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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO – USP
ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES – ECA
CURSO DE GESTÃO INTEGRADA DA COMUNICAÇÃO DIGITAL
EM AMBIENTES CORPORATIVOS
A Alienação e o Ambiente Virtual: das abstrações à consciência
FABIANA GHANTOUS
São Paulo
2012
FABIANA GHANTOUS
A Alienação e o Ambiente Virtual: das abstrações à consciência
Monografia apresentada à Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo em cumprimento parcial às exigências para obtenção do título de Especialista em Gestão Integrada da Comunicação Digital, sob orientação da Profa. Ms. Else Lemos.
São Paulo
2012
FABIANA GHANTOUS
A Alienação e o Ambiente Virtual: das abstrações à consciência
Monografia apresentada à Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo em cumprimento parcial às exigências para obtenção do título de Especialista em Gestão Integrada da Comunicação Digital.
Orientadora: Profa. Ms. Else Lemos
COMISSÃO EXAMINADORA
_______________________________________________
Assinatura: _____________________________________
_______________________________________________
Assinatura: _____________________________________
_______________________________________________
Assinatura: _____________________________________
São Paulo
2012
AGRADECIMENTOS
Agradeço à Professora Else pela paciência, conselhos e apoio
nos momentos necessários.
Agradeço ao amigo Flávio que se pôs ao meu lado e muito
contribuiu para um melhor Abstract.
Agradeço aos meus irmãos, aos queridos amigos e ao meu
companheiro que, mesmo à distância, estiveram presentes –
graças às tecnologias digitais ou pelo sentimento e motivação –
e que compreenderam e respeitaram o período curto, porém
necessário, de isolamento e imersão nas abstrações do mundo
simbólico da linguagem escrita.
Agradeço especialmente aos meus pais que me acolheram e
proporcionaram o ambiente perfeito para estar alheia à
homeostase básica e mergulhada nos sentidos da consciência,
necessidades dessa primeira jornada monográfica.
“Não é este ainda o meu poema o poema da minha alma e do meu sangue
não eu ainda não sei nem posso escrever o meu poema
o grande poema que sinto já circular em mim
O meu poema anda por aí vadio no mato ou na cidade
na voz do vento no marulhar do mar no Gesto e no Ser.
O meu poema anda por aí afora
envolto em panos garridos vendendo-se
vendendo “ma limonje ma limonjééé”
(...)”
António Jacinto, Poema de Alienação
RESUMO
Este estudo pretende compreender a relação entre o processo de alienação humana
e o ambiente virtual a partir das análises dos conceitos de alienação, tecnologia
como extensão do homem, cibercultura, sociabilidade e socialidade, consciência e
tautismo. O processo de alienação humana, ou seja, o processo de transferir para
fora de si a propriedade de partes ou funções do homem, está presente no
desenvolvimento da humanidade, desde a subjetivação até a produção de cultura. A
criação de tecnologias não escapa a isso. Infiltradas na vida pós-moderna, as
tecnologias digitais a representam quase em sua totalidade. Estão nas relações do
homem com o homem e do homem com a natureza. São a extensão do homem no
mundo e daquilo que nos é mais abstrato, nossa subjetividade. A alienação humana
no ambiente virtual pode ter como consequência a alienação dos sistemas
responsáveis pela manutenção da vida humana, e essa constatação dá maior
relevância à questão.
Palavras-chave: alienação; tecnologia de mídias digitais; virtual; cibercultura;
sociabilidade; socialidade; consciência; tautismo.
ABSTRACT
This study aims to understand the relationship between the process of human
alienation and the digital age, from the analysis of the concepts of alienation, of
technology as an extension of human beings, cyberculture, sociability and sociality,
consciousness and tautism. The process of human alienation is present in the
development of humanity, from subjectivity to culture production. The invention of
technology is no exception. Digital technologies are interlocked in postmodern life in
such a way that they almost represent it entirely. They are present in the relationship
among humans and between humans and nature. They are the extension of human
activities in the world, and of what is most abstract in humanity: subjectivity. Human
alienation in the digital age may also cause alienation of the systems responsible for
the maintenance of human life. This finding enhances the relevance of the issue.
Keywords: alienation; digital technologies; virtual; cyberculture; sociability; sociality;
consciousness; tautism.
SUMÁRIO
Introdução ... 10
Alienação ... 14
Origem Etimológica e Conceituação ... 14
Tecnologias de Mídias Digitais e o Ambiente Virtual ... 20
O conceito de Tecnologia e as Mídias Digitais ... 20
Cibercultura e Sociabilidade (ou Socialidade) ... 23
A Alienação e o Ambiente Virtual ... 27
Alienação e Tecnologias de Mídias Digitais, Cibercultura e Socialidade ... 27
A Consciência na Alienação em Ambientes Virtuais ... 35
Considerações finais ... 40
Referências ... 42
"Sua condição é a de um homem que apenas adormeceu ao amanhecer: primeiro, tem ótimos sonhos; depois, uma sensação de preguiça; e, finalmente, uma desculpa perfeita para continuar na cama." Søren Kierkegaard, em The Present Age – On the death of rebellion (tradução nossa)1
1 Do original: “Its condition is that of a man who has only fallen asleep towards morning: first of all come great dreams, then a
feeling of laziness, and finally a witty or clever excuse for remaining in bed.”
10
INTRODUÇÃO
A palavra alienação, na língua portuguesa, traz hoje forte carga pejorativa e
estreita relação com loucura, demência. Entende-se por ser humano alienado aquele
que perdeu a sua racionalidade, que está absorto e alheio de sua condição
sociocultural. Entretanto, o processo de alienação humana está presente no
desenvolvimento da humanidade, desde a subjetivação até a produção de cultura e
tecnologia.
No início deste estudo havia uma percepção: existe comportamento alienado no
ambiente virtual, no uso das tecnologias de mídias digitais. Mas era uma percepção
etérea, sensitiva, vinda do choque ao se ouvir tantas vezes exclamações de
surpresa sobre o que há por trás dessas tecnologias e como elas funcionam, sobre o
quanto estamos expostos nelas e reféns a elas, sobre a quantidade de informações
que salpicamos por onde passamos virtualmente, sobre a facilidade com que se
pode juntar todas essas informações e o que pode ser feito com tudo isso por
aqueles que tiverem acesso, poder. Muitas vezes, essas exclamações de surpresa
eram transformadas em feições de ira quando arrematava – com um certo grau de
agressão, confesso – que as centenas (ou milhares) de amigos coletados nas redes
sociais digitais não eram de fato amigos.
A impressão que havia era de que o uso das tecnologias digitais era instintivo,
para satisfazer impulsos de necessidades individuais, sem reflexão ou consciência
dos sentidos e consequências. A ironia de Dostoiévski na leitura de Memórias do
Subsolo (2000) apenas reforçou a sensação. Não se trata apenas do estar alheio,
mas do fato de perdemos a referência com relação ao sentido das ações e
comportamentos no que diz respeito ao ambiente virtual.
Repito, repito com insistência: todos os homens diretos e de ação são ativos justamente por serem parvos e limitados. Como explicá-lo? Do seguinte modo: em virtude de sua limitada inteligência, tomam as causas mais próximas e secundárias pelas causas primeiras e, deste modo, se convencem mais depressa e facilmente que os demais de haver encontrado o fundamento indiscutível para a sua
11
ação e, então, se acalmam; e isto é de fato o mais importante. (DOSTOIÉVSKI, 2000, p. 29)
Essa percepção era seguida da indignação: mas como se pode ser tão alheio a
coisas que dizem respeito a si, à sua individualidade? A extensão de partes do ser
humano ou de suas habilidades através de uma tecnologia e a posterior alienação
daquilo que foi estendido já foi descrito por McLuhan (1969). Poucos sabemos, por
exemplo, de todos os mecanismos que implicam no funcionamento de um
automóvel, principal extensão do sistema de locomoção do ser humano na
atualidade. Mas se trata de extensão de uma parte física do homem e não
chegamos a substituir completamente nossas pernas e pés por essa tecnologia. E
mesmo quando isso fazemos, como na utilização de próteses e pernas mecânicas,
não se perde a referência de que aquilo é uma prótese ou perna mecânica, que se
trata de uma representação do corpo.
As tecnologias de mídias digitais estão presentes em todas as relações da
sociedade pós-moderna. Não apenas nos meios de transmissão de informações,
mas também nas transações econômicas, nos controles de transporte, nos acessos
aos ambientes públicos e privados, nos relacionamentos dos cidadãos com o
estado, dos clientes com as empresas, dos amigos e familiares entre si. É a
digitalização do homem no mundo, a virtualização das relações do homem com o
homem e do homem com a natureza, virtualização do que nos é mais abstrato,
nossa subjetividade. A alienação no ambiente virtual é a alienação dos sistemas
responsáveis pela manutenção da vida humana e isso traz maior peso para a
questão. Ficamos vulneráveis a possíveis manipulações daqueles que se
apropriarem do que alienamos.
Esse estudo se propõe a elaborar um panorama geral e uma análise introdutória
desse contexto, ou seja, a perceber o processo de alienação humana no ambiente
virtual. O tema, por enquanto, conta com escassa referência direta. Portanto, é
tarefa um tanto ambiciosa e cuja relevância reside no fato de apontar as
características e motivações da alienação em ambiente virtual e contribuir para a
reflexão sobre os impactos do ambiente virtual na humanidade e iniciar um possível
caminho para futuras análises e aprofundamentos na construção do entendimento
da alienação do homem no ambiente virtual.
