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ÁREA TEMÁTICA: ST13 SEXUALIDADE E GÉNERO Ir/responsabilidade Social (de Género) das Empresas Estrangeiras: Uma perspetiva reportada ao fenómeno do femicídio em Juárez, no México FERREIRA, José Catalão Sociólogo, Doutorando em “Direito, Justiça e Cidadania no Séc. XXI” FDUC/CES/FEUC [email protected]

ÁREA TEMÁTICA: ST13 SEXUALIDADE E GÉNERO

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ÁREA TEMÁTICA: ST13 SEXUALIDADE E GÉNERO

Ir/responsabilidade Social (de Género) das Empresas Estrangeiras:

Uma perspetiva reportada ao fenómeno do femicídio em Juárez, no México

FERREIRA, José Catalão

Sociólogo, Doutorando em “Direito, Justiça e Cidadania no Séc. XXI”

FDUC/CES/FEUC

[email protected]

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Palavras-chave:Empresas Cosmopolitas; Exploração do trabalho das mulheres; Responsabilidade Social Empresarial de Género(RSEG); Violência de Género contra as mulheres

Keywords: Cosmopolitan Companies; Women`s work exploitation; Gender Corporate Social Responsibility (GCSR); Genderviolence against women.

[PAP0319 ]

ResumoJuárez, no México, é a cidade mais industrializada da América do Norte e onde se concentram mais

empresas estrangeiras. Considerada uma das cidades mais perigosas do mundo é, também, aquela ondeocorrem mais mortes de mulheres por razões misóginas (femicídio), muitas das quais trabalhavam nasindústrias maquiladoras ali existentes. As empresas estrangeiras ali instaladas, sobretudo de origemnorte-americana, dos EUA e Canadá, contribuíram para o crescimento económico e demográfico daquelazona, no entanto, parece existir uma relação entre esse crescimento o aumento da criminalidade porrazões misóginas, contra mulheres trabalhadoras nas maquiladoras, consequência do confronto deculturas e hábitos locais com as práticas e a cultura transportadas do exterior comas empresasestrangeiras, relacionados com a cultura machista e o mariana enraizadas na população mexicana. Estasempresas, ao instalarem-se em países menos desenvolvidos do que o da origem, raramente levam emconta os impactos sociais e culturais que daí podem resultar e muito menos assumem responsabilidadespelas consequências, principalmente quando o que está em causa são questões de género, como estas, queafetam sobretudo as mulheres. Partindo da questão de Juárez, tentamos chamar à atenção para um novofenómeno, o da crescente de cosmopolitização mundial das empresas e ‘nova’ tendência para a procura eexploração do trabalho das mulheres dos países menos desenvolvidos e do Terceiro Mundo, sendonecessário responsabilizar essas empresas e exigir que adotem medidas de Responsabilidade SocialEmpresarial de Género (RSEG), para se poder evitar uma nova vaga de desigualdades à escala global e,nomeadamente, impedir o aumento da violência de género contra mulheres que trabalham nestasempresas.

AbstractJuárez, in Mexico, is the most industrialized city in North America and where more foreign

companies are concentrated. Considered one of the most dangerous cities in the world is also the onewhere most deaths occur in women for misogynist reasons (femicide), many of whom worked in themaquiladoras industries there. Foreign companies, there installed, mainly from Canada and USA,contributed to the economic and demographic growth in that area, however, there seems to be arelationship between this growth in number of femicides, against working women in the maquiladoras, asa consequence of the clash of cultures, local habits and practices with the outside, culture carried withforeign companies, related to the machismo and marianismo cultures rooted in Mexican population.These companies, to settle in countries less developed than that of origin, rarely take into account thesocial and cultural impacts that might ensue and much less assume responsibilities for the consequences,especially if we are talking about gender issues that affect women. Starting from the question of Juárez,we try to call attention to a new phenomenon, the growing number of world cosmopolitan companies, andthis 'new' tendency to a demand and exploitation of female laborin least developed and the third worldcountries, being necessary to blame these companies and require that they have to adopt GenderCorporate Social Responsability (GCSR) measures, to prevent a new wave of global inequality andincreased gender violence against women working in these companies.

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Introdução

O século XX terá sido um daqueles em que houve maiores mudanças e evolução em termos sociais e dedireitos humanos. Para isso contribuíram duas guerras mundiais, várias crises económicas e mudançaspolíticas que culminam com o fim do Bloco de Leste e no enfraquecimento dos ideais comunistas que, entreoutras consequências, viriam a permitir a difusão à escala global do capitalismo e do neoliberalismoeconómico.

Os novos movimentos sociais, que surgiram e se desenvolveram do século passado, de estudantes,feministas, ambientalistas, pacifistas, antirracistas e muitos outros, impulsionaram muitas das mudançassociais ocorridas no século passado. Entre estes destacam-se os movimentos feministas que, em menos deum século, conseguiram inverter tendências milenares de dominação e diferenciação dos papéis das mulheresem relação aos dos homens, que as remetia para um papel secundário eas impedia, nomeadamente, de acederao mercado de trabalho em condições iguais às dos homens.

Após séculos de dominação e dependência masculina, muitas mulheres estão finalmente a conseguirdesvincular-se do modelo patriarcal e a assumir papéis socialmente idênticos e/ou tão valorizados como osdos homens. No entanto, e apesar de todas as mudanças positivas que ocorreram, verifica-se que ainda hámuitos países onde isso não aconteceu, não vai acontecer ou está a demorar mais a acontecer. Sobretudo nospaíses menos desenvolvidos e do Terceiro Mundo aquilo a que se assiste é a um misto de evolução eretrocesso: evolução no sentido de que há já muitas mulheres, principalmente das classes mais favorecidas,que já estão em pé de igualdade em relação aos homens; retrocesso, se pensarmos que, para além dasdiferenças que já existiam e ainda se mantêm, muito por influência da globalização e do neoliberalismoeconómico, um pouco por todo o lado, estão a surgir novas formas atípicas de dominação, abuso e violaçãodos direitos humanos e das mulheres – como o tráfico de seres humanos, rapto, violação, prostituiçãoforçada, turismo sexual e, muito mais graves do que quaisquer outros, o tráfico de órgãos para transplantes eosfemicídios.1

Na pós-modernidade, definida por UlrichBeck (2006) como aquela que distingue o mundo cosmopolitado mundo globalizado eda modernidade que a antecede, as empresasestão a tornar-se cosmopolitas,principalmente as que têm origem nos países mais desenvolvidos podem agora instalar-se em qualquer partedo mundo (Beck, 2006). Ao fazê-lo, estas empresas transportam consigo culturas e práticas diferentes daslocais, dos países menos desenvolvidos(Cliford, 2000). Quando estas empresas se instalam nestes países ochoque resultante do confronto de culturas e hábitos locais,enraizados nas populações,com os que sãotransportados e implementados através das empresas, pode ter consequências sociais e culturais que, namaioria dos casos, afeta mais as mulheres do que os homens, não só ao nível da exploração do trabalho comorelacionadas com o aumento da violência de género. Como Salzinger refere, nas últimas décadas as mulheresdo Terceiro Mundo, principalmente as mais jovens, estão a surgir como as trabalhadoras paradigmáticos docapital transnacional, que vê nas suas habilidades e experiência adquiridas com a realização das tarefas do laruma natural propensão para o trabalho, passível de ser utilizada em benefício das empresas (Salzinger, 1997,pp. 559-560)

A Cidade de Juárez, no México, é a cidade mais industrializada de toda a América do Norte e ondeexiste a maior concentração de empresas estrangeiras. Considerada por muitos a cidade mais perigosa domundo é, também, aquela onde ocorrem mais mortes de mulheres por razões misóginas (femicídio), muitasdas quais trabalhavam nas indústrias maquiladoras ali existentes. As empresas estrangeiras que ali seinstalaram, sobretudo norte-americanas, dos EUA e Canadá, terão contribuído positivamente para ocrescimento económico e demográfico daquela zona do México, contudo,parece haver uma relação entreesse crescimento, a instalação de empresas estrangeiras em Juárez e o aumento da violência de género contraas mulheres e dos homicídios por razões misóginas. De facto, os dados indicam que um e outro fenómenosão coincidentes, pelo que, a confirmar-se a relação, estamos perante uma consequência provável dainstalação e concentração de empresas estrangeiras naquela cidade fronteiriça do México.

Apesar dos outros efeitos positivos, em termos de criação de emprego feminino e de autonomização das1Femicídio é o temo usado para descrever o homicídio de mulheres, muito violento, envolvendo rapto, violaçãodesmembramento e violência extrema, por razões misóginas, de ódio contra o sexo oposto, neste caso contra as mulheres.

