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INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE SÃO PAULO LICENCIATURA EM GEOGRAFIA HENRIQUE MACEDO JUSTINIANO O CENTRO EDUCACIONAL UNIFICADO COMO UM FATOR DE CENTRALIDADE DA PERIFERIA SÃO PAULO SP 2014

O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

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Page 1: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE SÃO

PAULO

LICENCIATURA EM GEOGRAFIA

HENRIQUE MACEDO JUSTINIANO

O CENTRO EDUCACIONAL UNIFICADO COMO UM FATOR DE

CENTRALIDADE DA PERIFERIA

SÃO PAULO – SP

2014

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HENRIQUE MACEDO JUSTINIANO

O CENTRO EDUCACIONAL UNIFICADO COMO UM FATOR DE

CENTRALIDADE DA PERIFERIA

Monografia apresentada para a conclusão do curso de

Licenciatura em Geografia do Instituto Federal de Educação

Ciência e Tecnologia de São Paulo.

Colaboração: Professor Me. Marco Antonio Teixeira.

SÃO PAULO

2014

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Para meus pais Seu Tião e Dona Léia.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço aos familiares pelo suporte dado em diversos momentos para a conclusão do

curso. Alexandre e Adriana sempre juntos nas adversidades. Meus sobrinhos Gabriella e

Thiago por cederem o computador quando eu preciso.

Agradeço principalmente ao meu pai Sebastião Rodrigues Justiniano e minha mãe

Leacira Maria Macedo que fizeram e fazem ainda muitos esforços em suas vidas para darem o

máximo possível de bem estar para mim.

Agradeço ao Professor Rodrigo que em conversas no ano de 2009 me indicou o curso

de Geografia do Instituto Federal de São Paulo.

Agradeço ao CEU Pêra Marmelo e CEU Perus pelo acolhimento à pesquisa.

Agradeço a Leda, José Soró e Marcio que me cederam entrevistas significativas para a

pesquisa.

Agradeço aos professores do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia por

fazerem um curso de Geografia muito rico na visão crítica da sociedade em que vivemos,

sendo fundamental uma aula do Professor Fausto no ano de 2010 para a definição do tema de

pesquisa.

Por fim, agradeço a todos(as) amigos e amigas que tive o prazer de conversar durante

esse período do curso sobre os mais diversos assuntos. Galera do CA Estrabão- Gestão Bertha

Becker pela experiência interessante de articulação política. E claro agradecimento especial

pelas conversas filosóficas divertidas que ocorrem invariavelmente com a companheira Deise

Serra e com os camaradas Douglas Faria, Edson Silva da Rocha, Marcio Romeiro e

Regimarcio Pereira.

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Os que moram

Do outro lado do muro

Nunca vão saber

O que se passa no subúrbio

Eles te consideram

Um plebeu repugnante

Eles te chamam

De garoto podre

Garotos Podres - Garoto Podre

Aqui não vejo nenhum clube poliesportivo

Pra molecada frequentar, nenhum incentivo

O investimento no lazer é muito escasso

O centro comunitário é um fracasso

Racionais MC’s - Fim de Semana no Parque

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RESUMO

No ano de 2003, durante a gestão da prefeita Marta Suplicy (PT – 2001-2004), a

periferia da cidade de São Paulo obteve um novo equipamento público: o Centro Educacional

Unificado (CEU). Tal equipamento continha num mesmo espaço teatro, piscina, biblioteca,

quadra poliesportiva e sala de informática abertos não só aos alunos ali matriculados, como

também a toda a comunidade sendo alvo de uma grande disputa política na eleição do ano

seguinte, o presente trabalho pretende investigar o significado mais profundo que está contido

neste objeto técnico, que resistiu as gestões conservadoras de José Serra (PSDB – 2005-2006)

e Gilberto Kassab (DEM – 2006 - 2012); foi taxado de concreto pedagógico por um grande

jornal de São Paulo e nos faz questionar quanto à possível resolução da nossa Questão

Periférica e a emergência de uma Centralidade da Periferia.

Palavras- Chave : CEU; Questão periférica; centralidade da periferia; Marta Suplicy;

José Serra.

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ABSTRACT

In 2003 during the administration of Mayor Marta Suplicy (PT - 2001-2004) to the

outskirts of São Paulo got a new public facility: Unified Education Center (CEU). Such

equipment contained in the same space theater, swimming pool, library, sports court,

computer room open not only to students enrolled there as well as the entire community.

Target of a major political dispute in the election the following year, this study aims to

investigate the deeper meaning that is contained in this technico object, which withstood the

conservative administrations of José Serra (PSDB - 2005-2006) and Gilberto Kassab (DEM -

2006 - 2012), was labeled a pedagogical concrete for a major newspaper in São Paulo and

makes us wonder about the possible resolution of our Issue Peripheral and the emergence of a

Centrality of the Periphery.

Key-words: CEU, peripheral issue, the centrality of the periphery, Marta Suplicy, José Serra.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO........................................................................................................07

1 - O CEU - EM BUSCA DA TOTALIDADE.........................................................09

1.1 Reestruturação Urbana..................................................................................16

1.2 Verticalidades e horizontalidades..................................................................20

1.3 Amplificação Pública......................................................................................22

1.4 Cidade Educadora..........................................................................................24

1.5 Conselho Gestor..............................................................................................27

2 – A QUESTÃO PERIFÉRICA............................................................................30

2.1 Queixadas e o CEU Perus..............................................................................34

CONCLUSÃO – CENTRALIDADE DA PERIFERIA........................................36

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................38

APÊNDICE..............................................................................................................40

ANEXOS...................................................................................................................41

Page 9: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

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1 - Introdução

Quando seu objeto de investigação está indelevelmente ligado a sua formação e

construção de sua vida o pesquisador fica instado a vangloriar tal objeto. Porém a insatisfação

leva ao questionamento e assim questões diversas são levantadas para que se tenha uma

compreensão satisfatória do processo social, da luta política, das relações sociais, da

construção e identificação para com o território, palco no qual está colocado o objeto, e no

qual atuam os diversos atores sociais.

Instigado a investigar o porquê de um grande jornal de São Paulo taxar o Centro

Educacional Unificado (CEU) de “Concreto pedagógico”, passamos a investigar o debate

político por detrás de tal equipamento público, localizado em áreas marginalizadas da Cidade

de São Paulo, verdadeiros espaços esquecidos pelo Estado na área social.

Esta questão territorial dos CEUs também causa uma curiosidade epistemológica, no

sentindo de compreender o porquê de tal investimento em uma obra de grande porte,

verdadeiro monumento arquitetônico a contrastar com o entorno autoconstruído, em

localidades periféricas com baixo índice de desenvolvimento humano.

Fazer falar o território1 é uma questão central no trabalho do geógrafo. As disputas

sociais, econômicas, políticas e culturais possuem uma expressão e correlação fortemente

ligada ao território, à produção do espaço, sendo a Cidade de São Paulo dialeticamente

desenvolvida nas contradições que emergem de uma verdadeira disputa entre classes.

Postulamos que existe uma luta de classes, em todos os âmbitos acima citados, que

marca o território de forma ímpar. E o papel dos intelectuais exercido na construção de uma

hegemonia através da disputa política para a classe na qual exercem sua função também é um

ponto de interesse para o entendimento do que é o Projeto CEU.

Assim, a pesquisa é feita através da paixão no sentido gramsciano da palavra2, na

busca de entender a formação periférica de São Paulo e as possíveis saídas para que tal

1 “Quando a gente faz falar o território – que é um trabalho que creio que é o nosso, fazer falar o território, como

os psicólogos fazem falar a alma, como Darcy Ribeiro quis fazer fala o povo, como Celso Furtado quis falar a

economia, o território também pode aparecer como uma voz... O território brasileiro é esquizofrênico, [...]

porque de um lado, recebendo esses insumos de modernização globalitária, ele se fragmenta, se fragiliza; de

outro lado, descobre que esse processo não lhe convém. E talvez lhe falte descobrir qual é a lógica mais geral

que permita a produção de um discurso novo. Primeiro acadêmico, quando possível também de mídia, e depois o

discurso político”(SANTOS in : Entrevista em Caros Amigos,1998). 2 “Paixão no sentido de Gramsci: o de colocar-se em uma posição e, mediante essa colocação e por causa dela,

tentar entender uma tragédia” (OLIVEIRA, 1987,p.9)

“Porque somente a paixão aguça o intelecto e ajuda a tornar mais clara a intuição” (GRAMSCI, 2005, in

SADER. p.35.).

Page 10: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

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periferia construa uma nova centralidade na qual o ser o humano seja o cerne da questão em

detrimento do lucro capitalista.

A busca pela totalidade do fenômeno se faz presente no primeiro capitulo, no qual é

debatido o processo político de execução do Projeto CEU, aas escolhas feitas, mudanças

ocorridas, etc. Uma análise dos conceitos ligados ao nosso objeto técnico também é necessária

para o entendimento das suas características de localização periférica e possível pólo de

desenvolvimento das comunidades na construção de uma Cidade Educadora.

Indo além, postulamos uma por nós chamada Questão Periférica. Por que a periferia

pobre e marginalizada tende a formar um bloco histórico3 com setores conservadores da

cidade de São Paulo? O Projeto CEU poderia ajudar a resolucionar a nossa chamada Questão

Periférica, ou é mesmo um mero concreto pedagógico sem utilidade alguma? Com ajuda do

depoimento de alguns atores sociais possíveis respostas emergem das contradições

apresentadas.

Caminhe conosco nessa investigação. Boa leitura!

3 Uma análise apurada do conceito de Bloco Histórico na obra de Antonio Gramsci pode ser encontrada em

PORTELLI, Hugues. Gramsci e o bloco histórico; tradução de Angelina Peralva. Rio de Janiero, Editora Paz e

Terra,1977

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1 – O CEU – Em busca da totalidade.

Analisamos nosso objeto técnico, o Centro Educacional Unificado (CEU), através do

olhar do geógrafo Milton Santos e sua análise da forma, função, estrutura e processo, com

vistas a alcançar a totalidade. : “A forma nos apresenta a coisa, o objeto geográfico; sua

função atual nos leva ao processo que lhe deu origem; e este, o processo, nos conduz à

totalidade social, a estrutura social que desencadeou e dá ao objeto uma vida social”

(SANTOS,1988,p.7)

Entendemos que a forma se constitui no objeto técnico intitulado Centro Educacional

Unificado, que com sua arquitetura arrojada, causa um contraste impactante com as casas

autoconstruídas ao redor. Porém, o objeto em si não se explica, é preciso compreender o seu

fundamento dado através das relações sociais.

O objeto apresenta-se com a função de desenvolver o local, o lugar, assim sua forma

(arquitetura arrojada) possui uma função (desenvolvimento local). Devemos então

compreender a estrutura social no qual o equipamento está inserido, investigando o processo

social e suas mudanças produzidas no decorrer do tempo.

Assim, discorremos sobre este fenômeno social buscando abarcar sua totalidade:

Forma, função,estrutura e processo são quatro termos disjuntivos

associados, a empregar segundo um contexto do mundo de todo dia.

Tomados individualmente, representam apenas realidades parciais, limitadas,

do mundo.Considerados em conjunto, porém, e relacionados entre si, eles

constroem uma base teórica e metodológica a partir da qual podemos discutir

os fenômeno espaciais em totalidade. (SANTOS,1985,p. 52.).

E para buscar tal totalidade, percorremos os processos políticos envolvidos na

execução inicial do Projeto CEU, a historicidade da formação periférica da Cidade de São

Paulo, os conceitos por de trás da confecção do objeto técnico e por fim entrevistas com

aqueles que dão vida ao equipamento, os atores locais que possuem o território como abrigo:

Os atores locais tem o território como um abrigo, buscando

constantemente se adaptar ao meio geográfico local, ao mesmo tempo que

recriam estratégias que garantam sua sobrevivência nos lugares. É neste jogo

dialético que podemos recuperar a totalidade.(SANTOS,2004,p.261)

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Os CEU’s se baseiam em experiências anteriores, tais como as “Escolas Parques” do

educador Anísio Teixeira na Bahia nos anos 1950, os CIEP’s (Centros Integrado de Educação

Pública) escolas de tempo integral construídas no Rio de Janeiro durante o governo de Leonel

Brizola (1983-1987), com apoio do educador Darcy Ribeiro, entre outras tentativas de

integrar educação, cultura e lazer num mesmo equipamento (PADILHA, 2004, p.29-30).

Um dos nossos entrevistados4 comenta sobre essa influência do CIEPs já nas

discussões sobre uma Cidade Educadora e a construção de equipamentos públicos com esta

concepção na época da Prefeita Luiza Erundina (1989-1992) e de Paulo Freire como

Secretário Municipal de Educação:

Tinha o aspecto de dar um choque na educação, e isso tem a ver

com a Fábrica e com o CEU também, porque essa ideia do CEU nasce lá

atrás via Paulo Freire, de uns encontros com o movimento de moradia da

zona leste. Eles eram metidos a pensar o lugar da educação como um lugar

educativo, e foram atrás do Paulo Freire pra discutir isso. E desenharam a

implantação do conjunto habitacional todo pensado como um lugar

educador, do jardim a casa, a praça, todo desenhando com o Paulo Freire. Ai

começa a nascer essa ideia do CEU acho assim, de um lugar que seja

integrador da comunidade, nascem dessas ideias ai. Mas eles não chegaram a

fazer o CEU, e todos eram fãs assim, apesar de estar em partidos diferentes ,

do Darcy Ribeiro e os CIEP's no Rio, mas não chegaram a fazer o CEU. José

Soró.

Assim, em 2002 na Gestão da Prefeita Marta Suplicy (2001-2004) o Projeto CEU se

apresenta como um pólo de desenvolvimento da comunidade, pela sua arquitetura arrojada e

fundamentalmente, por propor a integração de seus diversos setores. Seus espaços e

equipamentos abertos ao uso, não só dos alunos matriculados, mas também da comunidade

potencializam os princípios da Cidade Educadora, caracterizando-se como uma rede de

proteção social.

Isto demonstra o equívoco do jornal Estado de São Paulo, que em sua edição de

03/08/2003 ataca os CEUs, através de uma critica ao discurso5 do Presidente Luiz Inácio Lula

da Silva (PT), pronunciado na inauguração do CEU Jambeiro em Guaianazes no extremo leste

da capital paulista no dia 01/08/2003.

4 A íntegra das três entrevistas realizadas com Leda (Moradora da Vila Aurora e frequentadora do CEU Pêra

Marmelo, sendo também Presidente do Conselho Gestor), José Soró (morador de Perus e agente cultural do

bairro) e Marcio Bezerra ( morador de Perus e gestor do CEU Perus) encontram-se no anexo 1. 5 Confira a íntegra do discurso em http://www.biblioteca.presidencia.gov.br/ex-presidentes/luiz-inacio-lula-da-

silva/discursos/1o-mandato/pdfs-2003/2o-semestre/01-08-2003-discurso-do-presidente-da-republica-luiz-inacio-

lula-da-silva-na-cerimonia-da-inauguracao-do-centro-educacional-unificado-jambeiro/view. Acesso em

13/10/2014 , 23:15.

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O Jornal no editorial “O CEU das elites”6 trabalha apenas sobre uma ótica

economicista, entendendo o Projeto CEU como um “Concreto pedagógico” , tratando os

alunos ali matriculados como os “eleitos” em detrimento dos demais alunos das escolas da

comunidade. Por falta de conhecimento, ou como coloca a Prefeita Marta Suplicy (PT)7 , no

mesmo Estado de S. Paulo do dia 06/08/2003, por um preconceito ideológico contra o CEU, o

Editorial do jornal deixa de citar as possibilidades criadas com o Projeto. Assim obtém uma

resposta da Prefeita Marta Suplicy, deixando claro os objetivos que os CEU’s possuem :

Os CEU’s são uma nova proposta pedagógica de educação inclusiva

e consistem em organizar toda a rede municipal nesse conceito. Assegurando

a todas as crianças do ensino fundamental uniforme e material escolar

gratuito : transporte para as que moram a mais de dois quilômetros da escola;

merenda de qualidade e acesso a computação, música e instrumentos

musicais, teatro, cinema e esportes, começando pelas regiões mais pobres da

cidade. Em algumas regiões, isso estará concentrado numa única construção,

como os CEUs que estão sendo inaugurados agora, assegurando como

rotatividade o acesso a esses espaços. Em outros bairros, criando espaços

semelhantes interligados com a rede escolar já existente. A comunidade

passa a ser co-gestora e participe do sistema. Juntos construiremos um outro

futuro se a reprodução recorrente da pobreza. Não fomos escolhidos para

perpetuar o sistema e a desigualdade social. Estamos fazendo uma revolução

na educação, rompendo com a lógica de 500 anos de exclusão.

(SUPLICY,2003,p.2).

A execução da obra possibilita que, de certa forma, um direito começa a efetivamente

se fazer presente aos excluídos da periferia, caracterizado por José de Souza Martins (2008)

como:

O direito justo dos pobres de terem acesso às promessas sociais e

revolucionárias do centro, do monumento e do monumental, do teatro, da

música erudita, da arte, dos museus, do propriamente urbano e do bem-estar

que ele anuncia e possibilita, aquilo que é propriamente emancipador do

homem. A falta desse acesso corrói o referencial crítico que possibilitaria a

um periférico fazer a crítica social e política do seu periferismo (MARTINS,

2008, p.55.)

Um dos nossos entrevistados também comenta esta visão do jornal que acaba por

contaminar até mesmo funcionários do equipamento:

E a gente pensa justamente o inverso, todo este complexo cultural,

esportivo é pra todas as escolas do entorno. É isto que a gente faz hoje, a

gente abre pra todas. Uma diretora daqui chegou a usar o seguinte termo

6 Confira o Editorial “O CEU das Elites” no acervo online do Jornal o Estado de S. Paulo no link :

http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/20030803-40101-nac-3-edi-a3-not acessado em 13/10/2014, 23:25. 7 Confira a resposta da Prefeita ao Editorial “O Ceu das Elites” no acervo online do Jornal o Estado de S. Paulo

no link : http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/20030806-40104-nac-2-opi-a2-not acessado em 13/10/2014,

23:30.

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numa reunião, por isso que eu falo porque foi numa reunia aberta, “ - Pô

vocês tão abrindo o CEU desse jeito daqui a pouco o morro vai descer pra

cá” . Pô eu falei pra ela se o morro descer pra cá é isso que eu quero né!

(risos). Este complexo não é de vocês. O Gestor do CEU era um zelador de

condomínio das três unidades. E eles não perceberam até hoje a dimensão do

que é a concepção do CEU. Marcio

É interessante notar que construídos com êxito durante o governo da Prefeita Marta

Suplicy (2001-2004), do Partido dos Trabalhadores (PT), os 21 CEUs de sua gestão não se

fizeram como um “espetáculo da educação, em prol de um clientelismo político”, como

preconiza Reinaldo Tadeu Boscolo Pacheco (PACHECO, 2009), afinal a candidata petista a

reeleição foi derrotada nas urnas por José Serra (PSDB), que inicialmente, sendo coerente

com seu discurso eleitoral de que o projeto era caro, barrou a construção de outros 24 CEU's

já licitados, retornando-os ao final de seu primeiro ano de mandato (2005)8, com algumas

mudanças no projeto (como por exemplo, a capacidade do teatro que foi reduzida de 450 para

180 pessoas.).

Em 2006 mais um fato político ocorreu na prefeitura de São Paulo, a saída de José

Serra (PSDB) para se candidatar ao governo do estado de São Paulo, tomando posse seu então

desconhecido vice-prefeito Gilberto Kassab (DEMOCRATAS- DEM)9. Comparando através

da Tabela abaixo10

a votação da Prefeita Marta Suplicy nas eleições de 2000 (campanha

vitoriosa) e 2004 (campanha derrotada) com os locais de construção dos 21 CEUs entendemos

que a tese de clientelismo político não é válida.

Mas claro a derrota dela causa uma grande surpresa:

O CEU foi uma coisa tal impactante pra periferia que eu achava que a

Marta não perderia jamais a eleição. Na época tinha 21 CEUS construídos, a

Marta fez 21 teatros na periferia, 21 cinemas. E não é qualquer teatro, é uma

coisa de qualidade uma coisa boa, 11 anos depois você desce lá, ele ta lá

bonitinho. Não tinha como perder essa eleição, mas eleição se perde nos

detalhes (risos). Marcio.

Olha voltar à fase da Marta é difícil. Igual à Marta não tem, fiquei até

triste que ela não ganhou, pelo tanto que ela fez, mas voltar do jeito que era

ela é difícil. Leda

8 Serra decide retomar os CEUs veja : http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u115664.shtml

acessado em 14/10/2014 00:10. 9 Marta foi duramente criticada pelos valores dos 21 CEU’s, porém a dupla Serra/Kassab fez 24 mini-CEU’s,

mais simples, sem preocupação com a estética, com menores equipamentos, porém mais caros no seu custo final

como demonstra o link : http://blogdofavre.ig.com.br/2008/09/o-ceu-e-a-verdade/ acessado em 14/10/2014

00:30. 10

Tabela extraída do interessante trabalho “A derrota não explicada – Uma reflexão sobre a eleição municipal de

2004 em São Paulo” que busca explicações para a derrota nas urnas de uma Prefeita com 48% de ótimo e bom

na avaliação de sua gestão. Acessado no dia 11/10/2014 23:00 no link : http://www.bocc.ubi.pt/pag/paula-luiz-

eleicao-municipal.pdf . Sobre o papel da mídia e a administração municipal leia na época da Marta leia :

http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos/iq260220032.htm acesso em 14/10/2014 02:45.

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Tabela11

com os votos de Marta Suplicy nas eleições de 2000 e 2004 :

11

Vide nota 10.

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14

Analisando a tabela percebemos que Marta aumentou sua votação nos bairros do

Grajaú (CEU Navegantes e CEU Três Lagos), Guaianazes (CEU Jambeiro) São Mateus (CEU

São Mateus e CEU São Rafael) e Capela do Socorro ( CEU Cidade Dutra).

Nas demais localidades diminuiu sua votação: Cidade Ademar (CEU Alvarenga),

Capão Redondo (CEU Capão Redondo), Pirituba (CEU Pêra Marmelo e CEU Anhanguera),

Itaim Paulista (CEU Vila Curuça e CEU Parque Veredas), Brasilândia (CEU Paz),

Sapopemba (CEU Rosa Da China), São Miguel Paulista (CEU Parque São Carlos), Itaquera

(CEU Inácio Monteiro e CEU Aricanduva),Ipiranga (CEU Meninos), Butantã (CEU Butantã),

Campo Limpo (CEU Casa Blanca).

Apesar da derrota de uma força progressista, entendemos o Centro Educacional

Unificado como uma política de luta por hegemonia através da cultura, esporte e lazer

associados à educação em áreas até então esquecidas nestes itens pelo Estado, estabelecendo-

se assim uma luta pela democracia. E a guerra de posição neste contexto é travada nas áreas

periféricas, quase sempre cooptadas pelo conservadorismo.

Afinal, Aldo Tortorella12

diz sobre a Hegemonia que :

Para Gramsci, o grande mérito de Lênin é precisamente o de ter

compreendido, contra as degenerescências e simplificações economicistas e

deterministas, o extraordinário e decisivo valor da luta cultural e ideológica

para a afirmação das classes subalternas e de um novo sistema

econômico-social. Contudo, a ideia da hegemonia em Lênin — segundo a

interpretação de Gramsci — não deve ser entendida como afirmação de uma

dominação, mas como afirmação de uma capacidade superior de

interpretação da história e de solução dos problemas que ela coloca (grifo

nosso)

Quanto a guerra de posição Gramsci coloca no caderno 13 “Breves notas sobre a

política de Maquiavel” parágrafo 1713

que :

Se as crises históricas fundamentais são determinadas

imediatamente pelas crises econômicas; pode-se excluir que, por si mesmas,

as crises econômicas imediatas produzam eventos fundamentais; podem

apenas criar um terreno mais favorável à difusão de determinados modos de

pensar, de pôr e de resolver as questões que envolvem todo o curso

subsequente da vida estatal.

