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Filipa Caldeira e Pedro Batalha, Partners da Fullsix Portugal e colaboradores no Curso Geral de Gestão da NOVA Executivos, escreveram em conjunto com a Nova School of Business & Economics um “applied knowledge” sobre a Comunicação sincronizada: O poder está no “ser digital”.
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applied knowledge
Comunicação sincronizada O poder está no “ser digital” Julho de 2012
Esta é a era da colaboração em que os consumidores participam na criação de valor através
da cocriação de produtos, serviços e elementos de comunicação. Os marketers já não têm o
controlo das suas marcas porque agora competem com o poder coletivo dos consumidores,
munidos de ferramentas de comunicação com um poder ímpar na história. Como resposta
a esta nova realidade propomos um modelo de comunicação, a que chamámos comunicação
sincronizada, baseado na integração do consumidor, como agente ativo, no processo de
comunicação das marcas, promovendo-se o estabelecimento de uma conversa contínua
entre a marca e os seus consumidores. Nessa conversa, a relevância do conteúdo assume
maior importância que a frequência do broadcast da mensagem.
Filipa Caldeira
Fullsix
Pedro Batalha
Fullsix
António Abrantes
Nova School of Business and Economics
Jorge Velosa
Nova School of Business and Economics
Introdução
A era da colaboração e a nova forma de
pensar e agir por parte dos consumidores,
potenciada por significativas alterações
tecnológicas, obriga as marcas e os
marketers a rever as suas metodologias de
abordagem do mercado e a forma com se
relacionam com os seus potenciais clientes.
O modelo de comunicação unidirecional
perde vigor e o desafio de adaptação é real.
Questionamo-nos até que ponto estas estão
preparadas para permitirem e potenciarem
a entrada dos consumidores num território
que até agora tem sido exclusivamente seu
– a estratégia de comunicação e a própria
identidade da marca.
Neste artigo pretendemos identificar
algumas das alterações evolutivas mais
significativas no comportamento dos
consumidores relativamente às marcas e ao
2applied knowledge
Nova School of Business and Economics
Comunicação sincronizada O poder está no “ser digital” Julho de 2012
processo de decisão de compra, e propor um
modelo alternativo de comunicação, a que
chamámos comunicação sincronizada. Tal
como na natação sincronizada, onde todos
os elementos da equipa executam uma
série de movimentos que se sincronizam
num conjunto dinâmico e harmonioso, a
comunicação sincronizada procura construir
a identidade da marca numa sincronia entre
esta e os consumidores assumindo estes um
papel fundamental na sua construção.
Este modelo pretende contribuir para
construção de um novo paradigma de
comunicação multidireccional que envolve o
consumidor numa conversa contínua, fluida
e relevante ao longo de toda a relação marca-
cliente, e sustentada pela maior importância
da relevância face à frequência.
de “FAzer dIgItAl” A “Ser dIgItAl”Uma nova forma de consumir
Não se pense que esta é uma realidade exclusiva
do mundo desenvolvido. Mais de dois mil
milhões de pessoas são utilizadores da internet
– cerca de 30% da população mundial1. Em
Portugal este número é superior a cinco milhões
(62% das pessoas com mais de 15 anos)2. Os
números de ligações entre equipamentos é ainda
mais impressionante – trinta e cinco mil milhões
de aparelhos estão ligados à internet.
O facebook tem mais de 875 milhões de
utilizadores ativos e mais de 50% fazem login
todos os dias, são lá colocadas diariamente
mais de 250 milhões de fotografias e são
integradas mais de sete milhões de aplicações.
Em Portugal o número de utilizadores de
facebook é superior a quatro milhões. Da
AppStore da Apple já se fizeram mais de
vinte cinco mil milhões de downloads. No final
de 2011 existiam mais de seis mil milhões
de ligações móveis. Desde o lançamento
do iPad pela Apple, já se venderam mais de
cem milhões de Tablets em todo o mundo.
Estes são números impressionantes mas
que subestimam a verdadeira mudança
– a mudança de comportamento dos
consumidores.
