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FACULDADE LUTERANA DE TEOLOGIA – FLT EXEGESE DE MIQUÉIAS 2.6-11 ALEXANDER DE BONA STAHLHOEFER Metodologia Exegética do Antigo Testamento São Bento do Sul, novembro de 2005 Este é um trabalho acadêmico que está sendo disponibilizado para pesquisa e consulta. Não é permitida a cópia do conteúdo. Há ainda erros de digitação e correção que serão revistos no futuro. Algumas melhorias no texto serão feitas antes da publicação do material.

EXEGESE DE MIQUÉIAS 2.6-11

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FACULDADE LUTERANA DE TEOLOGIA – FLT

EXEGESE DE MIQUÉIAS 2.6-11

ALEXANDER DE BONA STAHLHOEFER

Metodologia Exegética do Antigo Testamento

São Bento do Sul, novembro de 2005

Este é um trabalho acadêmico que está sendo disponibilizado para pesquisa e consulta. Não é permitida a cópia do conteúdo.

Há ainda erros de digitação e correção que serão revistos no futuro. Algumas melhorias no texto serão feitas antes da

publicação do material.

Apenas para leitura – proibida reprodução – Alexander De Bona Stahlhoefer 2

FACULDADE LUTERANA DE TEOLOGIA – FLT

EXEGESE DE MIQUÉIAS 2.6-11

Exegese elaborada no curso de Bacharelado em Teologia como requisito à disciplina de Metodologia Exegética do Antigo Testamento. Professor: Renatus Porath.

São Bento do Sul, novembro de 2005

Apenas para leitura – proibida reprodução – Alexander De Bona Stahlhoefer 3

SUMÁRIO

SUMÁRIO............................................................................................................................3 I TEXTO ........................................................................................................................4 1.1 DEFINIÇÃO DOS MÉTODOS HISTÓRICO-CRÍTICOS (MHC)..............................4 1.1.1 Limites ....................................................................................................................4 1.2 PRÉ-TEXTO ..............................................................................................................5 1.3 TEXTO INTERLINEAR ............................................................................................5 1.4 TRADUÇÃO..............................................................................................................6 1.5 CRITICA TEXTUAL.................................................................................................7 1.6 COMPARAÇÃO DAS VERSÕES .............................................................................9 II ANÁLISE LITERÁRIA............................................................................................13 2.1 DELIMITAÇÃO E CONTEXTO LITERÁRIO ........................................................13 2.1.1 Contexto Maior......................................................................................................13 2.1.2 Contexto Menor.....................................................................................................14 2.1.3 Delimitação da Perícope ........................................................................................14 2.2 FORMA E ESTRUTURA ........................................................................................15 2.2.1 Linguagem e Estilo ................................................................................................15 2.2.2 Estrutura ................................................................................................................17 2.2.3 História da Forma: Gênero, lugar vivencial e intencionalidade...............................18 2.3 CRÍTICA LITERÁRIA ............................................................................................18 2.3.1 Coesão...................................................................................................................18 2.3.2 Autoria ..................................................................................................................19 2.3.3 Contexto histórico..................................................................................................20 2.3.4 HISTÓRIA DA REDAÇÃO ..................................................................................22 III PALAVRA .................................................................................................................24 3.1 PARÁFRASE...........................................................................................................24 3.2 SÍNTESE TEOLÓGICA...........................................................................................32 3.3 ESCOPO ..................................................................................................................33 IV HERMENÊUTICA....................................................................................................34 4.1 RELEVÂNCIA DO TEXTO PARA MIM, PARA A COMUNIDADE CRISTÃ E A SOCIEDADE.......................................................................................................................34 4.2 PISTAS PARA ATUALIZAÇÃO ............................................................................35 V REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................36 ANEXO I ............................................................................................................................38

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I TEXTO

1.1 DEFINIÇÃO DOS MÉTODOS HISTÓRICO-CRÍTICOS (MHC)1

Método é um conjunto de procedimentos que podem ser transmitidos, repetidos,

ensinados e aprendidos, e que permitem o acesso objetivo a um objeto de pesquisa. O termo

“histórico” faz reconhecer que os textos estudados foram compostos dentro de um contexto

histórico e possuem relação com este contexto, que possivelmente tem algo a dizer sobre o

sentido do texto. Com “crítico” refere-se ao processo de análise dos aspectos históricos do

texto: o processo de construção do texto, a identidade do autor, a época da sua composição,

sua relação com outros textos contemporâneos e sua relação com a realidade extratextual.

A partir da definição dos termos, descrevem-se os métodos histórico-críticos como

sendo métodos que buscam explicar o texto a partir de um pressuposto histórico e entender

sua intenção original. De um pressuposto crítico busca entender o texto a partir de suas

compreensões ao longo da história da sua composição.

1.1.1 Limites2

Como qualquer método de estudo, os MHC possuem limites. Há que se relacionar aqui

três limites que devem ser levados em conta no momento da exegese.

A dificuldade de estabelecer relação objetiva entre o MHC e os resultados válidos

obtidos a partir de outros métodos, principalmente no que tange as interpretações tipológicas

que o NT faz do AT e as alegóricas dos Pais da Igreja.

Há dificuldade em se obter as verdades teológicas ou de fé dos textos a partir da

aplicação dos MHC, uma vez que a obtenção destas verdades não dependem do conhecimento

histórico, nem da interpretação derivada da história.

1 Segundo Horácio, SIMIAN-YOFRE, Metodologia do Antigo Testamento. p.74-75 2 Ibid, p.75-76.

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Os MHC são incapazes de trazer uma interpretação atual do texto, aproximando o

leitor atual da intenção do texto. A solução para este limite seria a utilização dos MHC como

primeiro passo da interpretação e como atualização da mensagem, passar a utilização de

métodos hermenêuticos.

1.2 PRÉ-TEXTO

A impressão que se tem é de que o profeta sofre oposição de outros profetas (falsos),

que não gostam das palavras duras que Miquéias traz, e que chegam a questionar a validade

das palavras de Miquéias (e de Deus) para àqueles que andam em retidão.

A violência, roubo e atentados contra as mulheres parecem ser atos cometidos dentro

da casa de Israel, pelo que se ira Miquéias, ordenando aos falsos profetas que não fiquem

mais em Israel, que não é lugar para o descanso deles.

Miquéias profere juízo contra os falsos profetas, que profetizam sobre vinho e bebida

forte, e entende que estes são os profetas que o povo merece.

1.3 TEXTO INTERLINEAR

al{ï!Wp+yJiy: WpJiÞT;-la; = 6a

Eles vaticinam – “Não vaticineis”

hL,aeêl' WpJiäy:-al{) = 6bα para estes - Que eles não vaticinem

`tAM)liK. gS;ÞyI al{ï= 6bβ

ultraje - afastar-se-á - não

hw"ëhy> x;Wrå ‘rc;q'h] bqoª[]y:-tyBe( rWmåa'h, = 7aα YHVH? - a paciência – perdeu - ó casa de Jacó? - que foi dito

wyl'_l'[]m; hL,aeÞ-~ai = 7aβ

suas obras? - são estas

WbyjiêyyE yr;’b'd aAlÜh] = 7bα Fazem bem - Minhas palavras – não

`%lE)Ah rv"ïY"h; ~[iÞ = 7bβ

aquele que anda? - o correto - com

~meêAqy> byEåAal. ‘yMi[; lWmªt.a,w> = 8aα

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Levantou-se contra- Para um inimigo - meu povo - e ontem

!Wj+vip.T; rd,a,Þ hm'êl.f; lWMåmi = 8aβ fostes despojados de – glória - manto – de diante da

xj;B,ê ~yrIåb.[ome = 8bα

seguro - daquele que passa

`hm'(x'l.mi ybeÞWv = 8bβ guerra - aquele que virou-se da

!Wvêr.g"åT. ‘yMi[; yveÛn> = 9aα

vós expulsastes - meu povo - mulheres de

h'yg<+nU[]T;( tyBeÞmi = 9aβ de seu deleite - da casa

Wxïq.Ti h'yl,êl'[o) ‘l[;me = 9bα

Vós arrancastes - Suas crianças - Por cima

`~l'(A[l. yrIßd'h] = 9bβ para sempre - minha honra

Wkêl.W WmWqå = 10aα E ide – levantai

hx'_WnM.h; tazOà-al{ yKiî = 10aβ

o lugar de descanso - este não (é) – pois

`#r'(m.nI lb,x,îw> lBeÞx;T. ha'²m.j' rWbï[]B; = 10b que será dolosa - e destruição – danificarás – tornou-se impuro – porque

bZEëKi rq,v,äw" ‘x;Wr’ %lEïho vyaiú-Wl = 11aα

mentiu - e mentira – espírito - que caminha - se um homem

rk"+Vel;w> !yIY:ßl; ^êl. @JIåa; = 11aβ e para bebida forte - para vinho - para ti - eu profetizarei

`hZ<)h; ~['îh' @yJiÞm; hy"ïh'w> = 11b

a este - o povo - profeta - e ele será

1.4 TRADUÇÃO

6a – “Não vaticineis”. Eles vaticinam

6bα – Que eles não vaticinem para estes

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6bβ – Não se afastará o ultraje3

7aα – Que foi dito, ó casa de Jacó? Perdeu a paciência YHVH?

7aβ – São estas suas obras?

7bα – Minhas palavras não fazem bem

7bβ – com aquele que anda correto?

8aα – Outrora meu povo contra um inimigo levantou-se4

8aβ – de cima (do) manto fostes despojados de glória5

8bα – daquele que passa seguro

8bβ – aquele que virou-se contra guerra.

9aα – Mulheres de meu povo vós expulsastes

9aβ – da casa de seu deleite

9bα – por cima suas crianças vós arrancastes

9bβ – minha honra para sempre.

10aα – Levantai e ide!

10aβ – pois este não (é) o lugar de descanso

10b – Por causa (de) ninharia hipotecareis (com) penhor6 cruel.

11aα – Se um homem que caminha em vento de mentira, mentiu:

11aβ – “eu profetizarei para ti para o vinho e para a bebida forte”

11b – E ele será profeta para7 este povo.

1.5 CRITICA TEXTUAL

A necessidade da crítica textual explica-se pelo desejo de chegar-se com segurança ao

texto original. Cerca de dois mil anos de tradição em manuscritos se passaram, e ao longo

deste tempo muitos erros de transmissão foram produzidos.8

A critica textual tem por objetivo reconstruir o texto danificado para chegar ao texto

pretendido pelo autor, ou então o que mais se aproxima dele. Além disto pretende-se

“determinar a história da transmissão e do desenvolvimento do texto escrito de que temos

várias formas hoje9”. Para esta crítica lança-se mão do aparato crítico da Bíblia Hebraica

3 Ultraje ou insulto. Os termos são sinônimos, entretanto prefere-se ultraje haja vista a indicação de uso de ultraje para este versículo em Luis ALONSO-SCHÖKEL, Dicionário Bíblico Hebraico-Português. p.319 4 Ler com o aparato crítico da BHS. 5 Ler com o aparato crítico da BHS. 6 Ler com a crítica textual abaixo. 7 Ler com aparato crítico da BHS. 8 Hans Walter WOLFF, Bíblia, Antigo Testamento: introdução aos escritos e aos métodos de estudo. p.89. 9 H. SIMIAN-YOFRE, Metodologia do Antigo Testamento. p.39.

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Stuttgartensia e da tradução grega Septuaginta10 como fonte para obter maior clareza na

perícope.

No versículo 10b o Texto Massorético11 traz a expressão “lb,x,îw> lBeÞx;T.” cuja tradução

é “danificarás e destruição”. O termo “lBeÞx;T.” é um verbo piel imperfeito na 2ªp. masc. sg, e

o termo “lb,x,îw”> é um substantivo comum masc. sg. precedido por uma conjunção w(vav).

O editor da BHS12 propõe, como primeira possibilidade dentre quatro outras, no

indicativo “b-b” do aparato crítico do referido versículo a substituição da expressão que

encontra-se no TM por “WlB.x.t; lbox]”. Sendo assim, tem-se um substantivo masculino abs.

(lbox]), seguido de um verbo piel imperfeito na 2ªp. masc. pl. (WlB.x.t;), cuja tradução é

“hipotecareis (o) penhor/garantia”. Como segunda possibilidade o aparato crítico sugere

trocar “WlB.x.t;” por “lB;xuT.”, um verbo Pu’al imperfeito 2ªp. masc. sg., portanto a tradução

seria “penhor será arrancado”. Como terceira possibilidade, tem-se a sugestão do editor da

BHS de que seja omitida a partícula “lbox]”, uma vez que esta é possivelmente erro de

ditografia, então tem-se apenas a forma verbal “lB;xuT.”, traduzido por “será arrancado”.

