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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
FACULDADE DE ARQUITETURA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO
ROSE LAILA DE JESUS BOUÇAS
NO OLHO DA RUA:
trabalho e vida na apropriação do espaço público em Salvador / BA
Salvador
2015
ROSE LAILA DE JESUS BOUÇAS
NO OLHO DA RUA:
trabalho e vida na apropriação do espaço público em Salvador / BA
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e
Urbanismo da Faculdade de Arquitetura da
Universidade Federal da Bahia, como requisito
para obtenção do grau de Mestre.
Orientadora: Professora Dra. Ana Fernandes.
Co-orientadora: Professora Dra. Angela
Franco.
Salvador
2015
B752 Bouças, Rose Laila de Jesus. No olho da rua: trabalho e vida na apropriação do espaço público em
Salvador / Ba / Rose Laila de Jesus Bouças. 2015. 268 f. : il.
Orientadora: Profa. Dra. Ana Maria Fernandes. Co-orientadora: Profa. Dra. Ângela Maria de Almeida Franco Dissertação (mestrado) - Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Arquitetura, Salvador, 2015. 1. Planejamento urbano. 2.Trabalho informal. 3. Economia. I
Universidade Federal da Bahia. Faculdade de Arquitetura. II. Fernandes, Ana Maria. III. Franco, Ângela Maria de Almeida.
CDU: 711.4
ROSE LAILA DE JESUS BOUÇAS
NO OLHO DA RUA:
trabalho e vida na apropriação do espaço público em Salvador / BA
Dissertação aprovada para obtenção do grau de Mestre em Arquitetura e Urbanismo,
Universidade Federal da Bahia, pela seguinte banca examinadora:
________________________________________________
Profa. Dra. Ana Maria Fernandes (orientadora)
Pós‐Doutorada pela École d'Architecture Paris ‐ Malaquais
________________________________________________
Profa. Dra. Ângela Maria de Almeida Franco (co-orientadora)
Doutorado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal da Bahia
________________________________________________
Prof. Dr. Antônio Heliodório Lima Sampaio (membro interno)
Doutorado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo
________________________________________________
Profa. Dra. Urpi Montoya Uriarte (membro externo)
Pós-Doutorada pela Universidade Federal de Pernambuco
________________________________________________
Prof. Msc. Gabriel Kraychette (membro externo)
Mestre pela Universidade Federal da Bahia
Salvador, 18 de dezembro de 2015.
AGRADECIMENTOS
Gostaria de reconhecer aqui a importância de cada pessoa que faz parte da minha vida, assim
como também àqueles que foram somados ao meu rol de amizade nos últimos dois anos e meio
de mestrado. Sou muito grata por cada palavra, incentivo e colaboração de vocês.
Agradeço à professora Ana Fernandes por ter me acolhido carinhosamente no Grupo de
Pesquisa Lugar Comum. Sou verdadeiramente grata por sua orientação cuidadosa, pelos livros
emprestados e por seu olhar atencioso e preciso, capaz de me fazer rever de forma única a
concepção e estruturação desta pesquisa.
À professora Ângela Franco pela generosidade em ceder seu tempo, sua casa, e seus livros.
Considero um grande presente tê-la conhecido e poder ter contado com suas orientações,
atenção e carinho durante esse tempo. Sinto-me com muita sorte por ter contado com o apoio
de duas orientadoras tão incríveis.
Ao professor Luiz Antônio por ter sido o primeiro a me incentivar e a acreditar na minha
pesquisa.
Ao curso de Urbanismo da UNEB por ter alimentado e contribuído com a minha sensibilidade.
Aos professores e grandes mestres que tive a honra e o prazer de conhecer no decorrer das
disciplinas do PPG-AU: Heliodório Sampaio, Angela Gordilho, Paola Berenstein, Fernando
Ferraz, Washington Drummond, Pasqualino Magnavita, Xico Costa e Thais Portela.
Aos membros da banca por terem aceitado o convite de avaliar meu trabalho.
Aos meus pais que, apesar das inúmeras dificuldades que tiveram, sempre me incentivaram e
fizeram o melhor por mim e pela minha educação. Aos meus avós maternos, a quem dedico
esse trabalho, por serem os guardiões das minhas lembranças mais doces e ternas.
Ao meu companheiro Caio Rubens pela paciência, incentivo e afeto em todos os momentos.
Pela família que estamos solidificando com esse ser semente que trago agora no ventre.
Aos amigos que fiz no PPG-AU, no Lugar Comum e, sobretudo, durante o período em que
participei da elaboração do Plano de Bairro 2 de Julho.
Aos professores, companheiros tirocinantes e estudantes que participaram do Ateliê V no
semestre de 2014.1 da Faculdade de Arquitetura.
À Gabriela, Alice, Iago, Gabriel e Emyle, bolsistas do PIBIC Jr. e estudantes do Colégio
Estadual Ypiranga, dos quais fui tutora durante pouco mais de um ano no âmbito do Plano de
Bairro 2 de Julho e que me ensinaram bastante sobre a arte de partilhar conhecimentos com
paciência.
À Reinofy e Suzana da produtora Domínio Público pela amizade e apoio na impressão dos
questionários aplicados na pesquisa de campo.
À Bruna Tupiniquim pela colaboração cuidadosa na coleta de dados secundários, aplicação e
sistematização dos 299 questionários da pesquisa.
Aos trabalhadores de rua e lideranças que gentilmente cederam um pouco do seu tempo de
trabalho para conversar conosco durante a aplicação dos questionários e nas entrevistas.
Às queridíssimas do grupo “Belas e Criativas”, pela sororidade desse grupo feminino que é o
mais amoroso que conheço.
Aos amigos de todas as horas e tempos: Thallita, João, Larissa e Lais por seu carinho verdadeiro
e por sempre vibrarem positivamente por mim, ainda que nem sempre possam estar fisicamente
presentes.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, pela bolsa
concedida durante os dois anos de mestrado.
Muito obrigada!
O homem está na cidade
como uma coisa está em outra
e a cidade está no homem
que está em outra cidade
mas variados são os modos
como uma coisa
está em outra coisa:
o homem, por exemplo, não está na cidade
como uma árvore está
em qualquer outra
nem como uma árvore
está em qualquer uma de suas folhas
(mesmo rolando longe dela)
O homem não está na cidade
como uma árvore está num livro
quando um vento ali a folheia
a cidade está no homem
mas não da mesma maneira
que um pássaro está numa árvore
não da mesma maneira que um pássaro
(a imagem dele)
está/va na água
e nem da mesma maneira
que o susto do pássaro
está no pássaro que eu escrevo
a cidade está no homem
quase como a árvore voa
no pássaro que a deixa
cada coisa está em outra
de sua própria maneira
e de maneira distinta
de como está em si mesma
a cidade não está no homem
do mesmo modo que em suas
quitandas, praças e ruas
Ferreira Gullar
RESUMO
O trabalho é, talvez, a dimensão da vida que tem mais importância em nossa estrutura social.
Através dele obtemos recursos para nosso sustento e podemos nos sentir inseridos na sociedade.
Contudo, o mercado de trabalho não absorve a todos. Desta forma, obter os meios de
sobrevivência para boa parte da população é uma luta diária, que envolve grande criatividade e
poder de adaptação. Nesta dissertação investigamos uma dessas muitas formas alternativas de
sobrevivência. Buscamos compreender o desenrolar de uma atividade laboral que ocorre aos
olhos de todos, no olho da rua, nas ruas do centro de Salvador. Nosso objetivo é, portanto,
estudar de que maneira a atividade dos trabalhadores de rua está inserida e se relaciona com o
espaço público, bem como a maneira como incidem as ações de planejamento e ordenamento
elaboradas entre 1992 e 2014 sobre a mesma, numa área do centro antigo da cidade de Salvador,
onde observamos uma grande incidência de trabalhadores de rua. Nesse sentido, para auxiliar
nossa compreensão, a teoria dos circuitos da economia elaborada por Milton Santos é
fundamental, pois nos ajuda a entender a maneira como as atividades se organizam no espaço,
na medida em que fazem parte do circuito superior ou inferior da economia. O espaço com o
qual estamos lidando, por sua vez, é o espaço público, comum a todos. A apropriação da rua
pelo trabalho por si só já pressupõe a existência de tensões, conflitos e disputas por este lugar.
Nos parece interessante observar ainda, que essa apropriação se converte em uso, na medida
em que passa a ser regulada pelo poder público, que reconhece a problemática social e busca
alternativas para compatibilizar os diversos interesses sobre o local.
PALAVRAS-CHAVE: trabalhador de rua; economia; rua; apropriação; planejamento
urbano.
ABSTRACT
Gainful employment is a large aspect of life that is important to our social structure. We rely
on this for our livelihood and so we can become productive, contributing members of the
community. However, the labor market does not account for the entire population. Thus
obtaining the means of survival, for a majority of the population, is a daily struggle. In this
master thesis we investigate one of those many alternative forms of survival. We seek to
understand the gradual unfolding of an employment activity that occurs for us all to witness on
the streets in Salvador downtown. Our goal is to study how the activity of street workers is
related to public space, as well as how the planning actions of 1992 and 2014 affects this activity
on the city's old downtown area where numerous street workers can be noticed. The theory of
the economic circuits by Milton Santos is an important element to our comprehension because
it helps us to understand the manner in which activities are organized on the space, as it involves
the upper and lower aspects of economy. The space which we are dealing with is the public
space, common to all. The appropriation of the street for the work itself takes on the existence
of tensions, conflicts and disputes over this place. It’s also interesting to take note that this
appropriation becomes a use as they happen to be regulated by the government, which
recognizes the social problem and seeks solutions to reconcile the various interests on the site.
KEYWORDS: street workers; economy; street; appropriation; urban planning.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Trecho da Avenida Sete de Setembro. ................................................................... 81
Figura 2: Trecho da Avenida Sete de Setembro. ................................................................... 81
Figura 3: Largo de São Bento ............................................................................................... 82
Figura 4: Largo do Mocambinho, vista da Rua Carlos Gomes. ............................................. 84
Figura 5: Avenida Sete de Setembro. Área 3 – perspectiva da área (Rua do
Cabeça/Estacionamento São Raimundo). ............................................................................. 88
Figura 6: Projeto para o Largo do Rosário. ........................................................................... 92
Figura 7 Largo do Rosário reformado................................................................................... 92
Figura 8: Proposta de requalificação do mercado das flores (Largo 2 de Julho) / Praça General
Inocêncio Galvão ................................................................................................................. 93
Figura 9: Rua do Cabeça e “Largo das Flores”, bairro Dois de Julho. ................................... 94
Figura 10: Reunião para discussão do Projeto de Requalificação do Mercado Dois de Julho. 94
Figura 11: Trecho da Avenida Sete com parklet. Fotografia retirada de slide apresentado
durante reunião convocada pela SEMOP em 21-11-2014. .................................................... 96
Figura 12: Largo de São Bento em reforma. ......................................................................... 96
Figura 13: Largo de São Bento antes da reforma. ................................................................. 96
Figura 14: Praça Barão Rio Branco (Relógio de São Pedro) antes da reforma. ...................... 97
Figura 15: Vista de cima da Praça Barão Rio Branco (Relógio de São Pedro), em reforma. .. 97
Figura 16: Esquema de espaço demandado pela atividade do trabalhador de rua................... 99
Figura 17: Situação 1 - Demanda de espaço pela atividade, considerando mobiliário
independente de outros. ...................................................................................................... 100
Figura 18: Situação 2 - Demanda de espaço pela atividade, considerando mobiliário de quina
ou encostado com outros. ................................................................................................... 100
Figura 19: Situação 3 - Demanda de espaço pela atividade, considerando mobiliário encostado
com outros ou com a parede. .............................................................................................. 101
Figura 20: Representação esquemática de uma rua. ............................................................ 102
Figura 21: Esquema densidade de ocupação – Ruas tipo “A”. ............................................ 102
Figura 22: Esquema densidade de ocupação – Ruas tipo “A”. ............................................ 103
Figura 23: Improvisos para proteger-se da chuva e do sol na Rua da Forca......................... 150
Figura 24: Improvisos para proteger-se da chuva e do sol na Rua Coqueiros da Piedade .... 150
Figura 25: Ação do rapa com presença policial em 24.09.2014........................................... 153
Figura 26: Ação do rapa com presença policial em 24.09.2014........................................... 154
Figura 27: Reforma da rua Portão da Piedade. .................................................................... 154
Figura 28: Reforma da Rua do Cabeça. .............................................................................. 154
Figura 29: Trabalhadores provisoriamente deslocados para a Praça da Piedade. ................. 155
Figura 30: Trabalhadores provisoriamente deslocados para Avenida Joana Angélica.......... 155
Figura 31: Trabalhadores provisoriamente deslocados para a lateral do Mosteiro de São Bento.
.......................................................................................................................................... 155
Figura 32: Trabalhadores provisoriamente deslocados para canteiro central da Av. Joana
Angélica ............................................................................................................................ 155
Figura 33: Trabalhadores que permanecem ao longo da Avenida Sete. ............................... 157
Figura 34: Trabalhadores que permanecem ao longo da Avenida Sete. ............................... 157
Figura 35: Comercialização de mercadorias realizada com o uso de automóveis. ............... 158
Figura 36: Comercialização de mercadorias realizada com o uso de automóveis. ............... 158
Figura 37: Comercialização de mercadorias realizada com o uso de automóveis. ............... 158
Figura 38: Comercialização de mercadorias realizada com o uso de automóveis. ............... 158
Figura 39: Carregador levando mercadoria para o ponto de um trabalhador. ....................... 163
Figura 40: Trabalhadora montando sua guia no início da jornada de trabalho. .................... 163
Figura 41: Carregadores levando mercadoria na Rua do Cabeça. ........................................ 163
Figura 42: Carregador na Rua Carlos Gomes...................................................................... 163
LISTA DE MAPAS
Mapa 1: Av. Sete de Setembro – Extensão total, 2015. ......................................................... 68
Mapa 2: Bairros que margeiam a Avenida Sete de Setembro. ............................................... 71
Mapa 3: Ruas contempladas com o projeto de ordenamento. ................................................ 91
Mapa 4: Densidade de ocupação na área de estudo. ............................................................ 104
Mapa 5: Percurso de aplicação do questionário de aprofundamento. ................................... 114
Mapa 6: Localização dos trabalhadores de rua em Salvador/BA ......................................... 129
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Estimativa do número de ocupados. ...................................................................... 37
Tabela 2: Distribuição da população em desemprego oculto pelo trabalho precário e experiência
anterior de trabalho, segundo tempo de perda do emprego e duração do último trabalho Regiões
Metropolitanas(*) e Distrito Federal – 1999, 2004 e 2009 (em %) ........................................ 40
Tabela 3: Síntese da análise do projeto “O Informal em Salvador: políticas e propostas”, 1992.
............................................................................................................................................ 83
Tabela 4: Comparativo entre as alternativas da Proposta I para relocação do comércio informal
– Av. Sete de Setembro, 1997 .............................................................................................. 86
Tabela 5: Comparativo entre as alternativas da Proposta II para relocação do comércio informal
– Av. Sete de Setembro, 1997 .............................................................................................. 86
Tabela 6: Síntese da análise do projeto “Comércio Informal: projeto de relocação dos
ambulantes da Av. Sete de Setembro e Baixa dos Sapateiros”, 1997 .................................... 89
Tabela 7: Síntese da análise dos projetos “Plano de requalificação e reordenamento de
ambulantes de Salvador”, “Requalificação do Mercado 2 de Julho” e “Programa Avenida Sete
de Setembro – Território Empreendedor”, 2014. .................................................................. 97
Tabela 8: Caracterização da Atividade – Quais produtos comercializa? .............................. 144
Tabela 9: Caracterização da Atividade – Onde você compra os produtos que comercializa?145
Tabela 10: Caracterização da Atividade – Quanto você consegue tirar num dia bom / ruim?
.......................................................................................................................................... 148
Tabela 11: Questionário de aprofundamento – Quais as três coisas que gosta no trabalho / quais
as três dificuldades / quais os planos para o futuro.............................................................. 161
Tabela 12: Questionário de aprofundamento – Quais as três coisas que gosta no trabalho / quais
as três dificuldades / quais os planos para o futuro.............................................................. 166
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1: Evolução do PIB nacional, trimestral e das Populações Metropolitanas
Economicamente Ativa e Ocupada -..................................................................................... 37
Gráfico 2: Taxas de desemprego, segundo tipo ..................................................................... 38
Gráfico 3: Caracterização geral – Pirâmide etária ............................................................... 126
Gráfico 4: Caracterização geral – Grau de escolaridade ...................................................... 127
Gráfico 5: Caracterização geral - Origem ........................................................................... 128
Gráfico 6: Caracterização da atividade – Como se desloca até o trabalho? .......................... 131
Gráfico 7: Caracterização Geral – Como você chama o trabalho que faz aqui neste lugar? . 132
Gráfico 8: Caracterização Geral – Se já trabalhou de carteira assinada, o que fazia? ........... 133
Gráfico 9: Caracterização Geral – Quando fica doente (ou quando tem algum acidente ou
problema), o que acontece com o negócio? ........................................................................ 134
Gráfico 10: Caracterização da Atividade – Por que o seu ponto é nessa rua? ...................... 139
Gráfico 11: Caracterização da Atividade – Tempo em que exerce a atividade / tempo que
trabalha na mesma rua ........................................................................................................ 140
Gráfico 12: Caracterização da Mercadoria – Se paga aluguel no depósito, quanto custa? .... 142
Gráfico 13: Caracterização da Atividade – Com quem você compra os produtos que
comercializa? ..................................................................................................................... 145
Gráfico 14: Caracterização da Atividade – Que tipo de investimento fez para começar no ramo?
.......................................................................................................................................... 147
Gráfico 15: Caracterização da Mercadoria – Porque tem licença ........................................ 152
Gráfico 16: Caracterização da Mercadoria – Porque não tem licença .................................. 152
Gráfico 17: Caracterização da Mercadoria – De qual associação/sindicato faz parte? ......... 159
Gráfico 18: Caracterização da Atividade – Se não faz parte de nenhuma associação, qual o
motivo? .............................................................................................................................. 160
Gráfico 19: Caracterização da Atividade – Como você bebe água e se alimenta?................ 164
Gráfico 20: Caracterização da Atividade – O que faz com o lixo produzido? ...................... 165
ABREVIATURAS E SIGLAS
ASFAERP - Associação dos Feirantes e Vendedores Ambulantes da Cidade de Salvador e
Região Metropolitana
ASSINDIVAN - Associação Integrada de Vendedores Ambulantes e Feirantes de Salvador
ASSINFORMAL - Associação dos Trabalhadores Informais de Salvador
BNDES - Banco Nacional do Desenvolvimento
CAB - Centro Administrativo da Bahia
CDL - Câmara de Dirigentes Lojistas de Salvador
CIA - Centro Industrial de Aratu
CLT - Consolidação das Leis Trabalhistas
CMC - Centro Municipal do Camaragibe
CMR - Centro Municipal Retiro-Acesso Norte
CMT - Centro Municipal Tradicional
DIEESE - Departamento Intersindical de Estatística e Estudo Socioeconômicos
FMLF - Fundação Mário Leal Ferreira
LOUOS - Lei do Ordenamento do Uso e da Ocupação do Solo de Salvador
OIT - Organização Internacional do Trabalho
PAC - Programa de Aceleração do Crescimento
PDDU - Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano de Salvador
PEA - População Economicamente Ativa
SEBRAE - Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
SEDUR - Secretaria de Desenvolvimento Urbano
SEMOP - Secretaria de Ordem Pública
SESP - Secretaria Municipal de Serviços Públicos e Prevenção à Violência
SINDIFEIRA - Sindicato dos Feirantes e Ambulantes da Cidade de Salvador
SUCOM - Superintendência de Controle e Ordenamento do Uso do Solo do Município
TRANSALVADOR - Superintendência de Trânsito de Salvador
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 18
1 TRABALHO DE RUA: UMA RELAÇÃO ENTRE INFORMALIDADE E ESPAÇO
PÚBLICO ........................................................................................................................... 28
1.1 NEM DICOTOMIA, NEM AMBIGUIDADE: DOIS CIRCUITOS DE UM MESMO SISTEMA ............. 29
1.2 A ECONOMIA NO ESPAÇO, O TRABALHO NA RUA ............................................................ 47
2 O ESPAÇO PÚBLICO E O TRABALHO DE RUA EM SALVADOR:
CARACTERIZAÇÃO, LEGISLAÇÃO E PLANEJAMENTO ....................................... 65
2.1 CARACTERIZAÇÃO DAS RUAS ONDE SE OBSERVA O TRABALHO DE RUA: AVENIDA SETE DE
SETEMBRO, TRANSVERSAIS E LARGO DOIS DE JULHO ......................................................... 66
2.2 O ESPAÇO PÚBLICO EM SALVADOR E A LEGISLAÇÃO INCIDENTE ..................................... 72
2.3 PROJETOS DO PODER PÚBLICO INCIDENTES SOBRE A ATIVIDADE DO TRABALHADOR DE RUA
......................................................................................................................................... 76
2.3.1 Propostas em 1992 ............................................................................................... 77
2.3.2 Propostas em 1997 ............................................................................................... 84
2.3.3 Propostas em 2014 ............................................................................................... 90
2.4 A DENSIDADE DE OCUPAÇÃO ........................................................................................ 99
3 O TRABALHO DE RUA EM SALVADOR: OS PROTAGONISTAS, SUAS
CARACTERÍSTICAS E FORMAS DE ORGANIZAÇÃO DA ATIVIDADE.............. 106
3.1 AS ASSOCIAÇÕES/SINDICATOS .................................................................................... 106
3.2 OS TRABALHADORES DE RUA ..................................................................................... 113
3.3 CONCEPÇÃO E FUNCIONAMENTO DOS CIRCUITOS DO TRABALHO DE RUA EM SALVADOR 134
3.3.1 Se virar: entre a subordinação e a autonomia .................................................... 136
3.3.2 A correria e o rapa: conflitos e disputas ............................................................. 149
3.3.3 A pedra: circuitos de cooperação, pertencimento e solidariedade ...................... 162
CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 170
REFERÊNCIAS ............................................................................................................... 181
ANEXO A: PLANTAS DO PROJETO “O INFORMAL EM SALVADOR: POLÍTICA
E PROPOSTAS, 1992” – TRECHO SÃO PEDRO, JOANA ANGÉLICA E SÃO
BENTO ............................................................................................................................. 189
ANEXO B: PLANTAS DO PROJETO “COMÉRCIO INFORMAL: AV. SETE DE
SETEMBRO; ÁREAS PROVISÓRIAS. SALVADOR: 1997” ...................................... 193
ANEXO C: PLANTAS DO PROJETO “REQUALIFICAÇÃO DA AV. SETE DE
SETEMBRO - ORDENAMENTO DO COMÉRCIO INFORMAL" ........................... 201
APÊNDICE A: QUESTIONÁRIO BÁSICO APLICADO COM OS 289
TRABALHADORES DE RUA ........................................................................................ 205
APÊNDICE B: QUESTIONÁRIO DE APROFUNDAMENTO APLICADO COM OS 10
TRABALHADORES DE RUA SELECIONADOS ........................................................ 209
APÊNDICE C: RESULTADO DA CONTAGEM DOS TRABALHADORES PARA
DEFINIÇÃO DA AMOSTRA ......................................................................................... 211
APÊNDICE D: ÁREAS PARA APLICAÇÃO DOS QUESTIONÁRIOS BÁSICOS ... 215
APÊNDICE E: ROTEIRO DE ENTREVISTA ASSOCIAÇÕES / SINDICATO ......... 216
APENDICE F: DENSIDADE DE OCUPAÇÃO............................................................. 219
APÊNDICE G: SISTEMATIZAÇÃO DO QUESTIONÁRIO BÁSICO: TABELAS E
GRÁFICOS ...................................................................................................................... 224
18
INTRODUÇÃO
Nesta dissertação estudamos o trabalho e o trabalhador de rua na Avenida Sete de
Setembro e seu entorno, no centro tradicional da cidade de Salvador, lugar onde a atividade
acontece com grande intensidade, entre as maiores da cidade. A pesquisa surge e se justifica,
portanto, com o objetivo de estudar de que maneira a atividade dos trabalhadores de rua está
inserida e se relaciona com o espaço público, bem como a maneira como incidem as ações de
planejamento e ordenamento sobre a mesma. Além disso, busca compreender o perfil do
trabalhador que atua hoje nas ruas de Salvador e verificar, através da apropriação do espaço
público pelo trabalhador de rua, quais são as tensões, interações, contradições, pertencimentos,
conflitos, disputas e solidariedades que se evidenciam na dinâmica da realização da atividade
aqui estudada. Esta pesquisa parte então do princípio de que, além de ser necessário
compreender o contexto no qual a atividade dos trabalhadores de rua se torna mais expressivo
na cidade, a ponto de o tema ser inserido nas políticas públicas do Estado sob a forma do
planejamento, é preciso buscar entender também como os trabalhadores se relacionam entre si
e com o cotidiano da cidade e qual a sua importância para ela.
O trabalho, nesse contexto, é tratado como um aspecto intrínseco à vida, e se destaca
ao analisarmos sua realização em um o espaço público, a rua aqui em questão. Talvez possamos
arriscar dizer que o trabalho é a própria vida para essas pessoas, principalmente se
considerarmos que, assim como em outras ocupações na estrutura social capitalista, o trabalho
torna-se uma das feições mais importantes da vida, para a qual dedicamos a maior parte de
nosso tempo. É também através do trabalho que o indivíduo é capaz de obter satisfação pessoal,
de sentir-se útil para a sociedade e potente diante da vida, além de ser o meio pelo qual se pode
garantir a sobrevivência.
O trabalho que estamos estudando possui essa peculiaridade de ocorrer às vistas de
todos, sobre o que podemos nos perguntar: o que leva as pessoas a utilizarem o espaço da rua
para vender mercadorias? Esta pergunta parece um tanto óbvia, mas aqui nos cabe explicitá-la.
As pessoas estão utilizando a rua para comercializar mercadorias, em sua maioria, como
veremos no desenvolvimento desta dissertação, porque não encontraram outro emprego. Apesar
de haver casos de pessoas que optaram por essa ocupação, a maioria dos trabalhadores
pesquisados revelou ter entrado nesse mercado por não ter conseguido um emprego formal ou
por terem sido demitidos, ou seja, porque ficaram no “olho da rua”, expressão que carrega em
seu significado a ameaça ou a própria situação de desemprego. É justamente no olho da rua que
19
verificamos o desenrolar do trabalho, enquanto aspecto fundamental da vida social moderna,
expresso na apropriação do espaço público pelos trabalhadores de rua em Salvador. No olho
das ruas do centro da cidade podemos verificar a presença de diversos trabalhadores que não
foram absorvidos pelo mercado formal, revelando uma das faces das desigualdades de
oportunidades a que está submetida grande parte da população urbana e, ao mesmo tempo, um
de seus lugares de maior disputa.
Para além das motivações que levaram essas pessoas a realizar suas atividades de
trabalho expostas aos olhos de todos, é importante também entender quem são elas, suas
histórias, suas atividades e estratégias de trabalho, questão que será abordada no Capítulo 3 da
dissertação. Todavia precisamos desde já esclarecer porque estamos fazendo uso do termo
“trabalhador de rua”. Cabe ressaltar que, embora seja necessário olhar um pouco para o passado
para justificar tal denominação, o nosso objetivo não é fazer um histórico do trabalho de rua em
Salvador, mas analisá-lo no período compreendido desde a redemocratização do país e
promulgação de sua nova constituição até os dias atuais (1988-2014). Esse recorte temporal foi
escolhido em função de sua correspondência com os projetos encontrados e que foram
elaborados pelo poder público para o tratamento da questão, bem como com o seu tratamento
enquanto política pública incorporada ao planejamento urbano. Dessa forma, podemos melhor
aproximar o tema pesquisado da linha de pesquisa de Processos Urbanos Contemporâneos, do
Programa de Pós Graduação em Arquitetura e Urbanismo da UFBA.
Por que não nos referimos a essas pessoas como “ambulantes” ou “camelôs”? O
primeiro termo, “ambulante”, se refere àquele que se desloca para oferecer mercadorias ou fazer
negócios. Dá ideia, portanto, de alguém que não cria pontos fixos de trabalho, uma vez que se
está sempre em deslocamento e não foi o caso investigado nesta pesquisa. Já o termo “camelô”
começou a ser tratado em 1869, conforme Mollier (2009), por Pierre Larrousse no Dictionnaire
universel du XIXe siècle. Nele, o termo camelot aparece com o uso popular que recebia na época,
referindo-se ao “vendedor ambulante que empurra uma carreta com os braços e encurvando as
costas, o que faz lembrar um camelo” (MOLLIER, 2009, p.49). Já no segundo Supplément do
Grand Dicitionnaire universel du XIXe siècle, em 1890 o termo era explicado pelos sucessores
de Larousse como:
O termo camelô aplica-se a uma nova classe de negociantes essencialmente características das grandes cidades e em particular de Paris. Ativo, esperto,
inteligente, o camelô geralmente tem verve e espírito suficientes para reunir a
20
multidão em torno de seu modesto mostruário, que cabe inteiro em um pano
estendido na calçada (MOLLIER, 2009, p.49).
O autor supramencionado destaca que, no intervalo de 20 anos entre as publicações
destacadas, é possível notar que a noção sobre este trabalhador se aprimorou, o que se deve ao
fato de, já naquela época, haver uma expansão da atividade. Vale ressaltar que em outra
enciclopédia, La Grande Encyclopédie de Marcellin Berthelot, publicada entre 1885 e 1891, o
termo se subdividia em duas categorias: o primeiro (gascão) corresponde genericamente ao
mascate e o segundo (parisiense) se subdivide entre aqueles que lidam com papel (ex.:
jornaleiro) e os que vendem mercadoria ordinária (ex.: passador de fitas, bengalas, guarda-
chuvas etc.).
Mollier (2009) dedica sua obra a este que seria um personagem familiar nas grandes
cidades desde o século XIX, retratando o surgimento e papel dos camelôs, na França, que para
ele é uma figura onipresente na metrópole. A rua, para este autor, preserva em si a função
essencial de circulação de informações e mercadorias.
Expostos em um mostruário rudimentar, diretamente no chão ou em uma banca de madeira, mas na maioria das vezes apresentados suspensos em
cordões improvisados e presos com pregadores de roupas, esses opúsculos
expressam à sua maneira a capacidade de resistir ao tempo (MOLLIER, 2009, p.16).
Se no século XIX na França as atividades dos camelôs já se faziam importantes, no
mesmo período no Brasil, sobretudo nas cidades de Salvador, Recife e Rio de Janeiro, se
identificava atividades que se aproximam com a anteriormente descrita, com a peculiaridade de
estarem inseridas num contexto de uma economia ainda baseada na escravidão. De acordo com
Durães (2002) em seu trabalho onde estabelece um paralelo entre os trabalhadores de rua de
Salvador do século XIX e os trabalhadores de rua de hoje, as atividades exercidas pelos
primeiros, trabalhadores negros (escravos e libertos) e crioulos que trabalhavam nas ruas de
Salvador, os identificava como “ganhadores”, “carregadores” ou ainda como “prestadores de
“serviços”. Segundo o mesmo autor “dentre as atividades consideradas como informais, na
época, registram-se a venda de comidas típicas (quitandeiras) e a atividade dos trabalhadores
de “ganho” (carregadores), entre outras” (DURÃES, 2002, p.291).
21
[...] se constituiu o trabalho de rua em Salvador no século XIX, altamente
marcado pela estrutura social rígida, onde diferenças raciais e sociais eram
nitidamente afirmadas. Nesse bojo, processou-se a atividade não regulamentada, marcada pela busca imediata da sobrevivência, que ainda não
se caracterizava pela relação de assalariamento, ou seja, eram atividades
tipicamente não capitalistas, muito precárias e, por vezes, discriminadas,
marginalizadas e excluídas naquela sociedade (DURÃES, 2002, p.294).
Segundo o referido autor, parte do que os trabalhadores de ganho recebiam era
repassado para seus donos e a outra parte era utilizada para garantir sua própria subsistência.
Essas atividades se realizavam, sobretudo no espaço público da rua, considerada como “reduto
dos mais vivos, hábeis e representava o espectro da liberdade para uns, dentre esses o escravo
de ganho[...]” (DURÃES, 2002, p.291). Nesse contexto havia já naquela época uma
concentração desses trabalhadores em “cantos” específicos da cidade. Nesses “cantos”, de
acordo com Durães (2009) havia uma estrutura simbólica que possibilitava o seu uso, mas
também uma dimensão legal/oficial de funcionamento já que normalmente se estabeleciam em
alguma esquina das ruas mais movimentadas.
Como mencionamos anteriormente, nesta dissertação não nos aprofundaremos
neste aspecto particular do contexto histórico que traz à tona a questão do trabalho na rua desde
o período do final da escravidão, pois o momento histórico que estará em foco é mais
contemporâneo. Porém, consideramos importante evidenciá-lo como uma forma de ampliar
nossa percepção sobre o trabalho realizado na rua, cuja apropriação pelo trabalho, como
podemos notar, é histórica. A questão da apropriação, por sua vez, será mais bem explorada na
segunda parte do primeiro capítulo desta dissertação. Por ora, é interessante observar que a
atividade, desde o período comentado por Durães (2002), sofre regulações pelo poder público,
que determina sua realização em cantos específicos da cidade. O fato de ela ter sido realizada
majoritariamente por negros, escravos e libertos, portanto, pessoas em situação de maior
vulnerabilidade, também nos dá indícios sobre a segregação que engendra nossa formação
social, política, econômica e espacial.
Para além das questões mencionadas e uma vez apresentados os termos mais
comumente utilizados para se referir aos trabalhadores de rua, cabe ainda justificar o uso do
termo nesta dissertação. A expressão “trabalhador de rua” é considerada como a forma mais
simples de traduzir e remeter ao significado que se quer passar, de alguém que exerce uma
atividade laboriosa nas ruas para dela tirar o seu sustento. Além disso, consideramos a expressão
importante também por reforçar que se trata de um trabalhador, ainda que a atividade realizada
por ele seja precarizada, desprovida de direitos trabalhistas e o deixe em uma condição de
22
vulnerabilidade, uma vez que são grandes as incertezas no que se refere à obtenção de
rendimentos reais no final do mês. O termo nos parece também mais abrangente, pois pode ser
utilizado tanto para aqueles que possuem pontos transitórios, quanto para aqueles que possuem
pontos fixos de trabalho. É importante salientar também que há uma grande diversidade nas
formas de se referir a esse trabalho, cujo entendimento não é uniforme entre os próprios
trabalhadores de rua, como veremos no terceiro capítulo desta dissertação.
Ao nos aproximarmos de como se estrutura a presente dissertação nos parece
importante esclarecer a metodologia aqui empregada, pela qual foi necessário percorrer um
caminho que buscou alinhavar a compreensão teórica e conceitual com as análises empíricas.
O levantamento teórico-conceitual contou com a revisão da bibliografia sobre o assunto e a
pesquisa empírica contou com o levantamento de informações em fontes primárias e
secundárias, o que foi realizado principalmente porque as informações obtidas com o
levantamento teórico-conceitual não foram suficientes para compreendermos efetivamente o
funcionamento da atividade e quem são os agentes que a tornam possível. Mesmo nos projetos
encontrados, incluindo-se aí os recentemente elaborados, não há um levantamento preciso do
quantitativo de trabalhadores atuando na área estudada, por exemplo, tampouco constam
informações sobre o perfil dessa população. Por este motivo, se fez necessário realizarmos um
levantamento empírico que contou com a observação participante, aplicação de questionários
estruturados, entrevistas, registros fotográficos e elaboração de diário de campo.
No que se refere ao caminho teórico proposto, buscamos principalmente
compreender o que se entende como os dois eixos que alicerçam a nossa abordagem: a
informalidade e o espaço público. O resultado dos estudos sobre esses dois eixos e a relação
estabelecida entre ambos aparece no primeiro capítulo desta dissertação. Em seguida, no
segundo capítulo, veremos como as ações do planejamento municipal vêm incidindo sobre a
área estudada, ao analisarmos os projetos propostos no período enfocado. No que se refere a
tais projetos, a análise deteve-se nas seguintes categorias: existência de um diagnóstico sobre a
situação; conforto ambiental; infraestrutura de suporte para a atividade; relação entre a proposta
e o entorno; e densidade de ocupação. A partir da análise realizada através dessas categorias,
acredita-se ser possível avaliar os projetos de forma mais consistente e crítica. Por fim, no
terceiro capítulo, os dados empíricos nos ajudam a ter uma leitura sobre o panorama geral do
que é o trabalho de rua desenvolvido no centro tradicional de Salvador, suas características,
quem são as pessoas que o realizam e como ele se organiza.
23
O primeiro capítulo é iniciado contextualizando a informalidade, sob a ótica das
linhas teóricas que tratam do assunto, o que nos permitirá analisar o comportamento da
economia e do mundo do trabalho do final da década de 1980 até os dias atuais. Além disso,
dados estatísticos sobre a situação do emprego e da informalidade serão apresentados,
relacionados ao contexto histórico do período estudado, ou seja, considerando o processo de
reestruturação produtiva e da globalização com viés neoliberal, que contribuíram para a
flexibilização e diversas formas de precarização do trabalho. Nesta noção sobre a economia, a
formalidade e a informalidade são interpretadas como duas faces de uma mesma moeda, partes
de um mesmo sistema. Dizer isso significa tratar os dois temas compreendendo que sua
distinção se origina do processo tardio de industrialização do Brasil, que arruinou as ocupações
tradicionais sem ser capaz de absorver uma grande massa de pessoas pouco qualificadas,
desempregadas com a modernização dos processos produtivos, seja na indústria, seja na
agriculta. Trata-se, portanto, de um traço estrutural de nossa economia e que pode ser melhor
compreendido se tivermos em conta a leitura sobre os circuitos superior e inferior da economia
desenvolvidos por Milton Santos, onde a noção do espaço é inserida, ampliando nosso
entendimento sobre a problemática. Sobre esse aspecto, vale mencionar ainda que a teoria dos
circuitos da economia se constituirá como fundamento teórico estruturante da dissertação.
O espaço, por sua vez, é uma dimensão bastante importante para nós e será
brevemente delineado teoricamente, sendo compreendido enquanto um produto social em
permanente transformação. A questão do espaço será levantada, sobretudo, para que possamos
evidenciar a relação imbricada que existe entre espaço e economia, que pode ser expressa de
diferentes formas, como é o caso dos trabalhadores de rua aqui estudados. Ademais, o local
específico no espaço em que se expressa a atividade dos trabalhadores de rua, por sua vez, é o
espaço da rua, espaço público, portanto, que também merece ser melhor compreendido. Assim,
a importância das ruas enquanto lugar do diferente, da socialização e da democracia será
destacada, buscando direcionar o olhar para as diferentes formas de apropriação que incidem
sobre este espaço, que não ocorrem sem problemas ou contradições. A apropriação por parte
dos trabalhadores de rua, como veremos, é convertida em direito na medida em que a atividade
é absorvida pelas políticas públicas do Estado, que a incorporam no planejamento, não sem
restringi-las ou regulá-las.
Uma vez discutidos os aspectos dos eixos informalidade e espaço público, no
segundo capítulo nos deteremos às propostas de intervenção elaboradas pelo Poder Público em
momentos distintos entre os anos de 1988 e 2014. Para isso, realizamos pesquisa de dados junto
24
à Fundação Mário Leal Ferreira (FMLF), ente responsável pela concepção e execução dos
projetos urbanísticos desenvolvimentos para o planejamento urbano do município de Salvador,
onde foi possível colher informações sobre os projetos elaborados durante o período estudado.
Além disso, foi realizada entrevista com um representante da Secretaria de Ordem Pública
(SEMOP), órgão responsável atualmente pelo licenciamento e fiscalização do trabalho informal
na cidade.
Ainda no Capítulo 2, a Avenida Sete de Setembro e as ruas de suas imediações,
onde se incluem as ruas do bairro Dois de Julho, serão apresentadas como uma forma de
aproximar o leitor do lugar estudado. Além disso, as propostas de intervenção são apreciadas
tendo em vista o contexto do planejamento urbano no Brasil no qual estão inseridas, e os
contextos políticos na cidade de Salvador, com a finalidade de evidenciar as semelhanças,
diferenças e críticas das propostas apresentadas. Pensamos que assim será possível tensionar a
ação do Poder Público na regulação da atividade, no que se faz importante ainda realizar um
estudo sobre a legislação incidente sobre o assunto.
No terceiro e último capítulo nos debruçaremos sobre quem são os trabalhadores de
rua que atuam hoje na área estudada, em Salvador, o modo como operam sua atividade e qual
a importância que esses enxergam seu trabalho para a cidade. Nessa parte da dissertação
contamos com uma metodologia bastante comprometida com a consistência das informações
coletadas em campo, que contou com a realização de entrevistas e aplicação de questionários
com um universo considerável de pessoas. Cabe mencionar ainda que o método utilizado foi de
realizar um estudo de caso com inspiração etnográfica e antropológica.
A referência à inspiração etnográfica surge primeiro pelo interesse em
evidenciarmos os protagonistas da história, os trabalhadores de rua. Em seguida, pela natureza
da pesquisa ser qualitativa, principal característica da pesquisa antropológica, ainda que não
esteja sendo realizada com a perícia, habilidade e temporalidade do trabalho de uma
antropóloga. Aqui interessa-nos também, portanto, as histórias de vida e os dados advindos da
observação do cotidiano. De acordo com Santos (2005) conseguir os dados desejados, em
grande parte dos casos, está relacionado ao fato de o pesquisador “estar lá”, envolvido com sua
pesquisa, realizando a etnografia.
O método etnográfico, de acordo com Uriarte (2012:173), “consiste num mergulho
profundo e prolongado na vida cotidiana desses Outros que queremos apreender e
compreender”. Este mergulho possui uma primeira fase de aprofundamento na teoria, em que
se realiza um amplo levantamento de informações e interpretações sobre a população que
25
queremos pesquisar; uma segunda fase de convívio intenso com as pessoas dessa população; e
uma fase de escrita quando o pesquisador retorna para casa e registra suas impressões.1 O
“mergulho” em nosso caso, foi dado muito mais como processo que possibilita a observação
do que da participação propriamente dita, excetuando-se aí os casos em que foi possível
estabelecer uma relação de convívio e confiança com alguns trabalhadores. As impressões
levantadas neste percurso resultaram na elaboração de um diário de campo, realizado
principalmente para que as percepções do campo não escapassem da memória. Nesse sentido
há também a realização de registros fotográficos em diferentes momentos da pesquisa. Diante
disso, fica evidente se tratar de uma inspiração no método e não na sua aplicação propriamente
dita. Contudo, acreditamos que ainda que não se constitua essencialmente como método
etnográfico com toda a profundidade de envolvimento que esta forma de estudo implica, a
inspiração nele foi capaz de enriquecer bastante esta pesquisa, sobretudo pela dimensão mais
cotidiana dos sujeitos que se tornou possível aproximar.
O levantamento de informações também foi realizado através da aplicação de
questionários com uma amostra calculada dos trabalhadores de rua, de modo a auxiliar no
entendimento de como se caracteriza a apropriação do espaço utilizado para o trabalho e como
se organizam suas redes de funcionamento. Em nosso caso, como trata-se apenas de uma
inspiração no método etnográfico e por termos o intuito de levantar informações mais acuradas
e atualizadas sobre o perfil dos trabalhadores de rua, que não estão disponibilizadas pelos
órgãos municipais competentes, optamos pela aplicação de questionários estruturados. Para esta
aplicação foi definida uma área de estudo, considerando os locais onde há incidência de
trabalhadores de rua na Avenida Sete e suas imediações. Os questionários aplicados foram
divididos em dois momentos de aplicação:
Um momento de aplicação do questionário básico (Apêndice A), com questões
majoritariamente fechadas e quantitativas, aplicado com um universo mais amplo de
trabalhadores;
Um momento de aplicação do questionário de aprofundamento (Apêndice B), com
questões totalmente abertas e, portanto, qualitativas, realizadas com o intuito de captar
um pouco mais a própria visão dessas pessoas com relação ao trabalho que
desempenham e a importância deste para a cidade.
1 A inspiração nessa metodologia levou a pesquisadora a se dedicar nos últimos quatro anos aos estudos e trabalhos desenvolvidos sobre a temática, além de, nos últimos dois anos tê-la levado a residir no bairro Dois de Julho, uma das áreas pesquisadas, de modo que assim foi possível experenciar mais de perto os aspectos do cotidiano que são mobilizados em função
da atividade dos trabalhadores de rua.
26
Para iniciar o trabalho empírico, buscou-se levantar o número de trabalhadores em
publicações como jornais e diário oficial, porém, devido à diversidade dos quantitativos
encontrados, fez-se necessário realizar uma contagem in loco. Como metodologia para a
contagem, foi decidido realiza-la em dois dias diferentes e posteriormente tirar uma média dos
quantitativos encontrados, para, a partir dessa média, definir o tamanho da amostra necessária.
Para facilitar a orientação e análise de campo, foi criado um mapa distinguindo as 04 áreas de
aplicação dos questionários (Apêndice D). Neste mapa estão identificadas as áreas e os trechos
da Av. Sete de Setembro e Av. Joana Angélica que precisaram ser subdivididos durante a
contagem. Os resultados da contagem por trecho, por sua vez, estão listados no Apêndice C.
Por ora, cabe aqui comentarmos que a amostra resultante desse processo foi de 287
trabalhadores de rua, nos quais foram adicionados mais 2 questionários em campo por engano,
resultando em uma amostra de 289 trabalhadores, os quais nos permitiram analisar os dados do
perfil e da dinâmica da atividade.
Os resultados da aplicação do questionário básico, bem como os significados dessas
respostas estarão distribuídos ao longo do terceiro capítulo, em diálogo tanto com a teoria
apresentada nos capítulos anteriores, quanto com entrevistas realizadas com os outros agentes
que interagem com a atividade do trabalhador de rua. As entrevistas, portanto, se constituem
como um terceiro elemento da metodologia de realização do trabalho empírico e foram
realizadas também em dois momentos: um com os representantes das três associações e de um
sindicato dos trabalhadores de rua; e com um representante do órgão municipal responsável
pelo controle e ordenamento da atividade.
Soma-se ainda à metodologia de trabalho desenvolvida em campo, a elaboração e
apresentação de um relato construído com o intuito de aproximar-se ao máximo de uma
narrativa2, que surge como um produto do levantamento de dados e que é incorporada ao
terceiro capítulo do trabalho. Tal relato constitui-se, talvez, como o lugar onde mais
genuinamente se evidenciam as relações do trabalhador de rua com o espaço do qual se utiliza
e com os agentes que nele interferem, fazendo emergir um pouco da relação dessas pessoas
com a cidade. A inserção da narrativa no texto se justifica principalmente por considerarmos
que o ponto de vista dessas pessoas sobre o seu trabalho é tão ou mais importante do que aquilo
que se diz sobre elas. Como nos diz Uriarte (2012:175) sobre o método etnográfico “a essas
2 Uriarte (2013) esclarece sobre a distinção entre descrever e narrar o campo. Segundo a autora, descrever é: “um ato sem prévia reflexão, que conta acontecimentos, fatos, impressões sem tentar encontrar ainda ordem ou lógica entre eles”. Já narrar é entendido como “um trabalho conscientemente inventivo, que se vale de outras linguagens que não apenas a oralidade”, ou seja, é uma forma de contar fatos selecionados (determinadas passagens, momentos, personagens, etc.), montados em uma certa
ordem ou sequência, como uma composição.
27
pessoas damos voz não por caridade, mas por convicção de que têm coisas a dizer”. Contudo,
cabe dizer ainda que tal narrativa, apesar de apresentar brevemente a história de vida de dez
“personagens” da Avenida Sete de Setembro, em sua condição de trabalhadores de rua, não
poderá ser demasiadamente prolongada, o que deixa tanto a pesquisadora com mais vontade de
escrever sobre elas, quanto pode deixar o leitor com mais curiosidade por conhecê-las.
Uma vez esclarecida a metodologia realizada para o levantamento de dados
empíricos, cabe-nos apresentar os resultados encontrados como uma forma de dar visibilidade
à dinâmica do trabalho realizado nas ruas da cidade de Salvador. Para isso, no terceiro capítulo,
o perfil do trabalhador de rua é apresentado através dos gráficos e tabelas resultantes da
sistematização do trabalho de campo. Em seguida tentamos sistematizar a análise da atividade
segundo três aspectos que se destacam no seu funcionamento, identificados como: “se virar”,
referente ao próprio exercício do trabalho, onde destacamos a relação entre a subordinação e a
autonomia no trabalho desenvolvido; “a correria e o rapa”, onde se tratará sobre os
tensionamentos existentes no desenrolar da atividade; e “a pedra”, que aborda a relação do
trabalhador com o lugar, seus pertencimentos e relações de solidariedade. Acreditamos que a
apresentação dos dados dessa forma nos ajuda a ter uma leitura mais completa do
desenvolvimento do trabalho de rua em Salvador e suas características, além de ampliar nossa
visão sobre quem o torna possível.
Por fim, serão apresentadas as conclusões da pesquisa, onde serão evidenciadas as
reflexões sobre as questões mais relevantes discorridas ao longo da dissertação. Elas serão
problematizadas principalmente para colocar em questão as interações, contradições, conflitos
e disputas originadas da apropriação do espaço público pelos trabalhadores.
28
1 TRABALHO DE RUA: UMA RELAÇÃO ENTRE INFORMALIDADE E ESPAÇO
PÚBLICO
Neste capítulo será possível tratar sobre os aspectos do contexto e os conceitos que
formam o lastro teórico para o processo aqui observado. As mudanças políticas, econômicas,
sociais e seu rebatimento no urbano serão apresentadas de modo que o desenrolar da atividade
do trabalhador de rua pode ser compreendido como parte de um traço estrutural de nossa
economia. Tais informações, embora nos permitam entender o contexto no qual a cidade de
Salvador esteve e está inserida, só se completa se também estivermos atentos a dois eixos
estruturantes e articuladores de como entendemos o trabalho de rua nesta dissertação. Trata-se
do entendimento do que a relação entre as noções de informalidade e do espaço público nos
dizem a respeito do trabalho realizado na rua.
No primeiro eixo, informalidade, será colocada em evidência a discussão sobre os
setores formal e informal da economia. Perpassar pela evolução da distinção dualista que
inicialmente faz parte do entendimento teórico sobre os dois setores, auxilia também no
entendimento da expressão que a chamada informalidade ganhou na sociedade, sobretudo no
que se refere ao seu papel para a circulação das mercadorias. A dimensão da informalidade será
apresentada então, à luz do processo de reestruturação produtiva e da globalização, que
contribuíram amplamente para flexibilização e precarização do trabalho. Tais análises,
entretanto, não se darão apenas contrapondo os aspectos duais dessa discussão e sua evolução.
Agrega-se a leitura do professor Milton Santos sobre esse processo, onde a informalidade
aparece como parte componente de um sistema, compreendido pelos circuitos superior e
inferior da economia. As características desses dois circuitos serão apresentadas com ênfase no
que se refere ao circuito inferior, onde está inserida a atividade estudada.
O entendimento da informalidade, a evolução da discussão a seu respeito e sua
compreensão a partir dos circuitos da economia não podem ser completos se não levarmos em
conta a noção do espaço, segundo eixo estruturante para a compreensão da atividade estudada
nesta dissertação. O trabalhador de rua ocupa um lugar no espaço que não é escolhido
aleatoriamente. Ele possui características funcionais para o desenvolvimento da atividade que
perpassam por sua localização na cidade e que tem a ver com a dimensão pública da vida. A
concepção do espaço é, portanto, elucidada a partir de categorias de análise propostas pelo
professor Milton Santos (forma, função, estrutura e processo), e serão explicitadas para auxiliar
no entendimento do espaço propriamente dito, compreendido enquanto produto social em
29
permanente transformação. A economia e o espaço aparecem assim intrinsecamente ligados,
onde a economia se expressa no espaço sob as diferentes formas em que este é apropriado, o
que pode ser observado, sobretudo, quando é o espaço público que está em questão. A discussão
sobre o espaço público, compreendido tendo em vista às dimensões pública e privada da vida,
será evidenciada a fim de chamar a atenção para a importância das ruas enquanto lugar de
socialização e do encontro com as diferenças. Considera-se que a articulação entre os dois eixos
apresentados nos instigam a olhar para o cotidiano de maneira especial, enxergando para além
do que normalmente o senso comum nos permite ver.
1.1 Nem dicotomia, nem ambiguidade: dois circuitos de um mesmo sistema
Que significado para a cidade tem o trabalho da pessoa que usa o espaço da rua para
comercialização de mercadorias? A que categoria da economia este trabalho pertence? Para o
desenvolvimento desta pesquisa, considerou-se importante inicialmente compreender quem são
os trabalhadores de rua na cidade de Salvador e isso implica saber em que categoria eles estão
enquadrados, como esse trabalho funciona, como ele está inserido no modo de produção
capitalista e, consequentemente, quais são os desdobramentos da atividade no espaço. Para
aproximar-nos um pouco mais das respostas a essas questões é preciso entender o que é a
informalidade e como ela se apresenta no Brasil. Para tanto, algumas contribuições serão
explicitadas a seguir.
Esta seção tem o objetivo principal de buscar conhecer as principais características,
abordagens e mudanças que o entendimento sobre a informalidade sofreu nas últimas décadas,
e a partir daí explorar também as mudanças ocorridas no mundo do trabalho no mesmo período.
Para Costa (2010) a informalidade surge da noção de subdesenvolvimento, de modo a explicar
a não-inserção dos menos favorecidos no processo produtivo, em contextos nos quais o
assalariamento é pouco generalizado. Para a autora, tal debate se divide em duas correntes:
estruturalista e de extração marxista.
A corrente estruturalista seria orientada pela “Teoria da Modernização”, que
concebia o subdesenvolvimento como decorrência de uma desvantagem no valor relativo das
trocas econômicas entre o centro e a periferia. Está marcada pela presença de um setor de
subsistência ou informal, caracterizado pela baixa densidade de capital, pelo precário nível
técnico de produção e pela baixa produtividade, convivendo com um setor moderno, de
avançado padrão tecnológico, economicamente mais capitalizado e dinâmico.
30
Já a corrente de extração marxista pensava o problema da não integração na
perspectiva das contradições do próprio modelo de acumulação capitalista consolidado sob a
égide da industrialização. Essas ideias eram construídas em torno da “Teoria da Dependência”,
onde o subdesenvolvimento não era entendido como um estágio anterior ao desenvolvimento,
mas como produto de uma inserção subordinada e dependente dos países da região no sistema
capitalista mundial. Destaca-se ainda uma importante crítica dessa corrente:
A crítica basilar dessa corrente às teses da modernização como marginalidade,
e que vai buscar seu fundamento na lei geral da acumulação capitalista em Marx, sustenta que o problema da marginalidade e da informalidade, decorre
não de uma condição de inadequação de parte do sistema (o arcaico) a seu
padrão normal de funcionamento (o moderno); ao contrário, é resultado do
modo de produção capitalista, estruturado sob uma lógica de dominação das relações de produção, portanto, de classe, que gera seu próprio excedente de
trabalho: um exército industrial de reserva que vai buscar seu meio de
sobrevivência fora do domínio das relações capitalistas modernas e que é, sim, funcional e rentável àquele padrão de acumulação, posto que é fator de
barateamento e disciplinamento da força de trabalho (COSTA, 2010:174).
A crítica põe em evidência a funcionalidade da informalidade dentro do sistema
capitalista, pois além de baratear a força de trabalho, ela favorece também à circulação das
mercadorias em diversos níveis, o que será mais bem explorado posteriormente neste trabalho.
Podemos acrescentar nesse debate ainda a ponderação de Oliveira (2003) em sua crítica à razão
dualista, que justamente propõe uma superação ao dualismo no debate entre o formal e o
informal, pois o autor compreende que ambos os setores compõem partes de um mesmo sistema
na economia. Se por formal pode-se entender que há todo um respaldo no que refere ao campo
dos direitos do trabalhador, no informal esses direitos são total ou parcialmente negados, o que
não necessariamente indica uma falta de modernidade ou de importância do setor. “Formal” e
“informal” são, portanto, dois lados de uma mesma lógica e assim, para o referido autor, a
utilização destes termos por si só não possuem mais força explicativa.
Destaca-se neste sentido um trabalho desenvolvido para Organização Internacional
do Trabalho (OIT), onde se caracteriza a mudança do conceito de setor informal para economia
informal. Entre algumas das contribuições apresentadas por Krein e Proni (2010), no que se
refere ao setor informal, este aparece como sendo “funcional” ao conjunto de empresas formais
para rebaixar o custo de reprodução da força de trabalho, além de servir como porta de entrada
ao mercado de trabalho e como manifestação do excedente estrutural e de mão-de-obra. Por
31
conta da diversidade de interpretações sobre o setor informal, a discussão sobre a informalidade
se tornou tema de algumas conferências da OIT.
Para a OIT, em 1991, o dilema enfrentado pelos países cuja predominância é o
trabalho informal se refere à necessidade de se optar pela eliminação do conjunto heterogêneo
das atividades de que faz parte a informalidade, para propor estratégias que aproveitem o
potencial de geração de ocupação e renda para parte da população menos favorecida. Em 1993
foram adotados os critérios estabelecidos na conferência de 1991, que definia que as unidades
econômicas informais poderiam ser de duas maneiras: empreendimentos unipessoais ou
familiares; e microempresas com trabalho assalariado. Para Krein e Proni (2010) as várias
expressões da informalidade continuaram a se expandir, aumentando a sua heterogeneidade, o
que significava que o setor informal desempenhava um papel importante na geração de renda
para parcela significativa da população.
Em 2002, em mais uma conferência sobre o trabalho, a OIT passou a utilizar o
termo economia informal. O motivo da mudança era o de poder abarcar no conceito a
diversidade e dinamismo presentes nesse conjunto complexo e heterogêneo de atividades. O
conceito passou então a abranger:
a) trabalhadores independentes típicos (microempresa familiar, trabalhador em cooperativa, trabalhador autônomo em domicílio);
b) “falsos” autônomos (trabalhador terceirizado subcontratado, trabalho em
domicílio, trabalhador em falsa cooperativa, falsos voluntários do terceiro setor);
c) trabalhadores dependentes “flexíveis” e/ou “atípicos” (assalariados de
microempresas, trabalhador em tempo parcial, emprego temporário ou por tempo determinado, trabalhador doméstico, “teletrabalhadores”);
d) microempregadores;
e) produtores para o autoconsumo; e
f) trabalhadores voluntários do “terceiro setor” e da economia solidária (KREIN E PRONI, 2010:12).