A história da formação das periferias de São Paulo denota o quão perverso é o regime

de acumulação do capital no Brasil. Deixados à margem das políticas do Estado, milhões de

pessoas foram excluídas do centro da cidade e de suas promessas culturais, sociais, ou seja, de

12

http://www.acessa.com/gramsci/texto_visualizar.php?mostrar_vocabulario=mostra&id=644 acesso em

14/10/2014 00:40. 13

Extraído de http://www.acessa.com/gramsci/texto_visualizar.php?mostrar_vocabulario=mostra&id=643

acessado em 17/10/2014 14:30

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cidadania, sendo “exilados” nas longínquas periferias da cidade, sem mínima infraestrutura

adequada, se reproduzindo com o básico (em alguns casos abaixo do básico), aumentado

dessa forma a acumulação de capital.

Assim, em 2003, no processo de implementação dos CEUs esse contexto histórico foi

entendido de forma superior, sendo necessária a construção de alguma ferramenta para a

possível superação desse problema de segregação sócio espacial constituindo pela formação

das periferias. Essa ferramenta se materializa nos CEUs, espaços destinados a uma política de

integração da sociedade civil. Aqui, instala-se a necessidade da democracia política para que

coincida governantes e governados no mesmo processo dialógico.

A construção dessa democracia política se dá pelo poder através de uma ação de

classe, construindo-se uma contra hegemonia na sociedade. Exercido em conjunto através da

cultura, desmontando o intelectual orgânico da burguesia, criando o intelectual orgânico da

classe trabalhadora. Ocorre aqui uma apropriação da cultura de massa e uma resignificação

da mesma perpetrada pelos novos intelectuais orgânicos formados nessa nova agenda social

realizada através das possibilidades colocadas pelo instrumental contido nos CEUs.

Deve-se dessa forma aproveitar as condições materiais do nosso tempo, para produzir

outra forma política, utilizando por exemplo a internet como forma de disseminação da

informação e consequentemente da contradição presente no mundo, mote fundamental do

desenvolvimento histórico. E o território é a base dessa luta. Entendido como matriz da vida

social, econômica e política para a superação da contradição maior da sociedade brasileira

contida no desequilíbrio entre direitos e deveres na construção da cidadania. Isso se faz

possível porque no nosso tempo está contida a possibilidade de se conviver com o futuro

possível.

Apenas a visão da violência como forma de entendimento do mundo não capta o real

processo do movimento perpetrado de baixo para cima, pelas classes populares em suas mais

diferentes organizações e instrumentos de luta. O presente trabalho analisa a capacidade e o

potencial do Centro Educacional Unificado de funcionar como um forte instrumento pela

construção da democracia verdadeiramente participativa, na qual as decisões e processos

partam da base14

.

Assim a apropriação dessa ferramenta, transformando-a numa “esquina” da

comunidade, na qual os problemas sejam debatidos, e soluções sejam apresentadas significam

14

Os CEUs possuem o Conselho Gestor, local de debate das questões relativas ao uso dos equipamentos,

envolvendo representantes da comunidade (vide apêndice), dos professores, alunos e direção. Analisaremos

melhor esta questão no subcapítulo 1.5.

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uma construção pela sociedade civil, no entendimento Grasmiciano do termo, de uma

necessária participação política.

Nas palavras dos nossos entrevistados fica claro que é essa “Esquina da Comunidade”:

Eu uso um termo que eu ouvi num curso que eu fiz, lá atrás o

arquiteto que planejou ele dizia que o CEU tem que ser a esquina do bairro,

o que é a esquina do bairro? Onde os movimentos sociais, a população, se

encontram pra debater. Ao invés de debater no boteco, vem aqui no CEU.

Por exemplo, hoje a noite vai ter a reunião do movimento da fábrica. De

manha teve na biblioteca o curso caminhos da UBS, na sala da UAB uma

reunião do conselho gestor de saúde Pirituba/ Perus e no teatro um evento

DST/AIDS, é isso a Esquina do Bairro todos os movimentos convergindo

pra cá e ele sendo ponto de efervescência de todos os movimentos populares.

Marcio.

A gente começou a fazer o baile, era um bailinho pequeno pouca

gente, a gente colocava mesinhas, mas cresceu tanto que hoje não cabe mais

mesinha, ai começou a vir gente de fora, do CEU Vila Atlântica e nos vamos

ao baile lá. Isso, e é bom que a gente conhece muita gente, é muito bom lhe

dar com o pessoal da melhor idade e tem também o artesanato, conseguimos

ai uma parceria com uma pessoa que estudou gerontologia, e visa o bem

estar dos idosos, ai com a gente ela vai ver essas questões de leis, estatuto do

idoso, estas coisas assim porque a gente tem muita dúvida, das leis, dos

direitos dos idosos. Eu já conhecia ela do tempo da Marta, mas ai no tempo

Serra/ Kassab ela foi posta de lado e ai ela voltou agora. Leda.

Por tanto no CEU, essa “esquina da comunidade”, a democracia deve ser debatida e

fortalecida para a evolução social do lugar perante o mundo. Como um projeto de larga

escala, o CEU possui uma gama enorme de conceitos por de trás da sua confecção. Vamos

analisar algum deles.

1.1- Reestruturação Urbana

O Projeto CEU, pela sua particularidade de localização periférica15

visa torna-se um

pólo de desenvolvimento das comunidades periféricas de São Paulo16

, baseado na

intersetorialidade, de forma que a cultura, educação, esporte e lazer se integrem constituindo-

se numa forte ferramenta para o desenvolvimento local e a participação popular.

Assim, pretende-se chegar a uma melhoria da qualidade de vida e um aumento da

justiça social através do desenvolvimento sócio espacial. Com sua arquitetura arrojada os

15

Vide mapa da localização dos CEUS por Diretoria de Ensino e uma tabela com os endereços de cada unidade

no anexo 2. 16

Sobre as condições sociais da Cidade de São Paulo acesse:

http://www9.prefeitura.sp.gov.br/sempla/mm/index.php?texto=corpo&tema_cod=5. Acesso em 17/10/2014

17:30.

Page 19: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

17

CEUs se apresentam como projetores de uma possível mudança social positiva, não apenas

nas relações sociais, mas igualmente na espacialidade.

O lugar constitui-se como um espaço vivido17

, no qual as relações sociais estão

contidas de emoções, significados diversos, etc. Os CEUs pretendem-se como um espaço de

encontro para o fortalecimento dessas relações, necessárias para a construção da democracia

participativa, representada de forma maior pelo conselho gestor nos CEUs. Com a Operação

Urbana CEU o Governo Municipal agiu de forma a propiciar um ferramental para a

construção de tal democracia, minimizando a segregação espacial em relação à cultura,

educação etc.

A concepção dos CEUs está orientada para o futuro do desenvolvimento das regiões

no qual foi construído. A alternativa escolhida foi pela periferia. A derrota na eleição de 2004

promoveu mudanças na concepção do Projeto CEU pelo candidato vencedor José Serra

(PSDB)18

, baseado no Estado mínimo Neoliberal19

, o projeto inicial dos CEUs de participação

popular foi abandonado. A chegada ao poder em 2013 de Fernando Haddad (PT) retoma as

características originais baseadas na concepção de uma Cidade Educadora, de intervenção

urbana com vistas ao desenvolvimento igualitário da Cidade de São Paulo20

.

17

“O espaço vivido é o conjunto dos lugares de vida de um indivíduo. A casa, o lugar de trabalho, o itinerário de

um a outro local formam os componentes principais do espaço vivido.” (PONTUSCHKA,2007 p.314) 18

http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/20051210-40961-nac-53-cid-c1-not/ Acesso em 18/10/2014 04:50. 19

O Neoliberalismo privilegia o mercado em detrimento da intervenção Estatal nas áreas sociais. 20

Até 2016 a gestão de Fernando Haddad prometeu a construção de 20 novos CEUs, reutilizando equipamentos

já existentes como os Centros Esportivos subutilizados, com a construção das torres que compõem as

características originais do Projeto CEU, constituindo assim o Território CEU.

http://planejasampa.prefeitura.sp.gov.br/wpcontent/uploads/2014/10/EQP_141015_Audi%C3%AAncia_CPOP.p

df Acesso em 17/10/2014. 16:00.

Page 20: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

18

Mapa da exclusão/inclusao – Distritos do Munícipio de São Paulo-200221

.

Para execução da Operação Urbana CEU, foram delimitados os locais com maior

vulnerabilidade social, baseados nos índices sintetizados no Mapa acima, no qual os locais em

vermelho possuem piores condições de qualidade de vida, desenvolvimento humano e

consequentemente menor autonomia dos indivíduos. Repare no mapa abaixo a localização dos

45 CEUs coincidindo com esses locais de maior vulnerabilidade.

21

Extraído de http://www9.prefeitura.sp.gov.br/sempla/mm/mapas/indice4_1.pdf Acessado em 18/10/2014

04:10.

Page 21: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

19

45 CEUs - Centro Educacionais Unificados22

.

22

http://planejasampa.prefeitura.sp.gov.br/wp-content/uploads/2014/10/SME_CEU_CPOP15.10.pdf Acessado

em 18/10/2014 04:20.

Page 22: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

20

1.2 - Verticalidades e Horizontalidades

O sistema econômico atual se impõe de forma vertical, delimitando lugares que

mandam e lugares de exclusão. Na cidade de São Paulo, em relação à cultura, educação, etc.,

os bairros centrais perpetram uma verticalidade de produção e acumulação de equipamentos

sócio-culturais que segregam espacialmente boa parte da população, “exilada” nas periferias

longínquas, tanto perante a distância, quanto à questão econômica. Afinal:

O processo de implantação de infra estrutura ocorre

descontinuamente, aos saltos, sendo que, quando acontece, cobre uma

grande área de uma só vez. E isto ocorre porque os investimentos feitos pelo

poder público em bairros de população de baixa renda dependem muito

mais de conjunturas políticas do que de um processo de

planejamento.”(BONDUKI, 1978, p.124)

Assim, para a construção de uma horizontalidade diversificada, pois contra

hegemônica a produção homogeneizadora dos lugares, os CEUs se apresentam como uma

importante ferramenta popular:

As horizontalidades, pois, além das racionalidades típicas das

verticalidades que as atravessam, admitem a presença de outras

racionalidades (chamadas de irracionalidades pelos que desejariam ver como

única a racionalidade hegemônica). Na verdade, são contra racionalidades,

isto é, formas de convivência e de regulação criadas a partir do próprio

território e que se mantêm nesse território a despeito da vontade de

unificação e homogeneização, características da racionalidade hegemônica

típica das verticalidades. A presença dessas verticalidades produz tendências

à fragmentação, com a constituição de alvéolos representativos de formas

específicas de ser horizontal a partir das particularidades. (SANTOS, 2000,

p.110.)

Comentando sobre o processo de participação na construção do CEU Perus um dos

nossos entrevistados coloca luz neste encontro das verticalidades e horizontalidades, ou seja,

da produção que vem de “cima” e as questões horizontais que circulam em “baixo” :

Como a gente já reivindicava um centro cultural há muitos anos, rolou

então essa coisa do CEU em Perus e começou o processo de participação das

pessoas a dizer como queria, que tipo de CEU queria... Eu acompanhava de

longe e pensava o seguinte, era a favor que você tem que montar algo que

quebre a lógica mórbida periférica, até brincava a gente lutou durante quase

quinze, vinte anos pelo centro cultural e de repente a gente ganha esse mega

monstro (risos). Pra alguns lugares isso foi tão espantoso, que a falta de

habilidade de quem estava na gestão com o entorno, transformou em elefante

branco, ou escola privilegiada, o CEU é sempre tido como uma puta escola

pelos seus recursos Mas enfim, eu achava o CEU muito correto como

política publica, muito mais talvez pelo aspecto cultural do que o

educacional, porque numa ideia de mudança da sociedade a gente tem que

reparar os direitos das pessoas, chegar com as condições, mas eu já tinha

uma concepção que era muito mais além disso, as pessoas não tinham boa

escola, não iam no teatro, não era só por que não tinham acesso ou custava

caro, nessa época trabalhando com pessoas de rua já tinha descoberto que o

Page 23: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

21

repertório de universo imaginário das pessoas é fundamental, então uma

pessoa que nunca foi no teatro, ou qualquer outras manifestações artísticas,

não tem isso no seu cotidiano. Não faz parte. Ele não vai por que aquilo não

diz muito respeito a ele. Não faz parte do cotidiano dele, ele também não

estimula os filhos porque não tem esse repertório. Então pra mim é

necessário investir em cultura, porque ela potencializa o universo

imaginário das pessoas, enriquece. Jose Soró. (Grifo nosso)

Vista aérea do CEU Perus23

.

Vista aérea do CEU Pêra Marmelo24

.

23

https://www.google.com.br/search?q=Ceu+Perus&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ei=6mxZVNndPOX9sASJ

hoKgCA&ved=0CAcQ_AUoAg Acesso em 04/11/2014 22:20

24

https://www.google.com.br/search?q=Ceu+Pera+Marmelo&es_sm=93&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ei=P

25ZVPBq-JOxBLSdgrAB&ved=0CAkQ_AUoAg&biw=1280&bih=699 Acesso em 04/11/2014 22:25

Page 24: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

22

É dessa forma, graças à esquizofrenia do espaço, no qual os lugares é que são o

mundo, pois o reproduzem de “... modos específicos, individuais, diversos. Eles são

singulares, mas são também globais, manifestações da totalidade-mundo, do qual são formas

particulares” (SANTOS,2000 p.112), que o cidadão, até então excluído das promessas do

centro, pode e deve apropriar-se dos CEUs para a constituição dessa horizontalidade

diversificada, instalando-se como um cidadão de sua Cidade, de seu Estado, do seu País:

Nas condições atuais, o cidadão do lugar pretende instalar-se também

como cidadão do mundo. A verdade, porém, é que o “mundo” não tem como

regular os lugares. Em conseqüência, a expressão cidadão do mundo torna-se

um voto, uma promessa, uma possibilidade distante. Como os atores globais

eficazes são em última análise, anti-homem e anticidadão, a possibilidade de

existência de um cidadão do mundo é condicionada pelas realidades

nacionais. Na verdade, o cidadão só o é (ou não o é) como cidadão de um

país. (SANTOS, 2000, p.113)

A cultura popular, pelas suas características específicas dos lugares em que é criada,

enraizada no território, produz uma contraordem. Os CEUs possuem possibilidades,

potencialidades de se constituírem como os enclaves de formação dessas “irracionalidades”,

pois contrárias a racionalidade dominante, produzindo-se assim uma nova hegemonia, na qual

a questão sociocultural como integradora e possibilitadora da destruição das desigualdades se

construa, pois “... a conformidade com a Razão Hegemônica é limitada, enquanto a produção

plural de “irracionalidades” é ilimitada. É somente a partir de tais irracionalidades que é

possível a ampliação da consciência” (SANTOS, 2000, p.115).

1.3 - Amplificação Pública

A mídia é conhecida como o quarto poder da república, pela sua característica de

contar os fatos e de certa forma transformá-los em verdade. Assim, as periferias de São Paulo

ficaram estigmatizadas como locais de violência, moradia de ladrões, traficantes, homicidas,

etc. A miséria tratada como espetáculo por programas como “Aqui Agora”, “Cidade Alerta”,

“Brasil Urgente”, “Polícia 24 horas”, entre outros, perpetuam as mais tristes e podres

caricaturas dos moradores dos bairros periféricos das grandes cidades.

A televisão não é como um livro, ou sequer como um jornal

impresso, cuja leitura podemos interromper, refazer, submeter a reflexões

demoradas. A dinâmica da imagem solicita respostas imediatas de quem a

ela está submetido. As reações são reflexas, rápidas. Esse mecanismo é

muito eficaz quando se trata de manter oculta a estrutura do texto ou a

concepção que está na base da disposição segundo a qual as imagens são

representadas. (ARBEX, 2008, p.13)

Page 25: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

23

Será mesmo que a periferia é apenas violenta e desprovida de algum bem cultural de

valor universal ? 25

Faz-se, então, necessária a superação das imagens televisivas estereotipadas. Até

mesmo pelas universidades que costumam vir até a periferia com uma visão salvadora,

ignorando os conhecimentos que circulam por ali. Nosso entrevistado José Soró nos alerta

sobre isso ao comentar sobre as parcerias frustradas com a universidade:

Umas da primeiras conversas foi com a USP leste. Mas eles não

aguentaram, porque tem uma coisa complicada nessa relação com a

universidade, uma coisa vetorizada superior, tanto é que eles separavam

conhecimento popular e conhecimento acadêmico, eu falo não tem essa,

conhecimento é conhecimento, o que eles são ? São diferentes. A academia

é um vetor de conhecimento, um vetor com um jeito de organizar e

estabelecer conhecimento. Mas ao longo dos anos isso acabou gerando um

vetor de valor, deixando os outros conhecimentos desvalorizados. E isso não

é verdade. As pessoas aqui tem um grande conhecimento. E o desafio era

impor isso, mas a universidade não soube como lidar com isso, não saber

que papel assumir quando você não tem mais isso de chegou a salvação

(risos). Quando a gente começou a questionar queremos uma relação que

esses conhecimentos e capacidades daqui estejam integrados. Se não, não

rola. Uma relação de domino não rola. Eles não deram conta de achar um

lugar que não fosse esse de salvador. Foram embora, chegamos a

desenvolver um curso de capacitação cultural juntos, mas foram embora.

José Soró.

25

https://www.google.com.br/search?q=Sorria+voce+esta+sendo+manipulado&es_sm=93&source=lnms&tbm=i

sch&sa=X&ei=W29ZVOjnL-vjsATjzoJo&ved=0CAgQ_AUoAQ&biw=1280&bih=699 Acesso em 04/11/2014

22:35.

Page 26: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

24

Porém as tentativas de parceria não cessaram. Está em curso atualmente o projeto da

Universidade Livre e Colaborativa com o Professor Euller Sandeville26

, tendo o CEU um

papel auxiliar no projeto:

Depois que o Marcio assumiu a gestão o CEU Perus virou uma

espécie de lugar que a gente tem todas as condições e tal, mas ela continua

circulando, tem aula em igrejas, casas, escolas, na Quilombaque, na praça,

enfim. Ela mantém esse espírito pra não permitir o predomínio de uma

lógica funcional. E entendendo que o conhecimento, ele não é só um pedaço

do discurso, da retórica, ele é toda uma experiência. Porque isso vindo aqui

as pessoas participando de almoço comunitário, quebrando barro, aula na

casa de não sei o quem. Então a ideia da Universidade é um aprendizado

integral. Enriquecendo seu repertório afetivo vivencial. Ai cada aula é

diferente, não existe uma igual a outra. José Soró.

Dessa forma, os CEUs se apresentam como holofotes a apontar novos

caminhos,abrindo espaços para as diversas experiências do seu entorno, desmitificando-se a

estigmatização das periferias, propiciando assim a “Amplificação Pública” (SOUZA, 2010,

p.111), ou seja, outra visão desses lugares até então estigmatizados pela violência e carência

material, pois pelas características do Projeto CEU, as questões político-sociais que afetam

tais áreas estão associadas às matérias produzidas sobre os CEUs, e consequentemente as

resoluções apontadas pela cultura popular imbricada e produzidas dentro do equipamento

social. Além disso, com a emergência das redes sociais essa amplificação pública se faz maior

e melhor, pois é executada sem a visão, algumas vezes distorcida, dos intermediários

midiáticos comprometidos com a ideologia mercadológica dominante.

1.4 Cidade Educadora

A construção de uma Cidade Educadora está atrelada a ação estatal. O Projeto CEU

está imbricado à constituição de uma Cidade Educadora, na qual a escola torna-se um espaço

comunitário e a cidade um grande espaço educador para que se possa aprender na cidade, com

a cidade e com as pessoas, valorizando o aprendizado vivencial. Um dos princípios

norteadores do Projeto CEU é a constituição de uma Cidade Educadora27

·: “A Cidade

Educadora é um complexo em constante evolução e pode ter expressões diversas, mas sempre

considerará como uma de suas prioridades o investimento cultural e a formação permanente

de sua população” (GADOTTI, 2004 p. 12).

26

http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?metodo=apresentar&id=K4792295T9 Curriculum

Lattes do Professor Euller Sandeville. Acesso em 02/11/2014 19:40. 27

Veja alguns elementos que você pode encontrar em uma Cidade Educadora:

http://educacaointegral.org.br/noticias/19-elementos-que-voce-pode-encontrar-em-uma-cidade-educadora/.

Acessado em 16/10/2014. 02:05.

Page 27: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

25

Vivemos uma tensão global-local, no qual existe uma racionalidade dominante

vinculada ao capital que produz o espaço de forma a atender seus interesses. A periferia

pobre, excluída, acaba por se constituir como um produto dessa produção do espaço, não

sendo uma exclusividade brasileira:

Em geral, é na periferia que também se encontram os bolsões de

extrema pobreza (favelas brasileiras, villas miséria na Argentina,

callampas chilenas, precaritas mexicanas etc.), que foram se construindo a

partir das migrações rurais- urbanas da década de 1950, dando lugar à

conformação dos assentamentos irregulares que cresceram enormemente

entre os anos 1960-1970, e que desde os anos 1980, são a expressão de uma

sociedade informal fortemente definida, cuja característica é o

congestionamento domiciliar e a carência de serviços urbanos e péssima

qualidade de vida (GADOTTI, 2004 p. 18-19.) Grifo nosso.

Com uma diminuição da intervenção social do Estado, a produção do espaço ocorre

desregradamente, porém compreendemos que no caso da acumulação capitalista que se deu

no Brasil pós década de 1950, esse desregramento foi planejado, ou seja, ficou a cargo única e

exclusivamente da classe trabalhadora buscar meios para se reproduzir, sendo a

autoconstrução a principal saída para a resolução do problema da moradia.

Assim, pelas particularidades do local (baixa renda, consequentemente menor

mobilidade urbana) seus moradores perdem um contato maior com a Cidade, porém caso

ocorra um reconhecimento histórico28

do seu entorno, cria-se uma sensação de pertencimento

interessante:

A possibilidade de poder nos reconhecer historicamente em nosso

próprio entorno físico e social cria um caráter ativo de identidade cultural.

Devemos pensar, então, a cidade como totalidade complexa, que é

necessário recuperar como espaço público de discussão e realização,

fortalecendo assim o desenvolvimento de experiências culturais através do

exercício da Cidadania.(GADOTTI, 2004, p.24-25).

Realizado em Barcelona, em novembro de 1990, o primeiro Congresso Internacional

de Cidades Educadoras fez uma carta que continha os princípios básicos para definir um

modelo progressista de cidade.

Assim, a “força do lugar” se faz presente, encampadas por políticas publicas

executadas pelos municípios, tornando-se o motor da construção das Cidades Educadoras:

No lugar- um cotidiano compartido entre as mais diversas pessoas,

firmas e instituições – cooperação e conflito são a base da vida em comum.

28

“Cada grupo de pessoas percorre apenas pequenos setores das cidades quando realiza suas tarefas habituais.

Talvez por isso, se perca a experiência do urbano, enfraquecendo os laços de solidariedade e a ideia de

pertencimento” (GADDOTTI, 2004 p.21).

