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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE DIREITO MARIANY HAYGERT MACHADO ELUCIDANDO O DOCUMENTO ELETRÔNICO E O SEU ALCANCE PROBANTE

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SULFACULDADE DE DIREITO

MARIANY HAYGERT MACHADO

ELUCIDANDO O DOCUMENTO ELETRÔNICO E O SEU ALCANCE PROBANTE

Porto Alegre2010

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MARIANY HAYGERT MACHADO

ELUCIDANDO O DOCUMENTO ELETRÔNICO E O SEU ALCANCE PROBANTE

Trabalho de Conclusão apresentado como cumprimento de requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, área de concentração: Direito Processual Civil.

Orientadora: Profª. Daniela Courtes Lutzky

Porto Alegre2010

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MARIANY HAYGERT MACHADO

ELUCIDANDO O DOCUMENTO ELETRÔNICO E O SEU ALCANCE PROBANTE

Trabalho de Conclusão apresentado como cumprimento de requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, área de concentração: Direito Processual Civil.

Aprovada pela Banca Examinadora em ____ de ____________ de 2010.

Banca Examinadora:

__________________________________________________Orientadora: Profª. Daniela Courtes Lutzky - PUCRS

_________________________________________________Prof. (a) Examinador(a)

__________________________________________________Prof.(a) Examinador(a)

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos aqueles que de alguma forma contribuíram para que a

conclusão deste trabalho se tornasse possível.

Aos amigos e professores, pela força e incentivo.

A professora Daniela, pela dedicação e excelente orientação.

As amigas Cláudia Bahlis e Mariana Toniolo Cândido, pela alegria e

motivação.

Ao Samuel, pela força e apoio contínuo na elaboração do trabalho.

Aos meus pais pelo amor incondicional.

A Deus, por tudo.

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O papel estará conosco infinitamente, mas sua importância como meio de encontrar, preservar e distribuir informação já está diminuindo. À medida que os documentos ficarem mais flexíveis, mais ricos de conteúdo de multimídia e menos presos ao papel, as formas de colaboração e comunicação entre as pessoas se tornarão mais ricas e menos amarradas ao local onde estão instaladas.

Peter Drucker

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RESUMO

A sociedade está em constante evolução e cabe ao Direito adequar-se à

nova realidade, acompanhando e disciplinando as relações jurídicas advindas do

novo contexto social. A internet tornou-se um instrumento hábil para tornar as

pessoas mais próximas e o ser humano, como ser social que é, em poucos anos a

transformou em um ambiente de inúmeras relações. Toda a sociedade dependerá,

em maior ou menor grau, dos documentos eletrônicos e não há como escapar dessa

nova realidade que se instala. Diante disto, surge a necessidade de transformar os

documentos resultantes dessa nova tecnologia em instrumentos seguros e capazes

de servir como meio válido e eficaz de prova em um futuro processo judicial. Aos

operadores do Direito cumpre a tarefa de imprimir confiabilidade e segurança

jurídica aos documentos tidos em meios eletrônicos, com a edição de leis que

regulem a matéria e com a aceitabilidade da validade jurídica destes documentos no

âmbito probatório pelos juízes e tribunais de nosso país. Este trabalho justifica-se

pela atualidade e relevância social do tema e pela gradativa substituição da

comunicação em papel pela comunicação através dos meios eletrônicos.

Palavras-chave: prova documental, documento físico, documento

eletrônico, validade jurídica

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 72 DA PROVA 92.1 PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA 102.1.1 O contraditório e o direito à prova 122.2 CONCEITO DE PROVA 122.3 FINALIDADE DA PROVA 142.4 OBJETO DA PROVA 152.5 CLASSIFICAÇÃO DAS PROVAS 192.5.1 Quanto ao Objeto: Provas Diretas e Indiretas 192.5.2 Quanto ao Sujeito: Provas pessoais e reais 202.5.3 Quanto à forma: Prova testemunhal, documental e material 202.5.4 Quanto ao Momento: prova casual e prova pré-constituída 212.6 VALORAÇÃO DA PROVA 222.6.1 Sistema da Prova Legal 222.6.2 Sistema da Livre Apreciação da Prova232.6.3 Sistema da Persuasão Racional da Prova 242.7 DIFERENCIAÇÕES ENTRE PROVAS ILEGAIS, PROVAS ILÍCITAS,

PROVAS ILEGÍTIMAS E PROVAS ATÍPICAS 262.8 MEIOS DE PROVA 292.8.1 A Prova Documental 302.8.1.1 Conceito de Documento 322.8.1.2 Autoria Documental e os Documentos Públicos e Privados: Autenticidade

333 DO DOCUMENTO ELETRÔNICO 363.1 CONCEITO DE DOCUMENTO ELETRÔNICO 373.2 UTILIZAÇÃO E IMPORTÂNCIA DO DOCUMENTO ELETRÔNICO NA ATUALIDADE

393.3 VALOR PROBATÓRIO DO DOCUMENTO ELETRÔNICO 413.3.1 Requisitos para que o Documento Eletrônico seja considerado um Meio

Válido de Prova 433.3.1.1 Autenticidade 453.3.1.2 Integridade 463.3.1.3 Perenidade do Conteúdo 493.3.1.4 Tempestividade 503.4 SEGURANÇA DO DOCUMENTO ELETRÔNICO 513.4.1 Criptografia 523.4.2 Assinatura Digital 563.4.3 Certificação Digital e Autoridade Certificadora 583.5 ADMISSIBILIDADE PROBATÓRIA DO DOCUMENTO ELETRÔNICO PELO PODER

JUDICIÁRIO 613.6 O DOCUMENTO ELETRÔNICO NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA 643.6.1 A Lei Modelo UNCITRAL 653.6.2 A Medida Provisória 2.200 de 2001 663.6.3 Lei 11.419 de 19 de dezembro de 2006 693.6.4 O Anteprojeto de Lei da OAB/SP (Projeto de Lei nº 1.589/99) 704 CONSIDERAÇÕES FINAIS 72

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REFERÊNCIAS 75

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1 INTRODUÇÃO

O direito reflete as mudanças comportamentais e culturais da sociedade.

Quando a sociedade muda, o direito também deve mudar, pois a segurança do

ordenamento jurídico depende de normas válidas e eficazes que venham ao

encontro das verdadeiras necessidades sociais.

O advento da internet possibilitou que as pessoas se comunicassem de

forma cada vez mais rápida e frequente. Não há limites nem fronteiras para as

relações tidas em meios eletrônicos e esta característica fez com que a sociedade

moderna se estruturasse de forma indissociável sobre a tecnologia dos

computadores e dos aparelhos eletrônicos.

Todo o processamento de informações e dados por computadores, quer seja

na forma do envio de e-mails, na publicação de uma notícia em um site ou na

inserção de informações em uma base de dados, deixa registros na forma de

arquivos eletrônicos que podem ser relevantes para a comprovação de um

determinado fato jurídico. É imprescindível, portanto, que o direito esteja preparado

para adequar-se a esta realidade: a utilização dos documentos resultantes destas

novas tecnologias e que servirão como prova em um futuro processo judicial. Não

poderia o direito deixar de tutelar as relações jurídicas que se estabelecem em meio

eletrônico, bem como não poderia deixar de adequar a tecnologia à realidade

jurídica processual.

Vale destacar que o documento eletrônico já é uma realidade e fará, cada

vez mais, parte das relações jurídicas da mesma forma corriqueira que o documento

físico. Fatores técnicos não são impeditivos à utilização do documento eletrônico

como meio idôneo de prova, já é possível falarmos em validade jurídica desta forma

de documento em razão dos mecanismos de segurança existentes.

O objetivo deste trabalho concentra-se em analisar conceitualmente o

documento eletrônico e sua utilização como meio de prova válida e eficaz no âmbito

do processo civil, levando em consideração as relações jurídicas decorrentes da

evolução tecnológica e da globalização. É tomada como base a comparação entre

os documentos eletrônicos e os documentos tradicionais, aqueles tidos em papel e,

demonstrado que, preenchidos alguns requisitos, é perfeitamente possível a

utilização dos documentos eletrônicos como prova em um processo judicial.

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Inicialmente, é realizada uma análise acerca da prova, seu conceito,

finalidade, objeto e relevância no direito processual civil, bem como os princípios que

norteiam a sistemática probatória em um processo judicial. De maneira mais

específica, são abordados, o conceito de prova documental e os requisitos para que

um documento seja apto a comprovar os fatos jurídicos nele representado.

Após, é elaborada uma análise conceitual acerca do documento eletrônico,

bem como dos requisitos para que possa ser aceito como ferramenta apta a provar

relações jurídicas em um processo e, ainda, os mecanismos hoje existentes que

conferem segurança jurídica às informações postas em arquivos eletrônicos.

Para finalizar este trabalho, é avaliada a jurisprudência a respeito da

admissibilidade probatória dos documentos eletrônicos e, ainda, a regulamentação

normativa existente em nosso ordenamento jurídico sobre o assunto.

O tema mostra-se relevante por sua atualidade e importância social. Toda

revolução tecnológica gera inquietações e faz-se necessária uma apreciação do

assunto para que se resolvam todas as questões que possam vir a surgir com

relação a estas novas tecnologias. Toda mudança tecnológica é também uma

mudança comportamental da sociedade e, por isso, jurídica.

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2 DA PROVA

O estudo da prova no Direito Processual Civil é de grande importância no que

diz respeito à resolução das lides postas em juízo, uma vez que são as provas que

oferecem os parâmetros necessários ao julgador da demanda para que esse possa

resolver os conflitos. A ideia de prova evoca, não apenas no processo, a

racionalização da descoberta da verdade. Para o juiz não bastam afirmações de

fatos, mas é essencial a demonstração de sua existência ou inexistência e para isso

exige-se a produção de provas.

É somente através da apresentação das provas que o magistrado terá como

desvendar a veracidade alegada na demanda judicial pelas partes, podendo apenas

após a apreciação dessas, através do julgamento de valores, encontrar a verdade

formal, aquela trazida aos autos.

A prova é, por assim dizer, instrumento para que as partes influam na

convicção do juiz sobre os fatos que afirmarem. É também o meio pelo qual o

magistrado pode averiguar a veracidade das alegações trazidas e comprovadas no

processo pelas partes.

A prova eletrônica, tida através do documento eletrônico – objeto de nosso

estudo-, foi reconhecida no artigo 2251 do Código Civil Brasileiro. Também o artigo

332 do Código de Processo Civil assegura que todos os meios legais, bem como os

moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para

provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa.

Ambos os diplomas legais supramencionados aceitam o documento eletrônico

como meio válido e eficaz de prova. Tal espécie de documento já é uma realidade e

fará cada vez mais parte das relações jurídicas da mesma forma corriqueira do

documento físico. Fatores técnicos não são impeditivos à utilização do documento

eletrônico como meio idôneo de prova, já é possível falarmos em validade jurídica

desta forma de documento.

1 As reproduções fotográficas, cinematográficas, os registros fonográficos e, em geral, quaisquer outras reproduções mecânicas ou eletrônicas de fatos ou de coisas fazem prova plena destes, se a parte, contra quem forem exibidos, não lhes impugnar a exatidão.

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2.1 PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA

Os princípios do contraditório e da ampla defesa estão assegurados com

base no artigo 5º, inciso LV da Constituição Federal:

Art. 5°. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

O princípio do contraditório é inerente ao direito de defesa e decorre da

bilateralidade do processo, ou seja, todos os atos e termos processuais devem

primar pela ciência bilateral das partes, e pela possibilidade de tais atos serem

contrariados com alegações e provas.

Como leciona Ribeiro (1998, p.30):

O referido princípio caracteriza-se pelo fato de o juiz, tendo o dever de ser imparcial, não poder julgar a demanda sem que tenha ouvido autor e réu, ou seja, deverá conceder às partes a possibilidade de exporem suas razões, mediante a prova e conforme o seu direito [...]2

Por este princípio as partes têm direito de serem ouvidas e de expor com

liberdade ao julgador os argumentos que pretendem ver acolhidos. Deve entender-se

por contraditório, de um lado, a necessidade de dar conhecimento da existência da

ação e de todos os atos do processo às partes, e, de outro, a possibilidade de as partes

reagirem aos atos que lhes sejam desfavoráveis.

Nery Júnior (2000, p.131) afirma que a garantia do contraditório é inerente às

partes litigantes – autor, réu, litisdenunciado, opoente, chamado ao processo – , assim

como também ao assistente litisconsorcial e simples e ao Ministério Público, ainda

quando atue na função de fiscal da lei. Todos aqueles que tiverem alguma pretensão de

direito material a ser deduzida no processo têm direito de invocar o princípio do

contraditório em seu favor .3

O contraditório é também conhecido como princípio da bilateralidade da

audiência, uma vez que no processo civil é suficiente que seja dada oportunidade aos

litigantes para falarem nos autos, por intermédio do contraditório recíproco.

2 RIBEIRO, Darci Guimarães. Provas Atípicas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998.3 NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do Processo Civil na Constituição Federal. 6.ed. São Paulo:

Revista dos Tribunais, 2000.

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Pode o réu deixar de apresentar contestação sem que isto configure ofensa ao

princípio do contraditório.

Nas palavras de Portanova (1999, p.161):

O contraditório assenta-se em fundamentos lógico e político. A bilateralidade da ação (e da pretensão) que gera a bilateralidade do processo (e a contradição recíproca) é o fundamento lógico. O sentido de que ninguém pode ser julgado sem ser ouvido é o fundamento político. Sustentado sobre esses dois pilares, o princípio dinamiza a dialética processual e vai tocar, como momento argumentativo, todos os atos que preparam o espírito do juiz.4

Intimamente relacionado ao princípio do contraditório, apresenta-se o

princípio da ampla defesa que traduz a liberdade inerente ao indivíduo de, em

defesa de seus interesses, alegar fatos e propor provas. Além do direito de tomar

conhecimento dos termos e atos do processo, a parte também tem o direito de

alegar e provar o que alega. Não se pode obrigar a parte a apresentar sua defesa,

mas, optando ela por se defender, o faz com total liberdade.

Pode-se dizer que a ampla defesa possui duplo significado: a autodefesa e a

defesa técnica. A autodefesa representa o direito subjetivo e disponível que tem o

acusado de autodefender-se, inclusive comparecendo a todos os atos do processo.

Já a defesa técnica é a injunção legal indeclinável, um pressuposto inarredável ao

válido desenvolvimento da relação processual (PORTANOVA, 1999, p.124).5

A não observância de tais princípios gera a nulidade de todos os atos

subsequentes realizados no processo, inclusive da decisão em razão do

cerceamento de defesa. Não será válido o desenvolvimento da relação processual

se tais princípios não forem observados durante todas as fases do processo. É o

que se depreende do seguinte precedente jurisprudencial:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. INSCRIÇÃO NEGATIVA EM CADASTRO DE INADIMPLENTES SEM NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. CDL. INOBSERVÂNCIA AO ART. 67 DO CPC. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. NULIDADE DA SENTENÇA. Não tendo o juízo a quo reaberto o prazo para a apresentação da peça contestacional após a recusa da nomeação à autoria pelo demandante, deve a sentença ser desconstituída e os autos devolvidos à origem, para que o processo retome seu curso regular. Observância ao disposto no artigo 67 do CPC, bem como aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Sentença desconstituída. Apelo prejudicado6.

No âmbito probatório, tais princípios manifestam-se na oportunidade que as

partes têm para requererem a produção de provas, o direito de participarem 4 PORTANOVA, Rui. Princípios do Processo Civil. 3.ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999.5 Ibidem.6 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n.º 70032233033. Relator: Roque Miguel

Fank. Porto Alegre, 10 mar. 2010.

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diretamente de sua realização, bem como o direito de se pronunciarem a respeito do

seu resultado. Devem ser observados durante todas as fases do processo, sob pena

de possível nulidade da decisão em função do cerceamento de defesa.

2.1.1 O contraditório e o direito à prova

O direito à prova, além de se mostrar um instrumento essencial para a

concretização das garantias constitucionais de ação e defesa, uma vez que através

das contradições entre o que é exposto e o que é provado no decorrer do processo

que o magistrado pode formar um juízo de valor sobre as questões que irá decidir, é

também um aspecto fundamental do contraditório.

Como bem assevera Marques (2009, p.50):

[...] o contraditório deixaria de ser uma garantia real e concreta, se não assegurasse a cada uma das partes a possibilidade de contradizer os argumentos da parte adversária, mediante a produção de todos os elementos necessários para influir no convencimento do juiz.7

As provas produzidas pelas partes como consequência da garantia

constitucional do contraditório abrangem a possibilidade de a parte disponibilizar

todos os meios de prova em direito admitidas a fim de comprovar aquilo que alega.

2.2 CONCEITO DE PROVA

Prova é todo elemento que pode levar o conhecimento de um fato a alguém.

E provar é demonstrar a verificação de juízo. O vocábulo prova é originário do latim

probatio, que emana do verbo probare e significa examinar, persuadir, demonstrar.

Conforme o ensinamento de Silva (2005, p.320):

No domínio do processo civil, onde o sentido da palavra prova não difere substancialmente do sentido comum, ela pode significar tanto as atividades que os sujeitos do processo realizam para demonstrar a existência dos fatos formadores de seus direitos, que haverão de basear a convicção do julgador, quanto o instrumento por meio do qual essa verificação se faz. No primeiro sentido, diz-se que parte produziu a prova, para significar que ela, através de algum elemento indicador da existência do fato que se pretende provar, fez chegar ao juiz certa circunstância capaz convencê-lo da veracidade da sua afirmação. No segundo sentido, a palavra prova é empregada para significar não mais a ação de provar, mas o próprio instrumento utilizado, ou o meio com que a prova se faz (grifo do autor).8

7 MARQUES, Antônio Terêncio. A Prova Documental na Internet – Validade e Eficácia do Documento Eletrônico. 4.ed. Curitiba: Juruá, 2009.

8 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Curso de Processo Civil: Processo de Conhecimento. 7.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005.

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No sentido objetivo, conceitua-se prova como os meios destinados a fornecer

ao juiz o conhecimento da verdade dos fatos deduzidos em juízo. Já no sentido

subjetivo, prova é aquela que se forma no espírito do juiz quanto à verdade dos

fatos, ou seja, é a convicção que a produção de provas gera no juiz a respeito da

verdade ou não dos fatos alegados (SANTOS, 2009, p.343). 9

Como bem ensina Burgarelli (2000, p.53), em seu Tratado das Provas Cíveis:

No direito processual, provar resume-se na realização de uma tarefa necessária e obrigatória, para constituir estado de convencimento no espírito do juiz, este na condição de órgão julgador, a respeito de um fato alegado e sua respectiva ocorrência, tal como foi descrito. Prova, assim, é meio, é instrumento utilizado para a demonstração de veracidade entre o fato alegado e sua direta relação com o mundo da realidade material, de modo a criar, no espírito humano, convencimento de adequação. Prova judiciária, a seu turno, é o meio demonstrativo de veracidade entre o fato material (fato constitutivo do direito) e o fundamento jurídico do pedido10.

Insta salientar que fatos do processo - verdade formal ou processual -,

diferentemente dos fatos materiais - verdade material ou real -, são acontecimentos

registrados dentro do processo; são verdades formais, trazidas e comprovadas nos

autos.

Conforme elucida Theodoro Júnior (2004, p.384):

Ao juiz, para garantia das próprias partes, só é lícito julgar segundo o alegado e provado nos autos. O que não se encontra no processo, para o julgador não existe [...] deve-se reconhecer que o direito processual se contenta com a verdade formal, ou seja, aquela que aparenta ser, segundo os elementos do processo, a realidade. 11.

Ainda, demonstra-se de suma relevância a definição dos critérios objetivos e

subjetivos que deverão integrar o conceito de prova.

Sobre o tema, as considerações de Ribeiro (1998, p.68):

Por critérios objetivos, devem ser entendidos os meios utilizados pelas partes ou impostos pela lei para convencer o juiz do seu direito. São os mecanismos, os instrumentos transportadores da certeza necessária para a formação da convicção no espírito do julgador, e, salvo as provas atípicas, estão previstos na lei, porém não se esgotam nela, razão pela qual o legislador, ultrapassando este critério, insculpiu no art. 332 do C.P.C., que “Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou defesa.