12
O estudo pretende identificar como o processo de alienação está presente no
uso das tecnologias digitais e se existem características comuns ao processo de
alienação e ao ambiente virtual que facilitam, fomentam ou aceleram o
desenvolvimento de ambos. Ainda objetiva investigar as formas da alienação
humana no ambiente virtual e as motivações para que isso aconteça, sugerir
consequências da inserção alienada no ambiente virtual e apontar possibilidades
para que o processo se dê de forma positiva.
Para tanto, o estudo tem forma de ensaio, vale-se de conhecimento prévio e da
exploração bibliográfica hipotético-dedutiva e pretende refletir sobre o tema com
base na Cibercultura e em estudos desenvolvidos nas áreas da Filosofia, Psicologia,
Sociologia, Comunicação e Neurociência.
A seleção de autores delimita a estrutura do estudo e foi feita a partir de
conceitos analisados pelos autores que poderiam de alguma forma se relacionar
com os conceitos de alienação humana e de ambiente virtual e respaldar a linha de
argumentação do estudo. Por isso, Karl Marx (apud MÉSZÁROS, 2006), István
Mészáros (2006), Newton Duarte (2004), Marshall McLuhan (1969), Michel Maffesoli
(2010), António Damásio (2011) e Lucien Sfez (2007) sustentam o eixo norteador do
estudo, que transpassa os paradigmas Conflitual-Dialético, Culturológico,
Midiológico, da Pós-Modernidade e Horizontal-Interacionista.
Marx é escolhido por sua reconhecida teoria de alienação humana, Mészáros
pelo estudo que fez dela e Duarte pela sua contextualização psicológica e
comportamental. McLuhan sustenta o conceito de tecnologia como extensão do
homem e do meio como mensagem, e tudo que se desdobra desses conceitos.
Maffesoli surge para explicar as motivações do ser humano na pós-modernidade,
com seus conceitos de sociabilidade e socialidade. Damásio faz a ponte da
sociologia e psicologia para a biologia na explicação da consciência humana. E Sfez
traz o termo “tautismo” para o contexto cibercultural da comunicação, e que será
relacionado com consciência no ambiente virtual.
O estudo é dividido em três capítulos. O primeiro busca compreender as origens
do conceito de alienação e descrevê-lo tendo como referência definições
etimológicas e teorias filosóficas e psicológicas desenvolvidas a partir do conceito. O
segundo capítulo destina-se a descrever o ambiente digital a partir da definição de
13
tecnologia de mídias digitais, tendo como referência teórica o autor McLuhan, e a
analisar as características da cibercultura, da sociabilidade e da socialidade
buscando respostas para as motivações do usuário com relação a essas
ferramentas tecnológicas.
O terceiro e último capítulo é o que se depreende dos capítulos anteriores. Nele,
relaciona-se o conceito de alienação aos conceitos de tecnologia, cibercultura e
socialidade. Para isso, vale-se de estudos e exemplos do comportamento humano
no uso de tecnologias digitais. Além disso, tendo como referência o autor Damásio,
discute a relação da consciência no processo de alienação em ambiente virtual e a
relaciona ao conceito de tautismo, cunhado por Sfez.
Por ser um estudo introdutório do tema, pretende-se concluir, com base em tudo
que foi referenciado anteriormente, se de fato há alienação no comportamento
humano em ambiente cibercultural. Também tenciona compreender os processos,
características e motivações que constroem esse cenário e apontar possíveis
caminhos para que o processo se conclua de forma a contribuir para a evolução da
humanidade. O objetivo primordial deste estudo é formar o primeiro degrau, ou
camada de abstração, em direção a futuras análises do tema.
14
1. ALIENAÇÃO
1.1 Origem Etimológica e Conceituação
A palavra “alienação” tem origem etimológica no Latim (alienatio, -onis), derivada
do adjetivo alienus (relativo ao outro, no Português: alheio), e significa a ação de
transferir para outrem o domínio de alguma coisa.
O Dicionário Michaelis (1998-2007) atrela algumas definições à palavra: 1 Ação
ou efeito de alienar; alheação. 2 Cessão de bens. 3 Desarranjo das faculdades
mentais. 4 Arrebatamento, enlevo, transporte. 5 Indiferentismo moral, político, social
ou mesmo apenas intelectual. Alienação mental: loucura.
Alienado seria o objeto da ação de alienação. Ou seja, aquilo cujo domínio foi
transferido para outrem. Michaelis o define enquanto adjetivo como: 1 Transferido ou
cedido a outrem. 2 Afastado, desviado, separado. 3 Arrebatado, absorto, enlevado. 4
Endoidecido, enlouquecido. E, como substantivo: Indivíduo atacado de alienação
mental.
Neste estudo, trataremos do ser humano como objeto da alienação, seja
alienando a si próprio ou sendo alienado por outrem. Algumas ciências da
humanidade valeram-se de um conceito de alienação para compreender processos
ou situações humanas. Na Psiquiatria, o surgimento do conceito de alienação
humana está estritamente relacionado à apropriação, definição e categorização da
loucura. Ela deixa de atuar no campo místico para estar relacionada à racionalidade
humana, ou ainda, à perda desta.
A história da loucura nos séculos XVIII e XIX é quase sinônimo da história de sua captura pelos conceitos de alienação e, mais tarde, de doença mental. (...) No processo de apropriação da loucura pela medicina o conceito de alienação tem um papel estratégico, no momento em que torna-se sinônimo de erro; algo não mais da ordem do sobrenatural, de uma natureza estranha à razão, mas uma desordem desta. A alienação é entendida como um distúrbio das paixões humanas, que incapacita o sujeito de partilhar do pacto social. Alienado é o que está fora de si, fora da realidade, é o que tem alterada a sua possibilidade de juízo. (TORRE & AMARANTE, 2001, p.74-75)
15
Na Filosofia, o principal autor de um conceito de alienação humana é Karl Marx.
Sua teoria de alienação estrutura a defesa marxista das relações de dominação
humana na sociedade capitalista. O filósofo húngaro István Mészáros (2006), em A
Teoria da Alienação em Marx, discorre introdutoriamente sobre as origens do
conceito. Segundo o autor, a problemática está presente em textos bíblicos, na
literatura e em tratados sobre direito, economia e filosofia, perpassando o
desenvolvimento europeu desde a escravidão até a era de transição do capitalismo
para o socialismo.
No mundo antigo, Aristóteles (apud MÉSZÁROS, 2006) cunhou os conceitos de
“liberdade por natureza” e “escravidão por natureza”, em concordância com a
necessidade ideológica predominante da época. Era necessário justificar a
dominação de escravos e, para isso, diferi-los dos homens livres. O escravo era
alienado, mas não era considerado homem, mas, sim, “simples coisa, um
instrumento falante” (p. 42). O mesmo que dizer que era desprovido de razão,
daquilo que o definiria como humano.
A inter-relação de uma consciência da alienação e da historicidade da concepção de um filósofo é necessária devido a uma questão ontológica fundamental: a “natureza do homem” (“essência humana” etc.) é o ponto de referência comum a ambas. Essa questão ontológica fundamental é: o que está de acordo com a “natureza humana” e o que constitui uma “alienação” da “essência humana”? Essa pergunta não pode ser respondida a-historicamente sem ser transformada numa mistificação irracional de algum tipo. (MÉSZÁROS, 2006, p. 42)
No cristianismo, a alienação do homem com relação a si próprio e com relação à
natureza dava-se em prol de um ser superior. Segundo Mészaros (2006), é “função
essencial das mitologias transferir os problemas sócio-históricos fundamentais do
desenvolvimento humano para um plano atemporal, e o tratamento judaico-cristão
da problemática da alienação não é exceção à regra geral.” (p. 40).
Ou seja, a alienação era fundamentada na mistificação para justificar o
“injustificável” – o escravo não é um homem – e transferir as questões problemáticas
do desenvolvimento das sociedades para além do homem. A alienação era uma
necessidade provocada pela pressão de responder a algo que o homem não
suportava apenas com seus conhecimentos e racionalidade. Como consequência,
16
essas questões ficavam confinadas a um plano além da responsabilidade humana,
resguardadas de uma discussão política, racional.
Na sociedade feudal, objetos e propriedades podiam facilmente ser alienados de
uma pessoa para outra. Mas o ser humano, para ser dominado por outro, precisava
primeiramente ser “reificado”, isso significa, transformado em coisa. Ele precisava
aceitar ser o servo de um senhor, em troca de salário, moradia. Aqui, temos a
autoalienação e ela acontecia por meio de um “contrato”. O homem escolhia alienar-
se para outro, mesmo que uma análise mais profunda coloque em questão a
relatividade de escolhas que havia ou o grau de consciência existente na ação.
A principal função do tão glorificado “contrato” era, portanto, a introdução (...) de uma nova forma de “fixidez” que garantisse ao novo senhor o direito de manipular os seres humanos supostamente “livres” como coisas, objetos sem vontade própria, desde que estes “escolhessem livremente” celebrar o contrato em questão, “alienando voluntariamente aquilo que lhes pertencia”. (MÉSZÁROS, 2006, p. 38)
Ainda segundo Mészáros, “o olhar de Rousseau para os múltiplos fenômenos da
alienação e da desumanização é mais agudo do que o de qualquer outro, antes de
Marx.” (2006, p. 57). Rousseau descrevia duas possibilidades de alienação do
homem sobre si próprio: “dar” ou “vender”. A primeira era considera nobre, aquele
que “dava” a própria vida, em defesa de seu país, por exemplo. A segunda, como
condenável, o mercenário, que se vendia em troca de lucro.