A Web 2.0 já é passadoEm 2007 Constantinides e Fountain (2007)
definiram a Web 2.0 como um “conjunto de
aplicações de código aberto, interativas e
controladas pelos utilizadores que expandem
as experiências, o conhecimento e o poder de
mercado dos participantes nos processos sociais e
empresariais”. Para os autores, a “Web 2.0 suporta
a criação de redes informais que facilitam o fluxo
de ideias e conhecimento permitindo a eficiente
geração, disseminação, partilha e edição de
conteúdo informativo”3. Os impactos no Marketing
deste novo paradigma são significativos,
os consumidores assumem o controlo dos
media, a diversidade e a expressão individual
substituem o conformismo, e as “conversas” entre
consumidores e entre a marca e os consumidores
substituem o controlo absoluto da marca4.
Comunicação sincronizada. O poder está no “ser digital” 3applied knowledge
Nova School of Business and Economics
1 Fonte: Internet World Stats, 2011
2 Fonte: Social Bakers, 20113 Constantinides e Fountain
(2008)4 Meadows-Klue (2008)
Este novo mundo tornou-nos “fazedores”
de conteúdo digital. Nos blogues, nas redes
sociais, nos fóruns, nas comunidades, somos
nós os criadores das notícias, das opiniões, dos
comentários. Nós, os consumidores, assumimos
parte do controlo e as marcas têm, agora, um
novo parceiro na construção da sua identidade.
A maior parte da geração dos 30 e dos 40 já se
considera “literata digital”. Têm uma página
no facebook e outra no LinkedIn, consultam
regularmente uma série de blogs e até leem
as notícias na Internet. Mas os adolescentes,
e mesmo a geração dos 20, vê televisão, joga
no iPad, troca sms com os amigos e conversa
no facebook, tudo isto ao mesmo tempo.
O telemóvel, cada vez mais sob a forma de
“smartphone” permite-lhes estarem ligados,
onde quer que estejam, 365 dias por ano. Esta é a
diferença entre “fazer digital” e “ser digital”. Existe
um nova geração de consumidores para quem
a expressão “digital” não é sequer verbalizada
pois todo o seu modo de pensar incorpora já o
conceito, como fazendo parte do ADN da sua
interação com o mundo. Eles “são digital” tal
como a geração dos 40 foi audiovisual.
E é aqui que a Web 2.0, o novo paradigma da
segunda metade da década zero, é já uma
realidade ultrapassada. A nova geração de
consumidores não encara a cocriação de
conteúdo e o seu poder como consumidor
como um novo paradigma ou uma revolução
comportamental, mas sim como uma constante
óbvia e integrante natural do seu dia-a-dia.
Mas o mais revolucionário não é a própria
mudança em si. Verdadeiramente alucinante é a
velocidade a que a mudança se deu e os impactos
que tem na forma como as marcas comunicam
criando um cenário de media totalmente novo.
novo cenário de mediaMuitas organizações lutam para se ajustarem
a esta nova realidade. O enfoque obstinado
no “broadcasting” (figura 1) e nos GRP (Gross
Rating Points) ainda orienta muitas decisões de
comunicação de marketing, apesar da maioria
das empresas admitir que os resultados
obtidos são cada vez menores. É um modelo
que favorece a massificação da mensagem
através de uma aposta na frequência, na
procura de chegar o maior número de vezes ao
maior número de consumidores potenciais.
Os marketers não podem mais subestimar
as dramáticas mudanças tecnológicas e de
media e ignorar a transformação verificada no
comportamento dos consumidores. O mundo
mudou, os consumidores mudaram, as marcas
têm de mudar. A questão é se conseguirão
mudar tão depressa quanto as novas
exigências do mercado.
os novos consumidoresNascidos num mundo digital, os “nativos
digitais” veem a vida como um jogo, exigem
estar conectados 24 horas por dia em diversas
plataformas, são multitarefas compulsivos
e não se pense que serão a geração de
consumidores de amanhã. Eles são já
consumidores e serão a esmagadora maioria
dentro de muito pouco tempo.
Quando um “nativo digital” fizer 21 anos, em
média, já recebeu e enviou 250 mil emails,
mensagens instantâneas e sms; já usou o
telemóvel mais de 10 mil horas; já jogou mais
de cinco mil horas de videojogos; e já passou
mais de 3500 horas nas redes sociais online5.
Estes consumidores fazem parte do grupo
dos “Smarter Consumers”, assim definido pelo
IBM Institute for Business Value6 no estudo de
2011 que revelou uma série de tendências que
mostram bem quem é este consumidor.
