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Ao amor Por Monique A. Carvalho Personagens: ELE ELA Ele - Ao amor que eu dei. Sufoco. Sufoco. Sufoco. Tornei-me a pior metade de um ser humano. Destruí o amor que me deram. Destruí por nada. Por capricho. Acabei com o que um dia sentiram por mim. E era forte. A vida me presenteou com ela. O mais belo presente que se pode querer. O mais dedicado amor que se pode ter. Com as mais belas histórias pra se viver. Um mundo de sonhos do outro lado do oceano. Longe de casa, família e amigos. Eu a tinha e ela tinha à mim. Eu fui amado. E eu amei. Mas voltar pra casa me trouxe de volta à minha realidade. Cruel. Ela já não fazia parte de mim, da minha vida, dos meus dias. Mas tentava. Ela sempre me ligava. Eu não retornava. Ela mandava mensagens. Eu só visualizava. O que eu fiz com o amor? Como ou quando eu me tornei hábil a torturar quem amo? Quem amei. Talvez eu nunca tenha amado. Ela podia ter desistido de mim muito antes de tudo isso. Eu dei trabalho. Mas ela estava sempre ali. Ninguém nunca havia me amado assim. Talvez isso tivesse me assustado. Dizem que o amor assusta. Eu sei que onde quer que ela estivesse, ela chorou. Ela chorou muito. Por mim. Eu fiz um doce amor sofrer. Eu fiz sofrer. Era doce. Doce. A sua boca me fez sentir por tantas vezes um rei. Mas o rei fez promessas que não iria cumprir. Mas isso já é um costume. Por que ela estranhou tanto? O ser humano é assim por natureza. Ela me fazia bem quando estava por perto. Longe não fazia nada. Longe não era nada. E aos poucos eu abandonei. Sem dizer nada. Alimentei sua alma de promessas, ao mesmo tempo que a ia deixando. Percorri outros lugares, conheci outras pessoas. Me envolvi. Mas ela ainda estava lá. Alimentada pelas minhas canções. Hoje não sei como está a única pessoa que me trouxe à vida. Eu a deixei ir. Contra a sua vontade. E ela foi. Ao grande amor, pedi que me esquecesse. Ao grande amor, sugeri minha morte. E assim o fiz. Exclui-me do mundo dela, e aos poucos fui me excluindo do meu. Eu me exclui de mim. Me abandonei. Arranjava suporte em outras pessoas, mas nada nunca se comparou a ela. Um dia quis ouvir sua voz. Já havia passado muito tempo. Ela já não precisava de mim. Mas nas minhas noites sozinho é com a lembrança do seu sorriso que eu consigo dormir.

Ao amor

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Page 1: Ao amor

Ao amor

Por Monique A. Carvalho

Personagens:

ELE

ELA

Ele - Ao amor que eu dei. Sufoco. Sufoco. Sufoco. Tornei-me a pior metade de um ser

humano. Destruí o amor que me deram. Destruí por nada. Por capricho. Acabei com o

que um dia sentiram por mim. E era forte.

A vida me presenteou com ela. O mais belo presente que se pode querer. O mais

dedicado amor que se pode ter. Com as mais belas histórias pra se viver. Um mundo de

sonhos do outro lado do oceano. Longe de casa, família e amigos. Eu a tinha e ela tinha

à mim. Eu fui amado. E eu amei.

Mas voltar pra casa me trouxe de volta à minha realidade. Cruel. Ela já não fazia parte

de mim, da minha vida, dos meus dias.

Mas tentava.

Ela sempre me ligava. Eu não retornava.

Ela mandava mensagens. Eu só visualizava.

O que eu fiz com o amor?

Como ou quando eu me tornei hábil a torturar quem amo? Quem amei.

Talvez eu nunca tenha amado.

Ela podia ter desistido de mim muito antes de tudo isso. Eu dei trabalho. Mas ela estava

sempre ali.

