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1 Inclusão Digital: Uma solução educacional, tecnológica ou social? Guilherme B. Franca 1 , Keyla E. N. Alicrim 1 1 Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia – Campus Irecê CEP 44.900-000 – Irecê – BA - Brasil {franca,alicrim} [email protected], [email protected] Abstract. Educational project of basic computing for primary schools in Brazil with the aim of providing digital inclusion to basic education students. Resumo. Projeto educacional de informática básica para escolas de ensino básico do Brasil com o objetivo de proporcionar inclusão digital a estudantes do ensino fundamental. 1. Introdução Com o surgimento da era da informação, diversos recursos existentes no mundo real ganharam uma versão digitalizada: jornais, revistas, telefone, TV, e mais recentemente, até mesmo o dinheiro. Mas além de todos os recursos que prometem deixar a vida humana mais prática, os problemas também adentraram o ciberespaço, e a desigualdade social se refletiu nesse novo mundo em um grande processo de exclusão digital. Através do estudo da exclusão digital e inclusão digital promovida durante o processo educacional do Brasil, o objetivo desse trabalho é propor um modelo educacional de informática básica, que promova inclusão digital através do conceito dos “5Cs” de Bradbook e Fisher (2004). 2. Um estudo da desigualdade digital no Brasil “Hoje, as redes digitais são instituições sociais, integradas ao dia-a-dia contemporâneo” (WELLMAN, 2001). Portanto, quando um cidadão não tem acesso às Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), não se trata de ele simplesmente não ter acesso a uma tecnologia, e sim a uma instituição social, resultando, portanto, em exclusão social. (LOPES, 2007) Em 2002, Elizabeth Gomes, então Assessora da Presidência da Anatel, em seu trabalho “Exclusão Digital: Um problema tecnológico ou social?” disse: “A conhecida desigualdade registrada entre pobres e ricos entra agora na era digital e ameaça se

Exclusão Digital: Uma solução educacional, tecnológica ou social?

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Inclusão Digital: Uma solução educacional, tecnológica ou

social?

Guilherme B. Franca1, Keyla E. N. Alicrim1

1Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia – Campus Irecê

CEP 44.900-000 – Irecê – BA - Brasil

{franca,alicrim} [email protected],

[email protected]

Abstract. Educational project of basic computing for primary schools in Brazil

with the aim of providing digital inclusion to basic education students.

Resumo. Projeto educacional de informática básica para escolas de ensino

básico do Brasil com o objetivo de proporcionar inclusão digital a estudantes

do ensino fundamental.

1. Introdução

Com o surgimento da era da informação, diversos recursos existentes no mundo

real ganharam uma versão digitalizada: jornais, revistas, telefone, TV, e mais

recentemente, até mesmo o dinheiro. Mas além de todos os recursos que prometem

deixar a vida humana mais prática, os problemas também adentraram o ciberespaço, e a

desigualdade social se refletiu nesse novo mundo em um grande processo de exclusão

digital. Através do estudo da exclusão digital e inclusão digital promovida durante o

processo educacional do Brasil, o objetivo desse trabalho é propor um modelo

educacional de informática básica, que promova inclusão digital através do conceito dos

“5Cs” de Bradbook e Fisher (2004).

2. Um estudo da desigualdade digital no Brasil

“Hoje, as redes digitais são instituições sociais, integradas ao dia-a-dia

contemporâneo” (WELLMAN, 2001). Portanto, quando um cidadão não tem acesso às

Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), não se trata de ele simplesmente não

ter acesso a uma tecnologia, e sim a uma instituição social, resultando, portanto, em

exclusão social. (LOPES, 2007)

Em 2002, Elizabeth Gomes, então Assessora da Presidência da Anatel, em seu

trabalho “Exclusão Digital: Um problema tecnológico ou social?” disse: “A conhecida

desigualdade registrada entre pobres e ricos entra agora na era digital e ameaça se

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expandir com a mesma rapidez das tecnologias de comunicação.” O principal problema

dessa exclusão, é que a tecnologia, principalmente a internet, se tornou algo

indispensável. A limitação do acesso a esses recursos impede que pessoas consigam

emprego, façam inscrição para um vestibular ou tenham uma barreira em seus estudos.

