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Cognição Musical
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1IMAGINRIO
A experincia da msica e as escutas contemporneas
Rodrigo Fonseca e Rodrigues/Faculdade Metropolitana de BH
E.mail: [email protected]
Resumo:
Este artigo prope uma reflexo sobre a dimenso da
experincia da escuta contempornea, buscando examinar os
seus estatutos a partir dos escopos que a mdia, a tecnologia
e a cultura operam mutuamente na construo perceptiva da
nossa experincia snica e vice-versa. Presidem ento a esta
anlise tanto a ateno acerca da dimenso cultural como
sobre a perceptual da experincia esttica no campo sonoro.
Os principais tpicos de abordagem consistem na observao de
pontos de partida perceptuais nos quais o ouvinte
hipoteticamente se apia para realizar sua experincia
habitual com a msica e, a seguir, considerar o pensamento de
autores como John Cage, Pierre Schaeffer, Steve Reich, Brian
Eno e Slvio Ferraz acerca das modalidades de escuta
contempornea.
Abstract:
The purpose of this article is a reflection about the
contemporary listening and its dimensions of experience,
attempting to examinate their status starting from the points
of views that media, technology and culture impose to the
2perceptual construction of our sonic experience and vice
versa. Leading this analysis are the atenction over both the
cultural and the perceptual dimensions of the aesthetic
experience into the sound field. The main topics of aproach
launch to show the perceptuals starting points wich the
listener stand for reach their habitual experience with the
music and then regard the ideas of authors like John Cage,
Pierre Schaeffer, Steve Reich, Brian Eno and Slvio Ferraz
according to the contemporary listening modalities.
Palavras-chave: mediao tecnologia cultura msica
contempornea experincia esttica
Nesses vinte e cinco sculos, de Plato a John Cage, as
reflexes acerca das instncias do belo e da arte musical
transitaram entre mltiplos horizontes de investigao,
marcados tambm pela submisso s diversas escolas de
pensamento: da "msica das esferas" arte da sensualidade e
da indisciplina, do culto ao hedonismo ao rigor do juzo
crtico, da imanncia transcendncia, do fetiche utopia,
das rgidas estruturas sistmicas s probabilidades
informacionais. Transitaram pelas esferas do trgico e do
pattico, do apolneo e do dionisaco, do ethos e da
metafsica, pela pesquisa sistematizada do seu
desenvolvimento gramatical e pela ateno, esta mais recente,
3sobre as dimenses do seu reconhecimento e das suas
modalidades de recepo.
A reflexo que este artigo prope a de atualizar a
discusso a respeito da experincia contempornea da msica,
em suas diversas modalidades alternativas de inveno e
escuta. Para um melhor acompanhamento do seu desenho,
importante apontar as principais balizas que o orientam, como
a compreenso das nossas potencialidades da percepo sonora
e dos condicionamentos e conotaes culturais relacionados na
escuta. Tal abordagem visa a demonstrar como a anlise da
apreenso musical contempornea merece ser repensada, para se
entender a experincia sonora como parte do descortinar de
novas dimenses comunicativas que ampliam as nossas
prerrogativas de escuta.
Sabemos o quanto a gravao, a reproduo e a difuso
meditica da msica expandiram as oportunidades para a sua
fruio, mas tambm as dessacralizaram como formas de
contemplao tradicionais. Tambm passamos a experienciar uma
audio desritualizada, desprendida dos espaos de
confinamento fruitivo, pagando com a disperso da conscincia
diante da massiva afluncia sonora. Podemos ouvir, como e
quando quisermos, uma mesma pea musical, milhares de vezes e
4tambm acionamos ou interrompemos, com um simples zapping,
qualquer execuo sonora, bem como podemos fazer outras
tarefas cotidianas enquanto escutamos msica: durante as
leituras, enquanto trabalhamos no computador ou navegamos na
rede, nos momentos de introspeco, no carro, em avies, nas
salas de espera, elevadores, estaes e supermercados, na
rua, enquanto dormimos, na hora do sexo, do banho, do
passeio, da ginstica, em festas, coquetis, cerimnias
cvicas ou religiosas, boates, festivais, shows, concertos,
bares, etc. A inflao dos signos sonoros e da exposio
excessiva a que somos impingidos, em quaisquer ambientes e
situaes sociais, contribuiu para dissolver o culto e a
demanda ritualizada de concentrao da experincia
tradicional, com o preo da depreciao de seu antigo impacto
"aurtico" sobre a percepo.
