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Desigualdade na repartição da riqueza e do rendimento desde o século 19
I. Riqueza versus rendimento
II. Desigualdade da riqueza na Europa, 1810-2010
III. Desigualdade do rendimento na Europa continental, 1910-2010
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I.Riqueza versus rendimento
Riqueza de um país =
= casas +
+ capital físico das empresas (edifícios, máquinas e equipamentos) +
+ capital físico do Estado (estradas, hospitais, escolas).
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Cada pessoa detém uma parte da riqueza do país:
parte das casas, parte do capital das empresas e parte do capital do Estado. Exemplo:
uma ou duas casas +
+ acções de empresas (parte do seu capital físico) +
+ obrigações de empresas e do Estado
(empréstimos a empresas e ao Estado, por estes usados para adquirirem o seu capital físico)
+ depósitos bancários
(usados pelos bancos para fazerem empréstimos às empresas e ao Estado).
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Riqueza ≈ Capital,
no sentido em que a riqueza proporciona a quem a detém um fluxo de rendimento por unidade tempo,
Isto é, Riqueza --> rendimento:
- Casas --> rendas.
- Acções --> dividendos (lucros).
- Obrigações e depósitos bancários --> juros
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Rendimento = rendº trabalho + rendimentos capital
= salários + (juros + rendas + lucros)
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II. Desigualdade da riqueza no UK desde 1810
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Facto 1: Uma desigualdade muito alta em 1810, que se acentuou ao longo do século seguinte.
Facto 2: Uma redução progressiva e acentuada da desigualdade desde a 1GM até 1970-80.
Facto 3: Um ligeiro aumento da desigualdade de 1980 a 2010
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1. Por que razão a desigualdade era alta em 1810 e aumentou no século seguinte (facto 1)?
1810 1910
Top 1%: 55% 70%
Top 10%: 80% 90%
Desde pelo menos 1700 até à 1ª GM, o rendimento real do capital esteve aproximadamente constante em torno de 5% ao ano: r = 5%.
E era fácil obter este rendimento:
- OTs -> taxa nominal de juro de 5%.
- As rendas ≈ 5% do preço das terras agrícolas.
- A taxa de inflação era 0%.
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Efeito de r = 5% no caso de uma pessoa rica com um capital inicial de 100M€,
e que gaste apenas metade do rendimento gerado por esse capital e poupe a outra metade:
Rendº capital no 1º ano: 5%.100M€ = 5M€ =>
Poupança de 2.5M€ =>
aumento do capital p/ 102.5M€ no ano seguinte =>
=> O capital da pessoa rica cresce 2.5% ao ano.
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O q aconteceu ao capital inicial pessoas não ricas?
Considere-se uma pessoa com um capital inicial de apenas 100 mil euros.
O rendimento do capital desta pessoa =
= 5%.100 mil euros por ano =
= 5 mil euros por ano = 416 euros por mês, que será quase todo gasto =>
=> não haverá poupança e o capital da pessoa não crescerá.
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Em suma,
Houve uma tendência ao longo da história até à 1GM para a concentração da riqueza nos 1% e 10% mais ricos, pq:
- Estes podiam poupar parte significativa do muito rendimento gerado pela sua grande riqueza =>
Crescimento da sua riqueza.
- Enquanto que os não ricos não conseguiam poupar parte significativa do pouco rendimento gerado pela sua pequena riqueza =>
Não crescimento da sua riqueza.
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Significado prático desta extrema concentração da riqueza nos 1% mais ricos:
No período 1872-1912, o rendimento de capital de um parisiense pertencente aos 1% mais ricos era de 80-100 vezes o salário médio.
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2. Explicações para a diminuição da concentração da riqueza desde a 1GM até aos anos 1970-80 (facto 2)
1910 1970-80
Top 1% 70% 20%
Top 10% 90% 60%
1ª) Destruição da riqueza dos ricos nas duas GMs:
- 1.PIB (França)
- 2.PIB (Alemanha)
- 10%.PIB (Reino Unido)
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Nota: tributação proporcional vs. progressiva
- Proporcional – uma taxa de imposto única (ex: 10%) qq que seja o nível de rendº/ riqueza a tributar.
