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5/11/2018 Claus Roxin - O domínio por organização como forma independente de autoria mediata - slidepdf.com
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Revista Eletrônica Acadêmica de Direito Law E-journal PANÓPTICA
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O domínio por organização como forma independente de autoria
mediata* **
O «domínio da vontade em virtude de aparatos organizados de poder» é considerado hoje um
dos principais temas do debate acerca da teoria jurídico-penal da autoria. Todos os manuais e
comentários tratam acerca disso, há várias dissertações mencionando a respeito e, apenas para
elucidar este exemplo, uma única «edição comemorativa» que me foi dedicada no último
mês
The domain by organization as a mediate independent authorship
Claus Roxin
I INTRODUÇÃO
NT1 contém quatro trabalhos sobre o tema do domínio por organização1. Esta figura jurídica foi desenvolvida por mim, pela primeira vez, no ano de 19632
* Aula inaugural proferida em 21 de junho de 2006 na Universidade Luzern, Suíça, à convite do Prof. Dr. iur.Jürg-Beat Ackermann. O presente artigo, intitulado Organisationsherrschaft als eigenständige Form mittelbarer
Täterschaft , consiste na versão atualizada da preleção proferida pelo Prof. Dr. Claus Roxin na Universidade deLuzern, na Suíça, e foi gentilmente cedida pelo autor para compor esta obra. Tradução da versão alemã de PabloAlflen da Silva.** Tradução de Pablo Rodrigo Alflen da Silva, Professor de Direito Penal e Processual Penal da UNIVATES e doCurso de Especialização em Direito Penal e Política Criminal da UFRGS, Mestre e Doutorando em CiênciasCriminais (PUCRS), Advogado Criminalista (Cezar Bitencourt Advogados).NT1 Refere-se, aqui, o autor, à última edição de 2006 da Revista Goltdammer’s Archiv für Strafrecht (GA).1 Festgabe für Claus Roxin zum 75. Geburtstag, organizada por J. Wolter/P.-G. Pötz/W. Küper/M. Hettinger,como Heft 5/2006 de «Goltdammer’s Archiv für Strafrecht» [GA], p. 255-438. Nesta: C. Kress, Claus Roxins Lehre von der Organisationsherrschaft und das Völkerstrafrecht , 304 e ss.; A. Nack, Mittelbare Täterschaft durch Ausnutzung regelhafter Abläufe, 342 e ss.; H. Radtke, Mittelbare Täterschaft kraft Organisationsherrschaft im nationalen und internationalen Strafrecht , 350 e ss.; R. Zaczyk, Die «Tatherrschaft kraft organisatorischer Machtapparate» und der BGH , 411 e ss.2
C. Roxin, Straftaten im Rahmen organisatorischer Machtapparate, GA, 1963, 193 ss. O texto foi passado poralto, em suas partes essenciais, em meu escrito de habilitação «Täterschaft und Tatherrschaft », § 24, 1. Aufl.,1963, até 8. Aufl., Berlin 2006.
. Ela se baseia na tese
de que em uma organização delitiva os homens de trás, que ordenam fatos puníveis com
poder de mando autônomo, também podem ser responsabilizados como autores mediatos, se
os executores diretos igualmente forem punidos como autores plenamente responsáveis. Estes
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homens de trás são caracterizados, na linguagem alemã corrente, como «autores de escritório»
(Schreibtischtäter ). Minha idéia era a de transpor este conceito cotidiano às precisas
categorias da dogmática jurídica. A razão imediata para este esforço era justamente o
processo promovido em Jerusalém contra Adolf Eichmann, um dos principais responsáveis
pelo assassinato de judeus no período nazista.
Nas décadas seguintes esta moderna construção jurídica se impôs na literatura alemã em sua
grande maioria3 e no ano de 1994 foi aceita pelo Supremo Tribunal Federal alemão 4
Esta decisão jurisprudencial foi levada adiante nas decisões posteriores, e na Alemanha ainda
mal provocou uma quantidade visível de posicionamentos científicos.
. Nesta
decisão um membro do assim chamado Conselho Nacional de Defesa, do antigo governo da
Alemanha oriental, foi condenado como autor mediato de homicídio doloso, porque teria
ordenado que os fugitivos que quisessem ultrapassar o muro da fronteira do Estado alemão
oriental fossem impedidos de realizar o seu propósito, em caso necessário, até mesmo por
meio de disparos mortais. Os soldados da fronteira, os «atiradores do muro», que teriam
realizado os fuzilamentos com as próprias mãos, foram igualmente condenados por homicídio
doloso.
5 Mas no âmbitointernacional a figura jurídica do domínio por organização encontrou grande ressonância. Nos
anos oitenta do século passado ela já foi utilizada no julgamento da Junta Geral Argentina.6
Ela é levada em conta também no moderno Direito Penal Internacional. 7 Isso porque o Art.
25, III, a do Estatuto do Tribunal Penal Internacional não só reconhece a autoria mediata,
como acentua expressamente que independe de que o executor direto também seja penalmente
responsável («regardless of whether that other person is criminally responsible»). O penalista
alemão Kress afirma, resumidamente:8
3 Compare as indicações em C. Roxin, Strafrecht, Allgemeiner Teil, Bd. 2, Formas especiais de manifestação dofato punível, München 2003, § 25, n.m. 108.4 Entscheidungen des Bundesgerichtshofs in Strafsachen (= BGHSt), Bd. 40, 218 e ss.5 Uma explicação sobre isso contém a 8.ª edição de meu livro «Täterschaft und Tatherrschaft », p. 704 e ss.6 Compare sobre isso Roxin, (supra, nota 3), § 25, n.m. 109, com uma longa citação da decisão do Tribunal de
Apelação.7 Compare Roxin, (supra, nota 3), § 25, n.m. 112, nota 140.8 Kress, (supra, nota 1), 307, com outras indicações.
«enquanto os intérpretes norte-americanos atualmenteencontram-se, de forma compreensível, bastante perplexos face às alternativas ao executor
responsável, este passo é considerado pelos intérpretes alemães, em geral, como
reconhecimento da autoria pelo domínio da organização.» Além disso, ele entende que, caso
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se oriente pelas primeiras manifestações do Tribunal Penal Internacional, «a figura dogmática
desenvolvida por Roxin em 1963 dominará, em breve, a praxis do primeiro Tribunal Penal
Internacional permanente na história do direito»9. E nós esperamos por isso! O domínio por
organização como forma independente da autoria mediata é discutido inclusive na literatura
suíça, se bem que a práxis do seu país, felizmente, ainda não produziu tais casos. 10 Eu defendi
e precisei minha concepção originária em inúmeras publicações, contra os mais diversos
ataques, ao longo dos 43 anos que se passaram desde o seu surgimento. Kress fala11
Embora ilustres autores
de um
«diálogo polêmico, interessante e ainda não acabado». A presente exposição leva adiante tais
esforços, na medida em que abarca as contribuições da discussão mais recente e desenvolve
minha própria solução em alguns pontos.
II RECHAÇO À CO-AUTORIA
12
Não existe uma decisão comum para o fato. O cumprimento de uma ordem é o contrário de
uma tomada de decisão comum, de um acordo entre os co-autores. A «identificação no
estabelecimento do fim comum», na qual se baseia Otto
advoguem pela condenação do homem de trás não como autor
mediato, mas sim como co-autor, pode-se afirmar que: para a aceitação de uma co-autoria
entre o mandante, no centro de um aparato de poder, e o executor, «desde o local» (por
exemplo, no caso dos assassinatos nos campos de concentração ou no caso dos disparos nomuro), faltam todos os pressupostos.
13
9 Kress, (supra, nota 1), 308.10 G. Stratenwerth, Schweizerisches Strafrecht, Allgemeiner Teil I: Die Straftat , 3. Aufl., Bern 2005, § 13, n.m.40.11 Kress, (supra, nota 1), 305.12 Para co-autoria J. Baumann/U. Weber/W. Mitsch, Strafrecht, Allgemeiner Teil, 11. Aufl., Bielefeld 2003, § 29,n.m. 143; G. Jakobs, Strafrecht, Allgemeiner Teil, Die Grundlagen und die Zurechnungslehre, 2. Aufl.,Berlin/New York 1991, 21/103 com as notas 190, 191; o mesmo, Anmerkung zum Urteil des BGH vom 26.7.1994 (= BGHSt 40, 218), NStZ 1995, 27; H.-H. Jescheck/T. Weigend, Lehrbuch des Strafrechts,
Allgemeiner Teil, 5. Aufl., Berlin 1996, 670; H. Otto, Grundkurs Strafrecht, Allgemeine Strafrechtslehre, 7.
