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1 Fichamento da obra: O que é globalização. BECK, Ulrich, 1994 O que é Globalização? Equívocos do globalismo: respostas à globalização/ Ulrich Beck; tradução de André Carone. São Paulo: Paz e Terra, 1999. Aluna: Patricia Martinez Almeida Professor: Dr. Marcelo Benacchio Prefácio 9; Primeira parte Introdução 13; Segunda parte O que significa globalização? Dimensões, controvérsias e definições 39; Terceira parte Equívocos do globalismo 201; Quarta parte Respostas à globalização 223; Sugestão de leitura 279. Com a finalidade de trazer a lume de maneira clara os debates ao derredor da globalização, o Autor discorre sobre a multiplicidade, os diversos significados e as dimensões do fenômeno, discutindo as armadilhas, as teorias e os meios de evitá-las, assim como a ampliação dos horizontes nas respostas políticas à globalização. Desta maneira, o cerne da pesquisa se consubstancia em verificar o significado da globalização e as possibilidades de sua configuração política. Introdução. I. Contribuintes virtuais: após a queda do muro de Berlim acreditou-se ter chegado a uma época para além do socialismo e do capitalismo, pois a tese de isolamento da política perdeu força diante do processo da globalização, e, diante da escala de alcance da globalização econômica acabou por transpor as fronteiras e a moldura da categoria do Estado nação, com intuito da exclusão da política do Estado nacional. O novo modelo econômico, no mercado sem fronteiras das empresas transnacionais, culminou na derrocada do modelo da economia nacional. Desta maneira, as empresas transnacionais passaram a operar sem oposição e em escala mundial e com o poder de decisão na possibilidade do deslocamento de seus investimentos, ou seja, sua posição e força de mercado permitem criar confrontos entre os Estados nacionais e locais para realizarem com elas “pactos globais” (p. 17) com a finalidade escolher aquele Estado que ofereça melhores condições de instalação, que possuam mão-de-obra barata, com menor recolhimento de impostos e maior oferta de subsídios. Desta maneira, poderão os dirigentes das empresas transnacionais escolherem para si os Estados que melhor lhes atendam e pagar impostos somente aos que forem mais baratos, tudo a força do discurso de um suposto crescimento econômico por eles propiciados ao Estado de destino, com o aumento e manutenção dos postos de trabalho, e, desta maneira, castigando os Estados mais “caros” ou que menos atrativos propiciem aos investimentos dos empresários, com a não instalação e investimento neles, ou quando neles já instalados, na retirada das empresas e do capital lá investido, repercutindo, ainda, na consequente demissão em massa. “Os empresários descobriram a pedra do reino. Eis aqui a nova fórmula mágica: capitalismo sem trabalho mais cap italismo sem impostos” (p. 20). Daí a crítica e problemática da dicotomia entre contribuintes reais e os virtuais, uma vez que as grandes empresas, com seu poderio de barganha, escapam aos impostos nacionais, as

globalização / Ulrich Beck; tradução de André Carone. – São Paulo: Paz e Terra, 1999

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Fichamento da obra: O que é globalização.

BECK, Ulrich, 1994 – O que é Globalização? Equívocos do globalismo: respostas à

globalização/ Ulrich Beck; tradução de André Carone. – São Paulo: Paz e Terra, 1999.

Aluna: Patricia Martinez Almeida

Professor: Dr. Marcelo Benacchio

Prefácio 9; Primeira parte – Introdução 13; Segunda parte – O que significa globalização?

Dimensões, controvérsias e definições 39; Terceira parte – Equívocos do globalismo 201;

Quarta parte – Respostas à globalização 223; Sugestão de leitura 279.

Com a finalidade de trazer a lume de maneira clara os debates ao derredor da globalização, o

Autor discorre sobre a multiplicidade, os diversos significados e as dimensões do fenômeno,

discutindo as armadilhas, as teorias e os meios de evitá- las, assim como a ampliação dos

horizontes nas respostas políticas à globalização. Desta maneira, o cerne da pesquisa se

consubstancia em verificar o significado da globalização e as possibilidades de sua

configuração política.