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mulheres, a quase exclusividade e preferência pelo trabalho das mulheres nas empresas estrangeiras, pelastransformações sociais e culturais que implica - num país onde o machismo, o marianismo e a culturapatriarcal predominam e dominam –, pode ter efeitos negativos e ser uma das principais causas, ou estar acontribuir, para aumento da violência género contra as mulheres, da misoginia de muitos homens e donúmero de femicídios. Muitas mulheres das mulheres que trabalham nas maquiladoras, pelo simples facto deadotarem posturas e hábitos que colidem com a cultura patriarcal e mariana, ambas ainda muito enraizadasna população do México, tornam-se vítimas deste progresso e crescimento económico, da forma maisabrupta, pagando com a própria vida e das formas mais violentas que é possível imaginar-se. O facto dehaver muito mais mulheres do que homens a trabalhar em empresas estrangeiras e de muitas se teremtornado mais autónomas e menos dependentes dos homens, ou pelo simples razão de estas poderem adotarposturas e comportamentos próprios da «cultura viajante» transportada pelas empresas estrangeiras, de paísesmais avançados e culturalmente mais evoluídos, são mudanças passíveis de serem consideradas pelo sexooposto e em alguns casos por pessoas do mesmo sexo, disruptivas em relação às práticas e à cultura local.2

Num estudo realizado por Salzinger (1997) em três empresas estrangeiras instaladas em Juárez, ainvestigadora refere alguns das justificações dadas pelos empresários para preferirem o trabalho dasmulheres mexicanas, por os homens mexicanos serem muito preguiçosos, conflituosos e pouco produtivos e,entre as outras razões invocadas, outras, essencialmente fundadas em diferenças de género: por poderempagar menos às mulheres do que aos homens; por serem mais dóceis; por serem menos conflituosas; e poraguentarem mais tempo sentadas nas linhas de montagem do que os homens mexicanos (Salzinger, 1997).3

A preferência das empresas estrangeiras pelo trabalho do feminino, por razões pouco altruístas como ade lhes poderem pagar salários mais baixos ou por serem mais resilientes, poderá ser uma das razões quemais contribui para o aumento da violência de género e dos crimes contra as mulheres em Juárez e à escalaglobal, nos países menos desenvolvidos. A rejeição do trabalho dos homens e a preferência pelo trabalho dasmulheres coloca muitos numa situação dependência em relação às mulheres. Essa mudança, benéfica para asmulheres, mas demasiado repentina, inaceitável e até incompreensível para muitos homens mexicanos,poderá ser uma das causas geradoras do aumento da violência e crimes contra as mulheres, por razões demisoginia.

A realidade é que, as empresas estrangeiras ao instalarem-se em países menos desenvolvidos do que oda origem raramente levam em conta os impactos sociais e culturais que daí podem resultar, como os quepodem resultar do confronto entre a cultura viajante (com as empresas) e a local. Os impactos culturais esociais dependem de muitos fatores e podem em muitos casos ser difíceis ou quase impossíveis de prever,impedindo, por isso, que haja uma maior intervenção governativa e política, para os tentar minimizar oueliminar pela via legislativa, nacional ou internacional. Por outro lado, as empresas estrangeiras aoinstalarem-se nestes países, por acharem que este tipo de problemas deve ser resolvido pelos governos,autoridades e organizações locais, evitam imiscuir-se ou simplesmente ignoram estas matérias, esquecendo averdadeira origem dos problemas e desresponsabilizando-se em relação aos mesmos.

Conhecendo-se a origem dos problemas e as consequências, somos levados a pensar que estas empresas– cosmopolitas – que se deslocam para países menos desenvolvidos à procura do trabalho mais barato eprodutivo das mulheres, poderiam e deveriam ser socialmente responsabilizadas pelos mesmos. Nestesentido estas empresas deveriam ser obrigadas a ter de tomar outras medidas, em sede de ResponsabilidadeSocial Empresarial (RSE), para além das que algumas já tomam por iniciativa própria ou por seremobrigadas, assumindo também a responsabilidade por questões de género, como aquelas que afetam asmulheres que trabalham nas maquiladoras, sendo certo que se as empresas quisessem, muitas destassituações poderiam ser prevenidas ou minimizadas. Na realidade, as questões de género que resultam dosimpactos culturais configuram-se como uma ir/responsabilidade que os governos local e federal tendem adesvalorizar e as empresas estrangeiras a ignorar, sobrepondo-se os interesses económicos e políticos àsquestões sociais e de violação dos direitos humanos, em particular, como aquelas que afetam as mulheresque trabalham nas maquiladoras, em Juárez.2 Em relação à questão das «culturas viajantes», por analogia, ver James Cliford (Cliford, 2000).3Sobre a questão da desvalorização do trabalho masculino e dos hábitos adquiridos pelas mulheres que trabalham masindustrias maquiladoras veja-se o estudo realizado por Leslie Salzinger (1997).

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O facto de Juárez ser uma cidade fronteiriça e o principal ponto de passagem da imigração ilegal e dotráfico de droga do México para os EUA, atividades há muito controladas pelos cartéis de droga alilocalizados, pode servir para explicar parte do problema da violência e a razão pela qual a Cidade de Juárez éconsiderada a mais perigosa do mundo. O facto, porém, é que essa criminalidade tem vindo a acentuar-se nosúltimos anos, coincidindo com o crescimento económico e demográfico daquela zona, no seguimento doacordo económico NAFTA4, assinado entre os EUA, Canadá e México (e Chile) e que entrou em vigor em1994. Entre outras coisas, este acordo veio permitir que inúmeras empresas de capital estrangeiro sepudessem instalar no México, em maior número junto à fronteira com os EU e na Cidade de Juárez.

Um dos efeitos da enorme concentração de empresas maquiladoras estrangeiras em Juárez, cidade quepara além de fazer fronteira com El Paso é o principal ponto de passagem entre o México e os EU, terá sido odo aumento das migrações internas e imigração dos outros países a Sul do México para aquela zona. Comuma particularidade, que se reflete no tipo de migrações e na demografia local, que é, no início, asmaquilhadoras empregarem mais de 90% de mão-de-obra feminina e principalmente mulheres muito jovens(Salazar, 2004). Todo isto terá contribuído não só para o para o crescimento demográfico anormal dapopulação feminina em Juárez e que a maioria das mulheres jovens ali residentes passassem a ter comoatividade principal o trabalho em maquiladoras estrangeiras. Coincidência, ou não, no mesmo período e namesma proporção do crescimento económico aumentaram também os femicídios, que se caraterizam por serhomicídios muito violentos de mulheres por razões misóginas e de sexo. Entre as vítimas desses homicídiosencontram-se muitas mulheres que trabalhavam nas indústrias maquiladoras que, segundo os relatos defamiliares e outras fontes, foram raptadas no percurso entre a casa e o emprego, donde se presume poderexistir uma forte relação entre o trabalho das mulheres nas maquiladoras o fenómeno do feminicídio.5

Por exemplo, assegurar o transporte entre a casa/emprego, que é uma obrigação que muitas empresas játêm de cumprir e que consta de muitas legislações nacionais, nomeadamente, quando não há alternativas detransporte, poderia ser uma forma simples de evitar alguns destes crimes. Em Portugal, desde 1913, asempresas são obrigadas a fazerem seguros de acidentes de trabalho que incluam nas coberturas os acidentesocorridos no percurso casa/trabalho, como uma forma de proteção dos trabalhadores e trabalhadoras. Maisque não seja, esta é uma confirmação de que as responsabilidades das empresas não começam e acabam notrabalho e local de trabalho. No caso de Juárez, assegurar o transporte entre a casa e o trabalho não é umaobrigação legal – embora algumas empresas de maior dimensão o façam. Sabendo-se, no entanto, que o queestá em risco é a vida das trabalhadoras das maquiladoras e que é precisamente neste percurso que asmulheres ficam mais vulneráveis e expostas aos riscos de poderem ser raptadas, violadas e mortas, éincompreensível que isso não aconteça. Este é só um exemplo de uma responsabilidade que podia serassumida pelas empresas estrangeiras, senão de uma forma obrigatória, pelo menos em sede de SER. Outrasmedidas, como uma simples mudança de horários de trabalho das mulheres, para evitar que tivessem de sedeslocar em horas mais suscetíveis de correrem maiores riscos, poderiam ser tomadas pelas empresas eigualmente ajudar a minimizar o problema.