Quarta possibilidade, é ater-se ao indicativo “c” do aparato crítico do versículo 10b,

sendo assim tem-se “lb,x,îw> lB;xuT.”, cuja tradução é “será destruido e destruição”. Sicre13

propõe uma nova ordenação do texto consonontal e revocalização, sendo a conjunção w(vav)

de “lb,x,îw>”, colocado como sufixo pronominal de “lB;xuT.”, revocalizando tem-se “lb,x,î

WlB.xuT.” com o que concorda parcialmente a Septuginta. A LXX traz a expressão “diefqa,rhte

fqora/|”. O termo “diefqa,rhte” é um verbo ind. aoristo passivo 2ªp. pl.14, cuja tradução é

“fostes destruídos”, o que concorda em voz , pessoa e número com a forma verbal “WlB.xuT.”

porém não no tempo. E “fqora/|” é um substantivo fem. dativo sg.15, cuja tradução é “à

destruição”. Sendo, então, a tradução: “sereis destruidos à destruição”.

Entretanto, está sendo feita opção pela primeira possibilidade, ou seja, ater-se ao

indicativo “b-b” do aparato crítico, definido-se a tradução como: “hipotecareis (o) penhor”.

Para defender esta proposição torna-se necessário seguir o que o editor da BHS propõe

no indicativo “a” do aparato crítico do versículo em questão, alterando-se “ha'²m.j'”, um verbo

10 A Septuaginta, daqui a diante denominada por LXX é datada da metade do séc. III a.C. 11 O TM é o manuscrito hebraico B19/A da Biblioteca Pública de Leningrado e é datado por volta de 1008 d.C. 12 Bíblia Hebraica Stuttgartensia 13 J. L. SICRE , A justiça social nos profetas. p.373 14 Frans L. SCHALKWIJK, Coinê: pequena gramática do grego neotestamentário. p.74 15 Ibid, p.26-27

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Qal perf. Na 3ªp. fem. sg. cuja tradução é “tornou-se impuro”, por “hm'Wam. j[;m.”. O termo

“j[;m.” é um adjetivo masc. sg. abs. cuja tradução é “pequeno, pouca coisa16”, e o termo

“hm'Wam.” é um substantivo masc. sg. cuja tradução é “algo, alguma coisa17”. Definidos os

termos, a tradução que se propõe é: “alguma coisa pouca”, porém prefere-se por aproximação

de significado apropriar-se do termo alemão “Kleinigkeit18”, que vertido para o português é

“ninharia19”.

Considerando-se que ao invés da impureza20, termo que não é comum no contexto de

crítica social, tem-se como causa da hipoteca uma dívida ínfima, o que agrava a situação do

povo, então pode-se afirmar que a primeira sugestão do editor da BHS é a mais plausível

dentro do contexto de Miqueias capítulos 2 e 3.

1.6 COMPARAÇÃO DAS VERSÕES

Nesse passo as principais versões em português junto com a tradução da Bíblia

Hebraica serão colocadas lado a lado para verificar suas semelhanças e diferenças. As

traduções analisadas serão a Almeida Revista e Atualizada (ARA), Nova Versão Internacional

(NVI) e Bíblia de Jerusalém (BJ).

ARA

6 Não babujeis,

dizem eles. Não

babujeis tais coisas,

porque a desgraça

não cairá sobre nós.

7 Tais coisas

anunciadas não

alcançarão a casa de

Jacó. Está irritado o

NVI

6 “Não preguem”,

dizem seus profetas.

“Não preguem acerca

destas coisas, a

desgraça não nos

alcançará”. Ó

descendência de

Jacó,

7 é isto que está

BJ

6 Não vaticineis, eles

vaticinam, eles não

devem vaticinar

assim! O opróbrio

não se afastará.

7 Pode-se dizer isso,

casa de Israel?

Perdeu Iahweh, por

acaso a paciência?

BH

6 “Não vaticineis”.

Eles vaticinam. Que

eles não vaticinem

para estes. Não se

afastará o ultraje.

7 Que foi dito, ó casa

de Jacó? Perdeu a

paciência YHVH?

São estas suas obras?

16 “A fewness, a little” conforme W. BAUMGARTNER, L. KOEHLER, Lexicon in Veteris Testamenti libros. p.546. 17 L. ALONSO-SCHÖKEL, Dicionário bíblico Hebraico-Português. p.351. 18 Tradução proposta por H. W. WOLFF, Biblischer Kommentar Altes Testament: Dodekapropheton 4: Micha.

p.38. 19 A. J. KELLER, MICHAELIS: Minidicionário Alemão-Português: Português-Alemão. p.228 20 Como sugere J. SICRE, A justiça social nos profetas. p.373

Apenas para leitura – proibida reprodução – Alexander De Bona Stahlhoefer 10

Espírito do Senhor?

São estas as suas

obras? Sim, as

minhas palavras

fazem o bem ao que

anda retamente.

8 mas, há pouco, se

levantou o meu povo

como inimigo; além

da roupa, roubais a

capa àqueles que

passam seguros, sem

pensar em guerra.

9 Lançais fora as

mulheres de meu

povo do seu lar

querido; dos

filhinhos delas tirais

a minha glória, para

sempre.

10 Levantai-vos e

ide-vos embora,

porque não é lugar

aqui de descanso;

ide-vos por causa da

imundícia que

destrói, sim, que

destrói

dolorosamente.

11 Se houver alguém

que, seguindo o

vento da falsidade,

mentindo, diga: Eu te

sendo falado: “O

Espírito do Senhor

perdeu a paciência?

É assim que ele

age?”

“As minhas palavras

fazem bem àquele

cujos caminhos são

retos.

8 Mas, ultimamente,

como inimigos vocês

atacam o meu povo.

Além da túnica,

arrancam a capa

daqueles que passam

confiantes, como

quem volta da

guerra.

9 Vocês tiram as

mulheres do meu

povo de seus lares

agradáveis. De seus

filhos vocês

removem a minha

dignidade para

sempre.

10 Levantem-se, vão

embora! Pois este

não é o lugar de

descanso, porque ele

está contaminado, e

arruinado, sem que

haja remédio.

É este o seu modo de

agir?

Não são boas as suas

palavra com quem

caminha retamente?

8 Ontem meu povo

se levantava contra

um inimigo; de cima

da túnica, tirais o

manto daqueles que

passam em

segurança, voltando

da guerra.

9 As mulheres do

meu povo vós

expulsais cada qual

da casa que amava.

De seus filhos tirais,

para sempre, a honra

que vem de mim.

10 Levantai-vos e

ide! Não é mais

tempo de repouso!

Por tua impureza

provocas a ruína, e a

ruína será aguda.

11 Se há um homem

que corre atrás do

vento e inventa

mentira: “Eu te

vaticino por vinho e

bebida

embriagadora!”, eu

Minhas palavras não

fazem bem com

aquele que anda

correto?

8 Outrora meu povo

contra um inimigo

levantou-se, de cima

(do) manto fostes

despojados de glória,

daquele que passa

seguro, aquele que

virou-se contra

guerra.

9 Mulheres de meu

povo vós expulsastes

da casa de seu

deleite, por cima suas

crianças vós

arrancastes minha

honra para sempre.

10 Levantai e ide!

Pois este não (é) o

lugar de descanso,

por causa (de)

ninharia hipotecareis

(com) penhor cruel.

11 Se um homem

que caminha em

vento de mentira,

mentiu: “eu

profetizarei para ti

para o vinho e para a

bebida forte”. E ele

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profetizarei do vinho

e da bebida forte,

será este tal o profeta

deste povo.

11 Se um mentiroso

e enganador vier e

disser: ‘Eu pregarei

para vocês fartura de

vinho e de bebida

fermentada’, ele será

o profeta deste

povo!”.

profetizaria para esse

povo.

será profeta para este

povo.

No v.6, a NVI começa com “Não preguem”, enquanto BJ e BH trazem “Não

vaticineis” e ARA traz “Não babujeis”, o verbo hebraico traz a idéia de pingar, gotejar, com o

que concorda em sentido ARA ao trazer babujar21, também é usado em Amós 7.16 como um

sinônimo de profetizar. NVI prefere colocar a segunda oração com uma função explicativa

acrescentando “seus profetas”, apesar de ARA, BJ e BH não fazerem o acréscimo, também

entendem a segunda oração como explicativa da primeira. Diferença considerável nota-se no

final deste versículo, quando NVI traz “a desgraça não nos alcançará” e ARA “a desgraça não

cairá sobre nós” enquanto que BJ traz “O opróbrio não se afastará”, que está mais próximo do

sentido pretendido pela BH: “Não se afastará o ultraje”.

No v.7 ARA e NVI apresentam diferenças quanto à compreensão da função da frase,

sendo que ARA traz “Tais coisas anunciadas não alcançarão a casa de Jacó” como uma

afirmação, NVI traz “Ó descendência de Jacó, é isto que está sendo falado:”, como introdução

ao que será dito em seguida. Enquanto que BH traz uma pergunta: “Que foi dito, ó casa de

Jacó?”, o que também faz BJ “Pode-se dizer isso, casa de Israel?”, apesar de esta última trazer

Israel, ao invés de Jacó. Tanto BH, BJ e NVI concordam que oração seguinte traz uma

pergunta: “Perdeu a paciência YHVH?”, apesar de NVI preferir “O Espírito do Senhor perdeu

a paciência?”, o que difere de ARA.

No v.8, BH traz “Outrora meu povo contra um inimigo levantou-se”, com o que

concorda BJ. ARA dá a entender que o povo é o inimigo: “se levantou o meu povo como

inimigo”, enquanto NVI prefere “como inimigos vocês atacam o meu povo”. Tanto NVI,

quanto BJ concordam em sentido na oração “de cima da túnica, tirais o manto daqueles que

passam em segurança”. BH apresenta um novo sentido haja vista as alterações propostas no

aparato crítico da BHS “De cima (do) manto fostes despojados de glória daquele que passa

21 Dizer, proferir com a boca cheia de baba, conforme W. WELSZFLOG, MICHAELIS: Moderno dicionário da

Língua Portuguesa. p.280.

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seguro”. Também ARA entende o particípio ybeÞWv como “sem pensar em guerra”, o que se

aproxima mais do sentido pretendido por BH “aquele que virou-se contra guerra.”

No v.9 somente na parte final do versículo há diferenças. NVI traz “dignidade”, BH e

BJ trazem “honra”, e ARA “glória”. NVI, ARA e BH lêem “minha honra/glória”, enquanto

que BJ lê “a honra que vem de mim”.

No v.10 ARA e BJ iniciam com “Levantai-vos”, enquanto NVI traz “Levantem-se” e

BH “Levantai”. ARA e NVI acrescentam “embora” ao termo “ide”, dando a idéia de

expulsão. ARA, NVI e BH concordam com a construção “Pois este não (é) o lugar de

descanso”, enquanto BJ traz “Não é mais tempo de repouso!”. A parte final do texto é a que

apresenta maior discórdia, sendo que ARA e BJ apresentam compreensão semelhante do

texto. ARA traz “por causa da imundícia que destrói, sim, que destrói dolorosamente” e BJ

traz “Por tua impureza provocas a ruína, e a ruína será aguda”. NVI apresenta outra proposta

de tradução: “porque ele está contaminado, e arruinado, sem que haja remédio”, enquanto que

a BH, lançando-se mão da crítica textual lê “Por causa (de) ninharia hipotecareis (com)

penhor cruel”.

No v.11 ARA e BJ novamente concordam em significado, BJ traz “corre atrás do

vento e inventa mentira”, enquanto ARA traz “seguindo o vento da falsidade, mentindo”. Já

NVI apresenta outra tradução “Se um mentiroso e enganador vier e disser”, entretanto BH traz

“Se um homem que caminha em vento de mentira, mentiu:”. ARA, BJ e BH concordam com

o conteúdo da proclamação do falso profeta: “eu profetizarei para ti para o vinho e para a

bebida forte”, enquanto NVI prefere “Eu pregarei para vocês fartura de vinho e de bebida

fermentada”. Finalizando a perícope, concordam ARA, NVI e BH quanto à afirmação: “E ele

será profeta para este povo”, dando a idéia de que aquele que profetiza do vinho e da bebida

forte é o profeta merecido pelo povo, com o que não concorda BJ: “eu profetizaria para esse

povo”.