Por critérios subjetivos, devemos entender a convicção, a certeza criada no espírito do julgador. É o seu convencimento interior, que só pode ser adquirido mediante a percepção, e que constitui o cerne da prova, formando a própria “verdade” do caso em concreto, à medida que o juiz é

9 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva, 2009.

10 BURGARELLI, Aclibes. Tratado das Provas Cíveis. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000.11 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2004.

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chamado para decidir, dirimir o conflito, com a autoridade da coisa julgada [...] (grifo do autor).12

Pode-se afirmar, portanto, a relevância da prova no âmbito do Direito

Processual, pois é por meio dela que o juiz forma seu convencimento e pode exercer

sua função pública de prestação jurisdicional, baseado na verdade formal, aquela

trazida e comprovada nos autos.

2.3 FINALIDADE DA PROVA

São as provas que oferecem os parâmetros necessários ao julgador da

demanda para resolver os casos postos à sua análise. Somente através da

apresentação das provas é que o juiz poderá sopesar a veracidade do que foi

alegado pelas partes na demanda.

Como elucida Greco Filho (2003, p.182):

A finalidade da prova é o convencimento do juiz, que é seu destinatário. No processo, a prova não tem um fim em si mesma ou um fim moral ou filosófico; sua finalidade é prática, qual seja, convencer o juiz. Não se busca a certeza absoluta, a qual, aliás, é sempre impossível, mas a certeza relativa suficiente na convicção do magistrado13.

A prova, no âmbito processual civil, tem por objetivo convencer o julgador da

veracidade de um fato no qual se funda a pretensão do autor ou a exceção do réu.

Pode-se concluir, portanto, que não se busca uma certeza absoluta sobre o fato,

mas sim uma certeza relativa que implica o convencimento do juiz.

A prova assume, então, um papel de argumento retórico, elemento de

argumentação, dirigido a convencer o magistrado de que a argumentação feita pela

parte, no sentido de que alguma coisa efetivamente ocorreu, merece crédito. É um

meio retórico, regulado pela lei , dirijido a convencer o Estado-juiz da validade das

proposições feitas no processo, é o diálogo entre as partes e o magistrado para

estabelecer os fatos controvertidos. 14

Nas palavras de Marinoni e Arenhart (2008, p.57):

[...] não é objetivo concreto do juiz encontrar a verdade (absoluta) no processo. Conquanto possa essa meta continuar como elemento mítico – e objetivo utópico – da atividade jurisdicional (mesmo para que se possa assegurar a qualidade da pesquisa efetivada pelo magistrado e, consequentemente, do resultado obtido), não se pode acreditar que,

12 RIBEIRO, Darci Guimarães. Provas Atípicas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998.13 GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. v.2.14 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Comentários ao Código de Processo Civil.

Revista dos Tribunais, São Paulo, v.5, t.1, p.64, 2000.

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concretamente, esse ideal seja realizado no processo, ou mesmo que ele a isto se destina.15

Conforme Burgarelli (2000, p.99) busca-se com isso, a aproximação com a

verdade processual, formal, ou seja, aquela que aparenta ser, segundo os

elementos do processo, a realidade.16

A finalidade da prova não é, portanto, a reconstrução do fato, mas sim o

convencimento do julgador sobre ele. A prova deve servir para convencer o seu

destinatário - o magistrado – dos fatos alegados em juízo, e é esse o seu objetivo.

2.4 OBJETO DA PROVA

A prova, como suporte comprobatório das alegações de quem as traz aos

autos, deve ter como objeto os fatos relevantes e controvertidos que são capazes de

influenciar na decisão da causa pelo magistrado.

Nas palavras de Marinoni e Arenhart (2008, p.266):

[...] somente fatos pertinentes e relevantes para o processo constituem objeto de prova. Assim, pouco interessa para o processo a afirmação e, conseqüentemente, a prova de fatos não importantes à solução do litígio [...].17

Existindo fatos que são relevantes para a solução da demanda e que sejam

controvertidos deve ser oportunizada às partes a produção de provas a respeito dos

mesmos. Nesse sentido, o seguinte precedente jurisprudencial:

DIREITO PRIVADO NÃO-ESPECIFICADO. AÇÃO MONITÓRIA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. FATOS CONTROVERTIDOS. DESCONSTITUIÇÃO DA SENTENÇA. NULIDADE CONFIGURADA. 1. Conquanto no ordenamento jurídico pátrio vigore o principio da livre persuasão fundamentada, é defeso ao magistrado, se controverso fato relevante para o deslinde do feito, julgar antecipadamente a lide, sob pena de violação ao devido processo legal. 2. Caso em que apesar de restaram controvertidos fatos relevantes para a solução da controvérsia posta nos autos, houve o julgamento antecipado da lide, sem que tenha sido oportunizada à parte-embargante a produção de provas por ela postuladas tempestivamente, em afronta ao devido processo legal. 3. Provimento do apelo. Sentença Desconstituída.18

De fato, existindo fatos controvertidos, a necessidade de prova a respeito

deles exige, ainda, que esses fatos controvertidos sejam pertinentes e relevantes ao

15 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil – Processo de Conhecimento. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.

16 BURGARELLI, Aclibes. Tratado das Provas Cíveis, São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000.17 MARINONI; ARENHART. Opus.cit.18 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n.º 70031750078. Relator: Paulo

Sérgio Scarparo. Porto Alegre, 10 set. 2009.

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deslinde do processo. Assim, só serão avaliadas aquelas informações capazes de

confirmar as alegações aduzidas pela parte e que sejam imprescindíveis ao

processo. Objeto da prova é o conjunto das alegações controvertidas das partes em

relação a fatos relevantes para o julgamento da causa, não sendo estes notórios

nem presumidos.

Os fatos não relacionados com a causa devem ter sua prova recusada pelo

juiz sob pena de desenvolver atividade inútil. Tanto que o artigo 130 do Código de

Processo Civil19 permite ao juiz dispensar as provas que julgar desnecessárias.

Conforme Nery Júnior (2003, p.530), a questão de deferimento, ou não, de

uma determinada prova depende da avaliação do juiz dentro do quadro probatório

existente, da necessidade da prova para o processo. 20

Sobre o tema, os precedentes jurisprudenciais abaixo colacionados:

APELAÇÃO CÍVEL. CHEQUE. PRETENSÃO ANULATÓRIA DO TÍTULO. SUSTAÇÃO DE PROTESTO. AGRAVO RETIDO. PROVA PERICIAL. DESNECESSIDADE. Sendo a matéria eminentemente de direito, desnecessária se mostra a realização de prova pericial. O Juiz é o destinatário da prova, a qual é produzida em benefício de seu convencimento. Art. 130, CPC. O magistrado pode indeferir as provas que entender desnecessárias à instrução do processo, as diligências inúteis ou as meramente protelatórias. Precedentes jurisprudenciais desta Corte [...]21

No caso supramencionado o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

reconheceu a decisão do magistrado a quo em não acolher a realização de prova

pericial, uma vez que se trata de matéria eminentemente de direito. O juiz é o

destinatário das provas e estas servem para convencê-lo dos fatos alegados no

processo e, por esta razão, pode indeferir aquelas que entender desnecessárias à

instrução do processo.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DO DEVEDOR. EXECUÇÃO DE VALORES E ENCARGOS LOCATÍCIOS SHOPPING CENTER. EMPREENDEDORES. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. PROVA ORAL. INDEFERIMENTO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA [...] Cabe ao Juiz indeferir a produção de provas que entender inúteis ao seu convencimento, ou mesmo aquelas que seriam em qualquer caso irrelevantes à sua conclusão, não se podendo falar em cerceamento de defesa pelo simples fato do indeferimento – inteligência do art. 130, CPC [...]22.

19 Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias.

20 NERY JÚNIOR, Nelson. Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.

21 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n.º 70032147118. Relator: Tasso Caubi Soares Delabary. Porto Alegre, 10 de fevereiro de 2010.

22 MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n.° 1.0024.07.689358-5/001. Relator: Sebastião Pereira de Souza. Belo Horizonte, 15 out. 2008.

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São relevantes e passíveis de comprovação aqueles dados que servem de

base para a afirmação do direito pretendido. Somente serão avaliadas aquelas

informações capazes de confirmar as alegações aduzidas pela parte e que sejam

imprescindíveis ao processo.

O artigo 334 do Código de Processo Civil trata de algumas situações em que

os fatos não precisam ser provados: Não dependem de prova os fatos: I – Notórios;

II – afirmados por uma parte e confessados pela parte contrária; III – admitidos, no

processo, como incontroversos; IV – em cujo favor milita presunção legal de

existência ou veracidade.

Tais fatos não exigem que o autor se preocupe em prová-los. O juiz está, em

princípio, dispensado de formar uma convicção sobre esses fatos individualmente,

embora deva considerá-los quando da valoração do conjunto probatório

(MARINONI; ARENHART, 2008, p.280). 23

Não estão sujeitos à prova os fatos tidos como notórios que são os de

conhecimento geral, de prova desnecessária ou inútil. A notoriedade é um conceito

relativo, dependente de circunstâncias de tempo e lugar.

Conforme assevera Greco Filho (2003, p.183):

Observe-se que para a dispensa da prova não há necessidade de que a notoriedade seja absoluta, ou seja, que o conhecimento seja de todos e em todos os lugares. Basta a notoriedade relativa, local ou regional e do pessoal do foro, observando-se, porém, neste caso, a circunstância de que a notoriedade deve também atingir o conhecimento do tribunal de segundo grau de jurisdição, que em tese poderá julgar o recurso, sob pena de, futuramente, nascer dúvida sobre sua existência.24

Fatos notórios, portanto, são aqueles cuja existência é conhecida geralmente

pelos cidadãos de cultura média, no tempo e no lugar em que a sentença é proferida

(LOPES, 2000, p.29).25

Sendo o fato incontroverso – aceito expressa ou tacitamente pela parte

adversa (artigo 302, CPC), a parte não possui o interesse de demonstrá-lo. Será,

todavia, exigida a prova de fato, ainda que incontroverso, se o instrumento público

for essencial à sua prova e forma, porque nesses casos a aceitação ou a confissão

não lhe suprem a falta (art. 366, CPC), ou os relativos a direitos indisponíveis

(GRECO FILHO, p.183). 26

23 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil – Processo de Conhecimento. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.

24 GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. v.2.25 LOPES, José Batista. A Prova no Direito Processual Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2000.26 GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. v.2

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Ainda, como elucida Theodoro Júnior (2004, p.284):

Se os fatos incontroversos, por simples falta de impugnação, não precisam ser provados, com muito maior razão ocorre a mesma dispensa de prova com relação aos fatos alegados por uma parte e confessados pela outra.Também são inteiramente desnecessárias e inúteis as provas de fatos em cujo favor milita presunção legal de existência ou veracidade. Assim, o filho nascido nos 300 dias 19ubsequentes à dissolução da sociedade conjugal não precisa provar que sua concepção se deu na constância do casamento (Código Civil de 2002, art. 1.597, III; CC de 1916, art. 338, II).27

Os direitos não necessitam ser provados, pois é dever de todos conhecê-los.

Há, todavia, o artigo 337 do Código de Processo Civil que dispõe que a parte que

alegar direito municipal, estadual, estrangeiro ou consuetudinário, provar-lhe-á o teor

e a vigência, se assim o determinar o juiz.

Nesse sentido:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSOS. AGRAVO INTERNO. JULGAMENTO MONOCRÁTICO DE NEGATIVA DE SEGUIMENTO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA. JUNTADA DE LEI MUNICIPAL. REQUISIÇÃO JUDICIAL. PROVA DO DIREITO ALEGADO. Consoante o art. 337 do CPC, cabe à parte que alega o direito municipal a sua prova. Caso concreto em que o Município embasou a emissão da CDA na legislação municipal e o excipiente acusou-a de inconstitucional, donde se conclui que o Juiz podia intimar qualquer das partes à juntada. Mantém-se o pronunciamento monocrático em agravo interno, quando não comprovada a sua incorreção no plano material. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.28

Conforme ensinamento de Marinoni e Arenhart (2005, p.471), contudo, o juiz

não pode determinar a prova do direito municipal ou estadual pertinente à sua

competência. Em outros termos, se o direito municipal ou estadual é do Município ou

do Estado em que o juiz exerce a sua atividade, não há como admitir que possa

exigir prova do seu teor e vigência.29

Em suma, entende-se que o objeto da prova são os fatos relevantes e os

controvertidos. Todavia, conforme aponta Ribeiro (1998, p.77-8), há outro enfoque

sobre o que é objeto da prova:

Por objeto da prova se entende, também, o provocar, no juiz, o convencimento sobre a matéria que versa a lide, isto é, convencê-lo de que os fatos alegados são verdadeiros, não importando a controvérsia sobre o fato, pois, um fato, mesmo não controvertido, pode influenciar o juiz ao decidir, à medida que o elemento subjetivo do conceito de prova

27 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2004.

28 RIO GRANDE DO SUL, Tribunal de Justiça. Agravo Interno n.º 70020973483. Relatora: Rejane Maria Dias de Castro Bins. Porto Alegre, 30 de agosto de 2007.

29 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.

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(convencer) pode ser obtido mediante um fato notório, mediante um fato incontroverso.30

Além dos fatos relevantes e dos controvertidos, pode ser também objeto de

prova o convencimento, que é elemento subjetivo, pois um fato, mesmo que não

seja controvertido, pode influenciar o juiz na decisão definitiva da lide.

2.5 CLASSIFICAÇÃO DAS PROVAS

O jurista italiano Malatesta classifica as provas segundo os seguintes

critérios:

a) Quanto ao objeto: diretas e indiretas;

b) Quanto ao sujeito: pessoais e reais;

c) Quanto à forma: testemunhal, documental e material.

Darci Guimarães Ribeiro acrescenta à classificação de Malatesta uma quarta

modalidade que leva em consideração o momento da produção da prova:

d) Quanto ao momento: casual ou preconstituída.

2.5.1 Quanto ao Objeto: Provas Diretas e Indiretas

Provas diretas são aquelas que visam demonstrar o fato principal da

demanda. É a relação imediata entre o fato e juiz, ou seja, entre o fato a ser provado

e o juiz não há nenhum elemento intermediador, quando a prova é fornecida ao

magistrado dando-lhe a ideia objetiva do fato a ser provado (prova documental,

testemunhal, etc.).

Já as provas tidas como indiretas são as que não reproduzem diretamente o

fato, mas, indiretamente, permitem que o juiz chegue à conclusão de que o objeto da

prova é verdadeiro.

Consonante ensinamento de Ribeiro (1998, p.72):

Para a concepção de Bentham e Malatesta, a prova indireta é aquela que não se refere diretamente ao fato probando, mas, sim, a outro fato que, indiretamente, leva o juiz a ter certeza ou não do fato principal, ou seja, é a intermediação de um fato secundário, acessório, formador indireto entre o conhecimento do juiz e o fato principal [...].31

30 RIBEIRO, Darci Guimarães. Provas Atípicas, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998.31 RIBEIRO, Darci Guimarães. Provas Atípicas, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998.

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Portanto, a prova indireta não reproduz diretamente o fato, mas sim,

indiretamente, permite que se possa chegar à conclusão de que o fato realmente

ocorreu.

2.5.2 Quanto ao Sujeito: Provas pessoais e reais

Tal classificação refere-se à fonte das provas, sua origem. Fonte de prova é

tudo aquilo que for capaz de transmitir informações ao processo no intuito de

comprovar a veracidade dos fatos alegados e decorrem de pessoas ou coisas.

Consonante ensinamento de Santos (2009, p.344):

Prova pessoal é toda afirmação pessoal consciente, destinada a fazer fé dos fatos afirmados. A testemunha que narra fatos que viu o documento de confissão de dívida, a escritura de testamento são provas pessoais.Prova real de um fato consiste na atestação inconsciente, feita por uma coisa, das modalidades que o fato probando lhe imprimiu. A carreira de bambus, nos limites entre dois imóveis; as trincas nas paredes; o ferimento, o terror, o desespero são autênticas provas reais.32

Será pessoal quando emanada de uma pessoa. Pressupõe a afirmação

pessoal a respeito de um fato, como, por exemplo, a testemunha ao depor ou a

parte ao confessar.

Nas provas reais as informações emanam da coisa (res). É o fato verificado

materialmente, que se deduz pelo estado das coisas.

2.5.3 Quanto à forma: Prova testemunhal, documental e material

É a maneira pela qual a prova será apresentada em juízo.

A prova testemunhal refere-se à declaração oral de uma pessoa sobre um

fato. É a que se obtém por meio do relato prestado, em juízo, por pessoas que

conhecem o fato litigioso. Além da prova feita por meio de testemunhas, a confissão

e, nos sistemas que o admitem, também o juramento.

Documental, como o nome indica, é a prova tida através de documentos. É a

afirmação escrita ou gravada como as escrituras públicas ou particulares,

fotografias, desenhos, etc.

Para a definição de prova material, valho-me das sábias palavras de Ribeiro

(1998, p.74):

32 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva, 2009.

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Material é a representação da coisa mesma em sua forma própria, material; ou seja, consiste no elemento material da coisa que se apresenta diretamente sob a percepção do juiz e lhe serve de prova [...].33

Também para Malatesta (2004, p.119), a forma das provas se divide em

testemunhal, material e documental, vejamos:

A prova testemunhal é em geral a verificação de pessoas na forma real ou possível; A prova material é a verificação de coisa na materialidade das suas formas; A prova documental é a verificação na forma do escrito ou de outra materialidade permanente.34

Insta ressaltar na conceituação de Malatesta a referência à forma da prova

documental como sendo o escrito ou outra materialidade permanente. Percebe-se

aqui a aceitação do autor com relação ao documento não ser apenas o escrito, mas

também qualquer materialidade permanente. Tal concepção é muito importante para

que o documento eletrônico possa ser aceito como meio válido de prova, sendo

possível a adequação do processo judicial às inovações ocorridas na sociedade.

Inovações estas que devem ser recepcionadas pelo direito para que a prestação

jurisdicional possa ser, de fato, eficaz.

2.5.4 Quanto ao Momento: prova casual e prova pré-constituída

A classificação da prova em casual ou preconstituída leva em consideração o

momento de produção, preparação da prova.

Na conceituação de Amaral (2009, p.345):

[...] ainda distinguimos as provas, quanto à sua preparação, em casuais e preconstituídas.Por casuais, também ditas simples, se consideram as provas preparadas, no curso da demanda. São casuais as testemunhas, que assistiram eventualmente ao fato; os documentos, que não hajam sido formados para servir de representação do fato probando.Por preconstituídas, no sentido amplo, se entendem as provas preparadas preventivamente, em vista de possível utilização em futura demanda. No sentido estrito dizem-se preconstituídas as provas consistentes em instrumentos públicos ou particulares representativos de atos jurídicos que pelos mesmos se constituem (grifo do autor).35

Prova casual ou simples é a que se forma no decorrer do processo, ou seja,

quando nasce em juízo a necessidade de sua produção. São exemplos a prova

testemunhal, pericial, etc.

33 RIBEIRO, Darci Guimarães. Provas Atípicas, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998.34 MALATESTA, Nicola Framarino Dei. A Lógica das Provas em Matéria Criminal. Trad. Paolo Capitanio.

Campinas: Bookseller, 2004.35 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva,

2009.

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23

Preconstituída é aquela prova formada anteriormente ao início da demanda,

antes da necessidade de sua apresentação, não sendo intencionalmente

constituídas para fazer prova em processo, como o contrato, escritura, etc.

2.6 VALORAÇÃO DA PROVA

Às partes cabe a iniciativa de produzir as provas capazes de comprovar suas

alegações. Ao juiz cabe atribuir a estas provas o valor que merecem para, então,

julgar os pedidos procedentes ou improcedentes, aplicando o direito ao caso

concreto.

Para Theodoro Júnior (2004, p.384) a prova se destina a produzir a certeza

ou convicção do julgador a respeito dos fatos litigiosos. Mas, ao manipular os meios

de prova para formar seu convencimento, o juiz não pode agir arbitrariamente; deve,

ao contrário, observar um método ou sistema.36

Existem três grandes sistemas no que diz respeito aos critérios de avaliação

da prova: sistema da prova legal, sistema da livre apreciação da prova e sistema da

persuasão racional da prova.

