apesar de prestarem serviços públicos ou de praticarem atos característicos de entes administrativos).

→ Características comuns a TODAS as pessoas da AP Indireta:

1) Personalidade jurídica própria : elas respondem pelos seus atos. Têm patrimônio próprio e receita própria (independentemente de sua origem – orçamento, doação, própria atividade, etc.); têm autonomia técnica, administrativa e financeira (não têm autonomia política, que diz respeito à capacidade de legislar – obs.: lembrar que as agências reguladoras, que definem normas técnicas complementares à previsão legal, não possuem capacidade de legislar; não substituem a lei).

2) Criação : ☺art. 37, XIX, CR: “Lei específica cria a autarquia e autoriza a criação das empresas públicas, das SEM e das fundações”.Lei = Lei Ordinária (se o legislador constitucional quisesse LC o teria dito expressamente).Trata-se de LO específica: feita especificamente para aquela pessoa jurídica. Cada pessoa jurídica tem a sua própria lei.

Cria → Autarquia (e a Fundação Pública de Direito Público)LO (específica)

Autoriza a criação → EP, SEM, e Fund. Pública de Direito Privado

Quando a lei cria, não é necessário mais nada; a autarquia já existirá para o mundo jurídico. Quando a lei autoriza a criação, a EP, SEM e F não existirão ainda para o mundo jurídico, para tanto será necessário o registro dos seus atos constitutivos no órgão competente (que será o Cartório de registro de pessoas jurídicas, se a natureza for civil; ou Junta Comercial, se a natureza for empresarial).

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Por paralelismo de formas, da mesma forma que é necessária a lei para a criação, também esta será necessária para a extinção (se a lei cria, a lei extingue; se a lei autoriza a criação, a lei autoriza a extinção). Esta lei definirá as conseqüências da extinção (o que vai acontecer com os servidores, com o patrimônio, com a receita, etc.).

LC definirá as finalidades da Fundação. Ou seja, neste caso, LO autoriza a criação e LC define suas possíveis finalidades.

A doutrina e a jurisprudência se divergem quanto a natureza dessa fundação: para CABM diz que só é possível no Brasil a Fundação Pública de Direito Público; HLM diz que só é possível a Fundação Pública de Direito Privado. A maioria do restante da doutrina e o STF dizem que as fundações podem ser tanto de direito público como de direito privado (☺item “Fundações”).

3) Finalidades Específicas : Cada pessoa da AP Indireta tem uma finalidade específica (pelo Princípio da Especialidade). Esta finalidade é definida por lei, e as pessoas jurídicas estarão vinculadas a esta finalidade. É possível a alteração dessa finalidade? Somente por meio de lei. O que a lei faz o administrador não pode modificar.

4) Fins não lucrativos : Não se admite fins lucrativos na AP Indireta. Quando o Poder Público for criar a pessoa jurídica, ele irá escolher não a que dá mais lucro, mas sim a que for necessária. Elas podem ter lucro, mas não podem ser criadas em virtude de lucro.

EP e SEM podem ser criadas para: prestar serviços públicos ou para explorar atividade econômica. Pergunta: neste último caso (exploração da atividade econômica) há finalidade lucrativa? ☺art. 173, CR – o fim, o objetivo da EP e SEM exploradoras da atividade econômica não é o lucro, mas sim o interesse coletivo e a segurança nacional. E só nesses dois casos será possível a exploração da atividade econômica.

5) Controle : Não há relação de subordinação (hierarquia) entre a AP Direta e a AP Indireta. O que existe é controle, fiscalização. As pessoas jurídicas da AP Direta podem controlar as pessoas jurídicas da AP Indireta, por exemplo, através do Poder Judiciário. O Poder Legislativo pode fazer este controle da AP Indireta através do Tribunal de Contas (que é longa manus do PL) e também da CPI.

O Poder Executivo, por sua vez, pode realizar esse controle por meio da supervisão ministerial. A supervisão ministerial tem como objeto o controle finalístico (controle de finalidade). Ademais, esta supervisão também tem outro sentido: como estas pessoas estão sujeitas às regras orçamentárias, também será possível controlar as receitas e despesas dessas pessoas jurídicas. Por fim, a supervisão ministerial permite que os dirigentes da AP Indireta sejam nomeados pela AP Direta, de acordo com cada lei específica (e esta nomeação política, infelizmente, acaba por se consubstanciar numa espécie de hierarquia sim – ex.: é o chefe do executivo que nomeia de forma livre e também da mesma forma exonera os dirigentes - ☺art. 52, CR: casos em que é necessária a prévia aprovação do Senado Federal – ex.: Banco Central e agências reguladoras).

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• FUNDAÇÕES :

- Conceito: é um patrimônio personalizado; patrimônio destacado por um fundador para uma finalidade específica – Pessoa jurídica composta por um patrimônio personalizado destinado pelo seu fundador para uma finalidade específica, prestando atividades não-lucrativas e atípicas do Poder Público, mas de interesse coletivo, como a educação, cultura, pesquisa, entre outras sempre merecedoras de amparo estatal. Trata-se da personificação de uma finalidade.

O Dec. Lei 200/67 define a fundação pública como “entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado*, sem fins lucrativos, criada em virtude de autorização legislativa, para o desenvolvimento de atividades que não exijam execução por órgãos ou entidades de direito público, com autonomia administrativa, patrimônio gerido pelos respectivos órgãos de direção, e funcionamento custeado por recursos da União e de outras fontes”.

- Instituidor / fundador: determina a sua natureza – se foi instituída por um particular, ganha o nome de Fundação Privada, não compõe a AP e é regida pelo Direito Civil, não sendo objeto de estudo pelo Direito Administrativo; se foi instituída pelo Poder Público, ganha o nome de Fundação Pública. Quando instituída pelo Poder público é fundação pública, compõe a AP Indireta e pode ter personalidade jurídica de direito público ou de direito privado.

Resumindo:a) Fundação Privada: quem a regulamenta é o Direito Civil. Seu regime é privado. Não compõe a Administração; não é estudada no Direito Administrativo.b) Fundação Pública: instituída pelo Poder Público.

- Regime Jurídico da Fundação Pública: pode ser de direito público ou de direito privado.A Fundação Pública de Direito Público é uma espécie de Autarquia (Autarquia

Fundacional). Sendo espécie de autarquia, a lei a cria e não apenas autoriza a sua criação. Tudo o que se falar sobre autarquia valerá para a Fundação Pública de Direito Público.

A Fundação Pública de Direito Privado tem regime de Direito Privado. É a chamada Fundação Governamental. Segue o mesmo regime híbrido (misto) aplicável às EP e às SEM (atenção: ter o mesmo regime não quer dizer ter a mesma natureza! Aqui não ocorre o que vimos acima, que a FP de Direito Público é uma espécie de autarquia! Aqui não é espécie, só segue o mesmo regime). Neste caso, portanto, a lei autoriza a criação (e não cria).

(*) O DL 200/67 conceitua fundação pública como pessoa jurídica de direito privado. Todavia, com a alteração sofrida nesse diploma legal, manteve-se o conceito citado, mas estabeleceu-se que essas pessoas jurídicas não obedeceriam às regras do CC vigente. Surgiu, assim, uma impropriedade, já que não é possível compatibilizar as duas regras. Como admitir que uma pessoa jurídica de regime privado não se submete à lei civil? Toda a divergência foi solucionada com a publicação da CR/88, que, em razão de diversos dispositivos, definiu FP como pessoa jurídica de direito público, dando-lhe o mesmo tratamento de uma autarquia. Nessa época, muitos doutrinadores que defendiam o regime privado acabaram rendendo-se ao regime público. Posteriormente, adveio a EC 19/98 que modificou inúmeros dispositivos da CR, especialmente o art. 37, XIX, que dá à FP a mesma forma de criação das EP e SEM, que são empresas privadas, reascendendo toda a discussão. Atualmente, encontram-se doutrinadores em todos os sentidos: aqueles que defendem só o regime público ou só o regime privado e, ainda, aqueles que admitem as duas possibilidades. Para CABM, a FP não pode ser de direito privado, apesar da possibilidade de o Estado criar pessoas de direito público ou de direito privado. O STJ, neste sentido, já decidiu que “é absolutamente incorreta a afirmação normativa de que as FP são pessoas de direito privado. Na verdade, são pessoas de direito público, consoante, aliás, universal entendimento, que só no Brasil foi contendido. Saber-se se uma pessoa criada pelo Estado é de Direito Privado ou de Direito Público é meramente uma questão de examinar o regime jurídica estabelecido na lei que a criou. Se lhe atribuiu a titularidade de poderes públicos, e não meramente o exercício deles, e disciplinou-a de maneira a que suas relações sejam regidas pelo Direito Público, a pessoa será de Direito Público, ainda

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que se atribua outra qualificação. Na situação inversa, a pessoa será d Edir Privado, mesmo inadequadamente denominada” (☺Resp. 480.632/RS). Nesse cenário, CABM conclui que as FP são pura e simplesmente autarquias. HLM, em sentido contrário, antes da CR/88, dizia que a fundação, mesmo quando criada e mantida pelo Poder Público, não perdia sua personalidade jurídica de direito privado; com o advento da CR/88, o autor mudou seu posicionamento, dizendo que o texto transformou essas fundações em entidades de direito público, mas, posteriormente, com a publicação da EC 19/98, a doutrina recente parece admitir o posicionamento anterior do autor. Já para MSZDP, o Poder Público pode criar fundação de direito público, denominada tão-somente de fundação pública, sendo, nesse caso, uma espécie de autarquia, também chamada de autarquia fundacional, como regime jurídico administrativo e com todas as prerrogativas e sujeições que lhes são próprias, e, de outro lado, pode-se instituir fundação de direito privado, denominada de fundação pública de regime privado ou fundação governamental, em que a lei autoriza a sua criação, podendo, ainda, o Poder Público dar às fundações privadas, por ele instituídas, regras especiais previstas em lei.

→ Exemplos de Fundações Públicas: FUNAI, FUNABEN, IBGE, Butantã, Memorial da América Latina, etc.

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• AUTARQUIAS :

- Conceito: é uma pessoa jurídica de direito público que tem finalidade típica de Estado – serve para a prestação de serviços públicos, especialmente as atividades típicas do Estado (por ser pessoa jurídica de direito público, ela recebe as atividades mais importantes do Estado) – dotada de capital exclusivamente público, com capacidade administrativa e criada para a prestação de serviço público.

São pessoas jurídicas de direito público que gozam de liberdade administrativa nos limites da lei que as criou. Não são subordinadas a órgão nenhum do Estado, mas apenas controladas, tendo direitos e obrigações distintas do Estado.

O Dec. Lei 200/67 conceitua autarquia como “o serviço autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita própria, para executar atividades típicas da AP, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada”.

- Como o regime é público, ela tem tratamento de Fazenda Pública, muito semelhante ao da AP Direta.

- Regime jurídico da Autarquia – regras:a) Ato praticado pela autarquia: é ato administrativo; ela é pessoa jurídica de direito público,

seus atos são atos administrativos, gozam de presunção de legitimidade, de autoexecutoriedade e de imperatividade.

b) Contrato celebrado pela autarquia: é contrato administrativo; tem cláusulas exorbitantes. c) Licitação: se o contrato celebrado é administrativo, ele está sujeito ao procedimento

licitatório, será precedido de licitação; ou seja, autarquia tem que licitar.d) Responsabilidade civil da autarquia: a autarquia está sujeita ao disposto no art. 37, §6º,

CR – responsabilidade objetiva, como regra; e subjetiva, em casos excepcionais.Atenção: a responsabilidade do Estado nasceu na Teoria Subjetiva. Mas, para caracterizar a

responsabilidade nesta categoria é preciso que estejam presente 4 requisitos: que tenha havido uma conduta, que tenha havido um dano, que haja um nexo de causalidade entre a conduta e o dano e, ainda, que haja prova da culpa ou do dolo (elemento subjetivo). A responsabilidade evoluiu, com o objetivo de facilitar esse conjunto probatório, como forma de proteção à vítima. Na Teoria Objetiva, portanto, dispensa-se o elemento subjetivo (culpa ou dolo), bastando os demais 3 elementos. No Brasil, desde 1946 as Constituições aplicam como regra a Teoria da responsabilidade Objetiva. A jurisprudência admite a responsabilidade subjetiva quando tratar-se de omissão.

e) Responsabilidade do Estado por ato de autarquia: é subsidiária; o Estado pode ser chamado de forma subsidiária, com ordem de preferência (os dois não respondem ao mesmo tempo, solidariamente). E é também objetiva, já que a vítima não tem que provar a culpa ou dolo do agente quando for cobrar subsidiariamente do Estado.

f) Prazo prescricional: quanto ao prazo prescricional para se ajuizar alguma ação em face da autarquia, prevalece o entendimento de que é de 5 anos (quinquenária), já que autarquia tem tratamento de Fazenda Pública (☺Dec. Lei 20.910/32).

g) Bens de autarquia: são os chamados bens autárquicos; são bens públicos, seguem o regime dos bens públicos, ou seja:

- são inalienáveis de forma relativa (ou alienáveis de forma condicionada); - são impenhoráveis: não pode ser objeto de penhora (restrição judicial para garantia do juízo – não pode porque o bem ao final não poderá ser alienado), de

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arresto ou seqüestro (cautelares típicas que servem para proteger uma futura penhora – se arresta bens indetermináveis e se seqüestra bens determinados);- não são passíveis de oneração: não pode ser objeto de penhor (garantia fora do juízo, sobre bens móveis) e de hipoteca (garantia sobre bens imóveis);- são imprescritíveis: não podem ser objeto de prescrição aquisitiva, ou seja, não pode ser objeto de usucapião. Mas atenção: a autarquia pode usucapir bens de particular (só não pode sofrer usucapião).

h) Pagamento dos débitos judiciais: é feito através do regime de precatórios - ☺art. 100, CR: os precatórios constituídos até 01/07 de cada ano será pago no ano seguinte. Mas o pagamento dependerá da disponibilidade orçamentária (por isso pode demorar tanto para se receber). Obs.: os débitos de natureza alimentar seguem o regime de precatórios também, mas com fila própria (são pagos primeiro). A autarquia também tem uma fila própria. Cada autarquia tem a sua fila de precatórios.

i) Privilégios tributários: ☺art. 150, VI, a, CR: imunidade recíproca – os entes políticos não pagam impostos uns para os outros. A imunidade recíproca não atinge taxa e contribuição. Assim, a União não paga imposto, mas paga taxa e contribuição. A autarquia tem a mesma imunidade recíproca do art. 150, VI, a (☺art. 150, §2º), desde que no exercício da sua finalidade específica. Ex.: doação de imóvel feita à autarquia, que não utiliza o imóvel na sua finalidade específica, assim, deverá pagar imposto sobre este imóvel.

j) Privilégios processuais: a autarquia tem tratamento de Fazenda Pública e, portanto, assim como a Fazenda Pública, tem privilégios processuais previstos no CPC: 1) prazo processual dilatado (art. 188, CPC – prazo em dobro para recorrer e em quádruplo para contestar); 2) reexame necessário (antes era chamado de “recurso de ofício”, ocorre nas matérias que tem duplo grau obrigatório; se a decisão que depende de reexame não foi enviada ao Tribunal, não fará transito em julgado – não acontecerá no caso de decisões de até 60 SM ou nas decisões já julgadas pelo Pleno).

k) Sujeição à LC 101 (Lei de Responsabilidade fiscal): a contabilidade da autarquia é pública, se fala em procedimentos financeiros que são públicos, assim, a autarquia está sim sujeita à LC 101, bem como à Lei 4.320/64.

l) Regime dos Servidores: quem trabalha na autarquia é servidor público. De qual regime: estatutário ou celetista? Situação atual no Brasil (e isso vale para qualquer servidor público): na CR/88 (texto original) estabeleceu-se que para os servidores públicos aplicava-se o Regime Jurídico Único, o que significava que deveria haver um só regime, independentemente se era celetista ou estatutário. O fato é que, preferencialmente, os nossos entes políticos escolheram o regime estatutário, mas muitos municípios ainda escolheram o celetista. Em 1998 a regra foi alterada pela EC 19 (Reforma Administrativa), que alterou o art. 39 da CR, para dizer que a partir de então estaria sendo abolido o Regime Jurídico Único, passando a admitir o Regime Múltiplo. Assim, tornou-se possível ter os dois regimes ao mesmo tempo, no mesmo ente, devendo a lei estabelecer o regime dependendo se foram criados cargos (estatutário) ou empregos (celetista). A partir de então os entes criaram cargos e empregos. Dez anos depois o STF julgou, em sede de cautelar, a ADI 2135, definindo que o art. 39, CR (que admitia o Regime Múltiplo) padecia de uma inconstitucionalidade formal (uma alteração feita no SF não foi devolvida à CD para votação no 2º turno). Restabeleceu-se, assim, no Brasil, o Regime Jurídica Único. Como a ADI foi julgada em sede de cautelar, produziu efeitos ex nunc. Assim, daí em diante não é mais possível misturar cargo e emprego. Os casos que já existiam de regime múltiplo devem ser decididos caso a caso (e nada foi decidido ainda). Provavelmente os empregos vão acabar entrando em quadro de extinção. Mas o fato é que voltou a antiga divergência quanto a qual deve ser o Regime único: estatutário ou celetista. Ser único não quer dizer que precisa ser estatutário, mas este é o que predomina, pelas garantias que o regime estatutário oferece ao servidor.

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→ Exemplos de autarquias: INSS, IBAMA, Universidades Federais (como regra), agências reguladoras, autarquias territoriais e conselhos de classe.

Autarquia territorial: é o território, se criado. Foi a “saída” encontrada pela doutrina para enquadrar este ente. Decidiu-se, pois, que ele teria natureza de autarquia, apesar de não ter finalidade de autarquia.

(11/09/08)

• Conselhos de Classe:

Nasceram com natureza de autarquia – as chamadas “autarquias profissionais”. Têm natureza de autarquias federais. A competência para suas ações é da Justiça Federal.Veio a Lei 9.649/98, que além de criar as agências executivas, mudam a natureza do

conselho de classe, que passaram a ter natureza jurídica de direito privado; são pessoas jurídicas de direito privado.

Essa pessoa jurídica exerce a fiscalização nas diversas categorias profissionais. Exercem, portanto, poder de polícia. Assim, quando a Lei 9649/98 deu a natureza de pessoa jurídica de direito privado, veio a pergunta: será que ainda assim elas poderão continuar exercendo aquele controle?

Essa matéria foi objeto de controle de constitucionalidade no STF, com o ajuizamento da ADI 1717, na qual o STF fez um reconhecimento que acabou servindo para outras situações, afirmando que não se admite o exercício do poder de polícia nas mãos do particular, pessoa jurídica de direito privado (este não pode receber delegação do poder de polícia).

Assim, o STF resolveu que não se pode dar natureza de direito privado para os Conselhos de Classe porque sua função é exatamente o exercício do poder de polícia. Assim, conselho de classe não pode ter natureza privada. O que o STF reconhece é que o poder de polícia nas mãos de um particular geraria risco à segurança jurídica (particular caçando carteira de um particular).

O STF reconhece, portanto, a inconstitucionalidade da Lei 9649/98, em seu art. 58. O conselho de classe volta então a ter natureza de autarquia.

Se hoje o conselho de classe tem natureza de autarquia, tudo o que estudamos para as autarquias vale também para eles:

- a anuidade cobrada pelo conselho tem natureza tributária, tem natureza de contribuição. Segue o princípio da anterioridade, da legalidade. Se não for paga, estará sujeita à execução fiscal.

- ademais, o conselho de classe está sujeito à contabilidade pública (Lei 4.320/64) e ao controle pelo Tribunal de Contas.

Atenção para a situação da OAB: A OAB começa a sofrer as primeiras modificações em face dos demais conselhos com o

advento do Estatuto da OAB, que afasta a execução fiscal da cobrança da anuidade, afirmando que a execução seria comum (a anuidade não teria natureza tributária). Ademais, o EOAB estabelece que quem trabalha na OAB é celetista.

O PGR, naquele momento (em que ainda se admitia o regime múltiplo) aceitou que se estabelecesse o regime da CLT, mas com prévio concurso público. O PGR ajuizou então a ADI 3026, com o objetivo de se chegar a uma interpretação conforme que aceitasse o regime da CLT,

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mas com concurso público. Mas o tiro saiu pela culatra: o STF decidiu que não procede a alegação de que a OAB submete-se aos ditames da AP Direta e Indireta; a OAB não é entidade da AP Indireta da União, é um serviço público independente, categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas existentes no direito brasileiro; a OAB não está incluída na categoria na qual se insere as autarquias especiais.

Assim, ela não estaria sujeita a controle da AP e nem a qualquer de suas partes estaria vinculada. Tem como características a autonomia e a independência, diferenciando-se dos demais órgãos de fiscalização profissional. É, pois, incabível a exigência do concurso público para a admissão daqueles que atuam na OAB.

Sendo assim, qual é a natureza jurídica da OAB? Segundo o STF, a OAB tem natureza jurídica ímpar.

Quem julga suas ações? Se não são autarquias, a Justiça Federal não quer julgar, nem tampouco a justiça comum quer. Isso ainda não foi resolvido. Nem tampouco a questão dos contratos, se têm ou não natureza de contratos administrativos.

Resumindo: o que se sabe é que a anuidade da OAB realmente não tem natureza tributária, e se não for paga cabe execução comum (e não fiscal). Se ela não segue regime de autarquia (nem de autarquia especial), pois é pessoa jurídica que não compõe à AP Indireta, não estará sujeita à contabilidade pública e ao controle pelo TC. Ademais, não há necessidade de fazer concurso público. Isso tudo a nossa jurisprudência já estabelece de forma pacífica.

- Discussão acerca dos demais conselhos de classe: eles, ainda que com natureza de autarquia, não faziam concurso público. O TC então proferiu decisão no sentido de que não se pode mais contratar sem concurso público. Os conselhos de classe (de odontologia, de farmácia, etc), então, começaram a se mobilizar para questionar por que eles têm que fazer concurso público se a OAB, que também é conselho de classe, não precisa? Vários MS foram impetrados pleiteando o mesmo tratamento da OAB. Dois MS já têm decisão liminar (26150 e 26149): o primeiro diz que não precisa fazer concurso e o segundo diz que precisa fazer concurso. Ou seja, são decisões contraditórias do STF. A situação, para os demais conselhos, portanto, ainda está pendente de solução. Ficamos aguardando a decisão de mérito.

• Autarquias de Regime Especial:

É hoje uma terminologia muito utilizada no nosso sistema.Elas surgiram, inicialmente, para designar a Universidade Pública. Os dirigentes das

universidades públicas (o seu reitor) são escolhidos através de eleição. No entanto, sabemos que a nomeação do dirigente da AP Indireta é, como regra geral, feita pelo chefe do Executivo, por meio de nomeação livre, com exoneração livre, via supervisão ministerial. Na universidade pública, portanto, a situação é diferente. Podemos afirmar, assim, que esta expressão “regime especial” surge, primeiramente, por esta diferenciação na escolha dos dirigentes. Este é um dos pontos que dá a autarquia o regime especial. A outra situação que aconteceu na universidade pública diz respeito à grade curricular (cada universidade pública tem sua grade curricular), que é definida de forma autônoma, o que também dá a ela um regime especial → razoes: escolha de forma diferenciada do dirigente e autonomia curricular.

Daí em diante, esta terminologia “regime especial” passa a ser utilizada em outras situações e, dentre elas, a mais importante é a da Agência Reguladora.

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• Agências Reguladoras:

O Governo Federal, objetivando reduzir o déficit público e sanear as finanças públicas, criou o Programa Nacional de Desestatização (PND), que permitia a transferência à iniciativa privada de atividades que o Estado exercia de forma dispendiosa e indevida, tendo todos os seus parâmetros previstos em lei. O afastamento do Estado dessas atividades passou a exigir a instituição de órgãos reguladores, conforme previsão do art. 21, XI, da CR, com redação dada pela EC 08/95, e do art. 177, §2º, III, CR, com redação dada pela EC 09/95 quando então nasceram as agências reguladoras.

As Agências Reguladoras nada mais são do que Autarquias de Regime Especial, instituídas em razão do fim do monopólio estatal. São responsáveis pela regulamentação, controle e fiscalização de serviços públicos, atividades e bens transferidos ao setor privado.

A autarquia de regime especial, apesar de ter algumas peculiaridades que transformam o seu regime em regime especial, não deixa de ser autarquia, tendo todas as regras de uma autarquia. Portanto: os bens da agência reguladora são bens públicos, os débitos judiciais são pagos por precatório, os procedimentos financeiros são de contabilidade pública, o regime de pessoal é o mesmo.

O que transforma a agência reguladora uma autarquia de regime especial?No que tange ao regime especial para essas pessoas jurídicas, não há previsão legal,

estipulando exatamente a sua amplitude. Segundo a doutrina, esse regime é decorrente da maior estabilidade e independência em relação ao ente que as criou.

Especificamente, quanto às agências reguladoras, encontram-se algumas previsões que demonstram essa especialidade. Assim, podemos dizer que o regime especial das AR decorrem de 3 regrinhas especiais:

1) Função da AR: ela serve para regular, para normatizar, para fiscalizar os diversos serviços públicos (energia elétrica, telefonia, etc). Esta não é uma função nova, o Estado já exercia papel de regulação, de fiscalização antes do surgimento das AR.

Em que contexto surge a necessidade de AR? Como vimos, a partir de 1995 cria-se no Brasil a política nacional das privatizações. Entretanto, depois de algum tempo, percebeu-se que este nome não era o ideal porque muitas vezes o Estado não estava vendendo, mas somente transferindo a prestação, a execução do serviço. Passou-se, então, a denominar esta política de política nacional de Desestatização (e não mais de privatização). Dentro desta política o que o Estado fez, em inúmeras situações, foi concessão e permissão de serviços, desestatizando os serviços (transferido-os para a iniciativa privada, para enxugar a máquina estatal). Assim surgiu a necessidade de fiscalização, controle, regulação dessas empresas privadas, que receberam a transferência desses serviços.

Segundo a prof. a AR não serve para nada na verdade. O Estado decide desestatizar para reduzir a máquina estatal (nº de servidores, de cargos, de empregos, enfim, reduzindo os custos) e, ao mesmo tempo, cria uma nova pessoa jurídica para controlar esses serviços. Mas esta AR terá todos os seus custos, inclusive com pessoal. Então, não adianta nada. A situação fica ainda mais grave quando se fala em ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações), já que as empresas de telefonias no Brasil são recordistas em ações judiciais e a ANATEL não faz muita coisa por isso. E o caso do apagão? A ANEL já existia. E no caso do acidente da TAM, a ANAC também já existia. E a ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), é vista fazendo alguma coisa? E a ANCINE (Agência Nacional de Cinema)? Pra que serve? É só para gastar nosso dinheiro mesmo...

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A Reforma da Administração, quando da criação dessas novas pessoas jurídicas, inovou quanto à terminologia “agência”, que foi copiada do regime norte-americano. Ou seja, o nome “Agência” é um nome novo, que veio do direito norte-americano para tentar dar maior credibilidade à essas pessoas jurídicas. Mas, quanto às funções por elas exercidas não há nada de novo, é uma função muito antiga, que não representa nenhuma novidade para o Poder Público.

Assim, em rigor, autarquias com funções regulatórias não se constituem em novidade alguma. O termo com que foram batizadas é que era novo no Brasil. Apareceu ao ensejo da “Reforma Administrativa”, provavelmente para dar sabor de novidade ao que é muito antigo, atribuindo-lhe o suposto prestígio de ostentar uma terminologia norte-americana (“agência”).

O Estado já exercia essa regulação, esse controle (as funções normativa e de regulação já eram exercidas pela AP Direta e Indireta). O Poder Público só resolveu criar as AR sob o argumento de que assim essa fiscalização seria mais eficiente. Fato é que, para o exercício dessa função de regulação, controle, fiscalização, ganham mais autonomia e liberdade do que as outras pessoas jurídicas. Apesar disso, essa sua autonomia não chega à capacidade legislativa. A normatização das AR, que não acontece com as demais autarquias, ela de fato acontece, mas não chega a ser uma capacidade política, capacidade de legislar. Serve para normas técnicas e sempre complementares à previsão legal. As AR têm grande autonomia, mas não tem capacidade política. Elas têm uma força muito grande sobre os serviços, sobre o mercado, mas não têm capacidade política.

Essas autarquias vêm assumindo o inédito papel de poder concedente na concessão, permissão e autorização de serviços, conforme previsão do art. 2º, da Lei 8.987/95, além do controle de atividades econômicas monopolizadas, elencadas no art. 177, CR, alterado pela EC 49/06.

A problemática, quanto à função dessas agências, decorre do limite do poder de regular e normatizar as diversas atividades. Não há dúvida de que a esse poder está vedada a invasão de competência legislativa, devendo ater-se a aspectos técnicos, providências subalternas à lei, disciplinadas por meio de regulamentos, não podendo contrariar ou distorcer a disposição legal.

Assim, fala-se que o verdadeiro problema com as AR é o de se saber o que e até onde podem regular, sem estar com isto, invadindo competência legislativa.

Obs.: admite-se a criação dessas agências também na ordem estadual e municipal. Inclusive inúmeras foram criadas Brasil afora, respeitando-se sempre a distribuição constitucional de competências para a prestação dos serviços públicos.

2) A segunda especialidade está na nomeação dos dirigentes: em regra, os dirigentes das AR são nomeados pelo PR, mas, ao contrário do que ocorre com as demais autarquias, essa nomeação depende de prévia aprovação do SF, conforme previsão dos arts. 84, XIV, e 52, III, f, ambos da CR, combinados com o art. 5º, da Lei 9.986/00, que dispõe sobre a gestão de recursos humanos das agências reguladoras. Em decorrência disso, há a terminologia de investidura especial dos seus dirigentes.

3) A terceira regra especial está no mandato: o dirigente da AR exerce mandato fixo, com prazo determinado. Cada AR tem a sua lei, e cada lei especificará o seu prazo. Assim, há mandatos com prazo de 2, de 3 e de 4 anos. Só não se admitem prazos superiores a isso, porque seria superior à própria legislatura do PR (e a duração do mandato dos dirigentes não pode ultrapassar a legislatura do PR, sob pena de engessar o futuro governante em antítese absoluta com a idéia de democracia e de república, fraudando o povo). Destarte, a garantia dos mandatos dos dirigentes das Agências só opera dentro do período governamental em que foram nomeados. A lei de criação de cada agencia disporá sobre a forma da não-coincidência de mandatos.

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Existe um projeto de lei tramitando no CN (Projeto nº 3.337/04), que dispõe sobre gestão, organização e controle social das AR, que pretende a fixação de 4 anos para o mandato dos dirigentes de todas as AR, sendo que seriam 4 anos não coincidentes com o mandato do PR (o PR deveria escolher e nomear os dirigentes no 1º ano do seu mandato, no 2º ano entrariam os dirigentes em exercício, que ficariam apenas 1 ano coincidindo com o mandato do PR).

É certo que o mandato vem com prazo fixo, mas o dirigente pode sair antes de findado o prazo do mandato. A Lei 9986/2000, que é a norma geral das AR, estabelece que os Conselheiros e os Dirigentes somente perderão o mandato em caso de renúncia, de condenação judicial transitada em julgado ou de processo administrativo disciplinar, conforme o art. 9º da lei, admitindo-se que a norma criadora de cada agência estabeleça outras condições.

Em caso de vacância no curso do mandato, este será completado por sucessor investido na mesma forma.

O dirigente da AR, quando deixa o mandato (ainda que seja pelo encerramento de seu mandato), tem muitas propostas para trabalhar na iniciativa privada, pois teve acesso a muitas informações privilegiadas, como, por ex., de todas as licitações que estavam tramitando na AR, inclusive os editais que ainda não foram publicados.

Para proteger as informações, a lei estabeleceu que os dirigentes se submetem ao chamado “prazo de quarentena”, ou seja, o ex-dirigente ficará impedido, por um período de 4 meses, contado da data do término do seu mandato, de prestar qualquer tipo de serviço no setor privado. ☺art. 8º, Lei 9.986/00 (e esta previsão também aparece nas leis específicas de cada AR – ex.: Lei da ANATEL, art. 30). Todavia, nesses casos a lei prevê quarentena de 12 meses, só se aplicando a regra geral de 4 meses quando do silêncio da lei específica.

Caso não existisse a proibição de que o ex-dirigente do órgão regulador, nos meses seguintes à sua exoneração, fosse contratado por empresas do setor por ele regulado, a quantidade de informações privilegiadas que o ex-dirigente levaria consigo tornaria inexistente a distinção entre os interesses de regulador e regulados.

Nada impede que ele vá trabalhar em outra estrutura do Estado, naquele ramo. O que ele não pode é ir para a iniciativa privada naquele ramo de atividade. Obs. sobre a quarentena: o prazo é de 4 meses! É muito pouco tempo! É claro que nesse tempo não acabam as informações privilegiadas. Ocorre que durante esse temo o dirigente pode trabalhar, mas não naquele ramo de atividade e, por isso, ele continua recebendo o seu salário de dirigente! Por isso não poderia durar muito tempo. Ocorre que, como cada AR tem a sua lei, a regra geral é de 4 meses, mas há algumas AR que tem prazo de 12 meses.

Obs.: o projeto que tramita no CN(PL nº 3.337/04) também visa introduzir inúmeras regras, tais como o processo decisório dessas agências, aspectos sobre a prestação de contas e o controle social, com a criação de ouvidoria, formas de integração entre as AR, o controle da atuação das agências nas mãos do Congresso, objetivando a maior democratização e compreensão das decisões tomadas, regras quanto ao orçamento, entre outras.

Há duas regras do regime especial que merecem maiores aprofundamentos (quanto aos demais aspectos vale o que foi estudado para as autarquias):

1) Licitação:

N que tange ao procedimento licitatório, algumas leis criadoras dessas agências tentaram esquivá-las da obediência às formas licitatórios da Lei 8.666/93. Podemos dizer que há, pois, uma tentativa de se fugir das licitações.

A Lei 9.472/97, que cria a ANATEL, foi chamada de Norma Geral das Telecomunicações e veio regular, de forma inconstitucional, as licitações de telecomunicações,

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prevendo um regime jurídico próprio e específico para algumas contratações promovidas pela Agência.

Esta lei definiu que a AR não está sujeita à Lei 8.666/93, devendo cada uma definir o seu próprio procedimento de licitação. Além disso, a AR deverá seguir modalidades próprias de licitação: o pregão e a consulta. Essas regras, contudo, são inconstitucionais. A Lei 9.472/97 foi, assim, objeto da ADI 1668, que disse que, como a AR é autarquia, não pode escapar da Lei 8.666, não podendo definir seu próprio procedimento. A AP está sujeita á Legalidade, quem define o procedimento, portanto, é a Lei.

O STF rejeitou, pois, as soluções legislativas similares às contempladas na Lei 9.478/97, declarando inconstitucionais os dispositivos que atribuíam competência normativa autônoma para uma autoridade administrativa disciplinar, matéria pertinente a contratos e licitações que é de competência da União para normas gerais. Alguns dispositivos sofreram interpretação no sentido de fixar o entendimento de que a competência apontada é meramente regulamentar, não podendo contrariar as normas gerais.

Nessa ADI foram discutidos vários dispositivos da Lei 9.478/97. o art. 22, II, por ex., que definia a competência do Conselho Diretor para introduzir normas próprias de licitação e contratação, sofreu interpretação de que tal competência é somente regulamentar, devendo se submeter às normas gerais de licitação e suas respectivas leis. O art. 119 teve sua eficácia suspensa, ficando proibida a definição de procedimento administrativo licitatório pela própria ANATEL, na hipótese de permissão, tendo em vista a violação do art. 22, XXVII, CR. O mesmo destino teve o art. 59, que facultava a contratação de técnicos especializados, determinando o STF que essa contratação se submeta às regras da Lei 8.666/93.

Em seu art. 54, P.U., essa lei criou duas novas modalidades licitatórias: a consulta e o pregão. O caput desse dispositivo diz que a ANATEL seguirá as regras da Lei 8.666/93, tão-somente para as contratações de obras e serviços de engenharia e que, nos demais casos, poderá adotar procedimentos próprios, conforme regras previstas na mesma lei, além de outras que ela estabelecerá por meio de regulamento, o que contraria a CR, em seu art. 37, XXI e art. 22, XXVII, sem contar as ofensas às normas gerais de licitação introduzidas por aquela lei.

Essa regra também foi objeto de controle na mesma ação. Entretanto, por maioria de 6 votos a 5, o STF decidiu não suspender a aplicação do dispositivo, bem como dos arts. 55 a 58, que, da mesma forma, cuidam do assunto. Portanto, permanece a controvérsia quanto ao conceito de normas gerais e a competência para exercê-la.

Ou seja, o STF disse ser constitucional o pregão e a consulta. Quer dizer que a AR está dentro da Lei 8.666, não pode ter procedimento próprio, mas pode seguir modalidade própria (pregão e consulta). Parece muito incoerente, mas foi o que passou a valer. Apesar da Lei 9.472/97 ser só da ANATEL, a regra do pregão e consulta foi estendida para as demais AR através da Lei 9.986/00. Agora, portanto, o pregão e a consulta são aplicáveis a qualquer AR. Obs.: em 1997, quando surgiu a Lei 9.472 e estas modalidades foram atribuídas para as AR, não se falava em pregão e em consulta no Brasil – o pregão ainda não estava disciplinado, uma vez que foi introduzido por meio da MP 2.026/00, oportunidade em que foi previsto somente para a União, só tendo sido estendido para todos os entes em 2002, por meio da Lei 10.520 (que é considerada como norma geral de licitação para esta modalidade). Desta forma, atualmente, no tocante ao pregão, não há qualquer problema quanto à sua utilização pelas agências reguladoras, devendo, é claro, obedecer ao procedimento da lei própria.

Assim, se todos os entes admitem a modalidade pregão, qual é a única modalidade licitatória própria da AR? Somente a consulta. E como se faz uma consulta no Brasil? Até hoje esta modalidade não foi definida de forma válida, não há lei definindo este procedimento. Ninguém sabe exatamente o que é consulta no Brasil.

Portanto, no que tange à modalidade consulta, o problema é mais complexo, tendo em vista, justamente, que não há previsão dessa modalidade enquanto norma geral, sendo

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inconstitucional, já que não se admite que a lei que cria uma autarquia venha a definir nova modalidade licitatória, exigindo a CR, nesse caso, uma lei específica e de âmbito nacional, e não somente uma lei federal (aplicável apenas à ordem federal) -☺art. 22, XXVII. Na verdade, até hoje, não se sabe qual é o procedimento da consulta: a única certeza é que ela é aplicável quando não se admitir o pregão.

Vale lembrar que a outorga dos serviços de rádio e TV, segundo disposição do art. 211, da mesma lei, terá procedimento definido pelo Poder Executivo, sem a definição de critérios objetivos, escancarando o favoritismo.

Para a ANP, a Lei 9.478/97 também estabelece algumas inconstitucionalidades. Essa agência obedecerá, quanto ao procedimento licitatório, ao regulamento que ela mesma estabelecerá (arts. 23 e 36), estando submissa ao estabelecido em sua lei criadora que praticamente nada dispõe.

Quanto à Petrobrás, para a aquisição de bens e serviços, ela obedecerá a procedimento licitatório simplificado definido pelo PR, mediante decreto, consoante dispõe o art. 67, da mesma lei.

Contudo, vale salientar que as normas sobre licitação são instrumentos par impedir o favoritismo, a corrupção, respeitando a isonomia e buscando sempre o melhor contrato para o interesse público. Entregar essas regras nas mãos dos dirigentes dessas agências representa ofensa gritante a diversos dispositivos da CR, os quais, infelizmente, ainda não foram declarados inconstitucionais.

Convém lembrar também que o art. 37, XXI exige previsão legal para definir licitação, não se admitindo essa regência por meio de mero ato administrativo, donde se conclui que regulamentos e disposições inferiores à lei são manifestamente inconstitucionais.

2) Regime de Pessoal:

Quem trabalha em AR é servidor público? Sim. A AR é pessoa de direito público. Sendo servidor público, ele deveria ser celetista ou estatutário? No Brasil existem basicamente AR nacionais, mas é possível que surjam AR também no âmbito estadual ou municipal. Em tese, elas seguem o regime aplicável à AP Direta (se na Direta é estatutário, deveria ser estatutário; se na Indireta é celetista, deveria ser celetista).

Inicialmente, os agente dessas pessoas jurídicas receberam um tratamento diferente das demais autarquias, uma vez que a Lei 9.986/00 (disciplinadora dos recursos humanos das AR), em seu art. 1º, estabeleceu o regime de emprego público, seguindo a CLT.

O dispositivo teve sua eficácia suspensa por decisão cautelar na ADI nº 2.310-1, do DF, em que o STF, por intermédio de decisão do Min. Marco Aurélio, reconheceu a sua inconstitucionalidade, tendo em vista que a natureza da atividade desempenhada pelas AR demandava regime de “cargo público”, sendo incompatível com o de “emprego”.

Tal decisão vem a reafirmar o que já dizia a doutrina quanto ao regime a ser adotado pelos servidores públicos, estabelecendo que o regime normal de quem presta serviços públicos, nas pessoas de direito público de forma regular e contínua, deve ser o estatutário, só sendo admitidas algumas exceções como funções subalternas, contratações temporárias e aquelas remanescentes do regime anterior ao da CR/88. alerta ainda que, no caso em tela, as atividades desenvolvidas nas agências, em regra, não são temporárias (tratam-se de atividades permanentes), não se admitindo assim esses contratos temporários excepcionais.

Explicando melhor: quando estas AR surgiram, por meio da Lei 9.986/00, esta lei definiu que o quadro de pessoal deveria ser formado todo por contratação temporária, que dispensa concurso público. Quando se usa contrato temporário no Brasil? Em caso de excepcional interesse público, situações de anormalidades, situações de necessidade temporária. O quadro de

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servidores da AR não pode, portanto, ser formado totalmente de contratação temporária (não é caso de necessidade apenas temporária).

A Lei 9.986/00, foi, portanto, objeto da ADI 2310. O STF decidiu em sede de cautelar que os contratos temporários seriam inconstitucionais, tem que ser cargo ou emprego. Mas como não se podia mandar todo mundo embora, permitiu que aqueles que lá já estivessem lá permanecessem até o final do contrato, devendo a AR, portanto, fazer concurso. Ocorre que a Lei foi modificada pelo Governo Federal, criando mais de 5.000 cargos no Brasil (o que é, ainda assim, muito pouco), antes da decisão de mérito da ADI.

O que ocorreu de fato foi que, em razão da decisão cautelar do STF, o PR editou a MP 155, de 23/12/03, para resolver, temporariamente, a situação. A MP foi convertida na Lei 10.871/04, que dispõe sobre a criação de carreiras e organização de cargos efetivos das autarquias especiais, denominadas AR, definindo, assim, o regime estatutário para esses agentes, dentre outras regras.

A nova lei também afirma a exigência de concurso público (art. 14), a jornada de trabalho de 40 hs (art. 12) regras para remoção e promoção dos servidores, além da possibilidade de gratificação, estabelecendo, ainda, a contratação temporária, em caráter excepcional, pelo prazo de 12 meses, admitindo-se prorrogação, mediante processo seletivo simplificado (art. 30).

Quando a lei foi alterada, a ADI 2310, foi julgada prejudicada em definitivo, em 07/12/04, sendo extinta, por perda do objeto decorrente da modificação do diploma em discussão.

Ocorrendo isso, em 15/12/05, o Governo editou uma nova MP (MP nº 269, hoje convertida na Lei 11.292/06) permitindo a prorrogação dos contratos temporários até março de 2007, sob a justificativa de insuficiência de quadros recrutados para as agências, até a citada data, em decorrência de concursos públicos convocados para essa finalidade, visando assim evitar a solução de continuidade de suas finalidades e seus possíveis prejuízos. Os contratos foram, então, novamente prorrogados, desconsiderando, dessa forma, a orientação do STF que já havia se manifestado pela inconstitucionalidade desse tipo de contrato.

Foi ajuizada, em decorrência disso, outra ADI (ADI 3678), que está ainda em tramitação. Continua, portanto, a mesma situação: vem nova MP, nova Lei e novas prorrogações dos contratos. O PR (por vergonha) passou a não prorrogar mais todos os contratos temporários de todas as AR, o fazendo somente para algumas delas.

As AR que não tiveram seus contratos temporários não prorrogados continuam com seus funcionários trabalhando normalmente, seu quadro de pessoal preenchido por temporários sem sequer existir lei para ampará-los. Nem mesmo se sabe de onde sai o dinheiro para pagá-los, já que não existe respaldo legal para seus contratos.

Diante de tudo isso, se vier a pergunta na prova, qual o regime deve ser aplicado às AR no Brasil? A única decisão do STF que temos, no julgamento cautelar da ADI 2310, foi pelo regime estatutário com cargo e concurso. Mas o regime regra no Brasil, na prática, atualmente, é mesmo o de contratação temporária (contratos temporários prorrogados pro MP, alguns com prazo até março de 2009). É um absurdo, mas é assim.

No Brasil, o que ocorre é que os temporários são usados para necessidades permanentes. Há, inclusive um projeto tramitando, chamado projeto “trem da alegria”, que pretende, via EC, é estabilizar temporários que já trabalham há um certo tempo. Parece um absurdo, mas um pedaço desse projeto já passou.

A EC 51, legitimando a contratação de agente comunitário de saúde, permitiu o aproveitamento daqueles que já estavam no quadro contratados temporariamente. Eles ganharam a estabilidade sem fazer concurso. Parece, então, que o resto também vai passar. Se isso acontecer, em todas as áreas, ramos e poderes milhões de temporários vão ser estabilizados.

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→ Exemplos de AR: ANATEL, ANEEL, ANCINE, ANTAQ, ANTT (transportes terrestres), ANA, ANVISA, ANS, ANP.

→ Espécies de AR:Algumas agências afetas à disciplina e controle de tais atividades são:

a) Serviços públicos propriamente ditos: neles estão incluídos a ANEEL, a ANATEL, a ANTT, a ANTAQ;

b) Atividades de fomento e fiscalização de atividade privada: para essas atividades foi criada a ANCINE;

c) Atividades econômicas integrantes da indústria do petróleo: tem-se a ANP;d) Atividades que o Estado e o particular prestam: aqui encontram-se agências como

a ANVISA e a ANS;e) Agência reguladora do uso de bem público: tem-se a ANA.

Obs. importante: Nem tudo que tem nome de agência é verdadeiramente uma AR. A expressão “agência”

vem sendo mal utilizada em virtude de algumas impropriedades na estrutura da AP, fazendo parecer mero entusiasmo do governante quando copiou o modelo americano, talvez por acreditar que a entidade teria maior credibilidade em razão do nome. Hoje, instituições com o nome de agência são só autarquias, não seguindo regime especial. Logo, não são verdadeiras agências reguladoras, tais como a a ADA (Agencia de Desenvolvimento da Amazônia) e a ADENE (Agência de Desenvolvimento do Nordeste), que são agências executivas! Há também o caso da AEB (Agência Espacial Brasileira), que só tem natureza de autarquia e não de agência, apesar do nome. Tem o caso também da ABIN (Agência Brasileira de Inteligência), que é somente um órgão da AP Direta, nem tem personalidade jurídica.

Mas atenção para o caso da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), que apesar de não ter o nome de Agência, é AR: temos aqui o caso de uma autarquia que recebeu regime especial e papel de agência reguladora, mas que não ganhou essa denominação. A CVM é dotada de autoridade administrativa independente, ausência de subordinação financeira e orçamentária, e seus dirigentes também se sujeitam à investidura especial, condicionada à aprovação pelo Senado federal.

Por último, deve-se tomar cuidado com alguns serviços sociais autônomos que, de igual maneira, estão sendo criados com o nome de agência, como é o caso da Apex-Brasil (Agência de Promoção de Exportação do Brasil), e da ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial).

(17/09/08)

• Agências Executivas:

As agências executivas foram legalmente definidas por intermédio dos arts. 51 e 52, da Lei 9.649/98, que dispõe sobre a organização da Presidência da República e seus Ministérios.

São autarquias ou fundações públicas que, por iniciativa da AP Direta, recebem o status de Agência, desde que preenchidas algumas condições, visando a uma maior eficiência e redução de custos.

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Autarquias e fundações ineficientes (sucatiadas) celebram um Contrato de Gestão com a AP, assim, a autarquia ou fundação vai receber mais recurso público e, conseqüentemente, mais autonomia.

A doutrina critica a AE, porque se as pessoas jurídicas que celebram esse contrato já são ineficientes, a nova estrutura talvez não resolva seus problemas.

As AE, como visto, são autarquias ou fundações. Assim, o regime a elas aplicado é o mesmo das autarquias e fundações, só recebendo o nome de AE.

Assim, a qualificação de AE será feita por ato do Presidente da República para as autarquias ou fundações que tenham um plano estratégico de reestruturação e de desenvolvimento institucional em andamento e que hajam celebrado contrato de gestão com o respectivo Ministério supervisor, caso em que o Executivo editará medidas de organização administrativa específicas para elas visando a lhes assegurar autonomia de gestão e disponibilidade de recursos para cumprimento das metas constantes do contrato de gestão, o qual terá prazo mínimo de 1 ano.

As AE não podem ser confundidas com as AR, porque estas têm como função precípua exercer controle sobre os particulares, o que não é o caso das AE, que se destinam a exercer atividade estatal, com melhor desenvoltura e operacionalidade, não tendo nada de inovador nisso. Elas continuam exercendo os normais objetivos das autarquias e fundações.

Para a sua criação o PR expede decreto, concedendo a qualidade de AE, desde que preenchidos aqueles dois requisitos:

a) que tenham um plano estratégico de reestruturação e de desenvolvimento institucional em andamento;

b) que hajam celebrado contrato de gestão com o respectivo Ministério supervisor, momento em que o Executivo, obedecendo aos limites legais, definirá as regras para garantir a essas pessoas jurídicas uma maior autonomia de gestão e disponibilidade de recursos para a implementação de suas metas, em um prazo mínimo de um ano.

Ou seja, as exigências são:- o plano estratégico de reestruturação: planejamento, programação da reestruturação;- a celebração com a AP de um Contrato de Gestão: através dele a AE pode receber mais

recursos públicos, e também mais liberdade, mais autonomia.

Segundo CABM, com a expressão “contrato de gestão” querem mencionar aquilo que, na verdade, não passa de um arremedo de contrato, uma encenação sem qualquer valor jurídico, pelo qual se documenta que a Administração Central “concede” à autarquia ou fundação maior liberdade de ação, isto é, mais autonomia, com a dispensa de determinados controles, e assume o “compromisso” de repasse regular de recursos em contrapartida do cumprimento por estas de determinado programa de atuação, com metas definidas e critérios precisos de avaliá-las, pena de sanções a serem aplicadas ao dirigente da autarquia ou fundação que firmou o “pseudocontrato” se, injustificadamente, o descumprir.

Esta titularização, aparentemente, não leva a nada. Em rigor, a conseqüência única de relevo decorrente da qualificação de uma autarquia ou fundação como AE é a que aparece não na lei própria, mas em outra lei, da mesma data dela (Lei 9.648/98); a saber: a ampliação dos limites de isenção ao dever de licitar para as agências executivas. A dita lei agregou aos 23 itens de dispensa de licitação previstos no art. 24, da Lei 8.666/93, mais um, o de nº XXIV, e aí acrescentou um par[agrafo único no qual amplia os limites de isenção ao dever de licitar quando se trate de SEM, EP ou AE. O que há, pois, por detrás desta qualificação, é mais uma vez, a

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revelação de que o Executivo e sua “Reforma Administrativa” tem horror dos mecanismos moralizadores da licitação e que busca, por todos os meios, escapar o quanto possa da Lei 8.666/93.

O status de AE, como visto, é declarado por decreto do Presidente da República. É ele que declara que, a partir daquele momento, a autarquia ou fundação será uma AE. Ademais, este status de AE é temporário. Será AE enquanto tiver andamento o contrato de gestão. Quando encerrado este, ela voltará a ser uma simples autarquia ou fundação.

Por meio desse contrato de gestão, a autarquia ou a fundação comprometem-se a proceder a uma reestruturação da gestão para tornarem-se mais eficientes, otimizando recursos, reduzindo custos, aperfeiçoando os serviços que prestam em troca de uma maior autonomia gerencial, orçamentária e financeira, recebendo algumas prerrogativas e privilégios.

A doutrina faz duras críticas a essas regras, dizendo tratar-se de expressões vazias e até inconstitucionais. Segundo CABM, trata-se de “um arremedo de contrato, uma encenação sem qualquer valor jurídico, pelo qual se documenta que a Administração Central concede à autarquia ou fundação maior liberdade de ação”.

Representa apenas uma redução de controles, além de um compromisso de repasse regular de recursos, tendo como contrapartida o cumprimento do programa de atuação. É como se a lei viesse para permitir aquilo que não passa de uma obrigação desses entes públicos, pois exercer a atividade administrativa é múnus público, devendo ser sempre eficiente, independentemente de qualquer contrapartida.

Note-se, ainda, que competências e autonomia das entidades administrativas decorrem de lei, não podendo fazê-lo um mero contrato. No que tange à sua organização interna, até se admitem atos infralegais, atos subalternos à lei, mas, nesse caso, a competência seria do PR ou dos Ministros mediante delegação (☺art. 84, P.U., CR), não se admitindo, nem mesmo nessa situação, a definição por simples contrato de gestão.

Esse termo “Contrato de Gestão” surgiu em nosso ordenamento jurídico para designar os contratos celebrados entre dois entes da AP. Hoje, porém, esta situação não é mais a mesma: existem contratos entre outros entes que não AP x AP.

Contrato de Gestão: é um vínculo firmado entre o Estado e o terceiro para gestão estratégica e consolidação da Administração Pública gerencial. Não há nenhuma dúvida de que o contrato de gestão traz para a AP brasileira um movimento de “contratualização”, pelo qual vários países passaram e cujo principal representante é o Governo Francês.

Gestão estratégica diz respeito à necessidade de o Estado fazer um planejamento com distribuição das funções, com discriminação dos objetivos e das metas.

Na idéia de Administração Pública gerencial, está a exigência de controle de resultado, a avaliação de desempenho. O contrato de gestão é um instrumento perfeito para isso (para o controle de resultado).

Contrato implica a exigência de duas partes ligadas por um vínculo jurídico que estabelece obrigações recíprocas.

Teoricamente, o contrato de gestão ampliaria a gestão de pessoal, possibilitando dar bonificações para o cumprimento de determinadas metas.

Crítica: as vantagens (remuneratórias, de licitação etc.) devem ser estabelecidas por lei; não poderiam ser criadas pelo contrato de gestão.

Qual é natureza jurídica do contrato de gestão?- 1ª corrente: é um convênio – as vontades das partes são convergentes para um único propósito:

cumprir a meta com a outorga da vantagem;- 2ª corrente: é um contrato – as vontades das partes são divergentes. O Estado quer o resultado; o

terceiro quer a vantagem que o Estado vai dar. A prof. concorda com essa corrente.Aqui, seria preciso licitar (necessidade de licitação, salvo em casos de inexigibilidade ou dispensa).

E o contrato só poderia ser rompido diante de permissivos legais.

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A natureza jurídica do contrato de gestão vai afetar o regime jurídico a ser adotado.Com o contrato de gestão, a transparência administrativa é ampliada, possibilitando ainda: a

identificação dos limites da competência pública a ser exercida pelos órgãos ou entidades; a fixação dos resultados de aperfeiçoamento possíveis a serem buscados e a viabilização de um controle efetivo futuro; a viabilização para que terceiros impugnem as ilicitudes estatais.

Essas são as vantagens que justificam os contratos de gestão com o incremento da amplitude de suas cláusulas.

Obs.: o contrato de gestão é uma inovação, mas não é uma nova figura. É um meio por meio do qual o Estado e o terceiro se vinculam para gestão estratégica e consolidação da Administração Pública gerencial. Ele não faz nascer uma nova pessoa.

Autarquia e fundação dependem de lei para ser criada. A lei define sua autonomia e sua liberdade. Será que é mesmo possível que um contrato celebrado entre a AP direta e a AP Indireta possa ampliar essa autonomia, dando mais do que a própria lei fez? Esta é outra crítica feita às AE.

Outra crítica: no Brasil, as regras do orçamento estão previstas na lei orçamentária. Para que o Estado transfira recursos para uma pessoa jurídica que já participa do orçamento não precisaria de contrato. Bastaria suplementar o orçamento e transferir mais recursos para essas pessoas.

Por tudo isso, o contrato de gestão é um instrumento desnecessário.Não obstante, a AE existe ainda na prática.

Atenção: a expressão “agencia executiva” corresponde apenas a uma qualificação, não se configurando como categoria nova de pessoa administrativa. Para adquirir essa qualificação, é necessário um ato administrativo que a reconheça como portadora de atributos que lhe dão essa natureza. Sendo assim, embora tenha os atributos, não será AE antes do reconhecimento, que é ato, no âmbito federal, do PR, veiculado por decreto editado por indicação do Ministério supervisor da respectiva autarquia ou fundação.

O status de AE não é permanente. Uma vez extinto o contrato, ela voltará a ser uma simples autarquia ou fundação. Por paralelismo jurídico, a desqualificação também se efetivará via decreto, não levando à extinção da pessoa jurídica, somente a despindo do qualitativo de agência executiva.

Como conseqüência dessa maior autonomia, foi introduzido o P.U. ao art. 24, da Lei 8.666/93, ampliando os limites para dispensa de licitação, quando se tratar de autarquia ou fundação qualificadas como AE. A liberalidade é de R$ 30.000,00 para obras e serviços de engenharia, e de R$ 16.000,00 para outros bens e serviços.

