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Tiago Manuel Aguilar dos Santos
A Favor da Inclusão da Comunidade Cigana. Uma Experiência de Implementação Das TIC no Ensino Básico
setembro, 2013
Relatório de Estágio de Mestrado na Área Científica de Sociologia,
orientado pela Professora Doutora Sílvia Portugal e apresentado à
Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra
Tiago Manuel Aguilar dos Santos
A Favor da Inclusão da Comunidade Cigana. Uma Experiência
de Implementação Das TIC no Ensino Básico
Relatório de Estágio de Mestrado na Área Científica de Sociologia, orientado
pela Professora Doutora Sílvia Portugal e apresentado à Faculdade de
Economia da Universidade de Coimbra
setembro, 2013
Agradecimentos
Embora este relatório, como trabalho académico que é, seja um processo individual,
existem alguns contributos que não posso deixar de referir. Deste modo, quero deixar
os mais sinceros agradecimentos:
Ao meu local de estágio, o Projeto Trampolim em nome da minha orientadora local
Carla Mendes bem como toda a equipa do Trampolim, Francisco Vieira, Andreia
Couceiro, Hugo Cortez, Dóra Kenez, Joana Ferrão, Débora Sousa, o meu muito
obrigado por todos os momentos de aprendizagem e amizade que me proporcionaram
e por me terem feito sentir, sempre, parte da equipa.
Um muito obrigado a todos os participantes do Trampolim que sempre me trataram
com simpatia e respeito salientando os “miúdos” Vasco e Ismael pela sempre
contagiante alegria e boa disposição e por me terem marcado, particularmente a nível
pessoal.
À minha Orientadora Cientifica, a Doutora Sílvia Portugal, o meu enorme obrigado por
toda a ajuda, dedicação, compreensão e principalmente, amizade. Obrigado por me
ter estimulado continuamente durante a realização deste relatório, impondo-me uma
exigência cada vez maior à medida que me aproximava do fim.
Aos alunos, professores e funcionários da escola EB1 do Ingote, obrigado pela
simpatia demonstrada e por terem sido fundamentais na minha integração.
Como este é o culminar de um longo trajeto académico, tenho, também, que
agradecer a todos os que me acompanharam e partilharam os bons e maus momentos
académicos e pessoais. Assim o meu muito obrigado à Natália Silva, Luísa Pereira,
José Valentim, Sara Félix, Liliana Rodrigues, João Rocha, Filipe Alves, Andreia
Barbas, Cláudia Sabença, Elzo Paul e Alexandre Miguel.
Aos meus amigos e companheiros de vida, aos melhores amigos do mundo, Mariana
Póvoa, Henrique Santos, Manuel Coroa, Frederico Dias, João Balsa, Lara Borges,
João Manata, Manuel Fonseca, Tiago Agostinho e a todos os outros, o meu obrigado
por me ensinarem o significado da palavra amizade e serão sempre, para mim, uma
fonte de orgulho e inspiração.
Aos meus amigos do “Ninho”, Mariana Monte, André Almeida, Raquel Ferreira, Ana
Rita Rodrigues, o meu obrigado pelos excelentes momentos passados, pelas risadas,
pelo apoio e amizade em todos os momentos importantes da minha vida.
À Sylvie, por todo o amor e carinho dado ao longo destes anos, por toda a paciência,
amizade, por sempre me ter feito acreditar em mim, pelas palavras certas nas alturas
difíceis, por ser o meu suporte quando mais preciso, o meu muito obrigado. É ótimo
ter-te ao meu lado.
Por fim, um enorme obrigado aos meus Pais e irmão por terem feito tudo para apostar
na minha formação, por sempre me terem apoiado em todas as minhas decisões e por
todo o carinho dado.
Resumo
Este relatório resulta do estágio curricular realizado no Projeto Trampolim, nos
Bairros da Rosa e do Ingote em Coimbra. O Projeto Trampolim tem como objetivo
central a proteção e inclusão de crianças e jovens dos bairros municipais da Rosa e
do Ingote, e do Centro de Estágio Habitacional (Parque Nómada), através da
promoção do sucesso escolar, da integração profissional, da participação cívica e na
capacitação dos jovens. O relatório aborda algumas das problemáticas que
enquadram a realização do estágio, discutindo, fundamentalmente, a questão da
exclusão social nas comunidades ciganas e as potencialidades da introdução das TIC
no sistema educativo para a inclusão das crianças e jovens destas comunidades.
Partindo desta reflexão, o texto apresenta, também, uma descrição das atividades
desenvolvidas durante o estágio, centrando-se na minha tarefa principal no Projeto,
que envolveu uma experiência de trabalho com as TIC no ensino básico.
Palavras-chave: Comunidade Cigana, Etnia, Etnicidade, Representações
Sociais, Exclusão Social, Ensino, TIC, Inclusão Digital
Abstract
This report follows on from the curricular internship I’ve done on Projeto Trampolim, in
the neighborhoods of Rose and Ingote in Coimbra. Projeto Trampolim have as its
central objetive the protection and inclusion of children and young people of the
municipal districts of the Rose and Ingote, and Center Stage Housing (Nomad Park),
by promoting academic success, professional integration, civic participation and youth
empowerment. The report discusses some of the issues that surround the
implementation stage discussing, fundamentally, the issue of social exclusion in gipsy
communities and the potential of the introduction of ICT in the education system for
the inclusion of children and young people from these communities. From this
reflection, the text also presents a description of the activities undertaken during the
stage, focusing on my main task in the project, which involved an experience of work
with ICT in basic education.
Keywords: Gypsy Community, Ethnic ity, Race, Social Representations,
Social Exclusion, Education, ICT, Digital Inclusion
Índice
Introdução...................................................................................................................... 6
Capítulo 1| A comunidade Cigana em Portugal ............................................................ 9
1.1-Breve História ..................................................................................................... 9
1.2-Etnicidade e Cultura .......................................................................................... 12
1.3-Comunidade Cigana e Políticas Sociais ............................................................ 15
Capítulo 2 | Exclusão Social e Educação .................................................................... 21
2.1-Exclusão Social ................................................................................................. 21
2.2- Educação e Inclusão ......................................................................................... 25
Capítulo 3| O Estágio .................................................................................................. 32
3.1-O Local: Bairros da Rosa e do Ingote ............................................................... 32
3.2- O Enquadramento Institucional........................................................................ 33
3.2.1- Programa Escolhas............................................................................................ 33
3.2.2- Projeto Trampolim............................................................................................ 35
3.3-O Tema .............................................................................................................. 35
3.3.1- As TIC .............................................................................................................. 36
3.3.2- Inclusão Digital................................................................................................. 39
3.4- Atividades Desenvolvidas ................................................................................ 40
3.4.1- Elaboração e Aplicação de Questionários ........................................................ 41
3.4.2- Cid Livre ........................................................................................................... 48
3.4.3- Apoio às Famílias ............................................................................................. 48
3.4.4- Exposição Fotográfica ...................................................................................... 49
3.4.5- Acompanhamento Semanal aos Alunos da EB 1 Ingote .................................. 49
Conclusão .................................................................................................................... 52
Referências Bibliográficas ...................................................................................... 55
Anexos .......................................................................................................................... 60
Introdução
Introdução
Tiago Santos 7
O presente relatório foi desenvolvido no âmbito das atividades de estágio
realizadas no Projeto Trampolim no seguimento do estágio curricular do 2º ano de
Mestrado em Sociologia. O estágio teve como orientadora local a Drª Carla Mendes e
como orientadora científica a Professora Doutora Sílvia Portugal.
O propósito maior dos estágios curriculares, para além de contribuírem para a
nossa aprendizagem, reside num primeiro contato com o mercado de trabalho, através
do qual podemos retirar várias experiências, aumentar o conhecimento em diversos
campos e desenvolver uma componente social importante para o nosso
desenvolvimento pessoal que nos ajudará, certamente, na nossa próxima etapa.
O estágio no Projeto Trampolim possibilitou-me experiências pessoais,
académicas e profissionais, das quais este relatório pretende dar conta. Através do
estágio curricular pude perceber, por dentro, como funciona um projeto deste tipo e
como é dinamizada a intervenção social numa comunidade. Com esta primeira
experiência profissional, aprendi que, como profissionais no terreno, temos de ter uma
enorme flexibilidade e capacidade de adaptação a novas situações. A área das
ciências sociais forma-nos para possuir uma grande abertura e capacidade para
desempenhar várias funções. Esta capacidade de “multitasking” deve ser encarada de
forma a retirar a máxima experiência e aprendizagem de cada situação, pois só assim
podemos evoluir e construir o nosso caminho enquanto profissionais.
O Projeto Trampolim tem como objetivo central a proteção e inclusão de
crianças e jovens dos bairros municipais da Rosa e do Ingote, e do Centro de Estágio
Habitacional (Parque Nómada), através da promoção do sucesso escolar, da
integração profissional, da participação cívica e na capacitação dos jovens. Encontrei
neste Projeto uma equipa multidisciplinar com uma enorme versatilidade e capacidade
de adaptação às necessidades de intervenção. A equipa garante a realização de um
grande número de atividades, diversificadas, e para vários públicos-alvo,
desdobrando-se, assim, os técnicos, em vários papéis. Esta parece-me ser uma
característica essencial para o sucesso do projeto. Também a interação entre a equipa
do Projeto e a comunidade é um fator determinante. Estes traços apresentam-se como
características fundamentais do trabalho desenvolvido, permitindo uma ligação forte
ao meio e uma relação estreita entre o diagnóstico dos problemas e a intervenção. Foi
neste contexto que realizei o estágio e enquadrei a minha atuação, retirando enormes
ensinamentos para uma futura inserção profissional.
O tema principal deste relatório tem como foco as TIC (Tecnolog ias de
Informação e Comunicação) e a sua aplicação no âmbito escolar, como forma de
Introdução
Tiago Santos 8
inclusão social. Estas ferramentas tecnológicas foram implementadas na escola EB 1
do Ingote, onde a maioria dos alunos pertence à comunidade cigana. Deste modo, o
presente relatório centra-se numa discussão sobre as características desta
comunidade e a problemática da exclusão social no seu interior. Tento esclarecer
neste relatório que não se pode falar de comunidade cigana como um todo, mas sim
de comunidades ciganas, que são bastante heterogéneas e encerram em si diferentes
contextos económicos e sociais, que as diferenciam umas das outras. Este relatório é
focado na comunidade cigana do bairro da Rosa e do Ingote e é em torno do trabalho
com esta comunidade que construo a minha reflexão.
O texto do relatório é constituído por três capítulos e uma conclusão. No
primeiro capítulo faço um pequeno percurso pela história da comunidade cigana em
Portugal. Discuto, ainda, a questão da etnicidade e da cultura nesta comunidade,
assim como, as políticas sociais que lhe são destinadas. O segundo capítulo trata os
fenómenos de exclusão social que atingem esta comunidade, tentando esclarecer
como o ensino, local de interação multicultural, pode ser utilizado como forma de
inclusão.
O terceiro capítulo centra-se nas atividades do estágio, fazendo uma descrição,
quer do seu enquadramento geográfico, social e institucional, quer das tarefas
desenvolvidas. É também neste capítulo que o tema principal do trabalho é abordado,
discutindo o modo com as TIC podem contribuir para a inclusão digital e o sucesso
escolar. Neste sentido, o capítulo dá especial destaque à atividade principal de
acompanhamento semanal dos alunos da EB 1 do Ingote.
Finalmente, termino o texto do relatório com uma conclusão, na qual apresento
um balanço do estágio em função dos objetivos propostos e das problemáticas
discutidas.
Capítulo 1| A Comunidade Cigana em Portugal
Tiago Santos
9
Capítulo 1| A comunidade Cigana em Portugal
1.1-Breve História
De acordo com Cortesão et al (2005: 17) “se realizarmos uma análise sócio-
histórica acerca da permanência dos ciganos em Portugal, veremos que essa história
é feita de lutas, conflitos e persistências, reveladoras das representações sociais
negativas da sociedade maioritária em relação a este povo.”
Tendo em conta informação da Estratégia Nacional para Integração das
Comunidades Ciganas1 estima-se que o povo cigano está presente no nosso país há
cerca de 500 anos. Provenientes do Nordeste da Índia, atravessaram vários países e
no decorrer desses fluxos migratórios, vários grupos se fixaram em determinados
países enquanto outros seguiam e procuravam novos destinos. Desta forma, estes
grupos foram influenciados em termos culturais e linguísticos de forma diferente,
dependendo do local onde se fixaram originando, assim, grupos diferentes mas que
mantinham “raízes comuns”. “Este facto faz do povo cigano um conjunto
heterogéneo, dentro das suas semelhanças.” (ENICC, 2013: 3).
Os ciganos entraram em Portugal na segunda metade do século XVI (Costa
apud Cortesão et al, 2005). A primeira referência documental sobre a entrada de
ciganos no nosso país, data de 1510. Em 1521 aparece nova referência e logo a
partir desta data começam as primeiras queixas populares contra este povo. Pouco
tempo demorou até ter sido decretada, em 1526, a mando de D.João III, a expulsão
dos ciganos que se encontravam no nosso território bem como a proibição da sua
entrada Cortesão et al (2005). Desde que os ciganos entraram no nosso país que
“temos assistido a tentativas continuadas de exclusão deste povo pela população portuguesa,
evidenciada pela constante legislação produzida neste domínio ao longo dos séculos pelos governantes
portugueses” (Costa apud Cortesão et al, 2005: 17).