2.6.1 Sistema da Prova Legal

Segundo este sistema, cada prova possui um peso determinado, cabendo ao

juiz apenas computar o valor resultante das provas apresentadas e o resultado

surge quase automaticamente.

Tal critério encontra-se há muito tempo superado, apesar da existência de

alguns resquícios em disposições esparsas, como no artigo 366 do Código de

Processo Civil o qual aufere que quando a lei exigir, como da substância do ato, o

instrumento público, nenhuma outra prova, por mais especial que seja, pode suprir-

lhe a falta. São, também, exemplos o artigo 21537 e 22538, ambos do Código de Civil.

Nas palavras de Santos (2009, p.392):

36 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2004.37 A escritura pública, lavrada em notas de tabelião, é documento dotado de fé pública, fazendo

prova plena.38 As reproduções fotográficas, cinematográficas, os registros fonográficos e, em quaisquer outras

reproduções mecânicas, ou eletrônicas de fatos ou de coisas fazem prova plena destes, se a parte, contra quem forem exibidos, não lhes impugnar a exatidão.

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No sistema da prova legal, a instrução probatória se destina a produzir a certeza legal. O juiz não passava de mero computador, preso ao formalismo e ao valor tarifado das provas, impedido de observar positivamente os fatos e constrangido a dizer a verdade conforme ordenava a lei que o fosse. No depoimento de uma só testemunha, por mais idônea e verdadeira haveria prova apenas semiplena, enquanto que no de duas testemunhas, concordes e legalmente idôneas, ainda que absurdos os fatos narrados, resultaria prova plena e, pois, certeza legal.39

Seria plena a prova que trouxesse uma carga de convencimento suficiente

para fundar a decisão da causa; semiplena aquela que, não suficiente em si mesma,

teria de conjugar-se com outros meios para servir de base à convicção do juiz.

2.6.2 Sistema da Livre Apreciação da Prova

É justamente o oposto do sistema da prova legal. De acordo com este

sistema o juiz é livre para formar sua convicção a respeito das provas apresentadas

pelas partes. O que deve prevalecer é a íntima convicção do julgador, que é

soberano para investigar a verdade e apreciar as provas.

Na conceituação de Greco Filho (2003, p.209-10):

Segundo o sistema da livre apreciação ou da convicção íntima, tem o juiz ampla liberdade para decidir, convencendo-se da verdade dos fatos segundo valoração íntima, independentemente do que consta dos autos ou de uma fundamentação de seu convencimento. Decide por convicção íntima ou livre apreciação o Tribunal do Júri, no processo penal. Os jurados nem fundamentam a razão de seu convencimento, e não importa como formaram sua convicção40.

Tal sistema restou afastado pela doutrina ante a presença de várias

demonstrações de arbitrariedade e injustiça. Peca pelo excesso de liberdade que

tem o julgador na apreciação das provas, independentemente do que consta nos

autos.

2.6.3 Sistema da Persuasão Racional da ProvaÉ tido como um sistema intermediário, visto que não é tão rígido quanto o

sistema do critério legal nem tão inseguro quanto o sistema da livre convicção.

Embora aceite a tese do livre convencimento, o sistema da persuasão racional

impõe restrições à formação do convencimento judicial, ou seja, o juiz tem o dever

de fundamentar sua decisão indicando os motivos que formaram sua convicção.

39 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva, 2009.40 GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. v.2.

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25

Assim, o julgador brasileiro, como regra, não está adstrito à lei no que se

refere à valoração da prova, como não tem liberdade total para apreciá-la, porque há

a condição de que se limite a observar os elementos probatórios pertencentes ao

processo. Ademais, o artigo 93, IX, da nossa Constituição Federal41, exige decisão

fundamentada do magistrado.

O julgador, embora preso à prova constante nos autos, pode apreciá-la

livremente, segundo seu íntimo convencimento. Dessa forma, suas decisões podem

e devem ser fundamentadas, não há arbitrariedade, apesar do livre exame de

provas. O Princípio do Livre Convencimento Motivado reclama do juiz que

fundamente sua decisão, em face dos elementos dos autos e do ordenamento

jurídico.

Sobre o assunto é afirmado que:

A maior e mais importante limitação ao livre convencimento é a necessidade de motivação das decisões. Aqui é que a doutrina e a jurisprudência devem exigir mais e mais do julgador. Já que o subjetivismo do julgador é algo até desejável para que a decisão atenda aos avanços democráticos que sepultaram a prova legal, é necessário contar com outros mecanismos de controle do juiz. Quanto mais liberdade se der ao juiz, mais minuciosa deve ser sua sentença. Quanto mais responsabilidade se atribuir ao julgador, mais clareza e publicidade há de se cobrar de quem julga (PORTANOVA, 1999, p.247).42

A convicção fica condicionada, segundo Santos (2009, p.374): “a) aos fatos

nos quais se funda a relação jurídica controvertida; b) às provas desses fatos,

colhidas no processo; c) às regras legais e a máximas de experiência; e, por isso

que é condicionada, deverá ser motivada”.43

Ainda nas palavras de Santos (2009, p.394):

Na formação da convicção ater-se-á o juiz às provas colhidas e constantes do processo, não se lhe permitindo valer-se de elementos probatórios alheios a este. Com efeito, com o poder de apreciar as provas se conexiona o dever de ficar bem com sua consciência, donde não estar constrangido a formar convicção baseado em provas que seguramente sabe não traduzirem a verdade. Por isso, tem o poder de tomar a iniciativa de carrear para os autos os fatos e provas do seu conhecimento.Condiciona-se a convicção do juiz, ainda, às regras e a máximas de experiência, no sentido de que deverá considerá-las na apreciação da prova. Se o fato é de natureza a ser provado por instrumento público, ou

41 Todos os julgamentos dos órgãos do poder judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em caso nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação.

42 PORTANOVA, Rui. Princípios do Processo Civil. 3.ed.Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999.43 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. 25.ed. rev.e atual. São

Paulo: Saraiva, 2009.

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26

particular, não poderá convencer-se de sua existência pela prova fornecida por testemunhas [...].44

A motivação das decisões permite que se analise a decisão prolatada,

podendo-se inferir a linha de raciocínio utilizada pelo magistrado para imprimir suas

convicções em forma de julgamento. O legislador pátrio, indubitavelmente, abraçou

esse sistema, conforme se depreende do artigo 131 do Código de Processo Civil45.

Sobre o tema, os seguintes precedentes jurisprudenciais:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO PARA AQUISIÇÃO DE BENS GARANTIDA POR ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. ART. 285-A DO CPC. PRELIMINAR. DEVER DE OBSERVÂNCIA ÀS ORIENTAÇÕES EMANADAS NO RECURSO ESPECIAL. Em que pese as orientações emanadas pelo Superior Tribunal de justiça, o art. 131 do CPC, concede ao magistrado a faculdade de examinar as questões suscitadas pelas partes, de acordo com os elementos dos autos e conforme seu livre convencimento. SENTENÇA PARADIGMA QUE NÃO EXAMINA TODOS OS PEDIDOS FORMULADOS NESTES AUTOS. DESCONSTITUIÇÃO DA SENTENÇA, DE OFÍCIO. A sentença reproduzida como paradigma deve abranger todos os pedidos formulados na inicial do processo a ser julgado com fundamento no art. 285-A do CPC. Preliminar rejeitada. Sentença desconstituída. Apelação prejudicada.46

No caso acima mencionado, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

refere em sua decisão que o artigo 131 do Código de Processo Civil concede ao

magistrado a faculdade de apreciar as questões suscitadas no processo conforme

seu livre convencimento motivado.

Trago à baila outro precedente que reconhece o livre convencimento do juiz

ao apreciar as provas, contanto que este convencimento seja motivado, que sejam

apresentadas pelo magistrado as razões de seu convencimento:

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS - ACIDENTE NO INTERIOR DO ESTABELECIMENTO COMERCIAL - CASA NOTURNA - CULPA DO ESTABELECIMENTO - NEGLIGÊNCIA, IMPERÍCIA E IMPRUDÊNCIA - TEORIA DO RISCO - RELAÇÃO DE CONSUMO - BOLETIM DE OCORRÊNCIA - LESÃO CORPORAL - CEGUEIRA DE UM OLHO - DANO MORAL - CONFIGURAÇÃO - LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO - ART. 131 DO CPC - FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. No direito processual civil brasileiro vige o princípio do livre convencimento motivado do juiz (art. 131 do CPC), segundo o qual o juiz aprecia livremente as provas, devendo, porém, dar as razões de seu convencimento [...].47

44 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. 25.ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009.

45 O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento.

46 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n.º 70034254508. Relatora: Lucia de Castro Boller. Porto Alegre, 28 de janeiro de 2010.

47 MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n.° 1.0047.06.001677-4/001. Relator: Unias Silva. Belo Horizonte, 27 de fevereiro de 2007.

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Conforme Nery Júnior (2003, p.532) em comentários ao artigo 131 do Código

de Processo Civil:

O juiz é soberano na análise das provas produzidas nos autos. Deve decidir de acordo com o seu convencimento. Cumpre ao magistrado das as razões de seu convencimento. Decisão sem fundamentação é nula pleno iuri (CF 93 IX). Não pode utilizar-se de provas genéricas que nada dizem. Não basta que o juiz ao decidir, afirme que defere ou indefere o pedido por falta de amparo legal; é preciso que diga qual o dispositivo de lei que veda a pretensão da parte ou interessado e porque é aplicável no caso concreto (grifo do autor).48

Como se vê, o texto do artigo supramencionado estabelece limites à atuação

do juiz, impondo-lhe o dever de motivar a sentença e impedindo-lhe de basear sua

convicção em elementos colhidos extra-autos.

2.7 DIFERENCIAÇÕES ENTRE PROVAS ILEGAIS, PROVAS ILÍCITAS, PROVAS

ILEGÍTIMAS E PROVAS ATÍPICAS

A prova será ilegal sempre que caracterizar infração de normas legais ou de

princípios gerais do ordenamento, de natureza processual ou material. Do gênero

prova ilegal têm-se duas espécies distintas: as provas ilícitas e as provas ilegítimas.

Quando a ofensa ao direito se verificar no momento da coleta da prova,

violando regras de direito material, dos costumes, dos princípios gerais de direito e

da moral a prova será ilícita; quando a prova é introduzida no processo infringindo

normas processuais será ilegítima.

Conforme o ensinamento de Bergmann (1992, p.13-4):

Com efeito, a prova é ilícita quando afrontar uma norma de direito material, isto é, quando a ofensa ao direito é pertinente à obtenção da prova. Como exemplo citamos a utilização, em processos, de documento subtraído.

Por outro lado a prova é ilegítima quando colidir com a norma de direito instrumental – ilegitimamente produzida -, como no exemplo clássico de provar um fato que deixou vestígio exclusivamente com prova testemunhal.

Portanto, a prova produzida contra um princípio de ordenamento de natureza processual configura a PROVA ILEGÍTIMA, ao passo que a violação a um princípio de direito material – meio e modo usados para a obtenção da prova afrontando ao direito material -, gera a PROVA ILÍCITA.49

Certamente o Código de Processo Civil não indicou taxativamente os meios

de prova admissíveis no processo tendo em vista que o avanço da tecnologia e a 48 NERY JÚNIOR, Nelson. Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2003.49 BERGMANN, Érico. Prova Ilícita – A Constituição de 1988 e o Princípio da Proporcionalidade.

Porto Alegre: Escola Superior do Ministério Público, 1992.

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globalização podem trazer, como vêm trazendo, novidades na captação e

reprodução dos fatos. São atípicas, portanto, aquelas provas que não estão

devidamente tipificadas em nossa legislação, mas são asseguradas pelo artigo 33250

do Código Processual Civil.

Conforme Guimarães (1998, p.93):

O legislador, ao elaborar o CPC, previu determinadas provas que poderiam ser utilizadas em juízo para formar o convencimento do magistrado tais como o depoimento pessoal, a confissão, a exibição de documento ou coisa, o documento, a testemunha, a perícia e a inspeção judicial. Todavia, não vetou a possibilidade de o juiz se convencer através de outros meios, quando introduziu, sabiamente, o art. 332 do CPC, permitindo com isso que pudesse o magistrado se abeberar em outras fontes de convencimento para melhor atender aos reclames da justiça.51

Sobre o tema, o seguinte precedente jurisprudencial:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. OFENSA À PRIVACIDADE. ATO DE VANDALISMO. DANO CONFIGURADO. 1. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. INDEFERIMENTO [...] 4. PROVA OBTIDA POR FILMAGEM FEITA PELAS VÍTIMAS. MEIO MORALMENTE LEGÍTIMO. É cediço que todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos são hábeis a provar a veracidade dos fatos em que se motiva a ação. Inteligência do art. 332 do CPC. Caso em que a instalação de câmara de vídeo na entrada da residência dos autores, em direção ao corredor do edifício, foi o único meio encontrado para descobrir a autoria dos atos de depredação que vinham sendo praticados na porta do apartamento. Prova que não se caracteriza como ilícita, mormente ante a inexistência de violação ao direito de intimidade das rés ou ofensa ao art. 5º, incisos X e XI da CF. Prova pericial que confirmou a autenticidade das gravações. Contaminação do procedimento não configurada [...].52

Poderão as partes, portanto, valer-se de quaisquer instrumentos moralmente

legítimos como meio de prova, ainda que não previstos em lei. Vale dizer que os

documentos eletrônicos estão inseridos no rol de provas atípicas, uma vez que a sua

utilização como meio de prova não está prevista em lei.

Segundo Marinoni e Arenhart (2005, p.181):

Não há que se confundir prova ilícita e prova atípica; prova atípica ou inominada é aquela não está prevista no ordenamento jurídico, ao passo que prova ilícita é um conceito que pode atingir tanto a prova atípica quanto a prova típica. Em outras palavras, não é porque a prova é atípica ou inominada, ou seja, não prevista no ordenamento, que ela será ilícita, pois a prova pode ser típica, isto é, prevista no ordenamento jurídico, e ser considerada ilícita.53

50 Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa.

51 RIBEIRO, Darci Guimarães. Provas Atípicas, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998.52 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n.º 70013447578. Relator: Paulo

Roberto Lessa Franz. Porto Alegre, 22 de junho de 2006.53 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Comentários ao Código de Processo Civil.

São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.

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Dentre as provas atípicas temos a prova emprestada, que consiste no transporte

de produção probatória de um processo para outro. É o aproveitamento de atividade

probatória anteriormente desenvolvida, mediante traslado dos elementos que a

documentaram, excepcionando-se, assim, a regra geral de que a prova é criada para

formar convencimento dentro de determinado processo. Todavia, controvertida é a

eficácia da prova emprestada com relação ao processo para o qual foi transladada.

Conforme Santos (2009, p.378):

O problema não diz respeito às provas preconstituídas e às documentais em geral, pois essas, originais ou emprestadas, valem, igualmente, em qualquer juízo em que forem apresentadas. Refere-se às provas casuais, ou simples – as que se colhem ou se produzem no decurso do processo, sem que tenham sido intencionalmente constituídas e preparadas para a demonstração dos fatos ali deduzidos pelos litigantes. Sobre estas, e especialmente sobre as provas de natureza oral (testemunhas, depoimento pessoal, esclarecimento de peritos), é que gira a controvérsia (grifo do autor).54

Para Marinoni e Arenhart (2008, p.291) a legitimidade da prova emprestada

depende da efetividade do princípio do contraditório, podendo ser a prova translada de

um processo para o outro desde que as partes do processo para o qual a prova deve

ser translada tenham participado adequadamente, em contraditório, do processo no

qual a prova foi produzida.55

Já Ribeiro (1998, p.112) sustenta:

Não merece acolhida essa posição que nega qualquer valor à prova emprestada pelo simples de não se ter respeitado determinados valores da oralidade. A própria lei se encarregou de retirar o caráter absoluto desses princípios, uma vez que admitiu a possibilidade de ser colhida a prova oral, tanto por meio de precatória, a chamada prova fora da terra, quanto por antecipação, a chamada prova ad perpetuam rei memoriam. Aliás, também em segundo grau temos a possibilidade de os julgadores aprofundarem na avaliação da prova sem que a tenham colhido.56

Nesse sentido:

APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDÊNCIA PRIVADA. FUNDAÇÃO BANRISUL. AUXÍLIO CESTA-ALIMENTAÇÃO, DÉCIMA-TERCEIRA CESTA-ALIMENTAÇÃO, CESTA ALIMENTAÇÃO ADICIONAL E ABONO SALARIAL ÚNICO. EXTENSÃO DOS BENEFÍCIOS AOS INATIVOS. POSSIBILIDADE. AGRAVOS RETIDOS. DA INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO EM RAZÃO DA MATÉRIA.[...] Quanto à prova emprestada, somente se admite sua utilização se houver identidade das partes em ambos os feitos, o que não ocorre no caso em tela [...].57

54 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva, 2009.55 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil – Processo de

Conhecimento. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.56 RIBEIRO, Darci Guimarães. Provas Atípicas, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998.57 RIO GRANDE DO SUL, Tribunal de Justiça. Apelação Cível n.º 70032986184. Relator: Romeu

Marques Ribeiro Filho. Porto Alegre, 17 de março de 2010.

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No caso supramencionado não foi admitida a utilização da prova emprestada,

pois não houve identidade entre as partes de ambos os feitos. O precedente abaixo

colacionado aceita a utilização da prova emprestada quando realizada em processo

semelhante, no qual os autores pertencem à mesma categoria funcional.APELAÇÃO. SERVIDOR PÚBLICO. CONVERSÃO DOS VENCIMENTOS DE CRUZEIRO REAL PARA URV. UTILIZAÇÃO DE PROVA EMPRESTADA. POSSIBILIDADE. REALIZAÇÃO DE PERÍCIA. DESNECESSIDADE. PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO. INOCORRÊNCIA. [...] É plenamente possível a utilização de prova emprestada - perícia realizada em processo semelhante, no qual os respectivos autores pertencem à mesma categoria funcional - na medida em que restou observado o princípio do contraditório [...].58

São também exemplos de provas atípicas o reconhecimento de pessoas ou

coisas, a reconstituição de fatos, meios previstos no Código de Processo Penal,

entre outros.

2.8 MEIOS DE PROVA

Os instrumentos materiais ou pessoais trazidos ao processo para orientar o

juiz na busca da verdade dos fatos são chamados de meios de prova. Para que

sejam admitidos, os meios de prova não podem estar contaminados pela

imoralidade, que os torna ilegítimos.

Conforme Marques (2009, p.80):

Verifica-se, desta forma, que a idéia conceitual de meio de prova constitui os instrumentos, as ferramentas trazidas pelas partes ao processo, que têm o desiderato de revelar ao magistrado, na busca da formação de um juízo de valor, a verdade de um fato. Essa verdade, entretanto, não é absoluta, mas relativa, porque será aquela que, diante dos elementos trazidos e constantes no processo, convergirá para a formação de convicção do julgador.59

Theodoro Júnior (2004, p.389) traz o rol de instrumentos probatórios

especificados pelo Estatuto Processual Civil: I) depoimento pessoal (arts. 342-347);

II) confissão (arts. 348-354); III) exibição de documento ou coisa (arts. 355-363); IV)

prova documental (arts. 364-391); V) prova testemunhal (arts. 400-419); VI) prova

pericial (arts. 420-439); e VII) inspeção judicial (arts. 440-443).60

58 RIO GRANDE DO SUL, Tribunal de Justiça. Apelação Cível n.º 70031478175. Relator: Eduardo Delgado. Porto Alegre,19 de janeiro de 2010.

59 MARQUES, Antônio Terêncio. A Prova Documental na Internet – Validade e Eficácia do Documento Eletrônico. 4.ed. Curitiba: Juruá,. 2009.

60 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2004.

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Todavia, como visto anteriormente, este rol não é taxativo. Outros meios,

desde que moralmente legítimos, são hábeis a provar a verdade dos fatos (GRECO

FILHO, 2003, p.185).61

Interessa-nos, neste trabalho, analisar de maneira mais aprofundada a prova

documental.

2.8.1 A Prova Documental

Antes de adentrarmos no que diz respeito à validade dos documentos

eletrônicos como meios de prova, é necessária uma análise da prova documental.