Além do facto de serem muito digitais,
estes novos consumidores revelam duas
características muito interessantes: São pouco
convencionais – São consumidores que refletem
pouco o seu nível de riqueza nos seus hábitos
de compra. Vinte a vinte cinco por cento dos
consumidores procuram promoções e compram
apenas aquilo que realmente necessitam,
independentemente do seu nível de rendimento
ou do seu otimismo relativamente ao seu futuro
financeiro; Querem sentir-se no poder – O
“Smarter Consumer” exige um bom serviço ao
cliente e exige ser bem informado. Quer ter
uma noção clara de todos os preços praticados
no mercado para um determinado produto ou
serviço, e tem ferramentas para o fazer. Prefere
pagar via mobile do que ficar na fila da caixa.
O “Smarter Consumer” está para ficar, ou
melhor, o “Smarter Consumer” está por muito
Comunicação sincronizada. O poder está no “ser digital” 4applied knowledge
Nova School of Business and Economics
TV RÁDIOIMPRENSAOUTDOORSPONTO DE VENDAMonólogoMedia de massasMensagem pushEntretenimento
Fonte: Fullsix 2011
No entanto, este modelo de comunicação é
desadequado para a realidade introduzida
pelo conceito de Web 2.0 e ainda mais para
os “nativos digitais”, a nova geração de
consumidores que nem sequer entende a lógica
de não participar ativamente no processo
comunicacional. É a era das plataformas multi-
interativas onde a marca comunica de forma
iterativa e contínua com os seus consumidores
(figura 2). Os brand managers têm agora de se
preocupar em assegurar uma conversa contínua
interessante e relevante sobre a sua marca.
PUBLICIDADE ONLINEEMAILPESQUISAInterativoMassa & nichoMensagem pushInteressante
COMUNDIDADESBLOGSMICRO BLOGSMOBILESocialDiálogoNichoÚtil
Figura 1 – Comunicação unilateral da Marca
Figura 2 – Comunicação bidirecional da Marca – Plataformas Multi-interativas
Fonte: Fullsix 2011
5 Rainie (2006)6 Fonte: IBM Institute for
Business Value (2011), Capitalizing on the Smarter Consumer
pouco tempo pois brevemente irá evoluir para
algo como o “Even Smarter Consumer” com
hábitos que não podemos sequer imaginar.
de compra e que exigem novas formas de
comunicação. Propomos-lhe uma nova jornada
por caminhos ainda por desbravar.
decisão de compra, uma nova jornadaO modelo tradicional que pretende descrever o
processo de decisão de compra (Figura 3) parte
da criação de notoriedade através de métodos
de comunicação clássicos como a televisão
ou a imprensa escrita passando pelo processo
de criação de um grupo de consideração, pela
seleção, pela compra para terminar na criação
da lealdade.
Comunicação sincronizada. O poder está no “ser digital” 5applied knowledge
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Visualizaçãoanúncio TV ou imprensa
NOTORIEDADE
Ir à lojacomparar opções
CONSIDERAÇÃO
Escolher melhoropção
SELEÇÃO
Comprarproduto
COMPRA
Acompanhar a marca
FIDELIZAÇÃO
Figura 3 – Modelo tradicional de processo de decisão
o deSAFIo dAS MArCASUma nova forma de comunicar
A nossa proposta é que a resposta não deve
ser digital, ou seja, não se trata de criar novas
ferramentas de comunicação digitais mas sim
de mudar todo o paradigma de comunicação,
redefinir um dos pilares do Marketing
Mix. Trata-se de rearranjar este conceito
adaptando-o ao novo consumidor digital.
Propomos substituir o “P” de Promotion pelo
“R” de Relationship. Será eventualmente menos
sexy pois 3 P’s e 1 R nunca será tão atraente
como 4 P’s.
Nos próximos parágrafos proporemos um
modelo de comunicação orientado pelos
“Smarter Consumers” com novos processos
Fonte: Fullsix 2011
Qual o verdadeiro impacto nas marcas desta
vertiginosa onda de mudança? Estão as marcas
preparadas para este impacto?
MARCA
LOJA
novo modelo de comunicação baseado
no estabelecimento de uma relação de
continuidade entre a marca e os seus
utilizadores. Uma relação onde os próprios
consumidores sejam um meio de comunicação,
onde sejam consumidores e criadores, onde
estejam em parceria com a marca no processo
de construção da própria identidade da marca.