Page 28: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

26

Porque cada um exerce uma ação própria, a vida social se individualiza; e

porque a contiguidade é criadora de comunhão, a política se territorializa,

com o confronto entre organização e espontaneidade. O lugar é o quadro de

uma referência pragmática ao mundo, do qual lhe vem solicitações e ordens

precisas de ações condicionadas, mas é também o teatro insubstituível das

paixões humanas, responsáveis, por meio da ação comunicativa, pelas mais

diversas manifestações da espontaneidade e da criatividade.” (SANTOS,

2012, p.322.).

Portanto cabe:

Aos Municípios desenvolver com eficiência as competências que

lhes correspondem em matéria de educação pelo qual devem organizar uma

política educativa ampla e de alcance global, de maneira a incluir nela todas

as modalidades de educação formal e não formal assim como as diversas

manifestações culturais (GADOTTI, 2004, p. 29).

As cidades são reconhecidas como verdadeiros espaços de aprendizagem e a educação

possui um papel de assumir e compreender a diversidade:

A educação tem que assumir a difícil tarefa de compreender e aceitar

a diversidade, já que esta potencializa o enriquecimento entre os indivíduos e

os grupos humanos, e evitar que esta se converta em fator de exclusão social.

Para isso é necessário gerar os espaços de encontros e de

integração”(GADOTTI, 2004, p.31).Grifo nosso

Entendemos os CEUs como um desses espaços de encontros e de integração, numa

“Esquina da Comunidade”. No escopo da cultura popular urbana, as esquinas são pontos de

encontro de fundamental importância, possuindo quase sempre um bar, no qual se discute os

mais variados assuntos (futebol, trabalho, política29

, religião, etc.), ou seja, a “Esquina da

Comunidade” está intrinsecamente vinculada à produção de cultura popular, sendo, portanto

interessante esta visão do equipamento CEU, pois durante a Gestão Kassab o mesmo foi

esvaziado30

, afinal era visto apenas como um local de entretenimento, visão da qual não

compartilhamos, pois a cidade já possui diversos espaços privados que funcionam sobre esta

ótica, como os Shooping’s. Portanto o CEU, “Esquina da Comunidade”, objeto técnico

capaz de alavancar a revanche da cultura popular, desde que devidamente apropriado, deve

ser entendido como produtor de uma pedagogia urbana:

29

Veja que interessante a fala de Frei Chico irmão do ex presidente Luís Inácio Lula da Silva (2003-2009) sobre

a importância do Bar da Rosa nas articulações políticas em

http://docverdade.blogspot.com.br/2011/03/presidentes-da-america-latina-brasil.html. Acessado no dia

16/10/2014 04:20. 30

http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,publico-de-eventos-dos-ceus-cai-42-na-gestao-kassab,365064

Acessado em 16/10/2014 03:42.

Page 29: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

27

“As contribuições da pedagogia urbana mais significativas são as

seguintes:

1 – Ampliação do campo de ação pedagógica.

2 – Construção de valores democrático-participativos.

3 – Ressignificação da cidadania: de objetos urbanos a sujeitos.

4 – Multiplicação de redes educativas e culturais.” (GADOTTI, 2004, p.

35)”

Sobre o esvaziamento do CEU nas gestões Serra/ Kassab leia o diálogo com Leda :

Henrique- Mas ai mudou o governo, você notou diferença? Você reparou

diferença de Marta pra Serra /Kassab?

Leda – Deu muita diferença, foi o Kassab que venho depois?

Henrique - Venho o Serra ele ficou um ano e pouco ai entrou o Kassab,

porque o Serra foi ser candidato ao governo.

Leda - Isso ele abandonou né. Então, mas ai piorou muito. Deu uma caída

boa o CEU, porque no tempo dela era muito bom. Eu lembro que tinha

muito teatro, tinha teatro pra adulto, e teatro infantil eu ia aos dois porque eu

gosto de teatro, participava dos dois, tinha peças boas, depois do Serra caiu

muito o CEU.

E com Marcio :

Marcio - E a população se apropriou porque ela sabia na gestão

Marta, eu acompanhava, frequentava o CEU direto, que toda sexta e sábado

a noite tinha um filme, que todo mês um sábado tinha uma peça de teatro.

Criou um hábito. Tem um rapaz aqui do lado o Mario que ele falava “ –Eu

sabia que toda sexta ou sábado eu podia ir lá que tinha um filme, mas

quando o Serra/ Kassab entrou acabou com isso”. Isso daqui virou um

condomínio fechado. Eu conto umas historias aqui e passo por mentiroso

cara, mas é verdade. No primeiro mês que entrei aqui, eu recebi uma

denúncia de uma pessoa do Recanto dos Humildes que tava lendo e foi

expulso da biblioteca. Eu falei vem cá me conta esta historia direito. Ele

falou eu sou casado e tenho filho pequeno, eu gosto de ler, e o único lugar

que eu consigo ler tranquilo é aqui na biblioteca, e nesse dia me tiraram da

biblioteca eu tava lendo, não sei por que falaram que ia ter um evento. Ai

chamei à bibliotecária e perguntei por que tiraram o rapaz da biblioteca? Ela

falou que toda última sexta feira do mês a Natura faz uma exposição na

biblioteca pra vender produtos!

Henrique- Apropriação privada do bem público!

Marcio - Isso. Era isso que acontecia. Isso daqui foi

desmantelado.Grifos nosso.

1.5 - Conselho Gestor

Nosso país possui uma democracia nova. E seu passado autoritário ecoa forte nos

atuais tempos, pois apesar da pressão popular, a transição foi arquitetada por cima com a

eleição indireta de Tancredo Neves na década de 1980 pelo colégio eleitoral. Porém, José

Page 30: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

28

Sarney, advindo das fileiras da ditadura assume a presidência após a morte de Tancredo,

promovendo uma distribuição nada democrática de transmissoras de rádio e televisão a

políticos em troca de apoio. Manteve-se assim uma tradição autoritária na execução das

políticas públicas. Algumas instituições, como a Polícia Militar não se democratizaram,

atuando ainda sobre a ótica ditatorial do inimigo interno, tratando a sociedade civil, e

principalmente aqueles que reivindicam melhores condições de vida, com forte truculência.

Por isso, enquanto instituição nova, a proposta intersetorial dos CEUs é importante

para a construção e fortalecimento da democracia, pois abrangem diversas áreas tais como

meio ambiente, educação, emprego e renda, participação popular, desenvolvimento local,

saúde, cultura, esporte e lazer, afirmando-se dessa forma como um espaço de afirmação de

direitos e de promoção da cidadania, como coloca o Decreto de Regulamentação dos

Conselhos Gestores:

1° O Conselho constituir-se-á em instância permanente de debate e de

articulação entre os vários equipamentos que integram o CEU, tendo em

vista o atendimento das necessidades comuns e a solução dos conflitos que

possam interferir em seu funcionamento (DECRETO Nº 50.738, de 15 de

Julho de 2009)

Assim, a participação no Conselho Gestor da população torna possível uma melhor

construção dessa proposta intersetorial, pois as demandas são colocadas, debatidas,

construindo-se soluções conjuntas para os problemas específicos de cada CEU. A construção

desse espaço comunitário atua como princípio da Cidade Educadora. E para a constituição de

uma tradição democrática de participação é necessário que :

Os governos locais possuam mecanismos institucionais adequados

que deem a um número representativo de cidadãos a possibilidade de intervir

no planejamento urbano e na construção de políticas públicas necessárias

para o planejamento da cidade presente e futura. E nós cidadãos devemos

aprender a participar ativamente na conquista e construção das nossas

cidades.(GADOTTI, 2004 p.33)

Identificamos na fala dos nossos entrevistados alguns problemas com o Conselho

Gestor :

Acho que falta participação da comunidade, é fácil chegar e

reclamar, mas a comunidade não ta participando, só tá indo eu e a Maria, eu

sozinha é difícil, agora o conselho tá mais formado por professores, lógico

que eles vem o lado deles, mas acho que a comunidade ta perdendo com

isso, ninguém quer se envolver ninguém quer dar a cara a tapa pra mim

sozinho é difícil.Leda

Conseguimos eleger um conselho gestor só no meio do ano, mas

mesmo assim ele não é um conselho gestor participativo pleno, mas isso daí

Page 31: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

29

é outra coisa que a gente vai retomar aos poucos a participação no conselho.

As pessoas tão retornando a participar agora do CEU, é uma coisa lenta, a

gente quer que se apresse, mas é lento, mas tá voltando a participação.É uma

coisa legal isso. Marcio

A política adotada durante oito anos pelas gestões Serra/Kassab (2005-2012)

promoveu um esvaziamento intencional do debate político dentro do CEU, tornando o

Conselho Gestor um órgão esvaziado, apesar da sua grande importância. Porém, acreditamos

assim como nosso entrevistado José Soró, que a questão da autonomia do CEU como um todo

acaba por influenciar na participação, pois o Conselho Gestor fica preso a esta dependência de

decisões externas, sendo, portanto, em nossa visão mais um instrumento consultivo do que

deliberativo:

Olha, eu tava pensando nisso hoje, você me cutucou. Fiquei pensando

em como pode ser um desenho viável pro CEU, por que ele fica preso na

própria lógica dele, forma dele, e não se potencializa no que foi pensando

nele como política pública, não materializa aquilo que se esperava dele

enquanto força dinâmica. Há que se pensar, acho que os CEUs deveriam ser

organismos autônomos, inclusive do ponto de vista orçamentário. Ai a

gestão integrada teria o papel de construir projetos próprios de características

locais, de cada região. Mas não tendo isso não cumpre esse papel. Mesmo a

gestão Haddad, que eu respeito, neste aspecto não oferece nenhuma

esperança que vai mudar esse enquadramento. José Soró.

Após esta breve análise desses instrumentais vinculados ao Projeto CEU ficamos

instados a propor que tal equipamento pode contribuir para a resolução daquilo que

chamamos de Questão Periférica, possibilitando a construção de uma Centralidade da

Periferia. Desenvolveremos esta tese no próximo capítulo.

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30

2 - A Questão Periférica

“Todos os homens são intelectuais, poder-se-ia dizer então:

mas nem todos os homens desempenham na sociedade a função de

intelectuais”

Antonio Gramsci, Os intelectuais e a organização da cultura.

Após a análise da concepção do Projeto CEU, fica a questão: será que tal equipamento

é capaz de resolver nossa Questão Periférica, permitindo a construção de uma Centralidade

da Periferia. Devemos entender primeiramente o que seria esta Questão Periférica.

O Comunista italiano Antonio Gramsci (1891-1937) se questionava quanto a Questão

Meridional verificada em sua terra natal:

Afirmamos que o camponês meridional esta ligado ao grande

proprietário rural por meio do intelectual. Este tipo de organização é o mais

difundido em todo o Mezzogiorno e na Sicília. Forma um monstruoso bloco

agrário que no seu conjunto funciona como intermediário e guardião do

capitalismo setentrional e dos grandes bancos. Seu único objetivo é

conservar o status quo.(GRAMSCI in : SINGER,2002 p.9)

Intrigava o comunista italiano o fato dos camponeses pobres do Sul formarem um

grande bloco histórico ligado aos grandes proprietários, protegendo o capitalismo dos grandes

bancos do norte da Itália, mantendo um status quo que era prejudicial a tais camponeses.

Como citado acima o papel dos intelectuais nessa composição era fundamental.

No Brasil, André Singer, em sua análise quanto aos Sentidos do Lulismo,31

investiga a

possível resolução daquilo que ele chama de Questão Setentrional, na qual dessa vez ocorre

um deslocamento das massas rurais exploradas, principalmente no Nordeste brasileiro, que até

2006 estavam ligadas aos grandes proprietários rurais, representados em nossa democracia no

antigo PFL (Partido da Frente Liberal) - atual DEMOCRATAS - para o Lulismo. Tais massas

beneficiadas pelas políticas públicas do primeiro mandato de Luis Inácio Lula da Silva (2003-

2006), tais como o Bolsa Família, Crédito Rural, Luz para todos, fortalecimento do salário

mínimo, entre outras fazem tal deslocamento de apoio, consagrando Lula com um segundo

mandato em 2006.

31

SINGER, André Vitor. Os Sentidos do Lulismo: reforma gradual e pacto conservador. 1ed. São Paulo. Cia das

Letras,2002.

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31

Entendemos então, que o CEU como ferramenta construtora de intelectuais orgânicos

pode promover a resolução da Questão Periférica colocada da seguinte forma: Por que as

massas periféricas da Cidade de São Paulo tendem a se alinhar a um conservadorismo

direitista que invariavelmente tende a prejudicar tais classes? Pois tal visão de mundo não

está preocupada em buscar resoluções para as desigualdades sociais, além de atuar de forma a

barrar atitudes que tem esse objetivo, como é o caso da descaracterização promovida nos

CEUs construídos nas Gestões Serra/Kassab32

.

O nosso entrevistado Marcio conta uma história interessante da visão de Serra sobre os

CEUs:

Tem uma piada, não sei se é piada ou se é verídico33

. Dizem que o

Serra quando assumiu, reuniu seus secretários e falou:

“-Vou fechar os CEUS”.

Ai o pessoal saiu foi pros bairros que tinha CEU :

“-Serra é bom não fechar”.

Ai ele falou:

“- Então não vou construir mais nenhum”.

Ai o pessoal saiu pros bairros voltou.

“ - Olha Serra é bom fazer (risos)”.

“-Vou fazer. Mas vou fazer mal feito.” Marcio

Aqui o papel de intelectuais orgânicos ligados aos setores conservadores, tais como

José Luiz Datena34

e Marcelo Rezende35

ajudam a explicar essa aderência. Porém,

entendemos que as políticas públicas executadas nos CEUs podem agir como uma contra

hegemonia no sentindo de criar intelectuais orgânicos vinculados a classe trabalhadora,

tendendo a se aliar a setores progressistas da Cidade, pois como coloca Singer (2012, p.23) :

“As classes podem transformar-se em classes para si, isto é, conscientes de seus interesses e

dispostas a lutar por eles no plano da política.”

A ação política no caso do Projeto CEU encampada no mandato de Marta Suplicy

(2000-2004) baseou-se fortemente no terreno da realidade efetiva, pois:

O político em ação é um criador, instigador, mas não cria nada

nem se move no vazio turvo de seus próprios desejos e sonhos. Ele se

baseia na realidade efetiva. O que é, porém, essa realidade efetiva ? Será

por acaso algo estático ou imóvel, ou, antes, uma relação de forças em

constante movimento, alternando continuamente o equilíbrio ? Aplicar a

vontade na criação de um novo equilíbrio de forças realmente existente e

32

Arquitetos criticam os CEUS de Serra. http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/20051210-40961-nac-53-cid-

c1-not Acesso em 20/10/2014 acesso em 20/10/2014 08:10. 33

História verídica ou não o fato é que José Serra possui um grande desprezo pelo Projeto CEU. Veja:

http://poderonline.ig.com.br/index.php/2012/04/21/serra-diz-que-os-ceus-sao-iguais-a-qualquer-outra-escola/

02/11/2014 21:20. 34

Apresenta o programa policial Brasil Urgente na Bandeirantes. 35

Apresenta o programa policial Cidade Alerta na Rede Record.

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32

operantes, baseando-se em determinada força que se considera progressista e

reforçando-a para levá-la ao triunfo, é se mover sempre no terreno da

realidade efetiva, mas para dominá-la e superá-la ou contribuir para

isso.(GRAMSCI, previsões e perspectivas In SADER, 2012 p. 36-37 )

Grifo nosso.

Entendemos o Projeto CEU como um fortalecimento das forças progressistas. De todo

um movimento que existe na periferia, convergindo para o CEU, desde que ele esteja aberto á

participação. Veja este caso interessante no CEU Perus:

Quando a gente chegou aqui no ano passado a pista de skate

tava detonada e a gente não tinha dinheiro pra consertar. Até recebi

denúncia que tinha ferro solto, tava perigosa. Falei quer saber de

alguma coisa, chama essa molecada. Esta pista é muito usada, num

mês fizemos uma medição passam por dia em torno de cem a duzentas

crianças, jovens e adultos. Chama essa molecada pra conversar.

Temos que fazer a reforma. Que reforma eles querem que faça ? E tem

um menino ai campeão brasileiro de skate, o Feijão, que já foi pra

Barcelona, já foi pra Dinamarca. Falei pra ele coordena a molecada ai

e vamos conversar. Ai nos vimos que o problema era maior, além da

pista de skate tinha uma molecada que usava bicicleta. Eles falaram

“- Porque a gente não faz uma pista de bicicleta do lado?” Eu

falei:

“- Beleza vamos fazer juntos porque sozinho eu não consigo”.

Fomos na diretoria regional:

“-Olha tem que reformar”.

“- Vai custar caro?”

“-Não.”

“-Então a diretoria banca.”

Tinta, quem vai pintar? Chama o coletivo de grafite de Perus,

chama o Danilo chama o Bonga chama o Perusferia e vamos fazer. O

Feijão coordenando tudo. No dia do Emicida aqui no teatro nos

fizemos à inauguração da pista lá, todos os grupos de hip hop da

região vieram tocar, cara a molecada chorava, porque quem fez a

reforma foram eles. Ai venho o pessoal da bicicleta:

“- E nossa pista ?”

“ -Bem vamos lá na diretoria, o que precisa ?

“ - Precisa terra.

“ - Se a sub prefeitura autorizar a gente faz.”

A subprefeitura autorizou. Pegaram terra no rodo anel com o

caminhão do depósito aqui de baixo, e pronto fizeram a pista de

bicicleta. Nos apenas intermediamos. Quem fez foram eles. Isto pra

mim já valeu a pena, um negócio assim indescritível. Marcio.

Voltando a Gramsci, possuindo uma concepção dialética da histórica ele faz uma

distinção entre movimentos conjunturais e movimentos orgânicos :

No estudo de uma estrutura, é necessário distinguir os movimentos

orgânicos – relativamente permanentes- dos movimentos que podem ser

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33

chamados de conjunturais – que se apresentam como ocasionais, imediatos,

quase acidentais... A distinção entre “movimentos” e fatos orgânicos e

movimentos e fatos “conjunturais” ou ocasionais de ser aplicada a todos os

tipos de situações. (GRAMSCI, previsões e perspectivas In SADER, 2012

p. 40-41)

Lembrando que para Gramsci :

É o problema das relações entre estrutura e superestrutura que

precisamos colocar concretamente e resolver para chegar a uma analise justa

das forças que operam na historia de um determinado período e determinar

suas relações.

Nenhuma sociedade se coloca problemas sem que existam condições

necessárias e suficientes para sua solução, ou sem que essas condições

estejam ao menos em via de aparecer ou se desenvolver (GRAMSCI,

previsões e perspectivas In SADER, 2012 p.39 )

Assim, podemos compreender a eleição de Marta Suplicy em 2000 como um fato

conjuntural, pois é o retorno de uma força progressista ao governo municipal, após oito anos

de governos conservadores encarnados nas figuras de Paulo Maluf (1993-1996) e Celso Pitta

(1997-2000) e o Projeto CEU, disputado politicamente na eleição de 2004, como um

movimento orgânico, ou seja, algo permanente, sobrevivendo ao retorno conservador das

gestões Serra (2005-2006) e Kassab (2006-2012), até a ocorrência de um novo movimento

conjuntural, a eleição de Fernando Haddad em 2012, retornando o Projeto original do CEU

enquanto pólo de desenvolvimento da comunidade não meramente como espaço de

entretenimento.

Para facilitar o entendimento podemos separar estes momentos da seguinte forma:

2000 – Eleição de Marta Suplicy (PT) – Movimento Conjuntural;

2003 - Execução Projeto CEU – Movimento Orgânico;

2004 – Eleição de José Serra (PSDB) - Movimento Conjuntural;

2012 – Eleição de Fernando Haddad (PT) - Movimento Conjuntural;

A posse de Gilberto Kassab (na época no DEMOCRATAS hoje no PSD) ,em 2006,

após a renúncia de José Serra para concorrer ao governo de São Paulo e, posteriormente, a

reeleição de Kassab em 2006,fazem parte do mesmo movimento conjuntural de 2004 de

fortalecimento do conservadorismo. Em 2012 ocorre o retorno de uma força progressista ao

governo municipal encampada na figura de Fernando Haddad. O CEU apesar do seu

esvaziamento, ou das tentativas de esvaziamento, seguiu enquanto um movimento orgânico,

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34

permanente, passando pelas duas gestões conservadoras, e agora ressurge com força numa

gestão de caráter progressista.

O Haddad ele tem um olhar sobre o CEU, que eu acredito, muito

legal. Na primeira reunião ele disse o seguinte, o CEU tem que ser a

menina de olhos dessa prefeitura, O CEU tem que ser o lugar onde

eles vão falar mudou. O PT tá ali mudou, não só o PT porque nem

todos os gestores são do PT, mas a administração do PT tá ali mudou

a relação com a comunidade. Marcio

Portanto entendemos que o Projeto CEU – movimento orgânico, permanente - se

propõe a fortalecer a classe trabalhadora enquanto força progressista de transformação da

realidade desigual brasileira sem do assim um fator de extrema importância para a

resolução da nossa Questão Periférica.Vejamos um exemplo interessante que ocorre no bairro

de Perus extremo noroeste da Capital Paulista.

2.1 Queixadas e o CEU Perus

O Centro Educacional Unificado de Perus é um caso emblemático na luta política

contra hegemônica. Entendido pelo seu Gestor como uma Esquina da Comunidade, está

fortemente atrelado as questões do bairro, como por exemplo ao Movimento pela

Reapropriação da Fabrica de Cimento de Perus36

. Este movimento tem como origem a Greve

dos Queixadas, trabalhadores da antiga Fábrica de Cimento da região que na década de 1960

promoveram uma grande greve na luta por melhores condições de trabalho. Atualmente,

existe no bairro este movimento pela reapropriação da fábrica com vistas a torná-la um ponto

de memória e cultura da classe trabalhadora37

. Suas reuniões ocorrem dentro do CEU Perus,

que expõe também atividades diversas sobre a memória da fábrica, tais como exibição de

filmes, palestras e exposições sobre a história do movimento dos Queixadas, promovendo a

construção de um sentimento de pertencimento ao bairro por parte das gerações mais novas.

E a desapropriação da fábrica será a coroação de uma luta antiga dos trabalhadores

desta região:

Conseguimos criar uma ideia de parque dos Queixadas no

território que é da fábrica, um território cultural que envolve Jaraguá,

Anhanguera e Perus. É um mecanismo de proteção, a gente não tem a

36

Sobre o Movimento Pela Reapropriação da Fabrica de Cimento de Perus acesse :

http://movimentofabricaperus.wordpress.com/ Acessado em 17/10/2014. 17:30. 37

Veja algumas questões importantes que envolvem a luta política em Perus no link a seguir :

https://drive.google.com/file/d/0BxR7Lnu7EeUiNDdaOWN5T3hHRWs/view?pli=1 formando toda uma rede

cultural sendo o CEU Perus um polo irradiador fundamental dessa luta. Acesso em 20/10/2014 10:00.

Page 37: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

35

fábrica por que continua privada , mas vamos criando movimentos

entorno que vão dificultando essa degradação, a possibilidade do cara

vender etc. E o movimento recuperou sua vitalidade, tem uma

integração muito grande com os coletivos, as ações são até autônomas

do movimento, cada coletivo inventa sua ação. E todos tem claro que

precisamos conquistar a fábrica, ela é um elemento simbólico vital.”

José Soró

Vista aérea da fábrica de cimento de Perus.

