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revistas da academia sul brasileira de letras
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REVISTADA ACADEMIA SUL-BRASILEIRA DE
LETRAS
Pelotas
Outubro 2004-Abril 2005.No. 8 e 9
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REVISTADA ACADEMIA SUL-BRASILEIRA DE LETRAS
Fundada em 9 de maio de 1970
Presidente: Jandir João ZanotelliVice-Presidente RS: Joaquim MoncksVice-Presidente SC: Lauro JunkesVice-Presidente PR: Ivo Arzua PereiraSecretário: Ivone Leda do AmaralTesoureiro: Wilma Mello Cavalheiro
CONSELHO EDITORIAL
Ângela Treptow SapperIvone Leda T. AmaralJandir João Zanotelli (organizador)Joaquim MoncksLígia Antunes LeivasPedro BaggioSérgio OliveiraWilma Mello Cavalheiro
Sede: Rua 3 de Maio 1060 – Conj.403 –Pelotas – RS– 96010-620E-mail- jandir@atlas.ucpel.tche.br
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SUMÁRIO
Apresentação........................................................................5
EVENTOS............................................................................7
1.Posse de Manuel Jesus Soares da Silva.............................72.Homenagem a Sadi Maurente
Azevedo...........................133.ASBL: Compromisso com a Feira do Livro...................154. Feira do Livro -Discurso de Abertura – Lígia A. Leivas165. Pozenato: Doutor porque romancista..............................236. Homenagem a Harly Clóvis Stocchero...........................387. Eleição na Academia......................................................468. Falece Heloísa Assumpção do Nascimento....................49
POESIA .............................................................................51
O Remador – José More3ira da Silva.................................51Projeto de Conciliação – José Moreira da Silva.................52Testamento - Roza de Oliveira .........................................54Casa Oníria – Roza de Oliveira... ......................................55Chove e não vens – Miguel Russowsky.............................56Chove dentro de mim – Marilú Duarte..............................57Hino à vida - Maria Amélia Gonçalves Hillal..................58O mundo e a vida – Pedro Baggio......................................59Divagando De...va...gar - Ivo Leda do Amaral..................60Esperança – Wilma Mello Cavalheiro................................62Desfazimento – Lígia Antunes Leivas................................63De hora em hora – Lígia Antunes Leivas...........................63Poema de Absolvição – Joaquim Moncks..........................6430º Verso – Cheila Stumpf.................................................66
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CRÔNICAS E CONTOS ..................................................67
Meu irmão o medo – Blau Souza.......................................67Mulher... antes, agora e sempre – Lígia Antunes Leivas...71
Ressurgimento da soberana ordem do Sapo – Ivo Arzua Pereira .......74
ARTIGOS E ENSAIOS ....................................................79
Palavras sobre Poesia Brasisleira – Ir. Elvo Clemente......79 História memória e mestra da Humanidade –
Ivo Arzua Pereira...........95Questionamentos - Olga Maria Dias Ferreira..................100Refletir é Preciso – Olga Maria Dias Ferreira.................103 O chasque do imperador e Simões Lopes Neto –
Angela Treptow Sapper....107Cultura e Comunicação – Kenia Maria Menegotto Pozenato
e Loraine Stomp Giron..............112Crítica Antiga e Crítica Nova – Luís Borges....................134Análise discursiva de deficiências em língua portguguesa...
– Angela Treptow Sapper..........149As primeiras sociedades literárias de Pelotas –
Angelo Pires Moreira.........166
RECENSÕES...................................................................171
ESTATUTO SOCIAL DA ASBL...................................172
ASBL: Cadeiras – Patronos – Titulares ..........................187
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APRESENTAÇÃO
A Revista semestral da ASBL , por motivos de
viabilidade gráfica, vem à luz juntando os números 8 e 9
correspondentes ao segundo semestre de 2004 e ao primeiro
de 2005.
Mantém a mesma estrutura e a riqueza das
contribuições literárias como o leitor poderá constatar.
Contém, nas linhas e entrelinhas, a gravidade dos
tempos atuais com a saudade de três estimados acadêmicos
falecidos, Sady Maurente Azevedo, Harley Clóvis
Stocchero e Heloísa Assumpção Nascimento, com o
falecimento do papa João Paulo II e a eleição de Bento XVI
que comoveram o mundo, a posse de Manuel Jesus Soares
da Silva, em tempos de Natal e Ano Novo cada vez mais
esvaziados no escoadouro do mercado e do papai noel, em
tempos de Carnaval para esquecer as guerras estúpidas que
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assolam a Terra e a exclusão de tantos, mas também em
tempos de Páscoa da Ressurreição que nos permite ver
medrar a Esperança dentre as pedras de tantos destroços.
Nossa Revista recolhe o labor de tantos, vigias,
zeladores, cuidadores da palavra onde habita o homem e
onde se manifesta o Ser, que nos apela para os caminhos
éticos do servir, na economia, na política, na cultura.
Palavra que se faz serviço e por isto se faz festa.
Somos gratos aos apoiadores que permitiram o
advento deste número duplo da Revista da Academia Sul-
Brasileira de Letras.
Jandir João Zanotelli (org)
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EVENTOS
1. POSSE DE MANUEL JESUS SOARES DA SILVA
A posse do professor e escritor Manuel JesusSoares da Silva na cadeira N.2 da ASBL e que tem comopatrono Francisca Marcant Gonçalves aconteceu no salão daBiblioteca Pública de Pelotas, com a afluência de cerca de300 pessoas convidadas e foi saudado por sua paraninfa, aacadêmcia Olga Maria Dias Ferreira com o discurso quevem a seguir:
Senhoras... Senhores... Amigos...
Engalanado encontra-se este sodalício,/ naexpressiva oportunidade em que acolhe mais umacadêmico,/ a cerrar fileiras,/ em defesa da cultura e dasletras em nossa terra./
Sobremaneira felizes soam os corações dos pais,irmãos e demais familiares,/ bem como de alunos, colegas,companheiros, amigos e admiradores/ da figura singular dojornalista e escritor/ MANOEL JESUS SOARES DASILVA,/ no momento em que,/ na Casa de João SimõesLopes Neto,/ ACADEMIA SUL-BRASILEIRA DELETRAS,/ torna-se um IMORTAL. Sucedem-se asemoções ante a magnitude do momento. O muito queridoamigo Manoel Jesus, filho do Senhor MANOEL RAULINDA SILVA e da senhora FRANCELINA SOARES DASILVA,/ natural de Canguçu,/ nascido a 5 de junho de
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1955,/ jovem de nobre coração,/ defere-nos,/ mercê dagenerosidade que o caracteriza, bem como do intenso afetoque nos irmana,/ a honraria de paraninfá-lo, nesta hora deencantamento./ Inúmeros confrades e confreiras poderiamexercer tão honroso mister./ Quis a alma carinhosa e ternade MANOEL JESUS,/ aqui estivéssemos, a realizar estaapresentação,/ com certeza, movido pelo forte vínculoafetivo que nos envolve./
Tive a grata oportunidade de conhecer MANOELJESUS, nas lides rotárias./ Desde então, algo muito estreitonos mantém unidos,/ na fraternidade do diálogo/, nacumplicidade do encontro, na dimensão de um sentimentoverdadeiro. O fato de estar aqui,/ na sublimidade destacerimônia, a paraninfá-lo,/ saberá ele aquilatar comsabedoria e serenidade./ Cumpre-nos, pois, a tarefaprazerosa de corresponder ao carinhoso convite,/ com apresteza de dissertar sobre um jovem idealista e justo,/verdadeiro e honesto,/ trabalhador e religioso que, hoje,aquiesceadentrar as lides acadêmicas/ para dar continuidade a seulavor.
Aprendeu as primeiras letras na Escola ImaculadaConceição – Escola Paroquial e Assistencial de SantaTeresinha e/ no Seminário Diocesano São Francisco dePaula,/ onde concluiu o segundo grau.
.Ao ingressar na Universidade Católica de Pelotasem 1977 – no Curso de Comunicação, chegou à conclusão,com habilitação em JORNALISMO, em 1979./ No afã deuma especialização/ realizou curso EDUCAÇÃO ESOCIEDADE, concluído em 1984./ Dando prosseguimentoà formação universitária,/ realiza MESTRADO EMDESENVOLVIMENTO SOCIAL, na Universidade
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Católica de Pelotas,/ cuja conclusão, com defesa de tese,verifica-se a 16 de julho de 2000, na qual obtém conceitoA, com sugestão de que seja a mesma publicada./
Esta,/ caríssimos amigos,/ a brilhante trajetóriaacadêmica de nosso afilhado./ Profissionalmente, MANOEL JESUS vem-se destacandocomo Assessor de Comunicação da Diocese de Pelotas e daRádio Universidade Católica; Produtor no Departamento deJornalismo, ocupando cargo no Setor de Comunicação daPrefeitura Municipal de Pelotas; desempenhou a função deCoordenador do Setor de Comunicação, na AssembléiaLegislativa do estado; foi Assessor Parlamentar e Assessorde Comunicação, nas Prefeituras Municipais de Pelotas eMorro Redondo, Mercê do conceituado desempenho frentea tais atividades, Manoel Jesus, cria a empresa J&CComunicação para atuar na área de Editoração Eletrônica./Em 1993,/ cria em sociedade,/ a Empresa Empório eComunicação,/ passando a atuar, simultaneamente/ nasáreas de Jornalismo, Relações Públicas/ e Publicidade ePropaganda. Em 1995,/ ingressa como Auxiliar de Ensinona Escola de Comunicação Social da Universidade Católicade Pelotas,/ passando,/ dois anos após,/ a integrar o quadrode carreira do Magistério da mesma universidade,/ apóscriteriosa avaliação de seu desempenho no início daatividade docente./ Ao exercer a cátedra com a maiordedicação, mantém-se,/ permanentemente,/ atualizandoconhecimentos atinentes à área de atuação/ fato que o leva aser escolhido, diretor da Escola de Comunicação daUCPEL, em 2002,/ cuja recondução se verifica em 2004./ Ainteração do Mestre Manoel Jesus e seus discípuloscomprovam/ eloqüentemente,/ sua verdadeira vocação./ Detal sorte, é escolhido Professor homenageado, das turmas de1996, 1997/1 e 2,1998 e 1999. É, outrossim escolhidoPatrono das turmas de Comunicação Social em 1998 e
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2000./ O reconhecimento dos alunos não cessara/ e, em1999,/ fora guindado à condição de paraninfo dosformandos em Comunicação Social.
Demonstrando alto grau de conhecimento e notávelexperiência,/ nosso afilhado tem mais de uma dezena detrabalhos publicados,/ tanto na área de Marketing Político,/como na de Informática e Desenvolvimento Social, sendoarticulista do DIÁRIO POPULAR bem como da ECOS,/revista da universidade.
Pessoa vastamente conhecida e das mais atuantesem nossa sociedade,/ vem brindando os amantes da arteliterária com belas obras, como: /QUE SEJA EM NOME DE DEUS,/ NOS BRAÇOS DODESCANSO ETERNO, / DESENVOLVIMENTOSOCIAL, CONHECIMENTO E TRABALHO/ e ainda/REMENDOS E ARRANJOS, a ser lançado nos próximosdias, na FEIRA DO LIVRO./ .
.-.-.-.-.-.-.-.
Até este momento,/ amigos,/ apresentamos ohomem,/ o cidadão Manoel Jesus,/ no desempenho fiel damissão que lhe foi outorgada./ Com brilhantismo...eficiência... sabedoria.
Cumpre-nos,/ todavia,/ ressaltar o que de mais beloe expressivo ele nos tem a dar:/ a alma envolta na plenitudede uma espiritualidade ímpar./ Basta conviver pouco tempocom Manoel Jesus,/ ou Manojesu, ou ainda Mano,/ como ochamamos na intimidade do diálogo fraterno,/ para aspirar àgrandeza de seu espírito. É isto mesmo, AMIGOS,/ todosnós, somos seus AMIGOS,/ que nos faz sentir a grandeza
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do Amor do Pai/ ao propiciar-nos tal convivência./ A cadaencontro,nova oportunidade de crescimento,/ ricaexperiência de vida./ E,/ por mais que desejemos repassar,/através de palavras,/ a profunda admiração que nutrimospor nosso querido empossando,/ seria pobre,/ muito pobreo esforço dispendido,/ pois em suas próprias palavras, aoendossar Exupéry “ O ESSENCIAL É INVISÍVEL AOSOLHOS”...
“Há muita coisa que não conseguimos descrever./ Sãoexperiências íntimas,/ ligadas à nossa fé,/ que suplantam asdescrições que somente alinham palavras,/ juntamparágrafos,/ dão seqüência a páginas e páginas./ Muitos otentam/ e o que fica no papel não consegue ser oequivalente a um momento de silêncio,/ em que sopra abrisa em meio às árvores.” E prossegue: “Há muita coisaque não precisamos descrever.”/ E, justo neste ponto,/somos nós a defender o que afirma./ Para conhecer bem odestacado da noite, não há como fazê-lo,/ na simplicidadedo discurso. Ao contrário,/ a eloqüência reside tão somente,em seu estilo de vida,/ na afabilidade,/ na simpatia,/ nacondição de filho dedicado e amoroso,/ na generosidade docoração a ver em todos nós,/ familiares, colegas eamigos,/verdadeiros irmãos. A excelência da espiritualidadede Manoel Jesus,/ desde logo,/ nos mantém cativados./ Suacompanhia é um renovado prazer,/ sua presença, umadádiva.../ Busquemos todos, pois,/ o silêncio/ e escutemos osom melodioso dos versos de nosso poeta:
“UM POEMA DE CINCO LINHAS”
Pensar num sorriso.Lembrar de um rosto.Acariciar um corpo.Fechar os olhos.
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E ser feliz por um instante.///
Por mais que nos esforcemos em buscar aconcretude das palavras,/ alcançamos apenas a expressão desua infinitude...
Ou ainda,/ quando somos impulsionados ao melhordevaneio, em:
‘RENOVANDO UM SONHO”
Os primeiros ruídos da madrugada,/O sol chegando mais cedo,/A acácia voltando a florir/E enchendo com seu perfumeCada canto,/ cadaUm dos lugares que amamos.
É tempo de Primavera./Há sorrisos despreocupados,/Há um calor que inebria,/Há sonhos que se renovam./
Quero voltar a andar./Mãos no bolso./No rumo de um caminho,/Sorvendo cada detalhe,/Colhendo cada bom dia,/Brincando com cada criança./Renovo meu coração.E tenho certeza:/É um novo dia,/Um maravilhoso dia./
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Um sonho que se torna realidade.”
Este,/ queridos amigos/ que aqui estão a iluminaresta noite/ e, certamente, inebriam nosso coração de amor eternura,/ MANOEL JESUS, nosso mais novo acadêmico,/ocupante da cadeira número dois,/ cujo patrono é a grandepoetisa /– FRANCISCA MARCANT GONÇALVES.///Uma alma rica,/ com uma rica vivência de fraternidade;/um espírito elevado/ a elevar-nos os pensamentos,/ no rumodo bem, do justo, do verdadeiro;/ uma pessoa simples/ ausar a simplicidade,/ na desmedida complexidade do ser./
Este o Manoel Jesus que tivemos todos a graça deencontrar,/ um dia,/ e privar de sua amizade para sempre.
Este o intelectual de sobejo valor/ que/ a partir destanoite passa a vivenciar,/ na íntegra,/ a meta a que se propõea Academia Sul-Brasileira de Letras,/ no compromissomaior de defendê-la,/ difundi-la/ e honrá-la./
Eis a síntese do que sabemos,/ pensamos e sentimos/a respeito de Manoel Jesus./ A ele,/ nestes calorososmomentos de festa e júbilo/ apresentamos votos sinceros deboas vindas e endereçamos o mais veemente APLAUSO.!
Olga Maria Dias Ferreira
2. Homenagem a SADI MAURENTE AZEVEDO
1. Não podemos abandonar nossos sonhos. Os sonhos debeleza, os sonhos de justiça, os sonhos para além dos
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padrões quadriculados de nosso senso comum que nosremetem à banalidade, à frivolidade, à tagarelice davida cotidiana.
2. Como um bom poeta mentias muito: dizias que erasdescrente, ateu, sem religião para dizer que acreditavasno Deus que fez a beleza, que nos convida para a vidaplena para além da moral e da religião. Aliás Cristo jádissera, para o espanto de tantos que o ouviam: oSábado foi feito para o homem e não o homem para oSábado. A moral, a religião foram feitos para o homeme não o homem para a moral e para a religião.
3. Sadi nos ensinava que, sendo poeta até o fim, e nãoapenas meio poeta, arranjador de palavras para o efeitosonoro e para o ritmo, na poesia encontraríamos o maissignificativo. Como diziam os astecas: a única estradaque foi dada ao homem nesta terra para chegar àverdade são a flor e o canto: a poesia. Assim como aflor absolutamente efêmera, é a epifania, a revelação datranscendência no perfume e na beleza; que nasce eexplode em sua beleza pela manhã e à tarde murcha e seesvai; assim como o canto nos encanta e eleva para odivino num momento privilegiado e logo se esvai nosilêncio, nas caladas das montanhas e vales; assimnosso acesso à verdade acontece na efemeridadeencantadora da poesia que, se canta e declama e se vai.
4. Tuas poesias ficaram entre nós para conclamar,convocar, sussurrar, insinuar a possibilidade daexperiência da vida mais plena, da vida natranscendência, na beleza que é a ante-véspera do amor.Prenúncio de justiça, de coexistência na paz.
5. Sadi, que no abraço quente de Deus, poesia e justiçaelevada ao infinito, encontres a paz. Descansa em paz.Enquanto nós, na saudade de cada poesia, urdimoscaminhos de esperança.
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6. Wilma Cavalheiro declamará, para encerrar estahomenagem a Sadi Maurente e a cada um de seusfamiliares.
Jandir J. Zanotelli
3. ASBL: COMPROMISSO COM A FEIRA DO LIVRO
A Academia Sul-Brasileira de Letras, fundada em 9de maio de 1970, abrangendo intelectuais escritores dos 3Estados mais meridionais do Brasil, e profundamenteempenhada em promover a cultura, a arte, a literatura,companheira permanente na realização da tradicional Feirado Livro em Pelotas, declara que, para a Feira de 2004pretende atuar com eventos como:
- oficina de “Arte e Técnica de ProduçãoPoética”;
- oficina de “Arte e Técnica de Falar em Público”;- oficina de “Produção Literária de contos”;- oficina de “Produção Literária de Contos
Infantis”;- Palestras sobre a Literatura no Brasil e Rio
Grande do Sul nos Tempos Atuais;- Seções de declamação de poesias e narração de
contos;- Seções de autógrafos de escritores da Academia,
destacando as obras de Wilma Mello Cavalheiro,Jandir João Zanotelli, Lígia Antunes Leivas,Solange Ferreira Pereira, Olga Maria DiasFerreira e outros;
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É de destacar ainda que a Academia estará atuandotambém na Coordenação da Feira na pessoa da AcadêmicaSolange Ferreira Pereira.
As atividades desenvolvidas pela Academia na Feiranão trarão custos adicionais à efeméride, uma vez que osparticipantes o fazem como “voluntários” ou a própriaAcademia cobrirá os gastos.
Para cada oficina estão previstos cerca de 100participantes.
Pelotas, 3 de agosto de 2004.
Jandir João Zanotelli – Presidente.
4. FEIRA DO LIVRO – PELOTAS – DISCURSODE ABERTURA
Lígia Antunes Leivas1
Excelentíssimas autoridades nominadas pelo protocoloSenhores e SenhorasCaríssimo público
As palavras iniciais dirijo-as ao patrono desta 32ªFeira do Livro de Pelotas.
Professor Walter:
1 Lígia Antunes Leivas – membro da ASBL e Oradora Oficial da XXXII Feira do Livro de Pelotas - 29-10-2004
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Além de em muitos outros palcos, nos de Pelotas, ao longodo tempo, V. Sa. tem sido aplaudido de pé pelo sucesso epela qualidade de suas peças teatrais que arrebatam platéiasemocionadas ao assistirem, por exemplo, e entre tantasoutras, – Em nome de Francisco – cujo enredo evoca nossogrande poeta Lobo da Costa.
E hoje – novamente em pé – o público pelotense oaplaude como patrono da nossa Feira do Livro, a qual, portê-lo nesta condição, já começa exitosa.
Parabéns, prof. Walter: parabéns aos que oescolheram para tutelar este evento tão cheio de significado.
Em seguida cumprimento também Gelso Lovatel –presidente da Câmara Pelotense do Livro e os que aintegram, assim como os realizadores (Prefeitura Municipale SESC), patrocinadores (RENOSUL, Conservas Schramme Conservas Neumann), operadores, editores, livreiros eseus funcionários, os artistas, a imprensa em todas asmodalidades, os autores (escritores, cientistas, literatos,prosadores, poetas) e mais aqueles que de alguma formatrabalham para a realização desta feira. Cumprimento aacadêmica Nair Solange Ferreira, que com denodo sedesempenha nas tarefas que compõem este acontecimento.
Presto homenagem especial à razão maior deestarmos aqui: o LEITOR – sem ele nada precisaria ter sidofeito.
Caro leitor: atenta para o lema desta Feira: QUEMLÊ, VIVE MAIS e eu acrescentaria – E MELHOR; porquenão há amizade tão dedicada e complacente como a doslivros, e eles trazem ainda, no dizer de Mário Quintana, avantagem de a gente poder estar só e ao mesmo tempoacompanhada. Aliás, São Jerônimo, em sua carta a Rústico,
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escreve ao amigo: “que nunca o livro fique longe da tuamão e dos teus olhos.”
Autoridades,Srs. e Sras.,Distinto público:
Na mitologia grega, Zeus, o deus supremo,dominava tudo e todos; temia, porém, seriamente, doisadversários: o tempo e o destino. Mas o tempo e o destino,se às vezes nos pregam algumas peças, também nosproporcionam momentos de inusitada satisfação.
As cenas da vida de cada um de nós se passam,predominantemente, nas circunstâncias do cotidiano. Háocasiões, no entanto, em que elas se processam como seficcionais fossem, tal a perplexidade que causam em quempor elas é envolvido.
Na minha vida é o que ocorre hoje: a cena de agorame premia e se reveste de um valor tão especial que – deverdade – me emociona.
Receber a honrosa homenagem de ser a oradora da32ª Feira do Livro de Pelotas é um gesto dadivoso, umaespécie de surpreendente recompensa que o tempo põe nomeu destino – gesto que acolho com gratidão, numa vezque nesta trajetória de algumas décadas, estive quasesempre em contato com os livros: quer folheando-os; queros lendo ou no exercício de minha profissão.
Garcia Marques escreveu que todos nós temos anossa vida pública, a nossa vida privada e a nossa vidasecreta.
A compreensão dos Srs. e das Sras. quepacientemente me ouvem, vai por certo, possibilitar-lhesdesculpar minha confissão um tanto intimista e já agora nãomais fazendo parte da minha vida secreta: estou realmenteorgulhosa da tarefa que me foi confiada pelos componentes
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da Câmara Pelotense do Livro (tendo a destacar o nome doprofessor Manoel Luis Breener de Moraes – Diretor daEditora e Gráfica da UFPel). A eles confiro aresponsabilidade pela festa que se instala em minha alma –festa que se estende para além do que me é possívelimaginar: uma feira que traz para a praça livros – livros nosmais variados gêneros, para todos os gostos, para todas asidades; – uma feira como esta é uma festa para o povo;festa que soa marcante em meio a nobres e floridosjacarandás, magnólias, anacauítas, pau-brasil, palmeiras,grevíleas, folhagens, flores, perfumes, tudo a evocar amaravilha da criação ao nos oferecer a natureza exuberantena primavera de muitas cores que transforma a paisagem dePelotas sob o azul denso deste céu.
Mas, afinal, o que é o livro?Deixando de lado as considerações de Platão sobre o
definir, referencialmente, para a ABNT – o livro é umapublicação impressa não periódica, que consta no mínimode 48 páginas, sem contar as capas; para a UNESCO, adefinição é a mesma, apenas com uma página a mais – 49;para algumas legislações, o número de páginas é 160,subindo, às vezes para 200, diferençando o livro do folheto.
O livro é um produto industrial; mas é muito maisque um simples produto: é o veículo, o suporte de umainformação, constituindo-se uma das mais revolucionáriasinvenções humanas. Antes mesmo que o homem pensasseem usar certos materiais para escrever (como pedras,materiais inorgânicos e orgânicos à base de tintas, vegetaise minerais), as bibliotecas da Antigüidade estavam repletasde textos gravados em tabuinhas de barro cozido – eram oslivros daquela época. Ainda na Antigüidade o homemexperimentou outros suportes encontrados na natureza
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como forma de registrar a visualidade ou sua escrita: paratanto, usou argila, ossos, conchas, marfim, folhas depalmeiras, bambu, metal, cascas de árvores, madeira, couro,papiro, velino, pergaminho, seda e, finalmente, o papel.
O papiro – usado pelos egípcios que escreviam comhieróglifos em rolos de cerca de 20 metros – atravessouséculos levando a cultura do Egito a outros povos,incluindo os gregos e os romanos. Os indianos faziamlivros em folhas de palmeiras. Os astecas e os maiasfaziam-nos em forma de sanfona, com material macio queexiste entre a casca da árvore e sua madeira. Os chinesesusavam rolos de seda para fazer seus livros, e os romanosescreviam em tábuas de madeira revestidas de cera.
Com o surgimento do pergaminho (que substituiu opapiro, pois este se tornava escasso e caro), os persas, emPérgamo, na Ásia Menor, desenvolveram uma técnica quetornou o pergaminho mais flexível e apropriado para aescrita.
Mas foi na China (no final do século 2º) que ahistória da impressão sobre papel começou, de modo que oprimeiro livro propriamente dito de que se tem notíciaapareceu naquele país, no ano 868 da nossa era.
A Europa já conhecia, no início do século XV, opapel, a tinta e a matriz. Faltava apenas uma idéia a maisque juntasse isso tudo em um só equipamento. É quandoentra em cena GUTEMBERG – um alemão nascido àsmargens do Reno, no final do século quatorze. Ourives ejoalheiro de profissão, curioso por natureza, ele inventou aprensa tipográfica. Com a invenção de JohannesGensfleisch (que ficou conhecido pelo sobrenome da mãe,Gutemberg), as informações e o conhecimento começarama ser divulgados de forma sistemática.
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Nas chamadas sociedades de consumo, o livro podeser considerado uma mercadoria cultural, com maior oumenor significado no contexto socioeconômico em que épublicado. E enquanto mercadoria, pode ser vendido,comprado, trocado. Isso não ocorre, porém, com sua funçãointrínseca: ou seja, ser instrumento cultural de difusão deidéias, transmissão de conceitos, documentação,entretenimento e ainda condensação e acumulação deconhecimento.