Se numa perspetiva legal e normativa não é fácil imputar responsabilidades às empresas estrangeiraspelos crimes cometidos contra as mulheres que trabalham nas maquiladoras, numa perspetiva moral e éticahaverá correlações que não se podem ignorar, nem esquecer, como aquelas que resultam dos impactossocais, diretos ou indiretos, causados pela instalação das empresas estrangeiras em países menosdesenvolvidos. Estabelecendo-se a correlação entre os femicídios e a instalação de empresas estrangeiras emJuárez, estamos certamente perante um caso em que as empresas estrangeiras deviam, pelo menos, tentarassumir a responsabilidade pela segurança das trabalhadoras no percurso entre a casa e a empresa, evitandoque fossem raptadas e posteriormente violadas e mortas.

Estras responsabilidades, não podendo ser exigidas por uma via legal e tendo em conta, nomeadamente,que as empresas também não se podem substituir nem assumir algumas responsabilidades que resulta daincompetência dos governos e das autoridades locais, poderiam, no entanto e entretanto, assumir uma

5 Não há um verdadeiro consenso entre a utilização do termo femicídio ou feminicídio, no entanto, parece que a tendência éusar o femicídio para referir um tipo de homicídio, que vitima as mulheres por razões misóginas,e o feminicídiopor referência aofenómeno dos femicídios. Informação disponível em http://www.mujeresdejuarez.org/, página consultada em 2/08/2011.

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categoria de Responsabilidade Social Empresarial de Género (RSEG). Um conceito novo, que se poderiatentar generalizar e estender a outros casos e a outros países, onde as mulheres possam estar a sofrer asconsequências, quaisquer que sejam, dos impactos sociais e culturais que resultam do simples facto de estasprestarem trabalho em empresas estrangeiras e isso poder provocar alterações dos padrões habituais de vida,contra as expetativas de muitos homens (maridos, namorados, pais, etc.) que devido a culturas muitoenraizadas os conseguem assimilar, reagindo com violência contra essas mulheres.

Daí o nosso objetivo principal deste paper, que é somente o de chamar à atenção para e necessidade dehaver medidas e soluções, para além das habituais, consignadas nas legislações nacionais e em acordosinternacionais, que possam, através da ação dos governos e das organizações não-governamentais,internacionais e mundiais, impor às empresas, que se estão a tornar cada vez mais cosmopolitas einteressadas na exploração do trabalho das mulheres, novas regras de Responsabilidade Social Empresarialde Género (RSEG).

Neste sentido, e partindo do caso paradigmático de Juárez, tentamos argumentar e responder à perguntade partida deste ensaio, que é: devem ou não as empresas estrangeiras, que se estão a tornar cada vez maiscosmopolitas e interessadas na exploração do trabalho das mulheres dos países menos desenvolvidos e doTerceiro Mundo, ser socialmente responsáveis e responsabilizadas pelos impactos sociais e culturais queresultam da sua instalação nesses países e, consequentemente, ser obrigadas a criar e tomar medidas deResponsabilidade Social Empresarial de Género (RSEG), como forma de prevenir ou tentar minimizar oaumento (global) das desigualdades e violência de género contra as mulheres?

1. Crescimento económico e da violência de género contra as mulheres que trabalham nasmaquiladoras em Juárez, no México

A instalação de empresas junto à fronteira dos EUA com o México e em Juárez não é um fenómeno recente,surge na sequência da implementação do Programa de Industrialização da Fronteira do México, estabelecidoem 1965. As indústrias ali instaladas, designadas maquiladoras ou maquilas, destinavam-se inicialmente aabsorver a mão-de-obra de trabalhadores mexicanos imigrantes nos EUA, que depois de acabar os contratoseram obrigados a retornar ao país de origem, muitos dos quais acabavam por se concentrar junto à fronteira(Sazinger, 1997, p. 2 de 15). Porém, o maior crescimento económico ocorre a partir da assinatura dosacordos NAFTA, que vieram permitir a livre circulação de mercadorias entre o Canadá, EUA e México. Esseacordo fez com que muitas empresas dos EUA e Canadá se instalassem junto à fronteira, principalmente naCidade de Juárez, no México, e El Paso, nos EUA.

A proximidade com a fronteira, entre outras vantagens para as empresas, tornaria mais fácil e vantajoso otransporte de mercadorias ali produzidas, não só para o sul como para o norte e daí para todo o mundo, comopara os países da América do Sul, além disso, beneficiando as empresas norte-americanas, canadenses e dosEUA, do acesso ao baixo custo da mão-de-obra mexicana e da livre circulação de mercadorias, isenta deimpostos, consignada nos acordos NAFTA.

O crescimento demográfico de Juárez viria, assim, a aumentar muito na última década e na proporção donúmero de empresas estrangeiras que se instalaram no lado mexicano. Trata-se sobretudo de uma zona queatrai muitos migrantes e imigrantes do sul do México e dos países situados a Sul do México, não só pelocrescimento económico que tem tido, de um lado e do outro da fronteira, como pela esperança acalentada pormuitos/as dos/as que se encontram no lado do México de conseguirem emigrar para os Estados Unidos ouCanadá. Porém, e ao contrário do que acontece na maioria das migrações, o facto de existirem inúmerasmaquiladoras em Juárez e junto à fronteira, a empregar sobretudo mulheres jovens, fez com que muitas paraali se deslocassem, sozinhas, em grupo, acompanhadas pela família e ou companheiros, para trabalhar nasmaquiladoras (sobretudo as mulheres) e, em muitos casos, tentar passar a fronteira para os EUA. Daíresultou um fenómeno demográfico, que faz distinguir Juárez de outas zonas do México, existindoatualmente 99.9 homens por cada 100 mulheres, muito mais mulheres do que em relação a outras cidades doMéxico. Além disso, em Juárez morre quase o dobro dos homens por ano. Por outro lado, mais de um quartodo total das 85.052 famílias ali existentes é chefiado por mulheres, o que constitui um facto inédito, se

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comparado com o resto do Estado de Chihuahua e todos os outros Estados no México6.

Este fenómeno, da preferência e aumento da procura de mão-de-obra feminina, está a deixar de ser só umfenómeno local de Juárez, transfronteiriço e do México. Como refere Leslie Salzinger (1997), as mulheresjovens dos países mais pobres e do Terceiro Mundo estão a tornar-se as trabalhadoras paradigmáticas docapital transnacional, enquanto os homens, como acontece no caso do México, são frequentemente definidoscomo pouco trabalhadores, preguiçosos e conflituosos, nomeadamente, se e quando comparados com asmulheres, principalmente as mais jovens, que têm maior destreza e são muito mais dóceis, obedientes etrabalhadoras (Sazinger, 1997, pp. 1-3). Além disso, como nos dá conta Jorge Alonso, investigador doCIESAS West, o custo do trabalho das mulheres é mais barato,

For the past 40 years, Ciudad Juárez has been a pole of attraction for the maquiladora work force. Inthe seventies and eighties, as male unemployment was on the rise, the job offers in these assembly plants forre-export prioritized young women. The bosses argued that women work more and—even moreimportantly—cheaper. This contributed to the increase in female migration. Single women headed many ofthe households in Juárez, the city with the highest reported rate of children born to single women. Alcoholconsumption increased among the men, as did violence against women (Alonso, 2004, p. s/ nº).

A Cuidad de Juárez, para além de ser o maior polo industrial do México, mantém característicasdemográficas muito próprias que a tornam diferente das restantes cidades do México, em parte devido àsempresas estrangeiras ali instaladas e à preferência destas pelo trabalho feminino, donde podemos concluirque a instalação de empresas estrangeiras naquela zona do México, somada a outros fatores, não só teveimpacto ao nível do crescimento económico como ao nível da estrutura demográfica, em relação ao tipo e àdiversidade da população ali existente. Bastaria estabelecer a correlação entre a população ali existente e apopulação trabalhadora nas maquiladoras para se poder perceber as razões a razão de ali haver maismulheres do que na maior parte das outras cidades mexicanas em consequência da instalação de empresasestrangeiras naquela zona. Os impactos destas movimentações e alterações demográficas têm, certamente,consequências ao nível cultural e dos hábitos e práticas sociais dos autóctones e populações migrantes doMéxico e imigrantes dos países do sul que ali chegam todos os dias. Sabe-se, no entanto, que o problema daviolência contra as mulheres é universal. No entanto, e como Jeanne Armstrong refere, este problema tem-seintensificado em certas regiões onde a cultura local e a supremacia masculina são desafiadas pelas mudançasno trabalho e uma menor exposição às normas patriarcais de género (Armstrong, 2009, p. 6).

