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1. A GAVETA DAS DIFICULDADES
“...Se permanecerdes em mim, e as
minhas palavras permanecerem
em vós, pedireis o que quiserdes, e
vos será feito” (João, XV, 7).
Pelas dificuldades vividas em certo momen-
to da vida percebo, nos refolhos de minhas
lembranças, que os obstáculos se mostravam
quase INSUPERÁVEIS. As dívidas, as molés-
tias, as incompreensões, as carências, se erigiam
à minha frente, como se fossem montanhas
inescaláveis. Lembro-me que, desolado cami-
nhava afogado em desespero, quando encontrei a
pequena Raquel, alegre, cantarolando uma can-
ção infantil. Ela parou, olhou para mim, sorriu,
deixando efluir de si um encanto irresistível,
como se fora ela, um oceano de paz. Falou-me
quase sussurrando:
— Não vale a pena estar triste e, muito
menos, ser triste.
— O que você leva nesta cestinha? Quis
saber.
— Levo a felicidade.
2
— Deixe que eu a veja, pois não a conhe-
ço.
O belo anjo abriu a cesta, que continha
algumas flores.
— Não vejo nada aí, além das flores.
— Você viu o perfume delas?
— Não.
— Mas ele existe e você não o viu. A
felicidade também é assim, nós não a vemos,
mas a sentimos dentro de nós, basta termos as
gavetinhas na alma para guardá-la.
— Quais são essas gavetinhas, minha santa?
— São as gavetas da bondade, da paciência
e da fé. Quem é bom sempre vence o mal com a
prática do bem. O paciente tem por aliado o
tempo para aprender e superar as dificuldades e,
quem tem fé, confia na presença de Deus em si
e, por isso sabe que tem sabedoria e força para
vencer.
Raquel, como se fora uma ninfa flutuando
nas ondas do infinito mar da vida, afastou-se,
como chegara, sorrindo e cantando. O velho
Bino olhou-me, sorriu e falou:
— Aprendeu a lição, meu amigo?
— Ouvi, mas não sei como vencer as
dificuldades que me assoberbam a mente.
3
— Abre a gaveta da bondade praticando o
bem e o mal será anulado. Agasalha-te na fé e
terás força para suportar e sabedoria para vencer
as procelas da vida. Cultiva a paciência e o
tempo será o teu aliado para sepultar em suas
dobras todas as dificuldades e amarguras de
hoje. Não te esqueças, também, que o tempo é o
mais justo dos juízes e o mais implacável
executor de suas sentenças.
Hoje, refletindo ao limpar a gaveta de
minhas dificuldades, percebi que todas elas
foram niveladas ou vencidas pelo tempo e que,
aquilo que se assemelhava uma montanha de
tormentos, hoje mais parece um grão de areia
solto ao vento.
Não vale a pena alimentar tormentos e difi-
culdades, se não podes vencê-los agora, deixe-os
de lado e siga em frente, o tempo se encarregará
de extingui-los.
Dificuldades, podem parecer,
Com nuvens negras, tempestuosas,
Que nos ameaçam furiosas
Mas que o tempo as faz esmaecer.
4
2. NA GAVETA DO MEDO
“...Não se turbe o vosso coração,
nem se atemorize” (João XIV, 27).
Era uma manhã emoldurada pelo multicolo-
rido dos raios do sol refratados em múltiplos
tons, como se um pintor divino ali retratasse to-
do o seu talento. Eu pensava, remoendo preocu-
pações, como era possível o contraste de tanta
harmonia e beleza, enquanto eu carregava tantas
dúvidas e o negror do medo na intimidade.
A doce e pequena Nicolle aproximou-se,
saltitante e alegre, como sempre, silenciando por
um momento as minhas inquietações íntimas.
— Meu amigo, observou a pequena, como
se fora uma ave canora, veja o jardim, como está
belo e perfumado.
— É verdade, eu não havia percebido.
— Veja, as flores não têm medo de abrirem
suas pétalas e oferecerem beleza, perfume e
néctar.
Nicolle sorriu e desapareceu na folhagem do
jardim.
5
O velho Bino, a tudo presente, completou
aquela eloqüente afirmação.
— O medo acorrenta o homem impedindo
sua caminhada para o sucesso. Não permita,
nunca, que a cautela venha a confundir-se com o
medo, pois enquanto este oblitera os caminhos,
aquela aponta o rumo certo a seguir. O medo
suga energias, enquanto a ponderação e o bom
senso revigoram.
— O que devo fazer para libertar-me do
medo?
— Usa a alavanca da confiança em Deus e
no Seu poder que está imanente em ti. Usa a
sabedoria para limpar as gavetas de tua mente
dos medos acumulados e, creia, estarás dando o
primeiro passo para vencer.
Agradecido continuei a caminhada,
refletindo. Quantos medos eu havia guardado
nos refolhos da mente, medo do castigo dos pais,
do castigo de Deus. Medo de errar, de perder o
emprego, dos revides e, até mesmo o medo de
um futuro que não conhecia. Onde estariam os
medos do passado? Por que, então alimentar
novos medos no presente?
Caminhava, enquanto ressoavam em minha
intimidade as palavras do velho Contador de
6
Estórias:
o medo bloqueia os caminhos do sucesso;
vence o medo pela confiança no poder de
Deus que se manifesta em ti pela dádiva
da vida e pelo arbítrio da escolha.
Decidi, então limpar a gaveta dos meus
temores, observando a singela e doce lição da
pequena Nicolle. Tal como as flores que
oferecem beleza, perfume e néctar sem temer as
procelas do dia, eu iria seguir o meu caminho
alegre, sorridente, procurando ser útil, a cada
passo, para estar sempre feliz.
Quem passa pela vida a temer,
Dificultando o seu caminhar,
Renuncia o direito de amar,
Curvando-se ao guante do sofrer.
7
3. A GAVETA DO REVIDE
“Não te apresses em irar-te, por-
que a ira se abriga no íntimo dos
insensatos” (Ecl. VII, 9).
O velho conselheiro do banco da praça via
as pessoas que caminhavam, cada uma delas
mostrando em seus reflexos a carga de preo-
cupações que guardava em sua intimidade. Um
homem aproximou-se, visivelmente irritado,
trazendo a estória recente de seu desconten-
tamento. Olhou para o velho Bino e despejou:
— Eu gostaria de estar armado!
— Para que, meu filho?
— Aquele sujeito do carro azul passou sem
cuidado na poça de água, salpicando o meu carro
de lama.
— E isso seria motivo para uma briga?
— Senhor Bino, essas pessoas só aprendem
apanhando.
No curso daquele desabafo, tiveram a aten-
ção desviada para o deboche de um garoto que
avançara sobre uma menina despojando-a de
uma bela rosa que havia colhido. O menino cor-
8
reu sob o protesto de muitos, enquanto a menina,
a Pequena Raquel, sorrindo, como se nada hou-
vesse acontecido, veio ao encontro do seu ami-
go, o Contador de Estórias, cumprimentando-o e
beijando-lhe as mãos. O homem irritado, a inter-
pelou:
— Por que você não deu uma pedrada na-
quele moleque?
— Por que? Ele não fez nada de tão ruim. A
flor não era minha, eu a tirei da roseira!
— Mas já estava em tuas mãos!
— Meu amigo, quem briga por rosas, fere-
se nos seus espinhos.
A Pequena Raquel deu a lição e voltou para
os seus folguedos, alegre e saltitante. Um outro
homem, ainda jovem, aproximou-se do grupo e,
dirigindo-se ao irritado da véspera, falou:
— Meu amigo, peço desculpas por haver,
por descuido, salpicado lama em teu carro, mas
já mandei limpá-lo. Falou e despediu-se.
O homem olhou quase envergonhado para o
ancião, que tomou da palavra, completando a
lição que recebera.
— Meu filho o revide é falta de reflexão,
pois sempre resulta em conseqüências piores que
a afronta que lhe deu causa. Calar e afastar-se do
9
agressor é, sempre, a melhor solução. Não te
esqueças:
o malho que molda o aço, desgasta-se na
mesma intensidade que dá contornos à
peça;
o tempo e a distância são os melhores
remédios para vencer o odiento;
o revide aumenta a carga de ódio do
agressor.
Diante do ódio e da agressão,
Na fogueira do mal a crepitar
É melhor afastar-se, não revidar,
Seguindo os rumos da reflexão.
10
4. A ESCURA GAVETA DAS DÍVIDAS
“A ninguém fiqueis devendo
coisa alguma, exceto o amor...”
(Rom. XIII, 8).
A dívida é a pior de todas as armadilhas que
a ganância arma para o homem incauto e
imediatista.
Quem tenta solucionar dificuldades momen-
tâneas contraindo empréstimos, verá ao final que
as dificuldades aumentaram e as soluções se
tornaram mais difíceis e distantes.
A dívida transforma o devedor em escravo
do credor, que lhe suga o suor e quase sempre o
deixa afogado em lágrimas, pois além de levar o
fruto do trabalho, deixa-o amortalhado no manto
da desonra. Quem deve perde o patrimônio, a
liberdade e a honra.
Depois desta reflexão, o devedor, explorado
e vencido pergunta ao velho Bino:
— Como posso libertar-me das grades da
dívida?
— O primeiro passo é tomar consciência de
11
que o empréstimo não é solução, sendo, ao con-
trário, mais um aperto na corda da forca. O se-
gundo passo é ter a coragem de olhar nos olhos
do credor impiedoso e dizer-lhe: d’ora avante
resgatarei a minha dívida, apenas, com o fruto do
meu trabalho e não pagarei juros fora dos limites
da lei. O terceiro passo é não distanciar-se do
credor, para que ele saiba que não é temido e que
não está tratando com um fujão. O quarto degrau
é trabalhar e gastar menos do que produz, desti-
nando o que sobra à amortização do débito, sem
aceitar aumentos ilógicos. O último e definitivo
passo é criar vergonha não colocando outra vez
os pés e as mãos no nó górdio de obrigações
impossíveis.
Depois dessa admoestação, o bondoso an-
cião concluiu, dizendo:
a dívida é o câncer da economia, pois
quase sempre leva o devedor ao óbito do
patrimônio e da honra;
quem resiste às tentações da dívida, pode
sofrer um pouco, mas despertará livre
enquanto o devedor, se vier a despertar, o
fará prisioneiro, pobre e desonrado.
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Resista a teus encantamentos,
Da vaidade e do brilho falaz
Da dívida que te rouba a paz,
E te leva à dor e sofrimentos.
13
5. NA GAVETA DA MORTE
“Por que o que me acha acha a
vida e alcança favor do Senhor...”
(Prov. VIII, 35).
Uma senhora vagava pelos jardins da praça,
colhendo flores, enquanto vertia lágrimas e dava
mostras de balbuciar cumpridas preces. O velho
Bino, a passos medidos, arrimado na bengala,
aproximou-se e, mirando-a demoradamente,
perguntou:
— Por que tantas lágrimas?
— A vida perdeu o sentido para mim. Meu
único filho faleceu em um acidente deixando-me
afogada na dor da separação repentina.
— Para que essas flores?
— Meu único consolo é levar diariamente
algumas rosas ao seu túmulo e, lá, permanecer
horas a rezar por ele. O meu desejo é morrer
para poder encontrá-lo no céu.
— Filha, as lágrimas pesam no espírito de
teu filho e o perturbam ao invés de consolá-lo.
— Mas eu rezo incontáveis “Aves-Marias”
e “padres-nossos” por ele.
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— Isso, também, pouco ou nada vale.
— Por quê?
