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Instituto de Educação Superior de Brasília Bacharelado em Relações Internacionais SERVIÇOS: O Brasil no Comércio Internacional de Serviços Milena Martins de Oliveira VOLUME 1 / 1 Brasília-DF Novembro de 2007

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Instituto de Educação Superior de BrasíliaBacharelado em Relações Internacionais

SERVIÇOS: O Brasil no Comércio Internacional de Serviços

Milena Martins de Oliveira

VOLUME 1 / 1

Brasília-DFNovembro de 2007

Milena Martins de Oliveira

SERVIÇOS: O Brasil no Comércio Internacional de Serviços

Aline Contti CastroMestre

Brasília - DFIESB

Novembro / 2007

ii

FOLHA DE APROVAÇÃO

Serviços: O Brasil no Comércio Internacional de Serviços

.

Milena Martins de Oliveira

Monografia submetida ao corpo docente do IESB (nome da unidade responsável

pelo curso de Graduação), como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de

bacharel em Relações Internacionais.

Aprovada por:

Profª. Aline Contti Castro - Orientadora

(Mestre)

Prof.________________________

Prof.________________________

Brasília

2007

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Aos meus pais.

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FICHA CATALOGRÁFICA

Oliveira, Milena Martins de. Serviços: O Brasil no Comércio Internacional de Serviços./ Milena Martins de Oliveira. Brasília: IESB/ Relações Internacionais, 2007. xi, 84 p; il. Monografia – Instituto de Ensino Superior de Brasília, IESB, Relações Internacionais, 2004.

1. Comércio Internacional. GATS. Brasil. Brasil – Monografia. 2. Serviços. Economia.

Organizacional – Monografia. I. Título. II. Monografia (Grad.-IESB/Rel.Internacionais).

.

v

RESUMO

O objetivo deste trabalho é analisar o desempenho do Brasil no comércio

internacional de serviços. Desde 1994 com a criação do Acordo Geral sobre Serviços no

âmbito da Organização Mundial do Comércio é crescente a participação dos países no

fluxo do comércio mundial de serviços. Neste estudo é analisada a economia brasileira

de serviços, distinguindo as atividades mais prósperas. A pesquisa também apresenta o

grau de compromisso assumido pelo Brasil nas negociações do Gats durante a Rodada

Uruguai e por fim, uma análise sobre os investimentos estrangeiros diretos no setor de

serviços e o alcance das exportações de serviços brasileiras.

Palavras-chaves: Serviços. Rodada Uruguai. Investimento Estrangeiro Direto.

Exportação de serviços. Brasil. Gats.

vi

ABSTRACT

The aim of this research is to give an introduction to Brazilian performance in

the International Trade in Services. Since 1994, with the creation of General Agreement

on Services within the scope of the World Trade Organization, the participation of

countries in the flow of international services has been increasing. The first part of this

study analyzes the Brazilian services economy, highlighting the most prominent

activities. The research also presents the degree of Brazil’s commitment to the Gats

negotiations during the Uruguay Round. This study analyzes the entrance of foreign

direct investment into the services sector in Brazil, and the range of Brazilian exports in

services.

Key-words: Services. Uruguay Round. Foreign Direct Investment. Services

Exportation. Brazil. Gats.

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Número de empresas (1998/1999) .......................................................... 12

Gráfico 2- Pessoal ocupado (1998/1999) ................................................................... 13

Gráfico 3 – Receita dos setores (1998/1999) ............................................................. 13

Gráfico 4 – Número de empresas (2001) ................................................................... 17

Gráfico 5 – Pessoal ocupado (2001) .......................................................................... 18

Gráfico 6 – Receita dos oetores (2001) ..................................................................... 18

Gráfico 7 – Evolução da média salarial na economia de serviços ............................. 19

Gráfico 8 – Número de empresas (2002) .................................................................. 20

Gráfico 9 – Pessoal ocupado ..................................................................................... 20

Gráfico 10 – Receita dos setores (2002) .................................................................... 21

Gráfico 11 – Investimento estrangeiro direto no Brasil (2001-2005) ........................ 49

Gráfico 12 – Balança comercial de serviços do Brasil (1999-2003) ......................... 56

Lista 1 – Lista de exceções do artigo II (NMF) do Brasil .......................................... 68

Lista 2 – Lista dos compromissos horizontais do Brasil ............................................ 68

Quadro 1 – Características e atributos específicos dos serviços ................................ 9

Quadro 2 – Compromissos setoriais – Brasil e o Mundo – Rodada Uruguai ............ 40

Tabela 1 – Gastos e receitas com turismo em 2001 e 2002 ....................................... 21

Tabela 2 – Resultados sobre a economia de serviços do Brasil de 1998 à 1999............................................................................................................................

22

Tabela 3 – Participação anual da economia de serviços no PIB nacional ................. 23

Tabela 4 – Investimento direto do Brasil no exterior por atividade receptora.... ....... 51

Tabela 5 - Valores das exportações e importações de serviços comerciais do 70

viii

Brasil...........................................................................................................................

ix

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

1. BACEN – Banco Central do Brasil.

2. GATS – Acordo Geral sobre Comércio de Serviços.

3. GATT – Acordo Geral de Tarifas do Comércio.

4. IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

5. IED – Investimento Estrangeiro Direto.

6. IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.

7. MDIC – Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.

8. OCDE – Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico.

9. OMC – Organização Mundial do Comércio.

10. PAS – Pesquisa Anual de Serviços (do IBGE).

11. PD – países desenvolvidos.

12. PED – países em desenvolvimento.

13. PIB – Produto Interno Bruto.

14. UNCTAD – Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento.

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SUMÁRIO

Introdução ................................................................................................................ 1Capítulo 1 – A Economia de Serviços do Brasil ...................................................... 31.1 Definição de serviços ........................................................................................... 31.2 A Economia de Serviços do Brasil ...................................................................... 10Capítulo 2 – O Gats e o Brasil nas Negociações da Rodada Uruguai ...................... 252.1 O que é o Gats ..................................................................................................... 262.2 Rodada Uruguai ................................................................................................... 282.3 Os Compromissos assumidos pelo Brasil............................................................. 342.4 Breve Análise Comparatória entre os Compromissos Brasileiro e Outros Membros .................................................................................................................... 40Capítulo 3 – Os Avanços do Brasil no Comércio Internacional de Serviços ........... 453.1 Os efeitos das relações comerciais internacionais de serviços para o Brasil ....... 453.2 Exemplos Brasileiros que já conquistaram espaço no mercado mundial ............ 56Conclusão .................................................................................................................. 64Anexos ....................................................................................................................... 68Referência Bibliográfica .......................................................................................... 71

xi

INTRODUÇÃO

O comércio internacional é o espaço onde os países e territórios trocam suas

mercadorias, capitais, mão-de-obra e serviços. O comércio internacional de serviços é

responsável, por mais de 60% do comércio internacional segundo a Unctad

(Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento) (UNCTAD,

2001). O Brasil não pode dar-se o privilégio de não participar do fluxo movimentado

pelo comércio de serviços.

Por isso, é muito relevante conhecer a dinâmica da produtividade interna em

serviços e saber quais setores se destacam. É crescente a proeminência da função dos

serviços na cadeia de relações interindustriais. Atualmente, a análise do papel das

atividades de serviços no processo de desenvolvimento das economias deve incorporar

formas de conceituação e mensuração do seu valor, e também avaliar os impactos da

atuação dos serviços sobre outros setores econômicos e sobre a acumulação de riqueza

pela economia do país.

Este projeto trata deste tema, com foco no Brasil. O objetivo é analisar os

reflexos do Gats (Acordo Geral sobre Comércio de Serviços) na situação da economia

brasileira de serviços, destacando a entrada de investimento estrangeiro direto no setor

de serviços e também se o Gats instigou a exportação de serviços brasileiros. Mais

especificamente, a hipótese é que houve aumento da entrada de Investimento

Estrangeiro Direto (IED) no setor de serviços do Brasil e das exportações de serviços

brasileiro devido ao Gats.

Para isso, o estudo analisa a postura brasileira nas negociações da Rodada

Uruguai e o nível de compromisso assumido pelo Brasil naquele momento. Reconhecer

o nível de compromisso assumido pelo país significa descrever suas principais decisões

e observar o quanto se foi flexível ou não para com a liberalização do comércio

internacional de serviços que é a determinação do Acordo da OMC.

Os dados estatísticos utilizados são das seguintes instituições: Instituto Brasileiro

de Geografia e Estatística (IBGE), Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA),

Banco Central, Organização Mundial do Comércio (OMC) e UNCTAD. Depois de

colhidos tais elementos estatísticos, segue-se para uma descrição da Rodada Uruguai,

1

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momento de criação do Gats, para compreender as medidas de abertura para o comércio

de serviços tomadas pelo país.

Por fim, encerra-se a pesquisa com a análise do grau de inserção que o Brasil já

conquistou no comércio internacional de serviços a partir dos investimentos

estrangeiros diretos no setor de serviços e o montante das suas exportações de serviços.

Destaca-se o fortalecimento da economia de serviços na história recente do Brasil e do

mundo e como se tornou um fator importante para a inserção do país no comércio

internacional nos últimos anos.

A monografia estrutura-se em três capítulos. O primeiro capítulo trata do marco

teórico do estudo, trazendo os conceitos de serviços para compreender como é possível

mensurar o valor e a riqueza que este tipo de atividade econômica pode agregar na

economia, assim como traçar o mapeamento da economia de serviços no Brasil, para

isto, são usados os dados elaborados pela Pesquisa Anual de Serviços (PAS) do IBGE e

alguns dados do Banco Central.

Já no capítulo dois, apresenta-se o debate entre as posturas de negociação dos

países desenvolvidos e dos países em desenvolvimento durante a Rodada Uruguai, da

qual resulta o Gats. Este é o panorama exterior que contextualiza o tema na agenda do

comércio internacional, e todo este cenário serve como bússola para entender as ações

tomadas pelo Brasil na Rodada e posteriormente dimensionar a tomada de decisão

brasileira quanto as suas ofertas assumidas para a comercialização internacional de

serviços.

Para finalizar, o último capítulo traz a análise central do estudo e aponta como

se procedeu a entrada de investimento estrangeiro direto no setor de serviços e a

influência deles no aumento das exportações brasileiras. O capítulo também avalia

casos de setores que já participam do comércio internacional de serviços.

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CAPÍTULO 1

1. A Economia de Serviços no Brasil

O objetivo deste capítulo é apresentar a conceituação sobre a economia de

serviços; mostrar a definição e a mensuração da atividade terciária. Apresentar os

índices da economia de serviços no Brasil e os segmentos mais representativos na

economia interna dentro dos dados pesquisados. Para apurar os dados relativos ao Brasil

foram usados os relatórios do Banco Central do Brasil e a Pesquisa Anual de Serviços

do IBGE.

1.1 – Definição de Serviços:

Desde os autores clássicos de economia, há a discussão sobre a existência de

atividade produtiva dentro da economia, a terciária. Alguns autores clássicos da

economia não consideravam as atividades além da agricultura e da indústria

manufatureira. Adam Smith via a atividade como trabalho improdutivo porque não

produzia riqueza; já o trabalho agrícola rendia valor de troca porque possibilitava o

pagamento dos funcionários e os investimentos na terra. Isto é, gerava lucro diferente

dos médicos, advogados, professores e outros que não produziam riqueza ao realizar o

seu exercício profissional na visão de Smith.

Adam Smith rejeitou a teoria do valor como teoria adequada para a explicação dos preços em um sistema de economia em que a terra e o capital eram de propriedade de uma classe cujos membros não eram obrigados a trabalhar. A única versão da teoria do trabalho que ele concebia era a noção de que os preços das mercadorias eram proporcionais ao volume de trabalho incorporado às mercadorias (HUNT, 1987; p. 252)

Porém, a idéia do valor produzido pelo trabalho já estava implícita no

pensamento desenvolvido por Adam Smith, entretanto as limitações técnicas talvez não

permitissem naquela época vislumbrar o serviço como algo que também se

expressassem em preço. Malthus quando interpreta os pensamentos smithianos já

consegue aperfeiçoar e aceitar o serviço não como um trabalho improdutivo, mas sim

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menos produtivo em relação à agricultura que era mais produtiva. Também, ele ressalta

a troca do termo riqueza pelo termo produtividade.

Dentro da abordagem dos estudiosos de economia, um termo é inerente à

concepção econômica de mensuração do produto ou do trabalho: valor, porque é

preciso explicar como se determina o preço das mercadorias ou do trabalho realizado.

Assim, o valor de um bem consistia no trabalho incorporado aos meios de produção do

produto e também no trabalho retirado da própria força de trabalho comprada e usada

pelo capitalista, proprietário dos meios de produção.

Existem dois postulados teóricos que objetivam esclarecer a importância do

valor dentro das atividades econômicas. O primeiro postulado teórico é do valor-

trabalho, enquanto o segundo é a teoria do valor-utilidade. Na teoria do valor-trabalho o

valor é explicado a partir da quantidade de trabalho incorporada no processo de

produção das mercadorias. Hunt (1987) aclara que, o que se buscava pelos estudiosos

era explicar que na produção havia trabalho empregado e que este por sua vez devia

constar no cálculo do lucro e no preço da produção. Este preço se alterava porque o

volume de trabalho suficiente em uma linha de produção não necessariamente seria o

mesmo para todas as mercadorias.

Por isso há aplicação da mensuração do preço (valor) estipulado aos produtos.

Porque era uma recompensa pela produção de algo concreto, já o trabalho não era

recompensado por ser intangível. Para Smith (apud MEIRELLES, 2006-a) o trabalho

era improdutivo por não acumular riqueza. Já para Marx a relação entre valor e trabalho

existe quando o trabalho é produtivo e contribui para a formação de um excedente na

economia. Ou seja, na sua concepção era a capacidade de geração de mais-valia que

definia se uma atividade é ou não produtiva.

Na teoria do valor-utilidade se concebe o valor do ponto de vista da satisfação

das necessidades humanas. Para Say (apud Ibidem; p.123) “os processos produtivos não

são geradores de objeto, de matéria concreta, mas sim de utilidade.” Mill complementa

a visão de Say, pois para que o serviço seja considerado produtivo o importante é que a

utilidade gerada seja incorporada na riqueza do país. Em suma, os utilitaristas passam a

aceitar que não apenas os produtos vindos da terra são geradores de riqueza, mas

também o produto da realização do trabalho humano.

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Kon (2004) também apresenta a concepção dada às atividades produtivas

elaboradas pelo economista Say. Ele traz três definições para indústria e uma delas é a

indústria comercial ou comércio, quando coloca à nossa disposição os objetos de que

necessitamos e, os quais, se não fosse por ela, estariam fora de alcance. Assim a

indústria comercial contribui para produção ao aumentar o valor do produto, por

exemplo, no seu transporte. “Os produtos imateriais são frutos da indústria humana,

pois chamamos de indústria qualquer espécie de trabalho produtivo” (SAY apud KON,

2004; p.10).

Com a dinamização da economia mundial e com o surgimento de novas

tecnologias os trabalhos individuais conquistaram importância econômica e também foi

preciso atribuir valor ao esforço despendido na realização de uma atividade que não

resultaria numa mercadoria concreta. O conceito de valor dentro dos estudos

econômicos ajuda a entender como é possível a mensuração de um serviço. Este

conceito é considerado essencial na economia porque revela os preços pagos ou a

contrapartida necessária do bem ou serviço produzido.

O conceito de valor estabelecido pelos estudiosos de economia ajuda na

aceitação do serviço como atividade econômica, porque ele é capaz de prover resultados

quantitativos na receita do Estado. Serviço é rentável logo não deve estar ausente dos

dados do balanço de pagamento, do produto interno bruto, do produto nacional bruto e

demais contas dos países. O breve histórico do termo “valor” indica que a atividade de

serviços é uma categoria da atividade econômica que também rege a vida econômica ou

parte dela há um tempo considerável.

“The contribution of services to gross domestic product (GDP) in individual

countries/areas can be higher than 89% 1.” (UNCTAD, 2001; p.3) e a Unctad

acrescenta que o montante percentual no produto interno bruto dos países em

desenvolvimento pode chegar a 45% do PIB. Isso indica que a retórica assumida pela

linha de pensadores que como Smith enxergava apenas a mercadoria como viabilizador

para o desenvolvimento e entendia o serviço como imaterial e assim não-contribuinte

por sua natureza não mensurável, não conseguiram no seu período visualizar a

importância do terceiro setor na economia.

1 Tradução livre: A contribuição dos serviços no produto interno bruto (PIB) em certo país/área pode ser superior a 89%.

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É compreensível o pensamento que repudia o serviço como fornecedor primário

de riqueza. Afinal uma atividade que executa simultaneamente o consumo e oferta do

serviço, não poderia ser facilmente compreendida em períodos com menos tecnologia

disponível, população menor, economia menos diversificada, necessidades menos

exigentes dos consumidores. Com a transformação da tecnologia ao longo dos tempos,

somada ao forte declínio de empregos nas indústrias na década de 1970 em vários

países desenvolvidos, a aceitação do serviço como atividade econômica conquista

espaço. Marconini (2003; p.31) traz dados da queda dos empregos na indústria no

período pós-1970: “no caso japonês e alemão a queda é moderada – respectivamente de

26,0% para 23,6% e de 38,6% para 32,2%. Já no caso dos EUA e do Reino Unido as

quedas são grandes – respectivamente de 25,9% para 17,5% e de 38,7% para 22,5%.”

Entretanto, há o argumento de que “mesmo o setor de serviços que contenham

significativo conteúdo tecnológico seriam apenas usuários destes, e não de fato seus

provedores” (KUBOTA, 2006; p.20). Isto é uma visão tradicional que enxerga o setor

de serviços ofertando menos possibilidades de crescimento do que a indústria em

emprego, tecnologia e crescimento econômico. Pois na corrente tradicional o setor de

serviços era considerado residual em relação ao total da economia. Segundo Kon (2004)

após a consideração das atividades primárias e secundárias, as terciárias eram vistas

como intangíveis e de inerente menor produtividade, de acordo com os tradicionalistas.

No entanto, a visão do setor de serviços como residual ainda permanece na

concepção atual de alguns estudiosos. Marconini (2003) diz que na ausência de

definições mais precisas, a forma residual de abordar serviços tem sido a principal

maneira de tratá-la para efeitos analíticos. Porém uma atividade que agrega valor a

economia não pode ser considerada um resíduo da economia.

Serviço não é improdutivo, ou seja, não está isolado do processo produtivo de geração de riqueza porque é intangível, como defendia Smith, ou porque não está submetido à lógica de valorização do capital industrial, conforme interpretado por Marx. Da mesma forma, serviço não pode ser produtivo somente quando gera uma utilidade permanente ou durável, conforme definido por Mill e Walras. Na verdade, serviço é simplesmente realização de trabalho em processo e é a sua existência que garante a incessante reprodução do capital aplicado no setor ao qual está vinculado, o que permite tratá-los de forma endógena e integrada no sistema econômico. (SAY apud MEIRELLES, 2006-a; p.134)

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Kon estabelece uma espécie diálogo entre várias correntes conceituais que

tentam definir serviços, por fim ela consegue estabelecer os principais aspectos para a

classificação e mensuração do serviço. Para fins teóricos do presente estudo os três

pontos apontados guiarão a análise proposta. Para ela os principais elementos para a

definição de serviços são (KON, 2004; p.29):

1. A natureza do produto da produção, ou seja, que acarreta uma mudança na

condição de uma unidade econômica com a anuência prévia da pessoa ou

unidade econômica anterior;

2. Os insumos singulares utilizados (tipos específicos de relacionamentos entre

produtor e consumidor como insumos de produção); e

3. O propósito atendido pelo processo de produção (com relação a tempo, lugar e

forma de utilidade).

