View
333
Download
63
Category
Preview:
Citation preview
ISBN 978-989-8550-20-0
Realizado na Universidade Metodista de Angolade 6 a 8 de Outubro de 2011
ECONOMIASOCIOLOGIA, AMBIENTE
E DESENVOLVIMENTO RURAL
ActAs do 2. Encontro Luso-AngoLAno
Coordenao
Maria Leonor da Silva Carvalho Marcos Olmpio Gomes dos Santos
Joaquim Caeiro
Ttulo Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural Actas do 2. Encontro Luso-Angolano na Universidade Metodista de Angola
Autores Vrios
Coordenao Maria Leonor da Silva Carvalho, Marcos Olmpio Gomes dos Santos e Joaquim Caeiro
Edio Comisso Executiva do 2. Encontro Luso-Angolano em Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural / Universidade Metodista
de Angola
Projecto grfico e paginao Joo Morgado
Dezembro de 2013
ISBN 978-989-8550-20-0
Os pontos de vista e argumentos apresentados nos textos constantes da presente obra
so da inteira responsabilidade dos seus respectivos autores e em momento algum
podero ser imputados s instituies promotoras, organizadoras e apoiantes do livro.
FICHA TCNICA
6 a 8 de Outubro de 2011
vii
PREFCIO
H realidades cujo impulso vital to forte, que teimam em permanecer
mesmo quando tudo parece indicar que deveriam perecer. Como alguns esporos,
ou algumas sementes, resistem a longos perodos de estiagem, aos rigores do
frio, s vezes mesmo do fogo e quando as condies minimamente favorveis
se apresentam, revivescem, germinam e florescem com vigor e exuberncia.
Assim so os Encontros Luso-Angolanos que, desde 2007, tm procurado reunir
investigadores angolanos e portugueses em diversas reas do conhecimento
relevantes para a compreenso e o desenvolvimento das sociedades.
Na verdade, depois do I Encontro Luso-Angolano em Cincia do Ambiente,
realizado em 2007, e do I Encontro Luso-Angolano em Economia, Sociologia e
Desenvolvimento Rural, em 2008, gerados no feliz encontro entre a Federao
das Associaes Angolanas em Portugal e a Universidade de vora, eis que
surgiu o 2. Encontro Luso-Angolano em Economia, Sociologia, Ambiente e
Desenvolvimento Rural, que teve lugar em Luanda entre 6 e 8 de Outubro de
2011.
Desta vez, queles dois parceiros iniciais juntou-se a Universidade Metodista
de Angola, atravs do seu Centro de Estudos e Investigao Cientfica (CEIC),
que teve o gosto de acolher o evento nas suas instalaes. Tambm para a
Universidade Metodista de Angola a realizao do encontro se revestiu da
maior importncia, uma vez que, pela primeira vez, ela acolheu um verdadeiro
encontro cientfico, em que, a par de reputados cientistas de ambos os pases
que do nome ao encontro, os seus docentes, os seus mestres e estudantes
de mestrado puderam apresentar comunicaes e v-las agora publicadas. De
realar o interesse de investigadores brasileiros que se associaram a esta incitava
com a apresentao de trabalhos cientficos.
A esta realizao no foi alheio o facto de o Professor Joaquim Lauriano,
verdadeiro pai destes encontros, ter regressado a Angola e estar a exercer funes
docentes e de Presidente do Conselho Cientfico desta jovem instituio de
ensino angolana. -lhe, pois, devia uma profunda vnia de gratido.
viii
A deslocalizao de vora bero dos ELA para Luanda deste 2. Encontro
foi uma ousadia, uma vez que trouxe associada uma srie de problemas, lo-
gsticos, financeiros e organizacionais, que houve que acautelar, mas foi uma
ousadia que compensou, largamente, no fim, os riscos corridos.
As dificuldades que a organizao teve que enfrentar foram superadas graas
aos denodados esforos de uma notvel equipa de organizadores, dos quais
importa destacar os Professores Leonor Silva Carvalho e Marcos Olmpio Santos
pelo lado luso e Joaquim Lauriano e Joaquim Caeiro pelo lado angolano.
Para a memria subjectiva dos que participaram, ficar a lembrana de trs
dias intensos de escuta atenta, reflexo, discusso, partilha e convvio fraterno.
Para a memria objectiva e colectiva ficar este livro de Actas, cuja ddiva luz
foi to morosa, mas que rene a totalidade das intervenes que a se fizeram e
que disponibiliza um importante acervo de informao para os investigadores
e restantes leitores interessados.
A possibilidade desta publicao fica-se a dever generosidade do Conselho
de Administrao da Universidade Metodista de Angola, que aceitou finan-
ci-la, ao Sr. Joo Morgado que a paginou e Zaina Internacional que a editou.
A todos o nosso muito obrigado.
Comea j a tardar a realizao do 3. Encontro Luso Angolano. Esperemos
que a edio destas Actas possa ser uma espcie de pilar de apoio, que nos
permita galgar at esse momento, na continuidade que os temas que aqui
se tratam e as realidades que o mundo em geral, mas Angola e Portugal em
particular, atravessa exigem.
Luanda, Junho de 2013
Lus Miguel Sebastio
Vice-Reitor
ix
NDICE
PREFCIO vii
INTRODUO 1
SESSES PLENRIAS
A importncia da produo de caf na sustentabilidade da agricultura Angolana
Jos Mahinga 15
Turismo e Desenvolvimento Rural Francisco Martins Ramos 31
Desigualdades e Assimetrias Regionais em Angola Alves da Rocha 41
SESSES PARALELAS
Polticas Agrcolas, Ambiente e SustentabilidadeA reviso da poltica de tarifas de gua no uso agrcola: um estudo de caso
no Sul de Portugal Rui Fragoso e Carlos Marques 69
A tipologia comunitria das exploraes agrcolas Maria do Socorro Rosrio 97
A importncia da floresta Indgena e Extica no desenvolvimento econmico
e social de Angola: situao actual e potencialidades Jeremias Domingos
e Antnio Pinheiro 117
Interdependncia dos preos de feijo-vulgar entre cinco dos principais mercados
em Moambique Estevo Chaves, Erly Teixeira, Leonardo de Mattos e Cynthia
Donovan 129
DesenvolvimentoMulheres licenciadas e a promoo do desenvolvimento em Angola: que diferena
faz o Ensino Superior? Maria Raquel Lucas, M. da Conceio Rego, Isabel Ramos e
M. Leonor da Silva Carvalho 151
Pesca, piscicultura e economia solidria Glson de Lima Garfalo 163
O acesso gua e o desenvolvimento em frica Manuel Branco, Pedro Henriques
e M. Leonor da Silva Carvalho 187
Reflexes em torno de perspectivas sobre questes tericas e prticas
relacionadas com o Desenvolvimento Marcos Olmpio dos Santos 211
x
Logstica e Distribuio: variveis vitais para alavancar a produo, o escoamento
dos produtos e o desenvolvimento integrado e sustentvel de Angola J. Jordo
e P. Miranda 231
Polticas Agrcolas e SustentabilidadeA competitividade da mandioca em Angola: perspectivas de mercado
Joo Saraiva Gomes, Patrcia de Sousa e M. de Ftima Oliveira 263
Mudanas sociais por meio do ensino profissionalizante
Terezinha Filgueiras de Pinho 289
Contribuio para o debate sobre a sustentabilidade da agricultura angolana
Fernando Pacheco, M. Leonor da Silva Carvalho e Pedro Henriques 311
Planeamento de canais de comercializao: O caso do agro-negcio do azeite
em Portugal Rui Fragoso 345
Produo de biocombustveis em Angola prs e contras ambientais
Joo Serdio de Almeida 375
A produo de caf em Timor-Leste e a sua comercializao Pedro Henriques e
M. Leonor da Silva Carvalho 381
DesenvolvimentoAlguns contributos para o estudo do desenvolvimento econmico da Provncia
do Huambo Antnio Zacarias da Costa e M. da Conceio Rego 413
Alguns contributos para a caracterizao da comunidade angolana imigrante
em Portugal e para a dinmica populacional portuguesa Jos dos Santos,
M. Filomena Mendes, M. da Conceio Rego e M. da Graa Magalhes 415
Os empregos verdes no desenvolvimento econmico local: desafios,
oportunidades, boas prticas e potencialidades no contexto angolano
Marcos Olmpio dos Santos e Jos Manuel Pinotes 427
O fomento da produo de caf em Angola e o Desenvolvimento Rural
Agostinho Dias Alexandre e Carlos da Silva Carvalho 443
Economia social e cooperativismo: pilares fundamentais ao desenvolvimento
integrado e sustentvel da sociedade angolana J. Jordo, P. Romera, J. L. Lpez
Garca e J. Briz 461
INTRODUO
Na sequncia do 1. Encontro Luso-Angolano em Economia, Sociologia e
Desenvolvimento Rural, realizado na Universidade de vora, em vora, de 16 a
18 de Outubro de 2008, realizou-se em Luanda, na Universidade Metodista de
Angola, o 2. Encontro Luso-Angolano naquelas temticas, de 6 a 8 de Outubro
de 2011.
Tal como o 1. Encontro, este tambm foi muito participado, tendo
contado com cerca de 100 participantes, sendo de salientar as presenas de 14
portugueses e 2 brasileiros. Contou ainda com uma ampla cobertura meditica,
a nvel de televiso Televiso Pblica de Angola, TV Zimbo e RTP frica, de
semanrios Sol-Angola e REGISTO-vora, e ainda da Angola Press.
ObjectivosCom este evento procurou-se por um lado contribuir para fortalecer o
relacionamento entre Angola e Portugal no interesse comum dos povos em
relao ao desenvolvimento sustentvel, no qual a agricultura desempenhar
um papel determinante e, por outro lado, contribuir para a criao de iniciativas
que promovam o desenvolvimento rural, bem como a troca de informao sobre
experincias bem-sucedidas ou boas prticas que conduzam a uma estratgia
de desenvolvimento sustentvel no eixo agro-industrial.
Este 2. Encontro veio consolidar e ampliar as relaes de parceria existentes
entre as Universidades Metodista de Angola e a Universidade de vora, relaes
essas que tm passado pela leccionao de Mestrados da Universidade de
vora na Universidade Metodista de Angola, investigao e assessoria tcnica e
cientfica, entre outras actividades.
Introduo
2
Organizao e estruturaAs actividades deste II Encontro centraram-se nas temticas relacionadas com
a sustentabilidade ao nvel da Agricultura e das Polticas Agrcolas, do Ambiente
e dos Recursos Naturais, e ainda com o Desenvolvimento em geral.