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II ANÁLISE LITERÁRIA

Para a análise literária, parte-se do pressuposto de que toda pessoa possui um conjunto

determinado de características próprias e que aquilo que alguém escreve constitui uma

unidade22. Sua importância reside no fato de que ela situa afirmações isoladas dentro da

mensagem global do autor, o autor dentro de sua época, e a época em que viveu dentro da

marcha histórica.23

2.1 DELIMITAÇÃO E CONTEXTO LITERÁRIO

Como já se apontou na introdução do presente capítulo, a análise literária situa

afirmações isoladas dentro da mensagem global do autor, sendo este o objetivo principal desta

etapa da exegese. “Toda forma de expressão revela apenas um aspecto da psicologia de um

autor, e é somente em relação com o todo que as partes isoladas adquirem sua plena

significação”.24

2.1.1 Contexto Maior

O livro de Miquéias divide-se em quatro partes: I – Mq 1-3; II – Mq 4-5; III – Mq 6.1-

7.7; IV – Mq 7.8-20. Nestas partes se alternam, a grosso modo, palavras de julgamento (partes

I e III) e palavras de salvação (partes II e IV).25 A primeira parte traz após o título (1.1),

palavras de julgamento de Deus tanto para o norte como para o sul, a seguir passa-se a

denúncia de pecados concretos nos capítulos 2 e 3 intercalado por uma promessa de salvação

em 2.12-13.26 A segunda parte focaliza o tema da salvação, com o anúncio do futuro reino

universal de Javé em Sião, da vitória sobre os inimigos de Sião, um oráculo messiânico, o

22 cf. Diego ARENHOEVEL, Assim se formou a Bíblia: Para você entender o Antigo Testamento, p.45 23 cf. Id, Ibid, p.67-70 24 Id, Ibid, p.67 25 cf. R. MARTIM-ACHARD, Miquéias. in VV. AA., Os profetas e os livros proféticos, p.123 26 cf. L. ALONSO-SCHÖKEL, J. L. SICRE DIAZ, Profetas II: Ezequiel, Profetas menores, Daniel, Baruc, Carta de Jeremias, p.1067

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papel do resto de Israel e fecha com ameaças de destruição.27 Na terceira parte a palavra de

Javé vem a Miquéias anunciando julgamento. Inicia com uma convocação para que a natureza

assista a controvérsia de Javé contra o seu povo, em seguida há o confronto de como Javé

agiu na história do seu povo e como o povo tem buscado agradar-lhe, porém a palavra de

juízo vem sobre o povo, pois Javé não se agrada de seus sacrifícios, mas quer “que pratiques a

justiça, e ames a misericórdia, e andes humildemente com o teu Deus.” (6.8b). Em seguida

um ataque àqueles que se enriqueceram praticando a injustiça e uma lamentação de que não se

pode mais confiar em ninguém, nem sequer nos seus íntimos.28 A quarta parte é considerada

como uma liturgia final e contém palavras de salvação. Um hino é entoado, há confissão de

pecados, esperando castigo e restauração. No final uma invocação à misericórdia de Javé.29

2.1.2 Contexto Menor

Após o título(1.1), encontra-se no v.2 o imperativo W[m.vi (ouvi) indicando o início da

proclamação profética, o mesmo imperativo se repete em 3.1 e 6.1 indicando novas unidades.

Já no capítulo 2 encontra-se a interjeição yAhô (ai!) indicando a proclamação de juízo. No

capítulo 1 encontra-se a manifestação punitiva de Javé e sua repercussão na natureza, em

Samaria e em Judá, enquanto que nos capítulos 2 e 3 já se encontram palavras que justificam

os castigos de Javé.30 No capitulo 2 percebe-se uma quebra entre os versículos 11 e 12s. Da

discussão com os profetas passa-se repentinamente para uma promessa de salvação para o

remanescente de Israel. Esta palavra de salvação é estranha no contexto, pois está inserida

entre duas perícopes que tratam do juízo de Deus. Van der Woude, Procksch, e Aalders

entendem 2.12s como sendo palavra dos falsos profetas contrastando com as acusações de

2.6-11.31

2.1.3 Delimitação da Perícope

Apesar de que tanto o capítulo 2 quanto o 3 tratarem do mesmo tema: a justificação do

castigo, pode-se isolar a perícope de Mq 2.6-11 das demais passagens e considerá-lo uma

unidade retórica independente, apesar de não haver indícios de delimitação de unidade de

sentido na BHS, pode-se fazer esta delimitação com base na diferença de temas, pois na

perícope anterior (2.1-5) Miquéias denuncia os latifundiários e em 2.12-13 há uma palavra de

27 cf. Teodoro BALLARINI(ed.), Introdução à Bíblia: Os doze profetas, Daniel, p.78-79 28 cf. L. ALONSO-SCHÖKEL, J. L. SICRE DIAZ, Op cit, p.1068-69 29 cf. Teodoro BALLARINI(ed.), Op cit, p.78-79 30 cf. ALONSO-SCHÖKEL, J. L. SICRE DIAZ, Profetas II: Ezequiel, Profetas menores, Daniel, Baruc, Carta de Jeremias, p.1069 31 cf. Id, Ibid, p.1067

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salvação. Pode-se comprovar, portanto, que Mq 2.6-11 é uma unidade independente

consultando-se obras de introdução e comentários do livro de Miquéias.

2.2 FORMA E ESTRUTURA

2.2.1 Linguagem e Estilo

a) Linguagem – Miquéias utiliza-se especialmente da poesia na transmissão de seus

ditos, também se utilizou de histórias como ferramenta didática especialmente na controvérsia

em 6.1-8. Miquéias tem um gosto acentuado pelo uso de imagens, algumas menos, outras

mais desenvolvidas, também faz uso de termos concretos e até vulgares(2.6; 3.5). Freqüentes

são os jogos de palavras por assonância ou aliteração.32 O amplo uso da forma poética indica

um aprofundamento do pensamento e um polimento de expressão33, o que fica evidente em

Mq 2.6-11 com o uso dos paralelismos como recurso de mnemotécnica. Os ditos não estão

agrupados em ordem cronológica, nem de gênero, pois se encontram ao lado de palavras de

ameaça (2.1-11), promessas (2.12s); ao lado de lamentações (1.8-16), apresentam-se cenas de

processo (1.2-9), salmos (7.14-17) e uma confissão (7.18ss)34. Na perícope de Mq 2.6-11

encontra-se uma controvérsia entre o falso e o verdadeiro profetismo, sendo que se pode

delimitar a controvérsia a partir da repetição do verbo @jn nos versículos 6 e 11. Outro

recurso formal consiste na citação dos ditos dos adversários antes da acusação propriamente

dita35, a forma apaixonada dos que estão disputando mostra-se imediatamente nas curtas

sentenças, sendo que a controvérsia termina com um dito sarcastico contra os falsos profetas36

(v.11).

b) Estilo – Os paralelismos encontrados na perícope em análise são: o sinonímico,

sintético e o climático.

No paralelismo sinonímico em cada linha se expressa o mesmo pensamento em

linguagem equivalente37, tendo como paradigma A-A’. No paralelismo climático, encontrado

em versículos de três membros, há repetição de alguns termos decisivos, mas avança o

32 Teodoro BALLARINI(ed.), Introdução à Bíblia: Os doze profetas, Daniel, p.76-77 33 D. BAKER, T. D. ALEXANDER, R. J. STURZ, Obadias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuque e Sofonias:

Introdução e comentário, p.171 34 cf. Teodoro BALLARINI(ed.), op cit, p.79 35 cf. L. ALONSO-SCHÖKEL, J. L. SICRE DIAZ, Profetas II: Ezequiel, Profetas menores, Daniel, Baruc, Carta de Jeremias, p.1080 36 cf. H. W. WOLFF, Biblischer Kommentar Altes Testament: Dodekapropheton 4: Micha, p.43 37 W. LASOR, Introdução ao Antigo Testamento, p. 250-51

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pensamento, tendo como paradigma (-A)-(A)-(+A). No paralelismo sintético a segunda parte

do versículo leva adiante a idéia da primeira parte, porém sem repetição de sinônimos.38

v.6a – Não vaticineis. Eles vaticinam

A

v.6bα – Que eles não vaticinem para estes

A’

v.7aα – Que foi dito, ó casa de Jacó? Perdeu a paciência YHVH?

-A

v.7aβ – São estas suas obras?

A

v.7bα – Minhas palavras não fazem bem

v.7bβ – com aquele que procede correto?

+A

v.8aβ – De cima (do) manto fostes despojados de glória

A

v.8bα – daquele que passa seguro

B

v.8bβ – aquele que virou-se da guerra.

B’

v.9aα – Mulheres de meu povo vós expulsastes

A B

v.9aβ – da casa de seu deleite

c

v.9bα – por cima suas crianças vós arrancastes

A’ B’

v.9bβ – minha honra para sempre.

C'

38 Werner H. SCHMIDT, Introdução ao Antigo Testamento, p.285

Paralelismo sinonímico

Paralelismo climático

Paralelismo sintético

Paralelismo sinonímico

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v.10 – sem paralelismos

v.11aβ – “eu profetizarei para ti

A

para o vinho e para a bebida forte”

B B’

2.2.2 Estrutura

Uma palavra de juízo contra os detentores de poder (2.1-5) resulta em uma disputa

entre o falso e verdadeiro profetismo. A disputa se apresenta em duas partes principais e um

pequeno encerramento. Primeiramente o profeta cita seus oponentes (v.6-7a), então responde

a eles (v.7b-10) e conclui com um dito sarcástico sobre os profetas que são desejados (v.11).

Estrutura de Miquéias 2.6-11 Sentenças negativas

rejeitando a

pregação de

Miquéias

v.6a “Não vaticineis...”

v.6bα “Que eles não vaticinem para estes”

v.6bβ “Não se afastará o ultraje”

6-7a Citação dos

oponentes

Perguntas dos

oponentes que

requerem resposta

negativa

v.7a “Que foi dito, ó casa de Jacó?

Perdeu a paciência YHVH?

São estas suas obras?”

Contra-pergunta v.7b “Minhas palavras não fazem bem

com aquele que procede correto?”

7b-10 Resposta de

Miquéias

Denúncias v.8aβ “De cima (do) manto fostes

despojados de glória”

v.9a “Mulheres de meu povo vós

expulsastes da casa de seu deleite”

v.9b “por cima suas crianças vós

arrancastes minha honra para sempre.”

v.10b “Por causa (de) ninharia

hipotecareis (com) penhor cruel.”

Paralelismo sintético

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11 Dito sarcástico v.11 “Se um homem que caminha em espírito de mentira... E ele

será profeta para este povo”

2.2.3 História da Forma: Gênero, lugar vivencial e intencionalidade

Para um maior entendimento da palavra profética é imprescindível que se conheça a

forma usada pelo profeta para comunicar sua mensagem, bem como o motivo pelo qual ele

usou determinada forma e com que objetivos. O método da crítica das formas procura

determinar a forma com tal precisão que se possa reconstituir o lugar vivencial. Conhecendo-

se o gênero literário pode-se conhecer o seu lugar vivencial e somente a partir deste é que se

pode entender a intencionalidade do autor.39

A mensagem de Miquéias se dá em uma alternância de palavras de juízo e salvação, há

também controvérsias, como é o caso da perícope em análise, Mq 2.6-11, neste gênero de

disputa o profeta aceita o desafio de enfrentar diretamente seus ouvintes40, neste caso os falsos

profetas. Nas disputas o profeta cita as acusações de seus oponentes e faz perguntas esperando

as respostas (cf. 2.6-7; ainda Am 3.3-6), em seguida passa a enumerar acusações contra seus

oponentes e termina com uma palavra de juízo, na perícope em análise com um sarcasmo.41 O

lugar vivencial do gênero de disputa deve ser buscado junto aos círculos sapienciais, onde “o

ouvinte é levado a formar seu próprio julgamento através de um fluxo de perguntas com a

finalidade de preparar a adesão à mensagem. Esta então é apresentada como conclusão”.42

Portanto a intenção do autor é “com suas perguntas (...) levar seus interlocutores à reflexão,

convencer seus contemporâneos do direito ou até da necessidade de sua proclamação,

conduzir à percepção correta”.43

2.3 CRÍTICA LITERÁRIA

2.3.1 Coesão

O Texto Massorético de Miquéias está muito corrompido, existem muitos termos

obscuros, de difícil tradução e até incompreensíveis. Também ocorrem repetições (3.2s; 5.7s),

explicações em forma de glosas (3.8; 5.1).44 Apesar da simetria apontada na estrutura do livro,

39 cf. Diego ARENHOEVEL, Assim se formou a Bíblia: Para você entender o Antigo Testamento, p.86 40 Werner H. SCHMIDT, Introdução ao Antigo Testamento, p.181 41 cf. síntese encontrada em H. W. WOLFF, Biblischer Kommentar Altes Testament: Dodekapropheton 4: Micha, p.43 42 H. W. WOLFF, Bíblia, Antigo Testamento, p. 96 43 Werner H. SCHMIDT, A fé do Antigo Testamento, p.376 44 cf. Teodoro BALLARINI(ed.), Introdução à Bíblia: Os doze profetas, Daniel, p.81-82

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o caráter fragmentário do livro é evidente sob uma leitura atenta. “A mudança constante de

sujeito e predicado leva a supor que cada uma das três divisões [quatro conforme a divisão ora

proposta] é um mosaico de várias profecias”45, talvez estas tenham sido proferidas durante a

atuação pública de Miquéias e posteriormente reunidas em um escrito por redator ou escola.