No item um a idéia proposta é que o serviço é um fenômeno não-físico que

proporciona mudança na condição de uma pessoa ou um bem pertencente a uma

unidade econômica. Já no número dois refere-se ao serviço como intermediário das

manufaturas e também em outras atividades terciárias. Segundo Gershuny e I. D. Miles

(apud KON, 2004) o serviço se refere ao produto do trabalho em serviço (service in

work) realizado dentro das atividades primárias e manufatureiras e com freqüência

retidos como serviços intermediários internos às empresas.

O número três aborda a flexibilidade própria do setor de serviços. “(...) o setor

prima pela heterogeneidade e variedade, seja em termos das características de produto e

de processo, seja do ponto de vista das estruturas de mercado, heterogeneidade esta que

se reflete no tratamento teórico dado ao setor” (MEIRELLES, 2006-a; p.119). Neste

ponto cabe dizer que o processo de produção do serviço só é iniciado a partir de uma

solicitação do consumidor, de modo que o serviço acontece sob a forma de fluxo de

trabalho contínuo no tempo e no espaço. Logo aqui se reconhece que o serviço deriva

de uma troca simultânea. “Esta simultaneidade resulta, por seu turno, em duas

propriedades, que são a inestocabilidade e a incomensurabilidade. Não é possível

armazenar um serviço, porque ele é consumido tão logo é produzido, daí a sua

intangibilidade.” (Ibidem; p.126).

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Este é o ponto da discussão em relação aos serviços, sua característica non-

tradeable, ou seja, não-comercializável. Segundo Kon ainda não está clara a distinção

entre bem como objeto tangível e serviço como intangível e perecível por ser criado e

consumido praticamente no mesmo tempo.

Ela cita exemplos onde não fica evidente esta distinção. A empresa que vende

refeições preparadas para trabalhadores de outras empresas é possível discutir se é uma

compra de bem da indústria alimentícia ou a aquisição de serviço de preparação e

distribuição de refeições. Outro exemplo dela é sobre bens que só podem ser

consumidos a partir da disponibilidade de algum serviço ou conjunto deles, como a

televisão, que está associada à disponibilidade dos serviços de transmissão das

emissoras e do fornecimento de energia elétrica. O fato é que não é possível prever

quando se encerra esta discussão sobre a distinção entre bem e serviços. Parece distante

o estabelecimento do consenso entre os acadêmicos, economistas, governos e demais

estudiosos.

Meirelles (2006-a; p.130) traz a sua definição de serviços de forma pragmática:

“serviço é realização de trabalho independente das características formais do processo

produtivo ou do produto resultante deste processo”.

A partir da sua premissa ela explica que não somente o recurso humano é a mão-

de-obra exclusiva do serviço, graças às inovações tecnológicas as máquinas também o

realizam. O resultado do trabalho pode ser um produto tangível ou não, já que o

importante na sua concepção é a ação do trabalho em si.

Porém, ela chama atenção e diz que nem todo trabalho realizado pode ser

serviço. Isto é, em todas as etapas dos processos econômicos onde se realiza trabalho há

um serviço em potencial, mas para que este potencial se realize é necessário que o

processo de trabalho em questão seja uma atividade econômica autônoma, estruturada a

partir de um arranjo contratual (formal ou informal), onde o propósito de sua

constituição é a prestação de trabalho. Ela quer dizer que há elementos da realização de

trabalho que são correspondentes aos elementos da prestação de serviço.

A interpretação da análise da autora é que a prestação do serviço deve ser

contratual, ou seja, em sua origem o serviço deve nascer de um contrato. Em suma, a

idéia de Meirelles é resumir serviço em realização de trabalho porque facilita a

incorporação de todos os atributos e características dos serviços. Pois mesmo sendo

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tangível ou intangível o seu produto final, o que de fato o qualificou foi a realização de

trabalho. O que importa é que o trabalho realizado agregou valor nas demais esferas de

economia. Sendo fluxo de trabalho, os serviços são em essência geradores de valor. Se

não há realização de trabalho, não há serviço e, logo, não há geração de valor.

Para consolidar e melhor congregar todas as idéias aqui explicadas o quadro

abaixo resume as principais visões sobre o setor de serviços. Quadro organizado por

Gershuny e Miles (apud MEIRELLES, 2006-a; p. 132):

Quadro 1 - Características e atributos específicos dos serviçosProcesso de Produção:

o Pesados investimentos em prédios e construções: necessidade de espaço físico para a integração produtor-usuário.

o Alguns são intensivos em mão-de-obra especializada e altamente qualificada, outros não.o A organização do processo de trabalho é sempre problemática porque é difícil controlar e

administrar o processo nos mínimos detalhes.Produto:

o Intangível e intensivo em informação.o Inestocável e de difícil transporte. Processo e produto são praticamente indistinguíveis.o Quase sempre customizado, atendendo especificidades do mercado consumidor.

Consumo:o A produção e o consumo são instantâneos no tempo e no espaço.o A produção depende de especificações do consumidor quanto a design e ao próprio processo

de produção.Mercado:

o A organização do mercado varia, desde serviços públicos administrados pelo governo até serviços privados operados em pequena escala por empresas familiares.

o Via de regra há dispositivos e mecanismos institucionais de regulação do mercado, com o objetivo de proteger o consumidor e orientá-lo nas suas decisões de consumo, tendo em vista a dificuldade de demonstração dos produtos antecipadamente.

O quadro demonstra a construção evolutiva da definição dos serviços que

inclusive inspiraram as duas autoras nos seus recentes estudos. Para compreender as

bases históricas e futuras de desenvolvimento do setor serviços é necessária uma

perspectiva ampla de análise, incluindo não apenas as características de produção,

consumo, mercado, mas também a organização e a estrutura dos serviços que importam

como valor adicionado na economia de um país.

A mudança de paradigma observada na linha evolutiva das definições, conceitos,

classificações, funções e a capacidade produtiva de valor do setor de serviços permitem

uma avaliação mais flexível sobre o papel dos serviços na economia brasileira.

1.2 – A Economia de Serviços no Brasil:

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A economia brasileira de serviços está inserida na estrutura econômica do país, e

a trajetória econômica brasileira serve para contextualizar a análise do segmento

econômico: economia de serviços. O período aqui selecionado para o estudo

compreende os anos de 1998 até 2002.

Desde o final da década de 1970 até 1990 o Brasil passou por turbulências

financeiras, com destaque para os anos 1980 marcado pela inflação e pelos planos

frustrados na tentativa do controle da hiperinflação. Em 1984, a inflação anual havia

atingido 220% e em fevereiro de 1986 se situava em 300%. E em fevereiro de 1987 foi

declarada a moratória unilateral brasileira, já que durante este ano as taxas de inflação e

juros internos alcançaram 1.000% e 2.000% respectivamente. (KON, 2006; p.95).

A partir dos anos 1990 algumas transformações iniciaram uma nova escrita para

a história das finanças brasileiras. O presidente Fernando Collor de Mello instituiu o

Plano Collor I e o Plano Collor II na tentativa de amenizar as mazelas financeiras do

país. Alguns autores defendem as suas ações como drásticas e prejudiciais ao país.

Outros logram êxito ao seu trabalho porque ele conseguiu aprofundar e dinamizar as

relações comerciais brasileiras quando liberalizou as importações.

Em 1993, entra o presidente Itamar Franco que traz o programa de estabilização

econômica. Neste programa estavam os planos sobre a URV – Unidade Real de Valor –

que serviria como padrão para referenciar preços e salários; a criação do Fundo Social

de Emergência para complementar a eliminação dos déficits públicos através dos

recursos advindos dos impostos e contribuições; e por fim, o Plano Real que amordaçou

a inflação e manteve uma política econômica restritiva monetária e fiscal que primava

pela estabilização dos preços e entrada de recursos estrangeiros.

A soma dos fatores dos períodos Collor e Itamar trouxe reflexos na conjuntura

de todo o cenário econômico do Brasil, incluindo o setor de serviços.

Como conseqüência dos problemas conjunturais de estabilização e da intensificação da modernização organizacional e produtiva, observou-se a eliminação crescente de postos de trabalho nas empresas e da elevação das situações de contratação sem vínculo empregatício legalizados, por um lado, concomitantemente ao crescimento de ocupações autônomas a partir da terceirização dos serviços de empresas. (KON, Op. Cit; p. 99)

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Os reflexos iniciais do fortalecimento da economia de serviços brasileira ocorre

neste momento de 1998 até 2002 devido as reformas efetuadas pelos governos em

períodos anteriores. O ano de 1998 marca o contexto de serviços porque foi o ano em

que o tema ressalta a sua importância na economia. “Antecedendo à PAS, o último

levantamento mais amplo e completo cobrindo as atividades de serviços foi o Censo

Econômico de 1985.” (IBGE, 1998/1999; p.1). A primeira Pesquisa Anual de Serviços

realizado pelo IBGE é referente aos anos de 1998 e 1999, e dá início à série anual desta

pesquisa. Dentro do enfoque das pesquisas anuais, cabe à PAS o levantamento de

informações voltadas à caracterização da estrutura produtiva do segmento empresarial

atuante em atividades de serviços.

Os segmentos dos serviços pesquisados pela PAS, têm como característica

principal a heterogeneidade. Deste modo, fazem parte da PAS tanto serviços

tradicionais, como alojamento e alimentação, transportes, serviços pessoais e

manutenção e reparação de bens, que se destacam pela baixa ou semiqualificação da

mão-de-obra, baixa intensidade de capital e baixo desenvolvimento tecnológico; como

os serviços pertencentes aos segmentos mais dinâmicos da economia, tais como

telecomunicações, atividades de informática e serviços audiovisuais que são em geral,

de capital e informação intensivas, empregam mão-de-obra altamente qualificada e são

usuárias das avançadas tecnologias da informação e comunicação.

Dentro dessa miscigenação de segmentos a PAS estrutura o seu trabalho

metodológico em quatro variáveis: número de empresas, pessoal ocupado, massa

salarial e valor da produção – a posição relativa de cada segmento dentro da renda

nacional (receita operacional líquida, subvenções e outras receitas).

A PAS 1998/1999 traz a informação de que neste ano o setor de serviço foi

responsável por 57,2% da absorção de mão-de-obra na economia. A pesquisa cobriu

cerca de 650 mil empresas atuantes em atividades de prestação de serviços, registrando

produção no valor de R$ 185,4 bilhões, uma massa de pessoas ocupadas de 5,3 milhões

e uma folha salarial de R$ 37,4 bilhões.

Os gráfico 1, 2 e 3 mostram as divisões percentuais de cada setor abrangido pela

pesquisa. Em número de empresas (gráfico 1), destacam-se os segmentos de alojamento

e alimentação com 41,6% e outras atividades com 23,1%. Como geradoras de emprego

11

11

(gráfico 2), distinguem-se as atividades de serviços prestados às empresas 2 com 30,6%,

alojamento e alimentação com 22,9% e transportes e atividades auxiliares com 22,8%.

Por fim sob o aspecto da participação no valor de produção (gráfico 3), o grande

destaque ficou com o segmento de transportes e auxiliares com 30,2%, seguido por

correio e telecomunicações com 20,0%.

Gráfico 1: Número de empresas (1998/1999)

23,1%

15,9%

5,0%

4,1%

0,5%

9,8%

41,6%

Outras atividades Serv. Prestados às empresas

Ativ. Imobiliárias Informática

Correios e telecomunicações Transportes e serv. Auxiliares

Alojamento e alimentação

Fonte: IBGE, 1998/1999; p. 3

2 Deve-se aos serviços de investigação, vigilância e segurança; serviços de limpeza em prédios e domicílios; seleção e locação de mão-de-obra e serviços técnico-profissionais. Que são atividades de intensivo uso de mão-de-obra.

12

12

Gráfico 2: Pessoal Ocupado (1998/1999)

13,3%

30,6%

3,3%

3,1%4,0%

22,8%

22,9%

Outras atividades Serv. Prestados às empresas

Ativ. Imobiliárias Informática

Correios e telecomunicações Transportes e serv. Auxiliares

Alojamento e alimentação

Fonte: IBGE, 1998/1999; p. 3

Gráfico 3: Receita dos setores (1998/1999)

13,3%

17,9%

3,7%

6,0%20,0%

30,2%

8,9%

Outras atividades Serv. Prestados às empresas

Ativ. Imobiliárias Informática

Correios e telecomunicações Transportes e serv. Auxiliares

Alojamento e alimentação

Fonte: IBGE, 1998/1999; p. 3

Dentro dos dados acima dois setores não aparentam o seu potencial, que são

correios e telecomunicações e informática, que, sem dúvida, representam a face mais

dinâmica e de tecnologia de ponta do setor produtor de serviços e cujos coeficientes

contrastam com os dos serviços tradicionais em todos os indicadores selecionados

(PAS-1998/1999). No gráfico 1 o número de empresas no ramo da informática e

correios e telecomunicação não é significativo, no entanto, suas capacidades de agregar

valor é um fato observado no gráfico 3.

13

13

Sobre o setor de informática é relevante observar no relatório anual do Banco

Central do Brasil de 1998 uma medida tomada pelo Conselho Monetário Nacional, que

aprovou a inclusão da área de software na consolidação das normas do Proex 3. Em

1995 ampliou-se a cobertura do Proex para o setor de serviços, porém nem todos os

setores foram acobertados pelo programa.

Ainda na modalidade de financiamento, a composição setorial da clientela evolui de uma situação, em 1997, em que os serviços responderam por 75,6% de total financiado, para outra, em 1998 e 1999, caracterizada por uma maior diversificação de carteira. De fato, em 1998, destacam-se máquinas e equipamentos com 37,4%, [agronegócios] com 12,3%, produtos minerais com 9,1%, e material de transporte com 8,1%, além de serviços que mantêm participação importante da ordem de 18,3%. (VASCONCELOS, 2001; p. 223)

O trecho acima quando dita o percentual aproveitado pelos prestadores nacionais

de serviços refere-se principalmente à construção civil. O autor frisa ao longo do texto

que o maior beneficiado deste financiamento era o serviço de engenharia. Entretanto, ao

curso do tempo outros setores ganharam destaque na economia e passaram a fazer parte

do financiamento. Segundo o próprio relatório do BACEN (1998), para tornar o

programa mais eficiente e melhor sintonizado com a corrente situação econômica

brasileira, o setor de software não podia ficar excluído do Proex.

O valor de produção gerado pelas empresas de informática foi cerca de R$ 11,2 bilhões em 1999, ocupando, em 1999, cerca de 166 mil pessoas. Um dos aspectos a ser destacado neste segmento refere-se ao grande número de pequenas e micro-empresas (até 19 pessoas ocupadas) respondendo por 12,9% da produção nessas atividades. (PAS, 1998/1999; p. 15).

O setor de telecomunicação tem vantagem na avaliação da PAS 1998/1999. A

pesquisa registrou cerca de 250 empresas com 20 ou mais pessoas ocupadas

responsáveis pela geração de um valor bruto de produção de R$ 32,8 bilhões em 1999,

o que representou 17,7 % do conjunto dos serviços cobertos pela pesquisa.

O setor de transporte e serviços auxiliares também tem números expressivos nos

números do gráfico 1. Dentro do setor a atividade de transporte de longo curso (opera 3 Programa de Financiamento às exportações – criado pela lei 8.187 de junho de 1991, com duas finalidades: financiamento pó-embarque à exportação de bens e serviços e equalização de taxas de juros. Os recursos alocados a esse programa são orçamentários, e o Banco do Brasil é o agente financeiro da União.

14

14

em rotas marítimas internacionais) a PAS registrou em 1999 apenas 11 empresas com

20 ou mais pessoas ocupadas, porém geraram em 1999, valor bruto da produção da

ordem de R$ 653,8 milhões e valor adicionado de R$ 130,5 milhões.

O relatório anual do BACEN de 1999 retrata as conseqüências da desvalorização

do real frente ao dólar no setor de serviços. “A importação de serviços não relativos a

fatores de produção respondeu prontamente ao aumento de custos associado à

desvalorização do real, com destaque para transportes e viagens internacionais.”

(BACEN, 1999; p.142). Isto é, as despesas líquidas com viagens ao exterior diminuíram

expressivamente, refletindo o ganho de competitividade do turismo no país em relação

ao consumo do turista brasileiro no exterior. Contudo, a vinda de turistas estrangeiros

não agregou nas contas finais do balanço de pagamentos no ano de 1999. “As viagens

de estrangeiros ao país, mesmo tornando-se mais acessíveis, propiciaram receita da

ordem de US$ 1,6 bilhão, mesmo patamar de 1998.” (BACEN, Op. Cit; p.143).

Na Pesquisa Anual de Serviços realizada em 2000 o número de empresas foi de

60.073 mil. Neste ano, se observa nos estudos complementares à PAS (IBGE-

Suplemento, 2001) a transformação nos serviços de telecomunicações, que passaram a

agregar riqueza nas contas nacionais. Os resultados dos processos de negociação de

privatização do setor efetuados nos anos de 1996 a 1998, começaram a resultar em

números. “Os produtos das telecomunicações como um todo representaram 66,8% da

receita das atividades de Informação, em 2000.” (IBGE-Suplemento, 2001; p.22). O

relatório do BACEN de 2000 auxilia na avaliação desta informação, ele traz o dado de

que neste ano a receita (US$ 1,3 bilhão) foi superior a despesa (US$ 1 bilhão).

“Assinalando-se que o aumento de despesas reflete a modernização do setor produtivo

interno, e o relativo às receitas, a existência de mercado externo para fornecimento de

tecnologia por empresas residentes.” (BACEN, 2000; p.165). A modernização foi

possível, em grande parte, com a privatização do setor de telecomunicações. Setor

representativo dentro da economia de serviços do país, que antes sob posse do Estado

encontrou dificuldades para se desenvolver tecnologicamente.

O relatório do BACEN (2000) acrescenta outros segmentos relativos a fatores de

produção que cresceram. As receitas associadas a serviços administrativos alcançaram

US$ 1,5 bilhão, aumento de US$ 202 milhões; as despesas com aluguel de

15

15

equipamentos, US$ 1,4 bilhão, aumento de US$ 796 milhões; e as de aquisições de

software, US$ 1 bilhão, aumento de US$ 65 milhões.

