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UNIVERSIDADE DE SO PAULO
FACULDADE DE ECONOMIA, ADMINISTRAO E CONTABILIDADE DE
RIBEIRO PRETO
DEPARTAMENTO DE ADMINISTRAO
IRACI DE SOUZA JOO
Comercializao de bioeletricidade no ambiente de contratao livre (ACL) pelas usinas
do setor sucroenergtico da regio de Ribeiro Preto: panorama e anlise das ameaas e
oportunidades
Orientador: Prof. Dr. Edgard Monforte Merlo
Financiamento: Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de So Paulo
RIBEIRO PRETO
2010
1
Prof. Dr. Joo Grandino Rodas
Reitor da Universidade de So Paulo
Prof. Dr. Rudinei Toneto Junior
Diretor da Faculdade de Economia, Administrao e Contabilidade de Ribeiro Preto
Prof. Dr. Andr Lucirton Costa
Chefe do Departamento de Administrao
2
IRACI DE SOUZA JOO
Comercializao de bioeletricidade no ambiente de contratao livre pelas usinas do
setor sucroenergtico da regio de Ribeiro Preto: panorama e anlise das ameaas e
oportunidades
Dissertao apresentada ao Programa de Ps-
Graduao em Administrao de Organizaes da
Faculdade de Economia, Administrao e
Contabilidade de Ribeiro Preto da Universidade de
So Paulo como requisito para obteno do ttulo de
Mestre em Administrao de Organizaes.
Orientador: Prof. Dr. Edgard Monforte Merlo
RIBEIRO PRETO
2010
3
Autorizo a reproduo e divulgao total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio
convencional ou eletrnico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.
Joo, Iraci de Souza
Comercializao de bioeletricidade no ambiente de contratao livre
pelas usinas do setor sucroenergtico da regio de Ribeiro Preto: panorama
e anlise das ameaas e oportunidades. Ribeiro Preto, 2010. 183 p. : il. ;
30cm
Dissertao de mestrado, apresentada Faculdade de Economia,
Administrao e Contabilidade de Ribeiro Preto/USP. Programa de Ps-
Graduao em Administrao de Organizaes.
1. Bioeletrecidade. Ambiente de Contratao Livre. Ambiente de
Contratao Regulada. Setor Sucroenergtico. Consumidor livre. Cogerao.
JOO, I. S. Comercializao de bioeletricidade no ambiente de contratao livre
(ACL) pelas usinas do setor sucroenergtico da regio de Ribeiro Preto: panorama
e anlise das ameaas e oportunidades. 2010. 183 f. Dissertao (Mestrado em
Administrao de Organizaes) - Faculdade de Economia, Administrao e
Contabilidade de Ribeiro Preto, Universidade de So Paulo, Ribeiro Preto, 2010.
ERRATA
pgina linha onde se l leia-se
17 08 contra uma demanda contra uma oferta
73 26 anlise de contedo anlise de contedo, segundo metodologia
desenvolvida por Lopes e Giampaoli (2009),
4
FOLHA DE APROVAO
Iraci de Souza Joo
Comercializao de bioeletricidade no ambiente de contratao livre pelas usinas do setor
sucroenergtico da regio de Ribeiro Preto: panorama e anlise das ameaas e oportunidades
Dissertao apresentada ao Programa de Ps-
Graduao em Administrao de Organizaes da
Faculdade de Economia, Administrao e
Contabilidade de Ribeiro Preto da Universidade de
So Paulo como requisito para obteno do ttulo de
Mestre em Administrao de Organizaes.
Aprovado em __/__/__
Banca Examinadora
Prof. Dr. ________________________________________________________
Instituio____________________________Assinatura___________________
Prof. Dr. ________________________________________________________
Instituio____________________________Assinatura___________________
Prof. Dr. ________________________________________________________
Instituio____________________________Assinatura___________________
5
DEDICATRIA
Aos meus pais Eleonilto e Clia com amor e
gratido pelo possvel e impossvel que
fizeram para que eu chegasse at aqui.
A minha irm Marina com admirao por me
acompanhar desde os primeiros rabiscos e por
ser meu exemplo.
6
AGRADECIMENTOS
A Deus, pela oportunidade de ter terminado mais um captulo da minha vida, na qual sempre
esteve presente, sendo luz, fora e beno.
A Universidade de So Paulo, especialmente ao campus de Ribeiro Preto por ter oferecido
toda a estrutura necessria para que se fosse possvel discutir cincia. Aos funcionrios da
FEARP pela excelente prestao de servio. A BCRP pelo servio de reviso.
Ao meu orientador Prof. Dr. Edgard Monforte Merlo por ter acreditado no meu potencial e
por ter aceitado o desafio que representou essa pesquisa. Agradeo ainda a orientao, a
experincia e o conhecimento transmitido.
Aos demais professores do Programa de Ps-Graduao em Administrao de Organizaes
da FEARP-USP que contriburam para minha formao e crescimento cientfico, profissional
e intelectual.
Aos professores Dr Viviana Giampaoli IME-USP e Dr. Marcos Lopes FFLCH-USP, pela
incansvel ajuda, orientao e efetiva participao na anlise dos dados o qual resultou em
imensurvel ganho de qualidade.
A Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de So Paulo FAPESP por ter reconhecido a
importncia deste estudo e ter disponibilizado os recursos financeiros necessrios para a
realizao da pesquisa (processo n2008/08983-5) e ainda por incentivar a pesquisa.
A todas as pessoas que ajudaram na abordagem das empresas e a todos os entrevistados, pelo
dispndio do precioso tempo, para colaborarem com realizao deste estudo e reconhecerem a
importncia da discusso cientfica para problemas da sociedade.
A minha famlia por todo apoio, compreenso, carinho e amor. Em especial aos meus pais
Eleonilto e Clia por serem meu porto seguro e a minha irm Marina e meu cunhado Edmar
pela constante amizade, ajuda e incentivo e por serem meus exemplos.
Aos amigos da casa 13 com os quais dividi dois agradveis anos da minha vida.
Aos amigos da sala da ps-graduao da FEARP-USP pela agradvel e enriquecedora
convivncia.
A turma de mestrado em Administrao de Organizaes 2008 pelas horas de estudo
compartilhadas, pela contribuio ao meu desenvolvimento cientfico e pela amizade.
Agradeo de um modo maior a Juliana Scriptore, Talia Bonfante, Carlos Bonacim, Leandro
Mximo, Paula Souza, Camila Coelho, Jacyana Saraiva, Christian Ganzert, Julia Taunay e
Saulo Rodrigues pela pacincia em escutar os dilemas e avanos do mestrado e desta pesquisa
e por maximizar os bons momentos e minimizar e minimizar os maus.
7
Nem tudo que se enfrenta pode ser modificado, mas nada pode ser modificado at que seja
enfrentado.
Albert Einstein
8
RESUMO
JOO, IRACI DE SOUZA. Comercializao de bioeletricidade no ambiente de
contratao livre pelas usinas do setor sucroenergtico da regio de Ribeiro Preto:
panorama e anlise das ameaas e oportunidades. 2010. 183 f. Dissertao (Mestrado)
Faculdade de Economia, Administrao e Contabilidade de Ribeiro Preto, Universidade de
So Paulo, Ribeiro Preto, 2010.
O mercado brasileiro de eletricidade enfrentou nos ltimos anos, crises de abastecimento,
devido ao maior crescimento da demanda em relao oferta. Derivado da falta de
investimentos em infraestrutura e da concentrao da matriz energtica em hidroeletricidade,
esse cenrio pode ser minimizado pela bioeletricidade cogerada a partir do bagao da cana.
Porm, a efetiva explorao de seu potencial, depende das usinas reconhecerem-na como
produto vivel e lucrativo. Nesse sentido, o objetivo deste estudo foi caracterizar a
comercializao de bioeletricidade no ACL e compar-la com o ACR identificando ameaas,
oportunidades, pontos fortes e fracos de cada um. Realizou-se entrevistas com gestores: de
quatro usinas sucroenergticas, da distribuidora de energia local e de um consumidor livre.
Utilizando-se a anlise SWOT e PEST e as tcnicas de anlise de contedo e correspondncia
os dados foram trabalhados. Os resultados indicaram que a principal vantagem do ACR a
segurana quanto ao preo da energia e a desvantagem a inflexibilidade do contrato aliado a
altas penalidades. O ponto forte relevante do ACL a flexibilidade na definio de prazo,
preo e quantidade e a fraqueza a volatilidade do preo. Devido a essas caractersticas os
agentes tendem a atuar nos dois mercados, adotando como estrutura de governana principal o
mercado e as formas hbridas em segundo plano. Constatou-se ainda a necessidade da atuao
governamental como incentivador de fontes renovveis e provedor de solues para entraves
como a conexo a rede de transmisso, fraqueza dos dois mercados, e a falta de um ambiente
adequado de comercializao.
Palavras-chave: Bioeletrecidade. Ambiente de Contratao Livre. Ambiente de Contratao
Regulada. Setor Sucroenergtico. Consumidor livre. Cogerao.
9
ABSTRACT
JOO, IRACI DE SOUZA. Comercialitation of bioelectricity in the free contracting
environment by the sugar cane mills of the sugar-energy sector from the region of
Ribeiro Preto: scenery and analysis of opportunities e threats. 2010. 183 f. Dissertao
(Mestrado) Faculdade de Economia, Administrao e Contabilidade de Ribeiro Preto,
Universidade de So Paulo, Ribeiro Preto, 2010.