A organizao foi do Centro de Estudos e Investigao da Universidade
Metodista de Angola, da Associao das Instituies de Ensino Superior Privado
Angolanas e do Instituto de Cincias Agrrias e Ambientais Mediterrnicas
da Universidade de vora, tendo a Universidade Metodista de Angola sido a
anfitri.
Para a realizao do Encontro foram constitudas as Comisses de Honra,
Cientfica e Organizadora.
Comisso de Honra Constituda por membros do governo de Angola e por responsveis de organizaes com um papel fundamental no
aprofundamento da cooperao entre Angola e Portugal.
Ministro da Agricultura
Ministra do Ambiente
Ministro da Administrao do Territrio
Ministro da Assistncia e da Reinsero Social
Ministra do Comrcio
Ministra da Cultura
Ministro da Economia
Ministro da Educao
Ministra do Ensino Superior, Cincia e Tecnologia
Ministro da Energia e guas
Ministra da Famlia e da Promoo da Mulher
Ministro da Hotelaria e Turismo
Ministra do Planeamento
Embaixador da Repblica Portuguesa em Angola
Presidente do Conselho de Administrao da Universidade Metodista
de Angola
Vice-Presidente do Conselho de Administrao da Universidade Metodista
de Angola
3
organizao e estrutura sesses plenrias sesses paralelas concluses
Reitora da Universidade Metodista de Angola Presidente
Reitor da Universidade de vora
Reitor da Universidade Agostinho Neto
Reitor da Universidade Jos Eduardo dos Santos
Reitor da Universidade de Belas
Reitor da Universidade Catlica de Angola
Reitor da Universidade Gregrio Semedo
Reitor da Universidade Independente
Reitor da Universidade Lusada de Angola
Reitor da Universidade Privada de Angola
Reitor da Universidade Tcnica de Angola
Reitor do Instituto Piaget de Angola
Comisso Cientfica Constituda por personalidades de reconhecido mrito cientfico, competindo-lhe traar e coordenar as orientaes sobre
as questes de natureza cientfica.
Adalberto Nascimento (Mestre, Universidade Metodista de Angola)
Adlio Chiteculo (Mestre, Universidade Metodista de Angola)
Esteves Hilrio (Mestre, Universidade Metodista de Angola)
Fernando Pacheco (Engenheiro Agrnomo, Angola)
Joo Ferreira Neto (Doutor, Instituto Nacional do Caf de Angola, Angola)
Joaquim Lauriano (Doutor, Universidade Metodista de Angola)
Jos de Sousa Vieira Jordo (Doutor, Universidade Metodista de Angola)
Kelusodi Eduardo Filemon (Doutor, Universidade Metodista de Angola)
Lisete Valle (Engenheira Agrnoma, Angola)
Martha Sambanje (Mestre, Universidade Metodista de Angola)
Ricardo Queirs (Doutor, Universidade Metodista de Angola)
Vicente Agostinho (Universidade Metodista de Angola)
Walter Viegas (Engenheiro Agrnomo, Angola)
Antnio Cipriano Pinheiro (Professor Emrito, Universidade de vora,
Portugal)
Carlos Pinto Gomes (Doutor, Universidade de vora, ICAAM, Portugal)
Diogo Figueiredo (Doutor, Universidade de vora, ICAAM, Portugal)
Eduardo Figueira (Doutor, Universidade Lusfona, Portugal)
Introduo
4
Jos Pinotes (Engenheiro, Consultor do Banco Mundial)
Maria Leonor da Silva Carvalho (Doutor, Universidade de vora, ICAAM,
CEFAGE, Portugal)
Maria do Rosrio Oliveira (Professor Emrito, Universidade de vora,
ICAAM, Portugal)
Raul Xisto Bruno de Sousa (Doutor, Instituto Superior de Agronomia,
Portugal)
Ricardo Serralheiro (Doutor, Universidade de vora, ICAAM, Portugal)
Comisso Organizadora Constituda por representantes de instituies vocacionadas para as reas da Economia, Sociologia, Ambiente e
Desenvolvimento Rural, competindo-lhe o planeamento e concretizao
de todas as tarefas conducentes realizao do Encontro.
Joaquim Lauriano (Doutor, Universidade Metodista de Angola)
Joaquim Caeiro (Investigador, Universidade Metodista de Angola)
Osvaldo Mendes (Mestre, Universidade Metodista de Angola)
Kelusodi Eduardo Filemon (Doutor, Universidade Metodista de Angola)
Antnio da Conceio Manuel (Licenciado, Universidade Metodista de
Angola)
Jos de Sousa Vieira Jordo (Doutor, Universidade Metodista de Angola)
Maria Salvadora Magalhes (Doutoranda da Universidade de vora,
Luanda, Angola)
Teresa Almada (Engenheira Agrcola, Ministrio da Agricultura, Luanda,
Angola)
Jaime Jernimo (Mestrando MEGA, Universidade Metodista de Angola)
Carlos Silva Carvalho (Engenheiro Agrnomo, vora, Portugal)
Marcos Olmpio (Doutor, CISA, vora, Portugal)
Maria da Graa Morais (Doutor, CIDHEUS, vora, Portugal)
Maria Leonor da Silva Carvalho (Doutor, Universidade de vora, ICAAM,
CEFAGE, Portugal)
Pedro Damio Henriques (Doutor, Universidade de vora, CEFAGE,
Portugal)
Vanda Narciso (Engenheira Zootcnica, Instituto de Apoio s Pequenas
e Mdias Empresas, vora, Portugal)
5
organizao e estrutura sesses plenrias sesses paralelas concluses
Conselho Consultivo da Comisso Executiva Constituda por interessados na realidade angolana e/ou anteriores ou actuais membros
de Comisses Executivas com experincia em iniciativas de complexidade
similar do Encontro Luso-Angolano, consistindo as suas funes em
apoiar a Comisso Executiva na seleco e concretizao das melhores
solues aplicveis aos aspectos prticos de concepo, programao,
execuo e avaliao do Encontro.
Antnia Vilar Baio (Cooperativa Mourense de Interesse Pblico de
Responsabilidade Limitada-COMOIPREL, Moura)
Carolina Caixinha Barrocas (Associao para a Inovao e Desenvolvimento
Integrado do Alentejo - IDEIA Alentejo)
Domingos Afonso Braga (Doutor, Universidade de vora, CISA)
Eduardo Jorge Esperana (Doutor, Universidade de vora)
Jaime Moleiro Serra (Doutorando, Universidade de vora, CISA)
Jos Lus Ramos (Doutor, Universidade de vora)
Jos Manuel Leal Saragoa (Doutorando, Universidade de vora, CISA)
Lus Albertino Alves Morais (Economista, CISA, vora)
Maria Beatriz Correia (Licenciada, Universidade de vora)
Maria Nomi Marujo (Doutoranda, Universidade de vora, CISA)
Maria da Saudade Baltazar (Doutor, Universidade de vora, CISA)
Rui Manuel de Sousa Fragoso (Doutor, Universidade de vora, CEFAGE-UE)
Rui Manuel Pingo (Administrador da Universidade de vora)
Ncleo de Apoio constitudo por alunos das licenciaturas da Universidade Metodista de Angola.
Na sesso inaugural, a mesa, presidida pela Magnfica Reitora da Universidade
Metodista de Angola, Professora Doutora Teresa Silva Neto, contou com o
Embaixador de Portugal em Angola, Dr. Francisco Ribeiro Telles, com o Magnfico
Reitor da Universidade de vora, Professor Doutor Carlos Braumann e com o
Prof. Doutor Joaquim Lauriano, Presidente da Comisso Executiva do Encontro.
O evento foi estruturado em Sesses Plenrias e Sesses Paralelas, orientadas
para as temticas da Economia, Sociologia, Ambiente e Desenvolvimento Rural.
Introduo
6
Sesses PlenriasA primeira sesso plenria foi dedicada ao Desenvolvimento Rural, tendo
sido orador o Doutor Altemiro Diogo, Director Geral do Desenvolvimento Rural,
em substituio da Doutora Filomena Delgado, Secretria de Estado para o
Desenvolvimento Rural. Moderou o Doutor Joaquim Lauriano (Universidade
Metodista de Angola) e o relator foi o Doutor Jos Jordo (Universidade Metodista
de Angola).
A importncia da produo de caf na sustentabilidade da agricultura Angolana foi o tema da responsabilidade do Mestre Jos Mahinga, Director Geral Adjunto do INCA em substituio do Doutor Joo Ferreira Neto, Director
Geral do mesmo Instituto. Foi moderadora a Doutora Maria Leonor da Silva
Carvalho (Universidade de vora) e relator o Dr. Cludio Bernardo (mestrando,
Universidade Metodista de Angola). O Mestre Jos Mahinga falou sobre a
sustentabilidade da cafeicultura em Angola, mostrando como se processa a
produo de caf e potencialidades para o sector.
O Doutor Francisco Ramos, Professor Emrito da Universidade de vora,
numa sesso moderada pelo Dr. Joaquim Caeiro (Universidade Metodista de
Angola, e tendo como relatora a Eng. Ana Sofia Pires (tcnica superior, Angola),
falou sobre Turismo e Desenvolvimento Rural, mostrando que o Turismo , efectivamente e em tempo de paz, a actividade econmica mundial com
maior impacto na vida dos pases, regies e comunidades, criando riqueza,
gerando postos de trabalho, arrastando actividades paralelas e complementares,
multiplicando sinergias e fomentando o desenvolvimento, sendo tambm um
fenmeno com implicaes sociais, culturais e polticas de grande alcance e
profundidade nos estilos de vida, nas formas de comportamento, na gnese do
processo de aculturao, no sistema educativo, na afirmao das identidades.
O Doutor Manuel Jos Alves da Rocha, Director do CEIC-UCAN dissertou sobre Desigualdades e Assimetrias Regionais em Angola. A moderao esteve a cargo da Doutora Maria Raquel Lucas (Universidade de vora) e o
relator foi o Doutor Joaquim Lauriano (Universidade Metodista de Angola).
Para o Doutor Alves da Rocha, o desenvolvimento e a programao regional
so domnios de estudo, pesquisa e anlise portadores de futuro, no apenas
7
organizao e estrutura sesses plenrias sesses paralelas concluses
do estrito ponto de vista econmico, mas, principalmente, na sua capacidade de propiciar a descoberta de dinmicas e sinergias invisveis quando se parte do topo para a base.
Houve ainda lugar a uma Mesa Redonda subordinada ao tema Agricultura e desenvolvimento sustentvel da economia Angolana, na qual foram intervenientes o Eng. Fernando Pacheco, Investigador e Consultor, o Mestre Jos Baptista, da Sociedade de Desenvolvimento dos Permetros Irrigados, o Doutor Jos Jordo, da Universidade Agostinho Neto, e o Doutor Joaquim Lauriano, da Universidade Metodista de Angola. Esta Mesa Redonda contou com a moderao do Doutor Rui Fragoso (Universidade de vora), tendo como relator o Doutor Marcos Olmpio (CISA- Universidade de vora).