A internet por exemplo, surgiu de pesquisas estatais, e apesar de hoje ser tratada como

um meio “universalizado” por, tecnicamente, não possuir um dono, é dominada pelas

grandes empresas de tecnologia. O encolhimento dos investimentos globais para a

inovação e o foco nas privatizações tiveram caráter decisivo no processo de exclusão

digital que se formara.

Para Gomes, o potencial da internet vai além da praticidade. Ela pode cumprir

também um papel social, provendo informações àqueles que tiveram esse direito negado

ou negligenciado, e com isso, permitindo maiores graus de mobilidade social e

econômica. Um dos exemplos desse poder social da internet foi o compartilhamento de

informações durante manifestações, como a Primavera Árabe e as Manifestações de

Junho de 2013 no Brasil. Informações “censuradas” pela grande mídia para defender

seus interesses particulares, foram livremente compartilhadas na rede, o que contribuiu

para a mobilização de novos adeptos. (GOMES, 2002)

Com o grande avanço nas tecnologias de transmissão de internet, como evolução

dos cabos e meios sem fio como roteadores e satélites, houve um grande aumento no

número de usuários da internet ao redor do mundo. No Brasil, 51% dos cidadãos com

mais de 10 anos de idade possuíam acesso à internet em 2013. Entre os principais

fatores que contribuíram para o marco inédito estão o aumento exponencial no uso de

celulares para conexão com a rede e a multiplicação de equipamentos portáteis, como

notebooks e tablets.

O número de usuários da internet do país é expressivo e importante. Se

olharmos de 2008 para cá, o salto foi de quase um terço da população para

mais da metade dela. No entanto, é preciso chamar atenção para algumas

disparidades que permanecem: a distância entre o acesso em determinadas

classes sociais e regiões ainda é muito grande. E ela vem se mantendo, não

diminuindo. (OYADOMARI apud JANSEN, 2013)

Apesar de o Brasil possuir um número alto de pessoas com acesso à internet, a

nona edição da pesquisa TIC Domicílios, de 2013, divulgada pelo Centro de Estudos

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sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação (Cetic.br) mostra que esse

acesso ainda é concentrado em determinadas classes sociais e regiões.

Nas classes A e B, a proporção de casas com acesso à internet é de 98% e 80%,

respectivamente. Na classe C esse número cai para apenas 39% e para 8% nas classes D

e E, o que comprova a relação entre a exclusão digital e a desigualdade social. A

internet também está predominantemente presente nas áreas urbanas, com 48% das

residências conectadas, contra 15% nas áreas rurais. E se analisarmos as regiões, a

internet está em 51% das residências na região sudeste, enquanto chega a apenas 26%

no Norte e 30% no Nordeste. (Cetic.br)

O fato de mais da metade da população brasileira ser internauta não significa

que o Brasil está cada vez mais conectado como um todo. [...] E o governo

tem de desenvolver políticas públicas efetivas para a diminuição dessas

diferenças. (OYADOMARI apud JANSEN, 2013).

O projeto “Banda Larga Para Todos” pretende levar conexão de internet de alta

velocidade a pelo menos 90% das residências brasileiras, através da implantação de

cabos de fibra ótica pelo Governo Federal, com o objetivo de diminuir o preço do

serviço e aumentar a competitividade entre pequenas e grandes empresas provedoras de

internet. O projeto “Computador para Todos”, de 2005, pretendia aumentar o acesso das

classes mais baixas ao computador, através da venda de uma configuração básica com

software livre a um baixo preço. Mas simplesmente abaixar os preços – apesar de ajudar

– não passa perto de resolver a questão da exclusão. A inclusão digital vai além de ser

apenas um processo de compra e venda de hardware e software. Para que o cidadão seja

considerado incluso no meio digital, ele precisa de “habilidades que vão de tarefas

básicas, como escrever e-mails e reconhecer um spam, a atividades complexas, como

pesquisar de maneira eficaz, acessar serviços e produzir um vídeo e transmitir via web”

(ASSUMPÇÃO e MORI, 2006).