A palavra escrita venceu o tempo e o livroconquistou espaço. Teoricamente toda a humanidade podeser atingida por textos que difundem idéias que vão deSócrates e Horácio a Sartre e Mcluhan; de Marx a AdamSmith; de Camões a Fernando Pessoa; de Gregório deMatos a Drummond; de Machado de Assis a ÉricoVeríssimo – apenas para exemplificar.
A história do livro confunde-se, pois, com a históriada humanidade e o conteúdo do livro integra a estruturaintelectual dos grupos sociais.
O avanço das técnicas eletrônicas, notadamente ainternet, faz, hoje, alguns teóricos da comunicaçãopensarem em um futuro sem os livros tradicionais. Apalavra escrita, porém, dificilmente deixará de serconsiderada uma das mais importantes heranças culturaisentre todos os povos.
Livro e leitura são, pois, gêmeos – e usufruir o bemdeles advindo significa construir os sentidos, ossentimentos, os valores – um processo cognitivo que temtudo a ver com a cultura de um povo.
Ler é um grande remédio; e como o hábito daleitura, no Brasil, começa na escola e não na família (comodeveria ser, mas esta em geral tem renda que mal dá parasuprir as necessidades básicas, quanto mais para comprarum livro) – urge que se façam projetos que incentivem a
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leitura na sala de aula e se ponha, em cada quarteirão dacidade, uma biblioteca, uma escola, com professores bemassistidos, bem remunerados. Desta forma, quem sabe,possamos evitar que as estatísticas cheguem ao absurdo derevelar que até mesmo em nível universitário, 76% dosestudantes jamais chegaram a ler um único livro, mas, pormais mediana que seja nossa mente, não temos, porém epor causa disso, de sentarmo-nos à mesa dos céticos...Livros, leitura, educação, tecnologia, cultura sãoinvestimentos inestimáveis para o desenvolvimento dopovo; para o aperfeiçoamento do ser – investimento estecapaz de transformar o indivíduo em cidadão, na melhorconcepção semântica deste sintagma. E não adiantacontemporizar e fazer de conta que se faz: é preciso fazermesmo – só assim o povo ganhará sabedoria e senso críticosuficientes para ser eticamente consciente e tecnicamentecompetente; para saber distinguir entre um discursoverdadeiro, um discurso aparentemente verdadeiro ou umdiscurso flagrantemente enganoso.
Enfim, o encantamento da leitura... ler, ler, lersempre para se viver mais e melhor.
Antes de finalizar, minha homenagem à ElfriedeJelinek, escritora austríaca que neste ano de 2004 ganhou oPrêmio Nobel de Literatura (Prêmio entregue a apenas novemulheres desde que foi criado em 1901). Parece que naaurora do Século 21 felizmente as mulheres firmam sua vozpública na escrita a ponto de se fazerem novamentemerecedoras de prêmios, na maioria das vezes, concedidosaos homens.
Por fim, cumprimentos reiterados aos organizadoresda Feira com a certeza de que ela será um sucesso; e játomando a liberdade de solicitar aos autores que aquiautografarem que doem um exemplar de sua obra a umaescola pública de Pelotas; as escolas por certo agradecerão.
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À população, faço o convite para que participem da32ª Feira do Livro porque os livros nos melhoram e, seestamos melhores, estamos em paz – paz que não é apenasum simples período no tempo ou um achado do destino –mas uma forma de se viver em harmonia com o nossosemelhante.
5. POZENATO: DOUTOR PORQUEROMANCISTA.
Está de parabéns a PUC-RS. Mostrando descortino, liderança, lucidez e
competência o doutorado em Letras da PontifíciaUniversidade Católica do Rio Grande do Sul, conferiu otítulo de Doutor ao escritor, romancista e acadêmico daASBL José Clemente Pozenato que apresentou como Teseseu romance “a Babilônia”, da Trilogia composta por “OQuatrilho” e “A Cocanha”.
Com isto, a PUC-RS mostra que a Universidade nãoé apenas o lugar do controle burocrático do conhecimento,mas pode ser também o lugar onde o conhecimentoencontra chancela, estímulo e parceria.
Ou, como diz Pozenato: “Concordo contigo que aPUC dá uma lição com esse gesto de aceitar um romancecomo tese: é a demonstração de que conhecimento válidonão é apenas o dito "científico".
O romance e a poesia podem ensinar muitos maiscoisas sobre o homem do que o pensamento positivista nemousa suspeitar”.
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Para que sirva de sugestão e para a alegria de todosnós, transcrevemos o Memorial que a douta comissãoexaminadora usou para justificar essa elogiável atitude
MEMORIAL ACADÊMICO E PROFISSIONAL
José Clemente Pozenato
1. MINHA FORMAÇÃO
Nasci em 1938, na pequena localidade de SantaTeresa, no município de São Francisco de Paula, com oscampos de Cima da Serra à frente e a Serra do Mar àscostas. A localização podia ser dita ao contrário, mas naminha imaginação a saída para o mundo, e portanto afrente, era pelo lado dos campos.
Meu pai era professor municipal, mas fuialfabetizado por minha mãe, por volta dos quatro anos deidade. Não tenho por isso lembrança de algum dia de minhavida não ter sabido ler. Ler para mim sempre foi algonatural, no sentido estrito de algo inato. E foi na cartilha deJoão de Deus que decorei o poema “Andava um dia / nosarredores / de Nazaré...”, que pôs dentro de mim a músicaque podem ter as palavras. Sendo meu pai professor, tinharegular quantidade de livros em casa, que ele chamavaorgulhosamente de biblioteca. Ali travei conhecimento comMonteiro Lobato, com as “Trezentas onças” de SimõesLopes Neto, com a “Pele de Asno” e as “Mil e uma noites”.
Aos 12 anos, fui estudar no Seminário Diocesano,em Caxias do Sul. Duas coisas me marcaramprofundamente, logo na chegada: a existência dos
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“italianos”, que falavam e sentiam diferente de mim, e otamanho da biblioteca.
O contato com a cultura dos meus colegas, quasetodos das colônias da região serrana, não se fez sem atritos.De língua, em primeiro lugar, e também nos hábitos e naordem dos valores. Meu pai, embora de origem italiana, seafastara completamente dessa tradição e enfatizava queéramos brasileiros. Minha mãe, de origem açoriana, formouminha sensibilidade e também educou meu paladar comcuscuz, pamonha e paçoca. Eu, mergulhado no mundo dos“gringos”, tratei de entender como eles eram e por que eramassim. O que passei depois a escrever sobre eles nasceudessa curiosidade e não, como alguns podem imaginar, detradições ou mitos de família.
A biblioteca do seminário foi outra fonte dedescobertas. Foi ali, no início dos anos 50, com meus 14anos, que descobri a poesia moderna, na Apresentação dapoesia brasileira, de Manuel Bandeira: não podia ter tidomelhor guia. Logo li seu Itinerário de Pasárgada, ondefiquei sabendo que qualquer coisa comum pode entrar napoesia, não só as estrelas e o firmamento. A descobertaseguinte foi Poesia liberdade, de Murilo Mendes, que metirou o fôlego: então era possível com palavras criar outraimagem do mundo? Feito isso, encontrei Machado deAssis: eu olhava como ele amarrava as frases, e zombavadas certezas, e ficava abismado. Era melhor do quequalquer dos outros que eu lia.
Também as aulas do seminário, não só a biblioteca,foram importantes na minha formação. Ensinaram-me latimo suficiente para ler Horácio, Virgílio e Ovídio no original.O francês abriu-me outras portas para me forrar de leituras.E das aulas de italiano saltei para ler Dante também nooriginal: empenhei três meses de férias nessa aventura.
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Aos 17 anos, concluído o ensino médio, fui paraViamão estudar filosofia. As aulas eram dadas em latim e aorientação do curso era dentro do maior rigor escolástico,quase medieval. Por sorte, havia também uma biblioteca.Nela terminei de ler os clássicos gregos, as grandes obrasda literatura ocidental, de Cervantes a Flaubert, deDostoiévski a Proust. e o que me faltava ler da literaturabrasileira. Não só os autores – Lins do Rego, José GeraldoVieira com toda a geração de 30 – mas também os críticos:todo Álvaro Lins, todo Alceu Amoroso Lima, maisAugusto Meyer e Agripino Grieco. A biblioteca de Viamãotinha ainda revistas européias em quantidade. Foi numadelas que descobri que a física quântica era uma questãoséria, ao contrário do que dava a entender meu professor defilosofia. E foi por causa da biblioteca, e não dosprofessores, que escolhi fazer minha monografia degraduação sobre o livro Être et Avoir, do existencialistacristão Gabriel Marcel.
O final do curso de Filosofia e o início do deTeologia coincidiram com a ventania do papa João XXIIIvarrendo o pó milenar da Igreja Católica. Era um projetotão empolgante que me vi mergulhando fundo no estudo dateologia do Concílio Vaticano II e decidindo encarar serpadre. Era o ano de 1963 e eu estava com 25 anos. Masbastaram três anos de um novo pontificado para perceberque, cessada a ventania, tudo voltava ao que era na Igreja.Terminava um sonho da juventude. Decidi então renunciarao sacerdócio, no qual atuei de modo pleno durante seteanos. Dessa experiência ficou pelo menos umconhecimento melhor da natureza humana e das (muitas)razões do pecado. Nesse momento, acredito agora,terminava minha fase de formação.
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2. ATIVIDADE ACADÊMICA
Em 1966 comecei a dar aulas no Curso de Letras daFaculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Caxias do Sul.Eram aulas de Teologia, mas que tomavam como basetextos literários: o silêncio de Deus em Erico Veríssimo,por exemplo, ou a concepção de mundo demoníaco deGuimarães Rosa. E jogava em sala de aula Graham Greene,Paul Claudel, Georges Bernanos, Jorge de Lima, MuriloMendes. Um ano depois, a pedido dos próprios alunos,assumi as aulas de Literatura Brasileira e de Teoria daLiteratura. No ano seguinte era criada a Universidade deCaxias do Sul, onde exerço atividades até hoje.
No ano de 1972, sem qualquer tipo de apoioinstitucional, um grupo de colegas da UCS iniciou o Cursode Mestrado em Letras na PUC-RS. Eram eles JaymePaviani, Cleodes Piazza Ribeiro, Vitalina M. Frosi, Ary N.Trentin, Lígia Cademartori e eu. Optei, obviamente, pelaTeoria Literária. Foi então que travei contato com oestruturalismo e os nomes de Roland Barthes, Todorov,Propp, Lévi-Strauss, entre tantos. Para quem vinha de umaformação filosófica, essa perspectiva era ao mesmo tempouma provocação e uma frustração: ensinava a ler por paresopositivos, o que ajuda a ver com mais clareza, mas senegava a estabelecer conexões com a história e a sociedade,o que parecia tornar inútil a leitura feita. Até hoje algunsprocessos mentais típicos do estruturalismo (ou seriamapenas aristotélicos?) conduzem meu modo de pensar, maistalvez do que eu próprio imagine.
Em 1973, fui admitido no mestrado em Letras daUniversidade Federal do Rio Grande do Sul, em suaprimeira turma. A orientação do curso preenchia para mimuma lacuna. Na linha de Antônio Candido, os estudos sevoltavam para as relações da Literatura com a história e a
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sociedade. Foi nesse ano que, a partir de um seminário,passei a discutir a questão do “regionalismo” da literaturagaúcha. Oriundo das discussões estruturalistas, busqueicontrapor a esse conceito o conceito de “regionalidade”,menos histórico e sociológico, mais estrutural (ou essencial,na linguagem aristotélica). Dessas reflexões nasceu opequeno ensaio O regional e o universal na literaturagaúcha, que teve um prefácio elogioso de GuilherminoCésar e foi publicado em 1974 pelo Instituto Estadual doLivro do Rio Grande do Sul. Quando se esgotou o livro,Carlos Appel me propôs reeditá-lo, com o que nãoconcordei, dizendo que se tratava de uma obra datada,muito presa a conceitos estruturalistas. Teria que rescrevertudo. Appel propôs-me então publicar o texto com umapêndice crítico, que não escrevi até hoje. Não estouconvencido de que seja necessário.
Uma série de acontecimentos, particulares eprofissionais, ocorridos nesse período fizeram com que nãopudesse concluir o curso de mestrado. A Universidade deCaxias do Sul passara por um processo de intervenção doMinistério da Educação e fui chamado a ajudar a redefiniros rumos da instituição. Teve início aí meu envolvimentoprogressivo com a administração universitária. Um dosprojetos de que participei, então, foi o da implantação doCiclo Básico, numa concepção que buscava valorizar umaformação geral para o aluno, antes de entrar nasespecificidades de cada curso profissional. No conjunto, oprojeto foi abandonado. Mas em decorrência dele publiquei,com Jayme Paviani, um ensaio com o título de Introduçãoà Universidade (1977), em que buscávamos provocar adiscussão sobre o verdadeiro papel da universidade. Dadiscussão surgiu um novo texto, editado agora com o títulomais modesto, e mais realista, de A Universidade emdebate (1978), também em co-autoria com Jayme Paviani.
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Assim, entre 1975 e 1980, desempenhei diversas funçõesadministrativas junto à Reitoria, com eqüivalenteafastamento das atividades acadêmicas.
A partir de 1980, passei a trabalhar de modo maisintenso num programa da UCS voltado para o estudo dacultura da imigração italiana na região: o Projeto Ecirs, doqual participo ainda. Além da motivação pessoal, vindadesde a infância, para buscar compreender essa cultura, vianisso a oportunidade para continuar pensando a questão daidentidade e da diversidade, abordada no ensaio de 1974.Nesse programa, coordenei diversos seminários de estudossobre o tema. Um deles resultou na publicação Processosculturais na região de imigração italiana, de 1990. (Em2004, na comemoração dos 25 anos do Projeto Ecirs, otexto foi revisto e reeditado junto com outros textosdispersos, com o título de Processos culturais: reflexõessobre a dinâmica cultural.) Foi enquanto examinava ediscutia essas questões que formulei o projeto de escreveruma trilogia sobre a história e a cultura da imigraçãoitaliana na Serra Gaúcha, a partir da idéia de que o romanceé talvez a forma mais adequada de fazer um ensaio deinterpretação da cultura. Mas isso fica para o item dasatividades literárias. Foi também no contexto do ProjetoEcirs que formulamos a proposta de criação de umprograma de pós-graduação em Cultura Regional, que sóviria à luz cerca de 20 anos mais tarde.
Em 1986 realizei um novo esforço para concluir oCurso de Mestrado na Ufrgs. Tive que refazer créditos e,com isso, tive acesso a preocupações novas no âmbito dosestudos literários. A maior delas era a questão do gênero, aque me dediquei com bastante interesse. A perspectivasociológica, da época de Guilhermino César, forasubstituída pela ênfase no comparatismo, o que não era umamudança de pequena monta. Mas os acontecimentos
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políticos na UCS outra vez engolfaram minha atenção emeus esforços, num processo que iria durar três anos. Fuioutra vez obrigado a renunciar à conclusão do Mestrado.
De 1990 a 1997 exerci, sem interrupção, durantequase 8 anos, o cargo de Pró-Reitor de Planejamento daUCS. Coordenei todo o processo de regionalização dauniversidade, a partir do princípio de que havia umademanda não atendida por acesso à formação de nívelsuperior, o que os números viriam comprovar: auniversidade passou da faixa de 6 mil alunos para mais de20 mil nesse período. Ao mesmo tempo, com o objetivo dequalificar o corpo docente para essa expansão quantitativa,ajudei a articular um projeto de cursos de mestrado e dedoutorado em convênio, mas realizados na própriainstituição. A proposta foi aprovada pelos órgãos oficiais eo primeiro convênio foi realizado entre a UCS e aUniversidade Federal de São Carlos, que realizou na UCSum curso de mestrado e um de doutorado em Educação,cada um deles para 10 candidatos. Foi então que obtive, em1995, o título de Mestre. Não em Literatura, mas emEducação. E a dissertação estava diretamente vinculada aomeu trabalho de então, como deixa ver o título:Universidade e região: a regionalização como estratégiade acesso ao conhecimento (1995).
Afastando-me da administração universitária nofinal de 1997, passei a dedicar-me ao projeto de pós-graduação que o Projeto Ecirs tinha em mente desde quaseuma década. Foi então que elaboramos, o Dr. FlávioLoureiro Chaves e eu, o projeto de mestrado em Letras eCultura Regional, reconhecido pela Capes e implantado em2002. Sem o doutorado, meu nome não foi aceito comomembro do corpo docente.
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3. ATIVIDADE LITERÁRIA
Não considero que a atividade literária tenha sidouma atividade paralela à profissional. As duas estiveramsempre muito relacionadas na minha biografia. Pelo menossão as mesmas idéias e os mesmos anseios que motivaramas duas linhas de trabalho, pelo menos no plano intelectual.Faço exceção para os sete anos vividos como pró-reitor. Sevi, e apalpei com as mãos, como se constrói uma região, oque serviria para alargar minha visão política, a atividadeliterária nesse fase desceu ao limbo. Toda a capacidadecriativa foi “vampirizada” pela instituição.
Já descrevi no item “Minha formação” de que modofui arrastado para dentro da literatura. Das leituras passeipara os ensaios de escrita. Meu primeiro prêmio literário,aos 17 anos, foi o de melhor conto. Logo depois recebitambém o de melhor poesia. Mas foi à poesia que medediquei, levado sem dúvida pelo fascínio de ManuelBandeira e Murilo Mendes, a que se somaria logo CarlosDrummond de Andrade, com o lastro, facilmenteperceptível nos meus versos, da dicção lírica lusitana.
É de 1967, salvo publicações dispersas, o início doque seria minha carreira literária, com a coletânea depoemas Matrícula, ao lado de Oscar Bertholdo, JaymePaviani e Ary Trentin. O livro foi bem acolhido, com umcomentário elogioso de Nelson Werneck Sodré, na RevistaCivilização Brasileira, e outro ainda mais favorável deManoelito de Ornellas no Correio do Povo.
O passo seguinte foi Vária figura (1971), que é umahomenagem ao mundo rústico da minha infância, dominadopelo cavalo e o vento, ao lado de outros temas. Está lá umasérie de líricas sobre o mundo contido no bairro aos quais,não sei por qual motivo, ninguém deu importância.Somente uma década depois, por razões que só a falta de
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mercado para a poesia explicam, saíram quase juntos Cartade viagem (1982) e Meridiano (1983). São dois livrosgêmeos, um editado pela editora da UCS e o outro numconcurso da Prefeitura Municipal de Caxias do Sul. O livrode poesia seguinte saiu com o título de Cànti Rùsteghi(1993). São cantos rústicos não pela linguagem nem peloolhar, mas pelo tema. No ano de 2000, fui homenageadopela Educs com a publicação de minha poesia reunida, sobo título de Mapa de viagem.
Considero que meus exercícios de poesia foramfundamentais para aprender a manusear a construção deimagens com palavras. Esse aprendizado me seriaextremamente útil quando passei para a prosa de ficção.
Meu ingresso na narrativa de ficção em prosa deveu-se a dois fatores principais, entre outros. Um, pelaconstatação de que se queria atingir um público maior,como desejava, a poesia não era o caminho. Segundo, sequeria fazer um ensaio de interpretação global da culturaque me rodeia, a forma mais adequada seria o romance:ficaria livre e eqüidistante das disciplinas acadêmicas. Ouseja, num romance é possível fazer ao mesmo tempohistória, sociologia, economia, antropologia, psicologia,sem ter de prestar contas a nenhuma dessas áreas deconhecimento. Ao contrário, criando estímulos para todaselas. Um terceiro fator talvez tenha sido o fato de estarentão chegando aos 40 anos, que a tradição diz ser a idadeideal para o romancista.
O projeto inicial surgiu, como relatei, daconvivência com um grupo de pesquisa voltado parainvestigar a cultura rural da imigração italiana, o que mefornecia o material de que ia necessitar. Por outro lado,sabia haver uma lacuna na ficção riograndense sobre otema. Além disso, desejava pôr em toalha limpa tudo o quetinha aprendido em anos de observação, em que se
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misturava simpatia e certa dose de atrito. Formulei então oplano de uma trilogia, que me veio ao natural. Hoje pensoque as trilogias são algo natural quando se quer abarcar atrajetória de um grupo cultural que migra para outro país.Há sempre três momentos críticos nessa trajetória: orompimento com o mundo de origem, marcado pelatravessia, a implantação de um projeto novo nesse mundonovo e, por fim, a dispersão das tradições construídas oubuscadas. Resumindo: as origens, a construção, a dispersão.
Comecei por escrever O quatrilho (1985), quecorresponde ao segundo momento. Tinha o material tododisponível para isso. Depois de publicá-lo hesitei entrevoltar atrás e escrever o primeiro momento ou seguir com asua continuação. Cometi o erro de prosseguir e ter depoisque interromper: não era possível amarrar as situações sema referência dos “mitos de origem”. Esse impasse coincidiucom o período de deserto na administração universitária,como pró-reitor. Ao voltar dos infernos, enfrentei o desafiode escrever o momento primeiro, do qual desafio resultou ACocanha (2000). Imediatamente retomei o trabalho paraconcluir a trilogia com o período próximo à SegundaGuerra Mundial. Foi uma tarefa difícil, porque todas asnarrativas referentes ao período são de algum modopartidárias, e eu precisava encontrar o ponto de vista daspessoas comuns: a vida não tem partido. O resultado desseesforço, cujo resultado ainda não sei bem avaliar, está noterceiro volume da trilogia: A babilônia. Fazendo as contas,vejo que o projeto demorou nada menos que 20 anos paraser executado.
Mas ao mesmo tempo em que esse projetoamadurecia e cumpria suas etapas, dediquei-me a escrevernovelas policiais. Também elas, para os menos avisados,são pequenos ensaios de análise e interpretação de algum
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contexto humano particular: o enredo e o suspense sãoapenas recursos para prender a atenção do leitor.
A primeira dessas novelas, O caso do martelo(1985), foi escrita no vácuo deixado pela escrita de Oquatrilho. A novela foi publicada alguns meses antes doromance por uma dessas curiosas histórias editoriais, masfoi escrita depois dele. De todas as minhas obras, écertamente a que despertou mais simpatia entre os leitores eo público. Talvez o responsável disso seja o lirismo quepermeia as suas páginas: havia quem sabe um poeta emrecesso escondido atrás do narrador. Essa novela foiadaptada para a televisão, com uma direção sensível dogaúcho Paulo José, e é a única de minhas obras que foitraduzida, para o espanhol e para o italiano.
O caso do loteamento clandestino (1989) é tambémum ensaio de análise de comportamentos, agora de umbairro de periferia de Caxias do Sul. São migrantes vindosos campos de Cima da Serra, onde passei a infância,tentando entender a dureza do mundo urbano e usando detodas as armas de sobrevivência, a começar pela mentira.Outra vez, o enredo policial é apenas pretexto. Como olivro foi editado em São Paulo, sua circulação no RioGrande do Sul foi bem menor. É mais um dessesfenômenos editoriais que nenhum escritor consegueentender.
Ao sair do deserto, no final de 1997, e antes de meabalançar ao tour de force de escrever o que seria ACocanha, escrevi outra novela policial intitulada O caso doe-mail (2000). É a mais despretensiosa de minhas obras, emque eu precisava fazer um ajuste de contas comigo mesmo.Se há um tom de humor mais saliente do que em outrostextos, é porque estou rindo de mim mesmo, sob a figura dodetetive Pasúbio que, vindo de outro tempo, sente-sedesajeitado diante da civilização eletrônica.
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Para não excluir nada de minha trajetória literária,falta fazer alusão a dois livros que escrevi para crianças: Ojacaré da lagoa (1990) foi escrito para a classe dealfabetização de minha filha caçula e ilustrado pelascrianças. O pisca-tudo (2000), editado em São Paulo, foiincluído em dois programas de divulgação: do canal Futurade televisão, e do projeto Rumos Itaú. Cultural.
Para concluir, caberia relatar algo mais a respeito darecepção de minha obra literária, em especial a de ficçãonarrativa, pela crítica e pelos leitores.
De um modo geral, diria que a crítica tem dado maisatenção, ou atenção quase exclusiva, ao aspecto temático demeus textos, confrontando-os com o que seria a história oua realidade social de onde sai a matéria deles. Já osprocessos narrativos utilizados raramente são referidos, oque não deixa de causar em quem escreve certa dose defrustração. O mais difícil no escrever uma história édescobrir qual a melhor maneira de narrá-la. O leitorcomum não vai se dar conta da engenharia que está por trásdas situações narradas, ele simplesmente gosta ou não gostado efeito resultante. O escritor gostaria, portanto, que aomenos os especialistas dessem atenção a esse aspecto deseu trabalho, e que chamassem a atenção do leitor comumsobre eles.
Mesmo nos estudos universitários a que tive acesso– monografias de graduação, dissertações de mestrado –essa dimensão propriamente literária do texto não tem sidoexplorada. A tendência mais comum é a de estabelecerrelações diretas entre o que está representado no romance eo que seria a realidade histórica e social. No caso, mostrarrelações entre as situações e personagens criadas e ahistória e as características culturais da região de imigraçãoitaliana, às vezes supondo que o autor está relatando suaprópria história ou a de sua tradição familiar. Tenho
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observado também o tipo de questões formuladas sobremeu romance em provas de vestibular, onde igualmente oaspecto temático é posto em realce.
Esse modo de ler o meu romance faz sentido, pensoeu, num momento em que o debate sobre as identidadesétnicas e culturais estão em primeiro plano, em função atémesmo do processo de globalização, e portanto dehomogeneização cultural, pelo qual todos passamos.
No entanto, não quero deixar sem registro que astécnicas que utilizo são bem mais complexas do que aaparente simplicidade, ou até linearidade, do texto possadar a entender. Há técnicas aprendidas com os mestres,entre os quais sempre cito Flaubert, Machado de Assis,Mario Vargas Llosa e Clarice Lispector, cada um deles comum contributo particular: Flaubert com a aparenteobjetividade da narrativa, Machado com a sutileza irônicaque evita qualquer tipo de exaltação, Vargas Llosa com suahabilidade em lidar com o ponto de vista, Clarice com atécnica de captar um estado de alma às vezes apenas comum verbo, outras vezes apenas com um advérbio. Mastenho dívidas também com as técnicas de narrativa visual,como as do cinema e as da televisão. As técnicas oriundasdo cinema são mais perceptíveis, e já foram usadas porHammett e Hemingway, e também por Erico Verissimo,com maestria. As marcas da televisão são mais sutis. Naliteratura brasileira atual, apenas em Rubem Fonseca vejo oaproveitamento consciente dos processos televisivos.