Aufl., Berlin/New York 2004, § 21, n.m 92; o mesmo, Täterschaft kraft organisatorischen Machtapparates, Jura2001, 753 e ss.13 Otto, Jura, 2001, (nota 12), 759.
, não é suficiente para isso. Pois, de
modo geral, enquanto se pode falar disso face a uma outra, absolutamente possível, motivação
do executor, tal «identificação» igualmente pode existir na relação do que instiga ou auxilia,
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com o autor. Também a consciência de que os atos «devem ser praticados de acordo com as
instruções de direção», referida por Jescheck/Weigend 14
Jakobs e seus alunos
, pode apenas transmitir a idéia de ter
que executar uma ordem, mas não fundamenta nenhuma decisão comum.
A co-autoria baseia-se na «obrigação» mútua e não na vinculação unilateral do emissor da
ordem. Falta, na tomada de decisão, a posição característica de mesma categoria para a co-
autoria. A co-autoria tem uma estrutura «horizontal». Onde existe uma estrutura «vertical»
inequívoca, como na hierarquia de aparatos de poder, leva-se em conta apenas uma autoria
mediata. O fato de que o emissor da ordem e o executor em regra não conhecem um ao outro
e também podem jamais se conhecer, faz a decisão comum parecer uma ficção.
15 esquivam-se do problema porque renunciam a uma decisão comum
para a co-autoria e consideram suficiente a «adaptação» de um participante – aqui, o executor
direto – no plano elaborado por outro. Mas isto não pode ser suficiente para uma co-autoria.
Pois o agrupamento de pessoas que comete o fato exige sobretudo uma «decisão comum para
o fato», cuja necessidade, de acordo com as palavras de Stratenwerth16
Porém, igualmente falta uma execução conjunta do fato. Pois aquele que dá a ordem, de modo
geral, não concorre com o seu executor, pelo menos não por meio de uma contribuição fática
no estágio de preparação. Isto não é suficiente para o cometimento conjunto, mesmo de
acordo com o entendimento de que a co-autoria não se limita a contribuições fáticas noestágio de execução. Em todo caso, pode-se fundamentar a co-autoria até mesmo sem os
problemas da instigação. A co-autoria é reconhecida como cooperação baseada na divisão de
trabalho através da participação ajustada ao fato. Por isso não se pode discutir aqui por que o
homem com a alavanca de poder não quer sujar as próprias mãos e quer deixar o «trabalho»
, está «fora de dúvida»
também para o direito suíço. Se faltar isto, então apenas poderá existir uma relação de
subordinação que deve ser verificada sob o ponto de vista da autoria mediata. A co-autoriaperderia todos os contornos e sua delimitação em face da autoria mediata, caso se renunciasse
a uma decisão comum para o fato e se considerasse como suficiente para ela uma mera ordem.
14 Jescheck/Weigend, (nota 12), 670.15 Jakobs, AT (nota 12), 21/43; R. Derksen, Heimliche Unterstützung fremder Tatbegehung als Mittäterschaft ,GA 1993, 163 e ss.; H. Lesch, Die Begründung mittäterschaftlicher Haftung als Moment der objektiven
Zurechnung, ZStW 105 (1993) 271 e ss.; H. C. von Danwitz, Ist die Mittäterschaft abhängig von einem gemeinsamen Tatentschluss der Beteiligten?, Bonn 1994.16 Stratenwerth, (nota 10), § 13, n.m 52.
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ser realizado por outro.17
Mais próxima que a co-autoria é a hipótese de instigação, que nos últimos anos encontrou
novamente em Herzberg
Também uma vinculação mútua dos cúmplices de mesma categoria,
que é característica para a co-autoria, não pode se apresentar no caso do domínio por
organização.
III RECHAÇO À INSTIGAÇÃO
18, Rotsch19 e, mais recentemente, em Zaczyk
20, defensores
particularmente engajados. Pois ela estaria de acordo com o teor do Art. 24 do Código Penal
suíço e do § 26 do Código Penal alemão, os quais exigem uma «disposição dolosa» ao fato.21
Um instigador não está no centro da decisão. Ele desperta a tomada de decisão, mas deve
abandonar o desenvolvimento posterior do acontecimento ao instigado, o qual tem o domínio
do fato determinante do acontecimento. No domínio por organização ocorre justamente o
contrário: o homem de trás, que detém a alavanca do poder, decide sobre o «se» do fato,enquanto que o executor direto produz, em geral, de forma ocasional a situação concreta de
atuação. Ele não pode mudar mais nada de essencial no curso do acontecimento traçado pelo
aparato, senão quando muito modificá-lo. Mesmo uma recusa à ordem, em regra, não serviria
Porém, ela contesta o peso da ordem e da execução conforme a ordem, em aparatos de poder
que atuam desvinculados do direito.
17 Contra a co-autoria pronunciam-se, de forma decisiva, também as recentes monografias de J. Schlösser e C.Urban. Para Schlösser, Soziale Tatherrschaft. Ein Beitrag zur Frage der Täterschaft in organisatorischen Machtapparaten, Berlin 2004, 363, exclui a ocorrência de uma autoria mediata, por ele afirmada, «apossibilidade de uma co-autoria entre homem de trás e o executor». Em Urban, Mittelbare Täterschaft kraft
Organisationsherrschaft , Osnabrück 2004, 45, isto significa que: «considerando as clássicas situações de mando,nas quais se manifesta a típica ordem soberana das instâncias superiores nos aparatos organizados de poder,exclui-se a co-autoria... como solução adequada.»18 R. D. Herzberg, Mittelbare Täterschaft und Anstiftung in formalen Organisationen, in: K. Amelung (Hrsg.), Individuelle Verantwortung und Beteiligungsverhältnisse bei Straftaten in bürokratischen Organisationen des Staates, der Wirtschaft und der Gesellschaft , Sinzheim 2000, 33 e ss.19 T. Rotsch, Tatherrschaft kraft Organisationsherrschaft , ZStW 112 (2000) 518 e ss.; o mesmo, Neues zur Organisationsherrschaft , NStZ 2005, 13 e ss.20 Zaczyk, (nota 1), 414.21 Ademais, sobre instigação M. Köhler, Strafrecht, Allgemeiner Teil, Berlin/Heidelberg/New York 1997, 510,que, porém, baseia-se em que, desde o princípio, ele limita uma autoria mediata à erros materiais sobre o fato e àcausas de justificação sobre a pessoa do intermediador do fato. Sobre isso C. Roxin, Täterschaft und Tatherrschaft , 8. Aufl., Berlin 2006, 663 e s. Um representante da solução da instigação é também J.
Renzikowski, Restriktiver Täterbegriff und fahrlässige Beteiligung, Tübingen 1997, 87 e ss. Em Renzikowskiesta concepção fundamenta-se em seu entendimento do princípio da autonomia; sobre isso Roxin, Täterschaft und Tatherrschaft , 681 e ss.
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em nada para a vítima, porque as condições organizatórias-marco geralmente asseguram a
execução de uma ordem também para este caso.
Portanto o homem de trás tem de longe o máximo «poder sobre o fato» e o «domínio sobre a
forma», como já o reconheceu o Tribunal Distrital de Jerusalém no caso Eichmann, na medida
em que expôs que o mandante na alavanca do poder transfere a responsabilidade principal
para o acontecimento:22
Herzberg esclarece:
«a responsabilidade aumenta quanto mais nos afastamos daquele que
coloca em execução com suas próprias mãos a arma mortal e chegamos ao nível mais elevado
da ordem...» As relações de domínio são mal-interpretadas se se julga o executor como autor
principal e os organizadores da criminalidade em massa como figuras marginais sem domínio.
Os apoiadores da solução da instigação reagem a esta averiguação, na medida em que negam
que a delimitação entre a autoria mediata e a instigação depende de relações concretas de
poder ou na medida em que estabelecem a tese de que o instigador tem o acontecimento em
suas mãos, justamente de modo que, sob o ponto de vista da distribuição de poder, também o
controlador do domínio possa ser caracterizado como instigador. Quanto ao primeiro ponto de
vista quero mencionar Herzberg e quanto ao segundo, Rotsch.
