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Índice
Nota Editorial — Da ‘arété’
ou excelência no desporto,
na educação e na vida.
Jorge Bento.
A excelência no Desporto:
Um estudo com o tetra-campeão
nacional de ralis.
Emanuel Figueiredo, Cláudia Dias,
Nuno Corte-Real, António Manuel Fonseca.
Estudo de determinantes tácticas
da eficácia do ataque
no Voleibol feminino juvenil
de elevado nível de rendimento
no side-out e na transição.
Gustavo de Conti Costa, Isabel Mesquita,
Pablo Juan Greco, Auro Barreiros Freire,
José Cícero Moraes.
9
12
33
47
62
78
96
115
Propriedades psicométricas
e estrutura factorial da versão portuguesa
do Parent-Initiated Motivational Climate
Questionnaire-2 (PIMCQ-2p).
Paula Santana, Teresa Figueiras, Cláudia Dias,
Nuno Corte-Real, Robert Brustad, António Manuel Fonseca.
Preditores da utilização de substâncias
anabolizantes e ergogênicas em Academias.
António Labisa Palmeira, Margarida Gaspar de Matos.
Investigação em expertise decisional
em jogos desportivos: Paradigmas,
métodos e desenhos experimentais.
José Afonso, Júlio Garganta, Mark Williams,
Isabel Mesquita.
Da participação ao abandono
da prática desportiva.
António Manuel Fonseca, Nuno Corte-Real, Cláudia Dias.
Como envelhecer sem dor.
José Augusto Santos.
2010/2
Corpo editorial da rpCd
DirectorJorge Olímpio Bento (UNIVERSIDADE DO PORTO)
conselhoeDitorialAdroaldo Gaya (UNIVERSIDADE FEDERAL RIO GRANDE SUL, BRASIL) António Prista (UNIVERSIDADE PEDAGóGICA, MOçAMBIQUE)
Eckhard Meinberg (UNIVERSIDADE DESPORTO COLóNIA, ALEMANhA)
Gaston Beunen (UNIVERSIDADE CATóLICA LOVAINA, BéLGICA)
Go Tani (UNIVERSIDADE SãO PAULO, BRASIL)
Ian Franks (UNIVERSIDADE DE BRITISh COLUMBIA, CANADá)
João Abrantes (UNIVERSIDADE TéCNICA LISBOA, PORTUGAL)
Jorge Mota (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)
José Alberto Duarte (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL) José Maia (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL) Michael Sagiv (INSTITUTO WINGATE, ISRAEL)
Neville Owen (UNIVERSIDADE DE QUEENSLAND, AUSTRáLIA)
Rafael Martín Acero (UNIVERSIDADE DA CORUNhA, ESPANhA)
Robert Brustad (UNIVERSIDADE DE NORThERN COLORADO, USA)
Robert M. Malina (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE TARLETON, USA)
eDitorchefe António Manuel Fonseca (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)
eDitoresassociaDosAmândio Graça (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)
António Ascensão (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)
João Paulo Vilas Boas (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)
José Maia (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)
José Oliveira (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)
José Pedro Sarmento (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)
Júlio Garganta (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)
Olga Vasconcelos (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)
Rui Garcia (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)
consultores Alberto Amadio (UNIVERSIDADE SãO PAULO)
Alfredo Faria Júnior (UNIVERSIDADE ESTADO RIO JANEIRO)
Almir Liberato Silva (UNIVERSIDADE DO AMAzONAS)
Anthony Sargeant (UNIVERSIDADE DE MANChESTER)
António José Silva (UNIVERSIDADE TRáS-OS-MONTES E ALTO DOURO)
António Roberto da Rocha Santos (UNIV. FEDERAL PERNAMBUCO)
Carlos Balbinotti (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL)
Carlos Carvalho (INSTITUTO SUPERIOR DA MAIA)
Carlos Neto (UNIVERSIDADE TéCNICA LISBOA)
Cláudio Gil Araújo (UNIVERSIDADE FEDERAL RIO JANEIRO)
Dartagnan P. Guedes (UNIVERSIDADE ESTADUAL LONDRINA)
Duarte Freitas (UNIVERSIDADE DA MADEIRA)
Eduardo Kokubun (UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA, RIO CLARO)
Eunice Lebre (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)
Francisco Alves (UNIVERSIDADE TéCNICA DE LISBOA)
Francisco Camiña Fernandez (UNIVERSIDADE DA CORUNhA)
Francisco Carreiro da Costa (UNIVERSIDADE TéCNICA LISBOA)
Francisco Martins Silva (UNIVERSIDADE FEDERAL PARAíBA)
Glória Balagué (UNIVERSIDADE ChICAGO)
Gustavo Pires (UNIVERSIDADE TéCNICA LISBOA)
hans-Joachim Appell (UNIVERSIDADE DESPORTO COLóNIA)
helena Santa Clara (UNIVERSIDADE TéCNICA LISBOA)
hugo Lovisolo (UNIVERSIDADE GAMA FILhO)
Isabel Fragoso (UNIVERSIDADE TéCNICA DE LISBOA)
Jaime Sampaio (UNIVERSIDADE DE TRáS-OS-MONTES E ALTO DOURO)
Jean Francis Gréhaigne (UNIVERSIDADE DE BESANçON)
Jens Bangsbo (UNIVERSIDADE DE COPENhAGA)
João Barreiros (UNIVERSIDADE TéCNICA DE LISBOA)
José A. Barela (UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA, RIO CLARO)
José Alves (ESCOLA SUPERIOR DE DESPORTO DE RIO MAIOR)
José Luis Soidán (UNIVERSIDADE DE VIGO)
José Manuel Constantino (UNIVERSIDADE LUSóFONA)
José Vasconcelos Raposo (UNIV. TRáS-OS-MONTES ALTO DOURO)
Juarez Nascimento (UNIVERSIDADE FEDERAL SANTA CATARINA)
Jürgen Weineck (UNIVERSIDADE ERLANGEN)
Lamartine Pereira da Costa (UNIVERSIDADE GAMA FILhO)
Lilian Teresa Bucken Gobbi (UNIV. ESTADUAL PAULISTA, RIO CLARO)
Luis Mochizuki (UNIVERSIDADE SãO PAULO)
Luís Sardinha (UNIVERSIDADE TéCNICA LISBOA)
Luiz Cláudio Stanganelli (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA)
Manoel Costa (UNIVERSIDADE DE PERNAMBUCO)
Manuel João Coelho e Silva (UNIVERSIDADE DE COIMBRA)
Manuel Patrício (UNIVERSIDADE DE éVORA)
Manuela hasse (UNIVERSIDADE TéCNICA DE LISBOA)
Marco Túlio de Mello (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SãO PAULO)
Margarida Espanha (UNIVERSIDADE TéCNICA DE LISBOA)
Margarida Matos (UNIVERSIDADE TéCNICA DE LISBOA)
Maria José Mosquera González (INEF GALIzA)
Markus Nahas (UNIVERSIDADE FEDERAL SANTA CATARINA)
Mauricio Murad (UNIVERS. ESTADO RIO DE JANEIRO E UNIVERSO)
Ovídio Costa (UNIVERSIDADE DO PORTO, PORTUGAL)
Pablo Greco (UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS)
Paula Mota (UNIVERSIDADE DE TRáS-OS-MONTES E ALTO DOURO)
Paulo Farinatti (UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO)
Paulo Machado (UNIVERSIDADE MINhO)
Pedro Sarmento (UNIVERSIDADE TéCNICA DE LISBOA)
Ricardo Petersen (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL)
Sidónio Serpa (UNIVERSIDADE TéCNICA LISBOA)
Silvana Göllner (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL)
Valdir Barbanti (UNIVERSIDADE SãO PAULO)
Víctor da Fonseca (UNIVERSIDADE TéCNICA LISBOA)
Víctor Lopes (INSTITUTO POLITéCNICO BRAGANçA)
Víctor Matsudo (CELAFISCS)
Wojtek Chodzko-zajko (UNIVERS. ILLINOIS URBANA-ChAMPAIGN)
FiCha téCniCa da rpCd
revista portuguesa de Ciências do desporto publicação quadrimestral da Faculdade de desporto da Universidade do porto [ISSN 1645-0523]
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IMPRESSãO E ACABAMENTO
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TIRAGEM 500exemplares
© A REPRODUçãO DE ARTIGOS, GRáFICOS
OU FOTOGRAFIAS DA REVISTA Só é PERMITIDA
COM AUTORIzAçãO ESCRITA DO DIRECTOR.
ENDEREçO PARA CORRESPONDêNCIA
REVISTA PORTUGUESA DE CIêNCIAS DO DESPORTO faculdadedeDesportodauniversidadedoPortoruaDr.Plácidocosta,914200.450Porto—Portugaltel:+351—225074700;fax:+351—[email protected]
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A Revista Portuguesa de Ciências do Desportoestá representada na plataforma SciELO Portugal
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A rpCd TEM O APOIO DA FCt
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COMUNITáRIO DE APOIO III
normas de pUbliCação na rpCd
tiPosDePublicaçãoINVESTIGAçãO ORIGINAL
RPCD publica artigos originais relativos a todas as áreas das ciências do desporto;
REVISõES DA INVESTIGAçãO
A RPCD publica artigos de síntese da literatura que contribuam para a generalização do conhecimento em ciências do desporto. Artigos de meta-análise e revisões críticas de literatura são dois possíveis modelos de publicação. Porém, este tipo de publicação só estará aberto a especialistas convidados pela RPCD.
COMENTáRIOS
Comentários sobre artigos originais e sobre revisões da investigação são, não só publicáveis, como são francamente encorajados pelo corpo editorial;
ESTUDOS DE CASO
A RPCD publica estudos de caso que sejam considerados relevantes para as ciências do desporto. O controlo rigoroso da metodologia é aqui um parâmetro determinante.
ENSAIOS
A RPCD convidará especialistas a escreverem ensaios, ou seja, reflexões profundas sobre determinados temas, sínteses de múltiplas abordagens próprias, onde à argumentação científica, filosófica ou de outra natureza se adiciona uma forte componente literária.
REVISõES DE PUBLICAçõES
A RPCD tem uma secção onde são apresentadas revisões de obras ou artigos publicados e que sejam considerados relevantes para as ciências do desporto.
regrasgeraisDePublicaçãoOs artigos submetidos à RPCD deverão conter dados originais, teóricos ou experimentais, na área das ciências do desporto. A parte substancial do artigo não deverá ter sido publicada em mais nenhum local. Se parte do artigo foi já apresentada publicamente deverá ser feita referência a esse facto na secção de Agradecimentos.Os artigos submetidos à RPCD serão, numa primeira fase, avaliados pelo editor-chefe e terão como critérios iniciais de aceitação: normas de publicação, relação do tópico tratado com as ciências do desporto e mérito científico. Depois desta análise, o artigo, se for considerado previamente aceite, será avaliado por 2 “referees” independentes e sob a forma de análise “duplamente cega”. A aceitação de um e a rejeição de outro obrigará a uma 3ª consulta.
PreParaçãoDosManuscritosASPECTOS GERAIS
Cada artigo deverá ser acompanhado por uma carta de rosto que deverá conter:
— Título do artigo e nomes dos autores; — Declaração de que o artigo nunca foi previamente publicado.
FORMATO:
— Os manuscritos deverão ser escritos em papel A4 com 3 cm de margem, letra 12 com duplo espaço e não exceder 20 páginas; — As páginas deverão ser numeradas sequencialmente, sendo a página de título a nº1.
DIMENSõES E ESTILO: — Os artigos deverão ser o mais sucintos possível; A especulação deverá ser apenas utilizada quando os dados o permitem e a literatura não confirma; — Os artigos serão rejeitados quando escritos em português ou inglês de fraca qualidade linguística;
— As abreviaturas deverão ser as referidas internacionalmente.
PáGINA DE TíTULO:
— A página de título deverá conter a seguinte informação: — Especificação do tipo de trabalho (cf. Tipos de publicação); — Título conciso mas suficientemente informativo; — Nomes dos autores, com a primeira e a inicial média (não incluir graus académicos) — “Running head” concisa não excedendo os 45 caracteres; — Nome e local da instituição onde o trabalho foi realizado; - Nome e morada do autor para onde toda a correspondência deverá ser enviada, incluindo endereço de e-mail
PáGINA DE RESUMO:
— Resumo deverá ser informativo e não deverá referir-se ao texto do artigo; — Se o artigo for em português o resumo deverá ser feito em português e em inglês — Deve incluir os resultados mais importantes que suportem as conclusões do trabalho; — Deverão ser incluídas 3 a 6 palavras-chave; — Não deverão ser utilizadas abreviaturas; — O resumo não deverá exceder as 200 palavras.
INTRODUçãO:
— Deverá ser suficientemente compreensível, explicitando claramente o objectivo do trabalho e relevando a importância do estudo face ao estado actual do conhecimento; — A revisão da literatura não deverá ser exaustiva.
MATERIAL E MéTODOS:
— Nesta secção deverá ser incluída toda a informação que permite aos leitores realizarem um trabalho com a mesma metodologia sem contactarem os autores; — Os métodos deverão ser ajustados ao objectivo do estudo; deverão ser replicáveis e com elevado grau de fidelidade; — Quando utilizados humanos deverá ser indicado que os procedimentos utilizados respeitam as normas internacionais de experimentação com humanos (Declaração de helsínquia
de 1975); — Quando utilizados animais deverão ser utilizados todos os princípios éticos de experimentação animal e, se possível, deverão ser submetidos a uma comissão de ética; — Todas as drogas e químicos utilizados deverão ser designados pelos nomes genéricos, princípios activos, dosagem e dosagem; — A confidencialidade dos sujeitos deverá ser estritamente mantida; — Os métodos estatísticos utilizados deverão ser cuidadosamente referidos.
RESULTADOS:
— Os resultados deverão apenas conter os dados que sejam relevantes para a discussão; — Os resultados só deverão aparecer uma vez no texto: ou em quadro ou em figura; — O texto só deverá servir para relevar os dados mais relevantes e nunca duplicar informação; — A relevância dos resultados deverá ser suficientemente expressa; — Unidades, quantidades e fórmulas deverão ser utilizados pelo Sistema Internacional (SI units). — Todas as medidas deverão ser referidas em unidades métricas.
DISCUSSãO:
— Os dados novos e os aspectos mais importantes do estudo deverão ser relevados de forma clara e concisa; — Não deverão ser repetidos os resultados já apresentados; — A relevância dos dados deverá ser referida e a comparação com outros estudos deverá ser estimulada; — As especulações não suportadas pelos métodos estatísticos não deverão ser evitadas; — Sempre que possível, deverão ser incluídas recomendações; — A discussão deverá ser completada com um parágrafo final onde são realçadas as principais conclusões do estudo.
AGRADECIMENTOS:
— Se o artigo tiver sido parcialmente apresentado publicamente deverá aqui ser referido o facto; — Qualquer apoio financeiro deverá ser referido.
REFERêNCIAS
— As referências deverão ser citadas no texto por número e compiladas alfabeticamente e ordenadas numericamente; — Os nomes das revistas deverão ser abreviados conforme normas internacionais (ex: Index Medicus); — Todos os autores deverão ser nomeados (não utilizar et al.) — Apenas artigos ou obras em situação de “in press” poderão ser citados. Dados não publicados deverão ser utilizados só em casos excepcionais sendo assinalados como “dados não publicados”; — Utilização de um número elevado de resumos ou de artigos não “peer-reviewed” será uma condição de não aceitação;
ExEMPLOS DE REFERêNCIAS:
ARTIGO DE REVISTA
1 Pincivero DM, Lephart SM, Karunakara RA (1998). Reliability and precision of isokinetic strength and muscular endurance for the quadriceps and hamstrings. Int J Sports Med 18: 113-117 LIVRO COMPLETO hudlicka O, Tyler KR (1996). Angiogenesis. The growth of the vascular system. London: Academic Press Inc. Ltd. CAPíTULO DE UM LIVRO Balon TW (1999). Integrative biology of nitric oxide and exercise. In: holloszy JO (ed.). Exercise and Sport Science Reviews vol. 27. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins, 219-254FIGURAS
— Figuras e ilustrações deverão ser utilizadas quando auxiliam na melhor compreensão do texto; — As figuras deverão ser numeradas em numeração árabe na sequência em que aparecem no texto; - As figuras deverão ser impressas em folhas separadas daquelas contendo o corpo de texto do manuscrito. No ficheiro informático em processador de texto, as figuras deverão também ser colocadas separadas do corpo de texto nas páginas finais do
manuscrito e apenas uma única figura por página; — As figuras e ilustrações deverão ser submetidas com excelente qualidade gráfico, a preto e branco e com a qualidade necessária para serem reproduzidas ou reduzidas nas suas dimensões; — As fotos de equipamento ou sujeitos deverão ser evitadas.QUADROS
— Os quadros deverão ser utilizados para apresentar os principais resultados da investigação. — Deverão ser acompanhados de um título curto; — Os quadros deverão ser apresentados com as mesmas regras das referidas para as legendas e figuras; — Uma nota de rodapé do quadro deverá ser utilizada para explicar as abreviaturas utilizadas no quadro.
subMissãoDosManuscritos— A submissão de artigos para à RPCD poderá ser efectuada por via postal, através do envio de 1 exemplar do manuscrito em versão impressa em papel, acompanhada de versão gravada em suporte informático (CD-ROM ou DVD) contendo o artigo em processador de texto Microsoft Word (*.doc). - Os artigos poderão igualmente ser submetidos via e-mail, anexando o ficheiro contendo o manuscrito em processador de texto Microsoft Word (*.doc) e a declaração de que o artigo nunca foi previamente publicado.
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DE ARTIGOS
Revista Portuguesa de Ciências do Desporto Faculdade de Desporto da Universidade do Porto Rua Dr. Plácido Costa,Porto Portugal(+351) 914 200 450e-mail: [email protected]
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The PJSS publishes original papers related to all areas of Sport Sciences.
REVIEWS OF ThE LITERATURE
(STATE OF ThE ART PAPERS): State of the art papers or critical literature reviews are published if, and only if, they contribute to the generalization of knowledge. Meta-analytic papers or general reviews are possible modes from contributing authors. This type of publication is open only to invited authors.
COMMENTARIES: Commentaries about published papers or literature reviews are highly recommended by the editorial board and accepted.
CASE STUDIES: highly relevant case studies are favoured by the editorial board if they contribute to specific knowledge within the framework of Sport Sciences research. The meticulous control of research methodology is a fundamental issue in terms of paper acceptance.
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BOOK REVIEWS: the PJSS has a section for book reviews.
generalPublicationrules:All papers submitted to the PJSS are obliged to have original data, theoretical or experimental, within the realm of Sport Sciences. It is mandatory that the submitted paper has not yet been published elsewhere. If a minor part of the paper was previously published, it has to be stated explicitly in the acknowledgments section.
All papers are first evaluated by the editor in chief, and shall have as initial criteria for acceptance the following: fulfilment of all norms, clear relationship to Sport Sciences, and scientific merit. After this first screening, and if the paper is firstly accepted, two independent referees shall evaluate its content in a
“double blind” fashion. A third referee shall be considered if the previous two are not in agreement about the quality of the paper.After the referees receive the manuscripts, it is hoped that their reviews are posted to the editor in chief in no longer than a month.
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The first page of the manuscript has to contain: — Title and author(s) name(s) — Declaration that the paper has never been published
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SIzE AND STyLE:
— Papers are to be written in a very precise and clear language. No place is allowed for speculation without the boundaries of available data. — If manuscripts are highly confused and written in a very poor Portuguese or English they are immediately rejected by the editor in chief. — All abbreviations are to be used according to international rules of the specific field.
TITLE PAGE:
— Title page has to contain the following information: — Specification of type of manuscript (but see working materials-manuscripts). — Brief and highly informative title. — Author(s) name(s) with first and middle
names (do not write academic degrees) — Running head with no more than 45 letters. — Name and place of the academic institutions. — Name, address, Fax number and email of the person to whom the proof is to be sent.
ABSTRACT PAGE:
— The abstract has to be very precise and contain no more than 200 words, including objectives, design, main results and conclusions. It has to be intelligible without reference to the rest of the paper. — Portuguese and English abstracts are mandatory. — Include 3 to 6 key words. — Do not use abbreviations.
INTRODUCTION:
— has to be highly comprehensible, stating clearly the purpose(s) of the manuscript, and presenting the importance of the work. — Literature review included is not expected to be exhaustive.
MATERIAL AND METhODS:
— Include all necessary information for the replication of the work without any further information from authors. — All applied methods are expected to be reliable and highly adjusted to the problem. — If humans are to be used as sampling units in experimental or non-experimental research it is expected that all procedures follow helsinki Declaration of human Rights related to research. — When using animals all ethical principals related to animal experimentation are to be respected, and when possible submitted to an ethical committee. — All drugs and chemicals used are to be designated by their general names, active principles and dosage. — Confidentiality of subjects is to be maintained. — All statistical methods used are to be precisely and carefully stated.
RESULTS:
— Do provide only relevant results that are useful for discussion. — Results appear only once in Tables or Figures. — Do not duplicate
information, and present only the most relevant results. — Importance of main results is to be explicitly stated. — Units, quantities and formulas are to be expressed according to the International System (SI units). — Use only metric units.
DISCUSSION:
— New information coming from data analysis should be presented clearly. — Do no repeat results. — Data relevancy should be compared to existing information from previous research. — Do not speculate, otherwise carefully supported, in a way, by insights from your data analysis. — Final discussion should be summarized in its major points.
ACKNOWLEDGEMENTS:
— If the paper has been partly presented elsewhere, do provide such information. — Any financial support should be mentioned.
REFERENCES:
— Cited references are to be numbered in the text, and alphabetically listed. — Journals´ names are to be cited according to general abbreviations (ex: Index Medicus). — Please write the names of all authors (do not use et al.). — Only published or “in press” papers should be cited. Very rarely are accepted “non published data”. — If non-reviewed papers are cited may cause the rejection of the paper.
ExAMPLES:
PEER-REVIEW PAPER
1 Pincivero DM, Lephart SM, Kurunakara RA (1998). Reliability and precision of isokinetic strength and muscular endurance for the quadriceps and hamstrings. In J Sports Med 18:113-117COMPLETE BOOK hudlicka O, Tyler KR (1996). Angiogenesis. The growth of the vascular system. London:Academic Press Inc. Ltd.BOOK ChAPTER Balon TW (1999). Integrative
biology of nitric oxide and exercise. In: holloszy JO (ed.). Exercise and Sport Science Reviews vol. 27. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins, 219-254FIGURES
— Figures and illustrations should be used only for a better understanding of the main text. — Use sequence arabic numbers for all Figures. — Each Figure is to be presented in a separated sheet with a short and precise title. — In the back of each Figure do provide information regarding the author and title of the paper. Use a pencil to write this information. — All Figures and illustrations should have excellent graphic quality I black and white. — Avoid photos from equipments and human subjects.TABLES — Tables should be utilized to present relevant numerical data information. — Each table should have a very precise and short title. — Tables should be presented within the same rules as Legends and Figures. — Tables´ footnotes should be used only to describe abbreviations used.
ManuscriPtsubMissionThe manuscript submission could be made by post sending one hard copy of the article together with an electronic version [Microsoft Word (*.doc)] on CD-ROM or DVD. Manuscripts could also be submitted via e-mail attaching an electronic file version [Microsoft Word (*.doc)] together with the declaration that the paper has never been previously published.
ADDRESS FOR MANUSCRIPT SUBMISSION
Revista Portuguesa de Ciências do Desporto Faculdade de Desporto da Universidade do Porto Rua Dr. Plácido Costa, Porto Portugal(+351) 914 200 450e-mail: [email protected]
notaeditorial
da ‘arété’ ou excelência
no desporto, na educação
e na vida.
o desporto, tal como a ciência, a cultura e a educação, das quais é parte constituinte, é por-
tador da ideia e mensagem de superação e transcendência, de elevação e perfeição, ou seja,
de ‘excelência’. este termo traduz a ‘arété’ dos gregos, uma síntese harmoniosa de técnica,
saber, desempenho, ética, estética, magnificência, virtude, sublimidade e excelsitude.
a excelência (excellentia) é a qualidade daquilo que é distinto, perfeito, magnífico, sumo
no ser, revelando a coincidência plena de uma entidade consigo própria, com a melhor ex-
pressão possível das metas e potencialidades que a definem.1
porém, para travar qualquer investida do relativismo militante, adiante-se que a exce-
lência subentende também a comparação de uma entidade com outra; e que existe, a ex-
celência em si mesma, balizada por critérios e fins de ‘elevação, ‘grandeza’, ‘magnificência’,
‘superioridade’. é com ela que a excelência de toda a entidade é comparada e por ela aferi-
da. há, pois, entidades mais excelentes do que outras.
Como referem os autores clássicos e humanistas, excelente é o que é bom. é o que é
muito bom. é o que é tão bom que não pode ser melhor. é o mais alto grau na ordem do
ser de determinada coisa ou pessoa ou ação, pensamento, sentimento, desejo ou vontade.
eJorgeolímpiobento1
1DiretordarevistaPortuguesadeciênciasdoDesporto
1 — O ‘Magnífico Reitor’ é primus inter pares; é aquele que corporiza e representa o mais alto grau da magnifi-
cência dos professores, dos conhecimentos e sabedorias da Universidade. O ‘Sumo Pontífice’ é aquele que as-
cende ao vértice da pirâmide e expressa a sumidade dos purpurados que pontificam na hierarquia eclesiástica.
9—RPcd 10 (2): 9-11
a tentativa de definição vai ainda mais longe. excelente é o perfeito, o distinto, o magní-
fico. o que é de ótima qualidade, a tal ponto que não pode ser melhor do que é. excelente
é, portanto, o que alcançou a excelência, coincidindo o que está a ser com o que é na sua
essência e potencial de ser.
só que há potenciais de ser e de excelência muito diferentes! logo nem todos podemos
atingir o mesmo nível de excelência. todavia isso não nos desobriga de a procurar: todos
temos obrigação de alcançar a excelência possível! todos temos o dever de perseguir afin-
cadamente a perfeição, assim vista por aristóteles: Perfeitas em si são aquelas coisas a que
nada lhes falta do que constitui o seu bem, ou nada lhes falta daquilo que não é superado no
seu próprio género, ou aquelas coisas que não têm fora de si nenhuma parte de si mesmas.
porque é que impende sobre nós o mandamento indeclinável da busca da perfeição?
muito simplesmente porque, no pensamento e linguagem filosófica aristotélica e humanis-
ta, a excelência é sempre concebida e equacionada ontologicamente. o mesmo é dizer que
ela nos compara e situa, simultaneamente, no mundo da realização do ser e no universo
da obtenção de Valor.
heráclito (576-480 a.C.) formulou isto de maneira bem explícita: Um só homem vale aos
meus olhos dez mil homens, se ele é o melhor. tendo albert einstein (1879-1955) comple-
mentado de modo primoroso: Procura ser não tanto um indivíduo de sucesso, mas sobretu-
do uma pessoa de valor.
a excelência configura a síntese harmoniosa de uma multiplicidade de valores suma-
mente valiosos. somente o que tem valor é património da humanidade. por outras pa-
lavras, a substância e a configuração da nossa humanidade prendem-se com o teor dos
valores que balizam as nossas atitudes, palavras, ações e reações.
Com a noção de excelência ou virtude ou arété os gregos (e na era moderna os hu-
manistas e iluministas) tecem uma valoração nova do homem e uma nova conceção do
lugar do indivíduo na sociedade, bem como encontram a chave da dignidade humana e
do conceito de humanidade.
ser humano é buscar a superioridade, atingir excelência, qualidade, perfeição, isto é,
arété. a nossa humanidade é uma expressão ‘artística’; é dada pelo índice de arte no que
somos, pensamos, dizemos e fazemos. somos entes e agentes ‘artísticos’, que se movem
atrás de objetivos ‘distantes’, traçados de ‘antemão’. a sua consecução é um pressuposto
da nossa humanização.
obviamente somos intimados a almejar o que é cimeiro e não o que se queda num
plano rasteiro. Como disse são Francisco de assis (1182-1226), o que tem de ser feito
deve ser bem feito.2
por isso toda a ação, coisa, ato ou gesto real que fique aquém do ideal não é excelente,
não tem a qualidade que lhe é exigível. aristóteles foi claro: No que diz respeito à excelên-
cia não é suficiente conhecê-la; é necessário possuí-la e usá-la. ou seja, a qualidade e a
11—RPcd 10 (2)
e
2 — há quem afirme que esta máxima se deve a um monge medieval anónimo; e que ela era originariamente
assim: O que vale a pena ser feito vale ainda mais a pena ser bem feito.
3 — Frei Bento Domingues, Jornal Público, p.36, 23.05.2010.
John Kennedy (1917-1963) também aconselhou a opção pelo voo nas alturas, ao formular: We choose to go
to the moon.
excelência são exigências intrínsecas à educação e à cultura, a todos os seus fatores e a
todas as suas modalidades.
portanto a exigência do fazer bem feito é a regra balizadora do ensino e da aprendiza-
gem em qualquer área educativa. a regra do educador só pode ser esta: educar bem. e a
regra do educando: aprender bem.
acentuemos este ponto, para que não subsistam quaisquer equívocos. deve elevar-se o
aluno, o aprendiz, o estudante, o atleta e executante, à altura do saber e da inteligência, da
excelência ética e estética? ou devem o ensino e a formação descer à rasura da incivilida-
de e mediocridade, da indolência e laxismo, da indigência cultural e moral?
infelizmente há quem tenha dúvidas na resposta ou opte pela segunda alternativa! para
desdizer o desaforo, vale-nos o bom senso de ludwig Wittgenstein (1889-1951): Eu não
sei porque estamos aqui, mas tenho a certeza de que não é para nos divertirmos. e também
vem em nossa ajuda este depoimento de Frei bento domingues: Para respirar como huma-
nos, precisamos de horizontes infinitos e do Infinito como horizonte da alma. É pelas formas
mais altas da criação artística que a humanidade descola do imediato e levanta voo.3
os homens, qualquer que seja o seu berço, não se podem perder e refugiar em descul-
pas, menoridades e lamentações, porquanto têm uma vocação alada. estão na vida para
atingirem superioridade, grandeza, elevação, qualidade, excelência. é no voo em direção
ao mais alto que justificam o dom da vida; é o fogo do impossível que os atrai e consome e
lhes confere o estatuto de humanos, quase perfeitos, quase felizes, quase divinos.
A excelência no desporto:
umestudocomotetra-campeão
nacionalderalis.
PAlAvRAs chAve:
competênciaspsicológicas.stresse
ansiedade.coping.emoções.ralis.
resumo
o presente estudo teve como objectivo traçar o perfil psicológico de armindo araújo um
dos melhores atletas portugueses de rali de todos os tempos. Foram realizadas dez entre-
vistas semiestruturadas: uma num momento aleatório, fora do ambiente competitivo, e as
outras nove no final de cada prova da época desportiva de 2006. as entrevistas versavam
sobre quatro aspectos principais: características/ competências psicológicas importantes
para o sucesso desportivo, fontes de stress, estratégias de coping e emoções (para além
da ansiedade) com influência no rendimento. os resultados ressaltaram a importância da
componente psicológica no rali e confirmaram o interesse de a preparação psicológica
incluir diferentes factores e processos cognitivos, emocionais e comportamentais, sempre
em relação com a modalidade e suas exigências contextuais específicas.
AutoRes:
emanuelfigueiredo1
cláudiaDias1
nunocorte-real1
antónioManuelfonseca1
1cifi2D,faculdadedeDesportouniversidadedoPorto,Portugal
correspondência:cláudiaDias.cifi2D,faculdadedeDesportodauniversidadedoPorto.
ruaDr.Plácidocosta,91,4200-450Porto,Portugal([email protected]).
13—RPcd 10 (2): 12-32
01excellence in sport:
a study with the tetra-national
champion of rallyes.