A pesquisa sobre serviços do IBGE de 2000 complementa a análise do relatório

do BACEN (2000) ao apresentar os dados do setor informacional 4. O setor

informacional, segundo os dados da PAS (2000) foi composto por 24.562 empresas e

geraram uma receita de R$ 74,6 bilhões. Ou seja, mais de 30% do total da receita

gerada pelo setor de serviços. A pesquisa ainda ressalta que dentro do setor

informacional a maior contribuinte foi a atividades de telecomunicações que com 1.423

empresas totalizou uma receita de R$ 52,8 bilhões. Mas as atividades de informática

também reforçaram o faturamento e auferiram R$ 8,91 bilhões em receita.

No ano de 2001, observa-se continuidade da importância do setor de informática

dentro da economia de serviços. O relatório anual do BACEN (2001) traz os seguintes

dados sobre as despesas governamentais com serviços de computação e informação;

eles alcançaram US$ 1,1 bilhão, mesmo patamar de 2000, enquanto os gastos com

royalties e licenças decresceram 12,2%, para US$1,1 bilhão. Isso mostra dois cenários,

primeiro os serviços de computação tornaram-se mais caros ou a demanda pelo serviço

cresceu. Já a diminuição de gastos com royalties e licenças indica que a produção

interna desenvolveu produtos nacionais com preços mais acessíveis ou a demanda

também diminuiu.

O relatório anual do BACEN de 2001 traz mais informações, houve reversão no

fluxo de serviços comerciais e de corretagem. De receitas líquidas de US$ 194 milhões

para despesas líquidas de US$ 23 milhões. Isso indica que o país adquiriu mais esses

serviços de prestadores estrangeiros, logo importou mais do que exportou.

Para o ano de 2001 o relatório do BACEN também informa que os serviços de

negócios, profissionais e técnicos (maior componente de outros serviços) mantiveram-

se no mesmo patamar, com destaque para o aumento de 16,7% em receitas líquidas de

serviços administrativos e para a redução de 15,7% em receitas líquidas de serviços

técnicos especializados. Os serviços especializados geralmente são oferecidos por

empresas estrangeiras, porque elas dispõem de conhecimento em áreas especializadas

como conserto de aparelhos celulares, computadores, impressoras, carros, máquinas

4 As atividades consideradas na PAS de 2000 para o setor informacional foram: telecomunicações; informática com edição de programas, processamento de dados, atividades de banco de dados; filmes com produção e projeção; rádio e televisão e agências de notícias.

16

16

usadas em grandes fábricas e etc. Interessante notar que são também empresas de

capital externo que produzem os bens com tecnologia sofisticada e por isso elas

precisam exportar o conhecimento técnico de reparo e manutenção para os compradores

dos produtos.

Na análise referente ao gráfico 6 observa-se que as empresas que compõem o

grupo dos serviços de informação foram responsáveis por 31,4% do total da receita

operacional líquida levantada na pesquisa, respondendo, no entanto, por apenas 5,9%

do total das empresas (gráfico 4) e 6,6% do total de pessoas ocupadas (gráfico 5),

respectivamente. Isto explica que um setor altamente tecnológico não demanda de mão-

de-obra em massa, ao contrário, é capaz de usar baixo volume de trabalhadores

disponíveis. Além disso, os trabalhadores ociosos no mercado não são especializados

para o segmento.

Gráfico 4 - Número de empresas (2001)

49,2%

10,5%

18,5%

4,7%5,9% 11,2%

Serviços prestados às familias

Correio Transportes e serviços auxiliares de transportes

Serviços prestados às empresas

Atividades imobiliárias e aluguel de veículos, máquinas e equipamentos

Serviços de informação

Outros serviços

Fonte: IBGE, 2001; p. 27

Gráfico 5 - Pessoal ocupado (2001 )

17

17

30,0%

22,8%31,8%

3,1%6,6% 5,7%

Serviços prestados às familias

Correio Transportes e serviços auxiliares de transportes

Serviços prestados às empresas

Atividades imobiliárias e aluguel de veículos, máquinas e equipamentos

Serviços de informação

Outros serviços

Fonte: IBGE, 2001; p. 27

Gráfico 6 – Receita dos setores (2001)

11,6%

30,3%

18,5%3,1%

31,4%

4,8%

Serviços prestados às familias

Correio Transportes e serviços auxiliares de transportes

Serviços prestados às empresas

Atividades imobiliárias e aluguel de veículos, máquinas e equipamentos

Serviços de informação

Outros serviços

Fonte: IBGE, 2001; p. 27

Porém a economia brasileira no seu total expressa a baixa qualidade da mão-de-

obra em serviços por meio do salário médio. Os números decrescentes de 1999 até 2001

refletem que a mão-de-obra para a maioria do setor de serviços não precisa de alta

qualificação, como observa-se no gráfico 7 na próxima página. Os baixos salários

correspondem a capacidade absolvição empregatícia do setor, onde prevalece as

atividades menos dinâmicas em tecnologia, que não requisita muita especialização dos

funcionários.

18

18

Gráfico 7 - Evolução da média salarial na economia de serviços:

R$ 626,60

R$ 619,40

R$ 597,10R$ 602,40

Ano

Salário médio mensal

1998 1999 2000 2001

Fonte dos dados: IBGE, 2001; p.29.

Na obra de Kubota Estrutura dinâmica da economia de serviços (2006)

consta que os maiores gastos por trabalhador são verificados nos serviços auxiliares

financeiros e nas atividades de informática, que constituem serviços modernos; porém

em setores mais oligopolizados, como o serviço de telecomunicações não se situam

entre as atividades de maiores gastos com trabalhadores.

“As condições de realização de trabalho estão diretamente relacionadas às

características de mercado no setor de serviços.” (MEIRELLES, 2006-b; p.353). Logo

existem processos de trabalho menos complexos ou que envolvem baixo investimento.

Serviços com nível intermediário de produtividade, já outros com elevado índice de

produtividade do trabalho que buscam mão-de-obra com maior tempo de estudo.

A PAS de 2002, por sua vez, divulgou que as atividades de serviços pesquisadas

geraram uma receita operacional líquida de R$ 290,5 bilhões e com um total de 67.470

mil empresas e destas mais de 60% prestam serviços às famílias e às empresas, como é

possível verificar no gráfico 8. Com destaque para os serviços de informação, que

participaram com 31,6% do total deste faturamento (gráfico 10). O grupo serviços

prestados às empresas foi o maior gerador de postos de trabalho, representando 33,8%

do total, conforme se lê no gráfico 9. Também contribuiu com 19,4% da receita

operacional líquida e com 22,2% do número de empresas no total dos serviços não-

financeiros (gráfico 10). Esta pesquisa ainda acrescenta, o segmento das atividades de

19

19

correio, transporte e serviços auxiliares apresentou a segunda maior produtividade do

setor de serviços com mais de 29% do total (gráfico 10), e teve a segunda melhor

remuneração.

Gráfico 8 - Número de empresas (2002)

38,4%

22,2%5,4%

10,1%

5,2%

18,7%

Serviços prestados às familias

serviços prestados às empresas

serviços de informação

Transportes, serviços auxiliares de transportes e correios

Atividades imobiliárias e de aluguel de veículos, máquinas e equipamentos

Outros serviços

Fonte: IBGE, 2002; p. 25

Gráfico 9 – Pessoal ocupado (2002)

25,5%

33,8%6,3%

21,5%

3,4%

9,5%

Serviços prestados às familias

serviços prestados às empresas

serviços de informação

Transportes, serviços auxiliares de transportes e correios

Atividades imobiliárias e de aluguel de veículos, máquinas e equipamentos

Outros serviços

Fonte: IBGE, 2002; p. 25

Gráfico 10 – Receita dos setores (2002)

20

20

9,9%

19,4%

31,6%

29,3%

3,5%

6,3%

Serviços prestados às familias

serviços prestados às empresas

serviços de informação

Transportes, serviços auxiliares de transportes e correios

Atividades imobiliárias e de aluguel de veículos, máquinas e equipamentos

Outros serviços

Fonte: IBGE, 2002; p. 25

O relatório do BACEN de 2002 diz que os gastos de brasileiros com turismo no

exterior diminuíram 27,3%, enquanto os gastos de estrangeiros com turismo no país

aumentaram 14,1%, já que a depreciação do real se manteve desde 1998. Entretanto, o

consumo das atividades de turismo pelos estrangeiros ainda foi menor do que os gastos

do Brasil com turismo em territórios estrangeiros. O déficit do governo em turismo foi

de 195 milhões de dólares. Dos relatórios anuais do BACEN, o de 2002 foi o primeiro a

apresentar dados sobre receitas e despesas detalhados do ano de 2001 e 2002 sobre o

setor de turismo.

Tabela 1 - Gastos e receitas com turismo em 2001 e 2002

Discriminação 2001 2002 Turismo - 1 231 - 195

Receita 1 696 1 935Despesa 2 927 2 129Free shop 177 142

Cartões de crédito - 587 - 303Receita 1 064 998Despesa 1 651 1 301

Serviços Turísticos - 187 - 45Receita 72 73Despesa 259 118

US$ milhões Fonte: BACEN, 2002; p.153

A partir da leitura da tabela 1 infere-se que em cartões de crédito o Brasil

conseguiu superar as receitas em relação às despesas. Em análise sobre o turista

21

21

estrangeiro no Brasil a partir dos dados da tabela 1, ele não consta como um

consumidor gastador durante a sua estada. O único item com ganhos é do free shop, é

possível que o gasto também seja mais dos nacionais viajantes do que dos turistas de

outros países.

O relatório (BACEN, 2002) traz informações sobre as receitas líquidas com

serviços financeiros que somaram US$ 390 milhões, com aumento de 23% na receita,

porém resultado ainda inferior às despesas que foram de US$ 623 milhões. Isso

representa que a maioria dos serviços financeiros não são prestados por empresas

nacionais.

As despesas líquidas com serviços de computação e informação somaram US$

1,1 bilhão, mesmo patamar observado em 2001. As receitas alcançaram US$ 36

milhões, e as despesas, US$ 1,2 bilhão. A análise é que, o Brasil não tem empresas

nacionais expressivas nas atividades de computação e informação. No setor de

informação os empreendimentos fortes são do ramo das telecomunicações, que já

estavam privatizadas no ano de 2002.

Tabela 2 - Resultados sobre a economia de serviços no Brasil de 1998 à 1999:

Ano Número de empresas – mil

Receita Operacional Líquida – bilhões de R$ Pessoas ocupadas – mil

1998 650 193 5 2271999 650 208 5 4122000 600,7 228 5 8802001 630,5 251 6 2622002 945 290,5 6 856

Fonte: Pesquisa Anual de Serviços do IBGE dos anos: 1998 a 2002 5.

Os dados e informações contidas nos relatórios do BACEN de 2002 e na

pesquisa do IBGE referente ao ano de 2002 refletem a evolução crescente do setor de

serviços no Brasil. Percebe-se o aumento numérico e informações mais minuciosas nos

relatórios do Banco Central e nas pesquisas do IBGE a cada ano.5 A PAS de 1998 foi elaborada junto com a 1999, os dados foram agrupados na mesma pesquisa. Entretanto, a PAS de 2002 apresentou dados separados para o ano 1999, que foram reproduzidos nesta tabela. Receita Operacional Líquida: corresponde às receitas provenientes da prestação de serviços, da revenda de mercadorias, bem como outras receitas provenientes de atividades industriais, construção etc., deduzidas dos impostos incidentes sobre estas receitas (ISS,ICMS, IPI, PIS, COFINS), os impostos e contribuições recolhidos via Simples, caso a empresa tenha optado por esta forma de tributação, assim como as vendas canceladas, abatimentos e descontos incondicionais. É o critério usado pela Pesquisa Anual de Serviços do IBGE.

22

22

O setor de serviços tem números expressivos dentro da economia brasileira. É

responsável pela maioria dos empregos e está presente na produção de bens como

insumos de produção. Como mostra a tabela abaixo o setor praticamente manteve os

números significativos num período de tempo relativamente curto, cinco anos.

Tabela 3 - Participação anual da economia de serviços no PIB nacional:

Ano PIB anual em R$ milhões

PIB do setor de serviços em R$ milhões

Porcentagem dentro do PIB nacional

1998 914 188 511 102 55,9%1999 973 846 529 746 54,4%2000 1.101 255 574 755 52,1%2001 1.200 060 629 861 52,5%2002 1.321 490 709 875 53,7%

Fontes: Contas Nacionais do IBGE de 2003 e Relatório do Banco Central de 2002. Adaptação do original.

Os setores de informática e informação se sobressaíram em grande parte por

causa da entrada de empresas estrangeiras no país na produção de software e de

telecomunicações. Além dos dois ramos de atividade, os outros ocupam espaço no

número de empresas e empregos, como alimentação e serviços prestados às empresas,

porém não agregam conhecimentos tecnológicos, não representam uma cadeia

produtiva complexa e dinâmica na estrutura econômica do país. Logo não são fortes

contribuintes para a negociação multilateral de serviços, pois o Brasil pode temer ao

ofertá-los ao mercado externo ou liberaliza-los por serem frágeis na competição com

empresas estrangeiras. Todavia, há redes transnacionais de franquias que já

conquistaram os mercados menos desenvolvidos nas áreas de alimentação, hotéis,

serviços de limpeza, dentre outros e o acesso a estes mercados não necessariamente

provocou insucesso para o país receptor.

Outros dois segmentos que tem representatividade na economia são: construção

civil e turismo. Este último ainda é pouco incentivado ou conta com políticas públicas

pouco eficazes para incrementar as receitas do país com dólares e dinamizar mais as

várias atividades incorporadas ao turismo, como hotéis, restaurantes, agências de

viagem, profissionais de guia, locação de transportes. Isto é, o potencial para oferta ao

exterior ainda não é compatível com as exigências demandadas internacionalmente. O

Brasil pode incrementar para melhorar a sua economia de serviços e quando tratá-la nas

negociações internacionais, pensar numa estratégia nacional para serviços.

23

23

Foreign participation in services activities may be useful as a complement to the domestic provision of services, but accelerated and excessive liberalization of key sectors (...) under legally binding rules of an free trade agreement has the potential to disrupt or hinder the process of establishing a national strategy for services 6. (UNCTAD, 2007; p.61)

6 Tradução Livre: A participação estrangeira nas atividades de serviços pode ser útil como complemento ao fornecimento doméstico, mas a acelerada e excessiva liberalização de setores chaves (...) sob regras forçadas de um acordo de livre comércio têm o potencial de deturpar ou atrasar o processo de estabilização da estratégia nacional de serviços.

24

24

CAPÍTULO 2

2. O Gats e o Brasil nas Negociações da Rodada Uruguai

A palavra troca é a palavra fundamental para a compreensão inicial do comércio

internacional. Segundo Paul Krugman (2005), existem três categorias de trocas para os

diferentes atores do sistema econômico internacional, que são: trocas de produtos ou

serviços por produtos ou serviços, trocas de produtos ou serviços por ativos e trocas de

ativos por ativos. E todas essas trocas de produtos, serviços e ativos podem trazer

benefícios para todos os participantes envolvidos. Serviços, produtos e ativos (capital)

são temas de grandes negociações internacionais comerciais.

O comércio internacional é o instrumento comumente usado pelos países no

intuito de dinamizar as suas economias e que pode ser uma grande fonte de receita para

o país. Os Estados com o intuito de conquistar mais espaço para as suas empresas

nacionais e também disponibilizar o seu mercado para os investimentos externos,

podem achar oportunidades no comércio internacional. Para as firmas que produzem

serviços não é diferente, o comércio internacional também emerge como ferramenta

para a expansão.

Geralmente, uma indústria primeiro amadurece as vendas no seu mercado interno para depois, alçar mercados externos. Com uma firma de serviços pode ser diferente, especialmente as de serviços profissionais, o crescimento pode acontecer já globalmente, e às vezes, ela nem atende clientes no seu mercado doméstico, mas só clientes internacionais. (UNCTAD, 2001; p. 10)

A proposta do capítulo é contextualizar a economia brasileira de serviços no

cenário internacional. O acordo internacional que engloba o tema serviços é o Gats no

âmbito da OMC, que trata da comercialização de serviços no contexto internacional. O

objetivo é elucidar o entrave existente entre os membros do Gatt na Rodada Uruguai

(posteriormente OMC) e o processo de negociação para o lançamento do Gats. Após a

explicação sobre as divergências entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento,

as principais tomadas de decisão do Brasil serão analisadas.

25

25

Para iniciar a exposição proposta e complementar a análise será esclarecido o

que é o Gats, os artigos de destaque e os conceitos inseridos no seu texto que são os

princípios teóricos regentes das negociações.

2.1 – O que é o Gats:

O Gats é um dos acordos que compõem a estrutura legal da OMC, ele segue os

princípios dispostos no Gatt e no acordo constitutivo da organização. Dentre tais

princípios: cláusula da nação mais favorecida (NMF), tratamento nacional,

transparência, acesso a mercados, não restrição a pagamentos internacionais,

consolidação de compromissos de países individualmente e progressiva liberalização

através de negociações futuras.

O Gats surge em 1994 quando ao final da Rodada Uruguai, as negociações

convergiram para a criação do órgão multilateral responsável pelo regime internacional

do comércio: a OMC. Até a Rodada Uruguai, não havia um instrumento legal que

englobasse todos os setores de serviços. O que existia eram acordos, convenções ou

regras internacionais que versavam sobre sub-tema de serviços. O Gatt e suas sete

rodadas de negociação versavam sobre o comércio internacional de bens.

O Gats entra em vigor em 1995, ele se compõe de quatro elementos que são

articulados entre si. São eles: o Acordo multilateral propriamente dito ou Acordo

Quadro, os anexos, lista de compromissos específicos ou lista de compromisso de

liberalização e a lista de exceção à cláusula da nação mais favorecida. O Acordo

Quadro é composto por 29 artigos que constituem a base normativa universal do Gats.

Em princípio é um acordo neutro, não obriga nenhum Estado membro a liberalizar

qualquer setor de serviços. Até o artigo 28, os membros só se comprometem de fato

com a cláusula da nação mais favorecida delimitada no artigo 2 e com a cláusula da

transparência expressa no artigo 3. Ambos molduram de forma geral a postura nas

negociações do comércio de serviços, assim como se dá no comércio de bens.

O artigo 29 remete às negociações sobre cada tema concreto aos anexos do Gats,

que passam a ter força legal do próprio Acordo. Os Anexos versam sobre temas

especiais relacionados a condições particulares para alguns setores de serviços. Os

setores ditados pelos anexos são: anexo sobre isenções ao artigo 2 do Acordo Quadro;

anexo sobre movimentação de pessoas físicas prestadoras de serviços; anexo sobre

26

26

transportes aéreos; anexo sobre serviços financeiros; anexo sobre negociações em

transporte marítimo e anexo sobre telecomunicações.

A complexidade de conceituação é inerente ao assunto de serviços, o próprio

Gats não conceitua serviços, e sim, prefere referir-se no artigo 1 sobre definição e

alcance do serviço, ou seja, mensurar de alguma forma o comércio internacional de

serviços. De fato, mais alcance do que definição. No primeiro artigo, é estabelecido o

alcance dos serviços através dos modos de prestação. São quatro modos de prestação:

1. Do território de um membro ao território de qualquer outro membro;

2. No território de um membro aos consumidores de serviços de qualquer outro

membro;

3. Pelo prestador de serviços de um membro, por intermédio da presença

comercial, no território de qualquer outro membro;

4. Pelo prestador de serviços de um membro, por intermédio da presença de

pessoas naturais de um membro no território.

