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Ciranda das guas 1
SRHU/MMAITAIPU BINACIONAL
A Secretaria de Recursos Hdricos eAmbiente Urbano do Ministrio do
Meio Ambiente (SRHU/MMA) orgo do governo federal respon-svel pelos procedimentos de gestodos Recursos Hdricos e Ambiente Ur-bano. Suas aes tm a gua comoelemento gerador e integrador, fun-damentando-se na integrao depolticas, sustentabilidade socioam-biental e no controle e participaosocial. Para o desempenho de suasatribuies conta com 3 departa-mentos - de Recursos Hdricos (DRH),
de Ambiente Urbano (DAU) e de Re-vitalizao de Bacias Hidrogrficas(DRB). Responsvel pela formulaode polticas pblicas de recursos hdri-cos, a SRHU/MMA tambm exerce afuno de Secretaria Executiva doConselho Nacional de Recursos Hdri-cos (CNRH).
A usina hidreltrica Itaipu Binacio-nal est localizada no Rio Paran, no
trecho de fronteira entre o Brasil e oParaguai, 14 km ao Norte da Ponteda Amizade, nos municpios de Foz doIguau, no Brasil, e Ciudad del Este, noParaguai. Com potncia instalada de14.000 MW, responsvel por 19% daenergia consumida pelo Brasil e 91%da consumida pelo Paraguai. Temcomo misso: gerar energia eltricade qualidade, com responsabilidadesocial e ambiental, impulsionando odesenvolvimento econmico, susten-
tvel, no Brasil e Paraguai
INSTITUTO ECOAR PARA CIDADANIA
O Instituto Ecoar para Cidadania uma Organizao da Sociedade Civil
de Interesse Pblico (OSCIP), fundadaem 1992 e sediada na cidade de SoPaulo. Tendo como misso contribuirpara a construo de sociedadessustentveis, o ECOAR cria, elaborae implementa projetos e programassocioambientais com foco nas reasde Educao para Sustentabilidade,Desenvolvimento Local Sustentvel,Aquecimento Global e MudancasClimticas, Fomento Responsabili-dade Socioambiental e Sustentabili-
dade nas empresas, Gesto Participati-va de Bacias Hidrogrfcias entre outros.Buscando cada vez mais a trans-parncia e sustentabilidade de suasatividades, em 2008 o ECOAR aderius diretrizes da Global Report Initiative(GRI) em seu processo de gesto, ten-do obtido Nivel A.
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Repblica Federativa do Brasil
Dilma Vana RousseffPresidente
Michel Miguel Elias Temer LuliaVice-presidente
Ministrio do Meio Ambiente
Izabella Mnica Vieira TeixeiraMinistra
Francisco GaetaniSecretrio executivo
Secretaria de Recursos Hdricos eAmbiente Urbano
Silvano Silvrio da CostaSecretrio
Ronaldo Hiplito SoaresChefe de Gabinete
Departamento de Recursos Hdricos
Jlio Tadeu Silva KettelhutDiretor de Recursos Hdricos e Revitalizao de Bacias
Coordenao de Polticas ePlanejamento de Recursos Hdricos
Franklin de Paula JniorGerente
Coordenao de Apoio aoConselho Nacional de Recursos Hdricos
Ana Cristina Monteiro MascarenhasGerente
Coordenao de Gesto de RecursosHdricos e Agenda Internacional
Jlio Tadeu Silva KettelhutGerente
Coordenao de Revitalizao de Bacias
Renato Saraiva Ferreira
Gerente
Itaipu Binacional
Jorge Miguel SamekDiretor-geral brasileiro
Nelton Miguel FriedrichDiretor de Coordenao e Meio Ambiente
Jair KotzSuperintendente de Meio Ambiente
Odair FiorentinGerente Executivo do Programa Cultivando gua Boa
Rosana Lemos TurminaGerente do Departamento de Proteo Ambiental
Silvana VitorassiGerente da Diviso de Educao Ambiental
Leila de Ftima AlbertonGestora do Programa de Educao Ambiental
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A gua um elemento essencial vida, fonte geradora de todos os processos construdos socialmente,elo entre os humanos e toda a teia viva do planeta. O estado das guas reflete as condies gerais doambiente e do modo de vida dos seres humanos, se h ou no sade e qualidade de vida.
Os impactos das mudanas climticas globais j fazem parte do cotidiano das pessoas. Eventos crti-cos como secas intensas, fortes tempestades e enchentes freqentes permitem uma percepo cadavez mais clara da crise ambiental planetria. Este cenrio exige a construo de novos caminhos, amudana de valores, de atitudes individuais e coletivas e da relao humana com o meio ambiente,sobretudo com a gua.
O domnio das guas brasileiras responsabilidade da Unio e dos estados, entretanto, para que agesto das guas se desenvolva de maneira articulada com a gesto do uso e da ocupao do solo,de responsabilidade municipal, estratgica a valorizao de aes locais e a promoo de umamaior insero dos municpios no Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hdricos.
fundamental que o poder pblico e a sociedade conheam, as boas prticas em gesto local derecursos hdricos e delas extraim referncias para o aperfeioamento das polticas pblicas, construindodessa forma sociedades sustentveis.
No intuito de alcanar esses objetivos, a Secretaria de Recursos Hdricos e Ambiente Urbano do Ministriodo Meio Ambiente (SRHU/MMA), em parceria com a Itaipu Binacional, publica o livro Ciranda das guas,tecendo rede de boas prticas e apoio ao local. A publicao apresenta um panorama da guana atualidade e relata experincias de boas prticas de gesto integrada de recursos hdricos e recu-perao ambiental na territorialidade das bacias hidrogrficas. A expectativa de que a identificaoe a valorizao dessas aes possam contribuir para a sua disseminao junto aos gestores locais e aogrande pblico, e acarretem tambm na reverso de passivos socioambientais.
Os textos falam da gua em suas diversas perspectivas: cultural simblica, do consumo, da disponibili-dade, das polticas pblicas e das mudanas climticas. Retratam tambm aes de comits de baciashidrogrficas, da sociedade civil e de instituies governamentais que, a partir de seus bons resultados,
trazem novos referenciais para um compromisso ampliado da sociedade brasileira com a sustentabili-dade socioambiental.
O programa Cultivando gua Boa, realizado pela Itaipu Binacional e mais de 2.000 parceiros, constituium dos eixos de referncia da publicao. Trata-se de uma experincia bastante consolidada de recu-perao ambiental em microbacias hidrogrficas, pela integrao entre a gesto das guas, do meioambiente e o manejo sustentvel dos recursos naturais. Envolve tambm comunidades e atores locaiscom atuao nos campos poltico, econmico, ambiental, social e at religioso, destacando o papeldos municpios na gesto dos recursos hdricos.Assim, a Ciranda das guas promove a tecitura de uma rede, a ser ampliada e multiplicada em outros
espaos de troca e compartilhamento. Convidamos todos a conhec-la, na inteno de que se possam agre-
gar cada vez mais experincias, cuidados socioambientais e os saberes existentes nas bacias hidrogrficas.
IZABELLA MNICA VIEIRA TEIXEIRAMinistra de Estadodo Meio Ambiente
JORGE MIGUEL SAMEKDiretor-Geral Brasileiro da
Itaipu Binacional
Apresentao
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Organizao
Joo Bosco SenraNelton Miguel Friedrich (Itaipu)Miriam Duailibi (Instituto Ecoar)
Roteiro e textos
Miriam DuailibiColaboradores:
Franklin de Paula Jnior (SRHU/MMA)Jair Kotz (Itaipu)Silvana Vitorassi (Itaipu)
Agradecimentos
Brites Carmo Cabral (SRHU/MMA)Carolina Ramalhete VieiraLara Regitz MontenegroPatrcia do Lago Grazinoli (SRHU/MMA)Priscila Maria Wanderley Pereira
Rogrio Cota Faria Pacheco (SRHU/MMA)
Pesquisa
Eduardo Barbosa Quartim (Instituto Ecoar)Jos Luciano Arajo (Instituto Ecoar)Dbora Teixeira (Instituto Ecoar)lvaro Gabriel Sandoval (Instituto Ecoar)
Diego Duailibi
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01. gua, a essncia da vida
02. Acesso gua, direito vida
03. gua, significados e transcendncia
04. Abundncia de gua, uma ddiva?
05. A cultura da escassez...
06. Cultivando gua Boa, um exemplo para o mundo
07. O papel e a importncia das Polticas Pblicas
08. Por que precisamos mudar agora, j...
09. Poluio e falta de saneamento, uma equao
de alto risco
10. Falar de gua em tempos de mudanas climticas
significa falar de sobrevivncia
11. Cuidando da escassez na abundncia
12. Eplogo
PG CAPTULOS
ndice
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01 gua, a essncia da vida
A intrnseca conexo entre gua e vida, como mostramos registros histricos, era conhecida por cientistas e filsofosdesde os primrdios das civilizaes.
Tales de Mileto, um dos sete sbios da Grcia Antiga, j noano 600 a.C, considerava a gua como a origem de todasas coisas. Ele e seus seguidores defendiam a existncia de umprincpio nico para a natureza primordial, afirmando que
o mundo evoluiu da gua por processos naturais, aproxi-madamente 2.460 anos antes de Charles Darwin.
Na Renascena, Leonardo da Vinci, considerado o maiorgnio da histria devido multiplicidade de talentos paraas cincias e as artes, referia-se gua como o veculo danatureza (vetturale di natura), o sangue do planeta, o nutri-ente de todos os seres vivos.
Tais conceitos, que advinham do convvio com a natureza,de sua observao e dos conhecimentos cientficos limitadosde ento, foram reconhecidos e reafirmados luz da moder-na cincia, que nos mostra que a vida na Terra emergiu dasguas por meio da evoluo da primeira clula viva.
O ciclo da gua, o mais bsico ciclo ecolgico, demonstrainequivocamente que ela um bem insubstituvel, essencialpara todas as criaturas vivas.
Setenta por cento do nosso corpo
composto de gua; sem ela, um
ser humano no sobrevive por mais
de trs dias. Sem alimento, uma
pessoa pode resistir at 40 dias;
porm consegue viver por somente
72 horas depois que perde os 13
litros de gua do seu corpo.
A proporo de gua no corpo hu-
mano adulto igual de gua no
planeta. medida que envelhece-mos vamos secando: at os 2 anos
de idade, 75 a 80% do nosso corpo
formado de gua; aos 5 anos
essa porcentagem cai para 70% e
depois dos 60 anos temos apenas
58% de gua em nosso organismo.
Uma pessoa totalmente seca estaria
morta. O nosso planeta tambm.
Sociedades no se sustentam onde o meio ambiente sucumbe.
Rajendra PachauriPresidente do Painel Intergovernamental sobre
Mudanas Climticas (IPCC) e Prmio Nobel da Paz 2008.