Esta fonte identifica algumas leis que, ao longo da história, foram elaboradas
para reprimir e excluir os ciganos. A Lei de 14 de março de 1573 ditou a renovação,
por parte de D. Sebastião, da política de expulsão, instituindo um prazo de trinta dias
para a saída dos ciganos do nosso território. Já no tempo de Filipe I, a perseguição a
este povo agravou-se naquela que ficou conhecida como Lei de 28 de agosto. Aos
ciganos que se encontravam em Portugal, era dado um prazo de quatro meses para
abandonarem o país, sob pena de serem condenados à morte aqueles que não a
1 Resolução do Conselho de Ministros nº25/2013.
Capítulo 1| A Comunidade Cigana em Portugal
Tiago Santos
10
cumprissem. Como indica Albertino Calamalote (2008: 13), “pretendeu-se limpar o reino
dessa gente, expulsando-a, prendendo-a, embarcando-a para as conquistas, ao invés de promover a
sua integração no seio da sociedade portuguesa .”
No alvará de 15 de julho de 1686, houve uma ligeira alteração em termos de
políticas sociais tendo sido decretada a expulsão “dos ciganos «de fora», mas
procurando «recuperar» os que «já são naturais, filhos e netos de portugueses»,
desde que tomem «domicílio certo», se vistam e falem como os portugueses e se
dediquem a «atividades honestas».” (Costa apud Cortesão et al, 2005: 17). Segundo
Cortesão et al (2005: 17) foi neste período que se assistiu à “primeira tentativa
legislativa de assimilação dos ciganos aos costumes e cultura portugueses.” Esta
situação é transformada com a Revolução Liberal que, através da Constituição de
1822 e da Carta Constitucional de 1826, elimina oficialmente as desigualdades em
função da categorização em raças e reconhece a cidadania portuguesa a todos os
nascidos em território nacional (Costa apud Cortesão et al, 2005). “Só passados quase
quatro séculos após a sua entrada em Portugal, a Constituição de 1822 atribui a cidadania portuguesa
às ciganas e aos ciganos, que são reconhecidos/as como portugueses e portuguesa s de pleno direito.”
(ENIC: 3)
Isto não significava, no entanto, que o povo cigano tinha deixado de ser
vigiado. Com a Portaria de 10 de abril de 1848, confirmada mais tarde pelo
Regulamento da Guarda Nacional Republicana de 1920, os ciganos começaram a ser
alvo de “vigilância especial” por parte das forças policiais que tinham ordens para
executar “uma «severa vigilância» sobre os ciganos em ordem à prevenção e
repressão dos «seus frequentes atos de pilhagem»” (Costa apud Cortesão et al,
2005: 18).
Importa também perceber as representações sociais sobre a comunidade
cigana. Esta era muitas vezes vista como participante em atividades marginais e
preocupava a autoridade real até ao ponto da criação de leis tão duras como aquelas
que tivemos oportunidade de ver. Os ciganos viviam em ranchos e quadrilhas que
assaltavam e roubavam. Esta era a queixa mais frequente e talvez a mais importante.
Outra acusação importante era o fato de estes não terem trabalho e só se dedicarem
a feitiçarias, embustes, práticas de adivinhação e negociatas (Calamalote, 2008).
Este contexto histórico ajuda-nos a perceber muitos dos problemas
vivenciados por esta comunidade, hoje. A comunidade cigana ainda é vista com
estranheza e conotada como diferente. Mantém uma identidade e cultura próprias
distantes da sociedade maioritária. Neste sentido, esta comunidade ainda vive uma
Capítulo 1| A Comunidade Cigana em Portugal
Tiago Santos
11
realidade que pode ser traduzida por uma forte discriminação e exclusão social. É
muitas vezes vítima de racismo e preconceito. Vive em condições muito precárias de
habitação, existe uma elevada taxa de absentismo escolar e profissional e uma
elevada dificuldade de acesso a bens e serviços de primeira necessidade (Guia para
a Intervenção com a comunidade nos Serviços de Saúde, 2004). As representações
sociais que se constroem acerca da comunidade cigana continuam a girar em torno
da ideia do envolvimento em atividades ilícitas como o tráfico de droga e o comércio
de mercadoria contrafeita. É este o estigma que continua enraizado na nossa
sociedade, apesar do investimento feito para reduzir os problemas e promover uma
inclusão sustentada desta comunidade. O interesse pela intervenção nesta
comunidade tem sido muito diverso, da academia às instituições religiosas, a
associações da sociedade civil, procurando-se construir novas dinâmicas e novas
relações. A exclusão continua, no entanto, a persistir.
De seguida, discuto alguns conceitos que contribuem para a compreensão da
situação atual da comunidade cigana e enquadram a problemática estudada e vivida
no estágio.
Capítulo 1| A Comunidade Cigana em Portugal
Tiago Santos
12
1.2-Etnicidade e Cultura
As sociedades contemporâneas são pautadas por uma enorme diversidade
cultural coabitando vários grupos estruturalmente diferentes uns dos outros. Esta
mistura de várias culturas na sociedade pode ser geradora de diferenças impostas
pelos grupos maioritários, existindo “dificuldades de aceitação de diferenças” e
“depreciação de culturas minoritárias” (Barbosa apud Caré, 2010: 1). Diferentes
culturas significam novas diferenças. Estas diferenças exprimem novas
manifestações culturais e sociais cujo grau de distanciamento ou proximidade com a
sociedade maioritária dependerá da etnia em causa.
Para Fernando Luís Machado (2002: 29), a etnicidade é definida como “a
relevância que, em certas condições assume, nos planos social, cultural e político, a pertença a
populações étnica ou racialmente diferenciadas. Essa pertença traduz -se e é veiculada por traços como
língua, religião, origem nacional, composição social, padrões de sociabilidade, especificidades
económicas e outras”. De acordo com este autor a etnicidade ganha tanta mais
relevância quanto mais acentuados forem os contrastes entre uma minoria e grupo de
pertença (Machado, 1992). Este autor concebe a etnicidade como um espaço de
“contrastes” e “continuidades” em relação à sociedade maioritária, construído a partir
de dois eixos fundamentais, o social e o cultural. Cada um destes eixos decompõe-se
em três dimensões. Estas condicionam a posição de cada minoria no espaço e a
possibilidade de essa posição se alterar no tempo (Machado, 2002: 39). Acerca da
posição cultural, as três dimensões a considerar são a língua, a religião e a
sociabilidade que assumem “o carácter de centralidade atribuído à composição de
classe no eixo social (Idem).
Para além do eixo social e cultural, Maria Manuela Mendes (1997), acrescenta
mais uma dimensão, a política. Enquanto para esta autora a dimensão social engloba
as desigualdades sociais e inserção sócio-profissional, a cultura a religião, valores,
língua, os estilos de vida, as tradições e práticas culturais, a dimensão política
destaca a organização interna à comunidade e face ao exterior, a autoridade interna,
o associativismo e a participação política.
Segundo Eduardo Costa Dias et al (2002), para uma construção de etnia terá
de existir uma tradição cultural transversal a todos, ou seja, todos vivem segundo
uma cultura muito própria. Fatores como a língua, a religião e as tradições que são
transmitidas de geração em geração, assumem-se como elementos chave que
tornam estanque a consciência coletiva e privilegiam a coesão do grupo. É desta
forma que é construída e se mantem uma etnia. Este conceito de etnia existe quando
alguns pressupostos se encontram preenchidos. Quando um “segmento significativo
Capítulo 1| A Comunidade Cigana em Portugal
Tiago Santos
13
da sociedade é visto como diferente a partir de combinações de algumas
características – língua, religião, raça e origem” quando “os seus membros
percebem-se a si próprios daquela forma e participam e partilham atividades
construídas à volta da sua origem e cultura comuns” (Yinger apud Mendes, 1997).
Observando a comunidade cigana, podemos falar de um “grupo social e
culturalmente múltiplo e dinâmico no interior da sua própria comunidade” (Caré, 2010:
26). Mesmo havendo semelhanças a nível da estrutura e organização social, as
comunidades ciganas assumem entre si diferenças conforme a sua situação
socioeconómica. Estas diferenças podem ser vistas quando, por exemplo,
comparamos comunidades ciganas nómadas com as que vivem em barracas, ou com
as que vivem em bairros sociais (Dias et al, 2002). Deste modo, e segundo Eduardo
Costa Dias (2002), podemos considerar a etnia cigana como um grupo constituído
por diversas comunidades. Para reforçar esta afirmação, Eduardo Costa Dias et al
(2002: 26) socorre-se de uma citação de Liégeois que diz que “os ciganos (...) formam no
mundo um mosaico de grupos diversificados, o que nos leva a formular duas considerações essenciais.
A primeira é que um mosaico constitui um conjunto cujos elementos, em certos aspetos, estão
interligados, contribuindo essas ligações para a organizar e estruturar, mesmo se a estrutura não for
rígida, como neste caso, mas mutável. A segunda é que cada elemento do conjunto possui
características próprias que o fazem aparecer, isoladamente, como diferente de cada um dos outros
elementos do mosaico”. Podemos assim falar de um conceito de etnicidade muito bem
delineado em todas as comunidades ciganas onde as suas características culturais,
em comparação com a sociedade maioritária, são diferenciadas e bem vincadas. Esta
diferenciação dos aspetos culturais e a criação de ambientes e atividades privadas no
seio desta comunidade são indicadores de uma cultura muito própria e muito
fechada. Assim, todas estas características comuns à comunidade cigana
personalizam uma identidade étnica única, espelhando características diferentes da
sociedade maioritária. Importa então perceber o que se entende por identidade numa
comunidade.
De acordo com Eduardo Costa Dias et al (2002), a identidade no caso de uma
comunidade desenvolve-se de acordo com as crenças religiosas, os hábitos e os
conhecimentos que ela adquire na sociedade. “ (…) a identidade de uma comunidade
é produto da sua cultura” (Dias et al, 2002: 27). Segundo o mesmo autor,
“A identidade, no caso cigano, constrói-se num contexto de interação, na relação entre o eu e o outro, na
semelhança e na diferença e determina o lugar que os indivíduos (ciganos) ocupam na sociedade (…) A
identidade cultural dos ciganos fundamenta-se numa organização social, com base na família alargada e
nas relações de parentesco realizadas entre as várias famílias, em que mulher, homem, criança do sexo
feminino e criança do sexo masculino cumprem papéis sociais distintos” (Dias et al, 2002: 27)
Capítulo 1| A Comunidade Cigana em Portugal
Tiago Santos
14
Nas palavras do mesmo autor, existe uma maior aptidão dos ciganos mais
jovens conseguirem experienciar outras dimensões fora do contexto cultural das suas
famílias e, assim, conseguirem uma relação mais próxima com “ inputs culturais
exteriores” (Eduardo Costa et al 2002). Ainda assim, mesmo com uma maior
capacidade de adaptação destes jovens ciganos, as “relações entre comunidades
ciganas e a sociedade em geral são fracas e mal articuladas ”, provocando um
afastamento muito grande da sociedade maioritária pois cada individuo tende a se
“inserir numa comunidade com a qual se sinta identificado” (Maalouf apud Magano e
Silva, s.d). A identidade cultural “envolve um sentido de pertença a um ou mais
grupos culturais e os sentimentos associados com esse facto” (Caré, 2010). A
identidade cultural envolve ainda uma série de diferentes dimensões que permitem a
manutenção na própria cultura adotada e o envolvimento com a sociedade
maioritária. Tudo isto dependerá dos “contactos sociais, da proficiência e uso da linguagem, dos
valores familiares em presença e da perceção e experiência vivida de situações de discriminação”
(Caré, 2010).
Capítulo 1| A Comunidade Cigana em Portugal
Tiago Santos
15
1.3-Comunidade Cigana e Políticas Sociais
Segundo a “Estratégia Nacional para a Integração das Comunidades
Ciganas”, há mais de 40 anos que existem instituições, públicas e privadas, que têm
tentado criar novas dinâmicas e têm procurado sensibilizar para os problemas sociais
desta comunidade. Intervenções em áreas como saúde, educação, e formação
profissional são um enorme investimento para o apoio às famílias da comunidade
cigana que passam por diversas dificuldades socioeconómicas.
“Com um número estimado entre 40.000 a 60.000 e com distribuição pelo território nacional de
Norte a Sul, muitas ciganas e ciganos portugueses carecem ainda de acesso a bens e serviços
fundamentais, promotores da sua integração. É, no entanto, certo que esta integração passa por uma
postura diferente por parte das comunidades ciganas e pela assunção das normas por que todos/as
os/as portugueses/as se devem reger, em termos de direitos e deveres, exercendo a sua cid adania
plena, de forma ativa e participada.” (ENICC, 2013: 5)
Em Maria José Casa-Nova (2004), podemos encontrar um levantamento das
políticas socias públicas destinadas às minorias étnicas. Em 1996, foi criado o
Estatuto do Alto Comissário para as Minorias Étnicas, alterado em 2001 para Alto
Comissariado para Imigração e Minorias Étnicas – ACIME, “com carácter de estrutura
interdepartamental de apoio e consulta do governo em matéria de imigração e
minorias étnicas”, tendo, sob a sua alçada, a Comissão para a Igualdade e contra a
Discriminação Racial e o Grupo de Trabalho para a Igualdade e Inserção dos
Ciganos.
São atribuições deste Alto Comissariado (art. 2º), entre outras, “contribuir para a
melhoria das condições de vida dos imigrantes em Portugal, de modo que seja proporcionada a sua
integração na sociedade no respeito pela sua identidade social e cultural; contribuir para que todos os
cidadãos legalmente residentes em Portugal gozem de dignidade e oportunidades idênticas; promover o
estudo da temática da inserção das minorias étnicas; colaborar na definição e cooperar na dinamização
de políticas ativas de integração social e de combate à exclusão ” (apud, Casa-Nova, 2004: 10).
A partir de janeiro de 2004, o Secretariado Entreculturas passou a incorporar
o ACIME, passando este a reunir também preocupações com a educação escolar dos
imigrantes e minorias étnicas. Este organismo oferece apoio legal aos imigrantes e
minorias étnicas, tendo criado em vários pontos do país 18 Centros Locais de Apoio
ao Imigrante e 2 Centros Nacionais (em Lisboa e no Porto).