A perícope de Mq 2.6-11 é coesa e assim defendida pela maioria dos especialistas.

Foram levantados questionamentos por Willi-Plein que consideram o v.10b como acréscimo

pós-exilico ou exílico e por Allen que considera o mesmo trecho como sendo releitura exílica,

para com isto buscar uma explicação da utilização do conceito de “impureza”46, também

Wolff afirma que o v.10b no TM pode ser procedente do campo cúltico e tem semelhança em

estilo à uma redação deuteronomística por Amós47. Entretanto, a partir da crítica textual

defendida neste trabalho não há motivo para se considerar o v.10b como acréscimo ou

releitura.

Portanto considera-se que a unidade retórica em questão é coesa e atribuída a

Miquéias sem maiores contestações.

2.3.2 Autoria

Quase nada se conhece sobre Miquéias (mîkâ, abreviação de Mîkāyâ, quem é como

Javé48), senão aquilo que se deduz do que está registrado na sua profecia. Miquéias é

contemporâneo, mas mais novo do que Isaías, os dois profetas atuaram no Reino do Sul e ao

mesmo tempo. Tanto Is 1.1 como Mq 1.1 mencionam os mesmos três reis: Jotão, Acaz e

Ezequias49. Miquéias nasceu em Morasti (Morasti-Gat), aldeia de Judá, 35km a sudoeste de

Jerusalém, portanto na Shefelá, ambiente agrário. Nada sabemos sobre sua profissão, posição

social, alguns o tratam como “homem símples do campo” (Sellin), ou “do círculo de pequenos

camponeses e donos de rebanho” (Weiser)50, ou ainda Wolff o considera como ancião (!qez"51)

da comunidade morastita.52

Possivelmente Miquéias tenha atuado na capital Jerusalém (3.9ss). Van der Woude

afirma que é estranho que um profeta judaíta conclua sua obra falando da Samaria, portanto,

45 D. BAKER, T. D. ALEXANDER, R. J. STURZ, Obadias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuque e Sofonias:

Introdução e comentário, p.175 46 cf. J. L. SICRE, A justiça social nos profetas, p.377 47 cf. H. W. WOLFF, Biblischer Kommentar Altes Testament: Dodekapropheton 4: Micha, p.XXVIII 48 Teodoro BALLARINI(ed), op cit, p.76 49 Werner H. SCHMIDT, Introdução ao Antigo Testamento, p.212 50 cf. J. L. SICRE, op cit, p.338 51 Ancião, chefe, autoridade. Cf. L. ALONSO-SCHÖKEL, Dicionário Bíblico Hebraico-Português, p.197 52 cf. H. W. WOLFF, op cit, p. XV

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para ele deve ter existido um Deutero-Miquéias responsável pelos capítulos 6-753. A maioria

dos comentaristas apóia a tese de que apenas os capítulos 1-3 (exceto 2.12s) são de autoria de

Miquéias, sendo os demais de origem controvertida.

2.3.3 Contexto histórico

Para entender uma pessoa e sua mensagem é necessário conhecer a época em que ela

viveu. Se quer-se realmente compreendê-lo precisa-se, primeiro, entender seu pano de fundo

histórico, a época, seus temores, altos e baixos. Além de conhecer a época é importante

entendê-la a partir do seu lugar na história daquele povo ou até no contexto mundial.54

Miquéias, segundo a introdução do livro, atuou durante o reinado de Jotão, Acaz e

Ezequias (Mq 1.1), aproximadamente entre os anos de 737 até cerca de 686.55 Entretanto

algumas dúvidas surgem ao se analisar este período de atuação, uma vez que as datas

propostas para os reinados de Jotão e Acaz são muito discutidas, porém a partir de outras

evidencias, como a referência a Samaria como capital (portanto antes de 722) em Mq 1.2-7 e

a referência à atuação de Miquéias no reinado de Ezequias em Jr 26.1856, pode-se afirmar com

maior certeza que a data aproximada da atuação seja 740(?) até 70057.

A situação no último terço do século VIII é a da dominação Assíria. Teglat-Falasar III,

da Assíria, havia se tornado um fator de poder de primeira ordem cujos efeitos os estados do

corredor siro-palestinense sentiriam em breve.58 Em 734 Israel e Damasco tentaram envolver

Acaz de Judá numa conspiração antiassíria, com o objetivo de livrar-se da pressão assíria,

entretanto Acaz opôs-se a proposta e enviou tributo a Teglat-Falasar III para que este o

apoiasse contra Israel e Damasco. Damasco caiu diante da Assíria em 732 sendo transformado

em província assíria, Israel perdeu os territórios de Galaad e Galiléia que foi transformado em

pequenas províncias assírias em 733, enquanto o remanescente de Israel caiu nas mãos de

uma dinastia favorável a Assíria.59

Além do tributo pago por Judá, Acaz atraiu conseqüências no campo religioso para

Judá, cf. 2Rs 16.7ss Acaz renunciou a sua liberdade e introduziu algumas inovações assírias

no templo de Jerusalém, como uma réplica do altar Assírio de Damasco. Noth interpretou o

53 cf. L. ALONSO-SCHÖKEL, J. L. SICRE DIAZ, Profetas II: Ezequiel, Profetas menores, Daniel, Baruc, Carta de Jeremias, p.1064 54 cf. Diego ARENHOEVEL, Assim se formou a Bíblia: Para você entender o Antigo Testamento, p.69-70 55 cf. Teodoro BALLARINI(ed), Introdução à Bíblia: Os doze profetas, Daniel, p.75 56 cf. L. ALONSO-SCHÖKEL, J. L. SICRE DIAZ, op cit, p.1064-65 57 cf. Werner H. SCHMIDT, Introdução ao Antigo Testamento, p.212 58 Herbert DONNER, História de Israel e dos povos vizinhos, p.349 59 Id, Ibid, p.352-355

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fechamento do passadiço do Templo como reconhecendo que o rei de Judá não possuía mais

autoridade no Templo. O reinado de Acaz foi lembrado como um dos piores momentos de

apostasia de Judá.60

Em 727 Teglat-Falasar III morreu e foi sucedido por seu filho Salmanasar V. No ano

de 724, Oséias de Efraim (o remanescente de Israel), suspendeu o pagamento de tributos à

Assíria e começou a fazer contatos com o Egito a fim de receber cobertura política e talvez

militar. Salmanasar V prontamente procurou subjugar violentamente o movimento contra ele,

conseguiu apoderar-se de Oséias e em 722, após três anos de cerco em Samaria, esta caiu.

Efraim foi transformado em província assíria, sua elite foi deportada para a Mesopotâmia e

Média e uma nova elite foi trazida da Babilônia e Síria Central, com isto sucumbiu o reino do

Norte.61

Em 722 após um golpe de estado, Sargon II tornou-se rei da Assíria e seu reinado

durou até sua morte em 705, quando então ascendeu Senaqueribe, filho de Sargon II. Durante

o reinado de Sargon II não houve qualquer tentativa da parte de Judá em tentar um levante,

entretanto com a ascensão de Senaqueribe, Ezequias de Judá (725-697) julgou oportuno

adotar uma política antiassíria. Ezequias liderou uma coalizão antiassíria no corredor siro-

palestinense e também um reforma interna que buscava a independência. Entretanto

Senaqueribe entrou na Palestina e subjugou as cidades filistéias rebeldes e em seguida Judá e

em 701 sitiou Jerusalém que aceitou pagar pesado tributo à Senaqueribe, tendo tornado-se,

então, estado vassalo da Assíria.62

As condições econômicas e sociais em Judá eram menos que ideais sob o reinado de

Acaz e Ezequias. A nação estava empobrecida, sobretudo por haver perdido os territórios de

Edom e o porto de Asiongaber, além do tributo pesado que era pago à Assíria. Os grandes

proprietários de terra expropriavam os pobres, e estes não tinham a quem recorrer devido à

corrupção dos juízes (Is 1.21-23; 5.23; 10.1-4). Entretanto, os ricos viviam no luxo, sem

preocupar-se com a situação dos desafortunados (cf. Is 3.16-4.1; 5.11ss). Além disso, a

religião oficial parece que não ofereceu qualquer censura a estas práticas. Apoiada pelo

estado, a religião oficial não questionava suas práticas tampouco a conduta dos dirigentes do

estado. O culto sofisticado mantinha a visão de que as exigências de YHVH só seriam

60 John BRIGHT, História de Israel, p.335-36 61 Herbert DONNER, História de Israel e dos povos vizinhos, p. 361 62 Id, Ibid, p. 368-373

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cumpridas com os rituais de sacrifícios. Os sacerdotes eram corruptos, oportunistas e os

profetas modelavam sua palavra pelo volume dos rendimentos.63

Neste contexto insere-se a perícope em estudo, que aponta claramente para os fatos

supramencionados de expropriação dos pobres, de um profetismo que não condena os abusos

da classe dirigente, antes se alicerça no culto oficial como suficiente para garantir o favor de

YHVH. A partir destes fatos Miquéias desenvolve sua controvérsia.

2.3.4 HISTÓRIA DA REDAÇÃO

Apesar da escassa documentação, é possível afirmar que os “oráculos proféticos foram

fixados por escrito imediatamente e logo transmitidos”. A maioria destes “oráculos” e ações

simbólicas foram colocadas por escrito quando do profeta ainda em vida, logo após a sua

pregação oral.64

O motivo pelo qual as palavras dos profetas foram colocadas por escrito foi o de que

ao se fixar a palavra ela conserva, e até intensifica, a sua virtude. “A cada leitura ou a cada

recitação, sua força é libertada de novo e se torna eficaz.”65. A formação de um livro profético

deu-se de uma forma geral em três etapas. Na primeira, a partir da união dos diferentes

discursos proféticos escritos obteve-se uma coleção de ditos, portanto não constituindo uma

composição homogênea. Numa segunda etapa da formação as coleções de escritos mais

extensos foram reunidas formando coleções maiores. O agrupamento das coleções maiores

deu origem aos livros proféticos em sua forma final.66

Desta maneira pode-se analisar a estrutura de Miquéias observando de que forma os

ditos proféticos vieram a ser agrupados formando coleções e por fim um livro. Os capítulos 1-

3 constituem uma unidade com ditos proféticos que tem uma relação entre si, sendo que, a

maioria dos estudiosos atribui sua autoria a Miquéias. Nos capítulos 4-5 também há uma

unidade temática, porém os estudiosos não atribuem sua autoria a Miquéias, portanto aqui há

indicio forte de que uma redação posterior tenha retrabalhado e talvez até atualizado a

mensagem de Miquéias, incluindo novos temas que parecessem oportunos. Em 6.1-7.7

novamente palavras de juízo atribuídas a Miquéias com forma semelhante ao primeiro bloco.

Em 7.8-20 uma liturgia final tida como acréscimo pós-exílico.67

63 John BRIGHT, História de Israel, p.336-38 64 E. SELLIN, G. FOHRER, Introdução ao Antigo Testamento, p.538 65 Id, Ibid, p.539 66 Id, Ibid, p.540-41 67 Werner H. SCHMIDT, Introdução ao Antigo Testamento, p.213

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Analisando a perícope, Pixley ainda defendeu que esta “sofreu uma nova censura por

parte dos autores do livro, de seus transmissores e de seus tradutores”.68 Analisando a LXX,

Pixley chegou à conclusão de que Miquéias, nesta perícope, estava conclamando o povo à

insurreição contra os líderes e autoridades, porém o TM não conservou esta ênfase.