— Ouça: se uma pessoa de teu bem-querer,
viajasse a um país distante para cuidar de negó-
cios e, você, por saudades ou preocupações tele-
fonasse para ela a cada minuto, manifestando
preocupações e dando provas de saudade, o que
aconteceria com ela e a tarefa por realizar?
A mulher levantou os olhos, fitando o velho,
como se buscasse a resposta. O ancião, por si
mesmo continuou.
— Se você o chamasse a cada momento,
ele, o viajante, seria perturbado por tua dor, tal-
vez compartilhando do teu sofrimento e, teria
infinitas dificuldades para completar a sua mis-
são. A morte é apenas uma viagem de retorno
para casa, o mundo espiritual, o que não pode ser
havido por uma separação eterna entre espíritos
que se amam. As lágrimas, as vibrações de amar-
gura e as rezas mecânicas a cada momento,
perturbam e aumentam a amargura do ente
querido que se foi.
— Quer dizer que pesa no espírito do meu
filho a minha saudade?
— A tua saudade não, mas a tua amargura e
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a chamada constante pelo fio do pensamento,
sim.
— Como devo comportar-me, para alcançar
a paz e não o fazer sofrer?
— Creia em Deus e, nos Seus desígnios,
certa de que, se o teu filho foi chamado ao mun-
do espiritual, foi em conseqüência da vontade do
Pai e para sua própria melhoria. Quando pensar
nele, o faça com alegria, certa de que a separa-
ção não será eterna, pois tenha para contigo, que
pouco mais e você estará com ele. Se você quiser
ser bondosa, apague a amargura da mente e só
alimente pensamentos de alegria e confiança.
Acredite, ele se sentirá mais conformado certo,
também, que você estará logo mais junto dele.
— Quer dizer que não posso rezar por ele?
— Melhor que a reza é a oração ou prece.
Se ela for alegre, confiante, certamente será um
bálsamo para ele. Não esqueça:
a morte é uma viagem de volta ao
verdadeiro lar, e todos os encarnados têm
passagem de volta para lá, onde hoje ou
amanhã estarão reunidos. É melhor viajar
alegre e confiante, que temeroso e triste.
16
Não lamente a pessoa querida,
Levada pelo fragor da morte,
Pois ela não teria melhor sorte
Que ir para a verdadeira vida.
17
6. O LIXO DO ORGULHO
“O que sai do homem, isso é o eu
o contamina” (Marcos VII, 20).
De parelha com a ingratidão, o orgulho é
uma das piores mazelas do espírito. O orgulhoso
sente-se molestado pela presença de criaturas
que não lhe pareçam brilhantes, pois acredita que
o humilde pode levá-lo a parecer inferior pela
companhia ou proximidade.
O orgulhoso julga-se superior, mais impor-
tante e pensa habitar um patamar acima dos seus
semelhantes.
O velho Bino, para destacar a falência da
presunção do orgulhoso, contou aos que o
ouviam, uma estória, como um bom exemplo.
— Um homem, disse ele, muito rico e orgu-
lhoso, por um dos caprichos do destino, veio a
tornar-se cego. Sofria e lamentava-se muito, por
não poder apreciar a beleza da vida. Somente um
transplante de córnea, seria capaz de libertá-lo da
escuridão que lhe fora imposta. Depois de muito
sofrer, um dos seus mais humildes serviçais veio
a falecer em desastre, e por compatibilidade,
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suas córneas fora transplantadas para o orgu-
lhoso senhor, devolvendo-lhe a bênção da visão.
Ao rever a fisionomia de sua bela esposa, o
ricaço orgulhoso, sorrindo falou:
— Querida, veja o quanto é bom ser rico, se
não dispuséssemos de dinheiro, certamente eu
permaneceria cego, sem poder contemplar tua
beleza.
— Você está enganado, aduziu a mulher, se
hoje podes ver-me, é por ter sido implantado em
teus ricos olhos, pobre e humilde córnea, as cór-
neas do Zeca, o teu mais humilde e desprezado
servo. Eu aprendi, que o orgulho cega mais o es-
pírito que o corpo, levando o orgulhoso a perder-
se no labirinto da presunção.
— O que devo fazer para compensar o mal
que pratiquei? Darei uma parcela do que tenho
aos herdeiros do Zeca, falos-ei ricos.
— Não, meu amigo, o que deves fazer é
desvestir-se do orgulho e perceber que eles são
teus semelhantes, mas que não são apodrecidos
pelo orgulho e pelo ódio, tanto que permitiram o
transplante que te beneficiou.
O velho Bino sentenciou:
— O orgulhoso, como a mariposa, queima-
se no brilho que corteja.
19
O ódio e o orgulho não condiz,
Com as lições de vida da Boa Nova,
Que prega o amor e renova
O homem, para ser bom e feliz.
20
7. NA GAVETA DA INGRATIDÃO
“O amor seja sem hipocrisia.
Detestai o mal, apegando-vos
ao bem” (Rom. XII, 9).
Tira da gaveta de tua mente, os pensamentos
e atos tisnados pela ingratidão. O ingrato é
aquele que é amado e finge amar, para ao final
afrontar àquele que o serve.
O amigo que recebe favores e, quando é
solicitado abandona quem o serviu, o benefi-
ciário que vira as costas ao seu benfeitor, o filho
que agride ou abandona os pais, são os exemplos
clássicos do ingrato, que se assemelha à fera que
dilacera a mão que o alimenta.
De todas as mazelas da alma humana, a
ingratidão é a faceta que se mostra mais tisnada
pelo mal, pois o ingrato leva em sua alma a
hipocrisia e o ódio, para fazê-los refluir, exata-
mente, contra quem lhe foi solidário e útil.
A Pequena Raquel, aproximou-se do velho
Bino, inquirindo:
— O que o senhor nos pode ensinar sobre o
ingrato e a ingratidão?
21
A ingratidão é a vestimenta disfarçada do
ódio.
O ingrato é aquele que morde, depois que
suga.
A ingratidão termina como a mortalha do
ingrato.
O ingrato termina por sorver o veneno que
instila.
A ingratidão fere e mata,
A confiança propagando dor,
Afastando a paz e o amor,
Ferindo a pessoa ingrata.
22
8. A GAVETA DA MENTIRA
“Quem anda em integridade,
anda seguro; mas o que per-
verte os seus caminhos será
conhecido” (Prov. X, 9).
Um homem bem conhecido pelas notícias
falsas que espalhava, aproximou-se do velho
Bino, demonstrando profunda tristeza. O ancião
dirigiu-lhe a palavra:
— Por que está tão acabrunhado?
— Eu sou perseguido por todos, não encon-
tro uma porta aberta, só conheço o fracasso.
— Meu filho, não foram as portas que se
fecharam para você, foi você mesmo que as
fechou, afastando-se da verdade. Todos fogem
das notícias que são propagadas por você.
— O que devo fazer para mudar o rumo de
minha vida?
— Anote e ponha em prática. Limpa as
gavetas de tua mente, do impulso malsão de
propagar notícias e maledicências, passando a
domar a língua para falar somente o necessário e
que for verdadeiro. Lembra-te que a mentira
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escraviza e a verdade liberta. Anota para ti que o
mentiroso é o primeiro a cair preso nas teias das
mentiras que alardeia. Anota para ti:
a mentira é um dardo envenenado, que
sempre retorna ao próprio mentiroso;
a verdade sempre triunfa sobre a mentira;
além da honra, o mentiroso sempre perde
a paz;
o mentiroso mente a si mesmo quando
pensa enganar aos outros;
não existe proteção mais segura que a
verdade;
a verdade é como o sol, sempre chega o
momento do alvorecer, afastando as
trevas.
Quem mente, falseia e contrafaz,
Laborando contra a verdade,
Perde a honra e a probidade,
Perturba e destrói a própria paz.
24
9. NA LIXEIRA DA MALEDICÊNCIA
“Desvia de ti a falsidade da bo-
ca, e afasta de ti a perversidade
dos lábios” (Prov. IV, 24).
A Pequena Raquel aproximou-se do velho
Bino, pedindo-lhe a bênção. O ancião tomou-lhe
as mãos, acariciando-a. Ambos expressavam
alegria pelo encontro matinal, que já se tornara
um hábito junto ao banco da praça.
— Senhor Bino, o dia amanhece parecendo
sorrir.
— É verdade, filha, tudo parece sorrir para
aqueles que não têm a alma enegrecida pelo
ódio. Já disseram que o mundo tem a cor dos
nossos olhos. Por isso tudo é belo e sorri para
você.
Falavam, quando aproximou-se o Zé Notí-
cia, conhecido e temido falador, sempre portan-
do notícias maledicentes, de onde lhe vinha o
apelido.
— Bom dia senhor Bino, o senhor já
soube...
— Deixe a notícia de lado.
25
— ... mas acontece que a mulher do Cido...
— Deixe o Cido e a mulher dele em paz.
— ... Mas.
— Não tem mais nem menos, deixe a vida
dos outros e fale de você.
O homem falador, sentindo-se frustrado em
sua ânsia de propagar más notícias, calou-se por
um pouco, pensou e voltou à carga.
— Senhor Bino, por que as pessoas fogem
de mim, não encontro trabalho e o sucesso se
mostra distante?
— Você apenas está colhendo os frutos
daquilo que semeia. Você sente alegria em
propagar, algumas vezes aumentando, notícias e
informações negativas, por isso, atrai para o teu
campo experimental, o que se assemelha aos teus
pensamentos, os quais antecedem à tua fala. Se
não fizer um esforço para mudar tua vida será
sempre um poço de maldades.
— O que devo fazer para ver o dia nascer
sorrindo, como disse a Pequena Raquel?
— Limpe as gavetas da mente do lixo da
maledicência, aprenda a ver o que é bom e edi-
ficante nas pessoas, nas coisas e nos fatos e você
verá o dia, as coisas e as pessoas sorrindo. Não
te esqueças que a roseira, mesmo tendo espi-
26
nhos, oferece flores, beleza e perfume. Assim
são as pessoas, os fatos e as coisas, se oferecem
uma faceta negativa guardam em si algo de bom,
basta ter olhos para ver.
— Senhor Bino, até o mal tem valor?
— Tem meu filho, na proporção em que
valoriza o bem e desperta o homem para trilhar o
bom caminho. Não te esqueças que a língua é
como a lâmina, pode servir ou ferir, mas,
enquanto a lâmina fere o corpo, a língua pode
macerar a honra. Cuida da tua língua, como o
combatente da sua espada, usando-a apenas para
as boas causas. Lembre-te:
se desejas viver em paz aprenda a calar,
mas se vieres a falar, faça-o sempre para
propagar o bem;
sábio é aquele que edifica quando fala e
sabe guardar silêncio.
Quem propaga a maledicência,
Semeando a dor, a maldade,
Sepulta a própria felicidade,
Tisnando a honra e a consciência.
27
10. A GAVETA DAS EMOÇÕES
“Melhor é ouvir a repreensão
do sábio, do que ouvir a canção
do insensato” (Ecl. VII, 5).
A Pequena Raquel parecia uma ave canora
esvoaçando livre na galhada. Brincava correndo
pelo jardim da praça, quando foi abordada por
uma bela moça que deixava transparecer grande
convulsão íntima, não escondendo as lágrimas
que rolavam como pérolas trabalhadas pela dor.
— Por que está chorando?
— Vejo você brincando despreocupada, o
que me leva a recordar a minha infância, quando
eu era livre e feliz.
— Você é bela, jovem e saudável, o que te
causa tanta amargura?
— O moço que amo foi embora para lugar
distante, só me resta chorar.
— Por que ele se foi?
— O pai o expulsou de casa o que fez
crescer nele a revolta e o desejo de afastar-se de
todos.