O conceito de alienação humana de Marx, segundo Mészáros (2006), é o
primeiro a considerar o contexto de desenvolvimento histórico-social da humanidade
e parte da contradição entre parcialidade e universalidade. A parcialidade do
interesse pessoal capitalista transformado no princípio universal dominante. “A
novidade histórica da solução de Marx consistia em definir o problema em termos do
conceito dialético concreto de “parcialidade predominando como universalidade””
(MÉSZÁROS, 2006, p. 36).
O caráter contraditório do mundo já está no centro da atenção de Marx quando ele analisa a filosofia epicurista. Ele ressalta que Epicuro está principalmente interessado na contradição, que ele determina a natureza do átomo como inerentemente contraditória. E é assim que o conceito de alienação surge na filosofia de Marx, ressaltando a contradição que se manifesta na “existência alienada de sua essência”: “Por meio das suas qualidades o átomo adquire
17
uma existência que contradiz sua ideia; ele é posto como um ser alienado, separado de sua essência”. (MÉSZÁROS, 2006, p. 68)
O motor da alienação humana, para Marx, era a vendabilidade universal, que
transformava o homem em:
(...) objetos alienáveis, vendáveis, em servos da necessidade e do tráfico egoísta. A venda é a prática da alienação. Assim como o homem, enquanto estiver mergulhado na religião, só pode objetivar sua essência em um ser alheio e fantástico; assim também, sob o influxo da necessidade egoísta, ele só pode afirmar-se a si mesmo e produzir objetos na prática subordinando seus produtos e sua própria atividade à dominação de uma entidade alheia, e atribuindo-lhes a significação de uma entidade alheia, ou seja, o dinheiro. (MARX, 1963 apud MÉSZÁROS, 2006, p. 39)
O aumento da complexidade, ou abstração, das relações também é
característica importante no processo de alienação. A especialização do trabalho e
as relações decorrentes, como troca, invenção da moeda, produção de mercadorias
e venda da força de trabalho, culminaram na possibilidade de acumulação de
capital, mas também destruiu progressivamente a relação trabalho-propriedade ao
distanciar o homem das suas relações primitivas com a natureza. Seja alienando o
trabalho da propriedade dos meios de produção e seu resultado, seja o inverso:
Esse distanciamento toma a forma de uma progressiva separação entre o trabalho livre e as condições objetivas de sua realização – os meios de trabalho e o material de trabalho. (...) Essas relações finalmente são postas a nu com o capitalismo, quando o trabalhador é reduzido a nada mais que força de trabalho e, podemos acrescentar, a propriedade se reduz a um controle dos meios de produção totalmente dissociado do trabalho (...). (HOBSBAWN, 2011, p. 125-126)
Aleksei Nikolaevich Leontiev empregou o conceito marxista de alienação
humana na Psicologia. Newton Duarte (2004) analisa os aspectos da obra do
psicólogo soviético que desenvolvem o conceito e o atrelam a questões da natureza
humana. O primeiro deles é aquilo que diferencia o ser humano das outras espécies
animais: o processo histórico de construção da cultura.
Na natureza não há liberdade, o que existe é a necessidade, “os processos
causais, espontâneos, imanentes, dos quais está ausente a ação movida por
objetivos conscientes” (DUARTE, 2004, p. 47). E o que produz essa historicidade, o
18
que move a história humana, é a atividade do ser humano. Diferentemente da
atividade animal, a atividade humana não é apenas para satisfação das
necessidades, mas também para a produção dos meios de satisfação dessas
necessidades.
A atividade de produção dos meios faz surgir novas necessidades, não mais
“imediatamente ligadas ao corpo humano como fome, sede etc., mas necessidades
ligadas à produção material da vida humana” (DUARTE, 2004, p. 49). Além disso, as
atividades humanas sempre foram coletivas. Ou seja, o desenvolvimento histórico
do ser humano não apenas o leva a produzir instrumentos, mas também a produzir
suas relações sociais.
Os instrumentos e as relações ganham existência objetiva e a atividade do ser
humano é transferida para o produto da atividade anterior. “Aquilo que antes eram
faculdades dos seres humanos se torna, depois do processo de objetivação,
características por assim dizer ‘corporificadas’ no produto dessa atividade”
(DUARTE, 2004, p. 49-50). Seria a “reificação” de subjetividades humanas, e esse
processo é “o processo de produção e reprodução da cultura humana (cultura
material e não-material), produção e reprodução da vida em sociedade” (DUARTE,
2004, p. 50).
O processo de objetivação da cultura humana desencadeia também o processo
de apropriação dessa cultura pelos indivíduos. É a relação do indivíduo com a
história social, mesmo que se dê de forma não consciente (como, por exemplo, a
apropriação da linguagem oral pela maioria das pessoas). “O indivíduo forma-se
apropriando-se dos resultados da história social e objetivando-se no interior dessa
história” (DUARTE, 2004, p. 51). Mas, para não sucumbir à dominação é preciso ser
um processo consciente e representativo da coletividade:
Uma das maneiras como pode ser entendido o conceito de Marx é justamente a de que o gênero humano constrói sua liberdade à medida que os processos sociais sejam fruto de decisões coletivas e conscientes, diferenciando-se dos processos naturais espontâneos e superando os processos sociais alienados nos quais aquilo que é social, e portanto criado pelos próprios seres humanos, domina estes como se fossem forças naturais incontroláveis (...). (DUARTE, 2004, p.47)
E ter sua matéria apropriada por todos, não apenas por uma parte:
19
(...) a temática da alienação nos trabalhos de Leontiev é a criação de obstáculos, por parte da sociedade capitalista, à apropriação da cultura humana pelos indivíduos (...) trata-se da apropriação privada da cultura material e intelectual produzida coletivamente e que deveria constituir-se em patrimônio de todos os seres. (DUARTE, 2004, p. 59-60)
Portanto, a alienação humana não é uma novidade, seja ela imposta ou
escolhida, seja de seu corpo físico ou de sua subjetividade. É um processo que faz
parte da produção de cultura humana, que acompanha e fomenta o desenvolvimento
da humanidade, para o bem ou para o mal.
20
2. TECNOLOGIAS DE MÍDIAS DIGITAIS E O AMBIENTE VIRTUAL
2.1 O conceito de Tecnologia e as Mídias Digitais
Para Marshall McLuhan (1969), tecnologia é a necessidade humana de estender
funções, ou partes, de seu corpo que não mais conseguem corresponder à demanda
existente. O homem, sempre que submetido a uma grande pressão que satura um
determinado órgão, prolonga esse órgão para além de seu corpo, em um
instrumento, ou melhor, em uma tecnologia.
Para McLuhan (1969), é isso que alimenta o avanço tecnológico. A roda, a
cidade murada e a imprensa são exemplos disso, pois são resultado da saturação
do sistema locomotivo próprio do ser humano; da pele que limita e protege todo o
organismo e funcionalidades do corpo; e da reprodução da linguagem escrita. Nesse
processo, também ocorre uma autoamputação. O sistema nervoso central protege o
corpo isolando o órgão alvo da grande pressão, hiperestimulado ou demandado, e o
substitui pela tecnologia recém-criada.
“O princípio da auto-amputação (...) se aplica à origem dos meios de
comunicação, desde a fala até o computador” (MCLUHAN, 1969, p. 61). E essas
mídias de comunicação já criadas pelo ser humano, devido ao princípio de
autoamputação, provocaram com o seu uso diversas transformações na relação do
homem com a comunicação. Transformações tanto no que diz respeito ao novo
meio, afinal, como já disse McLuhan, “o meio é a mensagem” – ou também é a
mensagem –, quanto no que diz respeito às funções primordiais da comunicação e
àquilo que era a demanda inicial e que provocou o surgimento da nova tecnologia.
Sherry Turkle (2011) relata que quando surgiram os primeiros “cyborgs”2 nos
corredores do MIT em meados dos anos 90, dizia-se que podiam ser vistos como
exóticos mas que aquilo era “apenas uma ferramenta” para o homem estar melhor
preparado e organizado em um mundo cada vez mais complexo e informacional. “O
2 Jovens pesquisadores do MIT Media Lab que andava munidos de computadores e transmissores de rádio em suas mochilas,
teclados em seus bolsos e visores digitais em lentes de óculos. Estavam sempre conectados à Internet sem fio e se
autointitulavam “cyborgs”.
21
cérebro precisava de ajuda” (TURKLE, 2011, p. 151). Ou estava saturando, sofrendo
forte pressão externa por maior velocidade no processamento de dados e pedindo a
autoamputação dessa função.
Como processamos os dados, como os correlacionamos, como se produz a
consciência e quais são os seus diferentes níveis, são questões do cérebro humano
que ainda estão sendo pesquisadas pela ciência. O que se sabe é que se trata de
um processo complexo: “O produto final da consciência provém desses numerosos
locais do cérebro ao mesmo tempo (...)” (DAMÁSIO, 2011, p. 39). A extensão do
cérebro pode ser entendida como a extensão daquilo que nos é mais abstrato: a
nossa subjetividade.
Tim Berners-Lee (2007) ressalta que o progresso nas tecnologias de
comunicação tem como característica o constante aumento de seu nível de
abstração, ou seja, está sempre sobrepondo camadas entre o significado e o sentido
da ação (DUARTE, 2004). Passamos da conexão entre computadores para a
conexão entre documentos, e agora estamos chegando na conexão das “coisas”. Ou
seja, passamos da Internet para a World Wide Web, e agora chegaremos à Web
Semântica.
