2003-Arte Telematica Dos Intercambios Pontuais Aos

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arte telemtic ados intercmbios pontuais ao s ambientes virtuais multiusuriogilbertto prado

arte telemticados intercmbios pontuais ao s ambientes virtuais multiusuriogilbertto prado

Catalogao Ita Cultural Prado, Gilbertto. Arte telemtica: dos intercmbios pontuais aos ambientes virtuais multiusurio/ Apresentao Arlindo Machado, Julio Plaza So Paulo: Ita Cultural, 2003. 128 p. : fotos p&b color. (Rumos Ita Cultural Transmdia). ndice Onomstico ISBN 85-85291-40-0 1. Artes visuais 2. Arte contempornea 3. Artemdia 4. Arte e Tecnologia 5. Arte telemtica 6. Ambientes virtuais 7. Realidade virtual 8. Ciberespao 9. Web arte

CDD 700.105

Bailarinos do elenco atual do Cena 11.

arte telemticados intercmbios pontuais ao s ambientes virtuais multiusuriogilbertto prado

Para Alice e Eduardo, que chegaram com o novo milnio, sementes, sonhos e caminhos.

Uma das mais importantes aes do Ita Cultural se evidencia no programa Rumos, de apoio produo artstica brasileira, que contempla cada rea com a qual a instituio trabalha artes visuais, cinema e vdeo, dana, literatura, mdia arte e msica. Fincado sobre o trip formao, fomento e difuso, Rumos caracterizase pelo mapeamento da nova produo em todo o territrio nacional. Rumos formao quando proporciona a artistas, curadores e pesquisadores a possibilidade de participar de cursos, workshops e atividades que ampliem seus horizontes intelectuais e profissionais. Rumos fomento porque abre espao para a manifestao de novos artistas e linguagens, fornecendo condies necessrias ao seu desenvolvimento. Rumos difuso, pois garante a circulao dessa produo via exposies, exibies, espetculos, registros fonogrficos e videogrficos e publicaes impressas e eletrnicas. Formatado com base em editais de inscrio separados por rea de expresso artstica e com caractersticas prprias que se coadunam com a poltica cultural da instituio, Rumos j recebeu 7.007 projetos, dos quais 333 foram selecionados por equipes compostas de profissionais especializados.

rumos ita cultural transmdiaA primeira edio do Rumos Ita Cultural Transmdia, ocorrida em 2002, baseou-se no princpio de que arte tecnolgica, arte eletrnica, arte digital e mdia arte so conceitos, e no definies, de uma fronteira em contnuo movimento. O programa privilegiou como campos de atuao ambientes imersivos, arte biolgica, arte telemtica, computador como mdia, inteligncia artificial, espetculos multimdia e instalaes interativas. O objetivo do mapeamento foi detectar indcios da incorporao dessas novas linguagens na produo artstica. Entre 540 trabalhos inscritos, foram contempladas 13 produes e pesquisas sobre a convergncia de linguagens, mdias e tecnologias, de realizadores de So Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco, Santa Catarina e Distrito Federal.

Os projetos foram selecionados por uma comisso independente, de acordo com trs modalidades: Produo, que apia a execuo de obras inditas; Desenvolvimento de Projeto, voltada formatao de propostas; e Publicao de pesquisas j realizadas. Nesta modalidade, foram contemplados Leituras de Ns: Ciberespao e Literatura, de Alckmar Luiz dos Santos; Arte Telemtica: Dos Intercmbios Pontuais aos Ambientes Virtuais Multiusurio, de Gilbertto Prado; e A Dana dos Encfalos Acesos, de Mara Spanghero. A comisso foi formada por profissionais de renome nos campos de atuao acima citados: Andr Lemos, professor da UFBA; Antonio Carlos Barbosa de Oliveira, diretor executivo do Ita Cultural; Arlindo Machado, professor do Programa de Ps-Graduao em Comunicao e Semitica da PUC, So Paulo; Fernando Perez, diretor cientfico da Fapesp; Jzio Gutierre, editor executivo da Editora da Unesp; Jimmy Leroy, diretor de arte da MTV Brasil; Helena Katz, crtica de dana; Loop B, DJ e produtor de msica eletrnica; Lucia Santaella, professora do Programa de Ps-Graduao em Comunicao e Semitica da PUC, So Paulo; e Suzete Venturelli, professora da UnB. O escopo de Arte Telemtica: Dos Intercmbios Pontuais aos Ambientes Virtuais Multiusurio situa-se no campo da experimentao artstica com os novos meios tecnolgicos, suas transformaes e derivaes. Reflete sobre as realizaes com as novas poticas do dinmico universo das imagens numricas, como uma necessidade de entender e explorar os avanos tecnolgicos e express-los na produo artstica contempornea. O enfoque apresenta-se nas manifestaes artsticas relacionadas arte telemtica, passando pelos intercmbios via fax e modem dos anos 70 e 80, pelas prticas artsticas e formas de trabalho na internet a partir dos anos 90, at os ambientes virtuais multiusurio que comeam a despontar nos nossos dias. O texto pontuado com trabalhos e projetos artsticos do autor. Gilbertto Prado professor do Departamento de Artes Plsticas da ECA/USP e participou de inmeras exposies no Brasil e no exterior (em Barcelona, Milo, Atenas e Paris, entre outras cidades). Foi curador da Mostra Welcomet Mr. Halley e do 12 Simpsio Brasileiro de Computao Grfica e Processamento de Imagens.

sumrioapresentaoarlindo machado julio plaza 12 15 20

introduo captulo 1 experimentaes artsticas nas redes telemticasas redes artsticas colaborao e complementaridade a ao sobre os dispositivos intercmbio e participao

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captulo 2 cronologia de experincias artsticas nas redes de telecomunicaesarte e telecomunicaes dos anos 70 aos 90 breve cronologia 1977-1994 40 43

captulo 3 experimentaes artsticas em redes telemticas e na webuma aproximao das estruturas das redes formas de trabalhos na web: algumas prticas artsticas sites de divulgao de eventos, exposies, colees etc., via rede sites de realizao de eventos e trabalhos na rede 64 65 66 68

captulo 4 ambientes virtuais multiusuriorealidade virtual html e vrml ambientes virtuais interativos multiusurio projeto desertesejo - estrutura do projeto visita virtual produo e modelagem dos ambientes ambiente monousurio ambiente multiusurio, chat 3d e avatares 80 81 82 85 86 92 92 95 102 110 122

consideraes finais bibliografia ndice onomstico

apresentao

apresentao - arlindo machadoUma notcia surpreendente, que circulou h pouco tempo apenas nos meios interessados em mdias mortas, informa que o ltimo servio de pombos-correios que ainda existia no mundo fechou finalmente suas portas. Atuando na regio de Orissa, na ndia, uma das mais remotas e miserveis do planeta, a pequena empresa que se dedicava mais arcaica forma de comunicao a distncia do mundo no pde resistir chegada dos servios de telecomunicao e telemtica. At mesmo a esquecida, longnqua e quase inacessvel Orissa, ltimo reduto do mundo em que as informaes ainda viajavam atadas fisicamente s patas de uma ave, teve de dobrarse globalizao implacvel dos servios de telefonia e conexo universal via internet. Hoje, quando os ndios do Xingu usam a net para construir um sistema alternativo de comunicao entre as naes indgenas do Par, quando os camponeses miserveis da regio de Chiapas invadem a web para buscar a adeso mundial rebelio zapatista contra o governo do Mxico, quando os ndios norteamericanos, praticantes da mais antiga forma de comunicao interativa em tempo real do mundo, trocam a skywriting (linguagem dos sinais de fumaa) pela netwriting, no h mais como ignorar o fato de que a conexo universal via net um fato consolidado e sem retorno. No mais apenas o mundo dos ricos que est conectado. O planeta todo est no ciberespao. A expresso ciberespao designa no propriamente um lugar fsico para onde podemos nos dirigir enquanto corpos matricos. mais propriamente uma figura de linguagem para designar aquilo que ocorre num lugar virtual, tornado possvel pelas redes telemticas. Pessoas localizadas em pontos diferentes do planeta podem se encontrar virtualmente atravs de dispositivos de comunicao e conversar, trocar experincias, como se estivessem mesa de um boteco, ou mesmo produzir trabalhos coletivamente, como se estivessem num escritrio, num estdio, numa escola ou associao de classe. Esses lugares virtuais, onde pessoas de vrias partes de um pas ou do mundo se encontram e produzem juntos sem se deslocarem fisicamente, constituem o que chamamos de ciberespao. Os Multi-Users Domains, MUDs, ampliaram essa metfora do lugar virtual e a transformaram em ambientes online construdos de forma colaborativa e em larga escala, verdadeiras cidades virtuais, a que os participantes podiam acrescentar objetos, cenrios, casas, cmodos, nos quais e com os quais era possvel desempenhar papis, contracenar aes e construir fices coletivas. Mas os MUDs eram ainda ambientes literrios: neles s havia textos escritos que descreviam esses ambientes, as caractersticas de suas personagens, as aes que desempenhavam e os dilogos que trocavam entre si. Era como se fosse um texto literrio, em contnua expanso, coletivamente construdo, que qualquer um poderia acessar no apenas para l-lo, mas tambm para acrescentar-lhe novas narrativas ou interferir nas j existentes. A partir de fins dos anos 80, com a criao da World Wide Web e o surgimento de navegadores grficos

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como o Mosaic, essas cidades virtuais comearam a ganhar imagens animadas e sons, as personagens que nelas transitam ganharam corpo e as aes se converteram em verdadeiras seqncias cinematogrficas. A produo de pensamento sobre os novos meios digitais e as redes telemticas tem colocado questes relacionadas com a instaurao nesses meios de regimes de subjetividade, formas de convivncia e experincias sensveis inteiramente novos, que demandam anlise. Brenda Laurel e Allucqure Rosanne Stone, por exemplo, respectivamente em Computer as Theatre e The War of Desire and Technology at the Close of the Mechanical Age, dedicaram parte de suas reflexes sobre as narrativas interativas ao fenmeno que os povos de lngua inglesa chamam de agenciamento (agency), ou seja, o efeito de assujeitamento do interator necessrio ao efeito de imerso. Por sua vez, Sherry Turkle, em Life on the Screen: Identity in the Age of the Internet, examinou no apenas as personalidades virtuais (avatares) que habitam o ciberespao, como tambm o desenvolvimento de identidades mltiplas nas situaes de interao mediadas por computadores. Mais diretamente interessada no modo como as narrativas do futuro sero concebidas, Janet Murray, em Hamlet on the Holodeck: The Future of Narrative in Cyberspace, dedicou-se aos mecanismos de imerso e aos modos como o espectador do futuro ir interagir com as situaes potenciais acumuladas nas memrias de computador. Essas reflexes todas, s quais se somam agora as contidas neste livro de Gilbertto Prado que o leitor tem em mos, parecem sugerir que novas figuras de subjetividade, novas sensibilidades, novas formas de relacionamento e convivncia esto sendo construdas hoje nos ambientes telemticos. De fato, entre os vrios grupos que transformaram o ciberespao num terreno de experincias inovadoras, os artistas certamente foram os que voaram mais alto. Na verdade, j nas duas ltimas dcadas do sculo XX os artistas comearam a se interessar pelo fenmeno da comunicao, concebendo experincias artsticas baseadas na transmisso/recepo interativa de textos, sons e imagens de um ponto a outro do planeta, atravs de telefone, slow scan TV, satlite, televiso e mais recentemente a internet. O primeiro movimento da histria da arte a valorizar a comunicao transnacional foi a arte postal, uma espcie de pr-histria da communication art. Reunindo artistas de diferentes nacionalidades para experimentar novas possibilidades de intercmbio de trabalhos numa rede livre e paralela ao mercado oficial das artes, a mail art foi a primeira modalidade de evento a tratar como arte a comunicao em rede e em grande escala. Mas as diferenas que existem entre as primeiras experincias com arte postal e a arte telemtica de hoje so a intermediao da eletrnica e as conseqncias advindas da adeso a essa tecnologia: alta velocidade de comunicao a distncias planetrias, procedimentos instantneos de comunicao, utilizao de suportes imateriais, alm do surgimento de questes novas para a arte, como a ubiqidade, o tempo real, a interatividade, a dissoluo da autoria, a criao coletiva etc. A fascinante aventura da arte telemtica, dos seus primrdios s experincias recentssimas, o tema deste livro de Gilbertto Prado. Perpassando todas as questes