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Desde os primrdios de nossa civilizao, essa fundamentali-dade foi intuda, percebida e incorporada pela humanidade.
Encontramos registros do uso da gua e da existnciade canais de irrigao na Mesopotmia e no Egito desdeo ano 5000 a.C. A primeira represa, datada de 2900 a.C.foi construda pelo fara Menes, do Egito, para abastecer acidade de Memphis.
O significado, o prazer e a importncia social da gua eramto grandes na Roma do primeiro sculo da era crist queseu fornecimento e a construo de luxuosos banhos pbli-cos se tornaram smbolo de poder e prestgio para os suces-sivos imperadores. O primeiro dos quatro aquedutos paraa distribuio de gua pela cidade data do ano 312 d.C.Algumas dessas verdadeiras obras-primas de engenharia elogstica ainda esto em funcionamento.
A civilizao egpcia, uma das mais antigas da histria, reve-renciava o rio Nilo, sabendo que sem ele seu territrio seriaapenas um imenso deserto. O Nilo foi o responsvel pela altadensidade demogrfica, pela miscigenao de culturas quedefiniu a regio, pelos assentamentos humanos cujos vest-gios remontam a 5 mil anos, pelas migraes de povos embusca da fertilidade das terras de suas margens.
Suas guas possibilitaram a existncia da vida, propiciaram
a comunicao e o comrcio e favoreceram a agricultura.Todos os anos suas enchentes fertilizavam e regeneravam a terra.Nos tempos dos faras, o Nilo era chamado de rio de Deus.
No entanto, o processo histrico e os equvocos do modelode desenvolvimento adotado por grande parte do mundomoderno, que pressupunha o afastamento e a dominaoda natureza, conduziram minimizao da essencialidadeda gua como seiva vital; fizeram esquecer que a origem
dos humanos remonta gua, que a palavra HOMEM vemde HMUS, terra molhada.
Para o telogo e filsofo brasileiro Leonardo Boff, a humani-dade rompeu a aliana de harmonia com a natureza eesta a castigou com secas, inundaes, tufes e mudanasclimticas (...).
A crise socioambiental que hoje
vivemos resultado da desconexo
do homem com a natureza e con-
sigo prprio e tornou evidente sua
fragilidade e sua interdependncia
com o ar, a gua, o solo, as rela-
es humanas e comunitrias. A
quebra da unidade do homem
com a natureza tem consequn-
cias danosas que s tendem a se
agravar no futuro. Por isso, atingi-
mos um ponto da histria em que
precisamos menos logos (razo) e
mais pathos (sentimentos), mais
cuidado do que conquista, sem
que isso signifique negar os avan-
os cientficos e os benefcios do
pensamento lgico e racional.
Nelton Friedrich, diretor de Co-ordenao e Meio Ambiente de
Itaipu e um dos mentores do Pro-
grama Cultivando gua Boa.
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Nesta terra, em se plantando tudo d, afirmou Pero Vaz de Caminha em sua carta ao reide Portugal, Dom Manuel, o Venturoso, em 1 de maio de 1500.
Mais de cinco sculos separam a constatao do desbravador portugus do ano de 2003,quando, em longnquas e interioranas terras paranaenses, a empresa hidreltrica Itaipu Bina-cional recria a mxima dos descobridores e demonstra, na prtica, que aqui tudo que se
cultiva d, inclusive gua. E da boa.
No oeste do Paran, as terras frteis e as guas abundantes propiciaram, ao longo dos scu-los, a emergncia da agricultura familiar bem-sucedida. Pequenos agricultores plantavame, com o fruto de suas colheitas, sobreviviam com dignidade. A desconexo com os ciclosnaturais, o cultivo intensivo, a introduo de tecnologias e prticas que no respeitavam asespecificidades dos ecossistemas locais degradaram a terra, desagregaram a organizaosocial, geraram pobreza, desencanto, migrao, violncia.
Do reconhecimento da conexo fundamental entre gua e vida, a partir da concepo da gua como recurso
universal que estabelece a verdadeira territorialidade e cuja qualidade afeta diretamente a comunidade de vida,
a Itaipu Binacional, em consonncia com sua misso, concebe, prope e implementa, com parceiros locais, o
Programa Cultivando gua Boa, CAB.
Inspirados pelo discurso do presidente Lula na cerimnia de posse da nova diretoria de Itaipu,em 2003, em que afirmou que gua mais do que energia, gua vida, Jorge Samek (DiretorGeral), Nelton Friedrich (Diretor de Coordenao e Meio Ambiente e demais diretores, assum-iram o compromisso tico de traduzir o conceito explicitado pela maior autoridade da Repbli-ca em prtica cotidiana de gesto da gua nas reas de influncia de Itaipu.
Cultivando gua Boa, resgatando a essencialidade da gua
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Quatro eixos fundantes aliceram o programa: o en-volvimento dos atores locais para atuao em seu microespao, influenciando e sendo influenciados pelo macroterritrio; o empoderamento das comunidades como pro-tagonistas das mudanas desejadas; a aprendizagem quese d por meio de pessoas que aprendem participando eo fomento a um novo jeito de ser/sentir, produzir e consumir.
Por meio de um pacto socioambiental, embasado na
tica do cuidado, ousando inovar, desenvolvendo uma visointegrada do solo, da gua, da ecologia, da questo social eda questo cultural, o Cultivando gua Boa reconhece o ter-ritrio da bacia hidrogrfica como unidade de gesto e apopulao como protagonista do processo de construode sociedades sustentveis.
Envolve e mobiliza tericos, cientistas, polticos, estu-dantes, agricultores, proprietrios rurais, catadores de
lixo, acadmicos, lideranas populares, indgenas, jovens,crianas, aposentados em um grande movimento paradiagnosticar os problemas e buscar solues tanto nosconhecimentos tradicionais, populares, quanto na cinciae tecnologia de ponta.
Busca fomentar nos atores sociais a compreenso darelao existente entre a problemtica global e as ati-tudes locais, estabelece o nexo causal entre os problemas
que hoje enfrentamos e o modelo de desenvolvimentoadotado, as relaes entre nossas atitudes cotidianas e asmudanas ambientais globais. Evidencia a co-responsabi-lidade de todos na busca de alternativas de soluo e aimportncia das aes coletivas para a construo de umfuturo sustentvel.
Assim vai sendo construda, passo a passo, a melho-ria real, concreta, palpvel da qualidade de vida e das
condies ambientais de toda a regio.
O resgate da compreenso da gua como eixo fundamen-tal do bem-estar e do equilbrio est mudando a paisagem dooeste do Paran. Cultivando gua Boa as comunidades estoretomando seus valores essenciais, readquirindo qualidade devida, integrao social, abundncia, felicidade.
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02 Acesso gua, direito vida
Em 22 de maro de 1992 a Organizao das Naes Unidas instituiu o Dia Mundial da gua,publicando um documento intitulado Declarao Universal dos Direitos da gua, que temcomo objetivo atingir todos os indivduos, todos os povos e todas as naes, para que estes,por meio de um esforo coletivo, promovam o respeito aos direitos e deveres ali proclamados
e assumam sua aplicao efetiva.
O primeiro direito mencionado na Declarao dos Direitos Humanos das Naes Unidasassegura o direito vida, liberdade e segurana das pessoas. Nenhuma segurana, nen-huma liberdade, nenhuma vida possvel sem o acesso gua limpa e potvel.
Declarao Universal dos Direitos da gua
A gua faz parte do patrimnio do planeta. Cada con-
tinente, cada povo, cada nao, cada regio, cada
cidade, cada cidado plenamente responsvel aos
olhos de todos.
A gua a seiva de nosso planeta. Ela condio es-
sencial de vida de todo vegetal, animal ou ser humano.
Sem ela no poderamos conceber como so a atmos-fera, o clima, a vegetao, a cultura ou a agricultura.
Os recursos naturais de transformao da gua em
gua potvel so lentos, frgeis e muito limitados. Assim
sendo, a gua deve ser manipulada com racionalidade,
precauo e parcimnia.
O equilbrio e o futuro de nosso planeta dependem da
preservao da gua e de seus ciclos. Estes devem per-
manecer intactos e funcionando normalmente para ga-rantir a continuidade da vida sobre a Terra. Esse equilbrio
depende, em particular, da preservao dos mares e
oceanos, por onde os ciclos comeam.
A gua no somente herana de nossos predeces-
sores; ela , sobretudo, um emprstimo aos nossos suces-
sores. Sua proteo constitui uma necessidade vital, as-
sim como a obrigao moral do homem para com
as geraes presentes e futuras.
A gua no uma doao gratuita da natureza;
ela tem um valor econmico: precisa-se saber que
ela , algumas vezes, rara e dispendiosa e pode muito
bem escassear em qualquer regio do mundo.
A gua no deve ser desperdiada, nem poluda,
nem envenenada. De maneira geral, sua utilizao
deve ser feita com conscincia e discernimento para
que no se chegue a uma s ituao de esgotamento
ou de deteriorao da qualidade das reservas atual-
mente disponveis.
A utilizao da gua implica em respeito lei. Sua
proteo constitui uma obrigao jurdica para todo
homem ou grupo social que a utiliza. Essa questono deve ser ignorada nem pelo homem nem pelo
Estado.
A gesto da gua impe um equilbrio entre os
imperativos de sua proteo, e o planejamento
da gesto da gua deve levar em conta a solidar-
iedade e o consenso em razo de sua distribuio
desigual sobre a Terra.
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Dois temas tem tomado a pauta internacional: produo de
energia e sustentabilidade do nosso planeta. Aqui em Itaipu
trabalhamos nas duas vertentes e alteramos nossa misso. Pro-
duzir energia sim, com qualidade, mas com cuidado socioam-
biental. Mostramos na prtica como possvel compatibilizar
o desenvolvimento econmico e a produo de
energia com a preservao do meio ambiente.
Jorge Miguel Samek,Diretor Geral brasileiro da Itaipu
O rpido crescimento da populao mundial, a grandeexpanso urbanstica, a industrializao, a agricultura e apecuria intensiva, a produo de energia eltrica, o aumen-to desenfreado do consumo fizeram com que quantidadescrescentes de gua passassem a ser exigidas. Esses processos,
especialmente vorazes nos ltimos 60 anos, acrescidos de umciclo ininterrupto de poluio (para cada mil litros de gua uti-lizados outros 10 mil so poludos), tornaram a gua o recursonatural mais estratgico de qualquer pas do mundo.
Assim, h em curso uma disputa pelo controle e acesso gua potvel, movida pela lgica de que aquele que detivereste controle ter um poder de vida ou de morte sobre milhese milhes de pessoas.
Quanto mais a gua for escassa e rara, mais freqentes e
numerosos sero os conflitos e as guerras intra-nao e inter-
naes por ela. Neste contexto, gua no mais ser uma
fonte de paz e cooperao, mas de guerra e rivalidade. O fu-
turo corre o risco de ter uma economia da gua baseada em
competio pela sobrevivncia. Por isto eu sugeri a expresso
petrolizao da gua.
