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5/17/2018 A guerra colonial e as Forças Armadas - slidepdf.com
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A guerra colonial e as Forças Armadas
Em 1961 as Forças Armadas portuguesas assumem-se ,mais uma vez,
como guardiões do regime que tinha cloroformizado a vida nacional.
As fotografias e os relatos dos acontecimentos vividos a partir de Março
de 1961 no Noroeste angolano impressionaram o povo português e os
meios militares. Em Abril o ministro da Defesa, General Botelho Moniz,
apoiado por outros oficinais ocupando os mais altos cargos do aparelho
militar – Almeida Fernandes, ministro do exército . Costa Gomes,
subsecretário de Estado do Exército e Beleza Ferraz, chefe do Estado-
Maior-General das Forças Armadas, exige ao chefe do Estado a
exoneração do presidente do Conselho de Ministros , Oliveira Salazar. Estaatitude que continha uma importante componente relacionada com a
política colonial (provável autodeterminação das colónias),é contrariada
por Kaulza de Arrigada, subsecretário de Estado da Aeronáutica, que
defende a manutenção da política governamental da «defesa do
Ultramar»
A 12 de Abril, os ministros da Defesa Nacional e do exército recebem uma
carta do chefe do Estado repudiando a exoneração de Oliveira Salazar,atitude que viria a culminar com as próprias exonerações. Na sequência
do «golpe», Salazar passa a acumular, com as suas anteriores funções ,as
de ministro da Defesa e numa comunicação ao País, lança a palavra de
ordem: «Para Angola, rapidamente e em força.»
Contudo, em meados de Dezembro de 1961, a União Indiana ocupa Goa,
Damão e Diu, cujas peripécias perdurarão na memória dos militares como
exemplo da «habilidade» dos políticos para responsabilizarem as ForçasArmadas.
A rebelião de Beja, de 31 de Dezembro de 1961 para 1 de Janeiro de 1962,
foi o último grito de revolta, antes de um profundo empenhamento das
Forças Armadas na política colonial do regime.
A partir de então, as Forças Armadas atravessam um novo período de
«estabilização, que incluiu um maior controlo exercido pelas autoridades
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civis, simbolizado pela vigilância policial sobre os candidatos ás escolas
superiores militares, os oficiais e as Forças Armadas em geral.
A aventura colonial, concretizada pelo envolvimento profundo e contínuo
das Forças Armadas, vai afinal, a pouco e pouco, coloca-las perante arealidade, revelando-lhes o verdadeiro papel que lhes estava atribuído: o
da defesa dos interesses económicos de uma pequena minoria.
De uma população metropolitana e insular que, de 1960 a 1970, baixou de
8 889 392 para 8 668 267 habitantes, com uma componente emigratória
de cerca de milhão e meio de pessoas no período de 1960 a 1974 (onde se
incluiu um número sempre crescente de jovens desertores que recusam a
participação na guerra), foram recrutados cerca de 800 000 homens emtreze anos de guerra .
Este esforço exigido á população metropolitana foi sempre escamoteado á
opinião pública nacional, levada a acreditar em «simples operações de
polícia», quando, efectivamente, se tratava ,«em algumas zonas, de uma
verdadeira guerra».
Em Moçambique, na Guiné e em algumas zonas de Angola, as unidades, e
principalmente as subunidades- com excepção das chamadas tropa de
intervenção, fuzileiros navais, tropas de comandos e pára-quedistas-
,vivem em condições físicas, morais e psicológicas nada propiciadoras de
um espírito colectivo de luta e agressividade. «Na Metrópole ninguém faz
ideia do que o Exército está aqui a sofrer. Precisamos não só de apoio
moral, como de meios que nos permitem vencer as terríveis dificuldades
que enfrentamos minuto a minuto»
A maioria dos efectivos passa cerca de 18 meses em zona 100%-zona de
guerra declarada- ,podendo ,eventualmente, passar os restantes seis
meses e mais algum «mata-bicho»(terminologia de campanha para
designar o prolongamento da comissão ,até que se consumar a rendição
por unidade recém-chegada da Metrópole ,e que para o final da guerra se
aproximava muitas vezes dos seis meses),numa zona de 20 ou 50 %,
respectivamente, zona sem actividade inimiga ou de actividade reduzida.