Num estudo realizado por Salzinger, sobre a construção das significantes de género, que teve comometodologia a observação participante em três empresas estrangeira, situadas em Juárez, percebe-sefacilmente como as mulheres que trabalham nas maquilas podem ser influenciadas pela cultura típica dasempresas multinacionais e de como isso as pode influenciar e, por exemplo, fazer mudar a forma de vestir ede apresentar no trabalho. O objetivo, na maioria dos casos, é poder destacarem-se umas das outras e dechamar à atenção dos responsáveis para, casualmente, poderem ser escolhidas para os cargos de chefia. Alémdisso, percebendo-se como as mulheres predominam e dominam sobre alguns dos, em menor número,homens mexicanos que trabalham nas maquiladoras – remetendo-os para um segundo plano neste tipo deindústrias (Salzinger, 1997).

Tudo isto pode-se considerar que tem impactos sociais, ao nível das práticas e costumes enraizados napopulação, com consequências que podem estar relacionadas como o aumento da violência de género contraas mulheres. Estas mudanças, apesar de serem aparentemente positivas para as mulheres, criam tensões noshomens, a maioria dos quais, no México e na maior parte dos países subdesenvolvidos, estão ainda estãohabituados ao domínio patriarcal e, no caso do México, à cultura marianista, que reforça, ainda mais, omachismo arreigado dos homens mexicanos. Estas tensões, associadas a outras que emergiram e já existiamem Juárez, podem explicar o aumento da violência contra as mulheres e, além disso, as tendências misóginase o fenómeno dos femicídios. Nas palavras de Hannah Arendt a «impotência gera violência», logo, podemospensar que a perda de poder dos homens em relação às mulheres será uma das causas da violência de género,

6Instituto Nacional de Estadística y Geografía (INEGI).http://www.inegi.org.mx/sistemas/mexicocifras/MexicoCifras.aspx?e=8&m=0&sec=M&ind=1002000001&ent=8&enn=Chihuahua&ani=2010&src=0, site consultado em 24/06/2011.

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neste e em muitos outros casos (Arendt, 1970, p. 54).

Rachel Barnstable (2009), no estudo que realizou, fez entrevistas a trabalhadoras mais velhas, as quaisconfirmaram que a vulnerabilidade e violência, das e contra as mulheres, aumentaram muito com ainstalação das maquiladoras em Juárez e, simultaneamente, alteraram os padrões familiares das famíliasjuarenses, pelo facto de muitas mulheres já não terem de depender dos homens, como no passado(Barnstable, 2009, p. 90).

2. A violência de género contra as mulheres e a responsabilidade social das empresas estrangeiras

A ideia de abordar a questão da responsabilidade social de género das empresas estrangeiras partindo doproblema do femicídio em Juárez, surgiu-nos na sequência da leitura do 1º capítulo do livro deKathleenStaudt (2008), Violence and Activism at the Border: gender, fear, and every day life in CuidadJuárez. Neste capítulo a autora aborda a questão da violência contra as mulheres na fronteira dos EstadosUnidos-México, com destaque para a questão do homicídio de mulheres por razões misóginas, o femicídio,que entre 1993 e 2003, só em Juárez, terá sido a causa da morte de mais de 370 mulheres, segundo aAmnistia Internacional, sobretudo mulheres jovens, que foram raptadas, violadas e mutiladas antes de morrer(Staudt, 2008, p. 2). A investigadora coloca a ênfase na questão da violência doméstica, que afeta asmulheres em ambos os lados da fronteira e é muitas vezes ignorada, podendo ser uma das principais causasdestas mortes. Staudt considera que a excessiva mediatização, feita pelas organizações nacionais einternacionais e os média, em torno da questão dos femicídios faz esquecer o problema principal, que é o daviolência doméstica de que são vítimas as mulheres, de um e do outro lado da fronteira, em Juárez e em ElPaso (Ibidem, 2008).

O relato seguinte é um desses exemplos. Serve ao mesmo tempo para expressar o que se passa emJuárez e corresponde ao discurso que Staudt, que tem uma larga experiência e conhecimento da realidadelocal e defende que é necessário evitar este tipo de discurso enfático, que faz fazer esquecer o problemaprincipal e o que tem de ser combatido – a violência de género contra as mulheres, de uma maneira geral, deum outro lado da fronteira.

Soy una mujer que trabaja, y hoyvuelvo a casa arrastrando el cansancio de una jornadaintensa. Y soy muy afortunada, mucho. Esta misma noche, en Ciudad Juárez, es muy probable queoutra mujer como yo -o mucho más joven, prácticamente una niña-, no regrese nunca a su hogardespués del trabajo en la maquila. La habrá señalado una mano invisible, homicida, y la oscuridad setragará sus sueños y esperanzas. Habrá sido atrapada y sometida a una tortura atroz: uninterminable caminho hacia la muerte poblado de vejaciones sexuales, mutilaciones y crueldadinaudita. Tal vez aparez casu cuerpo, mostrando la evidencia del sufrimiento indecible, o tal vez no.Simplemente, habrá desaparecido y sus seres queridos no tendrán siquiera la oportunidad dedespedirse de ella. Hablo de Lilia, Anahí, Juana, Esmeralda, Violeta... Todas tenían nombre, futuro, yun derecho a vivir libres y seguras que lesfue brutalmente arrebatado.

Hace una década que este exterminio sistemático y despiadado hacia las mujeres se practica enCiudad Juárez. A diario, como se toma el autobús, se compra algo de comer o se duerme. Más de 400víctimas mortales y un número indeterminado de desaparecidas han hecho que el crimen sea unescenario cotidiano en este lugar, una localidade fronteriza del estado de Chihuahua, en México. Lasrazones de este terrorismo de género se entretejenen una tupida y siniestrared de intereses. Mafias denarcotraficantes que imponen la ley del miedo y la violencia sexista como arma de dominación;grupos que practican el comercio de órganos; sicários del turismo sexual asesino, o de bárbarosrodajes cinematográficos... Siemprehay detrás alguien que se beneficia: que gana dinero o consolidapoder a costa de esas mujeres que há no sado buscar empleo, aunque seaen condiciones deexplotación, y tratan de ser dueñas de su propia vida enun entorno patriarcal y machista.7

7Velasco, Amparo Alvarez (2008). Ciudad Juárez: Combatircon la memoria. Martes 22 de abril de 2008.http://www.ciudaddemujeres.com/articulos/Ciudad-Juarez-Combatir-con-la, página consultada em24/06/2011.

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Porém, e ainda que a relação entre as empresas estrangeiras e o elevado número de femicídios queocorrem em Juárez possa ser considerada menos importante para resolver o problema, do que a relaçãodestes com a violência doméstica, não podemos deixar de pensar que essa relação existe e que as empresaspodiam e podem desempenhar um importante papel na prevenção destes crimes.

Ao contrário de Staudt, pensamos que se poderia aproveitar a ênfase dos média e das organizaçõesnacionais e internacionais, feministas e outras, que denunciam os crimes de femicídio, porém, fazendo-o como objetivo de obrigar as empresas estrangeiras a terem de se coresponsabilizar pelo problema, obrigando-as atomar medidas de RSE ‘de Género’, que pudessem contribuir não só para diminuir a violência de génerocontra as mulheres, como para evitar alguns crimes de homicídio, violação e rapto de mulheres. Um segundoobjetivo seria, a partir daqui, conseguir-se instituir a Responsabilidade Social Empresarial de Género, não sópara as empresas estrangeiras instaladas em Juárez, abrangendo todas as outras empresas estrangeiras(cosmopolitas) que já se instalaram e vão instalar noutros locais e países onde problemas de género, idênticosao de Juárez, possam surgir.

Em termos de in/capacidade das empresas estrangeiras poderem contribuir para a resolução dosproblemas da violência de género contra as mulheres que trabalham na maquiladoras, basta pensar que asempresas estrangeiras regra geral assumem compromissos de proteção dos seus trabalhadores/asestrangeiros/as, deslocados/as do país de origem ou outros, tudo fazendo para prevenir e evitar que, em casoalgum, estes ou estas possam ser vítimas deste ou de outro tipo de crimes. Daí se pode deduzir que estas têma capacidade e poderiam estender essas preocupações com a proteção aos restantes trabalhadores etrabalhadoras. Quiçá, por exemplo, para além de assegurar a segurança no percurso casa-emprego e amudança de horários de trabalho, bastaria promover uma maior aproximação e integração dos familiares e oucompanheiros das mulheres de forma a estes poderem conhecer e compreender as práticas destas empresas, acultura viajante e os diferentes métodos de trabalho, caso isso pudesse contribuir para a desmistificação eperda de alguns preconceitos dos homens mexicanos em relação ao trabalho das mulheres.

