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EDUCADORES E LUDOEDUCACORES: AS REPRESENTAÇÕES
SOCIAIS DO BRINCAR NA FORMAÇÃO DOCENTE
SOUZA, Joel Mesquita de1 - IEFES/UFC
ALMEIDA, Marcos Teodorico Pinheiro de2 - IEFES/UFC
Grupo de Trabalho - Formação de Professores e Profissionalização Docente
Agência Financiadora: não contou com financiamento Resumo O presente trabalho aborda a representação social do brincar na formação dos educadores, focando na relevância da formação lúdica na formação desses educadores, bem como a valorização da mesma a partir de uma experiência laboratorial com educadores em formação no Laboratório de Brinquedos e Jogos da UFC. Participaram do estudo 30 de pedagogia da Universidade Estadual Vale do Acaraú. A pesquisa utilizou-se como referencial teórico a Teoria das Representações Sociais de Moscovici (1978). A proposta do estudo foi descobrir o que significa para os futuros educadores, o brincar no contexto formativo de professores; que tipo de conhecimento específico eles desenvolveram sobre a utilização dos jogos e brinquedos; como eles se sentiram durante a experimentação dos mesmos e suas impressões. Outros autores dão suporte a teoria, Albuquerque (2005), Bourdieu (2004, 2008), Durkheim (2008) e autores que abordam a formação lúdica como Negrine (2008); Almeida (2011); Santos (1999, 2010), Kobayashi (2011) entre outros. A pesquisa enquadra-se em uma pesquisa de laboratório, em virtude à obtenção de informações, de caráter exploratório e com uma abordagem qualitativa. Devido ao número de participantes e condições da realização da pesquisa utilizamos a disposição metodológica do estudo de caso. Desta forma foram utilizadas duas técnicas de pesquisa, a observação e a entrevista aberta. Ao concluir o estudo ficou constatado que a representação social do brincar não está consolidada nos educadores, comprovando a necessidade de consolidar a formação lúdica dos educadores. Bem como a compreensão da formação lúdica promovida por espaços como brinquedotecas ou laboratórios de brinquedos e jogos e por ludoeducadores competentes serem uma soma preciosa a formação dos educadores. Verificamos que a formação lúdica é um eixo formativo deficiente nos currículos de formação de professores no ensino superior. Ficou comprovada na fala dos participantes a importância da formação lúdica no contexto educativo, seja no ensino formal e não formal. Palavras-chave: Ludoeducador. Formação lúdica. Representações sociais.
1 Graduando em Educação Física da Universidade Federal do Ceará – UFC. E-mail: mesquita.joel@yahoo.com.br. 2 Doutor em Pedagogia pela Universidade de Barcelona (UB). Mestre em Educação pela Universidade de São Paulo (USP). Graduado em Educação Física pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Professor do Instituto de Educação Física e Esportes (IEFES) da Universidade Federal do Ceará (UFC). Coordenador do Programa de Extensão: Centro de Estudos sobre Ludicidade e Lazer (CELULA) da UFC. E-mail: mtpa@ufc.br.
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Introdução
Embora tendo conhecimento da presença de estudos e pesquisas desenvolvidas sobre o
jogo na educação deste os tempos antigos, o jogo só teve um aprofundamento mais científico
no século XIX, com os estudos realizados por Froebel, dando assim início a trabalhos mais
significativos sobre a importância pedagógica do brinquedo e da brincadeira na educação e no
desenvolvimento da criança. O fenômeno identificado como jogo, por ser uma categoria com
propriedades amplas e por assumir significados diversos, passou a ser um elemento estudado
por pesquisadores de várias áreas do conhecimento como a psicologia, antropologia,
sociologia, linguística, filosofia etc. E essa multiplicidade de significados contribui para
dificultar ainda mais a tarefa de inserir e compreender o jogo no seu importante papel no
desenvolvimento infantil. Quando nos referimos ao brincar, educação lúdica, formação lúdica,
etc. Temos plena certeza de que são grandes os desafios que iremos enfrentar para que esta
área possa ser considerada como geradora dos avanços científicos. Ao compará-la com outros
setores (Medicina, Engenharia, Informática...), onde as inovações aparecem com frequência,
percebemos que nos últimos 50 anos pouco aconteceu, e os avanços ocorridos não chegaram a
reverter o processo como um todo. É interessante observar que os acontecimentos marcantes
que influenciaram a educação no decorrer da história não foram obras de educadores, basta
verificar a formação de personalidades como: Comênio, Rousseau, Froebel, Dewey,
Montessori, Decroli, Piaget Wallon, Vygotsky e Gardner.
A grande maioria das instituições educacionais ainda é pautada numa prática que
considera a ideia do conhecimento - repetição sob uma ótica comportamentalista, tornando o
conhecimento cristalizado e/ou espontaneísta e não como um saber historicamente produzido
visto sob a ótica do conhecimento/construção. Educar não se limita a repassar informações ou
mostrar apenas um caminho, aquele caminho que o professor considera o mais correto, mas é
ajudar a pessoa a tomar consciência de si mesma, dos outros e da sociedade. É aceitar-se
como pessoa e saber aceitar os outros. É oferecer várias ferramentas para que a pessoa possa
escolher entre muitos caminhos, aquele que for compatível com seus valores, sua visão de
mundo e com as circunstânias adversas que cada um irá encontrar. Educar é preparar para a
vida. Nesta abordagem do processo educativo a afetividade ganha destaque, pois acreditamos
que a interação afetiva ajuda mais a compreender e modificar as pessoas do que um raciocínio
brilhante, repassado mecanicamente. Esta ideia ganha adeptos ao enfocar o brincar no
processo do desenvolvimento humano. Se considerarmos que o brincar é a maneira pela qual
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a criança estrutura o seu tempo, ou seja, sua vida, sendo assim, precisamos reconhecer que
falamos de direitos humanos. Brincar é, antes de tudo, um direito da criança!