38

Assim o CEU aberto aos movimentos que permeiam as comunidades do seu entorno

torna-se um fator de construção da Centralidade da Periferia.

38

Imagem retirada de : http://hrechi.blogspot.com.br/2011/04/fabrica-de-cimento.html Acesso em 02/11/2014

22:20.

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36

Conclusão - Centralidade da Periferia.

Milton Santos (2008) discute diante da globalização perversa uma possível

centralidade dos países periféricos em relação aos blocos, países hegemônicos mundiais

(notadamente Estados Unidos da América, União Européia e Japão). O autor vaticina que o

novo será promovido pelos “debaixo”, os excluídos, que produzem uma contra ordem à

globalização expropriadora.

Essa análise se faz interessante na produção do espaço da capital Paulista,

notadamente segregador no qual as classes populares, ou seja, os “debaixo” foram

expropriados do centro39

e de suas promessas. Podemos entender, então, que os CEUs podem

propiciar aos periféricos, através da sua correta apropriação de seus variados equipamentos, o

referencial dito por José de Souza Martins (2008), facilitando assim a construção da crítica

social e política do seu periferismo e uma possível resolução da Questão Periférica, ou seja,

o desvinculamento da classe trabalhadora dos setores conservadores que a oprimem. Dessa

forma, se constitui assim o tempo de possibilidades:

O que conta mesmo é o tempo das possibilidades efetivamente

criadas, o que, à sua época, cada geração encontra disponível, isso a que

chamamos tempo empírico, cujas mudanças são marcadas pela irrupção de

novos objetos, de novas ações e relações e de novas ideia”. ( SANTOS,

2008,p.117 ).

Essa questão é colocada em nossas entrevistas :

Henrique – E o que você pensa do futuro, essa criançada que cresce com

esse tipo de escola, que já entra desde sempre no CEU, seis, sete, oito anos?

Leda - A educação é outra né, eles têm várias coisas boas pra aproveitar,

várias atividades, se eles tiverem a cabeça boa vão aproveitar bastante coisa

ai.

Fechamos aqui nossa busca pela Totalidade. Porém, fica claro para nós que ela é uma

Totalidade incompleta, nossos atores sociais entrevistados e a relação cotidiana do autor com

o CEU Pêra Marmelo e CEU Perus, além dos movimentos que circulam no entorno provam

que o CEU é apenas mais um fator da construção da Centralidade da Periferia. Porém, um

fator muito forte e significativo, suas paredes de concreto pulsam quando as pessoas

39

Veja nesta reportagem http://reporterbrasil.org.br/gentrificacao/haddad-e-alckmin-juntos-para-riscar-do-mapa-

favela-do-moinho/ a imensa luta dos moradores da Favela do Moinho, a última a resistir no Centro de São Paulo

contra a especulação imobiliária. Acesso em 20/10/2014 08:00.

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37

encontram- se ali naquela Esquina da Comunidade para debaterem as diversas questões que

perpassam-o seu entorno. E tais paredes reverberaram as soluções mais criativas e produtivas

para estas questões, pois são criadas pelos próprios atores locais.

E as novas gerações da periferia nascem já com um novo objeto técnico ao seu dispor,

com grandes possibilidades de construção de novas ações, relações e novas ideias. Sendo esta

uma das formas de construção de uma Centralidade da Periferia na Capital Paulista, com a

emergência da cultura popular.

Page 40: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

38

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39

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40

Apêndice

O autor do trabalho foi candidato eleito com 19 votos a representante da comunidade no

Conselho Gestor do CEU Pêra Marmelo no ano de 2011.

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Anexos

Anexo 1 - Íntegra das entrevistas realizadas:

Leda Maria de Moutta Ferro- Moradora da Vila Aurora, frequentadora do

CEU Pêra Marmelo e presidente do Conselho Gestor - Entrevista realizada

em 23/10/2014 – às 15 horas na casa da Leda.

Henrique - Gostaria começar pedindo que você se apresentasse se sempre morou aqui

na Vila Aurora?

Leda - Eu vim de Paranapiacaba (Santo André), faz mais de 15 anos, meu filho não

conseguiu escola, ai saiu o CEU pra sobrar mais vaga, ele tava numa escola longe, no Aldo,

não conseguiu vaga no CEU, foi para o Veríssimo.

Henrique – Você lembra como foi a formação do CEU, se você participou, como que

foi ? Foi em 2002, 2003, por aí? E como foi esse começo? Eu lembro que ali era um

campinho de futebol.

Leda- Participei, participei. Vai fazer 11 anos mês que vem (novembro de 2014).Isso

ali era um campinho de futebol.

Henrique – E como foi você lembra?

Leda – A Mara que era representante de bairro sabia da nossa luta por vaga na escola,

e chamou a gente pra participar, ai ela falou do CEU, já sabia que ia sair. Mas no começo eu

fiquei em duvida, fui de porta em porta pedir abaixo assinado pro pessoal, ai quando falou que

era uma escola assim que ia ter piscina, ia ter isso, aquilo, eu duvidei, ai eu falei meu deus se

não sair isso daí eu vou apanhar na rua.

Henrique - Na época você passava e falava essas características. Que ia ter piscina,

quadra teatro?

Leda- Isso, falava que ia ser tudo junto uma coisa só, mas mesmo assim eu duvidava,

tinha medo (risos) ia apanhar. Cheguei a trabalhar na política nessa época, mas graças a deus

saiu deu certo. Mas Eu ficava aqui de casa que da pra ver, eles trabalhando dia e noite, cada

coluna que eles colocavam eu ficava olhando aqui a primeira coluna a segunda coluna desde o

começo.

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Henrique – É eu lembro que passava ali na Pêra Marmelo dava pra ver batendo a

estaca, ficava curioso, mas eu não participei de nada era novo ainda. Você chegou a vir no dia

da inauguração

Leda – Sim, nos fizemos um bolo na padaria do CEU, porque aquela padaria era pra

comunidade aprender panificação, mas parece que acabou eu cheguei a aprender a fazer bolo

ali, matinha um professor, mas acabou, e hoje a padaria.

Henrique- Hoje virou uma cozinha.

Leda – Mas aquilo lá era pra comunidade aprender a trabalhar, que nem as maquinas

de costura, tem ali, mas nuca ninguém ensinou, que era pro pessoal aprender a trabalhar nas

maquinas industriais mas ate hoje não se usou, a intenção da Marta era boa, pro pessoal

aprender a trabalhar.

Henrique – Mas ai mudou o governo, você notou diferença? Você reparou diferença

de Marta pra Serra /Kassab?

Leda – Deu muita diferença, foi o Kassab que venho depois?

Henrique - Venho o Serra ele ficou um ano e pouco ai entrou o Kassab, porque o

Serra foi ser candidato ao governo.

Leda - Isso ele abandonou né. Então, mas ai piorou muito. Deu uma caída boa o CEU,

porque no tempo dela era muito bom.

Henrique - Eu lembro que tinha muito show, cheguei a ver show ali na pista de skate.

Leda - Eu lembro que tinha muito teatro, tinha teatro pra adulto, e teatro infantil eu ia

aos dois porque eu gosto de teatro, participava dos dois, tinha peças boas, depois do Serra caiu

muito o CEU.

Henrique - E como era sua relação com cultura antes do céu, teatro?

Leda – Nenhuma.

Henrique - Você acha que facilitou? Você já tinha visto teatro antes?

Leda - Sim com pouca frequência, por que era muito longe e caro. Ai o CEU venho

pra cá. Eu comecei a ver bastante. Todas eu assistia, de criança e de adulto e passava filme

também, tinha bastante filme, mas cortaram tudo isso.

Henrique - E quais outras atividades você fazia?

Leda - Sempre fiz ginástica, hidro, alongamento, tudo que tem eu faço, caminhadas,

artesanato da melhor idade, conselho gestor. Procuro sempre tá por dentro das coisas que vão

ter.

Henrique - E o seu filho chegou a fazer algum curso por fora?

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Leda - Chegou a fazer judô, mas no tempo do Serra acabou agora parece que tem

umas crianças fazendo, mas meu filho cresceu né ai não deu mais.

Henrique - E agora com essa mudança de prefeito, dois anos de Haddad, você acha

que de uma modificada, voltou à fase da Marta?

Leda - Olha voltar à fase da Marta é difícil igual à Marta não tem, fiquei ate triste que

ela não ganhou, pelo tanto que ela fez, mas voltar do jeito que era ela é difícil.

Henrique - E a questão do conselho gestor? Que eu participei também, vamos falar

um pouco, o que você pensa sobre ele, acha que falta participação?

Leda – Acho que falta participação da comunidade, é fácil chegar e reclamar, mas a

comunidade não ta participando, só tá indo eu e a Maria, eu sozinha é difícil, agora o conselho

ta mais formado por professores, lógico que eles vem o lado deles, mas acho que a

comunidade ta perdendo com isso, ninguém quer se envolver ninguém quer dar a cara a tapa

pra mim sozinho é difícil.

Henrique – E o que você pensa do futuro, essa criançada que cresce com esse tipo de

escola, que já entra desde sempre no CEU, seis, sete, oito anos?

Leda - A educação é outra né, eles têm várias coisas boas pra aproveitar, várias

atividades, se eles tiverem a cabeça boa vão aproveitar bastante coisa ai. Vários esportes, as

professoras dedicadas. Eu acho que se eles tiverem a cabeça boa vão aproveitar bastante, meu

filho infelizmente não conseguiu vaga ai, o tanto que eu lutei, mas não deu. Agora virou uma

bagunça porque no meu tempo ter que comprovar que morava perto da escola, agora vem

gente de longe, aqui briga com o Pedrinho do campo (Dono do terreno onde foi construído o

CEU Pêra Marmelo.).

Henrique – Ele não queria ceder o terreno?

Leda - Sim, mas no fim deu tudo certo. Mas você vê com tanta luta meu filho não

entrou ai, mas vem criança de longe.

Henrique – Fala um pouco pra mim sobre o baile da melhor idade esta integração

desde quando tem o baile?

Leda – Desde o começo tinha a Ana Claudia do telecentro, ai a gente começou a fazer

o baile era um bailinho pequeno pouca gente, a gente colocava mesinhas, mas cresceu tanto

que hoje não cabe mais mesinha, ai começou a vir gente de fora, do CEU vila Atlântica e nos

vamos ao baile lá.

Henrique – Ai tem essa integração, o pessoal de lá vem aqui e o daqui vai pra lá?

Leda - Isso, e é bom que a gente conhecesse muita gente, é muito bom o lhe dar com o

pessoal da melhor idade e tem também o artesanato, conseguimos ai uma parceria com uma

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pessoa que estudou gerontologia, e visa o bem esta dos idosos, ai com a gente ela vai ver

essas questões de leis, estatuto do idoso, estas coisas assim porque a gente tem muita dúvida,

das leis, dos direitos dos idosos. Eu já conhecia ela, do tempo da marta, mas ai no tempo

Serra/ Kassab era foi posta de lado e ai ela voltou agora.

Henrique – Falando de direitos aqui vai virar polo de direitos humanos? O que você

pensa disso?

Leda – Tudo que for feito pra comunidade pra melhorar é bem vindo, porque o

pessoal não se liga muito nessas coisas de informação, de direito de educação a gente tem que

saber tem que ta por dentro.

Henrique - E a comunicação do CEU? Você acha que é eficiente?

Leda - Então eles põem avisos, tem a programação do mês inteiro, mas tem gente que

fala assim pô você não me avisa, mas ta lá pra todo mundo vê, tem aqueles painéis, tem na

parede, é uma questão de parar e olhar, ler né! Se programar, eles divulgam sim é bem

divulgado.

Henrique – Pra finalizar o que você tem a dizer sobre sua relação com o CEU e o que

você pensa do futuro dele? Como você vê essa dinâmica do governo atual, da comunidade.

Leda – Você conhece o CEU aqui, você já foi CEU do Kassab? Olha o teatro é

pequenininho, não e igual esse o teatro daqui já venho muita gente aqui e todos elogiaram o

teatro daqui eu já fui no teatro Butantã, porque antes eu fazia o vocacional fui se apresentar

lá.O teatro era pequenininho.o nosso daqui é grande os da marta são melhores.

Henrique - Você fazia o vocacional?

Leda - Fiz durante um ano. Era dança. É legal mas não era o que eu queria eu queria

dança de salão,sempre lutei pra vir dança de salão aqui mas não venho,porque o vocacional é

mais expressão corporal alongamento, pé legal mas não era o que eu queria dança de salão

mesmo e o que mais você perguntou ?

Henrique- Sobre a relação do CEU e a comunidade o que você pensa pro futuro?

Leda - Era bom que a comunidade participasse mais, não só de deixar o filho lá, mas

participasse da vida do CEU que nem eu fico lá.

Henrique - Saber o que ta acontecendo

Leda - Exatamente porque as pessoas só deixam o filho lá e vão pra casa, e não é

assim tem que participar, tem que estar por dentro de tudo o que acontece, se você acha que

não tem uma coisa legal tem que ir lá no conselho e reclamar, porque uma pessoa sozinha dá a

impressão que é picuinha minha , que só eu que to vendo

Henrique - Não tem uma demanda unida.

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45

Leda - Não tem, na outra gestão tinha mais comunidade participando era melhor,

agora eu fico ali de bobeira, eu falo, elas acham que o direito delas ta certo.

Henrique - Então o que você pensa é que a galera precisa participar mais?

Leda - Isso você tem que ficar integrado ali, tem que saber tudo o que acontece,

porque isso daí é nosso é da comunidade, o pessoal que ta ali ta ganhado pra trabalhar, a gente

tem que ter o melhor, e pra gente querer o melhor a gente tem que ta integrado ali, participar,

isso daí falta muito.

Henrique - Bem e você quer falar mais alguma coisa?

Leda - Não, (risos) acho que já falei tudo acho. Já falei demais.

Henrique - Então agradeço e estamos ai. Participar, vou ver a questão do horário.

Leda - Ah deixa eu falar uma coisinha o meu vice me deixou na mão (risos) , mas eu

sei você tava estudando.

Henrique - Vou ver re retorno (risos).

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46

José Soró – Agente cultural de Perus, Diretor da Agendes – Agencia de

Desenvolvimento Cultural. Entrevista realizada no Quiosque do CEU Perus

no dia 25/10/2014 às 15 horas.

Soró- Eu fiquei curioso né, eu não trabalho no CEU, fiquei pensando por que você

quer me ouvir ?

Henrique -Mas aí que ta a graça (risos). Eu queria que você se apresentasse, José

Soró, onde nasceu ? Quanto tempo mora aqui em Perus ?

Soró - Eu nasci no mato grosso do sul, morei lá em fazenda ate os 11 anos, aí meu pai

morreu, nos somos em 6 irmãos e minha mãe, ai um tio meu que morava em São Paulo meio

que resgatou a gente , trouxe pra São Paulo, ai viemos morar em perus em 1976, aí fiquei por

aqui e de alguma maneira essas historias que tinha em Perus acabou atraindo muito, eu

cheguei num período que da minha casa dava pra ver tas manifestações no portão da fabrica,

tanques ainda da ditaduras e tal, essa coisas aguçavam.

Henrique – Impactaram ?

Soró – Impactaram. Ai quando entrei na escola, entrei com doze anos no Candido

Portinari, eu já sabia ler e escrever, antes não tinha estudado por que onde morava não tinha

escola, mas tinha aprendido a ler e escrever com gibis essas coisas e fui aprendendo, mas tive

que entrar na primeira serie, era um gigante, interessante né porque ali já exercício um pouco

o papel de mais velho, era o único lugar que tinha ou morrer de vergonha por ta ali com doze

anos no meio de crianças de sete. Enfim, o Candido Portinari, é uma característica das

escolas de Perus, era muito politizada, contava-se muitas historias dos queixadas,das lutas

sociais que existiam no bairro, ai acabou não dando outra cara!! Um dia cruzei com um

professor de historia e as coisas começaram a fazer sentido. Era interessante acompanhado um

pouco o período de 79 das lutas pela...

Henrique – Democratização ?

Soró - Não, ainda era pela anistia e aquilo aparecia assim, ai começaram a aparecer às

greves.

Henrique Greves, tinha informação ?

Soró – Tinha. E eu me lembro daquelas cenas da Vila Euclides, do Lula, que aquilo

ali dava um calor, mas eu ainda não entendia por que. E as contrainformações eram muito

grandes, sempre eram colocados como baderneiros enfim, e era sempre assustador esse clima

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ainda de final da ditadura militar, mas aquilo chamava atenção, e tanto é que eu acabei

entrando na militância política podemos dizer assim , mas não pelo PT, uma vizinha ia fazer

campanha pro Janio Quadros e resolveu contratar o povo, e eu fui enfim NE era um bico, mas

tinha aquele interesse porque vinha ai deputado conversar, ai tinha aquele interesse, mas

acabei entrando pela porta errada, mas era a campanha de 82 e o lula aparecia mais vezes,

porque tinha o horário eleitoral e aquilo começava a ferver, ferver, ferver dentro de mim, ai

chegou à eleição e meu primeiro voto foi no Janio Quadros prefeito, mas acho que nunca mais

cometi algum erro (risos). Mas me encantei por essa coisa do universo político, na eleição

mesmo conheci algumas pessoas, alguns jovens aqui do bairro e já tinha alguns jovens

discutindo a falta de cultura no bairro, e tinha um cara do PCB, Edson, por conta do Mario

Covas ser prefeito ele era uma espécie de subprefeito, e ele era muito envolvido com arte e

com cultura e começou a dar uma impulsionada também, ai a gente se juntou num grupo de

pessoas, ai a gente criou um centro cultural, se chamava Ajuá.

Henrique - Década de 80 ?

Soró – 82,83, ai promovendo algumas coisas ai, ai acabei indo pro mundo político,

fazendo militância política mesmo, achei que o PT era o que eu queria, aquela coisa com o

lula e tudo, e sou apaixonado por política acho uma arte, e fui compreendendo desde a minha

historia ate a realidade periférica de Perus que era muito violenta,fui começando a

compreender esses conceitos de luta de classe, etc. ai fazer política não foi só um gosto uma

adrenalina, mas um posicionamento pragmático político meso, quem eu era onde estava, e

sempre fui muito revoltado com a pobreza né, e teve um certo desencanto com a minha

infância né porque tudo que eu lembrava era muito bonito, mas depois você vai entendendo

que meu pai era trabalhador, a máquina roçadeira que eu vi um dia e achei maravilhoso

parecia de outro planeta, na verdade era a desgraça do campo e a consciência que meu pai era

trabalhador que vivia aquela migração atrás de emprego , de colheita,estas coisas e tal ate que

eu voltei um dia eu fui pro mato grosso uma época, tava tudo parado lá, ai nunca mais quis

voltar, nunca mais tive essa coisa de voltar pra lá, mas acho que ganhei do ponto de vista do

meu lugar no mundo e desde então participei dos movimentos sociais, aqui do bairro sempre

muitos movimentos, luta de absolutamente de tudo, água asfalto, etc.

Henrique – Bem eu fiquei curioso, você falou ai do Janio Quadros, e a vitoria da

Erundina em 89 ?

Soró – Ahh! Ai eu já tava bem descolado. Fiz parte assim de uma cristalização de uma

identidade política fudida, que foi a história da Erundina. Eu comecei a participar da Igreja

(Comunidades Eclesiais de Base) e toda essa ebulição que acontecia no Brasil, e tudo foi me

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interessando bastante e fui aprendendo, e nessa época da Luiza Erundina, era muito

interessante, eu fiz parte do PT acho que doze anos, assumi cargos, fui candidato etc. Mas não

era muito meu encanto, mas entendo que era um caminho natural quando você faz militância

partidária assumir cargos faz parte do percurso, mas da Luiza, o PT tinha uma proposta de ser

de massas e de quadros40

e ele era mais que um partido, era um movimento cultural de

mudança, e congregava diversos tipos de núcleos, neste sentido ele era de massas, por que a

base tinha lugares pra falar, participação intensa, ele se constituía por núcleos, só em Perus

tinha dois núcleos , e tinha uma participação muito direta desde o sujeito mais simples até o

mais intelectual dentro do partido, e isso politizou muita , estudar, era um movimento que

tinha aquilo de que tem que estudar, tem que se formar. Tanto até que na primeira reunião que

eu fui, a pedagogia era horrível, os caras sentaram lá, sábado a tarde e abriram O Capital

(risos) volume 1, e começaram a ler O Capital, era muito simples, mas essa consciência da

necessidade de estudar, isso me favoreceu muito, assim de ganhar disciplina, de pensar de

estudar fazer analise de conjuntura, e isso hoje acho que ficou muito pobre, essa necessidade

de ter a disciplina de estudar não é visto como uma tarefa revolucionária, ai tem um

empobrecimento enfim. Ai nesse caminho todo surge 88, que foi uma historia muito

interessante. A parte diretiva do PT, que já era um núcleo em torno do Jose Dirceu,eles

avaliavam que o melhor candidato era o Plínio por que ele era cristão,dialogava com a classe

media pra perder aquele medo do PT. E a outra candidata era a Luiza Erundina, que vinha

arrebentando tudo, zona leste com NE barro, tinha um discurso radical, que a cidade precisava

arrebentar a cidade por que a cidade era muito complicada. Enfim, a direção bancou o Plínio,

mas teve uma rebelião de bases interna, a cara do PT é a Erundina, e eu fiz parte desse

movimento, era da articulação que era majoritária mas comecei a me desencantar um pouco

com eles. E quando chegou as prévias as bases deram uma virada feia, tipo 80 por cento pra

Erundina e ai criou um problema por que a direção se ressentiu e se afastou, então você tinha

a máquina partidária controlada por essas pessoas e tinha uma candidatura lançada pelas

bases, e a consciência imediata era vamos com o que a gente tem, boca,língua convencimento

ai virou uma febre em são Paulo os núcleos todos se mobilizaram, lembro que aqui em perus a

gente fez porta em porta duas vezes conversando com a pessoa e isso se generalizou pela

cidade, ai não deu outra batemos o Maluf. Mas isso gerou um problema de governabilidade

porque ela não tinha estrutura partidária, não tinha estrutura, montou um governo conforme a

base apontou, mas não tinha sustentação. O primeiro ano foi muito difícil, mas isso foi bom

40

Sobre Partido de Quadros e Partido de Massas veja http://www.veduca.com.br/play/7283 Acessado em

02/11/2014 as 18:05.

Page 51: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

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porque as bases discutiam muito os diretórios indicavam o administração regional, tinha que

ser alguém de perto, os cargos eram todos discutidos, pra todos os organismo de saúde, de não

sei o que a gente montou conselhos populares, então tinha um participação muito intensiva,

foi um ano de governo direto com as pessoas. Mas a sustentação institucional era complicada

e ai eles tiveram que arregar por que a direção voltou e assumiu e falou que tinha que ser do

nosso jeito também, ai o governo ganhou em capacidade funcional administrativa,mas fugiu

um pouco das bases. Mas enfim esse papel esse momento é fundamental, essa é um pouco a

minha escola de aprender a olhar o mundo.

Henrique – Me fala mais um pouco ai da Erundina, ela que tomba a Fábrica de

Cimento nesse momento ?

Soró - Pois é, essa é uma historia ruim (risos) dela e nossa. No governo dela essas

coisas de recuperar a memória, dar valor ao movimento sociais, o povo da área acadêmica

vem em peso com a Chauí como secretaria de cultura , e começam a fazer um resgate de

memória na zona leste e isso bateu aqui nos ouvidos do João Breno e do pessoal do sindicato.