Em termos de ir/responsabilidade das empresas, que ainda que pudessem persistir algumas dúvidas sobrea possibilidade de haver algum tipo de relação, ainda que transversal, entre o trabalho nas maquiladorasestrangeiras e o aumento da violência de género contra as mulheres e dos femicídios (cfsupra), outraevidência mostra que as empresas são corresponsáveis pela violência contra as mulheres, a maioria das quaisse deslocou de outros locais só para trabalhar nas maquilas de Juárez: o facto de os governantes eresponsáveis das empresas estrangeiras saberem de antemão, antes das empresas ali se terem instalado, queaquela já era perigosa por razões que tinham a ver com o tráfico de droga, imigração ilegal e outras, podendopor isso ter escolhido outros locais, que não Juárez, para a instalação dessas mesmas empresas no México.

3. Responsabilidade Social Empresarial de Género (RSEG)

Não é nossa intenção apresentar aqui dados e outros elementos concretos sobre aquilo que se está apassar em Juárez, no sentido de confirmar a validade das hipóteses aqui colocadas – há já imensos estudos emuitas organizações de todo o tipo a trabalhar no terreno que abordam e estudam essas matérias. Aquilo quenos chamou à atenção e motivou esta abordagem tem a ver não só com o que se passa em Juárez, pelo dramaque envolve, mas, também, com o que se passa em muitas outras partes do mundo, embora com efeitos erepercussões que naturalmente variam de local para local – a necessidade de as empresas estrangeiras, que seestão a tonar cada vez mais cosmopolitas, terem de ter sempre em consideração a necessidade de adotarmedidas de responsabilidade social de género, sempre que necessário, no sentido minimizar e evitar osefeitos e consequências negativas para as mulheres que possam resultar de impactos sociais e culturais,ocasionados pelo confronto de culturas e práticas diferentes das locais, com as que são transportadas porestas empresas. Trata-se, no fundo, de alertar para uma das possíveis consequências do crescentecosmopolitanismo empresarial que, como refere Bauman, é uma consequência da difusão à escala global doshabitats económicos e que, segundo a perspetiva de Beck, em especial a partir da última década, veio

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permitir que também as empresas se pudessem tornar cosmopolitas, no sentido em que estas se podem agorainstalar em qualquer parte do mundo, não interessando a origem nem das empresas nem do capital (Bauman,1998; Beck, 2006).

Por conseguinte, o que importa é chamar à atenção das organizações nacionais e internacionais e dosgovernos dos países para a necessidade de responsabilizarem estas empresas (multinacionais/cosmopolitas) ede as obrigarem a tomar medidas concretas no sentido da prevenção dos impactos culturais e sociais quepodem resultar da sua instalação em países culturalmente diferentes e economicamente menosdesenvolvidos. Estas empresas (cosmopolitas), são aquelas que agora andam mundo fora e quase semrestrições, em busca de países e locais onde seja possível baixarem os custos de produção, em muitos casos,à custa dos salários baixos salários e, tendencialmente, à custa da exploração do trabalho das mulheres (cfsupra).

As empresas cosmopolitas são uma realidade ainda recente, empresas que dependem cada vez mais docapital financeiro, que não têm necessariamente uma nação de origem e que podem habitar (instalar-se) emqualquer parte do mundo, onde seja lhes mais rentável e possível a produção ao baixo custo e ou o acesso anovos mercados – não olhando estas a meios para o poderem fazer. Segundo a perspetiva defendida porUlrichBeck, que defende que só agora está a ocorrer a verdadeira passagem e entrada na pós-modernidade,segundo a perspetiva cosmopolita, que veio suceder à perspetiva nacionalista,da modernidade e dos Estados-nação, com origem em Vestefália, já não se pode falar em empresas multinacionais ou na internacionalizaçãode empresas, o que há agora são sobretudo empresas cosmopolitas (Beck, 2006). Daí, a nossa preocupaçãocom os efeitos e consequências desta crescente cosmopolitização mundial e das empresas, e a necessidade deas tornar socialmente mais responsáveis, nomeadamente, obrigando-as a ter em conta as questões de género eos impactos sociais resultantes da tendência para a feminização do trabalho à escala global.

4. Dualidade de conceitos de fronteira

As fronteiras geográficas são linhas que separam os países uns dos outros, que os delimitam e os fazemconfinar àquele espaço. Do ponto de vista sociológico, fronteiras são muito mais do que isso: são partiçõesque dividem não só espaços sociais e geográficos, mas também diferentes culturas e as suas representações(Adalberto & Simmers, 2008, p. 100). Esta concepção, para além de confirmar tudo o que temos vindoafirmar sobre o confronto de culturas, remete-nos para a ideia de há vários tipos de fronteiras e derepresentações desses espaços.

Para Adalberto e Simmers as fronteiras têm o potencial de mesclar terra e pessoas num corpocompartilhado de representações sociais e culturais e por isso os border crossers do México, em cadamovimento e incursão no espaço dos Estados Unidos, independentemente do visto ou autorização deresidência e trabalho e da proximidade com a fronteira, levam consigo todo um conjunto de representaçõesassociadas à fronteira, relacionadas com a imigração ilegal, o tráfico de estupefacientes e o receio depassagem de terroristas através do México para os EU (Adalberto & Simmers, 2008, pp. 101-103).

As fronteiras que separam a Europa de África ou os Estados Unidos do México, por exemplo, sãodiferentes das que separam Portugal de Espanha ou os Estados Unidos do Canadá: no primeiro caso, estãoem causa diferenças culturais e económicas, questões de segurança e muitas outras que distinguemclaramente os dois lados da fronteira; no segundo, as fronteiras estão cada vez mais dissimuladas e existemmais para exercer controlo externo e manter as diferenças entre os países, nomeadamente as culturais eeconómicas, embora essas sejam diferenças pouco acentuadas.

Apesar de se falar muito da maior porosidade das fronteiras e da perda de poder dos Estados-nação, estasainda continuam a ser muito importantes na construção da economia global. A tendência atual dos paísesmais desenvolvidos, principalmente dos EU e da UE, é a de manter as fronteiras abertas ao capital, aotrabalho barato e aos mais ricos e fechar as fronteiras àqueles que podem reivindicar direitos de cidadania oudireitos associados ao welfare-state (Wonders, 2007, pp. 35-36).

As representações que se fazem dos que atravessam as fronteiras, dos border crossers, também diferem

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entre si: no primeiro caso a tendência é considerar que existimos ‘nós’ e os outros e no segundo essadistinção não é tão clara, em alguns casos até se confundem uns com os outros. A concepção de fronteiracomo um espaço social transcultural, com potencial de apagar a distinção binária entre o ‘nós e os outros’,que Adalberto e Simmers defendem, aplica-se mais ao segundo caso, por exemplo, das fronteiras queseparam os países da União Europeia, que é bem diferente da fronteira que separa os EUA do México.

No caso da fronteira de Juárez com El Paso, principal ponto passagem do México para os EU, não só nãoé possível aplicar esta concepção como, pelo contrário, é natural que as diferenças culturais e os estigmasque separam ‘uns dos outros’ e ambos os lados aumentem; até porque de um lado da fronteira temos aquelaque é considerada a cidade mais perigosa do mundo e do outro uma das mais seguras dos EU – o que nãodeixa de ser paradigmático.

5. Obrigações sociais das empresas estrangeiras (cosmopolitas)

Um relatório da ONU, de 2006, sobre a violência contra as mulheres, reconhece claramente que ofemicídio é um fenómeno que ocorre principalmente em zonas onde as economias são dominadas pelasmaquilas, com destaque para Juárez8.

Nos países desenvolvidos a instalação de empresas, especialmente as de maior dimensão, estápreviamente sujeita a uma série de condicionalismos: estudos de impactos ambientais, urbanísticos, sociais eeconómicos. Nos países menos desenvolvidos sabe-se que isso nem sempre acontece, salvo quando se tratada instalação de empresas de grande dimensão ou de interesse nacional em que os Estados têm de intervir ouquando está em causa o cumprimento de acordos e obrigações internacionais das empresas e governos.

A ideia que se tem, e que a maioria dos governos dos países menos desenvolvidos parece subscrever, éque se se fizer muitas exigências às empresas multinacionais (cosmopolitas) afugenta-se o investimentoestrangeiro. As empresas, cada vez mais cosmopolitas – que tanto se podem instalar num país como emqualquer outro –, acabam na maior parte dos casos por preferir em países onde essas exigências não existemou são compensadas por outras vantagens.