Os servidores dessas pessoas jurídicas são os da autarquia ou da fundação, assim qualificadas, seguindo o regime possível para essas pessoas, seja estatutário ou celetista.

Seus atos e contratos seguem o regime administrativo com todas as exigências e prerrogativas do regime público.

Os Estados e Municípios também poderão instituí-las, desde que tenham leis específicas para tanto.

→ Exemplos atuais: ADA (Agencia de Desenvolvimento da Amazônia - antiga SUDAM); ADENE (antiga SUDENE), INMETRO.

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• Consórcios Públicos:

Compõem também a AP Indireta.O tema será mais aprofundado no Intensivo II.Desde 1993, na Lei 8.666, foram criados em nosso ordenamento jurídico os Convênios e

Consórcios. Natureza jurídica: o contrato tem interesses divergentes. Quando a lei fala em convênio e

contrato, por sua vez, se fala em interesses convergentes, comuns. Esta é a principal diferença.Ex.: convênio de estágio entre faculdade e a AP.Quando se fala em convenio, temos a reunião de esforços de entes de qualquer espécie

(AP Direta, AP Indireta, particulares). É diferente do que ocorre com os consórcios, em que temos a reunião de entes da mesma espécie. Ou seja, só é possível o consórcio entre dois entes da mesma natureza.

Nesses institutos são reunidos esforços para um interesse comum, mas não há a criação de uma nova pessoa jurídica, não há a constituição de uma nova pessoa jurídica.

Em 2005 foi introduzida a Lei 11.107, que introduziu os chamados “consórcios públicos” no Brasil. Esse novo instituto não extinguiu os consórcios anteriores, que continuam existindo. Por isso, atualmente temos dois tipos de consórcios: os da Lei 8.666 e os da Lei 11.107. Esses últimos, segundo a lei, tratam-se de uma gestão associada, ou seja, gestão de determinada atividade de forma associada, também buscado interesses comuns, convergentes. O que ocorre, porém, é que esses consórcios são constituídos por entes políticos (U, E, M e DF), ficando de fora a AP Indireta e os particulares.

Desta associação / gestão associada cria-se uma nova pessoa jurídica, que é chamada de Associação.

Os velhos consórcios eram para acordos comuns, situações corriqueiras. Naquela constituição, portanto, não havia a criação de uma nova pessoa jurídica. E a reunião era de entes da mesma espécie.

Nos novos consórcios é diferente: podem se reunir entes de espécies diferentes (já que só podem ser entes políticos) e, ademais, da sua reunião constitui-se uma nova pessoa jurídica. Se não há necessidade de uma nova pessoa jurídica, não há porque celebrar um consórcio.

Os novos consórcios públicos estão sendo utilizados para a conservação de uma área de preservação ambiental (APA). Os entes constituem um consórcio público, criam uma nova pessoa jurídica que será responsável pela preservação da área. A gestão associada facilita o transito entre os entes, já que todos eles poderão participar e decidir sobre o tema.

Também são criados consórcios públicos para a criação de uma associação que vá gerir uma determinada indústria de reciclagem.

Essa gestão associada é feita através do contrato de consórcio. Apesar do nome “contrato”, não se pode esquecer que os interesses são comuns, e não divergentes.

U, E, DF e M decidem constituir um consórcio público, celebrando um contrato de consórcio. Ou seja, o consórcio público tem natureza contratual. Constituído o consórcio, do contrato de consórcio nasce então uma nova pessoa jurídica, que será chamada de associação.

Essa associação pode ter regime público ou privado. Pode, pois, ser pessoa jurídica de direito público, seguindo o regime das autarquias; ou pode ser pessoa jurídica de direito privado, tendo natureza privada, quando terá o mesmo regime das empresas públicas e das SEM (regime híbrido).

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• EMPRESAS PÚBLICAS E SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA :

São pessoas jurídicas de direito privado que integram a AP Indireta. São, ambas, empresas estatais.A expressão “empresa estatal ou governamental” é utilizada para designar todas as

sociedades, civis ou empresariais, de que o Estado tenha o controle acionário, abrangendo a empresa pública e a sociedade de economia mista e outras empresas que não tenham essa natureza.

Nos interessam aqui a empresa pública e a sociedade de economia mista porque compõem a AP Indireta. Embora ambas sigam regimes parecidos, têm importantes diferenças quanto ao seu conteúdo, finalidade e constituição, que precisam ser conhecidos.

Obs.: o Estado pode ter participação em ações de algumas empresas ou como donos de determinadas empresas que não estejam classificadas nem como EP, nem como SEM. Ou seja, nem toda empresa da qual faça parte o Estado integrará a AP Indireta (só as EP e SEM fazem parte da AP).

Atenção: EP e SEM se divergem das paraestatais, que são entidades que estão fora da AP (ex.: OSCIP, sistema “S”, etc.). Antigamente era o nome usado para designar as EP e SEM, mas atualmente não se usa mais esta denominação.

A partir de 95, com a política de privatizações, o Estado diminuiu bastante as EP, mas elas ainda existem.

→ Empresa Pública:

Tem natureza jurídica de pessoa de direito privado. O nome “pública” não está ligado ao regime, mas sim ao capital.

É a pessoa jurídica de direito privado composta por capital exclusivamente público, criada para a prestação de serviços públicos ou exploração de atividades econômicas, sob qualquer modalidade empresarial.

A empresa pública é uma pessoa jurídica de direito privado, mas que não segue o regime verdadeiramente privado. Seu regime é o chamado regime híbrido ou misto.

Ela tem este nome em razão do capital, já que seu capital é exclusivamente público. Dizer que é exclusivamente público não quer dizer que não possa ter mais de um ente, desde que o capital seja exclusivamente público. Ou seja, pode ser de mais de um ente (ex.: U e E).

Ela pode ser prestadora de serviços públicos (PSP) ou exploradora da atividade econômica (EAC) - ☺art. 173, CR.

Ela pode ser constituída de qualquer modalidade empresarial (ex.: Ltda; S/A, desde que na qualidade de capital fechado, ou qualquer outra modalidade autorizada no direito empresarial).

Aqui valem também as 5 características vistas a cerca das pessoas jurídica da AP Indireta.Exemplos: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos; CEF; Casa da Moeda.

→ Sociedade de Economia Mista:

É a pessoa jurídica de idr privado, criada para prestação de serviço público ou exploração de atividade econômica, com capital misto e na forma de S/A.

Tem regime jurídica de pessoa jurídica de direito privado.

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Seu capital é misto. Significa que tem-se uma parcela de capital público e uma parcela de capital privado.

Essa pessoa jurídica tem que estar comandada pelo Poder Público, ou seja, a maioria do capital que dá direito ao voto (capital votante) tem que estar nas mãos do Poder Público. Quem vai definir esta empresa é a Administração.

A SEM também pode prestar serviços públicos ou explorar atividade econômica.Só pode ser constituída sob a forma de S/A.Exemplos: Banco do Brasil; Petrobrás; Bancos Estaduais (os poucos que sobraram);

gráficas oficiais (responsável pelo DO).

→ Diferenças entre a EP e a SEM:

Empresa Pública Sociedade de Economia Mista

- Capital exclusivamente público (originado da AP Direta ou Indireta,sendo que a maior parte tem que ser da AP Direta que a criou);- Pode ser constituída de qualquer modalidade;- Ações da EP Federal são julgadas pela Justiça Federal - ☺art. 109, CR;☺Súm. 517 e Súm. 556, STFObs.: Ações da EP ou SEM estadual ou municipal são de competência da Justiça estadual (aqui não há diferença).

- Capital misto, público e particular (mas o comando – maioria acionária votante – tem que estar nas mãos do Poder Público)- Só pode ser constituída sob a forma de S/A;- Ações da SEM Federal são de competência da Justiça Estadual (se a União tiver interesse na causa o processo poderá ser levado para a J. Federal, mas pelo interesse da União, e não da SEM).☺Súm. 556/STF e Súm. 42/STJ.

→ Regime híbrido:Quando uma EP ou SEM é mais pública ou privada?Deve-se levar em conta a sua finalidade:- se a empresa estatal for PSP, vai seguir um regime mais público do que privado – fica

derrogado o regime privado, aplicando-se, em sua maioria, o regime público – ex.: responsabilidade civil, bens, imunidade tributária, etc.;

- se a empresa estatal for EAE, o regime terá a possibilidade de ser próprio - ☺art. 173, CR - ☺§1º: poderão ter estatuto próprio – este estatuto próprio não existe ainda. Assim, essas pessoas jurídicas terão um regime mais próximo do regime privado do que as EP e SEM PSP – ex.: licitações e contratos, etc.

→ Regime Jurídico:

- Até o final de 2005, a posição do STF era a de que as EP e as SEM não estavam sujeitas ao controle pelo TC. Este posicionamento, contudo, já está superado. O STF passou a entender que elas são passíveis sim de controle pelo TC.

- Sujeição à falência: se o regime é público, não há dúvidas de que não é possível; a discussão só é pertinente para as EP e SEM porque estas têm natureza privada. Ocorre que foi estabelecido expressamente que estas pessoas jurídicas não se submetem ao novo regime de extinção (☺Lei 11.101/01, art. 2º), independentemente da sua finalidade (se são PSP ou EAE), ou seja, não podem falir.

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- Licitações e contratos administrativos: EP e SEM estão sujeitas à Lei 8.666? Na prática, essas empresas muitas vezes não licitam. Em verdade, elas não precisam licitar na atividade-fim.

As EP e SEM, se são PSP, têm seu regime mais próximo ao da autarquia, que está sujeita à Lei 8.666, portanto, elas estão sujeitas à Lei 8.666 (art. 37, XXI, CR e art. 1º, LLC).

Se a EP ou SEM é EAE, a CR diz no art. 173, §1º, III que elas poderão ter estatuto próprio e lei específica para licitações e contratos. Ocorre que o estatuto ainda não existe, a lei própria de licitações e contratos não veio, por isso, por enquanto elas seguem a norma geral, que é a Lei 8.666, até que seja editada a lei específica. Se sujeitam, também, pois, a LLC.

Atenção: o art. 1º, LLC fala da AP Direta e Indireta, e não distingue as EP e SEM PSP e EAE.

Mas, se essas empresas estão sujeitas à LLC, por que elas quase sempre escapam à Lei e não licitam? É preciso lembrar que a própria Lei 8.666 traz hipóteses de dispensa e de inexigibilidade, o que vale também para as EP e SEM – ex. de dispensa: art. 24, PU, LLC – contratos de valores pequenos (dispensa pelo valor – 20% do limite do convite, fugindo à regra geral do limite de 10% do valor do convite); ex.: de inexigibilidade (art.25, LLC): competição inviável (para que a competição seja viável é preciso preencher 3 pressupostos: o pressuposto lógico, que é a pluralidade; o pressuposto fático, que é o interesse de mercado; e o pressuposto jurídico, que é a proteção ao interesse público), inviável por não proteger ou, seja, por prejudicar o interesse público (ex.: quando prejudica o serviço público, ou seja, a atividade-fim da empresa; ou, ainda, no caso de EAE, se prejudica o interesse coletivo ou a segurança nacional, que é a atividade-fim da empresa). Resumindo: a EP ou SEM não licitará na atividade-fim quando a licitação prejudicar exatamente aquilo que ela deveria proteger, a própria atividade-fim e o interesse público. Afinal, a licitação é para perseguir o interesse público, e não para prejudicá-lo.

Mas e o caso da Petrobrás? É uma empresa estatal, poderia ter o estatuto próprio que ainda não veio, mas ela se submete à uma licitação simplificada. A questão está sendo discutida no STF. A Lei 9478/97 instituiu a MP no Brasil e também admitiu que a Petrobrás teria um procedimento de licitação simplificado, definido pelo PR, através de Decreto. É isso, portanto, que temos hoje. O PR já fez o Decreto e a Petrobrás vem usufruindo desse procedimento simplificado há algum tempo já. Ano passado o TCU resolveu questionar essa situação dizendo que ela até poderia ter um estatuto próprio, mas ele deveria vir por uma lei específica e que valesse para todas as estatais, não só para a Petrobrás. Foram, assim, suspensas pelo TCU as licitações da Petrobrás, dizendo que ela precisaria seguir a Lei 8.666. A Petrobrás ajuizou, então, um MS (MS 25.888/STF). O STF decidiu em sede de liminar este MS, dizendo que reconhece a própria Súm. que diz que o TCU pode fazer controle de constitucionalidade (Súm. 347, STF), mas este controle de constitucionalidade não pode ser concentrado, não Poe ser pela via de ação, substituindo a atuação do próprio STF, para dizer que uma determinada lei (Lei 9478) é inconstitucional. Assim, decidiu em liminar que o TCU não poderia ter suspendido as licitações da Petrobrás. Desta forma, enquanto não decidido o mérito do MS, a Petrobrás pode continuar com o procedimento simplificado de licitação.

- Responsabilidade civil: as EP e SEM submetem-se ao disposto no art. 37, §6º, CR? A CR diz: pessoas de direito público e pessoas jurídicas de direito privado PSP. Desta forma, as EP e SEM estão sujeitas ao art. 37, §6º, dependendo da sua finalidade: se forem PSP não há dúvida, elas terão responsabilidade civil que é em regra objetiva, respondendo o Estado subsidiariamente; contudo, se forem EAE não estarão sujeitas ao art. 37, §6º, a elas se aplicando o direito privado, que tem como regra geral a responsabilidade subjetiva (apesar das exceções, como a do CDC, que diz que na relação de consumo a responsabilidade é objetiva), não respondendo o Estado subsidiariamente.

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- Privilégios tributários: as EP e SEM gozam de privilégios tributários, como por ex., a imunidade recíproca? De acordo com o art. 173, §2º, CR, as EP e SEM não podem gozar de privilégios não extensíveis à iniciativa privada, quando são EAE. Se forem PSP, porém, aplica-se o art. 150, §3º, CR, segundo o qual as PSP podem gozar de imunidade recíproca desde que elas não repassem o valor do tributo para o preço do serviço, o que é quase impossível de se provar na prática (por isso é um dispositivo muito criticado) – mas o que importa é que é possível a imunidade tributária sim.

- Bens: bens de EP e SEM são bens públicos? Seguem o regime de direito público? Bens de EP e SEM são, em regra, privados; seguem o regime privado. Excepcionalmente, segundo a doutrina majoritária, estes bens seguirão o regime de bem público se estiverem diretamente ligados à prestação de serviços públicos. Assim, como regra eles são penhoráveis, mas se diretamente ligados à prestação de serviços, serão impenhoráveis. Mas atenção, o fato de a EM ser PSP não quer dizer que todos os seus bens são impenhoráveis. Só estão protegidos os bens que, sendo retirados, comprometerão o Princípio da Continuidade do serviço público. Atenção: a ECT (empresa de correios e telégrafos) tem natureza de Fazenda Pública, ou seja, tem tratamento de autarquia, e por isso, independentemente de seus bens serem ou não ligados ao serviço, são todos impenhoráveis.

- Regime de pessoal: quem trabalha na EP e SEM é celetista ou estatutário? É servidor público? Não são servidores públicos não. Só existem servidores públicos em pessoas jurídica de direito público. Mas são agentes públicos (conceito maior, que envolve todos os que exercem função pública – não confundir!). Portanto, ele é servidor de ente governamental de direito privado, ou também chamado simplesmente de empregado e, por isso, segue o regime da CLT. Ocorre que, apesar de não ser servidor público, se equipara ao servidor público em alguns aspectos: a) presta concurso; b) a ele se aplica o regime da não acumulação, em regra (art. 37, XVII, CR); c) está sujeito ao teto remuneratório (art. 37, §9º, CR), em regra, mas excepcionalmente não estará, quando não a EP ou SEM não receber repasse da AP Direta para o seu custeio; d) está sujeito à Lei de improbidade Administrativa (Lei 8.429); e) se equipara ao funcionário público para a lei penal (art. 327, CP); f) se equipara aos servidores públicos para fins de remédios constitucionais.

Obs.: este empregado público não se equipara aos servidores públicos para efeitos de dispensa. A competência para julgar esta relação celetista é da Justiça do Trabalho (após o julgamento da ADI 3395 não há mais dúvida: toda relação estatutária vai para a justiça comum, e toda relação celetista vai para a J. do Trabalho). O TST editou a Súm. 390, segundo a qual se o sujeito é emprego de pessoa jurídica de direito público, ele tem direito à estabilidade do art. 41, CR, (apesar deste dispositivo falar em cargo, e não em emprego). Mas se o sujeito é empregado de pessoa jurídica de direito privado, não terá a estabilidade do art. 41, CR. O TST editou, neste ponto, a OJ 247, segundo a qual a dispensa daquele que não tem estabilidade será imotivada (ou seja, não precisa de qualquer justificativa).

Mas atenção: esta OJ sofreu uma alteração recente para incluir que a dispensa é imotivada, salvo no caso da Empresa de Correios e Telégrafos (ECT). O TST fez isso porque a ECT tem tratamento de Fazenda Pública, ela então queria os privilégios da FP, mas não as obrigações, dispensando imotivadamente. A partir de agora, então, ela tem que motivar a dispensa. A ECT é EP, presta serviço postal (☺art. 21, X, CR) – como o legislador constitucional não previu para este serviço a concessão ou permissão, entende-se que é um serviço exclusivo da União. Mas como pode ser exclusivo se já foi dado à EP? Ao invés de tirar da EP e devolver para a União, preferiu-se dar à EP o tratamento de União (de Fazenda Pública).

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Seus bens são impenhoráveis, não paga imposto, tem regime de precatório. Mas, como é serviço exclusivo se tem tantas empresas privadas que prestam serviços similares (como a TAM Express). Essas empresas ajuizaram a ADPF 46 para resolver esta questão, elas querem que o STF reconheça que não há a exclusividade e, assim, não poderia haver o tratamento de FP. Ademais, como ficam as lojinhas de correios dos bairros, que são empresas privadas, abertas sem licitação, sob o regime de franchinsing? A Lei 11.648 resolveu a questão da exclusividade, afirmando que ela não existe. Mas o STF ainda não resolveu a ADPF 46.

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(19/09/08)

ENTES DE COOPERAÇÃO / PARAESTATAIS:ENTES DE COOPERAÇÃO / PARAESTATAIS:

Estão fora da Administração Pública. Ente de cooperação é aquele que coopera, que colabora com o Estado na busca de suas

finalidades. São, pois, os entes que colaboram ou cooperam com o Estado no desempenho de uma atividade de interesse coletivo, embora não integrem a Administração, residindo apenas ao lado dela.

São pessoas jurídicas de direito privado que, sem fins lucrativos, realizam projetos de interesse do Estado, prestando serviços não-exclusivos e viabilizando o seu desenvolvimento. Por isso, recebem ajuda por parte dele, desde que preenchidos determinados requisitos estabelecidos por lei específica para cada modalidade. Sujeitam-se ao controle pela AP e pelo Tribunal de Contas. O seu regime jurídico é predominantemente privado, contudo parcialmente derrogado por regras de direito público.

Compreendem entes de cooperação: os serviços sociais autônomos; as entidades de apoio; as organizações sociais e as organizações da sociedade civil de interesse público. Atente-se no fato de que não há uniformidade terminológica no enquadramento dessas entidades.

Divisão em Setores: é uma divisão da economia, é uma análise econômica do que temos no Brasil hoje (não é estabelecida pelo Ordenamento Jurídico).

- 1º Setor: Estado- 2º Setor: Iniciativa privada- 3º Setor: Organizações não-governamentais → podem ou não ter status de ente de cooperação, ou seja, nem toda ONG tem natureza de paraestatal. Há ONG que não recebe nada do Estado.- 4º Setor: Economia informal e pirataria (absurdo: a criminalidade já representa uma 4ª faixa da economia no país).

Aqui estudaremos as organizações que compõem o 3º Setor (lembrando que nem todas elas são entes de cooperação).

Daqui para frente estudaremos, pois, pessoas jurídicas que estão fora da AP. São, portanto, pessoas de direito privado.

Essas pessoas jurídicas cooperam com o Estado de diversas maneiras. Muitas delas recebem dotação orçamentária (recebem dinheiro público ou direto do orçamento, ou por via de repasse, ou por contrato) e, por isso, sofrem um certo controle.

Esses entes sofrem muitas críticas, já que se envolvem em algumas confusões. Por isso atualmente não são muito cobrados em prova.

→ Espécies: (mais cobradas em prova)

• Serviço Social Autônomo – “Sistema S”:

Serviço social autônomo é um rótulo atribuído às pessoas jurídicas de direito privado, integrantes da iniciativa privada com algumas características peculiares. Elas não prestam serviços públicos delegados pelo Estado, mas exercem atividade privada de interesse público, o que alguns doutrinadores preferem denominar serviços não-exclusivos do Estado. Compõem o chamado “Sistema S”.

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Segundo HLM, “são todos aqueles instituídos por lei, com personalidade de Direito Privado, para ministrar assistência ou ensino a certas categorias sociais ou grupos profissionais, sem fins lucrativos, sendo mantidos por dotações orçamentárias ou por contribuições parafiscais.

Para entender melhor, é necessário relembrar o que significam competência e capacidade tributária: competência tributária é a aptidão para instituir tributos (somente os entes políticos a possuem, sendo ela indelegável); a capacidade tributária, por sua vez, é a aptidão para cobrar tributos, admitindo delegação. Então, é denominada Parafiscalidade, que poderá ser realizada para as pessoas de direito público e as de direito privado perseguidores de interesses públicos, como é o caso dos serviços sociais autônomos.

Assim, o Serviço Social Autônomo pode receber recursos orçamentários (repassados diretamente do orçamento), e, ainda, é beneficiário da Parafiscalidade, que é a delegação da capacidade tributária (aptidão para cobrar tributos). Ocorre que essa cobrança, por ser pequena, e também pela falta de estrutura do sistema, é geralmente feita juntamente com outra arrecadação (geralmente feita pelo INSS).

O fato, porém, é que, mesmo não cobrando diretamente, o SSA tem a possibilidade de cobrar tributos sim (tem arrecadação de contribuição). Já que há a cobrança de tributos e o repasse de recursos orçamentários, o SSA está sujeito ao controle pelo TC (tem dinheiro público, tem controle pelo TC).

Quanto ao regime tributário, o entendimento da maioria é que eles não gozam da imunidade recíproca do art. 150, VI, “a”, CR, que só é aplicável às pessoas jurídicas de direito público, o que não é o caso. Todavia, é possível que esses entes se beneficiem de outros privilégios tributários, em razão do seu caráter assistencial, como ocorre com a imunidade do art. 150, VI, “c”, CR. JSCF defende a incidência dessa imunidade considerando que esses entes se dedicam, institucionalmente, às atividades de assistência social e de educação para o trabalho, sem finalidades lucrativas.

Ressalte-se que o benefício da imunidade só incide sobre impostos, sendo necessário o pagamento das demais espécies tributárias e limita-se ao patrimônio, à renda e aos serviços ligados diretamente às suas finalidades essenciais.

E quanto à licitação? Consoante a maioria da doutrina, eles estão sim sujeitos à licitação, conforme previsão do art. 1º, P.U., da Lei 8.666/93, que estabelece um rol indicativo dos entes da AP Direta e Indireta, além das demais entidades controladas direta ou indiretamente pelo Poder Público, hipótese em que se enquadram esses entes de cooperação, em razão da possibilidade de arrecadação de tributos e o conseqüente controle pelos órgãos especializados.

☺art. 1º, Lei 8666/93: AP Direta, Indireta e demais entes controlados direta ou indiretamente pelo Poder Público. Ou seja, se há o controle, os SSA deveriam se submeter à Lei 8.666/93 e ao seu procedimento.

Ocorre que o TCU decidiu, em decisão administrativa (Decisão 907/97), que ao Sistema S se aplica um procedimento simplificado de licitação – “os Serviços Sociais Autônomos não se subordinam aos estritos termos da Lei 8.666/93 e sim aos regulamentos próprios”. O TCU adotou uma solução de consenso, admitindo a adoção de um regulamento próprio para licitações e contratações administrativas, com regras próprias simplificadas, previamente aprovadas pelo próprio órgão, o que denominou “Regulamento Simplificado do Sistema S”. É, pois, possível aqui flexibilizar o procedimento da licitação porque tais entes não compõem a AP. Existe uma modalidade de licitação para os SSA chamada “Shopping” (muito utilizada pelo SEBRAE), para quando há financiamento internacional – é como se fosse uma consulta, um convite – e é definida pela instituição financiadora.

Essas pessoas jurídicas podem ser constituídas por meio das instituições particulares convencionais, como fundações, sociedades civis ou associações, bem como estruturas peculiares previstas em lei específica.

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No que tange à sua criação, eles são instituídos por meio de autorização legislativa, mas, para existirem efetivamente, é também preciso que sejam criados pelas respectivas Confederações Nacionais.

Os serviços sociais autônomos têm várias finalidades diferentes. Podem ser utilizados para cursos de qualificação, para lazer, para assistência, etc. Seu grande objetivo é fomentar as categorias profissionais (transportes, indústrias, etc.).

O Estado tem interesse nisso porque se a indústria, o comércio, etc. crescem, o Estado também cresce. Esses serviços colaboram com o Estado no desenvolvimento das diversas categorias profissionais.

Os serviços sociais autônomos não gozam de privilégios administrativos, nem fiscais e processuais, cabendo-lhes apenas aqueles que a lei especial, expressamente, lhes conceder.

A competência para julgar as ações, em que forem autores ou réus, é da Justiça Estadual. Nesse sentido, ☺Súm. 516, STF: “O Serviço Social da Indústria – SESI – está sujeito à jurisdição da Justiça estadual”. Este entendimento deve ser aplicado para os demais serviços sociais.

O regime de pessoal daqueles que atuam nos SSA é o da CLT, já que quem atua em SSA é empregado privado. Não há exigência de concurso público, mas há para um processo seletivo simplificado, que decorre do próprio interesse da carreira (visa proteger a própria categoria profissional), mas não há muito rigor quanto a essa seleção.

Não obstante, os atos dos seus dirigentes são passíveis de MS, ação popular, responsabilidade pessoal por danos, improbidade administrativa e responsabilização criminal, além de serem fiscalizados pelo TC.

→ Exemplos: SESI, SESC, SEBRAE, SENAI, SENAT, SENAR, etc. Em 2003 e 2004 foram instituídos dois novos SSA que ganharam nome de Agência: a

Apex-Brasil (Agência de Promoção de Exportação do Brasil), e a ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial).

• Entidades de Apoio:

São pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos, que exercem atividade social e/ou serviços sociais não-exclusivos do Estado, relacionados à ciência, pesquisa, saúde e educação. Normalmente atuam junto às universidades públicas e hospitais públicos, e servem para apoiar, incentivar a pesquisa, o trabalho.

Elas são constituídas pelos próprios servidores e não pela AP (não compõem a AP). ou seja, elas são instituídas diretamente por servidores públicos, em nome próprio e com recursos próprios, para exercerem atividades de interesse social relativas aos serviços prestados pelas entidades estatais em que esses servidores públicos atuem.

No que tange à natureza jurídica, elas são geralmente instituídas sob a forma de fundação de natureza privada, mas podem ser instituídas também sob a forma de associação ou de cooperativa, que precisam celebrar vínculos jurídicos com o Estado, em regra sob a forma de convênios.

Para MSZDP, essas entidades não se sujeitam a regime jurídico-administrativo, uma vez que prestam atividade de natureza privada. Assim, seus contratos são de direito privado, celebrados sem licitação e seus empregados são celetistas, contratados sem concurso público.

Elas se localizam e têm como endereço a própria sede da universidade ou hospital; seu quadro de servidores é formado pelos próprios servidores das entidades a qual apóiam; elas podem receber dotação orçamentária (diretamente); podem receber bens públicos (a própria sede é bem público); usa toda a estrutura da entidade. Ou seja, é tudo público, mas o dinheiro é usado

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como se fosse uma pessoa privada (como de fato é); por isso muito se discute sobre a necessidade de controle pelo TC (que deveria existir, mas não há), e sobre a necessidade de sujeição à licitação (pelo menos ao procedimento simplificado do Sistema S), que também não ocorre (é um “paralelo ilegal”) – temos como ex. a situação da entidade ligada a UNB, cujo reitor utilizou os recursos financeiros da entidade para mobiliar a própria casa.

A doutrina aponta inúmeras críticas a essas entidades. Inicialmente, deve-se alertar que elas não seguem regime público, mas, como visto, poderão receber dotação orçamentária, servidor e bens públicos, representando uma roupagem com que se reveste a AP para fugir do regime público, escapando do dever de licitar e de realizar concurso público.

Nos convênios, as entidades se confundem. O ente de apoio exerce a atividade que deveria ser exercida pela AP, tendo a mesma sede, o mesmo local de prestação do serviço. O ente de apoio assume a gestão dos recursos públicos da entidade e o seu quadro de pessoal que, em regra, é composto por servidores públicos. Enfim, como vimos, tudo pertence à AP, só que quem arrecada toda a receita é o ente de apoio e o faz sob as regras de direito privado.

Por fim, e para complicar ainda mais a situação, essas entidades não têm disciplina legal específica, existindo apenas a Lei Federal 8.958/94 (em relação às Universidades), que define as normas que estabelecem as relações entre as instituições federais de ensino superior e instituições de pesquisa científica e tecnológica com as fundações de apoio, estabelecendo regras de controle, de credenciamento, licitação, prestação de contas e restrições ao uso de bens e servidores públicos. No caso dos hospitais ainda não há regulamentação.

Resumindo: tais entidades deverão ser constituídas na forma de fundações de direito privado, sem fins lucrativos, e serão regidas pelo Código Civil. Sujeitam-se, portanto, à fiscalização do MP nos termos do CC e do CPC, à legislação trabalhista e, em especial, ao prévio registro e credenciamento nos Ministérios da Educação e da Ciência e Tecnologia, renovável bienalmente. Não são criadas por lei e nem mantidas pela União.

→ Exs.: FUNDEPES, FUNDEP, FAPEX, FAPEAL, FUSP, CERTI, FINATEC, etc.

• Organização Social (OS):

As OS foram instituídas e definidas pela Lei 9.637/98. são pessoas jurídicas de direito privado, que não integram a AP, não têm fins lucrativos e são criadas por particulares para a execução, por meio de parcerias, de serviços públicos não-exclusivos do Estado, previstos em lei.

As atividades por elas desenvolvidas são aquelas acessíveis aos próprios particulares, independentemente de intervenção estatal. Podem ser objeto de desenvolvimento autônomo por qualquer particular. Essas organizações atuam, em nome próprio, sob regime de direito privado, mas recebem apoio do Estado.

Na verdade, elas surgiram porque o Estado tinha em sua estrutura alguns órgãos sucateados, que já não funcionavam mais muito bem. Ele, então, resolveu extinguir esses órgãos e transferindo toda a sua estrutura (bens, servidores, serviços) para uma nova pessoa jurídica, da iniciativa privada, que foi a Organização Social.

Os Estados e Municípios poderão criar OS, desde que aprovem suas leis próprias, já que se trará de matéria de prestação de serviço público, em que a competência é de cada entidade estatal. Convém lembrar que a Lei 9.637/98 não é uma lei de âmbito nacional; ela poderá servir de modelo, devendo ser adaptada às peculiaridades regionais.

As possíveis finalidades desenvolvidas por essas organizações estão elencadas no art. 1º da mencionada lei, e se resumem na busca do bem comum, prestando serviços ligados a: ensino e pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico, meio ambiente, cultura e saúde, não se

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admitindo outras finalidades estatutárias. Por isso, são declaradas como entidades de interesse social e utilidade pública, para todos os efeitos legais (☺art. 11 da lei).

Essas organizações são livremente qualificadas pelo Ministro ou titular do órgão supervisor do seu ramo de atividade e pelo Ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão, desde que preencham alguns requisitos formais óbvios e requisitos substanciais, conforme enumeração dos arts. 2º e 3º da mesma lei.

Enquanto pessoa jurídica, a lei estabelece que ela deve celebrar Contrato de Gestão (antes mesmo de existir como pessoa jurídica, justamente para que isso possa ocorrer) - ☺art. 5º e ss da Lei 9.637/98 e art. 37, §8º, CR.

Crítica: mas como pode uma pessoa que antes mesmo de existir celebrar um contrato de gestão? É, pois, uma entidade que a doutrina chama de fantasma. Ela colabora com o meio ambiente, saúde, pesquisa, etc. Ela não presta serviço público diretamente, mas sim serviços secundários de cada um desses serviços específicos.

Na verdade, o conceito do contrato de gestão introduzido inicialmente pela Lei e, posteriormente, pela CR (com a EC 19) para essas entidades, contraria o seu conceito tradicional. Essa terminologia era, a princípio, utilizada para definir os contratos administrativos celebrados entre entes públicos, ao contrário das organizações sociais que são pessoas de direito privado, o que acabou desvirtuando o seu conceito.

Em princípio, contrato de gestão não se confunde com concessão de serviço público. Enquanto instrumento a ser formalizado com organizações sociais, o contrato de gestão não tem por objeto a atribuição a particulares da prestação de serviço público, por conta e risco próprios.

Entretanto, á uma grande dificuldade na doutrina para definição de sua natureza jurídica, porquanto alguns doutrinadores preferem reconhecê-lo como uma figura similar ao convencio, já que os interesses dos que o celebram são convergentes. De outro lado, preferem outros doutrinadores manter a denominação de contrato, deixando para analisar a sua natureza conforme o caso concreto, identificando-se o substrato da relação jurídica pactuada.

O contrato de gestão discriminará as atribuições, responsabilidades e obrigações do Poder Público e da OS. Na sua elaboração, devem ser observados os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e economicidade (☺art. 6º, P.U., da lei), além da especificação do programa de trabalho proposto pela organização, as metas, prazos e critérios de avaliação de desempenho e a estipulação dos limites e critérios de despesa com remuneração e vantagens a serem percebidas pelos dirigentes e empregados das organizações.

Essa nova figura desperta enormes dúvidas e sua aplicação será um desafio para a comunidade jurídica. (☺capítulo dos contratos administrativos).

Resumindo: a OS é pessoa jurídica de direito privado também sem fins lucrativos. Surgiu da extinção de estruturas (órgãos ou pessoas jurídicas) da própria AP. Ganha status de OS (nasce enquanto pessoa jurídica) com a celebração do contrato de gestão. Não há, portanto, qualquer controle de qualidade ou de eficiência anterior, do seu trabalho (já que a pessoa jurídica já nasce com o contrato).

Apesar do regime de direito privado, em razão das finalidades por elas exercidas, esse contrato pode dar as OS dotações orçamentárias, permissão de uso de bens públicos, e cessão de servidores públicos (☺arts. 12 a 15 da lei). Mas não podemos nos esquecer que trata-se de pessoa privada e gasta seu dinheiro como pessoa privada. A OS é administrada, gerida por um Conselho de Administração que vai ser composto por administradores (do estado) e por particulares, ou seja, um administrador do Estado será também gestor de uma entidade privada (recebe dinheiro que ele mesmo repassou para a OS).

É, por tudo isso, uma entidade muito criticada. É relevante, inclusive, a discussão quanto à possibilidade de controle por parte do Poder

Público, em face dessas organizações. De início deve-se lembrar que esse controle não pode ser

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realizado da forma que se faz perante os entes que compõem a AP, senão inexistiria a verdadeira organização social. Entretanto, em virtude dos benefícios acima apontados, elas não poderão seguir regime completamente privado, haja vista tratar-se de gestão de recursos públicos. Portanto, há dever de prestar contas. Dessa forma, os atos por ela praticados devem ser publicados e estão sujeitos ao controle pela AP e pelo TC, estando submetidos também às regras de improbidade administrativa.

Quanto à exigência de licitação, não se pode esquecer a regra do art. 24, XXIV, da Lei 8.666/93, que garante dispensa de licitação para que a AP contrate com organizações sociais, o que não acontece em outros casos de transferência de serviço público, colocando em risco a transparência da atividade administrativa e facilitando o desvio do dinheiro público.

Por essas razões é que a doutrina vem indicando muita cautela na interpretação dessa regra. Para Marçal Justen Filho, “há necessidade de prévia licitação para configurar o contrato de gestão e escolher a entidade privada que será contratada, já que os princípios da isonomia e indisponibilidade do interesse público continuam regendo o assunto”. Assim, completa o autor, “uma vez firmado o contrato de gestão, as futuras contratações de prestação de serviço – já previamente identificadas – serão pactuadas sem necessidade de nova licitação”, referindo-se aos contratos instrumentais relacionados ao contrato de gestão, também denominado contrato-mãe.

A qualificação de OS é temporária, enquanto vigente o contrato, sendo possível a desqualificação por meio de ato do Poder Executivo, quando do descumprimento das condições contratuais, exigindo processo administrativo prévio com o contraditório e a ampla defesa, respondendo os dirigentes solidariamente pelos danos, além da possibilidade de reversão dos bens e devolução dos valores recebidos e demais sanções cabíveis.

As OS foram objeto de controle de constitucionalidade pela ADI 1923, que discute a própria existência da entidade e a dispensa de licitação a ela conferida (já que ela recebe recursos públicos). A ADI foi decidida apenas em sede de cautelar, que foi indeferida por inexistência de periculum in mora! É importante acompanhar o julgamento do mérito dessa ADI! Assim, ainda vale a dispensa de licitação trazida pela LLC (art. 24, XXIV) – as OS gozam de dispensa de licitação nos contratos decorrentes do contrato de gestão. Assim, há quem afirme que nos demais contratos (não decorrentes do contrato de gestão) elas deveriam licitar, mas na prática elas não fazem mais nada além disso, e, portanto, não licitam para nada.

Para essas pessoas jurídicas, a doutrina também aponta inúmeras críticas de inconstitucionalidades, porque, no início, constituindo objeto de muita polêmica, foram idealizadas para absorver atividades, na época, desempenhadas por órgãos ou entidades estatais que foram extintos, com a cessão de suas instalações, bens móveis e imóveis, e de seus servidores.

Para MSZDP, elas são denominadas “entidades fantasmas”, uma vez que não têm vida própria, patrimônio, sede, servidores, vivendo exclusivamente na dependência do contrato de gestão.

Note-se ainda que as OS recebem bens, recursos orçamentários e até servidores, e não se submetem à licitação, não necessitam demonstrar habilitação técnica ou econômico-financeira de qualquer espécie. Basta a concordância dos Ministros, uma discricionariedade literalmente escandalosa, o que ofende inúmeros princípios constitucionais.

Atenção: a expressão “organização social” não pode ser mero pretexto para dar tratamento privado para a função pública, devendo repelir-se todas as tentativas de utilização abusiva dessa figura. Também é preciso que a AP realize a efetiva investigação para conferir se a forma da organização social corresponde à substância, para impedir que se trate de mera fachada, tendo em vista que liberar recursos, pessoal e bens em favor de entidades não existentes ou não atuantes, conduzirá à responsabilização patrimonial dos administradores, além da aplicação de outras sanções cabíveis, inclusive penais.

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Essas organizações não podem prover a absorção de serviços públicos, sob pena de ofender o art. 175, CR, que estabelece que a AP presta serviços diretamente ou por intermédio de concessão e permissão, sempre precedidas de licitação. Sem contar que os serviços de saúde, ensino e educação são deveres do Estado, estando obrigado a prestá-los diretamente, não podendo simplesmente, transpassá-los a essas OS (☺arts. 196, 205, 206 e 208, CR).

Por fim, tem-se a aberração da cessão de servidores que prestaram concurso para atuar nas entidades estatais e não em entidades particulares.

→ Exemplos atuais de OS (atenção, porque podem mudar - ☺site do Planejamento): Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamiraoá; Instituto de Matemática Pura e Aplicada; Associação Brasileira de Tecnologia Luz Sincrotom; Associação Rede Nacional de Ensino e Pesquisa.

• Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP):

☺Lei 9.790/99.A OSCIP é conceituada como pessoa jurídica de direito privado, instituída por particular,

sem fins lucrativos, para a prestação de serviços sociais não-exclusivos do Estado (serviços socialmente úteis), sob incentivo e fiscalização dele e que consagrem, em seus estatutos, uma série de normas sobre estrutura, funcionamento e prestação de contas.

A Lei 9.790/99 estabelece, em seu art. 2º, um rol de pessoas jurídicas que estão impedidas de receber qualificação de OSCIP, como é o caso das sociedades comerciais, organizações sociais, instituições religiosas, sindicatos, entre outras.

A AP muitas vezes tem uma estrutura que precisa de uma modernização (ex.: departamento de informática de uma Secretaria). Com o objetivo de reciclar esse departamento se cria uma organização social que irá estimular, desenvolver esse departamento. Ela, em tese, já existe no mercado, naquele ramo de especialidade. Ela então vai, executa seu projeto e, acabado o projeto, encerra suas atividades.

É isso que a OSCIP faz (para evitar que o Estado precisasse licitar para cada área diferente, em tantos casos).

☺Súm. 331, TST – veio para evitar uma situação muito comum em que a AP fazia falsas terceirizações, para burlar o concurso público. Também para burlar o concurso público se realizavam muitos contratos com cooperativas, que enviavam servidores falseando dados (mandavam umas pessoas no lugar de outras).

A OSCIP, da mesma forma, surgiu justamente para a execução de falsos projetos: a AP finge que está modernizando um determinado departamento, e a OSCIP diz que está mandando pessoas para a modernização desse departamento, enquanto, na verdade, está mandando trabalhadores para a AP (como servidores); ou seja, é outro meio de se fraudar o concurso público (e inclusive para colocar na AP pessoas da família). A idéia é mesmo a de execução de um projeto específico, mas não é o que ocorre na prática.

O vínculo jurídico surgia por meio de um Termo de Parceria (que na verdade, segundo a doutrina, não passaria de um contrato administrativo, tendo, pois, natureza contratual).

O termo de parceria não funciona como o contrato de gestão; não se paga a mão de obra e sim a execução de um projeto (existe recurso público sim, mas como pagamento de um projeto – não são recursos orçamentários). Não tem participação no orçamento. Para que a OSCIP celebre um termo de parceria, ela precisa já existir há pelo menos um ano no mercado, naquele ramo de atividade.

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No termo de parceria serão discriminados os direitos, responsabilidades e obrigações das partes signatárias. A sua celebração estará condicionada à prévia consulta aos Conselhos de Políticas Públicas das áreas correspondentes.

O art. 10, §2º, da Lei 9.790/99 estabelece as cláusulas essenciais do termo de parceria, como, por ex., a estipulação do objeto com as especificações do programa de trabalho, definição de metas, prazos e resultados esperados, previsão dos critérios de avaliação, previsão de receitas e despesas, obrigação de apresentar relatórios e de realizar a publicação em imprensa oficial.

Para a qualificação, enquanto organização social, é necessária a habilitação junto ao Ministério da Justiça, com o preenchimento dos requisitos dos arts. 4º e 5º da lei, como condição para sua existência. Destaque-se que não se trata de uma entidade nova; é pessoa jurídica já constituída que ganha esse status temporário, durável enquanto houver a parceria.

As possíveis finalidades desenvolvidas por essas pessoas jurídicas estão elencadas no art. 3º da citada lei, o qual aponta, por ex., a assistência social, a cultura, a proteção ao patrimônio histórico e artístico, bem como do meio ambiente, o desenvolvimento econômico e social e a pobreza, dentre outras.

A administração da OSCIP é realizada por particulares (a AP não interfere diretamente, em tese). É uma empresa privada, que já existia e só foi chamada a executar um projeto. Seu grande problema é justamente os falsos projetos; o dinheiro que é usado para suprir as necessidades da AP e não para a execução de um projeto verdadeiro.

→ Exemplos de OSCIP (atual – o status é temporário): Instituto Joãozinho XXX (RJ); Organização Ponto Terra (MG); Arte vida (DF); Centro de Referencia em Mediação e Arbitragem (SP); Instituto Asas (TO), Fórum Estadual de Defesa do Consumidor (RS).

Obs.: O surgimento das OSCIP causou muito espanto para os estudiosos do Direito, em razão

da grande similitude com as OS. As duas figuras foram introduzidas pela Reforma Administrativa, com bastantes semelhanças em alguns pontos e algumas diferenças relevantes em outros. Vejamos:

- O vínculo jurídico por elas celebrado recebe denominações diferentes entretanto, não há dúvida acerca da idêntica natureza jurídica de ambas as figuras, inclusive no tocante a limites e impedimentos. Os interesses não são contraditórios, e sim convergentes, pois ambos visam ao estabelecimento de programa de trabalho, definindo prazos de execução, critérios de avaliação de desempenho, limites para despesas, cronograma da liberação dos recursos previstos e previsão de responsabilidade e denúncia do TC.

- As OS estão sendo utilizadas para substituir órgãos que foram extintos, representando uma escolha discricionária do administrador, tendo como vínculo jurídico o contrato de gestão que representa condição para sua existência enquanto pessoa jurídica. Por meio de contrato, elas poderão ser destinatárias de recursos orçamentários e bens públicos necessários, além da cessão especial de servidores.

- Por outro lado, a OSCIP tem o objetivo de cooperar com o Estado, sem que a atividade deixe de ser desempenhada por ele, estando sujeita a uma análise rigorosa de requisitos. Nessa hipótese, ao contrário da anterior, o Poder Público não participa dos seus quadros diretivos. Sua atividade é mais ampla e o vínculo jurídico é o termo de parceria, o que não representa requisito para sua existência enquanto pessoa jurídica. Nesse caso, não há previsão expressa para recursos orçamentários, apesar de a lei estabelecer a possibilidade de recursos públicos que serão liberados em conta bancária específica. Também não há previsão para cessão de bens e servidores.

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Segundo CABM, as OSCIP se distinguem das OS, entre outros pontos relevantes, pelos seguintes:

a) a atribuição do qualificativo não é, como naquelas, discricionária, mas vinculada e aberta a qualquer sujeito que preencha os requisitos indicados; não prevê o trespasse de servidores públicos para nelas prestar serviço;

b) não celebram contratos de gestão com o Poder Público, mas termos de parceria, conquanto, tal como neles, seja especificado um programa a cumprir, com metas e prazos fiscalizados, além da obrigação de um relatório final, o que os faz mais distintos, entre si, pelo nome que pelo regime;

c) os vínculos em questão não são condicionantes para a qualificação da entidade como tal, ao contrário do que ocorre com as OS;

d) o Poder Público não participa de seus quadros diretivos, ao contrário do que ocorre naquelas;

e) o objeto da atividade delas é muito mais amplo, compreendendo, inclusive, finalidades de benemerência social, ao passo que as OS prosseguem apenas atividades de ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação do meio ambiente, cultura e saúde.

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PODERES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA:PODERES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA:

• Introdução:

Existe uma idéia vulgar de “poder” que precisa ser superada: a idéia de faculdade da qual alguém se utiliza quando e se quiser. Esta idéia não se aplica aos Poderes da Administração.

Poderes Administrativos não são favores nem privilégios exercidos aleatoriamente, ou não, pelo administrador público. Todo poder da AP traz uma função; os poderes são instrumentos dos deveres que lhe são impostos. Não se trata de mera faculdade, mas sim de dever que necessariamente deve ser exercido.

São irrenunciáveis e seu exercício é contínuo e permanente.Assim, os poderes administrativos são instrumentos, prerrogativas, que tem o Estado para

a busca de seus interesses. Poder é algo abstrato. Ele é materializado através da prática de atos administrativos.

Atenção: não confundir Poder do Estado x Poder da Administração: os poderes do Estado são os elementos estruturais, orgânicos ou organizacionais do Estado (PE, PL, PJ); já os poderes da AP são prerrogativas, instrumentos (Poder Hierárquico, Poder Disciplinar, Poder Regulamentar e Poder de Polícia).

Alguns autores falam também em “Poderes do Administrador” (☺aula de abuso de poder, em atos administrativos) – são as prerrogativas do agente pessoa física (que tem o agente na qualidade de agente).

Obs.: é preciso identificar os vícios (não raros) que podem impedir o exercício do poder da forma bastante e devida. São os seguintes:

a) Insuficiência: omissão, que pode ser parcial ou total, do administrador no exercício de um poder da AP. A omissão total é um ilícito. Não é lícito ao agente permanecer inerte em relação a um problema depois de decorrido prazo razoável. O “nada” possui conseqüências jurídicas. A insuficiência é um vício de conteúdo do comportamento.

b) Excesso de poder: ocorre quando o agente vai além dos limites da competência administrativa que detém, isto é, que o ordenamento jurídico lhe atribui. É um vício de sujeito, pois o sujeito extrapola suas atribuições.

c) Desvio de poder (desvio de finalidade): ocorre quando o agente público, ao exercer o poder que o Ordenamento lhe confere,atua dentro dos limites de suas atribuições, mas para atingir uma finalidade diversa do fim legal (compromete, pois, a finalidade, à moralidade, etc.). É preciso provar a intenção do agente (aspecto anímico), o que é muito difícil. É um vício de finalidade.

Atenção: a doutrina enumera como gênero do qual são espécies o excesso e desvio de poder, o abuso de poder. Mas atenção: não se pode confundir – um é vício de sujeito e o outro é vício de finalidade.

→ Espécies de Poderes Administrativos:- Poder Hierárquico- Poder Disciplinar- Poder Regulamentar- Poder de Polícia.

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• Características:

a) É de exercício obrigatório: ou seja, trata-se de um poder-dever, e não de uma mera faculdade; o Administrador está obrigado a agir. Atenção: CABM diz que o dever é mais importante do que o Poder, devendo aparecer em primeiro lugar – ele então fala em dever-poder.

b) Os poderes são irrenunciáveis: o administrador não pode abrir mão da prerrogativa, do instrumento (o que, porém, não significa que ele tem que aplicá-lo sempre). Esta característica deriva da indisponibilidade do interesse público. A competência é ônus, é obrigação para a AP, por isso o administrador não pode abrir mão desta competência. A função pública não é privilégio, é um ônus, um encargo, uma obrigação do administrador, ele não pode renunciar esta função. Ademais, renunciar ao poder significaria criar entraves para um futuro administrador, que perderia o instrumento e o administrador de hoje não pode criar entraves, obstáculos para o administrador de amanhã (não se pode comprometer a administração futura).

c) O exercício é limitado: a lei estabelece limites, define parâmetros para o exercício do poder. Ex.: regras de competência. Os limites são: necessidade, adequação e proporcionalidade.

d) O exercício gera responsabilidade: o caso de ação indevida ou de omissão ensejará a responsabilização da AP.

• Poder Vinculado e Poder Discricionário:

Na verdade a doutrina moderna discute esta terminologia, afirmando que o que é vinculado ou discricionário não é o poder e sim o ato administrativo praticado no exercício daquele poder. Um mesmo poder pode, inclusive, ser ora vinculado, ora discricionário.

Assim, discricionariedade e vinculação são apenas características da atuação administrativa, que também incide sobre os poderes.

O que interessa é saber o que é vinculação e discricionariedade.Trata-se de uma divisão quanto ao grau de liberdade do administrador.Ser vinculado quer dizer que o administrador se prende aos termos da lei, cumpre os

termos da lei sem liberdade de atuação – é uma conduta, atuação ou decisão do administrador que não tem liberdade, não tem juízo de valor, não tem conveniência e oportunidade; preenchidos os requisitos legais, o administrador é obrigado a praticar o ato. Ex.: concessão de aposentadoria (servidor que cumpriu os requisitos legais tem direito a aposentar-se e o administrador tem obrigação de conceder a aposentadoria); licença para construir; licença para dirigir.

Discricionário, por sua vez, diz respeito àquele que tem juízo de valor, liberdade de escolha, conveniência e oportunidade; ocorre quando o administrador tem escolhas, possibilidades, liberdade, dentro dos limites da lei, é claro. Inclusive, se o administrador extrapolar os limites da lei configurar-se-á exercício arbitrário, que é nulo. Ex.: permissão de uso da calçada para colocação de mesas de um bar; autorização para circulação de veículos acima do peso e da medida em determinadas áreas.

• Poder Regulamentar:

MSZDP chama de Poder Normativo.O poder regulamentar é o poder conferido ao administrador, em regra, chefe do Poder

Executivo, para a edição de normas complementares à lei, permitindo a sua fiel execução.A AP não tem capacidade legislativa, não tem capacidade política. O poder regulamentar

tem como objetivo normatizar, regulamentar definindo normas complementares, estabelecer

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regras complementares à previsão legal. Quando se complementa a lei se viabiliza a sua fiel execução, sua melhor aplicação.

O exercício deste poder guarda algumas semelhanças com a função legiferante, apesar de não se confundirem, pois ambos emanam normas gerais, atos com efeitos erga omnes e abstratos.

Ex.: a Lei 10.520/02 (Lei do Pregão) estabelece que o pregão deve ser utilizado para bens e serviços comuns. Ela completa dizendo que bem e serviço comum é aquele que pode ser definido no edital com expressão usual de mercado. É, pois, uma lei que, para sua fiel execução, precisa de um ato regulamentar para complementar a previsão legal, dizendo especificamente o que é bem e serviço comum, ou seja, permitindo sua aplicação correta, verdadeira, da melhor maneira possível.

Ato normativo é todo ato emanado do Estado que visa regular determinada situação de forma geral e abstrata, complementando previsão constitucional ou legal.

Os atos normativos podem ser classificados de diversas maneiras. Segundo Miguel Reale, eles podem ser divididos em:

- originários: quando emanados de um órgão estatal em virtude de competência própria, outorgada imediatamente pela Constituição, para a edição de regras instituidoras de direito novo;

- derivados: quando têm por objetivo a explicitação ou especificação de um conteúdo normativo preexistente, visando à sua execução no plano da práxis, como é o caso do regulamento.

O Regulamento é o principal ato no exercício do poder regulamentar. Mas podemos citar também as Portarias, Instruções, Resoluções, Deliberações e Regimentos.

→ Regulamento x Decreto Regulamentar: sempre que um ato vai normatizar, disciplinar uma situação, damos a ele o nome de Regulamento (decorre do conteúdo do ato – se no conteúdo do ato estamos regulamentando uma situação, será um Regulamento). Ocorre que este ato, ao ir para o Diário Oficial deve ganhar um formato, uma moldura, a que chamamos de Decreto (Decreto é, pois, a forma). Nem todo Decreto é regulamentar. Mas se o decreto tiver como conteúdo um regulamento, será um Decreto Regulamentar. Pode vir também com o nome de Decreto Autônomo, ou Decreto Regulamentar Autônomo.

→ Regulamento x Lei: regulamento se diferencia da lei em 2 aspectos: a) a lei é feita por meio de um processo legislativo rigoroso, com muitas formalidades; um regulamento é feito sem qualquer formalidade, não tem formalismo algum; b) quem faz lei é a Casa Legislativa, o legislador (o CN, no qual há vários interesses, já que há representantes do ente político e do povo – há uma pluralidade muito grande de interesses, e, por isso, é, em tese muito mais representativa), já quem faz o Regulamento, especialmente o Decreto Regulamentar, é o Chefe do PE (PR), ou seja, com uma representatividade infinitamente menor. Assim, é melhor para o nosso Ordenamento a atuação por lei.

Diante disso, o regulamento não pode ser a atuação regra (que é a lei); ele nasce como Regulamento Executivo, justamente para complementar a lei, permitindo a sua fiel execução.

Para a doutrina, são reconhecidos 2 tipos de regulamentos: o primeiro deles, o Regulamento Executivo, que complementa a lei, contendo normas para a sua fiel execução, conforme a previsão do art. 84, IV, CR/88. esse regulamento não pode inovar a ordem jurídica, criando direitos, obrigações, proibições, em razão do Princípio da Legalidade pelo qual ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Este tipo de regulamento é, pois, a regra no Brasil. Inclusive, excluída a hipótese do art. 84, IV, CR/88, é pacífico na doutrina que só existe no direito brasileiro o regulamento de execução, hierarquicamente subordinado a uma lei, sendo ato de competência privativa do Chefe do Poder Executivo.

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Ocorre que no Direito Comparado e hoje também no Brasil, encontramos o chamado Regulamento Autônomo ou independente, que é uma exceção, não podendo ser tido como regra. Ele, ao invés de complementar e executar a lei, substitui a lei, fazendo o papel da própria lei. Ele tem o poder de inovar a ordem jurídica, estabelecendo normas sobre matérias não disciplinadas em lei, não completando nem desenvolvendo nenhuma lei anterior, ou seja, podendo criar obrigações que não estão previstas em lei.

No Brasil há uma grande divergência sobre a possibilidade de decretos e regulamentos autônomos. Todavia, para a grande maioria da doutrina, o texto constitucional de 1988 limitou consideravelmente o poder regulamentar, não deixando espaço para os regulamentos autônomos.

Em verdade, o Decreto Autônomo tem o seu fundamento de validade na própria CR. Via de regra, a criação de cargos é feita por lei. Se se cria por lei, a regra é se extinguir também por lei. Mas se a própria CR diz que pode se extinguir por Dec. Autônomo, será possível.

Essa não é a orientação do texto original da CR. Foi a EC 32 que trouxe esta possibilidade, alterando o art. 84, VI, CR, que passou a admitir o Dec. Autônomo no Brasil → o PR poderá, por meio de Dec. Autônomo, organizar a estrutura da AP e extinguir cargo vago.

HLM diz que o Regulamento ou Dec. Autônomo é possível em qualquer circunstancia – trata-se de uma faculdade implícita no poder de chefia da AP, para suprir as omissões do legislador.

CABM diz que o Regulamento ou Dec. Autônomo não é possível nunca, porque é um perigo para o exercício da democracia – segundo ele, o regulamento é ato inferior, subordinado e dependente da lei, não podendo criar direitos ou restrições à liberdade, propriedade e atividades dos indivíduos que já não estejam estabelecidos e restringidos na lei.