Em tais contextos, parece haver elementos decisrios
especficos recorrentes nas formas contemporneas de pensar,
realizar, compartilhar e ouvir msica, num tecido plural de
relaes que se influenciam mutuamente. Os princpios de tal
experincia sonora advm de: 1)condies mediatizadas nos
circuitos de bens de consumo musicais; 2)recursos
tecnolgicos que propulsionam novos meios de se gerar a
matria sonora e forjarem da novos materiais expressivos;
53)diferentes potencialidades de escuta estimuladas pelas
novas formas de acesso musical; 4)posturas estticas que, ao
possibilitar alternativas para a experincia sonora, fazem
emergir um novo tipo de ouvinte mais atento a tais
procedimentos poticos; 5)uma escuta que fomenta a potica
dos artistas envolvidos com as prticas criativas renovadas.
Em meio a tantas expectativas difusas nas quais
mergulham os ouvintes contemporneos, consideramos,
doravante, os estatutos de conotao cultural que
condicionaram a escuta a uma atividade repertoriada, bem como
as alternativas para ultrapass-la, apontadas por John Cage.
Mais frente, abordamos as propostas de uma escuta concreta,
no-abstrata, por Pierre Schaeffer, defensor da escuta
"acusmtica" para se descondicionarem os sons das suas
conotaes simblicas. Passamos a apresentar, em seguida, as
prerrogativas da escuta minimalista de Steve Reich para
estimular a percepo sobre as nuanas materiais do som,
seguidas pelo pensamento de Brian Eno a respeito das
modalidades da escuta propulsionadas pela ambient music e
apresentamos as alternativas para uma escuta textural e
heterognea, advogada por Slvio Ferraz. Antes, porm,
importante salientar alguns aspectos culturais que modelam a
6atividade e as expectativas relacionadas com a experincia
perceptual da msica ocidental.
A importncia que atribumos a atitudes e reflexes
desconstrutoras enunciadas pelo poeta dos sons que foi John
Cage, a partir de seus textos e da sua primeira pea
eletroacstica (Imaginary Landscapes), criada em 1939,
resulta do fato de ele pressentir, assim como outros jovens
artistas, as obscuridades ontolgicas em que se viciara a
cultura artstica da chamada civilizao ocidental. H, na
seguinte afirmao de Cage, mais do que um dos muitos chistes
bem-humorados do polmico compositor americano:
"Eu aprendi que os intervalos possuem significados, que eles no so propriamente
sons, mas implicam suas progresses um som no realmente apresentado aos
ouvidos, mas mente. Toda questo aqui muito intelectual: fazer pensar em sons
que no esto propriamente presentes nos ouvidos. A separao entre ouvido e mente
estragou os sons. preciso liberar os sons das idias abstratas sobre eles.1
Na concepo de Cage, tudo atacado, desconstrudo, dos
edifcios ideolgicos armadura sagrada da sintaxe. Ele
reivindicava o fim das premissas culturais do concerto
clssico como um culto ritualstico da experincia esttica e
defendeu, com toda a ironia e bom humor, maior liberdade
7escuta, para que saibamos no apenas ouvir a elite dos sons
musicais, mas tambm apreciar os rudos dirios:
Uma das coisas que sabemos hoje em dia que algo que
acontece pode ser experienciado por meio da tcnica
eletrnica como outra coisa. Por exemplo, a gente
entrando e saindo de elevadores e os elevadores andando
de um andar para outro: essa informao pode ativar
circuitos que levam aos nossos ouvidos uma concatenao
de sons. Talvez voc no concordasse que o que ouviu era
msica. Mas, nesse caso, outra transformao teria
ocorrido: o que voc ouviu levou a sua mente a repetir
definies de arte e msica que se encontram em
dicionrios obsoletos. 2
Cage convocava as pessoas para que ultrapassassem as
molduras culturais para algo mais alm do uso obediente
sintaxe musical. Finalmente, o artista sugere que preciso
urgentemente descondicionar-se da expectativa auditiva
habitual, e estar atento no apenas fraseologia musical
(hierarquia que pressupe sempre algo acabado), mas a toda e
qualquer atividade dos sons.