A pergunta que se coloca (cfsupra), e que aqui voltamos a fazer, é se as empresas estrangeiras(cosmopolitas), especialmente as oriundas de países mais desenvolvidos, como os EU, devem ou não serresponsáveis e responsabilizadas pelos impactos sociais e culturais que resultam da sua instalação nessespaíses.

No caso dos femicídios em Juárez, que se sabe envolve muitas mulheres trabalhadoras dasmaquiladoras, coloca-se também a questão de saber se as empresas poderiam e deveriam tomar medidas noâmbito da RSEG, no sentido de ajudar a prevenir ou a minimizar a violência de género e os crimes contra asmulheres, como por exemplo, assegurar o transporte das trabalhadoras entre a casa e o emprego, evitandoque estas pudessem ser raptadas, violadas, mutiladas e mortas. Ou então, como já referido, outras maissimples e fáceis de tomar como a de alterar os horários de trabalho para evitar que as trabalhadoras dasmaquiladoras tivessem que se deslocar para o trabalho de noite ou de madrugada.9

Numa petição online, para acabar com a violência e os crimes contra as mulheres de Juárez, dirigida aogoverno de Chihuahua e à Comissão interamericana de Direitos Humanos, subscrita por várias organizações,podemos verificar que uma das reivindicações da organização mexicana May Our Daughters Return Home éde que as empresas assegurem o transporte entre a casa e o emprego das mulheres que trabalham nasindústrias e que muitas vezes têm de se deslocar durante a noite (Nuestras Hijas de Regreso a Casa y CocoFusco, 2011). Isto confirma que essa é uma das necessidades reivindicada e dirigida especificamente às

8 “Femicide occurs everywhere, but the scale of some cases of femicide within community contexts — for example, inCiudad Juárez, Mexico and Guatemala — has drawn attention to this aspect of violence against women. Most officialsources agree that more than 320 women have been murdered in Ciudad Juárez, one third of whom were brutally raped. |…|The killings have been concentrated in areas where the economies are dominated by maquilas, assembly plants for exportproducts owned and operated in tax-free zones by multinational companies”(United Nations, 2006, p. 41)9 Muitos relatos de familiares das mulheres raptadas dão conta de terem desaparecido enquanto esperavam pelo transporte,de e para a empresa onde trabalhavam, de madrugada e à noite.

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empresas estrangeiras, que são a maioria.

6. Riscos e segurança dos trabalhadores cosmopolitas e dos locais

As empresas estrangeiras têm uma particularidade muito própria, que é terem normalmente dois tipos detrabalhadores: os de primeira categoria, que pertencem à empresa ou ao país de origem, trabalhadores queUlrich Beck (2006) designa de trabalhadores cosmopolitas, e os de segunda categoria, que são trabalhadoreslocais.10 Entre um e outro tipo de trabalhadores há diferenças abissais, nomeadamente, em termosremuneração e de segurança. Se em relação à remuneração dos trabalhadores, ainda se compreende queassim seja, visto que as diferenças salariais se devem ao facto de estarem deslocados dos países de origem, jáem relação à questão da segurança não se percebe como é possível as empresas só terem de se preocuparcom a segurança dos trabalhadores e trabalhadoras estrangeiros e não com a dos e das locais – apesar de,obviamente, estarmos a falar de diferentes graus de responsabilidade.

À partida, quando um/a qualquer trabalhado/a se desloca em serviço, as empresas devem assegurar que ofaça em condições de absoluta segurança, nomeadamente quando estes ou estas têm de se deslocar parapaíses como o México e zonas de elevado risco como a de Juárez. Sendo esta cidade classificada como umadas mais perigosas do mundo, por essa mesma razão, é natural que haja, por parte dos responsáveis dasempresas, uma preocupação acrescida com a segurança dos/as trabalhadores/as. Porém, essa mesmaresponsabilidade parece não existir em relação aos trabalhadores locais, que em Juárez são, na maioria, doscasos mulheres que trabalham nas maquiladoras. Acresce a este o facto de muitas dessas mulheres, na suamaioria jovens, terem de se deslocar de noite ou de madrugada para trabalhar nas maquiladoras de Juárez, amaioria das quais estão instaladas em locais distantes das residências e fora das zonas urbanas, sendo estasobrigadas muitas vezes a deslocar-se por zonas degradadas, pouco populosas ou desertas, além de terem dese confrontar, também, com as dificuldades de transporte de noite ou madrugada, ficando expostas a todosriscos inerentes – rapto, violação e, no extremo, homicídio.

Perante isto, é legítimo pensar-se que as empresas estrangeiras, conhecendo os riscos que principalmenteas mulheres trabalhadoras nas maquilas correm no percurso casa/trabalho e que seguramente os/astrabalhadores/as deslocados/as do país de origem das empresas não têm de correr, deviam ser socialmenteresponsáveis e preocupar-se não só a segurança dos trabalhadores deslocados a partir do país de origem, mastambém com a dos trabalhadores, homens e mulheres, que lá trabalham, assegurando-lhes, por exemplo, otransporte entre a residência e a empresa.

Como Brennan (1997) refere, os países do terceiro mundo sempre serviram de muleta à economia dosEUA e agora isso faz-se de uma forma diferente e o acordo NAFTA é a prova de que o trabalho já se podeimportar, através dos gestworkers e das Leis de Imigração Seletivas (Brennan, 1997, p. 5). No caso doMéxico, diríamos o contrário, que também se exportam desigualdades em termos salariais, de segurança, decondições de trabalho e em especial de ir/responsabilidade social de género – como acontece no caso deJuárez.

7. Responsabilidade Social Empresarial de Género (RSEG)

Em termos de RSE, as empresas estrangeiras têm responsabilidades acrescidas em relação às outras,visto que, como já referido (cf. supra), ao deslocarem-se, inevitavelmente, transportam consigo modelossociais estranhos aos locais, que podem influenciar, positiva e negativamente, as práticas e os costumeslocais e causar impactos de diversa ordem. No caso de Juárez, a instalação das maquiladoras estrangeirasjunto à fronteira terá tido consequências económicas positivas, ao permitir que aquela zona se desenvolvesse.Por outro lado, originou surtos migratórios do Sul do México e da América do Sul, por motivos vários, quenão se limitam ao trabalho nas empresas maquiladoras. No caso das mulheres, os motivos das migraçõespara a fronteira são não só o emprego nas maquiladoras e a possibilidade de emigrarem para os EU,10 Trabalhadores cosmopolitas, no sentido que lhes é atribuído por UlrichBeck, são aqueles que estão em toda a parte, quese deslocam com as empresas cosmopolitas e que em alguns casos têm não uma mas várias nacionalidades (Beck, 2006)

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miscigenam-se com os interesses dos parentes e ou dos companheiros. Uns e outros, homens e mulheres,buscam na realidade melhorar as condições de vida e fugir à miséria que atinge a maior parte da populaçãomexicana. Porém, por razões várias, algumas já aqui abordadas, parece ser mais fácil para as mulheresadaptarem-se às mudanças e assimilarem certos hábitos e práticas importados com as empresas estrangeiras,que são comuns no país vizinho, os EUA, até porque, para muitas, isso significa a independência e fim dadependência e dominação masculina. Na verdade, não é tão fácil para os homens mexicanos aceitar asmudanças das mulheres, muito menos prescindir do poder patriarcal e romper com a cultura marianamexicana. Se atendermos ao que nos diz Nayla Farouki (2004), em Os dois ocidentes, percebemos o quemotiva e dá força às mulheres para seguirem um caminho diferente do da dominação e dependência emrelação aos homens, maridos, pais, companheiros, etc.:

A vontade de ser e o desejo de pertencer são, actualmente, bastantes vivazes. Mas a linha dedivisão situar-se-á cada vez mais no interior de cada indivíduo, entre o seu desejo de liberdade e oseu medo de enfrentar o desconhecido, entre valores universais que tem de reconhecer e os valoreslocais que teme ver desaparecer. (Farouki, 2004, p. 213)

Percebe-se, por outro lado, a dificuldade que muitos homens têm em se adaptar a essas mudanças e asrazões por que reagem mal, com violência física e psicológica e, em alguns casos com o recurso à violênciaextrema – ao femicídio.

Quanto às empresas, podemos pensar que se instalaram junto à fronteira na sequência dos AcordosNAFTA mas, também, pela oportunidade de aproveitar a mão-de-obra mais barata (sobretudo feminina),para poderem reduzir os custos de produção, concorrer com os mercados internacionais e aceder aosmercados dos países do sul e norte da América. Além disso, beneficiam, certamente, de alguma desregulaçãoe descontrolo institucional que impera naquela zona, o que lhes dá alguma mobilidade e liberdade deatuação, nomeadamente em termos de desresponsabilização social e de violação dos direitos humanos e dotrabalho.