Brincar é como nós somos feitos, como nós desenvolvemos e nos ajustamos a mudanças; permite que expressemos nossa alegria e nos conecta mais profundamente com o melhor de nós mesmos e dos outros; é a forma mais pura de expressão de AMOR. Quando um número suficiente de pessoas elevar o BRINCAR ao status que ele merece em nossas VIDAS, veremos que o MUNDO será um lugar melhor para viver. (BROWN, 1998. National Institute for Play)
O brincar é uma necessidade do ser humano em qualquer idade e não pode ser vista
apenas como diversão ou para passar o tempo. O desenvolvimento do aspecto lúdico facilita a
aprendizagem, o desenvolvimento pessoal, social e cultural, colabora para uma boa saúde
mental, prepara para um estado interior fértil, facilita os processos de socialização,
comunicação, expressão e construção do conhecimento. Estas questões nos remetem à
problemática da formação do educador em especial nos alunos de graduação em Educação
Física, Pedagogia e Psicologia, a qual passa por ambiguidades e paradoxos que nunca são
efetivamente dissipados. Isto resulta, quase sempre, em dificuldades no campo da prática
pedagógica. Então nos perguntamos: “Afinal, o que é necessário para formar o
educador?” Sabemos que os cursos de licenciaturas têm recebido inúmeras críticas,
especialmente no que se refere à sua ineficiência quanto à formação dos profissionais de
educação infantil. É, hoje, questão de consenso que os egressos dos cursos de graduação nas
áreas citadas anteriormente não estão suficientemente preparados para atender as necessidades
das escolas e da sociedade, principalmente no que se refere à compreensão do brincar como
conteúdo histórico-social capaz de desenvolver e construir o conhecimento infantil. A questão
é sempre recolocada e, apesar das reflexões teóricas a respeito do processo educacional, não
se tem encontrado reversibilidade neste processo. Qualquer que seja o ângulo abordado sobre
a realidade, há muito a ser repensado.
Fazendo um paralelo entre um quebra-cabeça e a formação do educador, pode-se
afirmar que, enquanto o primeiro se completa com o encaixe de todas as peças, o segundo
jamais se completará, pois a formação profissional não se acaba com o término de um curso,
sempre faltará a peça seguinte. A formação do educador não é um quebra-cabeça com recortes
definidos, depende da concepção que cada profissional tem sobre a criança, homem,
sociedade, educação, escola, conteúdo e currículo. Neste contexto, as peças do quebra-cabeça
se diferenciam, possibilitando diversos encaixes. Ao entender a educação como um processo
historicamente produzido e o papel do educador como agente desse processo, que não se
limita a informar, mas ajudar as pessoas a encontrarem sua própria identidade, de forma a
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contribuir positivamente na sociedade, e que o brincar tem sido enfocado como uma
alternativa para a formação do ser humano, atualmente os cursos de graduação em Educação
Física, Pedagogia e Psicologia deverão se adaptar a esta nova realidade. Uma das formas de
repensar os cursos de formação é introduzir na base de sua estrutura curricular um novo pilar:
a formação lúdica.
Na obra de Ayrton Negrine esta questão é analisada, onde o autor sugere três pilares
que sustentariam uma boa formação profissional, com a qual concordamos inteiramente, pois
os cursos de licenciaturas têm-se preocupado somente com a formação teórica e com a
formação pedagógica. A proposta de Negrine é que tenha também a formação pessoal que no
nosso entendimento preferimos chamá-la de formação lúdica e criativa. Este tipo de
formação é inexistente nos currículos oficiais dos cursos de formação do professor de
educação física e dos educadores de forma geral, entretanto algumas experiências têm
mostrado sua validade e não são poucos os educadores que têm afirmado ser o brincar uma
proposta inovadora para educação neste milênio. O brincar se assenta em pressupostos que
valorizam a criatividade, o cultivo da sensibilidade, a busca da afetividade, a nutrição da
alma, proporcionando aos futuros educadores vivências lúdicas, experiências corporais e
motrizes, que se utilizam da ação lúdica, do pensamento e da linguagem, tendo no jogo, no
brinquedo e na brincadeira sua fonte dinamizadora. Neste sentido, a formação do educador, a
nosso ver, ganharia em qualidade se, em sua sustentação, estivessem presentes os três pilares:
1) A formação teórica, 2) A formação pedagógica e 3) E como inovação a formação lúdica.
Quanto mais o adulto vivenciar sua ludicidade e seu brincar, maior será a chance de
este profissional trabalhar com a criança de forma prazerosa, tranquila e segura. A formação
lúdica deve possibilitar ao futuro educador conhecer-se como pessoa, saber de suas
possibilidades e limitações, desbloquear suas resistências e ter uma visão clara sobre a
importância do jogo, do brinquedo e da brincadeira para a vida da criança, do jovem e do
adulto. O adulto que volta a brincar não se torna criança novamente, apenas ele convive,
revive e resgata com prazer a alegria do brincar, por isso é importante o resgate desta
ludicidade, a fim de que se possa transpor esta experiência para o campo da educação, isto é, a
presença do jogo. A formação lúdica é uma forma alternativa para realizar formação de
educadores que enfoca a ludicidade no adulto, na expectativa futura de um trabalho
pedagógico mais envolvente junto à criança.