23 «a tentativa de determinar a autoria sobre o poder real de condução,deve ser inteiramente abandonada.» Trata-se aqui de uma espécie «fática» de observação, que
pretende opor uma compreensão normativa do domínio do fato. De acordo com isso o
organizador seria mero instigador, porque o executor direto mesmo não seria responsável por
seu ato e por trás dele não seria possível uma outra autoria. «Hitler, Himmler e Honecker não
cometeram os delitos de homicídio que ordenaram, na qualidade de autores, senão
provocaram como instigadores.» A isso junta-se Zaczyk 24
Eu ainda voltarei ao argumento principal de que por trás de um autor que atua de forma
responsável não seria juridicamente justificável a aceitação de um outro autor. Porém, aqui já
, na medida em que ele diz que a
«inclusão do ‹aparato organizado de poder› dissolve as circunstâncias que o influenciaram (deforma concreta) ao ato em apreço dentro da rede – que, porém, de maneira presumível não são
tão concretas que suprimam a responsabilidade do autor direto».
22
Decisão contra Adolf Eichmann, Strafakt 40/61, inoffizielle Übersetzung, Nr. 197.23 Herzberg, (nota 18), 48.24 Zaczyk, (nota 1), 414.
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fica dito que o próprio domínio do fato é um princípio normativo que, na verdade, como todos
os conceitos jurídicos não pode dissolver os fundamentos factuais correspondentes ao modelo.
Se se declara o poder real de condução como irrelevante, abandona-se ao mesmo tempo o
critério do domínio do fato. Pois este elemento não terá mais nenhum sentido se for
desconsiderado o domínio real sobre o decurso do acontecimento. O fato de que pelo menos
subsiste um normativismo desvinculado da realidade também mostra agora Radtke25
No caminho oposto à legitimação de uma mera instigação do emissor da ordem, no marco do
aparato organizado de poder, segue Rotsch
, o qual,
em todo caso, se afasta de uma «fundamentação do domínio fático-naturalístico», porém,
opondo-se à Herzberg procura explicar o homem de trás com base na «atribuição normativa»
e quanto ao resultado está de acordo comigo no que diz respeito ao autor mediato. As
hipóteses normativas que abandonam o plano da realidade tem popularidade e, como se vê,
podem servir, na mesma medida, para a fundamentação de hipóteses contrárias.
Uma outra delimitação das formas de participação que não esteja de acordo com o domínio
sobre a realização do tipo, sob nenhum ponto de vista pode representar um objetivo. Pois em
um direito penal do fato a delimitação pode resultar somente de acordo com o peso objetivo
da respectiva participação. E no caso do autor de escritório, isto é maior do que no caso do
executor ocasional de uma ordem de homicídio, o qual é apenas uma engrenagem no
mecanismo do aparato.
Se de acordo com o direito alemão e suíço a instigação está sujeita à mesma punição que a
autoria, então isto não teria o seu fundamento no fato de que a participação objetiva na
produção do resultado seria a mesma em ambas as formas de cooperação. Ao contrário, a
participação mínima do instigador no fato é compensada por meio do injusto complementar,
que consiste na provocação da decisão de realizar o fato. Porém, no caso do homem na
alavanca de poder a influência objetiva na causação do resultado já é predominante. Por istonão pode estar correto o seu rebaixamento à instigador.
26
25 Radtke, (nota 1), 355.26 Rotsch, NStZ , 2005 (nota 19), 13 e ss.
, uma vez que ele apresenta a tese de que um
habitual instigador tem o resultado nas mãos, com a mesma segurança que aquele que ordena
os fatos puníveis no marco de uma organização criminosa. O homem de trás no marco do
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aparato organizado de poder, portanto, não se distingue de outros instigadores e por isso pode
ser tratado como tal.
Ele procura comprovar isto através da construção de um exemplo e afirma: 27
27 Rotsch, NStZ , 2005 (nota 19), 14.
«se o... político
P, em uma manifestação diante de 500 de seus – não vinculados a uma organização –
fanáticos partidários, desafia a matar o malquisto concorrente X e para isso promete uma
recompensa de 1 Milhão de Dólares, ele pode estar certo da execução do seu ato, da mesma
forma que aquele que confia no cometimento de um ato no ‹decurso regular› de um aparato
organizado.»
Porém, com um exemplo tão peculiar não se pode comprovar a equivalência entre instigação e
domínio do fato. Pois, em primeiro lugar, no exemplo de Rotsch não se trata de um caso
habitual de instigação, senão de um caso que se aproxima amplamente do domínio por
organização, posto que os «fanáticos partidários» se sentem manifestamente tão obrigados
com o seu «dirigente», como os membros de uma organização. No típico caso de instigação
não se pode discutir por que o potencial autor é um «fanático partidário» daquele que o
desafia ao ato, e por que o desafiante ainda tinha nas mãos 500 daquelas pessoas e através da
oferta de milhões poderia conduzir ao fato. E, em segundo lugar, tal caso também éabsolutamente inimaginável, pois tal desafio público ao homicídio teria por conseqüência
natural uma intervenção imediata do poder estatal, que levaria à prisão do orador e à
frustração daquele golpe.
Instigação e domínio do fato são, portanto, formas de delito de categoria absolutamente
diversa. Hitler e os demais ditadores podiam realizar, com auxílio do aparato existente à
disposição deles, uma potencial destruição e violação do direito, que, comparativamente, nãose afastava da posição do instigador normal. Se se coloca o seu poder de domínio no mesmo
nível que a influência de um instigador, nivelam-se de forma normativamente simplificada
enormes diferenças materiais. Isto se justifica já pela linguagem empregada. Ele fala
indistintamente de «autor de escritório» e não de «instigador de escritório».
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IV COMO SE PODE FUNDAMENTAR UMA AUTORIA MEDIATA NOS CASOS DE
DOMÍNIO POR ORGANIZAÇÃO?
A hipótese, por mim proposta, de uma autoria mediata é, como sempre, predominante também
na discussão científica. Da literatura alemã cito apenas dois autores de grandes comentários.
Heine28 acentua que à medida em que se trata de um aparato organizado de poder
desvinculado do direito, «a autoria mediata pode estar amplamente assegurada». E Joecks
declara:29 «o domínio do fato em virtude de ‹aparatos organizados de poder› apresenta-se
como a terceira forma independente de autoria mediata. Ele é o protótipo de uma constelação
de ‹autor atrás do autor› e amplamente reconhecido na literatura e na jurisprudência. Somente
poucas vozes desaprovam a construção.» Também as três monografias de Langneff (2000)30,
Schlösser (2004)31 e Urban (2004)32 existentes sobre o tema na Alemanha, apesar de todas as
divergências em concreto, partem de forma uníssona da hipótese da autoria mediata nos casos
de domínio por organização. Da literatura suíça menciono apenas o representativo Tratado de
Stratenwerth33
Mas, como se pode fundamentar a autoria mediata com exatidão e convicção suficientes? A
circunstância de que eu tenho a concepção predominante ao meu lado, as considerações gerais
de plausibilidade dirigidas por mim até o momento, quanto ao peso da contribuição do ato e
também boas razões para o rechaço à co-autoria e à instigação, ainda não são suficientes para
isso. Pois aqueles que rechaçam uma autoria mediata e advogam por uma co-autoria ou umainstigação do homem de trás, fazem isto não em razão do poder de persuasão especial de suas
próprias hipóteses, senão como uma espécie de auxílio necessário. Eles escolhem esta
, que nos casos «de crime organizado através de um aparato de poder»
igualmente advoga por uma autoria mediata. «Pois aqui», diz ele, «manifesta-se o autor de
escritório, que não colabora propriamente na execução do fato, enquanto que o verdadeiro
senhor do acontecimento, que detém nas mãos a organização, pode, portanto, confiar que suasordens serão convertidas em fato através do aparato.»
28 A. Schönke/H. Schröder/P. Cramer/G. Heine, Strafgesetzbuch, Kommentar , 27. Aufl., München 2006, § 25,n.m. 25 a.29 W. Joecks, Münchener Kommentar zum Strafgesetzbuch, Bd. 1, §§ 1-51, München 2003, § 25, n.m. 123.30 K. Langneff, Die Beteiligtenstrafbarkeit von Hintermännern innerhalb von Organisationsstrukturen bei vollverantwortlich handelndem Werkzeug, Aachen 2000.31
Schlösser, (nota 17).32 Urban, (nota 17).33 Stratenwerth, (nota 10), § 13, n.m. 40.
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alternativa porque acreditam que a aceitação de uma autoria mediata violaria um princípio
irrefutável da teoria do autor.