Ainda assim, estas empresas por uma questão de imagem, de práticas, de avaliação e até de RSE,normalmente, pagam salários mais altos do que as empresas locais e dão melhores condições de trabalho(segurança, higiene, logísticas, etc.), tornando-se por isso atrativas para muitos trabalhadores e trabalhadoraslocais. Por esta e outras razões é natural que os trabalhadores e trabalhadoras das empresas estrangeirasadquiram também um estatuto diferenciado dos outros e outras que trabalham nas empresas locais. Aspráticas e os costumes transportados com as empresas estrangeiras podem ser um fator diferenciador eexercer diversos tipos de influência, que em muitos casos entram em confronto com os da cultura mexicana.Por exemplo, colocar mulheres e homens a trabalhar no mesmo sítio e em pé de igualdade ou deinferioridade dos homens é algo que pode colidir com a cultura local, nomeadamente, com as culturaspatriarcal e marianista que coexistem no México. Este estatuto diferenciado das empresas estrangeiras, aindaque possa ser positivo em muitos aspectos, nomeadamente por obrigar as empresas nacionais a evoluir nomesmo sentido, pode ser perspetivado como um impacto social negativo e um foco de conflitos culturais esociais.

Por outro lado, para os trabalhadores e trabalhadoras das empresas estrangeiras, autoridades e dosgovernantes locais talvez seja impensável responsabilizarem as empresas estrangeiras por este ou outro tipode impactos e menos ainda pelas consequências, ainda que transversais, que daí podem resultar. Pior ainda sese tratar de impactos sociais de género, como os que afetam as mulheres que trabalham nas maquilas, emJuárez.

Para nós, que conhecemos realidades diferentes e todo o conjunto de obrigações legais e em sede de RSEque as empresas dos países mais evoluídos estão normalmente obrigadas a cumprir, não seria estranho pensarque as empresas têm responsabilidades sociais também pelas questões de género e deviam responsabilizar-seou tentar evitar as consequências, diretas e indiretas, que daí podem resultar.

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Segundo a perspetiva feminista radical certamente que os homens, o patriarcado e o marianismo, são ascausas que explicam o fenómeno do femicídio em Juárez. Por outro lado, as narrativas públicas tendem afocar a responsabilidade nas autoridades e governos mexicano e dos EU, responsabilizando-os pelaineficácia no combate ao crime, ao tráfico de droga e à corrupção que explica muitos dos crimes cometidosem Juárez. O foco dos estudos feministas pós-estruturalistas, vai mais no sentido de estabelecer categorias degénero, hegemónicas, estruturadas em momentos culturais particulares dos espaços de trabalho. O estudo deLeslie Salzinger, no entanto, vai mais longe no sentido de perceber como são construídos as significantes degénero nos espaços de trabalho das maquiladoras de Juárez (cfsupra). Salzinger no estudo que realizouconcluiu que as percepções de género se constroem no mains stream das empresas, mas que não são nemarbitrárias nem isoladas: o género é uma relação social – uma estrutura de significados estabelecidos por eentre sujeitos vivos nas práticas diárias –, como tal as significantes de masculinidade e feminidade variamcom as interações, estratégias, enquadramento e subjetividades dos que habitam certos espaços e com oresultado de suas lutas (Salzinger, 1997, p. 12 de 15).

Nenhuma empresa estrangeira quando se quer instalar num país ignora a importância da cultura nativa,os hábitos e as práticas que são diferentes. As questões religiosas são um exemplo disso. No México,associado à religião e não só, persiste a cultura do marianismo e do patriarcado, construções sociais degénero que não podem ser ignoradas nem esquecidas. Nesse contexto cultural não é habitual as mulheresemanciparem-se em relação aos homens, nem sequer trabalharem fora de casa e muito menos serem elas aprincipal fonte de rendimento do lar. A instalação de inúmeras empresas estrangeiras em Juárez veio mudarmuitos desses hábitos, considerados por muitos de nós, ocidentais do norte, hábitos ancestrais.

No caso dos países menos desenvolvidos, ou em desenvolvimento como o México, independentementedos impactos culturais e sociais se poderem considerar positivos e um avanço em termos de emancipação eigualdade de direitos das mulheres, bastaria que houvesse uma única morte de mulher por razões misóginasem consequência desses impactos, para que tivéssemos que refletir e reagir em relação a isso. A questão quese coloca é se as empresas estrangeiras podem ou não ser responsabilizadas por questões como a da violênciade género de que são vítimas as mulheres que trabalham nas maquiladoras – vítimas dos femicídios?

Como Maria Costa (2005) refere, a responsabilidade social empresarial contém no seu cerne a ideia de ir“além da lei” (Costa, 2005, p. 75). Como tal, no caso específico de Juárez, diríamos que sim, que asempresas estrangeiras são responsáveis e têm a obrigação de ser socialmente responsáveis pelas questões degénero, não só pelas que podem estar na origem da violência contra as mulheres mas por todas as outras:primeiro, porque as maquiladoras na maioria dos casos empregam mão-de-obra feminina, no entanto,privilegiando o trabalho de mulheres jovens, entre os 16 e os 30 de idade em detrimento do das mulheresmais velhas; segundo, pelo facto de estas empresas admitirem mais mulheres do que homens também porrazões económicas, i.e. por lhes poderem pagar salários mais baixos do que aos homens, logo, umapreferência que se baseia em questões de género, socialmente construídas, não na diferença de sexo quedistingue os homens e as mulheres e os e as habilitam a realizar melhor alguns tipos de trabalho; terceiro,porque se essas empresas se preocupam e conseguem garantir a proteção dos trabalhadores deslocados dospaíses de origem e não fazem o mesmo em relação aos locais, apesar de saberem antecipadamente, antesmesmo de ali se terem instalado, que Juárez já era uma cidade muito violenta e perigosa; quarto, tem a vercom os costumes e as práticas transportadas pelas empresas estrangeiras, com a «cultura viajante», e o factode as empresas estrangeiras poderem não ter em conta a cultura e os hábitos locais e causar impactos sociaisnegativos, com consequências negativas, como o aumento da violência contra as mulheres e no extremo dofemicídio de muitas delas.

Estamos pois perante situações em que a RSEG se justificaria, atendendo não só à especificidade do casode Juárez, que certamente não é único no mundo, mas a outras situações em que os impactos sociais eculturais podem ter consequências imprevisíveis e por em risco a própria vida das mulheres. Consequênciasque se explicam e resultam da instalação de empresas estrangeiras (cosmopolitas) em países menosdesenvolvidos e culturalmente diferentes e que são preocupantes devido à crescente cosmopolitização einteresse das empresas pelo trabalho feminino (supostamente mais produtivo, mas mais mal pago).

O que importa é saber, é se os Estados e as organizações internacionais e mundiais deveriam impor

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regras e responsabilizar socialmente as empresas cosmopolitas pelo impacto social e cultural que causam ouse, pelo contrário, é suficiente alertar as empresas para este problema e deixar que sejam elas a atuar, noâmbito das políticas de responsabilidade social e da imagem que estas necessitam manter ao nível local eglobal, ou para agradar aos acionistas.11

O femicídio, os crimes, a violência, o tráfico de droga e todos os problemas que fazem de Juárez a cidademais perigosa do mundo, por mais estranho que possa parecer, não impediram nem impedem as empresas deali se instalarem, quando se sabe que estas poderiam igualmente instalar-se noutras zonas menos conflituosasdo México, sem prejuízo das atividades económicas. Estas empresas preferem gastar em segurança dasunidades industriais e dos funcionários deslocados do país de origem do que procurar zonas mais calmas emenos perigosas do que Juárez. Os governos, dos Estados Unidos e do México, as autoridades locais e asempresas são igualmente responsáveis pela situação que ali se criou.

Não obstante essa responsabilidade ser extensível às empresas, os movimentos sociais, a imprensa e amaior parte da literatura e bibliografia existente tende a responsabilizar mais as autoridades locais e osgovernos pela ineficácia no combate à violência, esquecendo a responsabilidade das empresas, que nestaamálgama de interesses saem e entram conforme os interesses económicos, as restrições e vantagens que lhesão impostas ou oferecidas, sem que ninguém fale da responsabilidade social das mesmas em relação aoscrimes e a violência de género de que são vítimas as mulheres trabalhadoras nas maquiladoras.