Sesses ParalelasEstas sesses foram divididas em 2 grandes reas: por um lado as Polticas
Agrcolas, Ambiente e Sustentabilidade e, por outro, o Desenvolvimento.
A primeira subseco destas sesses incidiu sobre as Polticas Agrcolas, Ambiente e Sustentabilidade. Foi moderador o Dr. Antnio Zacarias da Costa (mestrando, Universidade Metodista de Angola) e relatora a Doutora Maria de Ftima Oliveira (Escola Superior Agrria de Coimbra).
Na primeira comunicao, os autores abordaram a questo A reviso da poltica de tarifas de gua no uso agrcola: um estudo de caso no Sul de Portugal,
avaliando os efeitos de polticas de tarifas da gua no uso agrcola, em termos do consumo de gua, do aproveitamento das reas beneficiadas com regadio, do rendimento do produtor agrcola, da recuperao dos custos com a gua e do desenvolvimento agrcola.
Em A Tipologia Comunitria das Exploraes Agrcolas a autora mostrou a importncia de uma classificao comunitria das exploraes agrcolas por tipo de orientao tcnico-econmica e classe de dimenso econmica para facilitar a anlise das actividades estruturais e dos resultados econmicos das exploraes agrcolas, devido grande diversidade de estruturas e sistemas de produo na Unio Europeia.
A floresta Indgena e Extica de Angola foi o tema abordado em A importncia da floresta Indgena e Extica no desenvolvimento econmico e social de Angola:
situao actual e potencialidades.
Introduo
8
Em Interdependncia dos preos do feijo-vulgar em cinco dos principais mercados em Moambique os autores analisaram a integrao de preos entre os mercados varejistas e o sentido de transmisso entre as cinco capitais provinciais de Moambique, no perodo de janeiro de 2005 a janeiro de 2011.
A segunda subseco teve por tema o Desenvolvimento. Foi moderador o Doutor Jos Rebelo dos Santos (Instituto Politcnico de Setbal) e relatora a Dr. Terezinha Filgueiras de Pinho (IFFR, Brasil).
Em Mulheres Licenciadas e a Promoo do Desenvolvimento em Angola: Que diferena faz o Ensino Superior? As autoras identificaram a importncia da obteno de uma licenciatura na valorizao social e econmica das mulheres angolanas e, consequentemente na promoo do desenvolvimento da sociedade.
O diagnstico de aspectos a nvel mundial/brasileiro quanto produo, comrcio e consumo de pescado, detendo-se na piscicultura, ramo da aqicultura direcionado criao e multiplicao de peixes em viveiros escavados (viveiros de barragem) e de como a economia solidria pode influenciar no desenvolvimento desta cultura foi o objectivo da comunicao Pesca, piscicultura e economia solidria.
O acesso gua e o desenvolvimento em frica analisou o papel da recolha e da distribuio de gua no desenvolvimento, nomeadamente na melhoria das condies de vida das populaes Africanas.
Suscitar a troca de conhecimentos e de esclarecimentos mtuos, a partir de um texto actualizvel sobre Desenvolvimento foi o objectivo da comunicao Reflexes em torno de perspectivas sobre questes tericas e prticas relacionadas
com o desenvolvimento.
A ltima comunicao desta subseco, Logstica e distribuio: variveis vitais para alavancar a produo, o escoamento dos produtos agrcolas e o
desenvolvimento integrado e sustentvel do meio rural angolanos incidiu sobre as pontes a desenvolver entre a produo e o consumo, a produo de produtos de qualidade e a preos competitivos, tendo mostrado a necessidade de potenciar os agentes comerciais, e de gerar parcerias entre os sectores pblicos e privados, com incluso dos camponeses e pequenos agricultores nas cadeias de valor, e ainda a necessidade de aumentar a instalao de entrepostos ou cadeias de frio e outras infra-estruturas que permitam operaes atempadas de colheita e transporte, de fornecimento, de armazenagem e conservao, de acondicionamento, de fraccionamento, de expedio.
9
organizao e estrutura sesses plenrias sesses paralelas concluses
A terceira subseco foi dedicada s Polticas Agrcolas e Sustentabilidade.
Foi moderador o Doutor Glson Garfalo (PUC-USP, Brasil) e relator o Mestre
Estevo Chaves (Angola)
Esta subseco iniciou-se com a comunicao A competitividade da mandioca
em Angola: perspectivas de mercado, em que os autores apresentaram um estudo
do mercado da mandioca em Angola.
O ensino agrcola com o objetivo de analisar a influencia da educao
profissionalizante em Roraima, estado no norte do Brasil, verificando a interao
entre a utilizao da capacidade instalada e a sociedade local cujos habitantes,
na maioria, trabalham na condio de pequenos produtores, ou seja, so
agricultores familiares e desenvolvem atividade relacionada com a aquicultura
foi abordado em Mudanas sociais por meio do ensino profissionalizante.
A necessidade de aumentar e diversificar a produo agro-pecuria de
forma sustentvel, melhorando o abastecimento alimentar da populao e
as condies de vida do meio rural, e ainda a garantia de disponibilidade da
oferta de produtos alimentares, interligando zonas com excedentes e zonas de
maior procura e poder de consumo so objectivos que o Governo Angolano
visa concretizar, tendo delineado um conjunto de instrumentos de poltica que
foram discutidos e analisados na Contribuio para o debate da sustentabilidade
da agricultura angolana.
O autor de Planeamento de canais de comercializao: O caso do agro-negcio
do azeite em Portugal props um modelo de planeamento dos canais de
comercializao que considere tambm os custos de transaco, aplicando-o
ao agro-negcio do azeite em Portugal. A produo de caf em Timor-Leste e a sua comercializao analisou e reflectiu
sobre o sector do caf em Timor Leste, realando aspectos relacionados com a
sua produo e comercializao, e ainda sobre a competitividade e vantagem
comparativa do sector.
Em a Produo de biocombustiveis em Angola-prs e contras ambientais o
autor fez uma abordagem sobre os problemas ambientais da produo de
biocombustveis em Angola.
O Desenvolvimento foi o tema da quarta subseco. Moderou a Dr. Maria
Emlia Pepeka (ISCED, Huambo) e foi relatora a Eng. Maria do Socorro Rosrio
(Ministrio da Agricultura, Portugal).
Introduo
10
A primeira comunicao desta subseco, Alguns contributos para o estudo
do diagnstico do desenvolvimento econmico da cidade do Huambo, pretendeu
contribuir para o melhor conhecimento da realidade social da provncia
do Huambo e tambm identificar algumas solues baseadas no conceito
desenvolvimento sustentvel, dando nfase ao conceito desenvolvimento
equilibrado, que permita ao ecossistema urbano relacionar-se racionalmente
com os demais ecossistemas, garantindo assim o respeito pela funo social e
pela dignidade humana.
Em Alguns contributos para a caracterizao da comunidade angolana imigrante
em Portugal e para a dinmica populacional portuguesa, os autores tiveram como
objectivo a quantificao e caracterizao dos Imigrantes Angolanos, no mbito
da sua distribuio por sexo, grupo etrio e regio de residncia, baseando a
sua anlise nos dados do Instituto Nacional de Estatstica (INE) e do Servio de
Estrangeiros e Fronteiras (SEF).
Os empregos verdes no desenvolvimento econmico local: desafios, oportunidades,
boas prticas e potencialidades no contexto angolano relacionou empregos verdes
com as vantagens competitivas de um territrio e as possibilidades de promoo
da incluso social de pessoas desfavorecidas, no quadro da luta contra a pobreza.
A ateno dos autores de O Fomento da Produo de Caf em Angola e o
desenvolvimento Rural concentrou-se em mecanismos que conduzam ao apoio
dos agricultores que se dedicam cafeicultura, em especial no que respeita
aprendizagem e aplicao de prticas e tecnologias adequadas conduo
da cultura, da assistncia sua organizao estrutural e consolidao do seu
contributo para o desenvolvimento rural.
Os autores de Economia Social e Cooperativismo: pilares fundamentais ao
desenvolvimento integrado e sustentvel da Sociedade Angolana dedicaram
um especial enfoque a comentar alguns aspectos da vantagem cooperativa,
pretendendo contribuir para a descoberta de um ponto de encontro entre
o microeconmico (estratgia competitiva para a empresa ou organizao)
e o macroeconmico (capital social e crescimento econmico) atravs da
cooperao.
Em Factores que influenciam a participao dos camponeses nos mercados
agrcolas o autor mostrou como o desenvolvimento da agricultura essencial para a melhoria da vida nas reas rurais.
11
organizao e estrutura sesses plenrias sesses paralelas concluses
Encerramento e Concluses Na sesso de encerramento foram sintetizadas as principais concluses do
Encontro:
Dar continuidade ao Encontro atravs de uma nova iniciativa a decorrer
em Portugal no ano de 2013;
Apostar nos sectores da agricultura em geral, e do caf em particular,
mineralogia, energia e indstria transformadora;
Criar iniciativas que promovam o desenvolvimento rural e conduzam a
uma estratgia de desenvolvimento sustentvel no eixo agro-industrial;
Reforo e diversificao dos investimentos no interior do pas, com o
objectivo de se reduzirem as grandes assimetrias que ainda se registam
entre a capital Luanda e as demais regies;
Dinamizar a troca de experincias no mbito do desenvolvimento
turstico sustentvel;
Aprofundar a cooperao e parceria entre as instituies pblicas e
privadas de Angola e Portugal, no mbito do ensino, da investigao,
do empreendedorismo e das polticas sociais;
Estreitar os laos de Angola e Portugal com os restantes pases lusfonos,
aproveitando o interesse suscitado por este evento na comunidade
lusfona.
Os Coordenadores
Maria Leonor da Silva Carvalho
Marcos Olmpio Gomes dos Santos
Joaquim Caeiro
15
A importncia da produo de caf na sustentabilidade da agricultura angolana
Jos Mahinga1
1 mahinga.mahinga@gmail.com
Jos Mahinga
17
A importncia da produo de caf na sustentabilidade da agricultura angolana
Jos Mahinga
19
A importncia da produo de caf na sustentabilidade da agricultura angolana
Jos Mahinga
21
A importncia da produo de caf na sustentabilidade da agricultura angolana
Jos Mahinga
23
A importncia da produo de caf na sustentabilidade da agricultura angolana
Jos Mahinga
25
A importncia da produo de caf na sustentabilidade da agricultura angolana
Jos Mahinga
27
A importncia da produo de caf na sustentabilidade da agricultura angolana
Jos Mahinga
29
A importncia da produo de caf na sustentabilidade da agricultura angolana
31
Turismo e Desenvolvimento
Francisco Martins Ramos1
Antes de iniciar a leitura do presente texto, gostaria de cumprimentar os pre-
sentes e agradecer aos membros da Comisso Organizadora deste Encontro Luso-
Angolano o simptico convite que me foi dirigido para participar nesta meritria
sementeira de ideias que estabelece laos acadmicos, cientficos, profissionais e
pessoais entre instituies e elementos dos nossos dois pases.