Professor Riccardo Petrella,doutor em Sociologia e Cincias Polticas
da Universidade de Florena, Itlia,fundador e ex-presidente do Grupo de Lisboa
A gua doce, por ser um bem cadavez mais escasso somente 0,7%
acessvel ao consumo humano ,
vem se transformando em preciosa
e cobiada commodity mundial.
Atualmente, o preo mdio da
gua encanada no mundo de
US$ 1,80 por m3.
Hoje, 1,6 bilho de pessoas tem grave
insuficincia de gua e 2,6 bilhes no
dispem de saneamento bsico. Da-
dos do International Water Manage-
ment Institute (IWMI) mostram que no
ano 2025 mais de 30% da populao
mundial,1,8 bilho de pessoas de diver-
sos pases, dever viver com absoluta
falta de gua.
Para tentar uma soluo para oproblema de desabastecimento
de gua, o Banco Mundial estima a
necessidade de investimentos entre
US$ 600 e 800 bilhes nos prximos
dez anos.
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Ciranda das guas 13
Um paradoxo cruel se apresenta na atualidade: na maioria dos pases so as populaesmais pobres que pagam mais pelo mais essencial de todos os recursos naturais. Os faveladosem Dar es Salaam pagam o equivalente a US$ 8 por 1 mil litros de gua, comprados por lata.Nessa mesma cidade da Tanznia, lares mais ricos ligados rede de abastecimento municipalrecebem a mesma quantidade por apenas US$ 0,34. No Reino Unido, o mesmo volume degua custa US$ 1,62, enquanto nos Estados Unidos custa US$ 0,68.
gua, sade e pobreza, uma equao de alto risco
Embora a quantidade de gua do planeta permanea a mesma, sua disponibilidade sofre
contnuo processo de escasseamento. Ao no encontrar mais condies de retroalimentao
em seu territrio natural, a bacia hidrogrfica, o fluxo das guas alterado drasticamente. Nas
cidades, a impermeabilizao do solo no permite a alimentao dos lenis freticos. Apesar
de ser possvel fazer a captao, reaproveitamento e uso racional da gua nos centros urba-nos, o meio rural que pode proporcionar o servio ambiental para garantir a continuidade do
ciclo essencial da gua.Jair Kotz,
superintendente de Meio Ambiente de Itaipu.
Segundo a Organizao das Naes Unidas, uma das conseqncias mais dramticas daescassez de gua potvel de boa qualidade se faz sentir na sade das populaes dos pasespobres ou das regies pobres dos pases ricos. Reflete-se na taxa de 50% de doenas e mortesque ocorrem por falta de gua ou pela sua contaminao.
No incio do sculo XXI, em um mundo cada vez mais prspero, a gua contaminada a se-gunda maior causadora de mortes de crianas em todo o mundo uma a cada 8 segundos!
Solues simples, rpidas e baratas tambm vm sendo desenvolvidas para minimizar os pro-blemas da contaminao da gua. Para alm dos benefcios diretos de diminuio de doen-as de veiculao hdrica, essas tecnologias representam ganho ambiental e reduo decustos para as famlias, uma vez que no demandam combustvel para ferver a gua.
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Solarizao
O mtodo de solarizao da gua, prtica bastante antiga, embora pouco difundida, utiliza-se do efeito sinergtico da aplicao de radiao UV e calor para eliminar patgenos veicula-dos pela gua. ideal para a desinfeco de pequenas quantidades para o consumo humanoem nvel residencial. O tratamento pela solarizao consiste apenas em deixar a gua ao solpor um dia inteiro. Aps esfriar, a gua est pronta para ser ingerida, sem alterao qumica,nem de odor ou sabor.
Diversas experincias na regio amaznica, que especialmente privilegiada para a solar-izao da gua, uma vez que as temperaturas so normalmente elevadas e a incidncia deradiao UV mais intensa pela proximidade da regio do Equador, se utilizam desta tecnolo-gia social com excelentes resultados.
possvel combater doenas, cuidar da terra e da gua egerar renda s comunidades?
A partir de uma pesquisa na Bacia do Paran 3 sobre as doenas que mais afetavam apopulao, o Programa Plantas Medicinais fruto de parceria entre a Itaipu Binacional, univer-sidades, ONGs, associaes e prefeituras, identificou, por meio de estudos cientficos, osfitoterpicos comprovadamente eficientes para tratar dessas enfermidades.
SO
DIS
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Ciranda das guas 15
A partir da criao de um ervanrio, em 2005, com uma estrutura completa para secageme produo de fitoterpicos, passaram a ser montados kits com 18 tipos de plantas medici-nais, que servem para o tratamento das 10 doenas mais comuns da regio.
Foram realizados programas de sensibilizao para o pblico usurio e programas decapacitao para os profissionais de sade do Sistema nico de Sade (SUS), para onde oskits so enviados.
Quando as barreiras do desconhecimento so vencidas percebe-se que a adoo dosfitoterpicos traz inmeras vantagens para o sistema pblico de sade e para os usurios quepassam a dispor de remdios naturais, de alta eficcia a custo zero.
O programa tem como foco estabelecer uma cadeia de produo junto agricultura fa-miliar, como alternativa de renda. Como a produo de fitoterpicos precisa ser obrigatoria-mente orgnica, ela estimula o agricultor a adotar prticas conservacionistas e assim ir, aospoucos, abandonando a monocultura, os insumos qumicos, a contaminao e o desperdciode gua em sua propriedade.
PLANTASMEDICINAISUtilizao de PlantasMedicinais na ateno sade
Profissionaisde sade
MerendeirasNutricionistas
Rede deAgricultoresOrgnicos
Beneficiamento
Cultivo
Cursos deCapacitao
Cursos deCapacitao
Medicamentos
Programa de Sadeda Famlia (PSF)-Protocolos-Mdicos-Dentistas
-Nutricionistas-Farmacuticos
COMIT GESTORPrefeituras, pastorais,universidades, escolas.profissionais de sade,associaes e outrasentidades afins (ACIENS,SUSTENTEC, YANTEN)
-Escolas-Creches-Comrcio
Capacitaoe Assistncia
tcnica
-Ch desidratado-In natura-Extratos-Fitoterpicos
Alimento
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Ciranda das guas16
Para a totalidade das naes indgenas,rios, cachoeiras e mares fazem parte de umnico corpo onde se conectam com o sol,a lua, as rvores, os animais, os homens.
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3. gua, significados e transcendncia
A gua exige uma abordagem complexa, tanto por sua natureza fluida como por ser umelemento vital e sagrado para a vida, ou ainda por inter-relacionar as atividades humanas
entre si e com a natureza. Talvez por isso mesmo se converta no melhor indicador da relao
que os seres humanos estabelecem entre si e com o ambiente.Ramn Vargas,
gelogo, especialista em hidrologia e em hidrogeologia,
autor de A cultura da gua: lies da Amrica Indgena
A gua constitui uma das metforas mais significativas do Universo e da sacralidade de todaa vida. Como no cuidar dela? A percepo desta fundamentalidade determinada pelastradies culturais de cada comunidade, que, por sua vez, so definidas por fatores como asituao geogrfica, a abundncia ou escassez dos recursos hdricos, o acesso a eles e o est-gio de desenvolvimento da regio.
Nas diversas crenas espirituais, seus usos e representaes so mltiplos. Centram-se na sim-bologia do nascimento, renascimento e purificao, mas esto presentes em metforas de
foras de guerras, de proteo e em rituais de morte.
Sua imagem mais comum da pureza, de fora libertadora do pecado e da sujeira. Limpao corpo e os sinais externos de impureza. Esse poder de purificao lhe confere um status sim-blico, sagrado.
Indcios da gua como instrumento para a adorao religiosa na Europa Ocidental esto pre-sentes na Idade do Bronze (3000 a.C.) e remontam ao longnquo perodo Neoltico (8000 a.C).
Para o cristianismo, a imerso na gua viva, o batismo (conforme a Bblia), simboliza o renas-cimento e a libertao do pecado. A gua benta espargida pela casa a protege de todos osespritos do mal.
No hindusmo, todas as formas de gua so sagradas; o rio Ganges, na ndia, o mais sagradode todos os rios, possibilita o paraso a quem nele se banha ou a quem tem suas cinzas neleespalhadas.
A gua est presente nos rituais funerrios do budismo, hindusmo, judasmo e islamismo.
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O shintosmo particularmente conhecido por suas cren-as no esprito da gua, ou suijin, encontrado nos lagos, mares,fontes, poos. Aparece como serpente, drago, peixes, tar-taruga, podendo at mesmo assumir a surpreendente formade uma bactria que vem purificar as guas poludas.
No Brasil, Iemanj, a rainha do mar, tambm conhecidapor dona Janana, Ina, princesa de Aioc e Maria, noparalelismo com a religio catlica, simboliza o reino mis-
terioso das guas, o fascnio e o temor que elas exercem,desde sempre, sobre os humanos.
Nos cultos afro-brasileiros, proliferam os orixs da guadoce como Oxum, Ob, Eu, Loguned, Oxumar, Nana,Iemanj que no Brasil passou a ser do mar... Na umbanda,alm dos orixs, ainda h outras entidades ligadas gua,como a cabocla Janana, o caboclo Ogun Beira-Mar, asereia do mar, a pombagira Mara, os marinheiros.
Iara, que vive nas guas das matas brasileiras, revestidada mesma simbologia. Encanta os ndios com seu canto tolindo como o do uirapuru, sua face bela como a lua. Buscasempre os mais destemidos guerreiros de uma tribo, nelesdespertando paixo fatal que mina suas foras e finda porlev-los consigo ao fundo dos rios e lagos.
A mitologia dos ndios ianommi diz que o Grande Pai
gerou a mulher e seus filhos no mistrio das guas e lhesdeu cachoeiras para habitar, terras frteis e abundantesque lhes permitiam sobreviver e se multiplicar.
Para a totalidade das naes indgenas, rios, cachoeirase mares fazem parte de um nico corpo onde se conectamcom o sol, a lua, as rvores, os animais, os homens.
No registro de inmeros relatos na histria da humani-
dade, nos deparamos com grandes inundaes varrendoda face da Terra vidas humanas, vegetais e animais.Somente a interveno e o perdo dos deuses podemevitar a extino total.
O papel que a gua exerce na mitologia perpassadiversos aspectos da vida, desde a criao at a vida ps-morte, sendo vista ora como fonte de vida, ora como umafora destrutiva inquestionvel e invencvel.
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4. Abundncia de gua,uma ddiva?
Em nosso pas de guas abundantes e serenas, ela mais comumente vista como umaddiva de Deus e, portanto, a Ele e a todos seus santos, que recorrem as mais diversas co-munidades do pas quando acontecem alteraes no ciclo das chuvas;
Quando os crregos esto secos, as comunidades rurais e urbanas, em procisso de penitn-
cia, na cidade e nas comunidades rurais, cantam, oram, invocam os santos em ladainha.