A Pequena Raquel, tocada pelo sofrimento
28
da jovem, tomou-a pela mão, convidando-a para
ouvir os conselhos do Contador de Estórias, o
velho Bino, que se encontrava no lugar de costu-
me, no banco da praça.
— Senhor Bino, minha amiga precisa ouvi-
lo.
O velho olhou para a jovem, esboçou um
sorriso doce, enquanto Raquel se desvencilhava
da jovem e voltando para os seus folguedos.
— Qual o motivo de tuas lágrimas?
A jovem repetiu a estória do afastamento do
homem amado e de suas tropelias no seio da
família.
— Agora, Senhor Bino, não sei o que fazer,
só me resta chorar.
— Você pode ser feliz, mas volta as costas
para a felicidade, regando com lágrimas o
próprio sofrimento.
— Como proceder para voltar a sorrir?
— O primeiro passo é limpar a gaveta das
emoções, jogando fora tudo quanto possa
afastar-te do bom senso e da razão.
— Quer dizer que o amor deve ser atirado
pela janela?
— O amor não, mas a emoção irracional,
sim. O que você sente é a emoção própria dos
29
arroubos da mocidade. O amor verdadeiro é
manso, cordato, ordeiro e nunca provoca sofri-
mentos, pois nada exige, não afronta, não divide,
soma.
O velho fez uma pausa, tomou a mão da
jovem e continuou.
— Filha o moço de quem falas não merece
tuas lágrimas e, menos ainda, o teu amor. Se vo-
cê deseja ser feliz no casamento ou em qualquer
forma de relacionamento da sociedade, não
permita que a emoção conduza a escolha, pois a
emoção explosiva é passageira e raramente se
consolida.
— E como proceder para deixar a razão
conduzir a escolha?
— O primeiro passo é verificar se o esco-
lhido é bom filho, pois a experiência da vida
ensina que o bom filho é bom tudo e que o mau
filho é egoísta e quase sempre é mau tudo, mau
amigo, mau vizinho, sócio, empregado, patrão e
marido. Veja, minha filha, se o moço que tu
afirmas amar, rebela-se contra o pai e afasta-se
sem medir o sofrimento da mãe, certamente ele
não tergiversará em fazer o mesmo com você.
Por isso eu afirmo, se você deseja ser feliz,
alegre-se pela sorte que tens de vê-lo ir-se agora,
30
quando não deixa marcas, que depois do casa-
mento ou da união, quando, esgotado o viço da
juventude, certamente ele abandonaria o lar. O
bom companheiro, minha filha, além de bom
filho, deve ser trabalhador, saudável e honesto.
Não te esqueças:
o amor verdadeiro, faz brotar emoções
saudáveis e perenes;
a emoção física, é fugaz e só deixa ao
final a exaustão, o sofrimento e a dor;
quem verdadeiramente ama, não faz sofrer
a pessoa amada.
Quem se deixa levar por emoções
Saciando-se no aral do prazer,
Será levado à dor e ao sofrer,
Nas ondas turbulentas das paixões.
31
11. A GAVETA DO SEXO
“Tão certo como a justiça con-
duz para a vida, assim o que
segue o mal, para sua morte o
faz” (Prov. XI, 19).
Zumba, um conhecido libertino, jactava-se
de suas aventuras amorosas, envolvendo pessoas
conhecidas na sociedade da pequena cidade, sem
a menor preocupação quanto aos arranhões que
poderia causar na honra alheia. Falava, enquanto
os circunstantes ouviam em silêncio.
— A vida é para ser vivida com intensidade,
os prazeres do vinho e do sexo devem ser fruídos
até a exaustão, somente assim o homem é feliz.
Um moço tomando coragem o inquiriu:
— O que é a felicidade para você?
— Felicidade é poder saciar os nossos dese-
jos, sem a imposição de limites.
— Mesmo que os limites alheios sejam
rompidos?
— O que conta no culto da felicidade é que
você satisfaça os seus desejos e, não, os dos
outros.
32
O velho Bino que ouvia a sermonária líber-
tina, foi interpelado.
— Senhor Bino, o que pode nos dizer sobre
o que pensa o Zumba?
— Equivoca-se quem busca a felicidade
sorvendo o cálice dos prazeres, sem o freio do
bom senso, sem atentar para o respeito aos
limites próprios e alheios. O sexo é uma válvula
poderosa de escape de energias, que pode ser
prazeroso ou levar ao sofrimento.
— Como o sexo pode ser prazeroso ou
doentio?
— Quando a prática sexual é consentida,
sem perversão, respeitando os limites físicos e
morais, certamente ele leva a um prazer saudá-
vel, capaz de somar e consolidar afeições sérias
e duradouras. Por outro lado, o sexo que violenta
vontades, rompendo os limites físicos e da
honra, divide, açula o ódio e propaga moléstias
do corpo e do espírito.
— Quer dizer que se houver o concurso de
vontades o sexo pode ser praticado sem recato e
sem peias?
— A falta de recato e contenções é uma
forma solerte e amoral de violentar os limites
estruturados pela cultura, pela norma legal e pela
33
religiosidade da sociedade. É necessário que ao
consentimento e respeito aos limites, seja acres-
centado o senso de responsabilidade pelas conse-
qüências da prática sexual.
— Senhor Bino, o que vem a ser a felici-
dade?
— A felicidade é uma resultante do equilí-
brio de valores essenciais a um viver harmo-
nioso.
— Quais são os valores essenciais a que se
refere?
— No patamar físico, a saúde, a abundân-
cia, a honra e a paz. No plano espiritual, a fé e a
paz de consciência.
O velho Contador de Estórias calou-se por
um pouco, para logo mais concluir.
— Quem respeita os limites do corpo e da
mente, alcança a saúde, quem trabalha com
perseverança e honestidade, chega à abundância
e quem respeita os limites alheios e da norma
legal, encontra a honra e a paz.
O sexo no momento e na dose correta é
prazeroso, no momento inadequado e no exage-
ro, pode levar à desonra e ao sofrimento.
Quem não coloca freios no apetite sexual,
34
termina por afogar-se no lodaçal da devassidão,
da moléstia e da desonra.
Aprenda a bem dosar o prazer,
Afastando da concupiscência,
Da maceração da consciência,
De onde só resulta o sofrer.
35
12. NOS ÁTRIOS DA COBIÇA
“Grave mal vi debaixo do sol:
as riquezas que seus donos
guardam para o próprio dano”
(Ecl. V, 13).
O dia amanhecera, como sempre dizia o
velho Bino, alegre e promissor para os bondosos
e otimistas, mas parecia toldado e triste para os
pessimistas, que só vêm espinhos nas roseiras. O
ancião avaliava tudo do banco da praça, quando
dele avizinhou-se um jovem, que após cumpri-
mentá-lo tomou lugar ao seu lado.
— Bom dia senhor Bino.
— Bom dia filho, quais são os planos para o
dia?
— Eu só penso em ganhar dinheiro, ser rico,
poderoso e feliz.
— Embora não seja impossível é difícil
colocar riqueza, poder e felicidade na mesma
carruagem.
— Por que, senhor Bino?
— É imprescindível que se adicione sabe-
doria e humildade, requisitos que os poderosos e
36
argentários dificilmente cultivam.
O velho refletiu por um momento, para ao
depois continuar.
— Filho, vou contar a você uma estória
verídica acontecida aqui mesmo nesta região.
Dois irmãos herdaram vultosa fortuna, o mais
velho era um argentário empedernido, tudo
quanto fazia era alimentando o propósito de reti-
rar vantagens. Emprestava a juros escorchantes,
com garantias abusivas de hipotecas, o que o fez
senhor de vastas propriedades, tomadas de seus
devedores, os quais, via de regra eram despoja-
dos de seus bens e levados à miséria. A primeira
vítima fora o próprio irmão. Os dois seguiam
vivendo distanciados um do outro, um na condi-
ção de simples lavrador, mas feliz e respeitado,
com esposa e filhos todos dedicados ao trabalho.
O outro, rico, poderoso, colocado acima dos
demais pela força impositiva do dinheiro, olhado
por todos com desconfiança.
Um dia, o ricaço viu a saúde minada por
uma doença renal grave, sendo levado a nivelar-
se com os outros na mesa de hemodiálise.
Somente um transplante poderia salvá-lo. A
orientação médica apontava o irmão, ao qual
empobrecera, como um provável doador.
37
O homem rico, agora molestado, pensa con-
sigo. Eu devolverei ao meu irmão uma parcela
da fortuna que lhe tirei e, certamente, ele me
venderá um dos seus rins para que vivamos os
dois. Pensando assim, ordenou que o chamas-
sem. Feitos os exames operou-se o transplante,
que era novidade naqueles tempos, o que se fez
com sucesso, voltando o ricaço à plenitude da
vida. Com o desejo de cumprir a promessa, foi
ao encontro do doador.
— Meu irmão, você vendeu-me um dos
seus rins, o que foi bom para mim. Você não
sabe gerir dinheiro, por isso eu vou devolver,
apenas, a metade do que prometi.
O doador, mirando-o com medida conster-
nação, respondeu:
— Meu irmão, eu não negociei nada com
você eu doei um dos meus rins e, como ensinou
Jesus, “daí de graça o que de graça rece-
bestes”, como ele me foi dado de graça por
Deus, nada devo receber por isso. Fique com o
dinheiro, o que eu desejo é vê-lo sorrindo com
saúde.
— Meu filho, completou o venho, o dinhei-
ro é bom, mas não é tudo, o que vale é ser feliz.
— O que devo fazer para ser feliz?
38
— Limpe as gavetas dos excessos, coloque-
se no meio termo onde está o equilíbrio, pratique
o bem e permita que todos participem das
benesses da vida. A felicidade é como o ar, o
perfume, a luz, que não podem ser aprisionados,
mas partilhados por todos. Não te esqueças:
a ambição desmedida oblitera a razão e
enleia o ambicioso nas teias do sofri-
mento.
Quem se deixa na ambição perder,
Sem os rumos do senso e da razão
No altar do lucro frio e malsão,
Finda na desonra e no sofrer.
39
13. NA GAVETA DA PREGUIÇA
“Ó preguiçoso, até quando ficarás dei-
tado? Quando te levantarás de teu so-
no? Um pouco para dormir, um pouco
para toscanejar, um pouco para en-
cruzar os braços em repouso. Assim
sobrevirá a tua pobreza como um
ladrão, e a tua necessidade como um
homem armado” (Prov. VI, 9 a 11).
No banco da praça o velho Bino ouvia os
reclamos de um homem bem conhecido na
cidade por sua notória preguiça. Olhando para
um João de Barro que cantava alegre no galho
próximo ao ninho, onde sua companheira se
agasalhava para a desova.
— Por que até o João de Barro canta e tem
o seu ninho, enquanto eu sofro o travo da fome e
do desabrigo?
— Meu amigo, existe uma diferença essen-
cial entre você e aquela avezita.
— Qual?
40
— Hoje você a vê cantando junto a sua casi-
nha, o ninho, mas para chegar a esse ponto ele
realizou incontáveis vôos levando o barro e a
água para moldá-lo, e ao final vê-lo concluído.
Enquanto isso você apenas reclama e se lastima.
— O que devo fazer para mudar o rumo de
minha vida?
— O primeiro passo a ser dado é para lim-
par a gaveta da preguiça, dela retirando o como-
dismo e a desculpa, deixando de lado as costu-
meiras expressões “amanhã eu começo” ou “de-
pois eu faço”, para começar logo, agora, neste
momento, a diligenciar na direção do trabalho.
— Eu não encontro trabalho.