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importantes relacionadas com o tema como a colaborao, o intercmbio, a participao coletiva, a interferncia nos dispositivos, as performances ao vivo, o acesso ou controle remoto, a criao de avatares, os ambientes multiusurio, a realidade virtual na rede etc. , o livro de Gilbertto Prado constitui o mais completo levantamento de dados e conceitos sobre arte telemtica, no apenas no plano do Brasil, mas tambm no mbito mundial. O leitor encontrar aqui no apenas uma pesquisa arqueolgica sobre os pioneiros da arte/comunicao, mas tambm informaes fresqussimas sobre o que mal acabou de acontecer ou ainda est acontecendo. Enfim, neste livro o leitor ter uma rara oportunidade para se dar conta de um dos campos mais inovadores da arte contempornea, que dever marcar profundamente o conceito e a prtica de arte no sculo que se inicia. O mais importante neste livro, porm, o fato de ele traar uma histria a partir de uma viso de dentro. Gilbertto Prado no apenas um pesquisador que tem a arte telemtica como um objeto de interesse e investigao. Ele tambm um dos mais importantes criadores desse ramo da arte contempornea e sua histria pessoal est intimamente associada da arte na rede. Desde suas primeiras experincias junto ao grupo ArtRseaux, coordenado por Karen ORourke, at Desertesejo (2000), indiscutivelmente o trabalho mais denso e maduro j produzido no Brasil especificamente para acesso na rede, Prado acumula uma obra extensa, cujas propostas criativas j so hoje referncia para quem se aventura nesse terreno. Nesse sentido, este livro simultaneamente uma obra de conceitualizao do campo, que busca dar uma viso desse campo a mais abrangente possvel, e o memorial de um artista que comenta sua prpria obra. Quem, como Gilbertto Prado, faz arte hoje, com os meios de hoje, est obrigatoriamente enfrentando a todo momento a questo das mdias digitais e do seu contexto, com seus constrangimentos de ordem institucional e econmica, com seus imperativos de disperso e anonimato, bem como com seus atributos de alcance e influncia. Os pblicos dessa nova arte so cada vez mais heterogneos, no necessariamente especializados e nem sempre se do conta de que o que esto vivenciando uma experincia esttica. medida que a arte migra do espao privado e bem definido do museu, da sala de concertos ou da galeria de arte para o espao pblico e turbulento da internet ou do ambiente urbano, onde passa a ser fruda por massas imensas e difceis de caracterizar, ela muda de estatuto e alcance, configurando novas e estimulantes possibilidades de insero social. Ao ser excluda dos seus guetos tradicionais, que a legitimavam e a instituam como tal, a arte passa a enfrentar agora o desafio da sua dissoluo e da sua reinveno como evento coletivo. O livro Arte Telemtica coloca o leitor diante desse instigante ponto de virada e o convida a experimentar as diferenas.

Arlindo Machado So Paulo 2003

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apresentao - julio plazaComo sntese de pesquisas tericas e experimentaes artsticas com tecnologias, surge o texto Arte Telemtica, de Gilbertto Prado. O autor reflete sobre as poticas surgidas do contato com as Novas Tecnologias da Comunicao. De forma geral, os artistas tecnolgicos esto mais interessados nos processos de criao artstica e de explorao esttica do que na produo de obras acabadas. Eles se interessam pela realizao de obras inovadoras e abertas, onde a percepo, a recepo e as dimenses temporais e espaciais representam um papel decisivo na maioria das produes da arte com tecnologia. Nesse processo progressivo da tecnologia importante frisar que o artista trabalha na contramo da teleologia tecnolgica, no sentido em que ele no a homologa enquanto produtora de mimese do real, mas na criao de novos referentes e poticas. Para os tericos da arte-comunicao, a chamada esttica da comunicao no fabrica objetos nem trabalha sobre formas; ela tematiza o espao-tempo. A esttica da comunicao uma esttica de eventos. O evento subtrai-se da forma e se apresenta como fluxo espao-temporal ou processo dinmico do vivo. Agora, com os processos promovidos pela interatividade tecnolgica, na relao homemmquina, surge a abertura de terceiro grau. obra aberta e arte-participao sucedem as artes interativas, s que, desta vez, h a incluso do dado novo: a questo das interfaces tcnicas. Essa abertura coloca a interveno da mquina como novo e decisivo agente de instaurao e transformao esttica prprio das imagens digitais em redes. O conceito de arte interativa expande-se no comeo dos anos 80 com a apario das tecnologias ligadas ao cabo telefnico, que se tornam o suporte de eventos relacionados ao videotexto, fax, slow scan e outros meios. Como observara F. Popper: A interao considerada um fenmeno internacional e transnacional, acarretando numerosas formas de engajamento cultural capazes de edificar redes de relaes humanas desprovidas de discriminao. A interatividade suscitada pelo artista permite uma comunicao criadora fundada em atitudes construtivas, crticas e inovadoras. Autorizando novos tipos de interaes sociais, a arte tecnolgica pode igualmente se orgulhar de refletir as transformaes que afetam nosso tecido social, com todas suas contradies. As noes de interao, interatividade e multissensorialidade intersectam-se e retroalimentam as relaes entre arte e tecnologia. A explorao artstica desses dados perceptuais, cognitivos e interativos est comeando. A arte das

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telecomunicaes, a telepresena em mundos virtuais partilhados, a criao compartilhada, a arte em rede (herdeira da mail art) problematizam os cmbios socioculturais relacionados com o processo tecnolgico. Para os artistas da comunicao, a transmisso cultural desmaterializada provoca a emergncia de uma criatividade e inteligncia coletivas e a explorao de novos espaostempos, uma dilatao e densificao dos potenciais imaginrios e sensveis. A multissensorialidade trazida pelas tecnologias caracterizada pelo uso de mltiplos meios, cdigos e linguagens (hipermdia), que colocam problemas e novas realidades de ordem perceptiva na relao virtual/atual. Os conceitos de artista, autor e potica, a desmaterialidade da obra de arte, a recepo, as artes de reproduo e mesmo o conceito de reprodutibilidade encontram-se, atualmente, revolucionados. Estes fatos colocam os novos problemas estticos e filosficos ultramodernos acentuados pela transformao do mundo material, pelos meios de massas e filtrados pelas tecnologias onde a matria se torna invisvel, impalpvel, reduzida s ondas telemticas. Cabe destacar as poticas construdas em redes, como a criao compartilhada, concebidas pioneiramente por Gilbertto Prado e Karen ORourke em colaborao com o grupo ArtRseaux de Paris no incio dos 90. Entendem os artistas da arte-comunicao que os sentidos da obra artstico-telemtica so produzidos durante o curso de um processo dialgico, lanado pelos autores, atores coautores (ou colaboradores) como agentes inteligentes da obra. Nas artes da interatividade, portanto, o destinatrio potencial torna-se co-autor e as obras tornam-se um campo aberto a mltiplas possibilidades e susceptveis de desenvolvimentos imprevistos numa co-produo de sentidos. Isto parece coincidir com o conceito de Gilbertto Prado: As regras dos projetos de ao artstica em rede permitem e solicitam a atuao de parceiros. () o que existe so interaes de sentidos, () o artista se torna um tipo de poeta da conexo, onde cada participante se torna um (co-)produtor. () trata-se de uma estrutura de participao coletiva em transformao, uma cibercollage. () Que o desvio artstico ajude a trazer a liberdade da diferena e da escolha atravs do despertar/evidenciar aquilo que temos em comum e o que temos de diferente.

Julio Plaza So Paulo 2003

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introduo

As mquinas tecnolgicas de informao e de comunicao operam no ncleo da subjetividade humana, mas no apenas no seio das suas memrias, da sua inteligncia, mas tambm da sua sensibilidade, dos seus afetos, dos seus fantasmas inconscientes. Flix Guattari

O recente progresso das novas tecnologias apresenta um grande desafio para os artistas envolvidos com essas vertentes e profissionais das reas correlatas. Tal fato se d em virtude da demanda que essas tecnologias apresentam de um trabalho integrado entre diferentes reas de atuao, especializao e conhecimento. Deve-se levar em considerao que essa dinmica de atuao/participao de reas da tecnocincia em produtos de natureza artstica resultante de um conjunto de foras que contm, entre seus vetores, a hibridizao e o contato com outros campos de ao e conhecimento. As artes, as cincias e as tcnicas entretm relaes de interdependncia que possibilitam que as invenes ou mutaes tecnolgicas faam emergir novas formas artsticas. Se a tecnologia, com seus avanos, no inventa necessariamente novidades, ela transforma as condies de produo, modificando assim o seu status. As tecnologias do fim/comeo de nosso sculo, particularmente as relacionadas eletrnica e informtica, abriram novas possibilidades. As telecomunicaes se tornaram indissociveis dos sistemas informticos, viabilizando uma marca distintiva da nossa sociedade atual: a comunicao a distncia. preciso se render evidncia: as mquinas de comunicao modificam nossos modos tradicionais de comunicao e suas formas de leitura e de apresentao, constituindo-se em um dos componentes de um novo olhar possvel sobre o homem e seu cotidiano e estabelecendo, desta maneira, outras relaes e outras necessidades. As experimentaes artsticas com as novas mdias digitais acentuam-se e multiplicam-se nestes dois ltimos decnios com a utilizao, pelos artistas, de diversas formas de produo, distribuio e intercmbio, possibilidade ampliada com a recente introduo da web. Vrios artistas vm desenvolvendo projetos nesses domnios, que continuam a ser um campo frutuoso para experincias artsticas e representam um dos novos desafios para a arte contempornea. Sobre esta pesquisa e o trabalho exposto neste volume, cabe assinalar que ambos se inserem na continuidade de meus trabalhos, com textos, reflexes e produo artstica, e que aqui reelaborados compem um conjunto com a inteno de melhorar o entendimento desse processo. So apresentadas imagens de trabalhos, preferencialmente por mim realizados, visto que esta pesquisa incorre no somente sobre a minha produo de natureza reflexiva, mas tambm sobre a minha experimentao artstica, estando as duas num caminhar conjunto. No primeiro captulo comeamos a abordar as questes relativas s experimentaes artsticas nas redes telemticas, com os pequenos dispositivos destinados ao grande