Meu Pai, meu Senhor,/ de ns tenha d
que a seca est grande/ j est tudo em p.
J est tudo em p/ perdoai, Senhor,
o que ser de ns/ sem vosso favor.
Sem vosso favor/ morremos de fome.
Na casa dos pobres,/ j no se come (...)
Bom Jesus, a vossos ps a tristeza nos conduz.
Pelas vossas cinco chagas, dai-nos chuva,
Bom Jesus.
Minha Santa Catarina, ela do altar do cu,
dai-me uma gota dgua, pelo amor de Deus.
So Sebastio, ele do altar do cu,
dai-me uma gota dgua, pelo amor de Deus (...)
Eu vi o sol tremer, a lua balancear
alevanta sua bandeira, meu Jesus,deixa a chuva derramar (...)
Sem a gua no h vida,
Oi meu Santo Antnio, eu quero gua.
gua de beber, gua de lavar.
Meu Santo Antnio, eu quero gua.
Meu Deus, eu quero gua.
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A Festa do Bonfim, ou Lavagem do Bonfim, revela toda asignificncia da gua para a expresso da religiosidadepopular. Em uma celebrao que une devotos do catoli-cismo, da umbanda e do candombl em Salvador, na Bahia,acontece uma impressionante e mpar demonstrao de
sincretismo religioso.
Um tradicional cortejo de baianas sai da Igreja de NossaSenhora da Conceio da Praia e, a p, percorre 8 quilmet-ros at o alto do Bonfim, carregando vassouras e gua decheiro perfumada com alfazema, flor de laranjeira ou per-fume destilado para lavar, ao som de atabaques e cnticos,as escadarias da Igreja de Nosso Senhor do Bonfim, ou Oxal,sua correspondncia nos ritos afro-brasileiros.
Reconhecer a simbologia e a transcendncia da gua de
grande valia para o sucesso de programas de fomento ag-
ricultura orgnica familiar. A realidade e a espiritualidade das
famlias do campo so muito afinadas com as da Bblia. No fi-
nal do ltimo livro, o Apocalipse, surge a viso do rio que brota
do trono de Deus, em ambas as margens, cresce a rvore da
vida, produzindo cada ms o seu fruto, e suas folhas servem
para curar as naes. Em vrias parbolas do Evangelho, Je-
sus compara Deus com o agricultor que zela pela terra e
pela gua.
Andr De Witte,bispo de Ruy Barbosa, presidente do Instituto Regional da
Pequena Agropecuria Apropriada (IRPAA).
Muitos centros de romaria no Bra-sil, como em Bom Jesus de Iguape,
Bom Jesus do Matozinhos, Canind,
tm alguma fonte ou gua santa,
onde os romeiros bebem gua,
enchem garrafas, lavam o rosto
e at tomam banho para se puri-
ficar e se curar. Fontes milagrosas
se espalham por toda a Bahia, em
Porto Seguro, Candeias, Ilhus.
PauloHenriq
ueZioli
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Os santos que regulam as guas
Na cultura popular do Brasil h um santo ou uma divindadepara cada ocasio e para cada necessidade. Na culturapopular os fatos bblicos so comemorados em festa e ritos.Assim So Pedro, que era pescador, determina os ciclos dachuva. Todo dia 29 de junho h uma grande festa em sua
homenagem com procisses fluviais por todo o pas. Na vsperada festa de So Joo, sua imagem lavada no ribeiro dopovoado onde os fiis tomam banho e cantam:
So Joo batizou Cristo.
Cristo batizou Joo.
Ambos foram batizados
Nas guas do rio Jordo.
Santa Clara a protetora das lavadeiras, que em dias dechuva oferecem farinha para os patinhos de Santa Clara oulinguia, ovo e sabo, pedindo para o tempo clarear. H osque jogam um pedacinho de sabo ou traam uma cruz desal no telhado ou ainda desenham um sol de sal no terreiro eoferecem santa uma Ave-Maria.
Embora o folclorista Lus da CmaraCascudo afirme que Saint Clair, bispo
de Nantes (sc. III), e no Santa Clara,
teria sido inicialmente o padroeiro
que dissipa nevoeiros e d vista aos
cegos, pelo Brasil afora muitas lava-
deiras e mes de famlia rezam:
Santa Clara, dai o sol/ pra enxugar
nosso lenol.
Em Campo Grande (MS), Ayd Ricardo
de Oliveira reza para cessar a chuva:
Santa Clara clareia o sol/ para eu se-
car o meu lenol.
Em Urucuca (BA, 2002), Eudilce S. dos
Santos canta:
Santa Clara clareou,/ So Domingos
iluminou/ vai a chuva, vem o sol/ pra
enxugar o meu lenol.
Em Diamantina (MG) dizem:
Santa Clara traz o sol/ pra enxugar
nosso lenol.
No Nordeste registramos:
Santa Clara manda o sol, So Lou-
reno manda o vento pra enxugar os
paninhos do Santssimo Sacramento.
Santos tecnolgicos
O paulista nissei Takeshi Imai diariamente observa o cu em busca de nuvens para semear gua e fazer chover.
Fabricante de mquinas agrcolas e inventor de equipamentos de todos os tipos, Imai comeou suas pesquisas sobre
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chuva h 31 anos. Hoje, semea gotas coletoras de gua pura, de tamanho controlado, em nuvens pr-selecionadas
por um radar meteorolgico e faz chover, contribuindo para a mitigao da estiagem prolongada em reas muitosensveis como os mananciais de abastecimento das grandes cidades, em reas agrcolas, em usinas hidroeltricas.
A tecnologia usa apenas gotas dgua, dispensando os componentes qumicos usados nas primeiras chuvas artifi-
ciais nos Estados Unidos, no fim da dcada de 1930, e cujo uso se prolongou at a dcada de 1980 quando foram
definitivamente proibidas por causar doenas pulmonares.
A tcnica empregada na rea dos Sistemas Cantareira e Alto Tiet da Companhia de Saneamento Bsico do
Estado de So Paulo (Sabesp), responsvel pelo abastecimento de 14 milhes de pessoas; nas regies agrcolas
de Santa Catarina,do oeste do Paran, de Gois e da Bahia, alem de prevenir a ocorrncia de incndios florestais
no Parque Nacional da Diamantina,
A abundncia de gua transborda noimaginrio brasileiro
Perto de muita gua tudo feliz.Guimares Rosa,
escritor.
A histria do Rio So Francisco na cul-
tura nordestina, se liga diretamente
So Francisco de Assis, o santo dos
pobres, como conta seu Di:
No tempo antigo, Jesus reuniu seus
doze apstolos e presenteou-os, dis-
tribuindo entre eles as muitas riquezas
da terra. Quando So Francisco che-
gou ao cu, Jesus quis tambm pre-
sente-lo. Ofereceu ao santo de sua
estima um grande rio, nica riqueza
ainda no distribuda, e disse-lhe:
Este ser o rio de So Francisco!
O santo recebeu o presente com
muita alegria e perguntou a Jesus
se poderia fazer com ele o que
quisesse. Satisfeito com a resposta
afirmativa, percorreu toda a beirado rio e distribuiu bilhetes convo-
cando o povo para reunir-se na
serra da Canastra. Todos reunidos,
So Francisco abenoou o rio de
seu nome e entregou-o aos pobres,
para que habitassem as suas mar-
gens e dele pudessem viver.
Ao final da reunio, muito solene,
o santo proferiu esta sentena:Quem na beira do rio So Francisco
viver, rico no h de ser, mas de fome
e sede no h de morrer e mais de
uma camisa no h de ter!
Deocleciano Francisco dos Santos,
Ilha Nova Esperana, municpio de
Manga, MG, 1995.
A grandeza e o volume de gua dos rios e cachoeiras brasileirosimpregnaram nossa cultura com a idia da abundncia degua. De fato, o Brasil um pas privilegiado, pois aqui est 12%de toda a gua doce do planeta. Aqui tambm se encontramo maior rio do mundo o Amazonas e um dos maiores reser-vatrios de gua subterrnea do planeta o Sistema AquferoGuarani (SAG).
No entanto, os grandes conglomerados humanos em nossopas no se estabeleceram de acordo com a distribuio dagua; 70% das guas doces do Brasil esto na Amaznia, ondevive apenas 7% da populao. A regio nordeste, bastantehabitada, dispe apenas de 3% da gua doce do pas. EmPernambuco h apenas 1.320 litros de gua por ano por habi-tante e no Distrito Federal essa mdia de 1.700 litros, quandoo recomendado so 2 mil litros.
Tanto quanto inspirar religies e mitos, a gua tambm servecomo tema e estmulo para diversas manifestaes artsticas.Em msica e literatura tema recorrente. representada nasartes de inmeras maneiras; alguns artistas tentam retrat-laem movimento, sob a forma de correnteza de rio ou de ca-choeiras, outros a representam calma e serena, outros aindaa expressam em cor, forma e som, reforando mitos, lendas ecrendices da cultura popular.
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No Pantanal, os mistrios, mitos e lendas
das guas povoam o cancioneiro, a litera-
tura, a pintura, o artesanato, o folclore.
A vida das comunidades e a atividade
produtiva so reguladas pelo ciclo de
cheias e vazantes; a culinria farta de
peixes, a vida corre mansa como as guas
plcidas das terras midas.
Na Amaznia, a abundncia das guas
transborda na cultura colorida de penas
e contas, peixes e frutos, se apresenta em
toda sua grandeza nas lendas, mitos, fes-
tas populares, rituais em toda regio Norte
de nosso pas.
O guardador de guas
Trecho do poema de Manoel de Barros, escritor sul-mato-grossense
Eles enverdam nas auroras.
So viventes de ermo. Sujeitos
Que magnificam moscas e que oram
Devante uma procisso de formigas...
So vezeiros de brenhas e gravanhas.
So donos de nadifnido.
(nadifndio lugar em que nadas...
o nada destes nadifndios existe e se escreve com letra
minscula).
Se trata de um trastal.
Aqui pardais descascam larvas.
V-se um relgio com o tempo enferrujado dentro.
E uma concha com olho de osso que chora.
Aqui, o luar desova...
Insetos umedecem couros
E sapos batem palmas compridas...
Aqui as palavras se esgaram de lodo.
O Plano Amaznia Sustentvel (PAS), iniciativa do governo federal, tem o objetivo de implementar um outro modelo
de desenvolvimento para a regio, aliando o respeito ao meio ambiente e a melhoria socioeconmica das co-
munidades locais. Tem como estratgias o respeito ao patrimnio cultural, ao conhecimento local e valorizao
dos ativos ambientais da floresta.