Apesar do termo “economia informal” ser uma referência formulada pela OIT, de
acordo com Krein e Proni (2010), o mesmo não teve muita difusão no Brasil. O termo
informalidade continuaria para os autores, portanto, sendo o mais utilizado no debate nacional.
Nesse sentido, uma das conclusões a que chegam é de que a principal característica da
informalidade é a inserção precária no mercado de trabalho, o que se dá, sobretudo, pela
ausência ou precariedade de leis trabalhistas e sociais. Mas de que maneira chegamos a esse
cenário? É preciso compreender o processo que levou a questão informalidade a ganhar tal
32
expressão. Para isso, será necessário olhar um pouco mais no passado, mais precisamente para
algumas reflexões da década de 1960 para cá. Contudo, esse olhar não será demasiadamente
aprofundado, pois o que se pretende como foco neste trabalho é analisar os rebatimentos desse
processo nos dias de hoje, sobretudo no que se refere à atividade dos trabalhadores de rua.
De acordo com Costa (2000:175), “o trabalho informal pode ser conceituado como
aquele não regulamentado pelo ordenamento legal do trabalho no país, sobre o qual, inclusive,
a sociedade construiu sua política de seguridade social”. Nesse sentido, as políticas de
seguridade desenvolvidas pelo Estado dirigiam-se apenas para os trabalhadores formalmente
reconhecidos, o que significa para a autora uma “cidadania regulada”, ou seja, aquela adquirida
unicamente pelos indivíduos enquadrados na estrutura ocupacional definida e reconhecida pelo
Ministério do Trabalho. Sobre este aspecto é importante retomarmos a Consolidação das Leis
Trabalhistas (CLT), promulgada em 1943 na era Vargas, cujo objetivo era o de assegurar os
direitos dos trabalhadores no campo individual, com a definição do limite à jornada de trabalho
de 8 horas, salário mínimo, férias, 13º salário, entre outros benefícios, e que também assegura
a representação coletiva, ou seja, a negociação dos termos de trabalho entre patrões e
trabalhadores, através dos sindicatos. Entretanto, esses direitos se dirigem apenas aos
trabalhadores formais.
A divisão da economia em formal e informal para Filgueiras et al. (2004), além de
ser muito simplista, também associa o setor informal aos segmentos mais pobres da população,
sem considerar as formas de inserção do trabalhador na produção. Os autores destacam a
possibilidade de se distinguir o espaço econômico-social através de dois critérios distintos, que
originam três conceitos de informalidade diferentes. O primeiro critério distingue formal e
informal por suas lógicas de funcionamento e o segundo delimita a diferença entre ambos a
partir da legalidade e ilegalidade das atividades.
O primeiro conceito abordado pelos autores se refere aos estudos da OIT já
mencionados, para o qual o setor informal seria uma consequência do excedente de mão de
obra. De acordo com Filgueiras et al. (2004) a partir da década de 1970 o termo informalidade
passou a ser abordado partindo das relações do trabalhador com os meios de produção, cuja
definição engloba o conjunto de atividades não tipicamente capitalistas, onde a busca do lucro
não é o objetivo central e não há uma separação nítida entre capital e trabalho. Sob este enfoque,
a informalidade estaria relacionada às atividades autônomas.
O segundo conceito foi formulado a partir da realidade dos países capitalistas
centrais, onde a crise do Fordismo, do Estado de Bem Estar Social, e os programas de
33
liberalização econômica tiveram como consequência o surgimento de atividades não
regulamentadas pela legislação vigente nestes países. O termo informal, nesse contexto, passou
a ser utilizado para exprimir o conjunto de atividades ilegais e/ou ilícitas. A informalidade passa
nessa segunda definição a se referir tanto as atividades e formas de produção quanto às relações
de trabalho consideradas ilegais, identificando-se com o que se chama de economia subterrânea
ou submersa.
O terceiro e último conceito ao qual Filgueiras et al (2004) fazem referência é o da
informalidade tomada a partir da junção dos critérios de ilegalidade e das formas de produção
não tipicamente capitalistas, ou seja, a informalidade estaria relacionada com todas as formas e
relações de trabalho não-fordistas e/ou precárias. Isso quer dizer que os trabalhadores informais
teriam uma inserção precária no mercado de trabalho, ou seja, não estariam sob a proteção de
leis sociais e trabalhistas. Vale ressaltar que é em sentido semelhante que a informalidade é
entendida nesse trabalho, ou seja, como toda forma de inserção precária no mercado de trabalho,
onde não se tem respaldo quanto aos direitos trabalhistas.
Filgueiras et al. (2004) chamam atenção para o fato de, no Brasil, a informalidade
ter sido intensa desde o período que sucede a IIª Guerra Mundial, momento que coincide com
o período de aceleração da industrialização brasileira. De acordo com Costa (2010) a rápida
urbanização dos anos 1960 e 1970 não foi capaz de absorver os indivíduos que migraram para
as cidades. A atividade capitalista se expandiu, tomando espaço das atividades tradicionais,
porém não foi capaz de gerar os empregos na mesma proporção dos que destruiu ou dos que a
sociedade necessitava. Desse processo decorreu a criação de novas modalidades de trabalho
informal e o próprio desemprego.
Segundo Filgueiras et al (2004) no início dos anos 1980, momento de crise no
padrão de desenvolvimento criado desde o pós-guerra e de crise no fordismo, houve um intenso
processo de desestruturação do mercado de trabalho, onde já se prenunciava a precarização do
emprego. Para Costa (2010) foi a partir da referida década que as mudanças na análise do
problema da informalidade passaram a se dar em torno de duas situações principais: em torno
da perda da centralidade e do dinamismo do setor secundário (que não gerava mais tantos
empregos); e em torno da crescente força do setor de serviços na absorção da força de trabalho.
A informalidade se generalizou nesse período, em que se disseminou o discurso de que o
caminho para a modernidade passava por reformas no âmbito das privatizações e da
desregulamentação dos mercados e do trabalho.
34
Ainda segundo Costa (2010) na década de 1990 há uma acentuação no retraimento
da economia organizada e do trabalho formal. Com o advento da terceirização, empregos
regulares que contavam com certo acúmulo de conquistas sociais foram substituídos por
empregos precários, temporários e/ou não regulamentados. De acordo com Borges (2007) as
transformações dos anos 1990 impactaram a vida dos brasileiros mudando o padrão de
desenvolvimento, as formas e mecanismos de inserção e de permanência no mercado de
trabalho, e os projetos para o futuro de diversos trabalhadores. Passou-se de uma economia
fechada para uma economia aberta, desregulamentada, voltada a atender os interesses
neoliberais de agentes externos, que ganharam maior influência, sobretudo, através das
privatizações de setores estratégicos da economia nacional.
Finalmente, nesse período, passou-se de uma economia com elevado
dinamismo no seu mercado de trabalho, com geração contínua de postos de trabalho (bons e ruins), para uma economia que destrói os melhores empregos
e gera, quase que exclusivamente, postos de trabalho mal remunerados,
desprotegidos e em número insuficiente. Com isto, o mercado de trabalho
brasileiro, estruturalmente marcado pela presença expressiva da informalidade e do subemprego, aprofunda esses traços e a eles agrega
elevadíssimas taxas de desemprego aberto e oculto (BORGES, 2007:82).
Nesse sentido, para Filgueiras et al (2004) a globalização e a reestruturação
produtiva da década de 1990 possuem um papel de destaque, pois resultaram em altas taxas de
desemprego, acentuação da precarização do trabalho e do emprego, e crescimento das
atividades não regulamentadas. A globalização, por sua vez, favoreceu que as empresas
buscassem se fixar onde havia mais recursos para seus negócios (por exemplo: isenção de
impostos e mão de obra barata). Nos anos 1990, no Brasil, foram registradas as maiores taxas
de desemprego da história, bem como uma expansão bastante expressiva do setor de serviços,
que mesmo assim não foi capaz de absorver o contingente de trabalhadores existente. Ainda de
acordo com os autores supramencionados, a ampliação da informalidade com a transferência
dos trabalhadores que outrora realizavam atividades formais para as atividades informais, deu
origem a chamada nova informalidade. Esta, por sua vez, de acordo com Costa (2010) tem
como características: precariedade das condições de trabalho e vida, negação dos princípios
mais elementares de cidadania, além de perpetuar a reprodução da pobreza e das desigualdades
sociais. Grande parte dessa nova informalidade é formada por trabalhadores advindos de grupos
sociais pauperizados, que se inserem em condições de trabalho bastante precárias. Não se pode,
porém, generalizar o papel destes na economia informal, conforme nos diz Costa:
35
[...] a economia informal não pode ser considerada um eufemismo para a
pobreza, devido à sua elevada heterogeneidade: há muito dinamismo na
economia informal e ela é geradora de elevado nível de renda para muitos empreendedores informais. Todavia, a noção de pobreza não pode ser
entendida apenas pelo critério de renda (ou insuficiência de renda), pois ela
também está relacionada ao consumo ou ao acesso a serviços, como qualidade
da moradia, acesso à educação, políticas de saúde coletiva, enfim, à noção de direitos e de cidadania. Esses aspectos remetem às escolhas políticas de uma
sociedade e aos mecanismos que ela socialmente engendra para distribuir sua
riqueza. E esse é essencialmente o campo do conflito político de classe (COSTA, 2010:182).
No âmbito da economia informal nem sempre se poderá fazer uma relação direta
com a pobreza, cuja noção está relacionada à negação de uma série de direitos, nos quais se
incluem o direito ao trabalho. Considera-se, portanto, que o baixo ingresso ao trabalho formal
(aquele em que os direitos são assegurados) indica uma situação de maior vulnerabilidade para
todos os que estão submetidos a ele, uma vez que a possibilidade de acesso a recursos adequados
às necessidades cotidianas dos indivíduos fica limitada pela insegurança ou falta de renda. Nas
palavras de Kraychete e Borges (2007:233), “[...] a reprodução contínua da pobreza está
diretamente associada à sub-remuneração do trabalho”.
Com relação aos riscos provenientes da renda, aos quais estão submetidos esses
trabalhadores, é preciso ter em vista também o que nos chama atenção Filgueiras et. al. (2004),
quando mencionam os novos modos de exploração capitalista, sustentados numa forte
individualização e que têm no binômio empregabilidade/empreendedorismo a construção de
sua ideologia. Segundo Borges (2007) estes novos modos de exploração reforçam a ideia de
que, por exemplo, o empreendedorismo e o trabalho autônomo por serem flexíveis, oferecem
mais vantagens aos trabalhadores, pois lhes permitiriam ter mais autonomia e liberdade. Porém
essa ideia de liberdade é muito mais ideológica do que realmente concreta, pois a flexibilização
do trabalho implica em uma maior taxa de exploração, já que nesse regime não é coberta uma
série de direitos como a fixação de limite de horas e dias de trabalho, por exemplo, além de
favorecer o aumento da velocidade e ritmo do trabalho.
Aproximando-nos do momento histórico atual, temos que a situação do trabalho e
do emprego sofreu algumas alterações importantes nos anos 2000. De acordo com Alves
(2011), esse período da história da economia do Brasil pode ser denominado de
“neodesenvolvimentismo”, cujo termo é utilizado em contraposição ao período neoliberal
vigente nos governos dos presidentes Collor de Melo e Fernando Henrique Cardoso. O
“neodesenvolvimentismo” abrange, portanto, o período dos dois governos de Luis Inácio Lula
36
da Silva, entre 2003 e 2010, e se caracteriza por duas vertentes principais: “Estado financiador”
e “Estado investidor”.
O “Estado financiador” se caracteriza pela utilização de recursos, principalmente
oriundos do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES), para induzir o crescimento
econômico, contribuindo principalmente para o fortalecimento de grupos privados estratégicos.
Já o “Estado investidor”, se caracteriza pelo investimento em mega-obras de infraestrutura,
realizadas através do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Uma terceira vertente
que há ainda de se considerar como característica do momento vivido pelo país nos anos 2000
é o “Estado Social”, onde temos o Estado reassumindo o papel de provedor de políticas sociais
e de mitigação da pobreza.
De acordo com Boschi e Gaitán (2013) o neodesenvolvimentismo é um conceito
utilizado atualmente para referir-se aos estudos sobre desenvolvimento elaborados
posteriormente à hegemonia neoliberal. Sua discussão é considerada ainda como resultado do
fracasso das políticas neoliberais que proclamaram o Estado mínimo e poder auto regulador do
mercado. É discutido por dois grupos principais: o primeiro, sob a liderança de Bresser Pereira,
apresenta a proposta como mais do que uma simples teoria econômica, mas como uma
estratégia nacional de desenvolvimento, onde a base está na industrialização aberta à
competição com os mercados externos. O segundo grupo, se estabelece no Instituto de
Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro e da Associação Keynesiana Brasileira.
As ideias desse segundo grupo aproximam-se das análises do primeiro, mas buscam ir além da
questão macroeconômica ao incluir, por exemplo, a questão da relação entre público e privado
e as relações da economia com a sociedade. Para eles, o novo desenvolvimentismo demanda
um mercado e um Estado forte. Resumidamente, de acordo com Boschi e Gaitán (2013:327-
328), o neodesenvolvimentismo pode ser definido como "formulação de um projeto nacional
que postula a formação de um espaço de coordenação entre as esferas pública e privada, com o
intuito de aumentar a renda nacional e os parâmetros de bem-estar social." É considerado ainda
um processo econômico, político e social ligado à tensões derivadas das políticas
implementadas no país.
Segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos
(DIEESE, 2011), a partir de 2004 verificou-se um aumento no nível do emprego no Brasil. O
período entre 2004 e 2008 foi considerado o mais próspero da década, com melhoria nos
indicadores sociais e na redução do desemprego, onde a ocupação cresceu em ritmo superior
ao crescimento da População Economicamente Ativa (PEA) (Gráfico 1).
37
Gráfico 1: Evolução do PIB nacional, trimestral e das Populações Metropolitanas
Economicamente Ativa e Ocupada - Brasil e Regiões Metropolitanas(*) - 1998 a 2009 (Base 100 = média de 1998)
Fonte: Ipeadata e Convênio DIEESE/SEADE/MTE-FAT e convênios regionais. Pesquisa de Emprego e Desemprego - PED Nota: (*) Estão incluídas as Regiões Metropolitanas de Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador, São Paulo e Distrito Federal.
O DIEESE (2011) aponta que os fatores que tornaram essa realidade possível foram
a confluência de resultados positivos da gestão interna e do ambiente internacional favorável.
A partir de 2004 a nova dinâmica do mercado de trabalho brasileiro centrou-se no
comportamento do Produto Interno Bruto (PIB) e na expansão dos investimentos. Na Tabela 1
divulgada pelo referido Departamento, podemos verificar que o número de ocupados cresceu
em todas as regiões metropolitanas do Brasil.
Tabela 1: Estimativa do número de ocupados.
Regiões Metropolitanas(*) e Distrito Federal – 1999, 2003, 2004, 2008 e 2009
Fonte: Convênio DIEESE/SEADE/ MTE - FAT e convênios regionais. Pesquisa de Emprego e Desemprego - PED Elaboração: DIEESE Nota: (*) Estão incluídas as Regiões Metropolitanas de Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador e São Paulo
38
Através da leitura da Tabela 1 podemos notar ainda que entre 1999 e 2003 a média
do crescimento anual foi de 2,2%. No período de 2004 a 2008 o mesmo indicador atingiu 3,4%
e no período de 2004 a 2009, correspondeu a 3,1%, redução que se deu pela crise financeira
internacional, que ameaçou a prosperidade que vinha sendo observada no período. Contudo, o
destaque para o crescimento ocupacional nesse momento foi para o setor da construção civil
que continuou contratando em 2009 e 2010 devido ao aumento do crédito no segmento
imobiliário e ao Programa Minha Casa Minha Vida, que surgiu com o objetivo tanto de superar
o déficit habitacional no país, quanto de ampliar as ofertas de emprego no setor da construção
civil.
De maneira geral, o DIEESE (2011) aponta que nos anos 2000 verifica-se um
aumento importante no trabalho assalariado, enquanto os trabalhos domésticos e autônomos
apresentaram queda. É importante mencionar que no período mencionado houve ainda uma
forte geração de postos de trabalho com vínculo formal, além de incentivos fiscais como a
implantação do Simples Nacional, que estimulou as micro e pequenas empresas a saírem da
informalidade e a formalizarem o vínculo de trabalho junto aos seus funcionários.
Consideramos válido mencionar ainda que, no período de 1999 a 2009 segundo análise do
DIEESE (2011), a redução do desemprego foi generalizada. A taxa de desemprego médio anual
caiu de 20,3% da PEA para 14,2%, como poderemos observar no Gráfico 2.
Gráfico 2: Taxas de desemprego, segundo tipo
Regiões Metropolitanas(*) e Distrito Federal – 1999 e 2009 (em %)
Fonte: Convênio DIEESE/SEADE/ MTE - FAT e convênios regionais. Pesquisa de Emprego e Desemprego - PED Elaboração: DIEESE Nota: (*) Estão incluídas as Regiões Metropolitanas de Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador e São Paulo.
39
Dentre os tipos de desemprego apresentados no Gráfico 2, podemos observar que a
redução mais expressiva foi na taxa do desemprego aberto3 (2,6%). Com relação ao desemprego
aberto, é preciso estar atento ao fato dele estar relacionado com a procura pelo posto de trabalho,
que exige custos por parte do postulante à vaga que vão desde a distribuição dos currículos e
inscrição em agências de intermediação de mão-de-obra, até as providências para a boa
apresentação nas entrevistas e processos seletivos, sem contar com a manutenção de sua própria
sobrevivência nesse período. Assim, os trabalhadores que perderam ou deixaram um emprego
anterior há pouco tempo e que possuem recursos rescisórios conseguem se organizar de forma
melhor na busca por um novo posto de trabalho. Para o DIEESE (2011) os provedores de
família tendem, portanto, a aceitar as primeiras ofertas de trabalho que surgem, pois
dificilmente conseguem conciliar longos períodos de procura por trabalho com o sustento da
família. Se, por um lado temos que o desemprego aberto é menor entre os chefes de família nos
domicílios, por outro, entre os filhos desses chefes de família concentra-se a maior proporção
de desemprego aberto, ou seja, entre os mais jovens.
Uma categoria que merece ser evidenciada, por estar relacionada com o objeto de
estudo desta dissertação, é a do “desemprego oculto pelo trabalho precário”. Neste tipo de
desemprego, o DIEESE (2011) informa que encontram-se os trabalhadores com experiência
profissional anterior, porém essa experiência acumulada reflete mais uma trajetória de
dificuldades do que os requisitos exigidos pela matriz produtiva de um país em expansão. Isto
porque, mesmo tratando-se de um contingente em processo de redução, estes desempregados
foram demitidos e/ou perderam seus postos de trabalho há muito tempo. Para essas pessoas, o
desenvolvimento trouxe a rotatividade. Ainda de acordo com informações do DIEESE, em 10
anos houve, de maneira simultânea, a redução do número de trabalhadores que associam a
procura de trabalho com o exercício de bicos, e o crescimento para 35,6% da proporção
daqueles que declararam ter perdido ou deixado o último emprego nos últimos 4 meses. Cabe
destacar ainda que, como pode ser observado na Tabela 2, 40,7% dos desempregados em 2009
permaneceram por até 6 meses no último posto de trabalho, ou seja, um tempo bastante curto.
3 Segundo o DIEESE (2011), o desemprego aberto é composto pelas pessoas que procuraram trabalho de maneira efetiva nos 30 dias anteriores ao da entrevista e não exerceram nenhum trabalho nos sete últimos dias; o desemprego oculto pelo trabalho precário é composto pelas pessoas que realizam trabalhos precários – algum trabalho remunerado ocasional de auto-ocupação – ou pessoas que realizam trabalho não-remunerado em ajuda a negócios de parentes e que procuraram mudar de trabalho nos 30 dias anteriores ao da entrevista ou que, não tendo procurado neste período, o fizeram sem êxito até 12 meses atrás; e o desemprego oculto pelo desalento é composto pelas pessoas que não possuem trabalho e nem procuraram nos últimos 30 dias anteriores ao da entrevista, por desestímulos do mercado de trabalho ou por circunstâncias fortuitas, mas apresentaram procura
efetiva de trabalho nos últimos 12 meses.
40
Tabela 2: Distribuição da população em desemprego oculto pelo trabalho precário e
experiência anterior de trabalho, segundo tempo de perda do emprego e duração do último
trabalho Regiões Metropolitanas(*) e Distrito Federal – 1999, 2004 e 2009 (em %)
Fonte: Convênio DIEESE/SEADE/ MTE - FAT e convênios regionais. Pesquisa de Emprego e Desemprego - PED Elaboração: DIEESE Nota: (*) Estão incluídas as Regiões Metropolitanas de Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador e São Paulo.
Nesse contexto consideramos relevante o que nos diz Alves (2011) sobre esse
período contemporâneo de expansão capitalista do Brasil, em que se retoma, em termos
relativos, o crescimento da economia por um lado, e consolida-se um novo e precário mundo
do trabalho por outro, marcado por uma nova condição salarial flexível, caracterizada pela
intermitência laboral. Se na década de 1990 o mundo do trabalho no Brasil se caracterizava
pelo desemprego aberto e pela informalização das relações de emprego, na década de 2000 é a
natureza flexível do emprego e da organização do trabalho que predominam. O autor
supramencionado afirma que a expansão capitalista do Brasil “decorre não de aspectos
conjunturais da dinâmica capitalista, mas sim, de um processo estrutural de precarização do
trabalho que emerge com o novo regime de acumulação” (ALVES, 2011, p.157).
Embora possamos ter claro que a situação do trabalho e do emprego no país, de
maneira geral, tenha melhorado nos anos 2000, essa tendência ao crescimento da economia e
da geração de postos de trabalho cresceu juntamente com os fenômenos da precarização e da
flexibilização. Esse novo trabalho perde qualidade, portanto, no sentido de ser pouco capaz de
assegurar a prosperidade e qualidade de vida das pessoas que se ocupam sob tais termos, já que
carrega em suas entrelinhas a instabilidade e a insegurança no futuro. Nesse sentido, a discussão
sobre a formalidade e informalidade das relações de trabalho persiste, no que se torna
41
importante agregar a leitura sobre a teoria dos circuitos da economia propostos pelo professor
Milton Santos, considerada de fundamental importância para esta pesquisa.
Santos (2008a) parte da noção de subdesenvolvimento, assim como, por exemplo,
Chico de Oliveira anteriormente mencionado, para elaborar sua teoria dos circuitos da
economia, à qual é agregada a noção de espaço, aspecto bastante importante para nós. Para ele,
o espaço dos países subdesenvolvidos é descontínuo e instável, pois é mais fortemente
tensionado por múltiplas influências e polarizações oriundas dos diferentes níveis globais de
decisão. Ele está marcado pela grande desigualdade de renda, expressa tanto em níveis
regionais, onde é possível perceber uma tendência à hierarquização de atividades, quanto na
escala do lugar, onde é possível observar a coexistência de atividades de naturezas similares,
mas de níveis distintos. Nos países desenvolvidos, as disparidades de renda aparecem com
menos importância e têm pouca influência na aquisição de bens e serviços. Isto é o contrário
do que acontece nos países subdesenvolvidos, onde a capacidade de consumo dos indivíduos
possui uma variação maior. Assim, o nível de renda é colocado pelo autor como um nível que
também influencia na localização do indivíduo, pois aqueles que possuem melhores
rendimentos tendem a ocupar os locais onde há mais infraestrutura e aqueles que não dispõem
dos mesmos recursos, tendem a ocupar os lugares menos favorecidos. Esse nível de renda
quando associado a outros fatores, por sua vez, pode determinar a situação dos indivíduos
enquanto produtores e consumidores.
A seletividade do espaço é a chave para concepção de uma teoria espacial, que pode
exprimir coisas diferentes caso se considere a produção ou o consumo. A produção tende a se
concentrar com mais força em pontos onde as atividades são mais modernas e o consumo
responde às forças de dispersão. Este consumo, por sua vez, se apresenta de formas distintas, já
que a seletividade social age como um freio, que limita a capacidade de igualar o consumo dos
indivíduos qualitativa e quantitativamente. É neste contexto que o autor observa a constituição
de dois circuitos responsáveis pelo processo econômico e também pelo processo de organização
do espaço. Ele afirma que:
A existência de uma massa de pessoas com salários muito baixos ou vivendo
de atividades ocasionais, ao lado de uma minoria com rendas muito elevadas,
cria na sociedade urbana uma divisão entre aqueles que podem ter acesso de maneira permanente aos bens e serviços oferecidos e aqueles que, tendo as
mesmas necessidades, não têm condições de satisfazê-las. Isso cria ao mesmo
tempo diferenças quantitativas e qualitativas no consumo. Essas diferenças são a causa e o efeito da existência, ou seja, da criação ou da manutenção,
42
nessas cidades, de dois circuitos de produção, distribuição e consumo dos bens
e serviços (SANTOS, 2008a:37).
Para Santos (2008a), os circuitos superior e inferior são resultado da modernização
tecnológica, onde o superior usufrui diretamente dessa modernização, enquanto que no inferior
os indivíduos se beneficiam parcialmente ou não se beneficiam do processo.
O circuito superior é definido pela forma como se organiza e se comporta a
sociedade urbana. Já o circuito inferior é um produto da modernização em processo de
transformação e adaptação permanente, sendo, a maioria das vezes, subordinado ao circuito
superior. A diferença entre os dois está fundamentalmente baseada nas diferenças de tecnologia
e organização. No circuito superior é utilizada uma tecnologia de alto nível, ou seja, o capital é
intensivo. Já no circuito inferior a tecnologia é justamente o trabalho intensivo e as atividades
se baseiam no crédito e no dinheiro líquido. Além disso, os empregos raramente são
permanentes e a remuneração, de maneira geral, situa-se abaixo do mínimo que uma pessoa
precisa para ter uma vida digna, ou seja, para ter acesso à educação, saúde, moradia,
alimentação, lazer etc.
Cada circuito se define pelo conjunto de atividades realizadas em um determinado
contexto e se ligam pela atividade do consumo. É importante ressaltar que todas as camadas da
população podem consumir dentro ou fora do circuito ao qual pertencem, sendo este, um
consumo parcial ou ocasional de cada categoria. No circuito superior, os preços são geralmente
fixos e a sua manipulação supõe uma margem de lucro considerável a longos prazos, visando
sempre à acumulação. O circuito inferior é o maior gerador de ocupações para a população
pobre da cidade e nele pechinchar é uma regra. A preocupação com o lucro ou acumulação de
capital não possui tanta relevância quando o que está em jogo é uma questão de sobrevivência.
No circuito superior o lucro elevado corresponde ao volume da produção, o lucro
por unidade é reduzido e há grandes investimentos em publicidade, utilizada para criar e
modificar os gostos da demanda. No circuito inferior o resultado total de lucro é pequeno,
porém o lucro por unidade é elevado, porém repartido, o que se deve ao grande número de
intermediários envolvidos no processo até que o produto chegue ao consumidor final. Para
Santos (2008a) a publicidade não é necessária no circuito inferior, pois o contato direto da
clientela com os produtos garante a efetiva comercialização. Porém, podemos considerar que a
disseminação de produtos específicos em determinados períodos, podem ter a ver tanto com as
variações climáticas, quanto com a moda da época, propagada pelas telenovelas, por exemplo.
43
Dessa maneira, ainda que as atividades inseridas no circuito inferior não produzam sua própria
publicidade, utilizam-se daquela desenvolvida para as mercadorias produzidas no circuito
superior para potencializar a venda de seus artigos, frequentemente cópias produzidas com
menor qualidade.
No circuito superior há uma valorização da capacitação investida para qualificar o
seu quadro de trabalhadores. Com essa especialização há uma divisão maior do trabalho e a
remuneração é equivalente a tal especialização. Quando não encontra mão-de-obra
especializada no país busca a estrangeira. No circuito inferior existe um baixo nível de
especialização proveniente de uma base educacional precária, que leva para o setor produtivo
uma densidade de trabalhadores mal preparada, saturando o mercado e gerando um aglomerado
“exército de reserva”. A massa ociosa configura o quadro de desempregados da economia.
Todavia a outra parcela adicionada ao mercado de trabalho frequentemente é mal remunerada,
o que pode significar um menor poder aquisitivo.
Para Santos (2008a) então, os circuitos da economia podem ser identificados
através das diferenças de tecnologia e organização, onde podemos perceber a existência de uma
bipolarização e não de um dualismo, pois não há nem circuito intermediário, nem continuum
entre eles. Os dois circuitos, embora distintos, complementam-se, e um aspecto que lhes é
bastante importante é o da dependência do circuito inferior com relação ao superior. Ambos
têm, portanto, a mesma origem, conjunto de causas e estão interligados. Ainda para o autor,
insistir em sobrepor a posição hegemônica do circuito superior sem considerar o subemprego
como conseqüência das formas monopolísticas de suas atividades, pode nos levar a
interpretações superficiais da realidade. Por este motivo e porque o circuito inferior compõe o
ciclo de realização das mercadorias produzidas no circuito superior, uma vez que contribui para
distribuição de sua produção, será preciso analisar um pouco mais detalhadamente as
características e dinâmica do circuito inferior da economia.
Como já mencionado anteriormente, o circuito inferior é uma consequência das
desigualdades oriundas do modelo de crescimento econômico vigente, baseado, sobretudo, em
uma distribuição de renda desigual. A modernização da economia e a composição orgânica do
capital oriunda desse processo impõe uma rigidez à expansão do mercado de trabalho, uma vez
que são requeridas cada vez mais especializações, e grande parte da população fica excluída
por não ter acesso a, no mínimo, uma educação básica que lhes permitiria galgar melhores
postos de trabalho.
44
Para Santos (2008a), os pobres arcam com o peso maior da nova divisão do
trabalho, pois eles são aqueles que estão bem abaixo das escalas de salário e que mais
comumente estão desempregados. O processo de urbanização contribui para agravar as
desigualdades e, nesse sentido, o aumento das favelas está diretamente relacionado com a
pobreza urbana e o modelo de consumo vigente, onde as pessoas dão preferência ao dinheiro
líquido que é utilizado na compra de produtos não duráveis, relacionados com a própria
subsistência do indivíduo.
O trabalho no circuito inferior é de difícil compreensão, pois ele é tanto o mal
remunerado quanto o temporário ou o instável. Para ingressar nesse circuito é necessário muito
mais trabalho do que capital. Santos (2008a) indica ser possível distinguir três categorias de
atividades4:
as que não exigem nem capital nem qualificação (ex.: trabalho doméstico);
as que exigem exclusivamente capital; (ex.: comércio)
as que exigem qualificação e capital. (ex.: artesanato)
Como algumas características dessas atividades destacam-se a importância do
crédito para iniciar e/ou manter um negócio, a grande densidade dos comércios (de pequenas
dimensões com estoques reduzidos), que ocupam pouco espaço, além da existência da
possibilidade da realização da atividade comercial em casa, de maneira a fugir total ou
parcialmente do recolhimento de impostos.
O circuito inferior da economia, do qual fazem parte os trabalhadores de rua,
também está relacionado ao que Kraychete e Santana (2012) entendem por economia dos
setores populares. Para eles, as atividades que compõem esse setor da economia seriam aquelas:
“[...] que possuem uma racionalidade econômica ancorada na geração de
recursos humanos próprios, agregando, portanto, unidades de trabalho e não de inversão de capital. Essa economia abrange tanto as atividades realizadas
de forma individual ou familiar como as diferentes modalidades de trabalho
associativo, formalizadas ou não” (KRAYCHETE E SANTANA, 2012:1).
Além disso, a racionalidade dessas atividades estaria relacionada às necessidades
de reprodução da vida, ou seja, da busca pela satisfação das necessidades básicas para a
4 É importante frisar que, Santos escreveu seu livro no final da década de 1970. Hoje, a distinção das categorias propostas por ele poderia ser atualizada, uma vez que dificilmente é possível trabalhar ou montar um negócio sem ter capital e qualificação. É o caso das empregadas domésticas trazido por ele, por exemplo, que hoje precisam ter minimamente ter boas referências,
experiência e qualificação para se inserirem no mercado de trabalho.
45
sobrevivência da unidade familiar. O termo economia dos setores populares, entretanto, difere
conceitualmente daquilo que identificamos com o termo setor informal. De acordo com o
conceito apresentado no trabalho dos autores, o setor informal frequentemente está relacionado
com a produção em unidades produtivas micro ou pequenas, nas quais as relações capital-
trabalho não se encontram bem estabelecidas. Podem se situar ainda sob tal designação
processos como a sonegação fiscal e a contratação ilegal de trabalhadores. A economia dos
setores populares, por sua vez, pressupõe uma forma de desenvolvimento que alia o
desenvolvimento da economia com a promoção de outros direitos fundamentais.
Com relação aos trabalhadores de rua, Santos (2008a) entende que os mesmos
compõem o nível inferior da pulverização do comércio, configurando-se como o “último elo da
cadeia de intermediários entre importadores, industriais, atacadistas e o consumidor”
(SANTOS, 2008a:218). Esta categoria destaca-se por ter menor dependência com relação à sua
clientela, uma vez que desloca-se à procura da mesma.
[...] os pequenos vendedores ambulantes não são independentes, mas verdadeiros empregados de patrões invisíveis que comandam microcadeias de
comercialização, cujos agentes frequentemente são doentes, crianças e mesmo
adultos (SANTOS, 2008a:219).
Para o autor, há ainda uma distinção com relação a estes trabalhadores de rua em
duas categorias: aqueles que tem local fixo na calçada com suas mercadorias expostas nas ruas
do centro ou aqueles que vão a procura da freguesia nos bairros.
Cabe destacar, ainda, os três elementos essenciais ao funcionamento desse circuito:
o crédito – indispensável para agentes e consumidores sendo o método de
ingressar na atividade para os primeiros e configurando-se com a
possibilidade de consumo dos últimos;
os intermediários – responsáveis por fornecer crédito aos artesãos ou
comerciantes, cujo pagamento inicial é feito muitas vezes sob a forma de
mercadorias;
o dinheiro líquido – representa o pagamento dos numerários e é
indispensável para o funcionamento deste circuito.
O consumo na modernidade aumenta a necessidade do dinheiro líquido e acelera a
rapidez da sua circulação. O dinheiro líquido é utilizado tanto no pagamento de dívidas quanto
46
para obtenção de novos créditos. De acordo com Geertz apud Santos (2008a, p. 233) ele age
como “lubrificante” nas engrenagens do circuito inferior. A questão que se coloca é que uma
vez que o capital circula rapidamente há uma consequente baixa acumulação e, dessa maneira,
se mantém as condições de pobreza.
O crédito bancário não é facilmente acessado pelo circuito inferior, tendo em vista
a instabilidade de garantias de pagamento que o segmento pode oferecer. Nesse cenário os
atacadistas assumem grande relevância, já que oferecem maior flexibilidade aos que buscam
tomar empréstimo.
Quanto mais se desce na escada dos intermediários, mais diminuem o tamanho das
operações e os prazos, e mais aumentam os riscos e as taxas de juros. Assim, o medo
permanente dos atacadistas e semi-atacadistas de não serem reembolsados restringe os
fornecimentos em valor e os limita a uma clientela conhecida (SANTOS, 2008a: 239).
Esse tipo de crédito pode ser na forma do adiantamento de mercadorias e os prazos
geralmente são curtos. O endividamento ocorre, na maioria das vezes, justamente pelo desejo
de poder consumir. De acordo com Santos (2008a) os pobres tendem a endividar-se para
despesas correntes (pagamento do cartão de crédito) enquanto que os ricos se endividam para
as chamadas despesas ocasionais (despesas com viagens).
O pequeno comerciante, no entanto, possui margens de lucro mais elevadas e alerta-
se para o fato de que os trabalhadores de rua podem ainda possuir mais lucros que estes. Isto
acontece porque o vendedor de rua, nos termos utilizados por Milton Santos, pode escolher os
produtos que irá comercializar de acordo com seu interesse, enquanto os pequenos comerciantes
precisam de uma maior variedade para expor. Entretanto, o vendedor de rua conta com maior
instabilidade, já que pode passar dias sem vender nada. A margem de lucro por unidade pode
ser elevada, mas o lucro final pode ser nulo. Nesse sentido, Matta (1997) ao tratar das
diferenciações do comportamento do indivíduo na casa ou na rua, aborda a situação do
comércio, onde existe o comportamento de tentar obter vantagem quando efetuado com um
estranho na rua, o que não ocorreria caso houvesse uma proximidade de parentesco ou amizade
entre as partes (em casa).
A relação com o tempo é algo que também precisa ser destacado nos dois circuitos.
Estocar produtos pode representar um grande prejuízo para os pequenos trabalhadores de rua.
Um fenômeno comum é a possibilidade de o consumidor adquirir a mercadoria muito abaixo
de seu valor no final do dia, quando a falta do lucro é recompensada pela obtenção do dinheiro
líquido. É nesse sentido que ressalta-se a importância da pechincha enquanto mecanismo de
negociação entre vendedor e comprador.
47
Se retomarmos o pensamento marxista, temos que a mercadoria é a forma elementar
da riqueza, objeto que satisfaz necessidades humana e que rege o capitalismo. Toda mercadoria
é considerada no aspecto da qualidade e da quantidade. Para Santos (2008a), a importância de
uma mercadoria varia ainda de acordo com a característica do produto: se ele é perecível ou
sazonal, indispensável, necessário ou útil. Este aspecto é fundamental se observarmos as
mercadorias comercializadas pelos trabalhadores de rua, que variam tanto sazonalmente quanto
na medida em que necessidades de consumo são criadas.
Santos (2008a) considera que a importância do circuito inferior se dá de maneira
proporcional à massa de população que dele faz parte. As atividades dependem totalmente do
mercado local enquanto que no circuito superior a preocupação é controlar o mercado de
maneira ampla.
Há grande fluidez no emprego no circuito inferior e a velocidade com a qual o
dinheiro circula pode indicar uma baixa acumulação e, consequentemente, uma perpetuação da
situação de pobreza entre os indivíduos que nele se inserem. A complementaridade entre os
dois circuitos não exclui a concorrência entre ambos, pois os mesmos estão em um equilíbrio
instável que os conduz a uma relação dialética.
A observação do circuito inferior feita aqui, através da atividade do trabalhador de
rua possui estreita vinculação com o espaço, pois implica a apropriação da rua por estes
trabalhadores. A singularidade deste lugar estará expressa nos significados que esta apropriação
pode ter. Este é um aspecto bastante importante e que será destacado, sobretudo porque esta
pesquisa busca demonstrar a relação da economia com o espaço, através da apropriação do
espaço público pelo trabalhador de rua. Neste sentido, o presente capítulo seguirá com a
abordagem sobre o espaço público, de modo a construirmos os alicerces que proporcionarão
tais relações, além de servir de subsídio para entendermos o caso específico dos trabalhadores
de rua na cidade de Salvador.
1.2 A economia no espaço, o trabalho na rua
A atividade que se constitui como objeto de pesquisa desta dissertação não é
observada em qualquer lugar. Há particularidades onde ela ocorre que perpassam pela noção
do espaço propriamente dito. O que é o espaço? Explorar esta questão é um exercício que,
sozinho, daria uma dissertação. Portanto, o que se pretende nessa seção é discutir algumas
concepções teóricas que consideramos chave para compreensão do fenômeno estudado. Assim,
48
trabalharemos a noção do espaço de maneira introdutória considerando, sobretudo, o que nos
diz Milton Santos e Henri Lefebvre. Posteriormente, avançaremos na discussão sobre o espaço
público, local onde se expressa a atividade do trabalhador de rua.
De acordo com Santos (1985), o espaço pode ser compreendido como uma
instância da sociedade, um fator da evolução social que contém e é contido pelas demais
instâncias. A essência do espaço é, portanto, social, onde ele constitui-se não somente pela
paisagem (configuração geográfica), mas pela interação da mesma com a sociedade. As formas
geográficas contêm frações do social e adquirem conteúdo, conformando-se no que o autor
nomeia de formas-conteúdo. Dessa maneira, são permanentemente modificadas na medida em
que ganham novos conteúdos, o que nos permite fazer a leitura de que o espaço pode ser
compreendido então como uma interação de forma e conteúdo. Cada localização é resultado da
apreensão de um momento do movimento do mundo em um ponto, um lugar, e este muda sua
significação conforme o movimento social se desenvolve. Cada lugar tem seu papel no processo
produtivo e quanto mais diminuirmos a escala de análise com relação a um lugar, mais níveis
de forças poderão ser observados atuando sobre ele. Esse papel, no entanto, dá-se mais no nível
das trocas do que da produção propriamente dita.
Santos (1985) nos alerta para a necessidade de entendermos os efeitos dos processos
(tempo e mudança), especificando as noções de forma, função e estrutura, enquanto elementos
fundamentais para compreensão da organização espacial. Sucintamente, podemos dizer que a
forma é o que vemos, o aspecto visível de uma coisa. A função está relacionada à atividade que
espera-se ser realizada pela forma, com maior ou menor vinculação a ela. A estrutura é o modo
de organização vigente e, por fim, o processo é uma determinada ação no tempo. O conjunto
dessas categorias compõe o que podemos compreender como sendo o espaço. O espaço, por
sua vez, enquanto produto social está sob permanente processo de transformação e é o resultado
do que a sociedade produz.
[...] o tempo (processo) é uma propriedade fundamental na relação entre forma, função e estrutura, pois é ele que indica o movimento do passado ao
presente [...] O tempo vai passando, mas a forma continua a existir.
Consequentemente, o passado técnico da forma é uma realidade a ser levada
em consideração quando se tenta analisar o espaço. As mudanças estruturais não podem recriar as formas, e assim somos obrigados a usar as formas do
passado (SANTOS, 1985:54).
49
As formas podem ser entendidas ainda como uma cristalização do tempo. Santos
(1985) afirma que elas permanecem no aguardo do próximo movimento dinâmico da sociedade
para assumir uma nova função, de modo que dificilmente são destruídas ao longo do processo
histórico, tornando-se o que ele chama de rugosidade, cujo valor muda na proporção em que
muda a estrutura. As diferentes maneiras como este espaço é apropriado, por sua vez, são
resultado da maneira como a sociedade se organiza, o que perpassa pela distribuição de renda
entre os indivíduos e por suas necessidades de produção e consumo.
Para Lefebvre (2000) o espaço não é um lugar passivo, pois nele são contrapostas
as forças das relações sociais, onde a hegemonia de uma classe se superpõe sobre a sociedade
como um todo. Para este autor, o espaço é antes de tudo um produto social, com características
próprias de cada sociedade. Ele contém lugares apropriados pelas relações sociais de
reprodução social e pelas relações de produção que lhes engendram, organizadas de acordo com
a divisão do trabalho. As situações de produção e reprodução não podem se separar, pois a
divisão de trabalho repercute na família, na sociedade e, de forma inversa, a organização da
sociedade interfere na divisão do trabalho. No espaço estão contidas representações de
interferência entre relações sociais (produção e reprodução), que o complexificam.
O processo de produção do espaço, fundamentando-se nas relações de trabalho
entre homem e natureza, coloca-se como uma relação que deve ser mais amplamente entendida.
Neste sentido, Lustoza (2012) nos auxilia no entendimento do conceito de reprodução social e
relações de produção. A autora menciona que, na medida em que a sociedade produz o espaço,
passa a ter dele uma determinada consciência. Para ela, os homens ao produzirem seus bens
materiais e reproduzindo-se enquanto espécie, produzem o espaço geográfico, meio e condição
para reprodução das relações sociais. Este espaço, por sua vez, se diferencia conforme cada
momento histórico, e de acordo com o estágio de desenvolvimento das forças produtivas.
Contudo, a produção da vida não envolve apenas a produção de bens para satisfação material,
ela significa a produção da própria humanidade do homem. O plano da produção assim, articula
a produção em termos de desenvolvimento das relações de produção de mercadorias e de
produção da própria vida.
O espaço, para Lefebvre (2000), pode ser compreendido de duas maneiras. A
primeira delas é identificada por ele como sendo o espaço abstrato. Este é o espaço do
capitalismo, que contém o mundo da mercadoria, cuja lógica põe sua potência em termos de
dinheiro e de Estado político. O Estado, por sua vez, se sustenta na autoridade que exerce sobre
o espaço e o espaço, abstrato, apóia-se nas redes bancárias, nos centros de negócio e unidades
50
de produção. Ele funciona como um conjunto de coisas e signos, com relações próprias e
formais, que pode reduzir o significado do vivido, já que tende a homogeneização das relações.
Na medida em que o espaço abstrato reduz as diferenças e particularidades por
tender a homogeneidade, um novo espaço, diferencial, pode nascer justamente da acentuação
das diferenças que o abstrato produz. De acordo com Lefebvre (2000:64; tradução nossa) é o
espaço diferencial que “reúne aquilo que o espaço abstrato separa: as funções, os elementos e
momentos da prática social”. Esse espaço novo, portanto, discernirá o que o espaço abstrato
confunde, pois nele as diferenças não irão se basear em particularidades, mas irão emergir da
luta política cotidiana e vivida.
Assim, para o autor, a luta de classes pode ser lida claramente no espaço. E é ela, a
luta de classes, que impede que o espaço abstrato se estenda ao planeta inteiro apagando as
diferenças, pois ele mesmo as produz internamente ao crescimento econômico. Diante disso,
compreendemos que é através da construção do espaço diferencial que se poderá afirmar o valor
de uso do espaço, em contraponto a tendência do espaço abstrato de transformá-lo apenas em
valor de troca.
Dando continuidade à discussão do espaço em Lefebvre, temos que as
representações das relações de produção, que são também relações de poder, podem ser
percebidas no espaço, sob diversas formas, sejam elas materializadas sob a forma de edifícios,
monumentos, praças ou até mesmo obras de arte. Lefebvre (2000) estabelece uma triplicidade
de características sobre o espaço que são: a prática social, as representações do espaço e os
espaços de representação, também identificadas enquanto espaço “percebido”, “concebido” e
“vivido”, brevemente apresentadas a seguir.
Segundo Lefebvre (2000), a prática social abarca a produção e a reprodução, em
que espaços específicos e os conjuntos sociais próprios de cada formação social concebem à
relação de cada membro da sociedade ao seu espaço. Pode-se descobrir a prática social de uma
sociedade se decifra-se o seu espaço. E a prática social no neocapitalismo associa, no espaço
“percebido”, a realidade cotidiana (tempo) e urbana (trajetos que ligam os locais de trabalho,
da vida privada e do lazer), criando uma separação surpreendente entre os lugares que liga, o
que só pode ser examinado empiricamente.
As representações do espaço têm a ver com a ordem que as relações de produção
impõem a este espaço, ou seja, são conformadas enquanto espaço “concebido” (aquele do
51
domínio dos planejadores, urbanistas e técnicos). As representações do espaço são, para o autor,
dominantes na sociedade, cuja influência é bastante específica sobre sua produção.
Os espaços de representação, por sua vez, podem ser entendidos como o espaço do
“vivido”, onde estão inseridos os simbolismos ligados ao lado clandestino da vida social. É o
espaço do habitante, dos usuários, portanto, dominado, que a imaginação tenta modificar e
apropriar. É o espaço que tem um centro afetivo, contendo os lugares das situações vividas,
constituindo-se como obras simbólicas para os indivíduos.
Essa triplicidade de características do espaço trazidas por Lefebvre é capaz de nos
levar a leituras fundamentais, sobretudo quando forem relacionadas com aquilo que
estudaremos nos próximos capítulos, onde focaremos principalmente na relação entre o espaço
concebido e vivido. Assim, avançando na teoria para o ponto que desejamos chegar, podemos
prosseguir com o que nos diz Santos (1985). Para ele, cada lugar adquire uma significação
decorrente do movimento social em determinado período histórico (tempo) e possui um papel
próprio no processo produtivo que é formado pela produção propriamente dita, circulação,
distribuição e consumo. A maneira como os circuitos produtivos ocorrem, ajudam a
compreender a própria organização do espaço, pois “o espaço está na economia, assim como a
economia está no espaço” (Santos, 1985:1). Neste sentido, será preciso também abordar duas
importantes características deste lugar para ampliar nossa compreensão sobre a dinâmica
existente no espaço apropriado pelo trabalhador de rua: a primeira se refere à localização da
atividade estudada na cidade e a segunda se refere à particularidade do espaço onde ela ocorre.
A atividade dos trabalhadores de rua está fortemente presente no Centro Antigo da
cidade de Salvador5, de modo que é preciso compreender o significado que este lugar possui
em termos de polarização de atividades, usos e consumo. A produção de bens visando o
consumo do excedente e, consequentemente, a obtenção do lucro tem sua origem com o modo
de produção capitalista. A divisão social do trabalho distinguiu os ofícios da agricultura e os
ofícios que se instalaram na cidade. Ferrari (1977) questiona se foi o comércio que originou a
cidade ou o contrário que aconteceu.
De acordo ainda com autor supracitado o desenvolvimento dos transportes urbanos
permitiu a concentração do comércio a varejo, o que deu origem às zonas comerciais geralmente
situadas no centro das cidades. Os centros urbanos coincidem, portanto, muitas vezes com o
5 A localização da atividade em Salvador será apresentada no próximo capítulo desta dissertação.
52
núcleo inicial das cidades e possuem a histórica e marcante característica de ser o lugar de
organização do comércio local, favorecendo a circulação da mercadoria6.
Para Santos (2008b:198) “o ‘centro’ da cidade se caracteriza por uma paisagem
arquitetural e humana muito mais completa”, constituindo-se como o nódulo principal da cidade
com forte concentração de serviços e comércios nos países subdesenvolvidos, que tende a
monopolizar todas as funções mais importantes da cidade. Muitos autores consideram que os
centros antigos ou tradicionais (aqueles que se formam praticamente junto com a cidade) sofrem
um esvaziamento ou perda de importância na medida em que a evolução urbana acontece e
novas centralidades se formam ou são criadas. Aqui especificamente não se pretende tratar de
um “esvaziamento” do centro de Salvador, mas sim numa mudança no perfil da população que
utiliza o centro, pois tomando como exemplo a localidade analisada, observa-se que na
realidade houve uma modificação no status social da população que usufrui deste espaço. Se
antes era uma população abastada que se beneficiava do Centro, atualmente observa-se que são
as classes de rendas médias e baixas que o fazem. Como afirma Lefebvre (2001), esses centros
tradicionais podem se transformar, mas continuam sendo centros de intensa vida urbana, onde
a função econômica é a função essencial.
[...] O núcleo urbano torna-se, assim, produto de consumo de uma alta qualidade para estrangeiros, turistas, pessoas oriundas das periferias,
suburbanos. Sobrevive graças a este duplo papel: lugar de consumo e consumo
do lugar. Assim, os antigos centros entram de modo mais completo na troca e no valor da troca, não sem continuar a ser valor de uso em razão dos espaços
oferecidos para atividades especificas. Tornam-se centros de consumo. O
ressurgimento arquitetônico e urbanístico do centro comercial dá apenas uma versão apagada e mutilada daquilo que foi o núcleo da antiga cidade, ao
mesmo tempo comercial, religioso, intelectual, político, econômico
(produtivo). A noção e a imagem do centro comercial datam de fato da idade
média. Corresponde à pequena e média cidade medieval. Mas hoje o valor de troca prevalece a tal ponto sobre o uso e o valor de uso que quase sempre
suprime este último. (LEFEBVRE, 2001: 20)
É possível fazer uma analogia ainda com relação a teoria dos espaços opacos e
luminosos. Para Santos e Silveira (2003), os espaços luminosos são aqueles que acumulam
densidades técnicas e informacionais, estando aptos a atrair maior conteúdo em capital,
tecnologia, informação e atividades que fazem parte do universo formal. São as características
6 Existem abordagens clássicas que tocam a noção da centralidade, como são, por exemplo, as desenvolvidas na Escola de Chicago por Park e Burgess (1925) ou por Christaller (1933), que avançaram na teoria, mas não serão aprofundadas neste trabalho, pois não consistem em seu foco teórico. No entanto é importante destacar que essas discussões sobre a estrutura
urbana propõem modelos espaciais e tratam do centro da cidade como um importante centro de negócios.
53
assumidas pelas novas centralidades. No caso dos espaços opacos, as atividades presentes no
espaço luminoso estão teoricamente ausentes e existe, por analogia, uma maior presença de
atividades informais que é o que pode ser observado nos antigos centros, como é o caso de
Salvador.
A concentração de diversos usos e serviços no centro o torna um lugar bastante
atrativo e acessível, capaz de despertar o sentimento de pertencimento nas pessoas que o
frequentam cotidianamente. Costuma ser, portanto, o local da cidade mais propício para
realização de trocas, sejam elas econômicas, sociais e afetivas, por exemplo. As relações que
se expressam no centro são influenciadas e influenciam mutuamente na forma como o espaço
é percebido e vivido por todos aqueles que o frequentam. Ter em vista a importância da
dinâmica que este lugar cria é bastante importante para compreendermos a sua apropriação
pelos trabalhadores de rua. Contudo, não poderemos nos furtar a uma particularidade do espaço
do qual estamos tratando, ou seja, da rua, do espaço público.
Para compreender o que é o espaço público e o que a apropriação desse espaço pode
significar, precisamos também nos aproximar minimamente do que significa a distinção entre
as esferas pública e privada da vida. Para isso recorreremos principalmente a contribuição de
Richard Sennett, sem desprezar o que também nos diz Hannah Arendt.
Sennett (2014) acredita que a história destas duas palavras é fundamental para
entender as transformações ocorridas nos últimos séculos no domínio público. Segundo ele, as
primeiras ocorrências da palavra “público” o revelam como algo comum na sociedade.
Posteriormente, em Roma, “público” era aquilo que estava exposto à observação geral.
Retomando o pensamento grego, Arendt (2007) explica que com a cidade-estado o
homem recebe além da sua vida privada (família e casa), uma segunda vida (bios politikos) e
que a partir de então, o homem pertence a essas duas ordens de existência, onde diferencia-se
“aquilo que lhe é próprio (idion) e o que é comum (koinon)” (ARENDT, 2007:33). Essa
distinção entre as esferas pública e privada da vida por sua vez significam uma separação entre
a família e a política.
O que impediu que a polis violasse as vidas privadas dos seus cidadãos e a fez
ver como sagrados os limites que cercavam cada propriedade não foi o
respeito pela propriedade privada tal como a concebemos, mas o fato de que, sem ser dono de sua casa, o homem não podia participar dos negócios do
mundo porque não tinha nele lugar algum que lhe pertencesse. (ARENDT,
2007:39)
54
Sennett (2014), ainda sobre a historicidade dos significados de “público” e
“privado”, prossegue nos contando que no século XVI o termo “privado” foi usado com o
sentido de distinguir os privilegiados. Por volta do século XVII “público” e “privado” já se
opunham de maneira semelhante ao que ocorre na atualidade. “Público” significava que algo
estava disponível para observação de todos, enquanto que “privado” se referia a uma região
protegida da vida, referente à família e aos amigos. Já no século XVIII a palavra “público”
adquire o sentido moderno, onde significa não somente uma parte da vida separada do domínio
da família e dos amigos, mas também passa a significar um domínio público mais amplo
incluindo uma diversidade grande de pessoas estranhas. O “público” passa então a significar
uma vida para além da família e dos amigos íntimos, aproximando-se da região da vida pública
onde grupos semelhantes e diferentes podem ter contato.
Para Arendt (2007) a esfera pública significa comum, onde o “público” em primeira
instância pode ser visto e ouvido em todo lugar e em segundo é aquilo que é comum a todos, o
próprio mundo e o lugar de cada um dentro dele. Este mundo comum reúne os indivíduos e ao
mesmo tempo evita que ocorra um choque entre eles.
Só a existência de uma esfera pública e a subsequente transformação do mundo em uma comunidade de coisas que reúne os homens e estabelece uma
relação entre eles depende inteiramente da permanência. Se o mundo deve
conter um espaço público, não pode ser construído apenas para uma geração e planejado somente para os que estão vivos: ele deve transcender a duração
da vida de homens mortais (ARENDT, 2007:64).
Já o sentido moderno de “privado” aparece sob o formato de um círculo de
intimidade. Esta esfera privada se relaciona com a propriedade, onde o termo “privado” é
considerado na acepção de “privação”, que reside na ausência dos outros e induz à solidão. A
vida pública, ainda para Arendt (2007), só se tornaria possível na medida em que as
necessidades urgentes da própria existência (por meio da riqueza privada) fossem atendidas e
o meio para atingi-las se dá, portanto, através do trabalho.
Para Sennett (2014:36): “Juntos, o público e o privado criavam aquilo que hoje
chamaríamos de um “universo” de relações sociais”, onde os indivíduos mantêm certo
equilíbrio entre as “exigências da civilidade” (comportamento público) e as “exigências da
natureza” (família). Isto implica uma forma de relação diferenciada entre os estranhos, porém
55
fazendo parte desse conjunto de estranhos (vida pública), adversa ao tipo de relação
estabelecida em família (vida privada).
Arendt e Sennett contrapõem o espaço público, lugar de ação política, ao lugar da
família e das questões relativas à privacidade do indivíduo. Os pontos de interseção dos
pensamentos dos autores anteriormente citados levam-nos a entender o espaço público,
portanto, como o palco onde se estabelecem uma diversidade de relações sociais ou ainda como
sendo locus da comunicação, encontros ocasionais e democracia. Essa importante pontuação
conceitual entre as esferas pública e privada nos conduz com mais consistência à
problematização acerca da tensão e dialética que está contida na apropriação do espaço público,
mas no que, em essência, ele consiste?
Borja (2003) relaciona a noção do espaço público com a cidade e com a noção de
cidadania, entendida como um conceito do direito público. Ele trata da dialética existente entre
os conceitos de cidade, cidadania e espaço público e afirma que quanto mais uma cidade possua
espaços públicos, mais ela terá mais cidadania e também mais conflitos haverá sobre o uso deste
espaço. A cidade então, pensada enquanto cenário, constitui-se enquanto um verdadeiro espaço
público que quanto mais aberto a todos, mais expressará a democratização política e social. Isto
porque, para o autor, o espaço público é o local em que a expressão e a representação da
sociedade, considerando tanto dominados quanto dominantes, se tornam visíveis. É um lugar
de relação e de identificação entre as pessoas, de contato, de animação urbana e até mesmo de
expressão comunitária.
O espaço público é um conceito intrínseco ao urbanismo, e conforme Borja (2003),
costuma ser erroneamente confundido com espaços verdes, equipamentos ou com o próprio
sistema viário, o que se deve ao funcionalismo em que se baseia o urbanismo moderno, que
desqualificou o espaço público na medida em que lhe designou usos específicos. O espaço
público moderno resulta de uma separação entre a propriedade privada e o domínio público. A
dinâmica das cidades e os comportamentos das pessoas que nela habitam, podem criar espaços
públicos que a princípio não seriam pensados como tal pelo planejamento. Isto pode ser
observado em espaços intersticiais entre edifícios, no entorno de equipamentos públicos, ou em
locais abandonados, por exemplo. O que define o espaço público, portanto, é seu uso e não seu
status jurídico.