A prova documental tem como característica típica a circunstância de,

diretamente, demonstrar o fato pretérito e ser permanente. Através desse meio de

prova, o juiz tem conhecimento do fato sem qualquer outra interferência valorativa,

que não a sua própria. A interferência humana no fato, diante da prova documental

cinge-se à formação da coisa (documento) e à reconstrução do fato no futuro (pelo

juiz ou pelas partes, por exemplo). Não há, como ocorre com a prova testemunhal

ou com a prova pericial, mediação nessa reconstrução (MARINONI; ARENHART,

2008, p.341).62

A expressão prova documental abrange os instrumentos e os documentos,

que se diferenciam, principalmente, em razão de serem constituídos com a

finalidade de servir de prova; estes, ao contrário, poderão ser utilizados como prova,

mas não são confeccionados com essa finalidade.

Silva (2005, p.358) refere que sempre que se faz alusão à prova documental

imagina-se que esta categoria de direito probatório equivalha ao conceito de prova

literal, elaborada e produzida por meio da escrita. O conceito de documento, todavia,

é bem mais amplo, abrangendo outras formas de representação além das formas

gráficas ou simplesmente literais.63

Segundo Marinoni e Arenhart (2008, p.343):

Documento é toda coisa capaz de representar um fato. Pode constituir prova documental se for apta a indicar diretamente esse fato, ou

61 GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. v.2.62 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil – Processo de

Conhecimento. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.63 SILVA, Ovídio A. Baptista da. Curso de Processo Civil: Processo de Conhecimento. 7.ed. Rio

de Janeiro: Forense, 2005.

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prova documentada quando a representação do fato se dê de forma indireta (grifo dos autores).64

Instrumento é aquele documento formado com o fim específico de fornecer

elemento de prova de certo fato jurídico. Trata-se sempre de prova pré-constituída e

é destinado principalmente para a comprovação de determinado fato jurídico. Sua

formação exige solenidades estabelecidas em lei e sua finalidade é a de criar,

extinguir ou modificar um ato jurídico, servindo-lhe de prova.

Ainda nas palavras de Marinoni e Arenhart (2008, p.343):

A distinção não é meramente acadêmica. O Código de Processo Civil utiliza, em vários dispositivos, a expressão instrumento, pretendendo aludir especificamente à prova pré-constituída de fatos jurídicos (como no caso do art. 366). Em regra, todavia, utiliza o Código a expressão “documento”, referindo-se ao gênero (de que são espécies o documento e o instrumento), indistintamente (grifo dos autores) 65.

A utilização frequente das provas documentais deve-se, em grande parte, ao

aumento das relações sociais cada vez mais complexas e que exigem maior

preocupação com a segurança das relações jurídicas.

Sobre o tema, as considerações de Greco Filho (2003, p.209):

Na atualidade brasileira, nos documentos se retrata toda a vida do cidadão. Essa preocupação que talvez devamos à formação lusitana (e latina, em geral), chega a ser excessiva, a ponto de vigorar a errada concepção de que sem documento nada se prova ou de que o documento é a única prova válida.66

No processo civil o documento é, ainda, prova de capital importância. Há

casos em que até mesmo a lei impõe forma escrita para a celebração do negócio, de

modo a afastar outros tipos de provas em juízo.

2.8.1.1 Conceito de Documento

Segundo o entendimento de Santos (2009, p.399), documento é a coisa

representativa de um fato e destinada a fixá-lo de modo permanente e idôneo,

reproduzindo-o em juízo.67

64 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil – Processo de Conhecimento. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.

65 Ibidem.66 GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. v.2.67 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva, 2009.

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Theodoro Júnior (2004, p.407) conceitua documento como sendo o resultado

de uma obra humana que tenha por objetivo a fixação ou retratação material de

algum acontecimento.68

A característica de um documento é a possibilidade de ser futuramente

observado. O documento narra, para o futuro, um fato ou pensamento presente. Em

sentido lato o documento é a representação de ideias ou fatos que se pretende

indicar. A reprodução deve ser idônea, capaz de por si mesma expor o fato de

maneira apta ao conhecimento do julgador.

Conforme conceituação de Greco Filho (2003, p.209-10):

Documento liga-se à idéia de papel escrito. Contudo, não apenas os papéis escritos são documentos. Documento é todo objeto do qual se extraem fatos em virtude da existência de símbolos, ou sinais gráficos, mecânicos, eletromagnéticos etc. É documento, portanto, uma pedra sobre a qual estejam impressos caracteres, símbolos ou letras; é documento a fita magnética para reprodução por meio do aparelho próprio, o filme fotográfico etc.69

Em que pese a palavra documento nos remeta à ideia de papel escrito, tal

premissa não pode mais ser admitida no contexto atual, uma vez que a

modernização e tecnologia levam à necessidade de evolução do conceito de

documento. Nem apenas de palavras escritas consiste o documento, pois um

desenho, uma fotografia, gravações sonoras, filmagens, uma fotografia, etc., podem

ser considerados documentos.

Nas palavras de Marinoni e Arenhart (2008, p.344-5):

Vale ressaltar que é freqüente equiparar o suporte da prova documental à escritura. Imagina-se, nesta perspectiva, que somente haverá prova documental nas situações de prova escrita. Todavia, como já foi dito, o suporte do documento não se limita à via do papel escrito. Ao contrário, o que caracteriza o suporte é o fato de tratar-se de elemento real, pouco importando sua específica natureza. Dessa forma, o suporte pode ser uma folha de papel, mas também o papel fotográfico, a fita cassete, o disquete de computador, etc.70

Ademais, não poderia o direito, por exemplo, deixar de tutelar as relações

jurídicas que se estabelecem em meio eletrônico, bem como não poderia deixar de

adequar a nova tecnologia à realidade jurídica processual de utilização dos documentos

resultantes do meio eletrônico e que servirão de prova em um futuro processo judicial.

2.8.1.2 Autoria Documental e os Documentos Públicos e Privados: Autenticidade68 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2004.69 GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. v.2.70 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil – Processo de

Conhecimento. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.

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A autoria do documento tem relevada importância no que diz respeito à origem

do documento e, portanto, à verificação da valoração e fé que deve receber.

Normalmente a prova documental terá origem em alguma pessoa, será criada por

alguém e com alguma finalidade.

Àquele que cria a prova documental dá-se o nome de autor. Esse autor será

tanto aquele que efetivamente realizou, materialmente, o suporte em que se contém a

ideia transmitida pelo documento, como aquele que manda que o documento seja

formado. Nesse último caso ter-se-ão dois autores do documento: um imediato (aquele

que concretamente confecciona o documento) e um mediato (o que manda que a ideia

seja registrada no suporte).71

Com relação à autoria, o documento pode ser classificado em público e privado.

Documentos públicos são os firmados por oficial público com legitimidade para formá-lo,

já documentos privados são os formados por particulares. Será público, portanto,

quando o seu autor imediato seja agente investido de alguma função pública e quando

a formação do documento se dê no exercício de tal função. Será, ao contrário, particular

quando sua autoria imediata se dê por um particular. Consonante o artigo 371 do

Código de Processo Civil:

Art. 371. Reputa-se autor do documento particular:I- aquele que o fez e o assinou;II- aquele, por conta de quem foi escrito, estando assinado;III- aquele que, mandando compô-lo, não o firmou, porque, conforme a experiência comum, não se costuma assinar, como livros comerciais e assentos domésticos.

Não basta que o documento indique quem seja o autor, mas também deve ser

subscrito. A autoria do documento se define pela assinatura, não precisando que a

parte o tenha elaborado.

Conforme Santos (2009, p.402):

A subscrição não só indica e prova a autoria do documento como também torna presumível que a declaração nele representada foi querida pelo autor do fato documentado. Nesse sentido subscrição e assinatura são vocábulos que se equivalem.72

A subscrição há de ser sempre autógrafa, ou seja, realizada pelo autor do

documento. Em geral a própria lei atribui à subscrição condição de requisito

essencial para a eficácia probatória do documento.

Tratando do tema ensina Carnelutti (2005, p.20):71 Ibidem.72 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva, 2009.

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[...] a indicação do autor do escrito é um elemento essencial do documento autógrafo ou um complemento necessário para que a escritura tenha função documental (do fato) de sua formação; o escrito anônimo, ou seja, não subscrito ou, em todo caso, que não indique seu autor, não é verdadeiro documento (pelo menos, quanto ao fato de sua formação), senão somente um indício.73

A ideia de subscrição tem maior campo de aplicação na prova documental

escrita. Todavia, também os demais tipos de documentos podem e devem ser

subscritos (tais como as fotografias, as pinturas, etc.). Em alguns casos não haverá

a subscrição do autor no suporte físico do documento, mas ainda assim poderá

haver subscrição do documento através do uso de escrito apartado, em que se

reconheça a sua autoria (MARINONI; ARENHART, 2008, p.349).74

Importante salientar que na subscrição ou assinatura tem-se a autoria

aparente, pois pode ser falsa a indicação de autoria. Em relação ao documento

subscrito, será autêntico se for verdadeira a assinatura do suposto autor.

A autenticidade se refere à integridade formal do documento, à certeza de

que o documento provém do autor nele indicado. Tem-se, portanto, que a

autenticidade consiste na coincidência entre o autor aparente e o autor real.

O documento público tem a seu favor a presunção de autenticidade nos

termos do artigo 36475 do Código de Processo Civil. Relativamente aos documentos

particulares, presumem-se verdadeiras, em relação ao signatário, as declarações

deles constantes, quando por ele escrito e assinado ou somente assinado o

documento, conforme dispõe o artigo 368 do mesmo diploma legal.

Além da preocupação com a autoria, é necessário estabelecer, também, a

data no documento. Conforme leciona Carnelutti (2005, p.210):

A importância está na identificação do período em que a vontade foi expressa de forma permanente. Essa condição durável permite que terceiros possam conhecer os fatos e situá-los no tempo. É o marco inicial para o conhecimento dessas informações por quem não teve participação no documento. É um parâmetro importante na autenticidade dos documentos autógrafos, pois pode lhes conferir eficácia. A data do documento autógrafo consiste, precisamente, na indicação do lugar e do tempo de sua formação.76

73 CARNELUTTI, Francesco. A prova cível. Trad. Lisa Pari Scarpa. São Paulo: Bookseller, 2005.74 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil – Processo de

Conhecimento. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.75 O documento público faz prova não só da sua formação, mas também dos fatos que o escrivão, o

tabelião ou o funcionário declarar que ocorreram em sua presença.76 CARNELUTTI, Francesco. A Prova Cível. Trad. Lisa Pari Scarpa. São Paulo: Bookseller, 2005.

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Tal elemento faz-se necessário, portanto, para indicar em que exato momento

a pessoa que assinou tinha o animus de firmar o documento, indicando o lugar e o

tempo de sua formação.

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3 DO DOCUMENTO ELETRÔNICO

O avanço das comunicações instantâneas e a constante evolução tecnológica

proporcionaram ao ser humano variadas opções para a transmissão de informações.

A internet tornou-se um instrumento hábil para tornar as pessoas mais

próximas. Conseguimos manter contato com uma pessoa que esteja do outro lado

do mundo em tempo real e em poucos segundos recebemos notícias atualizadas de

qualquer lugar do planeta. O ser humano, como ser social que é, em poucos anos

transformou a internet em um ambiente de inúmeras relações jurídicas. O ambiente

virtual tornou-se um ambiente de lazer e, principalmente, de negócios e

comunicação.

Esse contexto produziu reflexos em várias áreas do direito e também fez

surgir questionamentos em relação ao Direito Processual Civil, mais especificamente

no âmbito probatório em relação às regras aplicáveis à produção e preservação da

prova em formato eletrônico. Como instrumento de regulamentação de condutas, o

Direito deve refletir a realidade da sociedade.

Uma característica própria da sociedade digital é a crescente tendência de

diminuição do uso de documentos físicos na realização de contratos, propostas e

mesmo divulgação de obras, implicando a modificação de uma característica básica

que se tornou comum em nosso modelo de obrigações: o uso do papel. É ilusão

acreditar que o papel é o meio mais seguro. Sabemos que armazenar dados e

imagens em discos rígidos ou fitas é muito mais seguro que arquivá-los em papel,

desde que o processo seja feito de modo adequado (PINHEIRO, p. 161-2).77

Descoberta em 1976, mas popularizada a partir de meados de 1994, com a

gratuita distribuição, pela Internet, do programa Pretty Good Privacy (ou

simplesmente PGP), uma técnica conhecida por criptografia assimétrica ou –como

também é chamada – criptografia de chave pública, tornou possível a equiparação,

para fins jurídicos, do documento eletrônico ao documento tradicional (MARCACINI,

2010).78

Conforme Pinheiro (2008, p.171-2):

77 PINHEIRO, Patricia Peck. Direito Digital. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2008.78 MARCACINI, Augusto Tavares Rosa. O documento eletrônico como meio de prova. Disponível

em: <http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas>. Acesso em: 04 abr. 2010.

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A criptografia é uma ferramenta de codificação utilizada para envio de mensagens seguras em redes eletrônicas. É muito utilizada no sistema bancário e financeiro. Na internet, a tecnologia de criptografia utiliza o formato assimétrico, ou seja, codifica as informações utilizando dois códigos, chamados de chaves, sendo uma pública e outra privada para decodificação, que representam a assinatura eletrônica do documento. Como os números das chaves têm até 2000 algarismos e são produto de complexas operações matemáticas que permitem trilhões de combinações, os especialistas afirmam que quebrar o sigilo de tal equação é praticamente impossível. A assinatura eletrônica é, portanto, uma chave privada, ou seja, um código pessoal e irreproduzível que evita os riscos de fraude e falsificação. Para o Direito Digital, uma chave criptográfica significa que o conteúdo transmitido só pode ser lido pelo receptor que possua a mesma chave.79

Ou seja, encriptando a mensagem com a chave pública, geramos uma

mensagem cifrada que não pode ser decifrada com a própria chave pública que a

gerou. Só com o uso da chave privada poderemos decifrar a mensagem que foi

codificada com a chave pública. E o contrário também é verdadeiro: o que for

encriptado com o uso da chave privada, só poderá ser decriptado com a chave

pública (MARCACINI, 2010).80

Assim, dessa nova realidade que nos é apresentada deve o direito adequar-

se inserindo a nova tecnologia à realidade jurídica. É imprescindível que os

operadores do direito tratem com naturalidade as novas figuras jurídicas que surgem

desta rápida evolução dos meios eletrônicos como, por exemplo, o documento

eletrônico que deve, no atual contexto social, ser aceito como meio válido de prova

no Direito Processual Civil.

3.1 CONCEITO DE DOCUMENTO ELETRÔNICO

Pode o documento físico ser definido como uma coisa representativa de um

fato, ou seja, é o registro de um fato inscrito no meio físico e a ele atrelado de modo

indissociável (MARQUES, 2009, p.126)81.

O conceito de documento nada tem haver com o papel. Documento é apenas

a fixação da informação para posterior acesso e conhecimento, independentemente

do suporte utilizado. A diferença do documento eletrônico para o documento

79 PINHEIRO, Patricia Peck. Direito Digital. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2008.80 MARCACINI, Augusto Tavares Rosa. O documento eletrônico como meio de prova. Disponível

em: <http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas>. Acesso em 04 abr. 2010.81 MARQUES, Antônio Terêncio. A Prova Documental na Internet – Validade e Eficácia do Documento

Eletrônico. 4.ed. Curitiba: Juruá, 2009.

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tradicional está apenas na substituição do papel por arquivos eletrônicos como

disquetes, discos rígidos, entre outros.

Sobre o tema, as palavras de Marcia Benedicto Ottoni (apud BLUM, BRUNO;

ABRUSIO, 2006, p.245):

A estreita ligação entre o papel e a própria noção de documento decorre, em parte, do fato de que no mundo físico a existência do documento escrito depende do suporte de papel. O documento em papel está preso original. A destruição do suporte significa a destruição do documento.No ciberespaço é diferente. O documento é uma sequência de bits, intangível, que pode ser infinitamente reproduzida.82

O documento eletrônico não se prende ao meio físico em que está gravado,

possuindo autonomia em relação a ele. O documento eletrônico é, então, uma

sequência de bits que, traduzida por meio de um determinado programa de

computador, seja representativa de um fato. Da mesma forma que os documentos

físicos, o documento eletrônico não se resume em escritos: pode ser um texto

escrito, como também pode ser um desenho, uma fotografia digitalizada, sons,

vídeos, enfim, tudo que puder representar um fato e que esteja armazenado em um

arquivo digital (MARCACINI, 2010).83

O documento eletrônico, portanto, pode ser entendido como a representação

de um fato concretizada por meio de um computador e armazenado em formato

específico (sequência de bits), capaz de ser traduzido mediante o emprego de

programa (software) apropriado.

Brasil (2010) define documento eletrônico como a representação de um fato

por meio de um computador e armazenado em programa específico capaz de

traduzir uma sequência da unidade internacional conhecida como bits, e comenta

que aqueles que tomam o documento como algo estritamente material, ao ligarem o

fato jurídico à matéria como uma coisa tangível, terão muitas dificuldades em

conceituar a nova forma de documentação, conhecida como documentação

eletrônica, em função de suas característica de intangibilidade.84

Apenas para elucidar a questão, faz-se importante, nesse momento, a

definição de bits:

82 BLUM, Renato M. S. Opice; BRUNO, Marcos Gomes da Silva; ABRUSIO, Juliana Canha (Coords.). Manual de Direito Eletrônico e Internet. São Paulo: Lex, 2006.

83 MARCACINI, Augusto Tavares Rosa. O documento eletrônico como meio de prova. Disponível em: <http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas>. Acesso em 04 abr. 2010.

84 BRASIL, Angela Bittencourt. O Documento Físico e o Documento Eletrônico. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1781>. Acesso em 05 abr. 2010.

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Dentro do computador, todos os dados que estão sendo armazenados ou processados são representados na forma de BITS que são impulsos elétricos positivos ou negativos sendo esses representados por 1 e 0,respectivamente. A cada impulso elétrico, damos o nome de Bit que é um acrônimo de Binary Digit ou Dígito Binário. É chamado "Binário" porque pode assumir apenas dois valores diferentes, ou zero ou um (VASCONCELOS, 2010).85

Os documentos eletrônicos são armazenados, portanto, em um arquivo digital

em forma de bits e necessitam de um suporte informático para a sua tradução.

Para Marcacini (2010):

Um conceito atual de documento, para abranger também o documento eletrônico, deve privilegiar o pensamento ou fato que se quer perpetuar e não a coisa em que estes se materializam. Isto porque o documento eletrônico é totalmente dissociado do meio em que foi originalmente armazenado. Um texto, gravado inicialmente no disco rígido do computador do seu criador, não está preso a ele. Assumindo a forma de uma seqüência de bits, o documento eletrônico não é outra coisa que não a seqüência mesma, independentemente do meio onde foi gravado. Assim, o arquivo eletrônico em que está este texto poderá ser transferido para outros meios, sejam disquetes, CDs, ou discos rígidos de outros computadores, mas o documento eletrônico continuará sendo o mesmo86.

O documento eletrônico subsiste sem estar preso ao seu meio representativo,

ao seu suporte como é o caso dos documentos tradicionais, escritos. Assim, pode

ser conceituado como aquele documento que está memorizado em forma digital,

sendo traduzido para conhecimento do homem somente com o auxílio de um

programa de computador. Nada mais é que uma sequência de bits que, traduzida,

nos representará um fato.

Não é o documento uma representação de um fato por meio da linguagem

escrita e aposta em papel, visto que não é fundamental que seu suporte seja o

papel. A função básica dos documentos sempre foi e continua sendo o registro fiel

de um fato ou informação. É indispensável que o documento cumpra sua finalidade,

independentemente de seu suporte físico.

3.2 UTILIZAÇÃO E IMPORTÂNCIA DO DOCUMENTO ELETRÔNICO NA ATUALIDADE

O surgimento da internet propiciou maior agilidade e rapidez na transmissão e

manuseio de dados. Não existem barreiras territoriais na rede mundial de

85 VASCONCELOS, Laércio. Introdução à organização de computadores. Disponível em: <http://www.laercio.com.br/artigos/HARDWARE/HARD-016>. Acesso em: 05 abr.2010.

