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91 Captulo 7 Plecoptera do Semiárido: conhecimento atual e desafios Lucas Silveira Lecci 1 , Tácio Vitor Duarte Simões 2 & Adolfo R. Calor 2 1 Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso - Campus Juína, e-mail: 3 [email protected] 2 Universidade Federal da Bahia, Instituto de Biologia, Laboratório de Entomologia Aquática, PPG Diversidade Animal, e-mail: [email protected], [email protected], [email protected] Introdução A ordem Plecoptera possui 16 famílias em duas subordens, Arctoperlaria e Antarctoperlaria (Zwick 2000). A primeira, de origem laurásica, con- tém as infraordens Euholognatha e Systellognatha, enquanto a segunda, de origem gondwânica austral, apresenta as superfamílias Eusthenoidea e Gripopterygoidea (Zwick 2000). De acordo com estimativas de Fochetti & Tierno de Figueroa (2008), o número de espécies descritas é aproximadamente 3.500. Trabalhos recentes (Froehlich 2010a, 2011a,b; Righi-Cavallaro & Lecci 2010; Lecci & Froehlich 2011; Bispo & Lecci 2012; Righi-Cavallaro et al. 2013), no entanto, adicionaram mais 23 espécies, prin- cipalmente no Brasil. Os plecópteros apresentam cabeça prognata, geralmente achatada, amplamente articulada com o pronoto, com dois olhos compostos bem desenvolvi- dos e dois ou três ocelos, an- tenas filiformes, longas e multissegmentadas, tarsos tri- segmentados (Stark et al. 2009). O corpo é um pouco achatado dorso-ventralmente, pouco esclerosado e de colo- ração sombria, existindo algu- mas espécies com coloração vibrante (Froehlich 1999). O abdome é composto de onze segmentos, sendo dez distintos e visíveis, o oitavo esternito da fêmea e o nono do macho formam uma placa subgenital, o décimo pri- meiro segmento possui um par de paraproctos e um par de cercos longos e multissegmentados (Hynes 1976; Stewart & Harper 1996). Suas gônadas são em forma de “laço”, tanto ovários quanto testículos fundidos em sua porção mediana, os machos possu- em sua vesícula seminal com arranjo complexo na porção anterior do “laço” (Zwick 2000). Os adultos possuem dois pares de asas arti- culadas que se dobram sobre o abdome (Fig. 1). As asas são membranosas, sendo as anteriores alongadas e relativamente estreitas, enquanto as posteriores são um pouco mais curtas e têm geral- mente um lobo anal bem desenvolvido que se dobra em leque quando em repouso (Pennak 1978). Daí o nome da ordem, pleco = entrelaçar, dobrar; pteron = asa (Froehlich 1999). Os imaturos são comuns em águas correntes e limpas, são muito utilizados em programas de biomonitoramento da qualidade da água em países da América do Norte e Europa (Rosenberg & Resh 1993). As ninfas podem ser encontradas sob pedras em riachos, e ocasionalmente em qualquer lugar do riacho onde exista oxigênio (Giller & Malmqvist 1998). Figura 1. Exemplar de Anacroneuria sp. 2 (Perlidae) proveniente da Serra da Jibóia, município de Santa Teresinha, Bahia. (Foto: Rafael Abreu). Na região Neotropical há 6 famílias, Notonemouridae e Perlidae (Arctoperlaria), Austroperlidae, Diamphinoidae, Eustheniidae e Gripopterygidae (Antarctoperlaria) com 47 gêneros válidos (Stark et al. 2009). Dentre estes táxons, ape-

Cap. 7 - Plecoptera do Semiárido: conhecimento atual e desafios

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Capítulo 7

Plecoptera do Semiárido: conhecimento atual e desafios

Lucas Silveira Lecci1, Tácio Vitor Duarte Simões2 & Adolfo R. Calor2

1Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso - Campus Juína, e-mail: [email protected] Federal da Bahia, Instituto de Biologia, Laboratório de Entomologia Aquática, PPG Diversidade Animal, e-mail:[email protected], [email protected], [email protected]