A Web Semântica é uma extensão da Web que vivenciamos hoje, já está em
desenvolvimento e tem como objetivo proporcionar às máquinas maior capacidade
de processar e “entender” os dados que foram simplesmente inseridos na web
(BERNERS-LEE; HENDLER; LASSILA, 2001). É a necessidade não só de dar
significado, mas também sentido, à enorme quantidade de dados colecionada desde
o início da era de conexão de documentos, a World Wide Web.
Porém, esse “entender” das máquinas esconde o que de fato significa: uma
combinação de algoritmos definidos por humanos e atribuídos às coisas para
significá-las e correlacioná-las segundo o seu entendimento (TURKLE, 2011). Ou
seja, restringe o entendimento ao ponto de vista daquele que definiu as correlações.
Pierre Lévy (2009) entende que os maiores avanços na cognição humana são
relacionados à invenção de novos meios e sistemas simbólicos, a partir da
apropriação destes pelo ser humano. Essa apropriação não acontece imediatamente
após o surgimento do novo meio ou sistema simbólico, portanto, ainda não
22
vivenciamos todas as possibilidades de cognição que podem ser proporcionadas
pelo surgimento dos computadores em rede.
Não há dúvida de que a cognição humana é fundamentada em estrutura cerebral e atividade neural determinadas biologicamente. No entanto, nas últimas décadas, um representante conjunto de pesquisas tem sido dedicado aos temas de tecnologias intelectuais e ferramentas simbólicas. A idéia principal por trás dessa pesquisa3 interdisciplinar é de que o apparati da memória coletiva orientada pela cultura, os meios de comunicação e os sistemas simbólicos desempenham um papel de destaque na formação de habilidades cognitivas pessoais e sociais. (LÉVY, 2009, p. 6, tradução nossa)4
A teoria de McLuhan sobre tecnologia chega a propor que com a invenção da
tecnologia elétrica o homem prolongou e projetou para fora de si “um modelo vivo do
próprio sistema nervoso central” (1969, p. 61), órgão que coordena os outros órgãos.
Com isso, todo o homem veio à superfície: “na era da eletricidade, usamos toda a
Humanidade como nossa pele” (1969, p. 66).
Hoje, a tecnologia de comunicação digital perpassa e dá corpo a praticamente
todas as tecnologias existentes. Dos controles de navegação aérea aos cartões
pessoais de transporte urbano; dos softwares de gerenciamento de dados das
instituições a como acessamos domesticamente informações e conteúdos – seja no
computador ou na TV –; do comércio eletrônico ou em lojas físicas ao sistema de
declaração de imposto de renda.
As diversas tecnologias de comunicação digital que conhecemos hoje são mais
que simples meios de comunicação. Elas representam a virtualização das relações
humanas. São a extensão da comunicação não apenas como instrumento de
transmissão de informação, mas como amálgama social, como “concreto” das
relações sociais (MAFFESOLI, 2010).
A principal originalidade da cidade virtual é que ela é única e planetária, ainda que ela conte evidentemente com cinturões protegidos (redes especializadas) e com bairros reservados (intranets e extranets). É absurdo opor a sociabilidade e as trocas intelectuais livres e gratuitas às
3 O filósofo francês se refere ao seu ambicioso projeto de inteligência coletiva, o IEML (Information Economy Meta Language).
4 Do original: “There is no doubt that human cognition is grounded in a brain structure and neural activity that is biologically
determined. Nevertheless, in the recent decades, an impressive body of research has been devoted to the subject of intellectual
technologies and symbolic tools. The main idea behind this interdisciplinary research is that culture-driven collective memory
apparati, communication media and symbolic systems all play a prominent role in shaping personal and social cognitive
abilities.”
23
atividades comerciais no ciberespaço, tanto quanto seria opô-las na cidade. As cidades são, necessariamente, ao mesmo tempo e no mesmo lugar: mercados, centros de troca de informações e desenvolvimento da cultura, espaços de sociabilidade. Ocorre o mesmo com o ciberespaço. (LÉVY, 2001, p.51)
2.2 Cibercultura e Sociabilidade (ou Socialidade)
Tudo que é relativo às relações humanas – sejam elas entre os homens ou dos
homens com a natureza – e que, no decorrer de nossa história, foi desenvolvido pela
técnica e fazendo surgir novas tecnologias, agora inserido na realidade virtual,
entende-se como cibercultura (SAAD CORRÊA, 2010). Resumindo, cibercultura é a
cultura modificada e produzida pelo ambiente digital. E, à medida que o ambiente
digital contaminou a pós-modernidade, a cibercultura invade toda a cultura que
vivenciamos hoje, de forma direta ou indireta, seja pela inclusão ou pela exclusão.
O prefixo “ciber” parece ser o elo etimológico entre a técnica e os processos de sociabilidade. Apresenta-se em diferentes significados – ciberespaço, cibercultura, ciberpunk, cibersex, entre muitos – como operador da experiência virtual referente ao substantivo vinculado. (SAAD CORRÊA, 2010, p. 9)
As principais características que a cibercultura traz para a realidade pós-
moderna são o domínio do espaço-tempo, a construção de múltiplos percursos e
múltiplas realidades, a participação de todos na construção do todo comunicacional,
a coexistência de múltiplas identidades, a disseminação do sentimento de
familiaridade e a intersecção dos mundos públicos e privados (LEMOS, 2009).
Em ambiente virtual, a percepção do espaço-tempo é distinta da percepção em
ambiente físico. O usuário assume de certa forma o controle do espaço e do tempo
e pode experienciar diversos espaços-tempos paralelos e simultâneos. Na
cibercultura, ferramentas tecnológicas sociais suprem a necessidade de sentimento
de familiaridade que havia sido esgotada em um mundo que teve sua noção de
espaço ampliada tão rapidamente.
Os diversos mundos, públicos e privados, coexistentes se inter-relacionam e se
confundem, dificultando o uso de máscaras específicas para cada ambiente. E
24
ainda, as culturas das pessoas, grupos e instituições que se inserem no ambiente
virtual são carregadas para esse mundo, por mais que ali sofram transformações. E
o que se vive é a soma de todas as facetas da realidade, ao mesmo tempo.
É a realidade toda, exposta. No virtual somos todos os nossos “avatares” ao
mesmo tempo e em grande profundidade. É possível que todo o conteúdo individual
no ambiente virtual represente mais totalmente o respectivo indivíduo que um
recorte de sua vida off-line. Mas, segundo Baudrillard (1991), seria um simulacro da
realidade. Uma realidade construída a partir da simulação, que se sobrepôs à
realidade primeira e perdeu sua relação com a finalidade, com o sentido.
(...) aqui o duplo desapareceu, já não há duplo, está-se já sempre noutro mundo, que já não é outro, sem espelho nem projeção nem utopia que possa refleti-lo – a simulação é intransponível, inultrapassável, baça, sem exterioridade – nós já nem sequer passaremos ‘para o outro lado do espelho’, isto era ainda a idade de ouro da transcendência. (BAUDRILLARD, 1991, p. 155-156)
Ou sob um ponto de vista não apocalíptico:
(...) participando de uma multiplicidade de tribos, as quais se situam umas com relação às outras, cada pessoa poderá viver sua pluralidade intrínseca; suas diferentes “máscaras” se ordenando de maneira mais ou menos conflitual, e ajustando-se com as outras “máscaras” que a circundam. (MAFFESOLI, 2010, p. 238)
Todas as potências trazidas pela cibercultura constroem uma realidade na qual
existe uma massa de individualidades interligadas de maneira instável, transitória,
movediça. Como a “espuma” de Peter Sloterdijk5 (apud BAIRON, 2010). Para se
sobreviver no todo e ao todo, a individualidade é mantida, mas todas as
possibilidades estão disponíveis e a mutação, ou transmutação, faz parte do código
comum.
Dessa forma, é moldada uma realidade que tem na efemeridade a sua essência.
Para Maffesoli, “(...) trata-se de um tribalismo que sempre existiu” (2010, p. 124). É
uma realidade que extrapola as questões comunicacionais, é a relativa às relações
sociais contemporâneas, transformadas pela cibercultura, não mais
5 Filósofo alemão que elaborou a teoria das Esferas (Sphären), na qual relaciona o desenvolvimento histórico-social do ser
humano a três estágios, ou “esferas”: Bolhas, Globos e Espumas, sendo esse último a síntese do que vivenciamos hoje, na
pós-modernidade.
25
necessariamente encerrada em um ambiente digital. Ou seja, todas as tecnologias
digitais utilizadas hoje são a extensão da sociabilidade humana. A extensão do
homem no mundo.
Sociabilidade é a habilidade de ser sociável, de viver em sociedade, e vem do
latim sociabile (sociável). É a ação constante da manutenção social e requer a
pragmatização das relações. Maffesoli (2010) defende o termo “socialidade”, em
substituição a sociabilidade, para processos das relações humanas na era pós-
moderna. O termo pode ser entendido como habilidade social (do latim sociale), ou,
simplesmente, a tendência da natureza humana de se associar, de “estar-junto” –
termo cunhado por Maffesoli (2010). Ainda segundo Maffesoli (2010), sociabilidade é
o “social racionalizado” e na “socialidade” predomina a empatia, é um “estar-junto à
toa”, são redes de amizade sem objetivo específico, cuja única finalidade é a reunião
por si só.
Socialidade talvez seja o termo que melhor define as relações humanas
transformadas pela cibercultura, e que tem nas redes sociais digitais a sua principal
representação. Elas estão mais próximas da emoção que da racionalidade e
permitem que o indivíduo se expresse de forma mais dilacerada.