Este princípio baseia-se na hipótese de que por trás de um autor plenamente responsável não
pode existir nenhum autor mediato. Se o autor direto – como, por exemplo, dos assassinatos
em campos de concentração ou dos disparos mortais no muro – enquanto detentor do domínio
do fato é plenamente responsável pelo seu fazer e é responsabilizado como autor, é impossível
pensar em atribuir ao homem de trás, ao mesmo tempo, o domínio do fato. Assim, o «autor
atrás do autor» é uma construção jurídica irrealizável, um «não-conceito», como uma vez já
teria dito Welzel34
A circunstância de que o aparato com o seu modo próprio de atuação lhe assegura o resultado,
de modo que para isso não depende de forma alguma, em primeira linha, do agente que
ocasionalmente executa o último ato, na maioria das vezes também tem sido admitida poraqueles que se opõe ao meu entendimento. Assim Rotsch
, antes de ter, mais tarde, modificado sua opinião. Esta é uma objeção
tentadora. Mas ela se baseia em três falhas, cujo conhecimento abre o caminho a uma
fundamentação convincente da autoria mediata.
Em primeiro lugar, quem possibilita ao homem de trás a execução de suas ordens, não é só
«instrumento» e também não é aquele que, predominantemente, deu causa com suas próprias
mãos à morte da vítima. O verdadeiro instrumento é, ao contrário, o próprio aparato. Este
consiste em uma diversidade de pessoas que estão inseridas em estruturas pré-estabelecidas,
que atuam conjuntamente em diferentes funções condicionadas pela organização e cujatotalidade assegura ao homem de trás o domínio sobre o resultado. O executor
individualmente não desempenha nenhum papel decisivo para a atuação da organização,
porque ela pode dispor de muitos outros executores solícitos.
35
34 Süddeutsche Juristen-Zeitung, 1947, p. 650.35 Rotsch, NStZ , 2005 (nota 19), 16.
conduz minha concepção a uma
fórmula que eu posso considerar como absolutamente válida: o «domínio por organização não
pressupõe nenhum domínio da conduta típica, senão apenas o domínio do resultado típico.»
Ele admite que justamente nesta particularidade possa se situar um fundamento suficiente
para estabelecer o domínio por organização como uma forma independente de autoria
mediata, juntamente com o domínio por erro e por coação. Porém, ele advoga pela instigação,
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sob o fundamento de que «com referência apenas ao resultado pelo domínio do fato
desvinculado da realização da ação típica, de Roxin, nada mais resta da exigência, baseada em
considerações de Estado de Direito, de que o autor é a figura central na realização da ação de
execução típica.» Pois a ação do homem de trás estará «absolutamente desvinculada da
realização do tipo propriamente».
Porém, eu não considero convincente a tese de que a ação do homem de trás estará
«desvinculada» da realização do tipo, de maneira contrária ao Estado de Direito, pois o
domínio do fato é sempre apenas o domínio sobre o resultado típico. O domínio do autor
direto pode ser um meio para a obtenção do domínio sobre o resultado, como ocorre no caso
de coação e, em certo grau, também no caso de provocação de um erro. Mas de modo algum
ele deve existir como justamente mostra o emprego de aparatos de poder. O fato de que nos
atos de extermínio em massa o emissor da ordem se manifesta como a «figura central»,
corresponde perfeitamente às relações reais de poder. A sua ação de realização típica constitui
o acionamento do aparato de extermínio, que de modo algum aparece «desvinculado» do seu
resultado pretendido. Além disso, a afirmação de que é certo que uma outra forma de
manifestação do domínio do fato também desloque o autor direto ao centro do acontecimento,
igualmente corresponde à realidade, pois todo aparato criminoso depende, da mesma forma,do autor de escritório e do executor.
Em segundo lugar, segue esta visão a ideia de que o executor e o homem de trás possuem
formas diferentes de domínio do fato, que não se excluem mutuamente. Quem mata a vítima
com as próprias mãos, exerce o assim por mim denominado domínio da ação, portanto, um
domínio que resulta da execução de um determinado ato. O homem de trás possui, de acordo
com isso, o domínio por organização, isto é, uma possibilidade de influência que lhe garante aprodução do resultado por ordem do aparato de poder existente sem a execução do fato pelas
próprias mãos. Esta garantia de resultado fundamenta o domínio do fato. Ela se distingue do
domínio da ação do executor, mas pode existir conjuntamente com ele. Um caso corrente
como o da situação de coação mostra que a possibilidade de um «autor atrás do autor», no
fundo, é evidente. Se alguém é coagido por meio de uma ameaça de morte a praticar um fato
punível, o executor coagido evidentemente tem o domínio somente sobre o ato realizado
diretamente por ele. A circunstância de que ele será exculpado devido à sua posição decoação, não muda em nada o seu domínio sobre o fato, pois este consistirá em uma forma de
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manifestação de um injusto típico. Não obstante isso, também o homem de trás tem o domínio
do fato e é autor mediato em virtude da coação. Portanto, de um modo geral, é um fato
inegável o de que as diferentes formas de autoria podem ser graduadas uma atrás da outra.
Em terceiro lugar, pode-se extrair das circunstâncias antes mencionadas uma conclusão
principal que torna plausível uma autoria mediata. Não se pode deduzir a autoria e o domínio
do fato primariamente de algum déficit do «instrumento», assim como ocorre no caso de
domínio do fato por erro ou coação, senão deve-se fundamentá-lo positivamente a partir da
posição do autor no acontecimento integral. Isto quer dizer, no caso concreto de condução da
organização: o domínio do fato do homem de trás baseia-se em que por meio de uma ordem
sua, através do aparato existente, ele pode causar o resultado com a maior segurança, como no
próprio caso de domínio por erro e por coação, os quais são reconhecidos de forma quase
unânime como casos de autoria mediata. Isto já foi verificado pelo Supremo Tribunal Federal
alemão, quando ele afirmou a respeito do domínio por organização que: 36
36 BGHSt 40, 236 e s.
«... na hipótese de
emprego de instrumento inculpável ou induzido em erro são freqüentes as ocorrências de
casos nos quais o autor mediato não tem inteiramente nas mãos a ocorrência do resultado,
como nos casos da espécie descrita.»
V OS PRESSUPOSTOS DO DOMÍNIO POR ORGANIZAÇÃO
De acordo com isso, se se reconhece o domínio por organização como uma forma
independente de autoria mediata, subsiste a questão de que em quais pressupostos se baseia
em concreto este domínio. Ele levanta várias questões. De acordo com a posição atual do meu
entendimento são quatro os fatores sobre os quais se pode atribuir o domínio do fato aohomem de trás.
1 PODER DE MANDO
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Autor mediato somente pode ser quem tem um poder de mando dentro de uma organização
conduzida rigorosamente e o exerce para produzir realizações típicas. O comandante de um
campo de concentração nazista era, portanto, autor mediato dos assassinatos ordenados por
ele, mesmo quando ele próprio agia com base em uma instrução de um superior. Por isso
muitos autores mediatos podem estar um atrás do outro, em diferentes níveis de hierarquia de
mando. Ao contrário, o pessoal de serviço de apoio somente pode ser punido por participação,
se na verdade promoveu conscientemente os fatos puníveis através de alguma ação, porém
por si mesmo não ordenou nenhum homicídio e também não colaborou na sua execução.
2 A DESVINCULAÇÃO DO DIREITO PELO APARATO DE PODER
Eu postulei desde o início a «desvinculação do direito» pelo aparato de poder como um
pressuposto imprescindível do domínio por organização. Esta exigência é discutida até
mesmo entre os partidários de minha teoria.37
Em primeiro lugar, o aparato de poder não precisa ter se desvinculado do direito em todos os
aspectos, senão apenas no marco dos tipos penais realizados por ele. As medidas tomadas pela
DDR e mesmo pelo Estado Nacional-Socialista moveram-se em muitos setores dentro do
direito vigente; porém os âmbitos de atuação, como o «impedimento de fuga da República
através de disparos mortais» ou, apenas para mencionar o caso mais assustador, a «solução
final para o problema relativo aos judeus», caracterizam atividades absolutamente
desvinculadas do direito. E, em segundo lugar, para a desvinculação do direito não interessa avisão do antigo sistema, senão a avaliação jurídica atual. Os assassinatos no muro eram
condutas desvinculadas do direito, ainda que o dirigente estatal da DDR tivesse outra opinião
a respeito disso. Então os assassinatos em massa do regime nazista, evidentemente, também
Contudo, penso que se deva persistir nesta
exigência, desde que se eliminem os pontos críticos trazidos à discussão através dos seguintes
esclarecimentos.