— Não falta oportunidade para quem se
prepara convenientemente para a tarefa. Sempre
existe uma oportunidade para quem tem boa
vontade e cultiva a honestidade. Aprenda a fazer
alguma coisa, faça-o com boa vontade, diligên-
cia e perseverança e, algum dia te verás como o
João de Barro, cantando alegre e satisfeito junto
a tua morada. Não te esqueças:
quem trabalha tem menos oportunidade de
praticar o mal;
41
o trabalho honesto e perseverante, oferece
por dividendo a abundância e a paz;
o fruto da preguiça é a miséria.
O fruto da ociosidade,
Do comodismo e da preguiça,
Leva à dor, ao final da liça,
Impedindo a felicidade.
42
14. NA GAVETA DO DINHEIRO
“O tesouro da impiedade, de
nada aproveita...” (Prov. X, 2).
Dois homens discutiam sobre as excelências
da riqueza e as virtudes da pobreza. O primeiro
reportava-se ao poder do dinheiro. Dizia ele:
— O que vale na terra é o dinheiro que
prevalece sobre todos os valores. Com o dinheiro
compramos o conforto, a saúde, a honra, o poder
e, até mesmo os ofícios religiosos para a salva-
ção da alma.
O seu contendor, um religioso genuflexo
obtemperou:
— Você está enganado, o dinheiro só traz
malefícios, induzindo em erro e levando o
homem ao pecado. Enquanto isso a pobreza
redime pelo sofrimento, aproximando o homem
de Deus.
O velho Bino que se encontrava próximo foi
chamado a opinar. Como sempre, pensou um
pouco para ao depois deixar sua lição.
— Filhos, o erro está nos exageros. Deus é
um manancial infinito de bondade, justiça e per-
43
feição. Por ser infinitamente sábio Ele não erra e,
por isso, não dá origem a nada que precise ser
refeito. Dentre os seus princípios destacam-se o
equilíbrio, que dita a prevalência do bem sobre o
mal e do bom sobre o ruim, da alegria sobre a
tristeza, da saúde sobre a moléstia e da virtude
sobre a desonra. Qualquer preceito ou procedi-
mento que venha a perturbar o equilíbrio, é um
desafio às Leis Divinas do equilíbrio.
— O que o senhor pensa sobre o dinheiro?
— O dinheiro é uma bênção se usado com
sabedoria para suprir as necessidades ou propor-
cionar alegria sadia. Mas, da mesma forma que a
lâmina, se mal utilizado, ele ao invés de propor-
cionar a vida, pode matar, ao invés de edificar,
pode corromper. O bem ou o mal não está no
dinheiro ou na lâmina, mas na forma e no abjeto
de seu manuseio.
— E a pobreza, não foi dito que é mais fácil
um camelo passar no fundo de uma agulha que
um rico alcançar a salvação?
— Em primeiro lugar, o camelo da passa-
gem referida é uma referência ao nó (camelo)
que as costureiras fazem na extremidade do fio e
que simboliza a dificuldade. A riqueza, como a
pobreza, são momentos de provação que o pró-
44
prio espírito busca como lição para o seu apren-
dizado e, é tão difícil não ultrapassar os limites
da honra e do bom senso manuseando riquezas,
quanto suportar as carências sem o travo da
revolta e da irresignação. O certo é tomar o
caminho da moderação e a retidão do agir, com
ou sem dinheiro, mas nunca se deve culpar o
dinheiro pelas mazelas de quem o possui e
jamais rotular a pobreza como passaporte para a
salvação.
— O que devemos fazer para bem viver,
com ou sem dinheiro?
— Limpar as gavetas da mente da cobiça e
da irresignação irosa, buscando a sabedoria de
bem exercitar o poder do ouro e melhor suportar
o peso das carências, sem resvalar para o
desequilíbrio físico ou moral.
O velho Bino fez mais uma pausa, concluído
sua lição, dizendo:
quem entrega as rédeas da vida ao fogoso
corcel do dinheiro, terminará destruído
pelo seu poder;
a pobreza em si é, também, um desequi-
líbrio, o que conta é lutar para vencê-la,
sem resvalar para a blasfêmia ou para a
desonra;
45
é sábio quem manuseia a riqueza sem
perverter-se, trilhando o caminho do
bem, ou suporta as carências sem revol-
ta, lutando para superá-las.
O dinheiro é bom e tem valor,
Como o corcel bem cavalgado,
Nas rédeas do bom senso domado,
Servindo nas tarefas do amor.
46
15. NO ALTAR DO LUCRO
“A balança enganosa é abomi-
nação para o Senhor, mas o pe-
so justo é o seu prazer” (Prov.
XI, 1).
O velho Bino, do banco da praça, dançava
os olhos pelo jardim, apreciando os que passa-
vam, cada um mostrando na cadência dos passos
e no semblante, a carga de preocupações, des-
conforto, pressa ou segurança e fé. É o homem
vivenciando as lições da vida. Um senhor, ao seu
lado, lia o noticioso do dia e, de quando em
quando, interrompia a leitura para tecer um co-
mentário, sempre amargo sobre os aconteci-
mentos. Em dado momento, dobrou o jornal com
indisfarçável enfado, resmungando com aze-
dume:
— Só é feliz quem sabe lucrar, pois, en-
quanto o povo trabalha, quem lucra vive à tripa
forra.
— Você está laborando em erro, confun-
dindo o ganho com o lucro e a riqueza com a
felicidade.
47
— Qual a diferença entre ganho e lucro?
— O ganho é a justa remuneração pelo
trabalho, seja ele do empregado ou do patrão,
enquanto o lucro é a vantagem abocanhada pelo
esperto. O ganho é como o orvalho que alimenta
a esperança, enquanto o lucro quase sempre é o
vetor de lágrimas. O ganho que resulta das ações
honestas, propicia a paz, enquanto o lucro que é
fruto do artifício e da esperteza, deságua num
altar erigido para o culto da cobiça.
— Senhor Bino, a vida é um negócio que
somente se perpetua pelo ânimo do lucro.
— Mais uma vez você está enganado. A
vida não é negócio, é um estado e, não é cevada
pelo lucro, mas pelo resultado do trabalho.
— Ao seu juízo, quem lucra?
— Quem induz o consumidor a sacrificar-se
para adquirir o que não precisa, quem negocia e
ganha com a destruição da natureza, envenena
alimentos para conservá-los, beneficia-se com o
vício, a concupiscência, a degeneração dos
costumes e dos valores, quem faz a guerra e
comercia com armas, quem mercadeja a fé,
quem vende a educação e a saúde, a grosso e a
retalho e, pior que tudo, aquele que usa o manto
do Cristo para prevalecer sobre seus semelhantes
48
e, não raro, amealhar bens materiais.
— De acordo com esse pensamento, onde
está o ganho lícito?
— Todo trabalho ou atividade honesta,
resulta em ganho proveitoso para quem o aufere
e para os seus semelhantes. Não te esqueças:
o lucro, a qualquer custo, sempre traz de
volta a revolta;
quem incensa o altar do lucro, termina
sacrificado no caldeirão do ódio;
o ganho honesto, com a abundância, traz a
paz.
Ilude-se quem pensa enganar,
O mundo e a todos, ao seu querer,
Pois desaguará na dor e no sofrer,
Em sua ânsia louca para lucrar.
49
16. NA GAVETA DA RELIGIÃO
“A religião pura e sem mácula
para com o nosso Deus e Pai é
esta: visitar os órfãos e as viú-
vas em suas tribulações, e a si
mesmo guardar-se incontami-
nado do mundo” (Tiago I, 27).
As pessoas que passavam eram atraídas por
uma discussão que se travava ao redor do Banco
da Praça, onde o velho Bino estava e ouvia com
atenção. Dois dos porfiantes professavam credos
diversos e já se encontravam a ponto de irem ao
desforço físico. O terceiro, um materialista irre-
verente, colocava lenha na fogueira, enquanto se
deliciava com a batalha doutrinária.
O primeiro deles, um ferrenho cultor da
Bíblia, asseverava:
— Fora da Palavra de Deus, não há salva-
ção, pois só o sangue de Jesus redime o homem
que se arrepende. Aceite Cristo como único e
suficiente Salvador e você será salvo.
— E o que é aceitar Cristo, seria aceitar a
tua religião? Quis saber o materialista.
50
— É sim, aceitar Cristo, que se comprova
pelo batismo.
— E as outras centenas de religiões que
usam como bandeira o nome do Cristo, qual de-
las é a verdadeira? Ou apenas exploram o nome
de Jesus para impor suas regras doutrinárias?
O segundo religioso, persignado como se
estivesse ajoelhado a rezar, interferiu.
— Falar que crê e aceita Jesus e ser batiza-
do para o povo ver, de pouco vale, o que leva o
homem para o céu é a confissão dos seus
pecados e o arrependimento que se prova pela
penitência da reza e obediência aos mandamen-
tos e sacramentos religiosos.
O materialista voltou à baila.
— Se Deus é sábio e justo, por que criou o
Diabo, permite a guerra, os terremotos que des-
troem cidades, as moléstias dolorosas em crian-
ças inocentes, por que criou os homens que se
dizem seus filhos, destinados ao sofrimento e à
dor? Por que permite a confusão das almas no
turbilhão de milhares de religiões que se estraça-
lham pela conquista de adeptos? Qual a religião
verdadeira, se algumas já fizeram e fazem guerra
em nome do Cristo?
O materialista, satisfeito com a sua perfor-
51
mance, conclui com deboche.
— Vocês são religiosos, cada um afirma ser
seguidor de Jesus e estão quase a se agridirem,
só falta um bater com a Bíblia no seu contendor
e receber de volta um revide com o crucifixo. O
que o senhor acha disso tudo? Indagou o irreve-
rente.
O velho Bino, adoçando suas palavras,
respondeu:
— A vida ensinou-me que a discórdia não
leva à razão, a qual somente é alcançada pela
reflexão e pelo equilíbrio do bom senso. Creio
que aceitar Cristo é prova de sabedoria, creio,
também, que seguir regras doutrinárias discipli-
nadoras, também edificam, mas também aceito o
mandamento de Jesus que ensinou dizendo:
“Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu cora-
ção, de toda a tua alma e de todo o teu entendi-
mento. Este é o primeiro e grande mandamento.
O segundo, semelhante a este é: Amarás ao teu
próximo como a ti mesmo” (Mat. XXII, 37 a
39).
Assim, creio que aquele que segue os ensi-
namentos de Jesus, amando a Deus e ao próximo
como a si mesmo, está, verdadeiramente prati-
cando a verdadeira religião, pouco importa o
52
rótulo doutrinário. Não esqueçam os que se
dizem religiosos e cristãos, que Jesus ensinou,
também: “não julgueis para que não sejais julga-
dos, não condeneis para que não sejais condena-
dos, perdoai para que sejais perdoados”.
O velho Bino, olhando mansamente para o
materialista, asseverou:
— Meu filho, você não poderia definir com
segurança, o alento da vida que guardas em ti
mesmo, como pretendes avaliar e definir a Deus
e a existência que d’Ele deriva, que têm dimen-
sões infinitas, com a métrica finita de que dis-
pões? Somente o tolo tenta mensurar a sabedoria
com a métrica de sua ignorância.
— Por que deveria eu aceitar a existência de
Deus?
— Pela lógica racional de que não existe
efeito sem causa. O que se faz necessário é que
todos se esforcem para limpar as gavetas do
entulho da intolerância e dos preconceitos, acei-
tando, cada um, ao seu tempo, a possibilidade da
renovação de conceitos de acordo com as novas
verdades descortinadas pela ciência e pelo
avanço do pensamento filosófico.
— A verdadeira oração se faz de pé, olhan-
do para frente e para o alto, trabalhando, crendo
53
em Deus, praticando o bem e buscando a ver-
dade.