Maria José Casa-Nova considera que as políticas desenvolvidas procuram
“promover a igualdade de direitos (civis, sociais e políticos) e alguma discriminação positiva no que diz
respeito pelas especificidades culturais de minorias, quer endógenas, quer exógenas” (Casa-Nova,
Capítulo 1| A Comunidade Cigana em Portugal
Tiago Santos
16
2004: 111). O Alto Comissariado, pela elevada carga de funções que apresenta é um
dos organismos com maior importância e protagonismo em Portugal no que respeita
às políticas de imigração, aos migrantes e minorias étnicas.
Em 1996 foi criado o Rendimento Mínimo Garantido com o propósito de
combate à pobreza e à exclusão social incluindo, para além da atribuição do subsídio
monetário, programas de inserção profissional. Este rendimento era atribuído ao
agregado familiar, podendo qualquer elemento do mesmo usufruir dos programas de
inserção quer profissional quer social. Para terem direito a este tipo de rendimento, os
agregados familiares teriam obrigatoriamente de enviar para a escola crianças e
jovens em idade obrigatória para frequentar a mesma. Por outro lado, os adultos,
quando analfabetos, teriam de frequentar o Ensino Recorrente Noturno. Os
programas de inserção implicavam também programas de vacinação e planeamento
familiar bem como ofertas de ações de formação. “Sendo uma medida que, do ponto de vista
do seu articulado, visa fundamentalmente combater a pobreza e a exclusão social (…) procurando
promover uma maior justiça social, tem também realizado alguma discriminação positiva,
nomeadamente pela promoção e desenvolvimento de ações de formação para grupos étnicos
específicos (ciganos e imigrantes dos PALOP). Podemos assim considerar que, do ponto de vista das
políticas sociais públicas (…) constituem em medidas h íbridas, que procuram simultaneamente criar
igualdade de oportunidades, mas também levam a cabo algumas ações de discriminação positiva no que
concerne à atenção à diversidade cultural, no sentido de diminuir as injustiças originadas pelas
diferenças de ordem cultural” (Casa-Nova, 2004: 13).
Em 2003 o Rendimento Mínimo Garantido foi revogado passando a designar-
se Rendimento Social de Inserção (RSI). Na sua atribuição está implícito que este
subsídio pode cessar a qualquer momento. A palavra-chave aqui é inserção, “quando
esta não se realizar por razões definidas centralmente como atribuíveis aos
beneficiários do rendimento, o subsídio é retirado” (Casa-Nova, 2004: 14). Aplicando
os pressupostos do RSI concretamente na comunidade cigana, podemos afirmar que,
do mesmo modo que acontece com outras famílias carenciadas, existe um aumento
do rendimento mensal para aqueles que apresentem dificuldades financeiras
concretas. Nesta comunidade em concreto, para usufruir deste tipo de apoio, existem
uma série de contrapartidas que têm de ser cumpridas sob pena de suspensão do
rendimento. No topo dessas contrapartidas podemos destacar que os beneficiários do
RSI têm de ter uma procura ativa de emprego e integração em formações
profissionais, sendo esta situação analisada com reuniões com assistentes sociais
destacadas para cada caso. Existe também a obrigatoriedade, no caso de se aplicar
esta situação, de colocar os filhos na escola diminuindo, assim, o abandono escolar.
Capítulo 1| A Comunidade Cigana em Portugal
Tiago Santos
17
Desta forma, estas comunidades conseguem ser alvo de uma integração gradual na
sociedade e, ao mesmo tempo, obter uma ajuda financeira que se revela
imprescindível em muitos casos.
Em 1999 foi criada a Lei de Defesa contra a Discriminação Racial, que tinha
como objetivo o combate à discriminação no emprego ou na oferta de emprego, a
discriminação no acesso à compra ou arrendamento de imóveis, a discriminação no
acesso a locais públicos ou discriminação no acesso ao exercício de uma atividade
económica. Esta lei foi um passo importante em direção à igualdade de direitos.
A Estratégia Nacional para a Integração das Comunidades Ciganas inúmera
uma série de grupos e programas explicitando todo o trabalho de intervenção de cada
uma junto da comunidade cigana.
O Grupo de Trabalho para a Igualdade e Inserção dos Ciganos tentou
aumentar o conhecimento geral da sociedade sobre esta comunidade, alertando para
uma necessidade de intervenção sustentada de modo a reduzir as dificuldades
destas famílias, sendo que o Rendimento Social de Inserção foi um fator importante
nessa estratégia.
A Subcomissão para a Igualdade de Oportunidades e Família, da Comissão
Parlamentar de Ética, Sociedade e Cultura, desenvolveu um relatório, que permitiu
uma discussão desta temática na agenda política, onde evidencia que este tipo de
comunidades continua a sofrer fenómenos de pobreza, exclusão social e
marginalidade, enumerando algumas recomendações que permitam reduzir as
dificuldades desta comunidade em áreas como a saúde, educação ou habitação.
O Programa Escolhas é um programa de âmbito nacional, tutelado pela
Presidência do Conselho de Ministros, e fundido no Alto Comissariado para a
Imigração e Diálogo Intercultural. Foi criado em janeiro de 2001 e deu este ano início
à sua 5ª geração. Visa promover a inclusão social de crianças e jovens provenientes
de contextos socioeconómicos mais vulneráveis, particularmente dos descendentes
de imigrantes e minorias étnicas, tendo em vista a igualdade de oportunidades e o
reforço da coesão social. 2
O mesmo Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural, criou,
em 2007, o Gabinete de Apoio às Comunidade Ciganas tentando proceder a um tipo
de apoio mais próximo e eficaz para estas comunidades, promovendo a sua
2 Analisado em detalhe mais à frente no Capítulo 3
Capítulo 1| A Comunidade Cigana em Portugal
Tiago Santos
18
integração social e tendo sempre em conta a preservação da componente cultural
destas comunidades, facilitando a interação na sociedade e a participação cívica
como cidadãos portugueses/as de pleno direito. Estas novas dinâmicas de
relacionamento tentam incutir um espírito de respeito e reconhecimento e são vistas
como um importante fator de mudança e crescimento.
Na definição das políticas para a comunidade cigana a Estratégia Nacional
para a Integração das Comunidades Ciganas é uma referência fundamental, que
importa analisar. Na sua elaboração da Estratégia Nacional para a Integração das
Comunidades Ciganas foi considerado que, face à realidade portuguesa, é
imprescindível a inclusão de um eixo transversal que dê resposta a um conjunto de
situações que marcam a vida destas comunidades e a sua relação com a sociedade
envolvente. O reconhecimento da importância de dimensões, como Justiça e
Segurança, Igualdade de Género, Segurança Social, Educação para a Cidadania,
Mediação e Combate à Discriminação, justifica um conjunto de prioridades que
potenciam o sucesso global da Estratégia Nacional, na medida em que são
dimensões profundamente marcadas pela natureza das relações humanas e sociais.
A Estratégia Nacional para a Integração das Comunidades Ciganas assenta a
sua temática em quatro áreas fundamentais. A área da Habitação, a área da
Educação, área do Emprego e Formação e a área da Saúde.
Dentro da área habitacional assumem-se como prioridades:
Melhoria sobre o conhecimento da situação habitacional das comunidades
ciganas;
Reforço, no quadro das políticas de habitação, das práticas promotoras da
integração das comunidades ciganas;
Adequar as respostas habitacionais e qualificar os espaços de realojamento;
Promover o acesso ao mercado de arrendamento/propriedade privada.
No plano educacional as prioridades são:
Melhorar o conhecimento da situação escolar das alunas/os e formandas/os
ciganas/os na escola;
Garantir o acesso à Educação Pré-Escolar;
Aumentar os índices de escolarização, garantindo que todas as crianças
ciganas completam a escolaridade obrigatória;
Capítulo 1| A Comunidade Cigana em Portugal
Tiago Santos
19
Promover a continuidade da escolarização a nível do ensino secundário,
incentivando à formação superior;
Prevenir o abandono escolar precoce;
Garantir o acesso à Aprendizagem ao Longo da Vida;
Promover a formação de agentes educativos/as na diversidade da cultura
cigana, com a participação de elementos dessas comunidades enquanto
formadores/as e interlocutores/as privilegiados;
Promover o combate à iliteracia.
No que diz respeito às vertentes de emprego e formação, as prioridades são:
Promover um maior conhecimento das comunidades ciganas;
Capacitar os serviços e adequar respostas formativas às especificidades das
comunidades ciganas;
Potenciar o acesso ao emprego e a criação do próprio emprego;
Aumentar as qualificações profissionais com vista à integração no mercado de
trabalho;
Desenvolver uma abordagem integrada junto das comunidades ciganas,
privilegiando o trabalho em parceria;
Revitalizar as atividades tradicionais das comunidades ciganas para a sua
integração socioprofissional;
Desenvolver ações de informação/sensibilização e de divulgação de boas
práticas;
Por fim, na área da saúde, as prioridades são:
Promover ações de formação/informação sobre educação para a saúde e
serviços disponíveis;
Contribuir para ganhos em saúde das comunidades ciganas, apostando na
prevenção;
Sensibilizar e formar os/as profissionais de saúde para a diversidade cultural;
Criar e/ou aprofundar as relações de proximidade entre os serviços de saúde
e as comunidades ciganas, estabelecendo pontes e dinamizando parcerias.
A Estratégia Nacional para a Integração das Comunidades Ciganas tem,
assim, uma lista de prioridades bem definidas nas quais existe uma preocupação de
integração das áreas mais problemáticas e importantes. O objetivo deve ser garantir
Capítulo 1| A Comunidade Cigana em Portugal
Tiago Santos
20
a implementação destas prioridades de uma forma sustentada e operacional. Parece-
me que cada vez mais existem melhores condições para a implementação destas
políticas, garantindo uma melhoria de vida das pessoas desta comunidade em todas
as áreas referidas. Obviamente não podemos esquecer que a grave crise que o país
atravessa pode ter impacto, a médio prazo, na implementação destas prioridades
devido aos cortes financeiros. Para uma mudança efetiva das perspetivas de vida, o
ensino e a formação são imprescindíveis. Desta forma, a atenção deve centrar-se
numa educação que prime não só pela frequência, mas também, pela obtenção de
resultados positivos garantindo, uma evolução no sentido da qualidade e da
sustentabilidade.
Capítulo 2|Exclusão e Educação
Tiago Santos
21
Capítulo 2 | Exclusão Social e Educação
2.1-Exclusão Social
Alfredo Bruto da Costa afirma que a expressão “exclusão social” entrou no
discurso político pelo menos há 20 anos. É uma expressão facilmente generalizável,
até mesmo entre os especialistas, pois não existe consenso quanto ao sentido deste
conceito (Costa, 1998). Segundo o autor, a noção de exclusão social aproxima-se da
tradição francesa na análise de pessoas e grupos desfavorecidos. Desta forma, Bruto
da Costa socorre-se de Robert Castel que define exclusão social como “a fase
extrema do processo de «marginalização», entendido este como um percurso
«descendente», ao longo do qual se verificam sucessivas ruturas na relação do
indivíduo com a sociedade” (Castel apud Costa, 1998: 10). A exclusão social pode
redundar em fracas condições habitacionais e sanitárias, baixas taxas de
alfabetização e taxas de desemprego elevadas (Costa e Pimenta apud Magano e
Silva, s.d). Os indivíduos posicionam-se segundo o acesso aos recursos que têm à
disposição, ou seja, aqueles que têm mais recursos conseguirão uma posição social
melhor do que aqueles que não conseguem aceder aos mesmos. Neste sentido, a
exclusão surge com o agravar das desigualdades do acesso a recursos. Cada
sociedade tem um padrão social de referência e a exclusão resulta quando alguém
fica privado do acesso a determinados recursos, como a educação ou saúde,
estando, desta forma, fora desse padrão de referência (Dias et al, 2002).
Para Bruto da Costa (1998) uma das ruturas mais importantes acontece em
relação ao mercado de trabalho traduzindo-se em desemprego, muitas vezes
prolongado. Neste sentido, numa fase mais extrema da exclusão social, não só a
relação com o mercado de trabalho sofre ruturas mas também os laços familiares,
afetivos e de amizade. Desta forma, Bruto da Costa clarifica dois fenómenos, o de
pobreza e exclusão social, que muitas vezes, de uma forma simplista, são vistos
como indissociáveis. Bruto da Costa afirma que “pode haver pobreza sem exclusão social,
como acontecia aos pobres do «ancien regime», em que os servos eram pobres, mas encontravam -se
integrados numa rede de relações de grupo (…) pobreza e exclusão social são (…) realidades distintas e
que nem sempre coexistem (Costa, 1998: 10).