O Turismo um fenmeno de dimenses mltiplas que tem vindo a assumir
um peso significativo, a vrios nveis, nas relaes entre regies, pases e continentes.
Por outro lado, a rpida e universal proliferao de actividades tursticas tem
intensificado o impacto da mudana nas sociedades ditas tradicionais. De facto, e
parafraseando Denise Lawrence, mesmo nos mais desenvolvidos pases da Europa
e da Amrica, o turismo tem vindo a afectar os residentes locais, quer se tratem de
habitantes das cidades de montanha da Itlia, dos burgos acastelados de Espanha,
das aldeias perdidas das ilhas do Mar Egeu ou da regio portuguesa do Alentejo
(Lawrence 1996), das ilhas de Cabo Verde ou da zona do Kilimanjaro.
Uma Comisso da Liga das Naes definiu, em 1937, turista estrangeiro como
qualquer pessoa que visita um pas, diferente daquele em que reside, efectivamente,
por um perodo de, pelo menos, vinte e quatro horas. As pessoas que ficavam menos
de vinte e quatro horas eram tratadas como excursionistas. Naturalmente que,
para alm do turismo internacional, devemos considerar, hoje, o turismo domstico,
segmento no negligencivel do processo turstico global. Em geral, os autores
actuais esto de acordo em definir turista como uma pessoa em situao de lazer
1 Professor Emrito da Universidade de vora
Francisco Martins Ramos
32
que voluntariamente visita um local diferente do da sua residncia, com o propsito
de experimentar uma mudana (Smith V. 1989), se bem que, algumas vezes, o lazer
possa estar associado ao trabalho. Dito de outro modo, uma viagem de negcios,
ou um congresso cientfico podem associar-se a visitas e prticas tursticas.
Nas sociedades actuais, o Turismo o grande veculo do contacto de culturas,
o instrumento privilegiado das relaes interpessoais entre ns e os outros,
o elo potencial da ligao com estranhos, forasteiros, hspedes e estrangeiros.
O Turismo mediatiza pois, o processo etno-antropolgico da hospitalidade, da
anulao etnocntrica, do relativismo cultural, da afirmao plena do Homem,
simultaneamente singular e igual aos outros homens (Ramos 1992). Todavia,
a complexidade e riqueza do fenmeno no o elegem como o nico factor de
desenvolvimento de uma regio, pas ou localidade. Trata-se pois, de um fenmeno
problemtico, delicado e controverso, que nem sempre resiste simplicidade de
uma anlise de custos/benefcios.
Nestas circunstncias, gostaria de referir algumas delicadezas do fenmeno e
obstculos actividade turstica.
Assim, uma primeira questo prende-se com a sazonalidade inerente ao prprio
processo turstico. A procura turstica no equilibrada e constante em todos os
perodos do ano e at mesmo em todos os dias da semana. Os profissionais e
especialistas devem estar aptos a encarar tal situao, no sentido de minimizar os
seus efeitos em termos econmicos.
Outro aspecto que convm ter em considerao a insegurana. Esta pode
revestir trs modalidades: 1) a marginalidade e os conflitos sociais que ocorrem
nos destinos; 2) os conflitos e guerras regionais; 3) a insegurana a nvel dos
equipamentos tursticos e hoteleiros. Trata-se de um obstculo cada vez mais
premente na sociedade globalizada, em articulao com ofertas inadequadas.
Uma questo que pode ser problemtica ocorre com as alteraes cambiais que
afectam, para o bem e para o mal, os fluxos tursticos. Por exemplo, as oscilaes
do valor do dlar, do yen ou do euro podem condicionar a procura turstica,
nomeadamente quando a moeda do destino valoriza.
As modas influenciam a procura turstica. Um destino pode ser prejudicado
por ser chique e meditico procurar outros destinos. Exemplos internacionais so as
modas que privilegiam determinadas ofertas como a frica do Sul, a costa espanhola,
o norte de frica ou as ilhas Seychelles.
33
Turismo e Desenvolvimento
A ausncia de capacidade de carga um obstculo que penaliza certos destinos,
por no possurem infra-estruturas suficientes face, nomeadamente, ao aumento
da procura e, em especial, ao turismo de massas.
A competio desleal, apesar de efmera, afecta pontualmente determinados
destinos.
O amadorismo, a ausncia de profissionalismo e o esquecimento do anfitrio so
factores que, cada um a seu modo, acabam por fomentar a consequente reduo
da procura e a eventual reaco negativa da comunidade anfitri.
As questes anteriormente referidas nem sempre podem ser minimizadas
ou eliminadas pelos agentes tursticos, de modo que, individualmente ou no
seu conjunto, constituem srias ameaas actividade turstica, enquanto factor
econmico para o desenvolvimento de um pas, regio ou localidade. Se tais
obstculos no existem, ou se so superados, a oferta turstica encontra-se em
condies de atingir as suas metas.
Convm, entretanto, contextualizar o processo turstico no seu enquadramento
temporal. Apesar de alguns movimentos histricos poderem ser hoje considerados
como turismo, nomeadamente o processo medieval de desenvolvimento urbano
(Burke 1978), foi a revoluo industrial e a gnese das classes burguesas nos
sculos XVIII e XIX que forneceram ao processo turstico o seu mais importante
mpeto, atravs da importncia dada ao lazer, viagem, ao bem-estar e cultura
material (Lawrence 1996). De facto, lhomme voyage depuis des millnaires, mais
le concept de tourisme na t invent qu la fin du XVIII sicle en Angleterre
(Lanquar 1985: 3).
Quando se chega ao sculo XX, existe j uma rede de transportes significativa
a que o automvel, o comboio e mais tarde o avio viriam dar nfase como factores
geradores das prticas tursticas.
Apesar das experincias europeias e americanas anteriores II Grande
Guerra, aps 1945 e nomeadamente nas dcadas de 60 e 70 do sculo XX que
o Turismo ir ter o seu perodo ureo de desenvolvimento. Para tal, contriburam
cumulativamente uma srie de fenmenos, factos e acontecimentos: o crescimento
exponencial do parque automvel, o desenvolvimento crescente dos transportes
areos, a democratizao dos alojamentos, a introduo de voos charter, a
regularizao da semana de cinco dias de trabalho e do horrio de oito horas dirias
e a institucionalizao das frias pagas.
Francisco Martins Ramos
34
O Turismo , duplamente, um fenmeno social total. Em primeiro lugar porque,
dada a sua riqueza e complexidade, ele pode ser objecto de anlise, estudo e
investigao por parte de todas as cincias sociais. Por outro lado, tambm o pelas
diversas implicaes, influncias e impactos que tem na vida das comunidades,
regies e pases (Ramos 1992: 189). Da a existncia de mltiplas leituras sobre as
diversas dimenses do turismo.
Por outro lado e apesar da importncia do Turismo como instrumento cul-
tural, no nos podemos alhear da natureza econmica desta actividade. A
melhoria da qualidade dos servios tursticos, a eficincia da prestao de tarefas,
o carcter personalizado que muitos defendem no contacto com o visitante, etc.,
destinam-se, justamente, obteno de resultados econmicos motivadores
para a sustentabilidade da actividade em anlise. Como qualquer outra iniciativa
econmica, a oferta turstica visa o lucro, a rentabilidade, a produo de riqueza e a
criao de postos de trabalho. Pensar de maneira diferente utpico ou romntico,
mesmo que se integre a actividade turstica na rea da pluriactividade.
Um tema comum na abordagem antropolgica ao turismo a constatao
da mudana cultural resultante da chegada dos turistas. Assim, parte-se do pres-
-suposto de que o sistema cultural local inferior ao dos turistas; considera-se que
as mudanas so destruidoras das tradies locais e pensa-se que tais mudanas
conduzem a uma homogeneidade cultural que afecta a identidade e os modos de
vida dos residentes (Mckean 1989).
Tal perspectiva tambm reducionista e incompleta: em muitos destinos,
apesar de mudanas sociais significativas, filhas do progresso tecnolgico, possvel
verificar que o prprio fenmeno turstico que recupera tradies, revitaliza prticas
autnticas, fomenta o esprito identitrio, inventa e reinventa tradies, contribui
para a coeso social.
Naturalmente que existe sempre o perigo da mercantilizao da cultura,
para o qual nos alerta Davydd Greenwood (1987). De facto, quando a cultura
se mercantiliza, o significado que os residentes do aos seus rituais, cerimnias,
edifcios, lendas, produtos tradicionais, stios, paisagens e artefactos desaparece.
Perde-se o valor simblico que as comunidades conferem ritualizao das suas
prticas quotidianas ou s manifestaes extraordinrias das suas datas queridas.
Para Carlos Fortuna, em muitas circunstncias, as sociedades passam a estar
investidas da funo turstica, e que no s so chamadas a abrir os seus espaos
35
Turismo e Desenvolvimento
fronteirios e os indivduos os seus locais de residncia aos visitantes estrangeiros,
como tambm se torna apelativo o seu envolvimento em relaes transaccionais
muito peculiares. Com efeito, trata-se de fazer entrar na categoria de bens
transaccionveis a cultura, o patrimnio, as tradies, a prpria identidade, a con-
templao de certas categorias da populao (os camponeses, os artistas, os
operrios) e, finalmente, de fazer dos modos de vida dos indivduos um objecto
turstico (Fortuna 1997: 245). Ter a capacidade para evitar tal situao o grande
desafio que se coloca aos destinos tursticos afectados pela massificao.
Desse modo, a sustentabilidade do turismo, e do turismo cultural em particular,
assenta em trs pilares:
Rentabilidade econmica da actividade
Massa crtica capaz de defender a tradio e aceitar inovaes
Condies infra-estruturais de acolhimento.
Por isso e por razes que referirei imediatamente que o turismo no deve ser
a nica actividade econmica de uma regio ou localidade. Ela deve ser articulada
com a agricultura, com o artesanato, com a gastronomia, com os servios e com
a indstria existente. De facto, o turismo um fenmeno muito delicado cujas
fragilidades j foram referidas. E no nos esqueamos que existem localidades sem
vocao turstica.