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Brincar na Educação
O brincar é a essência da infância. Por isso, ao abordar este tema, não podemos deixar
de nos referir também à criança. Ao retomar a história e a evolução do homem na sociedade,
vamos perceber que a criança nem sempre foi considerada como é hoje. Antigamente, ela não
tinha existência social, era considerada miniatura do adulto, ou quase adulto, ou adulto em
miniatura. Seu valor era relativo, nas classes altas era educada para o futuro e nas classes
baixas o valor da criança iniciava quando ela podia ser útil ao trabalho, colaborando na
geração da renda familiar. Os jogos e brinquedos, embora sendo um elemento sempre
presente na humanidade desde seu início, também não tinham a conotação que têm hoje, eram
vistos como fúteis e tinham como objetivo a distração e o recreio.
Cada período da história humana e cada cultura têm uma visão diferente de infância,
mas a que mais predominou foi a da criança como ser inocente, inacabado, incompleto, um
ser em miniatura, dando à criança uma visão negativa. Entretanto, já no século XVIII,
Rousseau se preocupava em dar uma conotação diferente para a infância, mas suas ideias
vieram a se firmar no início do século XX, quando psicólogos e pedagogos começaram a
considerar a criança como uma criatura especial com especificidades, características e
necessidades próprias. Foi preciso que houvesse uma profunda mudança da imagem da
criança na sociedade para que se pudesse associar uma visão positiva a suas atividades
espontâneas, surgindo como decorrência a valorização dos jogos e brinquedos. O
aparecimento do jogo e do brinquedo como fator do desenvolvimento infantil proporcionou
um campo amplo de estudos e pesquisas e hoje é questão de consenso a importância do
lúdico. Dentre as contribuições mais importantes destes estudos podemos destacar:
1. As atividades lúdicas possibilitam fomentar a "resiliência", pois permitem a
formação do autoconceito positivo;
2. O brincar possibilita o desenvolvimento integral da criança, já que através destas
atividades a criança se desenvolve afetivamente, convive socialmente e opera
mentalmente;
3. O jogo, brinquedo e a brincadeira são produtos de cultura e seus usos permitem a
inserção da criança na sociedade;
4. Brincar é uma necessidade básica assim como é a nutrição, a saúde, a habitação e
a educação;
5. Brincar ajuda a criança no seu desenvolvimento físico, afetivo, intelectual e
social, pois, através das atividades lúdicas, a criança forma conceitos, relaciona
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ideias, estabelece relações lógicas, desenvolve a expressão oral e corporal, reforça
habilidades sociais, reduz a agressividade, integra-se na sociedade e constrói seu
próprio conhecimento;
6. O jogo é essencial para a saúde motriz e mental;
7. O jogo simbólico permite à criança vivências do mundo adulto e isto possibilita a
mediação entre o real e o imaginário.
Portanto, ao valorizar cursos sobre o brincar na escola, percebemos o lúdico como
uma atividade natural, espontânea e necessária a todas as crianças, tanto que o BRINCAR é
um direito da criança reconhecido em declarações, convenções e leis em nível mundial. Por
estas razões é que acreditamos que, no contexto da formação dos profissionais de pedagogia,
educação física e psicologia, deveriam estar presentes disciplinas de caráter lúdico, pois a
prática docente é reflexo da formação do indivíduo. Por isso, quanto mais vivências lúdicas
forem proporcionadas nos currículos acadêmicos, mais preparado estes profissionais estarão
para trabalhar com as crianças.
Para contribuir nesta abordagem, apresentaremos as diretrizes básicas de cada eixo de
ação que iremos desenvolver neste artigo, acreditamos que os temas abordados permitirão aos
futuros educadores aprender jogando para ensinar brincando. Está formação possibilitará
que cada professor da escola possa analisar, discutir, refletir, polemizar e se posicionar em
cada afirmativa referente ao lúdico ou brincar de forma segura, cientifica e educativa. Além de
ser uma forma prazerosa de aprender. Desta forma, o presente artigo pretende oferecer a
possibilidade de uma análise interdisciplinar, sendo, portanto promovendo reflexões dos
diversos profissionais de diversas áreas do conhecimento humano que de alguma forma lidam
com a criança no seu desenvolvimento e na sua educação. Dentro desta perspectiva este artigo
tem como proposta auxiliar os profissionais da educação, da saúde e outras áreas a assumir
um conceito de jogo que oriente sua prática, oferecendo referenciais teóricos mais precisos,
possibilitando assim ao especialista uma aplicação do jogo, da brincadeira e do brinquedo
com mais embasamento. Outro aspecto é o fornecimento de instrumentos para subsidiar a
observação da criança em seu dia a dia através do brincar. Quando se trabalha com população
infantil não se pode deixar de lado o universo lúdico, sendo assim é imprescindível que o
profissional tenha uma noção básica de como a criança se desenvolve através do jogo, do
brinquedo e da brincadeira para que possa estabelecer uma relação mais científica entre sua
área de atuação e o brincar como um dos fatores que influenciam no desenvolvimento da
infantil.