37 Contra este critério, sobretudo, K. Ambos, Tatherrschaft durch Willensherrschaft kraft organisatorischer MachtapparateNT2, GA, 1998, 226 e ss. (241 e ss.). Compare minha discussão com Ambos in: Probleme von Täterschaft und Teilnahme bei der organisierten Kriminalität , in: Festschrift für Gerald Grünwald, organizadopor E. Samson/F. Dencker/P. Frisch/H. Frister/W. Reiss, Baden-Baden 1999, 556 e ss.NT2 O trabalho de Kai Ambos encontra-se publicado sob o título « Domínio do fato pelo domínio da vontade em
virtude de aparatos organizados de poder », no Brasil, na obra Ambos , Direito Penal: fins da pena, concurso de pessoas, antijuridicidade e outros aspectos, Porto Alegre: Fabris Editor, 2006, p. 47 e ss., com traduções ecomentários sob a perspectiva brasileira de Pablo Alflen da Silva.
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teriam sido atos desvinculados do direito se o antigo dirigente estatal os tivesse ordenado não
por meio de ordens secretas, mas «legalmente».
Porém, com base nestes dois esclarecimentos fica evidente que a desvinculação do direito
pelo aparato organizado de poder constitui um pressuposto necessário para o domínio do fato
do homem de trás. Por exemplo, se o assassinato dos fugitivos do muro fosse de modo geral
proibido e tivesse sido somente resultado de ordens de funcionários arbitrários, então tais
acontecimentos seriam ações isoladas e deveriam ter sido tratados de acordo com as regras da
instigação e da autoria. O soldado da fronteira também teria podido então, a qualquer tempo,
recusar a se subordinar à legislação da DDR e à sua respectiva práxis. O mesmo vale para os
atos de extermínio em massa pelos nazistas, os quais jamais teriam ocorrido se indivíduos
tivessem agido por transgressão e um grande aparato sistemático em todas as suas partes não
tivesse proposto este fim. O sistema (por exemplo, o sistema parcial de um Estado) deve,
portanto, trabalhar criminosamente («desvinculado do direito») como um todo, se as
instruções do homem de trás vierem para garantir o resultado que fundamenta a autoria
mediata.
3 A FUNGIBILIDADE DO EXECUTOR DIRETO
Também a fungibilidade, isto é, a possibilidade de substituição daquele que na conduta
delitiva do aparato organizado de poder praticou os últimos atos parciais de preenchimento do
tipo penal, para mim sempre foi um elemento essencial do domínio por organização. O
cumprimento das ordens do homem de trás, assim seguia minha tese, é assegurado em grande
parte justamente pelo fato de que muitos potenciais executores encontram-se à disposição, demodo que a recusa ou a perda de um indivíduo não pode impedir a realização do tipo. Isto
também segue, na literatura suíça, por exemplo, Stratenwerth,38
38 Stratenwerth, (nota 10), § 13, n.m. 40.
quando afirma: «como
qualquer indivíduo que colabora na execução é substituível, não é necessário em relação a ele
nenhuma coação ou erro para transferir ao homem de trás o domínio do fato.» Apesar disso,
na discussão mais recente também o critério da fungibilidade é submetido à crítica. Menciono
apenas as três mais importantes objeções:
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83
Renzikowski39
Schroeder
segue a mim quanto à «possibilidade garantida» de produção do resultado em
virtude da possibilidade de substituição do executor direto. Porém, ele me critica o fato de que
«condutas hipotéticas de terceiros», isto é, a possibilidade de aproveitamento de outros
executores, não poderia fundamentar um domínio efetivo do comportamento. Este argumento
está correto, caso se considere como instrumento somente o executor na situação concreta. Eu
já demonstrei, no entanto, que uma visão individualista desta espécie, que reduz o
acontecimento a uma relação entre duas pessoas, não é o modo correto de domínio por
organização. O instrumento é a organização e para o seu emprego eficaz a existência de
muitos possíveis executores não é uma hipótese, senão uma realidade asseguradora de um
resultado.
40
39
Renzikowski, (nota 21), 89.40 Fr.-Chr. Schroeder, Der Täter hinter dem Täter, Ein Beitrag zur Lehre von der mittelbaren Täterschaft , Berlin1965, 168.
apresentou a outra objeção afirmando que especialistas imprescindíveis enquanto
executores não seriam substituíveis, apesar do homem de trás ser o autor mediato. Porém,
com isso é abandonado o âmbito do domínio por organização, que é orientado pela
«automatização» descrita e, em regra, também por uma multiplicidade de acordo com o
mesmo esquema de crimes correntes. Se um serviço secreto precisa recrutar um especialista
que possua, somente ele, condições de executar um determinado delito, a organização nãoostenta desde o princípio o modo específico de atuação. Também um autor isolado pode se
engajar como tal homem. No entanto, existe apenas uma instigação, uma vez que não é
exercida nenhuma pressão coercitiva de acordo com o § 35 do StGB.
Porém, com isso é demonstrado na verdade que nem todos os delitos causados por uma
organização criminosa fundamentam eo ipso uma autoria mediata do causador. Mas isto eu
também jamais afirmei. Se – para escolher um exemplo mais realista – uma organizaçãocriminosa com base negocial e sem qualquer coação de alguém especializado nisso,
encomenda passaportes falsificados a uma oficina não pertencente à organização, não há
nenhuma autoria mediata, senão uma instigação à falsificação de documentos. O significado
da fungibilidade do executor para a autoria mediata no marco do aparato organizado de poder
não é relativizado por causa disso, senão acentuado.
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Finalmente, fez-se valer contra o critério da fungibilidade o fato de que o executor direto
poderia poupar e deixar escapar a vítima, de modo que ele teria então o domínio exclusivo
sobre a ocorrência do resultado e não se poderia mais falar em fungibilidade. 41 No caso dos
assassinatos em massa nos campos de concentração, que me surgiram diante dos olhos em
primeira linha no desenvolvimento do domínio por organização, o ajudante isolado, porém,
apenas terá tido a possibilidade de evitar a morte da vítima por meio da recusa ou inatividade.
O caso dos disparos mortais no muro de Berlim, que Herzberg também emprega como
exemplo, à primeira vista parece algo diferente.42
41
Herzberg, (nota 18), 37 e ss.42 Langneff, (nota 30), 151 e s., que aceita o critério da fungibilidade, mas rejeita aqui também uma autoriamediata.
O soldado da fronteira não poderia
simplesmente ter errado o alvo ou desviado o olhar? Mas também não é regra em situações
desta espécie, pois quando um regime toma medidas organizatórias que visam impedir uma
«fuga da República», em caso necessário por meio de disparos mortais aos fugitivos, isto não
pode ocorrer de modo que permita suceder fugas grosseiras e despercebidas. Esta não seria
uma organização capaz de funcionar. Ao contrário, deve ser criado um sistema de vigilância
mútua por sentinelas, como houve na DDR. Como os disparos mortais dependiam, na
verdade, «da atuação de uns poucos soldados», mas devido à inatividade sabotadora dos
soldados da fronteira uma fuga teria êxito – deve-se esclarecer se tal caso ocorreu –, sob o
ponto de vista do detentor do poder isto seria uma falha da organização, um «pane».
Porém, tal não-funcionamento é muito raro em uma organização criminosa, como no caso de
emprego de um instrumento inculpável ou induzido em erro, no qual ninguém põe em dúvida
a existência de uma autoria mediata, porque a tentativa pode fracassar no caso concreto.
Apesar disso, uma comparação dos assassinatos em massa do Nacional-Socialismo com os
casos dos disparos mortais no muro mostra que a fungibilidade em organizações delitivas
pode ser formada em diferentes medidas, de modo que é oportuno apoiar a autoria mediatanão exclusivamente nestes critérios e nos outros pressupostos já mencionados. Por isso quero
complementar as circunstâncias fundantes do domínio com mais um ponto adicional.
4 A DISPOSIÇÃO ESSENCIALMENTE ELEVADA DOS EXECUTORES AO FATO
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Com os critérios do poder de mando, da desvinculação do direito e da fungibilidade –
diferentemente do que eu tinha referido originariamente – as circunstâncias nas quais se
baseia o domínio do fato do homem de trás ainda não estão completamente caracterizadas.
Acresça-se, ainda, um fator que eu caracterizo em seus efeitos conseqüentes como a
«disposição essencialmente elevada dos executores ao fato».