In recent years, the Brazilian electricity market has gone through provision crises, due to the
greater increase in demand with regard to supplies. Resulting from the lack of infrastructural
investments and the concentration of the energy matrix in hydroelectricity, this scenario can
be minimized by the bioelectricity coproduced based on sugar cane pulp. However, the
effective exploration of its potential depends on sugar cane mills acknowledging it as a viable
and profitable product. This research aimed to characterize bioelectricity commerce in a Free
Contracting Environment (ACL) and compare it with a Regulated Contracting Environment
(ACR), identifying the threats, opportunities, strong and weak points of each. Interviews were
held with managers: of four sugar-electricity mills, the local energy distributor and a free
consumer. Data were processed using SWOT and PEST analysis, as well as content and
correspondence analysis techniques. The results indicated that the main advantage of ACR is
security about energy prices, while the disadvantage is the contracts lack of flexibility, in
combination with high penalties. The relevant strong point of ACL is the flexibility to define
term, price and quantity, and the weakness is price volatility. Due to these characteristics,
agents tend to act in both markets, adopting the market as the main governance structure and
hybrid forms at a secondary level. Government action is needed to encourage renewable
energy sources and provide solutions to bottlenecks like connection with the transmission
network, weakness of both markets and lack of an adequate trading environment.
Key Words: Bioelectricity. Free Contracting Environment. Regulated Contracting
Environment. Sugar-energy Sector. Free consumer. Cogeneration.
10
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Estrutura da pesquisa ................................................................................................ 22
Figura 2: Diagrama das instituies do setor eltrico brasileiro 2009. ................................. 38
Figura 3: Processo de comercializao de energia eltrica acr e acl ..................................... 42
Figura 4: Tipos de produtores de energia e transaes regulamentadas pelo decreto n. 2.003
.................................................................................................................................................. 43
Figura 5: Processo de cogerao no setor sucroenergtico a partir da queima do bagao da
cana. .......................................................................................................................................... 54
Figura 6: Sistema agroindustrial da cana-de-acar ................................................................. 59
Figura 7: Bagao e produo de bioeletricidade cogerada a partir do bagao da cana ............ 60
Figura 8: Ambiente da organizao .......................................................................................... 62
Figura 9: Comercializao de bioeletricidade no acl estruturas de governana e
caracterstica das transaes. .................................................................................................... 84
Figura 10: Contabilizao da compra e venda de energia eltrica no ACL ............................. 88
11
LISTA DE GRFICOS
Grfico 1: Energias renovveis na europa -2005...................................................................... 50
Grfico 2: Produo de energia eltrica a partir de biomassa (em mtoe) - 2005 .................... 51
Grfico 3: Produo de cana-de-acar em milhes de ton. Brasil e regies 1990-2008 .. 57
Grfico 4: Produo de bioeletricidade a partir do bagao de cana 1991 2006 ................. 61
Grfico 5: Anlise de correspondncia para o ambiente poltico-legal. ................................... 86
Grfico 6: Anlise de correspondncia para o ambiente econmico........................................ 93
Grfico 7: Anlise de correspondncia para o ambiente scio-cultural. ................................ 102
Grfico 8: Anlise de correspondncia para o ambiente tecnolgico. ................................... 106
12
LISTA DE QUADROS
Quadro 1: Estrutura de governana adequada em funo da caracterstica das transaes ..... 31
Quadro 2: Mltiplos mais comuns de watts ............................................................................. 35
Quadro 3: Principais diferenas entre o ACR e o ACL. ........................................................... 39
Quadro 4: Cogerao de energia eltrica pelo setor sucroenergtico: principais mudanas e
movimentos 1987 2008. ..................................................................................................... 55
Quadro 5: Anlise SWOT da comercializao de bioeletricidade no ACL e ACR. .............. 110
13
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Indicadores econmicos e energia eltrica Brasil, 1970-2004 ................................. 20
Tabela 2: Usinas cogeradoras localizadas na messoregio de Ribeiro Preto ......................... 71
Tabela 3: Contagem das frequncias da anlise SWOT para o ambiente poltico-legal .......... 87
Tabela 4: Contagem das frequncias da anlise SWOT para o ambiente econmico. ............. 95
Tabela 5: Contagem das frequncias da anlise SWOT para o ambiente scio-cultural ....... 102
Tabela 6: Evoluo dos indicadores econmico-energticos por cenrios Brasil 2005 - 2030
................................................................................................................................................ 104
Tabela 7: Contagem das frequncias da anlise SWOT para o ambiente tecnolgico........... 107
14
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ACL - Ambiente de Contratao Livre
ACR - Ambiente de Contratao Regulado
AL Ameaas do Ambiente de Contratao Livre
ANEEL - Agncia Nacional de Energia Eltrica
ANEEL - Agncia Nacional de Energia Eltrica
AP Autoprodutor de Energia Eltrica
AR Ameaas do Ambiente de Contratao Regulado
BEN Balano Energtico Nacional
BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social
CBEE - Comercializadora Brasileira de Energia Emergencial
CCEAR Contrato de Comercializao de Energia Eltrica no Ambiente Regulado
CCEE - Cmara de Comercializao de Energia Eltrica
CMO Custo Marginal de Operao
CMSE - Comit de Monitoramento do Setor Eltrico
CNAEE - Conselho Nacional de guas e Energia Eltrica
CNPE - Conselho Nacional de Poltica Energtica
COGEN - Associao da Indstria de Cogerao de Energia
CUSD - Contrato de Uso dos Sistemas de Distribuio
ECT Economia dos Custos de Transao
ELETROBRS - Centrais Eltricas Brasileiras S.A.
EPE - Empresa de Pesquisa Energtica
FOL Pontos Fortes do Ambiente de Contratao Livre
FOR Pontos Fortes do Ambiente de Contratao Regulado
FRL Pontos Fracos do Ambiente de Contratao Livre
FRR Pontos Fracos do Ambiente de Contratao Regulado
GW - Gigawatt
kW - Kilowatt
MAE - Mercado atacadista de energia
MAPA Ministrio da Agricultura, Pecuria e Abastecimento
MME - Ministrio de Minas e Energia
MW - Megawatts
MWh Megawatts hora
15
OL Oportunidades do Ambiente de Contratao Livre
ONS - Operador Nacional do Sistema
OR Oportunidades do Ambiente de Contratao Regulado
PCH Pequena Central Hidreltrica
PEST Poltico-legal, Econmico, Scio-cultural e Tecnolgico
PIE Produtor Independente de Energia
PLD Preo da Liquidao das Diferenas
PND - Programa Nacional de Desestatizao
PNE Plano Nacional de Energia
PRODIST - Procedimentos de Distribuio
SAG Sistema Agroindustrial
SIN - Sistema Interligado Nacional
SIN - Sistema Interligado Nacional
SINTREL - Sistema Nacional de Transmisso de Energia Eltrica
SWOT - Strengths, Weaknesses, Opportunities e Threats (pontos fortes, pontos fracos,
oportunidades e ameaas)
TUSD - Tarifa de Uso dos Sistemas de Distribuio
TW - Terawatt
UNICA Unio das Indstrias de Cana-de-acar
W - Watts
16
SUMRIO
1 INTRODUO ................................................................................................................................................ 17
1.1 OBJETIVOS ................................................................................................................................................... 19 1.2 JUSTIFICATIVA ............................................................................................................................................. 20 1.3 ESTRUTURA ................................................................................................................................................. 22
2 REVISO DA LITERATURA........................................................................................................................ 25
2.1 ECONOMIA DOS CUSTOS DE TRANSAO ....................................................................................... 25 2.1.1 Dimenses das Transaes ................................................................................................................. 28
2.1.1.1 Especificidade do ativo necessrio ................................................................................................................ 29 2.1.1.2 Frequncia ..................................................................................................................................................... 30 2.1.1.3 Complexidade das transaes e a incerteza sobre desempenho ..................................................................... 31
2.1.2 Pressupostos Comportamentais .......................................................................................................... 32 2.1.2.1 Racionalidade limitada .................................................................................................................................. 32 2.1.2.2 Comportamento oportunista .......................................................................................................................... 33
2.1.3 Crticas Economia dos Custos de Transao .................................................................................. 33 2.2 ENERGIA ELTRICA E O SETOR ELTRICO NACIONAL ................................................................. 34
2.2.1 Comercializao de energia eltrica no mercado livre ...................................................................... 40 2.2.2 Decreto n. 2.003 de 10 de setembro de 1996 ..................................................................................... 43 2.2.3 Resoluo Normativa n 281/1999 e n 109/2004 .............................................................................. 45 2.2.4 Experincias internacionais ................................................................................................................ 49 2.2.5 Cogerao a partir da queima do bagao de cana-de-acar e a bioeletricidade ............................. 53 2.2.6 Setor sucroenergtico ......................................................................................................................... 57
2.3 ANLISE DO AMBIENTE ....................................................................................................................... 61 2.3.1 Anlise PEST ...................................................................................................................................... 64 2.3.2 Anlise SWOT ..................................................................................................................................... 65
3 METOLOGIA .................................................................................................................................................. 68
4 RESULTADOS E DISCUSSO...................................................................................................................... 79
4.1 ECONOMIA DOS CUSTOS DE TRANSAO APLICADA COMERCIALIZAO DE
BIOELETRICIDADE....................................................................................................................................... 79 4.1.1Dimenses das Transaes .................................................................................................................. 80 4.1.2 Pressupostos comportamentais ........................................................................................................... 82
4.2 ANLISE PEST E SWOT PARA COMERCIALIZAO DE BIOELETRICIDADE ............................. 84 4.2.1 Ambiente Poltico-legal .................................................................................................................................... 85 4.2.2 Ambiente Econmico ....................................................................................................................................... 92 4.2.3 Ambiente Scio-Cultural ................................................................................................................................ 101 4.2.4 Ambiente Tecnolgico ................................................................................................................................... 105
4.3 RESULTADOS DA ANLISE SWOT .................................................................................................... 108
5 CONSIDERAES FINAIS ......................................................................................................................... 115
5.1 QUANTO AOS OBJETIVOS DA PESQUISA ...................................................................................................... 115 5.2 IMPLICAES TERICAS E GERENCIAIS ...................................................................................................... 117 5.3 LIMITAES E TRABALHOS FUTUROS ......................................................................................................... 119
REFERNCIAS ................................................................................................................................................ 120
APNDICE ........................................................................................................................................................ 131
ANEXO .............................................................................................................................................................. 159
17
1 INTRODUO
A energia eltrica pode ser gerada por fontes renovveis de energia como a hidrulica,
a elica, a solar e a biomassa ou por fontes no renovveis como os combustveis fsseis. No
Brasil, aproximadamente 90% da eletricidade produzida por meio da explorao do
potencial hdrico do pas. Apesar da importante participao e contribuio dessa fonte de
energia para a matriz energtica brasileira, tem sido evidenciado nos ltimos anos a
necessidade do desenvolvimento de outras fontes de energia, uma vez que o consumo tem
sido maior que a oferta. Em 2008, por exemplo, a produo de energia eltrica foi de 428,7
TWh contra uma demanda de 2,52 TWh, excluindo a autoproduo (BRASIL, 2009 b).