86 MARCACINI, Augusto Tavares Rosa. O documento eletrônico como meio de prova. Disponível em: <http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas>. Acesso em 04 abr. 2010.

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computadores, podemos manter contato com uma pessoa que está do outro lado do

mundo, e tudo em tempo real. São, portanto, cada vez mais comuns as relações

jurídicas que se estabelecem através de meios eletrônicos.

Marcacini (2010) enfoca as mudanças sociais decorrentes da revolução

tecnológica:

O progresso da ciência sempre traz consigo uma mudança nos hábitos e comportamentos das pessoas. E destes novos relacionamentos humanos surgem novas relações jurídicas, ou novos fatos jurídicos a serem objeto de regulação por parte do Direito. Nunca, porém, o avanço da tecnologia se fez tão presente no cotidiano como ocorre nos dias de hoje, com a informática.87

Justamente em razão deste contexto de avanço tecnológico dos meios de

comunicação e das crescentes relações jurídicas tidas em meio virtual é que surge a

figura do documento eletrônico para que se possa garantir, juridicamente, a eficácia

probatória das inovações trazidas pela Internet.

Gico Junior (2000, p.302) faz uma análise sobre a utilização e importância

que o documento eletrônico vem adquirindo na atualidade:

O uso cada vez mais amplo dos computadores na vida social e, em particular, a difusão das transferências eletrônicas de fundos, o home banking, a explosão da internet e o comércio eletrônico, nos leva á incontestável conclusão de que cedo ou tarde teremos de nos valer de algum tipo de documento proveniente de um sistema de elaboração eletrônica, seja ele o recibo de pagamento emitido por um terminal eletrônico de um banco, um ingresso para cinema ou teatro comprado online, a inscrição para um concurso público cuja taxa foi debitada automaticamente em seu cartão de crédito, etc.88

A sociedade moderna estruturou-se de forma indissociável sobre a tecnologia

dos computadores e dos aparelhos eletrônicos. Não é difícil prever que, em breve

período de tempo, toda a atividade de armazenamento de documentos se

desenvolverá de forma digitalizada. Consequentemente, o documento tradicional

perderá grande parte de sua importância social em favor do documento eletrônico

(GICO JÚNIOR, 2000).89

Cabe, ainda, destacar que o documento eletrônico não se relaciona única e

exclusivamente com a internet, podendo ser produzido por meio de um computador

ou outro aparelho eletrônico. O documento eletrônico pode ser definido, em síntese,

87 MARCACINI, Augusto Tavares Rosa. O documento eletrônico como meio de prova. Disponível em: <http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas>. Acesso em 04 abr. 2010.

88 GICO JUNIOR, Ivo Teixeira. O conceito de documento eletrônico. Repertório IOB Jurisprudência: Civil, Processual, Penal e Comercial, n.14, jul.-2000.

89 Ibidem.

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como o conjunto de sinais emitidos ou produzidos através de um meio eletrônico,

armazenado em um arquivo digital.

Pinheiro (2008, p.162) enfatiza que a questão sobre documentos eletrônicos

não é criação da internet. É um assunto que já se discute há muito tempo devido à

documentação de operações em redes eletrônicas de bancos, seja via intranet de

computadores ligados com operadoras de cartão de crédito, seja quanto a

aplicações financeiras realizadas remotamente na bolsa de valores, seja via telefone

em operações conduzidas pelo cliente em uma gravação eletrônica, nos serviços da

bank phone.90

3.3 VALOR PROBATÓRIO DO DOCUMENTO ELETRÔNICO

Partindo da premissa de que o documento eletrônico é uma realidade

consolidada e que o direito não pode ficar alheio às transformações da sociedade e

às novas relações jurídicas advindas da tecnologia, cumpre verificar as

possibilidades de fazer com que este tipo de documento seja aceito como meio

válido de prova.

Como já visto, vigora no processo civil brasileiro a regra da atipicidade dos

meios de prova. Isto significa que os fatos podem ser provados por qualquer meio,

desde que lícitos e moralmente legítimos, ainda que não os típicos, conforme

preceitua o artigo 33291 do Código de Processo Civil. Ainda, o artigo 38392 do mesmo

diploma legal autoriza o uso de qualquer reprodução de fatos ou de coisas, desde

que aquele contra quem for produzida lhe admitir a conformidade.

Não há, na legislação pátria, nenhum óbice à utilização do documento

eletrônico como meio de prova. O artigo 225 do Código Civil afirma expressamente

que as reproduções fotográficas, cinematográficas, os registros fonográficos e, em

geral, quaisquer outras reproduções mecânicas ou eletrônicas de fatos ou de coisas

fazem prova plena destes, se a parte, contra quem forem exibidos, não lhe impugnar

a exatidão.

90 PINHEIRO, Patricia Peck. Direito Digital. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2008.91 Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código,

são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa.92 Qualquer reprodução mecânica, como a fotográfica, cinematográfica, fonográfica ou de outra espécie,

faz prova dos fatos ou das coisas representadas, se aquele contra quem foi produzida Ihe admitir a conformidade.

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As regras supracitadas não superam a problemática da eficácia probatória do

documento eletrônico. A ausência de impugnação implica em sua plena eficácia

probatória, todavia a impugnação faz com que as partes tenham que produzir

provas com relação à validade dos documentos eletrônicos apresentados em juízo.

Constata-se, portanto, que o ordenamento jurídico Brasileiro não veda, e até

mesmo estimula a utilização de outros meios de prova que não aqueles

taxativamente previstos. Desta forma, não se pode negar eficácia e validade

jurídica ao documento eletrônico, simplesmente em virtude do suporte físico em que

é posto.

O receio, porém, para a ampla adoção dos documentos eletrônicos, vem da

facilidade para a sua adulteração justamente por não estarem presos aos suportes

em que são registrados. Para ter força probatória o documento não pode ser

passível de adulteração. Além de ser objeto de fácil adulteração, os documentos

eletrônicos permitem que se apaguem os vestígios capazes de apontar a

adulteração (BLUN; BRUNO; ABRUSIO, 2006, p.245).93

Assim, a fragilidade do ambiente virtual faz com que se restrinja a utilização

dos documentos digitais como meios de prova. Costuma-se atribuir ao documento

eletrônico as seguintes características: volaticidade, alterabilidade e fácil falsificação.

Tal situação tem trazido grandes preocupações acerca da segurança e credibilidade

dos documentos eletronicamente produzidos.

Marcacini (2010) explica as consequências do ambiente volátil no qual se

fixam os documentos eletrônicos e suas implicações no que concerne à segurança:

Não estando presos aos meios em que foram gravados, os documentos eletrônicos são prontamente alteráveis, sem deixar qualquer vestígio físico. Textos, imagens ou sons, são facilmente modificados pelos próprios programas de computador que os produziram, ou, senão, por outros programas que permitam editá-los, byte por byte. A data e a hora de salvamento do arquivo é também editável, mediante o uso de programas próprios. Isto é fato notório e relativamente fácil de realizar, mesmo pelo usuário de computador menos experiente. E nenhum vestígio físico é deixado para permitir apurar que o documento eletrônico tenha sido adulterado [...].

O meio em que estão gravados os documentos eletrônicos é essencialmente alterável sem deixar vestígios. E, principalmente, esta característica que têm os documentos eletrônicos, de não estarem presos ao meio em que são gravados, é justamente o que lhes dá a necessária flexibilidade a permitir sua transmissão por meio da rede mundial. Esta é uma das grandes vantagens do documento eletrônico, e que foi maximizada com a expansão da Internet: a possibilidade de envio instantâneo, seja para

93 BLUM, Renato M. S. Opice; BRUNO, Marcos Gomes da Silva; ABRUSIO, Juliana Canha (Coords.). Manual de Direito Eletrônico e Internet. São Paulo: Lex Editora, 2006.

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outra cidade, para outro Estado, ou para o outro lado do mundo, se preciso for.94

Diante de tal instabilidade característica dos meios eletrônicos, deve ter o

documento digital certas características para que possa ser aceito como meio válido

e eficaz de prova no âmbito processual. Todavia, não se pode simplesmente

destituir os documentos eletrônicos de validade, uma vez que, como já abordado, as

relações tidas em meio virtual são cada vez mais frequentes na atualidade, não

podendo o direito deixar de tutelá-las. Ademais, a admissibilidade deste tipo de

documento no ordenamento jurídico pátrio é incontestável, tendo em vista o disposto

tanto no Código Civil quanto no Código de Processo Civil.

É, portanto, perfeitamente possível que seja atribuída validade jurídica aos

documentos eletrônicos, contanto que preencham determinados requisitos.

3.3.1 Requisitos para que o Documento Eletrônico seja considerado um Meio Válido de Prova

Para que o documento eletrônico possa ter eficácia jurídica probatória é

indispensável que apresente requisitos essenciais. Tais requisitos apresentam-se

similares àqueles exigidos para se atribuir validade aos documentos tradicionais,

todavia em relação à forma prática de verificação são completamente diferentes.

O primeiro requisito para que o documento eletrônico seja aceito como meio

válido e eficaz de prova é a autenticidade, ou seja, deve ter sua autoria

determinável. Como já visto a autenticidade é a certeza de que o documento provém

do autor nele indicado, é a coincidência entre o autor aparente e o autor real.

Normalmente o que demonstra a autoria de um documento tradicional é a

assinatura lançada no suporte material, mas, em se tratando de documento

eletrônico, é a assinatura digital que tem a função de autenticação (MARQUES,

p.133).95

O segundo requisito essencial para que se atribua validade jurídica aos

documentos eletrônicos é a integridade. É necessário assegurar-se que um

documento eletrônico possua integridade, ou seja, que não seja passível de

alteração não sendo modificado após a sua concepção e, em sendo alterado, que

94 MARCACINI, Augusto Tavares Rosa. O documento Eletrônico como Meio de Prova. Disponível em: <http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas>. Acesso em 04 abr. 2010.

95 MARQUES, Antônio Terêncio. A Prova Documental na Internet – Validade e Eficácia do Documento Eletrônico. 4.ed. Curitiba: Juruá, 2009.

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seja identificável com métodos e técnicas apropriadas. Quando falamos em

integridade não nos referimos à impossibilidade de reprodução do documento, mas

à sua inalterabilidade.

A jurisprudência coaduna com a necessidade da presença da autenticação e

integridade para que um documento seja validamente aceito como prova no âmbito

processual. Colaciono trecho do voto do Desembargador Cláudio Baldino Maciel do

Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul no julgamento do Agravo Interno n.º

70034806430:

O comprovante de pagamento apresentado nos autos não goza de eficácia jurídica plena, na medida em que lhe falta a característica da integridade, que impede a formação de convicção no sentido de que não se sujeita a eventuais modificações mediante o emprego de ferramentas eletrônicas, como é o caso do editor de textos, pontos estes nos quais reside a proclamada fé pública.Segundo observações do doutrinador de Renato Opice Blum:"Deve-se ressaltar que só é possível atribuir um manto de eficácia jurídica plena aos documentos, em meios tradicionais ou eletrônicos, se esses possuírem determinadas características que tornem possíveis não só a identificação de sua autoria, mas também a certeza de sua não modificação ou indícios de tal. Os documentos, como legítimas manifestações de vontade e representações fáticas, geram responsabilidades e, se alterados, podem trazer prejuízos para pessoas físicas ou jurídicas. Assim, os documentos (em meios físicos ou virtuais) devem, além da originalidade, possuir determinadas qualidades que não permitam que sejam, totalmente ou em parte modificados, alterados, ou suprimidos sem que tal fato possa ser descoberto. Melhor ainda se, além da possibilidade da descoberta dessas alterações, seja possível obter sua reconstituição, em sua forma original."O mencionado documento de que se vale o recorrente para comprovar o preparo (fl. 53) não conta com a nota constante no rodapé, característica esta inerente aos documentos obtidos diretamente no sítio da instituição financeira responsável pelo recebimento dos valores correspondentes às custas judiciais. Uma vez salvo no aplicativo “Word”, o documento pode ser alterado em seu conteúdo, sem que se garanta, pois, o resguardo às informações corretas. Nesse caso, alterável o documento, uma vez impresso já não terá a nota de rodapé que lhe garante a autenticidade. Tal é o documento juntado pela empresa recorrente, sem a autenticação mencionada (grifo do autor)96.

Além dos dois requisitos supramencionados, se faz necessária, ainda, a

análise da perenidade do documento eletrônico e da tempestividade.

A perenidade do conteúdo do documento eletrônico refere-se à validade da

informação ou do conteúdo ao longo do tempo. Já a tempestividade diz respeito à

data em que o documento eletrônico efetivamente foi produzido.

Entende-se, portanto, que os documentos eletrônicos podem ser aceitos

como meios válidos de prova no direito processual civil desde que preencham

96 RIO GRANDE DO SUL, Tribunal de Justiça. Agravo n.º 70034806430. Relator: Cláudio Baldino Maciel. Porto Alegre, 25 de março de 2010.

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alguns requisitos básicos que são a autenticidade, a integridade, a perenidade do

conteúdo e a tempestividade.

3.3.1.1 Autenticidade

A principal relevância jurídica decorrente do tema relativo à autoria dos

documentos reside questão atinente à sua autenticidade. Como já trabalhado

anteriormente, a autenticidade se refere à integridade formal do documento, à

certeza de que o documento provém do autor nele indicado. Tem-se, portanto, que a

autenticidade consiste na coincidência entre o autor aparente e o autor real.

A autenticidade de um documento é relativa à possibilidade de verificação de

sua procedência subjetiva. Busca-se saber se é, realmente, quem diz ser aquele que

se apresenta como site de um Banco ou de uma loja de departamentos.

Pode-se afirmar, portanto, que a autenticidade implica em conhecimento da

autoria e na possibilidade de se identificar, com elevado grau de certeza, a autoria

da manifestação de vontade representada no documento eletrônico.

A simples indicação do autor do documento não é suficiente para que ele

possa ser utilizado como prova. Nesse sentido, as palavras de Gico Junior (2000,

p.329-325):A mera indicação do autor não garante a autoria, não demonstra a

quem cabe a paternidade do documento. Um documento apócrifo com apenas a indicação da autoria necessitará de comprovação da veracidade da indicação. De uma forma geral, essa confirmação se dá através da assinatura do documento, ou de sua subscrição, que é o lançamento, ao fim do documento, da assinatura do autor97.

Normalmente a autoria de um documento tradicional é demonstrada pela

subscrição do autor aposta no suporte material. Com relação aos documentos

eletrônicos é a assinatura digital que possui a função de autenticação.

A jurisprudência pátria se encaminha a aceitar a autenticidade dos

documentos eletrônicos. É o que se depreende do seguinte precedente

jurisprudencial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. NULIDADE DAS CDAS POR AUSÊNCIA DE ASSINATURA ORIGINAL DA AUTORIDADE COMPETENTE. IMPOSSIBILIDADE. CDAS SUBSCRITAS POR

97 GICO JUNIOR, Ivo Teixeira. O arquivo eletrônico como meio de prova. Repertório IOB Jurisprudência: Civil, Processual, Penal e Comercial, São Paulo v.03, n.15, ago. 2000.

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CHANCELA ELETRÔNICA. INTELIGÊNCIA DO PARÁGRAFO 7º, DO ART. 2º DA LEF. A chancela mecânica não é mais do que a reprodução da assinatura de próprio punho da autoridade competente, com resguardo das características e da autenticidade por equipamentos especialmente destinados a esse fim. Já na chancela eletrônica o processo é substituído por recursos de informática. Aliás, o artigo 2º, parágrafo 7º da Lei das Execuções Fiscais autoriza a utilização desses meios de autenticação. De qualquer modo, um ou outro sistema, seja mecânico seja eletrônico, têm resguardo em medidas de segurança e estão para agilizar o processo de cobrança dos tributos utilizando dos meios que a modernidade passou a disponibilizar, conferindo aos documentos a mesma credibilidade atribuída aos que subscritos manualmente.Se dúvida houver quanto à autenticidade, é lícito ao executado, para ficar no caso, suscitar o incidente de falsidade.Portanto, a CDA subscrita por chancela eletrônica ou mecânica, com imagem digitalizada ou mecânica que reproduza a assinatura de próprio punho da autoridade competente, tal como se dá no caso, é título hábil para aparelhar a execução fiscal.Apelo provido. Sentença desconstituída. Unânime (grifo do autor).98

O precedente supramencionado atribuiu à assinatura eletrônica a mesma

credibilidade e força probandi da assinatura manuscrita, com o resguardo das

características e autenticidade do documento.

Nas palavras de Marcacini (2010):

Se a assinatura tradicional é única e exclusiva porque corresponde à escrita manual do signatário, comandada pelos impulsos nervosos vindos do cérebro, a assinatura eletrônica obtém esta característica uma vez assegurada a exclusività del mezzo técnico. Ou seja, somente o sujeito que estiver de posse da chave privada tem condições técnicas de gerar uma assinatura como àquela.99

Com a evolução tecnológica, permite-se que uma assinatura eletrônica,

possuindo as mesmas características da assinatura manuscrita, possa ter o mesmo

significado e eficácia jurídica da assinatura manual.

3.3.1.2 Integridade

A verificação da integridade de um documento diz respeito à avaliação que se

faz sobre ter sido ele modificado ou não, em alguma ocasião após sua concepção.

Consiste em se ter certeza de que o mesmo não foi alterado ou corrompido durante

o seu envio e recebimento.

98 RIO GRANDE DO SUL, Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº 70029976115. Relator: Genaro José Baroni Borges. Porto Alegre, 19 de agosto de 2009.

99 MARCACINI, Augusto Tavares Rosa. O documento eletrônico como meio de prova. Disponível em: <http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas>. Acesso em 04 abr. 2010.

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Para servir de suporte probatório, o documento eletrônico não pode ser

passível de alteração, ou seja, não pode ser modificado após a sua concepção,

quando é transmitido do emissor para o receptor, nem tão pouco, quando

armazenado. Se for alterado, que seja identificável com métodos e técnicas próprias

(MARQUES, 2009, p.135).100

Sobre o tema, as palavras de Marcacini (2010):

É evidente que um documento eletrônico, para ter força probante, não pode ser passível de adulteração. Porém, o que se deve buscar preservar é a manutenção da seqüência de bits, tal qual originalmente criada, não importando em que meio o documento está gravado, ou se o meio é ou não alterável.101

O documento eletrônico consiste na tradução de um arquivo digital

armazenado em forma de bits, não estando preso a qualquer meio ou suporte físico.

Sua integridade, portanto, poderá ser constatada ou investigada através da

verificação da assinatura digital.

Quando nos referimos aos documentos fixados em um suporte físico, a

investigação poderá ser feita mediante exame do próprio continente em que se

encontra afixado. Desta forma, constataremos se há ou não alteração (GANDINI,

2002, p. 165-82).102

A jurisprudência se preocupa com a integridade dos documentos eletrônicos

para que possam ser eles utilizados como meios válidos probatórios:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. COMPROVANTE DE PAGAMENTO DAS CUSTAS RECURSAIS. DOCUMENTO OBTIDO VIA INTERNET. CERTIFICAÇÃO. AUSÊNCIA DE FÉ-PÚBLICA. INADMISSIBILIDADE. DESERÇÃO. O comprovante de pagamento das custas recursais apresentado nos autos não goza de eficácia jurídica plena, na medida em que lhe falta a característica da integridade e, assim, impede a formação de convicção no sentido de que não se sujeitou a eventuais modificações mediante o emprego de ferramentas eletrônicas, como é o caso do editor de textos, ponto este no qual reside a proclamada fé pública. Assim, não se revestindo o documento juntado aos autos das características necessárias à admissão de um documento eletrônico, sendo que a aferição quanto à autenticidade importaria dilação que não se coaduna com a disposição contida no art. 511 do CPC, impositivo o não conhecimento do recurso, porquanto deserto. RECURSO NÃO CONHECIDO (grifo do autor).103

100 MARQUES, Antônio Terêncio. A Prova Documental na Internet – Validade e Eficácia do Documento Eletrônico. 4.ed. Curitiba: Juruá, 2009.

101 MARCACINI, Augusto Tavares Rosa. O documento eletrônico como meio de prova. Disponível em: http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas. Acesso em: 04 abr. 2010.