Introdução. I. Contribuintes virtuais: após a queda do muro de Berlim acreditou-se ter

chegado a uma época para além do socialismo e do capitalismo, pois a tese de isolamento da

política perdeu força diante do processo da globalização, e, diante da escala de alcance da

globalização econômica acabou por transpor as fronteiras e a moldura da categoria do Estado

nação, com intuito da exclusão da política do Estado nacional. O novo modelo econômico, no

mercado sem fronteiras das empresas transnacionais, culminou na derrocada do modelo da

economia nacional. Desta maneira, as empresas transnacionais passaram a operar sem

oposição e em escala mundial e com o poder de decisão na possibilidade do deslocamento de

seus investimentos, ou seja, sua posição e força de mercado permitem criar confrontos entre

os Estados nacionais e locais para realizarem com elas “pactos globais” (p. 17) com a

finalidade escolher aquele Estado que ofereça melhores condições de instalação, que possuam

mão-de-obra barata, com menor recolhimento de impostos e maior oferta de subsídios. Desta

maneira, poderão os dirigentes das empresas transnacionais escolherem para si os Estados que

melhor lhes atendam e pagar impostos somente aos que forem mais baratos, tudo a força do

discurso de um suposto crescimento econômico por eles propiciados ao Estado de destino,

com o aumento e manutenção dos postos de trabalho, e, desta maneira, castigando os Estados

mais “caros” ou que menos atrativos propiciem aos investimentos dos empresários, com a não

instalação e investimento neles, ou quando neles já instalados, na retirada das empresas e do

capital lá investido, repercutindo, ainda, na consequente demissão em massa.

“Os empresários descobriram a pedra do reino. Eis aqui a nova fórmula mágica: capitalismo

sem trabalho mais capitalismo sem impostos” (p. 20).

Daí a crítica e problemática da dicotomia entre contribuintes reais e os virtuais, uma vez que

as grandes empresas, com seu poderio de barganha, escapam aos impostos nacionais, as

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pequenas empresas são sufocadas pela carga tributária, o que, com efeito, gera um efeito

reverso ao pretendido inicialmente pelo Estado ao albergar as transnacionais: receber

investimento, gerar riqueza e postos de trabalho. Entretanto, as empresas contribuintes reais

acabam por sucumbir e, desta maneira, elevam-se as taxas de desemprego nacional quando de

sua retirada dos países menos propícios aos interesses das empresas transnacionais, pois, além

de serem contribuintes virtuais, ou seja, não geram riqueza direta na arrecadação, tampouco é

suficiente para suprir todos os postos de trabalho necessário à manutenção da economia

doméstica o que implica na desestruturação do Estado nacional.

Esta perda de controle da arrecadação conduz a uma reconfiguração do Estado nacional e a

questão da justiça social ganha novo contorno teórico e político na era da globalização.

“A sociedade mundial, que tomou uma nova forma no curso da globalização – e isto não

apenas em sua dimensão econômica -, relativiza e interfere na atuação do Estado nacional,

pois uma imensa variedade de lugares conectados entre si cruza suas fronteiras territoriais,

estabelecendo novos círculos sociais, redes de comunicação, relações de mercado e formas de

convivência.” (p. 18)

Entre a economia mundial e a individualização o Estado perde a sua soberania: o que fazer?

Diante da escala da individualização o tecido social se tornou poroso, a sociedade perde a sua

consciência e autoconsciência coletiva, desta forma, a busca pelas respostas políticas às

grandes questões perde sentido e não mais possui local ou sujeito determinado, mas

determinável (p. 25).

Nos dizeres do Autor, o projeto da modernidade fracassou: o capitalismo globalizado gera

desemprego e não dependerá do trabalho, caindo por terra a histórica aliança entre a economia

de mercado, Estado do bem-estar social e democracia, pois não mais legitima o modelo

ocidental e o projeto do Estado nacional para a modernidade: os neoliberalistas se convolaram

em desmontadores do ocidente com sua modernização que conduz à morte do Estado nação.

(pp. 25-26).

Com a intenção de romper a ortodoxia territorial da política e da sociedade o Autor estabelece

uma distinção entre Globalismo, na concepção de que o mercado mundial substitui a ação

política, numa ideologia neoliberalista exclusivamente na dimensão econômica, que traz em

sua essência a distinção fundamental em relação à modernidade, ou seja, no afastamento da

tarefa primordial da política na delimitação das condições para os espaços jurídicos, sociais e

ecológicos, das quais a economia necessitava para se legitimar, para subverter tais condições

como meros instrumentos a serviço DA economia mundial em sua sede por lucros e

crescimento exacerbado; e,

Globalidade, que significa que vivemos em uma sociedade mundial, pois os espaços

isolados, ou limitações das fronteiras, se tornaram fictícia, assim as diversas economias,

culturas e políticas se entrechocam, uma vez que o conjunto de relações sociais havidas nessa

sociedade mundial não está integrado à política de um Estado nacional ou por ele

determinado, de sorte que para se operacionalizar acaba significando a sociedade mundial ser

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real e reflexiva; real no sentido das vontades de seus integrantes, mas uma diversidade sem

unidade (pp. 27-30);

Globalização significa os processos de interferência dos atores transnacionais na soberania,

identidade, redes de comunicação, orientações e chance de poder dos Estados nacionais (p.