Esse descompasso entre a capacidade de suprimento a curto e mdio prazo e a
crescente demanda, derivada da falta de investimentos no setor (PINTO JNIOR, 2007),
aliado a problemas climticos como secas prolongadas e consequente reduo dos nveis dos
reservatrios das usinas hidreltricas provocou nos ltimos anos crises sucessivas de
abastecimento de energia eltrica, culminando com o seu racionamento em 2001. Dessa
forma, para complementar o suprimento de energia eltrica o governo acionou usinas
termoeltricas. Paralelamente foram realizadas reformas no setor, como o estabelecimento de
novo marco regulatrio e a desestatizao.
Contudo, aps a crise do petrleo na dcada de 70, tornou-se preocupao mundial o
desenvolvimento de fontes renovveis de energia. Nesse sentido, dentre as opes que podem
ser consideradas pelo Brasil, para minimizar o problema de abastecimento de energia eltrica
por meio de fontes renovveis e a necessidade de desenvolver solues no curto prazo, e
tambm de prover a diversificao da matriz energtica, v-se como possvel alternativa a
cogerao de eletricidade a partir do uso dos resduos da cana-de-acar (o bagao, a palha e
os ponteiros da cana), que uma fonte de energia limpa e renovvel, cuja construo da
planta produtiva apresenta o menor tempo (12 meses) e baixo custo se comparada a outras
fontes.
A gerao de energia eltrica por parte do setor sucroenergtico encontra-se muito
aqum de seu potencial (SOUZA e AZEVEDO, 2004). Nesse sentido, Jank (2007) afirma que
se fosse utilizado 50% da biomassa de cana disponvel atualmente, a bioeletricidade1 poderia
suprir, at 2012, 8% da demanda brasileira projetada de energia, o que equivalente a nove
1 A produo de eletricidade a partir da queima do bagao da cana conhecida como bioeletricidade, portanto
nesse estudo ser utilizado esse nome.
18
mil MW (megawatts). Produo igual a esta ser a dos projetos de hidreltricas do rio
madeira, por exemplo. Segundo Souza e Azevedo (2004), mediante a adoo das tecnologias
disponveis de cogerao a partir da queima do bagao e da palha de cana, apenas o
excedente2 da produo de energia gerada pelas usinas paulistas de acar e etanol, seria
capaz de suprir o dficit de toda a regio Sudeste, registrado na poca do racionamento em
2001.
Alm do potencial de gerao, vale ressaltar que o bagao da cana est menos sujeito
s variaes das condies climticas. Assim, a bioeletricidade pode ser uma alternativa
importante para a diversificao da matriz energtica brasileira, que essencialmente baseada
em hidroeletricidade de grande porte, cuja produo dependente da precipitao
pluviomtrica. Adicionalmente, o pico da produo de eletricidade gerada pelo setor
sucroenergtico ocorre nos meses em que tipicamente o sistema hidreltrico sofre as maiores
baixas em seus reservatrios, devido ao perodo de seca.
Entretanto, a comercializao de energia eltrica pelas usinas de acar e etanol ainda
recente (somente em 1987 ocorreu a primeira venda do excedente da produo s
concessionrias de energia) e enfrenta srios problemas como volatilidade do preo e ausncia
de mecanismos contratuais que o minimizem, constante mudana de legislao, altas
penalidades, falta de um ambiente adequado para a comercializao etc.
Inicialmente a venda de energia eltrica e, portanto de bioeletricidade, poderia ocorrer
apenas no ambiente de contratao regulado (ACR), em que as transaes acontecem por
meio de leiles promovidos pelo governo. A partir de 1996, aps mudana no marco
regulatrio, originou-se um segundo mercado, o ambiente de contratao livre (ACL), em que
a transao ocorre diretamente entre geradores e consumidores finais, por meio de
negociaes e contratos bilaterais. Essa mudana teve como principal objetivo introduzir a
concorrncia no setor eltrico, que at ento era exemplo de monoplio natural. Porm, aps
14 anos da reestruturao, a comercializao de energia eltrica no ambiente de contratao
livre no se desenvolveu como o esperado.
No tocante ao setor sucroenergtico, este tambm vem passando por mudanas
profissionalizao da gesto, concentrao e abertura de capital so alguns exemplos. Uma
dessas alteraes, que deve colaborar com o desenvolvimento da bioeletriciade e a explorao
de seu potencial a incorporao do papel de gerador de energia pelos integrantes do setor.
Esta mudana de posicionamento comea ocorrer, haja vista a nova denominao deste, que
2
Diz-se excedente porque muitas usinas so autossuficientes, utilizando parte da energia produzida em seu
processo de fabricao.
19
agora chamado de sucroenergtico e no mais de sucroalcooleiro. Quanto ao cultivo e
industrializao da cana, nos ltimos anos, estes passaram por expanses para outras regies
do pas, porm o Estado de So Paulo ainda concentra o maior nmero de usinas e responde
pela maior produo de cana-de-acar (BRASIL, 2009 a), sendo que a regio nordeste deste
se destaca pela tradio, representatividade da produo e industrializao.
Dessa forma, dada a representatividade dessa regio e os benefcios da cogerao,
como os elencados por Souza (2003): produo descentralizada prxima demanda,
possibilidade de atender a sistemas isolados, ciclo de gerao complementar ao hidreltrico,
agresso relativamente menor ao meio ambiente e possibilidade de comercializao de
crditos de carbono, combustvel renovvel, investimentos menores em bens de capital
produzidos no Brasil e com tecnologia brasileira e rpida entrada em operao comercial; esta
dissertao optou por estudar a comercializao da bioeletricidade cogerada na mesorregio
de Ribeiro Preto.
Como afirmado anteriormente, a comercializao de eletricidade pode ocorrer em dois
mercados distintos, o regulado e o livre. Enquanto este ltimo pode ser considerado uma
forma inovadora de compra e venda de energia, o mercado regulado amplamente utilizado e
se encontra consolidado. O ACL oferece vantagens como maior concorrncia e flexibilidade,
porm ainda est em formao e por isso a legislao que o regulamenta vem sofrendo
frequentes alteraes. Ademais a falta de um ambiente de comercializao que rena todas as
informaes necessrias para a realizao da operao, um relacionamento fraco entre os
agentes (estritamente comercial) mesmo em transaes recorrentes, a adoo do mercado
como estrutura entre outros se configuram como entraves ao desenvolvimento dessa forma de
comercializao. Assim, a contribuio desse estudo foi analisar de modo mais profundo essa
forma de inovadora de comercializao, realizar comparaes com a comercializao
regulada, e propor subsdios para elaborao de polticas pblicas que objetivem o seu
desenvolvimento.
1.1 Objetivos
O objetivo geral dessa pesquisa foi o de caracterizar a comercializao de
bioeletricidade cogerada a partir da queima do bagao da cana, no ambiente de contratao
livre (ACL).
20
Especificamente pretendeu-se:
Traar um panorama da comercializao de bioeletricidade cogerada a partir do
bagao de cana-de-acar, no que tange aos aspectos legais e operacionais;
Comparar o ambiente de contratao regulado (ACR) e o de contratao livre
(ACL), identificando as principais ameaas e pontos fracos, bem como oportunidades e
pontos fortes de cada um deles;
Fornecer suprimento para a elaborao de polticas pblicas e privadas focadas na
gerao de eletricidade pelo setor sucroenergtico, objetivando a consecuo do
aproveitamento efetivo do potencial desse setor tanto no ACR como ACL.
1.2 Justificativa
Estudar a comercializao de bioeletricidade no ACL tem sua justificativa centrada
tanto na oportunidade de explorar o potencial da cogerao a partir da queima do bagao da
cana, quanto na ameaa de racionamento de energia eltrica enfrentada pelo mercado
brasileiro, devido principalmente ao crescimento desproporcional entre o consumo de energia
eltrica, bem maior que o aumento da populao ou do PIB (tabela 1).
Tabela 1: Indicadores econmicos e energia eltrica Brasil, 1970-2004
Discriminao 1970 1980 1990 2000 2004 Mdia no perodo
PIB (R$ bilhes de 2005) 501 1.145 1.339 1.739 1.895
variao entre perodos (% a.a.) - 7 2 2 2 4,0%a.a.
Populao total (milhes) 93 119 147 171 182
variao entre perodos (% a.a.) - 2 2 2 2 2,0% a.a.
PIB per capita (R$ de 2005/hab) 5.387 9.622 9.109 10.170 10.406
variao entre perodos (% a.a.) - 5 0 1 1 2,0% a.a.
Consumo final de e. eltrica (TWh) * 40 123 211 321 347
variao entre perodos (% a.a.) - 12 4 5 2 6,6% a.a.
*exclusive o consumo do setor energtico
Fonte: BRASIL, 2007 a
Ao fazer uma anlise da literatura existente sobre o assunto, no tocante
originalidade, nota-se que a maioria dos estudos teve como foco a implantao do projeto de
cogerao de eletricidade a partir do bagao de cana e a relao entre as usinas e as
21
concessionrias de energia eltrica no ambiente de contratao regulada - ACR (Coelho, 1992
e 1999; Walter, 1994; Clementino, 2001; Oddone, 2001; Pellegrini, 2002; Brighenti, 2003).
No que tange a comercializao, encontram-se os estudos de Souza (2000 e 2004) que
buscaram analisar as formas como ela ocorre. Especificamente no ACL, destaca-se o estudo
de Palomino (2009), contudo este teve como foco especfico o preo, uma das variveis
envolvidas na comercializao. Dessa forma, a abordagem realizada nessa pesquisa atende ao
critrio de originalidade.
