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1 Feminismo: lutando pelo direito à vida
1
COSTA, Juliana Pereira DINIZ, Leonardo Melo
FERNANDES, Natália Pereira Batista ROCHA, Mariana Angélica Brito2
Centro Universitário UNA/MG
Resumo: Foi nos proposto, para o Trabalho Interdisciplinar Dirigido, trabalho
acadêmico do Centro Universitário UNA, fazer um artigo sobre algum tema que estivesse presente no governo Geisel (1974 a 1979). Escolhemos o tema,
Movimento Feminista, mais específico, o Movimento Feminista em Belo Horizonte, e sobre a morte da “Pantera Mineira”, Ângela Diniz, que retrata mortes de mulheres, por brigas domésticas, e o homem saindo impune pelo crime cometido. O
movimento Feminista ganhou força no mundo em 1970, e iniciou em Belo Horizonte em 1975. Palavras-chave: feminismo; movimento feminista; ditadura; mulheres; crime.
Introdução
O movimento Feminista se deu origem por volta do século XIX, na Inglaterra
e nos Estados Unidos, motivado pelas reivindicações de direitos civis, como o direito
ao voto e ensino superior. Ressurgiu na década de 1960 nos Estados Unidos, com
mais algumas reivindicações, como o direito a sexualidade, controle de natalidade,
violência contra a mulher e a igualdade com os homens no mercado de trabalho:
Em grande parte, a força de repercussão do movimento feminista dependeu de sua participação na luta geral pela democracia, contra a ditadu ra e contra as desigualdades sociais. (MACHADO, 2010, p.137).
Nos anos de 1960 a 1970 o movimento começa a ganhar força, devido as
mulheres se sentirem prejudicadas por não poder exercer seus direitos e por meio
1 Trabalho Interdisciplinar Dirigido 3, apresentado no ExpoUna, feira de conhecimento, 2013.
Sob a orientação dos docentes: Cândida Emília Borges Lemos, Carlos de Brito e Mello, Elisângela Dias Menezes, Geralda Nelma Costa, Maria Magda de Lima Santiago e Piedra Magnani da Cunha. 2 Juliana Pereira Costa, estudante de graduação do Centro Universitário UNA, 3º período de Jornalismo
Multimídia. julianacostax@gmail.com Leonardo Melo Diniz, estudante de graduação do Centro Universitário UNA, 4º período de Jornalismo Multimídia. leonardomelobh@gmail.com Mariana Angélica Brito Rocha, estudante de graduação do Centro Universitário UNA, 3º período de Jornalismo Multimídia. mariana.angel18@gmail.com Natália Pereira Batista Fernandes, estudante de graduação do Centro Universitário UNA, 3º período de Jornalismo Multimídia. naty.pbf@gmail.com
2 disso, começa - se as lutas civis e minoritárias. Nos anos 70, é o ápice, para que as
feministas tomassem as ruas e chamassem a atenção das autoridades locais. Nesse
mesmo período, a ONU decretou - 1975 o ano Internacional da Mulher - causando
assim, um marco que iniciaria a mobilização de mulheres no Brasil. Muito embora,
ainda o país vivesse o fantasma de 1968, quando foi intitulado o Ato Institucional nº
5 (AI-5), abolindo os atos constitucionais, fechando o Congresso e conferindo ao
Executivo, autoridade para exercer poderes excepcionais.
Figura 1- Símbolo do movimento feminista
Fonte: Revista Parametro. Disponível em: www.revistaparametro.wordpress.com
Mesmo sob a ditadura, as mulheres se organizavam para questionar mais
profundamente o seu papel na sociedade:
Não era só por ser mulher. Era por ser mulher e idealista. E militante. Isso na segunda metade do século passado. Nos anos de chumbo. A juventude
de quem abandonou a família, amigos e o convívio social para se dedicar à luta pela liberdade, sendo do sexo feminino, deixou registros na memória. ( REZENDE, 2013, p.10.)