Esse modo de narrar, além de atender a um gostopessoal, acredito que vá ao encontro da sensibilidademoderna (ou pós-moderna?), cada vez mais centrada naimagem. Não é para mim surpresa, portanto, que quemproduz narrativas visuais, para o cinema ou para a televisão,diga que meus livros “são um roteiro pronto”. É verdade,mas é também uma ilusão. Uso processos que visam a
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efeitos semelhantes aos buscados pelo cinema e pelo vídeo,mas que não se limitam a eles. Basta examinar atransposição de meus textos para essas outras linguagenspara se perceber a diferença. Mesmo realizada com extremacompetência técnica e, posso atestar, com grandesensibilidade artística, a adaptação de O caso do martelo,feita para a televisão, linearizou a narrativa literária. Jamaisvou esquecer a sensação de estupor que senti quando vi oresultado na tela. A história narrada na tevê não “lia” ahistória escrita.
Quando da adaptação de O quatrilho para o cinema,essa lição estava já aprendida: o autor monta seu sistema desinalização para conduzir a leitura, mas quem lê tem suamaneira própria de ler e, portanto, de tirar do texto umsentido ou significado. Mas, se houve perdas emotivas natransposição, houve ganhos do ponto de vista profissional:o sucesso obtido pelo filme chamou a atenção do públicopara a obra em que teve origem, numa demonstração de queo livro também se beneficia da publicidade.
Ao chegar ao final desta breve memória de meupercurso acadêmico e literário, fico procurando uma fraseque defina, mesmo que a posteriori, os rumos por ondesegui. No momento, a melhor frase que me ocorre é esta:quanto mais se consegue ver, e mostrar, a particularidade deum ser humano, mais se contribui para se conhecer ahumanidade. No fundo, todos temos imensa curiosidade desaber como o outro sente e decide a sua vida. E o motivo éum só: sempre estamos em dúvida com relação à vida quenos coube a cada um. Isso pode ser traduzido em outraverdade: estamos sempre precisando aprender.
Porto Alegre, dezembro de 2004
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6. HOMENAGEM A HARLEY CLÓVIS STOCCHERO
O Acadêmico Luís Renato Pedroso enviou-nos esteprecioso texto sobre Harley:
HARLEY, O POETA DE TAMANDARÉ E DO PARANÁ
Renato Pedroso2
O dia 23 de março pareceu-nos cinzento,
triste, azíago até.
De inopino, a infausta notícia: Harley Clóvis
Stocchero, acometido de derrame cerebral, falecera.
Foi um duro golpe que atingiu, não só os
amigos e admiradores, como toda a cultura paranaense.
Natural de Almirante Tamandaré, município
e comarca da Grande Curitiba, onde residia, Harley se
2 Luís Renato Pedroso é desembargador jubilado, presidente do
Centro de Letras do Paraná, vice-presidente do Movimento Pró-Paraná e membro da Academia Sul-Brasileira de Letras, SeçãoParaná.
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graduara em Direito e era diplomado em desenho e artes
plásticas, além de técnico em contabilidade e professor
normalista, desfrutando de merecida aposentadoria como
dedicado servidor publico estadual.
Sobre ele, o renomado historiador Tulio
Vargas escreveu para a Revista da Academia Paranaense
de Letras, que preside e onde Harley ocupava,
brilhantemente, a Cadeira nº 6, verbis: “No campo
literário, embora com antecedentes criativos na revista
“Tingui”, produção de contos, estudo histórico e
premiação em concurso na cidade de Apucarana, somente
em 1983 passou a dedicar-se mais intensamente à
atividade cultural, após obter láurea em concurso
promovido pela Academia de Letras José de Alencar.
Exerceu a presidência do Centro de Letras do Paraná no
período 1986-87 e é membro da Sala do Poeta, União
Brasileira dos Trovadores e Instituto Histórico e
Geográfico do Paraná. Foi eleito em 1995 para a
Academia Sul Brasileira de Letras do Rio Grande do Sul,
com sede na cidade de Pelotas. Oito livros publicados e
uma vasta coleção de diplomas e condecorações. Consta
da sua bibliografia: Ermida Pobre, Os Dois Mundos, O
Pouso dos Guaraipos, Recordações de Clevelândia,
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Andanças na Terra Tingui, Seleções Poéticas de Novas
Cantigas”.
Poder-se-ia acrescentar a sua mais recente
produção “A Vingança da Terra”, coletânea de poemas
enfocando os problemas ecológicos da humanidade, como
bem define, no prólogo, concluindo com a assertiva de que,
“O poeta, além de crítico social, deve, também, profetizar”.
No ofício religioso de sétimo dia, sua família
fez distribuir dos sonetos de rara sensibilidade, um deles
com o sugestivo título “Escrevam que fui poeta” e outro
“O Terço”, ambos reveladores de suas firmes convicções
religiosas, como católico praticante, fato exaltado na
celebração pelo piedoso Vigário, que muito o estimava e
admirava.
Por tudo isso e muito mais, Harley Clóvis
Stocchero sempre será lembrado, jamais esquecido,
deixando-nos uma grande saudade!
Curitiba, em 05 de abril de 2005.
ESCREVAM QUE FUI POETA
“Descansem o meu leito solitário / Na floresta dos homens esquecida, /Àsombra de uma cruz, e escrevam nela: / - Foi poeta – sonhou – e amou na vida.”
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Álvares de Azevedo
Quando eu morrer, escrevam que fui poeta,que muito amei e fui temente a Deus;e que fiz da Poesia a flor diletapara brindar aos nobres e aos plebeus...
E procurei cumprir a minha meta:- servir a todos não somente aos meus;levando a vida sempre em linha reta,sem ofender aos crentes ou ateus...
Vou repousar aos pés da magnóliajunto os meus pais, no alto da colina,sentindo a brisa com a força eólia...
Quando lá fores visitar-me um dia,e ao perceber a flor os seus olores,lembrai de mim rezando a Ave-Maria!
Harley Clovis StoccheroAlmirante Tamandaré, 16.11.1998
O TERÇO
“Reza melhor quem melhor sabe amar”Coleridge
Quando vou pela estrada caminhando,à refletir nos dilemas desta vida,para meu Deus, com fé, sigo implorandoa proteção, o amparo e a acolhida.
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Na caminhada toda confirmandoa devoção à Virgem Aparecida,o terço do rosário vou rezandopara nela encontrar doce guarida.
Eu sei que à cada terço que se ofertanosso bom Deus retribuirá na certacom graças e com bênçãos especiais.
O terço vai deixar a porta abertapara o poder de Deus que se libertana proteção de todos os mortais.
Harley Covis StoccheroA. Tamandaré, 08.09.98
E o prezado Vice-Presidente da ASBL, Seção Paraná IvoArzua Pereira nos escreve:
Meu caro Presidente Zanotelli
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Saudações!
Profundamente consternado, estou transmitindo o texto
sobre as homenagens póstumas ao caro e saudoso amigo
Harley Clovis Stocchero, que foram realizadas no Centro de
Letras do Paraná, no dia 19 do corrente mês, com a
participação de todas as entidades acadêmicas das quais fez
parte o finado confrade.
Muito agradeceria se fosse publicado o referido texto sob o
título "Requiem para Harley Clovis Stocchero".
Antecipadamente grato, subscreve-se com um fraternal
abraço o amigo - Ivo Arzua Pereira
REQUIEM PARA HARLEY CLOVIS STOCCHERO
No início dos tempos os valores e as obras primas
do Criador estavam entesourados em sua Casa Celestial.
Então, um dia, o Senhor preocupado com o que
estava acontecendo na Terra, recomendou à Luz, ao Verbo,
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ao Amor, à Beleza, à Misericórdia, à Justiça e à Paz, que
olhassem pelo nosso Planeta.
A Luz olhou lá da imensidão celestial e viu a Terra
coberta de trevas e escuridão ; o Verbo observou a Terra e
apenas encontrou desentendimentos, incompreensões,
falsidades e hipocrisia ; o Amor expiou lá de cima e
somente percebeu antipatias, ressentimentos e angústias ; a
Beleza mirou lá do alto e apenas conseguiu enxergar
deformidades e desarmonias ; a Misericórdia fitou a Terra
lá do espaço sideral e somente pode perceber miséria e
sofrimento ; a Justiça sondou tudo lá das alturas e
somente avistou opressão e injustiças ; a Paz baixou seu
olhar inquisidor e somente divisou ódios, conflitos, guerras
e morte.
Então todos eles, cumprindo a suprema vontade do
Senhor, decidiram descer à Terra . Veio a Luz e
deslumbrantemente iluminou toda a Terra ; veio o Verbo,
se fez carne e habitou entre nós pregando : “Eu sou o
Caminho, a Verdade e a Vida”; veio o Amor e gerou a
plenitude da Vida : corpo e alma ; veio a Beleza e
transformou a deformidade e a desarmonia em encanto e
formosura ; veio a Misericórdia e docemente acolheu e
cuidou dos carentes e dos excluídos ; veio a Justiça e
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estabeleceu o primado do respeito às liberdades e aos
direitos humanos; veio a Paz e gerou a compreensão, a
tranqüilidade e a fraternidade entre todos os povos e nações
do Mundo.
Como seus arautos e promotores Deus enviou
também os missionários da fé e os literatos, poetas,
trovadores e artistas, entre os quais pontificou você, meu
caso e saudoso amigo, Poeta Harley Clovis Stocchero.
Para homenagear reverentemente sua memória,
estão hoje aqui reunidos sua querida esposa e seus queridos
familiares, juntamente com seus mais chegados confrades e
confreiras das instituições acadêmicas que você enobreceu
e engrandeceu com a sua dedicação e superlativo talento
poético e artístico.
“Requiescat in pace frati !”
Mas saiba,caro e inesquecível Amigo Harley,
que não morre jamais quem vive no coração de seus
entes queridos.
Acadêmico Ivo Arzua Pereira
Academia Sul Brasileira de Letras - Vice-Presidente
Subseção do Paraná - Presidente
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7. ELEIÇÕES NA ACADEMIA
A Academia Sul-Brasileira de Letras, em
Assembléia Ordinária realizada no dia 26 deste mês de
abril, elegeu e empossou sua Diretoria para o biênio 2005-
2007. Foram eleitos: Presidente: Wilma Mello
Cavalheiro; Vice-Presidente RS: José Clemente Pozenato;
Suplente de Vice-Presidente: Lígia Antunes Leivas;
Secretária e suplente: Ivone Leda do Amaral e Ângela
Treptow Sapper; Tesoureiro e suplente: Jandir João
Zanotelli e Nair Solange Pereira Ferreira; Conselho Fiscal
com respectivo suplente: José Anélio Saraiva e Jorge
Moraes, Maria Amélia Hilall e Olga Maria D. Ferreira,
Pedro Baggio e Manuel Jesus Soares da Silva. Votaram por
correspondência acadêmicos do Paraná, Santa Catarina e
Porto Alegre.
Por outro lado as Seções do Paraná e Santa Catarina,
obedecendo os Estatutos Sociais e as determinações que
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Wilma - Jandir
julgarem necessárias, elegerão seus respectivos Vice-
Presidente, Secretário e Tesoureiro até o dia 9 de maio,
festa de aniversário da Academia.
Houve também a prestação e aprovação das contas
do biênio concluído e que era presidido por Jandir João
Zanotelli. O relatório final chegará às mãos dos sócios
acadêmicos no jantar de confraternização que a ASBL
realizará na noite de 10 de maio, quando também será
lançado o número 8 em conjunto com o número 9 da
Revista da ASBL.
Os sócios acadêmicos mostraram-se entusiasmados
com as perspectivas de novas atividades culturais previstas,
acentuadamente sua revista eletrônica que, em breve estará
à disposição do público leitor.
A ASBL publicou também nos jornais de Pelotas
em sua coluna semanal homenagem ao acadêmico José
Anélio Saraiva:
A ASBL sente-se feliz ao comemorar o sonho e a
luta de seus acadêmicos. Basta lembrar que há mais de 30
anos o confrade José Anélio Saraiva vinha lutando, quase
sozinho, para evidenciar ao governo brasileiro a viabilidade
47
de prospecção de petróleo na bacia de Pelotas e que hoje se
torna uma das realidades mais alvissareiras para a região
Sul do RS. São milhões de investimento e milhares de
empregos à vista. É o mesmo lutador que mostra a
possibilidade de Urânio em nossa região, bem como a
riqueza do óleo de babaçu para múltiplas utilidades. Este
autodidata, honra sobremaneira o nome da Academia
fazendo da palavra um arado atrelado a uma estrela e que
arranca do chão o pão e o futuro de todos nós.
A palavra, em sua precariedade, limitação e
relatividade se faz a casa, não apenas das ansiedades,
desejos e memórias do homem, das lutas por pão, por
justiça e por paz, mas se faz sempre, provisoriamente e por
isso mesmo, a casa do Ser, a casa da Transcendência, a casa
da esperança. A palavra, é nossa tarefa, nossa faina, o lugar
de encontro de todos e de cada um de nós. Enquanto
diálogo primordial, ela é o lugar das coisas, o nome e o
sentido de tudo. Ela nos constitui humanos, à caminho da
verdade que está sempre além, acima de todos os nossos
passos e, por isso mesmo, é o horizonte de cada passo,
muito embora trôpego, coxo, titubeante. Ela nos constitui
peregrinos.
48
Felizmente ela não é propriedade minha, tua, ou de
quem quer que seja, ela não cabe no bolso de ninguém. Ela
nos ultrapassa, nos convoca e nos enraíza. Ela é a nossa dor
e a nossa festa.
De parabéns a nova Diretoria da ASBL. De
parabéns Pelotas e a Região Sul do Brasil. De parabéns a
inspiração e a transpiração de tantos artífices da palavra.
Jandir João Zanotelli.
8. Falece HELOÍSA ASSUMPÇÃO DONASCIMENTO
Neste último 4 de maio faleceu nossa co-irmãHeloísa Assumpção do Nascimento.
Considerada a mais importante pesquisadora dahistória de Pelotas das últimas décadas, na senda de AlbertoCunha e Fernando Osório, era graduada em Direito, pós –graduada em História da Arte, foi , por 40 anos professorada Escola Normal (Sociologia e Português), do curso deDireito (a primeira no RS e uma das primeiras mulheres doBrasil a lecionar Direito), do curso de Jornalismo daUniversidade Católica de Pelotas que ajudou a fundar,Heloísa marcou profundamente seus alunos com a simpatia,a simplicidade, a profundidade e competência.
Autora de: Harmonia Excelsa – romance 1936;História das mil ilusões – contos 1936; Três crônicas, Doissonetos e um Poema – crônicas 1940; Furna Encantada –
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romance histórico 1954; Praça da Matriz 1964; Haragano– romance que recebeu a medalha de ouro do Clube doLivro de São Paulo e da União Brasileira de Escritores,núcleo São Paulo ...1965. De sua pesquisa histórica é dedestacar: a Arquitetura neo-renascentista em Pelotas – aSanta Casa de Misericórdia (1975); O realismo fantásticona pintura – Goya (1979); Yolanda Pereira, Miss Universo(1980); História da Santa Casa de Misericórdia de Pelotas(1984); a Saga dos Açorianos (1999); Nossa cidade eraassim vol. 1, 2 e 3 (1994); Coletânea – viagens, contos ehistória (1982)
Escrevia inexcedíveis artigos sobre a vida e históriade Pelotas até o final da vida.
Intelectual honesta e talentosa, escritora brilhante ede uma beleza leve e jovial como era sua presença.Amigável companhia que ninguém queria perder, nacomunhão dos santos, será certamente nossa perene e felizcompanhia, na tarefa da palavra, da pesquisa, do magistérioe da solidariedade.
Era titular da cadeira 24 da Academia Sul-Brasileirade Letras, cujo patrono é Antônio José Gonçalves Chaves.Pertencia também à Academia Literária Feminina do RioGrande do Sul, ao Instituto Histórico e Geográfico dePelotas.
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POESIA
O REMADOR
José Moreira da Silva 3
Há em nossa vida um rio.Águas correm limpas, serenas,na superfície.No leito, há lama e pedras.
O bom navegador haverá de livrar-sedo que há no fundo do rio.Perturbadoras emoções que lhe toldariama alma, furtando a paz de espírito.
A chave da felicidade é o despertardas energias escondidas,abrir portas e janelas para o mundo,urdir novas dimensões no interior.
3 Oficial do Exército Brasileiro, na reserva. Advogado. Cronista. Poeta.Ativista cultural. Publicou “PAIXÃO – FRUTO MADURO –INFINITO”, Edicom, Porto Alegre, 1999, poesia. Idealizador epresidente da Academia Literária Gaúcha - ALGA, desde a suafundação, em 1994. Sócio ativo da Sociedade Partenon Literário e daCasa do Poeta Riograndense. Nascido em Pau D’ Alho, Pernambuco,em 1927, chegou ao RS no final da década de 50. Aqui estudou econstituiu família. Humanista por vocação, é um dos maioresestimuladores do associativismo literário. Reside em Porto Alegre.(JM)
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Quando, na bússola, trepida a agulha,perde-se o rumo da estrela-guia.Apagam-se os faróis, desorienta-se o nauta.Após tempestades e calmarias, semprehá um novo rumo.Novas descobertas além do curso,que se julga único.
Não deixes o barco à deriva,é preciso remar e remar!...E ajudar os outros a fazer o mesmo,quando não há ventos favoráveis.
PROPOSTA DE CONCILIAÇÃO
José Moreira da Silva
Amanhã, quando não mais for possívelsonhar, não venhas buscar o sonho,a ingratidão terá me matado.O acontecer condena ao sofrimento.Haverá algum dia, paz no revolto mardas paixões?
Nem ainda nos amamos e já somosinimigos, com se feras fôssemos.Isto é racional, se somos cristãos?
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Há muitas perguntas a fazer, mas mesae cama são encontros de ausências.Palavra não vem, rostos se contraem,fecha-se o mundo em abismos.Soluçam e morrem esperanças. Assim, somos pedras, matéria apagada,sequer servimos à produção da energia, fogo, calor e luz.
Ainda não foi jogado o último barco.Quem o jogará primeiro?O mais puro ou o mais humilde?Não esperemos, o tempo é surdo. Amanhã tudo será mais difícilna superfície das águas de amar.
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TESTAMENTO
Eu sei que o meu momento vai chegar.Que, das limitações eu sairei. E tudo que eu colhi hei de deixarPois noutra perfeição me integrarei.
Quero deixar minh’alma congeladaNas imagens sonhadas com ardorQuero ser luz na escuridão da estradaQuero ser sal nas vidas sem sabor.
Quero deixar pra mente torturadaO passaporte para a liberdadeDe contar, na terrena caminhada
Com a riqueza do sonho e da poesiaQue dão de brinde a toda a humanidadeLuz própria, Paz, Conforto e Alegria.
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Roza de Oliveira
CASA ONÍRICA
Bem no pico dos meus sonhosConstruí minha morada,Sem paredes, sem telhados, Sem limites Nos seus lados.
Bem que o telhado varia Varia Conforme o dia:Há telhado de gaivotas, De estrelas, De andorinhas...
Minha cama - é uma nuvem.Minha mesa - a lua cheia.O vento - o meu cavalo!Sou turista do infinito!
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CHOVE E NÃO VENS
Miguel Russowsky
Chove a chuva e tu não vens... (Tristeza!) ... e os talheres... e os cálices de vinho sobre a toalha, alvíssima, de linho... e as velas.... (mas nenhuma foi acesa!)
... e as flores como parte da surpresa... e alguém ansioso pelo teu carinho.... e a música ambiente... e o som baixinho... e as duas taças de cristal na mesa...
... e as dobras, com amor, nos guardanapos, cheias de ardis para teus dedos guapos... e as iniciais bordadas num cantinho...
...e a lareira onde o fogo já não arde... Chove e faz frio... e tu não vens...(É tarde!) Soubesses como dói jantar sozinho?!...
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CHOVE DENTRO DE MIM
Marilu Duarte.
Chove em minha solidão, lavando ressentimentos, transmutados de perdão. Chove chuva em todo o meu corpo, inerte, indiferente e quase morto.
Chove chuva abafando os meus gemidos e calando todos os meus sentidos. Chove chuva derrubando mitos, verdades e preconceitos. Chove chuva, caindo bem dentro do peito, esmagando a ilusão e os sonhos desfeitos.
Chove em cada retalho de memória, nas pegadas de minha trajetória, na minha ilusão adolescente, no meu passado e no meu presente. Chove chuva nas minhas esperanças, renovando meus sonhos, restaurando os versos que componho, para a minha alma criança.
Chove chuva dentro de mim, inundando minha existência, anulando minha consciência, afogando os meus desencantos,
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HINO À VIDA
Maria Amélia Gonçalves Hillal
O sol entrando em casa... as flores na janela...Olhar e poder ver. Devo um hino fazer.Cantar, em hino, a vida e meu amor por ela.Gozar tranqüilidade... a ventura... o lazer...
Afastar a tristeza e afastar a querela.O destino é a morte. Aceitar o morrerEm paz, serenamente, aceitação singela,Como a tudo o que tem de um dia acontecer!
Usar da consciência. Agir com a razãoQuando for decidir. (Dá calma ao coração);Ter a alma sempre em paz; jamais se arrepender...
A leitura, o escrever... Como esta vida é bela!Os pássaros cantando, as flores na janela...Como este mundo é bom e como é bom viver!!...
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O MUNDO E A VIDA
Pedro Baggio
Espaço, mundo, terraço entre o céu e a terra.
Palco, tablado formado para as cenas da vida, onde os homens dançam obrigados.
No ar, no mar, na terra todos à espera do inesperado, palhaços cansados de rir e de chorar!
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DIVAGANDO DE...VA...GARIvone Leda do Amaral
IO amanhecer erotizava a noite num orgasmo planetário.
IIAs tartarugas amarinhavam as ondas, que envergonhadas, bejavam as praias.
IIIO dia e a noite amavam-se, à distância, num abraço eterno.
IVO buraco negro versejava na brancura das nuvens, cantandohinos ao sol.
VOs pirilampos iluminavam a noite do meu bem.
VIA árvore, que aninhava os pássaros, detestava a negrura dosbesouros. Besouro, tanque de guerra, que busca paz na luz.
VIIPode a gota formar o rio? O rio não se avoluma só de lágrimas, mas de desejos impensáveis...São os nenúfares medalhões do infinito? Sua beleza é eterna sem eternidade.
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VIIIO sapo piscinou com fúria.
IXA janela quebrada avermelhava de inveja do rosado das azaléias descoloridas.
XO bem-te-vi amordaçou o canto, quando viu a cobra assanhar-se para ao gaturamo.
XIAs glicínias guirlandavam-se contra o vento, que gemia no desfolhar das pétalas.
XIIE, o sol, dissolvendo-se na saudade, me anoiteceu...
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ESPERANÇA4
Wilma Mello Cavalheiro
Enquanto a esperança dourar o meu caminho e o coração bater uma canção no peito, e o sol despontar entre os lábios da aurora para beijar a natureza em flor, enquanto as libélulas em metamorfose se transformarem em lindas borboletas, enquanto meus olhos se extasiarem ante a luz dos poentes coloridos, enquanto no horto da vida eu sustentar a fé que me conduz e acreditar que o amor pode redimir a humanidade, bendirei a vida que me fez poeta!
4 Primeiro lugar no Concurso Estadualo RS promovido pelo Rotary Clube Pelotas Norte e Club Pan-Americano (2004).
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DESFAZIMENTO
Lígia Antunes Leivas
Em minhas veias já não corre mais o sonho.Deserta de esperançadesperto para um novo dia...Em um segundoem mim esgota-se a crença em um mundo melhor.
DE HORA EM HORA
As horas de todos os diassabem de mim...Em suas entranhasmaceram incessantementeminhas venturas e desventuras.
As horas de todos os diassão sábias...No tic-tac do tempobrincam de esconde-escondeà espreita do meu fim.
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POEMA DE ABSOLVIÇÃO (OU EXERCÍCIO DA IRA)5
Joaquim Moncks6
Em nós a necessária busca.O mal prevalece na medida dos passos.Lenço de nuvens em que escondemos o rosto.
(Pobre do que avalia a profundidade das iracundas visões)
No exercício da ira o silvo do outono sobre os frutos, é poema de absolvição.
A alegoria dos ausentes foge na canção dolorosa.
5 Do Livro O poço das almas. Pelotas: Edit. Univ. Federal, 2000, p.816 Oficial PM, na reserva, advogado, poeta, declamador, conferencista, ensaísta eativista cultural. Nascido em Pelotas, em 1946. Seis livros individuais desde1973, no gênero Poesia. Mais de uma centena de participações em antologias ecoletâneas, em prosa e verso. Membro da Academia Sul Brasileira de Letras,em Pelotas e da Academia Literária Gaúcha, em Porto Alegre. Da SociedadePartenon Literário, da Estância da Poesia Crioula e das Casas do PoetaBrasileiro-POEBRAS e da Riograndense-CAPORI, todas sediadas na capital,onde reside. E-mail: joaquimmoncks@ig.com.br
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A solidão carpe o tempo das esperas.
Só Deus sabe dos achados e perdidos. O que a vista alcança morre ajoelhado no horizonte.
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30º VERSO
Cheila Stumpf
Passeipelo espelho e me vi, m ais parecia vestígio de caminho no mato, tinha boca, mas fizera dos cabelos cortina, tão densa, que os olhos que de lá me consultavam, o faziam como tochas num caminho escuro.
66
CONTOS E CRÔNICAS
MEU IRMÃO, O MEDO
Blau Souza
Parece que foi ontem. As estações de rádio
alternavam composições marciais com discursos
inflamados a incitarem os sentimentos patrióticos dos
gaúchos. A perplexidade pela renúncia de Jânio Quadros,
que cedera a forças ocultas, foi substituída pelos percalços a
serem enfrentados por João Goulart. Despreocupado
visitante da China, Jango teria de vencer forças nada
ocultas se quisesse assumir o poder. Era preciso empolgar o
povo na defesa da legalidade, e Brizola fez isso como
ninguém: seu cunhado teria de assumir o poder como
exigência da constituição O povo do Rio Grande assim
o queria.
Apresentavam-se voluntários das mais
diversas procedências e gerações. Jovens, com ou sem
afinidades partidárias, preparavam-se para a luta em favor
da legalidade e o faziam com o entusiasmo e o
67
desprendimento dos inocentes. O restaurante universitário
fervilhava. Lá se organizavam forças auxiliares, ao som de
dobrados e com um material bélico semântico, verbal.
Como estudante de Medicina, eu classificava medicamentos
ou ajudava na tipagem sangüínea de centenas de
voluntários. Eles vinham prontos a darem seu sangue de
maneira civilizada, transfundido; ou derramado de forma
heróica em hipotéticos campos de batalha.