O elemento assemelha-se aos conceitos com os quais Schroeder 43 e Heinrich
44 tentaram
esclarecer a autoria mediata em organizações delitivas. Schroeder fala de uma «determinação
condicionada ao fato»45 e Heinrich de uma «inclinação do executor de uma típica organização
ao fato». Também o Supremo Tribunal Federal alemão menciona – bastante influenciado por
Schroeder – entre as razões para a autoria mediata do homem de trás nas organizações
criminosas, «a disposição incondicional do autor direto, em cumprir o tipo penal». 46
Eu parto de que aquele que em um aparato organizado de poder desvinculado do direitoexecuta o último ato de preenchimento do tipo é diferente de um autor isolado em si mesmo.
Ele está sujeito a numerosas influências específicas da organização, que na verdade não
excluem de modo algum a sua responsabilidade, mas o tornam «mais disposto ao fato» que
Tais
circunstâncias não podem fundamentar nenhum domínio do autor direto. Pois, inclusive, a
situação dele estar «disposto ao fato», «determinado ao fato» ou «inclinado ao fato» não muda
em nada a sua liberdade de agir responsavelmente. Diferentemente ocorre, no entanto, se se
compreende tais atitudes como elementos do modo de atuação específico de uma organização
delitiva. Na verdade ele não é por si só decisivo para a aceitação da autoria mediata, masconstitui juntamente com os três fatores já mencionados por mim, um aspecto parcial do
domínio por organização. Quanto a esta hipótese, nem os autores mencionados e nem o
Supremo Tribunal Federal alemão explicaram detalhadamente. Por isso será demonstrado,
logo em seguida, em que sentido eu compreendo o critério da «disposição essencialmente
elevada ao fato» como elemento do domínio por organização.
43 Schroeder, (nota 40), 150.44 M. Heinrich, Rechtsgutszugriff und Entscheidungsträgerschaft , München 2002, 271 e ss. (273).45 O BGH fala na verdade de «disposição incondicional», enquanto Schroeder ressalta a «determinaçãocondicionada ao fato». Porém, Schroeder esclarece de forma mais exata, pois com este condicionamento elequeria falar, «na verdade, no desencadeamento ainda pendente de determinação já existente para o fato, para o
qual é suficiente o indício de mobilização do homem de trás.» ( Der Sprung des Täters hinter den Täter aus der Theorie in die Praxis, JR 1995, 179).46 BGHSt 40, 236.
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outro potencial delinqüente e, visto de forma global, aumentam a probabilidade do resultado
por meio de uma ordem e contribuem com o domínio do fato do homem de trás.
São várias e, em parte, até mesmo muito diferentes as circunstâncias que aqui exercem algum
papel.47
47 Em seguida eu acolho parcialmente as sugestões das recentes monografias de Schlösser e Urban (nota 17).
A integração de uma organização provoca, como tal, uma tendência à adaptação.
Espera-se que os membros se adaptem concretamente. Isto pode levar a uma adesão irrefletida
a condutas que jamais passariam pela cabeça de pessoas incorporadas a tal organização.
Porém, um fenômeno típico da organização é também o obsequioso zelo excessivo, seja pela
ambição na carreira, pela ostentação, pelo deslumbramento ideológico ou também em razão
de impulsos sádicos ou mesmo criminosos, os quais o membro de uma tal organização
acredita poder fornecer impunemente. Além disso, também há uma participação interna de
membros opositores, em conseqüência de uma resignada reflexão: «se eu não faço, de
qualquer forma outro o fará». Finalmente, acham-se também hipóteses que na verdade não
fundamentam nenhum domínio do homem de trás por erro ou coação, mas que se aproximam
em grande parte de tais situações: o executor solícito teme, por exemplo, no caso de recusa, a
perda de sua posição, o desprezo dos seus colegas ou outros prejuízos sociais; ou, apesar da
forte dúvida em relação ao injusto, ele conta com a impunidade do seu fazer ordenado «desde
cima».
Todas estas misturas alternadas dos fatores apresentados não excluem a culpabilidade e nem a
responsabilidade do executor direto e também reduzem muito pouco a sua medida e, em
algumas manifestações, até mesmo aumentam, porém convergem em um ponto: elas
conduzem a uma disposição condicionada dos membros da organização ao fato, que,
juntamente com a possibilidade de substituição pelo homem de trás, é um elemento essencial
de segurança, com base no qual ele poderia confiar no cumprimento de suas ordens.
VI AS REGRAS DO DOMÍNIO POR ORGANIZAÇÃO PODEM SER
TRANSFERIDAS À FATOS PUNÍVEIS EM EMPRESAS ECONÔMICAS?
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Com o exposto até aqui foram descritos de forma suficientemente precisa os pressupostos
para a autoria mediata em virtude de aparatos organizados de poder. Eu demonstrei minhas
teses nos casos de criminalidade estatal. A figura jurídica do domínio por organização pode
ser igualmente aplicada, por exemplo, às atividades terroristas e determinadas formas de
manifestação da criminalidade organizada, contanto que existam seus pressupostos no
respectivo caso concreto.
Mas com isso pode-se declarar como autores mediatos também os chefes de empresas
econômicas, caso eles provoquem empregados de seu estabelecimento a cometer fatos
puníveis? O Supremo Tribunal Federal alemão defende este entendimento. Ele já afirmou na
decisão referente ao Conselho Nacional de Defesa da DDR48 que: «o problema da
responsabilidade no caso de estabelecimento de empresa econômica também pode ser
solucionado assim», e em uma série de decisões subseqüentes ele procedeu da mesma
forma.49 O fato de que o BGH já tinha a intenção de se servir de minha teoria em sua decisão
no caso dos disparos no muro, mas, ao mesmo tempo, de ir além dela, já foi mencionado
expressamente, há algumas semanas, por Armin Nack , juiz presidente do Supremo Tribunal
Federal. Ele referiu50
A primeira decisão desta espécie, o chamado caso da interrupção de tratamento
( Behandlungsabbruchs-Fall ), surgiu já no mesmo ano (1994) que o caso dos disparos mortais
que no caso concreto o BGH «simplesmente poderia ter se limitado a
fundamentar a autoria mediata levando em conta o instituto do domínio por organizaçãofundado por Roxin». E ele prosseguiu então: «o 5.º Senado do BGH em matéria penal
posicionou-se, na ocasião, ao definir a autoria mediata ..., seguindo a Roxin. O autor – que
colaborou na decisão – recorda-se muito bem do diálogo com o seu colega do Senado,
Gerhard Schäfer, durante uma pausa na discussão. Nós estávamos de acordo quanto ao fato de
que um grupo de casos – praticamente o mais importante – deveria ser abrangido pelo: fato
punível provocado pelo chefe de uma empresa, ... no qual o colaborador da empresa atua ‹de
acordo com a instrução›.» Mas com isso a figura jurídica do domínio por organização éampliada. Eu pretendo demonstrar isso em algumas recentes decisões.
48 BGHSt 40, 237.49 Compare sobre isso, com detalhes, C. Roxin, Die Abgrenzung von Täterschaft und Teilnahme in der höchstrichterlichen Rechtsprechung, in: 50 Jahre Bundesgerichtshof. Festgabe aus der Wissenschaft, Bd. IV.
Strafrecht, Strafprozessrecht [BGH-Festgabe], organizado por C. Roxin/G. Widmaier, München 2000, 177 e ss.(192 e ss.).50 Nack, (nota 1), 343.
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no muro. O médico e o filho de uma mulher idosa acometida de grave lesão cerebral, que há
três anos já não reagia mais, instruíram os enfermeiros a interromper a alimentação artificial
da paciente (BGHSt 40, 257 e ss.). O BGH verificou isto sob o ponto de vista do delito de
homicídio e afirmou a autoria mediata do médico e do filho, que é deduzida da ordem
determinada por eles e, principalmente, do papel das pessoas vinculadas à ordem. Por
conseguinte, afirmou o BGH, não pode haver «nenhuma dúvida» quanto ao domínio do fato
de ambos os acusados (aaO., 268).