Um parceiro importante no combate à exclusão digital é a educação. A

educação é um processo e a inclusão digital é um elemento essencial deste

processo. Instituições de ensino, tanto públicas como particulares, devem

contribuir para o aprendizado e interação dos cidadãos com as novas

tecnologias, sendo para isso necessária a atuação governamental e da própria

sociedade. Atualmente, o termo sociedade do conhecimento, ou da

informação, vem sendo usado para designar uma nova forma de sociedade,

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onde o recurso mais importante é o capital intelectual, que é cada vez mais

exigido de quem deseja conseguir um emprego (SILVA-FILHO, 2003).

Segundo Almeida e Paula (2005), atualmente, a internet é essencial também

durante o processo de inclusão. O intenso surgimento de tecnologias, teorias e

informações inviabiliza a atualização do indivíduo apenas por meios tradicionais como

cursos, escolas ou imprensa. Esse ponto é coberto pela internet graças ao grande volume

de informações disponíveis na rede. Por esse motivo, a limitação da internet a apenas

uma parcela da população contribui para o aprofundamento da desigualdade sócio

digital.

3. Surgimento da internet no Brasil

Inicialmente no Brasil, o acesso à Internet era restrito a professores, estudantes e

funcionários de universidades e instituições de pesquisa. Em 1977, As Fundação de

Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e o Laboratório Nacional de

Computação Científica (LNCC) conectaram-se a instituições nos Estados Unidos. Após

conseguirem acesso a essas redes, a FAPESP e o LNCC incentivaram outras instituições

do país a fazerem o mesmo. As entidades conectavam-se utilizando recursos próprios e

pagando à EMBRATEL as tarifas normais pela utilização de circuitos de comunicação

de dados. O critério utilizado para selecionar onde se conectar, normalmente foi em

função da distância. Com o tempo, ficou clara a necessidade de um projeto para

fomentação de um backbone nacional.

Em 1990, o Ministério da Ciência e Tecnologia lança a Rede Nacional de

Pesquisa (RNP), com o objetivo é implantar uma moderna infraestrutura de serviços

Internet, com abrangência nacional. Sua missão básica era disseminar o uso da Internet

no Brasil, especialmente para fins educacionais e sociais.

A partir de 1995, usuários fora das instituições acadêmicas passaram a também

poder obter acesso à Internet, por meio da oferta privada. O Ministério das

Comunicações e o Ministério da Ciência e Tecnologia decidiram lançar um esforço

comum de implantação de uma rede Internet global e integrada, abrangendo todo tipo de

uso. Surgiu, então, o backbone nacional de uso misto (comercial e acadêmico),

resultante da expansão e reconfiguração do backbone de uso puramente acadêmico. A

partir desse momento, começou uma grande expansão do número de computadores com

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acesso à internet fora das instituições de ensino, além do surgimento de um grande

número de aplicações. O surgimento e expansão da internet a partir da região sudeste do

Brasil contribuiu para a grande concentração da rede nessa região atualmente.

4. Pilares da inclusão digital

Bradbook e Fisher (2004) sugerem aspectos importantes para o desenvolvimento

do tema inclusão digital. São eles:

a) Conexão: refere-se ao modo como as pessoas têm acesso aos dispositivos de

tecnologia da informação e à Internet;

b) Capacidade: significa as habilidades em informática que um indivíduo tem e

que podem melhorar sua qualidade de vida e sua empregabilidade;

c) Contexto: é o motivo do uso da tecnologia por parte do usuário;

d) Confiança e Motivação: são fatores chaves para que as políticas possam se

dirigir às pessoas que falharam ao tentar descobrir qualquer razão pessoal para

utilizar a tecnologia;

e) Continuidade: diz respeito a como fazer com que as pessoas que já tiveram

algum contato com a tecnologia da informação continuem melhorando e

utilizando as informações adquiridas.