O desenvolvimento de trabalhos com essa temtica tambm tem importncia
justificada ao considerar que: a) a energia eltrica desempenha um papel chave no
desenvolvimento da economia brasileira; b) que o pas enfrentou srios problemas para
atender demanda crescente de energia eltrica e que a bioeletricidade possui potencial para
minimizar os problemas de abastecimento, com ciclo produtivo complementar ao hidrulico
(base da matriz energtica nacional; e c) se trata de uma energia limpa e renovvel.
Nesse sentido, estimativas da unio da indstria de cana-de-acar (UNICA) apontam
que at a safra de 2017/18 a comercializao da energia cogerada pelo setor poder
ultrapassar a produo de eletricidade da usina hidreltrica de Itaipu, maior do pas, ficando
em torno de 10.158 MW mdios (UNICA, 2010).
Vale ressaltar tambm, que o pico de produo da bioeletricidade ocorre no perodo
seco, correspondente s maiores dificuldades de abastecimento de eletricidade na regio
Sudeste (maior consumidora3) devido as suas caractersticas climticas.
Porm, para que esse potencial seja efetivamente explorado, necessrio que o setor
sucroenergtico visualize a cogerao de energia eltrica como mais um produto da cadeia,
vivel e lucrativo, e no um subproduto como classificado atualmente, dado que o bagao
pode ser destinado para outros fins como composto para rao animal, fertilizante, biogs
entre outros (SOUZA e AZEVEDO, 2006). Para que isso ocorra, de suma importncia o
desenvolvimento de formas inovadoras de comercializao, como a venda direta para
consumidores livres, que minimize os efeitos prejudiciais causados pela concentrao das
empresas distribuidoras de energia.
A presente pesquisa partiu da concluso e da indicao de pesquisas futuras de outro
estudo no qual identificou-se que particularmente interessante aumentar o volume de
consumidores livres e amparar a comercializao entre estes e os cogeradores de energia
(SOUZA e AZEVEDO, 2006, p.198). Os mesmos apontam que uma maior disponibilidade de
3 Em 2004, a demanda por energia eltrica da regio sudeste foi de 172.029 GWh o que correpondeu a
54% do total brasileiro (MME, 2006).
22
consumidores livres tem o papel de aumentar o valor esperado do MWh, assim como de
reduzir a volatilidade e os riscos de apropriao da renda da atividade pela concessionria
local de energia.
1.3 Estrutura
Visando atender aos objetivos propostos, o estudo foi dividido em cinco captulos que
podem ser visualizados na figura 1.
Figura 1: Estrutura da pesquisa
No primeiro captulo, foi feito uma contextualizao da problemtica da pesquisa,
apresentado os seus objetivos e as suas justificativas. No segundo, foi realizada uma reviso
da literatura a fim de discutir a teoria que fundamenta essa anlise, ou seja, economia dos
custos de transao e anlise do ambiente (metodologias PEST e SWOT). Tambm foi
Captulo 1 INTRODUO
Apresentao do tema, objetivo e justificativa
da pesquisa e organizao do trabalho.
Captulo 3 METODOLOGIA
Anlise de contedo e de correspondncia.
Captulo 2 REFERENCIAL TERICO
Economia dos custos de transao, energia eltrica
e o setor eltrico nacional e metodologias para o
anlise do ambiente.
Captulo 4 - RESULTADOS DA PESQUISA
Aplicao da ECT na comercializao de
bioeletricidade e anlise PEST e SWOT e sugesto de
suprimentos para a elaborao de polticas pblicas.
Captulo 5 CONSIDERAES FINAIS
Implicaes tericas e gerenciais
23
elaborado um panorama sobre o setor sucroenergtico e eltrico, com a discusso do marco
terico para o ACL.
Posteriormente, no captulo trs, foi apresentado o mtodo utilizado para desenvolver
a pesquisa e analisar os dados. Por fim, nos captulos quatro e cinco, so apresentados e
discutidos os resultados do estudo, inclusive com a sugesto de subsdios para a elaborao de
polticas pblicas e as consideraes finais do estudo, respectivamente.
24
CAPTULO 2 REFERENCIAL TERICO
25
2 REVISO DA LITERATURA
2.1 ECONOMIA DOS CUSTOS DE TRANSAO
Pessoas e empresas podem auferir ganhos maiores se cooperarem, especializando-se
em suas atividades produtivas e efetuando transaes para adquirir outros bens e servios que
desejam. Segundo Milgron e Roberts (1992), para os ganhos de cooperao serem obtidos, as
aes e decises precisam ser coordenadas. Dessa forma, a existncia de uma organizao
formal e os detalhes especficos de sua estrutura, poltica e procedimentos refletem as
tentativas para alcanar eficincia em coordenao e motivao.
Essa coordenao pode ocorrer de diversas maneiras, sendo mercado (troca voluntria)
ou hierarquia (linha estrita de autoridade) os dois caminhos extremos que uma organizao
pode escolher (MILGROM; ROBERTS, 1992). J para Williamson (2002, p. 175), o
problema de organizao econmica adequadamente colocado no como mercados ou
hierarquias, mas preferencialmente como mercados e hierarquias 4 uma vez que uma
transao com alto desempenho econmico ir exibir propriedades de ambas as estruturas.
O mercado a estrutura de governana considerada mais eficiente para transaes de
curto prazo, com baixa incerteza e especificidade de ativo. Ela ocorre basicamente por meio
do sistema de preos e est associada a contratos do tipo clssico. J a hierarquia acontece
quando a empresa internaliza o segmento a jusante e/ou a montante de sua atividade principal,
possuindo a propriedade dos ativos e o controle gerencial (WILLIAMSON, 1985). Ademais
se encontra as estruturas hbridas ou intermedirias que so um modo alternativo de
governanas aos dois apresentados como. So criadas a partir de contratos complexos e
arranjos de propriedade parcial como: relaes de longo prazo com fornecedores qualificados,
contratos bilaterais escritos, alianas estratgicas, participao equitativa ou equivalente.
Segundo Coase (1937), em seu teorema que serviu de princpio para o
desenvolvimento da teoria da economia dos custos de transao (ECT), as partes podero
negociar e chegar a um acordo eficiente se o direito de propriedade (uso) estiver bem definido
e os custos envolvidos na negociao forem nulos ou irrisrios.
4 the problem of economic organization is properly posed not as markets or hierarchies but rather as markets
and hierarchies (WILLIAMSON, 2002, p. 175)
26
Nesse caso, os agentes podero negociar sem custos a alocao dos recursos e ento a
eficincia por si s determinar a escolha da estrutura de coordenao, sendo que outros
fatores podem afetar apenas decises sobre como os custos e benefcios sero compartilhados.
Assim, qualquer que seja a distribuio inicial dos direitos, as partes interessadas sempre
podem chegar a um acordo no qual todos ficaro em uma situao melhor e o resultado ser
eficiente (MANKIW, 2001).
Entretanto Coase nos revelou que, a realidade vivenciada pelas organizaes era outra
e que o mecanismo de mercado como estrutura eficiente para alocao dos recursos na
sociedade era exceo, uma vez que muitas transaes ocorriam fora do sistema de preos
(ZYLBERSZTAJN, 2005). A sua concluso foi a de que outras estruturas que no o mercado
eram adotadas porque minimizavam ou mesmo eliminavam os custos envolvidos em
negociaes e acordos (BESANKO et al., 2006).
Assim, Coase (1937) chamou esses dispndios de custos de transao e afirmou que
eles esto envolvidos em cada troca e determinaro a melhor estrutura a ser adotada (mercado
ou hierarquia), ou seja, aquela que os minimiza. Assim, a partir da anlise deles so
escolhidas quais transaes sero mediadas por meio de estrutura de mercado e quais sero
apresentadas dentro de uma organizao formal com direo centralizada.
Para North (1990), a ECT basicamente a somatria dos custos de mensurao do
valor do atributo que ser negociado e dos custos de proteo e monitoramento dos acordos,
para que os direitos sejam respeitados. De acordo com Besanko et al. (2006), os custos de
transao so formados pelo tempo e despesas envolvidas nas negociaes, a escriturao dos
acordos e o estabelecimento de meios para que os contratos sejam cumpridos. Segundo
Milgrom e Roberts (1992), custos de transao so o custo de execuo do sistema: o de
coordenao e o de motivao.
Dentro de um sistema de mercado, custos de transao esto associados com os
problemas de coordenao advindos da necessidade de determinar preos e outros detalhes da
transao, para fazer potenciais compradores e vendedores transacionarem (MILGROM;
ROBERTS, 1992).
Os custos de transao relacionados coordenao em mercados incluem os recursos
que os vendedores despendem com pesquisa de mercado para identificar o desejo do
consumidor e tornar os produtos conhecidos por eles e tambm s decises gerenciais que
determinam o valor da transao. Por outro lado, os consumidores tambm incluem o tempo
gasto na procura pelos fornecedores e pelos melhores preos. Os custos de transao tambm
incluem os benefcios perdidos devido ao encontro entre compradores e vendedores ser
27
imperfeito e transaes de valor no ocorrerem. J em hierarquias o custo determinado pela
busca da informao necessria para determinar um plano eficiente a ser implantado e a sua
comunicao aos responsveis (MILGROM; ROBERTS, 1992).
No tocante aos custos de motivao, eles esto associados assimetria de informao
e aos compromissos imperfeitos. Este advm da inabilidade das partes em fazer com que, por
meio de ameaas e promessas, o contratado seja de fato realizado. J aquela ocorre quando as
partes no possuem todas as informaes necessrias para determinar se os termos do contrato
so mutuamente aceitveis.
Segundo David e Han (2004), a ideia central da ECT que as transaes podem ser
trabalhadas a fim de que os custos envolvidos em sua execuo sejam minimizados. Assim,
foi adotada uma abordagem contratual para o estudo da organizao econmica na qual a
transao considerada a unidade bsica de anlise. Esse escopo, segundo Zylbersztajn
(1995), implica em modificaes significativas na teoria econmica e, consequentemente, no
desempenho econmico, dado que sob esse enfoque as empresas passam a ter o propsito e o
efeito fundamental de reduzir os custos de transao.