De acordo com Bruto da Costa a exclusão social assume-se, na prática, como
um fenómeno “complexo” e “heterogéneo” (Costa, 1998: 21). Deste modo, o mesmo
autor identifica vários tipos de exclusão social a saber: económico; social; cultural;
Capítulo 2|Exclusão e Educação
Tiago Santos
22
origem patológica e comportamentos auto-destrutivos (Costa, 1998). Dada a sua
pertinência para uma reflexão sobre as condições de vida da comunidade cigana,
vamos focar a nossa atenção na exclusão social e cultural. Para o tipo social, Bruto
da Costa afirma que a própria causa da exclusão se situa nos laços sociais. “É uma
situação de privação de tipo relacional, caracterizada pelo isolamento, por vezes associada à falta de
autossuficiência e autonomia pessoal” (Costa, 1998: 22). Falando do tipo cultural, o autor
salienta que fenómenos como o racismo podem originar processos de exclusão social
de minorias étnico-culturais. E sobre este tipo de exclusão social, Bruto da Costa
esclarece que a massificação da imigração que temos assistido nas últimas décadas
tem intensificado a discussão sobre os fatores de integração das minorias étnico-
culturais. O autor afirma que desde muito cedo na Europa, os fenómenos de
imigração de minorias étnico-culturais eram uma realidade. Acontece que nessa
altura (década de 70) o problema da integração social não se punha por três razões
essenciais. Em primeiro lugar, muitos dos imigrantes que entravam na Europa vinham
interessados em cursos de melhor nível académico. Muitos destes já vinham
familiarizados com o contexto cultural europeu, ou vinham mesmo com vontade de
aprender e serem influenciados por esta cultura. Em segundo lugar, eram pessoas
com níveis académicos acima da média para os padrões das sociedades de
acolhimento. Em terceiro lugar, estes imigrantes eram indivíduos isolados pelo que o
problema da integração não tinha grande expressão. Acontece que a questão de
imigração não se põe em termos individuais ou de famílias mas sim de comunidades
inteiras (Costa, 1998). Segundo Casa-Nova (2002), as interdependências mundiais, a
livre circulação de mão de obra entre países europeus, o aumento das trocas
comerciais, o reforço do capitalismo “exacerbaram tensões, radicalizaram as
diferenças culturais, transformaram as sociedades (Casa-Nova, 2002: 26). Tudo isto
trouxe para debate a problemática de multiculturalidade nas sociedades e os seus
efeitos ao nível da interação social entre atores de diferentes contextos sociais (Casa-
Nova, 2002).
Neste sentido, a Europa assume a sua condição de sociedade multicultural. “A
dimensão cultural é (…) a mais complexa de quantas é composto o problema das minorias étnico-
culturais na Europa. No caso Português, uma proporção considerável dessas minorias sofre de dois ou
três tipos de exclusão: a pobreza, (…) exclusão de tipo territorial, (…) e cultural” (Costa, 1998: 10).
Olhando a dimensão cultural da exclusão, é inegável que a comunidade
cigana sofre deste tipo de exclusão. A forma como a etnia cigana conseguiu manter e
preservar a sua cultura e os seus modos de vida ao longo de todos estes anos é para
Magano e Silva (s.d) uma das razões que levaram a fenómenos de profunda
Capítulo 2|Exclusão e Educação
Tiago Santos
23
exclusão social. Maria José Casa-Nova (2005) ajuda a perceber quais os princípios
culturais e os valores da comunidade cigana. Esta comunidade percebe que os seus
aspetos culturais são diferentes da sociedade de destino mas afirma possuir uma
cultura “que detém e preserva valores que consideram superiores aos da sociedade
maioritária” (Casa-Nova, 2005: 212). Para esta autora, no que diz respeito a
processos de socialização primária, as famílias ciganas valorizam o domínio de si, a
autonomia, curiosidade, segurança e responsabilidade desvalorizando de forma
relativa a limpeza e a disciplina (Casa-Nova, 2005). Esta valorização a par com a
“socialização de crianças e jovens em valores culturais que consideram ser superiores aos valores
transmitidos pela sociedade maioritária (o respeito e o não abandono dos mais velhos; o carinho e o não
abandono das crianças; a solidariedade com doentes e a preservação da virgindade das raparigas até
ao casamento), a forte coesão e proteção grupal em momentos de forte tensão e exposição individual
(…) bem como o medo que, como forma de poder e de estratégia de sobrevivência (…) é parcialmente
explicativa da segurança e algum sentimento de superioridade evidenciados pelos elementos de etnia
cigana em relação à restante sociedade” (Casa-Nova, 2005: 211). Estas características
culturais intrínsecas a esta comunidade são os alicerces que desde sempre
mantiveram firme esta etnia. Os valores e os ideais são passados de geração em
geração e são encarados de uma forma quase sagrada. Deste modo, esta
comunidade é muito segura, como já vimos, que os seus valores são os mais
indicados para educar os seus. No entanto, os seus valores e comportamentos são
vistos de fora, pela sociedade maioritária, de uma forma negativa. As representações
sociais dominantes sobre as comunidades ciganas reforçam a sua situação de
exclusão social, sendo essenciais para a compreensão das relações com a
sociedade maioritária.
As representações sociais são uma construção feita ao longo do tempo de
imagens mentais condicionadas por “processos de socialização, pelos meios de
comunicação social e pelas relações que desenvolvem nos diversos contextos sociais
de interação” (Moscovici apud Cortesão et al, 2005: 11). Luiza Cortesão et al (2005)
resumem o conceito de representações sociais ao dizer que estas “operacionalizam
rotinas diversas nas pessoas” e são essas rotinas que explicam a realidade. Estas
“categorizam e engendram imagens que contêm significados, conferem e atribuem
sentidos, auxiliam a edificar e a reproduzir identidades sociais e culturais” (Cortesão
et al, 2005: 11). Normalmente conhecidas como teorias do senso comum, as
representações sociais referem-se ao conhecimento social partilhado (Caré, 2010).
De acordo com Augoustinos, “as representações sociais são basicamente um sistema de
classificação e denotação, de atribuição de categorias e nomes e ao fazê-lo estamos na essência a
Capítulo 2|Exclusão e Educação
Tiago Santos
24
revelar o nosso quadro conceptual de valores, a nossa teoria da sociedade e da natureza humana”
(Augoustinos apud Caré, 2010: 10).
As representações sociais são influenciadas pelo estatuto socioeconómico e
cultural dos diferentes grupos. Elaboram e estruturam as nossas opiniões, as nossas
ideias, as nossas atitudes, sendo importantes para a construção da realidade. Estas
podem ser originadoras de estereótipos e preconceitos para vários grupos ou
comunidades, como é caso da comunidade cigana. Neste contexto, é importante
perceber o que se entende por estereótipo e preconceito.
Todos nós escolhemos, por opção, a que grupos pertencer, como, por
exemplo, na área desportiva ou política. Essa escolha é intimamente dependente das
nossas crenças, preferências e valores pessoais. No entanto, existem grupos sociais
a que pertencemos, independentemente do nosso juízo, como, por exemplo, o sexo e
a etnia. O sexo e a etnia são utilizados “frequentemente para emitir julgamentos acerca das
características daqueles grupos sociais que estão por base dos preconceitos e dos estereótipos”
(Agoustinous et al apud Caré, 2010: 8).
Para Maria José Casa-Nova (2002), a diferença não exprime a ideia de
desigualdade. A interpretação da diferença entre os diferentes grupos culturais é que
poderá dar origem a relações de desigualdade. O sentido individual de cada um de
nós é, grande parte das vezes, transformado para um nível global que tem como
base o grupo de pertença, anulando-se qualquer característica da identidade
individual. O sujeito é visto como representante de um determinado estilo, identificado
com a comunidade particular (Casa-Nova, 2002). Esta “estereotipização do olhar”
pode remeter para fenómenos de “cariz racista, materializados em tentativas de
exclusão (…) discriminação social” (Casa-Nova, 2002: 29). O preconceito é
insistentemente utilizado na nossa sociedade e deve ser encarado como um
problema social sério.
Nas sociedades, a atribuição de “valores sociais positivos e negativos” é
desigual e é feita “consoante se encontram no topo ou na base da hierarquia social”
(Caré, 2010:8). Deste modo, as clivagens intergrupais verificam-se segundo as
hierarquias ocupadas. Fenómenos como a pobreza, a falta de condições sanitárias,
as dificuldades de acesso a trabalho e ensino, espelham as dificuldades que os
grupos do fundo da pirâmide social atravessam que se traduzem em desigualdades
sociais. O preconceito é inevitável em condições de interação social. Tal acontece
com outras formas de “tensão intergrupal” (Caré, 2010: 8).
Capítulo 2|Exclusão e Educação
Tiago Santos
25
Também o estereótipo representa um problema social que é vivido pelas
sociedades contemporâneas. Baseia-se em representações mentais de grupos
sociais e dos seus membros. A informação sobre um grupo social é armazenada e é
ativada no confronto com um elemento ou símbolo desse grupo. A “ativação tende a
despoletar o preconceito levando a atitudes de discriminação” (Caré, 2010: 9). Os
estereótipos, normalmente, têm uma conotação negativa e são mais que “estruturas
cognitivas; têm uma natureza simbólica, política e ideológica e constituem estruturas
afetivas acerca de grupos dentro de uma sociedade” (idem). Em suma, os
estereótipos fazem de um membro individual de um grupo o portador das
características desse grupo sendo visto como homogéneo (Billing e Stangor, apud
Silva et al, 2008).
Carlos Silva et al afirmam que a “existência de atitudes e ideias negativas dos
membros de um grupo sobre outro que o conceito de preconceito procura denotar
(Allport, 1954) e é parte de processos de estigmatização, como referiu Gofffman
(1963) (…) atingem a minoria - os ciganos. No fundo, falamos de visões imaginadas,
que sustentam práticas, que cada comunidade constrói da outra – imagens,
representações, estereótipos que são co-estruturantes de formas discursivas e de
práticas de discriminação” (Silva et al, 2008:3). Assim, estas representações sociais
nascem devido a ideias pré-concebidas de conotação negativa e a preconceitos
enraizados na sociedade sobre esta etnia. Desta forma, as crianças são, desde muito
cedo, vítimas de preconceito e representações sociais negativas pois representam os
valores e as atitudes da sua comunidade de pertença. Por conseguinte, as
representações sociais são também elaboradas sobre a comunidade cigana no
espaço escolar. Segundo Casa-Nova (2006: 163), são criados “sistemas
classificadores das crianças”. A representação social que existe na sociedade sobre a
comunidade cigana acaba por ser negativa para as crianças pois estas são
associadas à comunidade geral vindo a sofrer as consequências. “As crianças
experienciam as consequências das representações sociais negativas associadas ao seu grupo de
pertença, quer na relação com a sociedade global, quer no contato com instituições específicas,
principalmente a instituição escolar” (Casa-Nova apud Casa-Nova, 2006: 164). Na opinião
da mesma autora, ao contrário do que se passa, era muito importante compreender
como se processam as experiências de escolarização destas crianças.
2.2- Educação e Inclusão
O nosso sistema de ensino público é cada vez mais heterogéneo em termos
culturais. A escola acolhe, hoje, crianças e jovens de etnias e nacionalidades diversas
Capítulo 2|Exclusão e Educação
Tiago Santos
26
(Caré, 2010). Segundo Cortesão e Stoer (1999), a escola tem vindo a ser confrontada
com um aumento do número de alunos e com um conjunto mais diversificado dos
mesmos devido ao fenómeno de modernização. Face ao aumento de alunos que
frequentam o ensino, a escola tem de recorrer a novas estratégias de “estruturação
de espaço e ao estabelecimento de regras de organização do seu funcionamento que
tornaram possível a poucos professores atender (…) a muitos alunos (…). Foram-se
elaborando regulamentos de funcionamento da instituição e regulamentos
disciplinares que deverão ser do conhecimento de todos e obedecidos por todos
(Cortesão e Stoer, 1999: 16). O aumento do número de alunos traduz de igual forma
um aumento da diversidade cultural dos mesmos. Decorrente de processos de
globalização e modernização, o conceito de alfabetização estendeu-se a uma grande
parte de crianças adolescentes. Desta forma, a escola tem no seu seio alunos nunca
antes escolarizados, essencialmente provenientes de classes sociais desfavorecidas,
de meios rurais, de zonas suburbanas, de zonas piscatórias e ciganos (Cortesão e
Stoer, 1999). A escola tem sido invadida “por todos aqueles que, há pouco tempo
atrás, não se aproximavam sequer da entrada” (Magalhães e Stoer, 2002: 30). Este
fenómeno de massificação da escola permite falar numa escola multicultural que
segundo Maria Casa-Nova (2002) se aproxima de uma ideologia defensora da escola
meritocrática. Os pressupostos desta escola meritocrática seriam os de proporcionar
uma igualdade de oportunidades para todos, independentemente do género, classe
social de pertença ou etnia, onde o aluno é julgado em função do seu rendimento,
das suas capacidades e do mérito demonstrado (Casa-Nova, 2002).
Para Magalhães e Stoer (2002), este modelo de escola meritocrática
encontra-se em crise. Esta resulta do facto desta escola ter sido construída com base
na desigualdade. Os autores questionam porque a escola meritocrática não poderia
ser uma escola para todos. A resposta incide no fato de a escola se ter
homogeneizado com base na exclusão da diferença promovendo juntamente uma
nova hierarquia social e novas desigualdades. “A escola meritocrática em Portugal
tem sido condenada a ser uma escola meritocrática mitigada” (Magalhães e Stoer,
2002: 24). Estes autores falam de “formas de ensino que passem pela produção de saberes,
produção essa que, por sua vez, depende do desenvolvimento de dispositivos de diferenciação
pedagógica dinâmicos e baseados nas vivências sociais e culturais dos alunos (…) a preocupação com
o sucesso deriva da necessidade de combater a exclusão social latente na escola meritocrática”
(Magalhães e Stoer, 2002: 25).
Para Olga Magano (2010), a integração social não é um ato único mas sim um
processo. “A modernidade abre a possib ilidade de o individuo, no percurso de socialização, por ser
Capítulo 2|Exclusão e Educação
Tiago Santos
27
confrontado com múltiplas oportunidades, poder fazer vários percursos e combinar diferentes
possibilidades de interiorização das normas sociais, resultando entre o indivíduo e a sociedade a
integração social” (Magano, 2010: 63).
Este conceito de integração social tem focado as suas atenções principalmente em
grupos sociais em situação de pobreza, marginalização, delinquência e,
recentemente, nos imigrantes (Schnapper apud Magano, 2010).
A análise sobre os processos de marginalização e de exclusão contribuíram
para um conhecimento mais alargado sobre modalidades de integração. Se podemos
falar em várias derivações do conceito de exclusão, o mesmo raciocínio pode ser
aplicado para a integração (Moller e Hespanha apud Magano, 2010). A ideia de
integração social tem a sua base em três dimensões essenciais no processo de
inserção dos indivíduos na sociedade (Gaulejac e Léonctti apud Magano, 2010), “a
dimensão económica, que autoriza a inserção e a participação social através das atividades de produção
e consumo: a dimensão social, compreendendo, por um lado, a integração no seio dos grupos primários
e, por outro lado, a integração na sociedade global; e a dimensão simbólica (…) definida por normas e
valores comuns e as representações coletivas que definem os lugares sociais” (Magano, 2010: 68).