56
El espacio público supone pues dominio público, uso social e colectivo y
multifuncionalidad. Se caracteriza físicamente por su accesibilidad, lo que lo
convierte en un factor de centralidad. La calidad del espacio público se podrá evaluar sobre todo por la intensidad y la calidad de las relaciones sociales que
facilita, por su capacidad para generar mixturas de grupos y comportamientos,
por su cualidad de estimular la identificación simbólica, la expresión y la
integración cultural. Por ello, es necesario que el espacio público se piense como obra de cualificación del entorno y de calidad intrínseca, como son la
continuidad en el espacio urbano y su facultad ordenadora, la generosidad de
sus formas, de su diseño y de sus materiales y la adaptabilidad a usos diversos a través del tiempo (BORJA, 2003:124).
Entendemos que o fator de centralidade mencionado pelo autor está numa ordem
de proximidade com o habitante, tanto se pensarmos em espaços públicos de maior atração,
como grandes praças e parques com capacidade de atrair habitantes de diferentes partes da
cidade, quanto se pensarmos na escala de um bairro, por exemplo, onde determinadas
localizações se convertem enquanto espaços públicos atraindo seus moradores. Neste caso,
podemos observar situações em que espaços planejados para serem destinados a função do
lazer, não são assim usados pelos moradores por diversos motivos, no que pode-se incluir desde
o fato de estarem localizados em locais com grande fluxo de automóveis ou não oferecerem
segurança, por exemplo. Em seu lugar, ruas por onde não transitam carros podem se converter
em verdadeiros espaços públicos, onde crianças brincam, amigos se reúnem em diferentes
momentos do dia, vizinhos se encontram, e diversos tipos de trocas sociais se realizam.
Para Borja e Muxí (2000) o espaço público não pode ser considerado como um
espaço residual, pois é o local que permite o passeio e o encontro, além de ordenar cada zona
da cidade, dando-lhes sentido. É um lugar ao mesmo tempo físico, simbólico e político. Para
estes autores, a história de uma cidade se confunde com a história do seu espaço público, pois
é nele que se materializam as relações entre os habitantes e o poder público. Deve, portanto,
garantir a apropriação por parte de diferentes coletivos sociais e culturais, de idade e de gênero,
em termos de igualdade.
Os espaços públicos têm seu significado e utilização modificados, sobretudo pelas
alterações nas formas como são utilizados ao longo do tempo. Para Lefebvre (2001), a cidade
é uma “obra” e esta contrasta com a orientação que há na direção da acumulação, do comércio,
das trocas e dos produtos, pois a obra se constitui em valor de uso, enquanto que o produto é o
valor de troca.
57
A cidade e a realidade urbana dependem do valor de uso. O valor de troca e a
generalização da mercadoria pela industrialização tendem a destruir, ao
subordiná-las a si, a cidade e a realidade urbana, refúgios do valor de uso, embriões de uma virtual predominância de uma revalorização do uso
(LEFEBVRE, 2001:14).
O espaço público para Lefebvre é, portanto, em essência social, onde estão contidas
as representações das relações de classes estabelecidas pelo modo de produção vigente. Em
sentido semelhante, para Serpa (2007), ao analisarmos o espaço público é preciso ter em vista
que forma e conteúdo são indissociáveis e que sua compreensão perpassa os aspectos da
“concretude” da esfera pública urbana.
O autor supramencionado, fundamentando-se em Henri Lefebvre, acredita que
ocorre uma homogeneização dos espaços urbanos, onde reina a repetição, o que ocasiona a
baixa diversidade na morfologia urbana, e o repetitivo substitui as características particulares
dos lugares. Esse espaço homogêneo (abstrato) se contrapõe ao espaço do vivido, onde ocorrem
as atividades cotidianas. É como se num mesmo lugar estivessem contidos um ideal (planejado)
e uma realidade (espontânea), onde o “ideal” é produzido de maneira a, muitas vezes, repelir o
uso, como é o caso observado na concepção das reformas ocorridas em Paris com o
“urbanismo” haussmaniano, comentadas por Lefebvre (2001). Já a “realidade” é aquilo que
acontece espontaneamente, independente da vontade do planejador, ou seja, a forma como o
espaço é apropriado pelos indivíduos.
Sennett (2014) afirma que, ao organizar o espaço urbano, o aspecto do domínio
público é muitas pensado como se fosse desprovido de sentido pelo planejamento. Nesse
contexto, as áreas a céu aberto são tratadas como espaços vazios, lugares de passagem e não de
uso ou permanência. O referido autor chega a transcrever as palavras de um dos encarregados
do planejamento do centro da Défense, maior centro financeiro de Paris, para o qual o solo é
definido como “nexo de apoio ao fluxo de tráfego para o conjunto vertical” (SENNETT,
2014:30). Sennett (2014) conclui sobre esta afirmação que o espaço público se tornou na
maioria dos casos, uma derivação do movimento.
Nesse sentido, para Sennett (2014), o automóvel é colocado como um fator de
grande influência, pois foi por intermédio dele que se deu uma facilidade de movimentação
desconhecida até o momento de sua massiva utilização. O fato de poder utilizar o carro para os
deslocamentos diários, associado às atribuições da vida moderna, provoca um grande impacto
no uso dos espaços públicos, sobretudo da rua que se torna um espaço sem sentido, pois esta
58
forma de movimentação substitui o estar na rua e vivenciar este lugar. As cidades, através do
massivo uso do automóvel e ao privilégio dado a esse meio de transporte em detrimento das
demais formas de deslocamento, passam então a ser pensadas muito mais para uso individual
do que para dar suporte à vida coletiva.
Para Sennett, o isolamento proporcionado pelo automóvel particular na medida em
que o mesmo produz no inconsciente a ideia de que se isolando em seu interior para se deslocar
com liberdade (todo o ambiente circundante perde o seu significado) contribui para o que chama
de morte do espaço público, pois agrava a tendência à diminuição da sociabilidade. Além do
automóvel, outros fatores como a insegurança, se somam para corroborar essa tal morte do
espaço público e são teorizados por diversos autores. Contudo, esta visão de morte do espaço
público, embora mencionada aqui, não será aprofundada por nós, pois o que observamos é
justamente o oposto: um espaço público vivo, pulsante, repleto de usuários e contradições.
As diferentes formas de organização do espaço público, por sua vez, revelam as
contradições das transformações sociais. Cabe-nos aqui, portanto, caracterizar o local que mais
do que um lugar de passagem, é também lugar de uso, permanência (ainda que transitória) e
onde ocorrem intensas trocas comercias e sociais, aquele que é o primeiro lugar no qual nos
encontramos assim que deixamos o ambiente privado de nossas casas e nos encontramos em
meio aos outros diferentes de nós: a rua.
Segundo Santos (1985) entre os pólos do “público” e do “privado” se estabelecem
relações de apropriação diferenciadas. Para ele, as atividades que se opõem às ideias de
intimidade e privacidade, tais como festas, encontros e jogos, encontram na rua o lugar ideal
para seu acontecimento.
De acordo com Santos & Vogel (1985:24) “a palavra rua vem do latim ruga.
Primitivamente o vocábulo significava o sulco situado entre dois renques de casas ou muros em
um povoado qualquer”. Para Lamas (1993), a rua é um lugar de circulação, ela é estruturadora
do traçado urbano e se constitui em um dos elementos mais fáceis de serem identificados numa
cidade, estando contidas no próprio gesto de projetar.
Sobre a importância da rua, Carlos Nelson esclarece:
[...] As ruas são importantíssimas. Não se pode conceber uma cidade sem elas.
Servem para ligar os diversos pontos de interesse particular ou semipúblico,
conformando uma rede de canais livres e de propriedade coletiva. Se não
existissem, não haveria troca de espécie alguma, pois servem de suporte ao
59
deslocamento de pessoas, veículos, mercadorias, informações. Mas não é só
isso: territórios de ninguém e de todo mundo, são palco de onde se
desenvolvem dramas e representações da sociedade (SANTOS, 1988:91).
A rua pode ser compreendida como o lugar da novidade, do inesperado para os
autores Santos & Vogel (1985). Isso se deve porque ela é o lugar do outro, que pode ser tanto
o estranho como também aquele com quem se mantém algum tipo de relação social. Na rua o
social pode se apresentar como espetáculo e daí gerar um fascínio, pois este lugar permite que
personalidades sejam assumidas e que diferentes papéis sejam desempenhados. A rua para esses
autores é “palco por excelência” (SANTOS & VOGEL, 1985:83).
Para Schvarsberg (2011) a confluência dos diversos desejos dos homens revela que
a rua está sujeita à própria dinâmica do sistema capitalista. O autor faz em sua dissertação de
mestrado a apresentação de quatro modelos de rua, de modo a retratar a maneira como uso deste
espaço foi se transformando ao longo do tempo. A caracterização desses modelos será apenas
brevemente apresentada, no entanto consideramos que vale a pena demonstrá-los, pois a
historicidade das transformações nas formas de seu uso e de sua apropriação são importantes
para nós. Os quatro momentos da rua abordados pelo autor são:
Boulevard: este modelo de rua surge no século XIX e se caracteriza por ruas longas e
avenidas que estruturam a circulação. Ele separa as calçadas, que continham arborização,
iluminação pública, sistema de drenagem, esgotamento sanitário e abastecimento de água,
do lugar destinado à passagem das carroças.
Autopista: surge já no século XX sob a perspectiva do trânsito mais intenso e da
popularização do automóvel. Defendido por Le Corbusier e presente na Carta de Atenas,
este modelo propunha um conjunto hierárquico de vias de maneira a organizar e deixar
fluir o tráfego de veículos, além de ligar de modo eficiente os pontos que abrigavam
diferentes funções urbanas. Ao longo dos trajetos criados avolumavam-se ilhas de
comércio e serviços, com bolsões de estacionamentos, formando um contexto onde surgem
e se popularizam, posteriormente, os shoppings centers.
Rua de bairro: é característica do período a partir da década de 1950. Sua concepção faz
parte do Movimento Moderno que teve como alvo o urbanismo funcionalista da Carta de
Atenas. Este tipo de via se caracteriza pela valorização da simplicidade da rua comum,
reforçando as relações de vizinhança e o comércio popular. Neste modelo, se indicava que
as calçadas fossem suficientemente largas para abrigar diversos tipos de apropriação,
como, por exemplo, o das crianças. Quadras curtas, lotes menores e possibilidades de se
60
combinar diferentes tipologias seriam responsáveis por aumentar o contato com o público,
além de criar uma rede de respeito e confiança.
Rua de pedestres: este modelo está associado ao modelo da autopista. Surgiu na década de
1960 devido às preocupações com os centros urbanos, uma vez que a mobilidade pelo
automóvel criava uma série de problemas para estes locais, como, por exemplo, os
congestionamentos. A importância das ruas de pedestres se dá, portanto, porque dentro de
uma ótica capitalista em que as cidades passam a ser consumidas, sobretudo nos seus
centros históricos, é preciso criar condições para que as pessoas possam circular.
As ruas de pedestre são difundidas em todo mundo, sobretudo pelo uso intensivo
do automóvel na sociedade moderna. É neste espaço e nas ruas de bairro que os habitantes de
uma cidade podem encontrar toda uma diversidade de situações e possibilidades de encontro
com o diferente e o novo. Porém, para que essa dinâmica da vida possa se expressar é
fundamental que o ambiente circundante não seja monótono. Nesse sentido, podemos
considerar que além do uso intensivo do automóvel, capaz de isolar o indivíduo do meio
externo, os grandes edifícios conhecidos popularmente como espigões influenciam diretamente
nas relações de vizinhança, pois diminuem as possibilidades de sociabilidade, já que isolam os
edifícios da rua e frequentemente criam uma série de atrativos em seu interior no sentido de
evitar que seus moradores precisem sair, sob a alegação de que entre seus muros há maior
segurança.
Jacobs (2011) ao escrever sobre a cidade a partir de suas observações do cotidiano
e vivência como moradora do Greenwich Village em Nova York, afirma que, para que uma rua
tenha segurança como trunfo à presença de desconhecidos, sua infraestrutura precisa conter três
características principais: 1) ter nítida a separação entre o espaço público e o privado; 2) existir
olhos para a rua, ou seja, as janelas dos edifícios devem estar voltados para a rua; e 3) a calçada
deve ter sempre usuários transitando por elas. As ruas das cidades devem lidar com os
desconhecidos, resguardando não apenas aqueles estranhos que depredam, mas também
protegendo os desconhecidos pacíficos e bem intencionados que por elas transitam, pois todos
precisam usar as ruas.
Essa situação desenhada por Jacobs (2011) coloca uma questão importante no que
se refere à vigilância, e consequente uso das ruas. Como ela mesma diz: não se pode forçar as
pessoas a vigiar ruas que elas não estejam interessadas em vigiar. O requisito básico da
vigilância proposto por ela então, é de que haja um número considerável de estabelecimentos e
de locais públicos dispostos ao longo das calçadas, que possam ser utilizados também durante
61
a noite. Esses estabelecimentos, por sua vez, contribuem para dar às pessoas que habitam o
lugar motivos concretos para utilizar e aumentar, conseqüentemente, a segurança das calçadas,
pois “a presença de pessoas atrai outras pessoas” (JACOBS, 2011:38).
A vida na rua, tanto quanto eu possa perceber, não nasce de um dom ou de um
talento desconhecido deste ou daquele tipo de população. Só surge quando
existem as oportunidades concretas, tangíveis, de que se necessita. Coincidentemente, são as mesmas oportunidades, com a mesma abundância e
constância, necessárias para cultivar a segurança nas calçadas. Se elas não
existirem, os contatos públicos nas ruas também não existirão. (JACOBS,
2011:75)
Jacobs (2011) observa também que para que uma rua se mantenha viva, é preciso
que ela gere diversidade, ou seja, a monotonia residencial deve ser quebrada pela presença de
opções de comércio variadas e de atrativos culturais. Teoricamente isso torna-se mais fácil de
ser alcançado pelas cidades grandes, naturalmente geradoras de diversidade e incubadoras de
novos empreendimentos e ideias. Contudo, só se verifica na prática se houverem diversas e
eficientes combinações de usos econômicos na cidade. As situações capazes de gerar tal
diversidade dependem, para a autora, basicamente de quatro condições essenciais: 1) atender a
mais de duas funções principais (lazer, moradia e trabalho, por exemplo), o que garante que
haja pessoas saindo em diferentes horários e otimiza o uso da infraestrutura disponível; 2) as
quadras devem ser curtas, o que possibilita aos usuários a oportunidade de virar esquinas, ou
seja, diminui-se a possibilidade de existirem ruas isoladas, separadas e desassistidas pela
população; 3) uma combinação de edifícios de idades e estados de conservação diversos, o que
pode gerar rendimento econômico variado, pois prédios antigos podem ser alugados por
comércios ou serviços que não tem recursos para investir em novos edifícios; 4) densidade alta
de pessoas, sobretudo incluindo pessoas com o propósito de morar no lugar. Este último aspecto
é importante por favorecer a concentração de pessoas no bairro, que habitualmente são as que
mais consomem dos pequenos comércios, o que amplia mais a diversidade de usos.
Tais condições problematizadas por Jacobs (2011), mais do que garantir o uso das
ruas, implicam também em sua apropriação pelos mais diversos tipos de usuários. Na rua, a
apropriação de suas formas, por sua vez, pode ocorrer de diversas maneiras. Para Santos &
Vogel (1985) apropriar-se de um ponto, por exemplo, em um determinado local através de uma
atividade, implica particularizá-lo, ou seja, privatizá-lo, não apenas pela especialização dada
por seu uso, mas também pelo tipo de vinculação ao grupo de pessoas que passa a se utilizar
62
desse lugar. O que define o “ponto” é o exercício regular de uma determinada atividade. Para
os autores, essa atividade pertenceria ao domínio público, pois sem ele não seria possível à
criação do mesmo. Entretanto, esse ponto pode ser ou não reconhecido. No caso de não ser é a
própria atividade que confere a sua significação, tornando-o passível de ser identificado.
Os conceitos de apropriação, particularização e privatização quando trabalhados
por Santos & Vogel (1985), contudo, talvez não tivessem a mesma distinção conceitual atual.
Hoje, por exemplo, a apropriação pode não implicar necessariamente numa privatização7. É
importante ressaltar que nesta dissertação não chegaremos a discutir se a apropriação implica
numa privatização do espaço público. O que nos parece importante sobre o que os autores
trazem, no entanto, é justamente a definição do ponto através de uma atividade regular, que se
relaciona com aquilo que observamos no caso dos trabalhadores de rua. É importante ressaltar
que a apropriação aqui é entendida como o ato de tomar posse de algo que, a princípio, não lhe
pertenceria ou como é o caso do espaço público, do lugar que pertence a todos.
Nesse sentido, consideramos significativo mencionar a definição de Roger Chartier
sobre o conceito de apropriação, que embora relacionado às suas pesquisas no âmbito da
História Cultural, nos parece bem interessante por atribuir ao conceito um uso inventivo e
criador. Ele nos diz:
Existe a apropriação no sentido da hermenêutica, que consiste no que os indivíduos fazem com o que recebem, e que é uma forma de invenção, de
criação e de produção desde o momento em que se apoderam dos textos ou
dos objetos recebidos. Desta maneira, o conceito de apropriação pode misturar
o controle e a invenção, pode articular a imposição de um sentido e a produção de novos sentidos (CHARTIER, 2001:67).
Para Chartier (2001), no âmbito da cultura, há sempre uma vontade de controle
sobre a apropriação, sendo esta o resultado de uma tensão entre o desejo de controle e
monopólio (do compositor de uma música ou autor de um livro, por exemplo) e a vontade de
conquista (de quem escuta a música ou lê o livro). Isto se dá porque, do lado de quem cria, há
a tentativa de fixar um sentido único para a obra, e a apropriação, que é a forma como as pessoas
tomam para si o sentido da obra, e que dificilmente pode ser controlada. Para Chartier, portanto,
a apropriação se dá nesse conflito.
7 Privatizar tem o sentido de tornar particular, não público. Já apropriar tem o sentido de tornar algo próprio, apoderar-se de
algo.
63
No nosso caso estamos falando do espaço público, e nele verificamos o conflito
latente entre o concebido pelo planejamento urbano e as formas como esse mesmo espaço é
vivido e apropriado pelas pessoas. Dessa ambiguidade podem resultar tanto praças abandonadas
quanto estacionamentos apropriados por crianças para brincadeiras, por exemplo. Assim, da
mesma forma que é possível usar uma caixa de fósforos para fazer música, os indivíduos são
capazes de tomar para si, de apropriar-se de espaços, para desenvolver outros usos que não os
inicialmente propostos pelo planejador.
Vimos na seção anterior que a industrialização tardia nos países em
desenvolvimento destruiu as atividades tradicionais, mas não foi capaz de absorver a força de
trabalho de toda a população que migrou para as cidades, sendo a favela como símbolo principal
desse processo. Já nos países desenvolvidos, segundo Lefebvre (2001), foi a proliferação de
subúrbios que se constituíram como um grande problema para a vida urbana, pois se
constituíram enquanto áreas homogêneas e segregadas. Nesse sentido, para o referido autor, o
problema da moradia sobressaiu e ocultou os reais problemas da cidade, aprofundados quanto
mais ela é tratada em termos de setores e funções subordinados aos centros de decisão. Na
medida em que a cidade se alinha pela lógica industrial, torna-se “dispositivo material próprio
para se organizar a produção, para controlar a vida cotidiana dos produtores e o consumo dos
produtos” (LEFEBVRE, 2001, p.82). Isso significa dizer, em nosso entendimento, que a
homogeneidade do concebido pode recobrir a diversidade, uma vez que tenta lhe podar as
possibilidades de apropriação. Assim temos que a forma criativa como os indivíduos podem se
apropriar daquilo que lhes é oferecido pela cidade, ou pelo que é concebido para ela, pode
resgatar o valor de uso nas cidades.
O sentido da apropriação tratada por Lefebvre também pode ser complementado
quando tomamos este conceito em outra obra sua, onde ele define que um grupo social se
apropria de um espaço natural quando o modifica para servir as suas necessidades e
possibilidades. Isto significa que o sentido da apropriação está relacionado às práticas que
modificam um espaço natural, podendo dar origem a um outro espaço produzido pelos
interesses do grupo em um determinado momento. “Nem sempre: um lugar, uma praça, uma
rua podem se dizer “apropriados”. Tais espaços abundam, ainda que nem sempre seja fácil dizer
em que e como, por quem e para quem eles foram apropriados” (LEFEBVRE, 2000:192). O
espaço público, portanto, não pode ser entendido como um lugar estático, mas sim como um
lugar praticado, cujas ruas e praças, por exemplo, podem ser transformadas pelo uso que lhes é
dado, pela forma como são apropriados.
64
Na medida em que a apropriação do espaço público aqui analisada se dá por meio
do trabalho que é exercido na rua, cabe destacar que este é convertido por essa prática em um
novo espaço de consumo e a junção de atividades formais e informais, por sua vez, contribui
para a convergência de fluxos que reafirmam a centralidade no lugar onde observamos sua
ocorrência. De acordo com Montessoro (2006), o comércio nas ruas existe e continuará se
expandindo, sobretudo nas áreas centrais, pois o fluxo que incide neste local permite uma
circulação mais acirrada. A apropriação por parte dos trabalhadores de rua, para esta autora,
tem uma relação de causa e efeito que está associada ao desemprego.
Ainda para a autora citada, a relação de troca com enfoque nos trabalhadores de rua
modifica os usos do espaço numa relação entre indivíduos e uma sociedade que se baseia no
consumo. Mesmo que a relação de troca esteja como pano de fundo, é possível estabelecer
contatos com as pessoas e com o lugar apropriado (ponto), de maneira que quando se avista
alguém adquirindo produtos com os trabalhadores de rua, pode-se pressupor que o contato de
compra e venda cria uma imagem da pessoa com o lugar, sendo este um espaço público
apropriado pelo vendedor.
Diversos tipos de apropriação do espaço público são possíveis, porém nos chama
atenção o fato de que no caso dos trabalhadores de rua, esta apropriação passe a ser reconhecida
pelo Poder Público e passe a incorporar o quadro de políticas públicas desenvolvidas pelo
Estado. Em outras palavras, isto significa que a apropriação é incorporada pelo planejamento
na medida em que ela passa a ser entendida como um direito. Veremos no Capítulo 3, por
exemplo, que mesmo nos locais onde o poder público permite a atividade do trabalhador de rua,
outras formas de apropriação são possíveis para além da atividade do trabalho. É o caso das
crianças levadas por suas mães e parentes, que além de aprenderem sobre o ofício, passam
também a utilizar esse espaço para brincar. Assim também é o caso das rodas de jogos de dama
criadas por trabalhadores nos momentos em que o movimento está fraco. Apesar desses
exemplos não podemos deixar de considerar a permanente tensão entre a apropriação pelo
trabalho em locais que a atividade dos trabalhadores não é permitida. Todavia, por ora, nos
deteremos a eles e seguiremos nos próximos capítulos tratando sobre a relação entre o
concebido e o vivido, ou seja, entre as ações do planejamento apresentadas criticamente no
Capítulo 2 e a atividade dos trabalhadores de rua, que será apresentada tal como se configura
na contemporaneidade, com base em dados empíricos que revelam sua caracterização e
funcionamento no Capítulo 3.
65
2 O ESPAÇO PÚBLICO E O TRABALHO DE RUA EM SALVADOR:
CARACTERIZAÇÃO, LEGISLAÇÃO E PLANEJAMENTO
No Capítulo 1 tentamos evidenciar a relação existente entre a informalidade e o
espaço público numa perspectiva predominantemente teórica, onde foi possível observar que a
apropriação se dá, sobretudo, pelo exercício de um uso novo e distinto do que aquele que teria
sido concebido para um determinado lugar. Neste capítulo agora, buscamos esmiuçar a forma
como essa apropriação se dá, mantendo a atenção nos dois eixos articuladores desta dissertação
(espaço e economia).
Neste capítulo, inicialmente, apresentaremos a área de estudo, onde se insere a
principal via aqui estudada, a Avenida Sete de Setembro e os bairros que a ela estão adjacentes,
nos quais se inclui o bairro Dois de Julho, aqui também tratado por concentrar historicamente
trabalhadores de rua. Posteriormente, apresentaremos a legislação que incide sobre o espaço
público e, seguiremos com a leitura crítica das propostas de intervenção elaboradas pela
municipalidade em momentos distintos, selecionados no período que sucede a
redemocratização do país.
Trataremos neste capítulo, não do histórico da relação entre o trabalhador de rua e
o espaço público, mas de como o espaço é concebido, ou seja, aquele espaço sobre o qual incide
o planejamento, sob os interesses de seu agente promotor, o Estado, conforme enunciado por
Lefebvre. Para nos aprofundarmos sobre a forma como este espaço é concebido,
apresentaremos a caracterização das ruas que aqui são estudadas, onde se observa a apropriação
pelo trabalhador de rua e que, por sua vez, integram o campo do vivido. Este, por sua vez, será
tratado mais adiante, no Capítulo 3, quando lançaremos nosso olhar sobre a organização e
funcionamento do trabalho de rua, que não se observa em quaisquer ruas. As ruas escolhidas
pelos trabalhadores são determinadas devido a um conjunto de fatores que envolvem desde o
grande fluxo de transeuntes que se deslocam em busca de empregos, serviços, comércio e
diversas outras atividades do cotidiano, até o próprio interesse do poder público em permitir a
comercialização de mercadorias em locais específicos e de obter com a atividade uma forma de
arrecadação.
Por fim, antes de avançarmos sobre o desenvolvimento desta parte do trabalho, é
importante destacar que a leitura das propostas elaboradas pelo poder público será feita com
base em cinco categorias de análise distintas: existência de um diagnóstico sobre a situação;
conforto ambiental; infraestrutura de suporte para a atividade; relação entre a proposta e o
66
entorno; e densidade de ocupação. Sobre esta última, densidade de ocupação, informarmos que
nos deteremos a ela mais particularmente, por ter sido uma categoria pouco ou não mencionada
nos projetos estudados e que consideramos de fundamental importância para compreensão da
dinâmica da atividade no espaço.
2.1 Caracterização das ruas onde se observa o trabalho de rua: Avenida Sete de Setembro,
transversais e Largo Dois de Julho
A Avenida Sete de Setembro é uma das principais vias urbanas do município de
Salvador. Além de ter sido palco de diversos acontecimentos históricos, ao longo da Avenida
Sete estão diversos marcos arquitetônicos importantes como o Mosteiro de São Bento e o
Convento das Mercês, por exemplo. Ao analisarmos também a localização da referida Avenida,
podemos observar que ela corta alguns bairros do centro antigo de Salvador, os quais não serão
detalhadamente apresentados aqui, com exceção ao bairro Dois de Julho, onde também é
fortemente notada a presença de trabalhadores de rua.
Em Salvador, as primeiras décadas do século XX podem ter sido marcadas pela
estagnação econômica, mas não pela letargia urbana. De acordo com Flexor (2011) os
problemas da cidade foram enfrentados sob a luz dos ideais higienistas, bem como foram feitas
tentativas de criar condições para modernização da cidade. Dentre as intervenções do período,
destaca-se o alargamento da Avenida Sete de Setembro entre os anos de 1912-1916, principal
obra do governo de J.J. Seabra, realizada seguindo os moldes do “urbanismo demolidor”
parisiense, que fora protagonizado pelo barão de Haussmann. As obras desse período visavam
romper com o traçado colonial, de modo a ordenar e higienizar a cidade que se expandia em
direção ao sul. O plano de J.J. Seabra contava com financiamento internacional, que teve seu
andamento prejudicado com o acontecimento da Primeira Guerra Mundial. Graças a este fato,
diversos prédios históricos deixaram de ser demolidos ao longo do trajeto da avenida, pois os
recursos destinados à obra foram reduzidos, o que forçou algumas mudanças na execução do
que foi planejado. Ainda assim, conforme Pinheiro (2011) cabe destacar que alguns prédios
históricos não escaparam e foram demolidos em prol do alargamento da Avenida Sete, como é
o caso da Igreja de São Pedro Velho.
67
Ainda de acordo com Pinheiro (2011) o objetivo da reforma da Avenida Sete era
desafogar o Distrito da Sé8. O traçado da via projetada tem 4,6km de extensão, 21m de largura
e 3m de calçada. Uma parte da avenida está situada no Distrito de São Pedro, área que
compreende 1,5km do total da via e que outrora fora ocupada pela elite econômica e intelectual
de Salvador, porém que passou por um processo de empobrecimento, em que muitas edificações
foram convertidas em cortiços. A atividade dos trabalhadores de rua é justamente observada no
trecho que corresponde ao Distrito de São Pedro, que vai do Mosteiro de São Bento ao Forte
de São Pedro. A partir do Campo Grande a Avenida Sete de Setembro faz parte do Distrito da
Vitória, uma das áreas mais enobrecidas da cidade, onde partes de seu trajeto são popularmente
denominados de Corredor da Vitória e Ladeira da Barra. De lá seu traçado segue até a Barra
(Mapa 01).
O Centro Antigo e o Centro Histórico de Salvador9 aos poucos perderam parte de
seu prestígio. Na Rua Chile, por exemplo, que tinha grande importância para o comércio e
serviços da cidade, as principais lojas e estabelecimentos de luxo foram deslocados para outras
regiões. Segundo Gomes & Fernandes (1995), já nos anos 1950 o varejo fino da cidade, que
antes se concentrava na rua supracitada, começava a se direcionar para a Avenida Sete de
Setembro. É de se considerar também o impacto que a ampliação do sistema viário com a
abertura das Avenidas de Vale proporcionou à cidade, que pode se desenvolver em novas
direções, o que, conseqüentemente, impactou diretamente no fluxo de pessoas que
redirecionaram seus deslocamentos para novas centralidades.
8 Reconhecemos que a delimitação por distrito, a princípio, pareça defasada. Porém, optamos por utilizá-la tanto para
compatibilizar aquilo que falamos hoje com as informações mais antigas sobre a área, quanto por Salvador ainda não ter uma delimitação oficial para os bairros, conforme será comentado adiante. 9 O Escritório de Referência do Centro Antigo da Cidade de Salvador em convênio com a Organização das Nações Unidas
para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) apresenta uma delimitação onde são considerados o Centro Histórico e o Cento Antigo da cidade. Nesta delimitação o Centro Histórico compreende a área que vai da Rua Chile ao Santo Antônio. Já o Centro Antigo abrange o Centro Histórico, Campo Grande, Politeama, Centro, Barris, Tororó, Jardim Baiano, Nazaré,
Barbalho, Lapinha, Comércio, Água de Meninos, Sieiro, Queimadinho, Liberdade e Calçada.
68
Mapa 1: Av. Sete de Setembro – Extensão total, 2015.
Fonte: Elaboração da autora.
Na década de 60, segundo Margarete Oliveira (2003), a criação do Centro Industrial
de Aratu (CIA), dentre outros fatores, contribuiu para que o crescimento físico da cidade fosse
direcionado para o vetor norte. Nessa região, além do favorecimento da malha viária, a
construção do Shopping Iguatemi Salvador, a implantação da Estação Rodoviária e o Centro
Administrativo da Bahia (CAB) na Avenida Paralela foram empreendimentos que
redirecionaram e redimensionaram os fluxos da cidade.
Esse conjunto de acontecimentos contribuiu para que o centro antigo e sua principal
avenida vissem a sofisticação e o luxo outrora existentes serem substituídos por um varejo mais
popular. Contudo, o fluxo de pessoas que se deslocam diariamente para a área não se tornou
menos importante. Nesse contexto, assume grande destaque um equipamento erguido nas
proximidades da Avenida Sete: a Estação da Lapa, inaugurada na década de 1980. Para o
69
terminal de transporte da Estação da Lapa se dirigem, segundo a Transalvador (2010), 92 linhas
de transporte, num contingente de cerca de 278 ônibus/hora ou cerca de 260.000
passageiros/dia. Ressalta-se ainda que, no ano de 2014, houve a inauguração da Linha 1 do
metrô, que atualmente vai da Estação da Lapa até o Acesso Norte, e que transportou no mês de
abril de 2015 uma média de 31 mil usuários por dia, segundo informações contidas no site da
Secretaria de Desenvolvimento Urbano (Sedur). Cabe ainda destacar que na região há também
duas grandes superfícies comerciais: os shoppings centers Lapa e Piedade, que atraem um
número significativo de viagens, o que pode ser constatado pelos números apresentados por
suas administrações, que informam em seus sites que por ali circulam cerca de 70 e 100 mil
pessoas/dia, respectivamente. Essas estimativas sobre o número de pessoas que circulam na
área indicam não somente o volume de transeuntes, mas também o grande número de empregos
que a região concentra, sejam eles formais ou informais.
O rumo seguido pela urbanização em Salvador durante a década de 1980 deslocou o centro do processo de capitalização – que se tornou centro histórico
– criando novas zonas de concentração de capital, porém deixando no centro
grande parte de suas funções tradicionais. Enquanto a formação de capital expandiu-se nas áreas de Pituba-Itaigara-Iguatemi, o centro continuou com a
concentração dos sistemas de transporte, preservou sua função residencial –
ainda que atualmente esteja destinado a outras classes sociais, mantendo sua dinâmica com um notável aumento da circulação de pedestres (SALVADOR,
1992a:18).
A Avenida Sete de Setembro então, mantém sua grande importância para a cidade,
pois corta uma área onde há grande concentração de atividades comerciais e de serviços, além
de instituições como igrejas e escolas. Ainda é palco dos principais eventos cívicos e de protesto
que acontecem na cidade e, por contar com um grande número de transeuntes que se deslocam
diariamente pelo local, seja para trabalhar, estudar ou consumir mercadorias e/ou serviços,
tende a ser bastante procurada por trabalhadores de rua para desenvolver suas atividades
laborais. Por este motivo, diversas intervenções foram e são planejadas pelo poder público.
Intervenções e propostas que datam desde o século XIX, no período próximo à abolição da
escravatura, quando escravos de ganho e quitandeiras podiam comercializar produtos apenas
em cantos específicos da cidade. Não será possível, entretanto, aprofundarmo-nos nessas
questões históricas, pois o recorte aqui proposto é contemporâneo. Contudo, não poderíamos
deixar de pontuar que este é também um traço histórico, que demonstra como o ato de utilizar
o espaço da rua para vender mercadorias faz parte da nossa herança cultural.
70
A Avenida Sete, como dito anteriormente, corta três distritos da cidade de Salvador.
Considerando sua parte pertencente ao distrito de São Pedro, ela pode ser entendida ao mesmo
tempo como um eixo de ligação e de fronteira entre alguns bairros centrais. Isto porque, se de
dia os moradores destes bairros podem transitar entre os mesmos e se utilizar dos serviços e das
mercadorias comercializadas na Avenida, durante a noite, finais de semana e feriados (quando
o comércio está fechado) este uso fica limitado, pois esta é uma região considerada insegura
por muitos daqueles que habitam no seu entorno. Isto se deve ao fato de, ao longo da avenida o
uso ser predominantemente destinado ao comércio e aos serviços, restando poucas moradias.
Lembrando do que nos disse Jacobs (2011) no capítulo anterior, quando a autora
comentava sobre suas observações das ruas em um contexto de bairro, o uso misto das formas
é tratado como uma das maneiras capazes de garantir que uma diversidade de interesses conflua
e se expresse no uso do espaço público e na sua consequente segurança. É uma situação um
pouco diferente do nosso caso, em que se trata, ainda hoje, de uma área predominamente
comercial, porém cercada de bairros residenciais. Estes são nutridos pela dinâmica do entorno
e também contribuem para nutrir a dinâmica das relações estabelecidas nas ruas do centro da
cidade. Durante o dia estas ruas, sobretudo a Avenida Sete de Setembro, apresenta grande fluxo
de transeuntes, tanto daqueles que se deslocam de diversas partes da cidade para este local,
quanto daqueles que habitam em suas proximidades. Isto se deve aos diversos tipos de
estabelecimentos que concentra e dos serviços que ali são ofertados. Além dos estabelecimentos
fixos, há neste espaço ainda grande número de trabalhadores de rua, comercializando todo tipo
de mercadorias em suas bancas, telas e esteiras postas sobre o chão das calçadas. A existência
de olhos voltados para as ruas, aspecto mencionado pela autora como uma das maneiras de
torná-las seguras, praticamente inexiste neste lugar no período da noite, favorecendo a
existência de atividades consideradas marginais.
Ao percorrermos a extensão que aqui é estudada temos os seguintes bairros nas
margens da Avenida Sete: Dois de Julho, Aflitos, Barris e Politeama.10 Destes, nos deteremos
apenas ao Dois de Julho, por também concentrar tradicionalmente trabalhadores de rua.
Destacamos ainda os bairros que fazem parte do Centro Histórico, Mouraria e Nazaré, que
apesar de não estarem imediatamente nas margens da Avenida Sete, também se relacionam com
este espaço (Mapa 02).
10 Embora aqui esteja-se usando a denominação bairro, a mesma não é reconhecida oficialmente pela municipalidade. Salvador, ainda no ano de 2015 ainda não possui uma delimitação oficializada pelo poder público. O estudo de maior referência até o momento é o trabalho intitulado “O caminho das águas” publicado no ano de 2010, porém ainda não foi oficializado. Mesmo neste estudo de referência, os bairros aqui mencionados não aparecem delimitados. A maioria deles compõe um “bairro”
denominado Centro, que engloba as localidades mencionadas.
71
Mapa 2: Bairros que margeiam a Avenida Sete de Setembro.
Fonte: Elaboração da autora, 2015.
A formação do bairro Dois de Julho coincide com as primeiras expansões
extramuros da Salvador colonial, quando caminhos e ladeiras foram abertos para vencer a
distância entre o porto, localizado na cidade baixa, e a cidade alta. Dentre tais caminhos destaca-
se a Ladeira da Preguiça e Rua do Sodré (Schefler et al.). A aglomeração de moradias nessa
região que fazia parte da antiga Freguesia de São Pedro, deu origem ao que conhecemos como
bairro Dois de Julho. Ainda naquele período há indícios de que nessa freguesia funcionava um
mercado de abastecimento que, dentre outas características, marcou a formação do bairro
(Nascimento, 1986).
Com o alargamento da Avenida Sete de Setembro no início do século XX, há uma
substituição das residências existentes por hotéis, pensões e alojamentos, sobretudo no Largo
Dois de Julho, o que favoreceu a desvalorização da área, uma vez que a população de elite
tendia a afastar-se das zonas comerciais (Araújo, 2006). Como pudemos notar, o Dois de Julho
faz parte e é afetado diretamente pela dinâmica do centro antigo, absorvendo os impactos das
mudanças nele ocorridas ao longo do tempo. Apesar de ainda hoje ser um bairro com uso
72
residencial forte, possui também um número considerável de estabelecimentos comerciais e de
serviços, sobretudo nas proximidades do largo e das praças existentes. Dentre suas
características marcantes, está a presença de um grande número de pessoas circulando e
vendendo mercadorias nas ruas, motivo pelo qual o poder público também se interessou por
intervir neste espaço, sobretudo no intuito de ordenar as atividades do comércio informal que
aí ocorrem. Nesse sentido, seguiremos apresentando a legislação que incide sobre a atividade
do trabalhador de rua no espaço público em Salvador.
2.2 O espaço público em Salvador e a legislação incidente
A Lei nº 3.377/84 que dispõe sobre o Ordenamento do Uso e da Ocupação do Solo
de Salvador (LOUOS/84) traz em um de seus anexos conceitos sobre o que a prefeitura entende
por diversos termos. Os espaços públicos são entendidos como “espaços livres de uso público”
e são definidos como “todas as áreas de domínio público cujo acesso esteja franqueado a
qualquer cidadão.” (SALVADOR, 1984, s.p.). O espaço público da rua em Salvador também
pode ser traduzido pelo termo “logradouro público”. Este é definido pela LOUOS/84 como
“espaço livre, reconhecido pela municipalidade, destinado ao trânsito, tráfego, comunicação ou
lazer públicos” (SALVADOR, 1984, s.p.).
No Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano de Salvador de 2008 (PDDU/2008)
os logradouros públicos são considerados como “ambientes de convívio e socialização, meios
de inserção social, de fortalecimento da identidade coletiva e de desenvolvimento econômico”
(SALVADOR, 2008, s.p.). A sua recuperação e complementação urbanística, com a finalidade
de melhorar a paisagem dos espaços está prevista como um dos objetivos da política urbana do
município. Esta definição nos remete à questão da própria apropriação dos espaços públicos
quando a lei cita o “fortalecimento da identidade coletiva” que se relaciona com a ideia de
pertencimento dos indivíduos ao lugar e, além disso, insere a ideia do desenvolvimento
econômico, que não aparecia nos conceitos anteriormente citados e que indica uma nova
funcionalidade. O PDDU/2008 ainda considera, dentre as diretrizes para o Centro Municipal
Tradicional11, o ordenamento e controle do comércio exercido pelos trabalhadores de rua nos
11 A lei nº 7.400/2008 que dispõe sobre o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU/2008) define zonas para onde convergem e por onde se articulam os principais fluxos estruturadores do município (corredores viários) pela convergência que há em relação a comércio, serviços e mobilidade. Três Centros Municipais são por ele definidos: Centro Municipal Tradicional (CMT), Centro Municipal do Camaragibe (CMC) e Centro Municipal Retiro-Acesso Norte (CMR). No CMT está incluído o
centro histórico e a região compreendida como centro antigo.
73
logradouros públicos. Ressalta-se que o PDDU sobre o qual estamos nos referindo está em
processo de revisão.
As atividades públicas ou privadas que configuram uso do solo na cidade são
reguladas, fiscalizadas e punidas administrativamente, quando é o caso, pela polícia
administrativa do município, que é responsável ainda por disciplinar o exercício dos direitos
individuais sob os interesses públicos e pode ser representada por órgãos como a
Superintendência de Controle e Ordenamento do Uso do Solo do Município (SUCOM) e a ex-
Secretaria Municipal de Serviços Públicos e Prevenção à Violência (SESP), cujas funções
foram absorvidas pela Secretaria de Ordem Pública (SEMOP), criada na gestão da prefeitura
do ano de 2013. No que se refere às atividades comerciais, compete ao poder de polícia
administrava disciplinar a exposição de mercadorias e impedir sua exposição em áreas externas
além do que estiver autorizado por ela, que deve ainda exercer o controle do uso do solo.
O Código de Polícia Administrativa, instituído pela Lei nº 5.503/99, regula as
atividades dos trabalhadores de rua, em que a exploração da atividade depende de um alvará de
licença ou autorização. Este só é emitido se estiver em conformidade com aspectos de higiene,
estética, limpeza pública e/ou segurança, trânsito e impacto ambiental, bem como com o
estabelecido pela LOUOS/84, no que se refere a sua localização e/ou equipamento utilizado na
atividade. O alvará expedido para atividade em logradouro público depende da autorização da
Prefeitura e sempre é emitido em caráter individual (pessoa física), precário e intransferível, ou
seja, precisa-se de autorização para vender. Por título precário entende-se o modo de conceder,
usar ou gozar alguma coisa, sem que isso se constitua como um direito. 12
A caracterização do que se constitui efetivamente enquanto trabalho de rua pela
municipalidade foi buscada também através da realização de entrevista com agente do poder
público13. Para a Coordenação de Fiscalização e Licenciamento da SEMOP, é entendido como
ambulante toda atividade que é exercida na via pública. Os flanelinhas, por exemplo, são
compreendidos em outra categoria, estando enquadrados como prestadores de serviço. Já a
baiana de acarajé faz parte de outro segmento, que é o segmento de alimentos. O vendedor de
pipoca também faz parte do segmento de alimentos, porém é cadastrado como comércio
12 Há ainda o Decreto nº 12.016/98 que é anterior ao referido código e o complementa no que se refere à localização e funcionamento da atividade desenvolvida pelos trabalhadores de rua nos logradouros públicos da cidade. Para obter a autorização deve-se preencher um requerimento junto à SEMOP, através da Coordenadoria de Licenciamento e Fiscalização, ente ao qual pertence competência pelo ordenamento, licenciamento e fiscalização da atividade desenvolvida pelos trabalhadores de rua. 13 Em 29/09/2014 foi realizada entrevista com o atual coordenador de licenciamento e fiscalização da Secretaria de Ordem
Pública, Braz Augusto Pires, que trabalha na prefeitura há 18 anos e atua na fiscalização e ordenamento há 2 anos.
74
informal. Contudo, o coordenador entrevistado chama atenção para o fato das denominações
“ambulante” e “comércio informal” quererem dizer a mesma coisa, referindo-se aquele que
comercializa na rua, porém a diferenciação é feita pela prefeitura apenas por uma questão de
diversificação do tipo de produto comercializado.14
A atividade comercial desenvolvida pelos trabalhadores de rua é entendida no
Código de Polícia Administrativa do Município como comércio informal. Com relação às
atividades em logradouros públicos, o exercício por parte desses trabalhadores se divide entre
aqueles que trabalham com equipamento removível daqueles que trabalham com equipamento
fixo.
Os que trabalham com equipamento removível deverão seguir o padrão definido
pela prefeitura, em que o seu funcionamento também é regulamentado.15 As atividades
desenvolvidas com equipamento fixo dependem de cadastramento e expedição de alvará de
funcionamento. A prefeitura, para emitir o alvará de funcionamento e a permissão da atividade,
verifica a conveniência de localização bem como as implicações relativas à mesma no que se
refere ao trânsito, estética, saúde pública e preservação do meio ambiente. O padrão do
equipamento fixo também é definido pela municipalidade, o que, de acordo com a lei, deverá
ser feito ouvindo em tempo as entidades representativas para o estabelecimento das normas do
decreto. Os 12 modelos padronizados pela SESP, hoje SEMOP, contidos no Decreto 12.016/98
incluem:
banca desmontável com dimensões de até 1.05mX0.80;
tabuleiro com até 1.20mX0.60;
equipamento móvel sobre rodas com até 0.95mX1.35m;
recipiente tipo mala com tampa com até 0.80mX0.50m;
isopor com capacidade para 50 litros;
mostruário com dimensões de até 0.80X1.20m;
cantimplora;
cestos de vime ou garrafas térmicas;
recipientes com capacidade de até 30 litros;
cadeira de engraxate;
14 As informações obtidas são confusas, mas relatam o que foi comunicado na entrevista mencionada. Isto revela uma fragilidade conceitual no entendimento do poder público com relação a atividade. Ressaltamos que este entendimento é confuso também para os trabalhadores como veremos adiante, que apresentam dificuldade para especificar a que categoria de trabalhadores pertencem. 15 Aqueles que possuírem a autorização para o exercício da atividade deverão sempre ter consigo o alvará de funcionamento,
documento de identificação e carteira de saúde.
75
máquina fotográfica tipo lambe-lambe;
máquina com esmeril tipo amolador
Tais modelos foram citados aqui com a finalidade de que se tenha uma ideia geral
do que é normatizado e encontrado nas ruas de Salvador, bem como as dimensões que os
equipamentos podem ocupar no espaço. Cabe ressaltar que outros modelos podem ser
encontrados, porém os mesmos dependem também de autorização específica por parte da
SEMOP. As taxas cobradas pelo equipamento para o exercício da atividade podem variar de
R$6,35 (ex.: equipamento usado por engraxate) a R$33,37 (ex.: equipamento tipo banca
desmontável) por mês, de acordo com o Código Tributário e de Rendas do Município (Salvador,
2006).
O processo de licenciamento e fiscalização, de acordo com a coordenação do setor
na SEMOP, é feito quando o trabalhador dirige-se ao setor de protocolo da secretaria e dá
entrada com a documentação exigida pelo órgão, onde informa o local onde ele quer atuar. A
Secretaria, por sua vez, envia a fiscalização no lugar a fim de avaliar se há vaga. Após o parecer
do fiscal, o trabalhador é chamado para ser informado sobre o deferimento ou indeferimento de
sua solicitação.
Ainda de acordo com o disposto no Decreto 12.016/98, para utilização de
logradouros públicos onde a atividade pode ser desenvolvida são considerados aspectos como
fluxo de pessoas que favoreça o exercício da atividade, espaço disponível para instalação do
equipamento e disposição da mercadoria, além de preservação do espaço livre ao pedestre e ao
trânsito de veículos, quando for o caso. A atividade poderá ocorrer ainda, todos os dias da
semana nos locais e dentro do horário especificado no alvará de autorização recebido. Cabe
salientar que a localização pode ser alterada a qualquer momento caso seja entendido que a
mesma está sendo prejudicial à circulação de pedestres ou a outros motivos de interesse público
devidamente fundamentados. O trabalhador não poderá ainda alterar a localização do
equipamento sem ser autorizado.
As restrições quanto à atividade se referem a alguns locais como, por exemplo, a
menos de 10m de semáforos, portões de acesso a estabelecimentos de ensino, bancário ou
repartições públicas, além de prédios residenciais. Não devem ocorrer ainda próximo a locais
em que haja a entrada e saída de veículos, pontos de ônibus, rampas de acesso, descidas de
passarelas e a menos de 20m de estabelecimentos que desenvolvam o mesmo tipo de atividade
só que no campo formal. Com relação às mercadorias, não é permitida a venda de bebidas
76
alcoólicas, armas que sejam consideradas perigosas como facas ou armas de fogo, inflamáveis,
corrosivos, explosivos, animais, alimento (exceto pipoca, cachorro quente, algodão doce,
amendoim e milho), ou qualquer outro produto que já não tenha sido especificado na
autorização concedida.
No caso do não cumprimento dos dispositivos contidos no Decreto nº 12.016/98,
os trabalhadores de rua podem ser punidos desde advertências por escrito até cassação da
autorização ou apreensão do bem e da mercadoria, caso seja constatado o caráter ilícito do
comércio, a transgressão às normas do referido Código ou quando se tratar de bens irregulares
localizados nos logradouros públicos.
A normatização para a atividade estabelecida por meio da legislação vigente cria
restrições e permissões à atividade, de modo que podemos perceber que o poder público define
através do seu poder disciplinador os locais e os formatos em que a atividade lhe interessa.
Assim, seguiremos apresentando os projetos elaborados pelo poder público no recorte temporal
que corresponde ao período posterior a redemocratização do país, cujo marco é a promulgação
da Constituição Federal de 1988, e vai até o ano de 2014. Este recorte foi escolhido por
corresponder ao período em que foram encontrados projetos propostos pelo poder público para
as áreas da Avenida Sete de Setembro e bairro Dois de Julho, e nos auxiliarão no entendimento
tanto da importância que a atividade adquire na cidade, quanto a forma como a mesma tem sido
regulada pela municipalidade ao longo das últimas décadas.
2.3 Projetos do poder público incidentes sobre a atividade do trabalhador de rua
O exercício da atividade comercial em via pública costuma ser alvo de intervenções
do poder público, que tem suas ações tanto no sentido de coibir quanto de regular a atividade.
No recorte de tempo aqui proposto, entre 1988 e 2014, na cidade de Salvador, foram elaboradas
algumas propostas por distintas gestões municipais no sentido de organizar a atividade do
trabalhador de rua na região da Avenida Sete e do bairro Dois de Julho, mais precisamente nos
anos de 1992, 1997 e 2014. Cada um dos projetos será brevemente apresentado, focando
principalmente nas principais características de cada um dos tipos de intervenção. Daremos
mais atenção, no entanto, aos projetos elaborados no ano de 2014, por coincidir com o período
em que também foram coletadas as nossas informações de campo. Porém, nosso olhar agora
será voltado principalmente para as características técnicas dos mesmos. Voltaremos a tratar
77
dos demais aspectos posteriormente, quando pudermos relacioná-los àquilo que foi obtido com
a aplicação dos questionários e entrevistas.
2.3.1 Propostas em 1992
Projeto “O informal em Salvador – Políticas e Propostas”, 1992
Este projeto foi proposto no ano de 1992, na gestão do prefeito Fernando José
Guimarães Rocha e contou com consultoria de dois economistas de referência: João Carlos
Araújo e Fernando Pedrão. No relatório do projeto, há uma importante contextualização e
diagnóstico da informalidade à época, destacada como um dos mais relevantes problemas da
cidade. A referida proposta tinha a pretensão de “implementar uma solução urbanística que
integre os trabalhadores atualmente localizados em um dos mais importantes e tradicionais
espaços da cidade” (SALVADOR, 1992a:4). Este espaço é sinalizado como o circuito
compreendido entre a Praça da Sé e o Campo Grande.
Para aquela gestão da prefeitura, a utilização do espaço público implicava em custos
e as atividades localizadas nos logradouros públicos deveriam, portanto, dentro de suas
possibilidades, contribuir com a manutenção desses locais. Além das propostas de intervenção
urbanística que visavam tanto organizar a atividade no local, quanto redistribui-la na cidade,
havia também diretrizes no âmbito social no sentido de incentivar a promoção de programas
para orientação e qualificação do trabalhador de rua.
Fica evidenciado, através do relatório, que a intenção da prefeitura naquele período
era de implementar uma política voltada para as atividades informais, nas quais estavam
incluídas a atividade do trabalhador de rua (ambulantes), das barracas de praia, bancas de chapa
e feirantes. Nota-se ainda uma preocupação de incorporar a problemática da informalidade ao
planejamento urbano da cidade, pois a proposta conta com o estabelecimento de diretrizes para
a questão e não somente com uma orientação para intervenções pontuais.
Antes de partirmos para a apresentação das diretrizes propriamente ditas, é
interessante notar como a questão da informalidade é posta pelo projeto de 1992. O relatório
nos traz um pouco da evolução pela qual o conceito da informalidade passou desde a década de
1970, destacando a imprecisão conceitual utilizada e a pluralidade de formas de trabalho nas
quais se inclui o uso do termo. Contudo, considera-se que tais conceitos têm pouco a oferecer
se não forem postos em contato com a realidade do cotidiano urbano. Neste sentido, a
78
informalidade é compreendida no âmbito do projeto como um produto da urbanização, fruto da
atividade urbana contínua, onde cada tipo de cidade possui um quadro de informalidade
correspondente, cuja composição muda ao longo do tempo, o que reflete as mudanças
demográficas e econômicas pelas quais a cidade passa. Reconhece-se então que a informalidade
transcende a questão da marginalidade e reflete estratégias de sobrevivência de trabalhadores
excluídos do mercado formal, de maneira que não parece muito interessante a proposição de
políticas que ignorem a questão ou visem extingui-la.
Assim como mencionamos no capítulo 2 desta dissertação, o texto do referido
projeto reconhece a informalidade como um traço estrutural de nossa economia, resultado de
um desenvolvimento econômico tardio e do descompasso existente entre as ofertas de trabalho
e a mão de obra disponível nos centros urbanos. A informalidade então é entendida por este
projeto como:
[...] um conjunto de relações sociais que não estabelece vínculos tipicamente capitalistas entre capital e trabalho, pelas quais a sociedade não se
responsabiliza, ou seja, a reprodução do trabalho fica a cargo exclusivamente
do próprio trabalhador. São os trabalhadores autônomos, assalariados sem carteira assinada e patrões, geralmente situados na faixa de renda de até 5
salários mínimos (SALVADOR, 1992a:9).
Tendo em vista esta concepção da informalidade pelo poder público à época, o
objeto das intervenções se concentraram em dois eixos: o primeiro, no que se refere às
atividades informais exercidas em logradouro público e o segundo, na implementação de uma
política social voltada para redefinir o quadro de pobreza urbana verificado na cidade. A
metodologia para o desenvolvimento deste trabalho recorreu tanto às pesquisas oficiais
desenvolvidas por institutos como o IBGE, quanto aos estudos de caracterização física e
socioeconômica das categorias, com vistas a compreender e qualificar melhor o universo
pesquisado. Foram selecionadas 16 grandes áreas de concentração de atividade do setor
informal, em que foram aplicados 3 questionários distintos, de modo a contemplar ambulantes
e barracas de praia, bancas de chapa e transeuntes.
Para orientar os estudos e proposições foram também pensados alguns possíveis
cenários futuros no que se refere ao desempenho da economia baiana, onde se revelou como
mais provável o cenário que previa uma estagnação generalizada da economia, com a
continuidade de uma política recessiva do governo federal, ausência de investimentos e
aumento do subemprego e emprego. Tal perspectiva apontava para a necessidade de que o
município de Salvador viesse a assumir iniciativas voltadas para sustentar o nível de ocupação
79
e renda de sua população, atuando não apenas de forma ordenadora. Apesar desta reflexão,
coloca-se que a postura da municipalidade não deve ser passiva com a informalidade, pois:
[...] não é possível assistir de formar impassível os espaços públicos serem
invadidos pelo comercio de mercadoria ou pela prestação de serviços como
também não se constitui em solução a adoção de medidas repressivas que só agudizam um problema de cunho eminentemente social e que, ao que tudo
indica, tende a agravar-se (SALVADOR, 1992a:16).
Os resultados das pesquisas realizadas indicaram, dentre outros fatores, que havia
uma expressiva demanda de consumo que só podia ser atendida por este tipo de comércio, que
ofertava mercadorias a preços menores. Além disso, o mercado informal se apresentava também
como alternativa de sobrevivência de parcela importante da população. Estes fatores são
apontados pelo referido estudo como motivação para adoção de uma postura proativa da
prefeitura com relação a atividade, a quem caberia a criação de condições favoráveis para que
essas pessoas pudessem garantir o seu sustento. Neste sentido, há uma importante indicação no
que diz respeito a integração da questão da informalidade ao planejamento urbano da cidade,
de modo a trata-la não apenas como uma problemática isolada ou setorial. Esta ação pressuporia
medidas preventivas e educativas em pontos identificados como críticos, bem como a
implementação de ações nos bairros de origem dos trabalhadores informais, de modo a criar
opções de trabalho ou de viabilização da sobrevivência dessas pessoas nas proximidades do
local de suas residências. Assim se estaria evitando a pressão exercida nas zonas de maior
tensão para onde essas pessoas costumam confluir, as quais correspondem às áreas centrais da
cidade.
A diretriz geral para a política da prefeitura com relação ao comércio informal
estabeleceu a indicação de que cabe ao poder público gerir os conflitos entre o exercício da
atividade informal nos logradouros públicos e os interesses globais da população,
compatibilizando-os. De maneira especifica, estabelece diretrizes nos seguintes eixos
destacados a seguir.
Físico/urbanístico: este eixo propunha a integração das ações voltadas para a
informalidade com o planejamento urbano, através da indicação de áreas para desenvolvimento
da atividade informal, de modo a ordená-la para liberação dos espaços públicos para o cidadão.