Não basta ajoelhar e orar
Suplicando o céu e a salvação,
Mais que isso é preciso ação,
No cultivar o bem e trabalhar.
54
17. A GAVETA DO VÍCIO
“Pondera a vereda de teus pés e
todos os teus caminhos sejam
retos” (Prov. IV, 26).
Um jovem tentava induzir um adolescente a
iniciar-se no uso de drogas, tecendo argumenta-
ção medida como se fora algo adredemente
preparado. Às objeções do adolescente, o jovem
retornava à carga.
— Não seja careta, você tem que ser você
mesmo, aprender por si mesmo. Como é que
você sabe se é bom ou ruim sem usar?
— Se meus pais souberem disso, vão sofrer
muito.
— Olha amigão, teus pais fazem coisas que
proíbem que você faça. O certo é aprender por si
mesmo, os velhos são de outro tempo.
O Contador de Estória, atento a tudo,
aproximou-se interferindo na conversa.
— Meu jovem, o melhor que o filho faz é
obedecer os conselhos e orientações dos pais,
que já viveram, sofreram e, por isso aprenderam.
— Os pais estão na deles, como alguém
55
pode escolher o bom ou ruim sem experimentar?
— Meu filho, você não precisa ingerir
veneno para saber que ele mata. Se alguém o
convidasse para entrar na jaula junto com um
tigre esfaimado, você aceitaria o convite?
— Certamente não!
— Por quê?
— A fera faminta, com certeza faria de mim
um almoço.
— Pois a droga é assim, sempre devora
quem dela se aproxima e, quem dela escapa, leva
consigo ferimentos para toda a vida. Você induz
o adolescente a ser ele mesmo e fazer o que
quer, mas a primeira conseqüência da droga é
aniquilar a vontade, o direito de decidir e esco-
lher. A droga tolda o pensamento, obumbra as
idéias, impedindo o drogado de expressar-se
com clareza, levando-o ao limiar da tolice
excepcional.
O velho calou-se por um momento, para
logo mais recomeçar a sua lição:
— Filho este jovem que está apontando o
caminho das drogas, não te deseja o bem, o que
ele pretende é lucrar com a tua desgraça.
A Pequena Raquel que brincava por ali, após
ouvir a conversa, dirigiu-se ao velho amigo,
56
perguntando: — Que conselho o senhor daria aos pais?
— Filha, a melhor vacina contra as drogas é
a presença acautelatória dos pais e, o melhor
remédio é o diálogo franco com os filhos. Os
pais encontram-se simbolicamente em casa, mas
bem distantes dos filhos. Quando os filhos deles
se aproximam, “estão cansados” ou “muito ata-
refados”, “depois falamos” etc, são as desculpas
que a “presença ausente” dos pais sempre
oferece. Não têm tempo para os filhos, a família,
mas o têm sempre para as “recepções”, “reu-
niões”, “aniversários” e “convescotes festivos”.
As drogas, manuseadas por “amigos” e “conse-
lheiros modernistas” se aproxima e toma o lugar
destes pais que se encontram distantes, embora
no mesmo lar, os quais serão levados ao sofri-
mento, juntamente com os filhos. Eu penso que,
quanto mais difícil o tema, com mais franqueza e
freqüência deve ele ser colocado entre pais e
filhos. Não esqueçam:
a droga antes de matar aniquila a honra;
o pior das drogas é que os filhos a usam e
as mães se desfazem em lágrimas sem
usá-las;
57
o jovem que usa drogas, ao mesmo tempo
que se mata, destrói a sua família;
quem usa drogas financia a violência;
a droga faz murchar o viço da juventude.
Quem pensa alcançar vida e prazer,
No lodaçal sombrio da droga,
Ilude-se, apenas se afoga,
Na desonra, na dor e no sofrer.
58
18. NA GAVETA DO FRACASSO
“O desejo dos justos tende somen-
te para o bem” (Prov. XI, 23).
No arrebol, o sol se despedia dourando o céu
com o infinito cambiar de cores, enquanto as
últimas andorinhas volitavam em busca de
refúgio nos agasalhos da torre da igreja. As
pessoas passavam apressadas, voltando do
trabalho, ou reflexivas, a passo lento, buscando o
aconchego do templo, cujos sinos badalavam
para o último ofício religioso do dia. Após a
refrega cansativa pelo pão de cada dia, vem a
pausa para a oração efervescida pela fé.
Um homem, pensativo, resmungava suas
amarguras no Banco da Praça, onde o velho
Bino, seleto observador da vida e do viver,
perdia-se em conjecturas. Olhando para o vizi-
nho, que dava mostras de inquietação, o convi-
dou às falas.
— Você não vai à reza?
— Reza não adianta para mim.
— Por que você diz isso?
59
— Não tenho sorte, tudo quanto faço resulta
em desacerto. Não consigo concluir nada que
empreendo. Caminho vencido, vendo o sucesso
beneficiar pessoas menos capacitadas do que eu.
— O fracasso ou o sucesso depende apenas
de você.
— O que devo fazer para vencer?
— Limpar as gavetas do fracasso.
— Como?
— Tudo, meu filho, tem nascedouro na
mente, que emite ondas vibracionais, as quais,
obedientes à Leis dos Semelhantes, atraem bens,
pessoas e valores, que lhes sejam semelhantes.
Se você deseja o bem ele e tudo quanto lhe seja
semelhante são atraídos para o campo de tua
experiência. Veja que em conseqüência dessa lei,
os malvados se reúnem em quadrilhas, os
bondosos se associam em grupos edificantes, e
os grupos se formam de acordo com suas
predileções.
— O que devo fazer, de forma prática, para
lograr o êxito?
— Retire de tua mente todo o lixo do fra-
casso, que são o medo, a dúvida, a maledicência,
a cobiça e o ódio em qualquer de suas gradações,
60
substituindo-os por impulsos positivos. Todas as
tuas afirmações sejam positivas doravante. Se o
impulso for “fracasso” anule-o com a imposição
do “sucesso”, se for “doença”, contraponha o
pensamento de “saúde” e assim por diante. Creia
que Deus está em ti, como ensinou o apóstolo
Paulo ao afirmar “Não sabeis que sois santuá-
rio de Deus e que o Espírito de Deus habita
em vós?” Assim, faça da presença de Deus um
escudo contra o fracasso e afirme sempre o que é
bom para você, desejando-o, também para os
teus semelhantes. Não duvides, o bem atrai o
bem e o mal atrai o mal. Confia em ti, faça o
que sabes fazer com honestidade e perseverança
e creia que o sucesso se refletirá em tua vida. Se
não sabe fazer aquilo a que te propões a
executar, aprende primeiro, para depois oferecer
honestamente o que os outros almejam de ti. Não
te esqueças:
o sucesso é o fruto do trabalho honesto e
perseverante;
quem pratica o mal será sempre ferido por
ele, enquanto aquele que pratica o bem
será o seu primeiro e maior beneficiário.
61
Quem, agora, aqui ou mais além,
Trabalha com fé perseverante,
Labora para viver contente,
Bem sucedido no aral do bem.
62
19. NA LODOSA GAVETA DA
DESONESTIDADE
“Melhor é ouvir a repreensão
do sábio, do que ouvir a canção
do insensato” (Ecl. VII, 5).
Um homem notoriamente esperto era conhe-
cido e temido pelas trapaças que armava para
vender, comprar ou trocar coisas, quando se
esforçava para enganar, com o propósito de levar
vantagens em tudo, mesmo que causasse prejuí-
zo aos outros. Era conhecido por Changa, epíteto
aplicado ao costume de negócios ligeiros com
troca de objetos e animais. A fama do Changa se
alargou de tal forma que todo prejuízo resultante
de negócios malfeitos lhe era atribuído, ou pelo
menos, alguém afirmava: “Parece negócio do
Changa”. Naquele dia, Changa questionou o
velho Bino:
— Não sei mais o que fazer, todos me
evitam e qualquer defeito em coisas trocadas,
mesmo longe de mim, alguém grita logo que eu
estou por trás do negócio.
63
— A culpa é tua, você vive enganando os
outros para lucrar.
— E é crime ou pecado ganhar dinheiro
comprando e vendendo coisas?
— Não é crime ganhar, mas é desonesto
enganar para retirar vantagens.
— Vou mudar-me para outra cidade e
recomeçar a vida onde não sou conhecido.
— Pouco vai adiantar.
— Por quê?
— O defeito está em você e, não, na cidade.
— O que devo fazer para voltar a ser
respeitado?
— Limpe as gavetas da desonestidade,
aprenda a respeitar os outros e eles, pouco a
pouco passarão a te respeitar. Não confunda
lucro com ganho e, tão pouco esperteza dom
desonestidade.
— Não vejo diferença entre ganhar e lucrar.
— Pois existe, não na forma, mas na essên-
cia. O lucro é o aumento trazido pelo artifício,
seja ele qual for, entre o valor real da coisa e o
preço alcançado, quase sempre forçado pela
necessidade ou pela ignorância. Já o ganho é a
contrapartida do trabalho, do esforço ou da ação
para produzir, comerciar ou conservar o bem ou
64
utilidade. Por isso, meu filho, jamais confunda
ganho com lucro, procurando, sempre, ganhar,
recebendo o que seja justo pelo esforço. Não te
esqueças:
o desonesto, sempre, termina enleado na
própria desonestidade;
o lucro obtido pela desonestidade é direta-
mente proporcional ao desassossego do
desonesto.
Para alcançar tranqüilidade,
É necessário agir e proceder,
Com reta sabedoria no viver,
Trabalhando com honestidade.
65
20. NA GAVETA DOS CONFLITOS
“O ódio excita contendas, mas
o amor cobre todas as trans-
gressões” (Prov. X, 12).
Eu não levo desaforo para casa, afirmava um
homem bem conhecido por suas arengas, muitas
das quais motivadas por coisas sem maior
importância.
— Comigo é assim, dizia ele, não levo
desaforo, sem revidar, para casa.
— É, meu filho, você não leva desaforo,
mas também não leva a paz.
O homem calou-se por um instante e quis
saber:
— Como seria possível viver em paz?
— A paz não é uma dádiva, mas uma
colheita, fruto do comportamento de cada um.
— Em que se resume esse alegado compor-
tamento?
— Esse comportamento salutar, resulta do
respeito a limites. O respeito aos próprios limites
leva ao equilíbrio do corpo. O respeito aos
limites alheios, faz desaparecer os revides e, com
66
eles esmaecem os conflitos.
— Diante da discordância ou da agressão,
como proceder?
— A melhor maneira de não incendiar as
vestes é o afastamento das chamas. O revide
aumenta as mazelas do ódio e nada oferece de
positivo e se assemelha a esmurrar o aço. Quem
se afasta do agressor evita que ele venha a
consumar a sua obra malfazeja. O melhor será,
sempre, evitar ou afastar-se do palco dos
conflitos.
O velho Bino olhando mansamente para o
interlocutor concluiu:
— Quando você aprender a tolerar e “levar
desaforos para casa”, com ele você levará,
também, a sementeira da paz. Não te esqueça:
o revide não poupa quem dele se vale;
a distância e o silêncio amainam a tempes-
tade do ódio;
não é possível ser feliz cevando a serpente
do ódio no peito.
Melhor que revidar, destruindo,
Alimentando o ódio e a dor,
É mais sábio cultivar o amor,
Servindo, amando, construindo.
67
21. NA GAVETA DO ÓDIO
“Tão certo como a Justiça con-
duz para a vida, assim o que
segue o mal para sua morte o
faz” (Prov. XI, 19).
