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A ETERNIDADE DO SER
Hideraldo Montenegro
Impresso no Brasil
Printed in Brazil
Diagramação:
Capa: Hideraldo Montenegro
Montenegro, Hideraldo, 1957 -
A Eternidade do Ser
2007
p.70
Filosofia
Para todos os rosacruzes,
em todo mundo, que conhecem
a fala do Capelão nas
convocações ritualísticas.
“Homem,
conhece-te
a ti mesmo”
Sócrates
A ETERNIDADE
DO SER
Recife
2007
A maioria de nós associa a existência à vida
tão-somente. Acreditamos que algo só começa a
existir quando nasce e que deixa de existir quando
morre. Ou seja, acreditamos que algo só existe se
está vivo. Mas, este raciocínio é muito simplista,
pois, uma pedra, por exemplo, existe embora não
tenha vida. Assim, se admitimos que uma pedra
exista, mas não tem vida, então, a existência não
pode está apenas associada à vida.
Conseqüentemente, vida e existência não podem
ser sinônimas. O fato de não existir vida não
significa que não exista existência. Antes de tudo,
precisamos desassociar vida e existência. Embora, a
vida sempre esteja ligada à existência, a existência
não está ligada indissoluvelmente à vida (pelo
menos à vida biológica). Enfim, não podemos
condicionar a existência a começo, meio e fim.
Uma existência só tem começo, meio e fim
relativamente. E, só existe começo, meio e fim se
houver movimento.
O que distingue um ser vivo de um mineral é
o grau de sensibilidade, de movimento. Todo
movimento acontece no tempo e no espaço, ou
seja, relativamente. A percepção do movimento (no
tempo e espaço) só ocorre com um referencial. O
movimento só ocorre na percepção entre uma
coisa e outra. É necessário existirem elementos
distintos para a ocorrência da consciência do
movimento. Mas, para que ocorra a percepção do
movimento é preciso que haja uma consciência que
o capte. Na verdade, o movimento só ocorre na
consciência. Se um movimento não é percebido, ele
não ocorreu. O movimento só ocorre relativamente.
Ou ele é percebido ou ele não aconteceu. De fato,
é na consciência que existe o movimento. A base
da vida é o movimento. É o movimento que
provoca a vida.
É a percepção que provoca a reação e o
grau de reação é o grau de movimento de algo.
Podemos dizer que um ser vivo é aquele que
apresenta certo grau de reação, de movimento. E,
uma reação só ocorre se houver certo grau de
sensibilidade presente.
O tempo e o espaço só existem na
consciência. Se há algo que se move no universo,
este é a consciência.
Podemos dizer também que algo só existe
quando o percebemos, quando o enquadramos no
tempo e no espaço. Porém, este raciocínio não é
satisfatório porque não resolve a questão da
existência de forma definitiva e absoluta. O fato de
um morador do Brasil negar a existência de certo
habitante da China, simplesmente porque não o
percebe objetivamente, de alguma forma, não
anula a existência deste. Este chinês existe
absolutamente. Ou seja, este chinês existe quer o
percebamos ou não. Ele existe absolutamente no
universo e relativamente para nós. Para ele, ele
existe. Para nós, que não o conhecemos, talvez ele
exista e, um dia, talvez (se ele vier para cá ou nós
irmos para lá), ele venha a existir de fato para nós.
É verdade, que o referido suposto chinês
ocupa certo lugar no espaço e que está vivendo
num dado momento, numa dada época. Mas, para
ele mesmo, ele é absoluto. Ele existe! Esta
consciência de “existir” é absoluta. Não existe nada
exterior a ele que anule a sua real existência. Ele
existiu ontem e existe hoje. Ele existe estando aqui
ou lá. Alguém que negue que ele existiu ontem e
que estar existindo hoje não anula a sua existência.
Sua existência, portanto, é absoluta.
O referido chinês existe no universo e,
assim, sua existência ultrapassa o condicionante
espacial chinês. Sua existência vai além das
fronteiras da China. Ele não existe simplesmente
porque mora na China. Ele existe no continente
asiático. Ele existe no planeta Terra. Ele existe na
Via Láctea. Ele existe, enfim, no universo. Ele existe
principalmente porque ele “sabe” que existe. Ele
existe porque “sabe” que existe, quer alguém saiba
disto ou não.
Ele existe absolutamente porque tem
autoconsciência. Sua existência é absoluta porque a
consciência percebeu algo em si que não varia: o
EU.
Se viajo de automóvel, durante o percurso
da viagem, a minha consciência vai mudando,
entretanto, o meu EU permanece o mesmo no
decorrer dela. Durante uma viagem eu permaneço
sendo o mesmo eu, porém, minha consciência,
durante uma viagem, terá variado. Mas, o que terá
variado será a consciência de tempo e espaço e
não a consciência do EU (a autoconsciência).
A consciência varia, o EU não. O EU é
absoluto e a consciência pode ser relativa. A
consciência só se absolutiza no EU. O que torna
uma existência absoluta é a consciência do EU. O
que torna uma consciência absoluta é o EU. O EU é
a própria existência porque o EU é a própria
eternidade.
Como sabemos que existimos? Como
sabemos que existimos sempre? Primeiro, vivemos
e, para vivermos, precisamos existir. Mas, o que nos
faz existir não é a vida, é o EU. Existimos porque
existe o EU. O EU não flui no tempo e no espaço,
portanto, ele é imutável, absoluto. Mas, só sabemos
que existimos porque vivemos e porque viver é ter
consciência. Não existe vida sem consciência. Mas,
teremos consciência sempre ou só enquanto dura a
vida? A consciência também se absolutiza no EU.
Assim, existimos sempre porque existimos no
eterno, embora, é só através da plena
autoconsciência que nos fundiremos
definitivamente ao EU. A vida flui, o EU, não. A vida
depende. A vida depende de coisas para se
manifestar. Existimos absolutamente? Se existimos
absolutamente, então, existimos sempre?
Uma existência relativa só acontece no
tempo e no espaço. Uma pedra só existe
relativamente. Ela ocupa um tempo e um lugar no
espaço. Se não ocuparmos um mesmo espaço em
que se encontre uma pedra, ela não existirá para
nós? Uma pedra existe independente de nós? Quer
a percebamos ou não, uma pedra existe ou ela só
existe na consciência? Uma pedra tem existência
absoluta? Tudo que for material, manifesto, está
condicionado à relatividade de tempo e espaço.
Tanto a vida biológica, que se manifesta na matéria,
num certo tempo e espaço, quanto os minerais
existem relativamente. Uma existência relativa só
acontece no tempo e no espaço. Porém, o tempo e
o espaço só existem na consciência.
Um chinês que mora em Pequim e chama-
se Lin Chu, existe relativamente para nós. Enquanto
ser físico, se não o percebemos, se não o
conhecemos, de alguma forma, então, ele não
existe para nós, embora, exista absolutamente. Ou
seja, independente de sabermos que ele exista ou
não, ele existe porque ele existe para ele. Ele existe
e inexiste relativamente e existe absolutamente. No
tempo e no espaço ele só existe relativamente.
Contudo, independente da relação tempo-espaço,
ele existe e se ele existe independente de tempo e
espaço, então, ele existe de forma absoluta.
Como uma existência se faz absoluta? Eu
existo quer alguém perceba ou negue a minha
existência. Porém, eu existo se não reconheço a
minha própria existência? Se algo não percebe a si
mesmo, que não sabe que existe, tem existência
absoluta?
Uma pedra tem existência para um homem
porque ele a percebe. Entretanto, ela não existe
para si mesma, não tem autoconsciência. Ela só
existe relativamente. Uma pedra, portanto, só existe
na consciência de quem a percebe. Se alguém se
ausentar da presença da pedra ela deixará de
existir.
No entanto, o EU sempre existirá na pedra. A
pedra pode deixar de existir, mas o EU, não. A
pedra existe relativamente, porém, o EU existe
absolutamente na pedra. É a consciência da pedra
que não sabe que existe o EU e, portanto, a sua
própria existência. A pedra não é autoconsciente e,
assim, só existe apenas na consciência de quem a
percebe. O EU não depende da consciência para
existir. A consciência só existe porque existe o EU.
Contudo, existem graus de consciência do EU. Às
vezes, a consciência não percebe a sua própria
existência (ou a existência do EU).
As coisas, independente do EU (já que
ocorrem na manifestação da relatividade), só
podem existir na consciência. A consciência das
coisas, por outro lado, só vêm a saber das
existências de suas próprias existências através da
autoconsciência (do EU). As coisas só passam a
existir de forma absoluta no EU. A consciência só se
absolutiza na autoconsciência. O EU independe das
coisas para existir. As coisas, para existirem,
dependem da consciência. A consciência para
existir absolutamente depende do EU. Tudo existe
no EU, mas no EU nem tudo existe.
Como podemos reconhecer e afirmar que
algo exista? Bom, antes de tudo, é necessário que
exista um instrumento de reconhecimento de
alguma coisa. Contudo, antes que algo seja
reconhecido é necessário que aquilo que
reconhece algo reconheça a si mesmo. Assim, é
necessário que o reconhecedor reconheça a si
mesmo. Ou seja, que o reconhecedor exista.