Já para Alfredo Bruto da Costa (1998), o fenómeno de integração assume cinco
domínios, o social, o económico, o institucional, o territorial e o das referências
simbólicas. A dimensão social é caracterizada pelas redes sociais, grupos e
comunidades em que cada pessoa se encontra inserida. O domínio económico tem
que ver com o conjunto de mecanismos geradores de serviços e o mercado de bens
e serviços. O institucional refere-se aos sistemas prestadores de serviços, às
instituições relacionadas com direitos cívicos e políticos. A dimensão territorial
menciona que existem certos territórios com maior aptidão para certas exclusões,
como por exemplo, bairros degradados. Por último, o simbólico, refere-se ao
“conjunto de perdas” do excluído, que se agravam quanto mais tempo este estiver em
situação de exclusão. Desta situação resulta a perda de identidade social, de
autoestima, de auto-confiança, de perspetivas de futuro, de capacidade de iniciativa,
de motivações, do sentido de pertença à sociedade (Costa, 1998: 17).
Segundo Olga Magano (2010), uma das principais dimensões da integração
social tem sido o domínio económico, assumindo-se como o principal fator de
integração para a definição de lugares sociais. A valorização da dimensão de trabalho
continua a ser um aspeto importantíssimo para avaliar quem está ou não integrado.
As pessoas continuam a ser caracterizadas pelas suas profissões, e os níveis de
escolaridade que servem como elementos de definição de estatuto e lugar social.
Outra vertente a ter em conta no processo de integração social é o processo
de escolarização (Magano, 2010). Num estudo sobre integração social, efetuado em
Capítulo 2|Exclusão e Educação
Tiago Santos
28
quatro países distintos, procurou-se relacionar a integração estrutural, que se refere à
participação objetiva de filhos de imigrantes em estruturas sociais como a escola,
mercado de trabalho etc, a integração social, que se refere às mudanças em termos
sociais, familiares ou de amizade e a integração cultural, que dizia respeito ao
posicionamento em relação aos tempos livres, práticas culturais, sistemas de valores
e também aos sentimentos sentidos acerca da sociedade do país de origem e sobre
a sociedade do país de destino. Uma das conclusões foi que a “integração aconteceu mais
rapidamente devido à frequência escolar, o que permitiu às crianças e aos seus pais obterem (…) um
maior conhecimento sobre a sociedade de acolhimento (…) a escolarização assegura o acesso a
saberes, mas também contribui para a interiorização de normas cultu rais (…) ” (Magano, 2010: 74).
Um dos conceitos da inclusão social reside em transformar a sociedade num
lugar apto à convivência entre pessoas de todos dos tipos, procurando a educação de
todas as crianças nas escolas regulares, sendo esta, uma preocupação fundamental
(Ramos, 2011). “A escola, como uma instituição voltada para a informação e a formação, poderia e
deveria ser um espaço que se preocupasse em tornar os alunos mais humanos. Assim entendida, ela
representa um lugar favorável a que todos que a procuram possam ser bem -vindos para colaborar no
trabalho realizado. Cada um deveria fazer parte do seu contexto como um membro valorizado e, por sua
vez, alunos e profissionais deveriam apoiar-se mutuamente, uns aos outros, como aprendizes ativos,
dinâmicos e recíprocos” (Ferreira e Guimarães apud Ramos, 2011: 28).
Deste modo, podemos falar de uma escola inclusiva, como instituição de
sociabilização e como garantia de integração de jovens e crianças na sociedade.
Ainda assim, este fenómeno de integração não é linear e pode existir uma clivagem
entre a integração estrutural (participação nas estruturas sociais) e a integração
cultural (preservação de valores e identidades do país de origem) (Magano, 2010).
Em Portugal o afastamento da escola pública das crianças e jovens de cultura cigana,
quer por fenómenos de absentismo escolar, quer por redução drástica da frequência
escolar, tem sido considerado, desde da época de 90, um problema social por
entidades públicas (Casa-Nova, 2006). No caso das comunidades ciganas, podemos
afirmar que dentro das minorias étnicas, as comunidades ciganas são aquelas que
apresentam menores taxas de aproveitamento escolar (Casa-Nova, 2006). Segundo
dados nacionais apresentados pela mesma autora, no ano letivo de 1997/98, 5420
crianças ciganas encontravam-se inscritas no 1º ciclo do ensino básico, das quais,
784 foram sujeitas a avaliação no 4º ano tendo sido aprovadas 55%. No 2º ciclo, o
número de crianças inscritas desceu vertiginosamente, sendo que apenas 374
crianças se encontravam matriculadas nos dois anos de escolaridade, das quais 85
foram sujeitas a avaliação no final do 6º ano, tendo sido aprovadas 75%. No 3º ciclo,
encontravam-se inscritos 102 alunos nos três anos de escolaridade sendo que foram
avaliados no 9º ano 11 alunos, dos quais foram aprovados 64%. Na sociedade
Capítulo 2|Exclusão e Educação
Tiago Santos
29
portuguesa, os índices de alfabetismo desta comunidade diminuíram entre gerações,
mas, no entanto, os números continuam a ser muito baixos sendo que muitos jovens
entre os 15 e os 25 anos, que já abandonaram a escola, apresentam-se apenas com
o 1º ou 2º ano do primeiro Ciclo do Ensino Básico (Casa-Nova, 2006).
De certo modo, as crianças ciganas não se sentem muito motivadas para a
frequência escolar: “As crianças ciganas geralmente não aprendem o que os currículos escolares
exigem, ou aprendem mal, não gostam, não se interessam pelo que acontece na escola, embora muitas
vezes nem tenham consciência do seu tédio e até digam que gostam. Mas finalmente não vão à escola
porque «lá fora» acontecem coisas mais importantes e/ou mais interessantes do que na sala de aula e
também – e por razões fáceis de compreender – porque não existe, nos seus grupos de pertença,
grande (ou por vezes nenhuma) pressão social para que cumpram a escolaridade obrigatória ou até para
que se alfabetizem” (Cortesão, apud Ramos, 2011: 24).
Casa-Nova (2006) aponta alguns elementos esclarecedores desta situação.
Para a autora, importa também perceber os processos de organização do trabalho
pedagógico na sala de aula. Os ciganos sentem-se incomodados com a escola o que
resulta na elaboração de uma variedade de pretextos para se “livrarem” dela. Dores
de cabeça, familiares doentes, um irmão mais pequeno são só algumas das
justificações dadas. Mas todas estas desculpas escondem um problema maior que
nem sempre é percecionado pelos professores. Estas estratégias de fuga relacionam-
se com o “mal-estar que estas crianças sentem dentro da escola tal como esta se
encontra atualmente configurada”(Casa-Nova, 2006: 164).
A comunidade cigana valoriza a escola sob a lógica de esta lhe conseguir
proporcionar a realização de alguns objetivos de vida, como a carta de condução.
Deste modo, para compreender os baixos níveis de escolaridade desta comunidade
teremos de abordar os processos de socialização e educação familiares, as
expectativas e perspetiva de vida, as relações familiares, em suma, teremos de
considerar as características da comunidade cigana, a sua relação com a sociedade
maioritária e os continuados fenómenos de exclusão acima discutidos.
Maria Casa-Nova enumera dois sistemas culturais estruturalmente
diferenciados que coabitam no espaço escolar. Por um lado, temos uma cultura de
transmissão oral, que valoriza o pensamento concreto e o conhecimento ligado ao
desempenho de atividades quotidianas que garantam a reprodução cultural e social
do grupo (a cultura cigana); por outro lado, temos uma cultura instruída, com base na
transmissão escrita, valorizando o pensamento abstrato e o conhecimento erudito (a
cultura da sociedade maioritária) (Casa-Nova, 2006). No espaço escolar entre estes
dois sistemas culturais, “a diferenciação cultural é duplamente evidenciada, quer através dos
processos de socialização e educação de que a criança cigana é alvo por parte da escola, quer dos
papéis que aqui é chamada a desempenhar e que diferem (…) dos papéis que desempenha dentro do
Capítulo 2|Exclusão e Educação
Tiago Santos
30
grupo de pertença” (Casa-Nova, 2006: 161). Neste sentido, as crianças ciganas não
conseguem compreender os processos de sociabilização que a escola quer incutir. A
escola pede à criança cigana o desenvolvimento de certas tarefas das quais a criança
vai percebendo que os conhecimentos que tem não são os adequados, o que resulta
na “ vulnerabilização da criança num meio que, não lhe sendo hostil, é desconhecido
e ameaçador na medida em que não funciona segundo as regras que conhece”
(Casa-Nova, 2006: 161-162). Desta forma, é imperativo que as propostas educativas
tenham em conta “as características culturais dos grupos minoritários a frequentar a escola, indo ao
seu encontro, rentabilizando-as e valorizando-as, de modo a despertar o interesse destes alunos pelas
tarefas que lhes são propostas, incutindo-lhes o gosto pela participação nas mesmas e uma maior
assiduidade” (Ramos, 2011: 24). Ao falar de inclusão escolar estamos a falar daquilo
que pode ser feito para minimizar os processos de exclusão no seio escolar, e
maximizar a participação do aluno dentro do processo educativo, produzindo um
processo positivo de aprendizagem (Santos et al apud Ramos, 2011). Para todo este
processo positivo de desenvolvimento no processo educativo, o aluno precisa de se
sentir incluído, precisa de sentir que faz parte da escola (Ramos, 2011).
O desenvolvimento de uma pedagogia concentrada no aluno apresenta-se
como um passo importante para uma educação inclusiva (Ramos, 2011). A educação
inclusiva é uma forma simples de iniciar oportunidades de socialização, de
aprendizagem de aproveitamento de potenciais talentos, quer na escola, quer na
sociedade. Falamos, então, do desenvolvimento de uma série de políticas que atuem
entre vários parceiros sociais (Macedo apud Ramos, 2011). Para Ramos (2011), a
ideia de que os alunos devem aprender juntos, independentemente das dificuldades e
das diferenças que cada um apresenta, é uma realidade. “As escolas devem adaptar-se a
estas diferenças, adequando os seus currículos, as suas estratégias pedagógicas e cooperando com a
comunidade local. No entanto, nem todas as escolas podem ser consideradas inclusivas, uma vez que
nem todas apresentam as respostas adequadas aos seus alunos, em função das suas especificidades
raciais, culturais e individuais” (Ramos, 2011: 32). O processo de aprendizagem é mais do
que uma transmissão de informação entre os alunos, é uma transição entre diferentes
paradigmas de conhecimento. As escolas devem-se reposicionar de modo a que
possam criar momentos de aprendizagem coletiva, diversificando o seu currículo
criando modelos inclusivos que promovam a igualdade de oportunidades entre os
seus alunos (Rodrigues apud Ramos, 2011).
De acordo com Ramos (2001), ainda estamos longe de uma Escola
verdadeiramente inclusiva. “O futuro é algo que, de alguma maneira, tem que ser inventado. É
nesta fase de «invenção» que se encontra, hoje, o modelo da «Escola Inclusiva», que acarreta consigo
um movimento pleno de humanismo, na medida em que se opõe a fenómenos de exclusão escolar e
Capítulo 2|Exclusão e Educação
Tiago Santos
31
social. A «inclusão» é, assim, um imperativo, mas também e, ainda, uma utopia ” (Peixoto apud
Ramos, 2001).
Neste sentido, podemos falar de uma escola inclusiva quando as escolas e os
seus agentes, conseguirem englobar todas as culturas e forem capazes de integrar
as diferenças culturais.
Capítulo 3|O Estágio
Tiago Santos
32
Capítulo 3| O Estágio
Este capítulo faz uma descrição mais concreta de todas as componentes
ligadas ao meu estágio. É feita uma caracterização do espaço geográfico onde o
estágio ocorreu, assim como, um enquadramento institucional onde podemos
perceber melhor o Programa Escolhas e o Projeto Trampolim. O tema principal do
meu estágio é abordado no sub-capítulo 3.4 onde é elaborada uma revisão teórica
esclarecendo o conceito de TIC e de inclusão digital, ajudando, assim, a perceber o
conteúdo executado na minha tarefa principal de estágio. A descrição das tarefas
executadas no estágio aparece logo no capítulo seguinte, tendo a tarefa de
acompanhamento semanal aos alunos da EB 1 Ingote um destaque especial por se
tratar da tarefa principal.
3.1-O Local: Bairros da Rosa e do Ingote
Segundo Márcia Pereira (2010), o crescimento da população aguçou a
necessidade de alojamento e de realojamento de pessoas carenciadas de bairros de
barracas. Neste sentido, foram criados novos bairros de habitação social, nos anos
de 70, 80, 90, que serviram e servem, ainda hoje, para alojar famílias com carências
económicas e habitacionais elevadas. “Na área do Planalto do Ingote estão o bairro do Ingote,
que surgiu em 1977, e o bairro da Rosa, que foi erigido em 1996. Ambos os bairros foram produzidos
pela autarquia, com o objetivo de realojar pessoas com elevadas carências habitacionais, de forma a
diminuir a construção de casas ilegais e de barracas” (Pereira, 2010: 104). O bairro do Ingote
teve origem nos arredores de Coimbra, nos finais dos anos 70, num local onde
funcionava a lixeira municipal (Pereira apud Pereira, 2010). A construção deste bairro
teve como intervenientes a Câmara Municipal de Coimbra, o FFH (Fundo Fumento de
Habitação) e a Cooperativa de Habitação do Mondego. Este bairro conta, nos dias de
hoje, com 26 edifícios de habitação divididos entre T1, T2 e T3. O bairro da Rosa,
também dinamizado pela Câmara Municipal de Coimbra, foi construído em 1996
“tendo realojado 210 famílias provenientes de habitação degradada, dispersa pelo
concelho de Coimbra” (Pereira, 2010: 105). Segundo dados da Câmara Municipal de
Coimbra do ano de 2006, Coimbra conta com 1033 alojamentos sociais.