A expectativa nervosa aguçava a
sensibilidade para fatos onde o cômico aliviava a tensão
crescente. Não esqueço o gauchão enorme, pilchado a
caráter, aguardando na fila para o exame de sangue e que
logo virou referência obrigatória. Ao ter o dedo picado por
minúscula lanceta, o homenzarrão desabou, suando frio e
revirando os olhos. Quando isso aconteceu, lembrei do
velho gaúcho, rezinguento, que visitara o restaurante
universitário pela manhã e perguntara com voz irritante:
Onde estão os combatentes, os homens de
briga? E quando indicamos os muitos homens a
circularem, pilchados, quase dançando pelas dependências
do centro de resistência, ele concluiu: Não, esses são de
trova e dança... Eu quero os de peleia.
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Os sentimentos eram intensos e exigiam
pressa. O amor à causa não era exclusivo e a convivência
com o medo estreitava laços, agregava incertezas solitárias.
Afinidades instantâneas facilitavam amores em casais
dispostos a dar e a retirar tudo da vida em perigo. Namoros
acelerados nasciam nos percursos entre o restaurante na
Azenha, os centros acadêmicos e a Praça da Matriz.
Também aí, não contrariei a regra e me restaram ternas
lembranças.
Não foram muitos os dias de lavagem
cerebral. Chegou a hora decisiva na Praça da Matriz, mais
cheia de expectativa que de gente... E eu estava lá. Os olhos
fixavam-se nas sacadas do Palácio Piratini, onde um
Brizola tresnoitado surgia de tempos em tempos. Ouvidos
assustados adivinhavam barulhos. Gargantas secas, vazio
no estômago, o coração disparando e ali estávamos a
arrastar os bancos da praça na tentativa de armar barricadas.
Não era conhecida a posição do exército e os boatos se
multiplicavam. Firmava-se a sensação de estarmos vivendo
momentos sem volta, históricos. O crescendo era
intolerável e momentos de uma infância feliz, bucólicos,
teimavam em saltar da memória diante das incertezas de um
futuro transformado em presente, ali e sem alternativas
69
honrosas. De repente, foi anunciado que o General
Machado Lopes, comandante da Terceira Região militar,
apoiava a posse do vice-presidente: era pela legalidade.
Abraçados, olhos úmidos, todos cantamos o Hino Nacional.
Por muito tempo os aspectos semicômicos
ocupavam todo o espaço quando eu falava da participação
na Campanha da Legalidade. Filtros de conduta, individuais
e públicos, resistiam a admitir o medo. O passar dos anos, a
valorização das paixões da mocidade, a análise das reações
pessoais e das massas mudaram o discurso. Eles me
ensinaram que o medo educa, amadurece, é inato ao homem
e exige de nós a coragem, até para admiti-lo. Vencê-lo
como velho conhecido, tenho certeza...é bem mais fácil.
70
Mulher... antes, agora, sempre
Lígia Antunes Leivas7
Através dos tempos, preconceitos e convenções sociais
(sem serem garantias de justiça) contiveram o pleno crescimento
da mulher, impossibilitando sua atuação em igualdade de
condições com os homens. Antes, o lugar adequado para a
mulher era bem restrito: ou ficava sob a tutela do marido (este até
poderia ser gentil, mas também ser um bruto, um tirano –
comportamento, infelizmente, ainda encontrado hoje), ou ia para
um convento ou para a prostituição. Ficar sob a tutela de um
homem significava ser uma serviçal: cuidar dele, das lides
domésticas e da prole... e assim considerar-se feliz, já que outros
sonhos não poderiam existir. O homem é quem protegia a mulher
(também do assédio de outros homens!...) uma vez que sem ele a
mulher ficava à mercê da maior solidão. Na viuvez a vida da
mulher era de desamparo e tristeza. O homem, porém, ao viuvar,
curtia a tristeza por pouco tempo: em seguida tratava de
encontrar outra mulher que o cuidasse e também o lar.
A literatura nos relata que o Romantismo (séc. XVIII) e a
difusão dos romances escritos trouxeram para a mulher o
despertar de uma mudança de conduta: ela vislumbrou outros
7 Lígia Antunes Leivas: Professora, escritora, poetisa, sócia acadêmicada ASBL – CLIPE - CBC
71
horizontes além do doméstico e começou a sonhar com novas
emoções. Surgiram, assim, as primeiras profissionais liberais, as
universitárias, as escritoras assinantes de seus próprios textos.
As barreiras de submissão e dependência gradativamente
iam se rompendo. Autonomia e estabilidade – até então apanágio
dos homens – incorporaram-se à vida das mulheres, permitindo-
lhes a expectativa de uma vivência criativa e feliz.
Ainda no início do séc. XX foi imenso o esforço das mulheres
para poderem ajustar-se ao mundo reservado aos homens. Mas
elas tornaram-se ativas política e socialmente; elas lutaram para
fazer um mundo melhor, sendo ainda cedo para saber se
conseguiram ou não. Como resultado de uma luta difícil, árdua
em meio a uma cultura tradicionalmente dominada pelo homem,
a mulher hoje está ocupando seu lugar como ser capaz de, com
responsabilidade e competência, desempenhar múltiplas
atividades (quase todas, aliás!...). Para tal, vale-se de suas
qualidades inestimáveis: auto-suficiência, coragem,
racionalidade, versatilidade, disponibilidade... tudo isso sem
perder o olhar amistoso, a sensibilidade, o dom maternal, a
habilidade para contornar conflitos e desarmonias e perceber,
com os olhos da perspicácia, quando é preciso pôr panos quentes
sobre os fatos que assim o exigem.
A situação da mulher séc. XXI já é diferente: ela não
depende mais do homem para ter a comida na mesa; ela escolhe
se é melhor casar ou não, ter filhos ou não; ela não precisa mais
72
ser a mulher do Sr. fulano... Enfim, a mulher ganhou o respeito –
senão de todos – de quase todos.
A luta, no entanto, segue em frente. Ainda há
sofrimento... e muito!... Há mulheres, pelo mundo afora,
cerceadas até em sua liberdade de ir e vir; há mulheres com
inúmeras jornadas de trabalho; há mulheres menosprezadas,
desconsideradas; há discriminação salarial para elas. E o pior: a
ideologia machista segue apostando suas fichas no retrocesso,
promovendo as patricinhas, as tiazinhas, as popozudas, as boas,
as feiticeiras (semanticamente este item permite grande número
de sinônimos). E tudo isso para convencerem as mulheres de que
elas só podem ter sucesso se for esta a trilha seguida.
Lembrando, pois e mais uma vez, o dia internacional da
mulher, vale dizer que a mulher é um ser humano que ama,
trabalha, se preocupa e ocupa com os outros, consigo mesma,
com os filhos dela e os filhos do mundo; se preocupa com a
qualidade de vida, com a natureza, o ar, a água, a saúde, a
educação; se preocupa com as emoções, os sentimentos e a
vivência plena.
Neste 8 de março – e por que não todos os dias?... –
sucesso, sorte, muita paz e felicidade para todas as Mulheres.
Ressurgimento da Soberana Ordem do Sapo
73
Ivo Arzua Pereira8
Sempre questionei-me para saber porque os insignes
e saudosos intelectuais Leocádio Correia, Leite Júnior,
Gabriel Ribeiro e Thales Saldanha, nos idos de 06/03/1898,
há portanto 107 anos, criaram um periódico sob a
intrigante denominação “O Sapo”, que existiu até
21/09/1902, somente ressurgindo em 06/11/1976 sob a
magistral direção e editoração do saudoso Acadêmico/APL
Vasco José Taborda Ribas, também fundador da Soberana
Ordem do Sapo em 15/08/1977, da qual recebeu o título
nobiliárquico de Conde das Araucárias, e que, até o seu
falecimento em 23/03/1997 , dirigiu com excepcional zelo e
proficiência .
Recentemente, em 31/07/2004, o Barão de
Tatuquara, o Acadêmico/APL Apollo Taborda França,
dotado de acendrado idealismo e indômita coragem, na
qualidade de Chanceler titulado, com o apoio dos demais
titulares, investiu-se nas funções de Grão-Mestre da
Soberana Ordem do Sapo, assim fazendo-a ressurgir, do
8 Acadêmico da ASBL - Subseção do Paraná - Presidente
74
que resultou esta esplendorosa solenidade de investidura de
14 ( quatorze) novos titulares .
Tudo bem, mas por que foi adotada a figura do sapo como
insígnia desta centenária entidade poética e literária? .
Pois bem! É de todos sabido que “sapo” é o nome
comum dos “anuros”, ou seja, dos animais vertebrados
desprovidos de cauda, espécime dos batráquios.
Até aqui menos mal, pois que, neste mundo onde grassa o
deletério vírus da corrupção, o sapo jamais poderá ter “ o
rabo preso” .
Além de tudo o sapo, cujo “habitat” são os charcos,
os terrenos alagadiços e os banhados, é bem o símbolo da
humildade, pois jamais intentou viver nas alturas
montanhosas para brilhar à luz do Sol e ser notado,
admirado e aplaudido, bastando-lhe ser alvo da simpatia
dos seres humanos e, principalmente, dos bravos
ecologistas.
A humildade, virtude desenvolvida por nós, os
seres-humanos, em nosso íntimo relacionamento espiritual
com Deus, e que tem como fundamentos o Amor, a
Verdade e a Justiça, nos faz compreender e aceitar nossa
ínfima importância em comparação com a infinita dimensão
do Universo, que abriga mais de 100 bilhões de galáxias,
75
cada uma com bilhões de estrelas, sendo que, somente em
nossa galáxia-a Via Láctea, existem cerca de 100 bilhões de
sistemas solares semelhantes ao nosso.
Eis porque a humildade, ajudando-nos a
compreender a nossa real pequenez, ajuda-nos a refrear, e
até eliminar, a tendência inata a todo ser humano de
superestimar-se, quando dominado pelo egoísmo, pela
vaidade, pelo orgulho e pela ambição.
A História da Humanidade é prenhe de magníficos
exemplos de humildade entre os luminares de todas as áreas
do saber humano, bastando citar para representá-los todos,
o imortal filósofo grego Sócrates (470-399 a.C.) e o erudito
e eloqüente tribuno Rui (1849 -1923) - o “Águia de Haia”,
os quais , com insuperável sabedoria, respectivamente
afirmaram: “Só sei que nada sei” e “Quanto mais largas as
vastidões do saber , mais razões de serem modestos os
seus cultores” .
Daí porque a humildade, sendo um dom
característico das pessoas mais sapientes e também um
atributo genético do sapo, paradoxalmente criou uma
conotação entre os vocábulos sapo e sapiência, o que,
muito provavelmente, tenha inspirado os eméritos
76
fundadores da Soberana Ordem do Sapo na seleção e
adoção da sua insígnia.
Também inspirada nesta lírica concepção é que a
Subseção do Paraná da Academia Sul-Brasileira de
Letras- ASBL, em sua reunião de 16/02/05, decidiu
formalizar o seu voto de louvor e gratidão ao conspícuo
Barão de Tatuquara Apollo Taborda França, Grão-
Mestre da Soberana Ordem do Sapo, pelo
restabelecimento das meritórias atividades desta vetusta
entidade cultural, com um troféu dominado pela
inconfundível e simpática imagem de um sapo coroado,
fleumaticamente assentado sobre um espelho simbolizando
uma pequena lagoa, oferenda que, neste momento, será
solenemente entregue pelas novéis Baronesas de Santa
Terezinha- Maria Alice Pedroso e das Misericórdias -
Maria Helena Sottomaior Pereira.
Curitiba, 05/03/2005
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78
ARTIGOS
PALAVRAS SOBRE POESIA BRASILEIRA
Ir. Elvo Clemente
LINGUAGEM DA POESIA
Henri Bremond, no prefácio de seu livro Prière Et
Poésie, toma a palavra de Middleton Murry, grande crítico
inglês: “Para reencontrar a via da salvação, o caminho
para salvar a humanidade é preciso tomar a sério a grande
poesia. Para conseguir isso é preciso antes de tudo fazer o
passo heróico, o salto mortal, admitir a legitimidade, o
valor de um conhecimento que não se exprime, que não
pode traduzir-se em palavras”.
A poesia vai além da palavra racionalizada,
manifesta-se no silêncio, na intuição daquele ritmo ou na
sonoridade daquela rima. Somos demasiadamente racionais,
filhos cartesianos que tudo avaliamos pela lógica das frases
79
e dos períodos. A linguagem poética vive na intuição,
desperta no silêncio, vive nas reticências da semântica.
Pretendo convidar a seleta assistência que me ouve a
percorrer o mapa de alguns poetas sul-rio-grandenses.
Procuremos sentir como e com eles como a poesia,
sabedoria se manifesta no escandir dos versos ou no ritmo
das estrofes.
DESENVOLVIMENTO
Começamos pelo nosso Poeta recitado e cantado há
um século: Francisco Lobo da Costa. Nascido nesta
cidade em 12 de julho de 1853 e falecido a 18 de junho de
1888.
Seu peregrinar de 35 anos, caracteriza o andejar de
cada ser humano por este vale de lágrimas. Era romântico o
grande lírico, dedilhava soberbamente as cordas dos
sentimentos mais caros e mais profundos do ser humano.
O grande poema - O Solitário de Tapes, de
Lucubrações, em seus 765 versos, ouve-se outra voz que
não a do poeta. É a voz misteriosa das cordas da harpa,
numa intuição, meditada e profunda se encerra em nove
versos:
80
Tem horas em que vaga silenciosoSoltando aos frios ventos o cabelo...quando solta porém a voz cadente,Tênue vapor soergue-se da terra,E sombra de mulher, também fantasma,Corre a seus braços nus por encantoVão fugindo p’ra o céu bem como nuvens,Enquanto que no fundo do arvoredoEscuta-se o tinir de harpa perdida.
Os poemas cantam amigos, celebram datas
nacionais, choram pesares e mortes, exaltam vitórias,
sorriem na caminhada pelos campos em flor, em tudo é
Poesia, as palavras são pobres sons, os silêncios revelam e
falam profundamente. Do “Adeus do Poeta” pode-se ler a
estrofe:
Tu és a linfa que correPor entre vergel em flores;És a estrela que não morreNadando sempre em fulgores
A densidade lírico-romântica plena de religiosidade
beirando o misticismo é A última confissão de Eugênia
Câmara.
O padre era um tipo venerando,Mais pálido que o marmor’ de Carrara;Ela a seus pés - de uma beleza rara,Tinha os olhos no chão - o seio arfando.
Deserto estava o templo, - mas quandoA voz do sacerdote se escutara,
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Abriu-se a porta da secreta ara,E um arcanjo de luz – passou chorando;
- Crê em Deus, minha filha? – Eu o idolatro.- De que se acusa? Que pecado há feito?- Meu padre, perdoai-me...eu tenho quatro.
- Credo em cruz; brada o velho a mão nopeito.- Amo a glória, o prazer...amo o teatro,E Castro Alves morreu por meu respeito.
(Lobo da Costa, EDIPUCRS,
IEL, FAPERGS, 1991)
De Pelotas vamos a Rio Grande, do século XIX
vamos ao século XX, sempre embalados nos ritmos da
Poesia. Encontramos o poeta Ernani Fornari, filho do
imigrante italiano Aristides Fornari, homem de circo e de
teatro. Ernani andarilho esteve em escola em Garibaldi, em
Porto Alegre e Faculdade de Direito de Pelotas que não
concluiu. Em 1923, publicou o seu primeiro livro de
poemas - Missal da Ternura e da Humildade.
Nos alvores do Modernismo, editou Trem da Serra,
em 1928, quando Carlos Drummond de Andrade publicava
seu famoso poema – No meio do caminho tinha uma
pedra... divisor de águas entre Simbolismo do poetas
decadentes e a era modernista, daí vem a dedicatória
82
significativa a Vargas Neto, Augusto Meyer, André
Carazzoni, Rui Cirne Lima e Olmiro Azevedo.
A curiosidade e a novidade do Trem da Serra, os
poemas vão-se apresentando com o suceder de estações na
viagem ferroviária de Porto Alegre a Caxias do Sul. Cada
local é homenageado com harmoniosos versos.
ESPERANDO O TREM
Nas vilas pobres, com estação na frente,há festa duas vezes diariamente- nas horas do trem chegar.E – Ave Maria! – quanto aceno de mão, quanta alegria,quanta alegria solta pelo ar!
O trem investe pela vila, protestando nosmancais,bisbilhotando os interiores e os quintaisdas casas coloniais,modestas, asseadas e com ninhos nosbeirais.
As moças comprometidas(se não vão à estação é que o noivo nãodeixa)ficam de papelotes,atrás das cortinas de cassa das janelas,espiando o trem passar.
As mais faceiras, as mais bonitas,
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mal contendo a excitação,em seus vestidos domingueirosuns de seda, outros de chitavão ao footing na estação.
Feira ingênua das vaidades vilarengas!
PROFECIA
Firmes, erectos, em linha indiana,vão os moirões varando os horizontes,dando-se as mãos farpadas uns aos outros,e acompanhando o trem.
Cada moirão marginalé o alicerce seguro de uma casinha debarro...- que o aramado, afinal,é a artéria principalda cidade sem fim dos joões-de-barro...
(Por certo, um dia, nós também seremosum povo construtor, como os joões-de-barro!Ah! nesse dia, então, nossas estradas todasTambém hão de se dar as mãos sem fim,e a nossa pobre terra agora descuidada,tão isolada em sua vastidão,será uma Pátria só, a Grande Pátria, enfim,única,unida,tal e qual,assim!)
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A CONQUISTA DA SERRA
O gringo veio do mar...
A bugra morena estava na terraquando o gringo chegou,dourado de luz,acordando a floresta com a voz empostadae fazendo calar os inhambus:
“O sole mio...”
Ela não compreendia mas advinhava,naquela toada feliz,que ele trazia para a Terra Nova,transformada em esperança,a desilusão do seu país.
E enternecida ao som daquela voz,a bugra ficou espreitando por detrás dopinheiralo gringo que chegava,louro e alegre como o sol – que era o deusde seus avós.
E o gringoConstruiu uma casa com telhado detabuinhas!(O rancho da bugra era de santa-fé...)E o gringoplantou trigo na montanha,plantou linho,plantou vinhas,
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pelo vale botou roça,milagrando aquele chão que era só pedra eareia grossa.
Mas um dia,quando o trigo já alourava,embalada na canção bonita e estranhado estrangeiro que plantaratambém cabelos louros no cocuruto damontanha,a bugra, embevecida, se deitou sobre o
trigal- e adormeceu.
Foi aí que o italiano, que já vinhasentindo qualquer coisa diferente emderredor,como a presença de alguém,foi até lá, de gatinha,e deu com a bugra nuinha,ferrada no sono bom.
Per bacco!
Houve um estremecimentomais violentono trigal...------------------------------------------------------- Cala o bico, bem-te-vi! Faz que não viu!------------------------------------------------------- Dandá, dandá pra ganhá tem-tem!- Figlio mio!
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Ernani Fornari celebrizou-se com a biografia – O
Incrível Padre Landell de Moura. Sua fama cresceu e
afirmou-se com as peças teatrais: Iaiá Boneca, Sem rumo,
Sinhá Moça Chorou. Esteve presente no jornalismo do
Estado - Correio do Povo, Diário de Notícias, Revista do
Globo. Em 2002, a IDEPUCRS publicou livro de contos
Teoria da Bengalada, textos preparados pelo Prof. Ir. Elvo
Clemente. Faleceu a 8 de junho de 1964, no Rio de Janeiro.
De Rio Grande vamos às ribanceiras do rio Uruguai,
a Itaqui, ali nasceu no dia 19 de julho de 1898 Paulo
Corrêa Lopes, filho do engenheiro José Corrêa Lopes e de
Dona Maria Dolores Musa Lopes. Órfão aos 11 anos
mudou-se com sua mãe para São Paulo, aprendeu a ler aos
12 anos. Diplomou-se em 1918 na Escola Normal. Até
1929 lecionou em escola estadual, transferiu-se depois para
Porto Alegre, sendo funcionário da Secretaria do Interior do
Rio Grande do Sul. Nesse tempo exerceu várias atividades
além do magistério, jornalista, redator do jornal do Estado.
Converteu-se ao catolicismo em 1933. Em 19 de julho de
1939 casou-se com a Doutora Íris Potthoff. Do casal houve
dois filhos: José Paulo e Antonio Luís.
87
A produção poética de Paulo começou em 1919, em
São Paulo, Penumbra, seguiram-se: em 1931 Poemas de
mim mesmo; em 1932 - Caminhos; Em 1938 - Poemas da
vida e da morte; em 1943 - Canto de libertação; em 1958
- Novos Poemas. Em 1959, Guilhermino César e Santiago
Naud promoveram a edição de Obra Poética, pela Divisão
de Cultura do Rio Grande do Sul. Em 1991 realizou-se a
edição crítica da Obra Poética de Paulo Corrêa Lopes
orientada por nós, pela Profª Mirna Dietrich e editada pela
EDIPUCRS, Instituto Estadual do Livro e FAPERGS.
Paulo Corrêa Lopes perambulou em sua poesia
pelos vastos ambientes da natureza, do gosto das coisas
naturais com seu sabor sensual e mórbido. Deixando as
estepes mornas e traiçoeiras voltou-se ao misticismo, à
procura do senso mais profundo da poesia que reside no
âmago do ser. Aí ouvimos o seu convite:
“Vamos sentir a alma das coisasnum beijo mais longo que nos faça acreditarque fomos nós que acendemos, as estrelas
do céu.
(Convite, Obra Poética p. 50)
88
Pela intuição penetra fundo na natureza, no mundo
do eterno.
“Intuição, olhar de Deus em nós,deixa-me penetrar o meu ser até o âmago”
(Intuição, Obra Poética, p.181)
No silêncio vai desafiando a profundidade dos seres:
“Quem quiser saber o que dizem oselementos
terá que se debruçar sobre o nosso abismo,irmãos.
Temos o segredo da vida porque ouvimos avoz de Deus e benedizemos o seu nome nosilêncio de nossa alma”.
( A noite não nos ouve, Obra poética, p.195)
Lança um olhar sobre a tarefa do crítico e mostra
como não se faz análise e crítica dos poemas impunemente:
“O crítico esquartejou o poetae depois ficou, sem perceber,com as mãos, com a boca, com as ventasinundadas de poesia...”
Não posso encerrar estas palavras sobre o poeta,sem transmitir o seu grande desafio:
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LARGAI AS VELAS
Largai as velas que o mar é largo!Para longe, para o fim de tudo!Largai as velasE vereis como é mais bela a vidaEntre relâmpagos e abismos!Largai as velas que o mar é largoe embala os coraçõesque não tremem diante do mistério.
(Obra Poética, p.75)
Do Itaqui vamos a Santa Maria, coração do Rio
Grande, a cantar. Encontramos o poeta Armindo Trevisan,
nasceu em 1933. Doutorou-se em Filosofia na Universidade
de Friburgo (Suíça). Estudou e defendeu o problema da
Criação em Bergson (1963). Em 1964 recebeu o Prêmio
Nacional de Poesia “Gonçalves Dias”, da União Brasileira
de Escritores com o livro “A Surpresa do ser”. O júri
estava constituído por Carlos Drummond de Andrade,
Manuel Bandeira e Cassiano Ricardo; Armindo publicou:
Abajur de Píndaro, 1972; O Ferreiro harmonioso, em 1978;
A Dança de Fogo, em 1996, Prêmio APLUB; Os olhos da
noite, em 1997. Os livros dele foram traduzidos em alemão,
italiano e espanhol.
90
Hoje apresento ao distinto público - O Canto das
Criaturas, uma biografia lírica de São Francisco de Assis,
da UNIPROM, 1998.
O poeta percorre a vida poética do Poverello de
Assise, recitando relatos e pequenos casos. Interpela o
Santo – Nas ruas de Assis.
De tantos amigos. Ó Francisco,o que restou? Para onde foram?
De tantos amigos de noitadasnas ruas de Assis, sob o luar,
de companheiros sem rei nem lei,o que restou? Suas cinzas voam
sobre o campanário da Basílicaonde, num sarcófago de pedra,
tu mesmo repousas. Estarãocontigo, na pátria suspirada.
em que as mãos de dão, multiplicadaslivres dos que as prende aos nossos sonhos?
De tantos amigos, Ó Francisco,restou um cometa rutilante
que trespassa o céu, e aflora a terra,por onde o carinho sobe e desce,
enquanto Bernardo, João, Felipe,
91
e um medieval cruciferário
(antigo leproso), te acompanhamàs fontes mortas da extroversão.
Para onde foram os teus amigosque faziam corar a bela Assis
com trajes de luxo, com pedaçosde saco entre as sedas elegantes?
Restou teu semblante! E a lição que a amizade dá aos solitários
quando ao gato, ao cão, e às prostitutasconfiam o abismo da solidão.
A DESPEDIDA
Sê bem-vinda, Irmã Morte! Já morriQuando a meu pai lhe devolvi as vestes!
Outras vezes ganhei a vida, dando-aem troca da nudez maravilhosada luz! Agora o nosso Pai Altíssimoquer que este frágil corpo se iluminecom o gelo da pedra que cobriua sua sepultura. Sê bem-vinda,Irmã Morte, que foste derrotadapelo nardo do vaso que quebrounossa irmã Madalena! Brevemente,ungido pelo óleo da partida,também eu, filho pródigo, voarei
92
até ao palácio do Senhor meu Rei.
Com minha nudez total, deitai-me à terra:Da terra vim, e à terra tornarei.
Mas antes de partir, mostrai-me Assis!Ó cidade bendita onde nasci!Eu te abençôo, pois em ti resplendea glória do Senhor que te escolheupara reino de todos os que buscamperfumes de uma vida santa e pura.
Abençoada Assis! Cidade bela!Que sobre ti repouse a mão de Deus!E não te falte, nunca, nos caminhos,a luz, a água, o amor...e os passarinhos!
No andejar por este mundo de Deus e das criaturas o
poeta vê, contempla, ouve e escuta, penetra os segredos
numa louvação intérmina que vai além do firmamento, dos
astros e do infinito, o reino “l’ amore que move il sole ed
altre stelle”.
(Paradiso XXXIII, 145)
Referências
- BREMOND, Henri. Preghiera e poesia.
- COLLI, Giorgio. O Nascimento da Filosofia,
editora UNICAMP, Campinas, 1988.
93
- FORNARI, Ernani. Trem da Serra. Livraria
Editora Acadêmica, Porto Alegre, 1987.
- MOREIRA, Alice Campos. Lobo da Costa -
Obra Poética. EDIPUCRS/IEL - Porto Alegre,
1991.
- LOPES, Paulo Corrêa. Obra Poética.
EDIPUCRS/IEL, Porto Alegre, 1991.
- TREVISAN. Armindo. O Canto das Criaturas –
uma biografia de São Francisco de Assis,
UNIPRON, Porto Alegre, 1991.