Os defensores da impossibilidade do decreto autônomo no ordenamento jurídico pátrio não admitem que o art. 84, VI, CR/88 confira ao PR uma esfera de liberdade que excepcione a sua vedação. Alegam que a disciplina, resultante do exercício dessa competência, não poderá implicar imposição de obrigações a terceiros, sob pena de violação à legalidade. Segundo CABM, é preciso ter cuidado com os enganos que concedem mais poderes ao Executivo do que os previstos na CR, que podem colocar em risco a nossa própria democracia nacional.

O STF decidiu esta questão, afirmando que o Dec. Autônomo é possível sim, mas somente em caráter excepcionalíssimo.

Apesar da doutrina ainda divergir, a melhor aceitação é, portanto, a do texto legal – hipóteses previstas no art. 84, VI, a e b, CR:

a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; e

b) extinção de funções ou cargos públicos quando vagos.

De se ressaltar, ainda, que o Poder Regulamentar se expressa – além dos regulamentos, que são de competência do Chefe do Poder Executivo – por intermédio de resoluções, portarias, deliberações, instruções e os regimentos, editados por diversas autoridades, inclusive de escalões mais baixos. Todos esses atos estão sujeitos a limites e estabelecem normas que têm alcance restrito ao âmbito de atuação do órgão expedidor, é dizer, não têm o mesmo alcance nem a mesma natureza que os regulamentos. É tranqüila a subordinação desses atos à lei, assim como aos próprios regulamentos.

Os atos normativos estão sujeitos a controle do Poder Legislativo, quando se tratar de atos normativos editados pelo Poder Executivo, podendo o CN sustá-los quando exorbitarem o seu poder regulamentar, retirando sua eficácia, nos termos do art. 49, V, CR/88.

Esses atos também podem ser controlados pelo Poder Judiciário, quando no exercício do controle de constitucionalidade, que abrange tanto a lei quanto os demais atos normativos.

A jurisprudência reconhece, ainda, a possibilidade de controle pelo Poder Judiciário quando o ato administrativo abstrato, no exercício do poder regulamentar, produzir efeitos

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concretos e contiver em sua concepção uma ilegalidade, admitindo-se, inclusive, a discussão via MS.

Importante também é o controle realizado pelo Judiciário em razão da omissão, previsto no art. 5º, LXXI e art. 103, §2º, CR, o que se faz por meio de MI ou da ADI por omissão, lembrando-se que, quando a ausência for de ato legislativo, será feita a comunicação ao Poder competente para as devidas providencias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em 30 dias.

(Caderno da Raquel Carvalho)

O Poder Regulamentar estaria inserido na função administrativa. Atualmente, porém, deve-se atentar para o fato de que há vários atos regulatórios da AP, além da função normativa. O poder normativo diz respeito à função normativa, que é gênero do qual são espécies a função legislativa, a função regulamentar e a função regulatória.

Atenção para o seguinte quadro:

Ato editado Quanto à inovação Competência DiscricionariedadeFunção

legislativaLei Inova (em regra) Poder legislativo Política

Função regulamentar

Regulamento (veiculado por

decreto)

Não inova (em regra – exceção: art. 84,

VI, a e b, CR)

Chefe do Executivo

Política

Função regulatória

Circulares, portarias, instruções, resoluções,

deliberações, atos regulatórios.

Não inova (em regra – exceção: ADC 12 –

CNJ/CNMP)

Autoridades administrativas,

órgãos e entidades administrativas

Técnica

- Lei é ato normativo primário.- Regulamento é ato normativo secundário.

A regra no direito brasileiro é a de que não há decreto/regulamento autônomo (cujo fundamento de validade decorra diretamente da CR, porque primeiro se deve passar pela lei). Porém, veio o disposto no art. 84, VI, a e b, CR, que permite ao PR sozinho fazer este regulamento, o decreto autônomo, que não será ato normativo secundário, mas sim ANP. O STF entendeu que isso não ofende a reserva legal, admitindo, pois, a existência desse decreto autônomo no ordenamento jurídico brasileiro.

Administrativização da função normativa: deslocou-se boa parte da edição das regras para a AP. para que ocorresse esse fenômeno deveria ocorrer a deslegalização, que é a retirada da seara normativa da lei para outras searas. Ela é possível ou não? Correntes:

a) Sim – com fundamento na CR/1988 (artigo 103-B, § 4º, inciso I – CNJ; artigo 130-A, inciso I – CNMP). CNJ e CNMP exercem poderes em outras esferas federativas (além da federal). ADC 12 – MC – as resoluções do CNJ são atos normativos primários. Ex.: Resolução 7 do CNJ.

b) Não, se não há previsão expressa na CR. A idéia de reserva legal relativa passa a ser trabalhada.A inovação primária/básica está na lei, mas os aspectos da discricionariedade técnica (especificação

técnica da AP – aspectos do conteúdo técnico) podem vir estabelecidos nos atos regulatórios (circulares, portarias, instruções, etc.). O ato regulatório especifica o que é necessário para que se utilize das inovações da lei. O preenchimento das especificidades técnicas consiste na pormenorização da lei. Isso não significa inovar.

Teoria do “Loi Codre”: a lei é o quadro; a pintura (preenchimento das especificidades técnicas) não é inovação – a lei que inovou, a discricionariedade técnica só preencheu o conteúdo já inovado pelo veículo adequado, que é a lei.

Atenção: os arts. 103-B e 130-A da CR falam erroneamente em poder regulamentar, ao invés de regulatório.

Ato regulatório: que ofende a lei, submete-se ao controle de legalidade; que se pretende lei, ofende a reserva legal e submete-se ao controle concentrado de constitucionalidade.

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• Poder Hierárquico:

CABM prefere chamar de “Poder do Hierarca”.O poder hierárquico é conferido ao administrador a fim de distribuir e escalonar as

funções dos seus órgãos, ordenar e rever a atuação de seus agentes, estabelecendo uma relação de hierarquia, de subordinação.

O poder hierárquico é , pois, uma prerrogativa que representa o exercício da hierarquia.Utilizando este poder, é possível estruturar, escalonar, hierarquizar os quadros da AP

(criando a própria hierarquia da AP), definindo quem manda e quem obedece, quem é chefe e quem é subordinado.

A organização administrativa é baseada em dois pressupostos fundamentais: distribuição de competências e hierarquia.

Estabelecida a hierarquia, o administrador chefe pode dar ordens, no exercício do poder hierárquico. Além disso, também no exercício desse poder, o administrador pode delegar e avocar funções; bem como fiscalizar, controlar a atuação dos seus subordinados.

O chefe tem também, a possibilidade de fazer a revisão dos atos de seus subordinados. Nesse exercício, se verificada uma infração funcional, o administrador deverá punir, aplicar sanção por infração funcional, no exercício do poder hierárquico, mas também no exercício do poder disciplinar, que é decorrência do primeiro. O poder disciplinar, portanto, é resultado, é conseqüência do poder hierárquico.

É relevante diferenciar hierarquia de vinculação. Hierarquia é uma relação interna que ocorre nos diversos órgãos, dentro de uma mesma pessoa jurídica, tipificando uma relação hierárquica. A vinculação, por sua vez, é uma relação que ocorre entre os entes da AP Direta e Indireta, não tipificando hierarquia, tratando-se tão somente de um controle de legalidade, seja em face de suas finalidades ou do cumprimento de regras orçamentárias quanto às receitas ou despesas, além de outros aspectos legais.

A hierarquia é uma característica peculiar da função administrativa, independentemente do poder que a exerce. Entretanto, inexiste esse mesmo aspecto quando se trata de agentes no exercício da função jurisdicional ou legislativa. No caso de agentes no exercício de função jurisdicional, aplica-se o princípio do livre convencimento do juiz, agindo este com independência perante os demais órgãos do Judiciário. É oportuno lembrar que a EC 45/05 acabou mitigando essa liberdade, quando definiu as chamadas súmulas vinculantes, exigindo que os órgãos do Judiciário decidam em conformidade com a orientação contida na súmula, o que, de certo modo, não deixa de ser um caráter hierárquico. Já no caso da função legislativa, o exercício é orientado por uma repartição constitucional de competência, definindo as atribuições de cada ente da federação, não existindo qualquer poder de comando de uma ordem política em face da outra e, se desrespeitado o campo de atuação de cada ente, a norma será inconstitucional.

• Poder Disciplinar:

É, basicamente, a possibilidade de aplicação de sanção por infração funcional, ou seja, em caso de infração no exercício de uma função pública.

O poder disciplinar conferido à AP lhe permite punir, apenar a prática de infrações funcionais dos servidores e de todos que estiverem sujeitos à disciplina dos órgãos e serviços da AP, como é o caso daqueles que com ela contratam.

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Ele atinge aqueles que estão exercitando, praticando uma função pública. Não abrange as infrações cometidas fora da função. A punição é aplicada àqueles que estão na intimidade da Administração.

Atenção: a independência funcional dos magistrados e membros do MP não afasta o exercício do poder disciplinar.

É de suma importância ressaltar que esse poder não abrange as sanções impostas aos particulares, já que eles não estão sujeitos à disciplina interna da AP e, nesse caso, as medidas punitivas encontram seu fundamento no Poder de Polícia do Estado.

Quanto aos servidores públicos, a possibilidade de aplicação de sanção decorre da existência de hierarquia, afinal a disciplina decorre do sistema hierárquico da AP.

Da mesma forma, admite-se a aplicação de penalidade por infração para os membros do MP e os Magistrados. Apesar de inexistir hierarquia quanto ao exercício de suas funções institucionais, essa penalidade existe no tocante ao aspecto funcional da relação de trabalho, ficando os seus membros sujeitos à disciplina interna da instituição.

O poder disciplinar é discricionário ou vinculado? HLM afirmava que o poder disciplinar é discricionário. Atualmente o melhor a se afirmar é que em regra ele é um poder discricionário, mas é uma questão bastante discutida na doutrina moderna. Hoje não se pode dizer que o poder disciplinar é absolutamente discricionário.

A partir do momento em que fica provado que a infração aconteceu, a escolha da sanção para esta conduta é uma decisão vinculada e não discricionária. O administrador, ao aplicar a pena, não terá liberdade.

Ademais, a AP não tem liberdade de escolha entre punir ou não: uma vez tendo conhecimento da infração, tem a obrigação de instaurar o processo administrativo disciplinar. Trata-se, portanto, de ato vinculado, sob pena de prática de crime de condescendência criminosa (art. 320, CP) e improbidade administrativa (art. 11, II, Lei 8.429/92). Entretanto, a discricionariedade existe limitadamente em alguns aspectos de sua aplicação, tendo em vista que os estatutos dos servidores não estabelecem regras rígidas como as que se impõem na esfera criminal, sem contar que a lei costuma dar à AP o poder de levar em consideração, na escolha da pena, a natureza e a gravidade da infração e os danos que dela provierem para o serviço público.

Pra completar, a lei, em inúmeras circunstancias, estabelece expressões imprecisas, os chamados conceitos indeterminados, conceitos vagos, como por ex. “conduta escandalosa”, “procedimento irregular”, “ineficiência do serviço”, ou “falta grave”. Nesses casos, a lei acabada deixando para a AP a possibilidade de enquadrar os casos concretos em uma ou outra infração. Não é possível definir com exatidão o que representa tais expressões; depende de cada caso concreto, é preciso, pois, fazer um juízo de valor. Assim, definir a conduta escandalosa é uma decisão discricionária, observando-se, é claro, a proporcionalidade e a razoabilidade.

De se ressaltar, ainda, que nenhuma penalidade poderá ser aplicada sem prévio procedimento legal, respeitados o contraditório e a ampla defesa.

Não se deve confundir a natureza jurídica dos ilícitos penais, civis e administrativos. Sendo assim, diante de um caso concreto será possível a tipificação dos 3 ilícitos, isto é, uma mesma conduta poderá configurar um ilícito civil, administrativo e penal, admitindo-se a instauração dos 3 processos com competências diferentes, os quais se submetem à regra da independência das instancias, salvo casos excepcionais.

Por fim, de se dizer, ainda, que o poder disciplinar também está sujeito ao controle pelo Judiciário, sempre que a conduta do administrador contrariar a regra legal.

(03/10/08)

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• Poder de Polícia:

Apesar do nome, não está ligado à atividade da Polícia. Significa um equilíbrio, uma compatibilização dos interesses com o bem estar social (o que quer o interesse coletivo + o que quer o interesse individual).

Para HLM, significa um instrumento conferido ao administrador que lhe permite condicionar, restringir, limitar, frenar o exercício de atividade e o uso e gozo de bens e direitos pelo particular em nome do interesse público.

É possível conceituar Poder de Polícia como a atividade da AP que se expressa por meio de atos normativos ou concretos, com fundamento na supremacia geral e, na forma da lei, de condicionar a liberdade e a propriedade dos indivíduos mediante ações fiscalizadoras, preventivas e repressivas, impondo aos administrados comportamentos compatíveis com os interesses sociais sedimentados no sistema normativo.

O CTN estabelece todo o conceito e demais detalhes sobre o exercício do Poder de Polícia.

☺art. 78, CTN: “Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do poder público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos”.

Este conceito aparece de forma expressa no CTN porque em matéria tributária o Poder de Polícia tem grande relevância, visto que possibilita a cobrança de uma espécie tributária, a taxa de polícia, sendo o seu fato gerador.

Atenção: a taxa de polícia se distingue da taxa de serviço, já que a taxa de polícia é cobrada no custo da diligência, é vinculada ao preço da diligencia (ex.: licença para construir).

Não obstante a definição dada pelo CTN, a doutrina alerta que a atuação do Poder de Polícia não representa limitações administrativas ao direito de propriedade e ao direito de liberdade, uma vez que essas restrições integram o desenho do próprio perfil do direito, fazendo parte da definição dessa garantia constitucional e definindo os seus contornos.

Em alguns casos, esses direitos individuais já se encontram plenamente delineados pela lei, devendo a AP, nessa hipótese, assegurar-lhes o respeito, fiscalizando a sua observância e impedindo qualquer violação. Em outros casos, a lei incumbe ao administrador averiguar, no caso concreto, a efetiva extensão que possuem, em razão da definição legal, genérica e imprecisa. Nesse caso, a AP não restringe nem limita o âmbito de tais direitos; somente aplica a vontade da lei, visando a compatibilizá-lo com o bem-estar social.

O fundamento para o exercício deste instrumento é o Princípio da Predominância do Interesse Público sobre o particular, que dá à AP posição de hegemonia sobre os administrados, caracterizando-se como exercício da supremacia geral, o que autoriza a sua atuação indistintamente sobre todos os cidadãos que estejam sob o império das leis administrativas.

O poder de polícia pode ser preventivo, repressivo ou fiscalizador.

→ Características do Poder de Polícia:

f) ele representa a busca do bem estar social, a compatibilização dos interesses, regulando, disciplinando, basicamente, dois direitos: liberdade e propriedade (ex.: velocidade numa determinada avenida; licença para construir; limitação administrativa que estabeleça, por ex., que a beira mar só se pode construir até 8 andares, estabelecimento de regras sanitárias ou urbanísticas, etc.).

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g) dever de indenizar: o poder de polícia não tem caráter oneroso, não institui uma onerosidade, é só uma regulação; assim, se a AP só regula o uso da propriedade ou liberdade, sem instituir uma obrigação, impedir o exercício do direito ou gerar uma onerosidade, não há o dever de indenizar. O Poder de Polícia não é impeditivo, oneroso e, por isso, não gera por si o dever de indenizar.

h) O exercício do Poder de Polícia não atinge diretamente às pessoas, mas sim os direitos, bens e interesses exercidos por essa pessoa.

i) Execução do poder de polícia: o Poder de Polícia pode se dar por meio de atos normativos, mas não só por eles. Também se encontra o exercício deste poder em atos punitivos (ex.: multa de trânsito por desrespeito à velocidade permitida na via; embargo de obra que desrespeitou regras urbanísticas, destruição de mercadoria por falta de documentação, etc.).

j) Espécies: o Poder de Polícia aparece tanto quando a AP normatiza, como quando aplica sanções punitivas. Este poder pode, pois, ser exercido no seu caráter preventivo (ex.: regulamentação do trânsito), pode ser fiscalizador (ex.: controle alfandegário, controle do cumprimento das regras sanitárias em uma empresa), ou pode ser ainda repressivo (ex.: multa de trânsito, demolição de uma obra).

k) O Poder de Polícia é negativo: na sua maioria estabelece uma abstenção (ex.: não construir acima de tantos andares, não ultrapassar certa velocidade, não descumprir regras sanitárias, etc.). Ou seja, traz um não fazer. Por isso a doutrina o chama de poder negativo, apesar de não ser sempre assim.

l) Fundamento para o exercício do Poder de Polícia: não existe entre a AP e o destinatário um vínculo jurídico, relação contratual; o Poder de polícia tem como fundamento a chamada “Supremacia Geral”, que é diferente da Supremacia Especial. A supremacia geral significa que a atuação do Estado independe de vínculo ou relação jurídica com o destinatário (como ocorre, por ex., em caso de concessões de serviços públicos, ou no em relação ao aluno matriculado e a escola pública). A supremacia geral se diferencia da especial porque esta última exige uma relação jurídica entre o Estado e o destinatário e a sanção decorrerá do contrato, da relação jurídica e não do exercício do Poder de Polícia. O Poder de Polícia só existe quando existir supremacia geral.

m) Delegação do Poder de Polícia: o administrador não pode delegar o Poder de polícia, a delegação do Poder de Polícia não é possível em nome da segurança jurídica (☺ADI 1717, que discute os Conselhos de Classe). O Poder de Polícia, por si só, não pode ser delegado. Mas e os atos materiais no exercício do Poder de Polícia, podem ser delegados? Existem os atos materiais anteriores ao exercício ou posteriores ao exercício do poder. Ex.: o particular (uma empresa privada) pode bater a foto do radar (já que este é um simples ato material), mas não pode aplicar a multa de trânsito. Ou seja, o simples ato material (ato material anterior, que é também chamado ato preparatório ou instrumental, ou mesmo o ato material posterior) pode ser delegado.

n) O exercício do Poder de polícia institui a chamada Polícia Administrativa, que se difere da polícia Judiciária. Na primeira o que se quer é a busca do bem estar social, enquanto nesta última se fala em controle, contenção e punição do crime. Quem exerce a Polícia Judiciária é um órgão especializado, uma corporação própria (Polícia Civil); quem exerce a Polícia Administrativa, por outro lado, pode ser exercida por qualquer órgão, dentro de sua finalidade e competência (todos os órgãos da AP podem proteger o bem estar social).

o) Atributos do Poder de Polícia: - Discricionariedade, em regra – ex.: autorização (mas excepcionalmente o

Poder de Polícia pode ser vinculado – ex.: licença, preenchidos os requisitos a AP está obrigada a conceder);

- Auto-executoriedade: a AP pode executar o Poder de Polícia sem a presença do Poder Judiciário; a auto-executoriedade dispensa o controle pelo PJ,

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mas não o impede (ele pode controlar no que tange à legalidade do ato). A auto-executoriedade, contudo, não dispensa o formalismo. Atenção: o Poder de Polícia não é sempre auto-executável (em caso de sanção pecuniária, por ex., não há como dispensar a influência do PJ). Parte da doutrina divide a auto-executoriedade em: exigibilidade (é o poder de decidir sem o PJ, todo ato administrativo tem exigibilidade, é natural do ato) e executoriedade (é a execução do que foi decidido – ex.: após a aplicação da multa, a AP não pode ir atrás do patrimônio daquele que não pagou a multa – a executoriedade só pode aparecer quando estiver prevista em lei ou quando se tratar de uma situação urgente, caso contrário é preciso a intervenção do PJ – no caso da sanção pecuniária a regra é justamente a não executoriedade). Assim, nem toda atuação do Poder de Polícia é auto-executável, já que a auto-executoriedade depende de duas bases, exigibilidade e executoriedade, e nem todo ato tem executoriedade;

- Imperatividade ou Coercibilidade: significa que o ato no exercício do Poder de Polícia é imperativo, impositivo, imperatório, coercitivo.

→ Exemplos de poder de polícia: Polícia Edilícia; Polícia de caça e pesca; Controle de divertimentos públicos, de trânsito e tráfico, pesos e medidas; Polícia Sanitária; Polícia de Medicamentos.

• Quadro Sinóptico:

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- Poderes Administrativos são elementos indispensáveis para a persecução do interesse público. Surgem como instrumentos, por meio dos quais o Poder Público irá perseguir esse interesse.- Características: trata-se de um poder-dever e não mera faculdade. São irrenunciáveis, estão condicionados aos limites legais, inclusive quanto à regra de competência, devendo a autoridade ser responsabilizada em caso de abuso de poder, seja por conduta comissiva ou omissiva.

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- Poder Vinculado ou regrado é aquele que estabelece um único comportamento possível a ser tomado pelo administrador diante de casos concretos, sem nenhuma liberdade para um juízo de conveniência e oportunidade.- Poder Discricionário é aquele em que o administrador tem liberdade para atuar de acordo com um juízo de conveniência e oportunidade, de tal forma que, havendo duas alternativas, ele pode optar por aquela que, no seu entendimento, preserva melhor o interesse público. Também está subordinado à lei, diferenciado do arbitrário que é praticado contrário à lei.

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- Ou Poder Normativo, é o poder conferido ao administrador, em regra chefe do PE, para a edição de normas complementares à lei, permitindo a sua fiel execução.- O exercício do poder normativo poderá efetivar-se por intermédio de atos legislativos ou atos administrativos, como os regulamentos, sendo ambos abstratos e gerais, mas com diferenças marcantes quanto à sua origem, processo de elaboração, posição hierárquica da lei, em face do regulamento, e a possibilidade desta de inovar o ordenamento jurídico.- Os regulamentos podem ser executivos, o que é a regra, ou autônomos. Aqueles complementam a lei, enquanto estes exercem o próprio papel da lei independentemente de sua existência anterior (e no Brasil discute-se muito a sua possibilidade).- Pode ser praticado por regulamentos, resoluções, instruções, portarias, etc.- Esses atos estão sujeitos a controle, seja pelo PL ou pelo PJ, inclusive quanto à omissão. Também é possível a imputação de crime de responsabilidade ao PR (art. 85, VII).

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- É o conferido ao administrador para distribuir e escalonar as funções dos seus órgãos, ordenar e rever a atuação de seus agentes, estabelecendo uma relação de hierarquia, de subordinação, o que é peculiar da função administrativa do Estado.- Efeitos da hierarquia: poder de comando, dever de obediência, dever de fiscalização das atividades desenvolvidas por agentes de plano hierárquico inferior, poder de revisão dos atos praticados pelos subordinados, possibilidade, em caráter excepcional, de delegação e avocação de suas atribuições.

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- O poder disciplinar conferido à AP lhe permite punir, apenar a prática de infrações funcionais dos servidores e de todos que estiverem sujeitos à disciplina dos órgãos e serviços da AP, como é o caso daqueles que com ela contratam.- Este poder decorre da existência de relação hierárquica, portanto não admite a aplicação de penalidade aos particulares.- Para muitos, trata-se de um poder discricionário, entretanto essa não é regra absoluta.

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ia:

- É a atividade da AP que se expressa mediante atos normativos ou concretos, com fundamento na supremacia geral e na forma da lei, com objetivo de condicionar a liberdade e a propriedade dos indivíduos por meio de ações fiscalizadoras, preventivas e repressivas, impondo aos administrados comportamentos compatíveis com os interesses sociais, sedimentados no sistema normativo. ☺Conceito similar no art. 78, CTN.- Esse poder se expressa, quando no caráter preventivo, por meio de leis ou atos normativos, como é o caso dos regulamentos e portarias, e por injunções concretas quando em seu caráter repressivo e fiscalizador.- O exercício desse poder exige proporcionalidade entre a medida adotada e a finalidade legal a ser atingida, bem como a proporcionalidade entre a intensidade e a extensão da medida aplicada, além da exigência de ser a medida eficiente.- Delegação: para a maioria, o poder de polícia é indelegável, sob pena de causar uma instabilidade social, admitindo-se possível, em circunstancias excepcionais, somente quando se tratar de ato material preparatório ou sucessivo a ato jurídico de polícia, hipótese que deve ser analisada com inúmeras limitações e ressalvas.- Atributos: a discricionariedade, a auto-executoriedade e a coercibilidade.- Controle: os atos de polícia administrativa são atos administrativos e, como tais, submetem-se aos controles vigentes, tanto ao controle administrativo, quanto ao judicial.- Distinção: polícia administrativa não pode ser confundida com polícia judiciária. A primeira visa ao bem-estar social, incidindo sobre bens, direitos ou atividades dos particulares, caracterizando ilícito puramente admnistrativo, podendo ser exercida por diversos órgãos da AP. de outro lado, a polícia judiciária visa à proteção da ordem pública, incidindo sobre pessoas, punindo o ilícito penal, sendo regida pela legislação penal e processual penal, e seu exercício é privativo das corporações especializadas como é o caso da polícia civil.

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- Deveres do administrador: principalmente o dever de eficiência o dever de probidade e o de prestar contas, além de muitos outros.- Uso e abuso do poder: usar normalmente o poder é uma prerrogativa; é empregá-lo segundo as normas legais, a moral da instituição, a finalidade do ato e as exigências do interesse público, devendo ser utilizado sempre em benefício da coletividade administrativa. No entanto, nem sempre o administrador utiliza adequadamente esses instrumentos, caracterizando o que se denomina abuso de poder, levando à ilegalidade do ato praticado. São formas de abuso de poder: o excesso de poder que ocorre quando o agente exorbita no uso de usas faculdades administrativas, e o desvio de finalidade que se verifica quando o agente público, embora dentro de sua competência, afasta-se do interesse público ou da finalidade prevista na lei para a prática do ato.

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ATO ADMINISTRATIVO:ATO ADMINISTRATIVO:

• Conceitos Gerais:

Para conceituar ato administrativo é necessário entender alguns conceitos preliminares, tais como: fato, ato, fato jurídico, fato da administração, ato da administração e as suas divergências e distinções.

Fato é um acontecimento do mundo em nós vivemos. Ex.: nascimento, morte, etc.Este acontecimento pode ou não atingir a órbita do Direito. Se isso ocorrer, chamaremos

este fato de Fato Jurídico (acontecimento que produz efeitos para o mundo jurídico). Ex.: nascimento de alguém, que faz nascer uma nova personalidade jurídica, novos direitos, novas relações de parentesco, etc.

Se o acontecimento atingir uma fatia específica do mundo jurídico, o Direito Administrativo, este acontecimento será chamado de Fato Administrativo. Assim, o fato administrativo nada mais é do que aquele fato que, além de atingir a órbita do Direito, atinge tb o Direito Administrativo. Ex.: falecimento de um servidor público que acarreta a vacância do cargo, que gera nova investidura, etc; chuva abundante que atinge um bem público, etc.

De outro lado encontramos o Ato.Sempre que se fala em ato se fala em manifestação de vontade. O ato significa uma

manifestação de vontade. Esta manifestação de vontade pode ou não produzir efeitos para o mundo jurídico. Quando esta manifestação de vontade atingir o mundo jurídico, será chamada de Ato Jurídico. Quando, por sua vez, esta manifestação atingir especificamente o Direito Administrativo, será chamada Ato Administrativo, que é exatamente a manifestação de vontade que produz efeitos no Direito Administrativo. Ex.: desapropriação.

Atenção: Atos Administrativos são chamados de atos ajurídicos por Giógenes Gasparini. São os Fatos Administrativos. A simples execução do trabalho pelo servidor (ex.: ministrar uma aula na universidade) são meras condutas administrativas, meros trabalhos dos agentes públicos, não são manifestação de vontade e sim mero ato material, que está dentro do conceito de fato administrativo (e não de ato administrativo). O simples ministrar uma aula, por ex., não traz um efeito jurídico específico (como ocorre por ex. no caso de uma desapropriação, que acarreta a aquisição da propriedade). Mas isso não significa que a conduta não gere direitos (até porque gera o direito ao salário, a contagem de tempo para a aposentadoria, etc.), só não gera um efeito jurídico específico. Exemplos de fatos administrativos: digitar um ofício, ministrar uma aula, condução de uma viatura pública, etc.

→ Diferenças entre ato e fato:

Ato Administrativo: Fato Administrativo:- Tem manifestação de vontade;- É passível de anulação (quando ilegal) ou de revogação (quando inconveniente);- Goza de presunção de legitimidade;

- Não tem manifestação da vontade;- Não é passível de anulação ou de revogação;- Não goza de presunção de legitimidade (ou o fato acontece ou não acontece);

→ Questão: todo ato que a AP pratica é ato administrativo? Não.Se houve manifestação de vontade por parte da AP, será Ato da Administração. Ou seja,

quem fez foi a Administração, foi por manifestação de vontade dela.

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Mas a AP pode manifestar sua vontade seguindo dois regimes: público e privado. Assim, temos os atos da AP regidos pelo direito privado e os atos da AP regidos pelo direito público.

Resumindo: ato da administração pode ser conceituado como todo ato praticado pela AP, mais especificamente pelo Poder Executivo, no exercício da função administrativa, podendo ser regido pelo direito público ou pelo direito privado.

Exs.: contrato de locação celebrado pela AP tem regime de direito privado (que, no entanto, não dispensa o dever de licitar – não esquecer!); contrato de concessão de transporte coletivo celebrado pela AP, por sua vez, segue o regime público.

Os atos da administração podem ser:a) atos privativos da Administração, como, por ex., a doação, a permuta, a compra e venda e a locação;b) atos materiais: que são condutas que não contêm manifestação de vontade, consistindo apenas em uma execução, cmo a demolição de uma casa, a apreensão de mercadoria, a realização de um serviço, configurando fatos administrativos e não atos administrativos;c) atos administrativos.

Quando o ato praticado pela AP é regido pelo regime público ele será chamado também de Ato Administrativo. Ou seja, ato administrativo é o ato da AP sujeito ao regime público. Ele não deixa de ser ato da Administração, mas será também chamado Ato Administrativo, nome que está ligado ao regime público ao qual se sujeita o ato.

Mas quando, por ex., a empresa (privada) de telefonia corta o serviço por inadimplemento do usuário, este ato não foi feito pela Administração e, portanto, não é ato da Administração. Mas vai seguir o regime público e, assim, será Ato Administrativo (ex.: concessionárias e permissionárias, que praticam atos administrativos, mas que estão fora da AP). Ou seja, os nossos atos administrativos existem tanto dentro como fora da Administração.

Resumindo: ficam excluídos desse conceito de atos da administração os atos administrativos não praticados pela AP, como é o caso de alguns atos praticados por concessionárias. Portanto, a noção de ato administrativo não depende da noção de AP, porque acontecem atos administrativos dentro e fora da AP.

Conseqüentemente, existem atos administrativos que não são atos da administração, porque não foram praticados pelo Poder Executivo, tais como os praticados pelos PJ e PL, quando no exercício de sua função administrativa atípica, ou ainda, segundo alguns doutrinadores, certos atos praticados por concessionários e permissionários de serviços públicos, quando regidos pelo direito público, o que é bastante discutível.

Em resumo, é possível concluir que são atos da administração os praticados pela Administração, assim entendidos os atos praticados por órgãos do PE e entes da AP Indireta, que podem ser regidos pelo direito público ou privado. Quando regidos pelo direito público, esses atos são, ao mesmo tempo, atos administrativos e atos da administração. Entretanto, os atos administrativos também podem ser praticados fora da Administração, ficando claro que atos da administração e atos administrativos são conceitos coincidentes, que se encontram, mas não sobreponíveis (eles se encontram, têm um ponto de coincidência, mas não se encaixam perfeitamente, um sobre o outro).

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Há, aqui, 3 diferentes situações:1) atos que são só atos da Administração (regime privado): praticados pelo Poder

Executivo, podendo ser atos materiais, atos privados ou atos públicos (= atos administrativos);2) atos da administração e, ao mesmo tempo, atos administrativos: são atos da

administração porque foram praticados pelo Poder Executivo, e são atos administrativos porque são regidos pelo direito público.

3) só atos administrativos (não praticados pela AP, mas que seguem o regime público).

• Conceito de Ato Administrativo:

Elementos conceituais:

- manifestação de vontade – por parte do Estado ou de quem o represente (entidades que prestam serviços em nome do Estado, como as concessionárias e permissionárias; serviço notarial, etc.);- criação, modificação ou extinção de direitos;- perseguição do interesse público;- submissão ao regime jurídico público;- inferioridade e complementariedade à lei;- sujeição ao controle pelo Poder judiciário (no que tange à legalidade).

Assim, ato Administrativo é a manifestação do Estado ou de quem o represente, que crie, modifique ou extinga direitos, perseguindo o interesse público, sendo inferior e complementar à lei e estando sujeito ao controle pelo PJ.

HLM chamava o ato que preenchesse tais requisitos como ato administrativo em sentido amplo. Segundo ele o ato administrativo em sentido estrito teria todos esses elementos e mais dois outros: ser unilateral e ser concreto (fica de fora o ato bilateral e o ato abstrato).

Ato Administrativo em sentido estrito, por sua vez, é a manifestação do Estado ou de quem o represente, que crie, modifique ou extinga direitos, perseguindo o interesse público, sendo inferior e complementar à lei e estando sujeito ao controle pelo PJ, desde que unilateral e concreta.

• Elementos ou Requisitos do Ato Administrativo:

Quando se fala em elementos ou requisitos, uma é a posição da doutrina majoritária e outra é a colocação de CABM.

Aqui estudaremos como CABM organiza esta estrutura, pois é uma classificação muito cobrada nas provas atuais, apesar de não ser a posição majoritária.

Segundo a maior parte da doutrina os elementos ou requisitos do ato são os previstos na Lei da Ação Popular (Lei 4.717/65), art. 2º, que busca a nulidade de um ato quando da ausência de um desses elementos. Os 5 elementos do ato enumerados pela Lei de Ação Popular são:

1) Sujeito competente,2) Forma,3) Motivo,4) Objeto,5) Finalidade.

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Faltando um desses elementos discutir-se-á a validade desse ato, por vício em um de seus elementos.

CABM, porém, discorda dessa divisão, justificando que o termo elemento sugere a idéia de parte componente de um todo, sendo esse conceito incompatível com alguns dos elementos apontados acima, já que nem todos podem ser considerados partes do ato, porque são aspectos exteriores a ele, como é o caso do motivo e da finalidade. O autor, diz que nem tudo que o ato precisa pode ser chamado de elemento. Há coisas internas ao ato, que são sim seus elementos. Mas existem regras externas ao ato e que não podem ser chamados de elementos do ato, devendo ser denominados pressupostos. Para ele, portanto, há dois grupos: elementos e pressupostos do ato administrativo. São eles (exemplos - ☺ material de apoio):

1) Elementos: é o que é necessário para que o ato exista para o mundo jurídico, o que é condição para a existência do ato jurídico, ou seja, na sua ausência não existirá ato algum. Ex.: a exteriorização da vontade.

2) Pressupostos: se subdividem em:a) pressuposto de existência: condição para a existência do ato

administrativo, são condições para que o ato administrativo se concretiza, caso contrário teríamos somente um ato jurídico que não atinge a órbita do Direito Administrativo. Ex.: assunto que persiga o interesse público (assunto relevante em Direito Administrativo).

b) pressupostos de validade: são os requisitos, condição para que o ato jurídico que existe no âmbito administrativo seja também válido (condição de validade do ato) – o ato administrativo deve obedecer aos requisitos legais, sob pena de ser retirado do ordenamento jurídico pelo instituto da invalidação. Ex.: publicação em DO (formalidade para um ato específico).

• Quadro Comparativo:

Para CABM: Para a maioria da doutrina:

ElementosExteriorização da vontade FORMA

Conteúdo – é a decisão OBJETOPressuposto

s de existência

Objeto – é o assunto sobre que o ato dispõe OBJETOPertinência o ato ao exercício da função

administrativa----------

Pressupostos de

validade

Pressuposto subjetivo – sujeito (o produtor do ato)

SUJEITO COMPETENTE

Pressuposto objetivo – motivo (fato que autoriza ou exige a prática do ato)

MOTIVO

Pressuposto objetivo – requisitos procedimentais (procedimento administrativo

que antecede o ato)

FORMA

Pressuposto lógico – finalidade FINALIDADEPressuposto lógico – causa (é o vínculo de

pertinência entre o motivo o conteúdo)MOTIVO

Pressuposto formalístico – formalização (formalidade específica para a prática do ato)

FORMA

Apesar de toda a divergência decorrente da terminologia e da forma de distribuir cada uma das exigências do ato administrativo, a sua enumeração não é um assunto tão tormentoso,

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tendo em vista que a maioria dos doutrinadores utiliza os mesmos elementos ou requisitos, formando-se uma doutrina majoritária.

Passemos, então, ao estudo desses elementos:

- Sujeito Competente ou Competência:

→ Existem uma série de condições para ser sujeito de um ato administrativo:

- o sujeito competente deve necessariamente ser um agente público (conceito amplo – é todo aquele que exerce uma função pública, de forma temporária ou permanente, com ou sem remuneração);

- o agente deve ser capaz (Obs.: ato praticado por um louco – se o ato era vinculado, o ato será válido; se o ato era discricionário o juízo de valor estará comprometido e o ato será inválido), bem como o ente ao qual ele pertence também o deve ser;

- o agente não pode infringir regras quanto ao impedimento e suspeição (ex.: parente de candidato na banca de concurso), ou seja, não deve existir nenhum óbice à sua atuação no caso concreto, como um afastamento legal, um impedimento, etc. Obs.: a regra legal aplicável é a prevista no ordenamento jurídico como um todo, visto que em Direito Administrativo não há legislação específica sobre isso;

- ser competente – a fonte da competência é a lei, ou seja, a regra de competência está prevista na lei; muitas vezes algumas regras de competência vêm previstas na CR, mas a sua maioria vem disposta em lei – além da aptidão para a realização de atos administrativos, o seu exercício deve estar previsto na órbita de competência do agente. Entende-se por competência o conjunto de atribuições das pessoas jurídicas, órgãos e agentes, fixados pelo direito positivo, representando a esfera de atuação do agente; é o círculo definido por lei dentro do qual podem os agentes exercer legitimamente sua atividade.

→ Características da Competência Administrativa:

A competência administrativa é de exercício obrigatório. Portanto, exercitá-la não é livre decisão de quem a titulariza; trata-se de um poder-dever, uma obrigação do administrador. Quem decide é a lei. O administrador não pode renunciar, abrir mão dessa competência.

A competência administrativa, assim, é irrenunciável e também imodificável (já que quem a determina é a lei).

O agente público exerce função pública, isto é, exerce atividade em nome e interesse do povo, sendo inadmissível, em virtude do princípio da indisponibilidade do interesse público, que o administrador público abra Mao de algo que não lhe pertence. Ademais, aplica-se ainda o princípio geral do direito segundo o qual “o administrador de hoje não pode criar obstáculos para o administrador de amanhã”, o que naturalmente ocorreria em caso de renúncia, tendo em vista que o agente do futuro não teria mais esse instrumento para perseguição do interesse público. E, ainda, a Lei 9.784/99, em seu art. 11 veda expressamente a renúncia nestes termos: “A competência é irrenunciável e se exerce pelos órgãos administrativos a que foi atribuída como própria, salvo os casos de delegação e avocação legalmente admitidos”.

Ademais, a competência administrativa não admite transação, negociação, acordo, não sendo possível repassá-la a outrem, salvo quando expressamente autorizado por lei. E mais, a competência é imodificável por ato de seu titular, não podendo o administrador, por intermédio de ato administrativo, dilatá-la ou restringi-la, considerando que sua fonte definidora é a lei, logo, um ato superior na estrutura do ordenamento jurídico.

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O não exercício da competência não produz sua prescrição. Admite-se a prescrição de determinados atos, mas a competência administrativa, em si, é imprescritível, não sendo afetada pela prescrição. Trata-se de uma prerrogativa imprescritível, o que significa dizer que, mesmo quando não utilizada, independentemente do tempo, o agente continuará sendo o competente.

De acordo com o CPC, no caso de uma competência relativamente incompetente, se ninguém a alegar ocorre a prorrogação da competência, tornando-se competente. Ocorre que, em Direito Administrativo é diferente: não se admite prorrogação de competência administrativa, ela é improrrogável, ainda que não alegada. A incompetência não se transmuda em competência, ou seja, se um agente ou órgão público não tiverem competência para certa função, não poderão vir a tê-la posteriormente, pelas simples ausência de questionamento, a menos que a norma definidora seja modificada.

Quanto à delegação, é preciso entender: delegar é transferir, avocar é chamar a responsabilidade. ☺arts. 11 a 15, Lei 9.784/99.

A delegação, bem como a avocação, são possíveis, quando legalmente autorizadas, em caráter excepcional e por motivos relevantes, por isso precisam ser justificadas.

A delegação de competência normalmente é realizada para agentes de plano hierárquico inferior, todavia, a lei também a admite para o mesmo plano hieráruqico quando não existirem impedimentos, sendo conveniente em razão de circunstancias de índole técnica, social, econômica, jurídica ou territorial. Assim, pode-se afirmar que antigamente, antes da Lei 9.784/99, a delegação e a avocação estavam ligadas à hierarquia. Hoje, porém, percebemos que a hierarquia não é mais um pré-requisito, admite-se delegação e avocação independentemente da existência de hierarquia.

O ato de delegação exige publicação oficial e deverá especificar as matérias e os poderes transferidos, definindo os limites de atuação do delegado, a duração e os objetivos da delegação, além dos recursos cabíveis e demais ressalvas que o delegante entender convenientes.

A lei pode proibir a delegação de algumas funções, tornando inválidos os atos de delegação e os demais atos praticados em razão dessa ilegalidade pela autoridade que a recebeu. Nesse sentido, ocorrem as proibições do art. 13 da Lei 9.784/99, que veda expressamente a delegação de atos com caráter normativo, de decisão de recurso administrativo ou quando as matérias são de competência exclusiva do órgão ou da autoridade. Assim, não é possível delegar competência administrativa quando: se tratar de competência exclusiva (na privativa ela é possível); se tratar de ato normativo, e em caso de decisão em recurso administrativo.

Ressalte-se, também, que o ato de delegação não retira a competência da autoridade delegante, que continua competente cumulativamente com a autoridade delegada.

O fenômeno da avocação, por sua vez, ocorrerá quando a autoridade delegnte atrai para a sua esfera de competência a prática do ato objeto da delegação, efetivando-se o caminho inverso. Importante ressaltar que, para a realização desse evento, pressupõem-se um sistema de hierarquia e a inexistência de competência exclusiva.

→ Critérios de divisão / distribuição de competência:

A norma definidora de competência poderá levar em consideração diversos fatores ou critérios. Assim, a distribuição de competência pode ser feita de acordo com a matéria, de acordo com o território, ou em razão da hierarquia (estrutura hierárquica), sempre observando a regra de competência que está na lei ou na Constituição.

(09/10/08)

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- Forma:

A forma do ato administrativo é a forma prevista em lei, ou seja, tem que estar prevista em lei.

→ Exigências / condições para que o ato administrativo produza efeitos no mundo jurídico:

a) exteriorização da vontade (o que CABM chama de elemento do ato): considerada como instrumento de sua projeção, representando elemento que integra a própria formação do ato e é fundamental para completar o seu ciclo de existência.

b) cumprimento das formalidades específicas (que CABM chama de pressuposto formalístico de validade): para que o ato administrativo seja válido não basta a manifestação da vontade, é preciso que seja realizada conforme as exigencias definidas pela lei, que são denominadas formalidades específicas do ato, cuja ausência gera vício de legalidade, com sua conseqüente invalidação – a regra geral para todo ato administrativo é a prática por escrito (e para tanto não é preciso lei), mas em algumas situações é possível a prática por outra maneira, desde que a lei autorize: ☺art. 60, P.U., Lei 8.666/93, que admite o contrato administrativo verbal (em caso de pronta entrega, pronto pagamento e de valor não superior a R$ 4.000,00); sinal de guarda de trânsito; etc. Obs.: o administrador, ao praticar o ato administrativo, deve obediência ao Princípio da Solenidade de Formas, o que se justifica com o interesse público que ele representa.

c) motivação: para completar as exigências da forma, a doutrina aponta, ainda, a motivação, enquanto correlação lógica entre o motivo o resultado do ato e a previsão legal.

Obs.: o silêncio administrativo significa um nada jurídico. Não significa nem que sim e nem que não. Segundo a doutrina majoritária, o silêncio administrativo não produz efeito algum, salvo se a lei determinar de forma expressa qual será o seu efeito. Esse silêncio administrativo, contudo, pode gerar a interposição de MS. O direito líquido e certo que sofreu lesão aqui neste caso será o direito de pedir e de obter uma resposta (direito de petição). Mas atenção, mesmo com a interposição do MS, o juiz não pode substituir o administrador, a decisão do administrador; deverá fixar um fato para que o administrador pratique o ato sob pena de multa diária, de pena por desobediência ou de outras medidas que entender conveniente. CABM, contudo, entende que no caso do ato estritamente vinculado (mera conferência de requisitos) o juiz poderia deferir o pedido no lugar do administrador, mas esta não é a posição majoritária.

O ato administrativo deve ser praticado dentro de um processo. Ele é, para o Direito Administrativo, o resultado de um processo. Assim, como condição de forma do ato administrativo, ele depende de um procedimento administrativo prévio, ou seja, um procedimento que vai culminar na prática de um ato administrativo. Assim, o processo, atualmente, entra como forma do ato administrativo, é o procedimento administrativo prévio.

O processo administrativo, segundo a CR, deve respeitar o contraditório e a ampla defesa, principalmente se este ato atingir a órbita de alguém. O procedimento, portanto, tem que respeitar o contraditório e a ampla defesa. Serve como um mecanismo de defesa, mas não só. Significa também um mecanismo de documentação, que serve para contar a história da AP (10 anos depois da prática do ato é possível saber porque o imóvel foi desapropriado, porque o servidor foi demitido, etc. – está tudo dentro de um processo).

O processo serve para legitimar a conduta do administrador. Ex.: inexigibilidade de licitação – o procedimento de licitação é substituído por um procedimento de justificação, mas sempre deve haver um procedimento, um processo.

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Vimos acima as condições para que o ato administrativo produza efeitos no mundo jurídico. Mas é comum, ainda como desdobramentos do elemento forma, se perguntar: a motivação dos atos administrativos é mesmo obrigatória?

Primeiro é importante ressaltar que motivo é diferente de motivação. Motivo significa fato + fundamento jurídico que leva à prática do ato; motivação, por sua vez, é a correlação lógica entre os elementos do ato administrativo e a lei (previsão legal), é a justificativa, a fundamentação que leva à prática do ato.

Para a doutrina majoritária a motivação é obrigatória. A doutrina minoritária (JSCF), segundo a qual a motivação é facultativa, fundamenta-se

em duas justificativas: a) art. 93, CR/88 (“os atos administrativos, praticados pelo PJ, devem ser motivados”), afirmando que quando o constituinte quis a motivação ele o disse expressamente, e ele só o fez para os atos administrativos do PJ; b) o art. 50, Lei 9.784/99 enumera uma lista de atos para os quais a motivação é obrigatória, significando que para os demais a motivação é facultativa (se o legislador quisesse que todos os atos fossem motivados, ele o teria dito).

Mas prevalece o entendimento de que a motivação é obrigatória, sob a justificativa de que o art. 93, CR/88 deve ser aplicado a todos os poderes, por analogia, e, além disso, essa doutrina afirma que a lista trazida pelo art. 50, Lei 9.784/99 é tão abrangente que inclui todo e qualquer ato administrativo, estando, pois, todos eles sujeitos à motivação. Assim, esta corrente derruba os argumentos da minoritária. Ademais, segundo eles, o titular do poder é o povo, os administradores são os nossos representantes e, se o poder emana do povo sendo o administrador mero representante, ele deve motivar todos os seus atos, está obrigado a motiva seus atos. Por fim, para o exercício da cidadania, o cidadão precisa dessa motivação (☺art. 2º, caput e inciso II, CR/88); ademais, todos têm direito à informação, salvo quando colocar em risco a segurança da sociedade e do Estado (☺ar. 5º, XXXIII, CR/88), e, ainda, qualquer lesão ou ameaça de lesão deve ser revista pelo PJ (☺art. 5º, XXXV) e se o PJ vai rever um ato para avaliar sua razoabilidade e proporcionalidade ele tem que conhecer a motivação desse ato (a motivação é elemento indispensável a essa revisão).

O administrador pode ser chamado a motivar um ato que antes não foi motivado? A motivação deve ser feita antes ou durante a realização do ato, a motivação posterior não supre o defeito do ato, não resolve o problema (e por isso não é vista com bons olhos). Mas é sim possível que ocorra para evitar conseqüências mais graves (como o crime de responsabilidade), mas não impede a punição do responsável e pode não suprir a nulidade do ato. Há, no entanto, divergências quanto a isso, por ex., para CABM.

- Motivo:

Motivo é o fato + o fundamento jurídico.O motivo do ato administrativo representa as razoes que justificam a edição do ato. É a

situação de fato e de direito que gera a vontade do agente quando da prática do ato administrativo. Pode ser dividido em: pressuposto de fato, enquanto conjunto de circunstancias fáticas que levam à prática do ato, e pressuposto de direito, que é a norma do ordenamento jurídico e que vem a justificar a prática do ato.

Para CABM o requisito do motivo é conceituado como “o pressuposto de fato que autoriza ou exige a prática do ato” e é classificado como condição de validade do ato administrativo, denominado pressuposto objetivo de validade.

→ Legalidade do Motivo:O ato administrativo precisa da legalidade do motivo. Se o motivo é ilegal o ato também

o será. Para que o motivo do ato seja legal ele deve cumprir alguns requisitos:

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a) ele precisa de materialidade – a materialidade do motivo quer dizer que ele tem que ser verdadeiro, deve corresponder à verdade, ou seja, ser compatível com a realidade fática apresentada pelo administrador, sob pena de levar à ilegalidade do ato;b) o motivo declarado na prática do ato precisa ser compatível com o motivo previsto na lei, ou seja, é indispensável a correspondência do motivo existente que embasou o ato com o motivo previsto em lei, do motivo declarado para a prática do ato e o evento que efetivamente ocorreu, devido à situação abstrata definida pela lei, denominada motivo legal;c) o motivo declarado no ato tem que ser compatível como o resultado do ato, ou seja, exige-se a congruência entre o motivo existente e declarado no momento da realização do ato e o resultado prático desse ato, que consiste na some do objeto com a finalidade do ato.

→ Teoria dos Motivos Determinantes:Esta teoria relaciona-se com o motivo do ato administrativo, prendendo o administrador

aos motivos declarados ao tempo da edição do ato, sujeitando-se à demonstração de sua ocorrência, de tal modo que, se inexistentes ou falsos, implicam a nulidade do ato administrativo.

O administrador pode praticar o ato administrativo, sem declarar o motivo, nas hipóteses em que este não for exigido (ex.: exoneração ad nutum). Entretanto, se ainda assim decidir declará-lo o administrador fica vinculado às razões de fato e de direito que o levaram à prática do ato.

Assim, uma vez declarado o motivo, esse motivo deverá ser cumprido; a autoridade está vinculada ao motivo declarado.

Mas e se o motivo for falso, incompatível com a lei ou incompatível com o resultado do ato? Não. A Teoria dos motivos determinantes vincula o administrador ao motivo declarado desde que o motivo seja legal. Se ele for falso ou incompatível com a lei ou com o resultado, será ilegal, e então não há como cumprir. Assim, a TMD está amarrada à legalidade do motivo.

Atenção: declarar motivo falso também é violação à TMD – ex.: administrador exonera 3 servidores alegando que eles não são necessários, mas posteriormente contrata 3 outros para a mesma função.

Tredestinação: o Decreto Lei 3.365/41 autoriza que o administrador mude o motivo da desapropriação, sem que ocorra violação à TMD, desde que mantenha uma razão de interesse público. Trata-se de uma situação excepcional em que se admite a possibilidade de mudança do motivo alegado, quando ficarem mantidas as razões de interesse público. Assim, é possível alterar um interesse público para outro, caracterizando-se o instituto da tredestinação lícita, atualmente autorizado pelo art. 519, CC, não representando uma violação à TMD. Contudo, se o novo motivo declarado não representar um interesse público configura-se uma ilicitude e o ato será ilegal por vício no motivo.

- Objeto:

Segundo a maioria da doutrina (com exceção de CABM), o objeto do ato administrativo significa o resultado prático do ato; é o seu efeito jurídico imediato. É o ato em si mesmo considerado. Representa o efeito jurídico imediato que o ato produz o que este decide, certifica, opina, atesta.

Esse elemento configura, pois, a alteração no mundo jurídico que o ato administrativo se propõe a processar. Representa uma conseqüência para o mundo fático em que vivemos e, em decorrência dele, nasce, extingue-se, transforma-se um determinado direito.

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Ex.: pedido de licença para construir; o deferimento é o objeto – é aquilo que o ato faz em si mesmo.

O objeto pode ser dividido em:a) Objeto natural: é o efeito jurídico que o ato produz, sem necessidade de expressa

menção, é uma conseqüência natural do ato;b) Objeto acidental: é o efeito jurídico que o ato produz, em decorrência de cláusulas

acessórias apostas ao ato pelo sujeito que o pratica, como, por ex., o termo, a condição ou o encargo.

→ Requisitos de validade:Para que o objeto do ato seja legal, compatível, ele tem que ter licitude, tem que ser

possível e tem que ser determinado. Precisa então ser:- lícito: para o Direito Civil é aquele não vedado por lei, mas para o Direito Administrativo, o objeto lícito é aquele que foi previsto, autorizado por lei;- possível: faticamente possível, suscetível de ser realizado;- determinado: ou ao menos determinável, ou seja, deve ser específico, bem definido.

- Finalidade:

A finalidade basilar de todo e qualquer ato administrativo é a consecução do interesse público primário. No entanto, cada ato administrativo tem, ainda, um resultado específico que o ordenamento lhe estabelece, clã ou implicitamente, como objetivo a ser atendido.

Assim, a finalidade do ato administrativo é o bem jurídico objetivado pelo ato, o que se visa proteger com uma determinada conduta. Ou seja, significa o bem da vida que se quer proteger com a prática do ato. É chamada de efeito jurídico mediato do ato administrativo, que deve ser sempre o interesse público, o bem comum.

Todo ato administrativo tem uma finalidade com interesse público; todo ato administrativo tem que buscar uma razão de interesse público, seja ela qual for (segurança, meio ambiente, salubridade, educação, etc.).

Portanto, se o ato administrativo perseguir interesses ilícitos ou contrários ao interesse coletivo, ou seja, se o ato foi praticado com desrespeito ao interesse público, ocorre um vício chamado desvio de finalidade, que é um vicio ideológico, subjetivo. Significa defeito na vontade do administrador, e o ato deverá ser retirado do ordenamento jurídico.

O desvio de finalidade, segundo a doutrina tradicional (especialmente HLM) representa vício em dois elementos do ato administrativo: finalidade e motivo.

O ato administrativo, além da finalidade geral que é o interesse coletivo, deve também observar a finalidade específica, prevista em lei, tendo em vista que, para cada propósito que a AP pretende alcançar, existe um ato definido em lei.

Sendo assim, não é possível utilizar-se de um dado ato para proteção de um bem ou realizar um determinado propósito que, segundo a lei, deve ser obtido com a prática de outro ato.

Com efeito, desvio de finalidade ocorre quando o agente exerce uma competência que possuía, em abstrato, para alcançar uma finalidade diversa daquela em função da qual lhe foi atribuída a competência exercida.

Segundo Seabra Fagundes: “Nada importa que a diferente finalidade com que tenha agido seja moralmente lícita. Mesmo moralizada e justa, o ato será inválido por divergir da orientação legal”.

E segundo CABM: há desvio de finalidade, ainda que não exista intenção viciada, desde que tenha desacordo objetivo entre a finalidade do ato e a finalidade da lei.

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• Outras considerações sobre os elementos do ato administrativo:

Pergunta: no ato administrativo discricionário, onde está a discricionariedade? Em que elemento do ato administrativo encontra-se a discricionariedade?

No ato administrativo discricionário, os seus elementos são vinculados ou discricionários?

Onde está a liberdade do ato discricionário?Para recordar: ato vinculado é o ato em que o administrador não tem liberdade, não tem

juízo de valor, preenchidos os requisitos legais o administrador é obrigado a praticar o ato (ex.: pedido de aposentadoria e licença); ato discricionário, por sua vez, é aquele em que o administrador tem juízo de valor, conveniência e oportunidade para decidir (ex.: permissão de uso de calçada, autorização para que veículos maiores circulem na cidade, etc.).

Vejamos o que ocorre em cada um dos elementos do ato, sendo ele vinculado ou discricionário:

Elemento do ato Vinculado DiscricionárioCompetência: Vinculado VinculadoForma: Vinculado VinculadoMotivo: Vinculado DiscricionárioObjeto: Vinculado DiscricionárioFinalidade: Vinculado Vinculado

Pergunta: o que é mérito do ato administrativo?O mérito está no motivo e no objeto do ato administrativo, mas atenção, ele não é o

motivo e o objeto! Mérito é juízo de valor.

Pergunta: O PJ pode rever ato administrativo? Sim. Mas pode rever ato vinculado e discricionário? Sim, o PJ pode rever qualquer ato administrativo, sendo ele vinculado ou discricionário. Ele o fará no que tange à legalidade. Atenção: legalidade aqui é legalidade em sentido amplo – pode ser lei ou Constituição.

O PJ pode rever o motivo e o objeto do ato discricionário? Sim. O PJ pode rever o motivo e o objeto do ato discricionário no que tange à sua legalidade.