Ninguém nunca havia me amado assim.

Talvez isso tivesse me assustado. Dizem que o amor assusta.

Eu sei que onde quer que ela estivesse, ela chorou. Ela chorou muito. Por mim.

Eu fiz um doce amor sofrer. Eu fiz sofrer. Era doce. Doce.

A sua boca me fez sentir por tantas vezes um rei. Mas o rei fez promessas que não iria

cumprir. Mas isso já é um costume. Por que ela estranhou tanto? O ser humano é assim

por natureza. Ela me fazia bem quando estava por perto. Longe não fazia nada. Longe

não era nada.

E aos poucos eu abandonei.

Sem dizer nada.

Alimentei sua alma de promessas, ao mesmo tempo que a ia deixando. Percorri outros

lugares, conheci outras pessoas. Me envolvi. Mas ela ainda estava lá. Alimentada pelas

minhas canções.

Hoje não sei como está a única pessoa que me trouxe à vida. Eu a deixei ir. Contra a sua

vontade. E ela foi.

Ao grande amor, pedi que me esquecesse. Ao grande amor, sugeri minha morte.

E assim o fiz. Exclui-me do mundo dela, e aos poucos fui me excluindo do meu.

Eu me exclui de mim. Me abandonei.

Arranjava suporte em outras pessoas, mas nada nunca se comparou a ela.

Um dia quis ouvir sua voz. Já havia passado muito tempo. Ela já não precisava de mim.

Mas nas minhas noites sozinho é com a lembrança do seu sorriso que eu consigo

dormir.

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Ela - Foi intenso demais pra mim, mais do que eu podia querer, ou imaginar. Mais do

que um dia esperei pra mim. Mas também a causa da pior dor que já senti na vida. Meu

coração foi arrancado do peito, picado em pedaços mínimos e pisoteado para não haver

dúvidas. Humilhei-me. Rastejei. Implorei. Todas as noites eram lágrimas que caiam e

faziam uma pequena poça em meu travesseiro.

Como se consegue esquecer alguém assim?

Como um botão que se aperta e, de repente, você não está mais em seus pensamentos.

Era tão verdadeiro. Me pareceu tão verdadeiro. Para mim foi.

Todas as lembranças que tinha não deixavam claras a sua capacidade de desamar. Tão

sensível e tão frio. Tão poético e tão egoísta. A maior decepção que alguém poderia ter,

eu tive. Você foi ao extremo da minha confiança. Desistiria de tudo pela maior verdade

que eu havia vivido: o seu amor. Mas era falso. E eu só me dei conta disso muito tarde.

Depois de ficarmos longe.

O plano era que fosse uma distância temporária, mas se tornou permanente. Sem chance

de conversar, de tentar entender. Você se foi. Disse que havia outra pessoa. E eu morri.

Morri por dentro e por fora. Fui definhando. Fui definhando.

Você havia sumido do mundo. Não havia rastros que eu pudesse seguir. Não havia

como saber nem se estava vivo.

Quando eu consegui voltar a mim, nada fazia sentido.

Os planos. O que eram os planos? Por quê fizemos planos?

Quando os planos se foram, eu fiquei sem chão. Caminhava num vazio tão grande.

Demorou até eu me sentir preenchida novamente.

Até eu voltar a viver.

Confesso que ainda estou em processo. O choque foi grande, e confiar se tornou uma

dificuldade.

Mas quando um dia, sem eu esperar mais nada, recebi uma mensagem sua dizendo que

queria ouvir minha voz, minhas lembranças vieram à tona. Eu tive medo. Medo de

sofrer. Eu não conhecia mais aquele que me fez sorrir por tantas vezes, mas que me

inundou de lágrimas na mesma proporção.

Um dia, talvez, nesta vida ou em outra, você volte a me ver e escutar minha voz. Mas de

você eu não posso nem devo esperar mais nada.