Introdução

A ordem Plecoptera possui 16 famílias emduas subordens, Arctoperlaria e Antarctoperlaria(Zwick 2000). A primeira, de origem laurásica, con-tém as infraordens Euholognatha e Systellognatha,enquanto a segunda, de origem gondwânica austral,apresenta as superfamílias Eusthenoidea eGripopterygoidea (Zwick 2000). De acordo comestimativas de Fochetti & Tierno de Figueroa (2008),o número de espécies descritas é aproximadamente3.500. Trabalhos recentes (Froehlich 2010a, 2011a,b;Righi-Cavallaro & Lecci 2010; Lecci & Froehlich2011; Bispo & Lecci 2012; Righi-Cavallaro et al.2013), no entanto, adicionaram mais 23 espécies, prin-cipalmente no Brasil.

Os plecópteros apresentam cabeça prognata,geralmente achatada, amplamente articulada com opronoto, com dois olhos compostos bem desenvolvi-dos e dois ou três ocelos, an-tenas filiformes, longas emultissegmentadas, tarsos tri-segmentados (Stark et al.2009). O corpo é um poucoachatado dorso-ventralmente,pouco esclerosado e de colo-ração sombria, existindo algu-mas espécies com coloraçãovibrante (Froehlich 1999). Oabdome é composto de onzesegmentos, sendo dez distintose visíveis, o oitavo esternito da fêmea e o nono domacho formam uma placa subgenital, o décimo pri-meiro segmento possui um par de paraproctos e umpar de cercos longos e multissegmentados (Hynes1976; Stewart & Harper 1996). Suas gônadas sãoem forma de “laço”, tanto ovários quanto testículosfundidos em sua porção mediana, os machos possu-em sua vesícula seminal com arranjo complexo na

porção anterior do “laço” (Zwick 2000).Os adultos possuem dois pares de asas arti-

culadas que se dobram sobre o abdome (Fig. 1). Asasas são membranosas, sendo as anterioresalongadas e relativamente estreitas, enquanto asposteriores são um pouco mais curtas e têm geral-mente um lobo anal bem desenvolvido que se dobraem leque quando em repouso (Pennak 1978). Daí onome da ordem, pleco = entrelaçar, dobrar; pteron= asa (Froehlich 1999).

Os imaturos são comuns em águas correntese limpas, são muito utilizados em programas debiomonitoramento da qualidade da água em paísesda América do Norte e Europa (Rosenberg & Resh1993). As ninfas podem ser encontradas sob pedrasem riachos, e ocasionalmente em qualquer lugar doriacho onde exista oxigênio (Giller & Malmqvist1998).

Figura 1. Exemplar de Anacroneuria sp. 2 (Perlidae)proveniente da Serra da Jibóia, município de SantaTeresinha, Bahia. (Foto: Rafael Abreu).

Na região Neotropical há 6 famílias,Notonemouridae e Perlidae (Arctoperlaria),Austroperlidae, Diamphinoidae, Eustheniidae eGripopterygidae (Antarctoperlaria) com 47 gênerosválidos (Stark et al. 2009). Dentre estes táxons, ape-

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nas Gripopterygidae e Perlidae ocorrem no Brasil,com cerca de 150 espécies (Froehlich 2012).

A família Gripopterygidae Enderlein, 1909contém 49 gêneros, dos quais 24 são registrados naregião Neotropical, e 277 espécies descritas (Fochetti& Tierno de Figueroa 2008). O táxon apresenta dis-tribuição circum-antártica, com clados provavelmen-te resultantes das quebras da Gondwana austral(Stark et al. 2009). No Brasil, há 4 gênerosregistrados, Gripopteryx (Pictet, 1841),Paragripopteryx Enderlein, 1909, TupiperlaFroehlich, 1969 e Guaranyperla Froehlich, 2001,todos eles pertencentes a subfamília GripopteryginaeMcLellan, 1977 (Stark et al. 2009; Froehlich 2012).