Dessa maneira, a proposta executada pela prefeitura deveria compatibilizar a atividade do
comércio informal com a circulação de pedestres e tráfego de veículos. A municipalidade
deveria ainda: definir uma escala de prioridade entre as 16 áreas identificadas; identificar áreas
de baixa renda para o desenvolvimento do comércio informal; evitar o exercício das atividades
80
informais quando esta comprometer a paisagem e o patrimônio histórico; padronizar os
equipamentos utilizados, que deveriam apresentar características como adaptação à
comercialização de diversos tipos de mercadorias, ser removível e ter espaço para guarda de
material; definir a densidade e o zoneamento no sentido de disciplinar as atividades e facilitar
a fiscalização; e orientar a política de transporte coletivo a favorecer a circulação entre os
bairros populares para estimular o deslocamento dos trabalhadores em outros centros.
Social: as ações desse eixo se dariam no sentido de: definir programas de
assistência social que possibilitasse o pleno acesso a dignas condições de saúde, educação e
moradia; implementar estratégias com diferentes grupos de trabalhadores informais através de
suas representações de classe com o intuito de qualificar este trabalho e melhorar as condições
do serviço prestado; e definir programas educativos e assistenciais para população de baixa
renda, identificada como origem do comércio informal, através de dois programas: o primeiro
de educação básica voltada para cidadania e trabalho, e o segundo de orientação e intermediação
com realização de cursos sobre noções básicas de higiene, voltados sobretudo para aqueles que
trabalham com o segmento de alimentos.
Fiscal: indicava a necessidade de se instituir um sistema tributário que considere a
diversidade interna do setor quanto aos níveis de rendimento proporcionado, a fim de cobrar
taxas justas para os diferentes segmentos.
Jurídico Institucional: visava atualizar e instituir normas para a regulamentação
do exercício das atividades informais, voltadas para consolidar os objetivos do poder público
através da elaboração de uma legislação única voltada para a questão.
Administrativo: as ações desse eixo estariam voltadas para aperfeiçoamento do
sistema de fiscalização; modernização dos mecanismos de acompanhamento e fiscalização, a
ser realizada através da mútua colaboração entre os órgãos da prefeitura envolvidos; e
cadastramento e licenciamento de todos aqueles que trabalham no mercado informal.
Nessa conjuntura foi elaborada uma proposta piloto (Figuras 1 a 3), cuja
implementação serviria de exemplo para as demais áreas identificadas. Trata-se do circuito
entre o Campo Grande e a Praça da Sé, escolhido em função de determinações técnicas,
administrativas e políticas. Esta proposta implicaria em uma intervenção física ao longo da Av.
Sete de Setembro, suas transversais e ligações com a Av. Joana Angélica, incluindo as praças
existentes no percurso.
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Figura 1: Trecho da Avenida Sete de Setembro.
Fonte: SALVADOR, 1992a.
Figura 2: Trecho da Avenida Sete de Setembro.
Fonte: SALVADOR, 1992a.
82
Figura 3: Largo de São Bento
Fonte: SALVADOR, 1992a.
Através da análise dos croquis e das plantas16 do projeto apresentados
anteriormente podemos notar que a atividade do comércio informal permanece integrada ao
logradouro público, separada da calçada e da faixa de rolamento utilizada pelos automóveis
através do uso de recuo e barreiras físicas. No caso do Mosteiro de São Bento, há também a
disposição de pontos de trabalho na praça existente na frente da igreja, porém em local que não
interfere na entrada e saída de pessoas que se dirigem aos cultos. No caso da Avenida Sete,
notamos que o mobiliário utilizado pelos trabalhadores fica disposto de modo que a mercadoria
fica voltada para a calçada ao longo da via e o espaço para arborização e demais mobiliários
urbanos aparecem preservados. Na Tabela 3 apresentamos a análise do projeto apresentado, de
acordo com as categorias que consideramos importantes para sua avaliação.
16 Não foi possível apresentar todas as plantas do projeto, pois além de numerosas, elas foram desenhadas à mão em papel manteiga em formato com mais de 1m. Optamos, portanto, por fotografar as plantas por partes, já que não foi possível fotografá-las em sua totalidade. Este método tornou os arquivos ainda mais numerosos, levando-nos a selecionar apenas alguns trechos
para apresentar no Anexo A.
83
Tabela 3: Síntese da análise do projeto “O Informal em Salvador: políticas e propostas”, 1992.
CATEGORIAS DE ANÁLISE PROPOSTAS APRESENTADAS PELO PROJETO
Diagnóstico da situação Diagnóstico bastante completo, contando inclusive com
importantes consultorias em sua elaboração.
Conforto ambiental O projeto não apresenta proposta no sentido de abrigar os
trabalhadores do sol ou da chuva, deixando-os expostos às
intempéries.
Infraestrutura de suporte Em todos os pontos do projeto há disposição de lixeiras
públicas. Quanto aos sanitários, verificamos apenas 02
equipamentos localizados na Praça de São Pedro. Com
relação ao armazenamento das mercadorias, o relatório do
projeto informa que as mesmas serão guardadas na parte
inferior das bancas dos trabalhadores, o que não oferece
segurança para os mesmos. Não constam informações sobre
iluminação pública nos locais da intervenção.
Densidade de ocupação
O projeto não apresenta parâmetros ou cálculos para
densidade de ocupação na área de intervenção.
Relação proposta e o entorno A proposta visual visa uma integração da atividade com os
demais usos da rua, mantendo-a na via principal, segregada
por baias. Podemos notar ainda que há disposição de grande
número de bancos em todo o perímetro de intervenção, o que
significa uma alternativa importante para que os transeuntes
possam ter pontos de apoio e descanso enquanto fazem
compras ou passeiam. Fonte: Elaboração da autora com base na análise do projeto, 2015.
O projeto apresentado é de grande riqueza e profundidade, entretanto não foram
encontradas indicações sobre a implementação do mesmo pela prefeitura na gestão em que foi
elaborado. Apesar disso, os estudos realizados serviram de referência para elaboração de
projetos em outras gestões nos anos de 1994, no que se refere ao ordenamento do Relógio de
São Pedro e Joana Angélica, constantes no “Caderno de projetos” da gestão da prefeita Lídice
da Matta, eleita entre os anos de 1993 e 1996; e em 1997, no projeto de relocação dos
ambulantes realizada na gestão do prefeito Antônio Imbassahy, eleito duas vezes entre os anos
de 1997 e 2004.
Proposta de ordenamento do comércio informal: Largo 2 de Julho, Largo do
Mocambinho e Praça Cairú, 1992.
Destacamos ainda que no ano de 1992 há também a “Proposta de ordenamento do
comércio informal: Largo 2 de Julho, Largo do Mocambinho e Praça Cairú” (Figura 4), onde a
Praça Cairú localiza-se fora do recorte estudado.
84
Figura 4: Largo do Mocambinho, vista da Rua Carlos Gomes. Fonte: SALVADOR, 1992b.
Esta proposta visava ordenar o comércio informal nas áreas da Praça do
Mocambinho, Rua do Cabeça e Largo Dois de Julho, através da implantação de três módulos
comerciais construídos para absorver os comerciantes de flores do Largo Dois de Julho e Rua
do Cabeça. Estes módulos seriam implantados no Largo do Mocambinho, possuem forma
octagonal e espaço para quatro unidades comerciais, com ponto de água, pia, bancada interna,
prateleira externa para exposição de mercadoria e balcão de atendimento. Ao nos dirigirmos
hoje ao Largo do Mocambinho podemos verificar que o projeto foi implantado, porém passará
por novas alterações no ano de 2015, resultantes do projeto elaborado para requalificação do
mercado do Dois de Julho, que será comentado adiante.
2.3.2 Propostas em 1997
Comércio Informal: projeto de relocação dos ambulantes da Av. Sete de Setembro
e Baixa dos Sapateiros, 1997
Na gestão do prefeito Antônio Imbassahy foi elaborado um novo projeto com vistas
ao ordenamento do comércio informal na cidade de Salvador, publicado no ano de 1997. O
projeto faz referência aos estudos realizados em 1992, reconhecendo o cenário de agravamento
da crise na economia nos anos 1990 apontado por aquele estudo, que colaborou efetivamente
com a crise no emprego e levou muitos trabalhadores a recorrerem ao mercado informal como
uma alternativa de sobrevivência.
De acordo com as análises realizadas em 1997, a dinâmica do centro antigo foi
85
mantida e tensionada principalmente em razão do movimento de passageiros da Estação da
Lapa e da presença dos diversos serviços disponíveis neste lugar, o que o constituiu como a
maior concentração de trabalhadores de rua da cidade. Considerando que o projeto proposto em
1992 não foi efetuado, o projeto de 1997 toma os objetivos do trabalho anteriormente citado
como referência, porém com a pretensão de efetuar uma intervenção de caráter emergencial.
Acreditamos que tal caráter emergencial, embora não esteja explicitado nos relatórios
encontrados, se relaciona com a crise do emprego dos anos 1990 que influenciou diretamente
no aumento da informalidade. Entre os objetivos desta gestão estão: gerir os conflitos existentes
entre a atividade do comércio informal e os interesses globais da população; assegurar o uso
coletivo dos espaços públicos; compatibilizar a atividade com o sistema de circulação de
pedestres; evitar o comprometimento da paisagem e do patrimônio em decorrência da atividade
do comércio informal; e padronizar os equipamentos utilizados pelos trabalhadores.
O estudo verificou a existência de 1.620 pontos de comercialização existentes na
Av. Joana Angélica e Av. Sete de Setembro. De acordo com as informações contidas no
relatório, houve um crescimento de 64,47% da atividade nesta área desde 1992, onde se destaca
a comercialização de aparelhos eletro-eletrônicos. A comercialização de tais artigos
importados, por sua vez, é considerada como incompatível com as características do centro
antigo, e contribuiriam para descaracterizar o desenho desta região da cidade, pois
demandariam uma ampliação dos passeios em função do espaço para exposição que demandam,
o que, consequentemente, viria a prejudicar o desempenho e a fluidez do trânsito. Tais motivos
justificavam o remanejamento da atividade para outros locais.
A proposta da gestão do prefeito Imbassahy era de ordenar a atividade confinando-
a em trechos específicos e transversais existentes do lado esquerdo da Avenida Sete de
Setembro, no sentido de quem está na Praça Castro Alves e vai para o Campo Grande, com
exceção ao trecho correspondente à Ladeira de São Bento, onde se permitiria a ocupação em
ambos os lados. Nestes trechos haveria a instalação de baias e corrimãos de proteção. Para a
execução da proposta, previa-se a transferência dos trabalhadores da Praça da Piedade e Praça
Rio Branco (Relógio de São Pedro) para as transversais. Do Largo de São Bento deveriam ser
retirados todos os trabalhadores do comércio informal, restando apenas um ponto para
comercialização de acarajé.
Enquanto os estudos de 1992 reconheciam que os produtos comercializados na
região eram em sua maioria de gêneros alimentícios e que isso demandaria uma ação de
orientação do poder público no que se refere à higiene, o estudo de 1997 informa não ter
realizado um zoneamento por tipo de mercadoria, mas que “as precárias condições de higiene
86
na comercialização de frutas e verduras, determinaram a sua exclusão das atividades
permitidas” (SALVADOR, 1997a:9).
Duas propostas foram criadas, sendo a primeira com duas alternativas sintetizadas
a seguir, na Tabela 4 e a segunda também com duas alternativas sintetizadas na Tabela 5. As
plantas do projeto que foram disponibilizadas indicam a disposição dos trabalhadores de rua
nas áreas propostas, conforme pode ser observado no Anexo B.
Tabela 4: Comparativo entre as alternativas da Proposta I para relocação do comércio
informal – Av. Sete de Setembro, 1997
Trecho Alternativa I Alternativa II
Rosário/Politeama 113 pontos 113 pontos
Paraíso/Rosário 271 pontos 271 pontos
Relógio de São Pedro 222 pontos 222 pontos
São Bento 105 pontos 105 pontos
Estacionamento São Raimundo 452 pontos 916 pontos
TOTAL 1.163 pontos 1.627 pontos Fonte: SALVADOR, 1997c:9.
Tabela 5: Comparativo entre as alternativas da Proposta II para relocação do comércio
informal – Av. Sete de Setembro, 1997
Trecho Alternativa I Alternativa II
Largo da Igreja do Rosário 77 77
Praça Carneiro Ribeiro 213 213
Rua do Cabeça 70 70
Estacionamento São Raimundo 452 916
TOTAL 812 1.276 Fonte: SALVADOR, 1997c:11.
Podemos observar, através dos dados apresentados, que a única diferença entre as
alternativas da primeira proposta é com relação a uma maior ou menor ocupação do terreno do
Estacionamento São Raimundo, localizado nas proximidades do Shopping Orixás Center.
Contudo, a utilização dessa área não se constituía como prioritária, pois ela é considerada como
muito valorizada por suas características locacionais e topográficas. Caso a hipótese de
utilização do estacionamento fosse descartada, restariam 711 pontos de comercialização,
potencial que, de acordo com o relatório, poderia ser dobrado se em vez do uso diário pelos
trabalhadores em cada ponto houvesse utilização em dias alternados, o que resultaria numa
ocupação de 1.422 trabalhadores. Como foram cadastrados 1.620 trabalhadores em 1997,
considerando a hipótese de alternar os dias de utilização dos pontos entre os mesmos, haveria
ainda um déficit de 198 pontos de trabalho. Estes números, entretanto, não chegam a considerar
87
a exclusão dos que comercializam frutas e verduras, mercadorias tornadas proibidas nesta área.
A segunda proposta elaborada por essa gestão consistia na retirada por completo do
comércio informal das avenidas e imediações, relocando os trabalhadores para as seguintes
áreas: a) Estacionamento São Raimundo, com capacidade para 916 pontos, onde o comércio
seria destinado aos importados; b) Largo da Igreja do Rosário, com capacidade para 77 pontos,
onde o comércio seria destinado a comercialização de produtos artesanais; c) Praça Carneiro
Ribeiro, com capacidade para 213 pontos, com indicação para comercialização de produtos de
utilidade doméstica; e d) Rua do Cabeça, com capacidade para 70 pontos, onde a
comercialização de palhas e vimes seria mantida. Esta proposta totaliza 1.276 pontos de
trabalho.
Comparando as propostas, temos que a alternativa 2 da primeira proposta é a que
mais disponibiliza pontos de trabalho, considerando a utilização do Estacionamento São
Raimundo. Essa proposta, seria melhor do ponto de vista do trabalhador de rua, pois poderia
contemplar um maior número deles, contudo não significa ainda que seja a melhor alternativa
para a cidade, visto que as opções planejadas por essa gestão foram bastante limitadas,
reduzindo-se a apenas 4 ou 5 trechos. Vimos, por exemplo, que a proposta anterior elaborada
em 1992 contemplava uma área de ocupação bem mais expressiva. Na Figura 5 apresentamos
a perspectiva do projeto para o trecho da Rua do Cabeça, porém informamos que tivemos
dificuldade em relacionar a imagem ao local indicado no desenho. Acreditamos que talvez a
perspectiva se refira à área do Estacionamento São Raimundo e não à Rua do Cabeça conforme
é informado no projeto.
88
Figura 5: Avenida Sete de Setembro. Área 3 – perspectiva da área (Rua do Cabeça/Estacionamento São
Raimundo).
Fonte: Salvador, 1997b.
Podemos notar que, apesar de ser inspirado na proposta elaborada em 1992, o
projeto de 1997, segrega a atividade do comércio informal, pois prevê a sua retirada quase
completa da Avenida Sete e da Avenida Joana Angélica. Por tratar-se de uma medida de caráter
emergencial, a atualização da pesquisa feita pela proposta da gestão anterior também não é
totalmente realizada, limitando-se apenas à elaboração de um novo quantitativo por área e das
estimativas de crescimento ou decréscimo da atividade entre os períodos analisados. Além
disso, fica evidente o caráter repressivo da medida, uma vez que não são propostas soluções
para casos como o da comercialização de frutas e verduras, por exemplo, colocando a atuação
da prefeitura no sentido da proibição da venda desses produtos. De forma semelhante ao que
fizemos com o projeto de 1992, aqui também sistematizamos a análise das propostas
apresentadas pelo projeto de acordo com as categorias selecionadas para sua avaliação. Na
Tabela 6 estão relacionadas essas análises para cada uma das categorias escolhidas.
89
Tabela 6: Síntese da análise do projeto “Comércio Informal: projeto de relocação dos
ambulantes da Av. Sete de Setembro e Baixa dos Sapateiros”, 1997
CATEGORIAS DE
ANÁLISE
PROPOSTAS APRESENTADAS PELO PROJETO
Diagnóstico da situação A proposta apresenta um diagnóstico breve sobre a situação do
trabalhador de rua, no que faz referência aos estudos
anteriormente elaborados em 1992. Atualiza algumas
informações sobre o aumento da informalidade entre 1992 e
1997, porém não levanta informações com a mesma minucia
do projeto anterior.
Conforto ambiental A proposta apresenta um tipo de cobertura capaz de dar algum
nível de proteção aos trabalhadores no que se refere às
intempéries do dia. Entretanto, essa cobertura parece ser
confeccionada em lona colorida, não havendo estrutura para
captação e drenagem da água da chuva, por exemplo. Como
não temos informações sobre realmente qual é o tipo de
material utilizado, não podemos avaliar o quanto ele é capaz de
proteger do sol sem gerar um desconforto térmico.
Infraestrutura de suporte Nada é apresentado no projeto no que se refere às estruturas de
suporte à atividade. Não há informações sobre o
armazenamento das mercadorias, estrutura de sanitários
públicos ou destinados aos trabalhadores de rua, tampouco
informações sobre a coleta de lixo nos pontos de trabalho. Não
foram encontradas informações sobre o tipo de pavimentação a
ser utilizado ou as obras que seriam realizadas para implantação
dos novos locais de trabalho, nem informações sobre a
iluminação pública.
Densidade de ocupação
O projeto não apresenta parâmetros ou cálculos para densidade
de ocupação na área de intervenção.
Relação proposta e o
entorno
Podemos observar pelo exposto no projeto que os locais
propostos segregam a atividade do trabalhador de rua das áreas
mais movimentadas e criam uma estética que pouco tem a ver
com o lugar. Fonte: Elaboração da autora com base na análise do projeto, 2015.
Podemos observar como um todo, que o projeto elaborado em 1997 é menos
sensível a questão do trabalhador de rua. No entanto, os impactos das medidas, bem como a
opinião daqueles que vivenciaram esse processo serão abordados no Capítulo 3, quando
estivermos tratando dos conflitos e tensões que permeiam a atividade do trabalhador de rua. Por
ora, seguiremos aqui com a análise dos projetos elaborados em 2014.
90
2.3.3 Propostas em 2014
Plano de requalificação e reordenamento de ambulantes de Salvador, 2014
Somente em 2014 a questão do trabalhador de rua voltou a ser tratada no âmbito do
planejamento urbano da cidade de Salvador, após um hiato de 10 anos sem que nenhuma
proposta fosse apresentada pelo poder público, período que corresponde à gestão do prefeito
João Henrique Carneiro, eleito duas vezes entre os anos de 2005 à 2012. Esta lacuna no
tratamento da questão justificou uma ação, também realizada em caráter emergencial, pela
gestão do prefeito Antônio Carlos Magalhães Neto, iniciada no ano de 2013, poucos meses após
sua posse. Ressaltamos que o caráter emergencial desta vez não se relaciona com uma crise no
emprego, já que no referido período houve decrescimento da taxa de desemprego no país. A
emergência parece estar relacionada então, com a ausência da questão nas políticas públicas
propostas e realizadas pelo poder público na gestão anterior. Cabe destacar também que a nova
gestão da prefeitura tem tido ações que privilegiam os interesses corporativos e gentrificadores
na região do centro antigo da cidade, sobre os quais não poderemos nos aprofundar no
momento.17
A ação proposta no âmbito da gestão 2013-2016 vem sendo executada através da
Secretaria de Ordem Pública (SEMOP), que carrega em si a missão disciplinadora do espaço
público. Sua intervenção aparece no âmbito do plano de requalificação e reordenamento de
ambulantes de Salvador, que se desdobra em três projetos principais: Requalificação da Av.
Sete de Setembro – ordenamento do comércio informal; Requalificação do Mercado 2 de Julho;
e Projeto Avenida Sete – território empreendedor.
Não foi possível ter acesso ao plano de maneira integral, pois o mesmo não foi
publicado, nem tampouco disponibilizado pela atual gestão. Contudo, teve-se acesso aos
documentos das ações mencionadas anteriormente, onde constam basicamente pranchas de
plantas baixas e vistas do projeto executado.18 Diferentemente do que se relata sobre o projeto
elaborado em 1997 na gestão de Imbassahy, o processo de ordenamento de 2013-2015 contou
com a realização de reuniões entre as associações e sindicatos de trabalhadores do comércio
17 Cabe mencionar uma declaração proferida pela secretaria de Ordem Pública, que põe em evidencia uma tentativa de uniformização do espaço apoiada no discurso da necessidade de ordenamento do centro da cidade. Ela declarou de forma polêmica no início da nova gestão que “enfrentamos dificuldades na estética da cidade. Precisamos realizar um trabalho de maquiagem para receber [os visitantes]... Mas não só para isso, mas também tornar a cidade boa para quem mora aqui. Esse que é o objetivo principal” (Mendes, 2012). 18 Para auxiliar no entendimento do processo e na ausência de documentos oficiais fornecidos pela prefeitura, foram utilizadas
também informações contidas nas publicações do Diário Oficial do Município e em jornais de grande circulação no município.
91
informal e o poder público, com parceria do SEBRAE. Após a realização dessas reuniões com
as lideranças, a nova secretaria chega a um projeto que prevê a transferência de todos os
trabalhadores da Avenida Sete de Setembro para as transversais constantes no Mapa 03,
contemplando apenas aqueles que possuem licença.
Mapa 3: Ruas contempladas com o projeto de ordenamento.
Fonte: Elaboração da autora, 2015.
Iniciado no mês de junho do ano de 2013, no final do ano de 2014 a obra já contava
com a reforma estrutural de praticamente todas as transversais da Avenida Sete de Setembro,
restando apenas para conclusão a reforma da Praça do Relógio de São Pedro, Rua Onze de
Junho, Rua Vinte e Um de Abril e Rua Nova de São Bento. Na Figura 6 pode-se observar o que
fora divulgado por meio de jornais de circulação local a respeito do projeto de requalificação.
92
Trata-se de perspectivas da nova estrutura de trabalho e mobiliário proposto. A Figura 7 traz o
registro de uma das ruas que já passaram pela reforma.
Figura 6: Projeto para o Largo do Rosário.
Fonte: Correio da Bahia, 2013.
Figura 7 Largo do Rosário reformado.
Fonte: Foto da autora, 2014.
Nas 13 áreas o projeto executado conta com obras de saneamento, iluminação e
pavimentação, onde a pedra portuguesa foi substituída por piso intertravado e se inseriu rota
acessível para o uso de pessoa com deficiência visual. Houve também a implantação de
cobertura em policarbonato sobre estrutura metálica (SALVADOR, 2014). Alguns aspectos
relativos à implantação do projeto, entretanto, são questionáveis. É o caso, por exemplo, da não
existência de calhas para captar e canalizar a água da chuva e do conforto térmico. Contudo,
por se tratar do projeto executado no período em que os estudos empíricos desta dissertação
também se realizavam, tais observações não podem ser conclusivas.
No ano de 2014 há ainda o projeto para requalificação do Mercado 2 de Julho,
sintetizado na Figura 8, que prevê a transferência dos trabalhadores de rua que atuam na Rua
do Cabeça para um mercado que será implantado na Praça General Inocêncio Galvão.
93
Figura 8: Proposta de requalificação do mercado das flores (Largo 2 de Julho) / Praça General Inocêncio Galvão
Fonte: Machado, 2014. (Jornal A Tarde)
94
Em janeiro de 2014 foi realizada uma ação que retirou deliberadamente todos os
trabalhadores da Rua do Cabeça, não considerando aqueles que possuíam licença. Após esta
ação, associações que representam os interesses dos trabalhadores de rua e associações do bairro
Dois de Julho requisitaram que o projeto fosse apresentado e discutido, o que foi atendido pela
prefeitura. Foram realizadas reuniões para apresentação do projeto, onde se negociou a
substituição dos quatro boxes para dez, adequados para os peixeiros, com sanitários, pontos de
água e pontos destinados a coleta de lixo. Além da área construída com alvenaria, há também
uma área destinada para 44 trabalhadores, que são aqueles que hoje estão na Rua do Cabeça e
Largo das Flores e, após a reforma, comercializarão em mobiliário removível, fornecido pela
prefeitura.19 Na Figura 9 podemos ver parte do Largo das Flores com a presença de feirantes
em fotografia tirada no ano de 2012 e na Figura 10 temos o registro de uma das reuniões
realizada entre moradores, trabalhadores e a prefeitura de Salvador para discussão do projeto
para requalificação do mercado do Dois de Julho, realizada na sede da SEMOP. De acordo com
informações divulgadas no Jornal A Tarde, a obra está orçada em R$2,6 milhões e levará 8
meses para ficar pronta (MACHADO, 2014).
Figura 9: Rua do Cabeça e “Largo das Flores”, bairro
Dois de Julho.
Fonte: Foto da autora, 2012.
Figura 10: Reunião para discussão do Projeto de
Requalificação do Mercado Dois de Julho.
Fonte: Foto da autora, 2012.
19 Atualmente os trabalhadores guardam as mercadorias ou por conta própria, em depósitos existentes no próprio bairro, ou as deixam no próprio ponto, cobertas por lona e cordões bem amarrados. Após a reforma, por se tratar de mobiliário removível, será necessário que todos guardem suas mercadorias em depósitos, o que poderá implicar em maiores despesas para boa parte
dos trabalhadores dessa área.
95
Programa Avenida Sete de Setembro – Território Empreendedor, 2014
Por fim, no âmbito das ações voltadas para a atividade do trabalhador de rua criadas
na gestão de 2013-2016, há ainda o Programa Avenida Sete de Setembro – Território
Empreendedor, que consiste numa proposta de articulação entre os agentes econômicos,
políticos e sociais, localizados na Avenida Sete. Este programa, iniciado no ano de 2014, se
constitui como elemento de estruturação e ajuste das atividades econômicas, voltado para
ampliação das possibilidades de inserção e geração de emprego e renda na Avenida Sete,
concebida enquanto um território particular da cidade. Para sua execução estão sendo realizadas
reuniões com ambulantes, comerciantes, técnicos da prefeitura, acadêmicos e profissionais do
Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) e da Câmara de Dirigentes Lojistas
de Salvador (CDL). O plano de ação do Programa Avenida Sete de Setembro – Território
Empreendedor possui seus eixos de atuação nas seguintes áreas: empreendedorismo,
empreendedorismo social e acesso a crédito; desenvolvimento urbano; economia criativa,
cultura e turismo; comunicação e marketing; e prevenção à violência e assistência social
(SALVADOR, 2014). Como o projeto ainda está em processo de concepção, não será possível
realizar análise crítica sobre ele, porém considera-se importante destacá-lo por conta das
transformações que pretende no espaço.
Em reunião realizada em um auditório da CDL, no dia 21.11.2014 para
apresentação do projeto de requalificação urbana Av. Sete e Rua Chile, que fazem parte do
programa acima mencionado, foi levantado que um dos maiores problemas da região é de cunho
urbanístico, resultante do conflito existente entre o pedestre, o veículo e o comércio informal.
De acordo com as informações apresentadas pela prefeitura, este é um conflito que não atrai
moradores de outras áreas da cidade para a localidade. Sendo assim foi proposto o alargamento
do passeio do lado esquerdo da avenida, no sentido do Campo Grande à Praça da Sé, que poderá
ser efetuado com a redução de uma das faixas de rolamento da via. Esta medida deixa espaço
apenas para uma faixa de estacionamento, ao invés de duas em cada lado da via como existe
hoje. A Figura 11 traz um exemplo de uma das áreas do projeto.
96
Figura 11: Trecho da Avenida Sete com parklet. Fotografia retirada de slide apresentado durante reunião
convocada pela SEMOP em 21-11-2014.
Fonte: Foto da autora, 2014.
Além das proposições mencionadas acima, está ainda previsto o enterramento dos
cabos de energia dos postes e implantação de parklets em alguns trechos da via, com bancos
para descanso dos pedestres. As medidas apresentadas, entretanto, não propõem soluções para
melhoria da coleta de lixo ao longo da via, considerado um dos grandes problemas da área,
embora preveja um aumento na implantação das lixeiras públicas ao longo do trajeto. Cabe
ressaltar que as praças existentes ao longo do referido trecho da Avenida Sete também passarão
por obras de requalificação, porém os projetos foram apenas apresentados em vídeos. As praças
às quais nos referimos são o Largo de São Bento e Praça Barão Rio Branco (Relógio de São
Pedro), que se encontram em reforma, conforme podemos notar nas Figuras 12 a 15.
Figura 12: Largo de São Bento em reforma.
Fonte: Fotos da autora, 2012.
Figura 13: Largo de São Bento antes da reforma.
Fonte: Fotos da autora, 2014.
97
Figura 14: Praça Barão Rio Branco (Relógio de São Pedro)
antes da reforma. Fonte: Fotos da autora, 2012
Figura 15: Vista de cima da Praça Barão Rio
Branco (Relógio de São Pedro), em reforma.
Fonte: Fotos da autora, 2014.
Semelhante ao que foi realizado para os projetos anteriormente apresentados, assim
também realizamos uma análise dos projetos elaborados em 2014 com base nas nossas
categorias de análise, conforme consta na Tabela 7.
Tabela 7: Síntese da análise dos projetos “Plano de requalificação e reordenamento de
ambulantes de Salvador”, “Requalificação do Mercado 2 de Julho” e “Programa Avenida Sete
de Setembro – Território Empreendedor”, 2014.
CATEGORIAS
DE ANÁLISE
PROPOSTAS APRESENTADAS PELO PROJETO
Diagnóstico da
situação
Não foram encontradas informações sobre o diagnóstico elaborado pelo
poder público em 2014, no sentido de atualizar e informar sobre a
problemática do trabalhador de rua para os projetos estudados, inclusive
no sentido de justificar as ações propostas. As informações que
conseguimos coletar foram dispersas, disponibilizadas sobretudo
através de notícias de jornal e do Diário Oficial do Município.
Conforto
ambiental
Com relação à proposta elaborada no âmbito do “Plano de requalificação
e reordenamento de ambulantes de Salvador”, podemos notar que apesar
da existência da cobertura, a mesma não foi confeccionada com material
adequado, o que causa grande desconforto térmico para os
trabalhadores, que sofrem bastante com o calor sob a estrutura. Ainda
sobre a cobertura implantada, verificamos que proteção com relação a
chuva deixa a desejar, já que podemos notar em diversos pontos a
existência de improvisos com lona para evitar que a água da chuva
molhe tanto os trabalhadores, quanto sua mercadoria. Além disso, não
foram implantadas calhas.
98
Infraestrutura
de suporte
A pavimentação de todas as ruas que estão passando pela intervenção
foi substituída por piso intertravado. A prefeitura informa ainda que
realizou obras de drenagem nas localidades.
Com relação à disposição do lixo, além das lixeiras públicas que foram
distribuídas nas ruas de intervenção, apenas no bairro 2 de Julho será
implantado, segundo o projeto, contêineres para armazenamento dos
resíduos.
Também com relação aos sanitários, apenas no bairro 2 de Julho há
proposta de implantação desse equipamento. Nos demais pontos da
Avenida Sete, nada aparece nas plantas disponibilizada. Houve
informações obtidas através de entrevistas com as lideranças dos
trabalhadores de rua (que serão melhor apresentadas no próximo
capítulo), de que a implantação dos sanitários está em discussão com a
prefeitura.
Sobre o armazenamento de mercadorias, nada aparece nos projetos.
Fomos informados também através de entrevista com o responsável pelo
setor de Licenciamento e Fiscalização da SEMOP, cuja entrevista
também será apresentada no próximo capítulo, que a prefeitura não pode
bancar com essa estrutura, pois ela demanda também um custo com a
segurança do local e do material.
O projeto “Avenida Sete de Setembro – Território Empreendedor” não
pode ser avaliado, pois não conseguimos dispor de informações mais
precisas sobre o mesmo.
Densidade de
ocupação
Os projetos não apresentam parâmetros ou cálculos para densidade de
ocupação na área de intervenção.
Relação
proposta e o
entorno
Com relação às propostas apresentadas podemos notar, de maneira geral,
uma desarticulação entre a cobertura proposta e a morfologia urbana do
entorno. Este aspecto fica mais evidente principalmente nas ruas da
Avenida Sete. No caso do 2 de Julho, a relação entre a proposta visual e
o entorno também nos parecem em desarmonia e deslocam o vendedores
de frutas para uma área relativamente distante dos locais onde há mais
gente circulando, o que pode vir a prejudicá-los em suas vendas e fazê-
los retornar para o local de origem. Fonte: Elaboração da autora com base na análise do projeto, 2015.
A ausência de informações sobre a densidade de ocupação em todos os projetos
estudados revela um nível de inconsistência no conhecimento do poder público com relação a
real demanda por espaço que a atividade do trabalhador de rua implica. Consideramos que este
é um importante dado, capaz de subsidiar um planejamento mais eficaz, pois através do
conhecimento sobre a densidade de ocupação é possível saber realmente em quais áreas a
atividade influencia no direito de ir vir dos transeuntes e em quais áreas ela não é tão relevante.
Por este motivo, sentimos a necessidade de avaliar como a situação se encontra hoje na Avenida
Sete, ruas de seu entorno e bairro Dois de Julho, que trataremos a seguir.
99
2.4 A densidade de ocupação
O espaço demandado pelo trabalhador de rua não é apenas aquele ocupado
materialmente pela estrutura física do seu mobiliário. Além do espaço ocupado pelo mobiliário,
que por vezes extrapola os limites pré-estabelecidos pela municipalidade, ocupa-se também um
espaço para o desenvolvimento funcional da atividade.
A Figura 16 ilustra esquematicamente como se dá a demanda da atividade pelo
espaço, e através dela podemos identificar a área ocupada pelo mobiliário e o dimensionamento
da faixa utilizada pelos compradores das mercadorias, aqui denominada de “faixa de
utilização”. Para a definição do dimensionamento dessa faixa, se levou em consideração a
dimensão referencial para deslocamento de pessoas em pé da NBR 9050/2004, que é de 0,60m
para pessoas sem órteses. Se considerarmos que a rua esquematizada possui as dimensões de
8X5m e área de 40m², a área demandada pela atividade corresponderia a cerca de 30m² ou 70%
do total da rua. Esta informação é importante, pois ilustra o que pode ocorrer na maioria dos
casos nas ruas estudadas, em que o espaço físico requerido pela atividade dos trabalhadores de
rua é maior do que as dimensões do mobiliário fixo podem indicar, restando no final para o
transeunte muito pouco do total que deveria estar disponível para sua circulação.
Figura 16: Esquema de espaço demandado pela atividade do trabalhador de rua.
Fonte: Bouças, 2012.
100
Compreender essa questão é fundamental tanto para que possamos dar conta da
interpretação sobre a densidade de ocupação da atividade do trabalhador de rua nas localidades
que estudamos nesta dissertação, quanto para que possamos analisar o tratamento dessa questão
nos projetos encontrados. A densidade de ocupação que buscamos avaliar aqui difere da
comumente estudada pelo planejamento urbano, que se dá mais na escala da unidade de
vizinhança, do bairro ou da cidade. Para esses casos, a densidade costuma ser calculada através
da relação entre a população e a área ocupada, geralmente dada em km² ou hectares. Em nosso
caso, buscamos a densidade de ocupação das ruas, que está em uma escala maior e para qual
não encontramos parâmetros na literatura pesquisada. Por este motivo, fizemos um esforço para
tentar compreender a relação proporcional entre a área ocupada pela atividade e a área destinada
aos pedestres nas ruas e para tal, além de precisarmos ter em mente o que o esquema
anteriormente apresentado na Figura 16 indica, é preciso estarmos atentos também ao fato de
que diferentes arranjos entre o mobiliário e a faixa de utilização são possíveis. As Figuras 17,
18 e 19 indicam essas possibilidades e as respectivas áreas encontradas para cada caso.
Figura 17: Situação 1 - Demanda de espaço pela
atividade, considerando mobiliário independente de
outros. Fonte: Elaboração da autora, 2015.
Figura 18: Situação 2 - Demanda de espaço pela
atividade, considerando mobiliário de quina ou
encostado com outros.
Fonte: Elaboração da autora, 2015.
101
Figura 19: Situação 3 - Demanda de espaço pela atividade, considerando mobiliário encostado com outros ou
com a parede.
Fonte: Elaboração da autora, 2015.
As áreas encontradas para cada uma das situações hipotéticas apresentadas, nos
ajudará a calcular a área demandada pela atividade do trabalhador de rua. Para isso,
multiplicamos a média dos valores das situações hipotéticas (2,68m²) pelo valor encontrado
para a média de trabalhadores contados na área de estudo (conforme consta na contagem do
Apêndice C). Salientamos, porém, que em nossa área de estudo temos dois tipos de situação:
A) ruas completamente pedestrianizadas20, ou seja, por onde não transitam carros; e B) ruas que
dividem o espaço entre pedestres e veículos. No caso “A”, as ruas estudadas podem ser mais
densamente ocupadas pelo trabalhador de rua, pois há mais espaço disponível para ser
compartilhado com o pedestre. No caso “B”, o espaço disponível é apenas o espaço da calçada
e a atividade do trabalhador de rua compete muitas vezes com os demais usos da rua.
No croqui esquemático apresentado na Figura 20, representado utilizando as
normas para o dimensionamento de calçadas estabelecido pela NBR9050/2004, temos que
numa rua com duas faixas de rolamento a área destinada para o trânsito de veículos corresponde
à aproximadamente 73% da via. Já a parte da calçada corresponde aos outros 27%, e destes,
13% corresponde ao passeio.
20 De acordo com Cruz (2006), a pedestrianização compreende a exclusão do automóvel pela implementação de calçadas em toda a largura do logradouro. O objetivo nesses casos é reduzir o trânsito nos centros históricos ou em áreas de comércio
varejista intenso, de modo a tornar o ambiente mais agradável para o pedestre.
102
Figura 20: Representação esquemática de uma rua.
Fonte: Elaboração da autora, 2015.
Entender a distribuição de proporções entre os usuários desse espaço foi importante
para que pudéssemos estabelecer os parâmetros para as densidades de ocupação das ruas
estudadas. O esquema abaixo (Figura 21) sintetiza os parâmetros estabelecidos para os casos
de rua tipo “A”, pedestrianizadas. Nesse caso, o que define a densidade de ocupação da rua é a
relação entre a área ocupada pelo trabalhador de rua e o quanto ela ocupa da área total da rua
onde ele se encontra. Assim temos que, quando:
Figura 21: Esquema densidade de ocupação – Ruas tipo “A”.
Fonte: Elaboração da autora, 2015.
Para os casos das ruas tipo “B”, ou seja, daquelas ruas onde o espaço divide-se entre
a área destinada aos veículos e a área destinada aos pedestres, o que define a densidade de
ocupação da rua é a relação entre a área ocupada pelo trabalhador de rua e o quanto ela ocupa
da área total do passeio (Figura 22). Assim temos que, quando:
103
Figura 22: Esquema densidade de ocupação – Ruas tipo “A”.
Fonte: Elaboração da autora, 2015.
Assim, utilizando os dados colhidos com a contagem dos trabalhadores por rua, e
as áreas contabilizadas para cada uma dessas ruas, conseguimos definir a densidade de
ocupação verificada quando foi realizado o trabalho de campo desta dissertação. Os cálculos
realizados bem como os resultados encontram-se no Apêndice F. Com base nos resultados
obtidos foi possível fazer uma espacialização das densidades de ocupação observadas quando
da realização do levantamento de campo. Através do Mapa 04 podemos observar que a área
mais densamente ocupada pelos trabalhadores de rua está num raio de 170,5m e abrange a
localidade acessada diretamente pela Estação da Lapa, onde estão os dois shoppings centers da
região, duas importantes praças (Piedade e Barão do Rio Branco – Relógio de São Pedro), e no
acesso ao bairro Dois de Julho pelas ruas do Cabeça e da Forca.
A concentração dos trabalhadores de rua nessas imediações específicas, portanto,
se justificam pelos atratores presentes na localidade e indicam que essa pode ser a área por onde
mais circulam transeuntes na região, já que essa é uma condição importante para escolha da
localização dos trabalhadores, quando eles têm essa opção. Uma leitura sobre essa observação
pode ser mais completa ainda se lembrarmos do que nos disse Jane Jacobs (2011) sobre as
condições para a diversidade urbana. Esta região mais densa liga um dos bairros residenciais
mais dinâmicos do centro com a Avenida Sete de Setembro. Aí temos circulando tanto os
residentes do bairro, quanto os trabalhadores e comerciantes que se encontram na região.
Percebemos, portanto, o papel da combinação dos usos do lazer, trabalho e moradia, conectados
por um importante articulador que é a Estação da Lapa.
104
Mapa 4: Densidade de ocupação na área de estudo.
Fonte: Elaboração da autora, 2015.
Conseguir visualizar onde a atividade se concentra no espaço em nossa área de
estudo é um passo importante para ampliar nossa percepção sobre ela, para além da análise da
legislação e dos projetos que estudamos. Porém, para avançarmos mais, é preciso também
compreender quem são aqueles responsáveis pela execução da atividade. As ações do poder
público podem ser concebidas, com o intuito de organizar, ordenar ou coibir os usos que não
considera compatíveis com os interesses que se tem sobre o espaço público. Ainda que as
permissões para que os trabalhadores possam explorar o logradouro público sejam precárias,
ou seja, possam ser retiradas no momento em que este seja o interesse da prefeitura, isto não
significa necessariamente que a atividade possa ser totalmente eliminada ou controlada. Assim,
105
podemos nos questionar até que ponto é possível que tais representações do espaço, utilizando
aqui os termos de Lefebvre, são capazes de, de fato, exercer controle sobre os processos efetivos
de apropriação criativa dos espaços. Desta forma, nos deteremos a seguir às práticas cotidianas
presentes nos espaços de representação, ou seja, aquelas que ocorrem no âmbito do vivido,
naquilo que se refere ao trabalho exercido nas ruas de Salvador.
106
3 O TRABALHO DE RUA EM SALVADOR: OS PROTAGONISTAS, SUAS
CARACTERÍSTICAS E FORMAS DE ORGANIZAÇÃO DA ATIVIDADE
A atividade dos trabalhadores de rua está marcadamente presente no cotidiano da
sociedade soteropolitana e interfere diretamente na dinâmica da cidade, sobretudo do centro
antigo aqui em questão. No entanto, ela não se refere apenas ao espaço e as intervenções nele
incidentes ou apenas aos trabalhadores em si. Além de ser necessário compreender quem eles
são, é preciso buscar entender também o seu papel e o das associações e o sindicato, enquanto
entes representativos dos interesses dos trabalhadores. Nesse sentido, buscamos ainda nos
aproximar da visão atual da prefeitura sobre a atividade, através de uma entrevista realizada
com representantes do setor responsável pela fiscalização e licenciamento. Destacamos ainda
que reconhecemos a relação dos transeuntes e lojistas com a atividade, porém eles não serão
abordados em nossa pesquisa.
O presente capítulo é iniciado com a apresentação dos protagonistas da atividade
aqui estudada, começando pelas associações que representam os interesses dos trabalhadores
de rua e posteriormente por eles próprios, sujeitos que a tornam possível. Em seguida, essas
pessoas são apresentadas através de uma narrativa contendo as informações e impressões do
campo. Por fim, com a finalidade de possibilitar uma percepção ampliada da atividade do
trabalhador de rua em Salvador, serão apresentadas três propostas de entendimento sobre o
funcionamento da atividade, que são distintos, porém intrinsecamente ligados: a subordinação,
os conflitos, e o pertencimento e solidariedade.
3.1 As associações/sindicatos
Iniciamos este capítulo buscando entender o papel na atividade são as entidades que
representam os interesses dos trabalhadores de rua, ou seja, o sindicato e as três associações
existentes. Para tal, foram entrevistadas as quatro lideranças dessas entidades utilizando o
roteiro disponível no Apêndice E. É importante salientar que o quadro dessas lideranças é
composto por quatro homens casados, com idades entre 48 e 54 anos, e escolaridades entre o
ensino fundamental incompleto e ensino médio completo. Três deles são naturais de outras
cidades do interior da Bahia e apenas um nasceu em Salvador.
Buscamos levantar a forma como eles denominam o trabalho que realizam e
verificamos que não há um consenso no que se refere à nomenclatura, ainda que a descrição do
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conceito por eles elaborado muito se aproxime. Dois deles identificam a atividade como
ambulante, um como trabalhador informal e outro como comerciante. Ao somarmos suas
respostas, podemos chegar à descrição da atividade exercida como: “meio de sobrevivência da
pessoa que não tem emprego fixo, que vende todo tipo de mercadoria que se possa vender em
local aberto e conectado com a cidade, com o intuito de obter lucro”.
Neste momento, será apresentada cada uma das associações e o sindicato,
destacando o tempo em que cada liderança se envolve com sua respectiva entidade, quem pode
se associar, quais os critérios, quantos são os associados e quais os principais desafios e
conquistas enfrentados por eles durante o seu tempo de atuação. Ressalta-se ainda que
consideramos que o olhar para as questões da entidade perpassa pela pessoa que a representa,
seu perfil e histórico de atuação, motivo pelo qual faremos uma breve apresentação dessas
pessoas.
Começaremos a apresentar as entidades por aquela que é a mais antiga: o Sindicato
dos Feirantes e Ambulantes da Cidade de Salvador (Sindifeira)21, fundado em 1966 e que conta
com 16 membros na atual chapa, os quais assumiram seus cargos após a última eleição,
realizada em dezembro de 2013. As eleições para o sindicato ocorrem de 4 em 4 anos e o
representante com quem conversamos é o atual presidente da entidade, Marcílio Costa Santos,
que está no seu segundo mandato e autorizou o uso de sua entrevista22. Ele conta que começou
a ser feirante quando ainda morava em Valença, seguindo o exemplo do pai.
Para fazer parte do Sindifeira é preciso ser feirante ou ambulante, ter os documentos
básicos exigidos (CPF, RG, duas fotos 3X4 e comprovante de residência) e pagar uma taxa
mensal de R$15,00. Quem não é licenciado pela prefeitura também pode fazer parte do
sindicato. Para isso basta que o trabalhador prove que realiza a atividade através de fotos e
testemunhas. O sindicato faz uma averiguação no local, antes de confirmar a adesão do novo
membro. Marcílio estima que hoje existam mais de 26.000 associados ao Sindifeira, onde cerca
de 1.200 destes são ambulantes da Avenida Sete, conforme censo realizado pela entidade entre
os anos de 2012 e 2013. Nesta ocasião foi levantado também a área em que o trabalhador atua,
o produto que vende e sua situação com o órgão competente, informações que ainda não se
encontram sistematizadas. Apesar do grande número de associados, Marcílio conta que a
inadimplência é bastante expressiva. Ele acredita que isso se deve ao grande número de
21 Como podemos notar no próprio nome do sindicato em questão, sua atuação é tanto com os ambulantes, trabalhadores de
rua, quanto com os feirantes. 22 A entrevista com o presidente do Sindifeira foi realizada no dia 22 de janeiro de 2015, na Feira de São Joaquim, onde Marcílio
tem seu ponto.
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trabalhadores aposentados atuando na área, aos quais fica garantido pelo estatuto o direito à
isenção da taxa. Além de representar os interesses coletivos do segmento, o Sindifeira oferece
também orientação jurídica aos seus associados por meio de um advogado e atendimentos
médicos nas áreas de clínico geral, cardiologista, dentista e ginecologista. Esses profissionais
são pessoas pagas pelo sindicato e oferecem uma cota mensal de atendimento aos trabalhadores.
Assim como o sindicato, que possui maior legimitidade jurídica para negociar em
prol da categoria, há também outras três associações que trabalham pelo segmento. A primeira
entidade delas é a Associação Integrada de Vendedores Ambulantes e Feirantes de Salvador
(Assindivan), cujo presidente é Valmir Sales Fonseca que está no ramo há 40 anos e começou
a trabalhar com a família quando ainda era bem jovem23. Ele conta que, todos os dias ao sair da
escola, levava almoço para os tios e primos que trabalhavam na Baixa dos Sapateiros. Lá
passava a tarde e ganhava alguns trocados no final do dia, o que o levou a pegar gosto pelo
trabalho.
O presidente da Assindivan se envolve com as questões políticas de sua classe desde
1994, quando era membro de um sindicato extinto, posteriormente transformado em uma
associação também extinta. Essa associação também foi desmembrada e deu origem a
Assindivan no ano de 2013, com uma gestão compartilhada entre os seus dirigentes. Valmir
conta que a associação nasceu com o intuito de tomar a frente da arrumação da Avenida Sete
no âmbito do projeto de ordenamento da nova gestão municipal. Porém, em seu novo formato,
ainda não há nenhum associado pagante. A Assindivan está funcionando com base no trabalho
voluntário de seus dirigentes e só haverá inscrição de associados quando a situação das vendas
para o trabalhador de rua melhorar, o que se espera que aconteça após a conclusão das obras do
projeto. Valmir conta que, para se inscrever na entidade será necessário estar devidamente
regularizado junto ao poder público, ou seja, estar licenciado. A Assindivan pretende ter entre
seus membros, portanto, todos trabalhadores licenciados na região da Avenida Sete que
voluntariamente queiram se associar.
Para Valmir o trabalho da Assindivan possui três pilares: o cidadão de Salvador, o
trabalhador de rua e o poder público. Para ele o cidadão deve estar em primeiro lugar, pois
reconhece que quando ele sai para qualquer outro lugar ele precisa da calçada para se deslocar.
E para que o espaço da calçada seja preservado ao cidadão é preciso que haja um bom diálogo
23 A entrevista com o presidente da Assindivan foi realizada no dia 17 de novembro de 2014, no Largo do Rosário, onde
Valmir tem seu ponto.
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entre a prefeitura, responsável por ordenar o espaço público, e o trabalhador de rua, “que precisa
ganhar o pão de cada dia”, segundo suas próprias palavras.
O momento mais dramático que Valmir já vivenciou em sua experiência de
liderança foi nos anos 1992 e 1997. Naquela época foi feito um cadastro de trabalhadores
existentes entre o Campo Grande a Praça Castro Alves, resultando num quantitativo de 3.300
ambulantes. Ele conta que a gestão da prefeitura daquele período foi associando essas pessoas
ao mesmo tempo em que faziam o cadastro, dando-lhes a esperança de que todos teriam onde
trabalhar. Porém, o projeto elaborado contemplava apenas 453 pessoas, que teriam que
trabalhar em uma nova área nas proximidades da Ladeira da Montanha. Para garantir que a
proposta fosse cumprida, a municipalidade proibiu que qualquer ambulante colocasse seu
mobiliário na Avenida Sete utilizando a presença policial para coibir os trabalhadores que
tentassem infringir a determinação no trecho em questão.
Valmir relata que ao contrário do que aconteceu no passado, quando as decisões
eram tomadas de cima para baixo, agora é possível que as entidades representantes do segmento
consigam negociar diretamente com a prefeitura. Porém, apesar disso, já aconteceram algumas
ações consideradas como desastradas pelo presidente da Assindivan, como foi o caso da retirada
aleatória de todos os trabalhadores, sem tampouco considerar os que possuíam licença, da Rua
do Cabeça, no Dois de Julho, ocorrida em janeiro de 2014. A Assidinvan foi uma das
associações procuradas após a ação e junto com outros movimentos conseguiu articular
reuniões com o poder público que reverteram a situação e contribuíram para participação do
segmento na elaboração do projeto de requalificação do bairro Dois de Julho, onde foram
negociados os locais destinados e as condições para a atividade do trabalhador de rua no bairro.
Para Valmir, algumas das principais conquistas do segmento em Salvador
atualmente, além das 13 áreas indicadas pela prefeitura para a realização atividade, foram a
pedestrianização da Rua da Forca, que antes funcionava como retorno para os automóveis e o
reconhecimento da lateral da Caixa Econômica, na Rua Clóvis Spínola, como uma área também
destinada para a atividade. Ele conta que no início da atual gestão a proposta era de se criar um
camelódromo atrás da Secretaria de Segurança Pública, na Piedade. Porém tal proposta, apesar
de contar com um projeto para cerca de 1.200 trabalhadores, foi rechaçada pela categoria, pois
não atendia às necessidades deles, já que sua implantação implicaria em uma segregação do
trabalhador com a rua, distanciando-os conseqüentemente do seu público. Para ele, a prefeitura
gastaria dinheiro investindo em um projeto que não daria em nada, pois, quando as vendas
caíssem, as pessoas retornariam para seus locais de origem. Assim, após reuniões entre o poder
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público e a categoria, chegou-se à proposta que está em execução, onde ocorre a adequação das
transversais da Avenida Sete.
A terceira entidade de que falaremos é Associação dos Trabalhadores Informais de
Salvador (Assinformal), uma associação um pouco mais antiga do que a Assindivan, com
quatro anos de funcionamento, mas que atualmente está sendo modificada com a revisão do seu
estatuto. O interlocutor com quem conversamos é o presidente da entidade, Arismário Nunes
Barreto, mais conhecido como Alemão24. Ele nasceu na cidade de Santa Luz, mora em Salvador
há 30 anos e há 20 anos trabalha nesta área. Apesar do pouco tempo de existência da
Assinformal (14 anos), Arismário se envolve com as questões de sua classe desde 1999. Além
de ser presidente da Assinformal, ele também é membro da diretoria do Sindicato de
Ambulantes e Feirantes da Cidade de Salvador (Sindifeira).
Para fazer parte da Assinformal, Arismário esclarece que basta ser ambulante, ser
trabalhador informal, e por enquanto também não está sendo cobrada taxa de adesão para os
associados. Por ser uma entidade relativamente nova e que está passando por ajustes, não há
informações sistematizadas sobre o número de membros que a compõem.
Arismário coloca que a pior fase do relacionamento entre o trabalhador de rua e o
poder público foi nos anos de 1997 a 2004. Ele relata que naquela gestão houve muitos casos
de violência contra os trabalhadores. Entre as propostas daquela gestão, havia a de criar um
camelódromo no estacionamento São Raimundo (próximo ao Shopping Orixás Center) e na
Ladeira da Montanha, conforme também relatado por Valmir da Assindivan. O presidente da
Assinformal relata que a proposta de camelódromo não foi adiante e que na Ladeira da
Montanha, após poucos meses, só restaram cerca de nove trabalhadores. Foi realizado então um
deslocamento dos ambulantes para as transversais (becos), porém sem nenhuma estrutura e sem
muita discussão.
Em contraponto à fase anteriormente citada, Arismário relata que o atual momento
é o melhor na relação entre os trabalhadores de rua e a municipalidade, pois agora há diálogo
com o poder público, através da Secretaria de Ordem Pública. Contudo, a permanência de
pessoas trabalhando na Av. Sete foi inegociável no processo de elaboração do novo projeto de
ordenamento, ainda que a associação tenha indicado a permanência de trabalhadores em alguns
muros cegos de colégios e igrejas e colunas de lojas ao longo da avenida. Os trabalhadores
aceitaram se deslocar para os becos, mas segundo Arismário, enfrentam grandes dificuldades
24 A entrevista com o presidente da Assinformal foi realizada no dia 29 de setembro de 2014, no Beco Maria Paz, onde
Arismário tem seu ponto.
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para vender nesses locais, sobretudo porque os clandestinos (pessoas sem licença) continuam
vendendo ao longo da Avenida Sete, que para ele não tem sido devidamente fiscalizada. O
presidente da Assinformal diz que a entidade está aguardando a conclusão das obras, a fim de
verificar se o poder público vai cumprir com o que foi prometido aos trabalhadores e, enquanto
isso não acontece, segue no acompanhamento das obras. Para o entrevistado, o melhor dessa
nova gestão é justamente o processo de negociação mais aberto. Além disso, ele pontua também
a cobertura implantada nos becos e a pedestrianização da Rua da Forca, também mencionada
pelo presidente da Assindivan.
Por fim, temos ainda a Associação dos Feirantes e Vendedores Ambulantes da
Cidade de Salvador e Região Metropolitana (Asfaerp), presidida por Marcos Luiz Neves de
Almeida, ou Marcos Cazuza25. Ele conta que a crise do emprego entre as décadas de 1980 e
1990 o atingiu fortemente, sobretudo por ter pouco estudo, o que o levou a buscar seu sustento
como trabalhador de rua. Marcos Cazuza se envolveu politicamente com as questões de sua
classe praticamente desde que começou a trabalhar na categoria e é um dos fundadores da
Asfaerp. Sua motivação veio da desmobilização que observou no segmento e da vontade de se
organizar para ter uma vida melhor, com mais dignidade.
Para fazer parte da Asfaerp, assim como da Assindivan e da Assinformal, não é
preciso pagar nenhuma taxa: basta ser trabalhador de rua. A entidade, assim com as demais,
vive através dos recursos dos próprios diretores e das contribuições voluntárias dos membros
que desejem contribuir. O que garante a participação do membro na associação é a vida efetiva
dos companheiros no seu local de trabalho, ou “na pedra”, como eles se referem. Marcos Cazuza
conta que há 2.886 trabalhadores associados à Asfaerp, número que não considera apenas os
trabalhadores da Avenida Sete e a que se chegou através de um cadastro realizado pela própria
associação. A Asfaerp conta também com algumas informações sobre a categoria, levantadas
em um censo realizado em 2001, onde se verificou, por exemplo, o nível de escolaridade, o
tempo de trabalho “na pedra” (no mesmo local) e a cidade de origem. Não foi possível, no
entanto, ter acesso às informações desta pesquisa, pois elas não se encontram na posse da
associação e o presidente da associação não soube nos informar onde poderíamos encontrá-la.