AbstrAct
the present study aimed to trace the psychological profile of armindo
araújo, one of the greatest portuguese rally pilots ever. ten qualitative
interviews were conducted: one in a random moment, and one after each
competitive race of the 2006 portuguese rally Championship (in a total
of nine interviews). these interviews revolved around four main themes:
psychological characteristics/ skills important to sports success, sour-
ces of stress, coping strategies, and the role of emotions (other than
anxiety) in performance. the results highlighted the importance of the
psychological component in rallying, and confirmed the significance,
with regard to athletes’ psychological preparation, of different cognitive,
emotional and behavioral processes. this preparation should take into
account the specific contextual requirements of each sport.
Key woRds:
Psychologicalskills.stressandanxiety.coping.emotions.rally.
Introdução
porque será que os responsáveis pela melhoria do desempenho desportivo atribuem cada
vez maior importância à componente mental?
em termos históricos, o interesse dos responsáveis pelo rendimento desportivo dos atle-
tas centrava-se quase exclusivamente na melhoria dos aspectos técnico-tácticos, biológicos
e motores. todavia, cedo se começou a constatar que nem sempre os aspectos físicos dita-
vam o curso dos resultados, porquanto nem sempre os atletas fisicamente mais robustos
e tecnicamente mais evoluídos conseguiam os melhores desempenhos. assim, começou a
cimentar-se a necessidade de considerar e examinar de forma aprofundada o papel de dife-
rentes características, factores e/ ou processos psicológicos no rendimento desportivo.
num primeiro momento, a crença geral era a de que a identificação das características psi-
cológicas, identificadas com traços ou atributos (estáveis e persistentes) da personalidade
dos atletas, especialmente dos atletas de elite, permitiria diagnosticar e predizer o compor-
tamento e sucesso futuro no desporto, independentemente da situação (4,35,36). esta perspec-
tiva dominou particularmente durante os anos 60 e 70 do século XX e as investigações carac-
terizaram-se por uma tradição de comparações intergrupais: atletas eram comparados com
não-atletas, atletas bem-sucedidos eram comparados com atletas menos bem-sucedidos e
eram efectuadas comparações entre atletas de diferentes modalidades. no entanto, apesar
do elevado número de estudos publicados nos anos 60 e 70, muitos autores protestaram que
a avaliação dos resultados destas investigações não era, de todo, consistente e que os traços
de personalidade não eram, afinal, um factor significativo no desporto — no qual explicavam
apenas uma pequena percentagem de variabilidade no desempenho (3,6,23).
estas críticas abriram espaço para um modelo interacionista, que defendia que, para
compreender o comportamento dos atletas, era necessário considerar não apenas o atleta,
mas também a situação desportiva específica (4). de acordo com esta perspectiva, enquan-
to, no que diz respeito à situação, o mais importante seria compreender o seu significado
psicológico, em relação à pessoa importariam os factores cognitivos, vistos como os prin-
cipais determinantes do comportamento; por último, também era importante não descon-
siderar os factores emocionais (22).
assim, considerando que as experiências psicológicas actuais dos atletas também po-
deriam afectar decisivamente o seu desempenho, os investigadores não se restringiram
à análise das características psicológicas dos atletas de elite, procurando também iden-
tificar estratégias e padrões comportamentais e cognitivos utilizados antes e durante as
situações competitivas. isto implicava compreender, no âmbito de um paradigma intera-
cionista e transaccional, como é que os atletas se preparam mentalmente para a competi-
ção, qual o nível de ansiedade experienciado antes e durante a mesma, até que ponto esses
factores influenciam o rendimento óptimo, ou quais as características psicológicas que
diferenciam os atletas de elite dos restantes (4).
15—RPcd 10 (2)
01neste contexto, importará fazer referência a algumas das investigações mais antigas nes-
te domínio, desenvolvidas por mahoney e colaboradores. em 1977, mahoney e avener (24)
recorreram a entrevistas semiestruturadas, com o objectivo de analisarem as competências
psicológicas que distinguiam seis atletas seleccionados para a equipa olímpica dos eUa de
seis não seleccionados. os resultados demonstraram que os indivíduos apurados revelavam
níveis mais elevados de autoconfiança, sonhavam mais vezes com as provas, recorriam mais
frequentemente ao discurso interno positivo e pensavam na competição mais vezes por dia
do que aqueles que não tinham sido seleccionados. dez anos depois, mahoney, Gabriel e
perkins (25) utilizaram uma metodologia quantitativa para analisarem as competências psi-
cológicas de 713 atletas de 23 modalidades, sendo 126 atletas de elite, 141 pré-elite e 446
universitários. de forma similar ao estudo referido anteriormente, os resultados mostraram
que os atletas de elite evidenciavam algumas diferenças em relação aos outros: experimen-
tavam menos problemas de ansiedade, atingiam melhores níveis de concentração antes e
durante a competição, eram mais autoconfiantes, recorriam mais vezes à visualização men-
tal interna e cinestésica, estavam mais focalizados no seu rendimento individual do que na
sua equipa e encontravam-se mais motivados para o sucesso.
Um outro investigador que se destacou neste domínio foi terry orlick. em 1988, orlick
e partington (32)publicaram uma investigação com 273 atletas norte-americanos que ti-
nham participado nos Jogos olímpicos de los angeles (1984), concluindo que, entre os
elementos comuns àqueles que obtiveram melhores resultados, estavam a qualidade do
treino, o estabelecimento de objectivos diários, a prática da visualização mental, o uso de
simulações e a preparação mental das provas a disputar.
num estudo posterior com jogadores de golfe de elite, mcCaffrey e orlick (26) concluíram
que estes atletas, nos seus melhores momentos, estavam num estado de total envolvi-
mento com a tarefa, recorriam a planos mentais para a competição, praticavam diaria-
mente visualização mental, possuíam objectivos claramente definidos, e tinham uma per-
cepção muito clara dos elementos e estratégias que os conduziam a um bom desempenho.
entretanto, numerosos estudos realizados posteriormente confirmaram estes resulta-
dos (e.g.,14,28,29), podendo actualmente ser considerados seis domínios principais de diferen-
ciação dos atletas mais bem-sucedidos e dos restantes: controlo da ansiedade, preparação
mental, focalização na equipa, concentração, confiança e motivação. especificamente, os
atletas de sucesso e com elevados níveis de rendimento parecem caracterizar-se por ní-
veis mais baixos de ansiedade (ou mais competências de regulação e controlo da ansieda-
de), um maior envolvimento e focalização (concentração) nas tarefas competitivas, níveis
mais elevados de autoconfiança nas suas competências e capacidades, mais motivação
e comprometimento com o desporto e com a sua realização desportiva, e mais esforço e
cuidado na sua preparação mental para a competição. as estratégias ou métodos utiliza-
dos incluíam a visualização mental, estratégias cognitivas e comportamentais de controlo
emocional, a formulação de objectivos claros e específicos para as competições, a estru-
turação de planos pré-competitivos e competitivos e a capacidade para lidar eficazmente
com acontecimentos inesperados e distracções. nos desportos colectivos possuem tam-
bém maiores níveis de orientação para o colectivo e de espírito de equipa (3,4,9,25,31,32).
entre as características psicológicas consistentemente identificadas como importantes
para o desempenho desportivo, a (capacidade de controlo da) ansiedade competitiva tem-
-se constituído como uma das que mais investigação gerou ao longo dos anos (e.g.,12,15). di-
versos investigadores preocuparam-se, por exemplo, em identificar as principais causas/
fontes de stress e ansiedade. de uma forma geral, os estudos realizados neste âmbito
têm apontado um vasto leque de fontes gerais de stress, as quais podem ser agrupadas
nos seguintes aspectos principais: padrões de alto rendimento baseados em exigências
potenciais e ambientais, pressões de outros significativos, a natureza da competição, ou a
avaliação social (e.g.,12,18,33).
ainda no domínio do stress e ansiedade, outra temática que tem suscitado o interesse
dos investigadores prende-se com a determinação das estratégias de coping utilizadas
pelos atletas para lidarem com situações stressantes e/ ou problemáticas (e.g.,1,10,11,17). hoje
em dia, parece ser claro que os atletas recorrem a diferentes estratégias de coping, muitas
vezes simultaneamente, e que, embora muitas dessas estratégias sejam transversais a di-
ferentes modalidades e atletas, também há algumas específicas às exigências e contexto
da modalidade (e.g.,17).
Finalmente, importa salientar que, nos últimos anos, a investigação do stress e ansie-
dade no desporto tem-se expandido, estando hoje em dia claramente demonstrada a re-
levância do estudo do impacte de diferentes emoções negativas e positivas para além da
ansiedade (e.g., irritação/ raiva, felicidade/ alegria, culpa, medo, vergonha) no rendimento
e comportamento desportivos (e.g.,2,13,16,21,27).
decorrendo do exposto, a presente investigação visou traçar um perfil psicológico de ar-
mindo araújo, tetra-campeão nacional de ralis (2003, 2004, 2005 e 2006), relativamente a
quatro aspectos centrais: as características e/ ou competências psicológicas mais impor-
tantes para o sucesso desportivo, as principais fontes de stress e ansiedade, as estraté-
gias de coping usadas em situações problemáticas e stressantes, e outras emoções (para
além da ansiedade) com influência no rendimento desportivo. o piloto foi acompanhado
durante toda a época desportiva de 2006, numa abordagem longitudinal que, envolvendo
múltiplas entrevistas, permitiu a monitorização de uma possível natureza dinâmica das
respostas de um dos maiores pilotos portugueses de rali de todos os tempos ao longo de
toda uma época desportiva. de facto, convém sublinhar que não obstante partilharem um
importante número de características psicológicas que os diferenciam dos atletas menos
bem-sucedidos, os atletas de elite não podem e não devem ser vistos como um grupo ho-
mogéneo (4). Com efeito, mesmo no alto nível, as diferenças individuais não devem nunca
17—RPcd 10 (2)
01ser esquecidas, já que “determinar o que funciona para a maioria pode resultar em negli-
genciar as preocupações e competências específicas de cada atleta” (p.46) (8).
por outro lado, importa referir a escassez de estudos efectuados na área dos desportos
motorizados, os quais podem ser considerados dos mais desafiantes a nível físico e mental (20). além disso, o automobilismo é um dos desportos mais acarinhados e com mais adeptos
de todo o mundo. eventos como as ‘24 horas de le mans’, o ‘Grande prémio do mónaco’, o
‘rali de monte Carlo’ ou o ‘rali paris — dakar’ (‘lisboa — dakar’ em 2006) são mundial-
mente reconhecidos, e talvez sejam das organizações desportivas que - esquecendo os
‘triviais’ Jogos olímpicos e os mundiais/ europeus de Futebol - juntam mais nações e mais
mediatismo têm a nível mundial. desta forma, este estudo pode constituir-se como algo
inovador e, nesse contexto, dar alguma contribuição para o avanço do conhecimento numa
modalidade ainda pouco investigada, designadamente na área da psicologia.
mAterIAL e mÉtodos
estUdo de Caso
armindo araújo tinha 29 anos, sendo piloto de ralis desde o ano 2000. em 2002 tornou-se
piloto profissional de ralis e em 2006 sagrou-se tetra-campeão nacional da modalidade
(2003, 2004, 2005 e 2006).
proCedimentos
entrevista
os dados foram recolhidos através da aplicação de um protocolo de entrevista semiestru-
turada e de resposta aberta baseada num guião de entrevista desenvolvido por taylor e
schneider (34). especificamente, a entrevista visava traçar um perfil psicológico do piloto
relativamente a quatro aspectos centrais: (a) as características e/ ou competências psico-
lógicas mais importantes para o sucesso desportivo, (b) fontes de stress e ansiedade, (c)
estratégias de coping com situações problemáticas e stressantes, (d) emoções (para além
da ansiedade) com influência no rendimento.
recolha dos dados
após a obtenção de uma resposta positiva da Mitsubishi Motors Portugal para a realiza-
ção deste estudo, a entrevista foi primeiramente aplicada num momento aleatório fora da
competição. esta entrevista inicial, doravante apelidada de entrevista geral (eG), visava
traçar um perfil psicológico inicial do piloto. adicionalmente, com o objectivo de comple-
mentar essa entrevista e de compreender melhor o comportamento do piloto em situações
específicas, o piloto voltou a ser entrevistado no final de cada rali do Campeonato nacional
de ralis de 2006, num total de oito ocasiões (ver quadro 1). Com uma excepção (por im-
possibilidade do entrevistado), todas estas entrevistas tiveram lugar poucas horas após o
final de cada rali.
as entrevistas foram realizadas individualmente, num ambiente calmo e reservado, de
forma a impedir eventuais distracções. no decorrer das mesmas foi adoptada uma postura
não crítica e não avaliativa, tendo o entrevistador intervindo apenas quando estritamente
necessário, no sentido de esclarecer alguma afirmação ou ponto de vista.
QuaDro1 — Entrevistas realizadas durante o Campeonato Nacional de Ralis de 2006.
entreVista rali data
1 Rali Casino da Póvoa 24- 25 Fevereiro
2 PT Rali de Portugal 16- 18 Março
3 Rali Futebol Clube do Porto 26- 27 Maio
4 SATA Rali Açores 29- 1 Junho/ Julho
5 Rali Vinho da Madeira 3- 5 Agosto
6 Rali Centro de Portugal 14- 16 Setembro
7 Rali de Mortágua 27- 28 Outubro
8 Rali Casinos do Algarve 17- 18 Novembro
análise dos dados
a análise de conteúdo foi efectuada de acordo com procedimentos sugeridos por espe-
cialistas em metodologia de investigação qualitativa e análise de conteúdo (10,12,33). esta
análise obedeceu a alguns princípios fundamentais e foi efectuada em quatro etapas su-
cessivas: (a) transcrição das entrevistas na sua totalidade; (b) leitura e análise cuidada (in-
cluindo segunda e terceira leituras) das situações descritas; (c) identificação e descrição
(em bruto) dos temas específicos descritos pelo piloto; (d) análise dos temas encontrados
e identificação de factores e dimensões principais e ainda mais gerais.
inicialmente, a transcrição das entrevistas foi efectuada de forma a reproduzir fielmen-
te o discurso do piloto. de seguida, após a leitura e análise cuidadas das entrevistas, efec-
tuou-se uma interpretação lógico-semântica do seu conteúdo, identificando-se os temas
específicos que representavam o resumo das principais ideias expostas nas respostas. por
último, fez-se o agrupamento dos temas específicos cujos significados fossem idênticos
em dimensões mais gerais; em algumas questões o sujeito referiu mais do que uma di-
19—RPcd 10 (2)
01mensão geral. esta análise indutiva permitiu que temas e dimensões gerais pudessem ser
criados a posteriori a partir da interpretação lógico-semântica do texto (7), possibilitando
que os investigadores tentassem compreender a situação sem previamente impor expec-
tativas no objecto do estudo.
Como critério de inclusão de uma resposta numa dimensão, foi definida a obrigatorie-
dade de todos os investigadores assim a terem considerado. nos casos em que tal não se
verificou, a selecção da dimensão na qual a resposta foi incluída foi efectuada a partir de
reflexão conjunta, sendo as transcrições relidas até se chegar a um consenso; o ponto de
vista do primeiro autor (entrevistador) foi considerado especialmente relevante nas dis-
cussões interpretativas, uma vez que possuía a vantagem de ter conversado directamente
com o participante do estudo.
resuLtAdos
sobre as CaraCterístiCas e CompetênCias psiColóGiCas
mais importantes para o sUCesso desportiVo…
relativamente às características e competências psicológicas mais importantes para o su-
cesso desportivo, a análise qualitativa das entrevistas, apresentada nos quadros 2 e 3, per-
mitiu identificar oito dimensões gerais: (a) autoconfiança; (b) coesão e espírito de grupo;
(c) compromisso; (d) concentração; (e) controlo do erro; (f) controlo do stress, ansiedade
e pressão; (g) motivação e formulação de objectivos; e (h) rotina/ planeamento/ estratégia.
Como é possível verificar no quadro 2, quer na entrevista geral, quer nas entrevistas
realizadas ao longo da época, armindo araújo parecia dar especial relevância, em termos
de sucesso pessoal, ao planeamento e cumprimento de estratégias e rotinas, à capacida-
de de controlar o stress, ansiedade e pressão, e à motivação e formulação de objectivos.
Contudo, enquanto em termos mais ‘globais’ (i.e., na eG) estes três aspectos pareciam ter
um ‘peso’ semelhante, nas restantes entrevistas, a capacidade de planear e de cumprir
estratégias e rotinas evidenciava-se relativamente ao controlo do stress e ansiedade e à
motivação e formulação de objectivos.
especificamente, a rotina/ planeamento/ estratégia foi especialmente focada no início
da época, designadamente na entrevista 2 (pt rali de portugal), 3 (rali Futebol Clube do
porto) e 6 (rali Centro de portugal). na entrevista realizada após o pt rali de portugal,
armindo araújo queria mostrar todas as suas potencialidades, tendo referido que havia
necessidade de ‘montar’ um projecto internacional, num rali em que teve que contar com
a presença de pilotos estrangeiros e de competitividade mundial. nas entrevistas após o
rali Futebol Clube do porto e o rali Centro de portugal, a referência à rotina/ planeamen-
to/ estratégia estaria relacionada essencialmente com o piso dos troços: no primeiro caso,
devido a ser o primeiro piloto na estrada, algo que naquele tipo de piso em terra é bastante
prejudicial; no segundo caso, era um rali em que existiam vários tipos de asfalto e em que
a melhor afinação do novo carro ainda não tinha sido encontrada (quadro 3).
a questão do controlo da ansiedade, stress e pressão foi mais evidente na entrevista
1 (rali Casino da póvoa) e estava relacionada com a análise feita aos adversários e com
as novas aquisições mecânicas. na entrevista 2 (pt rali de portugal) esta dimensão teve
mais relevo devido ao facto de ser um rali em que a vitória era mais importante para a
demonstração do valor de armindo araújo e para a vontade de viabilizar um projecto inter-
nacional, do que propriamente para ‘marcar pontos’ para o campeonato. Foi também algo
muito evidenciado nas entrevistas 7 (rali de mortágua) e 8 (rali Casinos do algarve). na
entrevista 7 (rali de mortágua), a sua relevância justifica-se pelo facto de esta ter sido rea-
lizada logo após armindo araújo ter revalidado o seu título e se ter tornado tetra-campeão
nacional de ralis. Já na entrevista 8 (rali Casinos do algarve), a ênfase dada ao controlo
do stress e ansiedade deveu-se provavelmente aos esforços para a viabilização da interna-
cionalização de armindo araújo e da equipa.
a motivação e formulação de objectivos foi uma dimensão particularmente enfatizada
na entrevista 2 (pt rali de portugal), provavelmente pelos motivos anteriormente apre-
sentados (i.e., pela importância da vitória na demonstração do valor de armindo araújo
e na viabilização de um projecto internacional), e na entrevista 3 (rali Futebol Clube do
porto), certamente fruto da excelente vitória alcançada no pt rali de portugal.
para além destes três aspectos (planeamento e cumprimento de estratégias e rotinas,
capacidade de controlar o stress, ansiedade e pressão, e motivação e formulação de objec-
tivos), armindo araújo também relevou a importância da autoconfiança, da capacidade de
concentração e de controlo dos erros, bem como do compromisso e da coesão e espírito de
grupo. ressalte-se o facto de a autoconfiança e a coesão terem sido mais destacadas na en-
trevista geral do que nas outras entrevistas, ocorrendo o inverso no tocante à concentração.
de um modo específico, a concentração foi sublinhada em relação com o facto de não ter
havido momentos de distracção nos ralis, especialmente nas provas onde as condições cli-
matéricas eram piores: entrevistas 1 (rali Casino da póvoa), 4 (sata rali açores) e 8 (rali
Casinos do algarve). Já o controlo do erro (i.e., capacidade para não cometer erros) foi
particularmente evidenciado nas entrevistas 5 (rali Vinho da madeira) e 6 (rali Centro de
portugal), quando armindo araújo adquiriu um novo carro. nesta altura, o piloto ainda não
tinha encontrado as afinações correctas para a sua viatura, facto que o levava a ter mais
preocupações com possíveis erros. Já o compromisso foi realçado fundamentalmente na
entrevista 1 (rali Casino da póvoa) e na entrevista geral, numa forma de dar a entender a
disciplina e o rigor a que estava sujeito na sua profissão, enquanto a capacidade de sacrifí-
cio e de disciplina foram referidas de uma forma geral relativamente a todos os ralis, pois
os objectivos foram quase sempre cumpridos.
21—RPcd 10 (2)
01Finalmente, a importância da coesão e do espírito de grupo entre piloto, navegador e
equipa foi especialmente ressaltada na entrevista 6 (sata rali açores), prova na qual ar-
mindo araújo e a sua equipa exibiram, de facto, aquando da quebra da primeira velocidade
e subsequente substituição da caixa de velocidades, um elevado espírito de grupo e moti-
vação colectiva.
QuaDro2 — Características e competências psicológicas mais importantes para o sucesso desportivo (resultados globais)
dimensão Geral temas espeCíFiCos total% (n)
e Geral% (n)
e1 a e8% (n)
rotina/ planeamento/ estratégia
capacidade de planear e de cumprir estratégias e rotinas
24.0 (87) 19.6 (20) 25.7 (67)
controlo do stress, ansie-dade e pressão
capacidade e competências para lidar e/ ou controlar o stress, ansiedade e pressão
22.0 (80) 21.6 (22) 22.2 (58)
motivação e formulação de objectivos
motivaçãodeterminação para atingir objectivos sucessivosquerer ganhar
20.1 (73) 20.6 (21) 19.9 (52)
autoconfiança ter confiança e acreditar nas suas capacidades pessoaispensamento positivoauto-estima
9.1 (33) 13.7 (14) 7.3 (19)
controlo do erro capacidade para não cometer erros
7.2 (26) 5.9 (6) 7.7 (20)
concentração concentraçãocapacidade para se abstrair de tudo e centrar-se no rali
6.3 (23) 3.9 (4) 7.3 (19)
compromisso capacidade de sacrifíciocapacidade de disciplina
6.1 (22) 5.9 (6) 6.1 (16)
coesão e espírito de grupo
capacidade de trabalhar em equipaespírito de grupo
5.2 (19) 8.8 (9) 3.8 (10)
Total 100 (363) 100 (102) 100 (261)
QuaDro3 — Características e competências psicológicas mais importantes para o sucesso desportivo (entrevistas 1 a 8)
e1 e2 e3 e4 e5 e6 e7 e8
% (n) % (n) % (n) % (n) % (n) % (n) % (n) % (n)
1 25.5 (12) 29.4 (15) 48.1 (13) 16.1 (5) 21.7 (5) 31.4 (11) 4.8 (1) 19.2 (5)
2 8.5 (4) 29.4 (15) 25.9 (7) 19.4 (6) 21.7 (5) 14.3 (5) 23.8 (5) 19.2 (5)
3 27.7 (13) 17.6 (9) 11.1 (3) 16.1 (5) 21.7 (5) 17.1 (6) 42.9 (9) 30.8 (8)
4 6.4 (3) 2.0 (1) 3.7 (1) 12.9 (4) 4.3 (1) 5.7 (2) 14.3 (3) 15.4 (4)
5 17.0 (8) 9.8 (5) 7.4 (2) 9.7 (3) - - 4.8 (1) -
6 12.8 (6) 2.0 (1) - 6.5 (2) 8.7 (2) 5.7 (2) 4.8 (1) 7.7 (2)
7 - 5.9 (3) - 19.4 (6) - 2.9 (1) - -
8 2.1 (1) 3.9 (2) 3.7 (1) - 21.7 (5) 22.9 (8) 4.8 (1) 7.7 (2)
total 100 (47) 100 (51) 100 (2) 100 (21) 100 (23) 100 (35) 100 (21) 100 (26)
1 — rotina/ planeamento/ estratégia; 2 — motivação e formulação de objectivos; 3 - controlo do stress, ansieda-de e pressão; 4 — concentração; 5 — autoconfiança; 6 — compromisso; 7 — coesão e espírito de grupo; 8 — con-fronto com o erro
sobre as prinCipais Fontes de stress e ansiedade…
no que respeita às fontes de stress, a análise das entrevistas permitiu a identificação de
10 dimensões gerais: (a) comparação/ análise dos adversários, (b) condições climatéricas,
(c) factores financeiros/ orçamentais, (d) não ter o rendimento esperado, (e) natureza da
competição; (f) percepção de falta de prontidão física/ técnica/ mecânica, (g) preocupação
(carro novo), (h) pressões externas (comunicação social), (i) problemas mecânicos, e (j)
risco da profissão (quadros 4 e 5).
nas fontes identificadas, duas mereceram um claro destaque: os problemas mecânicos
e a comparação/ análise dos adversários. Contudo, enquanto este segundo aspecto assu-
miu maior importância na entrevista geral, comparativamente às entrevistas realizadas
após cada rali, o inverso aconteceu no concernente aos problemas mecânicos, os quais se
foram assumindo como uma das maiores fontes de stress durante a época — com particu-
lar relevância para a entrevista 4, após o sata rali açores, onde os problemas a este nível
foram maiores —, mas não foram salientados de forma tão premente na entrevista geral.
Já a comparação com e/ ou a análise dos adversários, a qual se centrava essencialmente
nos atributos mecânicos dos carros dos outros pilotos, foi especialmente referida, para
23—RPcd 10 (2)
01além da entrevista geral, nas entrevistas 2 (pt rali de portugal) e 5 (rali Vinho da ma-
deira). nestas duas provas estavam presentes pilotos de renome internacional e/ ou com
viaturas técnica e mecanicamente bastante evoluídas. na entrevista 1 (rali Casino da pó-
voa) também houve referência a esta dimensão, possivelmente por ter sido o primeiro rali
da época, sendo a análise às novidades a nível de pilotos e máquinas sempre importante.
paralelamente, a natureza da competição e a percepção de prontidão física/ técnica/
mecânica também foram referidas de modo substancial na entrevista geral e nas entrevis-
tas após cada rali. as questões ligadas à natureza da competição foram realçadas durante
toda a época, mas foram mais enfatizadas na entrevista 1 (rali Casino da póvoa) e na
entrevista 3 (rali Futebol Clube do porto) pelos aspectos já mencionados. Já a percepção
de falta de prontidão física/ técnica/ mecânica teve o seu principal destaque na entrevista
6 (rali Centro de portugal), possivelmente pela falta de prontidão técnica/ mecânica que
ocorreu nessa prova, já que as afinações do carro não eram as melhores. na entrevista 1
(rali Casino da póvoa) também houve referência à falta de prontidão mas neste caso mais
em ligação à falta de prontidão física, pois armindo araújo tinha estado doente na semana
anterior. de forma relacionada, o facto de ter estreado um novo carro a meio da época foi
um outro motivo ao qual o piloto associou algum stress e pressão (embora menos, com-
parativamente às dimensões anteriores), tendo as afinações e os problemas derivados da
juventude do carro sido realçados, quase na sua totalidade, na entrevista 5 (rali Vinho da
madeira), aquando da estreia com o novo carro. naturalmente foi também nessa entrevista
que se salientou a preocupação gerada pelo uso de um carro totalmente novo.
tal como a preocupação gerada pelo uso de um carro novo, as condições climatéricas
apenas foram mencionadas nas entrevistas após os ralis. além disso, contrariamente ao
que seria de esperar, pois o mesmo não se passará certamente com inúmeros pilotos de
ralis, foram pouco enfatizadas. isto poderá estar relacionado com o facto de o armindo
araújo afirmar que geralmente se consegue sobrepor mais à concorrência quando estas
condições estão adversas. de referir ainda que, apesar de poucas vezes referida, esta di-
mensão foi mais aludida nas entrevistas 1 (rali Casino da póvoa), 3 (rali Futebol Clube do
porto), 4 (sata rali açores) e 8 (rali Casinos do algarve), onde as condições climatéricas
tiveram, de facto, grande influência no normal decorrer da prova.
entre os aspectos menos focados como geradores de stress encontram-se ainda os fac-
tores financeiros e orçamentais, referidos pelo piloto nas entrevistas 1 (rali Casino da pó-
voa), 2 (pt rali de portugal) e 7 (rali de mortágua), sempre pelo mesmo motivo: preocupa-
ção em viabilizar o almejado projecto internacional. esta dimensão também foi referida na
entrevista geral, sempre em relação com o facto de este desporto estar muito dependente
de investimentos de verbas avultadas, marcas e patrocinadores. por outro lado, o facto de
a pressão gerada pela possibilidade de não ter o rendimento esperado ter sido algo rara-
mente focado, pode dever-se à atitude e autoconfiança de armindo araújo. esta dimensão
foi mais referida na entrevista 4 (sata rali açores), quando um grave problema mecânico
o levou a pensar que não iria alcançar os seus objectivos.
por fim, outras dimensões escassamente sublinhadas respeitavam ao risco da profissão,
apenas mencionado na entrevista geral e na entrevista 1 (rali Casino da póvoa), e a pres-
são exercida pela comunicação social, referida na entrevista geral e na entrevista 2 (pt
rali de portugal), possivelmente devido à extrema importância deste rali.
QuaDro4 — Fontes de stress e ansiedade (resultados globais)
dimensão Geral temas espeCíFiCostotal% (n)
e Geral% (n)
e1 a 8% (n)
problemas mecânicospreocupações geradas por avarias, escolha de pneus e afinações.
23.7 (37) 12.5 (4) 26.6 (33)
comparação/ análise dos adversários
comparação com adversários mais bem equipados;análise dos adversários
22.4 (35) 37.5 (12) 15.5 (23)
natureza da competição
importância do ralidificuldade do ralinovidade do ralinível do rali
14.1 (22) 15.6 (5) 13.7 (17)
percepção de falta de prontidão física/ técnica/ mecânica
má preparação física, técnica ou mecânica.
10.9 (17) 9.4 (3) 11.3 (14)
preocupação (carro novo)preocupação gerada pelo uso de um carro totalmente novo
7.1 (11) -- 8.9 (11)
factores financeiros/ orçamentais
preocupação gerada por orçamentos ou factores financeiros
6.4 (10) 6.3 (2) 6.5 (8)
condições climatéricasexigências competitivas relativas às condições climatéricas
6.4 (10) -- 8.1 (10)
não ter o rendimento esperado
não atingir objectivoster um rendimento abaixo do esperado
4.5 (7) 6.3 (2) 4.0 (5)
risco da profissão perigo da profissão 2.6 (4) 9.4 (3) 0.8 (1)
pressões externas (comunicação social)
pressão da comunicação social 1.9 (3) 3.1 (1) 1.6 (2)
Total 100 (156) 100 (32) 100 (124)
25—RPcd 10 (2)
01QuaDro5 — Fontes de stress e ansiedade (entrevistas 1 a 8)
e1 e2 e3 e4 e5 e6 e7 e8
% (n) % (n) % (n) % (n) % (n) % (n) % (n) % (n)
1 17.4 (4) 25.0 (5) 9.1 (1) 64.3 (9) 12.5 (3) 11.1 (1) 41.7 (5) 45.5 (5)
2 17.4 (4) 45.0 (9) 27.3 (3) -- 25.0 (6) 11.1 (1) -- --
3 26.1 (6) 10.0 (2) 45.5 (5) -- 4.2 (1) 11.1 (1) 8.3 (1) 9.1 (1)
4 8.7 (2) -- -- -- 8.3 (2) 55.6 (5) 25.0 (3) 18.2 (2)
5 -- -- -- -- 41.7 (10) 11.1 (1) -- --
6 21.7 (5) 5.0 (1) -- -- -- -- 16.7 (2) --
7 4.3 (1) -- 18.2 (2) 14.3 (2) 4.2 (1) -- 8.3 (1) 27.3 (3)
8 -- 5.0 (1) -- 21.4 (3) 4.2 (1) -- -- --
9 4.3 (1) -- -- -- -- -- -- --
10 -- 10.0 (2) -- -- -- -- -- --
total 100 (23) 100 (20) 100 (11) 100 (14) 100 (24) 100 (9) 100 (12) 100 (11)
1 —problemas mecânicos; 2 — comparação com/ análise dos adversários; 3 — natureza da competição; 4 — per-cepção de falta de prontidão (física/ técnica/ mecânica); 5 — preocupação (carro novo); 6 — factores finan-ceiros/ orçamentais; 7 - condições climatéricas; 8 — não ter o rendimento esperado; 9- risco da profissão; 10
— pressões externas (comunicação social)
sobre as estratéGias de CopinG…
no que concerne às estratégias de coping, a análise das entrevistas permitiu a identifica-
ção de cinco dimensões gerais: (a) aceitação da situação, (b) autocontrolo emocional e ou
redução da tensão/ pressão, (c) coping activo, (d) controlo da situação, e (e) reavaliação
positiva da situação (Quadros 6 e 7).
a aceitação da situação, o autocontrolo emocional e/ ou a redução da tensão/ pressão e a
reavaliação positiva das situações foram, de um modo geral, as estratégias de coping mais
enfatizadas. Contudo, enquanto na entrevista geral armindo araújo tinha dado particular
destaque à importância de reavaliar positivamente as situações stressantes, analisando-
-as de uma outra perspectiva, ao longo da época a aceitação da situação e o autocontrolo
emocional pareceram assumiram um papel mais preponderante.