102 GANDINI, João Agnaldo Donizeti. A segurança dos documentos digitais. Revista da Ajuris, n.87, set. 2002.

103 RIO GRANDE DO SUL, Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento nº 70033999137. Relator: Cláudio Baldino Maciel. Porto Alegre, 11 de março de 2010.

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Os Tribunais, como se vê, apenas reconhecem a eficácia probatória do

documento eletrônico quando este é revestido de integridade, ou seja, há certeza de

que não se sujeitou a eventuais modificações posteriores à sua formação.

Enfatiza Marques (2009, p.136) que a integridade dos documentos eletrônicos

poderá ser averiguada por outros meios que não apenas a assinatura digital, na

medida em que entendemos ser este documento uma nova modalidade de prova.

Poderá o julgador, perfeitamente, como também as próprias partes envolvidas,

dispor de todos os meios de prova admitidos em direito, visando demonstrar a

integridade e autenticidade do documento:

É absolutamente possível que o magistrado, por interesse próprio ou a requerimento da parte, acesse a rede de informações e determine que o provedor ou a autoridade certificadora, libere, de seus registros cadastrais, informações específicas, relativas à analise judicial feita, sem invadir a esfera jurídica de terceiros, evidentemente, para provar se o documento eletrônico averiguado nele foi originado de uma pessoa e o nome dessa mesma pessoa, para localizá-la e se chegar a sua autoria com um certo grau de certeza.104

Pode o juiz determinar que o provedor ou autoridade certificadora libere os

registros cadastrais de seus usuários em casos em que há dúvida quanto à autoria

de remetentes de e-mails, principalmente com conteúdo difamatórios.

Nesse sentido:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CAUTELAR DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. 1. REQUISITOS PREENCHIDOS. OFENSAS DIRECIONADAS CONTRA O AUTOR A PARTIR DE MENSAGEM ELETRÔNICA. 2. IDENTIFICAÇÃO DO IP (FIXO) DO EQUIPAMENTO DE ORIGEM DO E-MAIL. ALEGAÇÃO DO SERVIDOR DE INTERNET DE QUE NÃO POSSUI MAIS AS INFORMAÇÕES ACERCA DOS DADOS DE CONEXÃO E COMUNICAÇÃO REALIZADAS POR TAL EQUIPAMENTO. ÔNUS QUE LHE INCUMBIA. ART. 333, II, DO CPC. 3. COMITÊ DE GESTÃO DA INTERNET QUE INDICA PRAZO DE TRÊS ANOS PARA GUARDA DESSAS INFORMAÇÕES. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO DO RECURSO.1. A ação cautelar de exibição de documentos pode ser um procedimento tanto preparatório como satisfativo, no qual se busca a exibição judicial de documento próprio ou comum, em poder de co-interessado ou terceiro.Documento comum não pode ser considerado apenas aquele que pertence indistintamente a ambas as partes, mas também o que se refere a uma situação jurídica que envolva ambas as partes, ou uma das partes e terceiro.2. O ônus probatório acerca da impossibilidade de identificação do equipamento utilizado para o envio da mensagem eletrônica ofensiva à honra do autor é da ré, até porque não nega que tivesse acesso a tais informações, apenas que não as manteria mais em seu banco de dados.3. O Comitê de Gestão da Internet no Brasil indica aos servidores que guardem, por um prazo mínimo de três anos, os dados de conexão e

104 MARQUES, Antônio Terêncio. A Prova Documental na Internet – Validade e Eficácia do Documento Eletrônico. 4.ed. Curitiba: Juruá, 2009.

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comunicação realizadas por seus equipamentos (identificação do endereço IP, data e hora de início e término da conexão e origem da chamada).Tendo passado menos de três meses entre o envio da mensagem eletrônica e a citação da ré, não parece crível que tenha se desfeito dos dados relativos ao responsável pelo IP (fixo) indicado na inicial e apurado a partir de laudo técnico de empresa contratada pelo autor (grifo do autor).105

O sigilo das informações dos usuários de provedores de e-mail pode ser

suprimido diante de indícios de ilícito praticado por aquele a quem dizem respeito os

dados pretendidos. A Jurisprudência tem aceitado os pedidos judiciais de exibição

dos documentos eletrônicos no sentido de respeitar o princípio constitucional da

vedação ao anonimato.

3.3.1.3 Perenidade do Conteúdo

A perenidade do conteúdo diz respeito à durabilidade da validade do

documento ao longo do tempo, à validade da informação ou do conteúdo.

Os documentos postos em papel oferecem armazenamento de longa

duração, uma vez que sua preservação está garantida no formato específico em que

foram publicados (periódicos, revistas, livros, entre outros). Pode, também, os

documentos eletrônicos serem armazenados por um longo período de tempo sem

que sofram nenhuma alteração.

Nas palavras de Arellano (2010):

Na preservação de documentos digitais, assim com na dos documentos em papel, é necessária a adoção de ferramentas que protejam e garantam a sua manutenção. Essas ferramentas deverão servir para reparar e restaurar registros protegidos, prevendo os danos e reduzindo os riscos dos efeitos naturais (preservação prospectiva), ou para restaurar os documentos já danificados (preservação retrospectiva) [...]

A preservação digital compreende os mecanismos que permitem o armazenamento em repositórios de dados digitais que garantiriam a perenidade dos seus conteúdos. As condições básicas à preservação digital seriam, então, a adoção desses métodos e tecnologias que integrariam a preservação física, lógica e intelectual dos objetos digitais. A preservação física está centrada nos conteúdos armazenados em mídia magnética (fitas cassete de áudio e de rolo, fitas VHS e DAT etc.) e discos óticos (CD-ROMs, WORM, discos óticos regraváveis). A preservação lógica procura na tecnologia formatos atualizados para inserção dos dados (correio eletrônico, material de áudio e audiovisual, material em rede etc.), novos software e hardware que mantenham vigentes seus bits, para conservar sua capacidade de leitura.106

A Perenidade do conteúdo do documento se refere à possibilidade de

armazenamento e integridade ao longo do tempo. Importante salientar que, uma vez

105 SANTA CATARINA, Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 2007.028916-4. Relator: Henry Petry Junior. Florianópolis, 14 de julho de 2008.

106 ARELLANO, Miguel Ángel. Preservação de documentos digitais: ciência da informação. Disponível em: <http://revista.ibict.br>. Acesso em: 12 abr. 2010.

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que é o documento eletrônico separável de seu suporte físico, o que deve ser

preservada, ou seja, não corrompida é a sequência de bits.

3.3.1.4 Tempestividade

Outro requisito relativo à validade do documento eletrônico é a verificação da

tempestividade, a qual nos permite saber com total segurança a data em que o

documento eletrônico foi efetivamente produzido.

Este requisito viabiliza, através de mecanismos ou quando da realização de

uma análise pericial, que o técnico (perito) consiga rastrear, por meio do provedor os

acessos ou com programas específicos capazes de desfazer ações do tipo deletar

ou formatar em um determinado computador, a exemplo do unformat, comando para

rastrear dados formatados, obtendo a data, momento em que o documento digital foi

elaborado (MARQUES, 2009, p.136).107

A apuração da idade de um documento tradicional pode ser feita com a

utilização de técnicas apropriadas, pois até mesmo a forma de impressão e tipo de

tinta serão importantes para determinarmos a origem e a data de sua produção. Em

se tratando de documento eletrônico, pode-se detectar a data de sua formação por

meio da assinatura digital.

A importância está na identificação do período em que a vontade foi expressa

de forma permanente. Essa condição durável permite que terceiros possam

conhecer os fatos e situá-los no tempo. Essa condição durável permite que terceiros

possam conhecer os fatos e situá-los no tempo. É o marco inicial para o

conhecimento dessas informações por quem não teve participação no documento

(CARNELUTTI, p. 210)108.

Todos os requisitos para que um documento eletrônico possa ser aceito como

meio válido de prova estão atendidos através de mecanismos como a certificação e

assinatura digital, através das técnicas de criptografia, conceitos estes que serão a

seguir analisados, e que garantem maior segurança quanto à autenticidade,

integridade, perenidade do conteúdo e tempestividade dos documentos eletrônicos.

3.4 SEGURANÇA DO DOCUMENTO ELETRÔNICO107 MARQUES, Antônio Terêncio. A Prova Documental na Internet – Validade e Eficácia do

Documento Eletrônico. 4.ed. Curitiba: Juruá Editora, 2009.108 CARNELUTTI, Francesco. A Prova Cível. Trad. Lisa Pari Scarpa. São Paulo: Bookseller, 2005.

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Não há dúvidas que a utilização da internet proporciona a realização de

diversas relações jurídicas entre seus usuários, tanto pessoas físicas quanto

jurídicas. É comum, por exemplo, que as tratativas de um negócio jurídico sejam

feitas através de e-mails, que um contrato seja enviado por meio eletrônico ou que,

simplesmente, efetuemos compras em sites de lojas na internet. Entretanto, a

segurança conferida aos documentos resultantes dessas relações virtuais se impõe,

uma vez que é garantidora da validade jurídica e probatória de tais documentos.

Destarte, podemos considerar que a validade jurídica dos documentos digitais

dependerá da prévia garantia de sua segurança e, para que isso seja viável,

deverão existir mecanismos que garantam a segurança da autoria, da autenticidade

e da tempestividade, elementos estes que figuram como requisitos para que o

documento eletrônico possua valor probante em um eventual processo judicial.

Um grande obstáculo para a plena utilização do documento eletrônico nos

negócios jurídicos tem sido a impossibilidade de subscrevê-los. Nesse sentido:Assinaturas são sinais distintivos, únicos e exclusivos de uma pessoa,

que permitem identificar o autor do documento. Graças a esta natureza de exclusividade de cada indivíduo, a assinatura manuscrita aposta sobre o papel atesta a autoria do documento [...]

Mas não basta colocar uma marca digital como uma assinatura manuscrita digitalizada no documento eletrônico para autenticá-lo, porque uma marca digital, ao contrário da assinatura manual, pode ser facilmente copiada e fraudulentamente reproduzida (BLUM;BRUNO; ABRUSIO, 2006, p.245-6).109

A partir desta problemática, surgiram técnicas de cifrar e decifrar as mensagens

contidas nos documentos eletrônicos, de forma que somente o remetente e o

destinatário possam ter acesso ao seu conteúdo. Assim, em função da segurança que

os documentos têm que proporcionar nas relações mantidas no ciberespaço,

juntamente com a questão da validade jurídica e da eficácia probatória, surgiram

mecanismos que buscam suprir as finalidades de uma assinatura manuscrita

tradicional.

Com efeito, a saída encontrada pelos doutrinadores, bem como técnicos em

informática para resolver o problema da insegurança jurídica dos documentos

eletrônicos como meio de prova, consiste na utilização de uma técnica de certificação

109 BLUM, Renato M. S. Opice; BRUNO, Marcos Gomes da Silva; ABRUSIO, Juliana Canha (Coords.). Manual de Direito Eletrônico e Internet. São Paulo: Lex, 2006.

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digital, denominada criptografia assimétrica, que permite assinar documentos

eletrônicos e assegurar sua integridade posterior (WICK, 2004, p.219-43).110

3.4.1 Criptografia

A criptografia está intimamente relacionada com a segurança dos dados,

assumindo um papel cada vez mais importante devido à grande quantidade de

informações que são movimentadas e a utilização crescente da rede de

computadores.

Tecnicamente, a palavra criptografia origina-se do grego kriptós, que significa

escondido, oculto e grafo, escrever. Criptografia é a técnica ou mecanismo através

do qual se escreve escondendo e tornando-se incompreensível determinada

informação, tendo como escopo uma comunicação segura e unicamente acessível

entre os interlocutores (MARQUES, 2009, p.156).111

A criptografia é, portanto, uma técnica que consiste em transformar um texto

legível em um conjunto de caracteres indecifráveis.

Marques (2009, p.159) ensina que para que um sistema criptográfico seja

considerado seguro e completo, precisa estar capacitado para atender cinco

parâmetros, a saber:

1- Identificação: verificação se o remetente da mensagem é quem diz ser;2- Autenticação: identificação do verdadeiro remetente do texto

criptografado e certeza da sua não adulteração;3- Impedimento de rejeição: codificação que evitará a possibilidade de o

remetente negar o envio de dados ou arquivos que tenha feito;4- Verificação: capacidade de, com segurança, processar-se à identificação

e à autenticação de uma determinada mensagem criptografada;5- Privacidade: capacidade de o criptossistema tornar inacessível, ocultar o

conteúdo da mensagem daqueles que não sejam seus destinatários.112

Existem essencialmente duas grandes técnicas de criptografia, denominadas

simétrica e assimétrica. A criptografia simétrica (chave secreta ou tradicional) é a

mais antiga e consiste na utilização de uma única chave que está vinculada no

processo de cifragem e decifragem.

110 WICK, Gabriela Vittielo. O Documento Eletrônico como Meio de Prova no Direito Brasileiro. Revista Processo e Constituição, n.1, dez. 2004.

111 MARQUES, Antônio Terêncio. A Prova Documental na Internet – Validade e Eficácia do Documento Eletrônico. 4.ed. Curitiba: Juruá Editora, 2009.

112 Ibídem.

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Figura 1: Criptografia Simétrica

A criptografia simétrica consiste em, basicamente, criptografar informações com

uma senha (chave) e um algoritmo. Para descriptografar aquele que recebe a

informação deverá utilizar a mesma chave e o mesmo algoritmo. Esse método,

portanto, apresenta uma desvantagem que é a troca da chave. Depende que o

transmissor e o receptor já tenham entrado em acordo com relação à chave a ser

utilizada, utilizando algum meio seguro para trocarem a chave entre si.

Já a criptografia assimétrica, também conhecida como criptografia da chave

pública, consiste em um sistema diverso e muito mais avançado do que a criptografia

simétrica. Nesse sistema, são utilizadas duas chaves, uma privada e uma pública. Em

princípio, o remetente cifra a mensagem com a sua chave privada, de uso exclusivo

seu, sendo esta decifrada com a chave pública do destinatário ou de quaisquer outras

pessoas que a tenham por conveniência de comunicabilidade com o remetente

(GANDINI, p.165-82).113

113 GANDINI, João Agnaldo Donizeti. A segurança dos documentos digitais. Revista da Ajuris, n.87, set. 2002.

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Figura 2: Criptografia Assimétrica

Conclui-se desta forma que a mensagem que é cifrada por uma chave privada

somente poderá ser decifrada por uma chave pública correspondente. Também

pode ocorrer da mensagem ser cifrada pela chave pública e ser decifrada pela

provada. Todavia, nunca a mesma chave, seja a privada ou a pública, poderá cifrar

ou decifrar a mensagem. Aqui as chaves são totalmente independentes entre si,

porém uma chave completa a outra.

A criptografia assimétrica é, atualmente, considerada a única forma de

assinatura capaz de garantir a validade dos documentos eletrônicos como meio de

prova. Com o uso da criptografia assimétrica, é possível gerar assinaturas pessoais

de documentos eletrônicos cifrando a mensagem com a chave privada e, após, com

o uso da chave pública, é possível conferir a autenticidade da assinatura, mas não é

possível gerar uma assinatura com esta chave. A posterior alteração do documento

invalida a assinatura, o que faz com que o documento eletrônico deixe de ter valor

como prova.

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Conforme elucida Augusto Marcacini (2010);Convém salientar que a assinatura gerada por um sistema de

criptografia assimétrica em nada se assemelha, no aspecto visível, a uma assinatura manuscrita. A assinatura digital é, na verdade, um número, resultado de uma complexa operação matemática que tem como variáveis o documento eletrônico e a chave privada, detida pelo signatário com exclusividade. Como a chave privada se encontra em poder exclusivo do seu titular, somente ele poderia ter chegado ao número representado pela assinatura.114

A assinatura digital de uma mesma pessoa será diferente, para cada

documento assinado, pois, sendo este uma das variáveis da função matemática, o

seu resultado (assinatura), será diferente para cada documento. Isto evita que uma

mesma assinatura possa ser utilizada para outros documentos. Diversamente do

que ocorre com a assinatura manual, que contém traços sempre semelhantes, e

assim é conferida, a conferência da assinatura digital é feita com o uso da chave

pública, utilizando o documento subscrito também como variável: se, com a chave

pública, pudermos decifrar a assinatura e relacioná-la ao documento, isto significa

que foi a chave privada que a produziu para aquele documento, que não foi alterado

desde então.

Quanto à autenticidade do documento, é possível identificar com absoluta

certeza, através do uso da criptografia assimétrica, o remetente e o destinatário da

mensagem. Em se tratando da integridade do documento, com a assinatura digital,

qualquer alteração do documento será evidenciada e este não poderá ser decifrado

pelo destinatário, que não conseguirá abrir o documento.

Nas palavras de Gico Junior (2000, p.348):

Durante o processo de criptografia, insere-se no arquivo um código identificador da fórmula matemática (chave) utilizada para cifragem. Este código é de tal forma sensível que qualquer alteração no documento, ainda que de um único bit, invalida a fórmula utilizada. Em outras palavras, qualquer alteração no arquivo eletrônico torna impossível a decifragem pela chave correspondente, o que acusaria a alteração e possível falsificação do documento eletrônico. Temos, pois, o documento eletrônico inviolável plenamente confiável115.

Com a utilização desta técnica, portanto, torna-se possível auferir com

segurança a origem e integridade do documento eletrônico.

114 MARCACINI, Augusto Tavares Rosa. O documento eletrônico como meio de prova. Disponível em: <http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas>. Acesso em 04 abr. 2010.

115 GICO JÚNIOR, Ivo Teixeira. A assinatura eletrônica. Repertório IOB Jurisprudência: Civil, Processual, Penal e Comercial, n.16, ago. 2000.

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3.4.2 Assinatura Digital

A autoria do documento é normalmente identificável por meio da assinatura,

salvo, como já abordado, nos casos em que o documento não costume ser

assinado. O documento eletrônico não pode ser assinado de forma manuscrita e,

por isso, para que possa ter validade probatória estando cumprido o requisito de

autoria identificável, é que surge a assinatura digital.

A assinatura digital é uma modalidade de assinatura eletrônica, resultado de

uma operação matemática que utiliza criptografia e permite aferir, com segurança, a

origem e a integridade do documento. O problema da identificação e integridade dos

documentos eletrônicos, portanto, foi solucionado pela assinatura digital que é

desenvolvida através da tecnologia da criptografia assimétrica.

A assinatura digital é um mecanismo para dar  garantia de integridade e

autenticidade a arquivos eletrônicos. Prova que a mensagem ou arquivo  não foi

alterado e que foi assinado pela entidade ou pessoa que possui a chave privada

correspondente.

Não há de se confundir assinatura digital com assinatura eletrônica. Em

termos gerais, a assinatura eletrônica é mais abrangente e engloba todos os meios

de reconhecimento de autoria de um documento no meio eletrônico. Assinatura

digital, por sua vez, é uma sequência lógica de dígitos que somente é reconhecida

através de algoritmos sendo baseada em criptografia assimétrica.

Conforme Brasil (2010):

As técnicas de assinatura feitas por meio da Criptografia consistem numa mistura de dados ininteligíveis onde é necessário o uso de duas chaves, a pública e a privada, para que ele possa se tornar legível. É como se fosse um cofre forte que somente para quem tem o seu segredo é acessível.

Assim, ele em nada se assemelha à assinatura com a qual estamos acostumados, pois na verdade a assinatura eletrônica é um emaranhado de números que somente poderá ser codificado para quem possua a chave privada e sua descodificação então deverá ser feita por meio de uma chave pública.116

A figura abaixo é exemplo de uma mensagem com assinatura digital. As setas

em vermelho indicam os pontos de referência para verificar a existência de da

assinatura digital:

116 BRASIL, Angela Bittencourt. O Documento Físico e o Documento Eletrônico. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1781>. Acesso em 05 abr. 2010.

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Figura 3: Assinatura DigitalFonte: Castro (2010)117

A assinatura digital por chaves públicas oferece um elevado nível de

segurança, proporcionando uma presunção muito forte de que o documento onde se

encontra foi criado pela pessoa que dela é titular (WICK, 2004, p.219-43)118.