Marconini (2003) traduz simplificadamente os itens listados acima. Segundo ele,

o item um é o comércio transfronteiriço, a prestação que envolve o movimento do

próprio serviço entre os membros, como transportes e telecomunicações. O item

número dois é o consumo no exterior, aqui é o movimento de consumidores entre os

Estados membros, o exemplo mais claro é o turismo. O terceiro é a presença comercial,

o movimento neste caso é do capital ou da pessoa jurídica do país de origem para o país

de prestação, por exemplo, filiais de empresas que fornecem o seu serviço diretamente

no mercado receptor. Por fim, o quarto item é a presença de pessoas físicas; o

movimento de uma pessoa física prestadora de serviços, profissionais como arquitetos

ou consultores que vão de encontro ao seu cliente em algum mercado externo.

Também existem divisões temáticas criadas pelo Acordo para o tema serviços.

De acordo com a OMC pode-se separar em onze grupos principais o tema de serviços,

que são: negócios relacionados a empresas; comunicação; construção e serviços

relacionados a engenharia; distribuição; educação; meio ambiente; financeiro;

relacionado a saúde e serviços sociais; recreação, cultura e serviços de esportes; turismo

e demais áreas de viagens e transporte. Todos os setores citados são posteriormente

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subdividos em 160 sub-grupos. Dentro da OMC o Gats é administrado pelo Conselho

para o Comércio de Serviços.

O Gats pode ser visto como um meio de buscar a uniformização dos marcos regulatórios nacionais atinentes ao comércio internacional de serviços – principalmente nos países em desenvolvimento em direção a um ambiente desregulamentado e liberalizado. (VASCONCELOS, 2001; p. 17)

2. 2 - Rodada Uruguai:

O setor terciário sobressaiu-se no contexto político a partir do final década de

1950. No entanto, o debate não recebeu destaque para merecer um acordo de âmbito

multilateral exclusivo. Somente na Rodada Uruguai foi incluído um acordo exclusivo

para serviços na estrutura do Gatt, ao fim da Rodada (1994) surge a OMC e desde então

a questão de serviços é tratada no âmbito multilateral. Esta rodada de negociações

comerciais é caracterizada pelo debate entre os países desenvolvidos e os demais,

classificados como países em desenvolvimento. “Países em desenvolvimento se

opuseram desde o começo das tratativas à inclusão de serviços no âmbito do Gatt”

(MARCONINI, 2003; p.66).

A década de 1980 foi caracterizada pelo acirramento dos países no comércio

internacional. “Conflitos de interesses criaram mecanismos artificiais à margem das

regras de comércio estabelecidas dentro do Gatt.” (THORSTENSEN, 2001; p.26).

Acordos preferenciais de comércio eram acordados entre parceiros privilegiados, isso

distorcia o fluxo do comércio entre os Estados e o Gatt parecia se enfraquecer.

Para adentrar nas convergências e divergências inseridas nas negociações do

Gats entre os grupos de Estados é necessário conhecer as premissas originárias do Gats.

Durante a Rodada Tóquio (1973-1979) surge com a iniciativa norte-amerciana de

incluir o tema do comércio de serviços no âmbito do Gatt. Apoiada por demais países

desenvolvidos, que continuaram a reforçar o tema nas demais Rodadas.

Na verdade, a Rodada Tóquio iniciou a tendência para a reformulação do Gatt

na tentativa de inclusão de novos temas (serviços, efeitos comerciais de propriedade

intelectual e medidas de investimento, questões afetas a tecnologia). E diante da

proposta de novos temas, o embate entre os países desenvolvidos e os países em

desenvolvimento reacendeu. O primeiro grupo era favorável à reforma do Gatt e à

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adesão dos novos temas ao regime comercial enquanto que o outro lado defendia a

discussão dos temas tradicionais: agricultura, têxteis e acesso. (também é chamado de

backlog, o pacote dos temas tradicionais). Após a Rodada Tóquio, o período que

antecedeu a Rodada de negociação seguinte (1982-1985) foi marcado pelo acirramento

entre os dois conjuntos de países. Cada qual com os seus argumentos.

A introdução de serviços no programa do Gatt nos anos 80 não esteve isenta de controvérsia, e foi originalmente marcada pelo confronto norte-sul, com as nações desenvolvidas lideradas pelo EUA, sustentando o tema e as nações em desenvolvimento, lideradas por Brasil e Índia, contra o tema (BAHGWATI apud MARCHETTI, 2004; p.8 ).

A objeção por parte dos membros menos desenvolvidos era baseada no temor da

redução da importância dos temas que compunham o backlog diante de negociações

sobre novos temas. A oposição mais forte à inclusão de serviços na nova rodada de

negociações tinha origem no Grupo dos 10 7 (G-10), reunindo países em

desenvolvimento, no qual o Brasil desempenhou papel de liderança, juntamente com a

Índia. Os países em desenvolvimento alegavam desconhecimento técnico sobre o tema e

experiência limitada na negociação do mesmo.

A priori parecia provável que concessões na área de novos temas tendessem a resultar em prejuízo ao desenvolvimento da capacidade competitiva dos países em desenvolvimento, em vista da concentração das vantagens comparativas nos países desenvolvidos. As propostas iniciais também não incluíam os temas de maior interesse dos países em desenvolvimento tais como movimentos internacionais de mão-de-obra, acesso à tecnologia e regulação das atividades de empresas transnacionais. (ABREU, 1997; p.331)

O G-10 logo encontrou resistência, o Grupo dos 9, composto por países de

Associação do Livre Comércio, Austrália, Nova Zelândia e Canadá, firmaram sua

posição contrária na Declaração Ministerial de 1982 dos países contrários à

concretização do Acordo exclusivo ao setor de serviços.

Ainda na Rodada Tóquio, quando os Estados Unidos lograram a criação do

Trade Act de 1974, que traz em seu texto a primeira inclusão do comércio de serviço

nas negociações do Gatt, o tema tornou-se uma determinação norte-americana. Os EUA

7 O G-10 era formado por Argentina, Brasil, Cuba, Egito, Índia, Nicarágua, Nigéria, Peru, Tanzânia e Iugoslávia.

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e os países desenvolvidos sustentavam seus argumentos na postura de free riders

(caronas) sistematicamente assumida pelos países em desenvolvimento. Para minimizar

este problema os EUA e os demais queriam a reformulação do Gatt para rever a

cláusula da nação mais favorecida, para que esta revisão também alcançasse os temas

entrantes. Eles consideravam os países de economias mais fracas como caronas porque

tudo que era privilegiado entre os países ricos era automaticamente estendido aos

demais membros.

Os EUA não estavam sozinhos como precursores da inclusão do comércio de

serviços no fórum de negociações internacionais de comércio. A OCDE também

exerceu ampla influência nos preparatórios do Gats na Rodada Uruguai, pois, a

organização já trazia um arcabouço temático de serviços produzido internamente e cabe

ressaltar que a OCDE era constituída por países-membros desenvolvidos. “Por mais

competente que fosse, a OCDE por definição não podia estar patrocinando sob seus

auspícios a conformação de um acordo de participação universal” (MARCONINI,

2003; p.64). O QUAD, denominação para o grupo formado por EUA, União Européia,

Japão e Canadá, e foram defensores da elaboração do Gats. Possivelmente eles

marcaram presença nas produções realizadas pela OCDE sobre serviços.

O interesse do QUAD era avançar nas negociações sobre acesso a mercados,

porque tinham interesse na inclusão do setor de serviços no acordo final da Rodada.

“Em julho de 1993, os membros do QUAD negociaram com o G-7 8 uma forma de se

avançar na área de acesso a mercados.” (THORSTENSEN, 2001; p.39)

A Rodada Uruguai foi a primeira instância multilateral de comércio que de fato

contou com a participação dos países em desenvolvimento, e também a primeira que na

qual eles foram chamados para negociar o comércio de serviços. Os países em vias de

desenvolvimento, de fato não todos, formavam uma frente de oposição à inclusão do

setor de serviços nas negociações da Rodada Uruguai. Eles defendiam a entrada do

comércio agrícola e têxtil prioritariamente. Alguns países foram radicalmente opostos

como o Brasil e a Índia, que juntos lideraram um grupo de dez países em

desenvolvimento (G-10) discordantes do novo tema na negociação da Rodada. Eram

contrários porque prefeririam negociações em temas tradicionais como agricultura e

têxtil, que estavam praticamente excluídos das regras do Acordo Geral.

8 O G-7 era composto por: EUA, Canadá, Japão, Reino Unido, França, Alemanha e Itália.

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Como agravante que talvez não tenha tornado este G-10 um grupo maior, era a

novidade do tema. Para muitos países em desenvolvimento, serviços era um universo

completamente novo. Diferente das Rodadas de negociações anteriores com foco na

liberalização do comércio internacional já com regras estruturas, serviços era um tema

que demandava a criação de uma nova estrutura disciplinar. O desconhecimento tornou

os países em desenvolvimento e outros mais pobres, alvo para o discurso do QUAD,

que soube na Rodada Uruguai expor o tema de serviços como um futuro benefício para

todos os integrantes da OMC. Somado a isto, para desmontar o argumento dos países

relutantes ao Gats, os defensores esclareceram que não seria imposta nenhuma

obrigação de liberalização aos membros. “Commitments made to allow market access

were minimal and, when they were made, they did not go further of the status quo 9”

(MARCHETTI, 2004; p.9).

O Brasil e a Índia mantiveram uma liderança nas negociações por partilharem da

mesma visão sobre a importância dos temas agrícola e têxtil. Os dois, juntamente com

outros membros, formaram neste período o Grupo de Cairns, uma força conjunta em

prol do livre comércio agrícola. Eles, naquele momento das negociações da Rodada

Uruguai, não viam atrativos num acordo para a liberalização dos serviços. Como

mediador entre os dois grupos (QUAD e Cairns) havia a coligação liderado pela

Colômbia e Suíça, composto por vinte membros desenvolvidos e em desenvolvimento

(G-20) que incentivaram o debate no intuito de agregar à organização um acordo

específico para o setor terciário.

A Declaração de Punta del Este estabelecia que a Rodada teria duração de quaro

anos e terminaria na cidade de Bruxelas na Bélgica, porém perdurou por oito anos. De

fato a última reunião ministerial realizou-se na cidade. Entretanto, representou um

fracasso para o grupo dos países em desenvolvimento que buscavam um acordo para os

setores agrícola e têxtil. O resultado foi a elaboração de um Acordo Quadro, mesmo

incompleto, para o setor de serviços. Uma conquista para os EUA, União Européia e os

demais Estados da OCDE.

9 Tradução Livre: os acordos feitos para permitir o acesso a mercados foram mínimos, e quando eles os firmaram, eles não ultrapassaram o status quo vigente.

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Apesar do desacordo de opiniões sobre a inclusão do tema, sabe-se que o setor

de serviços tornou-se quesito importante tanto para os países desenvolvidos quanto para

os países em desenvolvimento. Afinal hoje quase nenhum produto está isento de algum

tipo de serviço na sua cadeia produtiva e, além disso, os próprios produtos advindos dos

serviços têm demanda internacional. São mercados monopolizados e há um

engajamento forte por parte dos diversos Estados no segmento de serviços, segundo

relata a própria OMC. Em vista disso os países em desenvolvimento podem e devem

atuar de maneira mais incisiva nas diversas áreas de serviços.

Não é difícil entender a composição heterogenia da OMC com grupos de

Estados com interesses divergentes, uma vez, cada membro logra patamar diferenciado

nos tabuleiros dos poderes: econômico, político e militar. Assim sendo, os países estão

em diferentes níveis de desenvolvimento, suas estruturas econômicas e a importância do

setor de serviços é relativo em cada um, assim como sua política econômica, monetária

e cambial são distintas. Celso Lafer (1998) diz que a OMC é uma das únicas instâncias

que efetivamente prevalece o multiporalismo, mas a organização é caracterizada pela

preponderância norte-americana. Um exemplo disso é o EUA buscou a aderência dos

demais países interessados na abertura comercial de serviços e concretizaram o Gats.

No entanto, a OMC que mesmo composta por Estado desenvolvidos, em

desenvolvimento e outros, confere aos membros voto de valor igual. Não há um sistema

de ponderação de votos como no FMI e no Banco Mundial. No Acordo de Marraqueche

da criação da OMC, o segundo parágrafo do artigo II traz o conceito do single

undertaking, que confere o empreendimento único de uma decisão para todos os

membros e assim reforça a argumentação e a barganha.

O sistema da votação exige o lastro do consenso; o que confere a todos o mesmo

poder no seu voto. Porém, os grupos estão divididos em blocos de interesse e assim

barganham o peso nas votações já que a soma dos votos de um grupo de interesse

grande, como a união do G-10 e do G-20, pode prevalecer no resultado sobre os outros

interesses. A negociação é complexa, já que a decisão final é partilhada, isto é, o single

undertaking. Este mecanismo representa uma justificativa plausível para a longa

duração das Rodadas de negociação na OMC. Neste assunto cabe agregar uma

explicação resumida sobre a lógica do objetivo do consenso encontrada na obra de

Celso Lafer que cita Albert O. Hirschman.

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Para fins de análise do papel do consenso na diplomacia econômica da OMC, é útil recorrer às categorias de saída, voz e lealdade para discutir como instituições respondem ao desafio da mudança. Saída expressa, metaforicamente, o potencial dos mecanismos de mercado para escolher entre alternativas – todas as maneiras de expressar insatisfação e descontentamento, quando a hipótese de retirada de uma instituição é viável. Voz representa o papel que desempenham os mecanismos de articulação política na promoção de pontos de vista à mudança e ajuste dentro da instituição. Finalmente, lealdade dependendo em grande parte de sua intensidade, determina a extensão da voz e estabelece os limites da saída. A lealdade em relação à OMC, trazida por um empreendimento único consensual negociado durante a Rodada Uruguai, exclui a possibilidade de saída e amplia a voz, mas condiciona seu funcionamento à reciprocidade de interesses abrangentes de todos na continuidade do trabalho da OMC. (LAFER, 1998; p.37)

Entretanto, nem tudo funciona com uma aplicabilidade distribuída a todos. O

Gats confere aos países sua ausência no acordo em determinados setores. Os Estados

elaboram suas listas de não-liberalização para certos setores de serviços. São chamadas

as listas de exceção às obrigações do artigo II, também conhecida como a lista de

exceções à cláusula da nação-mais-favorecida.

O grupo dos Estados em desenvolvimento é heterogêneo, abrangendo Estados

com diferenças exacerbadas entre si. Por isso, deve-se frisar que eles formam um grupo

dentro da OMC não porque partilham dos mesmos problemas internos, pelo contrário, o

que os une é o interesse comum no cenário externo: a não liberalização do comércio

internacional de serviços. A voz do grupo é maior dentro do conjunto OMC, a saída não

é a opção deles, por isso são leais aos seus interesses e buscam no consenso a ampliação

do seu coral de vozes nas Rodadas da OMC.

Although there is no denying their active participation, generally speaking developing countries have approached these negotiations with caution and defensively. They have submitted negotiating proposals and bilateral requests, have coordinated positions with each other, and have participated in multilateral discussions, but that activism is not necessarily synonymous with a vigorous stance in favour of liberalization that would manifest not only in the quest for further market access abroad but also in the (commitment to guarantee) the liberalization of their own domestic markets 10(MARCHETTI, Op. Cit; p. 16).

10 Tradução livre: Ainda que não negassem uma participação ativa, frequentemente, os países em desenvolvimento aproximaram seus discursos com cautela e defensivamente. Eles aproximaram os

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Como cada país angariará benefícios para as suas macro e micro-economia é

tarefa nacional. Como dito acima por Marchetti, os países em desenvolvimento também

sabem o que querem e executam uma estratégia de negociação. A razão para uma

postura defensiva dos países em desenvolvimento está atrelada ao baixo desempenho

interno do setor nesses Estados. Os países conquistam benesses para o seu setor de

serviços quando dispõem de regulamentos nacionais sobre investimentos e regras sobre

a participação dos prestadores de serviços estrangeiros na economia doméstica.

O esforço desprendido pelos países em desenvolvimento do G-10 não foi

suficiente para bloquear a criação do Gats. No entanto, conseguiram quebrar a

intolerância de outros membros quanto “a inclusão do tratamento nacional de

prestadores estrangeiros no texto relativo a serviços foi uma avanço significativo nas

negociações e importante concessão dos países em desenvolvimento mais relutantes.”

(ABREU, Op. Cit; pág. 334).

2. 3 – Os Compromissos Assumidos pelo Brasil:

O sistema de funcionamento sobre listas de compromissos de liberalização,

também chamada de lista de compromisso específico e a lista de exceções são os

instrumentos de averiguação para saber se ocorre ou não a liberalização dos serviços no

mercado mundial. Para estimar o valor do compromisso de liberalização do Brasil é

prudente examinar a sua lista de exceções (Lista 1, ver anexo) e a sua lista de

compromissos específicos (Lista 2, ver anexo).

Como pode se observar na lista 1 o Brasil optou pela inclusão dos serviços

audiovisuais, transportes terrestres e marítimos na regra de exceção à nação-mais-

favorecida. Na época da Rodada Uruguai muitos países tinham acordos bilaterais ou

plurilaterias que já cobriam algumas áreas de serviços, e assim discriminavam estas

áreas. O Brasil no item de transportes terrestres enumera os países aos quais se aplicam

a medida, já que com aqueles Estados o Brasil dispunha de um acordo sobre transporte

propósitos das negociações aos pedidos bilaterais, coordenaram posições entre eles e participaram da negociação multilateral, mas aquele ativismo não foi necessariamente sinônimo de postura favorável à liberalização que se manifestaria somente no acesso a mercado no exterior, mas também (o acordo de garantia) de liberalização dos seus próprios mercados domésticos.

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terrestre. Estes países foram privilegiados em relação aos demais, porque contavam com

a mesma cobertura de normas legais como as empresas nacionais.

As motivações colocadas pelo Brasil caracterizam a postura cautelosa na sua

tomada de decisão. Primeiro porque não são os setores mais competitivos, ao contrário,

eles não são capazes de enfrentar a concorrência estrangeira abertamente, mas não são

totalmente fracos. Assim o país optou por resguardá-los para atrair investimento

estrangeiro direto. Aumentar as vantagens competitivas deles através de acordos diretos

com os países que queiram cooperar na transferência de tecnologia e conhecimento para

estes setores.

O último caso dos transportes marítimos o Brasil não foi o único a poupar sua

frota nacional da concorrência externa. Porque é um setor estratégico como argumento

de defesa e segurança nacional. Os países alegam que para manter a vigilância via

marítima é importante o monitoramento das empresas de transporte de cargas,

principalmente estrangeiras. Neste caso de proteção nacional, a cabotagem é mais

restrita, porque ela é a navegação no interior do país. A cabotagem no Brasil é

permitida quando empresas estrangeiras são afretadas por empresas nacionais ou

quando existe um acordo sobre reciprocidade entre o Brasil e a nação de origem da

companhia estrangeira.