Ai rolou uma parceria e a secretaria de cultura venho pra cá e começou um estudo para efeitos

de tombamento patrimonial e ao mesmo tempo um resgate da memória oral que ia sustentar

esse tombamento imaterial por que em tese a fabrica não tinha elemento para ser tombada

patrimonialmente então a historia da greve dos queixadas sustentou esse tombamento, durante

quis um ano a gente ouviu uns 200 queixadas contando suas historias . E isso resgatou a ideia

do centro de cultura do trabalhador que era uma ideia de 58 a gente resgatou, ai conseguiu o

tombamento, faltava fazer a desapropriação e construir o centro de cultura e memória.Havias

conversas com o SESC pra viabilizar o centro de cultura e a prefeitura precisava fazer a

desapropriação. Foi feito o tombamento a gente celebrou na praça. Ai entrou no ultimo

mandato da Erundina, ai aconteceu uma coisa complicada, o povo militante nos cargos

começa a ir pra campanha, ai o governo começa a trabalhar mais lento. E havia uma crença

também, não que ela seria reeleita por que não tinha reeleição, mas que a gente ia conseguir

reeleger o sucessor, que na época era o Suplicy. Ai entramos nessa crença tanto eles do

governo e a gente dos movimentos sociais, então a gente vai ganhar faz a desapropriação

depois , ai se fudemos por que perdemos pro Maluf (risos). E FOI UM vacilo mesmo. Lembro

que o João Breno que era um cara muito sabido falava olha não vamos entrar nessa onda,

vamos acelerar as coisas e lembro que a gente mais militante falava assim que isso não seja pé

frio não fala dessas coisas (risos) . E isso criou um vácuo, porque ela foi tombada mas não foi

desapropriada.Ela continua pertencendo ao Abdalla que não conseguiu transformar ela pra

outros negócios ai venho destruindo ela sistematicamente. Foi falta de mais esperteza que

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50

acho que retardou atrasou um pouco. Foi essa historia com a Luiza Erundina, mas claro o

respeito e admiração pela coragem dela de enfiar a mão, porque eu lembro que essa discussão

da imaterialidade era tirada por todos os intelectuais da área de patrimônio como bobagem,

então foi uma luta muito forte pra reconhecer , e mais transformar uma ação de trabalhadores

em patrimônio, é fácil você achar ai um herói renegado e transformar em patrimônio, outra

coisa é transformar a historia de trabalhadores em patrimônio.

Henrique- Pra não fugir da Erundina, queria que você falasse um pouco da vala

comum também, é nesse momento que é descoberta , teve a CPI, ela venho aqui.

Soró – Foi, foi. Esses assuntos eram corriqueiros, se falava mas eram tidos meio como

boatos, e tinha um cara aqui de extrema direita que não sei por que se encantou com a

Erundina quando ela se elegeu (risos) e ele trabalhava no cemitério. E ele sempre contava

essas historia e ele resolveu levar a serio por que tinha convicção, ai debateu lá no serviço

funerário enfim e conseguiu convencer alguém La de que era possível essa história,ai o

pessoal comprou a historia dele e resolveu as valas e descobriu. Ai todas aquelas historias

boatos que se ouviam começa a ganhar conexão sentido, e grande parte da população naquela

época já tinha um ódio violento ao Maluf, aço que por causa dessas historias, por que o cara

foi um grande canalha, filho da puta, construiu um cemitério pra esconder dissidentes

políticos, movimentos de enfrentamento a ditadura. Mas, mais que isso, uma coisa muito

nojenta os extermínios de pobres e pretos na periferia, então era um cemitério pra isso, uma

coisa absurda! Ai tem uma parte que tem uma convicção danada anti Maluf e tem uma parte

que adora, venera ele. Mas faz parte dos movimentos lá. E a Luiza Erundina acho que teve

esses aspecto de um governo de coragem, de arrebentar a coisa de rasgar tecido. E tinha puta

quadros, não temos mais. Ela tinha Paulo freire como secretário da educação, Marilena Chauí

como secretária de cultura (risos) então tinha muita coragem, foi um governo de arrebentar

mesmo, muito corajoso. E tinha dois aspectos que eram muito interessantes. Um era dar um

choque na educação, e isso tem a ver com a Fábrica e com o CEU também, porque essa ideia

do CEU nasce lá atrás via Paulo Freire, de uns encontros com o movimento de moradia da

zona leste. Eles eram metidos a pensar o lugar da educação como um lugar educativo, e foram

atrás do Paulo Freire pra discutir isso. E desenharam a implantação do conjunto habitacional

todo pensado como um lugar educador, do jardim a casa, a praça todo desenhando com o

Paulo Freire. Ai começa a nascer essa ideia do CEU acho assim,de um lugar que seja

integrador da comunidade,nascem dessas ideias ai mas eles não chegaram a fazer o CEU, e

todos eram fãs assim, apesar de estar em partidos diferentes , do Darcy Ribeiro e os CIEP's no

Rio, mas não chegaram a fazer o CEU. Então a Luiza ela tem essas importâncias de arrebentar

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algumas coisas tinha isso de abrir discussões,abriu essa coisa do urbanismo. De memória

assim de conhecimento eu tenho memória do Mario covas do Janio, ai tinha ideia do que era a

prefeitura, na época dos caras as prefeituras era o que basicamente são as subprefeituras hoje,

zeladoria, a prefeitura era basicamente a zeladoria de São Paulo, não criava não propunha, ai

quando chegou a Luiza Erundina ela passa a ser uma prefeitura de olhar a cidade, o povo, ela

começou a abrir essas coisas a prefeitura é muito mais do que só administrar,zelar, acho que

no governo dela foi que abriu um pouco essas coisas em São Paulo. E esses acontecimentos

de arrombo né! O cemitério, a vala comum, era até um risco, era recente o fim da ditadura,

então ela foi corajosa nesse sentindo foi um governo que abriu muitas frentes de coragem Há

um choque inclusive mesmo na esquerda, a Marta e mesmo o Haddad agora , todo o ideário,

não tem nada novo nesse sentido , todos eles são continuação daquele programa feito em São

Paulo , mas com menos coragem (risos) naquele momento tinha coragem (risos).

Henrique – Vamos dar um salto histórico ai, amos pular o Maluf e o Pitta, e em 2000

a Marta é eleita, ganha do Maluf você chegou a participar dessa campanha ?

Soró – Não, já tava fora do PT. Sai fora do PT em 93/94. Eu digo que fui salvo da

mediocridade, eu sai já com o questionamento que era o receio da questão ética.

Henrique - Isso em 94 ?

Soró - Em 92 eu já tava em crise. No primeiro ano do governo da Erundina, seis setes

meses, teve um encontro municipal, na Vila Madalena, fui eu e o Mario Bortoto, a gente ta lá

sentando esperando um pouco, o povo atrasado uma hora e pouco, um ato revolucionário

chegar atrasado (risos), ai chega os opalas oficiais, e descendo o povo que a gente conhecia do

cotidiano, do ralo, chinelo no pé, com paletó pastinha de coro, nada contra isso , mas deu um

choque assim de visão . Ai o Mario falou, você tentou imaginar essas pessoas assim que ate

ontem ano tinha salários estavam desempregadas, j=hoje tem cargos, sala com ar

condicionado, como vai ser difícil pra elas se reacostumarem depois, voltarem pro ponto zero

? Eu falei que isso bobagem Mario . Num deu outra. Muita gente não conseguiu voltar. Ai

você começa um movimento interno de grupo que é na verdade de se sustentar. E é

complicado por que se perde a coragem tudo fica mais negociado, ai começa a perder ai, as

pessoas já não são tão mais livres e originais. E o PT tinha ganhado outras prefeituras e o Zé

Dirceu assumiu, ele deu um basta nessa historia de partido de quadros e de massas, não tinha

mais nada de massas (risos).Ai ele começou a montar a maquina a estrutura, o pessoal que

trabalhava aqui i começou a ir pras outras prefeituras, no acre,não sei na onde, outras

administração porque tinham conhecimento e habilidade, mas também por que já faziam parte

de uma rede já, ai esse caras não saíram mais do poder. E naturalmente os grupos vão

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começando a construir pra se manter e não mais pra transformar. Ai começa azedar o caldo

ético e cultural que a gente tava vivendo. Ai eu já tava desencantando com isso, inclusive fiz

uma fala com o grupo aqui, tenho um dever para com vocês mas to saindo desencantado e

minhas angustias tem a ver com essas coisas. Claro os seres humanos tão la sujeitos a risco

né, não tenho duvida que há corrupção, muita gente acaba sucumbindo aos mecanismo

corruptos. Eu lembro que a quando eu era do partido, era da comissão de ética, lembro que a

gente caçava a filiação do sujeito só por falas machistas, saber que o sujeito foi grosseiro com

a mulher dele já era motivo pro sujeito ir pra comissão de ética. Esse rigor era necessário pra

manter os companheiros na linha não correr o risco, mas enfim faz parte do processo político.

Henrique – Ai falando em participação, 2002, 2003 a Marta começa a execução do

projeto CEU, você lembra como que foi ? E teve questão de participação ? E o que era aqui

nesse terreno ? (CEU PERUS)

Soró - Este terreno era um brejão, um dia ele já foi há muitos anos, década de 50 um

campo de futebol, mas nos anos 80 pra cá, era um brejão matão, meio que o lugar das

enchentes porque sempre enchia aqui.

Henrique- Os queixadas jogaram bola aqui ? Década de 50 ?

Soró- Jogaram muita bola. O gestor de CEU aqui é palmeirense, a gente gosta de

lembrar de uma batalha que teve aqui que foi o Portland e o Palmeiras oficial, e o Palmeiras

apanhou( risos) , a gente adora lembrar essa historia pra ele, Palmeirinha tomou um cacete

(risos)

Henrique - Dos queixadas (risos)

Soró – Então mas era um brejão Eu não tava aqui , tava no centro da cidade

trabalhando com pessoal de rua, mas sempre acompanhado o que acontecia aqui, e o pessoal

continuava sempre mobilizado em perus, isso e um dado interessante em Perus, você tem

muitos grupos e pessoas divergentes aqui, mas há uma sensibilidade pra compreender coisas

que são coletivas do bairro, e nisso sempre se juntaram.Então esse jeito de funcionar sempre

teve, e sempre muito intenso, tinha movimento contra o lixão, o pessoal sempre permanecia

mobilizado né . Ai a Marta ganhou, e um grupo daqui montou a subprefeitura. O Mario

Bortoto como subprefeito, e a equipe, então eles começaram a meio que governar o bairro em

torno das lutas todas, foi um ano de subprefeitura muito itens, participativo, e nesse período

começou a discussão em torno dos CEUs, como a gente já reivindicava um centro cultural há

muitos anos, rolou então essa coisa do CEU em Perus e começou o processo de participação

das pessoas a dizer como queria, que tipo de CEU queria. Os projetos foram bastante

discutidos antes deles virem pra construção. Mesmo em cada um tem características mudadas.

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Aqui numa das audiências, o modelo arquitetônico era de um teatro de arena.Tinha um povo

das comunidades do entorno, Ai a Marta venho ai e falando ah vocês vão ter um teatro de

arena , aquela coisa idílica (risos) . Ai uma senhora vira pra ela e fala, que a gente quer teatro

é uma certeza, mas a gente quer um teatro, teatro!!! Com cortina etc. Ai a Marta parou

pensou e falou você tem razão e mandou mudar o projeto ai construiu esse prédio que tem o

teatro. Então o processo de construção dos CEUs foram bastante participativos neste sentido ,

nos bairros que as pessoas participaram mais tem essas características, e em Perus houve

grande participação, esta impregnado, enfim. Ai participaram de todo o processo, e a escolha

do terreno tinha que haver um que coubesse algo desse tamanho, não tinha muitas áreas livres

que coubesse, ai foi escolhido essa área aqui, claro tiveram que fazer um trabalho de suporte

ai porque era mais baixo por conta das enchentes, mas foi escolhido aqui por conta do aspecto

histórico e por que era a área central. E o grupo do Mario que tava na discussão do plano

diretor regional naquele período junto com os movimentos, já tinham entabulado uma

concepção dos 3 eixos e do corredor cultural. Esse corredor cultural implicava daqui do CEU

seguindo o rio, a rua passando pela praça entrando na fabrica pelo túnel que era a entrada

original dos trabalhadores.Ai junto com a fabrica e a ferrovia perus Pirapora formava um

grande corredor cultural.O corredor previa vários desapropriações aqui no entorno que era pra

construir outros equipamentos culturais, mas como eles saíram da subprefeitura esse resto que

era pra ser feito não foi feito.Ai ate hoje não conseguiu dar essa características de um

território, que era abrir aqui e conectar com a praça,uma grande área aberta com vários

equipamentos culturais, chegaram a fazer a pista de skate, mas parou por ai porque esse

grupo por conta de brigas internas foi expulso da administração, e ai quando eles saem essa

ideia toda perde força ai não aconteceu. Então o CEU parou ai. Durante ainda o governo da

Marta, eu não tava aqui mas acompanhava muito porque vinha aqui, o pessoal que assumiu a

gestão, Maria Helena, o povo que assumiu a gestão, tinham a ver com os movimentos do

bairro, então eles garantiram durante o governos da Marta um CEU bastante intenso,

produtivo com as características que eram pra abrir pra população.Eu acompanhava de longe

e pensava o seguinte, era a favor que você tem que montar algo que quebre a lógica mórbida

periférica, ate brincava a gente lutou durante quase quinze, vinte anos pelo centro cultural e de

repente a gente ganha esse mega monstro (risos), pra alguns lugares isso foi tão espantoso,

que a falta de habilidade de quem estava na gestão com o entorno, transformou em elefante

branco, ou escola privilegiada, o CEU é sempre tido como uma puta escola pelos seus

recursos Mas enfim, eu achava o CEU muito correto como política publica, muito mais talvez

pelo aspecto cultural do que o educacional, porque numa ideia de mudança da sociedade a

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gente tem que reparar os direitos das pessoas, chegar com as condições, mas eu já tinha uma

concepção que era muito mais alem disso, as pessoas não tinham boa escola não iam no

teatro, não era só por que não tinham acesso ou custava caro, nessa época trabalhando com

pessoas de rua já tinha descoberto que o repertório de universo imaginário das pessoas é

fundamental, então uma pessoa que nunca foi no teatro, ou qualquer outras manifestações

artísticas, não tem isso no seu cotidiano, não faz parte.Ele não vai por que aquilo não diz

muito respeito a ele. Não faz parte do cotidiano dele, ele também não estimula os filhos

porque não tem esse repertório. Então pra mim é necessário investir em cultura, porque ela

potencializa o universo imaginário das pessoas, enriquece. Tanto é que acho que a gente tem

um fenômeno grave hoje, que é conseguimos tirar grande parte da população de um estado de

miséria econômica, garantindo emprego, estabilidade, renda, mas temos uma grande parte

dessas pessoas hoje compondo movimentos fascistas. Imediatamente compondo com

preconceito, discriminação. Ele saiu ontem da favela e ta nisso, então o que é isso. É falta de

projeto ético, ideológico e cultural. Então o que a gente viu nesses anos todos de governos de

esquerda, esta compreensão diria errônea, ou limitada da questão da cultura e dos efeitos que

a miséria produz nas pessoas. Não é só a fome, é o que isso tira da sua capacidade de pensar,

de compreender, então retirar da miséria não é só garantir comida, mas também chegar com o

aprouche de outras coisas. Tanto é que a educação não melhorou de qualidade, a despeito de

temos todo mundo na escola , mas a educação piorou sua qualidade enquanto papel

formador. E a cultura sempre foi relegada a um canto dos governos, então é um tiro no pé.

Tanto é que ta correndo agora o risco de perder a eleição, ou correu um grande risco. As

pessoas que tão com ódio hoje, grande parte delas foram as pessoas beneficiadas, com

universidade com não sei o que, mas como não houve politização o sujeito não sabe de onde

venho, e ele se sente no direito de não ter responsabilidade com essa historia, com essa

construção. Então é meio que assim foi deus que deu emprego, não cara !!, foi uma escolha

política a outra escolha política desempregava. Não ouve politização, e esse papel é da

educação e cultura, e nos governos de esquerda essas áreas são complicadas.

Henrique- Você falou do partido, tem até um certo desencanto com os partidos, o

próprio PT não tem mais essa historia de formação.

Soró – Com certeza, pra você ter um partido de quadros controlado, você precisa

quebrar essa historia e a formação é uma delas. A captação de militantes que era os núcleos

foi tudo cortado, ai você tem uma perda. Por exemplo quando eu voltei pra Perus, em 2002,

2003, conversei com os jovens envolvidos na cultura, ai conheci a molecada do Quilombaque

e achei muito curioso, por que eles eram pessoas bem informadas, compreendiam a realidade,

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tinham um posicionamento político de lugar no mundo, que eram negros, jovens, etc. E

perguntei vocês tem experiência partidária e eles falavam que não. Nenhum deles tinham.Isso

me chamou muita atenção, ai atribui isso a esse déficit, que criou um vácuo, que esses

militante com consciência, poucos nesse sentido, que não tinham passado nas escolas

tradicionais, muito jovens hoje que não contribuem pra construção partidária , que seria muito

importante pra vitalidade dos partidos, mas também não é uma preocupação dos partidos nem

do governo, isso se perdeu. Falando com absoluta convicção, o PT não tem mais militância ou

paixão, esse tecnicismo apesar de produzir ações transformadoras, ele não produz paixão e

não produz a linkagem entre você lutar, conquistar e defender a conquista, então não tem essa

paixão. Ai agora pouco sofreram sério abalo, correndo risco de perder a eleição, eles

continuavam perdidos, e o interessante que quem fez o PT reacender foi o povo de fora,

coletivos periféricos , a maioria deles não tem vinculação partidária, grande parte dos

intelectuais de hoje, uma sociedade mais esclarecida que vendo o risco resolveu reagir, e a

primeira reação foi chuchar (risos) o PT, e falar acorda, briga, se defende, a gente fica aqui

vendo vocês apanhado da Rede Globo todo dia, de tudo quanto é mutreta e vocês não

reagem, falam das conquistas e avanços mas não criam uma identidade com isso, então essa

pressão de fora fez o PT reagir, e é o que vai fazer a diferença na reeleição da Dilma, essa

capacidade de reação, de voltar a acreditar em política, ir pra rua de discutir, enfrentar os

argumentos do fascismo. O cara nem percebe o quanto ta sendo odioso e não percebe a

contradição que ele ta fazendo. E na campanha da Luiza Erundina esse ódio contra mulher e

nordestina era violento, muito mais que hoje a gente enfrentou isso com debate, coragem de

debater,convencendo as pessoas e hoje nesse momento os caras ficaram recuados não vão pra

rua, não defendem, e essa reação social de entorno ,que eu chamaria democrática republicana

.Eu não faço mais parte do PT, não votei no PT no primeiro turno, votei na Luciana genro,

mas nesse momento é um posicionamento republicano ou é isso ou é essa caralhada de força

escrota que fechou entorno do Aécio e que dá vida, argumentos pra esses caras que ficam

assassinando os outros na rua. E os coletivos que entregaram o documento na zona leste, tem

um posicionamento bem claro, ninguém que tava lá tava envolvido no partido ou na

campanha, mas vamos lá entregar esse documento meio que com um compromisso, um

posicionamento responsável, até mesmo coletivos apartidários tiveram a coragem de se

posicionar. Não é um gesto gratuito, custa caro enfrentar o debate interno nos coletivos,

eleitores do Aécio tem poucos, mas tem muitos anarquistas, gente que defende o voto nulo,

então nesse sentido entregamos o documento, mas dizendo olha estamos entrando numa

batalha, mas vamos cobrar.

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56

Henrique - Eu queria saber, você falou dessa questão da Marta aqui o CEU bem

aberto participativo, e quando o Serra foi pra prefeitura, esse período Serra/ Kassab e o CEU,

como ficou essa relação ?

Soró –Piora né, a educação tomou conta de vez, sempre foi um conflito complicado

entre educação, esporte e cultura no mesmo lugar e com critério que tem a ver com a

educação, o gestor só pode vir da educação, então é um equilíbrio delicado num lugar que

devia ser autônomo por excelência Na época o grande projeto era das subprefeituras com a

concepção de governos locais autônomos, e o CEU já foi desenhando nessa perspectiva de

organismo autônomo.Não tendo aquela relação de guarda chuva que as secretarias tem, por

exemplo o posto de saúde só fala com a secretaria de saúde, etc. Como o projeto das

subprefeituras não foi pra frente, porque implicaria em tirar poder das secretarias, redistribuir

recursos, porque falar de autonomia sem recursos ... Ai esse instrumento de governo local não

deu certo. Ai você tem o CEU, ele tem a gestão, mas a parte da educação se relaciona com a

secretaria de educação, a parte de cultura com a secretária de cultura, de esporte com a

secretária de esporte, então você não tem um integração local, dependendo do gestor e do

conjunto que se forma ali. Então o projeto dançou ai, antes mesmo de chegar o Serra/Kassab,

quando eles chegaram, sem projeto nenhum na educação, tanto faz isso pra eles, não fede nem

cheira, afundou o CEU, isto aqui ficava as moscas, instrumentos abandonados, poucas

atividades. Então , eles só agudizam um processo que já no final do governo da Marta já

estava complicado o modelo CEU, porque ele se afundava em próprias contradições dele.Não

respondia e com a chegada do Serra/ Kassab só piora. O engraçado disso é que no final do

governo da Marta e começo do Serra, tinha o Quilombaque, que se propunha a ser um local

de articulação, não era pra substituir o CEU, mas o que não acontecia aqui acontecia lá. Ai

quando se fecham de vez as portas do CEU a Quilombaque estava num momento de

vitalidade, então acabou tendo um pouco o papel que o CEU poderia ter cumprido, que era

ser um centro de referencia no bairro que articula a movimentação cultural. Vários grupos

reclamavam que não tinham espaço no CEU, e iam lá no Quilombaque pedindo espaço era

uma festa (risos) a gente comemorava. Não queríamos acabar com o CEU, mas eles ficavam

reféns das atitudes mais estranhas, nenhum grupo tinha garantido por exemplo que todo mês

num domingo estava garantido um espaço para que o grupo pudesse se planejar. Era uma

burocracia estranha. O sujeito ficava sempre inseguro, não dava pra se programar. Mas enfim,

forçou a Quilombaque a crescer e acolher isso, e manteve essa cena viva que o CEU poderia

ter feito. Os meninos eram bem rebeldes, mas eu quando entrei macaco velho em política,

falei calma a gente tem que aprender quando tem que dá grito, quando tem que conversar.

Page 59: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

57

Então todo gestor do CEU que entrava, todo subprefeito que aparecia , a gente ia fazer uma

visita oficial e apresentava o que a gente tava fazendo e nossa proposta pro bairro e chamava

parcerias se o cara quisesse bem. Quase nenhum quis, mas a gente fazia nosso papel de ir lá e

reconhecer o instrumento público, nunca deixamos de legitimar os caras como instrumento

público e ate dizer pro cara que ninguém era bobo neste sentido. E a Quilombaque tentava se

diferenciar do discurso, se diferenciado pelo fazer, mostrando que sempre era possível e isso

sempre foi um incomodo pro CEU. Mas esse conflito é bom pro CEU não morrer de vez . Eu

conheço alguns CEUS, alguns nem chegaram a ter vida, outros perderam essa vitalidade

virando elefantes brancos , e os CEUs do Kassab que eram uma aberração, lugares sem alma,

sem condição.

Henrique – Já nasceram mortos.

Soró – É . Tem um na Anhanguera por exemplo que não consegue engatar uma ideia,

uma concepção. Porque nasceu meio naquela concepção enfia um prédio lá e pronto. Aqui

nasceu de um desejo da população do entorno, dos movimentos organizados e isso faz

diferença no animo.