E, para construir esta relação de continuidade,
a marca tem de descentrar a sua comunicação
do produto para a centrar na história que
conta. Como diz Seth Godin, o “marketing já não
é acerca das coisas que se fazem, mas da história
que se conta”7.
Esta nova jornada de compra foi estudada já
por outros8, com consequências importantes
para o processo de decisão do consumidor
da era digital. Baseando-se num estudo
do comportamento de compra de 20.000
consumidores em cinco sectores de atividade
em três continentes, Edelman e os seus
colegas da McKinsey & Company identificaram
aquilo a que chamam a “Consumer Decison
Journey” ( figura 5). O marketing tomava
Este modelo já não explica o processo de
decisão de compra do “ser digital” que é tudo
menos linear. De facto ele ainda compra na
loja, mas também compra online; ele ainda
conhece os produtos pela televisão ou pela
imprensa mas agora entra, principalmente,
em contacto com os diversos produtos ou
serviços através da rede de amigos, das redes
sociais e da internet; ele ainda se desloca às
lojas para comparar as diversas opções mas
agora usa um enorme manancial de fontes
de informação, onde se destacam as redes
sociais e a rede de amizades, para criar o seu
grupo de consideração (figura 4). Ou seja, a
abordagem tradicional que parte do objectivo
de comunicação para definir os meios e a
mensagem a utilizar perde relevo perante
uma complexa rede de influências a que o “ser
digital” está sujeito para tomar a sua decisão,
principalmente quando e porque pretende ser
o dono do processo e não estar sujeito a um
modelo de comunicação unidirecional.
O processo de compra do “ser digital” é
fragmentado e este novo consumidor quer
estar (e está) em controlo. Exige-se um
Comunicação sincronizada. O poder está no “ser digital” 6applied knowledge
Nova School of Business and Economics
Loja TV, imprensa
Amigos Mobile Pesquisa SitesSocial media
Publicidadeonline
NOTORIEDADE
CONSIDERAÇÃO
PESQUISA
SELEÇÃO
COMPRA
EXPERIÊNCIA
RE-COMPRA
Figura 4 – uma nova jornada de compra
Fonte: Fullsix 2011
7 Godin (2005)8 Court, Elzinga,Mulder,Vetvick
(2009), Edelman (2010)
Comunicação sincronizada. O poder está no “ser digital” 7applied knowledge
Nova School of Business and Economics
como dado adquirido um funil de decisão em
que os consumidores iniciavam o processo
com muitas marcas sob consideração e as
reduziam a uma marca só no fim do processo.
No entanto, na investigação realizada,
concluíram que os consumidores, em vez
de sistematicamente reduzirem as suas
escolhas, optavam por um processo muito
mais iterativo e menos redutor, em quatro
fases: consideração, avaliação, compra e enjoy-
advocate-bond.
Na fase de consideração, com o atual leque
de recursos disponíveis e a abundância
de informação do digital, o nº de marcas/
produtos sob consideração é frequentemente
mais reduzido. Segue-se a fase de avaliação
onde um conjunto de produtos iniciais sob
consideração é frequentemente expandido,
à medida que o consumidor procura
informação. Trata-se de uma nova avaliação
ativa, propulsionada por ferramentas de
apoio digital, em que se adicionam marcas
e se eliminam algumas das inicialmente
consideradas – no sector automóvel, por
exemplo, 2.2 marcas eram adicionadas ao
conjunto inicial de 2.8 marcas. Na fase de
compra a decisão de compra é, cada vez mais,
atrasada até ao ponto de venda, pelo que a
brand activation é um instrumento que permite
um contacto muito eficaz. Finalmente, na fase
de Enjoy-Advocate-Bond, que se verifica após
a compra, desenvolve-se uma ligação mais
próxima com o produto e com novos pontos
de contacto. Mais de 60% dos consumidores
de produtos de cuidado facial, de acordo
com a pesquisa da McKinsey, realizaram
pesquisas on-line sobre os produtos depois da
compra. Quando o novo consumidor digital
está satisfeito com a compra transforma-se
num embaixador ativo, por passa-palavra
ou word-of-mouth. Claro que a insatisfação,
a existir, origina o corte de relações com a
marca e uma propagação amplificada da má
opinião. Mas, se o comprador é embaixador
da marca, então entra num ciclo virtuoso de
enjoy-advocate-buy sem voltar a passar pelas
fases de consideração e avaliação ativa.