Entretanto, o que se pode afirmar sobre a perícope é que não se encontram nela rupturas e

cisões internas que possam indicar acréscimos, o que fica evidente é o problema de

transmissão do Texto Massorético.

A partir destes problemas de transmissão apontados, Von Rad coloca uma dúvida, com

a qual quer-se apontar para a próxima etapa deste trabalho:

“Este processo de desenvolvimento da tradição nos coloca diante dum problema hermenêutico para o

qual, aqui só podemos acenar. Se as palavras dos profetas atravessaram desta forma a história de Israel e

conservaram seu caráter de mensagem muito além da primeira proclamação, sua interpretação pelas

gerações posteriores deve ter sido elástica. Com efeito, a palavra não atinge os destinatários ulteriores

senão depois de uma adaptação de seu conteúdo. Ora, nossa exegese científica das palavras dos profetas

esforça-se por compreender o conteúdo tal qual o profeta teria transmitido. Sem renunciar a este método,

deveríamos também mostrar que esta compreensão do profeta não é mais do que uma das possibilidades

de interpretação”69.

68 Jorge PIXLEY, Miquéias o livro e Miquéias o profeta, in RIBLA Nº. 35/36, p.210 69 Gerhard VON RAD, Teologia do Antigo Testamento, vol.2., p.49-50

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III PALAVRA

Todo o trabalho realizado até o momento serviu como preparação para o ponto

culminante desta análise exegética, a análise da palavra. O que se busca neste capítulo é

elucidar os conteúdos da perícope através da análise de termos e recontar o texto

parafraseando-o para que não se perca a intencionalidade da unidade retórica. A finalidade

deste capítulo é chegar ao enunciado do texto.70

As indicações da quantidade de ocorrências de termos hebraicos foram retiradas de

Gerhard LISOWSKY, Konkordanz zum Hebräischen Alten Testament, exceto quando

indicada outra fonte.

3.1 PARÁFRASE

De acordo com o exposto no tópico 2.2.2, no v.6 encontram-se sentenças negativas

onde Miquéias cita as palavras de seus oponentes que rejeitam sua pregação. Na perícope em

questão o gênero é de disputa profética, entre Miquéias e outros profetas.

Os profetas (aybin" – 315 vezes, sendo 156 vezes entre os escritos proféticos e

especificamente 23 vezes nos profetas do século VIII a.C., mas bastante freqüente em

Jeremias com 95 ocorrências71) – O substantivo nābī’ aparece em textos fora da Bíblia nas

cartas de Laquis, no idioma siríaco, em árabe e etiópico, mas sempre como um empréstimo da

língua hebraica. A etimologia é incerta, o Lexicon de Gesenius faz o substantivo derivar do

verbo nāba‘, que significa borbulhar, ferver e derramar, portanto o profeta seria aquele que

extravasa em palavras. Outro grupo de estudiosos entende que o substantivo é derivado da

raiz árabe naba’a, anunciar, então o profeta seria um “porta-voz”. Albright deriva o

substantivo da raiz acadiana nabû, chamar, sendo o profeta “aquele que é chamado”. Há ainda

aqueles que defendem a tese de que o substantivo fora derivado de uma raiz semítica

70 cf. Renatus PORATH, Apontamentos sobre passos da Metodologia. Exegética do AT, p.36 71 cf. J. JEREMIAS, aybin" nabi´ Profeta in Ernst JENNI, Claus WESTERMANN, DTMAT, vol.2, col.23-24

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desconhecida.72 Tanto a forma nominal nābī’ quanto a verbal nābā’ são empregadas no

Antigo Testamento à homens que exercem diferentes formas de atividades proféticas, tanto

àqueles tomados por êxtase pelo Espírito, tanto quanto a comunicação de palavras vindas de

Javé, ou discursos sobre preceitos e conclamação à conversão, ações milagrosas, consultas e

súplicas a Javé. O entorno de Israel também conhecia profetas, há indicação de profetas de

Baal e profetas de Aserá em 1Rs 18.19, entretanto os paralelos são poucos.73

Quanto as origens e ao desenvolvimento da profecia hebraica, o substantivo plural

nebī’īm foi utilizado no período de transição entre a época dos Juízes e a dos Reis para os

grupos de iluminados extáticos que andam em bandos (1Sm 10.5,10) ou que se reúneniam em

casa para induzir o transe profético (1Sm 19.20), para tanto utilizavam música com muitos

instrumentos e dança, o comportamento de Samuel no texto supracitado parece indicar que o

culto era frenético. No período médio da monarquia, conforme a menção em 1Rs 22, existiam

na corte de Israel cerca de 400 profetas (v.6), estes estavam à disposição do rei, exerciam sua

atividade perante o rei (v.10) e eram chamados “seus profetas” (v.22).74

Característico nos profetas chamados “literários” são textos de vocação, onde são

relatados os seus chamados para profetizar por parte de Javé. Von Rad atesta que a vocação

era comunicada por uma palavra pessoal de Deus que criava no homem chamado um estado

totalmente novo, não era resultado de aptidões anteriores ou de uma escalada dentro da vida

religiosa. Este novo estado conseqüentemente produzia uma profunda mudança de vida, como

se pode inferir do relato de Am 7.14 “Eu não sou profeta, nem discípulo de profeta, mas

boiadeiro e colhedor de sicômoros. Mas o SENHOR me tirou de após o gado e o SENHOR

me disse: Vai e profetiza ao meu povo de Israel”. O vocacionado saía da sociedade,

abandonava suas garantias sociais e econômicas e passava a viver na dependência de Javé.75

Os textos de vocação também falam sobre a resistência dos profetas quanto à missão de Javé e

atestam sua legitimidade como profetas de Javé.76

Encontram-se neste período também os chamados profetas cultuais que tinham sua

atuação junto aos santuários, ao lado dos sacerdotes e levitas, além destes constata-se a

existência de profetas da corte, que exerciam um ministério perante o rei, como já explicado

anteriormente. Entre este grande grupo encontram-se aqueles que são chamados de falsos

72 cf. Robert D. CULVER, 1277a aybin" nabi´ Porta-voz, profeta in Laird R. HARRIS (org), DITAT, p.904-06 73 cf. J. JEREMIAS, aybin" nabi´ Profeta in Ernst JENNI, Claus WESTERMANN, DTMAT, col.25 74 cf. J. JEREMIAS, op cit, col.27-28 75 cf. Gerhard VON RAD, Teologia do Antigo Testamento, v.2, p.57-58 76 cf. J. JEREMIAS, op cit, col.43

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profetas.77 Se for considerada como correta a interpretação de McKenzie, os profetas tão

apenas revelam a natureza e o caráter de Javé, com quem tiveram uma experiência afirmando

as implicações desta natureza e caráter no modo de agir dos homens, comparando-se com Jr

23.16-17, entende-se que os falsos profetas são aqueles que falam a partir de si mesmos e não

a partir de experiências que tiveram com Javé, portanto não possuem esta consciência da

natureza e caráter de Javé.78

Miquéias descreve no v.6 da perícope em estudo as palavras dos profetas que o

acusam. O verbo utilizado para “vaticinar, profetizar” é @jn, este encontra-se 18 vezes, sendo

5 vezes em Miquéias, todas dentro da perícope em questão. No tronco Qal o verbo significa

gotejar, destilar, escorrer79, e encontra-se em 9 das 18 ocorrencias, as demais estão no tronco

Hiphil, cujo significado é escançar, manar, vaticinar80. Em Miquéias todas as ocorrências

estão no tronco Hiphil. Analizando-se o uso da forma verbal no tronco Hiphil entre os

profetas do século VIII (específicamente aqui Miquéias e Amós) entende-se que o seu uso é

pejorativo, lembrando-se do tronco Qal entende-se que a falsa palavra profética goteja ou

pinga, daí o significado pretendido por Sicre: “arengar, fazer sermão”81. O sentido fica mais

claro ao analizar Am 7.16, onde também Amós é acusado de “fazer sermão”. É neste sentido

que Miquéias responde aos seus interlocutores, afirmando com as mesmas palavras usadas

pelos falsos profetas, que são eles que “fazem sermão”.

O v.6 continua com a afirmação de que “não se afastará o ultraje”. O substantivo

ultraje (tAM)liK.) é encontrado 31 vezes no Antigo Testamento, sendo apenas 2 vezes em

profetas do século VIII (Is 30.3; Mq 2.6). O substantivo é derivado da forma verbal ~l;K' que

significa “ser envergonhado, confundido, ferido, censurado”82, e é encontrado 38 vezes no

AT. Segundo o Dêutero-Isaías, serão confundidos e envergonhados aqueles que se

enraivecerem contra Javé (Is 41.11), porém aqueles que são ajudados por Javé não serão

envergonhados (cf. Is 50.7). Se for tomado emprestado este conceito exílico para lançar luz

sobre a perícope em questão, pode-se afirmar que os interlocutores de Miquéias entendem que

este enraivece a Javé com suas acusações contra os latifundiários e os outros profetas, uma

vez que eles entendem a palavra de Javé como sendo sempre positiva a eles e que estando

77 cf. Georg FOHRER, História da Religião de Israel, p.290 78 cf. John L. MCKENZIE, Dicionário Bíblico, p.745 79 Luis ALONSO-SCHÖKEL, Dicionário Bíblico Hebraico-Português. p.433 80 Idem 81 José L. SICRE, A justiça social nos profetas. p.368 82 John N. OSWALT, 987 ~l;K' kālam ser (estar) envergonhado, confundido, ser censurado, magoado, ferido, ruborizar. in Laird R. HARRIS (org), DITAT, p.725-26

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Javé entre eles nenhum mal sobrevirá (cf. Mq 2.7; 3.11), por isto o ultraje não se afastará de

Miquéias. Entretanto Miquéias faz esta citação justamente para demonstrar que aqueles que

envergonham Javé são os que o acusam (também conforme Mq 3.5-7).

No v.7a encontram-se três perguntas retóricas pronunciadas pelos interlocutores a

Miquéias e que exigem uma resposta negativa da parte de Miquéias. Os interlocutores

questionam Miquéias sobre o caráter das obras de Javé (wyl'_l'[]m;). Seriam as obras de Javé

juízo sobre a casa de Jacó? O substantivo “obra, feito” (ll'[]m;) é encontrado 41 vezes no AT,

sendo 11 vezes nos profetas do século VIII e 3 vezes em Miquéias (2.7, 3.4, 7.13). Nota-se

que na maioria dos casos o termo é utilizado com um sentido semelhante: a(s) obra(s) dos

homens. Com esta conotação o termo é encontrado 38 vezes. Para os profetas do século VIII

as obras dos homens são, na maioria dos casos, apresentadas como obras más (Is 1.16, 3.8;

Mq 3.4, Os 9.15), outras vezes há afirmação de que Javé julgará os homens pelas suas obras

(Os 4.9, 12.3). Apenas 3 vezes o termo é empregado para as obras de Javé (Mq 2.7, Sl 77.11,

78.7). Em Salmos o termo ll'[]m; é utilizado como sinônimo de l[;P' “fazer, obrar, realizar”83 e

hl'yli[] “ação, ato, obra, feito, conduta”84. A partir das indicações dos escritos do século VIII,

aponta-se para um entendimento do termo num sentido negativo, portanto aduz-se que os

interlocutores estariam a questionar Miquéias quanto a “se as obras de Deus seriam ruins”, o

que requer uma resposta negativa da parte de Miquéias.