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De modo geral quando as pessoas pensam em brinquedos e jogos sempre os atribuem
a um público infantil ou infanto-juvenil, mas poucas vezes um público adulto. Essa
desvalorização dos jogos teve início a parti da industrialização. Segundo Borja (2005), “A
partir de la industrialización se produce una sobrevaloración del trabajo en detrimento del
juego, al que llega a considerarse una pérdida de tiempo.” O jogo passa a ser visto como algo
leviano e infantil, sem contribuições à figura das pessoas e mesmo sendo compreendido como
um mecanismo que infantiliza. Essa concepção de jogo perdurou por anos, mas durante o
século XIX, a visão sobre o jogo começa a mudar graças à contribuição de filósofos,
psicólogos e pedagogos que se aprofundam na área:
Esta concepción se ha mantenido vigente durante años a pesar de la defensa que hacen del juego, en el siglo XIXm grandes filósofos como Huizinga, psicólogos como Claparède, Freud, Piaget, Vigotsky y pedagogos como Pestalozzi, Froebel, Decroly o Fouriére, (entre otros), que no sólo permitían y potenciaban la necesidades de actividades lúdicas, sino que diseñaban juguetes con finalidades didácticas [...] (BORJA, 2005, p.15)
Desta forma estudos sobre os jogos foram desenvolvidos e a compreensão social deste
mudou. Formulou-se uma nova visão e entendimento do jogo e do brinquedo passando a ser
visto como um elemento que favorece o ser humano promovendo-lhe felicidade. Nos dias
atuais a ciência “[...] passa a reconhecer a necessidade de estudar melhor a importância de
aspectos positivos, como a felicidade, a esperança, a criatividade, a coragem, a sabedoria e a
espiritualidade, por exemplo.” (OLIVEIRA, 2010, p.15). O brincar e o jogo ganharam
dimensões e começaram a ser compreendidos em perspectivas cientificas. Não que o ato de
jogar ou o brincar passem a ser feitos como obrigações para o aprender. Embora o jogo e o
brincar devam, sempre, ser praticados voluntariamente, o olhar do educador não pode estar
leigo diante das contribuições que os jogos e o brincar trazem para o processo de
aprendizagem. Os jogos que antes eram vistos como perda de tempo passaram a ser
compreendidos como mecanismos pedagógicos e todas as suas contribuições formativas são
reconhecidas. Santos (2010) sustenta que,
[...] o lúdico começa a ser visto com mais seriedade, deixando de ser uma especificidade da infância, abandonando a ideia romântica do brincar apenas como uma atividade descomprometida de resultados, colocando-se em patamares bem mais elevados e com conotações que envolvem todas as fases do desenvolvimento humano. (SANTOS, 2010, p.26).
O brincar e o jogo revelam-se como elementos formadores da cultura humana.
Conforme lembra Oliveira, eles são “geradores e organizadores culturais”, elementos
incrustados na dinâmica biopsicossocial, intimamente associados a um contexto espaço-
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temporal. Com essa nova compreensão dos jogos e do brincar, estes passam a ser vistos como
fortes elementos promotores do processo educativo. Como mecanismos de mediação do
processo de ensino e aprendizagem, eles facilitam o processo. Atualmente o paradigma
metodológico educacional está em mudança, ganhando um viés mais holístico e
construtivista. Ao se analisar a Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional – LDBEN
(1996) ou o Plano Nacional de Educação – PNE3 vê-se o desenvolver desse novo paradigma
educacional, mas essa mudança de paradigmas é um movimento global e todo ele promove a
ludicidade e o brincar. Borja aponta que:
Las últimas reformas educativas y didácticas se acercan, diciéndolo o sin decirlo, a la esencia y a los valores de lo lúdico como un camino natural que ayuda a conseguir sus objetivos de desarrollo personal y de aprendizaje significativo en un marco de referencia constructivista. (BORJA, 2005, p. 24)
Contudo, o jogo e o brincar não são propiciados aos professores que irão realizar a
mediação através desses instrumentos de mediação dentro de uma formação lúdica. Mantém-
se uma formação de educadores e negligencia-se a formação de ludoeducadores. A formação
lúdica no Brasil é pouco explorada na formação docente, apresentando uma lacuna pela falta
de possibilidades formativas, pela falta de aparato, pela falta de pessoas capacitadas nas
instituições provedoras de curso em licenciaturas, que oferecem e viabilizam uma formação
lúdica mínima para seus futuros educadores. Assim, a formação dos licenciados fica
debilitada e frágil na área da ludicidade e educação. Não se espera uma intimidade entre os
educadores e os jogos e brinquedos, o que gera uma dificuldade no seu uso da aprendizagem
com os jogos e brinquedos. É visto nos professor que falta-lhes conhecimento e experiências,
diretamente, com esse elementos lúdicos. Existe uma forte carência nessa formação. Aqui, a
figura do ludoeducador ganha referência na formação dos professores.
O jogo e o brinquedo podem ser utilizados como um mecanismo de mediação
educacional, mas existem outras características fundamentais neles que devem ser
consideradas para o processo formativo dos indivíduos, capacidade dos jogos e dos
brinquedos de promover prazer e descontração, especialmente para crianças, jovens, adultos
ou até idosos. O jogo e o brinquedo aquecem a alma e favorecem emoções que atingem as
pessoas de forma direta. Trabalhar as emoções no decurso da formação educacional em todas
as idades, mas principalmente nos primeiros anos, é a base para aproximar os alunos dos
3 Ambos os documentos podem ser encontrados no site do Ministério da Educação, http://www.mec.gov.br/, e na
Biblioteca Digital da Câmara dos Deputados, http://bd.camara.leg.br/bd/.
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estudos e dos professores. Santos (1999) apresenta uma guia para se trabalhar com crianças de
zero a três anos que representa a importância dos jogos para elas e a necessidade de formação
e conhecimentos para se trabalhar com os pequenos. Reforçamos que os brinquedos e jogos
não devem ser utilizados unicamente para a educação, mas recorrentemente, e principalmente,
ainda para o prazer, para o lúdico, ou seja, para a diversão. O próprio prefixo ludus vem do
latim e quer dizer ‘jogo’ e ‘divertimento’ (FERREIRA, 1999, p.1238), sendo a diversão à
base para os jogos.