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pblico, que j permitem uma performance razovel e um acesso simplificado s redes. A utilizao desses sistemas comea a ficar acessvel ao grande pblico a partir dos anos 80, penetrando em todas as camadas sociais e integrando-se nas atitudes mais banais do nosso cotidiano. Discutimos as transformaes propiciadas pelas conexes em redes telemticas como possibilidade de composio, partilha e veiculao, que so o cenrio de reflexo deste trabalho. Comeamos tambm a introduzir as minhas experimentaes e projetos de natureza telemtica. O segundo captulo tem como inteno apresentar um resumo cronolgico de alguns eventos entre os anos 70 e comeo dos anos 90, que utilizaram as telecomunicaes e as redes telemticas para o intercmbio artstico. Nesse captulo, escolhemos nos orientar preferencialmente pelos intercmbios via fax e modem, trazendo um apanhado geral de algumas dessas manifestaes significativas de uma poca e de todo um movimento artstico. O terceiro captulo aborda algumas prticas artsticas e formas de trabalhos na web. A World Wide Web, parte da internet que conheceu a mais forte progresso nestes ltimos anos, permitiu aos artistas, galeristas e museus mostrar obras de todos os gneros, desde reproduo de quadros at ambientes de realidade virtual. Seria ilusrio querer recensear todas as formas de arte presentes atualmente nas redes eletrnicas. Porm, de maneira geral, no se faz nenhuma diferenciao entre a catalogao de espaos de exposio e/ou de divulgao de trabalhos artsticos realizados em distintos suportes e mdias e o levantamento dos casos em que as redes eletrnicas so os prprios espaos e mdias utilizados para a produo de eventos artsticos, numa relao mais direta com a arte telemtica. Esses sero os tpicos discutidos, assim como ser apresentada uma breve relao de sites de divulgao e de realizao de eventos na rede. No quarto e ltimo captulo iniciamos com uma breve introduo o tema da realidade virtual, para depois trazer a questo dos ambientes virtuais multiusurio. Em seguida, apresentamos o projeto artstico Desertesejo em suas vrias etapas. Desertesejo um ambiente virtual interativo multiusurio para internet construdo em VRML que permite a presena simultnea de at 50 participantes. O projeto explora poeticamente extenso geogrfica, rupturas temporais, solido, reinveno constante e proliferao de pontos de encontro e partilha. So espaos navegveis desenvolvidos em rotas distintas onde o participante trabalha com diferentes pontos de vista, formas de aproximao e caminhos que se entrecruzam e se alternam, que se encadeiam e se compem em diversos percursos onricos. No CD-ROM que acompanha este trabalho temos o projeto Desertesejo e o site do projeto wAwRwT, que podem ser navegados, e ainda apresentaes dos meus principais projetos artsticos e instalaes interativas de 1990 a 2000.

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captulo 1 experimentaes artsticas nas redes telemticas1

as redes artsticasOs computadores e as redes de telecomunicaes so indissociveis da infra-estrutura econmica e de informao deste fim de sculo. No nos surpreende que alguns artistas tenham escolhido trabalhar com essas tecnologias de comunicao predominantes. O acesso complexidade do mundo se faz, de mais a mais, por essa intermediao tecnolgica: formas de procedimento e de esquematizao que, se para alguns vo desencadear uma uniformizao do mundo e dar lugar a uma perda do sensvel, para outros, ao contrrio, sero as ferramentas e os instrumentos necessrios para se aproximar e despertar o seu prximo, por mais longe que ele esteja. Os criadores que trabalham hoje com esses meios crem estar diante de novas possibilidades e de transformaes considerveis, ou seja, diante de novos desafios. Entretanto, o interesse principal de trazer uma viso sensvel e crtica com a ajuda dessas novas possibilidades e ao mesmo tempo favorecer e estimular a circulao do imaginrio social e coletivo. Desta forma, os artistas podem ajudar a explorar o espao tecnolgico e suas contradies. Com os pequenos dispositivos telemticos de performance razovel destinados ao grande pblico, que comearam a ser bastante difundidos a partir dos anos 90, j iniciamos um acesso simplificado e uma descentralizao dos ns das redes. Podemos utilizar esses sistemas como um n autnomo, no importa onde, desde que estejamos conectados. A utilizao desses dispositivos vem penetrando todas as camadas sociais e integrando-se nas atitudes mais banais do nosso cotidiano. Assinalamos ainda que a partir da ltima dcada do sculo XX que um maior nmero de artistas comea a explorar sistematicamente as recentes possibilidades advindas da imagem numrica interativa, a informtica e as telecomunicaes. A problemtica da criao, geralmente colocada em termos das novas potencialidades tcnicas, reside nas transformaes radicais que elas aparentam algumas vezes engajar, tanto no mbito das obras individuais quanto no dos modos de difuso. Desta maneira, podemos considerar as novas funcionalidades como possibilidades de releitura dos objetos e dos processos de criao. Entretanto, para que abordemos corretamente esta questo, devemos distinguir entre possibilidade tcnica e realizao artstica. A idia que se defende que nessas trocas, nesses intercmbios, se enraza aquilo que especifica uma maneira de estar no mundo e de (se) tornar o mundo inteligvel. Isso diz respeito organizao e reunio de foras que determinam as preferncias e as desconfianas. Queremos tambm assinalar que a arte em rede uma das possibilidades que se reforam com a instalao e a banalizao dessas mquinas de comunicao no nosso cotidiano. medida que elas se tornam mais acessveis e o artista as utiliza, seu poder de ao renovado por essas mquinas. Os intercmbios artsticos em rede abrem uma rea de jogo; um espao social ldico que acentua o sensvel e as estratgias de partilha, mas que procura articular no trabalho artstico

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as experincias do indivduo confrontado com uma realidade complexa e em movimento, com a desordem do mundo e a de cada um, em particular. Cada artista, em cada participao, contempla, da sua maneira, uma certa possibilidade do mesmo mundo. Trata-se, em efeito, de uma mise-en-scne de diferentes imaginrios que no precisam se sujeitar s exigncias de uma formalizao estrita e anterior, de um sistema fechado de arrazoamentos e de prticas. As lgicas das redes, quer dizer, as maneiras como esses intercmbios acontecem, celebram assim, sem interrupo, a liberdade de dispor sempre diferentemente os sentidos do mundo, de poder colocar de outra maneira as coisas e as suas significaes. A criao em rede um lugar de experimentao, um espao de intenes, parte sensvel de um novo dispositivo, tanto na sua elaborao e realizao como na sua percepo pelo outro. O que o artista de redes visa exprimir em suas aes uma outra relao com o mundo: tornar visvel o invisvel, atravs e com um outro, para descobrir e inventar novas formas de regulao com o seu meio, cujo funcionamento complexo coloca o indivduo contemporneo numa posio indita. O encontro desses novos meios com as foras geradas pelas distintas aes pontuais espalhadas pelo mundo escapa dos marcos de referncia convencionais, gerando uma situao imprevisvel que alberga um espao para a criatividade social. Essas aes dinamizam a sinergia entre indivduos e coletivos que potencializam um novo espao de convivncia, uma mudana de atitude que produz novas formas de dissidncia ativa e participativa em vez da aceitao do papel de mero consumidor, espectador passivo. Cabe lembrar que o objetivo desse tipo de propostas partilhadas no s o de gerar novos processos estticos e formais. Pretendem tambm uma anlise crtica da construo da realidade.2 E como aponta Peter Weibel, o objetivo da construo social da arte a participao na construo social da realidade. De fato, nesses trabalhos artsticos em rede, quase impossvel se ver a ao do exterior; exige-se do pblico uma necessria participao, uma implicao ativa, no sentido de voltar periodicamente, de ver e interagir com eles, de acompanh-los no decorrer do tempo. So projetos artsticos em que so estabelecidas estratgias para criao de trajetrias prprias, mas que necessitam adquirir uma massa crtica com base na qual se disseminam e se reestruturam em novas configuraes. Neste captulo, antes de relatar brevemente alguns projetos artsticos em rede que pude realizar entre o fim dos anos 80 e o comeo dos anos 90, gostaria de citar o City Portraits. O projeto foi concebido por Karen ORourke, com imagens realizadas desde 1989 pelo grupo ArtRseaux de Paris (Christophe Le Franois, Isabelle Millet, Delphine Notteau, Karen ORourke, Gilbertto Prado, Hlne Spychiger, Michel Suret-Canale, entre outros) e seus correspondentes de nove cidades europias e americanas.3 Esse trabalho foi exibido na Galerie Donguy, Paris, em abril de 1990. Partindo de pares de imagens de entrada e sada (fotos e outros documentos) transmitidas aos parceiros, os participantes eram convidados a perfazer caminhos e estabelecer retratos de cidades que no conheciam. Com a explorao da metamorfose entre essas duas imagens (de entrada e de sada) intercambiadas via fax, os participantes faziam uma enquete sobre os seus prprios imaginrios que se abriam sobre o imaginrio do outro, ou seja, tratavase da descoberta de sua prpria cidade pela viso do outro. Uma viagem imaginria por si mesmo e pelo outro, com itinerrios-retratos que se construam durante o percurso.

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Trabalho ligado ao projeto City Portraits, concebido por Karen ORourke com imagens realizadas pelo grupo Art-Rseaux de Paris (foto Isabelle Millet)

Convite da exposio do projeto City Portraits na Galerie Donguy, Paris, em abril de 1990

Imagem do projeto City Portraits

Um outro projeto de arte e telecomunicao deste perodo foi Connect, por mim concebido, que permitia a pessoas localizadas em diferentes locais do planeta realizar simultaneamente um trabalho artstico comum. Em cada local os participantes deveriam estar equipados com dois fax: um para emisso (E) e outro para recepo (R), de forma que assim que o papel saa de (R) era encaixado diretamente em (E), sem ser cortado da bobina. Dessa maneira toda recepo se tornava imediatamente emisso e as imagens se sobrepunham e se sucediam numa nica e longa pgina encadeada em tempo real. Os participantes trabalhavam simultaneamente sobre o papel em movimento que circulava nas diferentes localidades, produzindo um trabalho nico e partilhado, numa relao/ao direta e integrada. Uma curva imaginria, interativa e efmera ia se desenhando atravs da rede artstica de comunicao.4

Diagrama do projeto Connect e imagens do Centre Saint Charles/Universidade de Paris I Panthon Sorbonne (foto Karen ORourke)

Desse mesmo perodo e tambm como parte de minha trajetria, pode-se ainda assinalar o projeto Telescanfax, cujo processo consistia na leitura de imagens de televiso com scanner de mo e no envio dessas imagens transformadas a um outro local via fax-modem. Graas composio dos movimentos de leitura entre o scanner (numrico) e a varredura da imagem televisiva (analgica), obtinha-se uma imagem decomposta, embaralhada, de aspecto enigmtico. Entre as primeiras imagens via Telescanfax por mim elaboradas est La Vendeuse e de Fer Repasser, enviada de Paris em 13 de agosto de 1991 para o evento Faxelstico, no contexto da exposio Luz Elstica, organizada por Eduardo Kac no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro.