Em 1975 é criado o jornal, Brasil Mulher (1975 - 1980), para mostrar a luta
das mulheres brasileiras pela anistia e democracia. Dez anos depois é criado o
Conselho Nacional dos direitos das Mulheres:
Em 1975, teve lugar o primeiro ato público, o Seminário sobre o Papel e o Comportamento da Mulher na Sociedade Brasileira, que aconteceu no Rio de Janeiro, e questões como a condição da mulher brasileira, trabalho,
saúde física e mental, à discriminação racial e à homossexualidade feminina, foram temas centrais. (MACHADO, 2010, p. 137).
3 Por causa das lutas promovidas pelas mulheres, surgiram vários clubes de
mães, que começaram a levantar discussões como, custo de vida, baixos salários,
creches. Começaram também os congressos de mulheres, marchas, entre outros.
O início da Mística Feminina
Mulher com ideias estranhas para o período vista como homossexual e até
mesmo espumando de ódio contra os homens, Betty Naomi Goldstein ou como era
seu pseudônimo Betty Friedan, foi uma mulher guerreira e se destacou no início do
Feminismo no mundo e especificamente nos Estados Unidos da América onde
nasceu e viveu.
Segundo a pesquisa realizada pela professora de História da Universidade
Federal de Santa Catarina, Ana Rita Fonteles Duarte (2006), “Betty foi mentora do
movimento Feminista nos EUA, escreveu um livro partindo da sua experiência no
Smith College onde suas colegas também se sentiam descontentes com a vida de
donas de casa.” (DUARTE, 2006, s/p.):
A ideia do livro surgiu de um encontro de ex-alunos do Smith College, no qual Betty estudou. Lá, ela comprovou que suas antigas colegas estavam tão insatisfeitas em sua vida doméstica quanto ela, que tinha se casado em
1947 com Carl Friedan, de quem se divorciou em 1969. O "problema mal formulado" ou "mal sem nome" que acometia mulheres, em especial as casadas, nas décadas de 50 e 60, tornou-se percept ível, para Friedan,
também a partir de sua própria experiência e da experiência de outras mulheres que ela conheceu em seu trabalho como repórter para uma revista. Nessa época estava criando seus três filhos em Roackland Country,
em Nova York. Entrevistou várias mulheres a respeito de suas dificuldades com os filhos, o casamento, a casa, a comunidade. Segundo ela, os ecos do problema podiam ser ouvidos em dormitórios universitários, enfermarias
de maternidades, reuniões de pais e mestres, almoços da Liga das Mulheres Votantes, coquetéis, carros à espera de trens. O problema ultrapassava classes sociais, idades, credos e etnias. As inquietações
manifestas por pessoas de várias idades, classes sociais e credos lhe tocaram primeiramente como mulher, para mais tarde se fazerem perceber como problemas psicológicos e sociológicos. (DUARTE, 2006, s/p.).
O diferente comportamento das mulheres na época foi visto como o mal que
não tinha nome e tampouco era discutido, na verdade era omitido até Betty Friedan
escrever o seu livro A Mística Feminina:
Como objetivo as feministas dessa organização colocavam a obtenção da
igualdade para as mulheres na sociedade cujas estruturas elas não
4
questionavam. As mulheres, segundo a NOW, predicavam a necessidade
de auto realização e de busca de identidade individual. Suas componentes pertenciam à classe média e ignoravam, em larga medida, os problemas das classes inferiores. Mulheres destas classes, incluindo as negras, pouco
tiveram participação na organização. (DUARTE, 2006, s/p.).
O livro causou um estranhamento na sociedade masculina através do
comportamento dessas mulheres, algo nunca visto em lugar algum.
Sua obra ficou conhecida na América Latina e Betty foi convidada pela Editora
Vozes a vir ao Brasil para o lançamento da A Mística Feminina, em 1971.
Acompanhada em suas visitas e entrevistas no Brasil pela sua amiga brasileira e
também feminista, Rose Marie Muraro.