“No Brasil os principais setores de serviços nos quais existem restrições à

participação estrangeira são: assistência à saúde, navegação de cabotagem, jornalismo e

radiodifusão, TV a cabo, mineração e energia hidráulica e transporte rodoviário de

carga 11.”(MOREIRA, ALVES, KUBOTA, 2006; p.238). A restrição não implica em

proibição, mesmo diante das medidas impostas aos setores citados, é possível para as

firmas estrangeiras adentrar neste setores com seus investimentos.

11 Pelo que se refere ao Brasil no contexto do comércio internacional de serviços, existem restrições, entre outras: quanto à participação estrangeira na área de Assistência à Saúde, de acordo com o artigo 199, parágrafo 3°, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e o artigo 23 da Lei 8080/90; à Navegação de Cabotagem, de acordo com o artigo 178, parágrafo único, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e os artigos 1º e 2º do Decreto Lei 2784/40; às Empresas Jornalísticas e de Radiodifusão Sonora e de Sons e Imagens, de acordo com os artigos 12, parágrafo 1° e 222 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e o artigo 12, parágrafo 2º, inciso I do Decreto 70436; às Empresas de Serviço de TV a Cabo, segundo o artigo 7º, incisos I e II da Lei 8977; às Empresas de Mineração e Energia Hidráulica, de acordo com o artigo 176, parágrafo 1º, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988; às Empresas de Transportes Rodoviários de Carga, de acordo com os artigos 22, inciso VII e 178 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e o artigo 1º, incisos I a II e parágrafos 1º e 2º da Lei 6813/80.

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35

A lista de compromissos específicos do Brasil (Lista 2) é o instrumento legal

internacional que contem os comprometimentos brasileiros sobre liberalização do

comércio de serviços. A lista de compromisso específico contem as descrições

detalhadas, com relação ao grau de acesso a mercado e à aplicação do tratamento

nacional das políticas e da abertura dos subsetores da economia que cada membro se

dispõe a liberalizar.

Assim como os demais membros da OMC o Brasil apresentou a sua oferta na

área de serviços por meio da sua lista de compromissos específicos, que foi dividida em

duas partes: uma de compromissos horizontais e outra para os compromissos setoriais.

A primeira parte refere-se a medidas que tratam de aspectos regulatórios que se aplicam

a todos os setores de serviços; e a segunda reporta-se a setores determinados.

Na maioria das vezes a lista de compromissos horizontais diz respeito aos modos

de prestação três (presença comercial) e quatro (presença de pessoas físicas). Que são as

providências necessárias para a presença comercial e para mão-de-obra.

O sistema da lista horizontal é conhecido como Sistema de Listas Positivas ou

Oferta. Ou seja, tudo o que está na lista é negociável, tem vistas á maior liberalização.

O que não faz parte da lista subentende-se que o país-membro não queira liberalizar,

prontamente. A liberalização progressiva do setor de serviços deve ser realizada com a

expansão da lista de compromissos específicos. Nesta Lista de Compromissos

Horizontais a restrição escrita se aplica para todos os setores de serviços.

No primeiro tema (movimento de pessoas físicas) percebe-se a preocupação do

Brasil no modo quatro de prestação de serviço. Indica uma dose de proteção com a

mão-de-obra qualificada do país, quando ele trata da proporção numérica de

funcionários executivos dentro das corporações e quando ele estabelece a implantação

de nova tecnologia ou um investimento mínimo em capital como compensação por não

contratar nacionais executivos.

No assunto sobre presença comercial se expõe exatamente o seu próprio modo

de prestação, o Brasil demonstrou uma ressalva quanto à definição de pessoa jurídica. O

que o Brasil autoriza é a formação de joint venture. É um tipo comum de associação

entre empresas que tem por objetivo trocar conhecimento e experiências. O interesse na

adoção do Brasil pela joint venture é que ela atrai investimento externo direto para o

setor nacional de serviços. O Brasil optou por uma política comercial estratégica neste

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caso. Segundo Robert Gilpin (2002), a política comercial estratégica é articulada

quando o país consegue dentro desta economia mundial interdependente, composta por

empresas oligopolistícas e Estados competitivos, iniciar políticas destinadas a desviar os

lucros das empresas estrangeiras para as nacionais.

Cabe destacar da lista, o último item sobre subsídios. O Brasil que naquele

momento conseguiu tomar uma decisão política assertiva. Porque ao perceber que não

tinha políticas públicas voltadas para o incentivo do setor não se comprometeu com

nenhum modo de prestação para não limitar as ações futuras. Quando se assinala o setor

como não-consolidado indica que o membro nem se compromete a relatar qual é a real

situação regulatória do país. Por isso a não-consolidação pode esconder a real situação

regulatória, que pode ser restritiva ou liberalizante.

Diferente da lista 2 que cobre todos os setores; a Lista de Compromissos

Setoriais do Brasil abrange sete áreas das onze listadas pelo Gats. O quadro abaixo

mostra a incidência de compromissos específicos setoriais dos membros da OMC.

Quadro 2 - Compromissos setoriais – Brasil e o Mundo – Rodada UruguaiEm % de países por categoria

PD PEDTotal PD PED Tot

al1. Prestados às empresas 6. Meio AmbienteA. Profissionais 100 48 62 A. Tratamento de Esgoto 92 9 30B. Informática 100 44 59 B. Tratamento de Resíduos

Sólidos 96 9 32

C. Pesquisa e Desenvolvimento 88 19 38 C. Saneamento 92 6 29D. Imobiliários 92 4 24 D. Outros 96 8 29E. Aluguel/ Leasing 100 17 39 7. FinanceirosF. Outros 100 49 87 A. Seguros 100 61 722. Comunicações B. Bancários 100 48 62A. Postais 0 4 3 C. Outros 0 0 0B. Courier 16 19 21 8. SaúdeC. Telecomunicações 16 23 24 A. Hospitalares 56 18 27- Básicas 8 2 20 B. Outro relacionado á saúde

humana8 5 6

- Valor – adicionado 100 28 49 C. Sociais 52 1 13D. Audivisuais 8 14 12 9. TurismoE. Outros 24 0 11 A. Hotéis e Restaurantes 100 88 923. Construção B. Agências de Viagem 100 69 77A. Edifícios 96 28 46 C. Guias de Turismo 92 27 43B. Engenharia Civil 96 27 45 D. Outros 1 17 13C. Instalação e Montagem 96 25 43 10. Recreação, Culturais e

EsportesD. Conclusão e Acabamento 92 17 37 A. Entretenimento 68 21 32E. Outros 8 19 35 B. Agências de Notícias 88 0 214. Distribuição C. Bibliotecas, Arquivos e 16 4 7

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MuseusA. Agentes Comissionados 88 2 23 D. Esportes 84 21 36B. Atacado 100 10 35 E. Outros 4 1 2C. Varejo 96 9 31 11. TransportesD. Franchising 92 6 26 A. Marítimos 20 34 30E. Outros 8 0 2 B. Fluviais 8 2 75. Educação C. Aéreos 92 22 42A. Primária 72 6 25 D. Espaciais 8 0 2B. Secundária 76 6 26 E. Ferroviários 76 6 25C. Superior 72 5 24 F. Rodoviários 100 19 41D. Adultos 72 1 22 G. Gasodutos 12 1 5E. Outros 12 2 7 H. Auxiliares 84 20 35

I. Outros 56 8 19PD – países desenvolvidos; PED – países em desenvolvimento; Total – total de países participantes na Rodada do Uruguai. Fonte: The results of the Round of Multilateral Trade Negotiations, Market Acess in Goods and Services: Overview of the Results, Genebra, novembro de 1994. apud MARCONINI, 2003; p. 306.

Os itens sombreados são os setores e subsetores os quais o Brasil tem na sua lista

de compromissos específicos. Nos setores inscritos na Lista de Compromissos Setoriais

cada membro deve ajustar aos serviços e aos prestadores de serviços estrangeiros

tratamento não menos favorável do que é concedido aos seus próprios serviços ou

prestadores de serviços. Porém na realidade do comércio internacional de serviços nem

sempre as distorções são corrigidas pelos objetivos travados nos acordos comerciais.

A partir do quadro é possível fazer o mapeamento das negociações brasileira e

ao comparar com outros países as diferenças de concessões são perceptíveis. O Brasil

fez ofertas nos setores que os países desenvolvidos mais ofertaram. Apenas em quatro

subsetores compromissados pelo Brasil: courier, audiovisuais, outros – construção e

gasodutos os países desenvolvidos apresentaram oferta inferior a 20 % em cada item.

Isso indica que o Brasil seguiu a tendência dos seus maiores mercados consumidores.

No Quadro 2 nota-se que não somente o Brasil fez compromissos setoriais, há

adesões dos países em desenvolvimento em vários substores dos parceiros

desenvolvidos. Segundo Marchetti (2004) há duas razões para este posicionamento dos

menos desenvolvidos: primeiro pelas reformas de mercado feitas na década de 1990

realizadas por vários países em desenvolvimento e segundo, atração de investimentos

estrangeiros para as atividades de serviços.

Entretanto mesmo diante da vontade dos Estados menos desenvolvidos em

receber investimento estrangeiro, a maioria foi cautelosa em seus compromissos com se

lê nas porcentagens da tabela. Marchetti também reforça quando diz:

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It is clear that developing countries have refrained from making commitments on key infrastructure sectors (e.g. maritime transport, courier, and distribution services) and business services (e.g. computer and related services, and professional services). Interestingly, the extremely low number of commitments on professional services by developing countries may be an indication of the difficulties that these countries face in opening the supply of services through mode 4. 12 (MARCHETTI, 2004: p. 14)

2. 4 – Breve Análise Comparativa entre os Compromissos Assumidos pelo

Brasil e Outros Membros:

O Brasil diferente dos países em desenvolvimento assumiu compromissos em

serviços profissionais, distribuição, courier e profissionais. Foram compromissos em

áreas de interesse dos desenvolvidos o que indica o peso da reciprocidade e da

necessidade de mostrar sua parceria em áreas demandadas nas negociações. “O Brasil se

pautou mais por responder a demandas feitas por países da OCDE do que seguir o perfil

de ofertas feitas por países em desenvolvimento, [estes] evitaram mais que do Brasil

fazer ofertas em áreas delicadas.” (MARCONINI, Op. Cit; p.308). Isto ressalta que os

esforços tentados anteriormente à negociação da Rodada Uruguai não foram

continuados. Uma vez concretizado o acordo de serviços, os países em desenvolvimento

tiveram que optar pela via menos onerosa e serem coerentes com as decisões dos países

desenvolvidos. Afinal estes são os principais ofertadores e demandadores dos serviços

no comércio entre Estados.

Logo o Brasil tomou uma decisão prudente com a sua linha de atuação de

política externa comercial ao não romper com seus principais parceiros comerciais, que

são os países desenvolvidos. Dos 54 subsetores possíveis, o Brasil se comprometeu em

17, isto é 31,5%. Dentre os quais, apenas em três a incidência dos desenvolvidos é mais

baixa do que os PEDs: serviços de courier, audiovisuais e outros dentro do setor de

construção.

Nos serviços prestados às empresas, o país consolidou compromissos em quatro

serviços profissionais: contabilidade, arquitetura, engenharia e planejamento urbano. De

12 Tradução Livre: É claro que os países em desenvolvimento privaram-se de acordos em setores chaves de infra-estrutura (por exemplo: transporte marítimo, correio e distribuição) e serviços empresariais (por exemplo: informática e outros relacionados e serviços profissionais). De forma interessante, o número extremamente baixo de acordos firmados para serviços profissionais pelos países em desenvolvimento, pode ser uma indicação das dificuldades que estes países têm para fornecer serviços no modo 4.

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39

106 países ao final da Rodada, 66 incluíram compromissos em serviços profissionais.

Todos os 25 países desenvolvidos acrescentaram serviços profissionais, e apenas 48%

dos países em desenvolvimento fizeram o mesmo. (MARCONINI, Op. Cit.; p.239).

Claro que cada um escolheu profissões distintas e talvez áreas profissionais

consolidadas o suficiente para agüentar a concorrência externa.

Nos EUA, é autorizado exercer a contabilidade desde que se obtenha uma

licença para o estabelecimento de um escritório (em 13 estados) e um atestado de

residência (em 26 estados) referente ao Estado que o exige. No Japão, para presença

comercial é necessário uma habilitação, um tipo de registro profissional. Na União

Européia, as medidas restritivas variam de país para país. Nos mais liberais, uma

autorização pela realização de uma associação entre estrangeiro e nacional basta. Outros

são mais específicos em suas exigências, como a Itália, Dinamarca e França que cobram

nacionalidade e/ou cidadania nacional e residência para o exercício do serviço.

Comparando os três casos com o Brasil que exige presença comercial e residência dos

prestadores estrangeiros, o mercado brasileiro é o mais acessível.

Na arquitetura, a situação é mais rígida para ingressar no Brasil, que proíbe

atuação de pessoas físicas e/ou jurídicas independentes não consociadas com pessoas

nacionais. Nos EUA, somente o estado de Michigan determina que três terços dos

executivos, sócios ou diretores de uma empresa prestadora de serviços sejam registrados

na entidade estadual competente. Na União Européia, para este serviço há diferenças

entre os membros sobre a cobrança das restrições. Na Alemanha, a aplicação das regras

nacionais sobre taxas e honorários para prestação transfronteiriça. Em Portugal,

Espanha e Itália está permitido apenas a prestação por pessoas físicas. Eles não querem

que haja um compromisso de estabelecimento de empresa ou incorporações nos seus

países. No Japão, já é o contrário, a presença comercial é exigida, mas precisa-se retirar

a credencial nacional. Neste caso o Brasil segue uma linha restritiva assim como os

exemplos dos países citados.

Os compromissos nos serviços de engenharia e planejamento urbano nos EUA

são poucos. No Distrito de Columbia é preciso cidadania norte-americana e em outros

12 estados o requisito de residência. Não há implicações para o comércio

transfronteiriço, tanto de consumo no exterior ou por presença comercial no território

norte-americano. Dos membros da União Européia, a Alemanha cobra taxas e

40

40

honorários para serviços prestados desde um território estrangeiro para os serviços de

planejamento urbano e serviços paisagísticos. Portugal, Espanha e Itália mantêm a

restrição para arquitetura na engenharia, apenas a prestação por pessoas físicas é

permitida. Portugal e Itália acrescentam necessidade de residência. Pode até haver

associação com nacionais, porém sem que haja compromisso de incorporação de uma

sociedade anônima. Na Grécia a cidadania é obrigatória. No Japão os serviços de

engenharia e de engenharia integrada não sofrem barreiras quando são relacionados a

petróleo e seus derivados: gás e mineral. Aqui os países membros reportam suas

limitações de mercado e fatores de demanda no formato de seus compromissos. Já o

Brasil não consolidou nenhuma medida para os modos de prestação 1 e 2, nem para

acesso a mercados nem para tratamento nacional. O que desprotege as firmas nacionais

prestadoras deste tipo de serviço. Entretanto, o país buscou uma amenização ao

restringir a entrada de pessoas e/ou jurídicas não consorciadas com nacionais.

Além dos subsetores de serviços listados outros foram incluídos: publicidade,

pesquisa de opinião e mercado, consultoria de administração, serviços de limpeza de

edifícios, tradução e interpretação. Dos 106 participantes do Gats, sessenta e sete

incluíram diversos subsetores de serviços prestados às empresas em suas listas de

compromissos (MARCONINI, 2003; p.245)

Os principais parceiros comerciais do Brasil não ofereceram extensas limitações

ao setor publicitário. Eles são até liberais, sem que haja restrições para prestação de

serviços por prestadores estrangeiros em nenhum dos quatro modos, restando apenas as

usuais já listadas na lista de compromissos horizontais. O mesmo é aplicado aos

serviços de pesquisa de opinião e mercado e consultoria de administração, os parceiros

comerciais não ditaram medidas para qualquer modo de prestação. O Brasil também

segue a tendência liberalizante e não estabeleceu nenhum critério para os quatro modos,

apenas as medidas horizontais são válidas.

O Brasil, assim como os pares comerciais, não estabeleceu medidas restritivas

aos serviços de limpeza de edifícios por pessoas físicas e/ou jurídicas estrangeiras. Os

serviços de tradução e interpretação também não sofreram restrições para os modos de

prestação transfronteiriça e consumo no exterior. Apenas a União Européia apresenta

um caso particular. A Dinamarca exige cidadania e residência e regula o número de

profissionais no seu mercado.

41

41

No setor de comunicação o subsetor de courier ou correio: os EUA não incluem

no âmbito do serviço de correio aqueles que envolvem transporte aéreo anterior ou

posterior. Isso demonstra que a intenção é excluir serviços que possam ser trabalhados

em acordos bilaterais aéreos. Já a União Européia e o Japão nem tratam sobre o

subsetor porque não está presente em suas listas de compromissos específicos. No caso

brasileiro não houve imposições, apenas optou por não consolidar o modo 2 de

prestação.

Serviços de construção, a medida norte-americana que pode afetar a exportação

é a exigência do estado de Michigan que cobra das construtoras a manutenção de um

escritório. Na União Européia alguns casos concedem direito de execução exclusiva do

serviço de construção. Na Itália podem ser estradas e aeroportos e em Portugal estradas.

Na Grécia há imposição da nacionalidade para diretores e/ou gerentes das construtoras

prestadoras de serviços públicos. O Japão exclui qualquer tipo de medida restritiva ao

setor de construção. O Brasil na época da Rodada Uruguai estabeleceu compromissos a

respeito da presença comercial para o setor de construção, e após cinco anos da entrada

em vigor do Acordo, suprimir qualquer restrição ao modo 3 de prestação.

Já no serviço de turismo, os EUA apresentam limitações. Para agências de

turismo e operadores de passeios, há uma proibição de atuação na área comercial a

escritórios oficiais de turismo estrangeiros; para serviços de guia de turismo o número

de licenças é controlado. Na União Européia as restrições são diversificadas. Alguns

membros: Portugal, Espanha, Itália e Grécia realizam testes de necessidade econômica e

assim restringem autorizações de licença para estrangeiros que desejam se tornar guia

de turismo. Eles alegam que é uma proteção aos seus patrimônios históricos e artísticos.

O Brasil no único subsetor ofertado não impôs limitação quanto ao acesso a

mercado em presença comercial e para tratamento nacional determinou a prerrogativa

governamental de conceder incentivos para as regiões Norte e Nordeste.

Estes foram os temas mais relevantes para efeitos comparativos. As ações

brasileiras e dos seus parceiros foram continuadas após a finalização da Rodada

Uruguai em 1994. Porque alguns setores demandavam mais debate por tratarem de

setores sensíveis e importantes para os países, principalmente para os membros menos

desenvolvidos.

42

42

Assim as negociações pós-rodada continuaram de 1995 a 1997. Para concluir a

Rodada Uruguai em serviços sem que todas as negociações sobre compromissos de

liberalização fossem terminadas, os países acordaram em continuar negociando

compromissos de liberalização, em temas complexos: serviços financeiros,

telecomunicação básica, transportes marítimos e movimento de pessoas físicas.