Esta análise conduz, de acordo com Edelman,
a duas consequências importantes: a primeira
traduz-se na importância de entender a que
fase da jornada de compra devemos afectar
recursos. A maior parte dos orçamentos de
marketing (70 a 90% dos analisados) tendem
a ser dedicados a Publicidade e Promoção
que impacta o consumidor nas fases de
consideração e compra. No entanto, o
consumidor na era digital é mais influenciado
pelo conselho e recomendação, pelo advocacy,
que não se obtêm pela comunicação
unilateral, pelo bombardeamento de uma
Figura 5 – nova jornada de compra (II)
Antes: a metáfora do funil – durante muitos anos os marketers assumiram que os consumidores começavam o processo de escolha com um número elevado de marcas sob consideração e afunilavam metodicamente as suas escolhas até chegar a uma marca só.
Depois: novos dados mostram que em vez de sistematicamente reduzirem as suas escolhas, os consumidores adicionam e subtraem marcas num processo de avaliação extenso. Depois da compra entram frequentemente numa relação aberta com a marca, partilhando a experiência on-line.
Fonte: Edelman Harvard Business Review Dezembro 2010
Muitas Marcas
Menos Marcas
Escolha Final
Compra
O Laço de Lealdade
Liga-se
AdvogaUsufrui
Compra
Considera
Avalia
Comunicação sincronizada. O poder está no “ser digital” 8applied knowledge
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audiência num só sentido da publicidade
tradicional. A influência acontece com mais
peso nas fases de avaliação e enjoy-advocate-
bond. Se a marca não é recomendada, se não
é discutida on-line pode não sobreviver ao
processo de escolha. Este é o papel duplo
consumidor-criador que acima comentámos,
que se torna embaixador e cocria a marca.
A segunda consequência é que os orçamentos
de marketing devem ser construídos de outra
forma. A filosofia tradicional do funil baseava-
se na comunicação unidirecional baseada
em paid media. A comunicação deve agora
cobrir também os owned media (os canais
controlados pela marca como o seu website)
e os earned-media (canais criados pelo cliente,
como comunidades de entusiastas, conversas
originadas não pela empresa mas pelos
consumidores). A nova consumer-decison journey
recomenda uma conversa, não um discurso
unidirecional.
CoMunICAção SInCronIzAdA
Num mundo repleto de dados, onde a
informação que circula entre os consumidores
é imparável, as marcas que querem obter
resultados devem sincronizar a experiência
integrada que oferecem aos seus consumidores
com os seus valores autênticos. E devem
sincronizar todas as suas ações com a
realidade dos consumidores, do mercado e com
o próprio consumidor, que assume agora um
papel ativo no processo de comunicação.
Mais relevância menos frequênciaA nossa proposta baseia-se num modelo que
realça a importância da relevância sobre
a frequência. Mais do que sermos ouvidos
repetidamente, é fundamental que a nossa
mensagem seja relevante para quem nos
ouve. Num mundo muito mais complexo e
transparente, não ganha quem fala mais alto,
mas sim quem é mais transparente, quem é
mais honesto e quem está mais disponível
para falar com os consumidores. Na base
do nosso modelo está a interação entre três
elementos fundamentais da comunicação que
consubstanciam três questões fundamentais a
que as marcas têm de responder (Figura 6).
| Marca
| O que é que a marca quer dizer?
Tal como em todos os domínios do
conhecimento humano, também as marcas
têm muito mais informação à sua disposição.
Há mais dados de mercado, mais dados
sobre os consumidores, mais dados sobre a
concorrência. Esta enorme quantidade de
dados deve ser usada para criar um novo
patamar de inteligência sobre o consumidor,
que torne as marcas mais relevantes.
Juntando conteúdos de interesse aos novos
canais digitais, as marcas devem ter como
objetivo construir uma experiência realmente
diferente, em que a marca tem um papel na
vida do consumidor, e não apenas ocupar 30
segundos da sua atenção. As campanhas de
comunicação devem ser concebidas como
organismos vivos, pilotados pela tecnologia
e que se sincronizam com as necessidades e
reações dos consumidores.
| Perfil do consumidor
| No que estão interessados?