Perlidae Latreille, 1802 apresenta 51 gênerose cerca de 1.050 espécies, ocorrendo desde a Re-gião Neotropical, passando pelas regiões Holártica,Oriental e Afrotropical (Fochetti & Tierno de Figueroa2008). A fauna neotropical inclui mais de 350 espé-cies, sendo Anacroneuria o gênero dominante emais diverso (Stark 2001). No Brasil, 4 gêneros sãoregistrados, Anacroneuria Klapálek, 1909,Macrogynoplax Enderlein, 1909, KempnyiaKlapálek, 1914 e Enderleina Jewett, 1960, todos dasubfamília Acroneuriinae Klapálek, 1914 (Stark etal. 2009; Froehlich 2012).

Segundo Froehlich (2011c, p. 4), “dez estadosbrasileiros, principalmente do Nordeste, e o DistritoFederal não têm registros de Plecoptera”. Nestecontexto, apesar dos recentes registros e uma des-crição envolvendo táxons ocorrentes no estado daBahia (e.g. Lecci & Froehlich 2011), o conhecimen-to taxonômico da fauna de Plecoptera ainda é bas-tante incipiente nesta região, principalmente se com-parado com estados da região Sudeste do país, pos-sivelmente pelo maior número de pesquisadores ecentros de pesquisa com insetos aquáticos (Froehlich2011c). Como há poucos especialistas no país, a or-dem Plecoptera tem recebido mais atenção em áre-as restritas do território nacional, especialmente nasregiões Sul e Sudeste. No estado de São Paulo, porexemplo, o registro de 64 espécies (Froehlich 2011a,2011c; Lecci & Froehlich 2011; Bispo & Lecci 2012)pode ser considerada mais acurada devido aos tra-balhos de Froehlich e colaboradores. No caso daregião Nordeste, onde se encontra o Semiárido, nãohouve grande esforço de coleta até o momento e,consequentemente, o conhecimento acerca daplecopterofauna ainda é bastante incipiente. A re-gião Nordeste tinha apenas cinco espéciesregistradas até 2011 (Froehlich 2010b; Lecci &Froehlich 2011), porém nenhuma destas foi descritaou registrada para o Semiárido.

Material e métodos

As ninfas foram coletadas em ambienteslóticos e lênticos com o auxílio de rede em “D” (ma-lha de 0,25mm) ou manualmente, em diferentesmesohabitats, desde remanso a corredeiras (Merritt& Cummins 1996). Os adultos foram coletados pormeio de armadilhas luminosas, tanto com uso de len-çol (tecido branco como anteparo com lâmpadas deluz mista e ultravioleta associadas) como bandejasluminosas (bandejas brancas com álcool e lâmpadasbranca e ultravioleta, sensu Calor & Mariano 2012).Também foram empregadas armadilhas tipo Malaisee coletas ativas com rede entomológica (puçá) navegetação próxima aos riachos. Álcool 80% foi uti-lizado para fixação e preservação dos exemplares.

Resultados e discussão

Plecoptera do Semiárido

As famílias Perlidae e Gripopterygidae foramencontradas no Semiárido, sendo representadas por4 gêneros: Anacroneuria e Kempnyia, em Perlidae,e Gripopteryx e Tupiperla em Gripopterygidae.

O gênero Anacroneuria já era esperado parao Semiárido, pois de acordo com Froehlich (1981,2002) este é o gênero de Plecoptera dominante eamplamente distribuído na região Neotropical. Asespécies de Anacroneuria podem ser encontradastanto em rios de montanhas quanto em planícies,sendo em algumas áreas o único gênero presente.Por outro lado, o gênero Kempnyia com distribui-ção anteriormente conhecida apenas para as áreasmontanhosas do Sul, Sudeste e Centro-Oeste doBrasil (Froehlich 2011a), passa a ser registrado parauma área montanhosa do Bioma Semiárido, especi-ficamente a região centro-leste do estado da Bahia.

Gripopteryx havia sido registrado na RegiãoNordeste (Lecci & Froehlich 2011), entretanto, so-mente desde o sul da América do Sul até Camacan,sul da Bahia (Lecci & Froehlich 2011), agora tam-bém conhecido no Semiárido.

Em relação ao gênero Tupiperla, ainda seregistros no Nordeste brasileiro, apesar de que en-tre as 16 espécies do gênero, 14 ocorrer no Brasilnos estados do Sul e Sudeste (Froehlich 1998; Bispo& Lecci 2012; Avelino-Capistrano & Nessimian2013).