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As experimentaes do projeto Connect foram apresentadas numa bobina nica de fax de 70 metros, formando um loop de 35 metros de comprimento, exposta no teto da galeria, na mostra La Fabrique, do grupo Art-Rseaux, Galerie Bernanos, Paris, abril de 1992 (foto Isabelle Millet)

A Vendedora de Ferro de Passar Roupa, Telescanfax, Paris, agosto de 1991

Projeto Telescanfax (foto Isabelle Millet)

colaborao e complementaridadeNs podemos distinguir na noo de rede, de uma parte, um conceito, ou seja, uma forma de trabalho, de ao/pensamento, de interao em um contexto partilhado; de outra parte, uma matriz tcnica de transporte e de organizao da informao e do simbolismo que ela veicula. Do ponto de vista artstico, as redes contm duplamente as pessoas como um de seus elementos ativos: enquanto indivduos, mestres temporrios da situao e enquanto co-atores num sistema participativo com certos graus de liberdade e de possibilidades. Uma vez que o interventor se desloca a cada ponto na rede, carrega consigo todos os outros. Ele faz valer suas intervenes at o prximo contato, a partir do qual torna-se espectador sem poder de ao, como um propulsor da situao que ele mesmo iniciou. Esse encadeamento de transformaes est relacionado tanto ao processo quanto ao produto visual e/ou sonoro. todo um imaginrio social e artstico que est em jogo e em expanso e de onde dificilmente ns podemos separar as participaes individuais. A rede implica as ferramentas, os objetos, as proposies e o contexto circundante, com o indivduo incluso nesse espao virtual. O trabalho em rede necessita de uma complementaridade entre as pessoas implicadas; uma experincia de colaborao mtua necessria para que os parceiros possam intervir de forma coletiva. A deciso de desenvolver um trabalho coletivo conduz a questes de estratgia de processo e de convites, para colocar em conexo os participantes em condies propcias possvel criao. Trata-se de um work in progress, um processo, seguimentos de transformaes que acompanham os participantes e cuja indispensvel propagao se efetua em funo dos interesses suscitados pela particularidade de cada projeto, assim como pelo empenho dos parceiros a esse esprito de explorao em grupo. uma rica combinatria de vontades e de intervenes que requer nada menos que um conjunto de importantes qualidades artsticas individuais para se chegar a uma experincia comum. Mas a fronteira permanece fluida entre o que diz respeito ao de um indivduo e quela proporcionada por seus vizinhos. Espaos de transio nebulosos, eles funcionam mais como ativadores ou catalisadores de aes que se seguem e se encadeiam. Por outro lado, essa dupla aspirao de individualidade e de universalidade constitui o fundo comum dos participantes. Vizinha ao desejo de participar, existe a unio ciberpotica com os outros onde nos consumimos, nos transformamos, nos apresentamos e onde regeneramos a conscincia.

a ao sobre os dispositivosCom a transformao das tecnologias e a interatividade, as divises entre aquele que faz e aquele que consome arte, entre autor e leitor, artista e observador so modificadas. Essas tcnicas autorizam uma ao direta sobre o prprio dispositivo. todo um ambiente

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que tende a levar em conta a ao dos participantes. O trabalho artstico resulta da convergncia de uma estrutura dinmica que s pode ser captada nas suas interaes sucessivas. O sentido se constitui, assim, a partir de um dilogo estabelecido entre os participantes. Vemos tambm que no se trata mais de separar o objeto artstico de seu consumidor ou produtor virtual, o artista de seu interlocutor, mas de lig-los numa mesma produo, num mesmo lugar. A posio do artista se encontra, ento, de uma parte identificada do fabricante e de outra do observador. Estamos na concepo de um mundo de arte, composto de redes que religam todas as pessoas cujas atividades so necessrias realizao de um trabalho artstico. A esfera da arte ento estendida, notadamente, a certas prticas estabelecidas na vida cotidiana, habitualmente afastadas do campo artstico convencional. Temos ento nas redes artsticas, em funo de suas constituies, procedimentos e possibilidades, no somente a incluso de novas mquinas, mas tambm de procedimentos inditos de trabalho e de novas relaes com esses instrumentos/interfaces. Essa nova sinergia entre os homens, as mquinas e as redes possibilita a proposio de horizontes lgicos e poticos diferentes, chamando para uma renovao de temas e contedos. Tratase de novas vias, de novos representantes em vista de novas criaes. Nossos hbitos de percepo, de concepo e de criao se encontram alterados da mesma maneira que nossos modos de aprendizagem e de ao. Essas utilizaes geram diferentes cdigos operatrios, cognitivos, ou ainda sociais. Podemos dizer igualmente que alguns desses novos cdigos e desenvolvimentos tcnicos influenciam e agem de forma retroativa sobre as manifestaes e transformaes artsticas. evidente tambm que, com o desenvolvimento da tecnologia, em particular a extenso tentacular das redes, no mais possvel associar a rede a uma imagem nica e definitiva. Em efeito, trata-se de modalidades de reagrupamentos ou de combinatrias pessoais. Um tipo de entrelaamento que se apia sobre a riqueza das possibilidades e da fragmentao (construo/destruio) e onde as redes se tornam instrumentos de reorientao e de filtrao. O projeto artstico telemtico se torna um tipo de energia latente, que o denominador comum a todos os participantes: uma cartografia de caminhos e de possibilidades. Trata-se de um movimento de sensibilidades e de intenes recprocas entre as partes. Mais que uma imagem definitiva congelada e nica, um fluxo de imagens que desgua como um rio, que tanto pode saciar a sede quanto afogar ou seguir seu curso modificvel, mas irreversvel. Um outro fator a assinalar: o poder de agir diretamente sobre esse novo espao, que o ciberespao. Este poderia ser o lugar, a zona intermediria, o no mans land onde a tecnologia encontra a rua. Um tipo de estrada consensual experimentada por milhes de operadores conectados vizinhos virtuais a cada dia, espao que eles mesmos criaram para uma viso simultnea do mundo, inscritos no tempo real da emisso e da recepo. Com efeito, essas manifestaes se propem ou se apresentam como uma maneira efmera de mostrar uma certa sensibilidade ciberntico-contempornea de realizar experincias de ordem artstica, com a elaborao e a prtica de diferentes possibilidades

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no universo da arte eletrnica. Trata-se, sobretudo, de uma dinmica de erupo dentro de um novo espao cotidiano. A prtica desses intercmbios experimentais repousa sobre um procedimento de transgresso artstica que possibilita condutas que do livre curso expresso, ao dinamismo e pluralidade do conhecimento e do sensvel. Trata-se, nesse caso, de insistir sobre o ato de criao/participao propriamente dito, sobre o momento em que os sentidos revelam as significaes, em que os esquemas de leitura/interveno assumem sua precariedade. So maneiras de conduzir o olhar sobre as coisas do mundo, como uma certa descrio/interveno do espao perceptivo. Uma maneira de a presena dos co-autores ser desenhada no mundo, entre as coisas. Com a chegada do modem de 64 Kbits/s via ISDN, ainda que em carter experimental, foi possvel, utilizando-se o princpio de tela partilhada, construir imagens simultaneamente em rede, com participantes em locais distantes. Quando se trabalha com esse dispositivo, temse a mesma imagem nos diferentes monitores. Imagem que pode ser construda a distncia, assim como o movimento dos mouses nico e compartilhado em tempo real. A proposio do projeto Moone: La Face Cache de la Lune era a de construir com um parceiro distante (e desconhecido) uma imagem hbrida e composta em tempo real, ressaltando essas presenas distantes com uma ao/criao comum e partilhada. A ambigidade estava na raiz da proposio: criar-se uma relao efmera em que o crescimento e a composio dependiam do outro e da dinmica do intercmbio. Tratava-se de explorao e descoberta conjuntas e instantneas, transporte e metamorfose incessantes, criao e partilha a grande distncia e alta velocidade. Esse projeto, entre outros, foi desenvolvido por mim no contexto da exposio Machines Communiquer lAtelier des Rseaux, na Cit des Sciences et de lIndustrie La Villette, em Paris. As primeiras imagens foram realizadas entre os Electronic Cafe de Paris e de Kassel (Documenta IX), na Alemanha, em junho 1992.

Vista do Atelier des Rseaux da exposio Machines Communiquer, na Cit de la Science et de lIndustrie. La Villette, Paris, novembro de 1991 julho de 1992 (foto Isabelle Millet)

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Projeto Moone: La Face Cache de la Lune. La Villette, Paris, e Electronic Cafe International, na IX Documenta de Kassel, 1992

Algumas imagens realizadas no projeto Moone

intercmbio e participaoCom os projetos telemticos estamos tratando de uma pluralidade participativa, ou seja, de perspectivas concorrentes, mas que guardam sempre a possibilidade de um dilogo. Dito de outra maneira, procura-se colocar em dilogo perspectivas diferentes para se assegurar uma abertura do campo artstico, construdo nesse caso por intermdio das redes. Com efeito, toda atividade artstica em rede implica a presena, a perspectiva do outro; nossos sentidos apenas existem na medida em que eles so tambm uma doao do outro. Em poucas palavras, podemos dizer que este trabalho de reinserir a contingncia do sujeito num trabalho coletivo no outra coisa seno o esforo de retornar ao sujeitoleitor, co-ator, toda a sua carga de responsabilidade. De fato, uma das idias diz respeito responsabilidade que deve guardar o interventor diante da sua participao. Transpostos ao plano da prtica, os intercmbios levam em considerao as relaes entre a validade primeira do projeto e a coerncia desenvolvida pela nossa participao crtica, entre a unidade que inaugura o projeto e a pluralidade possvel que venha a surgir. Em ocorrncia, temos um trajeto que no se tinha estabelecido anteriormente, que no se estanca num ponto determinado, numa perspectiva voluntariamente limitada do espao artstico-participativo, mas num mundo perpetuamente nascente. Podemos considerar a rede um grande campo de ao nmade aonde os atores vo descoberta de coisas algumas vezes precisas, outras vezes encontradas ao acaso, sonhando construir um mosaico com dados contguos, nos menores detalhes, mas no idnticos uns aos outros. Um mosaico onde a figura escondida pode surgir de um momento ao outro da configurao de suas caprichosas parcelas. O novo nmade se situa certamente sobre a grande cena tecnolgica e cultural de nossa contemporaneidade. O artista, eterno viajante no mundo, com seus personagens que no terminam de dizer bom-dia e adeus, que passam carregados de suas bagagens e histrias. Mas a criao no termina em um produto, ela , antes de mais nada, processo e engajamento no meio de dvidas, e se prolonga em cada um de ns. Cada artista, de acordo com seu estilo, testemunha uma experincia da paisagem telemtica atravessada em seu prprio ritmo, descartando-se do puro efeito tcnico para ater-se sobre nfimos eventos, que s vezes passam despercebidos no nosso cotidiano povoado de mquinas que funcionam em grande velocidade e marcado por enormes diferenas socioeconmicas. Num mundo onde tudo aparenta j ter sido pensado e realizado, as redes propem a seus parceiros novos territrios para o imaginrio. O trabalho artstico e o artista esto em profunda transformao. As redes permitem, ao menos aos que tm acesso a esses instrumentos de conhecimento/criao, sonhar juntos essa unio e essa partilha.

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Dito de outra maneira, trata-se de mover a sensibilidade, de ensin-la a se locomover nessa zona onde o imaginrio e o real se roam, se tocam, se permeiam, sem que haja uma linha de separao/continuidade bem definida. Isso significa que a cada troca/passagem, o artista/parceiro se engaja em um percurso de aprendizagem/participao que no se limita somente ao percurso em questo, mas que chama outros e ainda outros, em inumerveis caminhos, lembrando o Jardim de Borges, cujos caminhos se bifurcam infinitamente.

notas1 Uma primeira verso deste texto, agora ampliado e revisto, foi publicada sob o ttulo As redes artsticas telemticas. Imagens. Campinas, n. 3, p. 41-44, dez. 1994. 2 WEIBEL, Peter. Kontext kunst. Colnia: Dumont Buchverlag, 1994. 3 No Brasil, Paulo Laurentiz, Artur Matuck, Milton Sogabe, entre outros; em Chicago, Carlos Fadon Vicente, Irene Faiguenboim e Eduardo Kac. Para a relao completa de cidades e participantes, assim como textos sobre o projeto, ver OROURKE, Karen (Org.). Art-Rseaux. Paris: Cerap, 1992. 4 As primeiras experimentaes aconteceram em 31 de maio de 1991 entre Paris (Universit de Paris I - Centre SaintCharles) e Pittsburgh (Carnegie-Mellon University Studio for Creative Inquiry). Entre as vrias transmisses participaram Gilbertto Prado, Karen ORourke, Artur Matuck, Christophe Le Franois, Maria Matuck, Rachel Allard, Claudine Romeo, Patricia Franca, Isabelle Millet, Milton Dines, Paulo Souza e Annick Legoff, entre outros. Os resultados desse projeto foram apresentados na exposio Art-Rseaux, na Galerie Bernanos, Paris, em abril de 1992.