(...) a emoção coletiva é algo encarnado, algo que joga com o conjunto das facetas daquilo que o sábio Montaigne chamou l’hommerie: esse misto de grandezas e de infâmias, de idéias generosas e de pensamentos mesquinhos, de idealismo e de arraigamento mundano, em suma, o homem. (MAFFESOLI, 2010, p. 41)
Maffesoli constrói o conceito de socialidade relacionando-o ao instinto primário
do ser humano de sobrevivência. Seu motor é a “atração social” que vem do sentido
primordial da palavra religião – religare: “(...) antes de dogmatizar-se como fé, a
religiosidade popular (...) foi expressão de socialidade. Mais do que a pureza da
doutrina, é o viver e o sobreviver juntos que preocupa as comunidades de base”
(2010, p. 109).
“O papel da massa é o da sobrevivência” (MAFFESOLI, 2010, p. 114). A
necessidade de participar de um todo para lutar contra a morte é a impulsão da
socialidade. E ela se expressa da maneira que for necessária, utilizando, de acordo
26
com a ocasião, “o caminho real da política, do acontecimento histórico, ou a via
subterrânea, mas não menos intensa, da vida banal” (MAFFESOLI, 2010, p. 140).
Na verdade, a ajuda mútua, tal como aqui a entendemos, se inscreve em uma perspectiva orgânica em que todos os elementos, por sua sinergia, fortificam o conjunto da vida. Desse modo, a ajuda mútua seria a resposta animal, “não consciente” do querer viver social. Espécie de vitalismo que “sabe”, por meio do saber incorporado, que a unicidade é a melhor resposta ao domínio da morte (...). (MAFFESOLI, 2010, p. 60)
As tecnologias de mídias digitais formam o ambiente virtual, integram e
transformam a cultura humana e criam a cibercultura. Elas podem ser entendidas
como a extensão das relações do homem com o homem e do homem com a
natureza. E a necessidade de sobrevivência pode ser considerada a propulsão
desse processo, traduzida no impulso de socialidade, reunião que fortifica o
indivíduo pela massa e gera a construção de sociedade.
A sociabilidade racionalizaria a socialidade e se transformaria na pressão que
mantém a unicidade social refreando outros instintos individualistas do homem. Nas
palavras de Freud, “o poder dessa comunidade se estabelece como “Direito”, em
oposição ao poder do indivíduo, condenado como “força bruta”. Tal substituição do
poder do indivíduo pelo da comunidade é o passo cultural decisivo.” (2010, p. 57).
O ambiente virtual ainda está se delimitando, ou seja, ainda está no processo de
formação social, ou reunião. Nesta etapa, mais características de socialidade que de
sociabilidade podem ser observadas.
27
3. A ALIENAÇÃO E O AMBIENTE VIRTUAL
3.1 Alienação e Tecnologias de Mídias Digitais, Cibercultura e Socialidade
Podemos considerar as tecnologias de mídias digitais como extensões do
homem no mundo, ou seja, extensões das suas relações sociais e da sua
subjetividade. Essas funções e faculdades humanas necessitavam de “ajuda”,
estavam sobrecarregadas. E, no processo de desenvolvimento das tecnologias de
mídia digitais, elas foram autoamputadas, alienadas para a entidade digital, como
forma de proteção natural do corpo (MCLUHAN, 1969).
Mas podemos inferir outras correlações entre o processo de alienação e os
processos de desenvolvimento das tecnologias de mídias digitais, da cibercultura e
da socialidade. O processo de produção de cultura humana, e, por consequência, da
cibercultura, está intrinsecamente ligado ao desenvolvimento de tecnologias e à
relação entre os homens e deles com a natureza. Além disso, a comunicação que
vivenciamos nas tecnologias de mídias digitais é aquela não apenas da transmissão
de informações, mas a da comunicação como motor e mecanismo das relações
sociais (MAFFESOLI, 2010).
As relações sociais fazem parte da historicidade humana, são inerentes à
atividade do ser humano de construir relações e acrescer às suas ações camadas
de subjetividade, de abstração. Assim como acontece no progresso da tecnologia de
mídias digitais (BERNERS-LEE, 2010). E o desenvolvimento dessas relações
sociais está relacionado ao processo de subjetivação, que, assim como no de
alienação, dissocia o significado e o sentido da ação: “(...) em termos cognitivos
como em termos afetivos, a estrutura do psiquismo humano diferencia-se da
estrutura do psiquismo animal (...). Na mente humana há (...) uma relação indireta,
mediatizada, entre o conteúdo da ação e o motivo desta.” (DUARTE, 2004, p. 55).
É natural do desenvolvimento da subjetividade humana o processo de
objetivação, que pode ser entendido como a transformação da subjetividade em
“coisa”, a sua “reificação” (DUARTE, 2004). Portanto, quando o homem aliena sua
28
subjetividade para uma tecnologia de mídia digital, recorre à dupla alienação. Tanto
o homem quanto sua subjetividade são transformados em “coisa” e acrescentamos
mais camadas de abstração, ou distância, entre a ação e a finalidade.
Na subjetivação existe consciência, a cognição acompanha a relação indireta
entre a ação e a finalidade. Ou seja, existe a apropriação pelo indivíduo de toda a
cultura desenvolvida pela humanidade. E é a apropriação que permite o
desenvolvimento e crescimento sociocultural do ser humano (DUARTE, 2004). Na
extensão da subjetividade humana nas tecnologias digitais há tantas camadas de
abstração que a manutenção da relação entre ação e finalidade é dificultada.
Já na idade antiga (MÉSZÁROS, 2006), a essência humana era inalienável.
Para que o homem pudesse sofrer esse processo, havia duas maneiras: a imposta,
recorrendo à mistificação – ou religião dogmatizada – e desprovendo o respectivo
indivíduo da possibilidade de ser um humano; ou a por escolha, a autoalienação,
através de um “contrato”, ou aceite, que implicava no recebimento de algo em troca
– como salário, moradia –, ou seja, a venda implícita. De uma forma ou de outra, o
indivíduo é “reificado”, transformado em “coisa”, para que possa ser alienado ou
alienar-se. Naquilo que é construído pela participação de todos na rede de
tecnologias de mídias digitais, o indivíduo, seu comportamento e suas relações são
dados, “coisas”. E quem irá dar significado e sentido, ou melhor, subjetividade, a
essas “coisas” é a web semântica (BERNERS-LEE; HENDLER & LASSILA, 2011).
Rousseau (apud MÉSZÁROS, 2006) diferiu dois tipos de autoalienação, aquela
em que o homem oferecia o seu ser em prol de algo grandioso – como defender seu
povo –, e aquela na qual o homem se vendia. Podemos relacionar a primeira com
“mistificação” e “emoção” e a segunda com “contrato”, “razão”. Sendo assim, nesta
última haveria consciência, apropriação, e, portanto, a cognição acompanharia a
relação entre ação e finalidade. No entanto, para Rousseau, isso seria considerado
um ato mercenário.
A utilização da maioria das tecnologias de mídias digitais implica o aceite de um
termo de uso, um “contrato”. E essa escolha de autoalienação implica em
consciência, e, talvez, uma decorrente apropriação. Mas, apesar de haver um
“contrato” racional, a motivação, o impulso pelo uso, é a socialidade, e está mais
próxima do “místico” ou do “estar-junto à toa” de Maffesoli (2010). Como escreve o
29
sociólogo francês, “(...) as mídias contemporâneas (...) representariam o papel
destinado às diversas formas de palavra pública: assegurar por meio do mito a
coesão de um conjunto social dado” (MAFFESOLI, 2010, p. 62).
A “vendabilidade universal” de Marx (MÉSZÁROS, 2006) está relacionada à
“reificação” do ser humano e é o principal motivo, em sua teoria, para a alienação do
homem. A sua força de trabalho, sua ação, é objetivada pela “venda” e a crítica feita
por Marx é de que esse objeto, devido à necessidade de sobrevivência do homem,
adquire tamanha dimensão que perde sua relação com o seu verdadeiro significado.
Para Hobsbawn (2011) há também a alienação inversa. Não é apenas o trabalhador
que dissocia sua ação – seu trabalho – dos meios de produção e de seu produto
final; a propriedade também é reduzida a controle dos meios de produção,
dissociada do trabalho. À medida que o objeto da ação do indivíduo nas tecnologias
de mídias digitais adquire maior importância, mais o indivíduo se distancia do
sentido dessa ação – ou de sua finalidade, produto final.
McLuhan (1969), ao descrever o seu conceito de tecnologia, relaciona o mito de
Narciso à alienação pós-moderna. Narciso não se reconhece em seu reflexo, o
sentimento que tem é pelo outro. Seu mito não é o do Auto-Amor. Do grego
narkosis, Narciso significa entorpecimento. Seu mito é o do torpor pelo seu reflexo,
extensão de si mesmo em matéria que não o pertence. Para McLuhan (1969),
interpretarmos o mito de Narciso como do Auto-Amor é sintoma da cultura do
homem pós-moderno: tecnológica e narcótica. Ou melhor, sintoma da cibercultura.
A era pós-moderna é a era do simulacro, que, como definiu Baudrillard (1991),
não possui mais suas “referência e circunferência” (p.13), perdeu a relação entre
ação e finalidade, entre significado e sentido, é a sobreposição da realidade pela
ausência de realidade. Vivemos para além do real: “O signo (ou a imagem) absorve
e reifica o referente, tornando-se mais real do que o próprio real: hiper-real”
(PARENTE, 1999, p. 22). E acreditamos que essa hiper-realidade, ou esse
simulacro, é a realidade de fato. Ou seja, não há cognição, ou consciência, da
relação indireta. Estamos mais próximos da teoria marxista de alienação. Pela
psiquiatria (TORRE & AMARANTE), a alienação como entorpecimento significa
loucura e incapacita o indivíduo a participar do “pacto social”.