A conexão pode ser domiciliar ou comunitária. Para um processo de inclusão

amplo e barato, com o auxílio do Estado, a conexão comunitária se torna a melhor

opção, pois além de garantir o acesso imediato às tecnologias, permite o

compartilhamento de atividades comunitárias, ajudando diretamente no processo de

digitalização da comunidade. Além da criação de infocentros, é necessário que exista

um projeto de diversificação que permita o acesso de mais tipos de pessoas,

principalmente no que se refere a faixa etária. Também é preciso que exista um

processo educacional que motive as pessoas ao uso da tecnologia e ao interesse pela

informação.

A conexão domiciliar pode, e deve, ser expandida através de políticas públicas

de acesso e manutenção das redes domiciliares. A constante queda no custo das

tecnologias de transmissão de dados sem fio as tornam uma das melhores soluções para

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garantir acesso amplo a internet, com velocidade razoável e preço baixo. Propostas

como o já citado projeto “Banda Larga para Todos” do governo brasileiro também

podem contribuir para a queda dos preços dos pacotes de internet.

Também é importante notar que o Marco Civil da Internet contribui diretamente

com a parte econômica através da garantia da neutralidade da rede, assegurando que o

usuário não precise pagar mais pelo acesso pleno à internet. Além disso, a garantia do

respeito à liberdade de expressão, direitos humanos, pluralidade e finalidade social da

rede, permitem que o usuário tenha mais tranquilidade e segurança em relação aos

conteúdos publicados na internet. Porém, também existem críticas em relação à

importância do Marco Civil para a inclusão digital. Para Gonçalves (2013), o conceito

de neutralidade da rede não existe na prática, e no marco o mesmo é diretamente

atrelado à inclusão digital como direito fundamental. Por conta disso, seria necessário

maior rigor na atuação da lei de neutralidade para garantir os direitos propostos no

Marco Civil.

Quanto aos aparelhos utilizados para intermediar a conexão usuário x internet, a

expansão dos smartphones e tablets garantem um meio barato e eficaz de se conseguir

acesso, mas ainda existem limitações a outros recursos como edição multimídia e

formatação de documentos, tornando necessário o uso de um computador pessoal

padrão. O acesso a esse último pode ser aumentado através da queda de preços,

principalmente com uso de software livre, que é gratuito.

Além disso, governos e cooperativas podem realizar projetos para reciclar

computadores, visto que os computadores descartados, na maioria das vezes, possuem

peças em pleno funcionamento. Esses computadores reaproveitados podem ser

distribuídos a população carente em caráter emergencial, permitindo que essas tenham

acesso à internet.

A capacidade do usuário pode ser responsabilidade do governo e de escolas

privadas, que devem garantir os instrumentos necessários para que a população seja

incluída na sociedade da informação. A inclusão de uma disciplina de informática

básica no ensino público fundamental, com conceitos básicos de história da

computação, aplicativos de escritório, internet e redes, assegura que o usuário tenha os

conhecimentos mínimos para que não esteja à margem da sociedade digital. Esse

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conhecimento básico deve ser complementado através do acesso à internet, como

descrito no último parágrafo. “É preciso ter acesso à informação, saber buscá-la e

encontrá-la, dominar seu uso, organizá-la e entender suas formas de organização, e,

sobretudo, utilizá-la apropriada, adequada e eficazmente” (SPITZ, 1999).