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O espetculo da gua transfor-mada em energia e da energia
em desenvolvimento e melhoria
da qualidade de vida das popu-
laes do Brasil e do Paraguai. O
vertedouro, quando h gua sobrando,
forma uma cachoeira com uma
vazo equivalente a at 40 vezes
as Cataratas do Iguau.
Patrimnio cultural da humani-
dade (Unesco), as Cataratas do
Iguau so o maior conjunto de
quedas-d gua do mundo com
275 saltos que se estendem por2.700 metros dentro de um parque
de 250 mil hectares de mata into-
cada.
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5. A cultura da escassez...
gua de jegue ou de caminho pipa uma reali-
dade que est sendo deixada para trs nas reas de
seca em nosso pas. A construo de barraginhas, o
programa Um Milho de Cisternas da Articulao do
Semi-rido com apoio do governo federal, os progra-mas de Agricultura Familiar Orgnica com Irrigao
vm criando uma nova cultura no semirido, a de
que possvel conviver com o clima. Resgatando
conhecimentos tradicionais, acoplando-os pesqui-
sa e cincia avanada, programas e projetos que
plantam gua so promovidos por governos, empre-
sas, sociedade civil e universidades e tm melhorado
significativamente os ndices de desenvolvimento hu-
mano na regio.
Os infelizes tinham caminhado o dia inteiro, estavam cansados e famintos...
A caatinga estendia-se de um vermelho indeciso salpicado de manchas brancas que eram
ossadas...
Miudinhos, perdidos no deserto queimado, os fugitivos agarraram-se, somaram as suas desgra-
as e os seus pavores.
Graciliano Ramos,escritor, in Vidas Secas,1938.
Nas regies semiridas, no serto e nas periferias das cidades, o convvio com a escassez e
a pssima qualidade da gua por dcadas, amalgamaram a cultura dessas comunidades,alimentaram a saga da busca, as migraes, o voto em troca de algumas latas do lquido vitale tantos outros horrores fartamente descritos na literatura sertaneja. A distribuio de gua foidurante muito tempo arma poltica de governantes corruptos. Transformada em mercadoria, oacesso a ela era trocado por votos.
Mas no s na regio semirida que encontramos situaes de estresse hdrico.
Mesmo em regies de grande pluviosidade, como a rea de influncia de Itaipu Binacional(1.500 mm/ano), a escassez j se faz presente em razo da degradao dos elementos essen-ciais para a manuteno dos fluxos ambientais.
A situao de degradao a que chegaram os recursos hdricos no Brasil e no mundo apontapara uma profunda crise que traz em seu cerne a inconsistncia de nosso modelo civilizatrio.
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Predatrio dos recursos naturais, desigual e excludente, o modelo tem como consequncia aescassez, mesmo quando e onde a natureza foi abundante.
O comprometimento da qualidade de vida, da sade e da segurana alimentar das comu-nidades sem acesso gua limpa, as doenas de veiculao hdrica que afligem milhes depobres em nosso pas e em todos os cantos do mundo so parte de uma triste realidade quecomea a ser alterada.
No Brasil, um movimento virtuoso busca construir outro paradigma de desenvolvimento. Inicia-
tivas pioneiras e integradas tm contribudo para alterar significativamente as arraigadas prti-cas de troca de favores das comunidades com polticos inescrupulosos, imprimindo mudanasimportantes na cultura da escassez.
Para alm da liberdade poltica, o acesso gua de boa qualidade melhora as relaes degnero e a frequncia escolar, libertando mulheres e crianas da funo cotidiana de usargrande parte de seu tempo na busca por gua, em locais cada vez mais distantes.
Programas como Cultivando gua Boa so essenciais para alterar significativamente a
relao de empresas e governos com os municpios e as comunidades. Saindo de seu papelde cone regional e provedora de benesses, a Itaipu Binacional exerce hoje um papel eman-cipatrio no fomento do desenvolvimento local sustentvel em sua rea de influncia. A em-presa passa a se relacionar diretamente com os atores sociais de forma circular e participativa,gerenciando conflitos, empoderando lideranas, administrando expectativas, estabelecendoparcerias, estimulando protagonismos.
O programa Cultivando gua Boa, que um movimento pela sustentabilidade na BP3, demon-
stra que, em parceria com todos os atores sociais, organizaes pblicas e privadas,instituies de ensino, ONGs, associaes e moradores das microbacias, possvel promover
um novo modo de ser/sentir, de viver, de produzir e de consumir.
Nelton Miguel Friedrich,Diretor de Coordenao e Meio Ambiente da Itaipu
A instalao de cisternas pode significar muito mais
do que melhorar o acesso gua, pode gerarconhecimento ambiental fomentando a reflexo
das comunidades sobre sua relao com a gua,
sobre o uso racional e o combate ao desperdcio.
O Programa Cultivando gua Boa trabalha com a
instalao de cisternas, principalmente em escolas,
como uma ferramenta ecopedaggica.
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6. Cultivando gua Boa,um exemplo para o mundo
Em meus mais de 30 anos de atividade cientfica e profissional nunca me havia encontradocom uma viso to ampla e to bem articulada de como enfrentar os problemas e as pro-
blemticas socioambientais para alcanar uma sociedade e um ambiente melhor no futuro.
O Cultivando gua Boa um claro exemplo de globalizao racional de um programa
sem fronteiras e que, a meu ver, teria que ser considerado em seus princpios, em seus
fundamentos e em sua articulao racional como referncia por parte dos governos e das
instituies internacionais.Roberto Spandre,
hidrogeolgo ambientalista da Universit di Pisa, Itlia.
O Programa Cultivando gua Boa, que um sucesso desde a sua concepo, mostra que
o envolvimento de governos, sociedade e iniciativa privada, na busca de solues para os
problemas, como a perda da biodiversidade, o aquecimento global e a contaminao dos
recursos hdricos, traz resultados significativos. Com essa equao, todos tm a ganhar... Na
busca pela sustentabilidade, governo e sociedade precisam andar de mos dadas. Modelos
como esse, desenvolvido pela Itaipu Binacional, podem e devem ser replicados como exemplo
de compensao ambiental.Carlos Minc,
ex-ministro do Meio Ambiente
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A gua a portadora e a matriz da vida e, consequentemente, a proteo deste recursonatural vital crucial para a criao de comunidades humanas sustentveis. A grande con-
quista da Itaipu Binacional tem sido reconhecer a conexo fundamental entre gua e vida e
implementar essa realizao na prtica diria de gesto cuidadosa da gua.Fritjof Capra,fsico, escritor e ativista ambiental
O Cultivando gua Boa trabalha de maneira descentralizada na microbacia e na organiza-
o das comunidades. um exemplo concreto da aplicao dos princpios e dos fundamentos
da Poltica de recursos hdricos. Por isso tenho dado como exemplo o Cultivando gua Boa
para outras regies do pas como uma experincia concreta que pensa a bacia hidrogrfica
como um todo e que tem uma ao local muito forte. O programa, sem dvida, um ex-
celente carto de visitas do Brasil para o mundo em termos de uma ao concreta em defesa
das guas.Joo Bosco Senra,
ex-secretrio de Recursos Hdricos do Ministrio do Meio Ambiente.
s vezes, as pessoas acham que o Cultivando gua Boa tornou-se uma referncia emblemti-
ca para a gesto das guas s por causa dos recursos financeiros da Itaipu. Claro que issoconta, importante e exemplo de ancoragem de projetos e aes socioambientais para
outras empresas e instituies pblicas. Mas, o grande diferencial do Cultivando gua Boa
justamente o compromisso filosfico e poltico-institucional com um novo jeito de ser, pensar e
sentir que os gestores da Itaipu conseguiram traduzir, compartilhar e desenvolver junto com as
comunidades e parceiros institucionais da Bacia do Paran III, elegendo a gua como tema
gerador e integrador de uma nova frente de desenvolvimento humano e econmico em bases
ambientalmente sustentveis. Os recursos que a Itaipu e toda a rede de parcerias disponibilizapara o Programa so apenas conseqncia dos compromissos filosficos e polticos que se ma-
terializam por meio de uma metodologia inclusiva, democrtica, participativa e emancipatria
que alicera o ProgramaFranklin de Paula Jnior,
gerente da SRHU/MMA)..
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2009Prmio ECO AMCHAM Camara Americana de ComercioPrmio Von Martius de SustentabilidadeSelo Ouro Empresa Amiga da Fauna (Instituto Ambiental do
Paran e Secretaria Estadual de Meio Ambiente).Prmio Benchmarking Ambiental para o projeto de Educao
Ambiental do Programa Cultivando gua Boa.
2008Prmio Destaque Nacional de Responsabilidade Socioambiental
Empresarial, concedido pelo Instituto Ambiental Biosfera.Prmio Ecologia e Ambientalismo, concedido pela Cmara dos
Vereadores de Curitiba.Destaques no Prmio de Responsabilidade Social de Turismo
destinado a empresas privadas e ONGs pelo Ministrio do Turismo,Fundao Getlio Vargas e Childhood Brasil.
2007Prmio Benchmarking Ambiental Brasileiro (eleito melhor ao
ambiental do Brasil).Prmio Av-Guarani de Turismo na categoria rgo Pblico
Investidor no Setor Turstico.Diploma do Simpsio da gua de Cannes (conhecida como
capital mundial da gua), em razo da parceria estabelecidacom a Rede Internacional de Gesto dos Conflitos Ambientais.
2006Prmio Coge (Comit de Gesto Empresarial).Prmio Abes (Associao Brasileira de Engenharia Sanitria
e Ambiental).
2005Prmio do Evento Carta Terra + 5 (Earth Charter + 5) em
Amsterd: Prmio Carta da Terra Mximo T. Kalaw Jr.
Prmio Expresso de Ecologia Ambiental, na categoria de Edu-cao Ambiental (este prmio foi criado pela Editora Expressologo aps a Eco-92).
2004Prmio FAE/FIEP (de Responsabilidade Social).
Reconhecimentose premiaes
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Para viver melhor preciso mudar
Para a Itaipu Binacional avanar em direo construo de um paradigma de sustentabilidadesignifica ir muito alm de mitigar e corrigir passivos ambientais. Trata-se de usar sua imensa forapara contribuir com a mudana de valores da sociedade como um todo.
Isso significa sensibilizar, inspirar, animar e capacitar a populao local, estimulando umarelao harmnica entre o ser humano, a natureza e seus recursos, fomentando alternativas
para a produo sustentvel, facilitando o acesso a tecnologias inovadoras, incentivando mu-danas nos hbitos de produo, consumo e descarte.
Tomando como base os valores expressos na Carta da Terra, no Tratado de EducaoAmbiental para Sociedades Sustentveis e Responsabilidade Global, na Agenda 21 e nas Metasdo Milnio, a Itaipu Binacional alicera o programa na fora da participao das comunidades.