30).

Para o Autor a irreversibilidade da globalização convolará na necessidade de abertura de

espaço para a política, diante da perspectiva da pluridimensionalidade da globalidade para

ilidir a ideologia opressora do globalismo.

Traz oito motivos para a irreversibilidade da globalização: 1. Ampliação geográfica e

interação do comércio internacional; 2. A revolução dos meios tecnológicos; 3. A exigência

universal por Direitos Humanos; 4. As correntes icônicas da indústria cultural global; 5.

Política mundial e policêntrica (atores transnacionais); 6. A pobreza mundial; 7. A destruição

ambiental mundial; e 8. Conflitos transculturais localizados.

A investigação da vida humana ganha um novo significado, pois nada mais será um fenômeno

isolado e, assim, deve ser reorganizada e estudada em torno do eixo “global-local”, por tais

razões a política deve ser reformulada, reinventada. A partir da globalidade a globalização

caracteriza-se como um processo dialético que produz as conexões e os espaços sociais e

transnacionais reformulando o sentido e o alcance de espaço, tempo e densidade social da

comunicação (pp. 31-32)

A sociedade mundial representa um horizonte que se caracteriza pela multiplicidade e pela

não integração. Não foi alterada somente a vida cotidiana com a derrubada das fronteiras do

Estado nacional, com as novas tecnologias, mas a consciência desta transnacionalidade na

percepção do Outro transcultural e dos riscos ecológicos, além da indústria cultural global,

com o novo “desterramento” (desterritorialização ) da comunidade, do trabalho e do capital, a

escala de concentração econômica e a quantidade e o poderio de atores, instituições e acordos

transnacionais.

Assevera o Autor que “globalização significa também: negação do Estado mundial. Mais

precisamente: sociedade mundial sem Estado e sem governo mundial.” (p. 33)

III. O choque da globalização, uma discussão tardia: por significar a desnacionalização, a

erosão e possível transformação do estado nacional em transnacional, a globalização traz ao

Estado perda de suas dimensões na sua soberania e sua substancia, notadamente, quanto aos

seus recursos financeiros, conformação do poder político e econômico, política cultural e

informacional, além da identidade comum dos cidadãos. (pp. 36-37)

Assim, os fundamentos da primeira modernidade devem ser revistos, pois com a globalização

não sabemos mais o que significa tolerância, quais direitos humanos devem valer diante da

diversidade cultural ou quem irá garanti- los, diante do agravamento da pobreza mundial e do

desemprego como salvar e reformar as garantias sociais, antes manutenidas pelo Estado

nacional; não sabemos se assim caminharemos à um mundo sem violência e de paz a ser

garantida pelo mercado mundial ou se voltaremos às guerras santas, agravadas por catástrofes

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nacionais. Estes são os questionamentos ao derredor da discussão sobre a globalização

suscitados pelo Autor em sua obra.

Segunda Parte: O que significa a globalização? Dimensões, controvérsias e definições:

diante da globalização informativa, ecológica, econômica, da cooperação ou da força de

trabalho (home office ou a on- line), cultural e da sociedade, depreende-se que a globalização

possui dimensões distintas e repercussões diversas na esfera social e política dos indivíduos e

do Estado.

Mas permanece a incógnita do marco inicial da globalização. Alguns defendem que o início

se deu na dimensão econômica e por isso remetem às grandes navegações, outros à queda do

bloco do leste Europeu. Entretanto, seria possível ao menos definir um marco comum a todas

as dimensões da globalização?

Analisando as premissas da primeira modernidade (viver e interagir em espaços fechados e

delimitados dos Estados nacionais e as respectivas sociedades) e que a globalização significa

a experiência cotidiana sem fronteiras em todas suas dimensões, o surgimento do mundo

compacto, em que os eventos regionais repercutem na esfera global em tempo real.

“Globalidade significa o desmanche da unidade do Estado e da sociedade nacional, novas

relações de poder e de concorrência, novos conflitos e incompatibilidades entre atores e

unidades do Estado nacional por um lado e, pelo outro, atores, identidades, espaços sociais e

processos sociais transnacionais.” (p. 49)

IV. A abertura do horizonte mundial: para uma sociologia da globalização.

Citando Marx e Engels, o autor assevera a importância da burguesia na história mundial e o

dimensionamento cosmopolita dado à produção e ao consumo pela ótica da exploração do

mercado mundial.