A Pequena Raquel, como se fora uma
borboleta graciosa e colorida adejando as flores,
deslocava-se de touça a touça, como se corte-
jasse as bela e olorosas flores que se abriam para
enfeitar e perfumar o dia que se iniciava. O
velho Bino olhava com íntima satisfação aquele
espetáculo de pura beleza e inocência. A doce
menina aproximou-se do ancião, beijou-lhe as
mãos e, apontando para um galho pendente de
flores afirmou:
— Meu amigo, este buquê natural é teu.
— Por quê?
— Porque só você merece a beleza e o
perfume que delas exalam.
— Filha, a beleza, o perfume, a alegria, a
felicidade, não podem ser aprisionados pelo
egoísmo, ao contrário, devem ser partilhados por
todos.
68
— Mas existem aqueles que tentam apri-
sionar o perfume, o amor e a felicidade nos
repositórios de cristal ou nas grades do ciúme.
— Tentam mas não o conseguem, tão logo
o frasco é aberto para o regalo do egoísta, o
perfume se espalha agradando a todos, tão lodo o
ciumento rompe as grades do ciúme para fartar-
se do amor, ele escapa para o campo aberto da
liberdade, deixando ao longe o seu captor.
— Senhor Bino, como seria possível ao ho-
mem libertar-se do ódio, fazendo o amor preva-
lecer na Terra?
— Os semelhantes se atraem e os contrá-
rios se repelem, essa é a lei. As trevas se fartam
na ausência da luz, assim, também, o mal só
impera onde não se cultiva o bem.
— Qual seria o conselho para o homem
viver feliz?
— O primeiro passo seria limpara as gave-
tas do ódio em todas as suas formas, dentre elas
o medo, a cobiça, a maledicência, o revide e a
presunção. O medo erige obstáculos para o
sucesso, na intimidade de quem o aceita e
propaga a desconfiança. A cobiça é o repasto da
ira. A maledicência é a térmita que mina a honra
e macula a alma. O revide é realimentador da
69
fogueira do ódio e a presunção alimenta o
orgulho que cega o homem para os verdadeiros
valores da vida. A receita para alcançar a paz e a
felicidade é superar o medo, pela confiança em
si mesmo e pela fé em Deus, sufocar a cobiça
pela prevalência dos verdadeiros valores da vida,
calar a maledicência pela força da virtude, da
verdade e pela sabedoria do silêncio, afogar o
revide no bálsamo do amor e, por fim, vencer a
presunção pela aceitação da certeza de que todos
viemos da mesma origem e caminhamos juntos
para o agasalho do Pai.
O velho Contador de Estórias, depois de
breve reflexão, arrematou:
tenha em mente que o amor é o único
antídoto contra o mal;
quem pensa e pratica o bem coloca-se a
salvo do mal.
Para vencer o mal, que não convém
A quem deseja ser feliz e viver,
Alegre, sem o travo do sofrer,
É necessário praticar o bem.
70
22. A GAVETA DA DOENÇA
“Quem ama os prazeres empo-
brecerá, quem ama o vinho e o
azeite jamais enriquecerá” (Prov.
XXI, 17).
Uma senhora, ainda relativamente jovem, mas envelhecida pelas mazelas do corpo, aproximou-se vagarosamente do Banco da Praça, onde o velho Bino se encontrava.
— Bom dia senhor Bino. — Bom dia, como vai? — Carregando as minhas dores, a minha
artrose não me deixa. Se não bastasse, a minha gastrite não permite que me alimente e todo remédio que tomo, melhora uma coisa e piora outra. Não durmo, a minha insônia não deixa. Os médicos não sabem nada, os remédios só têm preço, mas não surtem efeitos. O que devo fazer Senhor Bino?
— Minha filha, a saúde, como tudo que nos afeta é uma conseqüência do nosso compor-tamento.
— Que mal eu fiz aos outros, para sofrer tantas dores?
71
— Você não fez mal aos outros, mas a si
mesma, saturando a mente com impulsos doen-
tios. Você quer ser doente.
— Por que o senhor diz isso?
— Olha minha filha, você pensou, falou e
repetiu “a minha artrose”, “a minha gastrite”,
“as minhas dores”, “a minha insônia” como se
aquelas mazelas fossem algo incorporado à tua
personalidade. Saiba que uma lei eterna, a “Lei
dos Semelhantes” rege a mecânica ativa, reativa
e interativa, das coisas, fatos, seres e pessoas no
Universo. Se você só fala em doença, não
acredita no médico e no remédio que ele receita,
certamente será envolvida em mazelas doentias.
— O que devo fazer para mudar a minha
vida?
— O primeiro passo é limpar as gavetas da
mente, das afirmações doentias. Substitua a afir-
mação negativa tal como “a minha artrose” por
afirmações positivas como “a minha saúde”, “o
meu sono”. Não fale em doença, ao contrário,
sature a tua mente com afirmações positivas. Se
alguém ao saudar-te perguntar “Como vai vo-
cê?”, cultiva o hábito de responder “estou bem e
vou ficar melhor”. Creia no médico e nos
remédios que ele receita.
72
O velho, após aquela sermonária, arrematou:
— Quando o pensamento negativo de doen-
ça, fracasso, maledicência ou pessimismo marte-
lar a tua mente, repita com insistência, até que
eles desapareçam, a afirmação: “O poder de
Deus está em mim, por isso, a cada momento
estou mais saudável e feliz”.
Por fim, aprenda a sorrir e a valorizar o belo
e o bom, uma vez que você recebeu de Deus a
valiosa oportunidade da vida.
Pensar em saúde é o primeiro passo para o
equilíbrio do corpo. O segundo passo é respeitá-
lo dosando com bom senso, a alimentação e os
limites de resistência do próprio corpo.
Quem deseja vida agradável,
Toma as rédeas do comportamento,
Saneia o próprio pensamento,
Para alcançar vida saudável.
73
23. NA GAVETA DA LÍNGUA
“A morte e a vida estão no po-
der da língua” (Prov. XVIII, 21).
Aquele homem era conhecido como verda-
deiro parlapatão. Manejava uma língua ferina,
metia-se em tudo, em todas as conversas, forçan-
do a convicção de que dominava todos os assun-
tos, demonstrando o desejo de prevalecer sobre
os demais. No Banco da Praça ele aproximou-se
do velho Bino e foi logo puxando assunto:
— Já sei, está filosofando, senhor Bino e,
faz muito bem, os homens de hoje não pensam.
Um bom exemplo é o povo desta vila metida a
cidade. São todos ignorantes e me evitam porque
não alcançam o que eu falo.
O velho permanecia calado, ouvindo aquela
sermonária vazia. O homem continuou, critican-
do o governo, tecendo considerações sobre ciên-
cia, política, detalhando e sublinhando as notí-
cias de jornais, como se houvesse participado
dos eventos aos quais se reportava. As pessoas
aproximavam-se, ouvia um pouco e se afastavam
74
sem esconder o enfado. A certa altura, o falas-
trão calou-se, olhou para o Contador de Estórias,
perguntando:
— Por que todos se afastam de mim?
— Meu filho, eles se afastam para não
serem rotulados como ignorantes.
— Será que o meu conhecimento os
intimida?
— Não, o que os intimida é a tua língua.
O homem, como se fora estocado por um
ferrete, calou-se. O velho continuou.
— Tenha para você que a língua tem o
poder de construir ou destruir, somar ou dividir,
propagar o bem ou o mal, mas acima de tudo ela
denuncia as mazelas, ou virtudes de quem fala,
por isso pode colocá-lo nas alturas ou atirá-lo ao
rés-do-chão.
— O que devo fazer para transformar a
minha loquacidade em instrumento útil a mim e
aos outros?
— A língua é como um corcel fogoso que
só é útil ao cavaleiro, se submetido a freios.
Coloca freios à tua língua, pensa antes de falar e
só fale o que for necessário. Não esqueça que:
o poder da fala está na firmeza do
pensamento;
75
o sábio pensa antes de falar, o tolo ou
presunçoso, fala antes de pensar;
quem fala sem refletir, sempre termina por
falir.
Falar sem refletir ou sem pensar,
Desejando viver cortejado,
Leva o tolo a ser forçado,
Ao constrangimento do bem calar.
76
24. A GAVETA DO CASAMENTO
“O filho insensato é a desgraça
do pai, e um gotejar constante,
as contensões da esposa. A casa
e os bens vêm como herança dos
pais; mas do Senhor, a esposa
prudente” (Prov. XIX, 13 e 14)
A Pequena Raquel aproximou-se do Banco
da Praça, onde o velho Bino, como de costume,
postava-se observando o que acontecia. A
menina, acompanhada por uma jovem, pediu a
bênção ao bondoso conselheiro e sentou-se ao
seu lado.
— Amigo Bino, tomei a liberdade de trazer
esta moça, para ouvi-lo.
O velho notou que a jovem tentava, mas não
conseguia esconder as lágrimas que teimavam
em denunciar suas mágoas íntimas.
— Filha, não permita que lágrimas afoguem
tua paz. Você é linda, jovem, tem os braços para
agir, as pernas para deslocar-se, olhos para ver e,
acima de tudo, tem o poder de exercer a vontade,
escolhendo e decidindo, tem a divina oportuni-
77
dade da vida, por que então choras, ao invés de
sorrir?
— Senhor Bino, eu estou sofrendo muito.
— Por quê, filha?
— Amo um moço, não seria capaz de viver
sem ele.
— Não vejo motivos para lágrimas no amor.
— Mas... é que ele foi embora para bem
longe.
— Qual o motivo do afastamento dele?
— Desentendimento entre ele, os pais e
irmãos o que o levou a desforço pessoal com
agressões mútuas.
— Ele é delicado, bondoso e respeitoso com
você?
— Senhor Bino, ele é muito nervoso, não
gosta de ser contrariado, mas sendo atendido nos
seus desejos, ele se mostra muito bom.
— Você já observou se ele é teimoso ou
malcriado com os pais?
— Ele é bom, Senhor Bino, só se mostra
irritado e algumas vezes furioso, quando não é
atendido em seus desejos.
O ancião, como sempre fazia, refletiu um
pouco para depois aconselhar.
— Olha, minha filha, você deveria chorar
78
de alegria e, não, por sofrimento. Agradeça por
aquele moço haver se afastado de você e peça a
Deus que o mantenha bem longe.
— Por quê?
— Ele não te ama, apenas quer você como
objeto de sua satisfação. Lembra o que disse o
apóstolo Paulo:
“O amor é paciente, é benigno, o
amor não arde em ciúmes, não se ufa-
na, não se enso-berbece. Não se con-
duz inconvenientemente, não procura
os seus interesses, não se exaspera,
não se ressente do mal; não se alegra
com a injustiça, mas regozija-se com a
verdade; tudo sofre, tudo crê, tudo es-
pera, tudo suporta” (I Cor.XIII, 4 a 7).
Nessa elegia do amor, o apóstolo aponta os
requisitos que indicam aquele que nutre verda-
deiro amor. Não te esqueças que “o bom filho é
bom tudo” e que “o mau filho é mau tudo”.
Quem tem coragem de afrontar o pai ou a mãe
termina por violentar qualquer um outro,
inclusive a noiva ou esposa. Não permita que a
emoção tome as rédeas de tuas decisões. O
casamento é um ato que marca a vida dos
79
cônjuges e dos futuros filhos, por isso a sua
tecitura não pode ser entregue ao saciamento
episódico e transitório das emoções prazerosas.
O velho, mais uma vez fez a costumeira
pausa, para afinal concluir:
se desejas ser bem sucedida no casamento
ou em qualquer outra sociedade, o primei-
ro passo é assegurar-se de que o futuro
parceiro ou sócio é bom filho;
o filho obediente, trabalhador e honesto,
tem tudo para ser um chefe de família
bondoso e responsável;
o filho que afronta à mãe que o gerou, não
reluta em agredir ao companheiro e aos
amigos.