8. Corresponsabilidade social dos Estados

O princípio que enforma e organiza as sociedades pós-capitalistas, segundo Peter Drucker (2003),considerado o pai da gestão moderna, é o da responsabilização, o dever das organizações assumirem paraalém da “responsabilidade económica”, também, a “responsabilidade social”. O mesmo autor defende que “odesempenho económico não é a única responsabilidade de um negócio, tal como o desempenho educacionalnão é e única responsabilidade de uma escola, […]. O poder deve ser sempre equilibrado comresponsabilização; de outro modo, torna-se tirania” (Drucker, 2003, pp. 109-113).

O mesmo se pode pensar em relação aos Estados sempre que têm algum tipo de intervenção económicaque se sabe vai implicar, necessariamente, a curto, médio ou a longo prazo, mudanças sociais negativas. E,quanto mais poderosos e desenvolvidos são maiores deviam ser as responsabilidades sociais e económicasque têm.

Os Estados mais ricos e desenvolvidos e as empresas cosmopolitas – que são quem mais beneficia comos acordos económicos com os países menos desenvolvidos ou em crescimento – deviam responsabilizar-sepelas consequências sociais negativas que resultam desses acordos económicos, como aquele que os EUA,Canadá e México fizeram (NAFTA), que permitiu o crescimento económico do México, mas não evitou quea Cidade de Juárez se tornasse a mais perigosa do mundo e aquela onde há mais vítimas de femicídio e deviolência de género. É até paradoxal pensar na diferença que existe entre um e o outro da fronteira que separaJuárez de El Paso: de um lado, está a cidade que é considerada atualmente a mais perigosa do mundo; dooutro, uma das mais pacíficas dos EU.

9. O papel dos Estados e das organizações internacionais e mundiais

O estudo realizado por Cecília Santos revela-nos a importância da criação da primeira Women`sPoliceStation no Brasil, de como isso tem contribuído para a redução da violência contra as mulheres e acabou porinfluenciar a criação de mais de trezentas esquadras de polícia femininas no Brasil, e de como esse fenómenose estendeu a outros países da América Latina, levando à criação de idênticas esquadras em oito países(Santos C. M., Women`s Police Sations: gender, violence, and justice in São Paulo, Brazil, 2005, pp. 178-179). Este é um exemplo de como os Estados podem, querendo, intervir e resolver as questões da violência

11 Importa não esquecer que já há índices nas bolsas que são constituídos só por empresas consideradas SocialmenteResponsáveis e Verdes.

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de género contra as mulheres.

Ainda assim, a criação de esquadras femininas não parece ter sido suficiente para acabar com osproblemas de discriminação racial, sexual e em função da posição social das mulheres – especialmente se sãoprostitutas, negras ou vivem na rua –, impedindo-as frequentemente de ter acesso à justiça, apesar de nestasesquadras só existirem polícias mulheres (Ibidem, 2005: pp. 132-149). Isto significa que não depende só doEstado acabar com as diferenças de género, discriminação racial e desigualdade social, visto que há questõesque não são fáceis de resolver e lhe fogem à alçada.

Há questões que só a própria sociedade e as organizações sociais, internacionais e mundiais, conseguemresolver e, mesmo assim, nem em todos os casos. Basta pensar no caso das burcas, que se passourecentemente em França e gerou imensa polémica, para se perceber que nem tudo o que está relacionado compráticas, crenças e costumes culturais pode ser resolvido com facilidade e segundo uma perspectiva globalúnica e universal.

A corrupção e falta de formação dos agentes policiais, sejam eles do sexo feminino ou masculino,continua a ser um dos problemas que mais contribui para a violência e impede a proteção de mulheres ehomens, no Brasil, tal como em Juárez. Cabe, assim, às organizações e associações internacionais enacionais, do México, denunciar, responsabilizar e exigir às empresas estrangeiras que cumpram as suasobrigações sociais em termos de responsabilidade social de género que afetam as mulheres que trabalhamnas maquiladoras, em Juárez.

10. Mudanças culturais, à escala global, por influência das empresas estrangeiras

Um exemplo recente e curioso da influência que as empresas estrangeiras e o rápido crescimentoeconómico podem casuar, é o da China, um dos países do mundo mais conservador e onde ainda predominaessencialmente a cultura patriarcal. Como refere o sociólogo ChenYijun, citado pelo People`sDaily, asmudanças culturais impulsionadas pelo desenvolvimento económico permitem que muitos jovens da«geração Y», pós anos 80, se tornem independentes mais cedo e isso fez também aumentarexponencialmente o número de divórcios nesta faixa etário, além disso, como os pais não têm que garantir osustento dos filhos durante tanto tempo isso permite que muitas mulheres e homens das faixas etárias acimados 50 anos se estejam também a separar.12

Muitas mulheres chinesas acima dos 50 anos preferem agora viver sozinhas, pondo fim ao calvário doscostumes enraizados que as impedia de seguir livremente a sua vida sem terem de assumir a dupla função detrabalhadoras, dentro e fora de casa. Este fenómeno acontece especialmente na fase de reforma porquedurante a vida ativa a separação destas mulheres teria sido menos aceite pela sociedade. No entanto, isto tudosignifica uma mudança cultural significativa e naturalmente resulta do impacto social da abertura da Chinaao modelo económico de mercado e à modernização que lhe é inerente. Uma modernização que em grandeparte se deve à influência exercida pelos hábitos e costumes importados juntamente com as empresasestrangeiras que a incorporam.

11. Conclusão: a ir/responsabilidade social de género das empresas estrangeiras

Segundo UlrichBeck o mundo do trabalho e as empresas estão a tornar-se cada vez mais cosmopolitas(Beck, 2006). Se antes eram os trabalhadores que migravam e se deslocavam à procura de trabalho noutrospaíses, agora são também as empresas que se deslocam à procura do trabalho, mais barato e tendencialmentefeminino, em países menos desenvolvidos e do Terceiro mundo. Outra diferença significativa, entre o antes eo agora, é que antes eram sobretudo os homens que migravam à procura do emprego noutros países e agorasão as empresas que se deslocam à procura de países e locais onde possam pagar salários mais baixos,sobretudo, à custa da exploração de mão-de-obra feminina. Como refere Salzinger, as mulheres dos paísesmenos desenvolvidos e do Terceiro Mundo estão a tornar-se trabalhadoras paradigmáticas do capital12http://www.chinahush.com/2011/06/05/5000-families-break-up-in-china-everyday/, pág. consultada em 28/06/2011.

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transnacional (Sazinger, 1997).

Neste paper abordámos a questão do crescimento económico, da violência de género, nomeadamente,em relação às mulheres que trabalham nas maquiladoras em Juárez. Estabelecemos a relação do crescimentoeconómico e instalação das empresas estrangeiras com a violência doméstica e o fenómeno dos femicídios eabordámos a questão das obrigações e responsabilidade social das empresas estrangeiras que se deslocampara os países menos desenvolvidos, do choque de culturas, das «culturas viajantes» transportadas pelasempresas estrangeiras e dos impactos socais e culturais que daí podem resultar, etc. Como referido naintrodução, o objetivo era responder à questão de partida deste estudo que, em resumo, questiona se asempresas estrangeiras (que se estão a tornar cada vez mais cosmopolitas) devem ou não ser responsáveis eresponsabilizadas, no âmbito da Responsabilidade Social Empresarial, por impactos sociais e culturaiscausados pela sua instalação em países menos desenvolvidos e do Terceiro mundo, e, consequentemente,devem ser obrigadas a criar e a tomar medidas que possam prevenir e ou minimizar os efeitos econsequências desses impactos?

Esta pergunta, está intensionalmente diferente da inicial (cfsupra), falta referir que se trata de umaquestão de Responsabilidade Social Empresarial de Género. E se fizemos esta omissão foi de facto parachamar à atenção do problema principal que está em causa, que não é só o da violência de género contra asmulheres, ou o do fenómeno do femicídio, que têm vindo a aumentar em Juárez. Trata-se, na realidade, deum problema à escala global que pode atingir muitas as mulheres de muitos outros países, que não só oMéxico, e que tem a ver com a crescente cosmopolitização mundial das empresas e a ir/responsabilidadesocial das mesmas, que agora têm como objetivo principal a exploração do trabalho das mulheres nessespaíses. O caso de Juárez só serve o intuito de enfatizar a questão e levar estas empresas, os governos e asorganizações nacionais, internacionais e mundiais a terem estarem atentos à necessidade que há dereformular as atuais políticas e normas de RSE, introduzindo um novo conceito de Responsabilidade SocialEmpresarial de Género (RSEG), que permita evitar uma nova vaga de desigualdades e impedir,nomeadamente, a exploração do trabalho e o aumento à escala global da violência de género contra asmulheres dos países menos desenvolvidos e do Terceiro Mundo.

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