Henrique –Na participação.

Soró – Sim, sim.

Henrique – E é porque, quando você fala do gestor , ai eu lembro eu tava aqui no dia

da posse do gestor do Marcio, ele comentou de transformar o CEU numa Esquina da

Comunidade.

Soró - É que quando ele nasceu a concepção era essa, do CEU ser um a Esquina da

Comunidade, o local onde as pessoas se encontram, essa é a concepção originária do CEU e o

Marcio como participou dessa primeira concepção, ele tem muito isso e tinha isso

engasgado, porque era o nosso centro cultural que lutamos (risos) e você vê os caras

desgraçando o lugar, dilapidando uma concepção linda. Que vinha como uma ideia de lá, mas

se encontrava com uma desejo, uma ideia que a gente tinha aqui com um lugar de cultura e

educação, então ficar vendo os caras acabarem com isso é difícil. E ter a oportunidade de

mudar isso é bom .

Henrique – Me fala um pouco da universidade livre, interessante essa parceria, a USP

vindo aqui, essa parceria, CEU, USP, Universidade livre e o Movimento da Fábrica.

Soró- Tem dois núcleos aqui que são muito fortes, o povo ligado a educação e o povo

ligado a cultura, ai vai vendo, quando tem esse encontro com a Quilombaque, e

compreendendo a realidade local de que a Quilombaque vai ter que assumir o papel

responsável de puxar, revitalizar isso, inclusive os companheiros cansados, e nesse ponto

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outros coletivos chegaram e somaram, a gente meio que foi descobrindo os outros o que tava

acontecendo nas bordas periféricas.Neste momento nasce a ideia de formar uma rede,

chamada Rede Viva Periferia Viva! Porque a gente tava discutindo um dos maiores problemas

do processo cultural, a tal da sustentabilidade, não tem condição, não tem dinheiro, etc. É

interessante inventar do nada, mas tínhamos que discutir condições de sustentabilidade, e eu

chegava então com minha experiência e começava a discutir com eles estratégias de

sustentabilidade, de sustentabilidade pedagógica. Não adianta as vezes você ter alguma

experiência de banda, teatro, experiência artísticas, mas você ficar mal das pernas, acaba e

não tem serventia, e pra processo pedagógico é preciso que essas coisas tenham longevidade.

Os grupos acabavam muito rápido, as ideias afundavam, e o problema financeiro era grave.

Eu como discutia, a capacidade financeira , a tal da sustentabilidade, eu discutia com eles

como fazer. Eles faziam uma coisa, que é quase natural, tanto por ser pobre e pela

convivência, que é aquela coisa da colaboração, a gente sempre fez isso , festinha, não sei o

que, junta uma coisa daqui dali,e faz a coisa e eles tinham isso quase que naturalmente, vários

coletivos se juntavam pra produzir algumas coisas juntos, mas não era uma concepção. O que

a gente fez foi trabalhar isso como uma coisa intencional, se juntar como uma estratégia de

sobrevivência, por exemplo tinha elaboração de projetos pros os editais etc. A gente fazia um

exercício de cada grupo ver qual sua atuação, manifestação, mas vamos discutir em conjunto

as planilhas, o que era isso, neste projeto você coloca som, neste completador,etc.Mas nem

todos nos vamos pegar, mas se você concentra em um só você corre o risco de não pegar

nada. Então com isso a gente foi conseguindo, por exemplo ganhar o edital ali você não pode

mandar dinheiro pra outro, mas pode comprar equipamento que todos utilizam, e a molecada

gostou , dessa historia meio Robin Hood. Então isso pegou e virou um plano, ai um dia o

Ministério da Cultura ouviu falar dessas historias, Quilombaque, Fábrica etc. Apareceu um

secretario aqui do Ministério e conversando a gente apresentando as ideias ele falou se

poderíamos fazer um projeto sobre isso, nos falando sobre a arte e a cultura pra combater a

violência. Ele perguntou se seriamos capazes de fazer um plano, opa somos (risos). Mas

como eu digo adiantado pra não chocar, falei custa caro,não é brincadeira um plano

desse.Nem tínhamos ideia, mas em um mês conseguimos construir um plano de

desenvolvimento local, que tinha a arte e cultura como ferramenta fundamentais de

transformação e também de potencial financeiro de girar a economia local. E pensamos assim

se queremos discutir a arte na periferia, que não seja só um entretenimento, mas também uma

perspectiva artística, cultural, a gente tem que pensar em processos sólidos, então a arte e

cultura possibilitariam isso desde que a gente conseguisse construir um plano sustentável. E a

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ideia era fortalecer os coletivos, dotá-los de capacidade pra concorrer na nova lógica de

distribuição de recursos, que tem que ter legalidade, etc. E construir uma espécie de circuito,

porque até então naquela parte que eu chamo de cultura patrimonial pegou um vicio de dar

oficina pra pobre, mas não tinha uma perspectiva sólida, concreta, falar assim vamos investir

na arte como exercício, se o sujeito quiser virar um artista ,ter potencial pra isso vire, mas não

só ficava nesse estímulo inicial, oficina daqui oficina dali, mas sem perspectiva futura.E a

gente queria traçar isso, vamos desenvolver oficinas, mas esse sujeito que saia da oficina pra

onde ele vai o que ele vai fazer. Pensamos então o desenvolvimento local como um sistema.

Por exemplo, o Danilo me falou uma coisa dolorida. Que ajudou a pensar e impactar um

pouco isso ele dava oficina de grafite, e tem um moleque lá com tem umas condições

familiares ruins, violência etc. Mas o moleque se descobriu no grafite, no desenho, quer ficar

lá o tempo todo, desenha muito, enfim o moleque se descobriu, mas a oficina vai acabar e o

Danilo não sabe o que fazer com esse moleque. Que merda né! Uma porta de saída pro

moleque , uma porta de talento pra arte, mas fudida porque você não tem estrutura pra isso.

Ai a gente começou a pensar nisso em fortalecer os coletivos, criar um circuito sólido,

fortalecer os coletivos, os centros culturais, na época era os Cicas, a Quilombaque, o

Girandolá em Morato, o Mutirão Cultural na Quebrada em Osasco, e o Quintal Cultural em

Carapicuíba. Então a gente falou vamos criar um circuito e garantir que esses atores poetas

etc. possam circular nesses lugares, ai quando ele sai da oficina ele tem um circuito seguro de

experimentação, inserção e contato com o mundo, a partir de uma rede você tem essa

possibilidade. Já que a gente não tinha estrutura pra segurar um ator que se descobre uma

bolsa gente da uma bolsa pra esse cara continuar estudando, não ter que trabalhar por causa

da pressão familiar etc.Ai a gente criou estratégias pra minimizar isso, ai de fato gente tá

discutindo a arte e a cultura como alternativas de desenvolvimento, de perspectivas pra

juventude.

Henrique – Não como mero entretenimento.

Soró- Isso, não só aquela ideia de oficina pra preencher o tempo, e depois acaba com a

brincadeira porque tem que ir trabalhar, e cara você perde muito. Como to vivendo mais esses

anos intensamente com os coletivos culturais, não perco a capacidade de me espantar com

tanto talento que existe, as vezes eu fico muito impactado assim ,você descobre gente com

tanto talento, mas ai você vê esse sujeito tendo que se tornar um trabalhado braçal fudido.É

uma estrutura que mata a criatividade. Então a gente tem que pensar estruturas que

potencializassem , criando caminhos pra que ganhe força, ai nasce o plano nesse sentindo,.

Um aspecto complicado era os preconceitos com esses dualismos, periferia x centro, as

Page 62: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

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experiências com as universidades são trágicas, as ideias de que a universidade vem pesquisa,

chupa, leva e não devolve nada, varias experiência nesse sentido. Mas a gente tinha que

quebrar isso, não podia formar uma ideia de gueto. A cultura é a cultura da quebrada, isso não

vai levar a gente a lugar nenhum a não ser a um isolamento. A gente tem que cruzar os

conhecimentos a varias experiências porque isso ia enriquecer. Um dos problemas da miséria

é a falta de conhecimento. Ai a gente foi atrás, umas da primeiras conversas foi com a USP

leste. Mas eles não aguentaram, porque tem uma coisa complicada nessa relação com a

universidade, uma coisa vetorizada superior, tanto é que eles separavam conhecimento

popular e conhecimento acadêmico, eu falo não tem essa, conhecimento é conhecimento, o

que eles são ? são diferentes. A academia é um vetor de conhecimento, um vetor com um jeito

de organizar e estabelecer conhecimento. Mas ao longo dos anos isso acabou gerando um

vetor de valor, deixando os outros conhecimentos desvalorizados. E isso não é verdade as

pessoas aqui tem um grande conhecimento. E o desafio era impor isso, mas a universidade

não soube como lidar com isso, não saber que papel assumir quando você não tem mais isso

de chegou a salvação (risos). Quando a gente começou a questionar queremos uma relação

que esses conhecimentos e capacidades daqui estejam integrados ,se não, não rola, uma

relação de domino não rola.Eles não deram conta de achar um lugar que não fosse esse de

salvador. Foram embora, chegamos a desenvolver um curso de capacitação cultural juntos,

mas foram embora.Um dia desses numa dessas causalidades que eu acho ótimo essas

causalidades, eu sempre falo assim a gente tem que ta na rua visível pra poder ter os

encontros, e numa dessa ai o Cica que tava enfrentando um despejo, traz o Euller Sanderville

da FAU que tava ajudando eles num projeto pra se defenderem. Ai trouxemos ele aqui no

Quilombaque, mas a gente tava vivendo um processo que tinha acabado de descobrir que um

povo da FAU trabalhando pra um escritório de arquitetura tinha desenhando o parque linear

aqui.

Henrique – Que desapropriava o Quilombaque ?

Soró- Isso, e a gente ajudou no projeto, mas ai depois descobrimos essa traição, que

nesse desenho a gente tinha o pescoço cortado, colocaram várias quadras lá onde é o

Quilombaque.Ai foi uma revolta generalizada , não só porque poderíamos o perder o lugar,

mas pela sacanagem, então falar que era arquiteto naquela época era risco de vida .Ai o

Juninho chegou com o Euller, falou que era da FAU, arquiteto (risos), o Dedê olhou pra ele e

falou assim, ah vocês são os filhos da puta que querem acabar com a gente aqui (risos). Ai o

Euller falou não faço parte disso, então você faz parte de cá. Ele tentou um tempo juntar,

promoveu um encontro com os escritório mas não rolou paixão mesmo, a traição ficou

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marcada. Ai o Euller caiu bem, ele falando de expectativas de montar a universidade, inserida,

de algumas experiências frustradas e tal a gente contou nossas histórias também, e nossa visão

de quanto era importante esse encontro de conhecimento pra enriquecer o território.E que as

questões que a gente levantava aqui precisavam de um momento de reflexão, de estudo.

Acabou-se criando então o projeto da universidade livre e colaborativa, que tem essa função e

intenção de ser um lugar que integra essa varias experiências e conhecimentos. E claro é

viabilizado porque a parceria com a FAU permite muitas coisas. Mas tem mais a ver com o

Euller e o LAB Cidade. Mas é uma proposta de experiência , e eu lembro que eu falava pro

Euller você ta disposto a apanhar ? Porque geralmente o pessoal não aguenta. Porque a gente

sabe o que quer a gente sabe o conhecimento que a gente tem, essa coisa de memória e

história a gente tem muito claro, então vocês não tão vindo salvar ninguém né. Mas o que

vocês tem, se juntar com o que a gente tem, consegue criar uma coisa muito interessante.

Mas é preciso desviciar vocês dessa mentalidade acadêmica, mesmo sendo libertário padece

dessa estrutura.E tem sido assim, uma parceria no sentido da gente ter personalidade, e umas

das questões pra dar errado também é quem ta recebendo a universidade não ter

personalidade, e nos temos. Então cada conversa, encontro, linha, vírgula da Universidade

Livre é resultado de muito debate, conflito, na própria aula o pau come. E o conflito é

desejado e bem vindo pra evitar que haja esse predomínio de uma coisa ou de outra. E na

própria metodologia de funcionamento isso ta garantido. As aulas sobre o território aqui elas

são dadas basicamente a partir dos pontos históricos importantes e das contribuições

importantes dos territórios. E são dadas pelos próprios agentes da historias, coletivos, escolas,

lugares, queixadas e as aulas andam.

Henrique - O CEU é só mais um lugar ?

Soró- Sim. Depois que o Marcio assumiu a gestão o CEU virou uma espécie de lugar

que a gente tem todas as condições. Mas ela continua circulando, tem aula em igrejas, casas,

escolas, na Quilombaque, na praça, enfim. Ela mantém esse espírito pra não permitir o

predomino de uma lógica funcional. E entendendo que o conhecimento, ele não é só um

pedaço do discurso, da retórica, ele é toda uma experiência. Porque isso vindo aqui as pessoas

participando de almoço comunitário, quebrando barro, aula na casa de não sei o que. Então a

ideia da Universidade é um aprendizado integral. Enriquecendo seu repertório afetivo

vivencial. Ai cada aula é diferente, não existe uma igual a outra.

Henrique- Não existe uma coisa programada.

Soró- Sim, e não chegamos ainda a viver o conflito em que a USP tenha medo e acaba

querendo meter a mão no processo. Por enquanto ele é solto livre, porque a gente não tem

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dependência das estruturas da USP. Então isso permite um pouco nossa autonomia nesse

funcionamento. Mas teremos conflitos ai nesses dois modelos ainda mais com a USP né

(risos). Historias com a USP não deram certo. Mas a gente tem mantido vivo e presente esse

conflitos todos, teóricos, as aulas tem alunos de graduação, pós - graduação, e que eu chamo

categoria acadêmica moradores (risos) , lideranças enfim. Tem mantido esse caldo, o projeto

tem ganhando respeitabilidade, já produziu enfrentamentos na cidade, construção de

territórios de cultura, uma outra abordagem clivando o plano diretor entrando com a questão

afetiva e cultura como elementos da cidade, não só a parte estrutural construtiva. Ela já

contribuiu muito e vai contribuir mais, agora no plano local, a gente vai participar dele, dia 22

vai ter discussão aqui, e já com um certo desenho do bairro, com o Movimento da Fábrica, e

tem essa ideia de Perus, dos três eixos. Um enfrentamento contra a especulação imobiliária

que com as rodovias vem com uma violência impressionante, e a gente precisa propor um

outro tipo de desenvolvimento, e nesse sentido a fabrica é um movimento principal e

fundamental nisso. E tem todo um território numa perspectiva de integração, tanto numa

possibilidade local, quanto num enfrentamento contra esse lógica da esquina de são Paulo que

é essa região, com o rodo anel etc. e os impactos que ela traz, deletérios.A gente acompanha

por exemplo valor de aluguel, imóveis tudo sobe.

Henrique – E o Movimento da Fábrica como que tá ? Com a aprovação do Plano

Diretor daqui como território cultural ? Isso passou ?

Soró – Passou. A gente entende esses instrumentais, essas regulações. Conseguimos

criar uma ideia de parque dos Queixadas no território que é da fábrica, um território cultural

que envolve Jaraguá,Anhanguera e Perus. É um mecanismo de proteção, a gente não tem a

fábrica por que continua privada , mas vamos criando movimentos entorno que vão

dificultando essa degradação, a possibilidade do cara vender etc. E o movimento recuperou

sua vitalidade, tem uma integração muito grande com os coletivos, as ações são até

autônomas do movimento, cada coletivo inventa sua ação. E todos tem claro que precisamos

conquistar a fábrica, ela é um elemento simbólico vital. E também com capacidade logística,

se a gente fazer lá o que a gente tá falando, ai essa briga pelo tipo de desenvolvimento fica

covarde, porque a gente chega com força. A parte institucional do movimento sentou com a

prefeitura, ta em elaboração a DUP (Declaração de Utilidade Pública). Há a preocupação de

fazer uma DUP que não corra riscos, a outra correu, ai conseguiram destombar grande parte.

Há uma preocupação legítima que se crie uma DUP que proteja e não crie buracos. Mas deve

sair agora, a eleição atrapalhou um pouco mas deve sair. E há uma conversa firmada com o

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Ministério da Cultura (MINC), com a Marta, que deu a proposta de que o Haddad faça a DUP

e o MINC paga a desapropriação através do PAC.

Henrique – E foi a Erundina que fez essa ligação com a Marta ?

Soró – Foi, foi interessante. Bem e nos não estamos criando algo novo, estamos dando

continuidade numa luta dos Queixadas. E claro há um reconhecimento no papel da Erundina.

Ai fomos procurar ela, não temos problemas em pedir pra alguém, mas ela falou vamos

conversar com o MINC. E a Marta tem uma características, aquela história do teatro, e numa

conversa rápida , ela tem essa característica, quando compreende e se empolga com uma coisa

é isso, é isso, esse lado teimoso dela é bom nisso. Há essa confiança na seriedade da promessa

dela. Mas claro ouvi noticias ai de que ela não tem uma relação legal no governo, e

provavelmente não ficará numa reeleição da Dilma. Mas tenho a confiança que dessa vez a

gente consegue, definitivamente dessa vez a gente faz a coisa por inteiro, desapropria,. Temos

todas as condições tanto de relações institucionais, quanto no bairro, as escolas, coletivos

envolvidos , é um momento muito forte que estamos vivendo, e isso dá essa convicção de que

vamos conseguir. Mas vamos ver né (risos) . Principalmente da parte do dinheiro que não é

barato desapropriar isso dali né. A gente sempre apostou que o Abdala estaria devendo

impostos , mas descobrimos que a empresa não ta devendo nada, mas há essa promessa do

MINC com o PAC. Vamos aguardar a conjuntura. Mas se não vier com dinheiro , essa

disposição de lutar ta muito forte agora e vai continuar, a gente não parou de fazer os processo

pedagógicos, de envolver as escolas e a população . A gente vê que o movimento é um ato

pedagógico. E estamos preparando agora um mega ato pra dezembro, artístico, cultural.E

entendo isso como um exercício do que a gente vai fazer lá dentro. Todos que participam tem

essa compreensão.Se for pago beleza, mas se não, tá crescendo a possibilidade da ocupação.

Henrique – Pra finalizar qual sua expectativa agora com o Haddad e o CEU ? Um

retorno da época da Marta de maior participação ?

Soró – Não, não. A leitura que tenho do CEU como um equipamento e uma ideia de

política pública, tem dois CEUS que eu acho muito representativos, o CEU Perus e o do

Jaçanã. Esse espírito de reduzir a segregação, o preconceito a descriminação, esse dois lugares

são ambiente acolhedores neste sentido. Aqui a entrada do Marcio rapidamente a população

sentiu isso. Nunca se produziu tanto e tem tanta participação de gente como nesses dois anos.

Mas é uma característica local e depende muito do gestor. Porque as secretarias e a estrutura

de governo não há uma linkagem. O CEU não tem autonomia, não produz programação, ele

fica dependendo do que sobra, não tem autonomia no sentido de construir um projeto local e

não vejo nesses últimos dois anos essa lógica de estrutura mudar. Aqui tem esse compromisso

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do Marcio com o movimento. Mas é aquilo, tem muita disputa pro lugar do Marcio, mais

pela visibilidade, status, do que pra trabalhar, o Marcio trabalha pra cacete, cada detalhe aqui

é uma briga, e ele tem disposição e a gente tem maior respeito pelo trabalho dele. Se não for o

Marcio ou alguém com esse compromisso a gente ta fora, vivemos oito anos sem o CEU e

fizemos. Mas claro que é um instrumento fundamental ser essa coisa da esquina e o Marcio

incorpora isso e faz acontecer mesmo. Eu brinco com ele, não é a subprefeitura o lugar do

bairro de discussão política , esse lugar tem sido o CEU, até o subprefeito venho aqui pedir

arrego (risos). Por que de fato toda discussão que tem no bairro ela tem um pé e passa por

aqui, transita aqui.

Henrique – Pra finalizar quer falar mais alguma coisa ?

Soró- Falar mais uma hora e meia (risos)

Henrique – Lembrei, fala um pouco da Agendes (Agencia de desenvolvimento

social).

Soró – Então na formação do plano cultural, a gente previa dois instrumentos: A rede

sua consolidação e a construção de uma agencia.E começou com um brincadeira, dos super

heróis coloridos.

Henrique – Power Ranges ?

Soró- Isso. Power Rangers (risos). Que era essa discussão ? A gente precisa construir

um instrumento de força. E a rede era isso. Ai elaboramos que era necessário construir uma

agencia de desenvolvimento social que ocuparia esse papel, que a gente já fazia de

sustentação institucional de capacidade de elaborar projeto que era uma defasagem dos

movimentos, e eu já trabalhava antes com um grupo chamado AGER. E a gente acabou

fomentando a Agendes e ela faz hoje esse papel de formação e capacitação.Mas tinha outro

lado dela como os Power Rangers, aquela coisa cada Ranger apanha mas quando eles se

juntam viram um robozão vão lá e ganham (risos). Essa parte então de construir um banco

comunitário, pra poder mexer com dinheiro. E o banco pode mexer com isso né, os projetos

não podem pegar dinheiro de um e dar pra outro. E incubar projetos também, por exemplo

alguns coletivos não tem regularidade ou nem querem ter, a agencia caba cumprindo esse

papel de fornecer regularidade jurídica. Esse é um lado de gerar recursos, fundos e capacidade

de ação logística integrada pra poder enfrentar. Quando a gente foi discutir Lei Rouanet a

gente defrontou com os grandes escritórios. Vai que um projeto emperra no MINC, questões

burocráticas, esse caras pegam um avião meia hora tão em Brasília, os coletivos as vezes não

tem um vale transporte pra ir na secretaria de cultura no centro. Então, a gente precisa ter

capacidade de operar pra enfrentar esse grupos, a Agendes nasce pra isso. Não opera ainda

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por não ter conseguido as condições pra montar isso, mas tem essa disposição, vontade, e

cumprindo um pouco esse papel de aríete de força de enfrentamento.Mas sempre essa coisa

colaborativa a gente só é forte juntos, todo o esforço é no sentido de construir entendimento e

construir entendimento não é apaziguamento, pelo contrario.É no conflito que a gente constrói

entendimentos sustentáveis. Então, a gente tem essa perspectiva de ser instrumento de força.

Henrique – Mais alguma coisa deseja pra encerrar ?

Soró – Olha, eu tava pensando nisso hoje, você me cutucou. Fiquei pensando em

como pode ser um desenho viável pro CEU, por que ele fica preso na própria lógica dele,

forma dele, e não se potencializa no que foi pensando nele como política pública, não

materializa aquilo que se esperava dele enquanto força dinâmica. Há que se pensar, acho que

os CEUs deveriam ser organismos autônomos, inclusive do ponto de vista orçamentário. Ai a

gestão integrada teria o papel de construir projetos próprios de características locais, de cada

região.Mas não tendo isso não cumpre esse papel. Mesmo a gestão Haddad, que eu respeito,

neste aspecto não oferece nenhuma esperança que vai mudar esse enquadramento.

Henrique – Eu não perguntei, alem da formação política você tem alguma formação

acadêmica ?

Soró - Eu sou quase teólogo, fiz dois anos de teologia, quase um cientista político

acadêmico, fiz dois anos de ciência política na Escola de Sociologia e Política, e tenho

tecnólogo de gestão em empreendimentos sociais.

Neste momento da conversa o Marcio gestor do CEU apareceu. E começamos a

conversar os três sobre a eleição. Assim encerramos o diálogo.

Henrique – Vou encerrar aqui então. Obrigado Soró pela participação.

Soró – Obrigado você.