O contexto se refere a utilidade que a tecnologia da informação tem na vida das

pessoas. É preciso que haja um forte motivo que torne a tecnologia relevante ao usuário,

como, por exemplo, a praticidade em calcular notas no Excel para um professor. Não

adianta apresentar a ele um editor de imagens profissional, pois ele não veria a

informática sendo utilizada a seu favor. (ALMEIDA e PAULA, 2005)

Experiências frustradas podem fazer com que as pessoas desistam da

informática, por isso é necessário que haja confiança por parte do usuário e motivação

no processo educacional, seja na escola ou nos telecentros. É preciso que o aprendizado

ocorra de forma prática e intuitiva, para evitar ao máximo problemas com as tecnologias

utilizadas. Aplicativos inteligentes conseguem facilmente manter o usuário motivado, a

partir de linguagem amigável e praticidade no processo de adaptação.

E por último, é preciso que o processo de inclusão digital permita a continuidade

do aprendizado, permitindo que o indivíduo se aprofunde cada vez mais nos

conhecimentos de tecnologia da informação. A internet tem papel essencial nesse

processo, devido ao grande volume de informações disponíveis, além da praticidade

para encontrá-las. Aplicar os conhecimentos não deve ser difícil após um processo

inicial de educação sobre a internet e demais tecnologias, permitindo que o usuário

possa aprender sem ajuda de terceiros.

5. A informática na educação

É muito comum que os projetos de inclusão digital, principalmente os

governamentais, foquem na redução de preços, principalmente em dispositivos de

hardware, o que permite que classes sociais mais baixas possam ter acesso a

computadores; e na expansão da estrutura de redes de internet, para levar o acesso a

mais pontos do território por preços mais baixos. Porém, o processo educacional

essencial para que haja uma inclusão plena, segundo os aspectos propostos por

Bradbook e Fisher (2004), muitas vezes é negligenciado. Com o objetivo de promover

um processo contínuo e completo de inclusão digital, é necessário que existam

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investimentos para tal na área da educação, com dois pontos principais de atuação:

Ensino de informática básica no Ensino Fundamental, com foco infantil, e projetos

educacionais para adultos e idosos.

O objetivo desse curso de informática básica seria não só permitir o aprendizado

do uso computador em suas operações básicas, mas também ampliar o conhecimento

dos alunos em áreas da informática como redes, arquitetura de computadores e

programação, através de um ensino prático, permitindo que esses tenham as capacidades

necessárias para executar diversas tarefas do cotidiano dentro da área de informática.

Com a praticidade da internet e demais tecnologias da informação/comunicação,

é comum que as pessoas tenham acesso regular sem um alto grau de instrução nessa

área. Porém, esse desconhecimento sobre o funcionamento das tecnologias aumenta o

risco de golpes na internet, além dos problemas com vírus e spywares. Logo, é

necessário que a educação de informática básica vá além da teoria, lecionando

informações úteis do cotidiano digital.

O uso de ferramentas como blogs, jornais e diários eletrônicos podem ser

utilizados no processo educacional para garantir a inclusão digital e social dos alunos,

pois não só permitem o uso prático dos recursos dessas mídias, como também fazem

com que os alunos consigam absorver informações básicas de programação web.

Serviços públicos de blogs e microblogs, como o tumblr, Wordpress ou Blogger, são

muito utilizados por jovens, e exigem o uso constante de HTML e CSS. Essas

ferramentas, comuns no cotidiano das crianças e adolescentes, podem ser utilizadas

como apoio para o ensino dos conteúdos relacionados a linguagens utilizadas na

internet, assim como a estruturação de design para sites.

Mas além dos conhecimentos de programação referentes a internet, é importante

que exista entendimento sobre o papel social da internet e o uso da mesma como meio

de integração. É necessário que o aluno não aprenda apenas a fazer pesquisas na

internet, mas que também saiba filtrar e analisar criticamente as informações

encontradas, com o objetivo de evitar fraudes.