Perlidae Latreille, 1802

Os Perlidae possuem 51 gêneros (Stark et al.

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2009) e aproximadamente 1.050 espécies descritasno mundo todo (Fochetti & Tierno de Figueroa 2008),sendo encontrados pelas regiões Neártica,Neotropical, Paleártica, Oriental e Afrotropical (Stark& Gaufin 1976). A região Neotropical apresenta porvolta de 390 espécies (Froehlich 2010b) e o Brasilpossui cerca de 120 espécies em 4 gêneros (Froehlich2012).

Seus adultos podem ser reconhecidos porapresentarem mandíbulas e maxilas reduzidas e clípeofundido com a fronte; seus imaturos são predado-res, apresentam brânquias torácicas e cercos maislongos que o abdome (Froehlich 2012).

Anacroneuria Klapálek, 1909

Este gênero possui pouco mais de 300 espé-cies (Starket al. 2009), 76 destas ocorrem no Brasil(Froehlich 2012; Righi-Cavallaro et al. 2013). A dis-tribuição vai desde o sul dos Estados Unidos daAmérica (Arizona e Texas) até a região norte daArgentina, tamanho variando entre 7-30 mm (Starket al. 2009), e espécimes com coloração desde oamarelo pálido ao marrom escuro. O gênero podeser reconhecido pela combinação dos seguintescaracteres (Stark 2001; Stark et al. 2009): linha pós-frontal simples, formando um Y com a coronal; sem-pre dois ocelos, relativamente próximos entre si;martelo do macho pequeno e cônico; ninfas combrânquias torácicas ASC (2-3) e PSC (2-3) ebrânquias anais ausentes; placa subgenital femininageralmente recobre quase todo o esterno 9, ápicebilobado ou quadrilobado.

Distribuição: Sul dos Estados Unidos daAmérica até a região Norte da Argentina. Brasil(AC, AM, MG, RJ, MS, MT, GO, RR, RO, SC, SP,PR, RS (Froehlich, 2002; Stark et al., 2009), CE,BA).

Anacroneuria amargosa Righi-Cavallaro &Froehlich, 2013

Comentários: Espécie descrita com base emmaterial coletado na cidade de Amargosa, Bahia.

Anacroneuria quilombola Righi-Cavallaro &Froehlich, 2013

Comentários: Espécie descrita com base emmaterial coletado nas cidades de Amargosa e Bar-reiras, Bahia.

Anacroneuria bahiensis Righi-Cavallaro &Lecci, 2013

Comentários: Espécie descrita com base emmaterial coletado nas cidades de Lençóis, Amargosae Barreiras, Bahia.

Anacroneuria kariri Righi-Cavallaro &Lecci, 2013

Comentários: Espécie descrita com base emmaterial coletado na cidade de Amargosa, Bahia.

Anacroneuria lencoensis Righi-Cavallaro &Lecci, 2013

Comentários: Espécie descrita com base emmaterial coletado na cidade de Lençóis, Bahia.

Anacroneuria sp. 1

Material analisado: Brasil, Ceará, Barbalha,Município de Arajara, Arajara Park, Gruta do Fari-as, S 07°19'58.3'’, W 39°24'46.6'’, 745m, 24.vii.2009,Calor A.R. & Lecci L.S. col.; 2 exemplares (Labo-ratório de Entomologia Aquática FFCLRP-USP).

Comentários: este é o primeiro registro des-te gênero para o Bioma Semiárido.

Anacroneuria sp. 2

Material analisado: Brasil, Bahia, SantaTerezinha, Vilarejo de Pedra Branca, Serra da Ji-bóia, S 12°50'51'’, W 39°29'03'’, 568m, 08.viii.2008,Calor A.R., Lecci L.S., Pinho L.C. & Moretto R.A.col.; 7 exemplares (Laboratório de EntomologiaAquática FFCLRP-USP). Bahia, Santa Terezinha,Vilarejo de Pedra Branca, Serra da Jibóia, S12°50'51'’, W 39°29'03'’, 568m, 07.viii.2009, CalorA.R. & Lecci L.S. col.; 5 exemplares (Laboratóriode Entomologia Aquática FFCLRP-USP).