Conseqüentemente, algo só reconhece alguma
coisa se possuir consciência. Portanto, o
instrumento de reconhecimento é a consciência e o
reconhecedor é o EU. O EU é aquilo que não varia.
O instrumento de reconhecimento é o que se
move. O reconhecedor é o fixo, o que não se move.
Quando dois homens estão olhando uma
mesma pedra reconhecem a existência desta por
conta do EU, caso contrário, o fenômeno da
percepção seria interpretado de forma variada por
ambos. Mesmo as idéias abstratas jamais seriam
compreensíveis de um homem para um outro se
não houvesse um EU, absoluto, invariável.
Se juntarmos todos os chineses do mundo
teremos várias consciências (ou vários graus de
consciência) e um só EU. O ser humano despertou
a autoconsciência, mas não alcançou a plenitude de
sua existência. A consciência humana não atingiu a
sua plenitude e a plenitude da consciência humana
só pode ocorrer no completo despertar do EU. O
EU “parece” diverso porque a consciência ainda é
vária. Como podemos saber que o EU é o mesmo
em todas as pessoas? Se algo não varia em mim. Se
algo não varia em você. Se, ambos, eu e você, nos
compreendemos neste algo, nos identificamos
neste algo, então, estamos diante de uma mesma
coisa.
O EU é distinto em cada ser autoconsciente
ou só existe um único EU, universal? O meu EU é
diferente ou absolutamente igual ao seu EU? Se o
EU fosse distinto em cada ser autoconsciente,
então, nunca haveria consenso a respeito de nada.
Só podemos falar num EU (e na compreensão que
isto implica) se houver semelhança entre todos os
Eus. O EU, portanto, é a base da unidade universal.
O meu EU percebe o seu EU e se reconhece como
semelhante. É através do EU que o tempo e o
espaço são rompidos. Se o EU é absoluto, então,
tudo é EU e EU é tudo. O EU, portanto, é infinito.
Pode ser que o EU se reconheça em todas as
coisas, mas para isso ocorrer é necessário que o EU,
antes de tudo, reconheça a si mesmo. Ou seja, para
o EU se reconhecer é necessário existir aquilo que o
possa refletir. O que reflete o EU, o instrumento de
reconhecimento, o espelho, é a consciência. A
consciência é o espelho do EU. A consciência só se
torna espelho do EU completamente quando se
torna autoconsciente. Uma consciência, portanto,
só se torna absoluta no EU. Uma existência só se
torna absoluta no EU.
Uma pedra só existe na consciência de
quem a percebe.
Para que um EU se reconheça em todas as
coisas é necessário que o EU esteja também em
todas as coisas. Quando um homem percebe uma
pedra ela passa a existir dentro dele e faz parte de
sua consciência? Se ela não existir em sua
consciência, ela não existirá para ele. Sequer ela
existirá para si mesma. Uma pedra, portanto, tem
existência relativa. Ela depende de uma consciência,
que não é a sua, para existir. Não existindo
autoconsciência não existe permanência da
existência. Mas, algo que não tenha
autoconsciência pode existir? Relativamente. Uma
pedra só existe exteriormente a um homem ou ela
só existe dentro dele? Ela só existe quando um EU
a percebe? Uma pedra possui um EU? Se algo só
passa a existir absolutamente a partir da
consciência do EU, então, uma pedra não existe,
exceto na consciência de quem a percebe. O
mundo físico, material, é uma ilusão?
Relativamente.
Não podemos dizer que o mundo material
seja uma ilusão absoluta. Assim, não podemos
negá-lo categoricamente nem afirmá-lo
unicamente. A China, para mim, não existe, exceto
que eu venha a ocupar aquele espaço que é a
China.
Se eu nunca tive alguma informação a
respeito de um país chamado China, ela não existe
para mim. No entanto, para um chinês, a China é
bem real, concreta. O território chinês, enquanto
espaço físico, não é autoconsciente. Ele só existe se
alguém o reconhece. A China só existe na
consciência de quem a percebe.
Qual a diferença, então, da existência de um
chinês e da China? Ambos não existem, enquanto
manifestação física, relativamente para nós? Por
que o chinês tem uma existência relativa, enquanto
manifestação física, e absoluta, enquanto ser
autoconsciente? Por que a China existe apenas
relativamente?
Assim como o chinês, a China também não
existe no planeta Terra, no sistema solar, na Via
Láctea, no universo e, enfim, no todo? Assim como
uma pedra, a China existe relativamente no todo.
Ela ocupa certo espaço num dado tempo no todo.
Se não houver uma consciência que a reconheça
ela não existirá para ninguém e nem para ela
mesma. Um chinês, embora ocupe um espaço num
certo tempo, ele existe absolutamente porque ele
sabe que existe. Nem o tempo, nem o espaço
podem restringir isto. Ele existe seja onde esteja. A
sua transcendência ocorre naquilo que não é
material: o EU.
Se não existe alguém que reconheça um
território que seja a China, ela não existe. Ela só
existe porque os homens dizem que ela existe
quando a localizam no espaço.
Qual o espaço que existe entre as coisas e o
EU? No EU não existe distância porque no EU não
há espaço. Assim, no EU não existe o fora e o
dentro. As coisas só existem porque existe o EU. Ou
tudo é no EU ou tudo apenas está. Algo pode estar
apenas na consciência (uma ilusão) e não estar no
EU, pois, mesmo o EU sendo tudo, nem tudo é o
EU.
As coisas materiais só existem em nossa
consciência? Na ausência da consciência a matéria
não tem existência? A matéria ocupa um espaço
num certo tempo. Todavia, sabemos que o tempo e
o espaço são relativos, então, podemos concluir
que a matéria (que ocupa um espaço num certo
tempo) existe relativamente. Mas, tempo e espaço
não são fenômenos da consciência? Eles não só
ocorrem na consciência? Sendo assim, a matéria só
existe na consciência.
O universo não existe se não houver um EU?
Um chinês existe absolutamente porque
tem autoconsciência. A China só existe porque
existimos. A China só existe porque ocupamos um
mesmo tempo e espaço. A China existe
relativamente no todo. Um chinês existe
absolutamente no todo porque ele sabe que é o
todo.
A consciência é absoluta? Se a consciência
fosse absoluta ela não variava, não existiria
diferença nela. Ela não se manifestaria diversificada.
Se a consciência fosse eterna, ela seria absoluta e
se ela fosse absoluta, ela não variava. Se a
consciência fosse absoluta ela seria imutável,
estática. O tempo é universal, mas não é absoluto.
No absoluto não existe tempo. O tempo só existe
na consciência. Como o tempo, a consciência é
universal, mas não é absoluta. A natureza é
universal, mas não é absoluta. Se a natureza fosse
absoluta ela seria eterna, imortal. A natureza só se
manifesta temporariamente. Mas, como o universal
não é absoluto se o absoluto é universal? O
absoluto é universal porque o absoluto é tudo. O
universal não é, necessariamente, absoluto porque
o universal é a manifestação de todo universo e o
universo só existe no tempo e no espaço. Universal,
portanto, é tudo que existe no universo. Ou seja,
universal é todo o movimento no universo. O
universo é a consciência. Portanto, a consciência é
universal, mas não é absoluta. A consciência só se
absolutiza no EU, na autoconsciência.
A consciência vai se formando no
movimento. A soma de todas as consciências
individuais gera a consciência coletiva. A soma de
todas as consciências (individuais e coletivas) gera
a consciência universal. Toda consciência surge na
memória universal. A memória, na verdade, é as
leis. O movimento se movimenta no estático, no
imóvel. Sendo assim, uma consciência vai nascendo
e se perpetuando na memória. Se existe uma
memória universal, então, todos os fatos, todos os
movimentos já existem nela. Então, uma
consciência segue um movimento que já está na lei
no seu grau de manifestação. Só existe memória se
houver movimento. Se não houver movimento não
pode haver memória.
A consciência individual, portanto, se forma
na vivência. As vivências criam as memórias que
são a base da consciência. A consciência depende
da memória. Não pode haver consciência se não
houver memória. O que forma a memória é a
sensibilidade. Não pode haver memória se não
houver emoção. Não pode haver memória se não
houver movimento.
Entretanto, como o que não se manifestou
(que não se moveu) pode ter memória? Existe a
memória essencial, primordial, limpa, apenas com
suas leis. Não existe o inevitável. O movimento
varia dentro da lei. A memória, no movimento, vai
registrando os fatos através daquilo que a pode
provocar: as emoções. Assim, a memória universal
vai registrando as memórias dos acontecimentos.
Destas memórias armazenadas são formadas as
consciências coletivas que se perpetuam de
geração para geração. É a memória que mantém o
átomo com a estrutura que tem e, portanto, a
memória é a organizadora da manifestação.
A memória universal traz em si a memória
do próprio EU. As coisas vivem esquecidas do EU
que as fazem existir. Se não houvesse memória não
haveria estruturas, perpetuação e,
consequentemente, manifestação. A memória é o
suporte da consciência, onde ela se move. A
consciência, ao se mover, vai gerando memórias.
Estas memórias, geradas pela consciência, não se
perdem (já que se trata de memórias) e vão servir
de suporte para as novas gerações de consciência,
fazendo ocorrer aquilo que chamamos evolução. A
base de toda evolução (seja ela de que tipo for,
material ou psíquica) é mental.