Quem deseja verdadeiramente,
Ter paz, ser feliz no casamento,
Ouve e anota o ensinamento,
Buscando filho obediente.
80
25. A GAVETA DA FAMÍLIA
“O coração do sábio é mestre de
sua boca, e aumenta persuasão
em seus lábios. Palavras agradá-
veis são como favo de mel, doce
para a alma e medicina para o
corpo” (Prov. XVI, 23 e 24).
Algumas pessoas discutiam sobre os rumos
e o valor do núcleo familiar, diante das inova-
ções dos costumes.
— A família é um ajuntamento de pessoas
que se digladiam, cada um tentando retirar dos
outros o melhor para si. Dizia um.
— O melhor é viver sozinho, que conviver
com pessoas cuja escolha você não fez, replicava
um outro.
— Para mim o grupo familiar é um poço de
provações, onde as dores são repartidas e as
alegrias são apossadas pelos mais espertos,
replicava o terceiro.
Chamado a intervir, o velho Bino colocou o
que pensava.
— Filhos, o mundo tem a cor de nossos
81
olhos, quem é bondoso vê o que é bom,
enquanto o maldoso só é despertado pelo que é
mau. Os defeitos e mazelas, não são da família,
mas dos seus membros. Se cada um tomasse a si
a decisão de reformar-se, certamente não só a
família, mas a própria sociedade, seus costumes
e rumos seriam recolocados em equilíbrio. A
família deveria ser vista como um ninho, uma
pausa na turbulência da vida, onde o homem
pudesse reordenar suas energias para luta.
— O que deve ser feito para recolocar a
família como oásis na grande travessia da vida?
— Cada membro da família deve colocá-la
acima de si mesmo, como o primeiro passo. A
seguir, deve esforçar-se para conhecer e vencer
suas próprias mazelas, ao invés de se erigir em
censor dos outros. É necessário ter em mente que
o grupo familiar nos oferece a primeira e maior
oportunidade de aprender, ensinar e servir, no
fervilhar dos conflitos e contradições dos seus
membros. O familiar difícil nos oferece a oportu-
nidade de servir e aprender. O parente orgulhoso
e prepotente oferece-nos a oportunidade de exer-
citar a humildade e a tolerância. O companheiro
paciente, sábio e amoroso, oferece o aprendizado
pela candência do exemplo.
82
Lembremo-nos que:
a família bem constituída, é um alicerce
seguro para os embates da vida;
de nada vale a caridade praticada fora do
lar, se nele impera o desamor e a desca-
ridade;
na família onde prevalece o amor, o res-
peito, o trabalho e a honestidade, entume-
ce a sementeira da felicidade.
Família que no amor se compraz,
Construída com honestidade,
Alcança o olor da felicidade
O respeito, abundância e a paz.
83
26. A ÚLTIMA GAVETA
“A boca do insensato é a sua
própria destruição, e os seus
lábios um laço para sua alma”
(Prov. XVIII, 7).
Quem deseja ser feliz, limpa as gavetas da
mente dos obstáculos que a impedem de medrar,
que são o medo, a preguiça, a desonestidade, a
cobiça, o orgulho e o revide. Mesmo no fragor
das tempestades da vida é possível aos que se
deleitam no bem ver e sentir o que existe de bom
e de belo no contexto da existência.
Aprenda a agradecer pelas dádivas da vida e
os seus espinhos se tornarão menos agressivos.
Nenhum homem é tão mau que não guarde den-
tro de si algo de bom, em algum momento ele
será levado a sorrir. Todos os fatos por mais
dolorosos que sejam, no mínimo deixam uma
lição àqueles que são humildes e desejam
aprender.
As dificuldades sempre serão menos duras,
para os que têm fé e confiança em si.
Não existem provações eternas nem monta-
84
nhas intransponíveis para os que se munem de
fé, conhecimento e perseverança.
O desespero é como o apagar das luzes na
escuridão da noite, sempre tornará mais difícil o
percurso. Enquanto isso, a fé, a confiança em si e
a serenidade são estímulos e luzeiro para os
caminhos.
Confia em ti, pratica o bem, agasalha-te na
verdade e certamente vencerás todos os desafios
da vida.
Quem doma a língua e o que diz,
Trabalha e busca a verdade,
Cultivando a honestidade,
Caminha firme para ser feliz.
85
NAS TRILHAS DA VIDA
CONSELHOS E REFLEXÕES
É feliz quem tem a disposição
para lutar e mudar o que pode ser
mudado, mas é resignado para
suportar o que não pode ou não
deve ser mudado.
Quem reflete e é prudente no agir,
evita a dor do arrependimento.
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01. Se você deseja viver em paz jamais adote decisões que se refiram à tua vida, impulsionado pela emoção, pois é certo que esta não permite a análise correta dos fatos e suas conseqüências. Proceda de forma que a razão predomine sobre a emoção e jamais te arrependerás. Este conselho se aplica de forma especial ao relacionamento amoroso.
02. Quem ama não agride, tolera; não exige, doa; não faz sofrer, mas partilha com a pessoa amada, de todas as dificuldades.
03. Não troque a emoção momentânea, por tua independência, liberdade e paz, pois quem cede aos apelos emocionais, sempre se enleia em sofrimentos.
04. Recuse, sempre, aos convites para negócios e comportamentos duvidosos, pois estes se assemelham a serpes que hoje ou amanhã te picarão, vertendo em ti a sua peçonha. Procure o caminho da honestidade, se desejas ser verdadeiramente feliz.
05. O primeiro a ser vitimado pela desonesti-dade é o próprio desonesto.
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06. Um homem blasfemava em altos brados,
lamentando o que dizia ser sua má-sorte.
Tudo parecia errado em sua vida. Chorava
entregue ao desalento.
O velho Contador de Estórias aproximou-se
procurando acalmá-lo, ensinando-lhe:
Meu filho, ao invés de lamuriar e
derramar lágrimas é melhor confiar em
Deus e em ti e trabalhar para superar as
dificuldades. Não te esqueças que mais
vale uma gota de suor que um rio de
lágrimas, para alcançar o sucesso.
Procura estender as mãos mais para
trabalhar do que para pedir.
Quem se lamenta perde tempo e energia
para a caminhada da vida.
07. Um jovem perguntou ao velho Bino:
— O que fazer quando um amigo nos
convida para beber, sem ferir?
— Meu filho, pense em alguém que se
encontre prestes a afogar-se e a quem você
atira uma corda para salvá-lo. O que seria
razoável, você permitir que ele o arrastasse
para o fundo das águas ou você o retirar
89
para a margem e salvá-lo? Certamente a
razão indica que seria melhor salvá-lo do
que afogar-se junto com ele.
Assim, também, deve proceder com aqueles
que o convidam para o lodaçal do vício,
procure salvá-los, se não puder fazê-lo,
afasta-te do pântano do vício onde a única
resultante será o fracasso. Lembra que:
o verdadeiro amigo não nos induz à
prática do mal;
o copo oblitera a capacidade de avaliar o
erro;
o vício, cedo ou tarde afogará o viciado
nas lágrimas e sofrimentos próprios e da
família;
o pior do álcool e das drogas é que a
irresponsabilidade do viciado sempre
deságua sobre a família;
quem permanece sóbrio tem maiores
possibilidades de encontrar o melhor
caminho.
08. Uma senhora aparentemente revoltada,
guardava um filho que, indiferente aos
fatos, permanecia em uma cadeira de rodas.
90
Exprobrava, afirmando não compreender a
razão do sofrimento do filho tão pequeno e
inocente, sofrer tamanha pena e, a ela, ser
atribuída a tarefa de arcar com tão pesado
fardo. Uma outra que a ouvia disse-lhe com
voz suave:
— Minha amiga, conforma-te com os
desígnios de Deus. Se pudesse, eu receberia
de bom grado a tua tarefa em troca da
minha.
— Existe algo pior que um filho na cadeira
de rodas?
— Minha irmã, o teu filho sorri está perto
de ti e, certamente não se entregará à
prática do mal. Para ti, basta paciência.
Quanto à mim, meu filho é, também,
prisioneiro, mas das grades da Justiça, por
crimes cometidos e tem por companheiros
criminosos endurecidos, que lhe sonegam a
oportunidade da recuperação. Agradeça,
pois, a Deus, pela provação que colocou em
teu caminho.
09. Feliz é aquele que recebe as dificuldades e
provações como oportunidade para apren-
der.
91
10. Não permita, nunca, que o desespero e o
medo obliterem a tua capacidade de decidir
racionalmente. Toma para ti que todas as
dificuldades podem ser superadas ou apa-
gadas pelo tempo.
11. Não te aflijas se alguém discorda de ti, tal-
vez seja o momento da reflexão e da toma-
da de rumos mais adequados para tua vida.
12. Nas dificuldades, conserva a calma e luta,
mas evita o desespero e a pressa, que impe-
dem uma avaliação correta dos fatos. Creia
que sempre existe uma solução ou uma
resposta elucidativa para todas as dúvidas.
A calma e a fé, apontam o caminho e
fortalecem para a caminhada.
Quem se desespera perde o rumo a
seguir.
13. Se a noiva ou noivo te abandonou, agrade-
ça, talvez aquele gesto seja uma bênção
para poupar-te de aflições muito maiores.
Nem sempre o que desejamos é o melhor
para a nossa edificação.
92
Uma decepção hoje, é bem melhor que
dores e sofrimentos incontornáveis no
futuro.
14. Se alguém te causa prejuízo agora, procura
recuperar o que perdestes, sem derivar para
o ódio. Se não for possível, esqueça e
afasta-te para que o malefício não seja
maior e não venhas a perder mais tempo.
Esqueça e reinicia a tua luta arrimado no
bem e, certamente, boas oportunidades sur-
girão para ti.
Algumas vezes o prejuízo serve para
afastar pessoas e mazelas bem maiores.
15. O lucro fácil pode ser uma armadilha, onde
o ambicioso perde o que possui e o que
ambiciona.
16. Quem ganha com esforço e cautela, sempre
valoriza mais o que amealhou.
17. Um homem demonstrando grande tristeza,
descansava à sombra de frondosa árvore. O
Contador de Estórias percebendo o que ia
na alma daquele irmão, o inquiriu:
93
— Qual o motivo de tua tristeza?
— Estou exausto, fiz o caminho do mundo
em busca da felicidade, entretanto só
encontrei mazelas e tristezas.
Aquele homem desfiou um rosário de
amarguras, alegando só haver encontrado
pessoas más, orgulhosas e somente havia
vivenciado carências e fome.
O velho Contador de Estórias retomou a
palavra.
— Tu fizestes o caminho errado em busca
da felicidade, por isso não a encontrastes.
— Qual o rumo a seguir?
— Meu irmão, a felicidade somente pode
ser alcançada de parelha com a paz e esta
depende de algo que está dentro de cada um
de nós.
— Que tesouro é esse do qual depende a
paz e, por conseqüência a felicidade?
— A paz resulta do respeito aos limites
próprios e alheios. Respeitando os próprios
limites o homem alcança a saúde e o
equilíbrio, respeitando os limites alheios,
evita conflitos. Saudável, equilibrado e sem
conflitos, o homem tem olhos para ver a
valorizar o que é belo e positivo na vida.
94
Por tudo isso podemos afirmar que a
felicidade está dentro de cada um de nós e,
que, o mundo tem a cor de nossos olhos.
18. Quem alimenta conflitos aliena a própria
harmonia, quem os evita caminha para
alcançar a paz e a felicidade.