- Progressiva – exemplo de uma pessoa com rendimento anual de 100 mil euros:
Rendº taxa imposto Colecta de imposto
Até 10 mil euros 0% 0
10 a 40 mil euros 10% 3 mil euros
40 a 70 mil euros 30% 9 mil euros
> 70 mil euros 60% 18 mil euros
=> Quanto maior for o rendimento, maior é a percentagem de imposto que a pessoa paga.
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2ª) Introdução da tributação progressiva sobre heranças e sobre o rendimento a seguir à 1ª GM:
- No século 19, a tributação sobre o rendimento das pessoas (IRS) e sobre as heranças era proporcional e muito baixa
(heranças; 1%; rendº < 10%).
- Em 1900-14, foram criados impostos progressivos sobre o rendimento das pessoas e sobre as heranças,
mas as taxas imposto dos escalões mais altos mantiveram-se baixas
(menores que 10% em ambos os casos na generalidade dos países)
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- A partir da 1ª GM, houve um aumento drástico da progressividade na tributação do rendimento e das heranças,
tendo as taxas aplicadas aos escalões mais altos permanecido:
- muito elevadas até 1980 (caso EUA e UK)
- elevadas até hoje (caso França e Alemanha).
Taxa do escalão mais alto rendimento em 1930-80:
- US e UK: 80%-90%
- Fr e Al: 50%-70%
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Taxa do escalão mais alto de heranças em 1935-80:
-US e UK: 70%-80%
-Fr e Al: 15%-35%
Nota: estas taxas incidiam apenas sobre rendº/heranças do top 0.5%-1% da população.
Taxas menores mas também muito altas incidiam sobre o top 10% da população.
A tributação foi muito mais progressiva no UK e US do que em Fr e na Al =>
=> teve mais importância na redução da concentração da riqueza nos primeiros do que nos segundos países no período da 1GM até 1970-80.
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3ª ) Expropriações no período 1914-1950:
- Ex. 1: Em vésperas da 1GM, as grandes fortunas europeias tinham parte significativa da sua riqueza aplicada no estrangeiro –
- por exemplo, em obrigações do Estado Russo.
Essa riqueza foi em parte confiscada –
- por ex. o regime soviético saído da Revolução de 1917 repudiou a dívida que tinha sido contraída pelo anterior regime czarista =>
=> franceses, britânicos e alemães ricos perderam todas as suas aplicações em obrigações russas.
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Ex 2: nacionalização de várias grandes empresas a seguir à 2GM em França, Alemanha e Reino Unido,
tendo os antigos proprietários recebido indemnizações correspondentes a apenas parte do valor das suas empresas.
Ex 3: Em França a seguir à 2GM, lançamento de um imposto extraordinário de solidariedade nacional sobre a riqueza,
cuja taxa chegou a 20% da riqueza nas maiores fortunas.
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4ª) Delapidação das poupanças em obrigações do Estado (que têm um valor nominalmente fixo),
em resultado de alta inflação no período 1914-50
França: preços multiplicados por 100 entre 1913 e 1950 =>
Apesar de grandes défices orçamentais (=> emissão novos TDP),
o valor real da dívida pública (detida sobretudo pelos ricos) diminuiu de 70% PIB em 1913 para 40% PIB em 1950.
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5ª) As grandes fortunas não diminuíram o seu nível de consumo de acordo com a diminuição dos seus rendimentos e das suas heranças =>
Em vez de pouparem e acumularem capital,
muitas fortunas deixaram de poupar e começaram a usar parte do capital para consumo =>
redução da riqueza das grandes fortunas.
Ex: Em Paris, o rendimento de capital de uma pessoa pertencente aos 1% mais ricos:
- Era de 80-100 vezes o salário médio no período 1872-1912.
- Mas passou para apenas 20 vezes o salário médio no fim dos anos 1930.