Cada um dos assuntos tem um anexo dentro do Gats e são os temas em destaque

dentro da Rodada Doha. Em 2001, iniciou a Rodada Doha e pode estar a caminho do

seu desfecho, espera-se pelo encerramento este ano, entretanto pode perdurar até 2008.

Então o que se pode dizer sobre a Rodada Doha é que os dois temas não terminados na

Rodada Uruguai e que são sensíveis para os países continuam sem conclusão;

agricultura e serviços.

Ao longo da explanação deste capítulo percebe-se a sensibilidade do tema de

serviços nas negociações internacionais. Para o Brasil comparecer nas Rodadas Tóquio

e Uruguai como líder questionador, acompanhado pela Índia, lhe agregou valor como

ator da negociação. Aceitar negociar tornou-se positivo porque foi possível traçar ações

coerentes com a realidade da economia de serviços brasileira, que se fortaleceu com o

passar dos anos, como infere-se da exposição sobre as atividades econômicas de

serviços no período recente pós-Rodada Uruguai (1998-2002) explicada no capítulo

anterior. Os números mostraram o crescimento do setor, a sua participação dentro do

PIB nacional e o aumento do número de empresas e assim sendo de trabalhadores

empregados na economia de serviços.

O Gats pode ter sido um diferencial para o incremento da economia de serviços

brasileira. No próximo capítulo será analisado o resultado do Gats na economia

nacional, se houve ou não ampliação de entrada de investimentos estrangeiros nas

atividades de serviços e se o Brasil conseguiu expandir as suas exportações de serviços.

43

43

CAPÍTULO 3

3. Os avanços do Brasil no Comércio Internacional de Serviços

O comércio internacional torna-se cada vez mais importante para os Estados

porque a interconexão de mercados e suas interações têm implicações para o

ordenamento interno dos Estados. Uma destas implicações pode ser o aumento das

exportações dos setores mais capazes de competir em nível internacional de exigência.

O comércio é baseado em trocas e segundo Robert Gilpin (2002) a partir das

relações comerciais com outras vizinhanças é possível alcançar alguns resultados,

como: a difusão tecnológica, que contribui para a economia de todos os povos; um

efeito de demanda sobre a economia, o qual, pelo efeito multiplicador, estimula o

crescimento econômico e a eficiência geral da economia; vantagens individuais para as

firmas, já que o comércio aumenta as dimensões do mercado, promove economias de

escala e aumenta o retorno sobre o investimento, enquanto estimula o nível geral da

atividade econômica; ampliação da faixa de escolha dos consumidores e por último,

redução dos custos de insumos, tais como matéria-prima e componentes manufaturados,

que contribui para diminuir o custo total da produção.

3.1 – Os Efeitos das Relações Comercias Internacionais de Serviços para o Brasil:

Não é uma tarefa fácil para os países estabelecer seus critérios competitivos nas

transações internacionais de serviços com base apenas na teoria das vantagens

comparativas. Porque é difícil prever como ela se manifestaria, como fluxo de

comércio, de investimento ou trabalho. O progresso dos três fluxos acarreta

conseqüências como as listadas por Robert Gilpin (2002).

O investimento estrangeiro direto está direta ou indiretamente relacionado aos

outros dois tipos: fluxo de comércio e de trabalho, porque a sua repercussão econômica

é abrangente, o impulso iniciado pelo IED em certo núcleo propaga ondas de

crescimento em outros setores da economia. E o setor de serviços acaba por responder

positivamente aos investimentos aplicados em outras atividades. Entretanto, é melhor

para economia de serviços que o IED seja disponibilizado diretamente no setor, uma

vez que isto colabora para a expansão externa da produção nacional de serviços. O

44

44

Gats, ao estabelecer os quatro modos de prestação de serviços, pontuou o modo três

(presença comercial) como aquele destinado a atender os ativos de longo prazo. O

capital empregado no território de um membro para instalação de empresas prestadoras

de serviços tem, assim um item específico dentro do Acordo.

O Brasil foi flexível na sua Lista de Compromissos Horizontais quanto à

presença comercial. Ressalta-se também que o país estava aberto para fundação de joint

venture no terceiro setor. O gráfico a seguir mostra que o setor de serviços recebeu nos

últimos anos posteriores ao lançamento do Gats mais IED do que a indústria e a

agricultura. A questão do investimento estrangeiro direto insere-se na discussão sobre a

liberalização do comércio de serviços porque para viabilizar as transações conforme a

prestação ‘presença comercial’ do Gats, o IED é com freqüência necessário.

Gráfico 11 – Investimento estrangeiro direto no Brasil (2001-2005)

0,00

2.000,00

4.000,00

6.000,00

8.000,00

10.000,00

12.000,00

14.000,00

2001 2002 2003 2004 2005

US

$ (m

ilhõe

s)

Agricultura, pecuária e extrativa mineral Indústria Serviços

Fonte: BACEN – Investimento Estrangeiro Direto. Adaptação do original.

A primeira percepção que se tem do gráfico é que o setor de serviços só tem

número inferior à indústria somente no ano de 2004. Em todos os outros anos, mesmo

2003 que tem os menores dados para as três atividades econômicas, nota-se que

serviços superou a atração de investimento estrangeiro direto e nas tabelas do Banco

Central o mesmo acontece em 2006. Ou seja, a economia de serviços consegue exercer

maior atração ao capital estrangeiro do que os demais setores da economia.

45

45

Além do número expressivo para a economia de serviços, cabe observar que de

2001 até 2005 o aumento de investimento foi maior em serviços, apesar das quedas nos

anos de 2002 até 2004, em 2005 recupera-se com mais de 12 milhões. Enquanto isso a

indústria retraiu os capitais externos e a agricultura apenas manteve um crescimento

relativamente linear ao longo do período. Em 2005, a diferença entre serviços e

agricultura é 16% a mais para o terceiro setor e entre a indústria e serviços é de quase

50% a favor dos serviços.

Os dados sobre os IEDs acima, quando analisados em termos dos modos de

prestação do Gats, percebe-se que a ‘presença comercial’ prevalece na opção dos ativos

estrangeiros, já que a adesão brasileira em setores mais demandados pelos países

desenvolvidos foi freqüente. Das dezoito atividades compromissadas pelo Brasil, em

sete a participação dos países ricos é de 100%.

Segundo Mário Marconini (2003), essa atração também se deve pela falta de

sintonia entre a regulamentação de alguns setores e a aplicação dada às normas relativas

à entrada de prestadores estrangeiros. Ele diz que o caso mais visível é do setor

financeiro que, mesmo sendo consolidado pelo Gats 13, reflete um nível de restrição

que não condiz com a realidade de mercado existente no Brasil. Na área bancária, as

instituições estrangeiras têm tido cada vez mais espaço de penetração no mercado

brasileiro. Isso tanto nas privatizações quanto na aquisição de entidades financeiras.

Duas formas de abertura para a presença comercial de estrangeiros foram

praticadas com mais freqüência no Brasil: a privatização e a concessão. A primeira foi

intensa nos anos 1990, na quebra dos monopólios na prestação de serviços públicos, o

exemplo mais lembrado é o das telecomunicações. A concessão, como se deu com a

distribuição de gás e também de energia elétrica, é outra maneira que os prestadores de

fora têm de acesso ao mercado brasileiro de serviços.

No Brasil, uma série de empresas prestadoras de serviços de outras

nacionalidades vem investindo no mercado interno, segundo Anita Kon (2004), com

maior intensidade a partir da metade dos anos 1990, principalmente por meio de

franquias, em setores como: serviços de limpeza, oficinas mecânicas, cabeleireiros,

lavanderias, locação de veículos, redes de fast food, serviços hospitalares e

equipamentos em domicílio, dentre outros. 13 Não é o objetivo deste trabalho apresentar os acordos setoriais tidos como os anexos do Gats. Existem acordos separados para cinco áreas e uma delas é o setor financeiro.

46

46

O Brasil segue a corrente dos investidores estrangeiros no país e também investe

mais em serviços do que na indústria ou na agricultura nos mercados externos, como

consta na tabela abaixo. A análise sobre os investimentos do Brasil no exterior são

registradas pelo Banco Central através da declaração de capitais brasileiros no exterior.

Os outros mecanismos nacionais de registro, o balanço de pagamentos por exemplo,

não dispõe de dados de movimentos de capitais de longo prazo desagregados por

setores. O valor das transações envolvendo capitais brasileiros serve, então, para dar

uma idéia da importância da presença comercial na inserção brasileira no mercado

mundial.

Tabela 4 - Investimento direto do Brasil no exterior por atividade receptora2001 2002 2003 2004 2005 Total

Total de todas as atividades 42.584 43.397 44.769 54.027 65.418

1. Serviços prestados às empresas 14.306 13.945 17.811 20.013 23.639 89.714

2. Intermediação financeira 13.171 15.083 13.856 15.137 17.234 74.481

3. Atividades auxiliares de intermediação financeira, seguros e previdência complementar

7.536 8.469 8.477 12.887 14.898 52.267

4. Comércio por atacado e representantes comerciais e agentes de comércio

1.724 1.806 1.868 2.235 2.871 10.504

5. Extração de petróleo e serviços relacionados 1.556 78 182 566 2.808 5.190

6. Fabricação de produtos de metal – exceto máquinas e equipamentos

118 145 152 468 478 4.540

7. Construção 1.229 1.504 695 544 568 1.3618. Fabricação de produtos alimentícios e bebidas 119 129 209 211 512 1.180

9. Fabricação de artigos de borracha e plástico 52 548 143 186 236 1.165

10. Transporte Aquaviario 164 162 117 151 170 764

Em US$ milhões. Fonte: BACEN – Capitais Brasileiros no Exterior. Adaptação do original. O critério para investimento direto adotado pela fonte foi o superior a 10%. Foram selecionadas as 10 atividades que apresentaram os maiores resultados na somatória dos anos.

47

47

O Brasil aumentou seus investimentos no exterior no setor de serviços com o

passar do tempo, como se observa na tabela 4. Cabe destacar que a separação por

segmento de atividade dos investimentos brasileiros diretos iniciou-se em 2001, antes

não era possível uma análise mais precisa porque os dados eram agrupados na balança

de pagamentos. Em 2001, o Banco Central iniciou o cálculo das remessas de capitais

brasileiros diretos. Logo, os dados da balança de pagamentos eram subestimados para o

setor de serviços por não captarem modos importantes de oferta, cobrindo apenas as

transações entre residentes e não-residentes. Assim, nota-se que, após a evidência do

tema de serviços no cenário econômico mundial, o Brasil passa a se preocupar com a

sua participação neste tipo de comércio.

Pela tabela 4, infere-se que os serviços prestados às empresas recebem muito

investimento. Segundo o IBGE, estes serviços são os serviços de investigação,

vigilância e segurança; serviços de limpeza em prédios e domicílios; seleção e locação

de mão-de-obra e serviços técnico-profissionais. Sobre serviços prestados às empresas

no Gats, os países desenvolvidos aderiram plenamente em quatro das seis categorias. O

Brasil marcou os subgrupos ‘profissionais’ e ‘outros’. É possível compreender a

intensidade de dinheiro brasileiro no exterior porque é o mercado mais acessível para a

exportação. Dos onze grupos de serviços do Gats, o grupo de serviços prestados às

empresas é tido como o mercado mais aberto à entrada estrangeira nos países

desenvolvidos. É o setor com mercado mais acessível, a participação dos países ricos

ultrapassa 95% 14 considerando os onze grupos.

Outro fator significativo para o envio massivo de IED neste setor é a forte

presença de empresas estrangeiras nas atividades de serviços prestados às empresas.

“Entre as empresas de capital estrangeiro, as representativas do setor de serviços

auxiliares às empresas concentrava-se relativamente de forma mais intensa,

participando com 30% em 1998 e aumentando para mais da metade em 2002” (KON,

2006; p. 159). Isso foi impulsionado pelo próprio governo brasileiro que adotou

algumas medidas destinadas a atrair IEDs 15. O Banco Central do Brasil simplificou o

14 Cálculo efetuado a partir dos números presentes na Lista 2 - Compromissos setoriais – Brasil e o Mundo – Rodada Uruguai no capítulo dois.15 Em 2002 foi instituído o Investe Brasil – um órgão destinado a promover os investimentos – que instituía a parceria entre o governo federal e as instituições empresariais setoriais, cuidando da promoção de investimentos e não da promoção de exportações. Foi montada uma rede instiuiçoes governamentais para fornecer informações sobre as oportunidades de investimento, sobre a regulação, os incentivos e outros fatores relevantes para as decisões de investimentos das empresas estrangeiras no

48

48

processo de registro requerido para a entrada de IED, reduzindo custos administrativos,

e o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) criou um sistema

para a promoção de investimentos e de transferência de tecnologia. (BACEN, 2001).

Tais medidas também fortaleceram a entrada de firmas estrangeiras em outros

segmentos, como as atividades financeiras. Os itens dois e três da tabela 4 também

apresentam quantias monetárias chamativas. A soma dos três primeiros é quase nove

vezes a mais do que o somatório dos outro sete segmentos de atividade. Nas atividades

pesquisadas pela PAS, o setor para ‘outras atividades’ ou ‘outros serviços’ reúne as

atividades de serviços auxiliares financeiros; representantes comerciais e agentes do

comércio; dentre outros serviços. No Gats, o grupo de serviços financeiros abrange

serviços de seguro, bancários e outros. Tanto serviços de seguros quanto os serviços

bancários tiveram adesão completa pelos países desenvolvidos na Rodada Uruguai e o

Brasil também assinalou compromissos com os dois subsetores.

Entretanto, o tema de serviços financeiros teve sua negociação adiada para 1997

em virtude da sensibilidade do assunto para vários países. Eles postergaram as

negociações para aperfeiçoar suas listas de oferta. Os países desenvolvidos apresentam

fortes instituições bancárias, financeiras e não-financeiras, que têm vantagem

competitiva no mercado internacional porque são consolidadas e cresceram em

economias mais dinâmicas do que as dos países pobres. Por isso puderam flexibilizar

suas listas de compromissos no setor financeiro e ainda aceitaram adiar a negociação,

afinal estavam ávidos a conquistar os mercados emergentes e menos ricos do globo.

O Brasil, apesar de não pertencer ao ranking dos países ricos, tem uma

economia razoável no mundo, que consegue se classificar entre as quinze principais do

cenário econômico mundial. O sistema bancário brasileiro e as firmas que trabalham

com serviços financeiros são capazes de participar do comércio internacional de

serviços, e elas já investem no mercado externo. Claro que parte do que é enviado ao

exterior está atrelado às empresas estrangeiras de serviços financeiros que entraram no

país por meio de fusão e/ou aquisição. Elas foram beneficiadas pela “renovação do

marco regulatório pelo governo que afetou os serviços que foram abertos aos

investimentos privados” (KON, 2006; p.150).

Brasil.

49

49

Segundo a pesquisa realizada pelo IPEA (KON, 2006) sobre as empresas de

capital estrangeiro e de capital nacional no país no setor de serviços, as que receberam

mais IED de 1995 e 2000, foram: serviços prestados às empresas; correios e

telecomunicação; intermediação financeira, seguros e previdência privada; e comércio

por atacado e intermediários do comércio.

Das quatro, três coincidem com os quatro ramos de negócios que mais recebem

investimento brasileiro direto, porque muitas dessas empresas são resultados de fusões

com empresas estrangeiras prestadoras de serviços e tornaram-se empreendimentos de

capital misto. Logo, o Brasil avançou com Gats porque ao liberalizar certos setores da

economia de serviços recebeu investimentos e posteriormente, estas firmas passaram a

re-investir no mundo seu capital.

Sobre o segmento ‘profissionais’, os países exigem do Brasil mais clareza na sua

regulamentação de atuação dos profissionais estrangeiros no país. Isto é, querem mais

liberalização para acessar o mercado profissional do Brasil. O Brasil é pressionado,

assim como outros países em desenvolvimento, a liberalizar cada vez mais os setores

das atividades profissionais.

Vale salientar que em alguns desses setores o Brasil poderia ter uma postura mais agressiva nas negociações, dada a competitividade de nossos profissionais. Para isso, no entanto, é necessário regulamentar aspectos negligenciados da atuação de profissionais estrangeiros no Brasil o quanto antes para que se possa definir com maior exatidão a fronteira entre nossas possíveis demandas e ofertas. (MARCONINI, 2003; p.324)

Na prática, o mercado do Brasil já está aberto para a presença estrangeira em

muitos ramos de atividade porque não existe regulamentação sobre a prestação de

serviços por pessoas físicas ou jurídicas estrangeiras. Por exemplo, em atividades de

informática ou serviços de pesquisa e desenvolvimento não há disposições consolidadas

sobre a atuação de profissionais ou firmas estrangeiras. O que se tem são as diretrizes

conhecidas na lista de compromissos horizontais relativas ao movimento de pessoas

físicas e investimentos. Porém, nada capaz de proibir a entrada estrangeira ou exigir

algum tipo de troca benéfica para o desenvolvimento do país.

Segundo o livro do Ipea sobre a estrutura e dinâmica do setor de serviços no

Brasil publicado em 2006, observou-se que no período de 1998 a 2002 o total do

50

50

número de empresas de serviços de capital nacional teve crescimento anual de 11,8%,

esta taxa para as estrangeiras foi na ordem dos 50%. Ou seja, intensa entrada de

investimento estrangeiro direto no setor de serviço e o crescimento das firmas

doméstica aquém das estrangeiras.

Segundo relatório da Unctad (2003), ainda existe muito espaço para a entrada de

IED em serviços no Brasil. Como salienta a própria organização, o crescimento de

novas indústrias de serviços é decorrente do processo de desenvolvimento.

Como grande parte dos serviços não é estocável ou possível de comercialização externa, sendo consumida no próprio local em que é produzida, os IEDs são meios dominantes de seu fornecimento em mercados externos aos que geraram o excedente de capital. Outro fator que vem contribuindo para o crescimento do setor de serviços é o fato de que as manufaturas estão estabelecendo filiais de serviços, para apoiar suas operações de comércio exterior e outras. A expansão também se deve pelo rápido desenvolvimento da tecnologia das redes internacionais de informação e tecnologia. (KON, 2006; p. 189).

A competição entre empresas e entre Estados não é mais instigada pelos

produtos que ofertam, mas sim pela tecnologia dos seus processos produtivos. Quanto

mais uma companhia usa de um serviço eficiente na sua cadeia produtiva, mais o seu

produto final está apto a concorrer no mercado internacional. Com o Estado, como ator

do comércio internacional, não é diferente. Ele precisa se estruturar, porque o processo

da globalização econômica exige cada vez mais a aceleração do progresso tecnológico.

Segundo Kon (2004), grande parte da internacionalização das atividades é influenciada

pelas políticas públicas internas compatíveis com os requisitos do aumento do fluxo

entre os países.