Nas palavras de Lucca e Simão Filho (2000, p.399):

Para que um sistema de assinatura digital tenha a mesma força que a assinatura autográfica é preciso que, à sua maneira, ele também preencha os requisitos que garantam a identidade, a integridade e a perenidade do conteúdo. Todos esses requisitos são preenchidos pela tecnologia da criptografia de chave pública, que é empregada nas assinaturas digitais119.

O objetivo da assinatura digital é garantir, principalmente, o reconhecimento

da autoria e da integridade do documento eletrônico. A verificação da assinatura

digital conduz, por conseguinte, a um elevado grau de validade jurídica da

autenticidade, autoria e integridade do documento, uma vez que prova que o

documento não foi alterado e que a assinatura foi aposta por seu titular, bem como é

possível detectar a data da formação de tal documento - tempestividade.

Ao documento assinado digitalmente, portanto, pode ser atribuída por lei a

força probante de um documento tradicional subscrito. É importante ressaltar que a

assinatura digital é mais segura que a manuscrita, pois é certificada, ou seja,

verificada em tempo real no sistema de duas chaves, enquanto as assinaturas

tradicionais, muitas vezes, não são verificadas.

117 CASTRO, Aldemario Araujo Livro eletrônico informática jurídica e direito da informática. Disponível em: <http://www.aldemario.adv.br/infojur/indiceij.htm>. Acesso em: 19 abr. 2010.

118 WICK, Gabriela Vittielo. O Documento Eletrônico como Meio de Prova no Direito Brasileiro. Revista Processo e Constituição, n.1, dez. 2004.

119 LUCCA, Newton de; SIMÃO FILHO, Adalberto (Coords). Direito e Internet – Aspectos Jurídicos Relevantes. São Paulo: EDIPRO, 2000.

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3.4.3 Certificação Digital e Autoridade Certificadora

A criptografia assimétrica é a base da segurança do documento eletrônico. A

assinatura digital, que resulta da aplicação da criptografia assimétrica, utiliza a chave

pública e privada para garantir a autenticidade e integridade desses documentos.

Marques (2009, p.175) aponta a necessidade de se garantir maior segurança

na troca de documentos na infovia. Afirma o autor que a preocupação quanto à

distribuição da chave pública é pertinente, em razão de essa distribuição ser feita em

massa, como ocorre com o comércio eletrônico, gerando incerteza e desconfiança

na identificação do remetente e na integridade do conteúdo do documento digital.120

Desenvolveu-se então, como solução para o problema acima citado, a

tecnologia da certificação digital que pode ser caracterizada como o conjunto de

técnicas que garantem maior segurança às relações tidas em meio eletrônico e

transmissões de dados, permitindo, ainda, a guarda segura desses documentos.

Utilizando-se deste mecanismo é possível evitar que um terceiro intercepte ou

adultere as comunicações realizadas via Internet, bem como é possível saber, com

certeza, quem foi o autor de uma transação ou de uma mensagem.

A certificação digital é, portanto, a atividade de reconhecimento em meio

eletrônico que se caracteriza pelo estabelecimento de uma relação única, exclusiva

e intransferível entre uma chave de criptografia e uma pessoa física, jurídica,

máquina ou aplicação. Esse reconhecimento é inserido em um certificado digital, por

uma autoridade certificadora (SANTOS, 2010).121

A autoridade certificadora, também chamada de tabelião virtual, funciona

como um terceiro imparcial – agente público ou privado – que, por meio de um

certificado irá atestar a validade de um ato o que, analogicamente, equivale ao ato

de comparecer perante um tabelião público para subscrever um documento de

próprio punho.

A sistemática da assinatura digital necessita de um instrumento para vincular

o autor do documento que utilizou sua chave privada, à chave pública

correspondente. Assim, a função da autoridade certificadora está centrada na

120 MARQUES, Antônio Terêncio. A Prova Documental na Internet – Validade e Eficácia do Documento Eletrônico. 4.ed. Curitiba: Juruá, 2009.

121 SANTOS, Valfredo José dos. O documento eletrônico no processo judicial eletrônico. Disponível em: <http://jusvi.com/artigos/37784>. Acesso em: 19 abr. 2010.

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autenticação digital onde fica assegurada a identidade do proprietário das chaves. A

comprovação da autenticação se dá por meio do certificado digital.

O papel da autoridade certificadora é criar um par de chaves criptográficas (a

chave pública e a chave privada) para o usuário, além de atestar a identidade do

mesmo (conferindo sua identidade física pelos meios tradicionais). A certificadora

emitirá um certificado digital contendo a chave pública do usuário que acompanhará

os documentos eletrônicos assinados, conferindo as características essenciais da

integralidade e da autenticidade (WAISBERG, 2001, p.301).122

Através da autoridade certificadora se obtém o certificado digital que contém o

nome do titular (pessoa física ou jurídica), o número de série, a data da sua

validade, a chave pública do titular e a assinatura (eletrônica) da autoridade

certificadora, que garante o próprio certificado.

Figura 4: Certificado Digital (geral)Fonte: Fonte: Castro (2010)123

122 WAISBERG, Ivo; SILVA JÚNIOR, Ronaldo Lemos da. (coords.). Comércio Eletrônico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.

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Figura 5: Certificado Digital (detalhes)Fonte: Fonte: Castro (2010)124

A função básica do certificado digital é diminuir as possibilidades de eventual

fraude a que está sujeito o sistema de assinatura digital. Trata-se de uma garantia

acerca da identidade do titular das chaves utilizadas, bem como de sua validade. Ou

seja, graças aos certificados digitais, uma transação eletrônica realizada via internet

torna-se segura, pois permite que as partes envolvidas apresentem as suas

credenciais para comprovar, à outra parte, a sua real identidade.

A Medida Provisória 2.200 de 28 de junho de 2001 que analisaremos

posteriormente, dispõe acerca da Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira –

ICP Brasil instituiu o Comitê Gestor de Políticas como órgão apto a fornecer os

certificados eletrônicos que irão garantir segurança aos documentos eletrônicos

123 CASTRO, Aldemario Araujo Livro eletrônico informática jurídica e direito da informática. Disponível em: <http://www.aldemario.adv.br/infojur/indiceij.htm>. Acesso em: 19 abr. 2010.

124 CASTRO, Aldemario Araujo Livro eletrônico informática jurídica e direito da informática. Disponível em: <http://www.aldemario.adv.br/infojur/indiceij.htm>. Acesso em: 19 abr. 2010.

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3.5 ADMISSIBILIDADE PROBATÓRIA DO DOCUMENTO ELETRÔNICO PELO

PODER JUDICIÁRIO

O posicionamento do Judiciário Brasileiro com relação à crescente utilização

de documentos eletrônicos, inicialmente tímido e bastante conservador, vem se

modificando nos últimos anos, em inegável adaptação do entendimento

jurisprudencial às recentes necessidades sociais.

Sendo preenchidos os requisitos de autenticidade, integridade,

tempestividade e perenidade do conteúdo, como já vimos, será possível a aceitação

do documento eletrônico como meio válido de prova. A força probante dos

documentos eletrônicos está intimamente vinculada ao preenchimento destes

requisitos e, através da criptografia assimétrica, utilizada nas assinaturas digitais, é

possível garantir essa segurança.

Em relação à resistência na aceitação dos documentos eletrônicos Gico

Júnior (2000, p.329-325) tece as seguintes considerações:

Bem, este tipo de questão nos parece mais um problema psicológico dos doutrinadores do que um problema de fato. Toda essa magia criada pela mídia acerca dos computadores e da Internet parece ter afetado um pouco o juízo das pessoas. Não encontramos, em texto doutrinário algum, a preocupação de um jurista em saber como o cabeçote do aparelho de videocassete opera a transformação dos registros magnéticos daquela fita cassete em som e imagem. Nem como o aparelho de interceptação telefônica intercepta a freqüência correta de um celular para captar o número desejado. Essas coisas são detalhes técnicos que ao jurista não interessam em sua atividade normal. Então porque alguns ficam impressionados com o fato de os arquivos computadorizados serem guardados em linguagem binária para que o chip de processamento possa interpretá-lo? Que relevância tem isso para o Direito? Alguém se incomoda com o tipo de ligação química estabelecida entre as moléculas de tinta e as de celulose do papel para formarem um amálgama indissociável? Ou que fenômeno físico explica a nossa percepção da mensagem escrita no papel. Não, isto não tem a menor relevância jurídica. 125

O jurista deve ficar atento às questões que possuem relevância jurídica,

deixando a cargo dos profissionais de Informática e de Tecnologia da Informação a

solução dos aspectos técnicos da internet, que não podem ser alçados à condição

de barreiras intransponíveis que impeçam o reconhecimento jurídico dos novos

institutos como o documento eletrônico.

125 GICO JUNIOR, Ivo Teixeira. O arquivo eletrônico como meio de prova. Repertório IOB Jurisprudência: Civil, Processual, Penal e Comercial, n. 15, ago. 2000.

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Como bem enfatiza Corrêa (2000, p.107):

Os operadores jurídicos deverão utilizar o bom senso para dirimir questões jurídicas relacionadas à Internet, procurando sempre relacionar a parte técnica com o ordenamento jurídico em exercício. São as análises simples e lógicas que possibilitarão um eficaz entendimento das questões cotidianas de nossos tribunais, sendo, principalmente, os bancos acadêmicos os futuros responsáveis pela construção deste, já que é neles que existe uma verdadeira interdisciplinaridade, essencial para a resolução dessas novas questões. Por ser algo muito novo, e por versar sobre rotinas falíveis, a Grande Rede constitui-se em um desafio, muito especial, para aquilo que visa pacificar e dirimir os conflitos sociais, o direito. É nosso dever evitar que ciência jurídica seja desgastada por algo responsável pelo seu desenvolvimento: a tecnologia126.

O posicionamento jurisprudencial é de suma relevância, uma vez que

competirá aos Tribunais, em sua tarefa de interpretação e aplicação dos princípios e

normas orientadores do direito, conferir a necessária segurança jurídica ao

documento eletrônico, de forma a estimular sua plena utilização como meio válido e

eficaz de prova.

Trago à baila jurisprudência a respeito do tema referente à força probante dos

documentos eletrônicos:

PROCESSUAL CIVIL. FGTS. TERMO DE ADESÃO. ANTERIOR AO AJUIZAMENTO VIA INTERNET. CRÉDITOS DE ACORDO COM O CRONOGRAMA PREVISTO NA LC 110/2001. RECONHECIDA A VALIDADE DA TRANSAÇÃO EXTRAJUDICIAL.1 - A adesão ao acordo previsto na Lei Complementar nº 110/01 afasta o interesse dos titulares das contas vinculadas ao FGTS de recorrer à via judicial, em busca do pagamento integral e de uma só vez da correção monetária de suas contas, porque o acordo torna obrigatória a aceitação de descontos nos créditos, conforme os seus valores, além de fixar prazo de até cinco anos para a liquidação da obrigação.2 - A CEF está efetuando os créditos consoante cronograma previsto na LC 110/2001, e pode alegar que se trata de ato jurídico perfeito.3 - O novo Código Civil espelha uma nova mentalidade, consistente em valorizar o conteúdo em detrimento da forma, descabido, pois, recusar validade a documento eletrônico no qual não se vislumbra vício.4 - Agravo conhecido e provido (grifo do autor) 127.

No precedente supramencionado foi atribuída validade jurídica ao documento

eletrônico, tendo em vista que este não apresentava nenhum vício, preenchendo

todos os requisitos necessários para sua validade probatória. Menciona, ainda, o

Desembargador Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz a nova sistemática

do Código Civil de 2002 que recepciona os documentos eletrônicos como meios

válidos de prova.

126 CORRÊA, Gustavo Testa. Aspectos Jurídicos da Internet. São Paulo: Saraiva, 2000.127 Tribunal Regional Federal da Quarta Região. Agravo de Instrumento n. 2005.04.01.052685-5.

Terceira Turma. Relator: Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz. 30 de janeiro de 2006.

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Ainda sobre a aceitação do documento eletrônico como prova no âmbito

processual, colaciono trecho de um acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais

que analisa o tema:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. MENSALIDADES ESCOLARES. DOCUMENTOS ELETRÔNICOS. FORÇA PROBANTE. INTELIGÊNCIA DO ART. 383 DO CPC. COBRANÇA INDEVIDA. AUSÊNCIA DE PROVA. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO NÃO PROVIDO.Os documentos eletrônicos gozam de força probante porque encontram amparo no art. 383 do CPC. A autora juntou o documento de f. 47/49 e dele consta as instruções que a ré recebeu para autorizar a referida compensação que seria, insista-se, via internet. A ré impugna o mencionado documento dizendo ser ele é unilateral, motivo pelo qual não deve servir como meio de prova. Quer a devolução em dobro. Estes os fatos. Quanto ao direito, anoto, prima facie, que os documentos eletrônicos, gozam de valor probante, eis que encontram amparo no art. 383 do CPC [...]Com efeito, o art. 383 do CPC, tratando de prova documental, tem em seu texto menção que deixa abertura ampla o suficiente para aceitação do documento eletrônico aos dispor sobre a aceitação de "qualquer produção mecânica, como a fotográfica, cinematográfica, fonográfica ou de qualquer outra espécie (...)", para prova de fatos[...].Não resta dúvida, então, que, preenchidos os requisitos já lembrados acima - e que são, em última análise, inerente a qualquer documento -, os contratos eletrônicos servem como meio de prova de relações jurídicas, e se prestam como meios hábeis a criar e representar vínculos entre partes. Servem como contratos. A diferença, e ninguém nega que são diferentes de um contrato "comum", mas tão eficazes quanto, é que os próprios efeitos do contrato eletrônico são o seu meio de prova mais importante. Vale dizer que o papel (no sentido de função) do contrato eletrônico extrapola os limites do próprio papel (grifo do autor).128

No precedente supramencionado o documento eletrônico foi aceito como

meio válido e apto a comprovar a relação jurídica existente entre as partes. O voto

está baseado no artigo 383129 do Código de Processo Civil e menciona que, uma vez

preenchido os requisitos inerentes a qualquer documento, os documentos

eletrônicos são válidos instrumentos probatórios.

Colaciono abaixo precedente sobre a aceitabilidade dos documentos

eletrônicos no âmbito probatório processual em que o Tribunal baseou sua decisão

no que dispõe a Medida Provisória 2.200 de 28 de junho de 2001 (ICP-Brasil):

AÇÃO MONITÓRIA - CÓPIA DIGITAL DOCUMENTO - AUTENTICIDADE – MEDIDA PROVISÓRIA 2.200/01 - DOCUMENTOS FORMA ELETRÔNICA - POSSIBILIDADE. A Medida Provisória 2.200, de 28/06/01 se propõe a "'garantir autenticidade, integridade e validade jurídica de documentos em forma eletrônica', mediante a criação de uma Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil)". Esta MP garante ao documento eletrônico a força de presunção verdadeira quanto aos seus signatários [...]

128 MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n.° 1.0024.04.388774-4/001(1). Relatora: Márcia De Paoli Balbino. Belo Horizonte, 27 de outubro de 2005.

129 Qualquer reprodução mecânica, como a fotográfica, cinematográfica, fonográfica ou de outra espécie, faz prova dos fatos ou das coisas representadas, se aquele contra quem foi produzida Ihe admitir a conformidade.

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Não resta dúvida de que documento de fs.07/18, registrado digitalmente foi elaborado através de procedimento autorizado pelo art. 127 da Lei n. 6.015/73 e Medida Provisória nº. 2.200 de 2001. Isso porque, não se pode ignorar a evolução tecnológica que vem ocorrendo nos órgãos públicos, inclusive no Judiciário, visando uma maior celeridade nos procedimentos. A Medida Provisória 2.200, de 28/06/01 se propõe a “'garantir autenticidade, integridade e validade jurídica de documentos em forma eletrônica', mediante a criação de uma Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil)". Esta MP garante ao documento eletrônico a força de presunção verdadeira quanto aos seus signatários. Entende-se então por documento eletrônico, toda declaração realizada no espaço cibernético que não envolve troca e papel e nem a escrita convencional. A assinatura digital realizada nesses documentos eletrônicos trata-se de um método seguro de personalização de documento, de sorte a não restar dúvida a respeito da assinatura criptografada juntamente, em razão de sua chave pública, análoga aos cofres particulares disponíveis para locação nos estabelecimentos bancários, e uma chave secreta conhecida apenas pelo remetente e indispensável para cifrar a mensagem [...] (grifo do autor).130

A partir da leitura dos precedentes acima transcritos é possível perceber a

importância da jurisprudência no reconhecimento e utilização do documento

eletrônico. Tem-se que os documentos eletrônicos são aceitos pela jurisprudência

pátria como meios válidos de prova se preenchidos os requisitos de autenticidade,

integridade, perenidade do conteúdo e tempestividade. Uma vez preenchidos tais

requisitos o documento eletrônico é capaz de produzir convencimento, pois é um

meio moralmente legítimo de prova previsto no ordenamento brasileiro.

3.6 O DOCUMENTO ELETRÔNICO NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

Como já afirmado, a sociedade moderna estruturou-se de forma indissociável

sobre a tecnologia dos computadores e dos aparelhos eletrônicos. Não é difícil

prever que, em breve período de tempo, toda a atividade de armazenamento de

documentos se desenvolverá de forma digitalizada.

As comunicações pela Internet passaram a produzir inúmeras situações

passíveis de regulamentação. Diante desse cenário, não pode o Direito ficar alheio

às transformações da sociedade, cabendo aos profissionais da área criar leis que

regulamentem a matéria e assegurem a segurança das relações tidas em meios

eletrônicos.

Nas palavras de Brasil (2010):

130 MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n.° 1.0024.09.541569-1/001(1). Relator: José Affonso da Costa Côrtes. Belo Horizonte, 11 de fevereiro de 2010.

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Tomando-se a Internet como uma realidade e compreendendo-se as facilidades que ela traz a todos que a utilizam como instrumento de trabalho e negocial, vimos que está reservado ao Direito uma importante parcela dos seus resultados, pois incumbe a ele a tarefa de estabelecer regras para essa relação, reprimir o abuso prejudicial dos contratos e, acima de tudo, encarar a rede como um meio eficaz e rápido para o crescimento econômico. E é entre os atos jurídicos que podem ser efetuados pela Web e que já estão sendo feitos, é que surge a necessária segurança para o estabelecimento completo dessas relações (grifo do autor).131

Atualmente existem vários comandos legais definidores da validade do

documento eletrônico na legislação brasileira. Também merece destaque a Lei

Modelo da UNCITRAL (Comissão das Nações Unidas para leis de comércio

internacional) sobre o tema.

Passamos à análise, portanto, da legislação, especialmente a brasileira,

acerca dos documentos eletrônicos.

3.6.1 A Lei Modelo UNCITRAL

A UNCITRAL (United Nations Commission on Internet Trade Law – Comissão

das Nações Unidas para leis de Comércio Internacional) elaborou, em 1996, a

chamada Lei Modelo que traz diversas instruções a todos os países que pretendam

legislar a respeito dos documentos eletrônicos em seus ordenamentos jurídicos. São

abordados, ainda, alguns pontos interessantes a respeito da validade dos

documentos digitais.

A Lei modelo da UNCITRAL estabelece que os registros eletrônicos, para que

recebam o mesmo nível de reconhecimento legal dos documentos postos em papel,

devem satisfazer, no mínimo, o mesmo grau de segurança estes documentos

proporcionam. Ou seja, a Lei modelo estabelece uma série de requisitos para que

um documento eletrônico alcance função equivalente ao documento escrito.

Em seu artigo 5º dispõem a referida lei que não se negarão efeitos jurídicos,

validade e exequibilidade às informações apenas por estarem na forma de

mensagem de dados. Tem-se, portanto, que a validade jurídica dos documentos

eletrônicos não pode ser negada apenas pela forma pela qual se apresenta tal

documento.Sobre o tema, as palavras de Cabral (2010):

131 BRASIL, Angela Bittencourt. A Legislação Penal Italiana em Matéria de Crimes de Computador. Disponível em: <http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas>. Acesso em: 23.abril.2010.