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3. Para quem foi a perda da parcela de riqueza do top 1%? (ainda facto 2)
1910 1970-80
Top 1% 70% 20%
Bottom 50% <5% < 5%
A perda da parcela de riqueza no topo não foi para os 50% mais pobres:
continua a existir metade da população que não possui riqueza alguma.
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Para quem então foi a perda da parcela de riqueza do topo?
1910 1970-80
Top 10% 90% 60%
Top 1% 70% 20%
“9%” 20% 40%
1º A classe média-alta (“9%”) duplicou a sua parcela na riqueza nacional.
Desde 1970-80, esta classe é composta por médicos, advogados, gestores e médios empresários bem sucedidos.
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2º Pela primeira vez na história, existe uma classe média (“middle 40%”) com alguma riqueza.
1910 1970-80
Top 1% 70% 20%
“9%” 20% 40%
Middle 40% 5% 35%
Bottom 50% <5% < 5%
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Nos países da Europa do norte, esta classe média pode ser representada por um casal com uma riqueza de 350 mil euros –
- Basicamente, o valor de uma casa muito boa (para os padrões portugueses).
Poderá ter mais alguns valores (carros, depósitos a prazo, acções de empresas),
mas isso é anulado por ter ainda parte do empréstimo da casa por pagar.
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Em síntese:
De 1910 a 1970-80, a redução da parcela do top 1% (70% -> 20%) foi a favor:
- Da classe média-alta (“9%”): 20% -> 40%
- De uma classe média que não existia (“middle 40%”): 5% -> 35%.
Metade da população (“bottom 50%”) continua a não ter riqueza alguma.
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4. De 1980 a 2010 houve um ligeiro aumento da concentração da riqueza nos US e UK (facto 3), mas não na Europa continental.
UK 1970-80 2010
Top 1%: 20% 30%
França 1970-2010
Top 1%: 20%
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Explicação – grandes descidas das taxas imposto sobre escalões de rendº e herança mais altos no UK e US (mas não na Europa continental).
Taxa imposto do escalão mais alto rendimento
-US e UK: descida de 80%-90% em 1930-80 para 30%-40% em 1980-2010
-Fr e Al: 50%-70% ao longo de 1930-2010.
Taxa imposto do escalão mais alto de heranças:
-US e UK: descida de 70%-80% em 1935-80 para 35% em 2010
-Fr e Al: subida de 15%-35% para 30%-40% em 1980-2010.
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III. Desigualdade do rendimento de 1910 a 2010 em França (Europa continental) – parcela top 1%
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Conclusões do gráfico:
1ª As parcelas do top 1% e top 10% no rendimento salarial mantiveram-se constantes de 1910 a 2010, isto é:
A desigualdade salarial não diminuiu de 1920 a 2010; manteve-se aproximadamente constante.
2ª Mas as parcelas do top 1% e top 10% no rendimento total (rendº salarial + rendº capital) caíram drasticamente ao longo de 1914-45.
Razão: queda drástica do rendimento do capital.
Parcela rendº capital no rendº total:
45% (1860) -> 37% (1910) -> 20% (1930-80)
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Ex: Em Paris, o rendimento de capital de uma pessoa pertencente aos 1% mais ricos:
-Era de 80-100 vezes o salário médio no período 1872-1912.
-Passou para apenas 20 vezes o salário médio no fim dos anos 1930.
Em certa medida, o período 1914-45 conduziu à “eutanásia do rentier”.
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O rendimento do capital diminuiu porque o valor do capital privado na Europa diminuiu (de 7xPIB em 1870-1910 para 3xPIB em 1940-80):
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Razões por que o capital privado caiu:
- destruição das duas GMs.
- aumento drástico das taxas de imposto sobre escalões mais altos de rendimento e de herança
- expropriações (ex: não pagamento TDP pelo governo soviético a seguir à revolução de 1917)
- alta inflação => desvalorização Títulos Div Pública
- as grandes fortunas não diminuíram o seu consumo de acordo com a diminuição dos seus rendimentos e das suas heranças