Para o presidente da Asfaerp o principal problema para a categoria sempre foi o
confronto com o rapa26, o que foi acentuado no período de 1997 a 2004, conforme já apontando
25 A entrevista com o presidente da Asfaerp foi realizada no dia 28 de janeiro de 2015, na Estação da Lapa, próximo de onde Marcos tem seu ponto. 26 De acordo com o disposto no dicionário Michaelis (2008) o termo “rapa” refere-se ao “carro que conduz fiscais da Prefeitura
e força policial para apreender, na via pública, mercadorias que estejam sendo vendidas por pessoas não licenciadas e pequenos
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pelas lideranças das outras entidades aqui apresentadas. O atual momento é visto por ele
também como um momento de diálogo mais aberto e humano. Ele acredita que a organização
é um ponto favorável para realização da atividade, que passa a ser vista de outra forma pelo
cliente. Sobre esse aspecto, pensa ser fundamental a realização dos cursos que o SEBRAE
ofereceu de forma complementar à ação da atual gestão da prefeitura. Os cursos ocorreram de
forma gratuita e capacitaram os trabalhadores nas áreas de, por exemplo, empreendedorismo,
vitrinismo e idiomas. Marcos Cazuza considera que a principal conquista do trabalhador de rua
hoje é a de poder trabalhar adequadamente, garantindo o sustento da família e uma melhor
educação para os filhos.
No âmbito do novo ordenamento executado pela atual gestão municipal e em
decorrência das reuniões com as lideranças até então ocorridas, criou-se também um novo
agente: os líderes de rua. Essa liderança surge porque, segundo o presidente da Asfaerp, há uma
sobrecarga das associações, que não tem diretores suficientes para cobrir cada área da Avenida
Sete. Os líderes de rua agem então como interlocutores entre as associações e os ambulantes
em cada rua ordenada e entre as associações e o poder público. Foram escolhidos de acordo
com o destaque e envolvimento que assumiram durante o atual processo de negociação com a
prefeitura e se constituem como um primeiro agente a tentar resolver um problema estrutural
nos becos quando este surge, como, por exemplo, a queima de uma lâmpada ou um furo na
cobertura, levando o problema para o conhecimento da prefeitura
É importante pontuar que, como podemos notar, as transversais da Avenida Sete
que hoje passam por adequações para comportar os trabalhadores de rua, já contavam com
pessoas cadastradas para elas desde a gestão da prefeitura de 1997. Por esse motivo, fica claro
que não foi possível criar efetivamente muitos novos pontos de trabalho. Nesse sentido, a
negociação com as associações e sindicato se deu de forma a contemplar os trabalhadores
licenciados na Avenida Sete, de acordo com os seguintes critérios: idade, idade no local de
trabalho, deficiência e proximidade de seus antigos pontos com relação às transversais
autorizadas. Segundo informações das entidades aqui entrevistadas, o número de trabalhadores
licenciados e que poderão permanecer nas transversais da Avenida Sete é de 950 pessoas.
A existência dessas quatro entidades com atuação sobre o segmento pode induzir
ao pensamento de que talvez ocorra uma sobreposição de interesses e de capacidade de atuação.
Sobre isso, os representantes das entidades aqui mencionadas dizem haver uma ajuda mútua
veículos não matriculados.
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entre eles nos processos de negociação, onde são defendidos os interesses coletivos do
segmento. Podemos notar ainda que há muitas convergências naquilo que observam sobre a
atividade, mas de forma semelhante, há também as divergências. Estas, contudo, serão
abordadas posteriormente, quando tratarmos dos circuitos de realização da atividade. Resta-nos
então, por ora, aproximarmos nosso olhar daqueles que são os agentes que dão corpo à
atividade, que a fazem existir: os trabalhadores de rua.
3.2 Os trabalhadores de rua
Para nos aproximarmos sobre quem são as pessoas que tornam esta dissertação
possível, optamos por trazer as histórias de 10 trabalhadores com os quais conversamos durante
a realização das entrevistas do questionário de aprofundamento em forma de narrativa, cujo
percurso consta no Mapa 05, principalmente porque o conteúdo dessas histórias fornece
elementos importantes para o entendimento do trabalho realizado por eles na rua. Esta narrativa,
entretanto, não deve ser entendida como uma forma de romantizar a atividade exercida nas ruas
da cidade, mas sim como uma tentativa de tornar visíveis aspectos do cotidiano que geralmente
não se expõem aos nossos olhos, além de conferir sensibilidade à discussão, o que pode
contribuir para ampliar nossa percepção sobre a realidade. Para trazer esta questão à superfície,
foram escolhidas as entrevistas dos trabalhadores com quem mais se teve contato durante a
pesquisa, ou seja, aqueles com os quais foram realizadas a aplicação dos questionários básicos
e de aprofundamento. Aqui não se terá foco apenas nas respostas objetivas dadas aos
questionamentos feitos, mas entrará em destaque também um pouco da ambiência e das
conversas espontaneamente ocorridas, que serão descritas com inspiração etnográfica.
Considera-se que este conteúdo é de extrema relevância e que irá auxiliar bastante na
contextualização dos dados que serão apresentados posteriormente, pois faz emergir o
entendimento dessas pessoas sobre sua relação com o espaço público e com o centro da cidade
no âmbito do trabalho que realizam.
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Mapa 5: Percurso de aplicação do questionário de aprofundamento.
Fonte: Elaboração da autora, 2015.
Antes de iniciarmos a história e apresentarmos seus “personagens”, é preciso situar
o contexto no qual ela se desdobra. Vimos no capítulo anterior que nos últimos 23 anos a
atividade dos trabalhadores de rua sofreu diversas tentativas de regulação pelo poder público,
que passa a reconhecer e incorporar a atividade em suas políticas públicas regulando-a e
controlando-a. No momento atual, as intervenções propostas pela municipalidade não vem
ocorrendo sem conflitos, pois a intenção do novo ordenamento é retirar todos os trabalhadores
de rua da Avenida Sete de Setembro, restringindo sua atividade a ruas e transversais específicas.
As mudanças ocorridas com a reforma trouxeram diferentes níveis de problemas,
tanto para os trabalhadores que atuavam nessas transversais, quanto para os da Avenida Sete.
Os trabalhadores das transversais foram deslocados para locais provisórios durante a reforma
da rua em que trabalhavam. Segundo muitos relatos, isso aconteceu sem aviso prévio, ou seja,
não foi possível avisar aos clientes com antecedência onde estariam durante o período da
reforma, o que trouxe diversos tipos de prejuízos para os trabalhadores, desde os emocionais
até os financeiros. Para os que trabalhavam na Avenida Sete, a situação foi ainda mais grave,
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pois mesmo com a determinação de não poder mais trabalhar no local, muitos retornam mesmo
com o risco de perder sua mercadoria para o rapa. No início da ação da prefeitura era possível
sentir um forte clima de tensão ao transitar pela Avenida Sete, com trabalhadores apreensivos
e sempre muito atentos a todos os movimentos do entorno. Esse sentimento de insegurança com
relação ao trabalho, ou seja, ao sustento cotidiano, infelizmente não foi uma situação pontual
para muitos trabalhadores. Nos relatos que leremos a seguir, veremos que situações semelhantes
ou piores já ocorreram em outros momentos, onde o jogo entre a norma e a irreverência, a
obediência e a resistência se fez presente em suas vidas. Temos então, a ação principal de
regular a atividade desencadeando o conflito pela sua permanência. Entendendo, portanto, o
conflito principal que se dá na disputa pelo lugar, podemos seguir apresentando o lugar e as
pessoas de quem nos aproximamos, suas histórias de vida e sua relação com o trabalho que
desenvolvem.
***
Ao percorremos a Avenida Sete com um olhar minimamente atento nos deparamos
com uma grande diversidade de situações e acontecimentos, edificações, usos e apropriações.
É difícil passar desapercebido(a) pelas diferentes arquiteturas que a margeiam e que pertencem
a distintos períodos históricos, onde podemos encontrar, por exemplo, edifícios-galeria, lojas,
escolas, bancos, igrejas, mosteiros e praças. Para além desse aspecto, não podemos deixar de
mencionar também como característica marcante da Avenida Sete, a diversidade de
mercadorias e de gente que por ela circula. Gente que disputa espaço, que caminha com pressa,
que caminha lentamente, que desvia dos carros, que tropeça nos buracos da calçada de pedra
portuguesa, que se orienta através de uma bengala, que usa cadeira de rodas, que procura o
caminho com mais sombra, que compra, que vende, que “mora na rua”, que mora nos prédios
ou que apenas passeia e vive o momento no lugar. Temos aí, portanto, um lugar onde a vida
pulsa intensamente, seja pelo desenrolar do próprio cotidiano, seja pelo trabalho presente em
quase todos os seus cantos.
Há ao longo da Avenida Sete um importante número de estabelecimentos
comerciais e de serviços, que por sua vez, concentram um grande número de empregos.
Juntamente com a abertura das lojas, escolas e clínicas há também a chegada de trabalhadores
que possuem empregos formais e informais. Aqueles que possuem empregos formais dirigem-
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se para seus locais de trabalho e lá, teoricamente, encontram a estrutura que precisam para
realizar suas atividades. Já os que trabalham no setor informal, sobretudo aqueles que utilizam
o espaço da rua, precisam montar e desmontar toda sua estrutura de trabalho diariamente.
Assim, se chegarmos entre às 7h e 9h da manhã na Avenida Sete de Setembro, vemos o início
da dilatação do dia, onde além de lojas se abrindo, podemos ver também carrinhos deslizando
por toda parte sendo empurrados por carregadores. Nesses carrinhos, é transportada toda uma
diversidade de mercadorias, armazenadas em grandes caixas de madeira, que pertencem aos
trabalhadores de rua que atuam na referida avenida, nas ruas de seu entorno e no bairro Dois de
Julho. Aos poucos escutamos aumentar o volume do tilintar das estruturas de metal das barracas
sendo montadas e o burburinho de vozes começando a se confundir.
No meio do dia, frequentemente com o sol a pino, a agitação do dia se expande. O
andar das pessoas é apressado. A disputa por quem grita mais alto para atrair o cliente se
intensifica. No caminho alguém oferece “ÁGUA MINERAL GE-LA-DI-NHA!!! OLHA A
ÁÁÁÁGUA!”. Em outro ponto pergunta-se: “É EXAMES E CONSULTAS?” e outra pessoa
oferece um “CHIP DA TIM”. A calçada torna-se um lugar de disputa e de trânsito intenso. É
possível verificar um transbordamento de pessoas para a faixa de rolamento em alguns pontos,
onde se disputa o espaço com o automóvel. É neste momento que temos o ápice do movimento
da vida nas ruas do centro da cidade.
Com o anoitecer, vem a retração da dilação do dia. Parte dos trabalhadores dirige-
se para os pontos de ônibus de volta para casa. Outra parte desloca-se a pé mesmo, pois mora
nas proximidades do centro. Os trabalhadores de rua começam a desmontar suas barracas e
armazenar as mercadorias para que os carregadores possam levá-las e guardá-las até o dia
seguinte nos depósitos, localizados geralmente ali bem perto de onde trabalham. É também na
noite que se verifica um novo movimento nesse lugar, que cede lugar para a prostituição,
usuários de droga e transito das pessoas em situação de rua, que buscam locais para se abrigar
e passar a noite.
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Diversos conflitos podem ser percebidos nesse lugar e ocorrem, dentre outros
motivos, devido a mistura de usos e apropriações que se expressam nesse espaço. A atividade
do trabalhador de rua é uma delas e sua permanência não se dá sem resistência e luta. Luta de
pessoas que não conseguem se empregar no mercado formal e que precisam, como todos,
sobreviver com o mínimo de dignidade. A forma de obter essa dignidade em nosso mundo
capitalista se dá, sobretudo, por meio do trabalho e essas pessoas não se negam a trabalhar. Para
o poder público não é mais possível lidar com essa situação sem reconhece-la, ou seja, sem
reconhecer sua própria ineficiência e incapacidade em gerar oportunidades de trabalho para
todos. É preciso então incorporá-la, aceitar que essa é uma das formas pelas quais seus
habitantes conseguem se manter, produzir e consumir. Contudo, esse mesmo poder público que
reconhece e incorpora a questão em suas políticas públicas, precisa também determinar como
ela deve acontecer, de modo a compatibilizar essa atividade com as demais da cidade. Porém,
muitas vezes o faz atropeladamente, na urgência das necessidades de um planejamento urbano
feito para resultados imediatos.
Entre os acertos e desacertos do poder público ficam as pessoas e suas necessidades
cotidianas. Pessoas com histórias de vida e de luta, com conquistas, desejos e sonhos. Esse é o
caso de seu Raimundo, um homem alto, de 55 anos idade, que “caiu” na juventude (foi preso)
e não conseguiu mais outro emprego. Seu Raimundo aprendeu sua profissão atual no Liceu de
Artes e Ofícios, que ficava na Praça da Sé, mas antes disso chegou a trabalhar com carteira
assinada na antiga Telebahia. Hoje trabalha como sapateiro no bairro Dois de Julho, entre
bancas de frutas, verduras, farinhas de beiju, ovos, queijos e ervas medicinais. O local onde ele
trabalha vai passar por uma reforma, mas ele disse que mesmo quando tudo estiver pronto vai
continuar nesse lugar e daqui não se mudaria, pois é onde está sua clientela. Seu Raimundo é
artesão e por ser artesão disse nunca ter conseguido licença da prefeitura. Ele opta por trabalhar
na rua principalmente porque em ambiente fechado fica-se muito exposto ao cheiro da cola de
sapateiro, então trabalhar na rua é uma questão de saúde segundo sua opinião. Contou que suas
coisas já foram jogadas fora e sua guia quebrada em momentos de tensão entre ambulantes e o
poder público, que existiram em gestões anteriores. Segundo conta, só conseguiu permanecer
por ajuda de uma cliente que foi professora de um antigo prefeito e intercedeu por ele. Ele não
tem nenhum controle contábil de seu negócio, o que sabe é que consegue pagar suas contas em
dias. Com o trabalho conseguiu conquistar a casa própria e o estudo particular dos filhos. Entre
seus planos para o futuro está o desejo de ver os filhos formados, mas não pensa em ter um
trabalho formal para si. Quer poder continuar sendo sapateiro e pontua que tem dificuldades
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por não ter uma boa máquina de costura, que ele não pode comprar com os rendimentos que
tem, que muitas vezes são incertos. Entretanto, diz ser muito contente pelos amigos e clientes
que tem no lugar onde trabalha. Para ele a melhor coisa no seu trabalho é ter a confiança das
pessoas. Como ele mesmo diz: “Chega uma pessoa e deixa aqui um sapato desses, não leva
nenhum papel porque eu não tenho recibo. Deixa o sapato só na palavra, então essa é a coisa
mais importante”.
Próximo ao ponto de seu Raimundo, mais adiante e também no Dois de Julho,
conhecemos dona Valdenice, de 58 anos, que chama atenção por estar praticamente sempre
catando feijão verde, mercadoria com que trabalha desde quando era criança e morava na roça.
A história que a levou a fixar ponto no Dois de Julho é, no mínimo, curiosa. Ela conta que
começou a vender numa feira que existia perto do Orixás Center. Lá era só dia de sábado, o
movimento era fraco e tinha muita gente vendendo a mesma coisa. Falaram pra ela ir pra feira
de São Joaquim, mas ela não tinha barraca e não conseguiu se estabelecer no local. Tentou
então vender seu feijão numa feira na Barra, mas só conseguiu vender 1L, pois a clientela dali
era fiel aos feirantes antigos. Com o pouco dinheiro que ganhou, decidiu pegar o primeiro
ônibus que passou, um Praça da Sé. No caminho pensou que estava fazendo bobagem, pois o
que iria vender na Praça da Sé? Porém ao passar pelo Relógio de São Pedro olhou pro outro
lado e viu gente na rua. Resolveu descer e foi até o Dois de Julho. Assim que botou a guia na
rua veio logo uma cliente. Conta que em meia hora vendeu todo o feijão que tinha levado: era
dinheiro pra ir embora, para comer e pra garantir a comida da filha recém nascida. Depois desse
dia nunca mais saiu do bairro e nele trabalha já há 30 anos. Dona Valdenice conta que com seu
trabalho conquistou a casa própria e nela tem tudo que precisa. Criou seus dois filhos e hoje é
empresária, só vai trabalhar duas vezes na semana (quinta e sexta). Além do feijão verde, vende
também mangalô, andu e pimenta, mercadorias que só ela oferta no bairro. Apesar de gostar
muito do trabalho que realiza, dona Valdenice, que já foi prestadora de serviço para uma
empresa com a carteira assinada, conta que gostaria de ter novamente um emprego formal, mas
sabe que não conseguirá mais por conta da idade e da pouca escolaridade. Se considera uma
boa comerciante e acha que seu trabalho é um lazer, pois nele pode conversar com todo mundo,
além de se divertir.
Saindo do Dois de Julho e caminhando para o início da Avenida Sete, próximo ao
Mosteiro de São Bento encontramos Adriana, que relatou ter começado a trabalhar costurando
em casa com a mãe. Mulher de 39 anos, concluiu o ensino médio e quer voltar a estudar. Disse
ter optado pelo trabalho na rua porque nele consegue ter liberdade para cuidar do filho pequeno,
120
que estuda no centro. De início não quis falar muito conosco, mas depois de um tempo de
conversa e com um sorriso largo no rosto contou que a grande vantagem de trabalhar assim é
que aqui consegue fazer o próprio horário, o que é bastante importante também se
considerarmos que ela mora a 24km do centro, no bairro de Itapuã. Como não ficar aliviada
com a possibilidade de sair mais cedo do trabalho e assim evitar pegar um engarrafamento que
cruza quase toda a cidade no horário de pico? Para Adriana “vender na rua é ter dinheiro à
vista”, e diz que se pudesse mudaria para um lugar onde tivesse mais movimento, pois a rua
onde está agora é muito fraca. Antes de vir pro beco estava trabalhando na Avenida Sete e conta
que alguns clientes já a encontraram, mas outros ainda não sabem para onde ela foi depois que
precisou se mudar devido à política de ordenamento implementada pela nova gestão da
prefeitura. Sua mercadoria é diferenciada, trata-se de confecções de moda praia produzidas por
suas próprias e habilidosas mãos, cujo controle de compras e vendas é feito num caderninho
onde ela anota tudo, separando o dinheiro daquilo que compra para manter o negócio, daquilo
que é de seu uso. Ela pontua que as principais conquistas de seu trabalho são de ter conseguido
arrumar a casa e de poder viver dignamente. Sua relação com as demais mulheres da rua
também é de chamar a atenção. Elas tomam conta das bancas umas das outras e reúnem-se em
conversas enquanto o movimento está fraco. Esta rua onde trabalham, Beco Maria Paz, é uma
das que mais se ouve reclamações por parte dos trabalhadores, pois o movimento de pessoas
transitando por ela é pequeno se comparada com as demais. Contudo, Adriana chama atenção
para algo que considera bom de estar nela, que é o fato de o lugar agora ser coberto, o que lhe
possibilita vender mesmo em dias de chuva, além de ser um lugar para onde ela pode levar seu
filho, que brinca com as outras crianças também filhos(as), netos(as) e sobrinhos(as) de outros
trabalhadores do local. Adriana revelou ainda que se as vendas continuarem fracas depois do
carnaval, desistirá do ponto e procurará um emprego formal próximo de onde mora, pois
pretende também mudar a escola do filho.
Ao contrário de Adriana, que já foi transferida da Av. Sete de Setembro para um
dos becos, entrevistamos também Diana, que ainda está na Avenida aguardando as obras do
local para onde será transferida serem concluídas. Diana tem 45 anos e fala muito de sua filha
pequena. Na primeira vez que nos encontramos, ela foi indicada por outros trabalhadores depois
de uma sequência grande de recusas para responder o questionário básico. Disseram para
procurá-la porque ela gostava muito de falar. Ela está neste ponto há dois anos e disse ter
entrado no ramo por falta de opção, depois de ter sido demitida do antigo emprego, onde atuava
na linha de produção, embalando roupas. Apesar de ter amizade com alguns lojistas próximos
121
de seu ponto, ela contou que não vai mais no banheiro enquanto está trabalhando, deixa pra ir
só quando chega em casa. Segundo ela o motivo para isso é a intensa fiscalização que está
havendo e as ações do rapa. Ela trabalha na rua e expõe suas mercadorias em tela, o que facilita
o seu deslocamento. Na segunda vez em que conversamos o sol estava muito forte e ela estava
trabalhando de sombrinha. Às vezes mostrava dificuldades para segurar a sombrinha ao mesmo
tempo em que atendia, recebia o pagamento e dava a mercadoria para o cliente. Contou que
preferia trabalhar num lugar coberto, onde tivesse um banheiro e disse que às vezes chega a
almoçar em pé. Sobre seu controle contábil, ela tenta anotar tudo que compra e o que vende,
sobretudo porque se não fizer isso sai gastando tudo que ganha no mercado e não pode deixar
a guia vazia. Quanto a seus planos para o futuro, deseja continuar trabalhando por conta própria,
mas quer “ter uma lojinha em um lugar mais aconchegante”. Considera que o bom de trabalhar
na rua é principalmente que tem sempre dinheiro na mão e faz amizades.
Uma história bastante marcante que conhecemos um pouco mais adiante na
Avenida Sete é a de seu Antônio, um homem de 61 anos, que disse nunca ter frequentado a
escola. Desde a primeira vez que conversamos, sua história despertou muita curiosidade,
principalmente porque foi difícil falar com ele, já que a todo momento chegava alguém para ele
atender. Além disso, houve uma cliente que se interessou tanto pela pesquisa, que quase queria
responder o questionário por ele. Nesse primeiro momento a mercadoria com que trabalhava
eram colares, anéis e brincos de aço inox e uma das poucas coisas que ele conseguiu contar foi
que não sabia onde nasceu porque fugiu de casa muito novo. Em nosso segundo encontro ele
vendia adereços para o carnaval: delicadas tiaras de flores confeccionadas por ele mesmo. Nesse
dia o movimento estava mais tranquilo e ele contou com mais calma sua história. Disse ter
fugido no fundo de um caminhão com 10 anos de idade porque era obrigado a trabalhar na roça
desde os 5 anos e apanhava do padrasto. Por isso ficou muito tempo sem documentos, não
lembra o ano certo em que nasceu, nem sua data de aniversário, tampouco de que cidade era.
Começou vendendo bala na rua e foi baleiro até os 20 anos de idade. Seu Antônio prefere
continuar vendendo na Avenida Sete sem ponto fixo, mesmo se tiver que correr do rapa, pois
ele não tem licença e acha que no beco não se vende nada. Segundo ele “cliente nenhum procura
camelô para comprar nada; ele compra quando vê a mercadoria”. Além disso, diz não ter mais
idade e condição de montar e desmontar a barraca todos os dias. Atualmente ele guarda sua
mercadoria numa das lojas da Avenida, pois tem amizade com o dono. Ele não faz controle
contábil de seu negócio e diz só saber o que deve no cartão de crédito. Destaca que sua principal
conquista com esse trabalho foi ter uma casa e ter criado os filhos, inclusive, contou com
122
orgulho que uma de suas filhas hoje está formada e é administradora. Seu Antônio não pensa
em ter um emprego formal, tampouco em sua aposentadoria. Ele não paga INSS e diz não saber
se vai conseguir sair da rua quando tiver que se aposentar, pois para ele “coisa boa é estar aqui
na rua, dá pra conhecer todo mundo, ter amizade”. De dificuldade no trabalho, para ele, só
mesmo o rapa.
Assim como seu Antônio, há outros trabalhadores que não se vêem em outra
atividade na vida. Esse é o caso de Fábio, homem de 36 anos, pai de 3 filhos, que pediu para
sair da empresa onde trabalhava com carteira assinada, abrindo mão de seus direitos
trabalhistas. Desde nosso primeiro contato ele se mostrou bastante receptivo e simpático. Sua
banca, que abriu com o investimento de R$250,00, fica na Praça do Relógio de São Pedro e é
na verdade constituída por um balcão pequeno e uma tela que fica encostada na parede cega de
uma loja (onde ele também guarda gratuitamente a mercadoria no final do dia). É neste lugar
onde pendem brincos, pulseiras e colares de bijuterias e folheados, num ponto muito
movimentado, sempre cercado por mulheres. A sua mercadoria, como ele chama, é “mercadoria
de vaidade”, escolhida pessoalmente por ele junto aos fornecedores. Ele anota tudo que vende
no cartão e na “mão”, tem segurança sobre quanto movimenta por dia. Nas conversas que
tivemos, ele contou que também já foi empresário e deseja voltar a ser, pois está cansado de se
sentir perseguido. Contudo diz que não vai deixar de ter o seu ponto na rua porque é nela onde
está a sua clientela. Fábio pegou gosto pelo trabalho de comerciante desde criança ajudando
seus pais a chamar clientes quando eles trabalhavam em lojas da Barroquinha. Para ele “é o
camelô quem movimenta a rua”, mas vê sua classe muito desunida, o que identifica como sendo
ponto negativo no trabalho que realiza. Acha que sua mercadoria é desvalorizada só porque não
está dentro de uma loja, mesmo que às vezes seja igual ao que é vendido muito mais caro nos
shoppings. Se diz apaixonado pelo que faz e que o comércio já nasceu consigo. Ao final do
nosso último contato fez questão de presentear com pares de brincos.
Também na Praça do Relógio de São Pedro conhecemos seu Francisco, de 56 anos,
que teve uma pequena indústria têxtil na época do governo FHC. Segundo conta, começou a
trabalhar nas ruas depois que a rede de lojas para a qual fornecia matéria prima quebrou e,
conseqüentemente, levou-o a falir. Além disso, ele também foi funcionário de outra empresa
por 11 anos. Conta que começou o atual negócio com apenas R$300 e que utiliza hoje a
experiência que adquiriu quando era empresário. Seu Francisco não parou de atender gente
enquanto conversávamos e para alguns ele até nem deu muito de sua atenção. Veio de Alagoas
e disse não gostar do trabalho como ambulante, nem do ponto. Quer ter seu próprio negócio.
123
“Gosto é de vender”, ele diz. Para ele, sua maior conquista foi a de ter conseguido, com o
trabalho de ambulante, pagar as dívidas adquiridas com a falência de sua pequena indústria. Ele
é também um homem muito organizado, contrata uma contadora para organizar suas finanças,
trabalha com cartões de crédito e está entrando no Simples27. Sabe de cor a porcentagem dos
impostos que paga para a prefeitura, para o Estado e para a União. Além disso, tem controle de
estoque, de tudo que compra e do que vende e quer estabelecer uma loja entre 1 ou 2 anos. Diz
que o trabalho na rua é só pela necessidade, mas não é bom, pois é um trabalho que exige muito
do indivíduo. Segundo ele, tem que acordar cedo, trabalhar de sol a sol, enfrentar intempéries,
desrespeito, opressão, e ainda por cima não é valorizado. Essas são algumas das piores coisas
que destaca no seu trabalho. As melhores coisas são os clientes que faz e a possibilidade de
honrar seus compromissos através do trabalho que realiza.
Próximo de onde trabalham Fábio e Francisco está dona Maria, na rua Portão da
Piedade. Uma senhora forte, de 58 anos que nos recebeu ambas as vezes arrumando os chapéus,
boinas e bonés de sua guia, o que fazia aparentemente sem muita pressa. Seu olhar desconfiado
se desfez quando descobriu que já tínhamos nos visto porque moramos no mesmo bairro. Ela,
que já trabalhou de carteira assinada como ascensorista, tem sua guia nesta mesma rua há 19
anos, “herdada” de uma amiga que não quis o ponto. Com isso pôde realizar o sonho que sempre
teve de trabalhar para si mesma, alimentado desde quando fazia crochê para complementar a
renda da família. Dona Maria contou que quando começou a vender na rua tinha vergonha de
levar marmita e se alimentar na rua, sempre dava um jeito de se esconder. Como o tempo fez
amizades e a vergonha foi passando. Comentou ainda sobre as intrigas que de vez em quando
acontecem entre seus colegas, mas que não afetam o desenvolvimento do trabalho, pois eles
“são como uma família”. Sua principal conquista com este trabalho foi ter formado os filhos e
“ter um cantinho”. Ao ser perguntada sobre seus planos para o futuro e se teria desejo de ter um
emprego formal, dona Maria ameaçou jogar um lenço e disse: “ai de vocês que me chamem de
camelô. Eu sou empresária!”. Para ela esse é o seu trabalho formal e apesar de estar com
problemas de saúde e precisar se afastar da atividade para se cuidar, não sabe se vai conseguir,
pois gosta de passar o dia no lugar onde trabalha. “A gente mora mais aqui do que em casa”,
ela diz.
Seguindo a rua Portão da Piedade encontramos dona Lindinalva, que trabalha na
rua Coqueiros da Piedade. Dona Lindinalva tem 54 anos, 2 filhos, 6 netos e 1 bisneto. Numa
27 De acordo com informações no site do SEBRAE, o Simples Nacional é “um regime de opção facultativa compartilhado de
arrecadação, cobrança e fiscalização de tributos, aplicável às microempresas e empresas de pequeno porte.” (SEBRAE, 2015).
124
primeira impressão parece ser uma senhora bastante mal humorada, o que talvez tenha se devido
ao fato de a termos abordado no momento em que ela tentava tirar um cochilo entre as folhas
de suas ervas medicinais. Bastante desconfiada, perguntou várias vezes sobre o que se tratava
e depois, na medida em que as perguntas eram feitas, foi ficando mais tranquila para nos
responder. Ela está nessa atividade há 48 anos e contou que começou aos 6 anos de idade,
sozinha indo pra feira, pois sua mãe estava cega e debilitada em uma cama, com seus 8 filhos
pra criar e que precisavam se virar. Dona Lindinalva, que não freqüentou a escola e contou
nunca ter ficado doente na vida, chegou na rua Coqueiros da Piedade antes dos shoppings, seus
atuais vizinhos, abrirem as portas. Conta que suas principais conquistas são sua casa e a
“comida que defende todos os dias”. Na idade em que está diz que não conseguirá outro
emprego e tampouco pensa em se aposentar. Vai continuar vendendo na rua enquanto der. Para
ela o melhor do seu trabalho é a hora em que pode ir pra casa descansar, mas gosta de ver as
pessoas passando enquanto lá está.
Perto de onde dona Lindinalva trabalha, um pouco mais acima, está Jeferson, um
jovem de 23 anos que já concluiu o ensino médio e que começou a trabalhar na área desde os
10 anos de idade, com sua mãe. Ele foi desconfiado e respondeu às questões com bastante
objetividade. A mercadoria com que trabalha é do ramo dos eletrônicos, celulares e acessórios,
que ele adquire aqui mesmo em Salvador. Hoje o ponto da família fica sob sua responsabilidade.
Jeferson conta que suas principais conquistas são materiais como carro, motocicleta e casa, mas
também as amizades que fez no ponto. Para ele essa rua é a melhor para se trabalhar, pois é
muito movimentada. Apesar de considerar o trabalho como bom, quer sair da área, mas não
pensa em ter um trabalho formal. Em sua opinião, a principal dificuldade enfrentada por quem
trabalha nessa área é o rapa.
Em outro ponto da Avenida Sete, Dona Marinalva, uma mulher que aparentava seus
50 anos de idade e que usava uma boina colorida, aceitou conversar conosco em uma
oportunidade, mas bem rapidamente. Dentre os poucos comentários que fez nos contou sobre
um esquema de agiotagem e revelou que não pretende mais voltar a trabalhar em casa de
família, mas que está sendo difícil continuar vendendo no beco. Depois disso foi difícil
encontra-la novamente. Seu ponto estava sempre vazio e as colegas diziam que ela estava “por
aí”. Um dia, por acaso, lá estava D. Marinalva com sua boina colorida correndo com várias
capas de almofada nas mãos, de um ponto da Avenida Sete para a transversal onde era seu ponto
licenciado, lugar onde nos encontramos a primeira vez. Foi visível em seus olhos o desespero
para não perder a mercadoria, bem como a solidariedade dos colegas que a ajudavam a carregar
125
suas coisas. Volta e meia é possível avistá-la em diferentes pontos da Avenida Sete de
Setembro, sempre com o olhar muito atento e poucas mercadorias nas mãos. Não conseguimos
mais conversar.
De forma semelhante não conseguimos mais conversar com Joana, uma moça
jovem que trabalhava na Praça Carneiro Ribeiro e estava muito animada com a nova perspectiva
de trabalho, cheia de quitutes preparados por ela para ofertar ao público. Joana acreditava que
agora conseguiria ser empresária, dona do próprio nariz. Talvez ela tenha encontrado outra
oportunidade de trabalho, ou desistiu porque o local onde estava trabalhando é considerado uma
das áreas com o movimento mais fraco.
Os conflitos que presenciamos no desenrolar da atividade agora não são exclusivos
desse tempo. Tem suas raízes na histórica falta de oportunidades de trabalho que engendram
nossa formação econômica. Tem seus momentos de maior calmaria e também de agitação.
Evidenciam a luta permanente pela sobrevivência. Um dia os trabalhadores podem ser retirados,
mas por quanto tempo?
Seu Raimundo, D. Valdenice, Adriana, Diana, S. Antônio, Fábio, Francisco, Maria,
D. Lindinalva, Jeferson, D. Marinalva, Joana e outros tantos trabalhadores da Avenida Sete de
Setembro, transversais e bairro Dois de Julho estão unidos não só pelo trabalho que realizam,
mas também pelo curioso afeto pelo seu trabalho apesar das dificuldades enfrentadas, sobretudo
com a possibilidade de perder o ponto ou a mercadoria em decorrência do novo ordenamento.
Curioso para nós, que a princípio não conseguimos imaginar que exista alguma felicidade em
um trabalho tão duro e precarizado, mas completamente possível para eles, que provavelmente
são muito gratos por levar o pão para casa todos os dias através da realização desse trabalho.
***
As pequenas amostras das histórias dessas pessoas nos colocam diante de uma
diversidade enorme de realidades e situações de informalidade. Permite-nos entrar um pouco
no cotidiano do seu trabalho e perceber suas dificuldades e realizações. Considera-se que essa
narrativa é de grande importância na costura entre a informalidade e o espaço público,
sobretudo quando a ela é agregado o embasamento dos dados estatísticos levantados. As
histórias se constituem como subsídio de realidade, portanto, substância essencial à nossa
leitura e interpretação da dinâmica, realizada através de três propostas de entendimento da
126
atividade do trabalhador de rua, e que serão tratadas mais adiante. Por ora, nos ocuparemos em
relacionar esses relatos aos dados coletados em campo. É importante ressaltar, no entanto, que
as informações serão apresentadas, mas não necessariamente todos os gráficos. Os dados
completos estarão disponíveis para consulta no Apêndice G.
Ainda antes de partirmos para a apresentação da leitura dos dados estatísticos
produzidos em campo consideramos importante reforçar que os mesmos não terão seu sentido
completo se não forem associados às narrativas, pois quando tabulados e transformados em
gráficos tendem a homogeneizar a realidade. Estas informações, portanto, quando associadas
ao desenrolar da vida cotidiana (e laboral) podem nos levar a outro patamar de compreensão da
realidade estudada em sua relação com o espaço.
Dedicou-se o primeiro bloco de perguntas realizadas no questionário básico para
captar um pouco melhor quem são efetivamente os trabalhadores de rua na cidade de Salvador,
no que foi chamado de caracterização geral. Do resultado destas perguntas, uma das primeiras
observações que podem ser feitas é de que nossa amostra foi bastante equilibrada em termos de
gênero, contudo há mais homens (53,3%) do que mulheres (46,7%). No Gráfico 3 podemos
verificar que a faixa etária dos pesquisados demonstra que trata-se de uma população
predominantemente adulta, entre os 31 e 50 anos (54,7%) e a proporção entre as idades do
restante dos entrevistados se equilibra bastante entre aqueles com idade até os 30 anos (23,1%)
e aqueles com idade acima de 51 anos (21,4%).
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Gráfico 3: Caracterização geral – Pirâmide etária
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
127
Ao analisar os dados quanto ao grau de escolaridade dos trabalhadores, temos que
os casos de seu Antonio e dona Lindinalva que nunca tiveram a oportunidade de estudar, não
se constituem como maioria de nossa amostra. Contudo o grau de escolaridade (Gráfico 4) dos
entrevistados não é muito alto. Boa parte deles, 47,1%, possui até o ensino fundamental
completo e 48,4% freqüentou o ensino médio, ainda que não o tenha concluído.
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Gráfico 4: Caracterização geral – Grau de escolaridade
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
As pessoas pesquisadas em sua maioria possuem um companheiro (51,6%) e têm
filhos (78,2%). São majoritariamente oriundos de Salvador e região metropolitana (51,6%) e
para tentar facilitar a visualização da origem desses trabalhadores, optou-se por relacionar os
municípios apontados com seus respectivos territórios de identidade, apresentados no Gráfico
5 a seguir. Apesar de os entrevistados nascidos da região metropolitana estarem em número
mais expressivo, temos também que 9,7% deles vem de outros estados, onde aparecem de forma
mais representativa os estados da região Nordeste, com destaque para Sergipe. Além disso,
temos também que 34,7% dos trabalhadores vieram do interior da Bahia, mais
representativamente do território de identidade do Portal do Sertão (9,7%), com destaque para
o município de Feira de Santana e do território de identidade do Recôncavo (5,9%), com
destaque para o município de São Felipe.
1,7%
32,9%
12,5%
17,3%
31,1%
0,7% 0,7%3,1%
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%
35,0% Sem escolaridade
Ensino fundamental incompleto
Ensino fundamental completo
Ensino medio incompleto
Ensino medio completo
Graduaçao incompleto
Graduaçao completo
Está estudando no momento
128
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Gráfico 5: Caracterização geral - Origem
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
Ainda na dimensão territorial, foi perguntado aos trabalhadores sobre o bairro no
qual residem na cidade de Salvador. As respostas a essa pergunta auxiliam-nos a entender a
articulação da atividade, realizada no centro da cidade, com os demais bairros de onde vem os
trabalhadores e, a partir disso, os fluxos que são gerados. Devido à grande diversidade de bairros
apontados pelos entrevistados e pela delimitação não oficial que dispomos28, optou-se por
realizar esta leitura através de um mapa elaborado especificamente para este fim (Mapa 06).
A indicação dos bairros de origem dos trabalhadores de rua foi elaborada utilizando
13 zonas, pensadas como uma subdivisão das macrorregiões Orla, Miolo, Centro e Subúrbio29.
Estas zonas são propostas como uma tentativa de organizar nossa leitura, levando em
consideração a existência de uma certa similaridade nas condições urbanas e sociais de cada
uma dessas áreas, porém não desconhecemos suas diferenciações internas.
28 Embora a cidade de Salvador possua um estudo de delimitação de bairros, o mesmo ainda não foi institucionalizado o que dificulta a definição da localização precisa da área estudada.
29 A proposta da divisão em 13 zonas é uma elaboração de Ângela Franco e Jacopo Spigaroli (FRANCO et al 2012).
1,7%3,8%
0,3%2,1%
0,3%1,0%
0,3%
52,2%
0,7%
9,7%5,9%
1,0%3,1%
4,2%
0,3%0,3%
9,7%
0,3%2,8%
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0%
130
Podemos identificar que, em linhas gerais, o Centro e Itapagipe correspondem a
uma região com forte característica histórica e que hoje concentram estratos populacionais de
rendas média e baixas. O Miolo juntamente com Pirajá/Valéria, concentra populações muito
frequentemente de estratos populacionais mais empobrecidos, redirecionadas para essas
localidades sobretudo por indução das políticas habitacionais datadas da década de 1980. A
Orla corresponde ao local onde há concentração de uma população com maiores rendas. Por
fim, temos o Subúrbio Ferroviário que corresponde a área mais empobrecida e carente de
infraestrutura urbana na cidade.
Uma vez que temos conhecimento das informações anteriormente mencionadas,
podemos identificar que a maioria dos trabalhadores de nossa amostra concentra-se na região
do Centro, sobretudo do Centro I, composto basicamente pelo Centro Histórico e Antigo de
Salvador30 e onde moram cerca de 26% dos entrevistados. Vale ressaltar que a Avenida Sete de
Setembro está inserida justamente no Centro I, o que significa que parte considerável das
pessoas que trabalham nesta rua, habitam em sua proximidade. O local de moradia do restante
dos entrevistados distribui-se na região do Subúrbio e Miolo, com destaque para o Miolo I
((Pernambués/Cabula/Tancredo Neves) e Miolo II (Fazenda Grande/Pau da Lima/Cajazeiras).
Chamamos atenção ainda para o fato de alguns dos trabalhadores residirem em cidades da
Região Metropolitana de Salvador, deslocando-se diariamente para o centro antigo da cidade
de Salvador.
O bairro de origem dos entrevistados também pode ser relacionado com a forma
como eles se deslocam até o local de trabalho. Através dos dados coletados, podemos notar que
a grande maioria desses deslocamentos se dá por meios de transporte motorizados, com
destaque para o transporte coletivo realizado por ônibus, utilizado por 59,3% dos trabalhadores,
como é o caso de Adriana, moradora de Itapuã cuja história foi apresentada na narrativa
apresentada anteriormente. É possível também evidenciar o número de deslocamentos
realizados a pé (23%), praticado principalmente por pessoas que moram no e nas proximidades
do centro (Gráfico 6).
30 O Escritório de Referência do Centro Antigo da Cidade de Salvador em convênio com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO)30 apresenta uma delimitação onde são considerados o Centro Histórico e o Cento Antigo da cidade. O Centro Histórico compreende a área que vai da Rua Chile ao Santo Antônio. Já o Centro Antigo abrange o Centro Histórico, Campo Grande, Politeama, Centro, 2 de Julho, Barris, Tororó, Jardim Baiano, Nazaré, Barbalho,
Lapinha, Comércio, Água de Meninos, Sieiro, Queimadinho, Liberdade e Calçada.
131
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Gráfico 6: Caracterização da atividade – Como se desloca até o trabalho?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
Ao perguntarmos se os trabalhadores estão realizando a atividade por conta própria,
91,7% respondeu que sim e 8,3% disse que não, ou seja, é contratado por alguém. Consideramos
importante também levantar a forma como eles identificam o seu próprio trabalho e qual o
termo que é mais difundido entre eles para essa identificação. Para isso utilizou-se a pergunta:
“como você chama o trabalho que você faz aqui neste lugar?”. Em alguns momentos esta
questão não foi muito bem compreendida, levando-nos a complementá-la realizando questões
do tipo: “quando te perguntam o que você faz ou qual o trabalho que você realiza, o que você
responde?” As respostas a essas questões muitas vezes foram dadas com hesitação e dúvida,
buscando uma confirmação nossa sobre aquilo que era respondido, o que pode ser devido a
discriminação com relação ao trabalho que realizam, a fraca coesão no seu entendimento
enquanto classe, ou a ambas. Analisando o Gráfico 7, constatamos que maioria das pessoas,
34,5%, se disseram ambulantes e 20,9% se disseram autônomos. Curiosamente apenas 15,7%
se vêem como camelô, embora alguns dos que tenham dado essa resposta tenham justificado
não ser ambulantes por possuírem ponto fixo. É importante ressaltar ainda, que esta questão foi
aberta e que as pessoas puderam dar mais de uma resposta para ela.
59,3%
23,0%
8,2%4,4%
1,3% 1,3% 0,6% 0,6% 0,6% 0,6%0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0%
70,0% Ônibus
A pé
Automóvel próprio
Motocicleta
Bicicleta
Carreto
Ferry boat
Metrô
Mototaxi ou van
Taxi
132
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Gráfico 7: Caracterização Geral – Como você chama o trabalho que faz aqui neste lugar?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
Vimos nas histórias relatadas no início dessa sessão alguns exemplos de motivos
pelos quais as pessoas começam a realizar a atividade trabalhando nas ruas. Para esta pergunta
também foi possível dar mais de uma resposta. 43,3% das pessoas informaram que não
conseguiram encontrar outro emprego, devido a diversos motivos tais como idade,
escolaridade, etc. 21,2% delas declararam também que estão nesse trabalho porque não querem
ter patrão, apontando a flexibilidade que conseguem ter para resolver outras questões da vida
como se ausentar do trabalho algumas horas para pagar contas, chegar um pouco mais tarde
porque precisou deixar o filho na escola, etc. Há ainda os casos de tradição familiar, 11,3%,
onde os trabalhadores que estão na atividade hoje aprenderam com os pais sobre esse oficio,
por acompanhá-los desde a infância e/ou por receber incentivo deles para entrar no ramo.
É importante notar também que 59,5% dos trabalhadores entrevistados já tiveram
um trabalho formal com carteira assinada e os outros 40,5% sempre estiveram na informalidade.
No Gráfico 8 verifica-se que daqueles que já tiveram um trabalho com carteira assinada, 57,6%
atuou na prestação de serviços com cargos em, por exemplo, serviços gerais, serviço doméstico,
vigilante, balconista, atendente e motoboy; 11,6% já trabalhou no ramo do comércio e serviços
e 9,3% na construção civil.
34,5%
20,9%
15,7%
7,4% 7,4%5,5% 5,5%
0,9%2,2%
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%
35,0%
40,0% Ambulante
Autonomo(a)
Camelô
Vendedor / Comerciante
Comércio informal
Micro empreendedor /Empeendedor individualOutros
Não respondeu
Artesão
133
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Gráfico 8: Caracterização Geral – Se já trabalhou de carteira assinada, o que fazia?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
Encerrando o último bloco de questões da caracterização geral, mas não do
questionário básico, foi perguntado aos trabalhadores de rua sobre o que acontece com o seu
negócio no caso de haver impedimentos relativos à sua saúde. A maioria deles, 59,9% diz que
caso sofra um acidente ou fique doente, o seu negócio fica fechado até se recuperar, o que pode
implicar em um grande prejuízo no final do mês (Gráfico 9). Essa questão evidencia, portanto,
uma grande fragilidade no que se refere a sua capacidade de se manter a partir desse trabalho,
pois uma vez que a guia fique fechada, não há vendas e, conseqüentemente, não há lucro.
57,6%
11,6%9,3%
4,7% 3,5% 2,9% 2,9% 2,9% 1,7% 1,7% 0,6% 0,6%0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0%
70,0%
Prestação de serviços Vendedor / comerciante
Construção civil Profissional do setor industrial
Não respondeu Profissional do setor de transportes
Profissional com cargo de gerência / bancário Outros
Profissional do setor de saúde Profissional do setor de educação
Profissional do setor agrícola Artesão
134
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Gráfico 9: Caracterização Geral – Quando fica doente (ou quando tem algum acidente ou
problema), o que acontece com o negócio?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
As informações apresentadas ajudam-nos a entender um pouco mais sobre o perfil
dos trabalhadores de que estamos tratando. Podemos relacionar tanto as histórias apresentadas
na narrativa, quanto os dados obtidos com a aplicação do questionário básico. Contudo, para
aprofundarmos nossa leitura sobre as informações levantadas no campo propomos sua
problematização no âmbito de três aspectos estruturantes, postos num formato que acreditamos
ser mais eficaz para identificar e reconhecer as diferentes perspectivas do trabalho de rua.
3.3 Concepção e funcionamento dos circuitos do trabalho de rua em Salvador
O trabalho de rua possui singularidades que perpassam desde a motivação dos
indivíduos que o buscam até as formas como este trabalho é realizado. Através das histórias
que apresentamos na seção anterior, pudemos ver diversos aspectos dessas singularidades,
representados numa pequena amostra de situações que se repetem e que se somam a outras
diversas. A motivação que leva essas pessoas a recorrerem a esta forma de sobrevivência pode
basear-se numa escolha pessoal, mas também ser fruto de poucas oportunidades em outras
áreas, decorrentes de baixa escolaridade, da idade, da busca por uma maior flexibilidade para
cuidar dos filhos, por exemplo. Os trabalhadores buscam seu lugar no espaço através da
comercialização de mercadorias e encontram meios de se estabelecer nos locais que lhes
parecem mais interessantes, onde seu produto é mais visto e cobiçado. Estabelecer-se em
determinados locais, por sua vez, cria nestes pontos tensões que reverberam em outras
59,9%
25,5%
7,6%4,8%
1,0% 0,6% 0,6%0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0%
70,0% O negócio fica fechado até serecuperarUm membro da família ouconhecido se encarrega do negócioUm outro trabalhador de rua cuidada atividadeNão fica / nunca ficou doente
O dono toma conta do ponto
Outro
Contrata outra pessoa paratrabalhar
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instâncias da cidade, pois além de movimentar dinheiro, movimentam-se também interesses
pessoais e coletivos e as relações que se estabelecem entre os indivíduos, a sociedade e o espaço.
Como dar conta dos diversos desdobramentos que decorrem desta atividade?
Podemos direcionar o nosso olhar para a atividade do trabalhador de rua de diversas
maneiras e assim realçar determinados aspectos em detrimento de outros, dependendo do
enfoque escolhido. Nosso intuito aqui é explorar ao máximo a relação que este tipo de trabalho
tem com o espaço, abordando o seu lugar na economia, os tensionamentos, conflitos, disputas
e redes de solidariedade que se formam no cotidiano. Para tanto, metodologicamente optou-se
por situar a atividade no âmbito de três propostas de entendimento, concebidas para analisar a
atividade de forma particularizada, mas sem encerrará-las em si próprios, pois consideramos
que as mesmos constituem partes de uma rede ampla de relações interdependentes.
Além disso, vimos também que o lugar onde a atividade se realiza é de interesse do
poder público, sobre o qual incide a competência do planejamento. As ações do planejamento
urbano em Salvador nos períodos analisados podem ser comparadas em parte com o que foi
proposto nesse mesmo sentido no Rio de Janeiro, sobre o que Ribeiro (1986:3) comenta serem
soluções que “expressam a tentativa de subordinar o excepcional às medidas rotineiras de
governo da cidade”. Podemos pressupor que essa sujeição tanto ao capital quanto às imposições
do poder público não se dá de forma pacífica e sem resistências.
Para Hardt e Negri (2005) os pobres estão incluídos na produção social e é preciso
reconhece-los não apenas como vítimas, mas como agentes poderosos na medida em que estão
excluídos apenas em parte do processo, o que se deve principalmente à sua criatividade. Para
os autores há uma “massa cinzenta” por onde os trabalhadores oscilam de maneira precária
entre o emprego e o desemprego. Além disso, nenhuma força de trabalho está fora dos processos
de produção social. As estratégias de sobrevivência dos pobres, como é o caso dos trabalhadores
de rua, revelam uma enorme criatividade e habilidade de sobrevivência, que merecem, portanto,
ser estudadas com a devida profundidade e detalhamento.
Dentre os aspectos apresentados podemos elencar três elementos chave: a
subordinação, os conflitos e as redes de solidariedade estabelecidas entre os trabalhadores. Estes
aspectos, portanto, foram aqueles escolhidos para que possamos olhar a atividade do
trabalhador de rua sob diferentes perspectivas, analisando as relações estabelecidas por cada
um dos circuitos que são criados por cada um dos aspectos citados. Serão traduzidos por
palavras do cotidiano dos trabalhadores aqui incorporadas.
136
3.3.1 Se virar: entre a subordinação e a autonomia
A nossa primeira proposta de entendimento tenta dar conta do “se virar”, que está
relacionado ao próprio exercício do trabalho realizado no cotidiano, onde destacaremos a
relação dialética que se estabelece entre a subordinação e a autonomia do trabalhador.
De acordo com Martinez (2010) a subordinação é inerente à relação de emprego
típica e decorre de um modelo de organização que posicionou o trabalhador como parte da
engrenagem do sistema produtivo. O trabalho é um gênero que contém o emprego, onde o
emprego será sempre uma forma de trabalho, mas o trabalho nem sempre implicará no emprego.
Nesse sentido, Gomes e Gottschalk (2008) colocam que o termo empregado deve ser utilizado
para quem trabalha em virtude de um contrato de trabalho.
Para Bulgueroni (2011) o trabalho representa toda a atividade desempenhada por
um indivíduo com vistas a sua promoção financeira e social. Através do trabalho, é possível
sentir-se inserido em uma classe simplesmente por conta do exercício da atividade e não
necessariamente porque se é tutelado pelo direito do trabalho. Porém, para aplicação do direito
do trabalho é fundamental que exista a subordinação.
No dicionário Michaelis (2008), temos que subordinação é “o ato ou efeito de
subordinar ou subordinar-se”, “ordem estabelecida entre pessoas dependentes entre si, tendo
umas o direito de mandar, e as outras a obrigação de obedecer, mas dentro da lei e da moral”.
É também a “dependência acompanhada do reconhecimento da superioridade de uns em relação
aos outros”, “obediência à lei, aos superiores, à disciplina, à ordem pública” e, por fim,
“dependência ou conexão direta das coisas entre si”.
Segundo Martinez (2010), no trabalho, a subordinação se evidencia quando o
tomador de serviço define o tempo e o modo de execução do que foi contratado. Isso significa
que o tomador de serviço pode determinar tanto o horário de início, de fim e de intervalo da
atividade, quanto a maneira como ela será operacionalizada. Na subordinação, o tomador de
serviços assume a condição de pós pagador, que primeiro recebe o serviço e depois paga por
ele. Tais fatores evidenciam que a subordinação é contrária à autonomia a qual, por sua vez,
indica uma situação na qual o próprio trabalhador estabelece as regras para oferecer o seu
serviço. Podemos compreender então que a subordinação limita à autonomia do prestador do
serviço.
137
A autonomia é uma característica do trabalho por conta própria e sobre o
trabalhador autônomo não incidem proteções e direitos trabalhistas, como é o caso do
trabalhador de rua, cuja atividade não possui proteção jurídica no âmbito do direito do trabalho.
Entretanto, a sua autonomia pode ser questionada, pois ele realiza seu trabalho não
necessariamente de forma independente, uma vez que se submete a diversos tipos de
subordinação. Relembrando-nos do que dissera Milton Santos sobre o circuito inferior da
economia, o trabalho realizado na rua não pode ser considerado como independente, pois ele
compõe as microcadeias de comercialização que permitem à circulação de mercadorias para o
capital. Durães (2013), de forma semelhante, comenta também sobre o que considera como
sendo o “trabalhador gratuito”, que é aquele que promove a realização final da mercadoria da
compra à venda, arcando com os custos de distribuição, armazenamento, troca e consumo.
Essas etapas que são bancadas pelo trabalhador de rua são, portanto, gratuitas para o grande
capital industrial, para quem a atividade é importante por manter o fluxo de escoamento das
mercadorias produzidas pelo seu sistema também no circuito inferior.
Como vimos anteriormente, sobre o lugar no qual a atividade do trabalhador de rua
é observada incidem ações de planejamento do poder público, onde os diversos projetos que
estudamos tentam dar conta justamente da organização da atividade no espaço ocupado por
esses trabalhadores. Estas ações não se limitam apenas ao planejamento urbano, mas à
regulação da atividade de acordo com aquilo que também é interessante para o município. Se
por um lado é socialmente inviável a proibição ou exclusão total da atividade nas ruas, por outro
numa cidade com vocação voltada para os serviços é importante também não limitar as
possibilidades de circulação de mercadorias. Nesse sentido, podemos analisar o caso da
intervenção mais recentemente ocorrida na cidade, onde, além do ordenamento proposto pelos
projetos e da adequação urbanística concebida, há também outras determinações que
subordinam a realização da atividade do trabalhador de rua ao poder público.
Vimos também que os projetos conforme têm sido concebidos e aplicados nem
sempre conseguem dar conta de todas as dimensões para as quais o vivido se expande,
sobretudo quando não levam em consideração alguns aspectos como os presentes nas categorias
de análise que elegemos neste trabalho. É importante ressaltar que essas categorias não são
engessadas, nem necessariamente se constituem como a melhor opção de análise, pois outras
formas de estudo também são possíveis. O método que encontramos é apenas uma forma de
leitura dentre tantas outras possíveis. No âmbito do projeto atual, por exemplo, as
determinações que se dão, além do lugar, também ocorrem na definição dos horários e nas
138
características do espaço onde a atividade pode ser desenvolvida. Podemos notar, portanto, que
a relação estabelecida se dá mais no nível da subordinação da atividade a determinações pré-
estabelecidas pelo planejamento, mas que não conseguem conter situações de autonomia. Este
e demais aspectos que caracterizam a subordinação da atividade é o que propõe-se tratar daqui
em diante, tendo como pressuposto os dados coletados em campo com a aplicação dos
questionários e realização das entrevistas.
Antes de começarmos a apresentar os dados, no entanto, é preciso ter em vista que
diversos níveis de subordinação e autonomia podem ser observados, tanto na relação do que a
prefeitura determina sobre a atividade, quanto, por exemplo, na obtenção de recursos para
iniciar ou mantê-la. Para organizar melhor nossa leitura sobre as informações, propomos
agrupá-las nos seguintes níveis de subordinação e autonomia: a) com relação ao que determina
o planejamento urbano; b) com relação à posição na ocupação (acordos, contratações e
subcontratações); c) com relação ao acesso às mercadorias; e d) com relação à obtenção de
recursos para iniciar ou manter a atividade;
a) Com relação ao que determina o planejamento urbano
Nas narrativas mencionadas anteriormente, nas quais contamos um pouco das
histórias de alguns trabalhadores de rua, podemos identificar alguns elementos de subordinação
quando os trabalhadores, por exemplo, submetem-se a mudanças de ponto, independentemente
de sua vontade e mesmo para locais onde as vendas são fracas, para não terem a mercadoria
apreendida pelo rapa. Em contraponto, verificamos também alguns casos de autonomia como
o de dona Valdenice, que vale-se do produto diferenciado que apenas ela comercializa para
estabelecer os dias e horários em que trabalha. A respeito do novo ordenamento, grande parte
dos dez trabalhadores que foram entrevistados com o questionário de aprofundamento,
disseram não ter tido tempo de avisar aos clientes sobre a mudança de ponto, onde agora
vendem muito menos. Consideram de maneira geral o ordenamento positivo porque lhes parece
necessário liberar a calçada para o pedestre, porém, ressentem-se da queda nas vendas, sobre o
que pondera seu Antônio: “cliente não vai atrás de camelô. Só compra quando passa e vê algo.
Você quer comprar um coador, você esquece que precisa. Mas quando passa e vê, você
compra”. Porém, além de ser necessário ocupar os locais determinados pela prefeitura, os
trabalhadores informaram que pagam também uma taxa para obter a licença e explorar o
139
logradouro público. 73% dos entrevistados possuem licença e aproximadamente 25% não a
possuem. Os outros 2% dos entrevistados não quiseram responder a essa questão.
Perguntamos ainda o motivo pelo qual o ponto é na rua onde eles estão e 43% deles
respondeu que estão nos locais onde trabalham atualmente porque houve uma determinação da
prefeitura, ou seja, não estão nos locais em que optariam por estar. Temos aqui uma aparente
contradição, pois anteriormente havíamos mencionado que 73% dos trabalhadores de rua
disseram possuir licença da prefeitura. Porém, é preciso ter em vista que parte dos trabalhadores
entrevistados já tinha seu ponto nas transversais agora adensadas pela prefeitura e outros, como
os que atuavam na Avenida Sete de Setembro, precisaram ser realocados. Com isso, deixamos
claro que embora 73% dos trabalhadores tenha informado que é licenciado, não
necessariamente responderam estar no local em que estão porque foi determinado pela
prefeitura, pois em momentos anteriores a esse ordenamento teria sido possível escolher entre
os locais disponíveis.