30
André Parente (2009) sugere que a era do simulacro começou “com a separação
entre natureza e cultura, separação esta vivida pelo homem com a introdução da
linguagem” (p. 22). A cultura é fruto e motor do processo de produção de
subjetividade “com seus universos cognitivos, discursivos, afetivos, sensíveis,
tecnológicos” (p. 40). Ela fornece “uma verdadeira visão artificial, que nos faz pensar
e sentir o mundo em função de um complexo sistema de representação.” (p. 40). “A
realidade virtual é uma espécie de princípio de realidade dos novos tempos, buraco
negro da nova cultura cibernética para onde estaria migrando toda a realidade
social” (p. 28).
(...) o ciberespaço é uma inegável lembrança do fato de que somos condicionados para, desde muito cedo, ignorar e negar que nossa subjetividade é, por si só, uma simulação hiper-realista. Nós não cessamos de construir e reconstruir modelos do mundo em nossa mente, usando os dados fornecidos pelos nossos órgãos dos sentidos e pela capacidade de processamento de informações do nosso cérebro e das nossas linguagens. Habitualmente, pensamos no mundo como “algo fora de nós”, mas o que percebemos é fruto de modelos cognitivos que existem apenas em nosso cérebro. (PARENTE, 1999, p. 33)
Portanto, podemos depreender a possibilidade de que a escolha de
autoalienação para as tecnologias de mídias digitais seja um “simulacro de escolha”.
Segundo Michel Hardt e Antonio Negri (2004), o poder conquista domínio efetivo
sobre toda a vida populacional – ou, sobre as relações humanas – tornando-se
função vital que é adotada e reativada por espontânea vontade por todos os
indivíduos. “O poder exprime-se, assim, como um controle que invade as
profundezas das consciências e dos corpos da população – e que se estende, ao
mesmo tempo, através da integralidade das relações sociais.” (HARDT & NEGRI,
2004, p. 163)
(...) deve-se entender a sociedade de controle como a sociedade que se desenvolve no extremo fim da modernidade, entrando no pós-moderno, e na qual os mecanismos de domínio fazem-se cada vez mais “democráticos”, cada vez mais imanentes ao campo social, difundidos pelo cérebro e pelo corpo dos cidadãos. Assim, os comportamentos de integração e de exclusão social próprios do poder são cada vez mais interiorizados nos próprios sujeitos. O poder se exerce, agora, por máquinas que organizam diretamente os cérebros (...) e os corpos (...) em direção a um estado de alienação autônoma, partindo do sentido da vida e do desejo de criatividade. A sociedade de controle poderia, então, ser caracterizada por uma intensificação e uma generalização dos aparelhos normalizantes da
31
disciplinaridade que animam do interior nossas práticas comuns e quotidianas; contudo, ao contrário da disciplina, esse controle estende-se bem além dos espaços estruturados das instituições sociais, por intermédio de redes flexíveis, moduláveis e flutuantes. (HARDT & NEGRI, 2004, p. 162)
O órgão mais diretamente afetado pelas tecnologias de mídias digitais é o
cérebro. Segundo Don Tapscott (2010), o cérebro humano, até os primeiros anos da
vida adulta, é bastante flexível, adaptável às influências que recebe do exterior. Esse
é o período em que os jovens da era pós-moderna, chamados por Tapscott de
Geração Internet, ficam expostos mais horas às tecnologias de comunicação digital.
Até o momento, podemos reconhecer impactos positivos nas habilidades motoras.
Embora haja muita controvérsia, as primeiras evidências sugerem que a imersão digital tem um impacto positivo tangível [na Geração Internet]. Os jogadores de videogames não apenas percebem mais coisas, mas também têm capacidades espaciais (...) mais desenvolvidas. E mais: posso ver pelas minhas próprias observações que o típico jovem da Geração Internet troca de tarefas com mais rapidez do que eu, e acha mais depressa o que está procurando na internet. (...) A mente da Geração Internet parece ser incrivelmente flexível, adaptável e hábil em várias mídias.” (TAPSCOTT, 2010, p. 122)
Além do impulso de socialidade e todas as características da cibercultura e pós-
modernidade, existiriam outras motivações para a alienação do ser humano em prol
das tecnologias de mídias digitais? Tapscott (2010) compara a Geração Internet com
a dos “baby boomers” – geração anterior, nascida no pós-Segunda Guerra, entre os
anos 50 e 60. Para a primeira, o dinheiro é mais importante. E talvez aí resida uma
motivação de “vendabilidade universal” para as tecnologias de mídias digitais,
muitas vezes gratuitas e subsidiárias de status.
Segundo dados do Censo dos Estados Unidos, 79% dos calouros em 1970 diziam que um importante objetivo pessoal era o “desenvolvimento de uma filosofia de vida significativa”. Em 2005, três quartos dos calouros disseram que seu objetivo principal era “ficar muito bem financeiramente”. (...) E, sim, eles consomem. Isso não é surpresa. A Geração Internet foi exposta a mais mídia e marketing do que qualquer outra geração; é a primeira geração que foi alvo dos publicitários como segmento pré-adolescente quando tinham entre oito e 13 anos. (TAPSCOTT, 2010, p. 361)
32
Tapscott (2010), apesar de uma visão integrada com relação às novas
tecnologias de comunicação digital ressalva que os indivíduos da Geração Internet
“estão abrindo mão da privacidade sem perceber – ou sem entender as
consequências” (p. 353) e que eles “tem[têm] a responsabilidade de se certificar do
controle das informações que são divulgadas publicamente” (p. 87).
“Em 2007, (...) 20% dos usuários do Facebook faziam uso de algum tipo de
privacidade no site. O resto deixava que o mundo inteiro visse sua vida privada (..)”
(TAPSCOTT, 2010, p. 85). Mas não se trata apenas da privacidade do indivíduo com
relação aos outros usuários da internet. Mesmo para os 20% que utilizam as
ferramentas de privacidade, dividindo os “amigos” em grupos e selecionando o que
cada grupo poderá ver de seu perfil, tudo que é feito pelos usuários em um site
proprietário, como o Facebook, fica armazenado em seus bancos de dados.
Ainda utilizando o Facebook como exemplo, a instalação e utilização de
aplicativos requer o aceite de um termo de uso que permite que o desenvolvedor do
aplicativo “veja” o que está no perfil do usuário “como os seus interesses de namoro,
seus planos para o verão, suas opiniões políticas, suas fotos e seus trabalhos”
(TAPSCOTT, 2010, p. 87).
Não se trata de uma grande novidade, o cadastro do consumidor e o histórico de
seu consumo em um determinado estabelecimento já existia. Os programas de
fidelidade coletam detalhes da vida do consumidor. “Mas agora, no mundo digital, a
questão é mais ampla porque as pessoas estão divulgando muito mais informações
para muito mais gente.” (TAPSCOTT, 2010, p. 87).
A venda da privacidade, visto que há em troca o uso gratuito de uma ferramenta
de interesse, é uma autoalienação contratual – pelo termo de uso – que fornece um
enorme banco de dados digital do comportamento da sociedade como um todo,
dividida em tribos e individualmente. É a realidade toda exposta.
Quando compramos medicamentos ou mantimentos em uma loja, e usamos nosso cartão de crédito para pagar, um registro é gerado e armazenado. A pesquisa de uma criança para um projeto escolar, o leitor de cartões de um estacionamento, as interações do seu carro com um banco de dados via satélite, as publicações on-line que você lê, a camisa que você compra com seu cartão da loja de departamentos, os remédios que você compra e as centenas de outras transações em rede em uma semana comum: todas essas
33
informações são gravadas em vários bancos de dados. (TAPSCOTT, 2010, p. 88-89)
Assim como o nível de abstração aumenta com o progresso das tecnologias de
comunicação digital, vivemos um aumento do nível de privacidade a ser entregue
em contrapartida.
Nossa privacidade poderá evaporar quando os nossos copilotos digitais estiverem a todo vapor – e começarem a manter registros ininterruptos de nossas vidas. Eles vão registrar nossas conversas e fotografar as pessoas que encontramos, usando truques como software de reconhecimento facial para nos poupar do trabalho de identificar todas as fotos. Gravações onipresentes de áudio e vídeo logo serão algo comum. A maior parte da tecnologia já existe. (...) O maior obstáculo é o armazenamento de dados, mas isso logo será resolvido.” (TAPSCOTT, 2010, p. 89)
E todos esses dados de nossa realidade toda exposta podem a qualquer
momento ser utilizados por aqueles que os detém:
Os computadores podem, com um custo baixo, conectar e cruzar esses bancos de dados para fragmentar e reorganizar as informações sobre os indivíduos em centenas de maneiras diferentes. Podem criar seu perfil com base no que você compra e no que faz on-line. (TAPSCOTT, 2010, p. 88-89)
Sherry Turkle compartilha do mesmo receio: “Gostamos que a Web nos
“conheça”, mas isso só é possível porque comprometemos nossa privacidade,
deixando um rastro eletrônico que pode ser facilmente explorado política e
comercialmente”6 (2011, p. 280, tradução nossa). A privacidade é refém da
tecnologia: “Podemos trabalhar em casa, mas nosso trabalho se infiltra em nossa
vida privada até que mal consigamos perceber a fronteira entre eles”7 (p. 280,
tradução nossa).