Williamson (1989), um dos pioneiros das discusses de ECT, afirma que a anlise dos
custos de transao centraliza-se em verificar se as partes se relacionam harmoniosamente ou
se h frequentes mal entendidos e conflitos que acarretam problemas ao funcionamento do
todo. Esta preocupao semelhante s da produo com relao ao funcionamento do
maquinrio (custos de produo).
A ECT tem uma viso microanaltica, voltada para as firmas. Ela introduz e
desenvolve a importncia econmica da especificidade do ativo; recorre mais anlise
institucional; atribui um peso maior s instituies contratuais ex post e d especial nfase
regulao do setor privado por oposio regulamentao judicial (ZYLBERSZTAJN, 1995;
WILLIAMSON, 1989).
Para o estudo da ECT, necessria a compreenso de dois termos: os custos ex ante e
ex post. O primeiro, chamado de seleo adversa (adverse selection), ocorre quando h
assimetria de informao e se caracteriza pelos custos de redao, negociao e salvaguarda
de um acordo, onde se busca a elaborao de um documento completo em que se estabeleam
numerosas contingncias, fazendo as adequaes necessrias a cada parte. Os estudos desse
tipo de custo enfatizam o alinhamento de incentivos, que incluem as teorias de direito de
propriedade e de agncia.
J o segundo, diz respeito aos custos de assegurar os compromissos e de estabelecer e
administrar a estrutura de governana, ou seja, do esforo para corrigir maus alinhamentos em
28
contratos bilaterais (WILLIAMSON, 1989), pois aparece na forma de risco moral (moral
hazard) devido s dificuldades no monitoramento. O estudo da ECT se foca nesses custos
gerados ex-post.
A transao sujeita ao oportunismo ex post se beneficiaria se fosse possvel elaborar
salvaguardas apropriadas ex ante. Contudo, a elaborao das mesmas envolve custos firma
econmica e, segundo Williamson (1989), a ECT sustenta a hiptese de que impossvel
concentrar toda a ao de negociao pertinente na etapa de contratao ex ante, devido
racionalidade limitada.
2.1.1 Dimenses das Transaes
De acordo com a ECT, as transaes diferem em alguns atributos bsicos, sendo que
cinco tipos tm importantes papis na anlise. Dois so chamados de pressupostos
comportamentais (racionalidade limitada e oportunismo). Os trs restantes so conhecidos
como as dimenses das transaes e compreendem a especificidade dos ativos, a frequncia
com que so realizadas as transaes e a incerteza.
As trs dimenses influenciam na escolha da forma de governana, que segundo
Williamson (1996), podem ocorrer de trs formas: mercado, hierrquica (firma) e hbrida. A
primeira a mais indicada quando as transaes apresentam baixa especificidade do ativo,
frequncia e incerteza, dado que a regulao ocorre via sistema de preo. A segunda
conhecida tambm como integrao vertical e acontece quando a empresa assume total
propriedade dos ativos a jusante ou montante de sua atividade e necessria quando h alta:
especificidade do ativo, frequncia da transao e incerteza quanto ao comportamento dos
agentes envolvidos.
Por fim, na forma hbrida, as partes mantm autonomia na operao, mas so
bilateralmente dependentes (DAVID; HAN, 2004). Esta envolve tanto contratos complexos,
em geral de longo-prazo, como por exemplo: coproduo ou distribuio; arranjos de
propriedade parcial de ativos, alianas estratgicas e joint-ventures.
29
2.1.1.1 Especificidade do ativo necessrio
H, segundo Williamson (1996), ao menos seis tipos distintos de especificidade de
ativos:
a) local - que ocorre quando uma determinada explorao exige que outra, normalmente
complementar, se localize prximo;
b) fsica quando o produto exige um padro de matria-prima especfica e, portanto, inibe os
clientes de trocar de fornecedor;
c) humana - relaciona-se ao capital intelectual necessrio para a produo de um dado produto
(know how);
d) de ativos dedicados produo - ocorre no caso em que uma estrutura produtiva ou um
determinado processo de produo exigido para atender a um cliente especfico;
e) de marca relaciona-se reputao que o nome da empresa ou produto tem no mercado e
exige a exclusividade no fornecimento da matria-prima por parte de uma organizao na
cadeia;
f) temporal envolve perecibilidade ou qualquer outra condio que exija o consumo em um
determinado perodo de tempo.
A especificidade gera uma relao de dependncia, em que uma das partes pode ser
enfraquecida, dado que h necessidade de equipamentos ou suprimentos especiais difceis de
serem encontrados e/ou transferidos para outra atividade. No caso de ativos, d-se a
oportunidade para o agente menos dependente agir de forma oportunista, beneficiando-se da
dependncia da outra parte (ZYLBERSZTAJN, 1995). Na ausncia dessas condies o
mundo dos contratos se simplifica enormemente (WILLIAMSON, 1989).
De acordo com o mesmo autor, as transaes que envolvem um maior grau de
especificidade se adaptam mais sensivelmente s necessidades de governana das transaes
que s estruturas no especializadas, pois no podem se submeter volatilidade das
negociaes sem algum tipo de regulao.
Milgrom e Roberts (1992) corroboram com esse raciocnio ao afirmarem que as
transaes que demandam investimentos especficos normalmente requerem tambm um
contrato ou a prtica de proteo para o investidor contra suspenso da transao
prematuramente ou renegociao oportunista.
A especificidade de um ativo em uma transao pode gerar o problema da apropriao,
pois mesmo em condies no satisfatrias, dado o comportamento explorador da outra parte,
30
para a empresa que detm o bem especfico ainda mais vantajoso vender para ela que para
sua segunda opo devido dificuldade de reaproveitamento do ativo para outros fins, sem
perda de valor. Isso pode gerar renegociaes de contrato mais frequentes e, por conseguinte,
mais difceis e custosas (BESANKO et al., 2006).
As outras duas dimenses (frequncia e incerteza) ganham destaque no estudo da ECT
se houver o registro da especificidade. O custo das estruturas de governana especializadas,
exigida pela especificidade do ativo, se recuperar com maior facilidade quando as transaes
forem grandes e recorrentes, sendo importante assim minimizao da imprevisibilidade das
atitudes posteriores, ou seja, da incerteza (ZYLBERSZTAJN, 1995).
2.1.1.2 Frequncia
A frequncia com que as transaes ocorrem tem importncia na escolha da estrutura
devido a trs fatores: conhecimento, credibilidade e compromisso. O primeiro decorrncia
do convvio, ou seja, quanto mais as transaes ocorrem, mais oportunidade as partes tm de
se conhecerem melhor o que implicar em reduo da incerteza e, como consequncia, adoo
de estruturas de governana menos robustas.
J a credibilidade surge por meio da reputao criada aps algum tempo de transao.
Esta pode ser tanto positiva quanto negativa e, em alguns casos, utilizada tanto por
consumidores, quanto por fornecedores no momento da escolha de seus parceiros e tambm
das formas de contratao.
Por fim, a repetio das transaes tambm pode gerar uma relao de compromisso
dado que frequentes interaes permitem a ambas as partes oportunidades para conceder ou
negar favores um ao outro. Dessa forma, se reduz a necessidade de um tipo formal de
mecanismo para se fazer cumprir o acordo, uma vez que, caso ocorra uma quebra de contrato
na transao X, a parte prejudicada poder punir a faltante na X+1.
Nesse sentido, Raiffa (1991) afirma que as estruturas de governana sero respeitadas
quando h frequncia, entretanto esse comportamento ocorrer at a penltima troca, dado
que na ltima os agentes tendem a se utilizar do comportamento oportunista, pois no haver
a prxima transao e, consequentemente, a possibilidade de punio. Da mesma forma, nas
negociaes em que a frequncia inexistente, a presena do comportamento oportunista
tende a ser maior.
31
2.1.1.3 Complexidade das transaes e a incerteza sobre desempenho
Geralmente quando h incerteza e complexidade torna-se difcil prever qual o
desempenho desejvel, assim a contratao se torna mais complexa, de alta especificao,
obrigao e procedimentos (MILGROM; ROBERTS, 1992).
Em uma definio genrica North (1990) afirma que a incerteza o desconhecimento
dos eventos futuros. Zylbersztajn (1995) afirma que h dois tipos bsicos de incerteza, a
primeira diz respeito aos eventos cuja ocorrncia aleatria e a segunda imprevisibilidade
do comportamento dos agentes, ou seja, ao possvel comportamento oportunista.
O quadro 1 mostra qual estrutura de governana adotar em funo de duas das trs
caractersticas das transaes relevantes para anlise de ECT. Williamson (1985) argumenta
que a integrao vertical, representa uma opo mais eficiente quando h grande necessidade
de coordenao interna, devido existncia de elevada especificidade do ativo e de grande
incerteza. Antes desta opo, o mercado e os modelos hbridos so avaliados.
Incerteza
Esp
ecif
icid
ade
dos
ativ
os
Baixa Mdia Alta
Baixa Mercado Mercado Mercado
Mdia Contrato Contrato ou
integrao vertical
Contrato ou integrao
vertical
Alta Contrato Contrato ou
integrao vertical
Integrao Vertical
Fonte: Brickley; Smith e Zimmerman, 1997.
Quadro 1: Estrutura de governana adequada em funo da caracterstica das transaes
Assim, por exemplo, quando a incerteza baixa e o ativo transacionado no
especfico aquela transao, a mesma pode ocorrer via mercado, pois os custos de transao
tendem a ser baixos. Da mesma forma, quando a transao possui um alto grau de incerteza e o ativo
transacionado de especificidade elevada, indicado que a organizao opte por estruturas mais
robustas e seguras de governana, o que leva ao outro extremo, ou seja, a estrutura hierrquica
(integrao vertical).
32
2.1.2 Pressupostos Comportamentais
Os pressupostos comportamentais so as variveis independentes da anlise da
economia dos custos de transao, chamados de racionalidade limitada e oportunismo.