No Brasil não foi diferente, Betty era vista como a mulher com estranhas
ideias e alvo nas entrevistas com suas respostas distorcidas pela imprensa
brasileira. Porém, nesta questão Betty conseguiu uma aliada, Carmen da Silva que
utilizou sua seção na revista Claudia, para mostrar sua indignação diante da
imprensa brasileira contra Betty.
Documentos de Carmen da Silva (1971) mostram as posições de Betty:
Como porta-voz do Movimento de Libertação Feminina, opina Betty Friedan – e eu endosso sem reservas – que não é possível modificar o atual
panorama de violência no mundo sem o concurso da mulher, que além de constituir metade do gênero humano, forma ou deforma a outra metade. Não se trata de opor-se ao homem, mas sim de que ambos, homens e
mulheres, tomem consciência de sua alienação, de sua manipulação pela sociedade de consumo que os impedem de crescerem e se realizarem juntos como seres humanos ativos, felizes, úteis. Trata-se de aliar energias
na tarefa de criar um mundo melhor. Trata-se de possibilitar entre eles um vínculo realmente maduro e harmonioso, em que nenhum domina o outro ou usurpa algo do outro. (SILVA, 1971, s/p.).
Segundo Duarte (2006), antes de Betty falecer (04 de fevereiro de 2006), já
não mais se dedicava ao Movimento Feminista, pois foi acusada de traição pelas
feministas radicais.
Consequentemente, a sociedade na qual nos encontramos, sofreu mutações
que partiram de uma norte-americana de personalidade fortíssima a fim de
questionarmos sobre a mística feminina.
5 A Ditadura - até Geisel
A Ditadura Militar teve início com a tomada do poder em abril de 1964. Nesta
época, as atitudes dentro do contexto político levaram à inúmeras ocorrências de
violações aos direitos humanos e à dignidade das pessoas. “A ditadura é um
costume da infâmia: uma máquina que te faz surdo e mudo incapaz de te escutar,
impotente para dizer e cego para o que está proibido olhar”. (GALEANO, 2005,
p.79).
O primeiro governo militar a assumir a presidência foi o Marechal Castelo
Branco, que esteve no governo no período de (1964-1967), e teve como um dos
fatos que marcaram seu governo a aprovação de uma nova Constituição Federal.
Em outubro de 1966 o general Arthur da, foi indicado por um Colégio Eleitoral
fabricado na ditadura.
A população brasileira, não satisfeita com o regime militar, saía para as ruas a
fim de protestar. Manifestações estudantis denunciam a falta de verbas e oposição
contra a privatização do ensino público.
Em 1967 a 1969, Costa e Silva teve seu governo caracterizado pelo avanço
do processo de institucionalização da ditadura. Eliminando a liberdade pública e
democrática. Devido a isto, em 1968 é intitulado o Ato Institucional nº 5 (AI-5),
radicalizando qualquer movimento contra o governo da época. A suspensão de
todas as garantias constitucionais e individuais aos cidadãos brasileiros acarretou
graves abusos e violações dos direitos humanos por parte dos órgãos oficiais
encarregados da segurança e repressão política.
O mandato de Costa e Silva como presidente da República foi interrompido
por uma grave doença: um derrame cerebral. Por causa do agrave da doença, o
presidente ficou impossibilitado de manter – se no cargo. Como o alto escalão dos
militares não quiseram que o vice-presidente Pedro Aleixo assumisse o mandato
fizeram então, uma Junta Militar formada por ministros da Aeronáutica, Exército e
Marinha que assumiu o governo de forma provisória. Mas a solução definitiva foi à
escolha de Emílio Garrastazu Médici, para presidente.
6
O primeiro morto na tortura desencadeou, no Brasil, em 1964, um
escândalo nacional. O morto número dez na tortura quase nem apareceu nos diários. O número cinquenta foi normal. A máquina ensina a aceitar o horror como se aceita o frio no inverno. (GALEANO, 2005, p. 79).
O governo Médici terminou sob forte repressão e teve como sucessão o
general Ernesto Geisel, em 1974. Com a instalação do governo Geisel instaura - se
um período de mudanças, ainda que pouco efetivas, mas o país ganha um momento
em que é publicado um projeto de “distinção lenta e gradual” estabelecido pelo então
presidente Ernesto Geisel.