Sob os argumentos suscitados no manifesto comunista, conclui que a história mundial teve

impulsionamento pela exploração do mercado mundial (do mercantilismo ao capitalismo

industrial), logo o papel do mercado na globalização tem suas raízes em datas longínquas,

consequentemente o papel do Estado nacional já era questionado em razão das políticas do

capitalismo industrializante. (p. 52)

Faz uma análise crítica da teoria sociológica do container social - na qual o controle do

espaço territorial, enquanto poder e força, é exercido pelo Estado, exigindo um sistema

ordenador de identidades de coletivas (classes, estamentos), um sistema social (economia,

política, direito, ciencia, família).

No qual a homogeneidade interna é parte do controle estatal como um caráter modernizante e

superior na evolução da sociedade - e a implicação da teoria sociológica da globalização -

partindo da pesquisa da migração e a consequencia multicultural e a glocalização, passando

pela análise internacional das classes e miscigenação, pela política internacional e proteção

internacional do direitos inerentes ao homem, pela teoria da democracia e a cultural theory e a

sociologia das grandes metrópoles, a avaliação dos espaços sociais transnacionais e sua

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repercussão na derrocada do Estado-nação.

O que impulsiona a globalização? lógica dominante da economia (MARX) e lógicas

complexas e multicausais, um pluralismo que abriga aspectos econômicos, culturais e sociais

(WEBER)

1. Teoria do sistema mundial (Wallerstein): o capitalismo como motor da globalização;

tendo como elementos básicos um mercado único em prol do lucro máximo, a existência de

estruturas internas e externas garantidoras do livre comércio e a deslocalização da força de

trabalho (centro, semiperiferia e periferia) levando a uma decomposição mundial.

Crítica de Beck: não há prova empírica ou histórica que sustente a teoria, nem marco

histórico apórtico da transnacionalidade pela economia linear apresentada, que não considerou

os fatores imprevistos e indesejados da perquirição (luta de classes, estado social, guerras…)

2. Política pós-Internacional (Rosenau, Gilpin e Held): questionando a ortodoxia do

Estado-nação diante da globalização tecnológica e das relações de política e poder;

significando a globalização que a humanidade teria ultrapassado a era da política

internacional circunscrita tão somente aos Estados nacionais para partilhar o cenário e o poder

global com atores internacionais (organizações e órgãos internacionais, companhias

transnacionais, movimentos políticos e sociais transnacionais)

Dupla arena de sociedades globais (politica mundial policentrica): dos Estados e dos

atores internacionais. Nela existe uma mútua implicação da politica e do capital que tem como

origem à dimensão tecnológica da globalização, no surgimento da sociedade da informação e

conhecimento e na eliminação das distâncias e das fronteiras que justifica a multiplicação dos

atores internacionais, quais sejam, organizações transnacionais, questões transnacionais,

eventos transnacionais, comunidades transnacionais, estruturas transnacionais.

Gilpin: Estados acorrentados, surgimento de atores internacionais, mas sob a dependência de

autorização dos Estados nação (tratados, documentos?), ou seja, a globalização permaneceria

contingente, ameaçada, pelo privilégio do Estado-nação. Se fazendo necessária uma

conversação entre as soberanias para evitar o caos sistêmico nas relações transnacionais e uma

estrutura hegemônica de poder como condição para a globalização.

3. Soberania cindida e acorrentada (David Held): a perda do poder da soberania estatal

pela comprovada cessão em tratados internacionais, internacionalização e internalização de

dos processos de decisão política (supraestatalidade), pela livre circulação de mercadorias e

trabalho (sem politica protecionista).

Diante da globalização emerge um emaranhado de condições e poderes mundiais, ou seja, um

processo de relativização e flexibilização da autonomia e da soberania estatal, diante da

transversalidade dos assuntos transnacionais disciplinados nas conversações entre as

soberanias

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4. Sociedade de risco mundial (Beck): A crise da consciência ecológica, os riscos

ecológicos despertaram no mundo uma consciência coletiva de implicação em todos os

continentes independente do grau de degradação ambiental isolada, quer sejam os riscos de

alcance global (camada de ozônio), causados pela pobreza, em que os recursos ambientais são

explorados à exaustão e pelos processos técnicos- industriais ou os causados pelo conflito

militar entre Estados ou pelo terrorismo fundamentalista;

5. Cultural theory (Robertson, Appadurai, Albrow): refutaram a teoria da mcDonaldização

do mundo (imposição de universalização dos símbolos e ideologia e exclusão pelo poder de

compra) declarando que a globalização cultural não significa homogeneidade mundial, mas ao

contrário, significa muito mais uma glocalização, ou seja, que a cultura local é adaptada a

nova realidade global, processo de implicação interna que tem como suas piores

consequências a dicotomia entre a riqueza global e a pobreza local (Bauman, Globalização e

as consequências humanas) e o capitalismo sem trabalho (Beck), ou seja, não é só uma

deslocalização, mas também uma relocalização. (p. 90)

“Global quer dizer em vários lugares ao mesmo tempo, ou seja, translocal. (...) tornar-se parte

da cultura local, o „localismo‟ é a estratégia empresarial que eleva o significado prático da

globalização” (BECK, 2007, p. 90).