Mas, o aprendizado (a memória) da
consciência tem continuidade? Tem que ter
continuidade ou o aprendizado seria inútil. E, se o
aprendizado fosse inútil não seria necessário existir.
Não podemos imaginar que a natureza produza
coisas inúteis, porque a natureza não produz coisas
inúteis. A natureza não produz coisas inúteis
porque algo só pode produzir aquilo que ele
mesmo é. Se a natureza produzisse o inútil ela
mesma seria inútil. Mas, será que a natureza é
inútil? Somos inúteis?
Qual a utilidade da vida senão o existir? A
utilidade da vida só pode ser o existir porque o
próprio pressuposto da vida é existir. Se não
houver existência não existe vida. Mas, a vida
existirá sempre? A vida não pode existir sempre
porque a vida só se manifesta relativamente no
tempo e no espaço. A vida tem começo, meio e
fim. Então, o que pode existir sempre, senão aquilo
que dá suporte à própria vida, à manifestação? O
existir é eterno porque é ele que pode dar utilidade
à vida. As nossas vidas só têm utilidade se
existirmos.
Se o aprendizado fosse inútil não seria
necessário existir. Não podemos imaginar que a
natureza produza coisas inúteis porque ela mesma
tem uma utilidade. E, se ela é útil, então, não pode
produzir aquilo que ela não é. A vida sempre está
buscando a perpetuação, a adaptação, a
transformação e, enfim, a evolução. A evolução não
pode ter um fim senão no absoluto, na eternidade.
Se não houvesse continuidade não haveria
evolução. Há, portanto, a continuidade do
aprendizado na consciência coletiva e na
consciência individual. Portanto, uma consciência
individualizada, que atingiu um grau de
autoconsciência, se move entre o manifesto e o
não manifesto. Uma consciência individualizada
deixa de se manifestar e volta a fazê-lo porque,
caso contrário, a evolução individual estaria apenas
presa a tempo e espaço. E, ela não pode está presa
a tempo e espaço porque findaria e se tornaria
inútil. E, ela não pode se tornar inútil porque ela é
útil. Ela é útil só enquanto ocorrer a manifestação?
Isto não seria possível porque a evolução não pode
ter um fim, senão no absoluto, na eternidade. Se
não houvesse continuidade, não haveria evolução.
A consciência não é absoluta. A consciência
individual pode se absolutizar naquilo que é
absoluto: o EU. A consciência universal vai se
formando gradualmente. Tudo no universo está
para ser (o devir). O mundo manifesto é o suporte
para que a consciência se universalize. Sem
memória não existiria consciência. Sem consciência
não existiria movimento. Sem movimento não
existiria manifestação. Sem manifestação não
existiria autoconsciência. A memória só existe
porque existe um tempo absoluto, ou melhor, a
unificação do tempo (passado, presente e futuro).
Quando, tempo e espaço são eliminados na
consciência, surge o absoluto. De fato, só existe o
relativo porque existe o absoluto, caso contrário, o
relativo seria absoluto. O absoluto não é
fragmentado. Apenas a nossa percepção capta
fragmentado o absoluto.
Embora, a existência não esteja condicionada
à vida (biológica), a vida está condicionada à
existência. Seja em que grau for, não existe vida
sem consciência. Todavia, uma vida só ganha
existência absoluta, de fato, com o despertar do EU.
Ou seja, uma vida só começa a existir
absolutamente quando adquire autoconsciência.
Uma árvore, embora tenha consciência e, portanto,
vida, não tem autoconsciência e, assim como uma
pedra, existe relativamente. É no EU que o tempo e
o espaço deixam de existir. A consciência só se
absolutiza no EU.
A consciência é o movimento do universo e
aquilo que cria a aparente diversidade. É a
consciência que dá vida às coisas. No entanto,
aparece um aparente paradoxo. Se a consciência
surge no movimento (ou que provoca o
movimento), ela já aparece nas partículas, nos
elétrons. Podemos dizer que tudo que é manifesto
tem vida. Uma pedra, portanto, tem vida. A
consciência já está no elétron. Sem consciência não
haveria movimento e, conseqüentemente, não
haveria vida. A base de toda manifestação,
portanto, é a consciência, o movimento. Ao
contrário do absoluto, o relativo é dinâmico. O
relativo se move entre o positivo (o Ser) e o
negativo (o não-Ser). A consciência, portanto, se
apresenta polarizada na manifestação. A
consciência se polariza entre a presença e a
ausência. Mas, na ausência de todas as coisas, o
que restará para a consciência apreender? Se a
consciência não percebe a presença daquilo que a
faz existir, se ela não percebe a si mesma, então, ela
apenas se manifestará temporariamente. Na
ausência ela deixará de existir.
A consciência só se apresenta relativa
enquanto houver movimento, diferença,
diversidade. Quando ela alcança a quietude, a
autoconsciência, e se absolutiza, aparece o EU.
No universo a inércia é maior do que a
cinética. Tudo no universo tende à paralisia, à
quietude. Todo movimento tem começo, meio e
fim. O movimento é temporário porque tudo tende
a ficar parado. O EU não é dinâmico. O EU é e,
portanto, não precisa de movimento, de ação, para
se completar. As coisas fluem, se movimentam,
porém, se deslocam para a inércia. A tendência da
matéria (de toda manifestação) é a estabilidade.
Tudo evolui para a estabilidade. O EU é a
estabilidade, o equilíbrio, de todas as coisas. O EU,
portanto, é harmônico.
Enquanto as coisas não se realizam no EU,
elas são apenas aparências. No movimento nada é.
No movimento apenas tudo “parece” ser. No
movimento o elétron cria a ilusão da diversidade.
No movimento a consciência não percebe o
absoluto. A consciência só apreende o EU, o
absoluto, quando se aquieta, quando transcende as
diferenças, quando se harmoniza. A consciência só
apreende a si mesma quando percebe aquilo que a
faz existir. É a quietude, portanto, que faz despertar
este conhecimento. O conhecimento é o
reconhecimento da existência. O conhecimento só
acontece na harmonia, quando a unidade se faz
conhecer. A consciência da eternidade só aparece
na autoconsciência. A consciência é um espelho
onde o EU se contempla. A evolução só ocorre, no
entanto, no movimento. Sem movimento a
consciência não atingiria a autoconsciência. Porém,
o EU só é despertado plenamente na harmonia, na
quietude, na apreensão da unidade.
Sendo o sensível (o manifesto) a consciência,
o espelho, ele reflete o EU. Porém, como o EU
sendo eterno, imutável, infinito, absoluto pode ser
refletido tão imperfeito? Por ser um espelho a
consciência reflete tudo invertido. O eterno parece
temporário, o infinito parece finito, o perfeito
parece imperfeito. O sensível (o manifesto) é o
mundo da aparência.
Aquilo que chamamos consciência, pudemos
chamar de natureza. A natureza não é
autoconsciente. Ela não sabe o que realmente é. A
natureza é autodestrutiva em sua evolução. Ela
precisa deixar de ser o que não é para ser o que
realmente é. A morte é o seu objetivo final.
Tudo no universo tende a ficar parado. Tudo,
o que pára, se potencializa. É no movimento que o
EU, aparentemente, se multiplica. Uma bola em
movimento descreve, em sua trajetória, a ilusão de
várias bolas.
Se a vida é movimento, podemos concluir
que tudo no universo tende à morte. A morte,
portanto, é o objetivo do universo (ou seu estado
real). Na morte, na paralisia, o universo se realiza. A
morte é o único estado absoluto, imutável.
Se existe um estado permanente no universo
este é a morte, a quietude, a plenitude. O
movimento só acontece relativamente num dado
tempo e espaço. Ou seja, tudo no universo tende a
ser aquilo que ele é: o absoluto. A morte (a
estabilidade) é fundamental para a consciência da
existência do EU.
A única existência permanente para as coisas
é a morte. Toda manifestação é relativa. Ela só
acontece no tempo e no espaço. É na morte que o
EU se realiza. A morte é o estado que o universo
persegue alcançar definitivamente. A morte
definitiva só ocorre no EU, na cessação da
consciência relativa (manifestação).
O movimento no universo é uma
perturbação. Mas, ele (o movimento) evolui para a
potencialização, para a estagnação. Todo
movimento segue uma evolução ascendente no
relativo e descendente para o absoluto. Aquilo que
podemos chamar de paz só ocorre na morte, na
quietude, na absolutização, na cessação do
movimento.
O movimento só ocorre na presença dos
opostos, do conflito. O movimento ocorre entre o
Ser e o não-Ser, entre o relativo e o absoluto, entre
o negativo e o positivo. Tudo que estiver manifesto
está sujeito à variação. As coisas manifestas estão
em permanente conflito. O conflito, no entanto,
produz a evolução. Aquilo que aparentemente não
é, sempre tentará ser o que realmente é. Aquilo
que não estar, sempre tentará alcançar a sua
plenitude, o seu real estado.
O movimento acontece na consciência e a
move. No movimento a consciência se eleva. A
consciência manifesta está dividida entre o
temporário (relativo) e o permanente (absoluto). É
só no EU que a consciência se torna absoluta.
A manifestação de todas as coisas vive em
constante conflito entre o permanente e o
temporário, entre a vida e a morte, entre o Ser e o
não-Ser. A morte é o estado permanente, absoluto.