Com efeito, a aceitação da situação foi a estratégia de coping mais destacada por ar-
mindo araújo ao longo das provas, tendo merecido particular atenção na entrevista 3 (rali
Futebol Clube do porto), quando um erro da equipa no penúltimo controlo horário antes
do final do rali fez com que, depois de vencerem o rali na estrada, passassem do 1º para o
17º lugar na geral.
a segunda estratégia mais referida foi a reavaliação positiva da situação. esta estratégia
foi mencionada de uma forma geral ao longo da época, mas também mereceu particular
destaque na entrevista geral.
o autocontrolo emocional e/ ou redução da tensão/ pressão também foi muito usado
durante as provas, tendo sido especialmente destacado na entrevista 1 (rali Casino da
póvoa), 6 (rali Centro de portugal) e 8 (rali Casinos do algarve). enquanto no rali Centro
de portugal houve alguns problemas mecânicos e de afinações, no rali Casinos do algarve
as condições climatéricas foram adversas e inconstantes, levando a grandes dificuldades
na escolha de pneus; além disso, também houve alguns problemas mecânicos.
o controlo da situação apenas foi reportado nas entrevistas realizadas após as provas.
esta estratégia foi particularmente referida na entrevista 6 (rali Centro de portugal), um
rali bastante difícil devido a vários aspectos já anteriormente referidos (afinações, proble-
mas mecânicos, vários tipos de asfalto). neste rali, armindo araújo referiu várias vezes o
controlo da situação como uma estratégia de coping das adversidades que lhe iam acon-
tecendo na prova.
por outro lado, e ao contrário do expectável, o coping activo foi escassamente menciona-
do: uma vez na entrevista geral e outra logo no primeiro rali da época.
QuaDro6 — Estratégias de coping (resultados globais).
dimensão Geral temas espeCíFiCostotal% (n)
e Geral% (n)
e1 a 8% (n)
aceitação da situaçãoaceitar a realidadeconformar-se
32.7 (35) 29.4 (5) 33.3 (30)
autocontrolo emocional e/ ou redução da tensão/ pressão
manter a calmanão perder a concentração
29.0 (31) 23.5 (4) 30.0 (27)
reavaliação positiva
autoverbalizações e pensamentos positivosver a situação de uma perspectiva positiva
22.4 (24) 41.2 (7) 18.9 (17)
controlo da situação procurar controlar a realidade 14.0 (15) -- 16.7 (15)
coping activoaumentar o esforço para resolver problemas
1.9 (2) 5.9 (1) 1.1 (1)
Total 100 (107) 100 (17) 100 (90)
27—RPcd 10 (2)
01QuaDro7 — Estratégias de coping (entrevistas 1 a 8).
e1 e2 e3 e4 e5 e6 e7 e8
% (n) % (n) % (n) % (n) % (n) % (n) % (n) % (n)
1 16.7 (3) 42.9 (3) 63.6 (7) 40.0 (2) 33.3 (4) 30.0 (6) 25.0 (1) 30.8 (4)
2 37.5 (12) -- 9.1 (1) 40.0 (2) 25.0 (3) 25.0 (5) 25.0 (1) 38.5 (5)
3 16.7 (3) 14.3 (1) 27.3 (3) 20.0 (1) 25.0 (3) 5.0 (1) 50.0 (2) 23.1 (3)
4 5.6 (1) 42.9 (3) -- -- 16.7 (2) 40.0 (8) -- 7.7 (1)
5 5.6 (1) -- -- -- -- -- -- --
total 100 (18) 100 (7) 100 (11) 100 (5) 100 (12) 100 (20) 100 (4) 100 (13)
1 — aceitação da situação; 2 — autocontrolo emocional e/ ou redução da tensão/ pressão; 3 — reavaliação positi-va da situação; 4 — controlo da situação; 5 — coping activo
sobre oUtras emoções…
no concernente às emoções, foram encontradas três dimensões gerais: (a) angústia, (b) frus-
tração/ desilusão/ revolta, e (c) prazer/ alegria (quadros 8 e 9). de uma forma geral, estas
emoções foram pouco reportadas, sendo-o exclusivamente nas entrevistas realizadas após
os ralis. não obstante, importa salientar que a frustração/ desilusão/ revolta foi focada tantas
vezes quantas o prazer/ alegria, enquanto a angústia apenas foi referida uma única vez.
mais especificamente, a frustração/ desilusão/ revolta apenas foi mencionada na entrevis-
ta 3 (rali Futebol Clube do porto), quando um erro da equipa ditou uma penalização, como já
foi anteriormente mencionado. por outro lado, o prazer e a alegria foram referidos maiorita-
riamente na entrevista 2 (pt rali de portugal), mas também nas entrevistas 6 (rali Centro
de portugal) e 7 (rali de mortágua). no pt rali de portugal, o prazer deveu-se à excelente
vitória alcançada frente a adversários de renome internacional. no rali Centro de portugal,
armindo araújo estava satisfeito por finalmente ter acertado com as afinações do novo carro,
facto que o levava a ter muito prazer na condução. e o prazer destacado no rali de mortágua
relacionava-se essencialmente com o prazer de condução e fundamentalmente por ter sido
a prova onde armindo araújo se sagrou pela quarta vez Campeão nacional de ralis.
Finalmente, a angústia apenas foi mencionada na entrevista 4 (sata rali açores), em re-
lação com a quebra da primeira velocidade da caixa de velocidades do carro. o piloto refe-
renciou a angústia sentida durante o primeiro dia dessa prova, no sentido de saber se o carro
aguentaria até ao final do dia, e também depois, na assistência, quando não se sabia se a
equipa conseguiria resolver o problema dentro do tempo regulamentar para o devido efeito.
QuaDro8 — Emoções (resultados globais).
dimensão Geral temas espeCíFiCostotal% (n)
e Geral% (n)
e1 a 8% (n)
frustração/ desilusão/ revoltafrustraçãodesilusãorevolta
46.2 (6) -- 46.2 (6)
prazer/ alegriaprazeralegriabem-estar
46.2 (6) -- 46.2 (6)
angústia angústia 7.7 (1) -- 7.7 (1)
Total 100 (13) -- 100 (13)
QuaDro9 — Emoções (entrevistas 1 a 8).
e1 e2 e3 e4 e5 e6 e7 e8
% (n) % (n) % (n) % (n) % (n) % (n) % (n) % (n)
1 -- -- 100 (6) -- -- -- -- --
2 -- 100 (4) -- -- -- 100 (1) 100 (1) --
3 -- -- -- 100 (1) -- -- -- --
total -- 100 (4) 100 (6) 100 (1) -- 100 (1) 100 (1) --
1 — frustração/ desilusão/ revolta; 2 — prazer/ alegria; 3 — angústia
dIscussão e concLusÕes
o presente estudo pretendeu, através de múltiplas entrevistas realizadas ao longo da épo-
ca de 2006, traçar o perfil psicológico de um dos melhores atletas portugueses de rali de
todos os tempos.
no que concerne às características e competências psicológicas que armindo araújo consi-
derava mais importantes para o seu sucesso desportivo, os resultados são consistentes, pelo
menos em parte, com investigações anteriores em diferentes modalidades, nas quais níveis
mais elevados de motivação e autoconfiança, bem como maiores níveis de concentração e
controlo da ansiedade, eram aspectos que distinguiam atletas de elite de atletas menos bem-
-sucedidos (3, 9, 12, 25, 37). Curiosamente, a característica globalmente mais referida pelo piloto, es-
29—RPcd 10 (2)
01pecialmente nas entrevistas após os ralis — rotina/ planeamento/ estratégia -, não é tão referi-
da na literatura da especialidade, embora haja estudos que a apontem (e.g., 19, 26). provavelmente
isso deve-se ao facto de a grande maioria dos estudos ter sido efectuada com populações de
desportos individuais ou colectivos em que o treinador assume essa função, enquanto o rali se
constitui como uma modalidade em que é o próprio atleta a definir estratégias e planeamentos.
num estudo com jogadores de golfe, modalidade na qual também existe essa responsabilidade
por parte dos atletas, foram encontrados dados semelhantes (26).
relativamente às origens do stress, também foi possível observar a importância de se
ter em consideração a especificidade da modalidade. Com efeito, nas cinco fontes de stress
mais referidas, quatro eram relativas ao carro ou ao facto de o rali ser um desporto mo-
torizado. mesmo a percepção física/ técnica/ mecânica e a comparação com/ análise dos
adversários tiveram sempre por base aspectos de índole motorizada ou mecânica. logo,
por serem próprias deste desporto (bem como de outros desportos motorizados), não é
surpreendente que não tenham surgido em outras investigações sobre a mesma temática.
em oposição, dimensões como a natureza da competição e, embora menos, a possibilidade
de não ter o rendimento esperado e as pressões externas, vão ao encontro de vários estu-
dos anteriores, designadamente alguns de cariz qualitativo (e.g.,9,12,18).
as estratégias de coping eram, de um modo geral, coincidentes com as descritas na literatu-
ra da especialidade como instrumentos úteis para lidar com situações problemáticas e stres-
santes. a aceitação das situações problemáticas e stressantes, por exemplo, é muitas vezes
considerada como um ‘ponto de partida’ fundamental no processo de coping. Frequentemente
os atletas sentem que (só) depois de aceitarem a situação stressante que está a ocorrer po-
dem tentar lidar com ela no sentido de melhorarem o que estava mal (5). de forma semelhante,
murphy e tammen (30) afirmam que o autocontrolo emocional e/ ou redução da tensão/ pressão
é uma das estratégias mais úteis na resolução de problemas, enquanto Gould e colaboradores (10,11) atribuem particular interesse à reavaliação positiva das situações. por outro lado, importa
sublinhar que o coping activo, uma estratégia frequentemente citada na literatura como positi-
va e eficaz no confronto com situações stressantes, foi pouco referida pelo piloto.
Finalmente, saliente-se que, apesar de armindo araújo não ter mencionado um leque
muito alargado de emoções, o prazer/ alegria se destacou entre aquelas efectivamente
mencionadas. esta emoção é geralmente considerada importante para o desempenho des-
portivo (16,21), já tendo sido reportada numa investigação realizada por dias, Cruz e Fonseca (5)com atletas de elite de diferentes modalidades. por outro lado, não obstante a frustração
ter sido relevada em ambas as investigações (i.e., no presente estudo e no de dias, Cruz
e Fonseca), o seu estatuto ‘emocional’ não é ainda consensual entre os investigadores da
área. lazarus (21), por exemplo, não considerou este fenómeno aquando da adaptação do
seu modelo cognitivo-motivacional-relacional do stress e emoções, um dos mais utilizados
actualmente para estudar o stress e emoções no contexto desportivo.
resumidamente, os resultados do presente estudo demonstraram que as característi-
cas e competências psicológicas de armindo araújo, bem como as estratégias e padrões
comportamentais e cognitivos a que o piloto recorria durante as provas, eram coincidentes
com os da generalidade dos atletas de elite e ou alto nível estudados em diferentes inves-
tigações ao longo dos anos. todavia, os resultados também evidenciaram a importância
de se ter em consideração as variáveis contextuais, quer no que respeita à especificidade
da modalidade (nomeadamente pelo facto de ser um desporto motorizado), quer no que
concerne às exigências específicas de cada prova (isoladamente), em particular. este fac-
to foi evidenciado pelas oito entrevistas realizadas ao longo da época, sempre no fim de
cada rali. por outro lado, ainda que os factores emocionais (para além da ansiedade), não
tenham tido uma expressão elevada, o facto de terem sido mencionadas algumas emoções
com um claro potencial efeito negativo no desempenho (frustração e angústia), deverá, na
nossa opinião, constituir-se como um alerta para a importância do controlo emocional dos
atletas. assim, no seu conjunto, estes dados poderão alertar para o não esquecimentoda
componentepsicológicanosralis,emordemapotenciaraharmoniamentaldospilotos e,
por conseguinte, a sua performance. paralelamente, poderão dar indicações importantes
para a preparação mental dos atletas de diferentes modalidades, no sentido de a mesma
incluir diferentes factores e processos cognitivos, emocionais e comportamentais, sempre
em relação com a modalidade e suas exigências específicas.
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33—RPcd 10 (2): 33-46
02estudo de determinantes
tácticas da eficácia do ataque
no voleibol feminino juvenil
de elevado nível de rendimento
no side-out e na transição.
PAlAvRAs chAve:
Voleibol.efeitodoataque.side-out.transição.
AutoRes:
gustavodeconticosta1
isabelMesquita2
PabloJuangreco1
aurobarreirosfreire1
JosécíceroMoraes3
1 Universidade Federal de minas Gerais belo horizonte, mG, brasil
2CiFi2d, Faculdade de desporto Universidade do porto, portugal
3Universidade Federal do rio Grande do sul, porto alegre, rs, brasil
correspondência:gustavodeconticosta.ruaDr.Juvenaldossantos,431/apt101,
bairroluxemburgo.ceP:30380530,belohorizonte/Minasgerais,brasil([email protected])
resumo
o objectivo do presente estudo consistiu em identificar possíveis determinantes da eficácia
do ataque em equipas de Voleibol juvenil feminino de elevado nível de rendimento compe-
titivo no side-out e na transição. Foram analisados oito jogos referentes ao Campeonato do
MundodeJunioresfemininosde2007,totalizando698acçõesderecepção,1052acções
de ataque e 471 acções de defesa. aplicou-se a regressão logística multinomial para ana-
lisar o poder explicativo do efeito da recepção, efeito da defesa, tempo de ataque e tipo
de ataque sobre o efeito do ataque. na fiabilidade de observação recorreu-se ao índice de
Kappa e observou-se que todos os valores encontrados foram superiores a .81. o presente
estudo mostrou que o ataque forte aumentou as chances de pontuar tanto no side-out
como na transição. em relação à velocidade do ataque, jogar mais rápido, 1º e 2º tempos,
aumentou as possibilidades de pontuar na transição. estes resultados evidenciam que o
jogo feminino de elevado nivel de rendimento competitivo reivindica, desde os escalões
de formação, a prática de um jogo ofensivo agressivo, mormente pelo recurso a ataques
fortes e mais rápidos.
study of tactical determinants of attack efficacy
in young female volleyball players of high
performance level in side-out and transition
pedagogical representations.
AbstrAct
the aim of this study consisted in identify possible determinants of the
effectiveness of the attack in women's junior Volleyball high perfor-
mance teams, in side-out and transition. eight games of the World Youth
Championship occurred in 2007 were analyzed, totaling 698 reception
actions, 1052 attacks and 471 defense actions. the multinomial logistic
regression was applied in order analyze the explanatory power of the
effect of the reception, effect of the defense, tempo of attack and type
of attack on the attack outcome. the reliability of observation recurred
to the Kappa index and all values founds were above .81. this study
showed that the strong attack increased the chances of scoring in both
side-out and transition. regarding the speed of attack, play faster, 1st
and 2nd times, increased the chances of scoring in transition. these re-
sults show that since the basic categories the female elite game claims
the practice of an aggressive offensive game especially by resorting to
stronger and faster attacks.
Key woRds:
Volleyball.effectoftheattack.side-out.transition.
35—RPcd 10 (2)
02Introdução
a análise do jogo de Voleibol, no que concerne à eficácia dos procedimentos que o consti-
tuem (serviço, recepção, levantamento, ataque, bloqueio e defesa) não é recente (3, 8, 9, 10, 20),
sendo que o ataque tem vindo a assumir-se como o procedimento com maior poder preditor
no sucesso competitivo das equipas (8, 9, 10, 14, 20). todavia, as suas características variam, fun-
damentalmente, em função do compartimento do jogo em que ocorre, sugerindo a neces-
sidade do seu estudo em função dos complexos de jogo. distinguem-se no jogo de Voleibol
dois grandes complexos, o complexo i ou side-out (recepção, levantamento e ataque) e o
complexo ii ou transição (serviço, bloqueio, defesa e contra-ataque) (12, 15, 21). desta forma,
a ocorrência do ataque no side-out (corresponde à equipa sem a posse do serviço) é signi-
ficativamente mais elevada (17, 22), para além de consubstanciar um jogo mais rápido (1) e um
ataque mais forte (4). Contrariamente, o jogo ao nível da transição (corresponde à equipa
que tem a posse do serviço), mostra que o tempo de ataque é mais lento, proporcionando o
aumento do número de opositores no bloco e a diminuição das possibilidades de pontuar (1,
5, 17). outras subdivisões do complexo ii são ainda possíveis, de forma a especificar a estru-
turação funcional da dinâmica do jogo em função de determinadas regularidades. assim, o
jogo de transição pode integrar os seguintes complexos: complexo ii (consiste na recupe-
ração da bola a partir da defesa ou do bloqueio do ataque adversário e posterior construção
do contra-ataque), complexo iii (consiste na recuperação da bola a partir da defesa ou do
bloqueio do contra-ataque adversário e posterior construção do contra-ataque) (21).
as acções ofensivas podem assumir contornos diferenciados, nomeadamente em função
das características da distribuição, do tempo de ataque, dos sistemas defensivos adoptados
pelo adversário e da zona de finalização do ataque (23). dos estudos realizados, ressalta a ocor-
rência de dependência funcional da eficácia do ataque com a qualidade do primeiro toque, tanto
no side-out, pela análise do efeito da recepção (2, 13), como na transição pela análise do efeito da
defesa (18). ao nível do ataque propriamente dito, o tempo de ataque, ou seja, a velocidade com
que é realizado (5, 23, 25), e o tipo de ataque (4, 16, 24) mostram estar associados com a sua eficácia.
particularmente no side-out, boas condições de construção do ataque podem predizer
a qualidade da sua finalização (9, 10, 19). parece ser evidente que o serviço adversário de
reduzida eficácia (6, 7), a recepção perfeita e os ataques realizados sem o toque no blo-
queio, com exceção do amorti (25), geram vantagens na conversão do ataque em ponto,
permitindo diferenciar vencedores de perdedores. Contrariamente, na transição, a qua-
lidade da defesa não tem evidenciado estar associada ao levantamento (18), para além de
apresentar fraco poder preditor sobre o resultado da equipa no jogo (26).
todavia, salvo raras excepções (9, 10, 25, 26), a maior parte dos estudos realizados recor-
reu a estatísticas bi-variadas, no caso o teste de qui-quadrado, as quais não permitem
indagar acerca do possível efeito preditor de variáveis explicativas sobre uma variável
resposta, o que limita substancialmente a compreensão da interação das variáveis que
configuram a dinâmica interna do jogo. para além disso, a pesquisa sobre estas variáveis
tem vindo a utilizar preferencialmente equipas de seniores masculinos de voleibol de
alto nivel de rendimento. dada a escassez de estudos aplicados em equipas de formação,
mormente de elevado nivel de rendimento competitivo, como são as seleccções nacio-
nais, revela-se pertinente realizar pesquisa capaz de contribuir para a identificação de
factores concorrentes do rendimento, pelo recurso a modelos não lineares, contribuindo
assim com informação relevante para o domínio da prática e da investigação.
baseado neste enquadramento conceptual, o presente estudo pretende analisar possíveis
determinantes do efeito do ataque no side-out e na transição, tendo por referência o efeito
da recepção e da defesa, a velocidade do ataque (expressa no tempo de ataque) e o tipo de
ataque, no âmbito da escalão júnior feminino de elevado nível de rendimento competitivo.
mAterIAL e mÉtodos
amostra
o presente estudo teve como amostra sete seleções nacionais presentes no Campeonato
do mundo de Juniores Femininos de 2007 (brasil — 1º lugar, China — 2º lugar, Japão —
3º lugar, itália — 5º lugar, Ucrânia — 6º lugar, alemanha — 7º lugar e porto rico — 9º
lugar). recorreu-se à observação de oito jogos, obtendo-se um total de 698 acções de re-
cepção, 1052 acções de ataque e 471 acções de defesa. a amostra utilizada foi de caráter
não probabilístico, ou seja intencional, na medida em que as equipas foram escolhidas
em função do seu nível de prática, selecções nacionais detentoras de um elevado nível
de rendimento competitivo.
VariáVeis do estUdo e instrUmentos
Efeito da recepção e da defesa
para a variável recepção e defesa, foram adaptados os critérios de eom e schutz (9), os
quais consideram uma escala de 4 itens, a qual varia de zero a quatro, ou seja, entre o erro
e o ponto, considerando duas possibilidades de continuidade mais e menos favoráveis para
a organização do ataque. no presente estudo, dado ser objetivo prioritário analisar a eficá-
cia do ataque, apenas foram consideradas para análise as ações de recepção e de defesa
que geraram continuidade. o critério para a categorização das acções assentou no efeito
que a recepção ou a defesa provoca ao nível da organização ofensiva, nomeadamente no
número de opções de ataque, considerando opção de ataque para o levantador quando
o atacante está espacial e temporariamente disponível para participar do ataque. sendo
assim, obteve-se a seguinte categorização:
37—RPcd 10 (2)
021. Recepção ou defesa que não permite ataque organizado: não há possibilidade de orga-
nização ofensiva, estando disponível apenas um atacante para o ataque.
2. Recepção ou defesa que permite ataque organizado: há a possibilidade de organização
ofensiva, com dois ou mais atacantes disponíveis para o ataque.
Efeito do ataque
o instrumento de observação aplicado foi o proposto por mesquita e César (16). desta forma,
as categorias consideradas foram:
Erro: atacante falha (rede, fora ou falta) ou o bloqueio adversário pontua;
Continuidade: a acção de ataque não se traduz numa ação terminal, havendo continuida-
de da jogada, após esta ter sido defendida ou devolvida pelo bloqueio;
Ponto: bola atacada, diretamente, para o solo do campo adversário/ bola atacada, segui-
da de toque no bloqueio ou defesa sem sucesso/ falta do bloqueio.
Tempo de Ataque
Corresponde ao parâmetro temporal do ataque, tendo como indicadores o levantador, o ata-
cante e a trajetória da bola. para a classificação dos tempos de ataque adoptou-se a classifi-
cação preconizada por selinger (27): 1º tempo de ataque: o atacante contata a bola logo após o
levantador a soltar; 2º tempo de ataque: o atacante sai para o ataque quando a bola chega às
mãos do levantador; 3º tempo de ataque: o atacante sai para o ataque quando a bola chega
ao ponto mais alto da trajetória ascendente depois de sair das mãos do levantador.
Tipo de ataque realizado
para a variável tipo de ataque foi utilizado o critério que diferencia o ataque forte do colo-
cado, em virtude de ser um escalão de formação, e por isso não ser pertinente o recurso a
uma elevada especificação das variantes destes dois tipos de ataque.
Ataque forte: o batimento na bola é forte, sendo esta contatada na parte superior ou
frontal, de forma a imprimir uma trajetória descendente;
Ataque colocado: corresponde aos ataques em que a bola é contatada com controle da
força aplicada, assumindo a bola uma trajetória ascendente com o intuito da bola ser dire-
cionada para uma região defensiva deficitária.
reColha dos dados
todos os jogos foram filmados de topo, permitindo a visualização do campo longitudinal-
mente. Foram realizados treinos de observação prévios, no sentido de verificar se as ima-
gens registadas em locais distintos dificultavam a observação de alguma variável do estu-
do. desta forma, observou-se um jogo de cada local de competição, constatando-se que a
mudança de local de filmagem não alterou a qualidade das imagens recolhidas.
análise dos dados
recorreu-se à estatística descritiva para determinar freqüências e percentagens de ocor-
rência de cada variável. no sentido de averiguar a possível existência de determinantes do
efeito do ataque, foi realizada a regressão logística multinomial. deste modo, pretendeu-se
a partir do recurso a esta estatística medir o poder preditor de variáveis explicativas (efeito
da recepção, efeito da defesa, tempo de ataque e tipo de ataque) em relação a uma variável
resposta (efeito do ataque). numa primeira fase, cada uma das possíveis variáveis explicati-
vas foi testada individualmente, no sentido de se identificar a existência de associação signi-
ficativa com a variável resposta (odds ratio bruto); caso esse pressuposto fosse verificado, a
respectiva variável seria integrada no modelo ajustado (odds ratio ajustado).
Fiabilidade da obserVação
para o estudo da fiabilidade foram analisadas 70% das acções, valores substancialmente
superiores aos (10%) de referência apontados pela literatura (28). recorreu-se ao índice de
Kappa, em virtude desta estatística detectar a existência de acordos por acaso (28). a fiabi-
lidade inter-observador e intra-observador mostrou valores de Kappa de .89 e .96, respec-
tivamente, para o efeito da recepção; de .96 e .94, respectivamente, para o efeito da defesa;
de .85 e .82, respectivamente, para o tempo de ataque; de .83 e .87, respectivamente, para
o tipo de ataque e de .96 e .96 para o efeito do ataque. desta forma, todas as variáveis
apresentaram valores substancialmente superiores aos valores mínimos aceitáveis apon-
tados pela literatura (.75) (11), anunciando da possibilidade de serem utilizados enquanto
ferramenta científica.
resuLtAdos
a regressão multinomial foi utilizada para estimar a probabilidade de cada uma das va-
riáveis independentes em função da variável resposta (efeito do ataque) no side-out. o
modelo ajustado foi estatisticamente significativo (G2 = 105.324; p<001) e as estimativas
dos coeficientes do modelo, bem como as respectivas percentagens de ocorrência para o
efeito da recepção, tempo de ataque e tipo de ataque são dadas no Quadro 1.
ao considerarmos o efeito da recepção sobre o efeito do ataque, observou-se que as re-
cepções que permitiram ataque organizado culminaram em ponto 46.7%, em continuidade
40.9% e em erro de ataque 12.4%. as recepções que não permitiram ataque organizado
resultaram em ponto 31.6%, em continuidade 57.9% e em erro de ataque 10.5%.
o tempo de ataque no side-out mostrou que, dos ataques de 1º tempo, 47.9% resulta-
ram em ponto do ataque, 39.1% permitiram a continuidade e 13.0% o erro do ataque. nos
ataques de 2º tempo, o ponto ocorreu 48.5%, a continuidade 39.8% e o erro 11.7%. re-
lativamente ao ataque de 3º tempo, 34.7% resultaram em ponto, 53.1% possibilitaram a
39—RPcd 10 (2)
02continuidade e 12.2% culminaram em erro. a análise do efeito do ataque em função do tipo
de ataque evidenciou que o ataque forte provocou o ponto 45.9%, a continuidade 40.1% e
o erro 14.0%, enquanto que o ataque colocado culminou em ponto 6.1%, em continuidade
89.4% e em erro 4.5%.
QuaDro1 — Coeficientes do modelo multinomial para as determinantes tácticas do efeito do ataque no side-out.
Var
iáV
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d
e J
oG
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Co
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b er
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(%)
b er
ro
-pa
dr
ão
X2 W
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d
or
a
JU
sta
do
p-V
alU
e
Recepção
Recepção não permite ataque org.
57,9% 10,5% -,32 ,826 ,8260,87
(0,38-1,97)0,74 31,6% -,14 ,311 ,188
0,89(0,49-1,64)
0,71
Recepção que permite ataque org. b
40,9% 12,4% 0B - - - - 46,7% 0B - - - -
Tempo de ataque
1º tempo de ataque
39,1% 13,0% ,01 ,001 ,0011,03
(0,45-2,37)0,94 47,9% ,383 ,311 1,522
1,52(0,83-2,79)
0,18
2º tempo de ataque
39,8% 11,7% -,28 ,818 ,8180,85
(0,41-1,76)0,66 48,5% ,264 ,271 ,947
1,34(0,79-2,27)
0,28
3º tempo de ataque b
53,1% 12,2% 0B - - - - 34,7% 0B - - - -
Tipo de ataque
Ataque forte
40,1% 14,0% 1,8 14,759 14,766,99
(2,08-23,5)0,002 45,9% 2,70 ,532 25,78
14,96(5,27-42,4)
<0,001
Ataque colocado b 89,4% 4,5% 0B - - - - 6,1% 0B - - - -
a Categoria de referência da variável resposta; b Categoria de referência da variável explicativa; org. — organizado;
Cont. — Continuidade
a análise do Quadro 1 evidencia que, no side-out, a única variável que determinou o efeito
do ataque no modelo ajustado foi o tipo de ataque. na associação entre o tipo de ataque e
o efeito do ataque, observa-se que o valor de odds ratio ajustado foi de 6.99, para o ataque
forte; o que significa que a razão erro/ continuidade foi maior para este tipo de ataque
do que para o ataque colocado (categoria de referência). desta forma, a possibilidade do
ataque forte resultar em erro foi aproximadamente sete vezes maior do que no ataque
colocado. além disso, verificou-se que para a razão ponto/ continuidade o valor de odds
ratio ajustado foi de 14.96, o que significa que a possibilidade do ataque forte pontuar foi
aproximadamente quinze vezes maior do que no ataque colocado.
a regressão multinomial foi utilizada para estimar a probabilidade de cada uma das va-
riáveis independentes em função da variável resposta (efeito do ataque) na transição. o
modelo ajustado foi estatisticamente significativo (G2 = 41.678; p<.001) e as estimativas
dos coeficientes do modelo, bem como as respectivas percentagens de ocorrência para o
efeito da defesa, tempo de ataque e tipo de ataque são dadas no Quadro 2. na associação
entre a eficácia da defesa e a eficácia do ataque, observou-se que a defesa que permitiu
ataque organizado deu origem ao ponto em 46.4%, à continuidade em 38.0% e ao erro em
15.6%. entretanto, a defesa que não permitiu ataque organizado culminou na conquista de
ponto em 27.2%, na continuidade em 60.5% e no erro em 12.3%.
na análise do tempo de ataque observou-se que, dos ataques de 1º tempo, 55.3% cul-
minaram em ponto, 34.2% permitiram a continuidade e 10.5% resultaram em erro. nos
ataques de 2º tempo, o ponto de ataque ocorreu em 50.0%, a continuidade em 35.3% e o
erro em 14.7%. relativamente ao ataque de 3º tempo, 27.3% resultaram em ponto, 58.0%
possibilitaram a continuidade e 14.7% foram erros do ataque. por sua vez, a análise entre
o tipo de ataque e o efeito do ataque, na transição, mostrou que o ataque forte resultou
40.2% em ponto, 41.7% em continuidade e 18.1%; em erro do ataque; o ataque colocado
culminou 11.0% em ponto, 74.0% em continuidade e 15.0% em erro.
a análise do Quadro 2 evidencia que na transição o tempo de ataque e o tipo de ataque
determinaram o efeito do ataque. assim, a associação do tempo de ataque com o efeito de
ataque evidenciou o valor de odds ratio ajustado de 2.93, o que significa que a razão ponto/
continuidade foi maior para este tempo de ataque do que para o 3º tempo de ataque (cate-
goria de referência). deste modo, a possibilidade de conquistar o ponto após o 1º tempo de
ataque foi aproximadamente 3 vezes maior do que após o 3º tempo de ataque. além disso,
observou-se que o valor de odds ratio ajustado para o 2º tempo foi de 2.14, o que significa
que a possibilidade de conquistar o ponto após o 2º tempo de ataque foi aproximadamente
duas vezes maior do que após o 3º tempo de ataque.