19. Se alguém te agride, deixe-o onde está e
segue o teu caminho, logo mais te encon-
trarás distante dele e do seu ódio.
20. Se a moléstia ou a carência bateu à tua
porta, acalma-te, pois é mais fácil suportá-
las e vencê-las com serenidade, do que em
desespero. Não te esqueças que sempre
existe uma saída no labirinto da vida.
21. Quem confia em si e luta, sempre encontra
uma saída para suas dificuldades.
22. Dois amigos caminhavam por trilhas desco-
nhecidas, quando perceberam que estavam
perdidos. No momento em que comenta-
vam suas dúvidas, encontraram um ancião
que caminhava a passos lestos, como se já
houvesse encontrado o seu destino. O pri-
95
meiro dos viandantes, denotando humil-
dade, interpelou o velho senhor. — Qual o rumo a seguirmos para encon-
trarmos o nosso destino? — Meu filho, pelo adiantado da hora é
melhor deixar o leito da estrada e agasa-lharem-se à sombra daquelas árvores, onde existe frutos e água para recompor as ener-gias. Amanhã retorne ao curso da viagem e pouco depois encontrarão a indicação do melhor caminho.
O outro companheiro, que dava mostras de presunção e teimosia, interferiu:
— Eu não deixarei o leito do caminho para esconder-me, vou seguir em frente pois é na estrada que encontrarei o rumo a seguir.
O primeiro, humildemente, aceitou o conse-lho e, buscou o agasalho da árvore amiga. O segundo, teimoso, esfalfou-se na estrada até cair desfalecido, sendo alcançado pelo socorro do primeiro no dia seguinte, trôpe-go e sem forças para a viagem.
O primeiro, humilde e atento aos conselhos dos mais velhos, ofereceu-lhe frutos colhi-dos da árvore amiga e água que recolhera. Refeito o teimoso, continuaram a jornada, agora atentos à lição recebida.
96
Quem ouve os conselhos dos mais expe-
rientes, sofre menos para alcançar o que
deseja.
O presunçoso, termina sempre esfoguea-
do pela própria teimosia.
Quem pensa que tudo sabe, termina por
afogar-se na própria ignorância.
23. As propostas miraculosas ou convites que
afrontem a ordem e a moral, são armadi-
lhas para prender os incautos. Se encon-
trares quem os faça para ti, cala, deixa o
proponente e segue o teu caminho.
24. Nós deveríamos ser como as flores que
oferecem beleza, perfume e néctar, sem
nada exigir em troca e, que, ao fim,
despetalam-se e fenecem sem murmurar.
25. Não permita que a maledicência te trans-
forme em instrumento do mal.
26. Se não puderes ser útil quando falas, é
melhor para ti e para os ouvintes que te
cales.
97
27. O farnel do perverso não se presta ao
homem de bem, pois é melhor permanecer
sedento que ingerir cicuta.
28. Só a experiência nos leva à sabedoria da
escolha, por isso, nunca despreze os
conselhos dos mais velhos.
29. Todos, em algum momento, podem ser
tomados por vacilações e dúvidas. Nesses
momentos o melhor é ser paciente e ouvir
as ponderações dos mais vividos.
30. Cultiva sempre a verdade, pois em quais-
quer circunstâncias, ao fim, ela sempre
prevalecerá.
31. A melhor forma para não enlamear-se no
charco é afastando-se dele. Da mesma
forma o distanciamento dos vícios, é a
maneira mais eficaz de evitá-los.
32. As dívidas nada solucionam, apenas agra-
vam as dificuldades, elas resultam, quase
sempre do imediatismo, do modismo e da
irreflexão.
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33. Confia em Deus e em ti e em tudo quanto
fazes, pois quem não tem a virtude de con-
fiar equipara-se ao náufrago que despreza a
bóia que lhe é atirada como auxílio para
salvar-se.
34. O medo, a ambição e a ira, sempre desá-
guam numa decisão equivocada. Vença o
medo pela fé, a ambição pelo desprendi-
mento e a ira pelo amor para que, possas
vencer e ser feliz.
35. Confia em ti e todas as barreiras e dificul-
dades se tornarão mais fáceis de serem
superadas.
36. Caminha o teu caminho, sem perturbar ou
obstruir a estrada de teus semelhantes. Só
assim alcançarás o teu destino sem torturas
para tua consciência.
Não te esqueças que os conflitos sempre
resultam do desrespeito aos limites uns dos
outros.
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37. Se campeiam os motivos para alimentar
tristezas, também existem inúmeras razões
para agradecer e viver alegre. Escolha a
alegria, agradecendo a oportunidade da
vida e, as tristezas esmaecerão.
38. A vaidade e o orgulho quase sempre obli-
teram a razão, levando ao despenhadeiro da
desilusão.
39. Antes de ensinar é necessário aprender.
Antes de exigir é imprescindível oferecer
bons exemplos.
40. Se alguém te agride, deixe-o onde está e
segue o teu caminho, certo de que, quem
sabe tolerar é mais sábio e poderoso, do que
aquele que revida.
41. Quem espalha maledicência deixa em si a
marca das mazelas que propaga.
42. Se o teu companheiro te agride, tolera-o
quanto possas. Se ele te abandona, deixe-o
ir sem lamúrias, pois o que te parece um
mal, no momento, pode ser um bem no
amanhã.
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43. Ganha mais quem sabe ouvir, que aquele
que se propõe a falar.
44. Nunca alimente tristezas. Olhe à tua volta e
encontrarás mil motivos para confiar em
Deus e voltar a sorrir.
45. O vício macula a alma e destrói o corpo
enquanto afasta a paz e a felicidade.
46. Quem usa o suicídio como fuga das dificul-
dades, engana-se, pois as causas de todos os
desacertos encontra-se no espírito e, não,
no corpo físico. O melhor é resistir e lutar,
pois tudo, hoje ou amanhã será amortalhado
pelo tempo. Por fim, é certo que sempre
existe uma resposta para as dificuldades da
vida.
47. Quem deseja prosperar, crescer e viver em
paz, deve cuidar dos próprios pensamentos,
disciplinando-os e os direcionando para o
que é positivo. É certo que eles atraem para
o campo de atuação de cada um, o que lhe é
semelhante…
A Lei dos Semelhantes leva os semelhantes
a se atraírem e os contrários a se repelirem.
101
48. A felicidade não é uma dádiva, mas uma
conquista, pois é feliz, quem semeia otimis-
mo, alegria, honestidade e rega tudo com o
suor do labor.
49. Na caminhada da vida não é a pressa que
leva ao destino desejado, mas a obstinação
e a perseverança.
50. Quem se preocupa com a vida alheia, perde
precioso tempo na edificação de sua própria
existência.
51. A melhor forma de ter bons vizinhos, é
procurar ser um bom vizinho.
52. As lágrimas de mãe, falam mais alto que a
mais vigorosa das sermonárias.
53. É melhor fazer, que prometer, pois a dádiva
liberta quem a pratica e a promessa
aprisiona quem a faz.
54. A luxúria embota os sentimentos levando o
homem a perder o senso dos seus limites e
a resvalar para o ridículo.
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55. Procura em teu semelhante o que ele tem de
bom e, certamente terás forças para supor-
tar o que ele possa oferecer de negativo.
56. Se alguém se vai e leva um pouco do que é
teu, agradeça, pois muito pior seria se ele
permanecesse perto de ti e viesse a soterrar
tuas esperanças.
57. Mais vale uma gota de suor que um caudal
de lágrimas. É certo que o trabalho soma e
dignifica, enquanto quem lamuria e chora,
nada produz.
58. Agradeça as dificuldades, como oportuni-
dades de aprender ou servir, certo de que as
facilidades, algumas vezes, levam a resva-
lar para a ociosidade e, até mesmo, para o
erro.
59. Seja honesto e trabalhador, e confia em ti,
para que os outros sejam levados a,
também, te dispensarem confiança.
103
60. O trabalho deve ser recebido como uma
bênção pelo trabalhador e este deve ser
aceito pelo empregador, como um irmão e
auxiliar. Só assim os frutos do trabalho
ultrapassarão os limites frios do lucro.
61. Liberta tua mente de pensamentos negati-
vos e, certamente pouparás o teu corpo e
tua vida de moléstias e insucessos.
62. Se algo se opõe à tua caminhada e, que, no
momento não podes superar, contorna e
entrega ao tempo, mas não desanimes,
segue em frente e, certamente alcançarás o
teu objetivo.
63. Coloca entusiasmo em tudo quanto faças,
para que encontres alegria no sucesso.
64. Faça das críticas que recebes um incentivo
ao teu aprimoramento e à perseverança na
tua luta. Se assim procederes, certamente
alcançarás a vitória.
65. Quem se vale do poder para impor a vonta-
de aos seus semelhantes, jamais alcançará a
paz.
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66. O sucesso resulta da soma equilibrada de
valores essenciais, de natureza econômica,
moral, intelectual e espiritual.
67. Muitos sofrimentos derivam da ânsia deses-
perada pela posse de bens, muitas vezes
absolutamente desnecessários para a me-
lhora da vida.
68. Quem tenta fugir das dificuldades no aga-
salho enganador das drogas, multiplica suas
dores e transfere seus sofrimentos aos ami-
gos e familiares.
69. Quem corrompe ou se deixa corromper,
cedo ou tarde afogar-se-á no pantanal da
desonra.
70. Se alguém te agride, deixe-o onde está e
segue o teu caminho sem atear em tua alma
o incêndio do ódio.
71. O ódio envenena no primeiro passo os
caminhos de quem odeia.
72. As dificuldades robustecem a alma dos que
têm humildade para aproveitar suas lições.
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73. É mais fácil superar as dificuldades com
sorrisos, do que com as lamentações ou
revoltas.
74. Enfrente as dificuldades com equilíbrio e
bom senso, mas não as alimente com a
seiva do medo e do desalento. Se puderes
superá-las, faça-o, se não for possível,
deixe-as e segue o teu caminho, mas retira a
lição para não as trazer de volta.
75. O medo suga as energias para as lutas da
vida, vence-o e tornarás mais fácil a tua
caminhada.
76. Sempre existe um lugar para o trabalhador
que está preparado para a tarefa e labora
com amor naquilo que faz.
77. Proceda com honestidade em teus negócios,
se desejas ser bem sucedido. Diz a sabe-
doria popular que, “quem precisa do leite
não sonega alimento e bom trato à vaca”.
78. Os negócios duvidosos são armadilhas que
prendem aqueles que deles se aproveitam.
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79. Cuida de tua palavra para que ela não se
transforme em lâmina de dois gumes e
venha a ferir-te.
80. Nunca lamente um negócio desfeito, talvez
o maior lucro resida em não fazê-lo.
81. Prepara-te para fazer bem o que deves
realizar e nunca te faltará trabalho, pois
sempre existe oportunidade para quem está
habilitado para a tarefa.
82. Nenhuma barreira da vida resiste à força da
honestidade e da verdade, somadas à virtu-
de da perseverança.
83. As grandes facilidades da vida, quase
sempre são armadilhas para os incautos e
ambiciosos. É bom não esquecer que os
ganhos honestos são regados pelo suor e
assegurados pelo bom senso.
84. O ambicioso, quase sempre é sacrificado no
altar do lucro fácil.
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85. Espera que o vendaval da emoção ou do
ódio esmaeça, para decidir e escolher para
que não venhas a sofrer as conseqüências
de uma decisão equivocada.
86. É melhor refletir e ponderar antes de agir,
que remediar as conseqüências dos atos
impensados.
87. A prática do mal acorrenta o homem nas
masmorras do sofrimento.
88. Quem pratica o bem, rega a própria
felicidade.