8Pierre Schaeffer, quando exps a problemtica das
impurezas simblicas que permeiam a escuta da msica
habitual, sugeriu um tipo de escuta acusmtica, proposta
anteriormente por seu colega Franois Bayle. Nesta modalidade
da escuta, um som ouvido sem que se revele a fonte que o
produziu, ou seja, sem qualquer relao do som com o que
visvel, tctil ou mensurvel. A experincia da escuta
acusmtica mostra que grande parte daquilo que acreditamos
estar ouvindo na verdade resultante da experincia visual
associada audio, uma escuta quase automtica na qual a
cadeia de signos disparada pelo objeto sonoro transforma-se
em mensagens complexas. Por esta razo, Schaeffer prope uma
escuta que se atenha unicamente sonoridade mesma.
Tal escuta material do som que visa a bloquear o
conceito e a representao foi expandida pelos compositores
minimalistas nos anos sessenta e setenta, perodo que
redimensionou, para muitos, os pressupostos da escuta
musical. No minimalismo, a escuta no predeterminada com
relao a um conceito fixo, mas sim deixada capacidade das
faculdades perceptivas do ouvinte de descobrir nuanas do som
em si, de localizar pequenos detalhes timbrsticos que se
desprendem do continuum sonoro. A escuta chamada a perceber
as resultantes espectrais, os sons residuais, os batimentos
9harmnicos, as melodias e ritmos parasitas, a repetio nua
da matria e a tatilidade do tempo pulsante. A msica minimal
permite e d tempo ao ouvinte de penetrar no objeto, a fim de
descobrir a diferenciao gradual por acrscimos e subtraes
sutis de elementos.
Ao expor o ouvinte a jogos reiterativos de duraes
extremamente longas aos quais ele no est acostumado, o
minimalismo ignora a presso do tempo e redefine a escuta,
agora acionada na intensidade perceptiva de cada momento. Na
escuta minimal, tanto o conceito quanto a memria parecem
ineficazes em representar todos os seus aspectos e os seus
movimentos texturais. Nesta modalidade da escuta, como afirma
o autor Slvio Ferraz, a memria no chamada a atuar, pois
no se trata de relacionar um elemento a outro, mas sim de
descobrir e deixar-se levar pela diversidade material que
gerada pela reiterao de padres sonoros, no abarcvel pela
representao. 3
O minimalismo contm elementos estticos que o ouvinte
no notaria, acostumado a esperar pelas mudanas e pelo drama
musical. Mas, apesar do material ser aparentemente limitado,
o montante de atividade acionada impulsiona o ouvinte para
uma situao perceptiva complexa. O princpio da reiterao
10
do material sonoro desobriga a memria de vasculhar no
passado prximo, procura dos elementos formais de
construo de um sentido musical. No processo da escuta
minimal somos motivados a ativar as micropercepes presentes
numa escuta intensiva. Focaliza-se a matria sonora, nas
alternativas formais de sua exposio, nas suas diferentes
paradas e comeos, uma vez que a reiterao e o fluxo so
dirigidos a um foco constante, na escuta das fases que
emergem, de modos diferentes, a cada ciclo.
Uma outra possibilidade de experincia sonora
anteriormente concebida pelas poticas de Erik Satie e John
Cage aperfeioada por Brian Eno na sua ambient music. De
fato, Eno comeara a perceber que a partir dos contextos
espao-temporais da escuta cotidiana, a centenria tecnologia
voltada para a produo e reproduo musical permitia
continuamente a criao de novos ambientes e hbitos de
escuta. Perscrutou o quanto podia uma nova modalidade de se
fazer e apreender msica, relacionando-se com ela como se
estivesse compartilhando o espao com uma espcie de aquarela
acstica ou de escultura snica.
Parece que Eno comeou a perceber as transformaes que
ocorriam nos hbitos auditivos da poca, no apenas no plano
11
tecnolgico dos aparelhos e espaos domsticos de escuta
(como no surgimento do toca-fitas, rdios e toca-discos
portteis), mas tambm nas lojas de discos que proliferavam e
ainda pela penetrao da msica popular norte-americana,
desde os anos cinqenta, no mercado da Inglaterra. O sentido
de estranheza que essa nova msica propiciava vinha
justamente de uma descontextualizao cultural da sua escuta.
Perpassava pelos princpios poticos de Brian Eno o
intento de colorir a atmosfera, rodear o ouvinte, criar um
senso de espacialidade e profundidade que permitisse tambm
ao ouvinte "mover-se" por entre espaos snicos alternativos.