A vida é o estado relativo, transitório, da existência
absoluta.
Como podemos dizer que algo seja absoluto
ou relativo? Ninguém pode negar que a vida, seja
de que nível for, é relativa, temporária. Também
não podemos negar que a morte é um estado
absoluto, permanente. Podemos dizer que todo
relativo tende ao absoluto. O absoluto é aquilo que
não sofre variação de tempo e espaço. O absoluto
é. O relativo não é. O relativo é temporário. O
relativo busca ser, mas ele varia entre o ser e o não
ser. O relativo só deixa de ser relativo quando ele
se torna absoluto. E, para o relativo se tornar
absoluto ele tem de sair do estado em que se
manifesta (tempo e espaço). Ou seja, o relativo se
torna absoluto quando deixa de se manifestar
materialmente. Ou seja, as coisas só deixam de ser
relativas quando morrem (ou quando transcendem
o mundo das aparências). Mas, a matéria morre? O
EU existe em tudo, mas nem tudo existe no o EU.
Aquilo que não despertou o EU só existe
relativamente. A matéria só existe relativamente. A
partir do momento que a matéria se absolutizar ela
deixará de ser matéria. Mas, matéria não é
indestrutível? A matéria é destrutível. O que não é
destrutível é o EU que existe na matéria. A matéria,
no entanto, não é consciente por isso ela não é
imortal, eterna. A matéria é destrutível. O que não é
destrutível é a energia (mente) que produz a
matéria.
O EU também está na matéria? Uma pedra
tem EU? Sendo o EU tudo e tudo sendo o EU,
então, o EU está em tudo e é tudo. O EU só pode
reconhecer aquilo que é ele mesmo. O EU não
reconhece o nada porque o nada não é o EU. O
nada não existe em nenhum plano (visível ou
invisível) porque não existe consciência no nada.
Aquilo que não vive (não se manifesta) é
eterno, pois, não se move. Não existe morte se não
existe vida. No plano do absoluto não existe vida,
só existe existência. As coisas só existem
permanentemente no absoluto. As coisas só
existem permanentemente se não se manifestam.
Não pode existir fim para aquilo que não se
move (que não tem início, meio e fim). Não existe
começo para aquilo que não se move. Só existe
começo, meio e fim para o que se move. A essência
de uma bola não é o seu movimento. O
movimento, numa bola, é temporário. Enquanto o
movimento de uma bola passa, ela, antes, durante
e após o movimento, permanece a mesma. Uma
bola parada é. Uma bola em movimento parece ser.
Uma bola é aquilo que é permanente. Uma bola
não pode ser aquilo que é temporário, transitório.
O movimento permanece na bola mesmo que ela
permaneça parada, mas ele não é a bola. O
movimento sempre tentará mover a bola, mas a
bola procurará sempre ficar parada.
O zero não é o nada, mas aquilo que
antecede o um. O zero é. Um está. O um não é o
zero, mas estar no zero, pois o um só existe se
existir o zero. O um é a energia, a consciência
movente, a base de toda manifestação. O um é
gerado no movimento. Algo só parece ser diferente
no movimento. Algo que se movimenta não é, está.
No movimento algo deixa de ser para estar. É o
movimento que cria a diversidade. O um é o zero
manifesto. O um não pode vir do nada, pois, o
nada nada gera. O zero é o EU, absoluto. O um é a
base da manifestação. O um é a consciência. Assim,
a base do movimento, do elétron, é a consciência.
Portanto, a consciência já está no elétron. A
consciência só se torna absoluta no EU. Após a
morte (cessação da manifestação) a consciência do
EU, a autoconsciência, sobrevive no absoluto. A
consciência só sobrevive no EU. Sem o EU a
consciência só se manifesta no tempo e no espaço
(tem início, meio e fim).
É no elétron que o um se torna vários. O
elétron gera o tempo e o espaço, o referencial. É na
consciência que o EU parece vários. O absoluto
parece ser relativo no movimento. O EU é a mente
e a consciência é o movimento na mente.
O EU é o zero absoluto. A consciência é o
um. A consciência pode se multiplicar e dividir. O
EU é imutável, único. É na consciência que surge o
relativo. O dois é gerado na consciência. A
polaridade é gerada na consciência, pois, a
consciência é um espelho e, assim, tudo parece
duplo, invertido. A consciência sempre está dividida
entre o positivo e o negativo, a existência e a não-
existência.
O número só é infinito no zero. O número
não é infinito. O próprio número é o seu próprio
fim. Dois mil e dois, por exemplo, é um número
completo em si mesmo. Ele é dois mil e dois. Ele
tem início, meio e fim. Todo número tem um fim no
zero que o prossegue. O nada não existe. O zero é
absolutamente tudo. Todos os números estão
contidos no zero. O zero é. O um é a afirmação do
zero e, portanto, sua própria negação. O dois é a
negação do um, o seu oposto. Dois só é dois
porque não é um. Um só é um porque não é dois.
Mas, quando um se torna dois? O um se torna dois
no movimento. O movimento só aparece na
oposição um e dois (ou um e um).
O um só existe se existir o zero. Porém, o
zero não precisa do um para existir. O um precisa
do zero para existir, mas sem o um o zero sempre
existirá. O um, no entanto, pode ser que nunca
venha a existir, mesmo que exista o zero. Tudo que
tenha que se tornar absoluto tem que se tornar
zero. Enquanto uma coisa existir como quantidade
e medida é relativa. Algo só pode se tornar
absoluto se deixar de estar (um, dois, cem, quatro
mil, etc.) para ser. É no EU que as diferenças deixam
de existir. No EU tudo é. No tempo e no espaço
tudo está. No zero, ou seja, na ausência da
manifestação, o EU se faz absoluto. Enquanto
estiver manifesto nada será absoluto, nada será
zero, tudo será um.
Quando uma consciência se situa no tempo
e no espaço surge um vazio e, então, aparece a
questão existencial: a pergunta. Se estou aqui
agora e estarei lá depois, existe ausência em mim?
Existirei sempre? Estas perguntas levam a uma
outra pergunta fundamental para o despertar do
EU: quem sou eu? Assim, a importância da
manifestação da consciência, no tempo e no
espaço, é fundamental para a natureza atingir a
autoconsciência. Se a consciência não se situasse
no tempo e no espaço, no referencial, jamais
haveria a autoconsciência e, não havendo
autoconsciência, não haveria a consciência da
existência.
A pergunta move a consciência, perturba,
inquieta. A pergunta surge na insatisfação, na
ausência de algo (que é o próprio conhecimento, a
posse de tudo). A pergunta faz a consciência
despertar para a ausência em que ela parece estar.
A consciência se moverá, tendo ou não perguntas,
no entanto, a pergunta acelera o movimento da
consciência. Contudo, as respostas às perguntas da
consciência só vêm no silêncio, na quietude da
mente. A razão só pode aflorar quando a emoção
se aquietar.
A consciência só se aquieta no EU, pois,
sendo o EU tudo, as diferenças (o movimento) são
anuladas em sua presença.
Afinal, tudo, o que percebemos, é eterno?
Sendo uma pedra, matéria, uma manifestação
relativa no tempo e no espaço, sua existência é
temporária. Sua existência só dura enquanto dura a
nossa percepção dela. Um corpo de um chinês é
temporário, só existe relativamente no tempo e no
espaço. O que é eterno é o EU do chinês. O corpo
de um chinês adulto não é o mesmo de quando ele
era criança. Entretanto, o EU deste chinês é o
mesmo. O seu EU não variou no tempo e no
espaço. O EU deste chinês é eterno.
O EU na pedra, através da consciência, só
está na pedra relativamente, Uma consciência só se
torna absoluta no EU, na autoconsciência. O EU
está na pedra, mas não é a pedra. A mente existe
na pedra, mas não sabe que existe na pedra. A
consciência se movimenta na pedra sem saber que
estar na pedra. A pedra tem consciência, porém, ela
não tem autoconsciência. A autoconsciência revela
a existência do EU e torna a consciência absoluta. O
EU está no corpo de um chinês e é o próprio chinês
porque ele é autoconsciente. Se houvesse apenas
corpo sem a autoconsciência do EU não haveria
chinês, nem ser humano algum. Todo universo
manifesto existe temporariamente.
A existência absoluta antecede e prossegue
à manifestação. O EU existe antes e depois do
corpo de um chinês. O EU no corpo de um chinês
criança será o mesmo que no seu corpo adulto.
Antes de existir o corpo adulto de um chinês, já
existia um EU e o EU ainda existirá depois que o
corpo infantil de um chinês se tornar adulto. O EU
não depende do corpo para existir.
Um corpo depende da consciência para
existir e da autoconsciência para saber que existe.
O corpo precisa do EU para que a consciência, nele,
exista absolutamente. O EU independe de um
corpo para existir porque o EU não depende de
tempo e espaço. O que existe apenas no tempo e
no espaço é o corpo e a consciência que o faz
existir. O tempo e o espaço só existem no corpo
através da consciência. Sem consciência sequer
existe corpo no tempo e no espaço. A consciência
põe o corpo no tempo e no espaço. Na verdade,
sem consciência não existe um corpo.