E ainda vivemos um paradoxo. Segundo Turkle (2011), as novas tecnologias são
demandadas e construídas sob o argumento de que o homem precisa ganhar tempo
de viver a vida social, uns com os outros, mas quando o homem apropria-se dessas
6 Do original: “We like it that the Web “knows” us, but this is only possible because we compromise our privacy, leaving
electronic bread crumbs that can be easily exploited, both politically and commercially.”
7 Do original: “We can work from home, but our work bleeds into our private lives until we can barely discern the boundaries
between them.”
34
novas tecnologias acaba incorporando as suas características de volume e
velocidade e sendo pressionado por elas (TURKLE, 2-11). Acredita-se que
tecnologias mais novas e eficientes irão resgatar o homem do afogamento de
demandas e informações, “mas os novos dispositivos incentivam cada vez mais
volume e velocidade”8 (TURKLE, 2011, p. 280, tradução nossa).
Em rede, estamos juntos, mas as expectativas entre nós são tão diminuídas que podemos nos sentir totalmente só. E há o risco de que cheguemos a ver os outros como objetos a serem acessados – e apenas para os momentos que acharmos útil, reconfortante ou divertido.9 (TURKLE, 2011, p. 154, tradução nossa)
O homem busca a conectividade para facilitar o encontro com as pessoas em
um dia a dia sobrecarregado, mas acaba gastando mais tempo com a tecnologia em
si do que uns com os outros. “Defendemos a conectividade como meio de estarmos
mais perto uns dos outros, mas na verdade nos escondemos uns dos outros.”10
(TURKLE, 2011, p. 281, tradução nossa).
Temos muitos novos encontros, mas podemos experimentá-los como provisórios, eles podem ser colocados "em espera" se outros melhores aparecerem. Na verdade, nem precisam ser melhores para ganhar nossa atenção. Somos propensos a responder positivamente pelo simples fato de ser uma novidade.11 (TURKLE, 2011, p. 280, tradução nossa)
Segundo Turkle (2011), o sonho tecnológico da pós-modernidade é nunca estar
sozinho, porém, mantendo sempre o controle de acesso ao outro. Isso pode ser
possível com o progresso da robótica, mas, de certa forma, já é vivenciado hoje ao
deslizar pelos portais de uma vida digital. É possível ter conexão quando e onde
quiser ou precisar, e pode-se facilmente mandá-la embora. Criamos meios para
termos mais tempo com amigos e familiares, mas nesses meios dificilmente dá-se
8 Do original: “But new devices encourage ever-greater volume and velocity.”
9 Do original: “Networked, we are together, but so lessened are our expectations of each other that we can feel utterly alone.
And there is the risk that we come to see others as objects to be accessed – and only for the parts we find useful, comforting, or
amusing.”
10 Do original: “We defend connectivity as a way to be close, even as we effectively hide from each other.”
11 Do original: “We have many new encounters but may come to experience them as tentative, to be put “on hold” if better ones
come along. Indeed, new encounters need not be better to get our attention. We are wired to respond positively to their simply
being new.”
35
alguma atenção a eles. E mais, assim como nos “reificamos” nas mídias digitais,
“reificamos” aqueles com quem nos relacionamos nelas.
Quando me refiro a um novo estado do self, itself, uso a palavra "itself" com um propósito. Ela captura, embora com certo exagero, minha preocupação de que a vida conectada nos encoraja a tratar aqueles que encontramos online de forma parecida com a que tratamos objetos – algo a ser despachado. (...) Online, inventamos meios de estar com as pessoas, mas que transformam as pessoas em algo próximo a objetos. O self que trata outra pessoa como coisa é vulnerável a se ver também como coisa. É importante lembrar que, quando enxergamos o robô como algo "suficientemente vivo" pra nos fazer companhia, nós o estamos promovendo. Se quando em rede, as pessoas se sentem "suficientemente vivas" por serem "máquinas maximizadas" de e-mails e mensagens, elas foram rebaixadas. São simetrias temerosas.12 (TURKLE, 2011, p. 168, tradução nossa)
3.2 A Consciência na Alienação em Ambientes Virtuais
Consciência, segundo António Damásio (2011), é estar cônscio tanto da
propriedade – a mente – quanto do proprietário – o “eu”, ou self.
O fato de que os inúmeros conteúdos exibidos em minha mente (...) estavam ligados a mim, o proprietário da mente, por fios invisíveis que reuniam esses conteúdos na festa movediça que é o self. E, igualmente importante, o fato de essa ligação ser sentida. Eu tinha o sentimento da experiência de mim mesmo e daquela ligação. (DAMÁSIO, 2011, p. 16)
Não ter consciência implica na suspensão do ponto de vista pessoal, “não
sabemos que existimos, nem que existem outras coisas.” (DAMÁSIO, 2011, p. 17).
Ou seja, há, por consequência, a suspensão de nossa subjetividade.
Para Damásio, as principais funções atribuídas à consciência são administrar e
preservar eficientemente a vida. “Pacientes neurológicos cuja consciência está
12 Do original: “When I speak of a new state of the self, itself, I use the word “itself” with purpose. It captures, although with
some hyperbole, my concern that the connected life encourages us to treat those we meet online in something of the same way
we treat objects – with dispatch. (…) Online, we invent ways of being with people that turn them into something close to objects.
The self that treats a person as a thing is vulnerable to seeing itself as one. It is important to remember that when we see robot
as “alive enough” for us, we give them a promotion. If when on the net, people feel just “alive enough” to be “maximizing
machines” for e-mails and messages, they have been demoted. These are fearful symmetries.”
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comprometida são incapazes de gerir sua vida independentemente, mesmo quando
suas funções vitais básicas estão normais.” (2011, p. 41).
O processo dinâmico de regulação da vida é chamado de homeostase. Em
estudos recentes, Damásio (2011) diferencia dois tipos de homeostase no ser
humano: a básica, que diz respeito às necessidades primordiais de sobrevivência, e
a sociocultural, mais relacionada à subjetividade humana (p. 43-42). A sociocultural
é uma abstração da básica, mas guarda a relação indireta entre ação e finalidade, e,
portanto, mantém o mesmo propósito de manutenção da vida. Em uma analogia
simplificada, podemos relacionar a homeostase básica e a homeostase sociocultural
com os conceitos de socialidade e sociabilidade de Maffesoli (2010). Homeostase
básica e socialidade dizem respeito às nossas questões instintivas de sobrevivência,
homeostase sociocultural e sociabilidade relacionam-se à complexificação das
questões de sobrevivência humana.
Damásio (2011) ressalta que a consciência humana e todas as funções que dela
se desenvolveram, como a “linguagem, memória expandida, raciocínio, criatividade,
todo o edifício cultural” (p. 44), podem ser entendidas como “as zeladoras do valor
nas criaturas modernas acentuadamente mentais e sociais que somos” (p. 44).
Portanto, compreender e projetar os impactos do desenvolvimento da cibercultura
pós-moderna e das tecnologias de mídias digitais no ser humano implica relacioná-
los a “como nosso cérebro flexível cria a consciência” (DAMÁSIO, 2011, p .45). A
partir disso, Damásio questiona:
(...) será que a globalização progressiva da consciência humana ensejada pela revolução digital manterá os objetivos e princípios da homeostase básica, como faz a atual homeostase sociocultural? Ou será que ela se desprenderá desse cordão umbilical evolucionário, para o bem ou para o mal? (DAMÁSIO, 2011, p. 45-46)
Segundo Damásio, a evolução humana deve muito à mente humana consciente
porque ela nos proporcionou escolhas, “possibilitou uma regulação sociocultural
relativamente flexível além daquela complexa organização social que vemos tão
espetacularmente, por exemplo, nos insetos sociais.” (DAMÁSIO, 2011, p. 54). E
essa mente humana consciente existe a partir de um cérebro constituído de
neurônios.
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Os neurônios não são essenciais para as necessidades primordiais de
sobrevivência, “os neurônios existem em benefício de todas as outras células do
corpo” (DAMÁSIO, 2011, p. 56). Eles “representam” o corpo, “constituindo uma
espécie de substitutivo virtual, um dublê neural” (p. 57). Para Damásio, “essa
referência perpétua [dos neurônios ao corpo] é a razão pela qual a vontade de viver
oculta nas células do nosso corpo pôde um dia traduzir-se em uma vontade
consciente surgida na mente.” (DAMÁSIO, 2011, p. 57). Ou seja, o cérebro como
simulação do corpo, e o corpo, mediação entre o ambiente externo e o cérebro.
Simulação, pois existe a consciência da referência e do referente e, portanto, é
possível a apropriação que propicia evolução. Podemos ainda correlacionar corpo e
cérebro com os conceitos de Maffesoli (2010): o impulso da socialidade como motor
da sociabilidade.
McLuhan (1969) defende que, ao estender o sistema nervoso central para uma
tecnologia, as atividades da consciência foram transportadas para o mundo físico e
permitiram ao homem ser consciente de que a tecnologia é uma extensão de seu
corpo. Seria a consciência da consciência.
A idade da angústia e dos meios elétricos é também a idade da inconsciência e da apatia. Em compensação, e surpreendentemente, é também a idade da consciência do inconsciente. Com nosso sistema nervoso central estrategicamente entorpecido, as tarefas da consciência e da organização são transferidas para a vida física do homem, de modo que, pela primeira vez, ele se tornou consciente do fato de que a tecnologia é uma extensão de nosso corpo físico. (MCLUHAN, 1969, p. 65-66)
Mas para Lucien Sfez (2007), o desenvolvimento dessas tecnologias de mídias
digitais – extensões das atividades da consciência humana – culminou na confusão
entre representação e expressão. Portanto, perdeu-se a consciência da consciência.