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Entrevistado Marcio Antonio Melhado Bezerra – Gestor do CEU

Perus. Entrevista realizada em 31/10/2014 às 16 horas na sala da Gestão do

CEU Perus.

Henrique – Boa tarde Marcio gestor do CEU Perus, Pra começar primeiro eu queria

que você se apresentasse, quanto tempo você mora aqui em Perus, sua formação?

Marcio – Bem vamos lá, sou formado em geografia pela USP e depois eu fiz

pedagógica na Uni nove. Trabalho na rede municipal como professor e diretor. Como diretor

desde 2008 e como professor desde 1998. Moro em Perus já se vão uns 30 anos mais ou

menos isso e minha área de atuação sempre foi a educação.

Henrique - Você é de São Paulo mesmo?

Marcio - Não, sou caipirinha, sou do interior, de Borborema, que tá no noticiário ai

por causa daquele acidente com as crianças ontem41

. Uma cidadezinha de 15 mil habitantes.

Mas eu vim do interior pra São Paulo porque a cidade pequena não tinha ensino médio, quem

queria estudar tinha que ir pra São Paulo. Sou o irmão mais novo, meus irmãos mais velhos já

tinham vindo, ai eu vim pra cá em 74.

Henrique - E começou a morar em Perus?

Marcio – Não. Ai eu morei na Penha, na Vila Prudente, e vim pra cá, Perus depois

que eu casei.

Henrique- E quando você chegou aqui em Perus como você começou a conhecer a

questão da fabrica e da greve?

Marcio – Interessante isso, conhecer Perus a gente sempre conheceu, desde que eu era

criança que eu já sabia, na minha casa eu aprendi a ler lendo jornal, meu pai assinava Folha de

São Paulo algumas revistas, e eu me lembro muito da luta dos trabalhadores contra a poluição

do pó de cimento. Perus pra mim já era conhecido pela questão do pó de cimento.

Henrique - E isso saia no jornal?

Marcio – Saia no jornal chegava à informação lá no interior 400 km daqui. Eu vim pra

São Paulo por exemplo, eu comecei a trabalhar no bairro do Polvilho em Cajamar bem

próximo daqui , eu morava em Santana nessa época, e quando falava em Perus eu já tinha a

localização espacial, a localização histórica na minha cabeça do que era o bairro, quando

cheguei aqui já tinha uma noção do que ia encontrar.

41

Sobre o acidente: http://g1.globo.com/sp/bauru-marilia/noticia/2014/10/onibus-com-adolescentes-teve-lateral-

arrancada-em-acidente-com-10-mortos.html Acesso em 02/11/2014 às 17:28.

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Henrique – Só por curiosidade, você falou da geografia, porque fez geografia?

Marcio – Ih cara essa historia é tão complicada, você tem tempo pra ouvir?

Henrique - Sim!

Marcio – Então vou te contar minha história cara. Eu fui pra educação sem querer,

antes de fazer geografia eu fiz biomedicina, terminei fiz alguns estágios e não arrumava

emprego, sempre estagio, eu queria trabalhar não como estagiário e não arruava nada. Ai

chegou um momento que eu falei não vou fazer mais nada, vou arrumar outra coisa. Ai uma

cunhada minha era diretora de escola ela chegou e falou assim, ela era diretora do Paulo

Prado. Ela falou Marcio lá no bairro do Polvinho em Cajamar tem uma professora lá que dá

aula e disse que não tem professor, vai lá, se não quer dar aula ? Eu nunca fiz isso na minha

vida. Ué você não tá sem trabalho, quem tá sem trabalho vai dar aula (risos). Falei vou lá ver

o que é isso. Na escola Tenente Marques, uma diretora muito boa dona Lúcia, hoje ela é

secretaria da educação em Cajamar. Ela falou tem aula de tudo aqui, realmente não tinha

professor, ai ela falou você fez o que? Eu fiz biomedicina. Então você pode dar aula de

biologia, peguei, mas têm as de física, matemática e química, eu nunca dei aula disso nem sei

o que é isso. Eu te dou uns livros você estuda e vai dar aula pro ensino médio. Eu falei ah

então tá bom, naquela época a gente preparava aula (risos) hoje não sei se o professor tem

tempo pra preparar aula, chegava no fim de semana eu estudava pra dar aula sem ter

formação. Cara descobri o que eu queria, é ser professor só que eu não tinha licenciatura, fui

fazer. E na época eu já tinha essas ligações políticas e comecei a despertar mais pelas leituras

de geografia. Falei bom já que eu vou fazer uma licenciatura vou fazer biologia. O cara falou

vai na PUC que o cara aceita seu diploma. Ai comecei a fazer física na PUC, fiz uns dois anos

e meio, mas ai falei não é isso que eu quero não. Ai sempre fazendo leitura de humanas, lendo

um monte de coisa, falei cara vou fazer história ou geografia, vou fazer geografia, foi uma

opção do nada, vai fazendo leituras, pô isso daí deve ser legal. Ai fiz o vestibular, passei na

USP, e cara é isso to aqui. E por coincidência eu peguei uma época da geografia lá na USP

onde eu fui aluno do Milton Santos, do Aziz, da Maria Helena Simmielli, da Odette Seabra,

só fera, falei cara como eu não tinha despertado pra isso. Assim despertei pra duas coisas ao

mesmo tempo a geografia e a educação. Fui aluno da Nídia, a gente começou a fazer muito

estudo de meio, eu falei fiquei tanto tempo sem fazer o que queria, ai comecei a dar aula

porque não tinha o que fazer, ai comecei a dar aula no Polvilho, ai fui fazer a minha formação

em geografia, depois em pedagogia, ai já tinha claro pra mim o que era. Então eu passei pelas

três, humanas, biológicas e exatas. Mas o despertar da geografia venho pelas leituras, pela

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universidade, e a educação foi sem querer , foi entrar numa escola e gente do céu é isso que

eu tinha que fazer, foi uma história complicada (risos).

Henrique – Foi uma historia diferente da minha, que já sai do ensino médio querendo

fazer geografia. E quando você entrou na prefeitura dando aula?

Marcio – Eu comecei a dar aula no estado em 84. Fiz concurso passei no estado fiquei

efetivo um tempão. Depois comecei a dar aula em escolas particulares e no estado na época

não queria prefeitura por que o salário era mais baixo que o estado. Fiz concurso da prefeitura

não assumi, depois fiz outro concurso da prefeitura em 98, ai assumi na prefeitura exonerei no

estado. Então to na prefeitura desde 98.

Henrique – Antes de começar a falar do CEU, eu queria falar da gestão da Erundina,

por que você lembra da gestão dela de 89 a 92 ? Porque acho que é interessante pra Perus né?!

Pelo tombamento da fábrica e a questão da vala comum de Perus, o que você lembra dessa

fase da Erundina? E a questão da educação também, que o Paulo Freire era o secretário nessa

época.

Marcio – Só lembrando Erundina teve, secretário da educação era Paulo Freire, da

cultura Marilena Chauí, só por ai não precisa falar nada. Paul Singer também acho que era

secretário de planejamento

Henrique- Adaílsa Sposati, Ermínia Maricato.

Marcio – Isso, e na época da Erundina eu me lembro de coisas legais, eu trabalhava

no Polvilho já morava em São Paulo, mas militava politicamente no PT no Polvilho. Me

lembro da fábrica que acabou na questão de utilidade publica e depois a questão da vala

comum de Perus. E a questão da educação, que me marcou na época a questão da valorização

do professor. Eu me lembro que no estado eu ganhava quase o dobro da minha esposa que

trabalhava na prefeitura. E três anos depois ela ganhava o dobro que eu no estado (risos), pelo

tamanho da valorizaçao. Mas não foi só o salário foi todo um pensar diferente na educação.

Eu não estava na época dela na prefeitura na educação, mas acompanhei porque minha esposa

era prefeitura. E eu me lembro muito de uma palestra de Paulo Freire, quando eu me lembro

da valorização, ele falava que a escola tem que ter duas coisas tem que ser bonita e gostosa.

Ele não falava nestes termos, ele falava tem que ser uma gostosura e uma belezura, tinha todo

um jeito característico de falar. E eu sempre usei isso, na periferia a escola tem que ser bonita

tem que está limpa, tem que ter flor, ela tem que ta organizadinha, o aluno tem que gostar de

estar na escola, dessa forma vamos atrair os alunos e a gente consegue trabalhar. E na época

da Erundina começou a trabalhar dessa forma, ai depois venho catástrofe, venho Maluf venho

Pitta ai foi um caos.

Page 71: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

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Henrique- Ai pulando, tem essa fase o Suplicy acaba perdendo a eleição em 92 para o

Maluf. Ai tem Maluf e Pitta e em 2000 a Marta ganha do Maluf. Queria pegar esta parte da

formação dos CEUs do governo da Marta. Queria saber se você lembra da época aqui como

foi à formação do CEU Perus, participação, consulta popular, reuniões?

Marcio - Quando a Marta assumiu eu já era professor da rede, já trabalhava na

prefeitura, eu me lembro claramente naquela época não era subprefeito era administração

regional, na época era o Mario Bortoto você conhece. E um dia ele chegou e falou , tão

querendo construir um CEU em Perus, até então a gente não sabia qual seria a concepção do

CEU o que seria aquilo. Ai começamos a participar dos debates, ai a concepção é essa e tal.

Ai precisamos achar um lugar. Porque Perus era um dos primeiros, tanto é que esse CEU era

pra ser o primeiro a ser inaugurado, foi o Jambeiro esse foi o terceiro. Vamos procurar lugar

ai, e saiu todo mundo junto com ele. E esse terreno aqui tava abandonado, uma localização

primorosa né! Do lado da estação no centro próximo ao recanto, uma localização ideal, e tava

dentro do mapa da exclusão da Adailsa Sposati. Ai o local foi escolhido e começou o debate

de como seria esse CEU, e tivemos varias reuniões sim. Eu me lembro disso daqui crescendo

e a gente entrava o povo acompanhou, teve pessoal que acompanhou dia a dia a construção do

CEU, as obras desde o começo, porque era uma coisa nova uma coisa que a gente não tinha

ideia, nos da educação do PT a gente perguntava pó vai ser bom? E lembro que a folha de são

Paulo batia pesado, olha ta construído um escolão, mais um escolão.

Henrique – Na época tinha as escolas de lata né. Ai tinha toda a polêmica de não

retirar essas escolas.

Marcio - Tinha, ao invés de tirar lata vai construir escolão. Hoje ainda tenho dúvidas

se a Emei, Emef e CEI é adequado estar aqui dentro né? Mas pesando os prós e contras acho

que é. Desde que a Emei, CEI e Emef saibam qual a função deles aqui dentro, geralmente eles

não sabem, eles pensam que a concepção do CEU é voltada só pra eles. Por que depois da

época da Marta, isso daqui passou oito anos abandonado, isso daqui virou o que? Um

condomínio das três unidades. O teatro era prioridade das três unidades. Não podia vir outra

escola.

Henrique - Não era aberto pra comunidade?

Marcio – Não era aberto. E ano passado eu abri, se você for hoje no Emei, CEI e

Emef, eles vão me xingar pra cacete (risos) porque eu tirei privilégios que eram deles, eu tirei,

não, nos tiramos aí, porque eu não faço nada sozinho.

Henrique – Umas das críticas que o Jornal Estadão faz é que o aluno daqui seria a

“elite” porque os alunos do entorno não são atendidos também.

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70

Marcio – E a gente pensa justamente o inverso, todo este complexo cultural esportivo,

é pra todas as escolas do entorno. É isto que a gente faz hoje a gente abre pra todas. Uma

diretora daqui chegou a usar o seguinte termo numa reunião, por isso que eu falo porque foi

numa reunia aberta, “ - Pô vocês tão abrindo CEU desse jeito daqui a pouco o morro vai

descer pra cá” . Pô eu falei pra ela se o morro descer pra cá é isso que eu quero né! (risos).

Este complexo não é de vocês. O Gestor do CEU era um zelador de condomínio das três

unidades.E eles não perceberam ate hoje a dimensão do que é a concepção do CEU. Eu uso

um termo que eu ouvi num curso que eu fiz, lá atrás o arquiteto que planejou ele dizia que o

CEU tem que ser a esquina do bairro, o que é a esquina do bairro ? Onde os movimentos

sociais, a população, se encontram pra debater. Ao invés de debater no boteco, vem aqui no

CEU. Por exemplo, hoje a noite vai ter a reunião da fabrica do movimento da fabrica. De

manha teve na biblioteca o curso caminhos da UBS, na sala da UAB uma reunião do conselho

gestor de saúde Pirituba/ Perus e no teatro um evento DST/AIDS, é isso a Esquina do Bairro

todos os movimentos convergindo pra cá e ele sendo ponto de efervescência de todos os

movimentos populares. Mas voltando lá, a participação aqui em Perus, não sei os outros como

foi, mas aqui teve um grupo de moradores que acompanhou pari passou a construção do CEU,

o debate sobre a concepção do CEU. Teve um debate agora sobre a comemoração do CEU a

Marta falou, chegou pra mim uma maquete feita pela associação de construtores de obras. Oh

isso pode ser o CEU, nos analisamos aquilo lá e falamos não isso é um escolão. Depois venho

um pessoal da Edif., e de uma secretaria, tem um cara lá com uma concepção diferente e isso

foi apresentado para as pessoas. Quando ela fez o Ceci ela levou a mesma concepção para os

índios, o que vocês acham disso? Eles falaram não queremos piscina, mas queremos a

biblioteca, tanto é que o Ceci não tem piscina. Isto a marta contando, então a maquete foi

mostrada, uma concepção do que seria o CEU, e o Ceci também foi isso. Eu me lembro que a

primeira escolha de gestão do CEU foi feita também uma comissão eleitoral tirado de

moradores movimentos sociais, alunos, era um colégio eleitoral. Quem queria ser gestor se

candidatava, ai sai uma lista tríplice, esses três fizeram um curso na FIA e a secretaria da

educação escolheu dos três mais votados um. Eu participei dessa. Me lembro que eram três

candidatos, eu, a Suely e o professor Francisco. Dos 15 votos eu tive 14, a Suely 11 e o

Francisco 3. Mas a secretaria escolheu a Suely. Mas eu participei de todo o debate da

construção, vim na inauguração, foi um processo construtivo acredito eu.

Henrique – Ai em 2005 entra o Serra, depois ele sai e entra o Kassab. Ai esse período,

você falou rapidamente, mas o que acontece com o CEU neste período? Ele vira um escolão?

Page 73: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

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Marcio – Tem uma piada, não sei se é piada ou se é verídico. Dizem que o Serra

quando assumiu reuniu seus secretários e falou vou fechar os céus. Ai o pessoal saiu foi pros

bairros que tinha CEU, Serra é bom não fechar. Ai ele então não vou construir mais nenhum,

ai o pessoal saiu pros bairros voltou, Olha Serra é bom fazer (risos). Vou fazer mas vou fazer

mal feito.

Henrique – Foi o que ele fez (risos)

Marcio – Foi o que ele fez. E o CEU foi uma coisa tal impactante, pra periferia, que

eu achava que a Marta não perderia jamais a eleição. Na época tinha 21 CEUS construídos, a

Marta fez 21 teatros na periferia, 21 cinemas E não é qualquer teatro, é uma coisa de

qualidade uma coisa boa, 11 anos depois você desce lá, ele ta lá bonitinho. Não tinha como

perder essa eleição, mas eleição se perde nos detalhes (risos). E a população se apropriou

porque ela sabia na gestão Marta, eu acompanhava, frequentava o CEU direto, que toda sexta

e sábado a noite tinha um filme, que todo mês um sábado tinha uma peça de teatro. Criou um

hábito. Tem um rapaz aqui do lado o Mario que ele falava “ –E u sabia que toda sexta ou

sábado eu podia ir lá que tinha um filme, mas quando o Serra/ Kassab entrou acabou com

isso”. Isso daqui virou um condôminio fechado. Eu conto umas historias aqui e passo por

mentiroso cara, mas é verdade. No primeiro mês que entrei aqui, eu recebi uma denuncia de

uma pessoa do recanto dos humildes que tava lendo e foi expulso da biblioteca. Eu falei vem

cá me conta esta historia direito. Ele falou eu sou cassado e tenho filho pequeno, eu gosto de

ler, e o único lugar que eu consigo ler tranquilo é aqui na biblioteca, e nesse dia me tiraram da

biblioteca eu tava lendo, não sei por que falaram que eia ter um evento. Ai chamei à

bibliotecária e perguntei por que tiraram o rapaz da biblioteca? Ela falou que toda ultima sexta

feira do mês a natura faz uma exposição na biblioteca pra vender produtos!

Henrique- Apropriação privada do bem público!

Marcio – Isso. Era isso que acontecia isso daqui foi desmantelado. Tanto é que teve

uma inversão, quem começou a frequentar o CEU não era mais os moradores do Recanto,

eram moradores da Vila Nova Perus, moradores de Caieiras, com poder aquisitivo melhor

vamos dizer assim. Houve uma inversão, o CEU que foi feito para uma população passou a

ser utilizado por outra. Pôr exemplo teve uma peça aqui , acho que Mulheres Iradas, e eu tava

fazendo uma reforma na minha casa, falei pro pedreiro pô cara vai ter uma peça de teatro,

autor global peça legal porque você não vai lá ? “- A não tem que pagar”, não cara o CEU é

de graça, “ - A não o CEU não é pra gente”, como assim cara , eu vou te dar três ingressos pra

você, sua esposa e sua filha, na primeira fileira você vai lá. Ele venho agora é frequentador.

Teve um evento aqui logo no começo que a gente chegou aqui da fabrica de cimento, um

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morador chegou e falou “- Pô a gente não fica sabendo só fiquei sabendo por que faço

ginástica ai vi o evento aqui. Meu pai era queixada”. Então, porque essa desinformação que

passou no bairro era de propósito mesmo, pra não ter ninguém aqui, só vir os escolhidos.

Quando tinha evento aqui, vinha Toquinho, Gloria Menezes, quem tava na primeira fileira

eram as famílias ricas de Caieiras, famílias da Vila Nova Perus, das escolas particulares, você

não via as famílias da Candido Portinari, do Recanto dos Humildes, do Jair de Almeida. Foi

uma inversão total do principio norteador que o CEU foi criado, e desconstruir isso é difícil.

Henrique – E pegando isso que você ta falando, como você vê o Haddad, até pelo fato

dele ter participado no começo da gestão da Marta. Você acha que está retomando o projeto?

Marcio – O Haddad ele tem um olhar sobre o CEU, que eu acredito, muito legal. Na

primeira reunião ele disse o seguinte, o CEU tem que ser a menina de olhos dessa prefeitura,

O CEU tem que ser o lugar onde eles vão falar mudou, O PT ta ali mudou, não só o PT

porque nem todos os gestores são do PT, mas a administração do PT ta ali mudou a relação da

comunidade. Então vocês gestores tem que ter esta visão de que o CEU retome esta sua visão

original. È difícil, mas eu vejo que ele pessoalmente tem um olhar muito legal sobre o CEU.

Teve aqui o balé da cidade este mês a esposa dele Ana Estela venho aqui assistir. E sempre

que ele pode ele vai ele gosta dos céus. Mas política é política né cara!Nem sempre o que o

prefeito quer acontece aqui em baixo, muitas vezes a coisa se dispersa, mas ele, a pessoa

Fernando Haddad tem um olhar diferente pro CEU.

Henrique – E a questão do conselho gestor, tem uma participação ou ele ta meio

esvaziado?

Marcio- Teve um desencontro, e a culpa é da prefeitura, quando nos assumimos

praticamente não existia conselho gestor. Ele estava meio esvaziado. Cada CEU tinha um

vigência de conselho gestor, tinha CEU que no ano passado tinha que fazer eleição, outros

que ainda tinham dois anos. No nosso caso tinha que fazer ano passado. Chamaram a gene

pra uma reunião e falaram pra não fazer eleição por que sairia uma nova legislação, porque a

original ta ultrapassada. A lei não foi feita ainda, assim conseguimos eleger um conselho

gestor só no meio do ano, mas mesmo assim ele não é um conselho gestor participativo pleno,

mas isso daí é outra coisa que a gente retomar aos poucos a participação no conselho, as

pessoas tão retornando a participar agora do CEU, é uma coisa lenta, a gente quer que se

apresse, mas é lento, mas ta voltando a participação é uma coisa legal isso.

Henrique - Você falou da relação com a CEI Emei e Emef, e como é a relação com as

diferentes secretarias, educação, cultura e esporte? É difícil?

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Marcio – Difícil não vou dizer que é difícil, com as secretarias é uma relação mais

distante, mas a gente tem recebe coisas aqui do esporte, por exemplo, estas três caixas de som

foi à secretaria de esporte que mandou, porque o CEU não tem verba, a gente não tem

dinheiro pra comprar nada aqui, a secretaria de cultura com eventos uma parceria interessante

tal. E agora tamos tendo uma parceira legal com a Secretaria de direitos humanos, já tivemos

vários eventos aqui junto dessa secretaria que ta bem participativa. Vamos ter agora semana

que vem um festival de cinema, o entre todos que é muito interessante, todas as seções já

estão lotadas. É uma coisa que ta retornando a participação das escolas do entorno

interessante.

Henrique – Eu queria que você comentasse a perspectiva de futuro né! Você na

gestão e o retorno da comunidade, e também esta ligação com fabrica de saindo à

desapropriação, esta relação da fabrica com o CEU também.

Marcio – A gente tem uma motivação, eu não to aqui por que impuseram, eu to aqui

porque eu quero, por que eu gosto do que faço, e a minha motivação, as pessoas falam pó

você deve ter um salário legal pra ta ai né, eu sou diretor de escola se eu tivesse como diretor

na minha escola eu estaria ganhando mais do que pra aqui então a motivação pra ta como

gestor do CEU com certeza não é financeira, são outras coisas, que muita gente não entende o

que é isso, esta motivação ideológica, política, social. Quando eu vejo as pessoas saindo daqui

que fizeram alguma atividade falando pô Marcio que legal, pô valeu pra mim já pagou o mês.