A sustentabilidade no pode ser apenas uma bandeira panfletria; pelo con-
trrio, em termos pragmticos, uma actividade s sustentvel se a conseguimos
legar aos nossos filhos sem impactos negativos na sociedade, na economia e no
ambiente, de modo que eles tambm a possam legar aos nossos netos.
Convm recordar alguns princpios orientadores definidos em 1980, na
Declarao de Manila sobre Turismo Mundial: Os recursos tursticos de que dispem
os pases so constitudos simultaneamente por territrios, bens e valores. Trata-se
de recursos cujo emprego no pode abandonar-se a uma utilizao incontrolada
sem se correr o risco da sua degradao e destruio... A satisfao das necessidades
tursticas no deve constituir uma ameaa para os interesses sociais e econmicos
das populaes das regies tursticas, para o meio ambiente, especialmente os
recursos naturais, atraco essencial do turismo, nem para os lugares histricos e
culturais. Todos os recursos tursticos pertencem ao patrimnio da humanidade. As
comunidades nacionais e a comunidade internacional inteira devem envidar os
esforos necessrios para a sua preservao.
Francisco Martins Ramos
36
O Turismo tende sempre a ser de massas e, como tal, um forte contributo
para a morte das sociabilidades locais. A sangria demogrfica e migratria da regio
portuguesa do Alentejo, da Extremadura Espanhola e de outras regies, a quebra
das actividades ligadas ao sector primrio, as crises econmicas, a venda de habi-
taes a proprietrios no residentes, a nuclearizao das famlias, o envelhecimento
populacional, etc., so aspectos cumulativos do mesmo fenmeno de perda da
coeso e identidades locais. No seguramente o caso de Angola.
Os industriais do turismo tendem a vender a tradio impregnada de histria
(re)inventada. Por outro lado, uma nova sociabilidade, a turstica, artificial,
esquece o anfitrio, invade a sua privacidade, os seus espaos fsicos e mentais,
deteriora as relaes de vizinhana e coloca os actores num palco de representao
social, onde s o cenrio no muda. A poluio sobre o meio social acompanhada
de poluio sobre o meio fsico e ambiental.
Como j foi referido, a capacidade de carga dos destinos tursticos deve ser
respeitada, de modo que a onda avassaladora do turismo massificado, desordenado
e predador no exera presso sobre um determinado territrio fsico e com os
inconvenientes de uma sazonalidade delicada economicamente e indesejvel.
Assistimos, nalguns casos, quilo que Davydd Greenwood classifica como a
mercantilizao da cultura. Parafraseando este autor podemos dizer que no co-
nhecemos nenhuma comunidade que possa viver sem os significados que a cultura
pode fornecer; de facto, o turismo est forar mudanas culturais sem precedentes
sobre populaes que sofrem os efeitos da desertificao, da industrializao e
da urbanizao. A perda de significado atravs da mercantilizao da cultura
um problema to srio como a desigual distribuio de riqueza que resulta do
desenvolvimento turstico (Greenwood 1987: 172).
um facto incontroverso que o turismo no poder ser eliminado como parte
integrante da vida moderna. De facto, o turismo rural/cultural constitui uma
vertente inovadora do fenmeno turstico em geral, uma interessante alternativa ao
turismo de massas e surge associado, por um lado, necessidade de diversificar a
oferta turstica para fazer face competitividade externa e interna e, por outro lado,
resulta de uma nova concepo de desenvolvimento regional e rural... (Baltazar
1994: 84).
O que h a fazer, na linha de pensamento defendida por Dogan (1991) tentar
maximizar os seus aspectos positivos e minimizar os seus efeitos perniciosos. Todavia,
37
Turismo e Desenvolvimento
que resultados do turismo so positivos e quais so os negativos? O respectivo
entendimento depender das caractersticas da sociedade anfitri e do nvel de
desenvolvimento turstico atingido ou a atingir.
O Turismo , efectivamente e em tempo de paz, a actividade econmica mundial
com maior impacto na vida dos pases, regies e comunidades, criando riqueza,
gerando postos de trabalho, arrastando actividades paralelas e complementares,
multiplicando sinergias e fomentando o desenvolvimento.
Mas no , como j foi referido, apenas uma actividade econmica. Trata-se
de um fenmeno com implicaes sociais, culturais e polticas de grande alcance
e profundidade nos estilos de vida, nas formas de comportamento, na gnese do
processo de aculturao, no sistema educativo, na afirmao das identidades.
Na realidade, o turismo no uma agregao de actividades meramente
comerciais; tambm um quadro ideolgico da histria, natureza e tradio;
um quadro que tem o poder de transformar a cultura e a natureza nas nossas ne-
cessidades (MacCannel 1992: 1).
O recente interesse pelas identidades locais, pela importncia do passado
para as comunidades, pelo relevo dos espaos vernculos (e populares) explica a
emergente consolidao do turismo cultural no apenas na vertente do patrimnio
construdo (Santos 2002), mas tambm pela procura da cultura intangvel.
Para os espaos rurais, o Turismo surge como uma promessa slida para a
melhoria da economia local e consequentemente da vida das populaes. Atravs
da valorizao do patrimnio local, com o aparecimento de actividades ligadas ao
pequeno comrcio, na ligao terra, ao artesanato, animao e conservao
da paisagem e do ambiente, e com a revitalizao de outras actividades, poder
existir um aumento do rendimento individual e, consequentemente, uma melhoria
da qualidade de vida.
Numa interessante viso prospectiva, dois autores brasileiros abordaram o
turismo do sculo XXI, colocando algumas afirmaes que, sendo umas bvias e
outras discutveis, ajudam a reflectir:
a) Os novos turistas sero pobres em tempo e ricos em dinheiro.
b) Os turistas daro muita importncia s componentes culturais das visitas.
c) Haver uma maior conscincia ambiental e social.
Francisco Martins Ramos
38
d) Problemas relacionados com a sade e a segurana sero dos factores mais
inibidores nas escolhas dos destinos tursticos.
e) Para os prximos 20 anos os turistas seniores sero maioritrios.
f) A China e os Estados Unidos sero os destinos tursticos com maior
crescimento.
g) Aumentar a utilizao da Internet no processo turstico.
h) Verificar-se- uma necessidade premente de profissionais especializados:
agentes, guias-intrpretes, investigadores, gestores tursticos, animadores,
operadores e docentes.
Estou certo que a criao de uma licenciatura em Turismo na Universidade
Metodista de Angola pode e deve ser um instrumento fundamental para a formao
de tcnicos e profissionais, essenciais para o desenvolvimento do turismo em todo
o pas. Trata-se de um sector estratgico que deve merecer das autoridades todo o
apoio na concretizao de projectos pblicos e privados.
Referncias Bibliogrficas
Baltazar, Alda Vitria Alegre 1994 Turismo no Campo Branco: Um factor de desenvolvimento local, Beja: Universidade Moderna
Burke, Peter 1978 O Mundo como Teatro, Lisboa: Difel
Dogan, Hassan 1991 Forms of Adjustement. Sociocultural Impacts of Tourism,
Annals of Tourism Research, vol. 16, no. 2, pp. 216-236
Fortuna, Carlos 1997 Les Centres Historiques et Monumentaux des Villes: A Propos du Tourisme Urbain et du Patrimoine, Sociologie Urbaine et Rurale 52/53
Greenwood, Davydd 1987 Culture by the Pound: An Anthropological Perspective on Tourism as Cultural Commoditization, in Valene Smith (edit.), Hosts and Guests, The Anthropology of Tourism, Philadelphia: University of Pennsylvania Press
39
Turismo e Desenvolvimento
Lanquar, Robert 1985 Sociologie du Tourisme et des Voyages, Paris
Lawrence, Denise 1996 Tourism and the Emergence of Design Self-Consciousness in a Portuguese
Town in D. Pellow (edit.), Setting boundaries: the anthropology of spatial and social organization, Wesport: Bergin & Garvey
MacCannel, Dean 1992 Empty Meeting Grounds: The Tourist Papers, London: Routledge
McKean, Philip F. 1989 Towards a Theoretical Analysis of Tourism: Economic Dualism and Cultural
Involution in Bali, in Valene Smith (edit.), Hosts and Guests, The Anthropology of Tourism, Philadelphia: University of Pennsylvania Press
Ramos, Francisco Martins, 1992 Os Proprietrios da Sombra, vora: Universidade de vora
Santos, Figueiredo 2002 Turismo, Mosaico de Sonhos, Lisboa: Edies Colibri
Smith, Valene (edit.) 1989 Hosts and Guests, The Anthropology of Tourism, Philadelphia: University of Pennsylvania Press
41
Desigualdades e assimetrias regionais em Angola
Alves da Rocha1
Pontos prvios
Estou convencido de que a problemtica do desenvolvimento regional no nosso
pas no goza da mesma prioridade poltica que outros temas, como a estabilizao
macroeconmica, o controlo do valor cambial externo da moeda nacional, a restrio
monetria, etc.
Tem-se conscincia das profundas desigualdades entre as regies e dentro destas,
entre as provncias. No entanto, a este nvel de percepo no tem correspondido
uma atitude reactiva em termos estratgicos e de polticas macroeconmicas, mi-
croeconmicas e empresariais tendentes a mitigar as diferenas de nveis de vida
entre Luanda e algumas provncias do litoral e todo o extenso interior.
Desde que finalizei a minha formao acadmica bsica e complementar que
a temtica regional me tem atrado, sobretudo pela influncia que a disciplina cur-
-ricular Mtodos e Tcnicas de Planeamento Regional exerceu sobre algumas das
minhas preferncias de estudos tericos e aplicados. A atraco por esta rea do
conhecimento levou-me e escrever um ensaio nos idos anos 70, depois de um ano
de actividade profissional ps-licenciatura2.
Na verdade, o processo de crescimento econmico , ele prprio, gerador de
desigualdades, provocadas por mecanismos de mercado capazes e suficientes de
1 Professor Associado da Universidade Catlica de Angola. Director do Centro de Estudos e Investigao Cientfica da UCAN.
2 Alves da Rocha Algumas Consideraes Tericas sobre Desenvolvimento Regional, Servios de Planeamento e Integrao Econmica de Angola, Julho de 1972, com prefcio de Jos Manuel Zenha Rella.
Alves da Rocha
42
assegurar, no substancial, uma afectao racional e eficiente dos recursos e factores
de produo, mas deficitrios nos critrios de repartio do PIB e do rendimento
nacional. Em diferentes pontos de vista: funcional (factores de produo), pessoal
e regional. A adopo de mtodos correctivos impe-se, pelas vias da descentrali-
zao de decises, da captao de factores, recursos e competncias, da valorizao
das vantagens competitivas regionais, da democratizao do acesso informao,
s oportunidades de negcios, ao crdito (uma das modalidades de se mitigar
a pobreza e corrigir a disfuncionalidade na repartio pessoal do rendimento
nacional), educao e sade.