A composio ambient de Eno, alm da construo de atmosferas
criteriosas, permite ser ouvida em diferentes espaos da vida
cotidiana, com diferentes expectativas, tal como antes
comearam a imaginar Satie, Varse e Cage. O princpio da
ambient music visava, em princpio, a redimensionar o espao
e o modo da escuta mediatizada, a fim de permitir ao ouvinte
acoplar a sonoridade como um suplemento ao meio ambiente
ntimo da escuta privada.
Para esse non-musician assumido, ouvir msica algo
como capturar parte de um processo infinito. Por isso ele
concebe a presena dos eventos acsticos como algo que
12
simplesmente flui, um infinito continuum no qual ns entramos
ou o abandonamos. O estatuto da compreenso auditiva sofre
uma mutao, ou seja, outro. E diverso tambm o alcance
da escuta na modulao livre da percepo, entre nuanas,
planos e texturas, espectros snicos e extratos acsticos
permeveis.
A ambient music tambm no exige aquela forma perceptiva
proposta pela teoria da Gestalt, feita de relaes entre
frente e fundo. O ouvinte pode focalizar muitas coisas,
alcanando muito mais do que a representao e a idia
musical. Ele pode perceber a msica sob uma variedade de
perspectivas que revela diferentes estratgias de escuta. O
ambient , de outro ponto de vista, um meio diferente de
explorar, em sua experincia, os aspectos verticais na
composio do som, os seus espectros harmnicos, a sua
qualidade timbrstica. Enquanto que na msica tradicional o
timbre acessrio, na ambient music a sua dimenso
estrutural. As informaes sonoras, tal como se d no
minimalismo, no requerem a aptido da memria treinada e
conotada pela cultura da msica tradicional na tarefa de
enfeixar e apartar lampejos do passado e amarr-los numa
suposta estrutura mais profunda.
13
Novas alternativas para uma escuta contempornea
condizente com as formas de composio engendradas nas
ltimas dcadas foram coerentemente aventadas por Slvio
Ferraz. Atravs do vocabulrio conceitual criado por Gilles
Deleuze, ele d especificidade ao pensamento deleuziano ao
aplicar detidamente o seu funcionamento no plano musical,
quando discute particularmente o conceito de ritornelo. 4
Na concepo de Slvio Ferraz, h trs categorias
aventadas atravs das quais a escuta pode configurar-se: a
gestual, a figural e a textural. O gesto atribui aos sons uma
rede complexa de significados; a figura atua como a escuta
das relaes e funes, fornecendo pontos de referncia para
a memria; e a textura diz respeito s nuanas sonoras
inabarcveis pela memria e pela representao.
A primeira alternativa a escuta que privilegia o
gesto, na qual os sons no so elementos em si, mas sim a sua
traduo, a representao sonora de elementos extramusicais e
afetivos. Ela ocorre quando a experincia perceptiva se
limita a regras determinadas a priori. A segunda categoria da
escuta preestabelece um quadro de smbolos atribudos a cada
textura sonora, o aspecto simblico da msica como funo
estrutural, sejam esses smbolos semnticos ou sintticos. A
14
terceira, informal e no-estrutural, despida de um ponto
fixo ou permanente e concebida como uma mnada indivisvel,
porm heterognea, que se articula nos espaos potenciais do
retorno do diferente, em suas potencialidades rizomticas.
Msico e pesquisador, Slvio Ferraz demonstra, com muita
pertinncia, as dimenses possveis da escuta contempornea e
advoga em causa de uma escuta mltipla a qual rompe com a
estabilidade e o seu confinamento nas formas abstratas e a
qual no se limita apenas a um s plano de escuta. Ferraz
apresenta as formas possveis de sensibilidade perceptiva na
experincia da msica contempornea, ao propor que, para a
realizao de uma escuta correspondente aos modos renovados
de composio, preciso uma multiplicidade de escutas que
aproxime efetivamente as poticas da experincia esttica.