2.1.2.1 Racionalidade limitada
De acordo com Besanko et al. (2006), esse pressuposto est ligado capacidade de
indivduos em prever ou enumerar as contingncias que possam surgir durante uma transao,
dada sua limitao para trabalhar com a informao disponvel, a complexidade do ambiente e
definir objetivos totalmente racionais.
A racionalidade limitada e o comportamento otimizador caminham juntos, uma vez
que o agente apesar de desejar ser o mais eficiente e eficaz possvel e despender seus
melhores esforos para lidar com a complexidade e imprevisibilidade do mundo a sua volta,
falta-lhe o conhecimento e / ou habilidade para prever com preciso todas as diversas
contingncias que possam surgir (BOERNER; MACHER, 2002), ou seja, os atores
econmicos desejam ser racionais, mas apenas conseguem s-lo de maneira limitada
(SIMON, 1961 apud 5 ZYLBERSZTAJN, 1995).
Dessa forma, devido incompletude dos contratos, criam-se salvaguardas contratuais
a fim de permitir uma reconsiderao ex-post caso ocorra um fato no previsto que afete
significativamente a transao e aumente os seus custos. Segundo Milgrom e Roberts (1992),
quando difcil mensurar o desempenho, as pessoas geralmente planejam seus negcios para
tornar a mensurao mais fcil ou reduzir a importncia de sua acuraria.
Williamson (1989) afirma existir trs nveis de racionalidade: a forte, considerada a
maximizadora; a semiforte, que a limitada; e a fraca, que a orgnica. A ECT parte do
princpio que os agentes esto no segundo nvel, ou seja, possuem racionalidade limitada, uma
vez que, so intencionalmente racionais, mas de forma limitada, tornando assim os contratos
incompletos.
5 SIMON, H. A. Administrative Behaviour. New York : Macmillan, 1961.
33
Aliados racionalidade limitada, outros dois fatores impedem a elaborao de um
contrato totalmente completo, so eles: a dificuldade em especificar ou mensurar o
desempenho e a informao assimtrica (BESANKO et al., 2006).
2.1.2.2 Comportamento oportunista
Com relao ao oportunismo, este tambm apresenta trs tipos, sendo o mais fraco a
obedincia; o semiforte, a busca do interesse prprio; e o mais forte e que est presente no
estudo da ECT, o oportunismo propriamente dito. Basicamente ele se refere revelao
incompleta e distorcida da informao, especialmente dos esforos premeditados para
equivocar, distorcer, ocultar, ofuscar ou confundir a outra parte.
Nesse sentido, Williamson (1989) coloca que o alto preo da informao a chave
para os custos de transao. O oportunismo gera a assimetria de informaes que
responsvel pelos problemas da organizao econmica. Em suma, quando no h
oportunismo todo comportamento poderia ser governado por regras gerais, por meio das quais
as partes aceitariam a limitao das aes de maximizao conjunta do benefcio.
2.1.3 Crticas Economia dos Custos de Transao
Ao fazer uma anlise crtica sobre a ECT, so levantados alguns pontos que merecem
maior reflexo. Nesse sentido, Hodgson (1998) aponta que o comportamento individual no
pode ser algo considerado como exgeno s organizaes, uma vez que elas podem produzir,
reforar e transmiti-lo, de maneira que a relao entre indivduo-estrutura no possa ser
analisada considerando apenas o comportamento do primeiro, do qual as organizaes
procuram salvaguardas.
Outro ponto criticado a considerao do oportunismo como um dos pressupostos
bsicos da ECT, dado que esse endgeno a cada cultura ou sociedade (valores) e no uma
hiptese que pode ser considerada a priori (DIETRICH, 1994). Esse autor ainda afirma que
no possvel separar a incerteza do comportamento individual dos agentes, sendo
desnecessrio o enfoque dessa teoria a esse pressuposto.
34
Por fim, criticado tambm o tratamento despendido ao ambiente institucional que
considerado como dado, ignorando assim a sua importncia no desempenho da firma, em
termos, por exemplo, de agente provedor de mudana ou de determinante do carter
especfico dos ativos (PITELIS, 1994; NOOTEBOOM, 1992). Essas duas caractersticas
esto presentes fortemente no agronegcio e tambm no sistema eltrico, com a atuao de
rgos de pesquisa e universidades no mbito da inovao e do governo na regulao que
podem conferir carter especfico ao ativo.
Segundo Zylbersztajn (2000), para se alcanar a eficincia na coordenao de sistemas
agroindustriais se faz necessrio um profundo conhecimento das caractersticas das
transaes, a fim de se obter o melhor desenho das transaes, ou seja, a forma de governana
mais adequada, que possibilita uma economia nos custos de transao. Dado que este
estudo analisa principalmente a contratao de energia no ACL, os aspectos tericos da
economia dos custos de transao foram aplicados ao tema e se encontram presentes na
anlise dos resultados.
2.2 ENERGIA ELTRICA E O SETOR ELTRICO NACIONAL
Para a produo de energia eltrica, seja ela em uma usina hidreltrica ou
termoeltrica (caso das usinas de acar e etanol), necessrio basicamente uma turbina, que
pode ser movida, por exemplo, por vapor gerado pela queima de bagao de cana, que produz
energia mecnica transformada em eltrica por um gerador.
A eletricidade medida em watts (W) sendo seus mltiplos expressos no quadro 2.
Geralmente o consumo medido em KWh (HOCHSTETLER, 1998). De acordo com Martin
(1992), a eletricidade originada por fonte primria quando advm de produtos energticos
naturais na sua forma direta, ou secundria quando a matria-prima sofre transformao.
Dessa forma, o bagao de cana-de-acar pode ser considerado uma fonte secundria de
energia.
No Brasil, a produo de energia eltrica possui quatro etapas distintas: gerao,
transmisso, distribuio e comercializao, sendo que na primeira e na ltima as atividades
so potencialmente competitivas, pois existem vrios geradores e compradores, e nas
intermedirias ocorrem monoplios naturais tpicos, com a atuao de poucas empresas
(CASTRO e DANTAS, 2008, a). A prestao desses servios pode ser considerada de
35
utilidade pblica, em que a administrao os presta diretamente ou concede a terceiros o
direito de prest-los em condies regulamentadas pelo Estado, mediante pagamento dos
usurios (BENJ, 1997).
1 kW (quilowatt) 1.000 Watts
1 MW (megawatt) 1.000 kW
1 GW (gigawatt) 1.000 MW
1 TW (terawatt) 1.000 GW
Fonte: Hochstetler, 1998
Quadro 2: Mltiplos mais comuns de watts
De acordo com a Eletrobrs (2008), o setor eltrico nacional passou por oito fases
distintas que revelam a implantao e o desenvolvimento deste no pas. So elas: Primrdios
(1879 1899); Implantao (1903 1927); Regulamentao (1934 1945); Expanso (1953
1961); Consolidao (1962 1973); Estatizao (1975 1986); Privatizao (1988 1999)
e a fase atual iniciada a partir do ano 2000.
A fase primrdios teve incio no ano de 1879 com a inaugurao da primeira
instalao de iluminao permanente do pas, na estao central da estrada de ferro D. Pedro
II, atual Central do Brasil RJ. Esta se desenvolveu a passos lentos, tendo como principais
caractersticas a produo de energia para o transporte urbano e para a iluminao das cidades
(ELETROBRS, 2008).
Em 1889, marcada pela atuao acentuada do capital estrangeiro, por meio das
empresas So Paulo Railway, Light end Power Company Limited e Rio de Janeiro Tramway
Light end power Co. Ltda, teve incio a segunda fase, na qual foi registrado um crescimento
considervel do setor.
Duas caractersticas so relevantes nela, a primeira foi a construo de centrais
geradoras de maior capacidade para atender a demanda crescente e a segunda, a intensificao
do processo de integrao horizontal e centralizao das empresas concessionrias (SOUZA,
2004). Pode-se acrescentar a essas caractersticas a aprovao pelo Congresso Nacional, do
primeiro texto de lei disciplinando o uso de energia eltrica no pas (ELETROBRS, 2008).
Em 1934, aps a promulgao do Cdigo de guas, teve incio a fase
regulamentao e com ela uma nova era para o setor: a estatal. Assim, segundo Guimares,
(2001), dado que a energia eltrica passou a ser vista como necessidade estratgica para o
desenvolvimento industrial do pas, foi proibido o aproveitamento de qualquer novo recurso
36
hdrico por companhias estrangeiras, sendo essa atividade a partir de ento, funo
predominantemente dos governos estadual e federal reguladas at os anos 60, pelo Conselho
Nacional de guas e Energia Eltrica - CNAEE.
Aps 1952, comeou a fase de expanso, em que a tendncia de estatizao foi
fortalecida pela construo, pelo governo federal, da usina de Paulo Afonso, no rio So
Francisco, e da criao do Ministrio de Minas e Energia (MME). Dessa forma, tornou-se
cada vez mais frequente a formao de empresas de capital misto (pblico e privado). Em
1962, o governo criou a Centrais Eltricas Brasileiras S.A. (ELETROBRS) e assumiu a
coordenao efetiva do setor eltrico (ELETROBRS, 2008).
Em 1963, j na fase consolidao, entrou em operao a Usina Hidreltrica de
Furnas, maior do Brasil na poca, e foi assinado o tratado para a construo da Itaipu
Binacional. Posteriormente, iniciou-se a fase da estatizao (1975) com a consolidao do
comando estatal no setor por meio da compra, pelo governo, da Amforsp, Light Rio e Light
So Paulo. A viabilidade desse modelo se deveu explorao de economias de escopo pela
integrao vertical entre gerao e transmisso, a ganhos de escala e diminuio dos custos
de transao (SOUZA, 2003).
Esse movimento de expanso da indstria eltrica no Brasil foi semelhante ao
observado em vrios pases industrializados, cujo pilar central era a constituio de
monoplios verticalizados, com tarifas reguladas pelo custo do servio (PINTO JUNIOR, et
al., 2007).
Segundo os mesmos autores, esse modelo foi sustentvel at o incio da dcada de 80,
quando a crise econmica pela qual passou o pas impactou no setor, deteriorando sua
eficincia econmica, seu modo de organizao industrial e o seu modelo de financiamento.