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O esforço de mobilização pesa igualmente sobre os quadros permanentes,
já que estes, nos curtos intervalos entre as sucessivas comissões mal têm
tempo de estar com a família ,porque ao chegarem a Portugal, onde a
instrução de novos contingentes é contínua, têm que assegurar o
funcionamento normal de unidades carentes em meios humanos e
materiais, unidades que, na maioria dos casos, não se situam nas suas
áreas de residência.
Uma após outra, sucedem-se as comissões com pessoal cada vez pior
instruído, pela falta de tempo e de instrutores capazes em número
suficiente. O ingresso de jovens na Academia Militar é cada vez mais
reduzido e as autoridades vêem-se forçadas a alargar o âmbito da
mobilização a oficiais milicianos que tinham sido licenciados antes do
início da guerra. Contudo, esta medida não passa de simples paliativo para
as necessidades sempre crescentes . Facilita-se , por isso ,a entrada na
Academia Militar a oficiais milicianos e depois, a sargentos; forma- se um
novo quadro de oficiais, o Quadro Especial de Oficiais, QEO . As
necessidades em pessoal enquadrante a nível de capitães, alferes e
sargentos conduz a alternâncias na cadeia hierárquica, sempre prejudiciais
numa organização que tem como base a disciplina ,já de si tão diluídapelas condições concretas da guerra.
Apesar da extrema diluição das frentes, da dispersão dos efectivos e da
forma insidiosa dos incidentes militares, aliás característicos da guerra
subversiva, esta guerra de treze anos não foi, comparativamente a outras,
excessiva em baixas .
Cada guerra tem ,todavia, as suas características. Uma guerra de
guerrilhas como a que se desenvolveu em Angola, na Guiné e em
Moçambique, sem grandes meios técnicos de parte a parte, sem ataques
de massa, desenvolvida em grandes extensões, onde as forças militares
portuguesas dispõem de superioridade aérea e de meios materiais,
embora actuado em climas inóspitos e terrenos desconhecidos e os
guerrilheiros dos movimentos de libertação, embora com menores meios
,dispõem, de uma forma geral, do apoio da população, das matas, da
mobilidade dos seus pequenos grupos e da actuação indirecta através deminas e armadilhas, tal guerra não pode ser comparável a uma guerra de
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tipo clássico, como , por exemplo, a enfrentada pelo Corpo Expedicionário
Português durante cerca de dois anos na Primeira Guerra Mundial. Por
isso não poderá provar-se a benignidade da guerra colonial, ao comparar
7908 mortos e os 14 884 incapacitados causados ao CEP com os 6340
mortos e os 112 205 feridos e doentes sofridos pelas forças portuguesas
durante treze anos de guerra em Angola ,Moçambique e Guiné no período
de 1961 a 1974.
No que respeita ás despesas de defesa, verifica-se que, durante os anos de
guerra, elas chegam a ultrapassar os 7% do Produto Interno Bruto,
enquanto o efectivo das forças mobilizadas por Portugal ultrapassa os 7 %
da população activa. Contudo, o índice que reflecte mais preocupante o
profundo empenhamento de Portugal na guerra é a percentagem que
ultrapassa os 40 %. Ele diz bem do esforço económico pedido á nação
portuguesa ,bem assim dos sacrifícios e das privações a que os
portugueses foram obrigados.
Esta guerra, a mais longa ao sul do Sara, com uma duração que nenhum
outro país da Europa industrializada conseguiu ( nem na maior parte das
vezes quis)manter ,representa em si mesma ,e nas suas consequências ,o
verdadeiro paradoxo que foi a criação do «subimpério» português.
Subimpério a que o Exército, no extremo da sua paciência, põe fum
enquanto as comunidades coloniais acreditavam que se manteriam
,graças aos militares que elas, apesar disso, olhavam com pouca simpatia.
Em suma, o esforço imenso das Forças Armadas portuguesas, que
puderam dilatar até ao inesperado o prazo de actuação dos governantes,
da diplomacia e da política, ver-se-ia inutilizado se aí se não tivesse
forjado o movimento de oposição que conduziu ao derrube do regime,
numa acção que redimiu as Forças Armadas do seu longo silêncio e da
dominação consentida das suas virtudes .