Devido ao agrave do “milagre econômico”3, foi nesse período que o Brasil, de
forma concreta, entrou no processo de industrialização, mais de certo modo foi um
processo sem planejamento social e que agravou mais ainda as desigualdades. A
população teve sua perda no poder de compra, concentração da renda e a inflação
causaram “mal estar” na população, comparando com os anos anteriores em que a
desigualdade não era tão expressiva.
O movimento Feminista em Belo Horizonte
Figura 2 – Movimento Feminista toma as ruas Belorizontinas
Fonte: Revista Parâmetro. Disponível em: www.revistaparametro.wordpress.com
3 Disponível em: <http://www.historiadomundo.com.br/idade-contemporanea/milagre-economico-brasileiro.>.
Acesso em: 11 jun. 2013.
7 O movimento Feminista organizado em Belo Horizonte iniciou em 1975, um
ano após a posse do General Ernesto Geisel.
Na sala da casa dos jornalistas Miriam Christus e Aloisio Morais aconteciam
as reuniões, Miriam foi a responsável por levar outra jornalista Beth Fleury para o
movimento e junto com Fleury foram mais duas amigas da universidade, Beth
Almeida e Beth Cataldo, na mesma casa - só que no quarto do casal - encontravam
- se a redação do jornal De Fato.
Beth Fleury contou - em entrevista concedida aos autores deste trabalho -
como se deu a criação do movimento feminista em Belo Horizonte. Ela gosta de
dizer que do ponto de vista formal, o grupo criado por ela e suas três amigas foi o
primeiro grupo feminista da cidade: “(...)Nós fizemos um debate de fundação desse
grupo lá no departamento dos estudantes no DCE, onde havia uma única mulher no
Brasil inteiro que dirigia um DCE, era a Samira Zaidan”. (FLEURY, informação
verbal)4.
Elizabeth Maria Fleury Teixeira, Fleury sobrenome de mãe do avô materno,
mas é o nome que acabou ficando, “toda Elizabeth no Brasil acaba de chamando
Beth, querendo ou não né?” - brinca Beth, hoje com 58 anos de idade - bem vividos -
ela se autodenomina como Elizabeth Fleury, mas na verdade é conhecida como
Beth Fleury, “tanto como jornalista quanto como poeta , né? É o meu codinome”.
Quando criança, morando na fazenda se sentia injustiçada por não levar
exatamente a mesma vida que o irmão, queria ser “livre como ele” não compreendia
porque o pai ficava mais feliz com o irmão dela, só por ser menino e isso a deixava
furiosa, assim que foi pondo os pés na universidade já “a capturaram” para o
movimento feminista, “já encarei logo, é comigo mesmo, essa história de ser livre e
independente é comigo mesmo”, frisa Beth.
É formada em Comunicação, desde o primeiro ano de universidade, já
começou a fazer estágio na Rádio Itatiaia, Rádio Cultura, depois fez estágio no
jornal O Globo na sucursal, em seguida foi para o Jornal De Minas, isso foi em 1974.
4 FLEURY,Beth. Belo Horizonte, 18 mai. 2013. Entrevista concedida a Leonardo M. Diniz, um dos autores deste
trabalho.
8 Em 1975 ajudou a fundar um jornal alternativo contra a ditadura, pela democracia,
jornal De Fato “foi idéia do Durval Guimarães, que era o nosso chefe redação”. Ele
tornou-se cunhado de Beth e foi responsável por ajudá-la no vestibular “porque ele
já trabalhava na revista Veja, na Editora Abril. Me dava coleções sobre publicações
para jovens que se preparavam para o vestibular. E então eu fui muito inspirada no
exemplo dele. Era um jornalismo muito competente, muito certo e em seguida foi
chamada para criar o jornal De Fato:
era um jornal também que foi sustentado por publicidade, mas um jornal
que se fazia toda uma revolução no jornalismo cultural de Belo horizonte, tanto na parte de cobertura cultural como na parte comportamental, que era os jovens, como é que viviam os jovens nas republicas, como é que viviam
as moças nas faculdades, como é que era a vida noturna em Belo Horizonte, quem era os atores, quem era as atrizes, cantores, tudo que acontecia de interessante. (FLEURY, 2013, informação verbal).