Contabilizando todos os alojamentos sociais pertencentes aos bairros sociais, temos
um total de 2448 habitantes (Pereira, 2010). Analisando a população residente nos
Bairros Sociais, podemos destacar a presença dos bairros da Rosa (cerca de 800
habitantes) e do Ingote (cerca de 374) como os mais populosos. Os bairros são vistos
como locais com uma carga negativa muito grande começando, desde logo, pelo seu
Capítulo 3|O Estágio
Tiago Santos
33
posicionamento geográfico (Pereira, 2010). Uma localização, quase sempre
estratégica, afastada da cidade é uma vertente neste tipo de bairros e que acarreta
uma representação negativa por parte da população geral. Se estão afastados é
porque não querem que se misturem com o resto da população. Esta é, por vezes, a
representação que a sociedade faz dos habitantes destes bairros. A população
destes bairros é muitas vezes vista praticante de atividades ilícitas e fonte de grande
número de problemas (Pereira, 2010). Segundo Márcia Pereira (2010: 112), os
bairros do Ingote e da Rosa são dois casos onde os problemas se acentuam,
existindo uma concentração de “famílias multiproblemáticas”. A maior parte dos
residentes destes bairros apresenta carências socioeconómicas muito elevadas, é
proveniente de bairros de barracas, como o caso dos ciganos, que habitam em
grande escala estes bairros. Aquando da construção destes bairros a grande
preocupação foi o realojamento das famílias que viviam em bairros de barracas, com
vista à irradicação destes. No entanto, realojaram-se pessoas sem qualquer sentido
de pertença às suas novas habitações e à comunidade de vizinhos. Dada esta falta
de sentido de pertença pelas novas habitações atribuídas, via-se em muitos casos
uma profanação tantos das habitações como dos espaços públicos circundantes o
que só demonstrava a indiferença destas pessoas em relação aos bairros das suas
novas habitações. No entanto tal não acontece nos dias de hoje. Pude perceber
durante o meu estágio nestes bairros que as pessoas que os habitam estão
verdadeiramente enraizadas e o sentido de pertença que falávamos é bastante
vincado. Houve assim uma clara evolução durante estes anos que permitiu que os
locais públicos fossem estimados tal como as suas habitações, fazendo, assim,
passar uma ideia de gosto pela vida dos bairros.
3.2- O Enquadramento Institucional
3.2.1- Programa Escolhas
O Programa Escolhas é um programa governamental de âmbito nacional
promovido pela Presidência do Conselho de Ministros e integrado no Alto
Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural – ACIDI, IP e cujo
financiamento é feito pelo Instituto de Segurança Social, pela Direção Geral de
Educação e pelo Fundo Social Europeu, através do Programa Operacional Potencial
Humano – POPH/QREN. Este programa tem como missão uma promoção da
inclusão social em crianças e jovens provenientes de contextos socioeconómicos
Capítulo 3|O Estágio
Tiago Santos
34
vulneráveis, tentando, assim, garantir uma igualdade de oportunidades e o reforço da
coesão social. O Programa Escolhas iniciou em 2013 a sua 5ª geração, que durará
até ao fim do ano de 2015. Este programa encontra-se espalhado por todo o país,
existindo protocolos com consórcios de 110 projetos locais de inclusão social em
comunidades vulneráveis, com a opção de poder a vir financiar mais 30 projetos,
muitos possivelmente localizados em territórios onde se encontram descendentes de
imigrantes e minorias étnicas.
O Escolhas foi criado em 2001 sendo, numa primeira fase, um Programa para
a Prevenção da Criminalidade e Inserção de jovens dos bairros mais problemáticos
dos Distritos de Lisboa, Porto e Setúbal. Entre janeiro de 2001 e dezembro de 2003,
período da primeira fase, o programa introduziu 50 projetos e alcançou 6.712
destinatários. A 2ª geração do Escolhas acontece em maio de 2004 tendo durado até
setembro de 2006. Após as experiências da primeira fase, este programa
reestruturou-se, tendo apontado os seus focos a novos desafios, e desviando a sua
ação da prevenção da criminalidade, para a promoção da inclusão social. Essa
reestruturação passou também pelo plano de atuação, deixando uma lógica
centralizada, para abraçar uma nova vertente, assente em projetos localmente
planeados, com base em instituições locais como escolas, centros de formação,
associações, IPSS entre outras. Durante esta fase foram financiados e
acompanhados 87 projetos por todo o país, abrangendo 43.200 destinatários em 54
concelhos. A 3ª geração do Escolhas prolongou-se entre 2007 e 2009, tendo
alcançado 81.695 crianças e jovens provenientes de contextos socioecómicos
vulneráveis, passando a estar presente em 71 concelhos do nosso país. A sua 4ª
geração surge em 2010 e durará até 2012. O reconhecimento da sua importância
levou o governo não só a prolongar o programa, como a garantir um maior
financiamento proporcionando, desta forma, um reforço da presença no terreno. A 4ª
geração do Escolhas tenta, de algum modo, reforçar a qualidade das ações
desenvolvidas e para isso às quatro medidas anteriormente conhecidas, (I) Inclusão
escolar e educação não formal; (II) Formação profissional e empregabilidade; (III)
Participação cívica e comunitária e (IV) Inclusão digital, uma nova medida foi
adicionada com o intuito de estimular o Empreendedorismo e Capacitação dos
jovens. “Outras apostas foram o reforço da empregabilidade e formação profissional,
uma maior diferenciação dos públicos-alvo, a consolidação dos consórcios, a
diferenciação e modularidade no financiamento, a adoção de um modelo misto de
acesso, a formação centrada em produtos e ainda um maior apoio a iniciativas dos
jovens e incentivo à sua participação.”
Capítulo 3|O Estágio
Tiago Santos
35
Nesta 4ª geração podemos salientar alguns números que permitem atestar a
importância deste programa. Num universo de 89.232 participantes em todos os
projetos, o sucesso escolar, por exemplo, atingiu uma percentagem de 86,7% no ano
letivo de 2011/2012. Existiram, ainda, 9776 reintegrações em escolas, formação e
emprego de jovens anteriormente desocupados.3
3.2.2- Projeto Trampolim
O Projeto Trampolim é um dos projetos do Programa Escolhas no território
nacional. Este projeto está sediado nos Bairros da Rosa e do Ingote desde 2004. É
promovido pela Câmara Municipal de Coimbra e tem como entidade gestora o
CASPAE (Centro de Apoio Social de Pais e Amigos da Escola). É constituído por um
conjunto de entidades reunidas em Consórcio da qual fazem parte Cáritas Diocesana
de Coimbra, Inovinter, Cearte, Junta de Freguesia de Eiras, Agrupamento de Escolas
Coimbra Centro, Agrupamento de Escolas da Rainha Santa Isabel, Direção Regional
do Centro do Instituto Português do Desporto e Juventude I.P. e Comissão de
Proteção de Crianças e Jovens de Coimbra.
O Projeto Trampolim tem como destinatários crianças e jovens dos 6 aos 24
anos e como beneficiários todos os familiares ou outros que estejam interessados
nas atividades desenvolvidas. O objetivo central deste projeto reside na proteção e
inclusão de crianças e jovens dos bairros municipais da Rosa e do Ingote, e do
Centro de Estágio Habitacional (Parque Nómada) 4, através da promoção do sucesso
escolar, da integração profissional, da participação cívica e na capacitação dos
jovens. No período que decorreu o meu estágio integrava a Equipa do Trampolim as
pessoas: a Coordenadora do projeto Carla Mendes, licenciada em Animação
Socioeducativa, a Psicóloga Andreia Couceiro, o Monitor CID Francisco Vieira, a
Dinamizadora Comunitária Débora Sousa e, por fim, Joana Ferrão, estagiária de
Psicologia.
Tendo recomeçado as suas atividades em janeiro deste ano, este projeto foi
sujeito a aprovação do Programa Escolhas estando agora na sua quinta geração,
Projeto Trampolim E5G.
3.3-O Tema
3 Informação retirada de www.programaescolhas.pt
4 O Parque Nómada foi construído para receber em curta estadia famílias com características culturais,
étnicas e sociais que pela sua realidade e natureza não encontram resposta nos equipamentos
tradicionais. A meta principal deste parque é proporcionar condições de educação e formação com vista à plena integração. O Parque Nómada conta com 11 habitações e 1 Centro de Ação Social. Para mais informações: http://www.cm-coimbra.pt
Capítulo 3|O Estágio
Tiago Santos
36
3.3.1- As TIC
Entende-se por TIC, Tecnologias de Informação e Comunicação o “conjunto de
conhecimentos refletidos quer em equipamentos e programas, quer na sua criação e utilização ao nível
pessoal, educacional e empresarial. Das várias ferramentas, métodos e técnicas, o computador destaca -
se, na medida em que é o elemento em relação ao qual existe uma maior interação com a componente
humana” (Sousa, apud Correia, 2004: 8).
O computador e a internet são dois dos muitos recursos (CD-ROM, DVD,
Vídeo) que estão presentes em diversas áreas e atividades que seriam impossíveis
de realizar sem o desenvolvimento constante das tecnologias. Este “boom”
tecnológico fez com que a sociedade se moldasse e adaptasse, tendo em vista um
aproveitamento máximo das novas potencialidades. São instrumentos de trabalho e
aprendizagem que marcam a nossa sociedade. No setor da educação, as TIC vieram
fornecer novas dinâmicas ao contexto de ensino-aprendizagem.
As Tecnologias de Informação e Comunicação multiplicam e facilitam o
acesso à informação e os sistemas interativos e multimédia, fornecendo a
professores e a alunos, um grande leque de informação. Estas tecnologias devem
incutir nos alunos uma capacidade de investigação, autonomia, bem como “potenciar
as capacidades comunicacionais de professores e alunos” (Silva, 2004: 5).
“Atualmente, vivemos numa sociedade onde o computador assume, cada vez mais, uma
importância significativa no dia a dia de cada cidadão. Neste sentido, a escola como meio socializador
da criança, não se pode alhear da utilização deste recurso educativo nas suas salas de aula, até porque
utilizá-lo significa aproveitar o seu potencial fascinante e educativo como fator de motivação dos alunos e
dos professores, tendo sempre em consideração a dinâmica da aprendizagem (…)” (Sarmento apud
Correia, 2004: 1).
De acordo com Correia (2004), com a evolução da sociedade de informação,
acentuou-se a necessidade de uma educação tecnológica. Assim, e para começar
desde cedo uma formação tecnológica, cabe à escola definir diretrizes que
possibilitem uma aprendizagem real capaz de ensinar valores e métodos para um
futuro desempenho social dotado pela tecnologia. As TIC no ensino básico podem ser
uma ferramenta potencializadora de diálogo entre alunos e professores, e podem
servir, também, como uma forma de quebrar a monotonia muitas vezes estabelecida
neste nível de ensino (Correia, 2004).
Segundo Silva (2004), a escola não tem vindo a acompanhar o avanço
tecnológico, notando-se um grande défice em relação à sociedade. Descrevendo, de
uma forma resumida, o contexto de integração das TIC no ensino, podemos começar
Capítulo 3|O Estágio
Tiago Santos
37
por dizer que a grande evolução nas estratégias pedagógicas viveram-se no início do
século XX. Nesta época, a pedagogia era influenciada por ideias mais positivas que
favoreciam um ensino mais assente em dinâmicas intuitivo-dedutivas. Foi sobre estes
pressupostos que foi introduzido o cinema no panorama educativo reconhecendo,
assim, a importância da mensagem visual (Silva, 2004).
A aposta no cinema foi bastante importante e foi o “gatilho” para a entrada de
outros meios audiovisuais na escola, contribuindo para uma discussão mais presente
na agenda política nacional. O exemplo disso mesmo, foi a criação, na década de 70,
do Centro de Pedagogia Audiovisual (CPA) de modo a aplicar no ensino o cinema, a
rádio, a televisão entre outros (Silva, 2004). Ainda de acordo com o mesmo autor,
importa realçar dois momentos marcantes para a tecnologia educativa. O primeiro,
nas décadas de 70 e 80, ao fazer parte dos planos curriculares dos cursos de
formação de professores. O segundo, na década de 90, com a implementação dos
cursos de Mestrado nesta área.
Durantes várias décadas foram muitos os projetos que pretendiam introduzir o
computador no ensino5 mas foi sob o cunho de uma sociedade de informação cada
vez mais emergente que na segunda metade da década de 90 foram criados
programas que pretendiam introduzir e expandir as TIC nos sistemas de ensino. O
Programa Nónio século XXI e o Programa Internet Escola foram dois programas
marcantes. De uma forma sucinta, o objetivo geral destes projetos seria o de ajustar
as escolas às novas exigências colocadas pela sociedade de informação que se
pautavam por uma necessidade de novo conhecimento e práticas mas também novas
infraestruturas sempre em evolução (Silva, 2004).
Importa, também, perceber especificamente os objetivos das TIC no 1º ciclo.