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captulo 2 cronologia de experincias artsticas nas redes de 1 telecomunicaes

Neste captulo no temos a inteno de apresentar uma relao exaustiva dos eventos telemticos, mas um apanhado geral de algumas dessas manifestaes significativas de uma poca e de todo um movimento artstico.

arte e telecomunicaes dos anos 70 aos 90Os trabalhos que esto descritos neste captulo se inscrevem no eixo das telecomunicaes, definido por transmisso eletrnica de informaes atravs de rede de computadores, slow scan TV (televiso de varredura lenta), telefones, satlites ou televiso.2 Neste tpico escolhemos nos orientar preferencialmente pelos intercmbios via fax e modem. No que diz respeito internet, cuja popularidade cresceu sobremaneira com o World Wide Web3 em meados de 1994, sua utilizao por artistas ser tratada no prximo captulo. Por esta razo, circunscrevemos o presente resumo cronolgico entre os anos 70 e comeo dos anos 90. Na medida em que valoriza a comunicao, a arte postal o primeiro movimento da histria da arte a ser verdadeiramente transnacional. Esta a razo de no podermos falar de redes artsticas sem nos referirmos mail art. Ao reunir artistas de todas as nacionalidades e inclinaes ideolgicas partilhando um objetivo comum, tratava-se de experimentar novas possibilidades e intercambiar trabalhos numa rede livre e paralela ao mercado oficial da arte. A mail art certamente uma das primeiras manifestaes artsticas a tratar com a comunicao em rede, em grande escala. Ela encontra suas origens em movimentos como Neo-Dad, Fluxus, Novo Realismo e o grupo japons Gutai, formado no fim dos anos 50, antecipando grandes mudanas que viriam a ocorrer no mundo das artes ocidentais, como o happening e a action painting. O ano de 1963, data de fundao da New York Correspondence School of Art pelo artista Ray Johnson, pode ser considerado a data de nascimento da arte postal.4 Nas diferenas entre a arte postal e as outras manifestaes artsticas em rede que comeam a emergir no incio dos anos 70 estavam as recentes interfaces eletroeletrnico/informticas e os novos dispositivos de comunicao, permeados pela tecnologizao em larga escala da sociedade, suas potencialidades e suas contradies.5 No incio da dcada de 1970 j existia por parte de alguns artistas a vontade e a inteno de utilizar meios e procedimentos instantneos de comunicao e suportes imateriais. No se desejava mais trabalhar com o lento processo de comunicao postal, era preciso fazer depressa e diretamente, passar do assncrono ao sincrnico. O desejo de instantaneidade e de transmisso em direto revelava que as questes de ubiqidade e de tempo real j estavam presentes nessa poca. Uma outra particularidade dos anos 70, segundo Carl Eugene Loeffler, era a caracterstica instrumental.6 Nesse perodo, comeavam a se estabelecer e se desenvolver as bases de uma relao entre arte e telecomunicaes, com artistas que criavam projetos de ordem global. Experincias em

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arte e telecomunicaes proliferaram, utilizando satlites, SSTV, redes de computadores pessoais, telefone, fax e outras formas de produo e distribuio por meio das telecomunicaes e da eletrnica. Um dos primeiros trabalhos artsticos realizados com fax7 foi o evento N.E. Thing Co, Trans Usi Connection Nscad-Netco, no perodo de 15 de setembro a 5 de outubro de 1969, no qual houve troca de informaes via telex, telefone e fax entre o Nova Scotia College of Art and Design e Iain Baxter, do N.E. Thing Co.8 Outra entre as primeiras utilizaes artsticas do fax como meio de transmisso de imagens e de composio a distncia foi a de Stan VanDerBeek. Em 1970, o artista, residente do Centre for Advanced Visual Studies, CAVS, no Instituto de Tecnologia de Massachusetts, no contexto de suas pesquisas, enviou durante um perodo de duas semanas imagens via fax para o Walker Art Center em Minneapolis. As imagens foram dispostas lado a lado e compuseram o trabalho Panels for the Walls of the World.9 Podemos tambm citar o evento Network70: NetCo, realizado na Fine Arts Gallery da Universidade de British Columbia em Vancouver, entre 7 e 24 de outubro de 1970. Foi estabelecida uma ligao transcontinental, via telex e fax, entre galerias e museus situados em Nova York, Los Angeles, Tacoma, Seattle, Halifax, North Vancouver e Vancouver.10 Nos anos 70, Sonia Sheridan desenvolveu uma srie de experimentaes utilizando tambm o fax, no contexto do seu programa Sistemas Geradores, no Instituto de Arte de Chicago. Seu eixo de pesquisa, no entanto, era mais dirigido para a transformao e composio de novas imagens, para a obteno de novos componentes plsticos atravs da modificao dos dados sonoros e tteis do fax e/ou interveno direta sobre o leitor do sistema.11 Em 1969 foi criada uma pequena rede experimental de computadores, ARPAnet, pela Advanced Research Projects Agency do Departamento de Defesa dos Estados Unidos, para permitir compartilhamento de recursos computacionais como a troca eletrnica de dados e a execuo remota de programas entre pesquisadores em universidades e outras instituies.12 A ARPAnet viria a ser o embrio da rede internet. A utilizao artstica das redes de computadores comea a ser trabalhada de maneira sistemtica somente a partir de 1980. Nesse ano, Robert Adrian props um evento chamado ARTBOX uma rede artstica de correio eletrnico , com ajuda da companhia multinacional I.P. Sharp, sediada no Canad.13 Mais tarde, o ARTBOX torna-se ARTEX, a pioneira das redes artsticas eletrnicas de acesso internacional, que foi a base de inmeros projetos de telecomunicao. Antes de iniciar o relato cronolgico dos eventos abaixo, gostaria de remarcar brevemente alguns artistas e o movimento da Esttica da Comunicao. Este movimento, campo de investigao que emergiu das novas tecnologias comunicacionais, foi fundado por Mario Costa, professor de esttica da Universidade de Salerno, com o artista francs Fred Forest e o artista argentino Horcio Zabala. Em 1983, definiram Esttica da Comunicao como verdadeiro e prprio evento antropolgico, capaz de

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reconfigurar radicalmente a vida do homem e a sua experincia esttica.14 A este respeito nos diz Walter Zanini: Os conceitos da Esttica da Comunicao que Mario Costa considera o pressgio de uma nova idade do esprito, baseada numa extraordinria fuso da arte, tecnologia e cincia foram por ele expostos consoante dez princpios fundamentais, publicados pela primeira vez na revista ArtMedia em 1986 e anos mais tarde em Leonardo. A esttica da comunicao afirma uma esttica de eventos. O evento definido em suas propriedades e, sinteticamente, podemos dizer: no se reduz a uma forma; apresenta-se como um fluxo espao-temporal, um processo interativo vivente; expande-se ilimitadamente no espao-tempo; sua importncia no reside no contedo permutado, mas nas condies funcionais da troca; seu processo se faz em tempo real; uma mobilizao de energia que substitui forma e objeto; o resultado de duas noes interativas temporais: o presente e a simultaneidade; consiste no emprego do espao-tempo para criar balanos sensoriais: refere-se particularmente s teorias da Escola de Toronto (de H. Innis a McLuhan) e a hipteses levantadas pelas pesquisas neuroculturais; ativa uma nova fenomenologia da presena puramente qualitativa e baseada na extenso tecnolgica planetria do sistema nervoso; o feeling de no se tratar do belo e sim do sublime e o fato indito de este poder ser pela primeira vez domesticado pela esttica da comunicao.15 Quanto aos artistas, remarcamos o j citado Fred Forest, que teve vrios envolvimentos com o Brasil, e que em Paris, em 1974, ao lado de Herv Fischer e Jean-Paul Thnot, criou o Collectif dArt Sociologique. Suas vrias aes do perodo 1962-1994 esto descritas em seu livro 100 Actions.16 Ainda entre os artistas, assinalamos a dupla Kit Galloway e Sherry Rabinowitz, citada logo abaixo por projetos com uso de satlites e pela criao do Electronic Cafe (Communication Access For Everybody) no Museu de Arte Contempornea de Los Angeles, em 1984, o qual posteriormente, sediado em Santa Mnica, na Califrnia, vai ser ponto de contato e conexo entre vrios projetos e artistas. Salientamos ainda Roy Ascott, artista e terico, considerado um dos pais da arte telemtica. autor do primeiro projeto de arte internacional, em 1980, de computer conferencing (sistema de comunicao via rede de computador que permite ler e responder a mensagens dos participantes em frum eletrnico pblico), entre o Reino Unido e os Estados Unidos, intitulado Terminal Consciousness, com uso da rede Planet, da sociedade Infomedia.17 E antes de iniciar a cronologia, assinalamos aqui no Brasil a 17 Bienal Internacional de So Paulo, com curadoria-geral de Walter Zanini, em 1983, que apresentou no seu setor de Novas Mdias o evento Arte e Videotexto, organizado por Julio Plaza com a participao de vrios poetas e artistas do pas; e, sob curadoria de Berta Sichel, uma rea de trabalhos composta de seis setores: cabodifuso, computadores, satlites de comunicao, varredura lenta-TV, videofone e videotexto. O catlogo da manifestao continha textos

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de Berta Sichel, Robert Russel (entrevistando Otto Piene),18 Marco Antonio de Menezes, Katty Huffman e Andr Martin. A iniciativa, mesmo com as grandes limitaes tecnolgicas do pas, representava um passo adiante dos projetos habituais da instituio.19

breve cronologia 1977-19941977 Com a inteno de fazer a conexo entre artistas atravs de meios eletrnicos, Willoughby Sharp, Liza Bear e Keith Sonnier criaram em Nova York o Send/Receive Satellite Network.20 O n da rede de artistas em So Francisco foi coordenado por Sharon Grace e Carl Loeffler. Nesse mesmo ano eles produziram 15 horas de transmisso entre as duas cidades.21 O primeiro trabalho do Send/Receive Satellite Network, Two-Way Demo, ligou artistas de Nova York e So Francisco durante trs horas, em 11 de setembro. Foi a primeira comunicao bidirecional por satlite entre artistas. As imagens foram transmitidas por redes de televiso de So Francisco e de Nova York. Segundo W. Sharp,22 transmisses como Two-Way Demo eram eventos muito complexos, muito caros e faltavam pessoas especializadas para coordenar os intercmbios. Douglas Davis, em colaborao com Nam June Paik e Joseph Beuys, realizou na inaugurao da Documenta VI, Kassel, Alemanha, um programa de televiso em direto que foi transmitido via satlite para mais de 30 pases. No fim, o autor convidava os espectadores a passar atravs da tela para se juntar aos outros participantes.23 Kit Galloway e Sherry Rabinowitz apresentaram pela primeira vez uma imagem composta interativamente por satlite: uma performance entre danarinos das duas costas dos Estados Unidos (Maryland e Califrnia), em que, graas a uma mixagem de imagens, puderam danar juntos, em tempo presente. O projeto Satellite Arts Projets foi feito em colaborao com a agncia espacial americana Nasa.