Eu deixo de lado a duvidosa questão se aqui se pretendia em geral um homicídio punível e
não, ao contrário, a suspensão justificada de um tratamento, porque em nosso contexto trata-
se apenas da problemática da autoria e da participação. Portanto, se se segue o BGH no
sentido de que aqui havia sido praticado um homicídio punível, então não se pode falar de um
domínio do fato do homem de trás. Na verdade, o médico e o filho da paciente recorreram à
atribuição de instruções, porém tal poder de mando compreendia, desde o princípio, apenas
instruções em conformidade com o direito. Também de modo algum pode-se afirmar que um
hospital consiste em um estabelecimento de trabalho desvinculado do direito. Em nosso caso
se mostraria convincente o fato de que o diretor de serviços negasse a execução da ordem e
encaminhasse ao tribunal de tutela (Vormundschaftsgericht ), que proibiria a suspensão daalimentação. Inclusive falta a fungibilidade do executor, pois não haviam outros executores e
nem se poderia obtê-los. Igualmente havia pouca disposição ao fato por parte do pessoal do
hospital, como mostra nosso caso. Ao contrário, em casos desta espécie os funcionários do
hospital são absolutamente escrupulosos, porque sabem que facilmente pode-se entrar em
conflito com a justiça penal.
Portanto, os quatro pressupostos, aos quais eu vinculei a ocorrência do domínio pororganização, devem existir conjuntamente, de modo que o caso deva ser apreciado no máximo
sob o ponto de vista de uma instigação tentada (Art. 24, al. 2 do Código Penal suíço e § 30, al.
1 do alemão). O fato mostra claramente como é necessário determinar de maneira exata os
pressupostos do domínio por organização, se não se quiser, com o seu auxílio, chegar a uma
ampliação sem limites da autoria mediata.
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Analogamente vale para uma decisão do ano de 1997,51
Uma terceira decisão, que igualmente surgiu no ano de 1997
pela qual o dirigente de uma
Sociedade de Responsabilidade Limitada foi condenado como autor mediato da remoção de
lixo lesivo ao meio ambiente, que constitui um fato punível de acordo com o § 326 do StGB
alemão. Ele era responsável pelo fato de que foram abandonados detritos aos recolhedores
que não dispunham da possibilidade de eliminação organizada do lixo. Também aqui se
afirma, invocando a decisão dos disparos mortais no muro, um domínio do fato e a autoria
mediata do dirigente. Isto é fundamentado com a declaração de que os acusados teriam
«aberto e indicado o caminho para que os detritos fossem eliminados ilegalmente». Não é
informado o que eles teriam feito concretamente, senão apenas dito que eles «seriam
responsáveis, porque os detritos foram abandonados aos recolhedores que não dispunham da
possibilidade de eliminação organizada do lixo».
Mas tudo isto ainda não justifica nenhum domínio do fato, sobretudo porque os recolhedores
não estavam vinculados à estrutura de organização da própria empresa e não dependiam dela.
Quem, sem colaborar por si mesmo com o preenchimento do tipo, «abre caminho para isso»,
ainda não tem o domínio do fato. Ao contrário, trata-se de um típico comportamento de
instigação, sob o pressuposto de uma provocação dolosa de um fato reconhecido como
contrário à proibição. Em todo caso, de modo algum são preenchidos os pressupostos dodomínio por organização.
52
51 BGH, NStZ , 1997, 544.52 BGH, wistra, 1998, 148.
, deve mostrar ainda que nosso
Supremo Tribunal Federal, sem hesitar, transfere a figura jurídica do domínio por
organização, criada para o sistema de criminalidade estatal e, quando muito, para grupos
mafiosos, à empresas econômicas. Aqui foram punidos os dirigentes fáticos de uma
Sociedade de Responsabilidade Limitada como autores mediatos de estelionatos que haviamsido cometidos por seus empregados em relação à encomenda de mercadorias. A autoria
mediata foi afirmada, apesar de não poder ser verificada «nenhuma atuação concreta ou
inclusive apenas o conhecimento atual dos acusados em relação às encomendas de
mercadorias». Pois «como autor em virtude do domínio do fato», leva-se em conta «também
aquele que se aproveita de condições básicas determinadas por estruturas de organização, que
impulsionam o curso regular». Isto o Supremo Tribunal Federal afirmou «também para
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atividades empresariais». Mas como o domínio do fato deve existir em acontecimento no qual
o acusado não atuou concretamente, isto não está fundamentado de forma exata. O domínio
do fato aqui é utilizado em uma repetição formalista das locuções desenvolvidas na decisão
referente aos disparos no muro, apenas para qualificar a responsabilidade mediata do setor
diretivo de uma empresa como domínio do fato. Porém, este conceito não é apropriado para
isso.
Na literatura alemã, a tentativa do nosso Supremo Tribunal Federal de transferir a figura
jurídica da autoria mediata em virtude de aparatos organizados de poder às empresas
econômicas que atuam principalmente no marco da ordem jurídica vigente, encontrou
somente pouca adesão53 e em sua grande maioria rejeição54. Ainda na «edição comemorativa»
recentemente publicada, mencionada ao início, Zaczyk 55
53 W. Krekeler, Brauchen wir ein Unternehmensstrafrecht? , in: Festschrift für Ernst-Walter Hanack, organizadopor U. Ebert/P. Riess/C. Roxin/E. Wahle, Berlin/New York 1999, 651; L. Kuhlen, Die Abgrenzung von Täterschaft und Teilnahme, especialmente em relação aos chamados representantes de empresas, in: Amelung, Individuelle Verantwortung (nota 18), 71 (79 e ss.); o mesmo, Strafrechtliche Produkthaftung, in:Roxin/Widmaier, BGH -Festgabe (nota 49), 671 e s.; A. Ransiek, Unternehmensstrafrecht , Heidelberg 1996, 46 e
ss.; W. Schild, Täterschaft als Tatherrschaft , Berlin/New York 1994, 23.54 Ambos, (nota 37) 226, 239; N. Bosch, Organisationsverschulden in Unternehmen, Baden-Baden 2002, 251 ess.; W. Bottke, Täterschaft und Gestaltungsherrschaft , Heidelberg 1992, 73; Schönke/Schröder/Cramer/Heine(nota 28), § 25, n.m. 25 a; G. Heine, Von individueller zu kollektiver Verantwortlichkeit. Einige Grundfragen der aktuellen Kriminalpolitik , in: Grenzüberschreitungen, Beiträge zum 60. Geburtstag von Albin Eser, organizadopor B. Burkhardt/W. Gropp/H.-G. Koch, Freiburg 1995, 61 e ss.; Joecks (nota 29), § 25, n.m. 131 e s.; K. Kühl,Strafrecht Allgemeiner Teil, 5. Aufl., München 2005, § 20, n.m. 73, b–d; G. Küpper, Zur Abgrenzung der Täterschaftsformen, GA 1998, 525; R. Merkel, Tödlicher Behandlungsabbruch und mutmassliche Einwilligung bei Patienten im apallischen Syndrom, ZStW 107 (1995) 555; U. Murmann, Tatherrschaft durch Weisungsmacht , GA 1996, 278 e ss.; Otto, Grundkurs AT (nota 12), § 21, n.m. 92; o mesmo, Jura 2001 (nota12), 759; Renzikowski (nota 21), 90 ss.; Rotsch, NStZ 1998 (nota 19), 493 e ss.; o mesmo, NStZ 2005, (nota 19),16 e ss.; Roxin (nota 3) § 25, n.m. 129 e ss.; o mesmo, Die Abgrenzung von Täterschaft und Teilnahme in der höchstrichterlichen Rechtsprechung, in: Roxin/Widmaier, BGH -Festgabe (nota 49), 192 e ss.; J. Schulz, Die
mittelbare Täterschaft kraft Organisationsherrschaft – eine notwendige Rechtsfortbildung?, JuS 1997, 113; B.Schünemann, Unternehmenskriminalität , in: Roxin/Widmaier, BGH -Festgabe (nota 49), 631.55 Zaczyk, (nota 1), 412.
declara esta ampliação efetuada pelo
BGH como uma «degeneração» de minha concepção. Esta rejeição merece, pelos três casos
por mim citados, absoluta adesão, pois dos quatro pressupostos do domínio por organização
faltam, em regra, no mínimo três: as empresas econômicas, contanto que não estejam
envolvidas desde o princípio em atividades criminosas, como regra, não trabalham
desvinculadas do direito. Falta também a possibilidade de substituição daquele que prepara as
condutas criminosas. E também não se pode falar de uma disposição essencialmente elevadaao fato pelos integrantes da empresa, porque, como mostra a realidade da vida, o cometimento
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de delitos econômicos e ambientais, ou até mesmo de delitos de homicídio em hospitais, traz
consigo o grave risco de punibilidade e também o risco de perda do lugar na empresa.