6. Globalização Roland Robertson: o processo em curso de intensificação de mútua

dependência, para além das fronteiras nacionais, evolui para a consciência do mundo como

um espaço singular. Assim, diante da globalização cultural ou melhor a glocalização cria um

abismo entre a identidade da sociedade nacional globalizada e o Estado nacional, ou seja, não

há como avaliar as consequências da globalização para a cultura sem considerar as mudanças

comportamentais dos indivíduos em movimento e não em termos de Estado.

7. O poder da imaginação dos mundos possíveis (Arjun Appadurai): os pontos de vista e

a teoria das culturais glocais de Robertson são ampliadas por Appadurai que desenvolve a

teoria da autonomia relativa, a independência e a lógica dessa cultural glocal, conjugando a

inquietude humana no deslocamento - turistas, imigrantes, fugitivos, trabalhadores - os

movimentos promovidos pela tecnologia - do comunicar para além das fronteiras, passando ao

negociar sem fronteiras e agora ao conviver sem fronteiras -, a propagação das possibilidades

de produção e das ideologias pelos meios midiáticos e a transição do mundo da produção para

a produção dos desejos das vidas possíveis como um produto na vitrine da imagem-modelo da

loja da felicidade (Bauman, Vida para consumo).

8. Riqueza globalizada, pobreza localizada (Bauman- Globalização e as consequências

humanas): se afastando da teoria da universalização cultural, a glocalização pode ser

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explicada como reflexo do desejo criado pela imaginação das vidas possíveis. O mercado de

consumo global, com vista a indústria do desejo, em que a felicidade é o objetivo dos

indivíduos, que poderá ser adquirido se e quando puderem pagar pelo bem de consumo que

foi transformado em objeto de desejo.

Daí a dicotomia entre ricos e pobres, para aqueles a globalização repercute a liberdade, para

estes o aprisionamento no local.

O esfacelamento do tempo\espaço gera outros sintomas e consequências: aqueles que

possuem condições (econômicas e técnicas) de usufruir dos bens de consumo e da realidade

do espaço virtual, são privilegiados por otimizar o tempo para auferir maiores benefícios

(negócios, compras, viagens, estudos) há uma gama de possíbilidades viabilizadas pela

globalização e o uso das TICs e das NTs, mas, em contrapartida, aqueles que não dispõem dos

mesmos recursos se vêem sem alternativas e sem mobilidade em seu espaço acorrentado,

acarretando o ócio destrutivo, isto porque, o capitalismo sem trabalho dispensa a necessidade

de contratação especialização, pois hoje os profissionais são multifuncionais para ganhar o

mercado.

Desta forma, há uma separação entre aqueles que podem consumir e atender a nova sociedade

do consumo globalizada e os que não podem, e, destes, não há sequer a preocupação em

resgatar a condição de consumidor, pois imprestáveis a função nova da sociedade não

atendem aos reclames da sociedade. Alteração do paradigma do consumir para viver, agora do

viver para consumir.

9. Capitalismo sem trabalho: (ver a mínima moralia): crítica a ausência da construção no

raciocínio baumaniano sobre os fatores que consecutiram na destruição da comunidade

mínima entre os mais ricos e os mais pobres.

Neste intento, Beck focaliza o estudo no questionamento: A sociedade do trabalho

(capitalismo industrial) finda sem trabalho?

A lógica do capitalismo - mais lucro, menos investimento - impulsiona a evolução

tecnológica, dispensando o uso da mão-de-obra de grande quantidade de trabalhadores

artesanais que foram substituídos por máquinas operadas por poucos trabalhadores, depois

mais evolução, e os poucos trabalhadores foram substituídos por aqueles mais especializados

e polivalentes e hoje desde o estabelecimento comercial, os atendentes e parte da logística das

empresas são substituídos por softwares que permitem que o próprio consumidor se sirva dos

bens de consumo na rede mundial de computadores.

Asseverou que no debate público 3 são os mitos que impedem uma visão mais clara da

situação: 1. o mito da incompreensibilidade; 2. o mito da prestação de serviço; e, 3. o mito

dos custos.