Anacroneuria sp. 3

Material analisado: Brasil, Bahia, Iaçu, RioParaguaçu, S 12°45'12,9'’, W 40°16'42,5'’,20.vi.2012, Quinteiro F.B. & Abreu R.; 2 exempla-res.

Kempnyia Klapálek, 1914

Este gênero possui 35 espécies descritas, po-dendo ser encontrado desde o Sul até as regiõesmontanhosas do Brasil central (Froehlich 2011a,2012), e pelo litoral, até o sul do estado da Bahia.Apresentam tamanho variando entre 8-35 mm (Starket al. 2009), e espécimes com coloração desde o

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amarelo ao marrom escuro homogêneo. O gêneropode ser reconhecido pela combinação dos seguin-tes caracteres (Stark 2001; Stark et al. 2009): linhapós-frontal avançando entre os ocelos; ocelos paresrelativamente próximos entre si; martelo do machoalongado; placa subgenital feminina grande, geral-mente cobrindo esterno IX, geralmente com entalheapical raso; ninfas com brânquias torácicas e anaispresentes.

Distribuição: Brasil (MG, RJ, SC, SP, PR,RS, GO (Stark et al. 2009; Froehlich 2011a), BA).

Kempnyia sp. 1

Material analisado: Brasil, Bahia, SantaTerezinha, Vilarejo de Pedra Branca, Serra da Ji-bóia, S 12°50'51'’, W 39°29'03'’, 568m, 08.viii.2008,Calor A.R., Lecci L.S., Pinho L.C. & Moretto R.A.col.; 1 exemplar (Laboratório de Entomologia Aqu-ática FFCLRP-USP). Bahia, Santa Terezinha,Vilarejo de Pedra Branca, Serra da Jibóia, S12°50'51'’, W 39°29'03'’, 568m, 04.ii.2012, Calor A.R.& Dias E. col.; 4 exemplares (Laboratório deEntomologia Aquática FFCLRP-USP).

Comentários: este é o primeiro registro des-te gênero no Bioma Semiárido e, também, na regiãoNordeste do Brasil.

Kempnyia sp. 2

Material analisado: Brasil, Bahia, SantaTerezinha, Vilarejo de Pedra Branca, Serra da Ji-bóia, S 12°50'51'’, W 39°29'03'’, 568m, 07.viii.2009,Calor A.R., Lecci L.S., Pinho L.C. & Moretto R.A.col.; 1 exemplar (Laboratório de Entomologia Aqu-ática FFCLRP-USP).

Gripopterygidae Enderlein, 1909

A família Gripopterygidae possui 49 gênerose aproximadamente 277 espécies descritas (Fochetti& Tierno de Figueroa 2008), apresentando distribui-ção circum-antártica com clados provavelmente re-sultantes das quebras da Gondwana austral (Starket al. 2009). Na região Neotropical, 24 gêneros sãoregistrados (Fochetti & Tierno de Figueroa 2008),sendo 4 deles ocorrentes no Brasil, com 46 espécies(Froehlich 2012; Bispo & Lecci 2012).

Os adultos possuem peças bucais funcionaise, diferente dos perlídeos, apresentam muitas veiasalares transversais (reduzidas em alguns gêneros)(Zwick 2000). As ninfas caracterizam-se pela pre-sença de um tufo de brânquias anais (Bispo & Crisci-Bispo 2006).

Gripopteryx (Pictet, 1841)

O gênero possui 17 espécies descritas, 15destas registradas no Brasil. O gênero tem sido re-latado desde o Uruguai, nordeste da Argentina,Paraguai e regiões sul, sudeste, central e ao longoda costa sul brasileira (Froehlich 1993) até o sul daRegião Nordeste, onde há ocorrência de três espé-cies (Lecci & Froehlich 2011). O gênero pode serreconhecido pela combinação dos seguintescaracteres (Froehlich 1990; Stark et al. 2009; Lecci& Froehlich 2011): fissuras latero-dorsal no tergo Xdo macho separando parcialmente a parte anteriorde uma porção posterior de forma triangular;paraproctos longos, curvados para cima, comprimi-dos ao longo do seu comprimento e côncavos daporção mediana à distal; epiprocto do macho tem oápice curto e relativamente largo, com pequena fi-leira de dentes em sua margem dorsal; paraproctosda fêmea com pequena projeção apicodorsal e oápice da placa subgenital espessada; ninfas possu-em espinhos no dorso abdominal (tergitos 1-9), e notergo X, quando presente, o espinho pode ser longo,curvado ou reto.