Mas e se a pergunta for: O PJ pode rever o mérito do ato administrativo? Não. O mérito, a liberdade, o juízo de valor, não pode ser revisto pelo PJ.

E quando o controle feito pelo PJ é o de razoabilidade, de proporcionalidade, de eficiência, esse controle é de legalidade ou de mérito? É um controle de legalidade, mas acaba atingindo o mérito. Assim, o PJ pode, por vias tortas, acabar por limitar o mérito do ato administrativo (o controle de princípios pode, então, atingir o mérito do ato).

Obs.: em algumas situações a lei apresenta alternativas – assim, o administrador poderá escolher uma dessas alternativas (ex.: ato que pode ser praticado via contrato, carta contrato, nota de empenho, ordem de serviço, ou ordem de pagamento - ☺art. 62, Lei 8.666/93). CABM diz, então, que a forma e a finalidade são, em regra, elementos vinculados, mas eles podem, excepcionalmente, ser discricionários quando a lei der ao administrador alternativas, desde que se tratem sempre de alternativas de interesse público, é claro.

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MÉRITO

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• Atributos do ato administrativo:

Considerando-se que os atos administrativos regem-se pelo regime jurídico de direito público e que este se constitui por uma série de normas que estabelecem prerrogativas e restrições incomuns no direito privado, é mister analisar quais são os atributos de que desfrutam os atos administrativos. Tais prerrogativas são previstas como forma de proteção dos interesses sociais que se colocam em posição de supremacia em face dos interesses particulares.

Os atos administrativos submetem-se, em regra, a um regime jurídico público específico, de que se destacam os seguintes atributos (alguns autores os chamam de características do ato administrativo):

a) presunção de legitimidade: leia-se “presunção de legitimidade + presunção de legalidade + presunção de veracidade”, ou seja, presunção de obediência as regras morais, de obediência à lei e de correspondência com a verdade, respectivamente. Esta presunção é relativa, juris tantum, que admite prova em contrário. O ônus da prova cabe a quem alega (normalmente o administrado). Conseqüência prática da presunção de legitimidade: aplicação imediata dos atos (o ato é legal até que se prove o contrário).

b) Auto-executoriedade: grande parte da doutrina o reconhece como desdobramento do atributo da presunção de legitimidade. Significa que o ato será praticado sem a presença do PJ. Mas atenção: a auto-executoriedade dispensa o controle pelo PJ, mas não o impede esse controle. Ademais, a auto-executoriedade não dispensa e não afasta o formalismo, as formalidades do ato. Pela doutrina majoritária, a auto-executoriedade se subdivide em dois sub-elementos: a exigibilidade (poder que tem a AP de decidir sem a presença do PJ – esse atributo todo ato tem) e a executoriedade (executar o ato sem a presença do PJ – nem todo ato tem, só ocorre quando a situação estiver prevista em lei ou quando houver urgência – a sanção pecuniária, normalmente não tem executoriedade, pois não se enquadra em nenhum nesses dois requisitos). Assim, nem todo ato administrativo tem auto-executoriedade! Normalmente tem, mas nem sempre.

c) Imperatividade: significa que o ato administrativo é coercitivo, obrigatório, deve ser obedecido independentemente da sua contrariedade. Atenção: nem todo ato administrativo tem imperatividade, só a terá se o ato tiver em seu conteúdo alguma obrigação (certidão e atestado são exemplos de atos enunciativos, que não têm imperatividade).

d) Tipicidade: atributo criado por MSZDP, mas atualmente já aceito pela maioria da doutrina. Significa que cada ato administrativo tem uma aplicação para uma situação determinada – ex.: a remoção serve à necessidade do serviço, a demissão é pena por falta grave, advertência é pena por infração leve. Assim, cada ato será aplicado a uma situação determinada.

• Classificação dos atos administrativos:

→ Quanto aos seus destinatários:a) atos gerais: não têm um destinatário determinado, é geralmente um ato abstrato e

impessoal, que atinge a coletividade como um todo. Ex.: velocidade na avenida x; nº de andares à beira mar, etc.

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b) atos individuais: têm destinatário determinado. Pode ser singular ou plúrimo, dependendo se tem apenas um destinatário determinado ou se tem mais de um destinatário determinado.

→ Quanto ao alcance:a) atos internos: são aqueles que produzem efeitos apenas dentro da AP. Ex.:

determinação de uso de uniforme.b) atos externos: são aqueles que produzem efeitos dentro e fora da AP. Ex.:

determinação de horário de funcionamento de órgão público.→ Quanto ao grau de liberdade:

a) atos discricionáriosb) atos vinculados

→ Quanto à formação:a) atos simples: aqueles que se tornam perfeitos e acabados com uma única manifestação

de vontade;b) atos compostos: aqueles que se tornam perfeitos e acabados com duas manifestações

de vontade, dentro de um mesmo órgão, em patamar de desigualdade (a primeira é a principal e a segunda é secundária, só confirmando a primeira). Ex.: atos que dependem de confirmação, de visto pelo chefe;

c) atos complexos: aqueles que se tornam perfeitos e acabados com duas manifestações de vontade, em órgãos diferentes, em patamar de igualdade. Ex.: nomeação de dirigente de agencia reguladora.

• Modalidades de ato administrativo:

Alguns autores chamam de outras classificações.São elas:

1) Atos normativos: são aqueles que disciplinam, regulamentam, normatizam determinada situação. É o exercício do poder regulamentar, como regra, ou também do poder de polícia.

2) Atos ordinatórios: são aqueles que ordem, escalonam, hierarquizam, estruturam os quadros da AP. É o exercício do poder hierárquico.

3) Atos punitivos: são aqueles que trazem uma sanção. Pode ser exercício do poder disciplinar ou do poder de polícia.

4) Atos enunciativos: são aqueles que certificam, atestam ou emitem opinião; não têm conteúdo decisório. Ex.: certidão, atestado e parecer.

5) Atos negociais: são aqueles que têm coincidência de vontade entre o que quer o Poder Público e o que quer o particular. Ex.: permissão de uso da calçada; autorização de uso de bem público.

(20/10/08)

• Formação e Efeitos dos atos administrativos:

O ato administrativo pode ser:

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- Perfeito: o ato administrativo é perfeito quando percorre todo o seu ciclo de formação; quando conclui sua trajetória de formação. Sempre que se fala em perfeição, portanto, se fala em ciclo de formação do ato. A partir daí se analisa sua validade.

- Válido: o ato será válido se preencher todos os seus requisitos.- Eficaz: é o ato que está pronto para produzir efeitos.É possível um ato perfeito que não produza efeitos? Ou um ato perfeito, válido e

ineficaz? Ou perfeito, inválido e eficaz?A doutrina administrativista não admite discussão, interferência na perfeição do ato. Ele

será perfeito ou não se cumpriu ou não seu ciclo de formação. Mas quanto aos demais aspectos (validade e eficácia) é possível que, eventualmente, esses não estejam presentes. Ou seja, o ato pode ser inválido e/ou ineficaz.

Um contrato, por ex., pode ser válido e ineficaz.Um ato administrativo pode, pois, ser perfeito, válido e ineficaz; pode ser perfeito,

inválido e eficaz; ou perfeito, inválido e ineficaz.

Quanto aos efeitos do ato, é importante lembrar:O ato administrativo tem, em regra, efeitos típicos (aquilo que se espera, se deseja com a

prática do ato), mas em algumas circunstâncias, alguns atos administrativos podem gerar efeitos atípicos, secundários (que a AP não espera ou não quer, mas que pode acontecer).

Ex.: o Estado decide desapropriar um imóvel de A; o efeito típico desde ato é a desapropriação; mas, imagine-se que o imóvel estava locado para B, o que acontecerá com o locatário B? O ato de desapropriação atingirá A e também B. A AP não tinha como objetivo inicial atingir B, mas ele será atingido por um efeito secundário do ato administrativo. Fala-se, ainda, em efeito atípico reflexo (também chamado reflexivo), que é o que atinge terceiros estranhos a prática do ato.

Questão: como se nomeia dirigente de agencia reguladora? O SF aprova e o PR nomeia. Assim, esse ato se torna perfeito depois das duas manifestações.

Assim, se a perfeição acontece somente após as duas manifestações, o que vem antes da perfeição é chamado de preliminar. Desta forma, se o SF escolhe um nome para a direção da agencia reguladora, surge para o PR o dever de se manifestar, a obrigação de falar alguma coisa, seja discordando, seja concordando. Essa obrigação surge antes do aperfeiçoamento do ato. Por isso é chamado de efeito preliminar (é um efeito que aparece antes da perfeição do ato). Este é um efeito atípico (a obrigação de se manifestar) e, por aparecer antes da perfeição do ato, é chamado de efeito atípico preliminar ou efeito atípico prodrômico.

Resumindo:O efeito atípico se divide em duas espécies: a) efeito atípico reflexo, que acontece quando

o ato praticado pelo Estado atinge terceiros estranhos à prática do ato (ex.: desapropriação que atinge o contrato de locação); b) efeito atípico preliminar (também chamado prodrômico), que aparece nos atos que dependem de duas manifestações (nos atos compostos ou nos complexos), sendo anterior ao aperfeiçoamento do ato, significando o dever da segunda autoridade se manifestar quando a primeira já se manifestou.

• Extinção dos atos administrativos:

É a retirada do ato administrativo do ordenamento jurídico.Acontece nas seguintes hipóteses:a) pela conclusão do seu objeto;

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b) pelo advento do termo contratual (prazo final);c) pelo desaparecimento do sujeito;d) pelo desaparecimento do objeto;e) pela renúncia;f) pela retirada do ato administrativo por ato do Poder Público – esta hipótese se

subdivide nas seguintes:

- Cassação: é a retirada do ato administrativo pelo descumprimento das condições inicialmente impostas.

- Caducidade: é a retirada de um ato administrativo pela superveniência de uma norma jurídica que é com ele incompatível.

- Contraposição: é a retirada de um ato administrativo por um segundo ato administrativo que elimina os efeitos do primeiro (exclui o primeiro).

• Anulação do ato administrativo:

É a retirada de um ato administrativo em razão de uma ilegalidade.Quem pode rever um ato, anulando-o, se este ato for ilegal?A Administração deve realizar a revisão desse ato e a sua anulação, pelo Princípio da

Autotutela (☺Súm. 346 e 473, STF). Ademais, o Poder Judiciário também pode fazer um controle de legalidade dos atos

administrativos – controle de legalidade em sentido amplo: leis e princípios constitucionais.Quanto tempo tem a AP para rever um ato administrativo se este ato é ilegal? A nossa Lei

9.784/99, nos arts. 54 e seguintes, traz o prazo de 5 anos para a revisão dos atos, especialmente dos atos que lhe são favoráveis (que produzem efeitos favoráveis). Depois deste prazo deve-se recorrer à via judicial.

A anulação é um novo ato administrativo que retirará o antigo ato. Se a anulação é um ato administrativo, depende de sujeito competente, de forma, de objeto, de finalidade, ou seja, deve respeitar todos os requisitos do ato administrativo.

Efeitos da anulação: em regra, ex tunc. Excepcionalmente, porém, a anulação poderá produzir efeitos ex nunc, dependendo do ato administrativo: se o 1º ato é ampliativo, a anulação produz efeitos ex nunc; se o 1º ato é restritivo, a anulação produz efeitos ex tunc (é mais benéfico).

• Revogação de ato administrativo:

Acontece quando o ato não é mais conveniente. É, pois, a retirada de um ato administrativo quando este não é mais conveniente.

A revogação é atribuída, como regra, à própria Administração. Mas atenção: o Poder Judiciário pode revogar seus próprios atos, no exercício da função administrativa (o que ele não pode é fazer controle judicial sobre os atos dos demais poderes).

Qual o prazo que tem a AP para revogar os seus próprios atos? Não há prazo. Não há limite temporal para a revogação. No entanto, há limite material, ou seja, em razão do conteúdo. Assim, não podem ser revogados:

- ato vinculado;- ato que já produziu direitos adquiridos;- ato consumado, que já exauriu os seus efeitos;- ato declaratório (mero ato administrativo);

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- ato que integra um procedimento (em função da preclusão);- ato para o qual já foi exaurida a competência.

A revogação produz efeitos ex nunc.

• Convalidação x Sanatória x Estabilização:

Se um ato administrativo preenche todos os seus requisitos ele é um ato válido. Se, contudo, ele tem defeitos, esses defeitos podem comprometer o ato completa ou parcialmente. se o vício é sanável, o ato será anulável. Se o vício, no entanto, é grave, o defeito será insanável e o ato será nulo.

Se o ato tem defeito sanável, ele pode ser sanado pela convalidação. Se o ato é nulo, tendo um defeito insanável, este ato deverá ser anulado.

A convalidação é, pois, o aproveitamento de um ato administrativo que tenha defeito sanável. Ao corrigir o ato ele se tornará válido.

A convalidação só é possível em ato anulável e a nossa doutrina só admite como defeito sanável o defeito de competência ou de forma (atenção: nem todo defeito de forma ou de competência será sanável, mas somente serão sanáveis os defeitos de forma e de competência).

A conversão ou sanatória, que são sinônimos, é o aproveitamento de um ato administrativo através da transformação de um ato solene, que não preenche os requisitos, em uma ato simples, para o qual os requisitos foram preenchidos.

Ex.: a concessão de serviço público, que é ato solene, depende de autorização legislativa específica. Se a AP dá início a uma concessão sem esse requisito da autorização legislativa, tratar-se-á de um ato solene que não preenche os requisitos, a AP poderá converter este ato em permissão de serviço, que não exige este requisito, é um ato mais simples, precário, e não depende de autorização legislativa. Assim, poderá acontecer o aproveitamento do ato.

A estabilização, por sua vez, é a manutenção dos efeitos de um ato em nome de outros valores constantes do nosso ordenamento. O dever de legalidade do administrador não pode desprezar esses outros valores previstos no ordenamento jurídico (segurança jurídica, boa-fé, etc.), assim, se a anulação do ato pode causar mais prejuízos do que a sua estabilização, deve-se preferir esta àquela. Na estabilização dos efeitos não ocorre a convalidação, mas os atos ilegais são mantidos, em nome de outros valores.

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PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA NO DIREITO ADMINISTRATIVO:PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA NO DIREITO ADMINISTRATIVO:

(Caderno da Raquel Carvalho)

• Segurança jurídica como fundamento dos institutos:

No mundo globalizado do Séc. XXI, é crescente a necessidade por estabilidade nos vínculos, inclusive de natureza pública, que não podem ficar à mercê das pressões circunstanciais, do arbítrio governamental, nem mesmo das vontades subjetivas de determinados grupos privados. Princípios como segurança jurídica ganham força como paradigma de atuação minimamente estável do Estado, buscando resguardar a previsibilidade e a continuidade das ações administrativas.

A segurança jurídica encontra-se expressa no art. 2º, XII, da Lei de Processo Administrativo Federal (Lei 9.784/99). O art. 55 do mesmo diploma impede a alteração de ato ou situação jurídica por força da aplicação retroativa de nova interpretação do texto legal. Ademais, esta lei estabelece preceitos regulamentadores da decadência e da prescrição administrativas, como é o caso do art. 54. Na base de todas as determinações está a demanda por estabilidade, cada vez mais invocada para limitar a revisão dos atos estatais. Afirma-se que, por vezes, a invalidação de um ato e a supressão dos efeitos dele decorrentes pode causar maior prejuízo ao interesse social que a sua manutenção.

Assim, devem ser ponderados os princípios integrantes do sistema, em face de cada realidade específica, de modo a se buscar a justa medida no equilíbrio entre legalidade e segurança, tendo como norte, sempre, a prevalência do bem comum. São estes os aspectos que devem inspirar a interpretação e definição dos institutos da prescrição e decadência no Direito Administrativo moderno.

No Direito Público, tal como no direito privado, a manutenção de situações jurídicas pendentes poderia eternizar conflitos que comprometeriam a própria segurança social. Daí a prescrição e a decadência incidirem sobre as relações jurídico-administrativas. No entanto, é indispensável compatibilizar ambos os institutos com os demais princípios integrantes do ordenamento, em especial a juridicidade e a supremacia do interesse público. Referida ponderação há de se dar quando do julgamento da constitucionalidade das regras que veiculam as hipóteses de prescrição e de decadência, à luz da própria técnica de proporcionalidade, bem como quando do exame das situações em que o ordenamento se omitiu no estabelecimento de prazos decadenciais e prescricionais.

• PRESCRIÇÃO:

É a perda da pretensão não exercida no prazo legal.Pretensão é o direito de uma pessoa exigir da outra a obrigação devida e

injustificadamente recusada.Ou seja, a prescrição é a perda de uma das partes da relação jurídico-administrativa do

poder de exigir da outra a reparação de determinado direito subjetivo violado, por ter sido ultrapassado o prazo fixado para que tal pretensão fosse aviada.

Requisitos ou Pressupostos:

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a) relação jurídica com obrigações recíprocas colocadas para ambas as partes;

b) recusa injustificada de uma parte a tender a obrigação perante a parte credora – aqui surge a pretensão (direito de exigir);

c) decurso de prazo superior ao fixado em lei, com a inércia do titular da pretensão → prescrição.

Passado esse prazo, não cabe mais o direito de exigir a obrigação. Mas isso não impede que a parte devedora atenda voluntariamente o direito que a outra tinha, caso em que não poderá se arrepender e cobrar de volta a obrigação que foi cumprida.

Atenção: o cumprimento voluntário pela AP de obrigação prescrita só é cabível muito excepcionalmente. Em regra, a AP não pode cumprir obrigação prescrita, porque isso viola o interesse público e este é indisponível.

→ Direitos subjetivos de terceiros perante a Administração Pública e seus prazos:

Depende da natureza do direito, vejamos:

a) Direitos Pessoais:

- ☺ Decreto 20910/32, art. 1º: prazo de 5 anos.Obs.: não seria aplicado aos direitos reais (☺art. 177, CC/1916: 10 anos entre presentes e

15 anos entre ausentes).- ☺art. 3º do DL 4597/42: permite a interrupção do prazo prescricional por uma única

vez. Recomeça-se a contar o prazo pela metade (2 anos e 6 meses).☺ Súm. 383, STF: repete a regra do art. 3º e acrescenta que não se admite prazo inferior

a 5 anos (para os casos de interrupção logo no início do prazo, ou na sua 1ª metade).

Ex.: Pretensão Interrupção Prescrição

* - - - - - - - - - - - - - - - -- - - * - - - - - - - - - - - - - - - - - - -* 01/01/1990 01/01/1994 01/01/1995

Interrupção em 01/01/1994. A prescrição ocorreria 2 anos e 6 meses após 01/01/1994. Mas, se a interrupção tivesse ocorrido em 01/01/1991, a prescrição só ocorreria em 01/01/1995.

b) Direitos Reais:

O CC não traz mais regra expressa. Vale, portanto, a regra geral do art. 205, CC: 10 anos.Normalmente, só se aplica prazo de prescrição do Direito Civil quando não houver regra

no Direito Administrativo. No entanto, para os direitos reais, a aplicação do Decreto 20.910/32 é inconstitucional, pois não atende o princípio da razoabilidade. Não é razoável que os direitos reais prescrevam em apenas 5 anos, por isso justifica-se aqui a aplicação da regra geral.

Atenção: ☺art. 2.028, CC – regra de transição: “Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada”.

Direitos reais entre ausentes: o prazo prescricional era de 15 anos no CC/16, e passou a ser de 10 anos.

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Se à época da entrada em vigor do Código Civil, já tinham se passado mais de 7 anos e meio, continua valendo o prazo antigo (continua a contar o prazo prescricional pelo prazo antigo). Ex.: já se passaram 12 anos; faltam 3.

Se à época da entrada em vigor do Código Civil, porém, não tinha se passado mais de 7 anos e meio (mais da metade), conta-se todo o novo prazo, começando a partir de 2003 (vigência do NCC). Ex.: já se passaram 6 anos; terá ainda mais 10 anos.

c) Desapropriação Indireta:

É um modo antijurídico de o Estado obter a posse de um bem que não é seu. O Estado esbulha o bem e o afeta, ou seja, dá a ele uma utilidade pública. O terceiro (proprietário do bem), que sofreu o esbulho, não pode buscar a proteção possessória. Deve ajuizar ação de desapropriação indireta, visando obter uma indenização, que tem natureza jurídica de direito real de propriedade (o Estado não é proprietário, mas mero possuidor, até que passe o prazo prescricional que neste caso representa a perda do direito de exigir a indenização e a transferência da propriedade). Assim, com a prescrição da desapropriação indireta, o proprietário perde o direito de exigir a indenização, bem como a propriedade se transfere para a Administração Pública. Por isso se fala que o prazo prescricional, portanto, é o de usucapião (☺art. 1238, CC): 15 anos. Admite-se a redução desse prazo para 10 anos quando houver justo título e boa-fé (que não é o caso do Estado esbulhador), ou quando a pessoa houver realizado obras/serviços no imóvel, mas isso não está sendo aplicado nas provas de concursos em se tratando de desapropriação indireta (fica, então, valendo o prazo de 50 anos mesmo).

Aqui também se aplica a regra de transição (☺art. 2.028, CC). Se a AP é credora, havendo regra aplica-se a regra (ex.: art. 174, CTN), mas se não houver regra, aplica-se o CC.

Quem pode legislar sobre prescrição é a União – considera-se que este poder de exigir perante o Judiciário a prestação inadimplida (pretensão) é matéria relativa ao Direito Processual Civil – direito de ação.

Cumpre observar que a competência para legislar sobre Direito Processual é reservada privativamente à União, pelo inciso I, do art. 22, CR. Assim, sendo, somente no âmbito federal é possível ter regras que estabeleçam o prazo para a AP e terceiros recorrerem ao Judiciário na defesa dos seus direitos subjetivos descumpridos pela outra parte da relação firmada à luz do direito público.

À pretensão da Administração Pública perante terceiros, aplica-se o que for estabelecido pelo direito civil e pelo direito penal, se não houver regra específica. Ex.: cobrança de pena de multa – prazo é de 2 anos, mas a forma de execução é a da Lei n.º 6.830/80.

☺art. 206, §3º, V, CC: prazo de 3 anos para exigir ressarcimento civil em que uma das partes é a AP. Na verdade, esta aplicação é indevida, porque, afinal, existe a regra, mas JSCF entendeu que eram 3 anos e há jurisprudência do TRF da 1ª região também nesse sentido, por isso, é o que vale.

• DECADÊNCIA:

É a perda de um direito potestativo não exercido no prazo legal. Direito potestativo é aquele que legitima o exercício de uma prerrogativa unilateralmente

pelo seu titular (no caso, o Estado).

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Uma pessoa sozinha pode exercer uma prerrogativa. Não há direito potestativo do particular em face da AP. Somente a AP possui direito potestativo em face do particular. Se esse direito não for exercido pela AP no prazo legal, opera-se a decadência.

Assim, decadência é a perda do próprio direito que é potestativo e que desapareceu em razão da inércia do seu titular em exercê-lo no período fixado no dispositivo de regência.

Não se trata instituto que possua, em regra, qualquer implicação direta com o exercício do direito de ação perante o Judiciário, porquanto sequer se fundamenta na idéia de pretensão. Em geral, trata-se do desaparecimento de um direito potestativo, em razão do seu não-exercício no prazo legal, sem que nem mesmo tenha relevância analisar a necessidade ou utilidade de se recorrer ao Judiciário. Afinal, direitos potestativos outorgam ao seu titular a prerrogativa de intervenção direta e unilateral na esfera jurídica de outrem, sendo desnecessária a aquiescência do terceiro ou qualquer autorização jurisdicional prévia, concomitante ou posterior. Sendo assim, decadência, em princípio, não consiste em matéria de Direito Processual Civil, motivo por que é necessário afastar a regra da competência legislativa privativa da União disposta no art. 22, I, CR.

Quem pode legislar sobre decadência será aquele que pode legislar sobre o respectivo direito potestativo (pode ser a União, os Estados, o DF ou os Municípios).

A competência para legislar sobre decadência definir-se-á, assim, segundo a competência para legislar sobre o direito que, não exercido no prazo fixado, se extinguirá.

Atenção: nos casos de poder de polícia e disciplinar, as leis erroneamente denominam tal perda de direito potestativo de prescrição – cuidado!

Ex.1: poder disciplinar – há prazos para a AP punir o servidor, que variam conforme a sanção a ser aplicada.

Ex.2: poder de polícia – Lei n.º 9.784/99 (União): prazo decadencial é de 5 anos, mas pode ocorrer a decadência intercorrente, quando o processo ficar paralisado por mais de 3 anos.

Ex.3: Autotutela administrativa – Lei n.º 9.784/99, art. 54 (aqui pela primeira vez a lei acertou e chamou o prazo de decadencial). O prazo para a AP invalidar o ato viciado é decadencial de 5 anos, salvo se comprovada a má-fé (nesse caso a lei não diz qual será o prazo, mas ele não será de 5 anos). Obs.: o STJ disse que essa lei não retroage, mas que atinge os efeitos dos atos viciados a partir do momento em que ela entrou em vigor.

Antes dela não havia prazo em vigor. Então, para todos os atos praticados antes de sua vigência, o prazo de invalidação é contado a partir de sua entrada em vigor, terminando em 2004, quando ocorrerá a decadência.

Se o Município e o Estado não tiverem lei específica para a autotutela, aplica-se a Lei n.º 9.784/99.

Obs.: o estudo dessa matéria deve ser complementado nos livros.(☺Livro da Raquel Carvalho, pg. 477 e seguintes).

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CONTROLE JUDICIAL DOS COMPORTAMENTOS PÚBLICOS:CONTROLE JUDICIAL DOS COMPORTAMENTOS PÚBLICOS:

(Livro: Raquel Carvalho)

• Aspectos preliminares:

Um dos objetivos do Direito Administrativo moderno tem sido buscar mecanismos aptos a substituir o arbítrio no exercício das competências estatais pela sujeição às normas do ordenamento jurídico, interpretado sistêmica e teleologicamente. Na perseguição de tal escopo, afigura-se relevante, além do dever de motivação das condutas estatais, o controle efetivo da legalidade pública.

É preciso analisar o controle dos comportamentos públicos sob 3 prismas: a) o controle dos atos administrativos vinculados e dos atos administrativos discricionários; b) o controle das omissões administrativas ilícitas (seja o silêncio ilegal pertinente aos atos vinculados ou a inércia antijurídica relativa aos atos discricionários); e c) o controle dos atos políticos, em especial daqueles que repercutem diretamente na atividade administrativa.

Antes, porém, é preciso analisar os limites aplicáveis a este controle.

• Limites do controle judicial do comportamento público:

É preciso reiterar o correto entendimento do Princípio da Legalidade. Passou-se a entender que não bastava à ação administrativa a legalidade estrita, sendo imprescindível a sua legitimidade, a saber, o atendimento simultâneo das normas legais e do padrão ético de conduta interna vigente na estrutura estatal, de acordo com os critérios de honestidade e lealdade administrativa.

Atualmente, entende-se a legalidade como o princípio que vincula a Administração ao Direito, no qual se inserem os princípios constitucionais explícitos (moralidade, impessoalidade, publicidade, eficiência, isonomia) e implícitos (razoabilidade, proporcionalidade, boa-fé objetiva, supremacia do interesse público), as normas constitucionais e legais vigentes, bem como a imprescindibilidade de atendimento às necessidades sociais em questão.

Assim sendo, tanto a moralidade, como os princípios da razoabilidade e da segurança jurídica, são critérios eficientes inseridos no controle de legalidade da conduta administrativa, indispensáveis à caracterização da juridicidade da ação estatal, independentemente da sua natureza vinculada ou discricionária. O mesmo se afirma em relação às regras legais dos diplomas federais, estaduais, municipais e distritais, o que se estende aos atos regulatórios da Administração.

Assim sendo, parâmetros como a proporcionalidade e a boa-fé objetiva, antes entendidos como insertos no mérito da ação administrativa, hoje se enquadram no domínio da juridicidade ou legalidade em sentido amplo.

Aos princípios acresce-se a repercussão significativa das normas regulamentares e regulatórias do Estado que, em multiplicidade, buscam assegurar atualmente a operacionalidade do ordenamento jurídico administrativo.

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Assim compreendido o sistema e a nova postura exigida do agente público e do magistrado, evita-se que o mérito da ação administrativa termine sendo uma palavra mágica capaz de encobrir desvios dos administradores ou de autorizar abusos pelo Judiciário.

Cabe ao administrador confinar-se à discricionariedade que o sistema lhe reconheceu. Cabe ao Judiciário, no controle da juridicidade, verificar a observância de princípios como proporcionalidade, isonomia, segurança jurídica, das regras legais e das normas regulamentares e regulatórias. Isto sem negar a possibilidade de haver resíduo da escolha deixado pelo ordenamento ao administrador.

A correta compreensão da juridicidade que vincula o administrador e que, simultaneamente, é o limite da ação controladora judicial, afasta o risco da ditadura administrativa, bem como exclui a possibilidade de o Judiciário invadir seara restrita à AP.

De fato, não se pode confundir a evolução do controle judicial com a possibilidade de o Judiciário, substituindo o administrador, reavaliar o mérito do ato administrativo, para o fim de modificar a conveniência e a oportunidade que informaram a AP ao editar o ato em tese. Afinal, nem sempre é possível definir objetivamente qual a única ação admitida pelo ordenamento jurídico. Neste contexto, inadmissível que o magistrado pretenda, no exercício de juízo de valor, definir aquela que seria a escolha ótima, penetrando um espaço de gestão privativo da AP. isto porque a discricionariedade permanece circunscrita à esfera administrativa, malgrado a legitimidade do controle de juridicidade reconhecido ao Judiciário.

Outrossim, a força coercitiva dos princípios implícitos e explícitos do ordenamento, aliada à idéia de dever do administrador agir no exercício da função que lhe foi atribuída, coloca sob nova perspectiva o controle judicial incidente sobre as omissões públicas. Se aquele que exerce a função administrativa tem o dever de exercer a competência que lhe foi outorgada para atingir a finalidade pública primária que lhe é imposta, cabe ao Judiciário, quando provocado, assegurar que ocorra o cumprimento de tal obrigação.

Torna-se cabível o controle judicial das omissões ilícitas da AP na exata medida em que se compreende que a cada agente público não é facultado agir se e quando livremente desejar. Incumbe a este agente público realizar a atribuição que só lhe foi transferida em razão do interesse social que lhe cabe concretamente proteger, pelo que não há possibilidade de renúncia de tal competência.

O fato de ser possível o controle judicial também das omissões administrativas lesivas ao dever de agir imposto à AP não equivale à possibilidade de transformar o magistrado em agente público encarregado do exercício direto da integralidade da função administrativa, inclusive das escolhas discricionárias. Também aqui incumbe o respeito judicial ao espaço de liberdade reservado somente ao administrador público, sob pena de desequilíbrio comprometedor do art. 2º, CR.

Da mesma forma, o fato de ser cabível o controle dos paradigmas constitucionais que vinculam a sua prática, como hodiernamente já se proclama nos Tribunais Superiores, não autoriza a supressão do espaço governamental reservado às decisões políticas.

Tão ruim como a insuficiência do controle judicial são os riscos de eventuais excessos no exercício de tal atividade.

O dever de todo jurista que trabalha e pensa o cotidiano estatal é definir a exata medida da legalidade administrativa e do controle judicial indispensável à efetividade do sistema jurídico-administrativo e ao atingimento dos interesses sociais.

• Controle judicial dos atos vinculados e dos atos discricionários:

Incumbe ao PJ manter o administrador dentro dos limites da juridicidade delineada no sistema normativo. Assim sendo, pode controlar todos os aspectos do ato vinculado, cujos

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elementos e pressupostos encontram-se fixados na lei, sendo identificáveis mediante atividade interpretativa levada a efeito diante da realidade em questão. É irrelevante a origem da vinculação.

Quando, ao realizar o controle de legalidade em sentido amplo, o PJ depara-se com ato vinculado viciado, deve fazer incidir a conseqüência que o ordenamento impõe, mesmo que isso implique sua extinção: o PJ, no exercício de sua competência constitucional (art. 5º, XXXV, CR), ao invalidar o ato administrativo inconstitucional ou ilegal, não invade a esfera de competência do Poder Executivo, inexistindo violação ao disposto no art. 2º, da CR.

Com efeito, se o PJ, ao analisar os elementos (conteúdo e forma) e pressupostos (motivo, sujeito e finalidade) de um ato administrativo vinculado submetido ao seu controle, verifica a presença de um defeito insanável como, por ex., desvio de poder ou ilicitude do conteúdo por desconformidade com regra constitucional, cabe-lhe invalidar o ato nulo, restaurando a juridicidade violada no sistema.

Assim, pode-se dizer que se todos os elementos e pressupostos do ato resultam diretamente do sistema mediante atividade interpretativa, é irrestrito o controle judicial, pois não há espaço algum reservado apenas à conveniência administrativa.

Já no tocante aos atos discricionários, não se pode imiscuir no núcleo da conveniência e oportunidade administrativas, mas isso em nenhum momento significa a exclusão de qualquer controle jurisdicional.

Atualmente, pode o PJ aferir os aspectos vinculados do ato que seja discricionário no conteúdo e/ou motivo. Um ato discricionário quanto ao conteúdo pode ter, por ex., o sujeito, a finalidade, o motivo e a forma fixados de modo vinculado na lei. Neste caso, incumbe ao magistrado verificar os pressupostos (subjetivo, teleológico e fático) e o elemento formal vinculado da atuação administrativa. Outrossim, no tocante à discricionariedade, impõe-se uma interpretação sistêmica do ordenamento constitucional, das normas legais e administrativas de regência, de modo a definir qual é a margem de liberdade que, de fato, remanecse naquele caso concreto.

Deve o PJ delimitar os contornos da discricionariedade a fim de evitar que, com base nela, possa o administrador resvalar em comportamento arbitrário. Para tanto, é indispensável o exercício de atividade interpretativa que observe, concomitantemente, a juridicidade e a independência e harmonia dos poderes, compatibilizando tais princípios informadores da sua atuação em cada realidade objeto de análise.

O controle judicial, destarte, é possível para aferir a juridicidade que condiciona os limites da liberdade outorgada à AP.

Segundo CABM: “Assim como ao Judiciário compete fulminar todo comportamento ilegítimo da AP que apareça como frontal violação da ordem jurídica, compete-lhe, igualmente, fulminar qualquer comportamento administrativo que, a pretexto de exercer apreciação ou decisão discricionária, ultrapassar as fronteiras dela, isto é, desbordar dos limites da liberdade que lhe assistiam, violando, por tal modo, os ditames normativos que assinalam os confins da liberdade discricionária. Finalmente, esse proceder do PJ não elimina a discricionariedade e nem pode fazê-lo, pena de agravo à própria lei”.

Além de obrigatória a motivação de todo e qualquer ato administrativo, cabe ao PJ analisar os aspectos vinculados do ato discricionário, bom como os próprios contornos da discricionariedade à luz da juridicidade. Este bloco de legalidade é o paradigma basilar à verificação da observância dos limites da liberdade outorgada ao administrador pela ordem jurídica.

Isto, porém, não torna possível a interferência nas razões de conveniência e oportunidade (mérito administrativo), que escapam ao controle judicial, pelo que é despropositada a exigência pelo PJ de prática de ato administrativo não exigido por lei e nem praticado de forma contrária a

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dispositivo legal. O pronunciamento do Judiciário deve se limitar a conter o administrador dentro dos limites de liberdade efetivamente conferidos pelo sistema normativo. O campo de apreciação meramente subjetiva permanece exclusivo do administrador e indevassável pelo juiz, sem o que haveria substituição de um pelo outro, com infringência do próprio princípio da independência dos poderes.

O STJ já advertiu: nos atos discricionários, desde que a lei confira à AP a escolha e valoração dos motivos e objeto, não cabe ao Judiciário rever os critérios adotados pelo administrador em procedimentos que lhe são privativos.

• Os efeitos do silêncio administrativo e o controle da omissão administrativa ilícita:

Percebe-se no cotidiano administrativo que um dos problemas mais graves que atinge o Estado é a inércia em cumprir as obrigações que lhe incumbe, de modo íntegro e tempestivo. Por vezes, embora viável a ação pública, há o total inadimplemento do dever de agir (de ofício ou mesmo em virtude de provocação por parte de terceiro interessado na atividade estatal).

A não-realização da atividade administrativa caracteriza comportamento ilícito, sempre que o atraso no exercício da competência afigura-se desarrazoado.

Nas situações em que a AP não concretiza nenhum aspecto da competência que lhe foi atribuída, é mister identificar as conseqüências que o ordenamento prevê, tanto em relação à necessária efetividade das normas de regência, quanto à responsabilização pela omissão ilícita. Mas, para que tais conseqüências sejam impostas, é fundamental que esteja clara a ilicitude do silêncio administrativo. Ou seja, é indispensável que se demonstre que a omissão de a AP agir, até aquele momento, contraria a obrigação exigível do agente público competente. Se não caracterizada tal ilicitude, é descabida a intervenção jurisdicional, porquanto não haverá necessidade ou utilidade de prestação da tutela judiciária e, conseqüentemente, ausente estará o interesse de agir.

Esclareça-se que a imposição de efeitos jurídicos ao silêncio não o transforma em um ato administrativo. Na verdade, o silêncio é a ausência de ato, ou seja, é a falta de declaração de vontade, que tem caráter ilícito em razão do princípio da função cogente integrante o regime jurídico administrativo. Qualificar-se o silêncio da AP que assumiu feição infracional com um resultado jurídico positivo ou negativo não significa transformá-lo em manifestação de vontade, mas apenas submetê-lo às conseqüências normativas previstas no sistema.

Mas, a partir de quando a omissão administrativa torna-se ilícita? E que qual o resultado deste silêncio ilícito da AP?

Os Tribunais Superiores vem acentuando que uma conduta só é omissiva se a conduta da autoridade que deixa de se pronunciar demonstra, de modo inequívoco, daí decorrer ineficiência administrativa no exercício das atribuições públicas.

E primeiro plano, há hipóteses em que a lei fixa prazos para a AP agir. Ultrapassado o prazo máximo fixado na lei, tem-se presente a ilicitude da inércia pública (ex.: art. 133, §7º, Lei 8.112/90).

Ocorre que esta previsão legal é rara no ordenamento brasileiro. A previsão de prazos expressos para a AP agir não é comum em nossa legislação. Na ausência de lapsos temporais específicos que obriguem o Poder Público, busca-se respaldo em um dispositivo genérico que pudesse servir de paradigma para o período máximo que, em regra, se reconhece à AP para agir.

A doutrina então tem indicado que, na ausência de regra específica, incide o art. 49, da Lei 9.784/99: prazo de 30 dias para decidir, salvo prorrogação por igual período expressamente motivada.

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Nos casos em que não for razoável observar o prazo de 30 dias da Lei Federal, por ser evidente sua inadequação ao caso concreto (por ser excessivo, em face da urgência do caso concreto, ou por se mostrar insuficiente, em razão da complexidade da ação administrativa), cabe utilizar o Princípio da Proporcionalidade como paradigma condutor da fixação do lapso temporal para o exercício da competência administrativa.

Se caracterizada a inércia administrativa ilegal, as conseqüências que daí advirão dependem do que a ordem jurídica fixar. Em alguns casos, a lei imputará efeito positivo à inatividade ilícita, considerando deferida a vantagem sobre a qual a AP deveria ter se pronunciado, mas se omitiu. Em outras hipóteses, a lei atribuirá ao silêncio efeito negativo, determinando como desprovida a pretensão do terceiro que dependia da cão administrativa.

Nos casos em que a lei não fixa conseqüências ao silêncio, também se assegura ao prejudicado com a omissão administrativa o direito de provocar o controle previsto no art. 5º, XXXV, CR, sendo mister analisar as possibilidades de pronunciamento jurisdicional presentes na espécie.

Se o ato em relação ao qual a AP se omitiu tem natureza vinculada, pode o interessado recorrer ao PJ, requerendo que o magistrado supra a inércia do administrador, deferindo-lhe a pretensão diante da prova levada a efeito na via judicial. O julgador, diante da inércia ilícita do administrador em reconhecer direito amparado no ordenamento, substitui o pronunciamento administrativo, prestando a tutela requerida.

Se o ato omitido tem natureza discricionária, já se explicitou ser inadmissível ao magistrado exercer o juízo de conveniência e oportunidade privativo do administrador. Mas o PJ pode condenar o Poder Público agir assinalando-lhe prazo razoável, após o qual é lícito fixar multa diária pelo descumprimento da ordem judicial.

• Controle do ato político:

Especificamente no tocante aos atos políticos, de condução dos negócios públicos, certo é que classicamente se os entendia fora dos limites do controle judicial, em virtude da maior discricionariedade reconhecida aos agentes competentes à sua prática.

No Brasil, os atos políticos são exercidos primordialmente pelo Presidente da República e pela cúpula do Executivo, também encarregado da função administrativa.

Função política e função administrativa no Brasil são, assim, contemporaneamente exercidas, de forma preponderante, pelo Poder Executivo, porém, com uma linha fronteiriça de nem sempre fácil identificação na prática governativa, muito embora sejam funções marcadamente distintas.

No cotidiano da realidade do Estado, a maioria das decisões de governo se dá na esfera do Executivo, em seus órgãos superiores, o que dificulta delimitar o domínio da AP diverso do espaço do governo.

Buscar distinguir os atos governamentais serve, principalmente, para explicitar, pontualmente, os limites que incidem sobre os mesmos. A relevância da identificação do regime jurídico que também contorna os atos políticos é evidente, mormente em se considerando a repercussão das limitações constitucionais na elaboração e implementação das políticas públicas.

Não só as políticas públicas, mas todas as decisões de governo submetem-se à exigência de juridicidade. E o cumprimento do ordenamento que se lhes impõe é basicamente o conjunto das normas dispostas na Constituição e que incidem sobre o ato político em tese.

Alguns atos de governo como a elaboração e implementação de políticas públicas, são os instrumentos necessários à proteção dos direitos fundamentais exigida imperativamente pela Constituição.

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É característica dos atos políticos o fato de serem expedidos pelo Governo. Este estará, pois, no exercício obrigatório de competência fixada diretamente pela Constituição e da discricionariedade política decorrente do texto constitucional, cujos limites vinculam, imperativamente, os seus titulares.

O fato de a independência dos poderes estar consagrada no art. 2º, CR não implica obstar o cumprimento da função primordial do PJ, nem exclui o dever dos órgãos dos demais Poderes cumprirem as normas constitucionais, quando do exercício de qualquer das funções do Estado.

Se ao PJ assegura-se a revisão até mesmo das leis, cuja conformidade com as normas constitucionais é aferida em sede de controle difuso e concentrado, não há razão para excluir do controle judicial os atos do governo, pois também a função política deve se conformar à Constituição.

Mas atenção: o PJ não pode tomar para si toda a atividade governamental. Fazer cair a regra da imunidade de controle dos atos políticos não é o mesmo de transferir para o PJ a integralidade da competência para a sua prática. Ou seja, reconhecer a legitimidade da tutela jurisdicional das normas da Constituição sobre um ato de governo é coisa diversa de extinguir a discricionariedade política reservada ao Governo e de recusar os próprios limites da competência constitucional.

Não obstante, torna-se legítimo ao PJ aferir se o governo, ao formatar e executar uma política pública, atendeu os aspectos vinculados estabelecidos nos princípios e regras da Constituição.

A repercussão positiva de princípios constitucionais, de modo a vincular a execução de políticas públicas, tornou-se um postulado imperativo de toda atuação estatal, mesmo porque se trata de entendimento presente em recentes e significativas decisões dos Tribunais Superiores. A doutrina e jurisprudência passaram a proclamar que produzir um mínimo essencial à concretização dos direitos fundamentais previstos na Constituição é aspecto vinculado decorrente das próprias normas constitucionais. O fato de haver discricionariedade política não autoriza, portanto, a completa inércia estatal, nem mesmo a incompetência injustificada em prestar algo essencial à sobrevivência dos cidadãos.

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LICITAÇÃO:LICITAÇÃO:

Dicas iniciais:→ Atenção para as alterações da Lei 8.666/93, trazidas pelas Leis 11.763 e 11.783, de setembro 2008.→ Ler a Lei 10.520/02 (Lei do Pregão)

• Conceito e Finalidades:

É o procedimento que vai preparar, legitimar a celebração de um contrato administrativo.A principal finalidade ou objetivo desse procedimento é dar à AP a possibilidade de

selecionar a melhor proposta, a proposta mais vantajosa para a AP, para o interesse público. Mas atenção, a melhor proposta nem sempre é a de melhor preço, pode ser a de melhor técnica ou a de melhor técnica mais o melhor preço.

A segunda finalidade da licitação é dar a qualquer pessoa que preencha os requisitos legais a oportunidade de contratar com a AP. O princípio que podemos identificar aqui é, portanto, o Princípio da Impessoalidade. Assim, a licitação, bem como o concurso público, são os maiores exemplos de aplicação do Princípio da Impessoalidade.

• Obrigação de licitar – Sujeitos:

☺rol do art. 1º, Lei 8.666/93.

Estão sujeitos à licitação:

1) os entes que compõem a AP Direta (entes políticos): União, Estados, DF e Municípios;

2) os entes da AP Indireta: autarquias, fundações públicas, EP e SEM: quanto às EP e SEM, elas podem prestar serviço público ou ser exploradora da atividade econômica. Seu regime é privado – na verdade é um regime misto, híbrido: se ela presta serviço público seu regime será mais público do que privado, portanto não há dúvida, elas se sujeitam à Lei 8.666/93, sujeita-se à licitação; a dúvida aparece, pois, no caso da EP ou SEM ser exploradora de atividade econômica - ☺art. 173, §1º, III, CR - essas empresas poderão ter estatuto próprio, através de lei específica para licitações e contratos, mas, como esta lei ainda não existe, elas seguem por enquanto a norma geral, e por isso estão sujeitas à Lei 8.666/93.

Atenção aos seguintes casos especiais: (☺novidades)→ Petrobrás: deveria licitar; já que a lei específica não veio, deveria estar sujeita à

Lei 8.666/93. Mas não é isso que ocorre. A Lei 9.472/97 instituiu a ANP no Brasil e estabeleceu que a Petrobrás deveria ter procedimento simplificado de licitação (☺capítulo da Organização da Administração – item EP e SEM). Foi ajuizado o MS 25.888 que ainda não foi julgado. O STF decidiu em sede de liminar que, por enquanto a Petrobrás pode continuar licitando por meio de procedimento simplificado. O STF reconheceu que a Súm. 347 continua válida, ou seja o TCU pode declarar uma lei inconstitucional, mas apenas em controle concreto; o TCU não pode fazer controle

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concentrado de constitucionalidade. É esta a situação atual. Atenção para a decisão deste MS!

→ ECT: é uma empresa pública que, em razão do art. 21, X, CR, tem uma exclusividade sobre esse serviço de correios – não admite concessão, permissão ou autorização – é um serviço exclusivo de competência da União, mas quem o presta é uma empresa pública. Por isso deram à empresa pública o tratamento de Fazenda Pública, justamente por prestar esse suposto serviço exclusivo. Isso significa que ela tem todos os privilégios inerentes à Fazenda Pública. Mas existem outras empresas que prestam o mesmo serviço (Fedex, TAM Express, etc.). Essas empresas então entraram com a ADPF 46, para afastar a exclusividade da ECT, que ainda não foi julgada. Se for reconhecida a exclusividade, as demais empresas terão que desaparecer; se não for reconhecida a exclusividade, deverão acabar os privilégios da ECT. Ademais, existem lojas dos correios via franchinsing, e não por licitação e concessão do serviço (porque se o fosse, a própria empresa estaria afastando a sua exclusividade). Assim, o TCU quer que a ECT decida: se for Fazenda Pública ela tem que fazer tudo com as próprias mãos, não podendo existir franchinsings. Ocorre que a Lei 11.668/08 reconheceu esse regime de franchinsing. Foi ajuizada a ADI 4155 contra esta lei, para dizer que a ECT tem o dever de licitar, não podendo manter essa situação.

3) Fundos Especiais: esta expressão foi uma impropriedade do legislador, mas está na lei. Fundo especial pode ter 3 naturezas diferentes. Eles servem basicamente para fins assistenciais, esta é a regra (foram criados para isso). É uma forma de se legalizar o dinheiro público. Na sua maioria, pois, têm natureza de Fundação Pública. Mas se tem natureza de FP, não precisava vir em separado (ela já está no item anterior – já compõe a AP Indireta). Ademais, excepcionalmente, o fundo especial pode ter natureza de órgão. Por fim, em algumas legislações especiais, fundo especial é um código orçamentário, apenas para destinar dinheiro, é apenas uma identificação no orçamento, nem existe enquanto estrutura. Nesses dois últimos casos, portanto, não precisa licitar. E no primeiro caso também não precisava vir expresso, eis que sendo FP já está dentro da AP Indireta.

4) Os demais entes controlados direta ou indiretamente pelo Poder Público: ente controlado é aquele que tem recurso orçamentário, estando sujeito ao controle pelo TC e à licitação. Ex.: serviços sociais autônomos – sistema S (que têm algumas facilidades na licitação, mas estão sujeitos à licitação); as OSCIP; as OS (que têm uma dispensa que está sendo discutida em sede de ADI – ADI 1923).

• Competência para legislar em matéria de licitações:

☺art. 22, XXVII, CR/88

Compete privativamente à União legislar sobre normas gerais de licitações e contratos. A União exercitou essa competência editando as seguintes leis:

- Lei 8.666/93; - Lei 10.520/02; - Lei 8.987/95; e - Lei 11.079/04.

Essa competência exercida é de âmbito nacional. As leis de normas gerais servem para todos os entes da Federação, é uma competência de âmbito nacional.

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A União legisla sobre normas gerais. Os demais entes podem legislar sobre as normas específicas, sendo sua competência também específica – de âmbito estadual, municipal ou distrital (só tendo as normas aplicação para o ente que legislou).

Atenção:☺ADI 927: o STF discutiu a constitucionalidade de algumas alíneas do art. 17 da lei

8.666/93, que fala sobre as condições para se alienar bens públicos. O STF reconheceu que este art. tem dispositivos de normas gerais, mas também tem alíneas que representam normas específicas da União, que só podem ser aceitas enquanto normas de âmbito federal. O STF fez, pois, uma interpretação conforme, reconhecendo a constitucionalidade do art. desde que suas alíneas sejam interpretadas enquanto normas específicas de âmbito federal (só servindo à União).

Hoje o nosso legislador já vem acatando esse entendimento em algumas normas gerais, nas quais já coloca capítulos separados que se aplicam apenas à esfera federal.

• Princípios em matéria de licitações:

Os princípios gerais da AP valem também para a licitação: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência.

Mas existem também princípios específicos. São eles:

1) Princípio da vinculação ao instrumento convocatório: como regra geral é o edital (excepcionalmente pode ser carta-convite). O administrador não pode exigir nem mais e nem menos do que está estabelecido no edital. O edital é a lei da licitação.

2) Princípio do julgamento objetivo: o edital deve prever de forma clara e precisa qual será o critério de julgamento, de seleção – são os tipos de licitação: ☺art. 45, LLC – tipo técnica, tipo preço, tipo técnica + preço.

3) Princípio do procedimento formal: o procedimento de licitação tem várias etapas e exigências previstas em lei e que devem ser seguidos, obrigatoriamente. As formalidades previstas na lei devem ser seguidas. Uma formalidade não respeitada só ocasionará nulidade se causar prejuízo.

4) Princípio do sigilo das propostas: as propostas são sigilosas até o momento de sua abertura, em sessão pública. Existe uma modalidade de licitação que não tem sigilo de propostas: o leilão, já que os lances são verbais (não é o pregão!). O desrespeito ao sigilo das propostas é crime previsto na LLC e também configura improbidade administrativa.

• Hipóteses de contratação direta:

Acontece em situações excepcionais.Pode se dar por dispensa ou inexigibilidade de licitação.

→ Dispensa:

Na dispensa a competição é possível, é viável, mas por determinação do legislador será dispensada. A liberação é da lei.

A nossa lei traz duas hipóteses de dispensa: a licitação pode ser dispensada ou dispensável.

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Se a licitação está dispensada, não é mais possível a licitação, ainda que o administrador queira licitar, o administrador não tem liberdade para fazê-lo. É a hipótese do art. 17, LLC.

Se a licitação é dispensável, sendo possível a competição, o administrador terá liberdade para licitar se quiser. São as hipóteses do rol do art. 24, LLC.

O rol da dispensa é taxativo, e é preciso decorar as hipóteses.- Licitação deserta: ocorre quando não aparece ninguém para se habilitar. Neste caso só

será possível contratar diretamente se a repetição da licitação puder resultar em prejuízo. Como regra não há dispensa de licitação (o rol é taxativo e o legislador não falou nessa hipótese).

- Licitação fracassada: começa a licitação e todos são inabilitados. Aqui se permite a contratação direta por dispensa.

→ Inexigibilidade:

Ocorre quando a competição for inviável.A inexigibilidade deriva de uma inviabilidade de competição.☺ rol do art. 25, LLC – trata-se de um rol exemplificativo.Quando a competição será inviável?A competição, para ser viável, precisa cumprir 3 requisitos. Faltando qualquer um deles a

competição será inviável. São eles:a) Pressuposto lógico: pluralidade, ou seja, é preciso mais de um competidor – atenção

para os casos de contratação singular.b) Pressuposto fático: o objeto da licitação tem que ter interesse de mercado; há uma

diferença entre a licitação inexigível por falta de interesse de mercado e a licitação deserta: aquela acontece antes da publicação do edital; já esta é hipótese de dispensa, a AP já publicou o edital, mas não apareceu ninguém (em razão de falta de cumprimento de requisitos, ou por falha na publicidade, ou seja, não é necessariamente por falta de interesse de mercado).

c) Pressuposto jurídico: a licitação tem que proteger o interesse público. Se a AP, no lugar de proteger o interesse público, ela prejudicar esse interesse, ela será inexigível por falta de pressuposto jurídico.

Resumindo:

→ Dispensa: na dispensa de licitação, algumas razoes de tomo justificam que se deixe de efetuar a competição, embora possível, em nome de outros interesses públicos que merecem acolhida. Pode ser:

a) dispensável: cabe análise discricionária do administrador (art. 24); b) dispensada: não cabe análise discricionária do administrador (alienação de bens

móveis e imóveis, hipóteses do art. 17, I e II).

→ Inexigibilidade: a inexigibilidade resulta de inviabilidade de competição dada a ausência de pressupostos da licitação, seja lógico (que exige pluralidade de objeto ou de ofertante); jurídico (quando a licitação prejudica o interesse público), ou fático (quando não existem interessados). ☺art. 25 (rol exemplificativo).

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(06/11/08)

→ Quanto à exigência de procedimento prévio: quando não houver licitação ou por inexigibilidade ou por dispensa, ou seja, em caso de contratação direta, a condição do ato será cumprida da mesma forma, sendo que no lugar da licitação será realizado um procedimento de justificação. Isso é uma exigência que vem do próprio ato, da formalidade do ato.

Esse procedimento de justificação é encontrado no art. 26 da LLC.É nesse momento que a AP vai demonstrar a inexigibilidade e a dispensa; é aqui que se

legitima a conduta, a atuação do administrador.

• Alguns conceitos importantes:

- Licitação de grande vulto: aquela cujo valor estimado seja superior a 25 vezes o limite estabelecido no art. 23, I, C (25 vezes R$ 1.500.000,00) - ☺art. 6º, V.

- Licitação de alta complexidade: aquela que envolva alta especialização como fator de extrema relevância para garantir a execução do objeto a ser contratado ou que possa comprometer a continuidade da prestação de serviços públicos essenciais -☺art. 30, §9º.

- Licitação interna: aquela de que tanto poderão participar empresas nacionais, quanto, isoladamente ou em consórcio com empresas brasileiras (art. 33), empresas estrangeiras em funcionamento no país (art. 28, V).

- Licitação internacional: é aquela aberta à participação de empresas estrangeiras que não estejam em funcionamento no país.

• Modalidades de Licitação:

☺art. 22, LLC→ Critérios para escolha da modalidade:

a) Em razão do valor:

- Concorrência;- Tomada de Preços;- Convite.

b) Em razão das qualidades do objeto:

- Concorrência (em alguns casos, além de em razão do valor, a concorrência será obrigatória em razão das características de seu objeto);

- Leilão; aqui o valor não importa; o que importa são as qualidades do objeto,- Concurso; mas há uma exceção: o leilão pode ser obrigatório em razão do- Pregão. valor.

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A) Em razão do Valor:

- Concorrência:

Concorrência em razão do valor, ou concorrência pelo valor é aplicável quando o valor for alto.

Valores altos para a licitação são os enumerados no art. 23, LLC.(☺quadro no livro da prof.)No caso da concorrência, obras e serviços de engenharia o valor deve ser acima de

R$1.500.000,00; e no caso de outros bens e serviços, o valor deve ser superior a R$650.000,00.A concorrência, no entanto, também pode ser obrigatória em razão do objeto. O será, por

ex., no caso de compra ou venda de imóvel. Em regra a alienação de imóvel é por concorrência, mas há uma exceção no art. 19, LLC, que diz que se o imóvel for decorrente de decisão judicial ou dação em pagamento, será possível aliená-lo por concorrência ou leilão.

Outra hipótese: concessão de direito real de uso de bem público ou concessão de serviço, que excepcionalmente também pode se dar por leilão.

A última hipótese em que a concorrência aparece como obrigatória em razão do seu objeto é o caso de licitação internacional, que é aquela em que há a participação de empresas estrangeiras. Essa licitação internacional tem algumas regras próprias quanto à adaptação da moeda, aos documentos estrangeiros as serem apresentados, regras quanto à publicidade, etc., e tudo isso deve estar previsto no edital. Essa licitação exige a modalidade concorrência, mas há duas exceções em que será possível a adoção de outra modalidade: a) a modalidade tomada de preços, se seguido o valor da modalidade tomada de preços, sendo necessário também o cadastro internacional da Administração; b) a modalidade convite, quando o valor for correspondente ao convite e se não tiver fornecedor no país.