O desenvolvimento e a programao regional so domnios de estudo, pesquisa
e anlise portadores de futuro, no apenas do estrito ponto de vista econmico,
mas, principalmente, na sua capacidade de propiciar a descoberta de dinmicas e
sinergias invisveis quando se parte do topo para a base.
Os estudos relativos s assimetrias do desenvolvimento dentro dum mesmo
pas no so recentes e o interesse que esta problemtica tem suscitado remonta a
Franois Perroux, Jonh Friedman e Jan Tinbergen na dcada de 60 do sculo passado3.
Mais recentemente, o interesse pelo estudo do crescimento regional alargou-se s
assimetrias decorrentes dos processos de integrao econmica, que tm levado
ou ameaam levar ao esvaziamento progressivo de territrios/zonas/espaos
escassamente competitivos ao nvel comunitrio. Esta nova direco de resto, com-
plementar da anterior que tem sido impressa problemtica regional/espacial
de particular interesse para Angola, a braos com uma ausncia de estratgia para
a sua integrao econmica nos espaos regionais africanos a que politicamente se
comprometeu pertencer.
O interesse acadmico e cientfico por esta componente da Teoria Econmica
s comeou a manifestar-se na segunda metade do sculo XX. Recuando-se at
ao sculo XVIII verifica-se que a Teoria Econmica foi construda numa perspectiva
a-histrica e a-espacial. Esta foi a filosofia fundamental do pensamento clssico, para
quem o livre jogo do mercado levaria, num sistema a que no se seguiria nenhum
outro, optimizao na determinao dos bens a produzir, na utilizao dos factores
de produo, na repartio dos rendimentos, no escalonamento temporal das
3 Ver A Planificao e os Plos de Desenvolvimento, Perroux, Friedman e Tinbergen, Edies RS, 1975.
43
Desigualdades e assimetrias regionais em Angola
decises e na localizao das actividades econmicas. Ficaram clebres as theories
of regional self-balance de Ohlin (1933), Losch (1939) e Isard (1956), de acordo
com as quais a optimizao dentro de cada pas se conseguiria atravs do livre
jogo das foras do mercado, levando os detentores de capital a maximizar os seus
ganhos e os trabalhadores os seus salrios atravs de localizaes espaciais onde as
circunstncias fossem mais favorveis, tanto do ponto de vista individual, quanto
social. O self-balance operar-se-ia, ento, do modo seguinte: os investimentos
seriam atrados das regies com salrios mais altos para as outras com salrios mais
baixos, onde, por ser escasso o capital, seria maior a sua produtividade marginal.
Por seu turno, a mo-de-obra movimentar-se-ia em sentido contrrio, para as re-
gies mais desenvolvidas de salrios mais elevados e disponibilidade de fora de
trabalho mais escassa e, consequentemente, de produtividade marginal mais elevada
(empobrecendo demograficamente as regies de origem). O equilbrio segundo o
ptimo de Pareto era evidente e alcanvel, desde que inexistentes quaisquer formas
de interveno do Estado que levassem ao falseamento das regras do mercado.
Portanto, assimetrias regionais era uma expresso abolida do seu lxico econmico.
S por volta da segunda metade dos anos 50 e primeira dos anos 60 do sculo
XX se reconheceu, emprica e cientificamente, que a realidade apresentava-se muito
assimtrica dentro de cada pas e com consequncias tais que s uma interveno
correctora do Estado poderia concertar. Justificou-se, assim o aparecimento das
teorias do desequilbrio regional (theories of regional imbalance), tendo como
representantes mais expressivos Franois Perroux (1955), Hirschman (1957 e 1958),
Myrdal (1957) e Kaldor (1967). O denominador comum do seu pensamento econ-
mico era o de que o livre jogo das foras do mercado no tenderia para o equilbrio
econmico interno.
Em termos tericos, so j relativamente abundantes conceitos, modelos
e ferramentas metodolgicas que, no mbito da disciplina do Crescimento Eco-
nmico4, tm permitido realizar e enfatizar determinados contrastes empricos que
4 Na literatura anglo-saxnica so vrias e definitivas as contribuies no domnio do economic growth, economic development ou development economics (esta designao mais atraente e verdadeiramente do domnio da teoria ou da anlise do desenvolvimento), com Robert Solow, Arthur Lewis, Paul Romer, Robert Barro, Xavier Sala-I-Martin, Debraj Ray, Michael Todaro, Stephen C. Smith, Ian M. D. Little, Philippe Aghion, Peter Howit, A. P. Thirlwall para, eventualmente, citar os mais importantes e conhecidos autores e tericos. Ver no Relatrio Econmico Anual 2003 do CEIC/UCAN a excelente reflexo de Vtor Santos sobre o ponto de situao do debate terico quanto ao desenvolvimento econmico regional.
Alves da Rocha
44
conduzam ao conhecimento/descoberta das causas do aumento do Produto, da
origem das assimetrias espaciais e, consequentemente, da criao e distribuio do
rendimento e das razes das dinmicas de desenvolvimento, ou seja, o porqu de
alguns pases/regies/territrios crescerem mais rapidamente do que outros/outras.
E neste contexto que se pode inserir a problemtica da equidade inter-territorial,
procurando-se reflectir se deve ser este o sentido do desenvolvimento regional ou,
pelo contrrio, se o mesmo se deve concentrar nas regies mais competitivas, de
modo a rentabilizar os investimentos econmicos e sociais e depois difundir o cres-
cimento para os espaos imediatamente mais contguos.
Quer dum ponto de vista terico, quanto duma perspectiva prtico/emprica,
os temas essenciais relacionados com a economia regional podem ser agrupados
em trs reas: a primeira, relacionada com o impacto do crescimento sobre a loca-
lizao e concentrao das actividades econmico-produtivas em determinadas
reas geogrficas, a segunda, focalizada sobre a evoluo das disparidades regionais
expressas pelas diferenas no rendimento mdio por habitante e o estudo das causas
que esto na origem das mesmas e, finalmente, a relao entre os processos de
integrao, crescimento e convergncia.
Em Angola tem estado ausente a reflexo sistemtica poltica e acadmica
sobre o desenvolvimento regional e a recuperao dos espaos interiores face a uma
litoralizao demogrfica e econmica crescente, a qual e perante uma ausncia de
estratgia e de poltica regional, tende a retro-alimentar-se5. Alguns estudos, muito
circunscritos, tm abordado, meramente ao de leve, as desigualdades regionais em
Angola, mas tm sido muito escassos os debates, as conferncias, as palestras e os
seminrios sobre este assunto, sendo, justamente, por isso que o CEIC, atravs do
seu Departamento de Estudos Econmicos, entendeu abrir esta frente de pesquisa
e anlise, embora consciente das ciclpicas dificuldades relacionadas com a falta
de informao de base e com a relutncia do Governo e da Administrao Pblica
em geral em disponibilizarem as poucas informaes existentes. Este estudo uma
primeira abordagem dos problemas da regionalizao em Angola da localizao das
5 A questo do desenvolvimento regional j mereceu, durante a Administrao portuguesa, uma ateno muito particular da parte das instituies que na poca tratavam do problema do crescimento econmico. Diversos planos de desenvolvimento provincial foram elaborados entre os quais ficou como referncia o da Provncia do Huambo e que visavam reduzir as disparidades regionais que dominavam o intenso crescimento econmico do pas na altura.
45
Desigualdades e assimetrias regionais em Angola
infraestruturas e do estado actual do debate e da reflexo terica sobre a economia
regional.
Introduo
Angola tem sido apresentada como um case study em termos de estabilizao
macroeconmica e crescimento da economia, a partir de 2002. Apesar de esta
situao ter uma correlao muito forte com o comportamento da economia mun-
dial e, em particular, da procura e do preo do petrleo, no se pode tirar mrito
aos Ministros das Finanas e aos Governadores do Banco Nacional de Angola
que entre 2000 e 2008 se responsabilizaram pelo desenho e implementao
das polticas de ajustamento macroeconmico que funcionaram como esteio do
fantstico crescimento econmico ocorrido. As bases metodolgicas em que a
estabilizao assentou fazem com que a mesma tenha deixado de ser um mero
episdio do processo econmico de Angola e passado a ser uma situao de rotina,
ainda assim exigente em conhecimentos cientficos, capacidade de entendimento
da causa das coisas, habilidade de gesto, flexibilidade de medidas e polticas e
competncia de interveno imediata. Estabilizao com crescimento foi, portanto,
o aspecto que tornou Angola num caso especial, reforado pela posio que,
durante aquele perodo, as autoridades governativas assumiram perante o Fundo
Monetrio Internacional em matrias relevantes da natureza do modelo de gesto
macroeconmica.
A disseminao do crescimento econmico , agora, o outro grande desafio.
As evidncias empricas at ao presente denunciam uma excessiva, injusta e eco-
nomicamente contraproducente concentrao do crescimento e dos seus resul-
tados em 5% da populao, meia dzia de sectores de actividade econmica,
0,18% do territrio nacional6 e 2 produtos exportveis. As assimetrias regionais so
assustadoras, provocando uma estratificao social indecente e imoral ao relegar
para planos secundrios e tercirios de considerao social e condies econmicas
de vida franjas considerveis da populao. Existem situaes de fome endmica
6 Em 2007, Luanda (com uma rea de 2257 quilmetros quadrados), respondeu por 75,1% do volume global de negcios realizado no pas, 55% do nmero total de empresas e estabelecimentos existentes e por 32,3% do emprego total (com os parciais de 25,3% do emprego pblico e 64,3% do emprego empresarial, pblico e privado).
Alves da Rocha
46
em muitas zonas do pas condio, de resto, corroborada pelo Governo nos seus
diferentes documentos de poltica econmica onde as acessibilidades materiais
so inexistentes.
A reduo das desigualdades territoriais, atravs da qual se pode levar o
crescimento econmico e os seus benefcios ao interior do pas, deve ser o novo e
prximo case study de Angola. fundamental imaginar e aplicar um sistema que
torne Angola num pas onde as dissemelhanas regionais se confinem s vantagens
comparativas de cada provncia, s diferenas culturais e histricas e aos acidentes
geogrficos.
Para isso, tem de se comear por construir um dique de reteno da populao
noutras regies que no Luanda e as do litoral. Os sistemas de educao e formao
profissional so os de maiores resultados a curto prazo, ao adiarem a entrada da
populao activa no mercado de trabalho. Em simultneo, as polticas de incentivo
ao crescimento econmico devem pressionar os investidores e empreendedores a
localizarem as suas empresas e actividades no interior do pas. difcil iniciar um
processo de crescimento regional relativamente equilibrado do pas se se mantiver
a tendncia actual de localizao econmica, em que mais de 77% das empresas
em actividade esto em Luanda, Benguela, Kwanza Sul, Cabinda e Namibe.