Uma pedra tem consciência. Uma pedra se
move internamente. Embora, pareça parada, uma
pedra se move na consciência. Uma pedra também
se move em cada ângulo em que é percebida. Para
uma pedra existir ela precisa ter consciência. Ela
não sabe que existe, mas ela existe na consciência.
Ela não tem autoconsciência, mas ela tem
consciência. E, se ela existe na consciência, ela
também pertence à consciência, ela tem
consciência.
Entretanto, a consciência só existe
relativamente (no tempo e no espaço). Uma pedra
só existe na consciência. Após a manifestação, ou
cessação de movimento, a pedra deixa de existir. O
EU, que existia na pedra, permanecerá existindo,
mas a pedra não existirá no EU. A consciência não
consegue mover a pedra a um grau que move um
ser vivo, porém, a consciência na pedra buscará
transformar o corpo da pedra em um ser movente
porque ela precisa mover-se, pois, esta é a sua
natureza. A consciência buscará mover as coisas
para expressar aquilo que a faz existir: o
movimento. O inanimado é movido, pela
consciência, para o animado. A natureza, a
consciência, sempre buscará alcançar a
autoconsciência para que ela desperte o EU.
Todo movimento implica numa evolução.
Todo movimento tem início, meio e fim. Qual é o
fim do movimento? As coisas precisam evoluir para
o quê? Se o relativo evolui, então, ele evolui para
alguma coisa que não é ele, caso contrário, ele
permaneceria estático, pois, estaria completo,
pleno. Aquilo que não é relativo é absoluto. Então,
o relativo evolui para o absoluto.
A natureza busca se realizar no absoluto. A
natureza está no EU e o busca, pois, ela não é
autoconsciente e, assim, está sem ser. O temporário
sempre busca o permanente. A natureza se move
na obscuridade da consciência para a luz daquilo
que a faz existir: o EU.
Redundantemente pudemos dizer que o
absoluto não precisa de um corpo para existir
porque o absoluto não precisa de nada, pois, o
absoluto é tudo e tudo é o absoluto. O absoluto é
completo e, portanto, existe independentemente
de qualquer condição. Sendo o EU absoluto, então,
o EU é imortal. A imortalidade do EU é a única
realidade permanente, absoluta. O EU é eterno.
Aquilo que chamam de morte (a não-existência)
não existe no EU. Chamam de morte o fim de uma
manifestação, de um movimento. Mas, nada se
movimenta no EU. No EU tudo é.
O fim de um movimento de uma bola não é
o fim de uma bola. Uma bola existe antes do
movimento e existirá depois dele. O EU existe antes
e depois do movimento da consciência. O
movimento da bola só existe se existir a bola, mas a
bola existirá sem movimento. A bola parada é a
bola. A bola em movimento está. A consciência
está. A consciência pode estar presente ou não.
Para a consciência de alguma coisa permanecer é
preciso que haja uma paralisia da consciência desta
coisa. Uma consciência só pode parar se o tempo e
o espaço deixarem de existir nela. Enquanto a
consciência se mover, não haverá eternidade nas
coisas.
Mas, como uma consciência manifesta pode
se eternizar? A consciência só pode se eternizar na
consciência da unidade. A base da unidade é o EU
porque tudo é o EU e o EU é tudo. Se a mente se
reconhece em todas as coisas e reconhece mente
em todas as coisas, então, nada é distinto, embora,
seja diverso. A mente pode se diversificar em sua
manifestação, mas ela permanecerá sendo mente.
A consciência movente move o corpo,
porém, o corpo também move a consciência.
Quando o corpo se move, movido pela consciência,
ele também a move. A consciência se move e é
movida porque ela é o corpo e o corpo é ela. O
corpo só se move porque tem consciência, porque
só existe na consciência. A consciência move o
corpo porque o movimento existe na consciência.
Uma bola parada tenderá a sempre ficar
parada, mas desejará sempre mover-se porque o
movimento está nela. Na verdade, nada está
completamente parado se está manifesto. A bola
pode estar parada, mas a consciência na bola está
se movendo e tentando movê-la. A única coisa que
está completamente parada é o EU. Se uma bola
parasse completamente ela se tornaria o EU e, para
se tornar o EU, ela teria que deixar de se manifestar
no tempo e no espaço ou adquirir autoconsciência.
Uma bola não pode ficar completamente
parada porque ela ainda se move no tempo. O EU
existe numa bola sem existir na consciência da
bola. O EU só existe na consciência quando a
consciência não separa as coisas do EU. A
consciência só se torna una quando se funde à
unidade do EU.
Assim como existem graus de consciência,
existem, conseqüentemente, graus de
autoconsciência, porque a autoconsciência é a
consciência do EU. A autoconsciência só se torna
definitivamente o EU quando pára de separar o EU
de um outro suposto EU. Quando o EU se
reconhece nas coisas, então, a autoconsciência se
integra definitivamente ao EU, pois não haverá
mais separação entre as coisas (a consciência) e o
EU.
A razão não se move, ela se revela, ou
melhor, é revelada. A razão é o EU (nas coisas) no
homem. A emoção é o movimento da consciência
nas coisas.
Não existirá reação se não houver
percepção. Não existirá percepção se não houver
consciência. Não existirá consciência se não houver
movimento. Não existirá movimento se não houver
emoção. Não existirá emoção se não houver
desejo. Não existirá desejo se não houver ausência.
Só existe ausência se há presença, pois, não pode
haver ausência do que não existe. Portanto, algo só
se move se há desejo (paixão). O desejo só existe
na ausência. Não existe desejo na presença.
Não existe desejo na razão. A razão já é e,
portanto, ela nada busca. A emoção (o movimento
da consciência) obscurece a razão. Quanto menor a
razão nas coisas, maior é o desejo nelas. Quanto
maior é a razão nas coisas, menor é o desejo nelas.
Algo só deseja o que não tem (ou o que não é). O
desejo da pedra é maior do que o desejo da árvore.
O desejo da árvore é maior do que o desejo do
gato. O desejo do gato é maior do que o desejo do
homem. O desejo do tolo é maior do que o desejo
do sábio. O desejo, portanto, é fundamental para a
ocorrência da evolução. O desejo não é apenas um
estímulo consciente. Toda natureza é estimulada
inconscientemente pela presença. A natureza
sempre está buscando aquilo que ela precisa ter
(ou ser). Um desejo inconsciente é instinto. O
instinto reage instantaneamente ao estímulo de
ausência.
A natureza está cheia de vontade. A natureza
se perpetua por conta do desejo. A natureza evolui,
ascende, por conta do desejo. Mas, o desejo
perturba, inquieta, provoca. Não existiria
dinamismo se não houvesse desejo. A natureza, a
consciência movente, persegue cegamente a
realização do desejo. Pela realização ela combate,
compete, elimina. Conseqüentemente, tudo que
está manifesto está em constante conflito.
Portanto, só existe harmonia no EU, pois nele tudo
estar realizado. Mas, o desejo tem um fim ou ele é
infinito? Todo desejo se encaminha para a
realização. O desejo se realiza quando atinge o
desejado. No EU, na ausência do movimento, ou
melhor, na presença da própria existência absoluta,
todo desejo é saciado, pois, nele se encontra o
equilíbrio. Nada está ausente no EU. No EU não
existe desejo, pois, ele é o próprio desejado,
embora alguns desejos pareçam não querer ou não
levar a ele.
O desejo é a força motriz do movimento.
Toda natureza está prenhe de desejos, porque a
natureza está repleta de ausência. A consciência
deseja aquilo que ela ainda não é. A natureza,
portanto, persegue um determinado fim. A
natureza deseja alcançar algo. Algo só se
movimenta se for para alcançar uma meta. A
natureza, a consciência, o instinto, persegue um
determinado fim. A natureza não se move à toa, ao
acaso. A natureza só se move porque busca algo.
Mas, o que busca a natureza? Se tudo na natureza
é transitório, então, ela busca aquilo que ela ainda
não tem, embora, tenha em essência: o
permanente. A natureza busca a estabilidade e a
estabilidade está no EU, no absoluto.
Mas, o que é essência? Essência só pode ser
aquilo que alguma coisa verdadeiramente é e não
aquilo que alguma coisa está. E, alguma coisa só é
no EU. Se alguma coisa não é o EU, então, ela
apenas está.
Quanto mais existe desejo numa coisa, mais
incompleta estar esta coisa. E, uma coisa só se
completa no EU.
Qual é a realização (de um desejo) da
existência senão a permanência? O que busca o
existir senão o perpetuar-se? O que busca a
natureza? O que busca a consciência senão o
eternizar-se? Como a consciência pode eternizar-se
no movimento? A consciência só pode se eternizar
no absoluto. O que falta à consciência relativa
senão um estado absoluto? Como ela pode se
absolutizar? Se a consciência apreende o todo,
então, nada vai se mover nela (estar presente ou
ausente), pois, ela será o todo.
O movimento é um efeito de uma causa. A
causa do movimento da consciência é a emoção.