Os consumidores passaram de receptores
da mensagem para atores desta nova
experiência da marca. Hoje em dia, o valor
de um consumidor para uma marca não é
unicamente a sua capacidade de consumo,
mas também o que pode trazer como
influenciador e/ou embaixador da marca,
ou seja o valor direto e indireto. Este papel
reforçado, implica uma cada vez maior
capacidade de ouvir, perceber, estudar e
agir em consonância com o interesse do
consumidor. Um maior investimento em criar
conteúdos e histórias relevantes para todos
e interessantes individualmente, é um factor
crítico de sucesso neste novo modelo.
| Comportamento do consumidor
| Quando e onde estão dispostos a ouvir?
Os meios digitais, e nomeadamente o crescente
Comunicação sincronizada. O poder está no “ser digital” 9applied knowledge
Nova School of Business and Economics
uso do telemóvel, trazem uma nova dimensão à
importância do comportamento do consumidor.
Ao serem corretamente utilizados e integrados
na comunicação da marca, a sua agilidade e
interatividade são críticos para a necessária
sincronização com a necessidade do consumidor
num preciso local e momento. A resposta
que um consumidor pretende obter de uma
determinada marca, depende do contexto em
que se encontra. Esta resposta é claramente
diferente, se o consumidor está a procurar uma
marca à noite, no computador em sua casa, ou se
o está a fazer às 4 horas da tarde, em plena rua.
com o consumidor que lhe fornece conteúdos
totalmente relevantes, utilizando a agilidade
e massificação dos canais digitais, para ser
pertinente individualmente e simultaneamente
criar uma ativa e participativa comunidade.
A Nike Plus contava já com uma comunidade
de mais de dois milhões de membros em
Fevereiro de 20119, e é um exemplo de sucesso
do uso eficaz de redes sociais, cuja relevância
e engagement para o consumidor se consegue
pelo facto de ser importante para os seus
membros (que partilham uma paixão comum,
a corrida), personalizada (guarda os dados de
cada corrida), interativa (feed facebook emite
um aplauso com cada “like” e os consumidores
estão ligados em rede), integrada (os
colaboradores da Nike são participantes ativos
da comunidade) e autêntica (comunidade é
consistente com o posicionamento da marca).
Foi também parte da razão do aumento da
quota de mercado da marca na categoria de
sapatos de corrida de 48% em 2006 para 61%
em 2008.
Sensibilidade e sincronizaçãoPara evoluir no sentido de maior relevância e
menos frequência, as marcas têm de modificar
os seus racionais de comunicação unidirecional
a adoptar propostas de relacionamento com
o seu público. Num relacionamento, que se
pretende duradouro, os velhos modelos de
transmissão de informação são obsoletos
e as grandes ações pontuais perdem vigor
quando se pretende entrar no território da
cumplicidade com o nosso consumidor-
cocriador. Este modelo não procura a
memorização de uma mensagem específica,
mas sim seduzir e convencer o consumidor
de uma forma contextual e individual. Neste
registo, a sensibilidade no processo relacional
e a sincronização da mensagem e do contexto
com o nosso novo interlocutor revelam-se
essenciais (Figura 7).
Sensibilidade
Mais do que falarem, as marcas devem ouvir.
Recorde-se que se trata agora de uma conversa
onde o consumidor assume um papel com,
pelo menos, igual poder. Além do que, é nosso
cocriador. As marcas não têm já de se centrar
em informar mas em envolver-se com os seus
O QUE AAMARCA QUER DIZER
MARCA PERFIL DO CONSUMIDOR
COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR
QUANDO E ONDE ESTÁ
O CONSUMIDOR DISPOSTO A OUVIR
EM QUE ESTÁ INTERESSADO
O CONSUMIDOR
Fonte: Fullsix 2011
Figura 6 – Comunicação Sincronizada
Um exemplo da sincronização destes três
elementos é o caso Nike Plus. Começando
por um par de ténis de jogging, a Nike criou a
plataforma Nike Plus que agrupa conteúdos
relevantes para o consumidor (quilómetros
corridos, tempo, calorias, músicas favoritas…)
disponibilizados pelos canais adequados
(iPod, telemóvel, internet, facebook) para
cada situação, em tempo real e permitindo
uma nova experiência do treino de jogging, a
nível pessoal, bem como de partilha com os
amigos e a comunidade. É uma extraordinária
demonstração deste novo modelo, em que
em vez da tradicional campanha, baseada
numa ideia criativa e numa mensagem
encapsulada num anúncio de 30 segundos,
foi criada uma plataforma de relacionamento 9 Gupta, Amstrong, Clayton
(2011)
Comunicação sincronizada. O poder está no “ser digital” 10applied knowledge
Nova School of Business and Economics
clientes e em inspirá-los com propostas que
façam a diferença, que sejam notáveis10.