1978 O slow scan TV ou televiso de varredura lenta, de uma utilizao mais simples e menos cara que os satlites, comeava a ser experimentado e utilizado com sucesso. A primeira utilizao do sistema de slow scan TV como meio de interao artstica data de 29 de julho. O evento se intitulou Hands across the Board. O projeto foi organizado por Bill Bartlett, Liza Bear e Willoughby Sharp e ligava as cidades de Nova York, Memphis, So Francisco, Victoria, Vancouver e Toronto.24 Esse ano foi muito importante para as transmisses com slow scan, em razo das experincias de intercmbio entre Open Space Gallery (Victoria), Center for New Arts Activities (Nova York) e California College of Arts and Crafts (Oakland), com a participao de Mary Arnold, Bill Bartlett, Susan Corman, Gail Johnston, Jim Lindsay e Jimmy Starck. Essas transmisses de alguma maneira serviram como preliminares para o Sat-Tel-Comp Collaboratory, organizado por Bill Bartlett no Open Space Gallery, Victoria, Canad. Houve uma srie de transmisses slow scan, com demonstrao de material, documentao, conferncias e atelis acessveis ao pblico.25

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1979 Foi a partir desse ano, com Interplay: Computer Culture/Interactive Communications,26 sob a coordenao de Bill Bartlett, que as redes de comunicao artstica comearam a atravessar os oceanos em direo Europa e Austrlia. Este evento fazia parte do Computer Culture Exposition, onde um ateli foi criado, utilizando-se a rede IPSA, composto de 22 centros e indivduos dispersos, na Europa, Austrlia e Amrica do Norte.

1980 Assinalamos o evento Artists Use of Telecommunications: Live International Video and Nodio Link, no Museu de Arte Moderna de So Francisco. Um projeto de Art/Com/La Mamelle, Inc., organizado por Bill Bartlett, Sharon Grace e Carl Loeffler. Um projeto com comunicaes via slow scan e ligaes por computador entre vrios artistas: Hank Bull, Kate Craig e Glen Lewis (Vancouver); John Southworth (Hava); Michel Goldeberg (Tquio); Norman White (Toronto); Douglas Davis e Martin Neisenholtz/Liza Bear e Willoughby Sharp (Nova York); Aldo Tambellini (Cambridge); Mike Powell (Victoria); Robert Adrian, Grita Insan e Kunstlergruppe (Viena).27 Por meio de ligaes por satlites, Kit Galloway e Sherry Rabinowitz fizeram o Hole in Space, um dispositivo com cmeras de vdeo atravs do qual o pblico podia comunicarse entre Nova York e Los Angeles.28 Sublinhamos a criao da ARTBOX por Robert Adrian, graas utilizao do sistema I.P. Sharp. Esta caixa postal eletrnica, que mais tarde vai se chamar ARTEX, foi a primeira base para os artistas interessados em telecomunicaes: ela serviu como veculo privilegiado de vrios projetos e intercmbios de informaes.29 Assinalamos o primeiro projeto de computer conferencing utilizando sistema interativo informatizado. Roy Ascott realizou seu projeto de telemtica chamado Terminal Consciousness entre a Inglaterra e os Estados Unidos. Para tal, Ascott utilizou o sistema Notepad da sociedade Infomedia, que permitia estocar e estruturar a paginao de um texto.30 Em 31 de outubro aconteceu o primeiro contato via fax entre artistas no Brasil. Os protagonistas foram Paulo Bruscky no Recife e Roberto Sandoval em So Paulo.

1981 Telecommunications Performance via Facsimile, entre Tom Klinkowstein, no Mazzo Nightclub, Amsterd, e Robert Adrian, no Blitz Bar, Viena. Depois do intercmbio de imagens previsto, o pblico pde tambm participar com o envio de textos, desenhos e Polaroids. Eles estavam tambm conectados rede eletrnica da ARTBOX.31 LexsSor - (Avant Garde Art Review Magazine), projeto organizado por Steve Soreff, consistia na transmisso de pgina por pgina de livros de artistas.32 Kunst-Microkunst-Macrokunst, projeto de comunicao por computador, foi organizado por Robert Adrian entre as cidades do Zagreb, de Amsterd e de Viena.33

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1982 Tom Klinkowstein concebeu Levittown, performance de telecomunicao utilizando, entre outros meios, slow scan, fax, vdeo e diapositivos.34 Telesky, primeiro evento de telecomunicaes na Austrlia, foi organizado por Eric Gidney entre o Paddington Town Hall, em Sydney, e o MIT, em Cambridge, Massachusetts.35 Entre as primeiras manifestaes de aes telemticas, sublinhamos, no mbito do Ars Electronica, o projeto The World in 24 Hours, organizado por Robert Adrian. A manifestao se desenrolou nos diversos continentes, com artistas de vrias cidades: Helmut Mark (Viena); Roy Ascott (Bath); David Garcia (Amsterd); Thomas Bayrle (Frankfurt); Bruce Breland (Pittsburgh); Derek Dowden (Toronto); Sarah Dickson (Wellflet); Tom Klinkowstein (So Francisco); Hank Bull (Vancouver); Eric Gidney (Sydney); Kazue Kobata (Tquio); John Southworth (Honolulu); Zona (Florena); annimo (Istambul); e Hartmut Geerken (Atenas). As transmisses foram estabelecidas com slow scan, fax e computador.36 Telefonmusik, Wien-Berlin-Budapest foi organizado por BLIX (Robert Adrian e Helmut 37 Mark) em Viena, Rainald Schumacher em Berlim e Artpool em Budapeste (G. Galantai). Em So Paulo, Arte pelo Telefone, projeto artstico em videotexto com coordenao e participao de Julio Plaza, com Carmela Gross, Lenora de Barros, Leon Ferrari, Mrio Ramiro, Omar Khouri, Paulo Miranda, Paulo Leminski, Rgis Bonvicino e Roberto Sandoval.38 Em 27 e 28 de setembro foi realizada a ao artstica Wiencouver III, entre Video Inn, em Vancouver, e General Idea, em Toronto, utilizando computador (rede I.P. Sharp), slow scan e fax.39 O projeto de comunicao interativa de Fred Forest La Bourse de lImaginaire realizou-se no Centre Georges Pompidou em Paris, utilizando telemtica, televiso, rdio e telefone.40 Bernd Kracke realizou Ecoute com Tes Yeux Regarde com Tes Oreilles, uma performance com slow scan entre Boston e So Francisco.41 No mesmo ano foi realizado um intercmbio de imagens artsticas por slow scan, entre Paris e vrias cidades americanas, organizado por Don Foresta durante a Bienal de Paris.42

1983 No Museu de Arte Moderna de Paris, no contexto da exposio Electra Llectricit e llectronique dans lart au XXe sicle, Roy Ascott realizou La Plissure du Texte, um recital coletivo por intermdio de telescriptores. Participantes de diversas origens construram um texto via IPSA, privilegiando a potencialidade da construo coletiva em uma escala global.43 A videotransmisso simultnea interativa Hommes, Images, Machines foi organizada por Jacques Polieri de Cannes com correspondentes em Tquio e Nova York.44 Wagner Garcia e Mrio Ramiro criaram Clones uma Rede de Rdio, Televiso e Videotexto, uma instalao com terminais de videotexto, monitores de TV, rdio e alto-falantes com a recepo sincronizada das trs transmisses no Museu da Imagem e do Som de So Paulo. Assinalamos tambm, em 31 dezembro, Good Morning Mr. Orwell, transmisso interativa via satlite entre Nova York WNET e Paris FR3. O projeto de Nam June Paik faz uma homenagem/referncia ao romance 1984, de George Orwell (1949).

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1984 Durante a primeira transmisso via slow scan por rdio, no Festwachen Kunstfunk Technology Exhibition, pelo Carnegie Mellon Amateur Radio Club Pittsburgh, Mike Chepponis (grupo DAX) enviou trabalhos de Bruce Breland e Jim Kocher para Viena (Hans Hahn).45 O projeto Contact, de Natan Karczmar, em Tel-Aviv, utilizou uma rede de 24 aparelhos telefnicos.46 O Electronic Cafe international (Comunicao Access for Everybody) uma rede de criao interativa e de comunicao em que os pontos de acesso so terminais que utilizam o vdeo, a informtica, as comunicaes e suas fontes. O primeiro prottipo foi criado com base em projeto homnimo de Kit Galloway e Sherry Rabinowitz. Mais tarde se tornou um espao permanente em Santa Monica, na Califrnia, onde os artistas desenvolveram outras aes e participaram de vrias manifestaes. pARTiciFAX, intercmbio de imagens por fax organizado em Toronto por Lisa Sellyeh e Peter Seep, teve participao de 26 pases. O projeto Vidiotex Art Network (VAN) com o grupo de trabalho da Hochschule fr Gestaltung em Offenbach, foi dirigido por Manfred Eisenbein.47 Maria Grazia Mattei organizou entre 21 de junho e 1 de julho em Pavia, Itlia, Telefaxart: Machina/Memory, projeto de intercmbio via fax. No Museu de Sannio, Benevento, na Itlia, aconteceu Labyrinthe, organizado por Marc Denjean, um projeto telemtico entre Frana e Itlia.48 Em setembro, em Lyon, na ELAC, Jacques-Elie Chabert realizou seu projeto de romance 49 telemtico Vertiges em pginas de tela de videotexto com mltiplas opes, no Minitel.

1985 Landscapes: Paradise, intercmbio via fax que solicitava tambm a participao de crianas, foi realizado em Turim, Itlia, no ms de maio. Amico di Telefax, organizado por Maria Grazia Mattei, realizou-se tambm em Turim no ms de junho, com crianas da cidade e de Paris e Viena. Roy Ascott concebeu Organe et Fonction dAlice au Pays des Merveilles, um videotexto no Minitel. Plissure du Texte fez parte do programa do Art Access no contexto da exposio Les Immatriaux, no Centre Georges Pompidou, Paris. No ms de outubro, na exposio Arte: Novos Meios/Multimeios Brasil 70/80, em So Paulo, apresentaram-se os seguintes trabalhos: Fac-Similarte, projeto fax de Paulo Bruscky e Roberto Sandoval (proposio de outubro de 1980); Caricaturas e A Arte na Trama Eletrnica, projetos artsticos em videotexto de Rodolfo Cittadino; e Arte Videotexto, de Julio Plaza, com participao de Alex Flemming, Alice Ruiz, Augusto de Campos, Carmela Gross, Leon Ferrari, Lenora de Barros, M. Jos Palo, Lucia Santaella, Mnica Costa, Nina Moraes, Omar Khouri, Paulo Leminski e Paulo Miranda.50

1986 Planetary Network and Laboratory Ubqua foi realizado na Bienal de Veneza. O Laboratory Ubiqua teve como organizadores Roy Ascott, Don Foresta, Tom Sherman e