5
Depois que o jornalista Guy de Almeida voltou do exílio, criou a Rede Minas.
Ele foi o chefe da Beth no De Fato “tudo que eu aprendi no jornalismo de importante
antes de ir pra Rio e São Paulo eu aprendi com o Guy”. Beth deixa bem claro que
quem criou o jornal De Fato não foi Guy, ele chegou depois e se tornou chefe.
Depois de um tempo Eustáquio Cidade Neto, se tornou editor chefe no final, ficou
durante muitos anos, e hoje é professor na Newton Paiva . Quando o jornal começou
a ficar com sérios problemas financeiros acabou tendo que se tornar um encarte do
Diário do Comércio e foi assim que conseguiu sobreviver por mais um tempo:
Mas foi uma grande experiência, nós éramos uma alma jovem do
jornalismo nós arejamos o jornalismo em Minas Gerais, eu tenho certeza disso. Era um sucesso assim, a maior badalação, nós éramos tudo badalado, todo mundo falava de nós, todo mundo sabia quem era a gente.
(FLEURY, 2013, informação verbal) 6.
Sua trajetória no jornalismo se interrompe no Rio de Janeiro, saindo de São
Paulo retornando para o Rio em 1987, quando ela entra para a fundação Oswaldo
Cruz, Beth está na FIOCRUZ (Fundação Oswaldo Cruz) há 26 anos e hoje é mestre
em Sociologia e também é pós-graduada em Ciências Políticas. Trabalha em uma
5 FLEURY. Beth. Belo Horizonte, 18 mai. 2013. Entrevista concedida a Leonardo M. Diniz, um dos autores deste
trabalho. 6 FLEURY. Beth. Belo Horizonte, 18 mai. 2013. Entrevista concedida a Leonardo M. Diniz, um dos autores deste
trabalho.
9 área de pesquisa, atualmente está finalizando um projeto, um dicionário sobre
violência contra mulheres, chama-se Dicionário Feminino da Infame-a – acolhimento
diagnóstico de mulheres em situação de violência:
O livro vai ser distribuído por todo o sistema único de saúde, todo o sistema
de assistência social do país inteiro para as equipes que atendem mulheres
em situação de violência, é um projeto assim que me deixa muito feliz, eu
sou suspeita. (FLEURY, 2013, informação verbal) 7.
A imprensa não era favorável ao movimento, nem a imprensa de Belo
Horizonte. Segundo o jornal De Fato, o Feminismo era mal visto. Em um exemplar
de abril de 1976, há uma nota com os seguintes dizeres:
Mais uma vez a grande imprensa demonstrou não ser o melhor local para
se conseguir informações exatas, pelo menos em relação ao feminismo.
(...) tem um tratamento pelos jornais brasileiros no mínimo ridículo. (DE
FATO, n. 3, edição on line, 2012).
O Feminismo e as feministas, como eram apresentadas, “ofendiam” a
sociedade, informada pelos valores do catolicismo. Era preconceituosa. Apenas
alguns jornais alternativos (De Fato, Bondinho, Opinião) abriam um certo espaço
para veiculação de notícias sobre o Feminismo. O jornal Opinião publicou cartas de
duas brasileiras residentes em Nova Iorque, indignadas por uma charge de Millor
Fernandes, publicada na revista Veja. Ainda sim a imprensa era tímida em relação
ao feminismo no Brasil. Sobre livros lançados, congressos e reuniões, pouco se
falava, e em jornais de destaque nem se via.