Por exemplo quando a gente chegou aqui no ano passado a pista de skate tava detonada e a

gente não tinha dinheiro pra consertar. Ate recebi denuncia que tinha ferro solto, tava

perigosa. Falei quer saber d alguma coisa chama essa molecada. Esta pista é muito usada,

num mês fizemos uma medição passam por dia em torno de 100 a 200 crianças jovens e

adultos. Chama essa molecada pra conversar. Temos que fazer a reforma que reforma eles

querem que faça. E tem um menino ai campeão brasileiro de skate, o Feijão, que já foi pra

Barcelona, já foi pra Dinamarca. Falei coordena a molecada ai e vamos conversar. Ai nos

vimos que o problema era maior, alem da pista de skate tinha uma molecada que usava

bicicleta. Eles falaram porque a gente não faz uma pista de bicicleta do lado? Eu falei beleza

vamos fazer juntos porque sozinho eu não consigo. Fomos na diretoria regional, Olah tem que

reformar. Vai custar caro? Não, então a diretoria banca. Tinta, quem vai pintar? Chama o

coletivo de grafite de Perus, chama o Danilo chama o Bonga chama o Perusferia e vamos

fazer. O feijão coordenando tudo. No dia do Emicida aqui no teatro nos fizemos à

inauguração da pista lá, todos os grupos de hip hop da região vieram tocar, cara a molecada

chorava, porque quem fez as reforma foram eles. Ai venho o pessoal da bicicleta e nossa

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pista? Bem vamos lá na diretoria, o que precisa. Precisa terra, se a sub prefeitura autorizar a

gente faz. A subprefeitura autorizou. Pegaram terra no rodo anel com o caminhão do deposito

aqui de baixo, e pronto fizeram a pista de bicicleta. Nos apenas intermediamos quem fez foi

eles. Isto pra mim já valeu a pena, um negocio assim indescritível. Quando eu cheguei aqui,

um negocio interessante rapaz, ai eu conto e passo por mentiroso rapaz. La na escola do

Recanto que eu sou diretor, lá tinha uma família Tenório, 5 crianças, toda serie tinha um

Tenorinho. Ai eu encontrei com eles perguntei por que vocês não vão no CEU? Ah tem que

fazer carteirinha. Eu vai lá e faz. Mas tem que tirar fotografia. Pô a mãe do menino não tem

dinheiro pra tirar pra um que dirá pra sete. Eu falei vai lá que eu dou um jeito. Eles vieram um

dia que eu não tava aqui, falaram a mesma coisa pra eles, tem que éter foto. Cara eles foram

pra casa eu acho que eles pegaram a única foto que eles tem da família, porque eles são

paupérrimos e recortaram a carinha de cada um. Este dia eu estava aqui, tava eu a Carol a

Elisangêla que trabalhava aqui, ai eles chegaram com aquela fotinha recortada de uma foto de

família, cara quase todo mundo chorou ai. Não, não o CEU não foi feito pra isso, a partir de

hoje precisa de foto vem aqui (mostrando o celular pra tirar foto), TUC!! , vai lá imprime põe

na carteirinha e vai embora. O pessoal da equipe antiga aqui dava pulo dessa altura porque

eles não queriam trabalhar, não queriam ninguém na piscina. Depois que nos fizemos isso

aumentou. Por final de semana fazíamos aqui 100 a 200 carteirinhas. Ai um dia eu cheguei,

tava a família Tenório dentro da piscina, eles pulavam ae diretor !!!! (risos) Isso daí já valeu a

pena, vou querer mais o que da vida (risos) pra isso que a gente ta aqui ,facilitador, cara eles

não podiam fazer carteirinha por causa de uma foto. Existia uma coisa dentro do CEU que

não pode, porque não pode , ah é uma ordem. Eu percebi isso um dia que eu cheguei num fim

de semana deixei o carro no estacionamento e tinha um casal lá no parquinho com duas

crianças brincando no parquinho. Daqui a pouco sobe alguém fala Marcio vai lá embaixo

porque ta tendo briga lá embaixo o pessoal ta bravo gritando. Cheguei o que ta acontecendo, o

guarda tirou a gente do parquinho, o que ele argumentou, ele falou que era ordem do novo

gestor ,eu falei caraça eu sou o novo gestão não dei essa ordem. Então os caras inventavam

ordens pra expulsar as pessoas daqui. Se você chegar aqui no CEU entrada com catracas,

tinha um portaozinho ali do lado eternamente fechado. Se conhece o SESC Pompeia, quando

você passa lá parece que ele t abraça e t leva pra dentro, é agradável é aberto. Você passa em

frente o CEU parece que tem uma mãozinha que te empurra,é catraca e segurança, nãoé isso ?

É uma repulsa. Eu falei deixa pelo menos o portãozinho aberto, eu subia o portaozinho aberto,

a ta bom seu Marcio. Chegava aqui olhava o portaozinho fechado, eu descia cara não falei pra

deixar o portão aberto, ah fechou seu Marcio, foi o vento, ou alguma criança que passou ai.

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Foi quase um mês pra conseguir deixar o portão aberto, não podia por que se ta aberto entra

gente, não podia entrar gente aqui. Ate hoje as diretoras acham que não podem, pra elas tem

que deixar o RG lá e falar aonde vai. Um dia tinha um casal namorando,sentados no

banquinho, que coisa mais bonita. Ai ta vendo tão namorando !!!! Se ta com inveja, pó o

pessoal não pode nem namorar (risos).

Henrique –È como se fosse uma praça né ?

Marcio – É uma praça. Eles não veem que isso daqui é um lugar que as pessoas tem

que passar, tem que se apropriar de tudo isso. Por exemplo quando eu cheguei aqui ano

passado tinha um grupo o Street Dance que vinha ensaiar, e o povo queria tirar, esses caras

vem aqui todo dia encher o saco, quase me convenceram a fechar o espaço pra essa moçada.

Ai conversando com eles fui entendendo a lógica deles, falei vamos abrir um espaço pra eles.

Esse ano eles ganharam um Festival Latino Americano ,essa chegaram da Alemanha semana

passada , levaram o nome do bairro, saíram daqui. Tem o Grupo Pandora que faz o “Relicário

de Concreto” começou aqui. Tem uma sala de xadrez ali em baixo, tem dois professores com

turma de xadrez, juntando os dois sabe quantos alunos eles tem? Dois. Por que nunca

ninguém divulgou que tem um curso de xadrez, e não é pra divulgar se não eles vão ter que

trabalhar.

Henrique – Vai vir mais de dois (risos)

Marcio – La tem quinze mesas cabe ali trinta né!!! Então cara é difícil, mas

justamente por que pé difícil que você me perguntou, que me move a querer continuar, se é

fácil não tem graça com embate que é legal. E a gente ta conseguindo, quando digo a gente ,

falo de todas as pessoas que participam, que não são da equipe e ajudam também. Por

exemplo a Quilombaque não vinha pra cá, hoje eles já participam já são parceiros. Outra

pergunta que você fez, quando o CEU foi concebido, conversando com o Alexandre o

arquiteto que fez o CEU, ele falou olha, o que nos pensamos do CEU vai desde o rio passando

pelo CEU chegando ate a fabrica de cimento, então na concepção inicial do CEU a fabrica

fazia parte. Formando uma passarela cultural, passando pela escola de samba, o Quilombaque

não tava ali mas depois se integrou, chegando a fabrica de cimento. Então já se falava

originalmente no projeto esta interligação com a fabrica de cimento.

Henrique – Interessante, e pra encerrar, obrigado, você deseja falar mais alguma coisa

?

Marcio – Não ,assim obrigado o que cara, acho que a gente ta aqui pra isso mesmo. O

que eu queria falar é que o desafio é grande. Mas a gente tem respaldo na Diretoria de Ensino

com o diretor regional, na SME com o prefeito. O que eles querem, e o prefeito quer é que

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isso daqui se abra. Uma coisa que parou aqui também que tinha de dois em dois meses era o

CEU é Show. Isso acabou. O que a gente quer e a orientação do prefeito é que se vem alguém

famoso as manifestações locais tem que ta presente. Por exemplo quando venho o Edi Rock

aqui quem abriu o show foi um grupo local o Cartel Central. E depois disso daí quando venho

o Emicida, os grupos locais se apresentaram em um palco aqui fora. Então é formar aquilo

uma concepção do Território CEU. Fazer com que o CEU seja um núcleo de todas estas

territorialidades, todas estas instituições que estão em torno do CEU, trazer isto pra cá. O

CEU não tem que ser preponente, tem que ser participe de fomentar pra que as coisas

aconteçam. Então o Jongo que acontece toda terça feira na praça a gente ta participando.

Agora no novembro negro toda terça feira o Jongo vai ser aqui dentro ali no pátio central. È

esta interligação, as pessoas daqui usando o CEU, que ficaram oito anos sem. Eu fico muito

feliz de ta participando de um movimento que tá devolvendo o CEU pra quem deva realmente

usar. Quando eu tomei posse aqui, o secretario orientou pra que a gente fizesse uma posse

simbólica. Aquilo lá me marcou muito, porque nos chamamos no dia pra fazer uma palestra o

Dom Angélico, você conhece ?

Henrique – Eu estava aqui.

Marcio – Então foi muito legal e ele me falou uma frase que me marcou muito.

Marcio você tem que ser o gestor do povo !!! Ele é muito enfático, falando Marcio você tem

que ser o gestor do povo. Pô aquilo lá me marcou. Pô tenho que ser igual o Mujica do

Uruguai (risos). Aquilo dali (apontando um papel na parede com uma frase de Paulo Freire)

todo lugar que eu vou eu ponho : “è fundamental diminuir a distância entre o que se diz e o

que se faz, de tal forma que em um dado momento sua fala seja sua pratica” . Por que eu

coloco isso, porque todo dia eu chego aqui leio e me cobro, ó companheirinho Marcio, o que

você fala você ta fazendo ? Na sala de aula, na escola, è fácil falar em democracia , agora

você exercer democracia, você reunir o conselho gestor, você como gestor e perder a votação

e implantar aquilo que eles decidiram que não é a sua vontade, pra algumas pessoas isto é o

fim,. Mas se eu prego a democracia eu tenho que exercer a democracia, então eu deixo aquela

frase ali e levo ela pra todo lugar que vou e me cobro todo dia, todo lugar que vou eu levo esta

frase.

Assim se encerrou a entrevista, pois o Gestor Marcio precisava atender uma

pessoa com problemas trabalhistas com a empresa terceirizada da limpeza.

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Anexo 2 - Mapa indicando os 45 CEUs por Diretoria de Ensino.

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Anexo 2 - Endereços das 45 Unidades dos Centro Educacionais Unificados :

1- CEU ÁGUA AZUL (inaugurado em 20/10/2007)

Email: [email protected]

Endereço: Avenida dos Metalúrgicos, 1262

Bairro: COHAB Cidade Tiradentes

CEP: 08471-000

Fones: (11) 2016-4476 (gestão) / 2016-4479

Diretoria Regional de Educação – Guaianases

2- CEU ALTO ALEGRE (inaugurado em 29/11/2008)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Bento Guelfi, s/n

Bairro: Jardim Laranjeira - Iguatemi

CEP: 08381-001

Fones: (11) 2075-1000 (gestão) / 2075-1012

Diretoria Regional de Educação – São Mateus

3- CEU ALVARENGA (inaugurado em 09/12/2003)

E-mail: [email protected]

Endereço: Estrada do Alvarenga, 3752

Bairro: Balneário São Francisco - Pedreira

CEP: 04474-340

Fones: (11) 5672-2544 (gestão) / 5672-2541 / 5672-2542

Diretoria Regional de Educação – Santo Amaro

4- CEU ARICANDUVA – Professora Irene Galvão de Souza

(inaugurado em 07/09/2003)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Olga Fadel Abarca, s/nº

Bairro: Vila Aricanduva

CEP: 03527-000

Fones: (11) 2723-7549 (gestão) / 2723-7543 / 2723-7557

Diretoria Regional de Educação – Itaquera

5- CEU AZUL DA COR DO MAR (inaugurado em 27/10/2007)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Ernesto de Souza Cruz, 2171

Page 81: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

79

Bairro: Cidade Antonio Estevão de Carvalho

CEP: 08225-380

Fones: (11) 3397-9000 / 3397-9014

Diretoria Regional de Educação – Itaquera

6- CEU BUTANTÃ - Professora Elizabeth Gaspar Tunala

(inaugurado em 27/09/2003)

E-mail: [email protected]

Endereço: Av. Engenheiro Heitor Antônio Eiras Garcia 1.870

Bairro: Jardim Esmeralda

CEP: 05588-001

Fones: (11) 3732-4551 / 3732-4557

Diretoria Regional de Educação – Butantã

7- CEU CAMINHO DO MAR – Profª Dulce Salles Cunha Braga

(inaugurado em 12/10/2008)

E-mail: [email protected]

Endereço: Av. Engenheiro Armando de Arruda Pereira, 5.241

Bairro: Jabaquara

CEP: 04325-001

Fones: (11) 3396-5544 / 3396-5540

Diretoria Regional de Educação – Santo Amaro

8- CEU CAMPO LIMPO – Cardeal Dom Agnelo Rossi

(inaugurado em 17/04/2004)

E-mail: [email protected]

Endereço: Av. Carlos Lacerda, 678

Bairro: Pirajussara

CEP: 05789-000

Fones: (11) 5843-4801 / 5843-4838 / 5843-4837

Diretoria Regional de Educação - Campo Limpo

9- CEU CANTOS DO AMANHECER (inaugurado em 22/06/2008)

E-mail: [email protected]

Endereço: Av. Cantos do Amanhecer, s/nº

Bairro: Jardim Eledy

CEP: 05856-020

Fones: (11) 3397-9720 (gestão) / 9729 / 9732

Page 82: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

80

Diretoria Regional de Educação - Campo Limpo

10- CEU CAPÃO REDONDO - Prof. Dr. Celso Seixas Ribeiro Bastos

(inaugurado em 14/12/2008)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Daniel Gran, s/nº

Bairro: Capão Redondo

CEP: 05867-380

Fones: (11) 5873-8067 / 5873-8093 / 5873-8090

Diretoria Regional de Educação – Campo Limpo

11- CEU CASA BLANCA – Professor Sólon Borges dos Reis

(inaugurado em 27/06/2004)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua João Damaceno, s/nº

Bairro: Vila das Belezas

CEP: 05841-160

Fones: (11) 5519-5201 (gestão) 5519-5212 / 5519-5206 / 5519-5208

Diretoria Regional de Educação - Campo Limpo

12- CEU CIDADE DUTRA - Dr. Adib Salomão

(inaugurado em 30/08/2003)

E-mail: [email protected]

Endereço: Avenida Interlagos, 7.350

Bairro: Interlagos

CEP: 04777-000

Fones: (11) 5668-1955 / 5668-1954 / 5668-1952

Diretoria Regional de Educação – Capela do Socorro

13- CEU FEITIÇO DA VILA – Deputado Professor José Freitas Nobre

(inaugurado em 07/06/2008)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Feitiço da Vila, s/nº

Bairro: Chácara Santa Clara – Capão Redondo

CEP: 05879-000

Fones: (11) 3397-6550 (gestão) / 3397-6559

Diretoria Regional de Educação - Campo Limpo

14- CEU FORMOSA

Page 83: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

81

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Sargento Claudiner Evaristo Dias, s/n

Bairro: Parque Santo Antônio - Vila Formosa

CEP: 03385-150

Fones: (11) 2216-4622

Diretoria Regional de Educação – Itaquera

15- CEU GUARAPIRANGA - Florinda Lotaif Schahin

(inaugurado em 24/05/2008)

E-mail: [email protected]

Endereço: Estrada da Baronesa, 1.120

Bairro: Jardim Ângela

CEP: 04919-000

Fones: (11) 3397-9550 / 3397-9571

Diretoria Regional de Educação - Campo Limpo

16- CEU INÁCIO MONTEIRO (inaugurado em 21/11/2003)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Barão Barroso do Amazonas, s/nº

Bairro: COHAB Inácio Monteiro

CEP: 08472-721

Fones: (11) 2518-9048 / 2518-9043

Diretoria Regional de Educação – Guaianases

17- CEU JAÇANÃ (inaugurado em 06/10/2007)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Antonio Cezar Neto, 105

Bairro: Jardim Guapira

CEP: 02274-100

Fones: (11) 3397-3979 (gestão) / 3958 / 3975

Diretoria Regional de Educação – Jaçanã/Tremembé

18- CEU JAGUARÉ - Professor Henrique Gamba

(inaugurado em 28/11/2009)

E-mail: [email protected]

Endereço: Avenida Kenkiti Simomoto, 80

Bairro: Jaguaré

CEP: 05347-010

Page 84: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

82

Fones: (11) 3719- 2250 / 2343

Diretoria Regional de Educação – Pirituba

19- CEU JAMBEIRO (inaugurado em 01/08/2003)

E-mail: [email protected]

Endereço: Av. Flores do Jambeiro s/nº

Bairro: Jardim Moreno

CEP: 08430-810

Fones: (11) 2960-2055 / 2960-2057 / 2960-2059 (fax)

Diretoria Regional de Educação – Guaianases

20- CEU JARDIM PAULISTANO - Professor Samuel Murgel Branco

(inaugurado em 15/06/2008)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Aparecida do Taboado, s/nº

Bairro: Jardim Paulistano - Brasilândia

CEP: 02814-000

Fones: (11) 3397-5410 (gestão)

Diretoria Regional de Educação – Freguesia do Ó / Brasilândia

21- CEU LAJEADO (inaugurado em 17/05/2008)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Manuel da Mota Coutinho, 293

Bairro: Lajeado

CEP: 08451-420

Fones: (11) 3397-6950 (gestão) / 6948 / 6954

Diretoria Regional de Educação – Guaianases

22- CEU MENINOS - Professor Pr. Artur Alberto de Mota Gonçalves

(inaugurado em 28/10/2003)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Barbinos, s/nº

Bairro: São João Clímaco

CEP: 04240-110

Fones: (11) 2945-2560 / 2559 / 2558

Diretoria Regional de Educação – Ipiranga

23- CEU NAVEGANTES – Professor José Everardo Rodrigues Cosme

(inaugurado em 12/12/2003)

Page 85: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

83

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Maria Moassab Barbour, s/nº

Bairro: Parque Residencial Cocaia

CEP: 04849-330

Fones: (11) 5976-5527 / 5976-5531

Diretoria Regional de Educação – Capela do Socorro

24- CEU PARAISÓPOLIS (inaugurado em 13/12/2008)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Doutor José Augusto Souza e Silva, s/nº

Bairro: Jardim Parque Morumbi

CEP: 05712-040

Fones: (11) 3501-5660 / 5666

Diretoria Regional de Educação – Campo Limpo

25- CEU PARELHEIROS (inaugurado em 06/12/2008)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua José Pedro de Borba, 20

Bairro: Jardim Novo Parelheiros

CEP: 04890-090

Fones: (11) 5921-4479

Diretoria Regional de Educação – Capela do Socorro

26- CEU PARQUE ANHANGUERA (inaugurado em 20/12/2008)

E-mail: [email protected]

Endereço: Pedro José de Lima, s/nº

Bairro: Jardim Anhanguera

CEP: 05267-174

Fones: (11) 3911-5274

Diretoria Regional de Educação – Pirituba

27- CEU PARQUE BRISTOL - (inaugurado em 21/03/2009)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Professor Arthur Primavesi, s/nº

Bairro: Parque Bristol

CEP: 04177-070

Fones: (11) 2334-1405

Diretoria Regional de Educação – Ipiranga

Page 86: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

84

28- CEU PARQUE SÃO CARLOS (inaugurado em 03/12/2003)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Clarear, 141

Bairro: Jardim São Carlos

CEP: 08062-590

Fones: (11) 2045-4250 / 4248

Diretoria Regional de Educação – São Miguel Paulista

29- CEU PARQUE VEREDAS - João Antônio da Silva

(inaugurado em 15/09/2003)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Daniel Muller, 347

Bairro: Chácara Dona Olívia

CEP: 08141-290

Fones: (11) 2563-6247 / 2563-6248 / 2563-6210 (fax)

Diretoria Regional de Educação – São Miguel Paulista

30- CEU PAZ (inaugurado em 15/05/2004)

E-mail: [email protected]

Endereço: Daniel Cerri, 1549

Bairro: Jardim Paraná

CEP: 02876-170

Fones: (11) 3986-3404 / 3986-3405 / 3986-3407

Diretoria Regional de Educação – Freguesia do Ó / Brasilândia

31- CEU PÊRA MARMELO (inaugurado em 13/11/2003)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Pêra Marmelo, 226

Bairro: Jardim Santa Lucrecia

CEP: 05185-420

Fones: (11) 3948-3967 / 3948-3964 / 3948-3956

Diretoria Regional de Educação – Pirituba

32- CEU PERUS (inaugurado em 25/08/2003)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Bernardo José de Lorena, s/nº

Bairro: Vila Malvina

CEP: 05203-200

Page 87: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

85

Fones: (11) 3915-8745 / 3915-8752 / 3915-8753

Diretoria Regional de Educação – Pirituba

33- CEU QUINTA DO SOL (inaugurado em 19/04/2008)

E-mail: [email protected]

Endereço: Avenida Luiz Imparato, 564

Bairro: Cangaíba

CEP: 03819-160

Fones: (11) 3396-3430 / 3433

Diretoria Regional de Educação – Penha

34- CEU ROSA DA CHINA (inaugurado em 10/08/2003)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Clara Petrela, s/nº

Bairro: Jardim São Roberto

CEP: 03978-500

Fones: (11) 2701- 2300/ 2357/ 2701-2311

Diretoria Regional de Educação – São Mateus

35- CEU SÃO MATEUS (inaugurado em 08/11/2003)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Curumatim, 201

Bairro: Parque Boa Esperança

CEP: 08341-240

Fone: (11) 2732-8139 / 2732-8158 / 2732-8154

Diretoria Regional de Educação – São Mateus

36- CEU SÃO RAFAEL (inaugurado em 28/03/2004)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Cinira Polônio, 100

Bairro: Jardim Rio Claro

CEP: 08395-320

Fones: (11) 2752-1001 / 2752-1006 / 2752-1064

Diretoria Regional de Educação – São Mateus

37- CEU SAPOPEMBA (inaugurado em 28/06/2008)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Manuel Quirino de Mattos, s/nº -

Bairro: Jardim Sapopemba

Page 88: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

86

CEP: 03969-000

Fones: (11) 2075-9100 / 9110 / 9111

Diretoria Regional de Educação – São Miguel Paulista

38- CEU TIQUATIRA (inaugurado em 15/11/2008)

E-mail: [email protected]

Endereço: Avenida Condessa Elizabeth Robiano com a Rua Kampala, 270

Bairro: Penha

CEP: 03704-015

Fones: (11) 2227-0516

Diretoria Regional de Educação – Penha

39- CEU TRÊS LAGOS (inaugurado em 12/12/2003)

E-mail: [email protected]

Endereço: Estrada do Barro Branco, s/nº

Bairro: Barro Branco

CEP: 04852-320

Fones: (11) 5976-5642 / 5976-5643 / 5976-5644

Diretoria Regional de Educação – Capela do Socorro

40- CEU TRÊS PONTES - Profª Nilzete Letícia Bispo dos Santos Lima

(inaugurado em 31/08/2008)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Capachós, s/nº

Bairro: Jardim Célia

CEP: 08191-330

Fones: (11) 3397-6410 (gestão) / 6420 / 6421

Diretoria Regional de Educação – São Miguel Paulista

41- CEU UIRAPURU

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Nazir Miguel, s/nº

Bairro: Jardim João XXIII

CEP: 05569-010

Fones: (11) 3782-3143

Diretoria Regional de Educação – Butantã

42- CEU VILA ATLÂNTICA – Professor João Soares Filho

(inaugurado em 12/10/2003)

Page 89: O Centro Educaciona Unificado como um fator de centralidade da periferia

87

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Coronel José Venâncio Dias, 840

Bairro: Jaraguá

CEP: 05160-030

Fones: (11) 3901-8743 / 3901-8744 / 3901-8746

Diretoria Regional de Educação – Pirituba

43- CEU VILA CURUÇÁ - Irene Ramalho

(inaugurado em 28/11/2003)

E-mail: [email protected]

Endereço: Av. Marechal Tito 3.400

Bairro: Jardim Miragaia

CEP: 08115-000

Fone: (11) 2563-6146 / 2563-6150 / 2563-6151

Diretoria Regional de Educação – São Miguel Paulista

44- CEU VILA DO SOL (inaugurado em 31/05/2008)

E-mail: [email protected]

Endereço: Avenida dos Funcionários Públicos, 369

Bairro: Vila do Sol - Jardim Angela

CEP: 04962-000

Fones: (11) 3397-9800 / 3397-9811 / 3397-9868

Diretoria Regional de Educação - Campo Limpo

45- CEU VILA RUBI – Jornalista Alexandre Kadunc

(inaugurado em 29/09/2007)

E-mail: [email protected]

Endereço: Rua Domingos Tarroso, 101

Bairro: Vila Rubi - Grajaú

CEP: 04823-090

Fones: (11) 5661-6518 / 5662-6512

Diretoria Regional de Educação - Capela do Socorro