→ Prazo de intervalo mínimo: ☺art. 21, LLC – no caso da concorrência, o intervalo mínimo dependerá do tipo de licitação:

- Se a licitação for do tipo técnica ou do tipo técnica mais preço, o prazo será de 45 dias;- Se a licitação for do tipo preço, o prazo será de 30 dias.Atenção: como a lei só fala em dias e não em dias úteis, trata-se de dias corridos.

- Tomada de Preços:

Esta modalidade também é escolhida pelo valor e ela fica entre o limite máximo do convite e o mínimo da concorrência. Ou seja, para obras e serviços de engenharia a tomada de preços será usada para valores superior a R$150.000,00 (até R$1.500.00,00), e acima de R$80.000,00 (até R$650.000,00) no caso de outros bens e serviços que não os de engenharia.

Esta modalidade só pode ser escolhida em razão do valor.Quem pode participar desta modalidade:

c) podem participar aqueles licitantes cadastrados. O cadastramento é um banco de dados da AP, que funciona como uma habilitação prévia;

d) aqueles que preencherem os requisitos para o cadastramento até o 3º dias anterior à entrega dos envelopes. Obs.: preencher os requisitos não significa estar cadastrado; isso se comprova através de um requerimento (o licitante tem que apresentar um requerimento com todos os documentos – e o deferimento por parte da AP não é necessário aqui). Se nesses 3 dias a AP indefere seu cadastramento, será possível usar, por analogia (orientação doutrinária, já que a lei não diz nada a respeito), o recurso da habilitação, já que o cadastramento é uma habilitação

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prévia, e esse recurso tem efeito suspensivo, ou seja, o procedimento pára até que seja julgado o recurso.

→ Prazo de intervalo mínimo para a Tomada de Preços:- Se a licitação for do tipo técnica ou técnica mais preço: 30 dias;- Se a licitação for do tipo preço: 15 dias.Os dias são corridos, porque a lei não fala em dias úteis.

- Convite:

É modalidade de licitação escolhida em razão do valor.Ele vai de R$0,00 até o limite de R$150.000,00 para obras e serviços de engenharia; e de

R$0,00 até R$80.000,00 para outros bens e serviços que não os de engenharia.Quem pode participar: a) os licitantes convidados; licitantes cadastrados ou não podem ser convidados, desde

que estejam no ramo de atividade; serão convidados um número mínimo de 3 (para o TCU não é possível prosseguir sem as 3 propostas válidas, mas há quem diga que é possível prosseguir com menos se se justificar a ausência dos demais);

b) os cadastrados, que com 24 horas de antecedência deverão apresentar uma manifestação de que pretendem participar;

c) os não cadastrados ou não convidados, desde que realizarem seu cadastramento até 3 dias antes da entrega dos envelopes (usa-se a regra da tomada de preços) – esta regra é doutrinária, a lei não diz nada a respeito.

O instrumento convocatório do convite é a carta convite.→ Intervalo mínimo: 5 dias úteis. Aqui temos uma exceção, é a primeira oportunidade

em que a lei fala em dias úteis. ☺art. 51, LLC – detalhes sobre a comissão de licitação: normalmente composta de 3

servidores, mas, tratando-se de convite, se a repartição for pequena e a seleção de 3 for prejudicar o andamento do serviço, será possível realizar o convite com um único servidor (e não com a comissão).

Limite de 10% do convite: licitação dispensável – R$ 15.000,00 e R$ 8.000,00, respectivamente, para serviços de engenharia e para outros bens e serviços.

Limite dobrado (20%): R$ 30.000,00 e R$ 16.000,00, respectivamente – ☺art. 24, P.U. – quando evolver autarquia ou fundação qualificadas como agencias executivas, EP, SEM e consórcios públicos (da Lei 11.107 – constituído pela união de entes políticos, constituindo associações – se o consórcio público contar com até 3 entes, os valores são dobrados, e se contar com mais de 3 entes, serão triplicados).

☺art. 26, §8º, LLC.

Obs.: Imagine que a lei exija a modalidade convite. Se a lei exigiu convite, é possível substituir essa modalidade por outra? Essa possibilidade só é cabível se for da mais simples para a mais rigorosa. Ex: se exigir tomada de preços, pode fazer concorrência; se exigir convite, pode fazer tomada. O inverso não é verdadeiro.

☺art. 23, §8º: Se o consórcio público tiver até 3 entes, faremos valores dobrados. Se tiver mais de 3 entes, os valores serão triplicados. Imagine que o consórcio tenha sido constituído por 3 entes – União, Estado de São Paulo e Município de São Paulo. Se tiver 3 entes, os valores serão dobrados.

Art. 23, §8º: “No caso de consórcios públicos, aplicar-se-á o dobro dos valores mencionados no caput deste artigo quando formado por até 3 (três) entes da Federação, e o triplo, quando formado por maior número”.

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Imagine que o consórcio tenha sido constituído pela União, 2 estados e 5 municípios. Se tiver mais de 3 entes, é necessário triplicar os valores. O limite do convite, então, será de R$450.000,00. Da mesma forma, o limite da tomada será de R$ 4.500.000,00.

B) Em razão do Objeto:

- Leilão:

Quando se utiliza a modalidade leilão? É modalidade de licitação que serve para alienação. Não se compra nada com o leilão.

- Alienação de bens imóveis: Que tipo de bem imóvel? Quando o bem for decorrente de dação em pagamento ou de decisão judicial (☺art. 19).

- Alienação de bens móveis: Quais são os bens móveis? Inservíveis (não é sinônimo de sucata. É aquele bem que não serve mais, mas pode servir a outra pessoa. Ex: tem um órgão que tem que fazer fiscalização no interior. O carro está velho que coloca em risco com viagens. Mas, esse carro será útil com outro órgão que não tenha que viajar), apreendidos e penhorados (restrição judicial para a garantia do juízo). Bem penhorado é objeto de penhora. Ela é restrição na ação de execução. Os bens penhorados são alienados em hasta pública. Os móveis serão através de leilão e os imóveis através de praça. O legislador queria falar em bens empenhados, e não penhorados. Os bens alienados por leilão da Lei 8.666/93 são os bens empenhados (são bens objetos de penhor. Ex: leilão de jóias da CEF).

- ☺art. 17, §6º: É possível a alienação de bens móveis, através de leilão, até o limite de R$ 650.000,00. A lei não qualificou os móveis. Então, significa dizer qualquer móvel.

Quem é responsável pelo leilão? É o leiloeiro. É possível fazer concurso para leiloeiro? Não é a prática, mas se a Administração decidir criar um cargo de leiloeiro pode criar o concurso. O que normalmente acontece é designar um servidor como leiloeiro.

O procedimento do leilão não está previsto na Lei 8.666/93. Ele segue a praxe administrativa. No leilão, é o quem dá mais. Não tem uma formalidade especial. A lei não prevê o procedimento.

Qual é o intervalo mínimo? É de 15 dias corridos.

- Concurso:

Quando se utiliza o concurso? O concurso público é igual ao concurso da Lei 8.666? Para que serve o concurso público? Serve para provimento de cargo. O objetivo é preencher cargo ou emprego público. E o concurso da lei de licitação? Serve para escolher trabalho técnico, artístico, científico, dando em contrapartida um prêmio (ex: viagem, bolsa de estudo, carro zero) ou remuneração.

Qual é o prazo de intervalo mínimo do concurso? O prazo é de 45 dias corridos. Obs.: Promoção ou concurso da Nestlé – onde se encontrará as regras desse tipo de

concurso? No site ou no verso da embalagem ou no regulamento. O concurso não tem procedimento na lei. Ele é previsto em regulamento próprio. Não

estudaremos o procedimento de concurso, pois cada concurso tem o seu procedimento.Comissão de concurso – Normalmente, quem participa da comissão é o servidor público.

Excepcionalmente no concurso, o sujeito não precisa ser servidor. Qualquer pessoa e com conhecimento na área, desde que idônea, pode participar da Comissão do Concurso (chamada de

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“comissão especial”, porque não precisa ser composta por servidor). É possível ser servidor na Comissão? Não precisa, mas pode ser.

- Pregão:

Para quem foi instituído pela primeira vez o pregão? Para as agências reguladoras, em 1997 (☺Lei 9.472/97 – Lei da ANATEL).

Em 2000, o pregão foi introduzido para a União, a partir de uma medida provisória. Com a Lei 10.520/02, o pregão passa a ser utilizado para todos os entes da federação.

A nova modalidade foi instituída com o escopo de aperfeiçoar o regime de licitações, permitindo o incremento da competitividade e a ampliação das oportunidades de participação nas licitações, além de desburocratizar os procedimentos para a habilitação e o cumprimento da seqüência de etapas do procedimento, contribuindo para a redução de despesas e concedendo uma maior agilidade nas aquisições.

A idéia simples e inovadora de estabelecer uma competição mais acirrada pelo menor preço em licitações favorece a AP, os fornecedores e a sociedade, que têm como exercer maior controle sobre as contratações realizadas. Busca-se o máximo pelo menor preço.

As regras do pregão são inovadoras e simples, no que tange ao procedimento. A lei prevê a inversão das fases de habilitação e classificação dos licitantes, permitindo que seja examinada somente a documentação do participante que tenha apresentado a melhor proposta, conforme veremos a seguir.

Para que serve o pregão? Serve para aquisição de bens e serviços comuns, ou seja, aqueles bens e serviços que podem ser conceituados no edital como expressão usual de mercado. Bens e serviços comuns cujos padrões de desempenho e qualidade sejam objetivamente definidos por edital, por meio de especificações usuais de mercado. Ex.: peças de reposição de equipamentos, mobiliário padronizado, combustíveis, material de escritório e serviços como limpeza, vigilância, conservação, seguro-saúde, locação, manutenção de equipamentos, agenciamento de viagens, vale-refeição, bens e serviços de transporte, etc.

Na modalidade, não há limite quanto ao valor, podendo qualquer quantia ser licitada. Todavia, a lei estabelece algumas hipóteses que, em razão da natureza do objeto, estão vedadas ao pregão: a) nas contratações de obras e serviços de engenharia; b) nas locações imobiliárias; c) nas alienações em geral; d) nas compras e contratações de bens e serviços de informática e automação.

O prazo de intervalo mínimo entre a última publicação do instrumento convocatório (o edital) e a entrega dos envelopes é de 8 dias úteis.

Em resumo, são finalidades do pregão: a redução de despesas, a redução do tempo necessário para a realização do certame licitatório, a possibilidade de realização de tantos pregões quantos forem necessários para um mesmo objeto; não-limitação de valor para a sua realização.

O pregão é modalidade de licitação somente no tipo preço. Não se admite o pregão para tipo técnica. Portanto, engenharia está fora. É necessário escolher o menor preço.

Quem faz pregão no Brasil? O pregoeiro. A nossa lei estabelece que o pregoeiro seja assistido por uma equipe de apoio. Esta equipe não tem, normalmente, poder decisório. É muito mais uma equipe organizacional, preparatória. Não significa dizer que essa equipe não mande nada. Quem bate o martelo é o pregoeiro.

Existem 2 tipos de pregão, a saber:

a) Presencial

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b) Eletrônico: seguirá o mesmo procedimento do pregão presencial. Sendo que o eletrônico acontecerá no mundo virtual. Com certeza, serão necessárias algumas adaptações. Para participar do mundo virtual, as pessoas recebem uma senha, chamada de “chave”. Não tem caído em concurso, porque as adaptações do pregão eletrônico foram feitas pelo Dec. 5.450/05, mas é bom conhecê-lo: o pregão na forma eletrônica como modalidade de licitação do tipo menor preço realiza-se quando a disputa pelo fornecimento de bens ou serviços comuns for feita à distância, em sessão pública, por meio de sistema que promova a comunicação pela internet. Essa modalidade apresenta um procedimento bem diferenciado. O pregão eletrônico foi introduzido para a busca de algumas finalidades e vantagens, tais como: agilidade nas aquisições de bens e serviços, garantia de transparência, maior segurança, otimização dos recursos, interação de diversos sistemas, redução de custos aos fornecedores e inibição à formação de cartéis. Em razão desses benefícios apresentados, o referido decreto estabelece que, para a União nas licitações para aquisição de bens e serviços comuns, será obrigatória a modalidade pregão, sendo preferencial a utilização da sua forma eletrônica, que somente não será utilizada quando comprovada a sua inviabilidade, devendo o fato ser justificado pela autoridade competente. Objetivando ainda a aplicação dessa modalidade licitatória, a União ampliou a sua obrigatoriedade, agora não somente para os seus órgãos, como também para outras pessoas jurídicas. Dessa forma, disciplinou no Dec. 5.504/05 que os instrumentos de formalização, renovação ou aditamento de convênios, os demais instrumentos congêneres, bem como nos consórcios públicos, quando envolver repasse voluntário de recursos públicos da União, deverão conter uma cláusula que determine que suas contratações serão realizadas através de procedimento licitatório e, quando tratar-se de aquisição de bens e serviços comuns, será obrigatório o emprego da modalidade pregão, devendo ser utilizada preferencialmente a sua forma eletrônica. Inclusive, quando ocorrer a inviabilidade da forma eletrônica, a autoridade competente deverá justificar. Excepcionalmente, a modalidade pregão na forma eletrônica fica proibida para as contratações de obras de engenharia, bem como para as locações imobiliárias e alienações em geral.

A preferência é pelo pregão, quando ele for cabível. E entre o presencial e o eletrônico, deve ser escolhido o pregão eletrônico, no âmbito federal. Ocorre que, na prática, imaginar pregão eletrônico para o âmbito federal é fácil, mas imaginá-lo no âmbito de um município pobre é muito difícil.

→ Observações Finais:

Essas modalidades estão previstas no art. 22 da Lei 8.666/93. Se a questão falar de valor, deve-se escolher uma das 3 modalidades – concorrência,

tomada de preço e convite. São modalidades escolhidas pelo valor, mas com uma exceção. A concorrência é escolhida pelo valor, mas a lei diz que em alguns casos ela também será

obrigatória em relação ao objeto. O segundo critério é a qualidade de objeto. Ex: comprar bens e serviços comuns,

contratar trabalho técnico, artístico e científico. Não importa o valor. O que interessa são as qualidades do objeto. A distinção entre uma e outra decorre das qualidades do objeto.

Há uma exceção: O leilão é escolhido pelo objeto, mas há uma hipótese em que tem limite de valor.

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☺Quadro sinóptico dos prazos:

Modalidades: Prazos:Concorrência: 45 dias corridos (critérios técnica e técnica e preço)

30 dias corridos (critério menor preço)Tomada de preços: 30 dias corridos (critérios técnica e técnica e preço)

15 dias corridos (critério menor preço)Convite: 5 dias úteis

Concurso: 45 dias corridosLeilão: 15 dias corridosPregão: 8 dias úteis

☺ Limites para as modalidades licitatórias: (☺arts. 23 e 24, I, II e P.U., LLC)

_________________________________________________↓ ↓ ↓ ↓ ↓0 15.000 30.000* 150.000 1.500.000

______________________________________________________↓ ↓ ↓ ↓ ↓0 8.000 16.000* 80.000 650.000

*

Atenção: para os consórcios públicos, os valores das modalidades licitatórias serão dobrados quando participarem até 3 entes da federação e triplicados quando participarem mais de 3 entes da federação (☺art. 23, §8º).

• Procedimento:

A concorrência, a tomada e o convite têm a mesma seqüência de atos, com algumas adaptações.

A Lei 8.666 é desorganizada. A licitação é um procedimento.

→ Etapas do procedimento:

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ConviteTomada de

PreçosConcorrência

OBS.: é possível substituir da mais

simples para a mais rigorosa

(☺art. 22, §4º)

Obras e serviços de engenharia

Outros bens e

serviços

Dispensável

Aplicam-se esses valores de dispensa de licitação quando tratar-se de EP, SEM, AE e consórcio públicos, de acordo com o art. 24, P.U., da LLC. Perceba que esses valores representam o dobro dos valores da

regra geral (20%do limite para a modalidade convite)

Esse valor também é limite para o leilão - ☺art. 17, §6

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a) Fase interna:

Esta fase identifica qual é a necessidade do processo. É necessário formalizar o processo, colocando capa, número, etc.

Feita a autuação do processo, deverá identificar a necessidade. Normalmente, quem pede alguma coisa deve fundamentar.

Posteriormente, será necessário identificar o recurso orçamentário. Quando se fala de recurso orçamentário, há uma questão muito interessante. Dizer que a obra não foi concluída porque não tinha dinheiro, significa que houve algo de errado, alguma irregularidade. O dinheiro acaba porque a Administração não tomou o cuidado necessário, e não previu no orçamento, ou porque o dinheiro não sobrou. Muitos administradores colocam a mentira na Lei Orçamentária, criando créditos que não vão entrar. Ex: “Caso de Odarongi”. IPTU de proprietário desconhecido. Cobra como? Inscrevendo na dívida ativa. Em face de quem? De Odarongi (ignorado de trás pra frente) da Silva. Entrou no orçamento como possível crédito. O dinheiro não entrará nunca.

Nomeia-se a comissão, observando as regras do art. 51 da lei.Após isso, a comissão irá elaborar o edital, devendo respeitar o art. 40 da lei.O edital precisa ser submetido ao parecer jurídico. É importante fundamentar muito bem

o parecer. Feito o parecer, o processo vai à autoridade que irá autorizar formalmente a deflagração

do certame. Quem é a autoridade superior? Ela irá fazer um ato especial para isso? A autoridade superior é o chefe que nomeou a comissão. Dependerá da lei de organização, podendo ser o ministro, o secretário, o prefeito, o governador, etc.

Com a autorização formal ocorre o fim da fase interna.

Resumindo: antes de iniciar a licitação, a administração precisa reservar um recurso orçamentário e nomear a Comissão. As regras sobre a Comissão de licitação estão previstas no art. 51 da Lei 8.666. Os requisitos do edital estão no art. 40 da Lei 8.666.

(20/11/08)

b) Fase externa:

Tem início com a publicação do edital.As regras sobre publicação do edital estão no art. 21, LLC.Publicado o edital, há duas discussões que merecem um maior estudo:- É possível que a AP cobre por este edital? A AP não pode vender o edital como

instrumento de arrecadação, mas é possível sim que se cobre o valor do custo de sua reprodução. Pode ser oferecido gratuitamente numa página da internet? Com certeza.

- Alguns editais estabelecem a participação condicionada à compra: o licitante só pode participar se comprar o edital. Esta condição é ilegal e não pode ser colocada no edital. Não é possível condicionar a licitação à compra do edital. O licitante precisa conhecer o edital, mas não precisa comprá-lo, ele pode conhecer o edital que outrem haja comprado, por ex O que

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acontece, na verdade, é que o licitante precisa conhecer o edital, não interessando de que maneira..

Este é o momento que o licitante e qualquer cidadão tem para impugnar o edital. Quanto à impugnação - ☺art. 41, LLC:Qualquer cidadão pode impugnar o edital. A lei fala em cidadão e não em pessoa. Ou

seja, é aquele que está em pleno gozo de seus direitos políticos.O cidadão tem o prazo de 5 dias úteis anteriores à data marcada para a entrega dos

envelopes para impugnar o edital (pode fazê-lo até o 5º dia útil).Apresentada a impugnação pelo cidadão, a comissão terá 3 dias úteis para decidir sobre a

impugnação.O licitante também pode apresentar impugnação ao edital. E neste caso duas observações

são importantes: o licitante tem até o 2º dia útil anterior para apresentar a impugnação (seu prazo é maior do que o do cidadão); o licitante tem que fazer isso neste momento, pois decairá do direito de fazê-lo se não o fizer nesta oportunidade (ao menos na via administrativa, porque na via judicial nada impede que ele discuta isso posteriormente).

Qual a natureza jurídica da impugnação? E ela suspende ou não o procedimento licitatório?

A impugnação não tem natureza de recurso, por isso não tem efeito suspensivo. Poderíamos perguntar se não há nisso uma incoerência? A comissão pode descobrir o defeito tarde demais. Neste caso, terá de começar tudo de novo. O ideal é que a Comissão julgue antes do recebimento dos envelopes, mas não há exigência nesse sentido.

Imagine que a comissão, recebendo as impugnações, verifica que o edital está com defeito. É possível que a comissão altere o edital? ☺art. 21, §4º, LLC. Atenção para este art. que cai muito em provas de concursos!

Para alterar um edital é preciso que haja um aditamento, que tem que ser publicado da mesma forma que é publicado o edital.

Se a alteração do edital atingir obrigações do edital (tanto para criar uma nova como para dispensar uma já existente) reabre-se o prazo de intervalo mínimo, de acordo com as exigências de cada modalidade.

Este é o momento do recebimento dos envelopes.Quantos envelopes o licitante deve entregar em cada licitação? Depende do tipo da

licitação: podem ser 2 ou 3 – se for do tipo preço serão 2, se for do tipo técnica serão 2, se for do tipo técnica e preço serão 3.

Todos os envelopes são entregues de uma só vez, todos lacrados.Se o licitante chegar atrasado, ele pode participar da licitação? O que interessa é o

momento em que a licitação encontra-se: o licitante atrasado pode participar se chegar até o momento de entrega de envelopes.

O licitante não precisa estar presente, o que é necessário é que os envelopes estejam lá no momento da entrega (podem chegar pelo correio, por outrem, não importa).

→ Fase de habilitação:

Alguns doutrinadores preferem a terminologia “qualificação”.Recebidos os envelopes inicia-se a fase de habilitação com a abertura do primeiro

envelope. Todos os membros da comissão e todos os licitantes presentes deverão então rubricar todos os envelopes, para evitar a substituição de envelopes, caso a licitação tenha que ser suspensa.

Se forem muitos licitantes, e a licitação for muito grande, é possível que a comissão escolha 3 licitantes que rubricarão todos os envelopes em nome de todos.

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Abertos os envelopes será preciso rubricar todos os documentos de todos os envelopes. Isso é importante porque se o licitante não entregou uma certidão, não poderá entregar depois porque ela não estará rubricada.

Feito tudo isso, a comissão passa a análise da documentação de todas as empresas.Para que o licitante esteja habilitado é preciso que se cumpram os requisitos previstos no

art. 27, LLC. Os arts. seguintes (28 a 31) falam dos documentos que devem ser apresentados para comprovar cada um dos requisitos.

O rol do art. 27 é taxativo. Ele precisa ser memorizado porque cai muito em concursos.Se o licitante cumprir os requisitos da habilitação ele estará então habilitado. O licitante

que não cumpriu os requisitos estará inabilitado ou desqualificado (e não desclassificado – Atenção!).

Se todos os licitantes forem inabilitados, será preciso tentar salvar a licitação, através da diligencia prevista no art. 48, §3º, LLC: a comissão suspenderá a licitação para que os licitantes tentem complementar os documentos pendentes em 8 dias úteis (e no caso do convite este prazo pode ser reduzido para 3 dias úteis).

Se vencido este prazo e todos os licitantes ainda continuarem inabilitados, será preciso licitar tudo outra vez. Não será caso de dispensa de licitação porque o rol para a dispensa é taxativa. Só há dispensa quando o fracasso se der na fase de classificação (e não na fase de qualificação).

Mas, imaginando-se que houve licitantes habilitados, a habilitação será julgada. Ai abre-se a oportunidade para recurso desse julgamento, no prazo de 5 dias úteis (salvo no caso de convite, em que este prazo será de 2 dias úteis). Aqui há efeito suspensivo (normalmente o recurso em licitação não tem efeito suspensivo, com apenas duas exceções, e esta é uma delas). ☺art. 109, LLC.

Resolvida a habilitação, os habilitados passam à próxima fase.

→ Fase de classificação e julgamento:

Aqui são feitas as análises das propostas.Num primeiro momento a comissão vai abrir as propostas, rubricar tudo novamente, e

analisar cada uma delas. Esta etapa é chamada de classificação.Aqui é preciso verificar se a proposta cumpriu as formalidades do edital. Se sim, a

comissão analisará se o preço está compatível com o praticado no mercado. Se a proposta não cumprir formalidades ou se o preço não estiver compatível com o de mercado o licitante será desclassificado (e não desqualificado – não confundir!). ☺arts. 44 e 48, LLC.

Se o licitante apresentar preço igual a zero ou irrisório, ele seria, em tese, desclassificado, já que o preço tem que estar de acordo com o preço de mercado. O valor zero ou irrisório só não leva à desclassificação quando ele não depender do trabalho, matéria prima e serviço, de outros (se o seu serviço só depender dele mesmo a proposta poderá ser aceita), porque cria-se uma presunção de que ele não conseguirá cumprir o contrato.

Essa desclassificação ainda não dá oportunidade de recurso.Se as formalidades do edital foram cumpridas e o preço estiver de acordo com o de

mercado passa-se a fase de julgamento.Se houver empate nos valores entre duas empresas, a lei estabelece alguns critérios de

desempate, em seu art. 3º, §2º.Encerrada a lista do art. 3º, §2º, se as empresas ainda continuarem empatadas, a saída

então será o sorteio, que deve ser descrito com detalhes na ata. ☺art. 45, §2º, LLC.O art. 3º sofreu críticas, sendo que muitos chegam a dizer que ele não teria sido

recepcionado pela CR/88, porque a Constituição, em seu texto original, distinguia a empresa de capital nacional das demais. Mas o novo texto da CR, pós emendas, não traz mais esta distinção.

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Ocorre que depois das emendas da CR o texto da LLC já foi alterado e não houve alteração no texto do art. 3º. Assim, não é caso de revogação (ao menos não expressa). E, apesar da posição doutrinária, este art. continua sendo cobrado em concursos. Não há nada pacífico sobre isso.

Feito o desempate, o próximo passo é uma nova fase de classificação.Essa nova classificação significa colocar em ordem as empresas já classificadas, de

acordo com a melhor proposta.Se nesta etapa todos os licitantes foram desclassificados, a primeira saída serão as

diligências para tentar salvar a licitação (☺art. 48, §3º, LLC), no prazo de 8 dias úteis (ou 3 dias úteis no caso do convite). Se ainda assim todos os licitantes tiverem sido desclassificados, agora sim haverá contratação direta com dispensa de licitação (é caso de licitação fracassada).

Julgado tudo, ai sim abre-se oportunidade de recurso, no prazo de 5 dias úteis (salvo no caso de convite, que o prazo será de 2 dias úteis). O recurso aqui também terá efeito suspensivo (é a segunda exceção, já que a regra é que os recursos na licitação não tenham efeito suspensivo). ☺art. 109, LLC.

→ Fase da homologação:

A autoridade que vai homologar vai conferir a regularidade do procedimento.Homologação é a verificação de regularidade.Quem homologa a licitação é uma autoridade superior (e não a própria comissão). É

aquela mesma autoridade que nomeou a comissão e autorizou a deflagração do procedimento.Se algo estiver errado, se houver algum defeito, ou seja, se o procedimento é ilegal

(porque não cumpriu alguma exigência legal) a saída é a anulação. Se estiver tudo certo, homologa-se.

→ Fase da adjudicação:

É o resultado oficial da licitação. É dar ao vencedor o status de vencedor.Feita a adjudicação, o licitante vencedor tem direito a assinatura do contrato? Há direito

subjetivo a assinatura do contrato? A posição aqui é a de que se trata de mera expectativa de direito. Mas ele tem o direito de não ser preterido.

Se a situação for a inversa, a comissão quer o contrato, o licitante está obrigado a assinar o contrato? Sim, ele está obrigado a assinar o contrato, no preço apresentado na proposta, pelo prazo de 60 dias a contar da fixação do preço pelo licitante, ou seja, a data designada para a entrega dos envelopes. O edital pode trazer um prazo maior, se já se souber de antemão que trata-se de uma licitação mais demorada.

Se o licitante, ainda que dentro do prazo, não quiser assinar o contrato ele será penalizado pelas penalidades previstas no art. 87, LLC. E, neste caso, será chamado o segundo colocado, que será chamado na proposta do primeiro (já que o primeiro fixou o preço), mas ele não estará obrigado a assinar o contrato. Se ele não quiser, chamam-se os seguintes. Se ninguém quiser, vamos ter que licitar tudo de novo. É licitação chamada de licitação frustrada por alguns autores (mas atenção: ela não é nem deserta).

• Procedimento do Pregão:

Como vimos, o pregão é a modalidade de licitação para aquisição de bens e serviços comuns, em que a disputa pelo fornecimento se dá por meio de sessão pública, presencial ou eletrônica, por meio de propostas e lances, para a classificação e habilitação do licitante que

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ofertou o menor preço. Destaque-se que o único critério possível para a seleção é o de menor preço.

☺ Lei 10.520/02Esta lei só traz o que é diferente, não traz todo o procedimento. Em muitos aspectos o

pregão segue as regras da LLC.Aqui agora verificaremos o que é diferente neste procedimento, para que ele seja mais

célere. Isso se dá, especialmente, em virtude da inversão do procedimento, considerando a seqüência das demais modalidades.

Na fase interna não há diferenças, afora a nomeação do pregoeiro e da equipe de apoio. Nela ocorrerá a justificativa da necessidade de contratação, definição do objeto do certame, bem como a elaboração do edital, definindo as exigências de habilitação, critérios de aceitação das propostas, sanções por inadimplemento e cláusulas do contrato, inclusive com fixação dos prazos para fornecimento.

Formalizado o processo, constituída toda a fase inicial de formalização do processo, passa-se à fase externa, em que também se realizará a publicação do edital.

A fase externa compreende, pois, as seguintes fases: publicação do edital, julgamento e classificação das propostas, habilitação, adjudicação e homologação, com obediência a essa seqüência.

A publicação do edital tem algumas regrinhas especiais, mas nada de muito diferente.Feita a publicação, os licitantes irão entregar os envelopes. Na licitação na modalidade

pregão serão entregues apenas 2 envelopes, já que o critério é preço (e somente o menor preço).Feito o recebimento dos envelopes, tudo recebido e assinado, passa-se à fase de

classificação e julgamento. Lembramos que aqui há uma inversão das fases.Quanto à fase classificação e julgamento, há algumas peculiaridades.Nesta fase os licitantes também apresentarão suas propostas escritas nos envelopes. Mas

nesta etapa temos duas sub-etapas para a escolha da melhor proposta: haverá um julgamento com análise de propostas escritas e haverá um julgamento com análise de propostas verbais.

A AP aqui utiliza a proposta escrita para fazer um filtro, uma pré-seleção. As empresas pré-selecionadas é que apresentarão propostas verbais (lances verbais).

A pré-seleção é feita da seguinte forma: será primeiro selecionada a melhor proposta; em seguida passa-se a seleção de todas aquelas que não excederem a 10% do valor da melhor proposta. Feito isso, será preciso que haja uma seleção da melhor e de pelo menos mais 3 outras empresas (ou seja, no mínimo 4 licitantes). Se não houver ao menos 3 outras empresas cujo valor apresentado não exceda o limite dos 10%, será preciso ignorar a regra dos 10% e selecionar a melhor e as outras 3 melhores propostas seguintes.

Passa-se aos lances orais, para que então se chegue à empresa vencedora.Passa-se então à fase de habilitação. Só passa a esta fase o licitante vencedor na fase

anterior. Na habilitação os requisitos são os mesmos da LLC.Se a empresa vencedora da fase anterior não se habilitar, chamam-se os seguintes. Neste

caso, como o preço ainda não foi fixado, chama-se o segundo, o terceiro, etc. colocados no seu próprio preço, e não no preço do primeiro, porque este não demarcou o valor do contrato. O pregoeiro pode negociar com o segundo colocado uma redução do seu valor, mas ele será chamado no seu preço (a licitação ainda não está concluída, não está ainda fixado o preço).

Assim, na habilitação ocorrerá a abertura do envelope, contendo apenas a documentação do licitante vencedor (trata-se de uma exigência dos arts. 27 a 32, da Lei 8.666/93). Caso o primeiro colocado seja inabilitado, o pregoeiro passará a examinar a documentação do segundo colocado, e assim sucessivamente, podendo negociar a redução do preço (☺art. 4º, XVII).

Abre-se, então, a oportunidade para o recurso, que será apresentado oralmente na mesma hora, no momento da sessão, mas podem ser entregues as razões por escrito em 3 dias. Alguns

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autores falam que são 3 dias úteis, outros em 3 dias corridos. Prevalece o entendimento de que são 3 dias úteis.

Declarado o vencedor, qualquer licitante poderá manifestar imediatamente a vontade de recorrer, sob pena de decadência. As razoes de recurso serão apresentadas no prazo de 3 dias, com igual prazo para os demais apresentarem contra-razoes (☺art. 4º, XVIII).

Resolvida a fase de recurso, a próxima etapa da licitação pregão é a adjudicação (que é feita imediatamente após a decisão dos recursos). A lei inverteu as fases da licitação geral. Ou seja, primeiro ocorre a adjudicação e depois a homologação. Na prática não há muita diferença porque é a mesma autoridade que adjudicará e que homologará.

O vencedor será convocado para assinar o contrato no prazo fixado no edital. Em caso de recusa, serão chamados os demais licitantes pela ordem de classificação (☺art. 4º, XVI).

☺Quadro sinóptico – Roteiro do procedimento do pregão:

1) Abertura da sessão → 2) credenciamento → 3) orientações de operação do pregão → 4) abertura dos envelopes de propostas → 5) seleção das propostas para lances verbais → 6) etapas de lances verbais → 7) negociação → 8) abertura de envelope e habilitação da melhor proposta → 9) manifestação de recursos → 10) adjudicação e homologação.

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CONTRATOS ADMINISTRATIVOS:CONTRATOS ADMINISTRATIVOS:

Dicas iniciais:→ Ler a lei seca (Lei 8.666/93)→ Estudar os contratos em espécie – principalmente concessão e permissão de serviço público

• Introdução:

Contrato administrativo é espécie do gênero contrato. É preciso aqui, pois, relembrar os conceitos estudados em Direito Civil.Será que todo contrato que a AP celebra é um contrato administrativo? Não. Como

vimos, a AP também celebra contratos como, por ex., contratos de locação, que são regidos pelo direito privado. Assim, nem todo contrato celebrado pela AP é contrato administrativo. Se a AP celebrou um contrato, este contrato será um contrato da Administração, mas não necessariamente será um contrato administrativo. Só será contrato administrativo se for regido pelo direito público.

Aqui estudaremos os contratos administrativos, regidos pelo direito público, já que os contratos regidos pelo direito privado serão estudados no direito privado.

• Conceito:

Contrato administrativo é um ato jurídico bilateral, que constitui um vínculo jurídico, com sujeito ativo e sujeito passivo que se comprometem a uma prestação e a uma contraprestação, criando, modificando ou extinguindo direitos, sujeito ao regime jurídico público, com a participação do Poder Público.

É a convenção estabelecida entre duas ou mais pessoas para constituir, regular ou extinguir entre elas uma relação jurídica patrimonial, tendo sempre a participação do Poder Público, visando à persecução de um interesse coletivo, sendo regido pelo direito público. É o ajuste que a AP firma com o particular ou outro ente público, para a consecução do interesse coletivo.

A presença do poder público pode estar no sujeito ativo, no sujeito passivo ou em ambos os pólos.

O regime jurídico é de direito público. É neste regime que encontramos a especialidade desse contrato e que podemos encontrar as cláusulas exorbitantes.

• Características:

a) O contrato administrativo é um contrato formal. São inúmeras as formalidades que transformam o contrato administrativo em um contrato formal. Essas formalidades serão estudas em seguida.

b) O contrato administrativo é um contrato consensual, ou seja, se aperfeiçoa no momento em que se manifesta a vontade. A constituição da relação acontece no momento em que se manifesta a vontade, é ai que ele estará perfeito e acabado. Ele é o contrário do contrato

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real, que está condicionado a um outro fator, como a entrega do bem (ex.: contrato de empréstimo).

c) O contrato administrativo é um contrato comutativo, ou seja, ele tem que ter prestação e contraprestação equivalentes e predeterminadas. É diferente do contrato aleatório.

d) O contrato administrativo é um contrato de adesão, ou seja, não é possível discutir suas cláusulas contratuais, já que uma das partes tem o monopólio da situação. O que pode haver é a escolha da parte se quer ou não aderir ao contrato. Quando o licitante entra na licitação, a minuta do contrato já está no edital, ele não pode discutir suas cláusulas.

e) O contrato administrativo é personalíssimo, ou seja, leva em consideração as qualidades do contratado. Isso significa que, em tese, não é possível a subcontratação em contrato administrativo. A subcontratação frauda o dever de licitar e viola o Princípio da isonomia. Por isso, para a doutrina brasileira, a subcontratação não é vista com bons olhos. Mas a lei diz que a subcontratação não autorizada no contrato gera a rescisão do contrato. Ou seja, a lei permite a subcontratação, que, no entanto, deve ser aceita em caráter excepcional. A lei apresenta alguns requisitos para a subcontratação:

- a possibilidade de subcontratação deve estar prevista no contrato ou no edital, - ela deve ser autorizada pela AP, - a empresa subcontratada terá que preencher todos os requisitos exigidos na licitação

(especialmente a idoneidade fiscal, a qualificação técnica, etc.),- não pode haver a subcontratação da totalidade do contrato, mas apenas de parte dele

para que não haja fraude à licitação e para que não se agrida a isonomia.

• Formalidades do contrato administrativo:

1) Procedimento licitatório ou procedimento de justificação: é preciso que haja licitação prévia ou, se for caso de contratação direta (licitação dispensável ou inexigível), deverá ocorrer um procedimento de justificação (☺art. 26, LLC).

2) Forma escrita: é a regra geral, mas excepcionalmente será possível o contrato administrativo verbal (☺art. 60, P.U., LLC: pronta entrega, pronto pagamento e valor até R$4.000,00).

3) Publicação: o contrato administrativo depende de publicação. O que é publicado é o extrato de contrato. O dever de publicar é obrigação da AP e corre a cargo da AP. O prazo que tem a AP para esta publicação é de 20 dias, segundo determina a lei, não podendo ultrapassar o 5º dia útil do mês subseqüente ao de sua assinatura. Ou seja, se o contrato for assinado em 05/11, a AP terá 20 dais para publicar o contrato; mas se o contrato for assinado em 25/11, a AP terá até o 5º dia útil do mês de dezembro para publicar (a regra determina que o termo final é o que acontecer primeiro). Há divergência doutrinária quanto a esta contagem, mas esta é a posição que prevalece. ☺art. 61, P.U., LLC.

4) Instrumento de contrato: ☺art. 62, LLC. É preciso que haja um documento que disponha todas as regras, todos os detalhes a cerca da contratação. O instrumento de contrato é este documento que descreve de forma minuciosa as regras, as condições da relação jurídica. O instrumento de contrato é obrigatório quando tratar-se de contrato no valor correspondente às modalidades concorrência e tomada de preços. Se a licitação for dispensável ou inexigível, não importa. O que importa é o valor do contrato. O instrumento de contrato será facultativo, por sua vez, quando tratar-se de contrato correspondente ao convite e quando for possível realizá-lo de outra maneira (ex.: nota de empenho, carta contrato, ordem de serviço, ordem de pagamento – válidos apenas para atos simples). Esta regra traz a forma do ato que, em regra, é vinculada, mas se a lei traz alternativas, trata-se de forma discricionária.

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• Cláusulas necessárias dos contratos administrativos:

☺art. 55, LLC.As mais importantes cláusulas consideradas indispensáveis, obrigatórias em todo contrato

administrativo, sob pena de nulidade são:

1) Objeto e seus elementos característicos;2) Regime de execução ou forma de fornecimento;3) Preço e condições de pagamento, critérios, data-base e periodicidade do reajustamento

de preços, critérios de atualização monetária entre a data do adimplemento das obrigações e a do efetivo pagamento;

4) Prazos de início de etapas de execução, de conclusão, de entrega, de observação e de recebimento definitivo, conforme o caso;

5) Crédito pelo qual correrá a despesa, com a indicação da classificação funcional programática e da categoria econômica;

6) Garantias oferecidas para assegurar sua plena execução, quando exigidas;7) Direitos e responsabilidades das partes, penalidades cabíveis e valores das multas;8) Casos de rescisão e reconhecimento dos direitos da AP, em caso de rescisão

administrativa;9) Condições de importação, data e taxa de câmbio para conversão, quando for o caso;10)Vinculação ao edital de licitação ou ao termo que a dispensou ou inexigiu, ao convite

e à proposta do licitante vencedor;11)Legislação aplicável à execução do contrato e especialmente aos casos omissos;12)Obrigações do contratado de manter, durante toda a execução do contrato, em

compatibilidade com as obrigações por ele assumidas, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação;

13)Definição do foro competente para as ações referentes ao contrato, que será a sede da Administração.

• Garantia:

☺art. 56, LLC. A AP deve ou pode exigir a garantia? A lei diz “pode”. A doutrina majoritária, no

entanto, entende que se trata de um poder-dever. A AP vai exigir a garantia com um percentual de quanto? Qual o valor dessa garantia? Até 5% do valor do contrato, salvo no caso de contrato de grande vulto, de alta complexidade, de riscos financeiros para AP, em que será possível chegar ao valor de até 10% do valor do contrato. Quem exige a garantia é a AP, mas quem escolhe a forma de prestá-la é o contratado, e ele pode escolher uma das alternativas da lei: caução em dinheiro, título da dívida pública, fiança bancária ou seguro garantia. O seguro garantia é um contrato de seguro do contrato (se a empresa não cumprir, a seguradora paga).

• Duração do contrato:

A duração máxima do contrato administrativo está prevista no art. 57, LLC. Ele deve ter sempre prazo determinado. O prazo máximo do contrato deve corresponder ao prazo máximo de um crédito orçamentário, que decorre do limite máximo da lei orçamentária, que é de 12 meses. Assim, o limite máximo do contrato administrativo é de um ano, como regra geral. ☺art. 166 e ss, CR/88. Mas, excepcionalmente, o contrato administrativo pode ter um prazo maior: se o seu

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objeto estiver previsto no PPA (plano plurianual – lei que estabelece metas e ações de governo pelo prazo de 4 anos). O limite, neste caso, então, é o próprio limite do PPA, que é de 4 anos. Mas também pode haver prazo diferenciado quando se tratar de prestação contínua (quanto maior o prazo, melhor o preço), quando é possível chegar ao prazo de até 60 meses. Ademais, a lei prevê uma prorrogação, em caso de excepcional interesse público, por mais 12 meses. Outra exceção é o caso de aluguel de equipamentos e programas de informática, para o qual o prazo máximo será de 48 meses. Por fim, nos casos de concessão e permissão de serviços, o prazo deve estar previsto na lei do serviço. Obs.: para os contratos sem desembolso (em que não há despesa) a AP pode fixar um prazo maior, dependendo do interesse da AP, não sendo necessário observar o prazo do art. 57, LLC, trata-se de uma determinação que decorre da LC 101.

(21/11/08)

• Cláusulas Exorbitantes:

O que significa uma cláusula exorbitante? Cláusula exorbitante é aquela que extrapola, que exorbita o comum dos contratos. É claro que a cláusula exorbitante traz para a administração alguns privilégios, algumas

prerrogativas. Se fosse escrita em contrato simples, seria considerada como cláusula abusiva, seria cláusula não lida.

Elas estão previstas no art. 58 da lei. Quais são as cláusulas exorbitantes?

1. Possibilidade que tem a administração de alterar unilateralmente o contrato administrativo. Lembre-se de que isso irá acontecer por parte da administração.

Falando de alteração contratual, é necessário saber o seguinte: as regras sobre alteração estão previstas no art. 65 da lei. Este artigo fala de 02 formas de alteração.

a) Alteração unilateral: Quem pode alterar unilateralmente é a administração. O contratado deverá aceitar essa alteração. Não poderá fazer qualquer alteração. A lei estabelece quando é possível que isso aconteça. O nosso sistema não se admite a alteração com relação à natureza do objeto. Ex: A administração contratou o transporte coletivo com uma empresa. Durante o contrato, a empresa quer que passe a ser serviço de telefonia.

A lei admite alterar as especificações do projeto. Imagine que a administração contratou com uma empresa privada a construção de uma escola. No meio do caminho, decide alterar o tipo de cerâmica da escola. Essa alteração significa alteração qualitativa do projeto. Está alterando aspectos da qualidade do projeto.

Imagine que a administração está contratando com uma empresa privada a construção de 100 km de rodovia. Este é o objeto. Para a execução dessa rodovia, a empresa precisa realizar a terraplanagem de determinada área. Foi determinado que dos 100 Km, a empresa deverá realizar uma área de 50 de terraplanagem. Quando da execução do contrato, percebe que a área de terraplanagem será insuficiente. A empresa terá de realizar uma área maior de terraplanagem. Conclui que serão necessário 80 km de terraplanagem. Essa alteração é qualitativa ou quantitativa? Tem cara de quantitativa, mas não é, porque o objeto do contrato continua o mesmo – 100 Km de rodovia. O que se está alterando são as qualidades do projeto. Se alterasse de 100 Km para 150 Km, a alteração seria quantitativa.

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Alteração quantitativa: Conseqüentemente, alterará o valor. O objeto será alterado quantitativamente. Imagine que a administração esteja comprando 100 canetas. Será que a administração, no meio do contrato, possa exigir que entregue 120 canetas? E se quiser reduzir de 100 para 80 canetas. Isso é possível? Alteração quantitativa é possível, porque a lei estabelece um limite de 20 %. Mais do que isso, seria um novo contrato. Seria uma fraude à licitação. A administração deverá pagar qual preço? A administração pagará aquilo que efetivamente estiver contratando. A alteração quantitativa do objeto gera a alteração do valor conseqüentemente. Ex: cada caneta custava 1,00. Alterou de 100 para 120 canetas. Quanto deverá pagar? A diferença do valor contratado. Se a caneta custava 1,00, ela continuará a pagar 1,00. Reforma = Planeja gastar 10.000,00, mas gasta muito mais. Nunca consegue executar dentro do que estava programado. A administração também passa por esse problema. A lei, então, estabelece que se tratar de reforma (seja de edifício ou de equipamento), a acréscimo poderá chegar em até 50%. A supressão continua em 25 %.

b) Alteração bilateral: Quando é possível alterar de forma bilateral o contrato administrativo? Quem escolhe a forma de prestar a garantia é o contratado. É possível que as partes, de comum acordo, alterem a garantia. Ex: foi prestado caução em dinheiro – será substituída por fiança bancária.

Há possibilidade de alteração do regime de execução do contrato. Quando se fala em regime, estamos falando das regras de execução do contrato. Ex: contratou 100 km, e o regime de execução foi contratado como 10 km por mês. É possível alterar a forma que o contrato será executado (regime de execução)? Sim. Não se está falando de alteração de projeto. Está falando de etapas da execução.

Obs.: Isso sempre cai em prova, misturando com especificações do projeto. Também é possível que as partes convencionem a alteração no que diz respeito à forma

de pagamento. Ex: A administração pagou aparelho de ar condicionado e até hoje não chegou. A lei diz expressamente que não se admite pagar antes de receber. Não se pode pagar pelo serviço antes de recebê-lo. Então, é possível alterar a forma de pagamento, desde que não pague antes do recebimento.

A alteração bilateral para o equilíbrio econômico e financeiro do contrato. Quando acontece essa alteração bilateral? Imagine que no momento da licitação, o licitante apresentou o preço da caneta a 0,95 centavos. Ganhou a licitação e foi celebrado o contrato. A empresa percebe que esse valor dará prejuízo. Será que é possível revisar o preço neste caso? Se ela apresentou 0,95 centavos, e nada de novo aconteceu depois disso, a empresa pode ter prejuízo, mas isso não significa desequilíbrio contratual. Só poderá falar em desequilíbrio se surgir uma situação nova. É muito comum isso na prática. O fato novo pode gerar desequilíbrio.

→ Teoria da Imprevisão = fala da alteração contratual para o equilíbrio econômico e financeiro do estado. É a velha cláusula rebus sic stantibus. Ela depende de algumas condições. Nós temos um contrato celebrado e, no momento da celebração, estabelece um equilíbrio. Depois disso surge um fato novo. Ex: fato superveniente (aumento do tributo que não estava programada, aumento do dólar, etc.). Qualquer situação que pudesse ser prevista e que não foi prevista intencionalmente pela parte, não poderá ser alegada. Isso não é teoria da imprevisão. É necessário lembrar-se de uma surpresa, de algo que não estava programado. Deve ser algo imprevisto (não previsto em contrato). Ademais, deve ser algo imprevisível (não dava para imaginar, não dava para planejar). Não pode jogar aqui a falta de cuidado do contratado. O contratado deverá assumir a responsabilidade se agir sem cuidado. Esse fato novo, imprevisto e imprevisível, irá desequilibrar o contrato, gerando um prejuízo para uma das partes. Irá gerar a onerosidade excessiva para uma das partes. Se tudo isso acontecer, há possibilidade de revisão contratual.

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Quais são as situações de teoria da imprevisão? • Fato do príncipe: Nada mais é do que uma atuação unilateral do Poder Público,

geral e abstrata. Sendo que irá atingir o contrato de forma indireta ou reflexa. Ex: serviço de coleta de lixo. No meio do contrato, há uma alteração da alíquota do ISS de 2% para 5%. O contrato será atingido pela alteração da alíquota. Essa alteração prejudica a coleta de lixo? Poderá até continuar coletando o lixo, mas não nesse preço. Não há impedimento ao ato de coletar o lixo. Se atingir o preço e não o objeto do contrato, falamos que atinge o contrato de forma indireta.

• Fato da administração: É também a atuação do Poder Público. Só que é uma atuação específica, e não geral e abstrata. Essa atuação é concreta, que atingirá diretamente o contrato. Tem um impedimento ao objeto principal do contrato. Ex: construção de viaduto. A administração contrata uma construtora. Só que para construir o viaduto, é necessário desapropriar uma área. Imagine que celebrado o contrato, a administração proibiu a desapropriação da área. Se não houver desapropriação, é possível construir o viaduto? Com certeza, não. Quando se fala da negativa da desapropriação, estamos impedindo o objeto principal. Atinge diretamente o contrato.

• Interferência Imprevista: O que acontece com isso? São situações decorrentes de aspectos da natureza, que já existem ao tempo da celebração do contrato, mas que só podem ser descobertas ao tempo de sua execução. Ex: Imagine que a administração contratou a construção de um edifício para a instalação de um hospital. Quando a empresa começa a realizar a obra, percebe que o terreno é mole demais. Então, a empresa precisará de uma estrutura mais resistente. E o fato novo? Só tinha como se descobrir quando da execução. Apesar de o fato ser preexistente, a empresa não tinha como descobrir isso antes. A descoberta é superveniente.

• Caso fortuito e força maior: Há divergência doutrinária. Alguns doutrinadores dizem que só pode caso fortuito, outros dizem que só pode forca maior. A lei diz as 02 hipóteses.

Obs.: Só será cláusula exorbitante a alteração unilateral do contrato.

2. Também é possível que a administração rescinda de forma unilateral o contrato. Obs.: se tiver um contrato comum, as partes poderão alterá-lo e extingui-lo de forma

bilateral. Portanto, todo contrato não. Não serão consideradas cláusulas exorbitantes.

3. Possibilidade de fiscalização do contrato. A administração pode fiscalizar o contrato. Na verdade, a fiscalização é uma obrigação da administração. Fiscalização é a prestação de serviço, é a obra pública, etc. Acontece que essa fiscalização vai alem de interferir. É possível, inclusive, a intervenção da administração na atividade realizada pela empresa. É uma fiscalização mais ampla, mais forte, com poder maior de interferência na execução desse contrato.

4. Possibilidade de a administração aplicar penalidades pelo descumprimento do contrato. Essas penalidades estão numeradas no art. 87 da lei. Ele traz os detalhes das penalidades. O que é importante guardar sobre essas penalidades? Na verdade, a lei estabelece 04 penalidades, e o administrador poderá aplicar de acordo com a sua análise. A lei não estabelece uma conduta e uma penalidade. A lei estabelece as sanções, e quem definirá cada sanção será o administrador. Quais são as sanções possíveis?

a) Advertência:b) Multa: De quanto é a multa? Os detalhes dependerão de previsão do contrato. A lei

não estabelece de quanto é, quando será cobrada, etc.c) Suspensão: Para situações mais graves. Ocorre a suspensão de contratar com o Poder

Público. Essa pena é aplicada até o prazo de 02 anos. A pena de suspensão atingirá o

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ente que aplicou a sanção. Se foi o Município (X) quem aplicou a sanção, a empresa estará impedida de contratar com o Município (X). Não impede que a empresa contrate com outros entes da administração.

d) Declaração de idoneidade: Essa pena será aplicada no mesmo limite da suspensão. Ou seja, será pelo prazo de até 02 anos. O que acontece com essa declaração? A empresa foi declarada inidônea. Então, com quem ela estará impedida de contratar? Com todos os entes da administração. A administração, em razão de todos os requisitos, só poderá contratar com a empresa idônea. Não só com quem aplicou a pena, mas com todos os entes da administração. Essa pena é muito mais ampla, muito mais rigorosa e muito mais séria. O que a empresa deverá fazer para voltar a ser idônea? Ela deverá reabilitar. E quando ocorrerá essa reabilitação? Ela deverá, primeiramente, cumprir o prazo estipulado. Além disso, ela deverá indenizar os prejuízos causados na administração. Essas 02 condições são cumulativas.

Como a declaração de idoneidade é uma pena muito grave, a doutrina diz que ela só poderá ser praticada em situações em que a conduta praticada seja criminosa. A própria lei 8.666 traz algumas condutas criminosas. O administrador é quem irá dosar a pena. Esse cuidado é para evitar abuso do administrador.

5. Ocupação provisória dos bens: Quando aparece? Imagine que a administração celebre com uma empresa privada o serviço de coleta de lixo. Meses depois, a empresa está descumprindo o serviço. Está prestando um péssimo serviço. A administração poderá extinguir o contrato e retomar o serviço? Sim. Atenção: A extinção do contrato é um ato administrativo. Já aprendemos que se for praticado um ato administrativo, ele depende de um procedimento administrativo prévio. É necessário dar à empresa o direito do contraditório, o direito de ampla defesa. Se não tiver outro jeito, a saída será a extinção do contrato.

Ex: Imagine que instaurado o procedimento administrativo, durante esse procedimento, a administração poderá retirar o serviço desde já? Poderá retomar o serviço? Sim. E se ela não tiver os caminhões necessários para a coleta de lixo, o que ela poderá fazer? Ela poderá ocupar provisoriamente os bens do contratado, primando pelo princípio da continuidade.

Encerrado o procedimento, a administração decidiu pela rescisão do contrato. O que acontecerá com os bens que estavam sendo ocupados provisoriamente? Esses bens poderão ser transferidos em definitivo para a administração, através do instituto da reversão. Nem sempre a reversão irá acontecer, mas ela pode acontecer.

E terá de indenizar? Que tipo de bem poderá ser ocupado? A ocupação provisória e a reversão poderão atingir os bens necessários para a continuidade do serviço. Além disso, elas são passíveis de indenização. (“Depende da amortização do contrato” = celebrado o contrato, ele estabelecerá além do lucro, o retorno do patrimônio. Se será passível ou não de indenização dependerá do que já foi amortizado. Isso dependerá da previsão contratual e de quanto tempo o contrato já estava rolando).

• Exceptio non adimpleti contractus:

É cláusula exorbitante? É também é chamada de exceção do contrato não cumprido. Significa que não se pode exigir o cumprimento da outra parte, enquanto não se cumprir a

sua. Hoje, essa exceção é aplicável aos contratos administrativos. É aplicável de forma

diferenciada – ☺art. 78, XV, lei. É aplicável a partir de 90 dias. Ex: a administração deixa de pagar o serviço de coleta de lixo. O contratado é obrigado a prestar o serviço? Isso acontece pelo

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prazo de 90 dias. Vencidos os 90 dias, se a administração não pagar, o contratado poderá suspender o serviço. Se ele não quiser mais o contrato, ele deverá ir ao Poder Judiciário para extinguir.

A exceção é aplicável aos contratos administrativos, mas não é imediatamente. Ela é aplicável de forma diferenciada. Isso acontece em razão do Princípio da Continuidade (Para que o serviço público não seja interrompido de repente).

A lei não proíbe essa cláusula, mas só determina a aplicação de forma diferenciada.Isso é cláusula exorbitante? No contrato comum (ex: compra e venda de geladeira). Se o

vendedor não entregar a geladeira, ele não poderá exigir que pague o valor. Essa cláusula é aplicável aos contratos comuns e aos contratos administrativos. Se ela está presente nos dois contratos, ela pode ser consideração cláusula exorbitante? Não. HLM dizia que a exceção não era aplicável aos contratos administrativos. A sua ausência é que representava a cláusula exorbitante. Hoje, entretanto, a maioria aceita essa cláusula nos contratos administrativos.

• Extinção do contrato:

Hipóteses:

1. Conclusão do objeto: A primeira hipótese vem justamente com a conclusão do objeto. Ex: A administração contratou a construção de uma escola. Encerrada a obra, conclui-se o objeto. Inclui o advento do termo contratual. Ex: contratou o serviço de segurança pelo prazo de 06 meses. Vencidos os 06 meses, o contrato estará extinto.

2. Rescisão: a) Administrativa: é aquela feita de forma unilateral pela Administração. Quando

a administração poderá extinguir unilateralmente o contrato? • Razões de interesse público: não há mais interesse público nesse contrato.

Ocorre em nome da supremacia do interesse público. A administração deverá indenizar o contratado? A administração deve indenizar. A supremacia exige que a administração indenize os prejuízos causados ao contratado.