Além disso, o movimento feminino era muito criticado pelo movimento
esquerdista, conta Beth Fleury, ela afirma que naquela época, o movimento de
esquerda, dizia que elas eram americanizadas, que o povo brasileiro não precisava
de Feminismo:
(...) precisava de revolução socialista, e que nós estávamos desviando a
força de esquerda para fazer o movimento das burguesinhas que queriam
fazer revolução sexual, eles achavam que o movimento de mulheres não
7 FLEURY. Beth. Belo Horizonte, 18 mai. 2013. Entrevista concedida a Leonardo M. Diniz, um dos autores deste
trabalho.
10
tinha esse peso e essa importância que agente achava que tinha.
(FLEURY, 2013, informação verbal).8
“Matando por amor” 9
Segundo Machado (2010), a questão específica do movimento que toma
maior visibilidade política é a do assassinato de mulheres. Alguns casos tiveram
grande repercussão na imprensa, principalmente contra mulheres de classe média
alta. Como foi o caso da socialite Ângela Diniz, conhecida como a “Pantera Mineira”,
assassinada por seu amante, o empresário Raul “Doca” Fernandes do Amaral
Street, no dia 30 de dezembro de 1976. Com uma foto na capa, e matérias com
quatro páginas, sobre a vida e morte de Ângela Diniz como é relatado na matéria do
jornal De Fato, de janeiro de 1977 diz “Ângela Diniz morreu por ser mulher”, que
sempre era apontada pela sociedade, por qualquer que fosse seus atos, ir a uma
festa sozinha, ser uma mulher desquitada, ou se apaixonar por um homem casado:
O desquite: perdeu a guarda dos filhos. Não era digna de educá-los, porque
tinha um sexo, porque tinha amantes e uma mulher que têm amantes não
pode ser mãe. Se ela fosse homem seria acusada de adultério se tivesse
levado a companheira para debaixo do teto conjugal, ou se tivesse montado
uma casa para ela. Fora disso, tudo bem: poderia sair com quem quisesse
chegar à hora que quisesse - se quisesse chegar. Mas para uma mulher ser
direita, exige-se muito mais do que é exigido dos homens: que se anule,
que viva com um homem a quem não ama que cumpra com ele os deveres
conjugais mesmo sem desejo. Fora do casamento não há salvação, nem
moral, nem filhos. Os amantes que as outras senhoras direitas sonham, ela
os tinha. O que os homens fazem escondido, ela fazia às claras. Subvertia
as bases da família. E ainda olhava as pessoas na cara, sem vergonha de
ser quem era. Isso incomoda demais os outros. (DE FATO, n. 10, versão
online, 2012)
Doca Street, como era conhecida pelos amigos, era salva-vidas, e largou a
mulher para viver com Ângela. O ciúme de Doca era excessivo, e Ângela,
acostumada ser uma mulher livre, que gostava de festas, bebidas, não suportou a
situação em que vivia com o amante.
8 FLEURY. Beth. Belo Horizonte, 18 mai. 2013. Entrevista concedida a Leonardo M. Diniz, um dos autores deste
trabalho.
9 Tese de defesa do empresário Raul “Doca” Street, que alegou ter agido em legítima defesa da honra.
Disponível em:< http://memoriaglobo.globo.com/Memoriaglobo/0,27723,GYN0-5273-250495,00.html>. Acesso em: 9 de jun. 2013
12 No primeiro julgamento realizado em 18 de outubro de 1979, Doca foi
condenado a dois anos de cadeia, mas obteve o direito de cumprir a pena em
liberdade. A tese da defesa era que ele teria agido em legítima defesa da honra e
“matado por amor”. Com esse argumento, militantes feministas organizaram um
movimento cujo slogan - “quem ama não mata”. 10
Com a mobilização das feministas para pressionar a justiça e mobilizar a
sociedade, veio à recompensa de o primeiro julgamento ser anulado, Doca Street,
novamente julgado,em 1981, foi condenado a quinze anos de prisão em regime
fechado. Este fato representou um novo passo no combate à violência contra a
mulher, causada pelo parceiro íntimo, que deu origem a mobilizações feministas
com a criação de centros e da Comissão de Violência contra a Mulher.