O contra-ataque do profeta Miquéias inicia no v.7b com um questionamento aos seus

interlocutores: “Minhas palavras não fazem bem com aquele que procede correto?”. Quais

seriam estas palavras que fazem bem àquele que procede correto? O substantivo rb'D'

“palavra, coisa”, é encontrado 1400 vezes no AT, sendo 47 vezes nos profetas do século VIII

e especificamente 3 vezes em Miquéias (1.1, 2,7, 4.2). Este substantivo é de suma importância

para o linguajar teológico do Antigo Testamento, tendo grande relevância, sobretudo por

causa da expressão “debar YHVH”, “palavra de Javé”, que ocorre 225 vezes como termo

técnico para a revelação profética. Além da expressão construta citada, ainda encontram-se

mais de 300 vezes dābār/debārīm relacionados a Deus (e/ou Javé). Aproximadamente 225

vezes esta relação faz referência à revelação profética.85 A partir das indicações dos Salmos

podem-se verificar algumas das características da “palavra de Javé”: “é reta, e todo o seu

83 cf. Luis ALONSO-SCHÖKEL, Dicionário Bíblico Hebraico-Português. p.543. Também compare o Sl 77.11 com 77.12, onde os termos supracitados são utilizados no recurso poético conhecido como paralelismo. 84 cf. Luis ALONSO-SCHÖKEL, op cit, p.499; Também compare o Sl 78.7 com 78.11, onde o recurso de paralelismo novamente é utilizado com os termos supracitados. 85 cf. G. GERLEMAN, rb'D' dābār Palabra in Ernst JENNI, Claus WESTERMANN, DTMAT, vol.1, col.623-24

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proceder é fiel” (Sl 33.4), “Para sempre (...) está firmada a tua palavra no céu.” (Sl 119.39),

“Lâmpada para os meus pés (...) e, luz para os meus caminhos.” (Sl 119.105), ela é “verdade”

(Sl 119.160).86 Também em Dêutero-Isaías: “assim será a palavra que sair da minha boca: não

voltará para mim vazia, mas fará o que me apraz e prosperará naquilo para que a designei.” (Is

55.11). Entretanto não se pode separar a Palavra de Javé do próprio Javé, pois ela só tem

existência a partir de Javé, um atributo divino não pode ter vida própria, pois é inerente à

própria divindade, contra a chamada hipóstase das virtudes e atributos divinos, como é

apontado acertadamente por Gerleman.87

A partir das diversas vezes em que o termo correlato “Palavra de Javé” é utilizado no

contexto de palavra profética, aliado ao prólogo de Miquéias, “Palavra do SENHOR que em

visão veio a Miquéias” (1.1), entende-se por “minhas palavras” uma fala de Javé através de

Miquéias, contra os interlocutores. A resposta da pergunta deve ser “sim”, de acordo com os

atributos da “Palavra de Javé” já citados anteriormente, que prudentemente não são negados

pelos interlocutores, entretanto como explica Alonso-Schökel e Sicre “não basta invocar o

sobrenome patriarcal nem apelar para a paciência de Deus nem supor a sua bondade ou a

própria inocência”88, requer-se que se proceda corretamente.

Como uma introdução as denúncias de Miquéias nos vv.8-10 é que se coloca o v.8aα,

onde encontra-se o substantivo ~[;, mais especificamente acrescido de sufixo da 1ª pessoa do

comum singular: yMi[;. O significado original é indicado como sendo “tio paterno”, o

significado “familiares” deve-se a uma evolução posterior, sendo assim, se subentende em ~[;;

o laço de parentesco entre os membros.89 Este substantivo encontra-se 1868 vezes no AT,

sendo 141 vezes nos profetas do século VIII e 19 vezes em Miquéias (1.2,9; 2.4,8,9,11; 3.3,5;

4.1,3,5,13; 5.6,7; 6.2,3,5,16; 7.14). Nota-se que em Miquéias o substantivo aparece 9 vezes na

forma sufixada yMi[; (1.9; 2.4,8,9; 3.3,5; 6.3,5,16), analisando as referências nota-se que 6

delas considera-se como palavras de Miquéias90, e que todas as referências apontam para

perícopes que se encontram em contextos de “palavras de julgamento”,91 entretanto não serão

analisadas neste trabalho as referências ao capítulo 6 de Miquéias por tratar-se um outro

86 cf. Earl S. KALLAND, 399 rb;D' (dābār) falar, declarar, conversar in Lair R. HARRIS(org), DITAT, p.292-97 87 cf. G. GERLEMAN, rb'D' dābār Palabra in Ernst JENNI, Claus WESTERMANN, DTMAT, vol.1, col.626 88 Luis ALONSO-SCHÖKEL, José L. SICRE DIAZ, Profetas II: Ezequiel, Profetas menores, Daniel, Baruc, Carta de Jeremias, p.1081 89 cf. A. R. HULST, m[;/ywGo ‘am/goy Pueblo in Ernst JENNI, Claus WESTERMANN, DTMAT, vol.1, col.374 90 cf. item 2.2.3 deste trabalho 91 cf. item 2.1.1 deste trabalho

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contexto histórico e de autoria incerta. Considera-se que, neste contexto, yMi[; refira-se a ~[;

hw"hy> “povo de Javé”, cujo significado é família ou parentela de Javé. Lohfink afirma que se

Javé escutava a voz de angustia dos seus adoradores e decidia salvá-los é porque os

considerava como membros de sua própria família. Lohfink ainda argumenta que também são

considerados familiares de Javé os pobre e oprimidos.92

Como povo pode-se definir uma comunidade de pessoas com vínculos entre si, sejam

de origem, língua, cultura ou história comuns. De um modo geral, pensa-se que na vinculação

de uma divindade com um povo, estes sejam entendidos como “povo da divindade”, portanto

se Israel é o povo que pertence a Javé, e que por este foi escolhido, logo Israel é “povo de

Javé”. Entretanto parece que este conceito foi relativizado, fazendo com que fosse obrigação

de Javé proteger, abençoar e conservar o “seu povo”. Os profetas parecem corrigir este ponto

de vista nacionalista-popular, tanto que muitas vezes ao invés de “meu povo” encontra-se a

expressão “este povo”.93 Miquéias, nos capítulo 1-3, utiliza “meu povo” referindo-se a

pessoas que sofrem ações, algumas violentas. Estas ações “são planejadas (2.1) e executadas

(2.2, 2.8-9, 3.1-3) por um sujeito social que é apresentado através de várias designações: ‘esta

tribo’ (2.3), ‘este povo’ (2.11), ‘chefes’ e ‘magistrados’ (3.1), ‘profetas’ (3.5)”.94

“Meu povo” vive em casas (2.2,9), mulheres e filhos estão próximos (2.9), ao observar

isto, Hahn entende que “meu povo” é um sujeito social ligado a terra (2.2).95

No v.8aβ inicia-se a série de acusações contra os “inimigos”, que conforme a síntese

apresentada por Hahn e descrita acima, são “esta tribo”, “este povo”, “chefes”, “magistrados”

e “profetas”. A primeira acusação que Miquéias faz é que “meu povo” foi despojado de

“glória” (rd,a,Þ/tr,D,a;) – O substantivo rd,a, aparece apenas uma vez referindo-se a manto ou

capa luxuosa, entretanto segundo o aparato crítico da BHS, deve-se entendê-lo como sendo

“glória”, uma vez que “meu povo” não encontra-se em condições de possuir tal veste luxuosa.

Além da glória “meu povo” foi despido do manto (tm;äl.f;) - A vestimenta dos homens e

mulheres hebréias no Antigo Testamento consistia basicamente de duas peças: a túnica e o

manto. A túnica era feita de lã ou linho e chegava até o tornozelo, existindo com ou sem

mangas, e era usada sobre o corpo nu. Por cima desta usava-se o manto, que também era

utilizado pelas pessoas para cobrirem-se à noite. Encontram-se em Ex 22.25 e Dt 24.13

92 cf. A. R. HULST, m[;/ywGo ‘am/goy Pueblo in Ernst JENNI, Claus WESTERMANN, DTMAT, vol.1, col.389 93 cf. A. R. HULST, op cit, col.392 94 Noli Bernardo HAHN, “Povo da Terra” e “Meu Povo” à luz de Miquéias, in Ludovico GARMUS(ed.), Estudos Bíblicos, nº.44, p.51 95 Idem

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indicações que não se deveriam retirar o manto (tm;äl.f;) de alguém devido ao fato de serem

utilizados como cobertor.96

A segunda acusação trata-se das mulheres de “meu povo”. As mulheres (hV'ai) -

substantivo que se encontra 781 vezes no AT, 20 vezes nos profetas do século VIII e em

Miquéias apenas em 2.9. Em seu significado está intimamente ligado com o substantivo

homem (vyai), tanto para indicar relação matrimonial, o elemento sexual, ou ainda como

expressão “homem e mulher” significando “um qualquer” ou também “todos”. Outras

expressões comuns onde o substantivo “mulher” é encontrado são os que tratam de família:

“filho/filha/criança”, “mulher/filhos/noras”, “mulheres/filhos”. Nota-se portanto uma relação

semântica entre “mulheres” (v.9aα) e “crianças” (v.9bα).97 Quanto à situação da mulher,

encontram-se no AT algumas indicações: a mulher é propriedade do homem que ele pode usar

para própria defesa (Gn 12.12-20, 20.2, Jz 19.24-27), no decálogo do Êxodo a mulher é

inserida dentro das propriedades (Ex 20.17), também se tem a impressão que as mulheres não

comiam junto com os homens (Ex 18.9, Rt 2.14). Na perícope em questão alguns

comentaristas indicam que estas além de pobres eram viúvas.98 A dependência da mulher de

uma relação familiar agravava-se no caso desta ser viúva, deveria vestir roupa que indicava

sua situação (Gn 38.14,19), não herdava do marido, e se ficasse sem filhos voltava à casa de

seu pai. A mulher que não tivesse um homem para assistir-lhe em seus direitos naturalmente

ficava à mercê de extorsão por parte de seus credores (2Rs 4.1, Mq 2.9a,10b), e de todo tipo

de opressão (Jó 22.9, 24.21, Ez 22.7).99

Interconectado com a mulher viúva, estão os seus filhos, ainda crianças (ll'wO[/llewO[).

Este substantivo aparece na forma ll'wO[ 9 vezes e na forma llewO[ 11 vezes. As duas formas

parecem ser intercambiáveis, e quanto ao sentido não diferem, ambas se entende como sendo

uma criança mais velha que um bebê (lW[).100 Como o substantivo utilizado para bebê é de

mesma grafia que o verbo desmamar101, entende-se que estas crianças já teriam sido

desmamadas, portanto teriam pouco mais de 3 anos de idade (2 Macabeus 7.27). As crianças

gozavam de poucos direitos, ou quase nenhum, é o que indicam textos como 2Rs 4.1 e Ne 5.5, 96 cf. John L. MCKENZIE, Dicionário Bíblico, p.958-59 97 cf. J. KÜHLEWEIN, hV'ai ’iššā Mujer in Ernst JENNI, Claus WESTERMANN, DTMAT, vol.1, col.369-372 98 cf. Luis ALONSO-SCHÖKEL, José L. SICRE DIAZ, Profetas II: Ezequiel, Profetas menores, Daniel, Baruc, Carta de Jeremias, p.1081; também cf. C. KEIL, F. DELITZSCH, Comentary on the Old Testament in ten volumes, vol.10, p.445; e, David BAKER, et al., Obadias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuque e Sofonias,

p.211-12 99 John L. MCKENZIE, Op. cit, p.969 100 cf. G. Herbert LIVINGSTONE, 1579d ll'wO[ (‘olal) criança, in Lair R. HARRIS(org), DITAT, p.1580 101 cf. G. Herbert LIVINGSTONE, 1579 lW[ (‘ul) amamentar, in Lair R. HARRIS(org), DITAT, p.1579

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onde as crianças são entregues à escravidão como penhor pela divida dos pais. O pai exercia

poder ilimitado sobre os filhos, eram os pais que escolhiam os cônjuges (Gn 21.21, Ex 21.9-

11), podiam anular um voto sagrado feito por uma filha, e também lhes era esperado que

entregassem os filhos para serem mortos, se estes fossem culpados por abusar dos genitores

(Ex 21.15-17).102 A luz destes fatos e considerando o fato de Amós ter denunciado comércio

humano (Am 1.6,9) entende-se que o “arrancastes minha honra para sempre” trata-se de ser

vendido como escravo, portanto as crianças teriam sido destituídas da honra.