The present globalization of the world is due in large part to the internationalization of services sector. Although often invisible to policy makers, services play a vital role in facilitating all aspects of economic activity. Increasingly even in the production of goods, the major proportion of value added (up 70%) comes from services inputs: upstream (such as feasibility studies, and research and development activities); onstream (such as accounting, engineering and administrative services); and downstream (such as advertising, warehousing and distribution) 16. (UNCTAD, 2001; p.3)

16 Tradução livre: A presente globalização do mundo é responsável por aumentar a internacionalização do setor de serviços. Ainda que invisível para os formuladores de políticas, serviços desempenham papel facilitador em todos aspectos da atividade econômica. Crescente até na produção de bens, a maior parcela do valor agregado (mais de 70%) vem dos insumos de serviços: pré-produção (como praticabilidade, estudos, pesquisa e desenvolvimento); durante a produção (como contabilidade,

51

51

O fenômeno da globalização gerou transformações econômicas que tiveram

como resultado indireto a crescente participação dos serviços com as cadeias produtivas

das mercadorias. Assim, os processos produtivos dos bens passaram a necessitar mais

dos serviços. No plano internacional, o que se podê perceber com a tendência da

globalização econômica foi um reforço das políticas liberalizantes.

O Gats cumpriu o seu papel nesse sentido ao moldar os obstáculos de regulamentação

da atividade de serviços em prol do fluxo do comércio internacional de serviços. O que

estimula o crescimento das trocas no comércio exterior de serviços.

No caso do Brasil, apesar de aumentar o fluxo do comércio, as exportações de

serviços ainda não superaram as importações. A balança comercial de serviços

brasileira é deficitária, entretanto percebe-se que um aumento significativo das

exportações, principalmente após 1997. De fato, este aumento não foi resultado direto

do Gats, ele impulsionou outras medidas, que foram as adaptações nacionais para que

os países emergentes estivessem aptos a receber mais investimentos, mais tecnologia,

entrada de corporações multinacionais e também dos profissionais estrangeiros.

Mesmo com a crescente das exportações de serviços, como é possível se inferir

do gráfico e da tabela a seguir, elas não superam as importações no Brasil. Mas como

serviços são insumos necessários para as demais atividades econômicas, não havendo

produção interna suficiente, é preciso importar.

Assim, o Brasil acaba por comprar muito mais dos prestadores estrangeiros do

que dos nacionais. E para ser competitivo no mercado internacional, exportadores de

serviços e mercadorias são fortemente dependentes dos insumos dos serviços do

exterior a menos que a produção local de serviços seja de qualidade e suficiente.

Gráfico 12 – Balança comercial de serviços do Brasil (1999-2003)

engenharia e serviços administrativos) e pós – produção (como propaganda, armazenagem e distribuição).

52

52

1999 2000 2001 2002 2003

25.617 29.847

38.82743.496

48.452

12.728 15.732 19.947 25.30129.153

Ano, valor em milhões de R$

Exportação Importação

Fonte: IBGE – Sistema de Contas Nacionais do Brasil/ Elaboração própria

Tanto os números do gráfico quanto da tabela 5 (ver anexo) mostram que o

Brasil também aumentou suas importações de serviços, houve um salto após 1994, ano

de conclusão do Gats. Os países ricos aguardavam uma regulamentação multilateral

mínima entre os Estados para ingressar nos mercados menos dinâmicos que eram

propícios a prestação de serviços avançados e de qualidade. Caso do Brasil que até o

qüinqüênio dos anos 1990 não contava com uma economia de serviços diversificada e

pródiga.

A abertura para o mundo em serviços apresenta risco de enfraquecimento para

as empresas nacionais prestadoras de serviços. No entanto, isso depende de como o

Brasil conduz a sua abertura. Ele preferiu instigar a importação e também a entrada de

investimento direto. “Como serviços são intensivos em conhecimento e capital humano,

a abertura do mercado certamente maximizará ganhos (...) que permitam às empresas

nacionais ter acesso a redes de informação e infra-estrutura internacionais”

(MARCONINI, 2003; p.330). Os benefícios agregados à abertura e as trocas comerciais

são aqueles da cooperação de conhecimento e tecnologia. Ao importar, promove-se o

estímulo geral da atividade econômica e ampliam-se as opções de escolha dos

consumidores, além de instigar a concorrência entre as empresas já presentes no Brasil,

tanto as firmas estrangeiras quanto as domésticas.

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Entretanto é interessante notar que, embora exista uma tendência esperada de os países em desenvolvimento importarem um montante maior de serviços do que exportarem, para a maior parte das economias avançadas, com exceção das da América do Norte, a parcela de importações de serviços também é superior à das exportações, confirmando a interdependência dos mercados globais. (KON, 2004; p. 191)

A colocação de Kon estimula a reflexão de que a inserção do país no fluxo do

comércio internacional de serviços é possível. Apesar da preponderância das economias

avançadas como Estados Unidos, União Européia e Japão que são os maiores

fornecedores e importadores de serviços, há espaço para os países em desenvolvimento.

Eles podem optar por desenvolver alguns setores e desenvolver vantagens comparativas

em determinados segmentos.

Segundo a Unctad (2001), a exportação de serviços já acontece pelas firmas

presentes nos países em desenvolvimento, e a participação das exportações de serviços

dos Estados em desenvolvimento vem aumentando rapidamente nos últimos anos. A

exportação de serviços traz vantagens econômicas para o país em desenvolvimento,

como obtenção de divisas.

Mais vantagem ainda é, a criação de novos empregos, pois as firmas prestadoras

de serviços não precisam de muito investimento. Às vezes, um grupo de cinco pessoas

desenvolve um serviço de qualidade que pode ser exportado. Ou seja, há uma facilidade

para a criação de pequenas e médias empresas. Além disso, é uma característica dos

serviços o uso intensivo de recursos humanos, pois eles representam o fator produtivo

dominante no processo de prestação de serviço. O que para o caso brasileiro é

excelente, pois são grandes responsáveis pela geração de emprego no país. Além disso,

as indústrias de serviços não são geralmente, muito poluentes como indústrias de

produção de bens.

Outro destaque para a exportação dos serviços é que o seu plano de exportação

não está preso a quantidade demográfica da demanda e nem as estatísticas de consumo,

o produtor de serviços preocupa-se com as necessidades e com a orientação da sua rede

de comunicação.

Em suma, segundo Marconini (2003), sendo ou não sendo desejável ou possível

pelo Brasil reverter os déficits, a questão é como fazer o melhor uso possível das

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negociações do Gats, ao mesmo tempo em que se preserve outras políticas relevantes

para o desenvolvimento nacional.

3.2 – Exemplos Brasileiros que já Conquistaram Espaço no Mercado

Mundial de Serviços:

Serviço foi definido como a realização de trabalho que gera valor e riqueza para

a economia. Porém a comercialização deste trabalho entre os Estados é complexo para

se mensurar, por isso o critério para as transações internacionais de serviços são aquelas

estabelecidas pelo Gats. Logo, “um serviço é comercializado quando o fornecedor e o

cliente são de países diferentes, independente da localização da transação” (MOREIRA,

2006; p.233).

Como citado anteriormente, serviço é fator importante para a produção de

manufaturas, assim sendo o comércio de serviço tem implicação para os países em

desenvolvimento, já que em sua maioria são exportadores de mercadorias. “A perda de

competitividade na produção de bens pode afetar a demanda e o tipo de serviços

necessários para uma economia dinâmica.” (Ibidem, p.236). Logo, é possível traçar

uma relação de mutualismo entre serviços e bens, pois tiram proveito um do outro e

ambos afetam a capacidade produtiva do país. A economia de serviços dinamizada pode

induzir o restante da economia. “Uma série de países menos avançados vem

desenvolvendo indústria de serviços para capitalizar vantagens comparativas, como por

exemplo, na área de turismo, ou por outros serviços de infra-estrutura ou financeiros.”

(KON, 2004; p.189).

No caso da construção, o Brasil tem empresas nacionais que já empreenderam

grandes projetos no exterior. Entretanto a participação brasileira é baixa em comparação

com os países que lideram este segmento, que são Estados Unidos, França e Inglaterra.

Mesmo com empresas capacitadas no serviço de construção, ainda são poucas as que de

fato atuam no mercado internacional do setor.

O setor de construção civil no Brasil é extremamente concentrado em termos de volume de capital. Assim, o segmento de construção pesada, por exemplo, inclui alguns dos maiores grupos empresariais do país, como, por exemplo, Camargo Corrêa, Norberto Odebrecht, CR Almeida e Andrade Gutierrez. Esse fato faz com que exista, tanto domesticamente como no plano internacional, um oligopólio com

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alguma capacidade de ditar preços no segmento de grandes obras. (MDIC, 2002-a)

Dentre as dez maiores empresas brasileiras 17 que exportam serviços de

engenharia e construção civil, as duas de destaque são Andrade Gutierrez e Odebrecht.

Das 52 inclusões de empresas brasileiras na lista das 200 maiores empresas da

Engineering News Record , 32 menções (ou 61,5%) se referiam às duas empresas. As

empresas brasileiras apresentam outra característica interessante, são mais atuantes na

América Latina e África. Os contratos de execução do serviço de engenharia e projetos

de construção por estas empresas são mais constantes com outros países em

desenvolvimento (segundo o relatório do MDIC – Oportunidades Internacionais para o

Setor de Construção Civil Brasileiro de 2002 - 86% dos contratos de projetos de

engenharia e obras das empresas brasileiras são feito com países em desenvolvimento)

Diante desta relação preferencial entre países em desenvolvimento na área da

construção civil, pode-se auferir que o Gats não foi o responsável pela preferência das

empresas nacionais pelos países em vias de desenvolvimento. As companhias brasileiras

são convocadas para obras de infra-estrutura, conhecimento já desenvolvido pelas

próprias firmas de engenharia no Brasil ao longo de anos, que ao demandar grandes

obras conseguiu aperfeiçoar o know-how das empresas domésticas provedoras deste

serviço. Outra questão é o tipo de demanda dos países desenvolvidos, eles já têm seus

campos de infra-estrutura consolidados. Logo não necessitam intensamente de obras

para estradas, portos, obras de saneamento básico, grandes obras para geração de

energia e etc, porque os executaram em momentos anteriores. A demanda deles é por

obras que exigem mais tecnologia como transportes de alta potência, prédios comerciais

altamente tecnológicos e grandes complexos de entretenimento.

Percebe-se na Lista 2 (capítulo 2) que o Brasil fez compromissos no Gats para

os subsetores de edifícios, engenharia civil e instalação e montagem, porém não se

comprometeu com conclusão e acabamento. Item no qual a percentagem de

participação dos países em desenvolvimento é de 17% contra 92% dos países

desenvolvidos 18. A vantagem comparativa das firmas brasileiras de construção não está 17 Os nomes das empresas e a fonte da classificação são de acordo com Engineering News Record – “The Top 200 International Design Firms”. In FÓRUM DE COMPETITIVIDADE. Subsídios para uma Política de Exportação de Serviços de Engenharia. (MDIC, 2002-a).18 Vale ressaltar que dos cinco subsetores do setor de construção do Gats a menor percentagem de adesão encontra-se no item de conclusão e acabamento. Dado presente na Lista 2 - Compromissos

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nos serviços de acabamento e conclusão. Outro fator que soma para frear a entrada das

empresas brasileiras nos mercados desenvolvidos é a barreira não-tarifária. No Gats não

foram criados mecanismos a fim de derrubar as barreiras não-tarifárias, que no caso da

construção são: padrões técnicos, questões de meio ambiente, registro profissional,

proteção da segurança nacional e ainda existem países que apenas aceitam obras

realizadas por empresas nacionais.

Outro setor que merece destaque é a produção de software. Um segmento

também presente na pesquisa anual de serviços no setor de informações na atividade de

informática 19. O surgimento do Gats foi de encontro com o ápice da Tecnologia da

Informação. A área de TI conquistou o mundo na década de 90 e precisava-se

regulamentar o seu modo de venda e compra no mercado global, assim o Gats também

regulamenta a prestação de serviços de TI 20. O Brasil não incluiu o setor de informática

na sua Lista de Compromissos Específicos na Rodada Uruguai e nem aderiu ao Acordo

de Tecnologia da Informação (ITA) em 1996.

O estudo do MIDC (2002-b) relata que não se sabe o número exato de empresas

brasileiras exportadoras de serviços do setor de informática. Porque muitas empresas

internacionais utilizam o Brasil e outros grandes centros produtores para a confecção de

etapas do produto final, sendo exportado muitas vezes das matrizes dessas empresas, ou

comercializado no mercado interno do país hospedeiro. Interessante isso ocorrer mesmo

o Brasil não liberalizando o setor de informática no Gats em 1995. O Brasil, por

conhecer pouco sobre o seu setor de software no momento do Acordo, não o marcou no

Gats. A falta de conhecimento somada à inexistência de normas para regular o trabalho

de produção de software, no entanto, agradou as empresas estrangeiras que migraram e

trouxeram parte da sua produção para o Brasil.

Segundo o estudo publicado pelo Ipea (KUBOTA, 2006), a participação do

software nacional é largamente predominante nos mercados em que atuam as empresas

classificadas como voltadas aos serviços de baixo valor agregado, já no segmento de

Setoriais do Brasil e do Mundo.19 No PAS 1998/199 software esteve enquadrado dentro do setor de informática.20 O mercado mundial de TI é regulamentado tanto pelo Gats quanto pelo Acordo sobre Tecnologia da Informação – ITA, ambos da OMC. O ITA surgiu durante a Conferência Ministerial de Singapura em 1996, e buscou a eliminação pelos participantes das tarifas em uma série de produtos de TI até 1° de Janeiro de 2000. E previu para 2005 a eliminação das tarifas para diversos componentes, entre eles: hardware e periféricos, equipamentos de telecomunicações (máquinas de fax, modems, pagers), software (disquetes e CD-ROMs), instrumentos científicos, equipamentos produtores de semicondutores, semicondutores e outros componentes eletrônicos

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serviços de alto valor, existe uma participação equilibrada entre as empresas nacionais e

estrangeiras. Na classificação software produto predominam as empresas estrangeiras,

mas também se observa a presença das firmas nacionais 21.

Entretanto, se afirma na pesquisa do MDIC (2002-b) que estudos apontam o

Brasil com grande potencial exportador de produtos e serviços de qualidade. O que

falta, no entanto, é um incentivo às exportações, por parte do governo e das entidades

interessadas, no sentido de orientar as firmas a respeito dos padrões exigidos pelos

outros países. Aqui tem dois aspectos relevantes, primeiro, mesmo com adesão total dos

países desenvolvidos na liberalização do ramo de informática na Rodada Uruguai, não

se conseguiu alcançar as suas demandas neste setor porque o Brasil esbarra em

problemas internos e falta de conhecimento sobre o potencial do comprador estrangeiro.

Isso indica que o papel do Gats foi de fato incentivar o Estado a regular os setores e

apoiar a liberalização do comércio internacional de serviços.

Entretanto, nem sempre a liberalização é recíproca. Os países desenvolvidos

mantiveram restrições mesmo com a conclusão do ITA. A UE e os EUA são signatários

do ITA e nem por isso eliminaram as barreiras aos serviços de software. Ao contrário,

quando eles aceitam a supressão tarifária, criam regras não-tarifárias, como forma de

privilegiar suas indústrias domésticas nas compras governamentais, já que governos são

grandes compradores de programas de computador.

A segunda observação refere-se à falta de incentivo interno aos produtores

nacionais de software. O Brasil demorou a incluir a produção de software no Proex.

21 No livro há uma separação classificatória para as empresas de informática em software. São quatro categorias: Categoria 1, empresas voltadas atividades de informática com menor conteúdo em desenvolvimento de software. São empresas de serviços em informática com ênfase na manutenção e na comercialização de hardware; Categoria 2, empresas voltadas ao desenvolvimento de funções menos complexas. As atividades classificadas nesta categoria são normalmente caracterizadas por rotinas repetitivas ou funções que não dependem de significativos conhecimentos específicos; Categoria 3, aquelas que incluem etapas mais complexas do desenvolvimento de uma solução em software. São etapas que envolvem freqüentemente conhecimentos específicos de engenharia de software e análise de sistemas; Categoria 4, indústria de software, aqui o software é comercializado à semelhança de uma mercadoria “material”, muitas vezes exposto em prateleira. Nesse segmento, os ganhos crescentes de escala desempenham papel fundamental para o sucesso de qualquer produto. Este produto não é voltado ao atendimento das necessidades de nenhum usuário particular, mas de um conjunto mais ou menos homogêneo.

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Com a adesão do segmento em 1998, em 2000, o Relatório do Banco Central já

divulgou a evolução das receitas que resultou em crescimento de 24,3% na corrente

desses serviços em relação a 1999, destacando-se a intensificação do fluxo de serviços

relacionados à transferência de tecnologia, de US$ 3,1 bilhões para US$ 3,8 bilhões.

A aquisição de software foi responsável por 1 bilhão deste montante. O BNDES

também criou um programa de financiamento para expansão da produtividade nacional

de software. No programa de Apoio ao Setor de Software-PROSOFT, o BNDES entra

com até 85% do investimento necessário. Entretanto, o estudo do MDIC expõe uma

colocação reveladora sobre o impacto dos financiamentos para o setor de software.

Existem algumas mudanças no comportamento das empresas que receberam financiamento no que diz respeito à busca de novos mercados, internos e externos. Entretanto, essas mudanças não necessariamente levam a uma melhora nas estratégias de penetração no mercado e na competitividade da empresa. (MDIC, 2002-b, p.17).

Isto indica que não é somente a escassez de capital que atrapalha no processo de

produção e exportação, mas também a falta de investimento no crescimento e

aperfeiçoamento das empresas nacionais.

A produção de software é dependente da inovação. E inovação é obtida quando

se investe em pesquisa e desenvolvimento. E no Gats em nenhum momento do Acordo

há uma preocupação expressa em cobrir a deficiência dos países em desenvolvimento

em pesquisa, tecnologia e inovação 22.

Em desenvolvimento de software, o Brasil está buscando se firmar no exterior

como um importante desenvolvedor de soluções para segurança, automação bancária e

industrial, gestão empresarial e e-procurement. Entretanto, segundo o estudo do MIDC

(2002-b), o Brasil ainda importava mais do que exportava até 2002.

Os estudos sobre os dados da exportação de serviços no Brasil são difusos, não

há padronização entre os órgãos responsáveis e os critérios delimitados numa pesquisa

não são os mesmos atribuídos à outra.

22 Toda a discussão sobre a adesão ou não do tema de serviços nas negociações da Rodada Uruguai entre os grupos dos desenvolvidos e em desenvolvimento esteve baseada na baixa competitividade do setor de serviços dos menos desenvolvidos. Os países eram cientes de suas fraquezas e não queriam expor o seu setor à concorrência internacional.

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Mas a indústria brasileira de software já conquistou algum espaço no mercado externo.

Segundo a pesquisa elaborada pelo Ipea “o valor total obtido no exterior pelas empresas

de software e serviços de informática foi de R$ 290 milhões em 2002, sendo que deste

total 82,5% advieram de empresas classificadas como parte da indústria brasileira de

software (excluindo-se as empresas da Categoria 1)” (KUBOTA, 2006; p.305). Ele

afirma que a indústria brasileira de software obteve receita de R$ 239,3 milhões com

exportações no ano de 2002.