Prosseguindo com a leitura dos dados no que se refere à relação com o que
determina o poder público, temos que aproximadamente 31% dos trabalhadores disseram ter
escolhido o lugar por causa do movimento, localização, por escolha própria por considerar o
lugar como bom e por tradição familiar. Essa possibilidade provavelmente se deu pelo fato de
terem se instalado nos pontos há mais tempo ou pelos lugares escolhidos não serem muito
concorridos (Gráfico 10). Cabe ressaltar que nesta questão foi dada a possibilidade aos
trabalhadores de indicar mais de uma resposta.
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Gráfico 10: Caracterização da Atividade – Por que o seu ponto é nessa rua?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
43,3%
14,9%9,7% 9,0% 7,3%
4,2% 3,1% 2,8% 2,4% 1,7% 1,4% 0,3%0,0%
20,0%
40,0%
60,0%
Determinado pela prefeitura / foi transferido / onde trabalhava está em reformaPor causa do movimento / localizaçãoFoi o único local disponívelTradição familiarEscolha propria / acha o local bom / pediu para ser transferido para cáPorque tem amigos no localNSOutroRecebeu o ponto de outra pessoaTem proteção contra sol e chuva / faz menos calorAcha que o lugar é mais tranquilo / tem menos concorrencia / os outros locais estavam cheiosFoi autorizado pelo dono do estabelecimento
140
A seguir, no Gráfico 11, podemos notar que aproximadamente 35% das pessoas
entrevistadas trabalham neste ramo entre 5 e 15 anos, o que corresponde exatamente ao mesmo
número de pessoas que disse trabalhar entre 5 e 15 anos na mesma rua. É possível verificar
também que 27% dos trabalhadores com quem conversamos mudou seu ponto para uma rua
nova no período de até 1 ano, o que corresponde ao momento em que a ação do novo
ordenamento ocorreu, e isto indica que o tempo de exercício no lugar, embora crie uma relação
de pertencimento, não significa necessariamente uma estabilidade na localização. Por isso
acreditamos que percentual encontrado provavelmente aumentará se realizarmos a mesma
pesquisa no final das obras da prefeitura, quando outros trabalhadores terão sido deslocados
para os novos pontos. Cabe ainda comentar que 80,8% das pessoas entrevistadas trabalham de
segunda à sábado, 60,5% chega para trabalhar entre 8h e 10h da manhã e 65,8% encerram a
jornada diária entre 17h e 19h. Aproximadamente 11% dos trabalhadores informaram começar
sua jornada antes das 7h da manhã e 7% a encerra após às 20h. Muitos trabalhadores
informaram durante as entrevistas que há uma recomendação da prefeitura para encerrar as
atividades entre 19h e 20h, no máximo.
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Gráfico 11: Caracterização da Atividade – Tempo em que exerce a atividade / tempo que
trabalha na mesma rua
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
10%
4,5%
9,7%
22,1%
12,8%14,2%
17%
6,9%
1,4% 1% 0,3%
27%
4,5%
14,5%
22,5%
12,5%
9%
6,9%
2,1%
0,3% 0,7%0%
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
até 1 ano entre 1 e2 anos
entre 2 e5 anos
entre 5 e10 anos
entre 1 0e 15 anos
entre 15e 20 anos
entre 20e 30 anos
entre 30e 40 anos
entre 40e 50 anos
mais de50 anos
NR
Tempo que exerce a atividade Tempo que trabalha na mesma rua
141
Os dados apresentados nos revelam que as determinações do poder público
tensionam a relação entre a autonomia e a subordinação principalmente no que se refere a
localização dos pontos de trabalho, porém essa conexão também se estabelece em outros níveis.
Seguiremos então analisando como se dá essa relação no que se refere à posição dos
trabalhadores em sua ocupação, ou seja, buscando entender se eles são realmente donos de seu
próprio negócio, quais os tipos de acordos, contratações e subcontratações que são mais
frequentes entre eles.
b) Com relação à posição na ocupação (acordos, contratações e subcontratações)
No trabalho de rua há a criação de arranjos e mecanismos de organização próprios.
Forma-se uma cadeia em que a informalidade se reproduz dentro informalidade, ainda que
inspirada nas relações formais, dando espaço para o surgimento de acordos informais de
subordinação. Assim, pode-se verificar que nem todos os pontos de trabalho pertencem aos
trabalhadores entrevistados, pois 53 deles (18,3%) trabalham para outras pessoas. Quando
questionados sobre a relação que têm com este outro indivíduo, 56% desses 53 trabalhadores
respondeu que o patrão é algum familiar ou amigo e 34% são contratados por alguém com quem
não possuem vínculos de amizade ou parentesco. É importante salientar que, embora algumas
pessoas tenham respondido que trabalham para alguém da família, isto não necessariamente
significa que são empregados, com obrigações de pagar aluguel pelo ponto, por exemplo. Em
muitos desses casos, os parentes ou amigos cedem o ponto para que outro trabalhador possa
ocupá-lo por um determinado tempo, sem que isso gere um custo ou uma relação “trabalhista”
entre as partes. Destacamos ainda os casos em que um mesmo trabalhador entrevistado possui
mais de um ponto, o que correspondeu a aproximadamente 5% da nossa amostra.
Com relação aos diferentes arranjos possíveis na realização da atividade do
trabalhador de rua, é preciso considerar ainda as relações que estabelecem para o
armazenamento das mercadorias. Os depósitos são uma estrutura bancada pelo próprio
trabalhador para armazenar sua mercadoria no final do dia. Verificamos durante a aplicação dos
questionários que há praticamente um ou dois depósitos na proximidade de cada uma das
transversais ordenadas recentemente pela prefeitura, ao longo da Avenida Sete e do bairro Dois
de Julho, e que 85,5% dos trabalhadores entrevistados guardam sua mercadoria nesses locais.
Optamos por não mostrar exatamente onde eles se localizam em respeito aos trabalhadores que
142
responderam os questionários com receio de revelar esses lugares. É importante notar, contudo,
que os depósitos são geralmente antigas casas utilizadas inteira ou parcialmente para este fim.
Conforme Bouças (2012) este fato revela novas funções sendo assumidas pelas antigas formas
do Centro, resultantes de uma demanda que confere um novo uso a imóveis aparentemente
abandonados, e que possivelmente tem implicações sobre o valor dos seus aluguéis. É possível
supor que os donos desses antigos imóveis preferem alugá-los como depósitos ao invés de para
moradia, pois existe aí um mercado que gera um rendimento considerável. 59,9% dos
trabalhadores entrevistados realiza apenas duas viagens para o depósito durante o dia, uma para
retirar sua mercadoria e outra para guardá-la. Entretanto, nem sempre é o próprio trabalhador
quem realiza essas viagens. Existem carregadores contratados pelos donos dos depósitos que
colocam e retiram as grandes caixas onde a mercadoria é armazenada dos pontos de trabalho.
80% destes depósitos são coletivos, ou seja, armazenam juntas as mercadorias de diversos
trabalhadores, e apenas 12,8% deles é de uso individual. Há ainda trabalhadores que alugam
quartinhos no centro para ter, além de um depósito privativo, um local de apoio e descanso,
onde é possível alimentar-se e ir ao banheiro, por exemplo.
Destaca-se, por fim, conforme nota-se no Gráfico 12, que 50% dos entrevistados
paga entre R$20 e R$60 aos depósitos por semana. Se hipoteticamente considerarmos que 10
trabalhadores utilizam um mesmo depósito para guardar suas mercadorias e pagam R$40 por
semana, o dono do depósito recebe por mês R$1.600,00 com este tipo de aluguel. Pontuamos
ainda que os 3% dos entrevistados que disseram não saber quanto custa o aluguel do depósito,
são pessoas contratadas e que provavelmente não tem muita relação com o dono do ponto.
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Gráfico 12: Caracterização da Mercadoria – Se paga aluguel no depósito, quanto custa?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
9%
7%
17%
32%
18%
3% 2% 3%5%
3%
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35% Guarda de graça
Guarda em casa
até R$20 por semana
entre R$20 e R$40 por semana
entre R$40 e R$60 por semana
entre R$60 e R$80 por semana
entre R$80 e R$100 por semana
mais de R$120 por semana
Não respondeu
Não sabe
143
Podemos constatar através dos dados apresentados que, no que se refere às
mercadorias, existe um nível de subordinação na relação dos trabalhadores com relação à uma
estrutura de suporte essencial para a atividade, que são os depósitos. A carência desse
equipamento favorece a criação de arranjos informais que surgem para suprir essa que é uma
necessidade básica para o funcionamento da atividade. A saída para aqueles trabalhadores que
tentam ter mais autonomia sobre seu trabalho acontece quando eles conseguem, por exemplo,
guardar sua mercadoria com amigos, parentes ou mesmo com lojistas. Porém, a relação dialética
entre a subordinação e a autonomia não se limita a questão do armazenamento, ela está também
presente na forma como as mesmas são adquiridas pelos trabalhadores.
c) Com relação ao acesso às mercadorias
Antes de avançarmos sobre a questão da subordinação e autonomia com relação à
acesso às mercadorias, consideramos importante informar aqui quais os tipos de mercadoria
mais frequentemente encontradas na nossa área de estudo. Na Tabela 8 podemos verificar que
os produtos mais frequentemente comercializados, considerando nossa amostra, são as
confecções e os adereços que somam 27,5% das mercadorias encontradas durante a aplicação
dos questionários. Cabe ressaltar que existe uma grande variação no tipo de mercadoria
comercializada, que corresponde à demanda de cada época do ano. Assim é possível encontrar
adereços de carnaval no período próximo a essa festa, cadernos escolares em período de retorno
às aulas, brinquedos quando se aproxima o dia das crianças, e assim por diante. Embora esta
questão em princípio não indique uma subordinação em si, consideramos que este é o local
mais adequado para sua exibição. Além disso, ela serve como subsídio para compreendermos
a relação de subordinação existente na aquisição, armazenamento e distribuição das
mercadorias. Chamamos atenção para o fato de, nesta questão, o número total de respostas ter
excedido o número de questionários aplicados, pois há trabalhadores que comercializam mais
de um tipo de mercadoria.
144
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Tabela 8: Caracterização da Atividade – Quais produtos comercializa?
Quais produtos comercializa? Nº de respostas %
Confecções 45 13,9%
Adereços (cintos; meias; toucas; chapéus; óculos e bijuteria) 44 13,6%
Frutas; verduras; temperos 25 7,7%
Eletrônicos (celular; antenas; cabos; etc.) 25 7,7%
Bolsas; carteiras; sacolas; mochilas 24 7,4%
Alimentos preparados (acarajé; sanduíches; pipoca;etc.) 22 6,8%
Relógios 19 5,9%
Acessórios e serviços para celular 16 5,0%
Variedades (adesivos; fotos; pega-rato; etc.) 12 3,7%
Água de coco; água; refrigerante 12 3,7%
Sandálias 11 3,4%
Brinquedos 11 3,4%
CD/DVD 10 3,1%
Produtos p/ o lar (peças e fogão; liquidificador; cantoneiras de
vidro; tolhas de mesa; almofada etc.)
9 2,8%
Bomboniere; cigarros 7 2,2%
Cosméticos; cabelo; maquiagem; perfumes 6 1,9%
Outros 5 1,5%
Importados 5 1,5%
Artesanato 5 1,5%
Plantas medicinais 4 1,2%
Serviços de afiações; engraxante 3 0,9%
Material de escritório; escolar 3 0,9%
TOTAL 323 100% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
Relacionado ainda ao circuito de subordinação está a forma como essas mercadorias
chegam até os trabalhadores de rua. As mercadorias são mais frequentemente adquiridas com
distribuidores no atacado, em aproximadamente 44% dos casos. Como pode-se ler no Gráfico
13, 24% dos entrevistados adquirem sua mercadoria no varejo, em muitos casos no próprio
centro da cidade nas lojas dos chineses e coreanos. Há ainda 18% dos trabalhadores que
informaram realizar viagens para adquirir as mercadorias em outros municípios dentro e fora
do estado e 3,7% que fabrica a própria mercadoria. Cabe destacar que existe um tipo de
fornecedor chamado de “atravessador” de mercadorias, que compõe a cadeia de intermediários
entre a produção e distribuição dos produtos. O atravessador é responsável por 8,1% do
fornecimento de mercadorias no centro da cidade e leva os produtos diretamente para a rua
onde o trabalhador está.
145
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Gráfico 13: Caracterização da Atividade – Com quem você compra os produtos que
comercializa?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
Em seguida, na Tabela 9, verifica-se que 64,2% das mercadorias adquiridas tanto
com atravessador, no atacado ou no varejo, é distribuída para os trabalhadores de rua na própria
cidade de Salvador, onde 15,8% destas pode ser comprada no próprio centro da cidade. Se
somarmos esses percentuais ao daquele correspondente as mercadorias que procedem do
interior do estado, temos que 80% das mercadorias que circulam nas ruas da Avenida Sete de
Setembro e bairro Dois de Julho são aquelas que chegam e são distribuídas no próprio estado
da Bahia. Ressalta-se ainda, no que se refere às mercadorias, que 32,6% dos trabalhadores
renova seu estoque diariamente e 37,5% o faz semanalmente ou quinzenalmente. Isto demonstra
como para esse comerciante é difícil fazer estoques, pois trabalha-se no circuito inferior com a
necessidade do dinheiro líquido, utilizando os termos do professor Milton Santos. É preciso
então vender na medida que há procura, e assim reduzir os riscos de prejuízos no final do dia,
o que significa um grau bastante importante de subordinação. Nesta questão também foi
possível que o trabalhador desse mais de uma resposta.
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Tabela 9: Caracterização da Atividade – Onde você compra os produtos que comercializa? Onde você compra os produtos que
comercializa?
Nº de
respostas
%
Salvador (BA) 169 48,4%
No próprio centro de Salvador (BA) 55 15,8%
Interior da Bahia (BA) 55 15,8%
São Paulo (SP) 35 10,0%
Ceará (CE) 9 2,6%
Sergipe (SE) 9 2,6%
Pernambuco (PE) 4 1,1%
Não Sabe 4 1,1%
Paraguai 3 0,9%
43,8%
24,4%18,0%
8,1%3,7% 1,7% 0,3%
0,0%
20,0%
40,0%
60,0% Com distribuidor (atacado)
Varejo
Faz viagens
Alguém leva no local (atravessador)
Fabricação própria
Não sabe
Não respondeu
146
Não respondeu 3 0,9%
Paraíba (PB) 1 0,3%
Santa Catarina (SC) 1 0,3%
Internet 1 0,3%
TOTAL 349 100%
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
Pelo exposto podemos notar que a aquisição de mercadorias movimenta outros
níveis na relação entre a subordinação e a autonomia dos trabalhadores. A subordinação, por
exemplo, se evidencia na aquisição de mercadorias com os atravessadores, que levam produtos
pré-determinados ou com a promessa de que serão mais facilmente vendidos para mostrar aos
trabalhadores, reduzindo suas possibilidades de escolha num mercado mais amplo. Já a
autonomia é verificada quando os próprios trabalhadores realizam viagens e escolhem os
produtos que irão comercializar pessoalmente ou quando eles mesmos os fabricam
artesanalmente. Além disso, essa relação entre autonomia e subordinação se evidencia na forma
como eles obtém o recurso inicial para adquirir tais produtos, sobre o que nos debruçaremos a
seguir.
d) Com relação à obtenção de recursos para iniciar ou manter a atividade
A relação entre a subordinação e a autonomia pode ser verificada também através
do tipo de investimento que foi necessário fazer para começar o negócio. No Gráfico 14
verificamos que 57% das pessoas entrevistadas informaram que utilizaram recursos de sua
própria poupança ou não precisaram de recursos para iniciar a atividade como trabalhador de
rua. Não ter precisado de recurso significa que o trabalhador começou vendendo alguma
mercadoria produzida por ele mesmo ou que foi comprada com baixo investimento e, a partir
dela, foi possível juntar dinheiro para aumentar o negócio. Destaca-se ainda que 12% dos
entrevistados adquiriu empréstimo com algum familiar e que outros 12% obtiveram recursos
através de empréstimo bancário ou do microcrédito produtivo. Dentre os 11% que responderam
ter utilizado outros recursos para começar o negócio destaca-se o fato de terem mencionado
recorrer à agiotagem para abrir sua guia. Durante a aplicação dos questionários, por exemplo,
Marinalva, que não conseguimos mais encontrar para conversar com mais profundidade após
uma primeira conversa, informou ter pego um empréstimo de R$400 para abrir sua guia,
147
pagando 24 parcelas de R$20 por dia, o que resultará no final do pagamento em R$80 de lucro
para o agiota.
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Gráfico 14: Caracterização da Atividade – Que tipo de investimento fez para começar no
ramo?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
Ainda relacionado ao dinheiro líquido, tentamos nos aproximar do conhecimento
sobre os rendimentos dos trabalhadores com quem conversamos. Houve uma dificuldade
grande para obter informações sobre esses valores, o que supreendentemente não parece ter
sido causado particularmente pela desconfiança com relação a esta questão, mas de realmente
essas pessoas não terem dimensões exatas do quanto lucram por dia. Nos relatos contidos na
narrativa, podemos perceber que poucos trabalhadores têm um controle mais formal sobre seus
rendimentos. Apenas um deles, por exemplo, mencionou contar com serviço de contador. Os
demais ou anotam essas informações em cadernos ou não fazem nenhum tipo de controle
contábil. Assim, perguntamos no questionário básico quanto esses trabalhadores conseguem
obter em termos de vendagem, considerando a diferença entre os valores de um dia bom e um
dia ruim. Podemos observar na Tabela 10, através dos dados obtidos que, no dia bom, 28,7%
dos trabalhadores consegue tirar entre R$51,00 e R$100,00 de vendagem. Os que conseguem
vender mais de R$300 num dia bom somam 16,3% dos entrevistados. Já com relação ao dia
ruim, temos o dado de que 43,6% dos trabalhadores conseguem obter até R$30,00 de vendagem.
A hora de trabalho atual custa R$26,26, considerando o salário mínimo de R$ 788,00 e uma
jornada de 8h de trabalho diárias. Inicialmente podemos pensar que até mesmo os valores
obtidos no dia ruim estão dentro do ganho de um trabalhador formal que recebe um salário
mínimo, porém é preciso considerar que o valor mencionado não é líquido, ou seja, não é lucro
livre para o trabalhador, pois aí não estão embutido os custos da produção, nem os custos fixos
com a reposição da mercadoria, aluguel de depósito, o pagamento ao carregador que transporta
36%
21%
12% 11% 10%6%
3% 2%
0%
10%
20%
30%
40% Poupança própria
Não precisou de recursos
Empréstimo com familiar
Outro
Empréstimo bancário
Não sabe
Indenização
Microcrédito produtivo
148
a mercadoria, a taxa para a prefeitura e até mesmo seu deslocamento até o local de trabalho.
Além disso, quando dizemos até R$30,00, significa que há pessoas que não vendem nada nos
dias ruins. É preciso descontar da média entre o dia bom e o ruim tudo aquilo que é necessário
para subsistência do trabalhador e de seu negócio, ou seja, aquilo que ele gasta para se deslocar
ida e volta até e do local de trabalho; o que ele gasta para alimentar-se e beber água; o que gasta
para adquirir os produtos a vender e a estrutura de suporte; e o que gasta para guardar a
mercadoria.
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Tabela 10: Caracterização da Atividade – Quanto você consegue tirar num dia bom / ruim?
Quanto consegue vender num dia bom? Quanto consegue vender num dia ruim?
Nº de
respostas
% Nº de
respostas
%
Não respondeu 31 10,7% Não respondeu 31 10,7%
entre R$10 e R$30 9 3,1% até R$10 80 27,7%
entre R$31 e R$50 19 6,6% entre R$11 e R$30 46 15,9%
entre R$51 e R$100 83 28,7% entre R$31 e R$50 41 14,2%
entre R$101 e R$150 23 8,0% entre R$51 e R$100 50 17,3%
entre R$151 e R$200 46 15,9% entre R$101 e R$150 15 5,2%
entre R$201 e R$300 31 10,7% entre R$151 e R$200 10 3,5%
entre R$301 e R$500 21 7,3% entre R$201 e R$300 11 3,8%
entre R$500 e R$1.000 21 7,3% entre R$301 e R$500 5 1,7%
mais de R$1.000 5 1,7% - - -
TOTAL 289 100,0% TOTAL 289 100,0%
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
Nas situações apresentadas vemos mais uma vez a relação dialética entre a
subordinação e a autonomia no trabalho de rua. O fato de iniciar a atividade através de seus
próprios recursos ou poupança própria revela um grau de autonomia com relação ao seu
trabalho, enquanto a necessidade de obter empréstimos com agências bancárias ou agiotas
revelam sua subordinação. Nesse sentido, é importante chamarmos atenção para o papel do
SEBRAE na disseminação de informações para a obtenção de crédito facilitado, sobretudo a
partir de 2009 com a criação do Microempreendedor Individual (MEI), que são aqueles
empreendedores que trabalham por conta própria, sem ter participação em outra empresa,
149
empregando apenas uma pessoa e recebendo um salário mínimo ou o piso de uma categoria. Os
trabalhadores que se tornam microempreendedores individuais são considerados formalizados
e podem se inscrever no INSS pagando taxas mais baixas que as vigentes, e dessa forma, passam
a acessar aos benefícios da Previdência. Contudo, a forma como os trabalhadores realizam o
controle contábil de suas mercadorias revela que poucos conseguem organizar suas finanças, o
que fragiliza a possibilidade do seu negócio crescer e prosperar.
De maneira geral, podemos considerar que os dados apresentados nesta proposta de
entendimento do “se virar” revelam o conjunto de redes e articulações que são movimentadas
no centro da cidade a partir da atividade do trabalho de rua, isto quando nos detemos apenas
aos aspectos relacionados à sua subordinação e autonomia, seja ao grande capital industrial,
seja às determinações do poder público. Continuando nosso objetivo de desvendar a relação
desta atividade com o espaço, seguiremos agora direcionando o nosso olhar para os conflitos
que se dão na relação entre os próprios trabalhadores de rua, entre eles e os lojistas, os
transeuntes, o poder público e suas entidades de representação. Nos deteremos então a essas
questões na apresentação do próximo eixo de análise da atividade.
3.3.2 A correria e o rapa: conflitos e disputas
A relação entre o trabalho de rua e o espaço público gera tensionamentos entre
interesses contraditórios se pensarmos apenas no antagonismo existente entre o ato de liberar
os passeios para os pedestres e o de permitir a livre comercialização de mercadorias neste
mesmo lugar. Vemos, de um lado, um ente que possui o poder de decisão e determinação sobre
a atividade, e de outro, aqueles que se submetem às determinações daqueles, numa relação
predominantemente em que uns mandam e aos outros cabe obedecer, sendo observados poucos
casos onde são tentados acordos comuns entre as partes, se tivermos como referência as
intervenções propostas para a atividade apresentadas no capítulo anterior, por exemplo. Essa
subordinação de uns com relação aos outros, como podemos supor, nem sempre se dá de forma
pacífica. Frequentemente podemos associar os conflitos e disputas que aí emergem ao rapa,
termo usado pelos trabalhadores para se referir aos fiscais da prefeitura que podem apreender
suas mercadorias, sobretudo daqueles que não são licenciados. Contudo, as situações
evidenciadas neste eixo não serão referentes apenas às ações do poder público, mas as relações
de embate e tensionamento que se revelam também em outas situações exploradas a seguir.
150
Olhando um pouco mais para o passado, sobretudo com a apresentação do papel
das entidades de representação dos interesses dos trabalhadores de rua que tivemos, foi possível
verificar que houve um momento crítico no período de 1997 à 2004, onde parecem ter ocorrido
casos de violência contra o segmento. As propostas de intervenção daquela época parecem não
ter sido bem aceitas nem pelas entidades, nem pelos próprios trabalhadores, porém foram
impostas sem muito diálogo. Segundo os relatos que obtivemos, o confronto com o rapa naquele
período era bastante frequente, assim como a presença policial nas ruas no sentido de coibi-los.
Sobre este aspecto, podemos nos remeter também às narrativas anteriormente apresentadas,
onde verificamos alguns exemplos dos conflitos ocorridos naquele período, como é o caso de
Seu Raimundo que teve suas mercadorias jogadas na rua e que só não perdeu tudo por conhecer
alguém influente.
Ao realizarmos as entrevistas do questionário de aprofundamento perguntamos aos
trabalhadores sobre os momentos críticos que já vivenciaram e sobre o que eles pensam que
está acontecendo hoje com relação às novas propostas de ordenamento. As respostas dos
trabalhadores não revelam um consenso na aceitação das propostas, evidenciando, inclusive,
dificuldades no entendimento das propostas pela linguagem que a prefeitura utiliza. Há, entre
os trabalhadores, aqueles que acreditam que haverá benefícios reais com o novo projeto e
aqueles que não as vêem como algo bom para ninguém. Alguns citaram que já existem
problemas com o que foi implantado, como o calor que foi intensificado pela cobertura em
policarbonato, apesar de agora terem alguma proteção contra a chuva (Figuras 23 e 24). Esta
proteção, contudo, não é total, devido a ausência de calhas nas laterais dos telhados, o que é
resolvido com diversos tipos de improvisos pelos trabalhadores.
Figura 23: Improvisos para proteger-se da chuva
e do sol na Rua da Forca
Fonte: Foto da autora, 2014.
Figura 24: Improvisos para proteger-se da chuva e do sol
na Rua Coqueiros da Piedade
Fonte: Foto da autora, 2014.
151
É importante salientar que, apesar de termos visto na seção anterior que 73% dos
trabalhadores de rua possuem licença, isso não significa que não estejam submetidos à ação do
rapa. Isto ocorre porque a licença, além de ser para o ponto, é também para o tipo de mercadoria
que é comercializada. A mercadoria, por sua vez, também como vimos, sofre uma variação
sazonal na medida em que os interesses pelos produtos variam no tempo. Assim, por vezes
determinados produtos considerados ilegais podem se tornar populares num determinado
período do ano e os trabalhadores os adquirem para aumentar suas vendas, ficando desta forma
também sujeitos à ação do rapa. Além disso, pudemos sentir durante a aplicação dos
questionários uma forte resistência ao ordenamento da Prefeitura pelo fato de nos pontos
propostos pelo planejamento as vendas serem mais fracas. Isto faz com que muitos
trabalhadores, embora licenciados para pontos nas transversais, desloquem-se para seus locais
de origem, localizados principalmente na Avenida Sete de Setembro, onde também podem ter
sua mercadoria apreendida.
Os motivos apontados pelos trabalhadores para os casos de ter ou não ter a licença,
por sua vez, revelam um pouco das tensões que existem hoje e estão presentes nos Gráficos 15
e 16. 28,6% entre os que possuem licença disseram que a tiraram porque é algo obrigatório,
sem o qual não se pode trabalhar. Motivos como “porque é mais seguro”, “porque pode ficar
em paz, despreocupado”, “para estar legal / ter respeito” e “para não perder mercadoria” somam
28,7% das respostas e deixam evidente a sujeição dos trabalhadores à necessidade da licença,
que é tirada com o intuito de assegurar o seu direito de trabalhar. Entre os que não possuem
licença, verifica-se que 38,9% já deu entrada e possui protocolo, aguarda apenas pela
oficialização de sua autorização ou que ainda não deu, mas deseja dar entrada no pedido de
licença, ou seja, verifica-se que há uma grande pressão para sua formalização. Há ainda 13,9%
que disseram nunca ter conseguido tirar a licença ou pelo tipo de mercadoria que comercializa,
ou pela indisponibilidade do local onde desejam ficar. Os que rejeitam o licenciamento seja
pela falta de interesse, por vender mercadoria não autorizada, porque acham que não adianta
em nada, não querem trabalhar nos becos, não tem tempo de tirar a licença e outros motivos
somam 29,3% das respostas dadas.
152
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Gráfico 15: Caracterização da Mercadoria – Porque tem licença
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Gráfico 16: Caracterização da Mercadoria – Porque não tem licença
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
No âmbito do novo ordenamento, sobre o qual não podemos nos aprofundar por
estar acontecendo concomitantemente com a realização da pesquisa de campo, podemos
evidenciar algumas questões relativas aos conflitos e disputas pelo espaço. Um exemplo é o
caso ocorrido no bairro Dois de Julho em janeiro de 2014, conforme relatado pelo presidente
da Assindivan quando entrevistado, em que ele conta ter havido a retirada de todos os
trabalhadores de rua de seus pontos de trabalho independentemente da posse da licença, o que
foi revertido posteriormente. Neste sentido, podemos destacar também, entre as narrativas
anteriormente apresentadas, o caso de uma trabalhadora que informou se privar de ir ao
28,6%
16,1%
8,8% 8,8% 8,3% 6,9% 6,5% 6,5%3,2% 3,2% 2,3% 0,9%
0,0%
50,0%
Porque precisa ter, é obrigatório / Senão não pode trabalharSem respostaPorque ajuda a organizar / precisa ter controlePorque é mais seguroOutros
36,1%
13,9%
9,7% 8,3%5,6% 5,6% 4,2% 4,2% 2,8% 2,8% 2,8% 2,8% 1,4%
0,0%
20,0%
40,0%
Tem protocolo, deu entrada, está aguardando Nunca conseguiuOutro Sem respostaNão tem interesse Não, senão tem que ficar no becoVende produto que não é licenciado Perdeu a licençaNão, mas tem autorização da loja Falta tempoNão, mas quer ter Não sabeNão, porque acha que não ajuda em nada
153
banheiro por medo de haver uma ação do rapa no momento que deixar sua mercadoria para
alguém olhar, embora tenha protocolo e esteja aguardando sua licença chegar junto com a
reforma do local para onde será relocada. Esses são casos de trabalhadores que teoricamente
terão seus pontos de trabalho preservados com a entrega e completa implantação do novo
projeto. No dia 24.09.2014, ao caminhar pela Avenida Sete, a pesquisadora presenciou uma
ação do rapa nas proximidades do Relógio de São Pedro. Ao tentar saber dos trabalhadores o
que ocorreu, foi relatado que pessoas se recusaram a deixar suas mercadorias serem apreendidas
e apedrejaram o carro da fiscalização e as viaturas da guarda municipal. De acordo com notícia
divulgada no site do G1 Bahia sobre o fato ocorrido neste dia, lideranças das associações
informaram tratar-se de um conflito com pessoas que não possuem licença para trabalhar e que
não fazem parte do reordenamento. Os registros da ação constam nas Figuras 25 e 26 a seguir.
Figura 25: Ação do rapa com presença policial em 24.09.2014
Fonte: Foto da autora, 2014.
154
Figura 26: Ação do rapa com presença policial em 24.09.2014
Fonte: Foto da autora, 2014.
Durante a reforma das transversais que viriam a abrigar os trabalhadores
licenciados, houve várias situações de deslocamento dos mesmos para áreas provisórias, o que
causou alguns transtornos, tanto para o segmento, pois os trabalhadores não tiveram como
informar sua clientela sobre o lugar onde estariam, como para os transeuntes, pois os passeios
ficaram ainda mais obstruídos. Nas Figuras 27 a 32 temos o registro dessas situações, onde
podemos notar o grande volume de pessoas transitando em locais estreitados ou em reforma.
Figura 27: Reforma da rua Portão da Piedade.
Fonte: Foto da autora, 2014.
Figura 28: Reforma da Rua do Cabeça.
Fonte: Foto da autora, 2013.
155
Figura 29: Trabalhadores provisoriamente
deslocados para a Praça da Piedade.
Fonte: Foto da autora, 2013.
Figura 30: Trabalhadores provisoriamente deslocados
para Avenida Joana Angélica.
Fonte: Foto da autora, 2014.
Figura 31: Trabalhadores provisoriamente deslocados
para a lateral do Mosteiro de São Bento.
Fonte: Foto da autora, 2013.
Figura 32: Trabalhadores provisoriamente
deslocados para canteiro central da Av. Joana
Angélica
Fonte: Foto da autora, 2013.
Uma questão que nos interessou também foi o que teria sido feito daqueles que não
conseguiram obter a licença? As lideranças das entidades dos trabalhadores de rua que
entrevistamos informaram que esses companheiros foram encaminhados para a SEMOP, para
que regularizassem sua situação legal junto à prefeitura, o que não significa que poderão
continuar comercializando na região da Avenida Sete e do bairro Dois de Julho. De acordo com
o coordenador de licenciamento e fiscalização da SEMOP, o critério para definir quem
continuaria atuando nas novas áreas destinadas aos trabalhadores de rua na Avenida Sete, os
chamados “becos”, foi estabelecido ao priorizar aqueles que já possuíam a licença nessa área e
tinham mais tempo na atividade. Os trabalhadores que continuaram irregulares, por sua vez,
não podem continuar na referida área, que tem sido fiscalizada todos os dias, das 8h00 às 19h00,
de acordo com a prefeitura. Aqueles que foram contemplados a continuar na região da Avenida
Sete foram deslocados para os becos de acordo com a proximidade destes com relação ao local
156
onde tinham seu ponto na Avenida Sete. No caso do bairro Dois de Julho, todos os trabalhadores
de rua, com exceção do mercado das flores, serão deslocados para o novo mercado na Praça
General Inocêncio Galvão, quando as obras forem concluídas.
O coordenador de licenciamento e fiscalização informou ainda que há uma média
entre 980 e 1.600 trabalhadores na região da Avenida Sete, onde também realizamos nossa
contagem, número que não pode ser precisado devido ao fato de cotidianamente aparecerem
novas pessoas trabalhando nas ruas. O cadastramento atualizado dos trabalhadores de rua que
atuam nessa área, entretanto, está sendo atualizado concomitantemente com a nova ação de
ordenamento, motivo pelo qual não pudemos dispor de informações mais precisas. O principal
problema enfrentado pela prefeitura na questão do trabalhador de rua, segundo o coordenador,
é justamente o excesso de trabalhadores em locais indevidos. Segundo ele, a maioria das
pessoas quer trabalhar nos locais mais centrais e isso dificulta o trabalho da prefeitura, pois não
há como alocar todos no mesmo lugar. Para solucionar a questão está-se pensando em criar
áreas fora do centro para que essas pessoas possam trabalhar. Há propostas de deslocar
trabalhadores para locais como: Iguatemi, Calçada, parte baixa do Bonfim e Comércio, nas
proximidades do porto que está sendo reformado.
Buscamos saber ainda o entendimento dos próprios trabalhadores entrevistados
com relação aos que ficaram de fora do projeto de ordenamento. Alguns informaram que
aqueles que não receberam licença não são de Salvador, “não são camelô”, segundo a fala de
uma das entrevistadas, o que nos revela um conflito interno da classe e uma disputa pelo lugar,
onde aqueles que são da cidade reivindicam o seu direito de permanência baseado em sua
naturalidade e não na sua condição de pertencimento a uma mesma classe. Em contraponto há
também aqueles que acreditam que todos devem poder trabalhar, já que não há espaço no
mercado formal para todos, desde que não lidem com mercadorias ilegais. Nesse sentido
podemos destacar a fala de um dos trabalhadores entrevistados: “um homem trabalhando não é
problema, é solução porque ele consegue dar educação pros filhos, saúde e uma habitação
melhor”. Uma outra trabalhadora também coloca que quem optou por ficar na “correria”, ou
seja, submetendo-se ao risco de ter a mercadoria apreendida pelo rapa, não tira a licença porque
não adianta ficar legal e não ter lucro. Ela, que está numa nova área ordenada, relata que uma
colega desistiu do ponto porque “aqui não vendia nada. Tem pessoas que moram de aluguel,
que tem conta pra pagar. Não dá pra ficar parado”. Tais relatos trazem à tona os conflitos entre
a atividade e o uso do espaço público. Nas Figuras 33 e 34 podemos notar a permanência do
exercício da atividade em diversos trechos da Avenida Sete de Setembro.
157
Figura 33: Trabalhadores que permanecem ao
longo da Avenida Sete. Fonte: Foto da autora, 2014.
Figura 34: Trabalhadores que permanecem ao longo da
Avenida Sete.
Fonte: Foto da autora, 2014.
Como a relação entre o exercício da atividade e o uso do espaço público pelos
transeuntes é percebida por esses trabalhadores? Para tentar responder esta questão
perguntamos aos trabalhadores de rua entrevistados através do questionário de aprofundamento,
o que eles pensavam com relação as seguintes afirmações veiculadas em jornais: “Comércio
desordenado invade calçadas”; “Pedestre é expulso das calçadas em Salvador por todo tipo de
tranqueira” e “Excesso de camelô na Calçada causa acidente e fere idosa”31. Três dos dez
trabalhadores entrevistados responderam que nunca viu pessoas se machucarem por causa da
atividade e acreditam tratar-se de perseguição, pois as notícias pegam casos isolados e destacam
como regra. Por outro lado, sete trabalhadores reconhecem que a situação acontece, mas
discordam quanto a justificativa. Dois deles já viram pessoas caindo e se machucando, porém
um acredita que isso é devido a não haver espaço para andar na calçada, e outro atribui o fato à
própria execução do projeto, onde há diferença entre os níveis do piso assentado. Os cinco
trabalhadores restantes se dividem entre três que acreditam que este tipo de problema é causado
pelo “outro tipo de camelô”, que coloca a mercadoria exposta no chão de qualquer maneira,
sem pensar no pedestre; e dois que acham que há exagero nas notícias, onde é preciso ponderar
no porquê deles estarem realizando esta atividade, para muitos única opção de trabalho possível.
Algumas pessoas nos falaram ainda sobre comerciantes que vêm de outros lugares da cidade
para vender mercadorias utilizando automóveis. Nas Figuras 35 a 38 temos registros de vendas
realizadas em automóveis nos anos de 2012 e 2014, porém não sabemos quem são aqueles
comerciantes. É possível notar nessas respostas que a maioria dos trabalhadores reconhece que
sua atividade interfere diretamente no uso do espaço público, porém os problemas são
31 Matérias publicadas pelo jornal Tribuna da Bahia entre os anos de 2010 e 2013, período antecedente às ações de ordenamento
iniciadas em 2013 pela recém empossada gestão da prefeitura.
158
colocados em outras instâncias, contrapondo os trabalhadores licenciados e antigos contra os
não licenciados, novos e “outros”.
Figura 35: Comercialização de mercadorias
realizada com o uso de automóveis.
Fonte: Foto da autora, 2012.
Figura 36: Comercialização de mercadorias realizada
com o uso de automóveis.
Fonte: Foto da autora, 2014.
Figura 37: Comercialização de mercadorias realizada
com o uso de automóveis.
Fonte: Foto da autora, 2014.
Figura 38: Comercialização de mercadorias
realizada com o uso de automóveis.
Fonte: Foto da autora, 2014.
Podemos associar as questões levantadas com uma pergunta do questionário básico
sobre a relação entre o entrevistado e os outros trabalhadores de rua, onde 95,8% dos
entrevistados disse que esta relação é boa. A contradição que esse percentual de respostas
coloca pode ser desfeita se considerarmos que, para eles, os outros a quem nos referíamos eram
os seus semelhantes, ou seja, aqueles licenciados e antigos e não aquele “outro tipo de camelô”.
Entre aqueles que disseram ter uma relação ruim, foram apontadas como justificativa a falta de
união da classe e a existência de intrigas.
159
Buscamos também evidenciar os conflitos entre os trabalhadores de rua e os lojistas,
questionando os 289 trabalhadores entrevistados sobre esta relação, onde 92% disseram ter uma
relação boa e 4,5% não pode comentar sobre o assunto por trabalhar em locais onde não há
lojas próximas. Assim, apenas 3,5% comentou ter uma relação ruim com os donos das lojas, o
que contradiz uma ideia frequentemente propagada de que há um grande conflito entre o
comércio formal e a atividade dos trabalhadores de rua nas proximidades dos estabelecimentos.
Por fim, no que se refere aos conflitos e disputas, podemos destacar ainda a relação
entre os trabalhadores de rua e suas entidades de representação, em que 85,5% dos entrevistados
disseram não fazer parte de nenhuma associação ou sindicato, contra apenas 14,5% que
disseram estar associado. Desses que disseram estar associados, observa-se no Gráfico 17, que
24,4% não souberam informar qual o nome da associação ou sindicato de que faz parte. 22%
se referiu ao Sindicato de Ambulantes e Feirantes e 14,6% mencionaram a Assindivan e a
Assinformal. O fato de muitos trabalhadores não saberem informar de qual associação fazem
parte pode ter a ver com o fato de muitas das associações terem sido criadas recentemente e
atuarem mais próximas da prefeitura do que efetivamente de sua classe. Assim, os trabalhadores
podem se sentir pertencentes a essas associações, no sentido de tê-las com algum nível de
referência no que se refere à sua competência de representar os direitos comuns da categoria,
mas sem estar verdadeiramente associado ou fazer parte da associação.
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Gráfico 17: Caracterização da Mercadoria – De qual associação/sindicato faz parte?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
24,4%
22,0%
14,6%
12,2%
7,3%
4,9%4,9%
2,4%2,4%2,4%2,4%
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0% Não soube especificar o sindicato ou associaçãode que faz parteSindicato dos ambulantes
Não respondeu
Assindivan
Associação dos vendedores ambulantes
Associação dos moradores do Dois de Julho
Associação dos feirantes
Assinformal
Associação de peixeiros
Asinderp
Movimento populacional dos moradores de rua
160
Entre os motivos para não fazer parte das entidades destaca-se: a falta de interesse
dos trabalhadores, apontada por 12,5% deles; a baixa credibilidade que há no trabalho das
associações mencionadas por 11,3% dos entrevistados; e a falta de conhecimento sobre o
trabalho das associações, apontada por 10,9% dos entrevistados (Gráfico 18). Podemos inferir
que tanto o baixo interesse pelas associações quanto o baixo reconhecimento delas enquanto
representantes dos interesses globais da categoria contribuem para fragilizar os trabalhadores
de rua enquanto classe e provavelmente diminuem seu poder de barganha frente às
determinações do poder público sobre seu trabalho e seus direitos.
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Gráfico 18: Caracterização da Atividade – Se não faz parte de nenhuma associação, qual o
motivo?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
Perguntamos aos trabalhadores quais as suas três principais dificuldades com
relação ao seu trabalho (Tabela 11) e verificamos que sobressai o conflito com o rapa. Surgem
também questões como a precariedade dos recursos para realização do trabalho, desgaste físico
e o sentimento de desvalorização. São apontadas ainda questões sobre a falta ou precariedade
da infraestrutura de suporte à atividade, sobretudo no que se refere a proteção às intempéries e
a inexistência de banheiros públicos. A dificuldade em seu trabalho no que se refere à
organização da produção também é mencionada quando o trabalhador diz que não consegue
25,0%
12,5%11,3%
10,9%10,5%
6,5%5,2%
4,8%3,6%
3,2%2,8%
2,0%1,6%
0,0%
10,0%
20,0%
30,0% Não respondeu
Não se interessa
Acha que as associações são fracas / nãoacredita nas associaçõesNão conhece / não tem associação
Outro
Não sabe o motivo
Ainda não procurou / não foi procurado pornenhuma entidadeNão gosta / não quer
Não vê melhora / utilidade
Não tem tempo
Já faz parte, mas saiu. Não sabe mais comoestáÉ novato / não sabe se continuará na atividade
Não tem dinheiro
161
repor a mercadoria na medida em que ela sai, porque não tem capital para produzir a mercadoria
nos momentos em que tem tempo sobrando para se dedicar ao seu negócio.
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Tabela 11: Questionário de aprofundamento – Quais as três coisas que gosta no trabalho /
quais as três dificuldades / quais os planos para o futuro
Questionário Quais as três dificuldades?
1 Equipamento precário
Ter um depósito/quartinho próprio
Guardam drogas na cobertura da barraca
2 Falta de respeito com o trabalhador
Grande desgaste físico
Falta de apoio dos gestores
3 Não consegue repor à medida que a mercadoria sai quando o movimento está forte
Quando tem tempo sobrando, não tem capital para produzir mercadoria
O ponto não é bom
4 O rapa
-
-
5 Classe desunida
Não há estudos do que precisa melhorar para a categoria, só do que precisa
melhorar para a cidade
Mercadoria é desvalorizada só por estar na rua
6 Relacionamento entre os colegas, mas faz parte. "mora" mais na rua do que em casa.
-
-
7 Sol e chuva
Falta de banheiro
O rapa
8 Chuva
-
-
9 Nenhum problema
-
-
10 Cobertura mal feita
O rapa
-
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de fevereiro e março de 2015.
Se por um lado temos um aspecto que evidencia os conflitos e disputas, onde pesam
as questões contraditórias e os tensionamentos estabelecidos em sua relação com o espaço, com
162
o poder público, com os transeuntes, lojistas ou entre os próprios trabalhadores, por outro há
um oposto que os complementa, ao qual nos deteremos a seguir.
3.3.3 A pedra: circuitos de cooperação, pertencimento e solidariedade
Como o próprio nome indica, neste eixo pretende-se explorar os aspectos mais
subjetivos que compõem a atividade, ou seja, aqueles que estão ligados ao sentimento das
pessoas com relação ao trabalho que desenvolvem, ao lugar onde ele acontece e com aqueles
que com ele estão envolvidos. “A pedra” é um termo que serve para designar a relação de um
trabalhador com o lugar, ou a rua, no qual se estabelece. No caso das entidades que representam
os interesses coletivos dos trabalhadores de rua, por exemplo, se anteriormente tínhamos
chamado a atenção apenas para o seu enfraquecimento, agora podemos também perceber o fato
de, mesmo com sua imagem desgastada, ajudarem-se solidariamente nos processos de
negociação, defendendo os interesses coletivos, ou pelo menos aqueles menos nocivos para o
segmento como um todo. Assim, nesta seção trataremos de aspectos dos circuitos de
cooperação, pertencimento e solidariedade envolvidos na realização da atividade.
Nas Figuras 39 a 42 temos exemplos de uma situação cotidiana entre aqueles que
frequentam, trabalham ou moram na Avenida Sete e seu entorno: a presença dos carregadores
contratados pelos donos dos depósitos, pessoas que usam sua força para empurrar pesados
carrinhos com as mercadorias dos trabalhadores de rua, por repetidas vezes durante o dia. Essa
situação é uma pelas quais se revela a complexidade do sistema que estamos estudando, já que
também está relacionada com uma das escalas de subordinação anteriormente apresentadas,
mas também nos remete às cadeias de reprodução da informalidade que ocorrem dentro da
própria informalidade, onde diferentes circuitos de cooperação32 se evidenciam e operam. Os
carregadores se configuram, portanto, como um elo importante entre os trabalhadores de rua e
os donos dos depósitos, realizando a tarefa diária de armazenar e entregar, em cada ponto, as
mercadorias que serão comercializadas.
Se por um lado há trabalhadores que precisam pagar aos donos dos depósitos, e
estes por sua vez remuneram os carregadores, numa situação em que a subordinação e
a cooperação se relacionam por outro lado temos também importantes relações de solidariedade
32 Azambuja (2009), fundamentando-se em Paul Singer, define a cooperação como a soma de esforços individuais coordenados
em torno de um objetivo comum.
163
estabelecidas com alguns lojistas, que guardam mercadorias gratuitamente, como é o caso de
Fábio que apresentamos na narrativa, dos peixeiros da Rua do Cabeça, que armazenam aquilo
que não conseguem vender num açougue existente na mesma rua, e de outros tantos
trabalhadores com quem conversamos.
Figura 39: Carregador levando mercadoria para o
ponto de um trabalhador.
Fonte: Foto da autora, 2012.
Figura 40: Trabalhadora montando sua guia no início
da jornada de trabalho.
Fonte: Foto da autora, 2012.
Figura 41: Carregadores levando mercadoria na
Rua do Cabeça.
Fonte: Foto da autora, 2012.
Figura 42: Carregador na Rua Carlos Gomes.
Fonte: Foto da autora, 2012.
Não podemos deixar de mencionar a percepção dos trabalhadores sobre a
contrapartida de suporte que a cidade dá para a realização deles, até mesmo para
compreendermos em que medida a ausência de determinadas estruturas nos projetos elaborados
pela prefeitura afetam a atividade. Para isso, perguntamos como essas pessoas costumam se
alimentar e beber água no dia a dia. Ao somar os percentuais de resposta daqueles que disseram
trazer o alimento de casa ao daqueles que compram quentinha, temos que 50,9% dos
164
trabalhadores se alimentam no próprio local de trabalho. Dona Maria, por exemplo, comentou
que tinha vergonha de almoçar na rua logo quando começou a desempenhar a atividade, mas à
medida em que fez amizades, se sentiu familiarizada com os outros colegas e não precisou mais
se esconder para se alimentar. Isso significa uma relação forte de pertencimento, pois é apenas
a partir do momento em que se identifica com os demais que estão em sua mesma situação, que
é pública, que ela consegue aderir a esse comportamento. Há ainda 39,8% dos entrevistados
que disse se alimentar em restaurante próximo do local onde trabalha e 8% que, por morar no
centro antigo da cidade, almoça em sua própria casa (Gráfico 19). Não podemos deixar de
mencionar ainda a cadeia de negócios que são movimentadas no centro em função da atividade
estudada, como podemos observar no caso dos diversos restaurantes existentes no centro da
cidade e que servem de apoio à atividade, pois 59,2% dos trabalhadores de rua compra e
alimenta-se nesses locais.
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Gráfico 19: Caracterização da Atividade – Como você bebe água e se alimenta?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
Perguntamos também como essas pessoas fazem para ir ao banheiro durante o dia
enquanto estão trabalhando e a grande maioria, 94,5% informou que utiliza banheiros de
estabelecimentos próximos ao local onde trabalham. Esses estabelecimentos pertencem ao
comércio formal como é o caso da Fundação Politécnica e dos shoppings Center Lapa e
Piedade, mas são também pequenas lojas e restaurantes. Assim, a ausência de sanitários
públicos construídos pelo poder público é compensada pela solidariedade dos donos dos
estabelecimentos comerciais, o que pode não durar a longo prazo, pois o aumento na demanda
nos sanitários desses estabelecimentos implica em custos para seu proprietário mantê-lo.
Com relação ao lixo, constatamos através do Gráfico 20 que 52,6% dos
trabalhadores de rua informam acumular resíduos durante o dia, descartando na própria rua no
39,8%
31,5%
19,4%
8%
1,4%
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0% em restaurante próximo ao localonde trabalha
traz de casa e consome no mesmolocal onde trabalha
compra e consome no mesmo localonde trabalha
em sua própria casa
em casa de amigos ou parentespróximo ao local onde trabalha
165
final do dia, em local próximo ao ponto de trabalho ou no próprio ponto. 42,3 % diz que descarta
o lixo em lixeiras públicas ao longo do dia ou acumula para o gari recolher durante o dia. Apenas
um trabalhador disse separar os resíduos produzidos para a reciclagem. Como vimos na
apresentação dos projetos, em geral são ofertas apenas lixeiras de pequeno porte no percurso
da área de estudo, embora haja pontos onde há um volume grande de descarte de resíduos e que
precisam de estruturas maiores como contêineres, por exemplo.
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Gráfico 20: Caracterização da Atividade – O que faz com o lixo produzido?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
Quando perguntamos aos trabalhadores o que eles consideram ser a coisa mais
agradável de seu trabalho, a grande maioria menciona os vínculos de amizade criados com os
outros colegas e o prazer de lidar com o público, cativando os clientes. Na Tabela 12 trazemos
de forma sintetizada as respostas que foram obtidas. Através delas podemos notar que a
satisfação com relação ao trabalho, além de estar relacionada com os clientes e amigos feitos
nos pontos, está também na possibilidade de honrar os compromissos através do trabalho
realizado e de ter uma maior flexibilidade para cuidar dos outros aspectos da vida que não
somente relacionados ao trabalho. Considera-se ainda a possibilidade de obter maiores
rendimentos e dinheiro sempre na mão.
Com relação aos planos para o futuro, a realização dessas pessoas está, sobretudo,
através do desejo de um futuro melhor para os filhos. Aproximadamente 50% dos entrevistados
mencionou que gostaria de se formalizar, ainda que reconheçam que isso poderá não ser
possível por sua idade ou grau de escolaridade. A outra metade, por outro lado, parece não ver
muita perspectiva no mercado formal, pois pretendem continuar desempenhando essa mesma
atividade. Assim, afirmam que gostariam de abrir seu próprio negócio.
52,6%
33,6%
8,7%4,2%
0,7% 0,3%0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0% acumula durante o dia e descarta naprópria ruajoga em lixeiras públicas ao longo do dia
acumula e gari recolhe durante o dia
outro
leva consigo para descartar em outro local
separa para reciclagem
166
É importante notar que a parcial falta de interesse por entrar no mercado formal
possa se justificar por diversas questões. Dentre elas está o fato de, apesar das inúmeras
dificuldades na realização desse trabalho, como o fato de estar exposto às intempéries do dia
ou de ter a mercadoria apreendida pelo rapa, para muitas pessoas essa ainda é uma perspectiva
melhor de obter sustento e garantir a sobrevivência, pois mesmo com os lucros incertos ainda
é possível obter uma melhor renda através dessa atividade do que com alguns empregos no
mercado formal, com carteira assinada. Além disso, como vimos, boa parte dos trabalhadores
que entrevistamos estão em idade adulta e possuem baixa escolaridade, o que significa ainda
mais dificuldade de entrar no mercado formal.
Pesquisa sobre trabalhadores de rua em Salvador
Tabela 12: Questionário de aprofundamento – Quais as três coisas que gosta no trabalho /
quais as três dificuldades / quais os planos para o futuro
Questionário Quais as três coisas que gosta no
trabalho?
Quais os seus planos para o futuro?
1 Os clientes Ver os filhos formados
As amizades Continuar desempenhando o mesmo serviço
A confiança das pessoas -
2 Os clientes Abrir uma loja, se formalizar
Honrar os compromissos com o trabalho -
- -
3 Poder tomar conta do filho Procurar o mercado formal se as vendas não melhorarem
Ganhar um pouco mais -
Poder fazer as coisas com mais liberdade
-
4 Trabalhar e passar o dia todo na rua Pretende continuar na atividade
Coisa boa é estar aqui, conhecer todo mundo, ter amizade
-
- -
5 É apaixonado pelo que faz Sair da rua
A clientela -
Fazer o próprio salário -
6 Fazer crochê Quer continuar na atividade mesmo com problemas de saúde
Toma café e almoça na rua -
Gosta do trabalho na rua -
7 Tem controle do próprio horário Sonha em ter uma loja
Dinheiro sempre na mão -
Contato com o público, faz amizade, alivia o estresse e conversa
-
167
8 Sair do cansaço e ir para casa dormir Continuar na atividade
Descansa a mente vendo as pessoas
passarem
-
- -
9 Os clientes Gostaria de ter um emprego formal,
mas acha que não vai mais conseguir
por causa da idade
Os colegas Pretende continuar na atividade
-
10 A amizade Não quer ter emprego formal, mas quer sair da área
Conhecimento adquirido -
Dinheiro -
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de fevereiro e março de 2015.
Vimos brevemente no Capítulo 1 que a leitura sobre o circuito inferior da economia
aproxima-se da economia dos setores populares, cuja racionalidade estaria mais associada a
reprodução da vida. Esta reprodução da vida de acordo com Kraychete (2000), entretanto,
ocorre de maneira precária, pois não há nenhum tipo de assistência técnica ou jurídica destinada
a esses trabalhadores, que precisam se virar da maneira como podem. Assim, apesar de haver
momentos de repressão, eles retornam para as ruas “proibidas”, mesmo sem possuir licença e
correndo o risco de perder sua mercadoria; se não há cobertura adequada para proteger a si e a
sua guia, criam eles mesmos diversos tipos de improvisos com plásticos, ganchos e cordas
presos aos postes de energia; organizam seu próprio sistema para o armazenamento de
mercadorias; subcontratam-se e movimentam um mercado próprio; a sua maneira, dão um jeito
de manter a si e às suas famílias. E um aspecto que não podemos deixar de considerar é que por
trás de cada trabalhador há uma unidade familiar, doméstica.
Para Coraggio (2000) as unidades domésticas são compostas por trabalhadores,
entendidos como as pessoas que dependem da realização permanente de sua força de trabalho
para se manter, onde não cabe enquadrar aqueles que vivem de rendas ou pensões oriundas de
trabalhos realizados no passado. Mesmo nos casos em que o empreendimento se encontra
separado do domicílio do trabalhador, ele funciona como uma unidade doméstica, cujo objetivo
não é propriamente a acumulação, mas o de manter-se a si e a qualidade de vida dos membros
da unidade a qual pertencem.
De acordo ainda com Coraggio (2000), um equívoco recorrente entre as agências
que prestam apoio a estas unidades, é o fato de tratarem os empreendimentos populares como
se fosse possível transformá-los em pequenas empresas capitalistas. Querem ensinar aos
168
trabalhadores que eles devem separar a economia da empresa, da economia do lar, no que é
possível resgatar o depoimento de Diana que disse precisar reverter rapidamente tudo que lucra
em novas mercadorias, pois se entrar num mercado pode gastar sem pensar todo o dinheiro que
obteve. Ela preocupa-se mais com a necessidade de prover a sua subsistência e a dos seus, do
que com a lucratividade do seu negócio, o que é abominado por muitos técnicos que não
conseguem captar esta racionalidade da reprodução da vida. A categoria dos setores populares
inclui em si formas de trabalho realizados solidariamente para produzir bens e serviços de
consumo muitas vezes desenvolvidos pelos próprios membros da família, seja na execução do
produto a ser comercializado, como é o caso de Adriana que produz em casa costurando com a
mãe a mercadoria que vende na rua, seja na realização do trabalho para o autoconsumo, como
é o caso das atividades realizadas para reprodução da unidade doméstica.
Através do que foi exposto então, podemos entender com mais clareza a relação da
atividade com a cidade e evidenciamos uma pergunta que fizemos aos trabalhadores com
relação a este tema. Perguntamos a eles qual a importância que consideram que o trabalho que
desempenham tem para a cidade, no que cabe a transcrição de suas respostas:
“A pessoa tem uma manicure, um cabeleireiro e também um sapateiro de
confiança. É uma pessoa que você sabe que o trabalho é bom e que confia. Além disso, tem
pouco sapateiro na cidade. A coisa mais importante é a confiança que as pessoas têm no meu
trabalho”, Seu Raimundo.
“Numa escala de 0 a 10, acho que a importância é de 7, 8. Salvador não tem muitas
ofertas de emprego. Onde a pessoa consegue emprego aqui? No comércio, nos serviços e no
governo. Mais de 40% vai pro comércio informal porque não acha outro emprego pra sustentar
a família. Muitos caem no comércio informal e nele é possível crescer, mudar de vida”, seu
Francisco.