No v.10 Miquéias exige que os acusados levantem-se e deixem aquele lugar, pois ele

não é lugar de descanso para eles. O lugar de descanso (hx'_WnM.) é encontrado 21 vezes no AT,

sendo 4 vezes nos profetas do século VIII (Is 28.12, 32.18, 11.10, Mq 2.10). O substantivo é

derivado da forma verbal x:Wn “descansar, estabelecer-se”103, podendo denotar tanto o local,

quanto o estado de descanso ou estabelecimento. O substantivo descreve o local que Javé

preparou para o descanso do povo em Nm 10.33, também se utiliza para o local onde o povo

estabeleceu-se de forma permanente (Dt 12.9, 1Rs 8.56), e o local escatológico de descanso

(Sl 95.11).104

A perícope é concluída com um dito sarcástico. A introdução deste (v.11aα) explica

que é mentiroso aquele que profere “profecia para o vinho e bebida forte”, sendo tal “profeta”

digno “deste povo”, não do “meu povo”. O v.11aα utiliza duas palavras para mentira: um

substantivo (rq,v,) e um verbo (bz:K'). O verbo é empregado 16 vezes no AT (1x no Qal, 2x no

Nifal, 12x no Piel, 1x no Hifil). O significado fundamental da raiz é “mentir, pronunciar uma

mentira, dizer o que não é certo, afirmar algo que não corresponde ao fato”. Partindo destes

significados se desenvolve o significado de “estar em erro”, oposto de qdec' em Jó 34.5-6, e

chega-se ao sentido de “ser infiel”, semelhante ao de rq;v'105. No vocabulário teológico do

AT, a revelação recebida por meios misteriosos de êxtase deve ser confrontada com a

revelação positiva de Javé por meio de Sua palavra, sob pena de ser tida como bz:K'.106

O substantivo rq,v, é encontrado 111 vezes no AT, sendo utilizado 6 vezes pelos

profetas do século VIII, mas é preferido por Jeremias: 38 vezes. Este substantivo designa

102 cf. João Marques BENTES, Russel Norman CHAMPLIN, Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia, vol.1, p.692 103 cf. Leonard J. COPPES, x:Wn (nûah) descansar, estabelecer-se in Lair R. HARRIS(org), DITAT, p.936-38 104 cf. Leonard J. COPPES, op cit, p.938 105 cf. M. A. KLOPFENSTEIN, bz:K' kzb Mentir in Ernst JENNI, Claus WESTERMANN, DTMAT, vol.2,

col.1121; também cf. Hermann J. AUSTEL, rq;v' (shāqar) enganar, ser falso in Lair R. HARRIS(org), DITAT, p.1617-18 106 cf. M. A. KLOPFENSTEIN, op cit, col.1125

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palavra ou atividades falsas no sentido de não corresponderem aos fatos ou a realidade, ou

seja, seu significado em muito é semelhante ao do verbo bz:K'. A preferência de Jeremias é

clara, ele emprega várias vezes o substantivo referindo-se aos falsos profetas, como quem

“profetiza sonhos mentirosos” (Jr 23.32).107

No v.11aβ o fala-se do que profere uma profecia mentirosa (rq,v,)108 a partir do “vinho

e bebida forte”. O substantivo vinho (!yIY:) encontra-se 140 vezes no AT, destas, 12 vezes em

conjunto com “bebida forte” (rk"Ve) que por sua vez encontra-se 22 vezes. O vinho no Oriente

Médio era produzido desde a pré-história, a Bíblia menciona vinho pela primeira vez com

Noé (Gn 9.20ss). Era comum nas refeições, e também levado como parte das provisões em

viagens (Js 19.19) e nas tropas de guarnição (2Cr 1.11).109 O substantivo !yIY: também se

emprega para referir-se simbolicamente à ira de Javé (Jr 25.15), à calamidade (Sl 60.3), ao

juízo da Babilônia (Jr 51.7), à violência (Pv 4.17), e a beijos e carícias (Ct 1.2, 4.10).110

Bebida forte (rk"Ve) denota uma bebida fermetada, tal como a cerveja, não destilada, pois as

indicações apontam para que a destilação só tenha sido conhecida na Idade Média. Nem todas

as referência à bebida forte são favoráveis, fala-se da sua capacidade inebriante, juntamente

com o vinho e a bebida dos ébrios (Sl 96.13, Is 5.11,22), suscita insolência (Pv 20.1) e não

sendo bebida adequada para governantes (Pv 31.4-5). 111

Isaías critica aqueles ávidos por vinho e bebida forte mas não que não olham para obra

de Javé (Is 5.11-12), e aqueles que são poderosos para beber vinho e valentes para misturar

bebida forte mas que julgam à favor do ímpio em troca de suborno e ao justo negam a devida

justiça (Is 5.22-23).

Miquéias da mesma forma critica seus interlocutores chamando-os de “profetas para o

vinho e para a bebida forte”, como indica Mq 3.5,11, estes falsos profetas somente profetizam

por dinheiro, e “este povo” em contraste com “meu povo” são aqueles que oprimem e causam

a injustiça, portanto os profetas mercenários são os dignos “deste povo”.

3.2 SÍNTESE TEOLÓGICA

Para Miquéias o ponto central é a pregação contra os abusos cometidos pelos

poderosos, estes baseados em suas interpretações nacionalistas-populistas da tradição javista,

107 cf. Hermann J. AUSTEL, rq;v' (shāqar) enganar, ser falso in Lair R. HARRIS(org), DITAT, p.1617 108 Note a semelhança sonora entre rq,v, e rk"Ve 109 cf. John L. MCKENZIE, Dicionário Bíblico, p.965-66 110 cf. Laird R. HARRIS, !yIY: (yayin) vinho in Lair R. HARRIS(org), DITAT, p.614 111 cf. John L. MCKENZIE, op cit, p.162

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crêem que sua salvação será garantida por direito de herança, por serem “povo de Javé”,

entretanto o que fica claro na linha traditiva por traz de Miquéias é que este por estar muito

enraizado nas tradições do povo, muito mais que seus conterrâneos e contemporâneos, talvez

por ser um ancião de Morasti-Gat, apresenta em sua pregação um diálogo com a tradição

javista, e “seu modo de compreender a tradição é justamente o que o faz emergir”112.

Na perícope em questão expõe aos seus interlocutores um tema que remonta a antigas

tradições do povo de Israel, o ser povo de Javé. Miquéias faz diferença entre “meu povo” e

“este povo”, é com certa razão que Wolff entende o profeta como um ancião de “meu

povo”113, em contrapartida, os seus interlocutores, falsos profetas, são àqueles que defendem

os interesses “deste povo”, e é contra esta classe opressora que Miquéias dirige seus ataques,

apontando os pecados concretos destes, acusando-os, e afirmando que, de fato, os profetas em

que “este povo” opressor confia são os que ele merece.

3.3 ESCOPO

A perícope analisada apresenta diversos pontos da proclamação de juízo que o profeta

Miquéias faz nos capítulos 2 e 3 do livro. Na controvérsia entre os profetas falsos e Miquéias,

este responde os interlocutores com as próprias palavras destes, mostrado-lhes os seus

pecados e os da classe opressora, insiste em dizer que para eles não há descanso na terra que

Javé prometeu ao Seu povo, e que os falsos profetas são justamente os que a classe opressora

merece.

112 cf. Gerhard VON RAD, Teologia do Antigo Testamento, vol.2, p.168 113 cf. H. W. WOLFF, Biblischer Kommentar Altes Testament: Dodekapropheton 4: Micha, p.XV

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IV HERMENÊUTICA

4.1 RELEVÂNCIA DO TEXTO PARA MIM, PARA A COMUNIDADE CRISTÃ E A SOCIEDADE

O labor exegético exigido para tal empresa foi bastante grande, trabalhar por quatro

meses em uma única perícope, ainda que o livro foi lido ao todo várias vezes, é desgastante e

em alguns momentos desanimador, entretanto a simples possibilidade de entrar, ainda que de

relance, na perspectiva histórica, social e religiosa de Israel no século VIII a.C., abre-nos a

vista para uma gama de novas interpretações da realidade. Assim como Miquéias estava

profundamente enraizado nas tradições de seu povo e dela bebeu para que pudesse apresentar

uma nova perspectiva desta tradição, quer-se seguir os passos do profeta e ver-se como

alguém que deseja beber da tradição cristã que nos acompanha, e nela buscar uma nova forma

de enxergar o mundo, fazendo-se um transformador de realidades, assim como os profetas

buscaram ser. A forma com que Miquéias respondeu a seus interlocutores, sua ousadia na

denúncia de pecados concretos, motiva o obreiro cristão à “ser profeta” hoje, também

denunciando o pecado da sociedade e do sistema, questionando os “falsos profetas” da

atualidade e apresentando ao mundo o plano de Deus através de Jesus Cristo.

A comunidade cristã tem o dever de dar valor à proclamação dos profetas, cujos livros

tem sido sistematicamente negligenciados nos cultos, pregações, encontros e estudos. Temas

que a comunidade pode aprender da perícope estudada são tais como: Quem são aqueles que

correm atrás de vento de mentira fingindo serem portadores da Palavra de Deus?114 O texto de

Mt 7.15-23 ajuda a elucidar a questão, Jesus afirma que “pelos frutos os conhecereis”;

Conforme a acusação de Jesus Cristo em Mt 23.29-31, não tem a comunidade perseguido os

“verdadeiros profetas” e adornado os túmulos dos “falsos”? Os falsos profetas também se

apoiavam nas promessas que Javé fez, entretanto, estes acreditavam mais na sua própria fé do

que no Senhor que concede a fé, não seria este um desafio para a comunidade luterana?115 De

fato “o justo viverá por fé” (Rm1.17b), mas o fundamento da fé cristã esta em Jesus Cristo

114 cf. Alphonse MAILLOT, Atualidade de Miquéias: Um grande “profeta menor”, p.62 115 Id, Ibid, p.63

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(1Co 3.11), que é verdadeiro Deus de verdadeiro Deus, filho daquele que nos concede a fé

através da sua Palavra (Rm 10.17). Cabe-nos como sacerdotes e serviçais (1Pe 2.9) sermos

“verdadeiros profetas”, despenseiros da multiforme graça de Deus e não aqueles que

barateiam a graça (1Pe 4.10).

A sociedade também tem a ganhar com a proclamação de Miquéias, promover a

justiça e o direito deveriam ser o ideal de todos os povos sobre a Terra. Neste sentido, também

a sociedade deve enxergar nas acusações de Miquéias temas para rever seus conceitos e

praticar aquilo para que Deus a colocou: promover a vida.

4.2 PISTAS PARA ATUALIZAÇÃO

A perícope estudada é rica em temas, tanto ao falar-se daqueles que proclamam a

vontade de Deus, quanto ao denunciar injustiças sociais.

A citação do discurso dos falsos profetas (v.6-7a) juntamente com o desfecho irônico

da perícope (v.11) apresentam o tema dos falsos profetas em contraste com o verdadeiro,

pode-se explorar nestes versículos quem seriam os falsos e os verdadeiros hoje, quando

alguém age como verdadeiro ou falso profeta, e quais seriam as ações dignas de um

verdadeiro profeta.

A resposta de Miquéias (v.7b-10) apresenta uma questão sobre a validade das

palavras de Deus, elas não seriam boas? Cabe aqui buscar uma compreensão de quais seriam

os usos corretos da Palavra de Deus e de que forma Deus age através de sua Palavra. Na

denúncia de pecados concretos temos Lei, que acusa a situação do homem enquanto pecador

destituído da sua liberdade. Estas acusações tanto poderiam levar a uma reflexão sobre quais

seriam as atitudes que a comunidade e o cristão deveriam tomar dentro da sociedade tanto

quanto para apontar o “nosso pecado” e servir de “aio” para conduzir o pecador a Cristo (Gl

3.24).

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V REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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3. ALONSO SCHÖKEL, Luis. Dicionário bíblico hebraico-português. 3ª. Ed. São Paulo: Paulus: 2004.

4. ARENHOEVEL, Diego. Assim se formou a Bíblia: Para você entender o Antigo Testamento. 2ª Ed. São Paulo: Edições Paulinas, 1978.

5. BALLARINI, Teodoro(ed.). Introdução à Bíblia: Os doze profetas, Daniel. Petrópolis: Vozes, 1978.

6. BAUMGARTNER, Walter, KOEHLER, Ludwig. Lexicon in Veteris Testamenti libros. Leiden: E.J. Brill, 1985

7. BENTES, João Norman, CHAMPLIN, Russell Norman. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia. São Paulo: Editora e Distribuidora Candeia, 1991. v.1

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9. BÍBLIA. Antigo Testamento. Grego. Septuaginta. Stuttgart: Deutsche Bibelgesselschaft, 1979.

10. BÍBLIA. Antigo Testamento. Hebraico. Bíblia Hebraica Stuttgartensia. 4ª. Ed. Stuttgart: Deutsche Bibelgesselschaft, 1997.

11. BÍBLIA. Português. Bíblia de Jerusalém: Nova edição revista e ampliada. São Paulo: Paulus, 2003

12. BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada: Nova Versão Internacional. São Paulo: Editora Vida, 2000.

13. BRIGHT, John. História de Israel. 7ª. Ed. São Paulo: Paulus, 2003.

14. DONNER, Herbert. História de Israel e dos povos vizinhos. 2ª. Ed. São Leopoldo: Sinodal, Petrópolis: Vozes, 2000. v. 2

15. GARMUS, Ludovico (ed.). Estudos Bíblicos: O Povo da Terra. Nº.44. Petrópolis: Vozes, 2002.

16. Georg FOHRER. História da Religião de Israel. São Paulo: Edições Paulinas, 1982

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18. JENNI, Ernst, WESTERMANN, Claus. Dicionário teológico manual del Antiguo Testamento. Madrid, Espanha: Ediciones Cristandad, 1998. 2 v.