Mas, o que provoca a emoção é a percepção. O
sensível, portanto, provoca a reação. Sem
percepção não há reação. Porém, não existe só
percepção dos sentidos. A consciência percebe a
existência do EU. Esta percepção é completamente
interior. É esta percepção que faz a consciência se
movimentar e se elevar até a autoconsciência. Sem
sensibilidade não haveria evolução da natureza. E,
se existe evolução é porque existe consciência e se
existe consciência, existe movimento. É através do
movimento, da sensibilidade, que a consciência
evolui. Entretanto, tudo, o que a consciência
percebe no movimento, é passageiro e só é
passageiro porque é movimento. A evolução só
pode acontecer no passageiro. A evolução precisa
ter um fim, mas ela só pode ter um fim no
invariável, no absoluto. O sensível é a consciência.
Só o sensível pode provocar e perceber o
movimento. Mas, como o que não se move pode
ser percebido pelo que se move? Quando o que se
move deixa de se mover.
A consciência se move em nós, mas, em nós,
algo permanece imóvel. No movimento da
consciência eu estou. Naquilo que não se move eu
sou. Na consciência, ora estou assim ou assado.
Porém, estando assim ou assado, permaneço sendo
eu. Isto, que existe em mim constantemente, é
permanente. A nossa emoção varia
constantemente. Se não controlarmos as nossas
emoções jamais iremos perceber o EU. Precisamos,
portanto, aquietar os sentidos para percebermos a
nós mesmos. Sem domínio da emoção, a razão
nunca será. A emoção descontrolada sempre
impedirá da razão ser. A razão absoluta impedirá a
emoção de estar. A emoção precisa estar e a razão
precisa ser para ocorrer a união.
Um cego e surdo ainda sente, pois, tem
consciência. Este sentir, este perceber de um cego e
surdo, é a consciência de si mesmo, a
autoconsciência. Sem consciência jamais íamos
perceber o EU. Este perceber de um cego e surdo
não é o conhecimento, mas a percepção do
conhecimento. O conhecimento independe da
percepção para existir. O conhecimento é. O
conhecimento só pode ser invariável. O
conhecimento apenas é descoberto. A
autoconsciência descobre o conhecimento que há
nela mesma. E, o que existe na autoconsciência é o
EU.
Eu sei que sei. Eu sei que sou. Eu sou nas
coisas e as coisas são em mim, mas se as coisas não
são em mim, ainda assim, eu sou em mim. Eu não
existo porque as coisas existem em mim. As coisas
existem em mim porque eu existo.
O fato de não haver percepção não significa
que não haja existência. Pode existir a percepção
sem que haja existência. A percepção pode
perceber algo (um fantasma, um som etc.) que não
existe. É verdade que esta é uma percepção falsa
(ou uma falsa interpretação), mas a percepção
existe. Ou seja, a percepção não é garantia de
existência.
O conhecimento do EU é imediato porque o
EU é o próprio conhecimento. Conhecendo o EU se
conhece o próprio existir. No EU o conhecimento
se realiza. Enquanto a sensação é o conhecimento,
através da percepção, do movimento, ele é um
conhecimento transitório. Ou melhor, a percepção
é o conhecimento de um estado momentâneo. A
sensação permite apenas termos um conhecimento
temporário de um estado de uma coisa. A sensação
não é o conhecimento mesmo, pois, o
conhecimento mesmo não se move, não se altera.
Para apreendermos o conhecimento é necessário
que o instrumento de reconhecimento não se
altere.
A psicologia se insere apenas naquilo que
varia: a emoção. A realidade não está na psicologia,
mas no EU, na razão. A emoção só tem realidade
temporária. Através do EU vemos as coisas como
são, sem variação. E, as coisas não têm variação no
EU.
A vivência não pode ser conhecimento
porque a vivência varia de um ser para outro, de
uma época para outra. Assim, nunca haveria
unidade, entendimento, ciência. A vivência só
ocorre no tempo e no espaço. A minha vivência
não é igual a sua. O conhecimento só pode ser fixo,
invariável, universal. O conhecimento não se
produz, se revela. Não construímos o
conhecimento, o descobrimos. Um conhecimento
que se constrói é falso. O psicologismo é falso.
A verdade não depende de interpretações
relativas, onde cada um tem uma. A verdade só
pode ser universal. Não podemos negar que
existam leis no universo. Não será a negação de
uma lei, baseados numa verdade pessoal, que a
vamos anular e que torne impossível a sua
confirmação. De fato, precisamos nos retirar da
vivência, do movimento, para captarmos aquilo que
está acima da psicologia. Fazendo isto, vamos
captar aquilo que nos é único, mesmo que o nosso
método ainda contenha parte de nossa vivência.
O conhecimento falso é o conhecimento
passageiro. O meu conhecimento de tempo e
espaço é falso para você, não lhe serve de nada. O
que a minha história pode ser útil para você? Como
ela pode constituir uma verdade absoluta? A minha
história é-me útil. O movimento de minha
consciência individual, a minha vivência, produziu
uma evolução em mim, mas não produzirá uma
evolução em você. Só a sua própria vivência, o
movimento de sua consciência, lhe será útil.
Entretanto, o movimento de sua e da minha
consciência evoluem para onde? Onde este
movimento está nos elevando, senão para o nosso
encontro? Onde nos encontramos? Onde não
variamos?
Da mesma forma, uma história coletiva só
será útil pra a coletividade que a vive(u). E, o
exemplo, não é útil? Dele, não podemos tirar uma
conclusão? Um exemplo só é compreensível para
quem viveu a mesma experiência. Se não vivi tal
experiência ela é-me inútil. Dela nada posso
concluir porque ela não faz parte de minha
consciência. E, se vivi uma experiência, então, não
necessito do exemplo dela. Ela faz parte de minha
vivência. Enfim, para a memória da consciência o
exemplo não vale de nada. Na verdade, podemos
afirmar que o conhecimento transitório, falso, não é
conhecimento, mas informação e informação não
pode ser conhecimento porque informação pode
ser falsa ou verdadeira.
Um conhecimento transitório não é um
conhecimento mesmo, mas informação. Das coisas
só obtemos conhecimento transitório, ou seja,
informação. Só podemos ter conhecimento daquilo
que é no EU. Não existe o conhecimento do EU e o
conhecimento das coisas. Existe o conhecimento
do EU e as informações das coisas. As coisas só nos
apresentam estados (ora estão assim, ora estão
assados). A única coisa que é o próprio
conhecimento das coisas é o EU.
Sem conhecimento não pode haver o EU.
Sem o EU não pode haver conhecimento, porque o
EU é o próprio conhecimento. As coisas, enfim, só
existem no conhecimento.
Suponhamos um cego. Ele não tem
informação de quando ou onde está uma coisa se
não usar os outros sentidos (tato, paladar, olfato).
O fato dele não perceber tempo e espaço, não
impede que ele tenha conhecimento. Pode lhe
faltar informação, mas não necessária e
consequentemente, conhecimento.
O EU não é uma idéia nem uma vivência
(experiências). O EU existe sem a idéia e sem a
vivência. O EU não se move e não pode ser movido,
porque é absoluto. O que existe como idéia e
vivência é a consciência. A percepção se move, mas
a percepção só se move naquilo que não se move
porque, caso contrário, a percepção não existiria.
Para existir a percepção é necessário um ponto fixo.
O movimento só é percebido se existir o imóvel
para percebê-lo. Se tudo se movesse no
movimento, então, o movimento não seria
apreendido. A existência do EU não depende da
consciência para existir porque não pode haver
dependência no absoluto. E, o EU é absoluto
porque não varia.
A percepção da consciência do EU varia
porque a consciência se desloca entre ausência e
presença. A consciência, às vezes, sabe que existe e,
às vezes, não sabe. A existência está lá, existindo,
mas a consciência, às vezes, não sabe que existe. A
existência permanece e a consciência passa ou fica.
O fato de não existir percepção não significa que
não exista existência. A existência não depende da
consciência. A consciência depende da existência
Mas, se o EU não é idéia nem vivência, como
podemos ter conhecimento do EU? Só podemos
ter conhecimento do EU no próprio EU. Primeiro:
eu não posso ter conhecimento do EU me
movendo. Segundo: eu não posso ter
conhecimento do EU idealizando. Assim, é
impossível pensar ou falar no EU. No EU só
podemos nos tornar. E, só podemos nos tornar
porque só existimos no EU. Eu não existo no
movimento. No movimento eu apenas me
movimento. Eu só existo no movimento
temporariamente.
Eu não posso imaginar o EU porque o EU
não se constrói. Não se constrói aquilo que está
construído. O que eu posso fazer é revelar o EU.
Contudo, eu só posso revelar o EU para mim
mesmo porque ele só pode ser revelado na
consciência. O EU não é um conhecimento que
possa ser transmitido. O EU é o conhecimento que
só pode ser apreendido.
Não pode existir conhecimento naquilo que
nunca é. O EU não pode ser um ideal. O
conhecimento não pode ser um ideal. Um
conhecimento só pode ser uma realidade. Um
conhecimento ideal é hoje, mas não será amanhã.
O desejo não cessa quando é realizado. O desejo
não tem fim na consciência porque o desejo se
move sempre. O desejo só tem fim no EU. No EU
não existem desejos porque no EU não existe
ausência.
O zero quando imagina, gera o um. O
imaginado é aquilo que não é. Mas, o imaginado
pode vir a ser. O um não é. O um pode ser zero. O
um pode ser dois. O um é apenas a negação do
zero, o seu oposto. O um confirma apenas uma
manifestação. O um confirma apenas a sua
temporalidade.