So indiscutveis os desequilbrios sectoriais e regionais que constrangem a
economia a conseguir um melhor aproveitamento da capacidade produtiva instalada
e dos recursos naturais de que dispe.
A situao de desequilbrios sectoriais e regionais uma consequncia di-
recta da importncia das relaes econmicas com o exterior, nomeadamente as
exportaes de produtos de base no transformados, que determinam, em mais de
90%, o crescimento do Produto Interno Bruto. Este estado, aliado s deslocaes de
populao como resultado do conflito militar, contribuiu para que o crescimento
verificado se processasse muito desarmoniosamente7.
A condio de arrasamento de praticamente todas as infraestruturas fsi-
cas e materiais a que a guerra conduziu hoje o principal obstculo para que as
7 At 2000, praticamente no houve crescimento econmico para distribuir pelo interior. De acordo com as informaes do African Development Indicators de 2002, a taxa mdia de crescimento do PIB, a preos de 1995, entre 1990 e 2000 no foi alm de 0,7%, o que, evidentemente, provocou uma degradao das condies de vida da populao e a emerso da pobreza como fenmeno estrutural.
47
Desigualdades e assimetrias regionais em Angola
zonas do interior do pas sejam chamadas a integrar-se num movimento global de
crescimento e de incluso da economia nacional. A recuperao dos principais e
mais significativos eixos de transportes rodovirios e ferrovirios , do meu ponto de
vista, a grande prioridade em matria de desenvolvimento regional e de criao das
condies para se pr em marcha um movimento que, a longo prazo, proporcione
a igualizao relativa das condies de acesso repartio do rendimento nacional.
O fenmeno das migraes internas tem jogado um papel de relevo sobre
o binmio populao/desenvolvimento (urbano e rural). A paz no teve as con-
sequncias esperadas em termos de regresso e fixao dos deslocados s e nas zonas
de origem. Pelo contrrio, a opo de segurana que as cidades proporcionavam
face guerra, comea a ser substituda pela simples atraco urbana, propiciada
pelos familiares aqui residentes, pelas maiores facilidades de sobrevivncia diria,
pelas oportunidades que o crescimento econmico centrado nas principais cidades
oferece8, etc. Se durante o conflito militar, o xodo rural, traduzido na fuga guerra,
deu origem ao aparecimento de um fenmeno de ruralizao das cidades reaco
social e econmica s dificuldades de sobrevivncia e s carncias de abastecimento
de bens alimentares durante a paz e com as dificuldades existentes nas provncias
do interior9, o reassentamento das populaes pode no ter registado as propores
esperadas e desejadas, colocando, em decorrncia, problemas ao prprio modelo
de se levar o desenvolvimento ao campo.
Assim, ser, mais uma vez, o problema da capacidade de reteno do cres-
cimento populacional nos quadros rurais de desenvolvimento societrio a con-
dicionar estratgias e polticas de desenvolvimento: a forte rarefaco que caracteriza
a ocupao populacional de Angola tem implicaes indelveis sobre a cobertura
de servios de sade, educao e formao, sobre o fornecimento de gua, sobre
os sistemas de transportes, etc.
8 o conhecido spill over effect.9 Durante as minhas recentes deslocaes por algumas provncias do Leste e por Malanje, ficaram
patentes vrias coisas: que a estabilizao macroeconmica tarda em chegar ao interior, que as dificuldades de recuperao da agricultura so fantsticas no se podendo pensar que, apenas, sero os mecanismos de mercado a reabilit-la que ter de haver durante um tempo razovel mais Estado (e, claro, melhor Estado), que a fome e a nudez so to evidentes como a paz, que o atavismo vai com certeza ser um obstculo implementao dum modelo de crescimento moderno e produtivista, que a iniciativa privada e o empreendedorismo nem sequer embrionrias so, que as igrejas detm uma influncia aprecivel sobre as populaes (no respeito pelas suas tradies), etc.
Alves da Rocha
48
Foi durante a Administrao colonial portuguesa e sobretudo quando os im-
pulsos de crescimento econmico do territrio foram considerados surpreendentes,
que se compreendeu ser difcil nessa fase do milagre econmico angolano levar
o desenvolvimento ao interior e, consequentemente, diminuir as diferenas regio-
nais que se acentuavam, com a concentrao do crescimento econmico em plos
como Luanda, Benguela e Nova Lisboa (Huambo). A fabulosa rede de estradas
que ento se foi construindo no obedeceu, apenas, a determinantes de ordem
militar, tendo-se, pelo contrrio, conjugado os interesses de circunscrever a aco
da guerrilha com os do desenvolvimento, porque se compreendeu que o levar-se o
desenvolvimento ao interior era, igualmente, uma forma de diminuir a intensidade
da luta de libertao nacional. Deveria ter sido o IV Plano de Fomento a consagrar,
de um modo prtico e particularmente atravs da Extenso Rural, o modelo de
alargamento do desenvolvimento ao hinterland, em condies de um equilbrio
populacional muito diferente do de hoje, em que a populao rural representava
mais de 80% da populao total do territrio10.
So tremendas as desigualdades regionais em Angola e que nesta fase de ps-
conflito se manifestam de modo totalmente visvel. Existem manchas imensas de
territrio completamente despovoadas como consequncia das migraes foradas
pela guerra. Inclusivamente, muitos eixos administrativos foram abandonados pelas
autoridades e populaes devido instabilidade militar, colocando-se a questo
de se saber se a reconstruo das respectivas infraestruturas se deve processar ou
se, pelo contrrio, devem ser construdas novas nos novos locais de concentrao
da populao deslocada.
A necessidade de se promover um desenvolvimento harmnico e equilibrado
do territrio nacional tem de, necessariamente, passar a assumir um lugar cada
vez mais destacado nos estudos e na anlise da economia de Angola, para que
corresponda, no fundo, conscincia generalizada da existncia de uma grande
desigualdade de nveis adentro das populaes das vrias provncias.
Decorre daqui a urgncia em se praticar uma poltica de regionalizao do
desenvolvimento, que leve a modernizao das estruturas produtivas e a me-
lhoria das condies de vida da populao ao interior, condio politicamente in-
10 Ver mais adiante referncias poltica regional em Angola, desde os III e IV Plano de Fomento, at aos mais recentes planos e programas do Governo angolano.
49
Desigualdades e assimetrias regionais em Angola
dispensvel para se falar em reconciliao nacional. Na realidade, a programao do
desenvolvimento econmico do pas no pode ser dissociada do estabelecimento de
novas estruturas econmicas e sociais em que seja possvel a troca de conhecimentos
e dos bens produzidos, num vasto esquema de valorizao do potencial humano
de Angola, que , em ltima instncia, o verdadeiro motor do progresso.
Por outro lado, no se poder acreditar na possibilidade de se conseguir um
desenvolvimento econmico intenso e ordenado que no seja custa da criao,
nas regies mais favorveis ou aptas, das infraestruturas e dos incentivos que tornem
viveis a implantao dum nmero crescente de indstrias e outras actividades
econmicas que possam conduzir a um melhor aproveitamento e transformao
das riquezas naturais, nomeadamente no domnio dos recursos agro-pecurios,
silvcolas e das pescas dessas regies.
Estudar a problemtica territorial em Angola pode ser feita ou do ponto de
vista da provncia ou dum ngulo mais agregado que traduza a verificao de um
ou mais critrios de proximidade geogrfica, cultural, disponibilidade de recursos
naturais, etc.
A base deste estudo sobre as desigualdades e assimetrias regionais em Angola
geogrfica, tendo levado considerao de cinco regies: Luanda/Bengo, regio
Norte (Cabinda, Zaire, Uge e Kwanza Norte), regio Centro/Leste (Malanje, Lunda
Norte, Lunda Sul, Moxico e Kwando Kubango), regio Centro/Oeste (Bi, Kwanza
Sul, Huambo, Benguela e Namibe) e uma regio Sul, com as provncias da Hula e
do Cunene.
Luanda/Bengo a grande metrpole angolana, exercendo um efeito polarizador
arrasador sobre todo o territrio nacional e representando um mosaico inter-tnico
e inter-cultural nico no pas.
A regio Norte, ao considerar as provncias de Cabinda e do Zaire, explora o
actual maior recurso natural do pas e junta as duas principais etnias da zona num
esforo comum de desenvolvimento e de aproximao social e poltica.
A regio Centro/Leste rene as provncias produtoras de diamantes e energia
elctrica dois recursos essenciais para o seu desenvolvimento e do pas e faz
interagir duas das mais importantes etnias de Angola, as quais, em conjunto, re-
presentam mais de 14% da populao do pas. a regio com a maior extenso
territorial onde a provncia de Malanje pode exercer um papel de polarizador e
Alves da Rocha
50
difusor do crescimento econmico e rea de ligao entre o litoral norte e o leste
do pas.
A regio Centro/Oeste pode ser considerada como a grande reserva agrria e
das pescas do pas11, apresentando a maior concentrao populacional depois de
Luanda/Bengo (30% em 2007) e uma enorme e reconhecida potencialidade para
a implantao dum fortssimo sector agro-industrial de satisfao das necessidades
do mercado interno e de exportao. Pode ser vista como a zona inter-tnica por
excelncia, uma vez que no seu seio coabitam, pelo menos, oito da totalidade das
etnias existentes em Angola.
Finalmente, a regio Sul, composta apenas por duas provncias com capacidades
e aptides semelhantes, mas onde se destaca a Hula.
Para que este futuro desenvolvimento polarizado possa funcionar e desencadear
os efeitos desejados sobre a reduo das disparidades regionais e a aproximao dos
nveis de vida das populaes so necessrias vrias condies, de onde se destacam
a descentralizao administrativa12, a capacidade de liderana e de governao
local e o envolvimento das autoridades tradicionais. So condies institucionais e
polticas elementares para que se possa levar o desenvolvimento ao interior e a ficar.
As assimetrias regionais em Angola
Populao
Contrariamente s expectativas, a paz acelerou, consideravelmente, as
assimetrias demogrficas no pas. At 2003 o conflito militar provocou uma des-
locao populacional em direco s cidades e que foi acelerada depois de
terminada a guerra civil e de se terem registado os primeiros sinais da recuperao
econmica e de se terem lanado as primeiras obras pblicas de reconstruo
nacional. A litoralizao destes empreendimentos atraiu as populaes em direco
a estas regies, sem sequer se ter registado um efeito significativo do regresso dos
deslocados.