Para tanto, promove aes de sensibilizao, mobilizao e capacitao, envolve os maisdiversos atores para que juntos gestem projetos coletivos, estabeleam alianas, conectem
aes locais com problemticas globais, reconheam problemas e limitaes, busquemalternativas de soluo, alimentem sonhos e utopias.
O programa se ancora na misso da empresa, em seu poder de transformao, no impactoque suas aes podem ter para a construo de sociedades sustentveis; est embasado emuma viso sistmica, holstica e tem como grande objetivo promover novos modos de ser esentir, viver e produzir e consumir nos habitantes da Bacia do Paran 3, por meio da aplicaode metodologias inovadoras de gesto, educao e ao ambiental.
Gerar energia eltrica com qualidade, com responsabilidade social e ambien-tal, impulsionando o desenvolvimento econmico turstico e tecnolgico sus-tentvel no Brasil e no Paraguai.
Misso da Itaipu Binacional
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Trata-se de uma verdadeira revoluo cultural, substituindo os velhos hbitos decorrentesda iluso de que os recursos naturais so inesgotveis por prticas sustentveis como areciclagem, o tratamento de efluentes, a recomposio das matas ciliares, a substituio daagricultura tradicional, altamente dependente de agrotxicos, por tcnicas agroecolgicas,a proteo da biodiversidade, entre outras.
Como que se faz?
O elemento gua, principal ativo da Itaipu Binacional, o foco das atenes e preocupaesda empresa.
O reservatrio da hidreltrica, com 176 km de comprimento, estoca permanentemente 29bilhes de m3 de gua e utilizado para mltiplas finalidades, alm da gerao de energia:lazer, turismo, pesca e abastecimento pblico.
Por meio do monitoramento da qualidade das guas do reservatrio de Itaipu, foramidentificadas cinco situaes crticas que poderiam por em cheque o cumprimento da missoda empresa: assoreamento, eutrofizao, presena do mexilho dourado e de agrotxicos,
desmatamento e usos mltiplos do reservatrio.
Tais problemas no se restringiam s reas dos municpios lindeiros, mas tinham incio a partirdos afluentes, evidenciando que para realizar com eficincia a gesto ambiental, havia quese tomar como referncia a unidade de planejamento da natureza: a bacia hidrogrfica.
Por essa poca, a Itaipu Binacional passa a considerar a bacia hidrogrfica, suas sub-baciase microbacias, como lcus de suas aes. Surge ento o Programa Cultivando gua Boa,cujo territrio a Bacia Hidrogrfica do Paran 3.
A Bacia Hidrogrfica do Paran
3 tem 8 mil km2 e pode ser sub-
dividida em 13 sub-bacias: Rio
Bela Vista, Guabiroba, So Joo,
So Vicente, So Vicente Chico,
Moinho, Dois Irmos, So Francisco
Falso, So Francisco Verdadeiro,
Branco, Guau, Aliana e Tatu,
envolvendo 28 municpios que jun-
tos somam aproximadamente 1
milho de habitantes.
Rios da bacia: So Francisco Ver-
dadeiro, Arroio Guau, So Fran-
cisco Falso, Oco, So Vicente, rio
do Passo Cu.
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Concebendo a gesto do programaA questo crucial que se colocava frente amplitude de um programa como o Cultivando
gua Boa, composto por inmeras variveis e que atinge milhares de pessoas em situaes ab-solutamente diferenciadas, referia-se escolha de metodologias e ferramentas sistmicas ino-vadoras e participativas que pudessem abarcar a complexidade e a diversidade intrnsecas aoprograma e, ao mesmo tempo, possibilitar sua gesto de forma profissional, eficiente e eficaz.
O Programa Cultivando gua Boa adotou uma forma descentralizada e participativa de
gesto, que respeita a organizao da natureza e reconhecida como unidade de planeja-mento e gesto dos recursos hdricos no Brasil pela Lei n 9.433 de 1997. Ou seja, a gesto porbacia, sub-bacia e microbacia hidrogrfica.
Vejamos, pois, os eixos estruturantes do Cultivando gua Boa:
Gesto por programas por meio da implantao do conceito da matricialidade, o programaimprimiu uma mudana profunda de papis nos gestores dos programas e projetos, desenhando no-vas relaes de poder entre eles; disponibilizou ferramentas inovadoras para enfrentar o desafio
da gesto descentralizada; fomentou o desenvolvimento de novas competncias necessriaspara a elaborao de projetos passveis de materializar expectativas, objetivos e aspiraes dopblico-alvo, considerando-o sujeito da ao educativa;
Gesto participativa a Itaipu passou a ter uma relao direta com os atores sociais da baciahidrogrfica, deslocando o tradicional eixo de poder baseado em relaes interinstitucionaismonopolistas e centralizadoras para uma relao descentralizada, circular e participativa. Essamudana no eixo da relao reforou a necessidade de desenvolver habilidades que permitis-sem lidar com a diversidade dos atores sociais regionais, de interpretar suas necessidades edemandas, de gerenciar conflitos, de estabelecer parcerias, de fomentar o surgimento de lideranasautnticas, de compreender e difundir o conceito da corresponsabilidade, de inspirar e geren-ciar processos de negociao;
Gesto por bacia hidrogrfica esta opo teve como decorrncia a ampliao do ter-ritrio de abrangncia de Itaipu, ampliando sua interface com municpios no lindeiros, comcaractersticas diversas, sem uma relao dialgica com a empresa. Isso exigiu novas posturaspolticas da empresa, a construo de um conhecimento regional mais amplo e a adequa-o do seu discurso, baseando-o em uma linguagem coerente com os princpios e valores doprograma. Foi necessrio tambm desenvolver uma capacidade de negociao capaz deequalizar expectativas, sentimentos e necessidades no estabelecimento de suas novas parce-rias institucionais;
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Gesto de sistemas de produo mais sustentveis exigiu o desenvolvimento de novos conheci-mentos tcnicos, de mercado e de cadeia produtiva agropecuria, da capacidade de inter-locuo com o segmento da agricultura familiar, de conhecimento das polticas pblicas federal,estaduais e municipais para o setor, alm de competncia para desenhar, implementar, co-ordenar e controlar tais processos;
Gesto para a sustentabilidade de segmentos vulnerveis demandou uma coordenaoque, para ser aceita, fosse legitimada por uma significante histria de vida, por sua trajetrianos movimentos sociais, com capacidade de resilincia e inteligncia emocional, capaz deestabelecer dilogo a partir da virtude de saber ouvir, interpretar e respeitar os modos de ser eviver de populaes em situao de risco ou excludas socialmente;
Articulaes institucionais para difuso, intercmbio tcnico e replicabilidade das aes e
metodologias demandaram viso e interpretao sistmica, organizao e capacidade desntese, capazes de abarcar as diversas realidades. Implicaram em desenvolver um arcabouosignificativo de conhecimentos conceituais e tcnicos e em fomentar habilidade de inter-locuo com diferentes nveis sociais em escala nacional e internacional.
Para o xito de iniciativa dessa complexidade foi preciso deslanchar um amplo e contnuoprocesso interno empresa proponente que contemplou todos os partcipes do programa,desde seus gestores at seu pblico-foco, em um movimento dialgico de concepo, imple-mentao, avaliao, correo, replanejamento e nova implementao.
O Papel de Itaipu
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Esforos
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Para a implantao do CAB nas comunidades, a partir dos eixos estruturantes, foidesenvolvida uma metodologia que obedece s seguintes etapas:
1.Seleo da microbacia: feita a partir do dilogo com a comunidade, autoridades e lider-anas locais.
2.Sensibilizao das comunidades: encontros para dilogo, reflexo e tomada de conscin-cia sobre a problemtica socioambiental que vivemos com nfase nas questes locais, apre-sentando a proposta do Programa.
3.Criao do Comit Gestor da Bacia: formado por representantes dos diversos programassocioambientais da Itaipu, representantes dos governos municipal, estadual e federal, cooperati-vas, sindicatos, entidades sociais, universidades, escolas e agricultores.
4.Oficina de Futuro: processo de planejamento participativo da comunidade na sua microba-cia, que identifica os problemas socioambientais locais, traduz suas aspiraes e elenca aese compromissos baseados na tica do cuidado
5.Convnios, acordos e termos de compromisso: aps a concluso da Oficina, com a as-sinatura do Pacto das guas, a Itaipu, a prefeitura e demais parceiros assinam os convnios eoutros instrumentos em que so estabelecidas as condies e as contrapartidas das partes paraviabilizar a execuo das aes de correo dos passivos ambientais.
6.Ajuste de parcerias: antes da execuo das aes, so realizados encontros entre os par-ceiros para que sejam feitos ajustes referentes participao de cada um.
7.Futuro no Presente: ao de sensibilizao promovida durante e aps a execuo dosprojetos, para despertar o cuidado com o patrimnio natural que est sendo recuperado, en-fatizando o papel do Comit Gestor como espao legtimo para o planejamento, execuo,monitoramento e proposio de aes para a melhoria contnua da qualidade socioambientaldas bacias hidrogrficas.
As aes, definidas e realizadas em parceria com a comunidade, seguem uma metodolo-gia de planejamento e execuo baseados na elaborao do Diagnstico Ambiental da mi-crobacia, de forma a apontar as aes necessrias tanto coletivas (como a proteo e isola-mento das matas ciliares) quanto individuais (correo de passivos especficos dentro de umapropriedade rural).
Com base nos dados levantados, passa-se a fase de elaborao dos Planos de Controle Am-biental (PCAs) para as propriedades rurais.
Posteriormente realiza-se o Diagnstico dos Sistemas de Produo da unidade familiar, a elabo-rao do seu Plano de Desenvolvimento Sustentvel e a elaborao dos instrumentos legaispara a execuo fsica e financeira das atividades.
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Gesto por Programas se utiliza da metodologia do Project Management Institute (PMI) paraa elaborao de projetos socioambientais, fundamentado no conceito de matricialidade ebuscando obter recursos e talentos humanos nas diversas estruturas da organizao, com omximo de sinergia e economicidade;
Metodologia do programa de gesto:quatro componentes estratgicos
Gesto por Bacias
Programa com foco na correo de passivos ambientais coletivos e individuais que afetam agua o solo, a partir do manejo de prticas conservacionistas, tendo como principais resultados:
Instalao de cercas para proteo da mata ciliar387,9 kilometros
Mata ciliar - mudas plantadas em reas protegidas2.011.765 unidades
Adequao de caminhos 307,67 kilometros
Conservaco do solo e gua 3,403 hectares
Fornecimento de terraceadores 04 unidades
Instalao de abastecedores de gua comunitrio88 unidades
Fornecimento de distribuidores de adubo orgnico82 unidades
Destino adequado de embalagens de agrotxicos442,8 toneladas
Projetos de Controle Ambiental (PCA) nas propriedadesrurais 3,685 projetos
Gestopor Programas
Gestoda Informao
territorial
Gesto
Ambiental
GestoParticipativa
Modelo deGesto
COMPONENTES
Planejamento
Estratgico IB
A(Action)
P(Plan)
C(Check)
D(Do)
CICLO PDCA
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Gesto da Informao Territorial - compreende um conjunto de tecnologias, algumasdelas desenvolvidas pela prpria Itaipu, para fazer o monitoramento das condies ambien-tais das microbacias, chegando muitas vezes ao nvel de detalhamento de cada propriedaderural. A confiabilidade das informaes fundamental para o planejamento das atividadesde recuperao dos passivos.