• Descumprimento de cláusula contratual: Quando a empresa contratada não estiver prestando bem o serviço. A administração deverá indenizar? Não. O contratado que deverá indenizar, a depender do que aconteceu.

b) Judicial: Imagine que o contratado não queira mais o contrato, requerendo a extinção do contrato. Ele poderá extinguir de forma unilateral? Isso é prerrogativa da administração. Para o contratado, a saída é a via judicial.

c) Amigável ou Consensual: É possível que, de comum acordo, as partes decidam pela extinção do contrato. Falamos em rescisão amigável ou em rescisão consensual. Ocorre por acordo entre as partes. No direito privado, é chamado de distrato.

d) De pleno direito: decorre de circunstâncias estranhas à vontade das partes. Ex: falecimento, incapacidade civil, falência, etc.

3. Anulação: Se o contrato tiver uma ilegalidade, o que acontecerá com ele? A saída será a anulação.

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SERVIÇOS PÚBLICOS:SERVIÇOS PÚBLICOS:

• Conceito:

É o serviço que deve ser prestado pelo Estado. Deve ser prestado para a coletividade. Qual é o regime aplicável a esse serviço?

Não há uma lista de serviço público. Não existe um rol taxativo. O que acontece é que o serviço deixa de ser serviço público de acordo com o momento histórico. Imagine há uns 20 anos atrás, a telefonia de celular não era utilizada. Serviço de bonde – como está esse serviço? E o serviço de energia elétrica? Os serviços se modificam de acordo com o contexto social.

Trata-se de uma utilidade ou comodidade material que o Estado irá prestar para satisfazer uma necessidade coletiva. Se falarmos em serviço público, veremos que o Estado irá assumir. O Estado iria assumir algo que não fosse necessidade coletiva? Isso não seria possível. O Estado só pode se comprometer à prestação, se o serviço representar uma atividade coletiva. Ex: serviço de rádio armador não representa um serviço coletivo. É necessário ser uma necessidade geral, coletiva.

Apesar de ser necessidade coletiva, não pode esquecer que cada um utiliza de sua maneira. A prestação é feita de forma coletiva, mas o serviço é utilizado, fruível singularmente.

O serviço é utilizado individualmente de acordo com as necessidades de cada pessoa.O Estado assume como dever. A comodidade transforma em obrigação do Estado. O

Estado poderá prestar de forma direta ou indireta (ex: concessão, permissão). Ele pode prestar com as próprias mãos ou ele poderá descentralizar.

Se o Estado assume como obrigação sua, a prestação é feita no regime público ou privado? Ex: telefonia celular. Na verdade, o regime do serviço público é um regime público, mas não precisa ser totalmente público. Pode transferir para empresas privadas. Uma concessionária de telefonia, de transporte coletivo – serviço tem parte pública e parte privada.

• Princípios aplicáveis:

Devemos lembrar-nos de todos os princípios estudados no início do curso. Mas, além desses princípios, encontraremos uma lista no art. 6º da lei 8987/95. Esta lei fala sobre concessão e permissão de serviço.

O que significa o serviço adequado? A doutrina chama de princípios específicos do serviço.

Vejamos:

1. Princípio da Continuidade: O serviço público deve observar o Princípio da Continuidade o que significa que o serviço não pode ser interrompido. Já foi falado na segunda aula desse curso.

2. Princípio da Eficiência: o serviço deve ser efeciente, não pode ter desperdício. Essa exigência foi introduzida no art. 6º antes mesmo da EC 19/98.

3. Princípio da Generalidade ou Universalidade: O princípio serviço deve ser prestado erga omnes, à coletividade em geral. Todos têm direito. Será que esse princípio está sendo

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aplicado no Brasil? Quando encontramos crianças sem ensino, pessoas sem saúde pública, nós percebemos que esse princípio não está sendo muito aplicado.

4. Princípio da Segurança: Vale lembrar que o serviço não pode colocar em risco a vida, a saúde e a integridade dos administrados. O serviço público é prestado efetivamente com segurança? Ex: aviação. Não há segurança.

5. Princípio da Atualidade: O serviço público deve ser prestado de acordo com as técnicas mais modernas. O “estado da técnica” significa técnica mais moderna.

6. Princípio da Modicidade: Significa que o serviço deve ter tarifas mais baratas possíveis. Será que isso é respeitado pelo Brasil? Ex: transporte coletivo, inscrição em concurso público.

7. Princípio da Cortesia: O serviço público deve ser prestado com cortesia, com boa educação, com urbanidade.

• Estrutura:

Existem diversas situações em que o serviço é indeterminado. O Estado deve fazer por sua conta. Há serviços em que o Estado tem a obrigação de promover e também tem de descentralizar o serviço. Também há casos em que o Estado deve prestar, mas ele pode transferir.

Quando falamos em serviço público, perguntamos de quem é a competência para aquele serviço.

A determinação constitucional estabelece, na maioria dos casos, a competência de serviço.

É necessário lembrar que o texto constitucional (☺arts. 21, 22, 30, etc.) não esgota todos os serviços. A Constituição não tem rol taxativo. Conseqüentemente, os demais serviços serão prestados de que maneira? A competência será estabelecida de acordo com o interesse. Se for de interesse geral, será da União; se for de interesse regional, será do estado; se for de interesse local, será do Município. Pensando nisso, quem determinará sobre o serviço será a LEI.

Exemplo de serviço que não está na CR: serviço funerário. É um serviço de interesse local. Município (A) – tem monopólio da prestação nas mãos de uma única empresa. Isso ainda acontece no País.

Quais são os tipos de serviços encontrados na Constituição?

1. Serviços Exclusivos do Estado: Devemos lembrar-nos do art. 21, X, CR – serviço postal. Por que esse serviço é exclusivo? A Constituição da República, em vários dispositivos, diz que o Estado deve prestar de forma direta ou indireta. A própria Constituição da República está reconhecendo a possibilidade de se transferir. Quando se fala desse dispositivo, a Constituição da República não prevê essa possibilidade. Ela não fala da possibilidade de transferência desse serviço. Então, alguns doutrinadores chegaram a conclusão de que o serviço postal é exclusivo, pois não há nenhuma previsão de transferência.

Apesar de ser empresa púbica, o ECT ganha tratamento de Fazenda Pública. O fundamento é justamente o fato de prestar um serviço em que a Constituição da República não autorizou a transferência.

Na prática, outras empresas prestam esse serviço. Já comentamos que a lei 11.668/08 legalizou o sistema de franquias de correio, portanto, reconheceu que o serviço não é exclusivo.

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Se não há exclusividade, essa empresa não poderia ter tratamento de Fazenda Pública. Só que essa matéria não está resolvida ainda. Por enquanto, essa matéria não foi decidida ainda (ADPF 46). Também se discute a constitucionalidade da lei 11.668.

2. Existem alguns serviços que o Estado tem a obrigação de prestar (é dever dele), mas ele tem a obrigação de transferir esse serviço: Obrigatoriamente, o serviço deve ser transferido. Ex: serviço de rádio e TV. O que acontece com esse serviço? O político não pode ter rádio, pois ele poderia manipular informações (Art. 223, Constituição da República). Se o Brasil tivesse só TV pública, seria muito diferente. É necessário surgir a possibilidade de a informação aparecer. É necessária a liberdade, a autonomia e a imparcialidade.

3. Há alguns serviços em que o Estado transfere de forma facultativa. É um serviço que o Estado tem a faculdade de promover. Quando a Constituição da República diz pode ser direta ou pode ser indireta, significa que o serviço deve ser promovido, mas a transferência é facultativa. Poderá transferir se for conveniente. Ex: transporte coletivo, telefonia (concessão, permissão e autorização do serviço). Muitos serviços foram transferidos por causa da PND.

4. Existe uma situação muito importante na Constituição da República. Imagine o transporte coletivo. O Estado resolveu transferir o transporte. O Estado faz uma lei e transfere para a autarquia esse serviço. A competência é do Estado e ele é quem faz essa transferência. Só que há uma categoria de serviços de titularidade do Estado, mas sem exclusividade. Significa dizer que o Estado é titular, mas o particular também é titular. Ex: ensino, saúde. O particular presta serviço porque fez um contrato com o Estado? Não. O particular presta serviço por causa de lei? Não. Ele presta porque a própria Constituição da República deu a ele essa titularidade. Não há vínculo. Há uma fiscalização, mas não há descentralização. Não é uma hipótese em que o Estado transferiu. Ex: para abrir uma faculdade, há uma fiscalização.

Obs.: MS contra diretor de universidade privada. Mas o Mandado de Segurança não é ajuizado em face de autoridade? Estamos falando de um serviço público, seja ele prestado pelo Estado ou pelo particular. O particular presta função pública. Há divergência na doutrina, mas a jurisprudência é clara nesse sentido.

• Classificação:

Há várias classificações. Só ficaremos com 02 hipóteses (são as que aparecem em prova de concurso):

1. De acordo com a essencialidade do serviço: Essa classificação foi introduzida por HLM. É muito criticada pela doutrina moderna. Ela não é compatível com a nossa realidade.

a) Próprio ou Propriamente Dito: é o serviço essencial, indispensável. O serviço essencial ou próprio não pode ser delegado. Não se admite delegação ao particular.

b) Impróprio ou Serviço de Utilidade Pública: É aquele serviço não essencial. É o serviço secundário. Esse serviço pode ser delegado ao particular.

Qual é o problema? Serviço próprio – ex: segurança nacional. Será que transporte coletivo é essencial? Com certeza, mas quem presta esse serviço no Brasil é o particular. O essencial, segundo o HLM, não poderia ser transferido. Hoje, há muito serviços essenciais que já foram transferidos, que já foram delegados. Há uma incoerência com o atual contexto. HLM faleceu em 1990. A partir de 1995, o Brasil entrou na chamada Política Nacional de Desestatização. Mas então, não poderia jogar para o impróprio? Poderia, mas o serviço de transporte é essencial.

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2. De acordo com os destinatários: Quem pode ser destinatário? a) Serviço geral: são prestados à coletividade em geral. São serviços que não podem ser

medidos e calculados. Não dá para medir e calcular o quanto cada um utiliza. Esse serviço é chamado de indivisível. Se o serviço é indivisível, ele deve ser mantido através de qual recurso? É mantido pela receita geral do Estado (resultado basicamente da arrecadação dos impostos). Imposto é espécie tributária não vinculada à atividade estatal. O administrador dará o destino desse recurso. Exemplo de serviço geral e indivisível: segurança pública, iluminação pública. Dá para medir e calcular o quanto cada um utiliza da iluminação pública? Se não dá, o serviço é geral. Logo, deveria ser mantido pela receita geral. No Brasil, existiu a chamada TIP. Isso representava uma maravilhosa arrecadação para o Estado. Só que taxa é tributo vinculado à contraprestação estatal. Só que não pode medir e calcular o quanto cada um utiliza. Então, a TIP foi dita como inconstitucional. Posteriormente, foi criada a CIP (contribuição de iluminação pública). Mas contribuição também é vinculada à contraprestação estatal. A doutrina fala mal, mas não foi declarado inconstitucional. Até hoje, a contribuição continua existindo. É serviço geral, logo, deveria ser mantido pela receita geral. Ex: taxa do bombeiro – carnê do IPTU. É constitucional? Dá para medir e calcular o quanto cada um utiliza? Não. Então, a taxa é inconstitucional. É serviço geral. Ex: taxa do buraco – é cobrada para tapar os buracos da cidade – carnê de IPVA. Dá para medir e calcular? Não. Houve o ajuizamento da ação. Foi declarada inconstitucional.

b) Serviço individual: são aqueles que têm destinatários determinados. Logo, pode medir e calcular o quanto cada um utiliza. São serviços específicos e divisíveis. Como se mantém serviço individual? Através de taxa ou tarifa? Depende. Há 02 serviços individuais, a saber:

• Compulsórios: São os mais importantes, os essenciais. Esses serviços são prestados pelo próprio Estado, que cobra através de Taxa (espécie tributária vinculada à contraprestação estatal). Quais os serviços são compulsórios? Não há lista. Há muita divergência em relação à enumeração desse serviço. O serviço compulsório é pago pelo simples fato de estar à disposição. Ex: saneamento básico. Pagará mesmo se viajar durante 01 ano. No Brasil, também existe pagamento de taxa mínima para quem não tem o serviço. Tem município que tem grande área sem saneamento básico, mas que cobra taxa mínima. Se ele não existe, não poderia ser cobrada taxa mínima.

• Facultativos: Só paga se utilizar esses serviços. Eles serão cobrados por Tarifas (não tem natureza tributária. Tem natureza de preço público). O administrador pode cobrar quando bem entender. Não tem preocupação com a legalidade, com a anterioridade, etc.

• Delegação de serviço público:

Quando é possível delegar serviço público? Estudaremos a delegação feita por ato administrativo e a delegação feita por contrato. O instituto que mais aparece é a concessão de serviço público. Se aparecer na prova

“concessão”, é necessário olhar se é de serviço ou de uso do bem (será visto no Intensivo II). São institutos diferentes.

Desde 1995, tínhamos a concessão de serviço na lei 8987/95. Qual é a natureza jurídica da PPP? A natureza jurídica é de concessão. Se for concessão,

o que irá acontecer com a da lei 8987? O legislador disse que a velha será chamada “concessão comum”. A nova será chamada “concessão especial”. Somente na lei de parcerias que essa terminologia foi utilizada.

A concessão especial está prevista na lei 11.079/04.

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Permissão de serviço público: Transferência do serviço com base na lei 8987. Há 02 artigos para permissão – art. 2º e art. 40. No mais, aplica-se o que couber o que foi dito para a concessão.

Autorização do serviço: Acontece por ato unilateral. Não é vista com bons olhos. A doutrina diz que deve aplicar o que couber a lei 8987/95.

(27/11/08)

• Concessão de serviço público:

Existem duas regras sobre concessão de serviço público. Começaremos a estudar a Concessão comum de serviço público e, em seguida, estudaremos a Concessão especial ou Parceria Público-privada.

A) Concessão comum de serviço público:

A concessão comum de serviço público está prevista na Lei 8.987/95. Esta lei é de uma linguagem simples e de poucos artigos.

☺Lei 8.987/95Concessão comum de serviço público é a delegação de serviço público feita pela

Administração que retém a titularidade e transfere somente a execução do serviço. A delegação é feita pelo Poder concedente a pessoa jurídica ou consórcio de empresas.

Pode concedente é a pessoa jurídica da AP Direta que tem o serviço na sua órbita de competência.

Atenção: não se admite a modalidade de concessão à pessoa física (apenas à pessoa jurídica ou a consórcio de empresas, que é a reunião de várias empresas).

Como se realiza, como é constituída ou formalizada essa concessão comum:Trata-se de um contrato administrativo, exige, pois, procedimento licitatório, que

necessariamente tem que ser na modalidade Concorrência. ☺art. 15, Lei 8.987/95 – peculiaridades dessa concorrência: a melhor tarifa de usuário

também pode ser usada como critério de seleção; ademais, a concorrência, neste caso, pode ter procedimento invertido, ou seja, primeiro seleciona-se a melhor proposta e só depois se passa a análise dos documentos; e a lei estabelece também a possibilidade de utilização de lances verbais.

Em se falando de licitação, há uma peculiaridade que foi introduzida pelo programa nacional de privatização (1995) – política das desestatizações, na verdade (por isso foi chamado PND – Programa Nacional de Desestatização). Alguns serviços foram selecionados nesse programa e, então, quando tratar-se de serviço previsto neste programa nacional de desestatização a modalidade licitatória pode ser o leilão. Ex.: licitação da telefonia.

Contrato administrativo, como vimos, tem que ter contrato determinado e, como a concessão é contrato administrativo, também deve ter prazo determinado. O prazo tem que ser aquele previsto na lei específica de cada serviço. Normalmente, quanto mais caro, ou seja, quanto maior o investimento, maior o prazo.

É preciso autorização legislativa específica, como todo serviço público que é objeto de concessão. A lei disciplina o serviço, autoriza a concessão, prevê o prazo, etc. Ou seja, uma única lei, normalmente, soluciona todas essas questões.

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E como se remunera os serviços objeto da concessão? Como é feita a remuneração desse contrato administrativo? Basicamente a remuneração é constituída através de tarifa de usuário. Os serviços públicos, como vimos, estão sujeitos ao Princípio da modicidade da tarifa. Assim, se para ser custeado, a tarifa ficar alta demais, é possível que o Estado participe com uma parte. Mas atenção, o recurso público é facultativo, mas não obrigatório. É possível que o Estado pague parte dessa conta, dependendo de cada concessão, mas esse recurso público é sempre facultativo. Na prática ele aparece menos do que deveria, pois ainda temos tarifas altas demais.

Ex: Instrumentos de propaganda atrás do ônibus – isso é chamado de “receitas alternativas” (receitas que podem contribuir para o valor desse serviço). Para constituir essa receita dependerá de previsão contratual e da lei do serviço.

É possível (já tem em alguns estados e em alguns municípios), a utilização de bem público. Tem-se, pois, o uso de um bem público, e, em contrapartida, uma receita alternativa.

Ex: O serviço está caro demais. Há o pedágio. A empresa está cobrando excessivamente. Isso não decorre da empresa. Toda política tarifária diz o valor da tarifa, o índice de reajuste, a data de reajuste, etc. – tudo isso é definido na escolha da proposta. A política tarifária é definida no momento da licitação. Mas, se a empresa estiver desobedecendo ao que estava previsto no contrato, aumentando a tarifa excessivamente, mais uma vez, isso é culpa da Administração, que não está fiscalizando o contrato.

Responsabilidade civil na prestação desse serviço: as concessionárias respondem por conta e risco na prestação desse serviço, segundo a lei. O que significa “por conta e risco”? Qual é a diferença de um contrato de coleta de lixo com um contrato de transporte coletivo? É necessário entender o que é um contrato de prestação de serviço e um contrato de concessão de serviço público. Isso determina a responsabilidade sobre o serviço.

Ex: Aluno de escola não está gostando da merenda escolar. O serviço não está sendo prestado direito. A quem se deve reclamar? Ou até mesmo o serviço de segurança (serviço terceirizado). Para quem se deve reclamar? O Estado contrata com a empresa privada o serviço de merenda escolar. O Estado contrata com a empresa privada o serviço de coleta de lixo. Nem se sabe qual é a empresa que está prestando o serviço. Se não coleta, deve-se ir à Administração e reclamar por esse serviço. Quando o usuário estiver insatisfeito com o serviço, ele deve ir direto ao Estado para reclamar desse serviço. A empresa privada será chamada num segundo momento. Se o Estado for responsável, ele chamará a empresa privada. Isso é um simples contrato de prestação de serviço. A relação se faz entre Estado e usuário. A empresa presta serviço em nome do Estado e por conta do Estado.

Qual é a diferença para o contrato de concessão? Imagine que (A) tenha a telefonia de sua casa. O Estado descentralizou esse serviço e contratou com uma concessionária a prestação desse serviço. (A) não quer pagar um valor injusto incluído na conta. A quem se deve reclamar? Se tiver que ajuizar uma ação, em face de quem se deve ajuizar? Em se falando de contrato de concessão, deverá chamar a concessionária para se responsabilizar. O usuário deverá cobrar diretamente da empresa. O Estado será chamado? Só se a empresa privada não tiver um patrimônio suficiente. A concessionária presta o serviço e responde por sua conta e risco. O vínculo jurídico se estabelece entre a concessionária e o usuário. Se na prestação de serviço ela causar dano aos usuários, quem responderá é a própria empresa.

Sendo responsabilidade da concessionária, essa responsabilidade será objetiva ou subjetiva? Aplica-se o art. 37, §6º, CR? “Pessoas jurídicas de direito público e as pessoas jurídica de direito privado prestadoras de serviço público (...)”. A concessionária entra nessa classificação? Esta é a regra que prevalece. Logo, a responsabilidade será sim objetiva.

Obs.: Excepcionalmente, a jurisprudência reconhece a responsabilidade subjetiva. Há uma decisão do STF, que já caiu no CESPE, que faz uma separação de usuário e não

usuário do serviço. O caso decidido pelo STF discutia os seguintes fatos: um ônibus de uma empresa prestadora de transporte coletivo bateu em um carro num cruzamento. Com essa

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colisão, o particular sofreu prejuízo. O passageiro que estava dentro do ônibus também sofreu prejuízo. Quem responde? Será a responsabilidade objetiva ou subjetiva? Nessa decisão (de 2006), o STF disse que o passageiro é usuário, mas o particular não é usuário. Então, o STF faz a seguinte interpretação. Aplica-se o art. 37, §6º para o usuário do serviço. No que diz respeito ao não usuário, a concessionária é uma simples empresa privada, logo, deve aplicar o direito civil. No direito civil, prevalece a responsabilidade subjetiva. Isso é um absurdo! Mas é o entendimento do STF. O STF interpretou como se a Constituição estabelecesse esta distinção: “pessoas jurídicas de direito privado, quando na prestação de serviço”. O STF tem entendimento pacífico em relação a isso.

E se o sujeito está no ponto de ônibus, esperando pelo ônibus? Ele é usuário ou não usuário do serviço? E se ele estava no ponto de ônibus, mas estava esperando uma carona? E o passageiro que acabou de descer do ônibus que foi atropelado pelo ônibus? Nunca mais o STF enfrentou a situação. O problema é prático. No caso decidido fica fácil separar se é usuário ou não usuário. Nos demais casos nem tanto.

Se a vítima ajuizar a ação em face da concessionária, e esta não tiver patrimônio suficiente, quem pagará a conta nesse caso? Poderá chamar o Estado? É serviço público, é dever do Estado, e se o Estado está assumindo como sua a obrigação e resolve transferir, ele continua sendo responsável. Ele transferiu porque quis, como ele bem entendeu. Ele tem a obrigação de fiscalizar. Logo, ele também poderá ser responsabilizado. A responsabilidade será solidária ou subsidiária? Será subsidiária. Isso significa dizer que tem ordem de preferência. Em primeiro lugar, quem paga é a concessionária. O Estado só responde em segundo plano.

Deve fazer a leitura das cláusulas contratuais. Os deveres não caem muito em prova de concurso, mas vale a pena dar uma olhada neles.

Quais são as hipóteses para a extinção da concessão? Devemos lembrar de institutos muito parecidos aos do contrato administrativo. Há 2 peculiaridades. Vejamos:

1. Advento do termo contratual: vencido o prazo, o contrato está extinto.2. Rescisão Judicial: quando o contratado não quer mais o contrato, qual é a saída? O

contrato deve ir à via judicial. Então, falamos em rescisão judicial.3. Rescisão Amigável ou Consensual: contratante e contratado podem, por livre vontade,

extinguir o contrato. Chamamos de rescisão consensual ou rescisão amigável. 4. Rescisão administrativa: ocorre quando a própria administração, por ato unilateral, decide

extinguir o contrato. Essa rescisão pode acontecer quando? a) Descumprimento de cláusula contratual por parte do contratado: É chamado de

caducidade. Parece com a caducidade de ato administrativo? São dois institutos com nomes iguais, mas diferentes. A Administração deverá indenizar o contratado? A supremacia está presente no poder que tem a administração de extinguir o contrato. A Administração não precisa indenizar nesse caso. Nesse caso, não há exigência da autorização legislativa.

b) Razões de interesse público: essas razões são chamadas de encampação. Atenção: essa hipótese gera para a Administração o dever de indenizar. Essa extinção depende de autorização legislativa. Não é uma decisão livre do administrador.

5. Anulação: Se o contrato tem uma ilegalidade, tem um vício, seja na licitação seja no contrato, ele é ilegal. A saída é a anulação.

6. De pleno direito: A lei 8987 também fala em extinção em razão de falência. A doutrina chama essa hipótese de extinção de pleno direito, porque há circunstancias estranhas à vontade das partes. Pode ser falência, pode ser falecimento, pode ser incapacidade civil, etc.A Lei 8.987,quando fala da concessão comum, fala da concessão comum precedida de

obra pública (☺art. 2º, lei 8987). O que é isso? Concessão é a delegação de serviço. Essa concessão é antecipada por uma obra pública. Ex: transferir o serviço de conservação da

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rodovia. Porém, antes disso, a empresa deverá construir uma ponte, por exemplo. Não perde a natureza de concessão de serviço. Nem toda concessão terá isso.

B) Concessão especial ou Parceria Público-Privada:

☺Lei 11.079/04Obs. importantes:O nosso governo federal, quando elaborou o projeto, ele tinha a certeza de que a PPP iria

resolver todos os problemas de falta de dinheiro. Ele acreditou que o parceiro privado iria colocar o seu dinheiro na relação para recebê-lo em 30 anos, por exemplo. Será que isso iria acontecer sem garantia para o parceiro privado? Infelizmente, há muito risco de não receber.

Conceito: Nada mais é do que uma concessão comum, com algumas regras próprias. As regras básicas são as da concessão comum, com algumas peculiaridades.

É necessário analisar 4 tópicos sobre isso:1. Objetivo : Por que o governo federal constituiu essa concessão especial? O primeiro

objetivo foi angariar para o setor público investimentos privados. Ele foi buscar o apoio na iniciativa privada. A segunda justificativa é a seguinte: o serviço público é muito pior do que o privado. É só o particular colocar a mão que o serviço fica melhor. Essa frase era muito ouvida. A prof. não acredita nisso, porque há vários exemplos. Ex: telefonia – é recordista em ação judicial. Mas o segundo objetivo foi sim buscar a eficiência que existe na iniciativa privada.

2. Criada a PPP, 2 modalidades foram constituídas:a) Concessão ou Parceria Patrocinada : A concessão patrocinada é uma concessão

comum (tarifa do usuário), sendo que obrigatoriamente há presença de recurso público. Ex: definição da 4ª linha do metrô de SP. É hipótese em que a tarifa do usuário banca grande parte, mas necessariamente terá recurso público. O buraco na obra do metrô foi responsabilidade em parceria? O projeto em parceria não foi para a obra. A obra do metrô já estava contratada quando a lei saiu. Quem responde é o Estado. É o contrato simples. Somente os metrôs entrariam em parceria.

b) Concessão administrativa : Significa a concessão comum, sendo que a Administração aparece como usuária direta ou indireta do serviço. Ex: projetos para construção de um presídio. Quem deve prestar o serviço é a Administração. Quem usa é o preso, mas a AP será usuária indiretamente. A doutrina critica esta modalidade. As críticas vêm justamente pelo fato de confundirem essa modalidade com o contrato comum. No contrato comum, a relação é também do Estado com a empresa prestadora. Então, a doutrina diz que isso é um contrato simples, e não concessão. O fato é que esta modalidade passou, especialmente, em face do financiamento privado. Ex: aeroportos. Depende da previsão contratual.

Obs.: A concessão especial é realmente uma parceria? O que tem registrado como parceria? É a reunião de esforços para um objetivo comum. Dos exemplos citados, será que PPP é realmente isso? Celebrado o contrato, o Estado quer prestar o serviço, quer construir a obra, e o que o particular quer nessa história? Ele quer o serviço? Não. Ele quer o lucro. Ele entra nessa história para ter o seu dinheiro multiplicado. Esse nome “parceria” é muito criticado pela doutrina. Isso é, na verdade, um contrato administrativo com interesses divergentes.

3. Diferenças em relação à concessão comum: é preciso analisar dois aspectos para se compreender essa diferença:

a) É concessão ou não é concessão? Deve-se verificar um financiamento privado. Isso significa que o particular irá colocar o seu dinheiro e irá receber em suaves prestações, a longo prazo.

b) É necessária pluralidade remuneratória. Esta é uma característica do contrato de concessão especial. Traz a oportunidade de o Estado pagar o parceiro privado de maneiras

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diferentes. Normalmente, faz-se o pagamento em dinheiro. A lei da concessão especial diz que o Estado pode pagar com pluralidade remuneratória:

- simples ordem bancária;- transferência de credito tributário. O parceiro privado irá abater do

investimento que ele efetuou.- utilização de bens públicos. Ele dará ao parceiro privado a utilização de

um parque, de um grande terreno, por ex. O valor que deveria ser pago pela utilização deverá ser abatido do financiamento.

→ Outorga de direitos: No Estatuto da cidade há todas as regras sobre construções verticais. Dependendo da área de base, ter-se-á um coeficiente para a construção vertical. A idéia de limitar o número de andares é de limitar o número de moradores. A lei estabelece que o terreno garante um coeficiente com número de andares certo. Ex.: ao invés de 5, o sujeito quer construir 8 andares. Ele poderá pedir esse pouco a mais à AP. A isso dá-se o nome de “outorga onerosa”. O Estado pode conceder esse direito, e não irá cobrar por isso. Isso é, com certeza, um ponto positivo. Pagar de várias maneiras compromete menos os recursos públicos. Em compensação, deverá haver fiscalização sobre tudo. Mas, na verdade, é muito fácil utilizar-se desses instrumentos para burlar a Administração.

c) Compartilhamento dos riscos : O projeto de parceria deve ser muito bem escolhido. Basicamente, quem pagará será o usuário, através de tarifas. Se o usuário não pagar, o Estado deverá dividir o risco desse empreendimento. Ex: Ferrovia do norte de País. O Estado contratou a construção da rodovia. Dizem que a ferrovia não transportou nada. Por isso a escolha deve ser cuidadosa. O administrador não pode utilizar-se de interesses próprios para escolher o projeto.

d) Vedações :- O contrato de parceria não pode ter valor inferior a R$ 20.000.000,00. O risco é

grande. Então, se der errado, o prejuízo também será grande. Esse valor é para obra pública, para serviço público nem é tão grande assim. O projeto mais barato de parceria está girando em torno de 50 milhões de reais.

- Além disso, o contrato de parceria não pode ter prazo inferior a 5 anos e nem ser superior a 35 anos. Se o serviço for contratado de forma inadequada, ficaremos em prejuízo por muito tempo.

- Há ainda uma vedação que diz respeito ao objeto do contrato. O contrato de concessão, necessariamente, deve misturar 2 elementos: obra + serviço ou fornecimento + serviço. Constituído o contrato de concessão, há constituição de uma nova pessoa jurídica – Sociedade de Propósitos Específicos. Essa sociedade tem o objetivo de fiscalizar, de gerir o contrato de concessão. É uma pessoa jurídica normal, constituída pelo regime privado. O objetivo é deixar alguém cuidar exclusivamente da concessão especial.

Do mesmo jeito que a concessão comum, a especial também é realizada por contrato, feita por concorrência. Tudo que foi anotado para a formalização da concessão comum também serve para a concessão especial.

• Permissão de serviço público:

A permissão de serviço público também está prevista na Lei 8.987/95. Antes de 1995 existia no direito brasileiro o instituto da permissão. Logo que ele surgiu

no Brasil, a permissão tinha a natureza de ato unilateral. Ele existia enquanto permissão de serviço e enquanto uso de bem público.

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A Lei 8.987/95 dá à permissão de serviço a natureza do contrato. Quando isso acontece, ocorre a separação entre:

a) Permissão de serviço = contrato administrativob) Permissão de uso de bem público = ato unilateral (matéria a ser estudada no Curso

Intensivo II). O que significa permissão de serviço? Permissão de serviço nada mais é do que uma

delegação de serviço público feita pelo Poder Concedente à pessoa jurídica ou à pessoa física.Questão: É possível descentralizar serviço público à pessoa física? É possível sim,

embora em regra, ela seja feita à pessoa jurídica. Ex: delegação de serviço via permissão.Além disso, a permissão de serviço é feita através de contrato administrativo. A lei não

exige, não determina a modalidade de licitação a ser seguida. A lei diz que a permissão é feita através de contrato de adesão. O que significa isso? É aquele em que uma das partes tem o monopólio da situação. Um manda e o outro adere se quiser. Qualquer contrato administrativo, na verdade, é constituído por adesão.

É um contrato administrativo que depende de licitação. A licitação irá depender do valor do contrato. Se for alto, deverá ser escolhida a concorrência. Se for médio, deverá ser escolhida a tomada de preço. Se for baixo, deverá ser escolhido o convite.

A permissão não exige autorização legislativa, diferentemente da concessão. O contrato de permissão de serviço deve ser constituído de forma precária. O que nós

temos que entender sobre isso? O que significa ser precário? Por que isso é muito criticado pela doutrina?

Quando falamos em ato precário, estamos falando daquele ato que pode ser desfeito a qualquer tempo, e não gera dever de indenizar. Quando falamos que o nosso vínculo é precário, vem a seguinte pergunta: ele não é constituído por contrato administrativo? Contrato administrativo deve ter prazo determinado. A AP pode retomar antes do prazo por razoes de interesse público. Se a Administração retoma, ela deve indenizar. Dá para perceber que essas características não coincidem. Como ser, ao mesmo tempo, precária e constituída por contrato? Se for precária não tem prazo, pode ser desfeita a qualquer tempo, e não tem indenização; se for contrato, não. Essas duas características não são compatíveis. Há muita divergência na doutrina. CABM diz que não é compatível. O vínculo é precário, e o contrato não é precário. Logo, a permissão continua sendo feita por ato unilateral. Todavia, a lei estabelece que deva ser por contrato. Prevalece que o vínculo é por contrato, mas a precariedade fica reduzida. Significa dizer que terá prazo determinado, mas poderá ser retomado a qualquer tempo. Na verdade, o contrato administrativo acaba por eliminar os elementos da precariedade. O único ponto que sobrevive é que o Estado poderá retomar a qualquer tempo. Deverá desfazer a qualquer tempo com indenização.

Conclusão: tem que ter prazo determinado, pode ser desfeito a qualquer tempo, mas deve indenizar. É a “arrumação” da característica da precariedade somada à exigência do contrato administrativo.

Para lembrar:- Precário: sem prazo, desfeito a qualquer tempo e sem indenização.- Contrato: com prazo, extinção por interesse público e com indenização.

Obs.: Segundo a posição do STF, a natureza jurídica da concessão é idêntica à natureza jurídica da permissão? Como se faz concessão? Por contrato. Como se faz permissão? Por contrato. A natureza jurídica então é a mesma – de contrato. Foi isso que o STF decidiu. É um contrato diferente da concessão, pois ele pode ser desfeito a qualquer tempo.

Como escolher entre permissão e concessão? O que muda da concessão para a permissão é o valor do investimento, é o valor do contrato. Não há muita diferença na escolha da modalidade.

Permissão: ☺art. 2º, IV e art. 40.

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Todos os demais elementos serão iguais ao da concessão.

• Autorização de serviço público:

É muito criticada pela doutrina. Alguns dizem ser inconstitucional, e afirmam que as autorizações não podem ser aceitas no Brasil. Mas a posição da maioria admite.

Só que a aceitação é de forma restrita, é de forma limitada. Ela é aceita para serviços de pequeno valor e para serviços e situações urgentes.

Ex.: táxi e despachante. A autorização do serviço é feita por ato unilateral, dispensando a vontade da outra parte.

O ato é discricionário, feito de acordo com a conveniência e oportunidade da Administração. Ademais, é um ato precário. Significa dizer que pode ser retomado a qualquer tempo, pode ser desfeito a qualquer tempo.

A doutrina completa dizendo que aplica no que couber o que foi estabelecido para a concessão.

Não há lei própria.

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AGENTES PÚBLICOS:AGENTES PÚBLICOS:

• Introdução:

Aqui iremos estudar os aspectos constitucionais: acumulação, estabilidade, estágio probatório, aposentadoria, etc.

É necessário lembrar que cada ordem política tem o seu estatuto. Ex: Lei 8.112/90, no âmbito federal.

Atenção: é importante a leitura da Lei 8.112/90, principalmente da sua primeira parte (+/- até o art. 40 e, ainda, do art. 116 ao 160).

• Conceitos importantes:

☺ CR/88 e Lei 8.112/90.Quem é o agente público? Agente público é todo aquele que exerce função pública, seja de forma temporária seja de

forma permanente, com ou sem remuneração. Mesmo que ele não ganhe nada por isso, naquele momento, ele será agente público. Ex:

mesário, jurado, etc.Saindo do conceito geral (exerceu função pública é agente – este é o conceito mais amplo

da doutrina e da CR), vamos classificar os agentes públicos em várias modalidades.

• Classificação dos agentes públicos:

1. Agente político :

São os quem mandam. Estão no topo da estrutura estatal. São todos aqueles que representam a vontade do Estado. São aqueles que estão no comando de cada um dos Poderes.

Ex: - Poder Executivo: Presidente da República, Governador, Prefeito, bem como seus vices; - Poder Legislativo: Senadores, Deputados Federais, Deputados Estaduais e Vereadores; - Auxiliares imediatos do Poder Executivo: Ministros de estado, Secretários estaduais e Secretários municipais.

Dentro dessa lista, há divergência em relação aos Magistrados e Membros do MP. Normalmente, quanto aos agentes políticos há escolha por eleição, de natureza política. Quando se fala em magistrado e membro do MP, no entanto, não há escolha política, mas escolha meritória (por concurso). Então, alguns doutrinadores divergem sobre isso. A maioria, por enquanto, inclui essas pessoas na lista de agentes políticos.

Agente político segue o regime estatutário? Se os direitos dos servidores estão previstos em uma lei ou na CR, eles fazem parte do Regime Legal ou Estatutário. Esse regime é aplicável ao titular de cargo. Só existe cargo em pessoa jurídica de direito público, não se admitindo em pessoa de direito privado.

Se, porém, os direitos estão previstos em um contrato de trabalho, o regime será chamado de regime contratual ou celetista. O agente então será titular de emprego. Emprego é possível em pessoa jurídica de direito público ou pessoa jurídica de direito privado.

Os direitos dos agentes políticos estão previstos na lei ou no contrato de trabalho?

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Atenção: Quando se fala em regime estatutário, muitas pessoas acham que se está falando da Lei 8.112. Mas há outros estatutos também, como os da Magistratura ou do MP, por ex.

Será que os agentes políticos são titulares de cargo ou emprego? Como são titulares de cargo, devemos falar em regime estatutário.

2. Servidores Estatais :

Ao se falar em servidor estatal, não se está falando em servidor público. Servidor estatal é todo aquele que atua no Estado, não importando se na Administração Direta ou Indireta, se é na pessoa jurídica de direito público ou de direito privado.

O servidor público atua em pessoa jurídica de direito público, ou seja, na AP Direta, em autarquias ou em fundações de direito público. Os servidores públicos são celetistas ou estatutários? Eles devem seguir o regime estatutário obrigatoriamente? A CR/88, em seu texto original, dizia que os servidores públicos estavam sujeitos ao regime jurídico único. Isso significa que deveriam estar sujeitos a um só regime. Numa mesma ordem política, só era possível um regime. Na ordem federal, um só regime; na ordem estadual, um só regime; na ordem municipal, um só regime. Preferencialmente, os nossos entes escolheram o regime estatutário, pois ele traz mais garantias e direitos aos servidores. A nossa Constituição não dizia que deveria ser obrigatoriamente o estatutário. Tanto que a maioria dos municípios escolheu o regime celetista.

Com a EC 19/98, houve a alteração dessa disposição. Essa EC 19 aboliu o regime jurídico único, e substituiu o regime único pelo chamado regime múltiplo. Então, os dois regimes passaram a ser aceitos ao mesmo tempo. Se a vontade do legislador era pelo cargo, seguiria o regime estatutário; se a vontade do legislador era pelo emprego, seguiria o regime celetista. Quando a lei criava se era cargo ou emprego, ela definia o regime. A partir de 1988, a mistura se torna então possível.

No entanto, ocorreu algo que modificou todo este contexto: uma EC deve ser aprovada em 2 casas e em 2 turnos e o art. 39, CR não foi devolvido à primeira Casa para a análise. Assim, a alteração da EC foi aprovada em apenas uma casa por 2 turnos. Na outra casa, não teve dois turnos. Houve, pois, um vício formal de constitucionalidade deste dispositivo. ☺ADIN 2135 – O STF, por enquanto, só decidiu em sede de cautelar. O STF disse que o art. 39 é inconstitucional. Essa é uma inconstitucionalidade formal, de procedimento. Melhor seria que fosse inconstitucionalidade de matéria. E quem já misturou os regimes, como fica? O STF disse que ele está decidindo em sede de cautelar de ADIN, logo, essa decisão produz, em regra, efeito ex nunc (daqui pra frente). Portanto, não retroage. O que irá acontecer com quem já misturou? Daqui pra frente, não pode misturar mais. Quem já misturou, deverá aguardar a decisão de mérito. Não se sabe o que irá acontecer. Provavelmente, o servidor entrará no quadro de extinção ou terá opção de escolha do regime.

Atualmente, o servidor continua tendo emprego quando estatutário continua tendo cargo quando celetista. Restabeleceu-se o regime único. Não precisa ser estatutário. Como tem a declaração de inconstitucionalidade de regime múltiplo, restabeleceu-se a regra original – regime único. Preferencialmente, escolhe-se o regime estatutário. O regime estatutário é obrigatório? Já caiu em concurso como obrigatório, mas o que prevalece é que o regime estatutário é facultativo. No âmbito federal, a regra é o estatuto. Quando se fala em servidor público, tem-se preferencialmente o regime estatutário. Em nenhum momento, porém, a Constituição exigiu o regime estatutário. Ele exigiu o regime único. Os entes que tinham estatuto voltam para o estatuto. Os que tinham CLT voltam para o regime celetista.

E na jurisprudência? É cedo demais ainda para sabermos. Não há uma jurisprudência consolidada. A decisão da ADIN é de 2007.

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Antigamente, utilizava a expressão “funcionário público”. Essa expressão já não é mais utilizada nem na Constituição e nem na Lei. O funcionário público é o servidor público titular de cargo. Essa expressão era utilizada no antigo estatuto.

3. Servidor de Ente Governamental de Direito Privado :

Atua em pessoa jurídica de direito privado, que são as Empresas públicas, as SEM e as Fundações públicas de direito privado.

Esse servidor é celetista ou estatutário? É celetista. Pessoa publica = cargo; pessoa privada = emprego. Se for pessoa privada, só pode ser regime da CLT.

Servidor de ente governamental de direito privado é servidor público? Não. Ele é servidor estatal, mas não é servidor público.

Ele parece com o servidor público. Ele se equipara aos servidores públicos em alguns aspectos. E quais são esses aspectos? Deve prestar concurso? Acumula ou não acumula?

Servidor de ente governamental de direito privado é um empregado. Ele é titular de emprego público? Normalmente, a expressão de “emprego público” é o empregado que está na pessoa jurídica de direito público. O titular de emprego aqui (na pessoa privada) é somente “empregado”. O TST utiliza as duas expressões como se fossem iguais. A jurisprudência mistura um pouco essas expressões.

No regime da CLT, apesar de esse servidor ser celetista, ele se equipara a servidor público em alguns aspectos. Esses aspectos já foram anotados em aula anterior.

Está sujeito a concurso publico, também está sujeito ao regime da não acumulação, e ao teto remuneratório (exceto quando a pessoa jurídica não recebe dinheiro para custeio). Se a empresa recebe repasse para as empresas correntes para o seu custeio (despesa de manifestação), ela estará sujeita ao teto.

Eles também estão sujeitos à Lei de Improbidade – Lei 8.429/92. Ademais, esses servidores estão sujeitos à lei penal. Significa dizer que eles são

funcionários públicos para efeitos penais.Eles também estão sujeito aos remédios constitucionais – MS, HD, etc.

Como se dispensa, em regra, um servidor público? Através de processo administrativo, com o contraditório e a ampla defesa. Sujeito que presta concurso e é empregado de pessoa jurídica de direito privado. Nesse caso, há a posição do TST – esses servidores não se equiparam. Eles são diferentes dos servidores públicos nesse ponto.

☺Súm. 390 / TST – não gozam da estabilidade do art. 41, CR. O TST publicou a OJ 247 – a dispensa é imotivada já que o servidor não goza da

estabilidade do art. 41. Essa OJ foi atualizada recentemente para ressalvar o empregado da empresa de correios e telégrafos. Essa ressalva vem justamente em razão do tratamento de fazenda pública dessa empresa, conforme já estudado.

4. Particulares em Colaboração :

O próprio nome já diz. É aquele particular, que não perde a qualidade de particular, mas que colabora com o Estado, que exerce função pública.

Há particulares que são requisitados, são obrigados a exercer a função pública. Ele é convocado, ele é obrigado a participar. Ex: mesário, jurado, serviço militar obrigatório.

Há particulares que vão por livre e espontânea vontade. Eles são chamados de voluntários. Ex: amigo da escola, médico que presta serviço público em hospital público.

Atenção: alguns doutrinadores utilizam a expressão “sponte propria” (espontânea vontade).

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Para HLM, esses particulares eram chamados de “agentes honoríficos”. Ele utilizava muito esta expressão quando falava de dirigentes de Conselhos de classe. É o agente voluntário, que participa por livre e espontânea vontade.

Há aqueles que exercem função pública – concessionários e permissionários.Há, ainda, os Delegados de função. Eles estão numa situação especial. A única hipótese

que a Constituição traz é o serviço notarial. Atenção: fala-se em delegação de função, e não de serviço (☺art. 236, CR).

Por fim, há o particular em colaboração que pratica atos oficiais. Estamos falando dos particulares que prestam o serviço a título próprio, tendo titularidade. Ex: serviço de ensino e serviço de saúde. Eles são titulares por vontade da CR. O dirigente da universidade privada, do hospital privado são particulares por colaboração. Exercem função pública porque estão prestando serviço público. É por essa razão que os seus atos podem ser discutidos por MS.

(28/11/08)

• Acessibilidade:

O que significa acessibilidade no Brasil? O Princípio da Acessibilidade é aplicado de forma ampla. Hoje, aplicamos a

acessibilidade para brasileiro e estrangeiro na forma da lei (pode ser servidor público). Qualquer brasileiro pode ser servidor público (nato ou naturalizado). Há alguns cargos que são privativos de brasileiros natos.

Para os estrangeiros deve ser na forma da lei. Os estrangeiros não tinham como legalizar a situação. O texto original só falava em brasileiro. Hoje, tanto o brasileiro quanto o estrangeiro podem ser estrangeiros. Já existe regulamentação para pesquisadores e para professores.

A porta de entrada para um serviço público, como regra, é o concurso público. A acessibilidade se efetiva através de concurso público. A regra geral é a prestação de serviço público. Não se admite qualquer outra forma de provimento originário. Se o sujeito estiver entrando pela primeira vez na carreira, deve ser por concurso público.

→ Situações em que o concurso público não irá aparecer: 1. Mandato eletivo: não presta concurso público, a escolha é meritória.2. Ocupantes em cargo em comissão: o cargo em comissão era antigamente

denominado de cargo de confiança. O constituinte de 1988 mudou a terminologia e passou a chamar de “cargo em comissão”. Ele continua sendo baseado na confiança. Portanto, ele é de livre nomeação e de livre exoneração. Esta exoneração de forma livre é chamada “Exoneração ad nutum”. Não precisa de justificativa, não precisa de qualquer explicação. Para que serve esse cargo? Para chefia, direção e assessoramento. Essas são as situações estabelecidas na Constituição.

Caso do cargo de dirigente num órgão: trata-se de um cargo de assessoramento, o chefe pode nomear de acordo com a sua confiança. O constituinte ficou preocupado com a mudança de chefe. Quando muda o chefe, normalmente, limpava todos os cargos em comissão.

Lembre-se de que hoje há a ressalva do nepotismo com a Súmula Vinculante n. 13. O nosso constituinte faz uma ressalva: se cada vez que sair o chefe, mudar todos os cargos em comissão, isso geraria risco para a continuidade do serviço. Logo, é necessário ressalvar um número mínimo de cargos que só podem ser ocupados por quem já tem cargo efetivo. Esse número mínimo poderá manter o serviço. Em tese, cargo em comissão pode ser ocupado por

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qualquer pessoa. A lei, quando cria um cargo, deve estipular o número mínimo. Esse mínimo depende de cada lei.

O sujeito, tendo cargo efetivo, se se afastar do cargo efetivo, assumirá o cargo em comissão e, posteriormente, retornará ao o cargo efetivo. O cargo em comissão tem o seu salário próprio. O sujeito receberá a remuneração do cargo em comissão.

Obs.: Cuidado para não confundir cargo de confiança (= cargo em comissão) com função de confiança. Quando se está falando de cargo, estamos falando em um conjunto de atribuições e de responsabilidades atribuídas ao servidor. Quando o servidor ocupa cargo, ele tem um espaço na estrutura da administração. Ex: Imagine que um quadro seja a estrutura da Administração. Quando o servidor ocupa o cargo, ele terá atribuições, responsabilidades, mais um lugar na estrutura da administração (= “posto” – e aqui não se está falando em lugar físico, mas um lugar na estrutura da AP).

Já a função não tem o lugar na estrutura da Administração. A função significa somente o conjunto de atribuições + responsabilidades. A função por si só não tem lugar na estrutura da AP. Em razão disso, o nosso constituinte não olha com bons olhos a função. Por quê? Porque não tem onde colocar o sujeito. A única função mantida na nossa Constituição foi a “função de confiança”. O nosso constituinte disse que a função de confiança também serve para direção, chefia e assessoramento, sendo que ela só pode ser ocupada por quem já tem cargo efetivo. Por que isso acontece? Porque a função de confiança não tem espaço no quadro, então, é necessário dar a função a alguém que já estava no quadro.

O sujeito já tem um cargo efetivo e, além disso, ele ganha mais uma função de confiança. - Cargo = atribuições + responsabilidades + lugar no quadro da Administração. - Função = atribuições + responsabilidades. O nosso servidor ganha uma função a mais. Se ele tem um plus nas atribuições e nas

responsabilidades, conseqüentemente, ele terá um plus na sua remuneração. Esse plus é a “gratificação por função de confiança”.

3. Contratação Temporária: O contrato temporário é feito através do processo seletivo simplificado – ☺art. 37, §9º, CR. Ele deve acontecer em caso de excepcional interesse público. Ou seja, neste caso é preciso se falar em situação de anormalidade, de situação especial.

4. Hipóteses constitucionais : – rol exemplificativo:a) Ministro do STF: não precisa prestar concurso, basta ter notável saber jurídico;

trata-se de cargo vitalício;b) Ministros e Conselheiros dos Tribunais de Conta: a escolha é política; é também

cargo vitalício;c) Regra do quinto constitucional: membros da OAB e do MP podem entrar na

magistratura (ainda que no caso do membro do MP ele não tenha prestado concurso para a Magistratura); é também cargo vitalício.

5. Emenda Constitucional nº 51: Atingiu o art. 198, CR. Na verdade, essa emenda cuida dos agentes comunitários de

saúde e dos agentes de combate à endemia. O que aconteceu com esses agentes? Quando se fala nesses agentes, a situação é bastante delicada. Muitos agentes comunitários existiam na Administração com vínculos precários. Era muito comum contratá-los temporariamente.

A EC 51 disse que esses agentes deverão realizar processo seletivo. Concurso público é processo seletivo? A nossa Constituição fala somente em processo seletivo. Só que os administradores dizem que se o constituinte quisesse fazer concurso, teria dito “concurso”. Na verdade, eles escapam do concurso, utilizando-se de processo seletivo simplificado. Atenção: ele deixa de ser temporário para ter emprego permanente – essa matéria foi regulamentada pela Lei 11.350. Felizmente, o STF vem colocando freio nessa história. A lei traz a chance de aproveitar aqueles que já estavam exercendo a função deles, sem realizar um novo processo seletivo. No mês de outubro, o STF proferiu uma decisão com o seguinte teor: é possível aproveitar aqueles

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que já estão na Administração, desde que eles sejam submetidos a um processo seletivo ou desde que o vínculo seja temporário. O objetivo da EC era estabilizar os empregados temporários.

• Questões jurisprudenciais sobre o concurso público:

→ Súmulas do STF:

☺Súm. 683: fala do limite de idade no Brasil para cargo público. O limite de idade é possível, mas deve estar compatível com as atribuições do cargo. “O limite de idade para a inscrição em concurso público só se legitima em face do art. 7º, XXX, da Constituição, quando possa ser justificado pela natureza das atribuições do cargo a ser preenchido”.

O que acontece com outros requisitos como, por exemplo, altura, peso? A jurisprudência é pacífica no sentido de que só pode ser colocada no edital se a exigência estiver prevista na lei da carreira. Para a magistratura e para o MP a atividade jurídica decorre da CR. Já a Defensoria Pública, se quiser exigir 3 anos de atividade jurídica, será necessária a previsão na lei da carreira. O mesmo ocorre com o exame psicotécnico.

☺Súm. 684: “É inconstitucional o veto não motivado à participação de candidato a concurso público”. Falamos da hipótese em que a inscrição foi indeferida sem qualquer justificativa. O veto não motivado é inconstitucional. Portanto, se ocorrer, deve ser motivado, justificado.

☺Súm. 685: “É inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido”. Fala-se aqui da proibição “do acesso ou da ascensão”. Ela diz a respeito do provimento originário. O provimento originário exige o prévio concurso público. A súmula diz que é proibida qualquer outra forma de provimento originário sem concurso público, salvo as ressalvas estabelecidas.

☺Súm. 686: “Só por lei se pode sujeitar a exame psicotécnico a habilitação de candidato a cargo público”. Esta súmula diz respeito ao exame psicotécnico. É necessário guardar que o exame psicotécnico não é visto com bons olhos, em razão da subjetividade do concurso. É difícil acreditar que o examinador não é mais maluco que o próprio candidato. É necessário estabelecer primeiramente na lei da carreira, antes de colocar no edital.

→ Súmula do STJ:

☺Súmula 266: “O diploma ou habilitação legal para o exercício do cargo deve ser exigido na posse e não na inscrição para o concurso público”. Esta súmula fala a respeito da habilitação legal ou diploma que deve ser exigido no momento da posse, para o exercício do cargo.

→ Prazo de validade do Concurso Público:

Qual é o prazo de validade do concurso público no Brasil? O prazo de validade é de até 2 anos. Pode ser de 6 meses, 1 ano, etc. Há possibilidade de prorrogação por igual período e uma única vez.Quando se fala em prazo de validade e de prorrogação, deve-se lembrar de que a

possibilidade de prorrogação deve estar prevista no edital do concurso. O administrador tem a obrigação de prorrogar ou é uma decisão discricionária? É uma decisão discricionária. Ele pode

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prorrogar, mas deve ser uma decisão fundamentada. Deve haver conveniência e oportunidade para o interesse público.

Ex.: o administrador realizou o concurso em janeiro de 2005. Em janeiro de 2007, ele prorrogou o concurso por mais 2 anos. É possível revogar a prorrogação? Quando cabe revogação? Em ato discricionário. Em tese, então, é possível revogar.

Mas, quais são os limites para a revogação do ato administrativo? Não há prazo para revogar. E qual é o limite para o administrador revogar a prorrogação? Há limites materiais/de conteúdo (ex: não se revoga ato vinculado, não se revoga ato que já produziu direito adquirido, etc.). É possível revogar a prorrogação de um concurso? E se o prazo da prorrogação não começou ainda, é possível revogar? O STF já decidiu essa questão. Quando se fala em concurso, é necessário observar o prazo de validade do concurso. Só pode prorrogar se o concurso ainda é válido, portanto, deve prorrogar antes de vencer o prazo. Se vencer o prazo, o concurso acabou, logo, não poderá falar-se mais em prorrogação.

Imagine que em dezembro de 2006, o administrador resolveu prorrogar. 15 dias depois, o administrador volta atrás e decide revogar a prorrogação, a jurisprudência diz que pode revogar a prorrogação. É ato discricionário. Só não poderá revogar se o prazo de prorrogação já começou. Não é caso de direito adquirido à nomeação, mas de direito adquirido à prorrogação (isso é limite material à revogação).

Imagine que o administrador fez o concurso em janeiro de 2005. O prazo de validade é de 2 anos. O concurso foi prorrogado até janeiro de 2009. Agora, em dezembro de 2008, o administrador resolveu realizar um novo concurso. Ele poderá fazer isso? Mesmo sendo válido o concurso anterior?

A Lei 8.112/90 dizia que não seria possível. Mas a EC 19/98 diz que pode. Atenção: em primeiro lugar, deve-se esgotar a lista do concurso velho, para depois passar à lista do concurso novo. Imaginemos que se existam 10 candidatos na lista 1; realiza-se um novo concurso com mais 20 candidatos na lista 2. Em janeiro de 2009, venceu o primeiro concurso. E agora, poderá passar para a lista 2? Esses 10 candidatos terão direito à nomeação? Se o concurso venceu, significa que ele acabou. Então será possível sim passar para a lista 2. O administrador se desobriga quando esgotar a lista dos candidatos ou quando vencer o prazo do concurso.

→ Direito à nomeação:

Candidato aprovado em concurso público tem direito à nomeação? Direito subjetivo à nomeação. A posição dominante era de que o candidato aprovado em concurso tinha mera expectativa de direito. Inicialmente, a jurisprudência consolida duas situações:

1) Se o candidato for preterido na ordem de classificação, ele ganha o direito à nomeação – ☺Súm. 15 do STF: “Dentro do prazo de validade do concurso, o candidato aprovado tem o direito à nomeação, quando o cargo for preenchido sem observância da classificação”. Ex: nomeia o 2º colocado ao invés do 1º.