A importância do lúdico e a utilização de jogos e brinquedos são fundamentais para a
formação humana e para isso a formação dos educadores deve ser sempre reforçada nessa
área, pois vê-se que os professores pouco valorizam o conhecimento dos jogos para a sua
profissão, e mais recorrente ainda, pouco os experimentam e os vivenciam, seja por
desconhecerem ou por desvalorizarem. O descaso docente no conhecer dos jogos e
brinquedos é precário. Assim, surge a indagação, para o educador o que é o jogo e o
brinquedo? Nesse sentido, o presente artigo vem apresentar os resultados de uma vivencias de
um grupo de formandos em Pedagogia no Laboratório de Brinquedos e Jogos, enfatizando as
representações sociais destes professores sobre os jogos e brinquedos após a manipulação
deste. Utilizou-se uma metodologia empirista, onde todos os alunos de graduação
participaram tanto dos jogos quanto da pesquisa. Observou-se ao fim que os alunos tiveram
muita centralidade da ideia do jogo e do brinquedo como alegria repleta de significados.
Representações Sociais
Com a Teoria das Representações Sociais de Serge Moscovici (1978) buscou-se
apreender o que são para os futuros educadores os jogos e brinquedos, o que eles
desenvolveram de conhecimento específico sobre a utilização dos jogos e o que eles sentiram
durante a experimentação dos jogos, especialmente, suas impressões. A Teoria das
Representações Sociais foi escolhida em virtude de sua especificidade analítica. A partir das
representações podem-se captar quais as interpretações grupais, em nível do senso-comum, de
determinados assuntos, temas, ou mesmo ações. Compreendidas as interpretações essa teoria
possibilita a compreensão da realidade, pois as ações de um indivíduo são determinadas por
suas interpretações do mundo que o cerca e assim os comportamentos no tocante a um tema
tornam-se evidentes e passíveis de serem melhorados, mantidos ou mesmo corrigidos.
Segundo Albuquerque as representações,
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[...] são construções mentais elaboradas coletivamente pelos sujeitos a partir de seus referentes culturais, que atribuem significações particulares aos objetos sociais. Tais significações servem para orientar os comportamentos e práticas individuais e coletivas, o que constitui uma característica intrínseca às representações sociais moscovicianas. (ALBUQUERQUE, 2005, p.73)
Essa teoria foi desenvolvida a partir da necessidade de se compreender cientificamente
o senso-comum. Em 1912, Dunkhein propôs a Teoria das Representações Coletivas, “[...] um
conjunto sistemático de elementos que tenta explicar um multiplicidade de fenômenos
sociais.” (NÓBREGA, 2003, p.52). Porém com Moscovici a teoria é revista e perde o caráter
explicativo, captador dos fenômenos sociais, sendo estas homogêneas e partilhadas por toda a
sociedade. As representações sociais passam a serem englobadas na dinâmica social, “[...] na
antinomia interativa onde são simultaneamente geradas e adquiridas.” (Idem, idem, p.55)
Para Moscovici as representações não são homogêneas, nem partilhadas por toda a sociedade,
mas sim um mecanismo orientador das ações dos indivíduos.
Assim, as representações sociais tornam-se orientadoras das ações dos indivíduos que
partilham delas, “[...] se pode afirmar que as representações organizam-se enquanto sistemas
de interpretação que regem nossa relação com o mundo e com os outros e organizam as
comunicações e as condutas.” (JODELET, apud: MADEIRA, 2003, p.120). A aquisição da
representação social ocorre a partir da vivencia social, nas instituições sociais, compreendidas
na perspectiva de Dunkheim (2008), a partir de seus estudos sobre religião, como elementos
que constituem a base da vida coletiva em numerosos povos. Nos processos educativos as
representações sócias são altamente visíveis, pois a escola é um mecanismo de reprodução
destas sendo simultaneamente uma formadora destas, como as demais instituições sociais,
porém atingindo um contingente muito maior do que a maioria das instituições, igualando-se
a instituição religiosa. Essa reprodução pode ser melhor compreendida e aprofundada em
Bourdieu (2004) e Bourdieu e Passeron (2008).
Laboratório e Brinquedos e Jogos (LABRINJO)
Com dez anos de existência, o Laboratório e Brinquedos e Jogos (LABRINJO) é um
projeto que destina-se ao fortalecimento do vínculo entre teoria e prática pedagógica e ao
conhecimento da realidade brasileira na área de brinquedos e materiais pedagógicos. Um
projeto que mobilizou reflexões e estudos sobre a importância do jogo, do brinquedo e da
brincadeira. Como laboratório de pesquisa, de extensão universitária e de formação didática
dos professores da Universidade Federal do Ceará – UFC, e de educadores como um todo, o
LABRINJO especializou-se no estudo e na pesquisa de jogos, brinquedos e materiais lúdicos
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e pedagógicos, no aperfeiçoamento da qualidade da formação metodológica do educador,
razão pela qual vincula-se ao Centro de Estudos sobre Ludicidade e Lazer (CELULA) do
Instituto de Educação Física e Esportes (IEFES) da UFC.
O laboratório tem como uma de suas atribuições, o oferecimento de oficinas para
professores da rede pública e privada assim como para alunos de licenciaturas e áreas a fim.
Desta forma transpondo o limite dos conhecimentos livrescos, teóricos, e proporcionando
certo nível de experiências, bem como oferecendo aos alunos um contato efetivo com as
matérias pedagógicos do laboratório.
O laboratório atua em sete eixos temáticos, sendo eles: espaço para desenvolvimento
de pesquisa; apoio às escolas e ONGs; apoio à comunidade (pais e famílias); assessoria
técnica; apoio ao estágio dos alunos do IEFES e de outros cursos da UFC; espaço para brincar
e de lazer; laboratório de ensino e experimentação. As linhas de pesquisa desenvolvidas no
LABRINJO são: jogos tradicionais e populares; jogos cooperativos; cultura da paz e o
brincar; ecojogos: brincar na natureza; sistemas de classificação e análise de jogos,
brinquedos e materiais lúdicos; apropriação de espaços-lúdicos; jogos e brinquedos virtuais,
eletrônicos e robótica; brincar: violência, inclusão e gênero; espaço para brincar: intensidade,
qualidade e trajetória lúdica; lazer e recreação.