“Acho que colabora com o comércio”, Adriana.
“Quando a pessoa não tem estudo, não tem jeito. Não tem emprego pra muita
gente. A importância é poder trabalhar”, seu Antônio.
“Todo trabalho honesto é importante para a cidade porque a clientela volta. Meu
preço é melhor do que o da loja. Além disso dou emprego pra outras pessoas. Sou
microempresário”, Fábio.
“Sem nós enfraquece as vendas. O mesmo que tem na loja, tem aqui. A gente é
microempresário sim, somamos com o lojista”, dona Maria.
169
“O preço é mais em conta, tá mais a vista a mercadoria da gente. É uma coisa que
a pessoa não liga, quando vê a mercadoria vai e compra. A mercadoria tá mais a vista, por
isso que ir pro beco foi ruim pra muita gente”, Diana.
“Sei lá! O povo compra chá, compra folha, não é uma mercadoria fácil de achar.
As pessoas compram, melhoram e voltam pra cá”, dona Lindinalva.
“Trazer alimento saudável pra barriga das pessoas. É coisa saudável, coisa boa,
o alimento é bom. É seguro pra eles (clientes) e pra gente”, dona Valdenice.
“Financeira. A gente vende coisas baratas, que às vezes não tá no mercado e
quando tá, é caro. A gente vende barato aqui”, Jeferson.
Percebemos que, à sua maneira e com suas palavras, os trabalhadores compreendem
o seu papel no mercado de trabalho e na economia, pois parecem cientes de que contribuem
para a circulação das mercadorias (e para a reprodução do capital), frequentemente oferecidas
a preços mais em conta do que aquelas do setor formal. Podemos perceber ainda que o preço
do produto sobressai em suas respostas. Além disso, eles evidenciam os benefícios de sua
mercadoria, sobretudo quando se trata de produtos naturais ou que fazem parte da cultura e do
saber popular. Aspectos como a honestidade e a confiança com relação ao serviço que oferecem
também reforçam a importância da autovalorização do seu trabalho. As respostas obtidas
revelam um sentimento de pertencimento e contribuição com a cidade que apenas pode ocorrer
se a atividade desses trabalhadores ocorre nas ruas, no espaço público. Isso pode nos levar a
refletir sobre o próprio conceito de espaço público presente atualmente no urbanismo. Será que
este espaço deve apenas ser funcional para o ir e vir, asséptico e vazio, concebido para repelir
uma diversidade maior de usos? Será que é possível conceber uma política urbana que
possibilite um espaço público mais humano, capaz de compatibilizar uma maior diversidade de
usos e torne outros diferentes tipos de apropriação possíveis, além dos previamente planejados?
170
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O mercado de trabalho brasileiro é marcado pelos efeitos de uma industrialização
tardia, que destruiu as ocupações tradicionais de boa parte da população. Se no campo a
estagnação ou a mecanização diminuíram as possibilidades de trabalho das pessoas por
substituí-las, nas cidades, passou-se a aglutinar uma grande massa populacional que não foi
absorvida pelo mercado de trabalho que começava a se consolidar. Um mercado que, portanto,
sempre foi excludente, e que traz as cicatrizes de um passado baseado num regime escravista,
sobretudo considerando a cidade de Salvador. Às margens desse mercado e com poucas
perspectivas de inserção provocadas por desigualdades históricas, como o acesso precário à
educação, saneamento básico, saúde, habitação, etc., temos indivíduos que buscam a
sobrevivência através de formas criativas, porém também frequentemente bastante
precarizadas. Assim, vimos brevemente no início do primeiro Capítulo desta dissertação, como
esses traços foram aprofundados, sobretudo na década de 1990, quando a globalização e a
reestruturação produtiva pela qual o mundo capitalista passou contribuíram para um
agravamento da situação.
Diversos teóricos tentaram entender o fenômeno e sua polarização simbolizada na
discussão sobre os setores formal e informal da economia. Francisco de Oliveira e Milton
Santos, dentre outros autores, nos mostraram que essa dualidade era mais complexa, pois
tratava-se de duas faces de um mesmo processo. Numa retrospectiva bastante sucinta sobre a
leitura de Santos (2008), temos que num mesmo sistema coexistem e se retroalimentam dois
circuitos da economia: um superior, no qual é possível satisfazer todas as necessidades de
consumo, e o inferior, em que se tendo as mesmas necessidades não há o mesmo poder de
consumo. Neste circuito inferior movimenta-se toda uma cadeia de trabalho, que se reproduz
sob diferentes relações, inclusive as informais. Os termos formal e informal para nós, portanto,
adquirem significado semelhante ao que Santos propõe para os circuitos: formal para nos
referirmos a quem tem acesso aos benefícios sociais garantidos pelas leis trabalhistas e informal
para quem não tem o mesmo acesso garantido, por não conseguir se inserir no mercado de
trabalho formal devido a sua impermeabilidade estrutural em cidades como Salvador, sobretudo
para aqueles sem acesso à educação.
Em um momento recente de nossa história, mais precisamente nos anos 2000, uma
melhora na situação do trabalho e do emprego é verificada no país, porém por um período muito
breve. Essa frágil melhora não se sustenta face à crise financeira mundial de 2008, que só
171
atingiu a economia brasileira anos depois, em 2015, levando a uma nova desestruturação do
mercado de trabalho brasileiro, num mundo ainda mais globalizado, marcado pela acumulação
flexível e pela precarização do trabalho, ou seja, por um trabalho que é muito mais instável e
inseguro, pouco capaz de garantir alguma estabilidade no futuro.
Tais acontecimentos têm diversos desdobramentos no espaço, como a ocupação de
áreas inadequadas para a moradia e comumente distantes dos centros urbanos, por exemplo. Na
perspectiva em que trabalhamos, esse desdobramento se dá numa escala de maior proximidade,
na escala da rua e do cotidiano. Aos olhos de todos, ricos ou pobres. No olho da rua de um dos
centros comerciais de maior importância para a cidade de Salvador. Situação, contudo, que não
é exclusiva de nossa cidade: repete-se em muitas outras capitais brasileiras, de formas ao
mesmo tempo particulares e semelhantes.
Trocar produtos num mercado talvez seja a forma mais antiga de se obter recursos.
A apropriação da rua pelo trabalho, por sua vez, provavelmente implica em disputa por esse
espaço desde seu primeiro instante. Para que uma pessoa defina seu ponto num determinado
lugar, é preciso minimamente que a mercadoria ofertada seja aceita pela população, que haja
demanda. Na medida em que a demanda gerada agrada é possível que o ponto possa se
estabelecer. Isso significa que uma apropriação inicial aos poucos se converte em uso e este
uso, por sua vez, converte-se em conquista social na medida em que é reconhecido como um
direito. Este reconhecimento ganha força principalmente quando o poder público passa a
legislar sobre o assunto e cria normas específicas para ordenar a maneira como o uso do
logradouro público pode se dar.
A atividade do trabalhador de rua, nesse contexto, assume real importância tanto
por questões sociais, uma vez que garante uma forma de sustento para aqueles que nela se
ocupam, quanto pelo capital que movimentam, visto que contribuem para o escoamento de
mercadorias que também são produzidas pelo circuito superior. A apropriação do espaço pela
atividade se incorpora ao cotidiano e estabelece novas relações entre aqueles que usam este
espaço.
É importante ter em vista, nesse sentido, que a apropriação não deixa de ser
tensionada mesmo quando convertida em um uso legitimado. Isto ocorre porque o lugar onde a
apropriação que estamos lidando ocorre, a rua, é um lugar em permanente disputa. No passado,
mesmo quando não haviam os veículos motorizados, o espaço da rua já era dividido entre
pessoas, animais de carga, carroças e charretes. No momento em que os veículos motorizados
se disseminam, o espaço de circulação dos pedestres nas ruas é reduzido e cada vez mais, até
172
que normas são criadas para garantir que os passeios permitam minimamente a circulação a pé
das pessoas. Assim, a calçada que já é uma porção reduzida da rua, agrega pelo menos a área
destinada ao mobiliário urbano, o passeio do pedestre e a área acesso aos estabelecimentos e
residências. Isso sem contar os demais usos e apropriações que se faz dela como, por exemplo,
quando uma pessoa em situação de rua delimita uma porção deste espaço para dormir. Nesse
sentido, a permanência nesse espaço limitado pressupõe um conflito constante entre diversos
direitos, como o direito de ir vir, o direito à cidade e o direito ao trabalho, por exemplo.
Podemos considerar que a rua enquanto lugar de disputa, é ainda mais tensionada
quando o poder público lhe impõe normas e regras de uso. No caso da atividade dos
trabalhadores de rua, a qual estudamos, pudemos perceber essa tensão constante sobretudo
porque as pessoas não querem trabalhar em ruas onde não há movimento, ou seja, em ruas onde
não há possibilidade de vender. A sua necessidade de sobrevivência se sobrepõe à ordem
estabelecida. Desta forma, os locais onde a atividade não deveria mais acontecer sofrem
pressões permanentes, assim como re-apropriações constantes, ocorridas durante e após cada
intervenção tentada pelo poder público.
Dentre as tentativas de ordenamento que estudamos nesta dissertação, pudemos
notar que entre 1992 e 2014 houve basicamente três propostas no que se refere a atividade do
trabalhador de rua em Salvador. A primeira delas foi realizada com base em estudos mais
aprofundados sobre a temática, sintetizados em uma proposta que integrava a atividade com os
demais usos do espaço público, porém sem se concretizar. Tal proposta sobressai por assimilar
o trabalho de rua como fenômeno inerente à economia soteropolitana e passível de integrar a
política pública urbana. A segunda proposta, apesar de partir da análise anterior, praticamente
repeliu toda a atividade da rua onde se manifestava com mais intensidade, redirecionando-a
apenas para alguns pontos específicos, o que foi desfeito na medida em que a fiscalização
constante desses locais não foi praticada, sobretudo no intervalo entre a transição de uma gestão
para outra. Neste caso, a normatização do uso não impediu que a apropriação voltasse a se
manifestar em outros momentos. A última e mais recente proposta, apesar de também
intencionar a retirada de todos os trabalhadores da rua principal, da Avenida Sete de Setembro,
cria algumas condições para a sua permanência em locais determinados ao implantar algumas
estruturas de suporte, o que não garante a efetividade da proposta.
A adequação desses projetos, avaliada com base nas categorias de análise que
elegemos mostra que apenas o projeto mais antigo, elaborado em 1992 possui um diagnóstico
mais bem estruturado sobre a questão. Os demais elaborados em 1997 e 2013, se justificaram
173
com base em necessidades urgentes e propuseram soluções pouco embasadas teoricamente e
voltadas para uma ação de curto prazo.
Com relação ao conforto ambiental, vimos que de 1992 a 2014 alguns avanços
foram propostos, sobretudo no que se refere ao fato de se pensar em algum tipo de cobertura
para os pontos de trabalho. Entretanto, podemos considerar que a proposta para as estruturas a
que se chegou não se constituem como as melhores soluções que podem ser pensadas, sobretudo
no caso da atual, onde a cobertura proposta foi executada com um material de baixa qualidade
e que intensifica a sensação térmica para quem está exposto a ela. Além disso, é uma estrutura
que praticamente não protege da chuva, levando muitos trabalhadores a improvisarem soluções
pontuais para não molharem a si ou a suas mercadorias. Por sua vez, essas estruturas servem
para ocultar a “desordem” causada pelo trabalhador de rua, sobretudo quando se visualiza o
centro da cidade de Salvador utilizando imagens de satélite. Isto significa que para quem não
conhece a cidade, vem de outro país ou estado e decide antes observá-la através de mapas,
passa-se a impressão de uma cidade mais “limpa” e ordenada.
A infraestrutura de suporte para a atividade também é pouco pensada pelo poder
público, que limita suas ações à pavimentação e iluminação. A coleta de resíduos sólidos parece
não levar em consideração o volume de resíduos gerados em algumas das transversais
estudadas, sobretudo naquelas onde há a venda de hortifrúti, geralmente acumulados sem
critério em grande quantidade em algumas esquinas no final do dia. Uma política voltada para
a coleta seletiva dos outros tipos de resíduos gerados também não é problematizada pelos
projetos estudados.
A questão dos depósitos é outra que quase não é tocada pelas propostas
apresentadas, ficando a cargo dos trabalhadores, que por sua vez se apropriam da ausência dessa
estrutura para criar possibilidades alternativas de obtenção de renda, movimentando uma outra
cadeia de informalidade.
Ainda no que se refere à infraestrutura de suporte, podemos notar que nada é
apresentado no que se refere aos sanitários, tanto os públicos que possam atender à população
de maneira geral, quanto a específicos, destinados aos trabalhadores de rua, que, assim,
dependem da solidariedade de lojistas ou dos sanitários existentes nas grandes superfícies
comerciais, que são os shoppings centers.
A relação entre as propostas e o entorno também foi um aspecto considerado para
a análise dos projetos. Assim temos que o projeto de 1992 foi o que mais conseguiu criar uma
174
solução que integra a atividade do trabalhador de rua com o espaço. Apesar de não prever
nenhum tipo de cobertura para proteção do trabalhador, podemos perceber essa integração
quando a mesma permanece na rua mais cobiçada que é a Avenida Sete de Setembro. A solução
encontrada suprime o espaço do automóvel e não do pedestre, buscando compatibilizar os três
usos no mesmo ambiente. As demais propostas visam uma segregação da atividade com a rua
principal e mais do que isso, propõe uma estrutura que visualmente se desconecta do contexto
do lugar.
Por fim, a última categoria de análise sobre a qual nos debruçamos é a densidade
de ocupação na área de estudo. Através dela verificamos que não há estudos que investiguem a
demanda pelo espaço que a atividade cria. Isso notadamente empobrece as propostas
elaboradas, já que são mais baseadas em suposições do que em resultados sistematizados sobre
a realidade. O método que encontramos para calcular a densidade de ocupação na área de
estudo, embora não tenha a pretensão de ser uma referência, nos ajudou a avançar sobre a
compreensão deste aspecto, de modo que podemos ter uma leitura mais apurada sobre quanto
do espaço é realmente demandado pela atividade do trabalhador de rua e o quanto ela interfere
no direito de ir e vir dos transeuntes. Com base em nosso estudo, consideramos que seria
interessante, por exemplo, verificar se o projeto mais recente contribuiu para adensar áreas que
já eram muito densas, o que pode ter implicado numa piora na qualidade da circulação de
pessoas e vai de encontro, portanto, ao que deveria ser o objetivo do planejamento. Como
realizamos nossa contagem num período em que o ordenamento dos trabalhadores de rua já
havia sido iniciado não é possível afirmar isso com certeza. Contudo, podemos observar que 05
das 14 ruas apontadas pela prefeitura como os locais permitidos para a atividade já se encontram
saturadas, com alta densidade de ocupação.
No que se refere à legislação sobre o assunto, consideramos importante notar as
incertezas e instabilidades dos trabalhadores de rua com relação ao trabalho de onde tiram o seu
sustento, já que as licenças são concedidas em caráter precário, o que significa a perda do ponto
a qualquer momento em que a municipalidade entenda a inviabilidade da atividade no local.
Sob esta questão há uma contradição interessante, pois ao mesmo tempo em que a atividade é
reprimida, o logradouro público é também considerado como local de desenvolvimento
econômico pelo próprio Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano de Salvador. O conceito de
logradouro público no PDDU/2008 agrega a ideia da funcionalidade do lugar para além dos
aspectos referentes ao convívio e socialização, pois insere o aspecto do desenvolvimento
econômico no conceito. Desse modo, o logradouro pode ser regulamentado e fiscalizado,
175
submetendo seus usuários às sanções administrativas estabelecidas por lei. Podemos inferir
diante das informações expostas no que se refere a intervenção do poder público, que o interesse
sobre a atividade não é apenas daquele sujeito que a realiza, mas também da municipalidade
que a reconhece sob diferentes perspectivas políticas, tanto do ponto de vista social quanto do
ponto de vista econômico, já que, como vimos anteriormente, a mesma promove a circulação
de mercadorias no circuito inferior da economia e gera impostos para serem arrecadados pelo
município.
Entre o poder público e os trabalhadores de rua há as associações e o sindicato que
representam os interesses dos trabalhadores. Essas entidades, no entanto, são entidades
fragilizadas tanto pelo seu pouco tempo de existência, quanto pelo pouco reconhecimento que
possuem junto a classe. Conforme pudemos notar, das três associações existentes, duas tem sua
data de fundação praticamente coincidente com o início da execução do projeto de ordenamento
elaborado pela gestão da prefeitura iniciada em 2013, o que indica que provavelmente elas
tenham sido criadas para dar suporte político a execução dos projetos elaborados pelo poder
público. Desta forma, a legitimidade das entidades para responder pelos trabalhadores fica
bastante comprometida, principalmente se levarmos em consideração o fato de que 85,5% dos
trabalhadores entrevistados revelaram que sequer sabem o nome das associações às quais estão
vinculados. De maneira geral ainda, essa circunstância torna delicada a relação entre
trabalhadores e poder público, já que as decisões tomadas possivelmente não levam em
consideração os interesses da maioria, nem são discutidas com um público mais amplo. Além
disso, a existência de quatro entidades atuando na mesma área pode indicar uma sobreposição
de interesses e problemas na capacidade de atuação, que precisa ser melhor articulada entre os
trabalhadores de rua e as lideranças.
Num primeiro momento, a fragilidade de direitos vivenciada pelos trabalhadores de
rua, sobretudo no que se refere ao direito ao trabalho, cuja carência implica a negação de uma
série de outros direitos, incluindo-se aí o direito à cidade. Nas falas dos trabalhadores
provocadas em parte por nossas perguntas, a maioria deles revelou que a importância do seu
trabalho se dá na medida em que contribuem para circulação das mercadorias, oferecidas a
preços mais em conta do que aquelas do setor formal, e assim consequentemente, favorecem a
economia na cidade.
Vimos que a maioria dos trabalhadores entrevistados são adultos e que o número
de homens é ligeiramente superior ao número de mulheres. O nível de escolaridade dessas
pessoas varia do fundamental incompleto ao ensino médio completo. De maneira geral as
176
pessoas com quem conversamos são pais e mães de família, ou seja, além de trabalhar para
obter o seu próprio sustento, trabalham também para manter outras pessoas. Em sua maioria
são oriundas de Salvador e Região Metropolitana, porém há quem tenha vindo de outros estados
do Nordeste.
Os dados apresentados indicam que parte dessas pessoas provavelmente ficou
desempregada na década de 1990, momento de profunda crise no emprego e no trabalho no
Brasil. A atividade realizada, como fica evidente através dos dados, não é realizada em caráter
transitório, mas se constitui como forma permanente de ocupação. Além disso, o baixo grau de
escolaridade e a idade em que muitos se encontram hoje são apontados como motivos para
permanecer na atividade, sem perspectivas de inserção no mercado formal. Podemos, portanto,
prever uma continuação do trabalho na rua, pois sendo esse trabalhador pouco qualificado e a
precarização do trabalho em geral uma tendência, o mais provável é que continue realizando
atividades informais.
Os dados indicam ainda que a maior parte dos trabalhadores de nossa amostra
residem no próprio centro de Salvador ou em bairros do Miolo e Subúrbio, sendo estas últimas
áreas as mais empobrecidas e com maior carência de infraestrutura urbana. O fato de muitos
trabalhadores residirem no centro ou nas suas proximidades aponta para a possibilidade dessas
pessoas constituírem um público alvo potencial para programas de habitação de interesse social
no centro da cidade, pois claramente têm um interesse em residir nessa área e provavelmente já
possuem também um vínculo com ela.
Verificamos também que cerca de 43% dos trabalhadores entrevistados exercem a
atual atividade porque não encontraram outro emprego formal ou porque foram demitidos. Ser
trabalhador de rua, portanto, foi a “opção escolhida” na falta de uma ocupação melhor. Essa
situação por si só rompe com a ideia de grande autonomia que se pensa sobre a atividade, ainda
que possamos perceber que há autonomia em certas circunstâncias como, por exemplo, quando
entrevistados mencionaram optar por esse trabalho para ter tempo de cuidar dos filhos.
O trabalhador de rua, em geral, está desprovido de seguridades sociais. Caso
adoeçam, por exemplo, não têm direito ou proteção alguma. Muitos trabalhadores disseram
durante as entrevistas que nunca adoeceram, o que é surpreendente, visto que trabalham numa
jornada diária extensa, expostos à rua, muitas vezes utilizando a voz como ferramenta para
atrair o cliente, sem poder ir ao banheiro e frequentemente alimentando-se mal. Em sua maioria,
folgam apenas uma vez por semana e não podem tirar férias já que seu sustento depende do
trabalho diário, de segunda a sábado.
177
Através da ação do poder público, da estrutura do mercado capitalista e da própria
rede que fornece as mercadorias, por exemplo, que podemos identificar as situações de
subordinação as quais estão submetidas este trabalhador. Apesar da maioria dos entrevistados
ter respondido dispor de licença para trabalhar nos pontos onde estavam, isto não significa que
não tenham receio das ações de fiscalização da prefeitura (o rapa), pois muitos dos que
migraram para os novos pontos queixam-se da queda das vendas e frequentemente retornam
para seus pontos de origem na Avenida Sete, correndo o risco de terem a mercadoria
apreendida. Além disso, há os que mudam o tipo de mercadoria comercializada e passam a
vender produtos considerados ilegais, que também podem ser apreendidos.
Boa parte dos trabalhadores revelaram ter mudado de ponto no último ano, ou seja,
tiveram seus pontos alterados. Foram muitos os relatos de trabalhadores que disseram ter
precisado mudar ponto do dia para a noite, sem ter tempo de avisar sua clientela. O impacto
dessa ação é bastante agressivo se pensarmos que algumas dessas pessoas ofertam uma
mercadoria que dificilmente pode ser encontrada, que é produzida artesanalmente, ou que suas
vendas dependem da relação antiga e amistosa que têm com seus clientes. Essas pessoas ficaram
"perdidas" na multidão e algumas vezes foram relocadas mais de uma vez. Uma vez que a
procura por produtos se dá quando a pessoa sabe onde encontrá-lo ou é atraído pela mercadoria
no instante em que passa por ela, isto traz realmente sérios impactos para os rendimentos do
trabalhador no final do dia e do mês. Como sabemos, há dias em que os trabalhadores podem
receber bastante dinheiro e há dias em que passam sem conseguir vender nada. Nesses
momentos, o pouco que conseguem obter frequentemente se destina ao transporte para ir
trabalhar e voltar para casa, e para alimentar-se durante o dia de trabalho.
A atividade do trabalhador de rua movimenta outras escalas de informalidade como
pudemos constatar. Há casos em que os pontos são alugados ou que um mesmo trabalhador
possui mais de um ponto. Além disso, os depósitos movimentam uma outra cadeia de
ocupações. Por armazenar a mercadoria dos trabalhadores de rua, inserem na atividade a figura
do dono do estabelecimento onde a mercadoria é guardada, carregadores que as transportam
diariamente e até mesmo seguranças responsáveis dos locais onde a mercadoria é guardada. Em
troca desse serviço, alguns trabalhadores pagam taxas semanais, mas há também aqueles que
conseguem guardar a mercadoria na casa de amigos, parentes ou lojistas, assim também como
há quem leve a mercadoria para casa todos os dias no final do expediente.
Através dos dados que obtivemos ainda sobre as mercadorias, pudemos notar que
há uma grande variedade delas sendo ofertadas na área de estudo, com destaque para as
178
confecções, adereços, produtos de hortifrúti, eletrônicos, bolsas e alimentos. As mercadorias
por sua vez são adquiridas em volume significativo no próprio centro da cidade, nas lojas de
atacado e varejo que muitas vezes pertencem aos chineses, ou com atravessadores que levam
mercadorias selecionadas diretamente para os pontos de trabalho. Uma parcela menos
expressiva de trabalhadores revelou adquirir a mercadoria que comercializam pessoalmente
através de viagens. Essas mercadorias, entretanto, não podem ser estocadas por muito tempo,
sobretudo porque a venda delas comumente é incerta. Diante disso, os trabalhadores costumam
adquirir os produtos num período de tempo menor, que varia de diariamente a quinzenalmente.
Vimos ainda que os recursos para começar a atividade costumam ser adquiridos com poupança
própria e com investimentos iniciais pequenos.
Boa parte dos conflitos dos trabalhadores de rua pode ser percebido em sua relação
com o poder público, com o rapa, sobretudo após as ações de ordenamento, o que é natural,
visto que a situação nova lhes tirou da situação mais confortável em que se encontravam antes.
Essa situação de impasse com as ações do poder público, por sua vez, já foi verificada em outros
momentos e gestões, e sua natureza está justamente no conflito inerente entre a competência do
poder público de buscar organização do espaço para permitir a efetiva circulação de pessoas e
a atividade dos trabalhadores de rua que se apropriam e intensificam a demanda por espaço,
obstruindo o fluxo do pedestre em alguns pontos. Contudo, as soluções adotadas pelo poder
público, como pudemos constatar, são bastante empobrecidas, seja pelo fato de a prefeitura não
ter dados sistematizados sobre a situação, seja pelos poucos estudos que embasam suas ações.
Além disso, pudemos perceber que existem conflitos entre os próprios trabalhadores, entre
aqueles que possuem e não possuem licença, que são de Salvador e de fora do município, por
exemplo. A relação com os lojistas, por sua vez, contrariamente ao que se pode incialmente
supor, parece ser bastante tranquila e amistosa.
Podemos afirmar que certamente o cotidiano no centro de Salvador não seria o
mesmo sem a atividade dos trabalhadores de rua. A dinâmica criada por sua atividade e as
diversas instâncias que este trabalho movimenta, criam contradições ao mesmo tempo em que
lhe enchem de vida. A atividade pode ser lida também como um resultado da diversidade de
usos existente na área. É como se os trabalhadores sentissem a concentração dessa diversidade
e a aproveitassem, dinamizando e ampliando ainda mais as possibilidades do lugar. Essas
pessoas provavelmente contribuem significativamente para a existência de tantos e variados
restaurantes e casas de lanches que existem no centro, por exemplo, que frequentemente
179
ofertam almoço a preços bastante populares. Isso para citar apenas um dos diversos negócios
que se beneficiam da atividade e se proliferam a partir dela.
O espaço da rua onde o trabalhador exerce sua função não se esgota no trabalho,
ele ganha contornos maiores. Estas pessoas desenvolvem uma relação de pertencimento com o
lugar no qual fixam seus pontos, onde muitos deles permanecem durante anos e até mesmo
décadas, o que faz surgir uma relação afetiva, comprometida e algumas vezes até mesmo
conflituosa, como pudemos constatar. Percebemos ainda que há uma grande heterogeneidade,
inclusive, nos próprios interesses dos trabalhadores com relação à atividade que desempenham,
pois há entre eles os que não têm outro meio de sobrevivência e mesmo assim encontram nessa
atividade maneiras de se divertir e ter prazer com o trabalho. Outro aspecto relevante é que, se
por um lado há a flexibilidade de organizar os próprios horários e a possibilidade de cuidar dos
filhos durante o trabalho, por outro lado há a incerteza da obtenção dos seus proventos diários
e mensais, o que leva alguns trabalhadores a terem bastante dificuldade de garantir sua
sobrevivência e até mesmo de prosperar em seus negócios.
Não há como negar, portanto, que esta categoria absorve boa parte da mão de obra
que não é aproveitada pelo mercado formal e está desempregada. O esvaziamento das ruas aqui
estudadas nos períodos da noite e finais de semana, como comentado por um dos trabalhadores,
revela ainda como a atividade comercial, incluindo-se aí a desenvolvida na rua, contribui para
a vivacidade dos espaços públicos. O trabalho na rua aparece assim como uma alternativa de
sobrevivência ao indivíduo socialmente vulnerável, através da qual lhe é possível viver com
alguma dignidade, e sua presença nas ruas é capaz de proporcionar uma intensificação da
experiência de estar, viver e pertencer à cidade.
O lugar que a atividade ocupa é de interesse de todos, uma vez que se trata do espaço
público. Este, por sua vez, não é escolhido aleatoriamente por cada um daqueles que dele se
apropria. Para o desenvolvimento da atividade aqui estudada vemos que as características
funcionais deste espaço perpassam por sua localização na cidade, nas quais diversos fluxos são
articulados. Assim, ações do poder público podem ser concebidas, com o intuito de organizar,
ordenar ou coibir os usos considerados não compatíveis com os interesses que se tem para o
lugar. Vale ressaltar também que as recentes intervenções executadas promovem uma
segregação da atividade do trabalhador de rua para transversais específicas, liberando a Avenida
Sete, vetor principal de circulação entre o Centro Histórico com a Barra, da presença e imagem
desse trabalhador, o que tornaria o lugar mais “atrativo”, sobretudo para o turista, como
180
preconiza o planejamento estratégico que visa, dentre outras coisas, a competitividade entre as
cidades.
Ainda que as permissões para que os trabalhadores de rua possam explorar o
logradouro público sejam precárias, ou seja, possam ser retiradas no momento em que este seja
o interesse da prefeitura, isto não significa necessariamente que a atividade possa ser eliminada.
Através dos projetos elaborados desde 1992 para cá ficou evidenciada a compreensão da
funcionalidade desse setor da economia, cuja vivacidade se relaciona com a força social dos
trabalhadores de rua que movimentam e contribuem para o escoamento das mercadorias no
circuito inferior da economia, bem como a resistência desses próprios trabalhadores em
permanecer ou retornar para os locais dos quais buscam se apropriar. Trata-se, portanto, de uma
situação que não pode ser ignorada pelo poder público e que o planejamento possivelmente só
será capaz de enfrentar a partir do momento em que busque compreender sua complexidade e
proponha alternativas que compatibilizem os diferentes interesses envolvidos, sem a intenção
de eliminar as práticas cotidianas dos espaços de representação, ou seja, do âmbito do vivido,
utilizando aqui os termos de Lefebvre, pois estas tendem a voltar ou resistir, tensionando o
espaço público, seus usos e apropriações.
181
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Periódicos:
SALVADOR (Município). Operação vai ordenar comércio informal na Barra. Diário Oficial
do Município, Salvador: PMS, ano XXV, nº 5.774, 12 a 14 jan. 2013.
Notícias:
G1 BA. Viatura da guarda municipal é apedrejada em ação de ordenamento. Portal G1 Bahia,
Salvador, 24 set. 2014. Disponível em: <http://g1.globo.com/bahia/noticia/2014/09/viatura-da-
guarda-municipal-e-apedrejada-em-acao-de-ordenamento.html> Acesso em: 29 out. 2014.
LAGO, Rodrigo. Excesso de camelô na Calçada causa acidente e fere idosa. Tribuna da Bahia,
Salvador, 24 out. 2010. Disponível em:
<http://www.tribunadabahia.com.br/2010/02/24/excesso-de-camelo-na-calcada-causa-
acidente-e-fere-idosa> Acesso em: 20 out. 2014.
MACHADO, Priscila. Largo Dois de Julho será revitalizado em 8 meses. Jornal A Tarde,
Salvador, 15 ago. 2014. Disponível em:
<http://atarde.uol.com.br/bahia/salvador/noticias/largo-dois-de-julho-sera-revitalizado-em-8-
meses-1614542> Acesso em: 22 set. 2014.
MENDES, Davi. Precisamos realizar trabalho de maquiagem para receber visitantes’, diz
secretária de Neto. Bahia Notícias, Salvador, 15 dez. 2012. Disponível em:
<http://www.bahianoticias.com.br/principal/noticia/127912-%E2%80%98precisamos-
realizar-trabalho-de-maquiagem-para-receber-visitantes%E2%80%99-diz-secretaria-de-
neto.html> Acesso em: 10 jan. 2013.
PEREIRA, Daniela. Comércio desordenado invade calçadas. Tribuna da Bahia, Salvador, 16
out. 2012. Disponível em: < http://www.tribunadabahia.com.br/2012/10/16/comercio-
desordenado-invade-calcadas> Acesso em: 29 out. 2014.
SECRETARIA DE DESENVOLVIMENTO URBANO DO ESTADO DA BAHIA (SEDUR).
Metrô atinge marca de 5 milhões de passageiros em menos de um ano de funcionamento.
Disponível em: <http://www.sedur.ba.gov.br/metro-atinge-marca-de-5-milhoes-de-
passageiros-em-menos-de-um-ano-de-funcionamento/> Acesso em: 22 abr. 2015.
SERVIÇO BRASILEIRO DE APOIO ÀS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS (SEBRAE).
Simulador Simples ou lucro presumido: qual o melhor para sua empresa? Disponível em:
<http://www.sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/artigos/Simulador-Simples-ou-Lucro-
Presumido:-qual-o-melhor-para-sua-empresa%3F> Acesso em: 29 abr. 2015.
188
SODRÉ, Naira. Pedestre é expulso de calçadas em Salvador por todo tipo de tranqueira.
Tribuna da Bahia, Salvador, 10 jan. 2013. Disponível em:
<http://www.tribunadabahia.com.br/2013/01/10/pedestre-expulso-das-calcadas-em-salvador-
por-todo-tipo-de-tranqueira> Acesso em: 29 out. 2014.
189
ANEXO A: PLANTAS DO PROJETO “O INFORMAL EM SALVADOR: POLÍTICA E PROPOSTAS, 1992” – TRECHO SÃO PEDRO,
JOANA ANGÉLICA E SÃO BENTO
a) São Pedro
Fonte: SALVADOR, 1992a.
193
ANEXO B: PLANTAS DO PROJETO “COMÉRCIO INFORMAL: AV. SETE DE
SETEMBRO; ÁREAS PROVISÓRIAS. SALVADOR: 1997”
Fonte: SALVADOR, 1997b.
201
ANEXO C: PLANTAS DO PROJETO “REQUALIFICAÇÃO DA AV. SETE DE SETEMBRO - ORDENAMENTO DO COMÉRCIO
INFORMAL"
a) Largo do Rosário-A
Fonte: SALVADOR, 2014b.
205
APÊNDICE A: QUESTIONÁRIO BÁSICO APLICADO COM OS 289
TRABALHADORES DE RUA
QUESTIONÁRIO BÁSICO
PESQUISA SOBRE TRABALHADORES DE RUA EM SALVADOR
CARACTERIZAÇÃO GERAL 1. NOME: ____________________________________________________________________ 2. SEXO: ( )F ( )M 3. BAIRRO ONDE MORA: _______________________________________
4. IDADE: _________________________
5. ESTADO CIVIL: 6. ONDE NASCEU: ________________________
( ) até 14 anos ( ) Solteiro(a) ( ) Salvador ( ) entre 14 e 18 anos ( ) Casado(a) ( ) RMS* ( ) entre 19 e 25 anos ( ) União estável ( ) interior da Bahia ( ) entre 26 e 30 anos ( ) Viúvo(a) ( ) Outro Estado ( ) entre 31 e 40 anos ( ) Divorciado(a) ( ) Outro país. Qual?
________________________ ( ) entre 41 e 50 anos ( ) Outro: _____________ ( ) entre 51 e 60 ( ) NR ( ) NR ( ) mais de 60 anos ( ) NR
* Região Metropolitana de Salvador: Camaçari, Candeias, Dias d'Ávila, Itaparica, Lauro de Freitas, Madre de Deus, Mata de São João, Pojuca, São Francisco do Conde, São Sebastião do Passé, Simões Filho e Vera Cruz.
10. VOCÊ TRABALHA POR CONTA PRÓPRIA? ( )Sim ( ) Não. 11. POR QUE ESTÁ REALIZANDO ESTE TRABALHO?
( ) Desejo de não possuir patrão ( ) Para complementar a renda da família ( ) Não encontrou outro emprego ( ) Um parente ou amigo ofereceu o trabalho ( ) Tinha experiência ( ) Outro motivo. Qual? _________________________ ( ) Tradição familiar ( ) NR ( ) Para ganhar mais ou melhor ( ) NS
12. VOCÊ JÁ TRABALHOU COM CARTEIRA ASSINADA ANTES? ( ) Não ( )Sim. 12.1 SE SIM, O QUE VOCÊ FAZIA? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 13. QUANDO FICA DOENTE (OU TEM ALGUM TIPO DE ACIDENTE), O QUE ACONTECE COM A ATIVIDADE? ( ) o negócio fica fechado até se recuperar ( ) um membro da família ou conhecido se encarrega do negócio ( ) um outro trabalhador de rua cuida da atividade ( ) outro: _________________________________________________________________
Universidade Federal da Bahia Faculdade de Arquitetura Programa de Pós Graduação em Arquitetura e Urbanismo - PPG-AU/UFBA Grupo de Pesquisa Lugar Comum Nome do entrevistador: _____________________ Data: ________________ Rua: ______________________________________________________________
8. TEM FILHOS? ( ) Não ( ) Sim. Quantos?
_________________ 9. COMO SE CHAMA ESTE TRABALHO QUE VOCÊ FAZ AQUI NESTE LUGAR? ______________ ____________________________ ____________________________
7.GRAU DE ESCOLARIDADE Sem escolaridade ( ) Ensino fundamental Completo ( ) Incompleto ( ) Ensino médio Completo ( ) Incompleto ( ) Graduação Completo ( ) Incompleto ( ) Pós-Graduação Completo ( ) Incompleto ( ) NR ( )
206
CARACTERIZAÇÃO DA ATIVIDADE
14. QUANTO TEMPO EXERCE A ATIVIDADE?
15. HÁ QUANTO TEMPO TRABALHA NESTA RUA:
16. QUE HORAS ABRE / QUE
HORAS FECHA:
_______ anos _______ anos Abre Abre ( ) até 1 ano ( ) até 1 ano 7h ( ) 7h ( ) ( ) entre 1 e 2 anos ( ) entre 1 e 2 anos 8h ( ) 8h ( ) ( ) entre 2 e 5 anos ( ) entre 2 e 5 anos 9h ( ) 9h ( ) ( ) entre 6 e 10 anos ( ) entre 6 e 10 anos 10h ( ) 10h ( ) ( ) entre 11 e 15 anos ( ) entre 11 e 15 anos 11h ( ) 11h ( ) ( ) mais de 15 anos ( ) mais de 15 anos Outro: _____ Outro: _____ ( ) NR ( ) NR 17. QUAIS DIAS TRABALHA? 18. COMO SE DESLOCA ATÉ O LOCAL DE TRABALHO? ( ) segunda à domingo ( ) a pé ( ) ônibus ( ) carona ( ) segunda à sábado ( ) motocicleta ( ) metrô ( ) carreto ( ) segunda à sexta ( ) bicicleta ( ) taxi ( ) NR ( ) outro:_____________________ ( ) automóvel próprio ( ) ferry ( ) NS ( ) NR ( ) transporte alternativo (mototaxi ou van)
19. ONDE VOCÊ BEBE ÁGUA E SE ALIMENTA? 20. SE PRECISAR IR AO BANHEIRO, ONDE VOCÊ VAI? ( ) traz quentinha e almoça no mesmo local onde trabalha
( ) em estabelecimento próximo do local onde trabalha
( ) compra quentinha no mesmo local onde trabalha
( ) em banheiro público
( ) em restaurante próximo ao local onde trabalha
( ) em casa de amigos ou parentes próximos ao local onde trabalha
( ) em casa de amigos ou parentes próximos ao local onde trabalha
( ) em sua própria casa
( ) em sua própria casa ( ) NR ( ) NR ( ) NS ( ) NS
21. O QUE FAZ COM O LIXO PRODUZIDO? ( ) acumula durante o dia e descarta no final da jornada. Onde: ___________________________ ( ) joga em lixeiras públicas ao longo do dia. ( ) leva consigo para descartar em outro local. ( ) deixa na mesma rua onde trabalha. ( ) separa para reciclagem. ( ) Outro: ___________________________________________________________________
22.1 QUANTO VOCÊ CONSEGUE TIRAR NUM DIA BOM?
22.2 QUANTO VOCÊ CONSEGUE TIRAR NUM DIA RUIM?
( ) até R$10,00 ( ) até R$10,00 ( ) entre R$10,00 e R$25,00 ( ) entre R$10,00 e R$25,00 ( ) entre R$25,00 e R$40,00 ( ) entre R$25,00 e R$40,00 ( ) entre R$40,00 e R$60,00 ( ) entre R$40,00 e R$60,00 ( ) entre R$60,00 e R$80,00 ( ) entre R$60,00 e R$80,00 ( ) mais de R$80,00 ( ) mais de R$80,00 ( ) NR ( ) NR ( ) NS ( ) NS
207
23. POR QUE SEU PONTO É NESTA RUA? __________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
24. O PONTO É SEU? 24.1 - SE O PONTO NÃO É SEU, QUAL A RELAÇÃO DE TRABALHO QUE VOCÊ TEM COM ESSA OUTRA PESSOA?
( ) Empregado ( ) Sim ( ) Familiar ( ) Não ( ) Amigo ( ) Outro: ____________________________________
26. VOCÊ TEM LICENÇA? ( )Sim ( ) Não. 26.1 POR QUÊ? ________________________________________________________________________ 27. QUE TIPO DE INVESTIMENTO FEZ PARA COMEÇAR A TRABALHAR NO RAMO?
( ) Poupança própria ( ) Indenização ( ) Empréstimo c/ familiar ( ) Empréstimo bancário ( ) Microcrédito produtivo ( ) Não precisou de recursos ( ) Outro. _______________ ( ) NR ( ) NS
28. SUA RELAÇÃO COM OS COMERCIANTES DAS LOJAS VIZINHAS É: ( ) Boa ( ) Ruim 28.1 SE RUIM, POR QUÊ?_______________________________________________________________ 29. SUA RELAÇÃO COM OS OUTROS TRABALHADORES DE RUA É: ( ) Boa ( ) ruim. 29.1 SE RUIM, POR QUÊ?_______________________________________________________________ 30. VOCÊ FAZ PARTE DE ALGUMA ASSOCIAÇÃO DE TRABALHADORES DE RUA OU AMBULANTES? ( ) Sim ( ) Não 30.1 SE SIM, QUAL? ____________________________________________________________________ 30.2 SE NÃO, POR QUÊ? _________________________________________________________________ CARACTERIZAÇÃO DA MERCADORIA 31. QUAIS PRODUTOS COMERCIALIZA?
( ) Eletrônicos ( ) CD/DVD ( ) Relógios ( ) Bolsas ( ) Roupas ( ) Artesanato ( ) Frutas ( ) Verduras ( ) Alimentos preparados ( ) Cintos ( ) Peixe ( ) Brinquedos ( ) Acarajé ( ) Outros: __________________
32. ONDE VOCÊ COMPRA OS PRODUTOS QUE COMERCIALIZA Indicar local, caso a pessoa especifique:____________________________________________________
( ) No próprio Centro ( ) Salvador ( ) Feira de Santana ( ) São Paulo ( ) Outra cidade. Qual?______________________ ( ) Outro estado. Qual? ________________________ ( ) Outro país. Qual? ________________________ ( ) NR ( ) NS
33. COMO VOCÊ COMPRA A MERCADORIA?
( ) com distribuidor ( ) Faz viagens ( ) Fabricação própria ( ) Outro: __________________ ( ) em lojas de varejo ( ) NR ( ) NS
34. COM QUANTO TEMPO RENOVA O ESTOQUE: ( ) não sabe informar ( ) diariamente ( ) semanalmente ( ) quinzenalmente ( ) mensalmente ( ) Outro: _______________________________________________________
35. ONDE GUARDA A MERCADORIA ( ) Depósito ( ) Em sua própria casa ( ) NR ( ) NS 35.1 ONDE FICA O DEPÓSITO?___________________________________________________________ 35.2 QUANTAS VIAGENS FAZ ATÉ O DEPÓSITO POR DIA? ( ) 2 viagens ( ) 3 viagens ( ) mais de 3 viagens 36. NO LUGAR ONDE GUARDA A MERCADORIA, O ESPAÇO É SÓ SEU OU É DIVIDIDO COM OUTROS TRABALHADORES? ( ) Individual ( ) Coletivo ( ) NR ( ) NS
25. VOCÊ POSSUI OUTROS PONTOS? QUANTOS?
25.1 SE POSSUI OUTROS PONTOS, ONDE ELES FICAM?
( ) Não possui outros pontos. ( ) Na mesma rua.
( ) Possui mais 1 ponto. ( ) Em outro local. Qual? ____________________
( ) Possui mais 2 pontos.
( ) Possui mais de 3 pontos.
208
37. QUANTO CUSTA? ( ) Gratuito ( ) Paga aluguel ( ) NR ( ) NS 37.1 SE PAGA ALUGUEL, QUANTO CUSTA? ________________________________________________ 38. VOCÊ TERIA DISPONIBILIDE PARA RESPONDER OUTRAS QUESTÕES PARA ESTA PESQUISA, CASO SEJA NECESSÁRIO? ( ) Sim ( ) Não OBSERVAÇÕES: _________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
209
APÊNDICE B: QUESTIONÁRIO DE APROFUNDAMENTO APLICADO COM OS 10
TRABALHADORES DE RUA SELECIONADOS
QUESTIONÁRIO DE APROFUNDAMENTO
PESQUISA SOBRE TRABALHADORES DE RUA EM SALVADOR
CARACTERIZAÇÃO DA ATIVIDADE
1. NOME: ____________________________________________________________________
2. COMO COMEÇOU A ATIVIDADE? O QUE PÔDE CONQUISTAR A PARTIR DESSE TRABALHO?
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
3. VOCÊ MUDARIA O LOCAL DO PONTO SE PUDESSE? PARA ONDE? POR QUÊ?
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
4. VOCÊ POSSUI ALGUM TIPO DE CONTROLE CONTÁBIL DO SEU TRABALHO? QUAL?
( ) Não possui ( ) Controle de estoques ( ) Controle de caixas ( ) Controles contábeis
( ) Controle de vendas a prazo ( ) Outro: __________________________
5. COMO VOCÊ OBTEVE A LICENÇA? QUANTO TEMPO LEVOU E O QUE VOCÊ PRECISOU FAZER?
________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
6. COMO ESCOLHE AS MERCADORIAS? VOCÊ CONSIDERA A CONCORRÊNCIA NA ESCOLHA?
_________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
7. QUAL SUA RELAÇÃO COM O LUGAR ONDE GUARDA A MERCADORIA? E COM O PROPRIETÁRIO? (Para ajudar, se for necessário: se conhece o local, se tem acesso, se acha seguro, etc.)
_________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
Universidade Federal da Bahia Faculdade de Arquitetura Programa de Pós Graduação em Arquitetura e Urbanismo - PPG-AU/UFBA
Grupo de Pesquisa Lugar Comum Nome do entrevistador: _____________________ Data: ________________
Rua: _____________________________________________________________
210
CARACTERIZAÇÃO DO COTIDIANO
8. QUAL A IMPORTÂNCIA QUE CONSIDERA QUE O SEU TRABALHO TEM PARA A CIDADE? ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
9. O QUE VOCÊ PENSA SOBRE O QUE ESTÁ ACONTECENDO HOJE COM RELAÇÃO ÀS AÇÕES E PROPOSTAS DE ORDENAMENTO DA ATIVIDADE?
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
10. O QUE VOCÊ PENSA SOBRE A SITUAÇÃO DOS QUE FICARAM DE FORA DA PROPOSTA DE ORDENAMENTO?
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
11. O QUE VOCÊ SABE SOBRE OS LÍDERES DE RUA? QUAL O SEU PAPEL?
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
12. O QUE VOCÊ PENSA SOBRE AS SEGUINTES AFIRMAÇÕES VEICULADAS EM JORNAIS:
“Comércio desordenado invade calçadas”; “Pedestre é expulso das calçadas em Salvador por todo tipo de tranqueira” e “Excesso de camelô na Calçada causa acidente e fere idosa”
(Se for preciso ajudar: o que você pensa sobre essa visão que a mídia ou que a população tem do seu trabalho e o que pensa sobre a relação com a rua)
__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
13. COM RELAÇÃO AO TRABALHO QUE DESEMPENHA, QUAIS SÃO SEUS PLANOS PARA O FUTURO? VOCÊ GOSTARIA DE TER UM EMPREGO FORMAL?
__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
14. QUAIS AS TRÊS PRINCIPAIS DIFICULDADES QUE VOCÊ ENCONTRA NO SEU TRABALHO?
________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
15. QUAIS AS TRÊS COISAS QUE VOCÊ GOSTA NO SEU TRABALHO?
_________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
211
APÊNDICE C: RESULTADO DA CONTAGEM DOS TRABALHADORES PARA
DEFINIÇÃO DA AMOSTRA
Para iniciar este trabalho empírico, buscou-se levantar o número de trabalhadores
em publicações como jornais e diário oficial, porém, devido a diversidade dos quantitativos
encontrados, fez-se necessário realizar uma contagem in loco. Como metodologia para a
contagem, foi decidido realizar a mesma em dois dias diferentes e posteriormente tirar uma
média dos quantitativos encontrados, para, a partir dessa média, definir o tamanho da amostra
necessária.
As contagens foram realizadas nos dias 03/09/2014 (quarta-feira) e 11/09/2014
(quinta-feira). No primeiro dia, 03/09/2014, a contagem foi realizada unicamente pela
pesquisadora, no período da manhã. Cada barraca ou banca que foi encontrada ao longo da área
de estudo foi contada, sempre atentando para a presença do trabalhador junto ao mobiliário. Na
medida em que foi-se caminhando pelas ruas, trechos foram separados para contagem de modo
a evitar a possibilidade de perder-se entre os números. Neste primeiro dia a presença de alguns
fiscais da prefeitura foi notada ao longo de todo percurso e alguns pareceram curiosos sobre o
que estava sendo feito. Os fiscais estavam sempre em duplas e foram observados em três locais
diferentes: próximo às Mercês, ao São Bento e na região do Center Lapa. A contagem realizada
neste dia foi de 1.180 trabalhadores. Ressalta-se que não foi incluída nesta contagem os
trabalhadores que usavam carrinhos, pois devido ao seu deslocamento, havia o risco de contá-
los mais de uma vez. A exceção para este caso foi dos carrinhos de água de coco, pois a maioria
destes tem ponto fixo na rua.
No segundo dia a contagem foi realizada pela pesquisadora e por uma bolsista de
iniciação cientifica. Cada uma fez uma contagem e no final os números foram conferidos. Na
grande maioria dos casos chegou-se ao mesmo resultado, porém quando o resultado diferia
optou-se por retornar ao local para contar novamente ou fechou-se uma média entre as duas
contagens realizadas. Nesse dia só foi notada a presença de quatro fiscais. Dois na região da
Praça São Pedro e dois na região do Center Lapa. Nesse dia o número total foi de 1.076
trabalhadores.
Para facilitar a orientação e análise de campo, foi criado um mapa distinguindo as
04 áreas de aplicação dos questionários (Apêndice D). Neste mapa estão identificadas as áreas
212
e os trechos da Av. Sete de Setembro e Av. Joana Angélica que precisaram ser subdivididos
durante a contagem. Os resultados da contagem por trecho, por sua vez, estão listados na Tabela
X.
De posse dos dados da contagem, cálculos estatísticos foram realizados para se
chegar numa amostra. Esta foi calculada com um nível de confiança de 95% e margem de erro
de 5%. A estatística nos sugere que se estabeleça uma proporção entre dois grupos distintos a
fim de compará-los com o objetivo de saber se a proporção de interesse é a mesma nos dois
grupos ou não. Por exemplo, se temos um dado oficial de que a proporção de mulheres
trabalhadoras de rua é de, digamos, 50% (valor hipotético). Em nosso caso, optamos por
estabelecer a amostra como se este dado proporcional fosse totalmente desconhecido, pois o
nosso interesse não é o de testar se uma determinada proporção é verdadeira ou falsa. Sendo
assim, foi utilizada nos cálculos a proporção 50%, indicada para quando o pesquisador não tem
elementos para arbitrar numa proporção suposta e que, conseqüentemente, resulta na maior
amostra possível. Os cálculos apontaram que seria necessário entrevistar 287 trabalhadores,
número que foi distribuído proporcionalmente ao total global de cada trecho nas ruas. Tendo
sido determinado o tamanho da amostra, partiu-se para a aplicação do questionário básico que
ocorreu entre os meses de setembro e outubro do ano de 2014.
213
Tabela X: Resultado da contagem por trecho
ÁREA LOGRADOURO CONTAGEM
1 DATA
CONTAGEM
2 DATA
MÉDIA
CONTAGENS 1 E
2
% AMOSTRA
ÁR
EA
1
Rua do Cabeça (Dois de Julho, até o coreto) 41 03/09/2014 28 11/09/2014 35 3% 9
Praça Inocêncio Galvão 13 03/09/2014 13 11/09/2014 13 1% 3
Rua da Forca (Dois de Julho) 3 03/09/2014 3 11/09/2014 3 0,3% 1
ÁR
EA
2
Avenida Sete - Lado direito (até o São Bento - Beco Maria Paz) – Trecho 1 22 03/09/2014 19 11/09/2014 21 2% 5
Beco Maria Paz 36 03/09/2014 35 11/09/2014 36 3% 9
Avenida Sete - Lado direito (do Beco Maria Paz à
Rua do Cabeça) – Trecho 2 34 03/09/2014 47 11/09/2014 41 4% 10
Rua do Cabeça (Carlos Gomes) 38 03/09/2014 34 11/09/2014 36 3% 9
Avenida Sete - Lado direito (da Rua do Cabeça até o
Beco do Mucambinho) – Trecho 3 8 03/09/2014 5 11/09/2014 7 1% 2
Beco do Mucambinho 10 03/09/2014 6 11/09/2014 8 1% 2
Avenida Sete - Lado direito (do Beco do
Mucambinho até Rua da Forca) – Trecho 4 4 03/09/2014 3 11/09/2014 4 0,3% 1
Rua da Forca (Carlos Gomes) 57 03/09/2014 55 11/09/2014 52 5% 14
Avenida Sete - Lado direito (da Rua da Forca até Rua Pedro Autran) – Trecho 5
26 03/09/2014 25 11/09/2014 26 2% 7
Avenida Sete - Lado direito (da Rua Pedro Autran até a Travessa Jonathas Aboti - Beco das Quebranças) –
Trecho 6
9 03/09/2014 9 11/09/2014 9 1% 2
Travessa Jonathas Aboti - Beco das Quebranças 5 03/09/2014 3 11/09/2014 4 0,4% 1
Avenida Sete - Lado direito (da Travessa Jonathas
Aboti (Beco das Quebranças) até Rua Salvador
Pires) – Trecho 7
5 03/09/2014 2 11/09/2014 4 0,3% 1
Rua Salvador Pires 6 03/09/2014 5 11/09/2014 6 0,5% 2
214
Á
RE
A 3
Avenida Sete - Lado esquerdo (até a Rua do Paraíso)
– Trecho 1 13 03/09/2014 14 11/09/2014 14 1% 4
Avenida Sete - Lado esquerdo (da Rua do Paraíso até loja Barreiro's Calçados ) – Trecho 2 4 03/09/2014 5 11/09/2014 5 0,4% 1
Praça São Pedro 147 03/09/2014 144 11/09/2014 146 13% 37
Rua Portão da Piedade 79 03/09/2014 84 11/09/2014 82 7% 21
Rua 11 de Junho 25 03/09/2014 em reforma 11/09/2014 0 0% 0
Rua 21 de Abril 62 03/09/2014 59 11/09/2014 61 5% 15
Avenida Sete - Lado esquerdo (da loja de roupas em
frente à Insinuante até a Livraria Monteiro e depois
até a Farmácia Santana) – Trecho 3 23 03/09/2014 23 11/09/2014 23 2% 6
Praça da Piedade 20 03/09/2014 22 11/09/2014 21 2% 5
Avenida Sete - Lado esquerdo (da Faculdade de
Economia até Largo do Rosário) – Trecho 4 15 03/09/2014 16 11/09/2014 16 1% 4
Largo do Rosário 25 03/09/2014 17 11/09/2014 21 2% 5
Avenida Sete - Lado esquerdo (do Largo do Rosário
até a Rua Clóvis Spínola) – Trecho 5 4 03/09/2014 4 11/09/2014 4 0,4% 1
Rua Clóvis Spínola 24 03/09/2014 24 11/09/2014 24 2% 6
Avenida Sete - Lado esquerdo (da Rua Clóvis Spínola até às Mercês) – Trecho 6 5 03/09/2014 4 11/09/2014 5 0,4% 1
ÁR
EA
4
Rua Nova de São Bento (em reforma) 0 03/09/2014 0 11/09/2014 0 0% 0
Frente do Center Lapa 24 03/09/2014 25 11/09/2014 25 2% 6
Rua Coqueiros da Piedade 193 03/09/2014 166 11/09/2014 180 16% 46
Rua Conselheiro Junqueira Ayres 48 03/09/2014 43 11/09/2014 46 4% 12
Rua 24 de Fevereiro 45 03/09/2014 34 11/09/2014 40 3% 10
Praça Carneiro Ribeiro (Central) 58 03/09/2014 56 11/09/2014 57 5% 15
Joana Angélica - Lado esquerdo(da Rua Portão da Piedade à recarga de cartucho) – Trecho 1 2 03/09/2014 1 11/09/2014 2 0,1% 1
Joana Angélica - Lado esquerdo(da recarga de
cartucho até Rua Nova de São Bento) – Trecho 2 10 03/09/2014 11 11/09/2014 11 1% 3
Joana Angélica - Lado esquerdo(da Rua Nova de São Bento até Rua Americo Simas) – Trecho 3 37 03/09/2014 43 11/09/2014 40 4% 10
Joana Angélica - Lado direito (da Coqueiros da
Piedade até 24 de fevereiro) 0 03/09/2014 0 11/09/2014 0 0% 0
TOTAL 1180 03/09/2014 1076 1131 100% 287
Fonte: Laila Bouças, 2014
215
APÊNDICE D: ÁREAS PARA APLICAÇÃO DOS QUESTIONÁRIOS BÁSICOS
Figura X: Divisão de áreas para aplicação do questionário básico
Fonte: Elaborado pela autora, sobre a Base SICAD (Sistema Cadastral do Município de Salvador).
216
APÊNDICE E: ROTEIRO DE ENTREVISTA ASSOCIAÇÕES / SINDICATO
ROTEIRO DE ENTREVISTA – ASSOCIAÇÕES E SINDICATOS
PESQUISA SOBRE TRABALHADORES DE RUA EM SALVADOR
1. Nome: ____________________________________________________________________
2. Sexo: ( )F ( )M 3. Bairro onde mora: _______________________________________ 4. Idade: 5. Estado civil: 6. Onde nasceu:
________________________
( ) até 14 anos ( ) Solteiro(a) ( ) Salvador
( ) entre 14 e 18 anos ( ) Casado(a) ( ) RMS*
( ) entre 19 e 25 anos ( ) União estável ( ) interior da Bahia
( ) entre 26 e 30 anos ( ) Viúvo(a) ( ) Outro Estado
( ) entre 31 e 40 anos ( ) Divorciado(a) ( ) Outro país. Qual?___________________
( ) entre 41 e 50 anos ( ) Outro: _____________
( ) entre 51 e 60 ( ) NR ( ) NR
( ) mais de 60 anos
( ) NR * Região Metropolitana de Salvador: Camaçari, Candeias, Dias d'Ávila, Itaparica, Lauro de Freitas, Madre de Deus, Mata de São João, Pojuca, São Francisco do Conde, São Sebastião do Passé, Simões Filho e Vera Cruz.