41—RPcd 10 (2)
02QuaDro2 — Coeficientes do modelo multinomial para as determinantes tácticas do efeito do ataque na transição.
Var
iáV
eis
d
e J
oG
o
Co
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a(%
)
er
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(%)
b er
ro
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(%)
b er
ro
-pa
dr
ão
X2 Wa
rd
or
aJ
Us
tad
o
p-V
alU
e
Defesa
Defesa que não permite ataque org.
60,5% 12,3% -,23 ,342 ,4360,69
(0,32-1,50) 0,35 27,2% ,025 ,342 ,0050,99
(0,52-1,91) 0,98
Defesa que permite ataque org. b
38,0% 15,6% 0b - - - - 46,4% 0b - - - -
Tempo de ataque
1º tempo de ataque
34,2% 10,5% -,13 ,536 ,0600,67
(0,19-2,43) 0,54 55,3% 1,09 ,467 5,4182,93
(1,18-7,24) 0,02
2º tempo de ataque
35,3% 14,7% -,03 ,369 ,0050,86
(0,37-2,00) 0,73 50,0% ,779 ,355 4,8072,14
(1,08-4,24) 0,03
3º tempo de ataque b 58,0% 14,7% 0b - - - - 27,3% 0b - - - -
Tipo de ataque
Ataque forte 41,7% 18,1% 1,50 ,405 13,642,76
(1,16-6,54) 0,02 40,2% 1,36 ,378 13,013,90
(1,86-8,18) <0,001
Ataque colocado b 11,0% 74,0% 0b - - - - 15,0% 0b - -
0,99(0,52-1,91) 0,98
a Categoria de referência da variável resposta; b Categoria de referência da variável explicativa; org. — organizado; Cont. — Continuidade
a associação entre o tipo de ataque e o efeito deste na transição evidenciou o valor de odds
ratio ajustado de 2.76 para o ataque forte, o que significa que a razão erro/ continuidade
foi maior para este tipo de ataque do que para o ataque colocado (categoria de referência).
desta forma, a possibilidade de cometer erro no ataque forte foi aproximadamente três ve-
zes maior do que no ataque colocado. além disso, verificou-se que para a razão ponto/ con-
tinuidade o valor de odds ratio ajustado foi de 3.90, o que significa que a possibilidade do
ataque forte pontuar foi aproximadamente quatro vezes maior do que no ataque colocado.
dIscussão
o presente estudo teve por objetivo analisar possíveis determinantes do efeito do ataque
no side-out e na transição, tendo por referência o efeito da recepção e da defesa, a veloci-
dade do ataque (tempo de ataque) e o tipo de ataque, no âmbito do escalão júnior feminino
de elevado nível de rendimento competitivo.
o efeito da recepção demonstrou que as recepções que permitiram ataque organizado
culminaram em ponto na maioria das vezes, enquanto que as recepções que não permiti-
ram ataque organizado propiciaram principalmente a continuidade do jogo. estes resulta-
dos estão de acordo com o estudo de João et al. (13) que através da análise de doze jogos
da World League masculina de 2001 observaram que as recepções que permitiram todas
as possibilidades de ataque resultaram em ponto 81.1% das vezes, enquanto as recepções
que permitiram apenas uma solução de ataque ou soluções de ataque denunciadas resul-
taram em continuidade, 51.4% e 38.9% respectivamente. sendo assim, é possível destacar
que as recepções de fraca qualidade induziram maior continuidade no ataque, verificando-
-se o contrário nas recepções de elevada qualidade, as quais tiveram no ponto o efeito de
ataque mais recorrente.
o efeito da defesa evidenciou que a possibilidade de organização ofensiva permitiu a
maior ocorrência de ponto no ataque e a sua ausência o efeito de continuidade. estes
resultados corroboram o estudo de mesquita et al. (17) que ao analisarem a liga mundial
de 2004 observaram que na transição a maior ocorrência do efeito de continuidade da
defesa limitou as possibilidades de ataque e, consequentemente, o efeito mais recorren-
te do ataque foi a continuidade. deste modo, a obtenção de ponto no ataque, na transição,
exige melhores condições de finalização, as quais se iniciam com elevada qualidade do
procedimento de defesa.
na análise do tempo de ataque, tanto no side-out como na transição, verificou-se que
jogar mais rápido (tempo 1 e 2) possibilitou a conquista do ponto, enquanto que jogar mais
lento (tempo 3) favoreceu o efeito de continuidade. estes resultados corroboram o estudo
de César e mesquita (5) que, ao analisarem os Jogos olímpicos de atenas de 2004 ao nível
feminino, verificaram que tendencialmente os ataques mais rápidos (1º tempo) resultaram
em ponto e os ataques mais lentos (3º tempo) em continuidade. tal sugere que os ataques
mais lentos permitem uma melhor estruturação defensiva principalmente ao nível de blo-
queio, expressa numa forte oposição ao atacante.
relativamente ao tipo de ataque no side-out, observou-se que o ataque forte resultou
em ponto na sua maioria, enquanto que o ataque colocado induziu o efeito de continuidade.
a tendência de o ataque forte ser predominante no Voleibol de elevado rendimento com-
petitivo, independentemente do escalão de prática, foi confirmada no estudo de Castro e
mesquita (4), ao analisarem doze jogos da liga mundial masculina e seis jogos referentes à
fase final do Campeonato da europa masculino de 2005 em equipas seniores.
43—RPcd 10 (2)
02no presente estudo, a análise do tipo de ataque, na transição, evidenciou que o ataque
forte foi o que mais ocorreu embora culminasse, predominantemente, no efeito de conti-
nuidade; por sua vez, o ataque colocado gerou com maior freqüência o efeito de erro, cor-
roborando em ambos os casos o estudo de César e mesquita (5). estes resultados sugerem
a necessidade de incluir, desde a formação, o ataque forte no processo de treino de equipas
femininas, no sentido da atacante aprender a colmatar as dificuldades impostas pelo siste-
ma defensivo adversário. todavia, é importante realçar que, para tal, as jogadoras devem
estar capazes de realizar o ataque correctamente, do ponto de vista técnico, em sintonia
com o recurso a estratégias variadas de finalização.
no que concerne às possíveis determinantes da eficácia do ataque, os complexos de jogo,
side-out e transição, mostraram tendências diferenciadas. enquanto que no side-out ape-
nas o tipo de ataque mostrou poder preditor, na transição não só esta variável mas também
o tempo de ataque mostraram determinar o efeito do ataque.
o fato da velocidade do ataque apenas ter sido determinante na transição é elucidativo
das dissemelhanças nas características da estrutura ofensiva do jogo nos dois complexos,
mostrando que o tempo mais rápido (1º tempo) e o tempo intermédio (2º tempo) aumen-
taram as possibilidades na obtenção de ponto. de facto, o side-out, por ser um complexo
de jogo, no qual à partida as condições de organização são mais estáveis, já que a bola é
recuperada a partir da acção mais previsível do jogo, o serviço, cria condições favoráveis à
organização ofensiva (15). daí ser plausível que neste complexo o efeito do ataque não de-
penda da sua velocidade porque esta é uma regularidade. Contrariamente, a transição por
possuir condições iniciais de organização mais instáveis, provocadas pela acção do ataque
adversário, gera a ocorrência de cenários ofensivos potenciadores do ataque menos veloz (15); conseqüentemente, o incremento da velocidade do ataque, neste complexo, optimiza
o efeito do ataque.
Contrariamente, o efeito preditor do tipo de ataque sobre o efeito do ataque foi verifi-
cado tanto no side-out como na transição, evidenciando que o ataque forte potencia sem-
pre a conquista do ponto. o estudo de rocha e barbanti (25) demonstrou que a chance de
ocorrer o ataque que permite a continuidade do jogo foi menor quando a bola foi atacada
directamente para o campo, regularmente concretizado pelo ataque forte; pelo contrário,
a prevalência do efeito continuidade aumentou quando o ataque foi colocado. desta for-
ma, evidencia-se a necessidade de incorporar nos treinos das equipas femininas, desde a
formação, maior “agressividade” ao ataque, reivindicando o aprimoramento da eficiência
(qualidade de realização) e da adaptação (uso oportuno e ajustado da técnica ao cenário
situacional), no sentido de se obter eficácia (resultado obtido).
ao nível da acção de recuperação da bola, tanto no side-out como na transição, o pre-
sente estudo mostrou que a qualidade da recepção e da defesa não determinou o efeito do
ataque. estes dados discordam, no que se refere ao side-out, do estudo de rocha e bar-
banti (25), no qual foram observados 20 jogos do campeonato sénior brasileiro pelo recur-
so ao modelo de regressão logística multinomial. os autores verificaram que a recepção
perfeita gerou vantagens para a obtenção do ponto de ataque. do mesmo modo, num outro
estudo, eom e schutz (10), pelo recurso ao modelo log-linear, observaram que a qualidade
do primeiro toque proporcionou melhores condições de distribuição e, conseqüentemente,
condições favoráveis de finalização. estas divergências podem encontrar explicação na
diferença de nível de jogo entre as equipas destes estudos (seniores masculinos de ele-
vado nível de rendimento) e as do presente estudo (juniores femininos de elevado nível de
rendimento), na medida em que o maior fluxo de jogo patente nas primeiras cria condições
de maior dependência funcional entre a organização defensiva (na recepção do serviço) e
a ofensiva (construção e finalização do ataque).
concLusÕes
emerge do presente estudo que no voleibol feminino juvenil de elevado nivel de rendi-
mento competitivo, tanto no side-out como na transição, recorrer ao ataque forte é crucial
para se obter eficácia no ataque. todavia, jogar com velocidade revelou ser determinante
apenas na transição, já que no side-out é uma regularidade, no sentido de criar condições
favoráveis de finalização capazes de retardar a acção do bloco adversário. por sua vez,
as acções de recuperação da bola, recepção e defesa, não mostraram ser determinantes
no efeito do ataque. tal, pode dever-se ao facto de nos escalões de formação, mesmo em
referência a um elevado nivel de rendimento competitivo, o jogo ser ainda pouco integrado,
o que sugere que as acções subseqüentes não possuem elevada relação de dependência
funcional das precedentes. estes aspectos são de capital importância para o processo de
treino, indicando a necessidade de um trabalho mais interligado entre os diferentes mo-
mentos do jogo, de forma a se optimizarem as condições de finalização do ataque. neste
particular, os resultados do presente estudo sugerem a necessidade de se aumentar a
“agressividade” ofensiva das equipas, através do incremento da velocidade do jogo.
para o domínio da investigação seria importante em futuros estudos analisar variáveis
situacionais, para além das adstritas à dimensão interna do jogo, como seja o match sta-
tus e a qualidade de oposição, as quais podem influenciar as estratégias utilizadas pelas
equipas e o seu rendimento, porquanto consideram a dinâmica relacional entre as duas
equipas, momento a momento do jogo.
02ReFeRÊnciAs
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03Propriedades psicométricas
e estrutura factorial
da versão portuguesa
do Parent-initiated
Motivational climate
Questionnaire-2 (PiMcQ-2p).
PAlAvRAs chAve:
Práticadesportiva.climamotivacional.influência
parental.Parent-initiatedMotivationalclimate
Questionnaire-2(PiMcQ-2p).Propriedades
psicométricas.estruturafactorial.
AutoRes:
Paulasantana1
teresafigueiras1
cláudiaDias2
nunocorte-real2
robertbrustad3
antónioManuelfonseca2
1isMai/ciDesD,Portugal
2cifi2D,faculdadedeDesportouniversidadedoPorto,Portugal
3schoolofsport&exercisescience,universityofnortherncolorado,eua
resumo
em portugal, são escassos os estudos sobre a influência parental no domínio da prática
desportiva, particularmente sobre a percepção de crianças e jovens relativamente ao clima
motivacional induzido pelos seus pais nesse contexto. para esse efeito, o Parent-Initiated
Motivational Climate-2 (pimCQ-2) tem-se constituído como o instrumento privilegiado
pelos investigadores desta área. nesse sentido, o objectivo deste estudo consistiu em
analisar a qualidade das propriedades psicométricas e da estrutura factorial da versão
portuguesa do pimCQ-2. participaram 1498 jovens portugueses de ambos os sexos, com
idades compreendidas entre os 12 e os 18 anos, praticantes de diversas modalidades
desportivas. para a análise dos dados recorreu-se à estatística multivariada da análise
factorial — análise factorial exploratória (aFe) e análise factorial confirmatória (aFC)
— bem como ao cálculo dos alfas de Cronbach dos itens de cada um dos factores e às
correlações inter-items e inter-factor. o pimCQ-2p revelou-se como um instrumento útil
para a avaliação das percepções dos jovens relativamente ao clima motivacional induzido
pelos seus pais para a prática desportiva, recomendando-se por isso a sua utilização pelos
investigadores desta área.
correspondência:Paulasantana.institutosuperiordaMaia.av.carlosoliveiracampos.
4475-690aviosos.Pedro.Portugal([email protected]).
psychometric properties and factor structure
of the Parent-Initiated Motivational Climate
Questionnaire-2 portuguese version (pimCQ-2p).
AbstrAct
in portugal, there are few studies on parental influence in the field of
sport, especially on the perceptions of children and young people in re-
lation to motivational climate induced by their parents in this context.
For this purpose, the parent-initiated motivational Climate-2 (pimCQ-2)
has been elected as the principal instrument by researchers in this area.
accordingly, the aim of this study was to analyze the quality of the psy-
chometric properties and of the factor structure of the pimCQ-2 portu-
guese version. participated in this study 1498 children and youth of both
sexes (aged between 12 and 18 years) enrolled in different sports. For
the data analysis it was used the multivariate factor analysis - explora-
tory factor analysis (eFa) and confirmatory factor analysis (CFa) - as
well as the calculation of Cronbach's alphas of the items of each factor
and the inter-items and inter-factor correlations. results revealed the
pimCQ-2p as a useful tool for assessing the perceptions of young peo-
ple in relation to motivational climate induced by their parents for sport,
recommending so its use by researchers in this area.
Key woRds:
sportpractice.Motivationalclimate.Parentalinfluence.Parent-initiated
MotivationalclimateQuestionnaire-2(PiMcQ-2p).Psychometricproper-
ties.factorialstructure.
49—RPcd 10 (2)
03Introdução
associado ao reconhecimento do elevado número de benefícios decorrentes da prática des-
portiva regular e sistemática, surge naturalmente o interesse em conhecer melhor porque e
como se motivam, ou podem motivar, as pessoas para este tipo de actividades. nesse sentido,
as questões associadas à motivação no desporto têm vindo a suscitar a realização de muitos
estudos, grande parte dos quais se sustenta na perspectiva sociocognitiva da motivação(22,23,24).
de acordo com este enquadramento conceptual, os diferentes comportamentos adop-
tados pelas pessoas, neste caso em contextos de natureza desportiva, são condicionados
essencialmente pelo tipo de crenças e objectivos que formulam a esse respeito e a extensa
investigação produzida nos últimos anos (e.g.,15,34) tem vindo a fornecer suporte nesse sentido.
adicionalmente, tem vindo a ser sublinhada (e.g.,3,12) a noção de que aquelas crenças apre-
sentam uma estreita relação com as crenças e os climas motivacionais induzidos pelos
outros significativos, designadamente pelos pais e treinadores (23), exaltando portanto a
importância de se perceber melhor os climas motivacionais em que as crianças e jovens
desenvolvem a sua prática desportiva.
na verdade, o modo como crianças e jovens privilegiam um determinado objectivo parece
relacionar-se fortemente com o seu entendimento sobre o que os seus pais e treinadores
privilegiam a esse respeito (13,38), mais ainda do que com o modo como estes se comportam (1).
assim, procurando compreender melhor a motivação das crianças e dos jovens para o
desporto, têm vindo a ser desenvolvidos estudos sobre as suas percepções relativamente
aos climas motivacionais criados pelos seus treinadores (25,28) os quais têm demonstrado
a existência das relações anteriormente referidas, designadamente no que se refere ao
impacto exercido pelos climas percebidos pelos jovens nos seus comportamentos (ver10,11).
do mesmo modo, parece ser perfeitamente adquirido que os pais assumem um papel
relevante no desenvolvimento das atitudes e comportamentos que os seus filhos adoptam
nos vários domínios das suas vidas, determinando em grande medida o modo como estes
participam, se comprometem e são, ou não, bem sucedidos no desporto (18,31). Com efeito,
os pais são os primeiros agentes de socialização dos filhos e têm um impacte substancial
nas suas experiências desportivas (2), ao ponto de a maioria dos desportistas salientar e
reforçar a importância do apoio dos pais ao longo do seu percurso desportivo (30,39).
nesse sentido, reconhecendo a necessidade de um instrumento para avaliar os climas
motivacionais induzidos pelos pais para a prática desportiva dos seus filhos, White, duda e
hart (37) decidiram basear-se num trabalho previamente realizado por athanasios papaio-
annou (26) e desenvolveram o Parent-Initiated Motivational Climate Questionnaire (pimCQ),
constituído por 14 itens relativos às mães e outros 14 (similares) aos pais, antecedidos da
questão “o que julgas que pensa o teu pai/ tua mãe sobre a tua aprendizagem de novas
tarefas e actividades físicas?”, que aplicaram no âmbito das aulas de educação Física a
uma amostra de 210 praticantes de diversas modalidades desportivas (futebol, hóquei no
gelo, basquetebol, natação e ginástica), com idades compreendidas entre os 11 e os 18
anos de idade.
através do recurso à técnica da análise de componentes principais, as autoras iden-
tificaram a existência, tanto no caso das mães como no dos pais, de três componentes,
responsáveis, no seu conjunto, pela variância de aproximadamente 51% da variância das
respostas: i) ênfase nos erros; ii) sucesso sem esforço; e iii) aprendizagem. adicionalmen-
te, o cálculo dos valores de alfa de Cronbach separadamente para as respostas das três
subamostras definidas (i.e., crianças, jovens adolescentes e adolescentes mais velhos) re-
velou, em todos os casos, valores aceitáveis para os itens dos três componentes, variando
entre 0.75 e 0.92.
Considerando os resultados encontrados, as autoras concluíram que o seu estudo per-
mitiu demonstrar a possibilidade de medir as percepções das crianças e dos jovens quanto
ao clima motivacional criado pelos pais. todavia, sublinharam igualmente que o pimCQ ne-
cessitava de ser revisto, nomeadamente através da adição de alguns itens que indicassem
de forma mais universal atitudes parentais acerca da recompensa, do prazer, do afecto, da
punição, do comportamento permissivo e das reacções de desinteresse relativamente ao
processo de aprendizagem. na sua opinião, esta opção permitiria aumentar a sua validade
e utilidade para avaliar o modo como os pais se situam face à participação dos seus filhos
em contextos de realização como o desporto.
Consequentemente, mais tarde, White e duda (36) modificaram o pimCQ, acrescentando-
-lhe mais alguns itens relativos aos sentimentos de prazer associados à aprendizagem de
novas habilidades físicas e dando origem ao pimCQ-2, que passou a ser constituído por 36
itens (18 relativamente às mães e 18 aos pais). independentemente porém do aumento
do número de itens, a análise factorial exploratória realizada às respostas dadas por uma
amostra de 204 jovens voleibolistas, com idades compreendidas entre os 14 e os 17 anos,
permitiu identificar a existência do mesmo número de factores da versão original: enquan-
to os itens referentes ao prazer se associaram aos itens relativos à aprendizagem, dando
origem ao factor que passou a ser designado como prazer na aprendizagem, os restantes
itens distribuíram-se de forma similar ao verificado no estudo inicial pelos outros dois fac-
tores (i.e., ênfase nos erros e sucesso sem esforço).
Complementarmente, a análise dos valores referentes aos alfas de Cronbach para os
itens de cada um dos seus três factores (que variaram entre 0.87 e 0.91) e do padrão de
correlações estabelecido por aqueles três factores com os objectivos de realização avalia-
dos através do Task and Ego in Sport Questionnaire (i.e., correlações positivas entre o clima
orientado para o prazer na aprendizagem e a orientação para a tarefa, bem como entre os
climas orientados para a ênfase nos erros e para a obtenção do sucesso sem esforço com
a orientação para o ego), suportou a conclusão das autoras no sentido da assunção da
51—RPcd 10 (2)
03validade e fiabilidade do pimCQ para avaliar o clima motivacional influenciado pelos pais
em contextos de actividade física e desportiva.
após a sua publicação, o pimCQ/ pimCQ-2 tem vindo a ser utilizado não só nos estados
Unidos da américa mas também noutros países, entre os quais portugal, designadamente
na sequência de um projecto de investigação internacional que visou um conjunto alargado
de questões associadas à motivação das crianças e dos jovens para a prática desportiva (3).
no âmbito do referido projecto, e considerando as sugestões de Vallerand (32) sobre a
tradução e adaptação transcultural de instrumentos psicológicos, a versão original do pi-
mCQ-2 foi inicialmente traduzida para a língua portuguesa por dois especialistas bilingues,
tendo as duas versões (i.e., a original e a traduzida) sido posteriormente submetidas à
apreciação de um júri, constituído por psicólogos, treinadores e tradutores, que concluiu
no sentido da equivalência semântica e de conteúdo entre elas.
em seguida, foram realizadas sessões de reflexão falada com crianças e jovens com
características diferenciadas (e.g., sexo, idade, desporto praticado), com o objectivo de
verificar a compreensibilidade e uniformidade intercontextual da versão traduzida. Consi-
derando que não foram evidentes dificuldades por parte das crianças e dos jovens no seu
entendimento e preenchimento, considerou-se criada a versão portuguesa do pimCQ-2,
denominada como pimCQ-2p (14).
desde então, o pimCQ-2p tem sido utilizado no âmbito de diversos estudos, designada-
mente em monografias e dissertações não publicadas (e.g.,27), tendo as análises prelimina-
res realizadas às suas propriedades psicométricas sugerido a sua fiabilidade e validade.
todavia, até ao momento, não foram publicados resultados dessa natureza, razão pela qual
se justifica o presente estudo, que pretende igualmente contribuir para o desenvolvimento
da investigação sobre esta temática.
na verdade, em contraste com o que se verifica noutros domínios, em portugal são es-
cassos os estudos sobre a influência parental relativamente à prática desportiva, particu-
larmente sobre as percepções dos filhos em relação ao clima motivacional induzido pelos
seus pais, o que, atendendo ao impacto que estas assumem no modo como aqueles deci-
dem, ou não, praticar desporto, é um cenário que importará modificar.
assim, em decorrência do exposto, o objetivo central deste estudo consistiu em verificar
a qualidade das propriedades psicométricas e da estrutura factorial da versão portuguesa
do pimCQ-2, quando aplicada a jovens praticantes de ambos os sexos e praticantes de vá-
rias modalidades desportivas, procurando dessa forma contribuir para a disponibilização
de um instrumento válido para os interessados na investigação destas questões, tanto em
portugal como nos restantes países lusófonos, e, naturalmente, colaborar desse modo
para o aumento do conhecimento nesta área.
metodoLoGIA
amostra
o presente estudo foi desenvolvido a partir de uma amostra constituída por 1498 jovens
portugueses de ambos os sexos (1027 do sexo masculino e 472 do sexo feminino), com
idades compreendidas entre os 12 e os 18 anos (14.44 1.69 anos) e praticantes de nata-
ção, atletismo, futebol, voleibol, basquetebol e andebol.
a natureza, a finalidade e os benefícios do estudo foram explicados a todos os partici-
pantes, tendo os encarregados de educação assinado um termo de consentimento.
instrUmento
Conforme anteriormente referido, o pimCQ-2p é composto por 36 itens que visam avaliar
as percepções de crianças e jovens relativamente ao clima motivacional induzido pelos
seus pais (18 itens relativos à mãe e outros 18 itens relativos ao pai), através de uma esca-
la de likert de 5 pontos: de 1=discordo totalmente a 5=concordo totalmente. Cada grupo
de 18 itens distribui-se por três factores: i) prazer na aprendizagem (e.g., “fica satisfeita/
o quando eu melhoro após me esforçar muito”; “considera os erros como fazendo parte da
aprendizagem”); ii) ênfase nos erros (e.g., “preocupa-se com os meus erros”; “faz-me sen-
tir medo de errar”); ii) sucesso sem esforço (e.g., “fica satisfeita/ o quando eu ganho sem
me esforçar muito“; “acredita que eu devo conseguir o sucesso sem me esforçar muito“).
proCedimentos
recorreu-se à estatística descritiva para determinar médias, desvios-padrão, assimetria e
achatamento dos valores das respostas e ao cálculo dos alfas de Cronbach e das matrizes
de correlação inter-itens e inter-total para avaliar a consistência interna dos itens de cada
um dos factores do pimCQ-2p .
para examinar a estrutura factorial do pimCQ-2p foi utilizada a estatística multivariada
da análise factorial: inicialmente a análise Factorial exploratória (aFe) e em seguida a
análise Factorial Confirmatória (aFC). para o efeito, a amostra foi dividida aleatoriamen-
te em duas metades equivalentes (através da técnica disponível no programa de análise
estatística de dados spss), tendo sido utilizada uma delas para o estudo exploratório e a
outra para o confirmatório.
no que se refere à aFe, após verificação da adequação da matriz de dados (através do
critério de Kaiser-meyer-olkin e do teste de esfericidade de bartlett), recorreu-se à técni-
ca da máxima verosimilhança para a extracção dos factores e ao critério de Kaiser-Gutt-
man para a determinação do número de factores a extrair. Quanto à rotação dos factores,
optou-se pela rotação oblíqua, admitindo portanto a possibilidade da existência de corre-
53—RPcd 10 (2)
03lações entre eles. de referir ainda que, para a retenção de um item num dado factor, foi
definido considerar apenas os que apresentassem um valor de saturação mínimo de 0.40
nesse factor, correspondendo à partilha entre eles de, pelo menos, 15% da variância (29).
para a realização da aFC foi utilizada a versão 8.5 do programa lisrel(17), com a ava-
liação do grau de ajustamento entre o modelo de medida previamente definido e a ma-
triz de covariância dos dados examinados a basear-se na análise dos valores relativos ao
qui-quadrado (χ2), ao Comparative Fit Index (CFi), ao Non-Normed Fit Index (nnFi), à
Standardized Root Mean Square Residual (srmr) e à Root Mean Square of Error of Aproxi-
mation (rmsea), em função dos critérios indicados na literatura da especialidade.
resuLtAdos e dIscussão
no quadro 1 estão apresentados os valores das médias, desvios padrão, assimetria e acha-
tamento das respostas aos 18 itens do pimCQ-2p, tanto para a mãe como para o pai. da
sua análise é possível verificar que foram utilizadas todas as hipóteses de resposta para
todos os itens, com as respectivas médias a variarem entre 2.06 e 4.11 (a única excepção
foi o item 5, relativo à mãe, cuja média foi ligeiramente inferior àquele intervalo; i.e., foi de
1.97), o que, considerando que a escala de resposta é constituída por cinco pontos, parece
demonstrar uma adequada variabilidade das respostas. do mesmo modo, a análise dos
valores referentes à assimetria e ao achatamento não sugeriu a existência de fenómenos
de violação da normalidade.
QuaDro 1 — Valores mínimos (mín), máximos (máx), médios (M), dos desvios padrão (dp), de assimetria (ass) e achatamento (ach) das respostas aos itens do PIMCQ-2p.
mãe pai
itemmín-máX
M dp ass aChmín-máX
M dp ass aCh
PIMCQ2p.01 1-5 3.99 0.97 -0.82 0.41 1-5 4.11 0.95 -1.01 0.86
PIMCQ2p.02 1-5 2.06 1.17 0.89 -0.12 1-5 2.18 1.27 0.79 0.45
PIMCQ2p-03 1-5 2.96 1.33 0.04 -1.09 1-5 2.79 1.36 0.17 -1.14
PIMCQ2p-04 1-5 4.08 0.96 -1.08 1.06 1-5 4.08 1.00 -1.16 1.18
PIMCQ2p-05 1-5 1.97 1.16 1.27 2.33 1-5 2.05 1.18 0.93 -0.06
mãe pai
itemmín-máX
M dp ass aChmín-máX
M dp ass aCh
PIMCQ2p-06 1-5 2.11 1.18 0.87 -0.13 1-5 2.17 1.19 0.81 -0.21
PIMCQ2p-07 1-5 4.05 0.93 -0.90 0.66 1-5 4.03 0.98 -1.05 1.06
PIMCQ2p-08 1-5 3.56 1.07 -0.40 -0.30 1-5 3.67 1.09 -0.62 -0.08
PIMCQ2p-09 1-5 2.53 1.21 0.34 -0.76 1-5 2.67 1.27 0.20 -1.00
PIMCQ2p-10 1-5 2.58 1.24 0.32 -0.81 1-5 2.57 1.27 0.33 -0.90
PIMCQ2p-11 1-5 4.19 0.95 -1.17 1.10 1-5 4.15 1.02 -1.22 1.12
PIMCQ2p-12 1-5 2.31 1.18 0.52 -0.63 1-5 2.32 1.23 0.57 -0.64
PIMCQ2p-13 1-5 2.17 1.15 0.82 -0.08 1-5 2.23 1.21 0.74 -0.38
PIMCQ2p-14 1-5 3.99 0.98 -0.89 0.60 1-5 3.99 1.00 -0.97 0.76
PIMCQ2p-15 1-5 4.00 0.98 -0.89 0.51 1-5 4.00 1.02 -1.02 0.74
PIMCQ2p-16 1-5 2.39 1.25 0.53 -0.70 1-5 2.49 1.30 0.44 -0.90
PIMCQ2p-17 1-5 4.04 0.96 -0.99 0.85 1-5 4.00 1.00 -1.03 0.83
PIMCQ2p-18 1-5 3.42 1.14 -0.36 -0.38 1-5 3.49 1.12 -0.46 -0.21
no quadro 2 estão apresentados os valores dos pesos factoriais ou saturações dos vá-
rios itens nos factores identificados através do recurso à análise Factorial exploratória
(aFe), tanto em relação à mãe como ao pai, os quais não só foram idênticos entre si como
também em relação aos factores previamente identificados para a versão original (36,37),
adoptando-se, por isso mesmo, a mesma designação: i) prazer na aprendizagem; ii) ênfase
nos erros; e iii) sucesso sem esforço.