O Programa CELULA (Figura 1) estrutura estudos, pesquisas e extensão sobre a
cultura lúdica, além de ser, um ambiente de aperfeiçoamento da formação lúdica, estudo,
pesquisa e vivencias de jogos, brinquedos e materiais lúdicos para educadores, crianças,
adolescentes, adultos e idosos.
O CELULA fundamenta-se e seis projetos de extensão já existentes e consolidados na
Universidade Federal do Ceará (UFC), estas ações de extensão se complementam e
interatuam entre elas. Os projetos de extensão que fazem parte do programa são: 1.
Laboratório de Brinquedos e Jogos (LABRINJO); 2. Museu da Infância e do Brinquedo
(MIB); 3. Brinquedoteca de Pesquisa e Lazer; 4.) Brincar para incluir; 5. Brincar na UFC: um
direito de todos; 6. Brincarmóvel: brinquedoteca itinerante. Este programa é caracterizado por
um conjunto de ações de caráter orgânico-institucional, de médio e longo prazo, com clareza
de diretrizes e orientadas a um objetivo comum, articulando projetos e outras ações existentes.
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Figura 1 – Organograma do CELULA Fonte: Coordenador do Programa CELULA professor Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida.
A pesquisa foi desenvolvida com um grupo de alunos do curso de Pedagogia da
Universidade do Vale Acaraú – UVA, que tomaram conhecimento do laboratório e marcaram
uma visitação. Com um total de trinta alunos participantes, dente eles, tivemos a participação
das duas professoras que acompanhavam a turma. Os participantes vivenciaram a experiência,
onde todos experimentaram ao menos um jogo. Os jogos utilizados para as vivencias lúdicas
foram previamente selecionados pelos bolsistas ludoeducadores, porém alguns brinquedos e
jogos foram escolhidos pelos participantes ampliando as experiências e revelando as
preferencias lúdicas dos participantes. Foram utilizados brinquedos e jogos diversos, de jogos
de tabuleiros a jogos de encaixe.
Uma forma de classificação desses jogos que bem exemplifica é utilizada pelo C.O.L.
– Classement des objets ludiques: jogos de exercício, brinquedos e jogos que trabalham com
despertar sensorial, motricidade e manipulação; brinquedos para jogos simbólicos.
Brinquedos de papéis; faz de conta e de representações; jogos de acoplagem, como jogos de
construção, encadeamento, experimentação e fabricação; jogos de regras. (KOBAYASHI,
2011, p.114-115). Para fazer a mediação entre os participantes e os jogos, a vivencia contou
com um grupo de onze bolsistas ludoeducadores, divididos entre estudantes do curso de
Pedagogia e de Educação Física da UFC, vinculados ao laboratório e com o professor
coordenador do laboratório, professor Marcos Teodorico Pinheiro de Almeida.
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Metodologia
A pesquisa enquadra-se em uma pesquisa de laboratório, em virtude à obtenção de
informações, exploratória e com uma abordagem qualitativa. Devido ao número de
participantes e condições da realização da pesquisa utilizamos a disposição metodológica do
estudo de caso, como colocam Silva e Silveira, “[...] trata-se de um objeto bem restringido
(individual) sobre o qual se levantam o maior número de informações possíveis. Assim, uma
cidade, um fenômeno ou mesmo um evento podem ser objetos de estudo de caso.” (SILVA,
2008, p.157). Desta forma, foram utilizadas duas técnicas de pesquisa, a observação e a
entrevista aberta. A primeira é explicada por Rodrigues como “[...] uma técnica de coleta de
dados a partir da observação e do registro, de forma direta, do fenômeno ou fato estudado”
(RODRIGUES, 2006, p.96). Compreendendo a dinâmica e a experimentação espontânea dos
jogos durante a ação lúdica, escolheu-se a observação por favorecer a coleta dos dados
durante as atividades sem perturbação das mesmas.
A entrevista aberta foi utilizada no último momento da experiência dos alunos, durante
a socialização das experiências, ela foi preferida por revelar diretamente dos participantes
seus pontos de vista e suas opiniões sobre a experiência de uma forma informal, prática e
rápida. A entrevista também conta com a possibilidade de “[...] captar a expressão corporal
do entrevistado, bem como a tonalidade de voz e ênfase nas respostas.” (GIL, 1999, p.118),
promovendo assim maior leitura e compreensão dos relatos dos participantes. A entrevista e
as observações foram documentadas em fotos e vídeos feitos em três momentos, primeiro o
contato dos participantes com o laboratório e fala do professor coordenador, em segundo, na
experimentação dos jogos e brinquedos, e por último, a socialização das impressões e
sentimentos captados durante todo o processo. A análise posterior, utilizamos a documentação
audiovisual para manter a fidelidade dos fatos reais captados na experiência. A captação das
representações sociais dos participantes será desenvolvida a partir dos dados obtidos com a
observação e a entrevista aberta.
Os resultados
O primeiro dado constatado durante a observação dos participantes no processo de
intervenção formativa com os ludoeducadores do laboratório foi o deslumbramento dos
alunos visitantes. A primeira expressão dos alunos de pedagogia foi de completa surpresa e
maravilha. Alguns comentaram que era como entrar em uma loja de brinquedos. A vontade de
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explorar, ver cada peça que compõe o acervo da brinquedoteca. Alguns buscaram ver jogos de
madeira, outros procuraram os jogos de tabuleiro, os jogos de grande porte4.