O ideal não é o EU, mas o ideal leva ao EU,
pois, o ideal é a emanação da imagem perfeita do
EU na consciência. O ideal perfeito é aquele que
ainda não foi alcançado porque o ideal perfeito
termina no EU. O ideal é o desejo não realizado
porque o ideal perfeito não pode ser alcançado
pelo imperfeito, pelo manifesto. Assim, o ideal é
infinito porque tem fim no infinito: o EU.
As emanações dos arquétipos são
descendentes para a manifestação (e, assim, são
descendentemente imperfeitas) e ascendentes para
o EU (e, assim, inexistentes).
O imaginado sai do EU e vai se realizando no
manifesto. O EU, portanto, emanou de si a imagem
perfeita de si mesmo. Esta imagem vai, pouco a
pouco, sendo revelada na consciência. Como uma
escada, os arquétipos estão em cada grau da
consciência. Na medida em que descem para o
manifesto, vão ficando difusos.
O ideal perfeito, portanto, tem um fim no EU.
O ideal perfeito tem um fim no EU não porque seja
o próprio EU, mas a sua imagem. Mas, qual é a
imagem do EU? A perfeição. O arquétipo é a
perfeição do EU. O arquétipo é a perfeição do EU
que vai sendo revelada, pouco a pouco, pela
consciência (ou que vai sendo revelada na
consciência). Algo só pode existir no EU se for
autoconsciente. E, para algo ser plenamente
autoconsciente, precisa sair da temporalidade para
a eternidade.
Então, no movimento só deve existir um
ideal, um desejo: alcançar o EU. Aquilo que é, é e
não depende de nada para ser. Não existe querer
naquilo que é. Aquilo que aparentemente não é, só
precisa de consciência (autoconsciência) para saber
que é. O ideal só existe na aparente ausência do
EU. Uma consciência não pára de desejar, de se
mover, enquanto não se realiza no EU. Fora do EU
tudo é desejo.
O agir no mundo sempre é uma ação falsa,
artificial. Através do nosso agir construímos tudo o
que é artificial em nossas vidas. Assim, nenhuma
ação tem uma base absolutamente verdadeira, mas
temporária. Toda ação se situa no tempo e no
espaço. Ela é boa hoje, mas pode ser ruim amanhã.
No entanto, as coisas não podem evoluir sem ação,
sem movimento, pois, é o movimento que produz a
evolução. Precisamos agir para evoluir. Contudo,
num certo nível, este agir é apenas mental, o
pensamento.
O movimento na bola alcança o seu objetivo
quando a bola pára. O movimento não é um
objetivo. O movimento acontece para algo atingir
uma meta. Desejamos que a bola esteja em tal
lugar e, então, a lançamos em tal direção. A
trajetória da bola é importante para alcançarmos
um ponto desejado, no entanto, a trajetória, o
movimento, não é o objetivo da bola, é apenas o
seu instrumento. A consciência se movimenta para
alcançar um determinado fim. O objetivo da
consciência sempre é alcançado quando ela pára.
A única coisa definitiva é o despertar do EU.
E, o despertar do EU não se faz na ação. Os
caminhos mais curtos para o despertar do EU são a
contemplação e a meditação.
A consciência, portanto, é um instrumento
do EU para alcançar a autoconsciência, meta
suprema do existir. Na própria palavra
“autoconsciência” temos o casamento de auto(eu)
e da consciência. Ou seja, a autoconsciência é a
fusão da consciência no EU. A consciência fundida
no EU não se move. Ela deixou de estar (em
movimento) para ser (EU). Uma consciência fundida
no EU não precisa mais de vivências, de
movimento, porque já atingiu o seu objetivo. A
consciência pára de se mover porque não existe
mais variação, diferença nela, pois, ela se tornou
absoluta. Nada estar ausente na consciência
fundida no EU. Não existe mais desejo na
consciência fundida no EU porque, no EU, não
existe ausência. O casamento da emoção com a
razão unifica a mente.
O EU existe independente do saber. O EU
sempre existirá porque o EU é a própria existência.
A consciência é que precisa saber que existe. Se
uma consciência não sabe que existe, ela existirá
apenas relativamente, no tempo e no espaço.
No EU a história pára, pois, não existem
conflitos, diferenças nele e, assim, não existe
movimento. A política gera a história. Enquanto
houver política haverá movimento e relatividade e,
assim, nada será absoluto, verdadeiro. A política
gera o falso, os opostos. Nada na política será
verdadeiro. O bem coletivo não está no
movimento, no conflito. O bem coletivo está na
consciência, no conhecimento que a consciência
pode apreender.
O homem, no EU, é universal. Se o homem
estiver separado por cultura e por região, então, ele
está dividido, incompleto. E, se ele está incompleto,
então, ele não é, ele apenas está. O homem só
pode ser completo no EU e, no EU, não existe
divisão. No EU tudo é unificado.
Para sermos verdadeiros, precisamos ser
autênticos. Para sermos autênticos, precisamos ser
verdadeiros. E, só pudemos ser verdadeiro naquilo
que é verdadeiro em nós. Portanto, só podemos ser
verdadeiros no EU. Se, por exemplo, eu apresento a
minha cultura como verdadeira, estarei me
contradizendo, porque uma cultura (qualquer
cultura) é uma coisa específica, localizada e, assim,
não pode ser verdadeira porque não pode ser
absoluta. Toda cultura é transitória. Cultura é uma
coisa que tomamos emprestada, não faz parte de
nós. A absorvemos ou não. A assumimos ou não.
Uma cultura pode ser manipulada, imposta. Assim,
não existe uma cultura melhor do que uma outra
porque não existe uma cultura absoluta. Uma
cultura só pode ser verdadeira para mim (ou para o
grupo ao qual faço parte), porém, ela não é
absoluta porque ela se transforma, varia, no tempo
e no espaço.
Eu posso está sendo autêntico comigo
mesmo ao assumir a minha cultura, porém, a
cultura mesma não é autêntica, ela é transitória.
Ora, se cultura não é autêntica, então, eu não posso
ser autêntico afirmando-a categoricamente. Posso
pensar que sou autêntico, mas estarei apenas
sendo ingênuo. Na verdade, eu não estarei sendo
autêntico, mas alienado. Ao assumir a minha
cultura como absoluta, ou automaticamente excluo
todas as demais culturas, ou acho a minha superior.
Eu só posso ser autêntico no EU. No EU, eu me
torno universal, transcendo tempo e espaço, rompo
limites. No EU todas as culturas se encontram, se
fundem.
No EU não se precisa encontrar justiça
porque ele é a própria justiça. No EU não se precisa
procurar a verdade porque ele é a própria verdade.
No EU não se precisa de nada porque ele é tudo.
No EU todas as dúvidas desaparecem. No EU todos
os problemas são resolvidos. No EU toda justiça é
realizada. No movimento não pode existir justiça
porque no movimento sempre haverá diferenças. O
EU é o próprio conhecimento, aquele que precisa
ser conhecido. O conhecimento não pode ser
construído porque ele, sendo conhecimento, não
pode variar.
História não é conhecimento. História é
informação, jornalismo. Jornalismo não é a
verdade. Jornalismo é fato.
Podemos dizer que os fatos são atualidades,
mas não são realidades. Entretanto, um fato não
precisa ser real para existir. Um fato é uma
realidade provisória, transitória e, portanto, não
pode ser e não é uma realidade absoluta. Dele não
podemos afirmar nada.
A história só existe no conflito. A história só
existe no movimento. O movimento só ocorre no
conflito (entre o ser e o não-ser, entre a presença e
a ausência). Na harmonia, na unidade do EU, a
história cessa, desaparece, Enquanto houver
história não haverá justiça. Só pode existir justiça
no EU. Se procuramos justiça, então, devemos
procurar primeiro o EU. Sem o EU não existirá
estabilidade em nada.
O problema do bem e do mal aparece aqui.
O bem é a presença e o mal é a ausência. Não
existe virtude fora do EU. Fora do EU sempre
existirá ausência e, se existe ausência, existe desejo.
Se existe desejo, existe movimento. Se existe
movimento, existe conflito. Se existe conflito,
existem insatisfação, infelicidade e o mal. Fora do
EU tudo estar desvirtuado. O mal, portanto, é
ignorância.
Existência é vivência? Uma vivência só existe
relativamente. Então, uma vivência só é existência
relativamente. Só existimos enquanto vivemos ou
só vivemos enquanto existimos? Existimos
enquanto vivemos ou vivemos enquanto existimos?
Há existência absoluta?
Suponhamos que alguém nasça cego e
surdo. Este alguém não tem consciência? Este
alguém não existe (não só para nós) para ele
mesmo? Alguém que tenha nascido assim não vai
ter vivências (ou as terá minimamente), mas existe.
A consciência, de alguém assim, vai variar muito
pouco. Suas emoções serão mínimas ou nenhuma
e, portanto, o nível de evolução deste alguém será
mínimo ou nenhum. Assim, conseguimos
compreender o papel da vivência para o processo
evolutivo. Entretanto, este alguém existirá, e mais:
existirá para si mesmo, apresentará
autoconsciência. Contudo, este alguém ainda
saberá que está no mundo, que está manifesto,
pois, ainda tem os sentidos do tato, paladar e
olfato.