A lógica das grandes ideias criativas surge
pálida perante um consumidor que prefere a
autenticidade e a relevância. As mensagens
e as propostas de valor das marcas são
escrutinadas continuamente e o resultado do
escrutínio pode ser (e é) comunicado de forma
imediata para milhares de pessoas.
Finalmente, mais do que nunca, as marcas
não se podem ficar pelas boas intenções.
Não chega dizer que se faz; é crucial fazer
e cumprir as promessas. O “ser digital” está
permanentemente atento e leva sempre a sério
todas as promessas da marca.
Sincronização
Na fase de planeamento da comunicação
devem-se utilizar todos os factos e dados
relevantes para desenvolver narrativas de
marca autênticas, relevantes e coerentes
com a prática diária e histórica da marca.
Mais importante que “dizer”, a marca tem
de garantir que consegue “fazer” a sua
proposta de valor ou narrativa – walk the talk.
A marca deve utilizar as suas ferramentas
e equipas para sincronizar todas as ações e
campanhas em torno de todos os pontos de
contacto procurando estabelecer três níveis de
sincronização:
• sincronizaçãodoperfilindividualdos
consumidores (quem, o quê, quando, como),
• sincronizaçãocomportamental(quem,o
quê),
• sincronizaçãoderesultados(gestãodiária,
semanal)
É este nível de sincronização que irá
determinar o sucesso da comunicação. O
conteúdo e a relevância da informação
destacam-se por oposição ao investimento em
media (mais relevância, menos frequência).
Uma conversa assume um registo de
continuidade que diverge de campanhas de
comunicação bem definidas no tempo. A marca
tem de estar sempre on e não comunicar a
espaços, não se pode “desligar” sob pena de
desaparecer do imaginário do “ser digital”. Deve
tornar-se uma presença constante e próxima
nas conversas que se estabelecem na rede de
amizades dos seus clientes – é a substituição
do “Broadcast” pelo “Friendcast”.
A repetição da mensagem não é mais o
caminho para a eficácia da comunicação,
é fundamental para a marca interpretar
o contexto em que o seu cliente se situa
e adequar-se devidamente. Não é mais
SENSIBILIDADE
SINCRONIZAÇÃO
Figura 7 – Sensibilidade e sincronização
DE
FALAR
INFORMAR
GRANDE IDEIA CRIATIVA
DIZER
INVESTIMENTO EM MEDIA
CAMPANHAS DE MARCA
MENSAGEM
BROADCASTING
REPETIÇÃO
COMUNICAÇÃO MULTICANAL
OUVIR
ENVOLVER E INSPIRAR
RELEVANTE E AUTÊNTICO
FAZER
CONTEÚDO E INFORMAÇÃO
MARCAS SEMPRE ON
CONVERSA
FRIENDCASTING
CONTEXTO ADEQUADO
COMUNICAÇÃO FLUÍDA
PARA
10 Godin (2005)
Comunicação sincronizada. O poder está no “ser digital” 11applied knowledge
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eficiente utilizar uma lógica de comunicação
multicanal, compartimentada e estruturada.
A comunicação deve ser encarada como algo
fluido, contínuo e independente do canal ou
meio utilizado – não esqueçamos que se trata
de uma conversa.
Impactos na organizaçãoA uma conversa subjazem dinâmicas
diferentes daquelas que estão subordinadas a
um discurso. Para estabelecer uma conversa
séria e coerente com o “ser digital” as
organizações precisam de se munir de algumas
ferramentas fundamentais a qualquer tertúlia:
• ouvidos – a organização precisa de criar
ferramentas de auscultação do que se
diz sobre ela, sobre os seus produtos ou
serviços, sobre os seus executivos, sobre as
suas políticas, sobre as suas mensagens.