Esse primeiro momento de contato livre com o espaço pelos participantes mostrou o
quão distante aquela realidade está deles. Jogos nunca antes vistos pelos participantes e jogos
a muito esquecidos, quando em contato gerou uma euforia e uma impaciência pelo manuseio,
manuseio esse que pela vontade dos alunos teria sido de caráter livre, mas como na condição
dos formadores em formação tiveram a orientação de serem experimentados com foco em
suas potencialidades formativas. O desejo do manuseio livre mostra o quanto os adultos têm a
vontade, mesmo a necessidade, e apreciam o brincar. Na experimentação dos jogos e
brinquedos, analisando-se as fotos dos participantes, observou-se que houve uma intensa
rotatividade dos alunos com os jogos e brinquedos. Constatou-se que nos cinquenta minutos
de intervenção cada aluno passou por, em média, cinco jogos sendo estes profundamente
utilizados. A utilização dos jogos por formadores em formação é fundamental, Negrine (2008)
afirma que essa postura auxilia mesmo o pedagogo em formação na sua formação pessoal,
para além das formações teórica e pedagógica.
Os jogos de grande porte e com caráter motor, que trabalham principalmente a
motricidade, foram alguns dos mais utilizados. Por exemplo, o jogo de “Totó”, ou como
também é conhecido “Pebolim”. Outro jogo que foi muito utilizado pelos alunos foi o “Jenga”
ou “Tumble”, este tem também um caráter motor, mas trabalha mais a motricidade fina, com
movimentos de pinça e controle do tónus muscular. O “Labirinto” é outro jogo motor que
trabalha controle motor, concentração, equilíbrio, tomada de decisão coletiva e
interdependência positiva. Jogos de motricidade comumente atraem muita à atenção tanto
pelo porte quanto pelo movimento em si que chama a atenção, porém os jogos que tiveram
maior destaque foram os jogos de tabuleiro e jogos de desafio.
Dos jogos de tabuleiro que chamaram mais atenção foram alguns internacionais. Jogos
espanhóis, chineses, africanos, portugueses, alemães, holandeses, entre outros. Foram jogos
que os participantes não sabiam nada da jogabilidade e das regras, porém com as orientações
do ludoeducadores passaram a dominar. É comum a negação de um jogo do qual não se tem
conhecimento, principalmente na idade adulta, pois sente-se mais conforto quando se está em
sua zona de conforto. Mas enquanto em um ambiente de aprendizagem lúdica a situação de
4 A classificação de jogos não é o foco deste estudo, porém para explicar os jogos fez-se uma classificação que utilizou-se de
elementos classificatórios baseados no aspectos físicos dos jogos e não em analises e áreas de competências desenvolvidas
nestes, apesar de algumas destas áreas serem explicadas no corpo do artigo.
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negar o jogo por desconhecer fica totalmente fora de contexto. Espera-se justamente jogos
desconhecidos para que sejam aprendidos e possam ser utilizados fora daquele espaço ludo-
formativo. A importância do ludoeducador nesse processo é preponderante, pois é ele quem
vai apresentar e orientar os jogos para os alunos em formação. É o ludoeducador quem
incentiva a participação no jogo principalmente para valorizar o brincar. Negrine propõe que:
Ao valorizar as atividades como um meio a mais na alavancagem dos processos de desenvolvimento e aprendizagem, requer continuamente pensar a preparação daqueles que se dispõem atuar neste campo emergente, qualificando os instrutores (pedagogos em geral) que deverão atuar com os atores (crianças, jovens, adultos e idosos) nas mais variadas faixas etárias. (NEGRINE, 2008, p.83)
Os ludoeducadores deram suporte aos participantes nos jogos de diversas áreas,
promovendo assim uma formação lúdica aos alunos que antes não teriam essa oportunidade,
mas com o amparo espacial da brinquedoteca e dos materiais como jogos e brinquedos e com
os conhecimentos dos brinquedistas5 Aprofundando a analise dos dados e tratando do
coletado com a entrevista aberta pode-se observar como os participantes se identificaram com
os jogos motores e com jogos de tabuleiro e raciocínio lógico. Jogos como “Los Caballeros
del Castillo”, “Jenga”, “Diavolo”, “Pebolim”, “Labirinto” foram alguns dos mais apontados.
No primeiro jogo os participantes reconheceram que este é um jogo “muito bom para
trabalhar a equipe”; coordenação visual; temporalidade (utilização da ampulheta de areia para
marcação do tempo). No “Pebolim” ressaltaram como características a “questão motora”,
“agilidade” e “trabalho em equipe”.
À medida que as apresentações das considerações sobre cada jogo foram sendo
expostas as dúvidas dos alunos eram tiradas, pelo vocabulário utilizado por eles, contatou-se
que elas não dispunham de conhecimentos técnicos sobre jogos e não sabia explicar
especificamente os jogos e suas finalidades, além de não saberem ampliar as possibilidades
dos jogos, por exemplo, quando se apresentou sobre o “Jenga” os alunos reconheceram o
caráter motor do jogo e da concentração utilizada, mas desconsideraram a motricidade fina, o
movimento de pinça, trabalho de precisão, além de pensar para além do tradicional do jogo.
Na manipulação do jogo desempenhada pelos alunos o jogo sempre teve um caráter
competitivo e nunca um caráter cooperativo, como orientam muitas leituras da área jogos e
cultura lúdica. Essa foi uma orientação passada aos alunos de pedagogia pelos
ludoeducadores, pensar no jogo para além do da perspectiva competitiva. Garófano e Caveda
5 Outra nomenclatura para ludoeducadores utilizada pelo Prof. Dr. Airton Negrine em seu artigo Brinquedoteca:
teoria e prática Dilemas na formação do brinquedista.