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A UNCITRAL, na elaboração da sua Lei Modelo, procurou seguir o critério do equivalente funcional, pelo qual se entende que quando cumpridas as necessidades básicas estabelecidas em lei para a validade do ato, aquela deve ser considerada satisfeita ainda que o tenha sido mediante o emprego de outra forma não prevista e não vedada em lei. Esse princípio não é estranho ao nosso ordenamento processual, porquanto, o Código de Processo Civil, em seus arts. 154 e 244 acatam o princípio da instrumentalidade das formas.132

Uma vez atendidas as necessidades básicas para a realização de um ato,

portanto, deve ser ele considerado válido e eficaz mesmo que tenha sido realizado

de outra forma que não a prevista em lei. A Lei Modelo da UNCITRAL está em

conformidade com nossa legislação, na medida em que segue o critério do

equivalente funcional, em consonância com os artigos 154133 e 244134 do Código de

Processo Civil.

3.6.2 A Medida Provisória 2.200 de 2001

A Medida Provisória nº. 2.200 representa a primeira iniciativa governamental

com o objetivo de regulamentar os documentos eletrônicos no Brasil. Sendo a

edição de uma Medida Provisória mais ágil e rápida que o processo legislativo

regular, a criação da Infra-estrutura de Chaves Públicas, a ICP-Brasil, antecedeu a

edição de uma legislação que regulasse o valor e a eficácia jurídica do documento

eletrônico.

A ICP-Brasil é composta por uma autoridade gestora de política, vinculada à

Casa Civil da Presidência da República, e por uma cadeia de autoridades

certificadoras composta pela autoridade certificadora de raiz (AC-Raiz), pelas

autoridades certificadoras (AC) e pelas autoridades de registro (AR) (MARQUES,

2009, p.182).135

A AC-Raiz é o chamado Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI),

autarquia federal vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia que é considerada

a maior autoridade na cadeia de certificação. Cabe a ela emitir, expedir, distribuir e

132 CABRAL, Antonio Carlos. O contrato eletrônico. Disponível em: <http://www.cbeji.com.br/novidades/artigos>. Acesso em: 23 abr. 2010.

133 Os atos e termos processuais não dependem de forma determinada senão quando a lei expressamente a exigir, reputando-se válidos os que, realizados de outro modo, Ihe preencham a finalidade essencial.

134 Quando a lei prescrever determinada forma, sem cominação de nulidade, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, Ihe alcançar a finalidade.

135 MARQUES, Antônio Terêncio. A Prova Documental na Internet – Validade e Eficácia do Documento Eletrônico. 4.ed. Curitiba: Juruá, 2009.

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revogar os certificados das ACs, bem como desempenhar a atividade de fiscalização

e, em virtude disso, poderá aplicar sanções e penalidades.

As autoridades certificadoras são entidades credenciadas a emitir certificados

digitais, vinculando determinados pares de chaves criptográficas ao respectivo

titular, também emitem, expedem, distribuem, revogam certificados e registram suas

operações. Já as autoridades de registro atendem pessoalmente os usuários,

encaminham solicitações de certificados às autoridades certificadoras e mantém

registros de suas operações.

A finalidade da Medida Provisória é garantir a autenticidade, integridade e

validade jurídica dos documentos e aplicações eletrônicas, nos termos do seu art. 1º:

Art. 1º Fica instituída a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, para garantir a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de documentos em forma eletrônica, das aplicações de suporte e das aplicações habilitadas que utilizem certificados digitais, bem como a realização de transações eletrônicas seguras.

Importante, nesse momento, a análise do artigo 10 da referida Medida

Provisória, porquanto de suma importância para o tema da validade jurídica dos

documentos eletrônicos como meios válidos de prova.

Artigo 10. Consideram-se documentos públicos ou particulares, para todos os fins legais, os documentos eletrônicos de que trata esta Medida Provisória. Parágrafo 1º. As declarações constantes dos documentos em forma eletrônica produzidos com a utilização de processo de certificação disponibilizado pela ICP-Brasil presumem-se verdadeiros em relação aos signatários, na forma do artigo 131 da Lei nº. 3.071, de 1 de janeiro de 1916 - Código Civil.

Em que pese o Código Civil de 1916 ter sido revogado com a entrada em

vigor do novo Código Civil em 10 de janeiro de 2003, o parágrafo primeiro do

supramencionado artigo não restou prejudicado do ponto de vista material, uma vez

que o artigo 139 do novo Código repete o texto do artigo 131 do Código antigo. A

MP 2.200, portanto, expressamente concede às declarações constantes dos

documentos em forma eletrônica produzidos com a utilização de processo de

certificação disponibilizado pela ICP-Brasil a eficácia probatória dos documentos

subscritos.

Segundo, o parágrafo segundo do artigo 10:Parágrafo 2º. O disposto nesta Medida Provisória não obsta a utilização de outro meio de comprovação da autoria e integridade de documentos sem forma eletrônica, inclusive os que utilizem certificados não emitidos pela ICP-Brasil, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento.

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Este dispositivo estende a presunção de veracidade reconhecida às

declarações constantes dos documentos digitais que utilizam o processo de

certificação disponibilizado pela ICP-Brasil para aqueles documentos que são

reconhecidos pelas partes como válidos ou reconhecidos pela pessoa a quem forem

opostos.

Nas palavras de Marcacini (2010):

Essas regras todas estabelecem a chamada presunção de veracidade do documento, enquanto meio de prova, presunção essa que se limita ao signatário do documento. Noutras palavras, o documento faz prova contra seu autor. Se um sujeito assina um documento, é porque assume como verdadeiro o seu conteúdo. Como essa presunção não é absoluta, admite-se que o signatário impugne a veracidade de um documento, alegando ser ideologicamente falso, isto é, que os seus dizeres são falsos, embora o documento seja materialmente verdadeiro. Entretanto, a presunção de veracidade faz com que o signatário tenha que provar o que alega e, na falta de prova, prevalece o teor do documento.136

Sobre o tema, os seguintes precedentes jurisprudenciais:

AÇÃO MONITÓRIA - CÓPIA DIGITAL DOCUMENTO - AUTENTICIDADE - MEDIDA PROVISÓRIA 2.200/01 - DOCUMENTOS FORMA ELETRÔNICA - POSSIBILIDADE. A Medida Provisória 2.200, de 28/06/01 se propõe a "'garantir autenticidade, integridade e validade jurídica de documentos em forma eletrônica', mediante a criação de uma Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-BRASIL)". Esta MP garante ao documento eletrônico a força de presunção verdadeira quanto aos seus signatários (grifo do autor).137

Neste caso do Tribunal de Justiça de Minas Gerais foi reconhecida a

autenticidade do documento eletrônico em questão e garantida sua veracidade em

relação aos seus signatários por força do disposto na MP 2.200.

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. TRÂMITE IRREGULAR DO PROCESSO. AUSÊNCIA DE REVISÃO. NULIDADE INOCORRENTE. A assinatura eletrônica ou digital para documentos públicos e privados restou autorizada pela Medida Provisória nº 2.200-2/2001, de 24/08/2001, que instituiu a infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileiras-ICP. Presunção de veracidade do conteúdo do documento. Art. 10 da Medida Provisória. Trâmite da apelação que observou as normas correspondentes, não negando vigência ao princípio do devido processo legal. Revisor do recurso que recebeu os autos do processo, tendo vista dos mesmos, concretamente, antes do julgamento do apelo, o que devidamente certificado. O fato de constar do relatório a assinatura digital do Revisor, certidão de vista do feito e pedido de data para julgamento, com data posterior à sessão de julgamento, não significa que aquele julgador não tenha tido efetivo contato prévio com os autos. A assinatura digital posterior do revisor é resultado da sistemática administrativa que teve que ser adotada, frente à necessidade de emprestar maior celeridade na apreciação dos feitos, contornando a crescente demanda. Feito exaustivamente analisado pela Relatora e por seus pares, antes e durante a

136 MARCACINI, Augusto Tavares Rosa. A Certificação Eletrônica na Legislação Brasileira Atual. Disponível em: <http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas>. Acesso em: 24 abr. 2010

137 MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Apelação Cível n.° 1.0024.09.541569-1/001(1). Relator: José Affonso da Costa Cortês. Belo Horizonte, 11 de fevereiro de 2010.

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sessão de julgamento. EMBARGOS REJEITADOS (grifo do autor).138

Como se vê, a jurisprudência de nossos Tribunais segue o entendimento de

aceitação da presunção de veracidade dos documentos públicos ou privados

assinados digitalmente com base no artigo 10 da Medida Provisória 2.200. A

certificação digital é uma ferramenta de segurança eficaz e que garante a

integridade e autenticidade das informações que trafegam na internet, bem como o

destino do documento eletrônico.

A MP 2.200 introduziu no direito brasileiro uma nova perspectiva sobre o

documento eletrônico na medida em que optou por garantir-lhe eficácia probatória e

validade jurídica através do sistema criptográfico assimétrico, produzido ou não pela

ICP-Brasil.

A Medida Provisória n° 2.200 de 2001 passou por duas alterações após sua

edição. Sua primeira edição foi em 28/06/01, a segunda em 27/07/2001 (2.200-1) e,

por fim a terceira edição que é a 2.200-2 de 24/08/01.

3.6.3 Lei 11.419 de 19 de dezembro de 2006

A Lei 11.416 reforçou o reconhecimento jurídico do documento eletrônico e

realizou uma série de definições importantes acerca das relações entre o documento

físico e o eletrônico e entre as noções de original e cópia.

Durante a tramitação do projeto de lei do ano de 2001, que resultou no diploma

legal em questão, foi expressamente consignado que o objetivo primordial dessa lei

seria o de permitir o uso de meio eletrônico na comunicação de atos e na transmissão

de peças processuais, tais como petições, recursos, cartas precatórias etc., sendo

que o projeto seria importante para a informatização do Poder Judiciário brasileiro, o

que implicaria a elevação da qualidade e a celeridade da prestação jurisdicional.

Buscou-se, assim, atribuir mais celeridade e eficiência ao processo civil brasileiro,

modernizando-o por meio da utilização de tecnologia da informação (WAMBIER;

WAMBIER; MEDINA, 2007, p.291).139

De acordo com este diploma legal, o envio de petições, de recursos e a prática

de atos processuais em geral por meio eletrônico serão  admitidos mediante uso de 138 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Embargos de Declaração n.° 70026941765.

Relatora: Fabianne Breton Baisch. Porto Alegre, 29 de abril de 2009.139 WAMBIER, Luiz Rodrigues; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; MEDINA, José Miguel Garcia.

Breves comentários à nova sistemática processual civil 3. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.

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assinatura eletrônica que é forma de identificação inequívoca do signatário. Todos os

atos processuais do processo eletrônico deverão ser assinados eletronicamente.

Os documentos produzidos eletronicamente e juntados aos processos

eletrônicos com garantia da origem e de seu signatário serão considerados originais

para todos os efeitos legais. A lei estabelece, ainda, que se por motivo técnico for

inviável o uso do meio eletrônico para a realização de citação, intimação ou

notificação, esses atos processuais poderão ser praticados segundo as regras

ordinárias, digitalizando-se o documento físico, que deverá ser posteriormente

destruído. Admite-se, assim, a possibilidade jurídica de um documento existir

apenas em formato eletrônico.

A lei estabelece que os extratos digitais e os documentos digitalizados e

juntados aos autos pelos órgãos da Justiça e seus auxiliares, pelo Ministério Público

e seus auxiliares, pelas procuradorias, pelas autoridades policiais, pelas repartições

públicas em geral e por advogados públicos e privados têm a mesma força probante

dos originais, ressalvada a alegação motivada e fundamentada de adulteração antes

ou durante o processo de digitalização.

Tem-se que Lei nº 11.419/2006 deve sempre interagir com a Medida

Provisória 2.200-2 de 2001, pois a utilização dos meios eletrônicos somente será

admissível quando houver certeza de autenticidade e integridade dos métodos

utilizados.

3.6.4 O Anteprojeto de Lei da OAB/SP (Projeto de Lei nº 1.589/99)

O Projeto de Lei nº 1.589, proposto em 31 de agosto de 1999 pela Ordem dos

Advogados do Brasil, Secção São Paulo, dispondo sobre o comércio eletrônico, a

validade jurídica do documento eletrônico e a assinatura digital, segue algumas

regras da Lei Modelo da UNCITRAL.

O anteprojeto partiu do princípio de que os conceitos tradicionais não devem

ser pura e simplesmente afastados, mas sim ajustados à realidade do comércio

eletrônico, dando segurança maior às partes, inclusive no que diz respeito aos

futuros pronunciamentos do Poder Judiciário. Levando em consideração que o

comércio eletrônico tem, como uma das principais características, a

transnacionalidade, o anteprojeto propõe tenham as certificações estrangeiras a

mesma eficácia das certificações nacionais, desde que a entidade certificadora

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tenha sede em país signatário de acordos internacionais dos quais seja parte o

Brasil, relativos ao reconhecimento jurídico dos certificados eletrônicos.

O projeto prevê regras para a oferta de produtos e serviços por meio

eletrônico, conferindo maior segurança jurídica a estas relações, bem como equipara

o documento eletrônico assinado por meio da criptografia assimétrica aos

documentos físicos. Quando o projeto de lei se refere à questão de fazer prova

através de documento eletrônico é preciso deixar claro que nem todos os registros

eletrônicos possuem este caráter probatório, pois para ser considerado meio válido

de prova o documento terá de estar devidamente assinado pela técnica da

criptografia assimétrica.

Seguindo a linha das demais legislações estrangeiras que vêm sendo

editadas, o Projeto de Lei 1.589/99 reconhece valor probante aos documentos

eletrônicos assinados por meio da criptografia assimétrica. Reconhece o documento

eletrônico assinado digitalmente como prova documental, equiparando-o aos

documentos hoje conhecidos. E, mais do que apenas equiparar um ao outro, o

projeto adapta às peculiaridades do documento eletrônico diversas normas legais

sobre a prova documental, constantes da nossa legislação nacional (MARCACINI,

2010).140

É extremamente importante que haja em nosso ordenamento jurídico pátrio

leis que regulem as relações tidas em meios eletrônicos para atribuir-lhes segurança

jurídica e validade probatória aos documentos oriundos de tais relações. Para tanto,

o Projeto de Lei 1.589/99 é o texto mais eficiente e capaz, em complementação à

Medida Provisória 2.200-2, de contribuir para garantir a eficácia probatória dos

documentos eletrônicos.

140 MARCACINI, Augusto Tavares Rosa. Notas sobre o Projeto de Lei de Comércio Eletrônico, Documento Eletrônico e Assinatura Digital. Disponível em: <http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas>. Acesso em: 24 abr. 2010.

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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo da prova no Direito Processual Civil é de grande importância no que

diz respeito à resolução das lides postas em juízo, uma vez que somente através da

apresentação das provas é que o juiz poderá sopesar a veracidade do que foi

alegado pelas partes na demanda. A prova é instrumento apto a proporcionar que as

partes influam na convicção do juiz sobre os fatos que afirmarem.

No processo civil brasileiro vigora a regra da atipicidade dos meios de prova,

ou seja, os fatos podem ser provados por qualquer meio, desde que lícitos e

moralmente legítimos. Não há, na legislação pátria, nenhum óbice à utilização do

documento eletrônico como meio de prova.

Vivencia-se uma grande discussão entre os operadores do direito a respeito

da equiparação do documento eletrônico com o documento posto em papel. A prova

documental tem como característica demonstrar de maneira direta o fato pretérito e

ser permanente. A utilização cada vez mais frequente das provas documentais deve-

se, em grande parte, ao aumento das relações sociais que exigem maior

preocupação com a segurança jurídica.

Em que pese a palavra documento nos remeta à ideia de escrito em papel, tal

premissa não pode mais ser admitida no contexto atual, uma vez que a

modernização e tecnologia levam à necessidade de evolução do que se entende por

documento. Documento é, na verdade, apenas a fixação da informação para

posterior acesso e conhecimento, independentemente do suporte utilizado e a

diferença do documento eletrônico para o documento tradicional está apenas na

substituição do papel pelo suporte eletrônico.

Nessa pesquisa foi possível verificar que a fragilidade do ambiente virtual faz

com que se restrinja a utilização dos documentos digitais como meios de prova.

Indubitavelmente os documentos tradicionais gozam de uma maior aceitabilidade

devido a falta de conhecimento a respeito da segurança e integridade que pode

possuir o documento eletrônico que cumprir certos requisitos, quais sejam a

autenticidade, integridade, perenidade do conteúdo e tempestividade.

A força probante dos documentos eletrônicos está intimamente vinculada ao

preenchimento destes requisitos e, através da criptografia assimétrica, utilizada nas

assinaturas digitais, é possível garantir essa segurança. A assinatura digital é uma

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modalidade de assinatura eletrônica desenvolvida através da criptografia assimétrica

e que permite aferir, com segurança, a origem e a integridade do documento. Os

métodos da criptografia assimétrica e certificação digital tornaram possível a

equiparação, para fins jurídicos, do documento eletrônico ao documento tradicional.

A verificação da assinatura digital conduz, por conseguinte, a um elevado

grau de validade jurídica da autenticidade, autoria e integridade do documento, uma

vez que prova que o documento não foi alterado e que a assinatura foi aposta por

seu titular, bem como é possível detectar a data da formação de tal documento.

Diante de tudo o que foi apresentado, percebe-se que o documento eletrônico

estará cada vez mais presente como forma de registro de fatos e informações.

Todavia, os maiores óbices a utilização deste tipo de documento não está em

aspectos técnicos ou jurídicos, mas sim na mudança cultural em aceitar como

documento válido juridicamente algo que não seja material, palpável e que não

esteja ligado ao seu suporte material.

É preciso uma noção técnica básica sobre o conceito de documento

eletrônico para troná-lo objeto de regulamentação jurídica, evitando a elaboração de

normas inexequíveis. Ainda que no Brasil já tenhamos contato com este tipo de

documento, sua plena utilização no âmbito probatório do processo civil somente será

efetiva quando forem superadas as barreiras culturais de desconfiança dos

operadores do direito em relação às novas tecnologias.

Embora seja utilizada como parâmetro a Medida Provisória 2.200-2, falta em

nosso ordenamento jurídico normas que, utilizando como base as novas tecnologias,

sejam capazes de regular efetivamente as relações jurídicas estabelecidas entre os

indivíduos. Como vimos, o Projeto de Lei 1.589/99 (Anteprojeto de Lei da OAB/SP) é

o texto mais eficiente e capaz, em complementação à Medida Provisória 2.200-2, de

contribuir para garantir a eficácia probatória dos documentos eletrônicos.

É imprescindível que a doutrina e a jurisprudência deixem de lado os antigos

e rígidos dogmas jurídicos e se tornem adequáveis a esta nova realidade,

recepcionando o documento eletrônico como meio eficaz de prova no âmbito do

Direito Processual Civil.

O posicionamento jurisprudencial, como demonstrado ao longo deste

trabalho, é de suma relevância, uma vez que competirá também aos tribunais, em

sua tarefa de interpretação e aplicação dos princípios e normas orientadores do

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direito, conferir a necessária segurança jurídica ao documento eletrônico, de forma a

estimular sua plena utilização como meio válido e eficaz de prova.

Faz-se importante enfatizar que o jurista deve ficar atento às questões que

possuem relevância jurídica, deixando a cargo dos profissionais de informática e de

tecnologia da informação a solução dos aspectos técnicos da internet, que não

podem ser alçados à condição de barreiras intransponíveis que impeçam o

reconhecimento jurídico dos novos institutos como o documento eletrônico.

A partir do que foi apresentado neste trabalho, imperiosa se faz a afirmação

de que os documentos eletrônicos podem ser aceitos como meios válidos de prova

no direito processual civil desde que preencham alguns requisitos básicos que são a

autenticidade, a integridade, a perenidade do conteúdo e a tempestividade. Ao

documento assinado digitalmente, portanto, pode ser atribuída por lei a força

probante de um documento tradicional subscrito ou até mesmo ser atribuída força

maior, uma vez que a assinatura digital é mais segura que a manuscrita, pois é

certificada, ou seja, verificada em tempo real no sistema de duas chaves.

Finalmente, insta destacar que o presente estudo não teve a pretensão de

exaurir o tema, apenas analisar conceitualmente o documento eletrônico e sua

utilização como meio de prova válida e eficaz no âmbito do processo civil, e que seja

essa pesquisa fonte inspiradora para debates e outros trabalhos acadêmicos, uma

vez que o tema não é suficientemente debatido.

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