Acreditamos estar na expressão imediata, espontânea, lá onde quem reina como senhora e dona é a representação. Delírio. Acredito exprimir o mundo, esse mundo de máquinas que me representam e que, na realidade, se exprimem em meu lugar. (...) A tal ponto que acabo emprestando à máquina social, (...), minhas próprias faculdades. Tendo-as delegado a ela, elas retornam a mim como se sua origem estivesse alhures, no céu tecnológico. (SFEZ, 2007, p. 108, grifo nosso)
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Sfez (2007) descreve três metáforas da realidade tecnológica pós-moderna que
podem ser entendidas como degraus de abstração no desenvolvimento da relação
entre o homem e as tecnologias de mídias digitais. A primeira é a da representação
e nela é a preposição “com” que se destaca. “Ele [o homem] faz uso dela [técnica],
mas não se lhe submete. (...) É “com” a técnica que o homem realiza as tarefas que
determina e que se mantém como senhor das atividades cujo meio pensou.” (p. 25)
A segunda metáfora, ou degrau, seria a da expressão e é a preposição “em” que
se destaca. “Em um mundo feito de objetos técnicos, o homem tem de contar com a
organização complexa de hierarquias à qual se submete. (...) A ideia de domínio
perde a força, cedendo lugar à adaptação” (SFEZ, 2007, p. 27).
Por último, temos a do Frankenstein, com destaque para a preposição “por”. “O
sujeito só existe por meio do objeto técnico que lhe determina seus limites e lhe
atribui qualidades. (...) Por meio da técnica, o homem pode existir, mas não fora do
espelho que ela lhe estende” (SFEZ, 2007, p. 28). “Sujeito e objeto, produtor e
produto são então confundidos” (p. 28) e acontece a “perda da realidade, do sentido,
da identidade” (p. 28). Perde-se a relação entre ação e finalidade, perde-se a
consciência da subjetividade.
Desse modo, os computadores pensantes seriam justamente simulacros (e não simulações). Para essa posição, que poderia reivindicar o apoio de Epicuro, os computadores não simulam, eles são, enquanto simulacros. Como tais, eles podem prefigurar um mundo sem verso nem reverso, sem ontologia, um mundo indiferenciado, ilimitado. Esse mundo sem verso nem reverso é o do paradoxo. (SFEZ, 2007, p. 130-131)
Esta última metáfora, ou este último degrau de abstração, reflete a realidade
vivida hoje na pós-modernidade: o “tautismo”. O termo cunhado por Lucien Sfez
(2007) é a contração de autismo e tautologia. O autismo é a “doença do auto-
encerramento”, na qual o indivíduo não tem necessidade de se comunicar com os
outros, de trocar pensamentos e se adaptar ao pensamento dos outros. O autista
visa apenas suas satisfações orgânicas ou lúdicas. Já tautologia é a repetição do
mesmo conceito, mas de formas diferentes. O tautismo é um “grande todo que nos
engloba e no qual somos diluídos” (SFEZ, 2007, p. 110).
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Baudrillard fala, então, de sideração: o espectador se torna mudo, quase autista e, a partir daí, não pode dizer mais nada. Cada qual em sua caixa, isto é, em sua casa, acredita entrar em contato simultâneo, imediato com todos os outros, em um grande todo sincrônico, ecossistêmico, até mesmo autogestionário. Mas todos eles entram em contato apenas consigo mesmos. Autismo tautológico pelo qual se repete interminavelmente a mesma cerimônia abstrata. Autismo totalizante pelo qual somos diluídos no absoluto do mundo, por não termos conseguido nos separar dele para compreendê-lo. (SFEZ, 2007, p. 116-117)
Sfez credita à interação a promessa de um diálogo enriquecedor que camufla a
“perda da criatividade que o indivíduo sofreria em conseqüência da maquinização de
sua memória e dos procedimentos heurísticos que lhe são próprios” (2007, p. 131-
132). “A comunicação se faz aqui de si a si mesma, mas de um si diluído em um
todo. Essa comunicação é portanto a de um não-si a um não-si-mesmo” (p. 142).
O tautismo se dá em um contexto místico, não racional. Como na “dramaturgia
grega da Atenas democrática” (SFEZ, 1996, p. 8), um fenômeno catártico pela
encenação mitológica.
Em que universo estamos, afinal? Um universo de ficção científica, onde as máquinas falam e os homens se comunicam por meio de próteses artificialmente conectadas a circuitos anônimos? Onde a devoção para com a técnica toma ares de religião, sacraliza ídolos, idola, imagens? (SFEZ, 2007, p. 143)
A interpretação seria a solução à realidade do tautismo:
Se a interpretação é parte integrante da comunicação e se, por outro lado, referimos essa interpretação à função simbólica, à medida que ela lê e liga os signos entre si pela mediação de símbolos interpretantes, devemos também reconhecer que ela se situa no lado oposto ao da confusão tautística. (SFEZ, 2007, p. 147)
O ser humano estaria alheio ou “surdo a toda objetivação e a toda limitação”
(SFEZ, 1996, p. 9). “Vivemos já uma outra aventura, uma outra relação com o
mundo e com nossos semelhantes, sem que disso tenhamos uma clara
consciência.” (p. 8). Apropriação, consciência ou interpretação seriam sinônimos
para uma segunda etapa no processo de alienação do ser humano na cibercultura.
Segunda etapa necessária para manter aquilo que nos faz humanos.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Não seríamos pensantes se não tivéssemos em nós mesmos esse movimento perpétuo de referência a nós mesmos que nos encerra em seu círculo. Proporcionemos ao computador sua própria auto-referência, a possibilidade de se lançar em abismos, e deixará de haver diferenças entre a máquina e o humano. (SFEZ, 2007, p. 128)
Apesar de a palavra “alienado” ter entre suas definições o significado de
“arrebatado”, “absorto”, “enlevado”, “endoidecido” e “enlouquecido” e estar ligada
etimologicamente a “alienígena” e semanticamente a “estrangeiro”, “estranho”,
“desconhecido”, a alienação humana não apenas faz parte do processo de
desenvolvimento das tecnologias de mídias digitais, ela faz parte da produção de
cultura humana, acompanha e fomenta o desenvolvimento da humanidade. Seja a
alienação imposta ou escolhida, seja de seu corpo físico ou de sua subjetividade.
As tecnologias de mídias digitais são a extensão do homem no mundo, ou seja,
são a projeção de suas relações sociais e de sua subjetividade. Seu progresso
acrescenta camadas de abstração, de complexidade, e o contexto cibercultural
acelera e amplifica todo o processo.
Como supôs Turkle (2011), o uso que se faz das tecnologias digitais hoje pode
ser visto como um sintoma, e, como sintoma, mascara os reais problemas. O
homem quer o controle no uso das mídias digitais, mas em troca aliena o controle de
sua subjetividade. Com o uso das mídias digitais, o homem reduz os outros seres
humanos a “coisas”, mas também é transformado em “coisa”.
Na pós-modernidade, a linha que divide a alienação como “natureza humana” e
a “alienação” da “essência humana” é muito tênue. Colocar a máquina como
substituta da subjetividade humana, e não apenas como uma ferramenta auxiliar, é
viver em simulacro. O perigo está no fato de que o simulacro esconde a simulação e
encerra o homem dentro dele, não permite retorno.
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As criações mais impressionantes e significativas do homem são possíveis pela
correlação inusitada, ou até mesmo pelo erro, equívoco ou pela estupidez. E isso
não é possível de ser programado em algoritmos. Máquinas não erram...
Precisamos acompanhar o desenvolvimento cibercultural e perceber
transformações desencadeadas pelo ambiente digital e pela alienação do homem à
entidade digital. Ainda vivemos o processo e, portanto, não temos o distanciamento
necessário para definir todos os impactos que terá na humanidade, menos ainda
determinar se será para o bem ou para o mal.
O que é possível depreender é que também faz parte do processo de alienação
humana uma posterior etapa que pode ser definida como apropriação, consciência
ou interpretação daquilo que foi alienado e transformado. O sujeito desta etapa pode
ser o homem como coletividade e aí estará assegurada a manutenção no homem
daquilo que lhe é humano e permitirá à humanidade o seu desenvolvimento.
Uma coisa, porém, é certa, um maior poder de reflexão, assim como um maior conhecimento, apenas aumenta a aflição do homem, e, acima de tudo, é certo que para o indivíduo, assim como para sua geração, nenhuma tarefa é mais difícil do que escapar das tentações da reflexão, simplesmente porque elas são tão dialéticas e o resultado de uma descoberta brilhante pode dar a toda a questão um novo rumo, pois, ainda no último momento, uma decisão refletida é capaz de mudar tudo – mesmo depois de esforços muito maiores do que o necessário para colocar um homem de caráter no meio da história. Søren Kierkegaard, em The Present Age – On the death of rebellion (tradução nossa) 13
13 “One thing, however, is certain, an increased power of reflection like an increased knowledge only adds to man’s affliction,
and above all it is certain that for the individual as for the generation no task is more difficult than to escape from the temptations
of reflection, simply because they are so dialectical and the result of one clever discovery may give the whole question a new
turn, because at the last moment of a reflective decision is capable of changing everything – after one has made far greater
exertions than are necessary to get a man of character into the midst of things.”
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