7.grau de escolaridade Sem escolaridade ( ) Ensino fundamental Completo ( ) Incompleto ( )
Ensino médio Completo ( ) Incompleto ( )
Graduação Completo ( ) Incompleto ( )
Pós-Graduação Completo ( ) Incompleto ( )
NR ( )
8. Para você, como se chama este trabalho que faz aqui? O que ele compreende? Como se define?
____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
9. Você trabalha por conta própria? ( )sim ( ) não. 10. Por que está realizando este trabalho?
( ) Desejo de não possuir patrão ( ) Para complementar a renda da família
( ) Não encontrou outro emprego ( ) Um parente ou amigo ofereceu o trabalho
( ) Tinha experiência ( ) Outro motivo. Qual? _________________________
( ) Tradição familiar ( ) NR
( ) Para ganhar mais ou melhor ( ) NS
11. Há quanto tempo está no sindicato / associação?
__________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________ 12. O que é preciso para fazer parte do sindicato / associação? Quais os critérios?
__________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
Universidade Federal da Bahia
Faculdade de Arquitetura
Programa de Pós Graduação em Arquitetura e Urbanismo - PPG-AU/UFBA
Grupo de Pesquisa Lugar Comum
Nome do entrevistador: _____________________ Data: ________________
Associação/Sindicato: _____________________________________________
217
13. Quantos são os membros associados hoje?
__________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________ 14. O sindicato / associação possui informações sobre quantos são os trabalhadores cadastrados para a
região da Av. Sete de Setembro e adjacências? Em caso afirmativo, onde constam esses registros?
__________________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
15. Há algum levantamento do perfil dos trabalhadores que fazem parte do sindicato / associação? É
possível ter acesso a essas informações? __________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
16. O sindicato ou associação possui informações sobre qual foi critério definido pela prefeitura para escolher os trabalhadores que permaneceriam na Avenida Sete?
__________________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
17. Há informações sobre qual o encaminhamento dado com os demais?
____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
18. O sindicato ou associação possui informações sobre qual a maneira de inibir/coibir que os que não
tenham autorização possam voltar? __________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________ 19. Qual a posição do sindicato/associação no que diz respeito a essa situação?
__________________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
20. Como foi o processo de negociação dos critérios do ordenamento com a prefeitura?
__________________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
21. O que o projeto contempla?
____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
22. E para a associação/sindicato, ficou alguma coisa de fora? __________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________ 23. Com relação às estruturas que dão suporte à atividade, o que mais precisa ser pensado? (ex.:
iluminação, armazenamento de mercadorias, banheiro, coleta de lixo, etc.).
____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
24. Na visão da associação/sindicato, o que mais significativamente mudou com o novo ordenamento dos trabalhadores de rua?
__________________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
218
25. Como funciona o processo de licença/fiscalização atualmente? Houve alguma mudança após as
ações de ordenamento dos últimos 2 anos?
____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
26. Durante o tempo de atuação do sindicato/associação, quais foram os principais problemas
enfrentados pela categoria e em que período esses fatos aconteceram? __________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
27. Durante o tempo de atuação do sindicato/associação, quais foram as principais conquistas alcançadas
e em que período esses fatos aconteceram?
____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
219
APENDICE F: DENSIDADE DE OCUPAÇÃO
A Tabela X apresenta os resultados obtidos para as ruas pedestrianizadas e a Tabela
X para as ruas em que o espaço é dividido entre as faixas de rolamento para veículos e a calçada
de uso dos pedestres. Vale ressaltar que em todas as ruas multiplicamos a média de contagens
por 2,68m² para encontrar a área total demandada pela atividade, exceto para o caso da Rua do
Cabeça (Dois de Julho), onde multiplicamos a média por 4,4m². Isto foi devido ao fato de que
na Rua do Cabeça o mobiliário utilizado não ser o padronizado pela prefeitura, podendo ser
encontrados diferentes tipos de tabuleiro. Por isto, optamos por utilizar como base a área da
situação onde mais espaço é demandado pela atividade.
Tabela X – Ruas tipo “A” – Pedestrianizadas
Logradouro
Média
contagens
1 e 2
Área
demandada
pela atividade
(m²)
Área da
rua (m²)
% Área
demandada /
Área da rua
(pedestrianizadas)
Densidade de
ocupação
Rua do Cabeça (Dois de
Julho, até o coreto) 35 155 313,6 50% Alta
Rua da Forca (Dois de
Julho) 3 8 805 1% Baixa
Beco Maria Paz 36 96 359,13 27% Média
Rua do Cabeça (Carlos Gomes)
36 96 229,04 42% Média
Beco do Mucambinho 8 21 167,2 13% Baixa
Rua da Forca (Carlos
Gomes) 55 147 215,73 68% Alta
Rua Portão da Piedade 82 220 387,42 57% Alta
Rua 11 de Junho 25 67 210,88 32% Média
Rua 21 de Abril 61 163 448,34 36% Média
Largo do Rosário 21 56 1041,35 5% Baixa
Rua Nova de São Bento 53 142 986,04 14% Baixa
Rua Coqueiros da Piedade 180 482 968,1 50% Alta
Rua 24 de Fevereiro 40 107 373,2 29% Média
Praça Carneiro Ribeiro 57 153 785,895 19% Baixa
Fonte: elaboração da autora, 2015.
220
No caso da Tabela X, em que temos o espaço dividido entre as faixas de rolamento
para veículos e a calçada de uso dos pedestres é importante salientar que a média das contagens
dos trabalhadores foi multiplicada por 4,4m² em todos os trechos da Avenida Sete, pois nessa
rua o mobiliário dificilmente atende ao padrão da prefeitura e muitas vezes fica isolado de
outros. Nos demais casos multiplicamos a média de contagens por 2,68m² para encontrar a área
total demandada pela atividade.
221
Tabela X – Densidades de ocupação nas ruas tipo “B” (dividida entre veículos e calçada)
Logradouro
Média
contagens
1 e 2
Área
demandada
pela
atividade
(m²)
Área da
rua
inteira
Área da
calçada
(m²)
% da área da
calçada em
relação à rua
inteira
Área do
passeio
% da área
do passeio
na
Calçada
% Área
demandada /
passeios
Densidade
de
ocupação
Travessa Jonathas Aboti - Beco das
Quebranças
4 11 532,56 133,14 25% 76,08 14% 2% Baixa
Rua Salvador Pires 6 16 400,66 131,56 33% 71,76 18% 4% Baixa
Rua Clóvis Spínola 24 64 1487 312,27 21% 178,44 57% 21% Média
Frente do Center
Lapa 25 67 1147,39 480,75 42% 96,15 20% 14% Alta
Rua Conselheiro
Junqueira Ayres 46 123 605,64 158,62 26% 86,52 55% 78% Alta
Avenida Sete - Lado direito (até o
São Bento - Beco
Maria Paz)
21 92 2721,65 1032,35 38% 225,24 22% 9% Média
Avenida Sete - Lado direito (do
Beco Maria Paz à
Rua do Cabeça)
41 180 3238,3 871,85 27% 298,92 34% 21% Alta
Avenida Sete -
Lado direito (da
Rua do Cabeça até
o Beco do Mucambinho)
7 31 820,7 226,4 28% 67,92 30% 14% Média
Avenida Sete -
Lado direito (do
Beco do Mucambinho até
Rua da Forca)
4 18 790,49 201,95 26% 69,24 34% 9% Baixa
222
Avenida Sete -
Lado direito (da
Rua da Forca até Rua Pedro Autran)
26 114 3061,5 714,35 23% 244,92 34% 16% Média
Avenida Sete -
Lado direito (da
Rua Pedro Autran até a Travessa
Jonathas Aboti -
Beco das Quebranças)
9 40 2565 665 26% 228 34% 6% Baixa
Avenida Sete -
Lado direito (da
Travessa Jonathas Aboti (Beco das
Quebranças) até
Rua Salvador
Pires)
4 18 1728,25 446 26% 133,8 30% 4% Baixa
Avenida Sete - Lado esquerdo (até
a Rua do Paraíso)
14 62 1468,64 274 19% 131,52 48% 22% Média
Avenida Sete -
Lado esquerdo (da Rua do Paraíso até
loja Barreiro's
Calçados - Praça São Pedro)
5 22 2142,6 398,85 19% 164,16 41% 6% Baixa
Avenida Sete -
Lado esquerdo (da
loja de roupas em frente à Insinuante
até a Livraria
Monteiro e depois até a Farmácia
Santana)
23 101 2549,9 655,9 26% 245,28 37% 15% Média
223
Avenida Sete -
Lado esquerdo (da
Faculdade de Economia até
Largo do Rosário)
16 70 2239,65 414,75 19% 199,08 48% 17% Média
Avenida Sete -
Lado esquerdo (do Largo do Rosário
até a Rua Clóvis
Spínola)
4 18 1761,2 523,6 30% 142,8 27% 3% Baixa
Avenida Sete - Lado esquerdo (da
Rua Clóvis Spínola
até às Mercês)
5 22 2521,92 444 18% 213,12 48% 5% Baixa
Fonte: elaboração da autora, 2015.
224
APÊNDICE G: SISTEMATIZAÇÃO DO QUESTIONÁRIO BÁSICO: TABELAS E
GRÁFICOS
A) Dados de caracterização geral
TABELA A.1
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Sexo
Nº de
respostas
%
feminino 135 47%
masculino 154 53%
Total 289 100,0 Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO A.1
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Sexo
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA A.2
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Bairro onde
mora
Nº de
respostas
%
Águas Claras 3 1,0
Alto da Teresinha 1 ,3
Alto das Pombas 2 ,7
Alto de Coutos 1 ,3
Alto do Cabrito 4 1,4
Arenoso 1 ,3
Arraial do Retiro 1 ,3
Bairro da Paz 3 1,0
Baixa de Quintas 1 ,3
Baixa dos Sapateiros 2 ,7
Barbalho 1 ,3
47%
53%
Feminino
Masculino
225
Barris 13 4,5
Barroquinha 2 ,7
Boa Visa do Lobato 1 ,3
Boca do Rio 4 1,4
Bom Juá 1 ,3
Bonocô 2 ,7
Brotas 4 1,4
Cabula 6 2,1
Caixa d'água 3 1,0
Cajazeiras 9 3,1
Calabar 2 ,7
Campinas de Piraja 1 ,3
Candeias 1 ,3
Castelo Branco 6 2,1
Centenário 1 ,3
Centro 14 4,8
Cidade Nova 2 ,7
Cosme de Farias 4 1,4
Coutos 1 ,3
Dois de Julho 14 4,8
Engenho Velho da Federação 2 ,7
Engenho Velho de Brotas 6 2,1
Engomadeira 1 ,3
Estrada da Rainha 1 ,3
Estrada das Barreiras 1 ,3
Fazenda Coutos 1 1 ,3
Fazenda Grande 2 ,7
Fazenda Grande do Retiro 1 ,3
Fazenda Grande II 1 ,3
Federação 4 1,4
Feira de Santana 1 ,3
G. Piraja 1 1 ,3
Garcia 2 ,7
IAPI 2 ,7
Ilha 2 ,7
Itapuã 2 ,7
Jardim Cruzeiro 1 ,3
Jardim Nova Esperança 1 ,3
Jardim Santo Inacio 1 ,3
Joana Angelica 2 ,7
Lapinha 1 ,3
Largo do Tanque 1 ,3
Lauro de Freitas 1 ,3
Liberdade 3 1,0
Lobato 4 1,4
Marechal Rondon 1 ,3
Mares 1 ,3
226
Massaranduba 1 ,3
Mata Escura 4 1,4
Matatu 1 ,3
Metro 1 1 ,3
Mouraria 1 ,3
Mussurunga 3 1,0
Narandiba 2 ,7
Nazare 3 1,0
Nazaré 6 2,1
Novo Horizonte 1 ,3
Ogunjá 1 ,3
Paralela 1 ,3
Pau da Lima 6 2,1
Pau Miudo 1 ,3
Periperi 2 ,7
Pernambués 8 2,8
Pero Vaz 1 ,3
Piedade 2 ,7
Pirajá 4 1,4
Pituaçu 2 ,7
Plataforma 4 1,4
Politeama 1 ,3
Portão 1 ,3
Praia Grande 1 ,3
Retiro 3 1,0
Ribeira 1 ,3
Rio Sena 1 ,3
Rio Vermelho 2 ,7
Saboeiro 1 ,3
San Martim 1 ,3
Santa Cruz 1 ,3
Santa Mônica 2 ,7
Santa Rita (Matatu de Brotas) 1 ,3
Santo Antônio 2 ,7
São Caetano 5 1,7
São Cristovão 2 ,7
São Marcos 1 ,3
Saúde 1 ,3
Sete de Abril 1 ,3
Sete Portas 3 1,0
Simões Filho 3 1,0
Suburbana 6 2,1
Suburbio 1 ,3
Sussuarana 8 2,8
Sussuarana Nova 1 ,3
Sussuarana Velha 1 ,3
Tancredo Neves 8 2,8
227
Teresinha 1 ,3
Tororó 6 2,1
Vale do Matatu 1 ,3
Valéria 2 ,7
Vasco da Gama 4 1,4
Vida Nova 1 ,3
Vila Laura 1 ,3
Vista alegre 1 ,3
Total 289 100,0 Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA A.3
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Idade
Nº de
respostas
%
até 14 anos 1 ,3
entre 14 e 18 anos 11 3,8
entre 19 e 25 anos 26 9,0
entre 26 e 30 anos 31 10,7
entre 31 e 40 anos 82 28,4
entre 41 e 50 anos 76 26,3
entre 51 e 60 46 15,9
mais de 60 16 5,5
Total 289 100,0 Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO A.3
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Idade
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
0,3%
3,8%
9,0%10,7%
28,4%26,3%
15,9%
5,5%
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%até 14 anos
entre 14 e 18 anos
entre 19 e 25 anos
entre 26 e 30 anos
entre 31 e 40 anos
entre 41 e 50 anos
entre 51 e 60
mais de 60
228
GRÁFICO A.4
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Pirâmide Etária
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA A.4
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Estado civil
Nº de
respostas
%
Solteiro(a) 117 40,5
Casado(a) 109 37,7
União Estável 30 10,4
Viúvo(a) 9 3,1
Divorciado(a) 14 4,8
Outro 10 3,5
Total 289 100,0 Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO A.4
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Estado civil
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
40,5% 37,7%
10,4%4,8% 3,5% 3,1%
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%Solteiro(a)
Casado(a)
União Estável
Divorciado(a)
Outro
Viúvo(a)
229
TABELA A.5.1
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Onde nasceu
Nº de respostas %
5 1,7
Alagoas 2 ,7
Alagoinhas 4 1,4
Amargosa 7 2,4
Anguera 1 ,3
Antas 1 ,3
Bom Jesus da Lapa 1 ,3
Botuporã 1 ,3
Cachoeira 1 ,3
Camaçari 1 ,3
Castro Alves 1 ,3
Ceara 3 1,0
Ceará 1 ,3
Chapada Diamantina 1 ,3
Cipó 1 ,3
Coite 1 ,3
Coité 4 1,4
Conceição de Feira 2 ,7
Coração de Maria 1 ,3
Cruz das Almas 2 ,7
Espírito Santo 1 ,3
Feira de Santana 16 5,5
Gandu 3 1,0
Grecia 1 ,3
Ilha 1 ,3
Ipiaú 1 ,3
Ipira 1 ,3
Ipirá 6 2,1
Irará 2 ,7
Itabuna 1 ,3
Itajuipe 1 ,3
Itaparica 2 ,7
Ituberá 1 ,3
Jaguaquara 1 ,3
Jaguaripe 1 ,3
Jeremoabo 1 ,3
Laje 1 ,3
Mairi 1 ,3
Maracás 1 ,3
Maragogipe 1 ,3
Maranhão 1 ,3
Marau 1 ,3
Mato Grosso do Sul 1 ,3
230
Muritiba 1 ,3
Mutuípe 1 ,3
Não quis informar 1 ,3
Não sabe exatamente onde
nasceu
1 ,3
Pará 1 ,3
Pernambuco 1 ,3
Riachão do Jacuípe 1 ,3
Rio Grande do Norte 1 ,3
Rui Barbosa 2 ,7
Salvador 143 49,5
Santo Amaro 2 ,7
Santo Antonio de Jesus 1 ,3
Santo Antônio de Jesus 1 ,3
Santo Estevão 3 1,0
São Felipe 6 2,1
São Felix 1 ,3
São Gonçalo dos Campos 1 ,3
São Miguel 1 ,3
São Paulo 4 1,4
Sátiro Dias 1 ,3
Sem resposta 6 2,1
Sergipe 9 3,1
Serra Preta 2 ,7
Serrinha 4 1,4
Simões Filhos 1 ,3
Sul do Brasil 1 ,3
Teodoro Sampaio 1 ,3
Terra nova 1 ,3
Valença 1 ,3
Vitória da Conquista 1 ,3
Total 289 100,0 Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA A.5.2
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Onde nasceu –
Síntese Geral
Nº de
respostas
%
Salvador 143 49,5
RMS 6 2,1
Interior da Bahia 111 38,4
Outro Estado 28 9,7
Outro País 1 ,3
Total 289 100,0 Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
231
GRÁFICO A.5.2
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Onde nasceu –
Síntese Geral
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO A.5.3
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Onde nasceu –
Por território de identidade
Nº de
respostas
%
1 ,3
Agreste de Alagoinhas 5 1,7
Bacia do Jacuípe 11 3,8
Bacia do Paramirim 1 ,3
Baixo Sul 6 2,1
Chapada Diamantina 1 ,3
Litoral Sul 3 1,0
Médio Rio das Contas 1 ,3
Metropolitana de Salvador 151 52,2
Outro Estado 29 10,0
Outro País 1 ,3
Piemonte do Paraguaçu 2 ,7
Portal do Sertão 28 9,3
Recôncavo 16 5,5
Sem resposta 8 2,8
Semi-árido Nordeste II 3 1,0
Sisal 8 2,8
Vale do Jiquiriçá 12 4,2
Velho Chico 1 ,3
Vitória da Conquista 1 ,3
Total 289 100,0 Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
49,5%
38,4%
9,7%2,1% 0,3%
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0%
Salvador
Interior da Bahia
Outro Estado
RMS
Outro País
232
TABELA A.6
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Grau de
escolaridade
Nº de
respostas
%
Sem escolaridade 5 1,7
Em andamento 9 3,1
Ensino fundamental completo 36 12,5
Ensino fundamental incompleto 95 32,9
Ensino medio completo 90 31,1
Ensino medio incompleto 50 17,3
Graduaçao completo 2 ,7
Graduaçao incompleto 2 ,7
Total 289 100,0 Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO A.6
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Grau de
escolaridade
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA A.7
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Tem filhos?
Nº de
respostas
%
Não tem filhos 63 21,8
1 filho 69 23,9
2 filhos 71 24,6
3 filhos 45 15,6
4 filhos 12 4,2
5 filhos 13 4,5
6 filhos 8 2,8
7 filhos 1 ,3
8 filhos 1 ,3
10 filhos 4 1,4
1,7%3,1%
12,5%
32,9%31,1%
17,3%
0,7% 0,7%
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%
35,0%Sem escolaridade
Em andamento
Ensino fundamental completo
Ensino fundamental incompleto
Ensino medio completo
Ensino medio incompleto
Graduaçao completo
Graduaçao incompleto
233
11 filhos 2 ,7
Total 289 100,0 Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO A.7
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Tem filhos?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA A.8
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Para você,
como se chama este trabalho que exerce?
Nº de
respostas
%
Ambulante 112 34,5%
Artesão 7 2,2%
Autonomo(a) 68 20,9%
Camelô 51 15,7%
Comércio informal 24 7,4%
Micro empreendedor / Empeendedor individual 18 5,5%
Outros 18 5,5%
Vendedor / Comerciante 24 7,4%
Não respondeu 3 0,9%
TOTAL 325 100% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
21,8%23,9%
24,6%
15,6%
4,2% 4,5%2,8%
0,3% 0,3%1,4% 0,7%
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%Não tem filhos
1 filho
2 filhos
3 filhos
4 filhos
5 filhos
6 filhos
7 filhos
8 filhos
10 filhos
11 filhos
234
GRÁFICO A.8
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Para você,
como se chama este trabalho que exerce?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA A.9
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Você trabalha
por conta própria?
Nº de
respostas
%
Sim 265 91,7
Não 24 8,3
Total 289 100,0 Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRAFICO A.9
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Você trabalha
por conta própria?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
34,5%
20,9%
15,7%
7,4% 7,4%5,5% 5,5%
2,2%0,9%
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%
35,0%
40,0% Ambulante
Autonomo(a)
Camelô
Vendedor / Comerciante
Comércio informal
Micro empreendedor /Empeendedor individualOutros
Artesão
Não respondeu
91,7%
8,3%
Sim
Não
235
TABELA A.10
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Porque está
realizando este trabalho?
Nº de
respostas
%
Desejo de não possuir patrão 71 21,2%
Gosta de trabalhar na rua 19 5,7%
Não encontrou outro emprego 144 43,0%
Para complementar a renda da familia 12 3,6%
Para cuidar dos filhos 6 1,8%
Tem pouca escolaridade 5 1,5%
Tinha experiencia 12 3,6%
Tradição familiar 38 11,3%
Outro motivo 28 8,4%
TOTAL 335 100% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO A.10
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Porque está
realizando este trabalho?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA A.11
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Já trabalhou de
carteira assinada antes? Nº de
respostas
%
Sim 167 57,8%
Não 122 42,2%
Total 289 100,0%
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
1,5% 1,8%3,6% 3,6%
5,7%8,4%
11,3%
21,2%
43,0%
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%
35,0%
40,0%
45,0%
50,0%Tem pouca escolaridade
Para cuidar dos filhos
Para complementar a renda dafamiliaTinha experiencia
Gosta de trabalhar na rua
Outro motivo
Tradição familiar
Desejo de não possuir patrão
Não encontrou outro emprego
236
GRÁFICO A.11
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Já trabalhou de
carteira assinada antes?
TABELA A.12.1
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Se já trabalhou
com a atividade formal antes, o que fazia? – Lista completa
Nº de
respostas
%
25 anos de carteira. Adquiriu deficiência 1 ,3
Acompanhante de idosos 1 ,3
Açougueiro 1 ,3
Ajudante 1 ,3
Ajudante de escritório 1 ,3
Ajudante de montador 1 ,3
Ajudante de pedreiro 2 ,7
Ajudante de pedreiro por 6 meses 1 ,3
Ajudante na empresa 1 ,3
Almoxarifado 1 ,3
Assessorista 1 ,3
Assessorista. Trabalhava no Spc. 1 ,3
Atendente 2 ,7
Atendente e balconista 1 ,3
Auxiliar administrativa 1 ,3
Auxiliar de cozinha 1 ,3
Auxiliar de cozinha. Operadora de caixa etc. 1 ,3
Auxiliar de deposito 1 ,3
Auxiliar de encanador industrial 1 ,3
Auxiliar de enfermagem 1 ,3
Auxiliar de escritório 1 ,3
Auxiliar de escritório, recepcionista. 1 ,3
Auxiliar de produção 1 ,3
Auxiliar de serviços gerais por 2anos 1 ,3
Auxiliar de serviços gerais. 2 ,7
Avipal nordeste no interior 1 ,3
Baba 1 ,3
Balconista 4 1,4
58%
42%
Sim Não
237
Balconista e trabalhou em fabrica também 1 ,3
Balconista, eletricista. 1 ,3
Banco por 3 anos. 1 ,3
Boy de empresas 1 ,3
Caixa de mercado 1 ,3
Caixa Econômica 1 ,3
Caixa por 3 anos 1 ,3
Casa de família 1 ,3
Casa nunes, loja de sapatos. 15 anos 1 ,3
Caseiro, mas não assinou carteira. 1 ,3
Cobrador e trabalhou na Coca Cola por 12 anos. 1 ,3
Comerciante por 19 anos com carteira 1 ,3
Comerciaria, em farmácia Chile. 9 anos e 6 meses 1 ,3
Comerciário 1 ,3
Confeitaria 1 ,3
Conferente 1 ,3
Construção 1 ,3
Construção civil. 2 ,7
Contadora por 10 anos 1 ,3
Construção civil. 1 ,3
Construção civil. 36anos de carteira 1 ,3
Costureira 1 ,3
Cozinheiro na cantina da lua(pelourinho) 1 ,3
Cuidadora de idosos 1 ,3
Dava aula para o primário por 3 anos(1990/1993). 1 ,3
Dava aulas. Tem curso de auxiliar de enfermagem e foi recepcionista. 1 ,3
Digitador 1 ,3
Domestica 2 ,7
Domestica/ Baba 1 ,3
Domestica/Serviços gerais 1 ,3
Eletricista 2 ,7
Em escritório, serviços gerais. 1 ,3
Emprega Doméstica 1 ,3
Empregada com bolsas, cinto ( Não era vendedora). 1 ,3
Entregava jornal 1 ,3
Estagiaria na Farmácia Santana 1 ,3
Fazia leitura de agua. Prestava serviço da Embasa 1 ,3
Fazia moveis 1 ,3
Foi gerente do bom preço. Por 16anos 1 ,3
Funcionaria do Banco Central por 35 anos. 1 ,3
Garçom 1 ,3
Garçom por 15 anos 1 ,3
Garçonete e vendedora 1 ,3
Gerente de loja 1 ,3
Gráfica, porto, frentista 1 ,3
Insinuante 1 ,3
Já trabalhou por a contrato de trabalho 1 ,3
238
Jardineiro 1 ,3
Lanchonete 1 ,3
Loja de ferragens 1 ,3
Manicure, cabelereira. 1 ,3
Militar do exército por 5anos 1 ,3
Motoboy 1 ,3
Motorista 1 ,3
Motorista, caminhoneiro. 1 ,3
Não respondeu 1 ,3
Não se aplica 113 39,1
Não se recorda 1 ,3
Nunca teve oportunidade 1 ,3
Nunca, e nem pretende. Daqui e botar uma loja e pronto 1 ,3
Office Boy 1 ,3
Oficina 1 ,3
Operador de máquina. Pediu para sair, perdeu 8 anos de empresa 1 ,3
Paga INSS de forma autônoma 1 ,3
Pagou INSS por fora para poder se aposentar 1 ,3
Pedreiro 1 ,3
Pedreiro . Carteira assinada por anos 1 ,3
Pedreiro por 18 anos 1 ,3
Pintor 2 ,7
Pintor por 23 anos 1 ,3
Porteiro 1 ,3
Porteiro de cinema. 1 ,3
Produção, embalar roupa, por 4anos 1 ,3
Professora 1 ,3
Promotora 1 ,3
Promotora de vendas 1 ,3
Promotora de vendas por 4anos 1 ,3
Recebia salario, tinha um patrão. Nunca assinaram sua carteira, era
vendedor. E musico.
1 ,3
Recepcionista 2 ,7
Recepcionista por 19anos 1 ,3
Repositor 1 ,3
Rodoviário 1 ,3
Segurança 3 1,0
Segurança por 35 anos. 1 ,3
Sem resposta 3 1,0
Senac, vestart, caixa, vendedora. 1 ,3
Servente, porteiro. 1 ,3
Serviços gerais 2 ,7
Serviços Gerais 1 ,3
Serviços gerais e vigilante 1 ,3
Serviços gerais, vendas de porta em porta. 1 ,3
Serviços gerais. 1 ,3
Serviços gerais por dois anos.Ganhava pouco 1 ,3
239
Sorveteria no campo grande. Viajava para o Paraguai 1 ,3
Supervisor de mercado. 1 ,3
Tem muitos anos . Domestica 20 anos 1 ,3
Terceirizado em uma empresa 1 ,3
Trabalhava na construção civil 1 ,3
Trabalhou 5 meses na Bel, mas não quis que assinassem a carteira,
pois so queria juntar dinheiro.
1 ,3
Trabalhou em 4 empresas 1 ,3
Trabalhou em casa de família 1 ,3
Trabalhou em estaleiro 1 ,3
Trabalhou em mercado 1 ,3
Trabalhou em mercado, repositor 1 ,3
Trabalhou em padaria 1 ,3
Trabalhou em Shopping e em clínica 1 ,3
Trabalhou em uma roça em São Paulo 1 ,3
Trabalhou na Pelicano 1 ,3
Trabalhou na Telebahia 1 ,3
Trabalhou no Bom preço. Promotora de vendas e garçonete 1 ,3
Trabalhou no Fantoches 17 anos 1 ,3
Trabalhou, mas não assinaram a carteira, era secretaria e doméstica. 1 ,3
Transportadora 1 ,3
Varias coisas 1 ,3
Vendas 1 ,3
Vendedor 2 ,7
Vendedor e produtor de material para o polo petroquímico 1 ,3
Vendedor por 13anos, e recepcionista. 1 ,3
Vendedor/ repositor/atendente 1 ,3
Vendedora 6 2,1
Vendedora de loja, 6meses 1 ,3
Vendedora por 13 anos. 1 ,3
Vendedora, professora 1 ,3
Vigilante 2 ,7
Vigilante. Depois com a idade não arranjou mais emprego 1 ,3
Zelador 1 ,3
Total 289 100,0 Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA A.12.2
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Se já trabalhou
com a atividade formal antes, o que fazia? – Síntese
Nº de
respostas %
NR 6 2,1%
Construção civil 16 5,5%
Vendas / Comerciante 20 6,9%
Prestação de serviços 66 22,8%
240
Área de saúde 3 1,0%
Serviços gerais 15 5,2%
Serviços domésticos 10 3,5%
Área de transportes 5 1,7%
Artesão 1 0,3%
Área agrícola 1 0,3%
Área industrial 7 2,4%
Área de educação 3 1,0%
Cargo de gerência / bancário 5 1,7%
Militar / segurança / vigilante 8 2,8%
Outros 6 2,1%
Não se aplica 117 40,5%
Total 289 100,0%
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO A.12.2
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Se já trabalhou
com a atividade formal antes, o que fazia? – Síntese
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
57,6%
11,6%9,3%
4,7% 3,5% 2,9% 2,9% 2,9% 1,7% 1,7% 0,6% 0,6%0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0%
70,0%
Prestação de serviços Vendedor / comerciante
Construção civil Profissional do setor industrial
Não respondeu Profissional do setor de transportes
Profissional com cargo de gerência / bancário Outros
Profissional do setor de saúde Profissional do setor de educação
Profissional do setor agrícola Artesão
241
TABELA A.13
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Quando fica
doente, o que acontece com a atividade?
Quando fica doente o que acontece com a atividade? Nº de
respostas
%
Contrata outra pessoa para trabalhar 2 0,6%
Não fica / nunca ficou doente 15 4,8%
O dono toma conta do ponto 3 1,0%
O negócio fica fechado até se recuperar 188 59,9%
Um membro da família ou conhecido se encarrega do negócio 80 25,5%
Um outro trabalhador de rua cuida da atividade 24 7,6%
Outro 2 0,6%
TOTAL 314 100% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO A.13
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Quando fica
doente, o que acontece com a atividade?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
59,9%
25,5%
7,6%4,8%
1,0% 0,6% 0,6%0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0%
70,0% O negócio fica fechado até serecuperarUm membro da família ouconhecido se encarrega do negócioUm outro trabalhador de rua cuidada atividadeNão fica / nunca ficou doente
O dono toma conta do ponto
Outro
Contrata outra pessoa paratrabalhar
242
B) Caracterização da atividade
TABELA B.1
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Há quanto
tempo exerce a atividade?
Nº de
respostas
%
até 1 ano 29 10%
entre 1 e 2 anos 13 4,5%
entre 2 e 5 anos 28 9,7%
entre 5 e 10 anos 64 22,1%
entre 1 0 e 15 anos 37 12,8%
entre 15 e 20 anos 41 14,2%
entre 20 e 30 anos 49 17%
entre 30 e 40 anos 20 6,9%
entre 40 e 50 anos 4 1,4%
mais de 50 anos 3 1%
NR 1 0,3%
TOTAL 289 100% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO B.1
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Há quanto
tempo exerce a atividade?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
10%
4,5%
9,7%
22,1%
12,8%14,2%
17%
6,9%
1,4% 1% 0,3%0%
5%
10%
15%
20%
25% até 1 anoentre 1 e 2 anosentre 2 e 5 anosentre 5 e 10 anosentre 1 0 e 15 anosentre 15 e 20 anosentre 20 e 30 anosentre 30 e 40 anosentre 40 e 50 anosmais de 50 anosNR
243
TABELA B.2
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Há quanto
tempo trabalha nesta rua?
Nº de
respostas
%
até 1 ano 78 27%
entre 1 e 2 anos 13 4,5%
entre 2 e 5 anos 42 14,5%
entre 5 e 10 anos 65 22,5%
entre 1 0 e 15 anos 36 12,5%
entre 15 e 20 anos 26 9%
entre 20 e 30 anos 20 6,9%
entre 30 e 40 anos 6 2,1%
entre 40 e 50 anos 1 0,3%
mais de 50 anos 2 0,7%
NR 0 0%
TOTAL 289 100% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO B.2
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Há quanto
tempo trabalha nesta rua?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
27%
4,5%
14,5%
22,5%
12,5%
9%
6,9%
2,1%0,3% 0,7% 0%
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%até 1 ano
entre 1 e 2 anos
entre 2 e 5 anos
entre 5 e 10 anos
entre 1 0 e 15 anos
entre 15 e 20 anos
entre 20 e 30 anos
entre 30 e 40 anos
entre 40 e 50 anos
mais de 50 anos
NR
244
TABELA B.3
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Que horas abre
/ que horas fecha?
Fonte: Pesquisa de
campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de
2014.
GRÁFICO B.3
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Que horas abre
/ que horas fecha?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
Horário que abre
Antes de 6h 2 0,7%
Entre 6 e 7h 29 10%
Entre 7 e 8h 63 21,8%
Entre 8 e 9h 101 34,9%
Entre 9 e 10h 74 25,6%
Entre 10 e 11h 12 4,2%
Entre 11 e 12h 6 2,1%
Outros 2 0,7%
Total 289 100,0%
Horário que fecha
Entre 17 e 18h 71 24,6%
Entre 18 e 19h 119 41,2%
Entre 19 e 20h 63 21,8%
Entre 20 e 21h 16 5,5%
Após às 21h 4 1,4%
Outro 16 5,5%
Total 289 100,0%
0,7%
10%
21,8%
34,9%
25,6%
4,2%2,1%
0,7%
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%
35,0%
40,0%
24,6%
41,2%
21,8%
5,5%
1,4%
5,5%
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%
35,0%
40,0%
45,0%
Entre17 e18h
Entre18 e19h
Entre19 e20h
Entre20 e21h
Apósàs 21h
Outro
245
TABELA B.4
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Quais dias
trabalha?
Nº de
respostas
%
segunda à domingo 6 2,1%
segunda à sábado 248 85,8%
segunda à sexta 27 9,3%
Outro 8 2,8%
TOTAL 289 100,0% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO B.4
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Quais dias
trabalha?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA B.5
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Como se
desloca até o local de trabalho?
N de
respostas
%
A pé 73 23,0%
Automóvel próprio 26 8,2%
Bicicleta 4 1,3%
Carreto 4 1,3%
Ferry boat 2 0,6%
Metrô 2 0,6%
Motocicleta 14 4,4%
Mototaxi ou van 2 0,6%
Ônibus 188 59,3%
Taxi 2 0,6%
TOTAL 317 100% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
2,1%
85,8%
9,3%2,8%
0,0%
20,0%
40,0%
60,0%
80,0%
100,0%
segunda à domingo
segunda à sábado
segunda à sexta
outro
246
GRÁFICO B.5
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Como se
desloca até o local de trabalho?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA B.6
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Onde você bebe
água e se alimenta?
Nº de
respostas
%
traz de casa e consome no mesmo local onde trabalha 91 31,5%
compra e consome no mesmo local onde trabalha 56 19,4%
em restaurante próximo ao local onde trabalha 115 39,8%
em casa de amigos ou parentes próximo ao local onde
trabalha
4 1,4%
em sua própria casa 23 8%
TOTAL 289 100% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO B.6
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Onde você bebe
água e se alimenta?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
59,3%
23,0%
8,2%4,4%
1,3% 1,3% 0,6% 0,6% 0,6% 0,6%0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0%
70,0%Ônibus
A pé
Automóvel próprio
Motocicleta
Bicicleta
Carreto
Ferry boat
Metrô
Mototaxi ou van
Taxi
39,8%
31,5%
19,4%
8%
1,4%
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0% em restaurante próximo ao local ondetrabalha
traz de casa e consome no mesmo localonde trabalha
compra e consome no mesmo local ondetrabalha
em sua própria casa
em casa de amigos ou parentes próximoao local onde trabalha
247
TABELA B.7
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Se precisar ir ao
banheiro, onde você vai?
Se precisar ir ao banheiro, onde vai?
em estabelecimento próximo ao local onde trabalha 273 94,5%
em banheiro público 1 0,3%
em casa de amigos ou parentes próximos ao local onde
trabalha
3 1%
em sua própria casa 10 3,5%
No mesmo local onde trabalha 1 0,3%
Não respondeu 1 0,3%
TOTAL 289 100% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO B.7
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Se precisar ir ao
banheiro, onde você vai?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA B.8
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – O que faz com
o lixo produzido?
Nº de
respostas
%
Acumula durante o dia e descarta na própria rua 171 50,1%
Acumula e gari recolhe durante o dia 33 9,7%
Descarta em outro lugar próximo (poste ou via
pública)
20 5,9%
Joga em lixeiras públicas ao longo do dia 109 32,0%
Não produz lixo 7 2,1%
Separa para reciclagem 1 0,3%
TOTAL 341 100% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
39,8%
31,5%
19,4%
8%
1,4%
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%
35,0%
40,0%
45,0% em restaurante próximo ao localonde trabalha
traz de casa e consome no mesmolocal onde trabalha
compra e consome no mesmo localonde trabalha
em sua própria casa
em casa de amigos ou parentespróximo ao local onde trabalha
248
GRÁFICO B.8
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – O que faz com
o lixo produzido?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA B.9
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Quanto você
consegue tirar um dia bom?
Nº de respostas %
Não respondeu 31 10,7%
entre R$10 e R$30 9 3,1%
entre R$31 e R$50 19 6,6%
entre R$51 e R$100 83 28,7%
entre R$101 e R$150 23 8,0%
entre R$151 e R$200 46 15,9%
entre R$201 e R$300 31 10,7%
entre R$301 e R$500 21 7,3%
entre R$500 e
R$1.000
21 7,3%
mais de R$1.000 5 1,7%
TOTAL 289 100,0% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
52,6%
33,6%
8,7%4,2%
0,7% 0,3%0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0%acumula durante o dia e descarta naprópria rua
joga em lixeiras públicas ao longo do dia
acumula e gari recolhe durante o dia
outro
leva consigo para descartar em outrolocal
separa para reciclagem
249
GRÁFICO B.9
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Quanto você
consegue tirar um dia bom?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA B.10
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Quanto você
consegue tirar num dia ruim?
Nº de respostas %
Não respondeu 31 10,7%
até R$10 80 27,7%
entre R$11 e R$30 46 15,9%
entre R$31 e R$50 41 14,2%
entre R$51 e R$100 50 17,3%
entre R$101 e R$150 15 5,2%
entre R$151 e R$200 10 3,5%
entre R$201 e R$300 11 3,8%
entre R$301 e R$500 5 1,7%
TOTAL 289 100,0%
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO B.10
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Quanto você
consegue tirar num dia ruim?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
10,7%
3,1%6,6%
28,7%
8,0%
15,9%
10,7%7,3% 7,3%
1,7%
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%
35,0%
Não respondeuentre R$10 e R$30entre R$31 e R$50entre R$51 e R$100entre R$101 e R$150entre R$151 e R$200entre R$201 e R$300entre R$301 e R$500entre R$500 e R$1.000
10,7%
27,7%
15,9%14,2%
17,3%
5,2%3,5% 3,8%
1,7%
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%Não respondeu
até R$10
entre R$11 e R$30
entre R$31 e R$50
entre R$51 e R$100
entre R$101 e R$150
entre R$151 e R$200
entre R$201 e R$300
250
TABELA B.11
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Por que seu
ponto é nesta rua? (Síntese)
Nº de
respostas
%
Determinado pela prefeitura / foi transferido / onde trabalhava está
em reforma
125 43,3%
Foi o único local disponível 28 9,7%
Por causa do movimento / localização 43 14,9%
Porque tem amigos no local 12 4,2%
Escolha propria / acha o local bom / pediu para ser transferido para cá 21 7,3%
Acha que o lugar é mais tranquilo / tem menos concorrencia / os
outros locais estavam cheios
4 1,4%
Recebeu o ponto de outra pessoa 7 2,4%
Foi autorizado pelo dono do estabelecimento 1 0,3%
Tradição familiar 26 9,0%
Tem proteção contra sol e chuva / faz menos calor 5 1,7%
Outro 8 2,8%
Não sabe 9 3,1%
TOTAL 289 100,0% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO B.11
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Por que seu
ponto é nesta rua?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
43,3%
14,9%
9,7%9,0%7,3%
4,2%3,1%2,8%2,4%1,7%1,4%
0,3%0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%
35,0%
40,0%
45,0%
50,0% Determinado pela prefeitura / foitransferido / onde trabalhava está emreformaPor causa do movimento / localização
Foi o único local disponível
Tradição familiar
Escolha propria / acha o local bom / pediupara ser transferido para cá
Porque tem amigos no local
NS
Outro
251
TABELA B.12
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – O ponto é seu?
Nº de
respostas
%
Sim 237 82%
Não 52 18%
TOTAL 289 100,0%
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO B.12
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – O ponto é seu?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA B.13
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Se o ponto não
é seu, qual a relação de trabalho que você tem com essa outra pessoa?
nº de
respostas
%
Empregado 18 6,2%
Familiar 24 8,3%
Amigo 6 2,1%
Outro 5 1,7%
Não se aplica 236 81,7%
TOTAL 289 100% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
82%
18%
Sim
Não
252
GRÁFICO B.13
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Se o ponto não
é seu, qual a relação de trabalho que você tem com essa outra pessoa?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA B.14
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Você possui
outros pontos? Quantos?
Nº de
respostas
%
Não possui outros pontos 275 95,2%
Possui mais 1 ponto 11 3,8%
Possui mais 2 pontos 2 0,7%
Possui mais de 3 pontos 1 0,3%
TOTAL 289 100,0%
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO B.14
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Você possui
outros pontos? Quantos?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
81,7%
8,3% 6,2% 2,1% 1,7%0,0%
50,0%
100,0% Não se aplica
Familiar
Empregado
Amigo
Outro
95,2%
3,8% 0,7% 0,3%0,0%
20,0%
40,0%
60,0%
80,0%
100,0%
Não possui outros pontos
Possui mais 1 ponto
Possui mais 2 pontos
Possui mais de 3 pontos
253
TABELA B.15
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Se possui
outros pontos, onde eles ficam?
Nº de
respostas
%
Em outro local 8 2,8%
Na mesma rua 6 2,1%
Não possui outros pontos 275 95,2%
TOTAL 289 100% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO B.15
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Se possui
outros pontos, onde eles ficam?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA B.16
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Você tem
licença?
Nº de
respostas
%
Sim 213 74%
Não 72 25%
Não respondeu 4 1%
TOTAL 289 100,0% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO B.16
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Você tem
licença?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
2,1% 2,8%
95,2%
0,0%
50,0%
100,0%
Na mesma rua
Em outro local
Não possui outros pontos
74%
25%
1%
Sim
Não
Não respondeu
254
TABELA B.17
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Porque tirou a
licença?
Nº de
respostas
%
Porque precisa ter, é obrigatório / Senão não pode trabalhar 62 28,6%
Porque é mais seguro 19 8,8%
Porque pode ficar em paz, despreocupado 14 6,5%
Para estar legal / ter respeito 15 6,9%
Para não perder mercadoria 14 6,5%
Porque ajuda a organizar / precisa ter controle 19 8,8%
Tem, mas acha que não ajuda 7 3,2%
Foi outra pessoa quem fez 7 3,2%
Tem, mas foi licenciado para outro lugar 2 0,9%
Outros 18 8,3%
Sem resposta 35 16,1%
Não sabe 5 2,3%
TOTAL 217 100,0% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO B.17
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Porque tirou a
licença?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
28,6%
16,1%
8,8% 8,8% 8,3% 6,9% 6,5% 6,5%3,2% 3,2% 2,3% 0,9%
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
Porque precisa ter, é obrigatório / Senão não pode trabalhar
Sem resposta
Porque ajuda a organizar / precisa ter controle
Porque é mais seguro
Outros
Para estar legal / ter respeito
Porque pode ficar em paz, despreocupado
Para não perder mercadoria
Tem, mas acha que não ajuda
Foi outra pessoa quem fez
Não sabe
Tem, mas foi licenciado para outro lugar
255
TABELA B.18
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Porque não
tirou a licença?
Nº de
repostas
%
Nunca conseguiu 10 13,9%
Não tem interesse 4 5,6%
Vende produto que não é licenciado 3 4,2%
Não, mas tem autorização da loja 2 2,8%
Não, mas quer ter 2 2,8%
Não, porque acha que não ajuda em nada 1 1,4%
Não, senão tem que ficar no beco 4 5,6%
Tem protocolo, deu entrada, está
aguardando
26 36,1%
Falta tempo 2 2,8%
Perdeu a licença 3 4,2%
Outro 7 9,7%
Não sabe 2 2,8%
Sem resposta 6 8,3%
TOTAL 72 100,0% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO B.18
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Porque não
tirou a licença?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
36,1%
13,9%
9,7%8,3%
5,6% 5,6%4,2% 4,2%
2,8% 2,8% 2,8% 2,8%1,4%
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%
35,0%
40,0%
Tem protocolo, deu entrada, está aguardandoNunca conseguiuOutroSem respostaNão tem interesseNão, senão tem que ficar no becoVende produto que não é licenciadoPerdeu a licençaNão, mas tem autorização da lojaFalta tempoNão, mas quer terNão sabeNão, porque acha que não ajuda em nada
256
TABELA B.19
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Que tipo de
investimento fez para começar a trabalhar no ramo?
Nº de
respostas
%
Crédito com fornecedor 5 1,6%
Empréstimo bancário 30 9,8%
Empréstimo c/ familiar 39 12,7%
Empréstimo com agiota 9 2,9%
Indenização 16 5,2%
Microcrédito produtivo 5 1,6%
Não precisou de recursos 76 24,8%
Não sabe 16 5,2%
Poupança própria 104 34,0%
Outro 6 2,0%
TOTAL 306 100% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO B.19
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Que tipo de
investimento fez para começar a trabalhar no ramo?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
1,6% 1,6% 2,0% 2,9%5,2% 5,2%
9,8%
12,7%
24,8%
34,0%
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%
35,0%
40,0%Crédito com fornecedor
Microcrédito produtivo
Outro
Empréstimo com agiota
Indenização
Não sabe
Empréstimo bancário
Empréstimo c/ familiar
Não precisou de recursos
Poupança própria
257
TABELA B.20
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Sua relação
com os comerciantes das lojas vizinhas é:
Nº de
respostas
%
Boa 266 92%
Ruim 10 3%
Não tem loja próxima 13 4%
TOTAL 289 100,0%
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO B.20
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Sua relação
com os comerciantes das lojas vizinhas é:
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA B.21
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Sua relação
com os outros trabalhadores de rua é:
Nº de
respostas
%
Boa 277 96%
Ruim 12 4%
TOTAL 289 100,0% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
92%
3% 4%
Boa
Ruim
Não tem loja próxima
258
GRÁFICO B.21
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Sua relação
com os outros trabalhadores de rua é:
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA B.22
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Você faz parte
de alguma associação de trabalhadores de rua ou ambulantes?
Nº de
respostas
%
Sim 42 15%
Não 247 85%
TOTAL 289 100,0% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO B.24
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Você faz parte
de alguma associação de trabalhadores de rua ou ambulantes?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA B.25
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Se sim, qual?
Nº de
respostas
%
Assindivan 5 12,2%
Assinformal 1 2,4%
Associação dos vendedores ambulantes 3 7,3%
Sindicato dos ambulantes 9 22,0%
Associação dos moradores do Dois de Julho 2 4,9%
Associação dos feirantes 2 4,9%
Não soube especificar o sindicato ou associação de que
faz parte
10 24,4%
96%
4%
Boa
Ruim
15%
85%
Sim
Não
259
Associação de peixeiros 1 2,4%
Asinderp 1 2,4%
Movimento populacional dos moradores de rua 1 2,4%
Não respondeu 6 14,6%
TOTAL 41 100,0% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO B.25
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Se sim, qual?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA B.26
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Se não, por
quê?
Nº de
respostas
%
Acha que as associações são fracas / não acredita nas associações 28 11,3%
Não vê melhora / utilidade 9 3,6%
Não gosta / não quer 12 4,8%
Não sabe o motivo 16 6,5%
Não conhece / não tem associação 27 10,9%
Não se interessa 31 12,5%
Não tem tempo 8 3,2%
É novato / não sabe se continuará na atividade 5 2,0%
Não tem dinheiro 4 1,6%
Ainda não procurou / não foi procurado por nenhuma entidade 13 5,2%
Já faz parte, mas saiu. Não sabe mais como está 7 2,8%
24,4%
22,0%
14,6%
12,2%
7,3%
4,9% 4,9%
2,4% 2,4% 2,4% 2,4%
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0% Não soube especificar o sindicato ouassociação de que faz parte
Sindicato dos ambulantes
Não respondeu
Assindivan
Associação dos vendedores ambulantes
Associação dos moradores do Dois deJulho
Associação dos feirantes
Assinformal
Associação de peixeiros
Asinderp
Movimento populacional dos moradoresde rua
260
Outro 26 10,5%
Não respondeu 62 25,0%
TOTAL 248 100,0% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO B.26
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Se não, por
quê?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
25,0%
12,5% 11,3% 10,9% 10,5%
6,5% 5,2% 4,8% 3,6% 3,2% 2,8% 2,0% 1,6%
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
Não respondeu
Não se interessa
Acha que as associações são fracas / não acredita nas associações
Não conhece / não tem associação
Outro
Não sabe o motivo
Ainda não procurou / não foi procurado por nenhuma entidade
Não gosta / não quer
Não vê melhora / utilidade
Não tem tempo
Já faz parte, mas saiu. Não sabe mais como está
É novato / não sabe se continuará na atividade
Não tem dinheiro
261
C – Caracterização da mercadoria
TABELA C.1
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Quais produtos
comercializa?
Nº de
respostas
%
Adereços (cintos; meias; toucas; chapéus; óculos e bijuteria) 44 13,6%
Acessórios e serviços para celular 16 5,0%
Água de coco; água; refrigerante 12 3,7%
Alimentos preparados 22 6,8%
Artesanato 5 1,5%
Bolsas; carteiras; sacolas; mochilas 24 7,4%
Bomboniere; cigarros 7 2,2%
Brinquedos 11 3,4%
CD/DVD 10 3,1%
Confecções 45 13,9%
Cosméticos; cabelo; maquiagem; perfumes 6 1,9%
Eletrônicos (celular; antenas; cabos; etc.) 25 7,7%
Frutas; verduras; temperos 25 7,7%
Importados 5 1,5%
Material de escritório; escolar 3 0,9%
Plantas medicinais 4 1,2%
Produtos p/ o lar (peças e fogão; liquidificador; cantoneiras de vidro;
tolhas de mesa; almofada etc.)
9 2,8%
Relógios 19 5,9%
Sandálias 11 3,4%
Serviços de afiações; engraxante 3 0,9%
Variedades (adesivos; fotos; pega-rato; etc.) 12 3,7%
Outros 5 1,5%
TOTAL 323 100% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA C.2
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Onde você
compra os produtos que comercializa?
Nº de respostas %
Salvador (BA) 169 48,4%
No próprio centro de Salvador (BA) 55 15,8%
Interior da Bahia (BA) 55 15,8%
Ceará (CE) 9 2,6%
Paraíba (PB) 1 0,3%
Pernambuco (PE) 4 1,1%
Sergipe (SE) 9 2,6%
Santa Catarina (SC) 1 0,3%
São Paulo (SP) 35 10,0%
Paraguai 3 0,9%
262
Internet 1 0,3%
Não respondeu 3 0,9%
Não Sabe 4 1,1%
TOTAL 349 100% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO C.2
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Onde você
compra os produtos que comercializa?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA C.3
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Como você
compra a mercadoria?
N de
respostas
%
Com distribuidor (atacado) 156 43,8%
Varejo 87 24,4%
Alguém leva no local (atravessador) 29 8,1%
Fabricação própria 13 3,7%
Faz viagens 64 18,0%
Não respondeu 1 0,3%
Não sabe 6 1,7%
TOTAL 356 100,0% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
48,4%
15,8%15,8%
10,0%
2,6%2,6%1,1%1,1%0,9%0,9%0,3%0,3%0,3%
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0%
Salvador (BA)
No próprio centro de Salvador(BA)
Interior da Bahia (BA)
São Paulo (SP)
Ceará (CE)
Sergipe (SE)
Pernambuco (PE)
263
GRÁFICO C.3
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Como você
compra a mercadoria?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA C.4
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Com quanto
tempo renova o estoque?
Nº de
respostas
%
Diariamente 99 32,6%
Dois em dois dias. 9 3,0%
Na medida em que vende 8 2,6%
Semanalmente 74 24,3%
Quinzenalmente 40 13,2%
Trimestralmente 5 1,6%
Mensalmente 45 14,8%
Semestralmente 3 1,0%
Bimensalmente 7 2,3%
Anualmente 1 0,3%
Não respondeu 1 0,3%
Não sabe 4 1,3%
Outro 8 2,6%
TOTAL 304 100,0% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
0,3% 1,7% 3,7%8,1%
18,0%
24,4%
43,8%
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%Não respondeu
Não sabe
Fabricação própria
Alguém leva no local (atravessador)
Faz viagens
Varejo
Com distribuidor (atacado)
264
GRÁFICO C.4
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Com quanto
tempo renova o estoque?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA C.5
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Onde guarda a
mercadoria?
Nº de
respostas
%
Depósito 247 85%
Em sua própria casa 24 8%
Outro 18 6%
TOTAL 289 100,0%
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO C.5
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Onde guarda a
mercadoria?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
32,6%
3,0%
24,3%
13,2%
1,6%
14,8%
1,0%2,3%
0,3%
2,6%
0,3%1,3%
2,6%
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%
35,0% Diariamente
Dois em dois dias.
Semanalmente
Quinzenalmente
Trimestralmente
Mensalmente
Semestralmente
Bimensalmente
Anualmente
Na medida em que vende
Não respondeu
Não sabe
Outro
85%
8%6%
Depósito
Em sua própria casa
Outro
265
TABELA C.6*
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Onde fica o
depósito?
nº de respostas %
Dois de Julho 42 14,5%
São Bento 14 4,8%
Barroquinha 3 1,0%
Avenida Sete de Setembro 20 6,9%
Politeama 9 3,1%
Carlos Gomes 3 1,0%
Portão da Piedade 30 10,4%
Piedade 12 4,2%
São Raimundo 7 2,4%
Rua 21 de abril 20 6,9%
Rua 11 de Junho 1 0,3%
Praça Relógio de São Pedro 16 5,5%
Rua Coqueiros da Piedade 6 2,1%
Lapa 15 5,2%
Campo Grande 4 1,4%
Av. Joana Angélica 4 1,4%
Barris 2 0,7%
Rua Conselheiro Junqueira Ayres 9 3,1%
Rua 24 de Fevereiro 5 1,7%
Rua Nova de São Bento 5 1,7%
Rua Direita da Piedade 3 1,0%
Em casa 21 7,3%
Não especificou 38 13,1%
TOTAL 289 100,0%
* Não pretende-se exibir estes dados na versão final da dissertação. Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA C.7
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Quantas
viagens faz até o depósito por dia?
nº de respostas %
Não faz viagens 55 19%
2 viagens 172 59,5%
3 viagens 14 4,8%
Mais de 3 viagens 26 9%
Não se aplica 22 7,6%
TOTAL 289 100,0%
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
266
GRÁFICO C.7
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Quantas
viagens faz até o depósito por dia?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA C.8
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – No lugar onde
guarda a mercadoria, o espaço é só seu ou é dividido com outros trabalhadores?
Nº de
respostas
%
Individual 37 13%
Coletivo 232 80%
Não se aplica 20 7%
TOTAL 289 100,0% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO C.8
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – No lugar onde
guarda a mercadoria, o espaço é só seu ou é dividido com outros trabalhadores?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
19%
59,5%
4,8%9% 7,6%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
Não faz viagens
2 viagens
3 viagens
Mais de 3 viagens
Não se aplica
13%
80%
7%
Individual
Coletivo
Não se aplica
267
TABELA C.9
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Se paga
aluguel, quanto custa?
Se paga aluguel no depósito, quanto custa? Nº de respostas %
Não respondeu 14 5%
Guarda de graça 27 9%
Guarda em casa 19 7%
até R$20 por semana 49 17%
entre R$20 e R$40 por semana 92 32%
entre R$40 e R$60 por semana 53 18%
entre R$60 e R$80 por semana 10 3%
entre R$80 e R$100 por semana 7 2%
mais de R$120 por semana 8 3%
Não sabe 10 3%
Total 289 100% Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
GRÁFICO C.9
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Se paga
aluguel, quanto custa?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
TABELA C.10
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Você teria
disponibilidade para responder outras questões para esta pesquisa, caso seja necessário?
Nº de
respostas
%
Sim 218 75%
Não 71 25%
TOTAL 289 100,0%
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
9%
7%
17%
32%
18%
3% 2% 3%5%
3%
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35% Guarda de graça
Guarda em casa
até R$20 por semana
entre R$20 e R$40 por semana
entre R$40 e R$60 por semana
entre R$60 e R$80 por semana
entre R$80 e R$100 por semana
mais de R$120 por semana
Não respondeu
Não sabe
268
GRÁFICO C.10
Pesquisa sobre trabalhadores de rua na Avenida Sete e Bairro Dois de Julho – Você teria
disponibilidade para responder outras questões para esta pesquisa, caso seja necessário?
Fonte: Pesquisa de campo da autora, realizada entre os meses de setembro e outubro de 2014.
75%
25%
Sim
Não