A "escuta textural", para Ferraz, no se refere
escuta restrita ao material ou qualidade do material, mas
ao devir expressivo do material, demarcando o territrio que
a escuta demarca com o seu ritornelo. Tal textura definida
no pela diferena de grau, mas pela diferena de natureza:
ao deslocar um elemento, ao subtrair algo da textura, ela no
se torna uma variao do modelo original, mas simplesmente
muda de natureza, transforma-se noutra textura. 5 Nesse tipo
15
de escuta das nuanas, o que conta no a qualidade sonora
em si, um atributo preestabelecido, mas do devir expressivo
dessa qualidade ao voltar para a escuta sobre a prpria
percepo que realiza o enunciado snico. preciso antes
atentar para a escuta da nuana sonora, das texturas e suas
potencialidades, no se retendo na mera apresentao de um
mero colorido orquestral.
Tal escuta ultra-sensvel das nuanas do espectro sonoro
nutre-se de suas dobras imperceptveis, inabarcveis, dos
espaos surdos e internos do som. Na heterogeneidade que
compe a autopoiesis da escuta textural, instvel e mltipla,
o ouvinte passeia por entre os seus espaos e as suas dobras
irrepetveis. A instabilidade da textura est diretamente
relacionada com a existncia de uma escuta de nuanas, das
dobras das texturas no alcanveis pela abstrao. Enreda-se
uma espcie de rede complexa em que qualquer ponto de
qualquer territrio toca qualquer ponto de qualquer outro
territrio, como num rizoma.
Na escuta textural constituem-se os plats, as
estratificaes de planos de escuta contemporneos, que se
deixam entrecruzar e se permeiam o tempo todo. Trata-se de
uma escuta nmade, que passa incessantemente do detalhe
16
forma geral. ( i ) O ouvinte vagueia livremente entre escutas
texturais, figurais e gestuais, passando por territrios que
so o desdobramento infinitesimal de outros territrios, numa
intensa atividade de ligar e desligar elementos ou partculas
sonoras. Acorrem, nessa modalidade auditiva, a ressonncia,
os graus de conectividade, os pontos instveis de referncia,
a trama inidentificvel de pontos de origem, as linhas de
fuga e as mltiplas possibilidades de conexes. 6
Para Ferraz, mesmo que a multiplicidade de modos
composicionais do sculo XX no garanta uma multiplicidade de
escutas correspondentes, possvel encontrar, atravs da
compossibilidade dos modos de escuta heterogneos, infinitas
linhas escapatrias at mesmo em meio aos enunciados sonoros
j capturados pelo hbito.
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4 O ritornelo, segundo a leitura de Ferraz sobre o pensamento de Deleuze, esse movimento de territorializao realizado por matrias de expresso numdeterminado sistema, num movimento incessante e irreversvel deterritorializao, desterritorializao e reteritorializao.Um exemplo deritornelo, no campo da escuta o da vibrao que se transforma em devir-outro da sensao de vibrao at ao ponto em que o objeto se faa nopensamento como som. O ritornelo da vibrao demarca o territrio do som.A vibrao cria outro territrio ao moldar o ouvido interno e externo eencontra outro territrio no pensamento, na forma de conceitos, perceptos eafectos. Quanto ao ritornelo da escuta musical, msicas diferentes participamna configurao de escutas diferentes e escutas diferentes incidem naconfigurao de novas musicalidades. FERRAZ, Slvio. Msica e Repetio.1996, p. 154
5 Por textura podemos entender ainda a sensao produzida pelaconfigurao e pelo dinamismo dos elementos presentes num determinadofluxo sonoro. Pode ser vista como o primeiro elemento da percepo musicale, por conseguinte, o ltimo: o resultado da sobreposio de elementos numacomposio. Tal qual a cor e a temperatura, a textura intensiva, no h comosubtrair ou dividir uma textura sem que ela mude de natureza. FERRAZ,Slvio. Msica e Repetio. 1996, p. 166
6 O ouvinte no apenas ouve um complexo sonoro, mas se torna partcula dotecido sonoro: digamos que o sujeito se transfigura passo a passo com o som,para praticamente percorrer os entremeios desse som. FERRAZ, Slvio.Msica e Repetio. 1996, p. 153
7 O compositor Xenakis j dizia que a escuta humana no-linear, uma escutahors-temps: a escuta, para ele, se funda na memria, na coexistncia dosfragmentos disparatados que no so contemporneos do ato de percepo.Por isso Xenakis prope abrir espao para uma composio que ponha emjogo justamente a desordem e a no-linearidade da percepo humana.Cf.FERRAZ, Slvio. Msica e Repetio. 1996, p. 69
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