Dessa forma, em 1990, foi sancionada a Lei n 31 que criou o Programa Nacional de
Desestatizao - PND. Tambm foi institudo o Sistema Nacional de Transmisso de Energia
Eltrica SINTREL - com o objetivo de viabilizar a competio na gerao, distribuio e
comercializao de energia (ELETROBRS, 2008).
Entretanto, em meados da dcada de 90, segundo Pires; Giambiagi e Sales (2001), o
setor estava na seguinte situao:
Estado descapitalizado, inviabilizando investimentos na expanso da oferta e manuteno
das linhas de distribuio, a fim de acompanhar a demanda crescente.
M gesto das empresas de energia e inadequao do regime regulatrio.
Diante desse cenrio, segundo Souza (2004), a partir de 1993, iniciaram-se projetos de
reestruturao do setor cujos objetivos principais foram: assegurar os investimentos
37
necessrios para suprir a demanda e transformar o setor em economicamente eficiente,
assegurando um suprimento confivel ao menor custo possvel.
Para tal, quatro estratgias foram traadas:
Separao das atividades de gerao, transmisso, distribuio e comercializao;
Desregulamentao das atividades de gerao e comercializao a fim de aumentar a
oferta e reduzir o preo. A transmisso e distribuio por serem monoplios naturais
continuariam sendo regulados;
Livre acesso s redes de transmisso e distribuio e
Privatizao.
Souza (2004) afirma que essas mudanas exigiram alteraes no ambiente
organizacional, culminando com a criao da Agncia Nacional de Energia Eltrica
(ANEEL), do mercado atacadista de energia (MAE) e do Operador Nacional do Sistema
(ONS).
Em 2001, o setor eltrico brasileiro enfrentou sua crise mais grave, o que culminou
com o racionamento de energia. Mesmo com os incentivos dado implantao de usinas
movidas a gs no ano anterior, no foi possvel evitar a reduo do fornecimento de
eletricidade. Assim, nesse mesmo ano, foi criada a Comercializadora Brasileira de Energia
Emergencial (CBEE), empresa responsvel por realizar a contratao de energia emergencial
(ELETROBRS, 2008). Para o setor sucroenergtico, esse foi um bom perodo, pois se
obteve as maiores remuneraes para a bioeletricidade, alm de benefcios como o desconto
de 50% na tarifa fio.
Essa questo aliada a outros fatores impediram o sucesso da reforma. Assim, em 2004,
realizou-se outra, cujo objetivo principal foi garantir o abastecimento a um preo acessvel.
Nesse sentido, o novo marco regulatrio do setor eltrico brasileiro introduziu mudanas
significativas a fim de atrair o capital privado necessrio para a expanso da gerao de forma
consistente com as caractersticas e peculiaridades do sistema eltrico brasileiro (ROCHA;
BRAGANA; CAMACHO, 2007).
Atualmente, o setor eltrico nacional composto de sete instituies, conforme a
figura 2.
38
Fonte: CCEE (2009)
Figura 2: Diagrama das instituies do setor eltrico brasileiro 2009.
O Conselho Nacional de Poltica Energtica (CNPE) um rgo interministerial de
assessoramento presidncia, responsvel por formular polticas e diretrizes para o setor de
energia e assegurar o suprimento de insumos energticos s reas do pas cujo acesso difcil.
Ao Comit de Monitoramento do Setor Eltrico (CMSE), cabe acompanhar e avaliar a
continuidade e a segurana do suprimento eltrico em todo o territrio nacional. J ao
Ministrio de Minas e Energia (MME), compete elaborar o planejamento do setor energtico
nacional e monitorar a segurana do suprimento definindo aes preventivas caso ocorra
desequilbrios conjunturais entre oferta e demanda de energia.
Criada em 1994 e vinculada ao ministrio de minas e energia, a Empresa de Pesquisa
Energtica (EPE) responsvel por realizar estudos e pesquisas destinadas a subsidiar o
planejamento do setor energtico.
A Agncia Nacional de Energia Eltrica (ANEEL), criada aps a ltima reforma do
setor, responsvel por regular e fiscalizar a produo, transmisso, distribuio e
comercializao de energia eltrica, assegurando a qualidade dos servios prestados e a
modicidade tarifria. O Operador Nacional do Sistema (ONS) o rgo responsvel por
cuidar do sistema de transmisso nacional e garantir o acesso ao sistema interligado nacional
(SIN).
Operador nacional do sistema
eltrico Cmara de comercializao
de energia eltrica
Agncia Nacional de
Energia Eltrica
Empresa de Pesquisa
Energtica
Ministrio de Minas
e Energia
Comit de monitoramento
do setor eltrico
Conselho nacional de
poltica energtica
39
Em 1994, foi criada a Cmara de Comercializao de Energia Eltrica (CCEE) a fim
de viabilizar a comercializao de energia eltrica nos ambientes de contratao regulada e
livre, alm de efetuar a contabilizao e a liquidao financeira das operaes realizadas no
mercado de curto prazo.
Segundo Rocha; Bragana e Camacho (2007), a principal caracterstica do modelo,
vigente atualmente, consiste na comercializao de energia em dois mercados: o ambiente de
contratao regulada - ACR e o ambiente de contratao livre - ACL (Quadro 3).
Cliente Livre Cliente Regulado
Conexo eltrica Concessionria local Concessionria local
Com quem celebra contratos Concessionria local e com o vendedor de
energia
Concessionria local
Tipos de contrato
Conexo e Uso de Rede com a
concessionria local
Contrato de fornecimento com a
concessionria local
Compra e venda de energia com o
vendedor escolhido
Demanda com a concessionria local
Energia com o vendedor escolhido
O que contratado Demanda com a concessionria local Demanda com a concessionria
local Energia com o vendedor escolhido
O que tem preo regulado Conexo e Uso de Rede, inclusive tarifa
(R$/kW)
Demanda (R$/kW) e energia
(R$/kWh)
O que de livre negociao Preo e condies comerciais de energia Nada
Responsabilidade pela
qualidade e continuidade do
fornecimento
Concessionria local Concessionria local
Atendimento de emergncia Concessionria local Concessionria local
Fonte: CPFL (2009)
Quadro 3: Principais diferenas entre o ACR e o ACL.
No primeiro segmento de mercado (ACR), as concessionrias, as permissionrias e as
autorizadas de servio pblico de distribuio de energia eltrica do SIN, devem garantir o
atendimento totalidade de sua demanda, que informada a ANEEL. Esta, por sua vez, deve
elaborar as licitaes para contratao regulada de energia eltrica e realizar, diretamente ou
por intermdio da CCEE, os leiles.
De acordo com Rocha; Bragana e Camacho (2007), a concorrncia no ACR
garantida por meio da realizao de leiles de preo e quantidade, cujo critrio de escolha o
da menor tarifa. Alm disso, so elaborados contratos bilaterais padronizados (Power
Purchase Agreements - PPA) de longo prazo, que garantem o repasse dos custos de aquisio
da energia para as tarifas dos consumidores finais.
40
J no segundo segmento de mercado, o (ACL), que o foco desse estudo, se realizam
as operaes de compra e venda de energia eltrica, por meio da elaborao de contratos
bilaterais livremente negociados, conforme regras e procedimentos de comercializao
especficos. Este inclui os consumidores livres e os comercializadores que podem contratar de
forma ativa sua demanda por energia eltrica.
2.2.1 Comercializao de energia eltrica no mercado livre
A criao do ambiente de contratao livre (ACL) potencializou a competio no
segmento de comercializao de energia eltrica, pois possibilitou a livre negociao entre os
produtores e consumidores de energia. Vale ressaltar que no mercado regulado vrios
produtores vendem para poucas concessionrias que depois revendem a energia para muitos
consumidores.
A diferena entre ACL e ACR no se d em torno dos agentes que ofertam energia,
mas dos que demandam energia em cada ambiente (PINTO JUNIOR, et al., 2007, p. 224).
Nesse sentido, consumidor livre aquele que pode optar pela compra de energia eltrica
junto a qualquer fornecedor, conforme legislao e regulamentos especficos (ANEEL,
2008), ou seja, utilizam o direito de escolher o fornecedor que suprir sua demanda.
Dessa forma, Pinto Jnior, et al. (2007) afirmam que a relao entre o fornecedor e o
consumidor regida por contratos bilaterais, nos quais so estipulados o preo, o volume e o
prazo da negociao, prevalecendo as leis da livre concorrncia. Palomino (2009) afirma que
nesse caso o consumidor deve firmar no mnimo dois contratos, sendo um do uso do sistema
de distribuio (contrato de uso dos sistemas de distribuio CUSD). Ele pago
concessionria e a tarifa a de uso dos sistemas de distribuio TUSD. J o outro, de
compra de energia com a remunerao paga diretamente ao gerador.
Szklo e Tolmasquim (2001) apresentam duas vantagens relevantes para o cogerador,
advindas da comercializao livre: reduo dos riscos de investimentos e amortizao dos
custos. A primeira alcanada na medida em que so assinados contratos bilaterais de longo
prazo com preos de venda de energia acordados fora do mercado spot (bruscas oscilaes de
preos); e a segunda se d por meio da comercializao de excedentes, considerando que,
muitas vezes, independente da venda, o gerador precisa investir na planta de cogerao para
uso prprio.
41
O consumidor, por sua vez, pode negociar o preo diretamente com o gerador,
firmando contratos de longo prazo com condies estabelecidas para ambos os lados, o que
minimiza o impacto da imprevisibilidade do abastecimento e principalmente da volatilidade
do preo da tarifa que ser praticado pela distribuidora a cada ano (PALOMINO, 2009).
Porm, na prtica, a compra de energia eltrica no ACL s vivel e permitida por lei a
consumidores com demanda maior que 500 KW, devido s taxas administrativas cobradas.
Assim, pelo que nota-se, essa opo tem sido exercida por grandes redes de supermercados,
empresas privadas e shoppings center (informao verbal)6.