94
A História: Memória e Mestra daHumanidade
Ivo Arzua Pereira9
Um Ideal Olímpico : “Mens Sana In CorporeSano”
(Mente sã em corpo são)
Leitor e admirador do famoso historiador inglês
Toynbee (Arnold Joseph- 1889...? ), autor da celebre obra “
A Study of History ” ( 1934-54) todavia, apoiado nas lições
da Olimpíada 2004, ouso discordar de sua afirmação de que
: “ Retirai dos homens a vaidade e a ambição e estareis
acabando com os heróis e os patriotas ”.
Provavelmente Toynbee escreveu esse pensamento
em um momento de desilusão e pessimismo, de que
ninguém está livre, ou talvez mesmo por uma incorreta
acepção da palavra herói.
Sempre acreditei que o conhecimento da língua para
o uso correto das palavras-a semântica, e a adequada
expressão dos pensamentos e sentimentos, não é apenas um
requisito lingüístico, literário, científico ou de comunicação
mas, o que é talvez mais importante, é condição primordial
9 Fundador da Academia de Cultura de Curitiba-, 1ºPresidente ePresidente de Honra .Academia Sul- Brasileira de Letras – Vice-Presidente – presidindo a Seção do Paraná.
95
para o bem-estar pessoal, familiar, social e igualmente para
a Paz Mundial.
Eis porque, relembrando um artigo que publiquei 25
anos atrás ( 13/08/1979) , sob o título “Quem Precisa de
Heróis ? ”, no Jornal Gazeta do Povo, decidi fazer uma
breve digressão sobre o significado e a importância da
palavra herói, com base nas seguintes perguntas: que é um
herói ? ; o mundo moderno precisa de heróis?
O escritor S.L.A. Marshall, autor de “ We Must
Have Heroes ? ” (Devemos Ter Heróis?), argumenta que:
“Se a vida neste planeta chegar a degenerar a um tal grau ,
que os grandes riscos pelo bem dos demais já não
parecem dignos de serem assumidos por alguém, teríamos
então a imagem perfeita da total rendição ao egoísmo, que
eventualmente resultaria em submissão passiva à
tirania”.
Josef Pieper, que escreveu “Heroism and
Fortitude”, adota idéias semelhantes às de Marshall e
defende a necessidade permanente de atos de heroísmo e,
em conseqüência, do continuo surgimento de heróis, em
uma gama variada, desde o mártir até o herói anônimo: O
mártir é verdadeiramente um herói , como também o é todo
o indivíduo modesto ou desconhecido, que arrisca sua vida
96
pela verdade e pelo bem, seja no categoricamente
dramático ato de martírio ou na dedicação de toda uma
vida, em submissão à absoluta vontade de Deus, à custa do
próprio bem-estar mundano”.
Esposando a idéia de que uma verdadeira
democracia não deve apegar-se à idéia exclusiva de que
herói é apenas aquele que oferece sua vida em holocausto
aos seus ideais, o escritor Sidney Hook (“ The Hero and
Democracy”) defende a tese de que, “ em uma
democracia , os heróis devem ser as grandes figuras do
panteão do pensamento, os homens de ideais , de visão
social, de realizações científicas e de poderio artístico.
Pois são estes homens os que dão forma aos idéias
intelectuais e atitudes dos cidadãos , os quais sem
adequados conhecimentos, percepção rápida e vontade
educada, não conseguem compreender nem alcançar a
promessa da Democracia”.
Compartilhando de tais pensamentos, em essência,
resta ressaltar o de A.M. Schlesinger Jr. (“The Decline of
Greatness”): “Se nossa Sociedade perdeu seu desejo e
inclinação por heróis e sua habilidade para produzi-los, é
bem possível que também já tenha perdido tudo o mais”.
97
Com fundamento nessas primorosas concepções
sobre o heroísmo e sua importância nas democracias,
poder-se-ia complementar a definição de Sidney Hook da
seguinte maneira: “em uma Democracia, os heróis devem
ser os cidadãos idealistas, que apresentam qualidades
exponenciais nos âmbitos do civismo, do patriotismo, da
política, da literatura, da ciência e - porque não? - do
esporte, que põe em prática o ideal da antiga Grécia : “
Mens Sana In Corpore Sano ” (mente sã em corpo são)
Poder-se-ia também dizer que herói é, antes de
tudo, um perfeccionista que aspira a melhorar sempre mais
tudo aquilo que, para os outros, já é muito bom.
Nesta ordem de idéias nós brasileiros devemos
estar sumamente jubilosos porque, nestas Olimpíadas
2004, a nossa democracia testemunhou a existência de
heróis brasileiros que conquistaram dez medalhas
olímpicas, sendo : a)- medalhas de ouro (4): vôlei
masculino, Giba, paranaense; vela-star: T. Grael/Marcelo
Ferreira; vôlei de praia: Ricardo/Emanuel , paranaense;
vela-laser: Robert Scheidt; b)- medalhas de prata (3):
hipismo-Rodrigo Pessoa; futebol feminino; vôlei de praia
feminino: Adriana Behar/Shelda ; c)- medalhas de bronze
(3): judô meio-médio: Flávio Canto; judô-leve- Leandro
98
Guilheiro; maratona-Vanderli Cordeiro de Lima,
paranaense, um verdadeiro supercampeão.
E jamais poderia esquecer, é claro, a incomparável
ginasta Daiane, exemplo de persistência, amor e sacrifício
pelo seu ideal esportivo e artístico.
Esses gloriosos campeões olímpicos, verdadeiros
exemplos para as novas gerações, nos trazem à mente um
dos magistrais pensamentos de Rui-Barbosa em sua
“Oração aos Moços”: “essa mocidade não seguia partidos,
nem militava em facções. Amava no Universo a Ciência, no
Homem o Bem, na Pátria o Direito. Só se inflamava pela
Verdade, pela Liberdade, pela Humanidade ” e, poder-se-ia
dizer também, pela Perfeição .
Para recompensar essas gloriosas conquistas desses
campeões olímpicos, seria justo perpetuar seus nomes em
centros esportivos de todo o Brasil e, até mesmo, em
panteões em Brasília e em seus Estados de.origem.
Honra a quem nos honra!
99
QUESTIONAMENTOS
Olga Maria Dias Ferreira10
Às vezes me ponho a pensar, se os questionamentos
que me assaltam, nos dias de hoje, são frutos da maturidade
ou, se a vida está mesmo difícil de entender, em uma
“primeira pensada”. Confesso não entender bem a
atualidade e isto me faz lembrar, com extrema nitidez,
palavras de meu saudoso Salvador, quando me dizia:
- Olga, há um momento certo para morrer. Os
valores sofrem tantas modificações, invertem-se
de tal maneira que se torna difícil acompanhar a
“onda” dos tempos.
Isto, em absoluto, queria dizer que estava predisposto a
partir. Eu o entendia como ninguém e sabia tratar-se de um
desabafo, apenas, de um ser altamente espiritualizado, a
encontrar-se ante DÚVIDAS incessantes a conturbar-lhe a
alma. Hoje, mais do que então, compreendo suas “catarses”
ao presenciar os fatos. Exemplificando. Em um país, onde
se apregoa aos quatro cantos o preceito constitucional de10 Membro da ASBL – cad.27, cujo patrono é LANDELL DE MOURA
100
que somos todos iguais perante a lei, ou seja, execrando o
preconceito de qualquer natureza, como podem “legislar”,
regulamentando a concessão de tal ou qual porcentagem a
negros, quer nas universidades, quer na oferta de empregos.
Por acaso esta não é a manifestação concreta da
discriminação? Existe tal dispositivo legal em relação a
brancos? Se não, cabe observar. Eu jamais me questionei a
respeito de colegas, alunos, amigos, companheiros,
subalternos, no que se relaciona a cor de sua pele. Sempre
me detive em sua capacidade intelectiva, principalmente,
nas escolas onde trabalhava, fossem brancos ou pretos. E,
saibam , eu os tive em grande quantidade, ao longo de trinta
anos de magistério. Jamais me passou pela cabeça fazer
qualquer distinção. Isto seria contra meus princípios éticos e
religiosos, sem estar preocupada com a imposição
legal.Nem nunca ouvi apregoar algo a respeito. Dirão que
falo de um fato isolado. Correto. Que, no Brasil, a
discriminação não existe de direito, mas de fato. Concordo.
Isto, lamentavelmente, ainda ocorre, nos dias de hoje, em
pleno século vinte e um. Tal é o fato TÁCITO. Mas e daí,
decretar determinado número de vagas nos meios
universitários e no mercado de trabalho para negros, não o
é, de forma EXPRESSA? Sob minha ótica, desvirtua-se,
101
LEGALMENTE, o preceito da CARTA MAGNA. Outro
agravante se constitui, indubitavelmente, na
institucionalização do DIA DO NEGRO. Existe o DIA DO
BRANCO? O, do Índio, bem como os demais,(da mãe, do
pai, da criança, do trabalhador, dos avós) interpreto como
homenagem.Em relação ao DIA DA MULHER, sou, pelos
mesmos motivos, frontalmente, contra. Francamente, está
sendo complicado entender os valores de hoje e a forma
como são interpretados. E, para agravar esta questão dúbia,
o Chefe do Executivo infla o peito, clamando pelo
desarmamento. Não me deterei no mérito e declaro não ser
a favor das armas, pois me considero pacifista por índole e
formação. Mas, permitam-me, apenas, uma pergunta: -
Como ficam os bandidos, os infratores, os delinqüentes (que
antes de tudo são doentes)? Serão desarmados? Quando,
como e onde? Com a resposta quem se considerar apto a
proporcionar-me qualquer esclarecimento. Obrigada, desde
já.
REFLETIR É PRECISO
102
Olga Maria Dias Ferreira
Há momentos em que nos sentimos predispostos a
um questionamento incessante. Pode ser resultado da
maturidade, é claro, mas também ocorre, freqüentemente,
pela simples observação do cotidiano. Basta engajar-nos em
um grupo para se nos depararem situações as mais
esdrúxulas. Em qualquer lugar, meio, nível ou classe social.
Tantos, os desacertos, as frustrações, os desencontros, que,
de pronto se nos parece incrível a assertiva filosófica de que
o homem é o ser social por excelência. É certo de que nos
buscamos uns aos outros com necessidades as mais
variadas. Um ideal comum, por exemplo, o sentido da fé, a
ânsia de proteção, o desejo de compartir, a busca da
felicidade, o encontro do amor ou a fuga da solidão. Sejam
quais forem os motivos propulsores das aproximações
mostram, desde logo, sua fragilidade, na maioria das vezes.
Ao estabelecer-se uma relação, percebemos apenas a
aparência das intenções, não raramente encobertas de
objetivos bem diversos. Podemos exemplificar melhor, se
103
nos valermos dos grupos agregados em nome da fé. De
início tudo vai bem. Tudo corre conforme apregoam os
mandamentos daquela determinada seita. Todos comungam
do mesmo ideal. Reverenciam a divindade com igual
convicção. Defendem seus valores com semelhante
determinação e confiança. Até que, como em qualquer
relacionamento animal, racional ou não, surge a imperiosa
necessidade da hierarquia. Todos a respeitam. Equívoco.
Inicia-se, lamentavelmente, a situação de conflito, pura e
exclusivamente, pela “fogueira inexcedível das vaidades”.
A liderança se sente ameaçada, inesperadamente, pela falta
de escrúpulo de muitos que não aceitam ser comandados,
ainda que, por um pequeno período de tempo. As falsas
estrelas, os diamantes enganosos, os oportunistas do
momento, buscam disseminar a contenda, a discórdia e o
engodo, motivados pelo mais terrível defeito: A INVEJA.
Corroem-se as estruturas, esvaziam-se os templos,
dispersam-se os adeptos, dissolvem-se as crenças. A certeza
de um BEM MAIOR que se sobreponha aos mesquinhos
interesses pessoais é relegada a segundo plano, dada a
incompatibilidade de ver apregoada A VERDADE e
praticada A FANTASIA. Se existe uma realidade aquilatada
como um bem verdadeiro, deve ser, sempre, sem oposições
104
ou disputas, defendida de modo coeso, em defesa do bem
comum a que deve corresponder. Lamentavelmente, não é o
que constatamos no dia a dia de nossas realidades. Somos
imperfeitos. Dirão que isso é natural. Com o que
concordamos. Discordamos, veementemente, todavia, na
negligência e omissão na busca do crescimento. Se aqui
estamos, nesta passagem, deverá ser, justamente, para
empreender o esforço de conquistarmos nossa melhoria
espiritual, para crescermos, enquanto seres humanos,
dotados de razão e vontade, matéria e espírito e, com isso, a
valiosa capacidade de discernir entre o bem e o mal. Não
nos basta haver sido concedido o livre arbítrio, se nos
deixamos levar pela ganância do poder e o devaneio da
vaidade. Se Deus, em sua Infinita Misericórdia nos
proporcionou a faculdade de decidir, façamos jus a Sua
Benevolência, na preponderância do bom, do certo, do
justo e do verdadeiro. Roguemos para que possamos
enxergar no outro, nosso irmão, no convívio, a fraternidade,
na entrega, o amor. Sejamos dignos de havermos sido
criados à Sua imagem e semelhança, a fim de que possamos
legar, um dia, exemplo de dignidade e honra a nossos
descendentes. Não tem sido isto, infelizmente, o que nos
tem mostrado a história universal e que ainda, nos dias
105
atuais, reproduzimos, vivenciando o estado confusional da
Torre de Babel. Praza aos Céus, possamos, em algum
tempo, em qualquer lugar, sentir que somos iguais, amando-
nos e respeitando-nos como apregoou Cristo em sua
passagem entre nós, fazendo-se nosso Irmão e, mais do que
tudo, sintamos que apenas na humildade e no amor
poderemos viver a PAZ e estabelecer a verdadeira
compreensão entre os homens.
106
O Chasque do Imperador e SimõesLopes Neto
Ângela Treptow Sapper
João Simões Lopes Neto nasceu em Pelotas em 9 de
março de 1865 e faleceu em sua cidade natal em 14 de
junho de 1916.
Manteve contato com a vida campeira somente
durante sua infância, mas seu grande interesse pelo resgate
da cultura gaúcha e sua linguagem regionalista induzem-
nos a crer que ele fazia o tipo do gaúcho tradicionalista.
Foi colaborador do jornal Diário Popular, redator de
A Opinião Pública e editor do Correio Mercantil. Escreveu
várias peças teatrais e publicou Contos Gauchescos
(1912), obra que o imortalizou, além de Casos do
Romualdo (1952) e outras publicações póstumas.
Não podemos estudar a obra de Simões Lopes Neto
sem nos reportarmos à questão do regionalismo, utilizado
essencialmente em sua linguagem. Podemos afirmar que ele
foi um grande coletor de lendas e casos do imaginário
gaúcho e seu mérito reside especialmente na forma de
contar e na retratação fiel da linguagem do homem do
107
campo. Sua narração é dinâmica, em primeira pessoa do
singular, com um narrador-personagem e testemunhas.
Blau Nunes tem um papel importantíssimo em Contos
Gauchescos e, em especial, no conto Chasque do
Imperador, objeto de nosso presente estudo. Será ele,
Blau, quem irá narrar os casos, ora de forma onisciente, ora
participando como personagem. Será o responsável pela
unidade da obra e a tornará um relato típico da cultura rio-
grandense, carregada de dialetismos e de elementos
essenciais do imaginário gaúcho.
Blau é o “guasca sadio, a um tempo leal e ingênuo,
impulsivo na alegria e na temeridade, precavido, perspicaz,
sóbrio e infatigável e dotado de uma memória de rara
nitidez”.
Outro fator importante no conto é a oposição herói /
anti-herói. O herói sempre é o gaúcho, com qualidades
evidenciadas: moreno, forte, honesto, valente, leal, franco e
que gosta de comer carne. Em oposição, o anti-herói
representa o forasteiro, que é loiro ou ruivo, olhos claros,
dissimulado, frágil, covarde, vegetariano.
Essa oposição é forte no conto em questão, que se
passa durante a visita do Imperador D. Pedro II ao Rio
108
Grande do Sul, por ocasião da Guerra do Paraguai e do
cerco de Uruguaiana.
Assim, podemos notar que Blau, dito por ele
mesmo, era extremanente leal, valente, forte e tendo todas
as características já enumeradas anteriormente:
“Quando foi do cerco de Uruguaiana pelos
paraguaios em 65 e o imperador Pedro II veio cá, com toda
a frota da sua comitiva, andei muito por esses meios, como
vaqueano, como chasque, como confiança dele; era eu que
encilhava-lhe o cavalo, que dormia atravessado na porta do
quarto dele, que carregava os papéis dele e as armas dele.”
“... sou um gaúcho mui cru; mas, para cumprir
ordens e dar o pelego, tão bom haverá, melhor que eu,
não!”
Os outros companheiros de Blau, também gaúchos,
tinham características semelhantes:
“Cada um, firme como um tarumã; as guascas, das
melhores, as garras, bem postas, os metais, reluzindo; os
fletes tosados a preceito, a cascaria aparada ... e em cima de
tudo – tirante eu – uma indiada macanuda, capaz de bolear
a perna e descascar o facão até pra Cristo, salvo seja!”
109
“Tudo isto é indiada coronilha, criada a apojo,
churrasco e mate amargo ... Não é como essa cuscada lá da
Corte, que só bebe água e lambe a ... barriga!...”
Já o imperador é visto como um forasteiro:
“Na testa, vinha um homem alto, barbudo, ruivo, de
olhos azuis, pequenos, mas mui macios.
...o ruivo, assim a modo um gringo, vinha todo de
preto, com um gabão de pano piloto, com veludo na gola e
de botas russilhonas, sem esporas.
Pela pinta devia ser mui maturrango.”
“O imperador – esse era meio maricas, era! ...”
“O imperador, com toda a sua imperadorice, gurniu
fome!...
“... Quê! Pois vossa majestade come carne?
Disseram-me que as pessoas reais só se tratavam a bicos de
rouxinóis e doces e pasteizinhos!...Vamos já a um
churrasco ... que eu, também, não agüento estas
porquerias!...”
Como se verifica no trecho anterior, existe o
contraste entre os hábitos requintados da corte de D. Pedro
e a rusticidade do gaúcho. O imperador é caracterizado
como requintado, claro, voz fina, jeito de maricas; já o
110
gaúcho é simples, forte, moreno, viril, qualidades
importantes na cultura rio-grandense.
Outro aspecto importante do conto é a valorização
da paisagem do pampa. O gaúcho é um amante da natureza
e da vida e a sua simplicidade, honestidade e rusticidade
são também exaltadas.
Em toda a narrativa, existe um resgate do
regionalismo, supervalorizando o tempo passado em
detrimento do presente.
Simões é, sem dúvida, um dos grandes expoentes da
literatura gaúcha e sua contribuição estende-se à literatura
brasileira, pois vê o regionalismo sob outro prisma;
aproveita-se da paisagem típica, do linguajar tradicionalista,
da construção das personagens para construir o seu
regional. Mas o aspecto primordial de sua obra é a
exploração dos conflitos vivenciados pelo gaúcho, que são
situações, na verdade, experimentadas por todos os homens
e, nesse sentido, Simões Lopes Neto torna-se universal e
eterno.
NETO, João Simões Lopes. Contos gauchescos. São
Paulo: Editora Globo, 2001.
111
CULTURA E COMUNICAÇÃO
TKenia Maria Menegotto Pozenato
TΤLoraine Slomp Giron
Os nexos entre comunicação e cultura tornam-se
fundamentais na medida em que se ampliam as redes de
energia elétrica e se vulgariza o uso da telefonia, e, ainda, a
utilização dos novos meios de comunicação como a
televisão e a Internet. Estes meios passam a ser utilizados
em regiões antes isoladas, como a zona rural. Na medida
em que se amplia a utilização desses meios, as culturas
notadamente marcadas pelo tempo e pelo espaço, passam a
ser permeadas por eles, colocando em cheque o princípio de
estabilidade dessas culturas. São vínculos interculturais que
possibilitam mudanças significativas.
Τ Drª em Ciências da Informação e da Comunicação pela UniversitéD’Aix-Marseille, França e Professora do Departamento deComunicação da Universidade de Caxias do Sul.ΤT Drª em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade de São Paulo eProfessora no Departamento de História e Geografia da Universidadede Caxias do Sul.
112
Entendendo a cultura como fenômeno histórico e
fenômeno regional, e não apenas como um conceito
teórico, no mundo contemporâneo ela está sujeita a um
impacto cada vez maior na medida em que aumentam os
apelos da comunicação e do mercado.
O objetivo deste artigo é o de identificar como a
cultura é marcada pelos meios de comunicação, através da
análise bibliográfica sobre dois temas fundamentais e
intervenientes na questão: cultura e comunicação.
SOBRE A CULTURA
Entende-se por cultura o resultado de um conjunto de
saberes e de fazeres que vão se transformando na medida
em que crescem as necessidades humanas, o que afeta de
forma direta as instituições sociais, que se tornam cada
vez mais complexas, quer sejam construídas de baixo para
cima ou de cima para baixo, ou seja, a partir da infra ou da
superestrutura.
Com o aumento das necessidades, e estas aumentam
de forma constante e inequívoca, há o surgimento de novas
tecnologias e a criação de novas instituições ou
organizações que se tornam parte integrante da sociedade.
113
A mudança nos meios de comunicação e a criação de novas
organizações como a Internet, ao mesmo tempo em que
mudam as necessidades, podem alterar também a cultura.
Parte-se do pressuposto de que o processo cultural,
sendo de construção e de transmissão, também o é de
mudanças.
Foi Lévy-Strauss, através de sua análise
antropológica, que ocasionou profundas mudanças na
interpretação da cultura através do reconhecimento das
estruturas simbólicas do pensamento dos povos ágrafos.
Segundo estudos antropológicos atuais, a cultura pode ser
vista como sistema: cumulativo, estrutural e simbólico, ou
seja, um código de símbolos partilhados pelos membros da
cultura11. O sistema cognitivo “consiste de tudo aquilo que
alguém tem de conhecer, ou acreditar para operar de
maneira aceitável dentro de sua sociedade”.12 Para Lévy-
Strauss, cultura, como um sistema simbólico, “é uma
criação acumulativa da mente humana. O seu trabalho tem
sido o de descobrir na estruturação dos domínios culturais
– mito, arte, parentesco e linguagem - os princípios da
11 LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. Riode Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1997. p.6412 LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. Riode Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1997. p.62
114
mente que geram essas elaborações culturais.”13 E,
finalmente, segundo De Geertz, a cultura deve ser
considerada “não um complexo de comportamentos
concretos mas um conjunto de mecanismos de controle,
planos, receitas, regras, instruções (que os técnicos de
computadores chamam de programas) para governar o
comportamento” 14.
Segundo Pinker,” a cultura é um fundo comum de
inovações tecnológicas e sociais que as pessoas acumulam
para ajuda-las na vida e não um coleção de papéis e
símbolos arbitrários que por acaso surgem para elas”15.
Este fundo é apreendido de forma individual através sob o
ponto de vista informacional, e de forma coletiva pela
normativa e pelo convencionalismo, ou seja, a cultura
resulta da imitação, das normas e das convenções. Desta
forma, estaria afetada diretamente pelo convívio individual,
social e pela tradição.
Tais conceitos representam agenciamentos espaço-
temporais. A cultura está marcada pela região, inclusive
13 LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. Riode Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1997. p.62 14 LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. Riode Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1997. p.6315 PINKER, Steven. Tábula Rasa: a negação contemporânea danatureza humana. Traduação Laura T. Mota. São Paulo: Companhia dasLetras, 2004. p.99
115
pelo espaço geográfico. A herança cultural de um povo que
vive nas regiões frias como os esquimós não é nem pode ser
a mesma dos nativos da floresta amazônica ou a dos
habitantes de São Paulo. “Esse caráter geográfico define
certos costumes, artes, religiões etc. como pertencentes às
regiões em que eles existem”16.
Cada grupo de indivíduos possui marcas espaciais da
cultura, como modo e materiais para erguer as habitações,
alimentos que consomem, vestuário, modos de locomoção.
Por outro lado, há ainda as heranças culturais, valores,
hábitos, costumes, religiões que os identificam e os
diferenciam dos demais. Cada região, portanto, tem uma
identidade própria, que se revela pelos seus traços culturais.
Cada grupo social representa uma cultura única e os
elementos dessa cultura têm significados diferenciados
dentro de cada contexto espacial e temporal.
Há na cultura, por outro lado, uma forma de
resistência às mudanças, uma certa força centrífuga que
garante sua sobrevivência. Santaella17 chama esta forma de
resistência princípio de estabilidade: Entretanto, para se
processar, a mudança enfrenta a resistência da16 SANTAELLA, Lucia. Culturas e artes do pós-humano: da culturadas mídias à cibernética. São Paulo: Paulus, 2003. p. 44.17 SANTAELLA, Lucia. Culturas e artes do pós-humano: da culturadas mídias à cibernética. São Paulo: Paulus, 2003. p. 45.
116
estabilidade, um princípio também necessário como
garantia de coesão para sobrevivência da cultura.
Já a cultura para Hegel constitui um caminho na
construção do saber que depende do Estado no qual se vive
Tal princípio vem a ser, na
história, a determinação do espírito -
um espírito nacional. É aqui que ele
exprime concretamente todos os
aspectos de sua consciência e da sua
vontade, a sua realidade plena, isto é,
que confere um cunho comum à sua
religião, à sua criatividade, à sua
política, à sua ética social, à sua
ordem política e aos seus costumes,
mas também à sua ciência e às
aptidões técnicas.18
O que levou Goombrich a concluir:
Agrada-me representar em diagrama o
conteúdo deste parágrafo,
extremamente importante, como uma
roda, de cujo eixo irradiam oito raios,
que representam as várias
manifestações concretas do espírito
18 GOMBRICH,E.H. Para uma história cultural. Tradução de MariaCarvalho Lisboa: Gradiva, 1994. pp. 24 -25
117
nacional, (...) São a religião, a
constituição, a moral, as leis, os
costumes, a arte e a tecnologia da
nação.19
Usando a imagem da roda, a cultura seria dotada
de uma força centrífuga que amarraria suas partes em
torno do eixo central, sua força centrípeta seria menor,
dependendo da fragilidade dos eixos.
SOBRE A COMUNICAÇÃO
Enquanto o conceito de cultura evolui teoricamente,
não havendo um consenso entre os vários autores com suas
diferentes posições ideológicas, a comunicação evolui no
mundo real de forma surpreendente. No século XX
ocorreram mais modificações nesta área do que em todos os
séculos anteriores.