QuaDro2 — Análise Factorial Exploratória (rotação varimax) ao PIMCQ-2p.
mãe pai
pa ee sse pa ee sse
PiMcQ2p.14 0.80 0.77
55—RPcd 10 (2)
03mãe pai
pa ee sse pa ee sse
PiMcQ2p.07 0.76 0.73
PiMcQ2p.11 0.75 0.73
PiMcQ2p.04 0.73 0.75
PiMcQ2p.15 0.72 0.72
PiMcQ2p.08 0.68 0.69
PiMcQ2p.01 0.67 0.68
PiMcQ2p.17 0.61 0.65
PiMcQ2p.18 0.52 0.51
PiMcQ2p.12 0.81 0.79
PiMcQ2p.16 0.80 0.79
PiMcQ2p.09 0.77 0.77
PiMcQ2p.05 0.71 0.73
PiMcQ2p.02 0.70 0.69
PiMcQ2p.10 0.79 0.83
PiMcQ2p.03 0.76 0.79
PiMcQ2p.06 0.44 0.67 0.40 0.68
PiMcQ2p.13 0.46 0.59 0.43 0.63
Valorpróprio 5.02 3.94 1.20 4.99 3.88 1.39
Variânciaexplicada
27.90% 21.89% 6.67% 27.72% 21.53% 7.70%
Nota: PA = Prazer na Aprendizagem; EE = ênfase nos Erros; SSE = Sucesso Sem Esforço.
a inspecção às soluções identificadas a partir da aFe revelou igualmente que quase não se
verificaram casos de saturação cruzada, com cada item a saturar apenas num determina-
do factor. as duas únicas excepções foram constituídas pelos itens 6 e 13 que, tendo apre-
sentado valores superiores a 0.40 tanto no factor ‘ênfase nos erros’ como no do ‘sucesso
sem esforço’, ainda assim saturaram de forma mais evidente no factor em que era suposto
saturarem (i.e., no factor ‘sucesso sem esforço’).
no que respeita à proporção da variância explicada, observou-se que enquanto no caso
das mães os três factores identificados explicaram 56% da variância das respostas aos
itens, no dos pais o valor foi de aproximadamente 57%, valores portanto superiores aos
aproximadamente 51% indicados para a versão original pelas respectivas autoras (37).
a análise dos valores dos alfas de Cronbach evidenciou aceitável consistência interna para
todos os factores, com os valores calculados (‘prazer na aprendizagem’: 0.86 tanto para o
pai como para a mãe; ‘ênfase nos erros’: 0.84 para o pai e 0.85 para a mãe; e ‘sucesso sem
esforço: 0.79 para o pai e 0.77 para a mãe) a assemelharem-se aos reportados noutras in-
vestigações em que foi utilizada a versão original. de facto, se laVoi e babkes stellino (19)
indicaram valores compreendidos entre 0.81 e 0.94, White, duda e hart (37) indicaram valores
relativamente mais baixos (i.e., entre 0.75 e 0.90), o mesmo se tendo verificado com White (35), que encontrou valores entre 0.73 e 0.90 (mais especificamente, valores de 0.89 e 0.90
para o factor ‘prazer na aprendizagem’, 0.85 e 0.90 para o factor ‘ênfase nos erros’ e 0.73 e
0.82 para o factor ‘sucesso sem esforço’, respectivamente para mãe e pai).
Considerando a chamada de atenção de Clark e Watson(9) no sentido de que a análise dos
valores de alfa não é suficiente para estabelecer com segurança a consistência interna e a
homogeneidade de um instrumento, no presente estudo procedeu-se igualmente à análise
das matrizes de correlação inter-itens e inter-total para cada factor (ver quadro 3).
QuaDro3 — Correlações inter-itens e item-total.
mãe pai
inter-item item-total inter-item item-total
PRAzER NA APRENDIzAGEM 0.24 - 0.58 0.41 - 0.71 0.21 - 0.55 0.40 - 0.68
êNFASE NOS ERROS 0.42 - 0.62 0.62 - 0.73 0.43 - 0.61 0.58 - 0.71
SUCESSO SEM ESFORçO 0.30 - 0.57 0.44 - 0.64 0.38 - 0.56 0.51 - 0.67
segundo Clark e Watson (9), os valores das correlações inter-item devem situar-se entre o
intervalo de 0.15 e 0.50, reflectindo que os itens se diferenciam adequadamente entre si e
permitem recolher mais informação e mapear de forma mais válida o construto em ques-
tão. no presente caso, embora algumas das correlações encontradas tenham sido ligei-
ramente superiores ao valor recomendado, a diferença não foi elevada, considerando-se,
por isso, que eventuais pequenas redundâncias entre alguns dos seus itens não retiram
consistência interna e homogeneidade ao instrumento. também importante foi o facto de
a análise da matriz de correlações item-total ter revelado que não existia nenhum valor in-
57—RPcd 10 (2)
03ferior ao valor critério de 0.20, sugerido como Clark e Watson(9) como o valor a considerar
para proceder à eliminação de itens.
para testar a estrutura factorial da versão portuguesa do pimCQ-2, decidiu-se recorrer à
técnica da aFC, atendendo à sua maior exigência e utilidade, quando o objectivo consiste na
determinação da validade de um instrumento já desenvolvido (21,33).
para a especificação do modelo de medida do pimCQ-2p a submeter à aFC entendeu-se
respeitar a proposta dos autores da versão original, corroborada pelos resultados da aFe pre-
viamente efectuada. ou seja, foram considerados três factores: i) ‘prazer na aprendizagem’
(constituído pelos itens 1, 4, 7, 8, 11, 14, 15, 17 e 18); ii) ‘ênfase nos erros‘ (itens 2, 5, 9, 12 e
16); e iii) ‘sucesso sem esforço’ (itens 3, 6, 10 e 13), tanto no caso dos pais como no das mães.
o método utilizado foi o da máxima verosimilhança e a matriz de dados examinada a
da covariância, tendo os resultados (ver quadro 4) evidenciado um ajuste aceitável para
ambos os casos, independentemente do valor estatisticamente significativo do qui qua-
drado; na verdade, conhecida a sensibilidade daquela estatística a elevadas dimensões da
amostra, conforme era o caso, é consensual e aconselhável atender aos valores de outros
indicadores de ajustamento.
QuaDro4 — índices de bondade do ajustamento global para o PIMCQ-2.
modelo χ2gl nnFi CFi rmsea (90% iC) srmr
MãE 969.69p<.001 132 0.95 0.96 0.069(0.066-0.073) 0.073
PAI 969.34p<.001 132 0.95 0.96 0.067(0.063-0.071) 0.073
os indicadores relativos à bondade de ajustamento global considerados neste estudo (i.e.,
o nnFi e o CFi) variam entre 0.00 e 1.00, estabelecendo-se usualmente 0.90 como o valor
de corte para a aceitação do modelo; ou seja, valores iguais ou superiores a 0.90 traduzem
que o modelo considerado se ajusta de forma aceitável à matriz de covariância inspeciona-
da, enquanto valores inferiores a 0.90 traduzem o contrário (8,21).
nesse sentido, o facto de os valores do nnFi e CFi terem sido claramente superiores a 0.90,
cumprindo portanto com aquele critério, bem como inclusivamente com as recomendações mais
exigentes de hu e bentler (16), no sentido daquele valor de corte se situar em 0.95, revelaram a
boa qualidade do ajustamento do modelo de medida inspeccionado à matriz de dados examinada.
do mesmo modo, também os valores calculados para a rmsea, inferiores a 0.07, con-
vergiram no sentido da manifestação da qualidade do modelo, considerando que valores
até 0.08 representam erros razoáveis de aproximação (5,6,20).
no que concerne aos valores da srmr, os valores encontrados, tanto no caso dos pais
como no das mães, foram ligeiramente superiores ao valor critério de 0.05 sugerido na li-
teratura (6,7). ainda assim, igualmente no que respeita aos resíduos, importará salientar a
inexistência de valores residuais estandardizados inferiores a -2.58 ou superiores a 2.58, o
que sugere a ausência de problemas associados à especificação do modelo inspeccionado (7).
no quadro 5 estão apresentados os pesos factoriais e os respectivos erros padrão, bem
como os valores t e a magnitude da variância que cada item partilha com o respectivo factor.
QuaDro5 — Estimativas do peso factorial (erro padrão), valor t e variância que os factores extraem dos itens do PIMCQ-2p.
mãe pai
pa ee sse t r2 pa ee sse t r2
PiMcQ2p.010.58(0.02)
23.57 0.340.59(0.02)
24.46 0.35
PiMcQ2p.040.67(0.02)
28.510.45 0.71
(0.02)29.49 0.50
PiMcQ2p.070.69(0.02)
31.38 0.480.69 (0.02)
29.05 0.48
PiMcQ2p.080.64(0.03)
23.39 0.410.68(0.03)
25.05 0.46
PiMcQ2p.110.69(0.02)
30.34 0.480.69(0.03)
27.44 0.48
PiMcQ2p.140.75(0.02)
32.76 0.560.75 (0.02)
31.76 0.56
PiMcQ2p.150.67(0.02)
28.03 0.450.71 (0.02)
28.39 0.50
PiMcQ2p.170.54(0.02)
21.78 0.290.60(0.03)
23.54 0.36
PiMcQ2p.180.46(0.03)
15.14 0.210.47(0.03)
15.79 0.22
PiMcQ2p.020.80 (0.03)
27.74 0.640.90 (0.03)
28.95 0.81
PiMcQ2p.050.80 (0.03)
27.85 0.640.86 (0.03)
29.85 0.74
PiMcQ2p.090.82 (0.03)
27.59 0.670.79 (0.03)
24.28 0.62
PiMcQ2p.120.96 (0.03)
34.98 0.920.98 (0.03)
33.84 0.96
PiMcQ2p.160.87 (0.03)
30.44 0.760.95 (0.03)
30.30 0.90
PiMcQ2p.030.61 (0.04)
16.98 0.370.74 (0.04)
20.42 0.55
59—RPcd 10 (2)
03mãe pai
pa ee sse t r2 pa ee sse t r2
PiMcQ2p.060.95 (0.03)
33.68 0.900.93 (0.03)
31.84 0.86
PiMcQ2p.100.87 (0.03)
28.13 0.760.91 (0.03)
28.75 0.83
PiMcQ2p.130.84 (0.03)
30.64 0.710.88 (0.03)
29.16 0.77
Nota: PA = Prazer na Aprendizagem; EE = ênfase nos Erros; SSE = Sucesso Sem Esforço.
em termos genéricos, foi possível verificar que todos os itens apresentaram valores de sa-
turação de elevada grandeza no respectivo factor, com a magnitude da variância atribuída
ao factor correspondente a apresentar valores moderados a elevados (o valor mais baixo
foi o do item 18, tanto no caso dos pais como no das mães, sendo ligeiramente superior a
0.20). Quanto aos valores t, foram todos elevados e estatisticamente significativos.
concLusÕes
os resultados das várias análises realizadas às propriedades psicométricas e à estrutu-
ra factorial da versão portuguesa do Parent-Initiated Motivation Climate Questionnaire-2
são convergentes entre si, sugerindo de forma consistente que ela se constitui como um
instrumento fiável e válido para a avaliação das percepções das crianças e dos jovens
relativamente ao clima motivacional induzido pelos seus pais para a prática desportiva.
nessa medida, ainda que seja desejável que estudos complementares possam reforçar os
resultados aqui apresentados, por exemplo, determinando em que medida a qualidade das
propriedades psicométricas do pimCQ-2p aqui evidenciadas se mantém quando aplicada
com crianças e jovens com características relativamente distintas dos que participaram
neste estudo, ou em subamostras de uma mesma amostra (e.g., verificando a sua invari-
ância ao longo de amostras dos dois sexos ou de diferentes escalões etários), desde já se
recomenda a sua utilização para esse efeito por parte dos investigadores desta área, na
expectativa de que daí decorra um maior aprofundamento do conhecimento actualmente
disponível neste domínio.
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Preditores da utilização
de substâncias anabolizantes
e ergogênicas em Academias.
PAlAvRAs chAve:
exercício.Psicologia.homens.substâncias
anabolizanteseergogênicas.
AutoRes:
antóniolabisaPalmeira1
MargaridagaspardeMatos2
1faculdadedeeducaçãofísicaeDesporto,universidadelusófonadehumanidadesetecnologias,Portugal
2faculdadedeMotricidadehumana,universidadetécnicadelisboa,Portugal.
correspondência:antóniolabisaPalmeira.universidadelusófonadehumanidadesetecnologias
—faculdadedeeducaçãofísicaeDesporto.campogrande,376.1749-024.lisboa,Portugal
resumo
esteestudoobjetivouaanálisedaassociaçãoentreosfatorescomportamentaisepsico-
lógicosdadependênciadoexercícioeautilizaçãodesubstânciasergogênicasemutentes
de ginásios do género masculino. Participaram 147 homens (idade = 27.39 7.08 anos)
praticantes em academias da zona de lisboa. recolheram-se elementos associados: a)
consumodesubstânciasergogênicas;b)fatorescomportamentaisepsicológicos(depen-
dênciadoexercício,dismorfiamusculareintençõesparaoconsumodesubstâncias).um
terço dos inquiridos declarou consumir anabolizantes e dois terços outras substâncias
ergogênicas.estesconsumosestiveramassociadosàdependênciadoexercício,dismorfia
musculareàsintenções(todosp<.01)eàintensidadedotreino(p<.001).ossujeitoscom
dependênciadoexercíciosecundária(i.e.,comvaloreselevadosdedismorfiamusculare
dedependênciadoexercício)reportaramconsumosmarginalmentesuperioresdeanabo-
lizantes(p=.071)emaioresintençõesdeconsumo.naanálisemultivariadaverificou-se
queasintençõesmantiveramasuaassociaçãoaoconsumoreportado,nãosendomediada
peladependênciadeexercíciooudismorfiamuscular.
04predictors of use of ergogenic
and anabolic steroid substances
in health Clubs.
AbstrAct
thestudygoalwastoanalysetheassociationbetweenbehaviourand
psychosocial factors on exercise dependence and the use of anabolic
andergogenicsubstancesinmaleregularexercisers.Participantswere
147males(age=27.39 7.08years)representingregularexercisersin
lisbon gym/ health clubs. self-report data was gathered concerning:
a)useofergogenicsubstances;b)behaviourandpsychosocialfactors
(exercisedependence,musculardysmorphiaandintentionstouseergo-
genicsubstances).onethirdoftheexercisersreportedtheuseofana-
bolicsteroids,whiletwothirdsreportedtheuseofotherergogenicaids.
this use was associated with exercise dependence, muscular dysmor-
phiaand intentions(allp< .01),andwithbehaviourfactors(specially
exercise intensity, p < .001). subjects with secondary exercise depen-
dence(i.e.highscoresofdriveformuscularityandexercisedependen-
ce)hadmarginallyhigheruseofanabolicsteroids(p=.071)andhigher
intentions touse.on themultivariateanalyses the intentionsmaintai-
nedtheirassociationwiththereporteduseandwerenotmediatedby
exercisedependenceormusculardysmorphia.
Key woRds:
exercise.Psychology.Men.anabolicandergogenicsubstances.
63—RPcd 10 (2): 63-77
Introdução
desde o relatório do Surgeon General de 1996 que se tornou evidente a importância de que
se reveste a atividade Física na promoção da saúde, envolvendo níveis tão díspares como
a saúde cardiovascular ou diversos tipos de cancro (23). esse documento desencadeou um
conjunto de alertas dirigidos às populações e instituições para a necessidade de promover
a atividade física regular, principalmente pelo valor preventivo, mas não esquecendo o va-
lor curativo, que essa regularidade proporcionaria junto do indivíduo.
no entanto, passada mais de uma década o sedentarismo continua a registar números
alarmantes, quer a nível internacional, quer em portugal. neste último, o eurobarómetro
213(7) retrata portugal como o país onde existe uma maior prevalência de ausência total de
prática de qualquer atividade física com um mínimo de estrutura (66%, sendo de 40% a mé-
dia europeia), revelador de uma situação alarmante em termos de saúde pública. ainda no
mesmo relatório se verifica que 15% dos indivíduos que realizam com regularidade atividade
física fazem-no em ginásios, sendo um valor que aumentou em 2% relativamente ao relatório
anterior, e julga-se que será uma tendência que se prolongará nos próximos anos (7).
se parece claro à maioria das pessoas que pratica atividade física regular quais são os
benefícios que dela decorrem, surge como fator perturbador e paradoxal um efeito nega-
tivo que é representado pela dependência do exercício. esta situação foi objeto de estudos
recentes, que apontam para a possibilidade do exercício, ao coexistir com determinados
fatores comportamentais (e.g., frequência do exercício) e psicológicos (e.g., distúrbio da
personalidade), poder ter efeitos negativos, quer a nível físico, quer a nível psicológico (9). Com a continuidade destes estudos surgiu a necessidade de explicitar o paradigma da
dependência do exercício, definido como um padrão multidimensional de maladaptação ao
exercício que conduz a situações clínicas prejudiciais ou ao aumento do stress negativo (10).
a dependência do exercício pode ser subdividida em dois tipos: primária e secundária(24),
resultantes de diferentes envolvimentos, comprometimentos e motivações que o indiví-
duo apresenta para com o exercício. a primária resultará de situações em que o indivíduo
realiza exercício pelo que ele lhe proporciona diretamente, o prazer pelo esforço, pela su-
peração, pelo desafio; enquanto que na secundária o indivíduo instrumentaliza o exercício,
usando-o como um meio para atingir um fim, necessariamente associado a um ideal de
imagem corporal que terá representações no feminino diferentes das do género masculino (9) ou a situações de desordem alimentar.
não se conhecem estudos epidemiológicos que possam indicar a gravidade desta situação,
mas trabalhos anteriores efectuados em portugal (13,19,20), que acumularam dados de diver-
sos cenários com base num instrumento psicométrico que discrimina três grupos de risco
para a dependência do exercício: Exercise Dependence Scale-21 (10), podem servir como indi-
cador para o conhecimento dos números da dependência do exercício no nosso país. a figura
1 é indicativa da situação na região da grande lisboa, com uma amostra de 984 sujeitos (52%
65—RPcd 10 (2)
04homens, 26.1 9.3 anos e imC=22.7 2.8 kg/ m2), praticantes regulares de exercício em
ginásios (frequência semanal auto-reportada = 4.2 1.8 vezes/ semana). os grupos de risco
são: assintomáticos — que não registam sintomas de dependência; sintomáticos — entre 1 e
3 sintomas de dependência; em risco — com mais de 3 sintomas de dependência (são usados
os critérios de dependência de substâncias do dsm-iV neste instrumento (2)).
figura 1— Distribuição dos grupos de risco de dependência numa amostra de praticantes em ginásio.
estes valores são semelhantes aos reportados por hausenblas e symon-dows (10)durante
o desenvolvimento do questionário numa população de estudantes universitários norte-
-americanos, pelo que se poderá colocar a hipótese destas situações de risco de depen-
dência surgirem em cerca de 10% da população que pratica regularmente exercício.
no estudo em portugal não se verificaram diferenças entre os géneros nesta distribuição,
mas a dependência do exercício esteve associada positivamente à idade e ao imC no grupo
em risco. esta última correlação deixa pistas para a possibilidade de existência de dependên-
cia secundária, visto que o imC pode estar a camuflar situações de indivíduos com grandes
massas musculares que procuram, através do exercício, desenvolver uma imagem de vigor
e musculada que tem sido associada à toma de substâncias ergogênicas nutricionais (e.g.,
batidos de proteínas, barras energéticas, aminoácidos) e anabolizantes (11,14,15).
este tipo de substâncias representa hoje em dia um mercado de grande crescimento, su-
perando os 8% no que respeita aos denominados suplementos nutricionais desportivos (16).
este mercado representa um volume de negócios com valores que superaram 4.7 biliões
eMrisco12%
assintoMáticos21%
siMtoMáticosnãoDePenDentes
12%
de dólares em 1999 (18). é uma indústria poderosa que tem vindo a desenvolver campa-
nhas de marketing fortíssimas. estas campanhas são, aliás, um dos fatores promotores
de relações menos saudáveis para com o exercício regular (21), atingindo especialmente os
adolescentes e jovens adultos (8). os números mais recentes a que se teve acesso mostram
que 1% da população britânica de 16-59 anos terá consumido ou consome atualmente es-
teroides anabolizantes (22), subindo esse número para 6% dos homens e 2.3% das mulheres
quando considerados os que praticam regularmente exercício em ginásios. Um número
ainda superior é registado quando se reportam ginásios onde está disponível material para
culturismo e onde a população é predominantemente masculina. neste contexto registou-
-se 29.5% de utilizadores versus os 1.5% encontrados nos ginásios onde o equipamento
predominante é o cardiovascular e aulas de grupo (12).
os racionais teóricos que têm vindo a ser usados para a explicação deste fenómeno
centram-se nas questões da imagem corporal e nos modelos conceptuais dos comporta-
mentos de saúde. as perturbações da imagem corporal têm revelado ser um importante
preditor da toma de substâncias ergogênicas nutricionais (incluindo os anabolizantes). no
estudo de Cole e colegas (5)verificou-se que entre 137 praticantes de bodybuilding, do
género masculino, 29 consomem actualmente esteroides anabolizantes e 19 consumiram
no passado. os restantes reportaram nunca terem consumido estas substâncias. de um
conjunto alargado de avaliações psicométricas, os valores de anorexia reversa (que repre-
senta atualmente o conceito de dismorfia muscular) e de dependência do exercício, estive-
ram positivamente associados à toma das substâncias, revelando que não será a prática
da modalidade que está associada ao consumo, mas sim esta perturbação da imagem
corporal e a maladaptação ao exercício.
o conceito de dismorfia muscular tem sido adoptado para representar as perturbações
de imagem corporal, tipicamente registadas em homens, que embora extremamente mus-
culados têm uma crença patológica que a sua musculatura é muito pequena (4). a análise
da dismorfia muscular resulta da evolução do estudo da anorexia reversa e motivação
para a imagem de vigor em praticantes de exercício em ginásio, procurando representar
como situações de maladaptação ao exercício poderiam estar associadas a estas pertur-
bações da imagem corporal. Vários estudos confirmaram esta hipótese, sendo sugerido
um quadro de sintomas que envolvia a toma de substâncias que fossem acreditadas como
potenciadoras dos resultados, bem como algumas psicopatologias (11,14).
por outro lado, os modelos explicativos de comportamento de saúde têm procurado es-
tudar esta mesma problemática, na busca dos antecedentes sócio-cognitivos do consumo
de substâncias. no entanto, e na pesquisa efetuada, apenas reportam a amostras com-
postas por atletas (24). o racional teórico utilizado foi a teoria do comportamento planeado,
67—RPcd 10 (2)
04que salienta a importância das intenções como principal determinante do comportamento
humano, refletindo o nível de motivação e a sua vontade para realizar o esforço necessário
para o completar. as intenções serão resultado da combinação linear das atitudes, normas
subjetivas e percepção de controlo comportamental (1). os estudos meta-analíticos sobre
o poder preditivo da teoria do comportamento planeado mostram que as intenções expli-
cam entre 30-40% do comportamento atual, sendo uma das teorias sócio-cognitivas mais
seguidas na análise dos comportamentos associados à saúde (6).
da revisão de literatura realizada realça que hoje está aberta uma “janela de oportunida-
de” para a atividade física regular tomar o papel de elemento promocional da saúde. a ade-
são a esta prática pode, paradoxalmente, ser condicionada por maladaptações ao exercício,
derivadas de perturbações da imagem corporal e situações de dependência secundária de
exercício, que estarão associadas a consumos de substâncias ergogênicas nutricionais cuja
eficácia não está comprovada (17) ou, mais grave, a consumos de esteroides anabolizantes.
Uma população que se encontra em risco acrescido é representada pelos praticantes
masculinos que se exercitam com o intuito de alterar a sua forma corporal. Foi então com
esta amostra que se realizou o presente estudo, que teve como objetivo analisar a asso-
ciação entre os fatores comportamentais e psicológicos da dependência do exercício e
a utilização de substâncias ergogênicas nutricionais em ginásios. mais especificamente
colocaram-se as seguintes hipóteses:
h1 — há uma correlação positiva entre os fatores comportamentais (i.e., frequência, dura-
ção e intensidade das sessões de treino) e a toma reportada e intenção da toma de substâncias.
h2 — há correlações positivas entre os fatores psicológicos de dependência do exercício
e dismorfia muscular com a toma reportada e intenção da toma de substâncias.
h3 — os sujeitos com dependência secundária do exercício reportam valores superiores
de toma ou intenção de toma de substâncias.
h4 — as intenções são mediadas pela dismorfia muscular e dependência do exercício no seu
poder preditivo para a toma de substâncias anabolizantes e substâncias ergogênicas nutricionais.
além da verificação destas hipóteses realizou-se ainda um estudo das frequências de
consumo destas substâncias.
metodoLoGIA
desenho do estUdo
o desenho do estudo foi transversal e correlacional.
amostra
a amostra foi constituída por 147 homens (idade=27.39 7.08 anos) representando indi-
víduos que realizam exercício regularmente (frequência =4.26 1.34 vezes por semana;
duração das sessões=72.69 27.69 minutos) em quatro ginásios de média dimensão (apro-
ximadamente 1000 clientes cada), que apresentam uma predominância de material para
treino do culturismo da zona de lisboa.
instrUmentos
Foi elaborada uma bateria de questionários constituídos pelos seguintes instrumentos:
Demografia. além dos dados demográficos, foram incluídos dados associados às vari-
áveis corporais peso e altura. também aqui foram incluídas questões para despiste da(s)
modalidade(s) praticada(s) e tempo de prática.
Fatores Comportamentais. as componentes da carga foram avaliadas através de questões
acerca da frequência e volume semanal de treino, sendo a intensidade avaliada através da
escala de percepção de esforço de borg. por último foi questionado o consumo de várias
substâncias ergogênicas nutricionais e anabolizantes. este questionário foi desenvolvido
com base em entrevistas a especialistas na área da dopagem e foi testado preliminarmente
numa população de alunos universitários para verificação da compreensão das questões.
Fatores Psicológicos. Foi elaborada uma bateria de instrumentos psicométricos: escala
de dependência do exercício; ede-21 (10,20), que avalia conforme os critérios de abuso de
substâncias do dsm- iV2 a dependência do exercício. a escala tem 21 itens e resulta em
sete dimensões com a possibilidade de um score total e definição de três grupos de níveis
de dependência do exercício. a consistência interna no estudo original foi boa com um α
médio = .81, enquanto que no presente estudo foi de α = .88. também foi aplicada a Drive
for Muscularity Scale; dms 15, que avalia a motivação para a imagem de vigor através de
15 items dos quais resulta um valor único que teve no estudo original um α = .85 (α = .88
no presente estudo). para a avaliação da intenção para a toma de substâncias (α = .98),
utilizou-se um instrumento baseado na teoria do Comportamento planeado (6).
proCedimentos
o estudo foi aceite pela comissão científica da Universidade lusófona de humanidades e
tecnologias.
69—RPcd 10 (2)
04Operacionais. os questionários foram recolhidos junto de vários ginásios da região de
lisboa, sendo uma amostra escolhida por conveniência. os sujeitos participaram volun-
tariamente no estudo. o preenchimento dos questionários foi feito no local da prática ou,
em alternativa, num local onde estavam presentes condições de conforto, privacidade e
ausência de distrações. a recolha foi realizada pelos investigadores e por um conjunto de
alunos universitários que participaram no projecto.
Estatísticos. inicialmente foi efetuada uma análise preliminar dos dados, para aferir as
características psicométricas dos instrumentos, bem como a análise de normalidade e
restantes pressupostos subjacentes aos procedimentos estatísticos posteriormente uti-
lizados. os pressupostos de normalidade foram cumpridos, permitindo o uso de técnicas
paramétricas. seguidamente realizou-se uma análise descritiva dos dados, reportando-se
as frequências de consumos, bem como as médias e indicadores de dispersão dos dados.
por último realizou-se a análise inferencial das hipóteses, utilizando-se para a análise cor-
relacional bivariada o produto-momento de pearson, para as comparações univariadas o
teste t para amostras independentes e por último um conjunto de procedimentos multi-
variados apoiados em regressões lineares múltiplas para a análise do poder preditivo e
possibilidades de mediação
resuLtAdos
o Quadro 1 apresenta a análise descritiva de consumos semanais reportados pelos parti-
cipantes no estudo
QuaDro1— Análise descritiva dos consumos semanais.
CateGorias m dp amplitUde % de Utilizadores
Substâncias Anabolizantes 2.94 5.97 0 - 33 31.70%
Substâncias Ergogênicas 12.03 13.37 0 - 56 66.00%
os resultados da análise das hipóteses um e dois estão presentes no Quadro 2.
QuaDro 2— Correlação de Pearson entre os factores comportamentais e psicológicos, a toma reportada e a intenção de toma.
FACTORES COMPORTAMENTAIS
CateGorias FreQUênCia FreQUênCia intensidade
Substâncias Anabolizantes 0.09 0.23 * 0.37 ***
Substâncias Ergogênicas 0.29 ** 0.11 0.37 ***
Intenção 0.37 *** 0.11 0.30 ***
FACTORES PSICOLóGICOS
dismorFia mUsCUlar dependênCia do eXerCíCio
Substâncias Anabolizantes 0.23 ** 0.27 **
Substâncias Ergogênicas 0.30 ** 0.30 **
Intenção 0.35 *** 0.45 ***
Nota: *p<.05; ** p<.01; ***p<.001
nos fatores comportamentais verificou-se que a intensidade das sessões de treino foi a variável
que se associou mais fortemente à toma reportada e intenções de toma (todos p < .001), segui-
da da frequência, que apenas não se associou à toma reportada de substâncias anabolizantes,
e duração de treino, que apenas se associou à toma reportada de substâncias anabolizantes.
o padrão de associações encontrado foi semelhante nos dois fatores psicológicos con-
siderados: dismorfia muscular e dependência do exercício. ambas se correlacionaram po-
sitivamente com as substâncias anabolizantes (p < .01), ergogênicas (p < .01) e intenção
para a toma (p < .001).
seguidamente criaram-se grupos de tipos de dependência do exercício — primária ou
secundária — incluindo neste último tipo todos os sujeitos que se apresentassem no tercil
71—RPcd 10 (2)
04superior da dismorfia muscular e pelo menos no grupo sintomático de dependência do
exercício. esta divisão discriminou 40 sujeitos com dependência secundária. a hipótese
associada, que os sujeitos com dependência secundária do exercício teriam valores supe-
riores de toma ou intenção de toma de substâncias, foi testada através de um teste t para
amostras independentes.
QuaDro3— Valores da média, desvio-padrão e teste t para amostras independentes para análise das diferenças na toma reportada, intenção de toma e factores comportamentais do treino entre os sujeitos com dependência primária e secundária.
dependênCia primária
dependênCia seCUndária
CateGorias M DP M DP t ES
Substâncias Anabolizantes 2.36 4.99 4.40 7.82 -1.72 a .32
Substâncias Ergogênicas 10.91 12.43 14.52 15.17 -1.25 .26
Intenção 12.30 8.68 18.18 10.43 -3.43 ** .61
Frequência 4.29 1.35 4.13 1.32 0.67 -.13
Duração 72.25 29.25 73.83 23.62 -0.30 .06
Intensidade 5.71 2.36 6.49 2.50 -1.71 a .32
Nota: ** p<.01; a) marginalmente significativo ; ES — magnitude do efeito (effect size).
os sujeitos com dependência secundária apresentaram valores mais altos de intenções
para o consumo (t(139) = -3.43, p < .01, es = 0.61). o mesmo se passou com o consumo
reportado de substâncias anabolizantes, pese embora a diferença tenha sido apenas mar-
ginalmente significativa (t(139) = -1.72, p = .071, es = 0.32). a intensidade foi a única com-
ponente da carga que registou ser marginalmente superior nos sujeitos com dependência
secundária (t(139) = -1.71, p < .077, es = .32).
Visto que a intenção revelou-se novamente uma variável que interage com as diferentes
variáveis em estudo, decidiu-se aprofundar o seu valor preditivo na toma de substâncias.