Do ponto de vista operacional, todo gerador ou consumidor que opte pela
comercializao no ambiente livre ACL precisa se associar a CCEE, informando o montante
de energia a ser ofertado ou demandado mensalmente, obedecendo data mensal para tal
informe. Aps a negociao entre os agentes e o estabelecimento de preo, quantidade e
tempo, o gerador tem a obrigao de registrar em um ambiente eletrnico controlado pela
CCEE um contrato que deve ser aprovado pelo consumidor e, at o incio de 2009, pela
ANEEL. Este deve conter obrigatoriamente os montantes de energia que sero fornecidos
hora a hora no perodo de vigncia do contrato, o vendedor e o comprador e os seus
respectivos submercados - Norte, Nordeste, Sudeste/ Centro-Oeste e Sul (PALOMINO,
2009).
Ao final do perodo, a CCEE faz um balano entre a quantidade de demanda/oferta
informada e a contratada. Se houver sobra, o gerador pode estabelecer contratos de curto
prazo (venda) ou liquidar7 a energia restante no mercado spot ao preo de liquidao das
diferenas PLD. O consumidor, por sua vez, pagar o valor contratado e liquidar
positivamente a diferena entre o valor contratado e o consumido8. Se ocorrer a situao
inversa (falta) o gerador tem a opo de firmar contratos de compra de energia para cumprir o
contrato, assegurando sua imagem ou liquidar ao PLD, e o consumidor poder comprar no
curto prazo ou liquidar ao PLD (PALOMINO, 2009).
A figura 3 sintetiza o processo de comercializao de eletricidade no ambiente de
contratao livre e no regulado, demonstrando os principais procedimentos para atuar nesses
mercados.
6 Informao fornecida por Nisihida, M., em Ribeiro Preto, 2009.
7 Processo de pagamento e recebimento de dbitos (obrigaes) e crditos (direitos) apurados no mbito da
CCEE referentes compra e venda de energia eltrica no mercado de curto prazo. 8 No permitido que o consumidor venda a sobra por meio de contratos bilaterais de curto prazo.
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Fonte: CCEE (2009); PALOMINO (2009).
Figura 3: Processo de comercializao de energia eltrica ACR e ACL
Utiliza bioeletricidade
na usina
Produz
bioeletricidade
Comercializo?
sim
no
Escolhe
Ambiente
Associa-se a CCEE
Informa montante de
energia a ser
comercializado
Negocia contratos
bilateralmente
Registra contrato
bilateral na CCEE
Participa de leilo reverso
organizado pelo governo
Firma contrato de
comercializao de energia
eltrica no ambiente regulado
(CCEAR)
Comercializo
no ACR? Comercializo
no ACL?
sim sim
no
Conecta-se rede de
distribuio
Escoa bioeletricidade
Escoa bioeletricidade FIM
FIM
INCIO
Conecta-se rede de
distribuio
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No que diz respeito comercializao de energia eltrica no ambiente de contratao
livre, o decreto 2.003 e as resolues normativas n. 281/1999 e n. 109/2004 foram marcos
decisivos para que essa forma inovadora de comercializao se tornasse possvel e, por isso, o
marco regulatrio e as leis envolvidas sero mais bem detalhados a seguir.
2.2.2 Decreto n. 2.003 de 10 de setembro de 1996
Em 10 de setembro de 1996, foi promulgado o decreto n 2.003. Este, dentro do ACL,
definiu dois tipos de produtores de energia: o Autoprodutor (AP) e o Produtor Independente
de Energia (PIE) (figura 4), sendo que enquanto este produz e comercializa energia eltrica
regularmente, aquele produz para consumo prprio e, esporadicamente, devido ao excedente
de produo, realiza a venda de energia.
Fonte: Brasil, 1996
Figura 4: Tipos de produtores de energia e transaes regulamentadas pelo decreto n. 2.003
De acordo com o artigo dois deste decreto, considera-se Autoprodutor de energia a
pessoa fsica ou jurdica ou empresas reunidas em consrcio que recebam concesso ou
autorizao para produzir energia eltrica destinada ao seu uso exclusivo. Este eventualmente
pode comercializar os excedentes de produo. Por outro lado, o produtor independente de
energia eltrica (PIE) consiste em pessoa jurdica ou empresas reunidas em consrcio que
recebem concesso ou autorizao para produzir energia eltrica destinada ao comrcio de
Consumidores livres de eletricidade
Outros produtores de energia
Qualquer consumidor que no tem distribuidora local que
lhe assegure o fornecimento de eletricidade
Consumidores de eletricidade integrantes do
complexo industrial ou comercial
Distribuidoras de servio pblico de eletricidade
PRODUTOR
INDEPENDENTE (PIE)
USINA
AUTOPRODUTOR (AP)
Comercializadores de eletricidade
44
toda ou parte da energia produzida. Vale ressaltar que, a implantao de uma usina
termeltrica, com potncia superior a 5.000 KW, tanto por AP quanto por PIE, depende de
autorizao do rgo governamental responsvel.
A fim de permitir a plena comercializao da energia produzida, o decreto ainda
assegurou, por meio do Art. 13, o livre acesso aos sistemas de transmisso e de distribuio
de concessionrios e permissionrios de servio pblico de energia eltrica, mediante o
ressarcimento do custo de transporte envolvido.
O Art. 16 definiu que tanto o AP quanto o PIE estaro sujeitos, do momento que
iniciarem a comercializao de eletricidade, aos seguintes encargos: compensao financeira
pelo aproveitamento de recursos hdricos para fins de gerao de energia eltrica; taxa de
fiscalizao dos servios de energia eltrica e quotas mensais da "Conta de Consumo de
Combustveis - CCC", subconta Sul/Sudeste/Centro-Oeste ou subconta Norte/Nordeste.
Ao analisar esse decreto pela tica de um dos pressupostos bsicos da teoria dos custos
de transao, a especificidades do ativo, se faz necessrio explorar os artigos 19 e 20.
Basicamente eles estabelecem que os bens e instalaes utilizados na produo de energia
eltrica a partir do aproveitamento de potencial hidrulico e as linhas de transmisso
associadas, no podero ser removidos ou alienados sem prvia e expressa autorizao do
rgo regulador e fiscalizador do poder concedente.
Estipula ainda que no caso de inadimplncia do PIE ou AP, poder o poder concedente
autorizar a declarao de caducidade ou a transferncia do contrato de concesso ou da
autorizao a qualquer interessado que atenda aos requisitos de qualificao tcnica e
econmico-financeira, previstos no edital da licitao ou no ato autorizativo. Nesse caso, no
ser devida indenizao dos investimentos realizados, assegurando se, porm, ao PIE ou AP a
remoo das instalaes.
Para a comercializao de bioeletriciade no ACL, os artigos 23 e 24 tm importncia
destacada, pois definiram quais consumidores o PIE9 (classificao em que se enquadra a
maioria das usinas), pode negociar. So eles:
I - concessionrio ou permissionrio de servio pblico de energia eltrica;
II - consumidores de energia eltrica nas condies estabelecidas nos artigos 15
(consumidores com carga igual ou maior que 10.000 KW, atendidos em tenso igual ou
superior a 69 KV) e 16 (novos consumidores, cuja carga seja igual ou maior que 3.000
KW, atendidos em qualquer tenso) da Lei n 9.074, de 1995;
9 Vale lembrar que essas especificaes de consumidores finais vm sofrendo alteraes ao longo dos anos.
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III - consumidores de energia eltrica integrantes de complexo industrial ou comercial,
aos quais fornea vapor ou outro insumo oriundo de processo de cogerao;
IV - conjunto de consumidores de energia eltrica, independentemente de tenso e
carga, nas condies previamente ajustadas com o concessionrio local de distribuio;
V - qualquer consumidor que demonstre ao poder concedente no ter o concessionrio
local lhe assegurado o fornecimento no prazo de at 180 dias, contado da respectiva
solicitao.
Contudo, segundo Souza (2003), a possibilidade de comercializao da energia
eltrica, principalmente para consumidores livres, era dependente da regulamentao do
acesso dos PIE a redes de distribuio. A no regulamentao permitia a continuidade do
exerccio de um poder de monopsnio das distribuidoras locais sobre os PIEs
sucroenergticos (SOUZA, 2003, p.129).
2.2.3 Resoluo Normativa n 281/1999 e n 109/2004
Devido s deficincias do decreto n 2.003, apenas a comercializao com a
distribuidora local vigorava (SOUZA, 2004). Foi s a partir da Resoluo n 281 da ANEEL
que se estabeleceram condies para venda direta entre usinas e consumidores livres,
regulamentando, assim, as condies de contratao do acesso, compreendendo o uso e a
conexo, aos sistemas de transmisso e distribuio de energia eltrica.
Essa normativa estipulou que, em suma, o Operador Nacional do Sistema Eltrico
ONS dever: elaborar as instrues e procedimentos para as solicitaes e processar os
pedidos de acesso ao sistema de transmisso, efetuar avaliaes de viabilidade tcnica dos
requerimentos de acesso, fornecer aos interessados toda a informao a eles pertinente;
estabelecer, em conjunto com as partes interessadas, as responsabilidades concernentes do
acesso ao sistema de transmisso; celebrar em nome das empresas de transmisso os contratos
de uso do sistema e firmar, como interveniente, os contratos de conexo, encaminhando os de
uso para homologao da ANEEL.
As concessionrias do servio pblico de transmisso, segundo o artigo quarto,
devero: propiciar o relacionamento comercial com o usurio, relativo ao uso dos sistemas de
transmisso e conexo nas suas instalaes, recebendo e encaminhando as solicitaes ao
ONS; negociar e celebrar, com intervenincia do ONS, os contratos de conexo com os
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usurios que venham conectar-se em suas instalaes, encaminhando-os ANEEL para
homologao e executar as providncias de sua competncia, necessrias efetivao do
acesso requerido.
Por fim, os usurios dos sistemas de transmisso ou de distribuio devero solicitar o
seu acesso aos mesmos junto ao ONS e concessionria ou permissionria de distribuio, de
posse dos dados e informaes necessrias avaliao tcnica do acesso. Cabe a eles tambm
celebrar, conforme o caso, os contrat