Assim, Silva (2004), afirma que “enquanto para muitos adultos a evolução tecnológica,
nomeadamente na área das Tecnologias de Informação e Comunicação, aparece como algo distante e
complexo, para as crianças estas tecnologias fazem parte do seu quotidiano, ou seja, é - lhes natural. É
essencial que as crianças aprendam a tirar vantagens das suas oportunidades, das suas utilizações e se
apercebam também das suas limitações e perigos” (Silva, 2004: 27). Por conseguinte, podem
destacar-se um conjunto de objetivos para o 1º ciclo de ensino na utilização das TIC
(Belchior et al apud Silva, 2004):
1. Comunicar ideias e expressões através do processamento de texto.
5 Despacho nº68 /SEAM/84, Minerva, Programa Nónio século XXI, Prodep
Capítulo 3|O Estágio
Tiago Santos
38
O processamento de texto pode ser bastante útil para aprender a escrever melhor e
corrigir alguns erros mas também para melhorar a capacidade de raciocínio e
organização mental. “Estas potencialidades repercutem-se no encorajamento para
escrever textos mais extensos e têm reflexos na motivação para a escrita. Quem já
lecionou no 1º Ciclo sabe que isto pode ser uma realidade” (Silva, 2004: 28).
2. Manusear informação pesquisando, selecionando, analisando e interpretando
dados.
A informação selecionada pelos alunos pode ser introduzida numa base de dados e
pode aparecer sob forma de gráfico ou tabela o que permite uma melhor leitura e
interpretação de resultados assim como pode exponenciar o trabalho de grupo na
discussão dos resultados (Silva, 2004)
3. Efetuar investigações matemáticas ou explorar representações de situações reais
ou imaginárias baseadas no computador.
A aplicação de jogos didáticos, por exemplo, permite aliar imagem, som, cor e
movimento o que torna a aprendizagem mais interativa. Estes jogos didáticos
possibilitam “definição de estratégias, resolução de problemas e a reformulação de
processos, etapas e aprendizagem com os erros” (Silva, 2004: 28).
4. Projetar, medir, fazer e controlar no ambiente físico, utilizando variadas ferramentas,
materiais, interruptores e computadores, nas Ciências, Matemática e Estudo do Meio.
A curiosidade natural das crianças pode ser utilizada para explorar as
funcionalidades dos aparelhos. Existe uma diversidade de software informático (CD-
ROMS por exemplo) que contribui para aquisição de conhecimento (Silva, 2004).
5. Explorar as TIC com o objetivo de desenvolver aspetos criativos e estéticos.
“A utilização de digitalizadores de imagem (Scanner), de processadores de imagem,
de CD-ROM e da Internet poderão ajudar os alunos a criar, armazenar e manipular
imagens e sons de forma a complementar ou obter produtos que exprimam as suas ideiascontribuindo
desta forma para desenvolver capacidades criativas e estéticas” (Silva, 2004: 29).
6. Identificar algumas consequências das TIC na sociedade e nos indivíduos.
As crianças facilmente identificam as consequências da utilização das TIC a nível
individual e na sociedade. “Conhecer a existência de várias fontes de informação, por exemplo
Capítulo 3|O Estágio
Tiago Santos
39
através da Internet, e identificar os efeitos que as tecnologias têm na sua vida quotidiana e na das suas
famílias, são também algumas das formas de exploração para atingir este objetivo” (Silva, 2004: 29).
Ensinar as crianças sobre as vantagens e desvantagens da utilização das TIC,
apresenta-se como um aspeto bastante importante. A supervisão de um adulto pode
evitar o acesso das crianças a conteúdos inapropriados e a situações de perigo na
internet (Silva, 2004).
Desta forma, a escola tem de se redimensionar de modo a garantir e integrar
no dia a dia dos seus alunos, as ferramentas indispensáveis do quotidiano como o
computador, internet, e-mail entre outros (Correia, 2004). Mais do que o material que
as escolas têm disponíveis, o importante é que percebam o que fazer com ele.
De uma forma simplista, se olharmos para as TIC como uma linguagem onde
podemos ter processamento de texto, internet, e-mail entre outros, facilmente
percebemos que é crucial garantir atividades que trabalhem estes segmentos de
forma a facilitar o ensino e aprendizagem (Correia, 2004).
3.3.2- Inclusão Digital
O crescimento das tecnologias de informação e comunicação, nas sociedades
contemporâneas, tem determinado algumas clivagens no acesso às mesmas. Assim,
entre aqueles que conseguem ter acesso a esta nova era tecnológica e aqueles que
não conseguem, é legítimo poder falar em desigualdade. É um tipo de desigualdade
de acesso a serviços, por assim dizer, mas que pode conduzir a um fenómeno
conhecido por exclusão digital. As novas tecnologias necessitam de um background
específico para o seu uso, de competências que carecem de aprendizagem. Como
estas novas tecnologias permitem o acesso a nova informação e, por conseguinte, ao
conhecimento, facilmente concluímos que nem todos estão em pé de igualdade.
Desta forma, na chamada sociedade de informação em que nos encontramos
corremos o perigo de viver fenómenos de exclusão digital que se vêm sobrepondo a
outros tipos de exclusão. Para evitar este tipo de fenómenos, as escolas devem unir
esforços de forma a possibilitarem o acesso às novas tecnologias por parte dos mais
carenciados.
De um ponto de vista mais global, o termo inclusão digital, entrou na esfera
social e política através da implementação dos chamados Programas Sociedade da
Informação, nos diversos países, em especial naqueles que compõem a União
Europeia (UE) (Bonilla e Pretto, 2011). “Diversos estudos sociais, políticos, culturais e
econômicos sobre as transformações que têm ocorrido na sociedade contemporânea, em geral, têm
enfatizado a difusão crescente das tecnologias da informação e comunicação, em escala mundial. Em
Capítulo 3|O Estágio
Tiago Santos
40
muitos destes, são enfatizados e criticados os contextos políticos nos quais nascem as proposições
destinadas a constituir, em escala mundial, uma «Sociedade da Informação» ” (Bonilla e Pretto,
2011: 23). A universalização do acesso às tecnologias da informação e comunicação
deve ser uma prioridade combatendo assim fenómenos emergentes de exclusão
digital (Bonilla e Pretto, 2011).
No plano da escola inclusiva a diferença deve ser respeitada e valorizada. A
estratégia da escola inclusiva deve sempre ter em conta que todas as crianças são
indivíduos com diferentes características e ritmos de aprendizagem. O objetivo é um
tipo de ensino mais eficaz, ao alcance de todos (Stubbs apud Pereira, 2008: 56).
A medida IV do “Programa Escolhas”, inscreve-se nesta temática especifica, o
projeto Trampolim, aposta nas TIC, para a promoção da inclusão. As novas
tecnologias cada vez mais têm sido utilizadas para melhorar os resultados
educacionais e promover a inclusão social. Deve existir uma aposta forte na oferta
educacional que procure usar as tecnologias para promover a igualdade de
oportunidades e resultados educacionais. Sabemos que uma maioria tem acesso a
material tecnológico e pode trabalhar e evoluir neste contexto. Mas tal não acontece
com as minorias, como a comunidade cigana. Escasseiam as condições para
disponibilizar às crianças computadores ou acesso à internet de forma a melhorar a
aprendizagem neste campo. Assim, um dos objetivos é mitigar as diferenças no
acesso a estas ferramentas tecnológicas, apostando no acesso às tecnologias que
procurem usar a educação para garantir a inclusão social em termos de
oportunidades e resultados tecnológicos.
Tendo em conta a necessidade de inclusão digital para uma melhoria da
educação, o Projeto Trampolim tem assumido uma enorme importância para
implementar esta abordagem na Escola Básica EB1 do Ingote. Os alunos desta
escola são oriundos, na sua maioria, dos Bairros socias do Ingote e da Rosa onde
mais de metade são de origem cigana. Sabendo que alguns problemas identificados
nestes bairros são o abandono escolar precoce, absentismo escolar, o insucesso
escolar e um desinvestimento das famílias no percurso escolar dos filhos, a estratégia
é uma aposta nas TIC como forma de intervenção, de modo a apoiar estas crianças
no seu trajeto escolar e, também, a motivá-las a continuar a estudar. Acreditamos,
então, que o Ensino Digital dá um contributo significativo como forma de melhorar o
acesso a estas tecnologias, ajudando a uma maior motivação face à escola e a uma
melhoria concreta dos resultados escolares.
3.4- Atividades Desenvolvidas
Capítulo 3|O Estágio
Tiago Santos
41
Como já referi anteriormente, a realização de um estágio é um excelente
modo de adquirir competências e ganhar experiência profissional. Neste sentido,
sempre tentei, no decorrer do estágio, participar no máximo possível de atividades
desenvolvidas pelo Projeto, de modo a apreender diferentes perspetivas e conseguir
uma aprendizagem sobre vários prismas. Neste ponto do Relatório, procedo a uma
descrição das atividades realizadas durante o estágio, dando especial destaque ao
apoio semanal aos alunos da Escola EB1 do Ingote .
3.4.1- Elaboração e Aplicação de Questionários
Numa fase inicial do meu estágio, em meados de setembro, foi-me dito, pela
equipa do Projeto, que gostariam de ter um instrumento que lhes permitisse saber a
opinião sobre o projeto e o grau de satisfação com as atividades do mesmo. Seria
uma boa oportunidade para confirmar o feedback que recebiam, constantemente, da
população que participava nas atividades do Trampolim e que certamente serviria de
apoio à candidatura que se iria realizar em outubro à 5ª geração do Programa
Escolhas. O objetivo central desta tarefa seria utilizar os resultados como suporte à
candidatura, atestando a importância deste projeto. Os questionários tentaram
principalmente, perceber a opinião dos jovens e crianças, moradoras dos Bairros da
Rosa e do Ingote, sobre o Projeto Trampolim e, as suas atividades.
Neste sentido, concordámos que o caminho a tomar seria a realização de
inquéritos aos destinatários do projeto, ou seja, a crianças e jovens dos 6 aos 24
anos. No curto espaço de tempo que dispunha para a realização desta tarefa, mais
ou menos duas semanas, elaborei e apliquei um inquérito a esta população. O guião
do inquérito6 é dividido em quatro partes: I. Caraterização do indivíduo, II. Percurso
Escolar, III. Relação com os Bairros e por fim IV. Tempos Livres. Apliquei-o a 30
crianças e jovens e no final elaborei um relatório com algumas conclusões. O
principal objetivo da realização destes inquéritos seria o de perceber a opinião destes
jovens e crianças, moradoras nos Bairros, sobre o Projeto Trampolim e sobre as
atividades desenvolvidas, tentando perceber, de igual modo, por quem e de que
modo é frequentado este projeto.
De seguida apresento alguns dados referentes aos inquéritos. A distribuição
da amostra por algumas variáveis de caracterização é a que se apresenta nos
quadros seguintes:
6 Anexo I
Capítulo 3|O Estágio
Tiago Santos
42
Capítulo 3|O Estágio
Tiago Santos
43
Estes gráficos mostram a distribuição dos inquiridos em relação à sua idade,
género, etnia e local de residência. Dos 30 inquiridos temos um maior número do
sexo feminino. Foram os jovens com 9 anos que mais responderam a este
questionário. Em relação à etnia, há que dizer que apenas foram considerados
aqueles que participavam ou já tinham participado no projeto Trampolim. Deste
modo, de um universo de 21 jovens nesta situação, 13 são pertencentes à etnia
cigana e 8 não pertencem. Relativamente à residência, maioritariamente, os jovens
inquiridos moravam no Bairro da Rosa (20) sendo que os restantes estavam
distribuídos entre os Bairros do Ingote, Loreto, São Miguel e António Sérgio.
No percurso escolar, tentámos saber que ano frequentavam atualmente, se
tinham ou não reprovado algum ano e se no futuro gostariam de continuar a estudar.
Os próximos gráficos revelam o sentido das respostas destes jovens.
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Em 30 Jovens inquiridos apenas um total de 9 tinham já reprovado um ou
mais anos sendo que 21 nunca tinham reprovado apresentando-se assim, para esta
amostra, uma razoável taxa de sucesso escolar.
Talvez por isso, as expectativas destes jovens relativamente ao futuro escolar
são elevadas. Confrontados com a questão se gostariam de continuar a estudar, 9
responderam que sim, até a Universidade. Esta resposta demonstra que muito destes
Jovens tem consciência que o estudo é vital para o seu crescimento e para uma
Capítulo 3|O Estágio
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garantia de uma vida melhor. De salientar, ainda, que apenas 2 Jovens disseram não
querer continuar a estudar.
Quando questionados com a questão “Se pudesses escolher morava noutro
local?” 17 nomearam outros locais onde gostavam de viver e 13 disseram que não
gostavam de viver noutro sítio. Podemos, assim, observar que estes jovens se
sentem bastante ligados ao seu local de residência.
No que concerne aos tempos livres, quase na sua totalidade, os Jovens
questionados ocupam-nos no Bairro onde habitam. Dividem o sítio onde praticam os
seus tempos livres entre casa, rua e o espaço Trampolim, sendo o último aquele que
apresentou um maior número de respostas. Daqui podemos retirar que o Trampolim é
um alicerce importante para os tempos livres destes Jovens (em 30 inquiridos, 23
utilizam o Trampolim como meio de ocupar os tempos livres).
Capítulo 3|O Estágio
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O Trampolim apresenta-se como um Projeto central pois concentra a atenção
dos Jovens para a realização dos tempos livres, promovendo a sua educação,
formação e crescimento ao mesmo tempo que lhes são fornecidas algumas
ferramentas técnicas sobre as novas tecnologias. Deste modo, muitos dos Jovens
que dizem ocupar os seus tempos livres a jogar computador, frequentam o Trampolim
e, por conseguinte, a unidade de acompanhamento informático, o Cid Livre. Estes
Jovens estão, assim, acompanhados desde cedo, o que pode ser relevante para
prevenir algumas situações de risco.
As relações pessoais com os técnicos são uma razão fundamental para a
frequência do projeto Trampolim. Estes técnicos já fazem parte da vida destes
Jovens, fornecendo um apoio fundamental e necessário. Entre uma série de
afirmações que tinham como objetivo saber qual era a razão da participação no
projeto Trampolim, a maioria respondeu que frequenta este projeto por causa dos
técnicos.