Gesto Ambiental - calcada nas normas ISO 14.001, sem objetivo da certificao, princi-palmente no que diz respeito ao ciclo PDCA (do ingls: planejar, fazer, checar e agir). Essametodologia permite um acompanhamento constante da eficcia das aes, gerando even-tuais correes simultaneamente execuo do projeto;
Gesto Participativa - indissocivel da implantao de um programa socioambiental quesoma mais de 2.200 parceiros como lideranas comunitrias e cooperativas agrcolas, orga-nizaes no-governamentais, rgos municipais, estaduais e da Unio.
Os Comits Gestores do Cultivando gua Boa
O principal mecanismo encontrado para se promover e garantir a participao dos di-
versos setores da sociedade no programa foi a de formar um Comit Gestor do Cultivando
gua Boa em cada um dos 29 municpios.
No incio do programa, os comits gestores eram informais, mas em 2009, nos processos de
avaliao sobre o andamento dos trabalhos, surgiu a proposta de institucionalizar o Comit
Gestor de cada municpio para ampliar e aprofundar o envolvimento dos partcipes.
A partir de um amplo debate entre Itaipu, autoridades municipais e setores organizados
da sociedade, cada municpio criou, por meio de lei municipal especfica, o Comit Gestor
do Programa Cultivando gua Boa.
Criada a lei, definiram-se as entidades da sociedade que estariam representadas no co-
mit sempre havendo espao para todas as interessadas e, por meio de decreto, o pre-
feito de cada municpio designou os integrantes.
A funo no remunerada e as principais atribuies so: congregar os interesses da
comunidade, permitindo a participao de todos os segmentos sociais; compatibilizar os in-
teresses dos diferentes usurios dos recursos naturais, especialmente a gua, evitando con-
flitos; aprovar o plano de bacia hidrogrfica e os programas anuais e plurianuais de inves-
timentos e acompanhar sua implementao; propor a elaborao de estudos e pesquisas
de interesse da bacia; acompanhar a execuo das obras e servios programados.
O caminho das pedras ao encontro das guas ...
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A educao ambiental como fio condutor do processoAtuamos com uma educao ambiental enraizadora, orgnica e comprometida com o pro-
tagonismo dos diversos atores sociais da Bacia do Paran 3, na busca por uma melhor quali-
dade de vida e do nosso ambiente.Silvana Vitorassi,
gerente de Educao Ambiental da Itaipu Binacional
O Programa Cultivando gua Boa vem promovendo na regio da Bacia do Paran 3 uma
profunda mudana de paradigma que tem na educao ambiental e na pedagogia daprxis seu fio condutor. Usando uma metodologia que estimula o despertar do sentido de
pertencimento das comunidades locais, trabalhando com a noo de empoderamento e
protagonismo de cada membro da comunidade, busca enraizar princpios e valores planetri-
os de forma que eles se reflitam sobre a prtica cotidiana, alm de fomentar intensamente
a participao e o controle social em todas as instncias de deciso possveis.
Algumas interfaces da
Educao Ambientalpara Sustentabilidade
EA CoorporativaProcessos Formativos
EducomunicaoEA nas Estruturas educadoras
Gesto por BaciaHidrografica
Oficinas do Futuro
Pacto das guas
Futuro no Presente
Monitoramentoe Avaliao
Ambiental
Monitoramentoparticipativo das guas
ColetaSolidria
Capacitaode catadores
Campanhas desensibilizao
Valorizaco doPatrimnio
Agricultura OrgnicaFamiliar e Plantas
Medicinais
Formaode Professores
Intervenes Educativas(Teatro,Livro)
Formao de Cozinheirase Nutricionistas
Concurso e Caderno deReceitas Saudveis
Colnia de Frias EA nas estruturaseducadoras
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Estimulada a pensar sobre sua condio, a expor os problemas que enfrenta, a recon-
hecer suas causas, a imaginar o futuro que deseja e a procurar por alternativas de soluo
para os males que a afligem, a comunidade estabelece vnculos entre si e com os demais
grupos em torno de problemas e sonhos comuns, aprende a conviver com o diferente, a
gerenciar conflitos e a exercer ativa e altivamente sua cidadania.
Oficinas de Futuro(baseadas na metodologia desenvolvidapelo Instituto Ecoar para a Cidadania)
Constituem-se em espaos para se debater sonhos, problemas e aes conjuntas. O mtodo
estimula a participao de todos os componentes do grupo no apontamento de problemas
que lhes afligem, em sua contextualizao histrico-geogrfica e poltica, no reconhecimento
do que h em comum entre eles, na percepo de suas causas, na visualizao dos sonhos
de futuro de cada um dos membros do grupo e nas sugestes de alternativas para a resoluo
coletiva dos problemas ali apontados.
Muro das Lamentaes: momento em que o grupo expe suas frustraes, crticas, medos
e problemas socioambientais.
rvore da Esperana:onde os participantes explicitam seus sonhos para o lugar onde vivem.
Caminho Adiante: definio de aes corretivas, visualizao das responsabilidades com-
partilhadas, definio de prioridades, prazos e recursos. O resultado propicia a elaboraoda Carta do Pacto das guas.
Pacto das guas:momento de celebrao, de chamamento reflexo e de estabeleci-
mento de compromisso entre Itaipu, prefeituras, parceiros e comunidade para a execuo
das aes e atividades para sustentabilidade da microbacia.
Como resultado das Oficinas de Futuro surge a Agenda 21 do Pedao, um verdadeiro plano
de ao de cada comunidade.
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O ser humano investe no que acredita e suas aes revelam os princpios, valores e crenas
que o orientam. Estamos num momento muito especial da histria da humanidade no qual
podemos afirmar que, em termos globais, a tecnologia alcanou nveis nunca antes conhe-
cidos. Da mesma forma, em termos de informao, nunca tivemos tantas condies e instru-mentos para comunicar-nos em tempo real, transcendendo fronteiras prximas e distantes.
Entretanto, tambm temos que afirmar que esse avano tecnolgico e acmulo de meios
de informao no lograram impedir o aumento das desigualdades sociais, a deteriorao
ambiental, as guerras, locais e regionais, como demonstraes claras da eroso de valores
que marcam a histria atual da humanidade e nos levam tambm a evidenciar como a
tecnologia e especialmente a tecnologia da informao so aplicaes e transmisso de
conhecimentos construdos a partir de vises de mundo, carregadas de princpios, valorese crenas. nesse contexto que a Educ-Ao para a Sustentabilidade adquire todo o seu
significado enquanto aprendizagem transformadora que acompanha aes de preservao
ou de recuperao de passivos ambientais.
Moema Viezzer,sociloga, educadora, consultora do Programa
Cultivando gua Boa de 2003 a 2008
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EDUCAO COMO EIXO:Formao de Educadores Ambientais FEA
O principal sinal de uma comunidade ecoeducada a existncia da organizao de pes-
soas em torno das questes relacionadas qualidade de vida e do ambiente. Quanto mais se
amplia o nmero de organizaes sem competir entre si e cooperando para implementar um
ideal comum, a est um indicador de que se est avanando.
Marcos Sorrentino,educador ambiental, professor universitrio, autor de diversos estudos e
livros sobre o tema, coordenador de Educao Ambiental do MMA de 2002 a 2008.
A Itaipu Binacional por meio do Programa Cultivando gua Boa assumiu na Bacia do Paran
3, como instituio-ncora, o programa de formao continuada de educadores ambien-
tais, em parceria com os ministrios do Meio Ambiente e da Educao, o Parque Nacional
do Iguau, 42 instituies regionais e 34 prefeituras municipais com o objetivo de constituir e
consolidar o Coletivo Educador.
A proposta poltica pedaggica do FEA teve sua implementao iniciada em 2005 a partir
de seleo de 300 educandos, dentre 900 currculos apresentados e 530 entrevistas realiza-
das, obedecendo a critrios estabelecidos pelo programa federal, como o comprometimen-
to com questes ambientais, representatividade social, potencial de capilaridade, liderana,
considerando a proporcionalidade entre a diversidade sociocultural e o nmero de habi-
tantes do municpio, o equilbrio de gnero, de gerao e de configurao territorial.
A composio do coletivo representava todos os matizes da diversidade presente na socie-
dade brasileira, desde representantes de rgos pblicos com atuao na rea ambiental e
educacional, professores da rede pblica e privada dos diversos nveis, sindicalistas, escoteiros,
catadores at representantes de clubes de servios, assentados, monitores da Rede de Edu-cao Ambiental Linha Ecolgica, comunidades eclesiais de base, de pastorais articuladas
pela Igreja Catlica, membros de comunidades indgenas, profissionais de comunicao,
agricultores, donas de casa, artistas, membros de ONGs, aposentados, empresrios.
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A simbologia da mandala remete
a aprendizagem circular, ou a
crculos de aprendizagem, a partir
de um objetivo comum, central,
que a busca pela construo
de sociedades sustentveis. A
metodologia Pesquisa-Ao-Par-
ticipante, usada no programa,
agregadora e integradora de pes-
soas, saberes e aes. Atua com
e a partir de vrias dimenses.
De 2005 a 2007, o FEA proporcionou um intenso programa de formao, baseado em forma-o de grupos de Pessoas que Aprendem Participando (PAP), assim compostos:
O grupo PAP1 refere-se aos idealizadores nacionais do programa, Ministrio do Meio Ambien tee da Educao, responsveis pela elaborao da proposta e repasse desse conhecimentovia oficinas de trabalho e disponibilizao de materiais de apoio s iniciativas no pas;
Os PAP2, que so os Coletivos Educadores, resultaram da aglutinao de esforos e ex-perincias regionais de instituies com atuao regional na rea ambiental, cujo trabalhofoi de pensar a formao do PAP3, construindo uma metodologia de ensino capaz de darconta das especificidades locais.
Os PAP3, Educadores Ambientais formados por meio da proposta e que assumiram
como desafio o enraizamento da Educao Ambiental em diversos locais e setores de cadamunicpio. O pblico a ser mobilizado pelos PAP3, atravs de proposta de interveno comu-nitria, chamado de PAP4. Estes se organizam por comunidades de aprendizagem.
Trata-se de um processo contnuo, em que educadores formados atuam na formao de edu-cadores ambientais populares, por meio das comunidades de aprendizagem, at que todacomunidade regional (1.035.000 pessoas) possa ser mobilizada para um exerccio de valores eprticas socioambientais necessrias para uma melhor qualidade de vida e do meio ambientedessa regio.