Distribuição: Relatado desde o Uruguai,nordeste da Argentina, Paraguai e Brasil (RS, SC,SP, RJ, ES, MG, BA (Froehlich 2010b; Lecci &Froehlich 2011).

Gripopteryx garbei Navás, 1936

Material analisado: Brasil, Bahia, SantaTeresinha, Vilarejo de Pedra branca, Serra da Ji-bóia, Córrego Duas Torres, lajedo, S 12°51'025'’, W39°28'805'’, 687m, 27.x.2008, Calor A.R., MarianoR. & Mateus, S.; 2 exemplares (UFBA). Bahia,Santa Teresinha, Vilarejo de Pedra Branca, Serrada Jibóia, Córrego das Antenas, 25.x.2012, GomesV., Vilarino A. & Campos, R.; 1 exemplar (UFBA).

Comentários: este é o primeiro registro dogênero e desta espécie para o Bioma Semiárido.

Gripopteryx pinima Froehlich, 1993

Material analisado: Brasil, Bahia, ElísioMedrado, Serra da Jibóia, Reserva Jequitibá,28.iii.2012, Quinteiro F.B., Duarte T. & Garcia, I.; 1exemplar (UFBA).

Tupiperla Froehlich, 1969

Este gênero possui 16 espécies descritas po-dendo ser encontrado desde o Nordeste da Argenti-na (Missiones) até países vizinhos como Uruguai eParaguai. No Brasil, 14 espécies são registradasdesde as regiões Sul, Sudeste e áreas montanhosas

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do Centro-Oeste e do Nordeste brasileiro (Bispo &Lecci 2012). O gênero pode ser reconhecido pelacombinação dos seguintes caracteres (Froehlich1998; Bispo & Froehlich 2007; Stark et al. 2009;Bispo & Lecci 2012): machos com tergo X relativa-mente estendido, terminando em dois dentes sepa-rados; machos com epiprocto ausente; espinhodistoventral no fêmur e pronoto mais estreito do quea cabeça; adultos sem veias transversais na célulapterostigmática.

Distribuição: Uruguai, Argentina, Paraguaie Brasil (SC, SP, RJ, MG, GO (Froehlich 1998;Froehlich 2010b; Bispo & Lecci 2012), BA, PE).

Tupiperla tessellata (Brauer, 1866)

Material analisado: Brasil, Pernambuco,Bonito, Cachoeira Véu de Noiva, 30.ix.2011, CalorA.R., Quinteiro F.B., Gomes V. & Silva-Neto A.; 1exemplar (UFBA).

Comentários: este é o primeiro registro dogênero e desta espécie para o Bioma Semiárido.

Tupiperla sp. 1

Material analisado: Brasil, Bahia, Varzedo,Serra da Jibóia, Faz. Baixa da Areia, Córrego CaiCamarão, S 12°57’45.5", W 39°26’55.3", 27.iii.2012,Quinteiro F.B., Duarte T. & Garcia I.; 1 exemplar(UFBA). Bahia, Varzedo, Serra da Jibóia, Faz. Bai-xa da Areia, Córrego Cai Camarão, S 12°57’35.9",W 39°26’54.9", 28.vi.2013, Calor A.R., Medeiros A.& Gomes V.A.; 1 exemplar (UFBA). Bahia,Varzedo, Serra da Jibóia, Faz. Baixa da Areia,Córrego Cai Camarão, S 12°57’39.2", W39°26’53.7", 11.vii.2013, Calor A.R. & Duarte T.; 5exemplares (UFBA). Bahia, Varzedo, Serra da Ji-bóia, Faz. Baixa da Areia, Córrego Cai Camarão, S12°57’39.2", W 39°26’53.7", 27.viii.2013, Calor A.R.,Gomes V.A. & Zanata A.M.; 6 exemplares (UFBA).Bahia, Amargosa, Faz. Boqueirão Colonha, S13°08’11", W 39°39’46", 18.viii.2009, Calor A.R. &Lecci L.S.; 1 exemplar (UFBA).