Por outro lado – e aí se situa o principal fundamento para a criticada jurisprudência do BGH,
conforme as declarações do juiz participante – não se pode negar que existe uma necessidade
político-criminal de punir os membros da direção, que estimularam, apoiaram ou apenas
permitiram condutas criminosas em sua empresa, como autores. Muñoz Conde56 e
Schünemann57
Quanto a isso já existem propostas de Tiedemann
procuram, por isso e também porque rechaçam uma autoria mediata, admitir
em tais casos, diferentemente daqueles do âmbito de outra criminalidade, uma co-autoria
entre os membros da direção e executores. Porém, as razões que eu aduzi contra uma co-
autoria no âmbito do domínio por organização valem, em sua grande maioria, também aqui,
de forma que tal solução me parece problemática.
Parece-me mais preciso recorrer à figura jurídica dos delitos de dever, desenvolvida por mim
já há décadas, e fundamentar com seu auxílio a autoria dos membros da direção, na medida
em que se lhes atribui a posição de garantidores em defesa da legalidade dos atos da empresa.
No Código Penal alemão sempre tivemos disposições sobre delitos praticados no exercício da
função. O § 357 diz que: «Um superior que induz seus subordinados a um ato ilícito noexercício da função... ou permite que um dos seus subordinados cometa tal ato ilícito, incorre
nas penas à este cominadas.» Caso se estendesse esta disposição, referente ao âmbito dos
delitos praticados no exercício da função, ao superior que tem o direito de dar ordens em uma
empresa econômica, esta seria uma solução sensata.
58 e Bottke59
56 F. Muñoz Conde, Willensherrschaft kraft organisatorischer Machtapparate im Rahmen «nichtrechtsgelöster»
Organisationen?, in: Festschrift für Claus Roxin zum 70. Geburtstag am 15. Mai 2001, organizada por B.Schünemann/H. Achenbach/W. Bottke/B. Haffke/H.-J. Rudolphi, Berlin/New York 2001, 609 e ss. (620).57 Schünemann, in: Roxin/Widmaier, BGH -Festgabe (nota 49), 621 e ss. (628 e ss.).58 K. Tiedemann, Die Regelung von Täterschaft und Teilnahme im europäischen Strafrecht , in: Festschrift für
Haruo Nishihara, organizado por A. Eser, Baden-Baden 1998, 496 e ss. (511).59 W. Bottke, Täterschaft und Teilnahme im deutschen Wirtschaftskriminalrecht – de lege lata und de lege ferenda, JuS, 2002, 320 e ss. (324).
. Também o Projeto de um
Corpus Juris para a proteção dos interesses financeiros da UE contém no Art. 13 uma regradesta espécie. Eu quero apresentar de maneira breve este modelo traçado de lege ferenda.
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Tiedemann desenvolveu, no marco de um projeto de pesquisa sobre a adaptação do direito
penal na Europa, um dispositivo sobre «responsabilidade por conduta alheia», que dizia da
seguinte forma:
(1) Pune-se como autor também quem tem que responder juridicamente por um ato ilícito não cometidopor terceiro, quando tinha conhecimento do ato do terceiro e podia ter evitado ou dificultadofundamentalmente o seu cometimento.(2) De acordo com a alínea 1 são responsáveis principalmente:a) os membros do governo, detentores de cargo oficial e soldados, por atos que são cometidos pelossubordinados às instruções, subalternos ou destinatários da ordem;b) Proprietário ou dirigente de uma fábrica ou empresa, bem como membros com poder de controle oudecisão em uma fábrica ou empresa, por atos que são cometidos por seus subordinados.
Esta proposta corresponde inteiramente às minhas intenções. A «responsabilidade por conduta
alheia» é incluída como forma independente de imputação da autoria nas disposições sobre
autoria imediata, co-autoria e autoria mediata. O fato de basear-se no «ter que responder
juridicamente» mostra que o dever de impedimento de determinados resultados fundamenta
uma forma independente de autoria, assim como eu já afirmei em relação à categoria, por
mim desenvolvida, dos delitos de dever. E o paralelismo dos representantes oficiais com o
plano dirigente de fábricas e empresas supre as lacunas jurídicas que não podem ser
preenchidas através da figura jurídica do domínio por organização, contrariamente à hipótese
do nosso Supremo Tribunal Federal.
Bottke propõe uma complementação ao § 357 do StGB que, de acordo com o seu
entendimento, poderia ser ampliada da seguinte forma: «quem, na qualidade de superior
legitimado a dar ordens em uma empresa, fábrica ou repartição pública, induz seus
subordinados à prática de fatos puníveis relativos à empresa, à fábrica ou à repartição ou
permite que aconteça tal fato ilícito, incorre nas penas cominadas para o autor deste fato
ilícito. O mesmo vale para o membro de uma empresa, fábrica ou repartição que está
encarregado da inspeção ou controle sobre as atividades realizadas por um outro dos seus
membros, contanto que o ato cometido por este pertença às atividades que ele tem que
fiscalizar ou controlar». Isto corresponde, em essencial, amplamente à proposta de
Tiedemann, porém circunscreve de forma mais precisa os limites do dever de responder.
Finalmente, também se tem indicado ainda o Art. 13 do projeto de um Corpus Juris para a
Proteção dos interesses financeiros da União Européia, que igualmente tenta conduzir a idéia
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de responsabilização pelo comportamento alheio em empresas econômicas à forma legal. O
dispositivo reza: «Se um fato punível é cometido através de uma empresa, por uma pessoa
que está sob a autoridade do dirigente ou de outra pessoa que detenha o poder de controle ou
decisão na mesma, então também o dirigente da empresa ou o detentor do controle ou da
decisão é responsável, caso tivesse conhecimento do cometimento do fato punível, dado a
ordem para o cometimento, deixado ocorrer o fato punível ou omitido as medidas de controle
necessárias.»
Todas as três propostas seguem na mesma direção, porém distinguem-se em alguns aspectos.
Mas isto teria que ser tema de outra exposição, para então poder seguir adiante e encontrar
uma formulação definitiva. Inclusive, para a dogmática do direito penal resulta, aqui, a nova
tarefa de delimitar um do outro, o âmbito de responsabilidade dos indivíduos participantes da
empresa. Mas sempre são oferecidas tão só «medidas de condução empresariais específicas,
ou seja, a dimensão dos deveres dos indivíduos orienta-se de acordo com a realidade do
âmbito de controle que lhe é confiado. Ao contrário, a alta direção tem o pleno dever de
controle e organização. Na verdade, em uma direção com muitos cabeças, determinados
âmbitos de responsabilidade podem ser destinados a dirigentes individuais, de modo que os
demais são eximidos do seu dever de fiscalização. Mas quando é perceptível que outrodirigente não cumpre seus deveres conforme a ordem, ou quando a empresa como um todo é
afetada por uma situação excepcional ou de crise, vige, ao contrário, o princípio da
responsabilidade coletiva de todos os dirigentes. A direção da empresa também pode delegar
determinadas tarefas de controle. Porém, ela deve então selecionar cuidadosamente seus
colaboradores, fixar de forma exata seu círculo de deveres e se convencer, por meio de
controles técnicos, da evolução ordenada dos processos empresariais. As particularidades
pertencem ao âmbito especial da criminalidade empresarial e aqui não podem serapresentadas.
VII CONCLUSÃO
Eu resumirei. O domínio do fato em virtude de aparatos organizados de poder é uma forma
independente de autoria mediata. Ela não pode ser compreendida, de maneira mais adequada,como uma co-autoria ou instigação. A autoria mediata não se baseia no domínio sobre o
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executor direto, mas sim no domínio sobre o aparato de poder que garante a realização do
tipo. O domínio do fato em virtude de aparatos organizados de poder baseia-se concretamente
em quatro dados: no poder de mando, na desvinculação do direito pelo aparato de poder, na
fungibilidade e na disposição essencialmente elevada do executor ao fato. Como estes
pressupostos existem apenas no injusto do sistema estatal, no «Estado criminoso dentro do
Estado», assim como a Máfia e formas semelhantes de manifestação da criminalidade
organizada, não se pode transferir esta figura jurídica aos fatos puníveis em empresas
econômicas, ao contrário da opinião do Supremo Tribunal Federal alemão. Aqui é necessária
uma regulamentação especial referente à responsabilidade do dirigente por fatos puníveis que
foram cometidos na empresa. A responsabilidade penal das pessoas que controlam ou
decidem é reduzida a um dever de garantidor que fundamenta uma forma independente de
autoria.
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