A comunicação realmente tem início com a
utilização da língua com a qual o homem passa a nomear o
mundo. Segundo Hegel a grande transformação humana foi
o uso da língua, pois “sem a língua, as atividades de19 GOMBRICH, E. H. Para uma história cultural. Tradução de MariaCarvalho Lisboa: Gradiva, 1994. p.24 -25
118
recordação e da fantasia são apenas exteriorizações
imediatas”20. Com a utilização da língua e da escrita pode o
homem finalmente atingir a história. Foi o uso da escrita
que fez com que o homem deixasse a oralidade e o mito e
entrasse para o mundo da história através do registro
escrito de seu passado. Um exemplo clássico é o da
escritura da Bíblia pelos judeus, onde sua cultura e suas
crenças foram preservadas. Sem a Bíblia a história do povo
judeu provavelmente seria outra.
Passados muitos séculos, foi a invenção de
Gutemberg que permitiu a divulgação maior do sabe,
através da impressão de livros. Outros tantos séculos se
passariam até que o combate ao analfabetismo permitisse a
leitura e o entendimento das obras impressas.
O século XIX foi pródigo em invenções que
facilitaram as comunicações. Entre elas a máquina a vapor,
uma das causas da Revolução Industrial que possibilitou
sua utilização em trens e em navios, facilitando a conexão
entre regiões distantes e culturas diferentes. O telégrafo e o
telefone outras invenções técnicas que mudaram a história
do mundo, interligando-o, acelerando a recepção das
mensagens e superando distâncias espaciais.
20 HEGEL. G.W.F. Textos dialéticos. Tradução Djacir Menezez. Rio deJaneiro: Zahar, 1969. p. 61
119
No último quartel do século XX houve um
incremento nos meios de comunicação, com o avanço da
televisão e, mais recentemente, da Internet. A televisão
exigiu novos hábitos do espectador, muito diversos
daqueles exigidos ao ouvinte de rádio. Para acompanhar os
programas de televisão não é possível realizar tarefas fora
do recinto onde ela se encontra, ao contrário do que
acontece com o rádio, que pode ser levado pelo ouvinte
para o local das suas atividades, inclusive a lavoura. Tal
forma de manter o espectador preso aos programas
propiciou condições para estabelecer comparações entre a
sua vida e a daquelas apresentadas pelo programa. Mais
radical ainda é o contato através da Internet, onde o usuário
permanece de certa foram plugado ao computador para
garantir o acesso ao meio.
O rádio trouxe mudanças marcantes com sua
instantaneidade nas informações, alterando
comportamentos e ritmo de vida. A fotografia trouxe
consigo a discussão sobre o que é ou não arte e libertou o
artista da reprodução da natureza, levando-o a tentar captar
a luz, o movimento, as sensações de cada momento único.
O telefone, unido à vulgarização do uso da eletricidade,
permitiu a comunicação à distância. O cinema criou uma
120
nova linguagem, a linguagem cinematográfica, que serviu
de base para a linguagem da televisão e do vídeo. A
televisão introduziu mudanças ainda mais profundas,
atingindo comportamentos individuais e sociais, alterando e
globalizando culturas de tal forma que permitiu a
McLuhan21 denominar o mundo de “aldeia global”. Da
Internet, não se conhecem ainda todas as possibilidades,
muito menos todos os efeitos, mas, como os demais meios
de comunicação, age sobre a sociedade, globalizando-a
ainda mais com a velocidade na difusão mundial da
comunicação, levando a novas linguagens e
comportamentos, sobretudo entre os jovens.
Segundo Santaella22, a televisão, com seu apetite
voraz, devoradora de quaisquer formas e gêneros de
cultura, tende a diluir e neutralizar todas as distinções
geográficas e históricas, adaptando-as a padrões médios
de compreensão e absorção.
A Internet, tal qual a teia que a identifica, atrai e
fascina novos usuários, prendendo-os no uso de suas
incontáveis possibilidades, entre as quais o acesso imediato
ao saber.21 MCLUHAN, Marshall. La galaxie Gutemberg. Montréal:H.M.H./Paris: Mame, 1972.22 SANTAELLA, Lucia. Culturas e artes do pós-humano: da culturadas mídias à cibercultura. São Paulo: Paulus, 2003.
121
CULTURA E COMUNICAÇÃO
Nos tempos atuais há um evidente avanço da mídia,
tanto em termos de expansão de sua influência como em
sua variedade. Não é por outro motivo que Bairon afirma:
Propiciada, entre outros pelas mídias
digitais, a revolução tecnológica que
estamos atravessando é psíquica, cultural e
socialmente muito mais profunda do que
foi a revolução provocada pela invenção
de Gutemberg. E ainda mais profunda do
que foi a explosão da cultura de massas,
com seus meios técnicos mecânico-
eletrônicos de produção e transmissão de
mensagens. Tais transformações são tão
vastas a ponto de atingir proporções
antropológicas. 23
Desta forma, segundo alguns autores, nos dias que
correm a mídia tem importância até nas transformações
antropológicas, sendo tais mudanças tão profundas quanto a
do advento da imprensa na sociedade européia moderna. As
mudanças midiáticas são ainda mais amplas, estendendo-se
23 BAIRON, Sérgio; PETRY, Luis Carlos. Hipermídia, psicanálise ehistória da cultura. São Paulo: EDUCS/Mackenzie, 2000. p.7.
122
a todas as regiões da terra, podendo, pois, atingir as mais
profundas regiões da psique humana.
Segundo outros, porém, o papel da mídia não é
considerado tão importante, tão decisivo a ponto de ser o
fator principal dessas transformações.
As posições dos autores com relação à influência da
mídia, portanto, diferem em muitos aspectos. Há os que
acreditam na influência externa dos meios de comunicação
e aqueles que não acreditam (como Bosi) em mudanças
culturais profundas a partir da sua influência em uma
sociedade marcada pela indústria cultural. A explicação se
encontra dividida entre os teóricos da Escola de Frankfurt,
que defendem que a indústria cultural vai se abater de cima
para baixo nos consumidores dos produtos delas
provenientes e os que acreditam que as idéias não podem
ser impostas, mas se constróem no fazer do homem. Tal era
a posição de Marx24 na introdução da Crítica à ideologia
alemã. Enquanto a Escola de Frankfurt acredita no
crescimento da cultura de massa a partir do crescimento do
capitalismo, Marx, Engels e Gramsci defendem uma
posição inversa. Os adeptos da primeira acreditam que a
superestrutura pode modificar a cultura, portanto, as
24 MARX, Karl; ENGELS, F. Crítica à ideologia alemã. Lisboa:Martins Fontes, s/d.
123
mentalidades, enquanto os segundos acreditam na força da
infra-estrutura sobre a superestrutura.
Na verdade, não é possível ignorar a força da
indústria de comunicação e a de entretenimento, o que leva
Swingewood25 a considerar que a cultura comercial no
século XIX não teve êxito em “integrar todos os estratos
sociais numa base comum universal”. Esta situação se
modifica no século XX, onde:
(..) em muitas sociedades capitalistas
modernas, monopólios gigantescos e
empresas multinacionais controlam hoje a
rádio difusão e a televisão, a produção
cinematográfica e a distribuição e edições
em todos os níveis: o efeito mais notório
destas tendências é que as revistas, os
jornais e os programas de televisão não são
produzidos por prestarem uma contribuição
importantes à educação e à cultura, mas,
antes, porque são os meios de atração de
receita de propaganda .26
25 SWINGEWOOD, Alan. O mito de cultura de massa. Tradução deJosé R. B. Azevedo. Rio de Janeiro: Interciência, 1978. p. 92.26 SWINGEWOOD, Alan. O mito de cultura de massa. Tradução deJosé R. B. Azevedo. Rio de Janeiro: Interciência, 1978. p. 92.
124
Segundo Morin27,
A cultura de massa responde
essencialmente a esse
“hiperindividualismo” privado. Mais ainda:
contribui para enfraquecer todos os corpos
intermediários – desde a família até a
classe social – para constituir um
aglomerado de indivíduos, - a massa – aos
pés da Super-Máquina social. (...)
Paralelamente, a perpétua incitação a
consumir e a mudar (publicidade, modas,
vogas e ondas), o perpétuo fluxo dos
flashes e do sensacional conjugam-se num
rimo acelerado em que tudo se usa muito
depressa, tudo se substitui muito depressa
(...) Um incessante esvaziamento opera-se
pela renovação das modas, vogas e
“ondas”.
De acordo com tal ótica, a indústria cultural se
prestaria menos à difusão da cultura do que ao papel de
propagandista e de vendedora de produtos cujo descarte é
cada vez maior, para que o consumo se torne também cada
27 MORIN, Edgar. Cultura de massas no século XX. Rio de Janeiro:Forense Universitária, 1997. pp. 175, 177.
125
vez maior. Assim, é possível que hajam mais vendas e
divulgação de produtos do que profundas mudanças
culturais.
Logo, torna-se importante colocar as posições de
alguns teóricos sobre a cultura de massa, e as influências
que ela pode sofrer sob o impacto externo. Segundo Bosi,
O andamento dos meios de massa acerta o
passo com a produção e o mercado
próprios de uma sociedade capitalista de
feições internacionais. O imperativo
categórico desse tempo social é o da
fabricação ininterrupta de signos com vista
ao consumo total, TV e rádio 24 horas por
dia, como os postos bancários. Já há muito
o cinema (a primeira grande arte da Era
Industrial) se apresenta em “sessão
corrida”. A imprensa desdobra-se nas
edições matutina e vespertina. O telefone,
polivalente, acha-se hoje em conexão
diurna e noturna com sistemas
informáticos, que na opinião de alguns,
estariam revolucionando não só a prática
como o sentido de cultura28.
28 BOSI, Alfredo. Cultura brasileira: temas e situações. São Paulo:Ática, 1987. p. 9.
126
Bosi complementa sua análise afirmando que o rápido
andamento da cultura de massa impede que seja absorvido
pela memória, pois é descartável. “O sujeito só guarda o
que a sua própria cultura vivida lhe permite filtrar (...) se
não houver a crítica e a seleção das mensagens é preciso
que o espírito do consumidor conheça outros ritmos que o
da indústria apenas. Se isso não ocorrer, ter-se-á no limite
do sistema o homem, o “homem unidimensional” proposto
por Marcuse29.
Seguindo ainda o raciocínio de Bosi, tal influência
não se concretizaria, já que “o que singulariza a cultura
superior” é a possibilidade que ela tem de avaliar a si
mesma; em última instância, é sua autoconsciência30.
Malinowski acredita que a cultura é produto das
necessidades humanas e delas depende. Com o aumento das
necessidades haveria por conseqüência uma mudança
cultural. Esta análise é de um lado funcional e de outra
institucional.
29 MARCUSE, Herbert. A ideologia da sociedade industrial. Rio deJaneiro: Zahar, 1982.30 BOSI, Alfredo. Cultura brasileira: temas e situações. São Paulo:Ática, 1987. p. 14.
127
A cultura é um conjunto integral de
instituições em parte autônoma, em parte
coordenadas. Ela se integra à base de uma
série de princípios, tais como: a
comunidade de sangue por meio da
procriação; a contigüidade espacial,
relacionada à cooperação; a especialização
de atividades, e por fim, mas não menos
importante, o uso do poder na organização
política. 31
Sendo a cultura resultado de um conjunto de
instituições, à medida que crescem as necessidades crescem
também o número e a complexidade das instituições. Com
o aumento das necessidades, e estas aumentam de forma
constante e inequívoca, há o surgimento de novas
necessidades e a criação de novas instituições ou
organizações que são integradas na nova cultura. E a
mudança nos meios de comunicação e a criação de novas
organizações como a Internet, ao mesmo tempo em que
mudam as necessidades, podem alterar também a cultura.
Essas possíveis mudanças culturais podem ser quase
irrisórias, como as evidenciadas no modo de vestir, no
31 MALINONOWSKI, Bronislaw. Uma teoria científica da cultura.Tradução de José Auto. Rio de Janeiro: Zahar, 1975. p. 46.
128
modo de falar, nos hábitos de consumo, nos valores éticos e
morais e nas relações familiares.
ÚLTIMAS CONSIDERAÇÕES
Durante muitos séculos o transporte das mercadorias
do Nordeste brasileiro dependia do jegue. O jegue e o
nordestino formavam um elemento cultural que marcava a
região. A utilização do jegue deixou de ter utilidade com o
advento das motos e dos bugs. Hoje a paisagem e a cultura
estão mudando. Os jegues estão ou abandonados pelas
praias e estradas ou sendo mortos, para que não consumam
o parco alimento existente.
Hoje um E-mail substitui um telegrama, a carta e até
o telefone. Desta forma, a comunicação entre as pessoas
mudou. Não é mais necessário sair de casa para levar uma
carta ao correio ou passar um telegrama, muito menos sair
para conversar com alguém. São mudanças que parecem
pequenas mas que afetam a vida e a profissão de muitas
pessoas como a do telegrafista, cuja função deixou de ter
tanta importância.
129
Assim, são muitas as mudanças que vão afetando a
curto prazo o cotidiano das pessoas e a longo prazo afetam
a sua cultura. Segundo Pinker, é espantosa a forma como as
culturas podem mudar. (...) “longe se ser monólitos
autopreservativos, as culturas são porosas e fluídas”32. A
imitação de soluções que deram certo para problemas
comuns é uma constante nas várias culturas no decorrer do
tempo. O ferro dos hititas serviu para tornar os egípcios
vencedores de muitas batalhas. Da mesma forma a Internet,
que passou a ser utilizada por tantos povos e lugares,
mudando o cotidiano das pessoas. Pincker, ainda se
referindo ao aproveitamento de elementos entre as culturas,
diz que, Quando notam, a história nos mostra,
despudoradamente tomam de empréstimo o que quer
funcione melhor.
A troca de tecnologias entre as várias culturas
possibilita avanços culturais, enquanto os homens
solitários perdem as técnicas e podem até morrer de
inanição.
No ciberespaço as culturas deixam o seu isolamento
e podem conviver, visto que os espaço temporais podem ser
vencidos. Os homens mudam, utilizam as melhores
32 PINKER, Steven. Tábula rasa: a negação contemporânea da naturezahumana. São Paulo: Cia das Letras. 2004. p 101
130
soluções para os problemas específicos. E se os homens
mudam, a cultura também muda. Em síntese, ninguém vai
usar uma carreta se puder usar um caminhão.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
BAIRON, Sérgio; PETRY, Luis Carlos. Hipermídia,
psicanálise e história da cultura. São Paulo:
EDUCS/Mackenzie, 2000.
BOSI, Alfredo. Cultura brasileira: temas e situações. São
Paulo: Ática, 1987.
GEERTZ,Clifford. As interpretações culturais. Rio de
Janeiro: LTC, 1989.
GOMBRICH, E. H. Para uma história cultural. Tradução
de Maria Carvalho Lisboa: Gradiva, 1994.
HEGEL. G.W.F. Textos dialéticos. Tradução Djacir
Menezez. Rio de Janeiro: Zahar, 1969.
LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito
antropológico. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1997.
131
MALINONOWSKI, Bronislaw. Uma teoria científica da
cultura. Tradução de José Auto. Rio de Janeiro: Zahar,
1975.
MARCUSE, Herbert. A ideologia da sociedade industrial.
Rio de Janeiro: Zahar, 1982.
MARX, Karl; ENGELS, F. Crítica à ideologia alemã.
Lisboa: Martins Fontes, s/d.
MCLUHAN, Marshall. La galaxie Gutemberg. Montréal:
H.M.H./Paris: Mame, 1972.
MORIN, Edgar. Cultura de massas no século XX. Rio de
Janeiro: Forense Universitária, 1997.
PINKER, Steven. Tábula rasa: a negação contemporânea
da natureza humana. Tradução Laura T. Mota. São Paulo:
Companhia das Letras, 2004.
SANTAELLA, Lucia. Culturas e artes do pós-humano: da
cultura das mídias á cibernética. São Paulo: Paulus, 2003.
SWINGEWOOD, Alan. O mito de cultura de massa.
Tradução de José R. B. Azevedo. Rio de Janeiro:
Interciência, 1978.
132
Crítica antiga & crítica nova
Luís Borges♣♣♣♣
♣ Poeta, tradutor, licenciado em Filosofia (UCPEL), pós-graduado emLiteratura Contemporânea (UFPEL), mestrando em História daLiteratura (FURG), coordenador adjunto do GPS/UCPEL e membro doNEL/CEFET-RS. Crítico literário com artigos publicados na imprensa eem periódicos especializados. Coordenador adjunto do GPS/UCPEL.Publicou: Consolos e saudades, poesia, 1991; Mãos de seda, poesia,1992; O amor em cinco tempos, crônicas, 1995; O dia das horasminguantes, crônicas, 1996; História, resistência e projeto em SimõesLopes Neto, ensaio, 2001; Travessia do pampa, ensaio, 2003. Estes doisúltimos em parceria com o prof. Agemir Bavaresco.
133
Crítica quando é boa não caduca. No
máximo, sofre aprofundamentos que apontam para
horizontes apenas intuídos ou tangenciados. Mas o
principal, o que faz uma crítica literária consistente, e por
essa razão perene para a compreensão da obra, já deve estar
ali, ainda que em germe.
É o que acontece, por exemplo, com muitos
artigos de Machado de Assis, Otto Maria Carpeaux, Sérgio
Milliet ou Antônio Cândido, só para citar alguns dentre os
grandes. Muitos trabalhos destes críticos estão tão frescos
quanto no dia em que foram escritos. Não se depreenda daí,
contudo, que a crítica feita no calor da hora, às vezes,
cegada para elementos fundamentais pela ausência da
distância histórica, a qual dilui o elogio afoito ou a
incompreensão diante da novidade, seja destituída de valor
pelo seu caráter, por assim dizer, datado. Ao contrário, se
soubermos olhar com mais atenção poderemos perceber que
seu valor reside justamente em nos ofertar um recorte do
passado, ao invés da melhor critica, intemporal por
definição.
Uma crítica antiga nos dá um instantâneo da
recepção de uma obra no momento de seu aparecimento. Os
retratos não representam a eterna juventude, embora
134
algumas pessoas mantenham certos traços de beleza juvenil
ao longo de toda a vida – igual à melhor crítica.
Nessa medida, me apraz ler crítica antiga e
compará-la com a nova. É interessante notar o quanto um
grande livro ou um grande autor (nem sempre já afinado ou
percebido em suas primeiras obras) diz coisas diferentes a
diferentes leitores em épocas diferentes. Esta é a chamada
obra de fôlego, requisito básico, segundo Ítalo Moriconi,
para que venha integrar o cânone.
Um autor canônico pode ser definido como
aquele a quem os professores obrigam seus alunos a ler, e
estes o lêem porque vai cair no vestibular. Estar citado em
sofisticados manuais de história literária também é sinal de
ser canônico. Porém, quanto mais ralé for o manual em que
ele aparece, mais canônico é o autor.
No fundo, ser canonizado é o desejo,
consciente ou não,de todo autor. Pensa só: alguém ser
obrigado a nos ler é a glória. Ser lido por prazer é quase
uma veleidade.
Li, de Paulo Becker, As faces do feiticeiro
(1996), sobre Mário Quintana, e me dei conta do quanto
sou leitor de crítica antiga. O mais recente estudo crítico
que eu havia lido sobre o autor de Sapato florido (1947) era
135
de 1982. Fui vasculhando na memória quais os textos
anteriores a essa data que conhecia. O primeiro do qual me
lembrei foi A poesia impura, de Sérgio Milliet, incluso em
Panorama da moderna poesia brasileira. O ano é 1952.
Exatamente 12 anos após a estréia literária de Mário
Quintana.
Paralelamente, mais ou menos na mesma
época – da segunda metade dos anos 50 até o início da
década seguinte -, surge a obra coletiva organizada por
Afrânio Coutinho, A literatura no Brasil. Quintana é citado
nela, em estudo assinado por ninguém menos que Péricles
Eugênio da Silva Ramos.
Na mesma trilha, em 1965, Augusto Meyer
publica O fenômeno Quintana, estudo incluso em seu livro
de ensaios A forma secreta (1965). Tomando
aleatoriamente este exemplo, podemos encontrar nos anos
60 do século passado vários textos críticos sobre o poeta de
A rua dos cataventos (1940), levados a efeito por críticos
importantes, tais como Fausto Cunha e o já citado Meyer.
Sua consagração literária, todavia, só se daria mesmo a
partir de 1980. Eis aí a importância da crítica antiga: o que
terá acontecido na obra de Quintana, na recepção dos
136
leitores e críticos decorridos 40 anos desde sua estréia como
poeta?
Observamos ainda nos dias atuais o quão
raros são os trabalhos mais alentados ou que se proponham
a dar conta do conjunto da obra do Poeta. Reside aí a
importância maiúscula do livro de Becker, além do mérito
da segurança e lucidez de seus juízos críticos, alicerçados
em sólido conhecimento da obra do Anjo-Poeta. Becker se
ocupou de maneira profunda, sem precedentes na história
da fortuna crítica de Quintana, da primeira década de sua
atividade literária, isto é, do período compreendido entre A
rua dos cataventos e O aprendiz de feiticeiro.
Não caberia nos limites despretensiosos
deste artigo comentar em minúcias o livro de Paulo Becker.
O que me interessa é, sumariamente, mapear na recepção
feita no calor da hora aquilo que permanece válido, ainda
que equivocado, e aquilo que caducou.
Encontro no Jornal de crítica (1ª série, 1941),
de Álvaro Lins, um de nossos críticos mais cultos, o longo
artigo Poesia, 1940, dividido em quatro partes. Na primeira,
ele faz considerações gerais sobre a poesia, aproveitando
para comentar Rimbaud, Mallarmé, Valéry e Baudelaire.
137
Tudo isso para, nesse mesmo bloco, comentar a publicação
das Poesias , de Manuel Bandeira.
Na segunda parte, trata do lançamento de
Estrela solitária, de Augusto Frederico Schmidt, a quem o
crítico atribui uma importância idêntica a de Bandeira.
Ironia! Em 8-7-2003 apresentei no Encontro Sem Palavras,
evento promovido semanalmente pela Secretaria municipal
de cultura de Pelotas, leituras e comentários sobre a poesia
de Schmidt para uma platéia que rigorosamente o ignorava,
enquanto dentre os presentes, Bandeira gozava – não sem
merecimento, é claro – de total popularidade.
Na terceira parte, Lins refere-se rapidamente
a autores estreantes, uma vez que possui uma dezena de
livros de versos para devorar. Analisando o saldo da
Semana, 20 anos depois, declara que o Modernismo, após
Schmidt, Drummond, Murilo Mendes, Vinicius e Jorge de
Lima, um movimento esgotado em sua faceta
revolucionária. Deste modo, procura verificar as influências
desses autores nas novas gerações. Entre os novos por ele
analisados naquele artigo de 1940, um dos poucos que
vingou como escritor foi – honrando a tradição paterna – o
filho de Alphonsus de Guimaraens, com seu Lume de
estrelas (livro de sonetos). Será nesta mesma parte que, ao
138
comentar poetas estreantes, dedica-se a analisar A rua dos
cataventos, de Mário Quintana.
O crítico do Correio da Manhã foi um dos
mais importantes fixadores do valor do movimento
modernista. Ora, em 1940 escrever um soneto (lembremos
que A rua dos cataventos compõem-se de 35 sonetos) já é
um pecado mortal, cuja remissão só se dará com a geração
de Tasso da Silveira, João Cabral de Melo Neto, Péricles
Eugênio da Silva Ramos, entre outros tantos, naquele grupo
que será batizado estranhamente como de 45 pelo crítico e
poeta português, depois emigrado para a capital paulista,
Domingos Carvalho da Silva.
Essa volta à disciplina, à preocupação formal, ao
agudo senso de medida, intelectualismo estetizante, etc,
encontrou eco em periódicos espalhados por todo o
território nacional, do que os exemplos mais importantes
são Revista brasileira de poesia , de São Paulo, Orfeu, do
Rio de Janeiro, Joaquim, de Curitiba, Edifício, de Belo
Horizonte, José e Clã, de Fortaleza, Região, do Recife e
Quixote, de Porto Alegre.
O denominador comum, e aqui não cabe
aprofundar o assunto, dessa assim designada Geração de
45, mais pela época de estréia literária do que por traços de
139
uma escola estética, é o recuo ideológico ao lado de um
apuro do artesanato poético. Sob esse ponto de vista, os
livros de sonetos de Alphonsus de Guimaraens Filho e de
Mário Quintana representam não exatamente um atraso
relativamente às conquistas formais e temáticas da primeira
dentição modernista, o período da orgia literária iniciada
em 22 e que Álvaro Lins declarara esgotada já em 1930,
mas uma transição – para não dizer uma antecipação –
daquilo que seria a Geração de 45, inaugurada em 1944,
com Mundo submerso, de Bueno de Rivera.
A questão que mais me chamou a atenção no
artigo de Álvaro Lins foi o elogio a um poeta da melhor
espécie dentro dos processos da velha poética, conforme
afirmou o analista de Jornal de crítica, apesar de declarar
explicitamente sua predileção pelas formas da poesia
moderna. O crítico observa que o poeta não se permite a
mínima liberdade com esta forma secular de 14 versos, uma
vez que antes já dissera que Quintana se mostrara um
indiferente ao que se passou, entre nós, de 1922 para cá
(refere-se a 1940).
Álvaro Lins procura encontrar razões para o
suposto descompasso estético de Mário Quintana. Para
tanto, entende que sua poesia é simples, limitada, repetida,
140
como os próprios decassílabos dos seus sonetos. E
acrescenta: A poesia do sr. Mário Quintana é toda intimista
[...]. pois, neste poeta gaúcho, tudo é delicadeza, é
simplicidade, é humildade.
Percebo – não é Álvaro Lins quem faz a
aproximação – que a recepção de outros poetas mais
infensos à revolução modernista, do que é exemplo Raul de
Leoni, morto em 1926, portanto forjado sob a égide do
parnasianismo, é semelhante em alguns aspectos a que se
faz a Quintana, especialmente quanto a certos vícios
herdados do neo-simbolismo português ou do helenismo
bilaquiano. Vejamos o que nos diz Agripino Grieco em sua
Evolução da poesia brasileira (1932) a respeito do autor de
Luz mediterrânea (1922): Sua mão possuía a leveza quase
alada das mãos rendeiras que se dão às suas rendas como a
trabalhos de joalheria branca, fazendo filigranagem em
linho ou seda como outros em ouro ou prata.
Nesse sentido, quanto a Mário Quintana, o
maior defeito de A rua dos cataventos não é a forma
passadista, mas a sombra ostensiva, generalizada,
dominante e absorvente de Antônio Nobre.
Apesar de Quintana no soneto XI chamar o
Só de “nosso livro santo”, aproximando-se do poeta
141
português através do timbre coloquial, da idealização da
infância e do passado, do tom confessional e delicadamente
magoado dos versos, isso não corrobora a primeira
impressão de Álvaro Lins.