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Tomaso Trini. Maria Grazia Mattei foi a coordenadora das transmisses via fax. O tema do projeto era Daily News, e mais de uma centena de artistas dos trs continentes estabeleceram contatos atravs de uma imensa rede ligada por videotexto, slow scan e fax.51 O projeto Bras-de-fer Transatlantique, encabeado por Mario Costa e Derrick de Kerckhove, foi posto em funcionamento por Doug Back, Norman White e Carl Hamfeldt. Tratava-se de um brao mecnico ativado por computador e modem, que tinha por funo o efeito de transmitir a sensao da presso exercida. Os primeiros testes entre Toronto e Salerno, em maio, no foram muito satisfatrios. Em compensao, em junho o evento se mostrou operacional entre Paris e Toronto. Efetivou-se o projeto de David Rockeby, que consistia em enviar e receber, por telefone, vdeo, computador, MIDI e sintetizador, sensaes provenientes dos movimentos de dois 52 danarinos das duas costas do Atlntico (Paris/Toronto). Em outubro, Stphan Barron organizou La Nuit Internationale de la Tlcopie, da cidade de Caen, em ligao com Amiens, Paris, Nova York, Bruxelas e Roma.53 Podemos assinalar tambm um outro projeto fax, Line of the Horizon, de Mit Mitropoulos, que se apresentou como um projeto de arte geopoltica54 que consistia na criao de uma rede com 27 ns, em que os participantes enviavam representaes de suas respectivas linhas de horizonte, criando assim um horizonte conceitual em escala global. Este projeto foi apresentado na Bienal Mediterrnea, na Grcia. O projeto fax de Toni Calvet, Transatlantic Copy-Art/Performance, realizou-se da KGB de Barcelona (Espanha) Galeria 2, no Soho, Nova York. Escritores e artistas grficos se reuniram para uma noite interativa no projeto Telegraffitirons. Foram realizados intercmbios por fax entre Roma, Caen, Nova York (Fashion Moda), Amiens, Bruxelas e Paris (Galerie Donguy).55 Na noite de 14 de outubro, com a coordenao de Joe Davis e a colaborao de Jos Wagner Garcia (fellow do Center for Advanced Visual Studies, CAVS), realizou-se uma edio especial de Sky Art Conference. Tratou-se de uma transmisso com slow scan entre artistas de So Paulo localizados no campus da USP e artistas americanos localizados no CAVS, em Cambridge, numa ao telemtica interativa internacional indita no Brasil. Em So Paulo, as imagens vindas dos Estados Unidos foram vistas em tela mltipla para 12 projees de vdeo, acompanhadas por um pblico numeroso de artistas, professores e estudantes. Nos Estados Unidos, a coordenao esteve a cargo de Otto Piene e Elizabeth Goldring. Entre os participantes figurava Nam June Paik, que apresentou SKY-TV. O artista coreano passou a imagem de um ideograma representando uma partitura sincronizada com o som da violoncelista Charlotte Moorman que, todavia, no pde ser ouvido. Entre os organizadores do encontro telemtico no Brasil encontravam-se os professores Walter Zanini e Frederic Michael Litto, da ECA/USP, e os artistas Julio Plaza, Artur Matuck, Marco do Valle, Jos Wagner Garcia, Mrio Ramiro e Guto Lacaz, os compositores de msica eletrnica Conrado Silva e Wilson Sukorski e o poeta Augusto de Campos, entre vrios outros participantes.56 No encerramento do encontro, Otto Piene transmitiu a primeira verso do Manifesto Sky-Art, que recebeu adeses dos participantes. O texto seria reelaborado aps serem ouvidos os participantes, e preparado em verso definitiva por Lowry Burgess, Otto Piene e Elizabeth Goldring, em Paris, sendo datado de 3 de

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novembro. Posteriormente foi includo no artigo Desert Sun/Desert Moon, de Elizabeth Goldring, publicado na revista Leonardo, n 4, de 1987.57

1987 Em Paris, realizou-se o projeto por Minitel Message Interplantaire, de Jean-Marc Philippe, e a operao Message des hommes lunivers (conduzida entre junho de 1986 e janeiro de 1987).58 Foi apresentado em Roma, Itlia, de 27 a 30 de abril, o projeto Videolento 1987, transmisso em rede de slow scan concebida por Giovanna Colacevich. Em 20 de junho, na Documenta VIII, Hank Bull produziu tambm uma teleconferncia de Kassel, Alemanha. Os participantes se encontravam no Banff Centre for the Performing Arts (Banff), Massachusetts College of Arts, The Western Front (Vancouver, British Columbia, Canad), Carnegie-Mellon University (Pittsburgh) e no Electronic Cafe em Nova York. Realizaram-se os eventos 40000, concebido por Andreas Raab, e Il Serponte de Pietra, produzido por Sandro Dernini e Franco Meloni, para celebrar o 100 aniversrio da descoberta do eletromagnetismo por Nicolas Tesla, nas redes I.P. Sharp, Bitnet e Earn.59 Um projeto de intercmbio de imagens digitais denominado Digital Body Exchange foi concebido por Roy Ascott em colaborao com Paul Thomas (Perth), Eric Gidney (Sydney), Zelko Wiener (Viena), Robert Pepperell (Londres) e Robert Dunn e Bruce Breland (Pittsburgh). Em outubro, durante uma viagem de trem, Stphan Barron realizou Orient-Express, em que 25 Polaroids foram feitas a cada hora e enviadas mais tarde por modem, de Budapeste a Paris.

1988 O evento Intercities: So Paulo/Pittsburgh intercmbio de imagens via slow scan entre o Instituto de Pesquisas em Arte e Tecnologia, Ipat,60 de So Paulo, e o Digital Art Exchange, DAX, da Universidade de Carnegie-Mellon, Pittsburgh foi coordenado em So Paulo por Artur Matuck e Paulo Laurentiz, e em Pittsburgh por Bruce Breland.61 Participou do evento o projeto Still Life/Alive, de Carlos Fadon Vicente.62 De 21 de janeiro a 13 de maio, Fred Forest realizou sua ao miditica A la Recherche de Julia Margaret Cameron, na cidade de Toulon, utilizando particularmente a televiso, o rdio e o jornal.63 Em 8 de abril ocorreu o dilogo via fax e canal de TV entre Mrio Ramiro, na TV Cultura de So Paulo, e Eduardo Kac, em seu estdio no Rio de Janeiro.64 O trabalho se chamou Retrato Suposto Rosto Roto. Na Itlia, Giovanna Colacevich concebeu durante o ms de maro o projeto Videolento 1988, entre Roma, Milo e Ferrara, e em outubro Fax for Pax, na cidade de Cantanzaro. Em setembro, um evento coletivo por fax foi apresentado na cidade de Camerino, na Itlia, com a participao de Roy Ascott, Giovanna Colacevich, Fred Forest e Tom Klinkowstein. No ms de novembro, em Ferrara, Itlia, um outro projeto fax, denominado Cavallo Telematico, foi concebido por Gianni Loperfido.65 Por ocasio do dcimo aniversrio do Francophone Development Management Seminar, FDMS, na Universidade de Pittsburgh, uma transmisso interativa foi realizada entre o campus da universidade e os atelis do grupo DAX na Universidade Carnegie-Mellon. O

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projeto se chamou Une Excursion de Lesprit - un Voyage sur la Mer Telemtica: un Evenement Dart Interactive.66 Em 4 e 5 de novembro, no Centre Culturel Canadien de Paris foi realizada a videoconferncia Les Transinteractifs, coordenada por Derrick de Kerckhove entre Paris e Toronto. Nesse mesmo evento realizou-se uma srie de manifestaes: Le Ruban de 7253 Kilomtres, entre Paris e Toronto, de Fred Forest; Le Toucher Transatlantique, de Christian Sevette; Dcouvrez o Canad, de Patrick Lee; Alice, de Stphan Barron; change de Neurones, entre Paris e Toronto, de Philippe Helary; Aparts, de Wolfgang ZiemerChrobattzek; La Pense Musicale Transatlantique, de Randy Raine-Reusch; Champs Informatiques, de Christian Lavigne; Transitercaricatures, de Natan Karczmar; Mridiennes, de Denise Bertrand; Corps Vibratoire, de Bure-Soh; Laube de Lre Nouvelle, de Doug Hamburgh; La Danse Transatlantique, de David Rockeby; Le Mandala, de Vincent John Vincent; Satellite Breaks, de Muhtadi e Keith Holding; e Toparontoris, de JeanClaude Anglade.67

1989 Em fevereiro o projeto Arte Fax 1 foi organizado por Maurcio Guerreiro na Escuela de Pintura, Escultura y Grabado La Esmeralda, Mxico, no contexto da exposio Electrosensibilidad, com participantes na Cidade do Mxico, Baltimore, Estados Unidos, e Copenhague, Dinamarca. Em maro ocorreu o Faxarte I, intercmbio entre a Escola de Comunicaes e Artes da Universidade de So Paulo, ECA/USP, e o Instituto de Artes da Universidade de Campinas, IA/Unicamp, So Paulo, coordenado por Artur Matuck e Paulo Laurentiz. Em 6 de junho, os estudantes dessas mesmas universidades participaram do Faxarte II, sob a coordenao de Artur Matuck, Shirley Miki e Gilbertto Prado. Participaram os artistas Anna Barros, Artur Matuck, Cristiane Aun, Claudia Del Canton, Gilbertto Prado, Laura Martirani, Lucia Fonseca, Marco do Valle, Milton Sogabe, Paulo Laurentiz, Shirley Miki, Rejane Augusto e Regina Silveira. Em setembro, no contexto da exposio Ars Electronica, foi realizado o projeto Aspects of Gaia, concebido e coordenado por Roy Ascott com a colaborao de Peter Appleton, Mathias Fuchs, Robert Pepperell e Miles Visman. Eles criaram nos trs continentes uma rede de vrios artistas que enviaram imagens digitais, textos e sons que integraram uma instalao interativa pblica.68 Em setembro, a instalao interativa Face--Face 4, de Mit Mitropoulos, foi realizada na Holanda. Nela duas pessoas podiam se comunicar interativamente por meio de monitores de televiso.69 De 7 a 19 de setembro foi realizado o projeto fax Lines, de Stphan Barron e Sylvia Hansmann. Eles enviaram imagens e textos via fax ao longo do meridiano de Greenwich (desde Villiers-sur-Mer at Castellon de la Plana).70 Em Viena, o projeto Trkpek Maps na Hochschule fr Angewandte Kunst/Lehrkanzel fr Kommunikationstheorie, com o intercmbio de sons, imagens e textos, teve a participao de Robert Dunn, Dana Moser, Gbor Kopek, Irene e Christine Hohenbchler, Stefan Back, Mathias Fuchs, entre outros. Realizaram-se dois projetos Minitel: Rpublique, criao de Philippe Helary, em Ajaccio, na Crsega, e Le Rservoir, de Jean-Claude Anglade, em Noisiel.71

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Em 24 de novembro, Natalia Cucieniello realizou o projeto Transmission Point, no Studio Morra, em Npoles, Itlia. No fim do ano, por ocasio da exposio LEurope des Crateurs Utopies 89, no Grand Palais, em Paris, Philippe Helary e Giovanna Colacevich apresentaram o projeto fax cho e Narcissus.72 Igualmente na exposio LEurope des Crateurs, Pierre Comte apresentou seus trabalhos de arte espacial como parte do seu projeto ARSAT Slnopolis.73 Entre os dias 11 e 15 de dezembro, as primeiras imagens via fax no projeto City Portraits, concebido por Karen ORourke, foram intercambiadas entre o grupo Art-Rseaux, em Paris, e outros artistas nas cidades de Dsseldorf, Filadlfia e Campinas.74