Também é possível usar a internet como meio de interação, através de fóruns de

discussão. Dentro do contexto do ensino de informática básica, o uso dos mesmos é

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indispensável para que o indivíduo consiga trocar ideias e informações, socializando e

gerando novos conhecimentos.

Conhecimentos básicos de redes e arquitetura de computadores também são

necessários no cotidiano. É interessante que exista um ensino voltado para aspectos

práticos dessa área. Os alunos devem aprender sobre cada dispositivo, interno e externo

do computador, conhecendo suas funções e aprendendo como montá-los

adequadamente. É necessário ensinar sobre as diferentes topologias de rede, e como

fazer a montagem das mesmas, assim como a instalação e manutenção de roteadores e

cabeamento, garantindo um conhecimento prático em relação as redes de computadores.

O principal objetivo do ensino de redes na educação básica é instruir os alunos a

possuírem os conhecimentos necessários para fazer a montagem e manutenção de

pequenas redes domiciliares, poupando economicamente a família das despesas

relativas a esses serviços.

É possível mesclar várias áreas de conhecimento da informática, como

arquitetura de computadores, sistemas operacionais e programação em projetos de

robótica. O projeto “KickRobot”, da Universidade Federal do Rio Grande Sul,

promoveu inclusão digital em escolas públicas do mesmo estado através da chamada

“robótica educativa”. Segundo Cesar e Bonilla (2007), a robótica educativa é “O

ambiente de aprendizagem onde professores e alunos planejam, discutem e executam

montagem, automação e controle de dispositivos mecânicos que podem ser controlados

pelo computador”. Através do projeto KickRobot, os alunos puderam construir sistemas

robóticos compostos de hardware e software, motivados pelo resultado final do projeto,

o que fez com que os mesmos obtivessem um bom desempenho no aprendizado dessas

áreas.

A robótica educativa, ou robótica pedagógica, vem sendo utilizada como

técnica de aprendizado que permite o desenvolvimento de atividades, como

ferramenta que estimula a criatividade dos alunos devido a sua natureza

dinâmica, interativa e até mesmo lúdica, além de servir de motivador para

estimular o interesse dos alunos no ensino tradicional. (GOMES, BARONE,

OLIVO, 2008)

O uso da robótica educativa permite que os alunos desenvolvam o raciocínio e a

lógica na construção de algoritmos, além de tornar acessíveis os princípios de ciência e

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tecnologia. Além disso, devido sua grande natureza dinâmica, interativa e lúdica, junto

ao seu potencial em multidisciplinaridade, a robótica educativa pode ser uma boa opção

para estudar outros conteúdos dos ensinos fundamental e médio.

É aplicado o conhecimento de microeletrônica (peças eletrônicas do robô),

engenharia mecânica (projeto de peças mecânicas do robô), física cinemática

(movimento do robô), matemática (operações quantitativas), inteligência

artificial (operação com proposições) e outras ciências. (CESAR, BONILLA,

2007)

Quanto aos professores necessários para ministrar as aulas dos conteúdos da área

de informática, a utilização dos profissionais da área das universidades é uma boa

opção, pois além de permitir que haja envolvimento entre a universidade e a

comunidade no processo de inclusão digital, é uma forma de contribuir com estágios na

área de educação no ensino superior.

Por serem centros de excelência na produção e difusão do conhecimento, as

universidades federais e outras instituições de ensino público têm um papel

de grande importância nos processos de inclusão sócio digital. Os

profissionais da área de tecnologia da informação têm uma alta

responsabilidade no processo de inclusão sócio digital, pois possuem um

maior conhecimento sobre o mundo digital. Ao mesmo tempo, estes

profissionais representam uma parcela ínfima da população com acesso a

tecnologias de ponta, formando assim uma elite digital. Na era dos bits, a

desigualdade social agora é fortalecida por aqueles que têm ou não têm

acesso à informação, está nas mãos dos profissionais de TI as ferramentas e o

saber necessários que podem contribuir para a diminuição dessa

desigualdade. (ABDALLA et al, 2005)