Na etapa atual do processo, so 119 comunidades de aprendizagem dialogando, construindoprocessos e atuando na busca pela sustentabilidade socioambiental da regio, envolvendoaproximadamente 2.900 pessoas.
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Tecendo a Rede de Educao Ambiental Linha EcolgicaA Rede Regional de Educao Ambiental Linha Ecolgica agrega gestores de Educa-
o Ambiental, tais como profissionais das secretarias Municipais de Educao, Ao Social,Agricultura e Meio Ambiente das 29 prefeituras da BP3, que, alm de exercer o papel deapoiar as comunidades de aprendizagem, tm como foco a promoo da Educao Ambien-tal no municpio em toda sua complexidade, transversalmente s outras secretarias munici-pais, fazendo interface com os demais programas socioambientais desenvolvidos, com vistas construo participativa do Programa Municipal de Educao Ambiental.
A Rede Regional de Educao Ambiental nasceu da parceria entre a Itaipu, o Conselhode Desenvolvimento dos Municpios Lindeiros ao Lago de Itaipu e as prefeituras municipais daBacia do Paran 3 e conta com um nibus equipado especialmente para a misso educa-cional itinerante.
Esses gestores recebem formao no FEA e a eles dada a possibilidade de participaoem eventos regionais, estaduais, nacionais e internacionais de Educao Ambiental, ondeapresentam as aes desenvolvidas na regio, conhecem outras experincias, agregamconhecimentos, se relacionam com outros educadores ambientais e articulam aes conjuntas.
O foco principal de atuao desses gestores est na rede formal de ensino onde trabalhamcom professores, alunos, merendeiras e nutricionistas em cursos de agricultura orgnica, plan-tas medicinais, alimentao saudvel, consumo consciente, entre outros. Dedicam-se tam-bm formao continuada de merendeiras de escolas, promovendo o curso AlimentaoSaudvel, com nfase nas plantas medicinais.
Com base na demanda de formao aprofundada, identificada pelos Educadores daLinha Ecolgica, os documentos planetrios adotados pelo Cultivando gua Boa, a Carta
da Terra e o Tratado de Educao Ambiental e de Responsabilidade Global esto sendotrabalhados em oficinas pedaggicas com os professores da rede municipal de ensino, deforma a estimular e subsidiar projetos e aes nas escolas.
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Programa Jovem Jardineiro 200 jovens formados;Biodiversidade plantio de mais de 24 milhes de rvores; implantao do Corredor de Biodiversidade Santa Maria;
Coleta solidria formao de 4 cooperativas e 16 associaes;Monitoramento e avaliao ambiental 101 agentes formados;Produo de peixes em nossas guas 400 tanques-redes;
Agricultura orgnica adeso de 700 propriedades e de mais 300 em fase de converso;Diversificao agropecuria 7 mil agricultores aderiram produo alternativa;Plantas medicinais 144 espcies de plantas cultivadas e beneficiadas;
Assistncia tcnica e extenso rural 25 assessores tcnicos, 40 agentes de extenso, mil agricultores assistidos.
Alguns programas e nmeros do Cultivando gua Boa
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Capacitao de professores
municipais de 1 a 4 sries com o
tema: Consumo consciente
Produo e distribuio dirigida
da cartilha mundo orgnico
- Capacitao de grupos
teatrais locais e apresentao da
pea teatral: A Matita: uma aventura
orgnica, com foco na implantao
de hortas orgnicas escolares
e familiares.
Formao continuada para meren-
deiras e nutricionistas, com o curso
Alimentao Saudvel e Gesto
da Merenda Escolar
- I Concurso de Receitas Sau-
dveis da Bacia do Paran 3
II Concurso de Receitas Saudveis da
Bacia do Paran 3 Edio Orgnica
Ed A bi t l U id d d C l T ti ( t did / ) 3 069
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Itaipu mostra que outra empresa possvel: o programa da Itaipu Binacional, Cultivando gua
Boa, possui um significado que transcende a empresa e mesmo o Brasil. Com este projeto, mostra
que um novo paradigma de relao entre uma grande empresa, a natureza e a cidadania
possvel. No se trata somente de produzir bens materiais, necessrios para a sociedade, mas
conjuntamente suscitar valores intangveis novos, formas de participao mais includentes euma surpreendente benevolncia para com a natureza, agora resgatada e potenciada. Se
os milhes de empresas do mundo fizerem o que Itaipu fez e faz, reconstituiramos a Terra como
Jardim do den.
Leonardo Boff,telogo, escritor.
Educao Ambiental nas Unidades do Complexo Turstico (pessoas atendidas/ano) 3.069 Oficinas Carta da Terra 65 Comits Gestores formados (municpios e assentamentos) 29
Convnios formalizados67 Parceiros envolvidos 2.146 Parceiros envolvidos nos Comits Gestores de Microbacias e Pactos das guas 1.633 Alunos sensibilizados atravs do trabalho com a Cartilha Mundo Orgnico 135.000 Apresentaes do teatro A Matita 483 Professores capacitados no curso Consumo Consciente/Cartilha Mundo Orgnico 485 Monitores/as representantes das prefeituras em processo de capacitao contnua 105 Hortas orgnicas escolares218 Hortas orgnicas familiares 1.280
Merendeiras e nutricionistas em formao: 95 Merendeiras participantes do concursos Receitas Saudveis da BP3: 870 Merendeiras premiadas 107 Receitas selecionadas para publicao em caderno 56 Caderno publicado Receitas Saudveis da BP3 1
Cento e cinquenta mil pessoassensibilizadas/capacitadas nas
aes do Cultivando gua Boa:
Educao ambiental 3.390
Agricultura orgnica 2.333
Plantas medicinais 1.674Monitoramento ambiental 141
Produo de peixes 900Coleta solidria 1.662
Gesto por bacias 300Pacto das guas 17.432
Eventos e conferncias 125 mil
O l i t i
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7. O papel e a importnciadas Polticas Pblicas
Plano de guas do Brasil: uma ao estruturante que confere
um novo sentido s polticas pblicas de recursos hdricos
Para estabelecer um modelo sustentvel de gesto dos recursos hdricos nacional, alegislao de guas vem sendo aprimorada desde o Cdigo de guas de 1934. A Consti-tuio Federal de 1988 estabeleceu uma Poltica Nacional, conhecida como Lei de guas,criou o Sistema de Gerenciamento dos Recursos Hdricos (Singreh), definiu a bacia hidro-
grfica como unidade territorial de gesto, estipulou o uso mltiplo das guas, garantiu oconsumo humano e a dessedentao de animais como usos prioritrios, apontou a gestodescentralizada e participativa dos recursos hdricos e ainda definiu a dupla dominialidadedas guas no pas sendo consideradas da Unio aquelas que percorrem mais de um estadoda Federao e de domnio dos estados, as que nascem e desguam em seu territrio.
O conceito de compartilhamento da responsabilidade sobre os usos da gua, queperpassa a lei, trouxe em seu bojo o desafio de estabelecer a Gesto Integrada dos RecursosHdricos (GIRH) e de promover a insero dos municpios brasileiros no contexto da poltica e
do sistema nacional de recursos hdricos.
O Plano Nacional dos Recursos Hdricos nasce do entendimento da importncia da partici-pao como fio condutor para o processo de sustentabilidade, do reconhecimento da baciahidrogrfica como unidade de gesto, da incorporao do municpio gesto integrada compreendendo que, embora os municpios no detenham domnio legal sobre as guasque nascem ou cruzam seu territrio, so responsveis pelos servios de saneamento, pelagesto do uso do solo e pela ocupao de suas margens, suas vrzeas. Dessas mesmasnoes so criados e fortalecidos os colegiados de recursos hdricos (conselhos e comits de
bacia hidrogrfica).
A percepo de que grande parte dos problemas hdricos acumulados historicamentedecorria da ausncia de um planejamento estratgico em nvel nacional fez com que o Brasilcomeasse a trabalhar srio nessa direo. Em 2002, em Joanesburgo, durante a cpula dasNaes Unidas para o Desenvolvimento Sustentvel, foi assinado o compromisso de elaborarum planejamento estratgico de nossas guas at o ano de 2005.
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De 2003 ao final de 2005 foi ento construdo o planobrasileiro de guas. O Brasil tornou-se o primeiro pas dasAmricas a cumprir o compromisso assumido junto s NaesUnidas, construindo um planejamento estratgico e participa-tivo de longo prazo para suas guas, levando em conta suasmltiplas dimenses.
Elaborado em um processo de construo coletivo,coordenado pela Secretaria de Recursos Hdricos e Ambi-ente Urbano do Ministrio do Meio Ambiente (SRHU/MMA)
em parceria com a Agncia Nacional de guas, com aparticipao direta de mais de 7 mil pessoas, entre usurios,especialistas, organizaes no governamentais, movimen-tos sociais, governos estaduais, municipais e federal, alm depopulaes tradicionais e indgenas, o plano foi aprovadopor unanimidade no Conselho Nacional de Recursos Hdricos(CNRH), em 30 de janeiro de 2006, e lanado para a socie-dade brasileira pelo presidente da Repblica em maro domesmo ano.
O Plano Nacional de Recursos Hdricos (PNRH) tem comobase a Diviso Hidrogrfica Nacional que define 12 regieshidrogrficas para o territrio brasileiro, compostas porbacias hidrogrficas prximas entre si, com semelhanasambientais, sociais, econmicas e culturais.
Sua grande inovao est alicerada no estabelecimentode um pacto entre o poder pblico, os usurios (indstria,
irrigao, setor de abastecimento de gua, gerao de en-ergia, entre outros) e a sociedade civil (associaes comuni-trias, ONGs, sindicatos, universidades, escolas entre outros).Estabelece diretrizes e metas para a gesto democrtica,racional e sustentvel dos recursos hdricos no Brasil at 2012,considerando como de relevncia a gua em seu valorsocioambiental.
O Plano atende s Metas do Milnio e proposta da Cpula
de Joanesburgo (Rio + 10), a Organizao das Naes Unidas(ONU) determinou que os pases construssem seus planosde gesto integrada de recursos hdricos at 2005, com o objetivode at 2015 reduzir metade o nmero de pessoas sem acesso gua potvel e ao saneamento bsico.
O Brasil protagonizou a elabora-
o de seu Plano Nacional de Re-
cursos Hdricos, de 2003 a 2006, com
ampla participao da sociedade
e consistente diagnstico, que
considerou a gua em suas mlti-
plas dimenses, destacando o seu
valor socioambiental relevante e a
necessidade de segurana hdrica
para as geraes atuais e futuras.
Agora, na fase de implementa-
o de seus programas, o plano
brasileiro conta com um Sistema
de Gerenciamento Orientado por
Resultados, que propicia uma
avaliao permanente e correo