1990 Em 28 de fevereiro, sublinhamos o projeto de Paulo Laurentiz LOeuvre du Louvre, em que artistas localizados em Campinas invadiram com envios de fax o Museu do Louvre, em Paris, durante o carnaval. Participaram Anna Barros, Lcio Kume, Mario Ishikawa, Milton Sogabe, Paulo Laurentiz e Regina Silveira. Na Itlia, em 10 de maro, foi realizado o evento de intercmbio de imagens via fax Nave di Luce, entre Siena (Palazzo Pblico Maggazine del Sale) e Florena (Conservatore de Musica), organizado por Marcello Aitiani e Francesco Giomi.75 Para celebrar o Dia da Terra, o grupo DAX, situado na Universidade de Carnegie-Mellon, Pittsburgh, organizou o projeto Earthday 90 Global Telematic Network & Impromptu.76 Foram estabelecidos contatos via slow scan e fax entre artistas das cidades de Viena, Lisboa, Campinas, So Paulo, Boston, Baltimore, Pittsburgh, Chicago, Vancouver e Los Angeles. Por intermdio do Caf Eletrnico de Santa Monica, Tquio e Moscou estiveram ligadas por videofone. Este evento foi realizado nos dias 21 e 22 de abril. Participaram, entre outros artistas, Andr Petry, Anna Barros, Artemis Moroni, Artur Matuck, Carlos Bottesi, Carlos Fadon Vicente, DAX Group, Eduardo Kac, Elisabeth Bento, Ernesto Mello, Eunice da Silva, Gilbertto Prado, Hank Bull, Hermes Renato Hildebrand, Irene Faiguenboim, Karen ORourke, Mrio Ramiro, Milton Sogabe, Paulo Laurentiz e Roy Ascott. Em 29 de abril foram realizados um intercmbio de imagens e a exposio do projeto City Portraits, concebido por Karen ORourke, com imagens realizadas pelo grupo ArtRseaux (Christophe Le Franois, Isabelle Millet, Delphine Notteau, Laurence Naud, Karen ORourke, Gilbertto Prado, Hlne Spychiger, Michel Suret-Canale, entre outros) e seus correspondentes de nove cidades europias e americanas, na Galerie Donguy, em Paris. Virtual Cultures, organizado por Anna Couey (ArtCom), foi apresentado no Cyberthon Whole Earth Institute. Tratava-se de um painel virtual assncrono no qual os interventores de diferentes comunidades puderam dialogar por intermdio das redes de computadores WELL e USENET. Biographateria foi apresentado na exposio Art Transition90 (Center for Advanced Visual Studies - MIT) por Tim Anderson e Wendy Plesniak, do Studio for Creative Inquiry, SFCI, Universidade de Carnegie-Mellon, Pittsburgh. O projeto descrevia uma base de dados pessoal e biogrfica e um simpsio online.77 Entre/Sortie, projeto sonoro e visual, foi organizado por Mathias Fuchs e Sylvia Eckermann, com a participao da rdio austraca Kunstradio (Heidi Grundman). Em junho, no evento Arts Rencontres Internationales, em Albi, Frana, Bure-Soh, com

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seu espao sonoro interativo, transformou movimentos em sinais sonoros, criando por telefone uma composio interativa entre Colnia, Berlim e Albi.78 Tambm em junho, a exposio Fax Arte, com vrios participantes, foi exibida na Faculdade Santa Marcelina, So Paulo. Em agosto, a exposio Arte Fax e Heliografia, de Paulo Bruscky e Daniel Santiago, foi montada na Galeria do Instituto de Artes da Unicamp, Campinas, So Paulo. De 7 a 22 de setembro, o Electronic Cafe International, em Santa Monica, Califrnia, promoveu uma srie de eventos, performances poticas, dana, intercmbios de mensagens, leituras etc., com videofone, fax, slow scan, em conexo com vrias cidades. Em outubro, durante a exposio Artifices, Art Lordinateur: Invention, Simulation, em Saint-Denis, no contexto de transmisso por rede de imagens numricas, foi apresentado Le Collectif Transport, messagerie de imagens numricas coordenado por Liliane Terrier, com a participao de vrias escolas de arte e de diferentes autores. O grupo Art-Rseaux realizou em 9 de outubro, na cole dArts Plastiques de Rosny-sous Bois, intercmbios sobre o tema Le Dessus de la Cidade. Entre os artistas presentes, Karen ORourke, Christophe Le Franois, Isabelle Millet, Gilbertto Prado, Jean-Claude Anglade, Delphine Notteau, Laurence Naud e Hlne Spychiger. De 19 a 21 de outubro, no contexto do evento People to People, a ao fax Manufaxtura foi coordenada por Jean-Claude Anglade, Patrick Dupuis e outros, em Praga, na Checoslovquia. Em 22 de novembro, ligao por rdio e telefone entre Paris e Moscou marcou a performance de Fred Forest Le Sens de Lhistoire. Entre os dias 10 e 11 de dezembro, foi realizado por Andr Petry o projeto fax de intercmbio de imagens Poticas Instantneas, entre as cidades de Campinas, So Paulo, e Porto Alegre, Rio Grande do Sul.79 Na passagem do ano de 1990 para 1991, Paulo Laurentiz coordenou o projeto No Time, entre o Brasil (IA/Unicamp) e o Japo (College of Arts of Kyoto). Esse projeto consistiu em transmisso via computador/modem e fax, durante as 12 horas do evento (meio-dia de 31/12/90 meianoite do mesmo dia, horrio de Braslia). A proposta foi trabalhar no perodo de diferena de fuso horrio entre os dois pases. Participaram do evento Paulo Laurentiz e Milton Sogabe, nos trabalhos grficos, e Jos Augusto Mannis e Eiko Akiyama, nos trabalhos sonoros.

1991 Em 17 de janeiro, para celebrar o 1000028me Anniversaire de Lart,80 foi organizado pelo Western Front Vancouver, Canad, um evento de arte-telecomunicao utilizando fax e slow scan entre vrias cidades.81 Em 1992, na mesma data, foi celebrado mais um aniversrio. Em 21 de janeiro, Lilian A. Bell realizou Fake/Faxed/Facade, fax/performance/instalao entre os Estados Unidos e San Jos (Costa Rica), no contexto da exposio Piedras de Papel, Materiales Humanos, no Centro Cultural Costarricense Norteamericano. Nos dias 23 e 24 de maro, o projeto texts, bombs & vdeo tape, organizado pelo grupo DAX em Pittsburgh, contou com a participao de vrios correspondentes. Em 31 de abril, o primeiro intercmbio de Connect, projeto de Gilbertto Prado, foi realizado em Paris com o grupo Art-Rseaux, Artur Matuck e outros participantes em The Studio for Creative Inquiry da Universidade de Carnegie-Mellon, Pittsburgh.

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O projeto Telesthesia, de Artur Matuck produo de um texto interativo por rede de computador, correio eletrnico , recebeu apoio do The Studio for Creative Inquiry de Pittsburgh e da Universidade de So Paulo.82 A primeira apresentao ao pblico do Caf lectronique de Paris aconteceu na Cit des Sciences et de lIndustrie La Villette, nos dias 25 e 26 de maio.83 Em Paris, sob a organizao de Don Foresta e George-Albert Kisfalaudi e equipe, Kit Galloway e outros participantes estabeleceram contatos e intercmbios de documentos com Sherry Rabinowitz e outros participantes de So Francisco. Em junho realizou-se conexo de Timothy Leary, em Santa Monica, no Electronic Cafe International, com Barcelona, na exposio Art Futura. Em 7 de junho, o II Studio Internacional de Tecnologias de Imagem, organizado por Luiz Monforte, no Sesc Pompia/Unesp, So Paulo, contou com uma srie de envios via fax de artistas de diferentes provenincias. Em Paris, os artistas estavam localizados no Centre Cnon e produziram o trabalho Bons Baisers de Paris, com James Durand, Nathalie Hamard-Wang, Gilbertto Prado e Christophe Le Franois. Em 13 de agosto, Faxelastico, projeto de Eduardo Kac, integrou a exposio Luz Elstica, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Stphan Barron realizou Les Plantes de Mon Jardin, que consistiu em envios cotidianos de imagens de plantas do seu jardim em Hrounville Saint-Clair (Frana), por fax, para a Galerie Spala, Praga, Checoslovquia. Em setembro, o projeto Artefax: Graphies dEurope, de Vincent Vasseur, foi realizado no Centre dExpositions e Congrs dAmiens, na Frana. Em outubro, a instalao miditica de Fred Forest remplir, distance, un rservoir par tlphone integrou a exposio Machines Communiquer Latelier des Rseaux, na Cit des Sciences e de lIndustrie, Paris. Em abril de 1992 o trabalho foi novamente exposto no prdio da Molle Antonelliana, Turim, Itlia. Em novembro aconteceram os primeiros intercmbios do projeto de ao interativa por modem Raction en Chane, de Gilbertto Prado, membro do grupo Art-Rseaux. O projeto integrou a exposio Machines Communiquer Latelier des Rseaux, na Cit des Sciences et de lIndustrie, em Paris. Nos dias 9 e 10 de novembro a instalao fax Le Driveur, por Jean-Claude Anglade, Patrick Dupuis e Grard Pel, participou do evento Parade Sauvage pour Arthur Rimbaud, no Grande Halle de La Villette, em Paris. De setembro a dezembro, por ocasio da 21 Bienal Internacional de So Paulo, Artur Matuck concebeu e coordenou o projeto Reflux. Ele props ligaes telemticas entre vrios ns e convidava os participantes a interagir com seus projetos os influxos. Entre outros, podemos citar: Langterra Dymaximal Terristory, de Artur Matuck e Robert Rogers (The Studio for Creative Inquiry, Pittsburgh); Image Locale, Image Globale, de Karen ORourke (Art-Rseaux, Paris); Traces, de Gilbertto Prado (Art-Rseaux, Paris); Clothfax, performance fax de Otavio Donasci (So Paulo); Hydra, de Vernon Reed (Sausalito, Califrnia); Geography of the Intimate, projeto de Brian Andreas (Berkeley, Califrnia); Communications across Borders, por Anna Couey - Art Com (So Francisco, Califrnia); wrap, unwrap, proposto por Varia qua da (Pierre Granoux, Sarah Vaughan e Anne Vidal) (Aix en Provence, Frana).84

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Em dezembro ocorreram os projetos de intercmbio de imagens fax provenientes de Gwent, Inglaterra: Where Is a Human Being?, por Richard Stock, e New Docs, por Robert Emery e Rupert Murrel.

1992 Em 7 de abril, o projeto fax Patchwork, de Isabelle Millet, foi apresentado durante o vernissage do grupo Art-Rseaux na Galerie Bernanos, Paris. Em abril, o projeto fax How do You Imagine the City of Compigne?, de Daniel Daligand, integrou a exposio Drles Denvois, no Centre Culturel de Compigne. Ainda em abril, o projeto fax Art Response, por Lora Jost, foi realizado em Madison, Wisconsin, Estados Unidos. No dia 2 de maio, o Decentralized World-wide Networker Fax Congress, organizado por John Held Jr., realizou-se na Dallas Public Library, Texas. Em maio, a instalao fax Earth Summit Fax, de Lilian A. Bell, participou da exposio Omame Project (Ben Fonteles & Lia do Rio), em Braslia. O projeto Infest, de Christophe Le Franois, do grupo Art-Rseaux, realizou envios e intercmbios de imagens por fax e modem no contexto da exposio Machines Communiquer Latelier des Rseaux, na Cit des Sciences et de lIndustrie, Paris. De maio a junho Le Banquet Tlmatique, projeto fax de Michel Suret-Canale com Marie-Dominique Wicker, do grupo Art-Rseaux, realizou-se ainda no contexto da exposio Machines Communiquer Latelier des Rseaux, na Cit des Sciences et de lIndustrie, Paris. Os convivas artistas plsticos, pesquisadores e escritores foram convidados a participar de um dos cinco servios, com seus envios pessoais de natureza e provenincia diferentes, recolhidos num s local de convergncia.85 De maio a setembro, realizou-se a instalao Telematic Dreaming, de Paul S. Sermon, no contexto da exposio Koti, na Galeria Kajaani, Finlndia. Tratava-se de dois leitos de casal, fisicamente distantes, conectados por ligao vdeo. A instalao permitia ao artista estar simultaneamente nos dois locais, com uma eventual parceira. O projeto foi igualmente apresentado no Ars Electronica 93, em Linz, ustria. Gnrateur Poitique, proposio de Olivier Auber, foi apresentada no Atelier des Rseaux, no contexto da exposio Machines Communiquer Latelier des Rseaux, realizando-se em torno de um programa informtico que gerava as relaes entre nove terminais do tipo Minitel e um televisor, que os reagrupava num mesmo local. Em junho, o projeto fax The Longing of the Electronic Media for Nature, de Pietro Pellini e Yola Berbes, foi reali