11 Segundo os mais reputados especialistas angolanos, no o Centro do pas a regio com as maiores e melhores aptides para a pecuria extensiva, mas sim Malanje e as Lundas, dada a abundncia de pastos naturais e de gua.
12 A descentralizao administrativa e financeira um dos tpicos actuais do conjunto de abordagens estratgicas do Governo.
51
Desigualdades e assimetrias regionais em Angola
Fonte: Clculos do CEIC com base no Recenseamento Eleitoral de 2007
Para alm de se verificar uma alterao significativa na ocupao populacional
relativa do espao nacional, outras modificaes so igualmente dignas de se
assinalarem.
Na verdade:
H regies perdedoras lquidas de populao e outras ganhadoras lquidas
de habitantes.
Ocorreu e aparentemente continua a ocorrer uma desertificao humana
do interior do pas traduzvel numa perda de 3 pontos percentuais e sete
pontos percentuais na representao relativa das regies do Centro-Leste
e do Centro-Oeste respectivamente.
O incremento exponencial da densidade demogrfica na regio Luanda/
Bengo explica as actuais dificuldades da metrpole luandense numa srie de
itens econmicos e sociais e que podero ter consequncias polticas a prazo.
Sabendo-se que a existncia duma massa crtica de populao indispensvel
para a localizao das actividades econmicas13, a diferena entre as densidades
13 Naturalmente que o poder de compra dessa populao outro elemento, porventura mais importante, para a localizao do investimento privado. Mais adiante voltarei a este aspecto.
Alves da Rocha
52
mdias da zona econmica industrial/comercial/financeira (Luanda e Bengo) e
da zona Centro-Leste (onde esto os diamantes) de 41,1 vezes explica porque
uma das actuais caractersticas do desenvolvimento regional em Angola a da
concentrao das actividades privadas na zona da Grande Luanda. De resto, j
o valor correspondente sua densidade relativa14 aponta para a verificao dum
profundo desequilbrio regional na distribuio da populao, com a ocorrncia de
amplas extenses de territrio totalmente desertas (a zona restrita dos diamantes,
a que corresponde quase 32% do territrio, habitada por pouco mais de 8% da
populao total).
patente a presso demogrfica sobre Luanda e regio circundante de in-
fluncia, onde a densidade demogrfica no s a maior (152 habitantes por
quilmetro quadrado), mas sofreu um agravamento de 86,7% entre 2000 e 2007.
Assimetrias econmicas
no domnio da economia que as assimetrias regionais se apresentam mais
agressivas, injustas e desigualitrias.
Com efeito, cerca de 55% de todas as empresas e estabelecimentos em
actividade encontravam-se em Luanda em 2007, cifra que sobe para 68,3% ao jun-
tarem-se as provncias de Benguela e Kwanza Sul.
Igualmente preocupante a dinmica de desconcentrao da actividade
econmica, no se tendo registado, no perodo em estudo, sinais de alteraes
sustentveis da estrutura regional de localizao empresarial, permanecendo a
regio centro-leste como a mais deprimida do pas.
Tecido empresarial
Segundo as estatsiticas do REMPE a actividade econmica no pas, utilizando-
se o indicador nmero de empresas e estabelecimentos, tem vindo a aumentar a
um ritmo mdio anual de 8,3% entre 2003 e 2007. Dum total de 18600 unidades
empresariais em 2003, o pas dispunha em 2007 de 25548 estabelecimentos.
14 Valores de 11,2 para a regio Luanda/Bengo e 0,27 para a regio Centro/Leste.
53
Desigualdades e assimetrias regionais em Angola
ESTRUTURA EMPRESARIAL REGIONAL VERTICAL
Fonte: INE, REMPE.
Os valores acima mostram alguns aspectos interessantes:
a actividade de extraco mineral no tem expresso em termos de nmero
de empresas no cmputo nacional, embora a sua participao em termos
de rendimentos seja arrasadora;
em todas as regies a actividade predominante exercida no domnio dos
servios mercantis: comrcio, reparao de veculos, hotelaria e restaurao,
transportes, armazenagem e comunicaes, actividades financeiras e imo-
bilirias, servios de educao e sade privados, podendo-se, portanto,
afirmar que neste aspecto as regies e as provncias se equivalem;
no entanto, dentro dos servios mercantis h diferenas assinalveis; por
exemplo, as actividades financeiras e imobilirias so bastante repre-
sentativas em Luanda, no o sendo nas restantes provncias;
confirma-se o que se afirmou sobre a no vocao agrcola de Luanda
quando se anlisou o emprego agrcola; de facto, quer em 2003, quer em
2007, as empresas agrcolas no chegaram a representar 2% do total do
universo empresarial da regio Luanda/Bengo;
a relevncia do sector agrcola aparece nas regies Centro/Oeste e Centro/
Leste;
Alves da Rocha
54
entre 2003 e 2007, o peso das empresas agrcolas no cmputo provincial
baixou nas regies do Centro/Leste e do Centro/Oeste;
a percentagem de empresas que se dedicam s actividades de transformao
relevante, praticamente, em todas as regies definidas; porm, uma
observao mais fina permite estabelecer diferenas significativas entre as
mesmas; na verdade, as verdadeiras fbricas de transformao industrial
esto concentradas no eixo do litoral Luanda/Kwanza Sul/Benguela, sendo
as do interior de transformao rudimentar e mesmo primria;
ainda na manufactura curioso assinalar-se um decrscimo do peso
relativo das empresas no universo empresarial de cada regio, mostrando,
aparentemente, uma alterao nas preferncias dos empresrios por outo
tipo de actividades, como a construo (na regio Luanda/Bengo o peso
relativo quase duplicou de 2003 para 2007 e na regio Centro/Oeste
ocorreu uma duplicao).
A abordagem horizontal da localizao regional da actividade empresarial
fornece informaes diferentes e mais compaginveis com a discusso sobre as
assimetrias regionais.
ESTRUTURA EMPRESARIAL REGIONAL HORIZONTAL
Fonte: INE, REMPE.
55
Desigualdades e assimetrias regionais em Angola
So visveis as desigualdades seguintes:
Em quatro sectores de actividade, o eixo Luanda/Bengo detm uma repre-
sentatividade acima dos 60%.
Na indstria extractiva, a preponderncia de Luanda acentuou-se de 2003
para 2007, localizando-se aqui mais de 87% das empresas mineiras do pas.
Seguramente que tal situao se deve ao facto de as sedes das companhias
petrolferas, diamantferas e de explorao de outros minrios estarem em
Luanda, ainda que a actividade produtiva propriamente dita se localize
em outras provncias (Cabinda, Zaire, Lundas e Moxico)15.
As empresas transformadoras esto concentradas em Luanda/Bengo (48%) e
Centro/Oeste (24%), perfazendo, em conjunto, quase do total nacional.
A zona de eleio das empresas agrcolas a Centro/Oeste com 60% do
total, sobressando o Kwanza Sul (369 empresas em 2007) e a alguma
distncia, Benguela, com um registo de 151 empresas16.
Luanda/Bengo manteve, em 2007, a sua posio relativa de regio preferida
de localizao empresarial, com 56% de todas as unidades em actividade.
Apresentam-se indicaes, de 2003 para 2007, duma litoralizao das
actividades econmicas, com o eixo Luanda, Kwanza Sul e Benguela a con-
centrar 68,4% de todas as unidades empresariais em actividade em 2007
(contra 68,1% em 2003). O grfico seguinte ilustrativo, devendo chamar-
se a ateno para o domnio de Luanda/Benguela/Kwanza Sul na estrutura
empresarial do litoral.
Volume de facturao
Neste atributo da facturao os desequilbrios regionais so verdadeiramente
dramticos, exigindo uma tomada de medidas estruturantes duma nova ordem
econmica regional interna.
15 Num estudo como este tem importncia este facto, porque a imputao regional do PIB deveria ser feita regio onde se realiza e no a outras onde a contabilidade feita. No entanto, a metodologia seguida foi a da localizao das sedes das companhias.
16 Ver-se- mais adiante que a provncia do Kwanza Sul apresentou no perodo em estudo sinais claros de poder competir com o Huambo na disputa de alguns sectores econmicos. Benguela (eixo Lobito/Benguela) , claramente, a segunda zona econmica de Angola, a uma distncia relevante do Huambo e da Hula.
Alves da Rocha
56
DISTRIBUIO REGIONAL DO VOLUME DE NEGCIOS
Fonte: REMPE, INE.
Mais de do turnover do pas foram realizados em Luanda em 2007,
correspondendo a uma cadncia mdia de variao anual desde 2003 de 13%,
ficando a segunda maior provncia em volume de facturao apenas com pouco
mais de 12%, para uma taxa mdia anual de variao de 1,8%17. No apenas numa
17 O completamento da recuperao do Caminho de Ferro de Benguela e a sua abertura ao trfego econmico, de mercadorias e de pessoas vai induzir algumas consequncias: incremento
57
Desigualdades e assimetrias regionais em Angola
perspectiva esttica, mas tambm em termos de dinmicas de alteraes estruturais,
as assimetrias existem e esto para ficar ainda durante algum tempo, de to amplas
serem as diferenas.
O agrupamento deste atributo por grandes regies permite verificar ser no litoral
que o crescimento econmico se concentra e onde encontra as melhores condies
e vantagens, dadas pelas externalidades geradas pela concentrao econmica e as
excelncias propiciadas pelas grandiosas obras de infraestruturas e pelos grandes
projectos econmicos.
Fonte: REMPE, INE.
Duas grandes regies Luanda/Bengo e Centro Oeste concentram a riqueza
gerada no pas, em detrimento das zonas do interior, cujo enfraquecimento ao longo
do tempo um dos registos assinalados no grfico anterior.
dos pedidos de instalao de actividades industriais no plo da Catumbela (foram registados intenes de investimento privado em propores muito significativas e a anteciparem-se as efeitos positivos esperados deste facto), aumento das trocas comerciais entre o litoral e o interior da regio Centro/Oeste e reforo da posio de Benguela-Lobito como plo de crescimento de Angola. Esta circunstncia poder agravar as assimetrias entre o litoral e o interior, na medida em que os efeitos de polarizao do crescimento podem exceder os de difuso, com implicaes no definhamento econmico das zonas interiores. Esta probabilidade pode ser reforada se as externalidades esperadas dos grandes empreendimentos (reabilitao, alargamento e modernizao do porto do Lobito, refinaria do Lobito, cimenteira da Catumbela, aeroporto da Catumbela, etc.) forem suficientemente atractivas para o investimento privado.
Alves da Rocha
58
Luanda/Bengo exerceu um efeito de depresso sobre todas as regies do pas
que perderam facturao para a gran
Recommended