Como as substâncias anabolizantes e as ergogênicas representaram os consumos mais
frequentes, e como a teoria do Comportamento planeado prevê que as intenções serão a
variável psicológica mais próxima do comportamento, decidiu-se procurar analisar o poder
preditivo das intenções no consumo de anabolizantes e substâncias ergogênicas. adicional-
mente, procurou-se analisar se a dependência de exercício e a dismorfia seriam mediadoras
desta predição. para estes procedimentos utilizaram-se os critérios de baron e Kenny além
das correções previstas por sobel (3). nos resultados anteriores tínhamos verificado que:
1. as intenções estavam associadas ao consumo reportado de anabolizantes (r(123) = 0.40,
p < .001) e de substâncias ergogênicas nutricionais (r(123) = 0.61, p < .001), cumprindo por
isso o primeiro critério de baron e Kenny;
2. as intenções estavam associadas à dismorfia muscular (r(123) = 0.35, p < .001) e de-
pendência do exercício (r(123) = 0.45, p < .001), correspondendo ao seguimento do segundo
critério de baron e Kenny;
na análise dos seguintes critérios verificou-se que, para o consumo reportado de ana-
bolizantes, a intenção manteve o seu poder preditivo, não sendo mediada pela dismorfia
muscular. o teste de sobel indicou que apenas 13.37% do efeito das intenções no consumo
de anabolizantes foi mediado pela dismorfia muscular. Foi obtido um resultado semelhante
na análise do poder preditivo das intenções sobre a toma de substâncias ergogênicas. o
teste sobel indicou que apenas 0.6% do efeito das intenções sobre o consumo de substân-
cias ergogênicas foi mediado pela dismorfia muscular.
a. DISMORFIA MUSCULAR
DisMorfia
Muscular
0,7%, n.s.45.4%, p
<.001
24,6%, p<.001
consuMo
Deanabolizantesintenções
DisMorfia
Muscular
1,12%, n.s.45.4%, p
<.001
83.7%, p<.001
consuMo
subst.ergogénicasintenções
73—RPcd 10 (2)
04b. DEPENDêNCIA DO ExERCíCIO
figura 2 — Resultados da análise de mediação da dismorfia muscular (A) e dependência do exercício (B) sobre o poder preditivo das intenções no consumo reportado.
o cenário repetiu-se quando se analisou o possível efeito mediador da dependência do
exercício na predição das intenções para o consumo de anabolizantes. apenas 7.8% do
efeito das intenções foi mediado pela dependência do exercício. para o consumo de subs-
tâncias ergogênicas, verificou-se um valor ainda menor da mediação, com 5.6% do efeito
das intenções a ser afetado pela dependência do exercício.
DePenDência
Doexercício
0,4%, n.s.48.5%, p
<.001
24,6%, p<.001
consuMo
Deanabolizantesintenções
DePenDência
Doexercício
0,9%, n.s.48.5%, p
<.001
83,7%, p<.001
consuMo
subst.ergogénicasintenções
dIscussão
o presente estudo procurou analisar a associação entre os fatores comportamentais e psi-
cológicos da dependência do exercício e utilização de substâncias ergogênicas nutricionais
em ginásios. a intenção para o consumo de substâncias ergogênicas revelou ter um poder
preditivo no consumo reportado, sendo esta predição independente de outras variáveis psi-
cológicas como a dismorfia muscular e dependência do exercício. estes resultados vão de
encontro a estudos anteriores com outros comportamentos nos quais, tal como defendido
pela teoria, as intenções são a variável psicológica mais próxima do comportamento. neste
estudo as associações entre as intenções e os consumos reportados rondaram os 30-40%,
enquadrando-se nos valores preditivos presentes nos estudos meta-analíticos revistos (6).
não encontrámos, no entanto, trabalhos que tivessem reportado a análise desta teoria no
cenário do presente estudo, impedindo um cruzamento direto dos dados agora obtidos.
será importante dar continuidade à investigação, pois poder-se-á obter um instrumento
que possa discriminar e prever a utilização de substâncias ergogênicas nutricionais nas
populações estudadas, antecipando possíveis situações de utilização pouco fundamenta-
da destas suplementações, com potenciais efeitos prejudiciais para a saúde (17). a criação
deste instrumento poderá oferecer uma alternativa interessante ao questionamento direto
sobre o consumo destas substâncias, pois tem sido assinalado que os sujeitos tendem a
sub-reportar os seus consumos (11).
também os restantes fatores psicológicos analisados, dismorfia muscular e dependência
do exercício, estiveram associados ao consumo reportado de substâncias. os valores das
correlações foram um pouco menores do que os obtidos nas intenções, mas na análise de
regressão revelaram ser fatores que podem estar associados ao consumo de substâncias
independentemente das intenções, sendo por isso importante verificar esta hipótese em es-
tudos futuros. estudos recentes sobre esta problemática têm revelado o papel essencial que
a dismorfia muscular representa nas maladaptações à prática de exercício, nomeadamente
na criação de situações de dependência secundária de exercício (4,5,9). não podemos com
este estudo definir o sentido da causalidade, apenas estabelecer associações entre estes fa-
tores psicológicos e o consumo de substâncias, mas pensa-se que será plausível que sejam
as perturbações de imagem corporal e a dependência de exercício que causarão o consumo
de substâncias, e não o inverso. esta posição já foi aliás defendida anteriormente pelo grupo
de pope, que tem sido um dos investigadores mais profícuos nesta área (4).
Consideramos interessante que o fator comportamental mais associado ao consumo re-
portado de substâncias seja a intensidade percebida do treino. a avaliação desta variável foi
efetuada com um instrumento que começa a ser comumente utilizado nos ginásios — a es-
cala de borg — pelo que se poderá colocar a hipótese de a utilizar como possível elemento de
despiste de consumo de substâncias; o indivíduo ao percepcionar que a sua prática é muito
intensa poderá procurar ajudas nutricionais para compensar essa sua percepção.
75—RPcd 10 (2)
por último, verificou-se que dois terços dos sujeitos da amostra reportaram consumir
substâncias ergogênicas (e.g., batidos de proteínas e/ ou hidratos de carbono, aminoáci-
dos, creatina e outros), sendo revelador do mercado que estes produtos hoje constituem.
Curiosamente, a maior parte deles não é controlada por nenhuma entidade que regule o
seu conteúdo efetivo, podendo estar a ser criadas condições para problemas de saúde
devido a contaminações com esteroides anabolizantes (aliás já reportadas por institui-
ções de defesa do consumidor). além disso, a eficácia destes produtos está ainda longe
de ser comprovada, principalmente em indivíduos sujeitos a cargas de treino pouco cui-
dadas e planeadas, pelo que nos parece que o grande impulsionador deste mercado é um
marketing que podemos considerar, pelo menos, pouco realista (17). por outro lado, quase
um terço dos sujeitos da nossa amostra revelou utilizar substâncias anabolizantes, que é
um valor um pouco superior ao encontrado na literatura para sujeitos que realizam treino
específico para o desenvolvimento da massa muscular (29.5%). seria importante verificar
quais os circuitos que proporcionam a estes indivíduos o acesso a estes produtos proibidos.
o exemplo que por eles é dado, com massas musculares que tendem a ser consideradas
uma referência pelos jovens adultos, pode ser um forte promotor do incremento da procu-
ra de soluções fáceis e esquemas que colocarão, sem dúvida, em causa a saúde de quem
procura através do exercício promover, paradoxalmente, a sua saúde.
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investigação em expertise
decisional em jogos
desportivos:
Paradigmas,métodos
edesenhosexperimentais.
PAlAvRAs chAve:
Expertisedecisional.Jogosdesportivos.
Performance.
AutoRes:
Joséafonso1
Júliogarganta1
MarkWilliams2
isabelMesquita1
1cifi2D,faculdadedeDesportodauniversidadedoPorto,Portugal
2liverpoolJohnMooresuniversity,reinounido
correspondência:Joséafonsoneves.cifi2D,faculdadedeDesportodauniversidadedoPorto.
ruaDr.Plácidocosta,91,4200-450Porto,Portugal([email protected]).
resumo
aexcelênciadesportivatemsidoalvodeaturadapesquisaemciênciasdodesporto,sendoque,
nosjogosdesportivos(JD),temevidenciadoserfortementeinfluenciadapormarcadoresdo
foropercetivo-decisional.nesteartigo,pretende-serealizarumasinopseemtornodospara-
digmasdeinvestigaçãodereferênciasobreatomadadedecisão,nocontextodosJD,calcorre-
andodeseguidaosmétodose,porfim,alcançandoosdesenhosexperimentaismaisutilizados.
osparadigmasdapsicologiacognitivaeecológicasãocontrastadoseosseuscontributose
limitaçõesrealçados.osmétodosmaiscomunssãoesmiuçados,mormenteoregistodemovi-
mentosoculares,pelocontributoquefornecemaoníveldainformaçãorelativaàvisãocentral,
eosrelatosverbais,pelapossibilidadedeseacederaosprocessosdepensamentoefontes
de informaçãoadicionais.aoníveldosdesenhosexperimentaisenfatiza-seacomplexidade
eaespecificidadedastarefas,porquantoapenasconsiderandoestasdimensõesépossível
alcançarumconhecimentoautênticoeprofundosobreaproblemática.emjeitodesíntese,
esteartigoenfatizaapremênciadainvestigaçãonoâmbitodaexpertisepercetivo-decisional
nosJDcontemplarumamultiplicidadedeabordagensemétodos,pressupondoummaiorgrau
detolerânciadiscursiva,deformaaintentarumacompreensãomaisholísticaeecológicados
fenómenosemestudo.
05research in team sports decisional expertise:
paradigms, methods and experimental designs.
AbstrAct
expertiseinsportshasbeenwidelyscrutinizedbyresearchersinsports
sciences.inteamsports,expertise isstrongly influencedbyperceptive-
decisionalmarkers.inthepresentreview, it isourintentiontosketcha
framework supporting the main research paradigms, methods and ex-
perimentaldesignsarounddecision-making insports.thecognitiveand
ecologic psychology paradigms are contrasted and their contributions
andlimitationsarehighlighted.themostcommonlyappliedmethodsare
examinedindetail,namelytherecordingofeyemovements,duetotheir
contributionwithregardtoinformationpertainingtothefovealvision,and
thecollectionofverbalreportsofthinking,astheyprovideawindowinto
thoughtprocessesandadditionalsourcesofinformation.Withrespectto
experimentaldesigns,taskspecificityandcomplexityareapproached,as
thesedimensionsarecrucialtoattainathoroughandauthenticknowledge
ofhowexpertsmakedecisionsinecologiccontexts.insum,thisreview
emphasizes the need for research in perceptive-decisional expertise in
teamsports tocontemplateamanifoldofapproachesandmethods,as-
sumingagreatdegreeofrespectforatolerantspeech,withthepurposeof
attemptingamoreholisticandecologicunderstandingofthephenomena
underinvestigation.
Key woRds:
Decisionalexpertise.teamsports.Performance.
79—RPcd 10 (2): 78-95
Introdução
a pesquisa científica no desporto tem devotado uma considerável atenção ao problema de
como melhorar a performance de atletas e de equipas. neste âmbito, uma das principais vias
de investigação relaciona-se com a performance dos praticantes de excelência, ou peritos,
nomeadamente visando o que caracteriza a performance de qualidade superior, bem como
os caminhos que conduzem à mesma. apesar da enorme complexidade envolvendo esta te-
mática, os investigadores têm vindo a abrir caminho e um alargado corpo de pesquisa tem
providenciado um conhecimento consistente acerca destas matérias. Williams e ericsson (87) propuseram a expert performance approach como um quadro de referência privilegiado
para identificar performances de elevado nível e para compreender os mecanismos que lhes
estão subjacentes. os autores propõem uma abordagem em três passos: a) determinar o que
discrimina os peritos dos não peritos, com auxílio de análise de vídeo e filme, análise notacio-
nal e simulações; b) investigar os processos subjacentes, através de métodos de seguimen-
to de movimentos oculares, estabelecimento de perfis biomecânicos e relatos verbais; e c)
examinar o desenvolvimento da expertise, usando perfis de historial de prática desportiva e
estudos de aprendizagem recorrendo a programas de intervenção prática.
o conceito de expertise é multifacetado e, de acordo com Janelle e hillman (43), pode ser
dividido em quatro grandes componentes: fisiológico, técnico, cognitivo (estratégico-tático
e percetivo-decisional) e emocional. apesar de nem todos os peritos serem excecionais
quanto à respetiva habilidade para tomar decisões (78,87), nos jogos desportivos (Jd) a habi-
lidade de rapidamente tomar decisões ajustadas e precisas afigura-se essencial para ace-
der a elevadas performances (31,36). a capacidade de lidar com sucesso com tais exigências
emerge como uma das principais características da expertise em Jd (21,87). neste contexto,
a expertise perceptiva e decisional denota ser uma componente nuclear do desempenho
de excelência nos Jd.
no presente artigo, são recompiladas, inicialmente, questões relevantes que envolvem
o conceito de expertise, com particular ênfase na expertise decisional. seguidamente, são
abordados os principais paradigmas sobre a tomada de decisão (td) — o cognitivo e o eco-
lógico —, buscando não apenas compreender as concernentes implicações para a pesquisa,
mas procurando também estabelecer pontes entre as duas conceções. de facto, a comple-
mentaridade dos dois paradigmas permite uma compreensão mais profunda da td em pro-
cessos da vida ‘real’, tendo em conta que alguns cenários poderão apelar a um acoplamento
perceção-ação quase direto, enquanto que outros proporcionam relações mais complexas
e indiretas entre perceção e ação. posteriormente, o foco da abordagem desta revisão será
direcionado para os métodos mais utilizados neste tipo de investigação, nomeadamente o
seguimento dos movimentos oculares e a recolha de relatos verbais. o registo de movimen-
tos oculares proporciona dados de interesse relativamente à visão central, que está profun-
damente relacionada com a alocação da atenção. Contudo, estes métodos ignoram inputs
81—RPcd 10 (2)
05da visão periférica, bem como de outras fontes sensoriais (e.g., audição, tato, proprioceção).
neste sentido, os relatos verbais podem assumir-se como complementares, proporcionan-
do dados relevantes relativos aos pensamentos dos praticantes. raramente a investigação
tem combinado estes dois métodos num experimento (60), limitando o nosso entendimento
dos processos decisionais no desporto. Finalmente, serão abordadas questões respeitantes
aos desenhos experimentais mais recorrentemente utilizados e às suas implicações para
a análise dos dados. no âmbito desta problemática, é direcionada particular atenção para
a especificidade da tarefa e sua complexidade, uma vez que os peritos são conhecidos por
serem superiores aos não peritos apenas sob constrangimentos específicos da tarefa, não
se verificando essa superioridade em tarefas fora do âmbito do seu campo de expertise.
neste sentido, espera-se contribuir para a sistematização do conhecimento a propósito da
pesquisa no âmbito da td em contextos desportivos e, paralelamente, sugere-se algumas
estratégias que possam ajudar a balizar futuras pesquisas.
o desAfIo do conceIto
de expertIse no desporto
a expertise relaciona-se com o alcançar repetido e sistemático de performances de elite,
mesmo sob circunstâncias difíceis (23). embora tal possa não ser totalmente verdadeiro em
áreas nas quais um evento criativo assuma uma importância capital — por exemplo, criar
uma obra de arte genial ou produzir uma descoberta científica fundamental —, é definitiva-
mente este o caso no desporto (25). a expertise é específica para cada desporto (54) e, dentro
deste, é específica para cada função e para cada tarefa (48,93).
não obstante, no desporto, a quantidade de experiência, reputação ou mestria de habili-
dades serem tomadas como medida da expertise, a investigação tem claramente demons-
trado que existe apenas uma fraca correlação entre estes indicadores e a performance (13, 20). acresce que a classificação dos peritos tem sido largamente arbitrária, variando
de atletas olímpicos até campeões de desporto escolar, enquanto os novatos vão desde
jogadores com poucos anos de prática até indivíduos sem qualquer experiência prévia na
tarefa (86,88). Consequentemente, alguns supostos novatos podem obter melhores perfor-
mances do que alguns jogadores mais experientes (23). adicionalmente, verifica-se que a
definição de expertise evolui e muda com a idade, contexto e mudanças desenvolvimentais
inerentes ao atleta (29). nomeadamente, o papel desempenhado pelo contexto é de parti-
cular importância, uma vez que o jogador pode ser considerado perito numa equipa, mas
apenas mediano quando jogando numa outra equipa(77).
Uma outra questão consiste em saber se a idade deve ser um fator a ponderar quando se
aborda a temática da expertise. embora a expertise tática pareça ser independente da idade
cronológica dos sujeitos(29,30,38,54), os peritos adultos são reconhecidamente melhores do
que os peritos mais jovens na elaboração de perfis das características dos adversários e na
monitorização do fluxo de jogo, bem como nos comportamentos antecipatórios (27). acresce
que as estruturas de conhecimento acompanham as melhorias no nível de habilidade e
na complexidade do jogo, motivo pelo qual a idade pode converter-se num fator relevante (28). adicionalmente, embora a função visual e seu hardware não melhore com o nível de
expertise(41), melhora com a idade (92). Com efeito, uma idade superior é acompanhada por
uma melhoria na discriminação intra-sensorial, conferindo maior qualidade à informação
capturada pelo sujeito (30). Contudo, independentemente da idade, os novatos exibem um re-
duzido conhecimento específico da tarefa, atendendo apenas a informação tática superficial
e estabelecendo planos de ação rudimentares (54). mesmo em praticantes de apenas nove
anos de idade, é possível distinguir diferentes níveis de expertise decisional (84).
pelo referido, percebe-se que, embora o nível de expertise discrimine melhor as habili-
dades de td do que a idade (28), os estudos sobre expertise deveriam considerar a interação
da idade com o nível de expertise(84). por outro lado, a expertise deverá ser entendida como
um continuum de performance, isto é, não como uma categoria qualitativamente distinta,
mas enquanto uma gradação que se estende de novato a perito (77).
pArAdIGmAs de InVestIGAção
em tomAdA de decIsão em JoGos desportIVos
paradiGma CoGnitiVo: ConCeitos e limitações
de acordo com as teorias cognitivas, a td em desportos coletivos ocorre em três etapas (51):
a) perceção e análise da situação; b) elaboração duma solução mental; e c) execução duma
resposta motora. implicada neste processo está a necessidade de tomar duas decisões em
cada sequência de ação: uma respeitante ao que fazer, outro ao como fazer (35). todavia, uma
vez que o processamento de informação tem capacidade limitada, tais modelos puramente
cognitivos encontram limitações severas quando se trata de interpretar e explicar a habili-
dade para tomar decisões em situações complexas que ocorrem em curtos lapsos de tempo.
Um procedimento que permite minorar este efeito é o agrupamento ou chunking de blocos de
informação em conjuntos ou padrões significantes, mecanismo pelo qual a carga informacio-
nal pode ser reduzida (54). este processo alivia a carga informacional tanto pela redução do nú-
mero de elementos a analisar e processar (69,74,86), quanto pelo seu maior impacto na memória,
uma vez que situações plenas de significado tendem a ser mais facilmente memorizadas (54,83).
além disso, avanços na psicologia cognitiva consideram que as redes neuronais cere-
brais utilizam duas vias complementares e simultâneas de processamento de informação:
a) uma via em série, de baixo custo, aplicável eficazmente quando existe algum tempo
disponível para tomar uma decisão; e b) uma via paralela, mais intuitiva e subconsciente,
83—RPcd 10 (2)
05capaz de lidar, em especial, com severos constrangimentos temporais (86). as duas vias são
igualmente importantes, uma vez que o desporto combina situações que exigem reações
rápidas com outras que possibilitam um maior grau de reflexão (45).
apesar da inegável utilidade dos modelos cognitivos, diversas críticas têm-lhes sido di-
rigidas. de acordo com abernethy, Farrow e berry (2), este paradigma tem uma validade
limitada no desporto, devido aos severos constrangimentos temporais e à elevada comple-
xidade espacial e multiplicidade de interações, mesmo considerando o papel do processa-
mento paralelo. adicionalmente, a perspetiva cognitiva baseia-se na separação Cartesiana
entre mente e corpo (37), bem como numa visão computacional da mente (67). tal implica
a necessidade de criar representações internas da informação e sua interpretação, um
procedimento inviável em muitas ações rápidas, como aquelas que tipificam os Jd (11,86).
acresce que, como afirma Capra (14), o pensamento racional puro é um sistema de concei-
tos abstratos com uma estrutura linear, claramente em contradição com a multidimensio-
nalidade e não-linearidade da maior parte das atividades humanas. À luz destas críticas,
têm vindo a ser desenvolvidas perspetivas alternativas, grande parte das quais se filia na
psicologia ecológica.
paradiGma eColóGiCo: ConCeitos e limitações
no desporto, a maioria das decisões são tomadas no decurso da ação (5), e, no caso dos
Jd, estando atleta e objeto de jogo em movimento (86). é conhecido que o movimento, em
si mesmo, gera informação e potencialidades de ação, de tal modo que a perceção gera
movimento, estabelecendo a base para as teorias do acoplamento perceção-ação (34, 86).
esta ligação bidirecional entre perceção e ação foi demonstrada nos estudos de slobounov
et al. (75) e stoffregen et al. (76). trata-se de uma relação complexa de mútua dependência e
causalidade circular entre sistemas percetivos e sistemas de movimento (37,67), no seio da
qual emerge a tomada de decisão (5,90), a qual se vai alterando no decurso da ação(83). estes
acoplamentos perceção-ação são específicos para cada contexto (66)e remetem para outro
conceito nuclear no âmbito das teorias ecológicas — a noção de constrangimento.
os constrangimentos constituem restrições à ação, cujas interações provocam a emer-
gência de ações coordenadas (4,5). na ausência de constrangimentos, os graus de liberdade
para a ação tornar-se-iam infinitos, perdendo o sistema a capacidade de se auto-organizar (86). três tipos de constrangimentos são comummente identificados: organísmicos, envol-
vimentais e de tarefa (37). a título de exemplo, a altura de um indivíduo é um tipo de cons-
trangimento do organismo; as condições de temperatura são constrangimentos do envolvi-
mento; e a situação de jogo em cada jogada ou rally são típicos constrangimentos da tarefa.
para lá desta divisão, beek et al. (7)distinguem duas classes de constrangimentos: a) cons-
trangimentos globais, que são invariantes por natureza; e b) constrangimentos locais, que
variam, mas usualmente não modificam a natureza dos constrangimentos globais.
a interação dos diversos constrangimentos induz ou inibe certas vias de expressão, emer-
gindo as affordances como possibilidades ou oportunidades para a ação (34). o conceito de
affordance é funcional, sendo um exemplo muito concreto oferecido por Williams et al. (86):
uma bola em voo não é percebida em termos das suas dimensões, cores, densidade, distância
ao alvo, nem qualquer outro atributo físico. em vez disso, é percebida de acordo com as suas
oportunidades para ação — que ações deve ou pode o atleta realizar numa dada situação.
Considerando que as situações táticas, típicas dos Jd, implicam movimento, e que este impõe
mudanças contínuas no campo visual (83), as affordances assumem um carácter dinâmico (34).
de acordo com a psicologia ecológica, apreender as affordances envolve uma sintonização
com as relações funcionais entre o movimento e o contexto específico de performance(4,66,81).
este processo é específico para cada indivíduo, no sentido em que varia na dependência
de constrangimentos inerentes ao organismo (17, 50). em resultado disso, as affordances
assumem uma dupla natureza, tanto objetiva (i.e., elas existem na natureza) como subje-
tiva (i.e., apenas existem em relação a algo ou alguém) (6,32,34). inclusivamente, o mesmo
sujeito pode descobrir múltiplos significados ou possibilidades de ação partindo do mesmo
conjunto de affordances (34). o significado de cada affordance e a sua perceção podem
mesmo mudar à medida que a habilidade do sujeito e a sua competência para a ação evo-
luem (68). assim, embora as affordances estejam presentes no envolvimento, o grau e modo
pelos quais são percebidas são afetados pelas experiências específicas de cada sujeito (33,83). a natureza evasiva das affordances deve, contudo, alertar-nos contra uma posição
dogmática que desconsidere em absoluto o papel de representações internas mediando
perceção e ação.
no alCanCe dUma perspetiVa inteGradora e Complementar
na discussão do fenómeno da td, o meio-caminho pode constituir a abordagem mais con-
trabalançada e profícua. as teorias cognitivas concedem que a cognição é um fenómeno
emergente pervasivamente embebido no nosso corpo — não apenas o cérebro, mas todo
o complexo sistema nervoso-corpo — e no envolvimento (16,27,79). por seu turno, investiga-
dores do domínio da psicologia ecológica advogam que os sistemas biológicos podem, até
certo grau, regular a forma como interagem com os constrangimentos e os manipulam,
amplificando, por essa via, as possibilidades de ação (5). a interação dos constrangimentos
estreita o número de graus de liberdade, mas geralmente não compele a uma opção única.
isto confere espaço para alguma deliberação consciente relativa às escolhas possíveis en-
tre diversos cursos de ação. independentemente do quadro de referência adotado, torna-
-se claro que a maioria das situações aceita uma ampla gama de soluções, todas contendo
incerteza respetivamente ao resultado final. mais ainda, é possível perceber algo e, apesar
disso, escolher não atuar, na medida em que as ações tendem a emergir apenas quando
certos limiares são ultrapassados (45).
85—RPcd 10 (2)
05outra questão relevante nos Jd referencia-se ao facto de as habilidades técnicas esta-
rem profundamente relacionadas com a perceção (36), uma vez que as soluções mentais
têm de ser traduzidas em soluções motoras(54). assim, uma decisão torna-se apropriada
quando é suscetível de ser aplicada, o que remete para a importância do conhecimento ou
consciência dos recursos e limitações próprios (29,35,36). acresce que as habilidades perceti-
vas dos atletas melhoram à medida que melhoram as suas habilidades motoras (40). Com a
melhora da habilidade motora, os jogadores tornam-se menos dependentes da informação
visual, controlando alguns aspetos das suas ações graças ao controlo propriocetivo (26,62).
Concomitantemente, libertam a visão dum controlo técnico, internamente centrado, para
um controlo tático, externamente centrado, evidenciando, inequivocamente, a relação
existente entre a habilidade motora e a expertise decisional(77).
a complementaridade dos paradigmas ecológico e cognitivo permite elencar alguns in-
dicadores que condicionam a td: a) cada situação possibilita certas ações e a interação
dos diferentes constrangimentos diminui o leque de possibilidades de ação; b) cada jo-
gador tem o seu próprio historial, experiência e representações mentais, que medeiam a
interação dele com o envolvimento e a tarefa; c) dependendo das características de cada
situação, o processo decisional poderá situar-se algures num continuum que vai de um
processo totalmente auto-organizado e espontâneo até um processo estritamente delibe-
rado e racional; d) as tomadas de decisão são sempre específicas da tarefa e do contexto.
mÉtodos nA InVestIGAção
em tomAdA de decIsão em JoGos desportIVos
em qualquer campo de pesquisa científica, a investigação empírica requer o desenvolvi-
mento e aplicação de certos métodos e ferramentas. tal como o martelo pode ser uma
ferramenta adequada para problemas envolvendo pregos, também determinados métodos
e ferramentas são propensos a abrirem portas relacionadas com os processos decisionais.
embora tenha sido desenvolvida ou adaptada uma pletora de métodos para aplicação no
campo da td em desporto, iremos focar-nos nos dois mais usualmente utilizados nesta
área: o registo de movimentos oculares — como porta de acesso para os processos da
visão central —, e a coleta de relatos verbais — oferecendo informações respetivas aos
pensamentos que subjazem certos cursos de ação.
reGisto de moVimentos oCUlares
a td no desporto depende fortemente do input visual (86). todavia, está demonstrado que
a qualidade da perceção não depende apenas, nem fundamentalmente, do hardware, mas
de outros fatores (78,92). a visão é, com efeito, um comportamento direcionado pela atenção (72), processo ativo envolvendo um curso pró-ativo de ação sobre o envolvimento que nos
rodeia (16,39). Consequentemente, uma ajustada alocação da atenção tende a preceder com-
portamentos motores eficazes (54,90).
por sua vez, a fixação ocular nas pistas relevantes tende a associar-se com a visão cen-
tral ou foveal. a fóvea é especializada em discriminação fina, detalhes e visão a cores,
cobrindo um campo visual de 2-3º (47). por este motivo, a análise da duração das fixações
é usada como indicador da quantidade de informação processada (52, 87). Contudo, as es-
tratégias de procura visual são mutáveis (11,90), permitindo o seu melhor ajustamento aos
constrangimentos singulares colocados por cada situação (52,78).
acresce que os comportamentos de busca visual se apoiam em diversos tipos de mo-
vimentos oculares. os movimentos de perseguição suave seguem objetos ou alvos em
movimento, mas têm uma velocidade máxima de apenas 100º por segundo, tornando-se
inviável utilizá-los para manter o controlo visual dum objeto movido elevadas velocidades,
o caso da bola nos Jd (46,83). Como tal, os movimentos oculares mais frequentes em contex-
tos com elevados constrangimentos temporais são os movimentos sacádicos, movimentos
rápidos que direcionam a fóvea para um novo ponto no espaço, podendo alcançar uma
velocidade de 700º por segundo (9). as sacadas superam as limitações dos movimentos de
perseguição suave, mas apresentam um senão: durante uma sacada, não há captura de
informação visual, fenómeno designado de supressão sacádica (3). teoricamente, fixações
mais prolongadas e menores mudanças no local de fixação favorecerão a recolha de mais
informação do envolvimento, devido a uma menor implicação da supressão sacádica (39,63).
Finalmente, o quiet eye emerge como conceito nuclear na investigação relacionada com
a td. o quiet eye é a última fixação que precede a ação, num ângulo visual de 3º ou menos,
por um período não inferior a 100 milissegundos, constituindo uma sólida medida da qua-
lidade da coordenação percetivo-motora (83). ao quiet eye é atribuído o controlo da atenção
visual(8,42). Quando este se inicia mais cedo e se prolonga por mais tempo, o efeito tende
a gerar uma performance de qualidade superior, algo que vem sendo demonstrado em
múltiplas modalidades desportivas e diversos contextos (8,44,52,91). não obstante, é primor-
dial referir que um quiet eye demasiado prolongado pode prejudicar a performance (8,83),
especialmente em desportos cujo ritmo é externamente regulado (42), como no caso dos Jd.
a investigação centrada na análise dos comportamentos visuais tem evidenciado que os
peritos utilizam padrões de procura visual distintos dos não peritos, e que os primeiros são
mais económicos ou sintéticos do que os segundos. os resultados sugerem que os peritos
exibem uma menor frequência de fixações, mas com superior duração média por fixação e
com maior economia do processo (82), como foi verificado numa meta-análise conduzida por
mann et al. (52). não obstante, em desportos como os Jd, pode emergir a necessidade de
atender a diversas potenciais fontes de informação, pendendo a vantagem, nestes casos,
para estratégias de busca visual que empreguem um maior número de fixações, mesmo
com duração inferior (86). desta forma, uma maior taxa de fixações pode constituir uma
87—RPcd 10 (2)
05exigência dos constrangimentos da tarefa, sendo expectável que varie de acordo com o
contexto e com o número de localizações contendo potenciais pistas relevantes(63).
as diferenças entre peritos e não peritos estendem-se, ainda, à natureza dos indicadores
observados (71,78). a natureza dos indicadores fixados pelos peritos diferem daqueles para
os quais os não peritos deslocam a sua atenção, como vem sendo demonstrado em vários
estudos (e.g.69,85). investigação conduzida com jogadores de voleibol revelou que os peritos
se focavam mais no braço do atacante, enquanto os novatos observavam mais a cabeça (64). no futebol, roca et al. (70) demonstraram que os jogadores mais habilidosos gastaram
significativamente mais tempo fixando áreas de espaço livre em comparação com os jo-
gadores menos habilidosos. portanto, os atletas peritos são capazes de melhor detetar os
indicadores relevantes e capturar a informação mais substantiva(47,90,87).
em suma, apesar dos comportamentos de busca visual serem importantes no estudo
das relações entre expertise e td, os mesmos não proporcionam uma compreensão cabal
desta relação. nomeadamente, a relação entre fixação visual e locus atencional não é line-
ar(59,78,87). de facto, à medida que o nível de expertise aumenta, os praticantes dependem
menos da visão central, uma vez que capturam mais informação a partir da visão periférica,
bem como de fontes auditivas, tatéis e propriocetivas (7,50,90). portanto, emerge a necessi-
dade das pesquisas considerarem outras possibilidades, apelando a métodos de estudo
complementares, tais como os relatos verbais (56,61,87).
relatos Verbais
as considerações prévias implicam o reconhecimento de que se torna conveniente que a
pesquisa considere fontes complementares de informação acerca do fenómeno da td. neste
sentido, os relatos verbais emergem como um poderoso utensílio suscetível de responder a
tais preocupações, ao providenciar uma janela para os pensamentos dos jogadores. a par-
tir das limitações da pesquisa baseada no seguimento de movimentos oculares, os relatos
verbais têm sido propostos como uma via de acesso aos pensamentos dos praticantes, per-
mitindo a identificação das fontes de informação subjacentes à td (15,56,87). tais procedimen-
tos vêm sendo considerados como complementares aos protocolos de busca visual (61), ao
permitirem o acesso à compreensão dos processos cognitivos mediadores da perceção-ação
(87). embora se questione até quanto os peritos são capazes de aceder conscientemente aos
pensamentos subjacentes à sua performance(2), o facto é que a recolha de relatos verbais
tem demonstrado ser um processo válido de aceder ao conhecimento processual (58).
a pesquisa com recurso a relatos verbais durante a resolução de problemas ou perfor-
mance tem fornecido evidências de que elevados desempenhos estão associados a bases
de conhecimento específicas dum dado domínio, e não a estratégias cognitivas gerais (56).
em resultado disto, as diferenças de performance relacionadas com a expertise são mais
pronunciadas em tarefas específicas do seu domínio de intervenção(57). no âmbito deste
quadro de referência, os relatos verbais retrospetivos têm sido utilizados para recolher
informação acerca das estruturas de conhecimento que suportam a ação, bem como de
processos de pensamento durante os eventos (56). de acordo com estes autores, os relatos
verbais recolhidos durante a performance numa tarefa revelam que as representações do
problema guiam a interpretação do input e a recuperação de informação relevante mobili-
zada através da memória de trabalho.