É Gilka Bittencourt, em 1983, em sua
dissertação de mestrado que mostrará com precisão o liame
e a distância entre os dois artistas. Quintana diferencia-se
naquilo que é essencial à poesia de Antônio Nobre, isto é, o
lacrimoso, o desiludido das coisas amorosas, o sentimento
derramado permeado por uma auto-piedade infantil, numa
permanente impotência diante da vida. Nada disso
encontramos em Mário Quintana, ainda que ele diga Eu sei
chorar... Eu sei sofrer... Só isto!. Em A rua dos cataventos,
a despeito da inegável influência de Antônio Nobre, não há
o ressaibo de ultra-sentimentalismo presente no Só.
Anteriormente a Gilka Bittencourt, Fausto
Cunha, em 1978, em seu Poesia e poética de Mário
Quintana, incluso no livro de ensaios A leitura aberta,
possui a forte convicção de que o poeta em seu livro de
estréia não é um ingênuo, nem um retardatário no campo
estético.
Álvaro Lins diz nada saber sobre as relações
de Quintana com o Modernismo, mas ao descrever seus
142
recursos como tão limitados, nada de grandes gestos,
grandes palavras, grandes sentimentos, tudo sussurrado,
identifica – guardadas as diferenças técnicas e temáticas de
Raul de Leoni – essa delicadeza da voz poética que tanto
impressionou Agripino.
O soneto, forma empregada por Quintana em
A rua dos cataventos, tinha para a crítica da época uma
forte vinculação com as estéticas passadistas, de sabor
tardo-simbolista ou parnasiana. Na atualidade, transcorridos
mais de 80 anos da Semana, percebemos não somente a
permanência, mas também a vitalidade e a renovação do
soneto, conforme mostrou tão bem Suzana Tust em seu
interessante ensaio Questionando o cânone: o soneto
enquanto releitura e ruptura (1999).
A crítica antiga entendia que todo livro de
sonetos era passadista e que todo sonetista era avesso ou
indiferente às conquistas do Modernismo. No caso de
Quintana não era assim, mas apesar disso os juízos de
muitos críticos sobre ele, consideram A rua dos cataventos
como um acontecimento pré-modernista na trajetória
literária do poeta.
Devemos descontar no julgamento de Álvaro
Lins, dois aspectos: o de incorrer, como confesso adepto do
143
Modernismo, nos preconceitos contra as formas fixas, em
especial o soneto, e o de, morando no Rio, pouco saber
sobre um poeta do RS. Talvez tenha sido através de outro
gaúcho, Augusto Meyer, já então imortal da ABL, residente
na Cidade Maravilhosa, que A rua dos cataventos tenha
chegado às mãos do crítico do Correio da Manhã.
Um dado insólito nos leva a uma insólita
conclusão. Meyer escreve o ensaio O fenômeno Quintana
(1965), no qual esclarece e retifica a opinião de Álvaro
Lins, que colocava Quintana como um atrasado
relativamente às novidades estéticas trazidas pelo
movimento modernista. Augusto Meyer revela o fato de
que Quintana ter estreado como sonetista não se deveu a
que ele não tivesse poemas compostos noutros moldes, pois
já teria inclusive prontos vários poemas em verso livre que
viriam a integrar O aprendiz de feiticeiro (1950).
Quintana não ignorava, como pareceu a Álvaro
Lins, as conquistas e os preceitos do Modernismo, uma vez
que o seu amigo Augusto Meyer, havia publicado em 1929,
os Poemas de Bilu, livro de acentuado sabor modernista.
Além disso, desde 1934, Quintana trabalhava na editora
Globo, traduzindo Proust, Vigínia Wollf e tantos outros
nomes importantes para a moderna literatura mundial.
144
A estréia de Quintana é muito mais uma
forma de independência que de atraso ou ignorância em
face das novas correntes estéticas. As explicações de Paulo
Becker em As faces do feiticeiro são muito pertinentes.
Quintana não só reconhecia as conquistas da revolução
modernista, sobretudo a invasão que o cotidiano faz no
terreno da arte, quebrando a distinção entre assuntos
poéticos e não-poéticos, coisa totalmente estranha à poética
de Raul de Leoni, sendo o único elo a os unir, a sutil
sensibilidade que o aproximava do Quintana de A rua dos
cataventos. Raul de Leoni era, de fato, no melhor sentido,
um atrasado, mas Quintana não.
Quem aproxima, muito forçadamente, Raul
de Leoni e Mário Quintana é o crítico cearense Herculano
Gastão nos ensaios de seu Últimos gritos (1991), por
confundir, conforme já dissemos, a delicadeza, o tom
sussurrado e o verso metrificado, em especial disposto em
soneto, como uma rejeição ou alheamento do Modernismo.
Mais próximo da verdade, se quisermos
estabelecer paralelos que permitam a compreensão para
transição que desembocará na Geração de 45, com a qual
Quintana não terá qualquer ligação programática, técnica
ou temática, é entre o autor de O aprendiz de feiticeiro e
145
Ribeiro Couto. Este último, na mesma linha de Álvaro
Moreyra, nitidamente influenciados pelo simbolismo, a que
nesse período a crítica costumava chamar de penumbrismo,
estréia em 1921, com O jardim das confidências, e se
firmará como significativa promessa, três anos mais tarde,
com Poemetos de ternura e de melancolia, bem recebido
por Agripino Grieco no Evolução da poesia brasileira
(1932). O mesmo Agripino dirá de Ribeiro Couto:
[...] Mas, penumbrista ou não, no seu livro [refere-
se a Poemetos] há versos para todos os paladares, embora
esse moço sensibilíssimo, que às vezes até as carícias
magoam, nada tenha de eloqüente e chegue a dizer-nos em
confidência:
Minha poesia é toda mansa,
Não gesticulo, não exalto...
Meu tormento sem esperança
Tem o pudor de falar alto. [...]
Neste poema de Ribeiro Couto há todo o clima de A
rua dos cataventos, muito mais do que na poesia de Raul de
Leoni. Mário Quintana percebe que o verso livre, técnica
146
que já conhecia e dominava, não era a expressão adequada
para a mensagem que pretendia anunciar. São claros os
indícios, que Álvaro Lins afastado do RS desconhecia, de
que Quintana já era dotado de procedimentos caros ao
Modernismo e outros que ele incorporaria à revolução
literária desencadeada pelo movimento, entre os quais a
poesia epigramática e o poema em prosa, cuja forma estava
ainda muito presa a uma retórica lírico-arcaizante nos
moldes de Guilherme de Almeida e Murilo Araújo.
Esses indícios de renovação artística não escaparam
ao olhar atento de um descobridor de talentos como
Monteiro Lobato, o qual, em 1939 ficou encantado ao ler
seus quartetos publicados na revista Ibirapuitan, de
Alegrete, cidade natal do poeta. Os quartetos que revelaram
o escritor gaúcho ao criador de Jeca Tatu só seriam editados
em livro em 1948, sob o título de Espelho mágico.
Todas essas constatações contradizem a crítica
antiga sobre A rua dos cataventos e a tradição interpretativa
que dela derivou, a qual a despeito das retificações de
Augusto Meyer já nos anos 60 do século passado, ainda
lança sua sombra de equívocos até os dias atuais, inclusive
sobre muitos segmentos do público especializado.
147
Além das análises, entre outras, de Meyer, Fausto
Cunha e Gilka Bittencourt, a posição de A rua dos
cataventos veio a ser esclarecida pelo próprio Mário
Quintana quando, em 1987, declarou numa entrevista
concedida a Edla van Steen que assim quis estrear apenas
para provar que os sonetos também são poemas.
ANÁLISE DISCURSIVA DEDEFICIÊNCIAS EM LÍNGUAPORTUGUESA DE PROFESSORES-ESTUDANTES:
(ESTUDO DE CASO EM ALUNOS DEPEDAGOGIA DA UNIVERSIDADE CATÓLICADE PELOTAS)
Ângela Treptow Sapper33
33 Da ASBL – professora, doutora da UCPEL e CEFET.
148
Este é o título de minha pesquisa que tem como
proposta de trabalho a análise discursiva processada em
textos produzidos por alunos do Curso de Pedagogia da
UCPel, os quais já se encontram na condição de professores
de séries iniciais do Ensino Fundamental. Tais professores-
estudantes apresentam deficiências de formação em Língua
Portuguesa, conforme constatação decorrente de
observações do Curso de Pedagogia da UCPel. A pesquisa
propõe-se a identificar tais deficiências e como elas podem
comprometer os processos enunciativos a partir de
instrumentos próprios da análise do discurso. Trata-se, em
última análise, de relacionar as deficiências da formação em
Língua Portuguesa dos sujeitos da pesquisa (os estudantes-
professores) com suas produções enunciativas, funcionando
aquelas como barreiras a estas, ou seja, constrições,
bloqueios e distorções ao ato individual de utilização da
língua. Os textos a serem analisados serão percebidos como
discursos, onde se procurará identificar as marcas
enunciativas das deficiências de formação.
Este trabalho encontra sua mais consistente
sustentação teórica a partir da análise do discurso. Essa é
uma área ampla e, embora inicialmente se possa entendê-la,
de maneira genérica, como a própria análise do uso da
149
língua, a presente proposta de trabalho está comprometida
em trazer a questão para o estudo real da linguagem, por
sujeitos reais e em situações reais, de modo que o problema
de pesquisa – conquanto sempre possa partir de uma
construção teórico-acadêmica - não padece de algumas
artificialidades que, muitas vezes, a investigação não
consegue evitar. A idéia de análise discursiva aplicada à
pesquisa ainda pode ser afinada se a considerarmos –
mesmo que partindo de análises lingüísticas de textos em si
mesmos – como compreensão de seu contexto, o que supõe
articular sua enunciação com um determinado lugar (social
ou de fala), sejam os sujeitos, no caso, estudantes ou
docentes.
Uma análise discursiva pode apontar para várias
direções, dependendo do que se queira mostrar, da corrente
teórica a que estamos mais afiliados e até mesmo dos
produtos a serem analisados. A esta altura, é importante ter
presente dois outros conceitos próximos, representados pela
tipologia dos discursos e os gêneros discursivos. No
primeiro caso, trata-se de idéia ligada à classificação dos
discursos, o que não é o caso da proposta deste trabalho. No
segundo caso, o interesse é maior em ter presente a questão
dos gêneros discursivos enquanto elementos sócio-
150
históricos que circulam na sociedade e que supõem uma
elasticidade maior em sua concepção. Assim, para os
efeitos desta pesquisa, vai-se considerar a produção
acadêmica dos alunos de Pedagogia enquanto tais como o
gênero discursivo a ser analisado, constituído por suas
redações, provas e trabalhos graficamente representados
(escritos), bem como pelos materiais que produzem
enquanto professores (planos, textos, esquemas, provas e
outros documentos).
Os materiais a serem analisados
correspondem a resultados textuais de práticas pedagógicas
que não podem prescindir da construção de enunciados que
vão sendo socializados por docentes e discentes; tais
enunciados, que portam os discursos do ensinar/aprender
são precedidos por enunciações que, no melhor dizer de
Emily Benveniste, é o mecanismo de colocação em
funcionamento da língua, a partir de um ato individual de
utilização (Benveniste, 1974:80). Corresponde a entendê-la
como instância produtora, lugar desencadeador do processo
de manufaturamento da significação, isto é, do próprio
processo discursivo. Constitui a enunciação o pivô da
relação entre língua e mundo, na medida em que permite
representar fatos, mas ela mesma constitui um fato,
151
enquanto acontecimento único, plasmado no tempo e no
espaço (Maingueneau,1996:42-3).
O ponto de partida de qualquer análise de
discursos que não pretenda ser hermética deve partir de
produtos culturais empíricos, produzidos por eventos de
linguagem, que se pode conceber genericamente como
“textos” (mesmos para os que não têm a forma escrita). É
necessário, como assinala Milton Pinto, que o analista
empreste especial atenção à “textura” dos textos, quer
quanto ao uso da linguagem verbal, quer quanto ao uso de
outras semióticas (Pinto, 1999:22-3). Assim, a análise
discursiva aqui proposta se interessa não só pelo que os
textos dizem ou mostram (embora não se reduza à mera
interpretação semântica), mas sim em como e por que o diz
ou mostra, o que supõe uma espécie de prévia “gramática”
discursiva e é em tal perspectiva que devem ser valorizadas
as deficiência de formação em Língua Portuguesa como
condicionantes do uso da linguagem.
Sobre a valorização de uma “gramática do
discurso”, vale a pena ter presente o que tem sido
assinalado por José Luiz Fiorin:
“Atualmente, os estudiosos da
linguagem estão começando a desenvolver uma série de
152
teorias do discurso, em que se mostra que existe uma
gramática que preside à construção do texto. Assim como
ensinamos aos alunos, por exemplo, a coordenação e a
subordinação como processos de estruturação do período, é
preciso ensinar-lhes a gramática do discurso, para que eles
possam, com mais eficácia, interpretar e redigir textos”
(Fiorin, 2001:9).
Tal “gramática” não se encontra pronta. Ao
contrário, ela se constrói sempre, porém em condições
bastante diversas, de situação para situação. Assim, neste
projeto se busca perceber seus mecanismos de conformação
em face das deficiências de formação em Língua
Portuguesa dos alunos-professores, o que os coloca em
posição estratégica em tal relação, não apenas do ponto de
vista profissional e de formação, mas como agentes de
práticas culturais onde se dá a construção de tal
“gramática”.
Alex Grijelmo, em sua obra “Sedução das
palavras”, lembra que é o conhecimento de um idioma que
permite, mesmo com letras e regras limitadas, que se possa
construir uma infinitude de idéias e uma eternidade de
frases (Grijelmo, 2000:17). Ora, quanto maior e melhor o
nível de formação na língua que se está utilizando, maiores
153
e melhores são as possibilidades de construção enunciativa,
ou seja, o sujeito não pode articular palavras se desconhece
os dois níveis essenciais aí imbricados: o sentido e o uso
das palavras e as regras de articulação pré-construídas e
consagradas.
Observe-se, por fim, que esta pesquisa,
subsidiariamente, levará em conta algumas reflexões
propostas por Paulo Freire em sua “pedagogia da
autonomia”, que supõe uma indissociabilidade das práticas
do aprender e do ensinar (Freire, 1997), com evidentes
repercussões e influências de uma sobre a outra, de modo
que os discursos dos sujeitos da pesquisa, ainda que
situados em lugares diferentes e alternados e produzidos em
contextos diferentes (ora como alunos, ora como
professores), guardam evidente relação entre si.
A pesquisa teve início em março de 2004, tendo
sido prevista para dois anos. O trabalho, em seu andamento,
desenvolve-se dentro do cronograma proposto. Os objetivos
específicos da pesquisa (identificar os mecanismos
lingüísticos de transposição de deficiências de formas em
Língua Portuguesa para os discursos; perceber a enunciação
e a constituição discursiva como dependentes de
determinados níveis de conhecimento da língua utilizada;
154
identificar as principais deficiências em Língua Portuguesa
apresentadas pelo público / alvo; categorizar / hierarquizar
tais deficiências de formação sob o ponto de vista das
repercussões que podem acarretar na enunciação /
discursividade; utilizar os resultados da pesquisa como
forma de orientar futuras ações de áreas afins (Pedagogia,
Letras), visando a suprir as deficiências identificadas) só
começarão a ser atingidos nas etapas seguintes da presente
pesquisa. Os contatos iniciais com os sujeitos objetos da
pesquisa confirmam a hipótese ajustada para este estudo e
permitem perceber que se trata de um trabalho útil e atual
para a área de educação da UCPel, em especial para os
cursos de Pedagogia e Letras.
Houve um primeiro contato da pesquisadora com as
referidos alunos, através de reunião explicativa dos
objetivos, metodologia, envolvimento e participação no
projeto. Foram marcadas datas individuais para o
preenchimento de uma ficha de Dados Pessoais e a
assinatura do Consentimento Informado, o qual estabeleceu
o compromisso referente à confidencialidade e privacidade
dos dados levantados, sendo garantida a impessoalidade dos
mesmos para todos os procedimentos referentes ao
trabalho. Esse documento revisado e aprovado pelo Comitê
155
de Ética foi assinado em duas vias, uma ficando com o
pesquisado e outra com a coordenadora do projeto.
A seguir, em novo encontro, foi entregue um
questionário com vinte e uma perguntas, a fim de que se
tornasse possível tomar conhecimento sobre a vida
estudantil pregressa de cada participante, suas preferências,
frustrações e deficiências.
Foram obtidos, posteriormente, produtos textuais
dos pesquisados, como provas acadêmicas, dissertações.
Após, foram realizados encontros consecutivos e,
neles, gravadas entrevistas com cada participante, a fim de
colher dados para a análise da linguagem oral e
identificação de deficiências.
Concomitantemente, foram observadas atividades
docentes e discentes dos participantes.
Como se trata de projeto iniciado em 2004
e em face da inclusão prevista de novos alunos
em 2005, não há a materialização de resultados;
entretanto, os vários encontros realizados com os
pesquisados, a aplicação do material preparado,
as entrevistas e a constante observação
evidenciam desde logo a relevância e a
oportunidade do estudo.
156
Numa conclusão preliminar, podemos detectar as
seguintes deficiências de formação em Língua Portuguesa
nos alunos investigados:
1- uso incorreto de flexões verbais referentes à
segunda pessoa do singular, especialmente no Presente do
Indicativo e Pretérito Perfeito do Indicativo;
2- uso inadequado dos verbos Haver, Fazer e
Ser, quando impessoais;
3- erros de regência verbal e nominal;
4- inadequações de concordância nominal;
5- problemas na grafia de palavras, tais como:
a- j / g em geito, ageitar, ageitasses, lisongeiro,
regeitasses;
b- s /z em quizera, quizeram, puz, puzeram,
propuz, propuzeram;
c- x / ch em enchergar, encherguei, enchugar,
enchuto;
d- s / x em expontâneo, extático;
e- s / c em ancioso, pretencioso;
f- ss / c em socego, socegar;
g- ss / ç em exceço, escaço;
h- s / ç em descança, descanço;
i- sc / c em acensorista; acensor;
157
j- xc / c em eceção, eceto;
k- ç / s em excesão;
l- am / ão na terceira pessoa do plural de verbos,
como em passão, estudão, venção, comprão;
6- quanto à vírgula, foram observadas os
seguintes situações:
a- o sujeito da oração aparece, às vezes, separado
por vírgula;
b- o adjunto adverbial de alguma extensão, quando
anteposto, não recebe vírgula; quando intercalado, apenas a
recebe depois;
c- a expressão deslocada só recebe vírgula, quando
posposta;
d- o vocativo recebe vírgula, quando no início ou
no fim da oração; intercalado, às vezes, recebe apenas uma
vírgula;
e- o aposto recebe vírgula, quando no início ou no
fim da oração; intercalado, às vezes, recebe apenas uma
vírgula;
f- as orações comparativas podem aparecer
separadas por vírgula ou não;
g- ocorre, às vezes, vírgula após a conjunção mas;
as orações coordenadas assindéticas, de um modo geral,
158
não vêm separadas por vírgula ou qualquer sinal de
pontuação;
7- problemas com a crase;
8- falta de acento agudo em diversas palavras e
especialmente nas conjugações verbais;
9- colocação inadequada dos pronomes átonos.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
BENVENISTE, E. Problemas de Lingüística General II.
Buenos Aires: Siglo XXI, 1974.
FIORIN, J.L. Elementos de análise do discurso. São Paulo:
Contexto, 2001.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1997.
GRIJELMO, Alex. La sedución de las palavras. Madri:
Santillana, 2002.
159
MAINGUENEAU, D. Términos claves del análises de
discurso. Buenos Aires: Nueva Visión, 1999.
PINTO, Milton José. Comunicação e discurso. São Paulo:
Hacker Editores, 1999.
Palavras-chave: análise do discurso,
deficiências
PETRÓLEO E URÂNIO
José Anélio Saraiva
Quando a Petrobrás anuncia pesados investimentos
na prospecção de petróleo na Bacia de Pelotas abrangendo
o litoral sul do RS e fronteira com o Uruguai, é interessante
transcrever as conclusões a que chegou José Anélio
160
Saraiva, titular da cadeira n. 8 de nossa Academia Sul-
Brasileira de Letras, que, há mais de meio século vem
anunciando a riqueza petrolífera desta bacia e sua
viabilidade de prospecção, com o descrédito de muitos, e
com a persistência de quem sabe ver bem além dos
horizontes cotidianos. Poeta, escritor, autodidata em
questões de geologia ele diz da bacia sedimentar de Pelotas
(jjz):
“A Bacia Sedimentar de Pelotas abrange – mais ou
menos – uma extensão de 45 mil quilômetros quadrados em
Terra e 200 mil quilômetros quadrados no mar. O perímetro
mais importante situa-se dentro do mar, num afastamento
de 80 a 100 quilômetros da costa, entre as cidades de Rio
Grande e Chuí.
Minhas conclusões apontam a presença de jazidas
de Petróleo regionais pelo simples fato de a Bacia de
Pelotas se enquadrar em todas as exigências e pressupostos
clássicos da pesquisa científica:
1- Possui camadas sedimentares formadas pela
lenta acumulação de depósitos capazes de conter o óleo;
2- A idade das camadas é idêntica à idade já
apurada nas camadas em produção efetiva;
161
3- Os sedimentos revelam teor de matéria orgânica
suficiente para formar jazidas;
4- Existem camadas bastante porosas para permitir
a acumulação petrolífera nos poros;
5- Estas camadas porosas alternam-se com
camadas impermeáveis, de tal sorte que o petróleo não
possa espalhar-se e ser absorvido pela Terra;
6- Não são observáveis condições suscetíveis de
produzir a destruição das eventuais jazidas;
7- Consideradas globalmente as camadas
favorecem apreciáveis acumulações;
8- As águas subterrâneas, pela natureza de seu
efeito, não poderão impedir a acumulação de petróleo nos
interstícios porosos.
Como se pode ver, trata-se de uma Bacia de
significativa importância nos planos da Petrobrás.”
Depois de muita carta, muito contato incluindo os
presidentes do Brasil desde Getúlio Vargas e Juscelino
Kubitschek de quem guarda correspondência amistosa e
estimuladora, depois de muita descrença de lideranças e de
cientistas conterrâneos, mas com o apoio dos mais lúcidos,
José Anélio vê, agora, o sonho do petróleo da Bacia de
Pelotas virar realidade. Realidade que não é apenas
162
econômica, mas também estímulo à identidade regional e
esperança para muitos.
Como nunca a palavra em José Anélio é um arado
atrelado a uma estrela cavando a profundidade do solo para
que surja o pão, a pátria e a paz.
E sobre o URÂNIO, ele diz:
“O Urânio foi encontrado em 1780, época em que se
falava da descoberta do planeta que lhe empresta o nome.
Mas só foi isolado em 1842. Encontra-se em vários
minerais: a Pechblenda, a Uranimita, a Chalcolita, a
Cornita, o Uranofânio e outros. Como velho estudioso e
tendo estagiado com velhos e abalizados mestres em
mineralogia, muito aprendi para dedicar-me a uma série de
estudos em benefício de minha querida e respeitável Pátria
– tão mal interpretada por muitos de nós e tão cobiçada pelo
estrangeiro.
Conheço vários métodos práticos capazes de tirar
dúvidas mineralógicas. Não é possível revelá-los
publicamente, mas tudo o que tenho proclamado, modéstia
à parte, pelo menos até o momento, ninguém conseguiu e
nem conseguirá desfazer.
163
Mesmo assim, tenho notícias de críticas amargas
contra mim. Em mineralogia sou prático e objetivo. Um dia
os homens e a história far-me-ão justiça.
Há Urânio nos seguintes municípios do Rio Grande
do Sul: Bagé, Lavras do Sul, Caçapava do Sul,
Encruzilhada do Sul, Canguçu e Pinheiro Machado pelo
menos.
Desde 1957 venho defendendo a possibilidade de se
encontrar Urânio no município de Canguçu.” Desde esta
data o jornal de Pelotas D. Popular, realizou reportagens e
entrevistas com José Anélio sobre isto.
Cada vez mais, este grande lutador, faz da pesquisa
uma palavra e faz da palavra um arado e uma espada (JJZ).
164
AS PRIMEIRAS SOCIEDADESLITERÁRIAS DE PELOTAS
Ângelo Pires Moreira
A idéia de fundação de uma biblioteca pública, em
Pelotas, trazia em seu bojo a criação de uma sociedade
literária. (1)
A instalação da Biblioteca Pública Pelotense, em 5
de março de 1876 (2), fundada em 14 de novembro de 1875,
(3), pelos “obreiros do progresso”, na retrospectiva do
“Correio Mercantil”, de 6 de janeiro de 1877, foi
165
considerada um dos grandes acontecimentos ocorridos no
ano pretérito, comparada com a transposição da barra do
São Gonçalo, em 11 de fevereiro, pelo primeiro navio
estrangeiro de longo curso, o palhabote americano Tampico.
Na reunião de diretoria da Biblioteca Pública, de 19
de março de 1876, por iniciativa de Napoleão de Arruda, foi
proposta e aprovada a criação de uma sociedade literária, e,
concomitantemente, foi nomeada uma comissão composta
pelos doutores J. J. Afonso Alves, Epaminondas P. de
Almeida e Joaquim Augusto de Assumpção, para elaborar o
estatuto. (4)
Na sessão seguinte do hoje centenário sodalício,que
ocorreu no dia 26, a comissão nomeada apresentou o
estatuto da nascente sociedade que recebeu o nome de
Culto às Letras, o qual, depois de discutido, foi aprovado.
Foi marcado o próximo dia 2 de abril para a eleição da
primeira diretoria. (5)
No dia aprazado, em sessão presidida por Joaquim
Afonso Alves e secretariada por João Cândido Ribeiro,
disputada e tumultuada, foi realizada a eleição e, ao que
tudo indica, cindiu o mundo intelectual pelotense.
Os eleitos foram os seguintes: presidente Saturnino
Epaminondas de Arruda; vice-presidente Joaquim J. Afonso
166
Alves; 1° secretário Artur Lara Ulrich; 2° secrertário
Anacleto da Costa Barcelos; orador F. de P. Azevedo
Souza; orador adjunto Francisco de P. Ibirapuitan Ourique.
Comissões: história Saturnino Epaminondas de Arruda e
Francisco Lobo da Costa; filosofia Bernardo Taveira Júnior
e Siqueira Canabarro; versão de idiomas Carlos André
Laquintinie e Lara Ulrich; literatura Alberto Cunha e
Francisco Lobo da Costa; redação Bernardo Taveira Júnior
e Epaminondas Piratinino de Almeida. (6).
Pouco ou nada se sabe das atividades da primeira
sociedade literária pelotense e, ao que parece, teve vida
efêmera.
Decorridos poucos meses (no dia 21 de novembro),
na sala de sessões da Biblioteca Pública Pelotense, “alguns
sócios” deste sodalício, sob a presidência do capitão
Antônio José Rodrigues de Araújo, reuniram-se para fundar
uma sociedade literária que recebeu o nome de Íris
Brasílico.