Para a atividade de software, há mercados que se apresentam como alternativas

para a inserção brasileira. Segundo a pesquisa do Ministério do Desenvolvimento

(2002-b), os mercados dos EUA e do Canadá para empresas brasileiras são opções a

curto prazo em virtude da alta demanda por mão-de-obra especializada em tais países, a

qual os mercados locais não conseguem suprir. Outro importante mercado de curto

prazo para as empresas e de relativa facilidade de penetração é o dos países do

Mercosul.

Para o médio prazo, o trabalho do MDIC aponta o Oriente Médio como

importador de softwares brasileiros, já que existe uma restrição cultural em alguns

países em comprar produtos norte-americanos ou indianos pela sua delicada relação

com seu vizinho muçulmano, o Paquistão. A China e a Índia também seguem como

potenciais compradores segundo o estudo.

A partir dessas possibilidades de importadores internacionais traçados pelo

estudo do MDIC nota-se a mixagem de nichos mercadológicos, isto é, há tanto

desenvolvidos quanto em desenvolvimento. A China nem participou da Rodada

Uruguai, mas revelou-se um grande mercado. Logo se percebe que o Gats não cria

demanda ao liberalizar setores de serviços, e sim estimula o aumento da contribuição

dos serviços no processo de interdependência global.

Entretanto o Gats focou e conseguiu delimitar os modos de penetração nos

mercados. Com vistas ao Gats e aos quatro modos de prestação de serviços, o Brasil

pode, portanto, estimular técnicos e programadores brasileiros a participarem do

mercado internacional de software, procurando suspender as barreiras ao movimento de

pessoas (modo 4) como a investimentos de empresas brasileiras em tais mercados

(presença comercial - modo 3). No futuro, acredita-se que em razão do comércio

eletrônico, o comércio transfronteiriço (modo 1) venha a ser extremamente significativo

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no setor de Tecnologia de Informação. O Brasil deve evitar consolidar posições no

modo 1 em razão das incertezas acerca das regras de comércio eletrônico.

Construção e software podem crescer mais, são áreas que de certa forma

conquistaram os consumidores estrangeiros sem muito apoio governamental. Ainda há

setores que não aproveitam a demanda externa, é o caso do turismo. O Brasil apresenta

bom potencial para os serviços de turismo, porém a sua capacidade de oferta é

subestimada. Dos itens do setor o Brasil ajustou na Rodada Uruguai apenas o item

‘hotéis e restaurantes’, o subsetor mais importante em comparação aos demais. Porém o

Brasil não exporta ao mundo grandes corporações de hotéis ou restaurantes. Nem é

visualizado na tabela de investimentos brasileiros no exterior.

Na área de produção audiovisual, o país tem conquistado algum espaço no

mercado internacional. Pelas pesquisas anuais de serviços do IBGE é notável a alta

receita para o setor de informações, no qual a atividade audiovisual está inserida. Em

2002 a pesquisa do IBGE constatou que 13% da receita líquida do setor de informação

já eram gerados pelas produções audiovisuais. A Associação Brasileira de Audiovisuais

(APRO) divulga que as produtoras de filmes e comerciais nacionais conquistam cada

vez mais espaço no mercado mundial. Eles exportam comerciais publicitários, filmes e

outras categorias publicitárias para a demanda externa.

O Brasil conseguiu com o Gats internacionalizar suas atividades de serviços, ou

seja, instigou tanto a importação quanto a exportação. A ação do Gats foi de certa

maneira indireta, porque para incentivar a exportação de serviços é preciso estabelecer

medidas internas compatíveis com os requisitos dos fluxos entre os Estados (muitas de

acordo com o formato das negociações do Gats) e a entrada de investimentos

estrangeiros diretos.

Nas negociações internacionais de serviços, o Brasil teve que se atentar para os

mecanismos que permitam flexibilidade na aplicação de disciplinas de liberalização nas

listas e nos prazos, para não abrir demasiadamente seus setores mais frágeis à

concorrência internacional. Alguns setores, ao contar com ações governamentais que

estimularam o aumento dos investimentos estrangeiros, cresceram internamente e

alguns também passaram a exportar, que foram os segmentos financeiros e bancários,

infra-estrutura, franquias e outros prestados às empresas. Porém incitar reformas

internas e atrair IED não é sinônimo de exportação imediata. “The effects of reforms

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may not necessarily materialize in an immediate increase in services exports, where in

some cases developing countries may not have a clear comparative advantage. 23

”(MARCHETTI, 2004; p.21)

Concluiu-se que o Gats não é um catalisador direto para aumentar as

exportações de serviços brasileiras, mas sim uma ferramenta de uso dos membros da

OMC à disposição dos países desenvolvidos, que são capazes de fazer ofertas mais

atrativas aos países emergentes, porque podem investir, comprar e vender mais serviços

no comércio internacional de serviços. Isto é, eles elaboram um ordenamento normativo

dentro da OMC de acordo com os seus interesses e aguardam os países menos

desenvolvidos efetuarem suas reformas internas e poderem abrir cada vez mais seus

mercados para os prestadores de serviços internacionais.

Entretanto, havendo o Gats no âmbito da OMC pelo menos é acessível aos

países uma instância internacional para questionar seu espaço dentro do contexto

desequilibrado de forças, já que o consenso por meio do single undertaking força a

negociação equilibrada, mesmo entre membros díspares economicamente. É possível

negociar com o mesmo padrão de regras, sem que certos países desenvolvidos

imponham unilateralmente suas vontades aos demais.

23 Tradução livre: Os efeitos das reformas não precisam necessariamente se materializarem no aumento das exportações de serviços, em alguns casos, países em desenvolvimento não terão vantagem comparativa clara.

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CONCLUSÃO

O comércio internacional de serviços não se apresentou como um assunto fácil

de explicar. Ao contrário, a complexidade inerente ao tema de serviços configura uma

pesquisa árdua para quem procura compreender melhor a sua importância para o Brasil

nas negociações internacionais, na sua própria economia interna de serviços e nos

avanços já conquistados pelo país nos mercados estrangeiros.

A partir das informações sobre a economia de serviços no Brasil, nota-se que o

país dispõe de um setor responsável por mais de 50% do PIB nacional. Conta com

setores dinâmicos, no sentido de empregabilidade, responsável por criar firmas e

empregos, o setor cresce mais do que a indústria e também é mais heterogêneo.

(KUBOTA, 2006). Assim, pode-se afirmar que a economia de serviços é responsável

por dinamizar a economia porque os serviços contribuem significativamente para a

produção de bens.

Assim, após todos os dados levantados e informações bibliográficas pertinentes

conclui-se que o Gats não foi o instrumento responsável pelo aumento das exportações

brasileiras de serviços. Entretanto, isto não deve se postular como um

descontentamento, o Brasil conseguiu se estabelecer no cenário da OMC como

articulador nos processos de negociação do tema e conseguiu responder positivamente

na sua economia interna ao manter bons índices na sua economia de serviços. E como

maior conquista, conseguiu com o Gats, captar mais investimentos estrangeiro direto

para o seu setor de serviços.

Estes investimentos estrangeiros na economia brasileira de serviços instigaram a

dinamização, cresceram o número de empresas, disponibilizaram mais empregos para as

atividades terciárias. E como conseqüência deste crescimento econômico em serviços,

as firmas mais preparadas alcançaram o exterior e passaram a participar do fluxo

internacional de exportação de serviços. Não são todas empresas nacionais, porém a

contribuição do capital nacional existe. Talvez o capital brasileiro não seja estimulado o

bastante para arriscar espaço no mercado consumidor estrangeiro.

Não foi incumbência deste trabalho retratar as assertivas ou os erros

governamentais em políticas públicas voltadas ao incentivo à exportação de serviços.

Mas em alguns argumentos apresentados foi possível notar a ausência de iniciativas

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governamentais para apoiar o produtor interno e assim a exportação. Percebe-se que a

falta políticas públicas para estimular a exportação do setor ainda é baixa comparada a

exportação de bens. Por exemplo, o caso da construção civil para financiamento das

exportações. Segundo o trabalho do MDIC realizado em 2002 sobre as oportunidades

internacionais para o setor; levam-se, em média, 2 ou 3 anos de negociações para obter

o financiamento e demandam-se custos proibitivos para pequenas e médias empresas.

Não somente o fomento dos financiamentos deve ser visto, outros incentivos que

merecem atenção é o apoio logístico e promocional no exterior. E nessa tarefa, tanto o

setor público quanto o setor privado podem apoiar a prospecção e o desenvolvimento de

novos mercados. Na verdade, é conglomerado de fatores que explica o baixo potencial

exportador de serviços do Brasil.

As justificativas indicadas na literatura para o fraco desempenho exportador vão

desde determinantes macroeconômicos, como os efeitos da valorização cambial em

determinados períodos, passando pela ausência de uma “cultura exportadora”, bem

como em um “viés anti-exportação” determinado estruturalmente pela existência de um

vasto mercado interno. A explicação baseada na significativa dimensão do mercado

doméstico parece ser insuficiente. Grande mercado interno, dotado de complexidade e

sofisticação de sua demanda, não representa potencialmente um fator propriamente

estimulante da competitividade da indústria nacional. Esse argumento seria sustentável

apenas em uma situação em que o mercado doméstico apresentasse um ambiente com

baixa pressão competitiva, propiciando cômoda situação de alta rentabilidade para as

empresas nacionais.

O contexto do Gats não é plenamente favorável para o Brasil, nem para outros

países mais fracos economicamente ou nivelados com o Brasil, no sentido de estimular

o acesso a mercados. Dá-se pouca importância às questões regulatórias para a expansão

do comércio de serviços, é pouco trabalhado no Gats, logo dificulta o desenvolvimento

de serviços como disciplina multilateral, que por sua vez é barrada pelo dilema da

interferência na soberania nacional, ou seja, a regulamentação pode limitar a liberdade

regulatória interna de cada país. A regulação abordada pelo Gats está reduzida

praticamente ao tratamento nacional (artigo XVII do Gats) e restrições para proteger o

balanço de pagamentos (artigo XII do Gats).

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O Gats também não se preocupou na sua primeira negociação tratar das

amenidades sobre a disparidade tecnológica entre os membros. O setor de serviços está

a cada dia mais dependente dos avanços da informática e da comunicação, pois a

fluidez de várias atividades de serviço precisa de dispositivos tecnológicos, como:

internet, computador, satélites e outros. Além disso, a importância da ligação entre os

setores, especialmente os intensivos em tecnologia. Porque geralmente é relação entre

os setores responsável para determinação dos recursos de uma economia, como estes

serão transformados e usados para aumentar as vantagens competitivas.

Menos quando se quer aumentar as vantagens comparativas, os países em

desenvolvimento devem perceber que as trocas do comércio internacional são

desproporcionais. Logo precisam estar atentos para a abertura comercial aos seus

mercados e exigir contrapartida com acesso à tecnologia e às redes de informação.

O que se notou durante a Rodada Uruguai foram as disputas, de um lado, os

países desenvolvidos demandaram por mandatos liberalizantes para bens não-agrícolas,

serviços, investimentos e compras governamentais, mandatos que preservam a proteção

à agricultura, o uso do antidumping e de medidas compensatórias, e a inclusão de temas

caros aos países em desenvolvimento como meio ambiente e direitos trabalhistas. Do

outro lado, estavam os países em desenvolvimento, que desejavam maior acesso a

mercados para seus produtos, basicamente produtos agrícolas e têxteis, tratamento

especial e diferenciação nas obrigações envolvidas nos acordos da (futura) OMC, maior

ênfase nas questões de implementação do que no avanço da liberalização em bens não-

agrícolas e não-inclusão de temas como meio ambiente e direito trabalhista.

Toda a discussão da Rodada Uruguai transferiu-se para a Rodada seguinte. A

Rodada Doha, iniciada em 2001 compreende em essência os mesmos temas espinhosos

entre os dois grupos de países. O grupo que aspira a quebra das barreiras tarifárias aos

produtos agrícolas e têxteis, e o outro que visa maior acesso aos mercados em serviços e

em produtos tecnológicos. “Diante desse quadro, o governo tem reiterado a necessidade

de liberalização mais significativa do comércio agrícola internacional para garantir a

conclusão da Rodada de Doha.” (BACEN, 2002; p.113)

Por fim, conclui-se com esta pesquisa que toda negociaçao do Gats contribuiu

para o Brasil participar mais dos fluxos de capitais (IED) e comerciais (importação e

exportação) do comércio internacional de serviços.

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ANEXOS

Lista 1 – Lista de exceções do artigo II (NMF) do Brasil Setor ou subsetor

Descrição da medida com indicação de sua

incompatibilidade com o artigo II

Países aos quais se aplica a medida

Duração Prevista

Condições que motivam a

necessidade da exceção.

Serviços audivisuais/ produção de filmes e fitas de vídeo

Medidas nas quais se definem as normas para a co-produção de filmes com países estrangeiros e se concede o tratamento nacional aos filmes co-produzidos com países estrangeiros que mantêm acordos de co-produção com o Brasil. Os filmes co-produzidos fora do contexto destes acordos não têm direito ao tratamento nacional

Todos os países

Indeterminada

Estes acordos têm a finalidade de fomentar o intercâmbio cultural e estabelecer mecanismos destinados a facilitar o acesso recursos financeiros.

Transporte terrestre (transfronteiriço)

Acordo sobre transporte terrestre internacional. Estabelece o tratamento nacional para os prestadores autorizados de países signatários com respeito ao transporte internacional de cara e de passageiros.

Os signatários são a Argentina, Bolívia, Chile, Paraguai, Peru e Uruguai.

Indeterminada

Facilitar o transporte entre países vizinhos na região do Cone Sul, baseando-se no tratamento da reciprocidade para os prestadores de serviços.

Transporte marítimo – Navegação de altura (carga)

Medidas que permitem a conclusão de acordos bilaterais relativos à participação na carga e às reservas de carga e medidas que prevêem o acesso à carga com base na reciprocidade.

Todos os países

Indeterminada

Garantir a participação efetiva de navios de bandeira brasileira no tráfego brasileiro de carga por linhas regulares.

Fonte: MARCONINI, 2003; p. 303.

Lista 2 – Compromissos horizontais do BrasilModos de prestação: 1 – prestação comercial 2 – consumo no exterior 3 – presença comercial 4 – presença de pessoas físicas Setor ou subsetor Limitação ao acesso a mercados

Limitação ao tratamento nacional

Compromissos

acordadosI. Compromissos Horizontais

Movimento de pessoas físicas4 – não-consolidado, com exceção de técnicos especializados e diretores. Técnicos especializados e profissionais altamente qualificados estrangeiros podem trabalhar sob contrato temporário com

4 – não-consolidado, com exceção do indicado na coluna de acesso ao

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Todos os setores

entidades estabelecidas no Brasil, de capital nacional ou estrangeiro. O respectivo contrato de trabalho deve ser aprovado pelo Ministério do Trabalho. A aprovação dos contratos de técnicos especializados e de profissionais altamente qualificados leva em consideração a compatibilidade de suas qualificações com a área de atividade em que a empresa atua. Esta deve justificar sua necessidade de contratar tais profissionais e técnicos em relação à oferta de profissionais e técnicos disponíveis no Brasil. A proporção de pelo menos dois brasileiros para cadê três empregados deve ser observada pelas pessoas jurídicas que atuem nas seguintes áreas, arroladas nesta lista: comunicações, transporte terrestre, estabelecimentos comerciais em geral, escritórios comerciais, seguros, publicidade, hotéis e restaurantes. São as seguintes condições sob as quais poderão assumir suas funções os gerentes e diretores designados para filiais de empresas estrangeiras estabelecidas no Brasil: indicação para cargo com pleno poder decisório; existência de vaga nesse cargo; existência de vínculo societário entre o prestador de serviços em território brasileiro e sua matriz no exterior; prova de que o gerente ou o diretor está desempenhando suas funções após ter recebido o competente visto, a ser apresentado pelo prestador de serviços. A designação de tais gerentes ou diretores deve estar relacionada com a implantação de nova tecnologia, aumento de produtividade, ou a empresa deverá ter investido no Brasil a quantia mínima de US$ 200,000.00 (esse montante poderá ser corrigido no futuro para ajustar-se ao valor em US$ estabelecido em 1993). Todos os outros requisitos, leis e regulamentos relativos à entrada, estada e trabalho permanecem em vigor.

mercado.

Investimento 3 – de acordo com as leis que regulam o investimento estrangeiro, todo o capital estrangeiro aplicado no Brasil deve ser registrado no Banco Central do Brasil para habilitar-se a futuras remessas. O Banco Central do Brasil estabelece os procedimentos relativos a remessas e transferências de fundos do exterior. Presença Comercial3 – os prestadores de serviços estrangeiros que desejem prestar serviços como pessoa jurídica deverão organizar-se sob uma das formas societárias previstas em lei no Brasil. A lei brasileira estabelece distinção entre pessoa jurídica e as pessoas físicas que a controlam, o que, consequentemente, confere vida independente à pessoa jurídica. Disso resulta que a pessoa jurídica tem plenos direitos e responsabilidades sob seu patrimônio e suas obrigações. Uma sociedade adquire a condição de pessoa jurídica de direito privado ao registrar o respectivo contrato social (estatuto e/ou contrato) junto ao registro público (RP) competente. É indispensável que os assentamentos do RP contenham as seguintes informações sobre a

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pessoa jurídica: - denominação, objetivo e localização da sede;- descrição de sua administração, que inclua representação ativa e passiva, judicial e extrajudicial;- o processo de alteração dos dispositivos de administração;- disposições relativas à responsabilidade dos administradores por atos que pratiquem; e - disposições relativas à sua dissolução, que incluam o destino que terão seus ativos. Não são consideradas pessoas jurídicas pela lei brasileira a “propriedade exclusiva” e a “parceria”, assim designadas no artigo XXVIII, item (1), do Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços. Poder-se-á estabelecer joint venture por associação de capitais mediante a constituição de qualquer tipo de sociedade comercial prevista na lei brasileira (geralmente uma Sociedade Privada de Responsabilidade Limitada ou uma Sociedade Anônima). Também se pode estabelecer joint venture por meio de consórcio, que não é nem pessoa jurídica, nem um tipo de associação de capital. O consórcio é utilizado sobretudo em grandes contratos de prestação de serviços. Trata-se da associação de duas ou mais empresas para a realização conjunta de uma finalidade específica. Cada associado do consórcio mantém sua própria estrutura organizacional. Subsídios 1, 2, 3, 4 – não consolidado.

1, 2, 3, 4 – não consolidado para subsídios para pesquisa e desenvolvimento.

Fonte: MARCONINI, 2003; p.

Tabela 5 - Valores das exportações e importações de serviços comerciais do BrasilAno 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001Exportação 3268 4002 3911 4817 6005 4453 5488 7083 6873 8846 8719Importação 6381 6609 91156 9836 13161 12200 14447 15743 13357 15869 15813Em milhões de dólares. Fonte: International Trade Statistics – OMC /Adaptação do original.

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