DESENhOS REPRESENTATIVOS DA TAREFA
independentemente dos métodos utilizados para recolher os dados necessários, os pe-
ritos revelam uma vantagem superior sobre os não peritos, quando as condições experi-
mentais se aproximam das condições de prática e, portanto, são mais ecológicas (52,53,89).
além disso, os peritos têm respostas de reação motora significativamente mais rápidas do
que os novatos (61,86). acrescenta-se ainda que as diferenças entre peritos e não peritos se
ampliam consideravelmente sob a influência de constrangimentos de tarefa desafiantes e
exigentes (20). estes factos advertem para a necessidade da pesquisa, no âmbito da exper-
tise, utilizar desenhos representativos da tarefa que se procura replicar, traduzindo desta
forma as características essenciais da expertise num dado domínio (24).
Uma das preocupações centra-se, sem dúvida, na especificidade da tarefa. as estra-
tégias de busca visual são específicas da tarefa (86) e, como tal, a estrutura e o significa-
do funcional dos cenários tornam-se essenciais para despoletar a vantagem da memória
específica do perito. num estudo experimental, shim et al. (73) colocaram tenistas numa
tarefa in situ de receção ao serviço. numa primeira situação, os jogadores recebiam ser-
viços vindos dum oponente humano, enquanto que na segunda situação recebiam bolas
enviadas por uma máquina de servir. esta última, ao contrário dos adversários humanos,
não fornece qualquer pista visual relativa à intenção ou à trajetória da bola. Como seria de
esperar, o tempo médio de resposta aumentou na segunda situação. nesta senda, borge-
aud e abernethy (11) conduziram um estudo em voleibol, contrastando jogadores com não
jogadores e considerando que, comparativamente aos não jogadores, os jogadores seriam
peritos. Ficou demonstrado que os jogadores eram melhores a relembrarem as posições
dos atletas nas situações de jogo, mas não quando se tratava de exercícios de aquecimen-
to. os efeitos da especificidade da tarefa sobre as estratégias de procura visual foram
também demonstrados no âmbito do râguebi(66)e do futebol (78).
assim, quando as tarefas experimentais não são específicas, especialmente quando
apelam a distintas estratégias decisionais, as performances ficam comprometidas (21,22,13),
podendo mesmo os peritos apresentar resultados inferiores aos dos novatos (10,82). assim,
tem sido consistentemente suportada a necessidade da pesquisa respeitar a especifici-
dade das tarefas, incluindo uma necessidade de ação, e não apenas um requerimento de
perceção sem necessidade de atuar(1). a pesquisa conduzida em contextos laboratoriais,
89—RPcd 10 (2)
nomeadamente usando projeção de slides ou de vídeo, tende a negligenciar o carácter con-
tínuo dos estímulos, apresentando-os como entidades discretas, separadas, o que com-
promete, consequentemente o acoplamento perceção-ação (34, 86), devido à remoção do
significado funcional da ligação estímulo-resposta(18). tais limitações são particularmente
evidentes em estudos que recorrem a imagens estáticas ou diapositivos, nos quais a apre-
sentação de estímulos discretos e sem movimento introduzem, artificialmente, a latência
ou tempo de reação, desconsiderando o controlo corrente da visão(49,65). Considerando que
os peritos são mais competentes a anteciparem ações, pode depreender-se que as técni-
cas de imagens estáticas limitarão a sua eventual superioridade (54), não capturando a sua
performance efetiva. para além disso, a apresentação de imagens estáticas fornece uma
perspetiva não representativa do jogo, removendo importante informação contextual (11,
86). desta forma, os vídeos podem oferecer algumas vantagens, mas, mesmo neste caso, a
redução do tamanho da imagem e da sua dimensionalidade (bidimensional e não tridimen-
sional) é propensa a afetar o processamento de informação (52).
os estudos de vision-in-action proporcionam contextos mais realistas, nos quais os jo-
gadores podem atender à evolução das sequências de jogo, fazendo uso de informação
contextual e antecipatória, a partir de probabilidades situacionais (27,83,86). os estudos que
recorrem a este paradigma facilitam também a perceção de profundidade (90). a conjunção
destes argumentos sugere que a pesquisa relativa às estratégias visuais no contexto da td
deverá evoluir no sentido do paradigma de vision-in-action, o qual respeita de modo mais
profundo o acoplamento perceção-ação(83). porém, a tecnologia concebida para apurar o
seguimento ocular não é ainda suficientemente refinada nem adequada para se ajustar
satisfatoriamente a contextos desportivos dinâmicos(86). além disso, mesmo na tradicio-
nal análise de vídeos ou diapositivos, algumas diferenças lógicas entre peritos e novatos
emergem, nomeadamente a maior rapidez dos peritos ao responderem e um maior grau de
precisão das suas respostas (48,64). portanto, embora se admita que apresentam limitações,
estes métodos permanecem válidos e úteis na discriminação de níveis de expertise.
sabendo-se que, em condições experimentais altamente controladas e simplificadas, os
peritos não revelam necessariamente melhores performances do que os novatos (19), a
complexidade da tarefa deverá também ser objeto de atenção na condução de estudos
empíricos(55). Com efeito, esta interfere com as estratégias de busca visual, induzindo di-
ferentes taxas de procura e alterando os locais de fixação (78). por outro lado, a comple-
xidade da tarefa tende a ser linearmente acompanhada por um aumento na duração do
quiet eye, na maioria dos sujeitos mais proficientes(91), acrescendo que os peritos lidam
melhor com estímulos complexos(69). por seu turno, o efeito da expertise, quando avaliado
pela precisão da resposta, manifesta-se apenas, em última análise, nos níveis elevados
de complexidade (28,73). não obstante estes efeitos evidentes da complexidade da tarefa
na performance, esta não interfere automaticamente com o tempo de reação — especial-
05
mente quando não estão presentes elementos distrativos, ainda que a performance possa
perder qualidade (12). analogamente, é raro os peritos encontrarem os mesmos desafios
sob condições semelhantes (25).
estes considerandos justificam que o estudo da expertise decisional deve procurar simu-
lar, tão precisamente quanto possível, os contextos competitivos reais do desporto (27,55),
replicando a sua complexidade e pressão temporal (69).
consIderAçÕes fInAIs
Constituiu propósito desta revisão sumariar questões nucleares que envolvem o estudo da
expertise decisional nos Jd. pese embora a aparente divergência entre os paradigmas cog-
nitivo e ecológico, admite-se que ambos aportam contribuições fortes para a compreensão
da td em contextos de prática desportiva. embora a perceção direta possa ser um facto
em determinadas situações, a maioria dos cenários desportivos envolve perceção indire-
ta, onde o tempo e a complexidade induzem uma decisão mais imediata ou mais mediata.
independentemente do fator predominante, o conhecimento e a sintonização aos cons-
trangimentos permitem aos jogadores explorarem eficazmente cada situação, diminuindo
as suas opções para um número reduzido e exequível. também é claro que as habilidades
decisionais dependem dos constrangimentos físicos e técnicos exibidos pelos jogadores.
Finalmente, os processos envolvidos na td são sempre específicos da tarefa e do contexto,
algo que se deve refletir nos desenhos experimentais.
a visão constitui, talvez, a mais relevante fonte de informação no desporto. a investi-
gação neste domínio tem revelado diferenças relacionadas com a expertise ou nível de
habilidade na taxa de procura visual e nas localizações de fixação, bem como no quiet eye.
não obstante, a natureza destas diferenças varia de acordo com a modalidade praticada
e com a natureza da tarefa apresentada. tal explica a multiplicação e o desdobramento
das pesquisas de acordo com a disciplina desportiva e a tarefa, e recomenda prudência
quanto à extrapolação de resultados de um contexto para outro, bem como no que respei-
ta à generalização dos mesmos. mais ainda, os conhecimentos atinentes à visão central
não são suficientes para se entender plenamente a forma como os jogadores fazem uso
da informação disponível, para além de não considerarem informações que estão fora do
domínio da visão central.
neste contexto, os relatos verbais são encarados como uma via para os pensamentos
dos praticantes, possibilitando o acesso a fontes de informação adicionais. recentemente,
começaram a figurar em estudos que os combinam com o seguimento ocular(60). os rela-
tos verbais proporcionam uma janela para os processos cognitivos mediando perceção e
ação (87). refira-se que as diferenças relacionadas com a expertise são mais pronunciadas
em tarefas específicas dum dado domínio (56). no âmbito deste quadro de referência, os
91—RPcd 10 (2)
relatos verbais retrospetivos têm sido utilizados para recolher informação acerca dos pro-
cessos subjacentes à td numa dada situação.
Como se pode constatar, independentemente dos paradigmas e métodos utilizados na
pesquisa, a performance superior dos peritos parece emergir apenas sob condições espe-
cíficas do seu domínio. por isso, as tarefas experimentais deverão ser específicas. entre
as sugestões possíveis, a investigação deverá considerar seriamente o paradigma vision-
-in-action(83), preferencialmente em estudos de terreno. neste âmbito, a complexidade da
tarefa deverá aproximar-se, tanto quanto possível, das condições naturais. no entanto, li-
mitações relativas ao tempo de investigação e a constrangimentos de índole tecnológica
ainda forçam os investigadores a recorrerem a soluções que obstam a necessidade de
ecologizar as avaliações.
em suma, no sentido de se aceder a um conhecimento mais profundo, o caminho da
investigação deverá apoiar-se numa multiplicidade de métodos e abordagens, fornecendo
uma compreensão mais holística dos fenómenos estudados e um maior grau de tolerância
discursiva; o campo da expertise percetivo-decisional não deverá constituir exceção. neste
contexto, a abordagem da expertise em contextos desportivos reclama uma pesquisa plu-
ral, combinando diferentes e complementares paradigmas e métodos e considerando, em
particular, a complexidade e a especificidade das tarefas visadas.
AGrAdecImentos
este trabalho foi financiado pela Fundação para a Ciência e tecnologia — ministério da Ciência,
tecnologia e ensino superior de portugal (sFrh/bd/45428/2008).
05
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da participação ao abandono
da prática desportiva.
PAlAvRAs chAve:
Crianças e jovens. participação no desporto.
benefícios. abandono. enquadramentos
conceptuais.
AutoRes:
antónio manuel Fonseca 1
Cláudia dias 1
nuno Corte-real 1
1 CiFi2d, Faculdade de desporto Universidade do porto, portugal
Correspondência: antónio manuel Fonseca. CiFi2d, Faculdade de desporto da Universidade
do porto. rua dr. plácido Costa, 91, 4200-450 porto, portugal ([email protected]).
resumo
reconhecendo o impacte positivo exercido pela prática desportiva regular no desenvolvi-
mento harmonioso e equilibrado das crianças e dos jovens, este artigo procura, a partir de
uma revisão narrativa da literatura existente neste domínio, não só enfatizar os benefícios
daquela prática, mas também alertar para a necessidade de se melhorar a compreensão
sobre o fenómeno do abandono desportivo, o qual parece atingir uma dimensão demasia-
do elevada. nesse sentido, são discutidas questões relativas à necessidade da correcta
identificação da sua magnitude bem como das variáveis que lhe estão subjacentes, convo-
cando-se para o efeito alguns dos enquadramentos conceptuais considerados como mais
úteis neste contexto.
06From the participaion
to the dropout of sport.
AbstrAct
recognizing the positive impact of a regular sport practice in the harmo-
nious and balanced development of children and youth, this paper seeks,
through a narrative review of the literature of this area, not only empha-
size the benefits of that practice, but also warns to the need to improve
the understanding of the phenomenon of the dropout of sports, which
seems to have a size too large. accordingly, are discussed issues relat-
ing to the need for proper identification of its magnitude as well as the
variables that underlie it, convening to this effect some of the conceptual
frameworks considered most useful in this context.
Key woRds:
Children and youth. sport participation. benefits. dropout. Conceptual
backgrounds.
97—RPcd 10 (2): 96-114
dos benefícIos
dA prátIcA desportIVA
actualmente, constitui-se como um dado inegável e incontornável o reconhecimento dos
múltiplos benefícios inerentes a uma actividade desportiva regular e sistemática dos indi-
víduos em geral, e das crianças e dos jovens em particular (20, 27, 70, 88). na verdade, tanto a
comunidade científica especializada no âmbito do desporto infanto-juvenil como a popu-
lação em geral coincidem na convicção de que o contexto desportivo é um cenário apro-
priado para o desenvolvimento físico, mas também para o fomento de hábitos saudáveis,
valores morais ou recursos psicossociais (7).
no plano físico e biológico, os defensores da actividade desportiva destacam que esta é
geralmente acompanhada de diversos benefícios, relacionados com a aquisição de hábitos
motores, aumento da capacidade física, força e resistência e desenvolvimento muscular e
ósseo (73). estudos realizados por diversos investigadores demonstraram que a actividade
física (ainda que em diversas formas e com diferentes níveis de intensidade) se associa,
por exemplo, a um decréscimo nos riscos de cancro no cólon (44), de ataques súbitos (56), da
hipertensão (77), ou de doenças cardíacas (59). para blair e colaboradores (4), a aptidão física
está mesmo associada a mais baixos índices de todas as causas de mortalidade.
estes dados são tanto ou mais relevantes se nos consciencializarmos, por exemplo, que
têm vindo a ser encontradas evidências no sentido de que, de uma forma geral, as doenças
coronárias e hipertensão têm origem na infância e adolescência. por outro lado, numa altu-
ra em que o aumento da prevalência da obesidade em crianças e adolescentes, geralmente
associado a um estilo de vida sedentário, se torna cada vez mais comum nas sociedades
modernas, a prática regular e sistemática de uma actividade desportiva pode também ser
determinante no controlo do peso dos indivíduos. a este propósito, importa salientar que
diferentes investigações têm salientado que todas as causas de mortalidade e doenças
coronárias na infância e adolescência assumem um significado mais elevado quando asso-
ciadas a excesso de peso na infância (51).
no entanto, as vantagens do envolvimento na prática desportiva não se esgotam nas
melhorias físicas ou biológicas que daí podem advir. Com efeito, a actividade desportiva
promove também benefícios a nível psicológico e emocional, sendo diversos os estudos
que identificam a existência de uma relação entre aquele tipo de actividade física e a saúde
mental das pessoas nele envolvidas, designadamente no que concerne a uma redução de
sintomas de depressão, stress e ansiedade (16, 20, 50, 52).
no caso das crianças e dos jovens, as vantagens psicológicas da participação no despor-
to podem ser ainda mais profundas e penetrantes. efectivamente, é durante este período
da vida que são desenvolvidas importantes atitudes, por exemplo, acerca da realização,
da autoridade, da conformidade, da subordinação, da responsabilidade, do compromisso
pessoal e da persistência em face da adversidade para atingir objectivos a longo prazo.
99—RPcd 10 (2)
06além disso, o desporto ajuda a desenvolver competências de autocontrolo e autoaceitação,
ensinando as crianças e jovens a lidarem igualmente com o sucesso e com o fracasso,
promovendo o desportivismo e o respeito pelos outros, e sugerindo formas alternativas de
competir e cooperar com outras pessoas. do mesmo modo, refira-se o seu enorme poten-
cial no que respeita ao fomento da autoconfiança, autoconceito e autoestima, assim como
à promoção da capacidade de tomada de decisões (42, 80, 81, 82, 83, 84).
importa igualmente não esquecer que, na medida em que muitos dos requisitos sociais e mo-
rais para a participação no desporto são similares aos requeridos para um correcto e desejável
funcionamento das pessoas em sociedade, o desporto constitui, ou pode constituir, uma excelen-
te oportunidade educativa para o desenvolvimento social das crianças e adolescentes (73).
a este propósito, smith e colaboradores (83) afirmam que a actividade desportiva se pode
definir como uma situação de vida em miniatura, em que os jovens atletas aprendem, atra-
vés da vitória e do fracasso, a lidarem com realidades que irão enfrentar na sua vida futura.
praticando desporto, as crianças e adolescentes desenvolvem igualmente maiores capaci-
dades para enfrentar o stress, tolerar a frustração e adiar a obtenção de recompensas; si-
multaneamente, podem aprender e desenvolver competências de interacção social, sendo
um contexto onde a unidade familiar pode ser reforçada (5, 79, 84).
ainda assim, será avisado reconhecer que a participação no desporto, por si só, não
resulta necessariamente no desenvolvimento de características sociais positivas; estas
consequências só se tornarão realidade se derivadas de experiências desportivas que pro-
movam experiências positivas e minimizem experiências negativas (73).
da análise da literatura e investigação mais especializada avultam igualmente evidên-
cias de que a participação no desporto tem implicações positivas no desenvolvimento
educacional, parecendo, ao contrário de alguma crença mais generalizada, encorajar as
crianças a permanecerem mais tempo na escola e ajudá-las a tornarem-se melhores es-
tudantes, quer no ensino básico, quer no secundário — uma contribuição que não se pode
minimizar, num mundo em que ocorrem frequentes mudanças sociais e económicas que
colocam uma grande ênfase nas competências de aprendizagem e adaptação (65). isto não
significa que a prática desportiva torne os estudantes mais “espertos” ou “inteligentes”,
mas sim que contribui para que eles se tornem mais produtivos, porquanto se tornam mais
fortemente motivados, mais organizados e eficazes em tarefas de desempenho e reali-
zação, competências essas que podem ser transferidas rapidamente para outros papéis
sociais, como o de estudante. a médio ou longo prazo, e de um ponto de vista económico,
estudantes produtivos tornar-se-ão com maior probabilidade adultos produtivos (20).
por último, não obstante reconhecermos não ser consensual a assunção de que a partici-
pação no desporto contribui para o desenvolvimento moral, consideramos importante des-
tacar a afirmação de seefeldt e ewing (73) de que o contexto do desporto se caracteriza pela
existência de um elevado potencial para esse desenvolvimento, essencialmente através das
interacções sociais associadas a um envolvimento e participação regular no desporto. esta
afirmação é apoiada por estudos ao nível da delinquência, que encontraram associações ne-
gativas entre a prática desportiva e comportamentos delinquentes e “desviantes”, menos
incidência de tabaco, drogas, gravidezes não desejadas e abandono escolar (8, 71, 75 76).
adicionalmente, os programas que incluem actividades desportivas podem também con-
correr para o desenvolvimento moral, porquanto constituem importantes oportunidades
para o desenvolvimento da liderança, para o desenvolvimento do sentido de comunidade
e pertença (41), dos valores de cidadania e, considerando o desejável respeito pela ética
de fair play e de adesão imparcial às regras, promovem o respeito pelos outros, especial-
mente para com os que provêm de diferentes enquadramentos socioculturais ou possuem
diferentes capacidades (20).
dA pArtIcIpAção no desporto
são, pois, múltiplas e diversificadas as vantagens associadas a um pronunciado envolvi-
mento no desporto e a um estilo de vida fisicamente activo, razão pela qual podem consi-
derar-se como naturais e pouco surpreendentes os resultados de diversas investigações
nacionais e internacionais a comprovar uma adesão maciça, empenhada e persistente das
crianças e jovens à prática desportiva (10, 24, 40, 48, 49, 89).
roberts afirmou, em 1992, que a participação das crianças e dos jovens em alguma
forma de desporto organizado atingia o impressionante número de 200 milhões, uma afir-
mação que parece ser corroborada por dados apresentados em diferentes países.
assim, por exemplo, nos eUa foi referido, durante a última década do século passado,
que aproximadamente metade das crianças e jovens até aos 18 anos participavam em
programas desportivos organizados nas suas comunidades (73) e muitos outros milhões em
programas desportivos extracurriculares (80). na mesma altura, Weiss e hayashi (94) referi-
ram que 40 milhões de crianças e jovens norte-americanas entre os 6 e os 18 anos esta-
vam envolvidos em programas desportivos, escolares e comunitários chegando brustad (6) a afirmar que 8 em cada 10 das crianças e jovens daquele país participavam, em algum
momento das suas vidas, em actividades desportivas.
na europa, os números disponíveis são igualmente expressivos. enquanto em espanha
53% dos jovens praticavam desporto federado e 95% desporto escolar (60), na bélgica os
dados existentes apontavam para um envolvimento no desporto de 60% dos jovens até aos
18 anos (19), percentagem ainda assim inferior aos 70/ 80% reportados no caso da ingla-
terra (95). na mesma linha dos dados anteriores, em França, dos 14 milhões inscritos em
federações desportivas em 1997, praticamente 90% tinham idades compreendidas entre
os 14 e os 17 anos (34).
101—RPcd 10 (2)
06dados relativos a um elevado envolvimento das crianças e dos jovens no desporto foram
igualmente divulgados nos países nórdicos: assim, foram indicados valores na ordem dos
70 a 80% na dinamarca (39) e dos 82% na Finlândia (47), enquanto na suécia, foi referido que
aproximadamente 66% dos rapazes e 50% das raparigas entre os 7 e os 20 anos participa-
vam em actividades desportivas (22).
no que concerne especificamente a portugal, alguns dos escassos dados existentes
apontavam no sentido de que a participação desportiva dos jovens com idades entre os 15
e os 19 anos se situava na ordem dos 50%, sendo que 34% dos sujeitos se encontravam
envolvidos no desporto organizado federado (48).
no entanto, será o panorama da participação das crianças e dos jovens em actividades
desportivas tão “dourado” quanto parece decorrer de todas as estatísticas anteriormente
referidas? para além disso, será aquela participação suficientemente regular e sistemá-
tica para que eles possam usufruir de todos os benefícios, anteriormente mencionados,
associados a essa participação?
Com efeito, o facto de estes dados, de uma forma geral, serem provenientes de estudos
transversais e não longitudinais, apenas nos permite constatar que eram muitos os que,
na altura a que se reportaram os referidos estudos, praticavam desporto, mas não nos
permite saber se aquela prática se prolongou — e prolonga — no tempo, de forma intensa
e regular; e essa é, efectivamente, a questão fundamental.
na verdade, parece quase desnecessário recordar que os benefícios decorrentes da prá-
tica desportiva apenas ocorrerão se, para além de o contexto em que se desenvolve a
referida prática reunir em si as condições necessárias para a sua consecução, as crianças
e os jovens a realizarem durante um período mínimo de tempo. não é com uma prática
desportiva de uma semana, um mês, ou mesmo um ano, que as crianças e os jovens vão
beneficiar, na medida do possível e do desejável, de todas as vantagens potencialmente
decorrentes de uma prática desportiva regular, sistemática e continuada.
do AbAndono do desporto
logo, parece-nos ser fundamental conhecer o verdadeiro número de crianças e jovens
que decidem abandonar uma modalidade desportiva cuja prática tinham iniciado normal-
mente com elevado entusiasmo, por vezes pouco tempo antes, bem como, naturalmente,
as razões que estiveram subjacentes a essa decisão. na verdade, ainda que sejam relati-
vamente escassas as investigações sobre os factores e processos sociais e psicológicos
relacionados com este fenómeno (36), são várias as evidências empíricas e científicas no
sentido da existência de um número significativo de crianças e jovens que decidem aban-
donar a prática desportiva, em aparente contradição com o interesse inicial manifestado
pelo desporto. assim sendo, em nossa opinião, a resposta a esta questão deve constituir-
-se como uma prioridade na agenda de preocupações de todos os interessados e envolvi-
dos no desporto infanto-juvenil.
no que concerne a estatísticas disponíveis sobre este fenómeno, podemos destacar, por
exemplo, as estimativas de roberts e Kleber (62) no sentido de que 80% das crianças ame-
ricanas entre os 12 e os 17 anos abandonavam os programas desportivos organizados
em que estiveram envolvidas. outras investigações no mesmo país forneceram suporte
para aquelas estimativas, apontando para que a percentagem de jovens que abandonava o
desporto até aos 17 anos se aproximava dos 80%, com uma terça parte a fazê-lo após os
12 anos (32). no mesmo sentido, o National Center for Education Statistics (53) identificou na
faixa etária dos 14 aos 17 anos a existência de um declínio no número de jovens envolvidos
no desporto, em contraste com o verificado com as crianças e os jovens com idades com-
preendidas entre os 5 e os 13 anos de idade.
também na austrália, um estudo sobre o abandono do desporto por parte de jovens aus-
tralianos na sua transição do ensino secundário para a universidade (85) revelou que 72%
dos inquiridos tinham cessado a sua participação desportiva em algum momento das suas
vidas, ainda que somente 26% tivesse abandonado o desporto de forma completa e defini-
tiva; os restantes 46% tinham terminado a sua implicação num determinado desporto, mas
estavam envolvidos noutro diferente.
no continente europeu, os dados são relativamente semelhantes. assim, na irlanda,
num amplo estudo com mais de 20 mil crianças e jovens, dos quase 7 mil que disseram
já terem praticado pelo menos um desporto 20% tinham abandonado completamente a
prática desportiva (46), sendo estes números similares aos encontrados na bélgica (19). mais
a norte da europa, concretamente na dinamarca, investigações realizadas nas modalida-
des da ginástica e natação apontaram, uma vez mais, para uma elevada taxa de abandono
entre as crianças e jovens: enquanto a natação era uma modalidade praticada por uma em
cada cinco crianças entre os 7 e os 9 anos, mas somente por um em cada 20 jovens de 13/
15 anos, na modalidade de ginástica, dois terços dos praticantes entre os 7 e os 9 anos, já
não o eram aos 13/ 15 anos de idade (39).
os resultados de alguns estudos longitudinais realizados em França são também fonte
de alguma apreensão no que respeita ao fenómeno do abandono. Uma investigação de na-
tureza longitudinal desenvolvida por Guillet e sarrazin (35) no âmbito do andebol feminino
revelou que 50% das atletas que tinham começado a praticar a modalidade entre os 9 e
os 12 anos abandonavam essa prática 3 a 4 anos depois. de forma semelhante, uma outra
investigação longitudinal, durante 10 anos, em atletas com idades compreendidas entre
os 13 e os 15 anos, revelou taxas de abandono de 50% 2 a 3 anos após o início da prática,
percentagem que se elevava aos 75% após 5 anos e meio (34). ainda neste país, mas na
modalidade do boxe, um estudo longitudinal de 5 anos realizado por trabal e agustini (87)
103—RPcd 10 (2)
06identificou uma taxa média de abandono na ordem dos 54%. Finalmente, uma outra inves-
tigação longitudinal, também ao longo de 5 anos, com praticantes de equitação, concluiu
que 66% dos atletas abandonavam antes dos 8 anos de prática, cifrando-se a taxa anual
média de abandono nos 40% (12, 13).
embora uma primeira leitura destes dados concorra naturalmente para a noção de que
o fenómeno do abandono do desporto por parte das crianças e jovens assume contornos
claramente elevados, importará, em nosso entender — não negando que são obviamen-
te muitos os que decidem abandonar a prática desportiva, com os naturais prejuízos daí
decorrentes —, levantar alguma reserva relativamente à efectiva e exacta dimensão das
taxas de abandono que normalmente são avançadas a esse respeito.
Com efeito, uma questão central que se coloca neste domínio consiste no facto de a maior
parte das investigações publicadas não precisar o que os seus autores entendem por aban-
dono (34, 69). Consequentemente, a partir da análise dos referidos estudos não é possível saber
se os jovens que indicaram ter cessado a prática desportiva o fizeram em relação ao despor-
to em termos gerais ou relativamente a uma determinada modalidade e essa é uma distinção
importante, atendendo a que “enquanto o abandono total da prática desportiva por parte dos
jovens é claramente um desfecho que devemos procurar evitar, atendendo fundamental-
mente às claras consequências negativas que daí advêm para eles, o mesmo não se passa
necessariamente com o abandono de uma determinada modalidade desportiva quando a
esse abandono se sucede a prática de uma outra modalidade desportiva, ou até da mesma
modalidade desportiva mas num clube ou num contexto distinto do anterior” (p. 269) (27).