A problemática suscitada por Beck se envereda pela questão democrática e da necessidade de

liberdade política para a democracia, entretanto, sem a garantia de direitos sociais o mercado

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de consumo não se mantém, pois para o consumo é necessário capital, pa ra isso o trabalho e

sem trabalho não há economia.

Beck: do confronto de todas essas teorias surge o quadro da sociologia plural da globalização.

V. SOCIEDADE CIVIL TRANSNACIONAL: COMO IRÁ SURGIR UM PONTO DE

VISTA COSMOPOLITA?

Nacionalismo metodológico e sua refutação: Adam Smith definiu como sociedade e Estado

cobrem um mesmo espaço e são pensados, organizados e vivenciados como sendo um mesmo

limite. Pressupõe a fixação e o controle político estatal do espaço. As aspirações de poder e

controle do Estado fundamentam e delimitam a sociedade (container social).

Refutação: a arquitetura desse pensamento se vê esfacelada diante da globalização economica,

cultural, politica, biográfica. Novas formas de poder , de ação e percepção da vida social:

empresas transnacionais e os pactos globais - postos de trabalhos e impostos- transformando

os Estados em instituições casca (Giddens), com os mundos simbólicos da industria cultural

global (glocalização cultural) também é suprimida a identidade entre Estado e sociedade, que

não mais se coaduna com os ideais estatais, mas para além do simples desejo das vidas

possíveis, uma verdadeira implicação no tecido social que se tornou poroso e miscigenado.

Eu: Na segunda modernidade ou pós-modernidade é elevado a era dos pluralismos: cultural,

religioso, ético etc. A cultura adquire um significado mais aberto para o exterior, mas ainda

com vistas a uma localização, ou seja, a cultura emana de um local, ainda que transnacional.

Por isso a conceituação de Lévy do ciberespaço como um local, uma vez que a cultura

cibernética ou cibercultura é o conceito mais abrangente da cultura, ou seja, um processo

translocal, localizado no espaço virtual. (inerente àqueles individuos- internautas).

Esse processo da globalização cultural foi impulsionado pelos meios de comunicação de

massa, que oportunizaram o alargamento do conhecimento dos mundos possíveis, gerando

aspirações aos seus espectadores.

Neste sentido a queda do bloco leste europeu seria uma consequencia e não o motivo da

globalização. Um marco histórico que comprova a força da globalização cultural e o

descortinamento do discurso socialista para o discurso persuasivo das possibilidades do

mundo capitalista globalizado, no qual se bradava a plenos pulmões a emiscuidade entre

consumo e liberdade política incutindo o desejo de pertencer a essa realidade sedutora.

A confusão do público e do privado: com a expansão da circulação de informações, os

meios de comunicação de massa foram utilizados como mecanismos manipuladores da

consciência coletiva global.

Com intuito de utilizar o mercado como instrumento de viabilização dos interesses estatais,

algumas funções aprioristicas do Estado foram delegadas às iniciativas privadas, às

organizações internacionais e ao mercado. Concebendo uma política economica mundial da

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associação do Estado -público- e o mercado - privado-.

Essa junção repercute em novo dimensionamento democrático global, isto porque as empresas

transnacionais e as economias domésticas sofrem pressão do espaço público mundial.

Por se tratar de uma nova sociedade voltada ao consumo, a participação individual-coletiva se

pauta no próprio consumo como fundamento para a intervenção política reunindo sociedade

ativa e democracia direta em todo o planeta - primeiro com a intermediação dos meios de

comunicação de massa e a pressão das vontades transnacionais, concretizando o discurso

suscitado por Kant em sua teoria da sociedade cosmopolita, sob a ótica da economia emerge a

nova lex mercatoria e os organismos de fomento, regulamentação e proteção ao livre

comércio e meios de alternativos de solução de controvérsia, como mecanismos hábeis às

novas necessidades do contexto globalizado.

Problemática: quem vigiará o vigilante? princípio da segurança ou garantia

“Se o Leviatã foi o simbolo da política moderna, então a posição moral dos „poderes

nacionais‟ e das superpotencias será reproduzida no futuro pela imagem de Lemuel Gulliver,

que após um inocente cochilo se vê amarrado a um sem-número de finíssimas correntes”.

(BECK, 1999, pp133-134)

Topopoligamia: casamento com muitos lugares_globalização das biografias: uma vida

nomade, no carro, no telefone, na internet (second life) é uma vida transnacional mass-media,

o residir e o conviver também são libertos e apartados de determinado local e do espaço

físico.

A figura arquétipica da vida individual é a convivência com o e-mail, telefone, a

plurilocalização se convola em prisão tecnológica. A globalização da vida individual augura o

sepultamento da soberania com a deslocalização dos indivíduos, pois a alternância e eleição

dos lugares são corolário da globalização e consequente afastamento da força subordinadora

do Estado moderno.