2) Era muito comum a Administração realizar um concurso e um parente de um servidor não passar. A AP então fazia um vínculo precário com esse parente. Como o candidato não tinha como provar que a Administração precisava do serviço, que tinha dinheiro para pagar, o Poder Judiciário consolidou uma posição. Se a Administração tem concurso válido, com candidatos aprovados, se ao invés de nomear os candidatos, a Administração realiza vínculos precários, o candidato terá direito à nomeação. Ex. de vínculo precário: contrato temporário, como o agente “ad hoc”, cessão de servidor. Tudo isso é vínculo precário. Se a Administração contrata esse servidor é porque precisa dele. Logo, ela tem dinheiro para pagar. Então, por que não nomear o aprovado? A jurisprudência então reconhece, nesses casos, o direito à nomeação. Em dezembro do ano passado, no entanto, o STJ mudou de opinião e passou a considerar que o sujeito tem direito subjetivo (☺RMS 20.718). Ele reconhece o direito à nomeação, desde que o candidato

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esteja dentro do número de vagas e enquanto válido o concurso. O administrador tem liberdade para fixar o edital, ele pode colocar o edital de acordo com as suas necessidades. Para escrever o edital, a decisão é discricionária, mas uma vez escrito o edital, a administração terá de cumprir. Agora, o ato se torna vinculado. Em outubro de 2008, o STF proferiu decisão sobre esse assunto. Foi uma decisão da 1ª Turma (☺RE 227.480). Nesse recurso, o STF, por decisão majoritária, reconhece o direito à nomeação, no mesmo sentido do STJ. Mas atenção, esse direito não pode ser dado em caráter absoluto, segundo o Ministro Carlos Ayres Brito, pois é possível que haja fato novo que seja impeditivo dessa nomeação. Ex: mudança de clima. Isso deve ser demonstrado.

• Estabilidade dos Servidores:

O servidor pode adquirir estabilidade, desde que preenchidas algumas condições. A estabilidade é uma qualidade do servidor, é uma característica do servidor. Logo, não

se poderá falar em “cargo estável”, mas sim em “servidor estável”. Requisitos para aquisição da estabilidade – ☺ art. 41, CR:

1. Deve ser nomeado para cargo efetivo (efetividade é atributo do detentor de cargo definitivo). Para ser nomeado para esse cargo, ele precisa de prévio concurso público. Mas, e se for nomeado para emprego público, ele terá direito à estabilidade? ☺Súm. 390 do TST – se o sujeito for empregado, é necessário distinguir:

a) AP Direta, Autarquia e Fundação Pública de direito Público: com estabilidade do art. 41, CR, ele é servidor público;

b) AP Indireta – EP e SEM: Sem estabilidade.

A Constituição diz expressamente que o servidor para adquirir estabilidade deve ocupar cargo efetivo. Como se pode dar a estabilidade para empregado se a CR exige que seja efetivo? Até 1998, quando a EC 19 foi introduzida, a Constituição não dizia nem cargo nem emprego. Falava apenas em 2 anos de serviço público. A EC 19 altera o art. 41 e altera o serviço público para “cargo efetivo”. Há muita divergência sobre isso. Há quem diga que só terá estabilidade o que for empregado antes da EC. O STF já reconheceu a estabilidade antes da EC. Após isso, o STF não proferiu nenhuma decisão. O assunto está sendo discutido muito mais no TST. Quando o TST edita a Súm. 390, ele não faz essa separação. Ele não diz “empregado antes e empregado depois”. Ele só utiliza a expressão “empregado”. A posição majoritária do TST é de que ele tem direito à estabilidade. Já sumulou, mas não está completamente cristalizada essa questão.

2. Ele precisa de 3 anos de efetivo exercício.

3. Ele precisa da avaliação de desempenho. Esta avaliação depende da lei da carreira. A Lei 8.112/90, após a alteração pela Lei 11.784, fala de algumas questões sobre a avaliação. A lei da carreira estabelecerá se será entrevista, se será prova, se será avaliação do trabalho.

Como é possível o servidor perder a estabilidade? Vejamos:1. Processo administrativo: que deve assegurar o contraditório e a ampla defesa;2. Processo judicial: que depende do trânsito em julgado;3. Avaliação periódica: vale lembrar de que essa avaliação sempre existiu para os

servidores públicos, mas somente com a EC 19 passou-se a permitir a retirada da estabilidade mediante essa avaliação; também dependerá da lei da carreira;

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4. Necessidade de se “enxugar a máquina estatal”: o servidor poderá perder a estabilidade em razão do art. 169, CR (que nos remete à LC 101/00).

Qual é o prazo de estágio probatório no Brasil? A nossa Constituição, no texto original de 1988, falava a respeito da estabilidade e exigia

para a aquisição dessa estabilidade 2 anos de exercício. Para regulamentar essa questão veio a Lei 8112/90.

Esta lei, seguindo a idéia da Constituição, diz no seu art. 20 que o estágio probatório no Brasil é de 24 meses. Nesse primeiro momento, havia, pois, uma coincidência (24 meses = 2 anos).

Após, veio a EC 19/98. Esta EC diz que de agora em diante, a estabilidade no Brasil depende de 3 anos de exercício. E agora? Continua valendo a Lei 8.112, e o art. 20 foi recepcionado pela nova regra constitucional, ou o art. 20 não foi recepcionado, não sendo compatível com o novo texto constitucional?

Para alguns autores, com a alteração da EC, a Lei 8.112/90 tornou-se incompatível com a nova regra constitucional, gerando para o servidor uma lacuna – 12 meses sem estabilidade e sem estágio probatório. O prazo do estágio passaria a ser de 3 anos, portanto. Outros doutrinadores e parte da jurisprudência dizem que são dois assuntos diferentes – estabilidade e estágio probatório. Eles não se misturam. A Constituição fala em estabilidade e a lei fala em estágio probatório. Logo, terá 3 anos de validade e 24 meses de estágio probatório. A Lei 8.112/90, para essa corrente, foi recepcionada pela Constituição.

O que acontece a partir da EC 19? Logo que saiu essa EC, o governo federal leva a matéria à análise da AGU, que emite um parecer com efeito vinculante (serve para todo o Poder Executivo federal – Acórdão 17/2004). O parecer diz que o prazo de estágio probatório é de 3 anos, pois o art. 20 é incompatível com a nova regra constitucional.

Em sentido contrário foi o entendimento, no mesmo ano de 2004, do STJ. O STJ, julgando o MS 9373, disse que o prazo de estágio probatório continua sendo de 24 meses. A nossa Constituição nunca falou de estágio, mas de estabilidade. A Lei 8.112/90 não sofreu alteração, sendo compatível com a Constituição.

O que aconteceu no TST? O TST, chamado a decidir sobre os seus servidores, editou uma Resolução 1145, onde fixou o prazo de 24 meses de estágio. Essa resolução já foi alterada. Quando reconheceram 24 meses, todos aqueles servidores já tinham o aumento retroativo. O TST percebeu que não tinha como cumprir a resolução. O TST editou a resolução 1187. E nesta ele então fixou o prazo de 36 meses.

No CNJ, no pedido de providencia 822, fixou-se a orientação de que são 3 anos para o estágio probatório.

Conclusão: No ano de 2008, foi editada a Medida Provisória 431. O presidente alterou o art. 20 da Lei 8.112/90, fixando o estágio probatório em 36 meses. Alterada a lei, o problema estaria completamente resolvido. Acontece que quando a MP foi objeto de análise, esse dispositivo não foi convertido em lei, sendo objeto de emenda. Essa medida provisória foi convertida na Lei 11.784/08. Portanto, voltamos ao estágio original. Nada foi alterado.

E agora, qual é saída? A prof. não concorda com a orientação de 24 meses, pois há uma grande lacuna na norma regulamentadora. Ex: licença para interesse particular. É própria para o servidor estável. A licença está proibida no estágio probatório. Se ela estava proibida para o estágio, ela poderia ser exercida quando se adquirisse a estabilidade. O servidor tem essa licença antes de adquirir a estabilidade. Então, a prof. não concorda com esse prazo. Todavia, ela aconselha a respondermos que o prazo é de 24 meses, em razão da decisão do CNJ (que foi a última decisão a respeito – já que não se converteu a medida provisória em lei).

Obs.: a única alternativa da qual não se pode falar é 2 anos de estágio probatório!

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• Sistema Remuneratório:

Modalidades de remuneração:

1) Provento: para o servidor aposentado.

2) Remuneração (sentido estrito) ou Vencimentos: a remuneração é composta de 2 parcelas: uma parcela fixa (salário base = vencimento) + uma parcela variável (que depende das condições de cada servidor). O que acontecia com esse tipo de remuneração? O jornal publicava – concurso para o cargo (X), salário R$ 10.000,00. Na verdade, o salário base era de R$ 415,00 e o resto era variável. Era muito comum no Brasil o auxílio guarda-roupa e o auxílio moradia. Quando o servidor se aposentava, havia uma discussão. A remuneração incorpora ou não incorpora? Ele deve aposentar com qual valor? O aumento será incidente sobre o total ou sobre o salário-base? Esse sistema gerava muita insegurança jurídica. A EC 19 criou, portanto, uma segunda modalidade.

3) Subsídio: significa parcela única. Somaram-se a parcela fixa mais a variável e a soma dos dois deu origem ao subsídio. O salário é um todo único. A doutrina fala muito mal dessa espécie de remuneração. Subsídio no Brasil significa em latim, “ajuda de sobrevivência”. O nome foi desastroso. O conceito também foi péssimo. Subsídio é parcela única. Parcela é parte de alguma coisa. Mas a parcela, nesse caso, é de nada. O subsídio tem algumas exceções. Vamos anotar, primeiramente, quem recebe subsídio no Brasil:

a) Chefe do Poder Executivo: presidente, governador, prefeito e os respectivos vices;b) Auxiliares imediatos: ministro de estado, secretário estadual e secretário municipal;c) Membros do Poder Legislativo: deputados federais, senadores, deputados estaduais,

vereadores;d) Magistrados e Membros do Ministério Público;e) Membros da AGU, procuradores federais, procuradores estaduais e defensores

públicos: os procuradores municipais estão fora dessa lista, porque o constituinte deixou fora;

f) Ministros e Conselheiros do Tribunal de Contas;g) Policiais: toda a carreira da polícia recebe subsídio, salvo a guarda municipal;h) Todos os demais cargos organizados em carreira: a CR diz que esses cargos podem

receber subsídio. O que significa o cargo de carreira? É aquele que tem plano de ascensão funcional (tem chance de crescer dentro da estrutura – Ex: magistrado, que pode ser de 1ª entrância, de 2ª entrância, de entrância especial, etc.). O ideal é que o cargo seja de carreira.

Obs.: O ideal é mesmo fixar-se subsídio, pois é o mais seguro para o orçamento. A regra geral é parcela única, mas, excepcionalmente, admitem-se parcelas fora da

parcela única. Há 2 situações:1. Como é um todo único, de um bolo só, o servidor terá direito a 13º? Não pode colocar

o 13º como regra. A nossa CR estabelece os direitos do trabalhador em seu art. 7º, e estabelece para os servidores públicos algumas garantias do trabalhador – ☺art. 39, §3º, CR – Ex: 13º, 1/3 férias. São parcelas pagas independentemente da parcela única. É possível na hipótese desse art. 39.

2. Além dessa situação, é necessário lembrar que o servidor pode ter de se deslocar para dar um curso, para fazer um treinamento em razão do serviço. Será necessário comer, hospedar e outras despesas nessa nova localidade. Se ele recebe parcela única, isso

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deverá ser indenizado por fora. São chamadas verbas de natureza indenizatória. Ex: diária, ajuda de custo (serve para remoção por necessidade dos serviços – deverá pagar o caminhão da mudança, a matrícula do filho na nova escola, etc. – essa ajuda é no valor de 3 vezes da sua remuneração). Isso incorpora? Não. Só recebe naquele mês da mudança. O STF já julgou que se pedir remoção por interesse particular não terá direito à ajuda de custo.

Como se fixa a remuneração dos servidores públicos? Princípio da Legalidade: o administrador só pode fazer o que a lei autoriza e determina.

Portanto, a remuneração deve ser fixada por lei, e o aumento da remuneração, bem como qualquer reajuste, também deve ser fixado por lei. Não pode ser via decreto. A iniciativa da lei dependerá da casa legislativa: se federal, federal; se estadual, estadual; se municipal, se municipal. E de quem é a iniciativa para apresentar o projeto de lei? Se for do Poder Judiciário, será o Poder Judiciário; se for do Poder Executivo, será o Poder Executivo; se for do Poder Legislativo, será o Poder Legislativo.

Excepcionalmente, a remuneração não será fixada por lei. Quando isso acontece? A CR estabelece que o CN, através de decreto-legislativo, pode fixar a remuneração dos deputados e dos senadores, do Presidente da República e dos ministros de estado. Também se fixa por decreto-legislativo da Câmara Municipal a remuneração dos vereadores.

Os deputados estaduais, os governadores e os prefeitos terão suas remunerações fixadas por lei (todos os que não estiverem na lista, terão a remuneração fixada por meio de lei).

O que é um decreto-legislativo? É uma espécie normativa que não tem deliberação executiva, não tem sanção e veto do Presidente. A posição majoritária fala em “decreto-legislativo”, mas há autores que falam em “resolução”.

• Teto Remuneratório:

Ninguém pode ganhar mais do que o Ministro do STF. Este teto foi introduzido desde a EC 19 de 1998. A EC dizia que a fixação do teto

depende de uma lei de iniciativa conjunta – Presidente da República, STF, Senado e Câmara dos Deputados. Acontece que essa lei nunca saiu. A EC introduziu o teto, mas ele não foi aplicado. Nessa EC, a norma era de eficácia limitada e, enquanto NEL, precisava de uma lei. Esta lei deveria ser de iniciativa conjunta.

A regra só foi aplicada a partir da EC 41/03. Essa EC mantém o teto geral do STF, fixa o subteto (tem um teto geral = ministro do STF e tem tetos específicos para a União, para os Estados e para os Municípios) e estabelece a aplicação imediata da regra. Agora, para fixar o teto, não precisa mais de uma lei de iniciativa conjunta. Basta uma lei. Esta lei será de iniciativa do próprio STF. O teto não será fixado pelo STF, mas a iniciativa é do STF.

Enquanto não vier a lei, deverá aplicar o teto mesmo assim – ☺arts. 8º e 9º da EC 41/03. O teto remuneratório foi fixado para o ministro do STF. Esse é o chamado “teto geral”, e

significa que toda a AP não pode ganhar mais do que o ministro do STF (☺Lei 11.143/05 = R$ 24.500,00).

Há uma grande campanha para aumentar esta remuneração.

A EC 41/03 criou os subtetos:1. Âmbito federal: Ninguém pode ganhar do que o ministro do STF. O que é teto geral

também serve para o âmbito federal.2. Âmbito estadual: depende de cada esfera de poder:

a) Poder Executivo: governador

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b) Poder Legislativo: deputado estadualc) Poder Judiciário: desembargador. Obs. importantes: o teto do desembargador é o

teto para todos os servidores do Poder Judiciário. Esse teto também é aplicável para os membros do Ministério Público, para os procuradores e para os defensores públicos. Se um sujeito é auxiliar administrativo do quadro do MP, ele está sujeito a qual teto? Quem é membro do Ministério Público? Os procuradores de justiça e os promotores de justiça. O auxiliar administrativo do MP não é membro do MP. Logo, ele não poderá se submeter ao teto do desembargador. Ele deverá se submeter ao teto do Poder Executivo – do governador. Todo o quadro administrativo desses órgãos terá como teto o do governador. E o analista? Está no Poder Judiciário, então sua remuneração deverá respeitar o teto do desembargador. Só será o do Poder Executivo para o quadro administrativo do MP, para o quadro administrativo da procuradoria e para o quadro administrativo da defensoria pública.

Qual é o limite remuneratório do desembargador? 90,25% do ministro do STF. Essa regra foi tida como inconstitucional? Não. A regra de 90,25% foi objeto de interpretação conforme do STF – ☺ADIN 3854. O STF disse que, quando se fixou esses 90,25% para o desembargador, a magistratura se revoltou. A magistratura federal tem o teto do ministro do STF, e a magistratura estadual tem o teto do desembargador. O Poder Judiciário é único e a divisão é só para fins de competência. Então, o STF disse que 90,25 % é o teto do desembargador, mas que, com outras verbas, com outras vantagens remuneratórias, poderá chegar ao teto do ministro do STF.

3. Âmbito municipal: o teto é do prefeito.

• Acumulação de cargos:

No Brasil, vale a regra da não acumulação. Mas, excepcionalmente, é possível acumular. Vejamos:

1. Nas hipóteses autorizadas pela CR: a Constituição só autoriza a acumulação de até 2 cargos. ☺art. 37, XVI, CR. Ex: O sujeito é juiz e professor de uma universidade pública e professor de 3 universidades privadas. Deve se esquecer das privadas. A CR fala de cargo e emprego público. Inclui a AP Direta e a AP indireta. Tanto o CNJ quanto o CNMP e a AGU, já têm norma com relação à carga horária. O sujeito não pode ser juiz e ter 40 horas de magistério. Eles estabeleceram que só é possível ter 20 horas de magistério por semana. O limite de carga horária depende da lei de carreira. A CR estabelece 4 hipóteses (☺art. 37, XVI e XVII e art. 38). Vejamos:

a) Sujeito está em atividade em 2 cargos. Ex: professor da UFMG e professor da UEMG. É possível exercer os dois somente se:

- O horário for compatível;- A soma da remuneração não ultrapassar o teto remuneratório;- Ocorra uma das seguintes hipóteses:

a) 1 professor + 1 professor;b) 1 professor + 1 técnico/científico (Ex: juiz + magistério);c) 2 cargos ou empregos na área da saúde com profissão regulamentada por lei.Obs.: esses requisitos são cumulativos – horário, teto e uma das hipóteses acima.

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b) Sujeito está aposentado em 2 cargos. Ex: O sujeito é professor da UFMG e se aposenta, mas também é professor da UEMG e quer se aposentar neste cargo. Ele poderá receber 2 proventos? Se ele podia acumular na atividade, ele também pode na aposentadoria. Nas hipóteses para a atividade, ele também pode acumular quando se aposentar.

c) Sujeito está aposentado em 1 cargo + em atividade em 1 cargo. Ex: Sujeito é professor da UFMG e se aposenta. Prestou concurso de juiz. Ele pode receber proventos cumulados com a remuneração do juiz? Ex: professor aposentado resolveu se candidatar à Presidência da República. Ele poderá cumular? Essa hipótese é possível em todas as hipóteses permitidas para a atividade. O que é possível na atividade, também será nesse caso. O professor da UFMG aposentado pode virar juiz? Sim (professor + um técnico/cientifico).

Sujeito aposentado em 1 cargo e aposentado em outro cargo – isso também será possível quando o 2º cargo for mandato eletivo. Ele pode em qualquer mandato eletivo – federal, estadual ou municipal. Se no 1º cargo ele está aposentado, o 2º cargo pode ser cargo em comissão. Mas é preciso estar aposentado no primeiro cargo.

d) Sujeito em atividade no primeiro e em atividade no segundo – mandato eletivo. Isso só é possível na hipótese de vereador, quando o horário for compatível.

Não esquecer que nos casos de acumulação no Brasil, ninguém pode ganhar mais do que o ministro do STF.

Ex: Mandato eletivo federal, estadual e distrital – o que acontecerá com ele? Pode ser professor e presidente? Não. Deverá afastar do cargo de professor e exerce o segundo. E a remuneração? Receberá a remuneração do presidente. Ele não tem escolha. Até porque são os maiores salários do País. Nesse caso, o sujeito receberá a nova remuneração.

Ex: Sujeito é professor da UFMG e ganhou a eleição para prefeito: Ele deverá se afastar do primeiro cargo e exercerá o segundo. Ele receberá qual remuneração? Ele poderá escolher a remuneração.

Ex: Cargo de vereador, se horário compatível, ele exercerá os dois e receberá pelos dois. Se incompatível, deverá aplicar a regra do prefeito.

(10/12/08)

• Aposentadoria:

→ Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) - ☺art. 40, CR. Ele é aplicável aos servidores, titulares de cargos efetivos e de cargos vitalícios. É estudado em Direito Administrativo.

→ Regime Geral de Previdência Social (RGPS) - ☺arts. 201 e ss, CR. Contribuição para o INSS. Este regime serve a toda a iniciativa privada, mas também pode ser aplicado aos empregados públicos, tanto os empregados da AP Direta quanto os empregados da AP Indireta. Além disso, também segue esse regime geral o servidor ocupante de cargo em comissão (apesar de ser ocupante de cargo, ter regime estatutário e estar sujeito à Lei 8.112/90, ele segue o regime geral). Esse regime geral é mantido pelo INSS e é estudado em Direito Previdenciário.

Do regime geral para o regime próprio e do próprio para o geral, aplica-se o Princípio da Reciprocidade. Isso significa que aproveita-se o tempo em um para o outro.

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Histórico da aposentadoria:

- A CR/88, em seu texto original, exigia do servidor público, para que pudesse se aposentar, um único requisito: tempo de serviço. Não importava se ele contribuiu ou não, se tinha tempo de serviço, tinha direito a se aposentar. Muitos servidores se aposentaram muito cedo, já que as pessoas começam a trabalhar também muito cedo. Por conta disso houve uma mudança.

- Em 1998 tivemos a primeira alteração no sistema, com a EC 20/98, que foi chamada “Reforma da Previdência”. O constituinte estabeleceu que o requisito tempo de serviço deveria ser trocado por outros dois requisitos: para se aposentar daí em diante o servidor precisaria cumprir o limite de idade + o tempo de contribuição (☺art. 40, CR). Esses requisitos continuam a existir até hoje. Agora, portanto, não interessa mais se o servidor está trabalhando ou não, mas sim se ele está contribuindo ou não. Se ele trabalha, mas não contribui, não pode se aposentar. Este é o chamado “Regime contributivo”.

Esse regime contributivo tem, no Brasil, uma conta única, para a qual todos os servidores pagam e de onde todos retirarão o dinheiro. É o regime de repartição simples (ao contrário do que ocorre em muitos países em que cada um faz sua própria poupança). Cada ente político tem o seu fundo. É uma conta só para todos os servidores.

Esta EC 20 trouxe 4 modalidades de aposentadoria:

1ª) Aposentadoria por invalidez:Quando ocorre a invalidez o servidor tem direito de se aposentar – se a invalidez

estiver ligada ao serviço, ele terá direito a proventos integrais, se a invalidez não estiver ligada ao serviço, ele terá direito a proventos proporcionais.

2ª) Aposentadoria compulsória:Acontece independentemente da vontade do servidor, quando ele, sendo homem

ou mulher, atinge os 70 anos de idade. Há um projeto tramitando para que a idade suba para 75 anos. O servidor terá direito a proventos proporcionais. Pode chegar aos integrais se contribuir o tempo todo, mas a regra é a dos proventos proporcionais.

3ª) Aposentadoria voluntária:O servidor precisa ter 10 anos de serviço público, mais 5 anos no cargo que

pretende se aposentar, independentemente do tipo de provento. Ele pode se aposentar na voluntária com proventos integrais ou proporcionais. Para receber proventos integrais, se for homem, deve ter 60 anos de idade e 35 de contribuição; se for mulher, deve ter 55 anos de idade e 30 anos de contribuição. Para receber proventos proporcionais, basta ter 65 anos de idade, se homem, e 60 anos de idade, se mulher. Esta última hipótese só é benéfica para quem começou a trabalhar com idade mais avançada.

4ª) Aposentadoria especial:Está regulamentada na CR, que traz todos os requisitos para o professor, que tem

direito a esta aposentadoria especial. A CR, após a EC 47 deu a aposentadoria especial também para outros servidores (deficiente físico e aquele que exerça atividade de risco – neste caso os requisitos não estão na CR, dependem de regulamentação por LC).

Os requisitos no caso do professor são: - ser professor do ensino infantil, do ensino fundamental ou do ensino médio (o

professor universitário fica de fora dessa lista);

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- precisa de exclusividade de magistério (☺ADIN 3772 – que discutiu a Lei 11.301, segundo a qual os professores que exerçam cargo de diretor ou coordenador nas escolas também tenham direito à aposentadoria especial – por maioria o STF decidiu que a Lei é constitucional, mas o STF coloca uma condicionante: não é qualquer diretor, mas aquele que um dia foi professor, e não é qualquer coordenador, mas aquele que era professor e que por algum tempo exerceu essa função – a Lei 11.301 quer, na verdade, estender esse direito a qualquer atividade administrativa, mas o STF não acatou essa interpretação);

O professor só tem direito, na aposentadoria especial, a proventos proporcionais. Se for homem precisa ter 55 anos de idade e 30 de contribuição, se for mulher precisa ter 50 anos de idade e 25 de contribuição.

A aposentadoria especial dos deficientes físicos e daqueles que exercem atividade de risco tem requisitos diversos, não previstos na CR. Dependem de regulamentação pro LC. A matéria foi levada ao STF, por meio de MI, em razão da falta de norma regulamentadora. Dois MI´s já foram julgados (MI 721 e MI 758) – e o STF neles já decidiu que a aposentadoria especial já pode ser aplicada, independentemente de lei, no caso da atividade de risco, devendo ser aplicadas as regras da Lei 8.213/91 (RGPS). Quanto aos deficientes físicos ainda não houve decisão. O STF, nos dois MI´s julgados, decidiu que eles não têm caráter declaratório, mas sim mandamental (ou seja, ele não só dá ciência ao órgão omisso, mas resolve o caso em concreto).

Obs.: aqueles servidores que já estavam no serviço e que já preenchiam os requisitos para se aposentar com a regra antiga, têm direito adquirido para se aposentar com a regra antiga. No caso dos servidores que ainda não tinham cumprido os requisitos para se aposentar, para eles foi criada uma regra de transição (nem tão boa quanto a velha e nem tão ruim como a nova), que era facultativa (se o servidor não quisesse, a ele se aplicaria só a nova regra). Esta regra de transição estava prevista no art. 8º da EC 20, mas já foi revogada. Esse art. 8º é a transição da EC 20, e, por isso, era aplicável aos servidores que entraram antes da EC 20/98 e que ainda não preenchiam os requisitos. É importante saber isso porque as novas EC que vieram trouxeram novas regras de transição.

- Em 2003 uma nova EC foi apresentada ao CN. Foi a EC 41. Esta emenda altera vários aspectos e cria a contribuição dos inativos, que tem natureza tributária (devendo, pois, respeitar todos os princípios tributários). O Governo não tinha interesse que o CN emendasse a EC 41. por isso ao mesmo tempo tivemos a EC 41 e a PEC paralela do CN, que virou depois a EC 47.

A EC 41 saiu no final de 2003. Ela não mudou os requisitos para aposentadoria, mas trouxe várias outras alterações, e as mais importantes foram:

a) traz a contribuição dos inativos – com alíquota mínima de 11%, incidente sobre a diferença entre o que o servidor ganha e o teto geral do regime geral, que é R$ 3.038, 90. O STF já decidiu na ADI 3105 que a contribuição dos inativos é constitucional (sob o argumento de que o povo brasileiro precisa ser mais solidário – o Princípio da solidariedade foi introduzido na CR pela EC 41, mas esse princípio não tem nada a ver com o argumento usado pelo STF! É um absurdo, mas é o que prevaleceu).

b) atinge e revoga o Princípio da Integralidade: ela substitui o Princípio da Integralidade pelo Princípio da Média da Vida Labora. Hoje o servidor, por este princípio, não tem mais o direito de se aposentar com tudo o que ele ganhava na atividade (como previa o Princípio da Integralidade), mas sim com uma média de tudo que ele ganhou, só servindo para esta média o que teve incidência de contribuição (e isso faz cair em muito a média). E não há direito adquirido, disse o STF, em face do regime legal.

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c) atinge e revoga o Princípio da Paridade: este princípio garantia que todo benefício dado à atividade seria estendido aos inativos. Este princípio foi substituído pelo Princípio da Preservação do Valor Real, que significa que o poder de compra do servidor tem que ser preservado. Na prática ele não serve para nada.

d) traz o teto de proventos: vai ser o mesmo do INSS (R$ 3.038,99). Já existe, mas ainda não foi aplicado. Depende da criação de um regime complementar, que depende de uma lei que ainda não existe.

Obs.: Para o servidor que, mesmo já cumprindo os requisitos, continua trabalhando, ele recebe um abono de permanência. O servidor fica isento, não contribui. Mas isso não seria tão bom, porque com a EC 41, se o servidor fosse isento, o tempo em que seria isento ele não poderia contar para a média. A solução foi então dar de presente esse valor: o servidor pagaria, mas receberia de volta. Ocorre que, se receber de volta, tem que pagar IR sobre o valor. De qualquer forma, ainda fica mais vantajoso do que pagar os 11% na inatividade.

- A EC 47/05 trouxe duas modificações importantes: a) a aposentadoria especial do deficiente físico e da atividade de risco; eb) uma nova regra de transição: quem já estava no serviço e já preenchia os

requisitos, puderam se aposentar pela regra velha (Princípio da Integralidade, Paridade, etc.) – é direito adquirido. Quem entrou depois da EC só tem direito à regra nova. Mas, para quem já estava no serviço, mas não preenchia os requisitos, foi criada uma nova regra de transição, que é facultativa. A EC 41/03 criou sua regra de transição no art. 6º, da EC 41. Esta regra de transição serve para quem entrou no serviço antes de 2003. é uma regra nem tão boa quanto a velha, mas nem tão ruim como a nova.

Art. 6º Ressalvado o direito de opção à aposentadoria pelas normas estabelecidas pelo art. 40 da Constituição Federal ou pelas regras estabelecidas pelo art. 2º desta Emenda, o servidor da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, que tenha ingressado no serviço público até a data de publicação desta Emenda poderá aposentar-se com proventos integrais, que corresponderão à totalidade da remuneração do servidor no cargo efetivo em que se der a aposentadoria, na forma da lei, quando, observadas as reduções de idade e tempo de contribuição contidas no § 5º do art. 40 da Constituição Federal, vier a preencher, cumulativamente, as seguintes condições: I - sessenta anos de idade, se homem, e cinqüenta e cinco anos de idade, se mulher; II - trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher; III - vinte anos de efetivo exercício no serviço público; e IV - dez anos de carreira e cinco anos de efetivo exercício no cargo em que se der a aposentadoria.

Em 2003 o constituinte revogou o art. 8º da EC 20 e introduziu o art. 2º da EC 41 (esse substituto serve, pois, para quem entrou antes da EC 20):

Art. 2º Observado o disposto no art. 4º da Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, é assegurado o direito de opção pela aposentadoria voluntária com proventos calculados de acordo com o art. 40, §§ 3º e 17, da Constituição Federal, àquele que tenha ingressado regularmente em cargo efetivo na Administração Pública direta, autárquica e fundacional, até a data de publicação daquela Emenda, quando o servidor, cumulativamente: I - tiver cinqüenta e três anos de idade, se homem, e quarenta e oito anos de idade, se mulher; II - tiver cinco anos de efetivo exercício no cargo em que se der a aposentadoria; III - contar tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de: a) trinta e cinco anos, se homem, e trinta anos, se mulher; e b) um período adicional de contribuição equivalente a vinte por cento do tempo que, na data de publicação daquela Emenda, faltaria para atingir o limite de tempo constante da alínea a deste inciso.§ 1 º O servidor de que trata este artigo que cumprir as exigências para aposentadoria na forma do caput terá os seus proventos de inatividade reduzidos para cada ano antecipado em relação aos limites de idade estabelecidos pelo art. 40, § 1º, III, a, e § 5º da Constituição Federal, na seguinte proporção:I - três inteiros e cinco décimos por cento, para aquele que completar as exigências para aposentadoria na forma do caput até 31 de dezembro de 2005;

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II - cinco por cento, para aquele que completar as exigências para aposentadoria na forma do caput a partir de 1º de janeiro de 2006.§ 2º Aplica-se ao magistrado e ao membro do Ministério Público e de Tribunal de Contas o disposto neste artigo.§ 3º Na aplicação do disposto no § 2º deste artigo, o magistrado ou o membro do Ministério Público ou de Tribunal de Contas, se homem, terá o tempo de serviço exercido até a data de publicação da Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, contado com acréscimo de dezessete por cento, observado o disposto no § 1º deste artigo.§ 4º O professor, servidor da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, que, até a data de publicação da Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, tenha ingressado, regularmente, em cargo efetivo de magistério e que opte por aposentar-se na forma do disposto no caput, terá o tempo de serviço exercido até a publicação daquela Emenda contado com o acréscimo de dezessete por cento, se homem, e de vinte por cento, se mulher, desde que se aposente, exclusivamente, com tempo de efetivo exercício nas funções de magistério, observado o disposto no § 1º.§ 5º O servidor de que trata este artigo, que tenha completado as exigências para aposentadoria voluntária estabelecidas no caput, e que opte por permanecer em atividade, fará jus a um abono de permanência equivalente ao valor da sua contribuição previdenciária até completar as exigências para aposentadoria compulsória contidas no art. 40, § 1º, II, da Constituição Federal.§ 6º Às aposentadorias concedidas de acordo com este artigo aplica-se o disposto no art. 40, § 8º, da Constituição Federal.

Essa regra de transição foi pior, e era facultativa. Então, para que pudesse haver escolha, veio o art. 3º da EC 47, que “substitui” o art. 2º da EC 41, que, por sua vez, substituiu o art. 8º da EC 20. Na verdade,não houve substituição, já que, a cada revogação, gerava-se um novo direito adquirido. Então o CN deixou o art. 2º e criou uma nova alternativa, que veio com esse art. 3º da EC 47 (que é uma alternativa um pouco melhor do art. 2º da EC 41, que, por sua vez, é o substituto do art. 8º da EC – serve, pois, pra quem entrou antes da EC 20).

Art. 3º Ressalvado o direito de opção à aposentadoria pelas normas estabelecidas pelo art. 40 da Constituição Federal ou pelas regras estabelecidas pelos arts. 2º e 6º da Emenda Constitucional nº 41, de 2003, o servidor da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, que tenha ingressado no serviço público até 16 de dezembro de 1998 poderá aposentar-se com proventos integrais, desde que preencha, cumulativamente, as seguintes condições: I- trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher;II- vinte e cinco anos de efetivo exercício no serviço público, quinze anos de carreira e cinco anos no cargo em que se der a aposentadoria;III- idade mínima resultante da redução, relativamente aos limites do art. 40, § 1º, inciso III, alínea "a", da Constituição Federal, de um ano de idade para cada ano de contribuição que exceder a condição prevista no inciso I do caput deste artigo.Parágrafo único. Aplica-se ao valor dos proventos de aposentadorias concedidas com base neste artigo o disposto no art. 7º da Emenda Constitucional nº 41, de 2003, observando-se igual critério de revisão às pensões derivadas dos proventos de servidores falecidos que tenham se aposentado em conformidade com este artigo.

Se o servidor muda de cargo, a EC estabelece que para que ele mantenha o direito à transição ele não pode ter tido solução de continuidade. Precisa sair de um cargo e já ir para o outro.

Obs.: acompanhar melhor este tema nos livros e no material de apoio.

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RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO:RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO:

• Considerações gerais:

Há 3 regras importantes quanto a responsabilidade civil do Estado:1. Hoje, no Brasil e no mundo, o Estado é pessoa jurídica e como pessoa jurídica, ele é

pessoa responsável.2. A responsabilidade civil sempre busca maior proteção da vítima. Toda a evolução da

responsabilidade é proteger a vítima. Na dúvida, proteja a vítima.3. A responsabilidade civil do Estado não segue os mesmos parâmetros da

responsabilidade civil do direito privado, porque toda atuação estatal é feita de forma impositiva. O Estado exerce a sua atividade de forma impositiva. O sujeito, querendo ou não, será submetido ao teste do bafômetro, à tarifação alfandegária, etc. É razoável que da mesma forma que o sujeito tem de suportar, o sujeito precisará de maior proteção em face do Estado. A responsabilidade civil do estado é sempre mais rigorosa do que a responsabilidade do direito privado. O sujeito aceitará a imposição da atuação estatal se houver mais rigor.

• Princípios Justificadores:

Qual é o fundamento teórico para a responsabilidade civil do Estado? Quais são os princípios aplicáveis ao caso?

Quando se fala em responsabilidade civil, deve-se lembrar de que o Estado é um sujeito responsável, que o objetivo dessa responsabilidade, como vimos, é proteger a vítima.

O grande fundamento para que o administrador indenize o prejudicado, quando a conduta do estado é ilícita, é o Princípio da Legalidade.

Ocorre que hoje, a responsabilidade civil do Estado também é aplicável em caso de atuação lícita do Estado. Ex.: se o Estado constrói um cemitério ao lado de sua casa, ou um viaduto. A justificativa para esta responsabilidade e para a indenização é, neste caso, então, o Princípio da Isonomia (a obra beneficia toda a sociedade e prejudica a um só, então, para restabelecer a isonomia vem a indenização). Assim, quando o Estado realiza uma atividade, presta um serviço que prejudica uma pessoa em nome do benefício coletivo, o prejudicado deverá receber uma indenização em razão do tratamento isonômico.

Resumindo: o dever de indenizar fundamenta-se no Princípio da Legalidade, se a conduta for ilícita; e no Princípio da Isonomia, se a conduta for lícita.

• Evolução da responsabilidade civil do Estado:

Nos primeiros tempos da organização do Estado tivemos a Teoria da Irresponsabilidade do Estado. Nesse contexto político valia a teoria da irresponsabilidade porque quem ditava o certo e o errado era o monarca, e ele jamais admitiria que errou, ou aceitaria conceder qualquer indenização (“The king can do no wrong”).

Muitos doutrinadores afirmam que o Brasil não passou por esta teoria, o Estado brasileiro já teria começado como sujeito responsável, mas há divergência a respeito disso.

Estado como sujeito responsável: dá para imaginar que o Estado não sairia da irresponsabilidade total para a responsabilidade total. O nosso Estado passa a ser sujeito responsável, portanto, em situações pontuais.

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A responsabilidade evolui. Saímos de uma responsabilidade específica para uma responsabilidade geral.

Vejamos as teorias a cerca da matéria:

Teoria da responsabilidade subjetiva: no Brasil, a teoria subjetiva foi aplicada a partir do Código Civil de 1916. Quais são os elementos necessários para que o Estado responda aplicando esta teoria? A responsabilidade subjetiva só pune conduta ilícita. Não se admite a aplicação da responsabilidade subjetiva para condutas lícitas. O Estado era responsável geral, mas somente em caso de conduta ilícita. Os elementos para se falar em responsabilidade aqui são 4: conduta, dano, nexo causal + elemento subjetivo (culpa ou dolo).

Num primeiro momento, a responsabilidade subjetiva exigia a culpa ou dolo do agente. A vítima, quando ajuizava a ação, tinha que demonstrar de quem foi a culpa. Mas isso era muito difícil de se fazer nos casos em que, por ex., houve um desmoronamento de uma construção sobre sua residência. É difícil saber quem foi realmente o agente responsável. Por isso a responsabilidade evoluiu da culpa do agente para a culpa do serviço.

Agora, basta demonstrar que o serviço não foi prestado, foi prestado de forma ineficiente ou de forma atrasada. É o que os franceses chamam de “Fault du service”. A vítima não precisa mais indicar o agente. Essa culpa também foi chamada no Brasil de culpa anônima. É, portanto, a Teoria da culpa do serviço ou da culpa anônima (que ainda é uma teoria subjetiva da responsabilidade).

Para caracterizar a responsabilidade subjetiva precisamos de 4 elementos (conduta, dano, nexo e culpa o dolo). E para excluir essa responsabilidade? Faltando qualquer um desses elementos fica afastada a responsabilidade (não só se se afastar a culpa ou o dolo, a exclusão de qualquer um dos outros elementos também exclui a responsabilidade).

Mas a responsabilidade evoluiu novamente. Saímos da responsabilidade subjetiva e passamos à responsabilidade objetiva.

Teoria da responsabilidade objetiva: no Brasil a responsabilidade objetiva é aplicada desde a Constituição de 1946. Hoje, no Brasil, coexistem as duas teorias, mas a responsabilidade dominante é mesmo a objetiva. A teoria da responsabilidade objetiva permite a possibilidade de indenização não só diante da conduta ilícita, mas também na responsabilização por condutas lícitas.

Quais são os elementos para caracterizar esta responsabilidade, para definir a responsabilidade objetiva? São 3: Conduta, Dano e Nexo Causal. A responsabilidade objetiva não precisa de culpa/dolo. Não cabe, portanto, o elemento subjetivo.

É possível excluir essa responsabilidade? Cabe excludente de responsabilidade objetiva? Existem duas teorias objetivas da responsabilidade: Teoria do Risco Integral e Teoria do Risco Administrativo.

A teoria do risco integral não admite excludentes. O Estado deve pagar e ponto. Já pela teoria do risco administrativo é possível excludente de responsabilidade, ou seja, é possível a exclusão dessa responsabilidade.

O Brasil adota a Teoria do Risco Administrativo. Sendo que a nossa Constituição diz que, excepcionalmente, acata-se a teoria do risco integral, em caso de material bélico, substância nuclear e dano ambiental. Nesses casos, não se admite excludente.

O Brasil adota a teoria do risco administrativo, admitindo excludente somente nos casos de culpa exclusiva da vítima, caso fortuito e forca maior? Errado. E se não houver dano, poderá excluir a responsabilidade? Com certeza. A excludente de responsabilidade objetiva aparece quando faltar qualquer um dos elementos. A culpa exclusiva, caso fortuito e força maior é um rol exemplificativo.

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Ex: Motorista da AP dirigia o carro da Administração cuidadosamente. Um sujeito resolve praticar um suicídio e pula na frente do carro do Estado, sendo atropelado. O Estado deverá pagar? Não. Trata-se de culpa exclusiva da vítima.

Ex: Motorista dirigia perigosamente. Um sujeito resolve praticar um suicídio e pula na frente do carro. E aí, o Estado responde agora? Falamos em culpa concorrente. Logo, há responsabilidade civil. O fato é que, na culpa concorrente, a indenização será reduzida de acordo com a participação de cada um. E se não for possível calcular? Se não for possível calcular, a jurisprudência (STJ) diz que se deve dividir a indenização pela metade.

• Aspectos constitucionais:

☺ art. 37, §6º, CR. Sempre que se fala em indenização, as pessoas já acham que se deve aplicar este

dispositivo, mas atenção: nem toda responsabilidade do Estado será fundamentada nesse artigo.Ex: Existe um contrato e uma das partes o descumpre. Esta parte terá de indenizar e o

dever de indenizar é com base na Lei 8.666/93 (e não o art. 37, §6º).Ex: A AP resolve desapropriar o imóvel de José. Ela está praticando um “sacrifício de

direito”. O Estado terá de indenizar? Sim. E o fundamento será o art. 5º, XXIV, CR (e não o art. 37, §6º).

O art. 37, §6º, CR traz responsabilidade contratual ou extracontratual? É responsabilidade extracontratual. Significa dizer que se existir contrato, havendo dever de indenizar em razão do contrato, não valerá o disposto no art. 37, §6º.

Ex: O Estado quer desapropriar o imóvel de José. Este é o seu objetivo, tomar o imóvel do José, e, assim, estará atingindo diretamente o direito de José. A indenização, portanto, deriva do objeto principal.

Ex: A AP constrói um viaduto, causando prejuízo aos vizinhos. O objetivo era fazer um viaduto. O viaduto pode gerar o dever de indenizar. Porém, a indenização é elemento secundário. Não era isso que pretendia o Estado. A intenção do Estado não era atingir o sujeito diretamente.

Questão de concurso: O Estado celebrou um contrato com dispensa de licitação, quando, na verdade, a licitação não era dispensável. O contrato é ilegal, mas o serviço já foi prestado. E agora? O Estado deverá pagar pelo serviço. O contrato ilegal deverá ser retirado do ordenamento – anulado. Como deverá ser efetuado o pagamento? Se não tem contrato, a responsabilidade é extracontratual. Se a responsabilidade é extracontratual, deve-se pagar o sujeito com fundamento em quê? No art. 37, §6º, CR.

O art. 37, §6º, traz os sujeitos da responsabilidade: Pessoa jurídica de direito público (Administração Direta, Autarquia e Fundação Pública), pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público (Empresa Pública – prestadora de serviço público, Sociedade de Economia Mista – prestadora de serviço público, e Fundação Privada), permissionárias e concessionárias.

Assim, a responsabilidade civil do Estado (Objetiva) é aplicável a:- Pessoas jurídicas de Direito Público- Pessoas Jurídicas de Direito Privado, desde que prestadoras de serviços públicos (EP e

SEM exploradoras de atividade econômica, bem como as concessionárias e permissionárias não se responsabilizam objetivamente).

Na verdade, quanto às concessionárias há que se diferenciar:a) em face do usuário do serviço a regra é a da responsabilidade objetiva

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b) em face dos não-usuários do serviço, entretanto, há divergências. Houve uma decisão do STF dizendo que não era caso de responsabilidade objetiva. Foi uma decisão (não é uma jurisprudência consolidada, mas já foi objeto de questão em prova de concurso tipo Cespe). Era, pois, caso de responsabilidade subjetiva, não se aplicando o art. 37, §6º, CR.

Ex.: empresa privada de transporte público coletivo – o ônibus bate em um carro particular – para os usuários do ônibus (vítimas), a responsabilidade é objetiva; para as vítimas do carro particular não-usuários do serviço a responsabilidade é subjetiva.

Ex: motorista de uma autarquia atropela uma pessoa. A vítima irá ajuizar uma ação em face da autarquia. A autarquia está pagando por um agente seu. Se o agente é da própria autarquia, a responsabilidade será primária. Ajuizada a ação em face da autarquia e esta não tendo recursos para pagar a conta, o Estado será chamado à responsabilidade. O Estado está pagando pelo ato de um agente de outra pessoa jurídica – responsabilidade subsidiária. Significa dizer que existe ordem de preferência. O Estado só pagará em segundo plano.

Assim, a responsabilidade poderá ser, ao mesmo tempo, objetiva e subsidiária (não solidária).

Que tipo de conduta pode gerar responsabilidade? O delegado recebe a ordem de prisão. O delegado prende o sujeito e o tortura. Isso é conduta comissiva. O Estado deverá responder. Na ação do Estado, a responsabilidade pode acontecer na conduta lícita ou ilícita. Esta responsabilidade será objetiva ou subjetiva? Objetiva. Na dúvida, deve-se falar em responsabilidade objetiva, que é a regra.

A responsabilidade objetiva surge, pois, tanto na conduta lícita quanto na conduta ilícita. O Estado irá construir um cemitério, um viaduto, um presídio. Ele decide construir um presídio ao lado de sua casa. A conduta é lícita. Se o imóvel sofreu desvalorização, isso gera responsabilidade na teoria objetiva. O Estado deverá indenizar o vizinho – Princípio da Isonomia.

Ex: Candidato recém aprovado em concurso vai à concessionária de veículos e adquire um veículo novo. Passa por ali um bandido que está sendo perseguido pela polícia. O bandido passa e a polícia pega o seu carro para sair atrás do bandido. O policial bate o seu carro no poste. O Estado pode requisitar o seu carro? Pode. Terá direito à indenização depois desse desastre? Com certeza. Não receberá administrativamente. Será necessário ajuizar uma ação. O juiz reconhece o seu direito. Como é uma decisão judicial, será um débito judicial. Logo, será pago em regime de precatório. A conduta do Estado é lícita e gera responsabilidade.

Ex: revista de mulher nua. Nunca mostram tudo na capa da revista. Se a editora esquecer e estampar tudo na capa, o Poder Público pode apreender e destruir a revista? Pode, devido ao exercício do Poder de Polícia. Isso é ato administrativo. Como é ato administrativo, a editora terá direito ao contraditório e à ampla defesa? Sim. Porém, se a AP não fez o processo e destrói as revistas sem processo, essa conduta é ilícita. Tinha o direito de aprender, tinha o direito de destruir, mas com o processo. O Estado terá de indenizar a editora. Trata-se de responsabilidade civil por ação decorrente de conduta ilícita.

(12/12/08)

Quando falamos em responsabilidade subjetiva é porque houve omissão do Estado. Para se ter responsabilidade subjetiva, além dos 4 elementos, é necessário um

descumprimento do dever legal, um desrespeito ao Princípio da Reserva do Possível.

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Como a teoria que prevalece no Brasil é a objetiva, o que a jurisprudência faz? Se descumprir um dever legal, deverá responder subjetivamente. No entanto, se o Estado assume o risco, ele não pode fugir à responsabilidade.

Ex: armazenamento de material bélico. Se resolve fazer um armazém, o Estado está assumindo um risco. Cai um raio e explode tudo. O Estado responderá por isso? Como se trata de material bélico, o Estado responde. Responderá de forma objetiva ou subjetiva? Se ele assumiu o risco, a responsabilidade será objetiva.

Ex: usina nuclear. Choveu demais na região e houve vazamento da usina. Aconteceu uma catástrofe. O Estado deverá responder por causa da Teoria do Risco Integral. Não se admite excludente. A responsabilidade é pelo risco. O Estado assumiu o risco de construir uma usina nuclear. Se o Estado assumiu o risco, deverá haver mais rigor.

A responsabilidade objetiva é mais rigorosa para o Estado é benéfica para a vítima.Dica: Fazer uma leitura da ADPF 45 – Reserva do Possível.Caso prático: Preso, a 100 KM do presídio, resolve entrar numa casa para assaltar. O

Estado responde? Responde. Com qual responsabilidade? Responsabilidade subjetiva, porque quebrou a situação de risco – foi a 100 Km dali. O Estado responderá, porque ele deixou o presidiário fugir.

• Características do dano indenizável:

Só se poderá falar em responsabilidade se realmente existir dano, pois, caso contrário, haveria enriquecimento ilícito.

Que dano irá gerar responsabilidade do Estado? O dano que gera responsabilidade do Estado deve ser:

- Econômico- Jurídico- Especial- Anormal- Certo

É necessário, inicialmente, que haja um dano econômico, ou seja, que tenha causado prejuízo econômico, e que seja, ao mesmo tempo, um dano jurídico. Isso significa que é necessário ter lesão a um direito que já existia. O sofrimento de um dano patrimonial não é suficiente para uma responsabilidade civil. Se não existiu lesão a direito, logo, o dano não é jurídico. Portanto, não há falar em responsabilidade civil do Estado. Lembre-se de que dano patrimonial não é suficiente para gerar a responsabilidade.

Ex: “A” mora numa casa muito tranqüila. A AP resolve fazer algumas mudanças no transito e nas regras urbanísticas. O bairro passa a ser comercial. A tranqüilidade já não é a mesma. Essa mudança gera responsabilidade para o particular? Não existe direito à manutenção de regra urbanística. Se não há direito, não há lesão a direito. Logo, não haverá responsabilidade civil do Estado.

Ademais, o dano precisa ser certo. Isso significa que o dano deve ser comprovado. Ele pode ser determinado ou determinável. É possível que se peça indenização, mas não se saiba o quantum. Ex: contratação de perícia para resolver o valor. É possível que o juiz reconheça o dever de indenizar e determine o cálculo do dano em liquidação de sentença.

É importante que o dano esteja comprovado e seja determinado ou determinável. A responsabilidade deve ser algo calculável.

Especialmente nas hipóteses de condutas lícitas, além do dano jurídico e certo, é necessário que o dano seja anormal e especial.

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Ex.: há responsabilidade do Estado se o transito de uma determinada cidade é péssimo? Isso faz parte de uma cidade grande. Conseqüentemente esse dano é normal. Logo, não gera responsabilidade civil do Estado. O dano, para gerar responsabilidade, deve ser anormal.

Ex: Cidade X foi tomada pela poluição, acarretando prejuízo à saúde dos cidadãos que nela vivem. Se isso for o normal da vida da cidade grande, não há responsabilidade do Estado. Mas e em caso de poeira decorrente de uma obra? Ou se o transito ficar pior em razão desta obra? O Estado deverá responder nesse caso? Se a obra acontecer em um tempo normal, não gera responsabilidade. No entanto, se a obra durar 10 anos, por exemplo, o Estado responde.

E o que significa um dano especial? É um dano particularizado, com vítima certa. Ex: cidade X tem um péssimo prefeito. Por ser péssimo prefeito, há direito de

indenização? Não, pois o dano não é particularizado. Mas se o prefeito tomar uma decisão errada e atingir um sujeito determinado, ai sim haverá responsabilidade.

• Ação de Responsabilidade Civil:

Em regra, a vítima irá ajuizar a ação em face da pessoa jurídica. Se a vítima ajuíza a ação em face do Estado, qual é a regra da responsabilidade? A regra é a responsabilidade objetiva.

Imagine que o Estado irá cobrar do agente a responsabilidade. Ou que a vítima tenha a opção de cobrar do agente.

Se o agente é chamado para responder, a sua responsabilidade é objetiva ou subjetiva? O agente só responde se agir com culpa ou dolo. Logo, a sua responsabilidade será subjetiva.

A responsabilidade objetiva é melhor para a vítima. Temos que observar que se a vítima quiser, ela poderá escolher a responsabilidade subjetiva e ajuizar a ação diretamente em face do agente? Em face do agente não há regime de precatório. A posição que prevalecia na jurisprudência era de que era possível. A decisão era da vítima. Em face do agente, a responsabilidade será subjetiva.

Em 2006, o STF proferiu uma decisão, afastando o agente dessa situação – a vítima não poderia mais ajuizar a ação em face do agente. O STF julgava naquele momento situação específica de um ex-agente político. O assunto sumiu da discussão. Em setembro de 2008, o STF volta a decidir a matéria. Ele analisa um caso de um servidor público normal. Analisando esse caso, ele admite que não cabe ação em face de agente público. Ele não cuida mais só do agente político. Não é possível, portanto, a vítima escolher o agente. A vítima deverá ajuizar a ação em face do Estado diretamente. O STJ, também no mês de setembro, analisa a matéria. O STJ também discutiu o caso de um servidor público comum e disse que a vítima é quem deve escolher – poderá ajuizar em face do Estado ou em face do agente. Se ela escolher o agente, a teoria será a subjetiva. Não há, portanto, uma definição pacífica sobre isso ainda.

Se a vítima ajuíza a ação em face do Estado, este poderá fazer a denunciação da lide, chamando o agente para o processo?

Segundo a doutrina brasileira, a denunciação da lide não é possível no Brasil hoje. O STJ diz que a denunciação da lide é aconselhável, mas quem decidirá se fará ou não denunciação é o Estado. Na jurisprudência é o contrário. Para a doutrina majoritária, a denunciação da lide não é possível no Brasil. Por quê? Se há a presença do servidor no processo e esse agente só responde se agir com culpa ou dolo, logo, necessariamente será ampliado o conjunto probatório. Ampliar o conjunto probatório significa fato novo. O processo não discutia culpa e dolo e agora deverá discuti-los. A vítima chama o Estado. O Estado deverá dizer o que à vítima para não responder? Que é culpa exclusiva da vítima, que é caso fortuito ou força maior. Se ele alega isso e, ao mesmo tempo, traz o agente para o processo, ele está admitindo a sua responsabilidade. Trazer o agente para o processo gera contradição para o processo. Além disso, irá procrastinar o feito. A vítima ficará em prejuízo.

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Todavia, o STJ tem uma orientação em sentido contrário, segundo a qual a denunciação da lide é aconselhável. É aconselhável em razão do Princípio da Economia e da Celeridade Processual. Denunciação da lide deve ser uma decisão do Estado. Ele não pode ser obrigado a denunciar. Quando o Estado traz o agente para o processo, ele estará reconhecendo a sua responsabilidade. Então, o STJ diz que o Estado não pode estar obrigado a reconhecer a sua responsabilidade. É uma decisão facultativa.

O CPC fala em denunciação obrigatória. Já a jurisprudência é muito tranqüila em dizer que na hipótese de direito de regresso a denunciação é facultativa.

Denunciação da lide – se o Estado decidir não denunciar, haverá nulidade para o processo? Ele perderá o direito de regresso? No processo civil, quando a denunciação é obrigatória e a parte não a realiza, o sujeito perderá o direito.

Ocorre que, em se tratando de responsabilidade civil do Estado, a ausência da denunciação não gera nulidade. Ademais, não compromete o direito de regresso. Este é um direto constitucional. O Estado, denunciando ou não, continua tendo direito de regresso. Quando o Estado decide não denunciar o agente, ele deverá cobrar por ação autônoma de regresso. Para o Estado cobrar do agente, a responsabilidade será sempre subjetiva. A Constituição é clara nesse caso.

• Prazo Prescricional:

Existe um pouco de divergência quanto ao prazo prescricional para a vítima ajuizar a ação em face do Estado. A posição que prevalece na doutrina e na jurisprudência ainda é a de que o prazo é de 5 anos (☺Decreto 20.910/32).

Entendimentos doutrinários:1) JSCF diz que a regra de reparação civil mais recente é a do novo Código Civil. O

CC/02 diz que a reparação de dano deve acontecer em 3 anos. É posição minoritária ainda, porque a norma superveniente que fala sobre reparação civil.

2) À ação ajuizada em face das pessoas jurídicas de direito privado – EP e SEM e demais pessoas jurídicas de direito privado, aplica-se o Código Civil, em razão do regime privado.

O que prevalece, no entanto, é mesmo o prazo de 5 anos. Imagine o Estado ajuizando a ação em face do agente – ação de regresso. Qual é o prazo

prescricional? É imprescritível (☺art. 37, §5º, CR). A reparação civil para os agente públicos não prescreve. É relação Estado – agente.

• Observações importantes:

Em qualquer situação, é importante analisar com bom senso para saber se o Estado irá ou não ser responsabilizado.

É inevitável descrever os fatos quando for falar em responsabilidade civil.

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INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE:INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE:

• Aspectos preliminares:

O Estado, para concretizar o interesse público primário, necessita, por vezes, atingir esfera jurídicas alheias, impondo-lhes restrições parciais ou integrais, transitórias ou definitivas. É que a satisfação das necessidades coletivas nem sempre se dá mediante a ação estatal diretamente realizada por servidores em favor dos cidadãos ou por meio do uso de bens que integram o patrimônio público. Em algumas situações é preciso que o Poder Público intervenha sobre atividades privadas, condicionando-lhes o desempenho (ex.: polícia administrativa). Em outros contextos, cabe ao Estado limitar ou até mesmo suprimir a propriedade de terceiros, uma vez que, apenas assim, a finalidade pública perseguida realizar-se-á. Neste último caso, o Estado intervém na propriedade alheia, ou impondo limites parciais ao seu exercício, ou até mesmo excluindo-a como bem pertencente a esfera jurídica do terceiro.