Como anteriormente sublinhámos, quase todos os estudos realizados até ao momento
foram de natureza transversal, e não longitudinal, centrando-se essencialmente na análi-
se da variação do número de inscrições num clube ou modalidade de um ano para o outro,
razão pela qual são úteis para determinar a taxa de reinscrição das crianças e dos jovens
num dado clube ou modalidade, mas não a taxa real de abandono do desporto (27).
a uniformização dos critérios estabelecidos pelos investigadores para definirem o con-
ceito de abandono da prática desportiva, que funcionarão posteriormente como estrutura
de enquadramento para a definição de objectivos mais específicos e potencialmente mais
comparáveis para os estudos a desenvolver neste âmbito, constitui assim um passo essen-
cial para o aprofundamento do conhecimento relativo a este fenómeno.
nesse sentido, procurando contribuir para a resolução desta questão, Gould (32) propôs
que o abandono desportivo seja considerado em função de um continuum, que inclua o
abandono de uma actividade desportiva, a mudança para outra actividade e o abandono
total da participação desportiva.
outra questão importante relaciona-se com o controlo da decisão de abandonar a prá-
tica desportiva. de facto, embora em certos casos o abandono esteja associado a causas
incontroláveis, como as lesões, ou mesmo o conflito com os estudos (32, 57), considerando-
-se a ocorrência de um abandono relutante (43), noutros casos o abandono do desporto
decorre da acção de razões controláveis, sendo este tipo de abandono mais frequente e
mais merecedor de atenção porquanto a compreensão do que lhe está subjacente poderá
fornecer informação bastante útil no sentido da sua prevenção, bem como, em concomi-
tância, na promoção de uma maior perseverança por parte dos jovens relativamente à sua
prática desportiva.
petlichkoff (57) identificou dois tipos de abandono controláveis pelo desportista: o abando-
no protagonizado por aqueles que ainda estão satisfeitos com a sua experiência desportiva
mas cujo interesse por outras actividades os “obriga” a deixarem a sua actividade — de-
signado de abandono voluntário — e o abandono dos desportistas que decidem parar a
prática devido, por exemplo, a uma elevada pressão percebida, agressividade do treinador
ou falta de êxito, podendo estes experimentar uma afectividade negativa que os torne mais
susceptíveis de suspenderem não só a prática da modalidade desportiva praticada mas,
inclusivamente, todo o tipo de prática desportiva.
ainda em relação a este assunto, Guillet e sarrazin (34, 66, 69) definiram cinco tipos de aban-
dono: i) abandono forçado (correspondente ao abandono não controlado pelos indivíduos;
por exemplo, devido a lesão); ii) abandono por curiosidade (correspondente ao abandono
de indivíduos que só se envolveram na prática desportiva para experimentarem e por pou-
co tempo); iii) abandono contra o coração (correspondente ao abandono de indivíduos que,
embora satisfeitos com a sua actividade desportiva, a suspendem por falta de tempo; por
exemplo, devido a obrigações familiares ou laborais ou porque se envolvem noutras activi-
dades mais apelativas; iv) abandono por descontentamento (correspondente ao abandono
de indivíduos cuja actividade desportiva não vai ao encontro das suas necessidades); e
v) abandono por esgotamento/ burnout (correspondente ao abandono de indivíduos cuja
prática desportiva — devido às exigências e contexto em que se desenvolve — lhes origina
um significativo cansaço físico ou emocional; por exemplo, devido a uma elevada ênfase
na vitória ou pressão dos treinadores, pais ou dirigentes). de destacar ainda que, de acordo
com sarrazin e Guillet (69), estas duas últimas categorias deveriam constituir-se como o ob-
jectivo principal da investigação destinada a incentivar a fidelidade dos jovens praticantes.
no que concerne às razões que subjazem à decisão das crianças e jovens abandona-
rem a prática desportiva, as relativamente escassas investigações realizadas até ao mo-
mento, adoptando uma abordagem eminentemente descritiva, destacaram que, de uma
forma geral, as crianças e jovens referem que as que maior impacte exercem na sua de-
cisão de abandonar o desporto são “a falta de prazer”, a “(in)competência percebida”, a
“ênfase excessiva na competição”, as “lesões” (14, 15, 30, 33, 43, 58, 74), o “conflito de interesses”
ou ”interesse por outras actividades”, o “aborrecimento”, os “conflitos com o treinador”,
o “fracasso na melhoria das competências”, ou ainda o “não jogar tempo suficiente” (69, 93).
adicionalmente, da análise dos resultados dos estudos realizados emerge ainda a cons-
105—RPcd 10 (2)
tatação de que a decisão das crianças e jovens abandonarem o desporto não surge como
consequência da acção de uma razão isolada mas sim da acção de um conjunto mais ou
menos diversificado de razões.
dos enquAdrAmentos conceptuAIs
todavia, não obstante o interesse e mesmo a importância do conhecimento das razões adu-
zidas pelas crianças e jovens para cessarem a sua actividade desportiva conseguido atra-
vés da realização dos estudos anteriormente referidos, os quais de resto convém continuar
a desenvolver, importa sublinhar aqui igualmente algumas das críticas que lhes têm sido
endereçadas. por exemplo, a circunstância de nalguns estudos os investigadores terem
recorrido a instrumentos elaborados por eles próprios integrando um elenco previamente
determinado de potenciais razões para o abandono da prática desportiva relativamente às
quais foi solicitado às crianças e jovens para indicarem o impacte assumido na sua decisão
de abandonar o desporto, constitui-se como alvo de crítica a partir do momento em que o
elenco de razões submetidas ao escrutínio das crianças e jovens nem sempre se caracte-
riza pela necessária abrangência da realidade em estudo.
do mesmo modo, a circunstância de o agrupamento das diferentes razões ser coman-
dado fundamentalmente por critérios de natureza estatística e não conceptual, decorren-
tes do recurso a técnicas estatísticas como a análise factorial exploratória, e de serem
fundados nestes resultados os modelos teóricos desenvolvidos posteriormente para uma
análise mais profunda do fenómeno do abandono do desporto infanto-juvenil é igualmente
uma estratégia criticável. a acrescer, o problema de falta de estandardização e especifici-
dade dos instrumentos utilizados nos diversos estudos realizados complica enormemente
o estabelecimento de comparações entre estudos (11).
assim sendo, o facto de a maior parte das investigações ter uma natureza descritiva, ateórica
e retrospectiva não tem permitido que o conhecimento neste domínio progrida de modo mais
significativo, pois os seus resultados reportam-se a razões do abandono intuitivas, subjectivas
e superficiais (36, 69). ou seja, investigar as razões referidas por crianças e jovens como estando
na origem da sua decisão de abandonar a prática de uma modalidade desportiva tem interesse,
mas não permite compreender plenamente que variáveis e processos diferentes conduzem
às razões apontadas, bem como pode inclusivamente induzir-nos em erro relativamente às
reais razões que levaram os indivíduos a abandonar a prática desportiva. por exemplo, a razão
“sentia demasiada pressão” pode corresponder quer à atitude do treinador e dirigentes do clu-
be exortando continuadamente os jogadores à vitória, quer à pressão dos pais que obrigam o
seu filho a praticar desporto contra a sua vontade. por outras palavras, diferentes variáveis e
processos podem conduzir às mesmas razões superficiais de abandono (69).
06
deste modo, para ultrapassar as limitações inerentes ao conhecimento decorrente da
análise das habitualmente designadas de “razões de superfície”, importa complementar
este tipo de informação sobre o abandono desportivo com outra informação, como seja a
que se relaciona com os factores e processos que promovem ou impedem a prática des-
portiva, o que implica a necessidade de desenvolver investigação baseada em enquadra-
mentos conceptuais robustos e reconhecidamente úteis (27).
na verdade, para melhor compreender os factores e processos psicológicos envolvidos
no fenómeno do abandono da prática desportiva e promover e aumentar os níveis de ac-
tividade física das crianças e jovens, é crucial conhecer o mais profundamente possível
os mecanismos relacionados com a motivação para a prática desportiva, já que estas são
duas realidades que, embora distintas, estão intimamente relacionadas (11). assim sendo, a
motivação pode ser considerada uma variável chave quando se tenta predizer a participa-
ção e o abandono no desporto (91).
até à data, os investigadores que se têm debruçado sobre a temática da motivação nos
mais variados contextos têm elegido como suas prioridades diversas questões mais ou
menos relacionadas (e.g., motivos para a participação; motivação intrínseca; expectativas
de autoeficácia e de resultado; objectivos de realização; climas motivacionais; concepções
sobre a competência; autorregulação do comportamento), recorrendo para o seu estudo a
distintos enquadramentos conceptuais.
no caso da investigação desenvolvida em contextos desportivos, os investigadores co-
meçaram por se preocupar com a determinação dos motivos que levam os indivíduos à
prática de uma determinada modalidade desportiva (1, 2, 3, 17, 25, 31), conhecimento esse que
pode contribuir igualmente para um melhor conhecimento do fenómeno do abandono, por-
quanto os motivos para a participação e para o abandono se constituem como a cara e a
coroa da mesma moeda, isto é, da implicação ou compromisso com o desporto ou da sua
desvinculação ou descomprometimento (11).
de uma forma geral, a literatura que resultou dos estudos sobre os motivos que levam
os jovens a praticarem desporto, destaca a existência de um leque alargado de motivos im-
portantes para as crianças e jovens praticarem desporto, de entre os quais poderemos re-
alçar os relacionados com o desenvolvimento e a demonstração de competência, a saúde
e a forma física, a afiliação e o prazer e o divertimento (25, 27). para além disso, foi também
evidente que, geralmente, os jovens apresentam como razão para a sua prática desportiva
uma diversidade de motivos e não apenas um único (25, 26, 28), divergindo os mesmos quando
analisados em função de variáveis como o sexo, a idade, ou a modalidade ou tipo de des-
porto praticado pelas crianças e jovens (25, 45).
no entanto, considerando as limitações e desvantagens que o estudo isolado e ateórico
dos motivos para a prática implicava em termos do desejável aprofundamento do conhe-
cimento no domínio da motivação, a investigação rapidamente evoluiu para uma aborda-
107—RPcd 10 (2)
gem baseada em enquadramentos conceptuais previamente definidos, normalmente ali-
cerçados numa matriz de natureza sociocognitiva, colocando a ênfase no modo como os
comportamentos dos indivíduos em geral, e das crianças e dos jovens em particular, são
influenciados pela sua percepção de competência (38) e pelos critérios de sucesso relativa-
mente a uma determinada actividade (21, 54, 55, 86).
a teoria da motivação para a competência de harter (37), que tem raízes no trabalho de
White (96), prediz que o que move um indivíduo a realizar uma tarefa e envolver-se em de-
terminadas actividades é a necessidade de se sentir competente, pelo que ele tratará de
dominar a situação e de pôr à prova a sua eficácia e mestria; porém, é necessário que essa
situação/ actividade seja valorizada pelo indivíduo. o êxito nessas situações é acompanha-
do de afecto positivo, promoção da autoestima e de uma sensação de controlo, que incre-
menta a motivação dos indivíduos para a prática da actividade em questão.
no contexto desportivo, e relativamente à temática do abandono da prática desportiva,
esta teoria prediz que os jovens desportistas que se orientam para a prática de uma mo-
dalidade e nela persistem têm percepções de competência mais elevadas do que os que a
abandonam (9, 23, 63). dito de outra forma, o abandono ocorrerá quando os participantes se
percebem a si próprios como sendo detentores de reduzida competência.
a percepção de competência é um construto igualmente importante na teoria que se
centra nos objectivos de realização dos indivíduos (21). o pressuposto fundamental desta
teoria é que, em contextos de realização, o principal objectivo dos indivíduos consiste em
demonstrarem uma elevada competência e evitarem demonstrar uma competência débil,
a si e/ ou aos outros. esta perspectiva destaca também que o modo como as pessoas defi-
nem o sucesso não é uniforme, o que as leva a avaliarem de forma diferente a competência.
assim, temos que uma das principais formas de definir sucesso e avaliar a competência
— habitualmente designada como orientação para a tarefa — decorre do recurso a critérios
de natureza autorreferenciada, enfatizando o progresso e a melhoria individual (por exem-
plo, “melhorar o rendimento pessoal” ou “completar uma tarefa com êxito”), enquanto
uma outra — habitualmente designada como orientação para o ego — decorre do recurso
a critérios normativos ou socialmente comparativos, destacando a comparação com o ren-
dimento dos outros (por exemplo, “ganhar” ou “fazer melhor que os outros”).
na medida em que a motivação dos indivíduos depende da sua competência percebida
na actividade, nos exclusivamente orientados para o ego a motivação manter-se-á eleva-
da enquanto consigam mostrar-se superiores aos adversários, diminuindo naturalmente
quando esse não for o caso; nestes casos, muitas vezes, ocorre o abandono da prática
desportiva como forma de evitar a demonstração de uma reduzida competência e pelo
receio de cair em ridículo. para os indivíduos fundamentalmente orientados para a tarefa,
um menor rendimento face aos seus adversários parece não ter as mesmas consequên-
cias ao nível da sua motivação, a qual se manterá elevada enquanto sentirem que estão
06
a progredir e a ter sucesso nas tarefas que se propõem realizar (54). a este propósito,
importará todavia sublinhar que é perfeitamente possível — e mesmo desejável — que
as crianças e os jovens recorram a mais do que um critério de sucesso, os quais não são
necessariamente incompatíveis entre si.
a investigação no âmbito do desporto nos eUa evidenciou que crianças e jovens com
diferentes objectivos de realização apresentavam diferentes perfis motivacionais e di-
ferentes crenças em relação ao sucesso. em concreto, verificou-se uma associação da
orientação para a tarefa com maior satisfação, maior divertimento, maior resistência
ao insucesso e maior coesão de grupo, enquanto a orientação para o ego se relacionou
com índices mais reduzidos de divertimento e de satisfação com a prática e índices mais
elevados de abandono (21). diversos estudos têm revelado resultados semelhantes na eu-
ropa, incluindo portugal, embora exista ainda espaço para a realização de mais estudos
no nosso país antes de se considerar que possuímos um conhecimento aprofundado e
consolidado sobre este assunto (28).
a investigação tem demonstrado igualmente que as pessoas não configuram do mes-
mo modo a natureza e as determinantes da competência desportiva, entendida por uns
como fruto do trabalho desenvolvido nesse sentido e por outros como algo geneticamente
determinado; de facto, embora, em termos genéricos, as crenças de que a competência
desportiva decorre da aprendizagem, é melhorável e específica sejam adoptadas por mui-
tos indivíduos, não é de negligenciar o modo como as crenças de que a competência é
determinada por factores de natureza genética, é estável e é generalizável são igualmente
identificáveis no ideário dos indivíduos (28, 67, 68).
de um ponto de vista motivacional, as implicações de uma ou outra perspectiva pare-
cem ser claramente distintas: os jovens que entenderem que a sua competência decorre
da aprendizagem, é melhorável e específica orientar-se-ão mais para o seu desenvolvi-
mento, pois acreditam que ela decorrerá essencialmente da sua aplicação nos treinos
e jogos; ao invés, os que a considerarem como um dom, estável e geral adoptarão uma
posição contrária, esperando-se que não estejam tão disponíveis para um intenso envol-
vimento em treinos e jogos (28, 29, 67, 68).
também a teoria da autodeterminação (18, 64) permite uma abordagem particularmente in-
teressante para a compreensão da motivação e do abandono no contexto desportivo. esta
abordagem, que consagra igualmente um papel especial à competência percebida, postula
que a pessoa é intrinsecamente motivada para uma actividade quando esta lhe permite a
satisfação de três necessidades básicas: i) de competência, isto é, de se sentir competente
no que concerne à realização da tarefa ou actividade em que está envolvido; de autonomia,
isto é, de se sentir com autonomia e controlo da decisão de realizar aquela tarefa ou activi-
dade; e iii) de pertença social, isto é, de se sentir aceite e ligado aos outros ou pertencente
a um determinado meio social (18, 90).
109—RPcd 10 (2)
aplicada ao contexto desportivo, esta teoria pressupõe que elevadas percepções de
competência, autonomia e de pertença social levam os indivíduos a envolverem-se de
livre vontade e de forma duradoura em actividades e contextos que lhes permitam perce-
berem-se daquela forma (91). de facto, são vários os estudos que fornecem suporte para
a sugestão da importância e impacte assumido pela competência percebida(97), pertença
social(78) e autonomia (92)ao nível da motivação intrínseca. segundo Cechinni e colabora-
dores (11), uma revisão de diversos estudos mostrou que quanto mais autonomia, esforço
e progresso são promovidos pelos treinadores mais os atletas se motivam de forma au-
todeterminada; bem como evidenciou que formas de motivação menos autodeterminada,
relacionadas com objectivos orientados para o ego, levavam ao abandono da actividade
praticada. a investigação demonstrou ainda que, em geral, a motivação intrínseca se
relaciona positivamente com a orientação para a tarefa e negativamente com a orienta-
ção para o ego, e permite predizer a intensidade e persistência com que os indivíduos se
envolvem na prática de uma certa actividade (61).
em conclusão, entendemos pois que estes enquadramentos conceptuais que anterior-
mente referimos, de forma necessariamente breve e resumida, e que são utilizados habi-
tualmente para explicar e compreender questões mais relacionadas com a motivação no
desporto, poderão revelar-se como muito úteis para a compreensão do abandono despor-
tivo, sendo este um desafio que deve constituir-se como uma prioridade da investigação,
mas também da intervenção, relativa à prática desportiva de crianças e jovens.
06
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07como envelhecer sem dor.
PAlAvRAs chAve:
envelhecimento. desporto.
arte. sentido de vida.
AutoR:
José augusto santos 1
1 CiFi2d, Faculdade de desporto Universidade do porto, portugal
Correspondência: José augusto santos. CiFi2d, Faculdade de desporto da Universidade
do porto. rua dr. plácido Costa, 91, 4200-450 porto, portugal ([email protected]).
resumo
o processo de envelhecimento é um fenómeno incontornável que marca indelevelmente
o existir humano. Quando nascemos, temos como destino seguro o terminar da existência.
esta inevitabilidade não deve ser encarada com angústia ou pessimismo mas como coro-
lário de uma vida normal.
Viver é uma aventura única e cada dia deve ser vivido como se fosse o último. para viver
muito temos inexoravelmente de envelhecer e por isso devemos atrasar, sempre que pos-
sível, os sinais de senescência que acompanham o viver muito.
somos caracterizados por várias idades — biológica, psicológica, afetiva, social e funcio-
nal. esta última, a idade funcional, é a que nos deve caracterizar. se soubermos envelhe-
cer, poderemos manter um nível de atividade, de funcionalidade, que nos faça esquecer a
ditadura do envelhecimento.
Cronos marca-nos com os sinais do tempo. temos de enganá-lo afastando para o mais
longe possível o atrasar da hora de inverno. enganemos o tempo e não atrasemos o relógio
no outono da vida. para isso devemos manter a mesma capacidade de amar e de nos sur-
preender da juventude. a melhor forma de enganar o tempo é fixarmo-nos na juventude.
não em recorrência malsã àquilo que fomos mas para mantermos da juventude a alegria
do risco e do desconforto. só assim se abrem fronteiras.
115—RPcd 10 (2): 115-122
ser jovem em espírito não é uma impossibilidade inelutável para aqueles que já viram
muita água passar debaixo das várias pontes da vida. deve ser o objetivo daqueles que
agarram a vida com toda a sua força tentando retirar dela o sentido ou sentidos da sua
plena realização humana.
militantes da vida, devemos preservá-la, mesmo que a emergência de algumas falências
biológicas nos forcem a redirecionar o essencial da nossa funcionalidade para recantos
mais calmos. aprendamos a descobrir na cultura — poesia, pintura, dança, desporto, etc.,
o sentido estético do existir que nos prolongará a vida numa dimensão superior em que
teremos a arte como companheira.
117—RPcd 10 (2)
07how to get older without pain.
AbstrAct
aging is an inevitable phenomenon that indelibly marks human existence.
When we are born the unique fate we can surely hope is end of existence.
this inevitability should not be viewed with anxiety or pessimism but as
a corollary of a normal life.
living is a unique adventure and each day should be lived as if it was
the last. We only can live long throughout aging and therefore we must
delay whenever possible the signs of senescence which accompanying
prolonged lives.
We are characterized by various ages - biological, psychological, emo-
tional, social, and functional. this last, the functional age, is the only im-
portant to characterize what we are. if we know how to get older, we are
able to maintain a level of activity and functionality that makes us forget
the dictatorship of aging.
Cronos brand us with the signs of time. We can trick him delaying as
much as possible the entrance in the winter hour. deceive the time and
did not change the hour in the autumn of life. For this we must maintain
the same capacity to love and to be surprised as we have done in youth.
the best way to cheat time is to remain young. no pathological returning
to the old good days but a healthy capability to maintain alive the drive
for risk and discomfort which are special privileges of the youngsters.
only assuming the risk we can open the borders of life.
being young in spirit is not an inescapable impossibility for those who lived
longer. to be young in spirit should be the goal for those who catch life with
full force trying to find the meaning or meanings of their human fulfillment.
as militants of life we must preserve it, even if the emergence of some
biological debilities force us to redirect our essential functionality to
quieter corners. learn to discover the culture - poetry, painting, dance,
sports, etc. When we search for the aesthetic sense of existence we pro-
long life in a higher dimension in which we have art as road companion.
Key woRds:
aging. sport. art. meaning for life.
Introdução
o drama e sortilégio da existência radicam no facto que ao nascermos começamos a mor-
rer. só que a morte perde a sua lógica de perda quando o ato genésico que nos fez hóspe-
des do mundo for continuado por momentos de realização que vão dando sentido à existên-
cia humana. para isso se concretizar temos de ser militantes da vida.
o que significa ser militante da vida?
significa que cada existência individual deve permitir acrescentar qualidade a este fenó-
meno cósmico peculiar que permitiu a matéria ganhar consciência de si e que se exprime
naquilo que nós conhecemos como vida no planeta que habitamos.
não podemos dramatizar o futuro incontornável que a todos espera, pois nada é mais
gratificante para o viajante de muitas jornadas que a fruição do merecido descanso, e que
será tanto mais merecido quanto as jornadas forem completas e bem vividas.
Quando nos cumprimos em vida aceitamos como natural o corolário da mesma, e quando
os átomos, protões, neutrões, eletrões, quarks, neutrinos, bosões, etc., que nos constituem
se desintegram do ser que nos dá forma, não se dissipam no vácuo e tornam-se disponíveis
para novas viagens cósmicas que têm sempre o mistério ou a poesia como meta referencial.
no mais ínfimo de nós, o universo já nos comportava; nos seus eventuais movimentos de
expansão e/ ou retração, o universo continuará a comportar-nos. no universo nada se cria
nada se perde, tudo se transforma. esta lei deve alegrar-nos pois permite-nos ver a morte
como ponto de passagem entre formas de vida ou existência diversas. algo de subtilmente
real dimana das conceções budistas que preveem várias vidas num percurso de aperfeiço-
amento interior. essas vidas poderão não ser mais perfeitas pois o universo não se rege por
lógicas de moral ou aperfeiçoamento mas é de aceitar que naturalmente aconteçam.
o universo simplesmente existe no incomensurável da sua dimensão, aberto a constante
renovação que erradica o conceito de finitude. por isso, devemos olhar a morte nos olhos,
sem temor, sem fatalismos, pois só ela dá razão à razão de viver. o que nos calha em sorte
é única e simplesmente viver o melhor possível, e é aqui, a este nível, que por vezes emerge
o drama, pois ao cumprirmo-nos em existência nem sempre o fazemos da forma mais grati-
ficante, já que por vezes, moldados aos valores duma sociedade desumanizada, perdemos a
oportunidade de nos descobrirmos em absoluto e de descobrirmos os outros em nós.
devemos viver, conseguindo metas de realização que não podem estar condicionadas
pela idade cronológica que nos localiza num tempo. mas esta idade marcada pelo relógio
não corresponde, não deve corresponder, às outras idades que nos expressam e que rele-
vam da possibilidade de constante aperfeiçoamento.
Que outras idades nos expressam?
119—RPcd 10 (2)
07idade biolóGiCa
devemos rejeitar a ditadura do tempo pois os relógios biológicos diferem de indivíduo para
indivíduo. Quando nos querem enclausurar nas prisões da idade cronológica negam-nos
a possibilidade de concretizar as nossas potencialidades biológicas que para uns podem
estar diminuídas pela doença, cansaço ou stresse vivencial, enquanto outros conseguem
manter por muito tempo a chama existencial que lhes faz perdurar, senão a juventude, pelo
menos a vitalidade e capacidade de trabalho.
Urge ultrapassar a ditadura da idade biológica, permitindo que seres que mantêm in-
tactas ou pouco reduzidas a sua funcionalidade biológica e a sua capacidade de trabalho
continuem a laborar premiando a sociedade com a sua experiência.
idade psiColóGiCa
é-nos dado verificar, amiúdes vezes, jovens e adultos a demonstrar sinais de cretinismo re-
flexivo, resultante não de insuficiências meníngeas mas de incompetência cultural. Quan-
do constatamos a lucidez reflexiva e a prolífica produção intelectual de muitos gerontes,
que se assumem como guerreiros da existência lutando contra o niilismo dos demitidos
da vida, quer-nos parecer que a arrumação dos indivíduos em idades é mais um dos fun-
damentalismos que caracterizam a nossa época. temos exemplos recorrentes de que o
melhor das consecuções intelectuais de muitos escritores, pintores, arquitetos, realiza-
dores cinematográficos, músicos, etc., é conseguido em idades bem avançadas. podemos
crescer psicologicamente até ao fim da nossa existência atual.
idade aFetiVa
não existem ciclos de declínio na capacidade de emoção; antes, pelo contrário, verifica-
-se que a idade permite dar nuances muito mais positivas às efervescências das paixões
juvenis. alguém, já em idade avançada, afirmou que o drama da velhice é continuarmos
a sentir da mesma forma absoluta as efervescências psicoafectivas do amor num corpo
que lhes não dá correspondência. não concordo, pois acredito que o avançar da idade não
só caldeia as tensões corporais de eros como as canaliza para fruições de maior pendor
estético e poético. alguns arroubos serôdios são mais jactância de macho latino que ver-
dadeiras manifestações de libidos desenfreadas que a existirem só têm a patologia como
justificação. na parte dos afetos mais tocada pela libido devemos ter sempre presente que
mais que físico l’amore è cosa mentale.
idade soCial
temos os papéis sociais em que melhor ou pior nos investimos. somos sempre o fruto dos
investimentos passados e, malgrado os constrangimentos duma sociedade com laivos de
desumanidade e redutora de possibilidades de realização, existe sempre uma brecha para
escaparmos à ditadura do “Metro, Bulot, Dodot”. até para ser feliz é necessário ter coragem.
assim, mesmo quando esgotamos um dado papel social numa lógica de realização pro-
fissional, todo o capital de experiência e conhecimento adquirido pode ser perfeitamente
canalizado para outros objetivos. tal nos permita a sociedade. devemos erradicar a lógica
de que a reforma é o nadir da capacidade de produtividade social. a procura de novos ob-
jetivos existenciais rejuvenesce o idoso e, por isso, urge repensar a continuidade na esfera
do trabalho daqueles que continuam com a efervescência produtiva da sua juventude.
idade FUnCional
é a única que nos deve caracterizar. aquilo que conseguirmos fazer, fruto da nossa ima-
ginação, conhecimento e capacidade, é que deve ser o verdadeiro aferidor do sentido da
nossa utilidade. existem jovens demitidos que se cumprem em inércia; existem idosos que
agem transformando qualitativamente o seu meio envolvente. o homem para viver em
plenitude deve ter consciência do mundo que o rodeia, que se transforma a um ritmo alu-
cinante, e que o obriga a encontrar respostas cada dia mais complexas. acreditamos que
a capacidade de captar a mudança não é apanágio exclusivo dos jovens; é fruto da capaci-
dade de realização pessoal que para muitos é um processo sem soluções de continuidade
e sem limites no tempo.
Quando vivemos em plenitude não existem idades diferenciadoras, a cronologia perde
força de referência, e assim podemos lutar contra os efeitos deletérios da flecha do tempo.
ao nascermos, caminhamos para o fim, não sem antes atingirmos um ponto ótimo adap-
tativo que corresponde à idade adulta. para platão, o zénite da formação cultural do ho-
mem só era atingido em idade muito avançada. Uns envelhecem rapidamente; outros re-
tardam a degenerescência conseguindo níveis de funcionalidade global que perduram até
ao momento que a matriz genética diz, chega!
assim, considerando o envelhecimento como um processo regular e multidimensional
que provoca a limitação das possibilidades adaptativas do organismo, podemos, quando
gostamos da vida, de nós e dos outros, atrasar a emergência das manifestações degene-
rativas correlacionadas com a idade e manter níveis de funcionalidade que nos permitam
fruir a existência afastando para longe as sombras da senescência.
o homem cumpre-se quando morre de posse do seu corpo, ou seja quando o corpo foi
companheiro de viagem e que malgrado algumas sevícias de ocasião com que o agredimos,
conseguimos mantê-lo vivo e sentido até ao fim dos nossos dias.
o corpo cumpre-se de múltiplas formas pois consubstancia a essência plural do homem.
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07Quando o corpo biológico nos começa a fazer negaças temos sempre outros corpos para
nos cumprirmos. o nosso melhor corpo é aquele que se cumpre em arte.
onde encontrar esse eldorado?
na música, poesia, literatura, escultura, desenho, teatro, cinema, fotografia, etc., e no desporto.
Quando entramos tarde em novas áreas de realização o êxito ou rendimento são mais
difíceis, mas os frutos são quiçá mais saborosos. é óbvio que nem todos podem ser picasso,
a fecundar filhos aos 70 anos e atingir zénites criativos aos 80. essa dimensão de arte e
realização biológica a poucos está cometida, no entanto, todos nós, ao nível das nossas
possibilidades e empenhamento, podemos construir o ato grandioso que nos permita en-
trar no areópago dos artistas.
Uma área especialmente gratificante de realização artística é o desporto. a via desporti-
va permite o acesso de muitos idosos ao élan transcendental da cultura, consubstanciando
uma forma ímpar de encontrar mais vida, na sã competição contra outros e fundamental-
mente contra si. a competição desportiva humana permite, independentemente da idade,
e de forma socialmente aceitável, responder às pulsões instintuais que caracterizam a
espécie e que estão adormecidas (não mortas) em virtude de fatores de constrangimento
vários impostos pelas normativas sociais.
sabemos que o nosso companheiro corpo envelhece; isto é, perde paulatinamente o seu
élan vital. o processo natural de envelhecimento, pode ser profundamente agravado pelo
denominado envelhecimento patológico, provocado quer pela doença quer pelo uso incor-
reto do corpo (drogas, tabaco, álcool, alimentação desregrada, exercício físico anárquico,
ausência de repouso, etc.).
Quando estamos perante a patologia as armas de que dispomos provêm da medicina. Quan-
do o envelhecimento se consubstancia numa mera diminuição das capacidades adaptativas,
então temos outras armas à nossa disposição para combater a degenerescência natural.
assim, a atividade Física ganha importância terapêutica, devendo ser coadjuvada por
uma nutrição cuidada. Contudo, devemos rejeitar atitudes fundamentalistas que fazem o
indivíduo sair da prisão da doença para entrar na prisão da saúde, mas sempre prisioneiro
sem liberdade. a atividade física deve ser moderada e as práticas nutricionais corretas
não podem excluir os momentos de festança e de fuga à regra. devemos saber distinguir
entre os dias normais dos de festa. não é por um sujeito de vez em quando se exceder em
algumas fruições gastronómicas que rompem as regras da frugalidade (apanágio duma
vida sã para o idoso) que deve desenvolver qualquer sentimento de culpa e auto-expiação
em posteriores práticas de jejum.
também o corpo do idoso tem o direito ao excesso.
todas as alterações que caracterizam o avanço da idade embora irreversíveis podem
ser atenuadas, quer mantendo níveis adequados de atividade quer estabelecendo regras
dietéticas saudáveis.
podemos ficar grisalhos e mesmo carecas mas manter a cabeça mais cheia.
podemos ficar com a pele rugosa mas a alma cada vez mais lisa
podemos reduzir de estatura mas crescer em emoção
podemos ficar mais pesados mas mais leves de espírito
podemos ficar mais fracos fisicamente mas com mais força interior
podemos perder a visão mas manter despertos os sentidos da sensibilidade estética
podemos ficar surdos e ouvir-nos melhor e aos outros
podemos perder células nervosas e ganhar células de cultura
podemos perder capacidade cardíaca e cada vez mais aumentar a nossa capacidade de amar
em suma, podemos ir diminuindo a funcionalidade de alguns órgãos e tecidos e aumen-
tar, doutra forma, o prazer de os utilizar.
o mal acontece quando a síndroma do idoso não se radica à sua dimensão física e con-
tamina a sua existencialidade. Quando o idoso fica frio, severo, e intolerante, e não aceita,
com naturalidade, o fluir incessante do muito vivido, é porque está doente ou porque falhou
na sua realização ontológica, tendo subordinado a sua existência a valores alheios à sua
dimensão humana, tendo vivido alheio a si.
até para viver é preciso ter coragem. Viver é uma aventura. Viver muito pressupõe canali-
zar a aventura para sagas de interioridade. pressupõe a aceitação de condicionamentos em
alguns planos mas a opção de outros planos de realização que deem novos sentidos à vida.
a expressão da sintomatologia do idoso não quer significar a emergência de uma espada
de dâmocles que paira por cima da sua cabeça. antes pelo contrário, serve como aviso para
o aparecimento de sinais que podem ser contrariados tanto mais eficazmente quanto mais
empenho tiver o sujeito em relação a algumas pautas comportamentais que se estabelecem
como fundamentais para atrasar e por vezes mascarar os efeitos degenerativos da idade.
sabemos que o progresso técnico tem facilitado o trabalho físico humano. hoje em dia o
stresse do quotidiano é menos de índole física e mais intelectual e psicoafectivo. de igual
forma as poluições (sonoras, paisagísticas, arquitetónicas, culturais, respiratórias, etc.)
que caracterizam as sociedades atuais têm de ser combatidas com comportamentos ade-
quados a uma vida o mais saudável possível.
ser saudável é uma condição sine qua non para retardar os efeitos negativos da velhice;
esse desiderato tem na alimentação e atividade física determinantes cruciais mas o prin-
cipal fator concorrente para a saúde é — a manutenção da capacidade de rir, sorrir e amar
que nunca devem ser perdidas apesar das vicissitudes existenciais.
REVISTA PORTUGUESA DE CIÊNCIAS DO DESPORTO