Isso requer um redimensionamento do conceito de mobilidade, pois a globalização das

biografias, que pode se dar de maneira incisiva nos campos da multilocalização de nações,

culturas, religiões, por isso ela pode se dar com a mudança no âmago do ser humano, no

deslocamento físico ou virtual dele (tele-trabalho, second life).

VI. CONTORNOS DA SOCIEDADE MUNDIAL: PERSPECTIVAS EM

CONCORRÊNCIA

Globalização acentua o caráter do processo de transnacionalização das dimensões com o

crescimento e intensidade dos espaços, dos problemas, dos conflitos, das biografias e, esse

movimento não deve ser compreendido como total ou totalizante, mas sim contingente e

dialético, pois é preciso questionar o grau, a escala e a densidade da globalização em suas

várias dimensões. (p. 157)

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O conceito de globalidade representa sociedade mundial e esse estado da coisa é irreversível,

multidimensional, policêntrica, contingente e politica e, portanto, um horizonte mundial que

se abre quando a comunicação comprova sua realidade.

Sua irrefutabilidade se espreita sob as perspectivas do Beck chamou da sociedade

telespectadora. A globalidade dos eventos não são dados ou construídos e sim fabricados

pelos meios de comunicação de massa.

Sociedade civil global;

Democracia cosmopolita, na qual a ordem global se concretiza em múltiplas redes de poder

em que todos os grupos almejam uma autonomia relativa em todos os campos da atuação

social, econômica ou política, os princípios e legislação garantidos em conexão local e

transnacional, incidência da supraestatalidade, formação de organizações da sociedade civil

transnacional e implementação dos direitos sociais;

Sociedade mundial capitalista: com a queda do bloco leste europeu e sua inserção na

sociedade capitalista o autor assevera que alguns aspectos da lógica capitalista, dantes

encobertos pelo capitalismo ocidental europeu do welfare state, foram descortinados, assim, o

processo de integração transnacional passa a implicar a desintegração nacional;

Como a globalização não ocorre de forma homogênea em todos os recônditos do mundo, as

companhias transnacionais têm particular interesse nos Estados fracos para impor seus pactos

globais, em razão disto o Estados de bem-estar social entram em crise progressiva, diante da

evolução tecnológica o trabalho é substituído pelo conhecimento e pelo capital aumentando

sobremaneira as desigualdades sociais, não só quantitativamente, mas sobretudo

qualitativamente, com isso há uma relativização\redimensionamento da pobreza servindo

como critério de exclusão aos incapacitados ao consumo;

Sociedade mundial de risco; sociedade de transição politica mundial; e, Estado transnacional.

IV PARTE: RESPOSTAS Á GLOBALIZAÇÃO

Para o autor, a única consequência derivada da discussão acerca da globalização, seria a

inauguração do debate a propósito da conformação política da globalização.

Um debate que pressupõe uma crítica radical da ideologia neoliberal do globalismo, da

unidimensionalidade econômica, do pensamento linear e de mão única, do autoritarismo

político, sempre ancorado no mercado mundial, que se apresenta de modo apolítico e no

entanto, intervém de forma extremamente política. Não seria o fim, mas o recomeço da

política.

Neste sentido, para o autor, a globalidade e a globalização não são nem um fenômeno de

aparência estrategicamente divulgado e cuja encenação pública seria um meio para a liberação

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dos grilhões do capitalismo estatal-social petrificado, e nem conceitos que podem requisitar e

impor a submissão de todos às novas leis naturais do mercado mundial.

O autor então contrapõe dez respostas ante as dez armadilhas do globalismo:

1. Cooperação internacional: a cooperação política entre os Estados nacionais precisa ser

construída para eliminar ou coibir a criação de “currais” que permitam às empresas globais

minimizar o pagamento de impostos e maximizar as subvenções estatais. A tarefa política

consiste em esclarecer a opinião pública que a globalização não pode significar o abandono de

tudo às forças do mercado. Cresce, assim, a necessidade de regulamentações e instituições

internacionais para transações que ultrapassem fronteiras. Ex.: União Europeia, G-7, OMC.

2. Estado nacional ou “soberania inclusiva: a arquitetura política do Estado transnacional pode

ser respondida em duas frentes: o princípio do pacifismo jurídico, fundado no direito

internacional, e o pacifismo federalista, que significa uma política de auto-integração ativa

dos Estados isolados no contexto das relações internacionais com vistas à renovação dos

Estadosglocais isolados e à delimitação do poder dos centros transnacionais. Significa a

renúncia aos direitos de soberania, implicando na conquista do poder de conformação política

fundamentado na cooperação transnacional.