Capítulo 3|O Estágio
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Estes Jovens sentem-se em casa no Trampolim e podemos perceber com os
resultados destes inquéritos, que o encerramento deste Projeto teria um elevado
impacto negativo, como revela a análise do próximo gráfico.
Capítulo 3|O Estágio
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Divididos entre não ter outra forma de ocupar os tempos livres e não ter outras
atividades interessantes nos Bairros, estes Jovens manifestam uma ligação muito
forte a este Projeto, que é mais do que uma forma de eles ocuparem os tempos livres
e participarem noutras atividades, é uma segunda casa. E com esta ligação tão forte,
é fácil perceber que seria difícil para eles encarar o encerramento do Trampolim.
3.4.2- Cid Livre
O Cid Livre é uma atividade dinamizada pelo Projeto Trampolim e está
incluída na medida IV, “Inclusão Digital”. Esta atividade consiste na utilização livre,
mas sob supervisão, dentro do espaço do Projeto Trampolim, da internet como
ferramenta para pesquisa de informação ou para a execução de trabalhos escolares
ou outros. Neste ambiente, os jovens podem ainda utilizar o Messenger e o Facebook
para comunicar com amigos e familiares. Podem também utilizar jogos online,
multimédia e didáticos em diferentes áreas fomentando assim o gosto pela
descoberta, a criatividade e autonomia. O meu papel nesta atividade era o de auxiliar
o monitor Cid@Net, na supervisão e apoio aos jovens aquando do desenrolar destas
atividades. Esta atividade permitiu uma aproximação aos jovens destinatários do
projeto, foi a partir daqui que os comecei a conhecer melhor, e eles a mim. Esta
experiência e conhecimento mútuo, para além de ter sido bastante importante para
mim, do ponto de vista pessoal, foi fundamental para a atividade central deste projeto.
3.4.3- Apoio às Famílias
O Projeto desenvolveu uma atividade de apoio às famílias que consistia no
esclarecimento de dúvidas e organização de documentos, na qual eu pude participar.
A atividade centra-se numa visita semanal a casa das pessoas com o objetivo de as
apoiar na gestão do quotidiano e da relação com as instituições, sobretudo nos
aspetos burocráticos. A tarefa principal consistia em selecionar os documentos e
cartas mais importantes, sendo estes organizados em pastas devidamente
etiquetadas para facilitar a procura. Criou-se um dossier com separadores com as
imagens das instituições mais importantes e mais comuns como a EDP, Câmara
Municipal de Coimbra, Hospitais da Universidade de Coimbra, entre outros. O nosso
trabalho com as famílias era selecionar as cartas mais recentes e verificar se tudo
estava em dia e organizar tudo para que as pessoas conseguissem aceder aos
documentos de uma forma mais prática e evitar que faturas perdidas ficassem por
pagar. Executei esta atividade com ajuda de um participante do Projeto Trampolim e
morador no Bairro da Rosa. Inicialmente dinamizámos esta atividade no Centro de
Capítulo 3|O Estágio
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Estágio Habitacional de Coimbra, Parque Nómada, onde tivemos ajuda do
Dinamizador Comunitário deste local que nos ajudou na comunicação com as
pessoas. Numa segunda etapa desenvolvemos esta atividade no Bairro da Rosa e do
Ingote. Foi uma experiência bastante enriquecedora que ajudou a comunicar com
outras pessoas da comunidade para além daquelas que frequentavam o Projeto
assim como perceber uma nova realidade, com a intervenção no Parque Nómada.
3.4.4- Exposição Fotográfica
Uma das atividades desenvolvidas no sentido do combate ao estigma e aos
estereótipos foi elaborar uma lista de ciganos famosos e transformá-la numa
exposição no espaço Trampolim. Foi-me pedido que elaborasse essa lista e que
fizesse uma pequena descrição sobre cada indivíduo identificado, elaborando um
cartaz em forma de moldura para cada um e este fosse afixado no espaço do
Trampolim. Esta atividade pretendia sensibilizar os jovens e crianças utilizadores
deste espaço para que estes vissem que existem casos de enorme sucesso na
comunidade cigana, mesmo sabendo que esta é, em muitos casos, vítima de
discriminação e que a sua afirmação na sociedade pode ser muito difícil. É importante
pôr estes jovens a pensar no futuro e fazê-los acreditar que vale a pena esforçarem-
se. Assim, o combate ao estigma e às representações sociais negativas tem de ser
feito desde logo pelos indivíduos desta comunidade. Muitas vezes os próprios se
autoexcluem e é importante fazer perceber que nada será fácil de alcançar e que o
princípio de meritocracia se pode aplicar tanto a eles como a todas as pessoas,
combatendo, assim, a explicação do insucesso a nível escolar ou profissional pela
diferença cultural que caracteriza a sua comunidade.
3.4.5- Acompanhamento Semanal aos Alunos da EB 1 Ingote
Esta tarefa encontra-se inserida, tal como o Cid Livre, na medida IV “Inclusão
Digital”. Esta foi a atividade principal que desenvolvi durante o meu estágio. Aquando
da minha chegada ao local de estágio pensei sempre em executar a minha principal
tarefa numa área na qual o projeto estivesse mais carenciado, querendo eu ser uma
mais-valia. Encontrei um projeto bem estruturado, bem planeado e executado,
estando todas as atividades asseguradas pelos técnicos do projeto. Também não
poderia iniciar de raiz um projeto para uma atividade, por um lado, porque o tempo de
estágio não seria suficiente para a sua realização e, por outro, porque o Trampolim
tinha diretrizes a seguir e um orçamento condicionado pelas entidades superiores.
Dado que a minha entrada neste estágio coincidiu com uma fase de restruturação do
Capítulo 3|O Estágio
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projeto, durante a qual teriam de apresentar uma nova candidatura do mesmo ao
Programa Escolhas para aprovação da 5ª geração. Nesta fase, começaram a surgir
alguns problemas nas atividades do Projeto, precisamente por não saberem se o
projeto continuaria ou não. Um desses problemas colocou-se na dinamização do
estudo acompanhado junto da EB 1 Ingote. Esta atividade consiste no
acompanhamento semanal dos alunos desta escola, do 1º ao 4º ano, aplicando
conteúdos didáticos através da utilização das TIC. Esta atividade era assegurada
com uma parceria com a “Escola Virtual” da Porto Editora. O projeto comprava
senhas de entrada para aceder ao conteúdo da “Escola Virtual” para todo o ano letivo
e assim seriam aplicadas matérias ajustadas para cada ano e estruturalmente
definidas por capítulos. Neste sentido, e dado que a continuidade do projeto não era
certa, este não poderia estar a despender dinheiro na compra de senhas de acesso,
sendo que existia a possibilidade do projeto terminar em dezembro. As novas
tecnologias e o seu enorme conjunto de funções e de funcionalidades sempre foram,
para mim, uma matéria de grande interesse. Assim, abracei o desafio de assegurar
esta tarefa de estudo acompanhado através das TIC na escola EB 1. Teria sob minha
responsabilidade a seleção e aplicação na sala de aula de conteúdos didáticos
segundo conteúdos programáticos do 1º ciclo. Com a ajuda do Monitor Cid
responsável por todas as atividades da medida IV, e com os professores da escola,
tentei sempre selecionar material que permitisse sessões lúdicas com um propósito
comum, utilizar as TIC no desenvolvimento de novas estratégias de ensino e
aprendizagem, tendo sempre em vista um aumento do sucesso escolar. Deste modo,
desde novembro até fevereiro, preparei as aulas para os alunos do 1º ao 4º ano,
tendo pesquisado conteúdos didáticos que fossem ao encontro dos temas
programáticos que estavam a ser dados nas aulas. A matemática e a língua
portuguesa foram os temas centrais, tendo encontrado bastantes sites com
conteúdos extremamente interessantes e que agarraram a atenção das crianças.
Entre esses sites destaco o Sítio dos Miúdos com a aplicação “Jogo da Sabedoria”7
que permitia a elaboração de perguntas segundo as três grandes áreas de ensino,
Matemática, Língua Portuguesa e Estudo do Meio. Outro site importante foi o “Eu sei
Eu sei- Centro de competências TIC da ESE de Santarém”8 com muitos conteúdos
para o 1º ciclo nomeadamente para o 1º e 2º anos, onde apresentavam vários jogos
com vogais. Por fim, outro site manifestamente interessante foi o da “Pasta Mágica”9
que, de igual modo, estava dividido por anos e por matérias, o que facilita muito a
7 http://www.sitiodosmiudos.pt/sabedoria/
8 http://nonio.eses.pt/eusei/
9 http://www.pastamagica.pt/
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51
utilização destas ferramentas. Elaborei, também alguns testes com a aplicação “Hot
Potatoes”10, nos quais incluí perguntas sobre vários temas em forma de “quiz” 11.
Abordei matéria como nomes coletivos, sinónimos, antónimos, várias componentes
gramaticais bem como alguns problemas matemáticos. A interpretação de textos foi
também uma preocupação, pois era o domínio que mais preocupava os docentes.
Por exemplo, muitos problemas matemáticos não eram resolvidos de uma forma
correta pelo fato dos alunos não interpretarem corretamente o pedido no enunciado.
Desta forma, elaborei também testes de interpretação sobre alguns textos12
. Tentei
ajustar o grau de dificuldade dos testes ao desenvolvimento das turmas, sabendo o
que eram capazes ou não de fazer, através do acompanhamento semanal que tinha
sido feito.
Sob a mesma ideia, a de inclusão digital, outras foram as nossas
preocupações. Sabemos que hoje é muito importante saber como manusear um
computador. Embora fossem os alunos a executar os jogos didáticos, esta tarefa não
seria suficiente para garantir uma aprendizagem a um nível mais completo. Assim
para os alunos do 3º e 4º anos, elaborei um teste com perguntas de cultura geral para
que utilizassem o motor de pesquisa Google 13 . Esta tarefa permitia uma maior
aproximação ao computador, ao mesmo tempo que aprendiam a pesquisar e a
compreender o que era pedido. Foi uma atividade que os alunos valorizaram e
apreciaram e que, creio, foi muito benéfica para o seu crescimento enquanto
utilizadores. Neste mesmo cunho de exploração das potencialidades do computador,
achámos também que seria interessante ensinar estes alunos os primeiros passos de
uma ferramenta muito importante, o Microsoft Word. Assim, os professores, em
algumas aulas, escolheram alguns textos que estavam a ser lecionados e os alunos
precederam à sua cópia nesta ferramenta.
10
O Hot Potatoes é um software educacional utilizado para criar exercícios sob a forma de objetos digitais para publicação na Internet. 11
Anexo II 12
Anexo III 13
Anexo IV
Conclusão
Conclusão
Tiago Santos
53
Este estágio curricular foi a minha primeira experiência no mercado de
trabalho e de certa forma uma antevisão do que pode vir a ser o meu futuro enquanto
trabalhador. Quando apareceu a hipótese de ingressar neste estágio não tive dúvidas
que seria uma excelente oportunidade e um grande desafio tendo em conta a
população-alvo deste projeto e a zona onde é dinamizado. O percurso desenvolvido
confirmou as minhas expectativas.
As problemáticas trabalhadas no Projeto Trampolim são complexas,
colocando enormes desafios à intervenção desenvolvida. O balanço que faço do
trabalho em que pude colaborar, durante o período do estágio, é bastante positivo. O
combate à exclusão social na comunidade cigana é um enorme desafio. A revisão de
literatura que realizei não deixava margem para grandes otimismos. A minha
participação no Projeto Trampolim contraria esta perspetiva.
Quer o conjunto de atividades desenvolvidas pelo Projeto, quer a área de
trabalho mais específica de trabalho em que estive inserido, apresentam resultados
muito positivos. O baixo rendimento escolar e o insucesso que se faz sentir logo
desde a escola primária é motivo de análise e da elaboração de uma série de
estratégias por forma a mitigar esta situação. Desta forma, fornecer um aumento de
competências, a vários níveis, como, por exemplo, através do recurso às TIC,
pressupõe uma interação social, não só entre técnicos e alunos, mas também entre
os alunos. Dinamizar esta população para se capacitar com mais e melhor
qualificação, através de formações contínuas, pode ser uma solução para o
problema. Uma interação entre os técnicos locais, comunidade alvo e centros de
formação permite perceber onde atuar e como o fazer. Esta dinâmica é bastante
importante para uma componente prática de resolução de problemas. Assim, é
indispensável criar novas formas de ensino e novas formas de integração para que a
motivação para a escola seja cada vez maior, sobretudo quando não existem
exemplos parentais de sucesso escolar positivo. Foi deste modo que o meu estágio
foi construído, através da atividade de apoio alunos da EB 1 do Ingote. O trabalho
com estes jovens e as TIC teve um repercussão muito positiva no seu percurso.
Todos os alunos transitaram de ano e todos os alunos do 4º ano que realizaram os
exames nacionais obtiveram aprovação. De realçar, ainda, que os professores desta
escola têm desenvolvido um trabalho incansável e é sobretudo sobre eles que deve
recair o mérito deste trabalho. É este trabalho em conjunto, neste caso entre projeto e
escola, que permite a evolução sustentada dos alunos percebendo as suas
dificuldades, tanto educativas como pessoais.
Conclusão
Tiago Santos
54
O Projeto Trampolim não conta com nenhum sociólogo nos seus quadros. No
entanto, acho que seria uma mais-valia a presença de um profissional desta área na
equipa. Num ambiente multidisciplinar, como é o caso deste projeto, um sociólogo
pode contribuir para uma mudança social positiva, através de uma intervenção ativa e
participante virada para a realidade vivida. Penso que neste projeto que trabalha
diretamente com a comunidade cigana, a sociologia aplicada podia ser um bom trunfo
para diagnosticar novos e velhos problemas e montar uma série de estratégias para a
sua resolução.
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Anexos
Anexo I
Anexo II
Anexo III
Anexo IV