Há várias formas de operacionalizar este
“sentido”:
– Atribuir esta responsabilidade a uma
equipa específica, como fez a Gatorade
com o “Mission Control Center”11, que
monitoriza, em tempo real, toda a
atividade das redes sociais que envolva
informações sobre a Gatorade;
– Criar grupos especializados na “escuta”
de canais específicos mantendo uma
coordenação centralizada por forma a
assegurar o controlo da informação;
– Disseminar por toda a organização
uma cultura de “escuta” para que cada
colaborador seja um elemento ativo do
processo de comunicação sincronizada,
criando canais específicos para que essa
informação possa ser centralizada e
tratada convenientemente;
– Subcontratar a responsabilidade pela
“escuta” a empresas especializadas,
garantindo um fluxo contínuo
de informação com a empresa
subcontratada.
• Boca – como em qualquer conversa, ouvir
não chega, a empresa terá de participar
ativamente no diálogo respondendo de
forma iterativa e atempada aos argumentos
desenvolvidos pelo “ser digital”. Também
aqui, terá de criar alguns instrumentos
que lhe permitam falar, nomeadamente,
estar presente no maior número de fóruns
onde possa interagir com os consumidores,
sejam eles digitais, como as redes sociais, ou
tradicionais como os canais de distribuição.
Tal como com os ouvidos, poderá utilizar
recursos internos para operacionalizar
este sentido, ou recorrer a empresas
especializadas.
Mas esta é a parte mais fácil de todo o
processo. A parte difícil, e que implica
uma alteração profunda na maioria das
organizações, é a que diz respeito à criação
da história que se vai contar e à forma como
esta é incorporada no ADN organizacional,
o que nos leva à próxima ferramenta da
tertúlia.
• Cérebro – ouvir e falar seriam atividades
inócuas se entre as duas não se pensasse.
Para evitar que a nossa conversa se torne
inconsequente, é fundamental que a
organização crie um “cérebro” que 1)
produza uma história relevante e coerente
com a sua proposta de valor, 2) transforme
a informação “escutada” em insight sobre
o “ser digital”, e 3) conceba uma resposta
ou argumento racional alinhado com a
história proposta e contribua para a criação
de valor quer para o interlocutor, quer para
a própria organização. Esta ferramenta
exige autonomia, responsabilidade e um
conhecimento profundo da identidade
organizacional, o que implica senioridade.
Chief relationship officer
Acima de tudo, o “cérebro” terá de ter a
capacidade de mobilizar toda a organização
transformando-a numa unidade coerente e
participativa na tertúlia que se estabelece
com o ”ser digital”. Só assim se garante que
a mesma história seja contada em todos os
pontos de contacto da empresa com o “ser
digital”. Esta capacidade requer a existência de
um campeão da conversa que se estabelece,
ou CRO (Chief Relationship Officer), que
tenha acesso direto ao topo da organização e
competências organizacionais transversais.
Requer organizações pouco hierarquizadas
onde o fluxo de informação seja rápido e
eficaz. Requer que a responsabilidade de
marketing saia da esfera do departamento de
marketing ou de comunicação e passe a ser
11 http://www.youtube.com/user/PepsiCoVideo/videos?query=gatorade+mission+control
uma responsabilidade de toda a organização,
onde o garante da coerência da história que se
conta é o CRO. Mas, mais importante, aumenta
dramaticamente a necessidade de marketing
interno e de partilha social, para que todos, na
organização, tenham acesso às ferramentas,
conteúdo e dados para participar ativamente
na conversa.
ConclusãoA comunicação sincronizada é uma abordagem
alternativa de comunicação de marketing
devidamente adaptada ao “ser digital” e à
revolução que este induziu nos processos
de decisão de compra e de envolvimento
com as marcas. O foco central deste modelo
de comunicação passa por um melhor
desempenho através de maior relevância e
menor frequência. Por um lado, sincroniza
toda a comunicação, interação e reputação
criativa com a realidade e com os valores
fundamentais da marca garantindo a sua
autenticidade. Por outro lado, sincroniza
todas as ações com os perfis de consumo, o
comportamento do consumidor, o desempenho
do negócio e, principalmente, o próprio
consumidor numa interação permanente e
contínua. Pretende-se estabelecer uma relação
continuada com os clientes suportada por
uma conversa que aborde um tema e conte
uma história relevante para a marca e para
o consumidor. Uma história onde ambos são
cocriadores.
Comunicação sincronizada. O poder está no “ser digital” 12applied knowledge
Nova School of Business and Economics
referências
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