3. Participação do capital: o trabalho vem sendo substituído pelo conhecimento e pelo capital.

Uma nova política social poderia estabelecer como meta a participação do trabalho no capital.

O princípio da decisão conjunta complementa o princípio da propriedade conjunta. Os

modelos em questão vão desde a substituição de parcelas de salários por participações no

capital da empresa, em seus lucros e prejuízos.

4. Reorientação da política educacional: o trabalho deve ser valorizado ou renovado pelo

conhecimento, como investimentos em educação e pesquisa, pois os verdadeiros ativa

tecnológicos de um país se encontram na capacidade de seus cidadãos para a resolução dos

problemas do futuro. Uma das melhores respostas políticas à globalização é esta: a construção

de uma sociedade de conhecimento e pesquisa, prolongamento do período de formação e a

quebra do seu vínculo com as implicações técnicas imediatas, e também o direcionamento dos

processos de formação para qualificações mais abrangentes.

5. As empresas transnacionais são a-democráticas ou então antidemocráticas: um capitalismo

transnacional que não arrecada impostos e destrói postos de trabalho acaba de perder sua

legitimidade. Quem pratica o comércio em todo o mundo, deve estar disposto a assumir, em

todo o mundo, as responsabilidades pelas condições políticas e sociais deste comércio,

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reunindo o controle local e o autocontrole empresarial. Suas contribuições para um

desenvolvimento social, acompanhado por uma justiça social, seriam indiretas, pois é preciso

refletir a respeito do paradoxo destes efeitos colaterais.

6. Aliança em favor da atividade comunitária: aliança civil-estatal pela sociedade civil em vez de

uma aliança pela atividade comunitária. Pressupõe uma concepção política que desestrutura o

monopólio do sistema política.

7. O que virá após o modelo Volkswagen de nação exportadora? A determinação de novos

objetivos culturais, políticos e econômicos: a identidade da nação exportadora já não se

sustenta. O mercado munida premia a diferença. Deve-se portanto, perceber e revelar a força e

o potencial dos aspectos que foram desacreditados, com especificidades regionais, a

individualização, mercados de risco, a re-regionalização dos mercados, a superação da

barreira da homogeneidade cultural.

8. Culturas experimentais, mercados-nicho e auto renovação social: na era das localidades

globais, as culturas desses mercados especiais são biótipos engenhosos, que servem de

influência para os criadores dos produtos para o mercado mundial. A generalização dos

mercados-nicho, regionalmente enraizados e prósperos, é uma das respostas de dois

problemas da primeira modernidade: o fim da produção em massa e o fim do emprego

integral.

9. Empresários públicos e trabalhadores autônomos: no lugar da figura social do trabalhador e

do operário como adversários do capitalista e do empregador, coloca-se a figura central do

trabalhador autônomo e do empresário público. Se o capitalismo inicial se firmou como

exploração do trabalho, hoje se apoia na exploração da responsabilidade (resultado).

10. Pacto social ou exclusão: como a justiça social é possível na era global? Organizar e

incorporar garantias básicas; fortalecer redes sociais de autoproteção e auto-organização;

levantar e vigiar a questão da justiça econômica e social em escala mundial, nos centros da

sociedade civil global.

EUROPA COMO RESPOSTA À GLOBALIZAÇÃO

A Europa política não existe, e sua existência não é vivenciada uma única vez como carência

real. É nada mais que um rótulo, adesivo ou decreto burocrático.

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O que a Europa é ou deve ser não precisa ser produzido a partir do passado, mas deve ser

politicamente projetado como resposta política às questões futuras, em todas as áreas

temáticas: mercado de trabalho, ecologia, Estado social, migração internacional, liberdade

política, direitos fundamentais. Somente na Europa de um espaço transnacional é que a

política de um Estado único pode-se transformar de objeto ameaçador em sujeito da

globalização configurada.

A construção de um Estado transnacional, pelos grandes países da União Europeia, poderia

trazer de volta para os Estados-membro a primazia da política e a capacidade de ação,

democraticamente controlável, da política econômica e social. Uma união Europeia forte e

democrática poderia empregar toda sua força, como maior poder comercial do mundo, na

promoção de reformas reais.

PERSPECTIVA: NAUFRÁGIO À LA CARTE – A BRASILIANIZAÇÃO DA EUROPA

Se o fatalismo dos pós-modernos e do globalismo neoliberal se converter em profecia auto-

realizadora, será fatal. Tornar-se-ão realidade as visões catastróficas que já tomam conta,

quase que exclusivamente, da fantasia pública.