A intervenção do Estado na propriedade funda-se na potestade que decorre da supremacia do interesse coletivo e que autoriza a sua intervenção junto a bens alheios os quais, embora não integrem o patrimônio público neste momento, sujeitam-se às normas e aos atos resultantes do poder extroverso estatal. É-lhe lícito, respeitados os contornos da juridicidade, restringir o exercício do direito de propriedade do terceiro ou até mesmo suprimir-lhe a existência, mediante a incorporação coercitiva do bem ao patrimônio público.

• Evolução histórica da Propriedade:

Quadro sinóptico:

- Séc. XVIII e XIX: direito de propriedade como direito natural e individual.- 1789 – Declaração dos Direitos do Cidadão: propriedade como direito inviolável e sagrado (não privação sem necessidade pública ou justa e prévia indenização).- Final do Séc. XIX: primeiras restrições ao Absolutismo.- Constituição de Weimar (1919): a propriedade obriga e o seu uso deve servir ao bem comum.

Na antiguidade clássica, a propriedade era reconhecida, com feições absolutistas, àquele que se encontrava na posse do bem, não sendo definida a partir de um título.

Na Idade Média esta situação se modifica: o Estado era um ente maior, representado por um rei que se impunha em relação aos demais possuidores de terras (suseranos). Revela-se, pois, nesse momento, o Estado como detentor do poder de propriedade sobre as terras, sendo que os suseranos possuíam o domínio indireto da terra e os vassalos possuíam o domínio útil.

No Séc. XVIII, a propriedade era um direito natural e individual, concebido de forma absoluta, exclusiva e perpétua como um conjunto de poderes de usar, gozar e dispor reconhecido ao titular de um bem.

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A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 consagrava, com quase nenhuma limitação, as prerrogativas de o titular empregar a coisa em seu proveito afetando-a a uma finalidade específica, como melhor lhe aprouvesse, inclusive mediante a retirada de frutos, produtos e rendimentos possíveis.

O liberalismo político e econômico que emergiu da Revolução Francesa consagrou os valores liberdade, igualdade e propriedade, esta a propriedade individual, fragmentada. A Revolução instaurou o dominium romano, que representa a mais intensa individualização da propriedade e a sua mais enérgica e científica expressão.

À medida que os ordenamentos jurídicos foram evoluindo no tratamento da noção de propriedade, abandonou-se uma postura absolutista que implicava definir este conceito como verdadeiro privilégio exclusivo do seu titular que, em posição de superioridade, nada devia à sociedade.

A encíclica papal Rerum Novarum, em 1891, defendeu a tese da propriedade como direito natural. também Duguit sustentou que a propriedade, ainda que privada, possuía função social, pois não seria um direito intangível e sagrado, mas um direito em contínua mudança a se modelar sobre as necessidades sociais a que deve responder. Fortaleceu-se, assim, o embasamento jurídico-científico para reconhecer ao Estado o poder de delinear os contornos do direito de propriedade sob um novo prisma. A propriedade juridicamente definida passou a se submeter a alguns limites, até mesmo na tentativa de evitar que o direito de propriedade se mantivesse como instrumento de exclusão social.

À propósito do perfil jurídico dado à propriedade pelo sistema jurídico moderno, a doutrina vem distinguindo:

Propriedade Direito de PropriedadeConceito metajurídico: noção descompromissada com sua

fisionomia em dado direito positivo.

Expressão normativamente qualificada da propriedade em certo Direito. Conceito

eminentemente jurídico: modo como, sob o aspecto normativo, se encontra disciplinada, juridicamente delimitada ou conformada a

propriedade.Congrega os poderes de usar, gozar e dispor da coisa, de forma absoluta,

exclusiva e perpétua, bem como o de persegui-la nas mãos de quem quer

que injustamente a detenha.

Conjunto dos poderes e das faculdades de que é titular o proprietário: não mais se

reveste o instituto do direito da propriedade de notas de absolutismo e exclusividade,

sujeitando-se a uma série de limitações (ex.: condiciona-se à função social.

A idéia de que a propriedade não se caracteriza como direito subjetivo exclusivo do proprietário e de que é preciso observa as limitações dispostas no ordenamento torna-se possível, neste contexto, a partir do surgimento das primeiras restrições ao absolutismo. Neste momento, tem-se o início da repressão ao abuso de poder, com a restrição ao exercício de direitos que prejudiquem desarrazoadamente terceiros.

À obviedade, não foi incólume a passagem do Estado Liberal para o Estado Social, com a segunda geração de direitos fundamentais abrangendo os direitos coletivos, vinculados à própria idéia de igualdade. A Constituição de Weimar, de 1919, é o retrato da nova filosofia, pois estabelece que a propriedade impõe obrigações e que o seu uso deve constituir, também, serviço para o mais alto interesse jurídico. Não há dúvida de que o referido dispositivo já vincula o uso da propriedade ao bem comum, o que significa clara superação do liberalismo.

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A partir de então ganhou reforço a concepção segundo a qual a propriedade não pode se reduzir à idéia de direito exclusivo e absoluto do proprietário. Sem se renderem à idéia de fim da propriedade proposta por Marx, os países ocidentais, em sua maioria, consagraram que o titular de determinado bem sujeita-se ao dever de também atuar em benefício da coletividade, sendo esta uma significativa mudança de paradigma social e jurídico.

A intervenção legislativa serve como freio ao egoísmo humano, valorizando-se a fraternidade em detrimento de uma igualdade meramente formal entre proprietários e não proprietários.

O caráter complexo da relação jurídica de propriedade decorre do próprio fato de o exercício das prerrogativas dominiais do bem não se admitir mais de forma ilimitada, devendo coexistir com direitos alheios, a saber os interesses públicos cuja proteção incumbe ao Estado.

Não há dúvidas quanto à evolução da propriedade exclusivamente individual para acrescer o aspecto social, e, enfim, solidário. De uma reserva interna da propriedade ao titular da coisa caminhou-se em direção à sua repercussão também vinculada às necessidades coletivas. Do absolutismo e exclusividade passou-se a reconhecer o que a doutrina denominou função social do detentor da riqueza.

• Função Social da Propriedade:

☺art. 5º, XXII e XXIII, CR.Função é algo a realizar; ação natural e própria de qualquer coisa. Propriedade refere-se a

bens. E social refere-se a algo que é feito a favor da sociedade; contribuição que um elemento cultural presta para a perpetuação de uma configuração sócio-cultural. Temos, assim, que função social significa que o imóvel, como coisa, sujeita-se à sua natureza e às necessidades da sociedade.

Todos os bens têm algo a realizar para o bem da sociedade. E este é o seu uso adequado.Uso adequado é o uso pertinente, no tocante àquele determinado bem.A função social da propriedade veio para mudar a própria concepção de propriedade, que

deixou de ser um direito absoluto. Hoje, o direito de propriedade é uma relação jurídica complexa. A sociedade é titular,

perante o dono do bem, do direito ao uso adequado de cada bem; ela é credora do dever de cumprimento do uso adequado / função social da propriedade.

A função social implica que toda a sociedade não seja apenas sujeito passivo do dever de não ofender a propriedade do titular do bem. Toda a sociedade é, ainda e simultaneamente, sujeito ativo da prerrogativa de ver, no uso do bem, condutas úteis e adequadas. O proprietário da coisa, que é o sujeito ativo do uso, gozo, fruição e disposição do bem, encontra-se individualizado também no pólo passivo da obrigação comissiva de dar ao bem função social.

Esta, pois, a complexidade da relação jurídica do direito de propriedade: o titular do bem pode opor o direito real erga omnes e exigir abstenção ofensiva de todos e, simultaneamente, está obrigado a cumpri a função social; a sociedade é devedora do respeito aos poderes dominiais do titular do bem e, simultaneamente, pode exigir o cumprimento da função social.

De fato, as prerrogativas dominiais passam a se vincular à noção de meio ambiente e de patrimônio comum da humanidade.

Assim, a expressão direito de propriedade, sujeita ao limite da função social, cria uma situação jurídica complexa, com vínculos jurídicos que implicam poderes e deveres, obrigações e ônus, tanto para os donos quanto para os terceiros não-proprietários.

Sob esta nova perspectiva, é essencial compreender a função social como elemento que define o direito de propriedade, conforme a própria expressão da garantia constitucional atribuída a este conceito jurídico.

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Ou seja, a função social da propriedade é um elemento definidor do próprio direito de propriedade.

Por isso se diz que este elemento não mais só restringe a propriedade, mas também a define. Sem função social não há propriedade.

A função social viabiliza a harmonização da idéia de bem comum, participação e solidariedade, e exclui a idéia de um conceito absoluto pré-estabelecido de propriedade, pois este direito harmonizará os diversos aspectos em questão somente diante das especificidades da realidade em tese. E cada realidade implicará um tipo de propriedade e de função social.

A função social é um elemento constitutivo do direito de propriedade, porquanto, na medida em que o ordenamento só protege o bem cuja função social é concretizada e, ainda impõe a perda coercitiva da propriedade quando tal princípio é descumprido, conclui-se que a função social da propriedade deixou de ser condição para o exercício e passou a se constituir elemento integrante do direito.

☺arts. 182, §4º, III e 184, CR.Ou seja, só haverá proteção jurídica à propriedade (e assim o próprio direito à

propriedade) se houver cumprimento da sua função social.O fundamento dos modos de intervenção do Estado na propriedade é justamente a sua

função social.A função social, portanto, é princípio básico que incide no próprio conteúdo do direito de

propriedade, somando-se às quatro faculdades conhecidas (usar, gozar, dispor e reivindicar). Em outras palavras, converte-se em um quinto elemento da propriedade. Enquanto os quatro elementos estruturais são estáticos, o elemento funcional da propriedade é dinâmico e assume um decisivo papel de controle sobre os demais.

• Considerações Gerais:

O Estado, como regra, não faz intervenção na propriedade do particular. A intervenção na propriedade ocorre em situações excepcionais, na anormalidade.

Como a intervenção é exceção, ela deve ser bem justificada, bem fundamentada. Aspectos importantes:- O que significa o direito de propriedade? - Quais são as a restrições que esse direito pode sofrer? Afinal, o que é direito de propriedade no direito civil? É o direito de usar, gozar, usufruir,

dispor e reaver o bem com quem quer que ela esteja.

A propriedade implica em um conjunto de poderes de usar, gozar, dispor e reaver o bem. Antes, estes poderes eram exercidos em caráter perpétuo, absoluto e exclusivo. O Estado, atualmente, porém, tem mecanismos para garantir o uso da propriedade de acordo com os princípios do bem comum, da participação e da solidariedade. Esses mecanismos são os mecanismos de intervenção que atingem o caráter perpétuo, absoluto e exclusivo da propriedade.

Quando pensamos em direito de propriedade, ele envolve 3 elementos:

1. Caráter Absoluto: é a liberdade que o proprietário tem sobre o seu bem. Ex: construir, plantar, criar. A Constituição restringe a propriedade em algumas condições. Ex: desrespeito à função social.

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2. Caráter Exclusivo: o proprietário tem direito ao uso exclusivo. A propriedade garante ao seu dono o uso exclusivo do bem, ou seja, só entrará lá quem ele deixar.

3. Caráter Perpétuo: a propriedade é do sujeito enquanto essa seja a sua vontade. Ela pode permanecer para o resto da vida.

Assim, podemos relacionar:

A intervenção na propriedade é justamente a interferência em um desses elementos, em um desses caracteres. A intervenção ora atinge o caráter absoluto, ora o exclusivo e ora o perpétuo.

A intervenção na propriedade, em todas as suas modalidades, salvo na desapropriação, atinge um desses elementos, mas não retira a propriedade. O sujeito continua sendo dono, apesar de não o ser com a mesma liberdade de antes.

A desapropriação é mesmo a única hipótese em que o dono deixa de ser dono. É uma forma de aquisição originária da propriedade. Atingirá o caráter perpétuo da propriedade.

• Mecanismos de Intervenção:

Há intervenções genéricas (limitações administrativas) e há intervenções que constituem gravames particularizados e constrições individualizadas (os chamados sacrifícios de direito), que são as intervenções individualizadas.

Nesta última modalidade se encontram: a desapropriação, a requisição administrativa, a ocupação temporária, a servidão administrativa e o tombamento.

A única espécie de intervenção genérica, por sua vez, como vimos, é a limitação administrativa.

Considerando os critérios da generalidade e da especificidade da constrição realizada, as limitações são as formas de intervenção genéricas que têm por objetivo evitar prejuízo ao interesse social. As limitações advêm de lei e se caracterizam pela generalidade, abstração e impessoalidade, não incidindo sobre um bem determinado. Já os sacrifícios de direito são gravames particularizados, ou seja, constrições específicas que incidem sobre determinados bens em favor do interesse público.

Destarte, nas limitações, o Estado de forma genérica conforma os direitos de terceiros. Nos sacrifícios de direito, há autorização legislativa preliminar a que o Estado atinja diretamente direitos consagrados no sistema, já incorporados no patrimônio dos terceiros. Não se trata de lhes definir os contornos, mas de, em face dos contornos já atribuídos pelo ordenamento, sacrificar-lhes o exercício, particularizadamente.

A intervenção genérica não implica em prejuízo, não leva ao dever do Estado de indenizar, já que vale para toda a coletividade. O caráter genérico exclui a presunção de prejuízo e exclui o dever de indenizar (já que todos sofrem a mesma restrição).

A constrição individualizada, por sua vez, em regra, leva à indenização (com algumas exceções).

Caráter da propriedade: Espécie de intervenção que o atinge:

É perpétua DesapropriaçãoÉ absoluta Limitação administrativa e TombamentoÉ exclusiva Servidão; Requisição e Ocupação

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Assim, afirma-se que as limitações, em razão da generalidade do gravame que impõem, não implicam dever de indenizar, ao contrário dos sacrifícios de direito, cuja especificidade constritiva implica, em regra, o dever de ressarcir os prejuízos sofridos. Malgrado a licitude dos sacrifícios, que são impostos com fundamento em autorização legislativa preliminar, devem ser indenizados, em princípio, os danos emergentes causados ao titular do bem.

Por isso aqui devemos nos lembrar da “regra da bengala”: →

Existe apenas 1 caso de intervenção genérica (que não é indenizável),e todo o resto é constrição individualizada (que como regra são indenizáveis).

Esta regra comporta, à obviedade, temperamentos, principalmente no tocante a sacrifícios de direito. Em primeiro plano, qualquer limite imposto só acarreta a obrigação indenizatória do Estado na hipótese de prova evidente dos prejuízos sofridos. Afinal, indenizar significa tornar indene de prejuízos e, na ausência de danos, não há o que se ressarcir. Outrossim, em algumas hipóteses de sacrifícios de direito, a jurisprudência pacificou-se no sentido da impossibilidade de indenizar, a despeito da especificidade da constrição imposta.

• Formas de Intervenção:

1) Restritivas: há restrição, ou seja, apenas um condicionamento parcial. Ocorre quando o Estado pretende apenas condicionar o uso da propriedade, impondo-lhe determinados condicionamentos parciais. Nestes casos, o titular do bem o mantém em sua esfera jurídica, estando obrigado apenas a observar determinadas restrições. Em cada uma das hipóteses, ter-se-á determinada restrição: de caráter transitório ou definitiva, que implica obrigação de fazer ou de não fazer, ou de suportar. São elas:

- Limitação administrativa- Ocupação temporária- Requisição administrativa- Tombamento- Servidão administrativa

2) Supressiva: há a verdadeira supressão da propriedade, atinge ao máximo o direito.- Desapropriação (é a única hipótese): por meio deste instituto, o Poder Público,

independentemente da aquiescência do terceiro ou de recorrer ao Judiciário, adquire coercitiva e originariamente o bem, incorporando-o ao patrimônio público, com base na supremacia do interesse coletivo.

Em todos os casos, porém, é imperioso notar, que a eleição do mecanismo de intervenção orienta-se pelas características do regime jurídico de cada uma das modalidades e pelo princípio da proporcionalidade. Ao Estado não é facultado escolher aleatoriamente qualquer daqueles meios, devendo, sim, desde que adequado para atingir a finalidade, utilizar sempre o menos oneroso para o titular do direito sacrificado.

• Desapropriação Indireta:

Muitas vezes, a Administração faz a intervenção na propriedade e determina tantas restrições (ex.: não pode plantar, não pode construir, não pode criar, enfim, não pode fazer mais nada) que, na verdade, acaba por atingir ao máximo o direito de propriedade, o suprimindo-o

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verdadeiramente. A AP tenta sempre fugir do instituto da desapropriação. Muitas vezes, ela finge uma ocupação, um tombamento, uma servidão, só para não pagar indenização, mas, na verdade, a intervenção se dá de tal maneira que afeta diretamente a propriedade, deixando o proprietário de poder utilizar-se dela de qualquer forma. Trata-se, pois, de uma verdadeira desapropriação. São casos em que a intervenção desnatura-se (fugindo ao seu objetivo principal – ex.: limitação administrativa) e terminam por suprimir integralmente a possibilidade de uso dos bens atingidos.

Caso o Poder Público não tome os cuidados necessários para desapropriar, se não faz o procedimento da desapropriação, mas está desapropriando, dá-se a isso o nome de Desapropriação Indireta. Nestes casos, será preciso indenizar o terceiro prejudicado.

Uma intervenção designada formalmente como limitação administrativa, mas que importa em perda dos poderes inerentes ao domínio, constitui verdadeira desapropriação indireta, sendo obrigatório o ressarcimento ao titular do bem dos prejuízos que lhe foram causados.

O mesmo ocorre se se retira do titular do bem a possibilidade de extrair proveito econômico de uma determinada área. É cabível indenização pelo fato de tê-la tornado inútil. Afinal, se em face de decretos e de tombamento não se pode realizar no imóvel qualquer empreendimento, quer para a exploração de riquezas florestais ou imobiliária, é clara a perda do seu valor, pois não se vislumbra uso ou interesse comercial que possa atrair investimentos.

Vistas estas considerações iniciais, vamos ao estudo de cada uma das modalidades de intervenção na propriedade:

• Limitação Administrativa:

É medida geral, gratuita e unilateral, imposta com fundamento no poder de polícia, com o fim de condicionar o exercício de direitos ou de atividades “particulares” (mas também públicas) às exigências do bem-estar social.

→ Aspectos principais:

- É geral porque atinge todas as pessoas ou coisas que se encontram em uma determinada situação.- Veículo: lei – só por lei se pode fazê-lo (já que é medida unilateral).- Competência: quem detém poder de legislar sobre a matéria objeto da limitação (resulta da repartição constitucional de competências).- É imperativa: caráter de coercibilidade (já que resulta de lei).- Não-confiscatoriedade: não se pode suprimir o bem ou a sua utilidade (se isso fosse possível seria uma desapropriação).- Obrigações: significam o conteúdo da limitação administrativa. Podem ser de agir, não agir ou de permitir que a AP aja, vejamos:a) positivas: obrigação de fazer (ex.: construir)b) negativas: obrigação de não fazer (ex.: preservação da reserva legal)c) permissivas: obrigação de suportar (ex.: permitir fiscalização do corpo de bombeiros)- Gratuidade: regra de não prejuízo – inexistência do dever de indenizar (lembrar da regra da bengala).

Atenção para uma situação excepcional: “área non aedificandi”: nas rodovias federais, o Poder Público é dono do “leito carrossável” da rodovia e as suas margens são bens privados,

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mas há o dever de não construir nestas margens. São áreas em que não se pode edificar. Mas, no caso de propriedade rural, é possível utilizá-la de outras formas (pode plantar, colocar gado, etc.), ou seja, algum proveito econômico para esta área haverá, e, portanto, não há o dever de indenizar. Já no caso de uma área urbana, onde só se pode haver edificações como forma de aproveitamento da área (já que ela se presta a isso), não há uso possível para aquela área, e, portanto, ocorre um esvaziamento do conteúdo econômico do bem, acarretando, assim, o dever de indenizar os prejuízos sofridos pelos titulares dessas áreas marginais. Mas isso não ocorrerá na situação em que a área urbana atingida pela limitação administrativa já sofria a restrição “non aedificandi” anteriormente, quando ainda era uma zona rural, caso em que não haverá o dever de indenizar (☺STF, RE 93553/SP e STJ, Resp. 983017/SP).

- As obrigações que decorrem da limitação administrativa têm natureza de direito pessoal (e não de direito real).- Há a característica de continuidade, de permanência ao longo do tempo (decorre da lei).

Quando falamos em limitação, é necessário guardar que esta é uma modalidade de intervenção que traz uma atuação geral e abstrata do Estado. O que significa dizer que o proprietário é indeterminado. Assim, não importa quem seja o dono do imóvel.

Como funciona a limitação administrativa? O que acontecerá com a limitação? Limitação nada mais é do que o exercício do poder de polícia. Ex: Poder Público determinada a construção de um número de andares. Este poder atingirá várias áreas diferentes, sempre na busca do bem estar social, como,

por ex. editando regras urbanísticas, regras de segurança contra incêndio, regras sanitárias, etc. Assim, o poder de polícia nada mais é do que a busca do bem estar social, é a

compatibilização do interesses. Obs.: A limitação administrativa tem por excelência a base do poder de polícia. A posição

na doutrina tradicional trazia a limitação administrativa como exercício do poder de polícia e ponto final. Hoje, porém, os doutrinadores mais modernos (CABM e MSZDP) defendem que o Poder de Polícia não está presente só na limitação administrativa, mas também nas demais modalidades. Ele também é fundamento para tombamento, para ocupação, para servidão. Assim, o poder de polícia é utilizado como fundamento das demais modalidades, exceto no caso de desapropriação.

Se falarmos em limitação administrativa, estamos falando em interferência em qual caráter da propriedade?

Ex: determinação de que não se pode construir acima de 08 andares. Qual é o elemento da propriedade que está sendo atingido com esta limitação? Trata-se do caráter absoluto da propriedade. Ocorre ai uma restrição desse caráter absoluto, uma restrição da propriedade na sua liberdade.

Limitação administrativa gera dever de indenizar? Ex.: determinação de que não se pode construir acima de 10 andares. Isto não gera dever de indenizar pelo Estado, pois é ato geral e abstrato.

O Poder Judiciário pode rever essa determinação administrativa? Somente no que tange à legalidade (em sentido amplo). Controle de conveniência e oportunidade não pode ser feito pelo Poder Judiciário.

Muitas vezes encontraremos esse instituto em Direito administrativo e em Direito civil. É importante então ter sempre em mente a seguinte idéia: se falarmos em limitação administrativa e a servidão administrativa, a principal diferença é o interesse – protege-se interesse público. A limitação civil serve para proteger o direito privado e é encontrada nos casos das regras do direito de vizinhança.

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• Servidão Administrativa:

É um direito real de gozo de natureza pública, que se institui sobre imóvel de propriedade alheia, em favor de um serviço público ou de um bem afetado a um fim de utilidade pública.

Significa, pois, um direito real sobre coisa alheia. Serve para prestação do serviço público.

Ex: passagem de fios de energia elétrica, passagem de saneamento básico, etc. Não podemos nos esquecer de que se trata de direito real sobre coisa alheia. Mas, e se o

próprio Estado adquirir uma propriedade onde existia uma servidão, o que acontecerá? A servidão desaparecerá, porque perdeu a qualidade de coisa alheia. Faltando esse elemento, não haveria sentido para o Estado manter a servidão. Trata-se, pois, de uma hipótese de extinção da servidão. Não há servidão sobre coisa própria.

O que é o direito real? O direito de propriedade também é um direito real. O direito de propriedade é um direito perpétuo. A servidão também é perpétua. Ela tem como característica a perpetuidade, já que incidirá sobre o bem de forma contínua (mas atenção: ela não atinge o caráter perpétuo da propriedade! Não confundir!).

A perpetuidade não é absoluta, o que significa dizer que ela pode ser afastada. Quando? A servidão e a limitação administrativas são realizadas em razão do interesse público. Se o interesse público desaparecer, ou seja, se o Estado não tiver mais interesse na servidão, ela irá desaparecer.

Sendo direito real, como é comprovado esse direito? Como se faz a transferência de uma propriedade? É necessário o registro. A servidão deve ser registrada. Deve constar no título do registro daquela propriedade. É necessário averbar no registro do imóvel. O registro representa proteção do terceiro de boa-fé. A servidão vai acompanhando o bem com quem quer que ele esteja por ser direito real.

Servidão não se presume; deve ser formalmente constituída (não existe servidão administrativa de fato – salvo raras exceções, como as que têm potencial gravoso muito pequeno, como a colocação de placas nos muros de casas de esquina).

Servidão acontece quando se fala em passagem de energia elétrica, passagem de saneamento básico. Nesse caso, qual elemento da propriedade está sendo atingido? Será o caráter absoluto, perpétuo ou exclusivo? O exclusivo. Acaba atingindo a liberdade, mas restringirá o uso da propriedade – alguém vai usar junto com o proprietário.

Há a idéia de uso moderado (meio mais suave possível, com o menor prejuízo possível).

Fundamentos legais:- DL 3365/41 (lei geral) - ☺art. 40;- Lei 9472, art. 100;- Lei 9074/95, art. 10;- Lei 8987, art. 29, VIII e IX.

Objeto: bem imóvel – privado ou público.Há “hierarquia federativa”: U→E/DF→MÉ possível que a União imponha servidão administrativa sobre bens dos Estados e dos

Municípios; e o Estado sobre bens dos Municípios (mas o inverso não).

Processo de instituição regular:1) Declaração de utilidade pública;

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2) Se for feito o acordo, ele deve ser reduzido a escrito; em seguida lavra-se a escritura e leva-se ao registro;

3) Se não há acordo (aquiescência), é essencial que se ajuíze uma ação (≠ do tombamento, em que não será necessário ajuizar ação). A sentença transitada em julgado é que será levada a registro.

Segundo MSZDP, é possível haver servidão administrativa instituída por lei, mas trata-se de uma posição minoritária (e ela mesmo se confunde porque, ao exemplificar, dá para o caso as características de limitação administrativa – ex.: proibição de construção acima de certa altura nas áreas marginais de aeroportos).

A servidão administrativa pode ser constituída de 3 formas diferentes:1. Por previsão legal: A doutrina brasileira diz que a servidão administrativa que

decorre de lei não precisa de registro. O registro serve para proteger terceiros de boa-fé. Quem compra o bem, compra o bem com servidão. O registro tem como objetivo também dar publicidade, divulgar a existência do instituto. O que dá mais publicidade – o registro ou a lei? Com certeza a lei. Se a nossa servidão decorre de lei, não precisa de registro. Nos demais casos, o registro é necessário.

2. Por acordo.3. Por decisão judicial.

Questão de concurso: o que acontece numa servidão civil e numa servidão administrativa no que diz respeito à relação de dominação? Ex: servidão civil de passagem. Há dois bens imóveis, e um deles não tem acesso à via pública. Para ter acesso, o imóvel precisará do direito de passagem. Na servidão civil, um bem se utiliza de outro bem. Há dois bens. A dominante (quem utiliza) é um bem, e o serviente (quem é utilizado) é outro bem. Quando falamos em servidão administrativa – Ex: passagem de energia elétrica – para essa energia chegar ao imóvel A é necessário que ela passe pelo imóvel B. Nesse caso, quem usa e quem é usado? Em caso de servidão administrativa, quem é o dominante e quem é o serviente? Em servidão administrativa, há um serviço sobre um bem, e não um bem sobre um bem. O dominante é o serviço e o serviente é o bem. Tanto o imóvel A quanto o imóvel B são servientes.

Diferenças entre servidão civil e servidão administrativa:1. Relação de dominação – serviço sobre bem.2. Interesse público

Obs.: a servidão administrativa atinge proprietário específico (ex.: o imóvel da rua tal). Atingirá, pois, um proprietário determinado.

Diferenças entre servidão e limitação administrativas:1. Limitação = caráter absoluto; servidão = caráter exclusivo.2. Limitação = ato geral e abstrato; servidão = ato específico sobre proprietário

determinado.

Há dever de indenizar no caso de servidão? A simples passagem indeniza? Não. Porém, se houver dano, há dever de indenizar.

Ex: curto circuito na energia elétrica.Ex: Imagine que pela sua propriedade passe agora não fios de energia elétrica, mas fios

de alta tensão. Vem uma placa, restringindo várias coisas. Se não pode construir, não pode plantar, etc., em virtude dessa passagem de fios de alta tensão, na verdade, há uma desapropriação indireta. Há um campo energético em torno dos fios que impede o uso da

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propriedade. Logo, deveria desapropriar e indenizar por isso. A mera servidão não poderia er utilizada neste caso.

Haverá o dever de ressarcimento de todos os prejuízos sofridos pelo titular da coisa serviente (com correção monetária, juros, honorários advocatícios, etc.).

Extinção da servidão administrativa (em circunstâncias excepcionais):- perda da coisa gravada;- desafetação ou afetação d coisa dominante a um fim diverso daquele que justificou a

servidão administrativa;- incorporação do imóvel serviente ao patrimônio público;- transformação da coisa por um fato que a torne incompatível com o destino.

• Requisição Administrativa:

É ato administrativo unilateral, auto-executório, oneroso, consistente no uso de bens e serviços particulares pela AP, para atender a necessidades coletivas em tempo de guerra ou em caso de perigo público iminente (risco social em vias de ocorrer), mediante indenização ulterior.

Pode incidir sobre bens móveis, bens imóveis ou serviços.A indenização ulterior deve se dar em processo dialético, ou seja, tem que dar

oportunidade a quem sofreu o prejuízo de negociar o valor da indenização (é preciso produzir prova, avaliar critérios, etc.) – a indenização não pode ser fixada unilateralmente pela AP.

Pode a União requisitar bens públicos de outros entes da Federação? Há no STF 3 posições quanto a isso: a) Carlos Britto entende que não, que só incide sobre bens privados; b) Joaquim Barbosa entende que sim, que pode incidir sobre bens privados ou públicos; e c) Cezar Peluso entende que sobre bens públicos que sejam empregados em destinação diversa do uso previsto no ordenamento pode incidir a requisição (para não interferir no equilíbrio federativo). Para a doutrina, a orientação majoritária é no sentido de ser o instituto restrito aos bens privados.

Esta é a espécie que mais aparece em prova de concurso.Previsão legal: ☺art. 5º, XXV, CR. O Poder Público poderá requisitar o patrimônio do particular sempre que existir iminente

perigo. A indenização, neste caso, será ulterior, se houver dano.É necessário guardar que a requisição acontece quando existir iminente perigo. Quanto tempo dura? A Constituição não estabelece prazo. Logo, deverá durar enquanto

existir o perigo. Mas a requisição deve ser uma situação temporária. Ex: vamos requisitar para socorrer os desabrigados da chuva. Quando cessar a chuva,

extinta estará a requisição.Muitas vezes, o Estado requisita, usa, a chuva vai embora, e ele simplesmente não

devolve o bem. Isso é muito comum na Administração. Para onde o Estado irá mandar os desabrigados? O problema é que a AP não tem outra

saída, então, ela fica por mais tempo. Neste caso, então, o prejudicado deve recorrer à via judicial para pedir a reintegração.

A indenização, como vimos, é ulterior e se houver dano. Ocorre que, na prática, normalmente, a administração usa, não devolve e não indeniza.

Essa intervenção atinge qual caráter da propriedade? O caráter exclusivo. Perde-se a exclusividade sobre ela.

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Obs.: a requisição pode ser decretada em tempo de guerra ou em tempo de paz. Basta existir iminente perigo.

Questão de concurso: O Poder Público requisitou roupas de uma fábrica e frangos de um frigorífico para socorrer os desabrigados da chuva. Esse instituto é o da requisição? Em todas as modalidades, o dono continua dono, exceto na hipótese de desapropriação. O dono, nesse exemplo citado, continuará dono? Dá para usar roupa da fábrica e, posteriormente, devolver? Não dá. Isso não é requisição! Todavia, doutrina e jurisprudência dizem que quando tratar de bens móveis e fungíveis (podem ser substituídos por outro, na mesma qualidade e na mesma quantidade) o instituto será o da requisição. Na verdade tem “cara” de desapropriação, mas não é. No caso das roupas requisitadas para socorrer os desabrigados da chuva, tratam-se de bens móveis, mas infungíveis, já que cada roupa é diferente da outra. Logo, não cabe requisição.

Diferença entre requisição e servidão: as duas atingem o caráter exclusivo da propriedade, mas a servidão tem caráter perpétuo e servidão tem caráter temporário. Ademais, servidão é serviço e requisição é iminente perigo.

• Ocupação Temporária:

Implica em utilização transitória, remunerada ou gratuita, incidente sobre “imóveis” particulares pelo Poder Público, durante período determinado, para a execução de obras, serviços ou atividades públicas ou de interesse público.

A ocupação temporária, como o próprio nome indica, é temporária. Logo, difere-se da servidão.

Ocorre quando o Estado intervém na propriedade em duas situações diferentes. Vejamos:1. ☺art. 36, do DL 3365/41: Esse decreto-lei é a norma geral da desapropriação. Fala

dos imóveis não edificados, ao lado de obras públicas, para guardar os materiais da obra. É possível utilizar esses materiais e guardá-los no imóvel vizinho à obra. Deve ser imóvel não edificado e deve estar ao lado da obra pública. Atenção: se no imóvel existir uma casa, não pode ser ocupado. Neste caso a indenização deverá ser paga ao final (a lei presume que há prejuízo, ainda que o titular do imóvel ocupado não esteja utilizando o bem, porque a partir do momento em que há a ocupação temporária, a simples impossibilidade de se dar eventualmente alguma utilização ao bem já dá direito à indenização). Neste caso a ocupação temporária dependerá de decreto que declarará a área como de utilidade pública (é possível que um mesmo decreto declare a utilidade pública da área que será desapropriada e da área que será ocupada temporariamente, mas o mais comum é que o decreto que imponha a ocupação temporária venha supervenientemente).

2. Demais casos: para esses casos basta que a forma seja escrita, não precisa de nenhuma solenidade ou formalidade (como o decreto, por ex.), pode ser feita até mesmo de ofício (ex.: para usar escola em dia de eleição). Não há indenização, salvo se houver dano (hipótese excepcional). ☺Lei 3.924/61. Muitas vezes, quando a Administração desconfiava de que num certo imóvel existia minério ou parque arqueológico, ela desapropriava e procurava o ouro. Mas muitas vezes ela não encontrava nada. Ocorria a desapropriação desnecessária. Hoje, a AP pesquisa o minério por meio de ocupação temporária. Se ela encontrar o ouro, ela desapropria o imóvel. O Poder Público perfura o que for necessário, escava a propriedade toda e depois, se não tiver nela mais nenhum interesse, devolve o imóvel. Assim, a ocupação temporária pode gerar o dever de indenizar. Se houver dano, a AP deverá indenizar.

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Assim, a ocupação temporária pode gerar dever de indenização, se houver dano. Além disso, vale lembrar que a ocupação temporária atinge também o caráter exclusivo da propriedade.

Obs.: a ocupação temporária pode, excepcionalmente, atingir bem móvel. ☺art. 80, II, da Lei 8.666/93 (bem móvel que seja necessário à continuidade do contrato administrativo, na situação de rescisão, em que o serviço deve continuar sendo prestado).

• Tombamento:

É um procedimento administrativo* no bojo do qual o Poder Público reconhece o valor turístico, histórico, paisagístico, cultural ou arquitetônico de uma coisa ou de um local que justifica a sua conservação, mediante inscrição no livro próprio.

(*) Fala-se em procedimento administrativo porque ocorre por meio de uma sucessão de atos administrativos, e não por meio de lei, já que limita a esfera jurídica do titular do bem e, portanto, deve dar a ele a oportunidade de se manifestar, de questionar os motivos, etc. ademais, o DL 25 não prevê o tombamento resultante de lei, mas só de procedimento administrativo.

A expressão “tombamento” provém da Torre de Tombo, uma das tores do Castelo de Lisboa, na qual estiveram guardados s documentos do reino de Portugal. Nessa torre, ficaram os arquivos oficiais de Portugal até o incêndio de Lisboa, em 1755. a partir de então, os arquivos foram transferidos para o Mosteiro de São Bento, onde permaneceram até 1990, quando foram transferidos para seu edifício atual, ou seja, a nova Torre de Tombo.

E a palavra “Tombo”, de onde provém? Ela tem origem controvertida. Para alguns, provém de tomus (latim: tomo, pedaço, volume, obra: daí a idéia de arquivo). Para outros, provém de tumulum (latim: elevação, morro, elevação de terra sobre uma sepultura; nesse sentido a palavra proviria, mas remotamente, de tumbos, palavra de origem celta e grega, com o sentido de tumba). Nesse sentido, a palavra significaria um amontoado de livros, arquivos e documentos.

De uma maneira ou de outra a palavra tombo ou tombamento acabo servindo em nossa língua para referir-se ao cadastro de propriedades ou direitos.

O tombamento é, hoje, uma forma de proteção administrativa de um bem de valor cultural.

O tombamento não constitui pressuposto necessário para a proteção judicial do bem de valor cultural (natureza declaratória do tombamento). Em juízo, um bem pode ser reconhecido como tendo valor cultural, mesmo não estando tombado, como também, ao reverso, pode o juiz negar a existência de valor cultural a um bem, ainda que tombado. O tombamento é, pois, uma presunção relativa de que o bem tenha valor cultural.

Previsão Legal: ☺DL 25/1937 (Leitura obrigatória). Na prática ou de fato, esse instituto está muito em desuso. O decreto é de 1937 e muita

coisa aconteceu depois disso. O Estado não investe em tombamento. Ele não tem estrutura para isso. Ademais, não há

fiscalização, não há investimento financeiro, etc. O tombamento significa a conservação da identidade de um povo. Serve para a

conservação do patrimônio histórico, artístico (obras de arte, escultura), cultural (dança folclórica) e paisagístico (árvore determinada).

Deverá ser registrado em livro próprio. Existem 4 livros diferentes: o livro de tombo histórico, o de tombo artístico, o de tombo cultural e o de tombo paisagístico.

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O sujeito (proprietário do bem) tem a obrigação de conservar o imóvel. Qual será, pois, o elemento da propriedade que será atingido? O tombamento atinge o caráter absoluto da propriedade.

O tombamento tem um procedimento administrativo próprio, previsto no decreto-lei.

- Controle cabível: há discricionariedade ou vinculação no procedimento? Depende. A fase externa é vinculada (prazos, recursos, homologação, etc., tudo isso está na lei). Já quanto a valoração, depende: pode haver discricionariedade administrativa ou não na valoração inicial do bem que será tombado – há bens que têm evidentemente conveniência de serem preservados, mas há situações em que não há essa conveniência. E muitas vezes será preciso recorrer a diferentes ciências (história, arte, cultura, etc.) para valorar da conveniência ou não e ai haveria então discricionariedade.

Já na fase externa (em que tudo está na lei), pode haver controle pelo Judiciário (controle de legalidade).

Quanto a avaliação do bem, se é evidente a necessidade de conservação e esta não ocorre, o Judiciário pode intervir (é caso de omissão ilícita); se, ao contrário, a AP tomba bem que não devia ter sido tombado, também cabe controle judicial. Neste caso é tudo vinculado.

Já nos casos em que pode haver ou não o tombamento (quando há uma discussão histórica e cultural, sobre a conveniência ou não de se tombar o bem), ai há discricionariedade no mérito da avaliação e não cabe controle judicial para substituir o critério técnico da valoração.

- Objetivo do tombamento: 1º) a conservação do bem, 2º) a fruição cultural do bem.Há casos em que a função cultural é incompatível com o regime especial do tombamento

(que é restrição parcial apenas). Ai, neste caso, o tombamento não será o meio adequado que conduzirá à satisfação pública (é melhor a desapropriação).

→ Regime jurídico que incide sobre o tombamento (conjunto de normas que regem o instituto):

- Competência legislativa: é concorrente (☺art. 24, VII e §1º c/c art. 216, §1º, CR) – a União edita normas gerais (DL 25/73), e os Estados e DF as normas específicas (não se fala em municípios).

- Competência material: ☺art. 30, IX, CR – aqui o município tem competência, mas tem que observar a legislação federal e eventual legislação estadual que possa intervir.

Ocorre que o art. 30, I e II confere ao município, no que diz respeito aos assuntos de interesse local (e não há nada de mais interesse local para um município do que a preservação de um bem desse próprio município). Mas a jurisprudência diverge: há quem diga que tombamento realizado com base em legislação municipal não é válido porque o município não tem competência para legislar sobre tombamento. Não há precedentes no STF quanto a isso. Tribunais regionais em geral entendem pela competência municipal legislativa.

Quanto à competência material não há dúvida: pertence a todas as pessoas legislativas.- Objeto: bens privados ou públicos, de qualquer ente (não há restrições – um ente pode

tombar bem de outro). Há restrição somente quanto ao nº de tombamentos: se mais de um ente quer tombar um mesmo bem, prevalece o interesse da União, depois o do estado e depois o do município.

Em tese, pessoa titular do bem não o poderia tombar, porque já tem a propriedade do bem e esta propriedade já ensejaria o dever de conservar (então não faz sentido o tombamento de bem próprio). Apesar de que na prática se sabe que o tombamento induz em uma série de ações que são muito mais eficazes do que a simples conservação derivada da propriedade.

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O que irá acontecer com o patrimônio enquanto o procedimento estiver em andamento? Enquanto estiver em andamento o procedimento administrativo, o Poder Público realizará o tombamento provisório. O tombamento provisório ocorre, pois, com a notificação preliminar do proprietário. Dele decorrerão todas as obrigações colocadas sobre o proprietário do bem, com exceção do dever de averbar à margem do domínio do tombamento. Encerrado o procedimento, o tombamento passa a ser definitivo. Neste ponto ocorrerá a inscrição da coisa no livro próprio no Cartório de Registro (para que tenha efeitos perante tercerios).

Encerrado o procedimento, deve-se efetuar o registro no livro de tombo em definitivo.O tombamento pode ser:

1. De ofício: em caso de bem público, notifica-se o responsável e já promove-se a inscrição no livro próprio. Ele estabelece a inalienabilidade do bem (porque os bens públicos enquanto afetados são inalienáveis).

2. Voluntário: em caso de bem privado, o proprietário entrega o bem para o Poder Público, dá a sua aquiescência (não acontece na prática, porque há muitas obrigações inerentes ao tombamento, logo, o proprietário não tem interesse no tombamento).

3. Compulsório: em caso de bem privado; vem por imposição da Administração, independe da concordância do titular (ocorre quando o proprietário se omite em concordar ou impugna o tombamento).

Além disso, o tombamento pode ser:1. Geral: se o Poder Público tomba a cidade inteira, um bairro inteiro, o tombamento

é geral. Ex: Olinda, Ouro Preto (foram tombadas na sua grande maioria).2. Individual ou Específico: se o Poder Público tomba uma casa determinada num

bairro determinado, o tombamento é específico.De quem é a competência para tombamento? E a competência para legislar sobre

tombamento? ☺art. 24, VII, CR: a competência legislativa é concorrente da União e dos estados-

membros. A União fica com normas gerais e os estados-membros com normas específicas. Quanto à competência material, na verdade, todos os entes podem realizar tombamento.

A competência é cumulativa (☺art. 23, III, CR). Quando se tratar de tombamento para bem público, há alguma restrição? Bem público

pode ser tombado? Pode. Mas o bem público tombado é inalienável e só pode ser transferido em caráter excepcional para outro ente político. Existe ordem? Ex.: a União faz dos estados e estes dos municípios. Esta é uma regra prevista para a desapropriação (o bem público pode ser desapropriado desde que respeitada esta ordem). Para o tombamento não existe essa previsão. Alguns autores (posição minoritária), como JSCF, entendem que a regra da desapropriação também deve ser aplicada para o tombamento, mas essa não é a posição que prevalece. O tombamento depende do interesse. Se o bem for de interesse da história local, quem tombará é o município. A União não tomba um bem que só interessa à história local de um determinado município. Se o interesse é regional, o tombamento é feito pelo estado; se nacional, o tombamento é feito pela União.

Obrigações decorrentes do tombamento:1. A principal obrigação é a de conservar o bem, de cuidar do bem, de não destrui-lo,

mutilá-lo ou reformá-lo sem autorização pública. A conservação corre por conta do titular do bem (!), não cabendo indenização se há capacidade econômico-financeira (exceção: haverá dever de indenizar se houver o esvaziamento do conteúdo econômico do bem, ou seja, se o que ocorrer na verdade for uma desapropriação e não um mero tombamento). Qualquer providência que se faça nesse bem para a conservação, necessariamente, dependerá de prévia autorização do instituto que o tombou. Conseqüência: sem autorização, não se pode nem mesmo pintar o

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imóvel. Até mesmo um conserto sem autorização pode acarretar em processo por crime de dano. A obrigação de conservar vem em contrapartida ao dever de não danificar. E se o proprietário não tiver o dinheiro para o conserto? Mesmo assim, terá a obrigação de comunicar à autoridade competente. Em tese, nesse caso, o Estado irá arcar com as despesas.

2. Dever de dar preferência em caso de alienação onerosa à União, ao Estado, e ao município, respectivamente (nesta ordem), independentemente de qual ente tenha tombado o bem. Obs.: é dever do Poder Público averbar o tombamneto à margem do domínio no Cartório de Registro (e é isso que acarretará o dever de dar preferência em caso de alienação onerosa).

3. Dever de suportar a fiscalização pública (e o Poder Público, por sua vez, tem a obrigação de fiscalizar a conservação do bem).

4. Patrimônio tombado não pode sair do País, salvo em caso de intercâmbio, por curto espaço de tempo, e desde que haja autorização pública. Ex: irá participar de uma exposição na Europa. Isso vale, é claro, para bens móveis. O prazo deve ser o razoável. O decreto-lei não prevê esse prazo.

5. É vedada a exportação. 6. A idéia do tombamento é contar a história do local ou da coisa. Então, o decreto-

lei diz que o vizinho do patrimônio tombado não pode colocar placas e cartazes que prejudiquem ou comprometam total ou parcialmente a sua visibilidade. Ou seja, trata-se de uma conseqüência que se estende até mesmo a terceiros (seria uma hipótese de servidão administrativa!).

Tombamento gera dever de indenizar? O tombamento, por si só, não gera dever de indenizar. Só existe uma possibilidade de se

falar em indenização: o decreto-lei permite que o Estado crie obrigações de fazer. Ex: O Estado exige que se pinte a casa. Nesse caso, deverá indenizar por essas obrigações. O que se indeniza não é o tombamento, mas as obrigações decorrentes dele.

• Desapropriação:

É a forma mais drástica de o Estado intervir na propriedade. Mas, ao mesmo tempo, é uma garantia do próprio direito de propriedade (já que é a única exceção legal ao direito – salvo pela aceitação por parte da jurisprudência da desapropriação indireta, que, na verdade, trata-se de um esbulho).

Desapropriação é um procedimento administrativo por meio do qual o Poder Público, fundado em interesse público, despoja compulsoriamente alguém de um bem e o adquire para si, de forma originária e mediante indenização, ressalvada a execução constitucional (☺art. 243, CR).

É forma originária de aquisição da propriedade (não existe vínculo ou relação com o antigo proprietário).

É preciso que se ajuíze ação caso não haja aquiescência do titular (tal como ocorre na servidão administrativa).

Fundamentos:- políticos;- constitucionais (☺art. 5º, XXIX; art. 182, §4º, III; art. 184 e ss; art. 243, CR);- legais (☺DL 3365/41; Lei 4132; Lei 8629; LC 76; Lei 10257; Lei 8257).

Competência para legislar sobre desapropriação: União (☺art. 22, II, CR)

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Competência material (quem pode fazer): em regra, todos os entes públicos podem (ma há exceções); também a AP Indireta e os delegados de serviços (☺art. 3º, DL 3365).

Objeto da desapropriação: em regra tudo pode (móvel, imóvel, corpóreo, incorpóreo). Exceções: direitos da personalidade, direitos autorais, alimentos.

Obs.: no caso do bem público → a União pode desapropriar bem do DF, dos Estados e Municípios; o Estado pode desapropriar bens de seus municípios; mas os municípios só podem desapropriar bens de seus particulares.

Se o município desapropriar bem da União, o vício estará no objeto (e não na competência, como se poderia imaginar). Isso porque bem público só pode ser desapropriado naquela ordem específica.

Indenização prévia: entendimento do STJ → com o pagamento da indenização ocorre a perda da propriedade.

O Poder Público pode desistir da desapropriação até o momento anterior ao pagamento da indenização (Pagamento da indenização ↔ perda da propriedade).

Atenção: com a imissão provisória na posse, o titular do bem pode levantar 80% do depósito realizado, desde que prove: o domínio do imóvel e a regularidade fiscal em todas das esferas da Federação.

Os 20% restantes só podem ser levantados com o transito em julgado da decisão.O valor da indenização posterior (que excede o valor do depósito) é recebido em

precatórios – ☺art. 10, CR.Se não houver imissão provisória do Poder Público na posse, a sentença fixará toda a

indenização – que será recebida em precatórios.

→ Modalidades de desapropriação:

A) Desapropriação comum/ordinária: ☺art. 5º, XXIV, CR → necessidade, utilidade, interesse. Dá ensejo a indenização prévia, justa e em dinheiro.

B) Desapropriação extraordinária: pela função social da propriedade ou por tráfico de entorpecentes. É a desapropriação sancionatória, que tem natureza de pena.

Importa em indenização em título da dívida agrária, resgatável em até 20 anos (com exceção das benfeitorias, que são pagas em dinheiro), se for caso de reforma agrária (competência da União); ou em título da dívida pública, resgatável em até 10 anos, se for para fins do plano diretor (nos casos de municípios com mais de 20.000 habitantes) – competência do município ou do DF. Obs.: O pagamento é pro soluto. Considera-se quitado o montante indenizatório quando o Poder Público entrega os títulos da dívida pública ao particular, independentemente de quando será o resgate.

Por fim, em caso de tráfico de drogas, ocorrerá a chamada desapropriação expropriatória (☺art. 243, CR), sem indenização.

Assim, pode-se falar em desapropriação:

1) Mediante indenização prévia, justa e em dinheiro:a) desapropriação por utilidade pública (☺DL 3365/41);b) desapropriação por interesse social (☺Lei Federal 4132/62).

- Competência legislativa: União- Competência declaratória: U, E, DF e M (chefe do executivo, por decreto), ou CN, AL,

Câmara de vereadores (por lei).

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Exceções: ANEEL (☺Lei n.º 9.648/1998 alterou o artigo 10 da Lei n.9.074/1995), que tem competência para declarar a utilidade pública/interesse social; e DNIT (☺artigo 83, inciso IX, da Lei 10.233/2001), que tem competência para declarar a utilidade pública/interesse social.

- Competência executória: U, E, DF, M e pessoas administrativas que têm competência declaratória (é a competência executória incondicionada) + as entidades da AP Indireta, os concessionários e permissionários (competência executória condicionada).

2) Mediante indenização em títulos especiais (“Desapropriação-sanção” – por

descumprimento da função social):a) Desapropriação para fins de reforma urbana: ☺art. 182, §4º, III, CR; Estatuto da

Cidade (Lei 10257/01); diploma municipal urbanístico (plano diretor) → indenização em títulos da dívida, pública resgatáveis em até 10 anos (em parcelas sucessivas, anuais e iguais);

b) Desapropriação para fins de reforma agrária: ☺art. 184 e ss, CR; Lei federal 8629/93; LC 76/93 → União – procedimento especial (rito sumário) – indenização em títulos da dívida agrária, resgatáveis em até 20 anos, a partir do 2º ano de emissão.

3) Sem indenização, em caso de desapropriação expropriatória por tráfico de entorpecentes. “Desapropriação confisco” (☺art. 243, CR). Ocorre quando a gleba for objeto de cultivo de plantas psicotrópicas.

A Lei n.º 82.57/1992 diz que a competência para realizar a desapropriação confisco é da União. Parte da doutrina diz que só pode desapropriar a parte da área em que está cultivada a planta. Fundamento: a desapropriação confisco, por ser uma restrição máxima, deveria ser interpretada restritivamente. A prof. não concorda com isso. Confiscado o bem imóvel, devem ser assentados colonos para cultivarem alimentos ou plantas medicamentosas. Prazo de 120 dias para iniciar.

→ Resumindo:União pode realizar:

- desapropriação por utilidade pública/interesse social;- desapropriação para fins de reforma agrária;- desapropriação confisco.

Estados podem realizar:- desapropriação por utilidade pública/interesse social.

Municípios e DF podem realizar:- desapropriação por utilidade pública/interesse social;- desapropriação para fins de reforma urbana.

Realizada a desapropriação, o bem é incorporado ao patrimônio público. A desapropriação é uma forma originária de aquisição da propriedade. Causa autônoma

de incorporação do bem ao patrimônio público. O bem entra no patrimônio público sem qualquer vício.

→ Características Importantes:- Não precisa de ação judicial, salvo em duas hipóteses: proprietário desconhecido e

discordância quanto ao valor da indenização.- Será pela via administrativa: a fase declaratória (decreto expropriatório / lei de efeitos

concretos) e a fase executiva (pagamento do valor).- O prazo para pagar e entrar no bem é o prazo de caducidade: se for por necessidade ou

utilidade, será de 5 anos; se for por interesse social, será de 2 anos.

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- Valor da indenização: valor venal (de mercado) + danos emergentes + lucros cessantes + juros moratórios e compensatórios + honorários advocatícios e custas processuais (se houver ação judicial) + correção monetária.

- Benfeitorias feitas depois da declaração só será indenizadas se necessárias, ou se, sendo úteis, tiverem sido previamente autorizadas.

→ Considerações finais:

a) a ação de desapropriação pode prosseguir independentemente de a AP saber quem seja o proprietário ou onde possa ser encontrado o mesmo. Aqui, não se aplicam os efeitos da revelia.

A inicial não pede a desapropriação, mas a fixação do quantum indenizatório. A perícia deve ser realizada de qualquer forma, isto é, com ou sem a presença do proprietário.

b) Todos os ônus e direitos (reais) que incidem sobre o bem extinguem-se, ou seja, sub-rogam-se no preço.

☺art. 31, do Decreto-lei n.º 3.365/41.Obs.: os direitos pessoais não se sub-rogam no preço.O ressarcimento deve ser buscado em um procedimento apartado (em face da União).c) O pagamento da indenização a terceiros que não seja proprietário não compromete a

validade do procedimento indenizatório.d) A transcrição da desapropriação no Registro de Imóveis independe da verificação da

continuidade em relação às transcrições anteriores (imóvel não sujeito à evicção). A desapropriação não pode ser usada quando houver outro meio de incorporação do bem

ao patrimônio público.Para a desapropriação, é exigida a necessidade da coercibilidade.

→ Procedimento da desapropriação no Decreto-lei n.º 3.365/1941:- fase declaratória: inicia-se com a declaração de interesse social e de utilidade pública.- fase executória: realização de providências concretas/materiais.A desapropriação então será:

a) administrativa: se houver acordo. Deve ser reduzido a escrito. É lavrada a escritura e registrada. Desapropriação amigável. Não é forma originária de aquisição da propriedade. Não cabe retrocessão. Para a prof., não é desapropriação, mas compra e venda. Marçal Justen Filho diz que é desapropriação.

b) judicial: não obtido o acordo na via administrativa, é preciso ajuizar ação para fixar o quantum indenizatório. Na sentença homologatória de acordo o juiz só analisa aspectos formais; não analisa aspectos meritórios. Só faz coisa julgada formal. Após, tem-se a sentença condenatória.

Obs.: o ato declaratório descreve o estado do bem objeto da desapropriação para fins de indenização.

As benfeitorias posteriores só serão indenizadas se necessárias ou se úteis autorizadas.O ato declaratório deve mencionar a finalidade da desapropriação. Se essa finalidade não

for cumprida, ocorre a tredestinação, que pode ser lícita ou não. O ato declaratório submete o bem à força expropriatória do Estado – possibilidade de realizar vistorias, medições, levantamentos etc.

Se o Poder Público precisar de posse, deve se valer da imissão provisória na posse. Para tanto, o Poder Público tem que, primeiro, fazer uma declaração de urgência.

Declaração de urgência ≠ declaração de utilidade de pública.A partir da declaração de utilidade pública, começa a correr o prazo de caducidade para

obter o acordo ou ajuizar a ação de desapropriação. O prazo é de 5 anos (☺art. 10, DL

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3.365/41). Caducada a primeira declaração, o Poder Público deve esperar 1 ano para fazer nova declaração.

Declaração de interesse social: o prazo de caducidade é de 2 anos para ajuizar a ação + efetivar a desapropriação (medidas concretas) - ☺art. 3º, da Lei n.º 4.132/62. Aqui, a caducidade não é definitiva.

Obs.: feita a declaração de urgência, o pedido de imissão provisória na posse deve ser feito no prazo de 120 dias, sob pena de caducidade definitiva.

Para conseguir a imissão, deve ser realizado o depósito, segundo os critérios estabelecidos no art. 15, § 1º, do DL 3.365/41.

O depósito é condição para a imissão provisória na posse.

Resumindo:- Desapropriação para fins de reforma agrária:Prazo de caducidade: 2 anos contados da declaração.Prazo de aproveitamento: 3 anos contados do registro do título.- Desapropriação para fins de reforma urbana:Não há prazo para declaração.Prazo de aproveitamento: 5 anos a partir da incorporação do bem ao patrimônio público. ☺art. 8º, § 4º, da Lei n.º 10.257/01.

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