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em seu artigo El Juego en el currículo de educación infantil, 2002, apontam diversas áreas
trabalhadas com jogos os mais variados.
Outra etapa bastante reveladora da pesquisa expressou-se no momento final da
entrevista que culminou na principal captação da representação social do brincar na formação
dos educadores, pois após a primeira analise observou-se que a representação não está
consolidada, ou mesmo existente, pois apesar de o lúdico ser uma área de estudo já existente
na pedagogia o brincar não é. Concepções de lúdico e trabalho ludopedagógico, são termos
conhecidos nos cursos de formação de professores, porém a formação lúdica efetiva, que
desenvolve o brincar e o jogar, está desassistida nesses mesmos cursos de formação. Marcos
Teodorico apresenta possibilidades e experiências frete a necessidade de reforçar a formação
lúdica e não apenas a formação teórica e a pedagógica, “Uma das formas de repensar os
cursos de formação é introduzir na base de sua estrutura curricular um novo pilar: a
formação lúdica.” (ALMEIDA, 2011, p.85)
Na segunda etapa da entrevista foi solicitado aos participantes que dissessem “uma
palavra que expressasse ou definisse a vivência e/ou sentimentos durante o processo”.
Dezenove participantes falaram suas palavras: descontração; infância; muito interessante;
diferente; brincadeiras; bonito; socialização; raciocínio; interação; trabalho em equipe; todo
mundo voltando a ser criança; vida; novidades; para valorizar o jogo; felicidade;
oportunidade; novas experiências; um mundo novo. Com a leitura das palavras contatamos
que elas poderiam ser organizadas de forma categorial de grupos de significados, grupos
semânticos. Três grupos semânticos foram constatados, A – Elementos de Jogos; B –
Sentimentos Pessoais; C – Qualidade de novo / Desconhecido e nelas as palavras foram
organizadas. A distribuição das palavras em seus respectivos grupos semânticos é
demonstrada na Figura 2.
GRUPO A Elementos de Jogos
GRUPO B Sentimentos Pessoais
GRUPO C Qualidade de novo / Desconhecido
- Brincadeiras - Socialização - Raciocínio - Interação - Trabalho em equipe
- Descontração - Infância - Diversão - Todo mundo voltando a ser criança - Vida - Felicidade
- Muito interessante - Diferente - Bonito - Novidades - Para valorizar o jogo - Oportunidade - Novas experiências - Um mundo novo
Figura 2 – Tabela de distribuição das palavras nos grupos semânticos Fonte: Dados organizados pelo(s) autor(es) com base na entrevista realizada na pesquisa.
Na Figura 2 observamos que o grupo C - Qualidade de novo / Desconhecido tem
maior representatividade de palavras, sendo este o grupo mais revelador da pesquisa, pois
apontou que as palavras evocadas carregam a compreensão de que, efetivamente, a formação
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lúdica esta desassistida no curso de formação para professores. A palavra “Bonito” pode
causar estranheza, todavia, dentro da análise ela foi percebida como expressão do sentimento
decorrente do contato com uma nova realidade deslumbrante e fascinante, assim, compondo o
grupo semântico de Qualidade de novo / Desconhecido. Apesar de os números serem
pequenos a analise dessa representação constata em escala reduzida a comprovação da
carência pré-concebida. A Figura 3 é mostra em forma de gráficos numérico o número de
palavras por grupo semântico.
5
6
8
2
3
4
5
6
7
8
9
Figura 3 – Número de palavras por grupo semântico
Fonte: Dados organizados pelo(s) autor(es) com base na entrevista realizada na pesquisa.
A maior incidência maior de casos esta no grupo semântico C – Qualidade de novo /
Desconhecido. As palavras: muito interessante; diferente; bonito; novidades; para valorizar o
jogo; oportunidade; novas experiências; um mundo novo. São palavras que revelam o qual
inovador, no sentido de ser pouco visto, pouco conhecido, foi a vivência para os alunos de
pedagogia e, assim, como essa área está carente. A Figura 4 mostra os mesmos números em
forma percentual apontando a maior incidência do grupo C.
9688
26%
42%
Figura 4 – Percentual das palavras por grupo semântico Fonte: Dados organizados pelo(s) autor(es) com base na entrevista realizada na pesquisa.
Considerações Finais
A formação lúdica deve ser promovida em diferentes espaços formativos e educativos.
Espaços como: Brinquedotecas, Laboratórios de Brinquedos e Jogos, Museu da Infância e do
Brinquedo seriam excelentes ambientes para formação de professores sobre o tema lúdico.
Formação que atualmente temos uma grande carência, porém já é reconhecida e começa a ser
pensada nos currículos formativos de professores nos cursos de graduação de Pedagogia,
Educação Física e Psicologia. A visita da turma de pedagogia da UVA revela outro elemento
subliminar da formação dos docentes, eles estão buscando a formação lúdica. Os educadores
em formação necessitam dessa formação para um bom desempenho de sua futura atuação
profissional, com vivências em espaços especializados na área de formação lúdica
coordenadas por profissionais qualificados e capacitados. Desta forma a cultura lúdica e os
incontáveis benefícios por ela promovidos poderão ser cada vez mais desenvolvidos na
sociedade e consequentemente na cultura que orientará as futuras gerações. Futuras gerações
que, se assim for, terão o brincar em seus cotidianos e com o brincar terão mais alegria,
sensibilidade, tolerância, aprendizagens e vivacidade, tornando o mundo um lugar mais
harmônico e feliz de se viver.
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