Na mesma ocasião foi discutido e aprovado o
estatuto elaborado por Francisco de Paula Ibirapuitan
Ourique. Foi marcado para o próximo dia 26 a eleição da
primeira diretoria. (7). No dia, no mesmo local, realizou-se
o ato previsto. Os eleitos foram: presidente Serafim José
167
Rodrigues de Araújo; vice-presidente Augusto Joaquim de
Siqueira Canabarro; 1º secretário João Cândido Ribeiro; 2º
secretário Fernando Antônio Pimentel; 1º orador Joaquim
Napoleão Epaminondas de Arruda; 2º orador Joaquim
Inácio Arnizaut Furtado; membros de comissões: Antônio
Joaquim Dias, capitão Antônio José Rodrigues de Araújo,
Francisco de Paula Ibirapuitan Ourique, João da Silva
Silveira e Mariano Joaquim de Sequeira.
Proclamado o escrutínio, foi designado o dia 17 de
dezembro para se proceder a posse. Ela foi realizada à noite
daquela data. As solenidades e os festejos foram
inexcedíveis.
Na época, a cidade era iluminada a querosene. Só as
noites dos grandes eventos eram iluminados a gás carbônico
e a posse da diretoria da Íris mereceu essa distinção.
Para que se tenha uma visão perfeita do que foram
os festejos da posse, arrematados com um baile, recomenda-
se a leitura do “Correio Mercantil” de 19 de dezembro.
Nessa época, a Biblioteca Pública Pelotense
funcionava em sobrado, de propriedade de Visconde da
Graça, gentilmente cedido, situado à rua General Neto,
esquina Anchieta.
168
Íris era a deusa do arco-íris e mensageira dos deuses,
também sinal de paz e de alegria, promessa de felicidade.
Íris Brasílico não seria um convite à paz e à
concórdia entre o mundo cultural pelotense?
No dia 4 de fevereiro de 1877 apareceu o “Progresso
Literário”, hebdomadário dominical literário e recreativo
sob a direção de Teodoro Garcia e de João José César,
franqueado ao mundo cultural pelotense.
Estávamos sob a influência negativa da cultura
francesa e o “Progresso Literário” manifestava-se assim:
”Contra os imitadores de estranhas literaturas é nacionalizar
o quanto possível as produções de atividade intelectual. Não
há literatura própria, sem cunho verdadeiramente nacional”.
(9).
Não tardou para que o hebdomadário a 25 do mesmo
mês, aceitasse o encargo de ser o porta-voz da Íris Brasílico,
passando a publicar as atas da literária, tornando-se o
veículo, por excelência, dos beletristas locais bem como os
das zonas onde Pelotas exercia a sua influência cultural,
para darem vazão aos seus talentos. (10)
FONTES
(1) “Correio Mercantil”, 13 novembro de 1875(2) “Correio Mercantil” 7 de março de 1876
169
(3) “Fernando Osório” a Cidade de Pelotas, 1ªedição, pg 181.
(4) “Jornal do Comércio”, 21 de março de 1876(5) “Diário de Pelotas”, 28 de março de 1876(6) “Diário de Pelotas”, 4 de abril de 1876(7) “Correio Mercantil”, 23 novembro de 1876(8) “Correio Mercantil”, 28 novembro de 1876(9) “Progresso Literário”, 4 de fevereiro de 1877(10) “Progresso Literário”, 25 fevereiro de 1877.
RECENSÕES
AGORA DEUS VAI TE PEGAR LÁ FORA – Carlos Moraes.Record, Rio de Janeiro, 2004. Deliciosa memória, ou“anotações de um padre preso numa cidade semzoológico”, é, na verdade um conjunto de crônicas da épocaem que Carlos Moraes, sacerdote em Bagé RS, foi presopor subversão e lá ficou até que, por falta de prova, ojudiciário o soltou. Desde o interior da cadeia, naconvivência com os outros presos que Moraes descreve coma fina compreensão de quem exerce apaixonadamente afunção pastoral de cuidar de cada pessoa, ele reflete nummisto de fino humor e profundidade humana e teológica, otragicômico da época da ditadura militar. Faz bem a cadaleitor, vê-lo envolto com o drama de cada preso, de cadavisitante e desmascarando o cinismo dos donos do sensocomum. Obra bem feita, não apenas no estilo leve, simplese profundo, como também memória de tempos de seriedadecom as coisas do homem e de Deus. Faz bem à alma e ao
170
coração ver esse ex-colega de estudos guardar a memória deraízes que contêm a esperança. (JJZ).
ADEMIA SUL-BRASILEIRA DE LETRAS
ESTATUTO SOCIAL
Título IDa Denominação, Sede, Símbolos e Abrangência
Art.1º - A ACADEMIA SUL-BRASILEIRA DE LETRASa qual utilizará a sigla ASBL e, doravante neste EstatutoSocial simplesmente como ASBL, com objetivos culturais eeducacionais é uma associação civil sem fins econômicos,com duração por prazo indeterminado, rege-se por esteEstatuto Social e pelas disposições legais atinentes, estandosediada na Rua 3 de Maio, número 1060, conjunto 403,Pelotas – RS, com foro neste município.
Art. 2º - São símbolos da ASBL:a) O Brasão;
171
b) A Bandeira;c) A Flâmula; d) A Pelerine;e) O Sinete.
Parágrafo único – Os símbolos da ASBL são descritos deforma minuciosa no Regimento Interno.
Art. 3º - A ASBL, para fins de congregação de sóciosacadêmicos, abrange os Estados do Rio Grande do Sul,Santa Catarina e Paran᧠1º – Em cada um dos Estados nominados haverá umaseção da ASBL administrada por um vice-presidente.§ 2º - A Seção 1 será a do Rio Grande do Sul, a Seção 2será a de Santa Catarina, a Seção 3 será a do Paraná.
TÍTULO IIDos Objetivos
Art. 4º - São objetivos da ASBL:a) Congregar literatos e intelectuais de sua área de
abrangência;b) Incentivar a investigação, o desenvolvimento das
atividades culturais, a criação, elaboração e a divulgação deobras literárias na região;
c) Instituir concursos, prêmios e outros incentivos;d) Manter intercâmbio e colaborar com as entidades
congêneres em âmbito local, regional, nacional einternacional;
e) Associar-se e colaborar com instituiçõeseducacionais públicas ou privadas no incentivo ao ensino eaprendizagem da língua pátria.
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TÍTULO IIIDo Patrimônio
Art. 5º - O Patrimônio da entidade é constituído de:a)direitos de qualquer natureza suscetíveis de serem
apreciados economicamente;b) bens imóveis e móveis;c) biblioteca, fototeca, pinacoteca, hemeroteca e
demais recursos audiovisuais;d) montante oriundo da contribuição do quadro
social;e) doações e quaisquer rendas eventuais.
Parágrafo único – A biblioteca, cuja organização efuncionamento serão regulados por Regimento Interno,reúne em seu acervo livros, jornais, revistas, fotografias,arquivos e museu adquiridos com recursos próprios ourecebidos em doação; para constituição de seu acervo, sãopriorizadas as obras dos acadêmicos, dos autores da área deabrangência da ASBL.
TÍTULO IVDa Organização Deliberativa e Administrativa
Art. 6º - A organização deliberativa e administrativa daASBL compreende:
a) a Assembléia Geral;b) a Diretoria;c) o Conselho Fiscal.d) as Seções Estaduais
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CAPÍTULO I Dos Sócios
Art. 7º - A ASBL congrega as seguintes categorias desócios:
a) Fundadoresb) Acadêmicos;c) Beneméritos;d) Honorários;e) Correspondentes.
§ 1º - São sócios Fundadores aqueles que assinaram a Atade Fundação da Academia Sul-Brasileira de Letras, em 09de maio de 1970.
§ 2º - São sócios Acadêmicos os literatos dos três Estadossulinos que, tendo, pelo menos, um livro publicado emqualquer gênero literário e que, apresentados por membrodo sodalício, tenham o seu ingresso aprovado pelaAssembléia Geral.
§ 3º - São sócios Beneméritos as pessoas físicas oujurídicas que prestarem relevantes serviços à Academia,independentemente de naturalidade ou nacionalidade, ajuízo da Assembléia Geral.
§ 4º - São sócios Honorários as pessoas físicas ou jurídicasque se destacarem na difusão da cultura,independentemente de naturalidade ou nacionalidade ajuízo da Assembléia Geral.
§ 5º - São sócios Correspondentes as pessoas físicas oujurídicas, com residência ou sede fora do município de
174
Pelotas e que, constantemente trocarem informações deinteresse da ASBL e/ou da cultura, e tiverem o nomeaprovado pela Diretoria.
§ 6º - A proposição à Diretoria de nomes para sócioBenemérito, Honorário e Correspondente é atribuição dosSócios Acadêmicos, acompanhando a indicação curriculumvitae e circunstanciada exposição de motivos.
Art. 8º - O quadro de Sócios Acadêmicos se compõe de até60 (sessenta) membros, cujas cadeiras têm um patronoespecífico; o de sócios Beneméritos, Honorários eCorrespondentes não tem limite prefixado.
Parágrafo único – A Direção da Academia cuidaráde uma adequada distribuição de vagas que contemple arepresentatividade dos três Estados.
CAPÍTULO II Dos Direitos e Deveres dos Sócios
Art. 9º – São direitos dos sócios de todas as categorias:a) Participar das atividades da Academia, utilizar o
seu patrimônio, freqüentar os espaços da sede, referir emsuas obras e publicações sua pertinência à entidade;
b) Sugerir, propor, discutir políticas e medidas quevisem ao engrandecimento do ASBL;
Art. 10 – São direitos dos sócios Acadêmicos:a)Ocupar cadeira numerada do Quadro Acadêmico;b) Usar o sinete acadêmico;c) Mencionar em suas obras o título de membro da
ASBL, referindo o número da cadeira que ocupa e o nomedo patrono, se assim desejar;
175
d) Votar e ser votado para os cargos eletivos daASBL, conforme as normas da entidade;
e) Ocupar cargos e desempenhar atividades nosDepartamentos, a convite do Presidente;
f) Representar a ASBL, quando autorizado paraisso, por procuração do presidente;
g) Vitaliciedade;h) Renunciar à vitaliciedade.
Parágrafo único – O sócio que perder a cadeira na entidadeconforme o disposto no parágrafo 3º do Art. 12, nãopoderá, a partir de então, referir sua pertinência à ASBL.
Art. 11 – São deveres dos sócios de todas as categorias:a) Cumprir e fazer cumprir o Estatuto Social, o
Regimento Interno, as normas e deliberações da ASBL;b) Contribuir para o bom nome da entidade;c) Incentivar a cooperação com as entidades
congêneres e outras instituições culturais;d) Zelar pela imagem e moralidade pública da ASBL.
Art. 12 – São deveres dos sócios Acadêmicos, além dosespecificados no artigo anterior:
a) Participar de reuniões, assembléias, solenidades eeventos promovidos pela ASBL.
b) Pagar mensalmente, ou em outras modalidadesoferecidas pela Diretoria, as contribuições financeirasestipuladas;
§ 1º - É condição para participar das Assembléias Gerais,ordinárias ou extraordinárias, com direito a voto, estar quitecom a tesouraria.
§ 2º - O sócio que não cumprir seus deveres será submetido
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a julgamento por uma comissão, designada pela Diretoria, ecom atribuições estabelecidas pelo Regimento Interno,garantidos ao acusado direito de ampla defesa e decontraditório.
§ 3º São previstas as seguintes penalidades: a) Advertência – Será aplicada ao sócio que infringiros deveres previstos nas letras a), b, e c do Art. 11, e asletras a) e b) do Art. 12. b) Suspensão - Será aplicada ao sócio quedescumprir o previsto na letra d) do Art. 11 ou reincidir nainfringência dos deveres para o que se prevê pena deadvertência.
c) Perda da cadeira – Será aplicada a penalidade deperda da cadeira ao sócio que, advertido e suspenso,reincidir em suas faltas, bem como ao sócio condenadojudicialmente por atos considerados desabonatórios eindignos de participação na Academia, assegurada apostulação de nova cadeira no quadro.
§ 4º - As penas de advertência e suspensão são de alçada daDiretoria; a aplicação da pena de perda da cadeira propostaao final do processo pela comissão julgadora, é decompetência da Assembléia Geral, sendo que de qualquerpenalidade será notificado o infrator através de documentoescrito expedido pela Diretoria.
CAPÍTULO IIIDa Assembléia Geral.
Art. 13 – A Assembléia Geral, órgão soberano da entidade,é constituída pelos sócios acadêmicos em pleno gozo deseus direitos estatutários.
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Art. 14 – A convocação para as Assembléias Gerais, com aespecificação da ordem do dia, será feita pelo Presidente,com antecedência mínima de 15 (quinze) dias, medianteedital afixado no local da sede e/ou em órgão dedivulgação, bem como através de correspondência pessoalenviada a cada acadêmico, comprovando-se a data deremessa pelo carimbo de postagem.
Art. 15 – A Assembléia Geral Ordinária, bem como aExtraordinária, serão abertas pelo Presidente ou por seusubstituto legal que, se assim o decidir a Assembléia,passará a direção dos trabalhos ao sócio que for escolhidopor maioria, convidando auxiliares para o desempenho dastarefas inerentes à reunião.
Art. 16 – As Assembléias Gerais funcionarão, em primeiraconvocação, na hora marcada, com a presença mínima de20% dos acadêmicos com direito a voto e, em segundaconvocação, trinta minutos após a hora marcada, com apresença mínima de 10% dos sócios habilitados.
Art. 17 – Para deliberar sobre a destituição do Presidente oua alteração dos Estatutos Sociais da ASBL, a Assembléiaespecialmente convocada para este fim, não poderádeliberar, em primeira convocação, sem a maioria absolutados associados aptos a votar, ou com menos de um terçonas convocações seguintes, exigindo-se o voto concorde de,no mínimo 2/3 dos presentes.
Art. 18 – Nas Assembléias de caráter eletivo será facultadoo voto por correspondência aos acadêmicos residentes forada sede, sendo o assunto regulado pelo Regimento Interno,vedada a modalidade de voto por procuração.
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Art. 19 – São atribuições da Assembléia Geral: a) Eleger a Diretoria da ASBL e os integrantes do
Conselho Fiscal;b) Aprovar o estatuto social e o regimento interno,
assim como suas modificações;c) Apreciar, aprovando ou rejeitando o relatório
financeiro da Diretoria acompanhado de parecer doConselho Fiscal;
d) Apreciar, homologando ou rejeitando aspropostas de ingresso de novos sócios acadêmicos, bemcomo o de sócios beneméritos e honorários, medianteexposição de motivos exarada pela Diretoria;
e) Decidir pela aplicação ou não da penalidade deperda da cadeira ao sócio julgado conforme o parágrafo 3ºdo Art. 12.
f) Destituir o Presidente com a concordância e oquorum previstos no art. 17.
g) Decidir pela extinção da ASBL conforme odisposto no Art. 35.
CAPÍTULO IV Da Diretoria
Art. 20 – A Diretoria da ASBL compreende os seguintescargos e funções:
a) Presidente;b) 1º Vice-presidente (RS);c) 2º Vice-presidente (SC);d) 3º Vice-presidente (PR);e) Secretário Geral;f) 1º Secretário (RS);
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g) 2º Secretário (SC);h) 3º Secretário (PR)i) Tesoureiro Geral;j) 1º Tesoureiro (RS);k) 2º Tesoureiro (SC);l) 3º Tesoureiro (PR).
§ 1º – A Diretoria contará ainda, para auxiliá-la, com oDepartamento de Imprensa e Relações Públicas, bem comocom os cargos de Diretor do Patrimônio e outros que julgarnecessários, todos os titulares de livre escolha do Presidentee segundo normatização exarada por ele.
§ 2º - Os cargos da Diretoria são eletivos, conforme art.19, a), havendo para cada cargo, excetuado o de Presidente,um suplente que auxiliará o titular em suas funções e osubstituirá em seus impedimentos.
§. 3º - O mandato da Diretoria é de 2 (dois) anos.
Art. 21 – Compete à Diretoria:a) Aprovar e pôr em prática as políticas a serem
implementadas pela Academia;b) Decidir quanto aos valores e formas de cobrança
das contribuições financeiras dos sócios acadêmicos; c) Auxiliar a presidência na administração da
entidade;d) Apreciar a indicação de nomes para sócios
acadêmicos, beneméritos, honorários encaminhando osnomes aprovados à homologação da Assembléia Geral;
e) Autorizar contratos de locação ou os queimplicarem comprometimento financeiro por parte daASBL;
f) Conceder licença ou aceitar a demissão de
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associados, quando solicitadas por escrito pelo interessadoem documento com firma reconhecida;
g) Aprovar a admissão ou demissão de funcionárioscom suas obrigações e salários especificados;
h) Autorizar o ingresso de Sócio Correspondente.
Art. 22 – O Presidente será eleito pela Assembléia Geral,para um mandato de 2 (dois) anos e podendo serreconduzido para um segundo mandato.
Parágrafo único – Em caso de vacância do cargo dePresidente, com menos de 50% do mandato, far-se-á novaeleição.
Art. 23 – Compete ao Presidente: a) Escolher, empossar e dispensar os titulares de
Departamentos e de cargos não eletivos, dentre os sócios daASBL;
b) Representar a ASBL ativa e passivamente,judicial e extrajudicialmente, em todos os atos deadministração e gestão, podendo para tanto, quandonecessário, nomear procurador com poderes específicospara representá-lo.
c) Assinar juntamente com o Tesoureiro osdocumentos da tesouraria e especificamente os chequesbancários;
d) Admitir e demitir funcionários;Resolver “ad referendum” da Diretoria, os assuntosconsiderados de urgência, dando ciência aos demaisdiretores na sessão imediata;
e) Convocar e dirigir a Assembléia Geral e os atossolenes realizados pela entidade;
f) Convocar e presidir as reuniões de Diretoria;g) Prestar contas de sua gestão através de relatórios
financeiros apreciados pelo Conselho Fiscal e pela
181
Assembléia Geral.
Art. 24 – Aos vice- presidentes, eleitos com o presidente, ecom igual mandato, compete:
a) Auxiliar o presidente no exercício de suasfunções;
b) Substituir o presidente em seus impedimentos econcluir o mandato, em caso de vacância do cargo,obedecida a ordem de precedência sucessivamente;Participar das reuniões da Diretoria;
c) Organizar e executar o protocolo das solenidades;Presidir e administrar a Seção do respectivo Estado,auxiliado por um Secretário e um Tesoureiro,desenvolvendo as atividades da ASBL que melhor julgaroportunas e relevantes, em representação do Presidente.
Parágrafo único – A administração econômico-financeira, a contabilidade e a prestação de contas dasatividades da Seção cabem ao Vice-Presidente.
Art. 25 – Compete ao Secretário Geral:a) Assinar, com o Presidente os documentos
relativos à Secretaria;b) Lavrar, em livro próprio, as atas de todas as
sessões da Diretoria;c) Manter em dia os registros da entidade.
Art. 26 – Compete aos Secretários auxiliar o SecretárioGeral em suas atividades e manter em dia o registro darespectiva Seção.
Art. 27 – Compete ao Tesoureiro Geral:a) Assinar, com o Presidente, cheques e
documentos;
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b) Conservar sob sua guarda os valores da entidade;Manter em dia os registros atinentes a seu cargo;
c) Manter em dia o registro de imóveis e móveis daAcademia.
Art. 28 – Compete aos Tesoureiros das Seções auxiliar oTesoureiro Geral fornecendo-lhe os dados para a prestaçãogeral de contas da ASBL e auxiliar o Vice-Presidente emtudo o que diz respeito às atividades de tesouraria na Seçãoà semelhança das tarefas exercidas pelo Tesoureiro Geralem relação à ASBL.
Art. 29 - As funções de Diretor de Patrimônio, de Assessorde Imprensa e de Relações Públicas serão especificadas noRegimento Interno, de acordo com o estabelecido nopresente Estatuto Social.
CAPÍTULO V Do Conselho Fiscal
Art. 30 – O Conselho Fiscal é composto por 3 (três)membros efetivos e 1 (um) suplente, tendo a função deexaminar os relatórios financeiros e contábeis da Diretoria edas Seções, emitindo parecer para encaminhamento àAssembléia Geral.
Parágrafo Único – A função de conselheiro fiscal éprerrogativa dos sócios acadêmicos, eleitos, pelaAssembléia Geral para um mandato de 2 (dois) anos.
CAPÍTULO VI Das Seções estaduais
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Art. 31 – Às seções estaduais compete:a) Promover o congraçamento dos sócios de seus
respectivos Estados e o entrosamento com os dos demaisEstados;
b) Indicar à Diretoria da ASBL nomes deacadêmicos a serem apreciados pela Assembléia Geral, parao preenchimento de cadeiras vagas.
c) Indicar, dentre os acadêmicos do respectivoEstado, candidatos a Vice-Presidente, secretário etesoureiro para a Seção, e seus respectivos suplentes aserem eleitos pela Assembléia Geral.
§ 1º - Respeitadas as normas do Estatuto Social e doRegimento da ASBL, cada seção organizará seu regimentointerno;
§ 2º - Cada seção, além de participar das atividades geraisda ASBL, administrará suas atividades, mantendocontabilidade própria e arcando com seu ônus financeiro.
TÍTULO VDas Disposições Gerais e Transitórias
Art. 32 – A ASBL comemorará o aniversário de suafundação em 9 de maio, data em que serão empossados osmembros da Diretoria e do Conselho Fiscal eleitos naAssembléia Geral.
Art. 33 – Os sócios não respondem, nem pessoal nemsolidariamente, pelas obrigações contraídas pela ASBL.
Art. 34 – Os sócios acadêmicos poderão requerer, porescrito , licença por um ano das atividades da ASBL.
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Art. 35 – A ASBL somente será extinta por deliberação daAssembléia Geral Extraordinária, convocada para este fim,com a presença de ¾ dos associados acadêmicos em plenogozo de seus direitos e com votos favoráveis de, nomínimo, ¾ dos participantes, destinando-se o patrimônio aoutra entidade congênere ou ao município em queestiverem sediadas a sede da ASBL e suas respectivasseções na proporção dos bens nelas localizados.
Art. 36 – As regras decorrentes deste Estatuto Social serãodisciplinadas pelo Regimento Interno ou Interno e porresoluções da Diretoria.
§ 1º - A Diretoria elaborará o Regimento Interno no prazode 120 (cento e vinte) dias.
§ 2º – Na falta do Regimento, e os casos omissos serãoresolvidos pela Diretoria.
Art. 37 – O presente Estatuto Social, aprovado pelaAssembléia Geral, entrará imediatamente em vigor,revogados as disposições em contrário e o Estatuto atéagora vigente, registrado sob o nº 1.280, a fls. 43v/44 doLivro A5, em 12 de novembro de 1973, no Registro dePessoas Jurídicas em Rocha Brito Serviço Notarial eRegistral, de Pelotas.
Aprovado na Assembléia Geral de 06/12/2003 eadequado às novas normas da legislação federal.
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ASBL :CADEIRAS-PATRONOS-TITULARES
CADEIRA No.1 Patrono: Jorge Salis GoulartTitular I: SADY MAURENTE AZEVEDOTitular II: Endereço: Rua Carlos de Carvalho, 400/101
CEP 96030-270 – Pelotas RS
CADEIRA No.2 Patrono: Francisca Marcant GonçalvesTitular: MANUEL JESUS SOARES DA SILVAEndereço:
CADEIRA No.3Patrono: Manoelito de Ornellas
186
Titular: IVONE LEDA DO AMARALEndereço: R. Gonçalves Chaves, 805/502
CEP 96015-560 Pelotas RS
CADEIRA No.4Patrono: Nelson Abott de FreitasTitular: JOAQUIM MONCKSEndereço:R. Lima e Silva, 116/401
CEP 90050-100 Porto Alegre RSE-mail: joaquimmoncks@ig.com.br
CADEIRA No.5Patrono: Érico VeríssimoTitular: VALTER SOBREIRO JÚNIOREndereço: R. Prof. Araújo, 2149/102
CEP 96020-360 Pelotas RS
CADEIRA No.6Patrono: Fernando Luis OsórioTitular: MÁRIO OSÓRIO MAGALHÂESEndereço: Av. Domingos de Almeida 3030
CEP 96085-470 Pelotas RS
CADEIRA No.7Patrono: Paula Correa LopesTitular: CATARINA SCHENINI CUNHAEndereço: R.Vicente Lopes dos Santos, 200/301CEP 90103-140 Menino Deus, P. Alegre RS -cyrinobrutus@.uol.com.br
CADEIRA No.8Patrono: Francisco de Paula Pinto MagalhãesTitular: JOSÉ ANÉLIO SARAIVAEndereço: R. João da Silva Silveira, 211- B. Na. Sra.
187
FátimaCEP 96080-000 Pelotas RS
CADEIRA No.9Patrono: Francisco Antônio Vieira Caldas JúniorTitular: SUELLY CORRÊA GOMESEndereço: R. Heinrich Hosang, 165/303
CEP 89012-190 Blumenau SC
CADEIRA No.10Patrono: Francisco Lobo da CostaTitular I: José Vieira EtcheverryTitular II: IRMÃO ELVO CLEMENTEEndereço: Av. Ipiranga, 6681 Reitoria
CEP 90610-001 Porto Alegre RS
CADEIRA No 11Patrono: Álvaro José Gomes Porto AlegreTitular: FELIPE ASSUMPÇÃO GERTUMEndereço: Av. A A Assumpção, 9805
CEP 96090-240 Pelotas RS
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CADEIRA No. 13Patrono: João Simões Lopes NetoTitular: ÂNGELO PIRES MOREIRA
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CADEIRA No l4Patrono: Aurora Nunes WagnerTitular I: LYDIA MOMBELLI DA FONSECATitular II:
CADEIRA No.15Patrono: Irajá Moraes NunesTitular: SÉRGIO OLIVEIRAEndereço: R. Leonardo Colares, 137/101
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CADEIRA No 16Patrono: Raul de LeôniTitular I: Ivo CaggianiTitular II: LÍGIA ANTUNES LEIVASEndereço: R. Dr. Franklin Olivé Leite, 323
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CADEIRA No. 17Patrono: Demerval AraújoTitular: HARLEY CLÓVIS STOCCHEROEndereço: R. João Cândido Oliveira, 244
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CADEIRA No .18Patrono Alberto Coelho da Cunha
189
Titular: RONALDO CUPERTINO DE MORAESEndereço: R. Gen. Osório, 938
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CADEIRA No. 20Patrono: Maria Alzira Freitas TaquesTitular: ZENIA DE LEÓN (Licenciada)Endereço: R. Bernardino Santos, 74
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