6. O papel do software livre

Para um estudo eficaz de sistemas operacionais no ensino público, uma boa

opção é o foco em softwares livres, como o Linux. Por ser livre, é muito mais fácil que

os alunos consigam observar a estrutura do sistema operacional, podendo até receber

dados básicos de programação a partir do estudo do mesmo. É possível trabalhar os

conhecimentos de softwares de escritório, aplicativos e internet a partir do próprio

Linux. Além disso, é mais acessível para as instituições de ensino, já que não existe

licença proprietária no sistema operacional, visto que a tecnologia e infraestrutura

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necessárias para empregar computadores na educação pode ser de alto custo, podendo

inviabilizar a adoção do projeto inclusivo, e esse custo pode aumentar em até três vezes

com o uso de sistemas operacionais proprietários. (ROCHA, 2012)

O projeto Onda Digital, criado e aplicado em 2004, foi um curso de informática

básica de 32 horas, que promovia aulas para 40 jovens carentes da cidade de Salvador.

Esse projeto utilizou em suas aulas diversos aplicativos livres rodando no sistema

operacional Debian GNU/Linux. Segundo Abdalla, Gama, Pinheiro, Rodarte e Santos,

os criadores do projeto, “prender-se a modelos proprietários pode ser atraente a curto

prazo, mas a dependência gerada por estes modelos podem atrofiar o alcance e abreviar

o tempo de vida destes projetos”. A dependência citada por eles se refere aos termos

presentes nas licenças e contratos de manutenção dos softwares proprietários, que

limitam o potencial existente para os mesmos no âmbito educacional. Após as aulas

usando o Debian, os alunos do Onda Digital foram orientados a utilizar o Windows,

com o objetivo de mostrar ao aluno que o aprendizado recebido através do Linux

também o habilita a usar software proprietário, o que ajuda a “acabar com a ilusão de

que ensinar informática baseada em software livre torna o aprendiz excluído do

mercado de trabalho.” (ABDALLA, et al, 2005)

O uso de softwares livres mantém a coerência social do projeto, já que não existe

limitação na distribuição e consequentemente permite que os conhecimentos do projeto

educacional possam ser levados a outros ambientes pelos próprios alunos. Outro ponto

importante da adesão desse tipo de softwares é a ajuda constante da grande comunidade

de software livre, o que reduz as chances dos projetos serem descontinuados.

7. Observações finais

Para que um processo pleno de inclusão digital seja alcançado, é necessário que

todos os pontos propostos por Bradbook e Fisher(2004) sejam cumpridos. Quanto a

conexão à internet, é preciso que haja um intenso processo de democratização para que

a mesma se expanda de forma homogênea no Brasil. O governo pode obter eficácia

nesse campo através dos programas de acesso à computadores e internet, como o Plano

Nacional de Banda Larga (PNBL) e Banda Larga para Todos. O acesso à internet

também contribui para a continuidade do uso dos recursos tecnológicos, pois a grande

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renovação de informações na rede coloca o usuário constantemente diante de novas

possibilidades na área de informática.

Já os campos de Capacidade, Contexto, Confiança e Motivação, são dependentes

de um processo de alfabetização digital, pois esses se relacionam às informações

adquiridas pelo usuário que o guiam acerca das tecnologias da informação e

comunicação. Tanto o governo, empresas privadas da educação e as ONGs com o

propósito de incluir digitalmente, devem pensar em um projeto educacional eficaz que

garanta as competências necessárias aos indivíduos beneficiados. Existe um grande

interesse, por parte do governo, principalmente, em criar projetos de inclusão digital,

mas esses acabam atingindo apenas o campo referente a conexão, enquanto a educação

digital, essencial para garantir a inclusão consistente, é esquecida. Incluir na educação

pública fundamental uma disciplina de informática básica, com as áreas de

conhecimento citadas anteriormente nesse trabalho, é o principal ponto para garantir que

as informações referentes às tecnologias alcancem o máximo de pessoas possível.