Em junho de 2003, o caso foi retratado no programa Linha direta justiça
programa exibido nas quintas-feiras, pela TV Globo, entre 1990 a 2007 apresentava
crimes que aconteceram pelo Brasil. Além da reconstituição do crime, houve
diversas imagens de arquivo, e contou com participações em depoimentos do
escritor Fernando Gabeira, do jornalista Artur Xexéu e da feminista Mirian Christus,
entre outros.
Considerações Finais
O movimento Feminista, nos dias atuais, ainda promove discussões em torno
de suas propostas e reivindicações, mas já não é algo violento como era , é algo
mais leve. Os direitos das mulheres mudaram com as reivindicações feitas no passar
dos anos. Como na Lei da Constituição Federal nº11340/06, 07 de AGO. 2006.
Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial
adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no Código de Processo Penal : I - ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a
termo, se apresentada; II - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e de suas circunstâncias;
10
Disponível em : <http://memoriaglobo.globo.com/Memoriaglobo/0,27723,GYN0-5273-250495,00.html.> Acesso em 9 de jun.2013
13
III - remeter, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao
juiz com o pedido da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de urgência; IV - determinar que se proceda ao exame de corpo de delito da ofendida e
requisitar outros exames periciais necessários; V - ouvir o agressor e as testemunhas; VI - ordenar a identificação do agressor e fazer juntar aos autos sua folha de
antecedentes criminais, indicando a existência de mandado de prisão ou registro de outras ocorrências policiais contra ele; VII - remeter, no prazo legal, os autos do inquérito policial ao juiz e ao
Ministério Público. § 1o O pedido da ofendida será tomado a termo pela autoridade policial e deverá conter:
I - qualificação da ofendida e do agressor; II - nome e idade dos dependentes; III - descrição sucinta do fato e das medidas protetivas solicitadas pela
ofendida. § 2o A autoridade policial deverá anexar ao documento referido no § 1o o boletim de ocorrência e cópia de todos os documentos disponíveis em posse
da ofendida. § 3o Serão admitidos como meios de prova os laudos ou prontuários médicos fornecidos por hospitais e postos de saúde. ( LEI nº11340/06, 07 de AGO. 2006)
Como no último dia 15 de maio, onde as placas de algumas ruas e praças de
Belo Horizonte tiveram os nomes trocados por nomes de mulheres importa ntes da
nossa história:
(...) o obelisco no Centro de Belo Horizonte fica na Praça Oito de Março, e
não na Sete de Setembro. Ou que a rodoviária fica em frente à Praça
Patrícia Galvão, e não à Rio Branco. O GPS pode até marcar Praça Rui
Barbosa, mas quando chegar lá, você vai se deparar com a Praça Olga
Benário. Ainda que na informalidade, endereços conhecidos da capital
mineira mudaram de nome em homenagem a datas e personalidades
importantes na luta pelos direitos da mulher. (O GLOBO, 15 de mai. 2013)
Beth fez um estudo sobre o feminismo do inicio até os dias atuais e conta que
se surpreendeu ao saber que a agenda não mudou:
uma parte mais privilegiada em termos financeiros e culturais conseguiu
realizar essa agenda, uma parte menos privilegiada, que é a maioria da
população, ainda não conseguiu, essa agenda ainda está para ser
executada, a essência do ponto de vista politico e filosófico, não pode ter
mudado porque a agenda não foi mudada. (FLEURY, 2013, informação
verbal).11
REFERÊNCIAS
11
FLEURY. Beth. Belo Horizonte, 18 mai. 2013. Entrevista concedida a Leonardo M. Diniz.
14 ÂNGELA Diniz, em Minas tudo é permitido, menos o escândalo. De Fato. Disponível
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Acesso em: 10 de jun. 2013-06-12
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<http://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2013/05/15/interna_gerais,387537/pracas-
do-centro-de-bh-ganham-novos-nomes-a-revelia-da-prefeitura.shtml> Acesso em: 10
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15 PINORIO, Maria Ap. Alves. O Movimento Feminista e sua contribuição para a
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