Chave para os gêneros ocorrentes noSemiárido

Adaptada de Lecci & Froehlich (2007), Bis-po & Froehlich (2004), Froehlich (2012), Bispo &Lecci (2012).

1 Adultos apresentam asas com poucas veiastransversais e peças bucais atrofiadas; ninfas combrânquias torácicas presentes, brânquias anais pre-sentes ou ausentes...(Perlidae) (2)

1’ Adultos apresentam asas com muitas vei-

as transversais e peças bucais funcionais; ninfas combrânquias torácicas ausentes, tufo de brânquias anaissempre presente...(Gripopterygidae) (3)

2 Linha pós-frontal simples, formando um Ycom a coronal; sempre 2 ocelos; ocelos pares apro-ximados entre si; machos com martelo (estrutura noápice do nono esternito) pequeno e cônico; ninfascom brânquias anais ausentes...Anacroneuria

2’ Linha pós-frontal avançando entre osocelos; dois ou três ocelos; ocelos pares relativa-mente próximos entre si; machos com martelo acha-tado e alongado; ninfas com brânquias anais pre-sentes ou ausentes...Kempnyia

3 Macho com fissuras latero-dorsais notergoX, tergo X sem extensão, paraproctos longos ecurvados para cima, epiprocto presente; fêmeasapresentando paraprocto com pequena projeçãoapicodorsal e o ápice da placa subgenital espessa-da; ninfas com espinhos no dorso abdominal (tergitos1-9 ou 1-10), espinho distoventral no fêmurausente...Gripopteryx

3’ Macho sem fissuras latero-dorsais notergoX, tergo X com extensão terminando em doisdentes apicais, paraproctos longos, epiprocto ausen-te; fêmeas sem uma pequena projeção apicodorsalno paraprocto; espinho distoventral no fêmur pre-sente em todos os semaforontes...Tupiperla

Considerações finais

Até o presente momento pouco se sabe so-bre a ordem Plecoptera no Bioma Semiárido, o quepode ser estendido para toda a região Nordeste. Al-guns fatores históricos influenciaram sobremaneiratal cenário, como o pequeno (ou inexistente) esfor-ço de coleta se comparado a grande extensão daárea e também a falta de tradição de grupos de pes-quisa em entomologia aquática, dedicados a estaregião do país. Porém com o desenvolvimento doprojeto PPBio Semiárido, associado à formação denovos pesquisadores e a colaboração de pesquisa-dores de instituições parceiras (e.g., Universidadede São Paulo e Universidade Estadual Paulista), oscomponentes da fauna de Plecoptera poderão cer-tamente ser melhor entendidos.

Agradecimentos

Ao PPBIO-Semiárido pelo apoio logístico efinanceiro, indispensável para a realização deste es-tudo; Ao CNPq e CAPES pelas bolsas. A equipe doLaboratório de Entomologia Aquática (LEAq–UFBA) pelo apoio nas atividades de campo.

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Referências bibliográficas

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Ficha Catalográfica

Diagramação e Editoração:Arivaldo Santiago Amaro

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Revisão Final:Freddy Bravo

Capa:Eric Roper Ribeiro de Carvalho

Projeto Gráfico e EditoraPrint Mídia

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A831 Artrópodes do Semiárido: biodiversidade e conservação/ Organizadores Freddy Bravo, Adolfo Calor . –Feira de Santana : Printmídia, 2014.

298 p. : il.

ISBN: 978-85-62465-16-1

1. Entomologia – Semiárido. 2. Artrópodes –Inventário. 3. Biodiversidade. I. Bravo, Freddy, (Org.)II. Calor, Adolfo, (Org.) III. Título.

CDU: 595.7