8. Considerações Finais

O essencial seria implantar em escolas, projetos de 'alfabetização' digital para

crianças e adolescentes, estimulado pela expansão de banda larga de internet, em

contato com órgãos públicos que garantiriam computadores novos (mas ainda assim não

desconsiderando a produção de lixo eletrônico, visando o cuidado com o meio

ambiente), construção e aprimoramento de salas e laboratórios condicionados ao

proceder com os projetos.

Em lugares menos urbanizados, mas ainda em ambiente escolar, a contratação

(pela prefeitura ou secretarias estaduais), de profissionais que poderão proporcionar o

aprendizado através de minicursos ou programas de apoio do básico ao avançado,

direcionados tanto a jovens com baixa renda quanto para adultos e idosos.

Em locais de difícil acesso como comunidades indígenas e quilombolas,

investimento em projetos que quebrem a vulnerabilidade social através da inclusão

digital e implantem nas comunidades profissionais qualificados com entendimento

básico da linguagem e cultura indígena e quilombolas, para fornecer no mínimo uma

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base do uso das tecnologias, e que possam garantir o fornecimento de conexão gratuita

com a internet.

Disponibilidade de empresas nas áreas tecnológicas, para relação paralela de

troca, com instituições que disponibilizem instrumentos digitais em troca de publicidade

e remuneração aos profissionais da área destinados a lidar com as causas para

abatimento da exclusão digital, dentro da perspectiva de uma gestão com

responsabilidade social.

Integração dos processos de formação educacional que podem regredir a

realidade da exclusão digital, com instituições que forneçam algum tipo de bolsa não

apenas para motivar os alunos ou participantes do projeto, mas também para que

continuem pertencendo ao meio tecnológico estando em casa, com equipamento

próprio, e para aqueles que tiveram uma maior facilidade de aprendizagem e estiverem

disponíveis para ensinar, o oferecimento de remuneração para monitoria.

Não se trata mais de inclusão digital apenas, os itens inclusivos se tornam um

importante ícone no processo de formação social do cidadão.

9. Resultados

A implantação da disciplina de informática garante um processo eficaz de

inclusão digital, pois mesmo que o indivíduo não possua computador e internet em sua

residência, ele possui o conhecimento necessário para utilizar de serviços como lan

houses e infocentros. Como observado no projeto Onda Digital, 22 alunos, de uma

turma de 40, chegaram ao final do projeto, e apresentaram uma grande evolução no uso

do computador, principalmente na atuação com software livre, que foi bem aceito pelos

alunos do projeto. É importante ressaltar que alguns desses alunos nunca tiveram

contato com um computador anteriormente, e por isso demonstraram uma evolução um

pouco menor em comparação a aqueles que já tiveram contato anteriormente.

Porém, é preciso que haja um estímulo para a permanência dos alunos no ensino

da disciplina, já que 18 desistiram do curso. Porém, é importante ressaltar que o Onda

Digital foi um curso a parte do ensino fundamental, diferente da proposta desse

trabalho. A inclusão da disciplina de informática básica no ensino básico público e

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privado provavelmente aumentaria a frequência devido as normas da instituição de

ensino.

10. Trabalhos futuros

A partir dos estudos deste trabalho, aponta-se a necessidade de novos projetos e

estudos sobre a inclusão digital X exclusão digital na região de Irecê, com o intuito de

buscar Conexão, Capacidade, Contexto, Confiança e Continuidade e enfrentar as

dificuldades que excluem parte da população do acesso digital. Assim, é possível não só

diagnosticar melhor o contexto como aprimorar um modelo educacional de informática

básica, que promova inclusão digital através do conceito dos “5Cs” de Bradbook e

Fisher (2004) e que envolva discentes e docentes do IFBA campus Irecê.

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REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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