Mas, imaginemos alguém que tenha nascido
sem nenhum sentido. Este alguém não tem
consciência ou não tem apenas consciência
objetiva? Seja em que nível for, este alguém, para
viver, precisa ter consciência. Não existe vida sem
consciência. Este alguém saberá que existe, embora
não saiba que vive na matéria, pois, tendo
consciência e sendo humano, necessariamente tem
que ter autoconsciência. Este alguém perceberá a si
mesmo e nada mais. A autoconsciência, enquanto
não está completamente realizada no EU, precisa se
manifestar e sofrer variações (vivenciar) para poder
evoluir para o todo, para poder apreender o todo,
o EU, completa e definitivamente. A
autoconsciência, num certo nível, ainda sofre
variação (existe presença e ausência nela).
Não podemos imaginar uma causa sem
efeito e não podemos imaginar um efeito sem uma
causa. Podemos ter dúvida se uma causa provocará
um efeito, mas esta dúvida não é uma verdade, um
conhecimento de fato. A dúvida é a ausência do
conhecimento, isto é óbvio. A dúvida está no
mundo da probabilidade, do talvez, do
possivelmente, mas não é uma ciência, não é
irrefutável. A dúvida sempre será uma incerteza. A
dúvida não pode ser a base de nada porque a
dúvida é nada.
A dúvida está no movimento. A dúvida é
sempre temporária. A dúvida não pode ser a base
de uma certeza (a certeza da dúvida), justamente
porque é uma dúvida. A dúvida tem um valor
incontestável: a busca da certeza, da verdade. É
necessário haver a consciência da dúvida para
existir o movimento até a certeza. A dúvida
incomoda, provoca, mobiliza. Mas, a dúvida em si
mesma não pode servir de fim. Criar uma filosofia
da dúvida é pôr em dúvida esta mesma filosofia. A
dúvida só estar nos sentidos. Posso duvidar do que
vejo, mas não duvido do que conheço e, nem tudo
que conheço, conheço porque vejo. O
conhecimento não pode vir só dos sentidos. Ao
contrário, às vezes, os sentidos podem nos dar um
conhecimento falso, uma ilusão.
Então, como podemos ter uma certeza a
respeito das coisas? Só podemos ter certeza no EU,
naquilo que não varia, na razão. O conhecimento
não pode vir das emoções. Ora sinto uma coisa
assim, ora sinto-a assado. Na emoção, no
movimento, algo pode “parecer” assim ou assado.
Nem tudo, o que sinto, é verdadeiro.
Todo movimento é gerado por uma causa.
Toda causa gera um efeito. Todo efeito tem uma
causa. Toda ação é efeito de uma vontade, de um
desejo. Todo desejo é uma ausência. Assim, o
provocador de uma ação é a ausência. Estas são as
leis que regem o movimento. O movimento se
movimenta na lei. Entretanto, as leis são estáticas.
As leis não se movem. O movimento se movimenta
no estático. Se uma suposta lei se move, então, não
é uma lei. A consciência se movimenta no EU. O
relativo se move no absoluto sem alterá-lo porque
o relativo é só aparência. Toda ação resulta numa
reação equivalente à força aplicada na ação. O
movimento, portanto, define a reação e o
movimento é definido pela força. Só podemos
mudar um resultado mudando um movimento, ou
a força e direção deste. Uma vez posto um
movimento em ação não podemos mudar o seu
resultado. Temos que esperar a conclusão de um
movimento para iniciarmos um outro na direção
que desejamos. A ação do movimento é feita pelo
pensamento. O pensamento é a força criadora. A
ação é o movimento e a reação é a direção do
pensamento. O pensamento é uma interferência no
estático. O pensamento é a própria ação.
Não pode haver ação se não houver
pensamento. Não pode haver pensamento se não
houver movimento. Não pode haver movimento se
não houver desejo. Não pode haver desejo se não
houver consciência. Não pode haver consciência se
não houver percepção. Não pode haver percepção
se não houver a dualidade ser (presença) e não-ser
(ausência). Não pode haver ausência se não houver
presença. Não pode haver presença se não houver
o estático, o que não se movimenta: o EU.
As leis universais estão no próprio
movimento. Se um movimento se move assim,
assim será um resultado. Se um movimento se
move assado, assado será um resultado. Toda ação
(movimento) produzirá uma reação de acordo com
o movimento que foi posto em ação. O movimento
se movimenta dentro de sua própria lei. Nenhum
movimento pode ser infinito porque ele precisa
causar um efeito. Se um movimento não causa
reação não é movimento. Todo movimento tem
fim, porque se ele não tivesse fim a consciência não
perceberia a sua existência e, assim, ele não existiria
porque um movimento só pode existir na
consciência. Consequentemente, as leis só existem
na consciência, porque é só para a consciência que
elas precisam existir. Elas só precisam existir no que
se move e não no que está parado. Se não
houvesse leis no que se movimenta, nenhum
movimento se repetiria e, assim, não haveria
manifestação possível, pois, nada poderia ser
construído, edificado, materializado.
O que está parado não necessita de lei
porque nada nele está sendo alterado. Para algo
ser alterado necessita de princípios para a sua
modificação, caso contrário, não teríamos ciência
possível em relação a nada. E, se existe ciência,
então, existem princípios e leis. O pensamento só é
possível ser ordenado se houver princípios e leis,
caso contrário, tudo seria um caos, uma
impossibilidade.
No caos nem a superstição, nem a ilógica
seriam possíveis, porque para existir a ilógica é
necessário existir a lógica e, existindo a lógica,
existe razão. Mas, como podemos ter uma lógica
absoluta? Existe lógica absoluta? Tem que existir
uma lógica absoluta de onde derivam todas as
demais (as lógicas relativas, as lógicas falsas,
aparentes). Se não existisse uma lógica absoluta
não haveria leis. Como podemos obter uma lógica
absoluta? Só podemos ter uma lógica absoluta
naquilo que é absoluto. Só podemos ter uma lógica
absoluta no EU. Sem o EU só teremos lógicas
relativas. A verdade só pode ser absoluta. Se uma
verdade é relativa ela é uma meia-verdade e
também uma meia-mentira.
A lógica está no movimento. Ou seja, todo
movimento leva à lógica. O que nem sempre é
lógico é a interpretação do movimento. O
movimento está na lógica porque o movimento se
faz na lei. A lógica está no movimento sem se
mover.
O movimento está na lei, se move na lei. O
pensamento se move na lei. O pensar pode ser
ilógico, a mente não. O pensar pode ser ilógico
porque o pensar é um ato, uma ação e, assim, é
dual, negativo (ausência) e positivo (presença). O
pensamento se move no tempo. A lei única do
movimento é a lei de causa e efeito. O fato é que a
lógica, sendo linear ou não, é a ferramenta que
abre a consciência para o EU, bem como toda
superstição (toda ilógica) afasta a consciência do
EU.
A intuição é o conhecimento sendo revelado
instantaneamente na consciência. A intuição é o
conhecimento se abrindo na mente. E, o
conhecimento não é construído pela mente. A
mente é que vai se abrindo para o conhecimento. É
como se, de repente, a consciência passasse a
perceber coisas que não estava percebendo,
embora estivessem em sua frente, fossem óbvias. A
conseqüência do estímulo da intuição é a
iluminação. Na iluminação toda compreensão se
abre diante da consciência. A iluminação é a
plenitude do EU na consciência.
A contemplação é a apreensão do EU no
exterior. A meditação é a apreensão do EU no
interior. Porém, como verdadeiramente não
existem o exterior e o interior no EU, a
contemplação e a meditação terminam fundindo
estas aparências numa única realidade: a presença.
A apreensão da unidade brota da unificação (ou
eliminação) de todos os espaços (exterior e
interior). A partir daí, não existirá eu e o outro, eu e
as coisas, minha pátria e a sua pátria, minha época
e a sua época etc. A partir daí, só existirá um único
EU, pois o EU é único. Se existe um “eu”,
exclusivamente, separadamente, então, este “eu”
não é o EU, mas um fantasma, uma ilusão do
movimento, da aparência.
Onde há defeitos não há virtudes. Onde há
virtudes não há defeitos. O mal só existe porque
não existe o bem. O mal não tem uma existência
absoluta. Ele só existe na ausência do bem.
Existindo o bem, o mal é completamente
eliminado. E, se o bem só existe no conhecimento,
então, é só através do conhecimento é que o
vamos obter e só vamos obter conhecimento no
EU.
Não existe virtude fora do EU. Fora do EU
sempre existirá ausência e, se existe ausência, existe
desejo. Se existe desejo, existe movimento. Se
existe movimento, existe conflito. Se existe conflito,
existem insatisfação, infelicidade e o mal. Fora do
EU tudo está desvirtuado. O mal, portanto, é
ignorância.
Se a ignorância obscurece a verdade da
existência do EU, não o anula. Ele existe, quer
saibamos disto ou não. Ele é eterno, quer saibamos
disto ou não. Ou seja, existimos eternamente,
porque se existe um EU que não varia no tempo e
no espaço, então, o EU é eterno e se o EU é eterno,
somos eternos no EU. Assim, antes de tudo, é
preciso aprendermos a olhar para nós mesmos,
pois, é ali, dentro de nós, que o EU habita
eternamente e onde nos faremos eternos.
Recife, maio de 2002