19. KEIL, L. F., DELITZSCH, F. Commentary on the Old Testament in ten volumes. Grand Rapids/EUA: Eerdmans, 1980.

20. KELLER, Alfred J. MICHAELIS: Minidicionário Alemão-Português: Português-Alemão. São Paulo: Companhia Melhoramentos, 1996.

21. KELLEY, Page. Hebraico bíblico: uma gramática introdutória. 4ª. Ed. São Leopoldo: Sinodal, 2003.

22. KIRST, Nelson, et al. Dicionário Hebraico-Português e Aramaico-Português. 18ª. Ed. Petrópolis: Vozes, São Leopoldo: Sinodal, 2003.

23. LASOR, William(ed.). Introdução ao Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1999.

24. LISOWSKY, Gerhard. Konkordanz zum Hebräischen Alten Testament. 2ª. Ed. Stuttgart: Deutsche Bibelgesellschaft, 1966.

25. MAILLOT, Alphonse. Atualidade de Miquéias: um grande “profeta menor”. São Paulo: Ed. Paulinas, 1980.

26. MCKENZIE, John L. Dicionário Bíblico. 8ª Ed. São Paulo, Paulus, 2003.

27. OWENS, John J. Analytical key to the Old Testament. Grand Rapíds, EUA: Baker Books, 1994. v. 4

28. PIXLEY, Jorge. Miquéias o livro e Miquéias o profeta, in CROATTO, J. Severino(org.). RIBLA. Petrópolis: Vozes, São Leopoldo: Sinodal, 2000. Nº. 35/36

29. PORATH, Renatus, Apontamentos sobre passos da Metodologia Exegética do AT. Material não publicado

30. SCHALKWIJK, Frans Leonard. Coinê: pequena gramática introdutória do grego neotestamentário. 8ª Ed. Patrocínio: CEIBEL, 1998.

31. SCHMIDT, Werner D. A fé do Antigo Testamento. São Leopoldo: Sinodal, 2004.

32. SCHMIDT, Werner D. Introdução ao Antigo Testamento. São Leopoldo: Sinodal, 1994.

33. SELLIN, Ernst, FOHRER, Georg. Introdução ao Antigo Testamento. São Paulo: Edições Paulinas, 1977.

34. SICRE, José L. A justiça social nos profetas. São Paulo: Ed. Paulinas, 1990.

35. SIMIAN-YOFRE, Horácio. Metodologia do Antigo Testamento. São Paulo: Edições Loyola, 2000.

36. VON RAD, Gerhard. Teologia do Antigo Testamento. São Paulo: ASTE, 1986. 2 v.

37. VV.AA., Os profetas e os livros proféticos. São Paulo: Edições Paulinas, 1992.

38. WELSZFLOG, Walter. MICHAELIS: Moderno dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo: Companhia Melhoramentos, 1998.

39. WOLFF, Hans Walter. Bíblia, Antigo Testamento: introdução aos escritos e aos métodos de estudo. 3ª Ed. São Paulo: Editora Teológica, 2003.

40. WOLFF, Hans Walter. Biblischer Kommentar Altes Testament: Dodekapropheton 4: Micha. Neukirchen-Vluyn/Alemanha: Neukirchener Verlag, 1982.

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ANEXO I LISTA DE VOCÁBULOS Análise de termos a partir de OWENS, John J. Analytical key to the Old Testament; e

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Termo Definição Tradução v.6 WpJiÞT;-la; Advérbio de negação, verbo hiphil

impf. Jussivo apocopado 2ªp. m.pl., raiz @jn

QAL: gotejar, pingar, escorrer. HI: Borbotar, vaticinar, escançar. (Alonso, p.433) “Não vaticineis”

!Wp+yJiy: verbo hiphil impf. 3 m. pl., raiz @jn Eles vaticinam

WpJiäy:-al{) particula negativa, verbo hiphil impf. apocopado 3ªp. m. pl, raiz @jn

Que eles não vaticinem

hL,aeêl'

preposição l, pronome demonstrativo m. pl.

Estes (Kirst, p.11) “Para estes”

Al{ï particula negativa Não (Kirst, p.107)

gS;ÞyI verbo niphal impf. 3ªp. m. sg., raiz gWs

NI: Retirar-se, afastar-se (Kirst, p.165); desertar, virar-se (Alonso, p.463) “afastar-se-á”

tAM)liK. substantivo comum fem. pl. abs. Desgraça (K, 102) Vergonha, rubor, humilhação, ultraje. (A, 319)

v.7 rWmåa'h, Particula interrogativa h], verbo qal

part. pass. m. sg. abs, raiz rm;a' QAL: Dizer (Alonso, p. 65) “Que foi dito?”

bqoª[]y:-tyBe( subst. comum m. sg. const., subst. próprio abs. (vocativo)

Ó casa de Jacó

‘rc;q'h] particula interrogativa h], verbo qal perf. 3ªp. m. sg, raiz rc;q'

QAL: ceifar, encurtar-se, abreviar-se. Fraseologia: x;Wr perder a paciência (Alonso, p.587)

x;Wrå subst. comum f. sg. abs. paciência (A, 609-10)

hw"ëhy> subst. próprio abs., Iahweh, SENHOR

hL,aeÞ-~ai Particula interrogativa, pronome demons. m. pl.

estes? (K, 12, 10)

wyl'_l'[]m; subst. comum m. pl. cons., sufixo 3ªp. m. sg.

Sua obra (K, 135)

aAlÜh] particula interrogativa h], part. negativa

Não?

yr;’b'd> subs. comum m. pl. cons., sufixo 1 c. sg.

Minhas palavras(K, 46)

WbyjiêyyE verbo hiphil impf. 3ªp. m. pl., raiz bj;y"

QAL: Ser bom, estar bem. HI: Fazer bem, beneficiar, tratar bem. (Alonso, p.275) “fazem bem”

~[iÞ preposição Com (K,181)

rv"ïY"h; artigo h, adjetivo m. sg. abs. O reto, correto (K, 97)

`%lE)Ah verbo qal part. at. m. sg. abs., raiz %l;h'

QAL: Ir, caminhar c/ prep. ~[i : proceder (Alonso, p.176-77) “aquele que procede”

v.8

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lWmªt.a,w> conjunção w, advérbio E ontem (k, 21)

yMi[; subst. comum m. sg. const., sufixo 1ªp. c. sg.

Meu povo (K, 181)

byEåAal. preposição l, verbo qal part. at. m. sg. abs., raiz by:a'

QAL: ser inimigo (Alonso, p. 45) “Para um inimigo”

~meêAqy> verbo polel impf. 3ªp. m. sg., raiz ~Wq

QAL: Levantar-se, Por-se em pé; POL: Levantar, reconstruir; Fraseologia: l – levantar-se contra. (Alonso, p.575-76)

lWMåmi preposição !mi, preposição lWm De diante da (A, 359)

hm'êl.f; subst. comum f. sg. abs. Capa, manto, veste (A, 644)

rd,a,Þ subst. comum m. sg. abs. Manto, pálio (A, 29)

!Wj+vip.T; verbo hiphil impf. 2ªp. m. pl, raiz jv;P'

QAL: Tirar, despojar-se de, desnudar-se, saquear. HI: Tirar, despojar de, desnudar (Alonso, p.550-51) “Fostes despojados de”

~yrIåb.[ome preposição !mi, verbo qal part. at. m. pl. abs., raiz rb;['

QAL: passar, cruzar, atravessar (Alonso, p.476) “daquele que passa”

xj;B,ê Advérbio Seguro, confiado (A, 98)

ybeÞWv verbo qal part. pass. m. pl. const., raiz bWv

QAL: voltar, volver, viarar-se. (Alonso, p.660) “Aquele que voltou da”

hm'(x'l.mi subst. comum f. sg. abs. Guerra

v.9 yveÛn> subst. comum f. pl. const. Mulheres de (A, 80)

‘yMi[; subst. comum m. sg., sufixo 1ªp. c. sg.

Meu povo (A, 500)

!Wvêr.g"åT. verbo piel impf. 2ªp. m. pl., raiz vr;G" QAL: expulsar, lançar, soltar; PI: Lançar, expulsar, despachar. (Alonso, p. 144-45) “Vós expulsastes”

tyBeÞmi Prep. !mi, subst. comum m. sg. const. Da casa de

h'yg<+nU[]T;( subst. comum m. pl. const., sufixo 3ªp. f. sg.

Seu deleite (A, 707)

‘l[;me preposição !mi, preposição l[ Em cima, por cima (Alonso, p.439)

h'yl,êl'[o) subst. comum m. pl. const., sufixo 3ªp. f. sg

Suas crianças

Wxïq.Ti verbo qal impf. 2ªp. m. pl., raiz xq;l' QAL: Colher, tomar, agarrar, pegar, pilhar, receber, cobrar, despojar, roubar, arrancar, levar. (Alonso, p. 346-47) “Vós arrancastes”

yrIßd'h] subst. comum m. sg. const., sufixo 1ªp. c. sg.

minha honra (A, 167)

`~l'(A[l. Prep. l, subst. comum m. sg. abs. Para sempre (A, 483)

v.10 WmWqå verbo qal imp. 2ªp. m. pl., raiz ~Wq QAL: Levantar-se, Por-se em pé

(Alonso, p.575-76) “Levantai” Wkêl.W Conj. w, verbo qal imp. 2ªp. m. pl.,

raiz %l;h' QAL: Ir, caminhar (Alonso, p.176-77) “E ide”

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yKiî conjunção Pois, que, porque (A, 312)

tazOà-al{ Part. negativa, adjetivo f. sg. abs. Este não (A, 189)

hx'_WnM.h; artigo h;, subst. comum f. sg. abs. Descanso, lugar de descanso (Alonso, p.383) “o lugar de descanso”

rWbï[]B; conjunção Porque (A, 189)

ha'²m.j' verbo qal perf. 3ªp. f. sg., raiz amej' QAL: ser/estar/tornar-se impuro, contaminado. (Alonso, p.259) “tornou-se impuro”

lBeÞx;T. verbo piel impf. 2ªp. m. sg., raiz lb;x'

QAL: (1) Atar, vincular; (2) Conceber; (3) Empenhar; (4) danificar PI: (4) Fazer estrago, danificar. (Alonso, p.201) “Tu danificarás”

lb,x,îw> Conj. w, subst comum m. sg. abs. E destruição (A, 202)

`#r'(m.nI verbo niphal part. m. sg. abs., raiz #r;m'

Ser penoso (Alonso, p.404); ser mau, ser doloso (Kirst, p.142) “que será dolosa”

v.11 vyaiú-Wl conjunção, subst. comum m. sg. abs. Se um homem(A, 339)

%lEïho verbo qal part. at. m. sg. abs., raiz %l;h'

QAL: Ir, caminhar (Alonso, p.176-77) “Que caminha”

x;Wr’ subst. comum f. sg. abs. Vento, espírito (Alonso, p.609)

rq,v,äw" conjunção w, subs. Com. m. sg. abs. E mentira (A,692)

bZEëKi verbo piel perf. 3ªp. m. sg., raiz bz:K' QAL part: Mentiroso; PI: Mentir, enganar. (Alonso, p.310) “Mentiu”

@JIåa; verbo hiphil impf. apocopado 1ªp. c. sg., raiz @j;n"

QAL: gotejar, pingar, escorrer. NI: Borbotar, vaticinar, escançar. (Alonso, p.433) HI: Profetizar, pregar (DITAT, p.1355-56) “Eu profetizarei”

^êl. preposição l, sufixo 2ªp. m. sg. Para ti

!yIY:ßl; preposição l, artigo h, subst. comum m. sg. abs.

Para o vinho

rk"+Vel;w> conjunção w, preposição l, artigo h, subst. comum m. sg. abs.

E para bebida forte

hy"ïh'w> conjunção w, verbo qal perf. consec. 3ªp. m. sg., raiz hy"h'

QAL: Ser, estar, existir (Alonso, p. 170) “E ele será”

@yJiÞm; verbo hiphil part. at. m. sg. , raiz @j;n" QAL: gotejar, pingar, escorrer. NI: Borbotar, vaticinar, escançar. (Alonso, p.433) HI: Profetizar, pregar; HI part.: profeta (DITAT, p.1355-56) “profeta”

~['îh' artigo h, subst. comum m. sg. abs. O povo

hZ<)h; artigo h, adjetivo m. sg. abs. A este